ENSINO
ENSINO MÉDIO
MÉDIO INTEGRADO
INTEGRADO
NO
NO BRASIL:
BRASIL: FUNDAMENTOS,
FUNDAMENTOS,
PRÁTICAS
PRÁTICAS E
E DESAFIOS
DESAFIOS
Ensino Médio
Integrado no Brasil:
fundamentos, práticas
e desafios
Brasília
2017
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília
Organização
Adilson Cesar Araújo
Cláudio Nei Nascimento da Silva
SGAN 610, Módulos D, E, F e G
CEP: 70830-450 – Brasília-DF
Fone: +55 (61) 2103-2108
www.ifb.edu.br
E-mail: editora@ifb.edu.br
2017 Editora IFB
E59
Ensino médio integrado no Brasil: fundamentos, práticas e desafios /
Adilson Cesar Araújo e Cláudio Nei Nascimento da Silva (orgs.) –
Brasília: Ed. IFB, 2017.
569 p.
Vários autores.
CDU 373.5:377(81)
© 2017 Editora IFB
A exatidão das informações, as opiniões e os conceitos emitidos nos artigos são de exclusiva
responsabilidade dos autores. Todos os direitos desta edição são reservados à Editora IFB. É
permitida a publicação parcial ou total deste periódico, desde que citada a fonte. É proibida a
venda desta publicação.
CONSELHO NACIONAL DAS INSTITUIÇÕES DA REDE FEDERAL DE
EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA (CONIF)
Avaliadores Ad Hoc
Adriana dos Reis Ferreira Maria Francisca Morais De Lima
Adriana Pionttkovsky Barcellos Maria Lucilene Belmiro De Melo Acácio
Affonso Celso Thomaz Pereira Maria Raquel Caetano
Aldo Rezende Mariângela de Araujo Rybalowsky
Ana Cláudia Uchôa Araújo Mary Roberta Meira Marinho
Carlos Andre de Oliveira Câmara Monique Seufitellis Curcio
Clarice Monteiro Escott Nilva Schroeder
Daniel Louzada da Silva Paola Alvarez
Degmar Anjos Paula Reis de Miranda
Delmir da Costa Felipe Reinaldo Reis Jr
Elinilze Guedes Teodoro Renato Pazos Vazquez
Erika Barretto Fernandes Cruvinel Roberta Cantarela
Fernanda Marsaro dos Santos Robson Santos Camara Silva
Glaucia Franco Teixeira Rosa Amelia Pereira Da Silva
Glauco Vaz Feijó Rosana Antunes Palheta
Hélder Sousa Santos Rosane de Fátima Batista Teixeira
Italan Carneiro Rosangela Gonçalves de Oliveira
Juliana Ferreira Leite Silvia Maria dos Santos Stering
Juliana Piunti Simônia Peres da Silva
Leonardo de Paiva Barbosa Sinara Pollom Zardo
Mairon Marques Dos Santos Sonia Maria da Costa Mendes
Mara Lúcia Castilho Teodoro Zanardi
Marcio Almeida Co Valdirene Alves de Oliveira
Marcos Pavani de Carvalho Washington César
Maria Do Rosário Cordeiro Rocha
APRESENTAÇÃO
6
227. POLÍTICA EDUCACIONAL E POLITECNIA:A EXPERIÊNCIA DO RIO GRANDE DO SUL –
José Clovis de Azevedo
257. PERSPECTIVAS DOS ALUNOS SOBRE O ENSINO MÉDIO INTEGRADO: POR QUE O FA-
ZEM? – Débora Martins Artiaga, Daniela Alves de Alves
377. AVANÇOS E DESAFIOS NOS CURSOS PROEJA DO INSTITUTO FEDERAL GOIANO CAM-
PUS RIO VERDE – Luiza Ferreira Rezende de Medeiros
8
INTRODUÇÃO
ENSINO MÉDIO INTEGRADO:
UMA FORMAÇÃO HUMANA, PARA UMA SOCIEDADE MAIS HUMANA
Adilson Cesar Araújo1, Cláudio Nei Nascimento da Silva2
1
e 2 Instituto Federal de Brasília
10
do papel da educação e tende a ge- Infelizmente, o movimento que
rar seres igualmente precários, par- se desdobra, a partir da recente re-
ciais e limitados. forma educacional do Ensino Médio,
Mais uma vez, cabe recorrer à vi- afirma o caráter tecnicista e produ-
talidade do pensamento de Gramsci, tivista da educação, indo na contra-
o qual, no início do século XX, já aler- mão de um Ensino Médio politécni-
tava para a necessidade de constru- co, o qual trabalha com a perspectiva
ção de um processo educativo que da integração entre trabalho, ciência
não operasse apenas a partir da ra- e a cultura; para a superação da frag-
zão instrumental: mentação do conhecimento, bem
como para a construção de saberes
A escola profissional não deve se
transformar numa incubadora de significativos e contextualizados à
pequenos monstros aridamente realidade social, econômica e cultu-
instruídos para um ofício, sem ideias ral.
gerais, sem alma, mas apenas com o
olho infalível e mão firme. Também O Ensino Médio Integrado (EMI)
através da cultura profissional é
possível fazer brotar do menino um
pode ser um contraponto ao mode-
homem; desde de que essa cultura lo de Ensino Médio hegemônico no
seja educativa e não só informativa, Brasil. Este se caracteriza pela uni-
ou não só prática e manual (MO-
NASTA, 2010, p. 66-67).
ficação do tempo escolar, por um
currículo fechado e pouco flexível,
com um viés centrado no conteúdo
Resta questionar, portanto, que e nas disciplinas, o que inviabiliza a
futuro se pode esperar da educação construção de projetos que conside-
se uma concepção de integração de rem: “para alunos diferentes, práticas
saberes e de fazeres não se fortalecer pedagógicas diferentes. Para trajetos
como fundamento de uma política diferentes, projetos diferentes! A es-
pública de ensino. Assim, é neces- cola deve olhar com mais atenção as
sário superar o viés produtivista que contribuições da etnografia à prática
subordina a escola aos interesses ime- escolar.” (CARNEIRO, 2012, p. 256).
diatos da produção. Ao mesmo tem-
O rompimento com o padrão de
po, deve-se garantir uma formação
Ensino Médio hegemônico não de-
geral sólida para que todos os jovens
pende apenas de mudanças curri-
do Ensino Médio possam ter acesso a
culares e metodológicas, depende,
uma educação republicana que visa
também, de alterações estruturantes
formar em múltiplas dimensões.
12
ensino como uma experiência nova e se trata de milagre! Trata-se, apenas,
de enxergar o que a evidência apon-
positiva, a qual possibilita uma sólida
ta (CARNEIRO, 2012, p. 160-161).
formação aos seus estudantes. Para
esse autor, o ensino da Rede Federal Cabe destacar que, ao longo da
é referência e deveria ser expandido última década, as condições objeti-
para os demais sistemas de ensino: vas de trabalho e de financiamento,
O nível de formação intelectual
para o Ensino Médio Integrado da
dos alunos no campo da educação Rede Federal funcionar, foram ofe-
básica lhes dá as condições neces- recidas. Isso permitiu transformá-lo
sárias para ingressarem no ensino
superior sem problema. Possuem,
em uma referência de educação
os alunos egressos destas institui- de qualidade para uma parcela da
ções, uma educação geral conjuga- população. Os últimos resultados,
da a uma formação técnica de alto
padrão. Isto apenas comprova que,
apresentados pela Rede Federal, nos
se o Estado brasileiro quisesse, de exames do PISA, mostraram a situ-
fato, as escolas públicas do Ensino ação privilegiada da Rede. No PISA
Médio teriam padrões de qualidade
semelhantes. Ou seja, em vez dos
de 2015, na área de Ciências, a Rede
especialistas ficarem criticando os li- Federal obteve desempenho de 517
mites elevados do custo/aluno/qua- pontos, o que foi superior aos obti-
lidade dos cursos de Ensino Médio e
técnico da rede federal, por que não
dos pelos países membros da OCDE
buscar ampliar o mapa da qualida- (493 pontos); e muito acima do que
de acadêmica da educação básica foi conseguido pela rede privada de
da escola brasileira independente-
mente de sua esfera administrativa?
ensino (487 pontos) e pela rede esta-
Por que não criar uma política de dual (394 pontos) .
1
14
bém na manutenção das condições Mesmo sendo uma referência
para garantir padrões de qualidade de Ensino Médio para o Brasil, o EMI
para a educação da Rede Federal da Rede tem de ser avaliado no seu
funcionar. Cabe ressaltar que a busca conjunto para que possa ser aperfei-
de um Ensino Médio Integrado, com çoado cada vez mais. Mas isso não é
qualidade referenciada socialmen- ação isolada da Instituição de ensino,
te, não se limita à aplicação de mais por isso, dependerá da construção
recursos financeiros e nem à moder- de um espaço educativo democráti-
nização tecnológica, apesar de im- co, interativo e que respeita a plurali-
prescindíveis. Assim, além de boas dade de vozes que compõem o am-
condições de trabalho e de estrutura, biente educativo; e do compromisso
é necessário afirmar o caráter eman- coletivo com as transformações,
cipatório do Projeto Político Pedagó- além de política de financiamento.
gico do Ensino Médio Integrado. Isso Tem de se avançar, muito ainda,
quer dizer que a questão não é só na construção das condições políti-
buscar a qualidade técnica, mas tam- cas e pedagógicas, para a busca de
bém a qualidade política, porque é outro referencial de escola. As experi-
esta que transforma a realidade: ências de implantação do EMI apon-
De pouco adiantará fazer todo um tam para a necessidade de serem
esforço monumental acerca da
garantia de financiamento para a tomados alguns cuidados para não
educação, como o que está sendo corrermos o risco de negar a origi-
travado para no Brasil acerca do nalidade inicial deste projeto, o qual
destino dos royalties do petróleo
das camadas do pré-sal, se as bases carregava, em si, uma perspectiva
políticas, ideológicas e epistemoló- transformadora de educação. Nesta
gicas da escola média continuarem discussão, devemos considerar que:
fundadas em concepções e práticas
produzidas no processo científico e a) é necessário compreender
tecnológico do mundo do trabalho
que a implementação do EMI é
estruturado nas primeiras etapas da
revolução industrial, contextos his- complexa e exige um repensar do
tóricos superados. [...] Trata-se, por- papel da gestão e da organização
tanto, da necessidade de uma orga-
curricular, dos tempos e dos espa-
nização do ensino em novas bases
epistemológicas, com a superação ços da escola, bem como da forma
da fragmentação disciplinar e seus de avaliação e da relação ensino e
programas abstratos e descontextu-
aprendizagem; ou seja, não é uma
alizados, desconectados do mundo
do trabalho (AZEVEDO; REIS, 2013, questão apenas de mudança curri-
p. 43). cular, mas de uma necessidade de
16
cro imediato. Portanto, a escola e a assumir outras funções. Assim, os
empresa não podem ter métodos gestores tendem a assumir o pa-
e técnicas idênticos, uma vez que pel de "gerentes”, preocupados
a finalidade da escola é diferente em garantir o controle, a ordem e
da finalidade que se busca atingir o cumprimento das normativas e
em uma empresa. Logo, a gestão das metas, muitas vezes, vindas de
democrática da educação na Rede fora; ou seja, um papel meramente
Federal, mesmo que prevista em burocrático. É necessária a com-
lei, não pode ser vista como uma preensão de que, além de exercer
mera formalidade de eleições tem- a liderança organizacional, os ges-
porárias para diretores e reitores. É tores da educação são lideranças
necessário revitalizar e construir pedagógicas e políticas. Pedagó-
novos espaços de participação gicas porque deveriam ter, como
da comunidade escolar nas to- uma de suas principais funções, ar-
madas de decisão. Construir uma ticular e coordenar o processo de
educação com sentido público construção do Projeto Politico Pe-
pautada na participação coletiva dagógico da Instituição. São lide-
nos rumos da educação, seja nos ranças políticas porque exercem
campi, nas reitorias e na definição um papel de líderes comunitários,
das políticas educacionais, parece os quais mediam os conflitos e
ser, ainda, um grande desafio a ser buscam construir, coletivamente,
perseguido na Educação Profissio- as mudanças necessárias para a
nal e Tecnológica; transformação da realidade esco-
f) é necessário, também, re- lar. Sendo assim, a tendência de
pensar o papel dos gestores da burocratização e o modelo geren-
educação na construção do EMI cialista têm de ser revistos urgen-
da Rede. Na condição de gestores temente, uma vez que a ação do
educacionais, esses devem assu- gestor se limitará aos aspectos téc-
mir um papel de liderança políti- nicos, ao cumprimento das ordens
ca, pedagógica e organizacional e das normativas burocráticas,
da Instituição. Há uma tendência, sem o vigor necessário para ser o
diante do aumento das demandas articulador da busca da transfor-
burocráticas, de os gestores serem mação da realidade da escola; e
engolidos pela tarefa administra- g) ampliar e incentivar a parti-
tiva, sobrando pouco tempo para cipação dos estudantes, reconhe-
18
médio: pressupostos teóricos e de-
safios da prática. SP: Fundação San-
tilana, 2013.
Marise N. Ramos
E-mail: ramosmn@gmail.com1
“La esperanza está latente en las contradicciones”
(BERTHOLD BRECH apud HARVEY, 2014, p. 258)
20
le que, num determinado momento, se movimenta em relação à educa-
conserva a supremacia de um dado ção brasileira. Para isso, trago uma
processo, que encarna e exerce a reflexão sobre a institucionalização
hegemonia que nele se verifica e da escola como o marco da separa-
que lhe desenha os traços” (MOURA, ção entre trabalho e educação, uni-
2012, p. 344). Nem sempre, o polo dade ontológica que é cindida na
dominante de uma contradição e o sociedade de classes, e sobre sua
seu polo determinante coincidem. reunificação na forma da dualidade
Com base nessa compreensão, educacional. Tendo como foco o En-
sobre a contradição, entendo que a sino Médio, situarei as reformas e as
conquista da educação pública, pela contrarreformas empreendidas so-
classe trabalhadora, resulta da não bre essa etapa de escolaridade a par-
coincidência entre polos determi- tir dos anos de 1930, quando o Brasil
nante e dominante da contradição. fez a transição do modelo produtivo
Ainda, que, na contradição capital e agrário-exportador para o modelo
trabalho, o primeiro seja o polo do- urbano industrial. Com isso, tentarei
minante no processo histórico, em demonstrar o quanto a relação en-
alguns momentos, o trabalho se fez tre trabalho e educação se manifesta
como polo determinante, o que le- nas mudanças educacionais que vi-
vou a classe trabalhadora a lutar pelo sam acompanhar as mudanças pro-
direito à educação. Esse direito, em dutivas em nossa sociedade.
alguma medida, também, convergiu Depois disso, passo a discutir a
com interesses do capital frente ao concepção de Ensino Médio Inte-
avanço das forças produtivas. Não grado em seus sentidos filosófico,
obstante, sempre esteve marcado ético-político, epistemológico e pe-
pela dualidade social a qual se ma- dagógico; defendendo-o como a
nifestou na delimitação do acesso concepção e uma práxis coerente
dessa classe aos níveis educacionais com as necessidades da classe tra-
superiores ou aos processos educati- balhadora; e compreendendo esta
vos com qualidade universal. classe como aquela que, efetiva-
Neste texto, tentarei lastrear o mente, produz a existência social
processo histórico pelos polos domi- da humanidade. Assim, ela é tanto
nantes e determinantes da contradi- produtora material quanto de co-
ção principal, capital e trabalho, que nhecimento e de cultura. Nesses
termos, não é razoável que o acesso
22
pela educação ou pela aprendiza- la de classe (a escola capitalista), de
gem realizada no seio de outra (EN- modo que as análises críticas2 iden-
GUITA, 1989, p. 106). Ainda assim, os tificaram sua função com a reprodu-
servos continuavam a se educar nos ção das ideias da classe dominante.
seus próprios afazeres. Esse fenôme- É a primeira Revolução Industrial
no, inclusive, nos é mostrado por Sa- que modifica a função da escola de
viani (2007) como expressão da uni- uma perspectiva de socialização
dade entre trabalho e educação, em para uma função econômico-pro-
um dado tempo histórico. Ele nos dutiva. A Revolução Industrial, ex-
explica que a institucionalização da pressão do uso da ciência como for-
educação é, ao mesmo tempo, o pri- ça produtiva, fez surgir o trabalho
meiro tipo de separação entre traba- abstrato por meio da divisão social
lho e educação, e se relaciona com o e técnica do trabalho, e por meio da
surgimento da sociedade de classes. redução do processo de produção a
Na ordem feudal da Idade Mé- um conjunto de tarefas simples. Sen-
dia, as escolas tiveram, fortemente, a do assim, a escola, para os trabalha-
marca da Igreja Católica. Nesse mo- dores, também, não era, a princípio,
mento, o Estado desempenhava um uma necessidade da produção, pois
papel importante, mas a educação os trabalhadores poderiam aprender
não era pública, já que era exclusiva as operações (de onde vem o nome
para uma classe. Foi o modo de pro- do operariado) diretamente no tra-
dução capitalista que colocou o Esta- balho. O problema, como bem iden-
do como protagonista da oferta da tificou Adam Smith, é que a divisão
educação escolar, “forjando a ideia extrema do trabalho, a redução do
de uma escola pública, universal, trabalhador à mercadoria e à força
gratuita, leiga e obrigatória” (SAVIA- de trabalho, a expropriação de suas
NI, 2007, p. 157). Mas, na verdade, a capacidades criativas, a extensa jor-
escola se manteve como uma esco- nada de trabalho e a intensa explora-
2 Falamos, aqui, das chamadas teorias crítico-reprodutivistas, elaboradas sob influências te-
óricas do estruturalismo althuseriano, como o reprodutivismo de Bourdieu e de Passeron, e
a teoria da escola dualista de Baudelot e de Establet, as quais identicavam a escola como um
aparelho ideológico do Estado burguês, cuja função essencial seria reproduzir as relações
econômicas, sociais e culturais de classe; assim, eram distinguidas as escolas destinadas à
classe dominante e à classe trabalhadora. Ideias da classe dominante. No nosso entendi-
mento, esse é um ponto de partida fecundo para discutirmos o currículo na perspectiva de
classe.
24
no Luís Inácio Lula da Silva, que revo- lhadora.
gou este Decreto por meio de outro, Antes de ser uma necessidade
o Decreto nº 5.154/2004. É, a partir econômica, porém, defendemos o
desse momento, quando se retoma direito de acesso ao conhecimento
a discussão da formação integrada científico e cultural sistematizado
inspirada pela concepção de educa- pela classe trabalhadora como um
ção politécnica debatida na década princípio ético-político, em razão do
de 1980. Finalmente, vivemos, hoje, sentido ontológico do trabalho. A
uma contrarreforma implementada humanidade se constituiu como tal
pela Lei nº 13.415/2017, a qual recu- porque o ser humano, diante de ne-
pera as piores medidas de reformas cessidades reais, se dispõe a dominar
anteriores. Compreender a concep- a natureza, a apreender seus deter-
ção do trabalho, em suas dimensões minantes na forma de conhecimento
e suas contradições, é um importan- e, então, transformá-los em benefício
te meio para se posicionar frente às da qualidade de vida humana. Isto é
concepções educacionais em dispu- um processo que se iniciou, primiti-
ta. vamente, pelo simples fato de que o
ser humano é um ser capaz de, com
3. O trabalho como princípio suas mãos e seu pensamento, apre-
educativo: fundamento con- ender a natureza para si. O que é isto,
traditório da formação dos senão o trabalho como mediação de
primeira ordem entre homem e na-
trabalhadores tureza? (MÉSZÁROS, 2016).
Constatamos que, na luta pelos Essa relação é, também, de pro-
direitos sociais, os quais se tornaram, dução de conhecimentos, primeira-
até mesmo, uma necessidade para o mente, na forma de conhecimento
capital, revelada sob a égide do cha- empírico, depois, quando orientado,
mado Estado de Bem Estar Social3, o sistematicamente, como conheci-
Estado, por meio da escola pública, mento científico. Disso deriva a cen-
possibilitou o acesso ao conheci- tralidade da classe trabalhadora e do
mento científico pela classe traba- trabalho na produção da existência
3 Entendemos o Estado de Bem Estar Social como a expressão política da teoria econômica
de Maynard Keynes, economista inglês que, após a primeira grande crise do capital, de-
fendeu a atuação do Estado tanto na esfera econômica quanto no provimento de políticas
sociais.
4 As inovações, introduzidas por Henry Ford na produção, mais destacadas são: a) a estei-
ra da produção, que possibilitou a aceleração da produção por manter o trabalhador num
posto de trabalho fixo, enquanto as peças chegavam diretamente a ele no ritmo coman-
dado pela velocidade da esteira; e b) a diminuição da jornada de trabalho conjugada com
o aumento de salário – o chamado dia de oito horas e cinco dólares – que, por um lado,
contribuiu para o aumento da extração da mais-valia relativa pelo capital e, por outro, gerou
condições de consumo pelos trabalhadores em benefício do ciclo virtuoso da mercadoria.
Sabe-se, além disto, que Ford foi pioneiro no que, posteriormente, se desenvolveu como a
Escola de Relações Humanas na administração, uma vez que o mesmo empreendeu medi-
das de proteção do trabalhador como, por exemplo, a visita em suas casas a fim de comba-
ter o alcoolismo dentre outras. Sobre esse assunto, que nos ajuda a entender o quanto o
fordismo não foi somente uma forma de produzir, mas também de regular socialmente o
trabalho, sugerimos a leitura de Harvey (1994).
26
dagogia, representado pela relevân- trabalhadora como suposta condi-
cia conferida às técnicas de ensino e ção necessária ao desenvolvimento
econômico. Agregou-se, assim, à ide-
à eficiência do currículo escolar. A ló-
gica produtiva taylorista-fordista foi ologia do desenvolvimentismo, no
fundamento da função econômica binômio com a segurança nacional,
da escola, configurando-a em corres- o que justificou o governo civil-mili-
pondência à divisão social, técnica e tar. Porém, como nos diz Luiz Antô-
hierárquica do trabalho. nio Cunha (2014), essa era a finalida-
A ideologia que sustentou essa de manifestada na Lei nº 5.692/71,
correspondência foi a Teoria do Ca- mas a real função era a contenção
pital Humano. Trata-se de uma teoria do acesso dos filhos da classe traba-
que vem das ciências econômicas, a lhadora ao ensino superior. O caráter
Economia da Educação, mas que se compulsório da educação profissio-
mostrou como ideológica5, baseada nalizante, no segundo grau, não foi
na linearidade da relação entre nível assimilado pela burguesia, sendo re-
de escolaridade e classificação social vogado pela Lei nº 7.044/1982.
das pessoas; e entre o nível de esco- A rede de Instituições Federais
laridade da população de um país e de Educação Profissional e Tecnoló-
o seu desenvolvimento econômico. gica cumpriu com a finalidade ma-
O caráter ideológico da Teoria do Ca- nifestada e tencionou a contradição
pital Humano orientou as políticas em benefício do trabalho. Isso quer
de educação da classe trabalhadora dizer que os cursos técnicos de se-
no Brasil dos anos 1950 aos 1970. gundo grau, ofertados por essas Ins-
Pela contradição, ela sustentou a am- tituições, reuniram formação geral e
pliação do acesso à escola pela classe profissional, com instalações de qua-
5 Ideologia, aqui, não é compreendida, somente, como o falseamento das ideias ou como
falsa consciência, sentido forte atribuído ao termo por K. Marx, mas também entendida, no
seu sentido ampliado, como ideias que constituem o senso comum de um grupo social. A
ideologia tem, então, um lado que se mostra verdadeiro e outro falso. É, pela manifestação
de seu “lado verdadeiro”, que ela produz o convencimento. No caso da Teoria do Capital Hu-
mano, não dá dúvidas de que o aumento da escolaridade proporciona maiores oportunida-
de de acesso aos empregos mais qualificados, com possibilidades de melhor remuneração
e, assim, mais chances de mobilidade ou de ascensão na classificação social. O lado falso
da Teoria do Capital Humano é tratar esse fenômeno como regra geral e universal. Ao con-
trário do que se defende, tais possibilidades são determinadas pela estrutura econômica,
configurada pela propriedade privadas dos meios de produção por uma classe. O estudo de
referência sobre a Teoria do Capital Humano é de Frigotto (2004).
28
momento, os educadores brasileiros rar-se-ia, assim, a formação, estrita-
estavam mobilizados com a possi- mente, técnica para os trabalhadores
bilidade de se orientar a educação e a acadêmica para as elites. Ao invés
nacional na perspectiva da escola de uma formação restrita a um ramo
unitária. Apontava-se para a supera- profissional, esta teria o caráter om-
ção da dualidade da formação, para nilateral, isto é, voltada para o desen-
o trabalho manual e para o trabalho volvimento dos sujeitos em “todas
intelectual; expressão da dualida- as direções”. De fato, a compreensão
de de classes, o que caracterizou a dos fundamentos da produção, pe-
existência de percursos formativos los estudantes, implica compreen-
profissionalizantes para o mercado der, também, seu lugar na divisão
de trabalho, em oposição ao prope- social do trabalho; isto é, as determi-
dêutico, o qual levaria os estudantes nações históricas de suas condições
ao ensino superior. Compreendia-se econômicas, sociais e culturais, as
o Ensino Médio como Educação Bá- quais, sendo questionadas pela me-
sica, de modo a ser uma etapa des- diação de conhecimento, podem ser
te nível de ensino, e, como tal, com transformadas não apenas subjetiva-
a finalidade de consolidar os estu- mente, mas politicamente, mediante
dos iniciados nas etapas anteriores. o reconhecimento de sua identidade
O caráter, historicamente, pendular, de classe.
desse momento formativo, cujas fun- Isso materializa o princípio edu-
ções oscilaram conforme o modelo cativo do trabalho no sentido onto-
econômico e dual, que dissociava lógico, uma vez que, ao se compre-
formação para o trabalho manual e ender que os bens, produzidos pela
para o trabalho intelectual, seria su-
sociedade, em benefício da melhoria
perado pela escola unitária, tendo o de sua qualidade de vida, são produ-
trabalho como princípio educativo. tos do trabalho humano, o qual co-
A educação politécnica seria locou em movimento a produção de
8
30
da pela Teoria do Capital Humano e civilização”9; e, assim, patrimônio das
pela concepção pedagógica tecni- elites, seja quanto às possibilidades
cista, não convergia com a concep- de desenvolvimento de habilidades
ção da educação politécnica e a de para a arte, seja quanto ao acesso ao
formação omnilateral. considerado conhecimento erudito.
Nessa experiência, o conceito de Sendo assim, a escola profissional
trabalho era restrito a sua forma his- não seria lugar de cultura, a não ser
tórica no capitalismo: o trabalho as- como uma complementação, por ve-
salariado ou emprego. O mundo do zes, lúdica, ao currículo técnico .
10
9 Um estudo sobre o conceito de cultura pode ser encontrado em Ramos e Moratoria (2017).
10 É interessante notar que, nas Instituições da Rede Federal, as atividades culturais são fre-
quentes, mesmo que, muitas vezes, não tenham composto o currículo formal. No entanto,
a existência de condições de infraestrutura, de professores dessa área e da disponibilidade
de um tempo livre incentivado pelos docentes, a ser usado, criativamente, faz com que a
presença de tais atividades tenha resistido às reformas que visaram conter os s de
educação politécnica que essas Instituições guardam (SAVIANI, 1997).
32
Na legislação vigente, isso foi formação escolar média; e, também,
viabilizado pela possibilidade de não fosse a sociedade ter deman-
“articulação” entre a Educação Pro- dado a possibilidade de o Ensino
fissional e a Educação Básica, dando Médio proporcionar a formação pro-
origem às formas de oferta da Edu- fissional, tal como resultou na Lei nº
cação Profissional Integrada e con- 9.394/1996; caso não tivesse ocorri-
comitante. Ainda, no plano formal, do a conquista da revogação do De-
a primeira, corresponde à realização creto nº 2.208/1997 pelo Decreto nº
de ambas as formações em um mes- 5.154/2004.
mo currículo, a diferença fundamen- Essa nota nos remete às contradi-
tal entre os Decretos nº 5.145/2004 e ções consideradas no primeiro item
nº 2.208/1997, destinada a egressos deste texto, pois foi o êxito da for-
do Ensino Fundamental. A segunda, mação de qualidade realizada pelas
a oferta dessas formações, cursadas, Instituições Federais, sob a égide da
ao mesmo tempo, conforme disponi- Lei nº 5.692/1971, expressão máxima
bilidades dos sistemas e das institui- da dualidade educacional em nosso
ções de ensino, porém em currículos país, que nos fez conhecer as possibi-
diferentes, também destinada aos lidades de acesso, pela classe traba-
egressos do Ensino Fundamental. lhadora, ao conhecimento científico,
Finalmente, a forma subsequente, cada vez mais, elaborado ainda que
não, originalmente, proposta por ne- sob o prejuízo da formação geral.
nhum dos dois decretos, mas já pra-
ticada por instituições e sistemas de Como afirmou Kuenzer (1998), o
ensino e procurada pelos próprios Decreto nº 2.208/1997 tratou um pro-
estudantes, equivale à formação pro- blema social: a necessidade de os fi-
lhos da classe trabalhadora cursarem
fissional posterior à conclusão do En-
sino Médio (inclusive sob a organi- o Ensino Médio já com a perspectiva
zação e as denominações anteriores, profissionalizante; como um proble-
como secundário e segundo grau). ma pedagógico, separando as duas
formações. Por vezes, o argumento,
Essa última forma poderia ter se que os defensores da educação poli-
tornado a hegemônica, não fosse técnica, também, consideravam que
a contraditória experiência propor- a formação profissional deveria ser
cionada pela Lei nº 5.692/1991, a posterior ao Ensino Médio, foi usado
qual criou os cursos técnicos de ní- pelos reformadores do Ministério de
vel médio equivalentes à respectiva
34
conhecimentos e de aplicação téc- (disciplinaridade) e em relação a ou-
nica e tecnológica dentre outros. Por tros de campos distintos (interdisci-
isso, reiteramos que os conhecimen- plinaridade).
tos não são abstrações ahistóricas ou Compreendendo que a vida hu-
neutras, mas, sim, a conceituação do mana é constituída por múltiplos
real oriunda do movimento de inves- processos sociais de produção ma-
tigação de seus fenômenos, motiva- terial e simbólica, esses podem ser
do pelos problemas que a humani- a referência do currículo. No caso da
dade se coloca e se dispõe a resolver;Educação Profissional Integrada ao
consequentemente, eles são históri- Ensino Médio, os próprios processos
cos e sociais. produtivos, relativos às profissões,
A compartimentação das ciências para as quais os estudantes são for-
foi um meio pelo qual se conseguiu mados, podem ser essa referência.
penetrar, mais profundamente, nes- Por mais que esses sejam particulari-
sa realidade, constituindo-se, assim, dades produtivas, que implicam em
os campos de conhecimento, cada dimensões científicas e em técnicas
vez mais, específicos nas disciplinas específicas, eles guardam determina-
científicas, as quais se constituíram ções da totalidade social que são de
em referências para o ensino na con- ordem econômica, política, histórica,
formação das disciplinas escolares. cultural, ambiental dentre outras.
Portanto, assim como na investiga- Se tais processos forem tratados
ção, feita a análise do fenômeno, é por essas perspectivas, os conheci-
preciso ordenar e relacionar as me- mentos que permitem sua compre-
diações captadas num processo de ensão, nas suas múltiplas dimensões,
síntese, de tal modo que o fenômeno se tornam uma necessidade, de for-
já não se manifeste, somente, em sua ma que os conteúdos de ensino ad-
aparência empírica, mas, sim, como quirem sentido não somente cientí-
uma realidade concreta apreendida fico, mas também social e histórico.
pelo pensamento, o concreto pensa- Por esse caminho, encontraremos,
do (KOSIK, 1978). No ensino, é preci- também, a relação entre o que de-
so que os conteúdos sejam apreen- signamos como conhecimentos de
didos como um sistema de relações formação geral e específica. Essa
que expressam a totalidade social. classificação tem dois fundamentos,
Para isso, eles devem ser aprendidos a saber: a) podem ser considerados,
no seu campo científico de origem
36
tizado); tempos de experimentação 5. A atual contrarreforma do
(o enfrentamento, pelo estudante,
Ensino Médio e os limites ao
de questões práticas, mediante as
quais ele se sente desafiado a valer- Ensino Médio Integrado
se do conhecimento apreendido e, Em sentido, diametralmente,
então, a consolidá-los e/ou a iden- oposto à proposta do Ensino Médio
tificar insuficiência e limites dos co- Integrado, a atual contrarreforma do
nhecimentos apreendidos); tempos Ensino Médio, empreendida pela Lei
de orientação (o acompanhamento, nº 13.417/2017, dirige-se, mais uma
pelos professores, dos enfrentamen- vez, à classe trabalhadora no sentido
tos dos estudantes, visando organi- de restringir seu acesso a uma Edu-
zar aprendizados e/ou colocar novas cação Básica pública e de qualidade
questões); tempos de sistematização social. Analiso-a, primeiramente, sob
(síntese/revisão de questões, de con- a ótica da relação entre método e
teúdos e de relações); e tempos de conteúdo, considerando a categoria
consolidação (avaliações com finali- hegemonia. Hegemonia é coerção
dades formativas). revestida de consenso (GRAMSCI,
Espera-se, finalmente, que a pro- 2002). As ideias hegemônicas são
posta curricular demonstre identida- aquelas que dão direção cultural e
de e unidade teórico-metodológica, material a um grupo social. Ela se dis-
participação ativa dos sujeitos, cons- puta e se conquista numa sociedade
trução coletiva do conhecimento, que tem relações, formalmente, con-
organização integrada e abordagem sideradas democráticas, já que, no
histórico-dialética de conteúdos in- estado ditatorial, predomina a coer-
tegrando trabalho, ciência e cultura. ção. Em sociedades democráticas, a
Nesse percurso formativo, coerente hegemonia implica obter o consen-
com a concreticidade da vida social timento ativo das massas e construir
dos sujeitos, as contradições são ti- o consenso. A contrarreforma atual é
das como relevantes e trabalhadas a expressão da hegemonia do pen-
mediante uma análise crítica do co- samento burguês, conservador e re-
nhecimento e da sociedade. trógrado, o qual se revelou em seu
método e em seu conteúdo.
A reforma se inicia com uma Me-
dida Provisória nº 746/2016 utilizada
38
mação da Educação Profissional, em prometidas com a formação básica,
um dos itinerários, retoma aspectos pública e de qualidade social dos
da Lei nº 5692/1971 de substituição estudantes deste país, em especial,
da carga horária do currículo pela por aqueles comprometidos com o
formação específica11. Como disse- projeto de Ensino Médio Integrado.
mos, a condição de itinerário conferi- O fundamento ético-político, desta
do à Educação Profissional, associada posição, é que a contrarreforma atin-
ao seu cumprimento em instituições girá, principalmente, os quase 90%
não escolares, ao aproveitamento de dos estudantes do Ensino Médio que
competências e a não obrigatorieda- estão nas redes estaduais de ensino.
de de formação docente apropriada, As escolas particulares, princi-
separa a Educação Profissional da palmente, as de elite, resistirão à sua
Educação Básica, realizando o inten- implantação e buscarão meios pró-
to do Decreto nº 2.208/1997. Isto é prios para garantir a Educação Bási-
feito de forma ainda mais grave, poisca em sua totalidade, tal como ocor-
se, sob a égide desse Decreto, a carga
reu quando se implantou a Lei nº
horária, destinada à Educação Profis-5.692/71. Essa resistência redundou
sional, abrangeria de 800 a 1200 ho- na revogação da obrigatoriedade da
ras, na nova lei, esta pode se limitar a
profissionalização compulsória do,
600 horas12. então, 2º grau pela Lei nº 7.044/82;
É preciso dizer que entendo o na verdade, legalizando a inobser-
protesto a essa contrarreforma e a vância à lei por parte dessas escolas.
não observância da lei como a pri- As Instituições Federais, por sua vez,
meira posição a ser tomada pelos ao gozarem de autonomia adminis-
educadores e pelas Instituições com- trativa, financeira e pedagógica, tam-
11 Pela Lei nº 13.415/2017, essa carga horária corresponde a 25% da carga horária que deve-
ria ser de formação geral. No caso da Lei nº 5.692/1971, essa substituição poderia chegar a
50%. Porém, pelo menos na Rede Federal, os currículos tinham, em média, uma carga horá-
ria de 4000 horas. A substituição da carga horária de formação geral era, assim, compensada
por uma carga horária global maior.
12 A lei prevê o aumento da carga horária do Ensino Médio mediante a implantação do
horário integral. Esse aumento, porém, deve se destinar, exclusivamente, aos conteúdos de
Língua Portuguesa e de Matemática. Ademais, sabemos que o novo regime fiscal, instituí-
do pela Emenda Constitucional nº 95 de 2016, impedirá o cumprimento desse propósito. É
possível até que alguns sistemas de ensino o implemente em escolas consideradas de ex-
celência, para servir de exemplo ou de referência nas avaliações de larga escala. Reforça-se,
assim, o caráter ideológico e midiático dessa contrarreforma.
40
res da BNCC e dos itinerários, assim instrumento para o desempenho
como para garantir vagas a todos os acadêmico ou profissional. Antes, o
seus estudantes a fim de cursarem conhecimento resulta da apreensão
outro itinerário. Feita a integração da realidade pelos seres humanos,
dos componentes, pode-se estender num processo histórico em que bus-
a carga horária global do curso para camos compreender nossas necessi-
que o estudante curse, simultanea- dades e produzir meios para satisfa-
mente, mais de um itinerário. Assim, zê-las. Esse é o próprio processo do
o currículo do Ensino Médio Integra- trabalho o qual gera conhecimentos
do, ainda, que, compulsoriamente, e novos modos de vida. Explica-se,
tenha a formação básica comum li- assim, a unidade entre trabalho, ci-
mitada a 1800 horas, poderia chegar ência e cultura que fundamenta a
a 3.200 horas; sendo 600 horas consi- concepção do Ensino Médio Integra-
deradas como itinerário da Educação do.
Profissional pela Lei nº 13.415/2017 É fundamental saber que o cará-
(o que as igualariam às escolas das ter contraditório do trabalho e a sua
demais redes) e as demais 800 horas relação com o capital fazem com que
voltadas para atender às Dcnept vi- ele seja determinado pelo tempo de
gentes ou à oferta de outro itinerá- necessidade, mas em busca do tem-
rio. Acende-se, assim, uma vela para po de liberdade. Na contradição, a
cada norma, em nome da formação conquista política da educação é,
integrada. Resta saber se esse será o também, necessidade do capital,
pecado fatal ou sua remissão. dado o avanço das forças produti-
vas. No entanto, essas disputas têm
Considerações finais um fundamento filosófico, pois im-
plicam compreender o ser humano
A luta pelo Ensino Médio Integra-
como capaz de produzir sua existên-
do é a luta pelo direito a uma forma-
cia pelo desenvolvimento de todas
ção humana e plena, tendo o traba-
as suas habilidades. É preciso pensar
lho como princípio educativo em um
qual é o sentido da educação em
currículo centrado nas dimensões
termos da formação humana, pois
fundamentais da vida: o trabalho, a
sua relação, com o trabalho, não é só
ciência e a cultura. Por essa concep-
instrumental, mas, sim, de realização
ção de formação, o conhecimento
ontológica. Não desprendamos o
não é, somente, um insumo ou um
nosso trabalho de nossa concepção
42
FRIGOTTO, Gaudencio. A produtivi- RAMOS, Marise. A pedagogia das
dade da escola improdutiva. 7. ed. competências: autonomia ou adap-
São Paulo: Cortez, 2004. tação?. São Paulo: Cortez, 2001.
FRIGOTTO, Gaudencio; CIAVATTA, RAMOS, Marise; MORATORI, Raquel.
Maria; RAMOS, Marise. Ensino Mé- Uma reflexão sobre o conceito de
dio Integrado: concepção e contra- cultura e sua relação com o traba-
dições. São Paulo: Cortez, 2005. lho e a ciência no projeto educativo.
GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e In: GALVÃO, Gregório; VELASQUES,
a organização da cultura por Anto- Muza; BATISTELLA, Renata. Cultura,
nio Gramsci. Rio de Janeiro, Civiliza- politecnia e imagem. Rio de Janei-
ção Brasileira, 1968. ro: EPSJV, 2017. p. 65-90.
