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Âneno milTErRo DA BURROCRACIA

A.ârtir do tltulô estc I'RATADO


DA LAVAÇÀo LrA uuRRA ou IN
TRODUÇAO A TR,INSCENDENCIA
BRASILEIRA tlaz âô lettor dois ns
pêctos de caracterÍsticas marcantes,
hâbitmente âpreFntados
O Frineiro refere sê à verificaçâo
e pc6teliot .ró'ne Llo fenôhêno com
o
o
o qual né6, rr,.
mos a
nos acostuma
"riros,
sonh ,llrndo náô o Podemc§
viver: tirar proveilos sem f.zêr eíor'
o ço, ou simplêsmcnte l,rva, a buna".
Tal constataçàô se impõe como ver
dâdeirã, ê aqui o cscritor a reve)a com
toda a competóncir de sua Pona sem

O segundo expõe a mrneiri dc co


mo o Poeta, nêst€ livro um crÍttco com
visáo de lincê, abãndôna a abírâçâo
e o liljsmo de setrli versos, paLr eDvere
I dar pela ssacidàde §erPenhiormê de
uma sátira aqui c acolá àparentaür Jo
deboche, bem ao qosto de seus con,Pi

Face voltada àvida n rigo', o


TRATADo DA LAV^ÇÀo D/\ uuR
RA, retrãta liêlmente nôslr r.riidade
com ôs efetivas corcs loü.\ de *us

ADO Depóê ainda, impl'ítrm.nle. mns


com prêctsão dê arqucuo, conirn os
arguei.os dos politicos que nos tazem
ser semprê o pais do futuro adiâdo
a cadâ djâ. Atrnge as oliqarquiãs domi
nantes, seia um simPles feudo fa
miliar nos confins do nordesie, ou üm

=íálÀÍ EA "trust" e seus mil têntáculos de Lntê'


4I-'
É na form. dc dizer as coi»s que
s€nlimo6 a p€r§picácia e galhnrdl.a do
escritor, pdnopàlment€ ao comentãr
rópicos como â autenticidade, o indi
vidualismo e a p€rsonalidadê de noss
ilTn0ouçÃ0 gente. sendo ale como não Poderia
.lêixâr de ser. de .e,to mcdo, cán_

irnmscmuÊilcn nhoso com sêu povo, quado desnudâ


in{meros traços de §ut$erviénciâ âo
DDTGII ElDI patráo interno ou âo estangeiro: pa
Côm âpurâdà ironia, Angelo Mon
teiro m6Úa que somos o povo mãjs
metnfísico do pl,lnet) nao sJbemos
o que deseJàmcÁi mas o desoFmos iá
que o impoÍânte mcsmo é làvar â bul
rã *m termo§ §equ.r a minünâ côns.i
ência d,r paÍagcm en quc eli * en
contra a ruminar o cnpim do üziDho
Ao fim .là brasilÍr,irir, iqnôr.rmos
em qua-l dos aspectos melhôr s. cx.
pres§ou: se na comproviÇ,io dos iarôs
ou dâ forma do col(x;i los Uma teliz
simbiose se lez. Sê c sulil na verifica
çáo do percebido, nos prcrniJ no jei
to o
de desvclir .om ,nrbsrnncrosa
censurâ jocosa.
Em sua digrêsçio, l\ngelo Monteiro
consohda modêlo$ dc dive.sas época§,
fases e geraçÕes. com suà
^trâvessa,
palavra fácil e profundà, a ponte ima
ginária entle os sâlôês das ÁNGELO A,IONTEI RO. alagoa'
as mesas dos bâres oia ^cademias
impecával, no, é ptoíessot assistente de Fi-
ora .elaxado, formal ou insolente lasofia do Ce,tro de Filosaíia e
e as academjrs sem mees nem lÍqui Citi)ci.)s l l!tn)iI)as da Univetsida-
de Federal de PeÍnambuco, onde
Porém, ninq'rém quê enxersue ào defendeu com distincão tese de
menos um palmo adiante do nâriz mestrada sobre Jorye de Lima-
ou que Pc§sua um olho que sêl:a, dei. visÍa sob o ângulo estétíco-filo-
xará de ver por trás de seu biombo o sófico e Íntitulada: O CONHE-
sbo^roso veneno, com que a têmpêra CIMENTO DO POÉTICO ÊM
de Anqelo Monteno o texto temperá JORGE DE Ll.ll4A. Publicou vá-
um imênso Amôr à teüa donde brota rias livtus de paesia: PROCLA-
ram a§ bulra§, sêus lâvadores e os que MAÇÁO DO VERDE 11969);
derelam quê umã buüa sela aperas DIDATICA DA ESF INGE
umâ bufta, e nada mais. (t 971); o lNaulStDOB (1975);
Qu to ã nés que fazemos o Mov! O TGNOBADO (l9BO e O RAP-
mento de Apoio Cuhural Ediçôes TO DAS NOITES OU O SOL
Baqaço cabe.n6 a alegria er inti CAMO MEDIDA 11983). Ensais
mâ satislação de sermos respon§ávêh ta, tetn publícadas estudos do
pela ediçâo de uma análi* que conri tnaiot interesse sobre poetas bÍa-
buná para um enfoque màis p!ôxjmo sileiros e estrangeios, contando
de um Brasil, sanadas as buras, ainda ainda, com ensaios inódítas, âlém
d;tante, por se tratar do eterno pais de um livro de poesia: O EXiLIO
do amânhá, enquõto, pelâs rlras, ave. DF BABEL
nidas, praças ê êíradis trot.l, por já
náo poder galopãr de táo gorda a
lavàclã buna do presente.

!D ü,1"[,1ffr,".',ti$::,,, .,"^,
APOIO CULTURAL
HOTEL VELEIRO S/A.

A AlbertL aíederico Lins, estudioso


Comp6ição: São Canindé e ,ntê: )t --te da nossa cultura; A
Projeto Oráfico: Jeúníno Netto zauk Jczerra, velho companheio,
Desenho da câpa e ilusttações: Azenildo Síqueift 2 : !-oiné Bios Montetro, meu pai,
SupeÚírão ctáíica: Assis Salo,não :tte nüt1ca lítvou a bufra.

Luiz A Etto Machado

Ediç6ês Basaço
Rua CorÉ. João Alfredo,ll6
CEP, 55.545 - PalnaÍes - PE

1986 - lnpreso no Rrá§,il.


EPÍGRAFE

"O que mais salta aos olhos, o que


mais Íere as vistas do observador, que bem
se pode chêmaí o expoente da vida geral
do país, é a falta de co€são social, o desa-
gregamento dos individuos, alguma couea
que os reduz ao eslado d€ isolamento âb-
soluto, de átomos inorgánicos, quas€ po-
dia dizer, de poeira impalpável e estéril.
Entre nós, o que há de organizado, é o
Etado. não é a Nação; é o governo, é a
administração, por seus altos Íuncionários
na Cort6, por seus sub{ogados na6 provín-
ciô, por seus ínÍimos caudatiírios nos mu-
nicípios; -nãoéo povo, o qual p€rma-
nece amorfo e dissolvido, sem outro liam€
entre si, a não ser a comunhão da língua,
dos maus costuínes € do s€rvilismo."

