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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA


CENTRO DE ARTES E LETRAS
CURSO DE DESENHO INDUSTRIAL - BACHARELADO

Maike Adriel Dos Santos

PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOB O ASPECTO DE SEGURANÇA:


MÉTODO DE AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO A PARTIR DA
EXPERIÊNCIA DO USUÁRIO NO AMBIENTE DA TRAGÉDIA NA
BOATE KISS.

Santa Maria, RS
2017
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Maike Adriel Dos Santos

PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOB O ASPECTO DE SEGURANÇA:


MÉTODO DE AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO
USUÁRIO NO AMBIENTE DA TRAGÉDIA NA BOATE KISS.

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Curso de Desenho Industrial
– Bacharelado, da Universidade Federal de
Santa Maria (UFSM, RS), como requisito
parcial para aprovação na disciplina de
Trabalho de Conclusão de Curso II.

Orientador: Profº Drº Sergio Antonio Brondani

Santa Maria, RS
2017
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Maike Adriel Dos Santos

PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOB O ASPECTO DE SEGURANÇA:


MÉTODO DE AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO
USUÁRIO NO AMBIENTE DA TRAGÉDIA NA BOATE KISS.

Trabalho de Conclusão de curso


apresentado ao Curso de Desenho
Industrial, da Universidade Federal de Santa
Maria (UFSM, RS), como requisito parcial
para obtenção de título de Desenhista
Industrial.

Aprovado em 18 de Dezembro de 2017:

___________________________________

Sergio Antonio Brondani, Dr (UFSM)


(presidente Orientador)

___________________________________
Ana Lúcia Oderich (UFSM)

___________________________________
Cássio F. Lemos (UFSM)

Santa Maria, RS
2017
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AGRADECIMENTOS

Para a construção e finalização deste trabalho, inúmeras pessoas se


envolveram com muita dedicação, compreensão e paciência. Ficam registrados aqui
meus agradecimentos a todas as pessoas que contribuíram de alguma forma para
que esta pesquisa se concretizasse, especialmente:
- Ao meu Orientador Sergio Antonio Brondani, para mim, mais que um
professor orientador, um ser humano incrível que me incentivou e me ajudou sempre
com a sua simplicidade paciência e carisma. Grato por tudo!
- Agradeço a cada sobrevivente da Tragédia da Boate Kiss que gentilmente
disponibilizaram seu tempo para ajudar e agregar sentido neste estudo.
- Agradeço a minha família pelo apoio que sempre tive.
- A minha namorada Brenda M. Sequeira da Silva.
- Aos meus amigos que se foram e aos que estão aqui comigo lutando
sempre por justiça, assim como seus familiares.
- Ao curso de Desenho Industrial- UFSM que sempre esteve junto comigo
apoiando e dando todo suporte possível quando eu precisei nos momentos mais
difíceis da minha vida, momentos que passei na Tragédia da Boate Kiss.
- Agradeço imensamente a Gianne Jornada Storgatto, Gilberto Luiz Storgatto,
Marina Jornada Storgatto Gabriela Jornada Storgatto e o Bruno Jornada Storgatto.
Família esta que acreditou em meu potencial, no qual sou grato de coração.
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RESUMO

PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOB O ASPECTO DE SEGURANÇA:


MÉTODO DE AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DO
USUÁRIO NO AMBIENTE DA TRAGÉDIA NA BOA KISS.

AUTOR: Maike Adriel Dos Santos


ORIENTADOR: Sergio Antonio Brondani

A pesquisa apresenta um método de avaliação da percepção que será utilizado por parte dos
usuários que frequentaram o ambiente no dia da tragédia. Seu principal objetivo é avaliar a eficiência
da sinalização de emergência e segurança, considerando as recomendações das normas nacionais
vigentes. Em relação ao proposto, a pesquisa é classificada como exploratória, tendo no seu
processo a utilização de Mapas Mentais como ferramenta para a busca de informações/elementos
que irão auxiliar nas análises e interpretações futuras. As inúmeras variáveis consideradas no estudo
proporcionaram a criação de um protocolo básico que serviu de roteiro para as entrevistas e
representações, considerado premissa para validação do processo.

Palavras chave: Boate Kiss. Percepção Ambiental. Mapa Mental.


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ABSTRACT

ENVIRONMENTAL PERCEPTION UNDER THE SECURITY APPEARANCE:


METHOD OF PERCEPTION EVALUATION FROM THE US EXPERIENCE IN THE
ENVIRONMENT OF THE TRAGEDY IN THE NIGHTCLUB KISS.

AUTHOR: Maike Adriel Dos Santos


ORIENTER: Sergio Antonio Brondani

The research presents a method of evaluating the perception that will be used by the users who
attended the environment on the day of the tragedy. Its main objective is to evaluate the efficiency of
the emergency and safety signaling, taking into account the recommendations of the current national
regulations. In relation to the proposed, the research is classified as exploratory, having in its process
the use of Mental Maps as a tool for the search of information / elements that will help in the analysis
and future interpretations. The many variables considered in the study provided the creation of a basic
protocol that served as a script for interviews and representations, considered a premise for validation
of the process.

Keywords: Nightclub Kiss. Environmental Perception. Mental Map.


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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Dimensões das placas de sinalização .......................................... 28


Tabela 2 – Sinalização de equipamentos .................................................... 29
Tabela 3 – Sinalização de orientação e salvamento ...................................... 31
Tabela 4 – Sinalização complementar: indicação continuada
de rota de fuga .............................................................................. 31
Tabela 5 – Sinalização complementar: indicação de obstáculo ..................... 32
Tabela 6 – Classificação das edificações quanto à sua ocupação ................. 33
Tabela 7 – Orientações dadas para o dimensionamento das saídas ............. 35
Tabela 8 – Classificação das edificações e áreas de risco
quanto à ocupação ....................................................................... 39
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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Memorial em homenagem às vítimas da


tragédia da Boate The Station ....................................................... 15
Figura 2 – Boate República de Cromagnón.................................................... 15
Figura 3 – Incêndio em hotel de Dubai, ocorrido na noite de réveillon ........... 16
Figura 4 – Planta baixa edifício da Boate Kiss, escala 1:50 ........................... 45
Figura 5 – Materialização da planta baixa da Boate Kiss ............................... 46
Figura 6 – Aplicação do “teste piloto” com um dos
sobreviventes da tragédia .............................................................. 47
Figura 7 – Sinalização indicativa de saída de emergência ............................. 48
Figura 8 – Aplicação da entrevista com um dos atores pesquisados ............. 50
Figura 9 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “A” .......... 52
Figura 10 – Mapa Mental do participante pesquisado “A” .............................. 53
Figura 11 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “B” ........ 54
Figura 12 – Mapa Mental da participante pesquisada “B” .............................. 55
Figura 13 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “C” ........ 56
Figura 14 – Mapa Mental do participante pesquisado “C” .............................. 57
Figura 15 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “D” ........ 58
Figura 16 – Mapa Mental da participante pesquisada “D” .............................. 59
Figura 17 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “E” ........ 60
Figura 18 – Mapa Mental do participante pesquisado “E” .............................. 61
Figura 19 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “F”......... 63
Figura 20 – Mapa Mental da participante pesquisada “F”............................... 64
Figura 21 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “G” ........ 65
Figura 22 – Mapa Mental da participante pesquisada “G” .............................. 66
Figura 23 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “G” ........ 68
Figura 24 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “H” ........ 69
Figura 25 – Mapa Mental da participante pesquisada “H” .............................. 70
Figura 26 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “I” .......... 72
Figura 27 – Mapa Mental do participante pesquisado “I” ................................ 73
Figura 28 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “J” ......... 75
Figura 29 – Mapa Mental da participante pesquisada “J” ............................... 76
Figura 30 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “k” ......... 78
9

Figura 31 – Mapa Mental da participante pesquisada “K” .............................. 79


Figura 32 – Sinalização indicativa de saída que foi
avistada no ambiente da tragédia ............................................... 81
Figura 33 – Modelos de sinalizações indicativas de saída ............................. 82
Figura 34 – Relação de percentuais de cuidados
à saúde dos atores pesquisados ................................................. 83
Figura 35 – Sinalização indicativa de saída derretida
pelo calor no interior da Boate Kiss ............................................. 84
Figura 36 – Um dos sanitários da casa noturna
onde se acumulou mais vítimas ................................................... 85
Figura 37 – Palco. Ambiente interno onde o incêndio
se iniciou na Boate Kiss ............................................................... 86
Figura 38 – Iluminação no piso indicando saídas de emergência .................. 87
Figura 39 – Autores da pesquisa no interior do
edifício da Boate Kiss pós-tragédia ............................................. 90
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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11
1.2 OBJETIVOS ........................................................................................................ 13
1.3 JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 13
1.3.1 Histórico das tragédias .................................................................................. 13
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................ 17
2.1 PERCEPÇÕES DO ESPAÇO ............................................................................. 17
2.2 CARACTERÍSTICAS DAS ATIVIDADES MENTAIS E SUAS
DEFINIÇÕES DE REPRESENTAÇÕES ............................................................. 19
2.2.1 As representações ......................................................................................... 19
2.3 MAPAS MENTAIS ............................................................................................... 20
2.4 CRONOLOGIAS REFERENTE À LEGISLAÇÃO E A
SEGURANÇA DOS AMBIENTES ....................................................................... 23
2.4.1 Associações Internacionais .......................................................................... 23
2.4.1.1 IAFSS - The international association for fire safety science......................... 23
2.4.1.2 NFPA - National fire protection association ................................................... 24
2.4.1.3 SFPE - Society of fire protection engineers ................................................... 24
2.4.1.4 FPA - Fire protection association .................................................................. 25
2.4.2. A Legislação de segurança contra incêndio do Brasil .............................. 25
2.4.2.1 Nível federal .................................................................................................. 27
2.4.2.2 Nível estadual e municipal............................................................................. 36
2.4.2.2 “Lei kiss” federal ............................................................................................ 40
3. MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO ............................................................................ 42
3.1 O AMBIENTE E A OPORTUNIDADE DA AÇÃO PROPOSTA ............................ 43
3.2 DESCRIÇÃO DAS ETAPAS DO MODELO APRESENTADO –
COLETA DE DADOS .......................................................................................... 44
3.3 MODELO APRESENTADO E SUAS APLICAÇÕES ........................................... 49
4. RELATOS E DIAGNÓSTICO DOS RESULTADOS DAS ENTREVISTAS ........... 50
5. COMPILAÇÃO DOS DADOS APRESENTADOS ................................................ 80
6. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 83
6.1. SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS ................................................... 89
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 91
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1. INTRODUÇÃO

Dia 27 de janeiro de 2013 – Santa Maria, “a fumaça nunca foi tão negra no
Rio Grande do Sul. Nunca uma nuvem foi tão nefasta.”. Palavras que repercutiram
do poeta e escritor gaúcho Fabrício Carpinejar ao trágico fato ocorrido na Boate
Kiss, a segunda maior tragédia no Brasil em número de vítimas em um incêndio.
Santa Maria naquela manhã de domingo não acordou.
No centro da cidade, Rua dos Andradas, 1925, é organizada na Boate Kiss
por estudantes dos cursos de Agronomia, Medicina Veterinária, Zootecnia,
Tecnologia de Alimentos, Tecnologia em Agronegócio e Pedagogia da Universidade
Federal de Santa Maria, a festa intitulada “Agromerados”, no qual se aguardava para
aquela noite aproximadamente mil pessoas. Bem antes das 23h, horário inicial de
funcionamento do estabelecimento, a fila para a entrada já se formava dobrando a
Rua dos Andradas, sendo a maioria usuários universitários da faixa etária entre 18 e
30 anos.
No evento “Agromerados” havia duas atrações em destaque: as bandas
“Pimentas e seus comparsas”, e como atração principal, “Gurizada Fandangueira”.
Em torno de 3h da manhã, o vocalista desta banda, Marcelo Jesus Dos Santos, no
refrão de umas das músicas tocadas, acende um artefato de pirotecnia. O Teto logo
foi consumido pelas chamas, no qual se espalharam rapidamente. Um segurança
tenta apagar o fogo, sem sucesso, pois o extintor de incêndio apresentava
problemas. Com a casa superlotada, a animação universitária se transforma em
pânico, terror, desespero e, em meio à confusão e falta de ar, a luta por
sobrevivência.
As chamas tomavam conta da boate, a espuma que revestia o teto pingava
queimando quem estava na frente do palco onde a banda Gurizada Fandangueira se
apresentava ao passo que, quem estava mais ao fundo longe do palco, sem visão
dos fatos, demorou a perceber o que acontecia. Enfim, quando todos estão cientes
já era tarde para uma reação efetiva de evacuação. Com a queima da espuma de
revestimento causada pelo artefato, se iniciou uma reação química liberando
monóxido de carbono e cianeto, substâncias altamente tóxicas.
A formação de uma fumaça densa e negra engole por inteiro a boate, com o
incêndio propagado as luzes do espaço se apagam, aumentando mais ainda a
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dificuldade de enxergar algo à frente. Todos de alguma forma tinham que chegar à
saída. Mil e quinhentas pessoas, enclausuradas em meio à fumaça ardente e quente
onde também se impregnou nas vias aéreas de cada um. Para piorar, a escuridão
prevalece e somando aos tantos obstáculos e dificuldades para tentar sair vivo, o
estabelecimento não tinha o espaço adequado para evacuação em casos de
emergência. A tragédia da Boate Kiss vitimou 242 pessoas, deixando ao menos
outras 680, marcados pela catástrofe deixando suas saúdes físicas e psíquicas
abaladas.
As dimensões da casa noturna eram de 650 metros quadrados, entretanto o
projeto interno foi muito questionado pelas autoridades após o ocorrido, pois não
cumpria normas técnicas básicas de segurança contra incêndios, como capacidade
de lotação e número suficiente de saídas de emergência. Além de a boate parecer
um labirinto, foram colocadas inadequadamente barras na parte externa na calçada
para controle de filas e na parte interna da boate. Estas barras só contribuíram
negativamente o aumento do número de mortes, servindo como obstáculo para o
usuário. Com várias obstruções à saída, aumentava cada vez mais o número de
vítimas fatais.
Segundo os laudos da necropsia entregues à polícia pelo Instituto-Geral de
Perícias (IGP), todas as mortes ocorridas dentro da boate Kiss durante o incêndio
foram causadas por asfixia provocada pela inalação dos gases tóxicos cianeto e
monóxido de carbono. O CO2 reduz a capacidade de transporte de oxigênio, a
fumaça danifica as vias aéreas (áreas nasais, faringe e pulmão) e provoca tosse. A
sensação de falta de ar faz com que a respiração fique mais rápida aumentando a
concentração de CO2 e de outros gases tóxicos nos pulmões. O cérebro, então,
passa a sofrer com a falta de oxigênio, o que causa tontura e sonolência. Em até
três minutos a pessoa desmaia e poucos minutos depois, a morte cerebral causa
parada cardíaca.
As condições de conforto e segurança no uso dos ambientes projetados,
especialmente onde ocorrem aglomerações de pessoas, normalmente são
condicionados à observação de leis e normas que tratam do assunto. Este fato pode
ser hoje verificado na maioria dos países, resultados de acontecimentos como é o
caso da Boate Kiss e que servem de exemplo para evitar futuros acidentes
semelhantes. Diante desta constatação, podemos nos perguntar: porque então
continua a acontecer este tipo de acidente? A bem dizer, se causa espanto que
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tragédias como da Boate Kiss tenha uma singularidade de tantas vezes repercutidas
pelo mundo, algumas com datas anteriores e outras posteriores a data da tragédia.

