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Luta no Ar

A Alemanha revoluciona a guerra aérea

Armas de represália alemã V-1 e V-2

A operação Overlord entrava em sua segunda semana quando,


pouco antes do amanhecer de 13 de junho de 1944, uma tremenda
explosão sacudiu o povoado de Swanscombe, no condado de Kent, a
uns 35 km de distância da estação central londrina de Charing Cross.
Segundos antes, observadores do serviço de defesa civil haviam
avistado, voando naquela direção e procedente do Canal da Mancha,
um estranho avião cuja silhueta não se identificava com nenhum dos
aparelhos aliados ou inimigos conhecidos até então. Uma testemunha
o descreveu como "um pequeno avião de asa média que voava a
grande velocidade, com um ronco parecido ao de um Ford T ao subir
uma encosta; da sua cauda se desprendia um jato chamejante".

Essa declaração e outras similares, unidas ao fato de não ser


encontrado o menor traço de algum cadáver entre os restos do avião -
que jaziam dispersos em torno da cratera da explosão - e aos informes
encontrados dos arquivos do Intelligence Service, levaram as
autoridades britânicas à conclusão de que o estranho artefato devia ser
um avião não tripulado e provido de uma potente carga explosiva,
integrante do famoso arsenal de "armas secretas" com que,
freqüentemente, a propaganda alemã ameaçava.

A notícia do novo perigo que pairava sobre a cidade causou viva


impressão na população londrina, que temia voltar a viver, talvez
numa versão mais terrível, as sangrentas jornadas da batalha aérea da
Inglaterra. Assim, não é de estranhar que, nas primeiras dez semanas
que se seguiram ao episódio de Swanscombe, mais de um milhão de
londrinos tenham-se transferido voluntariamente ao campo, fora quase
300.000, na maioria mulheres com filhos pequenos e crianças em
idade escolar, que foram evacuados por decisão governamental.

Hitler pede represálias

Os devastadores ataques aéreos desencadeados pela aviação aliada


na primavera de 1942, em particular o incêndio e a destruição da velha
cidade hanseática de Lübeck, em Schleswig-Holstein, provocaram um
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acesso de furor em Hitler, que imediatamente ordenou a execução de


um programa de bombardeios de represália que espalhariam o terror
entre a população civil e prejudicariam o esforço bélico britânico. A
"operação Baedecker" ocasionou danos consideráveis em cidades
como Bath, York e Exeter, porém a perda de quase 40 bombardeiros
em pouco mais de 200 missões constituiu um preço muito elevado
para as esquadrilhas participantes, transferidas propositadamente do
teatro de guerra do Mediterrâneo, para esta operação a oeste da
França. Também, como índice da diminuição da eficácia da Luftwaffe,
cabe registrar o fato de que num ataque contra Norwich, somente duas
toneladas de bombas, de um total de 102 lançadas, caíram nos limites
da cidade. Foi então que, para a execução da campanha de represálias
exigido pelo Führer, o Ministério do Ar alemão decidiu exumar de
seus arquivos, nos quais dormia desde antes da guerra, um projeto de
avião sem piloto, propulsado por uma turbina rudimentar, apresentado
pela firma Argus Motorenwerke. Por sua vez, e também com a
finalidade de represália, o exército determinou acelerar a
desenvolvimento do projeto A-4, um foguete de longo alcance, em que
trabalhava, desde alguns anos, uma equipe de técnicos encabeçada por
Chamier-Glisenski, Dornberg e Werner von Braun.

O Inspetor-geral da Luftwaffe e Diretor de Equipamento da arma,


Marechal-de-Campo Erhard Milch, presidiu, a 19 de junho de 1942,
uma reunião no ministério, que foi assistida por representantes de
firmas industriais vinculadas com o projeto "Argus". Decidiu-se,
então, confiar à Fieseler (construtora do famoso avião Fieseler-Storch,
"Cegonha") o, desenho e a produção do aparelho, enquanto a Argus e
a Askania se encarregariam, respectivamente, do sistema de propulsão
e de controle, com o engenheiro militar Brée, representante do
Ministério do Ar, atuando como coordenador. Embora o Marechal
Milch tivesse prometido um tratamento de alta prioridade ao
desenvolvimento e produção do novo engenho bélico, transcorreriam
dois longos anos - em lugar dos 15 meses calculados pelos peritos
antes que o projeto chegasse à fase operativa.

A primeira experiência do "Fieseler 103", como foi designado em


princípio (denominação mudada mais adiante, ainda na fase
experimental, para FZG-76), ocorreu em dezembro de 1942, e
consistiu no lançamento de um protótipo sem motor, de um Focke-
Wulf 200 "Condor" sobre o campo de provas de Peenemunde, onde o
exército continuava suas experiências com o foguete de longo alcance
A-4. Poucos dias depois, a 24 de dezembro, efetuou-se o primeiro
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lançamento, de terra, alcançando o projétil uma distância de três


quilômetros.

No verão de 1943, os preparativos para o produção em grande


escala do FZG-76 - somente ao entrar em serviço seria designado com
o nome de V-1 (abreviatura de Vergeltungswaffe 1 ou Arma de
Represália n° 1) - estavam quase concluídos. Porém um violento
ataque do aviação anglo-americana contra as fábricas Fieseler, em
Kassel, impôs um adiamento de várias semanas nos planos.
Finalmente, o produção maciça foi iniciada nos estabelecimentos
Volkswagen, de Fallersleben, em setembro de 1943 (isto é, a três
meses da data prevista para o início das operações).

Enquanto isso, os preparativos seguiram seu curso e os unidades


formadas continuaram a instrução e treinamento das tropos que teriam
a responsabilidade do manejo das novas armas. O Flakregiment 155
W (artilharia antiaérea), unidade designado para a operação do avião
não tripulado, foi transferido, durante o verão, a Zinnowitz, na ilha de
Usedom, próximo a Peenemunde. No primeiro momento, o Major-
General Welter Dornberger, um perito em bolística de longo alcance,
considerado o "pai" do foguete A-4 (chamado mais tarde V-2), tinha a
seu cargo, tanto a supervisão dos programas de produção e sua
coordenação com as necessidades de campanha como o comando
direto das operações. Posteriormente, das operações com a futura V-1
seria encarregado um veterano artilheiro, o Tenente-General Erich
Heinemann, enquanto que ao Major-General Richard Metz seria
confiado o comando operativo da V-2. O Alto-Comando da
Wehrmacht, todavia, contava como certo que ambas as armas estariam
em condições operativas a tempo de oferecer um desagradável
presente de Natal aos britânicos.

Informes alarmantes

Se bem que a explosão da primeira V-1 em Swanscombe pudesse


causar alarma na população das ilhas, o acontecimento, de tão
esperado, apenas produziu surpresa nas altas esferas aliadas: há vários
meses se conhecia aproximadamente a natureza da nova ameaça
alemã e estavam em estudo medidas para contrabalançar o seu efeito
ou anulá-la, caso chegasse a concretizar-se. O fato de que, mesmo na
obscuridade, a defesa antiaérea tenha podido reconhecer o estranho
artefato e descrevê-lo como um “avião não tripulado”, desde o
momento em que cruzou a linha da costa, indica o alto nível de
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prevenção alcançado pelas defesas britânicas, com base na informação


recolhida de várias e diversas fontes desde o começo da guerra.

Já na fase inicial da luta, uma infinidade de informes denunciavam


Peenemunde como um dos mais importantes centros de investigação
das "armas secretas" alemãs, espécie de trunfo insuperável exibido
ameaçadoramente pela propaganda do III Reich até ao final da guerra.
Porém, durante muito tempo, as advertências concernentes a
Peenemunde caíram mais ou menos no vazio, superadas por outras
urgências mais imediatas que o decurso dos acontecimentos iam
impondo à condução da guerra britânica. E assim se pode dizer que as
primeiras fotografias aéreas de Peenemunde foram obtidas quase por
casualidade: a 15 de maio de 1942, o Tenente D. W. Steventon, depois
de uma missão de reconhecimento de Kiel, voou sobre aquele
polígono de provas, fotografando o aeródromo; os peritos registraram
a presença de uma série de estranhas construções ovóides,
aparentemente de cimento armado, cuja finalidade não conseguiram
interpretar. Em conseqüência, o "caso Peenemunde" ficou arquivado
uma vez mais.

Até que, em dezembro de 1942, novos informes reunidos pelo


Intelligence Service indicavam, com rara unanimidade, esse polígono
de provas como sede de experiências alemãs com foguetes de grande
alcance. Desta vez, sim, o alarma abalou as altas esferas e foi
ordenada uma série de reconhecimentos aéreos, tanto de lugares
"suspeitos" na Alemanha, como da faixa costeira francesa, confinante
com o Canal; desse modo, os peritos obtiveram indícios reveladores
da natureza dessas experiências. No entanto, o fato de não existir na
organização de guerra britânica um departamento coordenador de
todas as informações recolhidas pelos diversos serviços de inteligência
das forças armadas, provocou múltiplas indecisões e demoras,
primeiro quanto às medidas mais adequadas para conjurar o perigo e,
segundo, quanto à oportunidade de aplicá-las. Ilustra perfeitamente a
situação o fato de que, em determinado momento, muitos dos
melhores agentes de espionagem britânicos estivessem empenhados -
à custa de incalculáveis riscos e invertendo nela muito tempo e
dinheiro - na tarefa de reunir todas as informações possíveis
concernentes, não somente ao avião não tripulado FZG-76 ou
"bomba-voadora" V-1 e ao foguete A-4 (V-2), como também, e com o
caráter de alta prioridade, a um hipotético foguete de 60 toneladas de
peso e 10 toneladas de carga explosiva, capaz de arrasar um bairro
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inteiro. Ao que parece, este fantástico artefato nunca existiu senão na


imaginação de alguns assessores científicos do Gabinete da Guerra.

Logo se tornou evidente a necessidade de centralizar numa só


pessoa toda a informação relativa às novas armas, supostas ou reais,
alemãs. A escolha recaiu, em meados de abril de 1943, em Mr. Duncan
Sandys, secretário parlamentar no Ministério de Abastecimentos e
genro de Winston Churchill. De imediato se ordenou à Unidade
Central de Interpretação iniciar, com a máxima prioridade, "uma
investigação especial sobre artefatos bélicos do inimigo de natureza
até agora desconhecida", missão que foi encomendada ao Comandante
de Ala, Hamshaw Thomas, um. dos pioneiros da fotografia aérea. E
Peenemunde, que somente havia sido fotografada do ar seis vezes, nos
dois anos e meio da guerra, foi "visitada" pelos aviões de
reconhecimento nada menos que quatro vezes naquele mesmo mês.
Simultaneamente, a aviação aliada perscrutava e fotografava uma es
treita faixa costeira, compreendida entre Cherburgo e a fronteira belga.
As fotografias de Peenemunde revelaram, indiscutivelmente, a
existência de longos objetos cilíndricos a bordo de enormes
caminhões estacionados junto a uma série de pistas de asfalto. As
obtidas na costa francesa, especialmente nas imediações de Bois
Carré, mostravam um número crescente de construções de cimento
armado, de teto semicilíndrico, unidas a rampas "em forma de esquis"
por trechos convergentes de estradas asfaltadas; posteriormente
verificou-se o significativo detalhe de que todas as rampas
"apontavam" para Londres. Ao mesmo tempo, por vias secretas,
chegava à capital britânica a advertência de que, dentro de não muito
tempo, essa cidade seria atacada mediante uma mina aérea com asas,
governada por controle remoto e impulsionada por um foguete",
precisando que o lançamento teria o auxílio de uma catapulta.

