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Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br
Sandra da Costa Lacerda
Dicionário
Caro(a) aluno(a), observe que, em face do das capacidades cognitivas básicas (a capacidade
anteriormente exposto, a controvérsia na inter- de generalizar, recordar, formar conceitos, racio-
pretação do crescimento educativo é colocada cinar etc.) em todos os grupos culturais estuda-
nos seguintes termos: enquanto o enfoque cog- dos. As mesmas pesquisas, entretanto, ressaltam
nitivo-evolutivo considera que a meta primordial diferenças na maneira de utilizar capacidades
da educação deve ser promover, facilitar ou, no em situações concretas de resolução de proble-
máximo, acelerar os processos naturais e univer- mas; e, o que é mais interessante, mostram que
sais do desenvolvimento, o enfoque alternativo essas diferenças estão relacionadas aos tipos de
considera que a educação deve ser orientada experiências educacionais. Tudo parece sugerir
mais à promoção e à facilitação das mudanças que existem alguns universais cognitivos, porém
que dependem da exposição a situações específi- o fato de serem, efetivamente, postos em prática,
cas de aprendizagem. depende da natureza dos aprendizados específi-
Em nossa opinião, ambas as posturas con- cos propiciados pelas experiências educativas.
têm parte de verdade, porém traduzem igual- A partir dessa constatação, inspirando-se
mente uma maneira incorreta de entender as fortemente, por um lado, nos trabalhos pioneiros
relações entre aprendizagem e desenvolvimento, de Vygotsky, Luria e Leontiev e, por outro, na pes-
que deve ser superada. Nos dois casos, os proces- quisa antropológica, surgiu uma nova proposta
sos de desenvolvimento e de aprendizagem são que supera a controvérsia descrita e reconcilia em
considerados quase independentes; atribuem-se um esquema explicativo integrador os processos
quase exclusivamente os primeiros a uma dinâmi- de desenvolvimento individual e o aprendizado
ca interna da pessoa, e os segundos, a uma pres- da experiência humana culturalmente organiza-
são externa. A diferença reside na ênfase dada, da (o que denominamos de aprendizagens espe-
mas nas duas posturas pressupõe-se que a única cíficas). O conceito de educação subjacente ao
relação entre elas é de tipo hierárquico: a apren- modelo de currículo que defendemos é tributário
dizagem subordina-se ao desenvolvimento, ou o dessa proposição, cuja ideia básica consiste na re-
desenvolvimento subordina-se à aprendizagem. jeição da tradicional separação entre o indivíduo
Saiba que a ideia de que existem proces- e a sociedade, que costuma ser introduzida pela
sos evolutivos e processos de aprendizagem in- análise psicológica.
dependentes entre si deve ser rejeitada, porque Observe que, nessa óptica, todos os proces-
contradiz algumas contribuições recentes da pes- sos psicológicos que configuram o crescimento
quisa psicológica. As pesquisas antropológicas e de uma pessoa – tanto os habitualmente consi-
transculturais têm manifestado a indivisibilidade derados evolutivos quanto os atribuídos, tam-
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Currículos e Programas
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des educativas igualmente importantes (na edu- social etc.), que também deveriam ser considera-
cação familiar, na educação extraescolar, na edu- das na análise holística do fenômeno educativo
cação impulsionada pelos meios de comunicação (COLL, 1998).
Você sabe que papel desempenha o cur- atividades de ensino especialmente pensadas
rículo nas atividades educativas escolares? Que para esse fim. São atividades que correspondem
elementos inclui? Em definitivo, que é o currícu- a uma finalidade e são executadas de acordo com
lo? Essas perguntas são realmente difíceis de res- um plano de ação determinado e estão a serviço
ponder, pois, na prática, cada especialista tem sua de um projeto educacional. A primeira função do
própria definição com nuanças diferenciais. currículo, sua razão de ser, é a de explicitar o pro-
Evitaremos o debate sobre o que é o currícu- jeto – as intenções e o plano de ação – que presi-
lo, limitando-nos a precisar o que se entende por de as atividades educativas escolares.
currículo na proposta e aceitando que existem Delimitando-se como projeto, o currículo
outras concepções diferentes da que aqui se con- é um guia para os encarregados de seu desen-
templa, porém sem polemizar. volvimento, um instrumento útil para orientar a
O caminho que leva à formulação de uma prática pedagógica, uma ajuda para o professor.
