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Cálculo Diferencial e Integral IV

João Alves Silva Júnior


UNIVASF – Universidade Federal do Vale do São Francisco
E-mail address: joao.alvesj@univasf.edu.br
VERSÃO 9.0, de 4 de julho de 2018

Principais modificações feitas a partir da versão 8.1:

• Inclusão do capı́tulo 3, ainda incompleto.


Sumário

Capı́tulo 1. Sequências Numéricas 1


1.1. Sequências 1
1.2. Crescimento e Decrescimento 8
1.3. Limitação 12
1.4. Subsequências 18
1.5. Limites de Sequências 20

Capı́tulo 2. Séries Numéricas 33


2.1. Séries 33
2.2. Teste da Integral 40
2.3. Teste da Comparação e Teste do Limite 42
2.4. Teste da Série Alternada 45
2.5. Convergência Absoluta, Teste da Razão e Teste da Raiz 46
Capı́tulo 3. Séries de Potências 49
3.1. Sequências e Séries de Funções 49
3.2. Séries de Potências e Raio de Convergência 51
3.3. Representação de Funções como Séries de Potências 54
3.4. Séries de Taylor e de McLaurin 57
Referências Bibliográficas 61

v
CAPı́TULO 1

Sequências Numéricas

1.1. Sequências
Definição 1.1.1. Uma sequência de números reais é uma função da forma
{an }∞
n=q : {n ∈ N | n ≥ q} → R
n 7→ an , (1.1)
onde q ∈ N está fixado.
A definição acima pode ser estendida para sequências de elementos de um con-
junto qualquer. Mas neste capı́tulo, só consideraremos sequências de números reais.
Então, frequentemente diremos apenas “sequência” querendo dizer “sequência de
números reais”. A expressão “sequência numérica” também é usada para desig-
nar este tipo de sequências. Mas dependendo do contexto, pode incluir também
sequências de números complexos (o que não ocorrerá neste material).
Para o caso de o leitor não estar muito familiarizado com a notação utilizada
na Definição 1.1.1, uma expressão da forma indicada em (3.1) define uma função
e nos diz como denotá-la. {an }∞ n=q é o nome da função (que, no caso, do tipo
sequência). {n ∈ N | n ≥ q} é domı́nio e R é o contradomı́nio dessa função. Note
que {n ∈ N | n ≥ q} é o mesmo que {q, q + 1, q + 2, q + 3, . . . }. A linha de baixo,
n 7→ an , nos diz que a cada n no domı́nio, a função associa um (único) elemento,
denotado por an , no contradomı́nio.
Os ı́ndices “n = q” e “∞”, na notação {an }∞ n=q , indicam que a variável inde-
pendente, n, assume valores naturais de q em diante, “até o infinito” (só que sem
incluir n = ∞, porque infinito não é um número natural). Às vezes, escreve-se o
infinito com sinal, +∞, para ressaltar que n varia “para cima”, e não “para baixo”.
Frequentemente, abreviamos {an }∞ n=q por {an }. Às vezes, a própria expressão
an é usada, por abuso de notação, como nome para a sequência que ela define. Mais
propriamente, a expressão an (com n não especificado) é chamada termo geral da
sequência {an }∞ ∞
n=q . Diremos que a variável n é o ı́ndice de {an }n=q e o número
q é o valor inicial desse ı́ndice, ou ı́ndice inicial da sequência. Para cada número
natural n no domı́nio de {an }∞ n=q , o número real an é chamado o termo de ı́ndice
n da sequência {an }.
A diferença entre “termo geral” e “termo de ı́ndice n” é um tanto sutil. Termo
geral é uma expressão envolvendo uma variável livre; tipicamente, n (mas também
pode ser i, j, k, m, etc). Por exemplo, se o termo geral de uma sequência é
an = n2 + 1, e ela inclui em seu domı́nio todos os números naturais, então seus
termos são a0 = 1, a1 = 2, a2 = 5, a3 = 10, etc. Por outro lado, a expressão “termo
de ı́ndice n” geralmente se refere a um número real bem definido, não meramente
uma expressão envolvendo uma variável livre. Se a sequência for, digamos {an }∞ n=0 ,
então a0 será o termo de ı́ndice 0, a1 o termo de ı́ndice 1, a30 o termo de ı́ndice
1
2 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

30, etc. Também é comum designarmos cada termo por um numeral ordinal, de
acordo com a posição que ele ocupa com relação aos outros. No caso de {an }∞ n=0 ,
diremos que a0 é o primeiro termo, a1 é o segundo termo, a2 é o terceiro, a30 é
o trigésimo primeiro, an o (n + 1)-ésimo. Mas note que a correspondência entre
o ı́ndice associado a um termo e o numeral ordinal desse termo depende do ı́ndice
inicial da sequência: Se a sequência começar em n = 1, ou seja, se for da forma
{an }∞n=1 , então a1 será o primeiro termo, a2 o segundo, a30 o trigésimo, an o n-
ésimo.
Quando o ı́ndice inicial de uma sequência {an } não for dado explicitamente,
consideraremos que ele é o menor natural q que torne a expressão an bem definida
para todo n ∈ N com n ≥ q.
Uma sequência {an }∞ n=q também costuma ser representada por listas de seus
primeiros membros:
{an }∞
n=q = {aq , aq+1 , aq+2 , aq+3 , . . . }.

No entanto, é preciso ter em mente que uma sequência não é meramente um con-
junto infinito de números reais. Quando usamos a notação {aq , aq+1 , aq+2 , aq+3 , . . . }
para representar uma sequência, estamos pensando não apenas no conjunto desses
valores listados entre chaves, mas também na relação de ordem entre eles e, princi-
palmente, na associação que está indicada entre esses termos e seus ı́ndices.
Definição 1.1.2. Denotaremos por Seq(R) o conjunto de todas as sequências
de números reais.
Exemplo 1.1.1. Seja f : A ⊆ R → R tal que o domı́nio A contém todos os
naturais a partir de algum q ∈ N. A restrição de f em N gera uma sequência de
números reais {an }∞
n=q dada por an = f (n). Dessa forma, obtemos, por exemplo:

(a) {(n − 3)2 }∞


n=0 = {9, 4, 1, 0, 1, 4, 9, 16, 25, . . . }, a partir de f : R → R dada por
2
f (x) = (x −
 3)1 . 1 1
(b) { n }n=1 = 1, 2 , 3 , 4 , . . . , a partir de f : R∗ → R dada por f (x) = x1 .
1 ∞


(c) {csc(m − 2)}m=3 = {csc 1, csc 2, csc 3, csc 4, csc 5, csc 6, . . . }, a partir da função
f : {x ∈ R | ∀k ∈ Z, x 6= 2 + kπ} → R dada por f (x) = csc(x − 2). É
importante notar que a sequência está bem definida: o domı́nio da função
cossecante inclui todos os números naturais, de modo que csc(m − 2) existe
para todo m ∈ {3, 4, 5, . . . }. Por outro lado, a sequência não estaria bem
definida se fosse {csc(nπ/2)}∞ n=1 .
(d) {arctan k}∞k=0 = {0, π/4, arctan 2, arctan 3, . . . }, a partir de f (x) = arctan x.
Observe que a única diferença entre cada uma das sequências listadas acima e
sua respectiva extensão f é que a variável independente da sequência (n, m ou
k) assume apenas valores naturais, enquanto a variável independente da função f
pode assumir muitos outros valores.
Nem toda função real em uma variável real pode ser transformada numa se-
quência por meio de uma restrição do seu domı́nio.

Exemplo 1.1.2. O domı́nio da função f (x) = 1 − x2 é o intervalo limitado
I = [−1, 1]. Por maior que seja o q ∈ N, é claro que I não contém o conjunto
{n ∈ N | n ≥ q}. Então a função f não pode ser transformada numa sequência por
meio de uma restrição de seu domı́nio.
1.1. SEQUÊNCIAS 3

Veremos agora uma sequência importante na história da matemática, que ilus-


tra bem uma outra maneira de definir sequências: por recursão.

Exemplo 1.1.3 (Sequência de Fibonacci). Os números

0, 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, . . .

ordenados desta maneira, e seguindo o padrão indicado acima até o infinito, formam
uma sequência {φn }∞
n=0 , chamada sequência de Fibonacci, tal que φ0 = 0, φ1 = 1
e φn+2 = φn + φn+1 para todo n ∈ N. A partir destas três igualdades, podemos
determinar qualquer termo da sequência. Por exemplo,

φ2 = φ0+2 = φ0 + φ0+1 = φ0 + φ1 = 0 + 1 = 1,
φ3 = φ1+2 = φ1 + φ1+1 = φ1 + φ2 = 1 + 1 = 2,
φ4 = φ2+2 = φ2 + φ2+1 = φ2 + φ3 = 1 + 2 = 3,
..
.

Então podemos dizer que as condições



φ0 = 0,

φ1 = 1,

φn+2 = φn + φn+1

definem a sequência {φn }∞


n=0 . Pelo fato de que certos termos, nesta definição, são
dados em função de termos anteriores, dizemos que esta é uma definição recursiva.
A sequência de Fibonacci ficou famosa por meio do livro Liber Abaci, publicado
por Leonardo de Pisa (também conhecido como Leonardo Fibonacci) no ano 1202
da Era Comum [Bur06]. Neste livro, é proposto o seguinte problema:
“Um homem coloca um casal de coelhos num certo lugar, in-
teiramente cercados por uma parede. Quantos pares de coelhos
podem ser produzidos a partir daquele par ao longo de um ano,
se a natureza desses coelhos é tal que, a cada mês, cada casal
produz um novo casal, que a partir do segundo mês se torna
produtivo?”
Após percebermos que a quantidade de casais de coelhos produzidos após n + 1
meses nessa situação é φn , fica claro que o problema pede o valor de φ11 . Ver
Fig. 1.1.

Após conhecer a definição recursiva da sequência de Fibonacci, uma pergunta


natural é se existe alguma fórmula explı́cita para φn em função de n. A resposta é
que existe:
" √ !n √ !n #
1 1+ 5 1− 5
φn = √ − .
5 2 2

Pode parecer um pouco complicada, mas na verdade muito poucas sequências im-
portantes podem ser definidas por fórmulas explı́citas tão simples quanto esta.
4 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

Figura 1.1. Sucessivas gerações de coelhos.

Exemplo 1.1.4. Para cada inteiro positivo n, seja ωn o número de fatores


primos distintos de n. Calculando os primeiros termos da sequência {ωn }∞
n=1 , en-
contramos os seguintes números [Fou]:
0, 1, 1, 1, 1, 2, 1, 1, 1, 2, 1, 2, 1, 2, 2,
1, 1, 2, 1, 2, 2, 2, 1, 2, 1, 2, 1, 2, 1, 3,
1, 1, 2, 2, 2, 2, 1, 2, 2, 2, 1, 3, 1, 2, 2,
2, 1, 2, 1, 2, 2, 2, 1, 2, 2, 2, 2, 2, 1, 3,
1, 2, 2, 1, 2, 3, 1, 2, 2, 3, 1, 2, 1, 2, 2,
2, 2, 3, 1, 2, 1, 2, 1, 3, 2, 2, 2, 2, 1, 3,
2, 2, 2, 2, 2, 2, 1, 2, 2, 2, 1, 3, 1, 2, ...
Não se conhece um fórmula fechada simples para ωn em função de n, mas a
sequência está bem definida mesmo assim.
Como corroborado pelo Exemplo 1.1.3, em muitas situações, na matemática e
na vida, sequências aparecem naturalmente e é preciso reconhecer certos padrões
numéricos para identificá-la. Apesar de não fazer muito sentido, matematicamente,
querer adivinhar os próximos termos de uma sequência a partir de uma quantidade
1.1. SEQUÊNCIAS 5

finita deles, é útil praticar reconhecimento de padrões, numa lista finita de números
reais, que levem a um termo geral simples para uma sequência cujos primeiros
termos são aqueles números reais.
Exemplo 1.1.5. Seja b > 0 uma constante. Determine o termo geral da
sequência
{an }∞
n=0 = {b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, . . . }.

Solução. Sempre que ocorre uma alternância de sinal preservando-se o mó-


dulo, podemos pensar numa sequência da forma {(−1)n b} ou {(−1)n+1 b}, onde b é
uma constante positiva (igual ao módulo comum a todos os termos da sequência).
No caso da sequência acima, {an }∞ n=0 , vemos que a0 = b, então a fórmula só pode
ser an = (−1)n b. Se tivéssemos a0 = −b, a fórmula seria an = (−1)n+1 b. Observe
que a fórmula também depende do valor inicial considerado para a variável n. No
caso acima, consideramos que o n começa em n = 0. Mas se disséssemos que
{an }∞
n=1 = {b, −b, b, −b, b, . . . }, a fórmula seria an = (−1)
n+1
b. 
Exemplo 1.1.6. Seja b ∈ R uma constante não nula. Determine o termo geral
da sequência {an } cujos termos são
b, 0, b, 0, b, 0, b, 0, b, 0, b, . . .
e cujo ı́ndice inicial é
(a) n = 0.
(b) n = 3.
Solução.
(a) Os números
b, 0, b, 0, b, 0, b, 0, b, 0, b, . . .
são as médias aritméticas das listas
b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, . . .
e
b, b, b, b, b, b, b, b, b, b, b, . . . .
Então
(−1)n b + b
an = .
2
(b) Como agora queremos considerar {an } começando em n = 3, convém usar este
mesmo ı́ndice inicial para as duas sequências cuja média aritmética é {an }. Se
definirmos {αn }∞
n=3 como sendo a sequência

{b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, −b, b, . . . }


e {βn }∞
n=3 como a sequência
{b, b, b, b, b, b, b, b, b, b, b, . . . },
n+1
então αn = (−1) b e βn = b, para todo n ∈ {3, 4, 5, . . . }. Logo,
(−1)n+1 b + b
an = .
2

6 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

Também poderı́amos ter chegado à fórmula do item (b) do Exemplo 1.1.6 a


partir da fórmula do item (a) do mesmo Exemplo, substituindo n por n + 3:
(−1)n+3 b + b (−1)2 (−1)n+1 b + b 1 · (−1)n+1 b + b (−1)n+1 b + b
an = = = = .
2 2 2 2
Em geral, se as sequências {an }∞ ∞
n=p e {bn }n=q possuem os mesmos termos, na
mesma ordem, ou seja, se
ap = bq , ap+1 = bq+1 , ap+2 = bq+2 , ...
então, para todo n ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . },
bn = an−q+p . (1.2)

an

(b + c)/2 c b

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 n

Figura 1.2. Representação gráfica da sequência {an }∞


n=0 do
Exemplo 1.1.7, no caso em que c > b > 0.

Exemplo 1.1.7. Sejam b, c ∈ R constantes distintas. Determine o termo geral


da sequência
{an }∞
n=0 = {b, c, b, c, b, c, b, c, b, c, b, . . . }.

Solução. Uma possı́vel resposta é


(
b se n é par,
an =
c se n é ı́mpar.
Procuraremos agora um forma mais algébrica para este termo geral.
Os termos desta sequência oscilam em torno da média aritmética de b e c, que
é (b + c)/2. A Fig. 1.2 ilustra o caso em que c > b > 0. Observe que os termos
de {an }∞ n=0 podem ser gerados somando-se ou subtraindo-se a medida |b − c|/2
(metade da distância entre b e c) da média (b + c)/2. A operação entre (b + c)/2 e
|b − c|/2, no cálculo de an , depende não só de n, mas também de qual constante,
dentre b e c, é a maior. Temos as seguintes possibilidades:
• c > b: Nesse caso, a distância entre b e c é |b − c| = c − b. Para obter b
a partir da média (b + c)/c, podemos subtrair metade dessa distância; e
para obter c, somamos metade dessa distância. Assim,
( (
b se n é par, (b + c)/2 − (c − b)/2 se n é par,
an = =
c se n é ı́mpar (b + c)/2 + (c − b)/2 se n é ı́mpar.
1.1. SEQUÊNCIAS 7

• b > c: Nesse caso, a distância entre b e c é |b − c| = b − c. Para obter b a


partir da média (b + c)/c, podemos somar metade dessa distância; e para
obter c, subtraı́mos metade dessa distância. Assim,
( (
b se n é par, (b + c)/2 + (b − c)/2 se n é par,
an = =
c se n é ı́mpar (b + c)/2 − (b − c)/2 se n é ı́mpar.
Perceba que as expressões obtidas para an são equivalentes, não importa se c > b
ou b > c. Em ambos os casos, temos
b+c b−c
an = + (−1)n ,
2 2
para todo n ∈ N. 
Exemplo 1.1.8. Sejam m um inteiro positivo e b0 , . . . , bm−1 ∈ R constantes.
Determine o termo geral da sequência {an }∞
n=0 cujos termos são

b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . bm−1 , b0 , . . . .


Solução. A resposta deste problema depende de qual tipo de expressão é con-
siderada válida. Se somos permitidos a usar palavras em português, então podemos
responder que
a n = br , onde r é o resto da divisão de n por m.
Se preferimos usar expressões um pouco mais “simbólicas”, e dispomos da relação
de divisibilidade1 entre números inteiros, então podemos responder que


 b0 se m|n,
se m|(n − 1),

 b
 1


..
an = .





 bm−2 se m|(n − m + 2),

bm−1 se m|(n − m + 1),
desde que também aceitemos definições por partes envolvendo reticências, como
essa aı́. Temos ainda a opção de usar alguma função periódica f : A ⊆ R → R,
como seno, cosseno ou tangente, aplicada em números da forma (n + j)p/m, onde
p ∈ R é o perı́odo de f (ver Definição 1.3.2), n ∈ N uma variável e j ∈ Z constante,
para gerar uma sequência {cn }∞n=0 , dada por cn = f ((n + j)p/m), cujos termos são

c0 , . . . , cm−1 , c0 , . . . , cm−1 , c0 , . . . , cm−1 , c0 , . . . .


E então, a partir daı́, tentarı́amos pensar numa função g que transformasse cn em
bn , para todo n ∈ {0, . . . , m − 1}. Feito isso, poderı́amos responder que
  
(n + j)p
an = g(cn ) = g f .
m
Para ficar mais claro, suponha que os termos de {an }∞
n=0 sejam

0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, . . .
Note que, aqui, m = 3, b0 = 0, b1 = 1, b2 = 2, b3 = 0, etc. Quando aplicamos
a função seno em números da forma 2(n + 1)π/3, com n ∈ N variável (estamos

1Dizemos que m divide M , e escrevemos m|M , se existe q ∈ Z tal que M = qm.


