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Caderno CRH

ISSN: 0103-4979
revcrh@ufba.br
Universidade Federal da Bahia
Brasil

Dubet, François
Qual democratização do ensino superior?
Caderno CRH, vol. 28, núm. 74, mayo-agosto, 2015, pp. 255-265
Universidade Federal da Bahia
Salvador, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=347641520002

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François Dubet

Qual democratização do ensino superior?

DOSSIÊ
François Dubet*

Esse artigo, resultante de uma conferência, discute traços do processo de democratização do ensino superior.
Procura distinguir analiticamente várias dimensões da democratização, baseadas, por sua vez, em concepções
diferentes da justiça: igualdade de oportunidades, meritocracia, utilidades e equidade dos procedimentos.
Cada sociedade constrói modelos de democratização desse ensino. A massificação do ensino superior de-
sempenhou papel democrático objetivo, favorável aos grupos sociais antes excluídos. Mas massificação não
equivale à democratização. Todas as categorias sociais não se beneficiam da mesma forma da massificação.
A democratização do acesso ao ensino superior não depende apenas das famílias. Depende também da estru-
tura geral do sistema educativo. A meritocracia acadêmica constrói uma hierarquia de competências que é
também social, com forte impacto reprodutivo. As desigualdades de utilidade das diferentes formações têm
impacto sobre o conjunto das desigualdades sociais. Os sistemas educativos implementam distintos procedi-
mentos de seleção, de concessão de gratuidades, bolsas e auxílios, que podem ser considerados como mais ou
menos equitativos segundo as normas de justiça que mobilizam.
Palavras-chave: Ensino superior. Democratização. Valor social dos diplomas. Equidade. Igualdade de oportunidades.

Na maioria dos países, os sistemas de A noção de democratização do ensino


ensino superior se democratizaram. Isso signi- superior, contudo, pode e deve ser entendida
fica simplesmente que estabelecimentos de en- de muitas maneiras diferentes. Para além da
sino superior, faculdades e universidades, até simples massificação, é possível falar da de-
então reservados a uma pequena elite social e mocratização do acesso aos estudos superio-
escolar, abriram suas portas a alunos prove- res, perguntando-se que categorias sociais se
nientes de classes sociais mais modestas. Na beneficiaram da massificação. Outro critério, o
América do Norte e em alguns países da Eu- da democratização interna, diz respeito às de-
ropa, a porcentagem de estudantes no ensino sigualdades internas do ensino superior: os es-
superior é de cerca de 50% da faixa etária ade- tudantes são mais numerosos, mas acessam ní-

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quada a esse nível, representando o horizonte veis muito desiguais nesse sistema. A análise
“da sociedade do conhecimento” traçado pelas dessas desigualdades internas dos sistemas de
agências internacionais como a Organização ensino superior levanta a questão da democra-
para Cooperação e Desenvolvimento Econômi- tização como equidade dos procedimentos de
co – OCDE (Santiago et. al., 2008). Nesse caso, seleção, ou, se preferirmos, da democratização
a democratização designaria apenas a abertura como justiça (Dubet, 2004, 2010). Finalmente,
de um sistema de ensino e a massificação do é preciso analisar a democratização do ensino
acesso a um bem escolar. superior em termos de utilidades1 acadêmicas:
qual o valor dos diplomas no mercado de tra-
* École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS). balho? Um sistema democrático, sob todos os
Centre d’Analyse et Intervention Sociologiques (CADIS).
3ter, place de la Victoire. 33076 Bordeaux. 1
N.T. A palavra utilizada originalmente em francês foi
françois.dubet@u-bordeaux.fr “Emprise”, cuja tradução poderia ser influência, ascen-
1
Este artigo é resultante da conferência apresentada no Se- dência, utilidade. Esse último termo foi escolhido por se
minário Internacional sobre Democratização do Ensino Su- aproximar mais fortemente do significado explicitado pelo
perior, realizado no PPGSA/UFRJ em novembro de 2013. próprio autor, de valor. No caso, valor social dos diplomas.
Tradução de Hermínia Willians Athayde, revisão M. Ligia Mesmo que essa palavra tenha uma forte conotação eco-
Barbosa. Por se tratar de uma conferência, as citações e refe- nômica, optou-se por “utilidade” por agregar também uma
rências são bastante reduzidas, sendo indicados pela editora ênfase maior na ideia de valorização, inclusive econômica,
os trabalhos de referência do autor para os temas específicos que a simples “influência”.