Assim, pois, embora a ninguém tenha ocorrido ainda relacionar as


rampas "em forma de esquis" - cujo número aumentava de semana a
semana - com a bomba-voadora, da qual já se tinham precisas e
abundantes referências, o novelo ia se desenredando, embora muitas
vezes boa parte de seus fios se confundissem no emaranhado de uma
informação promissora, porém contraditória. De qualquer maneira,
Duncan Sandys tinha em suas mãos provas mais que suficientes para
formular na reunião da seção Operações do Comitê de Defesa,
presidida por Churchill, a 29 de junho, o pedido de um ataque maciço
contra Peenemunde. Apelo que foi aprovado, mas a oposição de
alguns céticos, que argumentavam que tudo não passava de um
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estratagema da contra-espionagem alemã, tendente a atrair sobre


objetivos secundários muitas toneladas de bombas, destinadas a
golpear pontos vitais do esforço de guerra do III Reich. No noite de 16
de agosto, 600 bombardeiros decolaram de suas bases para efetuar
uma incursão de quase 2.000 quilômetros que os levaria à costa do
golfo da Pomerânia, no litoral do mar Báltico; e embora 40 dos aviões
atacantes fossem derrubados pelo fogo antiaéreo e pelos caças
noturnos, o preço foi considerado aceitável, em vista dos tremendos
danos infligidos às instalações da estação experimental.

A ofensiva se atrasa

De fato, as sucessivas vagas de bombardeiros arrasaram


praticamente a zona em que se desenrolavam as provas com o foguete,
assim como também as residências dos técnicos, em cujas fileiras se
registraram numerosos mortos, entre os quais o General Chamier-
Glisenski, chefe da base. Curiosamente, a parte meridional da estação,
onde se experimentava a "bomba-voadora" não sofreu o menor dano, a
ponto do Coronel Wachtel, chefe do Flakregiment 155 W, pensar que
se tratasse de um mero alarma aéreo, não se dando conta, até à manhã
seguinte, da magnitude das destruições causadas.
Um dos imediatos resultados do devastador ataque aéreo foi que os
alemães tiveram que abandonar o seu programa de montagem dos
foguetes em Peenemunde, Friedrichshaffen e Wiener Neustadt. Para
evitar ulteriores ataques decidiram recorrer a uma oficina subterrânea,
próxima de Niedersachswerfen, nas montanhas Herz.

Em virtude do mesmo temor, e cumprindo ordens pessoais do


Führer - que depois de ver num filme o lançamento de um foguete A-4
havia mudado o seu anterior ceticismo no mais fervente entusiasmo
pelas novas armas - o General Heinemann determinou a transferência
para o leste alemão, e até para Blizna (Polônia), das unidades sob o
seu comando, às quais se haviam somado, recentemente, equipes de
rastreio aéreo, dotadas de rádio e de radar, com a missão específica de
avaliar a precisão do material em experiência e o grau de treinamento
das tropas. Com esta medida, se bem que as unidades ficassem a
coberto de possíveis ataques aéreos, as provas podiam ser facilmente
fiscalizadas pelos agentes da Resistência polonesa, cujos informes não
tardariam a chegar a Londres.

Um pouco mais adiante, em fins de 1943, foi criado o 65 o Corpo,


sempre sob os ordens de Heinemann, que teria ao seu cargo a dupla
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ofensiva com as Vergeltungswaffen V-1 e V-2. Era integrado pelo


Flakregiment 155 W (Coronel Wachtel) e Harko 91 (General Metz).
Essas unidades ficaram reorganizadas em quatro brigadas cada uma,
compostas por quatro baterias, cada uma das quais teria a seu cargo
quatro posições de lançamento. As de Wachtel operariam em 64
rampas de lançamento das 96 construídas entre o Passo de Calais e
Cherburgo, assim como em outras instalações erguidas em
Lottinghem, Siracourt e Equeurdreville. As quatro brigadas de Metz -
das quais três eram móveis operariam de 39 posições de tiro
estabelecidas ao norte do Somme e 6 na Normandia, assim como das
grandes instalações de Wizernes e Sottevast.

Se bem que no OKW (Comando Supremo da Wehrmacht) se


considerasse possível o início da dupla ofensiva com a "bomba-
voadora" e o foguete A-4 em princípios de 1944, o General
Heinemann, depois de uma visita de inspeção à sua futura zona de
operações, alimentava sérias dúvidas o respeito. Segundo ele, os
pontos para lançamento da V-1 tinham o grave inconveniente de serem
facilmente localizáveis pela aviação aliada e muito vulneráveis aos
seus ataques. Por outro lado, nas obras haviam participado muitos
trabalhadores franceses, o que permitia razoavelmente supor que no
Intelligence Service já deviam existir detalhados informes acerca das
construções.

Em conseqüência, depois de haver refletido sobre os prós e os


contras da sua decisão, Heinemann propôs, ao OKW desistir das
posições “em forma de esquis” já preparadas que serviriam, de
qualquer modo, como "isca", para atrair os golpes da aviação inimiga -
e preparar, em seu lugar, uma nova rede de posições de tiro, muito
simplificadas com relação às anteriores. A sugestão foi aceita, e
Heinemann ordenou um programa de construções onde foram
reforçadas as medidas de segurança e se empregou exclusivamente
mão-de-obra alemã. Nessas "posições modificadas" - como as
designaram os serviços de inteligência aliados - a obra viva ficou
reduzida ao mínimo: apenas as rampas de lançamento -
cuidadosamente camufladas, por sua vez e os depósitos subterrâneos
de combustível para as "bombas-voadoras". Quanto a estas, foram
eliminados os depósitos para seu armazenamento, adotando-se "a
dispersão em campo aberto", como os aviões estacionados em suas
bases.
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O General Heinemann acolheu também a impressão de que os


planos prévios não haviam levado muito em conta os engarrafamentos
nas comunicações e abastecimentos, que fatalmente se produziriam na
zona operativa, dada a absoluta supremacia da aviação aliado nos céus
da Europa. Já nessa época, o duro castigo que o Comando de
Bombardeio infligia à indústria alemã, criava, a cada passo, problemas
progressivamente mais graves que, por sua vez, impunham
consideráveis atrasos, tanto na produção como no desenvolvimento
dos projéteis. Não se fabricavam em número suficiente para o
treinamento das unidades, ocorrendo mesmo casos em que algumas
deles começaram a ofensiva sem haver efetuado um só disparo com
projéteis "reais". Também, a qualidade destes se ressentia
notavelmente; em muitas ocasiões, a trajetória era absolutamente
imprevisível e não faltaram casos em que a bomba descrevia uma
curva de 180 graus e se abatia sobre a rampa de lançamento,
espalhando o terror e a morte entre as desconcertadas guarnições; em
uma série de provas, mais de 50% das bombas não chegaram a
abandonar a rampa e, das que o fizeram, 90% explodiram antes de
chegar ao alvo.

O programa de treinamento das tropas do General Metz,


incumbido das V-2, sofreu também um sério atraso, quando, no curso
de um ataque aéreo inimigo, foi atingido por acaso a fábrica que
montava os caminhões especiais encarregados do transporte dos
foguetes e de seu combustível propulsor. Considerando todos essas
dificuldades, o General Heinemann não acreditava que os homens do
Coronel Wachtel (V-1) estivessem em condições de iniciar sua
ofensiva antes de maio ou junho de 1944; quanto às unidades do
General Metz, previa um atraso ainda maior. Conseqüentemente,
determinou o deslocamento do Flakregiment 155 W para o norte da
França em fins de 1943.

Alerta nas ilhas

Enquanto isso, um acúmulo de informações das mais heterogêneas


continuava afluindo aos serviços de inteligência britânicos. Sua
procedência era também muito variada: seus próprios agentes em
território inimigo, reconhecimentos aéreos, informes de membros da
Resistência nos países ocupados, de operários recrutados à força para
trabalhar na indústria bélica do Reich e, freqüentemente, também dos
agentes da contra-espionagem alemã infiltrados naquelas
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organizações, que procuravam levantar uma cortina de dados falsos,


para confundir seus rivais.

Com essas informações, unidas às encontradas em seus arquivos e


ao assessoramento de homens de ciência e da Unidade Central de
Interpretação Fotográfica, o Estado-Maior da Força Aérea -
novamente encarregado da investigação por afastamento de Mr.
Duncan - estava em condições de armar parcialmente as peças do
quebra-cabeças: num informe apresentado a 1o de dezembro ao
Gabinete da Guerra, traçava com bastante aproximação, um esboço da
nova ameaça que pairava sobre a Grã-Bretanha. Nele eram analisadas
as diferenças entre a "bomba-voadora" e o foguete de longo alcance, e
estabelecidas as conexões entre as estruturas de cimento armado e os
"estranhos objetos provavelmente voadores" fotografados em
sucessivos reconhecimentos em Peenemunde, com as "rampas em
forma de esquis", que, em número de 96, haviam sido localizadas até
o dia anterior na costa francesa do Canal. Na reunião que o Gabinete
da Guerra celebrou a 2 de dezembro, decidiu-se, em vista da
gravidade da situação descrita no informe, lançar uma série de ataques
aéreos sobre as bases detectadas. No dia 5 de dezembro, uma massa de
caça-bombardeiros e bombardeiros leves da Segunda Força Aérea
Tática e da Nona Força americana, levou a cabo uma ação
"experimental". A 24 do mesmo mês teve lugar o segundo ataque, este
de proporções maciças: 672 "Fortalezas-Voadoras", numa incursão
diurna, lançaram 1.472 toneladas de bombas sobre 24 posições
escolhidas. Apesar da oposição mais ou menos declarada do Marechal
Harris, chefe do Comando de Bombardeio e do Tenente-General Carl
Spaatz, comandante das Forças Aéreas Estratégicas na Europa, que
não viam com bons olhos seus bombardeiros pesados serem
"distraídos" da sua missão de aniquilar a indústria alemã, nos
primeiros seis meses de 1944 a aviação aliada atirou sobre as bases de
lançamento um total de 31.000 toneladas de bombas (a magnitude da
cifra fica demonstrada se recordarmos que durante a blitz aérea contra
Londres, entre setembro de 1940 e maio de 194 , os alemães lançaram
um total de 19.000 toneladas). Os peritos aliados calcularam, em
princípios de maio, que 21 das 54 bases de lançamento atacadas
haviam sido virtualmente destruídas e que pelo menos outras 15
sofreram danos consideráveis. A impressão otimista de alguns círculos
teve sua expressão máxima num memorando do Estado-Maior do Ar,
de 11 de junho (isto é, dois dias antes que caísse em Swanscombe a
primeira V-1), no qual se afirmava que era extremamente improvável
que as bases de lançamento pudessem ser utilizadas "em escala
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apreciável", no decurso das próximas semanas. Nessa mesma noite


chegava a Londres um informe procedente da Resistência belga,
anunciando que um comboio transportando 99 objetos cilíndricos,
aparentemente foguetes, havia sido avistado perto de Gante, em
trânsito para a fronteira francesa.