8 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

tomando p = 2π, perı́odo da função seno, e j = 1), geramos uma sequência {cn }∞ n=0 ,
dada por cn = sen (2(n + 1)π/3), cujos termos são
√ √ √ √ √ √ √ √ √
3 3 3 3 3 3 3 3 3
− , 0, , − , 0, , − , 0, , − , 0, , − , ...
2 2 2 2 2 2 2 2 2
Observe que esta é uma sequência periódica, seus valores se repetem de três em
três, assim √como supomos ser o caso de {an }∞ n=0 . Em seguida, aplicando a função
g(x) = 2x/ 3 + 1 sobre os termos de {cn }∞ n=0 , obtemos os números

0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, 1, 2, 0, . . . .
Isto sugere que
    
2(n + 1)π 2 2(n + 1)π
an = g sen = √ sen + 1.
3 3 3


1.2. Crescimento e Decrescimento


Na matemática, dizer que uma propriedade dos números naturais vale para
todo n ∈ N suficientemente grande significa dizer que existe n0 ∈ N tal que aquela
propriedade vale para todo n ∈ N com n ≥ n0 . Esse n0 nem precisa ser muito
grande, pode até ser zero. Se a propriedade vale para todos os números naturais,
então vale para todos os naturais suficientemente grandes. Se vale para todos os
naturais a partir de 5, então vale para todos os naturais suficientemente grandes.
Mas se a propriedade vale para todos números naturais até 1000000, e depois disso
ela começa a alternar (não vale para 1000001, mas vale para 1000002; não vale para
1000003, mas vale para 1000004, etc.), então não é correto dizer que ela vale para
todo n ∈ N suficientemente grande. A menos que essa alternância pare, digamos,
em 1001000 e então a propriedade seja válida para todos os próximos naturais.
Definição 1.2.1. Dizemos que {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é
(a) estritamente decrescente se an1 > an2 para todo n1 , n2 ∈ N com q ≤ n1 < n2 .
(b) estritamente crescente se an1 < an2 para todo n1 , n2 ∈ N com q ≤ n1 < n2 .
(c) decrescente se an1 ≥ an2 para todo n1 , n2 ∈ N com q ≤ n1 < n2 .
(d) crescente se an1 ≤ an2 para todo n1 , n2 ∈ N com q ≤ n1 < n2 .
(e) monotônica (ou monótona) se é crescente ou decrescente.
(f) eventualmente estritamente decrescente se an1 > an2 para todo n1 , n2 ∈ N
suficientemente grandes, no domı́nio de {an }∞ n=q , com n1 < n2 .
(g) eventualmente estritamente crescente se an1 < an2 para todo n1 , n2 ∈ N sufici-
entemente grandes, no domı́nio de {an }∞ n=q , com n1 < n2 .
(h) eventualmente decrescente se an1 ≥ an2 para todo n1 , n2 ∈ N suficientemente
grandes, no domı́nio de {an }∞
n=q , com n1 < n2 .
(i) eventualmente crescente se an1 ≤ an2 para todo n1 , n2 ∈ N suficientemente
grandes, no domı́nio de {an }∞
n=q , com n1 < n2 .
(j) eventualmente monotônica (ou eventualmente monótona) se existe n0 ∈ N,
com q ≤ n0 , que torna verdadeira uma das seguintes afirmações: (i) para todo
n1 , n2 ∈ N com n0 ≤ n1 < n2 , an1 ≤ an2 ; (ii) para todo n1 , n2 ∈ N com
n0 ≤ n1 < n2 , an1 ≥ an2 .
(k) eventualmente constante se an1 = an2 para todo n1 , n2 ∈ N suficientemente
grandes, no domı́nio de {an }∞
n=q .
1.2. CRESCIMENTO E DECRESCIMENTO 9

Observe que se uma sequência não é crescente, ela não necessariamente é decres-
cente. E se não é decrescente, ela não necessariamente é crescente. Uma sequência
pode até ser crescente e decrescente ao mesmo tempo. Nesse caso, ela é necessaria-
mente constante. A recı́proca também vale: toda sequência constante é crescente e
decrescente. Mas uma sequência não pode ser estritamente crescente e estritamente
decrescente ao mesmo tempo.
Toda sequência crescente (estritamente ou não) é eventualmente crescente (es-
tritamente ou não, respectivamente). Se uma sequência não é eventualmente cres-
cente, ela necessariamente também não é crescente, nem eventualmente estrita-
mente crescente. As afirmações anteriores deste parágrafo também valem se trocar-
mos “crescente” por “decrescente”. Além disso, também é claro que toda sequência
monotônica é eventualmente monotônica.
Em cada um dos itens (c), (d), (h) e (i) da Definição 1.2.1, se a desigualdade
<, entre n1 e n2 , fosse substituı́da por ≤, a definição resultante seria equivalente.
Mas se esta substituição fosse feita nos itens (a), (b), (f), (g) dessa definição, as
sentenças obtidas seriam falsas, já que n1 = n2 implica an1 = an2 .
Uma sequência é eventualmente monotônica se e somente se é eventualmente
crescente ou eventualmente decrescente.
Para uma função real em uma variável real, adotaremos definições de “decres-
cente”, “crescente”, “monotônica”, etc. perfeitamente análogas à Definição 1.2.1.
Mais precisamente, dada uma função f : A ⊆ R → R, diremos que f é
• estritamente decrescente se f (x1 ) > f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com
x1 < x2 .
• estritamente crescente se f (x1 ) < f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 <
x2 .
• decrescente se f (x1 ) ≥ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 < x2 .
• crescente se f (x1 ) ≤ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A com x1 < x2 .
• monotônica (ou monótona) se é crescente ou decrescente.
• eventualmente estritamente decrescente se, para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes, com x1 < x2 , f (x1 ) > f (x2 ).
• eventualmente estritamente crescente se f (x1 ) < f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈
A suficientemente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente decrescente se f (x1 ) ≥ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A sufici-
entemente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente crescente se f (x1 ) ≤ f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes, com x1 < x2 .
• eventualmente monotônica (ou eventualmente monótona) se existe x0 ∈ R
que torna verdadeira uma das seguintes afirmações: (i) para todo x1 , x2 ∈
A com x0 ≤ x1 < x2 , f (x1 ) ≤ f (x2 ); (ii) para todo x1 , x2 ∈ A com
x0 ≤ x1 < x2 , f (x1 ) ≥ f (x2 ).
• eventualmente constante se f (x1 ) = f (x2 ) para todo x1 , x2 ∈ A suficien-
temente grandes.
Exemplo 1.2.1. Seja {an }∞
n=0 definida como no Exemplo 1.1.8:

{an }∞
n=0 = {b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . , bm−1 , b0 , . . . bm−1 , b0 , . . . }.

Prove que {an }∞


n=0 é monotônica se e somente se b0 = · · · = bm−1 .

Solução.
10 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

(⇒) Faremos isto pela contrapositiva, provando que se é falso que b0 = · · · =


bm−1 , então {an }∞n=0 não é monotônica. Se é falso que b0 = · · · = bm−1 ,
então existem i, j ∈ {0, . . . , m − 1}, com i < j, tais que bi 6= bj . Logo,
bi < bj ou bi > bj . Vamos supor que bi < bj ; a demonstração para o outro
caso é análoga. Observe que, como i, j ∈ {0, . . . , m − 1}, ai = bi , aj = bj
e i + m > j > i. Como os termos de {an }∞ n=0 se repetem de m em m,
ai+m = ai = bi < bj = aj . Assim,
– {an }∞n=0 não pode ser crescente, pois aj > ai+m , com j < i + m.
– {an }∞n=0 não pode ser decrescente, pois ai < aj , com i < j.
Portanto, se é falso que b0 = · · · = bm−1 , então {an }∞
n=0 não é monotônica.
(⇐) Se b0 = · · · = bm−1 , então {an }∞n=0 é constante, pois todos os termos desta
sequência pertencem ao conjunto {b0 , . . . , bm−1 }. Como é constante, é
crescente (e também decrescente). Então é monotônica.


Note que, no Exemplo 1.2.1, a condição b0 = · · · = bm−1 equivale a dizer


que {an }∞ ∞
n=0 é constante. Logo, a sequência {an }n=0 considerada nesse exemplo é
monotônica se e somente se é constante.
A partir do Exemplo 1.2.1, conclui-se imediatamente que as sequências dos
Exemplos 1.1.7, 1.1.6 e 1.1.5 não são monotônicas, pois estas três são casos par-
ticulares da sequência do Exemplo 1.2.1 (e não são constantes). Também é fácil
ver que nenhuma dessas quatro sequências é eventualmente monotônica. Afinal, o
comportamento de cada uma delas para ı́ndices grandes é o mesmo que para ı́ndices
pequenos.

Exemplo 1.2.2. Classifique quanto ao crescimento/decrescimento as sequências


vistas no Exemplo 1.1.1.

Solução.
• {(n − 3)2 }∞
n=0 não é crescente, pois tomando n1 = 2 e n2 = 3, vemos
que (n1 − 3)2 = 1 > 0 = (n2 − 3)2 , apesar de n1 < n2 . Também não é
decrescente, pois tomando n1 = 3 e n2 = 4, vemos que (n1 − 3)2 = 0 <
1 = (n2 − 3)2 , com n1 < n2 . Mas é eventualmente estritamente crescente,
pois (n1 − 3)2 < (n2 − 3)2 para todo n1 , n2 ∈ N suficientemente grandes,
com n1 < n2 . Com efeito, se n1 , n2 ∈ N são tais que 3 ≤ n1 < n2 , então,
pelas propriedades das operações aritméticas com números naturais,

0 ≤ n1 − 3 < n2 − 3 ∴ (n1 − 3)2 < (n2 − 3)2 .

• {1/n}∞ n=1 é estritamente decrescente, pois para todo n1 , n2 ∈ N, com


1 ≤ n1 < n2 , tem-se, pelas propriedades algébricas dos números racionais,
que 1/n2 < 1/n1 . Outra justificativa cabı́vel é que a função f (x) = 1/x é
estritamente decrescente para x > 0, o que pode ser verificado por meio
da derivada, notando-se que f 0 (x) = −1/x2 < 0.

• {csc(m − 2)}m=3 não é eventualmente crescente (logo, também não é cres-
cente, nem eventualmente estritamente crescente). Para provar isto, basta
mostrar que para todo n0 ∈ N maior que ou igual a 3, existem n1 , n2 ∈ N,
com n0 ≤ n1 < n2 , tais que csc(n1 − 2) > csc(n2 − 2). Dado n0 ∈ N, com
1.2. CRESCIMENTO E DECRESCIMENTO 11

n0 ≥ 3, sejam
n1 = min{n ∈ N | n0 ≤ n e ∃k1 ∈ Z, 2k1 π < n − 2 < π + 2k1 π},
n2 = min{n ∈ N | n0 ≤ n e ∃k2 ∈ Z, π + 2k2 π < n − 2 < 2π + 2k2 π}.
A existência desses naturais é justificada pelo princı́pio da boa ordem,
pela propriedade arquimediana e pelo fato que o comprimento de inter-
valos da forma (2kπ, π + 2kπ) ou (π + 2kπ, 2π + 2kπ) é π > 1. Note que
csc(n1 − 2) > 0 e csc(n2 − 2) < 0. Logo, csc(n1 − 2) > csc(n2 − 2). Analo-

gamente, prova-se que {csc(m − 2)}m=3 não é eventualmente decrescente
(logo, também não é decrescente, nem eventualmente estritamente decres-

cente). Portanto, {csc(m − 2)}m=3 não é eventualmente monotônica.
• {arctan k}∞k=0 é estritamente crescente. Isto pode ser verificado por meio
da derivada. Sequências não são o tipo de função que se costuma derivar,
mas podemos utilizar para isso sua extensão
f :R→R
x 7→ f (x) = arctan x.

A derivada de f é f 0 (x) = 1/(1 + x2 ), função positiva e bem definida


em todo x ∈ R. Então f é estritamente crescente. Logo, sua restrição
{arctan k}∞
k=0 também é estritamente crescente.


A definição que demos para sequência crescente, decrescente, etc. é boa para
sabermos o que acontece com a sequência vista como um todo. Mas uma ma-
neira mais prática de provar que uma sequência exibe determinado comportamento
quanto a crescimento/decrescimento é comparar termos consecutivos.
Proposição 1.2.1. Seja {an }∞
n=q ∈ Seq(R).
(a) {an }∞
n=q é estritamente crescente se e somente se an+1 > an para todo n ∈ N
com n ≥ q.
(b) {an }∞
n=q é estritamente decrescente se e somente se an+1 < an para todo n ∈ N
com n ≥ q.
(c) {an }∞
n=q é crescente se e somente se an+1 ≥ an para todo n ∈ N com n ≥ q.
(d) {an }∞
n=q é decrescente se e somente se an+1 ≤ an para todo n ∈ N com n ≥ q.

Demonstração. Provaremos apenas o item (a). As demonstrações dos outros


itens são análogas. Se {an }∞
n=q é estritamente crescente, então, para todo n ∈ N
com n ≥ q, como n+1 > n, segue diretamente da Definição 1.2.1(a) que an+1 > an .
Suponha agora que an+1 > an para todo n ∈ N com n ≥ q. Queremos mostrar
que an2 > an1 para todo n1 , n2 ∈ N com q ≤ n1 < n2 . Isto equivale a mostrar que
an+d > an para todo n, d ∈ N com n ≥ q e d > 0. Aplicaremos indução sobre d.
• Caso base: Se d = 1, então é claro que an+d > an , pois temos por hipótese
que an+1 > an .
• Passo indutivo: Para todo d ∈ N∗ , se an+d > an , então
an+(d+1) = a(n+d)+1 > an+d > an .

12 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

1.3. Limitação
Definição 1.3.1. Dizemos que {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é
(a) limitada inferiormente se existe um L1 ∈ R tal que L1 ≤ an para todo n ∈ N,
com n ≥ q.
(b) limitada superiormente se existe um L2 ∈ R tal que an ≤ L2 para todo n ∈ N,
com n ≥ q.
(c) limitada se é limitada inferiormente e superiormente.
(d) ilimitada inferiormente se não é limitada inferiormente.
(e) ilimitada superiormente se não é limitada superiormente.
(f) ilimitada se não é limitada.
É claro que se uma sequência é ilimitada superiormente, então ela é ilimitada.
Também é claro que a recı́proca desta implicação não vale em geral. Observações
análogas valem para a condição de ser ilimitada inferiormente.
Diferentemente das propriedades de crescimento, decrescimento e monotonici-
dade, os adjetivos e locuções adjetivas introduzidos na Definição 1.3.1 (“limitada”,
“limitada superiormente”, etc.) não são do tipo que se pode modificar significa-
tivamente pondo-se a palavra “eventualmente” (entendida no sentido usual) antes
deles. Por exemplo, digamos que tenhamos definido que uma sequência {an }∞ n=q
é dita eventualmente limitada se existe n0 ∈ N, com n0 ≥ q, tal que, para todo
n ∈ N com n ≥ n0 , existem L1 , L2 ∈ R tais que L1 ≤ an ≤ L2 . Esta é a maneira
mais natural e razoável de definir tal propriedade. Mas do ponto de vista de criar
um conceito novo, ela é um fracasso, pois toda sequência eventualmente limitada
(de acordo com essa definição) é limitada. De fato, se {an }∞
n=q ∈ Seq(R), n0 ∈ N
e L1 , L2 ∈ R são tais que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N com n ≥ n0 , então,
definindo
L01 = min{aq , . . . , an0 −1 , L1 } e L02 = max{aq , . . . , an0 −1 , L2 },
verifica-se facilmente que L01 ≤ an ≤ L02 para todo n ∈ N. Analogamente, não
seria nada útil definir sequência “eventualmente superiormente limitada”, “eventu-
almente ilimitada”, etc.
Proposição 1.3.1. {an }∞
n=q ∈ Seq(R) é limitada se e somente se existe M > 0
tal que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
Demonstração.
(⇒) Suponha que {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é limitada. Então existem L1 , L2 ∈ R
tais que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N com n ≥ q. Tomando M =
max{|L1 |, |L2 |}, segue que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
(⇐) Suponha que existe M > 0 tal que |an | ≤ M para todo n ∈ N com n ≥ q.
Tomando L1 = −M e L2 = M , segue que L1 ≤ an ≤ L2 para todo n ∈ N
com n ≥ q. Logo, {an }∞ n=q ∈ Seq(R) é limitada.

A Proposição 1.3.1 permanece válida se trocarmos M > 0 por M ≥ 0 ou M ∈ R
e/ou se trocarmos |an | ≤ M por |an | < M .

No Exemplo 1.2.2, não foi muito difı́cil verificar que {csc(m − 2)}m=3 não é
eventualmente monotônica. Bastou notar que existem naturais arbitrariamente
grandes em intervalos da forma (2kπ, π+2kπ) e também nos da forma (π+2kπ, 2π+
2kπ), com k ∈ Z. Não foi necessário prestar atenção se esses naturais poderiam ser
1.3. LIMITAÇÃO 13

tomados perto ou longe das extremidades desses intervalos. Porém, para avaliar
se a mesma sequência é ou não limitada, devemos observar quão perto os números
naturais estão dos múltiplos inteiros de π, pois é próximo de kπ, com k ∈ Z, que
a função cossecante assume valores arbitrariamente grandes em módulo. Acontece
que os naturais estão arbitrariamente próximos dos múltiplos inteiros de π. E isso
tem a ver com a irracionalidade de π.
Proposição 1.3.2. Sejam x, ω ∈ R, com ω ∈ / Q. Para todo δ > 0 e todo
n0 ∈ N, existem k ∈ Z e n ∈ N, com n ≥ n0 , tais que |x + kω − n| < δ.
Mais adiante, na Proposição 1.3.4, utilizaremos a Proposição 1.3.2 para garantir
a transferência de certos atributos (“crescente”, “limitada”, etc.) de uma uma
função real contı́nua e periódica para qualquer sequência definida a partir dessa
função via restrição. Antes disso, precisamos fixar alguma terminologia e introduzir
alguns conceitos que são importantes não apenas para o estudo de sequências, mas
dos números reais em geral.
Definição 1.3.2. Uma função real em uma variável real é dita periódica se
existe um ω ∈ R não nulo tal que, para todo x no domı́nio de f , x ± ω também está
no domı́nio de f e f (x ± ω) = f (x). Quando ω é o menor número real positivo com
esta propriedade, ele é dito o perı́odo de f .
Da Definição 1.3.2, por indução finita, segue diretamente que se f : A ⊆ R → R
é periódica com perı́odo ω, então para todo x ∈ A e todo k ∈ Z, tem-se x + kω ∈ A
e f (x + kω) = f (x).
Definição 1.3.3. Seja X ⊆ R. Um c ∈ R é dito
(a) uma cota inferior de X se, para todo x ∈ X, c ≤ x;
(b) uma cota superior de X se, para todo x ∈ X, x ≤ c.
Uma cota superior de um conjunto não precisa ser um número “perto” dos
elementos desse conjunto; só precisa ser um número maior que ou igual a cada
um deles. Pode ser inclusive muito maior. Observações análogas valem para cotas
inferiores.
Exemplo 1.3.1. Os números 1, π e 4572 são cotas superiores dos intervalos
I = [−1, 1) e J = (−1, 1], os quais possuem como cotas inferiores os números −3082,
−e/2 e −1, por exemplo.
Definição 1.3.4. Dizemos que X ⊆ R é
(a) inferiormente limitado se possui alguma cota inferior;
(b) superiormente limitado se possui alguma cota superior;
(c) limitado se é limitado superiormente e inferiormente;
(d) inferiormente ilimitado se não é inferiormente limitado;
(e) superiormente ilimitado se não é superiormente limitado;
(f) ilimitado se não é limitado.
Observação 1.3.1. O conjunto dos termos de uma sequência de números reais
é limitado (inferiormente/superiomente) se e somente se a sequência é limitada
(inferiormente/superiomente). Em outras palavras, dados {an }∞ n=q ∈ Seq(R) e
X = {an | n ∈ N, n ≥ q},
(a) {an }∞n=q é inferiormente limitada se e somente se X é inferiormente limitado.
(b) {an }∞n=q é superiormente limitada se e somente se X é superiormente limitado.
14 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

(c) {an }∞
n=q é limitada se e somente se X é limitado.

