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Goebbels

"Enfiar na cabeça dura das massas a devoção a Hitler, como o deus da nova Alemanha, tornou-se o meu
objetivo único", escreveu Goebbels - o novo Chefe da Propaganda - que manobrou magistralmente os
recursos da psicologia individual e de massa para atingir sua meta.

O Ministro da Propaganda
Quando se pesquisa sobre os seguidores de Hitler, um fato logo se torna evidente: por maior que fosse a
autoridade que exerciam, eles permaneciam muito mais que apenas subservientes a Hitler. O fenômeno não
se devia, ao que parece, à personalidade dominadora de Hitler, nem mesmo à sua posição na hierarquia
nazista, mas à indiscutível superioridade que levava sobre os demais no domínio da técnica da ditadura
implacável. Ele possuía uma habilidade tática e estratégica bem mais desenvolvida que a de Goering, a
despeito da alardeada formação militar deste. A percepção dos problemas da diplomacia estrangeira que
freqüentemente revelava, era superior à do palhaço Ribbentrop e muito maior que a de Himmler era a
capacidade que tinha de perceber a distância a mais leve intriga, apesar da sinistra reputação criada pelo
Reichsführer-SS.

Também na questão da propaganda e na influência da opinião das massas, era Hitler quem delineava os
princípios básicos; o Dr. Joseph Goebbels é que os punha em prática.

Contudo, deve-se dizer que Goebbels colocou no desenvolvimento e na aplicação da propaganda


espalhafatosa e inescrupulosa uma diligência, uma percepção e uma imaginação que chegavam às raias do
gênio. "A propaganda, para ser eficaz...", disse Hitler, "tem de se limitar a uns poucos elementos essenciais...
expressada tanto quanto possível em fórmulas estereotipadas... repetidas persistentemente" - e a partir de
meados dos anos 30 até os últimos dias do Terceiro Reich, o eco estridente de Deutschland erwache, Ein
Volk, ein Reich, ein Führer, Sieg Heil, Heil Hitler e, já próximo do fim, Sieg oder Bolschewismus Chaos!
varria permanentemente a Alemanha. Nenhuma ambigüidade ou sutileza de significado jamais toldou a
simplicidade cristalina das mensagens de Goebbels às massas.

Contudo, talvez na montagem dos gigantescos circos dos comícios partidários Goebbels tenha contribuído
com algum elemento particularmente seu, pois, embora Hitler tivesse todas as qualificações para ser o ator
principal, ele, que se saiba, não deixou provas de qualquer aptidão para direção de cena. Era ali que
Goebbels brilhava, e o efeito inspirador ou aterrador (dependendo da atitude da pessoa para com o Nacional-
Socialismo) das Reuniões Partidárias devia muito ao talento do pequeno Ministro do Esclarecimento e
Propaganda. O diretor de teatro que tão insolentemente o ignorou, quando, na juventude, Goebbels postulou
um cargo no setor de produção de espetáculos, possivelmente não era tão perspicaz quanto julgava que fosse.

Goebbels também possuía considerável talento histriônico, por isso que conduzia sempre a um enigma
qualquer paralelo que se pretendesse traçar entre Goebbels e Hitler.

Quem ouviu, se lembra claramente de ter ouvido ambas as vozes numa época em que o poderio da Alemanha
nazista parecia invencível. A voz de Hitler repercutia pelo mundo, triunfante, brutal, dominadora, assustadora
mesmo, talvez por isso tão absorvente, na sua qualidade e nos desafios que a todo instante lançava. A de
Goebbels, controlada, primorosamente ensaiada, profundamente comovente. Ainda se pode ouvir aqueles
belos tons na noite de Natal de 1941 "... Unseres schönes Reich, so Weiss, so Weiss, so Weiss und
wunderschone..."
Ele podia fazer chorar.
Hitler fazia tremer.

O Jovem
Paul Joseph Goebbels era intelectualmente o mais interessante dos líderes nazistas. A capacidade instintiva
de Hitler como estrategista militar ocultava um cérebro de terceira categoria; a indubitável inteligência de
Goering foi corrompida pelo sibaritismo e pela presunção; Himmler era um fanático de espírito tacanho. Mas
Goebbels usava o intelecto de maneira criativa. Ele transformou Hitler, homem de caráter irresoluto, no
Messias de vontade férrea do Terceiro Reich - ou melhor, ele criou em der Führer a ilusão de força
messiânica. E o fez apenas pela fraude verbal. Na atividade política, para cujo exercício a duplicidade é
considerada função essencial, ele alcançou um padrão de duplo sentido sem paralelo pa história moderna.
Virtuose da mentira, ele dominava de maneira tão completa a arte de engodar, que provar que preto era
branco não chegava a ser para ele façanha muito grande, uma vez que podia provar que era a cor que
escolhesse no momento.

O desenvolvimento do seu intelecto foi em grande parte feito por motivo dos defeitos físicos de que era
portador. Quando criança, foi incapacitado pela poliomielite e, mais tarde, pela osteomielite. Além disso, sua
constituição era frágil e sua estatura, diminuta. As crianças não são em geral muito dadas à compaixão, por
isso, embora nos seus primeiros tempos de escola raramente fosse vítima de crueldade física, muitas vezes
foi ele insultado pela fragilidade e deficiência que naturalmente o impediam de participar em atividades que
exigiam velocidade ou agilidade. Por conseguinte, ele se esforçou por brilhar no campo do aprendizado, uma
vez que no da façanha física estava condenado ao fracasso. E brilhou - para grande alegria dos seus pais.

Friedrich Goebbels, seu pai, era empregado de uma pequena fábrica têxtil, a W.H. Lennartz, situada na
cidade de Rheydt, perto de Düsseldorf. Em 1929, Rheydt foi reunida com Waldhausen, Odenkirchen e
München-Gladbach, chamadas coletivamente die Textil. W.H. Lennartz se especializava no tratamento
químico do tecido de algodão usado na confecção de camisas de lampião e Friedrich Goebbels começou a
trabalhar ali como mensageiro, chegando a amanuense.

Ele era um homem solene, orgulhoso por haver subido, pelos próprios esforços, da classe operária (seu pai,
Konrad Goebbels, fora carpinteiro) a membro do escritório executivo da firma; também era ardoroso católico
apostólico romano.

A mãe de Goebbels, holandesa de nascimento, chamava-se em solteira Katherina Odenhausen. Era filha de
um ferreiro que emigrara da Alemanha para a Holanda e se casara com uma holandesa, Joanna Coervers.
Katherina, também católica, nasceu em Uebach, Holanda, em 1869.

Os pais de Goebbels tiveram cinco filhos: Elizabeth, Maria, Konrad, Hans e Joseph, cujo primeiro nome,
Paul, parece nunca foi usado. Elizabeth morreu quando Joseph tinha 18 anos. A outra filha, Maria, era 12
anos mais moça que ele. Joseph nasceu a 27 de outubro de 1897, numa casa na Odenkirchener Strasse. Em
1899 a família mudou-se para a casa de n° 156 da Dahlener Strasse, em Rheydt, onde Joseph passou o resto
da infância e grande parte da juventude.

Seus problemas de ordem física eram bastante compensados por uma certa beleza. Cabelos pretos, bastos,
olhos castanhos bem colocados, bons dentes e mãos bem moldadas. Desde criança, Goebbels cuidava muito
da aparência, exibindo os elementos do exagerado apuro no trajar que, nos seus dias de poder, resultaria num
guarda-roupa de mais de 300 trajes; os que zombavam dele corriam o risco de receber de volta, como
retruca, o insulto de desleixado e de porco. Fritz Prang, seu amigo mais íntimo na escola, mais tarde escreveu
que, "durante esses rompantes, a gente se sentia como que fulminada pela ferocidade da linguagem por ele
utilizada contra a pessoa que se apresentasse com um colarinho sujo ou com a roupa faltando botões".

Dada a circunstância de ter que se isolar fisicamente, ele era inclinado a meditar, mas construtivamente. Com
ele, a introspecção não significava autocomiseração. Seus pais, no clima de devoção em que viviam,
acreditavam que ele estava juntando forças do espírito de Deus que brilhava dentro dele. Não era, entretanto,
a força do espírito de Deus que ele retirava da leitura que fazia com avidez, leitura que mais o encorajava ao
ceticismo que à crença na religião cristã. Mas tarde, ele viria a referir-se à missa como sendo "a asneira mais
tendenciosa jamais imposta à inteligência humana, mas poderosamente útil para provar a capacidade do
homem em absorver absurdos". Contudo, ele considerava vantajoso conformar-se, ansioso como estava por
não deixar passar a possibilidade de obter a ajuda dos que pudessem fazê-lo progredir em sua carreira.
Naturalmente, ele tomou o cuidado de ocultar o cinismo com que encarava a questão da espiritualidade e de
muitas maneiras expressava as reações dúplices de suas atitudes, como, por exemplo, no prazer que sentia
em imputar falsas informações que resultassem em castigo para os colegas de escola que zombavam da sua
debilidade - o que lhe valeu o apelido de Ulex (Ulisses), pela sua astúcia. Ele orgulhosamente se enfeitou
com o cognome durante toda a juventude, mas cuidou de observar que Ulisses era famoso pela coragem, mas
também pela astúcia; isto seria igualmente verdadeiro quanto a Joseph Goebbels.

A sua educação, que seus pais pagaram a duras penas, iniciou-se no Rheydt Gymnasium. Tem-se afirmado,
incorretamente, que Goebbels se ressentia amargamente da ironia de ser obrigado à violência do atletismo
por pais decididos a fazer com que sua incapacidade física fosse superada, mas isto não é verdade. Se os pais
enfrentaram dificuldades para educá-lo, os resultados foram extremamente compensadores. O filho era um
aluno exemplar. Em latim, grego; línguas modernas, história, matemática, política, economia e nas
Escrituras, ele estava sempre em primeiro lugar. Isto fê-lo perder popularidade, mas Goebbels pai muitas
vezes o congratulava por "manter-se firme contra a inveja dos inferiores". O que seu pai não percebia é que
ele se mantinha firme principalmente com as armas do sarcasmo e da arrogância.

A futura, carreira de Joseph era um grande problema. Quando tinha 17 anos e a Primeira Guerra Mundial
estourou, ele se apresentou como voluntário para o exército e, naturalmente, foi rejeitado por causa dos
defeitos físicos. Dificilmente poderia esperar ser aceito. (Desapontado ou não, o fato é que ele tirou excelente
partido da sua coxeadura, informando os curiosos complacentes de que fora uma das primeiras baixas na
guerra.) A rejeição deu-lhe a vantagem de poder continuar os estudos, coisa que os pais consideraram caída
dos céus para pô-lo no caminho do sacerdócio, onde, acreditavam, Goebbels, com seu gosto pelo estudo,
encontraria o seu verdadeiro destino.

Fritz Prang diz que, independente de crença, Goebbels estava perfeitamente disposto a "seguir o caminho
religioso, porquanto dificilmente deixaria de alcançar o bispado, no mínimo". Sua ambição - mais por um
lugar em alguma hierarquia do que pelo poder em si - era, como diz Prang, "quase incandescente quando ele
estava na Ober-Prima (Sexta Série) da escola". Sem querer duvidar da capacidade de Goebbels, é muito
pouco provável que obtivesse ingresso em qualquer seminário. A incandescência da sua ambição não teria
sido mais útil do que uma das camisas de lampião de Lennartz. O que os mentores da Igreja procuravam era
incandescência de crença.

Influenciados pela fé que tinham e pela inteligência do filho, Friedrich e Katherina Goebbels fizeram muito
sacrifício para que ele conseguisse um diploma. Também eles tinham sua ambição: que seu brilhante filho se
tornasse Herr Doktor Joseph Goebbels. Ele se matriculou na Universidade de Bonn em 1917, tendo obtido as
notas mais altas já registradas no Rheydt Gymnasium, no Maturitätsexamen. Embora dispostos ao maior
sacrifício, os pais de Joseph não conseguiram reunir o suficiente para cobrir as despesas exigidas pela
freqüência à universidade, e por volta de agosto de 1917 já era evidente que ele não poderia continuar seus
estudos. A quem recorreria? Ele conseguia alguns marcos como professor particular, que eram apenas
suficientes para pagar uma refeição modesta em certos dias. Precisava, a qualquer preço, buscar uma ajuda
caridosa. O Padre Johannes Mollen, o sacerdote de Rheydt, que se encarregava da instrução religiosa dos
filhos dos Goebbels, dirigiu um pedido à Sociedade Albertus Magnus, uma rica fundação que dá ou empresta
dinheiro a, entre outras pessoas, estudantes pobres que se preparam para o sacerdócio. Caracteristicamente
cínico, Joseph Goebbels ocultou a enorme descrença religiosa que mais tarde alardearia tão orgulhosamente
como parte do conceito nazista e, com ironia, escreveu para a sociedade em tons formais e humildes: "Peço
humildemente permissão para apelar para a Comissão Diocesana da Sociedade com o objetivo de obter apoio
financeiro para o semestre de inverno de 1917-1918. Na Páscoa, matriculei-me no Rheydt Gymnasium (cujo
relatório de exame estou anexando), onde estudei Filologia e História, pagando meus estudos com poupanças
que consegui fazer dando aulas particulares e com a ajuda de meu pai, que trabalha como amanuense e cuja
renda de 4.000 marcos anuais [cerca de 400 libras pelos valores de 1917] é aplicada no sustento de meus dois
irmãos, um dos quais está na Frente Ocidental, o outro é prisioneiro de guerra, e minha mãe e minha irmã
mais moça.
"Devido à minha perna defeituosa, fui rejeitado para o serviço militar e gostaria imensamente de prosseguir
meus estudos universitários no próximo período letivo. Mas isto depende inteiramente da caridade dos seus
companheiros de crença católica.
"Peço humildemente que examinem este pedido e me informem o mais breve possível da decisão que
tomarem. Estou certo de que meu ex-professor de religião, Padre Johannes Mollen, confirmará a correção de
todas as minhas declarações.
"Com respeito e devoção, cordialmente, Joseph Goebbels."
Ele anexou o resultado do exame e um testemunho do Padre Mollen, que dizia: "Herr Goebbels descende de
uma fiel família católica da minha paróquia e o recomendo pela sua atitude religiosa e pela sua alta posição
moral".

A sociedade dificilmente poderia contestar a palavra do padre - embora não fosse notavelmente entusiástica -
mas há uma insinuação no livro de minutas de que a comissão tinha suas dúvidas quanto à sinceridade de
crença de Goebbels: "Depois de demorada discussão", concordou-se, embora não por unanimidade, em
conceder-lhe um empréstimo de 185 marcos e considerar outros pedidos se houvesse necessidade. O
empréstimo, ou empréstimos não teriam juros. Quatro marcos eram então trocados por um dólar, de modo
que se pode ver que, mesmo em termos dos valores de 1917, o empréstimo não foi muito grande. Mas com
os 50 marcos que seu pai lhe mandava mensalmente, ele pôde completar seu período letivo em Bonn.

A partir deste ponto, os safaris educacionais do jovem Goebbels assumem uma complexidade estonteante.
De Bonn ele foi para Freiburg e, depois, para Heidelberg. O inverno de 1918 encontrou-o em Würzburg, e o
semestre seguinte em Colônia. Em 1919 ele esteve matriculado em Frankfurt e Berlim, enquanto que, em
1920 e 1921, passou mais dois semestres em Heidelberg e, entre eles, um em Munique. As razões para esse
verdadeiro nomadismo não são de todo claras. É certo que ele não foi suspenso ou excluído de qualquer das
oito universidades que cursou. Ao contrário, os professores que se manifestaram a respeito de Joseph, por
carta ou boletins escolares, são unânimes em reconhecer nele qualidades de inteligência, de aplicação e de
comportamento. Talvez o que explique o inquieto procedimento de Goebbels, esse desejo de aparecer entre
os diplomados de tantas alma maters, seja a ânsia de ampliar seu aprendizado em muitas direções - na
verdade é comum os estudantes alemães estudarem em duas ou três universidades, devido à especialização
dos currículos: literatura ein Heidelberg, teologia em Bonn, filosofia em Colônia etc. Mas oito parece ser um
número bastante exagerado. Talvez a escolha da universidade tenha sido, até certo ponto, ditada pela
disponibilidade de acomodações que ele pudesse pagar. As estalagens das cidades universitárias alemães
eram notoriamente gananciosas (a cupidez dessa gente foi retratada pela pena acre do artista George Grosz) e
as cartas do estudante Goebbels que ainda existem partiram de endereços pobres. Igualmente provável é que
a inquietação natural da juventude e a agitação política para a qual se dirigia a Alemanha do pós-guerra
ditassem os freqüentes vôos do universitário.

Em todo caso, ele obteve em Heidelberg, em 1921; o grau de Doutor em Filosofia. Seus professores foram
Friedrich Gundolf e Anton von Waldberg (ambos judeus) e sua tese de doutorado foi uma trabalhosa
dissertação sobre a obra de um dramaturgo menor alemão do século XIX, Wilhelm von Schütz. Ela foi
solenemente intitulada Uma Contribuição pura a História do Drama Romântico; mas na década seguinte,
depois de nomeado Ministro da Propaganda, ele mudou apressadamente o título para As Correntes
Espirituais e Poéticas dos Primeiros Românticos, para que os registros mostrassem suas tendências políticas
precoces.

Na verdade, naquele período da vida, ele considerava a política algo confuso - o que não é de surpreender,
em vista da agitação que abalava a Alemanha sob a República de Weimar. Um dos seus biógrafos, Curt
Riess, observa que "Estudantes reacionários e esquerdistas se insultavam e se denunciavam como traidores e
lunáticos. Sempre que os examinava atentamente, Goebbels descobria neles um bando de jovens instáveis e
desorientados. Para a sua mente analítica e dissectora, o que diziam não passava de frases sem sentido; suas
promessas, de simulações ocas. Sentia a inexistência de um ponto onde firmar-se: havia um vácuo. Desejava
que algo o inspirasse, queria ser como os outros; "queria crer".

Em tudo isso, naturalmente, Goebbels não mostrava nada de extraordinário: a busca de si mesmo, de um
arrimo, é tão universal quanto a própria juventude. Uma carta de seu pai, escrita quando Goebbels estava em
Munique, aconselha-o a buscar na oração o remédio para as dúvidas que alimentava sobre as coisas da
religião, acrescentando: "Mas, se tuas dúvidas são de natureza diferente, ainda assim só te posso aconselhar
uma coisa: orar e continuar orando, e eu também orarei para que Nosso Senhor te ajude, para que tudo saia
bem".

O grande problema de Goebbels era, entretanto, o complexo de inferioridade. "Sou um apóstata", escreveu
ele, em seu diário, em 1921. Em seguida, reescreveu a frase em letras maiúsculas, como se regozijasse diante
da descoberta, imaginando, quem sabe, que dessa maneira se desprendia da multidão vulgar. Mas a apostasia
não afrouxava o tormento que lhe impunha o complexo de inferioridade. Acima de tudo, ele sentia a
necessidade de uma linha de ação positiva.
Quem lhe mostrou essa linha foi Richard Flisges, um estudante cheio de amargura, ex-soldado, com muitas
condecorações por bravura e pouca inteligência. A amargura fizera-o voltar-se para o comunismo, que, como
muitos outros descontentes, considerava a solução para os problemas do mundo. Era um homem robusto e
desleixado, que podia erguer - e às vezes erguia - Goebbels pelo colarinho e o sacudir, mas por quem
Goebbels tinha uma afeição paradoxal que, naturalmente, ocultava debaixo das críticas que freqüentemente
fazia à aparência desmazelada de Flisges.

A orientação foi através de Marx, Engels e Walther Rathenau. Mas, longe de conduzi-lo para a crença
ardente nas teorias do comunismo, as discussões violentas que sustentava com Flisges e outros colegas sobre
a filosofia vermelha o conduziram para o lado oposto.

No começo dos anos 20, Munique, a capital da Baviera, era o grande centro de agitação comunista e para lá
se voltou Goebbels, à procura de trabalho: ("Tenho de encontrar um modo de começar a vida", escreveu ele
em seu diário), no verão de 1922. O aspecto urbanístico da velha cidade o havia agradado muito durante o
período em que lá esteve estudando, no ano anterior. Ele morara em Schwabing, cuja atmosfera lembrava
muito a da Rive Gauche, e a irradiação das ruas da Marien-Platz era para ele "uma representação simbólica
da diversidade de vida, pois cada rua oferece diferentes possibilidades".

Em 1922 Munique já havia passado por três grandes agitações políticas do pós-guerra. A República
Socialista de 18 de novembro, o contra-movimento Nacional-Socialista de janeiro de 1919 e a República
Soviética de abril de 1919 haviam começado ali. O partido nazista havia-se instalado na Braunes Haus e, já
com cerca de 50.000 adeptos inscritos, continuava atraindo adesões, sobretudo dos mercenários livres, que
viam na guerra contínua a salvação da Alemanha. Ali, com iguais objetivos revolucionários, estavam o
Freikorps e a Reichswehr, organizações paramilitares clandestinas carregadas de ameaça, e nas tavernas,
Adolf Hitler, na época Oficial de Propaganda do partido nazista. Ali também, algumas semanas antes da
chegada de Goebbels, Walther Rathenau, Ministro do Exterior e arquiteto do Tratado de Rapallo, projetado
para estreitar as relações russo-germânicas, fora assassinado por ex-oficiais da marinha pertencentes à
organização terrorista nacionalista. Munique podia ser esteticamente bela e agradável, mas dificilmente se
poderia considerá-la tranqüila.

Típico da Alemanha do pós-guerra, a licenciosidade campeava na cidade, embora menos que em Berlim e
Hamburgo, onde a depravação raiava pelo absurdo. Havia em Munique uma variedade de boates, bordéis,
cabarés de travestis, cassinos e de lugares onde se exibiam filmes pornográficos, e nessa atmosfera de
lascívia Goebbels derramava em abundância os gozos da juventude.

"Ele se mostrou sempre muito atrevido e convencido", lembra Fritz Prang, "durante todo o transcurso da vida
universitária. As garotas deixavam-se cativar facilmente por ele. Acho que a sua fragilidade e o seu pé
aleijado faziam com que elas se sentissem maternais e protetoras, e ai é que começava tudo. Goebbels não
demorava a conquista-las - fazendo-se muito encantador e colocando na voz bastante mel.

"Ele teve alguns casos amorosos sérios e duradouros. Um deles foi com uma jovem chamada Anka
Stahlhern, que durou três ou quatro anos, até que ela o trocou por um homem mais velho, que tinha mais
dinheiro. Bem, ele dificilmente poderia ter menos do que tinha, e fez uma grande cena de humilhação
torturada. O caso fora muito sério, com longas cartas de amor trocadas entre eles; mas os pais de Anka não
olhavam o romance com bons olhos, pois não viam qualquer futuro para Goebbels - as perspectivas não se
mostravam, em seus dias de estudante, muito boas para ele. Mais tarde, à sua maneira mordaz, costumava
Goebbels dizer que se ela tivesse sido menos mercenária, teria casado com o Ministro da Propaganda.

"Mas não a culpou totalmente por havê-lo abandonado. Tendo fracassado o seu casamento, Anka,
desempregada, recorreu, em 1934, a Goebbels, para que a ajudasse, e ele a colocou na equipe de uma revista
feminina.

