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FUNDAMENTOS DE ECONOMIA DO AUDIOVISUAL

A INDÚSTRIA DO CINEMA: ASPECTOS TEÓRICOS E EMPÍRICOS


RELEVANTES

Neste primeiro capítulo procuraremos expor as principais correntes


nacionais e internacionais de pensamento que tratam sobre economia da cultura,
com o objetivo de justificar a importância do tema. Destacam-se, entre os autores,
David Throsby, Charles Gray, James Helibrun, entre outros.

Para a compreensão das teorias desenvolvidas sobre economia da cultura,


introduziremos alguns conceitos de teoria econômica como externalidades, bens
públicos e capital humano. Para tal, utilizaremos idéias de autores como Musgrave
e Gary Becker.

Este capítulo está dividido em quatro seções. A primeira introduz o conceito


de economia da cultura e expõe um breve debate sobre o assunto e seus
principais teóricos. Apesar da escassez de publicações em caráter nacional
acerca do assunto, o tema de economia da cultura é muito tratado
internacionalmente, tendo inclusive um periódico chamado Journal of Cultural
Economics, que aborda o assunto.

Na segunda seção, apresentaremos, com base na literatura, as justificativas


para a participação da esfera pública na provisão de bens culturais. Para isso,
utilizamos conceitos de teoria econômica que fazem parte do mainstream da
ciência econômica atual.

A seção seguinte aborda efetivamente o mercado de cinema. Com a


colaboração das seções anteriores, criamos as ferramentas necessárias para a
compreensão do mercado de cinema, tratando especialmente da questão da
oferta de produtos cinematográficos e da dificuldade de provisão de bens culturais
sem o incentivo dos gestores de políticas públicas.

Na última seção, analisaremos alguns modelos de parcerias entre o setor


público e o setor privado que são comuns no mercado internacional de cinema.
Para isso, utilizaremos como referência três mercados: o americano, o francês e o
indiano.
1.1 INTRODUÇÃO A ECONOMIA DA CULTURA

Economia da cultura é a área da economia que analisa a melhor alocação


de recursos para a atividade econômica, relacionada a bens culturais e indivíduos
que possuem valores culturais. O objetivo do estudo da economia da cultura é
fornecer aos gestores de políticas públicas um forte instrumental analítico capaz
de indicar a racionalidade da intervenção estatal na oferta de bens culturais. Por
isso a economia da cultura se torna um instrumento bastante poderoso de análise
das leis de incentivos e seus impactos sobre emprego e renda3.

Bens culturais, segundo Felipe de Waldemar (2007), são bens que têm
características de envolver algum tipo de valor cultural e também valor econômico.
Portanto, quando um indivíduo consome bens culturais, ele estará procurando
maximizar seu grau de utilidade. Porém, a cultura também modela as preferências
humanas e cria hábitos, ou seja, uma pessoa que adquire mais capital cultural,
mudará suas preferências por outros tipos de bens, não só os culturais 4.

David Trhosby (2001) introduziu um importante conceito de capital cultural.


Trata-se de recursos que representam, possuem ou provém valor cultural,
indiferentemente de qualquer valor econômico. Enquanto o valor econômico é
reduzido a unidades monetárias, o valor cultural é um conceito coletivo, de
crenças e tradições de um grupo.

Um bem cultural pode ser tangível ou intangível. Como tangíveis


poderíamos destacar prédios, ruínas e obras de arte, por exemplo. O capital
cultural criado por esses bens, na forma tangível, tem certa duração de tempo e
necessita de manutenção. O capital cultural na forma intangível é relacionado a
crenças, idéias e valores compartilhados a um grupo.

Ainda com David Throsby (2001), o consumo de bens culturais é


impulsionado pelo acúmulo de capital humano presente na sociedade. Sabe-se
que educação é um dos componentes do capital humano e que também influencia

3
Efeito multiplicador do investimento em cultura
4
O chamado efeito transbordamento
16

a demanda por bens culturais, assim quanto maior o nível educacional de uma
sociedade, maior será seu consumo de bens culturais. Throsby também
argumenta, nesse sentido, que podem se ofertar bens culturais de forma meritória
e garantir sua demanda futura através de uma política educacional.

Sobre o hábito de consumo desses bens Throsby afirma:

“A further distinctive characteristic of the arts as


consumption goods is that they are subject to the
phenomenon of path dependence or, more specifically,
rational addiction; that is, they are commodities for which an
individual's present consumption depends on his or her past
consumption, and patterns of demand tend to be cumulative.
Although it is generally agreed that increased exposure to the
arts in the past and the present will generate increased
demand in the future (with consequent lessons for arts in
education), this is hardly a sufficient condition for defining
artistic goods, since a number of other commodities, not least
addictive drugs, share a similar characteristic”.

Assim, a demanda por esses bens se tornaria sustentável. Esses são os


princípios dos bens meritórios de Musgrave (1959) que são aqueles bens que o
Estado deveria ofertar mesmo que, em um primeiro momento, não haja demanda
da sociedade.

Nesse sentido, Baumol e Bowen (1966) apontam o principal empecilho de


se construir uma indústria cultural auto-sustentável. Os autores argumentam que
diferentemente de outros, bens culturais como arte, por exemplo, não passam por
um processo de inovação tecnológica que garanta um crescimento da
17

produtividade5, isso porque esses tipos de bens são intensivos em mão de obra.
Assim, há uma tendência ascendente dos custos totais e quase uma
impossibilidade de repassar esse aumento de custos aos consumidores, tornando,
em um longo prazo, esse tipo de bem escasso no mercado. A participação do
Estado, portanto, torna-se necessária para se fornecer subsídios capazes de
tornar a oferta de bens culturais viável.

Outra característica dos bens culturais, segundo Mas-Collel (1999) são as


especificidades desses bens ao comércio internacional, já que esses bens
possuem valor a um determinado grupo ou região, não significando que em outros
grupos o valor cultural seja o mesmo. Os bens culturais, portanto, têm
dificuldades de serem comercializados no mercado externo, através de importação
ou exportação.

Gary Becker (1964) relacionou capital humano e crescimento econômico.


Segundo o autor, existe uma relação positiva entre acúmulo de capital humano e
crescimento da renda dos indivíduos, efeito dado pelo aumento de produtividade,
fazendo com que o trabalhador produza mais em menor período de tempo. Assim,
aliada à proposta de Throsby que educação cria a demanda por bens culturais, os
aumentos gerados na renda tornam-se um argumento na defesa pelo investimento
em educação básica, gerando crescimento econômico e desenvolvimento cultural.

1.2 JUSTIFICATIVAS PARA A AÇÃO DO ESTADO NO MERCADO DE


BENS CULTURAIS

Nos últimos anos, os governos federais de praticamente todos os países


vêm promovendo a indústria cultural através de subsídios e de incentivos fiscais. A
atuação do Estado se apóia em algumas razões teóricas como a existência de
externalidades à questão da proteção da indústria nacional, à participação do
Estado para diminuir preços e, por fim, à ineficiência do setor privado em ofertar

5
Teoria desenvolvida no artigo Performing Arts: the economic dilemma
18

bens públicos e participar em mercados que existam informações assimétricas.


Existe também um contraponto de todas essas idéias feito por Mas-Collel (1999).

1.2.1 Externalidades

Na maioria dos bens, o mecanismo de mercado é capaz de alcançar


alocações eficientes no sentido de Pareto, porém quando tratamos de bens que
geram externalidades, o mercado não apresenta necessariamente uma provisão
de recursos eficientes no sentido de Pareto. As externalidades são o subproduto
de um processo de produção que não pode ser apropriado por aqueles que o
produziram. O que caracteriza as externalidades é que há bens com os quais as
pessoas se importam e que não são vendidos no mercado. Se a ação de um
produtor ou consumidor afeta outros de maneira negativa, isto é, gerando perda
de bem-estar, dizemos que se trata de externalidades negativas, no entanto, se
gerar aumento de bem-estar à sociedade, as externalidades serão positivas.

Em casos de externalidades negativas, o custo marginal social (soma do


custo marginal de produção com o custo marginal externo) é maior que o custo
marginal. A empresa maximizadora de lucros produzirá em um ponto onde o preço
será igual ao custo marginal, no entanto a produção eficiente ocorre quando o
preço se iguala ao custo marginal social. Haverá, portanto, um excesso de
produção nesse mercado gerando ineficiência, já que o beneficio marginal deveria
ser igual ao custo marginal social e não igual ao custo marginal privado.

Já no caso de externalidades positivas, o beneficio marginal social é maior


que o beneficio marginal privado. Assim, a oferta de bens com essas
características é realizada em um ponto subótimo, ou seja, abaixo do que seria
socialmente desejável pelos consumidores. Isso acontece pela dificuldade que se
tem em definir direito de propriedade de um bem gerador de externalidades,
porque se os direitos de propriedade fossem definidos, haveria um mercado para
esse subproduto onde as pessoas poderiam negociar seus direitos de produzir
externalidades. Essa falha de mercado é um exemplo que justifica a participação
19

do Estado na economia para gerar uma quantidade ótima, do ponto de vista


social, da produção desses bens.

Em casos de bens culturais, as externalidades estão freqüentemente


presentes. Supõe-se que países de grandes heranças culturais obtêm ganhos em
educação e, por conseqüência, em capital humano. Throsby (2001) afirma que as
pessoas têm ganhos simplesmente por viverem em locais com forte herança
cultural, como ruínas de prédios históricos ou escritos em cavernas de povos
antigos.

James Heilbrun e Charles Gray (2001) sugerem que exista benefício


coletivo ao se demandar cultura. As pessoas estariam dispostas a pagar por bens
culturais para que seus descendentes obtenham pelo menos o mesmo nível de
herança cultural. Dessa forma o governo deve incentivar medidas de educação
para que no futuro as pessoas possam demandar maiores quantidades de bens
culturais. Heilbrun e Gray, portanto, sugerem que o Estado deva corrigir essa
informação incompleta entre duas gerações diferentes e, assim, contornar o
problema gerado pelas falhas de mercado na provisão de bens culturais.

A presença de cultura em uma sociedade também fortalece os laços


pessoais. A maior inter-relação entre as pessoas gera um ganho pra sociedade
pela redução dos custos de transação que como já foi discutido por R. Coase
(1960) gera maior eficiência e maior crescimento econômico, como também
afirma a teoria do capital social6. A confiança social exerce o papel de causar
externalidades, assim, os ganhos ou prejuízos têm um efeito multiplicador
atingindo quem não está participando do “jogo”. Um exemplo de externalidades
gerada no caso da oferta de bens públicos é discutido por Portugal et al. (2005)
que trata do turismo que, por exemplo, um festival de cinema pode trazer para
uma região, como é o caso da França. O turismo aquece o comércio de toda uma
região, gerando desenvolvimento e renda.

6
Ver Robert Putnam (1993)
20

Para que haja a oferta de bens culturais, portanto, deve ser considerada
relevante a questão das externalidades. A atuação do governo é importante para
que esse tipo de bem não seja expulso do mercado e também porque negligenciar
a existência de externalidades pode gerar uma concentração desses benefícios.

1.2.2 Proteção a Indústria Nacional

Essa é uma questão específica do cinema, por isso um argumento em favor


da participação do Estado na provisão desse tipo de bem. Os Estados Unidos
7
operam com retornos crescentes de escala e agem numa espécie de
concorrência monopolística, diluindo seus custos fixos no mercado nacional e
repassando o produto ao mercado externo com custos marginais muito pequenos,
sufocando o surgimento de indústrias cinematográficas em outros países.

Esta é uma justificativa dos governantes ao elaborarem as leis de incentivos


à cultura e, mais especificamente, ao audiovisual. Assim esses recursos de
renúncia fiscal contribuiriam para gerar uma indústria cinematográfica auto-
sustentável que no médio prazo não necessitaria de apoio do Estado.

1.2.3 Estado como Agente Subsidiário

O incentivo do Estado em cultura também é justificado por modificar os


preços que serão submetidos à sociedade e assim inclui aquela parcela da
população que seria excluída do mercado se esse operasse com os preços
antigos. Além disso, o subsídio incentivaria a oferta de bens culturais e reduziria o
problema de escassez nesse mercado.

A teoria econômica defende o subsídio governamental na forma de


dinheiro, porque o produtor sabe a melhor forma de produzir e pode empregar o

7
Retornos crescentes de escala surgem quando a quantidade de insumos é dobrada, por exemplo,
e a produção cresce mais que o dobro.
21

dinheiro da melhor forma. Heilbrun e Gray (2001) justificam que o subsídio reduz
os preços gerando o aumento da demanda, principalmente para pessoas que não
teriam condições de usufruir desses bens. Assim, a participação do Estado geraria
aumento do excedente do consumidor.

1.2.4 Bens Parapúblicos

A última justificativa para a participação do Estado na provisão de bens


culturais é relacionada à dificuldade que o setor privado tem em ofertar bens
públicos. Os bens culturais se enquadram em bens parapúblicos, ou bens
semipúblicos. Esses, têm características tanto de bens privados como bens
públicos.

Um bem é considerado público se ele é não disputável e não excludente.


Bens não disputáveis são bens cujo custo marginal de produção é zero para um
consumidor adicional. Bens não excludentes são os bens em que as pessoas não
podem ser impedidas de consumir. Bens culturais são não disputáveis, uma vez
que ao aumentar o acesso, na maioria dos casos, não resulta em um maior custo
adicional, porém são excludentes por ter a necessidade de pagamento ao se
consumir esse tipo de bem.

Bens culturais, como o cinema, não apresentam custo adicional para um


consumidor a mais, o custo de um filme não varia se a quantidade de
telespectadores mudar, no entanto o consumidor necessita fazer o pagamento
para usufruir desse bem, por isso ele é exclusivo. Diferentemente dos bens
privados, em casos de bens públicos, encontrar a disposição a pagar de cada
indivíduo se torna praticamente impossível. Pela dificuldade de se excluir os free-
riders do consumo desses bens, o nível de produção será dado em um ponto
subótimo.

Segundo Heilbrun e Gray (2001), os bens culturais estão intimamente


ligados à definição de bens públicos e, portanto, a oferta de bens culturais é dada
22

em menor quantidade do que o socialmente desejável. Um exemplo analisado por


Portugal (2007) é que se empresas patrocinarem atividades culturais, todos os
indivíduos se beneficiariam com o produto, mas apenas os seus produtores que
iriam incorrer com os custos, certamente as empresas poderiam decidir patrocinar
as atividades culturais para exibir suas marcas.

Frey (1999) afirma que, devido ao efeito crowding out, os artistas produzem
menos quando existe uma recompensa monetária para incentivar a produção. O
autor atribui este efeito a desmotivação e a falta de criatividade causada pelo
controle que o subsidiário (o governo) exerce. Uma visão alternativa poderia ser
atribuída ao problema de moral hazard. Depois de dado o subsídio, o artista
poderia não ter mais os mesmos incentivos para produzir, e o governo não teria
como monitorar o esforço do artista8.

1.2.5 Assimetria de Informação

Nesse tipo de mercado, não há perfeita informação entre todos os agentes.


Isso ocorre devido à incerteza que os agentes têm, tanto os produtores não sabem
ao certo qual será seu lucro, como os exibidores não sabem a demanda que terão
pelo produto. Dessa forma, os produtores não têm garantias de que os exibidores
irão comercializar seu produto, assim eles assumem um grande risco na produção
de filmes.

Esse tipo de problema gera o aumento dos riscos para todos os


participantes do mercado, fazendo com que o mesmo se reduza e, em casos
extremos, acabe. Nesse ambiente de incerteza, a sinalização é de fundamental
importância. Ela pode ocorrer de duas formas: com a participação do governo ou
através da própria iniciativa privada. A participação do governo se daria através da
regulamentação, sinalizando ao mercado e, principalmente, aos exibidores de que
haverá, de alguma forma, mercado para esse produto.

8
Ver Holmstrom (1979)
23

Caso o governo não ofereça essas garantias, a forma que o produtor tem
de sinalizar aos exibidores que seu produto será aceito pelo mercado é através da
propaganda, dando credibilidade a seu produto.

1.2.6 O Contraponto de Mas-Collel

Apesar de todas as justificativas já citadas em favor da participação do


Estado na provisão de bens culturais, a opinião de Mas-Collel (1999) deve ser
ressaltada. Segundo o autor, em primeiro lugar, devemos fazer uma distinção
entre proteção à produção cultural nacional e proteção da produção de cultura
nacional. No primeiro caso, deve antes de tudo ser ressaltado a preferência dos
consumidores pelo produto nacional ou importado.

No segundo caso, é sim muito importante preservar a cultura local e manter


hábitos para gerações futuras, no entanto, a proteção, segundo Mas-Collel, acaba
por resultar em proteção à indústria nacional e não proteção de sinais da cultura
regional. Os incentivos ao desenvolvimento de uma indústria cinematográfica
nacional, portanto, pode gerar desvios de eficiência e a formação de uma indústria
dependente de subsídios.

1.3 O MERCADO DE CINEMA

O mercado cinematográfico, em sua cadeia produtiva, é composto por três


setores distintos, mas dependentes entre si. São eles: produção, distribuição e
exibição. A interação entre cada elo da cadeia produtiva ocorre porque, para haver
distribuição é necessário produção e para haver exibição é necessário que haja
produção e distribuição.

O setor de produção, sob ponto de vista econômico, consiste em assegurar


a coordenação da fase inicial com o conjunto das fases seguintes e oferecer o
24

bem ao mercado. Essa é a etapa de risco máximo. Isso ocorre porque há a


necessidade de grandes investimentos financeiros, comparáveis aos das
indústrias tradicionais e porque os altos custos fixos agem de forma a inibir a
entrada de novos agentes no mercado. Esse setor sofreu a partir dos anos 80 o
forte impacto das inovações tecnológicas e disso resultou uma forte corrida para a
produtividade, fenômenos crescentes de concorrência e fortes baixas nos preços.

O setor de distribuição é o responsável por colocar o produto à disposição


das redes de vendas. É necessário assegurar a promoção de um catálogo de
obras e as relações comerciais junto aos vendedores assim como toda a gestão
de fluxos físicos e financeiros com esses últimos.

O último elo é o da exibição. As empresas exibidoras de cinema funcionam


como agentes de comercialização do produto e são responsáveis por escolher e
ofertar ao público o que percebem como ideal. É o elo com menor risco da cadeia
produtiva, pois tem a capacidade de utilizar bens substitutos e diversificar seu
mercado.

Apesar da dependência entre os mercados, como já foi dito, Salvo (2008)


9
afirma haver uma assimetria entre os mercados, dados pelo descompasso
existente entre a oferta e a demanda. Segundo Salvo:

“A assimetria entre os mercados ocorre, porque


a oferta e a demanda não são exatamente as mesmas.
Os exibidores têm uma demanda por filmes, mas esta
depende do que seus fornecedores — os distribuidores
— oferecem. Os distribuidores são demandados pelos
exibidores, porém dependem do que foi produzido para
poder ofertar.”

9
Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 28, Número Especial, p. 895-916, 2008
25

Uma outra característica do mercado de cinema é a grande elasticidade da


demanda. Isso ocorre devido à existência de muitos bens substitutos. O
consumidor pode escolher entre o filme produzido nos Estados Unidos, no Brasil
ou em qualquer país. Se o consumidor não estiver satisfeito, ele tem bens
substitutos a sua disposição.

No caso brasileiro, os demandantes têm preferência pelo cinema


internacional, principalmente o americano. Esse produto é de fácil penetração.
Como já vimos, eles operam em grande escala, com alto custo, mas um nível de
excelência que facilita sua entrada e sua preferência. No caso brasileiro, existe
barreira a entradas de novos produtores. O mercado opera com elevados custos
fixos e elevados investimentos iniciais, tornando a indústria cinematográfica
brasileira menos competitiva e menos diversificada.

Como vimos, existe um descompasso entre os elos da cadeia produtiva


cinematográfica, assim a produção não garante a exibição e, a competição com
produtos internacionais, desencadeia em uma pequena demanda por filmes
nacionais. Portanto, mesmo que a produção seja realizada, a distribuição e a
exibição podem não garantir o retorno que o produtor desejava, visto que ele não
é responsável pelos demais elos da cadeia produtiva, e o setor de exibição, por
exemplo, racionalmente, tem preferências pelas indústrias internacionais, já que
esses filmes, na maioria dos casos, são mais aceitos pelo público.

As dificuldades do cinema nacional, enquanto produtor, decorrem de uma


série de problemas inerentes à oferta e à demanda. Como já foi discutido
anteriormente, os ofertantes se deparam com a existência de inúmeros bens
substitutos. Para corrigir esse problema, os produtores procuram a diferenciação
de seu produto. Isso pode ocorrer através da utilização de atores ou diretores
renomados, ou através da divulgação do produto. Essa utilização da marca
favorece a indústria dos Estados Unidos, pois, sendo os filmes produzidos em
Hollywood, há a garantia de alta qualidade.

Outro fator que prejudica a oferta de bens cinematográficos nacionais é a


possibilidade de o consumidor obter novos mecanismos para exibição de filmes,
26

como televisão e o homevídeo. Esses mecanismos reduzem a demanda nas salas


de cinema e, conseqüentemente, o lucro dos produtores.

Além desses mecanismos de exibição, também devemos ressaltar a


grande participação do mercado de falsificação que faz com que os filmes estejam
disponíveis em DVD, enquanto ainda há a exibição nas salas de cinema. Isso,
além de reduzir o lucro do produtor, desincentiva uma maior produção futura.

Todos esses fatores já citados contribuem para uma pequena oferta de


produtos cinematográficos nacionais, em relação a outros países. Conforme já foi
destacado, a produção cultural e, nesse caso o cinema, gera inúmeros benefícios
para os indivíduos e para o desenvolvimento de uma sociedade. Essa é a razão
para a participação do governo na provisão desses bens.

O Estado tem duas possibilidades de incentivar a produção de cultura: na


forma direta e na forma indireta. A primeira é feita simplesmente com
transferências de recursos públicos para o setor cultural. Já a forma indireta é feita
através da renúncia fiscal, o que não é totalmente independente de participação
do Estado, mas ele atua apenas como regulador.

Caso o Estado opte por incentivar a indústria cinematográfica diretamente,


cria-se um impasse de difícil resolução. O setor público pode simplesmente
repassar um montante de dinheiro e dividi-lo, por exemplo, para a produção de 50
(cinqüenta) filmes. Assim, todos esses receberiam uma pequena parcela desse
montante arrecadado. Isso, no entanto, causaria uma distorção na qualidade dos
filmes produzidos. Os filmes tenderiam a ser de baixa qualidade e a demanda não
acompanharia a oferta. Como a racionalidade da intervenção estatal na provisão
de bens culturais é ampliar o número de indivíduos que possam consumir esses
bens, a opção por investimento direto do Estado pode não gerar os resultados
pretendidos.

Dessa forma, a grande parte da captação de recursos feita pelas empresas


produtoras de cultura no Brasil é através de incentivos indiretos. No ano de 2005,
por exemplo, o mecanismo de captação para a indústria cinematográfica de forma
27

indireta gerou R$ 125 milhões de incentivos, enquanto a forma direta somou


apenas R$ 2 milhões em recursos10.

As leis de incentivos da esfera federal que mais oferecem recursos aos


setores culturais no Brasil são a Lei Rouanet de 1991 e a Lei do Audiovisual (LA)
aprovada em 1993. Existem outras formas de captação de recursos na esfera
Estadual, no caso do Rio grande do Sul, por exemplo, a Lei de Incentivo à Cultura
(LIC) atua através da renúncia tributária desde 1996. Porém, enquanto as leis de
ordem federal oferecem recursos da base do Imposto de Renda, as leis Estaduais
operam através da renúncia da base do ICMS.

As leis de incentivos são bastante atrativas para as empresas, por


representarem uma renúncia de até 100% do imposto de renda, como no caso da
Lei do Audiovisual. Porém, ao analisarmos os dados, notamos que as empresas
estatais ainda são dominantes no investimento em cultura com cerca de 90 % do
montante de recursos originados pela captação através da renúncia fiscal,
destacando-se, principalmente, a PETROBRAS.

Uma distorção criada por esse modo de incentivo é que ele favorece
apenas o setor de produção, ou seja, o lado da oferta. Esse desequilíbrio entre a
captação de recursos pelos ofertantes e demandantes também favorece o
descompasso entre a oferta e a demanda de cinema. Existe uma única forma de
incentivo para exibição de cinema nacional, que é a criação da cota de tela, em
dezembro de 2004. Ela tem o objetivo de fixar o número de dias para a exibição
de obras cinematográficas brasileiras, destinando cerca de 35 dias de cada sala
de cinema a dois filmes de longa-metragem nacionais, pelo menos.

1.4. OS MODELOS INTERNACIONAIS DE APOIO AO CINEMA

Ao longo do século XX os governos da maioria dos países do mundo


buscaram incentivar a produção e o consumo de bens e serviços culturais. Nas

10
Sumário Executivo ANCINE 2005
28

últimas décadas, com a utilização da teoria econômica e, com ela, a utilização do


conceito de externalidades, a participação do Estado na provisão desses bens se
justificou e, ainda, se acentuou.

No mercado internacional de cultura verificam-se diferentes formas de


parcerias entre o setor público e o setor privado. Serão tratados três mercados
diferentes: Estados Unidos, França e Índia. Os dois primeiros por representarem
os opostos. Enquanto o governo dos Estados Unidos age apenas através do apoio
institucional, o Estado Francês atua diretamente no setor cultural. Por último, a
Índia é um mercado em ascensão, que produz muitos filmes.

1.4.1 O Mercado Americano

Embora o cinema americano não tenha o apoio de nenhum órgão federal


centralizador, sempre foi considerado como um setor estratégico e prioritário,
recebendo todo o apoio institucional possível. Dessa forma, o cinema americano
se estabeleceu desde seu início como parte da cultura e do hábito dos cidadãos.
Fortaleceu-se graças a uma série de fatores históricos e obteve um sólido
embasamento institucional e industrial que, junto com suas funções culturais,
justificam sua força atual.

Segundo Valiati e Florissi (2007), no mercado americano existe uma espécie


de acordo tácito entre a sociedade, o Estado e o empreendedor, tendo cada um
uma parcela de responsabilidade. A sociedade autoriza a utilização de parte de
seus recursos fiscais para a produção de obras com retorno cultural. O Estado atua
principalmente como regulador da atividade cultural e o empreendedor oferta esses
bens de forma a retribuir o apoio da sociedade.

Um dos indícios mais significativos da importância que o cinema ganhou nos


Estados Unidos está na média de ingressos vendidos per capita no país. Em 2004,
por exemplo, segundo dados da Filme B, foram 5,7 bilhetes por habitante,
somando um público total de 1,5 bilhão. Números comparáveis apenas aos do
29

mercado da Índia, mas com uma diferença, que evidencia o abismo econômico
entre os dois países: na Índia, o preço médio do ingresso é de centavos de dólar,
enquanto nos Estados Unidos o preço médio do ingresso. está em US$ 6. Por isso,
a economia do cinema norte-americano gerou, em 2003, por exemplo, uma renda
de US$ 9,5 bilhões, enquanto o cinema na Índia ficou em US$ 642 milhões.

Ao longo dos anos, o cinema americano se reinventou para não perder sua
hegemonia. Internamente, sobreviveu à competição da televisão, a partir dos anos
60, e do homevideo, nos anos 90. Ao mesmo tempo em que os filmes se
transformaram em espetáculo (com a era dos grandes blockbusters), foi
estabelecido um novo formato de exibição, o multiplex, que otimizou investimentos
e aumentou a lucratividade do cinema como produto. Pouco depois, com o DVD,
criou-se uma nova e poderosa fonte de receita, já que os discos digitais passaram
a oferecer o filme diretamente ao consumidor (sendo vendidos, mais do que
alugados). O cinema independente, produzido fora do grande sistema, também
ganhou espaço com o imenso sucesso de filmes de baixo orçamento, forçando
uma reestruturação das próprias majors, que criaram novas divisões
especializadas em filmes menores.

1.4.2 O Mercado Francês

A França está entre os países do mundo que mais incentivam e protegem o


cinema nacional. A entidade governamental voltada para o setor é o Centre
National de la Cinematographie (CNC), órgão público administrativo ligado ao
Ministério da Cultura e da Comunicação. O CNC possui recursos próprios,
provenientes da taxação sobre o faturamento das TVs, taxação sobre o
homevídeo e taxação sobre os ingressos de cinema.

Assim como outras áreas da cultura francesa, a regulamentação do


audiovisual no país é baseada no princípio da exceção cultural. Ele determina que
produtos considerados como bens culturais não devem se submeter às regras do
30

livre comércio, obedecendo a uma legislação específica. Por isso, o audiovisual


possui um conjunto sólido de medidas de estímulo e proteção.

Toda a administração dos recursos e regulamentação do setor audiovisual


é centralizada pelo CNC, que baseia suas medidas em uma série de pesquisas
realizadas para compreender os hábitos e desejos do público. O governo incentiva
o cinema nas áreas de produção, distribuição e exibição. Isso caracteriza uma
peculiaridade do modelo francês de incentivo ao cinema. Ele atua em todos os
elos da cadeia produtiva, incentivado a demanda por esses bens. Diferentemente
de outros países que só utilizam medidas pelo lado da oferta.

Há também uma detalhada regulamentação sobre o funcionamento dessas


mesmas áreas, especialmente sobre a televisão. A maior parte dos apoios
concedidos pelo CNC é de caráter automático, dependendo dos resultados
obtidos por cada produtor, distribuidor ou exibidor.

Tolila (2007) argumenta que a França é um caso peculiar de participação


do Estado na provisão de bens culturais. Isso porque a França tem uma forte
política de incentivo ao turismo, e os gestores de políticas públicas ponderam
também o retorno que o investimento em cultura traz através dos gastos de
turistas.

A França é o mais forte mercado cinematográfico da Europa e um dos


poucos do mundo que gera uma renda anual próxima a US$ 1 bilhão. São
produzidos cerca de 200 longas-metragens por ano, muitos deles co-produzidos
pela televisão. A parceria entre cinema e TV é determinada por lei e forma um
sistema complexo que, apesar de estar em crise atualmente, foi considerado como
um modelo para outros países durante muitos anos.

Devido à forte tradição cinematográfica e à filosofia da “exceção cultural”, o


market share dos filmes franceses tem oscilado entre 30% e 40% nos últimos
cinco anos, o maior índice de toda a Europa e um dos maiores do mundo. A
França também é um dos países que mais lança filmes: em torno de 500 títulos
chegam ao mercado por ano.
31

1.4.3. O Mercado Indiano

Por fim, a indústria cinematográfica da Índia, ainda que robusta, sempre foi
considerada desorganizada. O alto índice de pirataria e a participação de capital
de origem obscura na produção de filmes chegaram a ameaçar seriamente a
saúde do cinema local e sempre mantiveram afastados possíveis parceiros
internacionais. Mas, a partir do ano 2000, o governo resolveu interferir e ajudar a
organizar o setor, tornando-se, inclusive, co-produtor de boa parte dos filmes.

O órgão criado para ajudar a organizar a indústria indiana foi a National


Film Development Corporation (NFDC). Em 2001, os longas-metragens foram
legalmente transformados em “produtos industriais”, para que os produtores
pudessem ter acesso a financiamentos bancários. Também estão sendo
implantadas sérias medidas de combate à pirataria. De uma forma geral, os
negócios ligados ao entretenimento na Índia são altamente taxados. A indústria de
cinema, especificamente, está sujeita a uma variedade de impostos que podem
consumir até 60% da receita, dependendo das taxas municipais do local de
produção ou exibição do filme. Como parte das novas medidas do governo, estão
sendo criadas formas de incentivo fiscal de âmbito nacional e regional para
estimular investimentos na melhoria da infra-estrutura dos setores de produção e
de exibição.

A Índia é o maior produtor de cinema do mundo. Seu market share da


produção local gira em torno de 95%. Todos os filmes no top 20 são produções
locais. A tradicional Bollywood, pólo da cidade de Bombaim, é responsável por
cerca de 10% do mercado. Outros pólos de produção vêm ganhando cada vez
mais força, como Telugu, Tamil, Malayalam e Bengali. O custo médio de produção
de cada filme fica entre US$ 1,5 milhão e US$ 2 milhões.

Como já vimos, apesar de ser a grande produtora mundial, em termos de


filmes produzidos, a renda do cinema indiano não se comporta dessa mesma
forma. Os preços dos ingressos são relativamente baratos, tornando o setor,
32

apesar de grande, pobre. Atualmente, a principal preocupação dos gestores de


políticas culturais indianos é com o setor de exibição, considerado atrasado. Essas
medidas de modernização do setor de exibição têm o objetivo também de
favorecer o mercado com o aumento do ingresso do cinema.
33

2. ASPECTOS EMPÍRICOS DA ANÁLISE DA DEMANDA POR CINEMA


NO BRASIL

A partir de meados dos anos 90, o cinema nacional obteve uma melhora
significativa em seus principais indicadores. Esse novo momento do cinema
nacional é chamado por alguns autores como a “retomada” do cinema brasileiro.
Essa nova fase da produção nacional de cinema é conseqüência da criação das
leis de incentivo, que através da renúncia fiscal, possibilitaram um maior
investimento no setor de cinema.

O modelo brasileiro de incentivo à cultura, portanto, é caracterizado pela


parceria entre o setor público e o setor privado. Dessa forma, o Estado atua
apenas como agente regulador, enquanto os investimentos diretos são de
responsabilidade das empresas.

Primeiramente, neste capítulo, faremos uma evolução histórica do cinema


brasileiro, ressaltando a importância que o Estado tinha sobre o mercado de
cinema, tendo criado, inclusive, uma empresa estatal para produções
cinematográficas.

Em um segundo momento, abordaremos o a racionalidade e as diferentes


formas existentes de renúncia fiscal. Discutiremos as principais leis de incentivo e
daremos uma dimensão do impacto que cada uma delas tem sobre o montante
arrecadado.

Na terceira seção, faremos a exposição dos principais indicadores do


cinema nacional, destacando a ampliação da oferta de cinema brasileiro, do
número de salas de cinema e do público.

Na quarta seção trataremos da diferença existente entre os valores


captados e a renda dos filmes, o que indica que o Brasil, mesmo após mais de 10
anos de leis de incentivo, ainda não conseguiu criar uma indústria cinematográfica
auto-sustentável.
34

2.1. EVOLUÇÃO DO CINEMA NACIONAL

A partir da década de 60, o Estado deixou de ser apenas legislador e


assumiu uma perspectiva industrial para o setor. O principal pilar dessa política foi
a Empresa Brasileira de Filmes S.A. (Embrafilme), criada em 1969, uma empresa
de capital misto, sob controle da União, responsável por produzir, co-produzir,
financiar, exportar e importar obras audiovisuais, formar profissionais, publicar
estudos e armazenar dados. Ela funcionava com investimentos diretos do
governo.

Já na década de 70, o Brasil adotava uma postura ativa na produção de


cinema nacional. Em 1975, criava-se o Conselho Nacional de Cinema (Concine),
com o objetivo de regulamentar o mercado. Esta participação do Estado visava
favorecer a oferta e a demanda pelos bem culturais. Durante cerca de 15 anos, a
Embrafilme e o Concine formaram a base da indústria cinematográfica no Brasil.

Durante a vigência desta parceria entre o Estado e os produtores de


cinema, o mercado nacional ocupava cerca de 35% do mercado interno, chegando
a produzir filmes com marcas históricas de bilheteria. O Brasil possuía uma infra-
estrutura melhor, possibilitando que a produção nacional tivesse uma maior
participação no mercado de cinema, em termos de exibição. Em meados dos anos
80, essa participação do Estado na provisão de cinema se encerra. E, já no início
dos anos 90, o cinema nacional entra em crise e o antigo modelo de cinema com
participação pública volta a ser requisitado.

De fato, medidas para o desenvolvimento cultural foram criadas. No


entanto, esse novo modelo de incentivo é alicerçado pelos benefícios que o
mercado traz em termos de eficiência, afastando-se da antiga idéia de que o
Estado deveria ofertar esses bens.

O modelo atual utilizado é que o Estado deve atuar apenas como regulador
e incentivador de atividades econômicas, tentando minimizar ao máximo sua
interferência no mercado. A opção, portanto, foi por um Estado que incentivasse a
produção cinematográfica nacional através de leis de incentivos, em outras
35

palavras, renúncia fiscal. Assim, os incentivos fiscais são concedidos a empresas


públicas e privadas que desejam investir parte de sua renda tributada em
atividades culturais, como por exemplo a produção de cinema.

Este modelo é mais eficiente, do ponto de vista econômico, que o modelo


anterior de oferta de bens culturais, pois possibilita às empresas a decisão sobre o
investimento, cabendo ao setor público apenas a regulação e o monitoramento do
projeto incentivado.

Na tabela 2.1 fazemos uma evolução dos principais indicadores do mercado


de cinema brasileiro em trinta anos. Podemos notar o impacto do descaso das
autoridades públicas com o cinema nacional. O Brasil que com a EMBRAFILME
chegou a ter 35% da participação no mercado nacional de cinema, em 10 anos
quase teve sua indústria cinematográfica encerrada. Podemos também analisar
pelo número de salas de cinema, que em 20 anos quase foram reduzidas a
metade.

A partir da criação da Lei do Audiovisual, que foi implementada no ano de


1994, ocorreu a retomada da produção nacional de cinema. Os lançamentos
nacionais que em 1992 eram apenas três, em 2002 já eram trinta e cinco. Cresceu
também, nesse período, o número de salas de exibição de cinema, assim como a
participação nacional no mercado cinematográfico, que no ano de 2005 já foi de
12,7 %.
36

TABELA 2.1
EVOLUÇÃO DOS INDICADORES DO CINEMA NACIONAL

PÚBLICO PÚBLICO %
(FILMES (FILMES PARTCIPAÇÃO LANÇAMENTOS
ANO SALAS PÚBLICO NACIONAIS) ESTRANGEIRO) NACIONAL NACIONAIS
1972 2.648 191.489.250 30.967.603 160.521.647 16,17 68
1982 1.988 127.913.000 45.965.000 82.948.000 35,93 80
1992 1.400 75.000.000 36.113 74.963.887 0,05 3
2002 1.650 85.000.000 6.500.000 78.500.000 7,65 35

Fonte: ADORO CINEMA BRASILEIRO, 2006, “Televisão aberta alavancando o


cinema: parceria entre conteúdo nacional e distribuição estrangeira” Suzy
dos Santos e Sérgio Capparel

2.2 INCENTIVOS FISCAIS

Este é o mecanismo cujas pessoas físicas ou jurídicas podem reduzir, ou


até mesmo eliminar o ônus dos impostos, repassando esse montante a algum
setor produtivo com o objetivo de incentivá-lo.

Esta é a principal forma de ação do Estado na provisão de bens culturais.


Assim, atuando de maneira indireta, o governo age como uma espécie de
regulador da atividade, diminuindo os riscos de produção e tornando interessante,
do ponto de vista financeiro, o investimento em obras culturais por parte das
empresas, já que elas têm liberdade de investimento e, assim, pode utilizar esses
recursos também como publicidade para sua marca.

Um problema que surge é que a decisão de investir é de responsabilidade


do departamento de marketing das empresas, que dificilmente são compostos por
pessoas com conhecimento do mercado de cinema para distinguir se um projeto é
ou não é bom. Essa decisão de investimento passa pela capacidade das
empresas de associar sua marca a um produto com qualidade. A maior parte dos
recursos, portanto, são destinados a produtores já estabelecidos e com
37

visibilidade no mercado. Isso causa a falta de incentivo ao aparecimento de novos


produtores.

Segundo Schuster (1999), o fomento indireto, através de leis de incentivo,


gerou maiores inovações em comparação com períodos que o fomento direto era
utilizado. Desta forma, afirma Schuster, as evidências sugerem que o subsídio
público indireto é a melhor maneira de o Estado atuar na provisão de bens
culturais.

Schuster (1999) ainda expõe quatro funções das leis de incentivo. A


primeira delas é de subsídio financeiro, que trata das transferências de recursos
do setor privado para as atividades culturais. A segunda função tem o caráter de
promover eqüidade. Desta forma, os bens culturais poderiam ser consumidos por
agente que antes não fariam parte do mercado. A terceira função é a de regular e
monitorar as obras com conteúdo cultural. Por fim, tem a função de estabelecer a
relação entre o setor público, setor privado e o setor cultural.

2.2.1 Criação da ANCINE

Mesmo após ter conseguido estimular a produção cinematográfica, o


governo brasileiro ainda enfrentava problemas, seja pela má utilização dos
recursos ou pela inexistência de formas de incentivo do lado da demanda de
filmes nacionais. Surgia, portanto, a necessidade da criação de um órgão
regulador para o mercado de cinema, assim como ocorreu em outros países,
como a Argentina e a Espanha.

Em 2001 foi criado esse órgão regulador para o cinema nacional, chamado
de Agência Nacional de Cinema (ANCINE). Este órgão tem o objetivo de executar
políticas de fomento às obras cinematográficas, fiscalizar o cumprimento da
legislação e regular o setor de cinema. No âmbito da regulação, o papel da
ANCINE consiste em criar mecanismos de fomento e produção à atividade
38

cinematográfica nacional e facilitar a participação de obras cinematográficas no


mercado interno e externo.

Dessa forma, a ANCINE participa diretamente da arrecadação de recursos


para o setor audiovisual. Ela tem o dever de fiscalizar os projetos que receberam
os recursos e de selecionar e divulgar esses projetos para as empresas
investidoras.

As principais leis de incentivo, em relação ao montante arrecadado, que


atuam no mercado audiovisual são as leis de caráter federal. São elas a Lei do
Audiovisual e a Lei Rouanet. Existem também leis de caráter estadual, como é o
caso do Rio Grande do Sul que a Lei de Incentivo a cultura (LIC) exerce desde
1996 um importante papel no desenvolvimento cultural do estado.

2.2.2. Lei Rouanet

A Lei Rouanet, criada em 1991, introduziu o Programa Nacional de Apoio à


Cultura (PRONAC). A lei foi criada com o objetivo de criar recursos para o
desenvolvimento cultural, estimulando a oferta, distribuição e a demanda por bens
culturais.

Como mecanismo de Incentivo Fiscal viabiliza benefícios fiscais para


investidores que desejam patrocinar, ou apenas fazer doações à atividades
culturais. Empresas e pessoas físicas podem utilizar a isenção em até 100% do
valor no Imposto de Renda e investir em projetos culturais. A renúncia fiscal, além
de possibilitar a redução dos tributos para as empresas, possibilita a venda de sua
marca.

A Lei Rouanet não é específica para o cinema. Ela age em todos os


segmentos do setor cultural, por isso, nesse trabalho, utilizaremos apenas os
dados referentes ao cinema nacional. Embora não específica ao cinema, a Lei
Rouanet exerce um papel importante no montante de recursos de renúncia fiscal
destinados a produções cinematográficas.
39

O gráfico 2.1 nos mostra a evolução do montante arrecadado pelo cinema


através da Lei Rouanet de 1995 até 2006, a preços de 2007. Os valores captados
pela lei cresceram rapidamente até 1997 e depois retornaram aos seus valores
inicias. O mesmo ocorreu em 2002, quando houve também um avanço em termos
de valores captados pela Lei Rouanet. Ao todo, o valor captado pela Lei Rouanet
nesse período foi de R$ 566.387.047, a preços de 2007.

GRÁFICO 2.1
Valores Captados pela Lei Rouanet para o Cinema (R$/2007)

100.000.000
90.000.000
80.000.000
70.000.000
60.000.000
50.000.000
40.000.000
30.000.000
20.000.000
10.000.000
0
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: Filme B

2.2.3 Lei do Audiovisual

Foi criada no ano de 1993 com o objetivo de garantir o equilíbrio e a


concorrência da obra audiovisual brasileira, estimulando a produção, divulgação e
exibição, tanto no Brasil como no exterior.
40

A Lei do Audiovisual age através da renúncia fiscal, de forma semelhante a


da Lei Rouanet e é, atualmente, a principal forma de incentivo a produções
cinematográficas nacionais.

Segundo o artigo 2 (dois) da lei, define-se audiovisual:

“Obra audiovisual é aquela que resulta da fixação


de imagens, com ou sem som, que tenham a
finalidade de criar, por meio de sua reprodução, a
impresso ou em movimento, independentes doe
processo de sua captação de suporte usado
inicial ou posteriormente para fixá-las, bem como
dos meios utilizados para sua veiculação.”

Das produções audiovisuais existentes, o cinema é o de maior impacto


econômico, tanto pela geração de emprego e renda, como pelo grande volume de
recursos captado através da renúncia fiscal.

Os mecanismos de captação de recursos da lei do audiovisual estão


basicamente ligados aos artigos 1° e 3°. A dedução permitida pelo Artigo 1° está
limitado a 3% do imposto devido, tanto para pessoas físicas quanto para pessoas
jurídicas. O limite máximo para incentivos por projeto é de 3 milhões de reais.

O Artigo 3° permite ainda o abatimento de 70% do im posto incidente na


remessa de lucros e dividendos decorrentes da exploração de obras audiovisuais
estrangeiras no território nacional, desde que os recursos sejam investidos na co-
produção de obras audiovisuais cinematográficas brasileiras de produção
independente, em projetos previamente aprovados pelo Ministério da Cultura.

O artigo 1° da Lei do Audiovisual é à maneira de re núncia fiscal de maior


impacto para a indústria cinematográfica. Entre os anos de 1996 e 2006, foram
arrecadados R$ 956.555.444, a preços de 2007. Nota-se, através do gráfico 2.2, a
grande arrecadação que a Lei do Audiovisual teve no ano de 1997,
41

acompanhando a tendência da Lei Rounet desse mesmo ano. Após esse ano
atípico, notamos que os valores captados ficaram em torno de R$ 60 milhões.

GRÁFICO 2.2
Valores Captados pela Lei do Audiovisual (art 1°) p ara o Cinema (R$/2007)

200000000

180000000

160000000

140000000

120000000

100000000

80000000

60000000

40000000
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: Filme B

Já o artigo terceiro da Lei do Audiovisual é o menos relevante, em termos


de valores captados, somando-se ao longo desses anos apenas R$ 311.843.934,
a preços de 2007. No entanto, nota-se uma clara evolução do montante
arrecadado ao longo do período analisado ao olharmos o gráfico 2.3.

Esse mecanismo não tem tanto impacto econômico por representar apenas
taxações de remessas de lucros a obras audiovisuais estrangeiras, diferentemente
do que ocorre com as outras formas de renúncia fiscal, que possibilita a dedução
dos impostos de empresas nacionais que queiram associar sua marca a algum
projeto cultural.
42

GRÁFICO 2.3
Valores Captados pela Lei do Audiovisual (art 3°) p ara o Cinema (R$/2007)

70000000

60000000

50000000

40000000

30000000

20000000

10000000

0
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: Filme B

Como vemos no gráfico 2.4, a Lei do Audiovisual, somando-se o artigo


primeiro e o terceiro, é o principal mecanismo de captação de recursos para as
produções cinematográficas, cerca de 80% do montante arrecadado através da
renúncia fiscal, entre os anos de 1995 e 2005.

A grande participação da Lei do Audiovisual na captação de recursos se


deve ao fato de que todo o montante dessa lei é utilizado para obras audiovisuais,
enquanto a Lei Rouanet, por exemplo, é utilizada por todos os segmentos do setor
cultural.
43

GRÁFICO 2.4.
PARTICIPAÇÃO DE CADA LEI NOS VALORES TOTAIS CAPTADOS
PARA A PRODUÇÃO CINEMATOGRÁFICA, ENTRE 1995-2005 (R$/2007)

Lei Rouanet
Lei do Audiovisual
Conv. Dívida
FUNCINES
ART 39

Fonte: ANCINE

A tabela 2.2 mostra a configuração das empresas que entre 1995 e 2007
foram as principais incentivadoras de produções cinematográficas. Observamos
que as grandes investidoras foram às empresas estatais. Destacam-se entre elas
a PETROBRAS e o BANCO do BRASIL.

TABELA 2.2
MAIORES INCENTIVADORES ENTRE 1995 E 2007 – LEI ROUANET E LEI DO
AUDIOVISUAL

Incentivador
1° PETEROBRAS
2° ELETROBRÁS
3° BANCO DO BRASIL
4° BANCO ITAÚ
5° GERDAU
FONTE: MINISTÉRIO DA CULTURA
44

2.3. PANORAMA ATUAL DO MERCADO CINEMATOGRÁFICO


BRASILEIRO

A partir da criação das leis de incentivos, houve uma retomada da produção


nacional de cinema. Também notamos uma evolução dos principais indicadores
do estado atual do cinema nacional.

Como mostra o gráfico 2.5, a partir da criação das leis de incentivo e,


principalmente, da Lei do Audiovisual, notamos uma retomada da produção
nacional de filmes. O Brasil que entre os anos de 1990 e 1995 produzira menos de
10 filmes ao ano, já em 1995 produziu 13 filmes e notamos claramente uma
tendência positiva de produção nacional de cinema, desencadeando no último ano
(2007) a marca de 78 filmes.

A partir desses dados podemos afirmar que as leis de incentivo tiveram


forte impacto no número de produções cinematográficas realizadas. Em outras
palavras, analisando pelo lado da oferta, as leis de incentivo tiveram um impacto
positivo no cinema nacional.

Em termos de produção de filmes, a partir de 2001 a produção de cinema


esteve sempre acima de 30 filmes por ano, destacando o ano de 2004 com 51
filmes produzidos e o último ano, 2007, com 78 filmes.

GRÁFICO 2.5.
NÚMERO DE FILMES PRODUZIDOS NO BRASIL A PARTIR DE 1990.
100
80
Início da Lei
60 do Audiovisual
40
20
0
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007

FONTE: ANCINE
45

O market share das produções brasileiras que em 1995 era de 3,7%, em


2007 já era de mais de 10%. De 1995 a 2007, a média de produções
cinematográficas no Brasil foi de aproximadamente 35 filmes ao ano. Nesse
mesmo período, as produções cinematográficas no Brasil cresceram 600%,
indicando um aumento significativo.

Outro fator importante para o crescimento da produção nacional de filmes


foi a criação da Globo Filmes, braço da TV Globo dedicado à produção e
participação em longas-metragens, que iniciou sua atuação em 1997.
Representando uma virada radical na política da emissora, antes reticente à
parceria com o cinema, a Globo Filmes estabeleceu mais uma importante forma
de visibilidade do produto brasileiro, principalmente em função da amplificação de
sua mídia, com grande repercussão no país.

Para mostrarmos o tamanho do impacto da produtora Globo Filmes vemos


os gráficos 2.6 e 2.7. No gráfico 2.6 vemos que cerca de 70% dos valores
captados são destinados a longa metragens co-produzidos pela Globo Filmes.
Isso demonstra que as produtoras grandes e renomadas também utilizam
recursos de renúncia fiscal e, inclusive, atraem mais recursos por se tratarem de
filmes com maiores chances de serem exibidos. Desta forma, os investidores têm
preferência por filmes da produtora Globo Filmes.

No gráfico 2.7 notamos a participação que a produtora Globo Filme tem no


total da renda gerada no setor entre 1997 a 2004, mais de 90%. Essa grande
participação está relacionada ao poder publicitário que acompanha a emissora
Globo e também relacionada com os artista e diretores que fazem parte da Globo,
e que diferencia o filme produzido pela Globo Filme.
46

GRÁFICO 2.6.
Valores captados por filmes pertencentes às empresas produtoras de longa-
metragens ficcionais brasileiros com renda superior a R$ 20 milhões (1995-
2004) (R$/2007)

Globo Filmes
Outras

FONTE: ANCINE, “Televisão aberta alavancando o cinema: parceria entre


conteúdo nacional e distribuição estrangeira” Suzy dos Santos e Sérgio Capparelli

GRÁFICO 2.7.
Renda dos filmes pertencentes às empresas produtoras de longa-metragens
ficcionais brasileiros com renda superior a R$ 20 milhões (1995-2004)
(R$/2007)

Globo Filmes
Outras

FONTE: ANCINE, “Televisão aberta alavancando o cinema: parceria entre


conteúdo nacional e distribuição estrangeira” Suzy dos Santos e Sérgio Capparelli
47

Um indicador que revela o estado atual do setor de exibição do cinema


nacional é o número de salas de cinema. Notamos através do gráfico 2.8 uma
clara evolução do número de salas nos últimos anos. Embora esse aumento no
número de salas de cinema tenha ocorrido, o Brasil ainda não alcançou os
mesmos números da década de setenta.

O aumento do número de salas de cinema se concentrou principalmente


em estabelecimentos como Shopping centers, já que os cinemas tradicionais
chamados “cinemas de rua” estão desaparecendo.

GRÁFICO 2.8
NÚMERO DE SALAS DE EXIBIÇÃO NO BRASIL A PARTIR DE 1995.

2.200
2.045 2.120
2.000 2.045
1.997

1.800 1.817

1.650
1.600
1.620
1.480
1.400
1.365 1.350
1.300
1.200

1.075
1.000 1.033
1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Fonte: Filme B

Nesse sentido, Ikeda (2004) argumenta que a queda do número de salas de


cinema na década de 80 se deve, entre outros fatores, a má fase da economia
brasileira e sua conseqüente queda dos salários reais no período. A partir de
1997, no entanto, houve a entrada no mercado dos multiplex, que geraram salas
48

de cinema com maior conforto, provocando concorrência no setor e, assim,


incentivando o aparecimento de novas salas de cinema cada vez mais modernas.

O principal indicador de análise da demanda por produções nacionais de


cinema é o público total de filmes produzidos no Brasil, em cada ano. O gráfico 2.9
mostra como essa evolução aconteceu. O gráfico mostra uma tendência positiva
do público de cinema nacional nos últimos anos. Embora positiva, essa tendência
crescente não é expressiva. Entre 1995 e 2007, o público de cinema nacional
subiu cerca de 290%, valor inferior ao aumento do número de filmes produzidos,
no mesmo período.

GRÁFICO 2.9
PÚBLICO DE CINEMA NO BRASIL A PARTIR DE 1995
25.000.000

20.000.000

15.000.000

10.000.000

5.000.000

0
1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007

Fonte: ANCINE

2.4. O HIATO ENTRE VALORES CAPTADOS E RENDA DOS FILMES

No primeiro capítulo mostramos como a racionalidade econômica das leis


de incentivo está ligada com o estímulo ao desenvolvimento de uma indústria
cinematográfica nacional auto-sustentável. Como esses recursos seriam
repassados ao governo através dos impostos, a renúncia fiscal reduz a
49

arrecadação tributária. No entanto, essa queda da arrecadação não ocorreu de


fato, indicando que as pessoas compensaram isso de alguma forma.

