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ao contrário do livro de Inês Meneses, a tas, nunca largou as rédeas da ambição


propósitos e ferramentas que merecem de publicar livros relevantes.
a nossa reflexão: novos meios de fideli-
zação de leitores; a importância de um &21&/86 2 28$',7$'85$'2&25$
grupo identitário bastante demarcado ¤ 2 Quando trocava impressões sobre
ter espaço para falar dos seus temas. este texto com um amigo, este trouxe-
Mas então o que justifica esta crítica e -me uma imagem há muito esquecida:
estes minutos roubados ao leitor? a ditadura do coração que é praticada
Se a objetos como este livrinho de Inês no reino do kitsch, como explica Milan
Meneses respondermos sempre com o Kundera n’“A Insustentável Leveza do
nosso silêncio, acabamos por assistir ao Ser”. Talvez estejamos perante o piná-
alastrar deste contágio de publicações culo dessa lógica em que, como sabe-
sem sentido que tem como resultado mos, só a sensibilidade de cada um inte-
máximo a estupidificação do leitor e a ressa e a razão já não tem lugar para
diluição de todo o texto escrito, corren- levantar objeções nesta fraternidade
do nós o risco de sermos obrigados pela onde todos aceitam tudo o que se lhes
multidão a dizer (em jeito de sketch) apresenta, em nome de uma camarada-
que a frase escrita na porta da casa de gem inerte e sem capacidade de mapea-
banho do bar tem o mesmo valor que mento da realidade.
os sonetos do Antero ou que o Raul Ultrapassamos assim em larga medida
Minh’alma é a nossa Maria Velho da os chavões do final do século passado,
Costa da era digital. Em suma, no meio porque já nem só de aproveitamento da
da falta de sentido é preciso dizer: por alienação das massas estamos a falar. Os
aí, não vou. agentes artísticos e culturais que culmi-
 nam hoje na elaboração estratégica de
0$,680$92/7$ Em jeito bernhardia- campanhas de marketing e legitimação
no, repetimo-nos na busca do espírito e (formal e institucional ou informal e popu-
motivo da obra. Este livro de Inês Mene- lar) chegam à massa consumidora sem
ses só é possível devido à sua populari- a necessidade de um plano prévio ou de
dade enquanto radialista e enquanto algo a ser alcançado: um prémio, uma
figura pública nas redes sociais (e jun- referência no jornal, uma troca de impres-
tamos assim a lógica deste livro à do sões entre dois leitores. O marketing é a
“Resumo de 2017 para Todos” de Miguel própria pessoa e a sua biografia, que foi
Somsen e Hugo van der Ding, que, par- erguida pelo seu ofício e pela sua pose
tindo da popularidade dos seus autores nas áreas de entretenimento.
e de textos do Facebook, é ainda assim É também por isso que acabamos este
mais oportuno que este). texto sem estarmos especialmente deses-
Com um grande e variado alcance de perançados. Quem aderir a esta jogada
pessoas ao seu dispor, Inês Meneses não abysmal (e aqui relembramos que a fra-
continua uma tradição literária, não rei- se icónica de Teixeira de Pascoaes con-
vindica uma nova forma de comunicar, tinua na última folha do livro como um
não expõe assuntos tabu ou de difícil frame absurdo num filme onde o reali-
descrição. E também por isso somos zador tivesse adormecido por cinco minu-
obrigados a pensar que Inês Meneses tos) não sofreu, de todo, a habitual com-
nos brinda com os seus “Amores (Im)pos- pressão de perspetivas que ao livro estão
síveis” por um impulso narcisista ou de normalmente subjacentes e que tentam,
natureza financeira. quase sempre, alcançar a homogenei-
Outra tarefa que caberá a cada leitor zação das ideias e das edições. Quem
que conheça o catálogo da Abysmo é a compactuar com esta ideia já terá o seu
de refletir o que é esta peça disforme e sentido crítico arrasado e, sobre isso, a
o que significa para a identidade edito- cada um caberá mapear e nomear os
rial de um projeto que, tendo-se apre- responsáveis que encomendaram o ser-
sentado bastante desigual nas suas apos- viço aos bulldozers.

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