"Depois que Anka terminou com ele, Goebbels arranjou outra garota. Chamava. se Else Taub, era professora
e sua família tinha muita influência nos círculos comerciais. Também dessa vez ele foi terrivelmente ardente
- poemas de amor, passeios idílicos pelos bosques, reclamações pelo fato de a sociedade ser desorganizada
demais para poder incluí-lo em seus planos. Era tudo coisa de estudante! Flisges, eu, Goebbels e Else
costumávamos passar horas nos cafés, ou em nossas próprias casas quando não tínhamos dinheiro para pagar
um café (normalmente quem pagava era Else).
"Naturalmente, o que precisávamos mesmo era de trabalho para ocupar o tempo, mas não era fácil consegui-
lo naqueles tempos conturbados. Goebbels decidira tornar-se literato e não parava de escrever artigos e
enviá-los para os jornais e revistas. Todos eram recusados. Escreveu uma novela e uma peça de teatro que
também não deram em nada. O dinheiro que ganhava vinha de empregos casuais, como professor ou em
escritório. Eu mesmo consegui um para ele na Bolsa de Valores de Colônia, e os Taubs o colocaram no
Banco Dresdener; mas esses dois empregos não duraram muito. Como se diz hoje, ele estava sempre fazendo
das suas - livre, namorando, metido sempre na mesma roupa surrada, vivendo em casa, em Rheydt, quando
sem recursos, ou arrumando-se comigo ou com Else, ou outros amigos, quando podia. Para um homem que
seria designado sucessor de Hitler, este tipo de formação era de fato muito problemático".

A tarefa
As primeiras manifestações literárias e oratórias do homem que viria a influenciar toda a nação alemã pela
palavra não foram nada espetaculares. Tendo recebido a oportunidade de ser o orador da turma, na sua
formatura, no Ginásio de Rheydt, o Padre Mollen lhe disse com um sarcasmo nada caridoso que, como
orador, ele sem dúvida seria um bom pasteleiro. Ele enviou várias centenas de artigos para os jornais e
revistas - principalmente o Berliner Tageblatt - e todos foram recusados, com a justificativa de que as idéias
neles contidas, além de mal formadas, eram apresentadas incoerentemente. Sua pretensa novela, chamada
Michael e escrita em tiras de pretensiosos versos livres, com pontos de exclamação e letras maiúsculas, foi,
também com justiça, recusada por todos os editores que a leram, até que, em 1929, um editor pró-nazista
achou ser de boa política aceitá-la. Duas peças teatrais em versos, O Peregrino e O Hóspede Solitário,
permaneceram inéditas. Depois que os nazistas subiram ao poder, a primeira delas foi encenada por três
noites, sendo recebida impassivelmente pela platéia.

Caracteristicamente, Goebbels reagiu com arrogante superioridade à manifestação de indiferença. "Sei que
minha obra encontrará seu lugar", escreveu ele em seu diário. "É só questão de tempo."

O tempo chegou em 1923. Em janeiro daquele ano, o Primeiro-Ministro da França, Raymond Poincaré,
ordenou a ocupação do Ruhr como medida punitiva contra a Alemanha, por não cumprir as condições
impostas pelo Tratado de Versalhes. Como conseqüência, naquela vasta área industrial houve de início certa
resistência passiva, na forma de greves, seguindo-se as sabotagens, a guerra clandestina e ferozes lutas de
rua, provocadas pelas facções, desorganizadas, mas violentas, dos Freikorps, dos anti-republicanos e dos
ainda embrionários nacional-socialistas.

Em seu diário, Goebbels diz que "de repente sentiu-se inflamado pelas injustiças de Weimar e de Versalhes.
Ouvi dizer que Krupp, o grande industrial, estava apoiando elementos guerrilheiros e peguei o dinheiro que
meus pais puderam dar-me e parti para Essen. Procurei Albert Schlageter, o líder dos sabotadores, e ofereci-
lhe meus préstimos para qualquer serviço. Ele me recusou, porque meu pé faria que me descobrissem
facilmente, o que seria um desastre para eles. Mas ele me disse que havia trabalho muito importante que eu
podia fazer: funcionar como agitador e propagandista".

Havia, deveras, causas suficientes para se agitar e fazer propaganda. Na época, a Alemanha estava
fervilhante delas e a de Albert Schlageter parece ter sido uma das numerosas causas anônimas, apenas uma
erupção provocada pela injustiça da ocupação do Ruhr. Todas as erupções desse tipo pecavam pela falta de
orientação e, portanto, eram ineficientes. A destruição de algumas pontes ferroviárias ou o seqüestro de um
ou dois caminhões carregados de munições eram pouco eficazes contra as tropas francesas e belgas
firmemente instaladas e contra a ameaça dos aliados de cortar o envio de alimentos para a Alemanha, se não
se restaurasse a ordem.

Nessas circunstâncias, os distúrbios não demoraram a ser suprimidos e as greves, canceladas. Mas, embora
as ações possam falar mais alto que as palavras, estas é que têm de vir primeiro. Tendo-se "inflamado com a
injustiça", Goebbels passou a reexaminar as obras de Marx, Engels e Rathenau, apenas para reagir ainda
mais violentamente do que antes contra elas. Nessa reação ele foi ajudado por Fritz Prang que, apesar da
oposição dos seus pais, ouvira Hitler falar em Munique e dera cópias de panfletos nazistas a Goebbels.
Embora ainda estivesse mal formada, na época, a política nazista de nacionalismo intenso "provocou e
realimentou minhas chamas de angústia", escreve Goebbels. Prang comenta secamente que era evidente que
a literatura nazista "o excitou politicamente"; ele sempre estava assim sexualmente.
Seu fascínio pela doutrina nazista foi acentuado pelas numerosas reuniões políticas a que Goebbels
compareceu - normalmente acompanhado de Prang e várias amigas - durante o ano de 1923. É possível, não
posso afiançar, que Hitler fosse o orador em algumas delas. Em um dos seus trechos mais pomposos (este
provavelmente foi acrescentado mais tarde à muito autobiográfica novela Michael, tal como mudara o título
da sua tese de doutorado para convencer a posteridade das suas primeiras tendências políticas), ele escreve
sobre um grande (mas anônimo) orador:
"Naquela noite sentei-me numa grande sala, com mil outras pessoas, para vê-lo novamente, para tornar a
ouvir aquele que me despertara.
"Ali está ele, em meio à sua leal congregação. Parece ter aumentado de estatura. Há muita força nele e um
mar de luz brilha naqueles grandes olhos azuis.
"Sento-me com os outros e parece que ele se dirige apenas a mim.
"Sobre a bênção do trabalho! Tudo o que eu simplesmente sentia ou adivinhava, ele punha em palavras.
Minha confissão e minha Fé: ali elas tomaram forma.
"Sinto sua força encher-me a alma. Aqui está a jovem Alemanha e aqui estão os que trabalham na forja no
novo Reich. A bigorna ainda está silenciosa, mas o martelo não tardará a bater.
"Aqui é meu lugar.
"Ao meu redor estão pessoas que nunca vi antes e sinto-me criança, enquanto lágrimas me afloram sos
olhos."

No mesmo espírito melodramático, ele declara mais tarde:


"Sei agora para onde meu caminho me leva. O caminho da maturidade. Pareço estar embriagado.
"Lembro-me da mão do homem apertando a minha. Um voto para toda a vida. "E meus olhos encontram
duas grandes estrelas azuis."

Tudo isto para nos dizer, pelo narrador autobiográfico de Michael, que ele fora fascinado por Hitler já em
1923. Ele pôde apresentar provas adicionais, na forma de uma Carteira de Membro do Partido com o baixo
número de 8762. Mas quando chegou o momento de provar sua fidelidade precoce ao Partido, Goebbels já se
encontrava em condições de poder alterar datas e números nos arquivos tão assiduamente compilados por
Heinrich Himmler, em seu papel de guarda zeloso do Führer, e não há dúvidas de que assim fez. Ele
compareceu a muitas reuniões políticas de muitos partidos, mas sua filiação ao bloco nazista não é tão antiga
como pretendeu fazer-nos crer; não participou do fracassado putsch de Munique, de 9 de novembro de 1923,
que resultou na prisão de Hitler por sedição, e certamente não conheceu Hitler pessoalmente antes de 1925.
Uma carta que ele afirmou ter enviado ao Führer na prisão de Landsberg, em 1924, na realidade foi escrita
muito mais tarde e antedatada para ser usada como prova da sua antiga filiação ao partido. Ele tinha de
iludir-se antes que pudesse começar a iludir outros. Mesmo assim, é uma carta interessante, oferecendo,
como observa Curt Riess, prova do "entusiasmo do propagandista-amador pelo mestre da propaganda":
"Como uma estrela que nasce, apareceste aos nossos olhos espantados, realizaste milagres para abrir nossa
mente, num mundo de ceticismo e desespero, deste-nos fé. Ergueste a ti mesmo acima das massas, cheio de
fé e certeza no futuro, e possuído da vontade de libertar aquelas massas com teu ilimitado amor por todos os
que acreditam no novo Reich. Pela primeira vez vimos com olhos brilhantes um homem que arrancou a
máscara das faces destorcidas pela ganância, das faces dos medíocres e intrometidos parlamentares. Vimos
um homem que nos mostrou o quanto o sistema é vergonhosamente corrupto e baixo...
"No tribunal de Munique [onde Hitler fora julgado] atingiste aos nossos olhos a grandeza de um Führer. O
que disseste são as maiores palavras pronunciadas na Alemanha desde Bismarck. Expressaste mais que tua
própria dor e tua própria luta. Deste nome à necessidade de toda uma geração, buscando em confuso anelo
homens e tarefas. O que disseste é o Catecismo da nova crença política, nascida do desespero de um mundo
ateu em colapso... Nós te somos gratos. Um dia a Alemanha te agradecerá ... "

A 1o de abril de 1924 - no mesmo dia em que Hitler foi condenado a cinco anos de prisão - Franz von
Wiegershaus, o representante eleito do Völkische Freiheitspartei no Reichstag, ofereceu trabalho político a
Goebbels. Este partido era integrado por um grupo dissidente da extrema direita do movimento nacionalista,
do qual os nazistas, naturalmente, haviam sido os mais evidentes através do seu líder Adolf Hitler. Agora, o
partido nazista estava proscrito e Hitler não tinha intenções de vê-lo nem mesmo subrepticiamente ativo
enquanto estivesse preso. Ele, que encontrara dificuldade em conquistar a sua liderança, o preferia totalmente
abandonado, a vê-lo dirigido por caminhos falsos por Führers rivais. No idealismo de Hitler só havia lugar
para um Führer.

Naturalmente, uma coisa é proscrever um movimento político pela lei; outra, muito diferente, é suprimir suas
atividades de verdade. Em meio ao caos constitucional e econômico que paralisou a nação durante toda a
década, os nacionalistas da fragmentada ala direita continuaram operando, apesar da sua desunião; no norte
da Alemanha, os remanescentes nazistas foram mantidos mais ou menos coesos por Gregor e Otto Strasser,
abastados homens de negócio que não gostavam de Hitler (que, no devido tempo, se vingaria de sua
vacilante lealdade), mas que se sentiam muito satisfeitos com a conotação política do movimento, de extrema
direita.

O Völkische Freiheitspartei não fora incluído na proscrição. Era pequeno, dirigido ineficientemente e não
representava qualquer ameaça visível à República de Weimar. Mas Wiegershaus pretendia continuar
veiculando opiniões extremistas através do seu jornal - que não passava de um boletim noticioso - o
Völkische Freiheit. Ele precisava de um secretário e redator-assistente e ofereceu a Goebbels 100 marcos
mensais, se este incluísse em suas atividades na redação do boletim alguns discursos a serem proferidos nas
reuniões públicas convocadas pelo partido.

O salário era insignificante, mas Goebbels, que atravessava uma das suas fases de desespero (ele tinha um
quê de maníaco-depressivo), depois que o redator do Berliner Tageblatt se recusara até mesmo a entrevistá-
lo, quando ele solicitou um emprego, e que um diretor de teatro chegou a rir-lhe na cara, aceitou o convite de
Wiegershaus. O diretor de teatro registrou, sobre o incidente com Goebbels, o seguinte: "Sem nunca ter tido
qualquer experiência teatral, ele pretendia ingressar diretamente no quadro de produtores". Por essa época, o
caso de amor que mantinha com Else Taub passava por crise muito séria. Assim é que já em meados de abril
de 1924 Goebbels estava metido numa série de reuniões políticas realizadas em Eberfeld, outra cidade têxtil
da Renânia do Norte-Westfália.

Ele não demorou a desiludir-se com as platéias que, segundo disse numa carta que enviou para casa, "eram
inacreditavelmente estúpidas e podiam ser levadas em qualquer direção com os mesmos limitados lemas" e o
faziam sentir-se como "um excelente ator perdido na companhia de um elenco de décima categoria".

Acontece, porém, que ele não estava perdendo tempo. Certa feita, Gregor Strasser encontrava-se por acaso
na platéia e, no fim da reunião, cumprimentou Goebbels pela eficiência da oratória. Nada mais aconteceu de
importante até que, no fim do ano, Hitler foi libertado da prisão, depois de cumprir nove meses da pena de
cinco anos que lhe havia sido imposta, e começou a reorganizar o partido.

Strasser nomeara um homem chamado Karl Kaufmann para cuidar dos assuntos nazistas no distrito Reno-
Ruhr e Kaufmann disse a Strasser que "um jovem ardente chamado Goebbels, dotado de ótima voz", o
procurara solicitando trabalho político. Strasser imediatamente lembrou-se da reunião em que viu Goebbels
lutar por incutir os princípios do Völkische Freiheit no cérebro de uma platéia estúpida.

"Tragam-no aqui", disse Strasser. (A conversa está registrada no livro de Otto Strasser, Die Deutsche
Bartholmaensnacht.) "Ele talvez seja mais eficiente do que o homem que temos no momento trabalhando no
secretariado, Heinrich Himmler. Himmler está pensando em se dedicar à criação de galinhas, para o que
talvez tenha muito mais aptidão. Se houver problemas em tirar Goebbels de Wiegershaus, ofereça-lhe o
dobro do salário que está recebendo agora. Acho que talvez valha a pena."
Assim, na primavera de 1925, passou Goebbels a funcionário do partido nazista - oficialmente na
ilegalidade, mas de modo algum moribundo.

"Era um emprego que exigia grande vigor", escreveu ele, mais tarde, em Batalha por Berlim. "O Führer saíra
da prisão cheio da determinação do gênio. Os discípulos reuniram-se em torno dele e lhe ouviram a palavra."
(A imagem dos discípulos sentados aos pés do Mestre não é corroborada pelos fatos; mas não está em
desacordo com as tentativas feitas por Goebbels de criar a imagem de um revolucionário semelhante a
Cristo. Embora apóstata, ele sabia por intuição que ainda não chegara o momento da palavra agnóstica.)

"Os movimentos revolucionários", prosseguiu ele, "não são feitos pelos grandes escritores, mas pelos
grandes oradores. É um erro acreditar que a palavra escrita é mais eficaz porque a imprensa diária é lida por
grande número de pessoas. Ainda que o orador possa apenas atingir, na melhor das hipóteses, uns poucos
milhares de pessoas, enquanto o escritor político atinge facilmente de dez a cem mil leitores, a palavra falada
tem muito maior poder de influência e pode ser transmitida cem, milhares de vezes. E um discurso bem feito
é infinitamente mais sugestivo do que um bom editorial".

O primeiro porta-voz oficial do partido nazista, o Nationalsozialistische Briefe, apareceu em outubro de


1925. Era dirigido pelos irmãos Strasser, diferindo bastante do Völkische Freiheit, que era mimeografado.
Fosse qual fosse a opinião de Goebbels sobre a importância da palavra escrita, o fato é que ele escreveu a
maior parte dos artigos saídos nos primeiros números fazendo a apologia de uma filosofia política de
extrema direita, bem de acordo com a ideologia nazista que Hitler, na prisão de Landsberg, ditou para Rudolf
Hess, na confecção dos originais do Mein Kampf. Se diferença havia no conteúdo da pregação de Goebbels
com o que Hitler preconizava em seu livro, não era nada que não pudesse ser de imediato a ele ajustado, e
isso se deu assim que se conheceram.

Esse encontro deu-se a 2 de novembro de 1925 e está registrado no diário particular de Goebbels, cuja parte
pertinente está na biblioteca da Universidade de Stanford, Califórnia. A nota refere a imediata simpatia de
Hitler pelo homem que lhe foi apresentado por Kaufmann como "o assistente de Gregor Strasser que está
fazendo um esplêndido trabalho pelo partido no Brieje e nas reuniões públicas". "Ele me cumprimentou
como a um velho amigo", escreve Goebbels, "e deu-me uma fotografia sua, com a inscrição Heil Hitler, que
está sobre a minha mesa. É um líder de origem é formação popular; tem tudo para ser um rei... grandes olhos
azuis, como estrelas... fala incansavelmente durante horas... Adoraria tê-lo como amigo".

Aqui, transposto para seu momento adequado no tempo, está claramente o Narrador do Michael, olhos
extasiados e tudo o mais. Aqui estão também o anseio por amizade e a queda para a bajulação, os dois pilares
de que se serviu Goebbels para crescer no conceito de Hitler. O exercício de sua falta de virtudes morais
fazia dele um exibicionista, um ansioso por ser adorado pelos que o cercavam, causa dos desencontros
registrados nas suas relações amorosas. "Ele estava procurando eternamente a mulher que o amasse e
'compreendesse' ", diz Curt Riess, e qualquer dos trechos do diário de Goebbels corrobora esta opinião: "Else
está aqui, toda em lágrimas e tristeza. Vamo-nos separar. Ela me implora para que não a deixe. Horas de
profunda angústia... Parece que tem de ser assim: há uma maldição comigo no tocante às mulheres... Else me
escreve um bilhete para acabar tudo. Não podemos nem mesmo ser amigos, mas eu amo essa pobre e doce
criança. Se ela pudesse retribuir-me o amor que preciso, a sua aclamação pelo que outros têm chamado de
minha brilhante capacidade".

Essa "brilhante capacidade" (como orador) era certamente um dom de Goebbels. Mas ele não podia resistir à
tentação de exagerar o entusiasmo da sua platéia. As reuniões políticas, cuja assistência, segundo nos
garantem Prang e outras testemunhas dignas de confiança, não ultrapassava umas poucas centenas de
pessoas, transformam-se em "milhares" nos diários; e "os aplausos entusiásticos e as horas de apertos de
mãos e congratulações" na verdade não passavam de sinais de aprovação e comedidas manifestações de
concordância. Como os diários pretendiam ser particulares, não pode haver dúvida de que Goebbels tinha
também enorme capacidade de enganar a si próprio. Eram, os seus diários, um espelho cor-de-rosa a refletir
as imagens que mais tarde refletiriam os seus numerosos e bem talhados ternos. Mas, por enquanto, eram
apenas distorções auto-induzidas.

Contudo, na primavera de 1926, o próprio Hitler condescendeu em levar Goebbels consigo numa tumultuosa
viagem pela Baviera, durante a qual ele seria o orador de apoio. Naturalmente, a condescendência destinava-
se a vitaminar a vaidade de Goebbels, providência que salienta a necessidade em que Hitler se encontrava de
ter em torno de si, na época, número cada vez maior de seguidores dignos de confiança que poderiam ser
indicados para as várias posições de mando à medida que o partido evoluía para a conquista do poder.

A alegria de Goebbels leva-o a depositar uma coleção de incoerências em seu diário: "Tudo nele é bondade...
ele é um rei... mas, Cristo ou João?... Tenho seu carro e seu motorista às tardes... ele me abraça enquanto os
gritos de entusiasmo abafam tudo... heil após heil... tenho os olhos marejados de tanta emoção... sua mão tem
a firmeza da de um rei na de um príncipe secundário... seus olhos prendem-me como um abraço... " E assim
por diante, em termos destinados a sustentar seu próprio ego e, ao mesmo tempo, ser preconcebidamente
favorável ao Führer, para o caso de ele vir a pegar o diário - o que Goebbels pretendia que viesse a acontecer.
"É preciso lembrar", escreve Prang, "que Goebbels tinha excelente faro para o sucesso psicológico; tanto
quanto Hitler. Assim, com efeito, os dois se estavam superando mutuamente na conivência - Hitler para
conquistar Goebbels pela adulação, e este, preparando uma espécie de base para Hitler pisar como que sobre
um tapete vermelho. Encontramos muitas anotações no diário dizendo que Hitler enviou flores a Goebbels,
ou que este 'presenteou o Führer com um singelo buquê de rosas que trouxe lágrimas àqueles grandes olhos'
e muitas extravagâncias desse tipo".

Quais seriam as intenções de Hitler? Por que se daria ele a tanto trabalho para conquistar um homem que
ainda não chegara aos trinta anos e que - apesar do que afirmaria mais tarde - apenas se filiara ao partido
havia alguns meses, e cuja natureza maníaco-depressiva insinuava uma instabilidade indesejável na política?
A resposta talvez residisse na fantástica percepção psicológica do Führer, que sentiu em Goebbels o
organizador potencial da propaganda do partido - um campo no qual ele próprio era um virtuose, como relata
em Mein Kampf. Mediante hábil publicidade e com apenas o capital original do partido, de 7.50 marcos e
sete membros desorientados cuja única ideologia, usada somente em conversas frívolas, era esmagar judeus e
bolchevistas, ele conseguiu arregimentar uma força que no começo dos anos 20 atingia cerca de 2.000
membros. Portanto, justo é que se lhe reconheça o direito de afirmar que reconhecia a distância um bom
propagandista.

Mas no momento havia trabalho mais áspero a ser feito do que a fabricação de propaganda e Goebbels teve
de provar que era, além de inteligente, um implacável membro do partido. O campo de provas seria Berlim,
onde o Gauleiter (líder de área) era um homem chamado Schlange, que fora nomeado pelos irmãos Strasser e
que permitira que a confusão, a negligência e a irresponsabilidade começassem a comprometer a organização
partidária. Hitler via aí a oportunidade de testar a lealdade de Goebbels e, através da reformulação da
atividade partidária que este promoveria, minar o prestígio de Strasser.

"Desde o momento em que comecei a organizar o partido", registra sua Conversa de Mesa, "decidi nunca
preencher um cargo até que tivesse encontrado o homem certo para o ocupar. Mesmo quando os membros
mais antigos do partido se queixavam da liderança política em Berlim, esperei até que lhes pudesse garantir
que encontrara no Dr. Goebbels o homem que estava procurando. Ele possui dois atributos sem os quais
ninguém poderia dominar as condições em Berlim: inteligência e o dom da oratória. Depois de estudar, a
convite meu, a organização do partido em Berlim, ele localizou o problema na liderança juvenil e pediu-me
carta-branca para introduzir as mudanças necessárias e expurgar do partido os elementos insatisfatórios.
Nunca me arrependi de ter-lhe dado os poderes que pedira".

Goebbels não estava, de modo algum, ansioso por assumir a liderança do partido em Berlim. Tendo
conseguido atrair a atenção de Hitler, era do seu mais alto interesse manter-se em sua órbita, o que
significava ficar no sul, na Baviera, onde Hitler estava concentrando todo o esforço possível. "Não quero
ficar atolado na confusão de Berlim", consignou ele em seu diário, "embora, se o Führer me desse o cargo de
Chefe da Propaganda do Partido, esteja disposto a ir para qualquer lugar, para me desincumbir da tarefa".