proposta curricular é mais o fruto de uma série Por essa função, não pode se limitar a enunciar
de decisões sucessivas do que o resultado da uma série de intenções, princípios e orientações
aplicação de alguns princípios firmemente esta- gerais que, por excessivamente distantes da rea-
belecidos e unanimemente aceitos. Consequen- lidade das salas de aula, sejam de escassa ou nula
temente, o que importa é justificar e argumentar ajuda para os professores. O currículo deve levar
sobre a solidez das decisões que vamos tomando em conta as condições reais nas quais o projeto
e, sobretudo, velar pela coerência do conjunto. O vai ser realizado, situando-se justamente entre as
caminho mais direto para precisar o que entende- intenções, os princípios e as orientações gerais e a
mos por currículo consiste em interrogarmo-nos prática pedagógica. É função do currículo evitar o
sobre as funções que ele deve desempenhar, e, hiato entre os dois extremos; disso depende, em
para identificá-las, convém recordar e ampliar o grande parte, sua utilidade e eficácia como instru-
que dissemos anteriormente a propósito da na- mento para orientar a ação dos professores.
tureza das atividades educativas escolares. Essa O currículo, entretanto, não deve suplantar
modalidade de educação surge quando a simples a iniciativa e a responsabilidade dos professo-
participação nas atividades habituais dos adultos, res, convertendo-os em meros instrumentos de
bem como sua observação e imitação, não são su- execução de um plano prévia e minuciosamente
ficientes para assegurar aos novos membros do estabelecido. Por ser um projeto, o currículo não
grupo um crescimento pessoal adequado. pode contemplar os múltiplos fatores presentes
As atividades educativas escolares corres- em cada uma das situações particulares no qual
pondem à ideia de que existem certos aspectos será executado.
do crescimento pessoal, considerados importan- Os componentes do currículo, os elementos
tes no âmbito da cultura do grupo, que não po- que ele contempla para cumprir com êxito suas
derão ser realizados satisfatoriamente ou que não funções, podem ser divididos em quatro grupos:
ocorrerão de forma alguma, a menos que seja for-
necida uma ajuda específica, que sejam exercidas
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1. Proporciona Informações Sobre o -se mais ao plano de ação a ser seguido de acordo
que Ensinar com elas.
Este grupo inclui dois temas: conteúdos Um dos problemas intrínsecos na ela-
(termo que designa aqui, em sua acepção mais boração do currículo reside em decidir
ampla, o que chamamos de “a experiência social como concretizar esses diferentes elemen-
culturalmente aceita”: conceitos, sistemas expli- tos e em assegurar a coerência de todos eles.
cativos, habilidades, normas, valores etc.) e obje- Em resumo, entendemos o currículo como o pro-
tivos (os processos de crescimento pessoal que se jeto que preside as atividades educativas escola-
deseja provocar, favorecer ou facilitar mediante o res, define suas intenções e proporciona guias de
ensino). ação adequadas e úteis para os professores, que
são diretamente responsáveis pela sua execução.
2. Proporciona Informações Sobre Para isso, o currículo proporciona informações
Quando Ensinar concretas sobre o que ensinar, quando ensinar,
como ensinar e o que, como e quando avaliar.
Traz informações sobre a maneira de
Em princípio, essa colocação está próxima
ordenar e dar sequência aos conteúdos e aos
da defendida por autores como Stenhouse (1984,
objetivos. A educação formal abrange, com efei-
p. 29), para quem “um currículo é uma tentativa
to, conteúdos complexos e inter-relacionados e
de comunicar os princípios e características es-
pretende incidir sobre diversos aspectos do cres-
senciais de um propósito educativo, de tal forma
cimento pessoal do aluno, sendo necessário, por-
que permaneça aberto à discussão crítica e possa
tanto, optar por uma determinada sequência de
ser efetivamente transladado à prática.”
ação.
Antes de continuar, no entanto, convém
esclarecer uma nuança com relação à extensão
3. Proporciona Informações Sobre
do currículo. Para alguns autores, entre os quais
como Ensinar
Stenhouse, o currículo inclui tanto a descrição do
Traz, ainda, informações sobre a manei- projeto educativo quanto a análise empírica do
ra de estruturar as atividades de ensino/aprendi- que realmente sucede nas salas de aula, quando
zagem das quais participarão os alunos, a fim de o projeto é concretizado; isso explica, por exem-
atingir os objetivos propostos em relação com os plo, que, para Stenhouse, o currículo deva abran-
conteúdos selecionados. ger, além dos componentes mencionados, uma
série de princípios para o estudo empírico da
4. Proporciona Informações Sobre O sua aplicação. É óbvio que existem dois aspectos
Que, Como e Quando Avaliar relacionados ao currículo, o Projeto ou Desenho
Curricular e sua aplicação, e que ambos estão in-
Na medida em que o projeto correspon-
timamente ligados. Mas, a nosso ver, o problema
de a certas intenções, a avaliação é um elemento
reside no fato de que, definido dessa maneira am-
indispensável que assegura se a ação pedagógica
pla, o currículo termina abrangendo a totalidade
responde adequadamente a essas intenções e in-
de elementos da educação formal, perdendo, as-
troduz as correções oportunas em caso contrário.
