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CAPı́TULO 1
Sequências Numéricas
1.1. Sequências
Definição 1.1.1. Uma sequência de números reais é uma função da forma
{an }∞
n=q : {n ∈ N | n ≥ q} → R
n 7→ an , (1.1)
onde q ∈ N está fixado.
A definição acima pode ser estendida para sequências de elementos de um con-
junto qualquer. Mas neste capı́tulo, só consideraremos sequências de números reais.
Então, frequentemente diremos apenas “sequência” querendo dizer “sequência de
números reais”. A expressão “sequência numérica” também é usada para desig-
nar este tipo de sequências. Mas dependendo do contexto, pode incluir também
sequências de números complexos (o que não ocorrerá neste material).
Para o caso de o leitor não estar muito familiarizado com a notação utilizada
na Definição 1.1.1, uma expressão da forma indicada em (3.1) define uma função
e nos diz como denotá-la. {an }∞ n=q é o nome da função (que, no caso, do tipo
sequência). {n ∈ N | n ≥ q} é domı́nio e R é o contradomı́nio dessa função. Note
que {n ∈ N | n ≥ q} é o mesmo que {q, q + 1, q + 2, q + 3, . . . }. A linha de baixo,
n 7→ an , nos diz que a cada n no domı́nio, a função associa um (único) elemento,
denotado por an , no contradomı́nio.
Os ı́ndices “n = q” e “∞”, na notação {an }∞ n=q , indicam que a variável inde-
pendente, n, assume valores naturais de q em diante, “até o infinito” (só que sem
incluir n = ∞, porque infinito não é um número natural). Às vezes, escreve-se o
infinito com sinal, +∞, para ressaltar que n varia “para cima”, e não “para baixo”.
Frequentemente, abreviamos {an }∞ n=q por {an }. Às vezes, a própria expressão
an é usada, por abuso de notação, como nome para a sequência que ela define. Mais
propriamente, a expressão an (com n não especificado) é chamada termo geral da
sequência {an }∞ ∞
n=q . Diremos que a variável n é o ı́ndice de {an }n=q e o número
q é o valor inicial desse ı́ndice, ou ı́ndice inicial da sequência. Para cada número
natural n no domı́nio de {an }∞ n=q , o número real an é chamado o termo de ı́ndice
n da sequência {an }.
A diferença entre “termo geral” e “termo de ı́ndice n” é um tanto sutil. Termo
geral é uma expressão envolvendo uma variável livre; tipicamente, n (mas também
pode ser i, j, k, m, etc). Por exemplo, se o termo geral de uma sequência é
an = n2 + 1, e ela inclui em seu domı́nio todos os números naturais, então seus
termos são a0 = 1, a1 = 2, a2 = 5, a3 = 10, etc. Por outro lado, a expressão “termo
de ı́ndice n” geralmente se refere a um número real bem definido, não meramente
uma expressão envolvendo uma variável livre. Se a sequência for, digamos {an }∞ n=0 ,
então a0 será o termo de ı́ndice 0, a1 o termo de ı́ndice 1, a30 o termo de ı́ndice
1
2 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
30, etc. Também é comum designarmos cada termo por um numeral ordinal, de
acordo com a posição que ele ocupa com relação aos outros. No caso de {an }∞ n=0 ,
diremos que a0 é o primeiro termo, a1 é o segundo termo, a2 é o terceiro, a30 é
o trigésimo primeiro, an o (n + 1)-ésimo. Mas note que a correspondência entre
o ı́ndice associado a um termo e o numeral ordinal desse termo depende do ı́ndice
inicial da sequência: Se a sequência começar em n = 1, ou seja, se for da forma
{an }∞n=1 , então a1 será o primeiro termo, a2 o segundo, a30 o trigésimo, an o n-
ésimo.
Quando o ı́ndice inicial de uma sequência {an } não for dado explicitamente,
consideraremos que ele é o menor natural q que torne a expressão an bem definida
para todo n ∈ N com n ≥ q.
Uma sequência {an }∞ n=q também costuma ser representada por listas de seus
primeiros membros:
{an }∞
n=q = {aq , aq+1 , aq+2 , aq+3 , . . . }.
No entanto, é preciso ter em mente que uma sequência não é meramente um con-
junto infinito de números reais. Quando usamos a notação {aq , aq+1 , aq+2 , aq+3 , . . . }
para representar uma sequência, estamos pensando não apenas no conjunto desses
valores listados entre chaves, mas também na relação de ordem entre eles e, princi-
palmente, na associação que está indicada entre esses termos e seus ı́ndices.
Definição 1.1.2. Denotaremos por Seq(R) o conjunto de todas as sequências
de números reais.
Exemplo 1.1.1. Seja f : A ⊆ R → R tal que o domı́nio A contém todos os
naturais a partir de algum q ∈ N. A restrição de f em N gera uma sequência de
números reais {an }∞
n=q dada por an = f (n). Dessa forma, obtemos, por exemplo:
ordenados desta maneira, e seguindo o padrão indicado acima até o infinito, formam
uma sequência {φn }∞
n=0 , chamada sequência de Fibonacci, tal que φ0 = 0, φ1 = 1
e φn+2 = φn + φn+1 para todo n ∈ N. A partir destas três igualdades, podemos
determinar qualquer termo da sequência. Por exemplo,
φ2 = φ0+2 = φ0 + φ0+1 = φ0 + φ1 = 0 + 1 = 1,
φ3 = φ1+2 = φ1 + φ1+1 = φ1 + φ2 = 1 + 1 = 2,
φ4 = φ2+2 = φ2 + φ2+1 = φ2 + φ3 = 1 + 2 = 3,
..
.
Pode parecer um pouco complicada, mas na verdade muito poucas sequências im-
portantes podem ser definidas por fórmulas explı́citas tão simples quanto esta.
4 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
finita deles, é útil praticar reconhecimento de padrões, numa lista finita de números
reais, que levem a um termo geral simples para uma sequência cujos primeiros
termos são aqueles números reais.
Exemplo 1.1.5. Seja b > 0 uma constante. Determine o termo geral da
sequência
{an }∞
n=0 = {b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, . . . }.
an
(b + c)/2 c b
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 n
0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, . . .
Note que, aqui, m = 3, b0 = 0, b1 = 1, b2 = 2, b3 = 0, etc. Quando aplicamos
a função seno em números da forma 2(n + 1)π/3, com n ∈ N variável (estamos
tomando p = 2π, perı́odo da função seno, e j = 1), geramos uma sequência {cn }∞ n=0 ,
dada por cn = sen (2(n + 1)π/3), cujos termos são
√ √ √ √ √ √ √ √ √
3 3 3 3 3 3 3 3 3
− , 0, , − , 0, , − , 0, , − , 0, , − , ...
2 2 2 2 2 2 2 2 2
Observe que esta é uma sequência periódica, seus valores se repetem de três em
três, assim √como supomos ser o caso de {an }∞ n=0 . Em seguida, aplicando a função
g(x) = 2x/ 3 + 1 sobre os termos de {cn }∞ n=0 , obtemos os números
0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, . . . .
Isto sugere que
2(n + 1)π 2 2(n + 1)π
an = g sen = √ sen + 1.
3 3 3
Observe que se uma sequência não é crescente, ela não necessariamente é decres-
cente. E se não é decrescente, ela não necessariamente é crescente. Uma sequência
pode até ser crescente e decrescente ao mesmo tempo. Nesse caso, ela é necessaria-
mente constante. A recı́proca também vale: toda sequência constante é crescente e
decrescente. Mas uma sequência não pode ser estritamente crescente e estritamente
decrescente ao mesmo tempo.
Toda sequência crescente (estritamente ou não) é eventualmente crescente (es-
tritamente ou não, respectivamente). Se uma sequência não é eventualmente cres-
cente, ela necessariamente também não é crescente, nem eventualmente estrita-
mente crescente. As afirmações anteriores deste parágrafo também valem se trocar-
mos “crescente” por “decrescente”. Além disso, também é claro que toda sequência
monotônica é eventualmente monotônica.
Em cada um dos itens (c), (d), (h) e (i) da Definição 1.2.1, se a desigualdade
<, entre n1 e n2 , fosse substituı́da por ≤, a definição resultante seria equivalente.
Mas se esta substituição fosse feita nos itens (a), (b), (f), (g) dessa definição, as
sentenças obtidas seriam falsas, já que n1 = n2 implica an1 = an2 .
Uma sequência é eventualmente monotônica se e somente se é eventualmente
crescente ou eventualmente decrescente.
Para uma função real em uma variável real, adotaremos definições de “decres-
cente”, “crescente”, “monotônica”, etc. perfeitamente análogas à Definição 1.2.1.
Mais precisamente, dada uma função f : A ⊆ R → R, diremos que f é
• estritamente decrescente se f (x1 ) > f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com
x1 < x2 .
• estritamente crescente se f (x1 ) < f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 <
x2 .
• decrescente se f (x1 ) ≥ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 < x2 .
• crescente se f (x1 ) ≤ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 < x2 .
• monotônica (ou monótona) se é crescente ou decrescente.