1.2 OBJETIVOS

Assim, diante do exposto, este trabalho propõe avaliar as condições de


percepção da sinalização de segurança em ambientes edificados. Será feita uma
abordagem de estudo de caso especificamente no caso da tragédia da Boate Kiss –
Santa Maria.
Seu principal objetivo é avaliar a eficiência da sinalização de emergência e
segurança, considerando as recomendações das normas nacionais vigentes.

1.3 JUSTIFICATIVA

Pesquisar nos fatos e acontecimentos reais de uma tragédia como é o caso


da Boate Kiss nos remete a alguns entendimentos de situações similares que já
aconteceram em outras partes do mundo. A compreensão dos procedimentos e
conseqüências dos fatos acontecidos foram premissas para controle de algumas
variáveis do estudo. Aprender com os erros talvez seja uma maneira de educar e por
conseqüência responsabilizar os defensores da prerrogativa de licenças/liberações
do funcionamento dos estabelecimentos.
Diante da contextualização que passamos a relatar, não é difícil concluir e
afirmar sobre o despreparo e falta de conduta ética dos responsáveis do
cumprimento das leis de prevenção e segurança. Assim sendo, destacamos
afirmação na citação:
“Cada vez mais na área de análises de ambientes tem seu enfoque na
análise das necessidades ou dos comportamentos dos usuários do espaço.
A importância do ambiente como fator que pode facilitar ou impedir
determinada atividade ou comportamento traduza-se pela abordagem do
espaço como recurso” (CREMONINI, 1998, p.9).

1.3.1 Histórico das Tragédias

Para melhor entendimento da proposta a ser pesquisada, é importante a


contextualização de uma linha do tempo de tragédias similares:
14

Nos anos 1940, como fala Silveira (2014), devido a um acidente com um
palito de fósforo, 207 pessoas morreram no Rhythm Club, Natchez (EUA), em 1942
o fogo iniciado em uma palmeira, no qual fazia parte da decoração da Boate
Coconut Grove, Boston (EUA), espalhou-se causando a morte de 492 pessoas,
devido à superlotação do local e ao mau funcionamento das portas de emergência.
Em 1971, novamente um palito de fósforo e o material altamente inflamável
empregado na construção consumiram em pouco tempo a boate Cinq-sept, St.
Laurent du Pont, (França), matando 143 pessoas, a maioria adolescentes.

Em 1977, chamas no Beverly hills Supper Club, Southdate (EUA), mataram


165 pessoas. Em 1990, incêndio ocorrido na Boate Happy Land, Nova York (EUA),
tirou a vida de 87 pessoas, em 1996, fogo no Ozone Disco Club, Quezon City
(Flipinas), provocou a morte de 160 pessoas, a maioria estudantes. Em 2003,
incêndio na Discoteca de Luoyang, Luoyang (China), deixou um saldo de 309
mortos, em 2009, propagação do fogo no Lam Horse Club, Pern (Rússia), provocou
o óbito de 154 pessoas.

No entanto, dos casos de incêndio em boates mais recentes, um maior


destaque se deu para dois eventos: The Station, West Warwick (EUA) Figura 1, em
2003, e da República de Cromagnón, Buenos Aires (Argentina) Figura 2, 2004. Nas
duas tragédias, o fogo se iniciou a partir de artefatos de pirotecnia durante
apresentações de bandas, bem como na Boate Kiss.
15

Figura 1 – Memorial em homenagem às vítimas da tragédia da Boate The Station

Fonte: site The House of Hair.

Figura 2 – Boate República de Cromagnón

Fonte: site Minuto Uno.


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As tragédias decorrentes após o início do fogo têm seu desenvolvimento em


sucessivas falhas nas condições e instalações de segurança. De alguma maneira,
todos estavam a observar algumas normativas de segurança, principalmente no que
se refere às rotas de fuga. Conclui-se então que isto não foi suficiente para evitar
mortes.
A importância de se planejar/projetar e implantar todos os elementos que
proporcionam conforto e segurança aos usuários dos ambientes pode ser facilmente
constatado no acidente do dia 31 dezembro 2015, em um hotel de Dubai, nos
Emirados Árabes, bem como mostra a figura 3 a seguir:

Figura 3 – Incêndio em hotel de Dubai, ocorrido na noite de réveillon

Fonte: site G1.globo.com.

O fato é que o fogo teve início no 20º andar do edifício com 63 andares,
resultando num saldo de 14 pessoas com ferimentos leves, decorrentes da operação
para evacuação do prédio, não foi constatada nenhuma tragédia com perda de vidas
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humanas. Verifica-se então a necessidade de projetar considerando todos os


aspectos perceptivos do ser humano, indo além dos padrões normativos.

Atualmente as pesquisas que estão comprometidas com a usabilidade se


tornam expoentes nas referências projetuais. Pesquisadores internacionais já estão
algum tempo debatendo a importância do tema, colocando-o ate mesmo como pré-
requisito de pesquisas aplicadas. Neste sentido salientamos a importância de obter
relatos dos sobreviventes da tragédia, condição esta que torna a pesquisa
significativa para os avanços nas metodologias utilizadas em avaliações ambientais.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

De acordo com Cremonini (1998, p.9), “basicamente, as pessoas e os objetos


estão relacionados através de uma separação pelo espaço e regras de organização,
sendo estas, antes um fato mental do que um fato físico”. Diante disso, entende-se
que a percepção é a capacidade do corpo humano de obter, construir e
compreender elementos, assimilando estas informações por meio de sentidos.
Afirma Bigoni (2012, p. 6), que:

A percepção do mundo nos é dado através de nossos sentidos: tato,


audição, olfato, paladar e principalmente a visão. Alguns especialistas
colocam que 80% de nossos estímulos sensoriais são principalmente
visuais. Podemos dizer que nosso mecanismo de visão é um “decodificador”
das informações trazidas pela luz. A sensação de bem-estar no espaço está
intimamente relacionada com sua percepção, aspecto também diretamente
influenciado pela iluminação.

2.1 PERCEPÇÕES DO ESPAÇO

Visando grupos de diversos ramos de conhecimento, seguindo objetivos em


comum, a percepção tem um diálogo entre diferentes autores, pertinente de acordo
com as áreas de atividade dos mesmos, respectivamente. Com isso, apontam-se
diferentes concepções:
“O termo ‘percepção’ vem do latim percipere: compreender, dar-se conta.
Ainda que as pessoas vejam o mundo de uma maneira mais ou menos igual o
estruturam e o avaliam de forma muito diferente” (GIBSON, 1968). Já Cremonini
(1998, p.9) diz que “a percepção é o mecanismo mais importante que relaciona o
18

homem ao seu meio ambiente. O homem percebe seu espaço através de suas
experiências com o meio, estas que são armazenadas na memória como
informação”. Rio e Oliveira (1999, p.4), falam que “embora essas percepções sejam
subjetivas para cada indivíduo, admite-se que existam recorrências comuns, seja em
relação às percepções e imagens, sejam em relação às condutas possíveis. ’’.
Conforme Wapner e Werner (1952), “a maioria das teorias perceptivas dá
ênfase a um aspecto interativo, argumentando a relação entre o sensório, o
cognitivo e o conotativo de modo que as propriedades perspectivas de um objeto
estão em função da maneira através da qual os estímulos que vêm do objeto afetam
o estado do organismo”. Rio, Duarte e Rheingantz (2002, p. 205), nos lembram que
“nossos processos perceptivos abrem possibilidades para entendermos onde nos
encontramos, permitindo referências para que nos situemos espacial e socialmente
e nos levando a adotar determinado comportamento.”.

“Entendemos a percepção como um processo mental de interação do


indivíduo com o meio ambiente que se dá através de mecanismos perceptivos
propriamente ditos e, principalmente cognitivos” (RIO, 1999, p. 3). Seguindo nesta
linha de raciocínio, Piaget fala que “a cognição é estática, muda lentamente, num
processo de dentro para fora, pela assimilação ou acomodação às coisas do
mundo”. (PIAGET, 1948, apud CREMONINI, 1998, p.16)
Sobre o termo “espaço”, afirma-se que:

“Espaço” é um termo abstrato para um conjunto complexo de ideias.


Pessoas de diferentes culturas divergem na forma de separar seu mundo,
de atribuir valores às suas partes e de medi-las. As maneiras de dividir o
espaço variam enormemente em complexidade e sofisticação, assim como
as técnicas de avaliação de tamanho e distância. Contudo existem certas
semelhanças culturais comuns, e elas repousam basicamente no fato de
que o homem é a medida de todas as coisas. Em outras palavras, os
princípios fundamentais da organização espacial baseiam-se nos resultados
da experiência íntima do homem com seu corpo e com outras pessoas,
organizando o espaço a fim de conformá-lo as suas necessidades
biológicas e relações sociais. (TUAN, 1980 apud BRONDANI, 1998, p.30)

Como podemos ver nas compilações das obras, então, é importante o


reconhecimento dos lugares onde estamos sendo a percepção em espaços físicos
essencial para projetar ambientes. Da mesma forma é nítido que o estudo da
percepção e seus processos mentais relacionados são importantes para
entendermos de forma clara a troca de relações entre usuário e o meio onde se está
19

inserido, no qual temos a possibilidade de intervir e firmar mudanças que possam


ser transformadoras por meio da percepção ambiental.

2.2 CARACTERÍSTICAS DAS ATIVIDADES MENTAIS E SUAS DEFINIÇÕES DE


REPRESENTAÇÕES

Para que se possa entender de que maneira os Mapas Mentais podem nos
conduzir para elementos bases referentes à percepção do meio pelas pessoas e no
que o ambiente afeta seu comportamento, compreende-se que há necessidade de
uma breve verificação sobre formação das atividades mentais.
Como Cremonini (1998, p. 33) nos fala, “uma das características das atividades
mentais é que estas constroem representações. As representações são
essencialmente interpretações que consistem em atribuir um significado de conjunto
aos elementos resultantes da análise perceptiva. ”. Pode-se dizer também que as
atividades mentais estão inclusas nas atividades cognitivas, no qual estão à frente
do tratamento das informações sensoriais, ambientais e de cunho linguístico.
(RICHARD,1990).
Complementam-se outras definições às atividades mentais:

Podem ser definidas primeiramente pela natureza das informações a partir


das quais trabalham e pela natureza das informações ou decisões que
produzem. As informações de onde elas partem são o resultado dos
tratamentos sensoriais: identificação dos objetos e de sua posição, dos
movimentos, das mudanças e de sua sucessão, que são a base da
percepção dos eventos e, pode-se acrescentar, identificação dos
significados proposicionais. As produções das atividades mentais são de
duas espécies: umas têm um resultado comportamental direto: são as
decisões de ação, que convém distinguir bem da programação dos gestos e
dos movimentos. Outras não têm resultados externos: permanecem internas
ao sistema cognitivo, o qual enriquecem sob forma de informações
memorizadas. (RICHARD 1990, apud CREMONINI, 1998, p.34)

2.2.1. As representações

“A construção das representações mentais é uma atividade mental definida


pela natureza dos tratamentos que elas operam.” (RICHARD 1990, apud
BRONDANI, 1998, p.58). Nos quais outros pesquisadores como caracterizam como
tratamento modular e não modular:
20

Os tratamentos modulares são tratamentos especializados que tem acesso


somente a uma parte da informação disponível no sistema: são, desse
modo, autônomos e impermeáveis ao que se passa em outras partes do
sistema. As atividades mentais são feitas de tratamentos não modulares,
pois elas integram informações de natureza muito diversa: informações
sobre a situação, conhecimentos relacionais e procedurais, informações
sobre a tarefa. Elas são, de fato, muito sensíveis aos efeitos do contexto:
não só o contexto perceptivo e linguístico, mas também o contexto
semântico e igualmente o contexto da situação e da tarefa. (FODOR apud
RICHARD, 1990)

O modo de expressar a nossa percepção, no qual Richard (1990) denomina,


é a “representação”, sendo construções circunstanciais feitas num contexto
particular e com fins específicos. Vale esclarecer algumas diferenciações de
distinção entre “representação” e “conhecimento”, onde este último está relacionado
às construções estáveis, permanentes e não inteiramente dependentes da tarefa de
realizar. Da mesma forma das representações, conhecimentos também são
construções, entretanto, são construções fixas de modo que estabelece
independência à tarefa feita, mantendo-se sob a mesma forma, caso não ocorra
modificações.
São várias as expressões utilizadas para explicar os termos, estas diferenciações
são usadas em comum acordo entre alguns pesquisadores da área, bem como
alguns autores preferem um único termo para representações, sendo:
representações tipos (chamadas conhecimento) e representações ocorrentes
(chamadas representações), ou estruturas permanentes e circunstanciais.
(RICHARD, 1990)
Diante de uma estrutura cognitiva, ainda sob raciocínio de Richard (1990
apud Cremonini, 1998, p.36):

A diferença entre conhecimento e representações é que os conhecimentos


têm necessidade de serem ativados para serem eficientes, enquanto que as
representações são imediatamente eficientes. Isto porque as
representações constituem o conteúdo da memória operacional, a saber, as
informações gravadas na memória de trabalho e as informações ativas da
memória de longo termo.