http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792015000200002 255
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aspectos do conceito, mas no qual os diplomas lheres eram excluídas de muitas formações su-
não valessem nada, não seria realmente demo- periores, enquanto hoje em dia elas represen-
crático (Dubet et al., 2010). tam, muitas vezes, a maioria do alunado.
Após ter buscado definir essas dife- A massificação do ensino superior de-
rentes dimensões da democratização escolar, sempenhou, portanto, um papel democrático
tentaremos mostrar como elas se articulam objetivo ao aumentar mecanicamente as pos-
em diversos sistemas nacionais, comparando, sibilidades de se fazer estudos longos. As clas-
por alto e entre si, alguns países europeus com ses médias beneficiaram-se amplamente dessa
condições socioeconômicas semelhantes e ta- massificação e uma parte das classes popula-
xas de massificação próximas. Tudo se passa res também aumentou suas possibilidades de
como se cada sociedade tivesse construído ter acesso à universidade. Mesmo quando se
progressivamente seus próprios modelos de tem prazer em salientar que os filhos de operá-
democratização do ensino superior. rios têm três vezes menos chances de entrar na
universidade do que os filhos de executivos,
o fato é que muitos deles entram atualmente,
DEMOCRATIZAÇÃO E MASSIFICAÇÃO sendo que isso era praticamente impossível
há uns cinquenta anos atrás. No fundo, ocor-
Sob o pretexto de que a abertura dos sis- re com o ensino superior o mesmo que ocorre
temas de ensino superior não cumpriu todas com todos os outros bens: a massificação tem
as promessas, diversas retóricas conservadoras um efeito democrático automático, quer se tra-
ou radicais denunciam essa expansão como te de geladeiras, de automóveis, de televisões
uma ilusão, quando não como uma catástrofe ou de diplomas superiores.
cultural. Para os conservadores, a massificação Essa democratização foi, portanto, fa-
teria reduzido o nível cultural das universida- vorável aos grupos que eram praticamente
des e o teria submetido aos interesses sociais. excluídos do ensino superior, mas muitos eco-
Para os radicais, ela não alteraria em nada a nomistas são de opinião que, além disso, ela
ordem das desigualdades sociais, exceto por foi positiva para a sociedade, por aumentar o
lhe conferir mais legitimidade ainda. As duas capital social da população. Nesse processo,
avaliações devem ser bastante matizadas. os conhecimentos acadêmicos e as culturas
É importante, em primeiro lugar, colocar de elite ter-se-iam espalhado pela sociedade,
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as coisas em ordem de grandeza. Na França,2 o nível cultural médio da população também


por exemplo, no início do século XX, a porcen- teria aumentado, e tudo isso teria tido um efei-
tagem de estudantes entre os jovens era de apro- to muito positivo no desenvolvimento econô-
ximadamente 1%. Nos anos 1960, ela alcança mico e no enriquecimento da sociedade. Com
10% e, hoje, é da ordem de 40%. As tradições isso, a massificação universitária teria tido um
universitárias foram, portanto, extremamente efeito positivo, inclusive para aqueles que,
elitistas e por um período muito longo. Apenas embora dela não tenham auferido benefícios
os filhos da aristocracia, da grande burguesia e diretos, se beneficiaram indiretamente: mais
um pequeno número de alunos considerados médicos, mais engenheiros, mais especialistas,
excepcionalmente “talentosos” tinham acesso à mais profissionais.
universidade. Lembremos também que as mu- Muitos especialistas pensam também
que a massificação do ensino superior teria tido
2
N. E. Esses dados foram trabalhados extensivamente no
estudo que compara os sistemas de ensino superior nos um efeito positivo sobre a modernização e a
países da OCDE (Dubet et al., 2010). Sua fonte primária democratização dos valores nas sociedades. De
são os inúmeros relatórios publicados a partir dos da-
dos do Programme for International Student Assessment fato, muitas pesquisas demonstram que aque-
(PISA), desde 2000, principalmente Literacy Skills for the
World of Tomorrow (OCDE, 2003). les que têm diplomas de curso superior aderem

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mais do que os outros a valores progressistas, gualdade de oportunidades.3


humanistas e democráticos. Confiam mais na Os recursos financeiros são um dos
ciência e na democracia e são menos autoritá- principais fatores na desigualdade de acesso
rios que os cidadãos com menos escolaridade. à universidade. Não somente alguns países
De modo geral, desde os anos 1960 e da massi- não têm um sistema universitário que não é
ficação democrática nos países ricos, os campi gratuito e, consequentemente, está fora do al-
e os movimentos estudantis defendem os valo- cance das classes sociais mais modestas, mas,
res de igualdade, paz, ecologia e democracia: mesmo nos países onde os estudos superiores
vide a revolta dos campi americanos, o Maio são gratuitos, ou quase, eles têm um custo. Os
de 68 na França, a revolta da Praça Tiananmen estudantes precisam viver, alimentar-se e alo-
em Pequim, as Primaveras árabes… jar-se durante o período em que estão estudan-
Por tudo isso, a maioria dos governos do. Além disso, o tempo dedicado aos estudos
escolheu abrir o acesso ao ensino superior. representa também uma perda de salário que
Muitas vezes, essa noção não é discutida e nos muitas famílias não podem assumir, uma vez
damos conta de que todos os governos, ou qua- que já esperam dos jovens que se responsabi-
se, jogam essa carta de diversas formas. No en- lizem por si mesmos e que contribuam para o
tanto, essa confiança na democratização como sustento da família. Os sistemas de bolsas e de
massificação não basta para fazer a análise de subsídios diversos, as possibilidades de combi-
todas as dimensões nela envolvidas. nar o trabalho com os estudos podem atenuar
essa deficiência econômica, mas ela continua
a existir assim mesmo. É o que explica porque
A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO as classes médias foram as grandes beneficiá-
rias da massificação escolar e porque as classes
Quando se define a democratização com populares “optam” pelo trabalho precoce ao
base no critério da igualdade de oportunida- término dos estudos obrigatórios. Com a crise
des oferecida a todos os indivíduos, de todos econômica, observa-se, hoje em dia, a formação
os grupos sociais, de ter acesso ao ensino su- de uma categoria de estudantes extremamente
perior, torna-se evidente que a massificação pobres. De modo geral, quanto mais uma socie-
não é necessariamente uma democratização. dade é relativamente igualitária, mais o acesso
De fato, sob esse prisma, a democratização exi- ao ensino superior é democrático.