Outro golpe, mais amargo do que a perspectiva de vir a ter que sair das proximidades do Führer, aconteceu
então: Gregor Strasser foi por ele nomeado, a 26 de outubro de 1926, chefe de Propaganda e Publicidade do
partido, sendo, logo depois, Goebbels destacado para Berlim. Assim, ardilosamente, Hitler instilou em
Goebbels ressentimentos contra Strasser e neste uma sensação de falsa segurança; estimulou a lealdade de
Goebbels para com ele conferindo-lhe uma tarefa administrativa de importância e deu a si mesmo a
possibilidade de atingir novas platéias, tendo Goebbels como porta-voz. (Os termos do documento normativo
da atividade de Goebbels incluíam a proibição de falar em público - proibição esta que podia ser
parcialmente superada, desde que os discursos políticos se limitassem a platéias "fechadas", isto é, a
indivíduos que, por definição, já eram membros do partido, de modo que grande parte do seu esforço se
diluía na pregação para os convertidos.)

Na noite de 9 de novembro de 1926, o 3 o aniversário do putsch nazista, Goebbels chegou a Berlim. "Um
cinzento crepúsculo de novembro cai sobre Berlim quando meu trem chega a Potsdammer Bahnof e, menos
de duas horas depois já me encontro pela primeira vez na plataforma do orador que será o ponto de partida
para futuro desenvolvimento."

Daquela noite em diante sua vida tomaria novo rumo.

O palco
O palco de Berlim, onde Goebbels agora pisava, estava preparado para um drama de certa magnitude. Nos
bastidores, espreitavam os mil e tantos nazistas que eram os únicos representantes do partido, até agora
fracamente orientado por Schlange. Este, funcionário público por profissão, esteve sempre muito mais
empenhado em conservar o cargo do que em promover a causa nazista. Apinhando-se no palco estavam os
comunistas e social-democratas, que eram a maioria eleitoral na capital. No fundo do palco, sinistro de tanta
corrupção, o "Antro do Ópio" (como Goebbels o chamava) - um porão na Potsdammerstrasse que era a sede
oficial da Gau de Berlim.
Ele achava o nome bastante apropriado: "Os raios do sol nunca chegavam ali. A luz elétrica ficava acesa dia
e noite. Mal se abria a porta, uma nuvem de fumaça de mil cigarros avassalava as narinas. Montes de jornais
velhos e arquivos mais velhos ainda entulhavam o local. Na ante-sala, os membros desempregados do
partido costumavam ficar conversando, matando o tempo. Havia um pretenso administrador que, orientado
somente pela memória, anotava num livro a entrada e saída de dinheiro. Era impossível qualquer trabalho
sistemático em ambiente tão confuso. As finanças eram uma barafunda e a Gau de Berlim só tinha dívidas.

Goebbels escreveu imediatamente a Hitler pedindo carta-branca para "expurgar o partido de todos os
elementos insatisfatórios". "Você só é responsável perante a mim", respondeu-lhe o Führer. Goebbels
mandou então emoldurar a carta e a pendurou na parede do novo escritório que alugou na Lützowstrasse.
"Achei que seria bom", escreveu ele em Batalha por Berlim, "que houvesse prova visível da minha
autoridade, pois pretendia ser implacável na reorganização do partido. Se alguém pretende ser Gauleiter
[Gau significa líder], primeiramente tem de preparar sua Gau para que seja capaz de ser liderada".

Apesar da urgente necessidade de aumentar a filiação partidária no norte, Goebbels pôs-se implacavelmente
a trabalhar no pretendido expurgo, expulsando 400 dos membros de Berlim. "Os que não contribuíam com
dinheiro ou com trabalho foram eliminados. Preferia uma filiação menor, mas digna de confiança, a um
monte de desocupados que, além de nada pagarem, ainda debochavam do esforço dos outros."

A 1° de janeiro de 1927 ele dirigiu-se aos 600 membros restantes do partido, exigindo 3 marcos de cada um
como contribuição mensal para os fundos do partido e ordenou àqueles que não se submetessem à sua
liderança e às suas ordens que deixassem o recinto imediatamente. Ninguém saiu.

"Temos uma tremenda tarefa pela frente", prosseguiu. "O partido aqui em Berlim é como um cordeiro
desgarrado, à mercê de bandos de vermelhos que, ocultos, estão prontos para devorá-lo. Há quase 5 milhões
de habitantes em Berlim e somos 600, anônimos no meio deles. Temos de derrubar a parede do anonimato.
Os berlinenses têm de ouvir-nos e falar de nós. Podem insultar-nos, caluniar-nos, investir contra nós, surrar-
nos, mas temos de fazê-los falar de nós, esta a grande tarefa. E juro-lhes que, embora sejamos hoje apenas
600, em seis anos seremos 600 mil."

Embora, por nomeação de Hitler, Gregor Strasser fosse diretor da propaganda nazista, não há quase
evidência de que se tenha dedicado à tarefa, exceto apoiar o partido em seu jornal Nationalsozialistische
Briefe (agora adequadamente impresso e consideravelmente aumentado). Ele não tinha o dom de atrair a
atenção das massas, e na verdade foi Goebbels quem se encarregou da tarefa de derrubar "a parede do
anonimato", antecipando-se à cobiçada nomeação para o cargo de propagandista do partido.

A propaganda é um meio utilizado para fazer alguém aceitar um principio, uma teoria, uma doutrina através
das emoções. Embora falem alegremente de "educar as massas", os propagandistas apelam não para a razão,
mas sempre para a emoção e o instinto. A própria palavra propaganda só apareceu em 1622, quando o Papa
Gregório XV convocou uma Comissão de Cardeais para orientar a difusão da palavra cristã pelas missões
estrangeiras. A comissão foi chamada Congregatio de Propaganda Fide - Congregação para a Propagação da
Fé, e funcionava como uma comissão de qualquer outra sociedade missionária - escolhendo missionários e
despachando-os para o estrangeiro. Mas não demorou para que a palavra ganhasse significados outros que
não propagação de crenças religiosas, como, por exemplo, agressão nacional, proselitismo político,
deturpação de fatos e censura por supressão, coisas muito convenientes para Hitler. Essas sinistras atividades
não tinham nada de novas. O Oráculo de Delfos do mundo antigo, pela hipnose, comandara as empresas
colonizadoras dos atenienses. Tucidides, em sua história da Guerra do Peloponeso, revelou que as facções
em confronto aumentavam seu domínio sobre os não convencidos pela contínua deturpação dos fatos. Platão,
em sua República, preconizava o banimento de todos os escritores cuja influência fosse desagregadora, e que
para o lugar deixado por eles fossem nomeados publicistas de tendência republicana; as paredes de Pompéia
estavam cheias de lemas de propaganda eleitoral e a Inquisição Espanhola armou-se com todas as formas de
censura que ajudassem seus objetivos. Evidentemente; a relativa inocência de um conceito como o do Papa
Gregório pode ser conspurcada por qualquer regime totalitário, pois é tão fácil propagar as mentiras quanto
as verdades.

Portanto, a propaganda, como William Albig diz acertadamente em seu livro Public Opinion, "aparecia
sempre que qualquer liderança tentava unir as opiniões de um povo, desde a propaganda política de um Júlio
César à propaganda da Igreja Católica Romana, à propagação da Lenda Napoleônica, ao propagandismo de
Potemkin em favor de Catarina a Grande, à propaganda panfletária de Sam Adam para a Revolução
Americana, à propaganda do Norte e do Sul na Guerra Civil Americana, às propagandas que proliferaram,
em todos os lados, na Segunda Guerra Mundial".

Bismarck, com quem Goebbels entusiasticamente comparava Hitler, também era um mestre da propaganda.
Grande parte da leitura de Goebbels, nos seus primeiros tempos em Berlim, foi dedicada ao estudo dos
métodos de Bismarck, que haviam incluído cartas forjadas, pretensamente vindas de Roma ou Paris, que ele
conseguia fazer publicar na imprensa, a criação de "turmas especiais de boateiros" (Gerüchtemacher), para
espalhar o desânimo na oposição, e a organização do "bureau" de imprensa estrangeira.

Goebbels usaria "material de impacto" contra seus adversários e não perdeu tempo em reunir dossiês repletos
de "fatos" sobre comunistas, judeus, capitalistas liberais e todos os antinazistas para usá-los de qualquer
modo eficaz - incluindo a distorção - quando chegasse o momento. Enquanto aguardava o momento
adequado, Goebbels recomendava métodos grosseiros, barulhentos e destinados apenas a atrair atenção -
desfavorável de preferência, já que havia muito mais publicidade em ser vilipendiado do que em ser
elogiado.

Os métodos que tinha à disposição, com o dinheiro que podia usar, eram poucos. Cada Gau procurava
manter-se com suas próprias verbas e, como Goebbels observara, Berlim estava em péssimo estado. A
publicidade através da imprensa, de qualquer tamanho razoável, a publicidade postal em grande escala, os
tapumes utilizados pelos agentes publicitários estavam todos proibidos pelos custos. A transmissão
radiofônica, que mais tarde Goebbels transformaria no grande veículo de difusão da filosofia nazista, não era
dirigida em bases comerciais, mas, ainda que fosse, seria dispendiosa demais, como outras formas de
publicidade em larga escala. Portanto, restavam-lhe apenas os meios mais simples de campanha, que se
revelaram, força é reconhecer, bastante eficazes.

Goebbels começou com pequenos cartazes, que os membros do partido colavam em colunas cilíndricas, que
eram colocadas nas esquinas das ruas especialmente para essa finalidade, sem ônus para o usuário, sendo
considerado crime o dano de qualquer tipo aos edifícios e locais públicos. Mas, por serem livres, havia uma
corrida contínua a essas colunas. Os colocadores de cartazes, competindo pelo espaço nessas colunas,
ficavam à espreita, aguardando a oportunidade de poder substituir um cartaz por outro, valendo-se também
dos meios os mais engenhosos, inclusive os efeitos aplicados às comédias de pastelão, como queda de escada
etc., para chamar a atenção dos passantes. Os cartazes eram desenhados pelo próprio Goebbels, usando o
conhecimento de artes gráficas que adquiriu na redação do jornal dos Strassers. Ele usava tipos grandes e
tinta vermelha para destacar uma frase provocativa, como o KAISER DA AMÉRICA FALA EM BERLIM,
embaixo da qual, em tipos menores mas também destacados, um ataque ao "Plano Dawes" e a seu
negociador, o Ministro das Relações Exteriores, Gustav Streseman. Raramente havia referência direta a
Hitler ou aos nazistas. Os cartazes pretendiam apenas provocar curiosidade - objetivo que conseguiram a
ponto de atrair a atenção da imprensa liberal - e atingir, por exemplo, um alvo: considerar maléfico o "Plano
Dawes", porque exigia fidelidade ao Tratado de Versalhes, e Streseman um traidor. Goebbels absorvera
completamente a análise que Hitler fizera da propaganda em Mein Kampf. Um dos princípios ali
preconizados era: "A verdade tem de ser sempre adaptada para ajustar-se à necessidade. O que diríamos de
um cartaz que, pretendendo anunciar nova marca de sabonete, insistisse nas qualidades das marcas rivais?
Naturalmente sacudiríamos a cabeça. O mesmo aconteceria com um cartaz de propaganda política que
incorresse no mesmo pecado. O objetivo da propaganda não é tentar julgar direitos conflitantes, dando a cada
um o que merece, e sim salientar exclusivamente o direito que estamos defendendo. A propaganda não deve
investigar a verdade objetivamente. Na medida em que a verdade pende para o outro lado, deve-se apresentá-
la de acordo com as regras teóricas da justiça, e só o aspecto da verdade que nos é favorável deve ser
manifestado".

Além disso, Goebbels recebera de Hitler, nessa época, a cópia de uma diretiva que o Führer mandara incluir
na Segunda Parte do Mein Kampf. Ela vinha acompanhada de uma nota confidencial explicando que, embora
a diretiva interessasse principalmente a Gregor Strasser, como Chefe da Propaganda, Goebbels deveria
observar atentamente o seu conteúdo "porque é seu o trabalho de aumentar nossa força em Berlim". (Dar a
Goebbels um vislumbre confidencial da diretiva era um exemplo típico da habilidade de Hitler em criar
correntes de suspeita entre seus executivos. Ele prosseguia lentamente em seus desígnios contra Gregor
Strasser, cujo apoio ainda lhe era necessário, sem esquecer um instante sequer que Strasser tentara assumir o
controle do partido enquanto ele, Hitler, estava na prisão. A diretiva dizia o seguinte: "O objetivo da
propaganda é atrair seguidores. A tarefa da organização é conquistar novos membros. O seguidor de um
movimento é aquele que se declara concorde com seus objetivos. O membro é o que luta por ele. Haverá dez
seguidores para cada um ou dois membros, no máximo. A filiação como membro requer espírito ativo e,
assim, se aplica somente a uma minoria. Portanto, a propaganda cuidará incansavelmente para que uma idéia
conquiste adeptos, enquanto que a organização tem de observar atentamente que apenas os mais valiosos
dentre os adeptos sejam transformados em membros. Depois que a propaganda conscientizou todo um povo
a respeito de uma idéia, a organização pode obter o máximo de benefícios com a ajuda de apenas um
punhado de pessoas".

Goebbels não tinha qualquer conhecimento de estratégia militar, jamais viu ação em qualquer frente e, à
parte uma breve visita a Genebra, permaneceu na Alemanha, principalmente em Berlim, durante toda a sua
vida de nazista. Contudo, ele poderia ter adotado como lema a enérgica conclamação do Marechal Foch a
seus comandados ("Meu centro está cedendo, minha direita está recuando; a situação é excelente; atacarei!")
no próximo movimento. (Não é sem propósito que o jornal de propaganda nazista que ele em breve fundaria
seria chamado Der Angriff [O Ataque].)

Sendo o ataque o melhor método de defesa e sendo os movimentos revolucionários feitos, conforme
acreditava, por oradores, e não por escritores, ele entrou no campo inimigo e, para uma reunião a 11 de
fevereiro de 1927, alugou o Salão Pharus, situado no coração comunista da cidade. Os cartazes anunciando a
reunião foram impressos numa imitação direta dos anúncios dos comunistas e a fraseologia tinha a mesma
conotação:
"O Estado Burguês aproxima-se do fim! Temos de forjar um novo Estado! Trabalhadores: o destino da nação
alemã está em suas mãos!"

Não existe meio mais eficaz para atrair a atenção do que provocando uma cena violenta, particularmente se
for prefaciada por uma verdadeira parada pseudomilitar, com agitação de bandeiras etc. Goebbels deu ordem
para que todo membro do partido desfilasse na frente da sede, na Lützowstrasse, com bandeiras e marchasse
para o Salão Pharus. Ele também teve um encontro com Kurt Daluege, o chefe das Tropas de Assalto. Esta
formação, que inicialmente era a guarda-costas de Hitler, crescera muito, transformando-se num considerável
corpo paramilitar especializado em trabalhos violentos para o partido. Daluege (que por profissão era
engenheiro civil, encarregado dos depósitos de lixo da cidade, considerado pelos que o conheciam pouco
mais que um cabeça dura) fora encarregado de presidir a reunião e "guardar" a sala com seus esbirros. Como
Goebbels escreveu mais tarde, em Batalha por Berlim: "Na verdade, eu criara deliberadamente uma situação
que só precisava que se acendesse a mecha para que se desse uma explosão".

Os comunistas, irritados pela maneira como haviam sido desafiados em seu próprio covil, ameaçaram com
derramamento de sangue, se a reunião fosse realizada. "Sua imprensa superou-se em ameaças horrendas.
Afirmava que nos seria feita uma recepção calorosa - tão calorosa que não teríamos vontade de voltar."

As Tropas de Assalto de Daluege haviam recebido ordens de comparecer à paisana e se misturar com a
platéia e com a multidão fora da sala. E quando os membros do partido - metidos em uniforme completo,
com botas de montaria e braçadeiras - cruzaram, empertigados, as ruas, com suas bandeiras e suas suásticas,
atraíram grande número de parasitas, curiosos por saberem que diabo era aquilo. Naturalmente houve
zombarias, apupos, aplausos e reações várias, por parte dos que passavam. No Salão Pharus, uma atmosfera
sombria e ameaçadora pairava no frígido ar de fevereiro. Um diretor de cinema poderia ter feito um
verdadeiro clássico da tela com os cortes de uma câmara voraz. Esse trabalho mostraria as faces todas da
brutalidade, da ameaça e do ódio; as mãos, armadas de maças e soqueiras com que se armaram os
contendores, teriam sido evidentes; e a trilha sonora - se possível na época - seria uma sugestão de violência.

Na verdade, houve violência. Daluege, na Presidência, mal declarara aberta a reunião quando partiu um berro
do fundo do auditório. Sem dúvida foi um comentário insensato sobre o tamanho da agenda, mas muito antes
que tal comentário se concluísse, Daluege pegou uma garrafa de água de cima da mesa e atirou-a na direção
de onde partia o comentário. Num instante, canecas de cerveja, garrafas e uma mistura surpreendente de
ferragens voaram pelo auditório, enquanto nazistas e comunistas se pegavam em violenta briga. Goebbels,
sentado à direita de Daluege, ordenou claramente: coitus interruptus - uma frase-código que ele cunhara para
a ocasião - e seis membros das Tropas de Assalto que estavam no fundo do auditório agarraram o intruso e o
surraram brutalmente, ao mesmo tempo que as portas laterais se abriram e o corpo principal das Tropas de
Assalto invadiu o recinto e começou a cuidar de qualquer um que oferecesse resistência. A polícia, que se
mostrou singularmente relutante em participar da festa - talvez a corrupção tivesse funcionado bem - acabou
aparecendo. Fizeram-se prisões - principalmente de bodes expiatórios - e os feridos receberam alguns
cuidados.
"Tudo isto demorara mais de trinta minutos", diz Goebbels a respeito do acontecido. "Ordenei então que os
membros do partido e das Tropas de Assalto que haviam sido feridos fossem levados para o palco, onde
poderiam ser vistos claramente e ouvidos os seus gemidos. Falei à platéia sobre um assunto que deveria
parecer improvisado - 'O Desconhecido Soldado da Tropa de Assalto' - ordenei que a intervalos de dez
minutos, durante meu discurso, os feridos fossem levados dali, um a um, com seus sangrentos ferimentos
claramente visíveis. Constatei que o método era extremamente eficaz para atrair atenção."

O principal ator do drama nazista de Berlim estreara no palco de onde não mais sairia.

Começa o drama...
Referindo-se a si mesmo, Goebbels disse que "nascera para o drama". Havia, sem dúvida, certa justificativa
para fantasias desse tipo, de que estão cheios seus diários. O malogro das tentativas que fez no sentido de
ingressar no teatro, solicitando, imprudentemente, um emprego de produtor, não se deveu propriamente a um
defeito de orientação, embora não se possa dizer que tenham sido bem dirigidas. Tudo nele revelava a
vocação para o drama. As Reuniões de Nuremberg, a apresentação dos seus discursos e os recursos de que se
utilizava para provocar tensão dramática eram astutamente estudados. Ele jamais poderia criar a atmosfera
emocional que Adolf Hitler inspirava, mas o controle que tinha do gesto e da palavra era igualmente eficaz,
de um modo diferente. Ele escrevia seus discursos com imenso cuidado, usando tintas coloridas para
distinguir as diferentes tonalidades de ênfase e todos eles eram ensaiados diante de um espelho triplo, em seu
quarto, na residência dos Steigers, no Tiergarten - acomodação que os Strassers lhe arranjaram tão logo
chegou a Berlim.

Os Steigers eram ricos e importantes. Todas as pessoas de posição, em Berlim, cultivavam a amizade deles.
Johann Steiger era membro da junta editorial do Berliner Lokalanzeiger, que pertencia a Alfred Hugenberg,
um dos muito respeitados industriais que forneciam dinheiro ao partido nazista e arrebanhavam seguidores
nas camadas mais altas - seguidores que auxiliavam monetariamente o partido com o dinheiro que receberam
do confisco de propriedades que possuíam, na esperança de que o grande projeto anunciado por Hitler para o
Terceiro Reich os reabilitasse. Em troca da esperança, Hitler, Goebbels etc. iam sugando-lhes o dinheiro.
"Esta gente é companhia boa e importante", disse Goebbels em carta a seus pais. "Frau Steiger tem dinheiro
e freqüentemente recebe a melhor sociedade, descendentes da nobreza germânica, figuras importantíssimas
da realeza, e todos admiram meus discursos, a minha eloqüência. Estão certos de que tenho um grande
futuro." As "figuras importantíssimas da realeza", uma exageração de Goebbels, não eram mais que o Grão-
Duque de Mecklenburg e Hesse, o Príncipe August Wilhelm von Hohenzollern, o Duque Ernst August de
Brunswick, o Príncipe Christian von Schauberg-Lippe, por exemplo - e eles absorviam o encanto e
servilismo de Goebbels como esponjas. Na elegante sala de estar dos Steigers, eles ouviam de bom grado os
discursos que Goebbels ensaiava, discursos para cuja elaboração se inspirava nas melodias nacionalistas que
extraia do piano "Bechstein" que Johann Steiger ganhara de presente de Natal de Helene Bechstein, mulher
do fabricante, ardorosa hitlerista e contribuinte efetiva do partido. "O pequeno Doktor", disse um deles,
"transmite depressão, mas inspira confiança em si mesmo, se não no futuro da Alemanha".

No começo de 1927, o futuro econômico da Alemanha foi superficialmente avivado por imensos
empréstimos - cerca de sete bilhões de dólares ao todo - que os Estados Unidos fizeram ao tesouro
germânico nos termos do "Plano Dawes".

"A República", diz William L. Shire em Ascensão e Queda do Terceiro Reich, "fez empréstimos para pagar
as reparações a que estava obrigada e aumentar os serviços sociais que prestava e que eram o modelo do
mundo. Os estados, cidades e municípios fizeram empréstimos para financiar os melhoramentos necessários,
como a construção de aeródromos, teatros, estádios esportivos e piscinas. A indústria, que eliminara suas
dívidas na inflação, tomou bilhões emprestados para se reequipar e racionalizar os processos de produção,
produção que em 1923 caíra para 55% da registrada em 1913, e subiu para 122% aí por volta de 1927. Pela
primeira vez, desde a guerra, o desemprego caiu para menos de um milhão - 650.000 - em 1928. Naquele
ano, as vendas a varejo aumentaram 20% sobre 1925, e, no ano seguinte, os salários reais eram 10% mais
altos que os dos quatro anos anteriores. As classes média e baixa, os milhões de lojistas e pequenos
assalariados aos quais Hitler tinha de recorrer em busca do apoio de massa, compartilhavam da prosperidade
geral".
Contudo, essa prosperidade geral perderia substância em meados daquele ano. Por volta de junho, a Bolsa de
Valores mostrava sinais de fraqueza e não se registrou nenhuma recuperação em bases sólidas até que Hitler
subiu ao poder como Chanceler, pois o colapso da Wall Street, em outubro de 1929, teve reflexos na
economia alemã, como de resto na economia mundial. Sem a ajuda do dinheiro americano, que, segundo o
Presidente Calvin Coolidge, fora despejado aos montes pelo "Plano Dawes", a economia alemã começou a
demonstrar toda a sua fragilidade. Como diz Shirer, houve períodos de ilusória prosperidade; mas a base da
economia nacional era insegura, e Goebbels, cuja ignorância em economia era total, fez profecias de
depressão, porque sentia - muito acertadamente - que o partido só poderia progredir em meio ao desastre do
desemprego em massa e da depressão. "O colapso, moral, físico e financeiro está às nossas portas", clamava
e escrevia incessantemente. E, de acordo com a regra básica da propaganda, apresentava suas provas - provas
estas que naturalmente não diziam nada sobre nada que esclarecesse o ponto de vista oposto. E como se
tornava cada vez mais evidente que a onda de prosperidade começava a desfazer-se, ele foi encarado como
um oráculo. A filosofia nazista começou a polarizar a atenção de todos, homens de sociedade, negociantes e
gente comum.