2.3 MAPAS MENTAIS

Num sentido mais amplo, mapas no nosso cotidiano têm uma participação
bastante forte. Como instrumento de orientação, informação e ou localização o mapa
como instrumento auxiliou o homem, tanto em atividades profissionais como em
21

outras esferas sócio-culturais implementado em inúmeras áreas de trabalho. De


algum jeito ou outro, frequentemente ou não tão frenquente, recorremos ao mapa
como um meio físico para expressarmos espacialmente a representação de uma
ideia, um objeto, cidades, país, etc.
Esta representação do que nos circunda para um suporte, como por exemplo,
o papel, é uma forma de linguagem do ser humano mais antigo que a própria escrita.
O homem pré-histórico por sua incapacidade intelectual não foi capaz de deixar
registrado de seu cotidiano por meio da escrita, entretanto, o fizeram de expressões
gráficas produzindo mapas que serviriam como modo de comunicação ajudando na
orientação nas redondezas (RIO, 1999). “Caçadores esquimós, por exemplo,
navegavam nas costas da Groenlândia auxiliados por bastões de madeira, cujos
entalhes forneciam as informações necessárias”. (WILDBUR, 1989, apud
PINHEIRO, 2013, p. 47)
“O mapa, surge então, como uma forma de expressão e comunicação entre
homens. Este sistema de comunicação exigiu, desde o início, e, consequentemente,
uma “leitura” dos significantes expressos” (DEL RIO, 1999, p. 187). Assim, os mapas
ultrapassam as barreiras limitantes da percepção do homem, dando novas
oportunidades para compreender o espaço físico.
Com a intenção de analisar informações e elementos que ajudarão na
compreensão da interação e comportamento do usuário com o espaço, se usará no
presente trabalho, por meio de ferramenta, a aplicação de Mapas Mentais para
contribuir na obtenção de dados no que diz respeito à percepção do indivíduo para o
meio. Cremonini (1998, p.14) ressalta que “para entendermos como o homem se
relaciona com o meio, através do seu comportamento, é preciso que antes saibamos
como ele percebe este espaço através de imagens.”:

A aplicação dos mapas mentais é caracterizada pela obtenção de


informações gráficas e verbais, onde o pesquisador solicita a usuários de
um determinado ambiente que desenhe este espaço, associando estes
dados aos obtidos através de uma entrevista ou conversa informal. As
informações coletadas passam por um processo interpretativo de avaliação
e análise feito pelo pesquisador, procurando compreender as interações do
homem com seu meio através da percepção do seu meio ambiente físico de
trabalho. (CREMONINI, 1998, p.14)

Para compreendermos os Mapas Mentais, Richard (1990), fala que


precisamos entender como o indivíduo passa da representação de um trajeto
22

conhecido à representação espacial, ou seja, de um trajeto descrito verbalmente,


para representações em que elementos são apresentados não somente por suas
posições, mas também por suas posições absolutas e suas distâncias. O autor
Byrne (1979, apud Cremonini, 1998, p. 60), defende um pensamento similar, que
“existem dois tipos de representações espaciais: representações em forma de rede
na qual são conservadas as relações topográficas, mas não as distâncias e
representações do tipo euclidiano, que conservam estas últimas relações.”
Na sua obra A Representação do Espaço na Criança, Piaget e Inhelder
(1993, apud Montoito; Leivas, 2012, p. 25), explicam como acontece a mudança na
percepção do espaço em relações topológicas, estas “vêm em primeiro lugar,
seguidas das relações projetivas e euclidianas e esta sequência admite
coordenações entre ações cada vez em grau maior de complexidade”. Eles ainda
concluem que:

Relações topológicas são as primeiras construídas pela criança e dizem


respeito às características dos objetos em si mesmos, revelando suas
relações de vizinhança (perto ou longe do observador, objetos perto ou
longe uns dos outros), separação (distinguir elementos uns dos outros e
partes do todo), envolvimento (perceber, numa sequência linear ou cíclica,
um elemento entre outros, e saber reproduzir esta sequência, bem como
perceber as relações de “dentro” e “fora” para figuras planas e formas
tridimensionais), continuidade (perceber que uma linha ou superfície é ou
não interrompida) e ordem, a qual se divide em duas partes: a ordem
perceptiva e a ordem representativa. (PIAGET; INHELDER 1993, apud
MONTOITO; LEIVAS, 2012, p. 27)

Souza (2010, apud Montoito; Leivas, 2012, p. 30), nos explica que a partir da
“construção informal do conceito de medida gera a compreensão da ideia de
distância, da qual surge, por sua vez, as relações euclidianas”, o autor ainda
completa dizendo que “nesta fase, adquirem-se os conceitos através da noção dos
objetos no espaço, projeta-se o espaço no plano, visualiza-se a ideia do objeto.”

Mapas Mentais, por definição da autora Cremonini (1998), são imagens


mentais em que o indivíduo deduz do seu meio físico, afetando seu comportamento.
São transformações psicológicas as quais levam os indivíduos a lembrar do seu
meio ambiente espacial e que são produzidas por suas preferências mais
significativas, sejam elas afetivas e/ou simbólicas. Dessa forma, podemos entender
que os esboços dos mapas criados nada mais são que representações físicas dos
mapas mentais. O indivíduo por meio de imagens mentais percebe o seu ambiente
23

físico, tais imagens são buscadas da memória de experiências pregressas como


desenhos ou esboços, difundidas pelos canais sensoriais por meio da percepção,
tornando-se que se denomina por mapas mentais. Com isso, pode- se considerar
como uma ferramenta eficaz à busca de dados que auxiliem no entendimento do
espaço físico pelo homem.

2.4 CRONOLOGIAS REFERENTE À LEGISLAÇÃO E A SEGURANÇA DOS


AMBIENTES

Com o domínio do fogo em tempos pré-históricos, por consequência e


obrigação também veio o cuidado na manipulação do fogo nos seus diversos
afazeres do cotidiano, podemos dizer que a idealização de prevenção e combate a
incêndios têm seus primeiros passos. O fogo controlado nos foi útil em nossa
evolução, em contraposição fora deste domínio tem força uma arrasadora, podendo
deixar exemplos de destruição da pré-história aos tempos de hoje com perdas
materiais ou em casos mais graves, ceifando vidas humanas.
Entende-se que para o homem, para sua própria proteção à vida, foi
implementado muitas tecnologias para combate ao fogo bem como artefatos,
desenvolvimentos de técnicas e leis, sendo esta última de prioridade máxima.
Todavia, como a própria evolução nos retrata, o ser humano aprende com os erros
cometidos. Como mostrado nos capítulos iniciais, por causa desses erros,
infelizmente vidas foram perdidas em inúmeros eventos trágicos e, a partir deles se
iniciou a preocupação na criação da legislação e ou até mesmo reformulação da
mesma.

2.4.1 Associações Internacionais

2.4.1.1 IAFSS - The International Association for Fire Safety Science

A The International Association for Fire Safety Science (IAFSS) foi fundada
com o objetivo principal de incentivar a pesquisa sobre a ciência de prevenir e
mitigar os efeitos adversos dos incêndios e de fornecer um fórum para a
apresentação dos resultados dessa pesquisa. “Ela procura cooperação com outras
organizações com aplicações ou envolvidas com a ciência que é fundamental para
24

seus interesses em incêndio. Visa promover altos padrões e normas estimulando


cientistas a questão de problemas de fogo, a fim de reduzir as perdas humanas e
materiais.” (SEITO et al., 2008)
Desde a sua reunião inaugural, a IAFSS cresceu para mais de quatrocentos
membros. Os membros atuais vêm da Austrália, Áustria, Bélgica, Brasil, Canadá,
China, Dinamarca, Alemanha, Finlândia, França, Holanda, Hong Kong, Índia,
Irlanda, Itália, Japão, Coréia, Luxemburgo, Países Baixos, Nova Zelândia, Noruega,
Rússia, Espanha, Suécia, Suíça, Taiwan, Reino Unido e Estados Unidos da
América.

2.4.1.2 NFPA - National Fire Protection Association

A NFPA foi criada em 1896, dedicada minimização de perdas devido


eliminação de mortes, feridos, propriedades e perdas econômicas devido a incêndio
e riscos relacionados. A associação fornece de mais de 300 códigos e padrões de
consenso, pesquisa, treinamento, educação, divulgação e advocacia, totalizando
mais de 60 mil pessoas ao redor do mundo.
Conforme SEITO et al. ( 2008, p. 5):
• Código de segurança a vida.
• Código nacional de instalações elétricas NFPA 70.
Mais de duzentas normas em Segurança Contra incêndio (SCI) foram
produzidas pela NFPA, que é uma referência internacional.

2.4.1.3 SFPE - Society of Fire Protection Engineers

A Sociedade de Engenheiros de Proteção contra Incêndio (SFPE) foi criada


em 1950 e incorporada como uma organização independente em 1971. “Tem como
objetivo o desenvolvimento da ciência e a prática na engenharia de segurança
contra incêndio e nos campos do conhecimento próximos, para manter altos padrões
éticos entre seus membros e para alavancar a educação em engenharia de proteção
a incêndios.” (SEITO et al., 2008, p. 5)
25

2.4.1.4 FPA - Fire Protection Association

A Associação de Proteção contra Incêndio (FPA) é a organização nacional de


segurança contra incêndios do Reino Unido, esta trabalha para identificar e chamar
a atenção para os perigos do incêndio e os meios pelos quais o seu potencial de
perda é reduzido ao mínimo.
SEITO et al. (2008, p. 6), no livro A Segurança Contra Incêndio no Brasil, nos
fala dos objetivos desta associação, tais como:
• Proteção das pessoas, propriedade e meio ambiente por meio de técnicas
avançadas de proteção a incêndio.
• Colaborar com os membros, seguradores, governo local e central, corpos de
bombeiros e outros.
• Ajudar a focar a atenção tanto nacional como internacionalmente nessas
questões.
• Influenciar nas decisões feitas por consumidores e negociantes. • Coletar,
analisar e publicar estatísticas, identificar tendências e promover pesquisa.
• Publicar guias, recomendações e códigos de treinamento.
• Disseminar aconselhamentos.

2.4.2. A Legislação de segurança contra incêndio do Brasil

Por ter poucos acontecimentos de grandes incêndios na realidade brasileira a


preocupação com técnicas, treinamentos às pessoas qualificadas, desenvolvimentos
de tecnologias e leis de prevenção e combate a incêndios, bem como pela ausência
significativa do número de vítimas, restringia-se apenas ao Corpo de Bombeiros
qualquer contraponto envolvendo incêndios.

Os primeiros passos à construção da legislação do Brasil se iniciaram a partir


dos anos 1970, visto que, até o início desta década legislações estaduais ou
federais não tinha sido elaboradas. “A regulamentação relativa ao tema era esparsa,
contida nos Códigos de Obras dos municípios, sem qualquer incorporação do
aprendizado dos incêndios ocorridos no exterior” MARTINS (2016 apud SEITO et al.,
2008, p. 22).
26

Uma atenção especial e mais detalhada da sociedade brasileira em relação à


segurança contra incêndios tem início após duas tragédias de grandes proporções
acontecidas em São Paulo na década de 1970, o incêndio do Edifício Andraus em
1972 e o Edifício Joelma em 1974. Entretanto, o maior incêndio em relação a perdas
de vidas, em nosso País, foi no Gran Circus Norte-Americano, em 17 de dezembro
de 1961, Niterói/RJ.
Gran Circus Norte-Americano era anunciado como o maior e mais completo
circo da América Latina, coberto por uma lona nova de náilon. Contudo, a notícia era
falsa o circo tinha uma lona de tecido de algodão revestido por um material
inflamável, a parafina. Esta tragédia deixou no mínimo 250 mortos (70% eram
crianças), e mais de 400 feridos. (JÚNIOR, 2013)

Percebe-se, até então, que o Brasil não tirou nenhum aprendizado com estes
exemplos de grandes incêndios ocorridos no passado do país, muito menos com
incêndios fora do território brasileiro, como por exemplo, “antes que ocorressem
incêndios com grande perda de vidas nos Estados Unidos da América (EUA), a
segurança contra incêndio, ou suas técnicas, eram difundidas com ênfase na
proteção ao patrimônio.” (GIL et al., 2008, p. 20)

Aqui no Brasil, a partir de grandes tragédias, de tamanhos inimagináveis, para


um país prematuramente prevencionista, buscou-se estudar e elaborar como itens
de segurança pudessem ser adaptados para pessoas sem treinamentos.

Percebeu-se a inaptidão dos poderes tanto municipal quanto estadual para


lidar com situações de risco, tanto pelo despreparo do Corpo de Bombeiros
quanto pelas consequências de grandes falhas nas legislações. É nesse
momento que se tem o início da criação de Comissões, Decretos, Normas e
aperfeiçoamento de todos os sistemas existentes atualmente, unificando
toda a linguagem de incêndio para todas as regiões do País, sendo o
Estado de São Paulo sempre um pioneiro nessa área. (GOMES, 2014, p.
25)
27

2.4.2.1 Nível Federal

A nível federal, a ABNT é o Fórum Nacional de Normalização fundada em 28


de setembro de 1940. Entidade privada e sem fins lucrativos, a ABNT é responsável
pela elaboração das Normas Brasileiras (ABNT NBR), cujo conteúdo é de
responsabilidade dos Comitês Brasileiros (ABNT/CB), Organismos de Normalização
Setorial (ABNT/ONS) e Comissões de Estudo Especiais (ABNT/CEE), são
elaboradas por Comissões de Estudos, formadas por representantes dos setores
envolvidos, delas fazendo parte produtores, consumidores, universidades e
laboratórios.