• eventualmente estritamente decrescente se, para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes, com x1 < x2 , f (x1 ) > f (x2 ).
• eventualmente estritamente crescente se f (x1 ) < f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈
A suficientemente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente decrescente se f (x1 ) ≥ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A sufici-
entemente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente crescente se f (x1 ) ≤ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente monotônica (ou eventualmente monótona) se existe x0 ∈ R
que torna verdadeira uma das seguintes afirmações: (i) para todo x1 , x2 ∈
A com x0 ≤ x1 < x2 , f (x1 ) ≤ f (x2 ); (ii) para todo x1 , x2 ∈ A com
x0 ≤ x1 < x2 , f (x1 ) ≥ f (x2 ).
• eventualmente constante se f (x1 ) = f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes.
Exemplo 1.2.1. Seja {an }∞
n=0 definida como no Exemplo 1.1.8:
{an }∞
n=0 = {b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . bm−1 , b0 , . . . }.
Solução.
10 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
Solução.
• {(n − 3)2 }∞
n=0 não é crescente, pois tomando n1 = 2 e n2 = 3, vemos
que (n1 − 3)2 = 1 > 0 = (n2 − 3)2 , apesar de n1 < n2 . Também não é
decrescente, pois tomando n1 = 3 e n2 = 4, vemos que (n1 − 3)2 = 0 <
1 = (n2 − 3)2 , com n1 < n2 . Mas é eventualmente estritamente crescente,
pois (n1 − 3)2 < (n2 − 3)2 para todo n1 , n2 ∈ N suficientemente grandes,
com n1 < n2 . Com efeito, se n1 , n2 ∈ N são tais que 3 ≤ n1 < n2 , então,
pelas propriedades das operações aritméticas com números naturais,
n0 ≥ 3, sejam
n1 = min{n ∈ N | n0 ≤ n e ∃k1 ∈ Z, 2k1 π < n − 2 < π + 2k1 π},
n2 = min{n ∈ N | n0 ≤ n e ∃k2 ∈ Z, π + 2k2 π < n − 2 < 2π + 2k2 π}.
A existência desses naturais é justificada pelo princı́pio da boa ordem,
pela propriedade arquimediana e pelo fato que o comprimento de inter-
valos da forma (2kπ, π + 2kπ) ou (π + 2kπ, 2π + 2kπ) é π > 1. Note que
csc(n1 − 2) > 0 e csc(n2 − 2) < 0. Logo, csc(n1 − 2) > csc(n2 − 2). Analo-
∞
gamente, prova-se que {csc(m − 2)}m=3 não é eventualmente decrescente
(logo, também não é decrescente, nem eventualmente estritamente decres-
∞
cente). Portanto, {csc(m − 2)}m=3 não é eventualmente monotônica.
• {arctan k}∞k=0 é estritamente crescente. Isto pode ser verificado por meio
da derivada. Sequências não são o tipo de função que se costuma derivar,
mas podemos utilizar para isso sua extensão
f :R→R
x 7→ f (x) = arctan x.
A definição que demos para sequência crescente, decrescente, etc. é boa para
sabermos o que acontece com a sequência vista como um todo. Mas uma ma-
neira mais prática de provar que uma sequência exibe determinado comportamento
quanto a crescimento/decrescimento é comparar termos consecutivos.
Proposição 1.2.1. Seja {an }∞
n=q ∈ Seq(R).
(a) {an }∞
n=q é estritamente crescente se e somente se an+1 > an para todo n ∈ N
com n ≥ q.
(b) {an }∞
n=q é estritamente decrescente se e somente se an+1 < an para todo n ∈ N
com n ≥ q.
(c) {an }∞
n=q é crescente se e somente se an+1 ≥ an para todo n ∈ N com n ≥ q.
(d) {an }∞
n=q é decrescente se e somente se an+1 ≤ an para todo n ∈ N com n ≥ q.
1.3. Limitação
Definição 1.3.1. Dizemos que {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é
(a) limitada inferiormente se existe um L1 ∈ R tal que L1 ≤ an para todo n ∈ N,
com n ≥ q.
(b) limitada superiormente se existe um L2 ∈ R tal que an ≤ L2 para todo n ∈ N,
com n ≥ q.
(c) limitada se é limitada inferiormente e superiormente.
(d) ilimitada inferiormente se não é limitada inferiormente.
(e) ilimitada superiormente se não é limitada superiormente.
(f) ilimitada se não é limitada.
É claro que se uma sequência é ilimitada superiormente, então ela é ilimitada.
Também é claro que a recı́proca desta implicação não vale em geral. Observações
análogas valem para a condição de ser ilimitada inferiormente.
Diferentemente das propriedades de crescimento, decrescimento e monotonici-
dade, os adjetivos e locuções adjetivas introduzidos na Definição 1.3.1 (“limitada”,
“limitada superiormente”, etc.) não são do tipo que se pode modificar significa-
tivamente pondo-se a palavra “eventualmente” (entendida no sentido usual) antes
deles. Por exemplo, digamos que tenhamos definido que uma sequência {an }∞ n=q
é dita eventualmente limitada se existe n0 ∈ N, com n0 ≥ q, tal que, para todo
n ∈ N com n ≥ n0 , existem L1 , L2 ∈ R tais que L1 ≤ an ≤ L2 . Esta é a maneira
mais natural e razoável de definir tal propriedade. Mas do ponto de vista de criar
um conceito novo, ela é um fracasso, pois toda sequência eventualmente limitada
(de acordo com essa definição) é limitada. De fato, se {an }∞
n=q ∈ Seq(R), n0 ∈ N
e L1 , L2 ∈ R são tais que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N com n ≥ n0 , então,
definindo
L01 = min{aq , . . . , an0 −1 , L1 } e L02 = max{aq , . . . , an0 −1 , L2 },
verifica-se facilmente que L01 ≤ an ≤ L02 para todo n ∈ N. Analogamente, não
seria nada útil definir sequência “eventualmente superiormente limitada”, “eventu-
almente ilimitada”, etc.
Proposição 1.3.1. {an }∞
n=q ∈ Seq(R) é limitada se e somente se existe M > 0
tal que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
Demonstração.
(⇒) Suponha que {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é limitada. Então existem L1 , L2 ∈ R
tais que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N com n ≥ q. Tomando M =
max{|L1 |, |L2 |}, segue que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
(⇐) Suponha que existe M > 0 tal que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
Tomando L1 = −M e L2 = M , segue que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N
com n ≥ q. Logo, {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é limitada.
A Proposição 1.3.1 permanece válida se trocarmos M > 0 por M ≥ 0 ou M ∈ R
e/ou se trocarmos |an | ≤ M por |an | < M .
∞
No Exemplo 1.2.2, não foi muito difı́cil verificar que {csc(m − 2)}m=3 não é
eventualmente monotônica. Bastou notar que existem naturais arbitrariamente
grandes em intervalos da forma (2kπ, π+2kπ) e também nos da forma (π+2kπ, 2π+
2kπ), com k ∈ Z. Não foi necessário prestar atenção se esses naturais poderiam ser
1.3. LIMITAÇÃO 13
tomados perto ou longe das extremidades desses intervalos. Porém, para avaliar
se a mesma sequência é ou não limitada, devemos observar quão perto os números
naturais estão dos múltiplos inteiros de π, pois é próximo de kπ, com k ∈ Z, que
a função cossecante assume valores arbitrariamente grandes em módulo. Acontece
que os naturais estão arbitrariamente próximos dos múltiplos inteiros de π. E isso
tem a ver com a irracionalidade de π.
Proposição 1.3.2. Sejam x, ω ∈ R, com ω ∈ / Q. Para todo δ > 0 e todo
n0 ∈ N, existem k ∈ Z e n ∈ N, com n ≥ n0 , tais que |x + kω − n| < δ.
Mais adiante, na Proposição 1.3.4, utilizaremos a Proposição 1.3.2 para garantir
a transferência de certos atributos (“crescente”, “limitada”, etc.) de uma uma
função real contı́nua e periódica para qualquer sequência definida a partir dessa
função via restrição. Antes disso, precisamos fixar alguma terminologia e introduzir
alguns conceitos que são importantes não apenas para o estudo de sequências, mas
dos números reais em geral.
Definição 1.3.2. Uma função real em uma variável real é dita periódica se
existe um ω ∈ R não nulo tal que, para todo x no domı́nio de f , x ± ω também está
no domı́nio de f e f (x ± ω) = f (x). Quando ω é o menor número real positivo com
esta propriedade, ele é dito o perı́odo de f .
Da Definição 1.3.2, por indução finita, segue diretamente que se f : A ⊆ R → R
é periódica com perı́odo ω, então para todo x ∈ A e todo k ∈ Z, tem-se x + kω ∈ A
e f (x + kω) = f (x).
Definição 1.3.3. Seja X ⊆ R. Um c ∈ R é dito
(a) uma cota inferior de X se, para todo x ∈ X, c ≤ x;
(b) uma cota superior de X se, para todo x ∈ X, x ≤ c.
Uma cota superior de um conjunto não precisa ser um número “perto” dos
elementos desse conjunto; só precisa ser um número maior que ou igual a cada
um deles. Pode ser inclusive muito maior. Observações análogas valem para cotas
inferiores.
