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Patrimônios Culturais
Investigações para a
iniciação à pesquisa
Rogerio Proença Leite
Eder Claudio Malta Souza
Organizadores
REITOR
Angelo Roberto Antoniolli
VICE-REITOR
André Maurício Conceição de Souza
COORDENADORA GRÁFICA
Germana Gonçalves de Araújo
CONSELHO EDITORIAL
Adriana Andrade Carvalho
Albérico Nogueira de Queiroz
Ariovaldo Antônio Tadeu Lucas
Dilton Candido Santos Maynard
Eduardo Oliveira Freire
José Raimundo Galvão
Leda Pires Correa
Maria Batista Lima
Maria da Conceição Vasconcelos Gonçalves
Maria José Nascimento Soares
Pericles Morais de Andrade Júnior
Vera Lúcia Correia Feitosa
Revisão Textual
Hudson Ferreira Aragão
Revisão Técnica
Eder C. Malta Souza
São Cristóvão/SE
2013
ISBN: 978-85-7822-342-7
1. Sociologia urbana. 2. Antropologia urbana. 3. Patrimônio
cultural. I. Leite, Rogerio Proença. II. Souza, Eder Claudio Malta.
CDU 316.334.56
11 Apresentação,
Rogerio Proença Leite e Eder Claudio Malta Souza
Prefácio
muito a acrescentar, isso sim, ao edifício do saber urbano para que este
livro tanto contribui ao dar-lhes visibilidade. Nas cidades com menos de
750 mil habitantes vive hoje 60% da população mundial, sendo uma lar-
ga maioria residentes de aglomerados menores de 100 mil. Para a teoria
urbana hegemónica e consagrada norte-ocidental, esta realidade urba-
na vive na margem insignificante de um mundo de poderosas megaci-
dades. O que esse estatuto subalterno de cidades situadas ao lado tem
de pior é que, além de político, ele é também epistémico. São cidades
destinadas a viver sem teoria explicativa. Destinadas a sobreviver sem
serem compreendidas, quiçá, sem reflexão sobre si próprias e o mundo
urbano que as envolve, destinadas que pareciam a permanecer na som-
bra do entendimento.
O locus da enunciação deste Cidade e Patrimónios Culturais é po-
tencialmente gerador de uma renovação nos modos de analisar as cida-
des contemporâneas. Vem juntar a sua narrativa às vozes que reclamam
um lugar epistémico para as outras cidades. Cidades pequenas. Cidades
do Sul global. Vivem os seus dramas, as suas capacidades, os seus patri-
mónios de modo diferente. Têm um sentido de lugar que outras não têm
e que começa a fazer sentido por todo o mundo académico de hoje. Têm
uma história vivida de proximidades e memórias intensas. Nada disso
pode ser visto como trajeto negativo, fracassado ou impotente do que
seria o seu expectável destino de cidades a crescer em conformidade
com o modelo canónico de cidade do Norte global. As outras cidades
não são cidades do avesso, o retrato em negativo das hegemónicas ci-
dades globais.
É de estórias destas outras cidades que fala o livro do LABEURC. De-
tém-se com propriedade, por exemplo, sobre os patrimónios e as políti-
cas de revitalização urbana. As abordagens, sendo diversas, são também
instigantes. Colocam a tónica na rua e nas sociabilidades, nos centros
históricos, nos mercados, nas ruínas e nas calçadas que pisamos. Todos
ingredientes que fazem as cidades de hoje, grandes e pequenas. São, ao
mesmo tempo, arte e memória, tecendo uma porosidade por onde uma
se combina com a outra e, no final, tornam presentes as coisas do seu
passado urbano.
Os patrimónios urbanos têm de ser analisados sem qualquer ce-
dência à preocupação com a noção de autenticidade e de sua irrestrita
conservação. Este é um conceito demasiado vago, como Françoise Cho-
LABEURC, da qual saímos com o mesmo recato com que entrámos. Mas
mais reconfortados por sabermos que, afinal, a obra-prima, qualquer
que ela seja, é tão só a obra primeira e que, portanto, outras se seguirão.
Carlos Fortuna
Faculdade de Economia
Centro de Estudos Sociais
Universidade de Coimbra
Apresentação
Av. Ivo do Prado até a Praça João XXIII (sentido leste/oeste) e da Praça
General Valadão até a Av. Coelho e Campos (sentido sul/norte).
Quanto a parte mais ao sul do centro, que na década anterior já ha-
via perdido substancial número de moradores em virtude do crescimen-
to e alargamento da zona comercial, nos anos 1980 começa também
a presenciar a fuga gradativa de lojas e boutiques para bairros de elite
que se desenvolvem no eixo sul da cidade. Bairros como Salgado Filho
e Grageru começam a revestir-se de características de nova centralida-
de, atraindo importantes empreendimentos imobiliários e passa a servir
uma gama de novos serviços e comércio. Nesta década temos também a
instalação do Shopping Riomar. Localizado na zona sul, o primeiro sho-
pping da cidade ajudou a reforçar o processo de fuga das classes média
e alta da área central.
Ao analisar os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Es-
tatística) de 1980 a 1991, França (1999) demonstra que o número de pes-
soas que deixaram o centro e os bairros centrais como local de moradia
representou uma redução de cerca de 20% de sua população. A situação
só não se mostrou pior por conta da saída de moradores já na década an-
terior. Nos anos 1990 o recuo no montante de habitantes da área central
não cessa ainda que desacelere, uma vez que o número de moradores já
não era tão grande assim. De acordo com Vilar (2002), se em 1991 o cen-
tro possuía um contingente demográfico de 10.076 pessoas, em 1996
ele não passava de 9.255.
Em contrapartida, bairros como 13 de Julho, Grageru e Coroa do
Meio apresentaram acréscimos populacionais consideráveis, influen-
ciados principalmente pelo crescente fenômeno da verticalização. A
verticalização passou a predominar também na ocupação de novas
áreas, como foi o caso da formação do Jardins, bairro de classe média
que, junto com o shopping center de mesmo nome, passou a represen-
tar, no final deste período, uma das mais importantes centralidades da
capital sergipana.
Ainda que as perdas populacionais, a saída maciça das classes abas-
tadas e a migração do comércio de luxo tenham se mostrado uma re-
alidade bastante evidente nas últimas três décadas do século XX, isto
não representou uma diminuição da atividade comercial no centro da
capital. Ao contrário, verifica-se que a expansão do comércio e a perda
de características residenciais foram processos inter-relacionados. O que
históricas de seu povo. Sendo assim, seu potencial turístico era indiscu-
tível. Partindo deste pressuposto, três Setores Especiais de Turismo (SET)
foram identificados, sendo que em cada um deles a estratégia de inter-
venção deveria seguir critérios específicos.
No primeiro SET, conhecido como “Rua da Frente”, a ideia era resgatar
a relação de animação do Centro Histórico com o Rio Sergipe. Para isto,
as principais ações foram o alargamento da calçada ribeirinha, criando
um passeio que se projeta sobre o rio, a reforma da iluminação pública,
criando um eixo de luz que, nas expectativas do projeto, atrairia passeios
noturnos, e a desobstrução visual do rio. Na região do porto, foram reti-
rados bares e construções que vedavam a paisagem do rio e, segundo
o projeto, depreciava seu potencial turístico. Além destas ações, outras
foram projetadas mas não saíram do papel, a exemplo da proposta de
criação de um museu interativo do folclore e comidas típicas.
