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Quem se educou por uma tal escola sempre achou correto, então, o uso de metáforas
vindas das ciências naturais para as ciências humanas. Mas quem se educou na escola
de Tocqueville conseguiu compreender Nietzsche e perceber também o inverso: muitas
de nossas metáforas das ciências naturais, e talvez a própria direção de investigação das
ciências naturais, só avançaram por conta da força do modo de vida social vigente. Ou
seja, o antropomorfismo já teria ocorrido bem antes, nas ciências naturais, de uma
maneira sorrateira. Tocqueville viu isso ao falar de como que povos democráticos, que
primam pela igualdade – americanos à frente – começariam a dar mais confiança para
ideias cada vez mais gerais, cada vez mais capazes de serem ideias de todos,
renunciando ao particularismo, ao detalhismo, às diferenças que, enfim, seriam mais
próprias de nações regradas por princípios aristocráticos, ou seja, por diferenciações.
Ao final do século de Tocqueville, que escreveu A democracia na América em 1835,
Nietzsche consagrou essa descoberta dizendo que leis da natureza, como as de Newton,
de igualação de comportamentos, só foram possíveis por conta das revoluções
igualitárias modernas. Nietzsche nunca deu crédito, na sua cosmologia, a princípios
igualitários. Para ele, os físicos nada eram senão decadentes democratas meio que
inconscientes.
Aprendemos aos poucos que o rigor de uma narrativa que se pretende científica não se
faz senão pelo modo que seus autores possam estabelecer palavras com significados
destacáveis, especiais, que em geral se chamam conceitos ou então “termos técnicos”.
Não se trata aí de uma disputa de significados, mas de uma disputa de impacto. Há frases
quer são impactantes, nos colocam em situações que chamamos de “rigor”, e outras
que nos impactam a ponto de falarmos que estamos no âmbito do “amor”.
Uma narrativa teórica possui conceitos e termos técnicos. Uma narrativa poética não.
Mas em ambos os casos, nada temos senão metáforas, senão disposições de transporte
de um termo de um campo para outro. Ou da natureza para o humano-social ou do
humano-social para a natureza, ou do fígado para a moral ou da moral para o micro-
físico etc. Fazemos um jogo de ir e vir na linguagem, sem que exista um porto seguro
final. Não existe o literal. Não existe o literal no sentido de o último reduto da linguagem
na qual esta espelharia de fato o que se descreve como que emanando dele, como se o
linguístico estivesse fundido no não linguístico.
Essa maneira de ver as coisas nos cativa hoje em dia. Coloca os fundacionismos de lado.
Mas não elimina nosso desejo metafísico que nos leva a achar que podemos, sim,
encontrar algo que seja mais literal que qualquer outra coisa. O literal é um fantasma
para pós modernos como nós. Quem disse que fantasmas não atemorizam?