44
Concluída essa etapa, em maio O trabalho colaborativo contou
de 2015, a Comissão ampliou a parti- com o engajamento do corpo do-
cipação da comunidade no trabalho cente, que considerou produtivo e
organizacional a partir da inclusão necessário o trabalho conjunto, a fim
de membros representantes dos es- de melhor conhecer as demandas
tudantes e dos técnicos-adminis- das várias disciplinas hoje trabalha-
trativos. Analisados os resultados das no EMI.
dos diagnósticos, a nova Comissão Ainda durante o processo de
constituída ponderou a necessidade construção da matriz curricular, a Co-
de sua formação teórica para funda- missão passou a preocupar-se com
mentar as futuras propostas. Iniciou- os impactos da implantação da nova
se, assim, um período de estudos, proposta, que se desenhava ousada.
que compreendeu leitura e discus- Entrou em contato, portanto, com
são de documentos e legislação e a Pró-reitora de Ensino do IFSP, em
participação em eventos que contri- especial com sua Diretoria de Educa-
buíram para a discussão do EMI. ção Básica para apresentar a propos-
Essa etapa de estudos fortaleceu ta e solicitar apoio ao projeto.
a comissão na definição de concei- A proposta obteve imediato aco-
tos a serem compartilhados com a lhimento, pois vinha ao encontro das
comunidade escolar e, a partir de discussões e reflexões acerca do EMI
então, iniciar a construção colabora- que já ocupavam as atenções da ges-
tiva da proposta de reestruturação. tão do IFSP. Em 2015, o IFSP promo-
A primeira iniciativa foi apresentar veu diversas ações que envolviam o
aos segmentos docente e técnico EMI, como: reformulação colabora-
-administrativo os conceitos norte- tiva da Organização Didática para o
adores da proposta preliminar. Em EMI, envio de servidor para oficinas
seguida, executou-se uma dinâmica sobre integração curricular promo-
de grupos, na qual os membros ela- vidas pelo CONIF, organização do
boraram propostas de componentes Congresso de Educação Profissional
curriculares que pudessem compor e Tecnológica (CONEPT) com o EMI
o currículo, a partir do conceito de como tema, fomento à participação
integração e indissociabilidade entre de servidor no programa Professores
ciência, tecnologia, trabalho e cultu- para o Futuro.
ra (BRASIL, 2007).
Em outubro de 2016, a Diretoria
46
do jurídico, além de uma necessi- Nessa perspectiva, surge o de-
dade social incontestável” (Ramos, safio de suplantar a tradicional seg-
2010. p. 42). Portanto, além de pau- mentação curricular e procurar um
tada em documentos referenciais1, formato que deixe transparecer o
a proposta em questão sempre pri- vínculo entre essas categorias. Para
mou pelo direito à educação pública isso, vemos como alternativa que os
de qualidade, adequada a um proje- professores trabalhem colaborativa-
to de ensino médio que integra tra- mente, em componentes curricula-
balho, ciência e cultura no sentido dares que integrem diversas disciplinas
formação unitária, politécnica e om- e conteúdos do ensino médio e do
nilateral (MOLL, 2010). ensino profissional. Descrevemos
Em primeiro lugar, estamos con- abaixo alguns pilares que compõem
victos de que se quer formar um a proposta:
profissional capaz de se inserir no a) Integralização: o curso se-
mercado de trabalho. No entanto, ria integralizado em quatro anos.
essa formação vai muito além de um Diante da perspectiva de amplia-
atendimento a vagas disponíveis nas ção da carga horária do ensino mé-
empresas. Apesar de estarmos cien- dio, consideramos que a concen-
tes de que a inserção profissional é tração do curso em três anos viria
socialmente necessária à maioria dos obrigar o estudante a permanecer
nossos alunos, não é nosso objetivo mais que cinco horas em sala de
vincular a oferta de formação profis- aula, tomando espaços que pode-
sional às necessidades – volúveis, há riam ser usados para desenvolvi-
que se acrescentar – do mercado. A mento de projetos, para convivên-
finalidade de nossos cursos integra- cia, para as artes, ou seja, tomaria
dos deve ser a de proporcionar aos um espaço de uso da criatividade,
jovens uma formação global, que o da prática da cidadania e da apli-
prepare para o trabalho, para a cida- cação dos diversos conhecimen-
dania e para a continuação dos estu- tos. A decisão se pautou também
dos e, sobretudo, que coloque Tra- na percepção dos alunos egressos
balho, Ciência, Tecnologia e Cultura e dos anos finais do EMI atualmen-
como categorias indissociáveis. te desenvolvidos em Sertãozinho
1 Neste artigo, não aprofundaremos a análise dos documentos que orientaram o trabalho
da Comissão. Porém, a legislação e diretrizes curriculares estão implícitas na proposta e
constam nas referências deste artigo.
48
da equipe gestora, do setor socio- g) Mentoria: a fim de dar apoio
educativo e de todo o corpo do- ao estudante em seu percurso por
cente. um currículo flexível, é essencial a
f) Flexibilização curricular (“Tri- figura do mentor, um servidor res-
lhas formativas”): a definição da ponsável por orientar um grupo
habilitação em curso só é possível de estudantes ao longo do curso.
com um currículo flexível, que per- Este seria definido no início de
mita ao estudante diversas alter- cada turma e receberia um grupo
nativas formativas. Essas alternati- de alunos sobre o qual teria res-
vas, ou “trilhas formativas”, seriam ponsabilidade de acompanhar
representadas pelos componentes até o fim do curso. Essa mentoria
curriculares eletivos, que repre- tem os objetivos de orientar a or-
sentam escolhas do estudante na ganização dos estudos, orientar as
composição de sua carga horária. estratégias de acesso aos serviços
O currículo teria um conjunto de que a instituição oferta e, em últi-
componentes obrigatórios, que ma instância promover a autono-
desenvolveriam conhecimentos mia do aprendiz em suas buscas e
fundamentais para a formação ge- escolhas.
ral e profissional. A carga horária h) Comissão de acompanha-
necessária para a formação do es- mento: inspirada no Núcleo Do-
tudante no EMI seria complemen- cente Estruturante dos cursos
tada por disciplinas eletivas, que superiores, a Comissão de Acom-
teriam por principal objetivo a de- panhamento teria por finalidade
finição de sua habilitação. Porém, acompanhar a implantação do
não há obrigatoriedade de que novo curso EMI, avaliar seu desen-
o estudante curse componentes volvimento e propor alterações,
eletivos de uma única habilitação. se necessárias. A diferença entre
Por um lado, há componentes cur- o NDE e a Comissão de Acompa-
riculares eletivos que contariam nhamento é que, enquanto aquele
carga horária para mais de uma é composto apenas por docentes,
habilitação. Além disso, faz parte esta teria representantes de, pelo
desta proposta a possibilidade de menos, três segmentos: docentes,
o estudante personalizar e diversi- técnicos-administrativos (obriga-
ficar seu itinerário formativo. tório um pedagogo) e alunos.
50
Conteúdo programático: Estrutura e Composição Celular, Compo-
nentes celulares, Organização dos Micro-organismos, suas funções e Me-
tabolismo (Citologia); Sensores, Elementos finais de controle, Controlado-
res lógicos programáveis, Linguagens de programação para CLP, Sistemas
supervisórios (Instrumentação e Automação de Processos Industriais); O
trabalho, a economia e a sociedade; Modos de produção; Trabalho e desi-
gualdade social; Novas relações de trabalho (Sociologia).
52
MOLL, J. et. al. Educação profissio-
nal e tecnológica no Brasil Con-
temporâneo: desafios, tensões e
possibilidades. Porto Alegre: Artmed,
2010.
54
sultados das atividades desenvolvi- dês, Pasi Sahlberg, aponta que não
das na capacitação na Finlândia e de há uma única razão para o sucesso ou
atividades de pesquisa aplicada nos insucesso de um sistema educacio-
Instituto Federais de Alagoas (cam- nal; pelo contrário, trata-se de uma
pus Marechal Deodoro), do Norte de rede interligada de diversos fatores
Minas Gerais (campus Januária), de – educacionais, políticos e culturais,
Mato Grosso (campus Várzea Gran- que funcionam de forma diferente
de), da Paraíba (campus Cabedelo e em diferentes situações. E o autor vai
campus Cabedelo Centro) e de São além, relata que o sistema educacio-
Paulo (campus Sertãozinho) . nal finlandês importou muitas ideias,
Segundo, não se trata simples- inspirações e inovações pedagógicas
mente de utilizar o modelo finlandês de outros países, mas o compromis-
como uma réplica para o sistema so com o “Sonho Finlandês” (Finnish
educacional brasileiro. Até porque, Dream) – uma excelente escola pú-
aspectos culturais, sociais, políticos e blica para toda criança – levou o país
econômicos podem ser determinan- a construir o seu próprio sistema
tes para os modelos educacionais educacional, conhecido como Fin-
de cada país, ou como afirma Ramos nish Way (SAHLBERG, 2015).
(2008, p.12): “cada realidade social, Segundo Sahlberg (2015), o Fin-
cada povo, tem a sua história e a sua nish Way preserva o que há de me-
necessidade. Portanto, o que vem lhor na tradição finlandesa (como
como reforma em nome da tendên- confiança – inclusive na política e nos
cia mundial requer muito cuidado”. serviços públicos, incremento da au-
Nesse sentido, entendemos que o tonomia, tolerância à diversidade), e
modelo educacional finlandês serve combina essas boas práticas com as
como elemento motivador para aná- inovações pedagógicas oriundas de
lises de necessidades que se expan- outras experiências internacionais.
dem desde o nível nacional ao local Da mesma forma, o autor corrobora
e, para tanto, podem trazer aplica- com a afirmação de Ramos (2008),
ções práticas para a realidade brasi- quando também orienta que ainda
leira. que haja limites quanto à transferên-
Nesse ponto, é importante regis- cia do modelo finlandês para outros
trar que uma das maiores referências países, algumas lições básicas po-
sobre o sistema educacional finlan- dem ser aplicadas a outros sistemas
educacionais: como o fortalecimen-
56
um projeto formativo para o Ensino A Finlândia sofreu mudanças
Médio e Profissional no Brasil em di- importantes logo após a segunda
reção aos interesses do mercado, e Guerra Mundial, que impactaram na
não do interesse discente. Cenário sua estrutura política, social e eco-
este que se fortalece, atualmente, nômica. O país sofreu perdas consi-
pela “Reforma do Ensino Médio” (Lei deráveis durante sua participação
13.415/2017). na guerra e, por isso, o período pós-
Quanto à Finlândia, numa direção guerra foi marcado por instabilidade
contrária, verifica-se que o país bus- política e transformação econômica.
cou uma outra via para implementar Por outro lado, tal cenário fez emer-
sua reforma educacional, diferente girem novas ideias e políticas sociais,
de uma reforma ideologicamente dentre elas a defesa de uma educa-
baseada no mercado, segundo Sahl- ção igualitária. Ou seja, desde então,
berg (2015). O autor complementa a educação tornou-se o principal ve-
que, ao contrário, a melhor maneira ículo de transformação social e eco-
para se resolverem problemas crôni- nômica no país (SAHLBERG, 2015).
cos em muitos sistemas educacionais Na década de 70, pautada pelos va-
não consiste em se livrar dos conse- lores de equidade e justiça social, a
lhos escolares e recorrer a processos Finlândia implementou seu novo
como privatização. E ainda, o sistema Comprehensive School (equivalen-
educacional finlandês tem seu enfo- te ao nosso Ensino Fundamental), e
que na equidade e cooperação e não posteriormente o novo Upper Secon-
na competição. dary School (equivalente ao nosso
nível médio) em meados da década
Então a primeira característica de 80. Um outro elemento importan-
que nos chama atenção no sistema te no cenário finlandês é a mudança
educacional finlandês refere-se à identitária na metodologia de ensino
universalização da educação pública, que promoveu o deslocamento ide-
gratuita e de qualidade para os cida- ológico no ensino que centrava-se
dãos finlandeses. Visando contextua- no professor para partir do aluno, o
lizar essa conquista, apresentamos a renomado student-centred approach.
seguir um histórico breve da Finlân-
dia no pós-guerra, que apresenta o Verifica-se, portanto, que a Fin-
cenário em que o Finnish Dream foi lândia não construiu um novo sis-
concebido. tema de ensino “de uma hora pra
outra”. Sahlberg (2015) defende que
58
um lugar de destaque, pois “é aquele a formação profissional se opõe ao
possível e necessário em uma reali- direcionamento restrito aos interes-
dade conjunturalmente desfavorável ses do mercado. Quanto à terceira
(...), mas que potencialize mudanças dimensão, trata-se da organização
para, superando-se essa conjuntura, de um currículo interdisciplinar, que
constituir-se em uma educação que possibilite aos estudantes apreende-
contenha elementos de uma socie- rem o conhecimento na sua totali-
dade justa” (FRIGOTTO; CIAVATTA; dade e na sua relação com o mundo
RAMOS, 2005, p. 44). real, o que pode ser, por exemplo,
pela integração entre conteúdos e
2.2. Construindo “trilhas forma- disciplinas. Assim, como afirma Ra-
mos “o currículo integrado organi-
tivas”: uma possibilidade para o
za o conhecimento e desenvolve o
currículo integrado processo de ensino-aprendizagem
A noção de currículo integrado, de forma que os conceitos sejam
segundo Ramos (2008), pode reme- apreendidos como sistema de rela-
ter a três dimensões específicas, mas ções de uma totalidade concreta que
complementares entre si. A primei- se pretende explicar/compreender”
ra delas se refere à forma de oferta (RAMOS, 2005, p.116).
de Educação Profissional Técnica de Voltando agora à realidade da
Nível Médio, sendo os cursos Técni- Finlândia, um currículo integrado,
cos Integrados ao Ensino Médio por nessa perspectiva, une três conceitos
meio de matrícula e projeto peda- basilares na concepção finlandesa de
gógico únicos, o que não garante, educação: o saber (aqui fazendo re-
necessariamente, que a segunda e a ferência ao conhecimento teórico); o
terceira dimensão da integração se- fazer (o conhecimento prático e sua
jam de fato vislumbradas pela orga- aplicabilidade); e o ser (concentran-
nização pedagógica e curricular do do-se essencialmente na perspecti-
curso. Isso porque a segunda dimen- va que coloca o aluno no centro da
são se refere ao projeto de sociedade aprendizagem e promove a união
que buscamos construir por meio de entre teoria e prática).
um processo educativo que integre Apresentamos a seguir algumas
ciência, trabalho e cultura nos pla- características do Ensino de nível
nos de formação geral e profissional Médio no país que serve de inspira-
(RAMOS, 2005). Nessa perspectiva, ção para esta proposta.
60
especialização precoce em determi- odo escolar de 6 a 7 semanas, depen-
nadas áreas do conhecimento. Pelo dendo da escola). Então teremos His-
contrário, o sistema educacional fin- tória I, História II, História III e História
landês é regulamentado por diretri- IV. Esses módulos, obrigatórios para
zes e outras normativas construídas os estudantes, devem ser cursados
coletivamente e por ampla represen- durante os três anos de curso, nos
tação, que têm como foco a garantia períodos identificados em cada um
da equidade e qualidade do ensino. deles, ou seja, cada estudante orga-
Assim, tanto o Ensino Médio regular niza sua “trilha formativa” (BARBOSA
quanto o Profissional possuem dire- et al, 2016) personalizada, seja no En-
trizes pré-estabelecidas, que garan- sino Médio regular ou Profissional. E
tem a todos estudantes o acesso ao mais, caso determinado aluno tenha
conhecimento geral e profissional, se interesse em se especializar em His-
for o caso; ao mesmo tempo em que tória, pode cumprir módulos extras
respeita a autonomia das escolas e de especialização nessa área dentro
os professores na organização dos do percentual da carga horária des-
seus espaços pedagógicos. tinado a esse fim e em acordo com a
O currículo é organizado em mó- sua disponibilidade de horário livre.
dulos de curta duração (em torno de Em relação ao currículo da Voca-
6 ou 7 semanas, sendo 5 períodos por tional Upper Secondary School, o es-
ano), mas com carga horária semanal tudante deve cumprir unidades refe-
concentrada (de 6 aulas semanais rentes à formação profissional, outras
para cada módulo, por exemplo), o referentes à formação propedêutica,
que faz com que os estudantes te- unidades optativas complementa-
nham que gerenciar, a cada período res e eletivas (em outras instituições,
do ano letivo, em torno de cinco a por exemplo). Além disso, um des-
sete módulos, conferindo maior de- taque nessa modalidade de ensino
dicação e qualidade dos estudos de se refere à articulação com o setor
cada aluno e de sua relação com os produtivo, já que os estudantes po-
professores. dem cumprir parte do seu currículo
Vamos ilustrar com um exemplo: diretamente nas empresas e/ou ser-
a disciplina de História pode ser divi- viços e ainda têm que cumprir pelo
dida em 04 módulos (cada um com menos 06 meses de estágio, dentre
início e duração dentro daquele perí- outras atividades que fortalecem o
vínculo entre a formação acadêmica,
62
havendo conexões interdisciplinares formados em 05 Institutos Federais
de aplicação prática entre elas. (IFAL, IFNMG, IFMT, IFPB e IFSP), indi-
Imaginemos quantos estudantes cam as possibilidades que veremos
são reprovados em uma, duas, três, adiante.
talvez até mais disciplinas, mas aca- Organização do currículo em pe-
bam repetindo toda a série escolar ríodos de curta duração, ao invés de
porque a “grade” de disciplinas e ho- períodos anuais (por exemplo: 10 ou
rários é fechada e não permite que 20 semanas). Os conteúdos seriam
os estudantes adequem possíveis organizados em unidades curricula-
dependências. E até mesmo a inser- res e não em disciplinas, de acordo
ção de disciplinas de 'dependência' com temas ou eixos geradores, que
somente pode ser realizada em ano podem ser desenvolvidos por mais
posterior à reprovação do aluno, fato de um professor, se for o caso, pos-
que por si só pode gerar inúmeras di- sibilitando o ensino em equipe inter/
ficuldades como mudança de docen- multidisciplinar, estratégia que apre-
te - o que implica diferente estilo de senta múltiplas vantagens para to-
ensino, ausência do docente no ho- dos os atores do processo de ensino
rário da 'dependência'’ - o que pode e aprendizagem. Por exemplo: uma
alongar ainda mais o processo de re- unidade curricular poderia ser cha-
cuperação do conhecimento, exces- mada de “Tragédias Ambientais Bra-
so de disciplinas, ausência de horário sileiras”, em que conhecimentos de
disponível do discente em virtude diversas áreas se articulam na defi-
de participação em estágio, só para nição, pesquisa e análise das ativida-
enumerar algumas dificuldades. des, problemas ou projetos propos-
Essas reflexões são importantes tos. Ou uma unidade de “Geometria
para que algumas possibilidades, Espacial”, ou quem sabe, “Fundamen-
construídas a partir de elementos tos de Genética aplicados à Zootec-
do sistema educacional finlandês, nia”. Uma orientação importante se
possam ser apresentadas a partir de refere ao fato de que a construção
agora. Barbosa et al. (2016), em do- dos projetos pedagógicos é tarefa
cumento que propõe diretrizes para de cada instituição, preferencialmen-
um currículo inovador para o Ensino te de forma coletiva, envolvendo a
Médio Integrado, após um ciclo de comunidade escolar, comunidade
discussões com grupos de trabalho externa e partindo da análise do pro-
cesso de produção e suas múltiplas
64
os requisitos mínimos para aprova- nal para participar de atividades de
ção na(s) unidade(s) curricular(es), seu interesse pessoal e profissional,
tenham maior tempo para estudos elementos já mencionados anterior-
de recuperação (inclusive antes do mente e que são imprescindíveis
final do ano, já que a progressão não para a manutenção do bem-estar fí-
estaria mais atrelada a um conjunto sico e mental discente, quiçá docen-
de disciplinas), e mesmo que não te, do mesmo modo. Verifica-se que
aprovados nas atividades de recupe- num curso de quatro anos esse “tem-
ração, caberá aos estudantes cursar po livre” é ainda maior, e mesmo que
apenas a(s) unidade(s) curricular(es) o tempo mínimo de integralização
novamente, em algum momento do seja estipulado em três anos, caso o
seu percurso formativo, não sendo estudante tenha que cursar unida-
mais necessário que estudantes re- des curriculares pendentes após esse
pitam toda uma série escolar, o que período (ainda que não seja durante
poderá contribuir consideravelmen- todo um ano), não se trata de um
te para diminuir os índices de reten- ano adicional por reprovação, mas
ção e evasão. do cumprimento de um percurso em
Por fim, o planejamento da “Tri- que o próprio estudante foi protago-
lha Formativa” pode ser feito como nista na construção.
previsão geral no início do curso, A seguir, algumas informações
mas pode ser alterado sempre que importantes sobre a atuação do “pro-
houver necessidade e mudança dos fessor conselheiro” (career guidance
interesses dos alunos. Na verdade, é and counseling) e sua conexão com a
essencial que o planejamento seja aprendizagem centrada no aluno.
revisado no início de cada período,
pois sabemos que ao tomar conhe- 2.3. Professor Conselheiro: figura
cimento e experimentar outras disci-
central no modelo finlandês
plinas os alunos podem desenvolver
novos interesses e ajustar suas esco- Há uma pergunta que necessi-
lhas pessoais o que, eventualmente, tamos fazer inicialmente: é permiti-
poderá levar às escolhas profissio- do aos estudantes de Ensino Médio
nais. Além disso, essa organização regular e integrado - e eles são en-
por unidades permite que estudan- corajados a - tomar decisões sobre
tes tenham, na maioria dos períodos sua trajetória de aprendizagem? A
cursados, espaço no horário sema- grosso modo podemos inferir que
66
em termos de questões educacionais melhante por meio do Professor-Tu-
como também as profissionais, como tor que é alocado para uma turma
já foi mencionado, podendo ain- e, usualmente, auxilia essa turma ou
da indicar outros profissionais caso discente individualmente a resolver
perceba necessidades de aconselha- questões relativas às habilidades de
mento pessoal. Para tanto, Barbosa aprendizagem, expectativas profis-
et al (2016) pesquisaram em seus ci- sionais, dificuldades - acadêmicas ou
clos de discussão e concluíram que, não, ausências, assistência social e
para se tornar um, o professor ou ser- financeira, momentos em que o Pro-
vidor público que trabalha na escola fessor-Tutor irá transferir o seu auxílio
ou Instituição de ensino deve passar para os departamentos competentes
por um treinamento apropriado para (BARBOSA et al., 2016).
desenvolver habilidades de escuta A função, como já elencado ante-
e orientação em conformidade com riormente, seria promover a reflexão
as competências e necessidades dis- colaborativa e com base nas neces-
centes, apenas para elencar algumas sidades discentes sem apontar o
características essenciais. caminho, mas deixando sempre a li-
Além disso, o servidor deve estar berdade de ação discente na tomada
ciente do currículo com que traba- de decisão. O pontapé inicial seria o
lha e ser empático com a comunida- desenho da “Trilha formativa” do dis-
de escolar e a família. O treinamen- cente, auxiliando-o na escolha das
to deve ser organizado e oferecido unidades, dos horários, espaços de
pela instituição de ensino e aberto a estudo e de realização de tarefas de
qualquer servidor que desejar fazer casa, individuais e em grupo. Após a
parte. O perfil e os campos de atua- conclusão dessa fase, ficariam esta-
ção do Professor Conselheiro devem belecidos encontros para avaliação
fazer parte de uma construção cole- da “Trilha” selecionada, o que pode-
tiva com todos os atores que fazem ria incorrer em uma modificação ou
parte do ambiente de ensino-apren- manutenção das escolhas realizadas.
dizagem em cada localidade e con- Ao final do ano, mais um encontro te-
siderando as necessidades nacionais, ria a “Trilha” como elemento de pau-
locais e suas idiossincrasias. ta para uma avaliação das escolhas
Alguns dos campi apontaram e já potencial seleção das próximas
que já lançam mão de estratégia se- disciplinas ou elementos curriculares
para os anos seguintes.
68
culo integrado no Brasil. Verifica-se, p. 57-76.
ainda, que a figura do Professor Con-
selheiro é central nesse processo. BARBOSA et al. Rethinking the cur-
riculum: calling teachers to discuss
As orientações construídas coleti- and propose new perspectives for
vamente por profissionais dos cinco the curricular design. Tampere – FI:
Institutos Federais e apresentadas Tamk, 2016. [Relatório técnico]
neste trabalho (BARBOSA et al., 2016)
confirmam essas possibilidades, ain- FRIGOTTO, G.; CIAVATTA; M..; RAMOS,
da que não tenham sido aplicadas M. (Orgs). Ensino Médio Integrado:
na prática, até o momento. O que se concepções e contradições. São Pau-
pretende dizer com essa afirmação lo: Cortez, 2005.
é que a construção de tais diretrizes
indica uma possibilidade de mudan- MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTE-
ça, algo como um “ponto de partida” RIORES (ITAMARATY). O sistema de
para os enfrentamentos que virão. ensino finlandês: os pilares de uma
Isso porque não restam dúvidas sociedade baseada no conhecimen-
quanto à existência de profissionais to. In: _______. Mundo Afora: Edu-
dispostos a refletir, discutir, propor cação Básica e Ensino Médio. Dispo-
e implementar; e, nesse movimen- nível em: <http://www.dc.itamaraty.
to, experiências como a da Finlândia gov.br/publicacoes/colecao-mundo
podem nos indicar possibilidades de -afora/Mundo%20Afora%20n11%20
ações. v11%20WEB%20single.pdf/> Acesso
em: 30 set. 2016.
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Modelo Nórdico de Educação. Revis- Inglaterra e Finlândia. Educação e
ta Lusófona de Educação, Lisboa, Sociedade, Campinas, v.38, nº 139,
v.11, p. 31-48, 2008. p. 405-429, abr.-jun., 2017.
ASBAHR, S.F.S; SANCHES, Y.C.S. Trans- MOURA, D.H. (Org.). Educação Pro-
formação social: uma possibilidade fissional: desafios teórico-metodo-
da educação escolar? In: PARO, V.H. lógicos e políticas públicas. Natal:
(Org.). A teoria do valor em Marx e IFRN, 2016.
a educação. São Paulo: Cortez, 2006, OLIVEIRA, R.. A (des)qualificação da
70
PROJETOS DE REFORMULAÇÃO DO ENSINO MÉDIO E
INTER-RELAÇÕES COM A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL:
(IM)POSSIBILIDADES DO ENSINO MÉDIO INTEGRADO
Monica Ribeiro da Silva
Universidade Federal do Paraná
E-mail: monicars@ufpr.br
72
momento, em que se vê exacerbada lidade a novas condições de ocupa-
ção ou aperfeiçoamento posterio-
a disputa em torno dos projetos para
res; [...]
o EM e para a EPTNM, explicitada na
IV – a compreensão dos fundamen-
iniciativa da Câmara dos Deputados tos científico-tecnológicos dos pro-
com vistas a alterar a LDB por meio cessos produtivos, relacionando a
do Projeto de Lei nº 6.840/2013. Por teoria com a prática, no ensino de
cada disciplina.
fim, nos referimos à reforma do Ensi-
no Médio iniciada com a Medida Pro-
visória nº 746/2016, aprovada como No art. 36, sobre a organização
Lei nº 13.415/2017, e que traz graves curricular, a LDB propõe:
implicações seja para o EM, seja para O currículo do Ensino Médio obser-
a EPTNM. Para esta, a reforma em vará o disposto na Seção I deste ca-
curso significa a inviabilização pla- pítulo e as seguintes diretrizes:
nejada da continuidade da oferta do I – destacará a educação tecno-
lógica básica, a compreensão do
Ensino Médio Integrado.
significado da ciência, das letras e
das artes; o processo histórico de
2 A LDB de 1996 e as DCN de 1998 transformação da sociedade e da
cultura; a língua portuguesa como
e 1999 instrumento de comunicação, aces-
so ao conhecimento e exercício da
O artigo 26 da Lei nº 9.394/1996 cidadania;
prescreve a composição do currículo II – adotará metodologias de ensino
por meio de uma base comum nacio- e de avaliação que estimulem a ini-
ciativa dos estudantes;
nal e de uma parte diversificada. A
I – domínio dos princípios científi-
complementação e o detalhamento cos e tecnológicos que presidem a
dessas prescrições encontram-se nas produção moderna;
Diretrizes Curriculares Nacionais for- § 2º – O Ensino Médio, atendida a
muladas pelo Conselho Nacional de formação geral do educando, po-
derá prepará-lo para o exercício de
Educação. Do que afirma a LDB para
profissões técnicas.
o EM e para a EPTNM, destacamos a
§ 4º – A preparação geral para o
configuração da Educação Profissio- trabalho e, facultativamente, a ha-
nal como modalidade de oferta, ain- bilitação profissional, poderão ser
da que o art. 35 afirme que: desenvolvidas nos próprios estabe-
lecimentos de Ensino Médio ou em
II – a preparação básica para o traba- cooperação com instituições espe-
lho e a cidadania do educando, para cializadas em Educação Profissional.
continuar aprendendo, de modo a
ser capaz de se adaptar com flexibi-
74
diferentes tecnologias relativas às Essa racionalidade supõe que, num
áreas de atuação. (BRASIL, PCNEM, mundo em que a tecnologia revo-
1999). luciona todos os âmbitos de vida,
e, ao disseminar informação amplia
as possibilidades de escolha, mas
também a incerteza, a identidade
As relações entre transformações autônoma se constitui a partir da
tecnológicas e necessidade de mu- ética, da estética e da política, mas
danças na educação escolar caracte- precisa estar ancorada em conheci-
mentos e competências intelectu-
rizam uma percepção linear e deter- ais que deem acesso a significados
minista sobre esta última, como se a verdadeiros sobre o mundo físico e
formação humana se restringisse ex- social. Esses conhecimentos e com-
petências é que dão sustentação à
clusivamente a formar para o merca- análise, à prospecção e à solução de
do de trabalho, e “circunscreve uma problemas, à capacidade de tomar
visão parcial e limitada do papel da decisões, à adaptabilidade a situa-
ções novas, à arte de dar sentido a
escola, pois a restringe à formação um mundo em mutação. (BRASIL,
para o mercado e à observância à ló- CNE/CEB, PARECER 15/1998).
gica mercantil” (SILVA, 2008, p. 76).
No Parecer CNE/CEB nº 15/1998,
Por sua vez, o Parecer CNE/CEB nº
que estabelece as Diretrizes Curricu-
16/1999 das Diretrizes Curriculares
lares Nacionais para o Ensino Médio,
Nacionais para a Educação Profissio-
as finalidades desta etapa da Educa-
nal é assentado, também, na noção
ção Básica estão vinculadas à ade-
de competências para o mercado.
quação (e subordinação) da escola
Ambas as Diretrizes reiteram o cará-
às mudanças nas formas de organi-
ter pragmático que deveria adquirir
zação do trabalho produtivo com
a formação dos indivíduos, prag-
base na “globalização econômica e
matismo oriundo da subordinação
(na) revolução tecnológica”. O alcan-
da educação à forma alienada do
ce da anunciada finalidade levaria ao
trabalho em nossa sociedade. Para
encontro da noção de competências
fundamentar esse intento, o Parecer
que, aliada aos princípios da estética
16/1999 assim se refere à noção de
da sensibilidade, da política da igual-
competências:
dade e da ética da identidade (BRASIL,
Quando competências básicas pas-
CNE/CEB, Parecer 15/1998), produzi- sam a ser cada vez mais valorizadas
ria a racionalidade capaz de atender no âmbito do trabalho, e quando
às ditas demandas da produção pós a convivência e as práticas sociais
na vida cotidiana são invadidas em
-industrial.
76
consagrando uma formação para o Médio e, aliado a essas proposições,
trabalho em sentido diametralmente o reconhecimento dos sujeitos, so-
oposto ao que vinham reivindican- bretudo dos jovens, como basilar na
do as ditas mudanças tecnológicas e configuração das finalidades da últi-
organizacionais a que nos referimos ma etapa da Educação Básica1.
anteriormente e que, ainda que car- O Decreto 5.154/2004, que pos-
regado de imediatismo e reducionis- sibilita a oferta integrada da Educa-
mos, se faziam presentes também ção Profissional – o Ensino Médio In-
nas justificativas da reformulação tegrado –, passa a compor as bases
curricular. dos projetos de reformulação tam-
bém do EM: é o que identificamos
2. Novo Decreto, novas DCN, nos documentos2 que antecedem ao
novos rumos? Programa Ensino Médio Inovador e
que dá sustentação tanto a este Pro-
No período subsequente, estabe- grama quanto ao processo de “atua-
lecemos como marco inicial dos iti- lização” das DCN para o EM e para a
nerários de reformulação do EM e da EPTNM. A base para as novas DCNEM
EPTNM o evento realizado em Brasí- (Parecer CNE/CEB 05/2011 e Resolu-
lia em junho de 2003 – o Seminário ção CNE/CEB 2/2012) foi o texto do
Nacional de Ensino Médio. Organi- coletivo social elaborado com vistas
zado pela Secretaria de Ensino Mé- à atualização das DCNEP, o que, por
dio e Tecnológico (Semtec), já neste si só, sinaliza uma aproximação entre
momento, são enunciadas as ideias as propostas de reformulação, não
centrais que darão sustentação con- fossem os deslocamentos de sentido
ceitual, epistemológica e metodoló- ocasionados no percurso da incor-
gica às trajetórias que assumirão as poração das proposições ao Parecer
iniciativas de reformulação do EM e e Resolução da EPTNM (SILVA; BER-
da EPTNM: trabalho, ciência e cultura NARDIM, 2014).
como conceitos estruturantes, base
As bases teóricas que deram fun-
da formação humana e da organiza-
damentação para o Ensino Médio In-
ção pedagógico-curricular do Ensino
1 A síntese das discussões está publicada no livro Ensino Médio: ciência, cultura e trabalho,
organizado por Gaudêncio Frigotto e Maria Ciavatta. Brasília: MEC, Semtec, 2004.
2 “Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil” (BRASIL, MEC/SEB, versão preli-
minar, abril de 2008); e “Ensino Médio Integrado: uma perspectiva abrangente na política
pública educacional” (BRASIL, MEC/SEB, versão preliminar, junho de 2008).
78
básica e formação técnica específica, Ensino Médio oferecido no país “não
conferindo hegemonia para a forma corresponde às expectativas dos jo-
concomitante e em parceria com o vens, especialmente no tocante à
setor privado, e impondo fragilidade sua inserção na vida profissional, e
e perda de centralidade do Ensino vem apresentando resultados que
Médio Integrado. não correspondem ao crescimento
social e econômico”. Foram mais de
3. Outros cenários da disputa 19 meses de trabalho, 22 Audiências
Públicas, quatro Seminários Estadu-
por um projeto hegemônico
ais e um Seminário Nacional. Des-
Em 15 de março de 2012, poucos se processo, resultou o Relatório da
dias após terem sido homologadas Comissão, que se transformou no PL
as novas DCN para o Ensino Médio, é 6.840/2013.
criada, na Câmara dos Deputados, a As principais propostas desse
“Comissão Especial destinada a pro- Projeto de Lei são: (i) o Ensino Médio
mover Estudos e Proposições para diurno em jornada de 7 horas (meta
a Reformulação do Ensino Médio de universalização ao tempo integral
– CEENSI”, por iniciativa do Deputa- em até 20 anos e, no final do décimo
do Reginaldo Lopes (PT-MG)4, que ano, com 50% das matrículas em 50%
assumiu a presidência da comissão. das escolas); (ii) limitação do acesso
Como relator, foi designado o De- ao ensino noturno para menores de
putado Wilson Filho (PTB-PB)5. Con- 18 anos, em até três anos; (iii) Ensi-
forme afirma o relatório da Ceensi, o no Médio noturno com duração de
80
dos estudantes reforça a fragmenta- dições de oferta da maior parte das
ção e a hierarquia do conhecimento escolas brasileiras de Ensino Médio.
escolar e leva à privação do acesso Em resposta ao PL nº 6.840/2013,
ao conhecimento, bem como às for- foi criado o Movimento Nacional em
mas de produção da ciência e suas Defesa do Ensino Médio6 que agrega
implicações éticas, políticas e estéti- entidades representativas da educa-
cas, acesso este considerado relevan- ção brasileira, dentre elas Anped, Ce-
te neste momento histórico em que des, Forumdir e Anfope.
as fusões de campos disciplinares
rompem velhas hierarquias e frag- O Projeto de Lei não teve mo-
mentações. vimentação até outubro de 2014,
quando foram retomadas as audi-
Quanto ao entrelaçamento entre ências públicas. Nesse momento,
EM e EPTNM, a inclusão do incentivo a atuação das entidades que com-
de que, no último ano, o/a estudan- põem o Movimento Nacional em
te fizesse a opção por uma formação Defesa do Ensino Médio foi crucial
profissional contraria o disposto no e contribuiu decisivamente para a
artigo 35 da LDB nº 9.394/1996, des- retirada de propostas que expressa-
considerando a modalidade de En- vam maior preocupação, dentre elas
sino Médio Integrado, mais próxima a opção formativa no terceiro ano, a
da concepção proposta nas DCNEM obrigatoriedade do tempo integral,
e já em prática nas redes estadual e a proposta dos temas transversais, a
federal. Implicaria, também, em uma proibição de acesso dos menores de
oferta precarizada, haja vista as con- 17 anos ao Ensino Médio noturno e
6 O Movimento Nacional em Defesa do Ensino Médio é composto por 10 entidades do cam-
po educacional: Anped (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação),
Cedes (Centro de Estudos Educação e Sociedade), Forumdir (Fórum Nacional de Diretores
das Faculdades de Educação), Anfope (Associação Nacional pela Formação dos Profissio-
nais da Educação), Sociedade Brasileira de Física, Ação Educativa, Campanha Nacional pelo
Direito à Educação, Anpae (Associação Nacional de Política e Administração da educação),
CONIF (Conselho Nacional Das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional Cien-
tífica e Tecnológica) e CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), e foi
criado no início de 2014 com vistas a intervir no sentido da não aprovação do Projeto de Lei
nº 6.840/2013. Para esse fim, empreendeu um conjunto de ações junto ao Congresso Na-
cional e ao Ministério da Educação, além da criação de uma petição pública. Os signatários
do Movimento criaram um Manifesto no qual explicitam as divergências com relação ao
Projeto de Lei 6.840/2013. O Manifesto completo, bem como os manifestos de entidades,
está disponível e pode ser acessado em http://movimentoensinomedio.org/ e em www.ob-
servatoriodoensinomedio.ufpr.br.
82
dade escolar irá oferecer. Essa medi- verno, interessa ampliar o tempo de
da, além de significar uma perda de estudo tendo em vista preparar os/as
direito e um enorme prejuízo com estudantes para as provas e exames
relação aos processos formativos da realizados pelo próprio governo.
juventude, fere a autonomia das es- Mais um entre tantos reducionismos
colas na decisão sobre seu projeto trazidos pela reforma proposta e que
político pedagógico, o que até então vai em sentido oposto aos que os es-
estava assegurado na LDB. tudantes têm mostrado como sendo
A LDB foi alterada também em necessários: atividades de múltiplos
outros aspectos com relação ao cur- interesses e formas aliadas ao conhe-
rículo do Ensino Médio: a retirada da cimento escolar que hoje estruturam
obrigatoriedade das disciplinas de as disciplinas escolares.
Filosofia e Sociologia, que passam a Especial atenção merece a pro-
ser tratadas como “estudos práticas”, posta do itinerário formativo relati-
podendo ser ofertadas em qualquer vo à formação técnico-profissional.
outra disciplina ou forma. Ao estabelecer que, para ser docen-
Além dessas determinações, a Lei te nos cursos, não há necessidade
nº 13.415/2017 deu base legal para o de formação especializada, bastan-
Programa de Incentivo ao Ensino Mé- do que o sistema de ensino certifi-
dio de Tempo Integral. No entanto, que um suposto “notório saber”, a
trouxe mais uma evidência de preca- Lei 13.415/2017 desconsidera que,
rização. Ainda que ampliar o tempo para o aprimoramento da qualida-
de permanência na escola possa ser de do ensino, é necessário garantir
interessante, é preciso ter claro qual aos profissionais da educação uma
é a proposta pedagógica que irá sus- sólida formação teórico-prática, pre-
tentar a maior permanência dos/das ferencialmente em cursos superio-
adolescentes e jovens na escola. A res. Além disso, para viabilizar esse
jornada de tempo integral necessita itinerário formativo, foram alteradas
de reestruturação do ambiente físico as regras do financiamento da edu-
e material da escola e uma diversifi- cação pública, por meio do incentivo
cação das atividades oferecidas. Na e da viabilização de parcerias com o
Portaria nº 1.145/2016, publicada setor privado, retirando recursos da
pelo MEC no dia 11 de outubro, fica Educação Básica do país. Essa pos-
clara a intenção de que, para o go- sibilidade visa, claramente, atender
aos interesses do empresariado e
84
a educação da juventude brasileira. NACIONAL EM DEFESA DO ENSINO
MÉDIO, 2016).