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giria que todas as classes sociais tivessem as Contudo, nos países mais ricos relativa-
mesmas possibilidades e que a população dos mente igualitários, as desigualdades econômi-
estudantes retratasse a sociedade. Ainda que cas explicam menos as desigualdades de aces-
a igualdade de oportunidades de ingressar no so ao ensino superior do que as desigualdades
ensino superior varie bastante de acordo com culturais. De fato, o acesso ao ensino superior é
os países (é maior na Suécia e no Japão do que condicionado pelo sucesso acadêmico dos alu-
na Argentina ou na África do Sul), ela não se nos no ensino primário e secundário e todos os
concretiza em nenhuma sociedade. Para dizê sociólogos sabem que esse sucesso depende do
-lo de forma mais simples, quanto mais eleva- capital econômico das famílias. Na verdade, até
da a origem social dos indivíduos, mais eles mesmo nos países onde o peso das desigualda-
têm oportunidade de cursar o nível superior. des econômicas foi reduzido, as desigualdades
Todas as categorias sociais não se beneficiam dos capitais culturais determinam muito mais
da mesma forma da massificação. Há cinquen- as desigualdades escolares. Em alguns casos,
ta anos, um número considerável de trabalhos há mesmo “resistência” à abertura da universi-
é dedicado a essa questão. A grande maioria 3
N. E. Esse tema é discutido de forma particularmente
destaca três explicações principais para a desi- destacada em Dubet (2010), em especial os capítulos 1 e 3.

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Qual democratização do ensino superior?

dade por parte das culturas das classes popula- as desigualdades de acesso, mas acentua as de-
res, que consideram que esses estudos não são sigualdades internas desses sistemas. Quando
feitos para os filhos de trabalhadores, o que os os sistemas universitários são malthusianos e
leva a limitar, elas mesmas, suas ambições. Na relativamente aristocráticos, são também, ao
Grã-Bretanha, por exemplo, os filhos da clas- mesmo tempo, relativamente homogêneos, e a
se operária ingressam menos na universidade distância que separa seus segmentos de maior
do que os filhos de imigrantes, que valorizam prestígio dos demais é relativamente curta,
muito mais os estudos superiores. Não somen- porque há pouca concorrência entre eles. De
te o ingresso na universidade é determinado modo inverso, quando os sistemas se abrem,
pelas desigualdades culturais, mas essas desi- a hierarquia entre os estabelecimentos e entre
gualdades são mais difíceis de reduzir do que as universidades não para de aumentar. De-
as desigualdades econômicas. corre daí que, nos sistemas mais abertos, as
A democratização do acesso ao ensino desigualdades ocorrem menos no momento
superior não depende somente dos meios finan- do ingresso, deslocando-se para dentro do pró-
ceiros e dos capitais cultural e acadêmico das prio sistema. A relativa igualdade de acesso à
famílias. Ela depende também da estrutura ge- universidade é acompanhada de um aumento
ral do sistema educativo. A igualdade de acesso das desigualdades de acesso aos diversos seg-
ao ensino superior é mais democrática quando mentos do sistema escolar.
o ensino secundário é amplamente aberto e Nos sistemas mais abertos, “as verda-
quando os alunos têm um bom nível e uma re- deiras” desigualdades são medidas dentro do
lativa igualdade de desempenho. É o que ocorre próprio sistema, e pode-se falar de “democrati-
nos países escandinavos, no Canadá, no Japão e zação segregativa”. Com base em seus recursos
em alguns outros. Em contrapartida, quando o financeiros, seu local de residência, suas com-
ensino repousa sobre uma base estreita e é mui- petências acadêmicas, seu capital cultural, os
to desigual, o acesso ao ensino superior é muito estudantes se orientam para formações mais
pouco democrático. Esse foi, por muito tempo, ou menos prestigiosas e mais ou menos rentá-
o caso da Alemanha, onde o ensino secundário veis. Por toda a parte, verificam-se profundos
repousava sobre uma estreita base elitista. É o afastamentos entre as universidades de maior
caso dos países que desenvolveram o seu ensi- e de menor prestígio, separando-se, com frequ-
no superior sobre uma base de ensino primário ência, as mais antigas das mais novas. Em al-
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e secundário extremamente desigual e frágil. guns países, como a França, a principal divisão
Pensamos aqui nos países da África e em alguns se encontra entre as grandes écoles e as univer-
países da América Latina. Em outras palavras, sidades. Em outros lugares, é na distância en-
a democratização do acesso ao ensino superior tre as universidades públicas e as universida-
pressupõe que as sociedades já tenham constru- des privadas que se organiza essa hierarquia.
ído um sistema de educação eficaz e relativa- Em algumas sociedades, são as universidades
mente democrático e que não tenham colocado públicas as que gozam de maior prestígio; em
“o carro na frente dos bois”. outras, são as universidades privadas.
É notável como a história universitária
de cada país acabou construindo um sistema
A democratização interna hierárquico original e, muitas vezes, bastante
sutil, que requer que os atores conheçam to-
A observação dos mecanismos de mas- dos seus mecanismos. Entre os dois polos do
sificação dos sistemas universitários poderia sistema, estende-se uma complexa hierarquia
levar a enunciar a seguinte “lei” sociológica: a baseada na reputação, na capacidade de atrair
massificação dos sistemas universitários reduz os melhores estudantes e os melhores profes-