Um discurso êm mangas de camisa (t879)


Tobias Barreto
PREFACIO A LOUVAÇÁO DA LAVAÇÁO

Nelson Saldanha

Muito melhor do que certas sátíras ptolixas e


pretenciosas oui do que certas análíses ctíticas muito
badaladas, potque publicadas no sul do país, este no-
tável texto de Ângelo Monteio confirma antes de mais
nada isto: que o poeta é um homem que vê. Nío foi
por acaso que Fernando Pe§soa disse "vi como um da-
nado"; nem que um poeta como Octávio Paz escreveu
uma penetrantê análise de seu país, o México, no li-
vro "O Labirinto da Solidão'. Livro que aliás vale parc
toda a América Latinâ-
entretanto mal encobfem uma serie de registros crÍtí
No texto de Angelo Monteiro, redígido entre o cos bastante sérios e sufpfeendentemente exatos.
surrcalista e o irôníco, entre a anotaÇão alongada e a fobias Barrcto havía falado, há cem anos, na
exposição sintética, estão presentes, como possíveis "íalta de cabeca pdà à l;lo\olid", que setià proprid
arquétipos, os modelos satíricos de todas as épocas; do brasíleiro, mas ninguém se lembrara de anotar que
e sua linguagem, que ola é aforísÍica ota cologuial, ser, ser mesmo pafa o brasileiro é'Íazer-se", na acep-
acompanhà com um pouco de prcssà às àssocidÇões
ção de ganhar, tirat vantagem, lavar a burra- O imedta-
de idéias do leitor, que vai a cada passo se surprcenden-
tismo nacional, espécie de enxetto danínho e implícíto
do. A partir de uma Írase grotesca e quase chula, o do pragmatismo anglo-saxãa, constituí ufi antiteoretí
poeta, desdobrado em interpretador cultural, desenvol-
cismo que entre nós se encontra até lpasme-se) nas
ve aguí um novo "Elogio da Loucura". Redígido em
Universidades, e que corresponde em termos genéricos
1978, o ensaio como que antecipa e isso merece des-
- ao arraígado hábito da improvisação e à íncurável ín-
-
taque coisas de hoje, que são agravamentat de sinto-
disciplina do brasíleíro. Com este hábíto estão ligados
mas velhos, ou de males crônicos.
alguns atrasos trágicos na hístôria cultural do pals: Ía.
O conceito de bofta, de notória origeÍt colonial
("uma mala abarrctada de ouro", explicita o autor), damos a ter imprensa, a ter Universidades, a libettar
se transfigurou, sem se desmentir, na locucão desabu- os escravos, Estas coisas, que sempfe preocupam aos
analistas mais escruoulosos, Angelo Monteíro não as
sada e amofal: "lavar a bufta" passou a sê/, no léxico
mencÍona a todas expressamente, mas estabelece uma
de nossa gíría, tirar vantagem, ganhar proveito sem tra-
série de aluúes imbricadas num texto questionador e
balho, obtet compensação material bastante pala com-
prat o ôcio lum ócio certamente sine dignitate). ,gas- extremamente sugestivo, onde elas aparecem como
temas centrais.
trcando as implicações da noção em tetmo de análise
Tadanças e imediatismos, com efeito, têm feito
culturcl, e de psicologia social - a velha psicologia
dos povos, que as empettigadas doutrinas do seculo do Erasil o eterno país-do-íuturo, e nisto o autor toca
XX desdenhaftm -, o autor encontra meios de apontar com írases eficientes, em divercos pontos. Ditíamos
algumas das mazelas do país, Do país e da chamada
então que o Erasil é talvez um pdts de ucÍonid, tuais
mesmo que de utopia. Além de set o país dos exageros:
cultura nacíonal. Algo na linha das viúes críticas que
exagero no cafnaval, no futebol, nas estatísticas- País
vieram com a década de 30, e tambéfi as alegorias con-
tídas em Martim Cererê e Macunaína (estas rccente
do "jeitinho", como se costuma dizer (e o historiador
João Camílo de olivein Torres chqou uma vez a relâ-
mente continuadas no admiúvel "Galvez", de Márcio
cionar o "ieitinho" coÍt o nominalismo franciscano,
Souza); mas algo, ao mesmo tempo, diÍercnte, cettas
alusões, por outo lado, nos tazem lembrar os pesados
presente em nossas o gens).
País da 'disponibilidade", tamMm: ou. como
ê eruditos estudos de Séryio Buaryue - por exemplo
em "Visão do Parat'so" -, ou osdeMerquiorefi seu
diz o autor, povo do acaso. Receptividade excessiva,
própría da dessubstancialídade cultuftl: enquanto ou-
valioso 'Saudades do Carnaval", mas na Lavaúo da
tfos povos se di§tinguem./rstarrerrie por terem cone
BuíÍa, o clima é diÍerente: há uma aparente displicên-
xão com matrizes definidas, ao Brasil Íaltam matrizes
cia no dizer, bêm como uma ch(Éante insolência, que
definidas, e falta deste modo uma suficiente diferenck-
ção, que seia marca, 'baráter" no sentido clássico,
substancialidade cultural, onlos histótico: de onde - e
aquí reencontramos o íraseado de Ângelo Monteiro - a
falta de ser autêntica, e com isto a intftnscendência co-
mo transcendência. De onde tamMm, observe-se, o Íí
loneísmo fácil, o culto da facilidade, mais o tradicional
privatismo (pot tantos sociólogos êstudado). E mais a
subsetuíência, de gue expressa e expressivamente íala
o autor, com anotações simplesmente impiedosas. De
onde, aléfi de tudo, a prodigalidade, irmã da indiscipli-
na, e a ptodigíalídade, irmã da fantasia gratuita.
Confome a cortante ironia clo autor, rcmos com
tudo isso o povo mais metaíísico do munda: nem sabe-
mos o que quefemos, mas o queremos, posto que alme.
iamos lavat a bufra sem a havet localízado, nem sequer
definido. Faltou ao Brasil a contínuídade da reflexão
de nível filosôÍico. Faltou também, talvez pelo gftnde
empenho do modernismo - já no seculo vinte - as ex-
periêncías verbais e cromátícas, uma meditação ctítica
VAiI(lS I.AVAfl A BURRA
qtê se debruçasse sobrc o "ser histôtico" do país (me
dilação que foi bdstante intensa no México, por exem-
plo). Ficou o Erasí|, então, entre aguela descontinui
dade e essas expeliências, tonlado pot "retratos" crí-
ticos nem sempre fàlhos, fias nem sempre convincen-
tes. A sátira de Ãngelo Monteiro, onde encontramos
o contfaste entfe o título contundente e o lexto subs-
tancioso, vale como provocaÇão temátíca, como desa-
fio, do mesmo modo que as críticas de Eca de Aueiroz
ao Poftugal de seu tempo, que eram, no íundo, um