Ocorre também que esses recursos, que antes eram de poder público e que
as empresas têm opção de utilizá-los, poderiam ser utilizados para outras
necessidades básicas, como saúde, educação e segurança. Isso demonstra o alto
custo de oportunidade do gasto dos recursos públicos. É necessário, portanto,
que o gasto governamental seja eficiente em qualquer área, principalmente, na
provisão de bens que não de necessidades básicas da população, como é o caso
dos bens culturais.

Para darmos uma dimensão do que ocorreu nesse sentido, a partir da


criação das leis de incentivo, utilizaremos uma medida de eficiência. Dessa forma,
veremos o quanto o cinema gerou de renda ao longo desses anos e quanto ele
captou de recursos através da renúncia fiscal.

O gráfico 2.10 compara o montante arrecadado através da renúncia fiscal


com a renda dos filmes, dependendo do público e do preço do ingresso, a cada
ano. Existe claramente um hiato entre valores captados e a renda dos filmes.

GRÁFICO 2.10.
RENDA X VALORES CAPTADOS (R$/2007) ENTRE 1995-2007

300.000.000 Renda dos


Filmes
250.000.000 Valores
Captados
200.000.000

150.000.000

100.000.000

50.000.000

0
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Fonte: ANCINE
50

Esse hiato evidencia que o Brasil até hoje não criou uma indústria
cinematográfica auto-sustentável. Vemos que apenas em 2003 houve maior renda
gerada pelos filmes que montante de renúncia fiscal no Brasil. Outra questão que
corrobora essa hipótese é que não existe nenhuma evidência, ao analisarmos o
gráfico 2.10, que haja uma evolução da renda em comparação com os valores
captados, não havendo perspectiva de redução desse hiato.

Além da questão da auto-sustentabilidade da produção de cinema,


devemos destacar a questão da eficiência econômica. Desde 1995, a renda
acumulada do cinema nacional, a preços de 2007, foi de R$ 914.949.709,
enquanto o montante arrecadado através da renúncia fiscal foi de R$
1.796.230.041. Dessa forma, acumulamos um hiato negativo de R$ 881.280.332,
no período analisado.

Para a auto-sustentabilidade de um processo de produção, é necessário


que exista tanto oferta quanto demanda pelo produto. No caso da produção
nacional de filmes, o incentivo oferecido através da renúncia fiscal é dado
exclusivamente pelo lado da oferta desses bens. No gráfico 2.11. podemos notar
que a evolução do público de cinema nacional segue uma leve tendência positiva,
no entanto, o montante arrecadado não tem essa tendência.

GRÁFICO 2.11.
PÚBLICO X VALORES CAPTADOS (R$/2007) ENTRE 1995-2007

300000000 25.000.000

250000000 20.000.000
200000000
15.000.000
150000000
10.000.000
100000000

50000000 5.000.000

0 0 Valores
1995 1998 2001 2004 2007 Captados

Fonte: ANCINE
51

Embora as leis de incentivo tenham gerado um significativo aumento na


produção de filmes no Brasil entre os anos de 1995 e 2007, elas não contribuíram
para a geração de demanda por filmes. Para darmos uma dimensão desse
descompasso, podemos dividir o total de público de cinema nacional em cada ano
pelo total de filmes produzidos nesses anos, assim teremos o público médio do
cinema nacional.

Essa medida é mostrada no gráfico 2.12. O público médio do cinema


nacional não tem uma tendência positiva. Tanto no gráfico 2.11, como no gráfico
2.12, notamos que no ano de 2003 o público de cinema nacional foi maior em
relação aos outros períodos. Desatacamos entre as causas desse fenômeno o
inédito número de filmes com público acima de um milhão, sete ao todo. Entre
esses filmes destacamos Carandiru, de Hector Babenco, Lisbela e o Prisioneiro,
de Guel Arraes e Os Normais, de José Alvarenga.

GRÁFICO 2.12
PÚBLICO MÉDIO DO CINEMA NACIONAL ENTRE OS ANOS DE 1995 E 2007
800.000
700.000
600.000
500.000
400.000 Público
Médio
300.000
200.000
100.000
0
1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007

FONTE: ANCINE

Concluímos, portanto, que efetivamente a maior parte dos indicadores do


cenário atual da produção cinematográfica nacional está evoluindo. Mas a melhora
nesses indicadores se dá principalmente no âmbito da produção. Isso indica que a
demanda por cinema no Brasil não acompanhou a oferta de filmes. Notamos
também que a demanda por produções nacionais se concentra especialmente em
52

um pequeno número de filmes, normalmente de grandes produtoras com grande


visibilidade no mercado.

As tabelas abaixo fornecem informações sobre os filmes que tiveram maior


renda do que arrecadaram de recursos através da renúncia fiscal, para os anos
2005, 2006 e 2007.
TABELA 2.3
FILMES COM MAIOR RENDA QUE VALORES CAPTADOS EM 2005
(R$/2007)
Valores
Filme Renda Captados
Dois Filhos
de
Francisco 36.728.278 5.746.000
O
Casamento
de Romeu
e Julieta 7.303.657 6.750.000
Vinícius de
Moraes 2.378.985 2.100.000
Fonte: ANCINE

TABELA 2.4
FILMES COM MAIOR RENDA QUE VALORES CAPTADOS EM 2006
(R$/2007)
Valores
Filme Renda Captados
Se Eu Fosse
Você 28.916.137 4.298.172
Didi, O Caçador
de Tesouros 6.220.01 3.101.106
Xuxa Gêmeas 5.764.742 3.680.950
O Cavaleiro Didi
e a Princesa Lili 4.630.354 2.929.517
Casseta e
Planeta - Seus
Problemas
Acabaram 4.262.366 0
Trair e coçar é
só começar 3.486.329 3.280.000
Fonte: ANCINE
53

TABELA 2.5.
FILMES COM MAIOR RENDA QUE VALORES CAPTADOS EM 2007
(R$/2007)
Filme Renda Valores Captados
Tropa de Elite 20.393.792 6.214.000
A Grande
Família 15.476.242 0

Ó pai ó 3.136.833 2.615.000


Fonte: ANCINE

Notamos que poucos filmes, no período analisado, tiveram renda superior


aos valores captados. Podemos ver também que esses filmes foram realizados
por grande produtoras e com gastos de publicidade muito altos. No ano de 2005,
por exemplo, o filme Dois Filhos de Franciso, de Breno Silveira, teve renda de
mais de 20 milhões de reais, valores muito superiores aos valores arrecadados. O
mesmo aconteceu em 2006 com o filme Se Eu Fosse Você, de Daniel Filho e, em
2007 com, Tropa de Elite, de José Padilha.

A grande renda aliada a pequena participação desses filmes no montante


arrecadado da renúncia fiscal nos faz levantar uma hipótese. Esses filmes
provavelmente seriam produzidos mesmo que não houvesse as leis de incentivo,
já que antes da renúncia fiscal o Brasil produzia cerca de quatro filmes ao ano,
número semelhante de produções que geraram renda maior que seus valores
captados. Obviamente, essa hipótese ainda precisaria ser testada, algo que não
fizemos nesse trabalho.

Outra hipótese que pode ser considerada ao analisarmos os dados sobre o


mercado de cinema nacional é que existe uma espécie de moral hazard por parte
dos produtores de cinema. Moral hazard se refere à situação em que um lado do
mercado não pode observar as ações do outro. Dado que os produtores recebem
recursos de renúncia fiscal, e nesses recursos já estão incluídos os pagamentos a
todos os fatores de produção, inclusive seus pagamentos e como os investidores
54

não têm capacidade de monitorar o trabalho dos produtores, esses não tem
incentivo a fazer um bom trabalho e, portanto, se esforçarão o mínimo possível
para aumentar a qualidade do bem.

Um dos fatores que determina a demanda por cinema é a qualidade do


bem. Um produtor leva isso em consideração ao realizar um filme, pois quanto
maior a bilheteria maior será sua renda. Em um ambiente de moral hazard, o
incentivo para melhorar a qualidade do bem é pequeno e, portanto, devem ser
produzidos filmes de qualidade baixa.
55

3. DETERMINANTES DA DEMANDA POR CINEMA NACIONAL

Neste capítulo pretende-se estimar um modelo que busque explicar os


determinantes da demanda por cinema nacional no Brasil, a partir da criação das
leis de incentivo a cultura. Primeiramente apresentamos a forma como os modelos
serão estimados. Nesta primeira seção também faremos a descrição das variáveis
utilizadas e dos testes que determinam a validez do modelo.

Na segunda seção, mostraremos os resultados da estimação para os


quatros modelos distintos propostos. Serão mostrados também os principais
testes de diagnóstico de problemas em nossas regressões. Esses resultados são
necessários para que possamos concluir nosso objetivo de verificar a significância
de cada uma das variáveis que utilizaremos no modelo e de fornecer as
elasticidades dessas variáveis na demanda por cinema.

Após terem sido feitas as estimações, buscamos interpretar os resultados.


Serão considerados nesta seção, apenas os modelos cujas variáveis foram
significativas, para assim podermos fazer inferência através dos coeficientes da
regressão. O capítulo se encerra com as considerações finais em sua última
seção.
56

3.1 APRESENTAÇÃO DO MODELO

Os estudos recentes sobre economia da cultura desenvolveram fortes


instrumentais teóricos sobre o assunto, como foi detalhado no primeiro capítulo.
No entanto, trabalhos de caráter empírico sobre economia da cultura ainda são
escassos. O objetivo deste capítulo é verificar a significância e o impacto de cada
uma das variáveis sugeridas pela literatura, no consumo de bens culturais, que no
caso analisado é o público de cinema nacional no Brasil.

O processo de geração de público de cinema nacional é algo ad hoc, não


havendo na literatura nenhum modelo teórico que possamos nos basear para
fazermos estimativas empíricas. O modelo utilizado aqui é da forma:

n
LogYt = α t + ∑ i =1 xit βit + ut (1)

onde yt é o público de cinema nacional para o ano t, xit são os determinantes da


formação de público de cinema e o ut é o ruído branco. A estimação será feita
pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQO).

3.1.1 Descrição das Variáveis

A finalidade desta seção é apenas descrever em que consiste cada uma


das variáveis que serão utilizadas no modelo econométrico. Será explicado como
cada uma será obtida e/ou porque cada uma será utilizada. Todos os dados que
serão utilizados são nacionais, e o período de análise é do ano de 1995 até o ano
de 2007. A escolha desse período se deve ao fato de que todas as leis de
incentivo ao cinema já existiam a partir do ano de 1995 e, dessa forma, os dados
sobre o cinema nacional se encontram disponíveis no site da ANCINE.
57

1)Público de Cinema Nacional: essa é a variável que buscamos explicar em nosso


modelo. Vale lembrar que se trata apenas público de cinema no Brasil para filmes
nacionais em cada ano, a partir de 1995. Não será utilizada uma medida de
público por filme (público médio) porque como vimos no capítulo 2, a maior parte
do público se concentra apenas em um pequeno número de filmes. Assim, o
modelo estimado não seria significativo.

2) Capital Humano: a literatura mostrada no primeiro capítulo afirma que o


acúmulo de capital humano gera aumento no consumo de bens culturais, portanto
essa variável será explicativa em nosso modelo. Para utilizarmos essa medida em
nossa estimativa, usamos os dados de média de anos de estudo das pessoas de
dez ou mais anos de idade que são disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). O período considerado será de 1995 até 2007.

3) Valores Captados: esses valores se referem ao montante arrecadado através


das leis de renúncia fiscal, que foram captados para a produção de filmes
nacionais em cada ano, a partir de 1995. Os dados utilizados são retirados da
base de dados da ANCINE e foram deflacionados para preços de 2007, pelo
índice do IGP-M.

Como as leis de incentivo visam criar uma indústria cinematográfica


nacional forte, e como a demanda por produções nacionais é intimamente
relacionada com o sucesso dessa indústria, o montante de valores captados é
uma variável explicativa em nosso modelo.

4) Renda Per Capita: esta é uma medida de renda da população. Como buscamos
explicar o consumo de um bem, o cinema nacional, é necessário testarmos, entre
as variáveis explicativas, uma medida de renda. A variável que utilizamos é a de
PIB per capita, para os anos de 1995 até o ano de 2007. Esses dados foram
58

retirados do site do IPEADATA, e foram deflacionados pelo IGP-M para o ano de


2007.

5) Número de Filmes: quantidade de filmes que o Brasil produziu em cada ano,


entre o ano de 1995 e 2007. Como a renúncia fiscal incentivou a produção
nacional de filmes, os consumidores se depararam com uma maior variedade de
escolha. Se essa variável for significativa, podemos afirmar que, nesse período de
tempo, o aumento da oferta de filmes gerou o aumento da sua demanda. Para
isso, utilizaremos os dados divulgados da ANCINE para cada ano.

6) Dummy: será utilizada uma variável binária para o ano de 2003. Como vimos no
segundo capítulo deste trabalho, o ano de 2003 foi atípico para o cinema nacional,
tendo o Brasil produzido sete filmes com mais de um milhão de expectadores.

3.1.2. Testes de Diagnóstico

Como o método de estimação utilizado foi o dos mínimos quadrados


ordinários, nossos resultados terão validade apenas se o resíduo se comportar
como um ruído branco. Espera-se, portanto, que o resíduo apresente ausência de
autocorrelação, homoscesdaticidade e normalidade (hipótese necessária para que
se possa fazer inferência a partir dos estimadores).

Dessa forma, utilizaremos testes para a detecção de autocorrelação serial.


São eles o teste LM Breusch-Godfrey e Q de Ljung-Box. Se os testes
apresentarem autocorrelação, os estimadores não serão eficientes, ou seja, o de
variância mínima dentre todos os estimadores lineares não tendenciosos.

Para testarmos a heteroscedasticidade, verificaremos a presença de


estrutura ARCH e faremos o teste de White sem termos cruzados. Os problemas
resultantes da heteroscedasticidade são semelhantes àqueles encontrados na
59

presença de autocorrelação serial. Apesar de perderem a eficiência, os


estimadores de MQO continuam sendo consistentes.

Para verificarmos a normalidade do resíduo, utilizaremos o teste de Jarque-


Bera. Se o resíduo apresentar essa propriedade, os estimadores de MQO são não
tendenciosos, eficientes e consistentes; pressupostos do modelo de regressão
linear clássico. Essas são condições suficientes para que possamos fazer
inferência estatística a partir do modelo gerado.

3.2. ESTIMAÇÃO

A estimação neste trabalho tem dois propósitos. O primeiro é observar as


variáveis que são significativas, ou seja, aquelas que ajudam a explicar como a
demanda por cinema nacional é formada. O segundo propósito da estimação é
fazer inferência estatística, encontrando as elasticidades. Dessa forma, todos os
modelos elaborados aqui serão estimados com logaritmos das variáveis
dependentes.

Em um primeiro momento estimaremos dois modelos (1 e 2), utilizando


todas as variáveis já descritas. Esse primeiro passo serve para testarmos a
significância de cada uma das variáveis. Posteriormente, retiraremos algumas
variáveis insignificantes do modelo para encontrarmos novos modelos com melhor
ajustamento e, dessa forma, poder fazer inferência estatística com maior
confiança. Os dois primeiros modelos, portanto, são estimados na forma a seguir:

i) Modelo 1

LogPUBt = α + β1EDUCt + β2 FILMESt + β3VCt + β4 DUMMY + ε t (2)


60

ii) Modelo 2

LogPUBt = α + β1 PIBt + β 2VCt + β3 DUMMY + ε t (3)

A variável PUB representa o público do cinema nacional, EDUC representa


capital humano, FILMES representa o número de filmes produzidos, VC
representa os valores captados, PIB representa o PIB per capita e DUMMY é a
variável binária que assume valor um para o ano de 2003 e zero para os demais
anos.

Estimaremos um modelo com capital humano e outro com renda porque


essas duas variáveis são muito correlacionadas, como o coeficiente de correlação
já calculado entre essas duas variáveis nos mostra, ρ = 0 , 8 7 . Se estimarmos
um modelo com essas duas variáveis, sofreremos o problema da
multicolinearidade. Com a presença de multicolinearidade, os coeficientes da
regressão terão grandes erros-padrão, o que significa que os coeficientes não
podem ser estimados com exatidão.

Outro problema que nos deparamos na estimação é o da


micronumerosidade. Esse problema surge quando a amostra é pequena em
relação à quantidade de regressores. Como as leis de incentivo são recentes no
Brasil, nossa amostra é pequena e esse é um problema que não teremos solução.
As conseqüências da micronumerosidade são semelhantes àquelas encontradas
na multicolinearidade, as estatísticas t e F, tenderão facilmente a aceitar a
hipótese nula. Outra restrição que teremos como conseqüência da
micronumerosidade, é que não poderemos realizar o teste de raiz unitária.

3.2.1 Resultados dos Modelos 1 e 2

A tabela 3.1 apresenta os resultados das estimações dos modelos 1 e 2. Os


valores das tabelas apresentam os coeficientes estimados e os valores dentro dos
61

parênteses representam os valores das estatísticas t. Nesta tabela também estão


as estatísticas necessária para verificarmos o grau de ajuste que obtemos na
estimação.

TABELA 3.1

RESULTADOS DA REGRESSÃO

(1) (2)

Constante 6,46 (2,3)** 7,46 (2,04)*

EDUC 1,66 (3,2)**

FILMES -0,02 (-1,57)

VC -6,18 (-0,25) -3,3 (-0,944)

PIB 0,000695 (2,32)**

DUMMY 0,57 (1,13) 1,417 (2,22)*

R2 0,816 0,547

R2 ajustado 0,724 0,396

AIC 1,34 2,09

Observações 13 13

Nota: *,**,*** representam significância a 10%, 5% e a 1% respectivamente

Os sinais dos coeficientes das variáveis EDUC e PIB são positivos e


significativos, assim como afirma a teoria. O mesmo não ocorreu com o coeficiente
da variável VC, que foi não significativo. A variável FILMES também não foi
significativa no modelo. A variável binária do primeiro modelo, diferentemente do
segundo, não foi significativa, indicando o problema da perda de graus de
liberdade causada pelo ingresso de variáveis não significativas no modelo.
62

Os valores do R2 e do R2 ajustado indicam que no primeiro modelo as


variáveis explicativas têm maior poder de determinação sobre a variável
dependente. O valor de AIC servirá apenas para compararmos os modelos 1 e 2
com os modelos 3 e 4 que serão tratados na próxima seção.

As figuras 3.1 e 3.2 nos mostram graficamente o ajuste que obtemos com
as estimações do modelo 1 e 2, respectivamente.

FIGURA 3.1 (MODELO 1)

VALOR OBSERVADO, VALOR ESTIMADO E RESÍDUO

17

16

15

0.5 14

13
0.0

-0.5

-1.0
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07

Residual Actual Fitted

FIGURA 3.2 (MODELO 2)

VALOR OBSERVADO, VALOR ESTIMADO E RESÍDUO

17

16

1.0 15

0.5
14
0.0
13
-0.5

-1.0

-1.5
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07

Residual Actual Fitted


63

A tabela 3.2 nos mostra os resultados dos principais testes de diagnósticos


que necessitamos para confirmar a validade do modelo.

TABELA 3.2

TESTES DE DIAGNÓSTICOS

(1) (2)

Autocorrelação LM

Dois lags 0,0461 0,298

Quatro lags 0,0477 0,576

Resíduo ARCH

Um lag 0,968 0,647

Quatro lags 0,782 0,415

Heteroscedasticidade White

Sem termos cruzados 0,335 0,538

Normalidade

Jarque-Bera 0,135 0,434

Especificação

RESET Ramsey com um lag 0,20 0,0027

Percebemos, de acordo com a tabela 3.2, que a estatística LM do modelo 1


rejeita a hipótese nula de ausência de autocorrelação serial. Esse problema gera a
ineficiência de nossos estimadores, porém não retira a validade de nosso modelo.
64

Já no segundo modelo, rejeitamos a autocorrelação com o nível de significância


de aproximadamente 30%. A estatística Q de Ljung-Box 11 indica que os dois
modelos não sofrem de autocorrelação. Com relação ao problema de
heteroscedasticidade, tanto o teste White como o do resíduo ARCH não rejeitam a
hipótese de homoscedasticidade nos dois modelos, indicando que não sofremos
de heteroscedasticidade nesses modelos. Embora difícil de ser alcançada,
principalmente em uma amostra pequena, o teste Jarque-Bera não rejeitou a
hipótese de normalidade dos resíduos nos modelos 1 e 2. No primeiro modelo, o
nível de significância da aceitação da hipótese nula de normalidade dos resíduos é
cerca de 13%, enquanto no segundo modelo foi cerca de 43%.

O teste RESET serve para a detecção de erros de especificação do modelo.


Nesse caso, a hipótese nula é de que o modelo está bem especificado. O modelo
1 não indica problemas de especificação. Já no segundo modelo, o teste não
rejeita a hipótese de má especificação do modelo.

3.2.2 Resultados dos Modelos 3 e 4

Os modelos 3 e 4 são constituídos apenas pelas variáveis significantes dos


modelos 1 e 2. Dessa forma, retiramos as variáveis VC e FILMES dos modelos.
Os modelos, portanto, são apresentados da forma a seguir:

iii) Modelo 3,

LogPUBt = α + β 1 EDUC t + β 2 DUMMY + ε t (4)

iv) Modelo 4

LogPUBt = α + β1 PIBt + β 2 DUMMY + ε t (5)

11
A estatística Q de Ljung-Box será apresentada nos anexos deste trabalho, assim como a função
de autocorrelação e a função de autocorrelação parcial de todos os modelos.
65

O modelo 3 apresenta a mesma estrutura do modelo 1, apenas com a


retirada da variável VC e da variável FILMES. Enquanto isso, o modelo 4 se
assemelha ao modelo 2, no entanto, também retiramos a variável VC.

Utilizamos novamente a proxy de renda e a proxy de capital humano em


modelos distintos, pois, como já mencionamos, a matriz de correlação nos fornece
um coeficiente de correlação alto entre essas variáveis, ρ = 0 , 8 7

A partir da estimação feita pelo método dos mínimos quadrados ordinários,


através das equações (3) e (4), obtemos os resultados apresentados na tabela 3.3,
onde apresentamos os estimadores e, entre parênteses, estão os valores das
estatísticas t. A tabela também contem as estatísticas que nos mostram o grau de
ajuste de nossos modelos e nos permitem comparar o modelo 3 e 4 com o modelo
1 e 2.

TABELA 3.3

RESULTADOS DA REGRESSÃO

(3) (4)

Constante 9,78 (7,84)*** 6,80 (1,88)*

EDUC 0,96 (4,69)***

PIB 0,000723 (2,44)**

DUMMY 0,95 (2,11)* 1,41(2,23)**

R2 0,75 0,50

R2 ajustado 0,70 0,40

AIC 1,34 2,03

Observações 13 13

Nota: *,**,*** representam significância a 10%, 5% e a 1% respectivamente


66

Os resultados apresentados mostram como todas as variáveis utilizadas


são significantes e como apresentaram sinais positivos. No modelo 3, por exemplo,
a variável EDUC apresenta nível de significância de 1% apenas. Nesse mesmo
modelo, com a retirada de variáveis não significativas, a variável dummy se torna
também significativa. Ainda no modelo 3, notamos que apesar de utilizarmos
poucas variáveis explicativas, o R2 e o R2 ajustado indicam um alto grau de ajuste
de nosso modelo. Com relação ao critério de informação Akaike, notamos que não
houve mudança entre o modelo 1 e o modelo 3.

No modelo 4, a retirada da variável VC não forneceu o mesmo impacto


positivo que obtemos no modelo 3, principalmente ao compararmos os valores do
R2 do R2 ajustado e do critério de informação Akaike dos modelos 2 e 4. Apesar
disso, a variável dummy agora apresenta um nível de significância de apenas 5%.

As figuras 3.3 e 3.4 nos mostram graficamente o ajuste que obtemos com
as estimações do modelo 3 e 4, respectivamente.

FIGURA 3.3 (MODELO 3)

VALOR OBSERVADO, VALOR ESTIMADO E RESÍDUO

17

16

0.8 15

0.4 14
0.0
13
-0.4

-0.8

-1.2
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07

Residual Actual Fitted


67

FIGURA 3.4 (MODELO 4)

VALOR OBSERVADO, VALOR ESTIMADO E RESÍDUO

17

16
1.0

0.5 15

0.0 14

-0.5
13
-1.0

-1.5
95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07

Residual Actual Fitted

Percebemos que na figura 3.3 a reta dos valores estimados se encontra


mais próxima da reta dos valores observados. Esse é um reflexo do R2 e R2
ajustado mais elevado que encontramos no modelo 3.

A tabela 3.4 nos mostra os resultados dos principais testes de diagnósticos


que necessitamos para confirmar a validade do modelo. As estatísticas Q de
Ljung-Box que rejeitaram a possibilidade de autocorrelação serial e as funções de
autocorrelação e autocorrelação parcial se encontram nos anexos deste trabalho.
68

TABELA 3.4

TESTES DE DIAGNÓSTICOS

(3) (4)

Autocorrelação LM

Dois lags 0,977 0,370

Quatro lags 0,931 0,661

Resíduo ARCH

Um lag 0,563 0,501

Quatro lags 0,527 0,268

Heteroscedasticidade White

Sem termos cruzados 0,483 0,835

Normalidade

Jarque-Bera 0,044 0,1624

Especificação

RESET Ramsey 0,024 0,037

Os testes LM para os dois modelos indicam a inexistência de


autocorrelação serial, sejam em duas ou em quatro defasagens. A hipótese de
homoscedasticidade para os dois modelos é confirmada pelos testes de White e
dos resíduos ARCH. O teste Jarque-Bera, no entanto, indica que os resíduos do
modelo 3 não possuem distribuição normal. Isso ocorre devido a pequena amostra
que temos. Como o nível de significância não foi um número próximo de zero
(4,4%), ainda temos estimativas confiáveis a partir dos modelos gerados.
69

Os modelos 3 e 4, também não rejeitam a hipóteses de má especificação


da forma funcional, como nos mostra o teste RESET. Com a retirada das variáveis
insignificantes do modelo 1, o modelo 3 passou a não rejeitar a hipótese de má
especificação.
Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do
audiovisual brasileiro contemporâneo

Aprovado pelo Conselho Superior de Cinema (CSC), em agosto de 2012, o


Plano de Diretrizes e Metas para o Audiovisual (PDM), após consulta pública e
nova apreciação pelo órgão em comento, tornou-se a referência para a política
audiovisual brasileira, nos seguintes eixos: desenvolvimento da atividade audiovisual;
produção e circulação de conteúdos brasileiros; economia sustentável, competitiva e
inovadora; liberdade de criação e diversidade cultural. Para a inserção do audiovisual
Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

brasileiro em um novo patamar de desenvolvimento, é prevista uma expansão do


circuito cinematográfico, com a ampliação do número de filmes brasileiros
lançados comercialmente, de 75 em 2010, para 170 em 2020; da renda bruta de
bilheteria, de R$ 1,26 bilhão para R$ 3,238 bilhões, no mesmo período; da
participação de filmes brasileiros nessas receitas, de 17,93% para 30%. Além disso,
é prevista uma expansão dos serviços de TV por assinatura, com a ampliação do
número de programadoras nacionais, de 6 para 20; de canais brasileiros nesse
segmento de mercado, de 16 para 50; da participação de obras brasileiras
independentes nas grades de programação, atingindo, até 2020, 41,3%; entre outras
diretrizes.
Essas perspectivas estão alinhadas com a centralidade do mercado
audiovisual nas dinâmicas contemporâneas. Considerando matizes simbólicos,
econômicos e culturais, o audiovisual vem sendo alçado à pauta da agenda
governamental brasileira. Para a Secretaria do Audiovisual (SAV/MINC, 2012), é
possível falar em uma revolução: “a revolução do conhecimento, da convergência,
da inovação, da informação, da comunicação, da coletividade ou, simplesmente, a
revolução criativa”. Transformações sociais, econômicas, políticas e culturais
ensejam redefinições de contextos e de conceitos. Novas práticas de consumo,
inovações tecnológicas, profusão de mídias pautam a era da informação
(CASTELLS, 1999), e requerem novos modelos de negócio, forjando outras
configurações de mercado. Neste artigo, são observadas as nuances que
atravessam esse importante campo de produção material e simbólica (BOURDIEU,
1992), sopesados os afastamentos e as reaproximações entre cinema e televisão na
economia, que tece tal contexto. Nessa esteira, a partir das conexões entre cultura,
criatividade e desenvolvimento, novos consórcios entre esses meios são
alinhavados e, em tal conjuntura, merecem destaque dois importantes eventos: o
lançamento do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e a edição da Lei 12.485/11
(Lei da TV por Assinatura).

2. O divórcio estético-político: cinema, televisão, negócio e cultura.


Contornos traçados pela interação entre cinema e televisão demarcam a
configuração contemporânea do campo audiovisual no Brasil. Para alcançar tal
configuração, hierarquias e dicotomias, afastamentos e reaproximações, revelam as
trajetórias desses meios audiovisuais, atravessadas pela função
preponderantemente estética, atribuída ao cinema, e pela função comercial,
pautada por controle e poder, atribuída à televisão. Ao percorrer essas trajetórias, é
possível visualizar que o processo de instauração do cinema e da televisão, no
Brasil, foi delineado por uma questão de viés nacionalista. Identidade brasileira,
integração nacional, necessidade de incentivos estatais para a inserção de bases
industriais, entre outros temas, norteiam discussões políticas, econômicas e
culturais, assim como convalidam espaços para o cinema e para a televisão no país.
Nos anos 1930, o direcionamento do olhar para o cinema brasileiro e para a
correlata possibilidade de consolidação de uma identidade nacional estava em
consonância com a ideia desenvolvimentista e nacionalista cunhada por Getúlio
Vargas. Foi apresentado pelo governo um conjunto de diretrizes para o cinema,
fundado, sobretudo, em incentivos para filmes de curta-metragem com fins
educativos e de caráter nacionalista.
Naquele momento, o cinema foi percebido como estratégico para a formação
e para a integração da nação. Em 1937, a articulação entre cinema, educação e
nação foi intensificada pela criação do Instituto Nacional de Cinema Educativo
(INCE), órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC). Ao valer-se do cinema
como instrumento voltado para a formação da nacionalidade, o INCE atendia
somente aos setores educativo e cultural, não havendo uma preocupação com o
desenvolvimento de uma perspectiva industrial (Bahia, 2012). Essa preocupação
aparece, efetivamente, nos anos 1940 e 1950. Com o fim desse governo, outras
demarcações, tecidas pela instituição de um “capitalismo frágil e uma indústria
cultural e um mercado de bens simbólicos incipientes” (idem, p. 33), e outras
disputas, relativas à afirmação do cinema nacional perante o trânsito de filmes e a
instalação de companhias distribuidoras norte-americanas nos mercados externos
e, no caso em tela, no mercado brasileiro, assinalam o campo cinematográfico.
Nesse período, duas importantes companhias cinematográficas brasileiras, com
pretensões industriais e comerciais, apresentam impactos no mercado de cinema
nacional, a saber, a Atlântida, criada em 1941, e a Vera Cruz, criada em 1949.
Apesar dos filmes produzidos entre os anos de 1951 a 1955 pelas
companhias em comento, em média 27 ao ano, e da tentativa de construção de uma
indústria e de um mercado de cinema nacional, estúdios e propostas entram em
declínio. Lia Bahia (2012) aponta o estágio primitivo da industrialização, o
surgimento da televisão, e a má administração de recursos como razões para tanto.
Com distintos graus de modernização, ultrapassar a condição de
subdesenvolvimento do cinema brasileiro representaria alcançar a própria
modernização do país. Em meados dos anos 1950, a industrialização é repensada e
novas propostas são esboçadas. Como aponta Pedro Butcher (2006), o setor
cinematográfico, ao abarcar apenas a produção, não constrói uma base industrial
consistente, e tanto sob a égide do governo de Getúlio Vargas, como do governo de
Juscelino Kubitschek, o cinema não ultrapassa os âmbitos da Educação e da
Cultura, respectivamente, para adentrar na seara econômica e industrial.
Outrossim, diante das forças políticas e econômicas norte-americanas, o foco
somente nesse elo da cadeia produtiva, garante uma posição confortável em
relação aos Estados Unidos. Mas não só isso, também ensejou críticas a essa
postura, proferidas por cineastas como Nelson Pereira dos Santos, Carlos Ortiz,
Alex Viany, entre outros, fundadas na busca de uma produção repousada em uma
Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

ideologia nacional popular. Para esses cineastas, por meio de temáticas e


linguagens nacionais, atingir-se-ia a “verdadeira indústria” do cinema (Butcher,
2006). No início dos anos 1950, importantes eventos, como os Congressos de
Cinema, foram realizados (1952 e 1953). Para além de questões sobre conquista de
mercado, questões sobre formulação de uma política cinematográfica e questões
sobre uma legislação para o setor também foram contempladas nos debates.
Importa registrar a criação do Grupo de Estudos da Indústria Cinematográfica
(GEIC), em 1956, e a criação do Grupo Executivo da Indústria Cinematográfica
(GEICINE), em 1961. Este último situado no polo universalista/ industrialista por
José Mario Ortiz Ramos (2004) e, portanto, implicado com a industrialização do
cinema brasileiro. No outro polo, nacionalista/culturalista, o autor situa o Cinema
Novo. Com influência da Nouvelle Vague francesa, e do neo-realismo italiano, o
movimento cinemanovista, liderado por Glauber Rocha, propõe um afastamento
da cinematografia orientada por perspectivas industrialistas. Trata-se de uma
oposição entre o cinema industrial e o cinema de autoria: “se cabia a Hollywood
fazer o cinema industrial, a única saída para o cinema brasileiro seria o cinema de
autor” (BUTCHER, 2006, p. 34). Ao insurgir-se contra a indústria do cinema, ou,
em outras palavras, contra a política defendida pelo GEICINE, o Cinema Novo
propôs um novo modelo de fazer/conceber o cinema, e rejeitou padrões
capitalistas. Para esse grupo, o subdesenvolvimento era uma condição a ser
assumida, e o cinema nacional poderia ser um meio para refletir e construir suas
próprias narrativas estéticas e políticas.
Foi nessa tessitura que emergiu o projeto de desenvolvimento do cinema
brasileiro, reconhecido tanto pela via industrial, como pela via cultural. Com fulcro
em uma visão desenvolvimentista, parte do setor cinematográfico, denominada
“nacionalista”, inclina-se para a realização de ações contra o monopólio do cinema
norte-americano e, para além disso, busca ampla intervenção do governo nesse
setor; outra parte, denominada “cosmopolita”, inclina-se para a realização de
filmes brasileiros aliados a filmes estrangeiros, e discorda da adoção de medidas
inibitórias em relação à presença dos últimos filmes no país. Nessa trama, o cinema
figura como questão estatal, e, em 1966, foi criado o Instituto Nacional de Cinema
(INC), autarquia federal vinculada ao Mec, que segue os moldes
desenvolvimentistas do governo. Sendo assim, o cinema é inserido em uma
política estatal de industrialização (Ortiz Ramos, 2004), e a impugnação do Cinema
Novo, quanto ao modelo em voga foi ancorada na percepção desse meio como um
bem de consumo. Havia uma preocupação do movimento cinemanovista com
questões mercadológicas, mas principalmente quanto ao modo de instaurá-las.
Industrialização e construção de um mercado de bens culturais são temas em pauta
nos anos 1960 e 1970, e são qualificadas como “peças essenciais para alavancar o
desenvolvimento do país” (Bahia, 2012, p. 46). É possível falar em uma tentativa de
expansão de mercado aliada a uma atuação estatal.
Gárdia Rodrigues Silva

Ainda nesse registro, cumpre mencionar a introdução e a consolidação da


televisão no país. Duas importantes emissoras, a TV Tupi (1950-1980) e a TV
Excelsior (1960-1969), combinados a elementos políticos, econômicos e culturais,
garantem o ingresso nesse cenário. Ao edificar uma estrutura assentada em uma
organização industrial, a televisão, dotada de recursos/investimentos próprios,
constrói uma trajetória independente do campo cinematográfico, e, embora ambos
sejam relevantes para “difundir ideias, criar estados emocionais coletivos e
legitimar o projeto de cultura nacional dentro de um processo de modernização do
país” (Bahia, 2012, p. 47), recebem tratamentos estatais distintos. O Estado
reconhece que cultura e meios audiovisuais envolvem relações de poder e vale-se
disso para atuar junto a essas searas. Em um primeiro momento, mais
especificamente, nos anos do pré-golpe de 1964, o Cinema Novo, conta com o
apoio de alguns setores empresariais que aderem à visão nacionalista dominante.
Após o Golpe e a decretação do Ato Institucional n. 5, em 1968, a repressão, a
censura, e a absorção do discurso nacionalista pelo próprio regime, engendram a
criação, em 1969, da Empresa Brasileira de Filmes S/A (Embrafilme). Com a criação
dessa empresa de economia mista, o Estado ocupa um espaço central na produção
e, posteriormente, na distribuição, de filmes brasileiros.
“Nacional como problema” é transformado em “nacional como mercadoria”,
com a construção de uma nova identidade, vinculada ao consumo e a
determinados modos de vida (Butcher, 2006). No projeto cultural nacionalista, para
a televisão, compreendida como “cultura de massa”, é direcionado um alto
investimento para a composição de uma infraestrutura de telecomunicações, sob a
administração da iniciativa privada; já para o cinema, enquanto cultura popular e
“artística”, há a criação de órgãos estatais. Em palavras outras, resta a tutela estatal,
desempenhada pela Embrafilme. Com a Embrafilme, e o Conselho Nacional de
Cinema (Concine), criado em 1975, ocorreu um arranjo de políticas de incentivo
com políticas de regulação. Ao olhar para as estatísticas relacionadas à produção
cinematográfica nos tempos da Embrafilme, é possível observar elevados números,
intensificada a produção ao longo dos anos 1970 e 1980. Na conjuntura exposta, de
um lado, para a televisão, tem-se um empreendimento empresarial ancorado em
um crescimento autônomo no que tange ao teor econômico, mas fortemente
vinculado às estruturas políticas brasileiras; de outro, para o cinema, tem-se a
Embrafilme como forma de ingerência do Estado sobre o setor em tela. Cumpre
destacar que a perspectiva desse projeto impede movimentos de vinculação entre
cinema e televisão e, por conseguinte, de formação de um campo audiovisual
integrado. Televisão é assunto apenas de comunicação (BARBERO, 2003), e o
cinema, cultura. Como se vê, hierarquias e dicotomias estruturam distintas
políticas e trajetórias para o cinema e para a televisão.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 271


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

3. Crise e retomada do cinema nacional: reaproximação e estratégias

Entre rupturas e continuidades, em consonância com vieses políticos,


econômicos e culturais, a imbricação entre Estado e cinema, mediante regulações,
incentivos e/ou subsídios, perpassa a historiografia do cinema brasileiro. A partir
da Medida Provisória 151, de 15 de março de 1990, decretada por Fernando Collor
de Mello, a dissolução de órgãos federais voltados ao cinema, como a Empresa
Brasileira de Filmes S.A. (Embrafilme), o Conselho Nacional de Cinema (Concine),
e a Fundação do Cinema Brasileiro (FCB), sem a substituição por outras estruturas,
converge para a ausência de suporte estatal ao setor cinematográfico no país e,
correlativamente, para a queda da produção de filmes. Falta de financiamentos;
perda de mecanismos de proteção perante o cinema estrangeiro;
desregulamentação da atividade; término da cota de tela; abertura irrestrita de
importações; rompimento de contratos; paralisação de produções; entre outros
fatores, demarcam, em um contexto específico, os contornos da crise da atividade
cinematográfica e, em um contexto mais amplo, a desobrigação do Estado com a
cultura no início dos anos 1990 (MARSON, 2009).
Diante de tal conjuntura, uma nova política de fomento, fundada em
incentivos fiscais, assegurados pela Lei 8.313, de 23 de dezembro de 1991 (Lei
Rouanet), destinada às atividades culturais, e pela Lei 8.685, de 20 de julho de 1993
(Lei do Audiovisual), destinada especificamente às atividades audiovisuais,
engendrou a gradual retomada da cinematografia nacional. O advento dessas
legislações, e de outras disposições, como as definições de cota de tela, de filme
nacional e de coproduções internacionais, pela Lei 8.401, de 8 de janeiro de 1992,
regulamentada pelo Decreto 567, de 11 de junho de 1992; a liberação de recursos da
Embrafilme via Fundos de Investimentos Culturais e Artísticos (FICART), bem
como a instituição da Comissão de Cinema para a seleção de filmes para
financiamento, ambos nos termos do Decreto 575, de 23 de junho de 1992; a
disponibilização desses recursos através do Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro;
o surgimento da Riofilme, importante distribuidora de filmes no cenário nacional;
e a criação da Secretaria para o Desenvolvimento do Audiovisual, vinculada ao
Ministério da Cultura (MINC), forjam o início de uma nova política
cinematográfica.
É possível inferir que, a partir de meados dos anos 1990, durante o governo
de Fernando Henrique Cardoso, o Estado retoma o “sentido da importância social,
política e econômica da produção cinematográfica” (FORNAZARI, 2006, p. 650).
Para além disso, com o aumento de filmes nacionais lançados comercialmente, e a
volta do público às salas de cinema, como mostram os dados do quadro que segue
abaixo; assim como com o emprego de técnicas, linguagens e estéticas advindas da
publicidade e da televisão, e a elevação da qualidade das produções, não apenas o
Estado, mas também a mídia, a sociedade e o próprio campo cinematográfico

272 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

conferem prestígio, visibilidade e legitimidade ao cinema nacional. (BAHIA, 2012).


Outrossim, frente à possibilidade de inserção dessa atividade em uma economia
globalizada, e considerados os incentivos asseverados pelo Estado, o investimento
em cinema nacional é percebido como “um negócio – e um bom negócio”, e outros
campos do audiovisual, como as produtoras O2 Filmes e Globo Filmes, direcionam o
olhar para esse setor.

Tabela 1. Mercado de Cinema Brasileiro: 1995 – 1999.

Ano 1995 1996 1997 1998 1999

Lançame 12 22 22 26 33
nto de filmes
nacionais

Público 2.966.2 1.227 2.401.9 3.466.2 5.715.


de filmes 39 .220 59 79 914
nacionais

Fonte: Filme B, 2012.

Apesar desses avanços, não há a consolidação de um mercado de cinema


brasileiro desvinculado do suporte estatal (Bahia, 2012). Os mecanismos previstos
nas leis de incentivo são voltados para a produção cinematográfica, sem o aceno
para uma articulação com os demais elos da cadeia produtiva – distribuição/
comercialização, exibição, e infraestrutura de serviços – e, por conseguinte, sem o
aceno para uma atividade cinematográfica autossustentável. Da mesma forma, não
obstante a aproximação entre o cinema, a publicidade e a televisão, nos moldes
acima mencionados, não há uma vinculação comercial entre esses meios para a
composição de um mercado audiovisual ou, em palavras outras, não é urdida uma
política multimídia (CANCLINI, 2001).

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 273


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

Ainda, por meio da política de incentivos, é concedida à iniciativa privada


não apenas a dedução do imposto de renda dos valores investidos em projetos
culturais, mas também o poder de deliberação sobre os projetos exequíveis, o que
conduz a uma “administração privada de recursos públicos” (BUTCHER, 2005, p.
19), e a um deslocamento da “gerência da cultura para a iniciativa privada” (Bahia,
2012, p. 61). No final dos anos 1990, esses e outros fatores, como, por exemplo,
denúncias de irregularidades no uso desses mecanismos, fundamentam as
reivindicações do setor cinematográfico no que tange à reorganização do mercado
e à reorientação das políticas públicas para o cinema. Frente a esse contexto,
merece referência o III Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), realizado em junho
de 2000, em Porto Alegre – RS. Com a presença de entidades e representantes de
distintos segmentos do setor, esse evento, organizado pela Fundação Cinema RS
(Fundacine), e presidido pelo cineasta Gustavo Dahl, demarca a busca pela
reestruturação e repolitização do cinema brasileiro. A partir desse Congresso, com
fulcro no entrelaçamento entre cultura, política e economia, o Estado reconhece a
necessidade de um novo delineamento para a relação Estado/cinema, e elege a
integração entre os meios audiovisuais, sobretudo entre o cinema e a televisão,
como um eixo estratégico para a consolidação de uma indústria audiovisual
autossustentável e, nesse rumo, conta com a anuência do próprio campo
cinematográfico, apesar da cisão de longa data entre um setor marcado pela
autonomia cultural e artística e outro pela pretensão industrial e comercial (Ortiz
Ramos, 2004). Para tanto, foi criado o Grupo Executivo para o Desenvolvimento da
Indústria Cinematográfica (GEDIC), que, ao mesclar orientações culturais e
econômicas, elenca cinco propostas para a inserção do cinema em um mercado
global, quais sejam, a criação de um órgão institucional para a atividade
cinematográfica; a redefinição das funções da Secretaria do Audiovisual (SAV); a
criação de um fundo de fomento para o desenvolvimento da cadeia produtiva; a
reformulação das legislações existentes e a disposição de uma legislação para a
regulação do sistema televisivo. Dessas propostas, de acordo com a tentativa de
alçar o cinema nacional a outro patamar de desenvolvimento, emerge a Medida
Provisória 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, com adendos da Lei 10.454, de 13 de
maio de 2002. A aludida medida, além de criar a Agência Nacional do Cinema
(ANCINE), contempla as diretrizes para a Política Nacional do Cinema (PNC);
define obra audiovisual brasileira; cria o Conselho Superior do Cinema (CSC); e
versa sobre alguns mecanismos fiscais 2.

2
Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional
(CONDECINE); Fundos de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional
(Funcines); Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Nacional (PRODECINE);
e conversão da dívida externa em projetos de produção, distribuição, exibição e divulgação
de obras audiovisuais brasileiras, de acordo com o inciso V, do Artigo 1°, da Lei 10.179, de
6 de fevereiro de 2001.

274 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

A publicação da medida em tela é uma tentativa de rearticulação das ações


governamentais e, a partir dela, uma nova institucionalidade é concebida para o
cinema brasileiro, ancorada na complementaridade de três órgãos estatais: o CSC,
voltado à formulação da política nacional do cinema; a ANCINE, voltada ao
fomento, regulação e fiscalização da indústria cinematográfica; e a SAV, voltada à
assessoria, elaboração e execução de políticas, planos e diretrizes. A
complementariedade entre esses órgãos fundar-se-ia nas distintas vinculações de
cada um deles, o CSC enquanto órgão superior, e portanto de instância
supraministerial, ficaria sob a égide da Casa Civil, ligada diretamente à Presidência
da República; a ANCINE, por tratar de aspectos do “cinema industrial”, ficaria sob
a égide do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC);
e a SAV, por tratar de aspectos do “cinema cultural”, ficaria sob a égide do
Ministério da Cultura (MINC). Paulatinamente, com o governo de Luiz Inácio Lula
da Silva, há um rompimento desse tripé institucional e, atualmente, os três órgãos
estão vinculados ao MINC (Ikeda, 2012). Esses novos parâmetros levam a um
significativo aumento de filmes nacionais lançados comercialmente: de 20 a 30
filmes anuais lançados até 2003, a produção foi elevada para mais de 40 filmes nos
anos seguintes, como se vê abaixo.

Tabela 2. Mercado de Cinema Brasileiro: 2000 – 2007.

Ano 2 2 2 2 20 20 20 2
000 001 002 003 04 05 06 007

Lança
mento de 2 3 2 3 49 44 73 7
filmes 3 0 9 0 8
nacionais

Públi
co 6 7 7 2 15 10 10 9
de .344.66 .948.06 .170.33 2.291.80 .494.873 .178.304 .727.571 .112.93
filmes 9 5 4 6 4
nacionais

Fonte: ANCINE, 2012.

Apesar do alcance de público e de filmes lançados, e embora atendidas


diversas requisições do campo cinematográfico, a regulação televisiva e a
integração entre cinema e televisão não foram abarcadas pela legislação. Ainda que

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 275


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

exista um dispositivo na Medida Provisória 2.228-1/01, mais especificamente o


Artigo 39, dedicado à programação internacional, e referente à opção de aplicação
do valor correspondente a 3% do pagamento da Contribuição para o
Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (CONDECINE) em
produção nacional para cinema e televisão, trata-se de um dispositivo isolado, não
remete à integração em questão. Caberia à ANCINE não somente fomentar e
regular o conteúdo para cinema, mas também o conteúdo para televisão,
entretanto, os itens televisivos são excluídos do texto final da Medida. De agência
do audiovisual, a ANCINE é reduzida à agência do cinema. Via política estatal,
disputas, negociações, reivindicações e pressões que circunscrevem esses meios
adiam o trânsito do cinema pela cultura da mídia (Kellner, 2001). Todavia, essa
articulação é realizada via política privada, com a criação do departamento de
cinema da Rede Globo, a Globo Filmes.
Ao longo dos anos, não há investimentos em produções filmográficas, assim
como não há uma inserção significativa de filmes brasileiros na grade de
programação dessa emissora firmada como hegemônica no país. No entanto, a
partir do fim dos anos 1990, a criação da Globo Filmes, demarcou uma nova relação
entre cinema e televisão. A aproximação estratégica desses meios está ancorada
nos desafios econômicos e estruturais acarretados pelas transformações
tecnológicas das últimas décadas do século XX. Novas tecnologias – internet,
celulares, TV paga, TV digital – acenam para novas demandas por conteúdo
audiovisual e novas possibilidades de produção e difusão da informação. Em prol
da defesa do conteúdo nacional, da ampliação e da manutenção de legitimidade da
emissora, e da antecipação de respostas às revisões da legislação audiovisual
desenhada a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luis Inácio
Lula da Silva, a TV Globo direciona o olhar para esse setor. No âmbito estatal,
entre avanços e recuos, para suprir essas ausências, em abril de 2004, foi
apresentada ao Congresso Nacional a minuta de um projeto de lei que criaria a
Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (ANCINAV); essa agência, além de
substituir a ANCINE, teria a competência para fiscalizar e regular o cinema, as TVs
Abertas e por Assinatura, o rádio e os demais meios audiovisuais. Novas disputas,
negociações, reivindicações e pressões encerram abortaram projeto.
No Brasil, enquanto o desenvolvimento da televisão é marcado por um
negócio híbrido, entre o público e o privado, o desenvolvimento do cinema é
marcado pela dependência de políticas estatais. Considerando o processo de
modernização do país, essa construção reporta a distinções e dicotomias conferidas
a esses meios ao longo dos anos. Indústria/entretenimento e negócio
empresarial/comercial refletem o tratamento conferido à televisão; já o
artístico/cultural e a política estatal, refletem o tratamento conferido ao cinema
(BAHIA, 2012). Nos anos recentes, uma reorganização do campo cultural e, por
extensão, do campo audiovisual, é alinhavada. Novos discursos, políticas e/ou

276 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

práticas enfraquecem essas oposições e hierarquias, e acenam para a aproximação


entre o cinema e a televisão. Na composição deste novo arranjo, importantes
medidas são adotadas para a consolidação de um mercado audiovisual e, nessa
contextura, estão inseridos o lançamento do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA),
em 2008, e a edição da Lei 12.485 (Lei da TV por Assinatura), em 2011.

4. O audiovisual como setor da economia criativa: cultura, criatividade e


desenvolvimento – o novo consórcio televisão e cinema.