Dentre as ações necessárias, o Movi-
mento assevera como essencial
a consolidação de uma organização As ações desse Movimento mos-
curricular que respeite as diferenças
e os interesses dos jovens mas que, tram o quão ainda é imprescindível
ao mesmo tempo, assegure a for- a ação dos movimentos sociais, dos
mação básica comum e de qualida- coletivos organizados em defesa do
de; que se de uma forma de avalia-
ção no Ensino Médio que possibilite direito à educação.
o acompanhamento permanente
Em pouco mais de 20 anos, des-
pelas escolas do desempenho dos
estudantes com vistas à contenção de a LDB de 1996, o Ensino Médio,
do abandono e do insucesso esco- de formação geral ou profissional,
lar; a ampliação dos recursos finan-
foi alvo de várias ações políticas com
ceiros com vistas à reestruturação
dos espaços físicos, das condições vistas à sua reformulação. Mas, da
materiais, da melhoria salarial e das análise realizada, é possível constatar
condições de trabalho dos educa-
algumas tendências que foram ga-
dores; construção de novas escolas
específicas para atendimento do nhando hegemonia: a preponderân-
Ensino Médio em tempo integral; cia de um discurso que visa reduzir a
indução à formação de redes de
formação da juventude a demandas
pesquisa sobre o Ensino Médio com
vistas a produzir conhecimento e do mercado; a reorganização curri-
realizar um amplo e qualificado cular com base em um viés econo-
diagnóstico nacional; articulação de
micista e eficienticista que acaba por
uma rede de formação inicial e con-
tinuada de professores a partir de subtrair dos/das jovens um conjun-
ações já existentes como PARFOR e to de conhecimentos necessários a
PIBID; fomento a ações de assistên-
uma formação mais qualificada e au-
cia estudantil com vistas a ampliar a
permanência do estudante na esco- tônoma; a desresponsabilização do
la; atendimento diferenciado para poder público por meio da amplia-
o Ensino Médio noturno de modo
ção da presença do setor privado na
a respeitar as características do pú-
blico que o frequenta; elaboração e oferta educacional; a destinação de
aquisição de materiais pedagógicos recursos públicos da Educação Bási-
apropriados, incluindo os forma-
ca para o setor privado.
tos digitais; criação de uma rede
de discussões para reconfiguração Em síntese, dos enunciados que
dos cursos de formação inicial de
professores, envolvendo as várias se tornam hegemônicos com a atual
entidades representativas do cam- reforma, é possível depreender que,
po educacional, estudantes, pro- nessas disputas, o que esteve e está
fessores e gestores. (MOVIMENTO
86
2014. Disponível em: <http://www. dio. Brasília: 1999.
planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2014/Lei/L13005.htm>. Acesso _____. Conselho Nacional de Educa-
em: 23 jun. 2017. ção. Parecer CNE/CEB nº 5, de 4 de
maio de 2011. Trata das Diretrizes
_____ . Lei nº 13.415, de 16 de feve- Curriculares Nacionais para o Ensino
reiro de 2017. Conversão da Medida Médio. Brasília: 2011.
Provisória nº 746, de 2016. Altera as
Leis nos 9.394, de 20 de dezembro _____. Conselho Nacional de Edu-
de 1996, que estabelece as diretri- cação. Parecer CNE/CEB nº 11, de 9
zes e bases da educação nacional, de maio de 2012. Trata das Diretrizes
e 11.494, de 20 de junho 2007, que Curriculares Nacionais para a Educa-
regulamenta o Fundo de Manuten- ção Profissional Técnica de Nível Mé-
ção e Desenvolvimento da Educação dio. Brasília: 2012.
Básica e de Valorização dos Profissio-
_____. Conselho Nacional de Educa-
nais da Educação, a Consolidação das
ção. Resolução CNE/CEB nº 3, de 26
Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo
de junho de 1998. Institui as Diretri-
Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio
zes Curriculares Nacionais para o En-
de 1943, e o Decreto-Lei no 236, de
sino Médio. Brasília: 1998. Disponível
28 de fevereiro de 1967; revoga a Lei
em: <http://portal.mec.gov.br/cne/
no 11.161, de 5 de agosto de 2005;
arquivos/pdf/rceb03_98.pdf>. Aces-
e institui a Política de Fomento à Im-
so em: 4 jul. 2017.
plementação de Escolas de Ensino
Médio em Tempo Integral. _____. Conselho Nacional de Educa-
ção. Resolução CNE/CEB nº 4, de 8
_____. Conselho Nacional de Educa-
de dezembro de 1999. Institui as Di-
ção. Parecer CNE/CEB nº 15, de 1º
retrizes Curriculares Nacionais para a
de junho de 1998. Trata das Diretri-
Educação Profissional. Brasília, 1999.
zes Curriculares Nacionais para o En-
Disponível em: <http://portal.mec.
sino Médio. Brasília: 1998.
gov.br/dmdocuments/rceb004_99.
_____. Conselho Nacional de Educa- pdf>. Acesso em: 29 jun. 2017.
ção. Parecer CNE/CEB nº 16, de 5 de
_____. Conselho Nacional de Edu-
outubro de 1999. Trata das Diretrizes
cação. Resolução CNE/CEB nº 2, de
Curriculares Nacionais para a Educa-
30 de janeiro de 2012. Define Dire-
ção Profissional Técnica de Nível Mé-
trizes Curriculares Nacionais para
88
INEP. Censo escolar da Educação
Básica 2016. Disponível em <http://
portal.inep.gov.br/>. Acesso em: 5
ago. 2017.
90
do (EMI) relacionado com a discus- forma pela qual o homem se relacio-
são sobre a potencialidade desses na com a natureza, pois diante dela,
cursos como uma possibilidade de faz juízo de valor e age no sentido
educação pública de qualidade para de transformá-la em seu favor. (Paro,
os jovens brasileiros. O texto é cons- 2016. p. 27).
truído considerando os avanços e O conhecimento entendido no
desafios para a democratização do sentido e caráter aproximativo da
Ensino Médio Integrado. plenitude da realidade, só se torna
Nesse trabalho recorremos a uma verdadeiramente adequado quando
pesquisa quantitativa de dados re- chega a descobrir suas leis imanen-
ferentes às matriculas e à oferta dos tes e atingindo a mais elevada forma
cursos de EMI, em âmbito nacional à qual se possa pretender (Lukács
e no Instituto Federal de Educação, 2011, p. 28-33). O conhecimento se
Ciência e Tecnologia de São Paulo apresenta como uma ação humana
(IFSP), além de pesquisa bibliográfi- social que só pode ser compreen-
ca. dida enquanto processo, pois está
relacionado ao que o homem como
2. BREVE DISCUSSÃO DO ENSI- ser social busca conhecer para trans-
formar parte da natureza. Nesse sen-
NO MÉDIO INTEGRADO NO BRASIL
tido, o conhecimento nunca é algo
Educação e trabalho são ques- desinteressado, sempre interessa
tões inseparáveis. A educação é um aos indivíduos em sociedade. A bus-
processo que se confunde com a ca pelo conhecimento se caracteriza
própria história do homem e tem como algo evidentemente progres-
como elementos fundamentais o co- sista, pois pelo processo de trabalho
nhecimento e o trabalho. Diante dis- os homens e mulheres em sociedade
to, é interessante compreendermos buscam constantemente aprimorar
melhor cada uma destas categorias. suas relações sociais. Essa busca nos
permite a superação da ignorância,
O trabalho, atividade exclusiva-
do senso comum e nos dá condições
mente humana, em seu sentido mais
objetivas para a construção de socie-
amplo, consiste na capacidade de re-
dades cada vez mais desenvolvidas
alizar uma atividade adequada a um
em seu sentido integral.
fim, isto requer capacidade de plane-
jamento. Além disto, o trabalho é a Por outro lado, a organização do
92
de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (INEP)1 apontam para Conforme dados do INEP, orga-
significativo avanço da oferta do EMI. nizados na Tabela 1, em 2015, o EMI
Tabela 2 – Evolução das Matrículas do EMI por região geográfica e por ano
Região
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Geográfica
Brasil 132.519 175.831 215.718 257.736 298.545 338.390 366.959 391.766
Norte 8.369 11.043 14.843 18.366 19.786 21.973 23.468 24.229
Nordeste 56.719 73.028 90.250 109.795 127.346 145.198 150.691 163.846
Sudeste 35.315 50.275 56.150 63.160 75.205 90.831 107.173 117.984
Sul 28.701 33.668 41.865 49.058 56.175 60.329 64.932 64.534
Centro- 3.415 7.817 12.665 17.357 20.033 20.059 20.695 21.173
Oeste
Fonte: MEC/Inep/Deed
1 Os arquivos referentes aos dados utilizados nesse texto, disponíveis no site do INEP, não
apresentam os mesmos dados para cada ano de analise o que explica a atualização de perí-
odos diferentes em algumas análises.
94
vância, nos dados do Censo de 2013, possibilidade de formação educacio-
é o crescimento de 9,4% no núme- nal de qualidade para os jovens da
ro de concluintes do ensino funda- classe trabalhadora.
mental entre 2007 e 2013, dado que Não obstante a proeminência das
também contrasta com os indicado- políticas voltadas para ampliação
res de matrícula do Ensino Médio, o do EMI no Brasil, é possível identifi-
que pode indicar, segundo o resumo car alguns obstáculos para sua con-
técnico do Censo Escolar 2013, que solidação. Esses obstáculos estão
o Ensino Médio não está captando relacionados, por um lado, com as
de forma eficaz os concluintes do dificuldades encontradas para a im-
fundamental. Segundo a referida plementação do currículo integrado;
publicação, esse quadro aponta para e, por outro, pela permanente dispu-
potencialidade do EMI em atender às tas e tensões entre distintos projetos
expectativas dos jovens no Brasil. de educação, e consequentemente
Estratégias como a ampliação da de sociedade, o que mais uma vez,
educação profissional integrada
ao Ensino Médio (grifos nossos) demonstra a distância entre o objeti-
– com a apropriada flexibilização vo das políticas e seus resultados.
e diversificação curricular, conside-
rando as aptidões e expectativas de
formação profissional e educacional 3. O ENSINO MÉDIO INTEGRADO
dos estudantes e em sincronia com
os arranjos produtivos locais – po-
NO IFSP
dem tornar o Ensino Médio mais
atrativo, permitindo que o aluno No que tange à questão da oferta
do EMI, verificamos que o cenário de
vislumbre nessa etapa não apenas o
caminho para a educação superior,
disputa e contradição também pode
mas também uma possibilidade
ser observado no âmbito do IFSP,
concreta de qualificação para o tra-
balho. (INEP 2013, p.20-21) uma vez que, apesar do disposto na
Lei de criação dos Institutos Fede-
rais (Nº 11892, de 29 de dezembro
Entendemos que a proposta de
de 2008), até 2012, dos 25 campi em
implementação do EMI, a partir de
funcionamento no IFSP apenas 06
uma concepção que busca a supe-
unidades ofertavam essa forma de
ração do dualismo educacional, ins-
ensino. Tal quadro não é exclusivi-
creve-se na perspectiva de constru-
dade do IFSP, como demonstra Moll
ção de um sistema de ensino mais
(2010), no que tange ao aumento da
democrático, que emerge como uma
oferta do EMI. A partir de 2005, ob-
96
IFSP, por meio de “projetos pedagó- ção social do IFSP, por outro lado,
para os mais críticos, isso foi enten-
gicos unificados”, em regime de in-
dido como um abandono do Institu-
tercomplementaridade. Segundo o to do seu projeto de oferecimento
referido Parecer, a unificação das ma- de cursos integrados próprios e um
descumprimento da lei de forma-
trículas e da certificação justificaria
ção dos institutos. (IFSP, 2013)
do ponto de vista legal o caráter inte-
grado da oferta desses cursos. Outra
justificativa dada no parecer seria a Cabe aqui também destacar que
caracterização dos cursos no “regime não há consenso no IFSP em torno
de experiência pedagógica”, como da exigência da oferta de 50% das
prever o art. 81 da Lei de Diretrizes vagas ofertadas para educação pro-
e Bases da Educação Nacional (LDB). fissional técnica de nível médio: há
Apesar da aprovação do Parecer pela grupos que defendem que este per-
Câmara de Educação Básica, para centual deve ser aplicado ao total
além das questões legais, parece- geral vagas da instituição, o que sig-
nos válido concluir que no caso do nifica na prática, que nem todos os
IFSP tal acordo não passou de uma campi precisariam cumprir a deter-
tentativa de eximir-se da obrigação minação se na somatória de todas as
legal de ofertar os cursos integrados vagas de todos os campi o resultado
próprios. for alcançado.
Nossa avaliação encontra resso- Neste contexto, o PDI acima men-
nância no disposto no Plano de De- cionado, estabelece como um dos
senvolvimento Institucional (PDI) do objetivos da pró-reitora de Ensino2
IFSP, referente ao período de 2014 a “Priorizar, em relação ao Ensino Mé-
2018, que aponta para uma mudan- dio Técnico, a oferta de cursos Inte-
ça de posicionamento em relação a grados Próprios em todos os campi”.
essa questão: Para tanto foram estabelecidas como
Em 2012, o IFSP, em colaboração metas: a) Orientar levantamento es-
com a Secretaria de Educação do tatístico da situação e projeções das
Estado de São Paulo, iniciou um pro-
grama de oferecimento de cursos necessidades dos campi - execução
técnicos para alunos matriculados 2014; b) Orientar planejamento de
na rede estadual. Se isso foi enten- implantação, verificando os requisi-
dido como um atendimento da fun-
98
Tabela 4 - Evolução da oferta de cursos por nível de ensino no IFSP
Ano Número total de Número de campi Percentual de
campi (incluindo com oferta de EMI campi com oferta
avançados) de EMI
2012 25 5 20%
2013 25 5 20%
2014 25 7 28%
2015 28 12 43%
2016 30 23 77%
2017 35 32 91%
Fonte: IFSP - Editais dos processos seletivos
que ofertava cursos de EMI, no IFSP, pliação da oferta dos cursos EMI que
aumentou de 5 para 7, apenas 2 uni- os objetivos preconizados no PDI
dades a mais, o que representava 2014-2018 foram utilizados como re-
apenas 20% do total de campi. Em ferência para a proposição de novos
2015 12 campi passaram a ofertá-los, cursos. A atualização do PDI, conclu-
representando 43%. Em 2016, dos 30 ída no primeiro semestre deste ano,
campi 23 ofertavam EMI, o que re- indica que os campi que não ofere-
presenta 87% do total de unidades, cem cursos EMI o farão a partir de
Já em 2017, dos 35 campi do IFSP 32 2018.
ofertam os cursos Integrados, o que A tabela 7 demostra que no pe-
representa 91% do total. Podemos ríodo de 2011 a 2016, houve um au-
afirmar a partir da verificação da am-
Tabela 6 – Matrículas por cursos no IFSP 2015-2017
mento de 1.450 vagas, sendo que o O exame dos números acima cor-
período de maior crescimento foi en- robora com a nossa análise de que a
tre os anos de 2014 a 2016, conforme oferta dos cursos EMI se insere em
previsto no PDI. Os dados aqui colo- um contexto de disputas e contradi-
cados, juntamente com os apresen- ções acerca do modelo de educação
tados na tabela 6, mostram que, em e de sociedade. Porém, observa-se
tendência, quando novos campi pas- que a ampliação de vagas nesses
sam a ofertar os cursos há também cursos está vinculada a uma forte
aumento pela procura. Isso pode ser demanda social, ainda não atendi-
observado pelo aumento de inscri- da plenamente pela instituição. Essa
tos do ano de 2015 para o de 2016, demanda social aponta uma poten-
que cresceu em 5.956, número visi- cialidade tanto para o aumento de
velmente mais expressivo que nos vagas como para a própria expansão
anos anteriores. Esse aumento coin- da instituição.
cide com o período em houve maior Contudo, ainda que se leve em
número de campi que passaram a conta o incremento da oferta dos
ofertar cursos EMI. Os dados mais cursos integrados no IFSP, é apro-
significativos da tabela 7 demons- priado inferir que a conjuntura polí-
tram que, mesmo com o considerá- tica foi um importante vetor para a
vel aumento no número de vagas, mudança da política institucional. As
ainda há demanda reprimida, pois o mudanças no cenário político, que
número de vagas ofertadas é muito ocorreram em 2016, trouxeram gran-
menor do que o número de jovens des incertezas para a rede federal de
inscritos. ensino, isto porque, ainda não são
100
claras quais serão as políticas do go- Aqui se faz necessária uma ex-
verno Temer com relação à rede3. É posição, mesmo que concisa, sobre
possível que a aposta estratégica do a realidade ora vivenciada que é a
IFSP na oferta dos cursos de Ensino aprovação da reforma do Ensino
Médio Integrado deva-se também ao Médio proposta pela equipe do Mi-
reconhecimento social desses cur- nistério da Educação do governo de
sos, e acrescente-se o destaque dos Michel Temer. É sabido que as refor-
mesmos nas avaliações externas4. mas nos sistemas de ensino são fru-
Acreditamos que a aposta na conso- tos de conflitos ideológicos em torno
lidação da rede passa pelo fortaleci- das disputas por diferentes projetos
mento do reconhecimento social da de sociedade. São justamente es-
mesma. ses conflitos que estão no centro
das discussões da atual reforma do
4. CONSIDERAÇÕES SOBRE AS Ensino Médio no Brasil. Tal reforma
representa um retrocesso para edu-
INCERTEZAS PROVOCADAS PELA
cação brasileira, posto que retoma o
LEI Nº 13.415, DE 16 DE FEVEREIRO modelo da Lei 5.692/71 do período
DE 2017 da ditadura militar, ao apostar em
“flexibilização”, por meio de “itinerá-
102
pode ser encontrada no próprio tex- na educação profissional.
to da reforma, como segue: Ademais, a Medida Provisória
§ 10. A critério dos sistemas de en- 746/2016 transformada na Lei nº
sino, a oferta da formação técnica e
profissional considerará: 13.415/2017 não apresenta altera-
I - a inclusão de experiência prática
ções na “Seção IV-A” que trata da Edu-
de trabalho no setor produtivo ou cação Profissional Técnica de Nível
em ambientes de simulação, esta- Médio, incluída pela Lei 11.741/2008.
belecendo parcerias (grifos nos-
sos) e fazendo uso, quando aplicá-
Não constam também novas propo-
vel, de instrumentos estabelecidos sições na “Seção V” que trata da Edu-
pela legislação sobre aprendizagem cação de Jovens e Adultos e para o
profissional; e
“Capítulo III” que trata da Educação
II - a possibilidade de concessão de profissional. O silenciamento da ma-
certificados intermediários de qua-
lificação para o trabalho, quando a téria no que tange à Educação Profis-
formação for estruturada e organi- sional traz ainda mais incertezas para
zada em etapas com terminalidade. o futuro da oferta do EMI, bem como
104
justa e fraterna. CIAVATTA, M.; RAMOS, M. Ensino
Médio e Educação Profissional no
REFERÊNCIAS Brasil: Dualidade e fragmentação.
Retratos da Escola, v. 5, p. 27-41, 2011
BRASIL, Decreto nº 5.154, de 23 de
julho de 2004- Regulamenta o §2º do FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS,
art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, M. (Org.). Ensino Médio Integrado:
de 20 de dezembro de 1996 que esta- concepções e contradições. 3ª edi-
belece as diretrizes e bases da educa- ção. São Paulo: Cortez, 2012.
ção nacional e dá outras providências.
INEP Instituto Nacional de Estudos e
______. Lei n. 11.892 de 29 de de- Pesquisas Educacionais. 2016. Brasí-
zembro de 2008. Institui a Rede Fe- lia. Disponível em:http://www.inep.
deral de Educação Profissional, Cien- gov.br
tífica e Tecnológica, cria os Institutos
LUKÁCS, G. Materialismo e dialéti-
Federais de Educação, Ciência e Tec-
ca: crise teórica das ciências da natu-
nologia, e dá outras providências.
reza. Brasília: Editora Kiron, 2011.
______. Lei n. 13.415 de 16 de feve-
MOLL, J. et. al. Educação profissio-
reiro de 2017. Altera as Leis nos 9.394,
nal e tecnológica no Brasil Con-
de 20 de dezembro de 1996, que es-
temporâneo: desafios, tensões e
tabelece as diretrizes e bases da edu-
possibilidades. Porto Alegre: Artmed,
cação nacional, e 11.494, de 20 de ju-
2010.
nho 2007, que regulamenta o Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento MOURA, D. H.; RAMOS, M. N.; GAR-
da Educação Básica e de Valorização CIA, S. Documento Base da Educa-
dos Profissionais da Educação, a Con- ção Profissional Técnica de Nível
solidação das Leis do Trabalho - CLT, Médio Integrada ao Ensino Médio.
aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, 2007
de 1o de maio de 1943, e o Decre-
to-Lei no 236, de 28 de fevereiro de PARO, V. H.. Administração escolar:
1967; revoga a Lei no 11.161, de 5 de introdução a crítica. 17. ed. São Pau-
agosto de 2005; e institui a Política de lo: Cortez, 2016.
Fomento à Implementação de Esco-
las de Ensino Médio em Tempo Inte- ______. Diretor Escolar: educador
gral. ou gerente? São Paulo: Cortez, 2015.
106
em essência, será inócuo porque não fissional Técnica de Nível Médio no
haverá integração no seu desenvol- Instituto Federal Farroupilha.
vimento. Assim, passamos, agora, a apre-
O objetivo, aqui, proposto é de sentar, brevemente, como se deu
apresentar parte da organização cur- esse trabalho de constituição das Di-
ricular dos Cursos Técnicos Integra- retrizes Institucionais e a parte da or-
dos do Instituto Federal Farroupilha ganização curricular dos Cursos Téc-
que visa facilitar o processo de ensi- nicos Integrados do Instituto Federal
no e de aprendizagem com formas Farroupilha, a qual visa facilitar o pro-
de integração possíveis para se bus- cesso de ensino e de aprendizagem
car a formação integral dos educan- com formas de integração possíveis
dos dessa Instituição. para se buscar a formação integral
dos educandos dessa Instituição.
2. Gestão Democrática do Ensi- Isso quer dizer que o objetivo
no no Planejamento da Orga- principal foi sempre possibilitar, por
nização Didático Pedagógica meio da gestão democrática do en-
sino, espaços de identificação para a
do IF Farroupilha construção de uma identidade ins-
Com o objetivo de dar início à titucional dos cursos técnicos do IF
proposta efetiva, para contínua dis- Farroupilha, visando garantir espa-
cussão dialética e consolidação da ços e possibilidades de integração
integração curricular e da formação ao longo do itinerário formativo e,
integral, no âmbito da Educação Pro- a partir disso, aprofundar, institucio-
fissional de Nível Médio, o Instituto nalmente, a discussão e a efetivação
Federal Farroupilha, depois de, apro- de um possível currículo integrado,
ximadamente, três anos de estudos e com vistas à formação integral/om-
de discussões sobre o ensino integra- niliateral dos educandos.
do e mais de um ano de elaboração
coletiva, aprovou, no Conselho Supe- 2.1 Por que fizemos?
rior (Consup), e consolidou, no Proje-
Os Institutos Federais (IFs), embo-
to Pedagógico Institucional (2014 a
ra resultem de uma história de mais
2018), as Diretrizes Institucionais da
de 100 anos da Educação Profissional
Organização Administrativo-didáti-
no Brasil, foram criados em dezembro
co-pedagógica para a Educação Pro-
de 2008. Desse modo, são institui-
108
dizagem. Ambiente esse, como indi- de e o resultado, daí produzido, vai
camos, muito diversificado, fazendo no mesmo movimento dialético, am-
com que o educador atue, ao mesmo pliando o horizonte e qualificando o
tempo, nos mais diversos níveis e nas discurso. Em síntese, o que se preten-
diferentes formas e modalidades de de, com a constituição dessas diretri-
ensino. zes, do ponto de vista da gestão do
Diante desse cenário, brevemen- ensino, é que prevaleça a autoridade
te exposto, é imprescindível que a do argumento ao invés do argumen-
Instituição elabore, de forma cole- to da autoridade. O gestor de ensino
tiva, normas internas claras, a fim é mero mediador do espaço de cons-
de garantir a todos o mesmo ponto tituição do discurso e da organização
de partida e possibilitar, assim, pela das atividades junto com seus pares.
consolidação da cultura organiza- Gestão democrática se constitui pela
cional, o fortalecimento da identida- participação e pela responsabilidade
de institucional e, nela, o espaço de em relação ao que é gerido.
identificação entre seus membros. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases
Essa necessidade possibilita o espa- da Educação Nacional), bem como as
ço para a própria formação continu- demais normas nacionais vigentes, já
ada em serviço, visto que, ao discuti- trazem uma série de diretrizes e de
rem as diretrizes e as normativas, que regras específicas, mas também pos-
orientam as atividades institucionais, sibilitam a autonomia institucional
os profissionais da educação discu- ao definir, em seu Projeto Pedagó-
tem suas próprias práticas, comparti- gico Institucional (PPI) e nas normas
lhando experiências, aprofundando internas, como irá proceder e orien-
estudos para o discernimento das tar aquilo que é flexível pela norma
questões, propondo formas diversifi- maior vigente, como, por exemplo,
cadas de ação dentre outras. a duração da hora-aula, a forma de
Dessa maneira, mais importante recuperação paralela, a avaliação, a
que o produto, resultante desse tra- prática profissional, a organização do
balho, das diretrizes e das normativas currículo etc.
institucionais, é o próprio processo Como dissemos, os IFs são mui-
de elaboração coletiva. O processo to jovens ainda e não há como falar
se constitui como espaço de identifi- de pessoas que tenham larga expe-
cação para a construção da identida- riência nessa forma de organização
110
de forma institucional, as demandas mesmo de concluir o primeiro itine-
específicas. rário formativo, de formar a primeira
Muitas soluções foram, altamen- turma em um determinado PPC, este
te, suficientes e já passam a integrar a já sofreu várias alterações.
cultura da Instituição, porém, outras, Verificamos que, aproximada-
por sua vez, careciam de revisão ou, mente, 95% dos pedidos de altera-
ainda, de elaboração a fim de sanar ções, em PPCs, se deram no mesmo
alguns problemas que começavam a período de troca de coordenação de
surgir e a prejudicar a consolidação curso, ou de mudança no corpo do-
cente do curso. Essa informação nos
da identidade institucional. Essa difi-
culdade se dava, principalmente, em levou a concluir que, ainda, não havia
planejar a Gestão de Ensino de forma identidade com o curso e no curso,
a garantir a identidade da Instituiçãovisto que todas as alterações (100%)
numa realidade multicampi, sem ferir foram relativas à carga horária de dis-
as especificidades locais e regionais ciplinas, às ementas, à carga horária
inerentes à realidade da cada unida- do curso, aos estágios e às atividades
de administrativa, campus e reitoria. complementares. Havia outras alte-
Dificuldade esta que ficava expressa rações ligadas, exclusivamente, ao
nos Projetos Pedagógicos de Curso entendimento daquilo que este(s)
(PPCs), formulados e reformulados ou aquele(s) profissional(is) enten-
nesse período, bem como no confli- diam como necessário de se minis-
to de normas internas, visto que fal- trar no curso, e não a partir do perfil
tava o lugar comum maior a partir do profissional do egresso pretendido
qual dialogavam. naquele curso ou, no máximo, aqui-
Nesses quase quatro anos de IF lo que cada um entendia como ser o
Farroupilha, a Instituição contava profissional formado. Essa compre-
com 146 (cento e quarenta e seis) ensão predominante, nesse período,
ofertas de cursos e com 168 (cento e obviamente, não se dá por capricho
sessenta e oito) PPCs vigentes. Nes- dos profissionais que pleitearam
se período, ocorreram mais de 160 tais alterações, mas, como dissemos
(cento e sessenta) reformulações nos acima, pela, ainda, não consolida-
PPCs; ou seja, em média, duas altera- da identidade institucional e ampla
ções em cada PPC num prazo inferior compreensão dos objetivos e das
a 18 meses. Isso revela que, antes finalidades da Instituição. Contudo,
esse contexto possibilitou o início da
112
cos apenas com carga horária menor de oferta, do perfil profissional pre-
ou, às vezes, carga horária maior exi- tendido, para cada formação espe-
gida no curso técnico do que a exi- cífica, e da construção e da consoli-
gida no superior; como no caso do dação da identidade institucional a
estágio acima. qual se expressa nos cursos e na for-
Em síntese, observamos, na orga- ma de educação ofertada.
nização dos PPCs de cursos técnicos, Outro fator relevante, e que tra-
em regra, minibacharelados ao invés duzia a ausência de conhecimentos
de formações específicas de acordo específicos da educação e da legisla-
com seu nível de ensino específico e ção de ensino vigente, era o fato de
a formação desejada. Essa conclusão haver muitos casos de não atendi-
se comprova quando observamos, mento à legislação mínima vigente,
em muitos casos, que o perfil profis- como, por exemplo: carga horária
sional do egresso, previsto nos PPCs mínima obrigatória, conteúdos obri-
de alguns cursos técnicos, era mui- gatórios etc. Esse fato demonstra-
to diferente daqueles descritos em va a necessidade não apenas de se
PPCs dos mesmos cursos ofertados, corrigir essas fragilidades, incluindo
em outros campus e em desacordo o cumprimento da legislação nos
com o Catálogo Nacional de Cursos PPCs, mas também de discutir e de
Técnicos. Novamente, pode-se dizer assessorar os profissionais que não
que isso não foi resultado do descui- tiveram essa formação, conforme os
do ou do capricho dos profissionais motivos pelos quais tais exigências
que elaboraram essas propostas, legais eram pensadas para a educa-
mas do fato de que, na ausência de ção no Brasil.
um entendimento maior sobre esse Além disso, a elevada carga ho-
nível e essa forma de oferta de Edu- rária, nos cursos técnicos, sobrecar-
cação Profissional, aqueles profissio- regava os docentes com atividades
nais elaboraram os PPCs baseados de horas-aula em sala de aula, difi-
em sua própria formação, sendo a cultando ou, até mesmo, impedin-
maioria de bacharelados e de tecnó- do a organização de espaços para:
logos. Mais uma vez, há necessidade Formação Pedagógica Continuada,
da participação coletiva na constru- planejamento coletivo ou individual
ção do entendimento, do objetivo e dos docentes, acompanhamento das
da finalidade de cada curso, em seu atividades, realização de recupera-
respectivo nível, forma e modalidade
114
outra. Trata-se, portanto, de garantir processos de ensino e de aprendiza-
uma gestão sistêmica e em rede no gem, seja na gestão do ensino ou no
âmbito interno da Instituição a qual, ensino efetivamente.
por sua natureza pluricurricular e A dimensão do contexto, que
multicampi, possibilita a diversidade, levou à elaboração das diretrizes,
mas com identidade institucional. é demasiada extensa para se dizer
Assim, entendemos, no Instituto nesse espaço, mas já nos foi possí-
Federal Farroupilha, que a elabora- vel indicar a base fundamental que
ção coletiva das Diretrizes Institu- expõe os principais motivos pelos
cionais possibilitaria: adequação à quais foram elaboradas as Diretrizes
Resolução CNE nº 06/2012; Gestão Institucionais da Organização Ad-
de Ensino democrática e comparti- ministrativo-didático-pedagógica
lhada; planejamento coletivo; oti- para a Educação Profissional Técnica
mização na organização do tempo de Nível Médio no Instituto Federal
escola; diversidade e integração cur- Farroupilha. Elas foram aprovadas
ricular; espaço e ponto de partida pelo Conselho Superior, pela Resolu-
para a formação continuada em ser- ção Consup nº 102/2013 e reiterada,
viço; qualidade no processo de ensi- com algumas adequações, no Plano
no e de aprendizagem; consolidação de Desenvolvimento Institucional, o
do perfil profissional do egresso dos qual foi aprovado pelo Consup em
cursos técnicos do IF Farroupilha; or- setembro de 2014.
ganização e revisão do Projeto Peda- Desse modo, as seguintes consi-
gógico Institucional (PPI), orientação derações gerais fundamentaram a
comum para a organização e a cons- elaboração da proposta:
trução dos Projetos Pedagógicos de
Art. 6º e Art. 205 da CF, segundo os
Curso (PPCs), inclusão de práticas quais a educação é um direito social
profissionais ao longo do itinerário e de que deverá ser promovida e
formativo; flexibilidade curricular incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desen-
orientada institucionalmente; enfim, volvimento da pessoa, seu preparo
premissas norteadoras para a cons- para o exercício da cidadania e sua
trução e a consolidação da identida- qualificação para o trabalho;
116
de uma ou mais áreas do co- • Estatuto da Juventude que,
nhecimento; dentre outras definições rela-
• estímulo à atividade docente cionadas à educação, define
em dedicação integral, com que “Art. 9o . O jovem tem di-
tempo efetivo para atividades reito à educação profissional e
de planejamento pedagógico, tecnológica, articulada com os
individuais e coletivas; diferentes níveis e modalida-
des de educação, ao trabalho, à
• dimensões do trabalho, da ci- ciência e à tecnologia, observa-
ência, da tecnologia e da cul- da a legislação vigente.”.
tura como eixos integradores
entre os conhecimentos de
distintas naturezas; o trabalho Com base nessas considerações
como princípio educativo; a basilares, o IF Farroupilha passou a
pesquisa como princípio pe- reger os cursos técnicos com base
dagógico; os direitos humanos nas Diretrizes Institucionais da Or-
como princípio norteador e; a ganização Administrativo-didático
sustentabilidade socioambien- -pedagógica para a Educação Pro-
tal como meta universal; fissional Técnica de Nível Médio no
• princípios, fundamentos e pro- Instituto Federal Farroupilha e outras
cedimentos, discutidos, demo- providências.
craticamente, com a comuni-
dade acadêmica, pelo Comitê
Assessor de Ensino e pelo GT 2.2 Como fizemos?
dos Cursos Técnicos, conforme
suas atribuições regulamenta- Desde outubro de 2012, conside-
das pela Portaria nº 0834, de 06 rando o breve contexto acima apre-
de maio, de 2013, para orientar sentado, a preocupação maior da
a organização curricular na ela- Gestão de Ensino não se concentrou
boração, no planejamento, na na organização didático-pedagógica
implementação e na avaliação em si e na organização de diretrizes
das propostas curriculares dos e de normas internas eficientes para
campus do IF Farroupilha os organização e orientação das ativi-
quais oferecem cursos técni- dades de ensino e de aprendizagem
cos; e no IF Farroupilha, mas em garantir
118
e, com a reformulação de todos os assim como ter critérios institucio-
PPCs de todos os cursos técnicos do nais claros para orientar a criação
IF Farroupilha, deram início à revisão de cursos e a garantia de viabilida-
de normas menores e à reorganiza- de de início e de desenvolvimen-
ção do ensino e da gestão de ensino to desses cursos com qualidade,
no âmbito institucional. considerando as dimensões da
Em síntese, os procedimentos avaliação externa de cursos: infra-
adotados foram os seguintes: estrutura, didático-pedagógica e
corpo docente e técnico; as quais
a) criação do Comitê Assessor são suficientes e qualificadas;
de Ensino (CAEN): formado pela
Pró-reitora de Ensino e Diretores d) criação do GT dos cursos
de Ensino dos Campus para plane- técnicos do IF Farroupilha, com re-
jamento, implementação, desen- presentação de todas as unidades,
volvimento, avaliação e revisão da a fim de planejar e de organizar as
proposta pedagógica da Institui- metodologias de elaboração das
ção, bem como para implementar diretrizes e de garantir a ampla
políticas de ensino que viabilizem participação da comunidade aca-
a operacionalização de atividades dêmica, possibilitando que todos
curriculares dos diversos níveis e os profissionais da educação e os
das diversas modalidades da Edu- educandos pudessem participar
cação Profissional; e contribuir no processo de dis-
cussão e de estabelecimentos dos
b) elaboração de um Plano de consensos institucionais;
Ações definindo as urgências, as
prioridades, as metas para o en- e) estudo da legislação de
sino no IF Farroupilha, iniciando ensino vigente, principalmente,
pela revisão e pela reformulação daquela voltada para a Educa-
da proposta de organização-didá- ção Profissional e a de subsídios
tico pedagógica da Instituição; teóricos sobre o tema. Os mem-
bros do GT dos cursos técnicos
c) elaboração de Regulamen- selecionaram uma série das prin-
to para criação, suspensão tem- cipais legislações e textos a fim de
porária e extinção de cursos do subsidiar as discussões, visto que,
IF Farroupilha, a fim de garantir como expomos acima, muitos dos
o atendimento aos objetivos e às profissionais da educação envol-
finalidades da Lei nº 11.892/2008,
120
• Núcleo Básico jeto Pedagógico Institucional, pas-
• Núcleo Tecnológico sando pelo Projeto Pedagógico de
Curso, pelos Planos de Ensino, pelos
• Núcleo Politécnico planejamentos coletivos das ativi-
Para constituir os núcleos, bem dades de ensino e de aprendizagem
como o restante da organização cur- (articulando ensino, pesquisa e ex-
ricular e o processo de ensino e de tensão), pela Formação Continuada
aprendizagem, para efetivação do de Docentes, pelas metodologias e
currículo, devem ser levadas em con- pela avaliação do ensino e da apren-
sideração as dimensões integradoras dizagem até as práticas reais de in-
do Ensino Médio com foco na forma- tegração entre a ciência, a cultura, a
ção integral dos educandos, consi- tecnologia e o trabalho.
derando o trabalho como princípio Ao longo dos estudos realiza-
educativo e a pesquisa como princí- dos, e no limite do que a discussão
pio pedagógico. coletiva possibilita, na sua diversi-
Na construção do Projeto Peda- dade e na sua dificuldade de enten-
gógico de Curso, pergunta-se: dimentos comuns, prevalece a tese
de que, sobre o currículo integrado,
• que profissional se deseja for-
não há “receita pronta” e as possibi-
mar?;
lidades são construídas no processo
• qual será o seu perfil?; dialético.
• onde atuará (em que lugar, em Com base nisso, passamos a re-
que momento do processo latar, logo abaixo, de forma resumi-
criativo)?; da, e o mais objetivo possível, parte
• que conhecimentos tecnológi- da proposta de integração curricu-
cos e científicos são necessá- lar elaborada pelo Instituto Federal
rios a esse profissional?; Farroupilha, o qual é nosso ponto
de partida comum para o aprofun-
• que valores éticos, estéticos e
damento e o aperfeiçoamento da
políticos orientam a conduta
perspectiva estabelecida, conforme
da sociedade da qual esse pro-
já apontado acima.
fissional faz parte?;
1 - Elaboração do Catálogo dos
Perfis Profissionais dos Egressos dos
Essas perguntas devem ser res- Cursos Técnicos do IF Farroupilha.
pondidas desde a concepção do Pro- Elaborado com base no Catálogo Na-
122
docentes elegem como principais objetivos comuns entre as diferentes
para as avaliações, os trabalhos etc. áreas, dando início à definição das
Há conteúdos aos quais o estudante áreas de maior integração no currí-
precisa ter acesso apenas para co- culo e possibilitando o planejamento
nhecimento conceitual e básico, a e a realização de um currículo mais
fim de poder dialogar com as demais integrado; uma vez que não existe
áreas do conhecimento, tanto técni- conhecimento desintegrado, mas
cos quanto da formação básica; en- formas e metodologias de ensino
quanto há conteúdos que o estudan- desintegradas e organizações curri-
te precisa aprofundar, com objetivo culares que dificultam a integração.
de exercer, com maior qualidade, as Além disso, não se pode falar em
atividades específicas esperadas da- currículo integrado ou em formação
quela formação profissional. integral se os docentes, principais
Ao desenvolver o planejamento, atores desse processo, desconhecem
a partir do perfil do egresso, e duran- o curso em si e os objetivos especí-
te a elaboração do Projeto Pedagógi- ficos de cada colega. Em suma, não
co do Curso, facilita-se a organização se trata de “eliminar as disciplinas”. É
das demais atividades do itinerário possível montar um currículo, total-
formativo, desde a elaboração do mente, organizado por grandes áreas
Plano de Ensino do professor até o ou temas geradores ou por qualquer
desenvolvimento de projetos inte- outro formato, mas um professor de
grados, de visitas técnicas, de pes- matemática nunca trabalhará os co-
quisas e de inúmeras outras ativida- nhecimentos de bovinos como um
des as quais podem ser pensadas ao professor com formação específica
longo do curso, entre os educadores para tal e vice-versa. E não haverá
e educandos, sem perder o foco do quem discorde que conhecimentos
perfil do egresso pretendido. específicos de matemática e de bovi-
Durante a definição da ênfase tec- nos são indispensáveis num curso de
nológica, o(s) professor(es) de cada Técnico em Agropecuária, por exem-
área devem dialogar com os demais, plo. Assim, pode-se até eliminar as
interagindo de forma tal que todos disciplinas do currículo, mas chegará
possam ter noção do que cada pro- um momento em que cada profissio-
fissional trabalha na sua especificida- nal dominará o ensino na sua área
de; identificando, assim, conteúdos e específica. Obviamente, se ambos
os professores tiverem pleno co-
124
todos ou pelo maior número possí- conhecimentos necessários para o
vel de docentes que atuam no curso, maior ou o menor domínio técnico
a fim de possibilitar uma construção pelo profissional, segundo sua possi-
interdisciplinar que define, com base bilidade de atuação, de capacitação
no perfil do egresso, qual a ênfase e de competência esperadas.
tecnológica a ser dada no curso. Os
conteúdos destacados, como ênfa- 3.2. Identificação de pré-requi-
se, serão bases para o planejamento
sitos para o desenvolvimento do
dos Planos de Ensino, os projetos de
pesquisa e extensão, as visitas técni- conhecimento da área técnica
cas, as avaliações etc. Já as áreas de específica
integração possibilitam identificar
Organização dos componentes
os principais componentes curri-
curriculares da área técnica de acor-
culares com maior possibilidade e/
do com a identificação dos pré-re-
ou facilidade de integração com o
quisitos pedagógicos e a sequência
componente curricular específico
nos conhecimentos específicos, a fim
da ementa, o que favorece, assim, a
de iniciar uma sistematização e uma
visualização e a direção para o pla-
coerência interna na construção da
nejamento e o desenvolvimento de
matriz curricular.
atividades integradoras do ensino e
da aprendizagem.