Como vimos no Exemplo 1.3.1, uma cota superior ou inferior de um conjunto


pode pertencer a esse conjunto, como também pode não pertencer. Quando per-
tence, é chamada elemento mı́nimo ou elemento máximo, respectivamente.
Definição 1.3.5. Seja X ⊆ R. Um c ∈ R é dito
(a) o elemento mı́nimo, ou menor elemento, ou simplesmente o mı́nimo de X,
denotado por min X, se c ∈ X e para todo x ∈ X, c ≤ x;
(b) o elemento máximo, ou maior elemento, ou simplesmente o máximo de X,
denotado por max X, se c ∈ X e para todo x ∈ X, c ≥ x.
Em cada item da Definição 1.3.5, o artigo definido “o” presume unicidade do que
está sendo definido. Ou seja, pressupõe que, num dado conjunto, não pode haver
mais de um elemento máximo, assim como não pode haver mais de um elemento
mı́nimo. De fato, como em ambos os casos o máximo/mı́nimo deve pertecer ao
conjunto, se houvesse mais de um, cada um deles seria maior que ou igual ao outro
(equivalentemente, cada um deles seria menor que ou igual ao outro); logo, seriam
iguais (contradição).
Definição 1.3.6. Seja X ⊆ R.
(a) O supremo de X, denotado por sup X, é a menor cota superior de X, desde
que exista.
(b) O ı́nfimo de X, denotado por inf X, é a maior cota inferior de X, desde que
exista.
Não confunda supremo com elemento máximo, nem ı́nfimo com elemento mı́ni-
mo. Quando um conjunto possui um maior elemento, este é o seu supremo; quando
possui um menor elemento, este é o seu ı́nfimo. Mas um subconjunto de R pode
possuir supremo e não ter máximo, assim como também pode possuir ı́nfimo e não
ter mı́nimo.
Exemplo 1.3.2.
(a) Como subconjuntos de R, Z não têm ı́nfimo nem supremo, enquanto N tem
ı́nfimo 0 (que também é seu elemento mı́nimo), mas não tem supremo (logo,
também não tem elemento máximo).
(b) O supremo do intervalo aberto (−1, 2) é 2, e o seu ı́nfimo é −1, mas (−1, 2)
não possui elemento mı́nimo, nem elemento máximo.
(c) O conjunto {0, 1/2, 1} possui elemento mı́nimo e elemento máximo, que são 0
e 1, respectivamente. Sendo assim, também é correto afirmar que 0 é o ı́nfimo
e 1 é o supremo de {0, 1/2, 1}.
(d) O conjunto (−∞, π) não possui elemento mı́nimo, nem elemento máximo, nem
ı́nfimo; mas seu supremo é π.
O seguinte enunciado faz parte da lista de axiomas de corpo ordenado com-
pleto, a qual define as propriedades fundamentais do conjunto dos números reais.
São princı́pios que nós não nos preocupamos em provar; apenas assumimos como
verdadeiros para observar o que se pode deduzir a partir deles.
Axioma 1. Todo subconjunto não vazio superiormente limitado de R admite
supremo.
1.3. LIMITAÇÃO 15

Observação 1.3.2. A partir do Axioma 1, verifica-se facilmente que todo sub-


conjunto não vazio inferiormente limitado de R admite ı́nfimo. Se X ⊆ R é não
vazio e inferiormente limitado, então X 0 = {−x | x ∈ X} é não vazio e superior-
mente limitado; logo, admite supremo, que deve ser o ı́nfimo de S. Reciprocamente,
se todo subconjunto não vazio inferiormente limitado da reta admite ı́nfimo, então
vale o Axioma 1.
Proposição 1.3.3. Suponhamos que A ⊆ R contém todos os naturais a partir
de algum q ∈ N. Se f : A → R é uma função contı́nua, periódica com perı́odo
ω ∈ R∗+ − Q, então, para todo x ∈ A, ε > 0 e n0 ∈ N, com n0 ≥ q, existe n ∈ N,
com n ≥ n0 , tal que |f (x) − f (n)| < ε.
Demonstração. Como f é periódica de perı́odo ω, para todo x ∈ A e k ∈ Z,
temos que x + kω ∈ A e f (x + kω) = f (x). Daı́, como f : A → R é contı́nua, segue
que, para todo x ∈ A e todo k ∈ Z, f é contı́nua em x + kω e f (x + kω) = f (x);
logo, para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, com n ≥ q,
|x + kω − n| < δ ⇒ |f (x + kω) − f (n)| < ε ⇒ |f (x) − f (n)| < ε. (1.3)
(Observe que estamos usando também a hipótese que todo n ∈ N com n ≥ q faz
parte do domı́nio de f .) Mas, pela Proposição 1.3.2, para todo δ > 0 e todo n0 ∈ N,
com n0 ≥ q, existe n ∈ N, com n ≥ n0 , tal que
|x + kω − n| < δ. (1.4)
De (1.3) e (1.4), segue que para todo x ∈ A e todo ε > 0, existe n ∈ N, com n ≥ n0 ,
tal que |f (x) − f (n)| < ε. 
No enunciado da Proposição 1.3.3, a sentença
“para todo x ∈ A, ε > 0 e n0 ∈ N, com n0 ≥ q, existe n ∈ N,
com n ≥ n0 , tal que |f (x) − f (n)| < ε”
poderia ser refraseada assim:
“para todo x ∈ A e todo ε > 0, existe n ∈ N, arbitrariamente
grande [tão grande quanto se queira], no domı́nio de f , tal que
|f (x) − f (n)| < ε”.
Usaremos esta segunda forma de escrita na próxima proposição.
ATENÇÃO: A próxima proposição está incompleta. Os itens ainda não provados
dela podem requerer mais condições do que as que foram citadas no enunciado. O
corolário que vem depois dela é provavelmente mais seguro, mas também deve ser
usado com cautela, já que sua demonstração ainda não foi feita.
Proposição 1.3.4. Sejam f : A ⊆ R → R e {an }∞ n=q ∈ Seq(R) tais que, para
todo n ∈ N com n ≥ q, tem-se n ∈ A e an = f (n). Suponhamos que para todo
x ∈ A e todo ε > 0, exista n ∈ N, arbitrariamente grande, no domı́nio de f , tal que
|f (x) − f (n)| < ε.
(a) {an }∞n=q é decrescente se e somente se f é decrescente.
(b) {an }∞n=q é crescente se e somente se f é crescente.
(c) {an }∞n=q é monotônica se e somente se f é monotônica.
(d) {an }∞n=q é estritamente decrescente se e somente se f é estritamente decres-
cente.
(e) {an }∞n=q é estritamente crescente se e somente se f é estritamente crescente.
(f ) {an }∞
n=q é limitada inferiormente se e somente se f é limitada inferiormente.
16 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

(g) {an }∞n=q é limitada superiormente se e somente se f é limitada superiormente.


(h) {an }∞n=q é limitada se e somente se f é limitada.
(i) Se um dos ı́nfimos, inf{an | n ∈ N, n ≥ q} ou inf{f (x) | x ∈ A}, existe, então
o outro também existe e eles são iguais.
(j) Se um dos supremos, sup{an | n ∈ N, n ≥ q} ou sup{f (x) | x ∈ A}, existe,
então o outro também existe e eles são iguais.

Demonstração.
(a) É fácil ver que se f é crescente, então {an }∞ n=q também é, já que esta é mera-
mente uma restrição daquela. Agora, suponha que f não é decrescente. Assim,
existem x1 , x2 ∈ A, com x1 < x2 , tais que f (x1 ) < f (x2 ). Logo, o número ε =
(f (x2 ) − f (x1 ))/2 é positivo. Por hipótese, existem n1 , n2 ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . }
tais que |f (x1 ) − f (n1 )| < ε, |f (x2 ) − f (n2 )| < ε e n2 > n1 , já que n2 pode ser
tomado tão alto quanto se queira; em particular, pode ser tomado maior que
ou igual a n0 = n1 + 1 (ou seja, maior que n1 ). Note que ε = (f (x2 ) − f (x1 ))/2
implica f (x1 )+ε = f (x2 )−ε. Daı́, por |f (x1 )−f (n1 )| < ε e |f (x2 )−f (n2 )| < ε,
decorre que
f (n1 ) < f (x1 ) + ε = f (x2 ) − ε < f (n2 ).
Portanto, se f não é decrescente, então existem n1 , n2 ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . },
com n1 < n2 , tais que an1 = f (n1 ) < f (n2 ) = an2 . Em outras palavras, se f
não é decrescente, então {an }∞
n=q não é decrescente.
(b) A demonstração é análoga à do item anterior.
(c) Esta é uma consequência imediata dos dois itens anteriores.
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
(i)
(j)


Corolário 1.3.5. Suponhamos que A ⊆ R contém todos os naturais a partir


de algum q ∈ N. Se f : A → R é uma função contı́nua, periódica com perı́odo
σ ∈ R∗+ − Q, e {an }∞
n=q ∈ Seq(R) é dada por an = f (n), então
(a) f ou {an }∞n=q é decrescente se e somente se ambas são constantes.
(b) f ou {an }∞n=q é crescente se e somente se ambas são constantes.
(c) f ou {an }∞n=q é monotônica se e somente se ambas são constantes.
(d) nem f nem {an }∞ n=q é estritamente decrescente.
(e) nem f nem {an }∞ n=q é estritamente crescente.
(f ){an }∞
n=q é limitada inferiormente se e somente se f é limitada inferiormente.
(g) {an }∞
n=q é limitada superiormente se e somente se f é limitada superiormente.
(h) {an }∞
n=q é limitada se e somente se f é limitada.
(i)Se um dos ı́nfimos, inf{an | n ∈ N, n ≥ q} ou inf{f (x) | x ∈ A}, existe, então
o outro também existe e eles são iguais.
(j) Se um dos supremos, sup{an | n ∈ N, n ≥ q} ou sup{f (x) | x ∈ A}, existe,
então o outro também existe e eles são iguais.
1.3. LIMITAÇÃO 17

Exemplo 1.3.3. Classifique quanto à limitação as sequências vistas no Exem-


plo 1.1.1.
Solução.
• {(n − 3)2 }∞
n=0 é limitada inferiormente, pois a escolha L1 = 0 faz com que
L1 ≤ (n − 3)2 para todo n ∈ N. Não é limitada superiormente, pois para
todo L2 ∈ R, existe
p
n = min{k ∈ N | k > 3 + |L2 |}
tal que (n − 3)2 > |L2 | ≥ L2 .
• {1/n}∞n=1 é limitada (inferiormente e superiormente), pois as escolhas
L1 = 0 e L2 = 1 fazem com que L1 ≤ 1/n ≤ L2 para todo n ∈ N∗ .
Esta última desigualdade pode ser justificada pelo fato que 1/1 = 1 e a
partir daı́, os termos de {1/n}∞ n=1 são cada vez menores, pois já sabemos
que esta sequência é estritamente decrescente (Exemplo 1.2.2(b)). A pri-
meira desigualdade, 0 ≤ 1/n, vem da regra dos sinais, já que o numerador
1 e o denominador n são ambos positivos.

• A sequência {csc(m − 2)}m=3 não é limitada, nem inferiormente, nem
superiormente, como pode ser verificado aplicando a Proposição 1.3.4.
• A sequência {arctan k}∞ k=0 é limitada, pois a função arco-tangente é limi-
tada: por definição, dado x ∈ R, arctan x é um número y no intervalo
[−π/2, π/2] tal que tan y = x. Assim, tomando L1 = −π/2 e L2 = π/2,
temos que, para todo x ∈ R, L1 ≤ arctan x ≤ L2 . Em particular, para
todo k ∈ N, L1 ≤ arctan k ≤ L2 .


Exemplo 1.3.4. Mostre que a sequência é ilimitada.


{n2 cos n}∞
(a)  n=0
∞.
(b) n3 /(n + 1) n=0 .
 √ ∞
(c) n2 / n3 + 4n n=1 .
Solução.
(a) Dado um M > 0, queremos encontrar um n ∈ N tal que |n2 cos n| > M . É fácil
ver que {n2 } é ilimitada, mas devemos nos preocupar também em garantir que
cos n não fique tão próximo de zero a ponto de neutralizar o crescimento de
n2 . Pela Proposição 1.3.3, sabemos que existe um natural n arbitrariamente
alto tal que cos n é arbitrariamente
√ próximo de cos 0 = 1. Assim, tomando
n0 = min{k ∈ N | k > 2M } e ε = 1/2, por exemplo, sabemos que existe
n ∈ N, com n ≥ n0 , tal que
1 1
| cos n − 1| < ε ∴ − = −ε < cos n − 1 ∴ cos n > .
2 2
Consequentemente,
1 1 1
|n2 cos n| ≥ n2 cos n > n2 ·
≥ n20 · > 2M · = M.
2 2 2

(b) Para todo M > 0, existe n = min{k ∈ N | k > 2M } tal que
n3 n3 n2
> = > M.
n+1 2n 2
18 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

(c) Para todo M > 0, existe n = min{k ∈ N | k > 5M 2 } tal que


n2 n2 n2
r
n
√ > √ = √ = > M.
3
n + 4n 3
n + 4n 3 5n 3 5


Observação 1.3.3. Sejam {an }, {bn } ∈ Seq(R), com an ≤ bn para todo n


suficientemente grande.
(a) se {an } é ilimitada superiormente, então {bn } é ilimitada superiormente.
(b) se {bn } é ilimitada inferiormente, então {an } é ilimitada inferiormente.
Exemplo 1.3.5. Considere a sequência {n!/2n }. Note que, para n suficiente-
mente grande,
n! n (n − 1) · (n − 2) · . . . · 4 · 3 2 · 1 n 2 1 n
n
= · · > ·1· · = .
2 2 | 2 · 2 · .{z
.. · 2 · 2 } 2·2 2 2 2 4
>1

Dai, como {n/4} é ilimitada superiormente, segue que {n!/2n } também é ilimitada
superiormente.

1.4. Subsequências
Definição 1.4.1. Dada {an }∞ ∞
n=q ∈ Seq(R), uma subsequência de {an }n=q é

uma sequência de números reais da forma {aα(n) }n=q0 , onde

α : {n ∈ N | n ≥ q 0 } → {n ∈ N | n ≥ q}
n 7→ α(n)
é uma função (mais especificamente, uma sequência) estritamente crescente.
Intuitivamente, uma subsequência de {an }∞
n=q é uma seleção de termos de
{an }∞
n=q , respeitando-se a ordem em que eles estão dispostos originalmente na
sequência.
Exemplo 1.4.1. Se selecionarmos os termos pares da sequência de Fibonacci
(Exemplo 1.1.3),

0, 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144, 233,


377, 610, 987, 1597, 2584, 4181, 6765, 10946, 17711,
28657, 46368, 75025, 121393, 196418, 317811, . . . ,
e os escrevermos um após o outro, na mesma ordem, obteremos uma outra sequência,
{0, 2, 8, 34, 144, 610, 2584, 10946, 46368, 196418, . . . },
cujo n-ésimo termo é o 3n-ésimo termo da sequência original. Ou seja, esta última
é {φ3n }∞
n=0 . Note que a função α : n 7→ 3n é estritamente crescente. Portanto,
{φ3n }∞ ∞
n=0 é uma subsequência de {φn }n=0 , no sentido da Definição 1.4.1.

Exemplo 1.4.2. Toda sequência é uma subsequência de si mesma: {an }∞


n=q =
{aα(n) }∞
n=q , onde α : n →
7 n é estritamente crescente.
1.4. SUBSEQUÊNCIAS 19

O crescimento da função α associada a uma subsequência {aα(n) } de {an } não


diz nada sobre o crescimento ou decrescimento de {aα(n) } ou de {an }. Na verdade,
a condição de α ser estritamente crescente é meramente uma forma de garantir
que os termos da subsequência estejam dispostos na mesma ordem em que eles
aparecem na sequência original. Afinal, uma função α é estritamente crescente se
ela preserva a ordem estrita, transformando n1 < n2 em α(n1 ) < α(n2 ).
Exemplo 1.4.3. Sejam {am }∞ ∞ n
m=1 , {bn }n=0 ∈ Seq(R) dadas por bn = 1/2 e
n
am = 1/m. Note que bn = aα(n) , onde α(n) = 2 . A função α é crescente, mas
{am }∞ ∞
m=1 e {bn }n=0 são decrescentes.

Exemplo 1.4.4. Denotando novamente por {φn }∞ n=0 a sequência de Fibonacci


(Exemplo 1.1.3), considere {ψn }∞
n=1 dada por
(
φ3(n+1) se n é par,
ψn =
φ3(n−1) se n é ı́mpar.
Os termos de {ψn } são os mesmos da subsequência de {φn }∞ n=0 definida no Exem-
plo 1.4.1, porém agora eles estão dispostos em outra ordem:
{ψn }∞
n=1 = {8, 2, 144, 34, 2584, 610, 46368, 10946, 46368, 196418, . . . .}.
Em outras palavras, ψn = φα(n) , onde
(
3(n + 1) se n é par,
α(n) =
3(n − 1) se n é ı́mpar,
mas α não é crescente (logo, não é estritamente crescente). Por isso, {ψn }∞
n=1 não
é uma subsequência de {φn }∞n=0 .
Proposição 1.4.1. Subsequências herdam todos os atributos com respeito a
crescimento/decrescimento e limitação. Mais precisamente, dada qualquer sequên-
cia numérica {an }∞n=q ,

(a) Se {an }n=q é (eventualmente/estritamente) decrescente, então toda subsequên-
cia de {an }∞
n=q também é.
(b) Se {an }∞
n=q é (eventualmente/estritamente) crescente, então toda subsequência
de {an }∞
n=q também é.
(c) Se {an }∞ ∞
n=q é (eventualmente) monotônica, então toda subsequência de {an }n=q
também é.
(d) Se {an }∞
n=q é (superiormente/inferiormente) limitada, então toda subsequência
de {an }∞
n=q também é.

Demonstração. Fica como exercı́cio. 


Também vale a recı́proca de cada item da Proposição 1.4.1, já que toda sequên-
cia é uma subsequência de si mesma (Exemplo 1.4.2). Além disso, as contrapositivas
dessas implicações merecem atenção. Por exemplo, se uma sequência possui duas
subsequências com atributos incompatı́veis com respeito a crescimento/decresci-
mento – digamos, uma subsequência é estritamente crescente e a outra é estrita-
mente decrescente – então a sequência original (“mãe” dessas subsequências) nem
é estritamente crescente, nem é estritamente decrescente.
Note, porém, que o supremo/ı́nfimo do conjunto dos termos de uma sub-
sequência pode ser diferente do supremo/ı́nfimo do conjunto dos termos da se-
quência original.
20 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

1.5. Limites de Sequências


As noções de limites normalmente estudadas num primeiro semestre de cálculo
diferencial e integral também servem para sequências de números reais, já que este
é um tipo de função real em uma variável real. Mas, em virtude das caracterı́sticas
topológicas de N, o único caso interessante de limites de sequências é o dos limites
no infinito; e o único infinito de N é infinito positivo. Então só estudaremos limites
de sequências da forma limn→+∞ an , o qual pode ser abreviado para limn→∞ an ,
ou até mesmo para lim an , desde que esteja claro, pelo contexto, que esse an dentro
do limite é o termo geral de uma sequência e o ı́ndice n é a variável do limite.
Definição 1.5.1. Dados {an }∞n=q ∈ Seq(R) e L ∈ R, dizemos que o limite de
an é L, e escrevemos limn→∞ an = L (ou limn→+∞ an = L, ou lim an = L), se
podemos tornar an arbitrariamente próximo de L tomando um n suficientemente
grande. Ou seja, se para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, com
n ≥ q, vale a implicação n > δ ⇒ |an − L| < ε. Simbolicamente,
lim an = L ⇔ lim an = L ⇔ lim an = L
n→∞ n→+∞
(
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N, n ≥ q,
⇔ (1.5)
n > δ ⇒ |an − L| < ε.

