Você está na página 1de 5

Instituto de Economia

Curso de Especialização em Gestão Pública e Governo


Disciplina: ECO 780 – GESTÃO PÚBLICA NO BRASIL
2º semestre de 2017

Catarina Duleba

GESTÃO PÚBLICA NO BRASIL

Reforma Administrativa (Decreto-lei n.200/67)

A Reforma Administrativa realizada pelo Decreto-lei n.200/67 foi a maior reforma


administrativa já feita no Brasil e tinha por propósito institucionalizar as mudanças na
administração do Estado brasileiro para que ele executasse os novos marcos de sua relação
com a economia, agora em uma sociedade urbana industrial. A redefinição institucional do
Estado era uma preocupação antiga, abordada por governos anteriores. No governo de
Vargas houve um esforço neste sentido com a criação do Conselho Federal de Comércio
Exterior (CFCE) e do Departamento de Administração do Setor Público (DASP). Seu governo
dispôs-se a formar um grande projeto de reforma administrativa para modernizar a
administração orçamentária e financeira, mas encontrou grande resistência e sua proposta
não conseguiu ser levada ao Congresso. Quando Juscelino Kubitschek assume, ele se
depara com um Estado sem coordenação instrumental, com todo o poder fragmentado e
assim, opta por evitar o desgaste político com isso. Seu Plano de Metas é feito a partir de
uma estrutura paralela e informal, embora efetiva, com a formação de entidades
administrativas (os “grupos executivos”), expondo a fragilidade do Estado diante da
aceleração da economia industrial.

Assim, desde o início do governo militar a reformulação institucional era questão em


pauta e buscava o desenvolvimento necessário das funções do Estado na gestão e
planejamento da economia nacional, para se tornar um Estado forte, planejador e eficiente.
O Decreto Lei 200/67 foi composto de 17 títulos1, sendo o primeiro a “Administração Federal”

1Os 17 títulos: I. Da Administração Federal; II. Dos Princípios Fundamentais; III. Do Planejamento, do Orçamento
Programa e da Programação Financeira; IV. Da Supervisão Ministerial; V. Dos Sistemas de Atividades Auxiliares; VI. Da

1
para determinar a Administração Direta (composta por serviços integrados na base
administrativa da Presidência e seus ministérios) e a Administração Indireta (constituída por
autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, entidades dotadas de
personalidade jurídica própria e vinculadas a algum Ministério). Os dois próximos títulos
tratam do planejamento, orçamento de programa anual e programas plurianuais e do plano
de governo para o orçamento da União. O Título IV, que fala da supervisão ministerial dá
maior autonomia para a administração indireta em sua ação, contanto que seja respeitado o
planejamento central. Destaca-se também o Título X que determina o “Plano de contas único”
para a administração direta, tornando obrigatória a existência de um órgão de planejamento,
controle e coordenação financeira em todos os Ministérios. O Título XI que trata do
funcionalismo público civil empenha-se em consolidar a meritocracia através dos concursos
públicos e das carreiras de Estado. O título seguinte fala das normas para licitações e
estabelece “privatizar” a execução de tarefas submetidas ao planejamento do Estado.

Considerando esta reforma administrativa em conjunto com outras reformas, temos a


ampliação de atribuições do Estado, porém não foi possível lhe assegurar uma integração
superior. Um problema gerado daí são as estatais que saem do controle e começam a atuar
como espaços autônomos dentro do Estado.

Principais desafios do planejamento e da gestão pública no Brasil, financiamento do


Estado e às relações entre os diversos níveis de governo

Ao contrário dos projetos de governos anteriores, durante o período do “Milagre


Econômico” (1967 – 1973) e do II PND (1974 – 1979) o padrão de financiamento foi o
endividamento externo. Por todos estes anos, não foi construída no país uma estrutura
interna de financiamento, um sistema capaz de nos autofinanciar e fornecer crédito a longo
prazo, somando-se a isso o problema da fraqueza do empresariado privado nacional que
sempre preferiu atuar em setores mais simples da economia. O cenário internacional era
favorável a este endividamento, já que havia uma grande oferta de dólares, com alta taxa de

Presidência da República; VII. Dos Ministérios e Respectivas Áreas de Competência; VIII. Da Segurança Nacional; IX. Das
Forças Armadas; X. Das Normas de Administração Financeira e de Contabilidade; XI. Das Disposições Referentes ao
Pessoal Civil; XII. Das Normas Relativas a Licitações para Compras, Obras, Serviços e Alienações; XIII. Da Reforma
Administrativa; XIV. Das Medidas Especiais de Coordenação; XV. Das Disposições Gerais; XVI. Das Disposições
Transitórias; e XVII. Das Disposições Finais.

2
liquidez do dólar e taxa real de juros negativa no mundo. Porém em 1979, isto entra em
colapso com o aprofundamento da crise internacional e o “choque dos juros” nos Estados
Unidos, deixando toda a periferia do mundo com uma alta dívida e sem crédito externo. Este
estrangulamento externo teve efeito devastador sobre as finanças públicas, uma vez que
este colapso do financiamento externo significou um colapso do financiamento da economia
brasileira, a “crise da dívida”.