Como a principal tarefa de Goebbels, na qualidade de Gauleiter, era recrutar novos membros e seguidores
para o partido, mas também ter em mente a distinção entre eles, conforme indicada pelo Führer, o trabalho
que vinha desenvolvendo nesse sentido começou a apresentar resultados. Três dias depois do confronto de
fevereiro, no Salão Pharus, recebeu 2.600 propostas de filiação ao partido, alem de 500 de ingresso nas
Tropas de Assalto de Daluege. Goebbels logo organizou outra reunião, na qual um velho pastor, chamado
Fritz Stucke, foi surrado pelas Tropas de Assalto e as autoridades do hospital comunicaram seus ferimentos à
polícia. O Assistente do Comissário era um homem chamado Bernhard Weiss, um judeu culto, que proibiu
imediatamente as atividades dos nazistas em toda a Grande Berlim. A proibição, por sua vez, ganhou as
manchetes dos jornais, resultando em boa publicidade para Goebbels, além de enriquecer a linha da
caricatura mordaz que Hitler histericamente traçou no Mein Kampf do arquétipo do judeu e que Goebbels
fez questão de servilmente conservar na sua propaganda partidária. Mais tarde, porém, revelou-se que o
Pastor Stucke havia-se afastado de sua igreja por causa do alcoolismo crônico e que na verdade não era um
democrata, e sim pró-nazista. (Mais tarde ele foi recompensado pelo partido com um cargo a ser exercido na
pequena cidade de Koeslin, onde poderia beber até morrer.)

Toda essa publicidade foi um achado valioso para Goebbels; ele estava certo, ao escolher métodos os mais
vulgares para atrair atenção. O insulto era realmente uma arma muito mais poderosa nas mãos dos nazistas
do que o elogio. O insulto podia ser torcido com mais facilidade. Ele podia ser transformado em injustiça,
inveja, vingança ou em qualquer tipo de humilhação. Desse modo, o insultado, o invejado e o ferozmente
punido podia conquistar não só simpatizantes como também seguidores.

A proibição policial apresentava como justificativa o fato de que desde a chegada de Goebbels a Berlim
vinham ocorrendo incidentes contínuos, causados sempre pelas Tropas de Assalto, choques nas reuniões e
não poucas mortes misteriosas com inferências políticas. Não há dúvida de que a polícia estava ficando
desalentada, por causa do número cada vez maior de procissões, bandeiras e desfiles com bandas tocando
música que evocavam emoções perigosas. Na tensa atmosfera emocional que se criou, Goebbels despejava
seus discursos, numa linguagem carregada de ironia e desprezo, depois de entrar dramaticamente no
momento preciso em que a platéia começava a inquietar-se. Ele era um agitador e um perturbador da paz que
à policia cabia manter. Mas, justificada ou não, a proibição foi singularmente ineficaz. Goebbels continuou
falando em reuniões "particulares", realizadas no salão dos Steigers ou nas cervejarias, com os convites
sendo feitos oralmente, não mais por meio de cartazes ou pela imprensa. Era muito simples fundar clubes
"sociais", ostensivamente para prática de esportes, jogos de salão e debates literários. Tudo o que aconteceu,
como resultado da proibição, foi que as atividades políticas do partido tornaram-se clandestinas. A parte
visível do movimento disfarçou-se de reuniões sociais.

E a proibição, que Goebbels explorou cuidadosamente, foi citada como manifestação do medo que a
República sentia diante do crescente poder do partido. Assim, segundo ele:
"Eles logo pararam de rir da nossa inflexível determinação. Começaram a nos insultar e denegrir. Quando a
perseguição e a maledicência fracassaram, eles atiraram o Terror Vermelho contra nós, mas este nos
encontrou lutando valorosamente. O adversário começou a espumar e a recorrer à anarquia e à ação
arbitrária. Agindo contra suas próprias pretensas convicções democráticas, ele proibiu nosso partido. Agora
não existimos mais - assim pensa ele. Com uma penada, um jagunço judeu pretendeu eliminar-nos da lista
das realidades. Voltamos a ser anônimos. A simples menção do nosso nome e a simples vista da Suástica
estão abalando as fundações da República. Quem dentre nós pensaria que somos tão fortes assim?"
"Negado o direito de falar", prosseguiu Goebbels, "tornou-se essencial que o partido conseguisse outra
plataforma de onde se pudesse lançar à propaganda nacional-socialista. Embora considerasse a palavra
escrita relativamente inútil, em comparação com o poder do orador, fui obrigado a recorrer a ela, ainda que
temporariamente".

Pensando na forma de apresentar a palavra escrita, decidiu Goebbels que a melhor seria através de um jornal
sobre o qual tivesse completo controle e que fosse independente do Berliner Arbeiterzeitung.
"Nunca me esquecerei que, certa noite, estávamos reunidos num pequeno grupo pensando em como se
chamaria o novo jornal. De repente eu tive uma inspiração: certamente só podia haver um nome para o nosso
jornal: Der Angriff ["O Ataque"]. O próprio nome tinha seu valor propagandístico, porque tudo o que
queríamos era atacar."

O primeiro número, publicado numa segunda-feira, 4 de julho de 1927, foi feito numa gráfica que não
dispensou à tarefa muito cuidado, já que lhe havíamos pedido um crédito de três meses. O papel absorvia
tinta como um mata-borrão. Praticamente seus únicos compradores eram membros do partido que haviam
recebido ordens de assiná-lo antecipadamente. Quanto ao seu conteúdo, dificilmente poderia ser mais vulgar.
Os cartuns eram espalhafatosos e mal desenhados; a tipografia nada concedia ao bom-gosto e o editorial era
virulento. Embora grosseiramente elaborado, o panfleto revelou-se eficaz para a causa. (Não tinha qualquer
valor noticioso e só se interessava pela política e em catar e denunciar corrupção administrativa.)

Passado um mês já O Angriff provocara confusão suficiente para repor Goebbels na berlinda. Bernhard
Weiss, Assistente do Comissário, foi violentamente atacado, tanto com palavras como pela caricatura.
Fazendo explodir o rancor à raça judia, Goebbels transfigurava Bernhard Weiss, que era judeu, num
elemento repulsivo, num vigarista, num réptil, numa aranha faminta, tratando-o sempre por Isidore, nome
que em alemão representa toda a sorte do mal. "Esta é a face da nossa pretensa democracia", dizia uma das
legendas; "maculada e destorcida pela covardia e pela hipocrisia".

"Tornamos Weiss responsável por todos os males que a policia nos causou, e nos termos mais condenáveis",
escreveu Goebbels, mais tarde, em Batalha por Berlim. Naturalmente a tática adotada pela direção do jornal
fez que contra ele surgissem interditos e ações por calúnia e difamação, que deveriam ter resultado em
sentenças de prisão contra o editor e os redatores. O fato de não ter isso acontecido subentende o medo que
havia das represálias dos nazistas, com suas Tropas de Assalto e seu grupo de espiões e conspiradores, que,
embora colocados fora da lei, eram muito ativos. O medo subjacente era, de certo modo, compreensível.
Weiss foi atacado e surrado certa noite, quando passeava sozinho, e alguns dos seus atacantes eram seus
próprios policiais, que posteriormente afirmaram tê-lo confundido com um delinqüente, no beco estreito e
mal-iluminado. Contudo, parece mais provável que o ataque tenha resultado de uma prematura transfusão de
sangue nazista para as veias policiais. De qualquer modo, Goebbels se lembraria de que nos primeiros
tempos de existência de O Angriff "meu único desejo era ver o dia em que chegaremos ao QG da Polícia,
bateremos à porta e diremos: Herr Weiss, sua hora chegou".

A hora de Weiss e de grande número de outras pessoas se aproximou ainda mais com a notícia de que haveria
eleições nacionais a 29 de maio de 1928. Para que não pairassem dúvidas quanto à linha democrática da
República, o partido nazista teve permissão de agir abertamente de novo, deixando livre o caminho para
Hitler.

A intenção de Hitler era, como sempre fora, fazer crer que a opção pelo Nacional-Socialismo parecesse mais
uma escolha livre do povo que uma imposição; e foi isto o que aconteceu, embora não sem a ajuda de muitas
circunstâncias fortuitas que colocaram o poder real ao alcance da mão do Führer. Em 1928 ele sequer tinha o
direito de concorrer às eleições para Deputado do Reich. Hitler era um apátrida, tendo renunciado à
cidadania austríaca a 7 de abril de 1925, na esperança de que a República Alemã lhe oferecesse a cidadania
alemã por serviços prestados à pátria durante a guerra. Como a contribuição que deu durante o conflito não
tivera qualquer distinção, exceto a condecoração, por méritos extremamente dúbios, com duas Cruzes de
Ferro, era pouco provável que isto provocasse, no Departamento de Naturalização, a disposição para atender
à expectativa de Hitler, e realmente não provocou. Ele tentou arrancar uma recomendação de amigos
influentes na Baviera para que lhe conferissem a cidadania alemã; mas esses amigos ou eram menos
influentes do que ele supunha, ou menos amistosos. Contudo, a representação potencial nazista no Reichstag
era suficientemente simples para dar um jeito de indicar alguns dos seus favoritos para as eleições. Goebbels
foi uma das primeiras escolhas do Führer.
Isto colocou o Gauleiter de Berlim numa posição que seria embaraçosa para qualquer outra pessoa. Há meses
Goebbels vinha atacando o Reichstag em artigos publicados em O Angriff.

"Há grandes saguões para facilitar a digestão, cheios de longas fileiras de cadeiras de braços estofadas que
oferecem excelentes oportunidades para uma soneca. Usar o termo soneca é ser muito moderado; se
chegamos ali à tarde, ouvimos o ressonar coletivo e satisfeito dos deputados. Os representantes do povo
alemão estão sempre descansando do extenuante trabalho realizado pela pátria."

Caracteristicamente, ele justificou a guinada que teve de dar com agressiva confiança.

"Entraremos no Reichstag para nos abastecermos no Arsenal da Democracia com suas próprias armas. Nós
nos tornaremos deputados do Reichstag para mudar o modo de pensar de Weimar com o apoio de Weimar. Se
conseguirmos plantar no Parlamento sessenta ou setenta dos nossos agitadores e organizadores, então o
próprio Estado equiparará e pagará a nossa máquina de combate. Qualquer um que seja eleito para o
Parlamento está acabado, se pretende ser apenas um parlamentar. Mas se, com seu arrojo inato, preservar na
luta implacável contra o crescente aviltamento da nossa vida pública, então ele não se transformará num
parlamentar apenas, mas continuará sendo o que é - um revolucionário...
Nós, que temos pregado, centenas, milhares de vezes; a mensagem de fé numa nova Alemanha... Nós não
pedimos apenas votos, exigimos e esperamos convicção, devoção e paixão. O voto não passa de um
expediente, para vocês e para nós. Pouco ligamos se construímos uma esterqueira fedorenta, porque estamos
na disposição de limpar o esterco."

Havia 500 cadeiras no Reichstag, e se Goebbels estava esperando seriamente conquistar 60 ou 70 delas, não
demoraria a desiludir-se. De um eleitorado de 30 milhões os nacional-socialistas conseguiram somente
800.000 votos, 50.000 dos quais foram conquistados em Berlim - aparentemente graças aos esforços de
Goebbels como Gauleiter. Embora pequena a votação conseguida, os nazistas conquistaram 12 lugares no
Reichstag - um dos quais coube a Goebbels. "Agora o espetáculo pode começar" escreveu ele.

... e continua
Em Hamburgo, durante a noite daquele dia de eleições, 20 de maio, várias pessoas, nas ruas e em suas
próprias casas, foram vítimas de um vapor esverdeado que se abateu sobre a cidade e só se dissipou às
primeiras horas do dia seguinte, graças a um vento fortuito que começou a soprar da baia para o interior. Nos
hospitais para onde foram levados os atingidos, o vapor entrando pelas janelas também fez que médicos e
enfermeiras desmaiassem de náuseas. Houve, ao todo, 28 casos de morte.

Os que participaram da guerra identificavam facilmente o vapor: era gás de cloro, ou algo estreitamente
relacionado com ele. Investigações revelaram que ele havia escapado de cilindros existentes numa fábrica de
motores navais situada próximo das docas. No inquérito realizado, afirmou-se que os cilindros de cloro
haviam sido estocados para ser usados como alvejante, mas vários jornais liberais sugeriram claramente que
ele vinha sendo armazenado com a finalidade de ser aplicado em guerra química. "Contra quem?"
indagavam. "O Tratado de Versalhes pode ser um documento injusto, sob alguns aspectos, mas a proibição
que estabelecia para o uso dos gases, em qualquer forma, exceto para fins industriais, é sensata."

Naturalmente, os comunistas tentaram aproveitar-se do acontecimento, apresentando provas muito mal


engendradas, para afirmar que os nazistas praticavam o terrorismo. Por sua vez, Goebbels teceu uma
tapeçaria maravilhosa de mentiras destinadas a "Somente uma Alemanha forte pode convencer - e em
numerosos casos convenceu - os indecisos de que os comunistas estavam importando, em sacos de milho,
não só cloro e outros gases irritantes, como também ratos inoculados com a peste bubônica que seriam soltos
contra as multidões, a menos que os nazistas, conquistando o poder, pudessem impedir esses cometimentos
desumanos.

A prova apresentada por Goebbels em apoio da sua acusação não teria, por si só, convencido um ingênuo
menino de cinco anos, mas, revestida da linguagem insolente do Gauleiter, atraiu atenção. Seguiram-se,
como seria de prever, várias ações judiciais contra O Angriff, terminando todas em pesadas multas impostas
ao redator e editor. Porém, se anteriormente à sua eleição para deputado Goebbels não pagara as multas a que
fora condenado, eleito, com imunidade parlamentar para alegar, é que não pagaria mesmo. Desse modo, nem
Goebbels, nem os que com ele injuriavam os comunistas e os partidários de agremiações políticas que
pudessem constituir obstáculo à caminhada dos nazistas cumpriram sentenças de prisão. Aliás, nunca
ninguém explicou satisfatoriamente a presença do cloro. Certo que na forma de gás ele não poderia ser
destinado a uso como alvejante. Apesar disso, a questão estava mesmo fadada a cair no esquecimento.

A cadeira de Goebbels no Reichstag assegurava-lhe que suas palavras seriam ouvidas por toda a Alemanha.
Ele permaneceu como Gauleiter de Berlim, mas gradativamente foi-se transformando em figura nacional.
Para sua imensa alegria, a 9 de janeiro de 1929, Hitler reorganizou seu "gabinete". Gregor Strasser, ainda
muito útil para o Führer para receber o tratamento que lhe estava reservado, foi nomeado Chefe da
Organização - posto que era virtualmente o de subcomandante do partido - e Goebbels recebeu o cargo que
ocuparia até a queda do Terceiro Reich: Diretor de Propaganda do Reich.

Em sua tarefa agora oficial, ele tinha autoridade absoluta e tirou disso bom proveito. Ele compartilhava (ou
imitava) do desprezo de Hitler pelas massas como este a apresentara no Mein Kampf.

"O poder receptivo das massas é muito limitado e a capacidade de compreensão que revelam é fraca. Por
outro lado, esquecem muito depressa. Sendo assim, a propaganda eficaz é aquela que se limita a uns poucos
elementos essenciais e estes devem ser expressados, tanto quanto possível, em fórmulas estereotipadas. Esses
lemas devem ser repetidos persistentemente, até que o último indivíduo tenha compreendido a idéia
apresentada. Se este princípio não for seguido, e se se tentar fazer abstração ou generalizar, a propaganda
será ineficiente, pois o público não poderá digerir ou guardar o que lhe é oferecido. Portanto, quanto maior o
escopo da mensagem, tanto mais necessário se torna descobrir o plano de ação psicologicamente mais
eficiente."

Goebbels sabia que o modo mais eficiente de fazer qualquer grande platéia aceitar uma idéia era prepará-la
emocionalmente. A aplicação da música adequada, do cerimonial certo, da solenidade e do ritual
convenientes predisporiam qualquer platéia a aceitar qualquer mensagem. Nunca se duvidou do efeito
hipnótico dos gritos, nas reuniões, dos lemas, das canções patrióticas, dos pés em marcha rítmica, dos
holofotes caindo sobre as formações de homens uniformizados, desde que aplicados com precisão, para não
se tornarem risíveis. E ele contou com a sorte de ter como ouvinte uma nação cujo senso de humor era
reconhecidamente pesado. (O passo de ganso nazista teria sido banido dos campos de parada britânicos ou
americanos por explosões de gargalhadas.) Sendo o chauvinismo, a agressividade e o sentimentalismo
elementos dominantes do caráter alemão, fácil foi para os filósofos do Nacional-Socialismo levar o povo
germânico a aceitar a sua pregação, com freqüentes apelos à "pureza racial" e a outros papos-furados de
igual teor, bastando-lhes apenas colocar na tribuna oradores com língua bem afiada.

O próprio Hitler passou a poder falar em público, e falou, conseguindo, através do trabalho de relações
públicas cuidadosamente organizado por Goebbels, enormes platéias em lugares como o "Sportpalast" de
Berlim. "Aceitei como único objetivo", escreveu o novo Chefe da Propaganda, mais tarde, com
espalhafatoso cinismo, "martelar na cabeça das massas estúpidas a aceitação de Hitler como o deus da
Alemanha que despertava".

Mas reuniões como as do "Sportpalast" não passavam de ensaios para os fantásticos congressos de
Nuremberg, aos quais Goebbels passou a dedicar-se com especial atenção a partir de 1929.

As reuniões do partido já se realizavam desde 1923, quando nazistas e ociosos se reuniram em Munique para
ouvir críticas contra a odiada República de Weimar e para iniciar uma cerimônia que se tornou característica
de todo o Parteitag - a Consagração das Bandeiras. Esse ritual começava com enfadonha explicação feita por
Hitler do simbolismo do vermelho, do preto, do branco e do desenho da suástica, com uma exortação para
que todos os que serviam sob o estandarte do partido jamais o abandonassem, exceto na morte, e nunca
permitissem que qualquer judeu ou marxista o insultasse. Depois disso, havia um desfile de Tropas de
Assalto carregando a floresta de bandeiras da suástica para a "consagração" solene por Hitler, que
permanecia imóvel, com seu braço estendido na saudação nazista.

A idéia das reuniões partiu de Julius Streicher, um pervertido, imbecil e sádico, que foi um dos primeiros
seguidores de Hitler e que colaborou com o governo local, Willy Liebel, na organização da primeira delas,
realizada em Nuremberg. (Munique e Weimar foram os outros locais.) Streicher, como Goebbels, tinha uma
aptidão natural para a organização, apesar do consideravelmente baixo nível de inteligência que possuía;
além disso, sua vocação para o melodrama era altamente desenvolvida. Contudo, a partir de 1929, Goebbels
tomaria a si a organização das reuniões e centralizaria a atenção do mundo em Nuremberg, como o ponto
focal das atividades dos nazistas.

Tendo conseguido o cobiçado cargo de Diretor de Propaganda do Reich, ele voltou-se de pronto para uma
análise da propaganda das outras nações na guerra moderna, da qual a claramente mais bem sucedida era a
aperfeiçoada pelos britânicos na guerra de 1914-1918 com a Alemanha. Goebbels referia-se
desdenhosamente à "maneira maluca como os ingleses reuniam em livro que qualquer um podia ler os seus
segredos e teorias sobre como influenciar o inimigo".

O livro a que ele se referia versava sobre a teoria e a prática da propaganda britânica sob a direção de Lorde
Northcliffe, de agosto de 1918 até o Armistício. O trabalho foi escrito por Sir Campbell Stuart, membro de
uma das comissões de Departamento de Northcliffe, e publicado em 1920 com o curioso título de Segredos
da Casa Crewe - A Casa Crewe era a sede do Departamento, na Rua Curzon, Mayfair (residência londrina do
Marquês de Crewe).

Naturalmente não havia nada de maluco na publicação do livro, que não revelava mais do que poderia
descobrir sozinho qualquer estudante de propaganda, demonstrando Goebbels muita ingenuidade, levando-o
tão a sério. Era um livro popular, que procurava satisfazer a curiosidade do público em torno do serviço de
"Inteligência". O Segredos da Casa Crewe não era um documento particularmente emocionante, mas
continha uma exposição ponderada do propósito da propaganda e uma análise sagaz do fracasso dos alemães
em compreendê-la durante a guerra do Kaiser.

A propaganda consiste, segundo Stuart, na apresentação de um caso de maneira tal que possa influenciar
pessoas. No tocante ao seu uso contra qualquer inimigo, o assunto tratado não deve ser claramente
propagandístico. Excetuando-se circunstâncias especiais, a origem deve ser completamente oculta. Em geral
também é conveniente ocultar os canais de comunicação".

A criação de uma "atmosfera" favorável é o primeiro objetivo da propaganda. Até que se produza esse efeito
psicológico (resultante de acontecimentos militares, de atividade propagandista ou de descontentamento
político interno), a mentalidade das tropas e da população civil inimigas - e ambas são igualmente
importantes na guerra moderna - será naturalmente indiferente e insensível à influência. Para se produzir essa
"atmosfera" de receptividade e suscetibilidade, é indispensável a continuidade da política de propaganda. Isto
pressupõe a definição de um plano de ação firme, baseado no conhecimento amplo da situação política,
militar e econômica, e também da psicologia do inimigo.

"As operações reais de propaganda só podem começar depois que se estabeleceu um plano de ação, não
antes. O mais importante axioma da propaganda é que só se pode fazer declarações verídicas."

Goebbels comentou depreciativamente sobre esse axioma, o que não é de surpreender, já que ele se dedicara
à importância da mentira. "Dizer a verdade em questões de propaganda", escreveu ele, "é tão estúpido que só
se pode concluir que o livro todo não passa de monstruosa "frente" erguida por Northcliffe para ocultar seus
próprios erros ou então que os britânicos nos consideram muito ingênuos. Há certa verdade no que Stuart diz
sobre o conhecimento da psicologia do inimigo. Mas estou mais interessado na psicologia da nossa própria
raça".

E estava. E como não havia ainda inimigos militarmente ativos fora da Alemanha, ele se concentrou
exclusivamente na maneira de incutir nos receptivos crânios dos seus concidadãos os princípios da filosofia
nazista através de lemas, canções e discursos.