3.3. Construção das ementas da
Esse processo de construção das
ementas será melhor explicado a se- formação técnica: identificação
guir. dos conhecimentos/conteúdos
específicos e ênfase tecnológica
3.1. Delimitação de componentes
a) Componente curricular:
curriculares e ementas da área téc-
nome do componente/disciplina
nica: movimento pluridisciplinar de forma delimitada e objetiva;
126
atividades interdisciplinares e das geradores são essenciais para evitar a
práticas profissionais integradas, linerealidade amorfa dos conteúdos
bem como o desenho da matriz e garantir a integração e a constru-
curricular por grau de intensidade ção dialéticas das práticas pedagó-
tecnológica. Além disso, auxiliará gicas com vistas à formação integral.
na elaboração das ementas dos No exemplo, anteriormente citado,
componentes curriculares da for- sobre o componente de Máquinas,
mação básica, nas suas respectivas Equipamentos, Ferramentas e Segu-
cargas horárias e na distribuição rança no Trabalho, após a construção
dentro das unidades de ensino e dialética entre docentes da área téc-
de aprendizagem; e nica e da formação básica, na qual
e) conceitos geradores/integra- uns expõem seus conhecimentos
dores: dentre aqueles conceitos in- específicos da área de formação para
tegradores/geradores do eixo-tec- os demais e revelam as áreas de in-
nológico, do curso técnico e das tegração com este componente, será
áreas do Ensino Médio, discrimi- fácil perceber como que, por exem-
nados a partir do perfil do egres- plo, ao tratar das Normas Técnicas de
so, identifica-se, agora, em cada segurança no trabalho, o educando
componente curricular, quais con- não pode ter por objetivo apenas de-
ceitos estão mais presentes nele e corar e dominar as referidas normas
quais podem ser mais explorados para planejamento, execução, manu-
pelas caraterísticas da área de co- tenção e controle de qualidade das
nhecimento deste componente obras, como lhe exige o perfil técni-
curricular. Tais conceitos serão fa- co, porque este mesmo perfil exige
voráveis para identificação de si- uma formação humanística e cultura
tuações problemas da realidade geral integrada à formação técnica,
do educando e, a partir dos quais, tecnológica e científica; de forma
o docente poderá nortear suas que o profissional atue com base em
práticas pedagógicas, de forma in- princípios éticos e de maneira sus-
tegrada com as áreas de atuação, tentável. Assim, perceber-se-á, por
anteriormente, identificadas (as exemplo, que ética, relação interpes-
quais, por sua vez, também, apre- soal, responsabilidade, cidadania,
sentarão estes e/ou mais conceitos saúde, comunicação e diálogo são
geradores). conceitos geradores/integradores
presentes no perfil desejado e que
Obs.: os conceitos integradores/ são trabalhados não só no conteúdo
128
Como preencher essa lacuna? sões da ciência, da tecnologia, da
Pode ser, parcialmente, preenchida cultura e do trabalho.
com metodologias de ensino e de Antes de definirmos o conceito e
aprendizagem, como também com a metodologia de Prática Profissio-
a formação continuada de docentes, nal Integrada, é necessário ter claro
o que é possível sugerir e exempli- o significado de Prática Profissional
ficar na organização curricular, mas compreendido nessa organização.
cuja concretização depende única e
exclusivamente dos sujeitos envol- A Prática Profissional é uma es-
vidos no processo de ensino e de tratégia educacional favorável para a
aprendizagem. contextualização, a flexibilização e a
integração curricular, abrangendo as
Torna-se, assim, necessário pen- diversas configurações da formação
sar em metodologias de ensino e de profissional vinculadas ao perfil do
aprendizagem que conduzam, nos egresso.
Cursos Técnicos Integrados ao En-
sino Médio, o movimento contínuo De acordo com a Resolução CNE
e integrado entre as especialidades nº 6/2012 (grifo nosso):
necessárias para a formação preten- Art. 21. A prática profissional, pre-
vista na organização curricular do
dida, preenchendo, ao máximo pos- curso, deve estar continuamente
sível, a lacuna gerada pela fragmen- relacionada aos seus fundamentos
tação dos saberes e tentando, desse científicos e tecnológicos, orientada
pela pesquisa como princípio peda-
modo, superar, ao menos em partes, gógico que possibilita ao educando
o ensino conteudista e disciplinar. enfrentar o desafio do desenvolvi-
mento da aprendizagem perma-
Como metodologias e ações de nente, integra as cargas horárias
ensino e de aprendizagem possíveis, mínimas de cada habilitação profis-
para realizar o movimento interdisci- sional de técnico e correspondentes
etapas de qualificação e de especia-
plinar e integrador pretendido, pro- lização profissional técnica de nível
põem-se, por exemplo, a previsão médio.
de atividades complementares, os § 1º A prática na Educação Profis-
Projetos Integradores, a constituição sional compreende diferentes situ-
ações de vivência, aprendizagem e
de núcleos de estudos e de inclusão, trabalho, como experimentos e ati-
a pesquisa, a extensão, as visitas téc- vidades específicas em ambientes
nicas; enfim, Práticas Profissionais In- especiais, tais como laboratórios,
oficinas, empresas pedagógicas,
tegradas que consideram as dimen- ateliês e outros, bem como inves-
130
de de ensino, oportunizando o • promover a interdisciplinarie-
espaço de discussão e o espa- dade.
ço aberto para entrelaçamento
com outras disciplinas, de ma-
neira que as demais disciplinas A PPI deve ser realizada por meio
do curso, também, participem de metodologias de ensino que
desse processo; contextualizam a aplicabilidade dos
conhecimentos aprendidos no de-
• operacionalização de uma in- correr do processo formativo, pro-
tegração vertical do currículo, blematizando a realidade, fazendo
proporcionando unidade em com que os estudantes, por meio de
todo o curso, compreenden- estudos, pesquisas e práticas desen-
do uma sequência lógica e volvam projetos e ações, baseados
um aprofundamento, cada vez na criticidade e na criatividade.
maior, dos conhecimentos em
contato com a prática real de A Prática Profissional Integrada
trabalho; tem, como principal base, o perfil
do egresso e o itinerário formativo,
• viabilização da efetiva aplica- possibilitando contínuo e articulado
ção da prática profissional es- aproveitamento de estudos e de ex-
pecífica de cada curso; periências profissionais e o contato
• espaço destinado aos enfo- com a prática real de trabalho.
ques para as habilitações de- A Prática Profissional Integrada,
sejadas pelo curso, conforme a na organização curricular em núcle-
localização geográfica em que os, é parte essencial do Núcleo Poli-
se encontra e as particularida- técnico, o qual é espaço onde se ga-
des regionais; rantem, concretamente, conteúdos,
• ser um componente curricular formas e métodos responsáveis por
de convite permanente à refle- promover, durante todo o itinerário
xão-ação; formativo, a politecnia, a formação
• incentivar a pesquisa como integral e omnilateral e a interdispli-
princípio educativo; nariedade.
132
Figura 2
134
organizacionais, econômicos, políti- regra, se reivindica muitos conteú-
cos, culturais, ambientais, estéticos dos considerados como necessários
e éticos, os quais alicerçam as tecno- de serem ensinados.
logias e a contextualização do eixo Na discussão, para identificação
tecnológico no sistema de produção das áreas de integração, percebe-se
social. A organização curricular é o que muitos conhecimentos e conteú-
espaço em que se garantem, concre- dos são trabalhados mais de uma vez
tamente, conteúdos, formas e mé- em disciplinas diferentes, os quais,
todos responsáveis por promover, agora, poderiam ser compartilhados
durante todo o itinerário formativo, entre esses componentes, diminuin-
a politecnia, a formação integral e do, também, a necessidade de mais
omnilateral e a interdisciplinaridade. carga horária, para que o educando
Sendo assim, o Núcleo Politécnico, tivesse o mesmo conteúdo, muitas
na organização curricular, tem o ob- vezes, sem perceber a relação entre
jetivo de ser o elo entre o Núcleo Tec- um componente curricular e outro.
nológico e o Núcleo Básico, criando
espaços contínuos durante o itinerá- Obviamente, o sucesso desse ob-
rio formativo para garantir meios de jetivo não depende da organização
realização da politecnia. do currículo, mas, sim, de seu de-
senvolvimento contínuo, de forma
planejada coletivamente, com mo-
5. Distribuição da carga
mentos específicos para a integração
horária curricular tanto entre os docentes,
no planejamento e na orientação das
A reorganização das matrizes
diversas possibilidades de metodo-
e dos ementários, principalmente,
logias e de práticas, as quais se origi-
identificando a ênfase tecnológica e
nam desse processo, quanto para os
as áreas de integração em cada cur-
estudantes, na realização dessas e no
so, possibilita perceber quais são os
desenvolvimento da autonomia para
conhecimentos essenciais para se
além da sala de aula.
atender determinado perfil de egres-
so, diminuindo, dessa maneira, con- Trata-se de um objetivo impos-
sideravelmente, o tradicional currí- sível de ser alcançado com eleva-
culo conteudista e, por conseguinte, das cargas horárias em sala de aula,
a excessiva carga horária reclamada o que gera ausência de tempo para
para cada disciplina, visto que, em que os docentes possam fazer forma-
136
Isso expressa que não se dimi- b) delimitação de componen-
nuiu a duração dos cursos. Elimi- tes curriculares e de ementas da
nou-se, sim, boa parte do currículo área técnica, movimento pluridis-
conteudista e engessado, possibili- ciplinar;
tando espaços para recuperação pa- c) identificação de pré-requi-
ralela, reuniões pedagógicas entre sitos para o desenvolvimento do
os docentes para planejamento e conhecimento da área técnica es-
construção das atividades de ensi- pecífica;
no; enquanto os alunos podem de-
senvolver atividades orientadas nos d) construção das ementas da
laboratórios e nos grupos de estudo; formação técnica: identificação
atividades culturais; receber apoio dos conhecimentos/conteúdos es-
dos profissionais técnicos em peda- pecíficos, ênfase tecnológica;
gogia, psicologia, assistência social, e) identificação das áreas de
enfermagem e dos demais colegas. integração técnica e dos conceitos
Desse modo, ainda, esses estu- geradores/integradores, primeiro
dantes podem realizar visitas técni- movimento interdisciplinar;
cas e trabalhos de campo; desenvol- f) delimitação das unidades
ver seus projetos de pesquisa e de de ensino e aprendizagem da for-
extensão; e ter um leque enorme de mação técnica: conhecimentos
possibilidades que se expande, des- técnicos agrupados por grau de
de que haja disposição e interesse intensidade tecnológica da menor
dos envolvidos no processo de ensi- para a maior intensidade técnica e
no e de aprendizagem. tecnológica;
Em síntese, o planejamento, a g) primeira aproximação da
implementação, o acompanhamen- formação técnica com a formação
to e a revisão da proposta de organi- básica por meio da identificação
zação curricular, dos cursos técnicos das possíveis áreas/ conhecimen-
do IF Farroupilha, com vistas ao currí- tos/conteúdos de integração da
culo integrado e à formação integral, formação básica, com cada com-
implicariam nos seguintes passos: ponente curricular (área/conheci-
a) perfil profissional do egresso mentos/ conteúdos) da formação
detalhado com as atribuições ine- técnica e vice-versa. Identificação
rentes à profissão; dos conceitos geradores/integra-
dores por área do Ensino Médio,
138
do profissionalizante etc. do seguinte ponto: prevaleceu a au-
toridade do argumento ao invés do
argumento da autoridade que, para
muitos, é o caminho mais fácil.
6. Conclusão
O mesmo trabalho foi realizado,
O que faremos? paralelamente, para a organização
dos cursos superiores que, respeita-
O que apresentamos, aqui, foi das as especificidades desse nível de
uma brevíssima síntese do trabalho formação, se deu pelos mesmos mo-
realizado para elaboração das Dire- tivos e com os mesmos objetivos: a
trizes Institucionais e da organização gestão democrática do ensino, a par-
curricular. A opção metodológica to- ticipação coletiva na concepção pe-
mada, certamente, não foi das mais dagógica da Instituição e a qualida-
fáceis de realizar, uma vez que, pro- de do ensino público ofertado pelo
por a construção coletiva, com a par- IF Farroupilha. As Diretrizes foram
ticipação direta de centenas de pes- ratificadas pela comunidade interna
soas, de lugares, de formações e de e externa, visto que, mesmo recen-
concepções, muito distintas, é, sem temente aprovadas, foram fruto de
dúvida, um desafio ousado e quase submissão à ampla consulta pública
suicida. Todavia, sem dúvida, é grati- durante a discussão e a elaboração
ficante porque, apesar das inúmeras do Plano de Desenvolvimento Ins-
dificuldades, na mediação dos con- titucional 2014 a 2018/19, e foram
flitos, o que se teve, como produto anexadas a este documento, direta-
final, não é fruto de pretensão, já que mente, relacionadas à essência do
não se tinha a pretensão que fosse o Projeto Pedagógico Institucional, o
“melhor dos mundos possíveis” (na que reforçou a legitimidade e o re-
compreensão Cândida, de Voltaire), conhecimento do trabalho por toda
mas é o melhor possível, dentro do comunidade interna e a ampla parti-
que os interessados puderam fazer cipação da comunidade externa no
em busca de um mundo melhor no projeto pedagógica institucional.
que tange à organização didático
-pedagógica dos Cursos Técnicos do Agora, serão necessárias ações
IF Farroupilha. Há quem discorde e, permanentes de acompanhamen-
talvez, com razão, desse ou daquele to, de avaliação e de revisão das Di-
ponto, mas não há que se discordar retrizes Institucionais e das normas
140
CURRÍCULO INTEGRADO NO IF GOIANO:
POSSIBILIDADES E DESAFIOS
Simônia Peres da Silva1, Cláudio Virote2
1
e 2 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano
E-mail: simonia.peres@ifgoiano.edu.br
142
coletiva como princípio formador no democrática, respeito, transparên-
ensino médio, antes de considerá-lo cia e probidade pública, de maneira
como prática estritamente produtiva a preservar a sua dignidade e a de-
pela qual se busca garantir a forma- senvolver ações junto à sociedade
ção exclusivamente para o mercado com base nos mesmos valores; d) a
de trabalho. educação profissional e tecnológica
Além dessa base teórica, as ativi- pressupõe, portanto, uma qualifica-
dades desenvolvidas no Projeto Pi- ção intelectual, ampla o suficiente
loto foram norteadas também pelas para permitir o domínio de métodos
orientações do Plano de Desenvolvi- analíticos e de múltiplos códigos e
mento Institucional (PDI) do IF Goia- linguagens para consolidar, por sua
no, que define os alguns princípios vez, uma base sólida para a constru-
pedagógicos direcionadores das prá- ção contínua e eficiente de conheci-
ticas educativas: a) compromisso de mentos específicos.
romper com a dualidade entre teoria
e prática, dimensões indissociáveis 3. PROCEDIMENTOS
para a educação integral, pois ne- METODOLÓGICOS
nhuma atividade humana se realiza
sem elaboração mental, sem uma te- Mesmo definidos algumas dire-
oria em que se referencie, apesar de trizes gerais comuns, os coordena-
ser a prática o objetivo final de toda dores do Projeto Piloto, vinculados
aprendizagem; b) não admite a sepa- a Pró-Reitoria de Ensino, incentiva-
ração entre as funções intelectuais e ram que cada campus construísse
técnicas, respaldando uma concep- sua proposta pedagógica integrada.
ção de formação profissional que Acreditou-se que o sucesso do Proje-
unifique ciência, tecnologia e traba- to só seria possível por meio da au-
lho, bem como atividades intelectu- tonomia e protagonismo dos sujei-
ais e instrumentais; c) a educação, em tos envolvidos. Em outras palavras,
todos os seus níveis e modalidades, projetos desenvolvidos distantes das
deve ser encarada como referencial reais necessidades dos sujeitos que
permanente de formação geral que efetivamente implementam, sem le-
encerra como objetivo fundamental var em conta as características orga-
o desenvolvimento do ser humano nizacionais de cada campus que irão
orientado pelos valores da justiça so- aplicá-los, não só podem desperdi-
cial, equidade, solidariedade, gestão çar um instrumento essencial para a
144
ções - CBO) algumas diretrizes. Desse vo e formação para currículo integra-
modo, a carga horária máxima dos do deverão acontecer com periodici-
cursos técnicos integrados ao ensino dade semanal e será organizado pelo
médio ficou estabelecida a partir do Comitê Local.
mínimo estabelecido na Resolução Em relação a matriz curricular
CNE/CEB n. 6, de 20 de setembro de dos cursos criados ou reformulados
2012, em seu artigo 27, que estabe- na perspectiva do currículo integra-
lece que: do, ficou definido que deveriam ter
Os cursos de Educação Profissio- como foco o perfil profissional de
nal Técnica de Nível Médio, na forma conclusão e deverá ser organizada a
articulada com o Ensino Médio, inte- partir de três núcleos de formação:
grada ou concomitante em institui- a) Núcleo Básico é constituí-
ções de ensino distintas com projeto do pelas disciplinas e conteúdos
pedagógico unificado, têm as cargas vinculados à educação básica, es-
horárias totais de, no mínimo, 3.000, truturados pelos conhecimentos
3.100 ou 3.200 horas, conforme o e habilidades nas áreas de lingua-
número de horas para as respecti- gens e códigos, ciências humanas,
vas habilitações profissionais indica- matemática e ciências da natureza.
das no Catálogo Nacional de Cursos
Técnicos, seja de 800, 1.000 ou 1.200 b) Núcleo Articulador é o espa-
horas. ço curricular organizado pelos fun-
damentos científicos, sociais, orga-
Foi estabelecido um excedente nizacionais, econômicos, políticos,
para a carga horária de até o limi- culturais, ambientais, estéticos e
te de 10% (dez por cento) da carga éticos que alicerçam as tecnologia
horária estabelecida para a parte e a contextualização do eixo tec-
técnica, ou seja, 80, 100 ou 120 ho- nológico no sistema de produção
ras, para cursos de 800, 1000 ou 1200 social. Tem o objetivo de fazer a
horas, respectivamente. Solicitou-se integração entre o Núcleo Técnico
aos campi Pilotos um cronograma e Núcleo Básico, criando espaços
previsto no calendário escolar para contínuos para garantir meios de
encontros de planejamento coletivo realização da politecnia, a forma-
e formação específica para o currícu- ção integral, a omnilateralidade e
lo integrado. Ficou acordado, que os a interdisplinariedade.
encontros para planejamento coleti-
146
teúdos, similaridades entre as disci- dade. Caso a avaliação diagnostique
plinas e as afinidades apresentadas que o aluno não apreendeu deter-
não apenas nos conteúdos, mas tam- minado conceito ou conhecimento,
bém entre os próprios professores. este precisa ser retomado pelo pro-
No momento o Projeto Piloto está fessor.
iniciando a quarta etapa, que se refe-
re a Organização Didática. O objetivo 4. RESULTADOS
dessa fase é planejar de forma coleti-
O planejamento e implementa-
va e individual as aulas, os projetos e
ção do Projeto contou com a adesão
as atividades pedagógicas, tendo em
de professores e técnicos adminis-
vista o tema gerador, os eixos temáti-
trativos. Por meio de várias reuniões,
cos e as relações presentes ou possí-
os coordenadores de curso conse-
veis na rede temática. Estão previstas
guiram sensibilizar os professores,
reuniões semanais para o trabalho
utilizando como argumento as van-
coletivo, momentos de troca de ex-
tagens de trabalhar de forma inte-
periências e formação, prevista no
grada, a necessidade de aproveitar a
PPC do curso. As aulas e práticas pe-
autonomia docente para planejar e
dagógicas estão sendo planejadas,
dinamizar a aula e, como fundamen-
desenvolvidas e avaliadas conside-
to da proposta, a observância da rea-
rando três momentos (estudo da re-
lidade concreta do sujeito educando
alidade; aprofundamento teórico ou
como fonte temática.
organização do conhecimento; apli-
cação do conhecimento). Foram criados grupos de traba-
lhos vinculados a um Comitê Local,
A quinta etapa, Avaliação do Pro-
sendo um para estudar a legislação,
cesso/Replanejamento, está sendo
outro para trabalhar a questão “o que
realizada durante todo o processo de
é currículo integrado” e outro analisar
planejamento e desenvolvimento do
a matriz curricular do curso. A partir
Projeto Piloto. O objetivo é fazer uma
de então, discentes, professores, téc-
avaliação diagnóstica, processual,
nicos e gestores puderam compar-
formativa e somativa, visando iden-
tilhar momentos ricos e produtivos,
tificar os limites e avanços do Projeto
nos quais foram reelaboradas cole-
Piloto, e principalmente se os alunos
tivamente as estratégias de integra-
estão aprendendo os saberes histo-
ção que envolviam tanto as questões
ricamente produzidos pela humani-
curriculares, quanto os processos de
148
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mimeo, 2008.
RODRIGUES, M. E. C. O trabalho
pedagógico a partir da metodolo-
gia de Projetos e de Tema Gerador.
2010.
E-mail: liz.pereira@ifpa.edu.br
150
os saberes das disciplinas da base de células, utilizando-se materiais
comum, em que as matérias nem de construção para produzi-las e no
sempre apresentam uma correlação curso Integrado de Informática, or-
direta com os saberes necessários ao ganizando a produção de Objetos
desenvolvimento daquele conheci- Virtuais de Aprendizagem para Bio-
mento técnico exigido na formação logia, dos quais iremos tratar neste
que aquele profissional irá exercer trabalho.
no mundo do trabalho.
Assim, em face dessas lacunas 2. DESENVOLVIMENTO
apresentadas entre os conteúdos das
disciplinas de base comum e as disci-
2.1. Educação Integrada, Integral
plinas técnicas observadas no ensino e Integradora
técnico integrado, surgiu a possibili-
Embora a Lei de Diretrizes e Ba-
dade de explorarmos esse território
ses da Educação Nacional – LDB, Lei
disponível, onde se transformou a
9.394/96, cujo texto, em seu art. 34, §
disciplina técnica em ferramenta, e a
2º, aponta para o aumento progres-
disciplina da base comum em objeto
sivo da jornada escolar na direção do
de trabalho.
regime de tempo integral; em seus
Através da junção dos conheci- artigos de 39 a 42, trata da educa-
mentos técnicos da disciplina técni- ção tecnológica, em que busca as
ca Materiais de Construção, da Turma aptidões para a vida produtiva em
TE4, do curso Técnico Integrado em articulação com o ensino regular ou
Edificações; das disciplinas Progra- independente de escolaridade; de
mação Web e Programação de Apli- tal modo, tendo-se em síntese, um
cações para Comunicações Móveis, contraditório educacional, em que
da Turma TI14, do curso Técnico Inte- há divergência de interesses no pro-
grado em Informática; e do conheci- cesso de formação do sujeito.
mento básico da disciplina Biologia,
Quando observamos a pedago-
em ambos os cursos, do Instituto Fe-
gia de John Dewey, que sustentava a
deral de Educação, Ciência e Tecno-
teoria de que a educação das crian-
logia do Pará, IFPA, campus Itaituba,
ças devia basear-se na abordagem
foram realizadas duas experiências,
de solução dos problemas – o que
em que, no curso Integrado de Edi-
chamou de “aprender fazendo”, em
ficações foram produzidas maquetes
que a teoria é levada à ação prática,
152
nológica, preenche algumas lacunas texto educacional, que envolvem a
deixada na Lei de Diretrizes de Ba- indissociabilidade do ensino, pesqui-
ses de 1996, dando um novo rumo a sa e extensão, bem como a interdis-
este processo de formação do sujeito ciplinaridade, especialmente envol-
completo, e não apenas tecnológico. vendo as disciplinas da base comum
com as disciplinas técnicas, dando
2.2. Políticas pedagógicas de inte- ênfase ao processo da educação in-
tegral, em que o sujeito compreende
gração no IFPA, Campus Itaituba
a importância de todos os saberes
O campus Itaituba tem como dentro de sua formação profissional.
grande objetivo oferecer educação Outro processo de grande im-
de qualidade para aqueles que não portância nesse contexto é a opor-
possuem ou não tiveram condições tunidade da interdisciplinaridade e
de usufruir desse tipo de ensino, integração de saberes, fazendo pon-
oferecendo uma formação orgâni- tes entre as mais variadas disciplinas,
ca que não separe humanização de bem como com a contextualização
profissionalização, mas que forme junto à vivência da comunidade aca-
cidadãos. Procura-se a formação do dêmica e da sociedade em geral, em
sujeito crítico, reflexivo, participati- que as potencialidades podem ser
vo, autônomo, que saiba trabalhar trabalhadas e os problemas estuda-
de maneira coletiva, buscando o seu dos na busca de solução dos mes-
desenvolvimento cognitivo, afetivo mos, através de uma prática cidadã.
e social, independente da modalida-
de de ensino que frequente. Dessa
2.3. Metodologia
forma, essa formação integral tem
como objetivo promover a transfor- Este trabalho é um projeto de
mação da sociedade por meio da sinergia curricular, interdisciplinar,
educação (IFPA/ITAITUBA, 2016). com integração de saberes, através
A partir de patamares de educa- da indissociabilidade do ensino, pes-
ção propostos no Projeto Político-Pe- quisa e extensão, em que as discipli-
dagógico do IFPA, campus Itaituba, nas foram desenvolvidas pelos seus
para que se tenha a obtenção de su- conteúdos na formação de habilida-
cesso na execução de tal proposta, des e competências que buscavam o
faz-se necessário o uso de ferramen- desenvolvimento do potencial téc-
tas educacionais disponíveis no con- nico da área do curso onde o aluno
154
O conteúdo escolhido para a re- sentadas para os docentes das duas
alização do projeto foi Estrutura de disciplinas, em que a turma precisa-
Células Animais e Vegetais, que pas- va apresentar, dentro da Biologia, o
sou a ser apresentado e discutido componente celular e sua função;
em sala através de aulas expositivas, e dentro da disciplina Materiais de
discursivas e debates, que gerou Construção, qual o material foi utili-
uma pesquisa de imagens em vários zado, sua origem e como este é usa-
níveis de observação e graus de au- do na Construção Civil.
mento, com uso de imagens de mi-
croscopia óptica. Assim sendo, foram 2.3.2. Objetos Virtuais de Apren-
realizadas reuniões interdisciplinares
dizagem – OVA’s com conteúdo de
para que os dois docentes compre-
endessem um o conteúdo do outro Biologia feito no Curso Integrado
e as suas aplicações. As equipes de de Informática
alunos foram formadas, cujo desafio
Atribuições do Projeto:
era criar uma maquete de uma célula
animal e uma célula vegetal, utilizan- • Natureza: Ensino, pesquisa e
do-se materiais de construção para extensão;
simular todos componentes celula- • Local de Execução: Turma TI14
res, desde a membrana até todas as do 2° Ano do Curso Técnico
mínimas organelas. Integrado em Informática do
O Prof. Neto de Materiais de Cons- IFPA, Campus Itaituba;
trução ficou responsável pela apre- • Disciplinas: Biologia 2, Progra-
sentação dos mais variados materiais mação Web e Programação de
de construção e em conjunto com a Aplicações para Comunicações
Profa. Liz da Biologia iam avaliando Móveis, atendendo a 26 alunos;
as escolhas dos alunos até que os
materiais de construção escolhidos • Objetivos pedagógicos: Apren-
representassem, da forma mais fide- dizado do Conteúdo de Gené-
digna possível, os componentes ce- tica da disciplina de Biologia
lulares. 2; Prática do conhecimento
adquirido nas disciplinas Pro-
Foi realizado um seminário para gramação Web e Programação
apresentação de todas as maque- de Aplicações para Comuni-
tes produzidas e estas foram apre- cações Móveis; e Integração
156
Os programas escolhidos para a públicas na busca da conquista de
execução dos OVA’s foram o Scrat- novos doadores de sangue, através
ch, que é uma linguagem gráfica de de um programa de orientação pre-
programação, que possibilita a cria- coce, com ferramentas atrativas e de
ção de histórias interativas, anima- uso simplificado.
ções, simulações, jogos e músicas, e
o Construct 2, que tem como foco a 2.4. Resultados e discussões
criação de jogos 2D, e vem com mui-
tos recursos, os quais o torna fácil, 2.4.1. Maquetes produzidas e
incluindo um sistema físico que per- apresentadas
mite que os itens no jogo sejam go-
vernados pela lei da gravidade, como Foram criadas quatro maquetes,
também bits gráficos e de sons como todas com a finalidade de demons-
os sprites, fundos e efeitos de som. trar a capacidade de espacialização,
através da representação em pers-
Após a criação, os OVA’s, foram
pectiva dos desenhos e das imagens
entregues com os seus respectivos
obtidos sobre as células animais e
relatórios, e apresentados aos do-
vegetais em livros e softwares es-
centes das disciplinas envolvidas; se-
pecializados. Além disso, os alunos
guindo-se os testes de efetividade e
passaram a manusear os materiais
posterior adequação de códigos fon-
de construção, observando as suas
te necessários para o registro oficial
características estruturais, de confi-
como um produto de inovação do
guração, propriedades físicas, quími-
IFPA, campus Itaituba. Seguiram-se
cas, e assim buscando compreender
apresentações à comunidade inter-
melhor a sua aplicação dentro do
na e, posteriormente, à comunidade
universo das Edificações para o qual
externa.
acabaram de adentrar, uma vez que
Finalizados todos os processos eram turmas do 1º Ano do curso.
técnicos, os OVA’s, após registros,
Nas figuras 1 e 2, observamos as
estão sendo incluídos no Projeto de
células produzidas pelos alunos da
Extensão “Doadores do Futuro” a ser
Turma TE4, do curso Integrado de
desenvolvido junto aos hemocen-
Edificações do ano de 2011, em que
tros brasileiros, com a finalidade de
foram usados isopor de impermeabi-
desenvolver uma campanha junto a
lização de laje para compor a parede
adolescentes e a jovens de escolas
celular, lâmpadas que representam
158
2.4.2. OVA’s produzidos e apresen- no qual ambos utilizam ferramentas
tados diversificadas para criação de games.
Os tipos sanguíneos foram os princi-
Foram criados 4 OVA’s: Collect pais focos deste OVA, em que o pú-
Blood®, Blood Floating®, Following blico em geral interagiu e aprendeu
Blood® e Blood Race®, todas com a fi- ao mesmo tempo. Os jogos foram
nalidade de demonstrar a importân- programados em 2D, sendo o pri-
cia que tem na definição dos tipos meiro jogo chamado Collect Blood®,
sanguíneos e nos processos de com- criado no programa Scratch (sic)
patibilidade entre estes. Aqui será (TI14, 2015).
apresentado o Collet Blood®, como Collect Blood® (Figura 3) é um OVA
modelo de OVA’s, fruto da integração plataforma 2D, criado a partir do pro-
de saberes entre as disciplinas de grama Scratch, em que o principal
Biologia 2, Programação Web e Pro- objetivo é coletar as gotas de sangue
gramação de Aplicações para Comu- de acordo com o tipo sanguíneo in-
nicações Móveis. A apresentação dos formado na tela inferior do jogo. O
resultados está fundamentada nos jogo contém 03 fases, divididas nos
relatos apresentados pelos alunos. quatro tipos sanguíneos A, B, AB e O,
Os OVA’s Collect Blood® foi desen- conforme estudados em sala de aula
volvido usando as ferramentas de (Figura 4). O jogo é bastante intera-
programação Scratch e Construct 2, tivo, colorido e divertido, ensinando
160
uma ação conjunta, interinstitucio- às explicações dos temas que serão
nal, envolvendo o IFPA, campus Itai- utilizados como objeto de trabalho
tuba, Hemocentros Brasileiros e as aplicado dentro da Informática.
Secretarias Municipais de Educação. Dentro da política de educação
O projeto pretende realizar 4 etapas, básica e técnica do IFPA, campus
a saber: a primeira local, acontecen- Itaituba, os cursos técnicos de nível
do em Itaituba, junto com as Secreta- médio na forma integrada têm sua
rias Municipais de Saúde e Educação; fundamentação teórico-metodoló-
a segunda, Estadual, envolvendo gica nos princípios da interdiscipli-
IFPA, campus Itaituba e a Fundação naridade, da contextualização e nos
HEMOPA; a terceira, Regional, esten- demais pressupostos da formação
dendo-se até o HEMONORTE, no Rio técnica integrada à educação básica,
Grande do Norte; e a quarta e última, usualmente denominada de currícu-
Nacional, em Brasília, junto ao Minis- lo integrado (IFPA/ITAITUBA, 2016),
tério da Saúde, com a proposta de de tal modo que não se pode levar
formatar uma campanha nacional o conhecimento para um curso Téc-
para sensibilização dos adolescentes nico Integrado como se fosse um
e jovens para serem futuros doado- grande armário cheio de gavetas
res de sangue, quando atingirem a isoladas, em que cada uma delas es-
maior idade. teja segmentado um conhecimento
diferente e isolado. Faz-se necessária
2.4.3. A ponte entre base comum a comunicação entre essas “gavetas”
e disciplinas técnicas para que se possa encontrar a real
importância de cada um dos conte-
Quando analisamos os produtos údos aprendidos e apreendidos pelo
aqui apresentados pelos alunos do aluno durante a sua formação profis-
curso Técnico Integrado em Informá- sional.
tica, observamos o conhecimento
A escolha da metodologia ba-
básico de Biologia sendo utilizado
seada na indissociabilidade entre
de forma profunda, em que foram
ensino, pesquisa e extensão tem-se
necessárias muitas horas de aprofun-
mostrado muito eficiente no pro-
damento e compreensão do tema a
cesso de ensino e aprendizagem na
ser desenvolvido nos Objetos Virtu-
educação profissional, científica e
ais de Aprendizagem. É notória a sa-
tecnológica, pois busca contextuali-
tisfação com que os alunos assistem
162
mente com a entrada das Pós-Gra- Desde 2003, Frigotto e Ciavatta
duações Stricto sensu, o processo de já discutiam esse processo, quando
qualificação profissional docente foi diziam que “a formação dos jovens
ampliado, favorecendo sobremanei- para a apropriação criativa da ciência
ra a entrada de pesquisadores para e da tecnologia debate-se entre uma
atuarem junto ao ensino técnico in- reforma imposta ao ensino médio e
tegrado, fortalecendo a proposta de técnico com forte acento nos cursos
indissociabilidade de ensino, pesqui- breves, modularizados para a crença
sa e extensão. Porém na contramão na “empregabilidade”. E ainda com-
do processo, essa Lei permite que plementam que num processo como
os professores da formação técnica esse, os sujeitos, frutos da educação
possam ser profissionais de notório profissional “começam e acabam
saber em sua área de atuação ou na sociedade, mas a escola pública,
com experiência profissional atesta- universal, laica, gratuita, democrá-
dos por titulação específica ou práti- tica e, portanto, unitária (síntese do
ca de ensino, o que particularmente, diverso) é um direito e uma media-
subverte a ordem científica, que em ção imprescindível nas suas lutas e
muito tem fortalecido o ensino técni- na produção de sua humanização e
co nestes últimos anos e incentivado emancipação (FRIGOTTO e CIAVAT-
especialmente os processos de ino- TA, 2003).
vação. E assim, perguntamo-nos que
Ainda de acordo com a nova Lei tipo de caminho a educação do En-
do Ensino Médio, “o currículo será sino Médio tem percorrido em nos-
dividido entre conteúdo comum e so país? Hora com ganhos, hora com
assuntos específicos de acordo com perdas. Mas até aqui não estão sen-
o itinerário formativo escolhido pelo do ainda contabilizadas as perdas
estudante (linguagens, matemática, irreparáveis que este processo trará
ciências da natureza, ciências huma- aos nossos alunos.
nas e formação técnica)”, decretando Dentro desse debate, se conside-
a morte do processo de andamento rarmos que o sujeito terá um currícu-
de educação integral, que vem sen- lo mínimo, a efetivação de um proje-
do efetivado, gradativamente ao lon- to como este que aqui apresentamos
go da história da Rede de Educação ficaria inviabilizado, por muitos fa-
Tecnológica. tores óbvios, mas que certamente, a
164
República Federativa do Brasil, Poder Blood, Blood Floating, Following
Legislativo, Brasília, DF, 17 fev. 2017. Blood e Blood Race, apresentados
Seção 1. p. 1. pelos alunos da Turma TI14, do Curso
Técnico Integrado em Informática do
CAVALIERE, Ana Maria. Anísio Tei- IFPA, Campus Itaituba. Itaituba. 2015.
xeira e a educação integral. Paidéia. 11p.
maio-ago. 2010, Vol. 20, No. 46, 249-
259. Disponível em <http://www. MORIN, Edgar. O método 4. As
scielo.br/pdf/paideia/v20n46/11. ideias. Tradução de Juremir Ma-
pdf>. Acesso em: 10/06/2017. chado da Silva. Porto Alegre: Sulina,
2001. Título original: La Méthode,
FRIGOTTO, Galdêncio; CIAVATTA, Ma- (t..4), Les idées, leur habitat, leur vie,
ria. Educação básica no Brasil na leurs moeurs, leur organisation.
década de 1990: subordinação ativa
e consentida à lógica do mercado. In: SCHMIDT, Ireneu Aloisio. John
Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 82, Dewey e a Educação Para uma So-
p. 93-130, abril 2003 Disponível em ciedade Democrática. CONTEXTO &
<http://www.cedes.unicamp.br>. EDUCAÇÃO. Editora Unijuí. Ano 24 nº
Acesso em: 10/06/2017. 82 Jul./Dez. 2009. p.135-154.