gesto dê amot à terB.
0" ini"io podc.)arecer esotérico e pontifical
apelo pan que tc,:t-,, "lavem a burrc". A "sua" burra.
Mas para que Íe ..ntenda semelhante ptodígío se íatá
necessário, .D,es de tudo, tlue não tenhamos Nincl'
pio, o" . conhecdm.\ .'r'genn. que seiamos ape'
râs. nas. por enqunnla L bu,ra em paz, e i4í
' :,'.i í: iraieto virgetn. ,N,l',ier;út' a qualquer desco'
:tJ. )mpressentido por a, ..ias os ar', ',los que poF
t:. : ,ntecederan a :Jn,.: existência tht,ltanto tri
'). ou i:rlrpo de Ír;bos âutôctones. A Gonde Taba
siá .le bracos abertDs. As paiés em fesÍa. Nesse trí
.juf{ de Ínaraeatus e maacás, brÍncamos com a civilí
.ação, mesmo supartando, com incrível galhatdia, as
suas mais refinadas e complicadíssifias tecnicas, ape"
nas pelo masoqutslico prazer de nos abíiímos para o
mundo. numa divetsão que vem nos custando não só
os olhos da cara. e sim a carc toda.
15
Somos um povo em festa; um povo que íaz de
sua euforia a condição íinal do seu proieto de ser. fu uma vida própria, pode ser um curioso sintoma da
Oue não é um proieto: já nascemos prontos. E ao nossa maís ftdical difercnciação. E tanto isso pode set
contrário de Minerya, que iá nasceu armada, sutgimo§ ínterqetado como um desencontro conosco, ufi fe
púdio às raizes, para melhor acolher o que fot cotpo
iustamente desarmados da cabeça aos pés. O nosso
primeiro postulado filosófico seia o seguinte: as coi- pt|dnho - tal se [atalmente livéssemos que nos virêr
sas não estão aqui para ser pensddês. As coisas parece sempre no outro - como pode sugerir ou apontar pa-
não se encaminharem a nenhum destino: estão co- ra um novo estágio de cultuta sequer adívinhado por
mo existência apenas no ho/e. Num hoje pronto e nenhum povo. O problema é saber a que hsa nos le-
acabado que é em si mesmo o seu próprio futuro. No va.
futebol, no samba e no carnaval, já temos a senha dia- A nossa disponibilidade para o outro, para o
lética dos tt^ ettágios qu!) rtão lograram sequer ser alheio, para o exteríor à nossa ptóptia confíguração
âtingidos pelo nosso esÍorço: pois nos fc)dm dados sí tacial ou polítíca, elimlna, por prínclpio, qualquer
multânea e instantaneameote §em nenhuma necessida- barreira gue os povt)s scmpre mantíveram e sempre v
de dê síntese, sem nenhum percalço lógico ou metafí voltaÍão a mantei Não poderemos nos referir nem
sico, A nossa metafísica se deixa exprcssar pelo mais meomo d úmd pa,. ivpl barretr" lingüísttLr, poÍ ter
símples dos axiomas: na prática a teoria é outra. O mos recebido cono idioma a porÍuguês. Notêmos,
que significa dizet: não fomos feitos para as teorias. pelo contrário, que se os alienlgenas aqui são tardos
Contamos com uma pática, que antes mesmo de se em assimilar a nossa linguagem, nós aprendemos mag-
constiluir numa imptuvisação nossd, já ndsceu un niíicamente as línguas mais exótícas, com sotaques,
dom que dispensou a conquisla. Sambatuos, iogdmos ídiotísmos e o resto, embora venhamos depois a des-
e brincamos carnaval: logo existifios. Não há neces cobrit, pfovavelmente deslumbrados, que não soube-
sidade de um projeto c ador da história. Nossa histó mos ainda falar o nosso português, Ê quando viremos
ria é esse rcdízio constante que, todavia, redunda río a aprendê-lo eíalá-lo?Seo país que recebeu de graça
a sua independência - poderá ser por dom divino, den-
Mas nada disso impona. Eis o que nos importa. trc de pouco tempo, haia o que houver, potência
aqui não há trcdição; há sô presente. É como se o que
houvesse de comum até agora, entre os homens, tives Eu, btasileíro incotigível, um tanto xenófobo,
se que ser Íev;sàdo oú transmutado pot uma e^pcti talvez iânais venha a aprcndet bem uma língua alheía.
ência inteíramente nova de ser. Por exemplo: essa dispa Emboâ saiba que, pot isso, esteja sujeito a teminar
nibilidade - ou bem mais uma docilida(le que nos é só nessa opetução- Meu país até lá pode até tet ado-
nata - de aceitar e compreendet tudo que é alieníge tado as línguas de todos os povos, e pedÍdo inteira-
na, e só porque alienígena, e que não nos deixa adqui Ítente a sua. lmprevisivelmente, por outro lado, guem
sabe, suceda o míraculoso: o de falarmos ainda me-
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lhot o português depois gue o tivéssemos desaprendí "O lavar a burra" reprâenta íilosoficafiDnte,
do de todo. . . Somos a pát a do milagre. Ouvidar da para nós, o gue em milhares de anos de sabedotia não
nossa inteligência, setia como duvidar de uma forma tinha sido inexplicavelmente sancionada ainda pelo
de ser - a nossa de que não existe em nenhuma
- homem. O vamos lavü a butâ não só nos indica o
parte similat. Essa ausência de similitude na experí desafogo em que habituêlmente procurahos fixat a
ência humana, com os outros, contribui por outro la- nos* práxis existenciâ|, com exclusão de todos os
do para gue adotemos todas as demais simÍlitudes. outros valoÍes por acaso possíveis, mas o milagre de
Mas onde ficaria a fé no milagte, se o nosso gran- ser sem esforço. De um tão sumo mílagrc guerc me
de proíeta - Pero Vaz De Camínha que íoi portu-
- constituir en prcfeta. Vamos "lavar a burra", meus
guês no int'cío da nossa história,não tivesse cunhado a
- irmãos. Cada um a "sua" bufta, é clarc.
íftse pandigmática e defínitiva da nossa ptópria feí
ção nacional como "a terra que em se plantando tudo
dá"?
Não só em música, e em iogo, e em perpétua
íesta, somos díferentes: pot que não também em Íilo-
sofia? Se o ser não é, entre nós, algo de pensável , te-
mos na negação básica da tragédia e principalmen-
-
te da tragédia de pensar, ou de qualqúer outra trans-
cendêncía - o nosso modo metaÍísico Ínais peculíar.
Aue é o tátil, o posítivo, o imediato. O novo mundo
iá íoi instaurado por nós, sem que nos déssemos dÍnda
por conta. Auen sabe se a ausêncía de qualquer tra-
dição não seja o nosso privílégio? Ouem sabe, tam-
bém, se o fato de serrnos utn pcvo sem memóÍia, não
venha a se constituir precisamentE ,lurtê nova concep-