Preparativos de ataque

Enquanto o General Heinemann estabelecia o seu QG em


Maisons-Lafitte, próximo de Paris, para seguir de perto a construção
das novas bases de lançamento "simplificadas" e a rede de
abastecimentos em conexão com elas, a produção em série da V-1 foi
iniciada em meados de janeiro de 1944, em Niedersachswerfen.
Porém teve que ser interrompida pouco depois, para dar a Dornberger
e seus técnicos oportunidade de introduzir algumas modificações. Os
estudos requereram algumas semanas, com o conseqüente atraso na
produção.

Coerente com sua opinião de que a "bomba-voadora" entraria em


operações vários meses antes que o foguete, o General Heinemann
dedicou preferência à solução dos problemas vinculados com as tropas
do Coronel Wachtel, enquanto o deslocamento dos unidades do
General Metz rumo às suas posições de combate seguia um ritmo mais
lento.

Em princípio ficara estabelecido que as unidades a cargo da V-1


receberiam suprimento de combustível de três depósitos situados ao
norte do Somme, três entre o Somme e o Sena, e dois da Normandia, a
oeste do Sena. Do mesmo modo, as unidades do Harko 91 (a cargo da
V-2) obteriam oxigênio líquido de depósitos protegidos, situados no
Passo de Calais e em Calvados, e o álcool de oito depósitos da
vanguarda, que, por sua vez, seriam abastecidos com reservas
armazenadas nos subúrbios de Paris e nas cercanias de Lille. Todos
eles estavam unidos às posições de tiro por meio de ramais
ferroviários que, seguramente, estariam - na opinião de Heinemann -
perfeitamente localizados e vigiados por agentes inimigos.

Do mesmo modo que fez prevalecer o seu critério de abandonar,


por segurança, as antigas posições em favor das "simplificadas",
Heinemann decidiu, com a aprovação do OKW, prescindir dos
depósitos da vanguarda, que foram substituídos por duas enormes
cavernas de pedra em Nucourt e Saint Leu-d'Esserent, no vale do
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Oise, e um túnel ferroviário em Rilly-la-Montagne, ao sul de Reims.


Nos seis meses transcorridos entre janeiro e junho de 1944,
Heinemann teve a enorme satisfação de ver como os Aliados
desperdiçavam muitas milhares de toneladas de bombas nas posições
abandonadas que, segundo suas previsões, serviram de chamariz para
a aviação, enquanto que as posições "simplificadas" e os novos
depósitos de Nucourt, Saint Leu-d'Esserent e Rilly-la-Montagne não
receberam um só impacto. Finalmente, no dia 6 de junho, poucas
horas depois do desembarque aliado na Normandia, Heinemann
emitiu ao Coronel Wachtel a ordem de preparar seu Flakregiment 155
W para operações imediatas contra a Grã-Bretanha. Nos seis dias
seguintes, e apesar dos contínuos ataques da aviação aliada contra os
centros de comunicações franceses, que haviam paralisado
praticamente o tráfego ferroviário diurno, mais de 800 "bombas-
voadoras" dos depósitos de Nucourt e Saint Leud'Esserent, assim
como grandes quantidades de gasolina de aviação e outros
combustíveis, chegaram às rampas de lançamento. Na noite de 12 de
junho, 54 dos 70-80 locais disponíveis até o momento ao norte e a
leste do Sena haviam completado os preparativos prévios e estavam
em posição de tiro.

Na noite de 11, o Coronel Walter, chefe do Estado-Maior do 65 o


Corpo, manteve uma reunião com o Coronel Wachtel em Maisons-
Lafitte, sede do QG de Heinemann. Ordenou-lhe que iniciasse o
ataque no dia seguinte, porém, ante as objeções do comandante do
Flakregiment 155 W, que argumentava que muitas de suas baterias não
estavam ainda suficientemente abastecidas de combustível, decidiu
adiar o início das operações para a noite de 12. A ordem especificava
que as baterias abririam fogo de forma tal, que a primeira salva
chegasse a Londres às 23 h 40 m, continuando depois com "fogo de
fustigamento" à medida que as diferentes rampas de lançamento
estivessem em condições. O Coronel Wachtel regressou ao seu posto
avançado em Saleux, perto de Amiens, entregando-se de imediato à
tarefa de coordenar os operações de suas baterias. Os informes que
chegavam das rampas eram incompletos e vinham com tanta atraso
que era impossível ter uma idéia do grau de prontidão das diversas
unidades. Para cúmulo dos males, à última hora, Wachtel teve notícia
de que nem uma só das rampas - muitas delas montadas
apressadamente e sem ter sido experimentadas - tinha pronto o
dispositivo de segurança. Via-se entre a alternativa de adiar a
execução das ordens recebidas ou expor os seus homens ao risco de
operar uma arma pouco segura, em rampas não testadas; por sorte, o
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General Heinemann, que havia acudido a Saleux para presenciar o


disparo da primeira salva, pôde ver por si mesmo a dificuldade
inerente ao fato de dirigir o tiro de mais de 50 posições
deficientemente equipadas, dispersos em mais de 15.000 quilômetros
quadrados de território hostil, e debaixo de um céu dominado pela
aviação inimiga. Compreendendo a absoluta impossibilidade do
cumprimento das ordens, concedeu pessoalmente a permissão para
adiar o disparo da primeira salva até às 3 h 30 m da manhã do dia 13,
continuando depois o “fogo de fustigamento” por todas as rampas.

Na realidade, os resultados foram bastante mais modestos: ao todo,


somente 10 "bombas-voadoras" partiram das rampas de lançamento à
custa de extenuantes esforços das guarnições. Delas, 5 explodiram no
ar pouco depois de disparados, outra desapareceu tomando rumo
imprevisto (provavelmente caiu no Canal da Mancha), e os quatro
restantes chegaram à Inglaterra. A primeira foi a causadora do "ronco
de Ford T" detectado pelos observadores do serviço civil, e caiu em
Swanscombe; as três seguintes caíram em Cuckfield, Sussex, em
Bethnal Green, Londres, e em Platt, condado de Kent. Não houve
baixas, salvo em Bethnal Green, onde seis pessoas perderam a vida e
nove foram feridas ao ser destruída uma ponte ferroviária.

Pouco depois, o Coronel Wachtel recebia um chamado telefônico


de Moisons-Lafitte: era o Coronel Walter, que em nome do seu chefe
(Heinemann) lhe ordenou não efetuar mais disparos até novo aviso e
camuflar as rampas de lançamento. Walter culpou o comandante do
Flakregiment 155 W do fracasso da noite anterior e chegou inclusive a
ameaçá-lo com um tribunal militar, ao que Wachtel respondeu que
havia feito tudo o que era humanamente possível nas circunstâncias
que atravessavam, e que faria o impossível para descobrir as falhas e
saná-las. Ao entardecer do dia 15, Wachtel informava ao QG do 65 o
Corpo que todas as posições haviam sido adequadamente supridas de
combustível e projéteis, as instalações estavam completas e a
totalidade dos seus efetivos se achava em condições de reabrir fogo
imediatamente.

O plano "Diver" em ação

Pouco antes das quatro da manhã de 13 de junho, dois membros do


serviço de defesa civil divisaram do seu posto de observação em
Dymchurch, Kent, a primeira "bomba-voadora" que chegava às ilhas.
Trinta e cinco segundos depois, um deles transmitia por linha
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telefônica especial a palavra chave: Diver, que poria em estado de


alerta o QG da Defesa Aérea da Grã-Bretanha, comandado pelo
Marechal-do-Ar Roderic M. Hill, que, por sua vez, se encontrava às
ordens do também Marechal-do-Ar Sir Trafford Leigh-Mallory,
comandante da Força Aérea Expedicionária Aliada. Da sala de
operações em Stanmore, foram transmitidas, com a premência que o
caso exigia, as ordens para o imediata execução do plano "Diver": a
partir desse momento, as barreiras de globos seriam levantadas; os
radares de direção de tiro e os baterias antiaéreas às ordens do
Tenente-General Sir Frederick Pile, assim como os aviões do
Comando de Caça e os equipes de refletores permaneceriam em alerta
permanente, prontos para atacar qualquer artefato voador inimigo que
penetrasse no espaço aéreo das ilhas. Naquela mesma manhã, na
reunião diária de chefes de Estado-Maior, Hill sugeriu que, ante os
reduzidas proporções da ofensiva alemã (somente quatro projéteis
caíram em território britânico) e de sua aparente suspensão
momentânea, convinha não alterar em nada as medidas defensivas
(plano "Diver") mas lançar, ao contrário, devastadores ataques aéreos
contra as plataformas de lançamento que, à luz da observação aérea,
revelassem haver sido empregados recentemente. Sua proposta
tropeçou com a resistência dos comandantes das forças de
bombardeio, pouco dispostos a "distrair" seus aviões das operações de
apoio ao exército de desembarque e fustigamento às comunicações
alemães na Normandia, para emprega-los numa missão de atacar alvos
tão escorregadios como as rompas de lançamento. O chefe do Estado-
Maior-do-Ar, Marechal Portal, propôs uma forma intermediária: em
lugar da destruição das rampas localizadas até o momento, que
exigiria várias milhares de saídas aos bombardeiros, sugeriu lançar um
ataque concentrado sobre os depósitos conhecidos, com o que se
conseguiriam efeitos similares (a paralisação do ofensiva V-1) a um
custo notoriamente inferior. Na tarde do dia 13, o Gabinete da Guerra
concordou em que se devia pedir ao Comandante Supremo aliado,
General Eisenhower, autorização para lançar "poderosos ataques
aéreos" contra esses depósitos; ao mesmo tempo se sugeria atacar
também as rampas "simplificadas", porém com tão pouca ênfase que
estas ficavam automaticamente relegadas ao grau de objetivos
secundários. Deste modo, o astuto General Heinemann teve o
satisfação de comprovar o acerto das suas previsões quando, entre 13
e 15 de junho, a aviação americana descarregou demolidores
bombardeios sobre os inúteis depósitos abandonados por ordem sua,
ao mesmo tempo que as rampas "simplificadas", de onde operava o
Segunda Guerra Mundial 14

Flakregiment 155 W, não recebiam outras "visitas" senão as de alguns


aparelhos do Serviço Fotográfico.

Entre as 10 e as 20 horas do dia 15, as tropas de Wachtel,


superadas suas dificuldades operativas, lançaram 244 projéteis contra
Londres, além de outros cinqüenta dirigidos contra Southampton.
Muitos explodiram imediatamente, porém os informes britânicos
assinalaram que 144 projéteis V-1, dos 155 avistados, conseguiram
cruzar a costa e que mais da metade caíram no perímetro londrino. A
defesa antiaérea abateu 33 "bombas-voadoras", o que nem sempre era
aconselhável, já que, contra a crença geral de que os projéteis
alcançados explodiriam no ar, 13 deles caíram em zonas edificadas da
capital, ao passo que teriam caído no campo se tivessem seguido a
trajetória que levavam.