Nos tempos contemporâneos, instituições internacionais como a


Organização das Nações Unidas (ONU), através de suas agências de cooperação –
Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento
(UNCTAD), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD),
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(UNESCO), entre outras, bem como o Estado brasileiro, lançam um novo olhar
para a cultura, e passam a percebê-la como um eixo estratégico para o
desenvolvimento. No contexto brasileiro, esse novo olhar é peremptório para uma
reconfiguração econômico-cultural (ORTIZ, 2008), e nele, “criatividade e
diversidade, [...] se entrelaçam e se resolvem num conjunto único de cultura”. 3
Criatividade, orientada pela singularidade, pelo simbólico, pelo intangível, que
remete à “capacidade não só de criar o novo, mas de reinventar, diluir paradigmas
tradicionais, unir pontos aparentemente desconexos e, com isso, equacionar
soluções para novos e velhos problemas” (Reis, 2008, p. 15), e diversidade, nos
termos da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões
Culturais, adotada em outubro de 2005, durante a 33ª Conferência Geral da
UNESCO e aprovada, no âmbito brasileiro, pelo Decreto Legislativo 485, de 20 de
dezembro de 2006.
Esses novos delineamentos para cultura e desenvolvimento restam
recepcionados pelo Plano Nacional de Cultura – PNC, instituído pela Lei 12.343, de
2 de dezembro de 2010, nos termos do § 3o do artigo 215, da Constituição Federal
de 1988. Depreende-se de tal Plano que resta reafirmada uma concepção ampliada
de cultura, consideradas as suas dimensões simbólica, no que tange à valorização e
à consolidação da identidade nacional, assim como ao acesso a bens e
equipamentos culturais; cidadã, no que tange à efetivação dos direitos culturais,
assegurados constitucionalmente; e econômica, no que tange à geração de emprego
e renda por meio de atividades culturais. O encadeamento dessas dimensões passa
a nortear programas, projetos e políticas culturais no país, em busca de um

3
Disponível em http://www.cultura.gov.br/site/2011/01/03/discurso-de-posse-da-ministra-
da-cultura-ana-de-hollanda/ Acesso em Junho de 2012.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 277


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

desenvolvimento orientado pela diversidade cultural, inclusão social, inovação e


sustentabilidade, como anuncia o PNC.
Dinâmicas culturais, sociais e econômicas erigidas a partir de bens e serviços
oriundos de setores criativos, demarcados pelo viés simbólico, intangível,
fundamentam a ideia de economia criativa. Em palavras outras, a imbricação entre
cultura e desenvolvimento implica em novos usos dessas categorias, e seus
desdobramentos convergem para a concepção de economia criativa. A economia
criativa, construção simbólico-discursiva tecida nas décadas finais do século XX, a
partir de discursos de organismos como a UNESCO, em âmbito transnacional, e
como o MINC, em âmbito nacional, emerge em um contexto de industrialização do
simbólico (CANCLINI, 1990), de expansão dos serviços e bens culturais e de
crescimento da importância a eles atribuídas ou, em suma, do significativo
aumento dos mercados culturais, e em meio às novas relações entre arte, técnica e
memória (ALVES, 2011). Essa economia é um dos setores mais dinâmicos da
economia global (MIQUEZ, 2007), pois instaura novas realidades e consigna novas
dinâmicas econômico-culturais.
Em uma conjuntura de proliferação de telas, há “tela em todo lugar e a todo
momento. Tela de vídeo, tela em miniatura, tela gráfica, tela nômade, tela táctil: o
século que começa é o da tela onipresente e multiforme, planetária e multimídia”
(LIPOVETSKY; SERROY, 2009, p. 23). Nesse período do “tudo-tela”, marcado pela
inventividade, diversidade e vitalidade, e pelas novas tecnologias da informação e
da comunicação ou, em outros termos, pelas convergências que definem
“transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais” (JENIKIS, 2008,
p. 22), merece destaque a “tela-ecrâ”. As transformações contemporâneas
envolvem em um movimento “as tecnologias e os meios de comunicação, a
economia e a cultura, o consumo e a estética”, e o “cinema obedece à mesma
dinâmica” (LIPOVETSKY; SERROY, 2009, p. 23). Considerando o processo de
interdependência e complementaridade entre os meios que compõem o campo
audiovisual (Bahia, 2012), bem como a incorporação de uma ampla noção de
cultura, outras modalidades de bens simbólicos, como a televisão, são incluídas no
âmbito de atuação do governo (Bezerra; Rocha, 2012). Com o advento do Fundo
Setorial do Audiovisual (FSA) e a edição da Lei 12.485, de 12 de setembro de 2011 –
Lei da TV por assinatura, há uma aproximação inédita entre o cinema e a televisão.
Instituído pela Lei 11.437, de 28 de dezembro de 2006, regulamentado pelo
Decreto 6.299, de 12 de dezembro de 2007, e lançado em 04 de dezembro de 2008,
pelo Ministro da Cultura à época – Juca Ferreira, e pelo Diretor Presidente da
ANCINE – Manoel Rangel, o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) é a primeira
categoria de programação específica do Fundo Nacional de Cultura (FNC) posta
em operação. Com o fim de fomentar o desenvolvimento articulado da atividade
audiovisual brasileira, distintos instrumentos, como investimentos,
financiamentos, operações de apoio e de equalização de encargos financeiros são

278 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

endereçados aos diversos elos da cadeia produtiva: produção,


distribuição/comercialização, exibição, e infraestrutura de serviços. Em cotejo com
outros investimentos públicos para a cultura no país, o FSA apresenta nova
abrangência de atuação e novos meios de estímulo estatal ao setor audiovisual.
Para Manoel Rangel, esse fundo incute “um novo ciclo de desenvolvimento para a
economia do cinema e do audiovisual no Brasil”; representa “uma possibilidade de
ação sistêmica inédita e necessária” nessa seara (ANCINE, 2012).
Com receitas oriundas da própria atividade econômica, de contribuições
recolhidas pelos agentes de mercado, sobretudo da Contribuição para o
Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (CONDECINE), e do
Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (FISTEL), entre outras fontes, cabe ao
FSA apoiar o desenvolvimento de alguns programas, a saber, o Programa de
Apoio ao Desenvolvimento do Cinema Brasileiro (PRODECINE); o Programa de
Apoio ao Desenvolvimento do Audiovisual Brasileiro (PRODAV); e o Programa de
Apoio ao Desenvolvimento da Infraestrutura do Cinema e do Audiovisual (Pró-
infra), de acordo com o Artigo 4, da Lei 11.437/06, combinado com o Artigo 47, da
Medida Provisória 2.228-1/01. Nessa senda, compete ao FSA operar por meio de
editais públicos, a partir de quatro linhas iniciais de atuação – produção
cinematográfica, produção para televisão, aquisição de direitos de distribuição
cinematográfica e comercialização de obras cinematográficas –, dispostas na
modalidade de investimento e, portanto, com comprometimento comercial das
obras, risco ausente nos financiamentos públicos desde a extinção da
EMBRAFILME.
Chamadas públicas instauraram as seleções de projetos para financiamento
pelo FSA, que são realizadas através de concurso público ou por fluxo contínuo.
Na modalidade de fluxo contínuo, antiga requisição do setor audiovisual para
atender às dinâmicas da cadeia produtiva, os investimentos são estendidos para
períodos posteriores à época de lançamento do edital. Em outros termos, a
apresentação de projetos pode ser feita a qualquer tempo, considerada a data de
convocação da linha de ação. No tocante aos projetos, as propostas podem ser
expostas por empresas brasileiras independentes, registradas na ANCINE e nas
Juntas Comerciais. A essas propostas são atribuídas notas e sopesados alguns
quesitos, conforme a linha de ação 4. Além dessas notas, são atribuídas pontuações
relativas ao retorno financeiro de investimentos anteriormente realizados pelo
Fundo em projetos da empresa ora proponente, sendo negativas as avaliações
quando não alcançado o montante referente à recuperação prioritária, também
denominada de retorno mínimo. A alíquota, para fins desse retorno, incide sobre a

4
Aspectos artísticos e adequação ao público; qualificação de diretor, roteirista e elenco;
capacidade gerencial e desempenho de produtora ou distribuidora; e planejamento e
adequação do plano de negócios figuram entre os quesitos.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 279


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

Receita Líquida do Produtor (RLP), auferida sobre segmentos de mercado e janelas


de exploração, licenciamento de marcas e imagens, e contratos de transferência de
direitos patrimoniais da obra e derivados (ANCINE, 2012).
Com essa nova política setorial, são considerados os desempenhos
precedentes das empresas, assim como o potencial de mercado dos projetos. Sendo
assim, ao dispor de recursos reembolsáveis e participar dos direitos de
comercialização das obras, o governo atua como sócio das empresas. Vânia Catani,
produtora da Bananeira Filmes, e uma das primeiras contempladas pelas
Chamadas Públicas do FSA, faz referência a um novo momento para o setor
audiovisual: “todos nós que atuamos como produtores durante a Retomada
tivemos que ser convertidos em empresários, de modo que essa nova equação de
equilíbrio é o desafio” (Filme B, 2012). Para Manoel Rangel, uma política
sustentável de ocupação do mercado exige uma alteração nos pressupostos de
financiamento. Em números, no quadro abaixo, seguem os projetos inscritos,
habilitados e contemplados nas quatro linhas de ação, nos anos 2008, 2009 e 2010.

280 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

Tabela 3. Projetos por Linhas de Ação: 2008 – 2010.

Chamadas Públicas

Linhas Linha A Li Lin Linha D T


nha B ha C otal
de Produção Comercia
Ação Cinemato Pr Aq lização
no gráfica odução uisição
pa de
ra TV Dir
eitos

Inscrito 220 46 15 18
s 97

008 Habilit 144 24 10 12


ados 90

Conte 18 5 8 7
mplados 8

Inscrito 207 57 26 12
s 02

009 Habilit 191 39 22 12


ados 64

Conte 45 23 16 10
mplados 4

Inscrito 189 57 24 4
s 74

010 Habilit 174 41 23 4


ados 42

Conte 41 21 16 2
mplados 0

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 281


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

Fonte: ANCINE, Finep, 2012.

Após longo período de financiamentos públicos fundados em mecanismos


de incentivos fiscais, não obstante a recuperação da produção cinematográfica no
país, para a efetiva inserção do cinema nacional no mercado audiovisual, outra
política cultural, mais consistente e abrangente, vem sendo vislumbrada com a
instauração do FSA (BAHIA, 2012). A eficácia dessa política depende de uma
lógica mais ampla, para além da produção de filmes de longa-metragem, requer o
direcionamento do olhar para a complexa e dinâmica rede de relações que
envolvem a cadeia produtiva do audiovisual (MATTA, 2010). Ao aferir os projetos
selecionados pelas linhas de ação, apesar de contemplados os distintos elos dessa
cadeia, assim como diversos gêneros e empresas, depreende-se que há a
concentração de projetos oriundos da Região Sudeste, mais especificamente dos
estados do Rio de Janeiro e de São Paulo. Esmiuçando os dados mostrados no
quadro anterior, do total de projetos contemplados, 106 são procedentes do Rio de
Janeiro; 80, de São Paulo, e 24, de outros Estados 5.

5
Destes 24 projetos, 9 são procedentes do Rio Grande do Sul, 6 do Paraná, 5 da Bahia, 3 do
Distrito Federal e de Minas Gerais, e 1 do Ceará, da Paraíba, e de Pernambuco. Em relação
à comercialização desses projetos, os números são 27, 9 e 3, consideradas as Linhas A, C e
D, respectivamente. Da Linha A, foram comercializados: Besouro; Do Começo ao Fim;
Histórias de amor duram apenas 90 minutos; Insolação; Chico Xavier; Eu e Meu Guarda-
Chuva; Bruna Surfistinha; Estamos Juntos; Não se Preocupe, Nada Vai dar Certo;
Transeunte; Onde Está a Felicidade?; O Homem do Futuro; Capitães da Areia; Meu País;
As Aventuras de Agamenon, o repórter; Billi Pig; Xingu; Eu receberia as piores notícias
dos seus lindos lábios; O Homem Que Não Dormia; Histórias que só existem quando
lembradas; Febre do Rato; Beira do Caminho; Cara ou Coroa; Boca; Gonzaga – De pai para
filho; O país do desejo; Os Penetras; da Linha C: Cinco Vezes Favela; De pernas pro ar;
Desenrola; Cilada.com; O Palhaço; Billi Pig; E Ai, Comeu?; Totalmente Inocentes; Até que
a Sorte nos Separe; e, da Linha D: Quebradeiras; Corações Sujos; Onde a coruja dorme.

282 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

Tabela 5. Projetos contemplados por estados: 2008 – 2010.

110

90

70
Outros
São Paulo
50
Rio de Janeiro
30

10

-10 Linha A Linha B Linha C Linha D


Fonte: ANCINE, 2012.

Com a promulgação da Lei 12.485, 6 sancionada pela Presidente Dilma


Rousseff, em setembro de 2011, resultado de longa tramitação no Congresso
Nacional, e de intensos diálogos e negociações entre parlamentares, representantes
do setor audiovisual, agentes econômicos e representantes da sociedade civil,
novos contornos são traçados para a cadeia produtiva do setor audiovisual no país
e, nessa tessitura, outras abrangências e recursos para o FSA. Convergência de
mídias, transformações tecnológicas, novos modos de consumo de informação e de
conteúdo audiovisual postulam novos delineamentos normativos. Em um cenário
marcado pelo aumento das demandas dos serviços de TV por Assinatura, e pela
imbricação entre economia criativa, economia do audiovisual e economia da
informação, a Lei 12.485 figura como um marco regulatório para a comunicação
audiovisual.
Considerando os avanços trazidos pelo texto legislativo, três grandes
inovações merecem destaque, quais sejam: a unificação de tecnologias, a
obrigatoriedade de cotas de conteúdo brasileiro e independente nas programações
das TVs por Assinatura e o ingresso de novos agentes econômicos nesse mercado.

6
São finalidades desta Lei: aumentar a competitividade e a garantia da sustentabilidade do
setor audiovisual; ampliar o acesso às obras audiovisuais brasileiras e aos canais brasileiros
de programação; induzir a sustentabilidade das produtoras e das programadoras brasileiras
independentes, através da geração de receitas provenientes das atividades de produção e de
programação, resguardada a detenção do poder dirigente sobre o patrimônio da obra;
promover ampla, livre e justa competição, estendendo a oferta de serviços e estimulando a
redução do preço final ao assinante; estimular o aumento da produção e da veiculação de
obras audiovisuais que promovam a diversidade cultural brasileira; entre outras.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 283


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

A partir dessas inovações, novos recursos são destinados ao setor audiovisual,


mais especificamente ao FSA. Estes novos recursos advém da arrecadação da nova
Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional
(CONDECINE). Com a promulgação da Lei 12.485, a CONDECINE é estendida às
concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços de telecomunicações
que possam, efetiva ou potencialmente, distribuir conteúdos audiovisuais, de
acordo com a redação dada pelo Artigo 26, dessa lei, ao inciso II, do Artigo 32, da
MP 2.228-1/01. Outrossim, ao instituir outra redação ao Artigo 4 da Lei 11.437/06, o
Artigo 27 da Lei da TV por Assinatura determina que, dos recursos advindos da
nova CONDECINE, no mínimo 30% devem ser reservados a produtoras brasileiras
situadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e, no mínimo, 10% devem ser
reservados ao fomento de produções audiovisuais independentes, com veiculação
prioritária em canais comunitários, universitários e de programadoras brasileiras
independentes.
Essas novas destinações estão alinhadas com os princípios informadores da
comunicação audiovisual de acesso condicionado. Dentre esses princípios, vale
sublinhar a promoção da diversidade cultural e das fontes de informação,
produção e programação, assim como o estímulo à produção independente e
regional. Igualmente, nos termos do Parágrafo Único, do Artigo 3 dessa lei, vale
realçar o aditamento de outros princípios, nomeadamente aqueles constantes na
Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais.
Cabe registro a consonância normativa da Lei 12.485 com o valor adjudicado à
diversidade cultural enquanto uma “referência maior na busca de um novo
ordenamento” (MATTELART, 2005, p. 133). Com a Lei 12.485 e com o FSA, há uma
redefinição dos fundamentos do financiamento público para o setor audiovisual.
Um dessas redefinições está relacionada à abrangência dos serviços. É estimado em
R$ 400 milhões anuais o volume adicional de recursos para o mercado audiovisual,
consideradas, em conformidade com a lei, as novas operações para televisão,
cinema e outras mídias. O montante mencionado representa o quádruplo dos
recursos atualmente disponíveis no FSA, assim como supera os valores captados
via mecanismos de incentivo para o setor. A seguir, são exibidos os valores dos
investimentos em audiovisual entre os anos de 2007 a 2011, assim como os valores
investidos em cada linha de ação do FSA.

284 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

Tabela 6. Investimentos em Audiovisual: 2007 – 2011 (R$).

Mecanismos

Lei Lei * Art.


8.3 8.683/ Fun 39 Total FSA
no 13/91 93 cines MP 2228-
1/01

9.1 126.2 1.92 20.9 158.2 37.96


007 76.087,56 41.552,47 3.000,00 04.037,31 44.677,34 3.007

7.7 134.8 8.18 16.8 167.6 56.16


008 60.011,32 13.510,95 5.000,00 43.996,05 02.518,32 0.628

8.5 115.3 1.85 11.8 137.5 99.34


009 49.600,00 29.971,10 0.000,00 01.379,34 30.950,44 6.483

2.8 155.3 9.79 12.4 180.4 65.23


010 89.790,00 00.929,02 9.550,00 74.573,78 64.842,80 7.792
5.1 143.3 6.50 20.4 175.4 227.8
011 87.692,22 19.035,47 0.000,00 88.914,57 95.642,26 75.011

33. 675.0 28.2 82.5 819.3 486.5


otal 563.181,1 04.999,01 57.550,00 12.901,05 38.631,16 82.921,00

Fonte: ANCINE, 2012.


* Inclusos os incentivos referentes aos Artigos 1º, 1º A, 3º e 3º A.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 285


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

Tabela 7. Recursos disponibilizados pelo FSA: 2008 – 2012 (R$).

Linhas de Ação

A: B: C:
AProdução Produção Aquisição D:Comercializaçã Tota
no par o l
Cinematográfic a TV de
a Direitos

2 15.000.000 7.0 10.0 5.000.000 37.0


008 00.000 00.000 00.000

2 33.757.261 17. 22.5 7.500.000 81.5


009 757.261 00.000 14.522

2 38.000.000 20. 25.0 5.000.000 88.0


010 000.000 00.000 00.000

2 90.000.000 55. 50.0 10.000.000 205.


012 000.000 00.000 000.000

T 176.757.26 99. 107. 27.500.00 411.


otal 1 757.261 500.000 514.522

Fonte: ANCINE, 2013.

Em 2012, o orçamento do FSA corresponde a R$ 109.760.348 e, com o crédito


suplementar de R$ 400 milhões, perfaz um total de mais de R$ 500 milhões, ou seja,
perfaz um montante superior à soma do orçamento total do FSA, considerados os

286 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

anos anteriores, de 2007 a 2011. Frente ao aumento de recursos e demandas


audiovisuais, decorrentes das inovações engendradas pela Lei 12.485, mediante
contrato firmado pela ANCINE, Secretária-Executiva do FSA, e a partir de
indicação do Comitê Gestor (CGFSA) – formado por dois representantes do MINC,
um representante da ANCINE, um dos agentes financeiros credenciados e dois
representantes do setor audiovisual –, o Fundo está sob os auspícios do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Como declara Manoel
Rangel, essa escolha é ancorada na “expertise na administração de mecanismos
financeiros” apresentada pelo BNDES ao longo dos anos (ANCINE, 2012).
Outrossim, a referida escolha reflete o entrelaçamento entre agentes econômicos e
agentes culturais no campo cultural contemporâneo. O viés dinâmico das
atividades econômicas referentes à cultura, e a consequente expansão do mercado
de bens culturais, motiva agentes econômicos, como o BNDES, a direcionar o olhar
para a seara cultural.
Nesses termos, dada a relevância econômica e o potencial de crescimento
desse setor, em 2006 a economia da cultura foi incorporada à estrutura operacional
do BNDES. Em um primeiro momento, com o enfoque no setor audiovisual e nos
elos produtivos correlatos, e foi lançado o Programa de Apoio à Cadeia Produtiva
do Audiovisual (PROCULT). Para atender a esse recorte setorial, “soluções
criativas” são tecidas através do “uso articulado de diferentes instrumentos
financeiros – não reembolsáveis, reembolsáveis e de renda variável”. De uma visão
de patrocínio, adotada nas ações anteriores, praticadas desde 1995, especialmente
por meio do edital público de seleção de projetos cinematográficos – o Edital de
Cinema, e “afeita às ações de comunicação institucional do Banco” (BNDES, 2012),
outra visão é adotada, norteada pelo desenvolvimento e fortalecimento da cadeia
produtiva do setor audiovisual. Recentemente, para estender os financiamentos a
outros nichos da economia da cultura, foi lançado o Programa BNDES para o
Desenvolvimento da Economia da Cultura (BNDES/ PROCULT). Em 2009, o Banco
foi contratado para operar diretamente no Programa Cinema Perto de Você, com
recursos associados do FSA e do PROCULT. Com a promulgação da Lei 12.485 e
com os novos recursos da CONDECINE, incumbe ao BNDES, desde dezembro de
2011, operar como agente financeiro central do FSA; de modo específico, cabe ao
BNDES gerir os recursos destinados ao desenvolvimento de um mercado de
conteúdos para televisão, cinema e outras mídias, previsto o repasse de R$ 2
bilhões, até o exercício fiscal de 2015, a bancos de desenvolvimento, agências de
fomento e/ou bancos públicos. Em maio de 2012, o Banco Regional de
Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) foi credenciado pelo CGFSA, e
contratado pelo BNDES, para atuar como novo agente financeiro para as linhas de

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 287


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

produção e distribuição de obras para cinema e televisão. 7 Esses desígnios realçam


o reconhecimento do BNDES e do BRDE como importantes agentes econômicos, e
mais, como agentes econômicos que transitam como agentes culturais no setor
audiovisual.
Nova legislação, novo fundo público, novos recursos estão inseridos em um
contexto de ampliação e sedimentação do mercado audiovisual brasileiro. Em
2011, as receitas desse mercado, centralizadas principalmente nas TVs Aberta e por
Assinatura, correspondem a cerca de R$33 bilhões (PDM, 2012). Entre os
segmentos do mercado em destaque, a TV por Assinatura apresenta a taxa de
crescimento mais elevada. Dados da ANATEL registram que o ano de 2012 foi
encerrado com mais de 16 milhões de assinaturas: de 4.583.125 de assinantes, em
dezembro de 2006, o número foi elevado para 16.188.957 de assinantes em
dezembro de 2012, estimado, ainda, um aumento de 35 milhões em um período de
cinco anos. O gráfico a seguir mostra a referida evolução. Esses números acenam
para um dos impactos das inovações mencionadas, e corroboram os altos índices
de consumo de bens e serviços culturais realizado no ambiente doméstico
brasileiro. Em dezembro de 2012, 222 mil adições líquidas são registradas, e 16,2
milhões de domicílios brasileiros com serviços de TV por Assinatura são
contabilizados. Isso significa 3,4 milhões de novas assinaturas, em 2012, e um
aumento de 27 % na base de assinantes. De acordo com o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), considerado o número médio de 3,3 pessoas por
domicílio, esses serviços são distribuídos para 53,4 milhões de brasileiros e estão
presentes em mais de 27% dos domicílios. Apesar do crescimento desses serviços
nas regiões Norte (17,1%), Nordeste (12,4%) e Centro-Oeste (24,0%), a região
Sudeste lidera em números, com a presença dos serviços em 38,6% dos domicílios
(ANATEL, 2013).

7
A Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), empresa pública vinculada ao Ministério
de Ciência e Tecnologia (MCTI), responsável pelas chamadas públicas do FSA no período
compreendido entre os anos de 2008 a 2010, e a Caixa Econômica Federal, responsável
pela estruturação do Projeto Cinema da Cidade, inserido no Programa Cinema Perto de
Você, são outros agentes financeiros do FSA, credenciados nos anos de 2007 e 2010,
respectivamente.

288 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

Tabela 8. Serviços de TV por Assinatura: 2006 – 2012.

18.000.000
16.188.957
16.000.000

14.000.000
12.744.025
12.000.000

10.000.000
9.768.993
8.000.000
7.473.476
6.000.000
6.320.852
5.348.571
4.000.000 4.583.125
2.000.000
dez/06 dez/07 dez/08 dez/09 dez/10 dez/11 dez/12

Fonte: ANATEL, 2013.

Ao unificar as normas da TV por Assinatura, a Lei 12.485 dispõe sobre a


regulamentação das atividades de produção, programação, empacotamento e
distribuição de conteúdo audiovisual no Serviço de Acesso Condicionado (SeAc).
Compete à ANCINE e à ANATEL a regulamentação das normas infralegais,
observadas as áreas de atuação de cada agência. A ANCINE, por meio das
Instruções Normativas 100 e 101, de 29 de maio de 2012, objetos de audiências e
consultas públicas, regulamenta as atividades de programação e de
empacotamento; já a ANATEL, por meio de resoluções, regulamenta as atividades
de distribuição. Além disso, a lei versa sobre a outorga de serviços de comunicação
por assinatura para empresas de telecomunicações, com fins de reduzir barreiras
quanto à entrada de novos prestadores e estimular a competição e a pluralidade.
Atualmente, há 154 operadoras desses serviços no país, organizadas em 84 grupos
econômicos. Em dezembro de 2012, o número de assinaturas do grupo econômico
Net/Embratel corresponde a 8.494.999, seguida pelo número de assinaturas do
grupo Sky/Directv que corresponde a 5.038.863. Aberto o mercado para novos
agentes econômicos, novas disputas são esperadas. No próximo gráfico, são
mostrados os números de assinaturas dos principais grupos econômicos que
prestam esses serviços no Brasil.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 289


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

Gráfico 1. Distribuição das Assinaturas por Grupo Econômico: Dezembro de


2012.

GVT: Outros:
425.635 665.885
Telefônica + Abril:
594.907
Oi:
748.758

Sky/ Directv: Net + Embratel:


5.038.863 8.494.999

Fonte: ANATEL, 2013.

Esses serviços são prestados através do emprego de distintas tecnologias:


por meios físicos confinados (Serviço de TV a Cabo – TVC); via espectro
radioelétrico em micro-ondas (Serviço de Distribuição de Canais de Multiponto
Multicanal MMDS – Multichannel Multipoint Distribution System); por meio de
frequência UHF – Ultra High Frequency (Serviço Especial de Televisão por
Assinatura – TVA); e via satélite (Serviço de Distribuição de Sinais de Televisão e
de Áudio por Assinatura Via Satélite DTH – Direct to Home). Em conformidade
com os dados da ANATEL, com o ingresso de concessionárias de telefonia no
mercado de TV por Assinatura, esse último serviço alcança 60,8% das assinaturas
em dezembro de 2012, e ultrapassa os serviços a cabo, que alcança 38,3% no
mesmo período. A ascensão da atividade audiovisual encontra respaldo em alguns
eventos. Analisados os 20 canais de maior audiência nesses pacotes, 9 deles
apresentam uma vasta programação de filmes e séries, sendo tal programação um
dos principais motivos especificados pelos usuários para a assinatura desses
serviços (PDM, 2012). Outrossim, há o aumento da renda da população, mais
especificamente, há o crescimento da classe C e a inserção dessa classe na
sociedade de consumo. Outro evento, está relacionado com a propagação de
serviços de telefonia móvel e de internet banda larga, assim como com a difusão de

290 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

equipamentos e tecnologias como tablets, smartphones, e outras, que tecem novas


possibilidades de formatos, modelos de negócio e distribuição de conteúdos
audiovisuais (ANATEL, 2012).
A promulgação da Lei 12.485, aliada ao credenciamento do BNDES para a
gerência do FSA, produz uma expectativa de reorganização do mercado
audiovisual, com uma maior abrangência de projetos, sobretudo independentes
(Pfeiffer, 2012). Um modelo de negócios ancorado em uma integração vertical de
produção, programação e provimento, com financiamentos publicitários, assinala a
trajetória da televisão no país (Ortiz Ramos, 2004). De um lado, esse modelo
apresenta a conquista da universalização dos serviços televisivos e, de outro, o
distanciamento das produções independentes, o óbice ao ingresso de novos
competidores, e a estagnação da TV por assinatura, somente em expansão nos
tempos atuais. Nos pacotes de TV por Assinatura, os poucos canais disponíveis
eram programados, até então, em grande parte, por grupos internacionais (PDM,
2012).
A partir da articulação entre o FSA e a Lei 12.485, programadoras nacionais
adquirem espaço nesse mercado, e abrem espaço para produtoras em consolidação
e já consolidadas como a O2 Filmes, entre outras. Fernando Meirelles, sócio da
empresa citada, corrobora a informação, registrando o aumento imediato das
demandas por conteúdos audiovisuais com a publicação da Lei da TV por
Assinatura. 8 Na mesma direção, Roberto Oliveira, diretor da TX Filmes, confirma
que é nítido o aumento da demanda por conteúdo audiovisual, e assevera que a
preparação de muitos canais para cobrir essa cota advém da promulgação já
anunciada dessa legislação, durante a longa tramitação do projeto de lei. Marco
Altberg, presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de TV
(ABPI-TV), afirma que essas inovações conferem à produção independente “um
valor dentro do mercado”, e a elas são creditadas o aumento do número de
produtoras associadas, de 170 para 265. Luiz Noronha, diretor-executivo de TV, da
Conspiração Filmes, diz que os estímulos da nova lei se estendem, também, a
investimentos nos próprios serviços. Como se vê, as produtoras falam em uma
“explosão de demanda”, ou até mesmo em uma “pequena revolução”. 9
Uma das principais inovações trazidas pela Lei 12.485/11 é a obrigatoriedade
de cotas de conteúdo brasileiro nas programações das TVs por Assinatura. Essa
determinação envolve a veiculação de conteúdos nacionais – entendidos como
aqueles produzidos por empresas brasileiras registradas na ANCINE, ou
produzidos por essas empresas em associação ou coprodução com empresas de

8
Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1101792-nova-lei-da-tv-paga-fara-
industria-ser-mais-forte-diz-fernando-meirelles.shtml, acesso em dezembro de 2012.
9
Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/1211461-cota-de-conteudo-
nacional-estimula-producao-para-tv-e-cria-pequena-revolucao.shtml, acesso em janeiro de
2013.

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 291


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

outros países –, nos horários nobres 10 dos canais de espaço qualificado 11 da TV por
assinatura, excetuados os canais da TV Aberta, canais esportivos, canais
jornalísticos. Ainda, é previsto um aumento do número de canais nacionais nos
pacotes por assinatura. Com a implementação dos dispositivos dessa lei, novas
dinâmicas são estabelecidas para o campo audiovisual brasileiro, e distintos
segmentos desse mercado podem ser contemplados. Similar sistema de cotas já
vigora e resta consolidado nos países da Comunidade Europeia, no Canadá, na
Austrália e na Coréia do Sul. Na esteira desses países, produtores de conteúdos e
exportadores de formatos audiovisuais, a Lei 12.485 busca alçar o Brasil a essas
mesmas condições. Essa política de veiculação de conteúdos nacionais e
independentes e, mais, da oferta de canais nacionais nos pacotes da TV por
assinatura, está sendo implementada de forma progressiva, e configura um
importante meio para assentar espaços para a cultura brasileira nesse mercado.
A “revolução” desencadeada pelo FSA e pela Lei 12.485, aponta para a
ampliação do mercado audiovisual brasileiro, e pode ser visualizada pelos
primeiros impactos na dinâmica desses mercados, seja pelo aumento de demandas
de conteúdos nacionais, seja pelo aumento de demandas de serviços de TV por
Assinatura. Em um primeiro balanço da aplicação da Lei 12.485, realizado por
Manoel Rangel no evento Rio Content Market, em janeiro de 2013, o diretor-
presidente da ANCINE assevera que ao longo do ano de 2012, ocorreu um
aumento significativo da presença de conteúdo brasileiro nos canais de TV por
Assinatura e, para além disso, há uma “efervescência da atividade da produção,
com incremento de receitas, de qualidade, de salários, entre outros; novos canais
brasileiros nasceram disponibilizando mais conteúdo, e há ainda uma maior
demanda por conteúdo brasileiro com mais canais comprando produções
nacionais”.
Também merece referência o crescimento do mercado de cinema em 2012,
consoante balanço elaborado pela Superintendência de Acompanhamento de
Mercado, e divulgado pela ANCINE. Em números, a arrecadação das salas de
cinema atinge R$ 1,6 bilhão em 2012, com um aumento de 12,13% em relação ao
ano anterior. O público alcança 146,4 milhões, e a participação de público quanto
aos filmes nacionais alcança 10,62%, sendo 5,12% no primeiro semestre do ano, e
15,2% no segundo. No total, o público de filmes brasileiros corresponde a 15,5
milhões, e dos 83 filmes nacionais lançados comercialmente, cinco deles superam 1
milhão de espectadores. Estes cinco filmes, E aí, comeu?; Até que a sorte nos separe;

10
Como prescreve a Instrução Normativa 100, da ANCINE, o horário nobre, nos canais
direcionados para crianças e adolescentes, compreende o período das 11h às 14h e das 17h
às 21h; para os demais canais, o período das 18h às 24h.
11
De acordo com a Lei 12.485/2011, são aqueles canais que exibem, predominantemente,
filmes, séries, animações, documentários, e similares.

292 Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012


Gárdia Rodrigues Silva

Gonzaga – De pai para filho; Os Penetras; e De Pernas pro Ar, foram contemplados e
comercializados pelas Linhas de Ação do FSA. Além desses dados, outros podem
ser destacados, como a expansão do parque exibidor e o aumento do número de
salas destinadas a lançamento de filmes nacionais. De 48 salas, em 2011, o número
é elevado para 63 salas, em 2012. Todos esses números indicam uma ocupação do
cinema nacional no mercado cultural. Abaixo, segue um quadro com os dados
relacionados ao mercado de cinema brasileiro, no período compreendido entre os
anos de 2008 a 2012.

Tabela 9. Mercado de Cinema Brasileiro: 2008 – 2012.

Ano 2008 2009 2010 2011 2012

Lançament 79 84 75 99 83
o de filmes
nacionais
Público de 9.143.0 16.07 25.227. 17.869. 15.553
filmes nacionais 52 0.36 757 385 .643

Fonte: Filme B, 2012; ANCINE, 2013.

Nesse texto, algumas nuances que conformam os traços da configuração


contemporânea do mercado audiovisual no Brasil foram apresentadas e, a partir
desses traços, uma reorganização dos negócios e dos mercados culturais é
percebida. Nesse novo âmbito, assinalado pelo entrelaçamento entre cultura,
desenvolvimento, criatividade e diversidade, o audiovisual pode ser considerado
uma via para a afirmação das identidades e o reconhecimento das diferenças
(ROSSINI, 2003). Valorização da cultura brasileira, incentivo para a produção e
para a circulação de conteúdos audiovisuais nacionais, ampliação da oferta de
serviços de TV por Assinatura e diminuição do preço final aos consumidores,
geração de riqueza interna, consolidação do mercado audiovisual, possibilidade de
crescimento de diversos segmentos desse mercado, são alguns demarcadores dessa
nova configuração. Na luta mundial de conteúdos, uma batalha vem sendo travada

Latitude, vol. 6, n°2, pp.267-295, 2012 293


Cinema e televisão: afastamentos e reaproximações na economia do audiovisual
brasileiro contemporâneo

pelo controle da informação, pelo domínio dos formatos audiovisuais, pela


conquista de novos mercados. Nessa batalha de mídias e culturas, o Brasil busca
uma identidade em prol da diversidade cultural (MARTEL, 2012). O FSA e a Lei
12.485 são fios que tecem essa nova tessitura, em que os meios de audiovisuais
buscam conviver e interagir uns com os outros (BABHIA, 2012, p. 206).

294 Latitude, vol. 6, n 2, pp.267 95, 2012


Economia Política da Comunicação e da Cultura

O desenvolvimento capitalista caracteriza-se, desde sua origem, pela mercantilização das


diferentes atividades sociais. A introdução das relações capitalistas no setor da cultura e da
comunicação, deu-se de uma maneira diferenciada e limitada. Não obstante, assistimos atualmente a
uma intensificação da industrialização dos processos de produção e de difusão dos produtos e serviços
culturais e comunicacionais. Daí a necessidade de se construir uma análise econômica dessas
atividades.

A história da pesquisa em comunicação na América Latina , recentemente resenhada por duas


publicações1, nos mostra caminhos de ampla variedade temática. Não deixa de chamar a atenção o
escasso lugar que se outorga aos estudos de economia política da comunicação. Se bem que, em alguns
trabalhos do inicio dos 70, tenha sido possível observar aproximações a essa linha de análise, ela nunca
foi sistematizada teoricamente2. Diferentemente do que ocorre nos EUA e na Europa, onde possuem
uma certa tradição, na América Latina, os estudos de economia política ficaram na maioria dos casos
marginalizados da agenda curricular .

Entendemos que, a partir da crescente integração dos meios de comunicação na estrutura


econômica mundial, não é possível deixar de considerar relevância dessa perspectiva de análise,
interessada, essencialmente, no estudo das relações de poder que se expressam no sistema econômico,
na cultura e nas suas interações. O papel dos meios no processo de acumulação de capital, o problema
das classes sociais, os meios e a legitimação da estratificação social, a relação entre produção material
e produção intelectual constituem a base analítica da Economia Política da Comunicação. O interesse
em se desenvolver esse tipo de estudos hoje, na América Latina, pode ser avaliado a partir de uma
citação curta mas extremamente expressiva de Pasquali (1995) sobre situação a atual:

"ingressamos globalmente, e de pronto sem retorno, na era da plutocracia. Há fila para


ajoelhar-se ante o dinheiro. O desinteresse, a solidariedade social e a mística do serviço público são
enviados para o arquivo morto dos valores obsoletos. A guarda pretoriana do pós-modernismo
rotula de jurássicos aqueles que ousam invocar verdade e razão, justiça ou valores".
O desencanto do professor venezuelano pode ser entendido se observarmos a evolução do
debate sobre a Nova Ordem Mundial das Informação e da Comunicação (NOMIC) e as Políticas
Nacionais de Comunicação. Duas décadas atrás, a academia latino-americana, incluindo Pasquali,
participava ativamente nas proposições políticas que, a partir do reclamo de uma Nova Ordem
Econômica, levaram ao seio da UNESCO a discussão sobre a necessidade de democratizar as
comunicações. Hoje, o Comitê Consultivo para a liberdade de Imprensa da UNESCO está integrado,
entre outros, pela senhora Noble.

Para além das mudanças nos comitês internacionais, preocupa-nos em maior medida as
mudanças na sua agenda temática, assim como na da academia latino-americana. Dois aspectos chave
dos reclamos dos anos 70, expressos na Conferência Intergovernamental da Política da Comunicação
da Costa Rica, em 1976, foram os de acesso e participação. O primeiro fazia referência à necessidade
de maximizar a cobertura mediática com o fim de garantir que aquelas populações menos favorecidas
economicamente também pudessem "ter acesso" aos meios. O conceito de participação partia do
projeto político de integrar os setores populares como sujeitos das políticas e, nesse caso específico,
das políticas de metas. Hoje já quase ninguém se preocupa em resgatar aqueles conceitos do
esquecimento. Por um lado, o desenvolvimento tecnológico atual, especialmente a combinação de
cabo e satélite, permitiram a expansão do mercado e a rentabilização das suas inversões até nos lugares
mais recônditos do continente. Muito mais alarmante é o caminho seguido pelo conceito de
participação, perigosamente ressemantizado por setores da academia latino-americana que, longe já
dos projetos políticos setentistas, aproximam-se das necessidades da ideologia do mercado,
descobrindo a soberania do receptor e a realização da cidadania no consumo. Diante desse panorama,
acreditamos que é cada vez mais necessário propugnar por uma economia política da comunicação que
resgate as análises sobre as relações de poder, restaure a discussão sobre o problema da estratificação e
das desigualdades de classe e, em termos gerais, que não deixe de estar atenta à analise das condições
de produção, distribuição e intercâmbio da indústria cultural. Porque os diagnósticos da década de 70

Getino (1988), na Argentina, além dos autores críticos que começam a tratar do tema das telecomunicações nesse
momento, como o brasileiro Marcio Wohlers ou o mexicano Ben Alfa Petrazzini, entre outros.
3

não falharam mas, ao contrário, não é arriscado dizer que, em muitos casos, viram-se superados devido
ao êxito alcançado pelas idéias neoconservadoras.3
Claro que, nessa linha, os estudos da economia política da comunicação só têm sentido como
ponto de partida para entender as relações sociais numa perspectiva aberta, não reducionista e crítica.
As origens da Economia Política da Comunicação podem ser encontradas na necessidade de se buscar
uma réplica às orientações funcionalistas que predominam nos estudos da comunicação a partir dos
anos 50.
A história dessa área de estudos pode ser apreendida a partir de uma divisão dos principais
autores que colaboraram para o seu desenvolvimento em dois grupos: o que talvez pudéssemos chamar
de "escola norte-americana", na tradição de Baran e Sweezy, Dallas Smythe e Herbert Schiller e
setores das academias britânica e francesa, vinculadas à produção intelectual de Nicholas Garnham,
Peter Golding e Graham Murdock, de um lado, Patrice Flichy, Bernard Miège e Dominique Leroy, de
outro.
São conhecidas as teses de Baran e Sweezy (1966) sobre a função da publicidade no
capitalismo monopolista, como arma fundamental das estratégias competitivas das grandes empresas
oligopolistas, centradas na diferenciação de produtos, afetando a demanda efetiva global e, com isso,
os níveis de renda e emprego e servindo, desse modo, como antídoto à tendência de depressão crônica
do sistema capitalista na sua fase mais avançada.4
As posições de Smythe e Schiller, desde fins da década de 50 representam alguns dos mais
sérios questionamentos à mass communication research que desenvolviam, naquele momento,
Lazarsfeld e Schramm, nos marcos do behaviorismo. Formados na década de 30, sua aproximação do
marxismo deve-se, de acordo com Mosco (1996:83), a suas experiências práticas na luta de classes no
período da crise dos 30.
Depois de afastar-se da Federal Communications Commission (FCC) devido às pressões
originadas pela guerra fria, Smythe inicia sua carreira acadêmica que se destaca por seus trabalhos
sobre o problema da definição da mercadoria em comunicação. No seu trabalho mais polêmico,
Smythe (1977) propõe que "a primeira pergunta que os materialistas históricos deveriam formular
sobre os sistemas de comunicação de massas é a que função econômica do capital servem, tentando
compreender seus papel na reprodução das relações capitalistas de produção". Sua resposta seria que
o papel dos meios de comunicação é vender audiências aos anunciantes. A partir daí, elabora sua

3
Como assinala o editorial de Causas y Azares (1996) “em tempos de concentração multimediática, torna-se absurdo
deixar de discutir políticas nacionais de comunicação; em tempos de hegemonia de indústrias culturais de aparente
pluralidade discursivo e estética, é igualmente insustentável não auspiciar práticos alternativas; em épocas em que
modelos culturais homogeneizadores se dissimulam na globalização cultural, as culturas dos setores subalternos não
podem ficar reduzidas a meros objetos de estudo".
4
Para uma crítica marxista bem fundamentada e correta, vide Arruda (1985).
4

teoria do duplo papel da audiência: de mercadoria, ao ser vendida como produto dos meios aos
anunciantes, e como trabalho, ao aprender a consumir, colaborando com a reprodução das forças
produtivas. O trabalho de Smythe, mesmo sendo reducionista, ao não considerar, por exemplo o papel
do Estado, e mesmo cometendo o equívoco, entre outros, de considerar o ócio como trabalho, não
tratando, ao contrário, do trabalho cultural, artístico ou informacional, que é onde se localiza de fato a
contradição que ele pretende desvendar, teve o mérito de voltar a propor o problema econômico em
lugar da autonomia dos aparelhos ideológicos de Estado que constituía a orientação predominante dos
estudos marxistas da época.
O trabalho de Herbert Shiller parte da análise da estrutura econômica internacional e os meios
de comunicação, dando ênfase especial à relação entre o Estado norte-americano, as grandes empresas
de comunicação (meios e agências de publicidade) e as corporações industriais e bancárias. Seu livro
de 1969, além de valer-lhe a saída da Universidade de Illinois, constitui umas das primeiras denúncias
do processo de concentração da propriedade dos meios, assim como um sério questionamento das teses
difusionistas e desenvolvimentistas do momento.
Depois de haver participado ativamente nos debates por uma nova ordem informativa
internacional, Schiller (1986) examina a importância vital da comunicação para as operações do capital
transnacional e, em particular, o papel dos meios na superação da crise de acumulação do capitalismo.
É justamente por essa linha de reflexão, que se toma a tradição norte-americana de Baran e Sweezy,
que podemos considerar Schiller entre os precursores da Economia Política da Comunicação. No
geral, sua obra, juntamente com a de Armand Mattelart, destaca-se como uma das mais importantes de
uma linha de pensamento, próximo do estruturalismo athusseriano, que teve forte influência no
pensamento latino-americano na área e que apresenta pontos de contato importantes com a Economia
Política da Comunicação: a das teorias da dependência cultural5.
Schiller e Smythe tiveram uma considerável influência em um setor da academia norte-
americana que continuou suas indagações, principalmente aquelas relativas à relação entre os centros
de poder político e os centros de poder econômico e mediático, assim como o problema da
concentração da propriedade em diferentes setores das indústrias culturais.
Do outro lado do Atlântico, vale destacar, em primeiro lugar, os estudos de Graham Murdock e
Peter Golding e os de Nicholas Garnham. Como característica geral pode-se assinalar que, na Europa,
primou, entre os economistas políticos, o interesse acadêmico em fixar critérios teóricos na relação
entre produção material e produção mental. Murdock e Golding (1981) centram a análise na tentativa
de explicar como as comunicações de massa participam do processo de estratificação social, na
reprodução das relações de classe. Para isso, propõem uma leitura não determinista da célebre frase de

5
Para uma resenha crítica, vide o excelente artigo de Ingrid Sarti (1979).
5

Marx e Engels na "Ideologia Alemã": "A classe que detém os meios de produção material controla
também os meios de produção mental". Murdock e Golding assinalam que a noção de determinação
de Marx não deve ser entendida num sentido estrito, "mas num sentido amplo de fixação de limites,
exercício de pressões e encerramento de opções". Sem embargo, observam a necessidade de começar
a tarefa de investigação a partir de "uma análise concreta das relações econômicas e das maneiras
como se estruturam tanto os processos como os resultados da produção cultural".
Nicholas Garnham (1979)6 propõe também como tarefa fundamental ocupar-se dos meios com
entidades econômicas mas, à diferença de Dallas Smythe, entende que a função econômica dos meios
é, por um lado, criar mais valia através da produção da mercadoria programa e, por outro, servir
indiretamente à criação de mais valia em outros setores, através da publicidade. Com relação ao
problema colocado pela relação entre produção material e intelectual, Garnham observa que não se
deve estabelecer uma determinação das formas econômicas capitalistas, nas relações cambiantes entre
o controle dos meios e a produção intelectual. Se bem existe um controle político material, este
aparece sob distintas formas econômicas, as quais constituem o principal objeto de estudo da
Economia Política da Comunicação
Na França, onde, em lugar da expressão Economia Política da Comunicação, predomina aquela
de Economia da Cultura e da Comunicação, é digna de nota a influência da análise econômica das
artes cênicas que William Baumol (1968), ao final dos anos 60, realizou para os Estados Unidos7. No
final dos anos 70, em Paris, Dominique Leroy (1980), a partir de uma abordagem crítica, analisou, no
longo prazo, as atividades ligadas às artes cênicas8.
Mas o trabalho mais conhecido da escola francesa da Economia da Comunicação e da Cultura é
aquele dos economistas de alguma forma ligados ao GRESEC, da Un. Stendhall, de Grenoble,
representados pela figura de Bernard Miège. Também os trabalhos do parisiense Patrice Flichy
incluem-se nesse grupo, cujo interesse principal foi o de estudar os processos de trabalho e de
valorização dos produtos culturais e suas especificidades, decorrentes do tipo específico de trabalho
envolvido na sua produção: trabalho cultural, artístico, conceitual, criativo. Os limites à subsunção
desse trabalho no capital determinam as especificidades não apenas da produção, mas também da
estrutura dos mercados culturais.
Imputa-se freqüentemente a Flichy a distinção entre setores de edição (livro, disco, vídeo, CD
etc.) e a culture de flot (rádio, TV). Miège e seus colegas desenvolveram essas idéias sob o conceito

6
Utilizamos aqui o texto de 1979, da Revista Media, Culture and Society, republicado em 1990, cf. bibliografia em anexo.
Duas traduções parciais ao castelhano podem ser encontradas em Moragas (1985), com o título "Contribuición a una
Economia Política de la Comunicación de Masas", e em Richeri (1983), com o título de "La cultura como mercancia".
7
Posteriormente, o autor (1986), estendeu os resultados desse estudo para o conjunto das atividades que contêm um
componente estagnante, em termos de ganhos de produtividade do trabalho.
8
Nos anos 80, na Europa e nos Estados Unidos, esse setor foi igualmente estudado a partir de uma abordagem
microeconômica ligada à economia pública e à análise da burocracia.
6

de "lógicas sociais", considerando a imprensa como um paradigma intermediário. Os trabalhos mais


importantes da escola francesa são duas produções coletivas do GRESEC (Huet, 1978 e Miège, 1986)
e o livro de Flichy (1980), importante também pela interessante discussão sobre a técnica, retomada e
aprofundada por Salaün (1989).
No seu conjunto os estudos em Economia Política da Comunicação representam uma ruptura
com certas análises marxistas que, a partir de uma aceitação não problemática do modelo
base/superestrutura, entendem os meios de comunicação como instrumentos do domínio das classes no
poder. Essa visão reducionista do papel dos meios de comunicação na sociedade foi rebatido a partir
da economia política que, embora assumindo a importância da estrutura econômica no funcionamento
dos meios e, especialmente a necessidade de analisá-la, insistiu em não cair no erro de uma
transferência mecanicista dos efeitos dos meios.
Por outro lado, os estudos da economia dos meios se distanciam das teorias que proclamam
uma excessiva autonomia dos níveis ideológicos ou políticos, eliminando qualquer influência das
relações econômicas no processo de significação. A esse respeito, Garnham (1979) assinala: "essa
posição desenvolve corretamente as instituições de escola de Frankfurt sobre a importância da
superestrutura e da mediação, mas prescinde do fato de que, na época do capitalismo monopolista, a
superestrutura se industrializa, é invadida pela estrutura". Aparece assim a reivindicação de deixar de
considerar os meios de comunicação como aparelho ideológico e se investe na necessidade de centrar-
se na sua função econômica9.
O desenvolvimento de uma Economia Política de Comunicação foi influenciado pela
transformação da imprensa, dos meios eletrônicos e das telecomunicações, de modestas empresas
familiares, nas corporações multinacionais atuais. Um dos atuais desafios para os estudos da economia
política é analisar como se organiza a produção para os novos mercados da informação segmentados e
específicos e como a comunicação participa do circuito de acumulação do capital e das necessidades
da estrutura econômica baseada na rapidez do consumo. O aumento da capacidade dos canais de
comunicação sugere que os novos meios "especializados", para audiências cada vez mais
fragmentadas, são uma conseqüência concreta do processo de reconversão econômica10.

9
Não menos conflitiva foi a relação entre a Economia Política da Comunicação e os Estudos Culturais. Se bem que
possamos considerar que partem do projeto comum de oposição às teses behavioristas, assim como de um manifesto
projeto político compartilhado, de reabilitação da classe trabalhadora, artigos recentes (Colloquy, 1995) indicam uma
escassa intenção de percorrer caminhos ao menos paralelos. Apesar da economia política ter elogiado os trabalho de
Williams, Tthompson e Stuart Hall, por um resgate da cultura ordinária e a análise da confrontação e resistência das classes
populares, também criticou o fato de que os últimos desenvolvimentos dos estudos culturais foram acompanhados pelo
esquecimento de temas como as classes e o poder. Não casualmente esse caminho surgiu a partir da institucionaliização
dos estudos culturais em importantes setores da academia.
10
Por outra parte, é fundamental para a economia política, o estudo do crescimento dos negócios no mundo da
comunicação, vinculado a uma maior intervenção estatal. Nesse sentido, é preciso denunciar o triunfo do
neoconservadorismo na utilização da crise de acumulação e legitimação para redefinir o papel do Estado, no que se refere à
comunicação, a favor de interesses de classe. Não pode deixar de preocupar-nos o novo caráter que adquiriu tal
7

Existem, hoje, diferentes matrizes teóricas utilizadas para realizar uma análise econômica das
atividades ligadas ao campo da informação e da comunicação:
i) a neoclássica, que ressalta a ineficiência das diferentes formas de intervenção pública
(Grampp, 1987, por exemplo). Ela constitui uma crítica das análises que tentam justificar a intervenção
do Estado a partir das especificidades dos produtos ou dos mercados (externalidades, indivisibilidades
etc.);
ii) a partir do conceito neo-schumpeteriano de trajetória tecnológica, é possível analisar as
evoluções tecno-econômicas dos sistemas de comunicação (Bolaño, 1991, 1995);
iii) as teorias do crescimento endógeno ressaltam o fato de que a tecnologia, concebida como
uma informação que tem um custo de produção e um custo de transmissão, é um bem público que gera
externalidades importantes. Neste caso, o rendimento privado é inferior ao rendimento social, o jogo
do mercado não permite alcançar o ótimo social e é possível justificar assim a intervenção do Estado
(Guellec et Palle, 1996);
iv) existem, igualmente, abordagens “positivas” que, numa perspectiva economicista, estudam,
a partir de um ponto de vista micro e macroeconômico, as modalidades de financiamento (Baumol,
1968, 1986) e a natureza dos mercados (Kopp, sd);
v) as abordagens críticas, em termos de economia política, como aquelas acima citadas do
GRESEC, na França, dos grupos ligados a Garham, Golding, Murdock, na Inglaterra, Mosco, no
Canadá, entre outros. Todos eles vêm na esteira da crítica interna aos expoentes do pensamento
marxista, como Baran e Sweezy, Dallas Smythe, Schiller, Raymond Williams, Althusser, e analisam as
estratégias dos agentes, as modificações das modalidades de financiamento dos produtos e dos serviços
e suas implicações em termos sociais e em termos de estruturação do espaço.
É a este último conjunto que nos filiamos e é à problemática teórica a ele vinculada,
relacionada tanto com a natureza dos mercados e dos produtos e serviços, quanto com as funções
macroeconômicas assumidas por essas atividades no âmbito do processo de acumulação capitalista,
que dedicaremos agora nossa atenção. Ressaltemos apenas quatro temáticas fundamentais, em relação
às quais não há consenso, por vezes, nem mesmo entre os autores do presente artigo.

1 - Na linha da escola francesa da economia da comunicação e da cultura (Huet, 1978),


Herscovici (1994) realiza uma análise a partir das categorias de trabalho concreto e trabalho abstrato,

intervenção que, em sintonia com as necessidades do capital, supôs, em muitos casos, acabar com políticas de redistribuirão
para assumir a defesa de interesses corporativos privados. Deve-se estudar em profundidade o labor estatal nos seus
múltiplos papéis de produtor, consumidor, distribuidor e regulador da comunicação. Mas, ao mesmo tempo, não é possível
conformar-se com a denúncia do caráter do processo de privatização de importantes zonas da esfera pública, mas deve-se
preocupar em apoiar o acesso público e o controle dos movimentos sociais sobre os meios de comunicação, assim como o
fomento das práticas alternativas à ortodoxia econômica.
8

mostrando que existem modalidades específicas e parciais de inserção do trabalho intelectual e


artístico nos processos de produção. Este tipo de produto se valorizaria essencialmente a partir do
trabalho concreto que lhe é aplicado e isto explica sua valorização intrinsecamente aleatória, não sendo
possível explicar seu preço a partir da quantidade de trabalho abstrato, ou seja, de trabalho socialmente
necessário. A valorização do trabalho intelectual e artístico se explicaria, assim, a partir de uma lógica
“extra-econômica” ligada às modalidades sociológicas de acumulação do capital simbólico no seio do
campo de produção (cf. Bourdieu, 1977). Bolaño (1993), ao contrário, não aceita a tese da
"valorização a partir do trabalho concreto" e afirma, com Zallo (1988) que a aleatoriedade não reside
na produção do valor, mas na sua realização, lembrando ainda que, se a contribuição de Bourdieu é
fundamental para a análise da arte como campo de produção, ela é insuficiente para explicar o
funcionamento das indústrias culturais. Todos concordam, de qualquer forma, com a idéia de que a
subsunção limitada do trabalho no capital nessas indústrias é que lhes dá sua especificidade.11

2 - É preciso estudar, igualmente, as funções macroeconômicas que a cultura e a comunicação


assumem no processo de acumulação capitalista. Já Adam Smith (1776) ressaltava a importância
fundamental das atividades de Comunicação e a necessidades delas serem geridas pelas administrações
públicas; pois fazem parte das “condições gerais” necessárias à acumulação. Assim, para a economia
clássica, essas atividades são assimiladas às atividades ligadas à circulação e à realização das
mercadorias. Apesar de não criarem valor, são necessárias 12 à acumulação capitalista. Para Marx, a
comunicação pode ser assimilada aos gastos de circulação. Neste sentido, ela constituiria, à primeira
vista, “gastos improdutivos”, apesar de necessários para a realização e, conseqüentemente, para a
reprodução do sistema (Marx, 1885, livro II, p. 133). Não obstante, Marx distingue, em termos de
gastos de circulação, as atividades que consistem em transferir títulos de propriedade e as que
consistem em transferir, de um lugar para outro, as mercadorias. As primeiras seriam improdutivas,
pelo fato de consistirem em uma “modificação de forma da mercadoria“ (idem, p. 150), enquanto as
últimas seriam produtivas pelo fato de se concretizar pela produção de mercadorias. É o caso do setor
de transportes e comunicações. Finalmente, no âmbito da economia da diferenciação, que caracteriza o
capitalismo contemporâneo, as atividades culturais permitem construir a imagem midiática dos
espaços geográficos e das diferentes mercadorias industriais (Herscovici, 1994). Como tais, elas
podem ser consideradas como fazendo parte da esfera da circulação.