No segundo SET, definido como “o coração do Centro Histórico”, o
foco eram as Praças Fausto Cardoso, Almirante Barroso e Olímpio Cam-
pos, as quais deveriam funcionar como “a sala de entrada e ponto princi-
pal de recepção turística de Aracaju” (TRAMA, 1997, p. 19). As ações pla-
nejadas para esta região tinham intenção a intervenção e a valorização
das edificações do entorno; a “revitalização” da ponte do imperador com
retorno de sua função primitiva, ou seja, recepcionar embarcações que,
no caso atual, seriam catamarãs que operam cruzeiros turísticos no Rio
Sergipe; iluminação diferenciada das edificações de destaque; e incenti-
vo à implantação e/ou transferência de agências operadoras de turismo
para esta região. Há de se destacar, no entanto, que as intervenções deste
perímetro ficaram restritas à pintura das fachadas dos edifícios históricos,
aos serviços de paisagismo e à reforma do calçamento e de seu mobiliá-
rio urbano. A Ponte do Imperador também passou por reforma significa-
tiva, mas não conseguiu ser ponto de recepção de embarcações.
Para o SET de número três, composto pela Praça General Valadão,
a expectativa era transformá-lo em um ponto de irradiação do processo
de recuperação e animação da imagem urbana em direção ao mercado
municipal, atribuindo-lhe a função de praça de happy hour. Pretendia-se
inclusive a criação de espaços para pequenos shows musicais e apresen-
tações folclóricas, com mesas ao ar livre.
O projeto fazia ainda outra ressalva bastante interessante: embora
a perda de grande parte de seu mercado consumidor em favor de no-
Referências Bibliográficas
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Documentos e Jornais
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em: <www.aracaju.se.gov.br/agencia>. Acesso em agosto de 2007.
Companhia Estadual de Habitação e Obras Públicas [CEHOP]. 1995. Projeto de
Tendo por base esta análise de Da Matta (1997), a qual postula ser
a Casa e não a Rua a fiel representação do âmbito da realização pesso-
al, R. P. Leite aponta que, no caso do Brasil, “esse excesso de familismo
poderia ser compreendido em decorrência da inexistência histórica
de uma cultura política que dissociasse as esferas pública e privada”
(Leite, 2001, p. 142). Este autor atribui esta particularidade brasileira
à singular trajetória das relações entre o Estado e a Sociedade Civil,
que muitas vezes não respeitou os limites entre as esferas pública e
privada, fazendo com que esta frequentemente adentrasse e mesmo
se fundisse ao domínio da coisa pública. Assim, a falta de uma cultu-
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Documentos e Jornais
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EMSURB. 2001. Relatório da atual situação dos Mercados Albano Franco, Antônio
Franco e Thales Ferraz, Aracaju.
Notas
2 Esta descrição da tipologia de bens passíveis de serem tombados foi retirada da Lei
Estadual Nº 2.069 de 28 de Dezembro de 1976, que apesar de ser relativamente antiga já
demonstra uma concepção mais abrangente e heterogênea do que poderia vir a ser o
Patrimônio Histórico e Artístico, mesmo que na prática esta multiplicidade de bens não
seja contemplada, conforme se pode verificar na Relação de Bens Tombados pelo Estado
de Sergipe.
3 Essa geração, chamada de New Urbanism, surge na década de 60, e é composta por
basicamente arquitetos e projetistas urbanos americanos e europeus.
4 Zukin denomina vernacular as paisagens construídas pelos desprovidos de poder e
afirma que elas sempre estão em conflito com a paisagem imposta pelas camadas mais
privilegiadas da sociedade.
7 É interessante notar que com a revitalização acontece algo curioso quanto aos usos
do Thales Ferraz: nele as pessoas muito mais passam do que ficam, isto é, pode-se observar
que este mercado se configura mais como um espaço de passagem do que de permanên-
cia, mesmo com a presença de lanchonetes e bares. Talvez isso possa ser atribuído ao fato
de este mercado se localizar entre o “Antônio Franco”, onde se concentra todo o artesanato
e os restaurantes mais elitizados e o Albano Franco, complexo de abastecimento de produ-
tos hortifrutigranjeiros. Nesta perspectiva, o Thales Ferraz acabaria servindo como ponto
intermediário de acesso aos serviços dos mercados vizinhos.
11 A primeira versão do Forró Caju se deu ano de 1987 quando a festa ainda era na praça
Fausto Cardoso, então conhecida como “Praça do povo”. Um ponto digno de nota é que
naquele tempo o público era basicamente dos grupos sociais de menor renda. Com a mu-
dança da festa para o Mercado Central, percebe-se que o evento passou a atrair camadas
sociais diversas, inclusive a classe média, o que sugere a aproximação dessas classes eliti-
zadas no Mercado, espaço que antes da “revitalização” lhes era estranho.
Rua da Cultura:
1. Introdução
Recorrendo à teoria de Victor Turner de drama social proponho ana-
lisar neste artigo o surgimento, na cidade de Aracaju, de um movimento
intitulado Rua da Cultura. Dividirei o evento nas suas quatro fases, farei
uma breve interpretação e explicitarei características intrínsecas à socie-
dade. Tudo isto através do Drama Social.
O movimento Rua da Cultura teve iniciou em 2002, circunscrito à
Rua Vila Cristina, em frente ao Teatro Atheneu, tradicional casa de es-
petáculos de Aracaju2. A rua Vila Cristina está localizada no bairro São
José zona residencial habitada pela classe média alta da cidade e nesta
mesma rua está a associação Atlética de Sergipe. O movimento foi uma
iniciativa encabeçada por Lindemberg Monteiro, diretor teatral e funda-
dor da companhia de teatro Stultifera Navis. Esta companhia de teatro
surgiu no Rio de Janeiro há doze anos e, com a vinda de um de seus
fundadores para Sergipe – Lindemberg –, foi formado há quatro anos o
núcleo teatral em Aracaju.
O movimento, todas as segundas-feiras à noite, transformava a rua
Vila Cristina – um espaço prioritariamente de passagem durante o dia e
ermo à noite – em um palco de artistas e de múltiplas interações sociais,
possibilitando o encontro entre artistas e público, entre grupos sociais
distintos. Posteriormente, devido ao conflito irrompido pelo Drama So-
cial, a Rua da Cultura teve que escolher um novo local de realização e
este novo espaço foi a rua Santa Rosa, localizada no centro histórico de
Aracaju. Neste novo espaço o movimento ressignificou ações e criou la-
ços que permanecem até o momento atual. Este artigo, no entanto, será
referente ao que classifico como primeiro momento da Rua da Cultura, o
período do Drama Social.
3. As Fases do Drama
Figura 01
Figura 02
Figura 03
3.2. A Crise
Após o rompimento com a estrutura, dada na primeira fase, segue-
se a crise. Esta é, de acordo com Turner, uma fase liminar, uma vez que se
encontra entre duas fases razoavelmente estáveis do processo. Aqui as
máscaras caem e a situação se mostra insustentável, não há como adiá-la
3.3 A Reparação
Na terceira fase, Turner afirma que uma vez a crise instalada, para
conter a sua influência e restabelecer o status quo anterior do grupo
em questão, mecanismos de contenção são acionados. Estes meca-
nismos podem variar desde ações embasadas na estrutura jurídica da
sociedade até conselhos pessoais ou mediações informais. É a fase na
qual tanto as ações pragmáticas quanto as simbólicas alcançam seus
níveis mais expressivos.