Como N é ilimitado em R (propriedade arquimediana), a sentença (1.5) é equi-


valente a
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N, n > δ ⇒ |an − L| < ε (1.6)
e também a
∀ε > 0, ∃N ∈ N, ∀n ∈ N, n > N ⇒ |an − L| < ε. (1.7)
Note que as condições (1.6) e (1.7) não dependem do ı́ndice inicial q da sequência.
Assim, o limite de uma sequência {an } depende apenas do que acontece com an
para n suficientemente grande. Em outras palavras. . .
Proposição 1.5.1. Dadas duas sequências {an }∞ ∞
n=q1 , {bn }n=q2 ∈ Seq(R) e um
q ∈ N com q ≥ q1 e q ≥ q2 , se an = bn para cada n ∈ {q, q + 1, q + 2, . . . }, então,
para todo L ∈ R, limn→∞ an = L se e somente se limn→∞ bn = L.
Esta proposição permite que enunciemos muitos resultados e definições sobre
limites de sequências sem fazer referência a ı́ndices iniciais, escrevendo {an } ao invés
de {an }∞n=q , mesmo quando o valor de q não está implı́cito no contexto. Também
nos habilita a calcular o limite de uma sequência sem saber precisamente qual é o
seu domı́nio.
Exemplo 1.5.1. Seja c ∈ R, constante. A fim de provar, por (1.6), que
lim c = c,
n→∞

tomemos ε > 0, arbitrário. Queremos exibir um δ > 0 tal que, para todo n ∈ N,
n > δ ⇒ |c − c| < ε.
Mas é claro que esta última desigualdade, e por conseguinte a implicação acima, é
válida independentemente de δ. Portanto, qualquer√número positivo serve como o
δ de que precisamos. Por exemplo, tome δ = 7π − 3.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 21

Exemplo 1.5.2. Vamos provar, por (1.6), que


1
lim = 0.
n→∞ n
Para todo ε > 0, queremos encontrar δ > 0 tal que, para todo n ∈ N,

1
n > δ ⇒ − 0 < ε.

n
Note que a desigualdade |1/n − 0| < ε, consequente da implicação acima, equivale
a n > 1/ε. Então queremos exibir um δ tal que
1
∀n ∈ N, n > δ ⇒ n > .
ε
Assim, basta tomar δ = 1/ε.
Note que, no Exemplo 1.5.2, calculamos limn→∞ 1/n sem saber precisamente
quais valores de n fazem parte do domı́nio de {1/n}. Sabemos apenas que o domı́nio
inclui unicamente números naturais positivos. Na verdade, aquele cálculo nos diz
qual é o limite de qualquer sequência da forma {1/n}. Uma observação similar se
aplica ao Exemplo 1.5.1.
Na Seção 1.3, vimos a definição de sequência limitada. É importante notar que
ser limitada, no sentido da Definição 1.3.1, não significa, necessariamente, possuir
um limite, no sentido da Definição 1.5.1.
Exemplo 1.5.3. Considere a sequência {an }∞ n
n=0 dada por an = (−1) . É fácil
n
ver que {an } é limitada. De fato, como |an | = |(−1) | = 1, tomando M = 1, por
exemplo, é claro que |an | ≤ M para todo n ∈ N. Provaremos agora que {an }∞ n=0
não possui limite, no sentido da Definição 1.5.1. Dado qualquer L ∈ R, temos as
seguintes possibilidades:
• L ≥ 0. Nesse caso, alguns termos da sequência {an } estão a uma distância
de L no mı́nimo igual a 1. Mais precisamente, todos os termos de {an }
associados a um ı́ndice n ı́mpar estão a essa distância mı́nima de L. De
fato, existe ε = 1 tal que, para todo N ∈ N, existe n = 2N + 1 ∈ N, com
n > N , tal que an = (−1)n = (−1)2N +1 = −1 e portanto
|an − L| = | − 1 − L| = |L + 1| = L + 1 (pois L ≥ 0 ∴ L + 1 ≥ 0)
≥ 1 = ε.
Logo, a condição (1.7) não se aplica. Ou seja, é falso que limn→∞ an = L.
• L < 0. Nesse caso, alguns termos da sequência {an } estão a uma distância
de L maior que 1. Mais precisamente, todos os termos de {an } associados
a um ı́ndice n par distam mais que 1 de L. De fato, existe ε = 1 tal
que, para todo N ∈ N, existe n = 2(N + 1) ∈ N, com n > N , tal que
an = (−1)n = (−1)2(N +1) = 1 e portanto
|an − L| = |1 − L| = 1 − L (pois L < 0 ∴ 1 − L ≥ 0)
≥ 1 = ε.
Logo, a condição (1.7) não se aplica. Ou seja, é falso que limn→∞ an = L.
Definição 1.5.2. Dizemos que {an } ∈ Seq(R) converge para L ∈ R (ou é
convergente para L) se este é o limite de an . Uma sequência de números reais é
dita convergente se converge para algum L ∈ R; caso contrário, ela é divergente.
22 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

Exemplo 1.5.4. De acordo com os Exemplos 1.5.1, 1.5.2 e 1.5.3, usando a ter-
minologia introduzida na Definição 1.5.2, podemos dizer que, sendo c ∈ R qualquer
constante, a sequência {c}∞ ∞
n=0 é convergente para c, {1/n}n=1 converge para 0 e
n ∞
{(−1) }n=0 é divergente.
Como já dissemos, ser limitada, no sentido da Definição 1.3.1, não significa,
necessariamente, possuir um limite, no sentido da Definição 1.5.1. No entanto, esta
última condição implica a primeira.
Proposição 1.5.2. Toda sequência de números reais convergente é limitada.
Em outras palavras, toda sequência de números reais ilimitada é divergente.
Demonstração. Sejam {an } ∈ Seq(R) e L ∈ R tais que limn→∞ an = L.
Tomando ε = 1 em (1.7), vemos que existe N ∈ N tal que, para todo n ∈ N, com
n > N,
|an − L| < 1 ∴ L − 1 ≤ an ≤ L + 1
∴ |an | ≤ |L − 1| ou |an | ≤ |L + 1|
∴ |an | ≤ max{|L − 1|, |L + 1|}.
Por outro lado, se n ≤ N , então é claro que |an | ≤ max{|a1 |, . . . , |aN |}. Assim,
definindo
M = max{|a1 |, . . . , |aN |, |L + 1|, |L − 1|},
temos que |an | ≤ M para todo n no domı́nio da sequência. E M ≥ |L + 1| > 0.
Então, pela Proposição 1.3.1, {an } é limitada. 
Exemplo 1.5.5. Como vimos no Exemplo 1.3.4, as sequências
 3 
n2
 
2 n
{n cos n}, e √
n+1 n3 + 4n
são ilimitadas e, portanto, divergentes.
Exemplo 1.5.6. Como vimos no Exemplo 1.3.5, {n!/2n } é ilimitada superior-
mente e, portanto, diverge.
Merecem atenção duas formas especiais de divergência, chamadas limites infi-
nitos.
Definição 1.5.3. Seja {an } ∈ Seq (R).
(a) Dizemos que o limite de an é mais infinito, e escrevemos limn→∞ an = +∞ (ou
limn→+∞ an = +∞, ou lim an = +∞), se podemos tornar an arbitrariamente
grande tomando um n suficientemente grande. Ou seja, se para todo ε > 0,
existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, vale a implicação n > δ ⇒ an > ε.
Simbolicamente,
lim an = +∞ ⇔ lim an = +∞ ⇔ lim an = +∞
n→∞ n→+∞
(
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N,
⇔ (1.8)
n > δ ⇒ an > ε.
(b) Dizemos que o limite de an é menos infinito, e escrevemos limn→∞ an = −∞ (ou
limn→+∞ an = −∞, ou lim an = −∞), se podemos tornar an arbitrariamente
grande em módulo, com sinal negativo, tomando um n suficientemente grande.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 23

Ou seja, se para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para todo n ∈ N, vale a
implicação n > δ ⇒ an < −ε. Simbolicamente,
lim an = −∞ ⇔ lim an = −∞ ⇔ lim an = −∞
n→∞ n→+∞
(
∀ε > 0, ∃δ > 0, ∀n ∈ N,
⇔ (1.9)
n > δ ⇒ an < −ε.
Assim como na Definição 1.5.1, podemos substituir o quantificador ∃δ > 0, na
Definição 1.5.3, por ∃N ∈ N, mantendo-se o significado essencialmente o mesmo. E
limites infinitos também não dependem do ı́ndice inicial da sequência.
Observação 1.5.1.
(a) Se uma sequência possui limite infinito, então ela é ilimitada. Mais precisa-
mente,
• Se limn→∞ an = +∞, então {an } não é limitada superiormente.
• Se limn→∞ an = −∞, então {an } não é limitada inferiormente.
Consequentemente, se uma sequência possui limite infinito, então ela diverge
(relembre a Proposição 1.5.2). Isto justifica as expressões comumente utilizadas
“diverge para ±∞”, introduzidas a seguir, na Definição 1.5.4.
(b) Se uma sequência possui limite infinito, então ela é limitada superiormente
ou limitada inferiormente. (E isto não contradiz o item (a), acima.) Mais
precisamente,
• Se limn→∞ an = +∞, então {an } é limitada inferiormente.
• Se limn→∞ an = −∞, então {an } é limitada superiormente.
Definição 1.5.4. Dizemos que {an } ∈ Seq(R)
(a) diverge para +∞ quando limn→∞ an = +∞;
(b) diverge para −∞ quando limn→∞ an = −∞.
Exemplo 1.5.7. Vamos provar, por (1.8), que limn→∞ n = +∞. Dado um
ε > 0, queremos exibir um δ > 0 tal que se n > δ, então n > ε. Evidentemente, a
escolha δ = ε resolve. Analogamente, prova-se que limn→∞ −n = −∞. Portanto,
as sequências {n} e {−n} divergem para +∞ e para −∞, repectivamente.
Observe que nem toda divergência é para +∞ ou para −∞.
Exemplo 1.5.8. Considere an = (−1)n . Já provamos, no Exemplo 1.5.3, que
a sequência {an }∞ ∞
n=0 não possui limite finito. Provaremos agora que {an }n=0 não
possui limite infinito. Para isso, considere ε = 1. Assim, para todo n ∈ N, é falso
que an > ε. Logo, é falso que ∃N ∈ N, ∀n ∈ N, n > N ⇒ an > ε. Ou seja, é
falso que limn→∞ an = +∞. Analogamente, e com a mesma escolha de valor para
ε, prova-se que não vale limn→∞ an = −∞. Portanto, {(−1)n } não tem limite,
nem finito, nem infinito. Em outras palavras, é uma sequência divergente cuja
divergência não é para +∞ nem para −∞.
A seguinte definição foi traduzida e adaptada de [Can].
Definição 1.5.5. A extensão afim de R é um conjunto R = R ∪ {−∞, +∞},
onde −∞ e +∞ são objetos distintos não pertencentes a R. Operações aritméticas
e relação de ordem são estendidas de R para R da seguinte maneira:
(a) −∞ < x < +∞ se x 6= ±∞; além disso, −∞ < +∞.
(b) −(+∞) = −∞ e −(−∞) = +∞.
24 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

(c) x + (+∞) = +∞ + x = +∞ se x 6= −∞.


(d) x + (−∞) = −∞ + x = −∞ se x 6= +∞.
(e) x · (±∞) = ±∞ · x = ±∞ se x > 0.
(f) x · (±∞) = ±∞ · x = ∓∞ se x < 0.
(g) x/(±∞) = 0 se x 6= ±∞.
(h) |x/0| = +∞ se x 6= 0.
Note que a definição acima não abrange expressões da forma +∞ + (−∞),
−∞+(+∞), 0/0, etc. Estas permanecem indefinidas. Expressões da forma 0·(±∞)
podem estar definidas ou não, dependendo do contexto. Se considerarmos que o
sı́mbolo 0 aı́ representa o número zero enquanto o sı́mbolo ±∞ representa uma
função com limite infinito, faz sentido escrever 0 · (±∞) = 0, no sentido que o limite
do número zero vezes uma função com limite infinito é zero. Porém, se quisermos
usar o 0 para representar uma função com limite zero, não faz mais sentido definir
que 0 · (±∞) é zero ou qualquer outra coisa. Nesse segundo caso, 0 · (±∞) seria
uma expressão indefinida.
Apesar de −∞ e +∞ não serem números reais, às vezes convém escrever f (±∞)
para denotar o limite de f (x) quando x tende a ±∞, desde que exista (finito ou
infinito). Assim, por √ exemplo, podemos √ escrever e−∞ = 0, arctan(+∞) = π/2
arctan(−∞) = −π/2, +∞ = +∞, −∞ = −∞. Mas √3
novamente, é preciso ter
cuidado com expressões indefinidas, tais como sen(±∞), −∞, etc.
Um elemento x de R é dito infinito se x = +∞ ou x = −∞; caso contrário,
ele é finito. Daqui por diante, sempre que for possı́vel e conveniente, trataremos
de limites finitos e infinitos simultaneamente, pensando em expressões da forma
limn→∞ an = L para um L ∈ R arbitrário, finito ou infinito.
Proposição 1.5.3 (Unicidade do Limite). Dados {an } ∈ Seq(R) e L1 , L2 ∈ R,
se limn→∞ an = L1 e limn→∞ an = L2 , então L1 = L2 .
Proposição 1.5.4 (Limite Herdado de uma Extensão). Sejam f : A ⊆ R → R
e {an } ∈ Seq(R) tais que an = f (n) para todo n ∈ N suficientemente grande.
Qualquer que seja o L ∈ R, se limx→+∞ f (x) = L, então limn→∞ an = L.
Exemplo 1.5.9. O limite da sequência {k sen(1/k)}∞ k=1 é 1, pois ela é a restrição
da função f (x) = x sen(1/x) = sen(1/x)/(1/x) no conjunto dos números naturais e
sen(1/x) sen u
lim = lim+ = 1.
x→+∞ 1/x u→0 u
Exemplo 1.5.10. A recı́proca da Proposição 1.5.4 é falsa. Sejam f : R → R
e {an }∞ ∞
n=0 definidas por f (x) = sen(π/2 + 2πx) e an = f (n). Note que {an }n=0 é
constante: an = 1, para todo n ∈ N. Então limn→∞ an = 1. Apesar disso, f não
possui limite quando x → +∞.
Exemplo 1.5.11. Seja {ak }∞ k=1 ∈ Seq(R) dada por ak = (ln k)/k. Esta
sequência é a restrição a N da função f (x) = (ln x)/x, definida para x > 0. Pela
Proposição 1.5.4, se f possuir limite quando x → +∞, este será o limite de {ak }∞
k=1 .
Por outro lado, sendo f da forma g(x)/h(x), onde g(x) = ln x e h(x) = x são di-
ferenciáveis, com limx→+∞ g(x) = limx→+∞ h(x) = +∞ e h0 (x) 6= 0 para todo x,
temos, pela regra de L’Hospital, que
limx→+∞ g 0 (x) limx→+∞ 1/x 0
lim f (x) = = = = 0.
x→+∞ limx→+∞ h0 (x) limx→+∞ 1 1
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 25

Portanto, limk→∞ ak = 0.
Observe que, no Exemplo 1.5.11, aplicamos a regra de L’Hospital não na
sequência, mas numa extensão f da sequência. E para isso, tivemos que verifi-
car que essa extensão satisafazia as condições da regra de L’Hospital, que exigem
que f seja da forma g(x)/h(x), com g e h diferenciáveis, etc. A regra de L’Hospital
não deve ser aplicada diretamente na sequência, pois sequências não são o tipo de
função que se deriva normalmente. A derivada de uma função f : A ⊆ R → R
é definida por um limite do tipo x → p, com p ∈ R, e, como já dissemos na in-
trodução desta seção, esse tipo de limite não funciona bem para sequências, devido
às propriedades topológicas de N (conjunto discreto, sem pontos de acumulação).
Poderı́amos até fixar uma definição para a derivada de uma sequência num ponto
p ∈ R, mas não teria como garantir a unicidade. A derivada de uma sequência dada
num ponto dado seria √ um limite que poderia assumir qualquer valor, simultanea-
mente; poderia ser 2 e 3/5, ao mesmo tempo, por exemplo.
Proposição 1.5.5 (Propriedades Operatórias). Sejam {an }, {bn } ∈ Seq(R),
p, L ∈ R e f : A ⊆ R → R, com A contendo an para todo n suficientemente grande.
(a) limn→∞ (an + bn ) = limn→∞ an + limn→∞ bn , desde que os limites indicados
existam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem definida.
(b) limn→∞ an bn = (limn→∞ an )(limn→∞ bn ), desde que os limites indicados exis-
tam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem definida.
(c) Se limn→∞ an = p e limx→p f (x) = L, então limn→∞ f (an ) = L.
Observação 1.5.2. Supondo que p = limn→∞ an é finito e f é contı́nua em
p, o item (c) da Proposição 1.5.5 nos diz que limn→∞ f (an ) = f (limn→∞ an ). Ou
seja, nesse caso o limite pode “entrar” na função. (Mais propriamente, o limite
comuta com a função.) Essa passagem do limite para dentro da função também é
válida quando limn→∞ an = ±∞ e limx→±∞ f (x) = L:
 
lim f (an ) = f lim an = f (±∞) = lim f (x) = L.
n→∞ n→∞ x→±∞

(Ver Exemplo 1.5.13.)


Corolário 1.5.6. Sejam {an }, {bn } ∈ Seq(R), p, L ∈ R.
(a) limn→∞ (an − bn ) = limn→∞ an − limn→∞ bn , desde que os limites indicados
existam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem definida.
(b) limn→∞ an /bn = (limn→∞ an )/(limn→∞ bn ), desde que os limites indicados
existam (finito ou infinito) e a operação indicada entre eles esteja bem defi-
nida.

Exemplo 1.5.12. Calcule o limite de {an } dada por an = n2 / n3 + 4n.
p
Solução. Multiplicando numerador e denominador por n−2 = 1/n4 , temos:
n2 n−2 · n2
lim an = lim √ = lim q √
n→∞ n→∞ n3 + 4n n→∞ 1
n3 + 4n
n4 ·

n2−2 1 1
= lim q = lim q = lim √ = +∞.
n→∞ n3
+ 4n n→∞ 1
+ 4 x→0 x
n4 n4 n n3

Então a sequência diverge. A penúltima igualdade acima é √justificada pela Pro-


posição 1.5.5(c), pensando na aplicação da função f (x) = 1/ x sobre a sequência
26 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

bn = 1/n + 4/n3 e observando que limn→∞ bn = 0. Outra maneira ligeiramente


diferente de calcular esse limite é escrevendo
r
n2 n4
√ = 3
n3 + 4n n + 4n
e notando que
n4 n3 n3
     
lim 3 = lim n · 3 = lim n · lim 3
n→∞ n + 4n n→∞ n + 4n n→∞ n→∞ n + 4n
   1

1
= lim n · lim = (+∞) · = +∞.
n→∞ n→∞ 1 + 4/n2 1+0

Exemplo 1.5.13. Calcule o limite de {an } dada por an = arctan (ln n).
Solução. Temos: limn→∞ ln n = +∞ e limx→+∞ arctan x = π/2. Então
π
lim an = lim arctan(ln n) = lim arctan x = .
n→∞ n→∞ x→+∞ 2
Assim, a sequência é convergente. De outro ponto de vista, o que fizemos acima foi
passar o limite para dentro da função arctan x, assim:
  π
lim arctan(ln n) = arctan lim (ln n) = arctan(+∞) = .
n→∞ n→∞ 2

Teorema 1.5.7 (Teorema do Confronto para Sequências). Sejam {an }, {bn } e
{cn } sequências de números reais tais que an ≤ bn ≤ cn para todo n suficientemente
grande. Se L ∈ R é tal que limn→∞ an = L = limn→∞ cn , então limn→∞ bn = L.
Exemplo 1.5.14. Sejam {an }, {bn }, {cn } ∈ Seq(R) dadas por
n−2 n−1 an + cn cn − an
an = , cn = , bn = + sen(n − 1),
n−1 n 2 2
para todo natural n ≥ 2. Note que an ≤ bn ≤ cn . Além disso, limn→∞ an = 1 =
limn→∞ cn . Daı́, pelo teorema do confronto, segue que limn→∞ bn = 1.
Lema 1.5.8. Para toda {an } ∈ Seq(R),
lim an = 0 ⇔ lim |an | = 0.
n→∞ n→∞

Demonstração. Basta reescrever limn→∞ an = 0 e limn→∞ |an | = 0 no for-


mato (1.6) ou (1.7), notando que |an − 0| = ||an | − 0|. 
Exemplo 1.5.15. Pelo Lema 1.5.8, a sequência {(−3)n /n!} converge para zero
se e somente se {|(−3)n /n!|} = {3n /n!} converge para zero. Mas, para um n
suficientemente grande,
3n 3 · 3 · ... · 3 · 3 · 3 · 3
0≤ =
n! n · (n − 1) · . . . 4 · 3 · 2 · 1
3 3 · ... · 3 3·3·3 27 1 n→∞
≤ · · < · −−−−→ 0.
n (n − 1) · . . . · 4 3 · 2 · 1 2 n
| {z }
<1

Daı́, pelo teorema do confronto, segue que {3n /n!}, e portanto {(−3)n /n!}, converge
para zero.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 27

Corolário 1.5.9. Se {an } ∈ Seq(R) é limitada e {bn } ∈ Seq(R) converge para


zero, então limn→∞ an bn = 0.
Demonstração. Como an é limitada, existe M > 0 tal que 0 ≤ |an | ≤ M .
Multiplicando estas desigualdades por |bn |, segue que
0 ≤ |an bn | ≤ M |bn |,
com limn→∞ 0 = 0 = limn→∞ M |bn |. Daı́, pelo teorema do confronto, decorre que
limn→∞ |an bn | = 0. Então, pelo Lema 1.5.8, limn→∞ an bn = 0. 
n

Exemplo 1.5.16. Seja √ an = (−1) /2 n. Observe que an = bn cn , onde bn =
(−1)n é limitada e cn = 1/2 n converge para zero. Logo, {an } converge para zero.