11
Sobre o tema da subsunção do trabalho intelectual, vide Bolaño, 1995b e 1997b.
12
A este respeito, ver o conceito de complementaridade entre trabalho produtivo e trabalho improdutivo em Herscovici,
1996.
9

3 - A informação e a comunicação representam, do ponto de vista teórico, a condição de


existência e de funcionamento do mercado. Para a economia neoclássica, a transmissão da informação
mais eficiente é realizada, nos mercados concorrenciais, a partir da formação dos preços: K. Arrow
(1974, p. 4) afirma que, neste caso, o mercado “oferece a informação ... sob a forma dos preços”. O
leiloeiro walrassiano é uma ficção, ou seja, um mecanismo hipotético e pouco realista, que centraliza a
informação disponível, envia sinais para os agentes sob a forma de preços e permite alcançar o
equilíbrio a partir de um processo instantâneo de market-clearing. No âmbito das abordagens
neoclássicas, a informação é concebida como um bem livre, ou seja, um bem cujo acesso é gratuito
para o conjunto dos agentes econômicos: Ao contrário, a partir do momento em que aparecem
“imperfeições” de mercado, notadamente imperfeições em termos de preços, a informação torna-se um
bem escasso e adquire um custo. Assim, nasce a indústria da informação (idem, p. 7). A imperfeição
da informação pode gerar rigidez de certos preços, as quais provocam desequilíbrios cumulativos e
13
afastam o sistema da situação ótima: A esse respeito, a teoria dos equilíbrios não-walrassianos
permite refutar, a partir de uma crítica “interna”, a economia neoclássica: A nosso ver, é preciso
analisar a natureza dessas imperfeições: À medida que são intrínsecas ao funcionamento do mercado, é
possível contestar toda a construção neoclássica.
Para as correntes “heterodoxas” (o marxismo, os pós-keynesianos e os neo-schumpeterianos), a
informação é, por natureza, incompleta, ou até inexistente, no caso dos mercados futuros (Arrow,
1974; Kregel, 1980). Isto permite explicar a rigidez intrínseca dos preços, ou sua “viscosidade”, como
prefere Herscovici (1997) e, neste caso, não é mais possível conceber o mercado como uma instância
socialmente eficiente. O conceito pós-keynesiano de contrato monetário ressalta a instabilidade
crônica dos mercados e constitui um meio a partir do qual os agentes econômicos diminuem esta
instabilidade. Isto se relaciona com a incerteza inerente ao mecanismo de mercado (no sentido definido
por Knight): Em períodos de estabilidade relativa, parte do risco pode ser parcialmente probabilizada,
enquanto em períodos de “turbulências”, existe uma incerteza forte, não redutível às probabilidades
(Vercelli, 1997).

4 - O setor da Cultura, da Informação e da Comunicação sofreu transformações importantes


nos vinte últimos anos. Tendo em vista as convergências tecnológicas que existem entre o
audiovisual, a informática e as telecomunicações, a análise dos conteúdos (o software) não pode mais
ser realizada independentemente das novas tecnologias de difusão e de transmissão da informação14.

13
Ver os trabalhos de Clower (1969), Leijonhufvud (1968), Bénassy (1984) e Malinvaud (1980). Para uma abordagem
marxista geral do conceito de informação, ver Bolaño, 1993, cap. 1.
14
O estudo econômico das convergências desenvolve-se a partir das seguintes abordagens: (i) a abordagem
microeconômica que privilegia o estudo das externalidades ligadas às redes e aos processos de compatibilização entre os
diferentes sistemas técnicos (Katz e Shapiro, 1985); (ii) as análises ligadas ao papel da informação e das indústrias da
10

Um tema crucial, ligado à discussão sobre a convergência, é o da privatização, pelo menos parcial, do
conjunto do sistema de telecomunicações em nível global. As escolhas que estão sendo feitas não
podem ser explicadas a partir de uma lógica tecnológica ou “puramente” econômica, como afirma o
discurso neo-liberal. Estas são políticas pelo fato de refletirem os interesses de certos grupos sociais,
mais especificamente os dos grandes usuários (Wohlers, 1995). O abandono progressivo da lógica de
serviço público universal, e dos efeitos de redistribuição a ele ligados, caracteriza a implementação
deste sistema de redes (Herscovici, 1996)15.
Nessas condições o estudo da economia das redes e das novas tecnologias de informação e da
comunicação adquire uma relevância política fundamental, apontando para as novas modalidades de
exclusão social e reforçando a importância dos enfoques como os da Economia Política da
Comunicação. Citemos apenas algumas questões chave.
i) Em que medida a implementação de um sistema mundial de redes utilizando as NTIC
implica numa redefinição da dicotomia privado/público? A Cultura, a Informação e a Comunicação
Social representam bens que pertencem, em princípio, à totalidade da coletividade. Como tais, eles não
podem ser objeto de uma apropriação privada. São indivisíveis, no sentido definido pela Economia
Pública, e constituem bens patrimoniais (Herscovici, 1997). O Estado limita as modalidades de
apropriação privada desses bens, em função das externalidades, geralmente negativas, geradas pela
apropriação privada dos mesmos, definindo, assim, em função das relações de força entre os diferentes
grupos sociais, uma certa dicotomia entre o privado e o público. Uma modificação dessa dicotomia
traduz uma modificação das relações de força entre os diferentes grupos que compõem a sociedade. O
caráter público ou privado de um bem não se define em função das características técnicas dos
produtos ou dos mercados, mas é o produto de decisões intrinsecamente políticas.
ii) No que diz respeito à economia das redes, o caráter público ou privado se define a partir das
escolhas que estão sendo feitas, em termos de modalidades de distribuição, ou seja, de acesso ao bem.
Por exemplo, um programa audiovisual pode ser considerado como um bem público, no caso da
televisão aberta, como um bem semi-privado, no caso das televisões por assinatura, ou como um bem
privado no caso das fitas de vídeo. A privatização do sistema corresponde a uma modificação das
modalidades de distribuição dos produtos e dos serviços. As políticas liberais se traduzem,
concretamente, pela introdução de um processo de exclusão, parcial ou total, pelos preços. A lógica
do club, no sentido empregado pela Economia Pública, substitui progressivamente o conceito de
serviço universal. Enquanto a lógica do serviço público implicava na não-exclusão pelos preços, ou na
existência de solidariedades tarifarias, a privatização do sistema se traduz por uma “economia dos

comunicação no funcionamento do sistema. Essas podem ser teóricas ou mais empíricas (Arrow, Knight); (iii) os trabalhos
que, a partir de uma abordagem multidisciplinar e no âmbito de uma visão crítica, de economia política, privilegiam as
lógicas sociais da cultura e na comunicação.
11

contadores“ (Miège et Pajon, 1990) em que a contribuição econômica do usuário determina as


modalidades de utilização do serviço considerado.
iii) No âmbito da lógica de globalização, a implementação dessas redes gera novas
modalidades de exclusão social. Existem, assim, modificações da natureza do espaço público, no
sentido definido por Habermas, e das modalidades de legitimação. As novas tecnologias mundializadas
se traduzem, em relação ao consumo e à cultura de massa, por novas modalidades de exclusão,
aproximando a nova esfera pública daquela vigente no século XIX, sem, no entanto, eliminar o
paradigma da massificação do século XX (Bolaño, 1997). Por outro lado, é necessário repensar as
análises tradicionais da dependência que raciocinam a partir dos antagonismos entre o centro e a
periferia. Enquanto essas contradições são progressivamente apagadas, outras aparecem. Com a
criação de redes como internet, por exemplo, os antagonismos não mais se refletem nas oposições
entre países centrais e países periféricos, mas na forma socialmente diferenciada de acesso a este
sistema pelos diferentes grupos sociais (Herscovici, 1996). A distância entre dois agentes não depende
mais da distância geográfica ou cultural mas essencialmente do tipo de conexões realizadas com as
diferentes redes (Richeri, 1995). Nessas condições, o próprio conceito de trabalho, a divisão entre
trabalho manual e intelectual e todas as conseqüências que ela implica em termos de contradições
sociais, luta de classes etc., deve ser estudado sob uma ótica renovada (Bolaño, 1995b, 1997b)
iv) No seio dessa economia da informação e da comunicação, as atividades ligadas à
distribuição, à organização e ao tratamento da Informação constituem a principal fonte de criação de
valor agregado (Rallet, 1996; Petit, 1996). O poder de mercado se situa neste nível, o que significa
conforme já observamos, que as modalidades de acesso à informação não são mais gratuitas. Por
outro lado, o espaço do mercado se amplia em nível mundial com as redes telemáticas e algumas de
suas funções se “desmaterializam”; Na área da finança internacional, por exemplo, este sistema de
Comunicação atende às necessidades da acumulação capitalista, não se trata simplesmente de
transportar fisicamente as mercadorias de um lugar para outro, mas de transferir os direitos sobre essas
mercadorias.

Não pretendemos, com o exposto, haver esgotado a apresentação de todas as correntes nem,
muito menos, resenhado todas as temáticas abordadas pela Economia Política da Comunicação e da
Cultura. Mas acreditamos haver apresentado um panorama suficientemente amplo para uma
introdução a essa área de estudos, enfatizando a importância do seu desenvolvimento para as Ciências
da Comunicação, especialmente na América Latina, no atual contexto de mudança estrutural do

15
Sobre a privatização no Brasil e em outros países, vide, por exemplo, Wohlers (1994) e Bolaño (1997c, 1998).
12

capitalismo, em que as tecnologias da informação e da comunicação ganham uma relevância inaudita e


em que a "industrialização da superestrutura” atinge níveis verdadeiramente impressionantes.
Apresentamos também uma lista bibliográfica bastante completa à qual seria indispensável
acrescentar apenas a completíssima coletânea em dois volumes editados por Golding e Murdock e
publicado em 1997, contendo todos os artigos fundamentais da escola anglofônica.
Em nível internacional, o espaço tradicionalmente ocupado pelas vertentes críticas de estudo de
economia política da comunicação são os GT's de Economia Política das sociedades de Ciências da
Comunicação. É o caso, por exemplo, da IAMCR (International Association of Mass Communication
Research), cuja seção de Economia Política é uma das mais antigas e bem estruturadas, contando com
a participação de autores como Vincent Mosco, discípulo de Dallas Smythe, de Nicholas Garnham,
Janet Wasco, entre outros. No Brasil e na América Latina os pesquisadores da área se congregam,
respectivamente, em torno dos GT’s de Economia Política da INTERCOM (Sociedade Brasileira de
Estudos Interdisciplinares da Comunicação), criado em 1993, e da ALAIC (Associação Latino-
americana de Investigadores da Comunicação), surgido em 1995.
Características econômicas do mercado de televisão aberta

cadeia produtiva e falhas de mercado

As falhas no mercado de televisão aberta produzem efeitos sobre a oferta de


conteúdo transmitida pelas emissoras de TV. Um aspecto tem chama atenção dos
estudiosos: a tendência à padronização ou uniformização da programação das emissoras
comerciais de televisão. O fenômeno seria decorrente da natureza da TV como bem
público, da produção de externalidades, do grau de concentração e da assimetria de
informações no mercado de TV.

O tema tem sido preocupação constante em sociedades que consideram a liberdade


de expressão e o direito à diversidade de informação e de opinião como fundamentais.
Muitas incluem esses princípios entre os mais importantes de seus ordenamentos
jurídicos43. Em termos econômicos, essa tendência à homogeneização resultaria em um
nível de diversidade de oferta da programação de TV abaixo do ótimo, e interferiria na
escolha soberana do consumidor, ao reduzir as opções disponíveis de opinião, informação
e entretenimento. A literatura discute a necessidade e eficiência da ação de Governo na
tentativa de correção dessas falhas.

3.1 Mecanismos de intervenção governamental no conteúdo da programação


de TV

Há dois principais mecanismos de intervenção governamental sobre a oferta de


programação de televisão: instrumentos de caráter direto, como provedor de conteúdo de
programação, e os instrumentos de caráter indireto, por meio de normas regulatórias da
oferta de programação das emissoras de TV comerciais.

No primeiro grupo, estão as emissoras de televisão com financiamento público,


produtoras e transmissoras diretas de conteúdo de TV. Um exemplo é a “TV Brasil”,
emissora pertencente à Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), grupo de comunicação
mantido pelo Poder Executivo Federal. A emissora foi criada em 2007 a partir da fusão da
Radiobrás com a TV Educativa do Rio de Janeiro (ambas financiadas por verba pública).

43
O direito à liberdade de expressão e a vedação de censura estão consagrados entre os principais
dispositivos da Constituição dos Estados Unidos e do Brasil, entre outros países.
Também é considera emissora pública a TV Cultura, dirigida pela Fundação Padre
Anchieta, que opera com aporte de recursos do Governo do Estado de São Paulo.

A provisão direta de conteúdo televisivo pelo Estado é prevista na Constituição,


que traz, em seu artigo 223, caput, o entendimento de que o sistema de comunicação deve
compreender o funcionamento de emissoras de radiodifusão comerciais (de capital
privado) e emissoras com financiamento público (públicas e/ou estatais).

Entre os outros instrumentos de intervenção no mercado de TV estão normas


regulatórias que interferem na oferta de conteúdo de programação, como o artigo 221 da
Constituição Federal, que determina à programação de rádio e TV a “preferência” pela
transmissão de programas com “finalidades educativas, culturais, artísticas e informativas”,
a “promoção da cultura nacional e regional” e o estímulo à produção independente. Além
disso, a programação deve respeitar, de acordo com o texto constitucional, os “valores
éticos e sociais da pessoa e da família”.

Além das determinações constitucionais, existem normas infraconstitucionais que


regulam a programação de televisão, como a Lei n° 4.117/62, que institui o Código
Brasileiro de Telecomunicações e o Decreto-Lei n° 236/67. O Decreto n°52.795/63
determina cotas de programação para as emissoras de radiodifusão, exige que as emissoras
reservem ao menos 5% da programação diária para veiculação de programas jornalísticos,
estabelece um teto de 25% da programação de TV destinada à publicidade comercial e fixa
uma cota de cinco horas semanais para a transmissão de programas educacionais.

Também interfere na programação de televisão a Lei de Imprensa (Lei n° 5.250, de


1967) embora a eficácia de alguns artigos tenha sido suspensa liminarmente em 2008 pelo
Supremo Tribunal Federal44. Existem ainda outros instrumentos regulatórios sobre o
mercado de radiodifusão que teriam, em tese, repercussão sobre o conteúdo de
programação como a vedação ao monopólio e oligopólio dos meios de comunicação (art.
220, § 5º, da Constituição Federal).

Em que pese a existência desses mecanismos em termos jurídicos, sua efetiva


aplicabilidade tem sido questionada por autores como Scorsim (2008). Em alguns casos,

44
Em decisão proferida em 27 de fevereiro de 2008, o Ministro Carlos Ayres Britto suspendeu
liminarmente a eficácia de alguns artigos da Lei de Imprensa (Lei 5.250, de 1967) na Argüição de
Descumprimento de Preceito Fundamental n° 130.
por falta de regulamentação, como no caso do artigo 221, III, da Constituição Federal, que
prevê a edição de lei específica para fixar o percentual de conteúdo regional da
programação das emissoras de TV radiodifusoras, ainda não editada. Em outros casos, por
falta de fiscalização dos dispositivos legais já existentes, como a observância dos critérios
exigidos no Decreto 52.795/63.

Esses críticos acusam as autoridades regulatórias de renovar as concessões das


emissoras sem verificar o cumprimento das normas exigidas. Esse foi o mote da
“Campanha por democracia e transparência nas concessões de rádio e TV”, lançada em
outubro de 2007, na qual se exigia mais transparência e controle dos critérios exigidos pela
Lei na renovação das concessões. Os organizadores do movimento45 apontavam um viés
no sistema de outorga e renovação das concessões de rádio e TV que privilegia
concessionários próximos do poder político. Além disso, denunciam a omissão regulatória
por parte das autoridades responsáveis, que tornam alguns dispositivos legais inócuos.

A eficiência desses mecanismos regulatórios e da fiscalização é dificultada pela


subjetividade dos conceitos legais. O que seria exatamente caracterizado como um
“programa educacional”, por exemplo? Merchandising de produtos durante a programação
é considerado publicidade? Jornalismo com enfoque em notícias de entretenimento seria
classificado como jornalismo?

Outro mecanismo de intervenção governamental parece ter tido mais efeito prático
sobre a programação de TV. O Ministério da Justiça tem editado portarias46 para
implementar progressivamente o sistema de classificação indicativa dos programas de
televisão, conforme determinação constitucional (art. 21, XVI e art. 220, I, § 3º da CF) e
determinada no Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei n° 8.069, de 1990). A norma
entrou em vigor após negociação com representantes do Ministério da Justiça, das
emissoras de TV e do Ministério Público Federal e tem sido utilizada pelas emissoras para
indicação da faixa etária adequada a assistir a programação de TV.

45
A campanha foi organizada pela Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), formada por
entidades como a União Nacional dos Estudantes (UNE), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o
Movimento dos Sem Terra (MST), e entidades ligadas ao estudo da comunicação como o Intervozes, entre
outros.

46
Entre elas estão a Portaria n° 1.220/07, Portaria n° 1.100/06, Portaria n° 264/07, Portaria n°
796/2000 e a Portaria n° 773, de 1990 do Ministério da Justiça.
3.2 Críticas à regulação e intervenção governamental

De modo geral, a indústria de mídia e de comunicação se manifesta contrariamente


a intervenções regulatórias sobre o conteúdo da programação de TV. Entidades
representativas de emissoras de televisão e agências de publicidade47 preferem defender a
auto-regulamentação48 como a melhor forma de regulação do mercado. A intervenção
governamental, alegam, traz riscos e distorções associadas a falhas de Governo.

Essa linha de cunho liberal acusa possíveis distorções provocadas pelos


instrumentos utilizados em defesa do “interesse público” na programação de televisão.
Intervenções governamentais podem ser perniciosas e deveriam pressupor análises de
custo-benefício: “Falhas de mercado são vistas como condição necessária, mas não
suficiente para intervenção governamental” (Hoskins, McFadyen e Finn, 2004). Os
autores apontam que, em muitos casos, há uma parcialidade nas políticas regulatórias que
careceriam de justificativa mais consistente, como o fato de o mercado de radiodifusão ser
bastante regulado na maioria dos mercados, enquanto o de imprensa escrita costuma ser
desregulamentado.

Um outro risco seria o de “captura regulatória” do Estado pelas emissoras de


televisão, que pressionariam o sistema regulatório para satisfazer suas demandas, não
coincidentes com o interesse público. Hoskins, McFadyen e Finn (2004) mencionam o
excesso de regulação do Canadá sobre o mercado de TV, que teria atrasado a entrada em
operação da televisão por tecnologia satélite e afetado a competição no mercado de TV
canadense. Atribuem o fato à “captura” da autoridade reguladora canadense, a Canadian
Radio Television Commission (CRTC), pelas emissoras de televisão a cabo que já
operavam no País e tentavam obstruir a competição com novas tecnologias.

Há autores com posicionamento intermediário entre o intervencionismo estatal e a


desregulamentação total. Owen e Wildman (1992) reconhecem a presença das falhas de

47
Entre essas entidades estão a Associação Brasileira de Emissoras de Radiodifusão (Abert), a
Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) e a Associação Brasileira de Radiodifusão,
Tecnologia e Telecomunicações (Abratel), entre outros. No ramo da publicidade e propaganda, destaca-se a
Associação Brasileira das Agências de Propaganda (Abap).
48
Um dos exemplos mais evidentes é o Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar),
entidade formada por agências de publicidade que dita normas e critérios a serem cumpridos pelas agências
de propaganda.
mercado e registram o viés de uniformização da programação de TV no mercado
competitivo, mas fazem críticas à ação estatal como alternativa de correção do problema.
Para os autores, a evolução do mercado irá prover o nível de diversidade adequado ao
desejo dos consumidores e espectadores, sem que haja necessidade de maiores
intervenções do Estado.

Para os autores, a concorrência do broadcast com outras tecnologias, como a TV a


cabo e a TV por DTH, significa uma ampliação do ambiente competitivo no setor, com
benefícios ao consumidor. Neste cenário, a ação estatal seria prejudicial ou inócua. Uma
das principais críticas é direcionada a provisão de conteúdo por emissoras com
financiamento público:

“O sistema político responde aos vieses da televisão comercial ao


patrocinar canais de televisão públicos com programas que reúnem as
preferências dos espectadores não atendidos pelos canais comerciais. Mas à
medida que o número de canais comerciais aumenta, novos serviços comerciais
são desenvolvidos e provém programas cada vez mais parecidos com o que é
oferecido pelos canais públicos. Isso enfraquece o apoio político ao canal de
televisão pública, que é derivado desses programas diferenciados”(OWEN E
WILDMAN, 1992, p.148-9).

Spence e Owen (1975) em estudo comparativo entre a televisão por assinatura e a


TV por radiodifusão, compartilham dessa análise interpretativa. À medida que cresce a
preferência por diversidade na sociedade, o mercado de TV transita do broadcast para a
televisão por assinatura. Nesta, o sistema de preços opera de forma relativamente mais
eficiente e resulta no aumento do número de canais e em maior oferta de diversidade de
programação.

Para esses teóricos, a evolução tecnológica tem permitido a superação de uma das
principais barreiras à competição no setor de TV, o limitado espectro de canais. Um
exemplo é o serviço de televisão por assinatura, que tem ampliado a oferta de canais nos
países onde o serviço foi introduzido. No Brasil, as primeiras transmissões de TV por
assinatura foram feitas há 17 anos e hoje o serviço está disponível em diferentes
modalidades (MMDS, a cabo, DTH) com maior espectro de canais quando comparado à
radiodifusão.

Nos Estados Unidos, o serviço de televisão por assinatura tem ampliado sua
participação no conjunto de telespectadores. A audiência das três maiores redes de
radiodifusão (ABC, NBC, CBS) vem caindo progressivamente ao longo dos anos. As
emissoras abertas detinham 90% da audiência em 1980. Em 1990, havia caído para 60% e,
em 2000, apenas 40%, do total de telespectadores (Doyle, 2000). O espaço foi ocupado
pela TV por assinatura. Nos países europeus, ocorreu movimento na mesma direção,
conquanto em escala e velocidade inferiores. Na Inglaterra, a participação de dois canais
pertencentes à BBC e do canal rival ITV, de sinal aberto, caiu de 100% da audiência em
1980, para 70% em 2000. O espaço foi ocupado pelo serviço de TV por assinatura e em
outras plataformas tecnológicas.

A tendência poderá continuar com a adoção da tecnologia digital, que permitirá a


ampliação de número de canais de TV. Com a transição da radiodifusão analógica para a
digital, a disponibilidade de canais poderá ser multiplicada. A compressão de dados na
tecnologia adotada no Brasil permite a transmissão de quatro canais digitais no espectro
equivalente a um canal analógico, caso a opção seja pela menor definição (SDTV)49. Outro
fator que terá efeito sobre a oferta de canais é o desenvolvimento da televisão transmitida
via plataforma de Internet, conhecida como IPTV, que, em tese, eliminaria restrições de
espectro. A evolução na velocidade e capacidade de transmissão de dados ditará o ritmo de
desenvolvimento dessa modalidade de TV.

A tecnologia digital poderá permitir, ainda, a exclusão dos telespectadores, a


exemplo da TV por assinatura. A propriedade da excludibilidade, até então inédita para o
serviço de broadcast, permitiria a cobrança pelo serviço de TV e a conseguinte redução do
excedente do consumidor, tornando o mercado mais eficiente, de acordo com a teoria
econômica. O broadcast, em tese, adquiriria feições de bem privado, a partir dessa nova
configuração tecnológica, e se assemelharia ao serviço de TV por assinatura via satélite
(DTH) hoje disponível.

Muitos programas de TV como transmissões esportivas ou filmes de grande


sucesso poderiam ser cobrados de espectadores com alta propensão a pagar por eles. A
possibilidade de competição via preço permitiria uma oferta maior de conteúdo para
audiências específicas, que valorassem altamente determinados programas, resultando no
chamado narrowcasting, prevêem Griffith and Wall (1999),

Sob a ótica da produção, a digitalização permite a disseminação rápida de


tecnologia a custos decrescentes, com crescente qualidade de produção. O movimento
contribui para disseminar os meios de produção audiovisual e deve aumentar a competição
no setor. A popularidade de sites de transmissão de áudio e vídeo, como o Youtube, é um
exemplo dessa democratização da produção e da transmissão audiovisual. A tendência do
mercado deve acompanhar o que já se nota na imprensa escrita, na qual a proliferação de
blogs e páginas pessoais multiplicou a oferta de informação escrita disponível. O mesmo
deverá ocorrer com transmissões de áudio e vídeo, que vai depender fundamentalmente da
evolução tecnológica e do ritmo de utilização da tecnologia digital pela população.

3.3 Críticas à visão liberal

Os críticos, contudo, são céticos quanto à possibilidade da revolução digital ampliar


a oferta de diversidade da programação de TV. Mencionam, ainda, problemas distributivos
causados pela exclusão de consumidores. A cobrança pelos serviços de programação
resultaria em perdas de bem-estar, dizem esses teóricos. Há o temor que o broadcast repita
o fenômeno observado na TV por assinatura e se torne disponível apenas a uma minoria de
consumidores com maior poder aquisitivo.

Para Croteau e Hoines (2006), o aumento da oferta de canais televisivos não


significa necessariamente ampliação de diversidade na programação. Permanecem
incentivos ao reaproveitamento de material de produção para economia de custos e não há
garantias de que as emissoras produzirão programações distintas entre si. Os autores
ilustram o argumento se utilizando de uma declaração do ex-presidente da companhia de
televisão norte-americana HBO, Michael Fuchs, que se mostrava cético, em 1994, com a
ampliação do número de canais que seria possibilitada pela tecnologia digital: “Todo
mundo diz 500 canais...estes 500 canais serão velhos canais reconfigurados multiplexed ?
Serão oito HBOs. Serão 100 canais pay-per-view e 10.000 canais de compras”. Fuchs
subestimou o caso; em 2004, já havia 10 HBOs” (Croteau e Hoines, 2006, p.159).

Mesmo restrições quanto à concentração da propriedade não são suficientes para


garantir diversidade na programação, alerta Lima (2003). O autor defende intervenções
regulatórias diretamente no conteúdo da programação de TV que garantam maior
diversidade de fontes produtoras de informação e entretenimento. “Essa diversidade não
pode ser confundida apenas com segmentação de mercado, ou com ‘diferença’ de
conteúdos, que certamente atendem às necessidades de anunciantes, mas não interferem
na representação pública de interesses em conflito” (Lima, 2003).

49
Standard Definition Television (SDTV).
De acordo com Croteau e Hoines (2006) o cerne do problema da escolha de
programação seria a diferenciação de produto, derivada de dois fatores: o número de firmas
ofertantes e o nível de diversidade de produto. Os sistemas regulatórios deveriam
considerar que o processo de fusões e concentrações reduz a quantidade de ofertantes de
programação. Além disso, como mencionado, a aversão ao risco produzia um incentivo à
reprodução de formatos de programas de sucesso.

“A homogeneização pode ser um resultado não intencional de


companhias minimizando riscos e maximizando lucros. Quando os gigantes da
mídia perseguem suas estratégias sinérgicas e tentam reduzir os riscos, eles
encontram competição limitada de outros gigantes da mídia. O resultado
freqüente é muito pouca inovação e muita imitação(..) A despeito do potencial
para lucros rápidos, este tipo de mídia provavelmente não serve ao interesse
público. ” (CROTEAU e HOINES, 2006, p.159).

Nenhum desses aspectos estaria eliminado com a transição para a tecnologia digital.
Portanto, não haveria razão para o mercado se organizar de forma diferente sob a nova
plataforma tecnológica, alertam Croteau e Hoines. Doyle (2002) reconhece as virtudes do
meio digital, mas alerta: “todas as formas de financiamento da televisão por radiodifusão
parecem envolver alguma ineficiência”. A possibilidade de exclusão de consumidores não
eliminaria por completo os “dois lados” característicos do mercado de broadcast
tradicional. Seria mais provável apostar numa forma híbrida, que reúna características da
radiodifusão com as possibilidades da nova tecnologia.
4. MODELOS DE ESCOLHA DA PROGRAMAÇÃO
Desde os anos 50, é analisado o processo de escolha da programação pelas
emissoras de televisão. Em geral, os modelos elaborados partem do princípio que a
programação de TV é transmitida e distribuída por firmas maximizadoras de lucro, as
emissoras de televisão, em um sistema de competição não-colusiva. Estas emissoras se
organizam em redes de televisão para obter ganhos de escala e reduzir custos.

A competição entre as emissoras de broadcast, não se dá via preço, mas em


dimensões como o agendamento da grade horária de programação e o tipo ou característica
dos programas veiculados. Em outros mercados de serviços substitutos, ou quase-
substitutos, como o de televisão por assinatura, é identificada competição via preço. A
televisão também compete, em menor grau, com outras formas de lazer e entretenimento.
Nesta dissertação, discute-se a competição apenas entre emissoras de radiodifusão, que
cumprem as mesmas estratégias de maximização de lucro e estão submetidas às mesmas
restrições.

Como um “mercado de dois lados”, como discutido no capítulo 3, a competição


entre as emissoras de radiodifusão é um jogo de estratégia para atrair espectadores e, por
meio deles, anunciantes. O paper inaugural na literatura sobre o assunto é Steiner (1952),
que iniciou uma linha de análise continuada por pesquisadores subseqüentes. O trabalho do
autor se referia à decisão de escolhas de programação por emissoras de rádio, mas suas
conclusões foram, sem perda de generalidade, estendidas ao processo de escolha de
programação por emissoras de televisão aberta.

Os mercados de TV aberta e de rádio respondem à mesma estratégia e aos mesmos


incentivos. Emissoras de rádio e de TV por radiodifusão agem com objetivo de maximizar
audiência para atrair anunciantes. São minimizadas as diferenças de produto final, do custo
de produção e de restrições específicas, como limitações distintas do espectro.

Para muitos teóricos, o modelo de Steiner lançou as bases da reflexão acadêmica


sobre a escolha da programação de televisão. Owen e Wildman (1992) elogiam a facilidade
do modelo para incorporar detalhes institucionais e a consistência de seus resultados.
Segundo os autores, o modelo de Steiner se destaca ao observar “o fracasso ao satisfazer a
diversidade de gosto dos consumidores da indústria de televisão aberta financiada por
propaganda”. (Owen e Wildman, 1992, p.65).

Uma das principais conclusões do modelo de Steiner é que, no mercado


competitivo de radiodifusão, haveria um viés em favor da uniformização, ou
homogeneização de programas por emissoras de TV diferentes. O resultado do modelo é
próximo do obtido no modelo geral de análise da competição de produtos apresentado por
Hotelling (1929). Em seu clássico artigo, Hotelling argumenta que, sob hipóteses
específicas de demanda, duas firmas competitivas irão ofertar produtos de “excessiva
semelhança”. No mercado de radiodifusão, Steiner observa fenômeno análogo, que
classifica como “duplicação” de programas por emissoras concorrentes.

Com o mercado organizado sob competição oligopolística, programas dirigidos a


públicos específicos, ou “minorias”, na expressão utilizada por Owen e Wildman (1992),
teriam dificuldade de serem ofertados pelas emissoras comerciais de radiodifusão. Os
incentivos do mercado seriam para transmissão de programas direcionados a grandes
audiências, ainda que significassem repetição, ou “duplicação”, nos termos de Steiner, do
mesmo tipo de programação.

Outra falha de mercado seria a duplicação de custos de produção. Emissoras


concorrentes empreenderiam duas estruturas de produção distintas para produzir
programas muito semelhantes, o que seria ineficiente em termos de alocação de recursos.
“Um radiodifusor deve duplicar a produção ou o custo de aquisição para conseguir a
duplicação de programas. Claro, duplicação pura não pode ocorrer; programas são
quase substitutos”, descrevem Owen e Wildman.

Outro resultado do modelo de Steiner – mais sujeito a críticas e ponderações em


estudos posteriores – é que, devido a essas particularidades, o monopólio tenderia a ser
mais eficiente que a organização competitiva no mercado de TV por radiodifusão. Com
vários canais reunidos em uma só emissora monopolista, não haveria o efeito de business-
stealing de audiências presente no cenário de competição oligopolística. Esse efeito seria o
responsável pela “duplicação” de programas, já que o incentivo às emissoras concorrentes,
em lugar de investir na diferenciação de produto, seria o de disputar as maiores audiências,
conquistadas pelos programas de maior popularidade.

Ao contrário do sistema competitivo, não haveria razão para o monopolista


competir consigo mesmo pelas mesmas fatias de audiência. O incentivo seria o de ofertar
programações distintas para atender diferentes segmentos e ampliar o conjunto total de
telespectadores. O argumento de Steiner representava justificativa para o estabelecimento
de monopólios públicos em mercados de comunicação, verificado nos primórdios da TV e
do rádio, especialmente nos países europeus.

Sob monopólio, portanto, haveria mais canais e espaço na programação de TV para


atrações destinadas a públicos específicos, o que resultaria em um nível de bem-estar social
superior ao obtido no sistema concorrencial. Essa conclusão de Steiner esteve sujeita a
críticas, em particular porque depende de um modelo com hipóteses muito restritivas. Uma
das hipóteses diz respeito à existência somente de espectadores com preferências de
programação exclusivas. Neste caso, os espectadores somente teriam utilidade na hipótese
de transmissão de seus programas preferidos e não admitiriam opções de second-best.

No modelo de Steiner, a alternativa a assistir o programa preferido seria não assistir


TV, o que parece ser uma simplificação radical, já que considerar opções de programas
com alguma utilidade, ainda que não a máxima, parece plausível ao comportamento do
telespectador. Outra hipótese simplificadora é que o custo de programação é
negligenciado, ou considerado como zero. A viabilidade econômica de um programa
parece importante na decisão por sua produção/transmissão ou não, apontam os críticos do
modelo.

Vários autores buscaram aperfeiçoar o modelo de Steiner, relaxando algumas


dessas hipóteses principais. Rothenberg (1962) questionou a exclusividade das preferências
– considerou um modelo com espectadores admitindo opções de programas second-best, e
considerou a hipótese de capacidade ilimitada de canais. Entre suas conclusões está a de
que se determinados programas, ainda que não sejam os favoritos de nenhum público,
estiverem entre as segundas melhores opções da maioria dos espectadores, tenderão a
serem transmitidos em detrimento dos demais. O fato reforçaria a tendência de duplicação
no ambiente competitivo identificada por Steiner.

Em relação à eficiência do monopólio, entretanto, Rothenberg apresenta resultados


distintos de Steiner ao relaxar a hipótese da limitação do espectro de canais de TV. Em
termos de diversidade de programação, em um cenário de oferta ilimitada de canais, o
mercado competitivo seria tão eficiente quanto o mercado monopolista, já que a
“duplicação” de programas, característica do sistema competitivo, não implicaria exclusão
de programas destinados a públicos específicos. Em outras palavras, haveria canais e
programação para todos os gostos, ainda que repetidos. Contudo, o problema da
ineficiência na alocação de recursos permaneceria, já que as emissoras continuariam a
duplicar estruturas de produção de TV para produzir resultados (programas) muito
semelhantes aos das emissoras concorrentes.

Beebe (1977) sofisticou o modelo de Steiner, relaxando outras hipóteses. Como


Rothenberg, considerou preferências não-exclusivas e cenários com oferta ilimitada de
canais. Além disso, Beebe buscou atenuar uma limitação crucial do modelo original de
Steiner, que não considera o custo de produção da programação, ou a restrição
orçamentária das emissoras, o que simplifica em demasiado de escolha da programação.
Para tentar compensar essa deficiência, Beebe criou duas categorias de programas, de
baixo custo de produção e de elevado custo de produção. Todas as hipóteses foram
comparadas em um sistema concorrencial e um mercado monopolista.

Como em Rothenberg, as conclusões de Beebe mostram que a eficiência do


sistema competitivo e do sistema monopolístico dependem de premissas fundamentais: o
custo da produção de programas, a limitação de canais disponíveis, a distribuição de
públicos das diferentes programações e a exclusividade das preferências dos consumidores.
Alterando-se cada uma dessas premissas, os resultados do modelo se modificam e não é
possível afirmar que o sistema monopolista é mais eficiente que o competitivo.

Contudo, Beebe corrobora a conclusão de Steiner no que diz respeito à tendência de


duplicação, ou homogeneização da programação, especialmente se o espectro de canais for
limitado e se a distribuição do público estiver concentrada em poucos programas de grande
audiência. Ao relaxar a hipótese de custo, Beebe conclui que programas de TV necessitam
de uma audiência mínima de “break-even” que justifique sua produção. Em um sistema de
preferências não-exclusivas, haveria certa tendência em transmitir programas com
características de “denominadores comuns” para os diferentes públicos, diminuindo a
variedade de programação disponível.

Posteriormente, outros modelos foram desenvolvidos, alguns com objetivo de


mensurar as intensidades das preferências dos espectadores. Os primeiros trabalhos a se
destacarem foram os de Spence e Owen (1977) e Wildman e Owen (1985), que consideram
a propensão a pagar pelo programa de televisão como medida de intensidade das
preferências, no caso da TV por assinatura.
Spence e Owen (1977) comparam o processo de escolha de programação das
emissoras de televisão aberta com as de televisão por assinatura. Eles observam que ambos
os mercados visam maximizar grandes audiências e tendem a evitar transmitir programas
de interesse mais restrito. O setor de broadcast estaria mais sujeito a esse viés em favor de
grandes públicos que o de TV paga. Desta maneira, concluem que a TV por assinatura, em
um ambiente competitivo, seria a organização do mercado mais eficiente possível. Em
segundo lugar, estaria o sistema de TV por assinatura sob monopólio e, em terceiro lugar,
estaria o sistema de televisão por broadcast.

Outros autores desenvolveram estudos a partir dos trabalhos de Steiner e Spence e


Owen. Wildman e Lee (1989) investigaram a qualidade da programação como uma
dimensão da escolha de programas. Spitzer (1991), por sua vez, tentou uma aplicação
empírica do modelo de Beebe e discutiu formas de intervenção governamental no mercado
de televisão.

Entre os autores subseqüentes, destaca-se Noam (1987), que, a partir de um modelo


da Teoria da Escolha Pública, chegou a conclusões semelhantes às obtidas por Steiner.
Para Noam, o funcionamento do mercado televisivo seria similar ao proposto no modelo de
50
Downs (1965) de análise do processo eleitoral. Partidos políticos e emissoras de
televisão operam com o mesmo objetivo: conquistarem audiência. O resultado do
funcionamento dos dois sistemas - políticos e de comunicação – também é semelhante.

Partidos políticos evitam posições extremistas e tendem a direcionar o discurso e


posicionamento para o centro do espectro político, com vistas a seduzirem o maior
contingente do eleitorado possível, principalmente se o objetivo for o sucesso em eleições
majoritárias. De forma análoga, emissoras de televisão aberta tenderiam a padronizar seus
programas para atender ao gosto “médio” da população e, assim, conquistar parcelas
maiores da audiência global.

Os modelos mais sofisticados, em que pesem diferenças instrumentais e de


abordagem da escolha de programação, de forma geral, corroboram a conclusão observada
por Steiner relativa à tendência de uniformização do conteúdo. Isso reforça a seleção do
modelo de Steiner, em uma adaptação proposta por Shy (2001), como referência para a
verificação da hipótese de homogeneização na TV brasileira e para o cálculo do nível de
diversidade da programação realizado nessa dissertação.
Neste estudo, o modelo é adaptado à configuração observada no mercado brasileiro
de televisão aberta, com a existência de cinco principais emissoras comerciais. De acordo
com o Ibope, as cinco emissoras de propriedade privada de maior audiência (Globo, SBT,
Record, Band e Rede TV), conjuntamente, têm índices de audiência superiores a 85% do
total de televisores ligados, em média, na Grande São Paulo. Nas localidades menores,
onde há menor oferta de canais e emissoras, o percentual é próximo a 100%.

No capítulo quatro, o modelo é apresentado em termos teóricos, bem como a


equação para o cálculo do coeficiente de diversidade da programação de TV aberta no caso
brasileiro. O indicador é utilizado como referência para estudo empírico da programação
das emissoras privadas e da TV Brasil no capítulo cinco. Os resultados são analisados e
discutidos à luz da teoria econômica.

4.1 Modelo de Steiner

O modelo de Steiner (1952) analisa o processo de escolha da programação pelas


emissoras em um mercado competitivo não-colusivo. Como mencionado anteriormente, o
modelo originalmente descreve a estratégia competitiva de emissoras de rádio, mas foi
estendido, sem perda de generalidade, ao processo de escolha das emissoras de televisão
aberta, dada as semelhanças entre os mercados de TV e rádio pela tecnologia de
radiodifusão.

A competição não se dá via preço e as receitas das emissoras advêm de comerciais


e anúncios veiculados em períodos durante a programação. A receita da emissora é
proporcional à popularidade ou do programa transmitido. A observação é determinante na
estratégia de maximização de lucro das emissoras, como demonstraram Spence e Owen
(1977) e Owen e Wildman (1992).

A referência utilizada nesta dissertação é uma versão do modelo de Steiner descrita


por Shy (2001), com uma apresentação contemporânea da teoria dos jogos, que considera
uma análise de bem-estar. O modelo analisa a estratégia de emissoras de televisão aberta
em uma importante dimensão de escolha: a decisão do tipo de programa a ser veiculado.

O modelo se concentra no processo de escolha do “tipo” ou de categoria de


programa de TV a ser transmitido pelas emissoras. Outra variável importante na escolha da

50
O modelo de Downs (1966) é outra adaptação prática ao modelo de Hotelling (1929).
programação, a definição do horário de transmissão dos programas (scheduling) é
negligenciada por Steiner. Para aprofundamento nesta matéria, trabalhos como Cancian
(1995) e Shy (2001) são ilustrativos. No cálculo do coeficiente de diversidade, proposto no
capítulo cinco desta dissertação, a dimensão de horário de exibição dos programas foi
considerada, como será discutido no capítulo seguinte desta dissertação.

Um dos pressupostos do modelo de Steiner/Shy é a relação entre o processo de


decisão da programação televisiva e o bem-estar social. Em uma configuração
benthaniana51 a função de bem-estar social (W) seria a soma das utilidades dos
espectadores (Ui) e das emissoras (Uj)52. Formalmente:

W = ΣU i + ΣU j

onde i > 0, i = 1,2,3...,ψ, correspondem a indivíduos e j > 0, j = 1,2,3...,ψ


correspondem a emissoras.

O problema do planejador central, ou regulador, seria maximizar:

max W = Σ U i + Σ U j

Para simplificação, supõe-se que o custo de produção é zero, ou seja, qualquer tipo
de programa seria factível de ser produzido. Discute-se no modelo a decisão de escolha do
tipo, ou categoria de programa, a ser veiculado, que pode ser definido como um noticiário,
uma telenovela, um programa de variedades, um evento esportivo, um reality show, entre
outras categorias de programas.

A função de bem-estar social é derivada da utilidade de dois tipos de agentes,


emissoras e espectadores. Como hipótese, devemos dizer que cada indivíduo tem uma
utilidade de U i = β se o programa de sua preferência for transmitido, e Ui = 0 se o
programa não for transmitido. Há aqui uma simplificação, já que a utilidade é discreta, ou
seja, considera-se apenas se o programa preferido representa algum valor de utilidade.

51
Expressão derivada das idéias de Jeremy Bentham (1748-1832), filósofo da corrente utilitarista,
para quem simplificadamente, o bem-estar social seria a soma das utilidades de todos os indivíduos de uma
sociedade.
52
A maximização da utilidade das emissoras (Uj) corresponde à maximização da receita total (RT)
das emissoras. Na exposição do modelo, contudo, preferiu-se manter a notação utilizada por Shy (2001), que
se refere à utilidade para consumidores e para emissoras.
Steiner não considera a hipótese de um programa second-best ou níveis de intensidade de
utilidade diferentes entre indivíduos, como o feito por Beebe (1972).

O objetivo das emissoras de televisão por radiodifusão é maximizar o lucro. Como


não há venda direta de programas, as receitas provêm dos períodos durante a programação
vendidos aos anunciantes, os chamados “comerciais”. O preço dos comerciais é
determinado pela popularidade dos programas, indicada pelos índices de audiência
produzidos por institutos de pesquisa. Como descreve Steiner (1952): “Estações e redes se
organizam por lucro (operando, contudo, sujeitos à restrição de licença federal e
supervisão), vendem um produto (tempo) a seus clientes”.

Formalmente, o lucro da emissora j é , onde é o número de


espectadores e ρ > 0 é a receita por espectador gerada indiretamente pela propaganda
vendida. O modelo assume que espectadores são iguais, outra hipótese simplificadora, já
que espectadores são diferentes e existe alguma informação sobre eles. No turno matutino,
por exemplo, há mais crianças assistindo televisão que no período noturno, no qual
predominam adultos.

Para maximizar a receita, a emissora deve buscar atrair a maior audiência possível.
Formalmente,

max

Antes da apresentação do resultado do modelo, são necessárias algumas


considerações. Seja uma emissora de televisão que pode escolher entre tipos ou categorias
de ψ programas possíveis indexados por i = 1, 2, 3, ..., ψ. O programa 1 pode ser um
telejornal, o programa 2 uma telenovela, o programa 3 um programa de auditório, e assim
por diante. A emissora pode transmitir apenas um programa por horário determinado (não
é possível transmitir dois programas em um mesmo canal, ao mesmo tempo). Cada
programa i é assistido por η i espectadores. A audiência de cada tipo ou categoria de
programa decresce do tipo com o maior número de espectadores η 1 , para o com menor ηψ :

A segunda hipótese é que emissoras que transmitem a mesma categoria de


programas repartem igualmente a audiência. Isto significa que, se duas emissoras
transmitem telejornais ao mesmo tempo, a audiência deste tipo de programa será dividida à
metade entre cada uma delas. A hipótese também é simplificadora, já que programas
concorrentes não são exatamente idênticos. O próprio Steiner, em desenvolvimento
posterior, relaxa essa hipótese, admitindo cenários nos quais a audiência de cada tipo de
programa é dividida em parcelas diferentes pelas emissoras. Entretanto, a hipótese de
divisão equânime da audiência não altera as conclusões finais deste estudo, a respeito da
verificação da homogeneização da programação.

4.2 Modelo com três emissoras de televisão aberta

Shy (2001), com base em Steiner, apresenta um jogo entre três emissoras de
televisão via satélite, indexados por j = A, B, C. Cada emissora ganha um lucro de ρ por
espectador adicional, e o objetivo de cada uma delas é maximizar o número de

espectadores. Os programas exibidos pelas emissoras podem ser dos

tipos/categorias/gêneros , no exercício com três emissoras. O objetivo é


encontrar o(s) equilíbrio(s) de Nash entre as escolhas de tipos de programas a serem
transmitidos .

Como dito, a audiências dos programas é decrescente .

Nesta configuração, o bem-estar social é definido como a soma da utilidade das


audiências e do lucro das emissoras. Formalmente:

Considere as seguintes distribuições da audiência:

(a) Se η 1 > 3η 2 , então pa , pb , pc = 1,1,1 . Ou seja, se o número de espectadores

do programa mais assistido (programa 1) for três vezes maior que a audiência do segundo
programa mais assistido, as três emissoras irão transmitir o tipo de programa mais popular.
Esta é a situação de mínima diversidade.

Prova:

No equilíbrio . Se a emissora A desviar para o

programa , então . Como , esta emissora também não irá


desviar para estratégia . De forma análoga, os pay-offs das demais estratégias para
as emissoras B e C também não são vantajosos.
Nesta situação de mínima diversidade, as três emissoras transmitiram o mesmo
programa 1. O bem-estar social seria:

(b) Se , existem três equilíbrios de Nash, onde exatamente duas


emissoras transmitem o programa 1 e uma emissora transmite o programa 2

Prova: Pela condição citada, podemos escrever que e .

Portanto, se a emissora A desviar para Neste caso, transmitir o


programa tipo 2 é melhor que dividir a audiência do programa tipo 1 com as outras duas

emissoras. Como , se A desvia para 2, B escolherá 1 e C seguirá


a mesma estratégia de B. Neste caso, transmitir o programa 3 nunca será vantajoso para
nenhuma emissora, dado que seu payoff será sempre menor que repartir audiência do
programa 1 ou veicular do programa 2.

Nesta situação o bem-estar social seria assim calculado

(c) A condição para haver o máximo de diversidade de programas é que .


Se esta condição estiver presente, no caso com três emissoras, existem seis equilíbrios de

Nash: .

Prova:

Se a emissora A desviar para /2, e como > por

definição, /2. Se A opta por 2, B escolhe 1 e C escolhe C ou

vice-versa. Formalmente A estratégia de C é a mesma


de B. Para nenhuma emissora é interessante duplicar programas, nesta situação.

O bem-estar social seria assim calculado:


4.3 Diversidade de programação e análise de bem-estar

Relembrando os níveis de bem-estar nas três situações:

Vê-se que W (1,2,3) > W (1,1,2) > W (1,1,1).

Intuitivamente, a configuração de maior diversidade de programação é a situação


que maximiza o bem-estar social.

4.4 Falha de mercado: duplicação de programas

No modelo com três emissoras, observa-se que a partir da condição de é


observada a ocorrência ao menos uma falha de mercado, já que um tipo de programa não
será transmitido por nenhuma estação. Esta falha ocasionará na duplicação de um tipo de
programa em duas emissoras.

Steiner (1952) sintetiza o raciocínio da decisão de escolha de programação: “Uma


nova estação (emissora) sempre duplicará um programa existente em vez de produzir um
inédito se a participação que lhe couber na repartição da audiência do programa existente
for maior que a audiência do programa inédito”.

O grau de duplicação dependerá fundamentalmente da diferença entre os níveis de


audiência dos programas transmitidos. Nas palavras de Steiner, “o tipo de programa e a
quantidade de duplicação que irá ocorrer com qualquer número de estações é
perfeitamente determinada dado o tamanho relativo das preferências por vários tipos de
programa”.

O grau de duplicação, caracterizado pela letra D, é definido pela diferença entre o


número de emissoras j e a soma de tipos diferentes de programas transmitidos, que
chamaremos de x. Formalmente,

, . e j > x. Se , podemos dizer que a duplicação é de primeira

ordem. Contudo, o grau de duplicação, por si, é medida insuficiente de diversificação. Se,
em um conjunto de três emissoras, todas produzem o mesmo tipo de programa, há uma
duplicação de segunda ordem. A duplicação de segunda ordem, contudo, também existe
em um universo de quatro emissoras, se duas delas produzirem e outras duas, . Em
termos de análise de diversidade, contudo, o segundo caso é preferido, pois apresenta duas
alternativas de programa disponíveis contra apenas uma na situação anterior.

A partir do conceito de duplicação, Steiner propõe o cálculo de um “coeficiente de

diversificação”, α dado por , para . Para j < 2 não há sentido falar em


duplicação. Desta maneira,

A maximização do bem-estar determinaria, , ou seja, o número de emissoras


deve ser igual à soma de tipos de programas diferentes. Ou ainda, que D = 0, o que
significaria o máximo de diversidade possível.

4.5 Modelo com cinco emissoras de TV (caso brasileiro)

Nesta dissertação, adapta-se o modelo de Steiner para um cenário com cinco


emissoras, com vistas a aproximá-lo das características do mercado de televisão brasileiro.
As cinco principais redes de televisão (Rede Globo, SBT, Record, Band e Rede TV),
reúnem 87% da audiência de televisão registrada na cidade de São Paulo53. Para efeito de
simplificação, as demais redes foram desprezadas.

Sejam cinco emissoras ( j =A, B, C, D e E), que maximizam , com

. Por definição A audiência dos tipos de programas varia do tipo 1,


de maior audiência, para o tipo 5, de menor audiência:

O bem-estar social com cinco emissoras é calculado por

53
Audiência média somada das emissoras Rede Globo, SBT, Record, RedeTV e Rede Band durante
a semana de programação entre (16/09/2007 a 23/09/2007), registrada na cidade de São Paulo, de acordo com
números do Ibope.
Por procedimento análogo ao utilizado no cenário com três emissoras, o bem-estar
seria maximizado no nível máximo de diversidade em W (1,2,3,4,5). Formalmente,

Em qualquer outro cenário o bem-estar estaria inferior ao ótimo social.

Casos extremos: cenários de máxima e mínima diversidade

(a) Caso de mínima diversidade: se , . Neste caso de extrema


homogeneização, o grau de “duplicação” seria máximo – na verdade, quadruplicação - ou
seja, as cinco emissoras transmitiriam o mesmo tipo de programa.

Prova:

No equilíbrio, . Se a emissora A desviar para o

programa , então, . Como , a emissora também


não desviaria para estratégia e tampouco para ou . O pay-off
das demais estratégias para as emissoras B, C, D e E também não são vantajosos.

(b) Caso de máxima diversidade: no outro extremo, o grau de duplicação mínimo,


ou de máxima diversidade de programação, ocorreria se .

Prova:

A condição para haver o máximo de diversidade de programas é que . Se

a emissora A desviar para /2. Como ,

analogamente, . Desta forma, seriam 120 equilíbrios de


Nash possíveis, em uma permutação de cinco tipos de programas diferentes em cinco
canais. Formalmente:

= .