Exemplo 1.3.1. Os números 1, π e 4572 são cotas superiores dos intervalos
I = [−1, 1) e J = (−1, 1], os quais possuem como cotas inferiores os números −3082,
−e/2 e −1, por exemplo.
Definição 1.3.4. Dizemos que X ⊆ R é
(a) inferiormente limitado se possui alguma cota inferior;
(b) superiormente limitado se possui alguma cota superior;
(c) limitado se é limitado superiormente e inferiormente;
(d) inferiormente ilimitado se não é inferiormente limitado;
(e) superiormente ilimitado se não é superiormente limitado;
(f) ilimitado se não é limitado.
Observação 1.3.1. O conjunto dos termos de uma sequência de números reais
é limitado (inferiormente/superiomente) se e somente se a sequência é limitada
(inferiormente/superiomente). Em outras palavras, dados {an }∞ n=q ∈ Seq(R) e
X = {an | n ∈ N, n ≥ q},
(a) {an }∞n=q é inferiormente limitada se e somente se X é inferiormente limitado.
(b) {an }∞n=q é superiormente limitada se e somente se X é superiormente limitado.
14 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
(c) {an }∞
n=q é limitada se e somente se X é limitado.
Demonstração.
(a) É fácil ver que se f é crescente, então {an }∞ n=q também é, já que esta é mera-
mente uma restrição daquela. Agora, suponha que f não é decrescente. Assim,
existem x1 , x2 ∈ A, com x1 < x2 , tais que f (x1 ) < f (x2 ). Logo, o número ε =
(f (x2 ) − f (x1 ))/2 é positivo. Por hipótese, existem n1 , n2 ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . }
tais que |f (x1 ) − f (n1 )| < ε, |f (x2 ) − f (n2 )| < ε e n2 > n1 , já que n2 pode ser
tomado tão alto quanto se queira; em particular, pode ser tomado maior que
ou igual a n0 = n1 + 1 (ou seja, maior que n1 ). Note que ε = (f (x2 ) − f (x1 ))/2
implica f (x1 )+ε = f (x2 )−ε. Daı́, por |f (x1 )−f (n1 )| < ε e |f (x2 )−f (n2 )| < ε,
decorre que
f (n1 ) < f (x1 ) + ε = f (x2 ) − ε < f (n2 ).
Portanto, se f não é decrescente, então existem n1 , n2 ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . },
com n1 < n2 , tais que an1 = f (n1 ) < f (n2 ) = an2 . Em outras palavras, se f
não é decrescente, então {an }∞
n=q não é decrescente.
(b) A demonstração é análoga à do item anterior.
(c) Esta é uma consequência imediata dos dois itens anteriores.
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
(i)
(j)
Dai, como {n/4} é ilimitada superiormente, segue que {n!/2n } também é ilimitada
superiormente.
1.4. Subsequências
Definição 1.4.1. Dada {an }∞ ∞
n=q ∈ Seq(R), uma subsequência de {an }n=q é
∞
uma sequência de números reais da forma {aα(n) }n=q0 , onde
α : {n ∈ N | n ≥ q 0 } → {n ∈ N | n ≥ q}
n 7→ α(n)
é uma função (mais especificamente, uma sequência) estritamente crescente.
Intuitivamente, uma subsequência de {an }∞
n=q é uma seleção de termos de
{an }∞
n=q , respeitando-se a ordem em que eles estão dispostos originalmente na
sequência.
Exemplo 1.4.1. Se selecionarmos os termos pares da sequência de Fibonacci
(Exemplo 1.1.3),
tomemos ε > 0, arbitrário. Queremos exibir um δ > 0 tal que, para todo n ∈ N,
n > δ ⇒ |c − c| < ε.
Mas é claro que esta última desigualdade, e por conseguinte a implicação acima, é
válida independentemente de δ. Portanto, qualquer√número positivo serve como o
δ de que precisamos. Por exemplo, tome δ = 7π − 3.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 21
Exemplo 1.5.4. De acordo com os Exemplos 1.5.1, 1.5.2 e 1.5.3, usando a ter-
minologia introduzida na Definição 1.5.2, podemos dizer que, sendo c ∈ R qualquer
constante, a sequência {c}∞ ∞
n=0 é convergente para c, {1/n}n=1 converge para 0 e
n ∞
{(−1) }n=0 é divergente.
Como já dissemos, ser limitada, no sentido da Definição 1.3.1, não significa,
necessariamente, possuir um limite, no sentido da Definição 1.5.1. No entanto, esta
última condição implica a primeira.
Proposição 1.5.2. Toda sequência de números reais convergente é limitada.
Em outras palavras, toda sequência de números reais ilimitada é divergente.
Demonstração. Sejam {an } ∈ Seq(R) e L ∈ R tais que limn→∞ an = L.
Tomando ε = 1 em (1.7), vemos que existe N ∈ N tal que, para todo n ∈ N, com
n > N,
|an − L| < 1 ∴ L − 1 ≤ an ≤ L + 1
∴ |an | ≤ |L − 1| ou |an | ≤ |L + 1|
∴ |an | ≤ max{|L − 1|, |L + 1|}.
Por outro lado, se n ≤ N , então é claro que |an | ≤ max{|a1 |, . . . , |aN |}. Assim,
definindo
M = max{|a1 |, . . . , |aN |, |L + 1|, |L − 1|},
temos que |an | ≤ M para todo n no domı́nio da sequência. E M ≥ |L + 1| > 0.
Então, pela Proposição 1.3.1, {an } é limitada.
Exemplo 1.5.5. Como vimos no Exemplo 1.3.4, as sequências
3
n2
2 n
{n cos n}, e √
n+1 n3 + 4n
são ilimitadas e, portanto, divergentes.
Exemplo 1.5.6. Como vimos no Exemplo 1.3.5, {n!/2n } é ilimitada superior-
mente e, portanto, diverge.
Merecem atenção duas formas especiais de divergência, chamadas limites infi-
nitos.
Definição 1.5.3. Seja {an } ∈ Seq (R).
(a) Dizemos que o limite de an é mais infinito, e escrevemos limn→∞ an = +∞ (ou
limn→+∞ an = +∞, ou lim an = +∞), se podemos tornar an arbitrariamente
grande tomando um n suficientemente grande. Ou seja, se para todo ε > 0,
existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, vale a implicação n > δ ⇒ an > ε.
Simbolicamente,
lim an = +∞ ⇔ lim an = +∞ ⇔ lim an = +∞
n→∞ n→+∞
(
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N,
⇔ (1.8)
n > δ ⇒ an > ε.
(b) Dizemos que o limite de an é menos infinito, e escrevemos limn→∞ an = −∞ (ou
limn→+∞ an = −∞, ou lim an = −∞), se podemos tornar an arbitrariamente
grande em módulo, com sinal negativo, tomando um n suficientemente grande.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 23
Ou seja, se para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, vale a
implicação n > δ ⇒ an < −ε. Simbolicamente,
lim an = −∞ ⇔ lim an = −∞ ⇔ lim an = −∞
n→∞ n→+∞
(
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N,
⇔ (1.9)
n > δ ⇒ an < −ε.
Assim como na Definição 1.5.1, podemos substituir o quantificador ∃δ > 0, na
Definição 1.5.3, por ∃N ∈ N, mantendo-se o significado essencialmente o mesmo. E
limites infinitos também não dependem do ı́ndice inicial da sequência.
Observação 1.5.1.
(a) Se uma sequência possui limite infinito, então ela é ilimitada. Mais precisa-
mente,
• Se limn→∞ an = +∞, então {an } não é limitada superiormente.
• Se limn→∞ an = −∞, então {an } não é limitada inferiormente.
Consequentemente, se uma sequência possui limite infinito, então ela diverge
(relembre a Proposição 1.5.2). Isto justifica as expressões comumente utilizadas
“diverge para ±∞”, introduzidas a seguir, na Definição 1.5.4.
(b) Se uma sequência possui limite infinito, então ela é limitada superiormente
ou limitada inferiormente. (E isto não contradiz o item (a), acima.) Mais
precisamente,
• Se limn→∞ an = +∞, então {an } é limitada inferiormente.
• Se limn→∞ an = −∞, então {an } é limitada superiormente.
Definição 1.5.4. Dizemos que {an } ∈ Seq(R)
(a) diverge para +∞ quando limn→∞ an = +∞;
(b) diverge para −∞ quando limn→∞ an = −∞.
Exemplo 1.5.7. Vamos provar, por (1.8), que limn→∞ n = +∞. Dado um
ε > 0, queremos exibir um δ > 0 tal que se n > δ, então n > ε. Evidentemente, a
escolha δ = ε resolve. Analogamente, prova-se que limn→∞ −n = −∞. Portanto,
as sequências {n} e {−n} divergem para +∞ e para −∞, repectivamente.
Observe que nem toda divergência é para +∞ ou para −∞.