Se por acaso os mecanismos de contenção falharem, retorna-se à
fase de crise, podendo haver repressão, explosão de violência, revolta ou
conflito armado. No caso aqui analisado não houve conflito físico direto,
pois o embate deu-se, basicamente, no âmbito jurídico.
No dia 14 de março de 2003 foi uma enviada “notitia criminis”, atra-
vés do Promotor de Meio Ambiente José Rony Silva Almeida, ao Juizado
Especial Cível e Criminal da Comarca de Aracaju, informando sobre o
acertado na audiência do dia 24 de fevereiro e o descumprimento da lei
pelo Projeto Rua da Cultura que insistia em permanecer no local:
3.4 A Resolução
Esta fase, a última delas, consiste na resolução do conflito, ou, acre-
dita Turner, no reconhecimento social e na legitimação de uma cisão ir-
reparável entre as partes em confronto. Ao fim desta fase encerra-se o
4. Considerações Finais
Turner afirmou: “É no drama social que começa a reflexividade. Se o
drama social regularmente implica conflito de princípios, normas, pessoas,
ele igualmente implica o crescimento da reflexividade”16 (Turner, 1974, p.
103). Analisando o conflito da Rua da Cultura, podemos afirmar que nele
há algo de significativo a ser explicitado sobre a sociedade em questão.
Alguma característica intrínseca a esta sociedade, através deste conflito,
veio à tona, tanto aos olhos do cientista social que a analisa, quanto, mes-
mo que parcialmente, aos próprios atores sociais que estão envolvidos na
trama. O conflito explicitou a intolerância e a distância social entre grupos
que habitam a mesma cidade, uma cidade territorializada, portanto.
A cidade, a diversidade de grupos sociais que abriga, tem, como
afirmou Arantes (2000), seu espaço territorializado. A partir daí surgem
as zonas de pertencimento e a ideia de pessoas fora do lugar. Surgem
Referências bibliográficas
ARANTES, Antônio. 2000. A. Paisagens Paulistanas: transformações do espaço
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TURNER, Victor. 1974. Dramas, Fields and Metaphors: Simbolic Action in Human
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TURNER, Victor. 1982. From Ritual to Theater, New York, Performing Arts Journal
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Jornais
NOGUEIRA, Kelly. Lugar de Cultura é na Rua, in Jornal A Semana, 16 a 22 de mar-
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Documentos
ABAIXO-ASSINADO. Encaminhado à Curadoria de Direitos do Cidadão, pelos
condôminos do Edifício Le Corbusier. Ministério Público do Estado de
Sergipe.
Internet
MAGNANI, José Cantor 1992. Tribos Urbanas, metáfora ou categoria?, Dispo-
nível em <www.aguaforte.com/antropologia/indice.htm>, Acesso em 16
nov. 2003.
Notas
3 Tradução livre de: “I had already come, before doing field work, to insist on the dynamic
quality of social relations and to regard Comte´s distinction between “social statics” and “social
dynamics” – later to be elaborated by A.R. Radclife Brown and other positivists – as essentially
misleading. The social world is a world in becoming, not a world in being (…) and for this rea-
son studies of social structure as such are irrelevant. They are erroneous in basic premise becau-
se there is no such thing as “static action”.
4 Tradução livre de: “units of aharmonic or disharmonic process, arising in conflict situations”.
5 Tradução livre de: “four main phases of public action, accessible to observation”
6 Tradução livre de: “A dramatic breach may be made by an individual, certainly, but he
always acts, or believes he acts, on behalf of other parties, whether they are aware of it or not.
He sees himself as a representative, not as a lone hand”.
15 Tradução livre de: “He can now analyze the continuum synchronically, so to speak, at this
point of arrest, having already fully taken into account and represented by appropriate cons-
tructs the temporal character of the drama”.
16 Tradução livre de: “Its in social dramas that plural reflexivity begins. If social drama regu-
larly implies conflict of principles, norms, persons, it equally implies the growth of reflexivity”.
17 Tribo urbana enquanto metáfora e não categoria. Usada aqui em um dos sentidos
descritos por Magnani: “para designar uma tendência oposta ao gigantismo das institui-
ções e do Estado nas sociedades modernas: diante da impessoalidade e anonimato destas
últimas, tribo permitiria agrupar iguais, possibilitando-lhes intensas vivências comuns, o
estabelecimento de laços pessoais e lealdade, a criação de códigos de comunicação e com-
portamento particulares” (Magnani,1992, não paginado)
A modernidade e a Rua:
Av. Atlântica. Rio de Janeiro, 1921. Foto Augusto Malta. Acervo de Arquivo Geral da
Cidade do Rio de Janeiro. Calçada da praia de Copa Cabana com as atuais curvas
sinuosas realizadas por Burle Marx. Foto: TEIXEIRA; VEIGA, 2007.
há um impacto muito grande, pois aponta mais uma vez a cidade de São
Rua João Pessoa na década de 40. Pessoas caminhando por entre os trilhos. Fonte:
MELINS, Murilo. 2007, p. 29.Rua João Pessoa na década de 60. Intenso movimento de
carros e pessoas. Fonte: MELINS, Murilo. 2007, p. 35.Rua João Pessoa na década de 70.
Aparentemente mais tranqüila, porém com movimento de pessoas sempre intenso.
Fonte: Arquivo Público da Cidade de Aracaju. Foto de autoria desconhecida.
Calçadão da Rua João Pessoa na década de 90. Sem a pedra portuguesa, o calçadão
recebe um piso “moderno”. Fonte: Imagem divulgada no site da Empresa Municipal
de Obras e Urbanização (EMURB). www.aracaju.se.gov.br/emurb. Acesso em outu-
bro de 2007.
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OLIVA, Terezinha Alves de. 2002. “Aracaju na História de Sergipe”, Revista de Ara-
caju, Aracaju, n. 09.
TEIXEIRA, Iolanda; VEIGA, Bruno. 2007. O Rio que eu piso, Rio de Janeiro, Ministério
da Cultura.
Notas
1 O trabalho apresentado é parte constituinte da monografia produzida no curso Lato
Sensu em Artes Visuais da Universidade Federal de Sergipe, sob orientação do Prof. Dr. Ulis-
ses Neves Rafael.
4 Basalto: [Do lat. basalte.] Rocha vulcânica, em geral porfírica ou vítrea, constituída es-
sencialmente de plagioclásio básico e augita com ou sem olivina (FERREIRA, 2000, p.453).
6 O termo “Flâneur” foi criado por Charles Baudelaire e utilizado por Walter Benjamin
em “Paris, capital do século XIX”. O termo designa (dentre outros significados) “[...] a per-
sonalidade descomprometida e, em simultâneo, o intérprete perspicaz da modernidade,
é a personificação da ambigüidade típica da cidade moderna. Produto híbrido resultado
do cruzamento das modernas multidões urbanas com a lógica do consumo de massa [...]”.
“Da sua anônima e diletante versatilidade, o flâneur retira uma capacidade muito particular
para “ver” a modernidade e devolver, dela e das suas múltiplas representações e redes de
significação, uma imagem fiel, porque paradoxalmente, translúcida, e consistente, porque
volátil e transitória” (FORTUNA, 1997, p.14).
7 A obra O Rio que eu Piso (TEIXEIRA; VEIGA, 2007) não contém número de página.
1. Introdução
Distante 25 km do litoral sergipano está a quarta cidade mais an-
tiga do Brasil: São Cristóvão, a primeira capital de Sergipe. O sítio da
cidade, propriamente dito, encontra-se situado no vale do Vasabarris.