Lemas em abundância se despejariam da sua pena: Lebensraum! Sangue e Solo! Os Judeus são a Desgraça
da Alemanha! Povo sem Espaço! Todos eles vieram a produzir impacto, mas o primeiro foi o mais famoso:
Deutschland, erwahe! - Alemanha, desperta! Esta, como a maioria das frases que lançou, foi tirada de obras
de outras pessoas - obras que, é de se reconhecer, não causaram muito impacto. O grande talento de
Goebbels, como propagandista, era para adaptar as frases que encontrava no decorrer de sua extensa leitura
aos interesses do credo nazista. O Deutschland, erwahe! tornou-se tão freqüente, nas bandeiras e tapumes,
nos jornais e transmissões radiofônicas, que se transformou numa saudação tão casual como "bom dia", mas,
ao contrário da saudação tradicional, ela expressava idéia de ação - "ela soa como um tambor na consciência
das massas", como disse Goebbels.
Houve também o caso de Horst Wessel, que Goebbels transformou engenhosamente num festival nacional do
martírio. Horst Wessel foi um dos que ingressaram entusiasticamente no partido depois do caso do Salão
Pharus. Era filho de um pastor luterano, louro, espadaúdo, com a pinta agradável de um vida-limpa. Na
verdade, porém, era brutal, amoral e estúpido. Wessel ingressara no partido vindo do Freikorps e Goebbels
encarregou-o de um pelotão de Tropas de Assalto e mais tarde o treinou como orador para encorajar a
filiação à organização da Juventude Hitlerista, vendo nele, acertadamente, o tipo de herói superficial que os
jovens admiram. Contudo, Wessel meteu-se com uma prostituta chamada Erna Jaenicke e se desinteressou do
partido, que para ele representava pouco mais que a oportunidade de satisfazer-lhe a queda para a
brutalidade, surrando pessoas nas reuniões de Goebbels. Ele descobriu que poderia viver com mais conforto
e ociosidade tornando-se gigolô de Erna e às suas custas viveu durante três anos. Todavia, ele tinha um rival
no gigolô anterior de Erna, um tal de Ali Hoehler que, a 14 de janeiro de 1930, durante uma briga na casa de
Erna disparou um tiro na boca de Wessel.

Goebbels imediatamente emprestou ao fato, apenas sórdido, a significação de um martírio político,


apregoando que "o herói do Reich que despertava" fora fuzilado por acreditar no futuro da Alemanha sob
Hitler, e que Hoehler era "um comunista imundo". (Na verdade, Hoehler também era nazista, mas o
reconhecimento deste fato ou de quaisquer outros detalhes da associação entre Erna e os dois gigolôs
dificilmente teria ajudado a história.) Wessel permaneceu no hospital durante três semanas. Goebbels o
visitava diariamente e criava nas colunas de O Angriff uma imagem fortemente colorida do herói moribundo.
Ele morreu a 23 de fevereiro de 1930 e teve um funeral público no qual Goebbels pôs em execução a
brilhante idéia de fazer a chamada das Tropas de Assalto reunidas e ordenar-lhes que respondessem
"Presente!" quando o nome de Wessel fosse chamado. Essa patuscada, de grande efeito emocional, foi
apoiada pelo canto da canção de Horst Wessel - versos que Wessel havia mandado para O Angriff e que
foram adaptados a uma canção popular. Foi a primeira apresentação da canção que se transformou no hino
nazista.

Assim, com a percepção da psicologia da sua platéia, ele por assim dizer pôs a máquina da propaganda em
regime de dedicação exclusiva da criação da mentira. Daí por diante, a única preocupação de Goebbels foi
com a invenção do perjúrio emocional, espiritual e intelectual.

Termina o primeiro ato


A Goebbels, mais que a qualquer outro - inclusive o próprio Hitler - deveu-se a retumbante vitória que os
nazistas conquistaram nas eleições de setembro de 1930 para o Reichstag. "Eu aumentarei a representação do
partido de 12 para 40 cadeiras". declarou ele, e começou uma campanha que, na verdade, era uma extensão
das reuniões de Nuremberg por todo o país. Ele escolheu e treinou para falar em público mais de 200
membros, reunindo-os num grupo de instrução em Munique e falando-lhes, na sessão inaugural, sobre o
papel do propagandista:
"O propagandista tem de construir sua própria verdade. O que for útil ao progresso do partido é verdade. Se
coincidir com a verdade real, tanto melhor; se não coincidir, será preciso fazer adaptações. A grande e
absoluta verdade é que o partido e o Führer estão certos. Eles sempre estão certos."

Com esta declaração, ele os fez freqüentar um curso intensivo de oratória que os mantinha ocupados durante
doze horas por dia. Em seguida, foram despachados em todas as direções para o proselitismo em reuniões
públicas, nas fábricas, nos estaleiros e escritórios e onde quer que pudessem, pelo método insidioso da
chantagem - pois já então Heinrich Himmler voltara à casa nazista e seus dossiês de informações pessoais já
se estavam multiplicando. O resultado da campanha de Goebbels foi um aumento na representação nazista
não de 12 para 40 cadeiras, mas de 12 para 107. Os nazistas alçavam-se assim à condição de segundo poder,
sendo superados somente pelo Partido Católico de Centro, de Heinrich Brüning.

"O Führer'', escreve Goebbels em seu estilo emocional corriqueiro, "enviou-me rosas vermelhas e abraçou-
me. Ele é meu começo e meu fim. Uma das estrelas cintilantes da História. Ele me deixa sem energia com
sua gratidão e lanço-me novamente no abismo da ação".

Nesse tempo Goebbels lançou-se não só "no abismo da ação" como também no casamento. Seus casos
amorosos, desde as paixões juvenis inspiradas por Anka Stahlhern e Else Taub, haviam sido numerosos, mas
superficiais (um deles fora a sedução da bonita empregada dos Steigers) e não eram mais satisfatórios do que
as visitas que fazia freqüentemente aos cabarés-bordéis de Berlim. Mas, pouco depois da vitória nazista ele
conheceu Magda Quandt.
Magda era a atraente filha de um professor de línguas orientais chamado Rietschel; fora educada num
convento belga e falava fluentemente três línguas, além da sua. A mãe se divorciara do pai por considerar
pequenas as recompensas financeiras que um professor universitário lhe podia oferecer. Posteriormente
casou-se com um rico negociante judeu, Jakob Friedländer, que descobriu que sua paixão por dinheiro era
mais do que ele podia suportar. Dando-lhe algumas propriedades e uma pensão vitalícia, escapou "antes que
todo o dinheiro que ganho desapareça pelos bolsos sem fundo dessa mulher encantadora mas gananciosa".
Frau Friedländer, a seguir, casou-se com outro homem de negócios, Christian Behrendt, de quem também
acabou por se divorciar em troca de uma pensão principesca. Assim é que Magda tinha uma formação de
instabilidade moral e segurança financeira.

Em 1919, ela conheceu - segundo alguns, num trem, quando de volta da escola de aperfeiçoamento - um rico
industrial, chamado Gunther Quandt. Ele tinha 40, anos, era divorciado e possuía dois filhos, Herbert e
Helmut. Magda estava com 19 anos, mas gostava demais das exterioridades do luxo para resistir a tudo o que
Quandt lhe podia oferecer. Casaram em janeiro de 1921 e foram morar no elegante bairro de Babelsberg, em
Berlim. Em novembro ela deu um filho a Gunther, a quem chamou de Harald, e poucos meses depois
Gunther deu-lhe um flagrante de adultério com seu filho Herbert. Contudo, ela conseguiu convence-lo de que
Herbert lhe implorara para que o amasse "porque sabia que não demoraria muito neste mundo" - e realmente
não demorou. porque morreu de peritonite pouco depois. Mas não foi tão fácil convencê-lo de que uma outra
ligação amorosa que manteve com o estudante de música Ernst Wieser se verificara por compaixão. Em
lugar de suicidar-se, como seria conveniente. Ernst a perseguiu implacavelmente e, depois de algumas cenas
melodramáticas, o enganado Gunther declarou que se divorciaria dela, sem lhe dar um tostão de pensão.

Magda enfrentou esta situação ameaçadora muito bem. Ela sabia que Gunther era culpado de sonegações do
imposto de renda e descobriu os papéis pertinentes em sua mesa. Com esses documentos funcionando como
uma ameaça igualmente poderosa contra ele, Gunther sucumbiu à chantagem de Magda e concordou em
livrar-se dela pelo pagamento de 50.000 marcos e de uma pensão mensal de 4.000 marcos, mais um
apartamento, livre de despesas, na Reichskanzlerplatz. Esse arranjo satisfatório foi celebrado em 1929, e daí
por diante Magda passou a viver a vida de rica divorciada. sem quaisquer outras responsabilidades além das
que tinha para com seu filho Harald, que estava sob sua custódia. Seus amantes eram escolhidos com
discrição e manobrados com habilidade. Ela continuou seu caso amoroso com Ernst Wieser e,
concomitantemente, formou várias ligações socialmente vantajosas - incluindo uma com o sobrinho do
Presidente Herbert Hoover, na época em missão diplomática em Berlim. Essas ligações sofisticadas lhe
ocupavam as noites; os dias eram passados em atividades menos excitantes, inclusive o trabalho voluntário
na sede do partido, em Berlim. Ali, um jovem amanuense tentou conquista-la e ela decidiu afastar-se. Mas o
afastamento não era coisa simples. Os regulamentos exigiam uma entrevista com o Gauleiter -
provavelmente algum tipo de lavagem cerebral - antes que pudesse partir, levando consigo os segredos de
que tomara conhecimento. Na verdade, seu trabalho era apenas o controle do material de escritório e foi fácil
convencer Goebbels de que não estava interessada em política, e muito menos em espionar para a oposição
ou intrometer-se. Foi igualmente fácil para ele convencê-la de que admirava sua beleza, inteligência e
posição social. Ofereceu-lhe um cargo muito mais importante no partido, o de "encarregada dos arquivos
particulares, onde você não será incomodada por atenções desagradáveis".

As suas atenções para com ela estavam longe de ser desagradáveis, mas por algum tempo ele se manteve
meio reservado, para não lhe dar a impressão de ser tão vulgarmente impetuoso quanto o amanuense que lhe
passara a mão nas pernas. Sua abordagem era intelectual: "Eu sabia muito bem que, vivendo a vida vazia de
uma divorciada na sociedade, ela não tinha muito com que ocupar o espírito e que aceitaria de bom grado um
estímulo mental". O estímulo que ele lhe deu foi, naturalmente, o nazismo. Ele a apresentou a membros
escolhidos do partido e encorajou-a a participar das discussões. Tanto quanto se sabe, não fez dela sua
amante; ele teria sido incapaz de não mencioná-lo em seu diário. O método que preferiu adotar foi
permanecer fugidio e continuar seu estímulo intelectual - "e ela se mostra uma aluna capaz", confiava ele ao
seu diário. "Tanto que decidi apresentá-la a Hitler, pois na sua presença ela cintilará com o brilho do seu
amor pela doutrina."

E estava certo. Em janeiro de 1931 ele arranjou um encontro em seu apartamento de Steglitz e Magda pôde
citar copiosamente trechos do Mein Kampf - para satisfação do Führer, que respondeu com encanto untuoso
e muita adulação e beija-mão. Como Goebbels, Hitler era altamente suscetível à adoração feminina e
qualquer coisa além de uma saudação polida ele considerava como atenções desvairadas. Ele disse a
Goebbels que a conquista de Magda provava que os membros da classe alta (dieoberen Klassen) estavam
mudando gradativamente para a aceitação da filosofia nazista. (Naturalmente, Magda só era considerada de
sociedade por causa da condição econômica; sua formação era essencialmente de classe média.) Quando
Goebbels lhe disse que estava pensando em casar com Magda, Hitler ofereceu-se imediatamente para ser o
padrinho.

A família e os amigos de Magda fizeram muita oposição ao casamento. Seu pai tachou Goebbels de
individuo sem linha; Quandt advertiu-a de que ele era um escroque político e sua mãe disse que ele não
passava de uma caricatura de homem. Ignorando todos os comentários e as violentas ameaças do seu amante
estudante, Ernst Wieser, Magda casou com Goebbels a 12 de dezembro de 1931. Ela desejava consorciar-se
na Igreja e, para tanto, Goebbels escreveu ao Cardeal-Arcebispo solicitando uma dispensa especial, em vista
da condição de divorciada de Magda. Mas, não concedida a licença, o casamento realizou-se apenas no civil,
numa propriedade de Gunther Quandt, em Mecklenburg, e Hitler manteve a promessa de ser o padrinho.
Mais tarde, Goebbels escreveu uma carta insultuosa ao Cardeal, dizendo que vivera toda a vida sem as
bênçãos da Igreja e continuaria assim, deleitando-se em sua blasfemia. O Cardeal nada lhe respondeu, mas a
Sociedade Albertus Magnus passou a insistir para que Goebbels lhe reembolsasse o dinheiro que ele tomara
emprestado para completar sua educação. O reembolso dessas quantias havia sido ignorado com o passar dos
anos, com Goebbels opondo-se com unhas e dentes à devolução, demonstrando ressentimento contra as
justas reivindicações da Sociedade. Além disso, a desesperada atividade necessária para levar o partido ao
poder, através da infâmia, da ameaça e da intriga, não lhe deixava muito tempo para preocupar-se com
intimações como as que vinha recebendo.

O ano de 1932 foi o mais crítico que os nazistas experimentaram. Apesar da representação enormemente
aumentada no Reichstag, que haviam conseguido como resultado da campanha desenvolvida por Goebbels
em 1930, o caminho para a conquista do seu objetivo não era nada fácil. A Constituição alemã previa a
realização de cinco pleitos durante o ano, dois para a presidência da República e três para a representação
estadual e para o Reichstag. Hindenburg, o Presidente, já com quase 85 anos de idade, embora fosse uma
personalidade respeitada, por causa de Tannenburg e de suas realizações com Ludendorff em 1916, - estava
mental e fisicamente fraco. Na primeira eleição, em março, ele não conseguiu obter maioria decisiva contra
Hitler, a quem Goebbels convencera a "testar o prestigio junto ao povo alemão candidatando-se à
presidência". Mas quando a batalha se repetiu, a 10 de abril, verificou-se que a posição de Hitler diminuíra,
pois dessa vez Hindenburg conseguiu fazer maioria absoluta, recebendo mais de 50% dos votos apurados.
Dois meses depois ele demitiu o Chanceler Brüning e o substituiu por Franz von Papen, que dirigiu o que
veio a ser conhecido como "o governo dos magnatas".

A administração von Papen recebeu todo o peso da ira de Goebbels em seus discursos políticos. Ele disse às
100.000 pessoas que se acotovelavam no Lustgarten: "Quero que o povo alemão julgue os últimos quatorze
anos de vergonha, de decadência e humilhação política... Verificou-se alguma mudança nas últimas semanas?
Nenhuma, além da troca de caras dos que governam. A situação econômica continua péssima. O novo
governo não iniciou nenhum programa de obras públicas. A miséria está aumentando e os famintos não
sabem mais de onde virá a próxima refeição...

Essas palavras praticamente não tinham qualquer originalidade ou tino. A surrada fraseologia bem poderia ter
partido de qualquer político em busca de poder para o seu partido. Mas Goebbels sabia o que estava dizendo.
Hitler não escrevera que "O poder receptivo das massas é muito limitado"? As sutilezas eram inúteis; quanto
mais vulgar a mensagem, tanto mais provável que as massas a compreendessem. E realmente parecia que
elas haviam compreendido, porque depois de uma campanha ciclônica - durante a qual os diários de
Goebbels ficaram cheios de frases como "Trabalhamos de pé, andando, dirigindo e voando... Estou vencido
pelo cansaço... cheguei às duas horas da manhã, discuti assuntos prementes do partido até às quatro, tomei o
trem para Berlim às seis... - houve outra vitória esmagadora para os nazistas, nas eleições de 31 de julho.
Passaram a contar com 230 cadeiras no Reichstag, colocando quase 100 à frente dos seus rivais mais
próximos, os social-democratas. Como partido majoritário, o Nacional-Socialista tinha o privilégio de eleger
um líder do Reichstag. Por indicação de Hitler, Goering elegeu-se líder do órgão a 30 de agosto, enquanto
que ele se reservava o direito de sonhar mais alto, de ser Chanceler da República ou talvez Presidente. "Sem
o poder supremo", escreveu Goebbels, "o Führer não pode controlar a situação. Aquele hipócrifa e
incompetente von Papen ofereceu-lhe a Vice-Chancelaria e, naturalmente, o Führer a recusou
desdenhosamente. Como poderia um salvador da Alemanha ser segundo-violino de um primeiro
desafinado?"
Von Papen era de fato um homem obtuso, mas muito astuto. Ele influenciara a queda de Brüning pela intriga
e, pensando na vantagem pessoal, maquinou a admissão de nazistas no seu gabinete. Por breve instante Hitler
teve esperanças de assumir o domínio, mas também foi desapontado. Ele foi chamado à presença de
Hindenburg a 13 de agosto e, recebido com gélida calma, ouviu deste a recusa peremptória em entregar a
Chancelaria ao dirigente de um partido de que só se ouviam intrigas e violência. O Presidente não tinha
muito respeito por Papen, mas deixou bem claro que respeitava Hitler menos ainda e que, na sua opinião, dar
a Hitler o poder que exigia seria dar "um dia agourento ao povo alemão".

Hitler retirou-se furioso. Não lhe haviam oferecido sequer uma cadeira para sentar-se durante a entrevista e,
pior ainda, sua arenga empolada desfez-se na fria dignidade do Presidente. Ele viajou imediatamente para o
seu retiro, em Obersalzburg, para meditar e tramar, enquanto Goebbels partia para uma semana de repouso
na costa do Báltico.

Nas conspirações subseqüentes, entre os líderes do Partido Centrista, os banqueiros e industriais, o Ministro
da Defesa, General von Schleicher, Papen e o próprio Hitler, Goebbels não desempenhou nenhum papel
importante. Por natureza, ele não era um conspirador, no sentido maquiavélico do termo. Sua continuou
sendo a tremenda tarefa de convencer a nação alemã. Numa época em que havia milhões de desempregados
e em que a fome mais e mais alargava a sua terrível sombra, os nazistas acenavam com o poder mágico de
mudar tudo. Os distúrbios provocados pelas Tropas de Assalto e os assassinatos tramados e consumados
pelas SS haviam angariado muita publicidade para o partido, mas havia sinais de que os discursos
intermináveis e a propaganda viciosa contra toda oposição estavam começando a ser prejudiciais. Houve
outra eleição, em novembro, de que resultou retumbante derrota para o gabinete Papen, por causa da sua
impopularidade pessoal. Dessa vez, como Goebbels temia, os nazistas recolheram menos 2 milhões de votos,
o que representou a perda de 34 cadeiras no Reichstag. Pior ainda, pôs em evidência que os comunistas
estavam ganhando terreno, pois haviam recebido cerca de 6 milhões de votos.

Goebbels concentrou imediatamente as suas energias no combate à ameaça comunista. Os industriais que
apoiavam o partido - que incluíam I. G. Farben e Thyssen, enquanto Krupp se mostrava já meio inebriado
pela suástica e não demoraria a alinhar-se - eram os mais vulneráveis à infiltração bolchevista e Goebbels
cuidou para que não se passasse um dia sem que fossem instados a decidir depressa entre o fim da empresa
capitalista sob os comunistas e a promessa de recuperação industrial sob Hitler. A escolha não era nada
animadora.

Gustav Krupp, o chefe da grande firma de armamentos, detestava Hitler e era um dos magnatas que
apoiavam Papen e Schleicher, começou a dar sinais de hesitação ante a insistente propaganda de Goebbels e
as manobras de Hitler, vindo a convencer Hindenburg de que Papen teria de renunciar; mas nem ele nem
seus colegas, os demais capitães da indústria, conseguiram convencer Hindenburg de que Hitler deveria ser
nomeado Chanceler. Em vez disso, o Presidente chamou Schleicher e a 2 de dezembro nomeou-o Chanceler,
para que "aquele cabo austríaco arrivista" ficasse de fora.

"À medida que o ano de 1932, pleno de lutas, se aproximava do fim", diz William Shirer, "Berlim andava
cheia de conspirações. Além das de Papen e Schleicher, no palácio presidencial também conspiravam o filho
de Hindenburg, Oskar, e seu Secretário de Estado, Meissner. No Hotel Kaiserhof, Hitler e sua gente
maquinavam a tomada do poder, mas também uns contra os outros. As teias da intriga em breve ficaram tão
emaranhadas, que por volta do Ano Novo de 1933 os conspiradores já não sabiam ao certo quem traía
quem".

No torvelinho dessas conspirações, o Presidente decidiu, a 28 de janeiro de 1933, demitir Schleicher, que
mais tarde disse amargamente: "Estive no poder 57 dias e fui traído 57 vezes em cada um daqueles dias".

Dois dias depois, enroladamente enredado na trama da intriga, o Presidente nomeou Chanceler do Reich
Alemão o homem que desprezara até então. Finalmente Hitler alcançou o poder.

Apenas três semanas depois, Goering, como líder da câmara, convidou os principais industriais, que há anos
vinham despejando dinheiro no Partido, mas que foram retirando gradativamente o apoio quando
compreenderam que Hitler representava a ameaça de ditadura de extrema direita, para uma conferência na
qual Hitler exporia a linha de sua política. William Manchester registra a cena em The Arms of Krupp:
"Os convidados sentaram-se em cadeiras de braço cuidadosamente arrumadas. Krupp, devido à riqueza que
possuía e por ser presidente da Reichsverband [Confederação Nacional], estava mais próximo da tribuna;
atrás dele, quatro diretores da I. G. Farben e Albert Vögler, diretor da poderosa Vereinigte Deutsche
Stahlwerke [Associação de Siderúrgicas Alemães]. Goering, abrindo a reunião, apresentou seu líder aos que,
como Krupp, o estavam vendo pessoalmente pela primeira vez. Então o Chanceler levantou-se: "Estamos
prestes a realizar a última eleição", começou, e fez uma pausa para que todos compreendessem plenamente
as inferências disso. Naturalmente, a transição para o Nacional-Socialismo seria facilitada se o partido
conquistasse maioria esmagadora. Portanto, ele pedia o apoio daqueles homens. Apoiando a ditadura, eles
estariam apoiando a si mesmos. "A empresa privada não pode sobreviver numa democracia." Para esclarecer
as dúvidas que tal afirmação pudesse suscitar, ele acrescentou que entre as "moléstias que esse regime
político faz que surjam inclui-se o sindicalismo". À mercê de tal instituição, o Reich "inevitavelmente cairá".
A grande preocupação da liderança consistia em encontrar ideais que unissem o povo alemão e ele
encontrara esses ideais no nacionalismo e na força da "autoridade e da personalidade". Garantindo-lhes que
varreria do país a ameaça comunista, afirmou que devolveria à Wehrmacht a sua antiga glória."

Evidentemente, o prestígio recém-adquirido por Hitler como Chanceler e a sua extraordinária personalidade
fizeram pender a balança. Krupp foi o primeiro a oferecer um milhão de marcos para os fundos do partido;
outros dois milhões foram prometidos pelos industriais ali presentes. Goebbels exultava. Havia apenas três
meses que ele observara que o partido estava falido: "Não há dinheiro sequer para pagar os salários dos
funcionários e a conta dos impressores. A situação financeira da Gau de Berlim é desesperada - nada mais
que dívidas e obrigações". Mas, com Hitler instalado na cúpula da República, "em grande parte como
resultado da determinação com que me lancei à tarefa de gravar profundamente nos corações certos a
mensagem do partido", os problemas financeiros começavam a desaparecer.