Exemplo 1.5.8. Considere an = (−1)n . Já provamos, no Exemplo 1.5.3, que
a sequência {an }∞ ∞
n=0 não possui limite finito. Provaremos agora que {an }n=0 não
possui limite infinito. Para isso, considere ε = 1. Assim, para todo n ∈ N, é falso
que an > ε. Logo, é falso que ∃N ∈ N, ∀n ∈ N, n > N ⇒ an > ε. Ou seja, é
falso que limn→∞ an = +∞. Analogamente, e com a mesma escolha de valor para
ε, prova-se que não vale limn→∞ an = −∞. Portanto, {(−1)n } não tem limite,
nem finito, nem infinito. Em outras palavras, é uma sequência divergente cuja
divergência não é para +∞ nem para −∞.
A seguinte definição foi traduzida e adaptada de [Can].
Definição 1.5.5. A extensão afim de R é um conjunto R = R ∪ {−∞, +∞},
onde −∞ e +∞ são objetos distintos não pertencentes a R. Operações aritméticas
e relação de ordem são estendidas de R para R da seguinte maneira:
(a) −∞ < x < +∞ se x 6= ±∞; além disso, −∞ < +∞.
(b) −(+∞) = −∞ e −(−∞) = +∞.
24 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
Portanto, limk→∞ ak = 0.
Observe que, no Exemplo 1.5.11, aplicamos a regra de L’Hospital não na
sequência, mas numa extensão f da sequência. E para isso, tivemos que verifi-
car que essa extensão satisafazia as condições da regra de L’Hospital, que exigem
que f seja da forma g(x)/h(x), com g e h diferenciáveis, etc. A regra de L’Hospital
não deve ser aplicada diretamente na sequência, pois sequências não são o tipo de
função que se deriva normalmente. A derivada de uma função f : A ⊆ R → R
é definida por um limite do tipo x → p, com p ∈ R, e, como já dissemos na in-
trodução desta seção, esse tipo de limite não funciona bem para sequências, devido
às propriedades topológicas de N (conjunto discreto, sem pontos de acumulação).
Poderı́amos até fixar uma definição para a derivada de uma sequência num ponto
p ∈ R, mas não teria como garantir a unicidade. A derivada de uma sequência dada
num ponto dado seria √ um limite que poderia assumir qualquer valor, simultanea-
mente; poderia ser 2 e 3/5, ao mesmo tempo, por exemplo.
Proposição 1.5.5 (Propriedades Operatórias). Sejam {an }, {bn } ∈ Seq(R),
p, L ∈ R e f : A ⊆ R → R, com A contendo an para todo n suficientemente grande.
(a) limn→∞ (an + bn ) = limn→∞ an + limn→∞ bn , desde que os limites indicados
existam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem definida.
(b) limn→∞ an bn = (limn→∞ an )(limn→∞ bn ), desde que os limites indicados exis-
tam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem definida.
(c) Se limn→∞ an = p e limx→p f (x) = L, então limn→∞ f (an ) = L.
Observação 1.5.2. Supondo que p = limn→∞ an é finito e f é contı́nua em
p, o item (c) da Proposição 1.5.5 nos diz que limn→∞ f (an ) = f (limn→∞ an ). Ou
seja, nesse caso o limite pode “entrar” na função. (Mais propriamente, o limite
comuta com a função.) Essa passagem do limite para dentro da função também é
válida quando limn→∞ an = ±∞ e limx→±∞ f (x) = L:
lim f (an ) = f lim an = f (±∞) = lim f (x) = L.
n→∞ n→∞ x→±∞
n2−2 1 1
= lim q = lim q = lim √ = +∞.
n→∞ n3
+ 4n n→∞ 1
+ 4 x→0 x
n4 n4 n n3
Daı́, pelo teorema do confronto, segue que {3n /n!}, e portanto {(−3)n /n!}, converge
para zero.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 27
√
Exemplo 1.5.19. Seja xn√= 2−n (1 + n)(−1)n sen 2n arctan 3n. Observe que
−n
xn = yn zn , onde yn = 2 (1+ n) converge para zero e zn = (−1)n sen 2n arctan 3n
é limitada. Logo, limn→∞ xn = 0.
Proposição 1.5.10. O limite de uma sequência de números reais é L ∈ R se e
somente se toda subsequência dela têm o mesmo limite L. Consequentemente, para
toda {an } ∈ Seq(R),
(a) Se alguma subsequência de {an } não tem limite finito, então {an } não tem
limite finito.
(b) Se alguma subsequência de {an } não tem limite (nem finito, nem infinito),
então {an } não tem limite (nem finito, nem infinito).
(c) Se duas subsequências de {an } têm limites distintos, então {an } não tem limite
(nem finito, nem infinito).
Demonstração. Provaremos o caso em que L é finito. A demonstração para
os casos L = ±∞ é análoga, trocando-se apenas a expressão “|a − L| < ε” por
“a > ε” ou “a < −ε”, dependendo do caso (+∞ ou −∞, respectivamente).
Suponha que limn→∞ an = L e seja bm = aα(m) , com α : m 7→ n estritamente
crescente. Dado ε > 0, temos:
∃N1 ∈ N, ∀n ∈ N, n > N1 ⇒ |an − L| < ε. (1.10)
Se α(m) = m para todo m, então é claro que limm→∞ bm = limm→∞ am = L. Por
outro lado, se α(m) 6= m para algum m, então segue de (1.10) que
∀ε > 0, ∃N2 = min{m ∈ N | α(m) > m > N1 }, ∀m ∈ N,
m > N2 ⇒ α(m) > α(N2 ) > N2 > N1 ⇒ |aα(m) − L| < ε; (1.11)
ou seja, limm→∞ bm = L. Reciprocamente, se toda subsequência de {an } converge
para L, então {an } converge para L em razão do que dissemos no Exemplo 1.4.2.
Exemplo 1.5.20. Como visto nos Exemplos 1.5.3 e 1.5.8, a sequência {(−1)n }
não possui limite, nem finito, nem infinito. A verificação disso foi pelas definições
de limite finito e limite infinito, com δ’s e ε’s. Mas agora, com a Proposição 1.5.10,
basta notar que as sequências constantes {−1} e {1} são subsequências de {(−1)n }
28 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
que convergem para limites distintos. Mais geralmente, toda sequência periódica
não constante (como aquela definida no Exemplo 1.1.8, só que com bi 6= bj para
algum i, j) não possui limite (nem finito, nem infinito), pois possui subsequências
constantes distintas.
Pn
Exemplo 1.5.21. Sejam {an }∞ n=0 ∈ Seq(R) definida por an =
k
k=0 (−1) . Ou
seja,
an = 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 · · · + (−1)n .
| {z }
n+1 parcelas
Um erro comum ao lidar com essa sequência é achar que, no limite, teremos uma
quantidade igual de parcelas −1 e parcelas 1, de modo que limn→∞ an = 0. O
problema de pensar assim é que a soma precisa ser calculada antes de aplicar o
limite, quando ainda existe apenas uma quantidade finita de parcelas. Note que
(
1 se n é par,
an =
0 se n é ı́mpar.
Então {an }∞
n=0 possui duas subsequências constantes distintas:
{a2m }∞ ∞
m=0 = {1}m=0 e {a2m+1 }∞ ∞
m=0 = {0}m=0 ;
logo, não possui limite (nem finito, nem infinito).
Exemplo 1.5.22. Seja {an }∞ ∞
n=1 , {bn }n=1 ∈ Seq(R) definidas por
(
log10 n se n é uma potência de 10,
an =
1/n caso contrário,
(
1/ log10 n se n é uma potência de 10,
bn =
1/n caso contrário.
{an }∞ ∞
n=1 diverge, e também não tem limite infinito, mas {bn }n=1 converge. Para ve-
∞ ∞ ∞
rificar que {an }n=1 diverge, basta ver que {a10k }k=0 = {k}k=0 é uma subsequência
divergente. Para verificar que {an }∞ n=1 não tem limite (nem finito, nem infinito), é
suficiente notar que {a10k }∞
k=0 e {a ∞
10k +1 }k=0 são subsequências com limites distin-
tos: a primeira destas duas é {k}k=0 e diverge para +∞; a outra é {1/(10k + 1)}∞
∞
k=0
e converge para 0. Por outro lado, para verificar a convergência de {bn }∞ n=1 , não
basta simplesmente tomar duas subsequências e mostrar que ambas têm o mesmo
limite. A partir de duas subsequências com o mesmo limite, não temos como ga-
rantir que todas as subsequências têm o mesmo limite. Toda sequência possui
infinitas subsequências. E em geral, tentar provar que todas as subsequências têm
o mesmo limite não simplifica em nada a tarefa de mostrar que uma dada sequência
têm aquele mesmo limite. Até porque uma das subsequências deve ser a própria
sequência inteira. Uma opção eficaz e cômoda para mostrar que {bn }∞ n=1 converge
é observar que
1
0 ≤ bn ≤
log10 n
e aplicar o teorema do confronto (p. 26).
Proposição 1.5.11 (Critério da Limitação e Monotonicidade). Seja {an } ∈
Seq(R).
(a) Se {an } é superiormente limitada e eventualmente crescente, então {an } con-
verge para o supremo do conjunto dos seus termos.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 29
a0 = b,
√
∀n ∈ N, an+1 = an .