Relativo às questões de incêndio especificamente delimitou-se a pesquisa na


análise da NBR 13434/ 2004 (ABNT, 2004) – Sinalização de Segurança contra
Incêndio e Pânico: Parte 1 – Princípios de Projeto; Parte 2 – Símbolos e suas
formas, dimensões e cores. No sentido de entendimento das citadas normas, são
apresentadas algumas definições de sinalização que irão auxiliar para melhor
justificar a contextualização das observações e abordagens:

 Sinalização de segurança: Sinalização que fornece uma mensagem de


segurança, obtida por uma combinação de cor e forma geométrica, à
qual é atribuída uma mensagem específica de segurança pela adição
de um símbolo gráfico executado com cor de contraste.
 Sinalização de equipamentos: Sinalização que visa indicar a
localização e os tipos de equipamentos de combate a incêndio e
alarme disponíveis no local.
 Sinalização de orientação e salvamento: Sinalização que visa indicar
as rotas de saída e as ações necessárias para o seu acesso e uso
adequado.
28

Tabela 1 – Dimensões das placas de sinalização

Fonte: ABNT- NBR 13434-2, anexo, tabela 1, p. 3.

Conforme se verifica na Tabela 1, a sinalização do ambiente pesquisado está


enquadrada como forma de sinalização quadrada e retangular. Esta forma é
utilizada para implantar símbolos de orientação, socorro, emergência e identificação
de equipamentos utilizados no combate a incêndio e alarme. A cor de segurança
(verde: utilizada para símbolos de orientação e socorro; vermelha: utilizada para
símbolos de proibição e identificação de equipamentos de combate a incêndio e
alarme, Tabela 2 e 3), deve cobrir no mínimo 50% da área do símbolo, exceto no
símbolo de proibição, onde este valor deve ser no mínimo de 35%.
29

Tabela 2 – Sinalização de equipamentos (continua)


30

(continuação)
31

(conclusão)

Fonte: ABNT- NBR 13434-2, Anexo, p. 13.

Tabela 3 – Sinalização de orientação e salvamento

Fonte: ABNT- NBR 13434-2, Anexo, p. 10.

Além da sinalização de orientação e salvamento, a referida norma também


apresenta a padronização de formas, dimensões e cores da sinalização
complementar. Esta sinalização é utilizada para indicação continuada de rotas de
fuga, indicação de obstáculos e indicação das condições de uso de portas corta-
fogo.

Tabela 4 – Sinalização complementar: indicação continuada de rota de fuga

Fonte: ABNT- NBR 13434-2, Anexo, p. 11.


32

Tabela 5 – Sinalização complementar: indicação de obstáculo

Fonte: ABNT- NBR 13434-2, Anexo, p. 13.

Visando facilitar a determinação de medidas, apresenta-se a classificação e


definição de imóveis conforme a NBR 9077. É a norma que trata de Saídas de
Emergência em Edifícios, podemos ressaltar que esta Norma ganha um maior
destaque na importância da área de prevenção de incêndios, base para Leis
Complementares citadas anteriormente, como também para todas as Legislações
brasileiras de Prevenção Contra Incêndio.
O objetivo desta Norma, (ABNT, 2001) é fixar as condições exigíveis que as
edificações devem possuir:
 A fim de que sua população possa abandoná-las, em caso de incêndio,
completamente protegida em sua integridade física;
 Para permitir o fácil acesso de auxílio externo (bombeiros) para o combate
ao fogo e a retirada da população.

Serão apresentados a seguir apenas itens de definições adotadas pertinentes


à pesquisa, como:
 Alçapão de alívio de fumaça (AAF) ou alçapão de tiragem: Abertura
horizontal localizada na parte mais elevada da cobertura de uma
edificação ou de parte desta, que, em caso de incêndio, pode ser aberta
manual ou automaticamente, para deixar a fumaça escapar.
 Duto de entrada de ar (DE): Espaço no interior da edificação, que conduz
ar puro, coletado ao nível inferior desta, às escadas, antecâmaras ou
acessos, exclusivamente, mantendo-os, com isso, devidamente ventilados
e livres de fumaça em caso de incêndio.
 Duto de saída de ar (DS): Espaço vertical no interior da edificação, que
permite a saída, em qualquer pavimento, de gases e fumaça para o ar
livre, acima da cobertura da edificação.
33

 Local de saída única: Local em um pavimento da edificação, onde a saída


é possível apenas em um sentido.
 Saída de emergência, rota de saída ou saída: Caminho contínuo,
devidamente protegido, proporcionado por portas, corredores, halls,
passagens externas, balcões, vestíbulos, escadas, rampas ou outros
dispositivos de saída ou combinações destes, a ser percorrido pelo
usuário, em caso de um incêndio, de qualquer ponto da edificação até
atingir a via pública ou espaço aberto, protegido do incêndio, em
comunicação com o logradouro.
 Unidade de passagem: Largura mínima para a passagem de uma fila de
pessoas, fixada em 0,55 m.
 Nota: Capacidade de uma unidade de passagem é o número de pessoas
que passa por esta unidade em 1 min.

A Norma apresenta as Classificações das Edificações, classificadas quanto a


Ocupação, quanto à altura e dimensões em plantas e características construtivas.
Por causa de as tabelas de classificação em função de Classe de Ocupação são
extensas, optou-se por colocar somente partes das mesmas nesta pesquisa.

Tabela 6 – Classificação das edificações quanto à sua ocupação

Fonte: NBR 9077/2001, Anexo, Tabela 1, p.25.


34

Quanto aos componentes de saída de emergência, prioritários a este


trabalho, a Norma nos diz que a saída de emergência compreende o seguinte:
 Acessos ou rotas de saídas horizontais, isto é, acessos às escadas,
quando houver, e respectivas portas ou ao espaço livre exterior, nas
edificações térreas;
 Escadas ou rampas;
 Descarga.

Em relação ao dimensionamento das saídas de emergência, Tabela 7, fala-se a


largura das saídas deve ser dimensionada em função do número de pessoas que
por elas deva transitar, observados os seguintes critérios:
 Os acessos são dimensionados em função dos pavimentos que servirem à
população;
 As escadas, rampas e descargas são dimensionadas em função do
pavimento de maior população, o qual determina as larguras mínimas para
os lanços correspondentes aos demais pavimentos, considerando-se o
sentido da saída.

As larguras mínimas das saídas no qual devem ser adotadas, em qualquer


caso, são as seguintes:
 1,10 m, correspondendo a duas unidades de passagem e 55 cm, para as
ocupações em geral, ressalvadas o disposto a seguir;
 2,20 m, para permitir a passagem de macas, camas, e outros, nas
ocupações do grupo H, divisão H-3.
35

Tabela 7 – Orientações dadas para o dimensionamento das saídas

Fonte: NBR 9077/2001, Anexo, Tabela 5, p.29.

A NBR 9077/2001 ressalta que é de suma importância as exigências especiais para


subsolos e prédios sem janelas.
As construções subterrâneas e as edificações sem janelas, além das demais
exigências desta Norma que lhes forem aplicáveis, considerando que, em áreas sem
acesso direto ao exterior e sem janelas para permitir ventilação e auxílio de
bombeiros, qualquer incêndio ou fumaça tende a provocar pânico, devem para
permitir a saída conveniente de seus usuários:
a) Ser dotadas de iluminação de emergência, exceto no caso de
ocupações A-1 e nos pavimentos destinados exclusivamente a caixas
d’água, casas de máquinas e assemelhados;
b) Quando com população superior a 100 pessoas, ser dotadas de
chuveiros automáticos (ver NBR 10897);
c) Quando com população superior a 100 pessoas e tendo conteúdo
combustível ou acabamentos combustíveis, ter sistema automático de
saídas de fumaça e gases quentes (ver NBR 8132), além dos
chuveiros automáticos (ver NBR 10897);
36

d) Ter sempre duas saídas, no mínimo, o mais afastado possível uma da


outra, se servir de local de trabalho ou houver acesso de público;
e) Quando com acesso de público ou população superior a 50 pessoas,
ter ao menos uma das saídas direta ao exterior, sem passagem pela
descarga térrea, no caso de subsolo.

2.4.2.2 Nível Estadual e Municipal

Em Santa Maria- RS, na data 21 de Janeiro de 1991 foi sancionada pela


Prefeitura Municipal a Lei Municipal nº 3.301/91 intitulada de Normas de Prevenção
e Proteção contra Incêndio. Onde fica claro a responsabilidade da Prefeitura do
município, “através do 4º Grupamento de Incêndio (4º GI), estudar, analisar, exigir e
fiscalizar todo o Sistema de Prevenção e Proteção Contra Incêndio, conforme o
estabelecido nestas normas.” (LEI MUNICIPAL,1991, p.4)
Ressalta ainda que Prefeitura Municipal de Santa Maria (1991), a qualquer
momento tem a segurança de determinar vistorias no intuito de fiscalizar as
instalações preventivas contra incêndio. Textualmente, visando facilitar a
determinação de medidas, apresenta a classificação e definição de imóveis
conforme a NBR 9077 – Saídas de Emergências de Edifícios. Desde sua publicação,
já era desafiador torná-la uma lei eficaz.

Pelo Estado do Rio Grande do Sul citam-se as Normas Técnicas de


Prevenção Contra Incêndios, que são resultantes da unificação do decreto nº
37.380, de 29 de abril de 1997, e decreto Nº 38.273, de nove de março de 1998.
Esta unificação, da mesma maneira que é contemplada na legislação municipal,
também remete a Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT e suas
respectivas Normas Regulamentadoras – NRs, como:
1. As saídas de emergência são obrigatórias nas edificações previstas na
NBR 9077, da ABNT, e deverão obedecer às regras ali previstas,
sendo que, nos locais de reunião de público com capacidade superior
a duzentas pessoas, as portas deverão ser dotadas de barra
antipânico, conforme a NBR 11.785, da ABNT.
37

2. Art. 12 - A iluminação de emergência deverá ser instalada nas


edificações previstas na NBR 9.077 e NBR 10.898, ambas da ABNT, e
deverão obedecer às normas técnicas ali previstas.
3. A sinalização de segurança contra incêndio e pânico deverá ser
instalada nas edificações previstas nas NBRs 9.077, 12.434, 13.435 e
13.437, todas da ABNT, e deverá obedecer às normas técnicas ali
descritas.
4. Nos locais de reunião de público, bem como nos casos previstos na
NBR 13.523 da ABNT, deverá existir uma central de GLP, sendo
executadas conforme a referida Norma.

Em decorrência da tragédia da Boate Kiss, houve um clamor popular em


nível nacional, no sentido de que as autoridades políticas pudessem promover
alterações na legislação, aumentando a segurança contra incêndio nos ambientes.
O Estado do Rio Grande do Sul apresenta então uma legislação
estabelecendo normas sobre Segurança, Prevenção e Proteção contra Incêndios
nas edificações e áreas de risco de incêndio: Lei Complementar n° 14.376 (ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, 2013), de 26 de dezembro
de 2013, intitulada também como “Lei Kiss”. A lei em vigor recebeu tal nome em
consequência ao trágico incêndio que ocorreu na parte interior da Boate Kiss, no
município de Santa Maria- RS, mencionado no primeiro capítulo desta pesquisa.

Esta Lei complementar já passou por algumas atualizações, no decorrer do


tempo ela sofreu algumas alterações pela Lei Complementar n.º 14.555 (ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, 2013), de 02 de julho de
2014; Lei Complementar n.º 14.690, de 16 de março de 2015 (ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, 2015). E por último, a Lei
Complementar nº 14.376 está atualizada até a Lei Complementar n.º 14.924, de 22
de setembro de 2016. (ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ASSEMBLEIA
LEGISLATIVA, 2016)

Na atual lei foram estudadas mudanças perante as leis antecedentes, ficando


algumas classificações, como também teve acréscimo de outras. Onde relata a lei,
conforme Art. 1°:
38

Ficam estabelecidas, através desta Lei Complementar, para as edificações


e áreas de risco de incêndio no Estado do Rio Grande do Sul, as normas
sobre Segurança, Prevenção e Proteção contra Incêndio, competências,
atribuições, fiscalizações e sanções administrativas decorrentes do seu
descumprimento. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, p. 1)

E, no Art. 2.º, são estabelecidos os objetivos desta Lei Complementar:

I - preservar e proteger a vida dos ocupantes das edificações e áreas de


risco, em caso de incêndio;
II - estabelecer um conjunto de medidas eficientes de prevenção contra
incêndio;
III - dificultar a propagação do incêndio, preservando a vida, reduzindo
danos ao meio ambiente e ao patrimônio;
IV - proporcionar meios de controle e extinção do incêndio;
V - dar condições de acesso para as operações do Corpo de Bombeiros
Militar do; CBMRS Estado Rio Grande do Sul
VI - proporcionar a continuidade dos serviços nas edificações e áreas de
risco de incêndio;
VII - definir as responsabilidades e competências de legislar em âmbito
estadual, respeitando as dos demais entes federados;
VIII - estabelecer as responsabilidades dos órgãos competentes pelo
licenciamento, prevenção e fiscalização contra incêndios e sinistros deles
decorrentes;
IX - definir as vistorias, os licenciamentos e as fiscalizações às edificações e
áreas de risco de incêndio; X - determinar as sanções nos casos de
descumprimento desta Lei Complementar. (RIO GRANDE DO SUL, 2013,
p.1)

A lei vigente Rio Grande do Sul (2016, p. 2), diz no seu Art. 4.° que:
As edificações e áreas de risco de incêndio deverão possuir Alvará de
Prevenção e Proteção Contra Incêndio – APPCI –, expedido pelo Corpo de
Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul – CBMRS.

Continuando o texto, o parágrafo fala:


Excluem-se das exigências desta Lei Complementar:
I - edificações de uso residencial exclusivamente unifamiliares;
39

II - residências exclusivamente unifamiliares localizadas em edificação com


ocupação mista de até 2 (dois) pavimentos, desde que as ocupações
possuam acessos independentes;

As edificações e áreas de risco de incêndio serão classificadas considerando


as seguintes características, conforme critérios constantes nas tabelas instituídas no
Decreto n.º 51.803, de 10 de setembro de 2014:
No Art. 28 da legislação estabelece a classificação das edificações e áreas de risco
de incêndio em que são consideradas a partir de características como:
 Altura;
 Área total construída;
 Ocupação e uso;
 Capacidade de lotação;
 Grau de risco de incêndio.

Abaixo, Tabela 8, mostra a classificação das edificações e áreas de risco


quanto à ocupação no Grupo F-6 – Clube Social e diversão, onde especificamente
determina, entre outras edificações, Boates, a exemplo da Boate Kiss.