A 16 de junho, o Marechal Hill, considerou chegado o momento de


colocar em marcha a segunda fase do plano "Diver", cuja execução se
completou em menos tempo do que estava previsto, graças à ativa
colaboração do Tenente-General Pile e do Vice-Marechal-do-Ar Gell,
que tinha a seu cargo a barreira de globos e realizou a façanha de
distribuir, em cinco dias, quinhentos deles a sudeste de Londres. No
mesmo dia, em uma reunião de chefes de Estado-Maior, presidida por
Winston Churchill, em sua qualidade de Ministro da Defesa, decidiu-
se solicitar novamente ao Comandante Supremo aliado a execução de
contramedidas tendentes a "destruir e neutralizar" os depósitos e
rampas de lançamento da V-1, "sempre que tais ações não
interferissem nas necessidades essenciais da luta na cabeça de praia da
Normandia". Porém, também desta vez, por deficiência na
coordenação dos Serviços de Inteligência, nas determinações do
Marechal Leigh-Mallory era indicada prioridade máxima na operação
contra os depósitos abandonados, seguidos, em ordem de preferência,
por onze das também abandonadas e inúteis rampas "em forma de
esquis" e doze das plataformas "simplificadas". E, novamente, os
bombardeios diurnos da aviação americana e os noturnos da RAF
foram um mero desperdício de bombas sobre alvos carentes salvo no
caso das poucas plataformas "simplificadas" - de qualquer valor
militar. E, por conseguinte, seus efeitos sobre a marcha das operações
da V-1 foram escassos ou nulos.

O Marechal Hill desejava que a aviação castigasse metodicamente


as 70 rampas "simplificadas" nos quais a evidência fotográfica
registrara atividade recente. Porém, uma vez mais, chocou-se com a
Armas de Represália Alemãs 15

oposição dos "bombardeiros" Marechal Harris e General Doolitle, que


sustentavam que, em lugar de ataques isolados e dispersos, era
preferível lançar todos os recursos disponíveis num esforço
concentrado uma só vez e no momento oportuno. Isso significava,
aparentemente, um novo adiamento. Porém, aconteceu que no dia 18
de junho, um domingo, uma "bomba-voadora" caiu às 11 h 20 m na
capela de Wellington Borracks, a apenas 500 metros do palácio de
Buckingham e não longe de outros centros militares e do governo. A
explosão causou a morte ou ferimentos graves em 78 civis e 111
militares que assistiam à missa. Nenhuma das V-1 havia causado até
então tal número de vítimas (em realidade, as estatísticas britânicas
calculavam até aquele momento uma pessoa morta em cada bomba
caída), e este fato expôs, então, ante os círculos governamentais, a
dramática necessidade de neutralizar de imediato essa ameaça. Nesse
mesmo dia, o General Eisenhower ordenou que, até nova ordem, os
ataques contra as armas de longo alcance alemães tinham prioridade
sobre todo objetivo que não estivesse diretamente vinculado com a
batalha que o exército aliado estava travando do outro lado do Canal.
Enquanto isso, a Unidade Central de Interpretação Fotográfica
estabelecera uma evidente relação entre os depósitos de Nucourt e
Saint-Leu-d'Esserent com as rampas "simplificadas" em atividade, e
ambos os objetivos foram postos à frente da até então incompleta e
errônea lista de prioridades do Ministério do Ar. Foi criado o Comitê
para a operação "Crossbow" (Catapulta), sob a presidência de Mr.
Duncan Sandys, com a tarefa de supervisionar as medidas em fase de
execução contra as armas de longo alcance alemães. Na última
semana de junho, a Oitava Força Aérea americana lançou vários
ataques maciços contra Nucourt e Saint-Leu-d'Esserent; de seu lado,
também o Comando de Bombardeio britânico atacou Saint Leu nos
noites de 4 e 7 de julho.

O resultado aparente desses ataques foi que o número de bombas,


que diariamente chegavam à Grã-Bretanha, diminuiu de 100 a menos
de 70 por dia, entre 7 e 17 de julho, das quais a defesa derrubava uma
média de 40 diários, atingindo Londres umas 25. Porém, outros teatros
de guerra reclamavam a presença dos bombardeiros aliados e a
operação "Crossbow" poucas vezes voltou o ter (pelo menos com
referência à V-1) contornos espetaculares; a tarefa de enfrentar as V-1
ficava entregue daí por diante, aos recursos exclusivos da Defesa
Aérea da Grã-Bretanha.
Segunda Guerra Mundial 16

Contudo o êxito defensivo que as forças do Marechal Hill estavam


obtendo na batalha da V-1, traduzido na baixa porcentagem de
"bombas-voadoras" que atingiam o alvo principal - Londres - o
sistema apresentava aos olhos do comandante da Defesa Aérea da
Grã-Bretanha alguns inconvenientes que impediam o pleno
rendimento das armas empregadas e suscitavam com freqüência
espinhosos problemas de jurisdição e competência. Foi necessário
regulamentar o campo de ação dos caças e da artilharia antiaérea; foi
preciso decidir que nos dias de bom tempo os caças tinham prioridade
para a perseguição dos projéteis inimigos, mesmo dentro do chamado
"cinturão artilheiro”, enquanto que nos de pouca visibilidade, os
aviões eram proibidos de sobrevoar essa zona. Apesar de tudo,
ocorriam acidentes que por sua vez geravam atritos entre as
corporações. Decidido a obter o melhor resultado dos recursos de que
dispunha e contando com a aprovação de Sir Robert Watson Wat, o
inventor do radar, que opinava que suas equipes trabalhariam melhor
perto do mar, o Marechal Hill ordenou o deslocamento do "cinturão
artilheiro" à costa sul da Inglaterra. Desta forma; embora o campo de
ação dos caças ficasse dividido em dois - sobre o mar, diante do
"cinturão artilheiro, onde as equipes de radar os ajudariam na
localização dos alvos, e em terra, atrás do “cinturão”, onde seriam
guiados pelos observadores da defesa civil mediante foguetes de
sinalização, refletores e projéteis de balizamento - a artilharia seria
beneficiada por poder usar, sem restrições, os novos projéteis
americanos, providos de um dispositivo de ondas de rádio que os fazia
explodir automaticamente nas proximidades do alvo; tais projéteis não
eram utilizáveis nas zonas habitadas, pois tinham o grave
inconveniente de que se não passassem perto do alvo, caíam ao solo
sem explodir, e podiam significar um perigo para a população.

Tanto o Tenente-General Pile, comandante da artilharia antiaérea,


como o Vice-Marechal Saunders, que comandava o 2o Grupo de Caça,
se mostraram de acordo, numa reunião celebrada a 13 de julho, com o
novo dispositivo, pelo que Hill ordenou a imediata execução, sem
esperar o autorização dos chefes de estado-maior. Esta ação poderia
custar-lhe a carreira ou proporcionar-lhe uma maior liberdade de ação,
como tributo de respeito a um comandante que sabia fazer valer suas
convicções. De início, lhe valeu uma reprimenda por escrito do
Comitê "Crossbow" onde era censurado por agir sem consultá-lo.

A 17 de julho estava completo o deslocamento. Mais de 800


canhões servidos por 23.000 homens e mulheres, junto com mais de
Armas de Represália Alemãs 17

60.000 toneladas de víveres e munições, ocupavam suas novas


posições, intercomunicadas por mais de 5.000 quilômetros de cabos.

A princípio, os fatos pareceram inclinar-se contra Hill. Na primeira


semana sob o novo sistema, 204 "bombas-voadoras" de um total de
473 avistadas, atingiram os limites urbanos de Londres; somente entre
o entardecer de 21 de julho e o do dia 22, os canhões e os caças
derrubaram 43 projéteis, e os globos das barreiras outros 17. Porém o
resultado era ligeiramente inferior ao da última semana sob o antigo
sistema, e o dos caças, particularmente, notoriamente inferior.

No entanto, como prêmio aos esforços de Hill por coordenar a


ação dos seus subordinados, os resultados defensivos começaram a
melhorar em fins de julho. A percentagem de projéteis destruídos
subiu na terceira semana de agosto a 74% dos detectados, chegando
em algumas semanas posteriores, a 83%. Também, como fatores que
de um modo ou de outro influíram para que a balança se inclinasse
decididamente para o lado dos defensores, é necessário citar o
incremento recebido pelo “cinturão artilheiro”, de 38 canhões leves e
180 pesados, o emprego dos novos caças a reação "Meteor" - embora
o grosso dos aviões continuassem sendo os "Tempest" V, "Spitfire"
XIV, "Mustang" III e, em missões noturnas, os "Mosquitos" - e a
adoção de novos sistemas de radar, especialmente adaptados.

Hill pôde declarar com relação à eficácia da defesa que "somente


uma de cada oito bombas disparadas tem probabilidade de chegar ao
alvo". A 28 de agosto, por exemplo, 28 caças que voavam sobre o mar
diante do "cinturão artilheiro" derrubaram 13 bombas de um total de
97 detectadas; os canhões deram conta de outras 65 e novamente os
caças abateram outras dez; das 9 restantes, 2 se chocaram. contra a
barreira de globos, 4 caíram no objetivo e 3 passaram de largo para
cair no campo.

A constante ascensão da curva de êxitos defensivos induziu os


membros do Comitê "Crossbaw" e o Ministério do Ar a enviar nos
primeiros dias de setembro várias cartas de felicitações ao Marechal
Hill, com o que, implicitamente ficava aceita a sua decisão de
transladar a artilharia antiaérea à costa sul.

Porém, pilotos e artilheiros não iriam mais ter muitas ocasiões de


demonstrar a sua capacidade combativa. Depois de cruzar o Sena
perto de Paris, a 29 de agosto, tropas anglo-canadenses chegaram ao
Segunda Guerra Mundial 18

Somme no dia 31, poucas horas antes que uma bateria descarregada
do Flakregiment 155 W efetuasse o último disparo do território
francês, ao amanhecer de 1o de setembro, antes de bater em
precipitada retirada para um acampamento situado nas imediações de
Amberes, onde já se encontrava o grosso do regimento. O General
Heinemann, com o Estado-Maior do 65o Corpo, esteve a pique de cair
nas mãos das vanguardas britânicas, perto de Waterloo, quando
procurava se dirigir a Bruxelas, procedente de Maisons-Lafitte.

A pausa imposta pela retirada das tropas do Coronel Wachtel


somente foi quebrada a 5 de setembro. Ao amanhecer desse dia, o III
KG 3, uma formação de velhos bombardeiros "Heinkel" III, adaptados
para o lançamento das V-1 do ar, disparou nove projéteis contra
Londres, antes de retirar-se para o noroeste do Alemanha. Com as 100
"bombas-voadoras" lançadas ao todo por essa unidade desde a
primeira semana de julho, o total de projéteis V-1 disparados contra a
Grã-Bretanha chegou a cerca de 9.000. Deles, mais de 2.000 se
desintegraram pouco depois do lançamento; dos 6.725 que foram
avistados da costa inglesa, 3.463 caíram graças à ação dos caças,
canhões ou barreiras de globos. Os restantes alcançaram a zona de
defesa civil de Londres, salvo algumas dezenas que caíram no campo
ou em outras cidades.

Uma nova ameaça: a V-2

No mesmo dia (13 de junho) em que o Coronel Wachtel iniciava a


ofensivo V-1 contra Londres, um foguete A-4 procedente da
reconstruída estação experimental de Peenemunde, desviou-se
inesperadamente da trajetória marcada e foi cair no sul da Suécia,
perto de Molmö, depois de um vôo de mais de 150 quilômetros.
Autorizados pelo governo sueco, dois oficiais do Intelligence Service
britânico inspecionaram os restos do foguete e acertaram o seu envio
ao Reino Unido.