Temos as seguintes possibilidades:
• b > 1. Nesse caso, prova-se por indução finita que, para todo n ∈ N,
an > 1 e an+1 < an .
– Caso base: Temos: a0 = b > 1 e, então
√ √
a1 = a0 = b < b = a0 ,
pois a raiz quadrada de qualquer número maior que 1 é menor do
que o próprio número.
– Passo indutivo: Para todo n ∈ N, se an > 1 e an+1 < an , então
√
an+1 = an > 1,
pois a raiz quadrada de um número maior que 1 é sempre maior 1, e
√
an+2 = an+1 < an+1 ,
pela mesma justificativa do caso base.
Assim, {an }∞n=0 é estritamente decrescente e inferiormente limitada por 1.
Logo, converge para L = inf{an | n ∈ N}. Note que L ≥ 1, já que 1 é uma
cota inferior de {an | n ∈ N}. O valor preciso de L pode ser determinado
√
aplicando-se o limite em ambos os membros de an+1 = an :
√ q √
L = lim an = lim an = lim an = L.
n→∞ n→∞ n→∞
de modo que
a2n+1 − a2n > 0 ⇔ an+1 − an > 0.
Por outro lado,
√
∀n ∈ N∗ , a2n+1 − a2n = ( 2 + an )2 − a2n = 2 + an − a2n = (2 − an )(1 + an ) > 0.
| {z } | {z }
>0 >0
Logo,
∀n ∈ N∗ , an+1 − an > 0.
Ou seja, {an }∞
n=1 é estritamente crescente. Como {an }∞
n=1 é superiormente limitada
e crescente, ela deve convergir para L = sup{an | √ n ∈ N∗ }. Como L é uma √ cota
superior de {an | n ∈ N∗ }, temos que L ≥ a1 = 2√> 0 e então existe 2 + L.
Aplicando o limite em ambos os membros de an+1 = 2 + an , temos:
√
L = 2 + L ∴ L2 = 2 + L ∴ (2 − L)(1 + L) = 0 ∴ L ∈ {−1, 2}.
√
Mas, como L ≥ 2, L não pode ser −1. Portanto, limn→∞ an = L = 2.
Exemplo 1.5.25. A Proposição 1.5.11 nos diz que ser limitada e monotônica,
essas duas coisas juntas, é uma condição suficiente para uma sequência ser con-
vergente. Mas isoladamente, ser limitada, em geral, não implica ser convergente
(contraexemplo: {(−1)n }); e ser monotônica, em geral, também não implica ser
convergente (contraexemplo: {n}). Além disso, dessas duas condições, limitação e
monotonicidade, apenas a limitação é uma condição necessária para a convergência.
A monotonicidade não é uma condição necessária. Por exemplo, a sequência
{(−1)n /n}∞
n=1 não é monotônica, mas converge para zero, pois, como vimos no
Exemplo 1.5.2, {1/n}∞ n=1 converge para zero; daı́, basta aplicar o Lema 1.5.8.
(a) Como {bn } converge, temos que {bn } é limitada (Proposição 1.5.2). Em par-
ticular, {bn } é superiormente limitada. Então existe um M > 0 tal que
an ≤ bn < M , para todo n suficientemente grande. Logo, {an } é superior-
mente limitada. Daı́, como {an } é crescente, segue que {an } converge (Pro-
posição 1.5.11).
(b) Pela definição de limite infinito, temos que, para todo ε > 0, existe N ∈ N tal
que, para todo n ∈ N, vale a implicação
n > N ⇒ bn ≥ an > ε.
(Lembre que a desigualdade an ≤ bn vale para todo n suficientemente grande; e
podemos supor, sem perda de generalidade, que todo n > N é suficientemente
grande; se não for, basta tomar um N maior.) Logo, limn→∞ bn = +∞.
Exemplo 1.5.26. Calcule o limite de {an } dada por an = n!/2n .
Solução. Como vimos no Exemplo 1.3.5, para n suficientemente grande,
n! n (n − 1) · (n − 2) · . . . · 4 · 3 2 · 1 n
= · · > .
2n 2 | 2 · 2 · .{z
.. · 2 · 2 } 2 · 2 4
>1
Daı́, como {n/4} diverge para +∞, conclui-se, pela Proposição 1.5.12(b), que
limn→∞ an = +∞.
Exemplo 1.5.27 (Progressões Geométricas). Dado um r ∈ R, considere a
sequência {rn }∞
n=0 . Temos:
(
n 1 se n = 0
• Se r = 0, então r = . Nesse caso, {rn } é uma
0 caso contrário.
sequência decrescente, eventualmente constante, que converge para zero.
• Se 0 < r < 1, então {rn }∞n=0 é decrescente e inferiormente limitada; logo,
converge para inf{rn | n ∈ N} = 0.
• Se −1 < r < 0, então {rn } converge para zero, pelo Lema 1.5.8 e pelo
item anterior.
• Se r = 1, então {rn }∞n=0 é constante e converge para 1.
• Se r = −1, então {rn }∞ n=0 não converge, como já foi visto no Exem-
plo 1.5.3. E também não possui limite infinito, como já foi visto no
Exemplo 1.5.8.
• Se |r| > 1, então {rn }∞
n=0 é ilimitada (para todo M > 0, se n > log|r| M ,
então |rn | > M ) e, portanto, diverge. Sendo que se r > 1, ela diverge
para +∞.
Resumindo, {rn } converge se e somente se r ∈ (−1, 1].
Exemplo 1.5.28. Calcule limn→∞ (1 − (1/5)n ), se existir.
Solução. Como 0 < 1/5 < 1,
n n
1 1
lim 1 − = 1 − lim = 1 − 0 = 1.
n→∞ 5 n→∞ 5
Exemplo 1.5.29. Calcule limn→∞ 3n+2 /5n , se existir.
32 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS
Exemplo 1.5.30. Calcule
lim e−n + arctan[−(4/π)n/2 ] ,
n→∞
se existir.
Solução.
lim e−n + arctan[−(4/π)n/2 ] = lim e−n + lim arctan[−(4/π)n/2 ]
n→∞ n→∞ n→∞
h p n i
−1 n
= lim (e ) + lim arctan − 4/π
n→∞ n→∞
p
e−1 )n + arctan[− lim ( 4/π )n ]
= lim ( |{z}
n→∞ n→∞ | {z }
∈(0,1) >1
= 0 + arctan [−(+∞)] = 0 + arctan(−∞)
π
=− .
2
Exercı́cio 1.5.1. Determine se a sequência {an } converge ou diverge. Calcule
o limite, se existir.
(a) an = (n3 − n)/(2n3 + 5n2 ).
(b) an = e1/n .
(c) an = p tan (2nπ/(1 + 8n)).
(d) an = (n + 1)/(9n + 1).
(e) an = e2n/(n+2) .
(f) an = (ln n)/(ln 2n).
(g) an = (en + e−n )/(e2n − 1).
(h) an = ln(2n√2 + 1) √
− ln(n2 + 1).
(i) an = n − n + 1 n +√3.
(j) an = (−1)n+2 n/(n + n).
(k) an = cos(n/2).
(l) an = (2n − 1)!/(2n + 1)!.
(m) a1 = 2 e an+1 = (an + 6)/2.
(n) a1 = 2 e an+1 = 1/(3 − an ).
CAPı́TULO 2
Séries Numéricas
2.1. Séries
Muitas sequências importantes são definidas por meio de somas de termos de
uma outra sequência.
Exemplo 2.1.1 (SomaPn de Progressão Geométrica). No Exemplo 1.5.21, es-
tudamos a sequência { k=0 (−1)k }∞ n=0 . Mais geralmente, dado qualquer r ∈ R,
poderı́amos pensar na sequência {sn }∞
n=0 dada por
n
X
sn = rk .
k=0
Temos, assim, uma sequência {sn } definida por meio de somas de termos de uma
outra sequência, {rk }. Esta última já foi estudada no Exemplo 1.5.27. Para avaliar
a convergência/divergência de {sn }, convém encontrar uma fórmula fechada para
seu termo geral. Isto pode ser feito de dois jeitos, pelo menos. O primeiro consiste
em observar que
n
X n
X n
X n
X n
X n+1
X
(1 − r)sn = sn − rsn = rk − r rk = rk − rk+1 = rk − rk
k=0 k=0 k=0 k=0 k=0 k=1
2 n−1 n
= 1 + r + r + · · · +
r
+
r − r − r2 · · · −
rn−1
n
− r
−r
n+1
= 1 − rn+1
(
(1 − rn+1 )/(1 − r) se r 6= 1,
∴ sn = (2.1)
n+1 se r = 1.
O segundo modo de chegar a esta fórmula é verificar que, na divisão do polinômio
1 − xn+1 pelo polinômio 1 − x, o resto é zero e o quociente é 1 + x + · · · + xn . A
partir de (2.1), temos as seguintes possibilidades:
• r ∈ (−1, 1). Neste caso, a sequência {rn+1 } converge para zero (Exem-
plo 1.5.27) e então
1 − rn+1 1−0 1
lim sn = lim = = .
n→∞ n→∞ 1−r 1−r 1−r
• r = 1. Neste caso, {sn } = {n + 1} diverge para +∞.