166
Cambuci, na tentativa de demons- Unidos da América, somente, por
trar como, na prática do cotidiano, os volta de 1920. Um grupo de estudio-
discursos e as teorias se concretizam. sos, ligados à administração escolar,
passou a entender o currículo, ofi-
2. APROXIMAÇÕES TEÓRICAS EN- cialmente, como forma de racionali-
zação, sistematização e controle da
TRE CURRICULO E ENSINO MÉDIO
prática educativa. Diante desse novo
INTEGRADO objeto, diferentes concepções de
O currículo não pode ser analisa- currículo começaram a se delinear e
do fora do seu contexto. Ele é a ex- várias teorias foram definidas, enfa-
pressão de seu tempo, mesmo que tizando certos conceitos de acordo
de forma não elaborada, e das ideo- com seu campo de interesse.
logias que configuram o pensamen- Essas visões são categorizadas,
to educacional, político, econômico segundo Silva, T. T. (2009), como: Te-
e social de sua época. O que dife- orias Tradicionais, que priorizam os
rencia e configura um determinado métodos de ensino-aprendizagem e
pensamento curricular é a ênfase, de avaliação, a metodologia didáti-
organizada e orientada, dada a cada ca, a organização e o planejamento,
um desses enfoques em detrimento além da eficiência para o alcance de
de outros. Mas ele não é apenas fei- objetivos; Teorias Críticas, que dão
to de consensos e supremacias. Ele ênfase à ideologia, aos artefatos de
é adaptável, é campo de conflito, de reprodução cultural e social, às rela-
contestação, de relações de poder e ções sociais de produção e de classe
de propagação de ideologias. Sen- e a um currículo que leve à conscien-
do assim, uma análise aprofundada tização, emancipação, libertação e
nesse campo de estudo nunca fará resistência; e Teorias Pós-Críticas, que
emergir, somente, a relação da so- enfocam a identidade, a alteridade,
ciedade com o conhecimento, mas o as diferenças e a subjetividade, assim
modo como ela se organiza ou não como os processos de significação e
para manter e/ou modificar suas es- construção do discurso no currículo
truturas (DÁLIA, 2011). e a ligação existente entre o saber e o
Segundo autores como Silva, T. T. poder e a múltipla representação so-
(2009), Moreira e Silva (2002) e Ma- cial e cultural nos documentos curri-
cedo (2009), o currículo como cam- culares.
po de estudos surgiu nos Estados Sabe-se que a rotina pedagógica,
168
dele se percebem e se representam pode ser estabelecido entre as várias
as relações dessa realidade (RAMOS, áreas de conhecimento com o intui-
2005). Sob essa perspectiva, o tra- to de desenvolver no educando um
balho, como “mediação ontológica olhar múltiplo sobre a sociedade.
e histórica na produção do conheci- Isso evidencia o compromisso polí-
mento” (RAMOS, 2005, p.114) passa a tico da escola em formar cidadãos
ser visto como princípio educativo e inteiros a partir e no meio do qual
integrador do conhecimento e a pro- participa.
fissionalização junto com a formação Diante disso, leva-se em conta
geral constituiriam, portanto, uma para a compreensão de currículo,
unidade e promoveriam uma escola neste trabalho, o pensamento dos
unitária e de educação politécnica seguintes autores, que se articulam
(FRIGOTTO, 2005). às concepções críticas e pós-críticas:
O Currículo Integrado de fato não Sacristán (2000), para o qual o currí-
diz respeito somente à articulação culo é uma práxis, um projeto educa-
entre formação geral e profissional. tivo, no qual se estabelece um diálo-
Isso significa que sua práxis deve se go entre agentes sociais, elementos
sustentar no desenvolvimento do técnicos, alunos e professores; Silva,
pensamento complexo, na experi- T. T. (2009), que o defende como do-
mentação, no trabalho como prática cumento de identidade; Moreira e
educativa e no contexto no qual o Silva (2002), que afirmam ser o cur-
discente está inserido, para assim ter rículo um instrumento de conserva-
como resultado uma aprendizagem ção, transformação e renovação dos
significativa, em uma tentativa cons- conhecimentos e de socialização
tante de interação entre as diversas ideológica; e Macedo (2009), com-
áreas de conhecimento. Consonan- preendendo o currículo como um ar-
te a Santomé (1998), a escolha de tefato socioeducacional que veicula
um currículo desse tipo demonstra, uma formação ética, política, estéti-
mesmo com dificuldades internas, ca e cultural, no cotidiano, enquanto
a identidade e a posição política de concepção e prática.
um determinado grupo educativo. Com base nesses pressupostos,
Não se desqualifica, nessa ocasião, entende-se que currículo é toda
o campo de ensino e pesquisa das prática que se tornou habitus1 edu-
diversas disciplinas e especialistas, cativo em uma determinada institui-
mas, sim, acredita-se no diálogo que
1 Segundo uma adaptação do conceito de Bourdieu que entende habitus como uma ação
que não é meramente mecânica nem individual, mas que se torna a única prática viável (“a
coisa certa a ser feita”) dentro de um determinado contexto social. Nesse caso, influencia-
do pela ideologia educacional e os valores sociais vigentes nas instituições e comunidades.
(BOURDIEU, 2004, p 21-23) e (GONÇALVES, N. G. e GONÇALVES, S. A. 2010, p. 51).
170
superação do caráter compartimen- cada campus, o IF-Fluminense, que
tado e dicotômico existente que se- abrange 14 municípios da área nor-
para homem/cidadão; teoria/prática; te do estado do Rio de Janeiro, man-
ciência/tecnologia; saber/fazer; (g) tém algumas políticas institucionais.
o desenvolvimento de um trabalho A atual Pró-Reitoria de Pesquisa, Ex-
educativo em que haja articulação tensão e Inovação (ProPEI) vem dan-
entre ensino, pesquisa e extensão;” do continuidade à oferta de ações
(IFF, 2011, p.113). Além disso, tem de pesquisa e de extensão em cada
como diretrizes de suas práticas aca- uma de suas unidades. Por meio de
dêmicas a inter e a transdisciplinari- editais de apoio e da concessão de
dade como oportunizadoras da “in- algumas bolsas aos estudantes, aos
tegração e articulação do currículo, pesquisadores e aos extensionistas,
provocando intercâmbios reais (...), tem-se procurado incentivar pro-
em que o sujeito perceba a neces- jetos nas mais diversas temáticas e
sidade de estabelecer relações (...) com os mais distintos objetivos. Os
na compreensão de um dado fenô- programas como o Núcleo de Estu-
meno ou na resolução de um deter- dos Afro-brasileiros e Indígenas (NE-
minado problema” (IFF, 2011, p.14). ABI), o Núcleo de Gênero e Diversida-
Observa-se aqui que a concepção de (NuGem) e o Centro de Memória
institucional de ensino dialoga com são garantidos em todos os campi,
as teorias críticas e defende a cons- desde que haja interesse dos sujei-
trução de uma visão integradora do tos sociais locais. Ademais, são in-
currículo, inclusive prevendo articu- centivados outros projetos de cunho
lação para além das ações de ensino, extensionista e investigativo, mais
ou seja, pelo menos no plano teórico, específicos, de acordo com as de-
percebe-se um compromisso com a mandas dos próprios profissionais2.
superação da compartimentação do Percebe-se, pois, com tais ativi-
conhecimento e do currículo como dades, que a integração promovida
instrumento do capital. pelo IF-Fluminense perpassa pela
Assim e a partir da necessidade execução dos projetos. Nos próprios
de garantir os princípios de integra- editais que avaliam, autorizam o
ção e articulação no contexto de funcionamento e concedem bolsas
2 Para maiores informações ver editais: 39/2017; 51/2017; 59/2017; 60/2017; 61/2017. Eles
estão disponíveis na página: http://www.sisep.iff.edu.br/cadastro/orientacoes/. Data de
acesso: 04/08/2017.
172
bém alguns profissionais caros a uma que resultam, hoje, no envolvimento
escola, como bibliotecários, pedago- direto de cerca de 40% dos discentes
go, psicólogo, dentre outros. da escola nessas propostas, sejam
Mesmo com vários problemas como voluntários ou como bolsis-
estruturais graves, que dificultam tas. Isso pode ser percebido na tabe-
muito as práticas educativas, e se va- la abaixo, que lista a quantidade de
lendo das possibilidades produtivas projetos coordenados pelos profes-
e sociais de uma escola agrícola situ- sores desde o momento em que a
ada na zona rural, os professores do unidade se tornou avançada:
Campus têm demonstrado um cres- Além do crescimento, deve-se
cente interesse pelo desenvolvimen- destacar também a diversidade for-
to de ações de pesquisa e extensão mativa das equipes dos projetos. Em
Tabela 1 – Número de projetos de pes-
quisa e extensão do Campus Cambuci
alguns deles estão presentes docen- justifica não somente pelo fato de
tes e técnicos com formações bem eles serem coordenados pelos auto-
diferentes, o que aponta para a cons- res deste texto, mas, principalmente,
trução de um conhecimento que por: partirem da concepção de Ensi-
rompe com os limites disciplinares. no Integrado apresentado anterior-
Diante disso, a análise aqui apresen- mente, isto é, serem projetos que,
tada se concentrará sobre três deles: apesar de estarem ligados a aspectos
um de pesquisa, um de extensão, e culturais, também estão fortemente
outro classificado pela instituição, vinculados à temática rural, tão cara
como de integração pesquisa e ex- aos Cursos Integrados de Agroecolo-
tensão. A escolha desses projetos se gia e de Agropecuária desenvolvidos
174
munidades vizinhas, o que facilitará já utilizadas nas aulas para as discus-
o desenvolvimento de ações de ensi- sões sobre assuntos cotidianos; tra-
no, de pesquisa e de outras ações de balhar, a partir dos dados obtidos, as
extensão. Tendo em vista os cursos relações entre os grandes processos
integrados oferecidos na unidade históricos estudados e a vida local;
escolar, o melhor entendimento da demonstrar como os sujeitos histó-
história e dos valores das comunida- ricos orientam as suas ações, o que
des rurais facilitará a construção de favorece a perspectiva de que todos
atividades que atendam as deman- nós somos agentes históricos e não
das locais. No que se refere especifi- somente os “grandes personagens”
camente ao Curso de Agroecologia, presentes nos livros didáticos. Ade-
o debate sobre o impacto da Revo- mais, os bolsistas e voluntários te-
lução Verde na produção local dina- rão a oportunidade de participar de
mizará o trabalho de resgate de prá- um projeto científico, tendo acesso
ticas tradicionais de produção. Além a uma série de atividades (leituras
disso, o projeto estará em constante complementares, orientação, apre-
diálogo com o recém-criado curso sentações orais em eventos científi-
de Pós-Graduação Lato Sensu: Lite- cos) que potencializarão o seu cresci-
ratura, Memória Cultural e Sociedade. mento como estudante, preparando,
Como a especialização tem a propos- inclusive, para uma possível vertica-
ta de analisar práticas culturais locais, lização.
o material levantado enriquecerá as Por fim, espera-se que as ações
discussões de algumas disciplinas. colaborem para o maior estreita-
Em segundo lugar, as ações do mento do Campus com as comuni-
projeto auxiliarão nas atividades dades vizinhas. Entende-se que, so-
pensadas pela disciplina de história. mente por meio desse enlace e do
Tendo como pressuposto as estra- conhecimento das demandas locais,
tégias de ensino de Circe de Bitten- será possível a instituição participar
court, defensora do estudo histórico da construção de um projeto coleti-
da realidade por meio de situações vo de desenvolvimento sustentável
problemas (BITTENCOURT, 2004), ele baseado, de fato, nas demandas das
possibilitará: exemplificar o debate populações do campo, respeitando
sobre fontes e metodologias do co- os seus interesses e a sua identidade.
nhecimento histórico; aprofundar as O projeto de extensão é pensa-
técnicas de pesquisa da história oral,
176
são reforçou a necessidade de esta- implicação desses insumos na saúde
belecer uma rotina sistematizada de da população local (MOREIRA, 2002).
estudos sobre a realidade dos alunos A introdução dos insumos químicos
do campus. Nasceu, assim, a ideia da esteve ligada a um processo mais
criação do Núcleo de pesquisas e estu- amplo de mudanças produtivas co-
dos sobre as ruralidades fluminenses, nhecida como Revolução Verde. Em
que foi aprovado e cadastrado pelo Nova Friburgo, algumas pesquisas
IFF junto ao CNPq em 20164. mostram que, no início dos anos
O projeto Memórias de vidas no 80, a grande maioria dos agriculto-
campo: as transformações nas “artes res já utilizava esses agroquímicos
de fazer e conviver” dos trabalhadores sem qualquer prescrição (MORETT
de bairros rurais da serra Fluminense e MAYER, 2003). Tal mudança na or-
(Nova Friburgo e Sumidouro) (1950- ganização produtiva deve ter afeta-
2000) é fruto do anseio de se enten- do amplamente a vida cotidiana da
der melhor o processo histórico mais população rural e é, justamente, essa
recente de formação e de desenvol- uma das questões principais da pes-
vimento de regiões rurais do estado quisa. Diante disso, optou-se por um
do Rio de Janeiro e se ancora na linha recorte temporal que se concentras-
de pesquisa: Linguagem, Identidade e se sobre os últimos 50 anos do século
Memória do Rural Fluminense do já XX, o que permitirá estabelecer uma
referido núcleo. O seu recorte geo- análise entre o modo de vida nessas
gráfico pode ser justificado de várias áreas, antes e depois da introdução
formas, levando-se em consideração, do pacote tecnológico e, em parce-
principalmente, as ligações histórias ria com o projeto de extensão Cen-
dessas áreas com aquelas mais pró- tro de Memória do IFF Cambuci, um
ximas ao campus Cambuci e as ati- comparativo com o território rural de
vidades econômicas predominantes Cambuci.
nessas regiões. Essas duas regiões Assim, espera-se entender me-
têm o seu arranjo produtivo voltado lhor as características de comuni-
para o setor agropecuário e são mar- dades rurais de regiões agrícolas
cadas pelo grande uso de agrotóxi- importantes para a economia do es-
cos, o que já gerou estudos sobre a tado. Uma vez de posse dos dados,
178
dados sociais, que só foram surgin- buci objetiva, pois, atuar exatamente
do de acordo com a necessidade na criação de tais ferramentas, pro-
peculiar de cada uma dessas ações. curando dar subsídios para uma atu-
O mesmo ocorreu com a constitui- ação institucional mais comprometi-
ção dos núcleos de pesquisa e com da com as questões locais.
a oferta dos cursos FIC, Tecnólogo e No campo pedagógico, o projeto
de Especialização, já com previsão partiu do princípio de que o currí-
de início. As ferramentas de consulta, culo de uma instituição educativa é
desses dois últimos, foram pensadas toda a sua práxis, em qualquer âmbi-
a partir da implantação dos projetos to (SACRISTÁN, 2000), transformada
pedagógicos já consolidados por ou- em seu documento de identidade
tros campi e não suscitadas por de- (SILVA, 2009), no qual se forjam ide-
mandas especificamente locais. No ologias, territórios políticos e con-
caso do curso FIC, não houve consul- cepções de saber e poder (MACEDO,
ta e foi uma ação planejada a partir 2009; MOREIRA e SILVA, 2002). Por
de um projeto de pesquisa apoiado isso, é de suma importância que ele
pelo CNPq5. reflita a realidade em que se insere.
Diante desse cenário e com os Contudo, para que ele seja veículo
quadros pedagógico e de gestão de representações e transformações,
já formados, o IFF campus Cambu- é preciso, antes de conceber uma
ci percebeu a necessidade de criar proposta pedagógica, e aí se incluem
instrumentos que possibilitassem as práticas científicas e extensionis-
compreender melhor as demandas tas, seja ela em qual modalidade for,
formativas, produtivas e sociais da conhecer o contexto no qual e para
comunidade que atende e de estrei- o qual se destina. Sendo assim, bus-
tar os laços com os agentes locais cou-se com tal proposta estabelecer
para aprimorar, gerir com mais efici- interlocução entre a escola e as co-
ência, planejar e integrar suas ações munidades atendidas por elas, diag-
de ensino, pesquisa e extensão. O nosticando suas necessidades e seus
projeto de Integração Pesquisa e Ex- anseios formativos. Isso permitirá
tensão Aportes para o planejamento construir os currículos do IFF-Cam-
das ações pedagógicas de pesquisa buci de modo mais coerente e condi-
e de extensão do IFF-campus Cam- zente, além de proporcionar aos seus
180
há de se levar em conta a possibilida- culo como documento e como prá-
de e a necessidade de se estender a tica educativa unitária, ratificando o
integração para além dos projetos e compromisso da instituição pública
torná-la uma prática do cotidiano es- com a excelência e com a formação
colar. Esse seria o principal desafio a crítica.
ser enfrentado pelas escolas da rede
federal, principalmente, pelo campus REFERÊNCIAS
Cambuci.
ARRUDA, M. C. C. e JÚNIOR, J. A. C. C.
A superação da formação dual
Conselhos Municipais de Educa-
de trabalhadores e trabalhadoras
ção: desafios daformação e da ges-
para o mercado encontra bases na
tão democrática. Seropédica: UFRRJ,
concepção da educação a partir da
2015.
construção do Currículo Integrado.
Somente a partir disso, pode-se ir BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de
além da mera formalização existente História: fundamentos e métodos.
no ensino integral como modalidade São Paulo: Cortez, 2004.
e não como práxis. Nesse sentido, a
inter ou a transdisciplinaridade se fa- BOBBIT, J. The curriculum. Boston:
zem imprescindíveis para a articula- Houghton Miffin, 1918.
ção entre os diversos saberes e para
BOURDIEU, P. Coisas ditas. São Pau-
romper com a abordagem empirista
lo: Brasilense, 2004.
e mecanicista da tradicional profis-
sionalização. DÁLIA, J. M. T. Formação integral na
Diante das experiências e dos de- educação do campo: o ensino de
safios apresentados, espera-se que, língua portuguesa no currículo inte-
no IFF campus Cambuci, o acúmulo grado da pedagogia da alternância.
criado com os projetos seja capaz de 24/08/2011. 107f. Dissertação. Pro-
fazer com que a equipe pedagógica grama de Pós-Graduação em Edu-
perceba que a integração curricular, cação Agrícola/UFRRJ. Seropédica,
de fato, é possível. Torna-se mister a 2011.
garantia estrutural para a continui-
dade desses projetos e que a articu- DEMO, P. Metodologia da investi-
lação vivenciada nessas ações seja gação em educação. Curitiba: Ibpex,
reelaborada na construção do currí- 2005.
182
MAYER. J. M. e ARAÚJO, J. R. (Org.)
Teia Serrana: formação histórica de
Nova Friburgo. Rio de Janeiro: Edito-
ra ao livro Técnico, 2003, p.265-84.
184
1999), “a educação para o trabalho dos futuros (MOURA, 2007).
não tem sido tradicionalmente co- A nova possibilidade de articu-
locada na pauta da sociedade brasi- lação entre educação básica e edu-
leira como universal” (p. 5), mas que, cação profissional técnica surge na
apesar disto, e devido a inúmeras forma integrada de Educação Profis-
discussões e avanços historicamente sional Técnica de Nível Médio. Essa
construídos, forma é resultante de debates mobi-
não se concebe, atualmente, a edu- lizados nos setores da educação pro-
cação profissional como simples
instrumento de política assisten- fissional, principalmente no âmbito
cialista ou linear ajustamento às dos sindicatos, e pesquisadores da
demandas do mercado de trabalho, Educação e Trabalho, com agentes
mas sim, como importante estraté-
gia para que os cidadãos tenham e atos políticos, que culminou na
efetivo acesso às conquistas cientí- revogação do Decreto nº 2.208/97,
ficas e tecnológicas da sociedade. que determinava a separação entre
Impõe-se a superação do enfoque
tradicional da formação profissional Ensino Médio e educação profissio-
baseado apenas na preparação para nal, e na publicação do Decreto nº
execução de um determinado con- 5.154/04, que permitiu novamente a
junto de tarefas. A educação profis-
sional requer, além do domínio ope- oferta da educação básica de forma
racional de um determinado fazer, articulada à educação profissional.
a compreensão global do processo
produtivo, com a apreensão do sa- O Ensino Médio Integrado à Edu-
ber tecnológico, a valorização da cação Profissional atualmente é ofer-
cultura do trabalho e a mobilização
tado nas instituições da Rede, pois
dos valores necessários à tomada de
decisões (BRASIL, 1999, p. 8). conforme o art. 6º da Lei nº 11.892
uma das finalidades dos Institutos
Federais de Educação, Ciência e Tec-
Esse documento denota a bus-
nologia (IFs) é: “ministrar educação
ca pelo rompimento da dualidade
profissional técnica de nível médio,
estrutural que se difundiu no Brasil
prioritariamente na forma de cursos
desde o império: a educação pro-
integrados, para os concluintes do
fissionalizante, de caráter mais ins-
ensino fundamental e para o públi-
trumental direcionada às camadas
co da educação de jovens e adultos”
populares como forma de apoio as-
(BRASIL, 2008, grifo nosso), devendo
sistencialista, e educação básica, de
garantir 50% de suas vagas para este
caráter mais propedêutico, dirigida
fim.
aos que se preparavam para os estu-
186
ção curricular. Para ela, os currículos autora relata que em sua prática do-
dos cursos integrados são bastante cente não buscava trabalhar os con-
fragmentados. Ao invés de se pen- teúdos científicos de forma articula-
sar em uma adaptação curricular da com os conhecimentos técnicos e
para essa forma de ensino, eles são lecionava como se estivesse em um
compostos de todas as disciplinas do ensino médio convencional. Visando
ensino médio regular e as demais da promover uma formação e tendo o
formação profissional e, deste modo: trabalho como princípio educativo,
[...] os alunos cursam um grande ela elaborou e aplicou uma propos-
número de disciplinas ao mesmo ta buscando promover a integração
tempo, com pouca carga horária
destinada a cada uma delas e sem
entre quatro disciplinas do curso
nenhum nexo ou ligação entre os técnico integrado em eletrotécnica.
conteúdos das matérias básicas Em sua investigação, a pesquisado-
com o ensino técnico. Os conteúdos
são ministrados individualmente
ra buscou informações sobre a visão
com pouca ou nenhuma conectivi- dos estudantes em relação ao ensino
dade entre si, o que contribui para médio integrado e percebeu que há
dificultar o entendimento e a assi-
milação por parte dos alunos (MU-
um desconhecimento por parte de-
NIZ, 2015. p. 84). les do que é um ensino integrado,
sendo predominante a ideia de que
neste tipo de curso simplesmente se
O problema apresentado por Mu- tem a formação básica adicionada
niz (2015) é tão grave que em pouco a disciplinas de cunho profissional.
tempo de existência do campus já Dentre as dificuldades encontradas
foram encerrados diversos cursos in- pela professora durante a execução
tegrados e abertos outros novos. Ela da proposta, ela destacou o des-
destaca a necessidade de se repensar conhecimento de conhecimentos
os currículos de modo que trabalho e específicos para se promover uma
estudo não sejam excludentes. efetiva integração, demandando
Outro estudo, realizado por Melo bastante pesquisa e estudo ao longo
(2015), também destaca a dificulda- do planejamento. Para a autora, essa
de dos docentes de efetivarem uma dificuldade pode ser atribuída a la-
formação integrada que se contrapo- cunas em sua formação docente que
nha a dualidade estrutural entre for- não contribuiu para prepará-la para
mação básica de nível médio e edu- atuar no ensino integrado.
cação profissional. Em seu trabalho, a
188
Mas eles próprios começam a se di- sua plenitude. Constitui-se assim um
ferenciar dos animais tão logo come- processo de alienação e, por meio
çam a produzir seus meios de vida dele, os homens tornam-se menos
(p.27). [...] mas os homens, ao de- homens (PIRES, 1997).
senvolverem sua própria produção As críticas de Marx se estendem/
material e seu intercâmbio material, aplicam à educação. A educação for-
transformam também, com esta sua mal pode contribuir para o processo
realidade, seu pensar e os produtos de humanização ou de alienação dos
de seu pensar (MARX e ENGELS apud jovens. Para o filósofo, a educação
ANDRADE, 2006, p. 52-53, grifo nos- profissional pautada no adestramen-
so). to dos operários por meio do ensino
A atividade humana é entendida de técnicas e manipulação de ferra-
como transformadora da realidade e, mentas tem como objetivos a manu-
ao transformá-la, o homem transfor- tenção da divisão do trabalho e a in-
ma a si mesmo em um movimento trodução de mais máquinas no meio
simultâneo. Deste modo, o homem de produção, contribuindo para o
não se situa fora da realidade, mas processo de alienação. O mesmo
pertence a ela (ANDRADE, 2006). ocorre em um sistema educativo que
É na categoria trabalho que está a foque apenas na formação intelectu-
materialidade histórica do homem, al e abstrata.
sendo ela o centro das relações so- Diversos autores brasileiros
ciais. O trabalho, ao constituir-se tais como Frigotto (2012), Ciavatta
como atividade vital, possibilita que (2012), Kuenzer (1998) discutem a
o homem se torne homem, em um relação entre trabalho e educação e,
processo chamado de humanização para Pires (1997) essa reflexão é mui-
(PIRES, 1997). to importante, pois:
Entretanto, na sociedade capita- A humanidade, produzida histórica
lista, o trabalho é explorado, sendo e coletivamente pelo conjunto dos
homens, diz respeito ao conjunto
vendido sempre por um preço me- de instrumentos (objetos, ideias, co-
nor do que ele vale. Nessa lógica de nhecimento, tecnologia etc) com os
organização, o capitalista expropria quais os homens se relacionam com
a natureza e com os outros homens
o trabalho do trabalhador dividindo para promover a sobrevivência. A
e setorizando os meios de produ- forma histórica de produzir a huma-
ção, retirando dele a atividade em nidade chama-se trabalho, portanto
a centralidade do trabalho nas rela-
190
Na concepção ontológica, o tra- ver seus meios de subsistência, suas
balho não deve ser reduzido ao em- necessidades fisiológicas e culturais,
prego. É uma atividade essencial não sendo correto que alguns grupos
para responder a produção de ele- explorem e vivam do trabalho dos
mentos necessários não só a vida outros (FRIGOTTO, 2012). Esse mito
biológica, mas a vida cultural, social, salvacionista da Ciência e da Tecno-
afetiva e todas outras necessida- logia é amplamente compartilhado
des que se modificam ao longo da pelos docentes que, ao discutirem
história. Segundo Frigotto (2012), o desenvolvimento científico e tec-
os trabalhadores sempre buscaram nológico como estudantes, o fazem
desenvolver meios/modos que pos- argumentando que os problemas
sibilitassem diminuir esse tempo de enfrentados pela sociedade serão
trabalho para dispor de mais tempo resolvidos com cada vez mais tecno-
livre, um tempo de escolha verdadei- logia. O que observamos é a grande
ramente criativo. Nessa perspectiva, desigualdade social, o aumento do
o trabalho humano se dá tanto na es- desemprego e milhares de pessoas
fera da necessidade quanto da liber- que passam fome diariamente, mes-
dade, que são inseparáveis. E é neste mo que se produza alimento sufi-
contexto que a ciência e a tecnologia ciente para atender a demanda.
se inserem, pois, elas podem ser uti- Na política educacional brasileira
lizadas na melhoria das condições de pode-se notar a falta de identidade
vida, permitindo um aumento desse do ensino médio. Mesmo sendo ela
tempo de efetiva escolha. a etapa final da educação básica e,
Todavia, as mudanças científicas consequentemente muito importan-
e técnicas não têm contribuído para te para a formação de cidadãos ativos
que grande parte das pessoas tenha na sociedade, nas instituições priva-
essa melhor qualidade de vida e pos- das ainda se busca apenas a prepara-
sa desfrutar de mais tempo disponí- ção dos jovens para exames e ingres-
vel. Muitos estão desempregados ou so no ensino superior. As instituições
trabalhando em condições precárias. públicas, tentando proporcionar
Desta forma, é preciso pensar em essa mesma oportunidade para seus
uma formação que tenha o trabalho estudantes, devido a diversos fatores
como princípio educativo, pois to- sociais, estruturais, econômicos, que
dos os seres humanos, como parte não se restringem as paredes da es-
integrante da natureza, devem pro- cola, não conseguem atingir os mes-
192
• O mito da superioridade do inércia e lógica de evolução,
modelo das decisões tecno- desprovida do controle dos se-
cráticas: na perspectiva tecno- res humanos” (VERASZTO et al.,
crática, os experts (especialistas 2008, p. 70), além disso, acredi-
e cientistas) são os responsá- ta que o progresso tecnológico
veis por decidirem sobre ques- é o principal promotor de mu-
tões controversas, deixando danças sociais.
pouca margem para participa- Ao pensarmos em exemplos de
ção social nessas decisões. Um concepções que manifestam uma
dos pilares que sustenta essa visão reducionista da relação entre
perspectiva é o cientificismo, ciência e tecnologia, podemos citar
que afirma ser a ciência supe- afirmações como: a tecnologia é a
rior a outros conhecimentos, aplicação da ciência básica, ou que a
sendo capaz de resolver quais- tecnologia é um produto da ciência.
quer tipos de problemas, de or- Esse tipo de afirmação desconsidera
dem social, política, econômi- que a tecnologia é muito anterior a
ca, ética, etc. Acredita-se que ciência, estando profundamente re-
os especialistas são capazes lacionada à história humana. É no
de trazer soluções úteis e de momento em que o homem pensa
modo ideologicamente neutro. e constrói uma ferramenta, até en-
• A perspectiva salvacionista tão inexistente, que ele se constitui
da Ciência e Tecnologia: nessa como homem. E isso ocorre muito
concepção, o desenvolvimento antes do advento da ciência. Como
científico-tecnológico conduz afirmam Veraszto e colaboradores
(ou irá conduzir) ao bem-estar (2008):
social. Isso porque, nessa visão, A tecnologia existia muito antes dos
a ciência e a tecnologia são conhecimentos científicos, muito
antes que homens, embasados em
criadas para resolverem os pro- teorias, pudessem começar o pro-
blemas da sociedade. cesso de transformação e controle
da natureza. Além de ser mais an-
• O Determinismo tecnológi- tiga que a ciência, a tecnologia não
co: esse mito “considera a tec- auxiliada pela ciência, foi capaz de
nologia como sendo autôno- inúmeras vezes, criar estruturas e
instrumentos complexos (p. 65).
ma, autoevolutiva, seguindo,
de forma natural, sua própria A crença dos professores em afir-
194
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Já o ensino médio integrado bus-
ca promover uma formação em sua
As atuais mudanças no ensino totalidade, inter-relacionando as di-
médio podem ser tidas como um re- mensões trabalho, ciência e cultu-
trocesso ao pensarmos na formação ra. A educação em uma perspectiva
integrada à educação profissional. politécnica busca atingir esse fim
Os estudantes que optarem pelo iti- contribuindo para que os estudan-
nerário formativo da formação técni- tes não só aprendam variadas técni-
ca e profissional, possivelmente, te- cas utilizadas no sistema produtivo
rão as mesmas aulas das disciplinas atual, mas as articule com os funda-
científicas dos estudantes que não fi- mentos científicos, sociais e culturais,
zerem essa opção. Deste modo, pen- envolvidas no desenvolvimento tec-
sar em um currículo integrado que nológico. Na prática, deve-se propi-
discuta o trabalho e possibilite uma ciar condições para que os alunos se
melhor compreensão dos funda- apropriem das habilidades e compe-
mentos científicos, sociais e culturais tências necessárias para a formação
do atual sistema produtivo, a partir de um profissional que a sociedade
da formação técnica em questão, se precisa. Portanto, é necessário ques-
torna inviável. tionar: o que a sociedade espera de
O Ensino Médio Integrado à Edu- um técnico em agropecuária? Quais
cação Profissional surge na tentativa são os conhecimentos necessários
de romper com a dualidade entre a para que se constitua um profissio-
educação profissionalizante, focada nal mais crítico, preocupado com as
essencialmente no ensino de técnicas relações sociais e culturais envolvi-
para a rápida inserção no mercado de das em sua prática? Devem ser tra-
trabalho e voltada para as classes po- çados objetivos que se atentem a
pulares, e a propedêutica, com enfo- essas questões, pensando em como
que na discussão de conhecimentos as diferentes áreas do conhecimento
necessários para o prosseguimento podem contribuir para esse fim.
dos estudos futuros. Ou seja, ambas Apesar dos documentos oficiais
as formas de educação desarticula- que tratam da educação profissional
das são alienantes e não contribuem defenderem a perspectiva integrada
para a formação de cidadãos que de ensino, a realização e a consoli-
compreendam o significado do tra- dação desse tipo de curso ainda têm
balho na constituição humana. sido um desafio. Em inúmeras insti-
196
_____. Decreto nº 5.154, de 23 de Cap. 2. p. 57-82.
julho de 2004. Regulamenta o § 2º
do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RA-
9.394, de 20 de dezembro de 1996, MOS, M. A gênese do Decreto n.
que estabelece as diretrizes e ba- 5.154/2004: um debate no contexto
ses da educação nacional. Brasília, controverso da democracia restrita.
DF: 23 de julho de 2004. Disponível In: FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RA-
em: <https://www.planalto.gov.br/ MOS, M. (Org.). Ensino Médio Inte-
ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/De- grado: Concepções e contradições.
creto/D5154.htm>. Acesso em: 20 3. ed. São Paulo: Cortez, 2012. Cap. 1.
jul.2017. p. 21-56.
198
IDEOLOGIA EMPRESARIAL NAS ESCOLAS ESTADUAIS
DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL CEARENSES
Ana Carolina Veras do Nascimento1, Dante Henrique Moura2,
Edilza Alves Damascena3
1
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
2
e 3 Instituto Federal do Rio Grande do Norte
E-mail: karolzinha033@yahoo.com.br
1 Destacamos que tal realidade vem ocorrendo desde a posse do primeiro governo de Lula
da Silva, quando o executivo do governo federal, ao assumir o poder, possibilitou o retorno
à discussão, principalmente no que diz respeito à necessidade de integração do Ensino Mé-
dio à Educação Profissional. Esse fato acabou resultando numa significativa mobilização dos
setores progressistas vinculados ao campo da Educação Profissional. Assim, vários debates
ocorreram, as discussões sobre a educação politécnica e/ou tecnológica, de tradição mar-
xiana voltaram a ocupar lugar central (MOURA, 2007).
2 Inclui curso técnico concomitante e subsequente, integrado ao Ensino Médio regular, nor-
mal/magistério, integrado à EJA de níveis fundamental e médio, Projovem Urbano e FIC
fundamental, médio e concomitante (MEC/INEP, 2017)
200
tes de financiamento foram os recur- Tese (Modelo de gestão – Tecnologia
sos advindos do Tesouro Estadual e Empresarial Socioeducacional), ins-
do Programa Brasil Profissionalizado, pirada, pela Tecnologia Empresarial
via Decreto nº 6.302/2007 que “visa Odebrecht (TEO3), tecnologia edu-
fortalecer as redes estaduais de edu- cacional apresentada inicialmente
cação profissional e tecnológica. ” à Secretaria de Educação do Estado
(BRASIL, MEC, 2013, s.n.). No que se de Pernambuco “como alternativa
refere ao Programa Brasil Profissio- para inovar o sistema de gestão dos
nalizado, o governo federal repassa Centros de Ensino Experimental que
recursos para os estados investirem viriam a ser implantados a partir
nas escolas técnicas. Para ganhar os daquele ano em Pernambuco”(ICE,
recursos desse programa, os esta- 2008, p.5). A Tese, posteriormente,
dos deveriam assinar o compromis- foi apresentada à Secretaria de Edu-
so Todos pela Educação (Decreto nº cação do Estado do Ceará e inserida
6.094/2007). como o modelo de gestão a ser utili-
Desde agosto do ano de 2008, o zado nas Escolas Estaduais de Educa-
número de escolas vem se amplian- ção Profissional.
do, não apenas na capital, mas por Diante do exposto, neste artigo
todo o território do estado. Inicial-
nos propomos a analisar o docu-
mente, contava com 25 EEEPs que mento Tese e seu antecessor TEO,
ofertavam o EMI em 20 municípios. doravante Tese/TEO, responsável
Até o final de 2014 já haviam 106 EE-
pela concepção de formação huma-
EPs distribuídas em 82 municípios. na presente nas escolas profissiona-
No ano de 2016, observamos um to- lizantes do estado do Ceará a fim de
tal de 115 escolas distribuídas por 90
compreendermos a concepção de
municípios (CEARÁ/SEDUC, 2015b). educação defendida por esse mate-
Apesar de as EEEPs serem apre- rial.
sentadas como um projeto de for- A necessidade de compreender,
mação integral, observamos que o de forma mais radical, as políticas
documento norteador da pedagogia educacionais, especificamente às
presente no interior da escola é a voltadas à articulação entre a EPTNM
202
Entretanto, Frigotto (2010, p. 59) Sabemos que o sistema capitalis-
ressalta que o trabalho, além de as- ta passou por diversas configurações
sumir sua forma ontológica, também ao longo da história5, sendo que,
adquiriu diversas formas históricas, atualmente, exibe uma organização
respondendo “às necessidades da pautada nos seguintes pilares: rees-
vida cultural, social, estética, simbó- truturação produtiva, políticas neoli-
lica, lúdica e afetiva” vivenciadas em berais, pensamento pós-moderno e
cada época4. Sob a ordem capitalista, globalização econômica. Esses pila-
o trabalho que, ontologicamente, re- res foram a resposta encontrada pelo
presenta a realização humana – sua capital a fim de superar a própria cri-
emancipação e possibilidade de au- se instaurada no início da década de
tossuperação – passa a ser um fardo, 1970, embora engendrada desde a
se transforma em mais um meio de década anterior.
reprodução e acumulação da riqueza No final dos anos 1960, as gran-
para os capitalistas. Nesse contexto, des potências capitalistas6 viram-se
Marx (2010, p. 83) afirma que o “tra- frente a um quadro de crise, que,
balho não é, por isso, a satisfação segundo Antunes (2009), teve como
de uma carência, mas somente um “expressão mais fenomênica” a crise
meio para satisfazer necessidades do padrão de produção taylorista/
fora dele”. Finaliza seu raciocínio afir- fordista. Segundo esse autor, os tra-
mando que o “o homem (o trabalha- ços característicos que desencade-
dor) só se sente como [ser] livre e ati- aram a crise podem ser resumidos
vo em suas funções animais, comer, da seguinte forma: 1) queda da taxa
beber e procriar, quando muito ain- de lucro, dada, principalmente pelo
da habitação, adorno etc., e em suas aumento do preço da força de tra-
funções humanas só [se sente] como balho; 2) esgotamento do padrão de
animal. O animal se torna humano, e produção taylorista/fordista, dada
o humano, animal” (p. 83). pela incapacidade de responder à re-
4 Fazendo um paralelo com a análise de Lessa e Tonet (2011) sobre as diversas formas assu-
midas pelo trabalho, destacamos que, nas primeiras relações sociais, representadas pelo co-
munismo primitivo, período caracterizado pela ausência de classes sociais, todos trabalha-
vam e usufruíam das benesses produzidas, portanto, o trabalho satisfazia as necessidades
básicas vitais e espirituais do ser humano. Com o desenvolvimento das forças produtivas,
diversas formas de sociedades foram produzidas historicamente, estas, apesar de possuí-
rem características próprias, carregavam como uma de suas características unificadoras a
transformação do trabalho de atividade vital para atividade de aprisionamento do próprio
homem.
204
virtude das modificações do próprio acarretou o processo de desespecia-
processo produtivo dadas pelo avan- lização do trabalhador em troca da
ço científico-tecnológico, pela cons- multifuncionalidade. Em decorrên-
tituição das formas de acumulação cia dessas mudanças, exigiu-se um
flexível, presenciamos fortes con- trabalhador adaptado aos “novos
sequências para os trabalhadores, tempos”, flexíveis, polivalentes, capa-
sua estruturação enquanto classe e zes de trabalhar em equipe, cumprir
sua organização. Segundo Antunes metas, prezar pela “qualidade total”
(2009), observamos uma diminuição das mercadorias (que quanto mais
da classe operária industrial, mas, pa- é alegada, maior é a constatação de
ralelamente, um crescimento signifi- indurabilidade dos produtos), par-
cativo do número de trabalhadores ticipativos e criativos, capazes de se
temporários, terceirizados, precariza- adaptar, de forma rápida, às novas
dos, vinculados à economia informal, modificações impostas pelo sistema
ou seja, passamos a vivenciar maior capitalista (ANTUNES, 2011)
intensificação e superexploração do Diante dessas transformações,
trabalho junto a uma elevada taxa de Ramos (2011) afirma que novos con-
desemprego. ceitos foram convocados para definir
Paralelamente a essa tendência as relações capital-trabalho que es-
apresentada, Antunes (2011) acres- tavam sendo construídas. Entre eles,
centa outra: o chamado processo a noção de qualificação8 foi sendo
de desqualificação dos trabalhado- questionada9 como incapaz de estru-
res de inúmeros setores. Esse autor turar as novas “relações de produção
caracteriza que o modelo de acu- e dos códigos de acesso e permanên-
mulação flexível, que modificou cia no mercado de trabalho” (p. 38).
profundamente o chão de fábrica, Nesse emaranhado, “recupera-se o
10 Reconhecemos que a educação tem uma relação de reciprocidade dialética com o traba-
lho, apesar disso, não podemos desconsiderar que ela está inserida e se relaciona na trama
social com os demais outros complexos existentes (econômico, político, religioso etc.), ou
seja, ela não é determinada de forma aleatória ou agindo de forma redentora sem conexão
com as relações sociais, na realidade, “a totalidade social é a responsável pela produção das
necessidades e das possibilidades relacionadas ao complexo da educação” (LIMA; JIMENEZ,
2011, p. 90). Assim, de acordo com a organização de cada sociedade, é exigido determinado
tipo de formação do indivíduo.