E havia razões para ele se regozijar: sua máquina de propaganda funcionava a pleno vapor. Mas ele teve
dificuldades domésticas. Em setembro, Magda dera à luz sua primeira filha, a quem chamaram Helga. Deu-
se a febre puerperal e durante mais de três meses - Magda esteve perigosamente mal. Por duas vezes viu-se à
beira da morte, enquanto Goebbels se encontrava a centenas de quilômetros de distância, fazendo campanha.
(O próprio Hitler esteve à sua cabeceira nas duas ocasiões, mas recusou-se a permitir que qualquer notícia de
seu estado de saúde fosse comunicada ao marido, para não desviá-lo das preocupações com o partido.)
Somente na segunda semana de janeiro de 1933 é que ela ficou fora de perigo, coincidindo sua volta a casa
com a nomeação de Hitler como Chanceler. "O alegre retorno de Magda a casa", escreve Goebbels, "foi
celebrada pela marcha triunfal das massas - centenas de milhares de pessoas - desfilando pela Chancelaria e
saudando o Führer com a canção de Horst Wessel. Hora após hora não ouvimos outra coisa que não as
palavras inspiradoras:
Ergam os estandartes! Cerrem fileiras.
As SA marcham com passo firme...
Meu coração está alegre novamente, depois dos meses de ansiedade e dúvida. Desce o pano sobre uma cena
de glória. Ele se erguerá sobre o novo Reich! Heil Hitler!"

Termina o segundo ato


Apesar do otimismo de Goebbels, era evidente que a posição de Hitler permanecia ainda insegura. O ano de
1932 deixara claro que as cabeças dos Chanceleres podiam rolar tão facilmente quanto quaisquer outras. O
partido precisava de pelo menos uma maioria de dois terços no Reichstag, para legalizar a ditadura do Führer
e impedir que ele caísse tão impotente quanto Brüning, Papen e Schleicher; e os comunistas ainda estavam
muito bem representados para que os nazistas pudessem conquistar a ambicionada maioria de dois terços.
Era necessário que ocorresse algum acontecimento dramático. Como Hitler diria tão agourentamente aos
industriais a 20 de fevereiro, a próxima eleição seria a última; não haveria outra oportunidade para ele
conquistar o poder absoluto, "para o beneficio da indústria alemã". A eleição seria realizada a 5 de março.
"Antes disso", observou Goebbels, "os comunistas têm de ser derrubados".

Produzindo talvez o golpe de propaganda mais brilhante de sua carreira, Goebbels levou ao extremo da
exageração a ocorrência de um incidente fortuito com a finalidade de desacreditar os comunistas perante o
eleitorado germânico.

Na noite de 27 de fevereiro, o vazio e mal guardado edifício do Reichstag - o Parlamento Alemão - foi
invadido por um jovem holandês. Seu nome era Marinus van der Lubbe e sua ambição era livrar a Alemanha
da ameaça da ditadura de direita. Embora não fosse comunista, pois era anarquista demais para aceitar a
subordinação a um credo tão disciplinado e monolítico, entre esquerda e direita, preferia a esquerda. Ele já
fizera uma tentativa de incendiar o palácio real em Berlim, e só fracassou porque o método primitivo que
usou permitiu que o prédio resistisse ao assédio das chamas. O Reichstag se incendiaria com muito mais
facilidade. Ele se abastecera de gasolina e acendedores domésticos de parafina sólida, fazendo um rastro com
as duas substâncias por uma grande área do interior do prédio. Quando ateou fogo ao que preparara, os
móveis, o madeiramento e as cortinas se inflamaram instantaneamente, obrigando-o a fugir às pressas. O
incêndio que provocara se alastrou com tanta rapidez, que ele, confundindo-se no caminho da fuga, acabou
encontrando dois guardas do prédio. Não resistiu à prisão, sendo imediatamente entregue à polícia alemã. A
notícia do atentado e da prisão do incendiário chegou logo aos ouvidos da liderança nazista. Goebbels talvez
tenha sido o primeiro a perceber que ali estava a ocasião ansiosamente procurada para assestar a maquinaria
repressiva do estado contra a esquerda antinazista. E viu também que, de sua parte, poderia colher o material
com o que sensibilizaria a opinião moderada, fazendo-a passar decisivamente para o lado de Hitler e do
partido. A história dos acontecimentos subseqüentes está narrada em seu diário.

Na noite de 27 de fevereiro, uma segunda-feira, Goebbels convidou Hitler para jantar, com ele e Magda, às
21:00 h. Depois do jantar, a eles se juntou Heinrich Hoffman, o fotógrafo oficial do Führer. A anotação no
diário de Goebbels - palavras cuidadosamente escolhidas para a posteridade por alguém que insiste em que
"a câmara não pode mentir" - diz: "Ouvimos um pouco de música e conversamos. De repente o telefone
tocou. Era Putzi Hanfstaengl [Hanfstaengl era amigo íntimo de Hitler; sua família financiara as atividades do
partido nos seus primórdios]: "O Reichstag está em chamas!" Pensei que se tratasse de uma brincadeira
maluca de Putzi e recusei-me a comunicar o fato ao Führer. Mas outros chamados confirmaram que era
verdade. Incêndio premeditado! Imediatamente falei ao Führer e saímos apressadamente de carro pela
Charlottenaurger Strasse. Todo o prédio ardia. Passando por cima das mangueiras, chegamos ao saguão pela
porta número dois. Goering encontrou-nos no caminho e Papen também não demorou a chegar.
Naturalmente isto é obra de incendiários - um louco seminu foi preso no prédio. Não há dúvida de que os
comunistas fizeram uma última tentativa de, pelo incêndio e pelo terror, conquistar o poder durante o pânico
geral.
"Agora temos de agir.
"Goering suprime imediatamente toda a imprensa comunista e social-democrata. Oficiais do partido
comunista são presos. As SA são avisadas para ficar de prontidão, para qualquer emergência.
"Os comunistas estão muitíssimo enganados. Eles tentaram fazer-nos cair, mas, em vez disso, desfechamos-
lhes golpe mortal."

No dia seguinte, Hitler não teve dificuldades em convencer Hindenburg a assinar um decreto de emergência,
"como medida defensiva contra os atos de violência dos comunistas que ameaçavam o Estado". Na verdade,
esse decreto marcou o começo do estado policial nazista legalizado. Ele autorizava restrições à liberdade
individual, ao direito de livre expressão e de opinião, incluindo a liberdade de imprensa e o direito de reunião
e associação. Também autorizou a violação do sigilo das comunicações postais, telegráficas e telefônicas e
concluía agourentamente: "Os mandados de busca nas casas e ordens para o confisco de propriedades
também são permissíveis além dos limites legais prescritos em outras circunstâncias". Visivelmente como
produto de uma reflexão tardia, um adendo autorizava a aplicação da pena de morte, através de julgamento
sumário, "a qualquer pessoa armada que esteja perturbando a paz".

Este decreto permitiu que Hitler prendesse, aprisionasse ou executasse virtualmente todos os que se lhe
opunham - e, como Goebbels registra afavelmente em seu diário, ele fez "Prisões e mais prisões. Agora a
peste vermelha está sendo completamente eliminada. Não há sinal de resistência em parte alguma. Os
adversários parecem tão avassalados pela ação enérgica que desenvolvemos que não se atrevem mais a
resistir". Como a "ação enérgica" representava incursões contra milhares de residências, escritórios e
fábricas, feitas pelos homens das Tropas de Assalto, que prendiam e torturavam brutalmente qualquer um
contra quem fosse possível imputar a acusação de "se opor ao Führer e à Glória do Reich Alemão", não é de
espantar que Goebbels pudesse usar a frase "não há sinal de resistência em parte alguma". Da mesma forma,
como todos os jornais e reuniões públicas dos comunistas e de outros adversários foram proibidos, também
não era de esperar que houvesse muita resistência nos meios de comunicação. Como só os nazistas e pró-
nazistas tinham permissão de fazer campanha, é um tanto irônico falar-se em falta de resistência.

Foi neste ponto, cinco dias antes das eleições de 5 de março, que Goebbels registrou:
"Estou prestes a assumir o controle do vasto setor radiofônico. Terei de livrar-me de muitos membros
ineficientes da equipe. É preciso realizar uma reformulação especialmente no pessoal da administração". O
mais interessante a respeito disso é a nota do dia preciso - 1 o de março de 1933 - em que Goebbels assumiu o
comando do veículo de comunicação que seria a sua mais efetiva arma de propaganda, pois a partir desse dia
o rádio passou a levar a personalidade hipnótica do Führer aos 40 milhões de súditos impressionáveis do
Reich Alemão. E o gênio de Goebbels, na manipulação das suas possibilidades, logo se evidenciou. foram
definitivamente vencidos."

"O Führer fala com o máximo de fervor e devoção", Goebbels garantiu ao povo. "Quando, no fim,
mencionou que o Presidente do Reich e Hitler haviam apertado as mãos - o primeiro tendo libertado a
Prússia do inimigo como Feldmarechal e o segundo tendo cumprido seu dever no Ocidente como simples
soldado - o hino de ação de graças e, ao fundo, o soar vigoroso dos sinos da Catedral de Königsberg
formaram um corpo esplêndido para o coroamento de seu discurso. Toda a Alemanha, nas praças, nas ruas,
nas cervejarias ou nos lares, ouvia o hino que palpitava pelas ondas etéreas do rádio. Ela se conscientiza de
que uma nova era raiou. Neste momento, milhares e milhares de pessoas estarão decidindo-se por Hitler,
optando assim pelo ressurgimento da nação."

Com entusiasmo incomum, Goebbels apreendeu a grande importância do rádio, assim como boa parte da
técnica que lhe asseguraria dramaticidade na sua utilização. Numa visita de duas horas a um estúdio de
transmissão, procurou familiarizar-se com os potenciômetros e outros dispositivos técnicos que lhe
permitiriam os truques de sons; valendo-se do uso hábil de gravações interpoladas, ele poderia obter efeitos
que transformariam mentiras em verdades, mistificando também na apresentação de Hitler ao microfone
alterando-lhe o timbre de voz o seu modo de falar, fazendo dele uma personalidade radiofônica elaborada.

Na verdade, o resultado das eleições de 5 de março não foi muito encorajador. Os nazistas e seus parasitas só
conseguiram 51% dos votos depositados. Mas Goebbels não perdeu tempo em apresentar a sua versão da
verdade:
Ouvir a Walkürie, à noite, na Ópera Estadual. A sublime música de Wagner mistura-se com o som da marcha
dos Stahlhelm que festejaram seu grande dia em Berlim e agora passam pela Ópera.

"Os primeiros resultados já chegaram. Sucesso sobre sucesso, fantástico e incrivel.


"Quando voltarmos à Chancelaria, depois do espetáculo, a vitória será nossa. Ela é muito maior do que nos
atrevíamos a esperar. Mas o que é que os números significarão, doravante? Somos os senhores do Reich e da
Prússia; todos os outros partidos foram definitivamente vencidos."

A vitória fora muito maior do que os nazistas se atreviam a esperar porque o decreto de emergência posto em
vigor determinou a prisão de todos os deputados comunistas eleitos alegando-se para tanto que os
instigadores do incêndio do Reichstag eram claramente inimigos do Estado, incapazes, portanto, de dirigir os
que por desorientação foram levados a votar neles - quanto mais "a vasta maioria da nação alemã que tinha
fé no único credo verdadeiro, o nacional-socialismo". Para preservar a aparência de democracia, os pequenos
partidos, como o Partido Nacional do Povo (dirigido por von Papen e pelo editor Alfred Hugenberg), e os
líderes dos social-democratas que haviam escapado de serem presos como simpatizantes comunistas,
permaneceram temporariamente sem serem perturbados; mas somente por alguns dias. A 23 de março, Hitler
não encontrou dificuldade em fazer passar pelo Reichstag uma "lei para eliminar o sofrimento do povo e do
Reich". Somente os social-democratas votaram contra ela, mas eram apenas 84 deputados. Os nazistas,
apoiados por seus ex-adversários menores, cujas mãos haviam sido "molhadas" pelo dinheiro de Krupp e
transformadas num apoio dócil ao "melhor caminho para a indústria alemã e, portanto, para a economia
alemã" aprovaram a lei com uma maioria de 357 votos.

Seguiu-se imediatamente um tumultuoso aplauso. No Teatro da Ópera Kroll, onde o Reichstag se reunira,
ecoaram os vivas ao triunfo nazista. Com esta simples lei, de cinco parágrafos, "para eliminar o sofrimento
do povo e do Reich" (ela foi sucintamente chamada "Lei da Capacitação Plena"), os nazistas arrancaram o
poder do parlamento alemão e instituíram um regime totalitário. Com eles ficou o domínio completo da vida
nacional germânica, inclusive o controle do orçamento do Reich, a aprovação dos tratados com potências
estrangeiras e a faculdade de promover emendas à Constituição sem recorrer à Câmara. Toda a estrutura do
estado - jurídica, econômica e interna - estava nas mãos do gabinete de Hitler, na verdade, nas mãos do
próprio Hitler. Como diz Shirer:
"Assim, a democracia parlamentar foi finalmente sepultada na Alemanha. Excetuando-se as prisões dos
representantes comunistas e de alguns deputados social-democratas, tudo foi feito muito legalmente, embora
acompanhado de terror. O Parlamento, subordinando sua autoridade constitucional a Hitler, suicidou-se,
embora seu corpo permanecesse embalsamado até o fim do Terceiro Reich, servindo freqüentemente de
caixa de ressonância de alguns dos tonitruantes pronunciamentos de Hitler, com seus membros sendo
escolhidos a dedo pelo partido nazista, pois daí por diante não haveria mais eleições verdadeiras. Foi
somente esta 'Lei da Capacitação Plena' que formou a base legal da ditadura de Hitler. A partir de 23 de
março de 1933, Hitler passou a ditador do Reich, livre de quaisquer restrições parlamentares e, para todos os
fins, também livre do controle do velho e cansado presidente. É certo que havia muito o que fazer para
submeter a nação e suas instituições ao controle nazista, embora... também isto fosse feito com inaudita
rapidez e muita vulgaridade, com trapaças e brutalidade."

O plano de Goebbels para derrubar os comunistas - e, por extensão, submeter a própria nação alemã aos
Aliados a 7 de maio de 1945 - funcionara brilhantemente. A "verdade" elaborada pelo propagandista levara a
palma.

Exatamente dez dias antes ele recebera a sua recompensa. Hitler criara o Ministério do Esclarecimento e
Propaganda e, a 13 de março, Hindenburg assinou o edito nomeando o Dr. Joseph Goebbels seu titular.
Naquela noite, ao chegar a casa, ele foi recebido por Magda como Herr Reichsminister. "Bebemos
champanha para brindar ao futuro. Sinto-me um pouco nervoso quando penso que, com pouco mais de 35
anos, tenho sobre os ombros tão grande responsabilidade... Mas, que a grande obra prossiga! E que eu
sempre permaneça grato ao Führer pela enorme confiança que tem em mim."

Escalada
Nos seis anos decorridos entre a tomada do poder pelos nazistas e o começo da guerra, Goebbels
desenvolveu as técnicas com as quais manteve seu Führer nos píncaros a que os truques de propaganda o
haviam erguido.

"A propaganda foi o gênio do nacional-socialismo", diz Joachim Fest em The Face of the Third Reich. "Ela
não foi apenas a determinante das mais importantes vitórias de Hitler. Mais que isso, ela foi a alavanca que
promoveu a ascensão do partido, sendo mesmo parte de sua essência, e não simples instrumento de poder. É
muito mais difícil compreender o nacional-socialismo através de sua nebulosa e contraditória filosofia do
que pela índole da sua propaganda. Indo ao extremo, pode-se dizer que o nacional-socialismo era propaganda
disfarçada em ideologia."

Do lado positivo, a canonização do Führer dependia inteiramente da máquina de estimulação e do


mesmerismo. As partes mais importantes dessa máquina eram as divisas, os rótulos, os letreiros
(Deutschland erwahe! Sieg Heil! etc., interminavelmente repetidos), fanfarras triunfais, bandeiras, holofotes,
formações em massa de gente e evidência material de força, uniformidade de propósito expressada pelas
colunas em marcha e pelo cintilar dos instrumentos de agressão ou de trabalho de campo e a criação de todas
as formas de êxtase que levavam ao estado irracional, no qual as palavras do Führer eram absorvidas como
verdades fundamentais.

Por outro lado, considere-se também a ação contrária, potencial ou real, dos que se apegavam secreta ou
abertamente ao liberalismo de pensamento ou de expressão. Era muito simples montar um Thingspiel
(mistura de toque de recolher, de circo e de dança orgiástica) num anfiteatro nacional e formar uma platéia de
45.000 Jovens Hitleristas que receberam ingressos nos seus envelopes de pagamento (de onde se deduziu o
dinheiro); era mais difícil impedir a circulação de propaganda antinazista tenuemente disfarçada de diversão,
literatura ou arte. Por exemplo, um artista de cabaré chamado Werner Finck apresentava uma cena, passada
numa alfaiataria, em que ele aparecia tirando as medidas para fazer um terno.

Parte do diálogo envolvia a pseudomedição - dezenove, trinta e três. À pergunta "como prefere os bolsos",
Fink respondeu: "Bem abertos - como é moda agora". Por isto ele foi mandado para um campo de
concentração. As provas contra esses infratores eram recolhidas principalmente por bisbilhoteiros - que
Himmler tinha em grande número - e por batidas policiais.

A literatura, no sentido mais amplo, era muito mais fácil de controlar, porque suas infrações eram evidentes
por si mesmas. Quem não ouviu falar das cerimônias de queima de livros de maio de 1933, quando milhões
de obras "imorais" foram destruídas nos pátios das universidades, acompanhadas de pios discursos dos
acadêmicos que não haviam sido demitidos ou enviados para os campos de concentração por causa das suas
deficiências raciais ou idéias liberais? O mesmo acontecia com os jornais: a demissão de um pretenso redator
liberal era tratada como a triunfal descoberta e exposição ao sarcasmo público de um traidor do Reich.
"Proibições atrás de proibições", escreveu Goebbels "decidem o rumo da revolução... os jornais judeus, que
nos têm causado tantas dificuldades, desaparecem repentinamente das ruas de Berlim, o que é um alivio e
uma bênção. Goering está limpando as cavalariças de Áugias".
Enquanto Goering realizava essa tarefa, Goebbels introduzia a idéia do nazismo nos lares e nas mentes de
milhões que, em outras circunstâncias, teriam permanecido indiferentes ou críticos - e em 1933 estes ainda
eram muito numerosos. ("Se Hitler fosse inteiramente popular, Goebbels estaria desempregado; e se
Goebbels fosse inteiramente bem sucedido, Himmler estaria desempregado", diria acremente o
correspondente do New York Times em Berlim.) Os vacilantes foram arrebanhados e convertidos pela mais
recente e poderosa máquina de propaganda de Goebbels: o rádio.

Sua primeira providência, após mandar o Departamento dos Correios aumentar o número e a potência dos
transmissores que controlava através da Companhia de Rádio Nacional Alemã, foi assegurar a
disponibilidade de receptores para as transmissões. Para tanto, expediu uma ordem direta do Ministério aos
fabricantes de rádio para que projetassem e produzissem um Volkspfänger (receptor popular) a ser colocado
à venda por preço tão baixo que ninguém deixasse de comprar um - sobretudo com a facilidade das vendas a
crédito. Desse modo, ele aumentou o número de ouvintes de casa para 24 milhões, à média de 4 pessoas por
casa, em fins de 1933. Mas havia cerca de 23 milhões de lares e nem mesmo Goebbels podia colocar um
receptor em cada um deles com rapidez suficiente para captar as palavras imortais que o Führer e os nazistas
que o apoiavam despejaram pelos microfones durante o seu primeiro ano no poder. Foi, então, ordenado que
se fizessem audições comunais.

"A audição comunal de transmissões consideradas importantes tornou-se uma característica da vida na
Alemanha nazista. Muitas delas eram feitas em horas de trabalho, o que levava as fábricas e escritórios a
suspender a atividade, para que fosse atingida toda a força de trabalho do país. Os restaurantes e cafés tinham
de possuir aparelhos de rádio, para essas ocasiões públicas; além disso, instalavam-se postes com alto-
falantes nas ruas... [Assim] o Terceiro Reich alcançou uma cobertura radiofônica mais densa do que qualquer
outro país do mundo. Os elos humanos, nessa rígida rede, eram os "guardiães radiofônicos" do partido
nazista, que tinham o dever de levar os que viviam em seu quarteirão a ouvir os programas prescritos pelo
partido, de dedurar os que ouviam transmissões estrangeiras e de enviar relatórios sobre, por exemplo,
reações produzidas na audiência, preferências e pedidos dos ouvintes para uma agência coordenadora
central".

O trecho acima, extraído do livro Social History of the Third Reich, de Richard Grunberger, leva à conclusão
de que se deve ter perdido uma quantidade enorme de horas de trabalho, pois os discursos de Adolf Hitler e
seus seguidores quase sempre duravam duas horas, às vezes três horas. Evidentemente, Goebbels achava que
a inseminação da doutrina nazista era mais importante que a produção dos trabalhadores. Nesse estágio de
instável domínio do partido sobre a nação, era essencial que os vacilantes e os críticos fossem levados para o
curral certo. A máquina de convencimento dos apartidários foi então acionada.

A eficiência do seu funcionamento foi testada em fins de junho de 1934, quando se deu o massacre dos
adversários e dos amigos duvidosos do nazismo, perpetrado na "noite das longas facas" - o fim de semana de
29 e 30. Chegara a hora de Gregor Strasser, assim como a do chefe das Tropas de Assalto, Ernst Röhm, cuja
ambição era tornar-se Ministro da Defesa e, subseqüentemente, substituir o poder do exército regular pelo
das suas tropas SA. Mas o exército regular é que tinha, pela Constituição, o poder, e com Hindenburg
caminhando rapidamente para a morte, Hitler planejava acumular os cargos de Presidente e de Chanceler, de
modo que todos os membros das forças armadas fossem obrigados a prestar juramento de fidelidade a ele
pessoalmente. As insubordinadas Tropas de Assalto de Röhm haviam cumprido sua tarefa e, de qualquer
modo, Hitler concordara em reduzir seus efetivos em dois terços, quando a Grã-Bretanha, na pessoa de
Anthony Eden, o desafiou - uma medida diplomática que fez baixar a temperatura da antipatia da Europa
para com Hitler.

Assim, Röhm teve de ser eliminado. Arrancado da cama, onde estava com "seu" amante, foi fuzilado por
seus próprios seguidores. O mesmo aconteceu com Gregor Strasser, a quem Hitler jamais perdoara por lhe
haver tentado arrancar o poder quando se encontrava na prisão. O mesmo aconteceu com centenas de
membros do partido - nunca se precisou o número deles - cujos atos subversivos eram evidentes ou sobre
quem pairavam acusações de Himmler de haverem praticado alguma contravenção, real ou inventada, como,
por exemplo, von Schleicher - que teve o azar de ser o homem que bloqueara o caminho de Hitler para a
Chancelaria - e muitos dos que haviam ajudado a tramar o incêndio do Reichstag e que por isso se tornaram
perigosos.
Todos esses, e incontáveis outros, foram procurados e assassinados pelas Tropas de Assalto do próprio Röhm
durante aquele fim de semana sangrento. Goebbels teve pouco que ver com o planejamento da "noite das
longas facas": ele estava preocupado era com a sua própria pessoa no resultado do expurgo e,
metaforicamente, agarrou-se à mão de Hitler para se garantir de que sairia ileso da fúria do furacão que o
Führer fez soprar no momento em que decidiu varrer do caminho quem quer que representasse obstáculo,
real ou potencial, às suas pretensões. Notou-se que Goebbels estava constantemente à sombra de Hitler - uma
caricatura diabólica e sorridente, aviltando-se e tentando desesperadamente ocultar seu pé aleijado, como se
isso fosse capaz de provocar o desagrado do seu senhor e resultar no seu afastamento do caminho do poder".