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sores, de garantir a maior utilidade dos diplo- DEMOCRATIZAÇÃO DAS UTILIDA-


mas, de construir as redes sociais que fazem DES DOS DIPLOMAS
com que os antigos estudantes se apoiem mu-
tuamente para monopolizar as posições profis- Em geral, a democratização dos sistemas
sionais de maior prestígio. Na maioria dos paí- universitários é analisada a montante, ou seja,
ses, algumas universidades, algumas escolas e a partir das “entradas” desses sistemas: tenta-
alguns institutos adquiriram um quase mono- se medir os efeitos das desigualdades sociais
pólio da produção de elites e, geralmente, seus sobre as desigualdades acadêmicas. Mas essa
estudantes procedem, eles mesmos, das elites, abordagem está longe de ser suficiente, porque
o que assegura uma forte reprodução social o ensino superior distribui bens acadêmicos,
dos dirigentes de empresas, altos funcionários, diplomas, cujas utilidades dependem das rela-
líderes políticos, e intelectuais. ções existentes entre a produção de diplomas
Hoje, as hierarquias dos estabelecimen- e a de empregos que exigem maiores qualifica-
tos do ensino superior tornaram-se uma ques- ções. Podem-se considerar, como desigualdade
tão pública, e a imprensa, as agências gover- fundamental, as desigualdades de utilidade
namentais, as classificações internacionais, das qualificações acadêmicas.4
como a de Shanghai, não param de ranquear os Quando os sistemas de ensino superior
elementos do sistema em termos de prestígio e eram malthusianos e reservados a uma elite
rentabilidade dos diplomas. Essas hierarquias restrita, a utilidade social dos diplomas po-
orientam as estratégias dos estabelecimentos dia ser garantida por sua escassez. A situação
que procuram desenvolver suas vantagens no ainda era favorável nos anos 1960 na Europa,
“mercado” universitário, mas orientam princi- quando a massificação escolar era menos rápi-
palmente as escolhas dos estudantes. Quanto da que a demanda de empregos que requeriam
mais se reconhece o prestígio de um estabe- maiores qualificações; nesse caso, os diplomas
lecimento mais ele pode ser seletivo, ou até do ensino superior podiam se multiplicar e
mesmo superseletivo, dado que pode jogar, ter, ao mesmo tempo, um valor crescente no
inclusive, com um mercado internacional. Por mercado de trabalho. Hoje, nos países que já
outro lado, os estabelecimentos menos presti- massificaram há algum tempo o seu ensino su-
giosos não podem ser seletivos e, para sobre- perior, a situação já não é bem a mesma. Em
viver, precisam atrair constantemente novos

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toda parte, os diplomas do ensino superior de-
estudantes. sempenham um papel útil no acesso ao empre-
Essa meritocracia acadêmica, com os go e no nível da renda, mas esse papel mesmo
melhores estudantes sendo selecionados pelos tornou-se extremamente desigual.
melhores estabelecimentos e melhores cur- No topo da hierarquia, as formações
sos, constrói uma hierarquia de competências mais seletivas têm uma espécie de monopólio
acadêmicas extremamente pronunciadas. E, sobre o acesso às profissões e às diversas elites
quando se olha de perto, fica evidente que essa que, muitas vezes, saem das mesmas escolas
hierarquia do mérito acadêmico é também uma e das mesmas universidades. À custa de uma
hierarquia social, que induz frequentemente forte seleção e de sólidas redes, essas forma-
uma forte reprodução social, pois, mesmo que ções mantêm uma utilidade muito grande dos
um elevado número de estudantes tenha acesso diplomas relacionados a “rendas” acadêmicas.
ao ensino superior, a distribuição deles no sis- Aqui, a correlação entre diplomas e empregos
tema continuará a ser extremamente desigual.
4
N. E. Essa discussão é feita de maneira bastante alentada
em Dubet et al. (2010). Em português, podemos encontrar
algumas indicações em Dubet et al. (2012). Nesse último
artigo, com excelente tradução, utilizou-se a palavra “in-
fluência” para traduzir a ideia de “emprese”.

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Qual democratização do ensino superior?