sim, seu caráter específico e também sua opera-
cionalidade. Contudo, resulta difícil admitir que a
Os quatro grupos estão relacionados entre análise empírica daquilo que realmente acontece
si e condicionam-se mutuamente, pois tratam de nas salas de aula possa ser reduzida ao desen-
diferentes aspectos de um mesmo projeto: en- volvimento ou à aplicação do currículo, a menos
quanto o primeiro (o que ensinar?) explicita as in- que nele sejam incluídos absolutamente todos os
tenções, os três restantes (quando ensinar?, como fatores que, de uma forma ou de outra, incidam
ensinar?, o que, como e quando avaliar?) referem- sobre a realidade escolar.
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A seguir, e para frisar o caráter de projeto Assim, nossa maneira de entender o Pro-
do currículo, manteremos a diferença entre Pro- jeto Curricular inclui tanto aspectos curriculares
jeto ou Desenho Curricular e Desenvolvimento ou em sentido estrito (objetivos e conteúdos) como
Aplicação do Currículo como duas fases da ação também aspectos de instrução (relativos a como
educativa que se alimentam mutuamente, porém ensinar).
não se confundem.
Uma última precisão terminológica sobre
os conceitos de instrução e de currículo para ter- Multimídia
minar esse item de considerações gerais: o termo
Pesquise as matrizes de referência para a avalia-
“instrução” é habitualmente utilizado, em sentido
ção do rendimento escolar no site:
amplo, como sinônimo de “educação formal” e de http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Projetos/
“escolarização” e, em sentido estrito, para referir- BibliPed/Documentos/publicacoes/MatrizesRe-
-se aos componentes de metodologia do ensino, ferencia.pdf.
tanto em sua vertente de projeto como de execu-
ção efetiva. O termo “currículo” às vezes também
é utilizado em sentido muito mais limitado, para
referir-se apenas aos objetivos e aos conteúdos
da educação formal.
O primeiro elo da complexa cadeia de ine- estender a todo o currículo –, que exis-
vitáveis problemas a enfrentar e resolver no pro- te forte discrepância entre três posturas
defendidas respectivamente pelos ‘pro-
cesso de elaboração de um Projeto Curricular
gressistas’, pelos ‘essencialistas’ e pelos
refere-se às suas fontes. Você sabe onde buscar ‘sociólogos’. Os primeiros destacam a
a informação necessária para definir as intenções importância de estudar a criança a fim
– objetivos e conteúdos – e o plano de ação a se- de descobrir seus interesses, seus proble-
guir na educação escolar? Tradicionalmente, as mas, seus propósitos e suas necessida-
des, sendo esta a informação básica para
respostas consistiram em dar prioridade a uma
selecionar os objetivos. Os ‘essencialistas’,
das possíveis fontes de informação em relação a por seu lado, consideram que os objeti-
todas as outras, seguindo modas mais ou menos vos devem ser extraídos de uma análise
passageiras ou adotando pontos de vista redu- da estrutura interna dos conteúdos do
cionistas, sem perceber que a complexidade e ensino, das áreas de conhecimento. Por
último, os ‘sociólogos’ tendem a situar a
heterogeneidade de fatores que desembocam fonte de informação principal para sele-
no Projeto Curricular obrigam necessariamente a cionar os objetivos na análise da socie-
levar em conta ao mesmo tempo informações de dade, dos seus problemas, necessidades
origem e natureza diferentes. e características. Não é difícil vislumbrar
por trás dessas posturas outras tantas al-
Como afirma Coll (1998, p. 47), ternativas ainda atuais que dão primazia
respectivamente à análise psicológica, à
análise da estrutura interna das discipli-
já em 1949, em obra clássica sobre o nas e à análise sociológica, como fontes
tema, R. Tyler ressalta, no tocante aos do currículo.
pontos suscetíveis de proporcionar in-
formação para selecionar ‘sabiamente’
os objetivos – a afirmação que se pode
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