O trabalho que lhe coube, ordenado por Hitler e executado com meticuloso cuidado; foi inventar e tornar
públicas histórias convincentes dos "suicídios" dos que desapareceram misteriosamente durante o fim de
semana de 29-30 de junho e cujos corpos não foram recuperados aos rios, pântanos e bosques distantes
durante muitos meses. Lágrimas de crocodilo verteram-se por Ernst Röhm: "Um grande homem da história
do Partido Nacional-Socialista. O seu suicídio foi o resultado inevitável de chantagem e homossexualismo".
E todos os documentos que poderiam de alguma forma vincular o Führer ao expurgo foram pessoalmente
destruídos por Goebbels, enquanto que os repórteres dos jornais foram ameaçados de desaparecimento
igualmente misterioso, nos campos de concentração, se fizessem qualquer referência desautorizada ao fim de
semana vermelho. O privilégio de noticiá-lo era de Hitler que, a 2 de agosto, após a morte de Hindenburg,
acumulou os cargos de Presidente e Chanceler, alçando-se desse modo ao poder absoluto. Não tendo, então,
nada que lhe pudesse solapar a autoridade, ele apresentou a sua versão do expurgo, acrescentando a ameaça:
"Todos devem saber que se, doravante, alguém erguer a mão contra o Estado, o destino será a morte certa".

Como de costume, Goebbels não se deu por achado diante da discrepância entre o que tinha propagandeado,
que todas as vítimas conhecidas do expurgo haviam sido suicidas, e a frenética revelação de Hitler de que ele
"expurgara o Reich dos seus inimigos", discrepância que fora anotada e estava sendo satirizada nos cabarés
clandestinos.

"Eu é que faço a verdade", escreveu ele cinicamente. "Estive com Himmler hoje e disse-lhe que temos de
arrancar esses pretensos satíricos dos seus cantos escuros e mostrar-lhes os erros do seu procedimento."

Aqueles que se negavam a engajar na linha de raciocínio estabelecida pelo Ministério do Esclarecimento e
Propaganda, denominados por Goebbels "intelectuais", receberam o mesmo tratamento. Um deles, Oswald
Spengler, publicara um livro, chamado A Hora da Decisão, no qual escrevera:
"Não censurarei nem elogiarei. Evitarei formar qualquer estimativa das coisas que estão surgindo agora. A
justa avaliação de um fato só é possível depois que ele se fez passado, e os seus bons ou maus resultados são
coisa concreta. Logo, só a História poderá julgar os grandes acontecimentos, talvez quando os seus
contemporâneos já não forem vivos. Isto [a tomada pelos nazistas do poder] não foi nenhum triunfo, pois
faltavam oponentes. A Alemanha está em perigo. Meu temor pela Alemanha não tem diminuído. Vejo mais
longe que outros... "

As dúvidas que Spengler lançou sobre as virtudes do novo regime foram raivosamente respondidas por
Goebbels em dois panfletos oficiais que esmagaram seus argumentos com golpes que, muito obviamente,
eram o desespero de um intelectual - Goebbels era sem dúvida um intelectual - reconhecendo o poder do
pensamento não reprimido. Spengler morreu dois anos depois, tendo recusado a transformar-se num seguidor
de Hitler.

Goebbels vingou-se de modo mais vigoroso de Elm Welk, redator do semanário Gruene Post, que o ofendera
publicando um editorial em que se registravam as dificuldades que vinha encontrando para publicar um
jornal que não passava de cópia de mil outros, todos feitos à base das notas fornecidas pelo Ministério da
Propaganda. "Somos informados de que essas declarações oficiais têm de ser reescritas", consignou ele, "que
não devemos ter medo de criticar; e também que, se tivermos dúvida, o próprio Ministro nos ajudará a
solucionar nossos problemas. Mas quando fui procurá-lo pessoalmente, constatei ser muito difícil entrar em
contato com tão grande homem, vivendo numa casa tão grande, com tantos aposentos e cercado de gente tão
importante. Esperei em mil antecâmaras para ver se podia obter qualquer informação sobre como dirigir o
Gruene Post de maneira a agradar o Ministro e, ao mesmo tempo, criticar sem receios. Mas vim embora sem
ter obtido qualquer informação".

Goebbels imediatamente suspendeu o jornal e mandou prender Welk e enviá-lo a um campo de concentração.
Mas, fora da Alemanha, ele nada podia fazer contra a sátira ou a critica. Quando Hitler o enviou a Genebra,
para participar da Conferência do Desarmamento de setembro de 1933, ele se fazia acompanhar,
permanentemente, por um grupo de seis guarda-costas, seis robustos homens das SS especialmente
escolhidos como exemplos do "físico ariano ideal". Eram altos, espadaúdos, louros - feitos pelo mesmo
molde de Horst Wessel. Uma caricatura publicada num jornal suíço mostrou-os como bonecos parados, de
braços cruzados, contra um fundo de bandeiras da suástica; em primeiro plano, agachava-se um ananicado e
deformado Goebbels, com seus cabelos pretos brilhando sobre um sorriso cruel. "E quem é este aí?"
indagava a legenda. "Ora, este é um belo, alto, louro, desempenado e fisicamente soberbo representante da
grande raça nórdico-ariana de alemães puros."

Contudo, dentro do seu território, Goebbels jamais teve diminuído o domínio sobre as emoções do povo
alemão. No ministério que dirigia, ele criou departamentos que não deixavam qualquer aspecto da vida
doméstica do país insondado pelos dedos da propaganda. Havia oito desses departamentos, que se ocupavam
com Lei, Finanças, Pessoal, Cultura e Publicidade; com Política, Cerimonial, Juventude, Saúde Pública,
Problemas Raciais e Viagens; com Rádio; com Disseminação de Notícias no País e no Exterior; com o
Cinema; com o Teatro, Música e Arte; e com a Proteção contra a Contrapropaganda no País e no Exterior.

O provimento dos cargos desses departamentos era feito com muito cuidado. Goebbels escolhia a dedo seus
auxiliares e exigia deles eficiência igual a sua, e ele era fantasticamente eficiente, podendo, a um só tempo,
dedicar-se com igual intensidade a uma variedade de assuntos. Era normal vê-lo rodeado em seu gabinete por
três ou quatro secretárias, ditando simultaneamente artigos, discursos, cartas e memorandos. Tendo
interrompido seu ditado a uma delas no meio de uma frase, para ditar algo completamente diferente a uma
outra secretária, ele voltava, às vezes até dez minutos depois, ao ponto que havia sido interrompido sem
qualquer vacilação. No fim de duas ou três horas de atividade assim intensa, ele talvez fumasse um cigarro e
bebesse um copo de vinho branco, para depois partir com outro séquito de secretárias, embarcando num
carro ou num trem, onde continuaria trabalhando com a mesma diligência, chegando ao seu destino
plenamente preparado para fazer um discurso de uma hora no qual, segundo o embaixador britânico na
Alemanha, Sir Nevile Henderson (e incontáveis outras testemunhas), "bílis alguma e mentira alguma eram
clamorosas demais para ele".

Sua incapacidade de fazer calar as chacotas a ele dirigidas pela imprensa estrangeira era um tormento
constante; mas toda a sua relação com os jornalistas que representavam os jornais das democracias era
exacerbada pela mesquinhez do seu ponto de vista. Apesar da sua indiscutível inteligência, ele não conseguia
compreender a psicologia de outras nações. "Por que eles insistem em ignorar a verdade como eu lhes
conto?" escreveu queixosamente em seu diário. Naturalmente porque os correspondentes de Nova York,
Londres, Paris e outros locais haviam visto com os próprios olhos os mil e um atos do estado nazista que
Goebbels negava com calor - como, por exemplo, a perseguição aos judeus, que aumentava gradativamente e
que os boletins oficiais para a imprensa chamavam eufemisticamente de "reorientação da população
trabalhadora de acordo com as necessidades da indústria alemã". Sua sofisticação revelava essa incapacidade
de compreensão: uma estranha crença de que a Europa e a América democráticas eram apenas uma extensão
do Reich alemão e que as pessoas lá fora eram facilmente iludidas por falsas convicções, como os súditos de
Adolf Hitler, já submetidos à lavagem cerebral. Quando se tornou evidente, pelas reportagens saídas na
imprensa estrangeira, que essas pessoas assim procediam por viverem fora de uma nação contida pela policia
secreta e por uma Lei da Capacitação Plena, que dava poder absoluto a um homem, ele se vingou expulsando
muitos correspondentes estrangeiros por fazerem "reportagens incorretas" - aparentemente não vendo que,
assim procedendo, estava mostrando fraqueza, e não força.

Como que para rebocar as fendas abertas no edifício do Terceiro Reich, ele mudou de tática e gastou uma
fortuna - 260 milhões de marcos em um ano apenas, 1934 - em propaganda no estrangeiro, colocando adidos
de imprensa em suas embaixadas e instruindo-os, em mensagens cifradas, sobre as diretrizes que deveriam
adotar:
"Para o mundo exterior, nossa propaganda deve sublinhar de maneira impressionante que a Alemanha não
deseja outra coisa senão uma solução pacífica de todos os problemas pendentes. De maneira hábil, todos os
que se têm recusado a ceder às legítimas exigências da Alemanha têm de ser culpados pelo fracasso de uma
composição pacífica. Isto tem de ser feito com discrição e de maneira que varie sempre."

Ineptamente, ele fez soar no exterior o tambor da propaganda. Não é de surpreender que viesse a fracassar
completamente em seu relacionamento com a imprensa estrangeira o homem que admitia - de acordo com o
que afirmou numa coletiva à imprensa, concedida a 7 de abril de 1933 - que "na Grã-Bretanha e na França,
qualquer que seja o ponto de vista dos partidos políticos, a opinião pública é sempre dirigida de modo
uniforme em todas as questões consideradas importantes para a nação".

Mas dentro dos seus próprios domínios, o som surdo da sua propaganda era tão implacável quanto o som de
pés em marcha - sorri este transmitido pelo rádio em todas as ocasiões possíveis, freqüentemente várias
vezes por dia. Num crescendo, os lemas, as ordens, a música marcial, os discursos, os hinos e o rufar de
tambores aceleraram de maneira aterradora para o choque fortíssimo da guerra.

O último ato
Antes que pudesse dedicar-se á tarefa de subjugar outras nações e ampliar as fronteiras da Alemanha, para
prover lebensraum para "a maior nação da terra" (foi uma frase que Goebbels criou para ele), Hitler teve de
subjugar primeiramente a própria Alemanha. No Reichstag, isto não foi problema. Os social-democratas
agarraram-se pusilanimemente aos nazistas, depois de fraca resistência nas eleições; os comunistas haviam
sido suprimidos; os democratas e o Partido do Povo expiraram por vontade própria e o Partido do Centro e o
Partido Nacional Alemão foram "voluntariamente" dissolvidos, quando Tropas de Assalto invadiram seus
escritórios como meirinhos apreendendo por dívidas. A 14 de julho de 1933, toda oposição foi proibida por
lei: "O Partido Nazista constitui o único partido político da Alemanha. Quem quer que se aventure a manter a
estrutura de qualquer outro partido político ou a formar um novo partido político, será punido com trabalhos
forçados até três anos, ou por prisão de seis meses a três anos, se o fato não for sujeito a maior penalidade, de
acordo com outros regulamentos".

Já anteriormente, os governos estaduais alemães, que sempre mantiveram seus próprios poderes dentro da
federação, haviam sido dissolvidos, e governadores nazistas haviam sido nomeados "para levar a cabo a
política geral estipulada pelo Chanceler do Reich".

Também os sindicatos foram esmagados, pelo confisco dos seus fundos, pela ocupação de suas sedes e pelo
encarceramento dos seus lideres, "por não cooperarem com o regime". Simultaneamente, a propaganda de
Goebbels informou os trabalhadores que o Führer compreendia a pobreza em que viviam e não permitiria a
exploração pelo "capitalismo anônimo" e que daí por diante os contratos de trabalho seriam regulamentados
pelos "líderes naturais" da indústria. Como com isto ele queria dizer que no futuro os empregadores seriam
os senhores absolutos da indústria e que as greves seriam proibidas por lei, é compreensível que os
trabalhadores não se convencessem. Eles foram persuadidos a uma semicrença por uma enorme celebração, a
1o de maio, das glórias do trabalho. A comemoração foi preparada (por Goebbels) no Campo Tempelhof, em
Berlim, num estilo semelhante ao que era usado nas Reuniões de Nuremberg. Hitler berrou para 100.000
delegados dos trabalhadores ali reunidos que ele e a nação sempre honrariam o trabalho e respeitariam o
trabalhador, acrescentando que era completamente fora de propósito a afirmação de que o nazismo era contra
os trabalhadores alemães. Aduziu ainda que a Festa da Primavera seria realizada em homenagem ao trabalho
alemão pelos séculos a fora.

Toda essa fantasia, pronunciada à maneira mesmérica de Hitler e apoiada pelas bandas de música, desfiles
comuns e outros processos de aquecimento, teve o efeito desejado - especialmente com o reforço, como
aconteceu durante as semanas seguintes, das prisões em massa e dos confinamentos "em custódia protetora"
de todo aquele que cometesse a temeridade de levantar um dedo ou dizer uma palavra de protesto. Acuando o
Judiciário com a ameaça de meter em campo de concentração os juízes que viessem a condenar os bandidos
que em nome da nova ordem atentavam contra as liberdades públicas, a "justiça" nazista prosperaria daí em
diante, assinalando o fim do regime de direito.

Quanto à estrutura econômica, Hitler substituiu o Diretor do Reichsbank, Dr. Hans Luther, pelo Dr. Hjalmar
Schacht, bajulador de Hitler desde os primeiros tempos do partido. Durante os cinco primeiros anos de
gestão, Schacht esforçou-se por demonstrar que fora sensata a escolha do Führer, baseando a economia
alemã num vasto programa de rearmamento. Não poderia ter sido mais eficiente na criação de trabalho para
os desempregados alemães que, com a crise econômica mundial provocada pelo colapso de Wall Street,
iniciada em 1929, somavam cerca de 6 milhões. Assim, os desígnios expansionistas de Hitler foram
convenientemente transformados num programa racional de recuperação - programa que durante breves
momentos se apoiou, nas palavras delicadas de Schacht, "nos processos inflacionários da impressora", mas
que em breve passou a desenvolver-se por seu próprio impulso e pelos "fundos confiscados dos bolchevistas,
judeus e outros inimigos do Grande Reich Alemão".
Naturalmente, o programa de rearmamento tinha de ser mantido em segredo. Aos jornalistas estrangeiros,
Goebbels negava a existência de qualquer esforço armamentista que ultrapassasse os limites impostos pelo
Tratado de Versalhes. O incrível é que esperava que acreditassem nele, assim como esperava que
acreditassem quando explicou que os campos de concentração eram "parte do plano do Führer para a
reabilitação da raça judia". Ele acreditava ingenuamente que, se podia criar em seu país a ilusão de que preto
era branco, as nações responderiam com igual credulidade. A propósito, um correspondente da Associated
Press em Berlim, Louis P. Lochner, diz:
"Notável exemplo da capacidade de Goebbels de cavilação descarada foi dado aos correspondentes
estrangeiros acreditados em Berlim a 10 de novembro de 1938, um dia depois que Hitler deu às suas hordas
o sinal para iniciar o saque às lojas de judeus, a demolição de suas propriedades, o incêndio das sinagogas e a
prisão de judeus inocentes. No fim daquela manhã fomos chamados ao Ministério da Propaganda, pois o Dr.
Goebbels queria fazer uma declaração.

"De repente, com passos rápidos e nervosos, ele entrou e convidou-nos a fazer um semicírculo ao seu redor,
e declarou que as histórias que chegaram aos seus ouvidos sobre o suposto saque e destruição de
propriedades de judeus são uma mentira suja (sind erstunken und erlogen). Não se tocou num só fio de
cabelo judeu (den Juden ist kein Haar geprummt worden).

"Entreolhamo-nos espantados. Em toda a nossa atividade jornalística, jamais víramos coisa semelhante.

"A apenas três minutos da Wilhelmplatz, onde ficava o Ministério da Propaganda, estava a famosa rua
comercial de Berlim, a Leipziger Strasse, em cuja extremidade se erguia a 'Wertheim', a conhecida loja de
departamentos, com suas grandes vitrinas destruídas e suas famosas exposições transformadas num monte de
escombros. Entretanto, Goebbels atrevia-se a dizer-nos que o que tínhamos visto com nossos próprios olhos
era 'uma mentira suja'.

"Depois que nos recuperamos da estupefação que a todos deixou paralisados, voltamo-nos para onde se
encontrava o Dr. Goebbels com a intenção de lhe fazer algumas perguntas. Valendo-se, porém, daquele
momento de embaraço para nós, ele desapareceu, fugindo a explicações muito difíceis.

"O que Goebbels não levou em conta quando deu seu golpe é que, embora reproduzíssemos fielmente suas
palavras, para que pudéssemos permanecer em nossos postos na Alemanha, no dia anterior havíamos enviado
ao nossos jornais depoimentos de testemunhas oculares do incêndio das sinagogas, do espancamento de
judeus, da destruição das vitrinas das lojas de judeus, da corrida dos bandidos pelas ruas aos gritos de Juda
Verrecke (Eliminem os Judeus).

"Na noite anterior, minha mulher e eu passamos horas assistindo à obra de destruição dos frenéticos nazistas.
Além disso, alguns de nós haviam enviado histórias, pouco antes que Goebbels iniciasse sua entrevista
coletiva com a imprensa, dando conta das dificuldades que encontramos para chegar à Wilhelmplatz;
escolhendo o caminho e fazendo desvios para não cortar nossos pneus nos cacos de vidro das caríssimas
vitrinas que entupiam as principais ruas.

"O efeito da fiel repetição da declaração de Goebbels foi, por isso, muito diferente do que o Ministro da
Propaganda de Hitler esperava."

Lochner referia-se à notória "noite das vitrinas quebradas" - ao terrível clímax do pogrom que por mais de
cinco anos havia chocado o mundo livre. Era já tão impossível manter em segredo o pogrom quanto os cinco
anos de rearmamento da Alemanha. A amena garantia de que a nação estava em franca recuperação
econômica, através de um bem elaborado programa de obras públicas", não convencia a ninguém fora do
alcance da incansável voz de Goebbels - embora, como veremos adiante, alguns dos que, por covardia,
confraternizavam com Hitler evidentemente quisessem ser convencidos.

Não havia dúvidas quanto às obras públicas - as Autobahn, os planos de erradicação de favelas etc. - mas
também não havia dúvidas, como diz Shirer, de que "a base real da recuperação da Alemanha era o
rearmamento, para o qual o regime nazista dirigiu as energias do mundo dos negócios e da mão-de-obra - a
partir de 1934. Toda a economia alemã passou a ser conhecida, no linguajar nazista, como Wehrwirtschaft,
ou economia de guerra, deliberadamente projetada para funcionar não só em tempo de guerra, mas também
durante o período de preparação da guerra".
De qualquer modo, soava tão ridículo a propaganda oficial de Goebbels apregoar que os objetivos de Hitler
eram "inteiramente pacíficas, interessados somente na recuperação econômica do Reich Alemão", como
pretender que "não se tocou num só fio de cabelo dos judeus". Em julho de 1934, o Führer tentou um golpe
na Áustria, dando ordens para que fosse assassinado o Chanceler Dollfuss - crime que as SS de Himmler
cometeram, para mascarar a procedência da ordem, em uniformes austríacos, mas que não conseguiu ser um
golpe porque o governo austríaco logo recuperou o controle da ameaçadora situação política. Fracassado o
primeiro ataque, Hitler tornou públicas expressões de profundo pesar pelo cruel assassinato, o qual,
naturalmente, atribuiu a traidores austríacos. Mas ninguém que conhecesse o panorama político europeu
poderia iludir-se, muito embora a reação internacional fosse tão indecisa e fraca quanto o foi oito meses
depois, ao ser anunciada ruidosamente a reconstrução da Força Aérea e da Marinha alemãs e o
restabelecimento da convocação para o serviço militar.

A ocupação da Renânia, em março de 1936, foi a primeira demonstração bem sucedida de força de Hitler -
força que ele reunira enquanto a Grã-Bretanha e a França assistiam irresolutas, faziam débeis discursos de
reprovação e advertência, e imaginando se talvez não fosse melhor permitir que a Alemanha se rearmasse
oficialmente. Os freqüentes discursos tranqüilizadores do Führer, sobre paz, razão e conciliação, eram
sancionados pelo que expressavam seus termos por alguns dos estadistas mais obtusos que vieram a ser
manipulados por Hitler como marionetes. E também por alguns dos mais respeitados jornalistas. Geoffrey
Dawson, redator do Times de Londres, deixou de publicar deliberadamente as reportagens perturbadoras que
Norman Ebbutt, seu correspondente em Berlim, lhe enviava. Tremendo em suas bem engraxadas botas, ele
escreveu ao seu representante em Genebra:
"Noite após noite, tenho feito o que posso para não publicar no jornal qualquer coisa que venha a ferir as
suscetibilidades alemães. Não creio que tenha publicado, há meses, o que quer que seja que eles possam
considerar injusto."

Não era de surpreender que, com homens como Dawson, Simon (o Secretário das Relações Exteriores
britânico), Baldwin e Chamberlain (Primeiros-Ministros na década que precedeu o último conflito), as
negativas de Goebbels sobre o rearmamento ganhassem credibilidade. Mesmo quando se transformaram
sutilmente em negativas de rearmamento para guerra, os britânicos se deixaram enrolar a tal ponto que
permitiram a reconstrução da marinha alemã até "um efetivo de 35% do da Marinha Britânica - acordo sobre
o qual nem a França, nem a Itália e nem a Liga das Nações foram consultadas.

Menos de um ano depois de invadir a zona desmilitarizada da Renânia com suas tropas pretensamente
inexistentes, Hitler anunciou generosamente ao mundo que a Alemanha retirava sua assinatura do Tratado de
Versalhes. Irritadas e ofegantes com a exaustão da descoberta do truque grosseiro que vinha sendo preparado
debaixo de seus olhos desde 1933, a Grã-Bretanha e a França continuaram a concertar fúteis acordos
diplomáticos que culminaram com a suprema estupidez do "Pacto de Munique", de setembro de 1938.

Apenas seis meses antes de Chamberlain descer cambaleante do avião, agitando no ar o certificado da "paz
em nosso tempo", Hitler anexara a Áustria, com sua famosa Diretiva n° 1 rezando o seguinte:
1. Se outras medidas fracassarem, pretendo invadir a Áustria com forças armadas para estabelecer condições
constitucionais e impedir outros ultrajes contra a população alemã.
2. Toda a operação será dirigida por mim mesmo.
3. As forças do Exército e da Força Aérea destacadas para esta operação tem de estar prontas para a invasão a
12 de março de 1938, ás 12:00 h o mais tardar.
4. O comportamento das tropas tem de dar a impressão de que não queremos travar guerra contra nossos
irmãos austríacos. Portanto, qualquer provocação deve ser evitada. Contudo, se houver resistência, esta tem
de ser dominada implacavelmente pela força das armas".