continua forte. Todavia, quanto mais “se des- ça, mais de 70% dos possuidores de diploma de
ce” na hierarquia do sistema e mais se aproxi- educação secundária. Nesse caso, aqueles que
ma de formações gerais pouco seletivas, mais a não são diplomados se veem condenados ao
correlação se enfraquece e menos os mercados desemprego, à precariedade e à marginalidade
de trabalho reconhecem as formações escolares profissional. Basicamente, a massificação esco-
pouco seletivas e pouco especializadas. Os es- lar exclui violentamente aqueles que não tira-
tudantes precisam, então, fazer o esforço de se ram proveito dela.
“inserir”, ou seja, transformar suas competên- As desigualdades de utilidade das for-
cias acadêmicas em competências profissionais. mações universitárias participam, portanto, das
Às vezes, essa perda relativa de valor desigualdades: quanto mais elas são desiguais,
dos diplomas é vivida pelos envolvidos como mais aumenta o impacto das desigualdades
um processo subjetivo de perda de status so- educacionais propriamente ditas. É possível
cial. Os estudantes cursaram muito mais es- demonstrar, assim, que a influência dos diplo-
tudos superiores do que os seus pais para mas sobre o acesso ao emprego e sobre o salário
ocupar, ao término de seu percurso, posições aumenta as desigualdades educacionais e a sua
profissionais e sociais próximas das que eles reprodução. Os sistemas nos quais os diplomas
tiveram. Muitas vezes, esses estudantes se sen- têm um valor menor podem ter desigualdades
tem traídos pela universidade que lhes “ven- educacionais relativamente mais fortes, mas o
deu” uma esperança de mobilidade social que impacto sobre as desigualdades sociais que de-
ela não lhes ofereceu. Com a multiplicação das las decorre é mais fraco7. Não se deve, portanto,
formações universitárias, é preciso pagar cada ignorar as desigualdades dos outputs ou da si-
vez mais para alcançar a mesma posição so- tuação à jusante das formações para apreender
cial. Certos analistas falam disso como “over todas as dimensões das desigualdades.
education”, designando, assim, uma ruptura
da relação entre o mercado dos diplomas e o
do trabalho.5 A essa “inflação” de diplomas é DEMOCRATIZAÇÃO E EQUIDADE
preciso acrescentar a redução da correlação
entre as formações ou cursos e os empregos. O mecanismo geral que acabamos de des-
Isso ocorre quando uma porcentagem muito crever não funciona de forma automática, por-
alta de estudantes - na França, a proporção é de que cada sistema educativo implementa proce-
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um estudante sobre dois - trabalha num campo dimentos de escolha e de seleção que podem
sem relação com sua formação.6 ser considerados como mais ou menos equitati-
Um dos efeitos induzidos pela massifi- vos do ponto de vista das normas de justiça que
cação do ensino superior é a deterioração da si- mobilizam. Afinal, é provável que um sistema
tuação da população que não possui diploma. puramente meritocrático e gratuito não impeça
Quando os diplomas eram raros, sua ausência a reprodução das desigualdades no ensino su-
não era um estigma, o que não é mais o caso perior e, mesmo assim, possa ser considerado
hoje, quando as taxas de escolarização aumen- 7
N. E. Essa ideia, que pode parecer contraditória, consti-
tui um dos pilares importantes do trabalho de Dubet et al,
tam a ponto de alcançar, como é o caso na Fran- 2010. Indica, na verdade, a complexidade das relações que
se estabelecem entre o sistema de ensino e a organização
das hierarquias sociais. O que o argumento de François
5
N. E. Esse tema é clássico na sociologia da educação fran- Dubet mostra é que essas relações não são lineares. Ao
cesa. Entre os estudos do autor, pode-se tomar como refe- contrário, naquelas sociedades que consideraríamos mais
rência Dubet 2004 e 2010. democráticas, justamente por serem mais abertas ao mérito
medido como escolarização, podemos encontrar um siste-
6
N. E. Todos os dados sobre o ensino superior francês e, ma escolar mais fechado, mais competitivo, mais hierar-
em geral, todas as estatísticas da população francesa estão quizado. Assim, fica claro porque, numa sociedade que dá
disponíveis no site do Institut National de la Statistique pouco valor à escolarização ou aos diplomas, as desigual-
et des Études Économiques (INSEE). Em particular, os da- dades escolares, por maiores que sejam, não constituem
dos sobre o sistema de ensino podem ser encontrados em um fator muito forte de produção de desigualdades sociais.
http://www.insee.fr/fr/themes/theme.asp?theme=7 . Ver também, sobre essa questão, Duru-Bellat, 2009.

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François Dubet

formalmente justo e equitativo. No que tange a necessários pela sociedade? É provável que os
isso, parece que os sistemas de ensino superior sistemas mais justos sejam os que outorgam as
combinam critérios de justiça diferentes. bolsas com base numa combinação de critérios
Um desses critérios é a questão da gra- econômicos e de mérito acadêmico. Há ain-
tuidade dos estudos. A priori, os sistemas nos da a questão dos empréstimos garantidos que
quais os estudantes pagam apenas taxas re- existem no Canadá, nos Estados Unidos ou na
duzidas de matrícula são nitidamente mais Grã-Bretanha. Esses sistemas podem ser consi-
equitativos do que os que exigem uma eleva- derados justos desde que o mercado de trabalho
da contribuição financeira dos estudantes. No absorva rapidamente os estudantes que se bene-
primeiro caso, o peso das desigualdades eco- ficiaram da utilidade das formações superiores.
nômicas é neutralizado de forma global. Mas Os procedimentos de seleção também
as desigualdades culturais e os desempenhos podem ser questionados quanto à justiça. Seria
acadêmicos dos estudantes continuam exer- mais justo selecionar os estudantes no início
cendo seus papéis nos sistemas gratuitos. E, de seus estudos superiores, garantindo-lhes
se os melhores estudantes que ingressam nas que prosseguirão até o término, ou seria mais
melhores universidades gratuitas são proce- justo abrir as portas da universidade e selecio-
dentes das categorias sociais mais favorecidas, ná-los ao longo de seus percursos acadêmicos?
seus estudos são pagos pelo conjunto dos con- A primeira escolha não é muito equitativa,
tribuintes, dentre os quais todos aqueles cujos porque se sabe que ela favorece os estudantes
filhos não estudam nessas instituições. É o que mais privilegiados, que estão mais aptos a pas-
ocorre em certos países, como o Brasil e a Fran- sar nesses exames e a se beneficiar de um pre-
ça, onde as formações de maior prestígio são, paro específico. Mas a segunda solução pode
ao mesmo tempo, gratuitas e, na realidade, re- também não ser mais justa e mais democrática,
servadas às elites acadêmicas e sociais. Tam- pois se sabe que os estudantes que não logra-
bém não é incomum que os estudos de menor rem concluir o curso terão perdido muitos anos
prestígio feitos por estudantes de meios mais e feito sacrifícios muitas vezes desnecessários.
modestos sejam pagos. Nesse caso, a gratuida- Na França, em certas formações universitárias,
de é um presente dado aos ricos. Para decidir um em cada dois estudantes abandona os estu-
sobre a equidade do financiamento dos estu- dos durante o curso. Além disso, ao longo dos
dos superiores é, portanto, importante avaliar, anos, são os estudantes menos privilegiados