206
Nesse novo contexto, o indivíduo Relatório de Jacques Delors (DELORS,
passa a exercer sua capacidade de 2011) como os princípios pedagó-
escolha, sendo responsável por sua gicos atuais, estão bem articulados
formação, devendo adquirir os meios com essa pedagogia. É a partir des-
que o permita ser mais competitivo se contexto histórico que se engen-
no mercado de trabalho. A escola dra a Tese/TEO como uma proposta
agora é o órgão certificador do sta- educacional, a qual discutiremos no
tus de empregabilidade e não mais a próximo item.
garantia do futuro emprego, “a edu-
cação passa a ser entendida como 3. A TESE/TEO: BREVES CONSIDE-
um investimento em capital huma-
RAÇÕES
no individual que habilita as pessoas
para a competição pelos empregos Após apresentarmos breve con-
disponíveis” (SAVIANI, 2011, p. 430). textualização histórica das trans-
Nesse sentido, Saviani (2011) formações ocorridas na sociedade,
afirma que a luta por um bom sta- como também de algumas mudan-
tus de empregabilidade força o tra- ças teóricas que as sustentaram, prin-
balhador a realizar diversos cursos, cipalmente no campo educacional,
permanecer mais tempo na escola, chegamos ao objeto central de nos-
a fim de escapar da condição de ex- sa análise, a compreensão da nova
cluído. Além da busca pelo emprego proposta de educação profissional
formal, existe uma forte propaganda cearense, ou seja, da Tese/TEO.
do indivíduo empreendedor, do mi- Para conseguirmos chegar à raiz
croempresário, do empreendedor do que fundamenta esse documen-
individual. to, remetemo-nos, inicialmente, a
A partir da discussão, finalizamos suas origens para, dessa forma, com-
a seção apontando que o modelo de preendermos que a Tese é um braço
competências casou perfeitamente da Tecnologia Empresaria Odebrecht
com as novas demandas do sistema (TEO) plantada no seio da educação
capitalista, em que a valorização do e carregada por uma racionalidade
saber se coloca secundária diante da própria de compreensão da realida-
dimensão experimental e comporta- de. Foi difundida por Norberto Ode-
mental, não à toa que os quatro pila- brecht no interior de sua empresa
res da educação, estabelecidos pelo como também por meio de diversas
obras. Hoje é também concretizada
208
A partir do apresentado, reco- qualidade dos relacionamentos que
a pessoa estabelece com os outros.
nhecemos que essa ideologia foi
O “aprender a fazer” desdobra-se na
reestruturada para adentrar ao am- “competência produtiva” e diz res-
biente escolar por meio da Tese/ peito ao desenvolvimento de habili-
dades e destrezas para o mundo do
TEO, com o objetivo, segundo seus
trabalho. Finalmente o “aprender a
formuladores, de solucionar o pro- conhecer” desdobra-se na “compe-
blema da educação formal. Portanto, tência cognitiva” e articula-se com
o modo com que o indivíduo lida
como o próprio documento afirma,
com o conhecimento (SILVA, 2013,
corresponde a uma nova proposta p.116-117).
de educação para a juventude bra-
sileira. Foi elaborada pelo Instituto
Dessa forma, o documento que
de Co-Responsabilidade pela Educa-
rege as EEEPs coloca em ação a ideia
ção – ICE (ICE, 2008) e apresentada
de uma nova proposta educacional
pelo consultor Jairo Machado, tem
que tem como foco central a apren-
59 páginas que relatam como deve
dizagem de competências e valores.
ocorrer a estruturação das escolas
Segundo Silva (2013) e França (2016),
de Ensino Médio em tempo integral
cada um a seu termo, para alcançar
a partir da experiência do Ginásio de
esse objetivo a escola pauta-se numa
Pernambuco.
Educação para Valores e Educação
Após a análise detalhada do do- para o Trabalho. A primeira é pauta-
cumento, percebemos que sua con- da na necessidade de aprimorar o
cepção de educação está assentada indivíduo enquanto pessoa humana,
nos Quatro Pilares da Educação, esta- que seja predisposta à ação e a hon-
belecida no Relatório produzido por rar seus compromissos e responsa-
Jacques Delors para a Unesco – Edu- bilidades; já a segunda, busca uma
cação: um tesouro a descobrir (DE- educação pela ação, possibilitando
LORS, 2011). Segundo Silva (2013), a ao jovem a compreensão da neces-
Tese/TEO desdobra esses quatro pi- sidade de uma formação contínua,
lares em quatro competências, como tornando o indivíduo capaz de as-
podemos observar na citação abaixo: sumir tarefas pontuais e atividades
O “aprender a ser” é desdobrado na mais complexas no ambiente de tra-
“competência pessoal”, é a qualida-
de da relação que a pessoa estabe-
balho. Salientamos, entretanto, que
lece consigo mesma. O “aprender a esses modelos estão pautados nas
conviver” desdobra-se na “compe- transformações constantes do mun-
tência relacional” e leva em conta a
do do trabalho, propondo então um
210
A Tese/TEO assume que, apenas caminhos traçados para o proces-
por meio de um novo modelo de ad- so educativo devem ser tratados de
ministração escolar eficiente e eficaz, forma bastante prática, por meio de
essa concepção teria condições de metas e de relatórios objetivos de
ser efetivada. Dessa forma, propõe avaliação, para que, posteriormente,
a aplicação do modelo de gestão sejam realizados os ajustes necessá-
empresarial baseado no Ciclo PDCA rios. A presença do líder (o gestor)
(Plan – planejar, Do – executar, Check que tem o controle sobre todo o pro-
– verificar/avaliar, Act – agir) na admi- cesso, dos parceiros internos (pro-
nistração das escolas, introduzindo, fessores, que devem vestir a camisa
portanto, teorias e práticas da admi- da escola/empresa), da comunidade
nistração privada do setor empre- (estudantes e suas famílias, são os
sarial no setor educacional público. clientes), do investidor social (poder
Assim, a escola assume outro papel, público e iniciativa privada, que apli-
passando a ser compreendida como cam capital) e dos parceiros externos
uma empresa, cujo principal negócio (comunidade, pais etc.) são funda-
é a educação de qualidade conforme mentais para alcançarem as metas
os preceitos da Tese/TEO. Segundo estabelecidas.
essa racionalidade, a escola deve ge- Dessa forma, o papel do gestor é
rar resultados tanto para a comunida- fundamental na organização da es-
de como para os investidores sociais cola-empresa, pois ele será o perso-
(iniciativa privada), de maneira que nagem essencial na transmissão da
o objetivo central é agregar valor às ideologia presente na Tese/TEO, edu-
fontes de vida (cliente/comunidade cando tanto os professores quanto
e investidor), que são riquezas mo- também os estudantes por meio da
rais e materiais, objetivando a garan- chamada pedagogia da presença. O
tia da satisfação de todos. Segundo gestor, portanto, deve ser um sujeito
Santos, Farias e Freitas (2013, p. 271), bastante presente na vida escolar, de-
“este tipo de parceria público priva- monstrando o compromisso, a dedi-
da é encarada com bons olhos pela cação e o exemplo aos professores e
comissão do relatório de Delors, haja estudantes, para que seja respeitado
vista a defesa dos setores empresa- e seguido. Segundo Dantas (2007),
riais para mercadorizar o ensino”. esse mecanismo é algo bastante uti-
De acordo com a Tese/TEO, nes- lizado nas empresas Odebrecht, sen-
sa concepção de escola-empresa, os do denominado por ele como “culto
11 Segundo Dantas (2007), vários mitos foram cultuados pela empresa, a figura do mestre
de obra tendo como principal representatividade o mestre Bonifácio, em que sua vida na
empresa foi sempre noticiada nos meios de comunicação da empresa. Outra figura foi de
Emílio Odebrecht, pai de Norberto, que foi construída em torno do símbolo da produtivida-
de, da capacidade técnica, de trabalho e da educação. Não poderíamos deixar de comentar
também a figura de Norberto Odebrecht, o idealizador da TEO.
212
preendemos que a tese/TEO é uma educação e participação democrá-
perspectiva de formação humana tica. Salvador: Fundação Odebrecht,
unilateral voltada, principalmente, 2000.
para atender aos anseios do capital.
Inserida, portanto, no projeto socie- DANTAS, Ricardo Marques de Almei-
tário da burguesia. Do lado oposto a da. Odebrecht: a caminho da longe-
esse avanço conservador, encontra- vidade saudável? 2007. Dissertação
mos a defesa de uma formação que (Mestrado)–Universidade Federal do
tem como norte a omnilateralidade, Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro,
base da proposta de Ensino Médio 2007.
Integrado à Educação Profissional
DELORS, Jacques. Educação: um te-
Técnica de Nível Médio (EMI), cujos
souro a descobrir. Relatório para a
fundamentos estão na concepção
UNESCO da comissão Internacional
de politecnia e de escola unitária, na
sobre educação para o século XXI.
perspectiva da formação humana in-
São Paulo: Cortez, 1998.
tegral.
Finalizamos, portanto, afirmando FRIGOTTO, Gaudêncio. Concepções e
que, diante desse forte avanço con- mudanças no mundo do trabalho e o
servador e levando em consideração ensino médio. In FRIGOTTO, Gaudên-
a realidade socioeconômica e edu- cio; CIAVATTA, Maria; RAMOS, Mari-
cacional brasileira, precisamos conti- se (Org.). Ensino Médio Integrado:
nuar lutando para colocar na ordem concepções e contradições. 2. ed.
do dia a defesa de Ensino Médio que São Paulo: Cortez, 2010.
garanta uma base unitária, tendo por
HARVEY, David. O neoliberalismo:
eixo estruturante o trabalho, a ciên-
história e implicações. São Paulo: Edi-
cia, a tecnologia e a cultura.
ções Loyola, 2014.
214
SAVIANI, Dermeval. História das
idéias pedagógicas. História das
ideias pedagógicas no Brasil. Cam-
pinas/SP: Autores Associados, 2011.
E-mail: eneida.monteiro@ifgoiano.edu.br
216
transformação. Diante de tal percep- pesquisadores e professores, na pers-
ção, requer-se uma prática pedagó- pectiva de formação crítico-reflexiva,
gica pautada na valorização das ex- que, por pressuposto, reverterá na
periências pessoais dos estudantes, melhoria do ensino” (FRANCO, 2016,
sejam elas acadêmicas ou de vida. p.513).
Tal proposta, desloca a atenção das Portanto, essa proposta faz parte
atividades de ensino para os resulta- de um plano de ação que visa, além
dos das aprendizagens dos sujeitos e da integração das disciplinas, o forta-
compreende o docente como um fa- lecimento do trabalho coletivo entre
cilitador e o estudante como sujeito os docentes, e também estratégias
ativo do processo de ensino-apren- de um ensino investigativo com ên-
dizagem (BRASIL, 2013). fase na resolução de problemas a
Nessa perspectiva, o presente partir de um tema gerador. Cons-
trabalho tem por objetivo avaliar a tituindo-se uma nova proposta de
experiência de uma proposta de in- conceber o conhecimento e a forma-
tegração curricular no ensino médio ção humana na concepção freireana:
integrado a partir de depoimentos “só existe saber na invenção, na rein-
de professores e estudantes parti- venção, na busca inquieta, impacien-
cipantes em todo processo, à luz da te, permanente, que os homens fa-
pesquisa-ação-participativa. Optou- zem no mundo, com o mundo e com
se por essa metodologia de pesquisa os outros” (FREIRE, 1993, p.58). Esses
por permitir a articulação da produ- são fundamentos básicos para o de-
ção de conhecimentos com a prática senvolvimento do Projeto Integrador
educativa, sendo possível ao mesmo que constitui a temática em questão.
tempo investigar a realidade e reali- Nesse contexto, considera-se o
zar o processo educativo necessário Projeto Integrador como uma estra-
ao enfrentamento dessa mesma re- tégia pedagógica de caráter inter-
alidade. Assim, toda pesquisa-ação disciplinar. O tema do projeto cor-
tem caráter formativo, na qual, obje- responde a um eixo do currículo que
tiva-se também a formação pedagó- articula as disciplinas e suas ementas
gica dos sujeitos da prática. Também para integração, mobilização e apli-
por valorizar o diálogo entre as pes- cação de conhecimentos que contri-
soas, e tornar o trabalho “participa- buam com a formação de uma visão
tivo, colaborativo, pedagógico, entre mais abrangente no decorrer do per-
218
de concretização da interdisciplinari- “O ensino médio, concebido como
educação básica e articulado ao
dade, Moura (2007), sugere:
mundo do trabalho, da cultura e
[...] a implementação de projetos da ciência, constitui-se em direito
integradores que visam, sobretudo, social e subjetivo e, portanto, vincu-
articular e inter-relacionar os sabe- lado a todas as esferas e dimensões
res desenvolvidos pelas disciplinas da vida. Trata-se de uma base para
em cada período letivo, contribuir o entendimento crítico de como
para a autonomia intelectual dos funciona e se constitui a sociedade
alunos, por meio da pesquisa, assim humana em suas relações sociais e
como formar atitudes de cidadania, como funciona o mundo da nature-
de solidariedade e de responsabili- za, da qual fazemos parte. Dominar
dade social. no mais elevado nível esses dois âm-
[...] potencializando o uso das tecno- bitos é condição prévia para cons-
logias com responsabilidade social, truir sujeitos emancipados, criativos
sendo, portanto, contextualizado a e leitores críticos da realidade onde
cada realidade específica (MOURA, vivem e com condições de agir so-
2007, p. 24). bre ela. Este domínio também é
condição prévia para compreender
e poder atuar com as novas bases
técnico-científicas do processo pro-
Desse modo, as práticas educati- dutivo”(FRIGOTTO, 2005, p.76).
vas de integração curricular no ensi-
no médio integrado busca também
transferir a centralidade do ensino, O pressuposto de integração to-
predominantemente focada no mer- mado no trabalho aqui apresentado
cado de trabalho, de forma imediatis- foi feito a partir de temas e pesquisas
ta, para uma formação humana com decididos pelos estudantes. Em no-
foco no sujeito e no conhecimento, vembro de 2016, realizou-se uma dis-
numa concepção de “Escola Unitá- cussão com os estudantes, na época
ria”, proposta por Gramsci, que visa ainda matriculados na primeira série
formar os trabalhadores de maneira do curso Técnico em Meio Ambiente
integral, instrumentalizando-os para Integrado ao Ensino Médio, a fim de
o exercício da profissão e o domí- se elencar problemas regionais re-
nio das técnicas, dando-lhes acesso levantes. A maioria apontou para a
ao conhecimento geral produzido problemática do lixo, a partir do qual
pela humanidade e preparando-os definiu-se o tema “O Lixo nas Cida-
para serem os novos dirigentes da des”, que funcionou como um eixo
sociedade. Nesse contexto, Frigotto articulador, por meio do qual foram
(2005) ressalta: desenvolvidas unidades temáticas,
dentre elas: impactos ambientais,
220
Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3
Analisar a relação
do ser humano
com a natureza, as
Conhecer o processo de Criação de maque-
relações sociais de
Proposta compostagem e doenças tes a partir de ma-
trabalho e susten-
associadas ao lixo. teriais recicláveis.
tabilidade com
base no filme “Lixo
Extraordinário”.
222
2.3 Reflexão sobre a prática ensino-aprendizagem na perspecti-
va politécnica se efetive” (OLIVEIRA;
A avaliação do projeto por parte MACHADO, 2012, p. 24).
dos estudantes foi realizada pelas
Os estudantes também elogia-
turmas e relatada pelos seus repre-
ram a relação com os demais cole-
sentantes através de duas formas
gas, uma vez que boa parte das ati-
distintas: durante o conselho de
vidades de pesquisa e prática foram
classe do segundo bimestre e através
executadas em grupos. Como o tema
de depoimentos tanto de estudantes
trabalhado foi “O Lixo nas Cidades”,
quanto de professores participantes.
os estudantes ponderaram a impor-
Em relação ao relato no conselho tância de aplicar conhecimentos no
de classe, ambas as turmas e alguns contexto local (cidade) e também
professores, considerando os mes- pessoal (no lar), envolvendo separa-
mos aspectos, relataram que houve ção de lixo, reciclagem, composta-
falta de clareza no repasse de infor- gem, dentre outros.
mações por parte de alguns profes-
Os estudantes tambeḿ destaca-
sores e também pouco tempo para
ram a importância de se perceber as
execução das atividades propostas.
relações que os seres humanos têm
Contudo, ficaram surpreendidos
com o lixo, sendo ela na forma de
com os resultados, destacando de
aprendizado, na forma econômica
forma positiva a participação, a co-
(retirando o sustento familiar através
operação e o comprometimento
do lixo) e nas relações de trabalho,
dos grupos de trabalho, sendo es-
enfatizando a vida dos catadores.
tes, fatores determinantes para que
Após a finalização do projeto, ficou
os objetivos fossem cumpridos e as
claro no discurso dos estudantes o
metas alcançadas. Da mesma for-
quanto a prática foi importante para
ma, os estudantes perceberam que
agregar conhecimento para o mun-
os conteúdos abordados nas disci-
do do trabalho.
plinas não precisam ser distantes
do mundo real e prático no qual se Quanto aos professores, muitos
inserem; podem explicar o dia-a- elogiaram o tema abordado, dada
dia, o que agrega muito mais valor sua importância no contexto social
ao conhecimento. Por este enfoque, e político regional, além de ser um
“contextualizar o conhecimento é tema articulador que leva a diversas
importante para que o processo de discussões, muitas de âmbito inter-
224
Portanto, dada a possibilidade de do desenvolvimento de produtos
articulação da educação básica com tecnológicos na área de formação
a educação profissional na perspec- profissional e inúmeras outras ativi-
tiva da educação integrada, como dades que contribuem para o reco-
um projeto de sociedade, faz-se ne- nhecimento institucional e social.
cessário pensar formas de integração
curricular e, com isso, novas formas REFERÊNCIAS
de organização do trabalho pedagó-
gico, de planejar e de ensinar para BRASIL. Diretrizes Curriculares Na-
que, de fato, a escola seja vista como cionais da educação Básica. Mi-
um agente transformador da socie- nistério da Educação. Secretaria de
dade. Educação Básica. Secretaria de Edu-
cação Continuada, Alfabetização,
Essa nova proposta de projetos
Diversidade e Inclusão. Secretaria de
integradores de disciplinas traz tam-
Educação Profissional e Tecnológi-
bém a possibilidade de integrar a
ca. Conselho Nacional da Educação.
vida do estudante ao projeto político
Câmara Nacional de Educação Bá-
pedagógico da instituição. Suas ex-
sica. Brasília, 2013. Disponível em:
periências de vida do cotidiano, sa-
<http://portal.mec.gov.br/index.
beres que antes eram desprezados,
php?option=com_docman&view=-
passam a ser valorizados por terem
download&alias=15547-diretri-
relação com as aprendizagens em
zes-curiculares-nacionais-2013-pd-
construção, criando vínculo de per-
f-1&Itemid=30192> Acesso em: 07
tencimento por parte dos estudan-
ago.2016..
tes em relação ao curso, por encon-
trar relação entre a teoria e a pŕatica CASTELLS, Manuel. A era da infor-
no mundo real e possibilidades de mação: economia, sociedade e cul-
inferência na sua própria realidade. tura. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
É nesse movimento do currículo
FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pes-
integrado que o Projeto Integrador
quisa-Ação Pedagógica: práticas
sinaliza para a formação humana do
de empoderamento e de participa-
estudante a partir do trabalho cole-
ção. ETD - Educação Temática Di-
tivo, da pesquisa sistematizada, do
gital, Campinas, SP, v. 18, n. 2, abr./
envolvimento do corpo docente,
jun. 2016. ISSN 1676-2592. Disponí-
da adoção de escrita normatizada,
vel em: <https://periodicos.sbu.uni-
226
POLÍTICA EDUCACIONAL E POLITECNIA:
A EXPERIÊNCIA DO RIO GRANDE DO SUL
José Clovis de Azevedo 1
1
Centro Universitário Metodista IPA. Programa de mestrado
em Reabilitação e Inclusão.
E-mail: clovisazevedo45@gmail.com
228
se nos seguintes princípios nortea- (2008, p. 85-86), qualidade implica
dores: planejamento coletivo, arti- também “aumentar o tempo dedi-
culação interdisciplinar do trabalho cado ao aprendizado, melhorar a
pedagógico entre as grandes áreas assiduidade e aumentar o número
do conhecimento (Ciências da Natu- de horas-aula do nível atual de 3-4
reza; Ciências Humanas; Linguagens; horas para 5-6 horas por dia.” A car-
Matemática), trabalho como princí- ga horária do EM aumentou de 2.400
pio educativo, pesquisa como prin- para 3.000 horas. O EM foi organiza-
cípio pedagógico, avaliação eman- do em três modalidades: o Ensino
cipatória e politecnia como conceito Médio Politécnico, não profissionali-
estruturante do pensar e fazer, rela- zante; a Educação Profissional Inte-
cionando os estudos escolares com o grada, profissionalizante; e o Normal
mundo do trabalho (SEDUC, 2011). A (Magistério).
reforma enfatizou, ainda, a qualidade A nova estrutura curricular im-
com permanência e aprendizagem, a plantada define-se como interdis-
redução da repetência e do abando- ciplinar e tem a pesquisa como
no. Como um dos pressupostos para princípio pedagógico e o Seminário
a qualidade, houve o aumento do Integrado (SI) como novo espaço.
tempo escolar, pois, segundo Costa
230
do Barbosa (2009), há concepções ção é uma relação de identidade. Os
e práticas que não dialogam com o homens aprendiam a produzir sua
universo social e cultural vivido pela existência no próprio ato de produ-
juventude e, muito menos, com os zi-la.” A separação entre educação e
avanços científicos e tecnológicos trabalho consolida-se na Revolução
do nosso tempo (KUENZER, 2007). Os Industrial, a partir do século XVIII,
fundamentos epistemológicos pre- adquirindo a forma contemporânea.
dominantes como pressupostos das A partir daí, a escola separa-se em
práticas pedagógicas, ainda, são, em duas vias: a preparação específica
grande parte, condicionados pelos dos trabalhadores para funções téc-
princípios positivistas e mecanicis- nicas, a preparação intelectual das
tas, reforçados pela cópia da organi- classes privilegiadas para formar diri-
zação escolar do modelo taylorista- gentes e para produzir a ciência que
fordista de organização do trabalho vai alimentar o aprofundamento do
(AZEVEDO, 2007). Tais pressupostos trabalho abstrato. Kuenzer (2007)
legitimam um currículo engessa- destaca que a divisão entre trabalho
do, fragmentado, com programas manual e intelectual foi aprofunda-
de conteúdos sem conexões com o da e solidificada com a organização
mundo real. científica do trabalho, conforme as
concepções taylorista/fordista que
3. EDUCAÇÃO E TRABALHO: OS hegemonizaram o trabalho fabril no
século passado. A divisão do traba-
DESAFIOS DA INTEGRAÇÃO
lho aprofundou a separação entre
A política educacional da Sedu- educação e trabalho. Operou a cisão
c-RS (2011) propôs o ensino politéc- entre a atividade intelectual e as ati-
nico como possibilidade para uma vidades humanas laborais (GRAMS-
formação que busque o domínio CI, 1978). A concepção burguesa de
intelectual dos fundamentos cien- educação separou os homens em
tíficos que sustentam os processos dois grandes campos conforme ca-
técnicos e produtivos. O conceito racteriza Saviani (2007, p. 159): “[...]
de educação politécnica implica co- aquele das profissões manuais para
nhecer os nexos e as rupturas entre as quais se requeria uma formação
educação e trabalho. Para Saviani prática limitada à execução de tare-
(2007, p. 155), “[...] no ponto de parti- fas mais ou menos delimitadas, dis-
da, a relação entre trabalho e educa- pensando-se o domínio dos respec-
232
poder e de exclusão, mas como insu- objetivo apenas melhorar os índices
mo para superação dos problemas de aprovação. A avaliação, entretan-
de ensino e de aprendizagem, ten- to, aparecia como controle, seleção,
do por foco a busca do sucesso do disciplinamento e classificação dos
aprendiz (SEDUC-RS, 2012). Essa con- considerados melhores, mas essas
cepção foi caracterizada na sua pro- posições receberam contrapontos
posição como uma avaliação eman- importantes durante o processo, per-
cipatória. Avaliar para perceber quais dendo força com a qualificação das
as reações pedagógicas necessárias discussões, possibilitadas pela inten-
para a garantia da democratização sa política de formação desenvolvi-
do acesso ao conhecimento. da pela Seduc-RS nos quatro anos
Essas propostas provocaram da gestão. Apesar das dificuldades,
uma discussão de mudança de pa- houve avanços na identificação da
radigma que gerou conflitos com a avaliação emancipatória na perspec-
cultura escolar tradicional, baseada tiva caracterizada por Saul (1998, p.
nas referências mecanicistas, tecni- 68): “O compromisso principal desta
cistas e no padrão taylorista-fordista avaliação é fazer com que as pessoas
de organização da escola. As reações direta ou indiretamente envolvidas
revelaram as representações e as de- em uma ação educacional escrevam
fesas dos signos e símbolos que sus- ‘a sua própria história’ e gerem suas
tentam o senso comum da cultura próprias alternativas de ação”.
escolar tradicional, expressos, princi- Outra reação importante foi dos
palmente, nas práticas de avaliação dirigentes sindicais dos professores.
seletiva e classificatória e no trabalho O sindicato não acompanhou a dis-
disciplinar e fragmentado. cussão junto com as escolas, pois
A insatisfação de segmentos dos negou-se a fazê-la, traduzindo sua
professores foi mais acentuada em posição na alegação de que a refor-
relação à avaliação emancipatória. ma visava “formar mão de obra ba-
As falas revelavam a força das con- rata para os empresários.” A posição
cepções utilitaristas da formação do grupo dirigente foi balizada pela
humana. A reação não apresentava disputa partidária com o governo,
um contraponto teórico à proposta condicionando o exame de qualquer
de mudança. A alegação era de que proposta ao pagamento imediato do
a política do governo tinha como Piso Salarial Nacional. A direção sin-
dical, composta de militantes de par-
234
5. ALGUNS PONTOS DE IMPACTO de nas ações pedagógicas. Segundo
Alves (2014, p. 105), “[...] um dos pres-
SOBRE A CURVA HISTÓRICA DES-
supostos da proposta, a autonomia
CENDENTE dos estudantes, foi algo possível de
Na sua fase inicial, a Reforma vi- observação, que se efetivou.” O Se-
veu momentos de conflitos e ten- minário Integrado tornou-se um es-
sões. Todos os estudos realizados a paço importante de diálogo com o
partir de 2012, porém, revelam avan- interesse de aprendizagem dos estu-
ços. Em 2014, já haviam 38 trabalhos dantes. Embora não supere todos os
acadêmicos publicados (RIBEIRO, marcos do pensamento acrítico, do
2016). Uma das marcas da experiên- senso comum e da associação linear
cia foi o trabalho intenso de forma- da educação com o mercado, desen-
ção continuada em serviço oportu- cadeou-se um processo de reflexão
nizada aos professores, em estreita e autonomia entre os educandos.
colaboração com as universidades O trabalho de iniciação à pesquisa
(SEDUC-RS, 2014). Este passo signi- como inerente ao ensino é indicador
ficativo de cooperação entre REE-RS de um novo paradigma, ainda que
e as universidades foi facilitado pela incipiente. As pesquisas referencia-
política do governo federal, concre- das acima ainda destacam a ressigni-
tizada no Pacto pela Melhoria do EM ficação dos conteúdos, tornando-os
(BRASIL, 2013). mais próximos e estabelecendo seus
vínculos com a realidade vivida pelos
O quadro contraditório de dificul- estudantes, sujeitos reais das apren-
dades e avanços é detectado pelas dizagens. Este foi um aprendizado de
pesquisas de Alves (2014) e Ribeiro parte dos professores, sobretudo os
(2016). Ambos destacam a resistên- mais envolvidos com o SI. Ainda que
cia de parte dos educadores, das não tivessem o aprendizado da pes-
adversidades estruturais das escolas, quisa em sua formação inicial, mui-
das alegações de falta de discussão e tos professores aceitaram o desafio e
da alegada imposição do projeto por apropriaram-se das metodologias de
parte do governo. Todavia esses es- pesquisa nas formações continuadas
tudos também destacam os pontos (ALVES, 2014). O protagonismo dos
em que o processo produziu novos educandos corresponde, também, a
comportamentos e práticas que am- um protagonismo dos educadores
pliaram o protagonismo da juventu- que, gradativamente, ultrapassam a
236
A pesquisa destaca que, entre o interdisciplinares com projetos de
segundo semestre de 2013 e 2014, pesquisa chegam a 82% das esco-
houve um aumento na adesão à pro- las; 57% das escolas fazem saídas de
posta. Isto se deu pelo avanço no campo para realizar pesquisas.
processo de formação em serviço, Apesar de a política educacional
nos debates mais intensos e apro- da Seduc-RS questionar as avaliações
fundados, melhorando a compre- externas centrada em resultados,
ensão e a percepção da proposta. prestando-se para os rankings e com-
Segundo Ribeiro (2016), quase a to- parações artificiais feitas pela mídia,
talidade das mais de mil escolas de a REE-RS melhorou seus resultados
EM participaram do EM Inovador e nestas avaliações (SEDUC, 2014). No
aderiram ao Pacto pela Melhoria do Índice de Desenvolvimento Educa-
EM, programas do MEC de apoio ao cional Brasileiro (Ideb), a REE-RS ocu-
EM. O estudo aponta também dados pava o 11º lugar em 2011. Em 2013,
quantitativos significativos: 81% das passou para a 2ª colocação entre as
escolas utilizam a pesquisa na cons- redes públicas do Brasil. Nesta mes-
trução do conhecimento; as práticas
238
- Universidade do Vale do Rio dos Si- Diretrizes Curriculares Nacionais para
nos, Programa de Pós-Graduação em o Ensino Médio. Brasília, DF, 2012.
Educação, São Leopoldo, 2014.
______. MEC. Resolução CNE/CEB
AZEVEDO, Jose Clovis de; REIS, Jonas nº 6, de 20 de setembro de 2012.
Tarcísio (Org.). Reestruturação do Define Diretrizes Curriculares para a
Ensino Médio: pressupostos teóri- Educação Profissional e Técnica de
cos e desafios da prática. São Paulo: Nível médio. Brasília, DF, 2012.
Santillana, 2014
______. MEC. Pacto Nacional pelo
______. Reconversão cultural da Ensino Médio: Formação de Profes-
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SEB, 2013.
BARBOSA, Ericka Fernandes. Políti-
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a Juventude Brasileira. Dissertação Públicas de Educação e o Ensino Mé-
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dade de Brasília (UnB), Brasília, 2009. cação, Porto Alegre, v. 21, n. 2, p. 83-
121, jan./jun. 2008.
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Decreto nº 2.208, Brasília DF, 14 de FRIGOTTO, Gaudêncio. Sujeitos e co-
abril de 1997. nhecimento: os sentidos do ensino
médio. In:
______. Presidência da República.
Decreto nº 5.154, Brasília DF, 23 de FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M. (Org.).
julho de 2004. Ensino Médio: ciência, cultura e tra-
balho. Brasília: MEC/Semtec, 2004. p.
______. Presidência da República. 53-70.
Lei nº 11.494. Brasília DF, 20 de ju-
nho de 2007. FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA,
Maria; RAMOS, Marise. Apresenta-
______. Congresso Nacional. Lei ção. In: ______. (Org.). Ensino Médio
nº11.741, Brasília DF, 16 de julho de Integrado: concepções e contradi-
2008. ções. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2010.
p. 07-20.
______. MEC. Resolução CNE/CEB
nº 2, de 30 de janeiro de 2012. Define
240
abandono, repetência e aprovação
no Ensino Fundamental e Ensino Mé-
dio da Rede Estadual de Ensino do
Rio Grande do Sul. Seduc-RS: Porto
Alegre, 2012.
242
Partimos do pressuposto de que se traduz em uma oferta de ensino
existem experiências de ensino mé- médio público massificada e desqua-
dio integrado que podem ser obser- lificada,e, do outro lado, os projetos
vadas como referência para a oferta vinculados aos movimentos sociais
de ensino médio público no Brasil. que apontam para um ensino médio
Neste sentido, organizamos a in- qualificado como direito do cidadão
vestigação, evidenciando as dificul- e de responsabilidade do Estado.
dades experimentadas pelo ensino Vale reforçar que estas disputas
médio integrado no IFRS, bem como têm algumas questões de fundo.
destacando traços que lhe impulsio- Uma destas é a perspectiva de refor-
nam neste instituto. ço, ou de enfretamento à dualidade
que historicamente caracteriza a
2. O ensino médio integrado educação básica, em especial a de
no IFRS como componente de nível médio. Tal dualidade materia-
uma complexa totalidade liza-se em um modelo de educação
voltado para o imediatismo do tra-
Acreditamos que na atualidade, balho (para os filhos da classe tra-
o EM, fundamentalmente na escola balhadora), e outro voltado para a
pública, está em evidência e em dis- continuidade dos estudos com viés
putas. Disputas estas que estão en- acadêmico (para os filhos das classes
raizadas historicamente e que se es- abastadas). O projeto dual de educa-
tabelecem a partir das contradições ção possui sua base na divisão social
das políticas públicas de educação do trabalho e recebe condicionantes
no Brasil. Vale ressaltar que durante históricos de classe sociais, culturais
a realização da pesquisa ainda não e entre outros (KUENZER 2007). Ain-
se tinha a aprovação da contra re- da, a dualidade está vinculada a um
forma do ensino médio, algo que, projeto de sociedade com objetivos
obviamente, proporciona novos ele- específicos de formação de um ser
mentos no cenário das disputas em humano que se adeque ao modelo
torno desta etapa da educação bási- burguês de sociedade e ao projeto
ca (MOTTA, CARDOSO e FRIGOTTO, hegemônico desta classe social (FRI-
2017). GOTTO, 2010). Assim, as propostas
As disputas em trono do ensino de ensino médio vinculadas ao ca-
médio apresentam, de um lado, os pital buscam a manutenção da du-
projetos vinculados ao capital que alidade, enquanto os projetos dos
244
te calcado na formação humana in- que, consequentemente, se estabe-
tegral e no trabalho como princípio lecem como contrapondo a dualida-
educativo, criaram caminhos para a de. Defendemos que a positividade
concretização de um ensino médio de tais experiências criam possibili-
que enfrente a dualidade. Ainda, dades para o ensino médio público
cabe mencionar as novas Diretrizes deste país.
Curriculares do Ensino Médio (BRA- Finalmente, verificamos o en-
SIL, 2012) que referendaram os prin- sino médio integrado no IFRS como
cípios da integralidade da formação componente desta complexa totali-
humana para a etapa final da educa- dade em que o EM encontra-se em
ção básica. evidência e disputas. No entanto,
Assim, para impedir o fortaleci- para que o ensino médio integrado
mento de propostas como as conti- se consolide como uma alternativa
das nestes documentos, alardeia-se à dualidade e possa se apresentar
a crise no ensino médio para poder como uma perspectiva para o ensi-
intervir com o objetivo de aproxi- no médio das diferentes redes pú-
mar a escola pública às organizações blicas, ele precisa se fortalecer nas
privadas, e encaminhar proposições instituições em que se concretiza,
que direcionem o ensino médio para reconhecendo as suas dificuldades
uma formação dual (não integral), e consolidando os traços que lhe im-
seja ela acadêmica, ou técnica. pulsionam.
Pensamos que para enfrentar as
dificuldades - como evasão, repe- 3. Obstáculos e potencialida-
tência, currículos desconectados da des do ensino médio integrado
realidade da juventude, entre outras no IFRS
– que não exclusivas das redes pú-
blicas, é preciso fortalecer o ensino É evidente que nos IFs, incluindo
médio público com investimento de o IFRS, o ensino médio integrado tem
todas as ordens. Além disso, devem- de transpor alguns obstáculos para o
se reconhecer experiências que ca- seu efetivo fortalecimento. Um des-
minham para formação humana in- ses é a diversidade de oferta de edu-
tegral e no trabalho como princípio cação profissional que são possíveis
educativo (acreditamos que o ensino aos Institutos, de acordo com a sua
médio integrado seja uma dessas) e lei de criação (Brasil, 2008).
246
tensos debates em torno de concep- Além das questões em torno do
ções de educação profissional. As- dilema da oferta de vagas, existem
sim, possivelmente, a alternativa que outros obstáculos que o ensino mé-
se encontrou em tal cenário foi o de dio integrado tem que transpor para
colocar os 50% de oferta para EMI. que os seus fundamentos da forma-
utilizando o termo prioritariamente, ção humana integral e o trabalho
tirando assim a obrigatoriedade da como princípio educativo se estabe-
oeferta. Tal fragilidade é mais um dos leçam no IFRS.
limites que o ensino médio integra- Um deles é a carente formação
do encontra no IFRS. inicial e continuada dos servidores
Para finalizar, sobre a oferta de (técnico-administrativos em educa-
vagas do IFRS, acreditamos que é ção e docentes para a prática do in-
preciso reforçar a ideia de que a tegrado). Certamente as dificuldades
Rede Federal de Educação Profissio- relativas à carência de formação dos
nal e Tecnológica tem uma tradição docentes não é uma exclusividade
de oferta reconhecidamente qualifi- do IFRS, algo que não diminui a in-
cada de ensino médio, o que não é tensidade deste obstáculo. Desta-
pouco se forem levadas em conta as camos que na pesquisa pudemos
dificuldades encontradas na oferta perceber que existe certo desconhe-
do ensino público de nível básico no cimento, inclusive entre os gestores,
Brasil. Consideramos que os Institu- sobre as legislações referentes à edu-
tos Federais não podem encaminhar cação básica. Salientamos que gran-
sua oferta de cursos de forma des- de parte do quadro de docentes do
comprometida com a realidade do IFRS, em sua maioria mestres e dou-
ensino médio no Brasil. Mais do que tores, têm a sua primeira experiência
isso, tem que se perceber que a etapa na educação básica ao ingressar no
final da educação básica, como tem instituto. Isso pode ter relação com
sido dito, encontra-se em contexto em um desconhecimento quanto
peculiar, sendo alvo de disputas de às questões conceituais que funda-
projetos educacionais e societários. mentam o ensino médio integrado,
Como os IFs originam-se de uma verificado ao longo da pesquisa.
política pública de educação, esses Logo, o nosso estudo verificou a
aspectos devem ser ponderados no necessidade de institucionalizarem-
momento de se encarar os dilemas se espaços de formação continuada
em torno da oferta de vagas. entre os profissionais da educação
248
mana integral e o do trabalho como Por outro lado, ao mesmo tem-
princípio educativo no IFRS. Con- po em que consideramos este GT
cordamos com Dante Moura (2013) como um germen importante para o
quando argumenta que é preciso dar EMI, acreditamos que se deve avan-
destaque não apenas ao que dificul- çar. Esta ação da PROEN encontrará
ta a materialização do ensino médio limitações, caso não sejam acompa-
integrado, mas também a “busca, nhadas por outras ações, inclusive
por meio da contradição, identificar de outras Pró-reitoras. Neste sentido,
os germens que podem estar contri- é necessário que a gestão do IFRS,
buindo para a materialização dessa como um todo, tome atitudes rela-
concepção de formação humana” cionadas à infraestrutura, gestão de
(MOURA, 2013, p.112). Logo, estes pessoas, política de ingresso de do-
germens são parte do processo con- centes, financiamento e entre outras
traditório que se estabelece ao lon- questões que considerem as peculia-
go da práxis de construção do ensino ridades do ensino médio integrado.
médio integrado. Percebemos, ao longo da pes-
Percebemos alguns desses ger- quisa, traços que indicam o fortale-
mens do ensino médio integrado nas cimento do ensino médio integrado
ações da gestão do IFRS. Algumas na prática dos docentes, sejam estas
atitudes da Pró-Reitoria de Ensino individuais ou coletivas. Em vários
(PROEN), como a referida criação de momentos da pesquisa, identifica-
um Grupo de Trabalho com repre- mos fazeres docentes (mesmo que
sentantes de diferentes campi para em muitos casos pontuais) indican-
repensar e agir sobre o ensino médio do uma relativa abertura dos profes-
integrado neste instituto, podem ser sores para ações pedagógicas dife-
consideradas como potencializado- renciadas que fortalecem a formação
ras desta forma de EM no IFRS. Veri- humana integral e o trabalho como
ficamos que este espaço de ação e princípio educativo.
reflexão sobre o ensino médio inte- Neste sentido, destacamos o
grado trouxe alguns resultados con- exemplo de uma professora de edu-
cretos, como a previsão de práticas cação física de um determinado cam-
integradoras nos projetos pedagó- pus do IFRS que, em parceria com
gicos de curso de alguns campi que outros colegas, desenvolvia, entre
antes não previam. 2011 e 2015, conhecimentos sobre
250
co dos estudantes do ensino médio instituição. Assim, percebemos entre
integrado na maior parte dos campi os pesquisadores e os extensionistas
foi claramente perceptível ao longo potenciais germens de uma forma-
da pesquisa. ção integral e do trabalho como prin-
Entendemos que, ao participar da cípio educativo. Logo, precisam ser
vida política da sua instituição, o es- aprimoradas para que constituam
tudante do IFRS sente-se parte deste vínculos orgânicos com as propostas
espaço. Assim, estabelece reflexões pedagógicas dos cursos de ensino
críticas sobre a sua realidade esco- médio integrado.
lar e tenta intervir sobre ela. Neste Verificamos que as atividades
sentido, ao se perceber como sujeito de pesquisa e extensão, incluindo
atuante da sua realidade e verifican- as culturais, se concretizavam como
do que esta pode ser modificada a ações paralelamente à proposta pe-
partir da sua intervenção, está se po- dagógicas dos cursos do IFRS, quan-
tencializando alguns dos pilares do do da ocorrência deste estudo. Estes
trabalho como princípio educativo, projetos timidamente se relacionam
apontado no já citado Documento com as atividades de sala de aula.