Exemplo 1.5.17. Seja an = (sen √ 2n)/(1 + n). Observe que an o produto
de bn = sen 2n e de cn = 1/(1 + n). Como {bn } é uma sequência limitada e
limn→∞ cn = 0, {an } converge para zero.
Exemplo 1.5.18. Seja sn = (cos2 n)/2n . Observe que sn = un vn , onde un =
cos n é limitada e vn = 1/2n converge para zero. Logo, {sn } converge para zero.
2


Exemplo 1.5.19. Seja xn√= 2−n (1 + n)(−1)n sen 2n arctan 3n. Observe que
−n
xn = yn zn , onde yn = 2 (1+ n) converge para zero e zn = (−1)n sen 2n arctan 3n
é limitada. Logo, limn→∞ xn = 0.
Proposição 1.5.10. O limite de uma sequência de números reais é L ∈ R se e
somente se toda subsequência dela têm o mesmo limite L. Consequentemente, para
toda {an } ∈ Seq(R),
(a) Se alguma subsequência de {an } não tem limite finito, então {an } não tem
limite finito.
(b) Se alguma subsequência de {an } não tem limite (nem finito, nem infinito),
então {an } não tem limite (nem finito, nem infinito).
(c) Se duas subsequências de {an } têm limites distintos, então {an } não tem limite
(nem finito, nem infinito).
Demonstração. Provaremos o caso em que L é finito. A demonstração para
os casos L = ±∞ é análoga, trocando-se apenas a expressão “|a − L| < ε” por
“a > ε” ou “a < −ε”, dependendo do caso (+∞ ou −∞, respectivamente).
Suponha que limn→∞ an = L e seja bm = aα(m) , com α : m 7→ n estritamente
crescente. Dado ε > 0, temos:
∃N1 ∈ N, ∀n ∈ N, n > N1 ⇒ |an − L| < ε. (1.10)
Se α(m) = m para todo m, então é claro que limm→∞ bm = limm→∞ am = L. Por
outro lado, se α(m) 6= m para algum m, então segue de (1.10) que
∀ε > 0, ∃N2 = min{m ∈ N | α(m) > m > N1 }, ∀m ∈ N,
m > N2 ⇒ α(m) > α(N2 ) > N2 > N1 ⇒ |aα(m) − L| < ε; (1.11)
ou seja, limm→∞ bm = L. Reciprocamente, se toda subsequência de {an } converge
para L, então {an } converge para L em razão do que dissemos no Exemplo 1.4.2. 
Exemplo 1.5.20. Como visto nos Exemplos 1.5.3 e 1.5.8, a sequência {(−1)n }
não possui limite, nem finito, nem infinito. A verificação disso foi pelas definições
de limite finito e limite infinito, com δ’s e ε’s. Mas agora, com a Proposição 1.5.10,
basta notar que as sequências constantes {−1} e {1} são subsequências de {(−1)n }
28 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

que convergem para limites distintos. Mais geralmente, toda sequência periódica
não constante (como aquela definida no Exemplo 1.1.8, só que com bi 6= bj para
algum i, j) não possui limite (nem finito, nem infinito), pois possui subsequências
constantes distintas.
Pn
Exemplo 1.5.21. Sejam {an }∞ n=0 ∈ Seq(R) definida por an =
k
k=0 (−1) . Ou
seja,
an = 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 · · · + (−1)n .
| {z }
n+1 parcelas
Um erro comum ao lidar com essa sequência é achar que, no limite, teremos uma
quantidade igual de parcelas −1 e parcelas 1, de modo que limn→∞ an = 0. O
problema de pensar assim é que a soma precisa ser calculada antes de aplicar o
limite, quando ainda existe apenas uma quantidade finita de parcelas. Note que
(
1 se n é par,
an =
0 se n é ı́mpar.
Então {an }∞
n=0 possui duas subsequências constantes distintas:
{a2m }∞ ∞
m=0 = {1}m=0 e {a2m+1 }∞ ∞
m=0 = {0}m=0 ;
logo, não possui limite (nem finito, nem infinito).
Exemplo 1.5.22. Seja {an }∞ ∞
n=1 , {bn }n=1 ∈ Seq(R) definidas por
(
log10 n se n é uma potência de 10,
an =
1/n caso contrário,
(
1/ log10 n se n é uma potência de 10,
bn =
1/n caso contrário.
{an }∞ ∞
n=1 diverge, e também não tem limite infinito, mas {bn }n=1 converge. Para ve-
∞ ∞ ∞
rificar que {an }n=1 diverge, basta ver que {a10k }k=0 = {k}k=0 é uma subsequência
divergente. Para verificar que {an }∞ n=1 não tem limite (nem finito, nem infinito), é
suficiente notar que {a10k }∞
k=0 e {a ∞
10k +1 }k=0 são subsequências com limites distin-
tos: a primeira destas duas é {k}k=0 e diverge para +∞; a outra é {1/(10k + 1)}∞

k=0
e converge para 0. Por outro lado, para verificar a convergência de {bn }∞ n=1 , não
basta simplesmente tomar duas subsequências e mostrar que ambas têm o mesmo
limite. A partir de duas subsequências com o mesmo limite, não temos como ga-
rantir que todas as subsequências têm o mesmo limite. Toda sequência possui
infinitas subsequências. E em geral, tentar provar que todas as subsequências têm
o mesmo limite não simplifica em nada a tarefa de mostrar que uma dada sequência
têm aquele mesmo limite. Até porque uma das subsequências deve ser a própria
sequência inteira. Uma opção eficaz e cômoda para mostrar que {bn }∞ n=1 converge
é observar que
1
0 ≤ bn ≤
log10 n
e aplicar o teorema do confronto (p. 26).
Proposição 1.5.11 (Critério da Limitação e Monotonicidade). Seja {an } ∈
Seq(R).
(a) Se {an } é superiormente limitada e eventualmente crescente, então {an } con-
verge para o supremo do conjunto dos seus termos.
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 29

(b) Se {an } é inferiormente limitada e eventualmente decrescente, então {an } con-


verge para o ı́nfimo do conjunto dos seus termos.
(c) Se {an } é limitada e eventualmente monotônica, então {an } converge.
Exemplo 1.5.23. Dado b > 0, seja {an }∞
n=0 definida recursivamente por

a0 = b,

∀n ∈ N, an+1 = an .
Temos as seguintes possibilidades:
• b > 1. Nesse caso, prova-se por indução finita que, para todo n ∈ N,
an > 1 e an+1 < an .
– Caso base: Temos: a0 = b > 1 e, então
√ √
a1 = a0 = b < b = a0 ,
pois a raiz quadrada de qualquer número maior que 1 é menor do
que o próprio número.
– Passo indutivo: Para todo n ∈ N, se an > 1 e an+1 < an , então

an+1 = an > 1,
pois a raiz quadrada de um número maior que 1 é sempre maior 1, e

an+2 = an+1 < an+1 ,
pela mesma justificativa do caso base.
Assim, {an }∞n=0 é estritamente decrescente e inferiormente limitada por 1.
Logo, converge para L = inf{an | n ∈ N}. Note que L ≥ 1, já que 1 é uma
cota inferior de {an | n ∈ N}. O valor preciso de L pode ser determinado

aplicando-se o limite em ambos os membros de an+1 = an :
√ q √
L = lim an = lim an = lim an = L.
n→∞ n→∞ n→∞

Isto só é permitido porque já sabemos


√ que o limite L existe e é não nega-
tivo,√de modo que também existe L. As únicas raı́zes reais da equação
x = x são x = 0 e x = 1. Como L ≥ 1, L não pode ser 0, então só pode
ser 1. Portanto, no caso b > 0, {an }∞n=0 converge para 1.
• b < 1. Analogamente ao caso anterior, prova-se por indução finita que,
para todo n ∈ N,
0 < an+1 < 1 e an+1 > an .
Assim, {an }∞ é estritamente crescente e superiormente limitada por 1.
n=0
Logo, converge para L = sup{an | n ∈ N} ≥ a0 = b > 0.√Aplicando o

limite em ambos os membros de an+1 = an , segue que L = L ∴ L = 1.
Em ambos os casos, {an }∞
n=0 converge para 1.

Exemplo 1.5.24. Seja {an }∞


n=1 definida recursivamente por

a1 = 2,

∀n ∈ N, an+1 = 2 + an .
Estude {an }∞
n=1 quanto a limitação, crescimento/decrescimento e convergência.
30 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

Solução. Por indução finita, prova-se que


∀n ∈ N∗ , 1 < an < 2.

• Caso base: É claro que 1 ≤ 2 ≤ 2.
• Passo indutivo: Para todo n ∈ N∗ ,
1 < an < 2 ⇒ 3 = 2 + 1 < 2 + an < 2 + 2 = 4
√ √ √
⇒ 1 < 3 < 2 + an < 4 = 2.
Isto nos diz que {an }∞
é limitada. Vejamos agora se a sequência tem algum
n=1
comportamento bem definido quanto a crescimento/decrescimento. Observe que,
para todo n ∈ N∗ ,
a2n+1 − a2n = (an+1 − an ) (an+1 + an ),
| {z }
>0

de modo que
a2n+1 − a2n > 0 ⇔ an+1 − an > 0.
Por outro lado,

∀n ∈ N∗ , a2n+1 − a2n = ( 2 + an )2 − a2n = 2 + an − a2n = (2 − an )(1 + an ) > 0.
| {z } | {z }
>0 >0
Logo,
∀n ∈ N∗ , an+1 − an > 0.
Ou seja, {an }∞
n=1 é estritamente crescente. Como {an }∞
n=1 é superiormente limitada
e crescente, ela deve convergir para L = sup{an | √ n ∈ N∗ }. Como L é uma √ cota
superior de {an | n ∈ N∗ }, temos que L ≥ a1 = 2√> 0 e então existe 2 + L.
Aplicando o limite em ambos os membros de an+1 = 2 + an , temos:

L = 2 + L ∴ L2 = 2 + L ∴ (2 − L)(1 + L) = 0 ∴ L ∈ {−1, 2}.

Mas, como L ≥ 2, L não pode ser −1. Portanto, limn→∞ an = L = 2. 
Exemplo 1.5.25. A Proposição 1.5.11 nos diz que ser limitada e monotônica,
essas duas coisas juntas, é uma condição suficiente para uma sequência ser con-
vergente. Mas isoladamente, ser limitada, em geral, não implica ser convergente
(contraexemplo: {(−1)n }); e ser monotônica, em geral, também não implica ser
convergente (contraexemplo: {n}). Além disso, dessas duas condições, limitação e
monotonicidade, apenas a limitação é uma condição necessária para a convergência.
A monotonicidade não é uma condição necessária. Por exemplo, a sequência
{(−1)n /n}∞
n=1 não é monotônica, mas converge para zero, pois, como vimos no
Exemplo 1.5.2, {1/n}∞ n=1 converge para zero; daı́, basta aplicar o Lema 1.5.8.

Proposição 1.5.12 (Teste da Comparação para Sequências). Sejam {an } e


{bn } sequências de números reais tais que an ≤ bn para todo n suficientemente
grande.
(a) Se {an } é crescente e {bn } converge, então {an } converge.
(b) Se limn→∞ an = +∞, então limn→∞ bn = +∞.
(c) Se {bn } é decrescente e {an } converge, então {bn } converge.
(d) Se limn→∞ bn = −∞, então limn→∞ an = −∞.
Demonstração. Demonstraremos apenas os itens (a) e (b). O item (c) é
análogo ao item (a) e o item (d) é análogo ao item (b).
1.5. LIMITES DE SEQUÊNCIAS 31

(a) Como {bn } converge, temos que {bn } é limitada (Proposição 1.5.2). Em par-
ticular, {bn } é superiormente limitada. Então existe um M > 0 tal que
an ≤ bn < M , para todo n suficientemente grande. Logo, {an } é superior-
mente limitada. Daı́, como {an } é crescente, segue que {an } converge (Pro-
posição 1.5.11).
(b) Pela definição de limite infinito, temos que, para todo ε > 0, existe N ∈ N tal
que, para todo n ∈ N, vale a implicação
n > N ⇒ bn ≥ an > ε.
(Lembre que a desigualdade an ≤ bn vale para todo n suficientemente grande; e
podemos supor, sem perda de generalidade, que todo n > N é suficientemente
grande; se não for, basta tomar um N maior.) Logo, limn→∞ bn = +∞.

Exemplo 1.5.26. Calcule o limite de {an } dada por an = n!/2n .
Solução. Como vimos no Exemplo 1.3.5, para n suficientemente grande,
n! n (n − 1) · (n − 2) · . . . · 4 · 3 2 · 1 n
= · · > .
2n 2 | 2 · 2 · .{z
.. · 2 · 2 } 2 · 2 4
>1

Daı́, como {n/4} diverge para +∞, conclui-se, pela Proposição 1.5.12(b), que
limn→∞ an = +∞. 
Exemplo 1.5.27 (Progressões Geométricas). Dado um r ∈ R, considere a
sequência {rn }∞
n=0 . Temos:
(
n 1 se n = 0
• Se r = 0, então r = . Nesse caso, {rn } é uma
0 caso contrário.
sequência decrescente, eventualmente constante, que converge para zero.
• Se 0 < r < 1, então {rn }∞n=0 é decrescente e inferiormente limitada; logo,
converge para inf{rn | n ∈ N} = 0.
• Se −1 < r < 0, então {rn } converge para zero, pelo Lema 1.5.8 e pelo
item anterior.
• Se r = 1, então {rn }∞n=0 é constante e converge para 1.
• Se r = −1, então {rn }∞ n=0 não converge, como já foi visto no Exem-
plo 1.5.3. E também não possui limite infinito, como já foi visto no
Exemplo 1.5.8.
• Se |r| > 1, então {rn }∞
n=0 é ilimitada (para todo M > 0, se n > log|r| M ,
então |rn | > M ) e, portanto, diverge. Sendo que se r > 1, ela diverge
para +∞.
Resumindo, {rn } converge se e somente se r ∈ (−1, 1].
Exemplo 1.5.28. Calcule limn→∞ (1 − (1/5)n ), se existir.
Solução. Como 0 < 1/5 < 1,
  n   n
1 1
lim 1 − = 1 − lim = 1 − 0 = 1.
n→∞ 5 n→∞ 5


Exemplo 1.5.29. Calcule limn→∞ 3n+2 /5n , se existir.
32 1. SEQUÊNCIAS NUMÉRICAS

Solução. Como 0 < 3/5 < 1,


 n  n
3n+2 2 3 3
lim = lim 3 = 9 lim = 9 · 0 = 0.
n→∞ 5n n→∞ 5 n→∞ 5


Exemplo 1.5.30. Calcule
 
lim e−n + arctan[−(4/π)n/2 ] ,
n→∞
se existir.
Solução.
 
lim e−n + arctan[−(4/π)n/2 ] = lim e−n + lim arctan[−(4/π)n/2 ]
n→∞ n→∞ n→∞
h p n i
−1 n
= lim (e ) + lim arctan − 4/π
n→∞ n→∞
p
e−1 )n + arctan[− lim ( 4/π )n ]
= lim ( |{z}
n→∞ n→∞ | {z }
∈(0,1) >1
= 0 + arctan [−(+∞)] = 0 + arctan(−∞)
π
=− .
2

Exercı́cio 1.5.1. Determine se a sequência {an } converge ou diverge. Calcule
o limite, se existir.
(a) an = (n3 − n)/(2n3 + 5n2 ).
(b) an = e1/n .
(c) an = p tan (2nπ/(1 + 8n)).
(d) an = (n + 1)/(9n + 1).
(e) an = e2n/(n+2) .
(f) an = (ln n)/(ln 2n).
(g) an = (en + e−n )/(e2n − 1).
(h) an = ln(2n√2 + 1) √
− ln(n2 + 1).
(i) an = n − n + 1 n +√3.
(j) an = (−1)n+2 n/(n + n).
(k) an = cos(n/2).
(l) an = (2n − 1)!/(2n + 1)!.
(m) a1 = 2 e an+1 = (an + 6)/2.
(n) a1 = 2 e an+1 = 1/(3 − an ).
CAPı́TULO 2

Séries Numéricas

2.1. Séries
Muitas sequências importantes são definidas por meio de somas de termos de
uma outra sequência.
Exemplo 2.1.1 (SomaPn de Progressão Geométrica). No Exemplo 1.5.21, es-
tudamos a sequência { k=0 (−1)k }∞ n=0 . Mais geralmente, dado qualquer r ∈ R,
poderı́amos pensar na sequência {sn }∞
n=0 dada por
n
X
sn = rk .
k=0

Temos, assim, uma sequência {sn } definida por meio de somas de termos de uma
outra sequência, {rk }. Esta última já foi estudada no Exemplo 1.5.27. Para avaliar
a convergência/divergência de {sn }, convém encontrar uma fórmula fechada para
seu termo geral. Isto pode ser feito de dois jeitos, pelo menos. O primeiro consiste
em observar que
n
X n
X n
X n
X n
X n+1
X
(1 − r)sn = sn − rsn = rk − r rk = rk − rk+1 = rk − rk
k=0 k=0 k=0 k=0 k=0 k=1
2 n−1 n
= 1 + r + r + · · · + 
r 
 +
r − r − r2 · · · − 
rn−1
 n
 − r
 −r
n+1

= 1 − rn+1
(
(1 − rn+1 )/(1 − r) se r 6= 1,
∴ sn = (2.1)
n+1 se r = 1.
O segundo modo de chegar a esta fórmula é verificar que, na divisão do polinômio
1 − xn+1 pelo polinômio 1 − x, o resto é zero e o quociente é 1 + x + · · · + xn . A
partir de (2.1), temos as seguintes possibilidades:
• r ∈ (−1, 1). Neste caso, a sequência {rn+1 } converge para zero (Exem-
plo 1.5.27) e então
1 − rn+1 1−0 1
lim sn = lim = = .
n→∞ n→∞ 1−r 1−r 1−r
• r = 1. Neste caso, {sn } = {n + 1} diverge para +∞.
• r = −1. Aqui, como vimos no Exemplo 1.5.21, e como pode ser confirmado
novamente por (2.1), sn oscila entre 0 e 1, de modo que {sn } não converge.
• |r| > 1. Neste caso, a sequência {rn+1 } é ilimitada (Exemplo 1.5.27) e
então {sn } = {(1 − rn+1 )/(1 − r)} também é ilimitada; logo, diverge. No
subcaso r > 1, {rn+1 } e, consequentemente, {sn } divergem para +∞.
33
34 2. SÉRIES NUMÉRICAS

1/4

1/2 1

1/16

1/8
1/64
1/32

Figura 2.1. Um quadrado de lado 1 particionado em retângulos


de áreas 1/2, 1/4, 1/8, 1/16,Pn etc. A soma dessas áreas, nesta
ordem, de 1/2 até 1/2n , é k=1 (1/2)k = an − 1. Então o limite
de anP − 1 é a área total do quadrado, que é 1. Logo, o limite de
n
an = k=0 (1/2)k é 1 + 1 = 2.