(c) Casos intermediários:

Os demais casos são situações intermediárias, nos quais haverá ao menos um grau
de duplicação de programas.
Observa-se que, a falha de mercado ocorre a partir da condição . Neste
caso, haverá ao menos uma falha de mercado: ao menos um tipo de programa não será
exibido, havendo preferência a qualquer emissora para duplicar o programa 1.

Formalmente, se A desviar para 5, .

A duplicação dos demais programas dependerá da relação proporcional entre as


audiências dos diferentes tipos de programas.

Exemplo de caso intermediário:

Se , então . Ou seja, quatro


emissoras preferirão dividir a audiência do programa 1 a qualquer outra estratégia até o
terceiro grau de duplicação. A emissora restante optará pelo programa 2, o segundo de
maior audiência. Neste caso, serão cinco equilíbrios de Nash: =

, , , , .

4.6 Coeficiente de Diversificação (caso brasileiro)

A partir dos cálculos anteriores, em um cenário cinco emissoras, próximo da


realidade brasileira, j = 5, o coeficiente de diversificação da programação de televisão α
poderia ser assim ser calculado:

Onde x, como dito, é o total de tipos de programas diferentes ofertados pelo mercado de
televisão.
5. ANÁLISE DA OFERTA DE PROGRAMAÇÃO DE TV ABERTA

5.1 Considerações Iniciais

Antes de proceder à análise da programação de TV, ressalva-se a dificuldade de


fixar critérios objetivos de mensuração de “diversidade” de conteúdo. A tipificação ou
classificação de programas de TV de acordo com gêneros, ou categorias, é um ato
subjetivo, variável a partir dos referenciais utilizados. Assim, mais que estabelecer
conclusões definitivas sobre o nível de oferta de programação, o exercício em seqüência
tem caráter ilustrativo, para verificação empírica da existência do viés de homogeneização
da programação de TV aberta previsto no modelo de Steiner, bem como sua relação com o
ótimo social.

O primeiro questionamento diz respeito aos parâmetros de diversidade da


programação. Neste exercício, o critério utilizado é o de categorização ou tipificação da
programação de TV. O método parte da premissa de que há características semelhantes
entre programas de TV que permitem classificá-los por tipos (ou categorias) semelhantes.
Essas características permitem agrupá-los em conjuntos que facilitam a comparação da
programação transmitida por emissoras distintas.

Desde já, contudo, é preciso destacar as limitações naturais de um sistema de


classificação por tipos (ou categorias). Eles sofrem das restrições intrínsecas a um sistema
de generalização, naturais de modelos comparativos. Em mercados com alta assimetria de
informações, como o de programas de televisão, a existência de bens perfeitamente
substitutos é, no limite, inexistente. Programas de TV podem reunir características
semelhantes, mas dificilmente são idênticos. Nem mesmo a mesma emissora costuma
exibir o mesmo programa de TV em duas oportunidades distintas – a estratégia mais
comum é a veiculação de novas edições, ou capítulos, do mesmo tipo de programa exibido
anteriormente.

Uma das razões é a singularidade da produção artística e intelectual – imitações


não são cópias perfeitas e até mesmo “sósias” guardam diferenças entre si. Outra razão são
instrumentos de preservação da propriedade intelectual, como as leis de copyright, que
impedem reproduções ou plágios de produções. A adoção de um critério de rigorismo
extremo de análise da diversidade inviabilizaria a verificação da hipótese do viés de
uniformização da programação de TV, já que, em última análise, o grau de diferenciação
entre produtos (neste caso, programas de televisão) é subjetivamente atribuído
diferentemente por cada espectador.

Entretanto, este exercício parte do princípio que é possível identificar padrões e


formatos na programação exibida pelas emissoras de TV. Esses padrões são referências
utilizadas no mercado de televisão e facilitam o cotejamento entre oferta e demanda de
programação. Tipificações de programas em categorias como telejornais, novelas,
noticiários esportivos, séries, programas de variedades, reality shows, entre outras, são
compreendidos por produtores e telespectadores. Uma evidência pode ser observada nos
sites eletrônicos das emissoras de TV, nos quais tais categorias são utilizadas para
classificar a programação que vai ao ar.

O mecanismo de categorização é largamente utilizado no mercado de


entretenimento e de bens culturais. No mercado fonográfico, produtores classificam artistas
em categorias como rock, samba, música brasileira, erudita, entre outras. No mercado de
TV, emissoras e telespectadores reconhecem características comuns nos programas de
televisão, como formatos, técnicas de edição, estilos de apresentação, dia de transmissão,
número de apresentadores, vestuário, tempo de duração, gênero, entre outros. O mercado
se utiliza de padrões de programação, que corrigem assimetrias de informação entre
produtores e consumidores.

Com esse entendimento, a partir dos dados de programação fornecidos pelas cinco
principais emissoras de TV comerciais do Brasil e pela TV pública federal (TV Brasil) é
desenvolvida uma categorização da programação da televisão aberta no Brasil. Essa
categorização fundamenta a análise do nível de diversidade da programação. O objetivo foi
testar a hipótese de homogeneização, ou duplicação, da programação de TV como previsto
no modelo de Steiner (1952). Como parâmetro de diversidade, foi utilizado coeficiente de
diversificação da programação apresentado no capítulo quatro desta dissertação. Os
resultados foram discutidos com as estimativas de ótimo social previstas no modelo.

Em seguida, o mesmo sistema foi utilizado para verificar de que maneira a


intervenção governamental direta, por meio da TV Pública, interfere na oferta de
programação de TV aberta. A intenção é verificar se a ação estatal age no sentido de
atenuar a falha de mercado, como determina a teoria econômica ou se produz efeitos no
mercado de programação contrários a seus objetivos.

5.2 Normas regulatórias e distorções na oferta de programação de TV

Para efeito de simplificação, esse estudo desconsidera possíveis efeitos sobre a


diversidade da programação da TV advindos de normas regulatórias da programação. A
premissa é que essas normas não afetam significativamente a decisão de seleção de
programação das emissoras comerciais, devido à repercussão limitada no total da oferta de
programação e à dificuldade do Poder Público de fiscalizar a aplicação das regras (ver
capítulo 3).

À exceção da TV Brasil, objeto de análise no item 5.9 desta dissertação, é


desconsiderado o impacto da programação das demais emissoras abertas financiadas pelo
Poder Público (como a TV Cultura, mantida pela Fundação Padre Anchieta, que tem como
financiadora o Governo do Estado de São Paulo). A exclusão é justificada pelo fato que as
emissoras públicas, a princípio, não operam exclusivamente para a maximização do lucro,
que decorre da maximização da audiência, premissa fundamental do modelo de Steiner.

As emissoras públicas podem responder a outros problemas de maximização, como


por exemplo, a expressão política do Governo que detém o seu controle ou ainda, a
maximização da diversidade de gêneros ou tipos, a despeito dos níveis de audiência. Para
efeito de simplificação, essas emissoras foram desconsideradas.

O exercício, portanto, em um primeiro momento, avalia a programação das cinco


principais emissoras brasileiras de TV comerciais (Rede Globo, SBT, Rede Record,
RedeTV e Rede Bandeirantes). Em um segundo momento, também considera os dados de
programação da TV Brasil. A seleção das cinco emissoras comerciais é justificada por sua
representatividade na audiência total do mercado de televisão aberta. Durante a primeira
semana de amostra escolhida para análise (16/09/2007 a 22/09/2007) as cinco emissoras
foram responsáveis 87% da audiência total de televisão observada na cidade de São Paulo,
de acordo com dados do Ibope. As demais emissoras comerciais, pela menor relevância,
foram desprezadas.

Cabe mencionar que o escopo deste estudo se restringe a uma análise quantitativa
de diversidade de oferta de programação. Não se discutem mensurações qualitativas da
programação exibida. O estabelecimento de parâmetros quantitativos de diversidade é por
demais complexo: a utilização de critérios valorativos implicaria perda de objetividade.
Optou-se por circunscrever a discussão ao âmbito da oferta de diversidade, sem entrar no
mérito da qualidade dos programas. Os critérios de comparação foram estabelecidos em
termos quantitativos pelo total de tipos de programas disponibilizados pelas emissoras
comerciais.

5.3 Metodologia do Estudo

Esta dissertação se propõe a analisar a oferta de diversidade da programação da


televisão comercial brasileira e o efeito da intervenção governamental neste mercado, por
meio da criação de uma emissora pública. O indicador utilizado como parâmetro é o
coeficiente de diversificação da programação proposto por Steiner (1952). Os resultados
são comparados com uma estimativa do ótimo social proposta por Shy (2001) em uma
versão adaptada do modelo de Steiner.

Ao propor a equação para o cálculo do coeficiente, porém, Steiner o fez apenas em


termos teóricos e não procedeu estudos com base em informações empíricas de
programação. Este exercício busca avançar nesta direção.

O indicador foi formatado para se adaptar à configuração do mercado brasileiro de


televisão, com cinco emissoras comerciais dominantes. Como referência, foi utilizada a
programação das cinco emissoras de televisão aberta de maior audiência (Rede Globo,
SBT, Record, RedeTV e Bandeirantes) transmitida na cidade de São Paulo (SP), publicada
no jornal Folha de S.Paulo. A programação das emissoras comerciais foi contrastada com a
programação exibida pela TV Brasil, publicada no site oficial da emissora pública.

Foram selecionadas duas amostras de programação. A primeira amostra analisada


compreende a programação de uma semana (7 dias) entre os dias 16 de setembro de 2007
(domingo) e 22 de setembro de 2007 (sábado). A amostra foi utilizada para verificação da
hipótese de homogeneização da programação e o contraste com o ótimo social. A primeira
amostra foi escolhida antes do início das transmissões da TV Brasil (contudo, as emissoras
Radiobrás e TV Educativa do Rio de Janeiro, que deram origem à TV Brasil, já
transmitiam à época alguma programação nos canais da futura emissora).
A segunda semana de amostra de programação foi selecionada, também
aleatoriamente, seis meses após o início das operações da TV Brasil (que iniciou
transmissões oficialmente em 2 de dezembro de 2007). Desta vez, a análise considerou a
programação das cinco emissoras adicionadas da programação da TV Brasil, veiculadas
entre os dias de 22 de junho de 2008 a 28 de junho de 2008. Nos dois casos, as
programações das demais emissoras foram desprezadas.

Para aproximar o modelo de program-choice aos dados empíricos de programação,


a análise das informações considerou uma dimensão inicialmente não contemplada no
cálculo do coeficiente de diversificação proposto por Steiner. A dimensão é o horário de
agendamento (scheduling) da programação, considerado como importante no processo de
escolha de programação por autores como Shy (2001) e Nilssen e Søgard (1998). O ajuste
foi feito para facilitar a interpretação do cálculo do coeficiente e não invalida as conclusões
principais do modelo.

A dimensão tempo foi considerada na divisão da grade de programação das cinco


emissoras em 48 períodos de 30 minutos para cada dia de programação analisado,
conforme é apresentado na Tabela 5.1 e nos anexos 1 a 7. A razão desta divisão é
estruturada na hipótese de que as pessoas costumam se organizar em unidades constantes
de tempo. Períodos de 30 minutos, bem como seus múltiplos e divisores, são comumente
utilizados como referência por produtores de televisão no agendamento da grade de
programação (Shy, 2001).

Para facilitar a comparação da programação das emissoras, foram feitas


aproximações nos horários de transmissão de alguns programas, especialmente daqueles
que tiveram início em horários intermediários entre os períodos de 30 minutos
apresentados. Exemplo: a transmissão de jogo de futebol do campeonato brasileiro, pela
Rede Globo, no dia 16 de setembro de 2007, iniciou-se às 15h45. Para efeito de
comparação, neste estudo, a atração foi enquadrada no horário de 15h30. As aproximações
não comprometem as conclusões relativas ao tipo de programação exibida.

A Tabela 5.1 apresenta a grade de programação das cinco emissoras analisadas no


dia 18/09/2007 (terça-feira). O mesmo procedimento de classificação foi utilizado para os
demais dias da semana analisada entre 16/09/2007 (domingo) e 21/09/2007 (sábado). A
programação dos demais dias é apresentada nos anexos 1 a 7 desta dissertação.
TABELA 5.1 – GRADE DE PROGRAMAÇÃO DA TV ABERTA COMERCIAL EM 18/09/2007 (TERÇA-FEIRA)

Emissora Emissora Emissora Emissora Emissora

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDETV BAND

05h00 05h05 Telecurso FORA DO AR PPProgramação 05h Igreja Igreja


M. Viva
2000 IURD Poder Deus

05h30 05h25 Telc. I / FORA DO AR Programação Igreja M. Poder Igreja Viva


05h35 Telc. 2 / IURD Deus
05h50 Telc. 3

06H00 06h05 Globo Rural 06h05 Jornal do Programação Igreja M. Poder Igreja Viva
SBT IURD Deus

06H30 06h30 Bom Dia Jornal do SBT 06h45 São Paulo Igreja M. Poder Igreja Viva
São Paulo no Ar Deus

07H00 07h15 Bom Dia 07h Carr. Animado São Paulo no Ar Igreja M. Poder Igreja Viva
Brasil Deus

07H30 Bom Dia Brasil Carrosel Animado 07h45 Fala Brasil Igreja M. Poder 07h45 Novas
Deus Idéias

08H00 08H05 Mais Você Carrosel Animado Fala Brasil Igreja M. Poder 08h15 Primeiro
Deus Jornal

08H30 Mais Você Carrosel Animado 08h30 Hoje em Igreja M. Poder 08h45 Copa Fut.
Dia Deus Fem

09H00 Mais Você 09h Bom Dia e Cia Hoje em Dia 09h Bom Dia Copa Fut. Fem
Mulher

09H30 09h26 Gnot. / Bom Dia e Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
09h29 O Point do
Mickey

10H00 09h50 Sítio do Bom Dia e Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
Picapau Amarelo

10H30 10h20 TV Xuxa Bom Dia e Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem

11H00 TV Xuxa Bom Dia e Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher 10h50 Bem
Família

11H30 TV Xuxa Bom Dia e Cia Hoje em Dia 11h45 TV Esporte 11h30 Jogo Aberto
Notícias

12H00 12h SPTV Bom Dia e Cia 12h Debate Bola TV Esporte Jogo Aberto
Notícias

12H30 12h45 Globo Bom Dia e Cia Debate Bola TV Esporte Jogo Aberto
Esporte Notícias

13h00 13h15 Jornal Hoje Bom Dia e Cia 12h40 T. M. Odeia 13h I. Universal do 13h São Paulo
o Chris R. Deus Acontece

13h30 13h45 Vídeo Show Bom Dia e Cia T. M. Odeia o Chris I. Universal do R. 13h30 Uma
Deus Família de O.

14h00 Vídeo Show 14h15 Chaves 13h15 A T. do 14h A Tarde é Sua 14h Mr. Bean
Pica-Pau

14h30 14h35 Da Cor do 15h As V. da Raven 14h30 Hércules A Tarde é Sua 14h30 Atualíssima
Pecado

15h00 Da Cor do Pecado 15h30 Eu, a P. e as 15h Xena, a A Tarde é Sua Atualíssima
Crianças Guerreira

15h30 15h50 Filme: 16h Charme Xena, a Guerreira A Tarde é Sua Atualíssima
"Good Burger"

16h00 Filme: "Good Charme 16h Programa da A Tarde é Sua 16h30 Márcia
Burger" Tarde
Emissora Emissora Emissora Emissora Emissora

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDETV BAND

16h30 Filme: "Good Charme Programa da A Tarde é Sua Márcia


Burger" Tarde

17h00 Filme: "Good 17h A Usurpadora 17h Zorro 17h Igreja da Márcia
Burger" Graça

17h30 17h37 Malhação A Usurpadora Zorro Igreja da Graça Márcia

18h00 18h10 Eterna 18h Casos de 18h15 SP Record 18h Notícias das 18h Brasil Urgente
Magia Família Seis

18h30 Eterna Magia Casos de Família SP Record Notícias das Seis Brasil Urgente

19h00 19h SPTV 19h Chaves 18h45 A T. do 19h Encontro Brasil Urgente
Pica-Pau Marcado

19h30 19h15 Novela II 19h25 Chiquititas 19h45 Jornal da Encontro Marcado 19h20 Jornal da
Sete Pecados Record Band

20h00 20h15 Jornal 20h15 Amigas e Jornal da Record 20h05 TV Fama 20h Família
Nacional Rivais Dinossauros

20h30 Jornal Nacional Amigas e Rivais 20h30 Luz do Sol TV Fama Família
Dinossauros

21h00 20h55 Paraíso 21h15 Liga da Luz do Sol 21h10 Rede TV 21h Show da Fé
Tropical Justiça News

21h30 Paraíso Tropical 21h35 CC / SBT 21h30 Tudo a Ver Rede TV News Show da Fé
Brasil

22h00 22h Casseta e SBT Brasil 22h Caminhos do 22h05 Superpop 22h Vídeos
Planeta Urgente! Coração Incríveis

22h30 22h35 Toma Lá, 22h25 C. Cf/ Caminhos do Superpop 22h15 A Grande
Dá Cá 22h30 Filme "Uma Coração Chance
Saída de Mestre"

23h00 Toma Lá, Dá Cá Filme: Uma Saída… 23h Simple Life Superpop A Grande Chance

23h30 23h25 Jornal da Filme: Uma Saída… Simple Life 23h35 Leitura A Grande Chance
Globo Dinâmica

00h00 00h Programa Filme: Uma Saída… 00h CSI Miami 00h05 Programa 00h Jornal da
do Jô Amaury Jr. Noite

00h30 Programa do Jô 00h40 CC / J. SBT 00h45 Jornal 24 Programa Amaury Jornal da Noite
Horas Jr.

01h00 Programa do Jô Jornal do SBT Jornal 24 Horas Programa Amaury 00h45 A N. é uma
Jr. Criança

01h30 01h30 Intercine: 01h30 C. Café 01h15 Programaç 01h30 Infocomerci 01h45 Programa
"Kamchatka", /Série: Veronica ão Iurd ais LBV

02h00 Filme/Intercine: Série: Veronica – Programação Infocomerciais Programa LBV


Kamchatka Mars IURD

02h30 Filme/Intercine: Série: Veronica – Programação Infocomerciais 02h15 Igreja


Kamchatka Mars IURD Viva

03h00 Filme/Inte Kamchatka Série: Divisão 03h 02h45 Igreja da Igreja Viva
Criminal Caçadoras Graça
de
Relíquias

03h30 03h30 Filme: "A Série: Caçadoras de Igreja da Graça Igreja Viva
Chave do Sucesso" Divisão Relíquias
Criminal

04h00 Filme: "A Chave do 04h15 Caçadoras de Igreja da Graça Igreja Viva
Emissora Emissora Emissora Emissora Emissora

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDETV BAND


Sucesso" Série Relíquias
Witchbla
de

04h30 Filme: "A Chave do Série Witchblade Caçadoras de Igreja da Graça Igreja Viva
Sucesso" Relíquias

FONTE: FOLHA DE S.PAULO, COM BASE NA PROGRAMAÇÃO FORNECIDA PELAS EMISSORAS. ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

5.4 Categorização da programação de TV aberta

5.4.1 Considerações da Metodologia de tipificação dos programas de TV

Os programas exibidos pelas emissoras de TV aberta nas duas semanas coletadas


como amostras (16/09/2007 a 21/09/2007) e (22/06/2008 a 28/06/2008) foram
classificados, cada um, em um tipo ou categoria diferente. A análise de diversidade da
oferta de programação foi feita a partir desta classificação, utilizando como referência o
cálculo do coeficiente de diversificação.

Os tipos de programa foram definidos com base em categorias de domínio comum


utilizadas pelo mercado de televisão (produtores e telespectadores). Entre elas, estão
conceitos como telejornais, novelas, programas de auditório, eventos esportivos, reality
shows, game shows, programas de variedades. Um exemplo dessa categorização pode ser
observado nas páginas eletrônicas das emissoras de TV na Internet, nas quais a
programação é classificada a partir desses conceitos54. O critério de categorização neste
estudo se fundamenta em razões semelhantes.

Em estudos anteriores, outros autores buscaram estabelecer critérios de


classificação para a programação de TV. Um deles, referência na pesquisa em
Comunicação, é proposto por Melo (1985). O autor organiza os programas de TV em três

54
Na página eletrônica do SBT, os programas exibidos pela emissora são classificados como:
Novelas, Filmes, Humor, Reality Show, Infantil, Jornalístico, Séries, Talk Show, Telejornal e Variedades. Na
página da Rede Bandeirantes, os programas das emissoras são classificados em categorias como Jornalismo,
Esporte, Entretenimento, Culinária, Filmes. Nas páginas das emissoras Rede Globo de Televisão e RedeTV
as classificações utilizadas são Entretenimento, Esporte e Jornalismo.
grandes grupos: informação, entretenimento e educação. As categorias não seriam
excludentes, e um mesmo programa de TV poderia reunir mais de uma delas.

Inspirada em Melo, Barca (2006) sugere um sistema de categorização mais


específico, ao quantificar a transmissão de assuntos científicos na TV aberta. A autora se
utilizou de doze categorias para catalogar os programas televisivos: Ciência, Cultura,
Educação, Entrevistas/Debates, Esporte, Filme, Horário Político, Humorístico,
Novela/Seriado, Religião, Variedades, Vendas. O foco da pesquisa de Barca, entretanto,
era o conteúdo apresentado pelos programas de televisão.

Neste estudo, os critérios de definição das categorias são mais complexos, e


redundaram em um sistema de classificação com 27 (vinte e sete) categorias de programas
de televisão distintas, definidas com base: i) no formato e nas características de
apresentação dos programas de TV; ii) no conteúdo, assuntos e temas abordados pelos
programas; iii) no perfil da audiência a que cada programa de TV se destina.

Cada programa de TV foi classificado em apenas uma categoria, embora muitas


vezes apresentem características que lhes permitam a inclusão em mais de uma das
categorias a seguir estabelecidas. Para efeito de simplificação, foi eleita uma característica
considerada predominante. Em contrapartida, optou-se por um sistema de classificação
com 27 categorias diferentes, que tentasse incorporasse ao máximo as sutilezas e
diferenças entre os programas de TV e evitasse superestimar o viés de homogeneização da
programação. O número de categorias é superior ao proposto por Melo, 1985 (três
categorias) e por Barca, 2006 (doze categorias).

Com esse entendimento, programas jornalísticos como Bom Dia São Paulo,
Esporte Espetacular e SBT Repórter, neste exercício, foram classificados em três
categorias diferentes: Noticiário Local, Noticiário Esportivo e Jornalístico,
respectivamente, de acordo com o formato de cada um, temática utilizada e características
da audiência a que se destinam.

Os programas de TV foram classificados como: Religioso, Infantil, Evento


Esportivo, Noticiário Nacional, Noticiário Local, Noticiário Esportivo, Jornalístico,
Policial, Programa de Auditório, Game Show, Novela, Humorístico, Entrevista,
Variedades, Filme, Série, Reality Show, Segmentado, Educativo, Musical, Infocomercial,
Horário Político Gratuito, Debate, Utilidade Pública, Ciência/Geografia/História,
Documentário/Curta.
Antes de prosseguir à análise de diversidade, cabem algumas ressalvas
metodológicas. A primeira, novamente, diz respeito à limitação de classificação dos
programas em uma categoria, já que alguns programas de TV reúnem mais de uma
característica. Um exemplo é o programa “Chaves”, exibido pelo SBT, voltado ao público
infantil, mas que se utiliza de humor em seu formato de apresentação. O programa foi
tipificado como “Infantil”, mas também poderia classificado como “Humorístico”.
Prevaleceu, contudo, o perfil da audiência a que o programa se destina (o público infantil).
Já o programa “Show do Tom” (Rede Record) apresenta traços de programa de auditório.
Sua classificação como programa “Humorístico”, entretanto, foi justificada pelo estilo do
programa e do apresentador, o humorista Tom Cavalcante, que permeia a atração com
imitações e sketches de humor.

Outra dificuldade é a generalidade intrínseca de determinadas categorias, como a


dos programas de “Variedades”. Sob esta tipificação, estão programas como “Bom Dia
Mulher” (RedeTV) voltado ao universo feminino e o “TV Fama” (RedeTV), noticiário
direcionado a entretenimento. Também fazem parte desta categoria o programa “Vídeo
Show” (Rede Globo) e o programa “Márcia” (Rede Band), que discute assuntos pessoais.
Neste caso, apesar de algumas diferenças de formatos de apresentação, prevaleceu o
conteúdo de suas programações, com temática diversificada, utilização freqüente do fait-
divers55, distinta do hard news dos telejornais ou do formato estanque dos programas de
auditório tradicionais.

Preferiu-se tratar categorias como “Séries” e “Filmes” como dois grupos distintos,
embora pudessem ser reunidas em um só conjunto pelas características de ambas (na maior
56
parte, produções hollywoodianas) . Tais agrupamentos teriam efeito sobre os resultados
dos cálculos do coeficiente de diversificação proposto neste exercício. No entanto,
preferiu-se tratar cada uma dessas categorias individualmente, para evitar classificações
abrangentes que pudessem superestimar o nível de homogeneização da programação da
televisão comercial brasileira, hipótese verificada neste exercício.

55
Fait divers, expressão francesa que define a informação ou conteúdo sensacionalista, que atrai o
consumidor (no caso, telespectador) ao apelar para a emoção, independentemente da relevância do fato em
questão a ser divulgado (Barthes, 1971).
56
Em Barca (2006), Novelas e Seriados são classificados conjuntamente, por exemplo.
O cálculo do coeficiente de diversificação (ver item 5.6 desta dissertação) foi feito
com base nessas categorias. A categoria de programas “Segmentados” engloba diversas
atrações direcionadas a públicos específicos. Seu conteúdo e temática, no entanto, por
vezes é distinto. Exemplos: o programa “Pesca Alternativa” (Domingo, SBT, 7h), voltado
para assuntos relacionados à pesca, e “Mondo Vino” (Domingo, Band, 00h30) dedicado a
temas ligados ao vinho. Ambos foram catalogados como “Segmentados” (anexos 1 a 16),
mas como são programas de temática completamente distinta, para efeito da contagem do
coeficiente de diversificação, foram considerados dois tipos de programas diferentes.

O mesmo ocorreu em relação à categoria de programas “Musicais”. Programas


como “A Grande Música” (voltado à apresentações de música erudita) e “Furacão 2000”
(dedicado à videoclips de musica pop) foram classificados como musicais, mas, para efeito
de cálculo do coeficiente de diversificação foram considerados programas distintos, por se
dedicarem a públicos diferentes.

Por fim, em que pesem questionamentos sobre o sistema de classificação, acredita-


se que uma categorização com base em 27 (vinte e sete) formatos de programas de
televisão distintos possa ser específica o suficiente para permitir uma análise da oferta de
diversidade de programação que evite o excesso de generalização. Reitera-se, novamente,
o caráter ilustrativo deste exercício, que visa aproximar a observação empírica das
conclusões do modelo teórico apresentado.

5.5 Análise do Nível de Diversidade

Os programas exibidos pelas emissoras durante a semana foram agregados desta


forma:

RELIGIOSO – Igreja M. do Poder de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus,


Igreja da Graça, Show da Fé, Igreja Viva, Igreja de Cristo em BH, Tempo de Avivamento,
Palavra da Paz, Igreja Bola de Neve, Helifly – a Voz da Verdade, Vitória em Cristo, Diante
do Trono, Igreja Pentecostal, Igreja do Evangelho, Santa Missa, Palavras da Vida, Médico
de Almas, Programação IURD, Show da Fé, Associação Família Debaixo da Graça,
Reencontro.

INFANTIL – Turma do Didi, Domingo Animado, Record Kids, A Turma do Pica-


Pau, O Point do Mickey, Sítio do Pica-Pau Amarelo, TV Xuxa, Bom Dia & Cia, Família
Dinossauros, Chaves, Liga da Justiça, Comando Maluco, Os Simpsons, TV Globinho, A T.
do Pica Pau, Pokemón, Carrosel Animado, Sábado Animado, TV Xuxa, Hannah Montana,
Clifford, Jay Jay, Janela Janelinha, Um Menino Muito Maluquinho, Turma do Pererê,
Castelo Rá-Tim-Bum, Catalendas.

EVENTO ESPORTIVO – Futebol Brasileirão, Campeonato Inglês, Fórmula Truck,


GP da Bélgica de F1, Futebol Compacto, Copa Sulamericana de Futebol, Futebol 2007,
Liga dos Campeões, Copa do Mundo de Futebol Feminino, Vôlei Feminino, Eurocopa, GP
da França de F1, Futebol 2007 Flu x LDU.

NOTICIÁRIO NACIONAL – Bom Dia Brasil, Jornal do SBT, SBT Brasil, Fala
Brasil, Primeiro Jornal, Jornal Hoje, Fala Brasil, Jornal da Record, RedeTV News, Jornal
do SBT, Jornal da Globo, Jornal 24 horas, Notícia das Seis, Jornal da Band, Jornal da
Noite, Globo Notícia, Repórter Brasil, Notícia das Sete, Good News.

NOTICIÁRIO LOCAL – Bom Dia São Paulo, São Paulo no Ar, SPTV, São Paulo
Acontece, São Paulo Record.

NOTICIÁRIO ESPORTIVO – Auto-Esporte, Esporte Espetacular, Bola na Rede,


Terceiro Tempo, Globo Esporte, TV Esporte Notícias, Jogo Aberto, Debate Bola, Bola no
Chão, Vídeo Gol, Band Esporte Clube, Esporte Interativo, TopSports, Esportvisão.

JORNALÍSTICO – Fantástico, Domingo Espetacular, Tudo a Ver, Repórter


Record, Leitura Dinâmica, SBT Repórter, SBT Realidade, Globo Repórter, Câmera
Record, 100% Brasil, Expedições.

POLICIAL – Balanço Geral, Brasil Urgente, Linha Direta.

PROGRAMA DE AUDITÓRIO – Domingão do Faustão, Domingo Legal, Tudo é


Possível, Superpop, Altas Horas, Caldeirão do Huck, Programa Raul Gil, O Melhor do
Brasil, Hebe.

GAME SHOW – Tentação, Vinte e um, Hiper QI, Curtindo com Reais, Qual é a
Música, Quem Perde, quem Ganha, Fantasia, A Grande Chance, Ataques de Risos, Quem
não viu vai ver, Esquenta, Game Play.

NOVELA – Da Cor do Pecado (reprise), Malhação, Eterna Magia, Sete Pecados,


Paraíso Tropical, Maria do Bairro, Casos de Família, Chiquititas, Amigas e Rivais, Amor e
Intrigas, Caminhos do Coração, Encontro Marcado, Dance, Dance, Dance, A Usurpadora,
Luz do Sol, Cabocla, Ciranda de Pedra, Beleza Pura, A Favorita, Privilégio de Amar,
Maria do Bairro, Chiquititas, Lalola, Pantanal, Os Mutantes, Amor e Intrigas, Água na
Boca.

HUMORÍSTICO – Show do Tom, Câmera Café, Casseta e Planeta, Toma Lá da


Cá, Vídeos Incríveis, Zorra Total, Sem Controle, Pânico na TV, A Praça é Nossa, A
Grande Família, Mr. Bean, Custe o que Custar, Show de Humor.

ENTREVISTA – Canal Livre, Programa do Jô, Show Business, A Noite é uma


Criança, Programa Amaury Jr., Roda Viva, Conexão Roberto D’Ávila.

VARIEDADES – Homenagem ao Artista, Mais Você, Hoje em Dia, Bom Dia


Mulher, Bem Família, Programa da Tarde, A Tarde é sua, Atualíssima, Márcia, Programa
da Tarde, TV Fama, Novas Idéias, Estrelas, Vídeo Show, Namoro na TV.

FILME – “Demolidor”, “Carga Explosiva”, “Resgate do Soldado Ryan”, Romance


no Parque, Constantine, Cowboys do Espaço, Marujos do Amor, Assalto ao 13º Distrito,
Acerto Final, “Um Príncipe em Minha Vida”, “Kill Bill”, “Eu, Tu, Eles”, “Good Burger”,
“Katchamka”, “A Chave do Sucesso”, “Uma Saída de Mestre”, “Caçadores de Aventuras”.
“A Idade da Violência”, “Grande Problema, “Vingança”, “Billy Madison”, “Cocoon”,
“Sounder – Lágrimas de Esperança”,“Eclipse Mortal”, “Coração de Dragão”, “Frida”, “A
Ilha no Topo do Mundo”, “Malditas Aranhas”, “Falcão – o Campeão dos Campeões”, “Eu
sei o que vocês fizeram no verão passado”, “Sonho de Uma Noite de Verão”, “Confissões
de Schmidt”, “Guerra Submarina”, “Adorável Andróide 2”, “Noites de Sexo”, “Triplo X”,
“Los Angeles – Cidade Proibida”, “Missão Perigosa”, “Corpo e Alma”, “Titanic”, “Anjos
Rebeldes 2”, “Bater ou Correr em Londres”, “Como Água e Vinho”, “Gigolô Europeu por
Acidente”, “O Casamento”, “A Passagem”, “Perdidos do Espaço”, “Bogus – Meu Amigo
Secreto”, “Tropas Estelares 2”, “A Culpa é do Macaco”, “Fúria Mortal”, “Auto da
Compadecida”, “Reviravolta”, “Adaptação”, “Passaporte para Paris”, “40 dias e 40
noites”, “A Máscara do Zorro”, “O Espantalho”, “Flinstones”, “Garotos e Eu”, “Viajantes
do Futuro”, “Clube da Luta”, “Drácula”, “Perdidos no Espaço”, “Players Club”,
“Soterrados”, “Querido Frankie”, “África dos Meus Sonhos”, “Michael, Anjo e Sedutor”,
“O Guarda-Costas”, “Seqüestrada para o Prazer”, Programa de Cinema.

SÉRIE – Lances da Vida, SmallVille, As Visões da Raven, Um Maluco no Parque,


Charme, Todo Mundo Odeia o Chris, Johnny Zero, Tele Seriados, Black Donellys, Taken,
Eu, P. e as Crianças, Veronica Mars, Divisão Criminal, Witchblade, Hércules, Xena - a
Guerreira, Zorro, CSI Miami, CSI Las Vegas, Caçadoras de Relíquias, Uma Família de
Outro Mundo, Dr. House, A Paranormal, O Vidente, Invasão do Poder, Estética,
Sobrenatural, A Sete Palmos, Monk – Um Detetive, Jack and Bobby, Pentágono, West
Wing, Donas de Casa Desesperadas, Os Pesadelos de Molly, Casal Gay, As Espiãs, Uma
Família da Pesada, Arquivo Morto, Divisão Criminal, Desaparecidos, Em Nome da Justiça,
Heroes, Haru e Natsu, Caçadora de Relíquias, OC, Studio 60, Estética, O Vidente, Casos e
Acasos, Dicas de um Sedutor, Homens às Pencas, Sete Palmos, Carnivale, Oz, Uma
Família da Pesada.

REALITY SHOW – Simple Life, High School Musical, É o Amor, O Aprendiz 5,


Supernanny, Astros, Dr. Hollywood.

SEGMENTADO – Siga Bem Caminhoneiro, Pé na Estrada, Pequenas


Empresas/Grandes Negócios, Globo Rural, Pesca Alternativa, Olhar Digital, Olhar
Oriental, Late Show, Vinho à Mesa, Garagem, Mundo Fashion, Acredite Se Quiser, Astros
do Rodeio, VRUM, Hora e a Vez da Pequena Empresa, Mundo Fashion, Viva mundo,
Espelho Brasil, Decola, Revista Brasil, Animania, Nordestinos, Filhos, Jornal Visual,
Observatório da Imprensa, Código de Barras, Mesa Brasileira, Saúde Brasil, Programa
Especial, Canal Saúde, Via Legal, Ver TV, Comentário Geral, Universo Pesquisa, Os
Caminhos do Yoga.

EDUCATIVO – Telecurso 2000, Telecurso 1º Grau, Telecurso 2º Grau, Telecurso


3º Grau, Globo Educação, Salto para o Futuro.

MUSICAL – Terra Nativa/CountryStar, Som Brasil, Ritmo Brasil, Furacão 2000, A


Grande Música, Conversa Afinada, Arraial Brasil, Especial – Parintins, Acervo MPB.

INFOCOMERCIAL – Programa Easy Rider, Pague Menos, Comerciais Variados.

HORÁRIO POLÍTICO – horário político eleitoral gratuito (permitido pela Lei No.
4.737, de 15 de julho de 1965).

UTILIDADE PÚBLICA – Brasil Eleitor, Mobilização Brasil.

CIÊNCIA, GEOGRAFIA E HISTÓRIA – Globo Ciência, Micro Macro, Caminhos


da Reportagem, A Oriente do Oriente, Repórter Eco.

DEBATE – Sem Censura, Espaço Público, Canal Livre.

DOCUMENTÁRIO/ CURTA – Curta Brasil DOC África, DOC Latino-Americano,


DOC TV Melhores, Curta Criança.
CULTURA – Diversidade Cultural, Revista do Cinema Brasileiro, Recorte
Cultural, Cultura Ponto a Ponto, Arte com Sérgio Britto, História da Música Brasileira.

Para facilitar a visualização desta classificação, foi associada visualmente uma cor
distinta a cada uma das 27 categorias ou tipos de programas. Os tipos de programas e
respectivas cores estão representados na tabela 5.2:
TABELA 5.2 – TIPOS DE PROGRAMAS E RESPECTIVAS CORES

TIPOS DE PROGRAMAS CORES


RELIGIOSO
INFOCOMERCIAL
INFANTIL
EVENTO ESPORTIVO
NOTICIÁRIO NACIONAL
NOTICIÁRIO LOCAL
NOTICIÁRIO ESPORTIVO
JORNALÍSTICO
POLICIAL
PROGRAMA DE AUDITÓRIO
GAME SHOW
NOVELAS
HUMORÍSTICO
ENTREVISTA
VARIEDADES
FILME
SÉRIE
REALITY SHOW
SEGMENTADOS
EDUCATIVO
MUSICAL
HORÁRIO POLÍTICO
UTILIDADE PÚBLICA
CIÊNCIA, HISTÓRIA E GEOGRAFIA
DEBATE
DOCUMENTÁRIO/ CURTA
CULTURA
Na Tabela 5.3 é apresentada a programação das emissoras comerciais exibidas
terça-feira (18/09/2007), apresentada na Tabela 5.1, colorida e classificada de forma
correspondente à categoria atribuída a cada programa:
TABELA 5.3 - CLASSIFICAÇÃO POR TIPOS DE PROGRAMAS – PROGRAMAÇÃO DA TV ABERTA - TERÇA-FEIRA
(18/09/2007)

EMISSORA

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDE TV BAND


05h05 Telecurso 05h Igreja M. Poder
05h00 2000 FORA DO AR Programação IURD Deus Igreja Viva
05h25 Telc. I /
05h35 Telc. 2 /
05h30 05h50 Telc. 3 FORA DO AR Programação IURD Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
06H00 06h05 Globo Rural 06h05 Jornal do SBT Programação IURD Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
06h30 Bom Dia São 06h45 São Paulo no
06H30 Paulo Jornal do SBT Ar Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
07h15 Bom Dia
07H00 Brasil 07h Carr. Animado São Paulo no Ar Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
07H30 Bom Dia Brasil Carrosel Animado 07h45 Fala Brasil Igreja M. Poder Deus 07h45 Novas Idéias
08H00 08H05 Mais Você Carrosel Animado Fala Brasil Igreja M. Poder Deus 08h15 Primeiro Jornal
08H30 Mais Você Carrosel Animado 08h30 Hoje em Dia Igreja M. Poder Deus 08h45 Copa Fut. Fem
09H00 Mais Você 09h Bom Dia & Cia Hoje em Dia 09h Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
09h26 Gnot. /
09h29 O Point do
09H30 Mickey Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
09h50 Sítio do
10H00 Picapau Amarelo Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
10H30 10h20 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Copa Fut. Fem
11H00 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher 10h50 Bem Família
11h45 TV Esporte
11H30 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Notícias 11h30 Jogo Aberto
12H00 12h SPTV Bom Dia & Cia 12h Debate Bola TV Esporte Notícias Jogo Aberto
12h45 Globo
12H30 Esporte Bom Dia & Cia Debate Bola TV Esporte Notícias Jogo Aberto
12h40 T.M. Odeia o 13h I. Universal do R. 13h São Paulo
13h00 13h15 Jornal Hoje Bom Dia & Cia Chris Deus Acontece
I. Universal do R. 13h30 Uma Família de
13h30 13h45 Vídeo Show Bom Dia & Cia T.M. Odeia o Chris Deus O.
13h15 A T. do Pica-
14h00 Vídeo Show 14h15 Chaves Pau 14h A Tarde é Sua 14h Mr. Bean
14h35 Da Cor do
14h30 Pecado 15h As V. da Raven 14h30 Hércules A Tarde é Sua 14h30 Atualíssima
15h30 Eu, a P. e as 15h Xena, a
15h00 Da Cor do Pecado Crianças Guerreira A Tarde é Sua Atualíssima
15h50 Filme: "Good
15h30 Burger" 16h Charme Xena, a Guerreira A Tarde é Sua Atualíssima
Filme: "Good 16h Programa da
16h00 Burger" Charme Tarde A Tarde é Sua 16h30 Márcia
Filme: "Good
16h30 Burger" Charme Programa da Tarde A Tarde é Sua Márcia
Filme: "Good
17h00 Burger" 17h A Usurpadora 17h Zorro 17h Igreja da Graça Márcia
17h30 17h37 Malhação A Usurpadora Zorro Igreja da Graça Márcia
18h Casos de
18h00 18h10 Eterna Magia Família 18h15 SP Record 18h Notícias das Seis 18h Brasil Urgente
18h30 Eterna Magia Casos de Família SP Record Notícias das Seis Brasil Urgente
18h45 A T. do Pica- 19h Encontro
19h00 19h SPTV 19h Chaves Pau Marcado Brasil Urgente
EMISSORA

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDE TV BAND


19h15 Novela II 19h45 Jornal da
19h30 Sete Pecados 19h25 Chiquititas Record Encontro Marcado 19h20 Jornal da Band
20h15 Jornal 20h15 Amigas e 20h Família
20h00 Nacional Rivais Jornal da Record 20h05 TV Fama Dinossauros
20h30 Jornal Nacional Amigas e Rivais 20h30 Luz do Sol TV Fama Família Dinossauros
20h55 Paraíso 21h15 Liga da 21h10 Rede TV
21h00 Tropical Justiça Luz do Sol News 21h Show da Fé
21h35 CC / SBT
21h30 Paraíso Tropical Brasil 21h30 Tudo a Ver Rede TV News Show da Fé
22h Casseta & 22h Caminhos do
22h00 Planeta Urgente! SBT Brasil Coração 22h05 Superpop 22h Vídeos Incríveis
22h25 C. Cf/ 22h30
22h35 Toma Lá, Dá Filme "Uma Saída de Caminhos do 22h15 A Grande
22h30 Cá Mestre" Coração Superpop Chance
Filme "Uma Saída de
23h00 Toma Lá, Dá Cá Mestre" 23h Simple Life Superpop A Grande Chance
23h25 Jornal da Filme "Uma Saída de 23h35 Leitura
23h30 Globo Mestre" Simple Life Dinâmica A Grande Chance
00h Programa do Filme "Uma Saída de 00h05 Programa
00h00 Jô Mestre" 00h CSI Miami Amaury Jr. 00h Jornal da Noite
00h45 Jornal 24
00h30 Programa do Jô 00h40 CC / J. SBT Horas Programa Amaury Jr. Jornal da Noite
00h45 A N. é uma
01h00 Programa do Jô Jornal do SBT Jornal 24 Horas Programa Amaury Jr. Criança
01h30 Intercine: 01h30 C. Café 01h15 Programação 01h30 Infocomerciai
01h30 "Kamchatka", /Série: Veronica Iurd s 01h45 Programa LBV
Filme/Intercine: Série: Veronica –
02h00 "Kamchatka" Mars Programação IURD Infocomerciais Programa LBV
Filme/Intercine: Série: Veronica –
02h30 "Kamchatka" Mars Programação IURD Infocomerciais 02h15 Igreja Viva
Filme/Intercine: 03h15 Série: Divisão 03h Caçadoras de 02h45 Igreja da
03h00 "Kamchatka" Criminal Relíquias Graça Igreja Viva
03h30 Filme: "A Série: Divisão Caçadoras de
03h30 Chave do Sucesso" Criminal Relíquias Igreja da Graça Igreja Viva
Filme: "A Chave do 04h15 Série Caçadoras de
04h00 Sucesso" Witchblade Relíquias Igreja da Graça Igreja Viva
Filme: "A Chave do Caçadoras de
04h30 Sucesso" Série Witchblade Relíquias Igreja da Graça Igreja Viva

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA A PARTIR DA GRADE DE PROGRAMAÇÃO DAS EMISSORAS PUBLICADA NO JORNAL FOLHA DE S.PAULO

O mesmo procedimento foi feito para a programação exibida pelas cinco emissoras
comerciais todos os dias das duas semanas analisadas (entre 16/09/2007 e 22/09/2007) e
(entre 22/06/2008 a 28/06/2008). A programação da TV Brasil na segunda semana (entre
22/06/2008 a 28/06/2008) foi classificada de acordo com as mesmas categorias (anexos 1 a
16).

Antes de prosseguir à categorização, faz-se necessário algumas ressalvas. A


primeira, diz respeito ao arrendamento dos horários de programação exibida durante a
madrugada pelas congregações religiosas (Igreja da Graça, Igreja Universal do Reino de
Deus, entre outras). Neste caso, a receita das emissoras não é vinculada à audiência dos
programas. As congregações pagam pela utilização dos horários de exibição um valor
superior à cotação cobradas pelas demais emissoras57.

A segunda ressalva diz respeito, novamente, aos custos de produção, ignorados,


como dito na seção teórica desta dissertação, no modelo de Steiner. As emissoras optam
por não exibir programação em determinados horários do dia (especialmente às
madrugadas), preferindo estar fora do ar, por considerarem que não há audiência mínima
de break-even que justifique a transmissão de programas. Nosso entendimento é que ambas
ressalvas, contudo, não comprometem as conclusões do estudo nos demais casos.

5.5.1 Padrões de homogeneização – o agendamento dos programas

A análise de diversidade de programação pode ser iniciada pelo estudo do


agendamento (scheduling) dos programas de TV pelas emissoras. Qual é o grau de
repetição de determinadas atrações? Existe uma padronização no horário de exibição dos
programas?

Em uma primeira avaliação, no recorte temporal de sete dias consecutivos, utilizado


como referência neste estudo, distinguem-se dois grandes grupos: a) a programação que
vai ao ar entre segunda-feira e sexta-feira, e b) a que vai ao ar no fim de semana (sábado e
domingo). Na programação das cinco emissoras analisadas, nota-se, no período entre
segunda-feira e sexta-feira, uma repetição na ordem de exibição dos programas a cada 24
horas. As exceções se concentram durante a programação exibida entre às 19 horas e às 22
horas, conhecido como “horário nobre” da TV, que costuma concentrar níveis de audiência
mais elevados. Neste horário, por vezes, são exibidos programas de periodicidade semanal.

A Tabela 5.3 mostra essa recorrência diária, na qual é apresentada a grade de


programação da Rede Globo de Televisão entre 17/09/2007 (segunda-feira) e 21/09/2007
(sexta-feira). Observa-se que a maior parte dos programas da emissora são repetidos a cada
24 horas, precisamente no mesmo horário do dia anterior:
TABELA 5.3 – PROGRAMAÇÃO REDE GLOBO - SEGUNDA (17/09) A SEXTA (21/09)

Horário REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO
SEGUNDA
17/09 TERÇA 18/09 QUARTA 19/09 QUINTA 20/09 SEXTA 21/09
05h05 Telecurso
2000 - Tecendo 05h05 Telecurso
05h00 o Saber 2000 05h05 Telecurso 2000 05h05 Telecurso 2000 05h05 Telecurso 2000
05h20 Telc. I / 05h25 Telc. I / 05h25 Telc. I / 05h35 05h25 Telc. I / 05h35 05h25 Telc. I / 05h35
05h30 05h35 Telc. 2 / 05h35 Telc. 2 / Telc. 2 / 05h50 Telc. 3 Telc. 2 / 05h50 Telc. 3 Telc. 2 / 05h50 Telc. 3

57
Revista Veja Edição 2029 – 10 de outubro de 2007 .
Horário REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO
SEGUNDA
17/09 TERÇA 18/09 QUARTA 19/09 QUINTA 20/09 SEXTA 21/09
05h50 Telc. 3 05h50 Telc. 3
06h05 Globo 06h05 Globo
06H00 Rural Rural 06h05 Globo Rural 06h05 Globo Rural 06h05 Globo Rural
06h30 Bom Dia 06h30 Bom Dia 06h30 Bom Dia São 06h30 Bom Dia São 06h25 Bom Dia São
06H30 São Paulo São Paulo Paulo Paulo Paulo
07h15 Bom Dia 07h15 Bom Dia
07H00 Brasil Brasil 07h15 Bom Dia Brasil 07h15 Bom Dia Brasil 07h15 Bom Dia Brasil
07H30 Bom Dia Brasil Bom Dia Brasil Bom Dia Brasil Bom Dia Brasil Bom Dia Brasil
08H00 Mais Você 08H05 Mais Você 08H05 Mais Você 08H05 Mais Você 08H05 Mais Você
08H30 Mais Você Mais Você Mais Você Mais Você Mais Você
09H00 Mais Você Mais Você Mais Você Mais Você Mais Você
09h28 Globo
Notícia / 09h31 09h26 Gnot. /
O Point do 09h29 O Point do 09h26 Gnot. / 09h29 O 09h26 Gnot. / 09h29 O 09h28 Gnot. / 09h31
09H30 Mickey Mickey Point do Mickey Point do Mickey O Point do Mickey
09h50 Sítio do 09h50 Sítio do 09h50 Sítio do Picapau 09h50 Sítio do Picapau 09h50 Sítio do
10H00 Picapau Picapau Amarelo Amarelo Amarelo Picapau Amarelo
10H30 10h20 TV Xuxa 10h20 TV Xuxa 10h20 TV Xuxa 10h20 TV Xuxa 10h20 TV Xuxa
11H00 TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa
11H30 TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa TV Xuxa
12H00 12h SPTV 12h SPTV 12h SPTV 12h SPTV 12h SPTV
12h45 Globo 12h45 Globo
12H30 Esporte Esporte 12h45 Globo Esporte 12h45 Globo Esporte 12h45 Globo Esporte
13h15 Jornal 13h15 Jornal
13h00 Hoje Hoje 13h15 Jornal Hoje 13h15 Jornal Hoje 13h15 Jornal Hoje
13h45 Vídeo 13h45 Vídeo
13h30 Show Show 13h45 Vídeo Show 13h45 Vídeo Show 13h45 Vídeo Show
14h00 Vídeo Show Vídeo Show Vídeo Show Vídeo Show Vídeo Show
14h35 Da Cor do 14h35 Da Cor do 14h35 Da Cor do 14h35 Da Cor do
14h30 Pecado Pecado Pecado 14h35 Da Cor do Pecado Pecado
Da Cor do
15h00 Pecado Da Cor do Pecado Da Cor do Pecado Da Cor do Pecado Da Cor do Pecado
15h35 Filme: 15h50 Filme:
"Um Príncipe 15h50 Filme: "Caçadoras de 15h55 Filme:"Billy 15h55 Filme:"Coração
15h30 em Minha Vida" "Good Burger" Aventuras Madison" de Dragão
Filme: "Um
Príncipe em Filme: "Good Filme: "Caçadoras de Filme:"Coração de
16h00 Minha Vida" Burger" Aventuras Filme:"Billy Madison" Dragão
Filme: "Um
Príncipe em Filme: "Good Filme: "Caçadoras de Filme:"Coração de
16h30 Minha Vida" Burger" Aventuras Filme:"Billy Madison" Dragão
Filme: "Um
Príncipe em Filme: "Good Filme: "Caçadoras de Filme:"Coração de
17h00 Minha Vida" Burger" Aventuras Filme:"Billy Madison" Dragão
17h33 17h34
17h30 17h37 Malhação 17h37 Malhação 17h37 Malhação Gnot./17h37 Malhação Gnot./17h37 Malhação
18h10 Eterna 18h10 Eterna
18h00 Magia Magia 18h10 Eterna Magia 18h10 Eterna Magia 18h10 Eterna Magia
18h30 Eterna Magia Eterna Magia Eterna Magia Eterna Magia Eterna Magia
19h00 19h SPTV 19h SPTV 19h SPTV 19h SPTV 19h SPTV
19h15 Novela II
Sete Pecados 19h15 Novela II 19h15 Novela II Sete 19h15 Novela II Sete 19h20 Novela II Sete
19h30 (19h15) Sete Pecados Pecados (19h15) Pecados (19h15) Pecados
20h15 Jornal
Nacional 20h15 Jornal
20h00 (20h15) Nacional 20h15 Jornal Nacional 20h15 Jornal Nacional 20h15 Jornal Nacional
20h30 HORÁRIO
20h30 Jornal Nacional Jornal Nacional Jornal Nacional POLÍTICO Jornal Nacional
20h55 Paraíso 20h55 Paraíso 20h55 Paraíso
21h00 Tropical Tropical 21h05 Paraíso Tropical 20h40 Jornal Nacional Tropical
Horário REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO REDE GLOBO
SEGUNDA
17/09 TERÇA 18/09 QUARTA 19/09 QUINTA 20/09 SEXTA 21/09
21h05 Paraíso
21h30 Paraíso Tropical Paraíso Tropical 21h30 Futebol 2007 Tropical Paraíso Tropical
22h00 Filme:
"Kill Bill - 22h Casseta &
22h00 Volume 2" (22h) Planeta Urgente! Futebol 2007 21h15 A Grande Família 22h Globo Repórter
Filme: "Kill Bill - 22h35 Toma Lá,
22h30 Volume 2" Dá Cá Futebol 2007 A Grande Família Globo Repórter
Filme: "Kill Bill -
23h00 Volume 2" Toma Lá, Dá Cá Futebol 2007 23h Linha Direta 23h Antônia
Filme: "Kill Bill - 23h25 Jornal da 23h45 Jornal da
23h30 Volume 2" Globo 23h45 Jornal da Globo 23h40 Jornal da Globo Globo
Filme: "Kill Bill - 00h Programa
00h00 Volume 2" do Jô Jornal da Globo Jornal da Globo Jornal da Globo
00h25 Jornal da
00h30 Globo Programa do Jô 00h20 Programa do Jô 00h15 Programa do Jô 00h15 Programa do Jô
01h
01h00 Programa do Jô Programa do Jô Programa do Jô Programa do Jô Programa do Jô
01h30 Intercine: 01h30 Som Brasil -
01h30 Programa do Jô "Kamchatka", Programa do Jô Programa do Jô Ivan Lins
01h50 Intercine: "A
Idade da Violência", "O
Filme/Intercine: Retorno de Tom Sawye 01h40 Intercine: 02h15 Intercine:
02h00 Programa do Jô "Kamchatka" e ..." "Cocoon", "Piquenique" "Frida", "Rollerball"
Intercine: "A Idade da
02h30 Filme: Filme/Intercine: Violência", "O Retorno Intercine: "Cocoon", Intercine: "Frida",
02h30 "Eu, Tu, Eles" "Kamchatka" de Tom Sawye e "Piquenique" "Rollerball"
Intercine: "A Idade da
Filme:"Eu, Tu, Filme/Intercine: Violência", "O Retorno Intercine: "Cocoon", Intercine: "Frida",
03h00 Eles" "Kamchatka" de Tom Sawye e "Piquenique" "Rollerball"
03h30 Filme: "A
Filme:"Eu, Tu, Chave do 03h40 Filme: "Grande 03h45 Filme: "Sounder - Intercine: "Frida",
03h30 Eles" Sucesso" Problema" Lágrimas de Esperança" "Rollerball"
Filme:"Eu, Tu, Filme: "A Chave Filme: "Grande Filme: "Sounder - Intercine: "Frida",
04h00 Eles" do Sucesso" Problema" Lágrimas de Esperança" "Rollerball"
Filme:"Eu, Tu, Filme: "A Chave Filme: "Grande Filme: "Sounder - 04h25 Filme: "A Ilha
04h30 Eles" do Sucesso" Problema" Lágrimas de Esperança" no Topo do Mundo
FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA A PARTIR DA GRADE DE PROGRAMAÇÃO DAS EMISSORAS – FOLHA DE S.PAULO

Entre segunda-feira e sexta-feira, as programações das demais emissoras (SBT,


Record, RedeTV e RedeBand) reproduzem, em linhas gerais, o padrão de repetição diária
verificado na programação da Rede Globo (anexos 2 a 6). O nível de recorrência não é
perfeito, já que a transmissão da programação de determinado dia não corresponde
exatamente ao mesmo conteúdo veiculado no dia anterior, mas ao mesmo tipo de
programa.