Tabela 8 – Classificação das edificações e áreas de risco quanto à ocupação

Fonte: Lei Complementar nº 14.376 Anexo, Tabela 1, p.29.


40

Dando seguimento a partes importantes para esta pesquisa, no Art. 36,


Capítulo IX das medidas de segurança contra incêndio, fica determinado que:

As edificações e as áreas de risco de incêndio serão dotadas das seguintes


medidas de segurança, que serão fiscalizadas pelo CBMRS:
I - restrição ao surgimento e propagação de incêndio;
II - resistência ao fogo dos elementos de construção;
III - controle de materiais de acabamento;
IV - detecção e alarme;
V - saídas de emergência, sinalização, iluminação e escape;
VI - separação entre edificações e acesso para as operações de socorro;
VII - equipamentos de controle e extinção do fogo;
VIII - proteção estrutural em situações de incêndio e sinistro;
IX - administração da segurança contra incêndio e sinistro;
X - extinção de incêndio;
XI - controle de fumaça e gases;
XII - controle de explosão.

Apresentado o contexto de normativas legais pertinentes a temática da


pesquisa, podemos constatar a responsabilidade dos profissionais projetistas em
observar os condicionantes de projetos no que se refere à segurança dos ambientes
construídos.

2.4.2.2 “Lei Kiss” Federal

No início do ano de 2017, dia 30 de março, o Presidente da República


sanciona a lei nº 13.425/2017 em razão do incêndio da tragédia da Boate Kiss. A
legislação federal estabelece várias regras para fins de prevenção contra incêndio e
desastres em estabelecimentos comerciais, edificações e áreas de reunião de
público.
A lei também deixar claro diretrizes à competência dos órgãos e suas
obrigações específicas de fiscalizações, expedições de alvarás, bem como os
profissionais que exercem o trabalho na área de proteção contra incêndio. A
legislação federal traçando estas regras gerais permite o estabelecimento de regras
pertinentes a cada estado e em cada município do país.
41

Os estabelecimentos e edificações abrangidos por esta lei recentemente


sancionada que devem se adequar na legislação vigente está escrito no parágrafo 1º
do Art. 2º, bem como citamos abaixo:

Art. 2o O planejamento urbano a cargo dos Municípios deverá observar


normas especiais de prevenção e combate a incêndio e a desastres para
locais de grande concentração e circulação de pessoas, editadas pelo poder
público municipal, respeitada a legislação estadual pertinente ao tema.

§ 1o As normas especiais previstas no caput deste artigo abrangem


estabelecimentos, edificações de comércio e serviços e áreas de reunião de
público, cobertos ou descobertos, cercados ou não, com ocupação
simultânea potencial igual ou superior a cem pessoas. (PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA, 2017)

Ou seja, estas espécies de estabelecimentos que possam potencialmente ter


até 100 pessoas, devem observar tais diretrizes. Entretanto no inciso 2º no parágrafo
2º do Art. 2º, é determinada uma exceção. Os estabelecimentos não atingindo o
número de 100 pessoas ainda sim são obrigados a manter ou se adequar as novas
regras de proteção contra incêndio

§ 2o Mesmo que a ocupação simultânea potencial seja inferior a cem


pessoas, as normas especiais previstas no caput deste artigo serão
estendidas aos estabelecimentos, edificações de comércio e serviços e
áreas de reunião de público:
II - que, pela sua destinação:
a) sejam ocupados predominantemente por idosos, crianças ou pessoas
com dificuldade de locomoção; ou
b) contenham em seu interior grande quantidade de material de alta
inflamabilidade.

É importante notar que esta lei federal se preocupa com as graduações no


qual se envolvem no âmbito da área de prevenção e proteção contra incêndios,
Engenharia e Arquitetura, exigindo o que o Art. 8º Nos fala:

Os cursos de graduação em Engenharia e Arquitetura em funcionamento no


País, em universidades e organizações de ensino públicas e privadas, bem
42

como os cursos de tecnologia e de ensino médio correlatos, incluirão nas


disciplinas ministradas conteúdo relativo à prevenção e ao combate a
incêndio e a desastres.

Para que se adaptem à legislação recém publicada, exige-se que os cursos


tenham ministrado conteúdos de combate à prevenção contra incêndios, bem como
o autor citado abaixo segue a mesma linha de pensamento em relação à
preocupação e prioridade das graduações se reformularem formando profissionais
mais bem preparados e atualizados à lei em questão:

A prevenção e proteção das pessoas é algo que deveria estar no topo dos
ensinamentos de qualquer currículo de cursos relacionados a esta área. As
edificações também devem estar neste patamar de importância visto que
são elas que influenciarão diretamente na assistência das pessoas no
segurança contra incêndio. (PALMA, 2016, p.22)

Entende-se que é de uma importância maior que profissionais da aérea


tenham plena consciência de conhecer as novas normas para aplicarem nas
edificações já existentes, como também nas edificações que estão sendo
projetadas. E para isso, precisa-se de conhecimento na área de prevenção e
proteção contra incêndios, as leis estarem em constante evolução, dando mais
segurança e confiança aos usuários de ambientes citados ao longo da pesquisa.
Assim, prevenindo acontecimentos de novas tragédias, como exemplo a mais
recente no país, a tragédia da Boate Kiss.

3. MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO

Em relação ao proposto, a pesquisa é classificada como estudo de caso,


tendo no seu processo a utilização de Mapas Mentais como ferramenta para a busca
de informações/elementos que irão auxiliar nas análises e interpretações futuras.

A utilização de um método, segundo Gil (2008) tem por objetivo proporcionar ao


investigador os meios técnicos para garantir a objetividade e a precisão no estudo
dos fatos sociais. Mais especificamente visam fornecer a orientação necessária à
43

realização da pesquisa social, sobretudo no referente à obtenção, processamento e


validação dos dados pertinentes à problemática que está sendo investigada.
Podem ser identificados vários métodos desta natureza nas ciências sociais.
Nem sempre um método é adotado rigorosamente ou exclusivamente numa
investigação. Com frequência, dois ou mais métodos são combinados, isto porque
nem sempre um único é suficiente para orientar todos os procedimentos a serem
desenvolvidos ao longo da investigação.

O método utilizado neste estudo é o experimental, que consiste segundo Gil


(2008), essencialmente em submeter os elementos de estudo à influência de certas
variáveis, em condições controladas e conhecidas pelo investigador, para observar
os resultados que a variável produz. Por sua contribuição nos conhecimentos
obtidos nos últimos três séculos, pode ser considerado como o método, por
excelência, o das ciências naturais.

Em relação ao objetivo proposto, a pesquisa é classificada como exploratória,


onde a principal finalidade é o aprimoramento de ideias. Seu planejamento é,
portanto, bastante flexível, possibilitando a consideração dos mais variados aspectos
relativo ao fato estudado.
No caso específico desta pesquisa, serão aplicadas entrevistas com pessoas
que estavam no interior da Boate Kiss no dia da tragédia. Assim sendo, possibilitará
sua análise segundo critérios de um estudo de caso, favorecendo o esclarecimento
para melhor compreensão do “problema” e descrevendo os resultados para a
análise, mais na condição de hipótese do que de conclusões. (GIL, 2002)

3.1 O AMBIENTE E A OPORTUNIDADE DA AÇÃO PROPOSTA

Diante da tragédia e na condição de aluno do curso de Desenho Industrial da


UFSM, não restou outra condição senão explorar os fatos para de alguma forma
poder contribuir para a diminuição das possibilidades de outras tragédias. Neste
contexto foi utilizada uma metodologia já estruturada por Brondani (2006) e aplicada
com profissional da neurociência e acadêmicos que sobreviveram à tragédia da
Boate Kiss.
44

3.2 DESCRIÇÃO DAS ETAPAS DO MODELO APRESENTADO - COLETA DE


DADOS

A preparação para a coleta de dados foi desenvolvida em três etapas:

a) Primeira etapa: busca por informações e documentação local – Com o


apoio da Polícia Civil do RS, tivemos acesso aos projetos arquitetônicos
que constavam da documentação do inquérito policial. Junto aos órgãos
da administração pública do município, foram coletados as normas e
regulamentos de prevenção de incêndio. Demais documentos e
bibliografias foram acessados em sites e bibliotecas.
b) Segunda etapa: junto à marcenaria do curso de Desenho Industrial da
UFSM, foi então materializada a planta baixa da Boate Kiss numa escala
de 1:50. Caracterizou-se como uma maquete de planta esquemática,
produzida com o corte de chapa de MDF 6 mm, definindo os acessos,
ambientes e paredes divisórias. Esta proposta visa facilitar o registro do
percurso do pesquisado quando da sua saída do interior do ambiente da
boate. A montagem e preparação do teste consistem inicialmente em
posicionar sobre uma mesa uma placa de poliestireno. Esta, então, será a
superfície para colocação do papel onde está graficada a planta baixa.
Sobre este, é posicionada a maquete esquemática, coincidente com a
planta baixa. Depois de estabilizada, estará pronta para a graficação do
percurso.
45

Figura 4 – Planta baixa edifício da Boate Kiss, escala 1:50

Fonte: Cássio F. Lemos.


46

Figura 5 – Materialização da planta baixa da Boate Kiss

Fonte: produção própria do autor.

c) Terceira etapa: elaboração dos Mapas Mentais (MMs) – foi aplicado o


“teste piloto” com um dos sobreviventes da tragédia. Este foi informado de
que não haveria tempo cronometrado para a realização da tarefa, usaria o
tempo que julgasse necessário. Disponibilizando de lápis, caneta e
borracha, foi então traçado o percurso, denominado de MM. Inicialmente
é dada explicação sobre a maquete, identificando os ambientes e os
acessos, fazendo com que o pesquisado se situe no local, como no dia da
tragédia. O pesquisador acompanha durante todo o tempo do
desenvolvimento da pesquisa, identificando e assinalando o início e o
término do percurso.
47

Figura 6 – Aplicação do “teste piloto” com um dos sobreviventes da tragédia

Fonte: produção própria do autor.

Na busca por mais informações, antes da representação dos MMs, foi


aplicada uma entrevista com o pesquisado, no sentido de auxiliar nas futuras
análises da percepção. Modelo de entrevista proposto:
1) Nome:
2) Sexo: ( ) M ( ) F
3) Idade quando do dia da tragédia:
4) Já havia frequentado a boate antes da tragédia: ( ) Sim ( ) Não
Quantas vezes:
Tempo para explicar a implantação da maquete esquemática; Com lápis e
caneta, traçar o percurso de saída que você lembra ter feito no local durante o
incêndio.
5. Lembra de alguma sinalização indicativa de saída de emergência que
auxiliou na sua saída:
( )Sim ( )Não
48

Figura 7 – Sinalização indicativa de saída de emergência

Fonte: produção própria do autor.

6. Onde morava quando do dia da tragédia:


( ) Casa ( ) Apartamento.
7. No local em que você morava, existia alguma sinalização indicativa de
saída de emergência:
( ) Sim ( ) Não
(em caso afirmativo, apresentar propostas de sinalização sugeridas
para a escolha do ator pesquisado):
8. Onde mora hoje:
( ) Casa ( ) Apartamento.
9. No local em que você mora, existe alguma sinalização indicativa de
saída de emergência:
( ) Sim ( ) Não
(em caso afirmativo, apresentar propostas de sinalização sugeridas
para a escolha do ator pesquisado):
10. Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss:
( ) Sim ( )Não
11. Esteve internado no hospital sob ventilação mecânica:
( ) Sim ( ) Não
12. Fez queimadura de pele:
( ) Sim ( ) Não
13. Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico:
( ) Sim ( ) Não
14. Faz uso de algum tipo de medicação:
( ) Sim ( ) Não
Legenda utilizada para demarcações no traçado da rota de fuga:
Letra “I”: início do percurso;
Letra “F”: final do percurso;
Linha Contínua (______): percurso livre;
49

Linha Tracejada (- - - - - -): percurso congestionado.

No desenvolvimento da pesquisa, a cada novo ator pesquisado, será retirada


a maquete esquemática e substituído o papel com o MM. Todos os registros gráficos
serão identificados individualmente e arquivados para as análises. Está previsto
trabalhar com um número mínimo de vinte atores. Para uma análise estatística, este
número é aceito para avaliar uma pesquisa exploratória. Os resultados obtidos
poderão direcionar para outras pesquisas, tendo em vista a caracterização de
algumas variáveis.

3.3 MODELO APRESENTADO E SUAS APLICAÇÕES

A aplicação do modelo proposto ocorreu-se entre os anos 2016 e 2017 com


sobreviventes que se voluntariaram à participação desta pesquisa, todos estavam no
interior da Boate Kiss. A partir do convite do pesquisador se solicitou aos voluntários
que deslocassem até o Prédio 40, Centro de Artes e Letras, na Universidade Federal
de Santa Maria onde ocorreram todas as entrevistas. Em uma sala reservada para
que se preservasse a integridade de cada um, bem como a segurança e legitimidade
dos dados, deu-se partida às conversações com cada ator convidado.

Inicialmente explicou-se o intuito da pesquisa, suas perspectivas de metas e


objetivos a serem alcançados. Posteriormente leu-se o Termo de Consentimento
esclarecendo algumas questões tais como a segurança da privacidade dos dados
pessoas de cada ator pesquisado, sem ocorrência de nenhum tipo prejuízo, tal como
o voluntário poderia optar por não continuar a entrevista e ou futuramente requerer a
solicitação da retirada de seu depoimento e seus dados da pesquisa. Para que o
sobrevivente pesquisado ficasse mais a vontade em contar seu depoimento da noite
da tragédia não se delimitou nenhum limite de período de tempo, ficando com total
liberdade de conversar tranquilamente sobre os fatos ocorridos. Esclareceu-se
também que no decorrer da entrevista o pesquisador registraria com uma máquina
fotográfica o andamento da conversa e a realização física do Mapa Mental.
Depois destes esclarecimentos iniciais o entrevistador começa a aplicação de
uma série de perguntas na entrevista com o pesquisado, como já mencionado no
50

capítulo anterior, explicando como funcionaria a graficação na maquete


esquemática.