Uma interpretação geométrica do Exemplo 2.1.1 para o caso r = 1/2 é mostrada


na Figura 2.1. Pn
Perceba que, no Exemplo 2.1.1, estudamos a sequência { k=0 rk } com base
em informações
Pn sobre a sequência {rk }. Além disso, a partir da verificação de que
k
o limite de k=0 r quando n → ∞ existe e é finito (igual a 1/(1 − r)), torna-se
conveniente escrever

X 1
rk = ,
n=0
1 − r
ou
1
1 + r + r2 + · · · = .
1−r
O primeiro membro em cada uma destas duas igualdades é o que chamamos de
série. Mas uma série não é simplesmente uma soma infinita. Se fosse assim, não
haveria diferença entre estudar séries e estudar sequências, porque toda sequência
pode ser vista como uma soma infinita e vice-versa. Na verdade, uma série é uma
soma infinita que é estudada com base na sequência de suas parcelas.
Definição 2.1.1.
(a) Uma série de números reais é uma expressão formal do tipo

X
ak , (2.2)
k=q

em que q indica um número natural e {ak }∞ k=q é uma sequência de números


reais. P∞
(b) A sequência das somas parciais da série k=q ak é a sequência
 ∞
X n 
ak .
 
k=q
n=q
2.1. SÉRIES 35

P∞
(c) Dizemos que o limite da série k=q ak é L ∈ R, e escrevemos


X
ak = L,
k=q

se L é o limite da sua sequência de somas parciais. O limite de uma série


também é chamado soma da série.
(d) Quando uma série possui limite finito L,
P∞dizemos que ela converge (para L);
caso contrário, ela diverge. Nos casos k=q ak = ±∞, dizemos que a série
diverge para ±∞.

A definição acima pode ser estendida para séries de elementos de um conjunto


qualquer. Mas neste capı́tulo, só consideraremos séries de números reais. Então,
frequentemente diremos apenas “série” querendo dizer “série de números reais”. A
expressão “série numérica” também é usada para designar este tipo de série. Mas
dependendo do contexto, pode incluir também séries de números complexos (o que
não ocorrerá neste material). P∞ P
Frequentemente, abreviamos k=q ak por a . A expressão ak (com k não
P∞ k
especificado) é chamada termo geral da série k=q ak . Diremos que a variável k é
P∞
o ı́ndice de k=q ak e o número q é o valor inicial desse ı́ndice, ou ı́ndice inicial
da série. Para cada número natural k no domı́nio de {ak }∞ k=q , o número real ak é
P∞
chamado o termo de ı́ndice k da série k=q ak .
P
Quando o ı́ndice inicial de uma série ak não for dado explicitamente, consi-
deraremos que ele é o menor natural q que torne a expressão ak bem definida para
todo k ∈ N comPk ≥ q.

Uma série k=q ak também costuma ser representada por expressões exibindo
explicitametente alguns dos seus primeiros termos:

X
ak = aq + aq+1 + aq+2 + aq+3 , . . . .
k=q

Ao usar essa notação mais relaxada, devemos nos certificar que o termo geral da
série pode ser determinado pelo contexto.

Exemplo 2.1.2 (Série Geométrica). Fixado um r ∈ R, a série



X
rk (2.3)
k=0

é chamada série geométrica de razão r. A sequência {sn } que estudamos no Exem-


plo 2.1.1 é a sequência das somas parciais de (2.3). Então, pelo que vimos naquele
exemplo, a série geométria de razão r converge se e somente se r ∈ (−1, 1). E
quando converge, converge para 1/(1 − r). Além disso, para r ≥ 1, a série (2.3)
diverge para +∞.

Uma série como aquela em (2.3), mas com um ı́ndice inicial diferente, também
costuma ser chamada série geométrica. Entretanto, observe que o valor da soma
36 2. SÉRIES NUMÉRICAS

da série depende do ı́ndice inicial. Por exemplo,


∞ ∞
X X 1 −1(1 − r) + 1 r
rk = −1 + rk = −1 + = = ,
1−r 1−r 1−r
k=1 k=0
∞ ∞
X X 1 −(1 + r)(1 − r) + 1 r2
rk = −1 − r + rk = −1 − r + = = ,
1−r 1−r 1−r
k=2 k=0

desde que r ∈ (−1, 1). Em geral, dado qualquer q ∈ N, temos



X rq
rk = , (2.4)
1−r
k=q

para todo r ∈ (−1, 1).


Exemplo 2.1.3. Encontre o termo geral e calcule o limite da sequência
( r q )
√ √ √
q

{an }n=1 = 3, 3 3, 3 3 3, . . . .

Solução. O limite desta sequência pode ser calculado pelo método utilizado
nos Exemplos 1.5.23 e 1.5.24, observando que uma fórmula recursiva para esta
sequência é

a1 = 3,

∀n ∈ N, an+1 = 3an .
Mas aqui, vamos aplicar a fórmula da soma da série geométrica. Observe que, de
acordo com o padrão indicado no enunciado,

a1 = 3 = 31/2 ,

q
a2 = 3 3 = (3 · 31/2 )1/2 = 31/2 · (31/2 )1/2 = 31/2 · 31/4 = 31/2+1/4 ,
r q

a3 = 3 3 3 = (3 · 31/2+1/4 )1/2 = 31/2 · (31/2+1/4 )1/2 = 31/2+1/4+1/8 ,
..
.
Pn k
an = 3 k=1 (1/2) .
Daı́, como
n  k ∞  k
X 1 X 1 1/2
lim = = = 1,
n→∞ 2 2 1 − 1/2
k=1 k=1
segue que
P∞ k
lim an = 3 k=1 (1/2) = 31 = 3.
n→∞


Exemplo 2.1.4 (Série de Termos Constantes). Se {an } é uma sequência


P cons-
tante de números reais, digamos an = c para todo n, então a série Pan converge
se e somente se c = 0. P
E quando converge, converge para 0. Se c < 0, an diverge
para −∞; e se c > 0, an diverge para +∞.
2.1. SÉRIES 37

Exemplo 2.1.5 (Série Telescópica). Uma série numérica é dita telescópica se


é da forma
X∞
(bk − bk+1 ),
k=q

para alguma {bk }∞


∈ Seq(R). Podemos calcular a soma de uma série telescópica
k=q
notando o seguinte padrão:

X n
X
(bk − bk+1 ) = lim (bk − bk+1 )
n→∞
k=q k=q
 
= lim (bq − 
bq+1
) + (  −
bq+1 bq+2
) + . . + (bn − bn+1 )
.
n→∞
= bq − lim bn+1 = bq − lim bn .
n→∞ n→∞

A justificativa para a última igualdade acima é que {bn+1 } é uma subsequência de


{bn }.
Exemplo 2.1.6. Calcule a soma da série
∞  
X 1 1
cos n − cos(n + 1) .
n=1
n n+1

Solução. Esta é, claramente, uma série telescópica, com n-ésimo termo an =
bn − bn+1 , onde bn = n1 cos n. Então
∞  
X 1 1 1
cos n − cos(n + 1) = b1 − lim cos n.
n=1
n n + 1 n→∞ n

Este último limite é zero, pois limn→∞ 1/n = 0 e a sequência {cos n}∞
n=1 é limitada.
Além disso, b1 = cos 1. Logo,
∞  
X 1 1
cos n − cos(n + 1) = cos 1.
n=1
n n+1


P+∞
Exemplo 2.1.7. Calcule a soma da série k=0 1/[(4k + 1)(4k + 5)].
Solução.
+∞ +∞
X (4k + 5)/4 − (4k + 1)/4
X 1
=
(4k + 1)(4k + 5) (4k + 1)(4k + 5)
k=0 k=0
+∞  
X 1 1
= −
4(4k + 1) 4(4k + 5)
k=0
+∞
X
= (bk − bk+1 ),
k=0

onde
1
bk = .
4(4k + 1)
38 2. SÉRIES NUMÉRICAS

Portanto, trata-se de uma série telescópica. Aplicando a fórmula:


+∞
X 1
= b0 − lim bk
(4k + 1)(4k + 5) k→+∞
k=0
1 1 1 1
= − lim = −0= .
4 · 0 + 1 k→+∞ 4(4k + 1) 4 4

Exemplo 2.1.8. Calcule a soma da série

X 1
.
n=1
n(n + 1)
Solução. Note que
1 n+1−n n+
 1 n 1 1
= = − = − .

n(n + 1) n(n + 1) n(n
+ 1) 
 n(n + 1) n n+1
Então

X 1 1 1
= − lim = 1.
n=1
n(n + 1) 1 n→∞ n


Podemos calcular a soma de alguns outros tipos de séries, não exatamente
telescópicas, usando a mesma ideia de cancelamento de termos intermediários, nas
somas parciais.
Exemplo 2.1.9. Calcule a soma da série

X 2
2−1
.
n=2
n

Solução. Seja an = 2/(n2 − 1). Note que


n + 1 − (n − 1) n+
  1 n−
  1
an = = −
(n + 1)(n − 1) (n
 +1)(n
 − 1) (n + 1) (n
 −
1)

1 1
= − = bn−1 − bn+1 ,
n−1 n+1
onde bn = 1/n. Assim, para todo m ∈ {2, 3, . . . }.
Xm m
X
an = (bn−1 − bn+1 )
n=2 n=2
= (b1 − b3 ) + (b2 − b4 ) + (b3 − b5 ) + 
.
..
 − bm−1  − bm ) + (bm−1
+ (bm−3  ) + ( bm−2  − bm+1 )
   
= b1 + b2 − bm − bm+1 .
No limite com m → ∞, encontramos:

X 2
2−1
= lim [b1 + b2 − bm − bm+1 ]
n=2
n m→∞

1 3
=1+ − lim bm − lim bm+1 = .
2 m→∞
| {z } | {z } 2
m→∞

=0 =0
2.1. SÉRIES 39


P
Proposição 2.1.1 (Teste da Divergência). Se uma série numérica an con-
verge, então a sequência dos seus termos, {an }, converge para zero. Em outras
palavras, se a sequência dos termos de uma série não converge para zero, então a
série diverge.
P
Demonstraç
P ão. Se an converge para L e {sn } é a sequência de somas
parciais de an , então, para um natural n suficientemente grande, temos an =
sn − sn−1 , de modo que
lim an = lim (sn − sn−1 ) = lim sn − lim sn−1 = L − L = 0.
n→∞ n→∞ n→∞ n→∞


3n2 +n−5
P∞
Exemplo 2.1.10. A série n=2 (n−1)(n+1) não converge, pois

3n2 + n − 5
lim = 3 6= 0.
n→∞ (n − 1)(n + 1)

Exemplo P∞2.1.11. Pelo que dissemos nos Exemplos 1.5.21, 2.1.1 e 2.1.2, é claro
que a série n=0 (−1)n não converge. Outra maneira de justificar isto consiste em
aplicar a Proposição 2.1.1 e notar que a sequência {(−1)n } não converge.
Exemplo 2.1.12 (Série Harmônica). A recı́proca da Proposição 2.1.1 é falsa.
Como contraexemplo, podemos citar a chamada série harmônica,

X 1
.
k
k=1

O termo geral desta série, 1/k, converge para zero, mas a série diverge, como
verificaremos agora. Observe que
1
X 1
= 1,
k
k=1
3
X 1 1 1 1
=1+ + ≥1+2· ,
k 2 3 4
k=1 | {z }
≥1/4+1/4
7
X 1 1 1 1 1 1 1 1 1
=1+ + + + + + ≥1+2· +4· ,
k |2 {z 3} |4 5 {z 6 7} 4 8
k=1
≥1/4+1/4 ≥1/8+1/8+1/8+1/8
..
.
j
2X −1
1 1 1 1 j−1
≥ 1 + 2 · + 4 · + · · · + 2j−1 · j = 1 + .
k 4 8 2 2
k=1

Daı́, como limj→∞ [1 + (j − 1)/2] = +∞, segue, pela Proposição 1.5.12, que
j
2X −1
1
lim = +∞.
j→∞ k
k=1
40 2. SÉRIES NUMÉRICAS

nP j o∞
2 −1
Assim, k=1 1/k é uma subsequência divergente da sequência das somas
j=0
parciais da série
P∞harmônica. Consequentemente, pela Proposição 1.5.10 e pela De-
finição 2.1.1, k=1 1/k diverge.

2.2. Teste da Integral


Proposição 2.2.1 (Teste da Integral). Sejam b ∈ R, f uma função real
contı́nua, positiva e decrescente em [b, +∞), e {an } ∈
PSeq(R) tal que an = f (n)
para todo natural n suficientemente grande. A série an converge se e somente
R +∞
se a integral imprópria b f (x) dx converge.

Note que a Proposição 2.2.1 não diz que a integral imprópria e a série analisada
por meio dessa integral devem convergir para o mesmo número, caso convirjam.
Além disso, não se deve desprezar as condições preliminares à aplicação desse teste:
a função f deve ser contı́nua, positiva e decrescente no intervalo de integração
para que se possa estabelecer alguma relação entre a integral e a série. A partir
daı́, caso essas condições sejam satisfeitas, podemos dizer que a convergência da
integral implica a convergência da série (mas não necessariamente para o mesmo
valor) e vice-versa.
P∞
Exemplo 2.2.1. Teste a série n=1 1/n2 quanto à convergência ou divergência.

Solução. A sequência {an }∞ 2


n=1 dada por an = 1/n é a restrição a N da

2 0
função f (x) = 1/x , que é contı́nua, positiva e decrescente em (0, +∞) (pois f (x) =
−2/x3 < 0 para todo x > 0). Então podemos usar o teste da integral. Porém, o
teste da integral exige que a função f seja integrada num intervalo semiaberto
ilimitado à direita (ou seja, da forma [b, +∞)), onde f seja contı́nua, positiva e
decrescente. Não podemos usar o intervalo (0, +∞), porque este é aberto, mas
podemos usar o intervalo [1, +∞), que está contido em (0, +∞) e, portanto, f
ainda é contı́nua, positiva e decrescente aı́. Integrando f em [1, +∞), temos:
Z +∞ Z a  a  
1 1 1 1
dx = lim dx = lim − = lim − + 1 = 1.
1 x2 a→+∞ 1 x2 a→+∞ x 1 a→+∞ a
R +∞
Como a integral imprópria 1 1/x2 dx converge, segue, pelo teste da integral, que
P∞
a série n=1 1/n2 converge. 
P∞ 3
Exemplo 2.2.2. Teste a série n=1 n2 e−n com respeito a convergência ou
divergência.
P∞ 3
Solução. A série n=1 n2 e−n possui termos da forma an = f (n), onde f :
3
R → R, dada por f (x) = x2 e−x , é uma função contı́nua, positiva para x 6= 0.
Observe que
3 3
∀x ∈ R, f 0 (x) < 0 ⇔ 2x · e−x + x2 · (−3x2 )e−x < 0
3 3
−x −x
< 3x3 · 
 
⇔ 2 ·
xe xe
p
⇔ x > 3 2/3.
2.2. TESTE DA INTEGRAL 41

p
Então f é decrescente no intervalo ( 3 2/3, +∞) e, consequentemente, também no
intervalo [1, +∞). Assim, podemos usar o critério da integral.
Z +∞ Z t
3 3
x2 e−x dx = lim x2 e−x dx
1 t→+∞ 1
1 t −x3
 Z 
= lim − e (−3x2 )dx
t→+∞ 3 1
Z −t3
1 1 −t3
= − lim eu du = − lim [eu ]−1
3 t→+∞ −1 3 t→+∞
1  3  1
= − lim e−t − e−1 = .
3 t→+∞ 3e
R +∞ 3 P∞ 3
Como a integral 1 x2 e−x dx converge, a série n=1 n2 e−n converge. 
P∞
Exemplo 2.2.3. Estude a série k=0 k/(1 + k 4 ) com relação a convergência
ou divergência.
Demonstração. A função f : R → R dada por f (x) = x/(1 + x4 ) estende a
sequência {k/(1 + k 4 )}∞
k=0 , é derivável (logo, contı́nua) em R e positiva para todo
x 6= 0. Vamos estudar seu crescimento/decrescimento. Derivando:
1 · (1 + x4 ) − x · 4x3 1 − 3x4
f 0 (x) = = .
(1 + x4 )2 1 + x4
Estudando o sinal da derivada:
1 − 3x4
∀x ∈ R, f 0 (x) < 0 ⇔ <0
1 + x4
⇔ 1 − 3x4 < 0 (pois 1 + x4 > 0)
r r
4 1 4 1
⇔ x<− ou x > .
3 3
p
Assim, f 0 (x) < 0 para todo x > 4 1/3 (inclusive para todo x ≥ 1). Consequente-
mente, f é positiva, contı́nua e decrescente em [1, +∞). Podemos então aplicar o
critério da integral.
Z +∞ Z +∞ Z t
x x
f (x) dx = 4
dx = lim dx
1 1 1 + x t→+∞ 1 1 + x4
Z t Z t2
1 1 1 1
= lim · · 2xdx = lim du
t→+∞ 1 2 1 + (x2 )2 | {z } 2 t→+∞ 1 1 + u2
| {z } du
1/(1+u2 )
1 t2 1  π
= lim [arctan u]1 = lim arctan t2 −
2 t→+∞ 2 t→+∞ 4
1 π π π
= − = .
2 2 4 8
A integral imprópria converge. Logo, pelo critério da integral, a série converge. 
Exemplo 2.2.4 (p-Séries). Uma p-série é uma série numérica da forma

X 1
,
n=1
np
42 2. SÉRIES NUMÉRICAS

com p > 0 fixado. Observe que, dado p > 0, a função y = 1/xp é contı́nua, positiva
R +∞
e decrescente em [1, +∞). Calculando a integral 1 1/xp dx, temos:
• Se p = 1:
Z +∞ Z +∞ Z a
1 1 1 a
p
dx = dx = lim dx = lim [ln x]1
1 x 1 x a→+∞ 1 x a→+∞
0
 
= lim ln a − 
ln 1
*
 = +∞.
a→+∞

• Se p 6= 1:
Z +∞ a  a
−1
Z
1 1
dx = lim dx = lim
1 xp a→+∞ 1 x
p a→+∞ (p − 1)xp−1
1
 
−1 1
= lim +
a→+∞ (p − 1)ap−1 p−1
(
1/(p − 1) se p > 1,
=
+∞ se 0 < p < 1.
P∞
Portanto, a série 1/np converge se p > 1 e diverge para +∞ se 0 < p ≤ 1.
n=1
P∞
Exemplo 2.2.5. A série k=1 1/(k + 1)3/2 converge, pois
∞ ∞ ∞
X 1 X 1 X 1
3/2
= 3/2
= −1 + 3/2
k=1
(k + 1) n=2
n n=1
n
P∞
e n=1 1/n3/2 é uma p-série com p = 3/2 > 1; logo, converge.

