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KEVIN FLAHERTY, SJ
11 Palestra proferida pelo autor num encontro latino-americano de formadores jesuítas (2002).
Por se tratar de um texto cujo conteúdo é de grande atualidade e interesse para a Vida Religiosa
em geral e não só para a Companhia de Jesus, julgamos oportuno publicá-lo na íntegra, com
autorização do autor.
cognição, mas também filtram e eliminam o que não cabe nos esquemas
estabelecidos.
Os esquemas determinam o que vemos e o que percebemos em um quadro,
mas também chegam a ser como teorias que, sem estar articuladas, dirigem a
maneira como interpretamos os fatos, interações e percepções da vida. Os
esquemas estão assimilados e moldados por nossa cultura, família, educação e
maneira de pertencer a diferentes grupos. Os esquemas pessoais se estendem
desde o reconhecimento das letras do alfabeto até as verdades culturais e
ideológicas.
Nos esquemas, a cognição e a emoção se encontram. Certas ideias,
memórias e experiências suscitam reações positivas ou negativas. Sentimo-nos
seguros quando o mundo é coerente com nossos esquemas, e há perplexidade e
confusão quando nossa maneira normal de entender é questionada. Tendemos a
desenvolver esquemas que se enquadram na maneira como recordamos nossa
narrativa pessoal e a imagem de nós mesmos. A angústia brota quando a própria
imagem se vê desafiada, seja pela dor que produz a lembrança dos sofrimentos
do passado, seja por ter que enfrentar uma verdade penosa no presente. Os
mecanismos de defesa são manobras mentais que protegem as pessoas de suas
angústias por meio de modificações, distorções e/ou repressões do que foi aceito
no consciente. Os mecanismos de defesa podem ser empregados frente a ameaças
particulares, mas também estão incorporados e têm muita influência no
desenvolvimento da personalidade. Para proteger nossa própria imagem ou
nossa forma de construir a realidade, utilizamos distorções e ilusões que nos
oferecem um sentido de segurança.
É possível entender as diferentes escolas de terapia como tentativas de
reparar e reformular os esquemas mentais de cada um. A pessoa se vê limitada
por esquemas de cognição e emoção construídos no passado e que resultam
destrutivos no presente. A associação livre de Freud convida a pessoa a se
permitir possibilitar que o reprimido entre em sua consciência. O longo processo
de desmascarar as defesas promove a aceitação do negado e a reconstrução da
narrativa pessoal. Os psicólogos cognitivos ajudam a pessoa a descobrir seus
"supostos" ou crenças profundas, que são aquilo que guia seu pensamento e
conduta. Centrar o enfoque no presente facilita a construção de esquemas de
pensar e atuar que permitem uma vida m ais eficaz e satisfatória. As terapias
familiares focalizam as dinâmicas dos esquemas partilhados pelos membros da
família para criar novos esquemas de entendimento das funções e interação.
Em cada terapia, a pessoa encontra o conceito de resistência de formas
diferentes. É difícil aceitar o doloroso, a vulnerabilidade, a fragilidade de si
mesmo. A pessoa não quer sua própria verdade e crê que não vai ser aceita nem
pelos que a rodeiam nem por seu acompanhante. Neste sentido, na maioria dos
casos, não há mentiras na terapia, mas há uma capacidade crescente de aceitar a
própria verdade. Vai-se descobrindo a verdade de si mesmo na medida em que
a aceitação do outro convida a encarar-se com seus próprios desejos, dores,
experiências e esperanças. O processo de autoconhecimento e auto aceitação está
vinculado à relação de confiança com o terapeuta. No melhor dos casos, a pessoa
tem confiança para aprofundar os temas mais sensíveis e delicados quando se
sente aceita e respeitada.
A Cultura
Vale a pena mencionar alguns fato- res culturais que influem na psicologia
dos jovens de hoje. Eles crescem em um mundo pluralista que lhes oferece um
leque de ofertas variáveis. Alguns são filhos não somente de seus pais, mas
também dos meios de comunicação. Da mesma maneira que são mais tolerantes,
tendem a ver tudo com um relativismo pragmático preocupante. Valorizam a
amizade, gostam de partilhar e dialogar, mas podem ficar com o superficial e
afetivo em vez de analisar e valorizar criticamente as propostas culturais, sociais,
políticas que se colocam diante deles. Para muitos, as utopias foram os sonhos de
seus tios, e as instituições são vistas com sus- peita e desconfiança. São generosos
e têm um grande desejo de ajudar os necessitados, porém são acompanha- dos
de uma sensação de que não podem mudar as estruturas da sociedade. Para eles,
o mais importante é o que vivem no presente, enquanto a história pertence a
outros, e o futuro é um incerto desconhecido.
Vários autores destacam a fragilidade psíquica dos jovens. As mudanças
sociais tão rápidas, a desconfiança nas instituições culturais e a deterioração da
família debilitaram os muros de contenção que fortaleciam a estrutura pessoal.
Um maior número de jovens cresce em uma sociedade massiva, que não brinda
instituições locais que sirvam como redes de apoio e pertença. O relógio social de
acontecimentos culturais já não marca a progressão da vida. Em contraste com o
passado, a puberdade se inicia mais cedo, e a juventude não termina até os 25 ou
30 anos. Os jovens correm o risco de assumir "identidades emprestadas" e às
vezes ficam fragmentados e sem um sentido de identidade sólido. Muitos jovens
refletem, em sua busca de gratificações imediatas, a sociedade de consumo na
qual cresceram. Em geral, buscam maiores comodidades e cuidam muito de seus
corpos; muitos tiveram experiências sexuais desde muito jovens e depois, com o
transcorrer do tempo, descobrem que as relações profundas se constroem com
muito mais coisas que com o mero compartilhar sexual.
As crises das instituições afetam os jovens. Muitos cresceram em sociedades
onde a palavra perdeu seu valor. Os jovens da América Latina são testemunhas
do fracasso de inúmeros governos. Os discursos populistas encobrem as
denúncias de corrupção e manipulação. Em muitos setores populares, a educação
é de muito baixa qualidade e costuma estar centrada em um estilo memorístico e
autoritário. Às vezes aprendem a dizer o que o professor quer escutar, em vez de
formular sua própria opinião. A Igreja também representa uma instituição
ambígua. A discrepância entre o ideal e o real se torna cada vez mais e mais
evidente. Um jovem que tenha 20 anos não lembra a figura de um Papa vigoroso
e pode ser levado a ver na hierarquia umas pessoas irrelevantes para a
experiência juvenil. Embora os escândalos dos abusos sexuais não tenham ainda
chegado à imprensa latino-americana com força, qualquer jovem já sabe sobre os
filhos de alguns sacerdotes, sobre a pedofilia e abusos com jovens e sobre a vida
não coerente de muitos outros. Para muitos jovens, a família não oferece um
ambiente de carinho e segurança. Os divórcios e segundos compromissos são
comuns na maioria de nossos p ovos. Encontramos com frequência uma ferida
familiar nos jovens que cresceram em lares sem pai, ou com uma figura paterna
mais distante.
A Família
Os Formadores
Os Formandos
A maturidade psicossocial