Exemplo: a Rede Globo de Televisão exibiu no dia 18/09 (terça-feira), às 3h30


minutos, o filme “A Chave do Sucesso”. No dia seguinte (19/09), quarta-feira, no mesmo
horário, a emissora exibiu o filme “Grande Problema”. Ambos fazem parte da mesma
categoria “Filmes”, embora sejam obras diferentes. A exibição de filmes do catálogo da
Rede Globo, aliás, é um padrão observado na grade de programação da emissora durante a
madrugada, diariamente.
O mesmo ocorre com a transmissão de novelas, telejornais, seriados e outros
programas de televisão. Na segunda-feira (17/09/2007), a Rede Globo exibiu, às 18h30
minutos, um capítulo da novela “Eterna Magia”. O capítulo seguinte da mesma novela foi
exibido, no mesmo horário, no dia seguinte 18/09/2007, e nos demais dias subseqüentes até
o sábado (22/09/2007). Os capítulos, evidentemente, não são os mesmos, mas permanecem
o formato dos programas, com edições consecutivas que preservam as características de
linguagem, apresentadores e/ou personagens presentes nas edições já exibidas. Os horários
de exibição também são repetidos diariamente.

Observa-se, ainda, entre segunda-feira e sexta-feira, a predominância de programas


exibidos diariamente durante a programação. Na Rede Globo, por exemplo, os programas
de periodicidade semanal exibidos pela emissora somam apenas 6,5 horas do total de 120
horas de programação exibidas pela emissora entre a segunda-feira e a sexta-feira, o
equivalente a 5% da programação. O restante é ocupado por programas com periodicidade
de exibição diária. Entre os programas semanais, estão “Casseta&Planeta”, transmitido na
terça-feira (18/09) entre às 22 horas e 22h35 minutos e o programa Grande Família,
exibido na quinta-feira (20/09) entre às 22h15 às 23h. O mesmo pode ser observado nas
grades de programação das demais emissoras, nas quais predomina a exibição de
programas com periodicidade diária (anexos 2 a 6).

O padrão de agendamento diário na Rede Globo é observado nas demais emissoras


(anexos 2 a 6). Observa-se que a grade de programação das emissoras repete um ciclo de
agendamento, reproduzido diariamente, na maior parte dos casos, e, em menor escala, em
ciclos semanais, como o programa “Casseta&Planeta”. As mudanças na grade de
programação costumam ser graduais, com sutis alterações, que podem compreender a
extinção, a criação de novos programas, alterações de horário, entre outras reformatações.
De forma geral, predomina o ciclo de repetição dos horários dos programas nos moldes
conhecidos.

Esse padrão revela uma inércia, ou condicionamento, no horário de configuração da


grade de programação de TV. A programação da semana corrente tende a ser semelhante a
que foi exibida na semana anterior e a programação da semana seguinte, da mesma forma,
tenderá a ser semelhante à programação de TV da semana corrente. Por este ângulo, a
análise da dimensão de agendamento (scheduling) revela uma tendência à repetição e
homogeneização da programação de televisão.
Alterações radicais na grade de programação dificilmente ocorrem em grande
escala em uma só oportunidade. Do contrário, é comum notar atrações de televisão que
persistem sendo exibidas durante anos. Um exemplo é o programa Fantástico, da Rede
Globo, que vai ao ar nas noites de domingo desde sua estréia, em 1974. Em que pesem as
repaginações estéticas, o formato do programa tem mantido suas características principais,
marcadas por um jornalismo de variedades, ou de “revista eletrônica”, como define a
página eletrônica da Rede Globo.

Esse fenômeno inercial também está relacionado à longevidade artística de


profissionais de televisão como Hebe Camargo, uma das pioneiras apresentadoras da
televisão brasileira, que apresenta um programa cujo formato não sofreu significativas
alterações desde suas primeiras exibições, em 1966. Há outros exemplos na televisão
brasileira e mundial desse fenômeno de inercialidade do agendamento da programação.

Essa padronização não é necessariamente negativa para o mercado de televisão. Há


aspectos positivos – o agendamento cíclico da programação corrige assimetrias de
informação no mercado de TV e permite que produtores e telespectadores coordenem
expectativas. Com o entendimento da lógica de exibição periódica das atrações, ambos se
adaptam ao horário da programação, maximizando, possivelmente, o público interessado
em determinado tipo programa.

A repetição contínua permite, por exemplo, satisfazer consumidores que não


tiveram oportunidade de assistir o programa em horários de exibição anteriores58. Para
efeito de simplificação, contudo, a literatura tem considerado que a utilidade marginal do
programa de TV decresce com o número de exibições, com base na hipótese que o público
interessado tende a diminuir à medida que a programação é exibida novamente.

5.5.1 Padrões de homogeneização – tipos de programas

Além do agendamento dos programas, outra dimensão importante da oferta de


programação de TV é a categoria ou o tipo dos programas exibidos pelas emissoras. A
análise desta dimensão é o foco desta dissertação e a partir desses conceitos será discutido
o nível de diversidade da programação da TV comercial no Brasil.

58
O capítulo final das telenovelas produzidas pela Rede Globo, por exemplo, costuma ser repetido
dois dias consecutivos.
Este exercício propõe o cálculo do coeficiente de diversidade da programação, com
base na fórmula proposta por Steiner (1952). O coeficiente foi calculado com base nos
dados de programação das cinco principais emissoras comerciais brasileiras. Este será o
indicador referencial do nível de oferta de programação transmitida aos telespectadores, e
permitirá comparações com estimativas do ótimo de bem-estar social, teoricamente
desenvolvido no capítulo 4.

No primeiro exercício, verifica-se a existência de falhas de mercado em termos de


oferta de programação na TV comercial brasileira, a partir do cálculo do coeficiente de
diversificação da programação exibida durante a semana analisada. A amostra considerada
será a programação de TV transmitida na semana entre 16/09/2007 a 22/09/2007. O
resultado é contrastado com o nível ótimo de diversidade para o modelo com cinco
emissoras apresentado no capítulo 4.

No segundo exercício, é feita uma análise comparativa entre o resultado do


coeficiente de diversificação obtido na primeira semana com o coeficiente de
diversificação do mercado de TV registrado após o início das transmissões da TV Brasil
(emissora pública federal). O objetivo é investigar de que maneira a presença da emissora
pública interfere no mercado de TV em relação ao nível de oferta de programação. Neste
segundo exercício, a semana de amostra referencial é a programação transmitida entre os
dias 22/06/2008 a 28/06/2008.

No primeiro exercício (que avalia apenas as emissoras comerciais), cada uma das
cinco emissoras analisadas (Rede Globo, SBT, Rede Record, RedeTV e Rede Band) é
responsável por um único e exclusivo canal e fixa sua grade de programação ao longo das
24 horas do dia. Durante o período de sete dias analisado, cada emissora teve 168 horas
disponíveis para preenchimento da grade de programação. As cinco emissoras totalizam,
portanto, uma programação semanal de 840 horas. Diariamente, a televisão brasileira
exibe, nestes cinco canais, 120 horas de programação.

Como dito, cada programa exibido pelas cinco emissoras foi classificado em apenas
uma das 27 categorias de programas. O tipo de programa mais exibido na televisão
comercial brasileira é o Religioso, com uma soma total de 139 horas de programação, ou
16,55% da oferta disponível de programação durante a semana analisada (Tabela 5.4). A
transmissão desse tipo de programa concentra-se durante as madrugadas em três emissoras:
Record, RedeTV e Rede Band (anexos 1 a 7).
TABELA 5.4 – TIPOS DE PROGRAMAS EXIBIDOS PELAS EMISSORAS DE TV COMERCIAIS (EM HORAS TRANSMITIDAS)

Programação das Emissoras DIAS

(Globo, SBT, Record, 16/09 17/09 18/09 19/09 20/09 21/09 22/09 Semana
RedeTV, Band)
TIPOS DE Dom Seg Ter Qua Qui Sex Sáb Total (%)
PROGRAMAS (h)

RELIGIOSO 18,5 20,5 18 21 21 19,5 20,5 139 16,55%

VARIEDADES 1 24 20 21,5 21 23 5 115,5 13,75%

INFANTIL 7,5 15,5 13 14 13 13,5 14 90,5 10,77%

FILME 18,5 7 7,5 6,5 7 7 11,5 65 7,74%

NOTICIÁRIO 0 11,5 13 10 12 13 4,5 64 7,62%


NACIONAL
NOVELA 0 10,5 8,5 8 7 8,5 6 48,5 5,77%

SÉRIE 5 6 12,5 11 10,5 12,5 3,5 61 7,26%

PROGRAMAS DE 13 3 1,5 1,5 2 1 12,5 34,5 4,11%


AUDITÓRIO
NOTICIÁRIO 5,5 3 4,5 4,5 3,5 3,5 6,5 31 3,69%
ESPORTIVO
EVENTO ESPORTIVO 11,5 0 2,5 5 2 0 7 28 3,33%

ENTREVISTA 1 2,5 3,5 3,5 3,5 3,5 4,5 22 2,62%

INFOCOMERCIAL 11,5 1,5 1,5 0 1 1 5 21,5 2,56%

NOTICIÁRIO LOCAL 0 3,5 4 3,5 3,5 3,5 1 19 2,26%

JORNALÍSTICO 6 2 1 3 2,5 2 0,5 17 2,02%

GAME SHOW 5 3,5 1,5 1 0 0 6 17 2,02%

HUMORÍSTICO 4 0 2,5 0,5 1,5 1 3,5 13 1,55%

SEGMENTADO 8 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 1 11,5 1,37%

POLICIAL 0 3 1,5 1,5 2 1,5 0,5 10 1,19%

FORA DO AR 2 1 1 1 1 1 2 9 1,07%

EDUCATIVO 0 1 1 1 1 1 0,5 5,5 0,65%

MUSICAL 0 0 0 0 0 2,5 3,5 6 0,71%

HORÁRIO POLÍTICO 0 0 0 0 2,5 0 0 2,5 0,30%

REALITY SHOW 1 0 1 0 0 0 0 2 0,24%

CULTURA 0 0 0 0 0 0 0 0 0,00%

UTILIDADE PÚBLICA 0 0 0 0 0 0 0 0 0,00%


Programação das Emissoras DIAS

(Globo, SBT, Record, 16/09 17/09 18/09 19/09 20/09 21/09 22/09 Semana
RedeTV, Band)
DEBATE 1 0 0 0 0 0 0 1 0,12%

CIÊNCIA, GEOGRAFIA 0 0 0 0 0 0 0,5 0,5 0,06%


E HISTÓRIA
DOCUMENTÁRIO/ 0 0 0 0 0 0 0 0 0,00%
CURTA
TOTAL DE HORAS 120 120 120 120 120 120 120 840 100,00%

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA, COM BASE NA PROGRAMAÇÃO PUBLICADA NA FOLHA DE S.PAULO

A segunda categoria mais exibida pelas emissoras de TV aberta são os programas


de Variedades, que totalizam 115,5 horas de programação, ou 13,75% da programação
exibida durante a semana. Em terceiro lugar, estão os programas Infantis, que somam 90,5
horas de programação exibida, ou 10,95% do total de horas ofertadas. Das cinco emissoras
principais emissoras comerciais, apenas a RedeTV não exibe programação infantil. Os
programas desta categoria se concentram no período matutino, mas são exibidos no
período vespertino e também no período noturno.

Nota-se que a programação da TV aberta comercial está concentrada em um grupo


seleto de categorias de programas. Oito tipos de programas (Religioso, Variedades,
Infantil, Filme, Noticiário Nacional, Novela, Série e Programas de Auditório) totalizam
618 horas de programação, o correspondente 73,5% da oferta de programação de TV
durante a semana. O demais 20 tipos de programas representam apenas 26,5% da
programação de TV aberta, ou 222 horas de programação da mesma semana. Este
equilíbrio estará abaixo do ótimo se a demanda por diversificação for superior à
diversificação observada.

5.5.3 Homogeneização e Duplicação da Programação

As emissoras formatam a grade de programação com foco nos maiores nichos de


audiência em determinados horários do dia. Com objetivo de buscar a audiência dos
programas mais populares, preferem, muitas vezes, reproduzir tipos de programas
ofertados pelas demais a exibir alternativas diferentes. Não há necessariamente
preocupação em distinguirem-se da programação exibida por outras emissoras, ou evitar a
reprodução de “mais do mesmo”. A assimetria de informações e a aversão ao risco
intrínsecas ao mercado de TV aberta reforçam o viés de padronização.

Esse mecanismo de incentivo induz ao fenômeno da homogeneização da


programação, discutido teoricamente no capítulo quatro. Um exemplo é a configuração da
grade de programação matutina das cinco emissoras de televisão aberta exibida na quarta-
feira (19/09/2007) apresentada na Tabela 5.5. Neste período do dia, a maior parte da
audiência é formada pelo público infantil e feminino. Notam-se dois conjuntos de tipos de
programas de TV. O primeiro conjunto, formado pelas emissoras Rede Globo e SBT,
predomina a oferta de noticiários (local e nacional) entre 6h e 8h seguida de programação
infantil até as 12h. O segundo conjunto, formado pelas emissoras Record, RedeTV e Band,
se concentra em exibir programas Religiosos, no início da manhã, e de Variedades, em
seqüência. Na Tabela 5.5:
TABELA 5.5 – PROGRAMAÇÃO MATUTINA DE QUARTA-FEIRA (19/09)

QUARTA EMISSORAS

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDE TV BAND


05h05 Telecurso 05h Igreja M. Poder
05h00 2000 FORA DO AR Programação IURD Deus Igreja Viva
05h25 Telc. I /
05h35 Telc. 2 /
05h30 05h50 Telc. 3 FORA DO AR Programação IURD Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
06h05 Jornal do
06H00 06h05 Globo Rural SBT Programação IURD Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
06h30 Bom Dia São Jornal do SBT /
06H30 Paulo Câmera Café Programação IURD Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
06h55 C.Café /
07h15 Bom Dia 07h Carrosel
07H00 Brasil Animado 06h45 São Paulo no Ar Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
07H30 Bom Dia Brasil Carrosel Animado São Paulo no Ar Igreja M. Poder Deus Igreja Viva
08h00 Novas
08H00 08H05 Mais Você Carrosel Animado 07h50 Fala Brasil Igreja M. Poder Deus Idéias
08h30 Primeiro
08H30 Mais Você Carrosel Animado 08h40 Hoje em Dia Igreja M. Poder Deus Jornal
09h Bem
09H00 Mais Você 09h Bom Dia & Cia Hoje em Dia 09h Bom Dia Mulher Família
09h26 Gnot. /
09h29 O Point do
09H30 Mickey Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Bem Família
09h50 Sítio do
10H00 Picapau Amarelo Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Bem Família
10H30 10h20 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Bem Família
11H00 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Bom Dia Mulher Bem Família
11h45 TV Esporte 11h30 Jogo
11H30 TV Xuxa Bom Dia & Cia Hoje em Dia Notícias Aberto
12H00 12h SPTV Bom Dia & Cia 12h Debate Bola TV Esporte Notícias Jogo Aberto
12h45 Globo 12h40 T. M. Odeia o
12H30 Esporte Bom Dia & Cia Chris TV Esporte Notícias Jogo Aberto
FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA, A PARTIR DA PROGRAMAÇÃO DAS EMISSORAS
Observa-se que o viés de homogeneização é reforçado em determinados períodos,
nos quais aumentam o nível de repetição e padronização da programação. Na manhã de
quarta-feira (19/09/2007) o telespectador que assistisse a televisão aberta entre às 9h30
minutos e às 11 horas, embora tivesse à disposição cinco canais, teria apenas duas opções
de programação disponíveis: programas Infantis - TV Xuxa” (Rede Globo) e Bom Dia e
Cia (SBT) - ou de Variedades - Hoje em Dia (Rede Record), Bom Dia Mulher (RedeTV) e
Bem Família (Rede Band).

Ao final da manhã, o nível de diversidade seria ainda menor: no horário entre


11h30 minutos e 13 horas, a TV aberta a programação se dedica à exibição de noticiários
esportivos. Neste período, quatro das cinco emissoras transmitem programas dessa
categoria: Globo Esporte (Rede Globo), Debate Bola (Rede Record), Esporte Notícias
(RedeTV) e Jogo Aberto (Rede Band). Apenas o SBT não exibe noticiário esportivo nesse
horário. O espectador que não for fã de esporte (na maior parte futebol), melhor não ligar a
TV.

Recortes de outros períodos da programação de TV durante as semanas analisadas


permitem observar padrões semelhantes de homogeneização (vide anexos 1 a 16). O
fenômeno sempre é induzido pela disputa dos canais comerciais pelos principais nichos de
audiência em determinados horários.

5.5.1 Caso concreto I: a ascensão da Record

Um exemplo do incentivo do mercado à homogeneização da programação pode ser


explicado pela recente ascensão da Rede Record na participação da audiência de televisão.
A partir de 2007, a Record passou a rivalizar com o SBT pela segunda posição entre as
emissoras mais assistidas. Segundo dados do Ibope, em setembro de 2007, a média diária
de pontos da emissora ficou em 4,94 pontos, contra 4,96 do SBT. Em alguns momentos da
programação, a emissora chegou a disputar o primeiro lugar da preferência dos
telespectadores com a líder Rede Globo, que naquele mês teve média de 15,52 pontos
diários (Tabela 5.6):
TABELA 5.6 – MÉDIA DE PONTOS DIÁRIOS NO IBOPE – SETEMBRO/2007

Audiência Domiciliar (% dos Audiência Domiciliar (em mil)


televisores)

Total 32,92 5.847


Televisores Ligados

Bandeirantes 1,98 351


Pública 0,60 107

Globo 15,52 2.757

Rede Tv! 0,77 137

Record 4,94 877

SBT 4,96 882

FONTE: IBOPE TELEREPORT

A ascensão da Record no Ibope é notada nos últimos anos, depois de uma mudança
da estratégia de programação da emissora a partir de 200459. Antes concentrada na
exibição de programas do tipo religioso (que ainda preenchem boa parte da grade de
programação, principalmente às madrugadas), e na opção de fórmulas de baixo custo, a
Record decidiu reorientar sua programação. Uma das mudanças recentes é a de reproduzir
formatos de sucesso já testados pela emissora de maior audiência, a Rede Globo.

O objetivo é disputar os principais segmentos de audiência, outrora atendidos pela


programação da concorrente. São exemplos dessa estratégia a exibição de atrações como
“Domingo Espetacular”, programa jornalístico com formato de “revista eletrônica”
semelhante ao do “Fantástico” (Rede Globo), que vai ao ar no mesmo dia da semana do
concorrente (aos domingos) em horários muito próximos. Dois dos três apresentadores do
“Domingo Espetacular”, os jornalistas Paulo Henrique Amorim e Janine Borba, tiveram
passagem anterior pela Globo.

O recrutamento de profissionais da concorrente é outra característica desse modelo


de “clonagem da Rede Globo”60, como definiu reportagem da Revista Veja. Durante a
semana de programação analisada, a novela exibida às 22 horas pela Record, “Caminhos
do Coração”, tem no casting atores egressos do núcleo de dramaturgia da Rede Globo.
Telejornais e programas humorísticos da emissora também contam com profissionais
provenientes da outra emissora.

Outro eixo dessa estratégia é o maior investimento na qualidade da produção de


televisão, para concorrer em qualidade técnica à produção da Rede Globo,
tradicionalmente tida como uma das razões pela liderança da emissora em audiência ao

59
Revista Veja Edição 2029 – 10 de outubro de 2007.
60
Idem.
longo das últimas décadas61. A elevação da audiência da Rede Record reforça a percepção
de que há um forte incentivo do mercado para repetir fórmulas de sucesso e direcionar a
programação para os maiores nichos de audiência, em detrimento dos demais.

5.5.2 Caso Concreto II: transmissão de s eventos esportivos ou de grande


audiência

Outro exemplo característico do incentivo à homogeneização da programação pode


ser observado na transmissão de grandes eventos esportivos pela televisão por
radiodifusão. As emissoras de TV costumam transmitir um mesmo evento de grande
popularidade, em horário idêntico, a optarem pela exibição de outros tipos de programas de
TV. Isso é verificado durante a exibição de partidas da seleção brasileira de futebol,
cerimônias de abertura de eventos esportivos e mesmo partidas idênticas do campeonato
brasileiro de futebol, em que pesem restrições contratuais 62.

A audiência nesses casos costuma ser tão elevada que se torna interessante para
diferentes emissoras transmitirem os mesmos programas de TV, sem preocupação com a
oferta de diversidade. Ao espectador, a oferta de imagens disponível se torna muito
semelhante – cabendo às emissoras concorrentes tentar alguma diferenciação investindo
em edição, apresentação, narração e jornalismo de apoio, entre uma ou outra programação
acessória, que ainda sim repete padrões adotados no mercado de TV.

O fenômeno corrobora as conclusões do Modelo de Steiner, que prevê o incentivo à


duplicação de programas na TV aberta, especialmente se observado que a audiência do
programa mais assistido é muito maior que a dos demais programas na escala de audiência.
Sob esta condição, existe uma forte tendência dos canais a exibir o mesmo programa em
detrimento de outras opções.

61
O nome da emissora ficou associado a um padrão mais elevado de produção televisiva no
mercado de TV que deu origem à expressão “Padrão Globo de Qualidade”, porque haveria apuro técnico que
a diferenciaria das demais emissoras de TV.
62
A Rede Globo, que atualmente detém os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro,
costuma fechar contratos de retransmissão de jogos de futebol com outras emissoras com cláusulas que
interferem na decisão de programação das concorrentes. Por vezes, é exigida a transmissão de imagens da
mesma partida exibida pela Globo naquele horário respectivo. Neste caso, a diferença entre as transmissões
se resumiria à edição de imagens, aos narradores e comentaristas de apoio às transmissões, entre outras
características acessórias.
5.6 Coeficiente de Diversificação – caso brasileiro

A classificação dos programas de TV durante a semana analisada fundamentou o


cálculo do coeficiente de diversidade da programação da televisão aberta brasileira, com
base no proposto por Steiner (1952). Este coeficiente, antes de configurar um indicador
absoluto da oferta de diversidade, tem utilidade primordial de referência, com objetivo de
ilustrar de forma empírica o problema postulado teoricamente.

No caso brasileiro, o coeficiente de Steiner, designado pela letra α, na versão para


cinco emissoras, é calculado a partir da equação:

Onde x é o total de tipos ou categorias de programas diferentes.

Como mencionado, neste exercício, o cálculo do coeficiente é controlado pela


dimensão tempo, não considerada por Steiner no modelo original. A razão é a possibilidade
de comparações intertemporais de diversidade. Desta forma, o coeficiente foi calculado
para cada período de 30 minutos da programação diária das cinco emissoras, ao longo dos
sete dias da semana em estudo.

O coeficiente depende da oferta total de canais (invariavelmente cinco, neste


exercício) e da variedade de tipos de programas disponíveis no período de análise. Em
cada dia, também foi estimado uma média diária do índice, bem como a oferta total média
de tipos de programas em cada período

O coeficiente pode variar de 0 a 1. O valor 0 representa um cenário de mínima


diversidade, no qual os cinco canais analisados transmitem o mesmo tipo de programa no
referido período de 30 minutos. O coeficiente no valor 1 representa o máximo de
diversidade possível, ou seja, os cinco canais transmitem cinco tipos programas diferentes
no mesmo momento.

Como exemplo, apresenta-se a programação transmitida na segunda-feira


(17/09/2007) no período entre 20h-20h30 (ver anexo 2). Naquele período, as cinco
emissoras comerciais exibiram três tipos de programas diferentes: 1) Noticiário Nacional -
Jornal Nacional (Globo), Jornal da Record (Record) e Jornal da Band (Band); 2) Novela -
Chiquitas (SBT) e 3) Variedades - TV Fama (RedeTV). O nível de duplicação no período é
2 (dois), já que o programa do tipo Noticiário Nacional é ofertado por três emissoras. O
coeficiente de diversidade para segunda-feira 17/09, às 20h-20h30, é de 0,5. Em termos
ilustrados na Tabela 5.7:
TABELA 5.7 – PROGRAMAÇÃO 17/09/2007 – SEGUNDA-FEIRA – HORÁRIO (20H-20H30)

Horário REDE GLOBO SBT RECORD REDE TV BAND

20h15 Jornal 20h Jornal da 19h20 Jornal da


20h00 Nacional 20h Chiquititas Record 19h50 TV Fama Band

LEGENDA DE CORES

TIPOS DE NOTICIÁRIO VARIEDADES NOVELA


PROGRAMAS NACIONAL

CORES

COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO - 17/09/2007 – SEGUNDA-FEIRA – HORÁRIO (20H-20H30)

Tipos de Coeficiente de
Total de Emissoras Programas Nível de Duplicação Diversificação

Horário

20h00 5 3 2 0,5
FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

A grade de programação das duas semanas selecionadas classificadas por tipo e o


cálculo dos coeficientes de diversidade por período são apresentados nos anexos 1 a 16
desta dissertação. Na Tabela 5.8, apresenta-se o cálculo do coeficiente médio de
diversificação com base na programação total de TV de quarta-feira, dia 19/09/2007
(anexo 4):
TABELA 5.8- COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO DA PROGRAMAÇÃO DE TV – QUARTA-FEIRA (19/09/2008)

EMISSORAS (J) TIPOS DE DUPLICAÇÃO COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO


PROGRAMAS (X) (0-1)
Horário
05h00
5 2 3 0,25
05h30
5 2 3 0,25
06H00
5 3 2 0,5
06H30
5 3 2 0,5
07H00
5 4 1 0,75
07H30
5 4 1 0,75
EMISSORAS (J) TIPOS DE DUPLICAÇÃO COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO
PROGRAMAS (X) (0-1)
08H00
5 4 1 0,75
08H30
5 4 1 0,75
09H00
5 2 3 0,25
09H30
5 2 3 0,25
10H00
5 2 3 0,25
10H30
5 2 3 0,25
11H00
5 2 3 0,25
11H30
5 3 2 0,5
12H00
5 3 2 0,5
12H30
5 3 2 0,5
13h00
5 5 0 1
13h30
5 4 1 0,75
14h00
5 3 2 0,5
14h30
5 3 2 0,5
15h00
5 3 2 0,5
15h30
5 3 2 0,5
16h00
5 4 1 0,75
16h30
5 4 1 0,75
17h00
5 5 0 1
17h30
5 4 1 0,75
18h00
5 4 1 0,75
18h30
5 5 0 1
19h00
5 4 1 0,75
19h30
5 4 1 0,75
20h00
5 3 2 0,5
20h30
5 4 1 0,75
21h00
5 4 1 0,75
21h30
5 5 0 1
22h00
5 4 1 0,75
22h30
5 4 1 0,75
EMISSORAS (J) TIPOS DE DUPLICAÇÃO COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO
PROGRAMAS (X) (0-1)
23h00
5 4 1 0,75
23h30
5 5 0 1
00h00
5 4 1 0,75
00h30
5 2 3 0,25
01h00
5 2 3 0,25
01h30
5 4 1 0,75
02h00
5 4 1 0,75
02h30
5 3 2 0,5
03h00
5 3 2 0,5
03h30
5 3 2 0,5
04h00
5 3 2 0,5
04h30
5 3 2 0,5
MÉDIA DIÁRIA
5 3,42 1,58 0,604

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

Verifica-se que o coeficiente médio de diversidade da TV registrado na quarta-feira


é de 0,604, abaixo do nível ótimo (que, como dito, seria um coeficiente de valor 1). Em
média, os cinco canais abertos oferecem pouco mais de três tipos de programas diferentes
em cada período de 30 minutos analisado (3,42) programas/horário. A menor oferta de
diversidade disponível ocorre no início da programação (entre 5h e 6h da manhã, no qual
predominam os programas religiosos – Record, RedeTV e BAnd exibem programas desse
tipo no horário; a Globo um programa educativo e o SBT está fora do ar). Neste período o
coeficiente médio é de 0,25. O período da madrugada também apresenta coeficiente de
diversidade inferior, de 0,5, resultado da exibição de programas religiosos e antigos filmes
do catálogo das emissoras e séries norte-americanas.

Nota-se a presença de, em média, ao menos um grau de repetição ou de


padronização da programação de quarta-feira. O grau de duplicação (D) médio observado
foi de 1,58.

Em apenas cinco momentos durante a programação é observado o nível máximo de


oferta de diversidade: (1) entre 13h-13h30; (2) 17h-17h30 (3) 18h30-19h00; (3) 21h30-22h
e 4) entre 23h30-00h00. No período compreendido entre 13h-13h30, por exemplo, foram
transmitidos cinco tipos de programas diferentes (noticiário nacional, infantil, série,
programa religioso e noticiário local, como observa-se no anexo 4).

O aumento de diversidade nesses períodos, que se reproduz nos demais dias


analisados, pode estar relacionado aos picos de elevação da audiência de televisão. Dos
cinco períodos de maior diversidade, três se concentram durante o “horário nobre” (18h-
22h) da TV, no qual se costumam registrar níveis mais elevados de audiência. O mesmo
raciocínio vale para a elevação da diversidade às 13 horas (hora do almoço, para muitos
brasileiros). Essa evidência sugere a correlação positiva entre aumento da audiência e
elevação da diversidade de programação, como argumentam Owen e Wildman (1992).

O mesmo procedimento para o cálculo do coeficiente de diversidade da quarta-feira


foi utilizado para estimar a diversidade da programação dos demais dias nas duas semanas
de amostra de programação (anexos 1 a 7). De modo geral, o padrão de duplicação e
repetição de tipos de programas verificado na quarta-feira (19/09/2007) se reproduz nos
outros dias das amostras. O ciclo de agendamento diário da maior parte dos programas de
TV reforça esse padrão de homogeneização. Na quinta-feira, por exemplo, o coeficiente de
diversidade foi de 0,609, com grau de duplicação de 1,56 programa por período. As
maiores alterações na grade de programação, com reflexos no nível de diversidade,
ocorrem aos finais de semana (sábados e domingos). Na Tabela 5.9, são apresentados os
coeficientes de diversificação observados nos dias da semana entre 17/09/2007 a
22/09/2007:
TABELA 5.9 - COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO DA PROGRAMAÇÃO DE TV (16/09/2007 A 22/09/2007)

DIA

Horário DOM SEG TER QUA QUI SEX SAB MÉDIA


SEMANA

05h00 0 0,25 0,25 0,25 0,25 0,25 0 0,18

05h30 0 0,25 0,25 0,25 0,25 0,25 0,25 0,21

06H00 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,54

06H30 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,54

07H00 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75

07H30 0,75 0,5 0,75 0,75 0,75 0,5 0,75 0,68

08H00 1 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,5 0,75


DIA

Horário DOM SEG TER QUA QUI SEX SAB MÉDIA


SEMANA

08H30 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75

09H00 0,75 0,25 0,5 0,25 0,5 0,25 0,5 0,43

09H30 0,75 0,25 0,5 0,25 0,5 0,25 0,5 0,43

10H00 0,5 0,25 0,5 0,25 0,5 0,25 0,75 0,43

10H30 0,75 0,25 0,5 0,25 0,5 0,25 0,75 0,46

11H00 0,75 0,25 0,25 0,25 0,25 0,25 0,5 0,36

11H30 1 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,57

12H00 1 0,75 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,64

12H30 0,75 0,5 0,25 0,5 0,5 0,5 0,75 0,54

13h00 1 1 1 1 1 1 0,75 0,96

13h30 1 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,79

14h00 1 0,25 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,54

14h30 1 0,75 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,64

15h00 0,75 0,75 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,61

15h30 0,75 0,75 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,57

16h00 0,75 0,5 0,5 0,75 0,5 0,5 0,5 0,57

16h30 0,5 0,5 0,5 0,75 0,5 0,5 0,75 0,57

17h00 0,75 0,75 1 1 1 1 0,75 0,89

17h30 0,75 0,5 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,71

18h00 0,5 0,5 1 0,75 0,75 0,75 0,5 0,68

18h30 0,5 1 1 1 1 1 0,5 0,86

19h00 0,5 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 1 0,75

19h30 0,5 0,75 0,5 0,75 0,75 0,75 0,5 0,64

20h00 0,5 0,5 0,75 0,5 0,5 0,5 0,75 0,57

20h30 0,5 0,75 0,75 0,75 0 0,75 0,75 0,61

21h00 0,75 0,25 0,75 0,75 0,75 0,5 0,75 0,64

21h30 0,75 0,5 0,75 1 0,75 0,75 0,75 0,75

22h00 0,75 1 0,75 0,75 1 1 1 0,89


DIA

Horário DOM SEG TER QUA QUI SEX SAB MÉDIA


SEMANA

22h30 0,75 0,75 1 0,75 1 1 1 0,89

23h00 0,5 0,75 1 0,75 1 0,75 1 0,82

23h30 0,75 0,75 1 1 1 1 0,75 0,89

00h00 1 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,5 0,75

00h30 1 0,5 0,25 0,25 0,25 0,25 0,75 0,46

01h00 0,5 0,5 0,25 0,25 0,25 0,25 1 0,43

01h30 0,5 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 1 0,75

02h00 0,25 0,75 0,75 0,75 0,75 0,75 0,5 0,64

02h30 0,25 0,5 0,75 0,5 0,5 0,75 0,5 0,54

03h00 0,25 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,75 0,50

03h30 0,25 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,25 0,43

04h00 0,25 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,25 0,43

04h30 0,25 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,25 0,43

MÉDIA
DIÁRIA 0,635 0,578 0,625 0,604 0,609 0,594 0,651 0,614

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

Na Tabela 5.9 compara-se a programação exibida durante os dias “regulares” da


semana (segunda-feira a sexta-feira) e a exibida nos finais de semana (sábados e
domingos). Nota-se que a programação de TV dos finais de semana apresenta coeficientes
de diversidade mais elevados, com médias de 0,643 por período. Entre segunda-feira e
sexta-feira, a média registrada do coeficiente é de 0,602. O dia de maior diversidade de
programação disponível, em média, é o sábado (21/09/2008) com coeficiente de 0,651. O
dia com menor diversidade de programação observado é segunda-feira (17/09/2008), com
média de 0,578.

Observa-se que a oferta total de programas por período, em média, também é


superior nos finais de semana. Aos sábados e domingos são disponibilizados pelas cinco
principais emissoras comerciais de TV 3,57 tipos de programa em cada período de trinta
minutos, contra 3,41 programas por período na programação entre segunda-feira e sexta-
feira. O aumento de diversidade nos finais de semana também pode estar relacionado com
um incremento da audiência potencial de televisão.
TABELA 5.9 – DIVERSIDADE DA PROGRAMAÇÃO DE TV – SEGUNDA A SEXTA E FIM DE SEMANA
(SEMANA 16/09/2007 A 22/09/2007)

MÉDIA
SEG A SEX SÁB E DOM SEMANA
COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO 0,602 0,643 0,614
MÉDIA DE TIPOS POR HORÁRIO 3,41 3,57 3,46
GRAU DE DUPLICAÇÃO 1,59 1,43 1,54

FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

5.7 O coeficiente e o nível ótimo social

O cálculo do coeficiente de diversificação durante a semana analisada (16/09/2007


a 22/09/2007) permite uma comparação com o nível ótimo social apresentado em termos
teóricos no item 4.5 desta dissertação. Observa-se que, em nenhum dia analisado, a oferta
média de diversidade se aproxima do nível que maximizaria o bem-estar coletivo.

Este seria dado por um coeficiente ideal de 1, que representaria o grau máximo de
diversidade de programação por período (cinco tipos de programas diferentes para cinco
canais de televisão). Neste nível ótimo, o grau de duplicação seria zero (D = 0), e haveria
120 equilíbrios de Nash possíveis , .... , conforme apresentado
teoricamente. Pela equação, o bem-estar seria maximizado em:

Com um coeficiente de diversidade da programação de TV médio durante a semana


analisada (16/09/2007 a 23/09/2007) de 0,614, a programação da TV aberta comercial, de
acordo com esses parâmetros, revela-se abaixo do patamar ótimo de bem-estar social.
Como o modelo de Steiner não considera custos, o bem-estar social é maximizado no nível
máximo de diversidade, sempre eficiente. Outra maneira de ver o problema é observar que
a média de tipos de programas disponíveis por horário (3,46 programas/período) está
aquém do nível ideal de diversidade, que exigiria uma oferta ideal de cinco programas por
período.

Um terceiro ângulo permite verificar que o grau de duplicação da programação da


semana, de 1,54 programa duplicado por período, em média, é sempre superior a zero,
distante, portanto, do nível ótimo mínimo de duplicação. A maximização da oferta de
programação é alcançada transitoriamente em alguns períodos, a maior parte concentrados
no horário nobre, conforme discutido anteriormente na análise intra-diária.

A elevação do nível oferta de diversidade parece estar relacionada aos picos de


audiência de TV, o que reforça a tese de que o crescimento do mercado tem correlação
positiva com a oferta de diversidade. O fato sugere que o aumento da audiência total de TV
pode ser um caminho para ampliar a oferta de diversidade de conteúdo e deve ser
considerado por Policy-makers e autoridades regulatórias no estabelecimento de políticas
públicas.

5.8 Intervenção estatal no mercado de TV aberta - TV Brasil

A existência de falhas de mercado é pressuposto para a intervenção governamental.


Entretanto, nem sempre a ação estatal é recomendada, sob risco dos efeitos associados a
falhas de governo ou da inocuidade da intervenção. Em relação ao mercado de televisão
aberta, uma medida adotada recentemente foi a criação da TV Brasil, nome da emissora de
TV aberta pertencente à Empresa Brasileira de Comunicação (EBC)63, que entrou em
atividade a partir de 2 de dezembro de 200764 .

A TV Brasil é uma emissora financiada pelo Poder Público, configurada como


sociedade de economia mista originada da fusão da Radiobrás e da Associação de
Comunicação Educativo Roquette Pinto (Acerp), antiga responsável pela transmissão da
TVEducativa. Ambas já eram vinculadas ao Governo Federal e transmitiam programação
antes da TV Brasil. A nova emissora está ligada à Secretaria de Comunicação da
Presidência da República.

A TV Brasil é financiada pelo Orçamento da União e por outras fontes de receita,


como doações, venda de publicidade institucional (voltada a eventos de utilidade pública e
responsabilidade social ou ambiental), da exploração dos serviços de radiodifusão pública,
prestação de serviços a entes públicos e privados e distribuição da publicidade legal
(publicação de avisos, balanços, relatórios) de órgãos e entidades públicas federais.

63
Criada pela Lei n° 11.652, de 2008.
64
Na realidade, o sinal da TV Brasil passou a ser transmitido no canal que era reservado à TV
Educativa (para audiências no caso do Rio de Janeiro) ou à TV Nacional (para as audiências em Brasília e
demais localidades), emissora da Radiobrás.
A legislação que instituiu a TV Brasil veda a veiculação de anúncios de produtos ou
serviços, mas pode haver patrocínio de programas por empresas públicas e privadas. O
patrocínio privado pode se servir de incentivos fiscais previstos na Lei Rouanet. No
Orçamento da União para 2008 reservou-se uma dotação de R$ 350 milhões para o
financiamento da TV Brasil65, o equivalente ao orçamento anual da Rede Bandeirantes, de
acordo com a diretora-presidente da EBC, Tereza Cruvinel.
TABELA 5.11 - ORÇAMENTO DAS PRINCIPAIS EMISSORAS DE TELEVISÃO ABERTA

Rede Globo R$ 5,5 bilhões

SBT R$ 750 milhões

TV Brasil R$ 350 milhões

Band R$ 350 milhões

Rede TV R$ 350 milhões

ESTIMATIVAS APRESENTADAS EM EXPOSIÇÃO DA DIRETORA-PRESIDENTE DA EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO


(EBC), TEREZA CRUVINEL À COMISSÃO DE EDUCAÇÃO DO SENADO FEDERAL EM 19 DE FEVEREIRO DE 2008.

A Radiobrás e a Acerp faturavam também cerca de R$ 23 milhões/ano em


prestação de serviços, receita que passou a reforçar o orçamento da TV Brasil. A EBC
conservou o quadro de pessoal das emissoras anteriores, que totalizam 2.431 funcionários,
dos quais 1.067 pertenciam à Radiobrás e os demais à Acerp. Há também previsão de
contratação de funcionários por “excepcional interesse público” por currículo, sem a
previsão realização de concursos públicos, em um primeiro momento.

A TV Brasil conta com uma diretoria executiva e um Conselho Curador, composto


por 20 integrantes, entre representantes do Poder Executivo Federal e da sociedade civil.
Eles são responsáveis por ditar as normas de programação da emissora.

A criação da TV Brasil envolveu acalorado debate público, que contrapôs seus


defensores, como o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e críticos, como lideranças do
PSDB no Congresso Nacional. Entre os profissionais, teóricos e intelectuais partidários da
TV Brasil estão alguns estudiosos das comunicações como o professor da Universidade de
São Paulo, Laurindo Leal Filho, e o jornalista Alberto Dines. Entre os que se manifestaram

65
Estimativas apresentadas em exposição da diretora-presidente da Empresa Brasileira de
Comunicação (EBC), Tereza Cruvinel à Comissão de Educação do Senado Federal em 19 de fevereiro de
2008.
contrários à criação da TV Pública estão o jornalista Reinaldo Azevedo e o jornalista e
músico Nelson Motta66, entre outros.

A discussão acerca da TV Brasil contrapõe visões acerca da utilidade da criação


deste serviço por parte do Poder Público. Seus defensores argumentam que as emissoras de
TV comerciais não cumprem todas as funções sociais da comunicação e que a
complementaridade do sistema de comunicação, que determina existência de televisões,
comerciais, públicas e estatais está previsto na Constituição. Já os críticos da TV Brasil
denunciam a possibilidade de dirigismo político de uma emissora ligada ao Poder
Executivo Federal, e apontam ineficiências de criação de uma estrutura burocrática com
retorno social questionável.

Um dos principais pontos levantados pelos críticos está relacionado aos níveis de
audiência das televisões públicas inferiores aos das televisões comerciais. Na semana de 23
de junho a 29 de junho de 2008, utilizada neste estudo como referência, a audiência dos
cinco programas mais assistidos transmitidos pela TV Brasil alcançou 1 ponto no Ibope,
abaixo dos índices principais emissoras comerciais.

Pela metodologia da pesquisa, cada ponto no ibope representa 1% do universo total


de 3.633.098 domicílios pesquisados, ou cerca de 38 mil domicílios. Os programas mais
assistidos da Rede TV e da Rede Bandeirantes costumam registrar cerca de quatro pontos
no Ibope. As principais atrações da Rede Globo, líder em audiência, registram patamares
superiores a 30 pontos no Ibope (Tabela 5.11):
TABELA 5.11 – CINCO PROGRAMAS DE MAIOR AUDIÊNCIA DA TV ABERTA POR EMISSORA ENTRE 23 DE JUNHO DE 2008 A
29 DE JUNHO DE 2008 (RIO DE JANEIRO)

Audiência Domiciliar (%) Audiência Domiciliar (em mil


Domicílios)
REDE GLOBO
FUTEBOL - LDU EQUADOR X FLUMINENSE 37 1.331
NOVELA III - A FAVORITA 35 1.274
JORNAL NACIONAL 35 1.267
NOVELA II - BELEZA PURA 31 1.141
MALHAÇÃO 31 1.138

SBT
DOMINGO LEGAL PSS 17 605
TELE SENA 13 489
TELA DE SUCESSOS 13 475
PANTANAL 12 444

66
Motta, N. (2008).
Audiência Domiciliar (%) Audiência Domiciliar (em mil
Domicílios)
A PRACA E NOSSA NOT 12 429

RECORD
NOVELA 2 - OS MUTANTES CAMINHOS DO CORACAO 17 629
NOVELA 3 - AMOR E INTRIGAS 16 573
JORNAL DA RECORD 14 493
DESENHOS NOT 13 482
SHOW DE HUMOR 13 458

BANDEIRANTES
JORNAL DA BAND 5 178
MARCIA 4 131
BRASIL URGENTE 1 4 127
JORNAL DO RIO 3 119
JOGO ABERTO RIO 3 104

REDE TV!
PANICO NA TV 5 186
SUPERPOP 4 138
POKEMON 4 129
PANICO REPRISE 3 116
TV FAMA SSX 3 114

TV BRASIL
REPORTER BRASIL NOT 1 38
PROGRAMA DE CINEMA NOT 1 38
PROGRAMA ESPECIAL NOT 1 1 35
FRUTAS DO BRASIL NOT 1 35
DOC TV DM 1 34

FONTE: MEDIA WORKSTATION – ALMANAQUE IBOPE. PROGRAMAS DE MAIOR AUDIÊNCIA DA REGIÁO DO GRANDE RIO DE
JANEIRO.

FONTE: IBOPE TELEREPORT

Os defensores da TV Brasil – e de emissoras públicas em geral – contra-


argumentam que obter audiência nos patamares das emissoras comerciais não é o objetivo
de emissoras financiadas pelo Poder Público. De acordo com essa interpretação, as TVs
públicas obedeceriam a uma lógica distinta das emissoras comerciais: não agiriam no
sentido de maximizar audiências e sim para oferecer programação destinada a audiências
específicas, não contempladas pela programação ofertada pelo mercado privado de TV.

Essa seria a principal justificativa para a proibição de veiculação de anúncios e de


publicidade comercial durante a programação dessas emissoras. A presença da publicidade
comercial poderia induzir um viés em busca de maximização da audiência, que não seria o
foco primordial dessas emissoras.

Sem essa restrição, argumentam os defensores da TV Brasil, a oferta de


programação das televisões públicas deveria se concentrar em temáticas educativas,
culturais, científicas, ou outras que não seriam objeto da programação comercial. A grade
de programação dessas emissoras teria objetivo de corrigir as falhas do mercado comercial
de TV, que teria, entre seus subprodutos, o efeito de homogeneização do conteúdo de
programação, conforme demonstrado em termos teóricos e empíricos. Entre os objetivos
da TV pública deveria estar a maximização do nível de diversidade da programação e a
transmissão de conteúdo televisivo com externalidades positivas.

5.9 Estimativa da repercussão da TV Brasil na programação de televisão

Mas de fato estaria a TV Brasil maximizando a oferta de diversidade de


programação? Qual seriam seus efeitos sobre oferta de conteúdo no mercado de TV? A
presença da TV Brasil produziria efeitos na programação das demais emissoras
comerciais?

Neste segundo exercício empírico, procura-se analisar os efeitos da entrada em


operação da TV Brasil na oferta de programação de televisão aberta. O foco também é o
nível de diversidade da programação. A metodologia foi a mesma utilizada no exercício
anterior, mas, desta vez, incluiu, além das cinco principais emissoras comerciais, a
presença da TV Brasil no mercado de TV. As demais emissoras, públicas e privadas, foram
negligenciadas.

Calculou-se, neste segundo cenário, o coeficiente de diversidade da programação de


TV na semana de 22 de junho de 2008 (domingo) a 28 de junho de 2008 (sábado). A
semana foi selecionada, aleatoriamente, entre as semanas posteriores à entrada em
operação da TV Brasil, que ocorreu em 2 de dezembro de 2007. A amostra escolhida
ocorreu seis meses após o início das transmissões da emissora.

Neste exercício, o coeficiente de diversificação foi calculado de duas maneiras. Na


primeira delas, analisou-se apenas o nível de diversidade da programação das emissoras
comerciais após a entrada em funcionamento da TV Brasil. A intenção era verificar se a
presença da emissora estatal produziu efeitos sobre a programação das emissoras privadas.
Na segunda estimativa, incluiu-se a programação da TV Brasil na oferta total de
programação, para verificar se a adição de mais um canal (agora público) ampliaria a
oferta de diversidade global de conteúdo.
5.9.1 Primeiro cenário: nível de diversidade das emissoras privadas após o
início das operações da TV Brasil

Na Tabela 5.12 observa-se que a média do coeficiente de diversidade da segunda


semana analisada (22 de junho de 2008 a 28 de junho de 2008) foi de 0,622, o que
representou variação positiva em relação ao observado na semana de 16 a 22 de setembro
de 2007, quando a TV Brasil ainda não havia entrado em operação67. Na ocasião, o índice
registrado foi, em média, de 0,614.

Analogamente, a média de tipos de programa por período de 30 minutos exibido


pelas emissoras tele alteração de 3,46 para 3,49 tipos/por período nas cinco emissoras em
transmissão. O grau de duplicação teve pequena variação negativa de 1,54 tipos duplicados
na semana de setembro de 2007 para 1,51 na semana colhida em junho de 2008 (Tabela
5.12).
TABELA 5.12 – COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO DAS EMISSORAS COMERCIAIS ANTES E APÓS A ENTRADA EM

FUNCIONAMENTO DA TV BRASIL

TIPOS DE GRAU DE COEFICIENTE DE


PROGRAMAS DUPLICAÇÃO DIVERSIFICAÇÃO
Antes TV Brasil Depois TV Antes TV Brasil Depois TV Antes TV Brasil Depois TV
Brasil Brasil Brasil
DOMINGO 3,54 3,38 1,46 1,62 0,635 0,594
SEGUNDA 3,31 3,48 1,69 1,52 0,578 0,620
TERÇA 3,50 3,44 1,50 1,56 0,625 0,609
QUARTA 3,42 3,48 1,58 1,52 0,604 0,620
QUINTA 3,44 3,46 1,56 1,54 0,609 0,615
SEXTA 3,38 3,48 1,62 1,52 0,594 0,620
SÁBADO 3,60 3,71 1,40 1,29 0,651 0,677
Média 3,46 3,49 1,54 1,51 0,614 0,622
SEMANA
FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

A pequena variação do coeficiente de diversidade pode ser explicada intuitivamente


por meio de uma análise comparativa das programações das emissoras exibidas nas duas
semanas. As grades de programação da primeira semana de amostra (colhida em setembro
de 2007) e da segunda semana de amostra (obtida em junho de 2008) são muito
semelhantes, com algumas pequenas alterações de horários dos programas exibidos, e, em
menor recorrência, efetiva substituição de atrações. Essa semelhança entre as grades
distantes em um horizonte de seis meses confirma o viés da inercialidade na grade de
programação da TV aberta. A programação da TV aberta pouco se diversificou no período,
o que denota o viés de homogeinização e a pouca variabilidade da programação. A
pequena variação do coeficiente coincide com essa interpretação.

A semelhança da programação de TV nas duas semanas escolhidas como amostras


sugere que a presença da TV Brasil não produziu significativas alterações na grade de
programação das emissoras comerciais. A principal explicação talvez esteja relacionada ao
baixo peso relativo da TV Brasil no conjunto da audiência. Os programas mais assistidos
da emissora registram apenas 1 ponto no Ibope, o equivalente, como dito, a 1% do total de
domicílios pesquisados pelo instituto. Com pouco poder de mercado, a emissora não seria
vista como concorrente pelas emissoras comerciais e sua presença produz efeito quase nulo
na grade de programação das demais.

O mesmo não ocorre quando as emissoras de maior audiência, como Rede Globo,
Record ou SBT, reorganizam suas grades e lançam novidades de programação,
especialmente àquelas que alcançam patamares elevados de audiência. Nestes casos, o
mercado de TV costuma se reorganizar rapidamente, com emissoras concorrentes se
mobilizando para se adaptar à nova realidade e para competir pelos novos nichos de
audiência.

5.9.2 Segundo cenário: nível de diversidade global incluindo a programação da


TV Brasil

O segundo cenário deste exercício incluiu a programação da TV Brasil no conjunto


total de emissoras ofertantes de programação. Neste cenário, a emissora pública se tornou a
sexta emissora analisada e procedeu-se, pela mesma metodologia, o cálculo do coeficiente
de diversidade de programação. O objetivo foi verificar como e em que medida a
programação da TV Brasil influiria no nível global de oferta de diversidade da
programação de TV aberta.

Neste caso, o coeficiente de diversidade foi calculado para seis emissoras, a partir
da equação:

67
No mesmo canal, havia, entretanto, as transmissões da TVE do Rio de Janeiro e TV Nacional para
outras localidades, as quais partilhavam muitas semelhanças à programação da TV Brasil a qual deram
origem.
Onde x é o total de tipos de programas diferentes exibidos pelas emissoras.