Base (BRASIL, 2007). Na sua maior parte são propostas
As atividades de pesquisa e de por docentes agregando um grupo
extensão também são vivenciadas de estudantes (voluntários ou com
com intensidade pelos estudantes bolsistas) e assim possibilitando a
do ensino médio integrado no IFRS. este grupo tal experiência. Neste ce-
Salientamos que os jovens, que par- nário, uma parcela de estudante fica
ticipam de tais atividades, constroem de fora da pesquisa e da extensão.
itinerários formativos diferenciados Logo, dentro de um mesmo curso e
ao terem contatos com experiências de uma mesma forma de ensino mé-
acadêmicas e vivências pessoais sig- dio, oportuniza-se uma formação de-
nificativas que contribuem decisiva- sigual para os jovens.
mente em sua formação. Reforçamos o nosso reconheci-
Salientamos que o intenso envol- mento do protagonismo dos estu-
vimento dos estudantes do EMI nas dantes de ensino médio integrado
atividades de pesquisa e extensão na pesquisa e na extensão do IFRS,
faz com que o ensino médio integra- no entanto, observamos que se pre-
do impulsione estas atividades na cisa aprimorar tal protagonismo, de
252
Algumas práticas - como entre- dessas que devem ser pensadas
ga de resultados, reuniões com pais considerando as peculiaridades do
para tratar de assuntos das turmas, ensino médio integrado de modo a
comunicados ou chamamentos dos fortalecê-lo. Esta referida complexi-
responsáveis pelos estudantes - são dade de forma alguma deve desen-
corriqueiras na educação básica e corajar a ocorrência do ensino médio
ocorrem com frequência nos cursos integrado. Ao contrário, os potencias
de ensino médio integrado do IFRS. e os obstáculos do EMI no IFRS têm
Aproximar a instituição da sua co- que ser percebidos como um apren-
munidade é fundamental para que dizado necessário e que podem ser
se conheça a realidade local e, desta referências para as demais redes pú-
forma, se construa algo que é central blicas.
na política dos IFs, o compromisso De todos os avanços na prática
com os territórios onde se está inseri- do integrado percebidos ao longo
do (BRASIL, 2008). Reafirmamos que da pesquisa, o que dá esperança
no IFRS, se comparada com as outras para quem acredita nesta forma de
ofertas de curso, a aproximação en- ensino médio é o fato de que, mes-
tre a escola e a comunidade encontra mo com todas as suas contradições,
maior força no ensino médio integra- o integrado do IFRS não tem como
do. prioridade a formação de mão obra
para as necessidades urgentes do
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS mercado. Assim, ao longo da pesqui-
sa percebemos ações com potencial
Os elementos encontrados na
para a integração entre as dimensões
experiência do IFRS, estudados por
da vida (o trabalho, a ciência, a tec-
esta pesquisa, apontam a comple-
nologia e a cultura). Logo, existem no
xidade que envolve uma política de
ensino médio integrado pesquisado
educação como a do ensino médio
alguns enfrentamentos a dualidade.
integrado. O conjunto de ações que
são necessárias para a sua consoli- Neste sentido, verificamos que a
dação, como vem se argumentando, experiência do ensino médio inte-
tem que envolver diversas políticas, grado no IFRS contribui como uma
internas e externas ao IFRS. Gestão possibilidade para outro ensino mé-
de pessoas, formação docente e as- dio público no Brasil. Tal experiên-
sistência estudantil são algumas cia evidencia que é possível a cons-
254
diretrizes e bases da educação nacio- ção dos Profissionais da Educação,
nal, e dá outras providências. Diário a Consolidação das Leis do Trabalho
- CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no
Oficial da União, Brasília, 2004. Dispo-
nível em: <http://www.planalto.gov. 5.452, de 1o de maio de 1943, e o De-
br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2004/ creto-Lei no 236, de 28 de fevereiro
decreto/D5154.htm>. Acesso em: 3 de 1967; revoga a Lei no11.161, de 5
setembro de 2013. de agosto de 2005; e institui a Políti-
ca de Fomento à Implementação de
________. Ministério da Educação. Escolas de Ensino Médio em Tempo
Educação Profissional Técnica de Ní- Integral.
vel Média Integrada ao Ensino Mé-
dio. Documento Base. Brasília: Minis- FRIGOTO.G. A relação da educação
tério da Educação, 2007. Disponível profissional e Tecnológica com a uni-
em: http://portal.mec.gov.br/setec/ versalização da educação básica in:
arquivos/pdf/documento¬_base. (org.) Jaqueline Moll e colaborado-
pdf. Acesso em: 15 mai.2013. res: Educação Profissional e Tecno-
lógica no Brasil Contemporâneo,
________. Lei 11.892 de 29 de de- desafios tensões e possibilidade.
zembro de 2008 que institui os Ins- Porto Alegre: Artmed. 2010.
titutos Federais de Educação, Ciência
e Tecnologia. KUENZER, A. EM EP na produção Fle-
xível: a dualidade invertida. In: (rev.)
________. Conselho Nacional de Retratos da Escola/Escola de For-
Educação. Resolução n.2, de 30 de mação da Confederação dos Tra-
janeiro de 2012. Define as Diretrizes balhadores em Educação ( Esforce)
Curriculares Nacionais para o Ensino – v. 5, n 8, jan/jun. 2011 – Brasília:
Médio. Brasília: CNE,2012. CNTE, 2007.
________. Lei 13.415, de 16 de feve- MOURA, D. O ensino médio integra-
reiro de 2017. Altera as Leis nº 9.394, do: perspectivas e limites na visão
de 20 de dezembro de 1996, que es- dos sujeitos envolvidos. In: Ensino
tabelece as diretrizes e bases da edu- Médio Integrado TRAVESSIAS/Mo-
cação nacional, e 11.494, de 20 de ju- nica Ribeiro da
nho 2007, que regulamenta o Fundo
de Manutenção e Desenvolvimento Silva (organizadora). – Campinas, SP:
da Educação Básica e de Valoriza- mercado de letras, 2013.
256
PERSPECTIVAS DOS ALUNOS SOBRE O ENSINO
MÉDIO INTEGRADO: POR QUE O FAZEM?
Débora Martins Artiaga1, Daniela Alves de Alves2
1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais –
Campus Avançado Ponte Nova
2
Universidade Federal de Viçosa (UFV)
E-mail: debora.martins@ifmg.edu.br
258
outros em suas terras, os quais pro- os demais componentes ambientais,
duziam para si e para o dono das como ainda nos atos civilizatórios e
propriedades. Já aos trabalhadores, nos de conquista. Podemos, pois,
aqueles que não detinham os meios afirmar que o fenômeno da educa-
de produção, restava apenas a pró- ção profissional acompanha as práti-
pria força de trabalho, a qual eles cas humanas desde os períodos mais
ainda precisavam vender para sobre- remotos da história.
viverem. O advento do modo de pro- Na visão de Saviani (1991), a na-
dução capitalista dispõe de mão de tureza da educação passa pelo pro-
obra liberada das obrigações servis cesso de transformação da própria
e desprovida de meios de produção. natureza pelo homem, em sua rela-
A força do trabalho passa então a ser ção com o trabalho, para sua subsis-
vendida ao empregador, que paga tência. Pelo trabalho, ele transforma
por ela e almeja, através dessa agre- a natureza e a si mesmo. Fica claro
gação de trabalho, a matéria-prima e então que o trabalho é intrínseco à
o acúmulo de capital. condição humana, sendo uma ativi-
Manfredi (2002) aponta que, des- dade central no que tange à socia-
de a pré-história, os homens transfe- bilidade e emancipação do homem.
riam seus saberes profissionais para Entretanto, o trabalho, na sociedade
as gerações mais novas por meio de capitalista perde essa dupla dimen-
uma educação baseada na observa- são, “direcionando as relações de
ção, na prática e na repetição, pelas produção para o aprisionamento da
quais repassavam conhecimentos e classe trabalhadora nos grilhões do
técnicas de fabricação de utensílios, trabalho abstrato, assalariado e alie-
aprimoramento de ferramentas, ins- nado” (SILVEIRA, 2010, p. 91).
trumentos de caça, defesa e demais Para Manfredi (2002, p. 34), as
artefatos que lhes servissem e faci- noções de trabalho “[...] vão se cons-
litassem o cotidiano. Com sua cog- truindo e reconstruindo ao longo da
nição e tecnologia acumuladas, as história das sociedades humanas,
populações pré-históricas e as civili- variando de acordo com os modos
zações que se seguiram produziram de organização da população e de
soluções para enfrentarem os desa- distribuição de riqueza e poder”. Du-
fios impostos pelo ambiente no qual rante a época do sistema de produ-
estavam inseridos, bem como nas ção artesanal havia uma relação es-
suas relações e interferências com treita entre sujeito e objeto, homem
260
século para outros países da Euro- O trabalhador perde sua antiga
pa, promoveu profundas alterações instrução em troca da ignorância ofe-
nas relações de produção e capital e, recida pela fábrica, através da substi-
consequen-temente, nas estruturas tuição dos instrumentos e dos pro-
e modelo de educação que deveria cessos produtivos pela repetição das
suprir o mercado produtivo, domina- máquinas. O capital exigia um traba-
do pela burguesia emergente. Esta lhador qualificado para as mudanças
primeira fase da revolução foi marca- tecnológicas. Surgia, então, um pro-
da pelo grande impulso do capitalis- blema: ou se oferecia dentro das fá-
mo industrial, a invenção de diversas bricas os métodos da aprendizagem
máquinas movidas a vapor e a busca artesanal, baseados na observação e
de matérias-primas e mercados con- imitação, ou então se transferiria às
sumidores na África e Ásia, através do escolas a missão de repassar os co-
neocolonialismo. Os trabalhadores nhecimentos profissionais, aliando a
das fábricas recebiam salários baixos, teoria à prática (SILVEIRA, 2010).
enfrentavam péssimas condições de Passou a ser exigida dos trabalha-
trabalho e não tinham direitos traba- dores da era da Revolução Industrial
lhistas. Houve o uso de mão de obra a capacidade de atender a essas no-
infantil e feminina com salários abai- vas demandas emergentes, ou seja,
xo dos homens (CANEDO, 2012). de se adequar à nova era de produ-
Segundo Frigotto (1999), a mo- ção fabril e servir à maior produção
dernidade alterou o vínculo entre de bens para o consumo. Entretan-
trabalho produtivo e educação com to, para muitos donos dos meios de
o advento do capitalismo, em que produção da época, a escolarização
a produção se rende ao mercado, o operária se tornou um problema,
qual assume para si a organização da pois muitos desses “patrões” enten-
produção e suas relações de capital diam que “[...] era supérfluo e até pe-
e trabalho. Ainda para esse autor, o rigoso ensinar a ler, escrever e, espe-
capitalismo determina as regras so- cialmente, fazer contas aos operários
bre valores, ideias, teorias, símbolos [...]” (MANACORDA, 2001, p. 287), já
e instituições, entre as quais se des- que, na visão deles, possivelmente,
taca a escola como espaço de produ- se os operários fossem instruídos,
ção e reprodução de conhecimentos, poderiam promover uma revolução,
atitudes, ideologias e teorias que jus- ou seja, poderiam exigir aquilo que
tificam o novo modo de produção. lhes era devido: salário justo, salubri-
262
ção dos direitos traba-lhistas; for- produtivo. O resultado foi à ênfase na
talecimento do sistema capitalista; bandeira política do neoliberalismo,
desenvolvimento da globalização, a concentração de renda, o enxuga-
princi-palmente após o fim da Guer- mento do estado e o reforço às leis
ra Fria, que trouxe um novo cenário de mercado. Pacheco (2011) afirma
nas relações econômi-cas e formas que o neoliberalismo foi definido por
de produção (CANEDO, 2012). um conteúdo ideológico fundado no
Na década de 1970, tivemos a individualismo e na competitividade
crise do capitalismo, que veio atra- que marcam a sociedade contempo-
vés das duas crises do petróleo e rânea.
também das crises fiscais dos países Com essas mudanças na política
centrais, com consequente aumento econômica, e consequentemente
da inflação. Portanto, na década de no mundo do trabalho, passou a ser
1970, o Estado do Bem-Estar Social, necessária uma nova relação entre o
expressão da ordem internacional homem e o trabalho, mediada pelo
capitalista e do fordismo, começou conhecimento científico, tecnoló-
a dar sinal de esgotamento, tornan- gico e sócio-histórico. Começou a
do-se cada vez mais difícil conciliar haver a demanda da formação de
serviços públicos e garantir os direi- um novo tipo de trabalhador, o qual
tos sociais e trabalhistas. Os sindica- especificaremos na próxima seção,
tos perderam o poder de barganha em que os conhecimentos sistema-
dos trabalhadores, pois não era mais tizados, as experiências e compor-
possível conciliar os direitos sociais e tamentos viessem substituir a rigi-
trabalhistas com a lucratividade do dez (KUENZER, 2004). Para que isto
capital. Essa crise nos conduziu para ocorresse, Kuenzer considera ser im-
um novo modelo de desenvolvimen- prescindível que se fundamentasse a
to econômico calcado no processo educação profissional em uma sólida
da terceira Revolução Industrial, a base de educação geral, para além
também chamada Revolução Tec- das dimensões meramente acadêmi-
nológica, que passou a requerer dos cas que caracterizam o ensino funda-
trabalhadores uma formação flexível. mental e médio no Brasil.
O liberalismo foi revisado e atua- O ensino Médio brasileiro, ao lon-
lizado através de referências compa- go de sua história, oscilou entre uma
tíveis com as alterações no processo finalidade voltada ora para a forma-
264
Com o toyotismo uma nova for- bilidades, que foram exportados do
ma de organização industrial e de re- mercado de trabalho também para
lação entre capital e trabalho emerge o ambiente escolar. Para Grabowski
das cinzas do taylorismo/fordismo: o (2007), no modelo toyotista, a linha
processo de acumulação flexível, no de montagem foi substituída pelas
qual se elimina a tradicional hierar- células de produção que contavam
quia gerencial, substituindo-a por com equipes de trabalho, onde a
equipes multiqualificadas que ope- qualidade e o trabalho são contro-
ram em conjunto, diretamente no lados pelo próprio grupo que realiza
ponto de produção. O modelo fle- um autocontrole e um autogerencia-
xível aborda a importância de uma mento da produção. Nesse novo mo-
equipe cooperativa, projetada para delo, as palavras de ordem passam
aproveitar a capacidade mental total a ser qualidade e competitividade e
e a experiência prática dos envolvi- assim um novo modelo de trabalha-
dos no processo de fabricação. dor passa a ser exigido.
Garcia (2009,) alega que o discur- De acordo com o autor supra-
so da acumulação flexível em relação citado esse profissional deveria ter
à educação se baseia no argumento algumas caracte-rísticas e capacida-
de que é preciso uma formação fle- des, tais como: comunicar-se corre-
xível, no sentido de acompanhar as tamente, com domínio dos códigos
mudanças tecnológicas, o avanço e e linguagens, incorporando, além do
a dinamicidade da produção científi- domínio da língua nacional, também
ca, substituindo, portanto, o modelo de uma língua estrangeira; autono-
de formação rígida, com formação mia intelectual, ser capaz de resolver
especializada, focada em ocupações problemas práticos gerados pelas
parciais e de curta duração para uma novas tecnologias e ciências; auto-
educação geral, ampliada, que acon- nomia moral, dentre tantas outras.
teça junto à Educação Básica. Este profissional deveria ainda ter a
Segundo Kuenzer (2007), o novo capacidade de enfrentar novas situ-
modelo de trabalhador exigido de- ações eticamente e, principalmen-te,
veria assegurar o domínio dos co- capacidade de comprometer-se com
nhecimentos que fundamentam as o trabalho, entendido em sua forma
práticas sociais e a capacidade de mais com-plexa e honrosa de cons-
trabalhar com eles, através do desen- trução do próprio trabalhador, do
volvimento de competências e ha- homem e da sociedade.
266
nual/industrial se deve à concepção cidadã de uma carreira, para o exer-
dada ao trabalho e, assim sendo, a cício de profissões e ofícios que te-
separação entre teoria e prática não nham nas mudanças operacionais e
é o resultado das formas de organi- no dinamismo a única constante.
zação e gestão do trabalho, mas tem Segundo Carvalho (2003) e Pa-
a origem na separação entre a pro- checo (2012), a educação profissio-
priedade dos meios de produção e nal deve ter o propósito de fomentar
a força de trabalho, isto é, na própria
a transformação do conhecimento
natureza do capitalismo. Dessa for- em atividades geradoras de bens
ma, não é o taylorismo ou fordismo e de serviços, considerando como
os que criaram a divisão técnica do pressuposto os avanços científicos
trabalho e não será o toyotismo que e tecnológicos, que são o que mo-
irá superá-la. vimentam todo o desenvolvimento
A educação é colocada então socioeconômico. Ao mesmo tempo,
como um espaço possível para supe- deve-se proporcionar um ensino que
rar a dualidade entre teoria e práti- permita continuidade, atualização e
ca, articulando ambas e fazendo do capacidade de aprender a aprender.
conhecimento e das competências
aliados para a solução de problemas. 2.3. Do Decreto Nº 2.208/97 ao
De acordo com Kuenzer (2007, p.
Decreto Nº 5.154/04
13), o trabalho passa a ser entendido
como “enfrentamento de eventos” e, O ensino médio brasileiro, ao lon-
exigem-se mais conhecimentos te- go de sua história, oscilou entre uma
óricos e mais habilidades cognitivas finalidade voltada ora para a forma-
complexas, portanto, capacidade de ção acadêmica, destinada a preparar
trabalhar intelectualmente, em opo- para o ingresso no ensino superior e,
sição à competência compreendida por outras vezes, voltada para uma
como conhecimento tácito. formação de caráter técnico, com vis-
Consideramos que mais que for- tas a preparar para o trabalho. A par-
mar para o emprego e mercado de tir da vigência da Lei 9.394/96, o en-
trabalho, a educação, seguindo os sino médio passa a ser a etapa final
passos do desenvolvimento de toda da educação básica e, dessa forma,
a sociedade, deve preparar o indiví- sua oferta se torna obrigatoriedade
duo para a construção autônoma e do estado brasileiro. Essa alteração
foi positiva, visto que possibilitou o
268
nário do Ensino Médio foi realizar um que apontavam as contradições em
diagnóstico da real situação e da ne- relação ao projeto de sociedade que
cessidade de ampliação do acesso ao começava a se delinear.
ensino médio. Esses foram os primei- O resultado foi a revogação do
ros passos na discussão da necessi- decreto nº 2208/97 e a aprovação do
dade de se criarem novas diretrizes decreto nº 5154/2004, com o resgate
curriculares e também da decisão do da possibilidade de indissociabilida-
governo brasileiro de universalizar a de do ensino médio e da educação
educação básica. Essas metas eram profissional, na forma do ensino mé-
consensuais entre os participantes. dio integrado. O novo decreto man-
Já o Seminário da Educação Profis- teve ainda as possibilidades de ofer-
sional contou com disputas por pro- ta de cursos técnicos subsequentes
jetos diferentes de sociedade e, con- e concomitantes ao ensino médio.
sequentemente, de educação. Uma Assim o decreto nº 5154/2004 foi
parte dos participantes defendia a incorporado à LDB através da Lei nº
permanência do decreto nº 2208/97, 11.741/2008. Esta lei pretendeu ain-
compunham esse grupo o Sistema S, da reintroduzir a articulação entre
assim como as instituições privadas e conhecimento, cultura e trabalho
também uma parte significativa dos e tecnologia, com o propósito de
Centros Federais de Educação Tecno- formação do ser humano na sua in-
lógica (Cefet). Garcia (2013) ressalta tegralidade física, cultural, política
que a rede federal foi, inicialmente, e científico-tecnológica. Buscou-se
o principal lócus de resistência da com isso a superação da dualidade
“reforma do Ensino Médio”, realiza- entre cultura geral e cultura técnica.
da pelo governo de Fernando Hen- Assim, foi resgatada a perspectiva da
rique Cardoso (1994-2002), mas que politecnia debatida nos anos 1980,
acabou por mudar parcialmente sua no processo de discussão da consti-
posição pelos benefícios conquista- tuinte e da atual LDB.
dos no mesmo período. Na parcela Chegou-se ao entendimento de
dos que apoiavam a revogação do que um tipo de ensino médio que
decreto nº 2208/97 estavam parte da garantisse a integralidade da edu-
rede federal e uma parcela das redes cação básica e também objetivos
estaduais que enfrentavam um gran- adicionais de formação profissional
de refluxo de oferta desta modalida- seria uma solução viável, mesmo que
de, e professores das universidades
270
montante de jovens em idade esco- formou ao final do ano de 2013. Do
lar para esta etapa de ensino no país. total de 20 alunos, 12 aceitaram par-
Essas turmas de EMI têm tido suas ticipar da pesquisa. Os entrevistados
vagas ocupadas pelos filhos das clas- tinham faixa etária variando entre 17
ses média e alta, os quais, identifican- e 18 anos. Dos 12, 11 estão cursando
do a qualidade da estrutura física e o ensino superior, sendo 9 em univer-
do corpo docente (muitos possuem sidades federais e 2 em faculdades
mestrado e doutorado), bem me- particulares. Os cursos escolhidos
lhor remunerado que os professores são os mais diversos, variando entre
da rede municipal e estadual, op- Agronomia, Arquitetura, Bioquímica,
tam por essa modalidade de ensino Direito, Economia, Engenharia Civil,
como uma etapa preparatória para o Engenharia Florestal, Engenharia
ingresso nas concorridas vagas ofe- Mecânica, Engenharia Química e Me-
recidas das universidades federais. dicina Veterinária.
Às classes baixas e mais pobres Dos 12 egressos que participaram
restou uma escola pública estrutu- da pesquisa, apenas um está atuan-
ralmente precária e sem qualidade do como Técnico em Agroecologia e
para fomentar projetos de vida indi-não está cursando o ensino superior.
viduais; enquanto que as classes mé-Esse estudante, aqui denominado de
“Egresso M”, ingressou no CTIA já vi-
dias e altas da sociedade pleiteiam as
poucas vagas ofertadas nas institui-sando a atuação técnica profissional
ções de ensino médio integrado fe- oferecida pelo curso, diferentemente
deral, teoricamente planejadas para dos demais egressos entrevistados.
Relatou ainda que se interessou pelo
atenderem aos filhos da classe traba-
lhadora. curso durante a divulgação feita por
servidores do campus Muriaé na es-
3. AS PERCEPÇÕES DOS EGRESSOS cola em que estudava, pois sempre
SOBRE O ENSINO MÉDIO INTEGRA- gostou dessa área e seus pais tinham
um sítio onde cultivavam hortaliças e
DO outras coisas. Então achou que fosse
Foram entrevistados os alunos uma boa oportunidade, uma vez que
egressos do Curso Técnico Integra- queria trabalhar no sítio com eles.
do em Agroecologia (CTIA) do IF SU- Esses relatos mostram que o objeti-
DESTE MG – Campus Muriaé, que se vo do egresso M sempre foi exercer a
profissão técnica.
272
Na verdade eu nunca cursei o téc- Eu acredito que as condições não
nico com a esperança de seguir car- foram as ideais, mas os professores
reira, eu entre no IF mais pela base sempre tentaram superar as barrei-
excelente de ensino médio (Egressa ras da falta de infraestrutura (Egres-
D). sa L).
274
lugares e trocar conhecimentos so M, que está atuando como técnico
foi muito proveitosa entre outros
em agroecologia, pretende continu-
(Egresso F).
ar trabalhando com seu pai, prestar
assessoria a outros produtores rurais
As vantagens são a formação dife- e almeja ainda, daqui um tempo, fa-
renciada em relação às pessoas que
se formam apenas no ensino médio,
zer o curso superior em Agroecolo-
assim como a experiência adquirida gia ou Agronomia.
em diversas áreas, a oportunidade
de fazer estágios em outros Insti- Quando questionamos aos
tutos Federais, órgãos públicos ou egressos se o CTIA lhes oportunizou
ONGs (Egressa L). crescimento intelectual, eles foram
unânimes em responder que sim.
Percebe-se que as vantagens Todos os que estão cursando o en-
elencadas dizem respeito especifi- sino superior atrelam essa realidade
camente ao curso técnico, visto que ao fato de terem feito o CTIA. Em re-
não seriam possíveis em um Ensino lação ao aumento de renda após o
Médio puramente propedêutico. Já término do curso, apenas o Egresso
em relação às desvantagens do cur- M respondeu positivamente a essa
so, os egressos enfatizam três pon- questão, uma vez que é o único que
tos: excesso de aulas teóricas e pou- está inserido no mercado de traba-
cas práticas, a falta de laboratórios lho. Todos egressos se mostraram sa-
equipados e também a escassez de tisfeitos com a conclusão do CTIA e
oportunidades de trabalho para os atribuem à escolha por este curso os
formados como técnicos em agroe- caminhos que estão trilhando agora,
cologia. Percebemos aqui que tam- seja na atuação profissional ou na se-
bém as desvantagens do CTIA estão quência de cursos superiores.
relacionadas à parte técnica do cur-
so. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em relação aos anseios dos egres- Pelo exposto, podemos dizer que,
sos para os próximos dez anos, os o ensino profissionalizante tem as-
que estão cursando o ensino supe- sumido um papel instrumental tec-
rior pretendem se formar, muitos nicista ao longo da história da edu-
pretendem continuar se especiali- cação básica brasileira, aspecto que
zando e, após isso, atuarem na área o decreto de 2004 busca superar na
de formação da graduação. O egres- busca de uma formação ampla dos
276
Nesse sentido, o EMI em IFs tem Técnico Integrado do Ensino Médio
se tornado muito atraente para os regular é formar mão de obra em
alunos que almejam o ingresso no atividades específicas, este não está
ensino superior, pois estes visam sendo cumprido. No entanto, o EMI
além de um ensino médio de quali- também objetiva a possibilidade da
dade ofertado por estas instituições, continuidade dos estudos. Alguns
o benefício de poderem concorrer a autores enfatizam que o estudante
50% das vagas que são destinadas em sua atividade profissional de ní-
aos concluintes do ensino médio em vel superior, mesmo que não sendo
instituições públicas, como prevê o a mesma do EMI, pode beneficiar-se
Artigo 2o do Decreto nº 7.824, de 11 dos conhecimentos tecnológicos ob-
de outubro de 2012, que prevê que tidos ao longo de sua formação bási-
as instituições federais de ensino ca.
superior reservarão no mínimo cin- Podemos concluir que o CTIA
quenta por cento de suas vagas em oferece um ensino médio excelente,
cada processo de seleção, por curso, uma vez que proporciona aos alunos
para estudantes que tenham cursa- o ingresso aos mais diversos cursos
do integralmente o ensino médio em superiores. Por outro lado, a parte
escolas públicas, inclusive em cursos técnica/profissionalizante do curso
de educação profissional técnica. está sendo pouco atraente e assim
Outro fator que contribui com a não motiva os alunos a seguirem
não opção dos concluintes do CTIA essa profissão, assim como a falta de
pela profissão técnica é a pouca ofer- ofertas de trabalho na área naquela
ta de empregos na área na região região.
de Muriaé, visto que a agroecologia
é desenvolvida em sua maior parte Referências
pela agriculta familiar na região, si-
tuação agravada pelo fato de que o ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do
CTIA do campus Muriaé ainda não é trabalho – Ensaio sobre a afirmação
reconhecido pelo Conselho Regional e a negação do trabalho. São Paulo:
de Engenharia e Agronomia de Mi- Ed. Boitempo, 2002.
nas Gerais (CREA-MG).
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Se o sentido de diferenciar estas de 17 abr. 1997. Regulamenta o §
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278
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280
mal envolve a utilização de conhe- neidade intelectual e tecnológica,
cimentos especializados, bem como autonomia e responsabilidade,
conceitos adquiridos em disciplinas orientados por princípios éticos,
específicas. A integração dessas estéticos e políticos, bem como
peças é que irá criar um novo co- compromissos com a construção
nhecimento ou compreensão mais de uma sociedade democrática,
profunda (SEIPEL, 2005). Generica- por meio do desenvolvimento sus-
mente, pode-se definir a experiência tentável;
interdisciplinar como o confronto de IV – domínio intelectual das
diferentes saberes organizados ou tecnologias pertinentes ao eixo
disciplinares que desenham estraté- tecnológico do curso, de modo a
gias de pesquisa, diferentes daque- permitir progressivo desenvolvi-
las que faria cada saber por seu lado mento profissional e capacidade
e fora dessa interação (FLORIANI, de construir novos conhecimentos
2004). e desenvolver novas competên-
Diante disto, a Resolução CNE/ cias profissionais com autonomia
CEB no06/2012 define os currículos intelectual;
dos cursos da Educação Profissional V – instrumentais de cada ha-
Técnica de Nível Médio e aquilo que bilitação, por meio de vivencia de
esses currículos devem proporcionar diferentes situações práticas de es-
aos estudantes: tudo e de trabalho;
I – diálogo com diversos cam- VI – fundamentos de empre-
pos de trabalho, da ciência, da endedorismo, cooperativismo,
tecnologia e da cultura como re- tecnologia da informação, legisla-
ferencias fundamentais de sua for- ção trabalhista, ética profissional,
mação; gestão ambiental, segurança do
II – elementos para compreen- trabalho, gestão da inovação e ini-
der e discutir as relações sociais de ciação científica, gestão de pesso-
produção e de trabalho bem como as e gestão de qualidade social e
as especificidades históricas nas ambiental de trabalho.
sociedade contemporâneas; Para atender à estruturação dos
III – recursos para exercer sua cursos prevista na Resolução CNE/
profissão com competência, ido- CEB no06/2012, a organização cur-
282
subsidiar a construção do Plano Na- ca e de politecnia aparecem em pas-
cional de Educação 2011 – 2020”, sagens dessa publicação associados
produzido pela Comissão Bicameral a noções como: formação integral;
do Conselho Nacional de Educação e superação da dualidade escolar; ca-
aprovado por esse órgão em agosto racterísticas humanistas e científico
de 2009, estabelece como uma das - tecnológicas da educação básica;
quatro principais prioridades para o escola unitária; domínio de diferen-
ensino médio: tes modalidades de conhecimentos
Romper com o dualismo estrutural e práticas requeridas pelas ativida-
entre o ensino médio e a educação des produtivas; compreensão teórica
profissional, compreendendo o en-
sino médio na concepção de esco-
e prática dos fundamentos científi-
la unitária e de escola politécnica, cos das múltiplas técnicas utilizadas
para garantir a implantação do pro- no processo produtivo; requisito da
jeto “Ensino Médio Inovador”, bem
como a efetivação do ensino médio
cidadania; combinação entre traba-
integrado como uma das alternati- lho, ciência e cultura; fundamentos
vas de profissionalização dos jovens científico-tecnológicos e histórico-
alunos do ensino médio (BRASIL,
2009).
sociais; superação da dicotomia en-
tre educação básica e técnica; for-
mação humana em sua totalidade;
Visando contribuir para a im- integração entre ciência, cultura,
plantação e o acompanhamento da humanismo e tecnologia; desenvol-
nova proposta de construção de um vimento de todas as potencialidades
ensino médio integrado à educa- humanas; domínio dos fundamen-
ção profissional, a representação da tos científicos das diferentes técnicas
United Nations Educational, Scientific que caracterizam o trabalho pro-
and Cultural Organization (UNESCO) dutivo moderno; fundamentos das
no Brasil editou, em novembro de diferentes modalidades de trabalho;
2009, a publicação “Ensino Médio e integração entre formação geral e
Educação Profissional: desafios da formação técnica no ensino médio.
integração”. O trabalho foi organiza-
Considerando esse contexto, este
do por Regattieri e Castro, com base
trabalho científico propôs descre-
em textos e debates que serviram à
ver a experiência de integração de
constituição de um workshop sobre
componentes curriculares do Curso
o tema (REGATTIERI; CASTRO, 2009).
Técnico de Nível Médio em Recur-
Os conceitos de educação politécni-
sos Pesqueiros na Forma Integrada,
284
um saber menos fragmentado que plar a integração dos conteú-
reconhece a realidade como uma to- dos envolvidos nas disciplinas;
talidade a ser percebida e analisada • Avaliação do conteúdo minis-
a partir de diferentes modelos e con- trado nas atividades integra-
cepções. doras, desenvolvida por meio
Mesmo reconhecendo a dificul- de relatórios técnicos que os
dade envolvida, professores e alunos alunos produziram em grupos
das práticas de ensino em questão de trabalho.
dispuseram-se a construir juntos um
trabalho nesta direção. As experiên- 2. DESENVOLVIMENTO
cias integradoras com práticas de en-
sino foram organizadas basicamente 2.1 Revisão Literária
a partir dos seguintes momentos:
A integração de disciplinas (ou
• Atividades preliminares com componentes curriculares) surge
o objetivo de construir aulas fortemente com a noção de núcleo
práticas e visitas técnicas a politécnico comum por ocasião dos
partir da junção, sobreposição processos de discussão ocorridos
e complementação de conte- em 2007 e 2008 e promovidos pelo
údos existentes nos planos de MEC sobre a necessidade de promo-
ensino das disciplinas que fize-ver mudanças na lógica de organiza-
ram parte das experiências de ção da oferta dos cursos técnicos no
integração, o que num primei- Brasil. A partir desses debates, que
ro momento passava por com- envolveram diversos especialistas
partilhar objetivos comuns e de campos tecnológicos diferentes,
conhecer e respeitar as diferen-chegou-se à formatação do Catálogo
tes visões presentes no grupo; Nacional de Cursos Técnicos, pau-
• Elaboração e realização das ex- tado em eixos tecnológicos. Antes
periências, que foram executa- os cursos estavam organizados por
das em momentos diferentes, áreas profissionais, o que seguia “a
atendendo à disponibilidade lógica de organização dos setores
dos professores responsáveis; produtivos” (MACHADO, 2009, p.07):
O eixo incorpora a lógica do conhe-
• Aulas em laboratório e visitas
cimento e da inovação tecnológica,
técnicas: essas atividades fo- constituindo-se como um vetor que
ram realizadas para contem- alcança – a partir dele – um conjun-
286
compreenderem a realidade para ra foi realizada com as disciplinas de
além de sua aparência fenomênica. biologia (Núcleo Básico) e biologia e
Sob essa perspectiva, os conteúdos ecologia aquática (Núcleo Tecnoló-
de ensino não têm fins em si mesmos gico), com o objetivo de contemplar
nem se limitam a insumos para o de- o conteúdo programático das duas
senvolvimento de competências. Os disciplinas relacionado a fisiologia
conteúdos de ensino são conceitos e anatomia animal e ao sistema de
e teorias que constituem sínteses da classificação dos seres vivos. A aula
apropriação histórica da realidade de laboratório teve duração de 2 ho-
material e social pelo homem. ras e atendeu satisfatoriamente ao
Portanto, a integração exige que previsto no plano de ensino das duas
a relação entre conhecimentos ge- disciplinas. Os alunos puderem vi-
rais e específicos seja construída con- venciar boas práticas de laboratório,
tinuamente ao longo da formação, bem como adquirir competências
sob os eixos do trabalho, da ciência e previstas durante a formação técnica
da cultura (RAMOS, 2005). (Figura 1). Todos os alunos consegui-
ram entregar o relatório técnico re-
ferente a esta atividade integradora
2.2 Descrição e Explicação dos
rico em informações, e alcançaram
Resultados notas necessárias para um ótimo
rendimento.
A primeira experiência integrado-
288
A terceira experiência integra- periências integradoras relacionadas
dora foi realizada com as disciplinas às disciplinas envolvidas. Durante
de biologia, química e artes (Núcleo a visita técnica, os alunos puderem
Básico) e a disciplina de biologia e vivenciar a rotina de uma curadoria
ecologia aquática (Núcleo Tecnológi- biológica, bem como conhecer es-
co). É importante destacar que esta pécies de peixes e de mamíferos até
experiência integradora contou com então desconhecidos pelos alunos,
a colaboração do Instituto Nacional puderem entender com mais clareza
de Pesquisa da Amazônia (INPA) que o uso do sistema de classificação dos
em parceria com a equipe do Bosque seres vivos e sua aplicação (Figura 3).
da Ciência e da Casa da Ciência de- No período vespertino, no Bosque da
senvolveu as atividades que haviam Ciência e Casa da Ciência (INPA), os
sido previamente repassadas para alunos participaram de uma dinâmi-
atender ao conteúdo das referidas ca onde envolveu temas de química,
disciplinas. Foi realizada uma visita biologia e artes, por meio da qual os
técnica ao INPA sob a coordenação alunos puderam ver a aplicação de
dos professores das disciplinas en- conceitos das disciplinas envolvidas
volvidas, onde os estudantes visita- (Figura 3). Todos os alunos consegui-
ram a coleção de vertebrados (es- ram entregar o relatório técnico re-
pecificamente a coleção de peixes e ferente a esta atividade integradora
mamíferos) no período matutino e, rico em informações, e alcançaram
no período vespertino, participaram notas necessárias para um ótimo
de uma atividade chamada Essên- rendimento.
cias da Amazônia que envolveu ex-
Fonte: (Bevilaqua: 2017, arquivo pessoal).
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292
significativas no Ensino Médio. Al- que circundam o campo do currículo
gumas considerações possíveis de é importante, pois se estará tratando
serem feitas no início do desenvol- dos docentes que, por formação, não
vimento do projeto de pesquisa em estão habilitados para atuarem com
andamento – do qual este texto se as peculiaridades do campo do en-
origina – caíram por terra neste per- sino – destaque-se, da Educação Bá-
curso, como a indicação de que os sica – e, por consequência e origem
docentes não licenciados tivessem da questão, são responsáveis, como
algum tipo de formação pedagógica não poderia ser diferente, pelas dis-
para que pudessem atuar na Educa- ciplinas que acabam sendo as que
ção Básica. Entende-se que proposta lideram e recebem destaque nesta
como essa se torna ainda mais dis- organização curricular de curso.
tante de realização, visto que se pre- A fim de que se possa dar encami-
vê, após a aprovação da lei 13.415 de nhamento a análises mais específicas
16 de fevereiro de 2017, ainda que que constituirão parte do arcabouço
com alguns critérios, a atuação de empírico deste trabalho, serão apre-
outros profissionais de áreas diver- sentados entendimentos que ilumi-
sas, entendidos como possuidores narão outras discussões anunciadas
de notório saber, em disciplinas do mais adiante.
currículo da Educação Básica.
Ainda neste campo introdutório, 2. SOBRE O ASPECTO INTEGRADO
cabe explicitar a inclinação curricular
DOS CURSOS ANALISADOS
que tem esta proposta de estudo e
o entendimento de aspectos da for- O Ensino Médio Integrado surge
mação de professores e de sua atu- como uma possibilidade de reali-
ação. Com Young (2011), é possível zação mais inteira de um processo
considerar a perspectiva do conhe- educacional, neste nível e âmbito,
cimento poderoso e trazê-la mais visto que busca cumprir o papel do
para dentro deste circuito; talvez desenvolvimento da capacidade de
seja coerente pensar que as “discipli- reflexão ampla, de cultura geral, de
nas poderosas” em um curso técnico visão ampliada de mundo e, nem an-
(integrado ao Ensino Médio) sejam tes ou depois, mas ao mesmo tempo,
justamente essas, as técnicas, que desenvolver habilidades específicas
conferem ao curso sua especificida- para o trabalho – que, dessa forma,
de. Assim, enveredar por caminhos não é cego ou alienado, é um traba-
294
Vale trazer com ênfase à cena apresentado em seguida:
algum apontamento sobre a ques- a) O aspecto integrado, que é
tão da politecnia. Como em Saviani justamente o que o diferencia de
(2003), a leitura desse termo ocorre outras modalidades de oferta de
no sentido de unir o trabalho técnico curso técnico associado ao nível
com o intelectual, não como uma va- básico da educação brasileira. Con-
riedade de técnicas. O entendimento forme apontado anteriormente, os
que nos interessa sobre o aspecto cursos técnicos concomitantes ou
politécnico se aproxima bastante da- subsequentes têm objetivos muito
quele de uma educação integral, que semelhantes ao curso técnico inte-
habilita o sujeito socialmente, para o grado ao Ensino Médio, no que diz
desenvolvimento de sua autonomia, respeito à liberação de profissio-
pelas vias da reflexão, do conheci- nais para o mercado de trabalho.
mento de uma cultura ampla e ge- No entanto, seus modi operandi os
ral, mas também de sua capacitação diferenciam bastante, visto que o
para o trabalho com técnicas especí- cotidiano escolar em que se inse-
ficas, refletidas e não alienadas. re esse curso técnico quando inte-
De modo que questões impor- grado a um curso de Ensino Médio
tantes façam sentido a partir do que revela diversas questões, disputas,
já foi exposto e nas análises que se- realizações (anti)pedagógicas e
guirão, faz-se necessário oferecer al- coloca em foco, para os que este-
gum destaque a um aspecto que já jam atentos a questões educacio-
está posto, mas parece não ser ób- nais, uma série de fatores que me-
vio, ou não fazer, sempre, diferença recem ser analisados;
no que diz respeito aos aspectos lin- b) Ainda na questão referente
guísticos e semânticos envolvidos. à integração entre dois cursos, um
Trata-se aqui de uma gama de técnico e um de nível médio re-
cursos técnicos integrados ao Ensino gular, há que se apontar a relação
Médio. A partir dessa nomenclatu- sintática que se revela semântica
ra em destaque, pode-se evidenciar e desperta diversos sentidos de
pelo menos dois itens que precisam valor que está presente em “curso
ficar bastante explicitados, conforme técnico em ...*1 integrado ao Ensi-
1 Há uma grande variedade de cursos técnicos possíveis de serem ofertados no Brasil, todos
listados no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, que está disponível por meio do link:
https://goo.gl/kC4eQm
296
Ainda na cena 1, abrindo espa- grupo para conversas em outra rede
ço neste mesmo cenário, pensando social, que congrega docentes que
como as abreviações e agilidades atuam em outro curso técnico inte-
do mundo virtual podem revelar grado ao Ensino Médio da mesma
entendimentos específicos, segue instituição.
apresentado como foi intitulado um
298
po do ensino se fazia desnecessá- mais específicos e “vocação” – con-
ria, pois ele mesmo, experiente no ceitos destacados que merecem um
ensino de sua disciplina do campo texto inteiro de reflexão a respeito.
técnico estaria presente na avalia- Ganha destaque nesta cena o
ção; c) nos concursos de disciplinas texto de uma jovem que representa
ligadas mais diretamente ao campo uma estudante na propaganda – “Eu
do ensino, como a área das línguas quero um curso técnico, pra já poder
(usada pelo docente como exemplo) trabalhar”.
nunca se havia visto um docente da
área técnica na composição da ban-
2.2 CENAS SOB ANÁLISE
ca examinadora.