Assentado sobre uma colina, denominada conforme os moradores lo-
cais de ‘cidade alta’, em uma zona fisiográfica do litoral sergipano, entre
os rios Poxim Assum, ao norte e Vasabarris ao sul e sudoeste, tendo na
margem esquerda o rio Paramopama, mais precisamente nas seguin-
tes coordenadas: 11º 00’ 59” de latitude Sul e 37º 12’ 09” de longitude
W. Gr. (Santos; Andrade, 1992).
Nesta acrópole são encontrados os monumentos históricos mais sig-
nificativos, de reconhecido valor desde 1938, quando foi elevada à cate-
goria de cidade-monumento do Estado de Sergipe. Isento dos processos
de revitalização, que permearam outros centros históricos, São Cristóvão
conserva em sua paisagem elementos que caracterizaram o cotidiano
de seus habitantes citadinos, a partir de disputas práticas e simbólicas,
desenvolvidas ao longo de sua história. Tomando como referência os mo-
mentos cotidiano e ritualístico, o segundo entendido enquanto sagrado,
cívico e festivo, procuramos demonstrar a multiplicidade dos usos de es-
paços edificados ao longo de séculos, bem como os sentidos atribuídos
pelos seus atores sociais, o que perpassa, evidentemente, a possibilidade
de criação de delimitações territoriais na paisagem urbana.
Para a realização deste trabalho foi desenvolvido um incurso etno-
gráfico sobre as ruas do centro histórico de São Cristóvão. Este procedi-
mento possibilitou não apenas a obtenção de informações adquiridas por
meio da oralidade, como também de fotos gentilmente cedidas pelos mo-
radores locais. Associadas a estas imagens foram trabalhadas outras, obti-
das através da Secretaria Municipal de Obras, Urbanismo e Meio Ambiente
como instalação do som, palanque etc., parece ser um dia normal, co-
truída com forte influência moura, localizada na praça Getúlio Vargas, nú-
4 – Breves considerações
Já há algum tempo Sergipe sugere oferecer nítidos sinais de inte-
resse de sua inserção nas agendas turísticas do Nordeste, por meio de
eventos públicos, ritualísticos, ecológicos etc. É perceptível a preocupa-
Referências Bibliográficas
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Entrevistas
Notas
1 O presente trabalho compreende parte da dissertação intitulada “Arqueologia
do cotidiano: um flâneur em São Cristóvão-Sergipe”, rientada pelo Prof. Dr. Rogério
Proença Leite e apresentado ao Núcleo de Pós-Graduação em Geografia (NPGEO/
UFS), na Área de Concentração “Formas e Processos Tradicionais de Ocupação Territo-
rial”: Estudos Arqueológicos.
3 A expressão “passeio casual” estaria mais próxima de algo poético, algo que de fato
venha a designar o “espírito” do trabalho de campo. Na realidade, foram necessárias várias
incursões e diversas conversas com moradores, guias turísticos, arquitetos etc.
5 No museu dos ex-votos encontram-se fragmentos de pernas, braços, mãos etc, geral-
mente em madeira, deixado por pessoas que fizeram algum tipo de promessa ao Senhor
dos Passos e acreditam ter alcançado a cura para aquele determinado problema.
O popular imaterial
Outra acepção de popular seria todas essas coisas que o povo faz ou
fez, o que aproxima de uma definição antropológica do termo: a cultura,
os valores, os costumes e mentalidades do povo. Esta definição também
causa estranheza, pois define o conceito de popular através de um inven-
tário descritivo. Não se pode simplesmente categorizar as coisas que o
povo faz e as que não faz, pois, como dito anteriormente, nada é estático
ou limitado a classes ou categorias e de tempos em tempos os conteúdos
dessas categorias mudam, são diluídos, pois são as instituições e os repre-
sentantes do poder que sustentam e reafirmam estas mudanças2.
Por fim, o autor optou por uma última definição para o termo po-
pular, a qual considera as formas e atividades cujas raízes se situam nas
condições sociais e materiais de classes específicas, não sendo necessa-
riamente incorporada às tradições e práticas populares. Considera, neste
sentido, como as relações de domínio e subordinação são articuladas,
sobretudo a influência das formas e atividades culturais como um cam-
po sempre variável. Em seu centro estão as relações de forças mutáveis e
irregulares, que define o campo da cultura transformada.
Neste jogo de disputas entre as forças em concorrência, algumas
formas culturais deixam de existir, dando lugar a expressões que po-
dem permanecer com resquícios de uma forma anterior como podem
também não deixar nenhum espólio. Procurando frear o ritmo de desa-
parecimento das formas culturais e, consequentemente, preservar uma
possível identidade nacional, surge a concepção de patrimônio cultural.
No Brasil, através do SPHAN, havia a preocupação com o chamado
patrimônio de pedra e cal, que são os museus, casarões, sobrados, igrejas
etc. Esta preocupação decorreu das profundas transformações ocorridas
a partir da metade do século XX, que revelou a destruição e descaracte-
rização sistemática da paisagem urbana e da arquitetura (Laraia, 2004).
Vendo esta relativa perda, os intelectuais do ISEB e CPC tinham a preocu-
pação de formular uma ideologia do desenvolvimento a partir de uma
tomada de consciência da dependência dos países subdesenvolvidos
com relação aos centros de decisão econômicos e culturais, tendo a cul-
tura popular como fio condutor desta ideologia. Para o CPC a cultura po-
pular não é uma concepção de mundo das classes subalternas, como o
é para Gramsci (1989), mas um projeto político que utilizou a cultura como
elemento de sua realização, levando cultura às massas, dentro de uma pers-
pectiva de exterioridade (Ortiz, 1994, p.72):
das narrativas, tais como Cacumbi, Reisado, Chegança, Taieira, São Gon-
çalo, Samba de Coco, Samba de Pareia e muitos outros. Alguns deles se
apresentam diante dos altares das igrejas e prestam homenagens aos
santos de sua devoção, revelando, a priori, uma identidade ligada ao sa-
grado e ao festivus.
Nesta forma de representar uma singularidade, a festa do Lambe-
Sujo de Laranjeiras procura encenar o conflito entre os caboclos e os ne-
gros fugidos, que viam no quilombo a salvação para as agruras impostas
pelo sistema escravocrata. Em outros estados existem manifestações fol-
clóricas similares ao Lambe-Sujo, como é o caso da Bahia, onde o evento
é conhecido por Negro Fugido e em Alagoas por Quilombos.
Em todos estes lugares é comum relacionar a festa como uma re-
memoração de um passado escravocrata no qual o negro fugido é cap-
turado pelos índios a serviço do homem branco. De certa forma, este
discurso serve como cortina, deixando de revelar particularidades dos
processos que são constitutivos na construção da festa. Para tanto, faz-
se necessária, para um melhor entendimento, uma descrição minuciosa
dos fatos que montam o festejo, traçando o percurso desde a sua prepa-
ração até o evento em si, descrevendo com pormenores as particularida-
des, procurando apreender os mecanismos que em convergência fazem
a festa do Lambe-Sujo de Laranjeiras.
com toda a pompa de uma grande realeza, revelada através de sua in-
dumentária dourada e sua espada prateada, posta-se à frente e conduz
o préstito. É quando tem início um novo cortejo, que segue em direção
mais uma vez ao terreiro nagô, para pegar o pai Joá que, para o contex-
to festivo, representa a figura do preto velho, juntando-se aos demais
membros no cortejo. Com cantorias e muita balbúrdia os lambe sujos
vão seguindo em direção à casa de outro personagem, a Mãe Suzana,
que através de cantorias sai às ruas com um cesto na cabeça cheio de
panelas e brinquedos. Dançam todos ao som dos atabaques, procuram
saudar este personagem que tem os atributos de curandeira e feiticeira,
segundo os próprios informantes:
Referências Bibliográficas
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ro, Paz e Terra.