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caso a caso, quem financia os estudos e quem que o fazem. Podemos, então, indagar sobre
se beneficia deles. Sem esse cálculo, nada in- qual seria a escolha menos iníqua.
dica que a gratuidade seja sempre mais equi- É mais justo favorecer o acesso de alguns
tativa que o pagamento de uma parte do custo estudantes de origem modesta às formações de
total dos estudos pelos próprios estudantes. elite, ou será melhor orientá-los para carreiras
O mesmo tipo de dilema de justiça surge menos ambiciosas, mas que correspondam me-
em relação aos sistemas de bolsas e auxílios da- lhor às suas “necessidades”? No primeiro caso,
dos aos estudantes em função dos seus recursos parece óbvio que a igualdade de oportunidades
econômicos e de seus sucessos acadêmicos. É é mais valorizada, mas, em contrapartida, mui-
mais justo beneficiar, de forma mais reduzida, to poucos estudantes poderão se beneficiar dis-
muitos estudantes, como é o caso na França, so. No segundo caso, as desigualdades entre as
ou ajudar muito os que realmente o merecem? carreiras não se reduzem, porém os estudantes
Os estudantes beneficiados por bolsas ou ou- podem ter mais possibilidades de sucesso. A
tras formas de auxílio devem poder escolher França parece ter preferido o primeiro modelo,
livremente seus estudos, ou devem ser orien- e a Alemanha, o segundo. Qual é o mais justo
tados para campos de formação considerados ou, melhor, o menos injusto?

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Qual democratização do ensino superior?

As políticas de discriminação positiva sistema constrói seus próprios modelos, im-


que introduzem quotas para mulheres e (ou) planta seus próprios valores e se defronta com
para membros de minorias culturais por muito suas próprias contradições. Evocaremos três
tempo discriminadas também levantam dile- sistemas europeus que, de certa forma, apre-
mas de justiça que são difíceis de julgar. Por um sentam uma forte coerência interna. É eviden-
lado, compensam injustiças históricas instaura- te que esse ângulo de análise é extremamente
das em nome da igualdade social, tendo, assim, estreito e que a pesquisa requereria compara-
o mérito de reconhecer que o jogo normal da ções muito mais amplas.
competição acadêmica exclui grupos culturais e
sociais e que é preciso, portanto, iniciar um mo- O elitismo republicano francês
vimento voluntário de democratização. Por ou-
tro lado, essas políticas prejudicam a igualdade O modelo escolar francês se quer iguali-
de oportunidades e podem ser sentidas como tário e meritocrático.8 Igualitário, pois perma-
negação de justiça pelos membros da maioria e neceria muito ligado à gratuidade dos estudos
como humilhação por parte de membros de mi- e aos diplomas nacionais, ainda que essa exi-
norias que delas se beneficiam por verem o seugência seja difícil de manter com a multipli-
mérito questionado. É por isso que, na maior cação das formações pagas e o crescimento do
parte do tempo, nega-se a prática dessas polí-número de estudantes pobres. Meritocrático,
ticas e elas são implementadas com cuidados. pois esse sistema funcionaria baseado na seg-
Ainda que pareça óbvia a existência mentação entre as grandes écoles, muito elitis-
de políticas mais justas que outras, é precisotas, e as universidades, que acolhem o restante
enfatizar que todas as normas de equidade dos estudantes; em todos os casos, os estudan-
se voltam facilmente contra si mesmas. Daí a tes são orientados apenas com base em seu de-
importância de observar, de perto, sua imple- sempenho acadêmico. Na verdade, o modelo
mentação para julgá-las. Deve-se também ter funciona baseado no ideal do “elitismo para
em conta que a educação constitui sempre um todos” e, para atenuar o peso da reprodução
investimento público e individual que traz be-social, instauram-se sistemas de formação re-
nefícios coletivos e individuais e que a esco-servados aos alunos de condições modestas,
lha entre os dois tipos de custos e benefíciosmas talentosos e merecedores, para que ascen-
é uma dimensão essencial da equidade. Os dam à elite. Contudo, são muito poucos os que
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estudantes formados devolvem à sociedade o conseguem trilhar esses percursos. Ao mesmo