De qualquer íoüna contamos com o'nais buli-


çoso e festivo dos postulados: ser é "lavar a burra".
E este enunciado, de una extensão incomum, possui
aínda mais vasta aplicação ptátíca, por atingiL não sô
a nossa ontologia, ou a nossa mestiça antropologia,
mas a ética, a política, e todos os demais campos dâ
nossa ex per iênc ia h u ma na.

18 19
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I
EI
e,
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o
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ue significa o "lavar a burra"? A entrega total a
uma satísfação patente e garantida? E a quem nos eft
tregêmos por inteiro, sem tergiversações, sem recuos,
sem receios, e até mesmo sem decoro? Ao acaso. O
acaso é a única coisa garantída com a qual contamos.
Nós somos o povo do acaso. O acaso para nós é valor:
porque todas as coisas reíletem para nós a sua marca.
A alegria dos nossos avoengos conquistadofes ao se
refocilarem sobre o fruto das suas pilhagens, trans-
mitiu-se, hereditaiamenÍe, até o nosso sangue. Essa
gÍaca de tirar o melhor pdrtido dàs situacões, paret"e
sef o eco em nós do longínquo btado heróico que íi-
cou latente nos subteffâneos da nossa raça: "vamos
lavaf a burra'1 Tudo lern que se ajustar, sem maiofes
adaptações, sem circunlóguios, sem pensares, sem de-
longas, pois assim o queremos, no voluntatismo dor-
mente de quem espera em berço esplêndido.
23
Nada de aculturações demoradas para a nossa at-
díante da qual se torna pálída a sentença anglo-aÍte-
ma rcceptiva a tudo, venha de onde vier. Nós estamos
aqui, estaticamente prontos para a pilhagem, fruh e ricana: "time ís money". Tempo é ouro mesmo pafa
o nós. Radicalmente ourc. Mais que velocidade, ou efí
o gozar de todos os beB. fienos como conquistadofes
gue como conquistados das fiquezas e dos dons cíêncid ou c\igància das enqrenagens socidis e econd
ca- micas, é um tempo agoniado de ser tempo. É um tem-
ídos dasnuvens, gue nem os seguidores de Moisés
cdminhafem no deserto. naquetes epicos lefipos,
a po fulminante em seu prestlgio áurco, que não pode
so- espefaÍ o ver-se apenas transformado em ouro mas
nnaram sequet. Mas não e só o mdná, nem às
codorni apreenciidc etn si mesma como ouro: que gnga nufi
zes, nem a veneranda graça que nos caem do céu.
É escoar incessante e i)controlável que nos tonteta,
maís do que isso: é a caça procurando o caçàdor,
éa Pois scmos um povo entantecido pelo tempo. Por unl
queza pe$eguindo aqueles que dormem,
hipnotiza, temp4 que nas Ía1 dourâdos, quer na DÍetérítô
dos.pela opulência de uma gigante natureza, Dm seu
SonhO superlolérico da ldvdcdb da burrd
, rtdi. hnL;d Jàs udLlrcí, - !.ttoup nja pút-Llu de s,
Mortes trágicas. guerras heróicas, atitudes grandio- nní ouer nc íLtu!|'a] t tnais exaltado aarvít cla
sas, Íalb coliias jamais alterariam o nosso Eldorado,
cuja face gueda reflete apenas a certeza tranqüila Nada pade est,rihat tnati: aitnà do que um vasto
de terriúria, E este ô temas: t1âc precísatnos dc sef e/..
que aqui estamos geográfica e transcenclentalmente
-
situados.de maneira estratégica para todo §empre _
pansio!)islas, Já nascemos dentro da expat&ão. Se
esperando a burrinha que, ceda ou tarcle, írÍamperá De[ nãa nos constitu]Lt cm pttj/o eleitc. deu entfetan-
, j r j,,.,L:.-,: ,., ...,1,j j,4 ..csi.
entre os nossas capinzais flarescentes e plácictos e . .nJ!
ti,,Í. Ic
, t,. ,)e ara/i.;1.:;:..a.t,r,..
htstóÍica não presscntiíla
Eis a grancla inverc.;o
por nenhuma concepcão prollÍc.siva ou cíclica da
lempo - a exigir algo tambén| t),tÍ:4stpia pari) a/ém
de uma "transmutacão de valores,, L r/. pard o tttó-
soío alemão de Zaratustra representand r")a sohJcío 4UÍi" ',, S(i:)iu(ts Ltaü5 par .ie5.4ttiL1osj: ;i i!]arle.
.hàvp paÍd ê àmpttdcào ou d supetdcd-o dos :t()tlzon- Por l:ossttírtnos uma vasta Íerra, JanÉis a ttossa vohtii
dt. ., 'd tt, pelidd à quà|qúeÍ lcntdltvà oe e^panstont,
tes habiÍuais do homem.
mo. E se o próprio Deus foi tomado brastleiro, a nos-
Nós somos sobtetudo ruminantes, muito mais do
que se supunha o admirável criadot do sa condescendente misericórdia independe de qual-
Super-homem. quer rcligião que tivéssemos aceito. Será essa miseri
Nós ruminamos absolutdmente tudo. numà tufiind-
córdia um cansaço precoce de resolverrhos os proble
çao faptda e numa digestão mêis tàpidd aindd.
Não há tempo a perder: eis uma de nossas tábuas, mas, ainda quando estes exijam detenninação ou pul-

24 25
Em tudo e por tudo estamos aptos a exercer o
nosso ministério, não só filosoíico, mas poético e mís-
tico, para o qual fomos fadados: o de lavar a burra. O
de lavar a burft, sim, mas quando?

tlE CÍlull TAVAR A BURRA

26

L
-)-i:.::?,-.

0 pr,r,eíro drao p"ra que se lave a bufta é que a


burra exista. Não há. entrctanto, uma entidade mais
intdngível, que chega mesmo às raias da sobrenatura'
lídade. E é interessante rcconhecet que,ainda sendo
pôucos aqueles que tíveram uma experiêncía concreta
com a burra, nada vem se tornando maís contagiante
do que a necessidade de lavá'la. Somos, por todos os
títulos, o povo mais metaíísico do mundo. Pois esta"
é._ fios todos dispostos a lavar a bufta, ainda setu saber'
aí mos o que esta seia. O número dos que a lavarufi é
inÍinitamente menot do que o daqueles gue guatdam
a esperança que, às vezes, ulttupassa a morte, de lavá'