Novamente, registra-se que o sistema de categorização contém as limitações já


mencionadas dos sistemas de generalização, que podem obscurecer diferenças e distinções
entre os programas de TV. Pode-se argumentar que programa “Castelo Rá-Tim-Bum”,
exibido pela TV Brasil, tipificado como programa “Infantil”, apresenta diferenças
significativas em relação aos programas infantis exibidos pelas emissoras comerciais que
justifiquem sua não-inclusão na categoria dos demais. Esse tipo de rigor, no limite
inviabilizaria a identificação de padrões de programação.

Essa limitação, em nosso entendimento, não impede a definição de um critério de


classificação, com base nos referenciais já mencionados anteriormente. A classificação da
programação da TV Brasil recebeu o mesmo tratamento dado às demais. De início, notam-
se indícios de um perfil diferenciado de conteúdo. A emissora pública é a única que
oferece programas das categorias “Utilidade Pública” e “Cultural”. No primeiro caso, estão
os programas “Mobilização Brasil” e “Brasil Eleitor”, que divulgam informações
relacionadas à cidadania, e que não encontram similar na grade de programação das
emissoras comerciais. No segundo, atrações como “Cultura Ponto a Ponto”, que aborda
manifestações artísticas e culturais que não costumam figurar no showbusiness.

Isso posto, foi feito o cálculo do coeficiente de diversificação com a inclusão da TV


Brasil no conjunto da oferta de programação de TV. Os coeficientes de diversificação
estimados para cada dia da semana da nova amostra (22 de junho de 2008 a 28 de junho de
2008) podem ser observados nos anexos 9 a 16 desta dissertação.

Na Tabela 5.13 compara-se o coeficiente de diversificação da programação de TV


antes do início das transmissões da TV Brasil (semana 16/09/2007 a 22/09/2008) e depois
do início das transmissões da TV Brasil (semana 22/06/2008 a 28/06/2008). Neste segundo
momento, novamente, foram considerados dois conjuntos de dados. No primeiro deles,
analisou o comportamento do coeficiente diversificação das emissoras comerciais
isoladamente e, no segundo, considerou-se a programação da TV Brasil dentro do cálculo
do coeficiente global de diversidade.
TABELA 5.13 – COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO – COMPARATIVO ANTES E APÓS DA TV BRASIL

COEFICIENTE DE DIVERSIFICAÇÃO
CINCO EMISSORAS COMERCIAIS SEIS EMISSORAS
(5 COMERCIAIS + TV Brasil)
Antes da TV Brasil Depois da TV Brasil
DOMINGO 0,635 0,590 0,600
SEGUNDA 0,578 0,620 0,621
TERÇA 0,625 0,609 0,617
QUARTA 0,604 0,620 0,621
QUINTA 0,609 0,615 0,625
SEXTA 0,594 0,620 0,613
SÁBADO 0,651 0,677 0,667
Média 0,614 0,622 0,623
SEMANA
FONTE: ELABORAÇÃO PRÓPRIA

Observa-se que a entrada em funcionamento da TV Brasil aumentou o nível global


de diversidade da programação da TV aberta brasileira. No cenário considerando a
programação da emissora no total da oferta de programas, o coeficiente de diversidade
observado foi de 0,623, superior ao 0,614 registrado na semana anterior à entrada em
funcionamento da emissora (em setembro de 2007)68.

Uma análise qualitativa da programação (anexos 9 a 16) permite observar que a


programação da TV Brasil apresenta um perfil mais heterogêneo que o padrão observado
nas emissoras comerciais. Há, por exemplo, uma oferta superior de programas de TV do
tipo “segmentado”, voltado a audiências específicas, como “Observatório da Imprensa” e
“Ver TV”, ambos destinados a uma análise crítica da mídia e da televisão. Programas com
essa temática não estão presentes na televisão comercial.

Na semana analisada, a oferta de programas segmentados pela TV Brasil totalizou


22,5 horas de programação, contra 5,5 horas de programação segmentada exibidas pela
Rede Globo, por exemplo. Outro exemplo de maior diversificação é a maior oferta de
programas de Debates, gênero praticamente ausente da TV aberta comercial. A TV Brasil
exibe, semanalmente, 14,5 horas de programas de debates contra apenas 1 hora semanal da
TV Comercial.

68
Novamente, ressalva-se, que na ocasião da coleta do índice da primeira semana, já ocupavam o
canal de transmissão da TV Brasil as emissoras Nacional/TVEducativa, que deram origem à TV Brasil.
Existe, ainda, na programação da TV Brasil, maior enfoque “cultural”, educativo ou
destinado a audiências não contempladas pela programação da TV Comercial. Um
exemplo é o programa “A Grande Música”, dedicado à exibição de espetáculos de música
erudita. Ou do “Jornal Visual”, noticiário com temática e formato direcionado a portadores
de necessidades especiais. Outro exemplo é a maior presença de programas dedicados a
aos temas Ciência/História/Geografia, como “Repórter Eco” e “Micro Macro”, que são
raros na programação das TVs comerciais. Na TV comercial a única atração do gênero é o
Globo Ciência (Rede Globo, sábado, 22/06/2008). Observa-se, portanto, de modo geral, a
preocupação de fornecer programação para atender a nichos de audiência normalmente não
contemplados pela TV comercial.

Críticos da TV Brasil (e emissoras públicas em geral) argumentam que a


programação direcionada a segmentos específicos da audiência não significaria
necessariamente uma virtude. Revelaria, na realidade, um certo elitismo da grade de
programação que poderia ser ineficiente em termos de eqüidade – o Estado estaria
produzindo/transmitindo programação que beneficiaria o público nas superiores faixas de
renda, que teriam maior utilidade no consumo de programação de música erudita, por
exemplo. Além disso, para esse segmento do público, a TV por assinatura seria uma
alternativa economicamente viável (item 2.1.1). De fato, há mais semelhanças entre a
programação da TV Brasil com a exibida pela TV por assinatura (Net, Sky e TVA, por
exemplo) que o conteúdo transmitido pelas emissoras abertas comerciais.

A programação da TV Brasil parece ampliar, na média, a oferta global de


diversidade do mercado de TV, mas a emissora não está imune à tendência de
homogeneização e duplicação verificada nas emissoras comerciais. Com a inclusão da TV
Brasil, o coeficiente de diversificação da programação (0,623) embora tenha aumentado
em relação à situação anterior, não alcança o ótimo em termos de diversidade (que
representado pelo coeficiente de valor 1).

Algumas características da grade de programação da emissora pública evidenciam


esse efeito. Em primeiro lugar, o tempo que a emissora fica fora do ar é superior ao das
demais emissoras comerciais. Durante a semana analisada, a emissora ficou mais 25,5
horas sem exibir programação (fora do ar), contra apenas duas horas da Rede Globo, por
exemplo. O fato afeta negativamente o nível de diversidade global do mercado (a não
exibição de programa representa a disponibilização de mais um canal com oferta zero de
programação).

Outra característica observada é o uso freqüente do artifício de reprisar programas


de TV, que também tem impacto negativo sobre o nível de diversidade. O recurso é
utilizado especialmente durante a exibição da programação infantil que predomina nos
turnos matutino/vespertino. A exemplo do SBT, que costuma exibir o programa Infantil
“Chaves” em diversos horários/turnos ao longo do dia, a TV pública exibe duplicadamente
programas infantis como “Clifford”, “Jay Jay – o Jatinho” e “Um menino muito
maluquinho”, transmitidos diariamente às manhãs e, novamente, às tardes das
programações entre segunda-feira e sexta-feira.

Sobre a programação infantil, cabem alguns comentários. As duas primeiras


atrações mencionadas (“Clifford” e “Jay Jay – o Jatinho”) são produções norte-americanas,
produzidas pela Public Broadcasting Service (PBS), a emissora pública norte-americana. A
exibição de programas estrangeiros pode contrariar a legislação que criou a Empresa
Brasileira de Comunicação (EBC, da qual pertence a TV Brasil). A emissora pública em
tese deveria privilegiar programação produzida nacionalmente (Art. 2º, IV). Além disso,
tais programas também são exibidos pela TV por assinatura (canal Discovery Kids), o que
implicaria em redundância com a programação da TV por assinatura.

Essa predominância de programas infantis durante a programação


matutina/vespertina da TV Brasil (anexos 9 a 16) afeta negativamente o coeficiente de
diversidade, já que as emissoras comerciais oferecem programação para este público (à
exceção da Rede Bandeirantes). Pode-se, contudo, considerar o fato de que os programas
exibidos pela TV Pública, em tese, deveriam aliar caráter “educativo” e “cultural” à
programação infantil que não estariam sendo atendidos pela programação das emissoras
privadas. O coeficiente de diversidade, entretanto, não considera análise qualitativa da
programação, como discutido.

Em outros momentos, a semelhança da programação da TV pública com a TV


comercial parece menos justificada. No domingo (22/06/2008), a despeito da ampla oferta
de programas religiosos pelas emissoras comerciais no início da manhã (quatro das cinco
emissoras privadas exibem programas desse tipo no turno matutino) a TV Brasil também
transmite programas religiosos. O programa “Santa Missa”, exibido pela TV Brasil às 8
horas do domingo (22/06/2008) é o mesmo exibido pela Rede Globo das 5h50min às 7
horas do mesmo dia (22/06/2008) (vide anexo 9). No turno, a TV Pública exibe também o
“Palavras da Vida” às 7 horas do mesmo dia.

A observância desse mimetismo da TV comercial pela TV pública em alguns


momentos diminui a oferta total de diversidade. Menciona-se ainda que o programa
religioso, em termos absolutos, é o tipo de programa predominante na TV aberta comercial
(16,4% do total da programação, na Tabela 5.4). Além disso, pode-se argumentar da
inconstitucionalidade da exibição de programas religiosos pela TV Pública, que fere a
determinação do Brasil como um Estado laico (Art.19, I, Constituição Federal).

A TV Pública também reforça a homogeneização da programação quando exibe os


mesmos tipos de programas nos mesmos horários das emissoras comerciais. Um exemplo é
o noticiário “Repórter Brasil” (diariamente, às 8 horas), que concorre na mesma faixa de
horário com os noticiários “Fala Brasil” – Rede Record, “Primeiro Jornal” - Rede
Bandeirantes, logo após o “Bom Dia Brasil” da Rede Globo de Televisão. Pode-se
questionar a necessidade da TV Pública de exibir mais um noticiário no mesmo horário,
principalmente se não houver distinções significativas de formato e conteúdo que
corroborem sua produção/transmissão pela emissora pública.

Outro exemplo é a exibição do noticiário esportivo “Esportevisão” (domingo, às


21h) em horário muito próximo do “Terceiro Tempo” (Band), programa de mesmo gênero,
que se inicia às 21h30. Novamente, em termos de diversidade, a exibição do programa só
se justificaria se houver diferenças suficientemente relevantes entre as duas atrações. A
dúvida é reforçada especialmente pelo fato que a audiência de programas do tipo
noticiário/mesa redonda esportiva está bem atendida pelo mercado comercial (apenas o
SBT não exibe programa desse tipo).

Conclui-se que, portanto, a repercussão da entrada da TV Brasil em termos de


diversidade da oferta de programação de TV aberta, no geral, é positiva, como foi
observado no aumento do coeficiente de diversificação. A emissora oferece uma distinta
variedade de programação, em termos de formato, conteúdo e direcionada a audiências não
contempladas pelas emissoras de televisão privadas.

Entretanto, em alguns momentos da programação a emissora pública parece


reforçar a falha de mercado. A programação da TV Brasil apresenta, em determinados
períodos, vetores de homogeneização, como a redundância com a programação comercial,
a utilização freqüente de reprises e o excesso de horas sem exibição de programação, que
concorrem negativamente em termos de diversidade.

Por fim, além da diversidade, a dimensão de audiência e a restrição orçamentária


parecem ser variáveis igualmente relevantes na discussão sobre políticas regulatórias para
o setor, principalmente em se tratando de mecanismos de intervenção direta como o
financiamento de emissoras com recursos públicos. A combinação ótima destas três
variáveis na decisão de escolha de programação das emissoras públicas merece estudos
posteriores.
Características econômicas do mercado de TV Paga

INTRODUÇÃO À ECONOMIA DA MÍDIA

O mercado de TV por assinatura está inserido em um setor que possui peculiaridades

substancialmente distintas de outras áreas da Economia. É importante, portanto, identificar os

principais conceitos e características que envolvem essa disciplina, afim de que seja mais fácil a

análise do mercado de TV por assinatura, objeto de estudo desse trabalho.

A economia da mídia, segundo Picard (2002), discute como os operadores de mídia

atendem às necessidades e desejos de informação e entretenimento das audiências, dos

anunciantes e da sociedade com os recursos disponíveis. Albarran (1996) considera que a

economia da mídia estuda como a indústria da mídia utiliza os recursos escassos para “produzir”

satisfação aos seus consumidores. Assim como Alexander et alli (1998), que defende que a

economia da mídia refere-se aos negócios e atividades financeiros das firmas que produzem e

vendem informações para várias indústrias midiáticas.

As questões da Economia da Mídia perpassam várias áreas da teoria econômica, tais como

comércio internacional, economia da concorrência, economia industrial, teoria dos custos e

preços, dentre outros.

Segundo Prado (2008)4, existem dois conceitos fundamentais da economia da mídia, são

eles: informação e news. Informação é toda transcrição que pode ser codificada em linguagem

digital, como por exemplo, uma fotografia, um resultado estatístico, uma música, etc. Já a news5 é
uma informação transformada em mercadoria, ou seja, acessível a outras pessoas através de um

mercado. Todas as informações contidas em uma mídia escrita ou audiovisual constituem news.

As indústrias de mídia apresentam uma estrutura de mercado oligopolística, com diferentes

graus de concentração. No setor da mídia, os níveis de concentração podem ser calculados com

base na audiência. Audiência é o conjunto das pessoas que, em dado momento, são receptores de

uma mensagem transmitida por determinado meio de comunicação. Total de pessoas que

assistem a um programa de TV, que ouvem uma transmissão de rádio, que lêem um jornal ou

revista, ou ainda que lêem um outdoor, etc (DOYLE, 2001).

1.1 – Principais Características da Economia da Mídia

A mídia e outras produções culturais têm características especiais não compartilhadas por

outros produtos ou serviços na economia. A aplicação de teorias e perspectivas econômicas, no

contexto da mídia, apresenta uma variedade desafiadora de opções. A seguir analisaremos as

características principais dessa indústria, que as distingue das abordagens tradicionais da

economia industrial (PRADO, 2008)6.

A primeira característica chave dessa indústria é a não-escassez. Os bens e serviços

produzidos pelas indústrias de mídia não apresentam escassez em seu consumo ou utilização.

Sempre que um filme, uma música, ou uma notícia é consumido isso não se esgota, ou seja, o
mesmo filme ou música poderá ser consumido diversas outras vezes que for demandado

(DOYLE, 2001)7.

O segundo aspecto importante do produto midiático é a não-rivalidade, ou seja, o seu

consumo por parte de um indivíduo ou grupo social não reduz a quantidade disponível desse

mesmo bem para outros integrantes da sociedade8. Caso uma pessoa assista a um determinado

programa de TV, esta não diminui a oportunidade de outra pessoa fazê-lo, porque o programa não

se tornou gasto, não foi consumido, o mesmo conteúdo pode ser outra vez vendido, exibido ou

consumido por outros consumidores quantas vezes mais forem demandado ou ofertado.

Essa característica aproxima os produtos midiáticos dos “bens-públicos puros”, que se

caracterizam por além de serem não-excludentes são também não-rivais. Neste contexto temos

como exemplo a televisão aberta, onde o acesso não está restrito a alguma forma de pagamento.

Porém existem também as mídias que tem características de bem-público com exclusão,

condicionando seu acesso a alguma forma de pagamento, por exemplo, TV por assinatura, ou ir

ao cinema (GABSZEWICZ e SONNAC, 2006).

Outros bens culturais, como as obras de arte, se classificam também como bens públicos,

porque o ato de consumo por um indivíduo não reduz a possibilidade de consumo por outros.

Estes bens se contrastam com os bens privados, pois estes vão se tornar gastos quando

consumidos (por exemplo, pão, lápiz, cerveja, etc). Assim que uma pessoa come um determinado

pedaço de pão, este não estará mais disponível para que outra também o coma. Um pedaço de pão

só poderá ser vendido uma vez, depois que consumido não mais. Mas, quando uma estória é

7
Essa característica é abordada por Doyle (2001, p. 10).
8
Ver conceito de não-rivalidade na teoria dos bens públicos em Giambiagi (2008, cap. 1).

10
vendida, o vendedor passa a possuí-la, e poderá vendê-la quantas vezes mais estiver interessado e

houver demanda.

O consumo de bens privados gera a escassez de recursos que devem ser racionalizados

(normalmente pelo sistema de preços e pelo mercado). Porém, os bens públicos não

compartilham dessa lógica. Com isso temos nossa terceira característica dessa indústria, o fato de

existirem custos fixos elevados e irrecuperáveis e custo marginal desprezível. O custo inicial

envolvido numa negociação de um produto de mídia pode ser alto, mas depois o custo marginal

associado à oferta de uma nova unidade do produto é próximo de zero, ou insignificante se

comparado com o investimento inicial (PICARD, 1989).

O custo marginal envolvido em proporcionar uma exibição extra de um programa de

televisão ou rádio, que já tenha sido exibido antes é normalmente zero, pelo menos em emissoras

terrestres, ou ainda, o custo marginal de prover uma publicação on-line para um novo usuário de

Internet é inexistente (zero). Segundo Prado (2008, p. 266), “o custo de produzir uma informação

não é afetado pelo número de pessoas que a recebem ou utilizam”.

Algumas firmas dessa indústria apresentam motivações econômicas diversas para ofertar

seus produtos, culminando assim em diferentes objetivos, tal como cumprir apenas sua função

visando o interesse público, busca de influência política e/ou ideológica, ou até mesmo (mais

comum) visando os interesses dos acionistas (busca de lucros), denotando assim uma

subjetividade de suas metas. Com isso, é difícil a adoção ou aplicação de qualquer modelo

baseado em teorias convencionais da economia.

11
A relação entre preço e os recursos alocados na mídia, por exemplo, é bastante incomum,

principalmente em empresas de TV ou radiodifusão, onde muitos serviços que os consumidores

recebem não envolvem pagamento direto por parte do telespectador. Sem o preço como link

direto entre o consumidor e o produtor, há uma dificuldade em se mapear ou conhecer de fato as

preferências do consumidor (DOYLE, 2001).

Outra implicação não usual da teoria econômica encontrada na economia da mídia, diz

respeito aos métodos de produção. Estes são ditos ineficientes se for possível produzir mais

apenas realocando os recursos disponíveis. Pode ser possível que uma companhia de TV, por

exemplo, redistribua os seus recursos de forma a se produzir mais horas de uma programação ou

consiga maiores níveis de audiência com os mesmos custos, podendo constituir-se em uma forma

mais eficiente de alocação dos recursos.

Essas questões relacionadas à eficiência na alocação de recursos e da produção pertencem

ao nicho da teoria econômica denominado teoria do bem-estar (welfare). Implícita nesta visão

está a concepção de que a função de bem-estar (por exemplo, uma relação funcional mostrando o

máximo de bem-estar que pode ser obtido através da decisão de alocação de recursos alternativa)

pode ser definida para a sociedade com um todo. Considerando este quadro, a economia da mídia

pode, portanto, minimizar a perda de bem-estar associada utilizando políticas de escolhas.

Outra característica importante concernente à economia da mídia a identificação dos dois

únicos produtos ofertados pelas indústrias de mídia, o que Picard (2002) se refere como mercados

de produto dual (dual product market). Os dois produtos que as empresas de mídia geram são:

conteúdo (programas de TV, cópias de jornal, artigos de revistas, etc); e a audiência, que é atraída

12
por esse conteúdo, e é importante, pois pode ser moldada, precificada e vendida a anunciantes

interessados em vender seus produtos (PRADO, 2008).

O entretenimento ou o conteúdo da notícia que os ouvintes, telespectadores, leitores

consomem constituem uma forma de produção que a firma de mídia vende. Já a audiência que foi

atraída pelo conteúdo produzido constitui um segundo valor de produção, tendo em vista que uma

audiência significativa pode ser empacotada, precificada e vendida para anunciantes (DOYLE,

2001).

A audiência é o principal foco da maior parte das companhias de mídia, pois elas

proporcionam as receitas de anúncios (publicidade). Na TV por assinatura, particularmente, o

crescimento do faturamento publicitário vem crescendo gradativamente ao longo dos anos,

registrando um crescimento de 26% no ano de 2008 em relação ao ano de 2007, como mostra a

tabela abaixo:

13
Gráfico 1.1 - Faturamento Publicitário Bruto Anual (em R$
milhões) da TV por Assinatura

802,7

638,6

529,9

374,2
303,8

188,3
183,1
142,6

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Fonte: ABTA9

Até mesmo mídias que não visam lucros se preocupam com audiência, como rádios ou TV

de serviço público, por exemplo, que devem estar atentas para seus índices de popularidade,

assim como a distribuição demográfica da sua audiência, afim de que seja possível organizar

estratégias para a expansão de sua audiência.

O conceito técnico de audiência no que tange ao mercado de TV comercial, segundo

Machado (1988)10 é o:

“Levantamento de uma cena tridimensional sobre a quantidade de receptores ligados em

determinado canal ou programa em determinado horário. A porcentagem de aparelhos

9
Dados disponíveis no site: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em: 20/05/09.
10
Ver o conceito e as diferentes classificações de audiência em Machado (1988).

14
ligados é obtida dividindo-se o número de telespectadores atualmente sintonizados em

determinado canal pelo total de aparelhos estimado numa determinada região geográfica.

Como não se pode consultar todos os telespectadores, faz-se a avaliação por amostragem,

utilizando informações fornecidas por um grupo de pessoas."

A audiência pode ser dividida em: acumulada, cativa, duplicada, líquida, média, primária e

útil (MACHADO, 1988). A audiência acumulada refere-se a soma das pessoas atingidas por uma

mensagem repetida várias vezes em um veículo, ou em uma série de edições de um programa de

rádio, tv, ou de um jornal, revista etc. Apartir deste conceito podemos subdividir a audiência

acumulada em dói grupos diferentes: a audiência acumulada bruta, que considera a superposição

de pessoas (por exemplo: uma pessoa que assiste 3 vezes a um mesmo anúncio, ou seja, três

inserções de anúncios de uma campanha, é computada com o valor de três pessoas) , ou

Audiência Acumulada Líquida, que considera apenas o total de pessoas diferentes que foram

atingidas pela campanha.

A audiência cativa diz respeito àquela habitual, ou seja, a audiência freqüente que um

determinado veículo de comunicação recebe (emissora de rádio ou TV, de uma publicação

periódica como jornal e revista, etc.).

Já a audiência duplicada refere-se ao conjunto de pessoas que recebem uma mensagem

através de dois ou mais veículos de comunicação. Esse fenômeno é chamado de Superposição ou

duplicação. Por outro lado, a audiência líquida corresponde ao total de pessoas que recebem pelo

menos uma vez uma mensagem transmitida por um ou por vários veículos. A audiência líquida é

também conhecida como audiência simples. Por sua vez, chama-se audiência média o número

médio de pessoas que recebem uma mensagem transmitida em mais de um veículo, ou várias

15
vezes em um mesmo veículo, resultado da soma das audiências registradas nas várias emissões,

divididas pelo número de emissões dos veículos.

Por fim temos o conceito de audiência primaria e audiência útil. A primeira corresponde à

parte da audiência que se liga diretamente à recepção da mensagem ou ao consumo do veículo de

comunicação. Ou seja, audiência que faz parte do público-alvo da campanha. É também

conhecida como audiência efetiva. As pessoas não incluídas nesta categoria são classificadas

como audiência secundária. Já a audiência útil são as pessoas que realmente assistem a uma

determinada programação, não apenas os televisores ou rádios ligados.

O outro tipo de produção de mídia – o conteúdo – exibe um número de características

diferentes e interessantes. O conteúdo de mídia é geralmente classificado como um bem cultural.

Filmes, emissoras de TV, programas de TV, livros e músicas não são apenas produtos comerciais,

mas são também apreciados em muitos aspectos pela forma de enriquecimento do nosso ambiente

cultural (DOYLE, 2001).

Muitos bens culturais compartilham a qualidade e seu valor para com seus consumidores

através de sua ligação com a informação ou mensagem que eles trazem, mais do que material que

carrega a informação ou conteúdo (rádio, CD, etc). As mensagens transmitidas ou os significados

são bens intangíveis, logo o conteúdo de mídia não é consumível no seu sentido literal da palavra.

Algumas vezes torna-se difícil definir o que constitui uma unidade de conteúdo de mídia.

Isso pode ser descrito, por exemplo, por uma estória, um artigo, um programa de TV, um jornal

completo ou um canal de rádio. De qualquer forma, a qualidade essencial da audiência ganha

valor pelo seu significado, que não está diretamente relacionado aos objetos materiais. Porque o

16
valor do conteúdo de mídia, em geral, é atribuído por características imateriais, não podendo ser

gasto ou exaurido (destruído) pelo ato de consumo.

Outra característica importante na indústria de mídia é que o preço é definido apenas pela

demanda. Produtos midiáticos têm custos elevados de produção e desprezíveis de reprodução, ou

seja, elevados custos fixos e custo marginal próximo a zero. Logo, esses bens são precificados de

acordo com o valor que os consumidores lhes atribuem e não de acordo com seus custos de

produção. Para emissoras de TV, por exemplo, os custos de produzir e transmitir um programa

são fixos, independentemente do número de telespectadores que assistem ao programa (PRADO,

2008).

Na próxima seção analisaremos em separado, outras duas características inerentes às

indústrias de mídia, são elas: os rendimentos crescentes de escala, e elevadas economias de

escopo.

1.2 – Economias de Escala e Escopo

Nesta seção veremos como os conceitos econômicos de economia de escala e escopo estão

relacionados com a economia da mídia. Primeiramente analisaremos o conceito e inter-relações

da economia de escala com as indústrias de mídia.

Por definição, economias de escala são reduções no custo médio geradas pelo aumento da

escala de produção. As economias de escala podem ser de dois tipos: internas, onde há redução

de custos à medida que a escala de produção aumenta, depende apenas de aspectos internos à

firma (tecnologia); e externas: a redução de custos da firma decorre do aumento no tamanho da

17
indústria (conjunto de firmas), normalmente associada à redução nos preços dos insumos quando

há mais fornecedores (PYNDICK, 2004).

Quando existem economias de escala internas, uma empresa consegue reduzir seus custos

(e ter produtos mais baratos / competitivos), com o aumento de sua escala produtiva. Assim, as

economias de escala estimulam a especialização e concentração na produção: em vez de produzir

muitos produtos em escala menor, a produção de um único produto, sob as economias de escala,

implica uma alternativa mais interessante.

A economia de escala existe na mídia por causa dos atributos de bem público deste produto.

Para as firmas de mídia, custos marginais referem-se ao custo de fornecimento de um produto ou

serviço para um consumidor extra. Já o custo médio é o total de custos envolvido em

proporcionar o produto ou serviço dividido pela audiência do mesmo – o número total de

usuários que ouvem ou vêem ou de alguma outra forma consomem o conteúdo (DOYLE, 2001).

Na maior parte dos setores de mídia, o custo marginal tende a ser menor, e em alguns casos

zero. Estes são também menores que os custos médios. Conseqüentemente, quanto mais

expectadores ou leitores, o custo médio para a empresa fornecer o produto será cada vez menor.

Então, se os custos médios de produção diminuírem ao passo que a escala de consumo aumentar,

serão obtidos maiores lucros e economias de escala (PRADO, 2008).

Por sua vez, economia de escopo tem haver com obter ganhos de eficiência, é possível que

uma empresa venha a ter vantagens de produção ou de custos ao produzir dois ou mais bens ou

serviços, em vez de apenas um. A redução de custos resulta de uma combinação de fatores: seja

18
do uso mais racional dos recursos (insumos), das instalações, de marketing em conjunto, seja por

utilizar a mesma administração, o que resultaria em economia de custos.

A economia de escopo resulta na redução nos custos unitários, que é proveniente da

utilização de instalações e processos em uma única planta industrial que produz mais de um

produto. Desse modo, trata-se de uma produção conjunta: dois ou mais produtos, os quais, para

serem produzidos, estão utilizando as mesmas instalações. Por isso, é possível conseguir redução

de custos por unidade produzida.

A economia de escopo é comum na economia da mídia porque a natureza da produção de

mídia possibilita que um produto possa ser criado para um determinado fim ou mercado e depois

reformatado e exibido em outro (PRADO, 2008).

Por exemplo, uma entrevista com um político que está gravado em um documentário para a

radiodifusão pode também ser editado para a inclusão em outros programas de notícia, seja na

televisão ou, mesmo, no rádio: os mesmos conteúdos para televisão podem ser recondicionados

em mais de um produto. E a reformatação de um produto destinado a uma audiência em um

“novo produto” adequado para uma platéia (audiência) diferente gera economias de escopo

(DOYLE, 2001).

Portanto, economias de escopo apresentam uma estratégia econômica eficiente, pois o custo

total da diversificação da produção da firma atuante no mercado de mídia é menor se comparado

a uma firma que produz apenas um tipo de padrão de serviço ou produto para o mesmo mercado.

19
1.3 – Política de concorrência e a economia da mídia

A defesa da concorrência não é um fim em si mesmo, mas um meio pelo qual se busca criar

uma economia eficiente. Em uma economia eficiente, os cidadãos dispõem da maior variedade de

produtos pelos menores preços possíveis e os indivíduos desfrutam de um nível máximo de bem-

estar econômico.

A legislação brasileira respalda a defesa da concorrência no inciso IV do artigo. 170 da

constituição Federal de 1988, quando baseia o princípio da livre concorrência no pressuposto de

que a competição não pode ser restringida ou subvertida por agentes econômicos com poder de

mercado. Portanto, é dever do Estado zelar para que este princípio não seja corrompido. Como

confirma Prado (2008):

“A legislação brasileira de defesa da concorrência tem como premissa a proposição de que

os mecanismos de mercado são um meio eficiente de promover o aumento da produtividade, a

inovação tecnológica, e preços compatíveis com o contínuo aumento do bem-estar do

consumidor”. (pág. 262)

Nota-se, portanto, a importância da competição, pois esta assegura que os agentes

econômicos e as forças empresariais sejam voltados para promover um nível máximo de

eficiência para as empresas e o menor preço possível aos consumidores. Além disso, a

concorrência disciplina os ofertantes de bens e serviços a estar atento aos desejos e expectativas

dos consumidores, afim de que estes não percam parcela de mercado para ou outras firmas.

Economias competitivas são, também, uma condição necessária para o desenvolvimento

econômico sustentável a longo prazo. Nesse ambiente econômico, as empresas defrontam-se com

20
os incentivos adequados para aumentar a produtividade e introduzir novos e melhores produtos,

gerando crescimento econômico.

Porém, para o cumprimento da defesa da concorrência, é necessária a existência de uma

estrutura institucional adequada capaz de fiscalizar a ordem econômica e impedir que ocorram

práticas anticoncorrenciais ou abusivas, e para isso existe a Lei nº 8.884/94, que entre outros

pontos, estabelece a forma de implementação da política de concorrência no país e a qual

transforma o CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica, em autarquia especial e

dispõe sobre a repressão e prevenção da ordem econômica.11

Portanto, o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC, deve estar atento para a

ocorrência de práticas anticoncorrenciais, decorrentes principalmente de atos de concentração,

lidando com problemas de fusões e aquisições. No atual contexto econômico, a repressão a

condutas anticompetitivas representa o grande desafio à frente do SBDC.

Porém, existem muitas áreas da economia nas quais o tema da concorrência ainda encontra-

se incipiente, em especial, o setor de “produtos midiáticos”, que segundo Prado (2008), nunca foi

discutido em uma perspectiva de política de concorrência no Brasil.

“Não há no Brasil uma reflexão sobre se a estrutura altamente concentrada de muitas

atividades ligadas à mídia – em especial o setor de teledifusão – deve-se a características

intrínsecas dessa indústria, ou se é produto de quase absoluta ausência de uma política

pública de concorrência para o setor”. (pág. 262)

11
Ver CADE, Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia Prático do CADE: a defesa da concorrência no
Brasil. São Paulo: CIEE, 2007.

21
Este fato justifica mais uma vez a relevância do objetivo que este trabalho propõe, ou seja,

um estudo sobre a regulação e concorrência de uma mídia, a TV por assinatura. Após

identificarmos as principais características e conceitos concernentes a disciplina economia da

mídia, onde está inserida a TV por assinatura, abordaremos no próximo capítulo o histórico do

serviço no Brasil, assim como suas principais formas de prestação, e o quadro atual do mercado

no país.

22
2 – O MERCADO DE TV POR ASSINATURA

2.1 – Evolução Histórica

A TV por assinatura tem sua origem em 1948, nos EUA, onde foi implantada a primeira

rede de cabos para a transmissão da programação de televisão em regiões com problemas de

recepção dos sinais de radiodifusão. As estações de TV a cabo eram utilizadas como repetidoras

locais, retransmitindo a programação da televisão aberta (HOINEFF, 1991). O método baseava-

se na instalação de antenas em locais elevados, conectando via cabos os domicílios demandantes

do serviço.

Até a década de 1970 as empresas prestadoras de TV a cabo limitavam-se a distribuir a

mesma programação transmitida gratuitamente por broadcast. Só em 1971 as empresas

Teleprompter e Manhattan Cable iniciaram em Nova York a transmissão de programação que

adicionava ao conteúdo do broadcast um conjunto de serviços gerados pelos operadores

(TORRES, 2005). A partir de então, o sistema de TV a cabo começou a se expandir nos Estados

Unidos, e este país deteve por largo período de tempo a posição de maior mercado dessa mídia.

De acordo com Melo et alli (1996), a demanda pelos serviços de TV a cabo era concentrada

principalmente nos Estados Unidos até a década de 1970, em decorrência de uma combinação de

vários fatores, como a renda elevada, alta penetração da televisão e grandes áreas de difícil acesso

à radiodifusão. Além desses fatores, a transmissão de televisão era monopólio estatal na maior

parte dos países industrializados, o que inibiu consideravelmente a expansão do sistema de cabo

(PRADO, 2008).

23
Com o passar dos anos, métodos de transmissão de TV por assinatura foram implantados e

com isso a expansão dos serviços se intensificou em todo o mundo. Na tabela abaixo são

apresentados dados sobre os maiores mercados de TV por assinatura no mundo, e para cada um

deles são mostrados os números de domicílios que dispõem de TV paga (TV a cabo e DTH), o

número de domicílios que dispõem de aparelho de televisão e a razão entre esses (taxa de

penetração)12.

Tabela 2.1 – Os 10 Maiores Mercados de TV por Assinatura.

DOMICÍLIOS COM TV DOMICÍLIOS TV


PAÍS % PENETRAÇÃO
(milhões) PAGA (milhões)

1º China 400,25 400,25 100,00

2º EUA 112,70 100,30 89,00

3º Índia 93,30 58,50 62,70

4º Japão 51,71 26,74 51,70

5º Brasil 48,21 5,00* 10,37

6º Indonésia 37,05 741 2,00

7º Rússia 35,26 8,78 24,90

8º Alemanha 33,55 30,83 91,90

9º Reino Unido 25,18 12,16 48,30

10º França 25,13 6,13 24,40

Fonte: ZenithOptiMedia 2007 - *Anatel (2007)

Nota-se na tabela acima que a China assumiu a liderança no total de domicílios com TV por

assinatura, e o Brasil possui um grande potencial de mercado ainda a ser explorado. Já a tabela
12
Dados disponíveis no site: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em: 01/06/09.

24
2.2 abaixo, mostra os mesmos indicadores, porém, agora por regiões ou continentes. Verifica-se

que as maiores penetrações de TV por assinatura estão na América do Norte.

Tabela 2.2 – TV por Assinatura (Resumo por Regiões).

DOMICÍLIOS COM DOMICÍLIOS TV


PAÍS % PENETRAÇÃO
TV (milhões) PAGA (milhões)

América do Norte 146,14 117,04 80,10

América Central e Caribe 3,00 1,32 43,90

América do Sul 77,67 19,30 24,80

Ásia 646,39 512,39 79,30

Europa 256,82 126,59 49,30

Fonte: ZenithOptiMedia 2007

O atual modelo de TV por assinatura é recente, datando da década de 1970, onde se marca o

início do processo de relaxamento progressivo das restrições legais à participação da iniciativa

privada no setor de radiodifusão.

Porém, o modelo de negócios e os conteúdos especializados somente se tornaram globais

com a implantação do primeiro Sistema Global de Comunicações via satélite, possibilitando a

transmissão simultânea da programação dos canais norte-americanos para assinantes de várias

partes do mundo, aumentando de forma significativa o mercado potencial e possibilitando o

surgimento de novos canais.

25
No Brasil, a chegada da TV a cabo poderia ter ocorrido bem antes do que efetivamente

aconteceu. Isto só não se concretizou, segundo Brittos (1999), devido à pressão política e

econômica de empresas da área de equipamentos e das grandes redes de televisão aberta sobre os

governos militares.

As infra-estruturas e os modelos de televisão e de telecomunicações foram criados e

desenvolvidos no território nacional a partir de investimentos maciços dos governos militares,

dando suporte à sua política de desenvolvimento econômico e de segurança nacional. Para

viabilizar a integração foram criados o Ministério das Comunicações, a Telebrás

(Telecomunicações Brasileiras S.A.)13 e a Embratel14.

Em 1974, o ministro das Comunicações, Euclides Quandt de Oliveira, negou-se a autorizar

a implantação de um projeto piloto de TV a cabo, que tinha como objetivo desenvolver uma

tecnologia nacional e estudo sobre seu impacto social. A negativa ocorreu, segundo Brittos

(1999), porque autoridades do Ministério das Comunicações já haviam preparado um

regulamento para o serviço, junto com alguns empresários de radiodifusão, que desenvolviam

projetos para várias cidades.15

13
Telecomunicações Brasileiras S. A. - TELEBRAS é uma sociedade anônima aberta, de economia mista,
constituída em 09 de novembro de 1972, nos termos da autorização inscrita na Lei n° 5.792, de 11 de julho de 1972,
vinculada ao Ministério das Comunicações exercendo, após o processo de desestatização de suas controladas, todas
as atividades institucionais como ente integrante da Administração Pública Federal.
14
Empresa Brasileira de Telecomunicações S.A., hoje empresa privada pertencente ao grupo mexicano Telmex.
15
Ver HERZ, Daniel. A introdução das novas tecnologias de comunicação no Brasil: tentativas de implementação
do serviço de cabodifusão - um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) - Faculdade de
Comunicação, UnB. Brasília, 1983.

26
Com isso, a tentativa de implantar a TV a cabo no país foi frustrada e suspensa no governo

Geisel16, e manobras semelhantes também ocorreram no governo João Figueiredo. O Estado até

então atuava de forma a privilegiar os interesses privados da indústria da mídia e de

equipamentos, impedindo a implantação e não permitindo o ingresso dessa nova modalidade

televisiva no Brasil.

Constata-se que apesar de ter havido volumosos investimentos em redes de comunicação

durante o período do regime militar, interesses políticos e econômicos impediram que a TV por

assinatura fosse implantada no Brasil naquele período. Esta visão também é compartilhada por

Torres (1999), que afirma em sua dissertação:

“Com tanto investimento em redes de comunicação durante o período militar é de estranhar

que a TV por assinatura só fosse implantada no Brasil em meados da década de 1990. Mas é

possível deduzir que não era de interesse da Globo e dos governos militares desenvolver a TV

por assinatura, criando um cenário de maior diversidade informativa, competitividade e,

portanto, de mais difícil controle.” (TORRES, 1999, págs. 68/69)

A atuação do estado só se alterou, no sentido de permitir que se implantasse a TV a cabo,

no fim a década de 1980, no Governo de José Sarney. Esta ação se deu em fevereiro de 1988,

quando o Ministro das Comunicações do governo Sarney, Antônio Carlos Magalhães baixou o

decreto n° 95.744/88 regulamentando o Serviço Especial de Televisão por Assinatura,

denominado de TVA, destinado a distribuir sons e imagens a assinantes, por meio de um único

16
O Jornal do Brasil publicou no dia 9 de julho de 1975 um editorial intitulado “TV congelada”, cobrando
transparência nas discussões e nas definições referente às mudanças que o governo pretendia promover no setor de
comunicações.

27
canal UHF17, através de sinais codificados que são transportados por espectro radioelétrico, o

mesmo utilizado pelos canais comuns de televisão, sendo permitida, a critério do poder

concedente, a utilização parcial sem codificação.

Ainda no governo de Sarney, através de uma portaria ministerial, a portaria nº 250, de 13 de

dezembro de 1989, assinada também pelo Ministro das Comunicações na época, Antonio Carlos

Magalhães, foi viabilizado o serviço de "Distribuição de Sinais de TV por Meios Físicos -

DISTV".

Segundo Murilo César Ramos (2000), “nessas duas decisões (decreto nº 95.744/88 e

portaria nº 250) estavam contidas as bases iniciais da política para a constituição no Brasil do até

então adiado mercado da televisão paga” (2000, p.150), que optou por definir esse serviço

diferenciando-o da radiodifusão pelo simples fato de transmitir sinal decodificado apenas a

assinantes, enquanto a televisão convencional distribui seus sinais livremente para o público.

Portanto, a TV por assinatura desde seu início foi tratada como um “serviço especial” seguindo

regras definidas especificamente para ela (TORRES, 2005).

Por todos os motivos anteriormente mencionados, a TV por assinatura só teve sua

implantação de fato no Brasil na década de 1990, no Governo Collor, onde além do

reconhecimento das autorizações liberadas com base na portaria nº 14318 como sendo de DISTV,

ocorreram, entre novembro de 1990 e julho de 1991, 98 outorgas, prevalecendo entre estas

17
UHF (Ultra High Frequency) – Faixa de freqüências entre 300 e 3.000 MHz. Os canais de televisão do 14 ao 69
estão nessa faixa.
18
A portaria nº 143, de 21 de junho de 1988, do Gabinete do Ministro das Comunicações, estabelecia o "Serviço de
Recepção de Sinais de TV via Satélite e sua Distribuição por Meios Físicos a Usuários", permitindo, na prática, o
início da televisão a cabo no país, sem discussão pública, nem enquadramento legal entre os serviços de radiodifusão
ou de telecomunicações, embora podendo utilizar-se da infra-estrutura de serviços públicos.

28
concentrações verticais (grupos com várias concessões de TV a cabo) e concentrações cruzadas

(grupos que detém negócios em mídias diferentes, como TV a cabo e emissoras de rádio, por

exemplo).

Em 1991, grandes grupos de comunicação ingressaram no setor, investindo em novas

tecnologias de transmissão. O pioneirismo deste processo foi das Organizações Globo, que

criaram a Globosat, um serviço de TV paga via satélite, na Banda C19, que exigia grandes antenas

parabólicas para recepção dos sinais. O Grupo Abril criou a TVA e posteriormente outros grupos

importantes, como a RBS do Rio Grande do Sul e o Grupo Algar, ingressaram no mercado logo

em seguida20.

Ainda assim, até meados da década passada, a TV por assinatura no Brasil ainda era

incipiente. O custo da mensalidade era bem mais elevado em relação aos dias atuais, e a oferta

dos serviços cobria um número bastante reduzido de cidades, concentrando principalmente nos

grandes centros urbanos do sudeste e sul do país. A nova modalidade de TV podia ser

considerada como um bem de luxo para a população brasileira21.

Depois de um longo processo de discussão, (que contou com a participação inédita da

sociedade civil, representada pelo Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações e sob

a liderança da Federação Nacional dos Jornalistas), foi elaborada a Lei n° 8.977, de 6 de janeiro

de 1995, mas somente em 1997 a lei e a norma foram definitivamente publicadas.

19
Banda C - Faixa de freqüências de microondas situada entre 3,7 GHz e 4,2 GHz. É utilizada na comunicação por
satélites e também em links terrenos. O termo é usado também para designar os primeiros serviços de TV via satélite,
que usavam essa faixa de freqüências.
20
Fonte: ABTA.
21
Segundo dados da ABTA, que consta em Melo (2002), em 1994, o número de assinantes de TV por assinatura no
Brasil era de cerca 0,4 milhão.

29
A “Lei do Cabo”, que será objeto de análise do próximo capítulo, obrigou as operadoras, a

disponibilizar seis canais de acesso público e gratuito: sendo três canais legislativos (Senado,

Câmara Federal e um terceiro compartilhado pela Assembléia Legislativa - Câmara Municipal),

um canal educativo-cultural, um canal universitário, e um canal comunitário, aberto para

utilização livre por entidades não governamentais e sem fins lucrativos. A lei também determinou

que as operadoras de TV a cabo devem manter dois canais para uso eventual, mediante aluguel

(BASSO, 2002).

Em 1997, com a promulgação da Lei Geral de Telecomunicações (Lei nº 9.472), foi criada

a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações – com o objetivo de regular o novo ambiente

competitivo das telecomunicações, recém privatizada, por meio do desenvolvimento e da garantia

de observância das novas regras do setor, inclusive de TV por assinatura, e vem dando

continuidade ao processo licitatório para expansão dos serviços.

Atualmente, no país, mudanças institucionais, que terão grande impacto nesses mercados,

têm sido discutidas no Congresso Nacional, que são as mudanças propostas no chamado PL 29,

que viriam a dar maior consistência ao modelo regulatório de TV por assinatura, hoje submetido

a um arcabouço que possui várias limitações, como o tratamento legal distinto das diversas

tecnologias de transmissão, que para a jurisprudência recente do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica), estão no mesmo mercado relevante22.

22
Ver Relatório AC 53500.029160/2004 que se refere ao Ato de Concentração apresentado ao SBDC, e teve como
Relator o ex-Conselheiro do CADE Luiz Carlos Delorme Prado.

30
Segundo o Grupo Mídia, o Brasil é considerado, hoje, o maior mercado inexplorado de TV

por assinatura do hemisfério ocidental, o que demonstra a relevância das discussões que

permeiam os aparelhos burocráticos brasileiro.

2.2 – A Cadeia Produtiva

Para um melhor entendimento da dinâmica do mercado de TV por assinatura, é necessário

se fazer um detalhamento de toda a cadeia produtiva do serviço, determinando os agentes

econômicos envolvidos na produção e suas respectivas funções no processo. Com isso,

discutiremos nesta seção primeiramente a definição generalizada da cadeia produtiva da indústria

de mídia, feita pelo ex-Conselheiro do CADE, Luiz Carlos Delorme Prado, no seu Voto referente

ao Ato de Concentração (AC) nº 53500.002423/2003, do caso Sky-DirecTV. Em seguida

detalharemos cada fase da estrutura de produção da TV por assinatura especificamente, conforme

foi determinado pela Anatel na ocasião do mesmo Ato de Concentração.

A definição da cadeia produtiva da indústria de mídia feita pelo ex-Conselheiro do CADE,

Luiz Carlos Delorme Prado, leva em consideração a teoria de economia da mídia discutida no

primeiro capítulo desta monografia. Para Prado, a cadeia produtiva dessa indústria envolve, em

termos gerais, três fases bem definidas: produção; empacotamento; e distribuição. Ou seja,

essencialmente o negócio da indústria da mídia é o fornecimento de conteúdo midiático aos

consumidores. Para isso é necessário inicialmente adquirir direitos, o que implica a produção de

news, (sejam filmes, músicas, etc).

31
Figura 2.1 – Fases da Cadeia Produtiva da Indústria de Mídia.

PRODUÇÃO EMPACOTAMENTO DISTRIBUIÇÃO

Fonte: Voto do AC 53500.029160/2004, referente ao caso Sky-DirecTV.

Em um segundo momento, esses produtos são organizados como um conteúdo midiático e

empacotados em canais de televisão, películas de filmes (analógicas ou digitais) para os cinemas,

DVDs, livros, jornais, etc. Finalmente esses produtos midiáticos devem ser distribuídos aos

consumidores através de operadoras de televisão, cinemas, bancas de jornais, livrarias, etc.

Prado observa, ainda, que nessa indústria nenhum estágio é mais ou menos importante do

que outro, e o mau funcionamento de um desses estágios levam a perda de bem-estar do

consumidor. Embora esse seja o modelo geral, cada mídia tem uma cadeia produtiva

característica.

Tendo em vista a base teórica da cadeia produtiva da indústria da mídia analisada

anteriormente, destacaremos agora, cada estágio da cadeia produtiva do mercado de TV por

assinatura especificamente, conforme consta no Informe da Anatel referente ao AC

53500.029160/2004 julgado pelo CADE. As seis fases da cadeia são ilustradas na figura a seguir,

onde o destino final é o consumidor (assinante).

32
Figura 2.2 – Agentes Econômicos da Cadeia Produtiva de TV por Assinatura, segundo

informe da Anatel.

Produtoras Distribuidores Programadoras Representantes Licenciadores Prestadoras


de canais

Fonte: Informe da Anatel.

A primeira fase da cadeia, se analisada da esquerda para a direita, na figura acima,

corresponde a Produção de Conteúdos Audiovisuais, onde as Produtoras, agentes econômicos

incumbidos desta parte do processo, produzem conteúdos audiovisuais, que podem ser programas,

feitos diretamente para veiculação em canais de televisão (abertos ou pagos), ou filmes, para

exibição inicialmente em salas de cinemas.

Esses conteúdos audiovisuais produzidos, tanto podem ser licenciados para Distribuidoras

de direitos de exibição (que se localiza no próximo elo da cadeia) que os comercializa com as

Programadoras, ou até mesmo podem ser negociados diretamente com esta terceira fase do

processo.

Atualmente a produção nacional é pouco competitiva com a estrangeira. Grande parte dos

canais de programação distribuídos pelas prestadoras brasileiras de TV por assinatura tem suas

grades de programação majoritariamente conteúdos produzidos em outras partes do mundo,

principalmente conteúdo norte-americano.

33
Por esta razão, um dos pontos mais discutidos no PL 29, que fará parte da análise do

próximo capítulo, é a questão de cota para a exibição de conteúdos audiovisuais de produção

nacional, como uma verdadeira reserva de mercado, que tem implicado em acirrados debates no

Congresso e na mídia.

O temor de quem é contra esta medida repousa no fato de que esta pode ter um efeito

contrário, pois através de experiências passadas constatamos que a reserva de mercado nunca

assegurou a qualidade de seus produtos, pelo contrário, estimula a acomodação e as produções de

baixo nível, tanto do ponto de vista técnico como de conteúdo. Além de que, a imposição de

exibição de determinados conteúdos fere a liberdade de escolha do consumidor.

A segunda fase do processo produtivo da cadeia da TV por assinatura é a aquisição,

licenciamento e distribuição dos conteúdos audiovisuais para diferentes seguimentos do mercado

audiovisual, dentre eles o mercado de TV por assinatura. Participam desta fase tanto as grandes

Distribuidoras internacionais, principalmente as majors norte-americanas, quanto agentes de

vendas que são autorizadas pelas produtoras a comercializar os conteúdos em determinadas

regiões e mercados específicos.

Os distribuidores são remunerados geralmente por comissão sobre as vendas, e

desempenham um papel muito importante no mercado de TV por assinatura, pois funcionam

como repositórios de conteúdos audiovisuais antigos, ou seja, não inéditos, de segunda a enésima

exibição, que compõem a maioria dos canais dos Pacotes básicos das prestadoras. Este

seguimento não é expressivo no Brasil, as programadoras locais geralmente adquirem conteúdos

no mercado internacional.

34
No terceiro elo da cadeia produtiva, temos as Programadoras, que são aquelas que

formatam canais de programação com conteúdos audiovisuais de produção própia ou produzidos

por terceiros, ou seja, constituem grades de programação 23 na forma de canais, agrupando

conteúdos de temática específica (esporte, ciência, filmes, notícias, etc), além de uma grade

horária determinada pela estratégia da respectiva programadora.

No Brasil há apenas duas programadoras de capital nacional que programam mais de um

canal: Newco (do Grupo Bandeirantes), que tem como canais a Bandnews e a Bandsports; e a

Globosat (das Organizações Globo) que tem como canais o 1º canal de notícias brasileiro 24

horas no ar (Globo News), o primeiro canal dedicado à produção audiovisual nacional (Canal

Brasil), o maior canal de esportes do Brasil (Sportv) e o primeiro canal de esportes voltado para

os brasileiros que moram no exterior (PFC Internacional), dentre outros.

Existem aquelas programadoras que programam apenas um canal, com destaque para a

Climatempo (Climatempo) e a Fundação Padre Anchieta (Rá Tim bum). Há em sua grande

maioria programadoras estrangeiras que atuam no Brasil, como a Warner Channel, Sony Channel

e a HBO, por exemplo.

A quarta etapa do processo é composta pela Representação de canais de programação, que

distribuem os mesmos no Brasil e inserem publicidade nos mesmos. Dentre as empresas atuantes

no mercado brasileiro de TV por assinatura, destaca-se a HBO Brasil, que além de programar e

distribuir os próprios canais, também representa os canais Sony, Warner Channel e A&E Brasil.

23
Grade de programação - Esquema com a seqüência de programação de um determinado canal durante um
determinado período de tempo.

35
Partimos agora para a quinta e penúltima fase da cadeia produtiva, o Licenciamento de

programação. Este segmento é composto por Agentes de Compras de Programação, que

licenciam canais, geralmente na forma de pacotes de canais, licenciando os direitos de

transmissão dos canais pelas Prestadoras de TV por assinatura. Segundo a legislação vigente no

país, a compra de programação ou de canais de programação são obrigatoriamente feitos por

empresa sediada no Brasil. Atuam com destaque nessa fase do processo produtivo no território

nacional, a Net Brasil S.A. e a Associação NEO TV.

Por fim, chegamos à última etapa da produção do mercado de TV paga, segundo informe da

Anatel, compostas pelas Prestadoras ou Operadoras de TV por assinatura, que comercializam

canais de programação junto ao consumidor. Essas empresas são responsáveis pela infra-estrutura

necessária e pela venda de pacotes de canais para o assinante.

Essa infra-estrutura, que será analisada a seguir pode ser feita através de três modalidades

(TV a Cabo, MMDS, e DTH), necessitando para tanto de concessão, autorização ou permissão

por parte da Anatel. As principais prestadoras de TV por assinatura no país são: Sky/DirecTV,

Net/Vivax, Telefônica e Oi TV.