A Alemanha protestou energicamente ante a Suécia, pelo que


considerava "uma atitude desleal e em conflito com a política de
neutralidade proclamada por esse governo". A nota diplomática alemã
não era acompanhada de ameaças (que, por outro lado, o III Reich já
não estava mais em condições de cumprir) e nem foi levada em conta
pelas autoridades suecas; assim, a primeira remessa dos restos do
foguete chegou à Grã-Bretanha em meados de julho, chegando a outra
por mar, no dia 31. O projétil foi "reconstruído" pelos técnicos do
Armas de Represália Alemãs 19

Ministério do Ar, sob a direção do doutor Jones, nos laboratórios. de


Farnborough.

Quase ao mesmo tempo chegava a Londres um engenheiro polonês


que tivera ocasião de examinar um foguete capturado quase intacto
pelos membros da Resistência em Blizna, Polônia, onde os alemães
estavam testando a nova arma. O emissário trazia uma valise com
mais de 50 quilos de material retirado do foguete, e seus informes
foram de inestimável importância para determinar as características da
futura V-2.

Pouco depois, o comitê "Crossbow" tinha em seu poder uma


descrição bastante precisa da nova ameaça que pairava sobre Londres.
O artefato que o Marechal Hill e seus efetivos da Defesa Aérea da
Grã-Bretanha teriam de enfrentar, era, segundo estimativas do doutor
Jones, um foguete de uns 12 a 15 metros de comprimento e com cerca
de 12 toneladas de peso, com uma carga explosiva de 800 a 1.500
quilos; era atribuída a ele uma velocidade acima de 3.000 quilômetros
por hora, com um alcance de 400 a 500 quilômetros e uma altura
máxima de quase 100 quilômetros. Para o lançamento do foguete não
se requeriam instalações especiais: bastava uma plataforma de
cimento de poucos metros quadrados, sobre a qual estacionava o
veículo vector - um caminhão especialmente construído e munido de
um dispositivo que permitia colocar o foguete em posição vertical.
Segundo todos os indícios, os alemães haviam iniciado vários meses
atrás a fabricação em massa da arma, e por essa razão os técnicos
acreditavam que a ofensiva V-2 pudesse começar em princípios de
setembro.

Hill e o seu estado-maior previam que o dispositivo de defesa


testado com tão bons resultados contra a V-1, resultaria de escassa ou
nula eficiência diante da V-2. Sabiam que os depósitos de
armazenamento dos foguetes eram subterrâneos, embora também
houvesse alguns de madeira, perfeitamente camuflados e dispersos em
bosques; sabiam também que os foguetes a ponto de lançamento e
suas guarnições somente seriam vulneráveis a um ataque aéreo
afortunado durante um lapso de duas horas aproximadamente. Assim,
suas maiores esperanças repousavam na possibilidade de que a ação
dos bombardeiros aliados desarticulasse as comunicações alemãs e
dispersasse as unidades encarregadas da operação V-2. E,
principalmente, que o avanço aliado na Europa obrigasse o inimigo a
Segunda Guerra Mundial 20

retirar-se para linhas mais afastadas, de modo que Londres ficasse fora
do alcance do foguete.

Essas esperanças decaíram um pouco ao concentrar o General


Eisenhower o peso principal da sua força sobre a ala direita do
avanço, e se desvaneceram por completo com o fracasso da audaciosa
operação dos pára-quedistas britânicos em Arnhem-Nimega, em
território holandês.

As SS e as armas secretas

Desde que o foguete A-4 entrou em uma fase avançado do seu


desenvolvimento, as SS pareciam considerar a nova arma como sua.
Por sua influência operou-se a transferência das tropas em instrução a
Blizna, reduto das SS. Também a decisão de efetuar a montagem do
foguete em Niedersachswerfen obedecia à mesma razão. A 6 de agosto
de 1944, duas semanas depois do atentado contra Hitler, este designou
Himmler como Comissionado Especial para todas as questões
relativas à V-2. Aparentemente, a decisão do Führer tinha, implícita,
uma dupla finalidade: recompensar a lealdade das suas SS, dando-lhes
o controle de uma arma inédita, e, ao mesmo tempo, infligir um
castigo coletivo à Wehrmacht - que havia acolhido em seu seio os
"traidores" de julho - arrebatando-lhe o fruto de muitos anos de
estudos e esforços. Himmler surrupiou de fato as operações V-2 das
mãos do General Heinemann, cujo malbaratado 65o Corpo estava se
reagrupando "em algum lugar do oeste". O comando dos operações foi
confiado ao General das SS Kammler, que recebeu, a 29 de agosto, a
ordem de iniciar a ofensiva contra Londres de uma área compreendida
entre Gante, Tournai, Malinas e Amberes, plano que teve de ser
abandonado ante a rapidez do avanço aliado. Dividiu suas tropas em
dois grupos, de duas baterias cada um: o Grupo Norte, comandado
pelo Coronel Hohmann, que tomaria posição perto de Haia para atacar
Londres, e o Grupo Sul, sob as ordens do Major Wehbe, distribuído na
Renânia para atacar objetivos na França e Bélgica; ao todo, uns 6.000
homens equipados com cerca de 1.600 caminhões. Contava, também,
com "uma bateria experimental", agregada ao Grupo Sul com a missão
específica de atacar Paris. Depois de duas tentativas falhas efetuadas a
6 de setembro, essa bateria conseguiu, no dia 8, um impacto na zona
povoada dos subúrbios parisienses. Posteriormente, a unidade
experimental foi agregada ao Grupo Norte, e, de suas posições na ilha
holandesa de Walcheren, somou-se ofensivo contra Londres.
Armas de Represália Alemãs 21

Dupla ofensiva V-1 e V-2

Os alarmantes informes que indicavam a iminência da ataque a


Londres com foguetes de longo alcance tiveram confirmação às 6 h 43
m da manhã de 8 de setembro, quando um desses artefatos, disparado
de um local próximo a Haia, explodiu em Chiswick, causando três
mortes e dez feridos. Um minuto depois, outro foguete da mesma
procedência destruía algumas choças de madeira em Epping.

Na sua função de Comandante da Defesa Aérea da Grã-Bretanha, o


Marechal Roderic Hill tinha sobre os seus ombros a dupla tarefa de
proteger as ilhas de qualquer novo ataque das "bombas-voadoras" e de
decidir e executar as contramedidas necessárias para neutralizar as
bases de lançamento dos foguetes V-2. Determinou, em primeiro
lugar, a dispersão do "cinturão artilheiro" da costa sul, já que,
presumivelmente, as próximas "bombas-voadoras" viriam pelo leste,
distribuindo, em meados de setembro, a massa de canhões entre o
estuário do Tâmisa e uma área compreendida entre Clacton, Harwick e
Yarmouth. Calculava que, sendo maior a distância que a bomba ou o
avião lançador teriam que percorrer, seus caças teriam maiores
probabilidades de interceptação.

Mais difícil de resolver era o problema suscitado pelas V-2, que


continuavam chegando às ilhas num ritmo de dois foguetes por dia.
Diante deles, os sistemas de interceptação convencionais estavam de
antemão condenados ao fracasso...

De momento, o mais urgente era averiguar de onde provinham os


foguetes. Com esse fim determinou a duplicação do número de
estações dotadas de equipamentos de radar especiais, estendendo uma
densa rede entre Dover e Lowestoft; dois regimentos providos de
globos de observação e estações móveis de radar foram distribuídos na
costa leste da Inglaterra e no território continental conquistado pelos
exércitos aliados. Todas as informações eram centralizadas por uma
unidade móvel de transmissões com sede em Molinas, em
comunicação com o QG de Hill em Stanmore. Logo ficou evidente
que a maioria dos lançamentos eram efetuados de bosques vizinhos a
Ter Horst, Eikenhorst e Raaphorst, na região de Haia. Hill pediu ao
Comando de Bombardeio que esses objetivos fossem atacados
maciçamente o mais cedo possível: a 14 de setembro Raaphorst, e três
dias depois Eikenhorst, receberam a "visita" dos bombardeiros da
Segunda Guerra Mundial 22

RAF. Porém, como sucedera no caso da V-1, a ação não causou os


efeitos desejados...

No dia 17 de setembro, tropas aerotransportadas. aliadas desceram


na região Nimega-Arnhem, numa manobra de distração tendente a
facilitar a travessia do baixo Rhin pelo Grupo de Exércitos do
Marechal Montgomery. Ante o temor de que suas forças ficassem
isoladas, o General Kammler ordenou ao Grupo Norte que batesse em
retirada para Burgsteinfurt, perto de Munster, onde se encontrava seu
QG, e a bateria experimental abandonou suas posições na ilha
Walcheren e se transferiu para Zwolle, na Holanda central. No dia 18,
uma bateria desgarrada do Grupo Norte disparou contra Londres o
último foguete da primeira fase da ofensiva; nos dez dias que durou
foram lançados contra Londres 35 projéteis V-2, dos quais apenas 17
caíram na região de Defesa Civil da capital. A 25 de setembro, quando
o fracasso da operação aerotransportada britânica era já evidente para
os alemães, o General Kammler ordenou que a bateria experimental
tomasse posição em Staveren, na Frísia, para recomeçar os ataques,
tendo Norwich e Ipswich como objetivos. Às 19h 19m desse dia, um
foguete que caiu em Hoxne, Suffolk, marcou o começo da segunda
fase da ofensiva V-1. A 30 de setembro, Kammler determinou que o
Grupo Norte retornasse às suas posições anteriores, nas imediações de
Haia, de onde essa unidade continuou operando até fins de março de
1945.

Porém, na tarde do mesmo dia 17, o grupo aéreo III KG 3 que


antes havia cooperado na ofensiva V-1 do Coronel Wachtel, lançando
"bombas-voadoras" da França, recomeçou seus ataques contra
Londres. Contra a expectativa, os projéteis lançados do ar,
apresentavam mais dificuldades para a interceptação que os
disparados de rampas, já que voavam usualmente a menos de 500
metros do solo, o que fornecia pouca probabilidade de detecção aos
radares e escasso ângulo de tiro à artilharia antiaérea.

Além disso, as bombas podiam vir, praticamente, de qualquer


parte, não permitindo o estabelecimento de um "cinturão artilheiro"
como o que tão bons dividendos rendera na ofensiva anterior. Hill
determinou, em fins de setembro e princípios de outubro, o
bombardeio dos aeródromos de Varrelbusch, Zwischenahm, Aalhorn e
Handorfbei-Munster, dos quais operava o III KG 3. Todos eles foram
sucessivamente atacados pelo Comando de Bombardeio britânico e
pela Oitava Força Aérea americana. A ofensiva V-1 pelo ar não
Armas de Represália Alemãs 23

cessou, porque a Luftwaffe foi paulatinamente incrementando os


efetivos do III KG 3 com os restos de suas esquadrilhas de
bombardeiros; tampouco foi Londres o único objetivo visado por essa
unidade, já que sua mobilidade lhe permitia selecionar os alvos à sua
vontade. Ao anoitecer de 24 de dezembro, por exemplo, 50 aviões
alemães lançaram outras tantas V-1 contra Manchester. Porém a
escassez de combustível, unida às fortes perdas que essa operação tão
arriscada causava nas tripulações (dos 41 aviões perdidos pelo III KG
3, calcula-se que, não menos da metade deles, se deveram a acidentes
no lançamento), impôs à Luftwaffe a suspensão da ofensiva. Às
2h33m da madrugada de 14 de janeiro caía sobre o Reino Unido a
última V-l, explodindo em Horsney, um subúrbio norte de Londres.