29
E sobre a discussão de um tema tão ímpalpável, se esgotasse, sempre nos re§tasse um fecurso mágico
para a maioria daqueles que viyem neste Paralso, a- patu adiar o seu cadávet e a sua conseqüente d*om'
inda surge um problema angustiante: como lavá-la? Des- posição. Por outrc lado vivemos apenas dentro do ho'
conhecem-te rituais mais complicados do que os dessa
ie. Tal se houvesse uma elisão do púprio tempo.
lavacão. Têm-se não somente que visralizar a bufta, De que forma conciliat essa aptidão de um povo
como de fazet o possível e o impossível para alcancá- êpenas paft o pfesente - e neste presente apenas paru
la. Muítos olhos estão cravados nela: embora, em o agora - cofio se nem o passado nem o futuro al'
in[tmeros casos, íixos sobrc o invislvel- Aue fazer? guma vez existissem, com esse malbafataf de um
FundamenÍalmente tet fé. e alguma esperança: não tempo continuamente amputado, decepado, degola'
é mistet fiais nada- do, na maioria das suas ftuções? A única Íoma de
A faculdade de brincarmos com o tempo parcce, concilíar semelhante paradoxo consiste, ao nosso ver,
à primeira vista, entrar em frcncd contftr!íção com a na lavação da burra. Dentrc de um tempo mais espe
nossa mania quase mórbida de entesoutá-lo, tal se o cial que o cronológico, e à patte mesmo de um sentí'
tempo fosse, para nós, constituido de moedas. Mas do cósmico que nele pudesse haver, rcstaria um tem-
estonteados e confu,os por essa verdadeira agonia po gue estivéssemos poupando apenas paft um dia.
de agarrar o tempo, antes gue ele nos voe das mãos, O grunde dia da lavação da burra.
estamos simultaneamente concorrendo para que as Talvez não esteiamos prcpandos pam o como l&
horas do cêlendáio humano nunca seiam aquelas que vála. Mas há ptodígios que podeéo despeftar, mês'
nele se encontram demarcadas, Deixamos de aproveí mo lançando fora a mais comezinha noção de tempo.
tar. muitas vezes, frações apreciáveis desse mesmo Senão também não se explicaia o caso de semos um
calendário, que se esgotam inutilizadas e sem ne povo conservador, e deslumbrado até pelo mais con'
nhuma sefventia, atrasando todos os nossos encontfos vencional. embon sem contarmos coh qualquer es'
decisivos com o tempo, coho se todas as horus e mi- pécie de tradição. Salvo as que achamos pot bem de
nutos perdidos fizessem parte de uma putpança espe- inventâr- Da mesfia Íorma não teríamos a§ nossas
cial para o século das vacas magras. E como se neste vanguardas. me$no sem dispotmos de qualquer espé'
exato século tivesse de irtumper, numa extrema con" ciê de íuturo.
tndição, o ptóptio apogeu das vacas gordas. Seria Ísso os nossos heroísmos. dêstituídos ernbon de br*
uma fé nas metamotfoses: as vacas gotdat saindo das vatas espanholds, conseg@tu ser. pof coota disso,
vacas magras? a multiplicação dos tesouros brotando n'rais fascinantês do qre sê porvehtura existissefi. E os
precisamente de um dissipar sem conta? Alimente nossos burocratis,Ítos trÉis convictos que ats drtopcut
mos como que uma cfença escatológica, de fundo se ou r@rtÂnericaoos. indqendem, irclu§ive, de uma
bastianista, na ressurrcição até dos nossos tempos conplexidade que tecnicafirênte sequer chqanos d
,nalbantados. É como se,quando todo tempo urn dia atiogir; e, além dd nsessidade. e5se r6peito, e§a w-
30 31
neração pelo papel
- como a dos nossos antepassados dos. potque os rccebendo iá prontos, evitarehos nós
indígenas pot- miçêngas, e espelhinhos, não tão distin- o trubalho de faz&los E não setá sem uma pasmêda
ta da nossa de hoie pelos hotóscopos e pelos
Nonun" admiração que se dÍrá de nôs: tão io:ven6 e tão buro-
ciamentos oficiais cratasl
- talvez nos fêÇa entendet melhor
porque, sendo um povo de burocratas natos, sejamos A burra estará sempre à nossa espera. Mas aonde?
conseqüentemente - feliz conseqüência - um povo No Íim da picada: lá onde tudo é possível, porque iá
de poetas, e, por extensão, uma matriz fecunda de se perdeu toda a noçãodo possível. Se nenhuma íada
todo tipo de heróis. sorri sobre os nossos destino$, uma indefectível burra,
O nosso burocratismo faz a história. daí seu dom ld no íim da picada, vela e softi por todos nós.
especlÍico em relação a outros burocratismos. E isso
automatÍcamente explica o fato de constituiúnos um
povo de poetas: trazefios a burocrdcid nu \dnoue-
Transformamos tudo em pdpel. No sagrado e ciera
do papel. E do papel irompe, como não poclerja dei_
xar de ser, a nossa miraculosa história e, com ela,
todo um cortejo imprevisível de heróis. E os maiores
heróis teriam de ser íatalmente os nossos poetas. Em
se\J hercísmo, sobtetudo, de não acreditarem muito
no heÍóico de sua postura ou posiÇão.
Nada mais inexplicável, ttatando-se de uma naÇão
tão jovem, do que essa estranha destinação nossa pa-
fa transformar tudo em papel. Mas quem não díspõe
de tmdição, se compensa no sistema. Na complica-
ção, absolutamente dispensável, do que se compreen-
de tão bombasticamente como sistema. Tudo então
se torna pretexto para registtos e códigos e documen-
tos. As coisas iá surgem oficiais ou oficializadas- E
a históia iá nasce empêpelada para o consumo furio-
so dos que, no hoje, não podem dispensar a doce e
embaladora chêncela oíicial. lsso nos impossibilita
de esperar o surgimênto, ocrescimentoea maturacão
de nossos lídercs, ídotos ou herói§, Entrctanto, por
outro lado, achamos melhor que eles sêjam importa-
32 33

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0 gr"nd" postulrdo, "ser é lavat a burô" conver'
te-se rapíclamente no: "ser é lavar a minha bufra"'
Não ie consegue, entre nós, raciocinat obietivamente
sobre uma palavra de extensão tão gtaode como ser'
Alíás não se consegue compreender qualquet coisa
quan.lo tomada em sua obietividade, Pois toda obie'
tívidade nos parcce ligada, de modo imediato' coh
um suieito: este suieito, particularíssimo, é cada um
de nós. E tudo que consiga escapat desse patticularis-
mo tão pouco metafisico é para nós transcendêrcia'
Trunscendência sería, por exemplo, imagínat uma
butm que não fosse nossa, mas habitassê outras c@
cheirus. Ou imagihá"la lavada. ainda que não seia um
de nós o rcsponsável por essa lavação.