que dela receberam em termos de qualificação, tempo, o ensino superior francês repousa so-
ou apenas angariam benefícios pessoais? Pode- bre um ideal “adequacionista”, segundo o qual
se oferecer uma formação gratuita aos futuros cada diploma deve conduzir a um emprego ou
traders ou aos médicos que se dedicam à cirur-a um nível de emprego específico. Evidente-
gia estética nos bairros chiques, quando faltam
mente, essa adequação só funciona para seg-
médicos nos bairros pobres? mentos seletivos do sistema, que recompen-
sam apenas os estudantes que são muito bons,
aqueles cujo percurso acadêmico é perfeito.
MODELOS EUROPEUS DE SISTE- O modelo universitário extremamente
MAS DE ENSINO SUPERIOR meritocrático e elitista, tal como o da Coreia e
o do Japão, explica por que os estudantes são
Os processos, os mecanismos e as ques- profundamente pessimistas e estressados: eles
tões gerais da democratização do ensino supe- 8 N. E. Além das obras do próprio François Dubet sobre o
rior que acabamos de mostrar não obliteram funcionamento do sistema de ensino francês, esse tema
também foi tratado recentemente por Baudelot e Establet
as peculiaridades nacionais. Na verdade, cada (2009).

262
François Dubet

temem não ter um percurso acadêmico perfei- a si mesmo durante os estudos. O sistema uni-
to e ter-se orientado mal, sabendo que é muito versitário é pouco hierarquizado, e a cada es-
difícil mudar de direção. Ao mesmo tempo, os tudante se oferece a possibilidade de ter seis
estudantes também reconhecem que esse siste- anos de estudo, que podem ser cursados entre
ma lhes oferece certa segurança e, em geral, se os 18 e os 54 anos, com base no modelo da
opõem a reformas que consideram arriscadas. formação ao longo de toda a vida. Trata-se de
oferecer aos estudantes tempo para escolher e
combinar, da melhor forma possível, os estu-
O liberalismo britânico dos e o trabalho assalariado. Quase 50% dos
estudantes suecos são assalariados ou vêm do
Esse sistema repousa sobre as escolhas mundo do trabalho para se formar.
individuais. Os estudantes escolhem seus es- Esse sistema, embora possa parecer mais
tudos em função de suas competências aca- justo, funciona numa sociedade profunda-
dêmicas, de seus recursos econômicos e de mente igualitária, em que o mérito conta me-
seus projetos pessoais. São menos auxiliados nos do que na França ou na Grã-Bretanha. Ele
por bolsas do que por financiamento, já que, funciona também num Estado do bem-estar
no modelo liberal, as formações universitárias social eficaz e generoso, cuja continuação nes-
são investimentos que devem trazer um retor- sas condições é incerta no futuro. Ao mesmo
no para os indivíduos. Enquanto os estudantes tempo, esse modelo, tanto quanto o britânico,
franceses são encaminhados para formações é individualista, pois importa dar às pessoas
específicas rígidas, os estudantes britânicos o tempo de se formarem e saberem o que que-
podem definir seu currículo de modo mais rem. Os estudantes suecos são, em geral, oti-
pessoal, escolhendo as formações para cons- mistas e confiantes em si mesmos, ainda que o
truir um curriculum vitae mais pessoal. padrão de igualdade seja às vezes vivido como
É com base nesse currículo que os jovens uma forma de conformismo. Ao mesmo tem-
ingleses se apresentam no mercado de trabalho, po, formações mais elitistas são criadas para
onde o diploma conta menos que o perfil pesso- colocar a Suécia no “mercado” da competição
al do candidato. Assim, os dispositivos de au- universitária internacional.
xílio aos estudantes desfavorecidos focam mais
nos projetos dos estudantes, não se restringin-

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do apenas a suas competências acadêmicas. REFLEXÕES FINAIS
Em última análise, o sistema britânico produz
e reproduz tantas desigualdades quanto o fran- Parece possível distinguir, analitica-
cês, mas o faz de forma distinta. Os estudantes mente, várias dimensões da democratização
ingleses são muito mais otimistas e confiantes escolar, baseadas, por sua vez, em concepções
em si mesmos que os estudantes franceses, e diferentes da justiça: igualdade de oportuni-
seus protestos se dirigem principalmente ao dades, meritocracia, utilidades e equidade
preço dos estudos e ao sistema de empréstimos dos procedimentos. Embora não seja difícil
bancários, especialmente quando o desemprego distinguir esses modelos, mostrar como eles
desperta neles o medo de não poder pagar. se estruturam é mais complicado, porque, na
maioria das vezes, são relativamente contradi-
tórios entre si; o que se ganha em um critério
A “bildung” sueca de democratização pode se perder num outro.
Os efeitos paradoxais da massificação dos sis-
Esse é um sistema cuja marca repousa temas de ensino superior deveriam nos levar a
sobre a igualdade e a liberdade de se construir questionar a crença unânime em seus benefí-