Notas
1 Esse texto é parte da dissertação de Mestrado defendida no PPGS/UFS, sob a orienta-
ção do Prof. Dr. Ulisses Neves Rafael.
6 No séc. XVIII servia como rota de chegada de escravos e escoamento de produtos da região.
7 A alvorada é uma festa particular dos Lambe-Sujos e representa para o contexto festi-
vo a libertação dos escravos pela princesa Isabel, filha do imperador Dom Pedro II, através
da Lei Áurea, assinada em 13 de maio de 1888, extinguindo a escravidão no Brasil.
9 Aparentemente protege a tribo, mas é também visto como mensageiro dos caboclos.
12 Tida como o prato nacional por excelência, onde suas origens prestam-se às mais
especulativas interpretações, costuma-se apresentá-la como a expressão da fusão racial
brasileira, através de um processo harmônico de suas etnias (Freyre, 2005). Uma outra in-
terpretação, sem igual peso difundido, vê a conversão de símbolos étnicos em nacionais
obliterar uma situação de dominação racial, tornando mais difícil a tarefa de denunciá-la.
“Quando se convertem símbolos de‘fronteiras’ étnicas em símbolos que afirmam os limites
da nacionalidade, converte-se o que era originalmente perigoso em algo limpo, seguro e
domesticado” (Fry, 2001).
Introdução
As cidades, nas últimas décadas do século XX, vêm sendo foco de
investimentos, com grande recorrência, de processos bastante impac-
tantes para a sociedade. Tais investimentos são decorrentes, principal-
mente, de uma forte tentativa de gerenciamento e de ordenamento de
espaços, que na maior parte dos casos visa aperfeiçoar um aproveita-
mento econômico, pautando-se, sobretudo, numa série de ações de
políticas patrimoniais que engendram novos usos em áreas até então
consideradas degradadas. Estes processos são conhecidos por gentrifi-
cation2, com franca inclinação para antigas edificações e em ruínas de
cidades consideradas históricas.
Tais políticas têm como sistemática a intenção de reconstruir usos
dos conteúdos e materiais de determinado passado, utilizando-se de
elementos físicos das cidades, (re)classificando os seus personagens e
lhes apresentando, por vezes, funções e ações sociais distintas das ori-
ginais, aplicando novos entendimentos às suas histórias, pelo viés de
um determinado aspecto. Em geral, isso atribui disposição ao turismo
e caráter de visitação.
No entanto, aquilo que em tese e a princípio se apresenta como
gerador de benefícios para o desenvolvimento econômico das cidades,
e que aparentemente protege e preserva suas edificações como patri-
mônio histórico e cultural, não reflete seus efeitos a estas duas esferas e
tampouco, somente de maneira positiva, como amplamente apontam
investigações realizadas na última década. Um dos aspectos que tan-
gem os efeitos desses processos, abordado pela sociologia, repousa so-
bre a “memória das cidades”.
Na sociologia, a inclinação para os desdobramentos que põem a
memória como conceituação teórica e categoria analítica são relativa-
mente novas. No entanto, já despontam como contributo à elucidação
tempo para outro. Benjamin (1984) põe a ruína como símbolo do trágico,
de uma história que terminou em catástrofe, que lembra o declínio e a
decadência; a ruína acaba por representar o que de um momento confli-
tuoso restou, e daí retira sua força, pois desperta a memória, provocando
emoção, sensibilidade e traz lembranças deste período.
Segundo Cristina Meneguello (2000), as cidades podem constituir-
se por um discurso fundamentado numa história que ressalta e revela o
que se foi pelas estruturas físicas, em especial suas ruínas, e pelos costu-
mes de seus habitantes. Para a autora, a cidade inglesa de Manchester é
um exemplo, pois ofereceu entre o século XIX e XX, a partir de suas várias
histórias e ruínas, a imagem de uma antiga, rica e importante cidade da
Idade Média.
A autora aponta para uma noção de monumento, de “ressignifica-
ção, como cristalização de imagens do passado e como jogo de apro-
priação e perda [...] que surge, como um olhar para o passado, catalogan-
do, colecionando e preservando, as ruínas, marcas do passado nacional”
(Meneguello, 2000, p. 19). Segundo a autora, sociedades que valorizam o
patrimônio se sustentam com marcas do passado e por vezes os discur-
sos históricos utilizam-se de elementos que perduram no tempo; entre
tais, estão as ruínas.
Entendendo a “experiência do presente como uma contínua rede
de referências ao passado” (id., ibid. p.19), Meneguello (2000) ressalta
a problemática apresentada pelos historiadores positivistas acerca das
raízes de Manchester, pois há ausência de ruínas na cidade que com-
provassem a continuidade da sociedade romana, fazendo com que as
ruínas da região central de Deansgate, que a autora considera como “pí-
fias”, fossem evocadas como lembrança de tal passado. “Re-construídas”
de forma “quase bizarra”, tornaram-se ponto turístico.
A autora discute uma compreensão de ruína que lentamente se
altera diante da sociedade que a vivencia: “progressivamente as ruínas
perdem o caráter de aviso simbólico da finitude humana e da velocida-
de de suas realizações” (id., ibid., p. 88). No entanto, assegura-se que as
ruínas proporcionam um sentido de pertencimento, como documentos
que atestam as raízes de uma cidade. Entre as considerações que Mene-
guello (2000) tece voltadas à apreensão da “função” da ruína, uma, em
especial, dialoga proximamente com a percepção proposta neste artigo:
tointerpretação. Esta foi a “função” dada à memória por sua teoria, numa
2003, p.145). Em tais análises isto ocorre pelo contexto das mudanças
geradas na sociedade moderna, “a partir do fim da tradição oral e do sur-
gimento da escrita, [já que] passamos a nos confrontar com a perda de
transmissão de conhecimento e valores entre gerações” (id., ibid., p.214),
especialmente a perda da memória transmitida oralmente.
De certo modo, o pensamento proposto pela Escola Francesa, que
tem como maior expoente Maurice Halbwachs, compartilha tais pressu-
postos. Porém, nesta tradição a discussão desloca a análise para o eixo
da coletividade e não mais a centra no indivíduo.
A reflexão de Halbwachs tem uma compreensão da sociedade a par-
tir da análise de sua memória compartilhada, vertendo sua preocupação
às representações coletivas das práticas sociais. Assim o autor atenta não
para as causas e consequências dos fenômenos sociais, mas, sim, para as
representações sociais que tiveram e verificam em seus “quadros sociais
de memória”. A importância de sua reflexão sobre memória repousa jus-
tamente no entendimento de que os indivíduos só se lembram de seu
passado sob o ponto de vista do pensamento coletivo, assim sendo, o
que lembramos é fruto das construções sociais estabelecidas pelo grupo
ao qual pertencemos.