37
No ato, imprcvável natunlmente, de cada um la- não sefi uma ponta de riso, deixasse dito de gue ele
vá-la, càdà um por suà vez, se obteria a noção univer- não nasceu para reinar, mas iá nêscêu reinando, Nós
sal de que todos objetivamente conseguiram operar o também como povo já nascemos reinando: apenas
ritual da lavação: e, dessà forma, se atinghia a com. não nos descobrimos ainda como donos desse reino,
preensão radícal de uma possíbilidade, a gual se realí Daí o reinarmos sem saber. Sempfe num futuro que
zando em nós - ainda que apenas ern um de nós - não ultrapassa as baffeias do presente. Sonhamos ata-
íez-se símbolo para todos, Vemos, pottanto, elevar-se dos às peias do agoâ-
à categoría de símbolo a resposta paft um catso partí Porém ensinamos ao mundo uma gnnde licão:
cular. As manobras que utilizamos para atender a um se nada nos resta mais do que uma burfa (lefibrese
dado interesse: eis notsa concepção de universalidade, que, para os nossos ancestfais, a burfa representava
quet de uma idéia, quer de um programa, quer de uma mala abarrotada de ourc) extâímos desse im-
uma ideologia, de ufia àne ou mesmo de um iogo. pondetável sentimento de posse uma ética de alcance
Uma máxima que venha interessar a todos terá universal: a de que todos os outros tenham o díreíto
que provir ptimeito do nosso interesse particular. Só de lavar a sua burra.
o fato de algo mobilizat patticularmente o meu iÍt" Cada um de nós guarda, no mais abscôndito e
teresse pode exemplarizar, em sua funcionalidade recatado das nossas aspÍrações, essa legendáia fiala
imedíata, uma razão uníversal. (E o que é válido paft ou essa lcgendàtia buttà. PorvenluÍa, mcsmo não se
a verdade é também válído paft o erro.) A nossa as" levdndo em contd uldnignos de qudlquet espéc;e,
t(lcia consiste quase toda num tatear eterno em busca em nós dormitam os mais rícos sottílégios que, espera
do pelo dourado dessa magnificente burra com a mos, - os màis patríotas não estão feservados ex-
qual iamais pararemos de sonhar. Dessa esperança é clusivamente paÍa os ursos e os piratas. Mas enquanta
que advêm a nossa alegria, a nossa eÍusão interminá" isso - e at pstd a desdobtdmento da nosso enstna
vel, o nosso deseio de se perder pot um nada ainda ético - aconselhamos de graça paÍa os mortais: La-
quando esse nada não passe de utua simples bola ba- ve cada um a sud burra. E deixe, também, que cada
tendo nas traves do destino, como sucedâneo da inca- ufi lave a sua burrinha em paz.
pacidadê de atingirmos o objetivo próNio da nossa E quo nuncê p,nemo\,lp lpnb,.t umà pJiseoeíh'
a do fim da picada. Num englobaÍ .lue valdas hiléias
iogada no mundo. Ou será que não estamos preocupa"
ine>,iríucáveis aos pampas e às caatingas. Não há pai
Os grandes ou pequenos pÍ@onceitos felizmente sagei) tfiais vasta pard um sonha. Nela utna burÍe
não passariam para nôs, até hoie, de ninharias; e, há (ie esperar por nós.
todavía, tanta liberdade do ser não nos deu ainda
aquela cefteza, nesmo velhaca, gue fez com que o
filósoío Matias Aires, em sua louvação ao rei D. José,
38 39
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la u.u to^" "onê,
com a qual costumamos üa'
tar aqueles gue panmm de disputar conosco: home'
n4aálos histericamente. através de lágrimas e discur'
sos intennioáveis, de hinos laudâtorios, de rêzas, de
coroas, Os mortos, sim, os mottos seáo sempre muí
to pnnteados: e a morte traz consigo o misterioso
condlio de tomíílos melhotes do que nunca em vida
supuseram ser, ou porque soube{,sem da sua real eô'
tatura, ou potque morrerdm na absoluta ignorância
dela. E na rcatidde nem a bondade, nem a generosi'
dade, nem as virtudes menos exigentet, se conttitu'
írem sequer na preocup4ão dês§s no§scÁ tão pnntea"
dos mortos.
43
Felizes d'aqueles que não mais vão lavar a nossâ
Mas a baiulação, gue ultmpassa até o domínio da burfa: pensa com certeza cada um de nós, Porque a
vida mortal, encontrcu no elogio deslavado dos nos- bufta é, pot principío, nossa. Ptotágoras, que era grc'
sos mottos a ptimeira de suas respostas. A ptópria go, doutrinava que o homem é a medida de todas as
mofte, com efeito, vê-se mefecedofa de encômios coisas. Nós, que somos brasileiros, colocamos no nos'
tais como a vída nunca os teve. Tudo porcue menos so eu todo o peso dessa medida.
um deixou de lavar a burra. A possibilídade. pottan- Mais felizes, poéfi, do que aqueles que se foram,
to, de a atíngirmos tornou-se, com os gue se vão ou sefemos nós, os que fícamos, nós que contamos com
os que se lordm, muilo fiaior. Já que a gruma não a sorridente perspectíva de voltaf nossos olhos para o
vem dando para todo§, disputamos agoniadamente infiniÍo horizonte em que se delineia, mítica e masca'
os seus pedaços, se bem que com uma elegância gue rada, a eterna promessa de todos os dias. Não o sol,
céÍacteriza tão viva?mente a nossa formaeão. nem a lua. Mas a burfa.
Se a bajulação não só àqueles que morrem, fias Alguns, principalmente os norte'americanos, olha'
também àqueles que vivem, se transíomou numa ins- am embasbacados para um disco voador, tal se fora
tituição nacional, isso se deve, entre outros íatores, uma deidade, proietada sobre os céus, Nós, mais mo'
principalmente a dois: a de não se quebrar a corrente destos, divisamos, na promessa da burra, o obieto da
que nos liga à ancestralidade - porque foi baiulando nossa mais áurea conquista. E no maior pasto, ao qual
que nossos avós nos legaram a herança de hoje -ea não faltará capim. E onde fattos, ao ruminá'lo, atin'
de nos perpetuarmos, ainda que equivocamente, na giremos a I lumínação. O Sato . O Ni ana. O Paralso.
memória dos outÍos. A bajulação, em sua estranha Tal como Nabucodonosor, o sábio rei. o alcançou.
miseÍicódia, parcce impossibilitar ou adiat semprc Numa súmula, Íinalmente, da nossa mittua e etet'
a certeza inquestionável da nossa morte. E, dessa for- na bajulação - única arma de defesâ encontrada para
ma, chegamos à última agonia seú percebermos,quí- suportarmos um futulo que não vem - ruminamosas'
çá muítas vezes, que não mais pettencefios à mun- sim a nossa miséria, e dela sairemos, de qualquer íoí'
ma, com o sonho da Fattura. Pois a espetutva existe
A bajulação constitui-se num iúlln da vída contra para essas coisas.
o logro da motte: tal metafísíca, que a iu.tifica peran-
te os nossos olhos, evitdndo-nos o escrúp t:a c o ê-
mo$o explica, provavelmente, porque somos tão
pródígos no elogio aos nossos morto' Por nos deixa"
rcm livre o caminho para que lavássemos a burra, e
também por nos permitit lhes agrudecermos, pela
nossa memória, à posse tão cobiçada de tão grande
bem.