Figura 8 – Aplicação da entrevista com um dos atores pesquisados

Fonte: produção própria do autor.

Diante disto, em paralelo com as perguntas da entrevista o ator pesquisado


começa a desenhar na maquete esquemática da Boate Kiss relatando o ponto
inicial, local onde estava quando viu e ou percebeu indícios de perigo real e ou o
fogo no interior da boate. A partir daí o sujeito pesquisado traça seu percurso até o
ponto final chegando à parte externa da Boate ou mesmo até onde se recorda de ter
consciência. Ainda, Pergunta-se para o entrevistado se em algum momento de seu
trajeto, do ponto inicial ao final, se ele se lembra de alguma sinalização que
indicasse saída de emergência em que auxiliou na sua saída da casa noturna.

4. RELATOS E DIAGNÓSTICO DOS RESULTADOS DAS ENTREVISTAS

À coleta proposta, foi frisada aos atores pesquisados a suma importância que
todos representam com suas participações na pesquisa, onde cada um colaborou
51

com informações extremamente valiosas não somente para este trabalho, mas
também uma contribuição positiva para reflexões futuras à nossa sociedade de
medidas em prol à vida. Foi-se fornecido como material à confecção dos Mapas
Mentais aos voluntários de lápis, borracha e caneta.
Para uma graficação tranquila dos atores deixou-se claro que não precisaria a
preocupação de estar bem feito o trajeto do desenho na maquete, não existindo
desenho feio ou bonito, tal como desenho certo ou errado. Somente foi pedido de
cada participante, a partir de suas lembranças da noite da tragédia, representasse
em forma de desenho trajeto no interior da casa noturna.

A identificação de cada sujeito pesquisado e seu Mapa Mental produzido se


fez através de letras do alfabeto para manter-se em anonimato. A mesma letra
corresponde tanto à ordem de entrevista, como também o Mapa Mental do
entrevistado, por exemplo: Ator pesquisado “A”, Mapa Mental “A”.
Todos os participantes pesquisados são adultos maiores de idade.

A seguir o apanhado de dados coletados em cada entrevista realizada:

Ator “A”
O Ator pesquisado do sexo masculino, com 31 anos de idade na época da
tragédia, já havia frequentado a casa noturna cinco ou seis vezes,
aproximadamente. O sujeito relata que teve dificuldades de chegar à parte externa
da boate. Quando percebeu a situação inicial de fogo, como mostra no seu Mapa
Mental na figura abaixo, graficado com a letra “I”, logo tentou se retirar, entretanto
chegando ao segundo ponto acabou caindo devido à confusão já disseminada. Não
conseguindo respirar foi perdendo seus sentidos no terceiro ponto do trajeto, pensou
que iria entrar em óbito, pois outras pessoas o pisotearam.
52

Figura 9 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “A”

Fonte: produção própria do autor.

Conta ainda que tomou forças erguendo-se do chão da boate com o auxílio
dos guarda-corpos, usou a camisa em seu rosto para facilitar a respiração, tateou
pela parede até a porta de saída. Por aproximadamente 20 segundos forçou a porta,
tentando abri-la para sair.
No quarto ponto de seu trajeto a sua frente avistou uma luz em meio à neblina
de fumaça, esta o ajudou a guiar-se à parte externa. Saindo da Boate ficou cerca de
15 minutos na frente da casa noturna, posteriormente não tendo mais consciência
de nada, foi ajudado por um casal que o levaram ao hospital. O ator “A” estimou um
intervalo tempo de 5 a 8 minutos para completar seu trajeto do início ao fim.
53

Figura 10 – Mapa Mental do participante pesquisado “A”

Fonte: produção própria do autor.

 Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;


 Esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Fez queimadura de pele;
 Não fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se lembra se havia alguma sinalização indicativa de saída.

Ator “B”
A entrevistada do sexo feminino, 36 anos de idade na época, estava no
banheiro feminino ao fundo da Boate Kiss, em seu ponto inicial de trajeto dentro da
casa. Detalha que todas as luzes do banheiro estavam ligadas. Já tinha frequentado
a boate antes da tragédia pelo menos duas vezes. Após 30 segundos, já no
54

segundo ponto do trajeto, uma funcionária da casa informou para sair por causa do
incêndio.
No terceiro ponto de sua caminhada, sabendo sobre o perigo, comenta com a
funcionária de ir avisar os amigos da situação, mas a funcionária avisa que todos já
haviam saído. Neste momento do trajeto, saindo do banheiro a participante da
pesquisa percebe que a casa noturna esta em completa escuridão, perde o sapato,
com dificuldades para respirar mesmo assim continua, escutou barulho de cadeira
caindo e madeira queimando.

Figura 11 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “B”

Fonte: produção própria do autor.

Chegando ao quarto ponto, como mostra seu Mapa Mental a seguir, a


entrevistada “B” desmaia. Sentiu que caiu em cima de alguém, com o rosto no chão.
Neste momento achou que iria morrer levando em conta a gravidade da situação.
Presume que só saiu do interior da boate quando o Corpo de Bombeiros chegou.
55

Figura 12 – Mapa Mental da participante pesquisada “B”

Fonte: produção própria do autor.

 Esteve internada em função do incêndio da Boate Kiss;


 Esteve internada no hospital sob ventilação mecânica;
 Fez queimadura de pele;
 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se lembra se havia alguma sinalização indicativa de saída.

Ator “C”
O participante “C” de sexo masculino, com a idade de 20 anos no ano da
tragédia, já havia frequentado a Boate Kiss pelo menos cinco vezes antes do
ocorrido. No ponto inicial de seu trajeto, ele e seu amigo viram o tumulto, contudo
não deram muita importância à situação e nesta hora o amigo que estava junto com
56

o ator “C” foi ao encontro de outro amigo, retornando assim para que os três
saíssem juntos do interior da boate.

Figura 13 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “C”

Fonte: produção própria do autor.

Na altura do ponto dois, como mostra a Figura 14, perceberam que as luzes
se apagaram, muita fumaça, impossível de evitar inalação. No ponto três O Ator “C”
caiu sobre as cadeiras onde estavam nas mesas fixas, vários batiam e o
pisoteavam, seus olhos ardiam. Ele deduz que, por ter caído esta primeira vez, a
própria queda o ajudou a ter sobrevivido, pois assim conseguira respirar tendo
forças para levantar e seguir o trajeto.
Chegando ao ponto quatro novamente cai ao chão. Muita gente forçando a
saída. Mas sabia que a saída era em linha reta. No último ponto da sua caminhada,
à parte externa da boate, vai ao chão outra vez com pessoas caindo e passando
umas por cima das outras. A aglomeração era tanta que ficou preso no chão.
Cansado ainda tentou sair fazendo muita força, todavia não obteve sucesso e
no mesmo lugar ficou até que um casal ajudou-o, puxando-o e, finalmente,
conseguindo tirá-lo arrastado de dentro da boate.
57

Figura 14 – Mapa Mental do participante pesquisado “C”

Fonte: produção própria do autor.

 Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;


 Esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Fez queimadura de pele;
 Fez tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Não faz uso de algum tipo de medicação;
 Sabia que tinha sinalização indicativa de saída por ter estado antes no local.
Entretanto na hora da tragédia não viu nenhuma sinalização.

Ator “D”
Com 18 anos de idade na data da tragédia, havia frequentado
aproximadamente três ou quatro vezes a casa noturna, a participante pesquisada é
do sexo feminino.
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Da cidade de Uruguaiana, cursando na época Processos Químicos na


Universidade Federal de Santa Maria, ela estava com mais cinco amigas na boate
comemorando o aniversário de uma destas amigas. Sobreviveram a participante “D”
e outra amiga.

Figura 15 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “D”

Fonte: produção própria do autor.

No seu ponto inicial, ela estava com mais outra amiga no banheiro localizado
na parte da frente do interior da boate, se dando conta do tumulto apenas no ponto
dois onde pensou que a correria poderia ser de fogo ou de briga. Neste momento
cogita em sair da boate.
No ponto três, como mostra o Mapa Mental na Figura 16, foi o ponto em que
demorou a sair. A participante relata que já saiu com queimaduras nas mãos e nas
costas, deduz que todo trajeto teria feito com rapidez, mas pela gravidade das
queimaduras, acha que realmente demorou até estar fora da Boate Kiss. Na parte
exterior, já na rua, relata que respirou e sentiu que queimava internamente, quando
deu alguns passos e caiu. Lembra da calçada e das ambulâncias no local. Nesta
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parte entende-se, então, que o edifício da boate já estava com fogo na hora que a
pesquisada “D” ainda estava no banheiro.

Figura 16 – Mapa Mental da participante pesquisada “D”

Fonte: produção própria do autor.

Finalizando seu relato, ela nos conta que ficou deitada num estacionamento
de um mercado em frente da boate e que foi levada de carro para o hospital por
outra pessoa. Fala também que não escutou de ninguém que a boate estivesse
pegando fogo e se recorda que havia luz no banheiro onde estava no ponto inicial.
Ela ainda diz que se lembra de pouca coisa, por isso acredita que apagou muito de
sua memória.
 Esteve internada em função do incêndio da Boate Kiss;
 Esteve internada no hospital sob ventilação mecânica;
 Fez queimadura de pele;
 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
60

 Fez uso de algum tipo de medicação;


 Sabia que tinha sinalização indicativa de saída na noite da festa, mas não tem
certeza de qual era.

Ator “E”
Com 21 anos de idade o pesquisado, sexo masculino, havia frequentado a
boate anteriormente à tragédia, em torno de 10 vezes. Em seu relato daquela noite
trágica nos conta que, no ponto um de seu trajeto o pesquisado estava de costas
para o palco, lugar onde iniciou o fogo dentro da boate a partir do acendimento de
um artefato pirotécnico por um dos integrantes da banda que tocava naquela noite.

Figura 17 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “E”

Fonte: produção própria do autor.

Seu amigo o avisa da situação que se constrói visualizando que o ponto


inicial do fogo se mantém ainda num lugar só. Ao verificarem se todos os amigos
estavam ali juntos iniciaram a caminhada até a parte externa da boate. Bem como
nos conta saíram entre três amigos conforme o fluxo das pessoas sem maiores
61

problemas deduzindo que não demoraram muito, em torno de dois minutos,


aproximadamente.
No ponto dois, Figura 18, ficou no lado externo da casa noturna ajudando o
Corpo de Bombeiros no qual permitiram que civis auxiliassem no resgate de quem
ainda estava na parte interna. Tendo a permissão de retornar para dentro da boate,
o Ator “E” ao ponto três visualiza alguém com sinal de vida. Fala que estava com
muita água e vidro quebrado no chão do local, tropeçou algumas vezes. Viu
pertences de outras vítimas como celulares e calçados. Avistou a mangueira do
Corpo de Bombeiros e outras pessoas para serem resgatadas. Já rastejando e
tateando, sem conseguir enxergar muito bem, por ter treinamento do grupo de
escoteiros conseguiu de uma melhor maneira respirar e puxar os que estavam no
chão e ou vindo em sua direção.

Figura 18 – Mapa Mental do participante pesquisado “E”

Fonte: produção própria do autor.


62

Na altura do ponto quatro saiu rastejando e já não se sentia bem fisicamente


em função de sua respiração afetada. Parou de prestar ajuda quando o Corpo de
Bombeiros avisara que não tinha mais possibilidade de quem estava na parte interna
da Boate Kiss estar com vida.
Este sobrevivente voluntário à pesquisa salienta que era perceptível que o
Corpo de Bombeiros tinha consciência da dificuldade que foi o contexto do resgate à
tragédia, entretanto não tinha noção mensurável do quão grave era à situação.
Ainda salienta que, pessoalmente, acha que faltou planejamento na construção e
estruturação do ambiente interno da danceteria, onde as reformas feitas pelos donos
prejudicaram à prevenção de segurança.
 Não esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;
 Não esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Não fez queimadura de pele;
 Sim fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Não Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.

Ator “F”
A participante que nos conta este depoimento é do sexo feminino e no ano da
tragédia tinha 18 anos de idade, nunca havia frequentado a boate. Partindo do ponto
um ela relata que estava com mais cinco pessoas e que enxergando a pista um da
boate, logo viram outras pessoas correndo, bem como também um clarão. Pensou
que pudesse ser briga, mas alguém disse então que era fogo. Logo tudo escureceu
por causa de queda de energia elétrica e não demorou a começar arder seus olhos
por causa da fumaça que tomava conta da boate. Sabendo do risco que a situação
poderia se agravar, a pessoa que avisou sobre o incêndio pegou-a pela mão para
tentarem sair em meio a inúmeros empurrões.

No ponto dois do caminho todas as pessoas que, ao mesmo tempo, tentavam


sair pela única abertura de entrada e saída que existia, devido à aglomeração todos
não conseguiam ir à frente. Ao ponto três nos conta que não conseguia mais
respirar. Suas pernas já estavam sem forças, mas ainda sim continuou tentando
63

sair, pois avistou uma luz. A pesquisada fala que era um automóvel do lado de fora
iluminando para o lado de dentro da boate.
Em meio à confusão, fumaça, alta temperatura e excesso de pessoas em
pânico tentando sair, a sobrevivente recebe ajuda de outra menina para guiá-la até a
saída onde ajudaram-na puxando-a para fora do ambiente. Nesta situação de terror
infelizmente acabou sendo empurrada batendo a cabeça no automóvel que ajudara
iluminar em direção a parte interna do estabelecimento. Já na parte externa na rua a
sobrevivente nos fala que ficou procurando seus outros amigos que estavam com
ela anteriormente por mais ou menos uma hora. Seu corpo já não aguentando mais
desmaia e toma consciência já sob cuidados médicos em um dos hospitais de Santa
Maria.

Figura 19 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “F”

Fonte: produção própria do autor.

Muito nervosa, com os lábios trêmulos e bastante emocionada em nos contar


sua história daquela noite fatídica, diz que na sua última posição, ponto três de seu
trajeto, sentiu que iria morrer, perdeu totalmente as forças. Como tinha memorizado
a entrada, pensou como deveria sair e realmente sentiu a gravidade da situação
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quando viu alguns corpos deitados na rua onde estes mesmo corpos não eram
levados para os hospitais da cidade, pois já se encontravam em óbito. A autora
deste depoimento termina dizendo que não sai mais a noite, a não ser em ambientes
que sejam abertos.
Figura 20 – Mapa Mental da participante pesquisada “F”

Fonte: produção própria do autor.

 Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;


 Esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Não fez queimadura de pele;
 Não fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.
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Ator “G”
A participante que nos conta este relato, sexo feminino, acadêmica de
Educação Física na Universidade Federal de Santa Maria, tinha 19 anos de idade no
ano de 2013, quando ocorreu o incêndio, estando pela primeira vez dentro do
edifício.

Figura 21 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “G”

Fonte: produção própria do autor.

Iniciando no ponto um, ela nos diz que em um momento sentiu cheiro de
fumaça, mas pensou que pudesse ser dos equipamentos de ventilação, pois
próximo a ela tinha dois ventiladores de teto. Pensou em ir para a pista dois,
contudo, antes foi à pista um buscar uma amiga.
Já na pista um, no ponto dois, Figura 22, observou que o incêndio já havia
iniciado e uma pessoa desconhecida, pelo que podemos interpretar já estava antes
ciente do início do incêndio, segurou na mão da entrevistada e de sua amiga
conduzindo-as em direção a saída. Ela lembra que tentaram sair, entretanto não se
recorda como saíram.
66

Figura 22 – Mapa Mental da participante pesquisada “G”

Fonte: produção própria do autor.

Conforme tentam sair foi obstruída no ponto três por um banco, recorda que a
porta estava fechada e os seguranças do estabelecimento impedindo os usuários
saírem. Depois que se rompeu o impedimento de chegar à parte externa e após a
queda ao chão, conseguiu levantar e, finalmente, sair de dentro da boate no ponto
quatro.
Passado a dificuldade para estar fora da boate, a sobrevivente pesquisada foi
para o outro lado da rua, em frente de um supermercado local, ela acredita que foi
uma das primeiras pessoas a sair da casa noturna. Ela entrou com mais oito amigos
e descreve que apenas fala sobre o assunto quando necessário, pois nunca teve a
real noção da gravidade da tragédia, haja vista que ainda é algo muito forte de se
lembrar. A realidade grave da situação foi ainda mais perceptível quando outra
pessoa começou vomitar fuligem próxima a autora desde depoimento. No desespero
e preocupada com o risco de vida que seus amigos corriam porque ainda estavam
67

dentro da boate, ela ainda tentou entrar novamente para procurá-los, mas sem
sucesso, porque foi impedida de entrar pela pessoa que a salvou.

Este tipo de reação dos sobreviventes que conseguiram sair sem maiores
ferimentos e quiseram entrar para salvar seus amigos no qual não tiveram a mesma
possibilidade de evacuação rápida, foi muito comum na noite da tragédia. Inúmeros
civis, bem como já vimos em relatos de outros atores pesquisados acima, forçaram a
entrada ajudando no salvamento e a retirada de outras pessoas. Muitos perderam
heroicamente a vida por esta escolha de salvar seus amigos, isto nos ilustra bem a
gravidade em que tudo se encontrava, onde o pavor e desespero eram os principais
agentes no enredo da tragédia.

Tentando acalmá-las do que estavam vivenciando a pessoa que salvou esta


participante entrevistada e sua amiga, leva as duas meninas para outra rua próxima
a casa noturna, um pouco mais para cima da aglomeração que já se montara em
frente da boate. Neste momento reencontra mais um de seus amigos que estavam
com ela, partindo da participante que nos conta, resolvem voltar à frente da Boa
Kiss, pois mais amigos ainda estavam desaparecidos, o que eles não esperavam
era pelo bloqueio da rua que foi feito pelas autoridades não podendo mais retornar
pelo caminho que passara antes.
68

Figura 23 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “G”

Fonte: produção própria do autor.

A sobrevivente pesquisada não satisfeita e preocupada com seus amigos faz


a volta na quadra da boate conseguindo passar o bloqueio estabelecido e
reencontrando uma das amigas do grupo, mas não sabiam do restante de seus
amigos. Pensaram, então, em ir procurar nos hospitais da cidade na busca de
informações do paradeiro de seus amigos perdidos. Apenas mais um amigo
encontraram em um dos hospitais de Santa Maria, os demais ainda estavam
desaparecidos.

Finalizando sua busca, um tempo depois teve a triste notícia que quatro
amigos do grupo que estavam com ela dentro da boate faleceram. Sua amiga que
saíram juntas, posteriormente, foi induzida ao coma por causa de seu agravamento
de risco à saúde. Outro amigo dela felizmente conseguiu se salvar. A sobrevivente
relatou seu depoimento com relativa emoção. A percepção da autora deste
depoimento era que a boate estava superlotada.
 Não esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;
 Não esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
69

 Não fez queimadura de pele;


 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.

Ator “H”
A entrevistada nesse depoimento é do sexo feminino, com idade de 23 anos
na época da tragédia, já tinha frequentado a Boate Kiss pelo menos quatro vezes.
Fazia parte da turma organizadora do curso de Agronomia da UFSM, havia ido à
boate numa quinta-feira anterior à tragédia para divulgar a festa do dia 27, no
sábado.

Figura 24 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “H”

Fonte: produção própria do autor.


70

Iniciando seu relato fala que quando estava no ponto um, como podemos ver
na Figura 25, localizava-se na frente do palco sendo testemunha do acionamento do
artefato pirotécnico que propagou o fogo na boate. Como era uma cena muito
assustadora decidiu sair com sua colega em direção a porta de saída da casa
noturna. No caminho dois, encontrou mais três colegas de turma e avisou o que
acabara de ver, mas os colegas não deram muita importância.
No ponto três sentiu dificuldade para se deslocar à saída, tanto por causa do
tumulto, quanto pela dificuldade para respirar. Ao ponto quatro caiu ainda
consciente, mas conseguiu sozinha levantar e sair. Sua colega saiu junto.

Figura 25 – Mapa Mental da participante pesquisada “H”

Fonte: produção própria do autor.

A sobrevivente comenta que levou em torno de um minuto do ponto um ao


ponto quatro de seu percurso. Entre o ponto três e o ponto quatro há falta de energia
elétrica. Considera-se umas das primeiras a sair da Boate Kiss. Fala-nos que não
71

chegou a ver os seguranças barrarem a saída, que tem consciência de que caiu
porque houve tumulto das pessoas lá confinadas, não justificando a fumaça como
motiva da queda.
 Não esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;
 Não esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Não fez queimadura de pele;
 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se lembra de sinalização indicativa de saída na noite da festa, apenas de
muita fumaça.

Ator “I”
O autor desse relato nos descreve seu trajeto a partir do ponto um. Chegou à
boate entorno de 1 hora da manhã e que ficou neste ponto conversando com as
outras pessoas que ali estavam. Como aquela noite a casa noturna estava muito
cheia preferiu ficar neste local. Iniciado o momento do incêndio em outro local da
boate, sem estar ciente do que havia ocorrido alguma briga ou se era fogo, vendo
outras pessoas indo em direção à única saída, resolveu seguir o fluxo. O
sobrevivente sabia onde era a direção da saída, pois já tinha frequentado mais de 50
vezes a boate. Do sexo masculino, tinha 27 anos de idade e é graduado em
Administração.
72

Figura 26 – Aplicação da entrevista com o participante pesquisado “I”

Fonte: produção própria do autor.

Por causa do montante de gente tentando fugir daquela situação apavorante,


nosso entrevistado conta que caiu por causa da fumaça e por cima dele caiu outras
pessoas. Por este fato não foi pisoteado e, como a fumaça era muito densa e
escura, desmaiou. Quando acordou no chão, sentiu muito calor e a luz estava
apagada, acredita que ficou por volta de 20 minutos inconsciente, quando voltou a si
rastejou até sair. Conseguiu ver outras pessoas entrando e retirando os demais,
percebendo que poderia ser ajudado, caído ergueu suas mãos até alguém resgatá-
lo para fora da boate. Até o ponto dois rastejou. Ao ponto três foi puxado para fora.

Alguns entrevistados nos afirmam que a contaminação das vias aéreas pela
fumaça provocava vômitos nas pessoas. Com este sobrevivente que nos conta sua
73

história não foi diferente, como tinha respirado a fumaça com fuligem na sua saída
deram água para assim vomitar.

O ator “I” fala que saiu mais pela intuição, pois não tinha ideia do que estava
acontecendo, porque do ponto inicial, como podemos visualizar na Figura 27, onde
se encontrava, não tinha possibilidade de ver o que estava acontecendo no ponto
onde se iniciou o incêndio na Boate Kiss, no palco da pista um.

Figura 27 – Mapa Mental do participante pesquisado “I”

Fonte: produção própria do autor.

Não se lembra de qualquer sinalização de segurança no decorrer de seu


trajeto, observou que tinha muitas pessoas indo na direção errada, por exemplo,
para os sanitários da parte da frente do ambiente, onde as autoridades encontraram
uma quantidade enorme de vítimas fatais. Também não se lembra dos corrimãos da
74

entrada da casa, entretanto, se recorda de ter passado pelo corrimão que tinha na
parte interna.

Hoje em dia faz acompanhamento médico a cada seis meses para ele ser
comunicado caso haja qualquer anormalidade em sua saúde. O autor do relato teve
queimadura leve externa na perna e, queimadura interna, nas vias respiratórias.
Ficou 12 dias internado no hospital, cinco dias em coma. Ele ainda salienta que não
estava tão debilitado, contudo a demora à saída da boate foi decisiva para ter tantas
complicações na sua saúde posteriormente.
 Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;
 Esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Fez queimadura de pele;
 Não fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.
Sugere que havia uma luz verde indicando a saída sobre as portas.

Ator “J”
Sexo feminino, com 19 anos de idade quando ocorreu a tragédia da Boate
Kiss, a participante deste relato começa seu depoimento dizendo que nunca havia
entrado na casa noturna antes daquela noite e desde já fala que a superlotação foi
algo que dificultou sua saída.

Inicialmente ficou no ponto um entre as duas pistas, visto que a pista um


estava muito cheia e na pista dois não estava de seu agrado. Momentos se
passaram e ela avista uma movimentação da equipe de seguranças e de pessoas
indo para o lado do palco principal, não deram muita importância e assim
continuaram aproveitando a festa. Percorreu então ate o ponto dois porque viu
alguém com um extintor. E no ar já sentia o cheiro de fumaça.
75

Figura 28 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “J”

Fonte: produção própria do autor.

Após perceber que algo errado estava acontecendo foi caminhando até o
ponto três, Figura 29, não conseguindo seguir adiante porque tinha muita gente
tentando sair ao mesmo tempo. Foi então que as luzes se apagaram, as pessoas
começaram a gritar e a se debaterem, umas puxando as outras. Em meio a esta
confusão, então, a sobrevivente conta que caiu por causa de um esbarrão e
prejudicada pela fumaça teve dificuldades para respirar.
76

Figura 29 – Mapa Mental da participante pesquisada “J”

Fonte: produção própria do autor.

Até o ponto quatro a sobrevivente foi rastejando, não se recorda se foi


pisoteada, mas posteriormente a noite da tragédia percebeu que estava com
inúmeros hematomas. Em conversa ela faz uma observação em que do ponto dois
ao ponto quatro, na sua percepção, levou muito tempo para cumprir o trajeto, mas
pelo que analisou sua psicóloga, este intervalo de trajeto durara de dois a três
minutos.
É importante salientar esta observação, pois a percepção da sobrevivente,
bem como cita a literatura estudada nesta pesquisa sobre a percepção do espaço,
mostra situações em que a autora do relato possa compreender e se localizar, assim
criando referências para que ela se situe espacialmente, logo, tendo que adotar
certo comportamento.
77

Sua amiga que estava junto, conhecendo a casa, foi quem a levou para a
saída. Em seu trajeto não se lembra de sinalização indicativa de saída de
emergência, assim como não se lembra de nenhum corrimão nem de algum tipo de
elemento bloqueando a saída. A amiga também sobreviveu.
Durante seu trajeto não desmaiou, entrou na boate por volta da meia noite e
recorda mais uma vez que a casa estava lotada. A sobrevivente comenta que saiu
da frente da Boate Kiss antes que o Corpo de Bombeiros chegasse, mas lembra de
ver a imprensa chegar antes mesmo do resgate. Pela situação ser tão impactante
emocional e fisicamente não conseguia reagir a tudo que estava acontecendo.
Finaliza dizendo que ficou paralisada com aqueles momentos terríveis no qual
passou. Hoje em dia não frequenta mais boates.
 Esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;
 Não esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Não fez queimadura de pele;
 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Fez uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.
Sugere que a placa de número dois fosse mais interessante para perceber.

Ator “K”
A sobrevivente que descreve esse relato é do sexo feminino, com idade de 35
anos em 2013. Havia frequentado a boate outras duas vezes além da noite da
tragédia. Frequentava a casa por lazer e naquela noite foi acompanhada de uma
amiga.
Sentiu cheiro de fumaça e viu o fogo, mas não foi avisada. No ponto um início
da sua posição, começou a caminhar, todavia como muitas pessoas estavam
tentando sair ao mesmo tempo, logo o congestionamento se estabeleceu. Chegando
ao ponto dois trancou a respiração para poder aguentar e ficar consciente. No ponto
três diz que seguranças da boate barraram a saída. Entre o ponto dois e o ponto três
descreve que a fumaça já tomava conta da boate. Chegando ao ponto quatro cai
sobre um corrimão junto ao meio fio da rua.
78

Figura 30 – Aplicação da entrevista com a participante pesquisada “k”

Fonte: produção própria do autor.

A autora deste relato nos conta que antes do início do fogo a amiga que a
acompanhava foi ao banheiro, não a vendo mais. Após a noite da tragédia ficou
sabendo que sua amiga faleceu. A sobrevivente fala que em nenhum momento de
seu trajeto perdeu seus sentidos, ficando sempre consciente mesmo machucada,
ela não se recorda de avistar nenhuma sinalização indicativa de saída durante o
trajeto percorrido. Só sabia que tinha sinalização por causa das outras duas idas na
boate. Termina dizendo que é impossível mensurar o tempo de percurso, mas
calcula que conseguiu sair em torno de 10 minutos, aproximadamente.
79

Figura 31 – Mapa Mental da participante pesquisada “K”

Fonte: produção própria do autor.