2.3. Teste da Comparação e Teste do Limite


Nesta seção, apresentaremos dois critérios de convergência para séries com ter-
mos positivos. Ambos os testes comparam os termos de uma série com os de outra
série, mas essa comparação pode ser feita diretamente (estabelecendo uma desi-
gualdade entre eles) ou indiretamente (via limite do quociente).
Proposição 2.3.1 (Teste da Comparação). Sejam {an }, {bn } ∈ Seq P(R) com
0 < an ≤ bn P para todo n suficientemente grande.PNestas condições, se
P bn con-
verge, então an converge; equivalentemente, se an diverge, então bn diverge
(para +∞).
Exemplo 2.3.1. Vamos analisar a mesma série do Exemplo 2.2.3,

X k
,
1 + k4
k=0

desta vez usando o teste da comparação. Sejam ak = k/(1 + k 4 ) e bk = 1/k 3 . (A


escolha de bk foi baseada na observação de que a parcela 1 no denominador de ak
influi muito pouco no valor de ak , de modo que ak se aproxima de k/k 4 = 1/k 3
para k grande.) Para todo inteiro positivo k, é claro que
1 1 k k 1
k4 + 1 > k4 > 0 ∴ 0 < 4 < 4 ∴ ak = 4 < 4 = 3 = bk .
k +1 k k +1 k k
Ou seja, para k suficientemente
P∞ grande (basta ser maior que zero), ak < bk . Por
outro lado, a série k=1 1/k 3 converge, pois é uma P p-série com p = 3 > 1. Então,

pelo critério da comparação, concluı́mos que a série k=0 k/(1 + k 4 ) converge.
2.3. TESTE DA COMPARAÇÃO E TESTE DO LIMITE 43

P∞ √
Exemplo 2.3.2. Teste a série n=1 (n − 1)/(n2 n) quanto à convergência ou
divergência.
2
√ P
Solução. Se an = (n − 1)/(n n), então a série an converge. De fato,
pondo bn = 1/n3/2 , temos que
P
bn converge (pois é uma p-série com p = 3/2 > 1)
e, para todo n ∈ N∗ ,
n−1 n 1
an = 2 √ < 2 √ = 3/2 = bn .
n n n n n
P
Daı́, pelo teste da comparação, segue que an converge. 
P∞ 3
Exemplo 2.3.3. Teste a série k=1 (k ln k)/(k + 1) quanto à convergência ou
divergência.
P∞
Solução. A série k=1 1/(k +1)3/2 é convergente, como já foi visto no Exem-
1/(k + 1)3/2 quanto P (k ln k)/(k + 1)3 possuem
P P
plo 2.2.5. Além disso, tanto
apenas termos positivos. Assim, para mostrar que (k ln k)/(k + 1)3 converge,
basta provar que
k ln k 1
≤ ,
(k + 1)3 (k + 1)3/2
ou equivalentemente,
k ln k − (k + 1)3/2 ≤ 0,
para todo inteiro positivo k suficientemente grande. Para provar esta desigualdade,
consideraremos a função f : R∗+ → R dada por
f (x) = x ln x − (x + 1)3/2 .
Usaremos o seguinte critério para estudar o sinal de f :
(I) Se f : A ⊆ R → R e a ∈ A são tais que f (a) < 0, f é contı́nua em [a, +∞),
diferenciável em (a, +∞), e f 0 (x) ≤ 0 para todo x ∈ (a, +∞), então f (x) < 0
para todo x ∈ [a, +∞).
É claro que isto pode ser reformulado para estudar também o sinal de f 0 , da seguinte
maneira:
(II) Se f : A ⊆ R → R e a ∈ A são tais que f 0 (a) < 0, f 0 é contı́nua em
[a, +∞), diferenciável em (a, +∞), e f 00 (x) ≤ 0 para todo x ∈ (a, +∞),
então f 0 (x) < 0 para todo x ∈ [a, +∞).
Derivando f duas vezes, encontramos

3 x+1
f 0 (x) = ln x + 1 −
2
e
1 3
f 00 (x) = − √ .
x 4 x+1
Estudando o sinal da segunda derivada:
1 3
f 00 (x) < 0 ⇔ − √ <0
x 4 x+1
(
16(x + 1) < 9x2

x+1>0
(
9x2 − 16x − 16 > 0

x > −1.
44 2. SÉRIES NUMÉRICAS


A única raiz de 9x2 − 16x − 16 = 0 que é maior que −1 é x1 = 4(2 + 13)/9; este
número é um pouco menor que 2,5. Como o gráfico da função y = 9x2 − 16x − 16
tem a concavidade para cima e x1 é sua maior raiz, temos que 9x2 − 16x − 16 > 0
para todo x > x1 ; logo, 9x2 − 16x − 16 > 0 para todo x ≥ 3. Assim,
f 00 (x) < 0 para todo x ≥ 3.
Além disso, √ 
0 33+1
f (3) = ln 3 + 1 − ln 3 +1 − 3 < 0.
= |{z}
2 ∼ =1
0
Daı́, por (II), temos que f (x) < 0 para todo x ∈ [3, +∞). Isto, junto com o fato
que
f (3) = 3 ln 3 − (3 + 1)3/2 = 3 |{z}
ln 3 −8 < 0,

=1
nos diz, por (I), que f (x) < 0 para todo x ≥ 3. Provamos assim que
x ln x − (x + 1)3/2 ≤ 0
para todo x ∈ [3, +∞) e, em particular, para todo x = k, inteiro maior Pque ou igual
∞ 1
a 3. Isto estabelece a desigualdade desejada entre os termos das séries k=1 (k+1) 3/2
P∞ k ln k
e k=1 (k+1)3 . Portanto, esta última converge. 

Proposição 2.3.2 (Teste do Limite). Sejam {an }, {bn } ∈ Seq (R) tais que
an > 0 e bn > 0 para todo n suficientemente grande. Suponha que exista
an
L = lim ,
n→∞ bn

finito ou infinito.
P P
(a) Se 0 < L < +∞, então an convergePse e somente se bn converge.P
(b) Se L = +∞, então a convergência deP an implica a convergência deP bn (e,
consequentemente, a divergência de P bn implica a divergência de P an ).
(c) Se L = 0, então a convergência de P bn implica a convergência deP an (e,
consequentemente, a divergência de an implica a divergência de bn ).
E estas são as únicas possibilidades.
P∞
Exemplo 2.3.4. Estude a série n=0 (n + 4n )/(n + 6n ) com respeito a con-
vergência ou divergência.
Solução. Se an = (n + 4n )/(n + 6n ) e bn = (2/3)n , então
an n + 4n 3n n/4n + 1
lim = lim · = lim = 1 > 0.
n→∞ bn n→∞ n + 6n 2n n→∞ n/6n + 1
P P
Então,
P pelo teste do limite, an converge se e somente se bn converge. P
Mas
bn converge, pois é uma série geométrica com razão 2/3 ∈ (−1, 1). Logo, an
converge. 

Exemplo 2.3.5. Vamos analisar a mesma série dos Exemplos 2.2.3 e 2.3.1,

X k
,
1 + k4
k=0
2.4. TESTE DA SÉRIE ALTERNADA 45

agora usando o teste do limite. Sejam ak = k/(1 + k 4 ) e bk = 1/k 3 , como no


Exemplo 2.3.1. Observe que ak e bk são positivos, para todo inteiro k > 0. Além
disso,
ak k k3 k4
lim = lim 4
· = lim
k→+∞ bk k→+∞ 1 + k 1 k→+∞ 1 + k 4
1 1
= lim = = 1 > 0.
k→+∞ 1/k 4 + 1 0+1
Como a sequência {ak /bk }∞k=1 convergeP paraPum número positivo, o critério do
limite nos diz
P que ou ambas as séries ak e bk convergem, ou ambas divergem.
P
Mas como bk converge, pois é uma p-série com p = 3 > 1, resulta que ak
converge.
Exemplo 2.3.6. Vamos analisar a mesma série do Exemplo 2.3.3,

X k ln k
,
(k + 1)3
k=1

agora usando o teste do limite. Tomando, ak = (k ln k)/(k +1)3 e bk = 1/(k +1)3/2 ,


temos:
ak k ln k k ln k ln k
lim = lim = lim ·√ = lim √
k→∞ bk k→∞ (k + 1)3/2 k→∞ k + 1 k + 1 k→∞ k+1
| {z }
→1


r
1/k k+1 k+1
= lim = 2 lim = 2 lim = 2 0 = 0.
k→∞ (k + 1)−1/2 /2 k→∞ k k=∞ k 2
P P
Daı́, como bk converge, pelo teste do limite (caso L = 0), segue que ak con-
verge.

2.4. Teste da Série Alternada


Definição 2.4.1.
P∞
(a) Uma série numérica n=p an é dita alternada se seus termos são, alternada-
mente, negativos e não negativos; ou seja, se existe uma sequência {bn }, de
termos não negativos, tais que an = (−1)n bn , ou an = (−1)n+1 bn , para todo
natural n ≥ p. P∞
(b) Diremos que uma série numérica n=p an é eventualmente alternada se existe
P∞
q ∈ N, com q ≥ p, tal que n=q an é uma série alternada.
Proposição 2.4.1 (Teste da Série Alternada / Critério de Leibniz). Se {bn } ∈
Seq (R) é eventualmente decrescente, com bn ≥ 0 para n suficientemente grande, e
limn→∞ bn = 0, então a série (−1)n bn converge.
P

Exemplo 2.4.1. Teste a série


∞ √
X (−1)j j
j=1
j+5
quanto à convergência ou divergência.
P∞ √ P∞
Solução. A série j=1 (−1)j j/(j + 5) é alternada, da forma j=1 (−1)j bj ,

com bj = j/(j + 5) > 0 para todo natural j ≥ 1. Então, para que ela convirja,
basta que a sequência {bj }
46 2. SÉRIES NUMÉRICAS

(i) seja eventualmente decrescente, isto é: bj+1 ≥ bj para todo inteiro positivo j
suficientemente grande;
(ii) possua limite igual a zero.
A fim de provar (i), recorreremos à função f : (0, +∞) → R dada por

x
f (x) = .
x+5
Note que f é derivável em todo seu domı́nio, (0, +∞). Para todo x neste intervalo,
1 √

2 x
(x + 5) − x · 1
0
f (x) < 0 ⇔ <0
(x + 5)2
1 √
⇔ √ (x + 5) − x < 0 (pois (x + 5)2 > 0)
2 x
⇔ x + 5 < 2x
⇔ x > 5.
Então f é estritamente decrescente no intervalo (5, +∞). Daı́, como bj = f (j),
segue que {bj } é (estritamente) decrescente a partir de j = 6. Isto prova a condição
(i). Provaremos
√ agora a condição (ii). Dividindo o numerador e o denominador
de bj por j e aplicando a regra do limite de função aplicada numa sequência
(Proposição 1.5.5(c)), temos:

j 1 1
lim bj = lim = lim √ 5 = k→∞
lim = 0.
j→∞ j→∞ j + 5 j→∞ j+ j√ k
P∞ √
Isto conclui a prova de que a série j=1 (−1)j j/(j + 5) converge. 

Exemplo 2.4.2. Estude a série



X (−1)n
n=2
ln n

com respeito a convergência ou divergência.


Solução. Esta é uma série alternada. A sequência {1/ ln n} é positiva, con-
verge para zero (pois limn→+∞ ln n = +∞) e é estritamente decrescente (pois
{ln n} é positiva e estritamente crescente). Então, pelo critério da série alternada,
(−1)n / ln n converge.
P


2.5. Convergência Absoluta, Teste da Razão e Teste da Raiz


P
Definiç
P ão 2.5.1. Dizemos que uma série an converge absolutamente se a
série |an | converge. Uma série convergente que não converge absolutamente é
dita condicionalmente convergente.
Exemplo 2.5.1. A série (−1)n /n2 converge absolutamente, pois
P

X (−1)n X 1

n2 =

n2
é uma p-série com p = 2 > 1 e, portanto, converge.
2.5. CONVERGÊNCIA ABSOLUTA, TESTE DA RAZÃO E TESTE DA RAIZ 47

Exemplo 2.5.2. Nem P toda série convergente converge absolutamente. Por


exemplo, a série alternada (−1)n /n converge, pois a sequência {bn } dada por
bn = 1/n é decrescente, de termos positivos, e lim
P n→∞ nbn = 0.PEntretanto, a
convergência de (−1)n /n não é absoluta,
P
pois |(−1) /n| = 1/n é a série
harmônica, que diverge. Portanto, (−1)n /n é uma série condicionalmente con-
P
vergente.
P
Proposiç
P ão 2.5.1. Seja {an } ∈ Seq(R). Se an converge absolutamente,
então an converge.

P Demonstração. Como an ≤ |an |, temos que 0 ≤ an + |aP n | ≤ 2|an |. Note que


2|an | converge, pois sua soma é igual a 2 vezes a daP série |an |, que converge,
por
P hipótese.
P Daı́, pelo teste
P da comparação,
P segue que (a n +|a n |) converge. Mas
an = (an + |an |) − |an |. Logo, an converge. 
Teorema 2.5.2 (Teste da Razão). Sejam L ∈ R e {an } ∈ Seq (R) tais que

an+1
lim = L.
n→∞ an
P
(a) Se L > 1, então a série anPdiverge.
(b) Se 0 ≤ L < 1, então a série an converge absolutamente.
(c) Se L = 1, então este teste é inconclusivo.
E estas são as únicas possibilidades.
P∞
Exemplo 2.5.3. Vamos analisar a série n=0 (−2)n /n! usando o teste da razão.
Seja an = (−2)n /n!. Temos:
n+1

an+1
lim = lim 2 n!
· n = lim
2
= 0 < 1.
n→∞ an n→∞ (n + 1)! 2 n→∞ n + 1
P∞
Então, n=0 (−2)n /n! converge absolutamente.
P∞ 2
Exemplo 2.5.4. Vamos analisar a série n=0 2n /n! usando o teste da razão.
2
Seja an = 2n /n!. Temos:
(n+1)2
22n+1

an+1
lim = lim 2 ·
n!
2 = lim = +∞ > 1.
n→∞ an n→∞ (n + 1)! 2n n→∞ n + 1
P∞ 2
Então, n=0 2n /n! diverge.
O item (c) do enunciado do teste da razão pode ser justificado pelos próximos
dois exemplos.
P
Exemplo 2.5.5. Se an = 1/n, então an diverge e

an+1
lim = lim n = 1.
n→∞ an n→∞ n + 1

Diante disto, não podemosP dizer que a condição limn→∞ |an+1 /an | = 1 assegura a
convergência de uma série an .
Exemplo 2.5.6. Se an = 1/n2 , então
P
an converge e
2
n2

an+1 n
lim = lim = lim = 1.
n→∞ an n→∞ (n + 1)2 n→∞ n + 1

Diante disto, não podemos Pdizer que a condição limn→∞ |an+1 /an | = 1 assegura a
divergência de uma série an .
48 2. SÉRIES NUMÉRICAS

Teorema 2.5.3 (Teste da Raiz). Sejam L ∈ R e {an } ∈ Seq (R) tais que
p
lim n |an | = L.
n→∞
P
(a) Se L > 1, então a série anPdiverge.
(b) Se 0 ≤ L < 1, então a série an converge absolutamente.
(c) Se L = 1, então este teste é inconclusivo.
E estas são as únicas possibilidades.
P∞  5n
Exemplo 2.5.7. Vamos analisar a série n=2 −2n n+1 usando o teste da raiz.
 5n
Seja an = −2nn+1 . Temos:
−2n 5

p
n
lim |an | = lim = 32 > 1.
n→∞ n→∞ n + 1

P∞  5n
Então, n=2 −2n n+1 diverge.

Observação 2.5.1. Os mesmos exemplos que mostraram que o caso L = 1


do teste da razão é inconclusivo também cabem aqui, como exemplos que mostram
que o teste da raiz é inconclusivo para L P
= 1. Além deles, também se enquadram
1/n3 (convergente).
P
nesta classe as series: 1 (divergente) e
CAPı́TULO 3

Séries de Potências

3.1. Sequências e Séries de Funções


As definições de sequências e de séries podem ser naturalmente estendidas para
permitir termos fora do conjunto dos números reais.
Definição 3.1.1. Dado um conjunto X, uma sequência de elementos de X é
uma função da forma
{an }∞
n=q : {n ∈ N | n ≥ q} → X
n 7→ an , (3.1)
onde q ∈ N está fixado.
Um tipo importante de sequências com termos que não são números reais são
as sequências de funções reais. Dados A, B ⊆ R, seja
F(A; B) = {f | f : A → B}, (3.2)
o conjunto de todas as funções com domı́nio A e contradomı́nio B.
Definição 3.1.2. Sejam A ⊆ R, {fn }∞ n=q ∈ Seq (F(A; R)) e f ∈ F(A; R).
Dizemos que o limite de fn é f , e escrevemos limn→∞ fn = f (ou limn→+∞ fn = f ,
ou lim fn = f ) se, para todo x ∈ A, limn→∞ fn (x) = f (x).
Exemplo 3.1.1. Determine o domı́nio da função f dada por
f (x) = lim fn (x), onde fn (x) = enx .
n→∞
Esboces os gráficos de f0 , f1 , f2 , f3 e f .
Solução. Para cada valor de x, {enx }∞ n=0 é uma progressão geométrica de
razão ex . Como tal, converge para −1 < ex ≤ 1 e diverge para ex ≤ −1 ou ex > 1.
Como ex é sempre positivo, isto equivale a dizer que a sequência converge para
ex ≤ 1 e diverge para ex > 1. Ou seja, converge para x ≤ 0 e diverge para x > 0.
Então o domı́nio de f é o intervalo I = (−∞, 0]. A convergência é para zero se
x < 0 e é para 1 se x = 0. Portanto, f é identicamente nula em (−∞, 0), mas tem
descontinuidade em x = 0, assumindo o valor 1 nesse ponto. Os gráficos de f0 , f1 ,
f2 , f3 e f são mostrados na Figura 3.1. 

Definição 3.1.3.
(a) Uma série de funções reais é uma expressão formal do tipo

X
fk (x), (3.3)
k=q

em que x é uma variável real, q denota um número natural e {fk }∞ k=q é uma
sequência de funções reais, tipicamente definidas sobre o mesmo domı́nio.
49
50 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS

Figura 3.1. Gráficos das funções f0 , f1 , f2 , f3 e f da Questão 6.


Observe que o gráfico de f é a parte negativa do eixo x unida com
o ponto (0, 1).