A partir de meados de janeiro até fins de fevereiro, a ofensiva


contra as ilhas ficou exclusivamente entregue à V-2, que o Grupo
Norte e a bateria experimental de Kammler lançavam então com uma
cadência de dez foguetes diários, enquanto o Grupo Sul continuava
atacando objetivos do continente, especialmente na região de Amberes
(Antuérpia). Salvo algumas esporádicas e nem sempre eficazes nem
oportunas intervenções do Comando de Bombardeio - dificultadas
também pelo fato da Holanda ser um país aliado e era preciso evitar, o
mais possível, causar baixas entre a população civil - o Marechal Hill
não dispunha de outros recursos senão os caça-bombardeiros da
Defesa Aérea para atacar sistematicamente as bases de lançamento.
Nos dois primeiros meses de 1945 suas formações realizaram 1.143
missões contra aqueles objetivos, o que determinou uma notável
diminuição do número de projéteis que chegaram a Londres nesse
lapso. Pouco depois chegaram informes a Londres de que os alemães
preparavam outra ofensiva com uma versão modificada da V-1, de
muito maior alcance que a anterior. A 28 de fevereiro, o
reconhecimento fotográfico demonstrou a presença de rampas de
lançamento apontadas contra Londres em Ypenburg, perto de Haia, e
em Vlaardingen, povoado vizinho de Roterdã; posteriormente, foi
localizada uma terceira, em Delft. Encontraram-se, ainda, outras três
rampas apontados contra Amberes (Antuérpia).

Para enfrentar essa nova ameaça, Hill redistribuiu a artilharia


antiaérea, reforçando a barreira de canhões entre Sheppey e
Orfordness; três esquadrões de "Mustangs" patrulhariam o mar diante
dessa barreira, enquanto um esquadrão de "Meteors" cedido pela
Segunda Força Tática tentaria a interceptação dos projéteis entre as
defesas artilheiras e Londres. De noite, dois esquadrões de
Segunda Guerra Mundial 24

"Mosquitos" patrulhariam o mar e um de "Tempests" vigiaria atrás dos


canhões. Os equipamentos de radar foram postos em estado de alerta.

Hill recomendou o bombardeio das rampas em fins de fevereiro,


porém sua sugestão não foi ouvida, pois o Estado-Maior do Ar não
acreditava que o inimigo estivesse em condições de operar nas
semanas imediatas. Contudo, as defesas estavam preparadas e das sete
bombas que chegaram à Inglaterra na madrugada de 3 de março, seis
foram destruídas e apenas uma caiu em Bermonsey pouco depois das
3. Das outras dez bombas disparadas entre a noite do dia 3 e o meio-
dia de 4, quatro foram destruídas, quatro caíram no campo e duas em
Londres. Apesar dos freqüentes ataques da aviação aliada, a ofensiva
V-1 continuou até fins de março, e a artilharia derrubou a última delas
no dia 29, às 12h43m, caindo o projétil no mar, no altura de
Orfordness. Nessa última fase foram lançadas 275 bombas-voadoras,
das quais somente 125 chegaram a cruzar a costa inglesa; 91 foram
destruídas pelas defesas e as restantes caíram em Londres.

Dois dias antes, 27 de março, às 4h45m, caía em Orpington, Kent,


o último foguete V-2 dos 1.403 disparados contra a Grã-Bretanha em
mais de seis meses. Deles, 517 haviam alcançado o região da defesa
civil londrina, caindo 537 no campo ou outras cidades e 61 no mar,
porém a uma distância que permitiu às defesas avistá-los; os restantes
288 foram disparos falhos.

Em vista da nova pausa ter todas as aparências de ser definitiva,


Hill suspendeu os ataques à zona de lançamento a 3 de abril. Embora
o reconhecimento aéreo, como medida de precaução tenha continuado
até o dia 25 de abril, o radar cessou a vigilância no dia 13. A 2 de
maio, os estados-maiores aliados concordaram em suspender todas as
medidas contra as armas de longo alcance alemãs, ante informes de
que elas teriam pouquíssimas probabilidades de reiniciar suas
operações.

Depois de lançar seu último foguete a 27 de março, as tropas do


General Krammler que operavam na região de Haia se retiraram
ordenadamente para a Alemanha, por ordem do OKW, que temia que
suas posições fossem conquistadas e o equipamento caísse intacto nas
mãos dos Aliados. Porém o colapso do Reich estava já muito próximo,
e a 9 de maio de 1945 o grosso destas forças se rendia ao 9 o Exército
americano.
Armas de Represália Alemãs 25

“Paperclip”

Os técnicos militares são unânimes em afirmar que a ofensiva das


"armas de represália", em que tantas esperanças haviam depositado os
círculos responsáveis alemães, resultou mais espetacular que eficiente.
Porém há um fato que na opinião de alguns justificava por si só o
emprego da V-1 e da V-2: para conjurar a ameaça das armas secretas
os Aliados tiveram que desviar milhares de saídas de seus
bombardeiros e mais de 130.000 toneladas de bombas que poderiam
ter utilizado contra outros objetivos mais decisivos para o curso da
guerra.

A "bomba-voadora" despertou pouco interesse nos peritos; sua


reduzida velocidade e pequena altura operacional, tornavam-na
extremamente vulnerável à interceptação pelos caças ou pela artilharia
antiaérea. O contrário, porém, aconteceu com a V-2, que muitos
consideraram, num primeiro momento, como a arma da guerra do
futuro.

A 2 de abril de 1945, o General Eisenhower recebia a Diretiva


1.067, na qual se instava o comandante-supremo aliado a tomar as
medidas necessárias tendentes a preservar da destruição e "para
capturar todos os planos, fotografias e dados relativos às novas armas
alemãs". Assim teve início a "Operação Paperclip", a cargo dos
serviços secretos americanos; no decurso dos anos seguintes, milhares
de documentos seriam examinados minuciosamente, ao mesmo tempo
em que na zona ocupada pelos Aliados ocidentais se levava o cabo
uma paciente busca dos técnicos que haviam estado vinculados aos
projetos da estação experimental de Peenemunde. Poucos meses
depois, se encontravam trabalhando nos Estados Unidos perto de 130
cientistas alemães, alguns dos quais eram reclamados pelos tribunais
de desnazificação. Centenas mais chegaram a esse país no imediato
após-guerra. Em 1948, a "Operação Paperclip" resultara em colocar
1.136 técnicos e cientistas alemães e austríacos trabalhando na
nascente fabricação de foguetes americana; entre eles figuravam o
General Walter Dornberg e um dos seus mais jovens e brilhantes
colaboradores, Werner von Braun.

Não consta de que os soviéticos tenham montado uma operação do


tipo "Paperclip" ...
Segunda Guerra Mundial 26

Embora não haja maneiro de determinar qual dos dois países foi
mais eficiente em suas gestões, não será arriscado afirmar que ambos
obtiveram dos seus inimigos de ontem os fundamentos sobre os quais
erigiram suas indústrias espaciais.

Anexo

Bases de lançamento
Reproduzimos um relatório do Esquadrão n° 226, equipado com
bombardeiros leves Mitchell, destacado para a destruição das bases
para lançamento das bombas V-l
"A 4 de janeiro a unidade foi selecionada para atacar a construção
de uma base de lançamento no norte da França. As bombas caíram de
1.800 a 2.300 metros, porém sem resultados satisfatórios.
"Um ataque similar foi levado a cabo a 5 de janeiro, conseguindo-
se uma boa concentração na área do alvo e a operação redundou num
êxito. Não se avistou nenhum avião inimigo, nem se encontrou
resistência da artilharia antiaérea.
"No dia 7 de janeiro, nenhum informe sobre missão alguma podia
considerar-se completo sem estas palavras familiares: construções de
bases de lançamento. Neste dia, o ataque teve êxito, como foi
demonstrado pelas fotografias aéreas.
"A 14 de janeiro se levou a cabo outro ataque não decisivo, porém
a 5 de fevereiro o Esquadrão se mostrou interessado ao ser apontado
um novo alvo: um aeródromo em Beauvais-Lille. A mudança mereceu
muito boa acolhida. Contudo, a 6 de fevereiro, voltamos às
“construções de bases de lançamento”. O ataque foi um fracasso
devido às nuvens, obstáculo normal para o bombardeio de altitude
com meios visuais.
"A 8 de fevereiro levamos a cabo dois ataques, ambos frustrados.
Uma incursão realizada a 9 de fevereiro foi considerada bem sucedida,
empregando-se o método “Gree” de navegação por radar.
“No dia 15 de fevereiro efetuamos outros dois ataques, um com
sorte. A incursão de 25 de fevereiro determinou 50% de feridos em
conseqüência do fogo antiaéreo a 9.000 pés (2.800 metros), porém
sem notarmos a presença de aviões inimigos.
"O ataque de 28 de fevereiro foi de resultados indecisos.
"Durante os dias 2, 3, 4 e 28 de março foram repetidos os ataques
de uma altura de 10.000 pés (3.300 metros) em média porém, em
resumo, não deram grandes resultados. A aviação inimiga primava
pela ausência fato que deve ser imputado à proteção dos objetivos no
Armas de Represália Alemãs 27

solo pátrio, em vista da sistemática destruição das cidades alemães


empreendida pelo Comando de Bombardeio".

Uma mancha esquisita


A mancha era pequena, esquisita. Era difícil distingui-la na textura
cinzenta e quadriculada da fotografia aérea. Além disso, antes não
estava ali; ou, pelo menos, não foi observada nas tomadas anteriores.
Os informes começaram a chegar em abril de 1943 ao escritório de
Mr. Duncan Sandys, membro do Parlamento. Eram montões de relatos
e informações imprecisas, tremendamente difusas, provenientes de
agentes secretos. Sandys sabia que o conteúdo de cada folha
datilografada havia custado muito sangue e muito dinheiro.
Segundo os agentes secretos, o inimigo aperfeiçoava um novo tipo
de arma para bombardeio a longo alcance. Analisando detidamente os
dados e comparando-os com os de outras fontes de informações,
Sandys e seus homens chegaram a suspeitar que a nova arma - se é
que existia estava sendo experimentada em algum lugar da costa do
mar Báltico. Então começaram as fotografias e apareceu a mancha
esquisita. Mas não apareceu logo.
Primeiro fotografaram diversos lugares da costa do Báltico, até
que Peenemunde, localizada numa ilha, se revelou como uma ampla e
avançada estação experimental. As lentes das câmaras instaladas nos
aviões de reconhecimento, começaram a focalizar Peenemunde cada
vez com maior freqüência. Os foto-intérpretes foram amontoando
dados cada vez mais precisos sobre a ilha, até que apareceu a tal
mancha.
Em realidade, era, praticamente, a única novidade. E alguns
intérpretes chegaram a pensar que poderia ter aparecido antes e que
não fôra notada.
Submeteram-na, então, a uma cuidadosa análise. Finalmente
comprovaram que, em essência, era um objeto parecido com um avião
em miniatura, montado no que podia ser uma espécie de rampa
metálica com trilhos. Em fotografias posteriores pôde-se apreciar que
o terreno em volta estava sulcado de traços ou estrias escuras. Sandys
recordava um relato de ficção científica em que presença de um
foguete marciano era denunciada pelo gramado queimado nas pontas.
Também ale, anteriormente, pensara que as estrias enegrecidas da
foto haviam sido provocadas por uma rajada abrasadora.
Considerando todos esses elementos, Sandys enviou um relatório
aos seus superiores: "a mancha esquisita observada em uma das fotos
de Peenemunde, bem pode ser um tipo de aeronave sem piloto,
Segunda Guerra Mundial 28

impulsionada a reação..." Numa conferência pronunciada em setembro


de 1944, Mr. Duncan Sandys disse: "Todas nossas dúvidas se
desvaneceram ao descobrir, em fins de novembro, que os alemães
construíam ao longo de toda a costa francesa, desde Calais até
Cherburgo, uma série de estruturas de concreto, com muitos pontos de
semelhança, sem possibilidade de engano, com aquelas já descobertas
na estação experimental do Báltico. Mais tarde soubemos que as
instalações da França estavam, na maioria, orientadas na direção de
Londres...
Pouco tempo depois, e apesar do devastador ataque aéreo sobre as
rampas de lançamento, 8.000 bombas-voadoras, disparadas a uma
velocidade de 500 a 600 quilômetros por hora, sulcavam o espaço.
2.300 alcançaram a área de Londres.