Nesse processo de construção coletiva o autor argumenta ser
impossível separar o tempo e o espaço da memória, especialmente o
espaço, pois o “tempo” da memória é concretizado no espaço, ou seja,
quando há uma sustentação espacial, o “tempo” pode ser recordado. O
espaço é, em certo modo, entendido como dotado de capacidade para
evocar a memória do indivíduo, guardado na “Memória Coletiva”.
Halbwachs (2006) assegura que, ao percorrer bairros antigos de
uma cidade experimenta-se uma satisfação particular de se estar “ouvin-
do” e “vendo” novamente a sua “história”, e entende que tal cenário, por si
só, é capaz de evocar lembranças. Em tal abordagem, estas ocorrem, ple-
namente, quando há fixação no tempo por meio do espaço. Assim, um
grupo, constituído num bairro ou cidade, irá fruir as mesmas condições
em suas memórias coletivas, sendo possível pensar numa “memória das
cidades”, entendida aqui como a memória de um grupo de pessoas liga-
das entre si no espaço de uma cidade, e que ali experienciam suas vidas
cotidianamente, durante uma relativa e estável duração de tempo.
TABELA 1
Usos encontrados em ruínas do centro histórico (fev. a jul. de 2009)
Assim, deixamos que sua arquitetura, suas ruas, suas ruínas e seus
habitantes se expressassem, dando-nos a apreensão dos sentidos da ci-
dade na “vida cotidiana” (Pais, 2003) dos habitantes do centro histórico.
O cenário mescla traços coloniais a traços de modernidade, observados,
especialmente, pelo movimento dos automóveis nas ruas de pedra, en-
voltos à arquitetura colonial, que impõe sua força sobre a modernidade
que a espreita.
Por certo este é o maior dos sentidos que Laranjeiras atribui aos seus
habitantes: o de cidade com arquitetura colonial; sua paisagem parece
não ter avançado no tempo, o espaço urbano ainda retém práticas se-
melhantes às do século XIX. A cidade a todo instante parece insinuar um
retorno no tempo, contribuindo com a manutenção da memória coletiva.
Algumas edificações, como o “Paço Municipal” e a “Praça Samuel
Oliveira”, pouco se alteraram, mesmo sendo estruturas arquitetônicas do
século XIX, com destaque no cenário econômico e social da época. De
certo modo, mantiveram similaridade com usos originais, orientando as
“classificações simbólicas das ações sociais” (Foucault, 1975) dos mora-
dores, ou como diria Fortuna (1997), organizando os movimentos huma-
nos e contribuindo com a manutenção das relações sociais.
De outra forma, ruínas de sobrados que abrigam comércios estão
presentes na rotina cotidiana dos habitantes da cidade que frequentam
Considerações Finais
A cidade de Laranjeiras, bastante consagrada no século XIX, dispu-
tada por políticos, intelectuais e homens de posse, especialmente por
ser o maior centro de Sergipe e contar com um modo de vida urbano
com vários equipamentos urbanos de serviços e de cultura, de certo
modo teve seu ingresso à categoria de cidade histórica promovida por
tais fatores, sobretudo pelo seu “Conjunto Arquitetônico e Urbanístico” –
representação “oficial” de uma época.
O desenvolvimento socioeconômico pelo qual passou Laranjeiras,
não a impediu de, no início do século XX, ter um forte e definitivo declí-
nio de sua economia. Aparentemente, isto poderia ter um impacto ne-
gativo na memória do grupo, porém, Jean Duvignaud (2006), apoiado
nos postulados de Halbwachs (2006), afirma que a quebra abrupta, no
ritmo cotidiano e na continuidade de um momento, acaba acarretando
sobre este uma maior atenção, o qual se propaga por gerações, através
da memória compartilhada no grupo.
De tal modo, o colapso vivido em Laranjeiras permitiu uma maior
“força de atenção”, ligando a memória do grupo àquele momento, so-
bretudo pelo patrimônio material. Seu Conjunto Arquitetônico e Ur-
banístico, de certo modo, resistiu incólume à decadência econômica e
social. Assim, suas edificações e ruínas oferecem um admirável suporte
aos moradores para compartilhar suas identidades e memórias, além da
reprodução dum período.
Halbwachs (2006) afirma que a capacidade de o indivíduo evocar
lembranças está estreitamente ligada ao contexto espacial do grupo ao
qual o indivíduo se liga: “Não é o indivíduo isolado, é o indivíduo en-
quanto membro do grupo, é o grupo em si que, dessa maneira, perma-
nece sujeito a influencia da natureza material [...]” (Halbwachs, 2006, p.
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Colina Azulada: a Universidade Federal de Sergipe em Laranjeiras, São Cristó-
vão, EdUFS, pp. 35-47.
Notas
1 Este artigo é parte da pesquisa para o Mestrado em Sociologia da Universidade Federal
de Sergipe, concluída em março de 2011, intitulada: MEMÓRIAS DA CIDADE: As Ruínas da
Histórica Laranjeiras/SE, realizada sob a orientação de Rogerio Proença Leite.
2 Este artigo tem por preocupação as ações que recaem sobre ruínas de centros e ci-
dades históricas, por um tipo específico de gentrification, que Leite (2007) chama de city
marketing, “cujas práticas compreendem um conjunto de intervenções voltadas à trans-
formação de degradados sítios históricos em áreas de entretenimento urbano e consumo
cultural” (p. 79).
3 O termo “sociologia das cidades” e não “sociologia urbana” nos faz ingressar nas dis-
cussões à luz da análise das cidades pelo que “reclamou” Carlos Fortuna (2002) por um
ajuste de foco, de modo a ”[...] inverter os sentidos da leitura sociológica da cidade e passar
a lê-la também de “baixo para cima” e “das margens para o centro” (p. 129).
5 O centro, definido como “coração da cidade”, foi tema do CIAM. Nesse encontro, o
centro urbano passou a ser abordado como o elemento caracterizador de uma comuni-
dade, voltado aos seus habitantes, o repositório da memória da coletividade e o local que
possibilitava entender o aspecto comunitário da vida humana (MENEGUELLO, 2005).
1. Introdução
Os espaços urbanos se adequaram a uma nova ordem mundial
de rendimento e desinvestimento do solo, que denominamos “rentgat”
(Smith, 1996). Agora, não se vende uma parcela de terreno, mas o seu
trajeto de lugar referencial para uma determinada época (Zukin, 2000). A
questão bifurcada do entendimento dos espaços como categoria de um
passado que se quer fazer presente e de uma conotação de consumo eli-
tista apresenta uma possibilidade para tentarmos compreender a forma-
tação de lugares na cidade pós-industrial. Os espaços significativos são
quase invisíveis, porém, nos permitem associar a vivência nos espaços
urbanos mediante uma elaboração referencial para determinadas ações:
“[...] lugar, [...] uma determinada demarcação física e/ou simbólica no
espaço, cujos usos o qualificam e lhe atribuem sentidos diferenciados,
orientando ações sociais e sendo por estas delimitado reflexivamente”
(Leite, 2007, p. 284).
Logo, lugares denotam significações para o indivíduo e, no caso das
políticas de gentrification, fazem parte de uma memória comum: “[...] um
lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico [...]” (Augé,
1994, p. 73), ou seja, formatam espaços urbanos de visibilidade para os
trajetos ímpares de indivíduos, os quais incitam o surgimento não pro-
gramado de um mesmo lugar. Não temos a intenção de colorir a cidade
como espaço dos desiguais e afirmar as dinâmicas como sociabilidades
do prazer, pois isso também se torna uma ressalva para não adentramos
na perspectiva do Outro universal ou do Outro exótico (Bhabha, 2007).