• r = −1. Aqui, como vimos no Exemplo 1.5.21, e como pode ser confirmado
novamente por (2.1), sn oscila entre 0 e 1, de modo que {sn } não converge.
• |r| > 1. Neste caso, a sequência {rn+1 } é ilimitada (Exemplo 1.5.27) e
então {sn } = {(1 − rn+1 )/(1 − r)} também é ilimitada; logo, diverge. No
subcaso r > 1, {rn+1 } e, consequentemente, {sn } divergem para +∞.
33
34 2. SÉRIES NUMÉRICAS
1/4
1/2 1
1/16
1/8
1/64
1/32
P∞
(c) Dizemos que o limite da série k=q ak é L ∈ R, e escrevemos
∞
X
ak = L,
k=q
Ao usar essa notação mais relaxada, devemos nos certificar que o termo geral da
série pode ser determinado pelo contexto.
Uma série como aquela em (2.3), mas com um ı́ndice inicial diferente, também
costuma ser chamada série geométrica. Entretanto, observe que o valor da soma
36 2. SÉRIES NUMÉRICAS
Solução. O limite desta sequência pode ser calculado pelo método utilizado
nos Exemplos 1.5.23 e 1.5.24, observando que uma fórmula recursiva para esta
sequência é
√
a1 = 3,
√
∀n ∈ N, an+1 = 3an .
Mas aqui, vamos aplicar a fórmula da soma da série geométrica. Observe que, de
acordo com o padrão indicado no enunciado,
√
a1 = 3 = 31/2 ,
√
q
a2 = 3 3 = (3 · 31/2 )1/2 = 31/2 · (31/2 )1/2 = 31/2 · 31/4 = 31/2+1/4 ,
r q
√
a3 = 3 3 3 = (3 · 31/2+1/4 )1/2 = 31/2 · (31/2+1/4 )1/2 = 31/2+1/4+1/8 ,
..
.
Pn k
an = 3 k=1 (1/2) .
Daı́, como
n k ∞ k
X 1 X 1 1/2
lim = = = 1,
n→∞ 2 2 1 − 1/2
k=1 k=1
segue que
P∞ k
lim an = 3 k=1 (1/2) = 31 = 3.
n→∞
Solução. Esta é, claramente, uma série telescópica, com n-ésimo termo an =
bn − bn+1 , onde bn = n1 cos n. Então
∞
X 1 1 1
cos n − cos(n + 1) = b1 − lim cos n.
n=1
n n + 1 n→∞ n
Este último limite é zero, pois limn→∞ 1/n = 0 e a sequência {cos n}∞
n=1 é limitada.
Além disso, b1 = cos 1. Logo,
∞
X 1 1
cos n − cos(n + 1) = cos 1.
n=1
n n+1
P+∞
Exemplo 2.1.7. Calcule a soma da série k=0 1/[(4k + 1)(4k + 5)].
Solução.
+∞ +∞
X (4k + 5)/4 − (4k + 1)/4
X 1
=
(4k + 1)(4k + 5) (4k + 1)(4k + 5)
k=0 k=0
+∞
X 1 1
= −
4(4k + 1) 4(4k + 5)
k=0
+∞
X
= (bk − bk+1 ),
k=0
onde
1
bk = .
4(4k + 1)
38 2. SÉRIES NUMÉRICAS
Podemos calcular a soma de alguns outros tipos de séries, não exatamente
telescópicas, usando a mesma ideia de cancelamento de termos intermediários, nas
somas parciais.
Exemplo 2.1.9. Calcule a soma da série
∞
X 2
2−1
.
n=2
n
1 3
=1+ − lim bm − lim bm+1 = .
2 m→∞
| {z } | {z } 2
m→∞
=0 =0
2.1. SÉRIES 39
P
Proposição 2.1.1 (Teste da Divergência). Se uma série numérica an con-
verge, então a sequência dos seus termos, {an }, converge para zero. Em outras
palavras, se a sequência dos termos de uma série não converge para zero, então a
série diverge.
P
Demonstraç
P ão. Se an converge para L e {sn } é a sequência de somas
parciais de an , então, para um natural n suficientemente grande, temos an =
sn − sn−1 , de modo que
lim an = lim (sn − sn−1 ) = lim sn − lim sn−1 = L − L = 0.
n→∞ n→∞ n→∞ n→∞
3n2 +n−5
P∞
Exemplo 2.1.10. A série n=2 (n−1)(n+1) não converge, pois
3n2 + n − 5
lim = 3 6= 0.
n→∞ (n − 1)(n + 1)
Exemplo P∞2.1.11. Pelo que dissemos nos Exemplos 1.5.21, 2.1.1 e 2.1.2, é claro
que a série n=0 (−1)n não converge. Outra maneira de justificar isto consiste em
aplicar a Proposição 2.1.1 e notar que a sequência {(−1)n } não converge.
Exemplo 2.1.12 (Série Harmônica). A recı́proca da Proposição 2.1.1 é falsa.
Como contraexemplo, podemos citar a chamada série harmônica,
∞
X 1
.
k
k=1
O termo geral desta série, 1/k, converge para zero, mas a série diverge, como
verificaremos agora. Observe que
1
X 1
= 1,
k
k=1
3
X 1 1 1 1
=1+ + ≥1+2· ,
k 2 3 4
k=1 | {z }
≥1/4+1/4
7
X 1 1 1 1 1 1 1 1 1
=1+ + + + + + ≥1+2· +4· ,
k |2 {z 3} |4 5 {z 6 7} 4 8
k=1
≥1/4+1/4 ≥1/8+1/8+1/8+1/8
..
.
j
2X −1
1 1 1 1 j−1
≥ 1 + 2 · + 4 · + · · · + 2j−1 · j = 1 + .
k 4 8 2 2
k=1
Daı́, como limj→∞ [1 + (j − 1)/2] = +∞, segue, pela Proposição 1.5.12, que
j
2X −1
1
lim = +∞.
j→∞ k
k=1
40 2. SÉRIES NUMÉRICAS
nP j o∞
2 −1
Assim, k=1 1/k é uma subsequência divergente da sequência das somas
j=0
parciais da série
P∞harmônica. Consequentemente, pela Proposição 1.5.10 e pela De-
finição 2.1.1, k=1 1/k diverge.
Note que a Proposição 2.2.1 não diz que a integral imprópria e a série analisada
por meio dessa integral devem convergir para o mesmo número, caso convirjam.
Além disso, não se deve desprezar as condições preliminares à aplicação desse teste:
a função f deve ser contı́nua, positiva e decrescente no intervalo de integração
para que se possa estabelecer alguma relação entre a integral e a série. A partir
daı́, caso essas condições sejam satisfeitas, podemos dizer que a convergência da
integral implica a convergência da série (mas não necessariamente para o mesmo
valor) e vice-versa.
P∞
Exemplo 2.2.1. Teste a série n=1 1/n2 quanto à convergência ou divergência.
p
Então f é decrescente no intervalo ( 3 2/3, +∞) e, consequentemente, também no
intervalo [1, +∞). Assim, podemos usar o critério da integral.
Z +∞ Z t
3 3
x2 e−x dx = lim x2 e−x dx
1 t→+∞ 1
1 t −x3
Z
= lim − e (−3x2 )dx
t→+∞ 3 1
Z −t3
1 1 −t3
= − lim eu du = − lim [eu ]−1
3 t→+∞ −1 3 t→+∞
1 3 1
= − lim e−t − e−1 = .
3 t→+∞ 3e
R +∞ 3 P∞ 3
Como a integral 1 x2 e−x dx converge, a série n=1 n2 e−n converge.
P∞
Exemplo 2.2.3. Estude a série k=0 k/(1 + k 4 ) com relação a convergência
ou divergência.
Demonstração. A função f : R → R dada por f (x) = x/(1 + x4 ) estende a
sequência {k/(1 + k 4 )}∞
k=0 , é derivável (logo, contı́nua) em R e positiva para todo
x 6= 0. Vamos estudar seu crescimento/decrescimento. Derivando:
1 · (1 + x4 ) − x · 4x3 1 − 3x4
f 0 (x) = = .
(1 + x4 )2 1 + x4
Estudando o sinal da derivada:
1 − 3x4
∀x ∈ R, f 0 (x) < 0 ⇔ <0
1 + x4
⇔ 1 − 3x4 < 0 (pois 1 + x4 > 0)
r r
4 1 4 1
⇔ x<− ou x > .
3 3
p
Assim, f 0 (x) < 0 para todo x > 4 1/3 (inclusive para todo x ≥ 1). Consequente-
mente, f é positiva, contı́nua e decrescente em [1, +∞). Podemos então aplicar o
critério da integral.
Z +∞ Z +∞ Z t
x x
f (x) dx = 4
dx = lim dx
1 1 1 + x t→+∞ 1 1 + x4
Z t Z t2
1 1 1 1
= lim · · 2xdx = lim du
t→+∞ 1 2 1 + (x2 )2 | {z } 2 t→+∞ 1 1 + u2
| {z } du
1/(1+u2 )
1 t2 1 π
= lim [arctan u]1 = lim arctan t2 −
2 t→+∞ 2 t→+∞ 4
1 π π π
= − = .