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f,eouo . ,- e g.andPs qLta.. Iodot. numa antecipa-
cão t.,t !:;iísrca, forÇam a aptopriação das coisas antes
dua ttàs cheguem pelas vias previs/veis e naturais. As'
.;Jn se explica porque mais da metade dos nossos lava'
lores chegassem à lavaÇão de uma burra que afinal
.:hes enlouqueceu a cabeça. Dessa forma os nossos
Í;taiores conseguiram, até hoje, lavat a burra. Não ca'
nonicamente. Absolutamente íorc dos cânones. Não
a burra, mas o sucedâneo dela. Veia-se até que ponto
a metafísica nacíonal ultrapa$a limites, mesmo sem
tê-los como ponto de pattida. Mesmo sem saber que
eles existem. e antes mesmo da núessídade de ultra'
passáJos,
49
que
O roubo, qualquer rcubo, passa pot uma ativida como burÊ. Aue a clefiência dos nossos deuses,
de lúdica, nada criminal. BoubaL fhudar, extorquir, são tantos, os aiudem - aos caciques e
paiés - nu'
com ou sem eufemismos, é atividade, entrc nós, prin- ma coisa: a se afundarcm cada vez mais' Valhd-lhes
cipalmente dos que não têm Íome. E por quê?.Poryue o prestígio itusótio da taba, e o nêda de uma au'éola
a fome de lideranças não leva em conta a fome primá- que não convencerá a fiais ninguém,
ia e elementar dos que prccisam de pão para sobrevi- Ctiaram maruinais, mas não conseguem entendê'
ver no mlsero e inevítável plano biológico. É uma ío- los. Aufientou'se, com isso. o número dos marginais
que ela
me, a delês, que quer íraudar outra fome: a dos que involuntiários da burn. O que não inpede
não queriam estat pilhados. Um autoritarismo plebeu contínue sendo sonhada pot aquele§ que vetdadeira'
parcce conslituit a base de esptÍito dos que, não sc mente a mefecem.
sabendo plebe pof escolhd própnd. deseiam apenas Aqueles que, sonhadorcs petpéfuos das loterias.
dominar, e sem conhecer o espirito da grande plebe, se desmilingüem no nada de suas vidas desamparad$
e as suas carênciêts e contradições, abacanham uma para acolher o rcsultado que eles, os fiaiorais, apenas
nobreza pêfa que não nascefam nem íoram prepafa- esperam paa si ptóprios.
dos. Abaixo que são da pequena e da grande plebe. cinkmo contraditório - estão se negando' os
Abaixo de sÍ mesmos. caciques e os paiés, à ímagem que de si
prctendentu
Mas a burra vai longe. A burra vaí muito longe. fazer para que uma taba Íaminta os aplaudisse'
A burra não chegaÉ a lugar algum? Auem a encontra" ionclusão: a buffa, a grande burft, morretá sem
rá? Se os maiotais da Tabê começaram por exerceÍ a ser entendida' Nem âchada, o
que é muito piot'
pilhagem dos que nunca conseguiram ver a burrc
nem em sonho. A pilhagem dos que nada têm para ser
pilhados. E o resultado é o mais curioso: a taba passa
fome para que os seus cacíques e pajés se locupletem.
Tais caciques ê paiés forçam rcvoluções. à direíta
e à esquerda, que apenas fetrogfadam o tempo da
Taba. São liberais sem rcspeitat a libetdade. São auto-
ritários desconhecendo o gue significa autotidade. Os
caciques e os pajés enlouquêceram e a taba, toda taba,
ficou muda: os primeiros não sabem de ideal; os se-
gundos não sabem de pão. Te ninou-se cruelmente
por lesat os dircitos da burtu - esta entidêde metafí-
sica que, como os deuses, necessita tânto da nossa
comprcensão e principalmente de se sentir conhecida
50 51
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À pri-"iru a* nossas sub.,,:rviêt)cias é ao tempo.
0' A ultimd modd, tlmd .p/ -'.s'.t.,toà, ddqu;ÍP d consis'
t tência das ditames tnila: tdÍes. Auanto ao passado, se
,l':I retóm apenas o qttc t.uve ou possa ainda haveÍ nele
de rcpetitívo. A::::i! i camo o Último cacoeÍe se torna
l.
dono da sítu:) : ), unta cólica do passado passa a co'
manddr as - .isas vidas, Chememo la, pols, de subseÍ_
viência t riiporal.
. segunda das nossas subsetuiências, que se en'
"1),..)a na primeira, é â subserviênc;a antológica. Um
sonsto cretino do passada, ou uma ma.dinha da mais
baixi categoria, se agaffa visgosamente à nossa sólida
itemória nacíonal - aliás, fiemó a sem memóría -
como Íemos presos às costas dos condenados às galés.
sem que possamos nos desvencilhar de semelhante íei'
tiÇaria. Um poeta brasileiro, que um dia cismou de
cantar as pombas, está hoie sentenciado, pot toda a
etemidade, pela maldição de iamais desptendet tais
pombas de sua vida. Ai dos condenados às antologías!
55
as letns, as ciência§ e as artes, se encarregam de fazer
Ai das pombas ou das cigarras gue não morrerão ia-
mais! EntÍe as condenaÇões lalvez não haià pior, nes.
o resto até culminar na transfomação em dogna do
ses casos, do que se estar condenado a não ser esque-
culto, jamais periclÍtante ou moribundo, do chefe.
Dessa foma não poucos têm deixado de lavat a sua
cido. Pois o esquecimento também salva. Mas é dessa
íorma que muitos lavam a burra entre nós. Por um burn. O chefe está em tudo: multiplicado em chefes.
I Embora não haÍa chefe algum, De um ponto de vista
nada não são poucos os que chegam à glóría eterna;
por um tudo, ao contráio, muítos se deírontam com teológico, teúamos a díluição do chefe nos chefes. A
I
I seu próprio sepultamento sob as duas do esqueci-
infinita multiplicidade deles teminou por gerar uma
erpécle de panteísmo do chefê.
mento e da mofte.
I A terceira das nossas subserviêrlcias é ao exletiot. Ouths especíes de subserviência podem conside
rar-se ftmificações das cinco formas assinaladas. Essã
Basta um débil mental cruzar o Atlântico, em deman'
subsetviência ampla, total, abissal - com suas frentes,
da de outros ares, para ganhar, entfe níis, a estatura
seus acordos, suas miscigenações ideológicas, etc.
de gênio. A rendicão dos nossos ao que íoÍ de fora
não seria a nossa forma de nos inclinarmos metaíisí
nos permite à indtlívcl graca de iamdis dL;ngitmos o
camcnte à tolaliddde do real que aIé agora conseryt
conhecimento de nós mesmos. Só nos rendernos, fora
disso, ao gue houver de pior dentro da nossa forma-
Esse deseio de lavar a burra, de qualquer ieito,
Ção. Notma da sub6erviência do exterioti ser sempre
não se a, ainda, de nossa parte, uma tentativa de retí
no outrc àquílo que não conseguimos ser para nós
ficar, pela continuidade da rotina - aqui adorada co-
mo um deus, ou como o perpétuo devír - o preceito
A quarta das nossas subseviências é à convenÇão
áurco do deíxa-disso ou do deixa-pra-lá, para ver de
de respeitabÍlidade. Fazer.se rcspeitável, ut parecer que ieito a coisa um dia fica? Lavemos a burra, ir-
respeítável, veio a constituir-se na ânsia suprema do
nosso espÍrito. A sanção acadêmica, as gloríolas
mão' E viva a nossa inocêncía-
adquiridas, à dura força, pela auto-louvação ou lava-
Ção grupal: assim se alcança o remate da nossa traie-
tória existencial. 6ssa é a subderviência ao respeitiá-