Aqui, estabelecemos para as nossas “andanças” práticas e teóricas uma
possibilidade de enxergarmos itinerários híbridos, a fim de compreen-
der a cidade também em seus “espaços praticados” (Certeau, 1996). As-
sim, diríamos que alguns agentes do cotidiano urbano constroem aber-
turas, por dentro das rígidas limitações impostas em alguns lugares de
surgirem, mesmo que seja como interrogação para os que não acompa-
Este deve ser o espaço urbano da moda para Aracaju, segundo a re-
vista. A quantidade de lojas refinadas definiria o gosto da elite sergipana.
Logo surge a ideia de bairro situado numa região privilegiada dos ícones
contemporâneos de prazer e conforto, simbolizados pelo consumo dos
melhores objetos, como espaço conectado com a moda, com uma espe-
cial ligação com a dinâmica da novidade, a disfarçar os círculos de vai e
vem descontínuo:
Considerações Finais
A Treze de Julho indica, como espaço urbano enobrecido, que nem
todas as estratégias programadas dos gestores urbanos podem inibir os
itinerários distintos. Assim, quando observamos a formatação espacial
do enobrecimento, percebemos a tendência mundial de fazer dos es-
paços urbanos, apenas, uma maquiagem para as trocas culturais limpas
de outros discursos. E, as palavras da ordem como uma espacialização
do consumo que tinha como âncora de embelezamento um Calçadão,
também forjou mecanismos de visibilidade menos lineares. São marcas
de itinerários que rasuram e demonstram que a cidade, ainda, possui
uma qualidade humana, e não só uma espetacularização tendenciosa
para o apagamento das possíveis manchas, sem adequação aos rituais
de passeio da elite aracajuana.
O mapeamento das zonas nos possibilitou enxergar as práticas de
uma imagem incômoda, para alguns indivíduos: mendigos, meninos na/
da rua, etc. Claro, que a pequena quantidade não impede a propaganda
esclarecedora de um Bairro representativo da qualidade de vida araca-
juana, porém, sinaliza as incoerentes diagramações das desigualdades.
Além disso, até mesmo o mangue que serve de escoadouro dos resíduos
das luxuosas mansões verticais, indica a falta de mínimo planejamento
ambiental, para um local que se quer símbolo salutar das práticas es-
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Londres/Nova Iorque, Routledge.
Jornais
CORREIA, Suyene. Iate Clube de Aracaju Comemora 55 Anos, Jornal da Cidade, 28
de agosto de 2008.
Entrevistas
MANGUEIRA, Wellignton. 30/06/2008. Entrevista concedida a Josevânia Nunes Ra-
belo, Aracaju.
Notas
*
Este texto é uma parte do terceiro capítulo da Dissertação de Mestrado, defendida no Nú-
cleo de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais da Universidade Federal de Sergipe
em 2010, sob orientação do Prof. Dr. Rogério Proença Leite. A pesquisa foi realizada no
âmbito do Laboratório de Estudos Urbanos e Culturais – LABEURC.
2 Não iremos comentar sobre a trajetória desportiva dos clubes, mas os mesmos tiveram
competições memoráveis (o Iate nos esportes aquáticos e o Cotinguiba no futebol).
3 Branco com alguns traços azuis e de arquitetura eclética, o clube foi reformado em
2009. Evaporou o carnaval de clube a partir do fenômeno do axé music, em Aracaju. Um
de seus foliões, Wellington Mangueira, comenta também com tristeza sobre a inexistência
dos carnavais de clube:“e aí acabaram e fizeram esse pré-caju(...); o tempo se encarregou
de liquidar o Cotinguiba, o Iate, a Atlética e o Vasco, todos que viviam em torno do carna-
val.” Entrevista concedida a autora. Aracaju, em 30 de julho de 2008.
10 SANTOS, Osmário. José Ferreira: O Líder da Praia 13 de Julho. Jornal da Cidade. Araca-
ju, 28 de março de 1993. Caderno B.
12 Dono do primeiro loteamento da Praia Treze de Julho. Isso é relevante, uma vez que
para a urbanização do Bairro tivemos inúmeras desapropriações, principalmente da favela
Japãozinho, entre o final da década de 60 e meados de 70, que ficava nas imediações da
atual Biblioteca Epifhânio Dórea..
17 Informação obtida mediante conversa com o gerente da loja da Av. Francisco Porto.
18 Não iremos discorrer sobre o conceito. E, o uso que fizemos dele, no momento, foi
considerando apenas uma das inúmeras interpretações. E, sabemos também que a res-
ponsabilidade social de inúmeras empresas tem obtido resultados positivos.
Dos onze bairros com maior renda salarial média, nove estão lo-
calizados na zona sul e sudoeste da cidade. São eles: Treze de Julho,
Grageru, Salgado Filho, São José, Luzia, Suissa, Atalaia, Inácio Barbosa
e Jabotiana. Já os outros dois bairros se localizam respectivamente no
centro (bairro Centro) e na zona oeste (Pereira Lobo). Portanto, pode-
mos verificar que as populações das zonas sul e sudoeste possuem as
maiores rendas salariais entre os bairros da capital. Segundo Ribeiro “a
zona sul foi, dentro do aglomerado urbano, aquela que recebeu maior
ciais para quem os usos foram destinados. O fato de estes usos estarem
Espaços vigiados
O Bairro Jardins foi construído semelhante ao formato dos subúrbios8
norte-americanos do pós-guerra, onde conjuntos residenciais foram cons-
truídos próximos a shopping centers. Este modelo foi reproduzido em ou-
tras cidades pelo mundo ao longo do século XX, o que representou a saída
das camadas de média renda dos centros históricos. Este tipo de projeto
urbanístico foi seguido pelos idealizadores do Bairro Jardins, com o predo-
mínio de habitações verticalizadas fechadas que cercam o grande centro
comercial do bairro, representado pelo shopping Jardins.
O projeto urbano do Jardins sugere espaços protegidos por equi-
pamentos e serviços de vigilância. Nos condomínios, esta característica
se expressa de forma mais evidente na construção de espaços de socia-
bilidades9: pracinhas, piscinas, salão de festas, para seus moradores. No
principal estabelecimento comercial do bairro, o shopping Jardins, refe-
rencial de consumo, lazer e entretenimento, estão situados espaços de
sociabilidades (cinema, praças de alimentação, bancos espalhados por
toda a extensão do shopping). Estes se caracterizam como a expressão
da homogeneização do bairro, acompanhados por câmeras espalhadas
por todo o prédio e seguranças dentro e nos estacionamentos.
Fora destes espaços, ao longo de algumas avenidas próximas ao
shopping, atores sociais provenientes de bairros mais pobres contrastam
com a paisagem estabelecida e com os seus ocupantes. Os atores sociais
distribuem-se nas avenidas Franklin de Campos Sobral e Geraldo Barreto
Sobral. São vendedores ambulantes, “hippies”, meninos em situação de
rua, pedintes e antigos moradores, caracterizando o contraste entre o
“vernacular” e a “paisagem de poder”.
Na Avenida Geraldo Barreto Sobral percebemos uma paisagem de
poucas habitações, contendo uma grande área ainda em estado natural.