P∞
(b) A sequência das somas parciais da série de funções k=q fk (x) é a sequência
 ∞
X n 
fk .
 
k=q
n=q
P∞
(c) Dizemos que o limite da série de funções k=q fk (x) é f ∈ F(A; R), e escreve-
mos
X∞
fk (x) = f (x),
k=q

se f é o limite da sua sequência de somas parciais. O limite de uma série


também é chamado soma da série.
P∞
(d) Quando uma série de funções k=q fk (x) possui limite finito f ∈ F(A; R) para
todo x no domı́nio comum de toda fk , dizemos que a série converge (para f );
caso contrário, ela diverge.
Também podemos falar em convergência absoluta/condicional para uma série
de potências.
P∞
Definição 3.1.4. Dizemos que uma série de funções reais k=q fk (x) converge
absolutamente P para f se, para todo número real x0 no domı́nio comum de toda fk , a

série numérica k=q fk (x0 ) converge absolutamente (ou seja, se, para todo número
P∞
real x0 no domı́nio comum de toda fk , a série numérica k=q |fk (x0 )| converge).
3.2. SÉRIES DE POTÊNCIAS E RAIO DE CONVERGÊNCIA 51

Em geral, qualquer propriedade de uma sequência ou série numérica no que diz


respeito a limites, convergência ou divergência pode ser estendida para sequências
ou séries de funções reais desta forma: dizemos que a sequência ou série de funções
tem uma dada propriedade desse tipo se, para todo x0 no domı́nio comum de todos
os seus termos, a substituição x = x0 faz com que a sequência ou série numérica
resultante tenha essa propriedade.
P∞
Exemplo 3.1.2. Determine os valores de x para os quais a série n=1 enx é
convergente.
P nx
Solução. Para cada valor de x, a série e é uma série geométrica de razão
ex . Como tal, diverge se |ex | ≥ 1 e converge se |ex | < 1. Como ex é sempre
positivo, a afirmação da frase anterior equivale a dizer que a série diverge se ex ≥ 1
e converge se ex < 1. Isto pode ser confirmado pelos critérios da razão e da raiz,
por meio dos limites
(n+1)x
enx
ex

an+1 (x) e
lim ex = ex

lim = lim = lim 
 = n→∞

n→∞ an (x) n→∞ enx n→∞  enx
e p p p
lim n
|an (x)| = lim n |enx | = lim n (ex )n = lim ex = ex ,
n→∞ n→∞ n→∞ n→∞
onde an (x) = enx . Portanto,
P nx
e converge se e somente se x < 0. 

3.2. Séries de Potências e Raio de Convergência


Definição 3.2.1. Uma série de funções é chamada série de potências se é da
forma
X∞
ak (x − x0 )k ,
k=q
em que x é uma variável real, {ak }∞é uma sequência de números reais, e x0 ∈ R
k=q
é uma constante, chamada centro da série de potências.
Definição 3.2.2. Dados x0 ∈ R e r ∈ R, definimos:
(a) A bola aberta de raio r com centro em x0 é o conjunto
B(x0 , r) = {x ∈ R | |x − x0 | < r}.
(b) A bola fechada de raio r com centro em x0 é o conjunto
B(x0 , r) = {x ∈ R | |x − x0 | ≤ r}.
Lema 3.2.1. Sejam {ak }∞ k=q ∈ Seq(R) e x0 , b ∈ R.
P∞
(a) Se a série k=q ak (x − x0 )k converge em x = b, então converge em todo x ∈
B(x0 , |b − xP
0 |).
∞ k
(b) Se a série k=q ak (x − x0 ) diverge em x = b, então diverge em todo x ∈
R − B(x0 , |b − x0 |).
Teorema 3.2.2 (Existência e Unicidade do Raio de Convergência). Dados
x0 ∈ R e {ak }∞
k=q ∈ Seq(R), existe um único R ∈ R, com R ≥ 0, tal que
P∞
(a) ak (x − x0 )k converge em todo x ∈ B(x0 , R);
Pk=q
∞ k
(b) k=q ak (x − x0 ) diverge em todo x ∈ R − B(x0 , R).
Além disso, a convergência em cada x ∈ B(x0 , R) é absoluta.
52 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS

P∞
Definição 3.2.3. O raio de convergência de k=q ak (x−x0 )k é o único R ∈ R
que satisfaz as condições (a) e (b) do Teorema 3.2.2.
P∞
Conhecido o raio de convergência de uma série de potências k=q ak (x − x0 )k
o Teorema 3.2.2 nos diz o comportamento da série com respeito a convergência ou
divergência, em todos os possı́veis valores de x, exceto em x0 ± R. Nestes dois
pontos, a convergência ou divergência deve ser verificada à parte. Independente
do que aconteça nesses pontos, o conjunto dos pontos onde a série de potêncuas
converge é um intervalo.
P∞
Definição 3.2.4. O intervalo de convergência de k=q ak (x−x0 )k é o conjunto
de todos os valores de x onde esta série converge.

P∞Exemplo 3.2.1. Determine o domı́nio da função real f dada por f (x) =


n
n=2 x / ln n.

P nSolução. O domı́nio de f é o conjunto de todos os x ∈ R onde a série


x / ln n converge. Definindo an (x) = xn / ln n, temos:
n+1
an+1 (x) x / ln(n + 1)
lim = lim
n→∞ an (x) n→∞ xn / ln n

ln n
= |x| lim
n→∞ ln(n + 1)

1/n
= |x| lim (por L’Hospital)
n→∞ 1/(n + 1)
n+1
= |x| lim = |x|.
n→∞ n
P∞ n
P∞testen da razão, se |x| < 1, então n=2 x / ln n converge. E se |x| > 1,
Daı́, pelo
então n=2 x / ln n diverge. Assim, o raio de convergência desta série é R = 1.
Resta saber o que acontece quando |x| = 1; isto é, quando x = −1 ou x = 1.
an (x) = (−1)n / ln n. Esta é uma série alter-
P P
• x = −1. Nesse caso,
nada. A sequência {1/ ln n} é positiva em todos os seus termos, converge
para zero (pois limn→∞ ln n = +∞) e é decrescente (pois {ln n} é cres-
n
P
cente). Então, pelo P critério da série
P alternada, (−1) / ln n converge.
• x = 1. Nesse caso, an (x) = 1/
P ln n. Para estudar esta série, vamos
compará-la com a série harmônica 1/n, a qual já sabemos que diverge.
– Teste da comparação: A função g(x) = x − ln x é positiva em x = 1
e possui derivada g 0 (x) = 1 − 1/x positiva para todo x > 1. Logo,
n > ln n e então 1/ ln n > 1/nP pra todo n ∈ N∗ . Daı́, pelo critério da
comparação, concluı́mos que 1/ ln n diverge.
– Teste do limite:
1/ ln n n
lim = lim
n→∞ 1/n n→∞ ln n
1
= lim (por L’Hospital)
n→∞ 1/n

= lim n = +∞.
n→∞
P
Isto mostra que as somas parciais P da série 1/Pln n crecem muito
mais rápido do que as da série 1/n. Portanto, 1/ ln n diverge.
3.2. SÉRIES DE POTÊNCIAS E RAIO DE CONVERGÊNCIA 53

Assim, o domı́nio de f é o conjunto de todos os x tais que |x| < 1 ou x = −1. Ou


seja, o domı́nio é o intervalo [−1, 1). 

Exemplo 3.2.2. Determine o raio de convergência e o intervalo de convergência


da série de potências

X xn
.
n=1
2n − 1

Solução. Para cada inteiro positivo n, seja fn (x) = xn /(2n − 1). Temos:
xn+1

fn+1 (x) 2n − 1
lim = lim ·
n→∞ fn (x) n→∞ 2(n + 1) − 1 xn

2n − 1
= lim · x
n→∞ 2(n + 1) − 1

2n − 1
= lim · lim |x|
n→∞ 2n + 1 n→∞

= 1 · |x| = |x|.
P∞
Assim, pelo teste da razão, a série n=1 fn (x) converge para |x| < 1 e diverge para
|x| > 1. Daı́, pelo teorema da existência e unicidade do raio de convergência,
P∞ segue
que o raio de convergência da série dada é R = 1. Isto nos diz que n=1 fn (x)
converge para todo x ∈ (−1, 1), podendo ou não convergir em x = −1 e/ou em
x = 1. Para determinar o intervalo de convergência, resta analisar o comportamento
desta série na fronteira do intervalo (−1, 1); ou seja, em x = −1 e em x = 1.
• Em x = −1, temos:
∞ ∞
X X (−1)n
fn (−1) = .
n=1 n=1
2n − 1
P∞
Esta é uma série alternante, da forma n=1 (−1)n bn , com limn→∞
P∞ bn = 0,
bn > 0 e bn+1 < bn , para todo inteiro positivo n. Então n=1 fn (x)
converge em x = −1.
• Em x = 1, temos:
∞ ∞
X X 1
fn (1) = .
n=1 n=1
2n − 1

Para todo inteiro positivo n, temos 2n − 1 ≥ n ≥ 1, de modo que


1 1
≤ .
2n − 1 n
P∞
Além disso, aPsérie harmônica n=1 1/n diverge. Logo, pelo critério da

comparação, n=1 fn (x) diverge em x = 1.
Portanto, o intervalo de convergência da série dada é I = [−1, 1). 

Exemplo 3.2.3. Determine o raio e o intervalo de convergência da série de


potências

X (−1)k π 2k+1 2k+1
x
(2k + 1)!
k=0
54 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS

Solução. Seja
(−1)k π 2k+1 2k+1
fk (x) = x .
(2k + 1)!
Note que, para todo x ∈ R,
(−1)k+1 π 2k+3 x2k+3

fk+1 (x) (2k + 1)!
lim = lim · k 2k+1 2k+1

k→∞ fk (x) k→∞ (2k + 3)! (−1) π x

k2k+1
(−1)(−1) π  π 2(2k+1)! x2k+1
x2
  
= lim

k2k+1 2k+1

k→∞ (−1) π  
(2k + 3)(2k + 2) (2k
+ 1)!
  x  

(−1)π 2 x2 π2

= x2 lim

= lim = 0.
k→∞ (2k + 3)(2k + 2) k→∞ (2k + 3)(2k + 2)
| {z }
zero

Como
fk+1 (x)
∀x ∈ R, lim < 1,
k→∞ fk (x)
P∞
segue, pelo teste da razão, que a série k=0 fk (x) converge para todo x ∈ R. Então
o raio de convergência dela é infinito: R = +∞. Consequentemente, o seu intervalo
de convergência é (−∞, +∞) = R. 

P∞Proposição n3.2.3. O raio de convergência de qualquer série de potências


n=q an (x − x0 ) , com an 6= 0 para todo natural n suficientemente grande, é
dado por
an
R = lim ,
n→∞ an+1

desde que o limite exista, finito ou infinito.


Exemplo 3.2.4. Vamos calcular o raio de convergência da série de potências
dada no Exemplo 3.2.2,

X xn
,
n=1
2n − 1
desta vez utilizando a Proposição 3.2.3. Temos:
ln(n + 1) 1/(n + 1)
R = lim = lim (por L’Hospital)
n→+∞ ln n n→+∞ 1/n
 −1
n 1
= lim = lim 1+
n→+∞ n + 1 n→+∞ n
  −1
1
= lim 1+ = 1−1 = 1.
n→+∞ n

3.3. Representação de Funções como Séries de Potências


P∞
Definição 3.3.1. Dizemos que uma série de potências n=q an (x − x0 )n re-
presenta uma função f : A ⊆ R → R num intervalo I se, para todo x ∈ I, a série
numérica correspondente converge para f (x); isto é, se

X
∀x ∈ I, an (x − x0 )n = f (x).
n=q
3.3. REPRESENTAÇÃO DE FUNÇÕES COMO SÉRIES DE POTÊNCIAS 55

A equação acima é dita uma representação em série de potências em torno de


x = x0 para a função f .

A definição anterior poderia ser estendida para admitir um I ⊆ R arbitrário;


não necessariamente um intervalo. Mas para nossos propósitos, basta considerar o
caso em que I é um intervalo.

Exemplo 3.3.1. Encontre uma representação em série de potências em torno


do ponto x0 dado para a função f dada.
(a) f (x) = 3x2 − 8x + 5, x0 = 1.
(b) f (x) = 1/(1 − x), x0 = 0.
(c) f (x) = x2 /(a3 + x3 ), x0 = 0. (a é constante não nula arbitrária.)
(d) f (x) = (5 − x)/(2 + 3x), x0 = 1.

Solução.
(a)

f (x) = 3x2 − 8x + 5 = 3(x − 1)2 + 6x − 3 − 8x + 5 = 3(x − 1)2 − 2x + 2


= 3(x − 1)2 − 2(x − 1) − 2 + 2 = 3(x − 1)2 − (x − 1).

Então, definindo {an }∞


n=0 por


 0 se n = 0,

−1 se n = 1,
an =


 3 se n = 2,
0 se n ≥ 3,

temos que

X
∀x ∈ R, an (x − 1)n = f (x).
n=0

(b) Pela fórmula da soma da série geométrica, temos



X 1
∀x ∈ (−1, 1), xn = .
n=0
1−x

(c) Note que


x2 x2 1
= · .
a3 + x3 a3 1 − [−(x/a)3 ]
Daı́, pela fórmula da soma da série geométrica, segue que
∞   3 n ∞ ∞
x2 X x x2 X (−1)n x3n X (−1)n x3n+2
f (x) = 3 − = 3 = ,
a n=0 a a n=0 a3n n=0
a3n+3

para todo x ∈ R tal que | − (x/a)3 | < 1; ou seja, para todo x ∈ (−|a|, |a|).
56 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS

(d) Observe que


5−x 4 − (x − 1) 4 1 x−1 1
= = · − ·
2 + 3x 5 + 3(x − 1) 5 1 − [−3(x − 1)/5] 5 1 − [−3(x − 1)/5]
∞  n ∞  n
4 X 3(x − 1) x−1 X 3(x − 1)
= − − −
5 n=0 5 5 n=0 5
∞ ∞
X 4(−1)n 3n (x − 1)n X (−1)n 3n (x − 1)n+1
= −
n=0
5n+1 n=0
5n+1
∞ ∞
4 X 4(−1)n 3n (x − 1)n X (−1)n−1 3n−1 (x − 1)n
= + −
5 n=1 5n+1 n=1
5n
∞ 
4 X 4(−1)n 3n (x − 1)n (−1)n 3n−1 (x − 1)n

= + +
5 n=1 5n+1 5n
∞ 
(−1)n 3n−1 (x − 1)n

4 X 4·3
= + +1
5 n=1 5 5n

4 X 17(−1)n 3n−1 (x − 1)n
= +
5 n=1 5n+1

X
= an (x − 1)n ,
n=0

onde (
4/5 se n = 0,
an =
17(−1)n 3n−1 (x − 1)n /5n+1 se n > 0.
Esta representação é válida pra todo x ∈ R tal que | − 3(x − 1)/5| < 1; ou seja,
para todo x ∈ (−2/3, 8/3).


Teorema 3.3.1 (Derivação e Integração de Séries de Potências). Se a série de


potências
X∞
an (x − x0 )n
n=q

tem raio de convergência R, então ela representa uma função f que é diferenciável
(logo, contı́nua) no intervalo (x0 − R, x0 + R), possui derivada dada por

X
f 0 (x) = an n(x − x0 )n−1 ,
n=q+1

e integral indefinida dada por



(x − x0 )n+1
Z X
f (x) dx = an + C.
n=q
n+1

O raio de convergência da derivada de f e de cada primitiva de f é R (o mesmo


raio de convergência de f ).
3.4. SÉRIES DE TAYLOR E DE MCLAURIN 57

3.4. Séries de Taylor e de McLaurin


Teorema 3.4.1 (Série de Taylor). Se a função f : A ⊆ R → R é de classe C ∞
num intervalo I ⊆ A contendo o ponto x0 , então, para todo x ∈ I e toda sequência
de números reais {an }∞
n=0 , a série

X
an (x − x0 )n (3.4)
n=0

converge para f (x) se e somente se an = f (n) (x0 )/n! para todo n ∈ N.


Definição 3.4.1. Seja f uma função real com derivadas de todas as ordens
em x0 ∈ R. Uma série de potências da forma

X f (n) (x0 )(x − x0 )n
n=0
n!
é chamada série de Taylor da função f em torno de x0 . Uma série de Taylor em
torno de x0 = 0 é dita uma série de McLaurin.
Exemplo 3.4.1. Seja f (x) = cos x. Esta é uma função de classe C ∞ em R.
Para todo x0 ∈ R e todo n ∈ N,


 − sen x0 se 4 divide n − 1,

− cos x
0 se 4 divide n − 2,
f (n) (x0 ) =


 sen x 0 se 4 divide n − 3,
cos x0 se 4 divide n.

Em particular, para x0 = 0,


 0 se 4 divide n − 1,

−1 se 4 divide n − 2,
f (n) (0) =


 0 se 4 divide n − 3,
1 se 4 divide n.

(
0 se n é ı́mpar,
= (3.5)
(−1)n/2 se n é par.
Assim, pelo Teorema 3.4.1,

X f (n) (0) · xn
f (x) =
n=0
n!
∞ ∞
X f (2k) (0) · x2k X f (2k+1) (0) · x2k+1
= +
(2k)! (2k + 1)!
k=0 k=0
| {z } | {z }
parcelas “pares” parcelas “ı́mpares”

∞ ∞ *0
(−1)k · x2k x2k+1

X X 0 · 
= + (Por (3.5))
(2k)! (2k
 + 1)!
k=0 k=0


X (−1)k · x2k
= ,
(2k)!
k=0
58 3. SÉRIES DE POTÊNCIAS

para todo x ∈ R. Portanto, para todo x ∈ R,



X (−1)k · x2k
cos x = . (3.6)
(2k)!
k=0

Exemplo 3.4.2. Seja g(x) = sen x. Esta é uma função de classe C ∞ em R.


Para todo x0 ∈ R e todo n ∈ N,


 cos x0 se 4 divide n − 1,

− sen x se 4 divide n − 2,
0
g (n) (x0 ) =


 − cos x 0 se 4 divide n − 3,
sen x0 se 4 divide n.

Em particular, para x0 = 0,

1
 se 4 divide n − 1,

0 se 4 divide n − 2,
g (n) (0) =
−1 se 4 divide n − 3,


0 se 4 divide n.

(
(n−1)/2
(−1) se n é ı́mpar,
= (3.7)
0 se n é par.

Assim, pelo Teorema 3.4.1,



X g (n) (0) · xn
g(x) =
n=0
n!
∞ ∞
X g (2k) (0) · x2k X g (2k+1) (0) · x2k+1
= +
(2k)! (2k + 1)!
k=0 k=0
| {z } | {z }
parcelas “pares” parcelas “ı́mpares”
0
∞ > ∞

X 0·x2k X (−1)k · x2k+1
=  + (Por (3.7))
 (2k)!
k=0 k=0
(2k + 1)!


X (−1)k · x2k+1
= ,
(2k + 1)!
k=0

para todo x ∈ R. Portanto, para todo x ∈ R,



X (−1)k · x2k+1
sen x = . (3.8)
(2k + 1)!
k=0

Exemplo 3.4.3. Seja h(x) = ex . Esta é uma função de classe C ∞ em R. Para


todo x0 ∈ R e todo n ∈ N,
h(n) (x0 ) = h(x0 ) = ex0 .
Em particular, para x0 = 0,
h(n) (0) = 1. (3.9)
3.4. SÉRIES DE TAYLOR E DE MCLAURIN 59

Assim, pelo Teorema 3.4.1,


∞ ∞
X h(n) (0) · xn X xn
h(x) = =
n=0
n! n=0
n!
para todo x ∈ R. Portanto, para todo x ∈ R,

X xn
ex = . (3.10)
n=0
n!
Referências Bibliográficas

[Bur06] David Burton, The history of mathematics: An introduction, 6th ed., McGraw-Hill, 2006.
[Can] David W. Cantrell, Affinely extended real numbers., From MathWorld–
A Wolfram Web Resource, created by Eric W. Weisstein.
http://mathworld.wolfram.com/AffinelyExtendedRealNumbers.html.
[Fou] The OEIS Foundation, A001221 – number of distinct primes dividing n (also called
omega(n))., Disponı́vel em https://oeis.org/A027748 (24/04/2018).

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