Operação V
Janeiro de 1944. Blizna, Polônia. Dois homens, aparentemente
dois desconhecidos, se cruzam numa ruazinha do povoado. Um deles
porém, leva em sua mão um pequeno pedaço de papel. Ao passar junto
ao segundo desconhecido, a nota troca rapidamente de mão. Assim,
uma hora mais tarde, um transmissor de rádio, oculto numa granja dos
arredores, comunica a Londres, em linguagem cifrada, um episódio
que acaba de ocorrer a quase duzentas milhas de Blizna...
Um grupo de aldeões poloneses trabalha nos campos que
rodeiam uma pequena aldeia. Ninguém pode prever o que vai
ocorrer daí a alguns minutos. E, no entanto, o inesperado acontece. De
súbito, uma atroadora explosão sacode os arredores. Uma nuvem de
fumaça se eleva e lentamente começa a dissipar-se. Quando a calma
volta a reinar, as pequenas casas da aldeia desapareceram. Um
instante mais tarde, dois caminhões carregados de soldados alemães
estacionam muito perto dali. Os homens descem, e correm até ao local
onde acabara de produzir-se o desastre. A uma ordem do oficial
que os comanda, os soldados, pertencentes a uma unidade SS,
começam apressadamente a recolher pequenos fragmentos dispersos
entre as ruínas. Os aldeões, atônitos, os observam, sem compreender o
que está passando. Apenas um deles olha com mais atenção e
compreende. Afasta-se dali rapidamente. Instantes depois, uma nota
escrita com mão nervosa, começa a passar de mão em mão até chegar
às de um jovem que opera um transmissor.
Em Londres, após receber a mensagem, uma complicada rede
de comandos começa a mobilizar-se e a estudar a informação. E surge
Armas de Represália Alemãs 29

então a conclusão inevitável: os alemães trabalham numa arma secreta


e é necessário conhecer dados, detalhes, cifras, datas...
O movimento de Resistência polonês, mobilizando seus homens,
coloca em marcha sua aparelhagem de espionagem. Agentes isolados
arriscam permanentemente suas vidas numa "caça a um pedaço de
metal". Patrulhas especiais, escapando aos grupos de soldados
alemães, recolhem pedaços de turbocompressores, tanques de
combustível e equipamento eletrônico.
Por fim, a sorte inclina a sua balança em favor dos combatentes
clandestinos e um dia, um dos estranhos projéteis cai sem explodir, na
margem do rio Bug, nas cercanias da aldeia de Sarmaki.
Os homens da Resistência de imediato, se entregam à tarefa de
recolher o petardo. É a grande oportunidade e eles o sabem. Talvez
nunca tenham outra igual.
Um grupo de poloneses, arrastando o projétil com dificuldade, o
lança, finalmente, às águas do rio. Em seguida, conduzem ao local
grande quantidade de gado, e fazem com que os bois atravessem o rio,
turvando de tal maneira as águas que se torna muito difícil a tarefa dos
alemães incumbidos da localização do engenho.
Nessa mesma noite, cautelosamente, os poloneses retiram a arma
das profundezas do rio e a transportam para longe dali.
Imediatamente, tratam de desarmá-la e retirar dela as peças e partes
que aparentemente são vitais.
A informação, entrementes, chegou a Londres. De lá,
urgentemente, os comandos solicitam que o petardo ou suas com
principais peças sejam remetidas à Grã-Bretanha.
A operação, planejada cuidadosamente, consistiria no envio de um
avião aliado, que aterrissaria numa pista abandonada, nas imediações
do local. Ali, rapidamente, numa operação executada em segundos, o
projétil ou suas partes seriam transportadas ao aparelho que, levantaria
vôo, no mesmo instante. Os cálculos prévios indicavam que seis
minutos seriam suficientes para a operação.
Na noite de 25 de julho de 1944, dia fixado para executar a
manobra, perto de 400 membros da Resistência rodearam a pista e os
bosques adjacentes, em missão de vigilância. Pouco antes da hora
prevista para a aterrissagem do avião britânico, um grupo de caças
alemães evoluiu sobre a pista, realizando ao mesmo tempo
aterrissagens e decolagens.Para tranqüilidade e alívio dos homens que
permaneciam nos arredores com as mãos crispadas na coronha das
armas, os aviões alemães se afastaram tão rapidamente como haviam
chegado.
Segunda Guerra Mundial 30

A espera, então se tornou angustiosa. Existia indiscutivelmente a


possibilidade de uma nova aparição dos caças alemães. E também a
trágica possibilidade de um encontro entre esses caças e o avião
britânico que já se encontrava em vôo, e muito perto dali. À hora
marcada, um avião "Dakota" britânico sobrevoou o campo, e, à luz de
precárias tochas tocou terra numa manobra impecável, aterrissando
em estilo de combate. Rapidamente um grupo de poloneses subiu pela
portinhola, levando consigo a documentação recolhida pelos homens
da Resistência e numerosas peças vitais do petardo.
À um sinal do piloto e já com o tato ligado, as hélices foram
novamente acionadas. Acelerado gradualmente, o "Dakota", no
entanto, não avançou, trepidando sobre o terreno. Uma e outra vez, os
motores foram parados e postos novamente em marcha. O "Dakota"
porém, se mantinha imóvel. Por fim, saltando a terra, a tripulação
começou um febril trabalho de reparação. Os motores rodavam a um
ritmo normal; o movimento das hélices era correto; os lemes
respondiam à manobra com suavidade.. . Tudo parecia estar em
ordem. Alguma coisa, contudo, falhava. Por fim, o piloto deduziu
repentinamente a razão que impedia a movimentação do aparelho: os
freios. E eram mesmo. Os freios estavam bloqueados. Imediatamente
os tubos que conduziam o óleo foram cortados e o líquido derramado.
Repentinamente, liberados os freios, o avião deu uma sacudida e ficou
novamente imóvel. Em seguida, o girar das hélices levantou nuvens de
poeira. E com uma rápida acelerada, o avião começou a taxiar para o
extremo da pista. Já em vôo, a tripulação enfrentou um novo
problema. De fato, vasados os tubos da instalação hidráulica, era
impossível recolher o trem de aterrissagem. A conseqüência seria uma
apreciável diminuição na velocidade do aparelho. Contudo, o
inconveniente foi rapidamente superado, enchendo novamente os
tubos com água das rações dos tripulantes.
Assim, via Brindisi, os segredos da V-2 chegaram a Londres. O
piloto do "Dakota" resumiu a experiência num relatório que deixa
entrever, claramente, a têmpera dos homens que tiveram em suas
mãos a operação: "Com exceção de uma ligeira agitação na pista, tudo
transcorreu muito facilmente".
No momento em que o "Dakota" decolou, as patrulhas alemães se
encontravam a quinhentos metros do local...

Dornberger
"Grandes massas de bombardeiros inimigos se deslocam ao norte
da ilha de Rugen, com rumo desconhecido... " A voz impessoal, fria,
Armas de Represália Alemãs 31

chegou até ao Major-General Walter Dornberger através do telefone


que comunicava seu QG com os postos de observação avançados.
Dornberger, depois de desligar, meditou brevemente. Existia, sim,
uma possibilidade de que a usina de Peenemunde, de que ele era a
autoridade máxima, fosse atacada aquela noite. Porém existiam,
também, muitas possibilidades de que não fosse. Dornberger decidiu
então tomar as medidas de segurança de rotina, e, após assegurar-se de
que cada posto de escuta e cada bateria estavam de prontidão para
entrar em ação, retirou-se para descansar. Dornberger dormia
profundamente quando o som inconfundível dos canhões antiaéreos o
despertou, sobressaltado. Em seguida, sem solução de continuidade,
surdas explosões fizeram estremecer as instalações da base. A primeira
reação de Dornberger foi pensar em um exercício noturno, que havia
autorizado naquele mesmo dia. Logo compreendeu que não podia se
tratar de um simulacro. Era, indubitavelmente, um ataque em regra.
"Senti-me transpassado - declarou Dornberger mais tarde -; a cena na
qual fixei o meu olhar tinha em si uma sinistra e aterradora beleza. Eu
a contemplava como se fosse, visto através de uma cortina rosada e
diáfana, um incrível cenário de luzes e cores amortecidas..."
Peenemunde, desmoronado pelas bombas, estava desaparecendo.
Afobados golpes na porta do dormitório de Dornberger anunciaram a
presença de um subordinado. Informou brevemente ao major-general:
"A oficina de medições está em chamas e as de montagem e consertos
estão começando a incendiar..." Dornberger, rapidamente, recobrando
o sangue-frio, apanhou o microfone que estava ligado com a rede de
alto-falantes da base e começou a dar suas instruções: "Atenção! Fala
o Major-General Dornberger. Retirem o material da oficina de
desenho, especialmente as caixas de segurança e o arquivo... " Os alto-
falantes calaram repentinamente. Um petardo atingira em cheio a
central de rádio e as comunicações foram silenciadas,
instantaneamente. Dornberger correu entre uma chuva de bombas e
escombros gritando suas ordens. O incêndio, entrementes, adquiria,
minuto a minuto, uma intensidade maior. Os esforços das equipes de
bombeiros e soldados eram praticamente inúteis. O ataque,
intensíssimo e inesperado, arrasou grande parte da base, matou
homens-chaves como o doutor Thiel e o engenheiro chefe Walter;
além disso, perto de 500 operários, altamente especializados,
pereceram. Em conseqüência, o programa de lançamento das V-2
sofreu um atraso de duas semanas.
Era 17 de agosto de 1943...
Segunda Guerra Mundial 32

“O dia em que paralisaram Peenemunde”