2 2 4 8
A integral imprópria converge. Logo, pelo critério da integral, a série converge.
Exemplo 2.2.4 (p-Séries). Uma p-série é uma série numérica da forma
∞
X 1
,
n=1
np
42 2. SÉRIES NUMÉRICAS
com p > 0 fixado. Observe que, dado p > 0, a função y = 1/xp é contı́nua, positiva
R +∞
e decrescente em [1, +∞). Calculando a integral 1 1/xp dx, temos:
• Se p = 1:
Z +∞ Z +∞ Z a
1 1 1 a
p
dx = dx = lim dx = lim [ln x]1
1 x 1 x a→+∞ 1 x a→+∞
0
= lim ln a −
ln 1
*
= +∞.
a→+∞
• Se p 6= 1:
Z +∞ a a
−1
Z
1 1
dx = lim dx = lim
1 xp a→+∞ 1 x
p a→+∞ (p − 1)xp−1
1
−1 1
= lim +
a→+∞ (p − 1)ap−1 p−1
(
1/(p − 1) se p > 1,
=
+∞ se 0 < p < 1.
P∞
Portanto, a série 1/np converge se p > 1 e diverge para +∞ se 0 < p ≤ 1.
n=1
P∞
Exemplo 2.2.5. A série k=1 1/(k + 1)3/2 converge, pois
∞ ∞ ∞
X 1 X 1 X 1
3/2
= 3/2
= −1 + 3/2
k=1
(k + 1) n=2
n n=1
n
P∞
e n=1 1/n3/2 é uma p-série com p = 3/2 > 1; logo, converge.
P∞ √
Exemplo 2.3.2. Teste a série n=1 (n − 1)/(n2 n) quanto à convergência ou
divergência.
2
√ P
Solução. Se an = (n − 1)/(n n), então a série an converge. De fato,
pondo bn = 1/n3/2 , temos que
P
bn converge (pois é uma p-série com p = 3/2 > 1)
e, para todo n ∈ N∗ ,
n−1 n 1
an = 2 √ < 2 √ = 3/2 = bn .
n n n n n
P
Daı́, pelo teste da comparação, segue que an converge.
P∞ 3
Exemplo 2.3.3. Teste a série k=1 (k ln k)/(k + 1) quanto à convergência ou
divergência.
P∞
Solução. A série k=1 1/(k +1)3/2 é convergente, como já foi visto no Exem-
1/(k + 1)3/2 quanto P (k ln k)/(k + 1)3 possuem
P P
plo 2.2.5. Além disso, tanto
apenas termos positivos. Assim, para mostrar que (k ln k)/(k + 1)3 converge,
basta provar que
k ln k 1
≤ ,
(k + 1)3 (k + 1)3/2
ou equivalentemente,
k ln k − (k + 1)3/2 ≤ 0,
para todo inteiro positivo k suficientemente grande. Para provar esta desigualdade,
consideraremos a função f : R∗+ → R dada por
f (x) = x ln x − (x + 1)3/2 .
Usaremos o seguinte critério para estudar o sinal de f :
(I) Se f : A ⊆ R → R e a ∈ A são tais que f (a) < 0, f é contı́nua em [a, +∞),
diferenciável em (a, +∞), e f 0 (x) ≤ 0 para todo x ∈ (a, +∞), então f (x) < 0
para todo x ∈ [a, +∞).
É claro que isto pode ser reformulado para estudar também o sinal de f 0 , da seguinte
maneira:
(II) Se f : A ⊆ R → R e a ∈ A são tais que f 0 (a) < 0, f 0 é contı́nua em
[a, +∞), diferenciável em (a, +∞), e f 00 (x) ≤ 0 para todo x ∈ (a, +∞),
então f 0 (x) < 0 para todo x ∈ [a, +∞).
Derivando f duas vezes, encontramos
√
3 x+1
f 0 (x) = ln x + 1 −
2
e
1 3
f 00 (x) = − √ .
x 4 x+1
Estudando o sinal da segunda derivada:
1 3
f 00 (x) < 0 ⇔ − √ <0
x 4 x+1
(
16(x + 1) < 9x2
⇔
x+1>0
(
9x2 − 16x − 16 > 0
⇔
x > −1.
44 2. SÉRIES NUMÉRICAS
√
A única raiz de 9x2 − 16x − 16 = 0 que é maior que −1 é x1 = 4(2 + 13)/9; este
número é um pouco menor que 2,5. Como o gráfico da função y = 9x2 − 16x − 16
tem a concavidade para cima e x1 é sua maior raiz, temos que 9x2 − 16x − 16 > 0
para todo x > x1 ; logo, 9x2 − 16x − 16 > 0 para todo x ≥ 3. Assim,
f 00 (x) < 0 para todo x ≥ 3.
Além disso, √
0 33+1
f (3) = ln 3 + 1 − ln 3 +1 − 3 < 0.
= |{z}
2 ∼ =1
0
Daı́, por (II), temos que f (x) < 0 para todo x ∈ [3, +∞). Isto, junto com o fato
que
f (3) = 3 ln 3 − (3 + 1)3/2 = 3 |{z}
ln 3 −8 < 0,
∼
=1
nos diz, por (I), que f (x) < 0 para todo x ≥ 3. Provamos assim que
x ln x − (x + 1)3/2 ≤ 0
para todo x ∈ [3, +∞) e, em particular, para todo x = k, inteiro maior Pque ou igual
∞ 1
a 3. Isto estabelece a desigualdade desejada entre os termos das séries k=1 (k+1) 3/2
P∞ k ln k
e k=1 (k+1)3 . Portanto, esta última converge.
Proposição 2.3.2 (Teste do Limite). Sejam {an }, {bn } ∈ Seq (R) tais que
an > 0 e bn > 0 para todo n suficientemente grande. Suponha que exista
an
L = lim ,
n→∞ bn
finito ou infinito.
P P
(a) Se 0 < L < +∞, então an convergePse e somente se bn converge.P
(b) Se L = +∞, então a convergência deP an implica a convergência deP bn (e,
consequentemente, a divergência de P bn implica a divergência de P an ).
(c) Se L = 0, então a convergência de P bn implica a convergência deP an (e,
consequentemente, a divergência de an implica a divergência de bn ).
E estas são as únicas possibilidades.
P∞
Exemplo 2.3.4. Estude a série n=0 (n + 4n )/(n + 6n ) com respeito a con-
vergência ou divergência.
Solução. Se an = (n + 4n )/(n + 6n ) e bn = (2/3)n , então
an n + 4n 3n n/4n + 1
lim = lim · = lim = 1 > 0.
n→∞ bn n→∞ n + 6n 2n n→∞ n/6n + 1
P P
Então,
P pelo teste do limite, an converge se e somente se bn converge. P
Mas
bn converge, pois é uma série geométrica com razão 2/3 ∈ (−1, 1). Logo, an
converge.
Exemplo 2.3.5. Vamos analisar a mesma série dos Exemplos 2.2.3 e 2.3.1,
∞
X k
,
1 + k4
k=0
2.4. TESTE DA SÉRIE ALTERNADA 45
(i) seja eventualmente decrescente, isto é: bj+1 ≥ bj para todo inteiro positivo j
suficientemente grande;
(ii) possua limite igual a zero.
A fim de provar (i), recorreremos à função f : (0, +∞) → R dada por
√
x
f (x) = .
x+5
Note que f é derivável em todo seu domı́nio, (0, +∞). Para todo x neste intervalo,
1 √
√
2 x
(x + 5) − x · 1
0
f (x) < 0 ⇔ <0
(x + 5)2
1 √
⇔ √ (x + 5) − x < 0 (pois (x + 5)2 > 0)
2 x
⇔ x + 5 < 2x
⇔ x > 5.
Então f é estritamente decrescente no intervalo (5, +∞). Daı́, como bj = f (j),
segue que {bj } é (estritamente) decrescente a partir de j = 6. Isto prova a condição
(i). Provaremos
√ agora a condição (ii). Dividindo o numerador e o denominador
de bj por j e aplicando a regra do limite de função aplicada numa sequência
(Proposição 1.5.5(c)), temos:
√
j 1 1
lim bj = lim = lim √ 5 = k→∞
lim = 0.
j→∞ j→∞ j + 5 j→∞ j+ j√ k
P∞ √
Isto conclui a prova de que a série j=1 (−1)j j/(j + 5) converge.
X (−1)n X 1
n2 =
n2
é uma p-série com p = 2 > 1 e, portanto, converge.
2.5. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA, TESTE DA RAZÃO E TESTE DA RAIZ 47
Diante disto, não podemosP dizer que a condição limn→∞ |an+1 /an | = 1 assegura a
convergência de uma série an .
Exemplo 2.5.6. Se an = 1/n2 , então
P
an converge e
2
n2
an+1 n
lim = lim = lim = 1.
n→∞ an n→∞ (n + 1)2 n→∞ n + 1
Diante disto, não podemos Pdizer que a condição limn→∞ |an+1 /an | = 1 assegura a
divergência de uma série an .