 Não esteve internado em função do incêndio da Boate Kiss;


 Não esteve internado no hospital sob ventilação mecânica;
 Não fez queimadura de pele;
 Fez ou faz tratamento psiquiátrico e/ou psicológico;
 Não fez de uso de algum tipo de medicação;
 Não se recorda de alguma sinalização indicativa de saída na noite da festa.
Mas como havia frequentado outras duas vezes a boate sabia que tinha
sinalização no ambiente.
80

5. COMPILAÇÃO DOS DADOS APRESENTADOS

Foram entrevistados 11 atores sobreviventes da tragédia na Boate Kiss, com


faixa etária entre 18 e 36 anos na época, onde todos estavam no interior do
ambiente da casa noturna com suas respectivas percepções do início do incêndio.
Destes, quatro atores são do sexo masculino e sete do sexo feminino.

Do total de atores entrevistados, no quesito referente quantas vezes já tinham


frequentado a boate, obteve-se as seguintes informações:
 Três atores nunca tinham antes frequentado a casa;
 Dois atores frequentaram a casa noturna até três vezes;
 Dois atores frequentaram a casa noturna até quatro vezes;
 Dois atores frequentaram a casa noturna de cinco a seis vezes;
 Um ator frequentou a casa noturna mais de 10 vezes;
 Um ator frequentou a casa noturna mais de 50 vezes.

No quesito referente à percepção das sinalizações indicativa de saída, ficou


assim registrado:
 73% não se lembram de nenhuma sinalização;
 27% lembram de alguma sinalização.

Do total de atores que se lembram de alguma sinalização do local no dia da


tragédia, quando sugerido alternativas de escolha para a indicação de qual tipo foi
observado, todos (três atores) apontaram para a tipologia padrão da norma técnica.
81

Figura 32 – Sinalização indicativa de saída que foi avistada no ambiente da tragédia

Fonte: produção própria do autor.

Quando anteriormente justificado a dificuldade de controle de algumas


variáveis, sem dúvidas que a sinalização se destaca por estar a muito tempo já
disseminada em muitas instalações do nosso cotidiano. A condição de muitos atores
entrevistados habitar, trabalhar e estudar em imóveis comerciais, institucionais ou
multifamiliares com as instalações de sinalização já adequadas à norma técnica,
favorece a indicação da opção sugerida.
 73% (8) moravam em apartamentos. É importante salientar que deste
percentual apenas 18% (2) informaram que em suas habitações havia
a sinalização indicativa de saída. O restante dos moradores dos
apartamentos entrevistados 55% (6) informaram que em suas
habitações não havia nenhuma sinalização indicativa de saída. Os
demais atores entrevistados 27% (3) moravam em residências
unifamiliares.

Constatado o fato de que havia muitos moradores em apartamentos sem


sinalização, obteve-se a informação que neste percentual haviam jovens
acadêmicos moradores da “Casa do Estudante” do Campus da UFSM - Santa
82

Maria. Percebe-se assim o quanto foi negligenciada a segurança, colocando


em risco muitas outras pessoas.

Das opções sugeridas para a escolha da placa de sinalização instalada, a


Figura 33 resume o resultado que ficou assim representado:

Figura 33 – Modelos de sinalizações indicativas de saída

Fonte: produção própria do autor.

É importante registrar que do total 100% (11) atores entrevistados, 82% (9)
informaram que habitavam (residiam) onde não havia nenhuma sinalização
indicativa. Apesar deste contexto, um percentual significativo 60% indicou a
sinalização de acordo com o modelo normativo. Isso não elimina o condicionamento
da memória de longo prazo para o indivíduo que frequenta ambientes equipados
com a sinalização preventiva.

Tratando com os resultados das entrevistas, identificamos algumas relações


dos percentuais de sobreviventes que necessitaram/necessitam de cuidados no
atendimento à sua saúde, estruturado abaixo como mostra a Figura 33, com a
condição observada pelos atores participantes da pesquisa.
Legenda:
 S – SIM
 N – NÃO
83

Figura 34 – Relação de percentuais de cuidados à saúde dos atores pesquisados


ATORES A B C D E F G H I J K
Esteve
internado
em função
do incêndio S S S S N S N N S S N
da Boate
Kiss
Esteve
internado
no hospital
sob S S S S N S N N S N N
ventilação
mecânica
Fez
queimadura
S S S S N N N N S N N
de pele

Fez ou faz
tratamento
psiquiátrico
e/ou N S S S S N S S N S S
psicológico
Faz uso de
algum tipo
S S N S N S S S S S N
de
medicação
Fonte: produção própria do autor.

6. CONCLUSÃO

Levando-se em conta a bibliografia estudada em conjunto ao estudo de


campo elaborado com os sobreviventes entrevistados, se consegue atribuir
respostas construtivas ao problema pesquisado.

Em relação à eficiência da sinalização de segurança contra incêndio e pânico,


pode-se afirmar com base nas entrevistas realizadas com os atores sobreviventes
da tragédia, que esta foi insuficiente na sua efetivação. Quando se fala na situação
de propagação de fumaça, no caso ambiente da Boate Kiss, como podemos ver os
atores tiveram severas dificuldades para encontrar a saída, pois a própria fumaça
84

bloqueou totalmente a visibilidade da sinalização que indicavam a saída, não tendo


eficiência na sua função de auxiliar para a rota de fuga. Abaixo na Figura 35, uma
ilustração de como ficou o estado deteriorante das sinalizações indicativas de saída.

Figura 35 – Sinalização indicativa de saída derretida pelo calor no interior da Boate


Kiss

Fonte: Cássio F. Lemos.

Com a aplicação da metodologia proposta e utilizando-se dos Mapas Mentais


e das entrevistas estruturadas como ferramentas de análises, se observou a partir
dos relatos do grupo de atores pesquisados que não se teve real eficiência da
sinalização de emergência.
É notável a incoerência da utilização das sinalizações indicativas de saídas,
fatores como superlotação do espaço interno, ambiente mal projetado, falta de
visibilidade das sinalizações ajudou dar ainda mais base para que se perceba a
precariedade na aplicação destas sinalizações. Levando-se em conta o contexto
trágico daquela noite do dia 27 de janeiro de 2013, os depoimentos dos atores
participantes da pesquisa com o que se resultou na morte de 242 usuários do
espaço, as normas nacionais vigentes não se mostraram capaz de fornecer auxílio
85

aos indivíduos usuários da casa noturna naquela noite. Na figura 36, onde mostra
um dos sanitários da Boate em que se encontrava o maior número de vítimas fatais.
Podemos ter uma noção de como a situação na hora da tragédia foi totalmente
desesperadora na busca de referencial em meio a fumaça para encontrar a saída do
estabelecimento.

Figura 36 – Um dos sanitários da casa noturna onde se acumulou mais vítimas

Fonte: Cássio F. Lemos.

Assim, vale reforçar uma atenção maior para uma revisão minuciosa na
construção das leis no que se refere à segurança contra incêndio. Devem ser
considerados estudos e pesquisas que trabalhem na temática da percepção do
86

indivíduo em ambientes edificados, levando-se em consideração a sua experiência.


Alguns autores citados chamam a atenção da relevância de ser mais bem observado
o meio no qual participamos, porque somos capazes de elaborar mentalmente
processos perceptivos que possam nos auxiliar e fundamentar na criação de novos
projetos ambientais.

Figura 37 – Palco. Ambiente interno onde o incêndio se iniciou na Boate Kiss

Fonte: Cássio F. Lemos.

No início do ano de 2017 foi sancionada com alguns vetos pela Presidência
da República, a “Lei Kiss Federal”. Isso foi resultado do apelo da população em
decorrência da tragédia que impôs a realização de uma revisão da lei vigente no
sentido de propor adequações. Considerando a contextualização dos fatos, esta
nova lei pode-se considerar tímida no aspecto de solução.

Se comparados com outros países de diferentes culturas e com melhor


desenvolvimento social e econômico, nossa legislação de Prevenção e Proteção
contra Incêndio tem muito ainda para ser desenvolvida. Como exemplo podemos
citar a regulamentação japonesa que prevê iluminação indicativa de saída ao nível
87

do piso, permitindo a visibilidade por qualquer usuário em qualquer ponto de sua


localização. Torna assim o fluxo de saída das pessoas mais ordenado e eficiente.
Esta condição exemplificada tem o mesmo significado ao das instalações e
posicionamento no piso das aeronaves de grande porte para o transporte coletivo de
passageiros, conforme mostrado na Figura 38.

Figura 38 – Iluminação no piso indicando saídas de emergência

Fonte: site Hangar 22 consultoria em aviação.

No que se refere à utilização de Mapas Mentais como ferramenta do método


utilizado na investigação de busca das informações necessárias para melhor
esclarecer os acontecimentos, podemos afirmar ser esta uma proposta confiável e
adequada para as análises apresentadas no que se refere à percepção dos usuários
e o ambiente. A estruturação das etapas e a aplicação do modelo de entrevista
88

adotado para com os sobreviventes foram de extrema importância para o significado


lógico das conclusões da pesquisa.

Cabe salientar um fato relevante em que um número considerável de atores


entrevistados residiam em apartamentos, ou seja, deveriam estar regidos segundo
as normas de segurança, onde há a obrigatoriedade de serem observados
ambientes adequados. Entretanto, fomos informados de que essas edificações não
estavam obedecendo às leis e normas técnicas. Este fato evidencia uma condição
de negligência por parte dos órgãos fiscalizadores, condição também observada na
Boate Kiss.
É oportuno neste espaço esclarecer algumas condições que ainda são
negligenciadas pelas leis criadas no que se referem à segurança dos ambientes,
mais especificamente, a falta de percepção das consequências da fumaça.
Para os municípios elaborarem suas leis de Prevenção e Proteção Contra
Incêndio, como de regra geral, formam comissões compostas por arquitetos,
engenheiros, construtores, políticos, ensino superior e Corpo de Bombeiros. Se
estruturam e apresentam a nova lei baseada nos objetivos, definições, condições
gerais e específicas considerando as descrições e os dados de dimensionamento de
acordo com as NBRs – Normas Brasileiras apresentadas na ABNT – Associação
Brasileira de Normas Técnicas. Em Santa Maria isso não foi diferente e verifica-se
que todo esse processo não foi suficiente para evitar a tragédia da Boate Kiss.

Para exemplificação do fato, citamos a fumaça tóxica desprendida da queima


dos materiais de revestimento do interior da casa. Já se constatou que essa foi a
causa maior dos 242 mortos. Ambientes sem aberturas de janelas que possam
auxiliar na ventilação para a retirada da fumaça, sem dúvidas aumenta muito o risco
dessas tragédias. Todo esse relato tem mais sentido ainda quando se observa na
ABNT a seguinte redação:

“3.3 Alçapão de alívio de fumaça (AAF) ou alçapão de tiragem

Abertura horizontal localizada na parte mais elevada da cobertura de uma


edificação ou de parte desta, que, em caso de incêndio, pode ser aberta
manual ou automaticamente, para deixar a fumaça escapar.”
(ASSOCIAÇÃO BRASILIERA DE NORMAS TÉCNICAS NBR 9077, 2001,
p.2)
.
89

Sem muito esforço de interpretação percebe-se que se esta condição


estivesse presente na Boate Kiss, certamente não teríamos uma tragédia na
proporção do ocorrido. Então as perguntas que ficam: Porque isso não é observado?
Até quando?

6.1. SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS

Até os dias atuais e por muito mais tempo teremos sempre vivo nas nossas
memórias os fatos e acontecimentos da tragédia. Além das 242 vítimas fatais, temos
ainda mais de 600 feridos que até hoje estão em tratamento de saúde, sejam físicos
ou psicológicos. Eu, autor dessa monografia, também sou sobrevivente e assim
como os onze (11) atores pesquisados, tenho sequelas daquela trágica noite.
Considerada como a segunda maior tragédia do Brasil, ultrapassou as
fronteiras e se destacou em todo o mundo. A perplexidade dos fatos que culminaram
com o evento, proporciona até hoje debates na sociedade em geral no sentido de
prevenir outras tragédias similares. Ainda hoje, decorridos quase cinco anos da
tragédia, percebe-se com muita evidência a dificuldade dos sobreviventes em lidar
com o fato. Relembrar daqueles trágicos momentos é difícil e incompreensível para
muitos.

Considerando os fatores estatísticos para as análises, inicialmente prevíamos


entrevistas com um número de vinte (20) sobreviventes da tragédia no sentido de
apresentar confiabilidade nas probabilidades. Esta condição não foi possível devido
à dificuldade de se obter a espontaneidade dos entrevistados, razão pela qual que
após quatro (04) anos de pesquisa, apenas onze (11) sobreviventes se encorajaram
a participar e contribuir para os resultados apresentados. Por esse motivo, utilizamos
por adequação o termo “amostra estatística”.

Para futuras pesquisas que envolvam sobreviventes de tragédias em que o


abalo psicológico é muito evidenciado, deve-se prever um período de tempo
prolongado, muito além do previsível, para a obtenção das informações necessárias.
Em nossa pesquisa especificamente, o tempo inicialmente previsto teve um
acréscimo de quatro (04) vezes. Talvez uma condição que possa auxiliar neste
quesito é a dos pesquisadores irem até os atores pesquisados e não do contrário.
90

Diante desta consideração, cabe ressaltar o cuidado em ter um local


totalmente isolado, para que os atores não sofram influências variadas de fatores
externos durante a entrevista, sejam eles de ordem pessoal, material ou sensitivos.

Deve-se prever antes de tudo, uma condição totalmente favorável para a


liberdade de expressão e sem qualquer tipo de constrangimento por parte dos
entrevistados. Podemos afirmar que estes foram os momentos mais difíceis e
impressionantes, marcados por pura emoção e sensibilidade de todos os envolvidos,
pesquisadores e pesquisados. Por certo são momentos que ficarão eternizados em
nossas memórias. Apesar de dolorido, temos a convicção de ter atingido plenamente
nossos objetivos deixando aqui nosso registro: VALEU A PENA.

Figura 39 – Autores da pesquisa no interior do edifício da Boate Kiss pós-tragédia

Fonte: Cássio F. Lemos.


91

REFERÊNCIAS

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ASSEMBLEIA LEGISLATIVA. Lei


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