A quinta das nossas subsetviências é o culto do


chefe, seia qual íor o chefe, mesmo sem §er chefe de
ieito nenhum: ser chefe é, de certo modo, participat
da divindade. Rit e chorct com o chefe: tal a norma
de tal subseruiência. Á subserviência ao chefu, Os
múltiplos coronel ismos regionais, üí,nsplantados para
56
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Tludo se nantém por meio deld, a suberyiência:
nada se alten, nem se trahsfoma, potque a subseruí
ência. da qual todos teminam por dqender, coluna
que é de todo o oruEniimo, e sustentáculo de todos os
ótgtã6, gannte a etemidade ou. pelo menos, s longe
vidade dos nolsos siste as e instituições. De sisÍemas
e instifrJiçõês gestos pelo cupim que. no cupim, itt-
sistem en peman*er. E ainda não entendenm, co,lt
pensatoriamente, a aberfrna do capim que, em sqt
vetde, pode talv e renovar. E uÍP butm iovicta ê
incólune, 6peta, vhídente sobre o vetde, a a<plogão
do caos ou da ordqn, e não sabe qual d6 úras explo-
sõ.§ virá. Salwmos, en6o, a burc. A buüa, nossa
éd,pe.?,nça. dare ser safua.


Uma taba. tão rcligiosa como a nossa))arece re ção? Essa butrice que contrcria à burn? Aue contrc'
jeitar os fâmintos do capim. E da alegria. fudo-pot- ria não só ao divino, mas ao humano e ao animal que
que os caciques e paiés, vendo que o capim vai se há burn?
tornando Í,ais carc, por mercê deles mêstuo' contam Como crer no Divino, se dependemos apenas
com uma alegtia que não pode irrompeL A alegria dum humano que esü abaixo do capim que lhe é
dos famintos de pão que aspirafi, peto menosffur di- prcmetido? Como, por (Ntrc lado, crer no humano,
teito ao capio. E viva a laba, e viva a alegria, mas co- se este se recusa ao Divino? Porque o Divino, sem o
mo? Salve-nos, Senhot de todas as tàbas, se o capim humano, que pode senão recusar?
ficêt mais caro gue o pão. Salve-nos antes do pão que Como crer no Humano e no Divino, se não há
do capim. Oue o pão não há mais. E se não houvet cheíes nem súditos; se a espinha do Homem se que'
brcu, e não alcanÇa, a essa altura, sequer dobrar'se
Mas a subseruiência não nos deixa. E a burra vai pata o Divino?
se tornando mais distante e mais inatingível- E a taba, A burn está abandonada: nem o Homem nêm
cada vez mais magra, não atina em que direção sewiL Deus, ainda à força, poderão aiudá-la..Aúebramo'nos.
E os caciques e paiés, cada vez maís atarantados, não aue fazer? Viva a burra que se perdeu!
sabem que destino dar à tribo. E nót, o que havere
mos de sabet?
O Nada? Mas o Nada não pode intercssat aos que
exigem o tudo: a burru, E ninguém consegue estar
abaixo do Nada. Abaixo da baixeza, gue existirá? E
como, por outro lado, ela, a baixeza. se iá ultnpas-
sar? Pode? Se pudet, o que farcmos da grundeza dos
pa§to§ que, pot tantas preces, e tantos desejos, e tan-
tas náuseas, e tantas crises, ainda não atingimos. Re-
conciliemo-nos com o Divino. E o Divino seÉ a but'
ft de todos nós. Uma bufta essa caixa de PandoÍa
- -
que está ainda mais acima da burra de cada um-
Mas os nossos avatares e os nossos guias, cada vez
mais raros, quando não invisíveis. que aspinfi, junto
a tais deuse, a colaborü com a nossa salvação, não
dispõem de meios porque nos recusamos de sal-
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var ninguém. Não queremos a salvação e queremos
nos salvar. Como pode ocorrer senelhante contradí
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i a cansada ínocôncia das que emeígtram o'a seni-


lidade npsma sem tt.,Íem conhecido a ;nfáncía, a vi
ram naquela a verdadeira tàcc de sua orígem. Ai dos
que nd\.ndm lh idu, ,lnles do ,atnpo pdrd qup asstn,
bem lúcidos, saubessem apenas o quanto vale o não
//tr sabeÍ. No torto, amar o tarto, mesmo sem a ânsia de
endireitá-lo, mas como? Nascer-se cego para depois
/ ry/1
ver na cegueira o sucedâneo da luz do olhar? E, nes"
sa ttuietória, a nossa hittória,é sempre um logto. Co-
memos um capim que as alimá as mais remotas rejei-
taram, e o nosso íuturo se endercça a uma buffa que
não conhecemos. Tanto melhor: o nome disso é mi-
to. Para os que nunca o tiveram, é mito tudo o mais.
Vestimo-nos da ausência de todos os carnavais
imaginários, sem que pudéssemos ainda conhecet o
nosso próprio carnaval. Alegramo-nos de ufia alegúa
alheia, e nos entÍistecemos com uma alegria que po-
67
Porém se observarmos um pouco, não úo nasas
deria ser nossa. A tal desacerto chamamos festa, e
tama alma, entregue aos ventos mais dispe6os, me' as tangas que nos cobrcm o cotpo, nem os cocares
que nos enfeitam a cabeça. nem as danças que nos
nos à atnosfeft, que lhe seia própria, veÍtos a slnte'
se da liberdade, Dessa forma desenvolvemos nos§a movimentam os membros - nem me$no o tiÊa,w é
o de nossas guerías.
eqerunça: na negação como forma de fé; na prcmis'
cuidade como princípio de carátet; na baryanha da Enquanto estavamor dormindo, irônicos duendes
própria alma como essência do nosso íuturo de indí - para os quais alargamos desmedidamente o cachim-
víduos e de povo. bo da paz - mudarcm não só os nossos gestos, mas
Nascemos velhos: ê isso para nós é ter fututo.
até as nossas fomas: dera,ftnos até outra carne ê
outro sangue. Pensamos ainda existir, e é hossa única
Futuro é o que não nos falta: possuímolo até demais,
vantagem. Auem sabe se também mudaram a cor
Será pela vantagem de nascermos velhos que a nossa
da nossa burra? Paru os que ainda pastam, senprc há
toleÉncia iamais se quebra, ainda diante dê gue nos
de restar uma esperunça.
espolie, nos deÍotn e e nos degrade? Só esttunhamos
a nossa púpria face. Esta parece ser a nossi, funda'
Recife, junho a iulho de 1978
hental estanheza. Tivemos alguns Canudos - e isso
há muitos, muitos anos - nas para nos contentar
basta macunâinamente o selo na carne de u,n herói
sem caháter.
Eis a forma que encontramos de ultftpassêr a
jamais aceita miscigenação: dispensamos o caldea-
mento que produz a têmpeft, Dispensamos, portanto,
a t*npera, A nós só nos interessa a misturação: só
não nos quisemos comptumetq com a difercrça.
A nossa difercnça. Pois o nosso marco é llquido.
E em água se detete o nosso sanglJe. Poís a águâ íaá
crescet mais âihda um mat que não é nosso. Para
que se embebendo mais a mais de§8a água, nos aÍogue'
mos todos.
Dançamos, pobre§ lncolas, o nosso furor perante
umê fogueira êxtinta: a nosta taba. Dançamos, cada
vez nais absortos, iulgando que as suas chamas ainda
brilhem. A i$o nos conduziu o nosso sonho. Sonho
de uÍra burra que tÉo chega nunca nem acaba mais.
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