48 2. SÉRIES NUMÉRICAS
Teorema 2.5.3 (Teste da Raiz). Sejam L ∈ R e {an } ∈ Seq (R) tais que
p
lim n |an | = L.
n→∞
P
(a) Se L > 1, então a série anPdiverge.
(b) Se 0 ≤ L < 1, então a série an converge absolutamente.
(c) Se L = 1, então este teste é inconclusivo.
E estas são as únicas possibilidades.
P∞ 5n
Exemplo 2.5.7. Vamos analisar a série n=2 −2n n+1 usando o teste da raiz.
5n
Seja an = −2nn+1 . Temos:
−2n 5
p
n
lim |an | = lim = 32 > 1.
n→∞ n→∞ n + 1
P∞ 5n
Então, n=2 −2n n+1 diverge.
Séries de Potências
Definição 3.1.3.
(a) Uma série de funções reais é uma expressão formal do tipo
∞
X
fk (x), (3.3)
k=q
em que x é uma variável real, q denota um número natural e {fk }∞ k=q é uma
sequência de funções reais, tipicamente definidas sobre o mesmo domı́nio.
49
50 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS
P∞
(b) A sequência das somas parciais da série de funções k=q fk (x) é a sequência
∞
X n
fk .
k=q
n=q
P∞
(c) Dizemos que o limite da série de funções k=q fk (x) é f ∈ F(A; R), e escreve-
mos
X∞
fk (x) = f (x),
k=q
P∞
Definição 3.2.3. O raio de convergência de k=q ak (x−x0 )k é o único R ∈ R
que satisfaz as condições (a) e (b) do Teorema 3.2.2.
P∞
Conhecido o raio de convergência de uma série de potências k=q ak (x − x0 )k
o Teorema 3.2.2 nos diz o comportamento da série com respeito a convergência ou
divergência, em todos os possı́veis valores de x, exceto em x0 ± R. Nestes dois
pontos, a convergência ou divergência deve ser verificada à parte. Independente
do que aconteça nesses pontos, o conjunto dos pontos onde a série de potêncuas
converge é um intervalo.
P∞
Definição 3.2.4. O intervalo de convergência de k=q ak (x−x0 )k é o conjunto
de todos os valores de x onde esta série converge.
1/n
= |x| lim (por L’Hospital)
n→∞ 1/(n + 1)
n+1
= |x| lim = |x|.
n→∞ n
P∞ n
P∞testen da razão, se |x| < 1, então n=2 x / ln n converge. E se |x| > 1,
Daı́, pelo
então n=2 x / ln n diverge. Assim, o raio de convergência desta série é R = 1.
Resta saber o que acontece quando |x| = 1; isto é, quando x = −1 ou x = 1.
an (x) = (−1)n / ln n. Esta é uma série alter-
P P
• x = −1. Nesse caso,
nada. A sequência {1/ ln n} é positiva em todos os seus termos, converge
para zero (pois limn→∞ ln n = +∞) e é decrescente (pois {ln n} é cres-
n
P
cente). Então, pelo P critério da série
P alternada, (−1) / ln n converge.
• x = 1. Nesse caso, an (x) = 1/
P ln n. Para estudar esta série, vamos
compará-la com a série harmônica 1/n, a qual já sabemos que diverge.
– Teste da comparação: A função g(x) = x − ln x é positiva em x = 1
e possui derivada g 0 (x) = 1 − 1/x positiva para todo x > 1. Logo,
n > ln n e então 1/ ln n > 1/nP pra todo n ∈ N∗ . Daı́, pelo critério da
comparação, concluı́mos que 1/ ln n diverge.
– Teste do limite:
1/ ln n n
lim = lim
n→∞ 1/n n→∞ ln n
1
= lim (por L’Hospital)
n→∞ 1/n
= lim n = +∞.
n→∞
P
Isto mostra que as somas parciais P da série 1/Pln n crecem muito
mais rápido do que as da série 1/n. Portanto, 1/ ln n diverge.
3.2. SÉRIES DE POTÊNCIAS E RAIO DE CONVERGÊNCIA 53
Solução. Para cada inteiro positivo n, seja fn (x) = xn /(2n − 1). Temos:
xn+1
fn+1 (x) 2n − 1
lim = lim ·
n→∞ fn (x) n→∞ 2(n + 1) − 1 xn
2n − 1
= lim · x
n→∞ 2(n + 1) − 1
2n − 1
= lim · lim |x|
n→∞ 2n + 1 n→∞
= 1 · |x| = |x|.
P∞
Assim, pelo teste da razão, a série n=1 fn (x) converge para |x| < 1 e diverge para
|x| > 1. Daı́, pelo teorema da existência e unicidade do raio de convergência,
P∞ segue
que o raio de convergência da série dada é R = 1. Isto nos diz que n=1 fn (x)
converge para todo x ∈ (−1, 1), podendo ou não convergir em x = −1 e/ou em
x = 1. Para determinar o intervalo de convergência, resta analisar o comportamento
desta série na fronteira do intervalo (−1, 1); ou seja, em x = −1 e em x = 1.
• Em x = −1, temos:
∞ ∞
X X (−1)n
fn (−1) = .
n=1 n=1
2n − 1
P∞
Esta é uma série alternante, da forma n=1 (−1)n bn , com limn→∞
P∞ bn = 0,
bn > 0 e bn+1 < bn , para todo inteiro positivo n. Então n=1 fn (x)
converge em x = −1.
• Em x = 1, temos:
∞ ∞
X X 1
fn (1) = .
n=1 n=1
2n − 1
Solução. Seja
(−1)k π 2k+1 2k+1
fk (x) = x .
(2k + 1)!
Note que, para todo x ∈ R,
(−1)k+1 π 2k+3 x2k+3
fk+1 (x) (2k + 1)!
lim = lim · k 2k+1 2k+1
k→∞ fk (x) k→∞ (2k + 3)! (−1) π x
k2k+1
(−1)(−1) π π 2(2k+1)! x2k+1
x2
= lim
k2k+1 2k+1
k→∞ (−1) π
(2k + 3)(2k + 2) (2k
+ 1)!
x
(−1)π 2 x2 π2
= x2 lim
= lim = 0.
k→∞ (2k + 3)(2k + 2) k→∞ (2k + 3)(2k + 2)
| {z }
zero
Como
fk+1 (x)
∀x ∈ R, lim < 1,
k→∞ fk (x)
P∞
segue, pelo teste da razão, que a série k=0 fk (x) converge para todo x ∈ R. Então
o raio de convergência dela é infinito: R = +∞. Consequentemente, o seu intervalo
de convergência é (−∞, +∞) = R.
Solução.
(a)
temos que
∞
X
∀x ∈ R, an (x − 1)n = f (x).
n=0
para todo x ∈ R tal que | − (x/a)3 | < 1; ou seja, para todo x ∈ (−|a|, |a|).
56 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS
onde (
4/5 se n = 0,
an =
17(−1)n 3n−1 (x − 1)n /5n+1 se n > 0.
Esta representação é válida pra todo x ∈ R tal que | − 3(x − 1)/5| < 1; ou seja,
para todo x ∈ (−2/3, 8/3).
tem raio de convergência R, então ela representa uma função f que é diferenciável
(logo, contı́nua) no intervalo (x0 − R, x0 + R), possui derivada dada por
∞
X
f 0 (x) = an n(x − x0 )n−1 ,
n=q+1
Em particular, para x0 = 0,
0 se 4 divide n − 1,
−1 se 4 divide n − 2,
f (n) (0) =
0 se 4 divide n − 3,
1 se 4 divide n.
(
0 se n é ı́mpar,
= (3.5)
(−1)n/2 se n é par.
Assim, pelo Teorema 3.4.1,
∞
X f (n) (0) · xn
f (x) =
n=0
n!
∞ ∞
X f (2k) (0) · x2k X f (2k+1) (0) · x2k+1
= +
(2k)! (2k + 1)!
k=0 k=0
| {z } | {z }
parcelas “pares” parcelas “ı́mpares”
∞ ∞ *0
(−1)k · x2k x2k+1
X X 0 ·
= + (Por (3.5))
(2k)! (2k
+ 1)!
k=0 k=0
∞
X (−1)k · x2k
= ,
(2k)!
k=0
58 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS
Em particular, para x0 = 0,
1
se 4 divide n − 1,
0 se 4 divide n − 2,
g (n) (0) =
−1 se 4 divide n − 3,
0 se 4 divide n.
(
(n−1)/2
(−1) se n é ı́mpar,
= (3.7)
0 se n é par.
[Bur06] David Burton, The history of mathematics: An introduction, 6th ed., McGraw-Hill, 2006.
[Can] David W. Cantrell, Affinely extended real numbers., From MathWorld–
A Wolfram Web Resource, created by Eric W. Weisstein.
http://mathworld.wolfram.com/AffinelyExtendedRealNumbers.html.
[Fou] The OEIS Foundation, A001221 – number of distinct primes dividing n (also called
omega(n))., Disponı́vel em https://oeis.org/A027748 (24/04/2018).
61