Nesta avenida são encontrados alguns estabelecimentos comerciais, edi-
fícios e casas. Na outra margem, junto às áreas ainda não construídas, há
substituiu por uma loja de roupas. Nesse sentido, pode-se verificar a afir-
Considerações Finais
As políticas urbanas baseadas nos projetos de intervenção pontu-
ais promovem a substituição social e a mudança no sentido e usos dos
espaços. Para a manutenção desses novos sentidos são desenvolvidos
equipamentos que julgo aqui de proteção divididas em duas verten-
tes. A primeira, contra a violência e o crime, e a segunda, para a conti-
nuidade e permanência de padrões de comportamento, sociabilidades
e modos de vida.
A segregação não está voltada apenas para a condição econômica
dos atores, mas também para o não compartilhamento dos comporta-
mentos, aspectos simbólicos e estilos de vida13. O conflito pode vir da
própria camada social, do encontro de suas formas de ver o mundo. No
caso das intervenções no espaço público, voltados para habitação, cria-
se um novo modo de vida, centrado no estilo de vida, caracterizado pe-
las habitações, pelo tipo de arquitetura, pelos serviços oferecidos.
A segregação socioespacial, representada pelo planejamento ur-
bano do Bairro Jardins, expressa a necessidade de um determinado
estrato social de estabelecer em um determinado espaço com todo o
seu aparato econômico, cultural e simbólico, portanto, o lazer, o con-
sumo e a moradia. Tais características são ressaltadas nas propagandas
pela associação do bem-estar à imagem do bairro, pela proximidade
de serviços e estabelecimentos comerciais, além das proximidades de
paisagens naturais transmitidas, principalmente tranquilidade; assim
sendo, desenvolve-se um sentido simbólico da casa e do bairro (Da-
Matta, 1991; Certeau, 1996).
Ao tomar as políticas de enobrecimento como segregativas no seu
planejamento, podemos considerar que a preocupação com a seguran-
ça é, também, uma forma de evitar a cidade e suas contradições. A pro-
cura por espaços homogêneos reforçam a construção de paisagens de
poder que abrigam comportamentos, códigos, modos e estilos de vida
específicos das camadas sociais de média e alta renda. A formação de
ilhas estreita ainda mais as diferenças entre os usuários da cidade, já que
a relação com os espaços públicos passam por uma carga dramática de
negociação e conflito.
Referências Bibliográficas
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Disponível em <www.archi.fr/SIRCHAL/glossair/glosdefb.htm#gen>, Aces-
so em 17 de abril de 2004.
Depoimento
Notas
*
Esta pesquisa foi realizada no âmbito do Laboratório de Estudos Urbanos e Culturais (LA-
BEURC) da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Artigo foi extraído da pesquisa de mestra-
do desenvolvida entre os anos de 2006 e 2008, sob a orientação de Rogerio Proença Leite.
2 Tomo aqui a definição de espaço público como “práticas que atribuem sentidos dife-
renciados e estruturam lugares, cujos usos das demarcações físicas e simbólicas no espaço
as qualificam e lhes atribuem sentidos de pertencimento, orientando ações sociais e sendo
por estas delimitadas reflexivamente.” (Leite, 2001, p. 07).
3 Região da qual o Jardins fazia parte antes de ser homologada a lei 2.666/98, que o
oficializa como bairro.
4 Depoimento de José Carlos Freire, morador do conjunto Leite Neto. Entrevista conce-
dida ao autor em 23 de novembro de 2003.
5 Sociedade Nordestina de Construções S/A, fundada em 1958, realizava construções
para obras públicas e industriais, redirecionando seu foco uma década depois para a cons-
trução de unidades residenciais voltadas para as classes média e alta. Disponível em (www.
norcon.com.br), acessado em 08 de março de 2004
6 Dados obtidos no anuário Estatístico da Prefeitura Municipal de Aracaju (Secretaria de
planejamento), 2002.
7 Antes do início do último censo demográfico, em 2000, e até o momento atual, a
Prefeitura Municipal não passou oficialmente as delimitações do bairro Jardins, que já es-
tava regulamentado enquanto bairro desde 1998. Com isso, o IBGE não incluiu os dados
referentes ao bairro. Estando, portanto, os dados do bairro Jardins inseridos nos dados do
bairro Grageru.
8 Os subúrbios norte-americanos são áreas ocupadas por camadas de média e alta ren-
da. Diferente do nosso sentido de subúrbio que está atrelado a moradias das camadas de
baixa renda.
9 Espaços públicos construídos para favorecerem as relações sociais.
10 Atribuiremos como área central do bairro as localidades próximas ao shopping, por
esta representar o marco inicial do bairro Jardins e por concentrar a maioria das atividades
comerciais, prédios residenciais e por ser um atrativo de relações sociais díspares à propos-
ta homogeneizante do bairro.
11 Conversa informal com um dos moradores da avenida “B”, concedida em 16 de março
de 2004.
12 Disponível em <www.shoppingjardins.com.br> acessado em 08 de março de 2004.
13 Cf. Andrade (2002; 2003).
Urbanização Litorânea:
1. Introdução
Os processos de intervenções urbanas em áreas litorâneas têm se
intensificando nas últimas décadas. A praia de Atalaia, localizada na
cidade de Aracaju, capital de Sergipe, no nordeste brasileiro, tem sua
paisagem alterada a partir da década de 90. As obras que modificaram
sua paisagem possibilitaram o que se reconhece como “Orla de Atalaia”.
Estruturada em torno de um ideal turístico, que objetiva disputar, com
outras cidades brasileiras e estrangeiras, não apenas os turistas de “sol
e mar”, como também os que preferem experiências “naturais”, mas não
menos urbanas.
Sharon Zukin (2000), ao apresentar três temas principais que regem
a produção da paisagem, atenta que tais turistas influenciam na forma-
ção de paisagem mesmo que na perspectiva de uma “cultura da nature-
za”. A autora atenta que aqueles que desejam “ter uma experiência mais
espiritual, talvez selvagem – mas não desconfortavelmente selvagem [...]
pode ser encontrado pelas pessoas, por um lado, nas áreas urbanas his-
tóricas e, por outro lado, nas praias desertas” (Zukin, 2000, p. 110) acabam
por influenciar na estruturação dos espaço que são adequadamente mo-
dificados para recepcioná-los. Os agentes que modificam os espaços para
atender a este público “devoram a paisagem natural que se desenvolveu
ao longo do tempo, [...] e estabelecem uma nova inserção de lugares ‘na-
turais’ na economia mundial e na cultura de consumo” (id., ibid., p. 110).
Reforçando este entendimento, em suas devidas adequações, pois
não é esta uma praia deserta, mas que também aspira atingir uma expe-
riência natural, percebe-se a valorização midiática da Orla de Atalaia a
partir de elementos praianos ao tempo em que se desloca dos mesmos
na medida em que suas estruturas físicas são apresentadas no sentido
de expressar uma experiência praiana, mas não tão natural, com areia
e sol, mas no conforto das estruturas físicas erguidas. As intervenções,
como objeto de estudo das Ciências Sociais, cabendo para este traba-
Figura 02
Figura 04
4. REFERÊNCIAS
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dade, Cultura e Globalização: ensaios de sociologia, Oeiras, Celta Editora.
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_____. 2010. “Antinomias de uma comparação: Notas sobre a vida urbana e cena
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NOTAS
1 Artigo extraído da dissertação de mestrado intitulada: Urbanização Litorânea: O sen-
tido público da Orla de Atalaia.
4 Região da Atalaia que se constitui como ponto de encontro nos últimos anos E que
antecede a primeira intervenção da Orla de Atalaia.