"O ataque à estação experimental de Peenemunde deve assumir as
características do mais forte e pesado ataque noturno do Comando de
Bombardeio, na primeira oportunidade que as condições
permitirem..." expressou o Primeiro-Ministro Winston Churchill.
Porém, até que o ataque pudesse ser levado a cabo, milhares de
homens trabalharam dia e noite ou morreram para criar a efetividade
necessária.
A base de Peenemunde era um longo e estreito alvo estendido
sobre uma ilha do Mar Báltico. Como, mesmo nas melhores
circunstâncias, seria difícil atingi-la, realizaram-se experiências num
setor da costa britânica que tinha certa semelhança com a do centro
experimental.
Ao mesmo tempo foram realizados vôos para precisão da rota e
regulagem de tempo, como também exercícios de aproximação na
melhor direção de ataque possível.
Desta forma, os erros de aproximação, que, a princípio eram de
1.000 jardas quadradas, se reduziram paulatinamente a 300, em
relação à média de impacto das bombas. O plano elaborado para o
ataque levava em conta que os alemães eram muito sensíveis e
vulneráveis a qualquer aproximação pela costa sul do Báltico.
Muitos ataques efetuados com êxito contra Berlim, através dessa
rota, confirmavam essa teoria.
Os esquadrões teriam que voar baixo, cruzando o Mar do Norte,
até à costa oriental da Dinamarca, na tentativa de escapar à detecção
do radar alemão, até encontrarem-se muito perto da costa; o inimigo
teria que dispor apenas do tempo mínimo para alertar os caças
noturnos. Às diversas tripulações foram designadas tarefas especiais.
Existiam os "marcadores cegos" que, com seu radar, balizariam a área,
disparando bengalas amarelas; os "marcadores visuais" que, com o
auxílio das bengalas teriam que identificar e assinalar os pontos exatos
a bombardear; os "reforçadores", cuja responsabilidade era manter as
marcas luminosas disparando marcadores adicionais sobre os pontos
previamente determinados, no transcurso do ataque. Todo o ataque era
dirigido e supervisionado pelo "Bombardeiro Mestre", aproveitando o
equipamento de radiotelefonia que levaria a bordo. Caso fosse
necessário, e como uma tripulação mais, deveriam atuar como
"marcadores adicionais" para corrigir o bombardeio e, ao mesmo
tempo, dar instruções cancelando tudo o que pudesse criar confusão
entre os esquadrões.
Cada demarcação devia ser bombardeada durante 15 minutos,
calculando-se que a duração total do ataque seria de 45 minutos.
Armas de Represália Alemãs 33

As 21h50m de uma clara noite de verão, o "Bombardeiro Mestre",


um "Lancaster" Williams, rumou para a costa dinamarquesa. Pouco
depois, os esquadrões voavam sobre a costa de Norfolk, quase a cem
pés sobre o mar.
A ilha de Sylt apareceu, poucas milhas ao sul. Nessa ilha havia
uma base de caças noturnos, porém nenhum deles se mexeu. Passando
a costa da Jutlândia, mudaram o rumo para o leste o começaram a voar
sobre numerosas ilhas pequenas, com suas granjas pintadas de branco
e praias muito recortadas. J. H. Searby, comandante do "Bombardeiro
Mestre", imaginou que os alemães já estivessem alertados e
conhecessem o rumo das esquadrilhas através da Dinamarca.
"Contudo - refletiu - um avião voando baixo sobre o mar, não é fácil
distinguir, inclusive sob a luz brilhante da lua, e nós estamos bastante
longe e demasiado baixo para que os grandes radares localizados em
terra firme nos tenham detectado."
Marginaram Rugen pelo norte para evitar a artilharia antiaérea e
começaram a corrida final para a pequena península na qual se
encontrava o estabelecimento experimental alemão. Até ali tudo ia
bem.
Era evidente que os alemães já os haviam detectado, porque logo o
alvo começou a cobrir-se de uma névoa fina, produzida por geradores
de "cortinas de fumaça". Porém haviam começado a funcionar
demasiado tarde para estabelecer uma camuflagem eficaz.
Pouco antes da Hora "H", o primeiro grupo de indicadores
amarelos caía na área dos alojamentos, onde viviam os cientistas e os
técnicos, e poucos segundos depois, um indicador vermelho aparecia,
brilhando entre os outros. Era o marcador do ponto a bombardear.
Pontualmente às 2 da madrugada, a força principal iniciou o
bombardeio pesado. Pouco a pouco, um moderado grupo de baterias
antiaéreas entrou em ação. Os alvos atingidos começaram a espalhar
suas chamas. Enquanto isso, a cortina de fumaça ia se tornando cada
vez mais densa, o fogo da artilharia mais forte, e os caças alemães
começavam a chegar em grande quantidade. Entrementes, um grande
incêndio tornou-se claramente visível na área do objetivo, embora
toda a sua intensidade não pudesse ser inteiramente observada devido
à fumaça que desprendiam os bosques próximos, ao arderem. Searby,
a bordo do "Bombardeiro Mestre" sentia-se feliz com o êxito do
ataque, preocupado embora, em alguns momentos, quando as bengalas
indicadoras tornavam-se muito espaçadas, e ansioso, quando os
bombardeiros soltavam cargas de bombas longe do objetivo a atingir.
Além disso, havia os aviões britânicos que se precipitavam à terra,
envoltos em chamas, enquanto tudo estremecia com a detonação das
Segunda Guerra Mundial 34

bombas e granadas da artilharia antiaérea. Por fim, preocupava-o


também a segurança da tripulação e do seu próprio "Lancaster" que
era freqüentemente abalado pelas descargas.
O preço fôra alto: quarenta bombardeiros ingleses destruídos,
porém, como dizia o piloto Fitzgerald, com visível otimismo: "Não
será necessária outra visita do Comando de Bombardeio a
Peenemunde".

"Camicase alemão"
Tudo não passou de um simples projeto... Em parte, porque
embora a idéia do "Camicase" provocasse temor e até admiração entre
europeus e americanos, somente um oriental, formado desde criança
numa sublimação quase total do materialismo, seria capaz de um
sacrifício semelhante. Pilotar um avião-suicida era como "jogar roleta
russa" com todas as balas...
Nos últimos dias do ocaso alemão houve homens que aceitaram o
sacrifício voluntário e que se declararam dispostos a convencer outros.
A idéia foi afastada sucessivamente por Milch e até pelo próprio
Hitler. Contudo, os defensores dessa teoria trabalharam com
habilidade e conseguiram o apoio do Coronel-General von Greim.
Inclusive o próprio General Koller chegou à conclusão de que "um
suicídio assim podia ser útil, com a condição de que tivesse como
resultado a destruição de uma grande unidade", embora, pessoalmente,
continuasse sendo contrário aos princípios do projeto.
Posteriormente, Hitler, apesar de sua negativa inicial, consentiu em
que se iniciassem os preparativos. A teoria era meter um homem
dentro de uma V-1. Milch fez as seguintes observações: tanto o
tamanho como a velocidade da V-1 eram relativamente pequenos;
pretender meter um homem no seu interior, seria reduzir sua carga
explosiva e sua velocidade; o que queria dizer que, na maioria dos
casos, o "piloto-suicida" morreria antes de atingir o alvo, vítima dos
caças interceptadores. Certo dia, chegou ao quartel de Milch o oficial
da SS Otto Skorzeny. Entrou alegando possuir plenos poderes para
realizar essas experiências, e que sua não realização provocaria a ira
do Führer. Milch, então, apesar das suas idéias, deu ordem de
transformar a V-1 para receber um piloto. Na base experimental de
Rechlin, vários engenheiros e uma mulher, Hanna Reitscha,
começaram os testes.
As poucas experiências que chegaram a realizar provocaram sérias
lesões na coluna vertebral dos pilotos de provas. Ao que parece
produziam-se certas vibrações que ocasionavam as tais lesões nos
Armas de Represália Alemãs 35

tripulantes; posteriormente houve uma tentativa para reduzi-las,


alargando a fuselagem. Porém, enquanto isso, a guerra terminava e os
que se haviam ofertado para tripular o "vento divino alemão" devem
ter desconfiado que o sacrifício seria inútil. Pouco a pouco o projeto
foi abandonado até cair no anedótico. Um comentarista alemão
declarou, ironicamente, que "foi a única tentativa para humanizar a V-
1".

Werner Von Braun


"A utilidade de uma descoberta não pode ser apreciada claramente,
até que essa descoberta seja mesmo realizada. Ninguém pode imaginar
o que o programa espacial pode causar à humanidade, assim como
tampouco Isabel, a Católica, podia imaginar qual seria o resultado da
viagem de Colombo".
Essas palavras pertencem a Werner von Braun, o principal e mais
conhecido cientista do mundo ocidental. Elas refletem claramente a
sólida convicção que ele possui em relação à extraordinária
importância dos seus trabalhos, e principalmente, de suas
conseqüências. Estas (o homem na Lua e, eventualmente, nos planetas
vizinhos) já quase tornadas realidade, são de uma dimensão óbvia. As
possibilidades de todos os tipos que oferecerão ao homem a conquista
do espaço se estendem a todos os campos da ciência.
Desde os seus primeiros anos, Werner von Braun sentiu o apelo do
espaço. Depois de uma infância em que devorou livros e artigos
discutindo a possibilidade da viagem do homem ao espaço exterior,
chegou à adolescência disposto a dedicar sua vida a tal evento.
Aos dezoito anos, sendo já estudante adiantado, elaborou seus
primeiros foguetes, artefatos rudimentares, que precederam os
gigantescos projéteis que atualmente projeta e constrói.
Ao chegar aos vinte anos, seu prestígio começa a dar frutos: é
nomeado chefe de estudos de projéteis-foguetes do exército alemão.
Tinha 32 anos quando a primeira V-2 sulcou o espaço. A guerra, nesse
mesmo instante; mudou de dimensão. A nova arma que se incorporava
ao arsenal bélico mundial alteraria fundamentalmente os princípios
clássicos da guerra e obrigaria a criação de novas técnicas e novos
princípios. Na sua aparição, as bombas auto-impulsionadas não
variaram o curso da contenda. Elementos alheios à bomba influíram
com tal objetivo; contudo, ninguém duvidava que uma nova era se
abria diante do homem; uma nova era que revolucionaria, não
somente a guerra, mas também a paz. De fato, aquela V-2 que acabava
Segunda Guerra Mundial 36

de sulcar o espaço com uma poderosa carga explosiva, seria a origem


dos gigantescos "Saturno V" da atualidade.
Posteriormente à guerra, radicado já em sua pátria adotiva, os
Estados Unidos, von Braun dedicou todos os seus esforços para
manter esse país num plano destacado na corrida pela conquista do
espaço.
Em 1957, na noite em que a Rússia colocou em órbita 9 seu
primeiro "Sputnik", ceando com Neil McElroy, Secretário da Defesa,
pediu-lhe liberdade de ação durante sessenta dias; esse era o prazo que
necessitava, declarou, "para colocar em órbita um satélite americano".
Von Braun esteve a um passo de cumprir sua promessa, e se se levar
em conta as incríveis dificuldades de todos os tipos que teve que
vencer, pode-se afirmar que a cumpriu; de fato, oitenta e quatro dias
depois daquela noite, os Estados Unidos colocaram em órbita seu
primeiro satélite. Prosseguiu, depois, incansavelmente em busca do
ideal que preencheu seus sonhos de adolescente: a conquista do
espaço para o Homem...

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