Assim, temos na década de 1980 um ponto de ruptura com o padrão


desenvolvimentista dos anos anteriores com um crescimento econômico acelerado para uma
crise profunda e de caráter estrutural, com grande instabilidade macroeconômica, crises
cambiais, dificuldades recorrentes nas contas externas, aceleração inflacionária, estagnação
da renda, queda de investimento e colapso das contas públicas. Diante destas dificuldades,
fica clara a incapacidade política do Brasil em responder aos desafios impostos pela nova
ordem internacional como também por suas próprias fragilidades internas. Tais desafios
resultaram em estagnação econômica e parasitismo financeiro ao longo da década.

Frente à crise, surgiram vários anseios reformadores durante a década tendo o seu
ponto máximo na Constituição Federal de 1988, que seria a consagração de boa parte da
agenda de reformas progressistas. Nela, determinou-se que será da responsabilidade de
toda a sociedade os gastos com a seguridade social, de maneira direta e indireta, por meio
de recursos derivados das contribuições sociais, municípios e distrito federal, estados, e
União, devendo ser feito o seu orçamento próprio de maneira integrada por órgãos
responsáveis pela previdência social, assistência social e saúde, considerando as metas e
prioridades determinadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A Carta Magna torna-
se o símbolo máximo da luta contra a desigualdade e injustiça social, em um período marcado
pela crise econômica, representando um sentimento de “resgate da dívida social” das forças
democráticas em um momento de abertura do regime militar. A ideia era projetar garantias
de promoção do bem-estar social e de um conjunto de direitos universais e políticas de
proteção social para viabilizar um novo padrão social para o país. Apesar de toda esta
garantia constitucional, permanece a ausência de condições materiais para efetivar tais
conquistas democráticas, nitidamente relacionadas à recuperação do desenvolvimento do
país. Temos aí uma situação de incompatibilidade entre um projeto social avançado e o
colapso do Estado com a estagnação econômica.

3
Ao longo da década de 1980 o Brasil passou por sucessivos planos econômicos
fracassados, mergulhando o país em uma crise brutal, suficiente para romper com o passado
nacional-desenvolvimentista, para se aventurar nas recomendações de organismos
internacionais para se integrar à ordem global política-ideológica do liberal-conservadorismo.
Para se adequar a esta agenda, desde o início dos anos 1990 foram adotadas medidas como
liberalização financeira e comercial, privatizações, reforma e disciplina fiscal, adequação da
política cambial, juros altos, câmbio valorizado, entre outras medidas hostis ao avanço de
investimentos de políticas públicas. Vale lembrar que desde a década de 1970 vinha sendo
concebido no Brasil um padrão de defesa da riqueza privada, baseado no rentismo e na
concentração dos riscos no Estado e nas finanças públicas, sustentado em bases frágeis,
que se consumou a partir dos anos 1990 com a combinação dos interesses financeiros
externos com os internos apoiados no rentismo. Integrando-se à ordem econômica global,
havia fartos recursos financeiros em busca de rentabilidade, mesmo para os países
devedores da periferia. Para tanto, foi necessária uma preparação com uma série de
recomendações para ajustar as economias periféricas aos mercados financeiros
liberalizados, com políticas liberais e medidas já mencionadas acima, que conduzem a um
eterno ciclo de necessidade de ajustes permanentes, instabilidade, baixo crescimento e
principalmente, subordinação às economias do centro. Em razão da própria natureza deste
ciclo, os ajustes estruturais que seriam momentâneos, tornam-se permanentes à medida que
tais medidas retroalimentam os desequilíbrios estruturais da economia. Ou seja, tal
ajustamento macroeconômico nunca se completa, demanda infindáveis reformas e
sacrifícios, reproduzindo um baixo padrão de crescimento, sempre subordinado
economicamente à lógica dos mercados financeiros globalizados, que acaba por engessar o
Estado e enfraquecer as políticas públicas. Isso se perdurou na economia brasileira e desde
o fim de 1998, a política fiscal passou a ser fundamentada no compromisso com metas de
superávit primário. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000 ditou um conjunto de
normas para a gestão pública como: limites para o endividamento público; limites de gasto
com pessoal em relação à receita corrente líquida para os três poderes e cada nível de
governo; determinação de metas fiscais anuais; proibição de qualquer operação de crédito
entre entes da federação; restrição da contratação de operações de crédito por antecipação
de receita orçamentária no último ano de mandato; mecanismos de compensação para
despesas de caráter permanente, com o que o governante não poderá criar uma despesa
continuada; e proibição do aumento das despesas com pessoal nos 180 dias que antecedem
o final do mandato. Foi criada a Lei de Crimes de Responsabilidade Fiscal que institui

4
sanções institucionais e administrativas no caso de não cumprimento das normas da LRF,
sendo assim, o ajuste fiscal virou lei e o não cumprimento, criminalizado, o que representa
um desafio concreto para as políticas públicas.

Você também pode gostar