2.3 – As Tecnologias de Prestação do Serviço de TV por Assinatura

No Brasil, hoje, existem operações de TV por assinatura em três tecnologias distintas de

distribuição de sinais: i) TV a cabo, ii) MMDS e iii) via satélite (DTH). Existe ainda uma quarta,

onde a distribuição de sinais utiliza radiofreqüência de um único canal em UHF, porém sem

nenhuma expressão econômica.

A seguir são descritas sumariamente as respectivas infra-estruturas de transmissão:

36
i) TV a Cabo

24
Neste sistema, que é o mais difundido no Brasil, o sinal de TV gerado no headend -

levado até os domicílios por uma rede constituída por cabos coaxiais e, eventualmente, fibras

ópticas - é um somatório dos sinais de programadores locais e/ou daqueles recebidos de

programadores distantes, os quais distribui seus sinais através de ligações (links) via satélite.

O custo de instalação dessa modalidade por domicílio é o mais alto dentre os métodos

utilizados, porém tem a vantagem de poder ser utilizado para outros fins, ou seja, serve como

meio para a prestação de diversos outros serviços, como dados, acesso a Internet, telefonia, e etc.

Essa rede é destinada tanto ao mercado residencial como ao corporativo, principalmente no que

tange aos serviços de voz, Internet em alta velocidade e telefonia.

Para receber os sinais em sua residência, o assinante do serviço necessita ter um aparelho

televisor pronto para receber sinais do cabo (cable-ready) ou utilizar um conversor (converter)25,

que recebe os sinais e os converte para uma freqüência compatível com o aparelho de televisão.

Se os canais forem codificados, será necessário usar um decodificador (decoder)26, em vez do

conversor. A figura abaixo ilustra esta modalidade de transmissão:

Figura 2.3 – Esquema de Prestação de TV por Assinatura via Cabo.

24
Headend - Central de recepção, processamento, geração e retransmissão do sinal para os assinantes. Termo usado
em cabo e MMDS.
25
Conversor - Equipamento instalado na casa do assinante que converte os canais recebidos pelo cabo em canais
sintonizáveis pela TV.
26
Decodificador - Aparelho que permite a visualização de sinais anteriormente codificados.

37
Fonte: ABTA - A programadora transmite o sinal por satélite até o headend da operadora, que envia a

programação ao assinante por meio de cabo coaxial ou de fibra óptica.

As tecnologias mais modernas desta forma, através de cabos do tipo bidirecionais, que

podem transmitir informações da residência do consumidor ao headend, permitem que haja o

acesso à Internet e à TV interativa27. Com isso, abrem-se possibilidades de exploração econômica

e publicitária dessa nova tecnologia.

Porém, é importante salientar que essa modalidade de prestação de TV por assinatura no

Brasil, via cabo, está restrita aos grandes centros, pois como já foi dito, o custo marginal de

instalação por domicílio é bastante elevado, logo não há incentivos econômicos para a exploração

desse serviço em locais afastados, com poucos habitantes e domicílios espaçados, ou seja, as

cidades de interior.

27
TV interativa – Serviço de TV que permite a interatividade, a interferência instantânea na programação por parte
do assinante.

38
ii) MMDS (Multipoint Multichannel Distribution System)

O MMDS é o Serviço de Distribuição de Sinais Multiponto Multicanais, onde a

distribuição é feita através de radiofreqüências na faixa de microondas terrestres (2500 a 2680

MHz), de forma semelhante à transmissão dos canais de TV aberta. Por utilizar freqüência tão

alta, o raio de transmissão limita-se de 30 a 50 km a partir da antena.

O sinal de TV é composto no headend para possibilitar a sua transmissão até os assinantes

através de um sistema de ondas em UHF. Cada assinante possui, obrigatoriamente, uma antena

receptora e um aparelho decodificador. A antena do headend deve estar instalada em um lugar

alto para que as antenas dos assinantes possam “vê-la”. Da mesma forma que na TV a cabo, o

sinal gerado no headend é composto a partir dos sinais recebidos de programadoras locais e

distantes. A figura abaixo mostra como é feita a transmissão dos sinais de TV por assinatura via

MMDS:

Figura 2.4 – Esquema de Prestação de TV por Assinatura via MMDS.

39
Fonte: ABTA – A operadora transmite o sinal por satélite até o headend da operadora que envia a

programação ao assinante. Este recebe através de uma antena de microondas.

Sua capacidade de transmissão é de até 31 canais analógicos, ou de cerca de 180 canais

digitais, mas novas tecnologias demonstram a viabilidade de ampliar-se ainda mais o número de

canais digitais transmitidos. A capacidade de canais do MMDS é menor que a do cabo porque o

sistema dispõe de uma faixa mais estreita do espectro de radiofreqüências. Essa capacidade pode

ser aumentada, entretanto, com a digitalização dos sinais.

iii) DTH (Direct-to-Home)

O sistema Direct-to-Home (DTH) permite que o sinal gerado pela operadora seja recebido

no domicílio do assinante diretamente do satélite, através de uma antena parabólica de

aproximadamente 60 cm de diâmetro e também um decodificador.

Dentre os benefícios de utilização desta tecnologia, está a possibilidade de cobertura

nacional ou até mesmo continental, por se tratar de uma transmissão via satélite. Além de que, o

custo de instalação dessa modalidade por domicílio é baixo se comparado as outras tecnologias

de prestação do serviço. A capacidade de transmitir um número bem maior de canais, em torno

de 180 a 200 canais, é outra vantagem do DTH.

Porém, as barreiras à entrada no mercado de TV por assinatura através desta tecnologia são

elevadas, pois engloba o aluguel de espaços em satélites e a montagem de uma rede a nível

nacional de distribuição e venda. Observamos que ultimamente estes serviços (venda e

distribuição) estão cada vez mais sendo terceirizados pelas operadoras.

40
O sistema DTH mais antigo, analógico, é comumente chamado de Banda C, pois ocupa

uma faixa de freqüências nessa banda (em torno de 6 GHz para subida e de 4 GHz para descida).

Da mesma maneira, o sistema mais moderno, digital, é identificado pela sua faixa de operação, a

Banda Ku28 (em torno de 14 GHz para subida e de 12 GHz para descida).

Figura 2.5 – Esquema de Prestação de TV por Assinatura via DTH.

Fonte: ABTA – A operadora transmite o sinal por satélite diretamente até a casa do assinante.

Diferentemente das tecnologias de TV a Cabo e MMDS, o DTH não permite a inserção de

programas de conteúdo local, pois a programação é a mesma para todos os assinantes, em toda a

área de cobertura.

28
Banda KU – Faixa de freqüência em microondas de 10,95 a 12,7 GHz, utilizada originalmente em aplicações
especiais. Mas recentemente, passou a ser usada para transmissão de sinais de TV, exigindo satélite e equipamento
de recepção próprios.

41
2.4 – O Cenário Nacional

Nesta seção, será exposta a situação atual do mercado brasileiro de TV por assinatura,

através de dados que balizarão a análise do mesmo. Inicialmente identificaremos a quantidade de

pessoas atendidas por este serviço no país.

Existem hoje (1º trimestre de 2009), no Brasil, segundo dados da Anatel29, mais de 6,6

milhões de assinantes de TV por assinatura, o que sugere o mesmo número de domicílios com

acesso ao serviço. Segundo a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD/IBGE), esse

número corresponde dizer que cerca de 22,4 milhões de pessoas tem acesso a TV paga em todo

território nacional30.

Este número demonstra um crescimento significativo do acesso a essa mídia se

compararmos com o ano de 2006, onde cerca de 4,6 milhões de domicílios eram atendidos por

este serviço, ou seja, 15,6 milhões de pessoas, o que corresponde um aumento de 44% do número

de assinantes que dispõem de TV paga atualmente31.

Em nível de população brasileira, segundo estimativas do IBGE no último Censo em 2007,

estima-se que a população brasileira é de cerca de 189,6 milhões de pessoas, logo, a parcela

populacional atendida hoje pelo serviço de TV por assinatura é de 11,8%32.

29
Fonte: Anatel, Dados Estatísticos dos Serviços de TV por Assinatura (Abril de 2009). Cap.1 pg 10, atualizado até
30 de abril de 2009. Disponível em: http://www.anatel.gov.br . Acesso em: 31/06/09.
30
Segundo a PNAD/IBGE, em 2006, o número médio de moradores por domicílio particular permanente, no Brasil,
correspondia a 3,4 pessoas.
31
Cálculo de estimativa próprio.
32
Cálculo de estimativa próprio.

42
Ao contrário da TV aberta, financiada através de um mercado de dois produtos

(programação e audiência), a televisão por assinatura, como o próprio nome sugere, é destinada

exclusivamente a assinantes, com poder aquisitivo suficiente para adquirir o serviço (pagar

mensalidade e a aquisição ou aluguel de aparelhos decodificadores dos sinais emitidos pelas

empresas operadoras), o que no Brasil representa uma restrição do acesso às camadas com

elevado poder aquisitivo.

Com os dados da ABTA apresentados no gráfico abaixo, verifica-se que a grande maioria

dos assinantes da TV paga concentra-se nas classes econômicas A e B da população brasileira. A

taxa de penetração (a razão entre o número de TVs por assinatura sobre o número de aparelhos de

TV existentes) da classe A é mais que o dobro da B, e as classes D e E somam juntas apenas 1%.

Gráfico 2.1 - Penetração da TV por assinatura por classes sociais


(%)
63%

24%

6%
1%

A B C De E

Fonte: ABTA33

33
Dados disponíveis no site: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em 20/05/09.

43
Além do acesso ao serviço ser restrito às camadas mais altas da sociedade, a cobertura do

território brasileiro mostra-se também excludente, pois excetuando-se as operadoras da

tecnologia DTH (Direct-to-home), cuja oferta está pulverizada por todo o país, as operadoras de

TV a cabo e MMDS têm seus serviços concentrados nos grandes centros.

O gráfico abaixo apresenta os estados onde se concentram os maiores números de acesso a

TV por assinatura no país. Nota-se que mais da metade dos assinantes de TV paga no Brasil

pertencem à região sudeste, e que o estado de São Paulo é responsável por cerca de 43,5% dos

acessos em todo o país.

Gráfico 2.2 - Acessos por UF a TV por Assinatura (Milhares )

São Paulo
43,5% Rio Grande do sul
7,5%

Paraná
5,3%

Distrito Federal
2,8%

Outros Rio de Janeiro


19% Minas Gerais 13,8%
8%

Fonte: ABTA34

No fim do ano de 2008, existiam prestadoras em operação em 457 dos 479 municípios onde

existiam contratos assinados. Ou seja, o serviço de TV por Assinatura (TV a cabo ou MMDS)

estava disponível em 8,2% dos municípios em todo o país35.


34
Dados disponíveis no site: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em 20/05/09.

44
A tabela abaixo demonstra a evolução na quantidade de prestadoras por tecnologia, entre

2003 e 2008.

Tabela 2.3 – Quantidade de Prestadoras por Tecnologia.

2003 2004 2005 2006 2007 2008

MMDS 29 28 28 27 27 26

TV a Cabo 113 111 112 109 111 108

MMDS e TV a Cabo 4 4 4 4 3 3

DTH 10 10 10 10 10 14

TVA (UHF) 21 21 21 21 22 22

MMDS e TVA 1 1 1 1 - -

TOTAL 178 175 176 172 173 176

Fonte: Anatel36

Segundo dados da Anatel, a tecnologia que dispõem do maior número de empresas

oferecendo o serviço de TV paga é a modalidade de TV a Cabo, no ano de 2008, havia no

mercado 108 empresas deste tipo, contra 26 utilizando a distribuição de sinais por microondas

(MMDS), e 14 empresas do tipo DTH.

Porém, cabe ressaltar que no que diz respeito ao crescimento de firmas por tecnologia, a do

tipo Direct-to-Home lidera com quatro adições do ano de 2007 para 2008, o que representa um

crescimento de 40% de empresas do tipo via satélite.

35
Fonte: Teleco. Estatísticas TV por Assinatura. Disponível em: http://www.teleco.com.br . Acesso em: 12/06/09.
36
Fonte: Anatel, Dados Estatísticos dos Serviços de TV por Assinatura (Abril de 2009). Cap.1 pg 10, atualizado até
30 de abril de 2009. Disponível em: http://www.anatel.gov.br . Acesso em: 20/06/09.

45
A tabela abaixo mostra o número de assinantes por modalidade de tecnologia no território

nacional.

Tabela 2.4 – Assinantes de TV por Assinatura por Tecnologia.

Milhares 2004 2005 2006 2007 2008 1 T/09

TV a Cabo 2.270 2.511 2.842 3.228 3.811 4.024

DTH 1.350 1.438 1.479 1.762 2.091 2.174

MMDS 230 227 258 346 397 390

TVA (UHF) - - 4 12 22 23

Total 3.851 4.176 4.583 5.349 6.321 6.610

Densidade* 2,11 2,26 2,45 2,84 3,32 3,47

Fonte: ANATEL - *Assinantes /100 habitantes

Diante dos dados da Anatel apresentados na tabela acima, inferimos que, do total de

assinantes, no primeiro trimestre de 2009, cerca de 63,7% eram usuários de TV a Cabo, 34,4% de

DTH, 6,2% de MMDS e 0,4% de TVA (UHF). Além disso, verificamos também que de cada 100

habitantes no Brasil, temos 3,47 assinantes de TV paga de qualquer modalidade.

Outro dado interessante de se examinar é o número de adições líquidas de assinantes de TV

por assinatura de acordo com a tecnologia de prestação do serviço, pois esta informação permite

identificar a tendência de crescimento das respectivas modalidades. O gráfico a seguir demonstra

essa evolução entre 2004 e 2008.

46
Gráfico 2.3 - Adições Líquidas de Assinantes de TV por
Assinatura
583

386
329
Milhares

331
283
241
142
112 88 89
42 30 50
-3 4 9 10

2004 2005 2006 2007 2008

TV a Cabo DTH MMDS TVA

Fonte: Teleco

O gráfico mostra que a TV a Cabo lidera as adições líquidas de assinantes com cerca de 583

mil novos consumidores no ano de 2008, contra 329 mil novos assinantes de DTH, 50 mil de

MMDS e 10 mil de TVA. Isso pode ser justificado pela expansão dos pacotes do tipo triple play

pelas empresas de TV a Cabo, que engloba os serviços de vídeo, dados e voz num único pacote,

resultado do fenômeno da convergência tecnológica nos meios de comunicação que discutiremos

mais à frente.

O preço médio dos pacotes de TV por assinatura cresceu de R$ 47 em 2003 para cerca de

R$ 56 em 2008, atingindo o maior patamar em 6 anos. Com isso, cresce também o faturamento

das prestadoras do serviço, atingindo a marca de 8,5 bilhões em 2008, segundo dados da ABTA

/SETA37, que corresponde um crescimento de 26% em relação ao ano anterior. Neste valor estão

37
Dados disponíveis no site: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em: 20/05/09.

47
inseridos essencialmente mensalidade, pay-per-view e Internet em alta velocidade, além das

receitas com publicidade que são captadas predominantemente pelas operadoras de TV paga.

É importante salientar a importância da participação do serviço de banda larga no

faturamento das prestadoras de TV por assinatura, já que 35% do faturamento das empresas de

TV a Cabo e MMDS advém dos assinantes de banda larga38.

As principais empresas operadoras de TV por assinatura no país são: NET / Vivax, SKY

/DirecTV, Telefônica e Oi TV. O gráfico abaixo apresenta o market share das prestadoras de TV

paga no primeiro trimestre de 2009.

Gráfico 2.4 - Market Share Operadoras TV paga -


1T/09
SKY/DirecTV
Net / Vivax 31%
50,6%

Telefonica
Outras 7,6%
12% Oi TV
0,9%

Fonte: Teleco

Segundo dados apresentados no gráfico acima, referentes ao primeiro trimestre de 2009, a

operadora Net/Vivax lidera o mercado de TV por assinatura com 50,6% dos assinantes no país,

38
Fonte: Teleco. Estatísticas TV por Assinatura. Disponível em: http://www.teleco.com.br. Acesso em: 12/06/09.

48
seguidos pela operadora de TV por satélite SKY/DirecTV, com 31% do market share. Telefônica

com 7,6%, e Oi TV com 0,9% são as outras com parcela de mercado significativa, e bom

potencial de crescimento no mercado dessa mídia.

Durante os últimos anos ocorreram mudanças no mercado que demonstram uma tendência a

concentração (vertical e horizontal), gerando preocupações nos órgãos componentes do Sistema

Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), composto pela SEAE (Secretaria de

Acompanhamento Econômico) vinculada ao Ministério da Fazenda, SDE (Secretaria de Direito

Econômico) vinculada ao Ministério da Justiça, e o CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), responsável pelo julgamento dos atos de concentração.

Em 2004, a Globopar (Globo Comunicações e Participações S.A.) e a DirecTV anunciaram

um acordo para a fusão das prestadoras de TV por assinatura por DTH SKY e DirecTV no Brasil.

A nova empresa, que manteve o nome SKY Brasil, passou a ser controlada e gerenciada pela

DirecTV (72%), com a Globopar detendo os 28% restantes. Essa fusão foi aprovada pelo CADE

em maio de 2006, tendo como relator na época o Conselheiro Luiz Carlos Delorme Prado39.

Em 2005, outro Ato de Concentração no mercado de TV por assinatura, a aquisição, pela

Telmex junto a Globopar, de participação acionária minoritária nas prestadoras dos serviços de

TV a Cabo e MMDS, controladas pela Net Serviços, adquirindo-se participação acionária,

também minoritária, nesta empresa. Em setembro deste ano, a Embratel Participações anunciou a

incorporação da Telmex Brasil e da participação acionária de 37,1% do capital social da Net

39
Refere-se ao AC nº 53500.002423/2003. Requerentes: The New Corporation Limited e Hughes Electronic
Corporation; e ao AC nº 53500.029160/2004. Requerentes: The New Corporation Limited, The DirecTV Group e
Globo Comunicações e Participações S.A. (Globopar). Relator: Luiz Carlos Delorme Prado.

49
Serviços de Comunicação S.A. detida pela Telmex mexicana. Em novembro de 2006, o CADE

aprovou esta operação40.

No ano de 2006, houve a aquisição pela TNL Participações, através de leilão na Bovespa

em 27 de julho, das ações ordinárias e preferenciais de emissão da Way TV, que era controlada

pela Infovias, empresa de comunicação de dados da CEMIG. A empresa do Grupo Telemar

desembolsou cerca de R$ 132 milhões na compra. A aprovação desta operação pelo CADE foi

condicionada a um TCC (Termo de Compromisso de Desempenho) que visava garantir que a

rede da Infovias não fosse utilizada futuramente com exclusividade pelas Requerentes41.

Em outubro de 2006, a Telefônica e o Grupo Abril anunciaram que a primeira iria adquirir a

totalidade das operações MMDS da TVA nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e

Porto Alegre, além de 100% das ações preferenciais e ordinárias das operações de TV a Cabo em

São Paulo, Curitiba, Florianópolis e Foz do Iguaçu. Porém, uma decisão da Anatel determinou

que a Telefônica não poderia exercer o controle acionário ou societário da TVA, pois segundo a

agência reguladora as empresas de telefonia fixa são proibidas de oferecer TV a cabo na região

em que já atuam. Com isso, AS empresas funcionam de forma independente no Estado de São

Paulo, onde a Telefônica é concessionária de telefonia fixa local.

Ainda no ano de 2006, a Net anunciou a aquisição da Vivax, operação que teve sua

efetivação em dezembro do mesmo ano, e foi aprovada pelo Anatel em maio de 2007, e pelo

CADE em dezembro do mesmo ano. Também em dezembro de 2007, a Net anunciou mais uma

40
Refere-se ao AC nº 53500.019422/2004. Requerentes: Teléfonos de México S.A. de C.V e Globopar
Comunicações e Participações S.A. Relator: Luiz Carlos Delorme Prado.
41
Refere-se ao AC nº 53500.022152006. Requerentes: TNL Participações S.A e Way TV Belo Horizonte S.A.
Relator: Luiz Carlos Delorme Prado.

50
aquisição, 100% das ações e quotas representativas da BIG TV, ampliando assim sua área de

atuação geográfica.

2.5 – A Convergência Tecnológica e seus Impactos

O termo convergência tecnológica é freqüentemente definido de uma forma muito

generalizada e simplificada, como sendo um processo pelo qual telecomunicação, tecnologia da

informação (TI) e da comunicação social, setores que originalmente operam separadamente, se

desenvolvem conjuntamente. Convergência é mais que tecnologia envolve estratégias

empresariais, novas maneiras de fazer negócios e de interação com a sociedade” (PRADO,

2007)42.

A convergência é um fenômeno mundial, induzido em grande parte pela digitalização

tecnológica e a evolução de protocolos de interface aberta, como o IP, por exemplo. No âmbito

da tecnologia “clássica” (ou tradicional), cada serviço requer sua própia rede e, portanto, os

mercados se identificam a partir dessas redes associadas ao serviço correspondente, ou a partir

das tecnologias utilizadas. Situação diferente ocorre no cenário da tecnologia convergente, pois a

mesma infra-estrutura de rede é utilizada para prestar diferentes serviços, aplicações e conteúdos,

acarretando numa modificação da “cadeia de valor”.

Outro conceito deste processo, que consta no Livro Verde da Comissão Européia (CE),

define convergência como a junção de dispositivos do consumidor, como o terminal telefônico, a

televisão e o computador pessoal. Esses novos produtos são chamados de triple-play ou multiplay.

42
Ver mais em Prado (2007).

51
Um ponto importante a ser considerado com o triple-play é referente à inclusão digital,

porque se formos observar existem muitas cidades, principalmente no interior dos estados, que

não possuem TV a cabo, mas com certeza já desfrutam dos serviços da Internet em banda larga.

Com esta nova tecnologia estas cidades poderão ter acesso a mais nova geração da televisão, que

quebra alguns paradigmas e apresenta vários entretenimentos aos usuários. Além disso, esta

tecnologia leva também a telefonia IP e o acesso banda larga, fazendo a distribuição da

tecnologia e levando ao conhecimento dos que ainda não conhecem.

Esta nova realidade tem motivado o desenvolvimento da competição entre as redes e

também tem proporcionado a maximização da utilização da complementaridade existente entre os

serviços de voz, dados e vídeo. Conseqüentemente, o processo de convergência traz consigo uma

série de alterações na forma de proverem estes serviços.

O processo em questão tem tanto um lado técnico como um lado funcional. O lado técnico

refere-se à capacidade de que através de qualquer infra-estrutura seja possível transportar

qualquer tipo de dados, enquanto o funcional significa que o consumidor poderá ser capaz de

acessar as funções de computação, entretenimento e voz em um único dispositivo capaz de

executar uma multiplicidade de tarefas.

Um ponto importante da convergência é que, se adequadamente gerida, a convergência dos

meios de comunicação pode desempenhar um papel importante a nível nacional, no que diz

respeito ao desenvolvimento econômico e social do país. Os governos podem aproveitar a

oportunidade para estimular o desenvolvimento do mercado e satisfazer as necessidades de

comunicação da sociedade, tornando mais democrático o acesso aos diversos serviços antes

elitizados, trazendo melhor qualidade de vida ao cidadão.

52
Por outro lado, temos também o impacto positivo do desenvolvimento das atividades do

homem moderno e da acentuação do processo de globalização, que faz com que a necessidade do

cidadão de ter de se comunicar a qualquer hora do dia, em qualquer lugar por meio de qualquer

dispositivo leva as redes de telecomunicações a disponibilizar sistemas e equipamentos com

funcionalidades cada vez mais convergentes.

A convergência diminui as barreiras à entrada no mercado de novos operadores (entrantes)

e prestadores de serviços. O aparecimento de novos operadores no mercado intensifica a

concorrência, dando aos consumidores uma ampla variedade de prestadores de serviços para

escolher, acarretando na queda dos custos de comunicação.

Segundo Prado (2007) em seu relatório “A Convergência Tecnológica e seus Impactos


43
Concorrenciais” , pode-se separar em diferentes níveis o processo de convergência:

Convergência setorial – fusão entre os setores de telecomunicações, tecnologia da informação

(TI), audiovisual (TV por assinatura), radiodifusão (TV aberta); Convergência entre serviços –

serviços e/ou conteúdos oferecidos por diferentes redes (telefonia fixa, banda larga e TV – triple-

play ou telefonia móvel – quadruple-play); Convergência entre redes – uma mesma rede

oferecendo diferentes serviços; e Convergência de terminais – um mesmo terminal dando acesso

a distintas redes e serviços.

Ainda segundo Prado (2007), os serviços tradicionais (“clássicos”) e os novos serviços

convergentes vão coexistir por tempo significativo e indeterminado. Com isso ressalta-se a

43
Ver Relatório "A Convergência Tecnológica e seus Impactos Concorrenciais", de autoria do ex-conselheiro do
CADE, Luiz Carlos Delorme Prado, resultante de 12 audiências públicas sobre o tema, realizadas de 26 de abril a 13
de setembro de 2007 no Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (CADE), Brasília.

53
importância de se ter um modelo institucional adequado para permitir o melhoramento do serviço

de telecomunicações no Brasil.

No próximo capítulo analisaremos os dispositivos institucionais que regulam o serviço de

TV por assinatura no país, atentando para o quadro apresentado sobre o cenário nacional do

mercado de TV paga e o fenômeno da convergência tecnológica apresentado, tal como as

consequências competitivas destes fatos para o mercado em análise.

54
3 – A REGULAÇÃO E O SISTEMA JURÍDICO DO MERCADO DE TV

POR ASSINATURA NO BRASIL

3.1 – A Regulação Econômica

A regulação está prevista no ordenamento jurídico brasileiro e traduz-se na competência do

Estado para orientar ou limitar o grau de liberdade de escolha dos agentes econômicos em defesa

do interesse público, visando aumentar os níveis de eficiência econômica nos mercados regulados,

assim como o bem-estar social.

Segundo Pinto Jr. E Fiani (2002, p. 515), os limites impostos aos agentes privados podem

referir-se tanto a preços e tarifas como ao nível de produção, ao número de concorrentes, à

segmentação de mercado, à qualidade e determinadas características do produto. Possas et alli

(1997) caracterizam exatamente qual é o objetivo da regulação econômica:

“Ao contrário do que possa parecer - e não raro surge no discurso político sobre o tema -, o

objetivo central da regulação de atividades econômicas não é promover a concorrência como

um fim em si mesma, mas aumentar o nível de eficiência econômica dos mercados

regulados”.(pág. 86)

A definição de eficiência econômica abarca quatro aspectos: eficiência produtiva,

distributiva, alocativa e dinâmica. A eficiência produtiva refere-se à utilização ótima da planta

produtiva e das respectivas técnicas de produção a custos mínimos.

A eficiência distributiva diz respeito à capacidade de distribuição dos ganhos econômicos

entre os agentes atuantes no mercado, essencialmente firmas e consumidores, por meio da

55
concorrência, da livre entrada e saída do mercado ou, ainda, de mecanismos que conduzam a

eliminação de rendas monopolísticas ou outros lucros extraordinários temporários por agentes

econômicos individuais.

Na eficiência alocativa, busca-se atingir a condição do ótimo de Pareto, que faz com que o

máximo de transações seja realizado, com a conseqüente geração de maior renda. Porém, sabe-se

que esta condição é teórica, pois só será atingida em condições de concorrência perfeita no

equilíbrio geral, onde os preços se igualam aos custos marginais em todos os mercados. O setor

público provavelmente não existiria se todos os bens e recursos fossem perfeitamente alocados no

mercado.

Já a eficiência dinâmica corresponde àquela ao longo do tempo, ou seja, que leva em conta

as diferenças intertemporais entre preços e margens de lucro, e entre a eficiência produtiva e a

capacidade de inovação. Tal noção torna o progresso técnico como variável endógena à eficiência

econômica (POSSAS et alli, 1997).

A necessidade de regulação econômica diminui na medida em que aumenta a concorrência

no setor regulado. A ausência de rivalidade acarreta vários prejuízos ao bem-estar econômico e

social. Os monopolistas têm pouco incentivo em buscar inovações e em aumentar a qualidade do

bem ou serviço produzido, além disso, a presença de concorrentes faz com que as firmas

busquem investir e inovar para não perder parcela de mercado, culminando num maior

desenvolvimento tecnológico, com conseqüentes benefícios para a sociedade (PYNDICK, 2004).

Existe um tipo de monopólio que pode constituir uma forma eficiente de organizar a

produção quando existem elevadas economias de escala e escopo, em relação ao mercado

56
atendido pelo monopolista. É a situação denominada monopólio natural, onde a entrada de mais

um concorrente no mercado seria ineficiente, pois seria eliminada pela própia concorrência,

exigindo-se assim a regulação do mercado.

O monopólio natural é uma situação de mercado em que os custos fixos são muitos

elevados e os variáveis ou custos marginais são muito próximos de zero. Caracterizados também

por serem bens exclusivos e com muito pouca ou nenhuma rivalidade (PYNDICK, 2004).

Esses mercados são geralmente regulamentados pelos governos e possuem prazos de

retorno muito grandes, por isso funcionam melhor quando bem protegidos. No Brasil, as

telecomunicações eram consideradas monopólio natural até a privatização do Sistema Telebrás,

em 1998.

A partir de então, a regulação ativa de agentes privados sob regime jurídico de concessão ou

permissão, tornou-se a opção adotada pelo Estado brasileiro após a privatização do setor, afim de

que se fosse feita uma rigorosa supervisão estatal na oferta dos serviços, de maneira a garantir

que sejam providos de forma adequada e a minimizar riscos de abuso do poder econômico.

3.2 – O Papel da Anatel

Após a extinção do monopólio estatal das telecomunicações e a conseqüente adoção de um

novo modelo, em um ambiente de competição entre as empresas operadoras, sob o contexto da

abertura econômica, surgiu a Agência Nacional das Telecomunicações, a Anatel.

57
O novo modelo das telecomunicações brasileiras foi definido pela Lei Geral das

Telecomunicações (LGT) – Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a mesma que criou a Anatel,

que tinha como objetivo organizar a exploração dos serviços de telecomunicações no país.

A Anatel foi criada para viabilizar este novo modelo de telecomunicações, desempenhando

o papel de órgão responsável pela regulação do setor, e preparar o país para ingressar na

sociedade da informação. A ela cabem os papéis de regular, fiscalizar e outorgar, exceto a

outorga dos serviços de radiodifusão, conforme o artigo 211 da LGT, mantendo-a no âmbito de

competências do Poder Executivo.

Ainda sim, a Anatel é responsável por garantir a toda população brasileira o acesso aos

diversos serviços de telecomunicações em condições propícias de qualidade e com tarifas

razoáveis, promover a expansão da cobertura das redes e serviços de telecom, fomentar a

competição e estimular a universalização.44

Os serviços de TV por assinatura foram classificados como serviços de telecomunicações

desde a vigência do Código Brasileiro de Telecomunicações - Lei nº 4.117/62. A TV por

assinatura é regulada, portanto pela Anatel, sendo sua regulação dissociada da radiodifusão, que é,

inclusive, de responsabilidade de outro órgão.

A Superintendência de Serviços de Comunicação de Massa (SCM) da Anatel é responsável

pela regulamentação, as outorgas para a prestação dos quatro tipos de serviço de TV por

assinatura (TV a cabo, DTH, MMDS e TVA-UHF) e o combate às infrações a ordem econômica.

44
Fonte: Informe da Anatel, Perspectivas para Ampliação e Modernização do Setor de Telecomunicações. Brasília,
2000.

58
Já a fiscalização no aspecto técnico das prestadoras do serviço é de responsabilidade da

Superintendência de Radiofreqüência e Fiscalização (SRF), também da Anatel.45

3.3 – A Lei do Cabo: Princípios e Limitações

Em 6 de janeiro de 1995, o Presidente da República na época, Fernando Henrique Cardoso,

sancionou a Lei nº 8.977 dispondo sobre o serviço de TV a cabo. Percebe-se então que esta lei

que regula os serviços de TV a cabo é anterior a LGT e a criação da Anatel. Portanto,

identificamos um primeiro problema, pois o dispositivo regulatório da TV a cabo não é o mesmo

daquele que regula as demais formas de prestação do serviço de TV por assinatura.

O serviço de distribuição de sinais de televisão e áudio por assinatura via satélite, o DTH,

tem suas condições para exploração e uso do serviço determinado pela Norma Nº 008/97. Já o

MMDS tem suas condições dispostas na Norma Nº 002/94 REV 97. Ambas as modalidades são

consideradas como Serviços Especiais, regulados pelo decreto Nº 2.196/97.

A Lei do Cabo, como ficou conhecida, definiu em seu artigo segundo os serviços de TV a

Cabo como serviços de telecomunicações que consistem na distribuição de sinais de vídeo e/ou

áudio, a assinantes, mediante transporte, por meios físicos.

O artigo 3º da mesma lei estabelece os seguintes objetivos do Serviço de TV a Cabo: “Art.

3º O Serviço de TV a Cabo é destinado a promover a cultura universal e nacional, a diversidade

de fontes de informação, o lazer e o entretenimento, a pluralidade política e o desenvolvimento

social e econômico do País”. A formulação desta política é orientada pelas noções de “rede única,

45
Fonte: Informe da Anatel, Estudo Comparativo de Modelos Regulatórios Nacionais. Brasília, 2007.

59
rede pública e participação da sociedade, operação privada e coexistência entre as redes privadas

e as das concessionárias de telecomunicações” (Artigo 4º, § 1º).

Neste último artigo citado podemos salientar pontos positivos do disposto na lei.

Primeiramente, a garantia da existência de uma rede única, no sentido de padronização e

conectividade, em consonância com as políticas públicas a serem desenvolvidas para as

telecomunicações no Brasil. Porém, de fato, a idéia de rede única nunca funcionou totalmente,

tanto que muitas operadoras de cabo construíram redes de transporte próprias, para transmissão

de imagem e áudio televisivos (RAMOS, 1996).

Em segundo, de acordo com Brittos (1999, p. 9): “a idéia de rede pública possibilita o

acesso de qualquer interessado ao sistema de transporte de TV a cabo, um grande passo

democratizante, num país onde os proprietários dos veículos sempre limitaram a participação na

programação da mídia”.

A Lei do Cabo estabelece a concessão como “o ato de outorga através do qual o poder

executivo confere a uma pessoa jurídica de direito privado o direito de executar e explorar o

Serviço de TV a Cabo” (Artigo 5º, I). A operadora é a pessoa jurídica diversa da “programadora”,

que produz e/ou fornece “programas ou programação audiovisual” (Artigo 5º, VII). Quanto aos

canais, eles estão divididos em básicos, destinados à prestação eventual de serviço, destinados à

prestação permanente do serviço, e de livre programação da operadora (Artigo 5º, IX, X, XI e

XII).

A concessão para o serviço de TV a Cabo, segundo o Art. 6º da Lei 8.977/95, é outorgada

por 15 (quinze) anos, podendo ser renovada por períodos sucessivos e iguais, dadas

60
exclusivamente à pessoa jurídica de direito privado que tenha como atividade principal a

prestação deste serviço.

O Art. 6º nos coloca a primeira limitação para a expansão do serviço, principalmente sob a

forma de aumento do número de empresas atuantes, pois o artigo estabelece que a outorga seja

dada através de concessão, um contrato rigoroso entre o Estado e uma empresa prestadora de

serviço de interesse público, onde se define direitos e deveres de ambos, assim como estabelece

um prazo permitindo periódicas reavaliações das condições de prestação do serviço. Já para as

outras modalidades de provimento do serviço, DTH e MMDS, a forma de outorga se dá via

autorização, concedidas pela Agência Nacional de Telecomunicações, após processo licitatório.

Outra barreira legal que se impõe é a determinação da Lei do Cabo de que concessionária

de TV a cabo deve ter como atividade principal a prestação desse serviço, faz com que um grupo

que for concessionário de telefonia fixa não pode ser de TV a cabo.

As licenças de TV a Cabo possuem caráter local, limitadas a um município, e sua

exploração continua sendo concedida somente à pessoa jurídica de direito privado e que tenha

sede no Brasil e pelo menos 51% do capital social, com direito a voto, pertencente a brasileiros

natos ou naturalizados a mais de dez anos (Artigo 7º, I e II).

Temos desta forma mais uma diferença na organização do mercado de TV por assinatura

nas suas diferentes modalidades, pois essa restrição de maioria do capital social da empresa ser

detida por brasileiros apenas, desestimula o investimento externo no setor, enquanto que a forma

via satélite e MMDS não requerem este tipo de cláusula. Ainda, essa determinação acabou tendo

61
conseqüências graves em termos de investimentos em infra-estrutura. A medida em que se

removerem os obstáculos ao capital estrangeiro, será possível expandir as redes.

Outra determinação importante feita pela Lei 8.977/95, no seu Art 9º, é que para ocupar a

direção da concessionária de TV a cabo, a pessoa física não poderá gozar de foro especial ou

imunidade parlamentar, evitando dessa forma que haja possíveis conflitos de interesse político e

privado.

O capítulo III da mesma lei estabelece que as concessões para exploração do serviço de TV

a cabo não terão exclusividade em hipótese alguma em nenhuma área de prestação de serviço

determinada (Art 14º), ou seja, uma ou mais empresas operadoras podem disputar o mesmo

mercado.

Neste capítulo identifica-se mais uma limitação da lei, quando em seu Art 15º estabelece-se

que somente serão autorizadas as concessionárias de telecomunicações a operar serviço de TV a

cabo na hipótese de não haver interesse por parte de empresas privadas em fazê-lo, caracterizado

este fato pela ausência de resposta a edital relativa a uma determinada área de prestação de

serviço.

As disposições referentes à Rede Local de Distribuição e a Rede de Transporte de

Telecomunicações são objeto do Capítulo IV da Lei 8.977/95, onde se define que a propriedade

da última pertence à concessionária de telecomunicações, sendo a mesma utilizada para diversas

operações de transporte de sinais de telecom, inclusive de TV (Art. 16). Já a primeira pode ser de

propriedade também da operadora de TV a cabo, sendo permitida a eventual utilização para

prestação de outros serviços pela concessionária de telecomunicações (Art. 17).

62
Ainda no mesmo capítulo, determina-se que as concessionárias de telecom poderão

estabelecer acordos com operadoras de TV a cabo ou outros interessados no que se refere à

construção de redes e na sua utilização partilhada (Art. 21).

O Art. 26 dispõe ainda em seus dois parágrafos, sobre a garantia ao assinante, mediante

pagamento da mensalidade e da adesão, ao acesso à totalidade dos canais básicos e a infra-

estrutura de transporte e distribuição de sinais de TV adequada, permitindo ainda a

individualização do acesso de assinantes a canais determinados. O problema neste aspecto é valor

da assinatura básica, que para padrões nacionais, como foi visto no capítulo dois deste estudo,

revela uma barreira ao acesso de classes mais baixas da população brasileira.

Em razão do alto preço das mensalidades de TV por assinatura pode-se dizer que a

expansão do serviço não deslanchou no Brasil. O país tem hoje (Fonte: Anatel / 1º trimestre de

2009) cerca de 6,3 milhões de assinantes e uma penetração entre as menores do mundo, mesmo

comparada com países com PIB per capta iguais ao nosso. No Brasil, enquanto a penetração de

TV paga é de apenas 10,3%46, na Argentina, a TV paga alcança 63% da população; no Chile,

25%; no México, 24% e na Venezuela, 21%. 47 . O alto preço do serviço no país pode estar

associado à falta de competição, já que o mercado de TV paga nacional conta com poucas

operadoras.

O Capítulo V da lei é referente à operação do serviço e dispõe sobre a exigência por parte

do Poder Executivo de que as operadoras de TV a cabo disponibilizem canais gratuitos para

diversas destinações. Uma das principais conquistas da lei foi a obrigatoriedade da presença de

46
De acordo com a tabela 2.1 apresentada no Capítulo 2 deste trabalho.
47
Dados da ABTA. Disponível em: http://www.midiafatos.com.br/index.aspx . Acesso em 23/07/2009.

63
emissoras públicas, comunitárias e universitárias na TV por assinatura sem custo algum, dentre

estes seis canais de acesso público e gratuito: sendo três canais legislativos (Senado, Câmara

Federal e um terceiro compartilhado pela Assembléia Legislativa - Câmara Municipal), um canal

educativo-cultural, um canal universitário, e um canal comunitário, aberto para utilização livre

por entidades não governamentais e sem fins lucrativos. A lei também determinou que as

operadoras de TV a cabo devem manter dois canais para uso eventual, mediante aluguel.

A possibilidade de transferência de concessão para a exploração do serviço de TV a cabo só

poderá ser requerida após o início da operação do serviço, dependendo de prévia autorização do

Poder Executivo competente, sob pena de anulação (Art. 27 e 28). Já a renovação da concessão é

assegurada à operadora que tenha cumprido de forma satisfatória as condições de concessão e

atendendo também a regulamentação, além de atender as exigências técnicas e econômicas para a

continuidade da prestação do serviço bem como a modernização do seu sistema (Art. 36).

Por fim, analisemos os direitos e deveres atribuídos às prestadoras de TV a cabo, assim

como aos assinantes do serviço. Segundo Art. 30 da Lei do Cabo, a operadora pode codificar

sinais, veicular publicidade (como foi visto anteriormente, esta é a principal fonte de receita das

empresas de TV por assinatura), cobrar mensalidade e remuneração pelos demais serviços

prestados (manutenção, por exemplo) e co-produzir filmes nacionais utilizando incentivos fiscais

previstos na Lei 8.685/9348.

As operadoras têm como dever atender as normas e regulamentos do serviço, não recusar o

atendimento de clientes dentro de sua área de prestação de serviço através de qualquer tipo de

48
Lei Nº 8.685, de 20 de julho de 1993, conhecida como Lei do Audiovisual cria mecanismos de fomento à atividade
audiovisual, como mecanismos de incentivo à produção de filmes brasileiros independentes, através de renúncia
fiscal.

64
discriminação, além de ser obrigada a exibir em sua programação filmes nacionais de todo tipo

(curta, média e longa-metragem, produção independente, etc).

Os assinantes têm o direito de conhecer previamente a programação ofertada, bem como

receber por parte da operadora, de forma direta ou por terceiros, serviços de instalação e

manutenção dos equipamentos de recepção de sinais. Os mesmos têm o dever de pagar a

mensalidade referente a assinatura do serviço e zelar pelos equipamentos fornecidos pela

operadora de TV a cabo, e sobre hipótese alguma interceptar sinais.

Diante das limitações e dos desafios relatados pela análise do atual arcabouço institucional

do segmento de TV por assinatura, principalmente a Lei do Cabo, que dispõe sobre o

regulamento de exploração do serviço de TV a cabo, e as Normas Legais estabelecidas pelo

Poder Executivo afim de que se organize também a exploração do serviço nas modalidades DTH

e MMDS, surge o debate da necessidade de um novo marco normativo que possa atender as

demandas legais atuais concernentes à convergência tecnológica e a evolução do mercado de

comunicação como um todo.

3.4 – PL 29: Novas Propostas para Regular o Mercado

Mediante esse contexto, mudanças institucionais vêm sendo discutidas no Congresso

Nacional, visando à adequação da atual legislação, que ganha corpo com o Projeto de Lei Nº 29.

O PL 29/07, de autoria do Dep. Paulo Bornhausen, pretendia instituir um novo marco legal para a

comunicação social eletrônica no País, matéria constante dos artigos. 220 a 224 da Constituição

Federal, e revogava dispositivos da Lei do Cabo, Lei nº 8.977/95. Foram apensados ao PL nº 29,

os Projetos de Lei nº 70/07, 332/07 e 1.908/07.

65
Essas proposições sujeitas à apreciação conclusiva das Comissões (inc. II do art. 24 do

Regimento Interno da Câmara) foram distribuídas para análise de mérito às Comissões de

Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio – CDEIC, de Defesa do Consumidor (CDC)

e Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática – CCTCI, e para análise de

constitucionalidade e juridicidade, à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Na

CCTCI, o PL 29/07 chegou a ser relatado pelo Dep. Jorge Bittar, que elaborou um Substitutivo49

que, no entanto, não chegou a ser votado, tendo o PL sido re-encaminhado à CDC, cujo

Substitutivo está na pauta de votação da Comissão. No fechamento desta monografia estava em

discussão um novo substitutivo do novo Projeto de Lei, de autoria do novo relator, o Dep. Vital

do Rêgo Filho, entendendo que ainda há necessidade de se fazer ajustes técnicos e legislativos ao

Substitutivo. Porém, ressalta-se que este trabalho está baseado no Substitutivo do Dep. Jorge

Bittar.

A proposta de transformação do setor de TV paga está baseada em algumas premissas:

neutralidade tecnológica; desverticalização da cadeia produtiva; regulação por camadas;

introdução de competição no mercado audiovisual; e o fomento a produção.

Com a primeira premissa, pretende-se quebrar o paradigma da atual regulação centrada na

plataforma tecnológica, transformando a TV por assinatura em um serviço neutro do ponto de

vista tecnológica, ou seja, regular igualmente as diferentes formas de distribuir o produto. Este é

o primeiro ponto positivo, pois o que realmente importa para o consumidor é o produto final, e

não a forma como este é provido. Para o consumidor final não há diferença se o serviço foi

prestado via cabo ou satélite.

49
Quando da divulgação do Substitutivo de Jorge Bittar ao PL 29, na CCTCI, manifestaram-se “favorável” ao
mesmo, a ANATEL e a STI/MDIC, e “favorável com sugestões”, a ANCINE, a SEAE/MF e a CONJUR/Minicom.

66
Por isso, o Projeto de Lei propõe a revogação da Lei 8.977/95 que fere a premissa da

neutralidade tecnológica, ou seja, só serve para o cabo. É proposta ainda a supressão dos artigos

na Lei Geral de Telecomunicações que remetem a Lei do Cabo.

Cabe também salientar que as propostas do PL 29 concentram-se na TV paga e não tratam

da radiodifusão, que por preceito constitucional é tratada de maneira distinta dos demais serviços.

O PL 29 só legisla sobre o serviço de radiodifusão no que diz respeito a restrições cruzadas de

capital entre operadoras de telecomunicações e emissoras de radiodifusão (limite de 30% para a

participação de empresa de telecomunicações). Além disso, os atuais serviços de TV a cabo, de

MMDS, de DTH e de TVA passarão a ser um único Serviço de Acesso Condicionado, explorado

em regime privado, sob autorização, e não mais concessão.

A desverticalização da cadeia produtiva, segunda premissa do substitutivo do PL 29, visa

obter um número maior de agentes econômicos atuantes em cada etapa do processo de produção.

Este é um outro ponto positivo, pois ao desagregar a cadeia produtiva identificam-se as diversas

atividades que contribuem para o serviço, estabelecendo, para cada uma delas, regras específicas.

O PL 29 considera que pelo menos quatro setores econômico-empresariais participam do

processo produtivo: produção, programação, empacotamento e transporte / distribuição50.

Observa-se que, de acordo com o Projeto de Lei, não há a necessidade da criação de

empresas “empacotadoras”, pois esta atividade é livre, podendo ser exercida inclusive pelo

50
É possível que mesmo assim ocorra “verticalização” nas atividades, por exemplo, a NET produz os seus conteúdos
através de diversas subsidiárias das Organizações Globo; programa-os através dos muitos canais Globosat (uma
dessas subsidiárias); empacota-os através da própria NET Brasil; e transporta os pacotes para a casa dos assinantes,
através da NET Serviços.

67
próprio distribuidor do serviço de TV por assinatura. A definição desta etapa da cadeia produtiva

é necessária apenas para efeitos regulatórios.

Em seu turno, a regulação por camada consiste em abrir a cadeia de valor de forma a

separar de um lado o audiovisual e do outro as telecomunicações, ou seja, cada órgão regulador

distinto terá a competência na regulação de cada uma dessas “camadas”, sendo a Ancine

responsável pela parte do audiovisual (produção, programação e empacotamento), e a Anatel

responsável pela distribuição do serviço (telecomunicações). Caberá a Anatel regulamentar e

fiscalizar apenas o segmento de distribuição, isto é, a infra-estrutura de transporte (cabo, satélite

ou MMDS). Toda a parte relativa a conteúdo, da produção ao empacotamento, ficará sob a

responsabilidade da Ancine. Também são dados poderes ao CADE para monitorar a concorrência,

pois a instrução dos processos de concorrência no setor do audiovisual será realizada pela Ancine

e encaminhada ao CADE (paralelo com a Anatel na LGT).

O estímulo à competição no mercado audiovisual foca principalmente na necessidade de

queda nos preços, e ainda o fomento à produção para ampliar o mercado, estimulando o conteúdo

nacional e a exportação. O fomento à produção ocorrerá mediante a transferência de recursos do

Fistel51 para a Condecine52, sem alterar a carga tributária ou criar novo tributo.

Como o PL 29 revoga a Lei do Cabo, logo as restrições ao capital estrangeiro também

mudam. Pelo disposto no novo Projeto de Lei o capital estrangeiro fica livre nas fases de

51
Fistel – Fundo de Fiscalização das Telecomunicações é um fundo que se destina a custear as despesas realizadas
pelo Governo Federal no exercício da fiscalização das telecomunicações, e a custear o desenvolvimento de novos
meios e técnicas para o exercício desta fiscalização.
52
Condecine – Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional – tem por fato gerador
a veiculação, produção, licenciamento e distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas publicitárias com
fins comerciais.

68
empacotamento e distribuição (telecomunicações), com isso surge a possibilidade da entrada das

empresas de telefonia fixa local na prestação do serviço de TV por assinatura.

Atualmente, as empresas de telefonia fixa são proibidas de oferecer TV a cabo na região

em que já atuam. Apesar disso, muitas driblaram a legislação e conseguem prestar o serviço. A

Telefônica, por exemplo, comprou parte da TVA, mas em São Paulo, não pode ter o controle da

empresa. Já a Oi comprou a operadora de TV a cabo Way TV em um leilão em 2006. Como a

empresa de telefonia foi a única a fazer oferta pela Way TV, a Anatel entendeu que isso era

permitido pela Lei do Cabo53.

Já o PL 29 permite que as operadoras de telefonia entrem no mercado de provisão de TV

por assinatura, com isso, o número de agentes competindo aumentará gerando benefícios para o

consumidor, principalmente em termos de qualidade de serviço e preços a serem aplicados.

Essa tendência, de uma empresa ou um grupo econômico oferecer uma variada gama de

serviços (voz, dados e vídeo), confirma as previsões decorrentes do processo de convergência

tecnológica, que vem desenvolvendo-se cada vez mais, e criando um cenário concentrado de

conglomerados de firmas prestadoras de serviços de telecomunicações.

A entrada das teles no mercado de TV por assinatura é importante também para facilitar a

expansão da oferta do serviço no território brasileiro, pois onde elas possuírem a infra-estrutura

necessária ao provimento do mesmo, não haverá a necessidade de se duplicar investimentos. A

desagregação das redes é outro fator importante, pois vai permitir mais uma fonte de renda para

as empresas e irá intensificar a competição no mercado.

53
A “Lei do Cabo” permite a concessionária comprar licença em sua área de concessão desde que haja manifesto do
interesse por parte de outros agentes.

69
Esta medida provoca um grande debate sobre seus pontos positivos e negativos, pois se por

um lado ela trás mais competição ao setor com a entrada de novas empresas no mercado

possibilitando a melhora na qualidade da prestação do serviço, a expansão da cobertura territorial

nacional, a possibilidade das empresas de telecomunicações de vender “pacotes” com diferentes

serviços (voz, dado e vídeo), e a queda dos preços que corresponde uma das maiores barreiras à

expansão do consumo no país. Por outro lado, há o temor de que as empresas de

telecomunicações com toda sua infra-estrutura pré-existente dominem o mercado de TV por

assinatura.

No que diz respeito ao controle das empresas de audiovisual, o PL-29 estabelece que os

grupos internacionais só poderão controlar até 30% do capital das empresas brasileiras de

produção e programação. Não há impedimento, porém, ao capital estrangeiro para realizar

produção audiovisual no Brasil, com 100% do capital de fora. As únicas limitações devem ser as

mesmas de Lei Geral de Telecomunicações (LGT), ou seja, os produtores devem ser empresas

constituídas sob as leis brasileiras.

Quanto à restrição da propriedade, as telecomunicações só podem participar com até 30%

nas atividades de produção e na programação, e a radiodifusão só pode participar com até 50% na

distribuição. Já o empacotamento é livre à participação de qualquer grupo de qualquer segmento

econômico, mas terá que ser uma empresa sob o controle nacional, gerida por brasileiros.

Um dos pontos mais polêmicos constantes no PL 29 é a promoção da produção de conteúdo

audiovisual nacional 54 pela introdução de um sistema de cotas de conteúdo e programação

54
Para definir conteúdo nacional, utiliza-se o mesmo critério adotado pela Lei da Ancine, ou seja, tem que ser
produzido por empresa com maioria de capital brasileiro (há uma quantidade de técnicos que também precisam ser
brasileiros), ou em regime de co-produção.

70
nacional. O sistema de cotas vai afetar as atividades de programação (de um canal) e de

empacotamento (de vários programas). Por essa razão que o empacotamento deverá ser feito por

empresa gerida por brasileiros, pois é nessa etapa que se assegura a programação brasileira.

Na programação foi importado da Comunidade Européia o conceito de “espaço

qualificado”, que se refere ao tempo de transmissão atribuído a filmes, documentários, séries de

televisão, novelas, tudo que não for jornalismo, programa de auditório, transmissão esportiva,

televendas etc. Dentro desse "espaço qualificado", cada canal fica obrigado a transmitir, no

mínimo, 10% de conteúdos nacionais (filmes, documentários etc).

Um canal que só transmite 100% de programação jornalística esportiva estará, com isso,

excluído dessa obrigação. Já um canal que, entre tantos programas, dedica algumas horas a filmes

ou séries, terá que cumpri-la na proporção dessas horas. Um canal 100% cinematográfico terá

que transmitir 10% de horas, em horário diurno de filmes nacionais.

Na atividade de empacotamento, pelo PL-29 são três as cotas obrigatórias: um mínimo de

25% de canais nacionais nos pacotes (suavização da aplicação das cotas para pacotes que

possuam grande quantidade de canais); um terço dos canais nacionais deve ser de produtores

independentes55; e deve se veicular conteúdo brasileiro em espaço qualificado. As cotas seriam

alcançadas de maneira progressiva em até quatro anos, com duração de quinze anos.

55
Utiliza-se também a lei da Ancine para definir o que é produção independente. O independente não tem vínculo e
não pode ter contrato de exclusividade com o programador.

71

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