Assim, desceu o pano que encer- A fim de que se possa observar
rou o diálogo. a cenas apresentadas e propor uma
análise, faz-se necessário estabele-
Cena 4: Afastando-se um pou-
cer alguns pontos de partida a par-
co da instituição-cenário na qual se
tir dos quais se fará tal observação.
focou até aqui, a cena 4 apresenta a
O texto fluirá como material único,
propaganda televisionada (disponí-
mas os campos de observação serão
vel em https://www.youtube.com/
a FORMAÇÃO DE PROFESSORES, o
watch?v=7_Fdhibi0yQ, acessada em
CURRÍCULO, o entendimento que se
30 de abril de 2017) em 2016 e 2017,
possa ter sobre ensino, em uma pers-
do governo federal brasileiro, acer-
pectiva DIDÁTICO-PEDAGÓGICA e a
ca do “Novo Ensino Médio”, como se
realização do ENSINO TÉCNICO em
tem chamado esse segmento escolar
si, estando ele integrado à Educação
após a aprovação da lei que oficiali-
Básica.
za sua reforma, alterando em vários
sentidos a Lei de Diretrizes e Bases da Com o primeiro fio de análise, é
Educação, de número 9394 de 1996. possível costurar boa parte de um
patchwork que se fará maior. Este fio
No vídeo, jovens levantam-se de
traz a cena 1, na perspectiva de como
uma plateia (?), sobre cada um se co-
que, ainda que inconscientemente
loca um foco de luz, e o estudante
ou por desconhecimento da cau-
representado diz por que aprova o
sa, se registra verbalmente o curso
novo Ensino Médio. As justificativas
técnico integrado ao Ensino Médio;
variam, mas ficam no campo do “in-
a cena 2 se une a essa perspectiva-
teresse” por itinerários curriculares
costura por demonstrar as dificulda-
300
modo de se fazer o curso, curricular e da empiria que se captura no coti-
pedagogicamente falando, visto que diano, pode-se dizer que há um fator
o “Ensino Médio” carrega, linguistica- intrínseco nesta seara que faz com
mente observando, um curso técni- que os sujeitos se apresentem pri-
co a ele atrelado. meiramente com o que lhe chama,
Cabe o destaque ao termo “inte- antes, a atenção. Cabe o registro de
grado”, que permanece no mesmo que a responsável pela criação desse
ponto da frase original que dá nome grupo de comunicação foi uma pro-
ao curso e não versão equivocada fessora, também coordenadora do
(?) que constitui a propaganda. Isso curso, que é da área propedêutica.
pode ser visto na linha 3 da tabela 1. Este modo de observar e enten-
A linha 4 traz, para essa pers- der o funcionamento, a realização de
pectiva de análise, o entendimento um curso, que independentemente
de cursos de Educação Básica mais de crenças e entendimentos, se faz,
complexo de ser justificado. Apontar por natureza, em atos pedagógicos,
a realização de um curso integrado “à conduz o alinhavo deste estudo para
informática”, que não constitui por si a cena 2: o take em que o aspecto
só um espaço ou segmento na dinâ- “integrado”, central nesta discussão e
mica da educação brasileira, impede também na cena 1, não foi concreti-
enxergar uma justificativa plausível zado por inteiro.
para tal. Tendo em mente a descrição da
Trazendo ao mesmo cenário a cena 2 e a diferença dos lugares de
figura 2, que apresenta o título de fala e de experiência já apontada an-
um grupo de conversas de uma rede teriormente, torna-se bastante possí-
social, pode-se destacar novamente, vel afirmar que a falta de familiarida-
de uma perspectiva semântica, dis- de com os trâmites escolares e com
cursiva e de representação de valor, a dinamicidade essencial que se faz
o fato de o Ensino Médio, apesar de entre conhecimento e disciplinas –
sua especificidade de englobar um que surgem para organizar o conhe-
curso técnico, ser a “cama” na qual cimento – fez com que os docentes
se esticam e movimentam todos os das disciplinas técnicas não vislum-
aspectos incluídos. Ainda que seja brassem caminhos para sua partici-
esse um dado constituído por bas- pação no projeto da “Feira Olímpica”.
tante informalidade, como é típico
302
atestados por titulação específica ou item d, urge perceber a necessidade
de preparo didático-pedagógico es-
prática de ensino”. Estará a prática de
ensino, considerando, por exemplo, pecífico e consistente dos docentes
a experiência vivida no contexto da que são responsáveis pelas discipli-
cena 2, em condições de equivalên- nas técnicas em um curso técnico
cia aos caminhos de formação pro- integrado ao Ensino Médio, visto que
postos em um curso de licenciatura essas disciplinas constituem o perfil
de professores? Seria possível con- desses cursos, sendo, assim, frequen-
figurar, aqui, um exemplo de que a temente as que lideram os currículos
prática de ensino não embasada em e, como causa e consequência, estão
pressupostos outros, teóricos, não se nas mãos dos docentes que não são
sustenta? oriundos dos cursos que preveem
Cabe o registro de alguns enten- formação para o ensino. Forma-se
dimentos, neste ponto, visto que o um ciclo. O item a poderia continuar
espaço e objetivo deste trabalho são o texto, e assim por diante.
mais estreitos do que o que pressu- A cena 4 se emenda neste fio de
põe um alongamento (necessário) análise das cenas anteriores porque
dessas questões: a) está posto que traz, é possível afirmar, uma propa-
não há curso de licenciaturas para a ganda com texto falacioso, pelo me-
formação de professores de todas as nos em parte; e traz também uma
áreas técnicas; b) não seria o item a questão muito atrelada ao ensino,
uma proposta oriunda dessa refle- aos profissionais que atuam nos cur-
xão; c) como na Medicina, por exem- sos técnicos e ao objetivo original
plo, sabe-se que os profissionais da desse tipo de curso.
área específica são os que têm o co- A estudante que aparece no ví-
nhecimento que precisa ser ensina- deo, como destacou a cena 4, anun-
do, e isso não está sendo questiona- cia que deseja optar pelo curso téc-
do aqui; d) há que se considerar que nico porque prefere logo começar
a Educação Básica tem demandas di- a trabalhar. Apesar de esta também
dático-pedagógicas específicas, que, ser uma discussão que necessita ser
aí diferentes de um curso superior detalhada em outro estudo, cabe o
como o de Medicina, fazem necessá- registro da grande falácia já denun-
rio considerar as condições e neces- ciada por Paulo Freire na década de
sidades específicas de aprendizagem 1960 ao evidenciar os riscos do tecni-
dos estudantes; e) estando posto o
304
dicotômica ou de antagonismo entre forma veemente na realização plena
o perfil técnico e o propedêutico ao da integração, em seu sentido mais
se colocar cursos técnicos integrados amplo.
ao Ensino Médio em questão. O ob-
jetivo é, com verdade, problematizar REFERÊNCIAS
os modos como têm sido postas e
assumidas determinadas questões AGÊNCIA SENADO. Sancionada lei
e práticas que, se entendidas como da reforma no ension médio. Se-
naturais, podem inviabilizar os senti- nado Notícias. Brasília, atualiza-
dos originais que são base de qual- do em 17/02/2017. Disponível em :
quer processo/curso/ação educativa: <www12.senado.leg.br/noticias/ma-
que os estudantes aprendam e que terias/2017/02/16/sancionada-lei-da
tenham condições de realizar coi- -reforma-no-ensino-medio> Acesso
sas outras com o que for aprendido, em 30 de abril de 2017.
produzir, para além de reproduzir. A
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de de-
própria disputa ideológica, pedagó-
zembro de 1996. Estabelece as dire-
gica e de entendimento de mundo,
trizes e bases da educação nacional.
típica do lugar escola, ainda tem se
Brasília, 1996
dado, de fato, com vistas a uma es-
pécie de demarcação de territórios _______. Lei nº 13.415, de 16 de
– o que é técnico, o que é propedêu- fevereiro de 2017. Altera as Leis nº
tico, o que se deseja que o estudante 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
egresso desses cursos seja capaz de que estabelece as diretrizes e bases
fazer e como, bem no sentido que já da educação nacional, e 11.494, de
destacamos sobre o conhecimento 20 de junho 2007, que regulamenta
poderoso. São movimentos natu- o Fundo de Manutenção e Desen-
rais de um processo recente, que se volvimento da Educação Básica e
está dando a conhecer e prosseguirá de Valorização dos Profissionais da
em constante mudança. O formato Educação, a Consolidação das Leis
integrado suaviza e busca atenuar do Trabalho - CLT, aprovada pelo De-
a demarcação entre os dois campos creto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de
e, consequentemente, eliminar tam- 1943, e o Decreto-Lei nº 236, de 28
bém as relações de poder e opressão de fevereiro de 1967; revoga a Lei nº
entre um e outro tipo de formação. É 11.161, de 5 de agosto de 2005; e ins-
nessa perspectiva que insistimos de titui a Política de Fomento à Imple-
306
CURRÍCULO INTEGRADO: UMA PROPOSTA EM
CONSTRUÇÃO
Rose Márcia da Silva 1
1
Instituto Federal de Mato Grosso/ Programa de Pós-
Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro
E-mail: rose.marcia@oi.com.br
308
O Parecer CNE/CEB nº 5/2011, [...] desenvolvidas em, pelo menos,
dois espaços e tempos: um volta-
que deu origem às Diretrizes Curri-
do para as denominadas atividades
culares Nacionais para o Ensino Mé- integradoras e outro destinado ao
dio, apresenta como outras possíveis aprofundamento conceitual no in-
terior das disciplinas. É a partir daí
propostas de organização curricular:
que se apresenta uma possibilidade
complexos; temas; projetos; apren- de organização curricular do ensino
dizagem baseada em resolução de médio que potencialize uma am-
pliação de conhecimentos em sua
problemas; centros de interesses e
totalidade e não por suas partes
investigação do meio, entre outros. isoladas. Para fins formativos, isso
Para uma escola que se pretende significa identificar componentes
e conteúdos curriculares que per-
emancipadora e transformadora da
mitam fazer relações cada vez mais
realidade dual e desigual na qual vi- amplas e profundas entre os fenô-
vemos, é destacado como relevante menos que se quer “apreender” e a
realidade na qual eles se inserem.
que a organização curricular se pau-
(BRASIL, 2013, p. 40)
te em concepções e metodologias
críticas, como o complexo1 de Pistrak
ou os temas geradores2 de Freire. Nesse sentido, a prática curricular
tem permanecido, grande parte do
No entanto, algumas barreiras
tempo, organizada por disciplinas,
têm sido encontradas para pôr em
alternando-se com atividades inte-
prática tais metodologias no Ensi-
gradoras, por meio de práticas inter-
no Médio, devido à necessidade de
disciplinares ou projetos de pesquisa
aprofundamento dos conceitos ine-
e extensão, conforme o Projeto Pe-
rentes a cada disciplina e área do
dagógico de Curso (PPC) prevê:
conhecimento e seus métodos de
A utilização de metodologias dia-
exposição próprios. O que tem dire- lógicas, interdisciplinares, inter-re-
cionado o trabalho docente para a lacionadas às condições históricas,
escolha de metodologias mistas. sociais e culturais dos alunos será o
310
trução do PPC, conforme afirma um Houve alguma conversa com al-
dos gestores: guns alunos e alguns pais, porém
[...] basicamente os projetos são não foi feita uma audiência pública,
construídos [...] partir de comissões eles não participaram, a comunidade
com a presença de professores das
diferentes áreas, mas, sobretudo
não participou, da elaboração desse
da área específica da formação que PPC (Gestora 1).
aquele curso vai enfatizar, com a
presença de pedagogos, técnicos, A maioria dos estudantes, des-
dos conselhos educacionais, enfim conhece, se confunde ou não se in-
da equipe pedagógica da institui- teressa por conhecer o PPC. Quando
ção. E o trabalho é coordenado pela
equipe pedagógica, porque exis- questionados, deram-se conta da
te uma preocupação em relação importância do documento, mas en-
a essa proposta de integração das tre os alunos entrevistados apenas
formações, da educação básica com
a educação profissional, mesmo sa- 01 disse conhecer todo o projeto.
bendo que essa não é uma questão Os outros, a princípio, disseram não
simples (Gestor 3). conhecer e, após explicação do que
seria o PPC, afirmaram que havia sido
A participação da comunidade apresentado no início do curso o que
escolar aconteceu via representação iriam estudar, como iriam concluir o
na comissão e em algumas ativida- curso e da necessidade de estágio;
des de elaboração de ementas e con- que foram apresentadas as ementas
versas com pais e alunos, segundo a das disciplinas e houve outros que
afirmação dos sujeitos: não sabiam como seria até o final do
[...] participei especificamente das
curso, somente durante cada ano.
disciplinas ligadas à área que eu mi- A construção da proposta pe-
nistro [...] na construção das emen-
tas. Aqui no IF [Instituto Federal] a dagógica do curso teve início com
gente tem um conjunto docente a discussão e definição coletiva do
formado por uma quantidade de en- perfil do curso, objetivos, justificati-
genheiros [...] a gente sempre estava
conversando entre si. Mas eu tam- va, bem como o perfil dos egressos
bém, buscava outras instituições de e o perfil de cada área, o que deveria
IFs no Brasil, outros IFs e fazia uma orientar o currículo integrado. Para
comparação de várias ementas, pra
ver o que era mais atual, fazer um isso, segundo um dos gestores, bus-
compilado dessas ementas e trazer caram
pra cá (Professor 2).
[...] levantar informações, conhecer
essas realidades através de pesqui-
sas, estatísticas, de diálogos com os
312
nológico de Recursos Naturais com institucional, uma vez que o currí-
ênfase na Agropecuária”, oferecer culo sempre foi organizado por dis-
ensino de qualidade, articulando for- ciplinas. A escolha das disciplinas
mação para o trabalho e para prosse- para compor a matriz curricular, bem
guimento nos estudos para “discen- como a distribuição das cargas ho-
tes oriundos do ensino fundamental rárias dos componentes curriculares
das escolas locais e dos municípios foram definidas a partir de discus-
circunvizinhos” e, sobretudo, “opor- sões entre os professores das discipli-
tunizar a criação e ampliação de no- nas específicas e os professores das
vas tecnologias que diversifiquem o áreas do Ensino Médio, a saber: lin-
cenário agropecuário regional, com guagens, códigos e suas tecnologias,
vistas a novas oportunidades de ciências humanas e suas tecnologias,
geração de emprego e renda, bem ciências da natureza e suas tecno-
como contribuir para a conservação logias e matemática e suas tecno-
dos recursos naturais ainda existen- logias, e a composição das ementas
tes”(IFMT CAMPUS SORRISO, 2015, p. das disciplinas foi feita isoladamente
16). por cada docente.
A organização curricular no for- Assim o processo pode ser de-
mato disciplinar decorre da cultura monstrado da seguinte forma:
Gráfico 1: Distribuição da
Carga Horária por Área
314
área de ciências da natureza e mate- va entre as áreas, a fim de evitar que
mática e o Núcleo Profissionalizante disciplinas consideradas mais impor-
em detrimento da área de ciências tantes como bases científicas dos
humanas, o que pode dificultar a cursos técnicos fiquem com a maior
possiblidade de um trabalho inter- parte da carga horária nos currículos.
disciplinar com outras áreas e com o Com relação às disciplinas especí-
Núcleo Técnico. E esse aspecto é co- ficas da área profissional, destaca-se
mum na definição das matrizes dos que o projeto de curso apresenta a
cursos técnicos, que buscam priori- opção da instituição em “atuar priori-
zar áreas mais relacionadas ao eixo tariamente nas áreas relacionadas ao
articulador da tecnologia. No entan- agronegócio, à agricultura de preci-
to para Ciavatta e Ramos (2012) o são, à produção de grãos, à produção
currículo elaborado sobre as bases e industrialização de alimentos, à pe-
do trabalho, da ciência, da cultura e cuária, à sustentabilidade ambiental,
da tecnologia, não pode hierarquizar à formação de professores, entre ou-
os conhecimentos nem os respec- tras áreas” (IFMT CAMPUS SORRISO,
tivos campos das ciências, devendo 2015, p. 12).
problematizá-los em suas historici-
dades, relações e contradições. A tendência dos cursos na área
agropecuária está na adoção de com-
O tempo concedido a cada área ponentes curriculares como agroe-
é um fator importante na definição cologia e cooperação, porém, como
das prioridades visualizadas na cons- alertam Vendramini e Machado, “es-
trução do currículo. Sendo assim, sas matrizes, embora reconhecidas
um grande desafio que se apresen- como importantes no processo de
ta para os Institutos Federais (IFs) é resistência, não são as que predomi-
romper com a cultura institucional nam nas relações produtivas” (2011,
de base técnica e científica das Es- p. 97). Tais componentes curriculares
colas Técnicas e Centros Federais não fazem parte da matriz curricular
de Educação Tecnológica (CEFETs) e do curso, a seleção das ementas das
conceber uma formação omnilateral, outras disciplinas se apresenta de
sob os eixos do trabalho, conheci- forma aberta, apresentando a cultu-
mento e cultura sob a base tecno- ra, criação de animais e tecnologias
lógica. Cabe ressaltar que alguns IFs de modo a contemplar a diversidade
já buscam orientar a construção do de pequenas e grandes proprieda-
currículo a partir da divisão equitati-
316
nas contemplam uma variedade de tão o projeto integrador seria uma
alternativa (Gestor 3).
metodologias, conforme as caracte-
rísticas de cada disciplina, tais como
aula expositiva, aula dialogada, apre- Em análise dos Planos de Ensino
sentação de seminários, debates, uso do 2º ano, percebe-se que das 18 dis-
de tecnologias, trabalhos individuais, ciplinas ofertadas, 14 fazem referên-
em duplas e grupos, problematiza- cia ao uso de atividades práticas em
ção, utilização e discussão de vídeos, laboratórios, visitas ou viagens técni-
revistas e filmes, aula prática, leituras cas e núcleo de produção (fazenda
e fichamentos, desenvolvimento de experimental) como recursos para o
projetos, demonstração, experimen- processo ensino-aprendizagem. De
tação e realidade do campo. acordo com o Gestor 3, é percebida
No entanto, percebe-se nas falas uma dificuldade dos professores efe-
dos professores e equipe de ensino tivarem o que está no projeto de cur-
a necessidade de uma definição me- so com relação à integração teoria e
todológica de organização do currí- prática, devido a um distanciamento
culo, ainda em discussão, como afir- entre elas, pois
mam: [...] no projeto pedagógico do cur-
so, há uma preocupação de que
[...] eu acho muito interessante, que essa prática, que é necessária para
a gente pode pensar no futuro e a formação do profissional [...] seja
trabalhar com temas, eu acho bem um lugar, uma espécie de origem
legal, tipo você propõe um tema ge- ou situação em que, a partir da
rador e as disciplinas vão trabalhan- qual os professores possam buscar
do todas naquele, existem colégios as teorias para poder elucidar, para
que trabalham dessa forma e dá poder resolver os problemas [...] não
muito certo. se vai a campo pra poder executar
[...] acredito que a introdução aí de aquilo simplesmente [...] a propos-
projetos integradores né..., ou por ta do curso era que aquela área da
problemas, facilitaria muito a mu- fazenda experimental, no caso es-
dança de concepção. [...] se a gente pecífico do Campus de Sorriso, sem
trabalhasse, por exemplo, com pro- estruturação, sem qualquer condi-
jeto integrador, seria uma coisa que ção de produção ela fosse analisada,
daria esse salto no sentido de pro- conhecida da maneira como ela é, e
porcionar ao grupo a compreensão aí sim a partir desse conhecimento,
de como é possível fazer a integra- da situação real em que a área se
ção e de como os conteúdos na re- encontra buscar na teoria, ou nos
alidade estão imbricados..., eles não estudos, nas disciplinas elementos
estão separados, estão separados e subsídios pra poder intervir na-
na nossa matriz curricular, mas na quela realidade modificando aquela
realidade eles estão imbricados, en- realidade para aquilo que se deseja,
318
interdisciplinares com a disciplina mesmo ainda não tendo definido a
nos 2º anos do Ensino Médio com
concepção metodológica a ser tra-
topografia. Então, a gente trabalha
meio que paralelamente, a mate- balhada pelo campus, os docentes
mática e topografia, até alguns pro- buscam alternativas ou metodolo-
jetos de extensão foram feitos nesse
gias críticas diversas, que inovem ou
sentido, matemática e topografia e
na agricultura I, trabalham os solos despertem o interesse dos estudan-
na agricultura I e na matemática es- tes e minimizem a fragmentação dis-
tava se trabalhando área e volume
ciplinar. A indefinição de uma meto-
então a gente conseguiu fazer bem
essa relação, até mesmo o professor dologia não pode ser vista como um
de física entrou com densidade, pra problema grave que compromete a
trabalhar isso. A topografia usa mui-
concepção de formação integrada,
to a trigonometria, então, a gente
trabalhou paralelamente também. haja vista que o campus está em pro-
A minha parte, matemática a gen- cesso, e a indefinição é própria do
te ia a campo coletava informações
processo. É o que Frigotto sinalizou
com trena, voltava pra sala e vinha a
parte matemática novamente nesse numa entrevista concedida em 2014:
sentido (Gestor 4). [...] a maior dificuldade de integrar
é primeiro querer integrar, uma ati-
tude política, segundo é o professor
Essa prática foi observada tanto que comece a fazer essa discussão
em sala de aula, como nos momen- que vocês estão fazendo “afinal de
contas, o que é integrar? mas como
tos de diálogo na sala dos professo- nós vamos fazer?”, precisa ter um
res e com os estudantes. Em deter- início e é uma atitude de querer, e
minadas aulas os professores fizeram aí o cara vai encontrar os caminhos
[...] você pode integrar por discipli-
articulação com outras disciplinas e na, não é impossível... você pode in-
os alunos relataram que percebiam tegrar por projetos, em todo aquele
essa inter-relação entre o conteúdo semestre a escola vai trabalhar um
grande projeto onde entra todos os
que eles estavam estudando naque- campos de conhecimento ou você
la disciplina com outros conteúdos pode trabalhar por temas, Paulo
ou com uma visita técnica ou uma Freire, temas geradores... isso não
tem uma regra, porque a gente par-
aula prática. Mas também que per- te do princípio que vocês como pro-
cebiam mais fortemente essa rela- fessores, foram se formando e têm
ção das áreas quando desenvolviam os elementos pra dizer "bom, aqui
nós vamos tentar isso, vamos tentar
alguma atividade prática, ou projeto aquilo”. Não existe uma fórmula, o
de ensino, de pesquisa ou extensão. que existe é uma concepção, de não
negar um conhecimento básico em
Dado o exposto, percebe-se que todas as áreas do que é humano.
(FRIGOTTO, 2014)
320
modo, se torna necessária a forma- pitalista neoliberal que ameaçam as
ção continuada dos educadores para conquistas da classe trabalhadora
aprofundamento dos conceitos de e de educadores socialistas. Isso é
integração e das concepções curri- claramente demonstrado pelo atu-
culares e metodológicas para efeti- al governo, que edita um pacote de
vação dessa proposta. “contrarreformas” de Medidas Pro-
As políticas curriculares imple- visórias, Projetos de Lei e Emendas
mentadas nos últimos dez anos têm à Constituição que ferem e retroce-
avançado no sentido de definir nas dem nas conquistas alcançadas até
Diretrizes Curriculares Nacionais para aqui, tais como a Lei nº 13.415/20173,
a Educação Básica (Resolução CNE/ a nova Base Nacional Comum Curri-
CEB nº 4/2010), nas Diretrizes Curri- cular (BNCC)4; a Emenda Constitucio-
culares Nacionais para o Ensino Mé- nal nº 95/20165 e o Projeto de Lei do
dio (Resolução CNE/CEB nº 2/2012) e Senado nº 193/20166. Esse pacote de
nas Diretrizes Curriculares Nacionais medidas antissociais precariza o tra-
para a Educação Profissional Técnica balho docente, despolitiza o ensino,
de Nível Médio (Resolução CNE/CEB empobrece o currículo e impede a
nº 6/2012) como eixos articuladores efetivação de uma educação integral
e integradores do currículo: trabalho, de qualidade.
ciência, cultura e tecnologia, tendo A luta pela superação da concep-
trabalho como princípio educativo ção utilitarista do ensino médio e
e a pesquisa como princípio peda- da educação profissional está posta
gógico. Mas encontram como desa- como resistência ao capital. O mo-
fio, na atualidade política brasileira, mento atual brasileiro tem exigido
projetos e programas de cunho ca- enfrentamento e posicionamento
322
Reis Filho. 1. ed. São Paulo: Expressão
Popular, 2000.
324
priorizando, no caso da Educação série de dicotomias, de contradições
Profissional de nível médio, a forma e de possibilidades, o que evidencia
de cursos integrados (BRASIL, 2008, o trabalho escolar e a prática docente
p. 4). O conceito de ensino integral, a partir de novas perspectivas. Nessa
contudo, não se origina e nem se direção, a inserção político-social da
restringe a essa modalidade de or- escola, aqui, analisada, bem como
ganização de cursos, ainda que mui- o posicionamento do curso Técnico
tas pessoas só o identifiquem nessa em Enfermagem, nesse contexto,
acepção. constituem-se como espaço privi-
Discussões e propostas de edu- legiado para dar contornos claros e
cadores vão mais longe. Ao defen- nítidos, materializando, assim, as elu-
derem a proposta de Ensino Médio cubrações propostas.
Integrado, resgatam fundamentos
filosóficos, epistemológicos e peda- 2. DESENVOLVIMENTO
gógicos da concepção de educação
politécnica e omnilateral e a de es-
2.1. Do ensino integrado ao currí-
cola unitária, baseados no programa culo integrado
de educação de Marx e Engels e de
Interdisciplinaridade, educação
Gramsci (RAMOS, 2011, p. 772).
global, centros de interesse, metodo-
Tais fundamentos convergem logia de projetos, globalização são
para uma concepção de currículo in- vocábulos que traduzem coisas bem
tegrado, cuja formulação incorpora semelhantes. Para Santomé (1998),
contribuições já existentes sobre o não obstante a vasta diversificação
mesmo tema, mas pressupõe a pos- de termos, pode-se pensar que, no
sibilidade de se pensar em um currí- fundo, trata-se apenas do mesmo e
culo convergente com os propósitos do eterno problema, ainda não re-
da formação integrada – formação solvido de maneira definitiva, isto é:
do sujeito em múltiplas dimensões, a necessidade de superar a fragmen-
portanto, omnilateral – e da supera- tação dos conhecimentos e a impe-
ção da dualidade estrutural da socie- rativa tarefa de estabelecer diálogo
dade e da educação brasileiras (RA- entre o currículo e a realidade coti-
MOS, 2011, p. 772). Nesse sentido, diana.
por sua complexidade e sua plurali-
Nesse sentido, fundamenta-se
dade, os estudos apontam para uma
o conceito de currículo integrado
326
construir todo o aparato ideológico bilização do governo com a adoção
[...]”. (MOURA, 2012, p. 54).
do real, o qual visava o ajuste estra-
tégico e à retomada do crescimento
Em face disso, o que se viu, em econômico. É nesse cenário em que
relação às novas regulamentações, se processam importantes mudan-
foi a fragmentação do ensino técni- ças no campo educacional. O ensino,
co, enfeixado junto com outras polí- consoante a perspectiva neoliberal
ticas, sob a denominação de Educa- de mercantilização, transforma-se
ção Profissional e Tecnológica. Essa em produto de venda. E, nessa pers-
tendência, consubstanciada em uma pectiva, aqueles que conseguem pa-
reforma educacional, implementada gar por um produto, assim o fazem,
no Brasil, a partir dos anos de 1990, deixando a rede pública como alter-
ocorre sob um novo modelo de Es- nativa para os que não conseguem
tado, de padrão norte-americano ou fazê-lo (SILVEIRA, 2004).
liberal-corporativo (RAMOS, 2012). Com isso, e tendo em vista a de-
Nele, ao mesmo tempo em que a sorganização do ensino técnico de
vida econômica é deixada ao livre nível médio, gerada pelo Decreto nº
jogo do mercado, o conflito de inte-
resses é também resolvido numa es-
2.208/97, as políticas de formação,
pécie de mercado político, no qual para o trabalho, passam a ser orien-
os grupos com recursos obtêm re- tadas para os programas de capaci-
sultados, enquanto os que não dis-
põem de tais recursos são excluídos,
tação em massa (RAMOS, 2012).
sem condições de obter influência “As escolas técnicas deixaram de
real. Estamos diante da proposta oferecer ensino médio profissionali-
mais conhecida como “neoliberal”, zante para oferecer cursos técnicos
que vem predominando em nosso concomitantes ou sequenciais a
país pelo menos desde o governo esses. A formação destinada aos tra-
Collor (COUTINHO, 2006 apud RA- balhadores passou a ser comparti-
MOS, 2012, p. 34). lhada pelos ministérios da Educação
e do Trabalho.” (RAMOS, 2012, p. 36).
328
II – concomitante, oferecida somen- cionalização, os Institutos Federais ,
te a quem já tenha concluído o ensi-
conforme Moura (2012), não foram,
no fundamental ou esteja cursando
o ensino médio, na qual a comple- totalmente, bem sucedidos no que
mentaridade entre a educação pro- concerne a manter o foco nas ques-
fissional técnica de nível médio e o
tões político-pedagógicas. Para o
ensino médio pressupõe a existên-
cia de matrículas distintas para cada autor, a estrutura administrativa das
curso [...] novas instituições, como, por exem-
III – subsequente, oferecida somen- plo, no que diz respeito à ocupação
te a quem já tenha concluído o ensi- dos novos cargos criados e à cons-
no médio (BRASIL, 2004, p. 2).
trução de prédios, sublinhadas pelo
imediatismo desse processo, figu-
A possibilidade de um ensino in- raram como eixo de deslocamento,
tegrado era real, sendo necessário roubando muito da centralidade que
avançar em sua direção, de modo a deveria repousar nas questões de en-
contribuir para uma efetiva (re)cons- sino-aprendizagem (MOURA, 2012).
trução da identidade e do sentido Por esse caminho, corre-se o risco
dessa etapa da educação básica bra- de negligenciar a construção de
projetos político-pedagógicos bem
sileira. Nessa perspectiva, contribui,
fundamentados, elaborados cole-
para esse processo de construção, a tivamente e coerentes com a reali-
implementação de um novo modelo dade socioeconômica local e regio-
nal de cada nova unidade. Por esse
institucional, consubstanciado nos
caminho, se está negligenciando a
Institutos Federais de Educação, Ci- necessária formação dos professo-
ência e Tecnologia (IFETs), e regula- res que estão sendo aprovados nos
concursos públicos para ingressar
mentado pelo Decreto nº 6.095/2007
na rede federal, principalmente nas
e pela Lei nº 11.892/2008. novas unidades. Essa é uma situação
crucial, pois muitos desses novos
Conforme Pereira (2010), a cria- e jovens professores são mestres e
ção dos Institutos Federais não con- doutores recém-formados, mas se-
sistiu apenas em uma ampliação da quer conhecem o campo da educa-
ção, uma vez que são bacharéis.
estrutura física da rede, mas também
Quanto aos licenciados nas discipli-
representou a afirmação de uma
nas da educação básica, muitos não
nova “[...] concepção de Educação conhecem a educação profissional,
Profissional que [colocasse] em seu pois os cursos de licenciatura, em
geral, não incluem em seus currícu-
cerne a humanização e democrati-
los estudos sobre esse campo e me-
zação do progresso” (PEREIRA, 2010, nos ainda sobre a sua relação com
p. 239). Não obstante, em sua opera- o ensino médio, de maneira que os
330
ção especial, enfim, de forma ampla, tes, questões políticas associadas aos
nas práticas educativas. Afinal, currí- aspectos ideológicos.
culo integrado não encerra o discur- Em relação ao contexto político,
so na modalidade de ensino médio, destaca-se o Decreto nº 5.154/2004,
vinculada à Educação Profissional, que buscava resgatar a base unitá-
mas antes vislumbra um universo ria do ensino médio, com vistas a
complexo de experiência educativa, “[...] restabelecer as condições jurí-
bastante abrangente e com grande dicas, políticas e institucionais que
potencial de transformação. se queria assegurar na disputa da
A exemplo disso, no caso da for- LDB na década de 1980.” (CIAVAT-
mação técnica em enfermagem do TA; FRIGOTTO; RAMOS, 2012, p. 37).
Instituto Federal da Bahia (IFBA), Disputa que, à época, resultou no
campus Eunápolis, observada nesta Decreto nº 2.208/1997 e na Portaria
análise, a forma de organização, em nº 646/1997, os quais proibiam a for-
nenhum momento, se deu por meio mação integrada e regulamentavam
da modalidade de ensino integrado. formas fragmentadas e aligeiras de
A opção pedagógica foi por estrutu- Educação Profissional, em função
rá-la nos moldes de ensino subse- das alegadas necessidades do mer-
quente, o que não inviabilizou o per- cado (CIAVATTA; FRIGOTTO; RAMOS,
curso no que concerne ao currículo 2012).
integrado, aqui, admitido como fun-
damento filosófico e epistemológico.
Do ponto de vista ideológico,
elementos compatíveis com o pen-
2.2 Espaço escolar: fios e desafios
samento de currículo integrado pa-
enredados recem, a princípio, não ter emanado
de uma escolha didático-pedagógi-
No contexto do curso Técnico em
ca, mas figurado como consequên-
Enfermagem do IFBA, na época CE-
cia frente ao desejo de se adequar
FET-BA (Centro Federal de Educação
à formação, no curso em análise, a
Profissional e Tecnológica da Bahia),
perspectiva marxista da saúde, em
ao lado do protagonismo docente,
consonância com a proposta de mu-
destacaram-se, como fatores motiva-
dança de paradigma sanitário, isto
cionais, para a busca de uma reforma
é, a transição do modelo flexneria-
curricular, figurando como elemen-
no, centrado na atenção médica e
tos estruturantes das ações docen-
332
modo intenso, a construção curricu- ções bastantes presentes na fala de
lar, aproximando-a das concepções Tarsila:
de escola unitária e de politecnia. So- Eu penso na formação integral,
bre essa centralidade da formação, né[...] essa formação omnilateral,
que tanto se fala, que a gente tanto
a partir do trabalho, perpassando a almeja, mas que a gente não con-
relevância do conceito para existên- segue. Então não é formar apenas
cia humana, Ramos (2012), citando para o trabalho, para o mercado de
trabalho, mas eu acho que[...] tendo
Lukács (1978) e Mészáros (1981), co- o trabalho como princípio educati-
menta: vo, né. A formação humana, mesmo,
A produção da existência humana, né, do sujeito que vai modificar o
portanto, se faz mediada, em pri- mundo, né, que consegue fazer essa
meira ordem, pelo trabalho. Primei- reflexão e intervir nesse mundo que
ramente, como característica ine- tá, atual, né. (sic) (TARSILA).
rente ao ser humano de agir sobre
o real, apropriando-se de seus po-
tenciais e transformando-o. Por isto Muito embora, a materialização
o trabalho é uma categoria ontoló- dos pressupostos ideológicos, na
gica: é inerente à espécie humana e
primeira mediação na produção de perspectiva de conceitos pedagógi-
bens, conhecimentos e cultura (RA- cos, expressos nos depoimentos e no
MOS, 2012, p. 108). texto do PPC (Projeto Pedagógico do
Curso), não se estabelece de forma
Nessa perspectiva, acredita-se tão nítida. Observa-se, por exemplo,
que a preocupação, com a esfera que, nas falas, os termos integrado,
do trabalho, no bojo da discussão integral, integração e integrado não
curricular, evidencia, como pressu- aparecem com tanta frequência. Tal
posto, na organização do currículo, fato, conforme explicitado anterior-
a formação humana, a qual concebe mente, ao que parece, demonstra
o sujeito como ser histórico-social que a construção não se pautou na
concreto, capaz de transformar a re- perspectiva de aplicação de matrizes
alidade em que vive; tendo, assim, o teórico-metodológicas estabeleci-
trabalho como princípio educativo, das, mas antes emergiu da esponta-
no sentido em que o trabalho permi- neidade do anseio de uma proposta
te, concretamente, a compreensão educacional mais condizente com o
do significado econômico, social, his- cenário da saúde, em âmbito nacio-
tórico, político e cultural das ciências nal.
e das artes (RAMOS, 2012). Concep-
334
casa com o que a gente sempre al- pulação, né, que envolvesse desde
mejou de formação, né, assim...da... a qualidade dos serviços de saúde,
de profissionais, para atuar na...na mas também, até as condições de
área de saúde, desde 1800...1988... vida e de trabalho, né, território...
pra cá... (sic) (PAGU). (sic) (PAGU).
336
Conforme Pagu, trata-se de fer- 3. CONCLUSÃO
ramenta essencial para a construção
do currículo integrado: Em relação ao currículo integra-
[...] as pessoas estão ali, elas discu- do, observa-se que, consoante o seu
tem, elas...é...estão juntas fisicamen- caráter ideológico e epistemológico,
te. E num processo desse não tem os encaminhamentos práticos, para
como ser virtual, né. Na construção
de um currículo integrado, as pes- o seu estabelecimento, não estão
soas precisam estar integradas, elas bem definidos. Ao contrário do que
precisam sentar juntas, elas preci- ocorre com o ensino integrado, no
sam...então...assim...(sic) (PAGU).
qual o conceito é utilizado apenas
no que está relacionado a um arranjo
Nesse contexto, exige-se a mo- organizacional.
bilização de novos e de diversos sa-
Nessa perspectiva, não existem
beres docentes numa perspectiva
fórmulas prontas e as estratégias,
de ruptura com o processo de tra-
para efetivação da politecnia e da
balho, calcado na fragmentação dos
omlateralidade, no bojo do currícu-
saberes e na desarticulação entre os
lo integrado, vão sendo definidas de
profissionais; engendrando, assim,
modo intuitivo, de acordo com as
desafios e novas abordagens. Esse
necessidades e o perfil da realidade
percurso envolve muitos desafios
escolar. Não obstante, a união do en-
e muitas disputas, o que resulta em
sino com o trabalho produtivo, a afir-
um caminho bastante heterogêneo.
mação do trabalho, como princípio
Contudo, a longevidade do trabalho,
educativo, e a busca de superação
que já conta com mais de dez anos, e
da fragmentação, com vistas a uma
os bons resultados, em relação à for-
melhor compreensão da realidade,
mação, tornam, de certo modo, vigo-
e objetivando superá-la, ao que pa-
rosa a constatação de uma busca real
rece, são marcas indispensáveis per-
na direção de um ensino integral,
meando as estratégias.
ainda que com base organizacional
diversa; o que se constitui como um
REFERÊNCIAS
convite para reflexões e experiên-
cias sobre uma formação condizente CIAVATTA, Maria; SILVEIRA, Zuleide
com os princípios da omnilateralida- Simas da. Celso Sucow da Fonseca.
de, e, também, indo além das or