263
Qual democratização do ensino superior?

cios. Ao que parece, a qualidade da formação Referências


escolar básica – aquela compreendida desde a
BAUDELOT, C.; ESTABLET, R. L’élitisme républicain: l’école
infância ao final do ensino médio – é um fator française à l’épreuve des comparaisons internationales.
bem mais decisivo na qualidade da educação, Paris: Éditions du Seuil, col. La république des idées,
2009. 117 p.
pois pode ser comum a todos os membros de DUBET, François. L’école des chances: qu’est-ce qu’une
uma sociedade e porque influencia a persona- école juste? Paris: Seuil, 2004. 96 p.
lidade e os valores muito mais claramente que ______. Les places et les chances. Paris: Seuil, 2010. 122 p.
a formação superior considerada isoladamente. ______; DURU-BELLAT, Marie; VÉRÉTOUT, Antoine. Les
Sociétés et leur école: emprise du diplôme et cohésion
É também naquele nível do ensino que os sis- sociale. Paris: Seuil, 2010. 224 p.
temas escolares têm mais liberdade para agir ______. As desigualdades escolares antes e depois da
escola: organização escolar e influência dos diplomas.
sobre as relações existentes entre a amplitude Sociologias, Porto Alegre, v. 14, n. 29, p. 22-70, 2012.
das desigualdades sociais e a das desigualdades DURU-BELLAT, Marie. Le  mérite contre la justice.
Paris: Les Presses de Sciences Po. (Nouveaux débats),
escolares, dado que sabemos que sociedades 2009. 166 p.
comparáveis em nível global produzem desi- OCDE. Literacy skills for the world of tomorrow. Further
gualdades escolares de amplitude distinta. Results from PISA 2000. Executive Summary. Paris:
OCDE, 2003. Disponível em: http://www.oecd.org/edu/
school/2960581.pdf.
SANTIAGO, P.; TREMBLAY, K; BASRI, E.; ARNAL,
Recebido para publicação em 12 de janeiro de 2015 E. Tertiary education for the knowledge society.
Special Features: equity, innovation, labour market,
Aceito em 15 de março de 2015 internationalization. v. 2, OECD, 2008. Disponível em:
<http://www.oecd.org/education/skills-beyond-school/
41266759.pdf>. ISBN 978-92-64-04652-8.
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François Dubet

What democratization of higher QUELLES DEMOCRATISATIONS DE


education L’ENSEIGNEMENT SUPERIEUR?

François Dubet François Dubet

This article discusses features of higher education Cet article analyse quelques traits du processus de
democratization process. It seeks to distinguish démocratisation de l’éducation. Il cherche à établir
analytically various dimensions of democratization, une distinction analytique entre les différentes
based in turn on different conceptions of justice: dimensions de la démocratisation, basée à son tour
equality of opportunity, meritocracy, utilities and sur les différentes conceptions de la justice: égalité
fairness of procedures. Each society constructs models des chances, la méritocratie, l’emprise des diplômes et
of democratization of education. The massification of l’équité des procédures. Chaque société construit ses
higher education played democratic role, favorable to propres modèles de démocratisation de l’éducation.
social groups previously excluded. But massification La massification de l’enseignement supérieur a joué
is not equivalent to democratization. All social un rôle démocratique, favorable aux groupes sociaux
categories do not benefit in the same way from it. précédemment exclus. Mais massification “n’st pas
The democratization of access to higher education équivalente à la démocratisation. Toutes les catégories
depends not only on the families. It also depends on sociales n’en bénéficient pas de la même manière. La
the overall structure of the education system. The démocratisation de l’accès à l’enseignement supérieur
academic meritocracy builds a hierarchy of skills ne dépend pas seulement des familles. Elle dépend
that is also social with strong reproductive impact. aussi de la structure globale du système éducatif. La
Utility inequalities of different courses have an méritocratie scolaire construit une hiérarchie des
impact on all the social inequalities. Educational compétences qui est aussi sociale, avec un impact
systems implement different selection procedures, important sur la reproduction sociale. Les emprises
provide gratuities, grants, scholarships, which can inégales des diplômes de différents cours ont un impact
be considered as more or less equitable according to sur toutes les inégalités sociales. Les systèmes éducatifs
the norms of justice that they mobilize. établissent des procédures de sélection différentes,
fournissent les subventions, les bourses, qui peuvent
être considérées comme plus ou moins équitable selon
les normes de la justice qu’ils mobilisent.

Key words: Higher education. Democratization. Mots-clés: Enseignement supérieur. Démocratisation.


Influence of diplomas. Equity. Equality of oppor- Emprise des diplômes. Équité. Égalité de chances.
tunities.

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François Dubet - Sociólogo. Pesquisador na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS)
e também do Centre d’Analyse et Intervention Sociologiques (CADIS). Foi professor na Université
Bordeaux II até sua aposentadoria em 2013. Autor de estudos já clássicos na sociologia, como: La Galère:
jeunes en survie, Fayard, 1987; Sociologie de l’expérience, Seuil, 1994; L’hypocrisie scolaire, Seuil 2000;
Les Inégalités multipliées, éditions de l’Aube, 2000; Le Déclin de l’institution, Seuil, 2002; Injustices,
Seuil, 2006; Travail des sociétés, Seuil, 2009. Seu trabalho publicado mais recentemente é La préférence
pour l’inégalité, La République des Idées, 2014. Vários de seus livros e alguns artigos estão disponíveis
em português.

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