Acontece que a anexação da Áustria foi incruenta, realizada pela infiltração dos quinta-colunas de Hitler no
Parlamento austríaco. Quando se realizou um plebiscito, a 10 de abril, a ocupação do país pelas tropas
alemães assegurou que os votos fossem praticamente cem por cento favoráveis a Hitler. Nem a Grã-Bretanha
nem a França podiam mais alimentar dúvidas quanto aos objetivos fundamentais de Hitler. Porém,
continuaram no país da fantasia durante todo o restante de 1938 e os primeiros oito meses de 1939, agitando
pedaços de papel, sacudindo guarda-chuvas e protestando através dos seus embaixadores "nos termos mais
veementes possíveis" contra as "intoleráveis reivindicações territoriais de Hitler". Quando os Sudetos foram
arrancados ao território tcheco-eslovaco e o famoso Corredor transformou-se no pomo da discórdia, com a
Polônia resistindo à devolução "legítima ao Reich" de Danzig, os estadistas da França e Grã-Bretanha
quedaram-se em inacreditável horror. O palco estava sendo preparado para o último ato e eles nem sequer
sabiam seus papéis.

Desce o pano
Os estadistas aliados talvez não soubessem seus papéis, mas Goebbels certamente sabia o seu. "Aristóteles",
comentava ele, por essa época, "diz que é melhor criar uma personalidade adaptável ao seu inimigo e resumir
essa personalidade numa única imagem representativa", e Goebbels passou a fazer isso.

Não havia muito o que fazer com Chamberlain, que era tão ineficiente, que não existia como personalidade.
Mas Churchill, que se tornou Primeiro-Ministro a 10 de maio de 1940, era vinho de outra pipa. "Em palavras
e imagens", instruiu Goebbels aos seus lacaios, "Churchill tem de ser representado como o arquétipo do povo
britânico - criatura viciosa e sorridente, com testa de macaco, um dipsomaníaco inventando mentiras, sempre
na companhia de plutocratas, judeus, bolchevistas, com os trabalhadores sob seus calcanhares. Deveria
também ser ressaltada a sua idade [Churchill tinha 65 anos], o estímulo que dava à guerra para tirar benefício
pessoal, sua disposição para aceitar qualquer cargo, em qualquer governo (o que corresponde com a desunião
do povo britânico) e seus antecedentes familiares, pai sifilítico, mãe prostituta etc."

Assim, o inimigo foi coletivamente tipificado para o povo alemão. Como Hitler e Goebbels haviam notado,
uma curiosidade da propaganda é que, quanto mais vulgarmente apresentada, maior a sua aceitação. A
mesma estranheza se constata na subdivisão da propaganda, a publicidade. É fácil convencer a maior parte
da população das virtudes de um produto que dá, por exemplo, uma flor de plástico aos que o adquirem, de
preferência a um outro qualquer. Sendo assim, nada há de extraordinário no fato de as piadas de Goebbels se
terem mostrado tão convincentes e no de, até o fim da guerra, em intensidade sempre crescente, o inimigo da
pura, esplêndida, altaneira e poderosa raça alemã ter sido apresentado disfarçado num Churchill
ridiculamente deformado.

Também os primeiros acontecimentos da guerra foram ridiculamente destorcidos. O afundamento do


Athenia, por exemplo. O Athenia era um navio de passageiros que transportava mil mulheres e crianças que
retornavam aos Estados Unidos e foi posto a pique pelo submarino U-30 a 4 de setembro de 1939, na
suposição - assim disse o comandante do submarino em seu relatório - que se tratasse de um cruzador
armado. Goebbels imediatamente providenciou para que desaparecesse o relatório, afirmando que em
verdade "Churchill mandara colocar bombas no navio, satisfazendo simultaneamente, desse modo, sua
própria crueldade e dirigindo a ira do mundo para uma Alemanha desumana". Ele apresentou provas de que o
Führer puniria com a morte qualquer comandante alemão que atacasse navio de passageiros desarmado.
Como o comandante do submarino ainda estava vivo e transmitindo uma versão da história (script de
Goebbels, naturalmente) para a nação alemã, a hediondez do crime contido ganhava coloração diferente.

O caso do Ark Royal foi mais difícil de controlar. O porta-aviões foi ligeiramente danificado por um torpedo
alemão a 14 de setembro e novamente, pela Luftwaffe, a 26. A imprensa e o rádio alemães comunicaram
rápida e triunfalmente que ele fora "totalmente destruído". Portanto, foi para o alemão desconcertante a
descoberta de que ele estava novamente em ação, no Atlântico Sul, duas semanas mais tarde e, em
novembro, agentes alemães viram-no, intacto, ancorado na Cidade do Cabo. Numa conferência, Goebbels
perguntou ao, oficial-de-ligação naval se podia explicar o que estava acontecendo, que era verdadeiramente
embaraçoso.

"Receio que não, Herr Reichminister. O Ark Royal foi afundado pelo Ministério da Propaganda, não por
nós."

A conferência em que se deu esse contundente comentário teve lugar a 23 de dezembro, durante uma das
reuniões que diariamente se realizavam na Wilhelmplatz, durante toda a guerra. Nessas conferências dava-se
corda na máquina de propaganda de Goebbels. A elas compareciam os chefes de departamentos do seu
Ministério - imprensa, rádio, cinema, cultura etc. - além de oficiais-de-ligação das forças armadas, Gauleiters
das sedes regionais do partido e representantes dos outros Ministérios. O ambiente era ideal para Goebbels;
satisfazia-lhe a vocação para o drama, permitia-lhe usar amplamente o cérebro ágil e manipular as palavras
com rapidez, além de lhe engordar a vaidade. Willi Boelcke, redator das minutas da conferência que
sobreviveram, diz que ali "Goebbels instalou seu posto de comando secreto. Era ali que, dia após dia, ele
transmitia ordens verbais para os vários setores da propaganda... Somente ele baixava os decretos, fazia
perguntas, elogiava ou censurava, apresentava idéias, entregava-se a monólogos críticos, delineava
argumentos e ignorava virtualmente todos os contra-argumentos. Somente ele determinava o que era correto
e "de interesse para o povo". Nunca havia uma discussão franca, e muito menos consultas, nem entre
colegas... A maioria dos participantes achava mais prudente não fazer perguntas nem expressar dúvidas".

Na conferência de 16 de junho de 1940, Goebbels concebeu um dos mais brilhantes e eficazes golpes de
propaganda. "Muito embora a França já esteja realmente derrotada", registra-se que ele tenha dito, "isto
ainda não está claro para o leigo... Ela ainda não se sentiu atingida no cerne da sua honra nacional e militar.
Contudo, nosso objetivo tem de ser a eliminação da França, de uma vez por todas, como potência de
importância na Europa. Em última análise, a Grã-Bretanha só pode ser expulsa do continente e reduzida a
uma "Holanda maior" se a França, sua espada continental, for esmagada de uma vez por todas. Por esta
razão, a honra e o orgulho nacional da França têm de sofrer um golpe de morte".

O golpe mortal não só foi dramático, mas sobretudo humilhante. Vinte e dois anos antes, a 11 de novembro
de 1918, o armistício entre a Alemanha e os Aliados fora assinado no Wagonlit do Marechal Foch, numa
clareira da Floresta de Compiègne. Para vingativo deleite de Hitler, Goebbels providenciou a colocação do
vagão no mesmo lugar para a apresentação dos termos de armistício alemães. O Führer sentou-se triunfante
na mesma cadeira em que Foch se sentou, e os emissários franceses, chefiados pelo General Charles
Huntziger, nas cadeiras que os delegados alemães haviam ocupado em 1918, humildes e amargurados.

Isto aconteceu a 21 de junho de 1940. No dia 22, os negociadores franceses, autorizados pelo seu governo,
em Bordeaux, assinaram o armistício às 18:50 h. Quinze minutos depois, o Wagonlit estava sendo retirado
por engenheiros alemães, para ser transportado para Berlim, onde milhares de pessoas pagaram alguns
pfênigs para fazer reverência ante o altar do triunfo erigido por Hitler. Foi uma das idéias mais produtivas -
em termos de dinheiro e moral - concebidas por Goebbels, que não perdeu tempo em explorar o êxito obtido.
Hitler passou a senhor de vasta extensão da Europa, do norte da Escandinávia a Bordeaux, no Oeste, e o Rio
Bug, no Leste. Goebbels deu ordens a seus propagandistas para que apresentassem a obra de rapinagem
como uma união da Europa e cujo único obstáculo à sua complementação eram os britânicos. "Esta semana",
anunciou ele na conferência de 23 de junho, "dar-se-á o maior golpe contra Churchill na Grã-Bretanha.
Naturalmente ele não poderá resistir. Formar-se-á um governo de conciliação. Estamos bem próximos do fim
da guerra". Mas quando os liderados por Churchill, que Goebbels retratou como imorais, bêbados, viciosos,
desintegrados, de ancestrais duvidosos e inteligência tacanha, longe de se encolherem sob os tacões
hitleristas, ou de se revoltarem contra seu governante, começaram a erguer rudemente dois dedos
concordantes, num gesto de desdenhoso desafio, Goebbels deu a sua interpretação ardilosa para o gesto
tachando-a de "suscetibilidade imbecil" dos britânicos "à palhaçada e à retórica" de Churchill. "Impossível",
dizia ele, "que qualquer nação, por mais desprezível que seja, não se levante contra velhos [Schelm]
desgastados, que bebem brandy de manhã à noite, que dormem todas as tardes e se levantam nos fantásticos
trajes da segunda infância". Quando Churchill demonstrou, a despeito da opinião de seu médico, Charles
Wilson, para quem "ele não se distinguia muito em julgamento, em habilidade administrativa, em
conhecimento da natureza humana", ser na liderança dos britânicos bem mais que um velho tolo e bêbado,
Goebbels calou a apresentação estranhamente errada do "único inimigo que resta entre a Grande Alemanha e
a união triunfal".

A inesperada resistência da Grã-Bretanha no verão do Spitfire de 1940 foi obscurecida pelas fanfarronadas
alemães, enquanto Londres era "arrasada" e a Real Força Aérea "reduzida à insignificância". Essa
fanfarronada redundou tão embaraçosa quanto a história do Ark Royal e se esvaziou à medida que as perdas
da Luftwaffe aumentavam. Lorde Hah-Hah (William Joyce) foi presenteado com uma caixa de charutos
"como prova do reconhecimento do Ministro por difundir alarma e desespero durante o verão mais
agonizante da Grã-Bretanha". À parte a instrução de que Hah-Hah devia prosseguir com o bom trabalho que
estava fazendo através de palestras radiofônicas na ARP, destinado "a incutir o horror na população civil
desde o início" a Batalha da Grã-Bretanha foi posta de lado como assunto de discussão na conferência diária.
"Não há nada que as massas detestem mais", disse Goebbels desdenhosamente aos seus propagandistas, "do
que a ambigüidade, do que serem chamadas a considerar isso e aquilo. Elas pensam de modo primitivo.
Adoram generalizar situações complicadas e, das suas generalizações, tirar conclusões claras e firmes".
Substituindo desse modo o argumento pela declaração, a Alemanha venceu a Batalha da Grã-Bretanha e
ninguém precisa mais incomodar-se com isso.

De qualquer modo, havia coisas mais urgentes do que os britânicos. Aquela raça moribunda poderia ficar
tranqüilamente à mercê da poderosa operação invasora de Hitler, a "Leão-Marinho", planejada para o outono
(planejada, replanejada e finalmente abandonada). Mais importante foi a declaração, feita a 3 de setembro de
1940 de que os Estados Unidos haviam concordado em emprestar à Grã-Bretanha 50 destróieres em troca de
bases navais nas Índias Ocidentais. Goebbels viu no acordo um passo decisivo para a participação dos
Estados Unidos na guerra e começou imediatamente a planejar a aristotélica personalização do novo inimigo.

Por conseguinte, Roosevelt tornou-se o arquético das maquinações capitalistas americanas. "Descobriu-se"
que ele tinha ascendentes judeus (sua mãe recebera "secretamente o direito de primogenitura pelo nome de
Sara Rosenfeld") e que tinha "desígnios" para a Grã-Bretanha, cuja ilha pretendia usar como trampolim para
tomar o resto da Europa e criar "um império mundial do capitalismo americano". Os antepassados judeus de
Roosevelt eram tão numerosos quanto as pernas de uma cobra. Trezentos anos antes, seu antepassado mais
antigo que se conhece chegou a Nova Amsterdã vindo da Holanda e era luterano. A mãe de Franklin, Sara
Delano, nunca esteve mais perto do judaísmo do que seus ancestrais huguenotes, os de la Noyes.

Mas, entretanto, fez-se o molde para o novo Roosevelt. "O Ministro determina que o tema a ser adotado
gradativamente seja: "A América judia lutará - se realmente lutar - até o último inglês". É perfeitamente claro
o que Roosevelt quer: ele quer tomar a posição de mando dos britânicos no mundo. Ele não tem qualquer
intenção séria de fornecer material à Grã-Bretanha, e, mesmo que quisesse, a indústria americana de
armamentos não está em condições de fazer isso. Ele só tem um interesse: prolongar a guerra para que o
império britânico enfraqueça e permita que os americanos colham seu legado."

Havia uma verdade na imagem que Goebbels começou a projetar durante o inverno de 1940: a indústria
americana de armamentos tinha sofrido drástica redução em seu potencial por influência dos numerosos
isolacionistas que se haviam decidido pela manutenção do país fora da guerra. Mesmo depois de Pearl
Harbor (7 de dezembro de 1941), Sir Alan Brooke, Chefe do Estado-Maior-Geral Imperial, foi informado
pelo Feldmarechal Sir John Dill, seu predecessor: "Nunca vi um país tão despreparado para a guerra e tão
indolente". Mesmo assim, a Lei do Empréstimo por Arrendamento foi apresentada por Roosevelt e aprovada
pelo Congresso em março de 1941.

Naturalmente, isto deu a Goebbels a oportunidade de golpear o Presidente com chamas de fúria. Roosevelt
tornou-se um "louco"; ele e Churchill eram "os grandes embusteiros do povo"; a nação americana era
governada "por um plutocrata vítima de uma doença que [havia] desarranjado sua mente, produzindo-lhe
ilusões de grandeza que chegavam às raias da megalomania". E à medida que se tornava cada vez mais
evidente que os Estados Unidos se uniriam á Grã-Bretanha, a campanha de difamação foi acelerada. Lendo
os jornais e ouvindo o rádio alemães, tinha-se a impressão de que o Cavaleiro da Armadura Brilhante, a
Alemanha, estava protegendo-se heroicamente do fedor venenoso, das chamas e da crueldade do dragão
Roosevelt-Churchill e aguardava apenas o momento certo para atacar e destruir a besta nauseante e libertar o
mundo dos horrores do capitalismo, do judaísmo, do sindicalismo, da megalomania, da dipsomania e de
outras características desagradáveis da democracia. A campanha não passava de uma continuação mais
barulhenta e menos cômica dos vociferantes ataques de Hitler dirigidos ao mundo na década anterior,
fortalecidos pelo choque das armas e abrangidos pelos tentáculos da guerra oral de Goebbels. "Às vezes
parecia", escreveu um correspondente americano que esteve em Berlim até o momento de Pearl Harbor, "que
Goebbels ultrapassava o palco onde estava para nos conduzir pelas orelhas: ele martelava declarações
incríveis na nossa mente e já estávamos muito próximos de considerá-las críveis. Todos procuramos manter a
razão, mas não há dúvida quanto à validade da afirmação de Hitler, quando assegurava que a mentira gritada
muitas vezes, bem alto, ganha na opinião do povo características de verdade.

É certo que houve oportunidades para Goebbels propagandear vantagens mais ou menos verdadeiras. Com
referência à Batalha do Atlântico, por exemplo. De 1941 a 1943, as perdas aliadas em navios mercantes
atingiram proporções desastrosas, e a cada minuto, todos os dias, os alemães ouviam afirmações triunfantes.
À medida que a produção americana de armamentos acelerava, declarou-se alegremente: "A colossal
produção do grande parque industrial americano não aterroriza o povo germânico, pois tudo aquilo graças à
atividade dos submarinos alemães, jamais chegará ao local da operação". Certamente era um exagero, mas
inconfortavelmente perto da verdade. Grande quantidade de material realmente se perdeu, graças à
habilidade dos comandantes de submarinos, reunidos em "alcatéias" contra os comboios. E quando Goebbels
fez uma transmissão radiofônica pessoal, em que se referiu aos navios mercantes Aliados: "Sua tonelagem, o
trunfo mais importante que possuía para sustentar a guerra, estava diminuindo, diariamente, com rapidez
aterradora", ele foi perfeitamente correto.
Já então - a transmissão foi feita a 3 de maio de 1942 - a campanha na Frente Oriental estava sendo travada
há quase um ano e colocou Goebbels diante de um problema para o qual ele não encontrava a solução. Era
impossível ocultar o fato de que o inverno causara sofrimentos enormes aos exércitos germânicos, detendo-
os em toda a frente. Repetia-se Moscou em 1812. Os pedidos de agasalhos e material de inverno para as
tropas não podiam de modo algum ser transformados em histórias de êxitos. Trombetearam e exaustivamente
uma reviravolta completa nos campos de batalha da Rússia quando Hitler assumiu o comando da campanha,
em fins de 1941. Ele era "o maior gênio militar da História" e a vitória-relâmpago viria com o verão. Não
aconteceu vitória-relâmpago nem de qualquer outro tipo e o mal-estar de Goebbels foi revelado numa carta
que escreveu para sua mulher, Magda, em setembro de 1942:
"Os problemas que a guerra com a Rússia levanta são de arrasar os nervos, que o diabo a leve! Preciso de
uma figura heróica para apresentar ao povo que não seja o Führer, que tem de permanecer acima disto tudo
pelo próprio fato de ser o Führer."

Ele encontraria essa figura e a descoberta o ajudaria a evitar as situações mais difíceis da campanha russa.
Mas havia situações igualmente difíceis na sua vida particular e com as quais estava tendo de lidar
continuamente, muito embora fossem criadas unicamente por ele.

O seu casamento deu-se a 12 de dezembro de 1931. O primeiro dos filhos nasceu-lhe nove meses depois e os
outros vieram a intervalos breves. (Nunca transcorreram mais que apenas alguns meses entre um e outro
período de gravidez de Magda; o último dos filhos nasceu em outubro de 1940). Apenas um deles foi um
menino que, durante sua breve existência, revelou ser uma criança bastante obtusa. Mas a vaidade de
Goebbels foi lisonjeada quando Hitler lhe disse que "um gênio só deveria ter filhas; um filho seria eclipsado
pelo pai".

Goebbels pôs a culpa da obtusidade do filho e da elevada proporção de filhas "na natureza fria e rancorosa"
de Magda. E Magda tinha muitas razões para ser assim.

Como Prang observou, certa vez, com uma ligeira confusão de tendências biológicas, Goebbels estava
sempre excitado sexualmente. Registraram-se breves casos com suas secretárias e astros menores do mundo
da publicidade com o qual estava estreitamente ligado. Suas eventuais companheiras de leito afirmavam que
ele era um amante eficiente. Ele também negou acaloradamente, quando Magda o descobriu na cama com
uma das suas convidadas, que jamais tivesse concordado em santificar o casamento com a abstinência.
Goebbels era incapaz de atravessar em inatividade sexual o período de abstinência imposto pela gravidez.
Magda, que na vigência do casamento com Quandt prevaricou muito, encarava romanticamente o seu
casamento com o Ministro da Propaganda e sentia-se humilhada com o fato de ele passar de uma cama para
outra com tanta facilidade. Além disso, com a aproximação da guerra e durante o seu desenrolar, havia
sempre uma lista de espera de pequenas atrizes e mulheres jornalistas dispostas a suborná-lo com seu corpo
em troca de algum favor.

"Isto", disse a Magda cruamente, "faz parte do trabalho que devo desenvolver pela Alemanha e pelo Führer".

Magda resolveu então que, se seu marido podia enganá-la, ela podia fazer o mesmo, e começou um caso
amoroso com um oficial-de-ligação norueguês e ameaçou divorciar-se. Goebbels ficou alarmado; o
casamento do Ministro devia ser um exemplo para todos; e se o número de vezes que apareciam juntos em
público pudesse servir de elemento de aferição, o seu casamento era realmente um sucesso. Houve a
reconciliação, que não durou muito, pois Goebbels então tomou como amante a atriz do cinema tcheco Lida
Barova, com quem passou a viver sem mesmo se incomodar em retornar a casa, para Magda e os filhos. Era
impossível manter secreta a ligação e o escândalo público resultante enfureceu Hitler. Ele ameaçou Goebbels
com a exoneração do ministério e com a transferência para Tóquio, como um diplomata secundário.
Goebbels estava tão caído por Lida, que nem a ameaça de remoção, nem a mágoa causada à sua colossal
vaidade tiveram efeito. Ele disse a Hitler que iria para Tóquio de bom grado se pudesse divorciar-se e levar
Lida consigo.

Hitler recusou-se a consentir nisso. Seria politicamente insensato fazer tal substituição na época, como
insensato seria também admitir que a publicidade em torno do processo de divórcio impopularizasse mais o
ministro. (Ele já era amplamente, ainda que sub-repticiamente, conhecido como "o girino - só tem boca e
cauda" - uma piada que dependia da palavra Schwanz, que significa cauda e também, vulgarmente, pênis.)
Com o envio de Lida a Praga, por ordem de Hitler, escoltada por dois agentes da Gestapo, e com a censura
de seu telefone e de sua correspondência, reabilitou-se o casamento de Goebbels e Magda. Hitler recebeu
publicidade como o grande salvador das famílias. As fotografias publicadas no Berliner Illustrierte Zeitung
eram revoltantemente piegas, mostrando um Hitler sorrindo viscosamente, reconciliando o casal depois de
"pequenas tempestades". Goebbels e Magda passaram a ser vistos novamente em público, e com tal
freqüência, que abafaram os boatos de que estavam virtualmente separados e de que Magda arranjara
discretamente outro amante, um tal de Karl Hanke, enquanto que Goebbels continuava sua procura
insaciável de mulheres, porém de modo mais calmo. A babá das crianças escreveu, mais tarde, que "Para o
observador casual, era um lar muito bem organizado, com crianças saudáveis, bem comportadas e pais
amorosos. Na realidade, porém, a família estava-se desintegrando, a atmosfera doméstica era opressiva e, em
última análise, intolerável. Temíamos diariamente que uma catástrofe se abatesse sobre nós".

Catástrofe de natureza menos doméstica se abateu prodigamente sobre os exércitos alemães, na frente russa,
durante 1942. Foi então que Goebbels encontrou o substituto heróico para o Führer, substituto que inflamaria
a imaginação do público alemão.

O General Erwin Rommel tivera algumas boas oportunidades nos primeiros meses da batalha da França,
quando apareceu como um gênio da guerra blindada. Ele tinha outras qualidades que o indicavam para o
papel de herói público: seus antecedentes não eram aristocráticos, como sucedia com tantos generais da
Reichswehr, e não só planejava os ataques como também os dirigia pessoalmente.

E os dirigia de maneira extremamente eficaz - para considerável embaraço do Ministério da Guerra britânico,
que estava recebendo relatórios sombrios do teatro de guerra da África do Norte. Churchill encontrara um
bode expiatório em Auchinleck, mas encontrar bodes expiatórios nada obstava aos avanços dos exércitos
panzer, que ameaçavam empurrar as forças aliadas para o mar. Além disso, os próprios britânicos
começavam a ter grande respeito por Rommel, cujas táticas só podiam ser admiradas, que superava seus
adversários com arrojo e tinha sob seu comando a nata das forças blindadas.

Rommel foi imensamente valioso para Goebbels. Do ponto de vista da propaganda, ele era uma jóia
esplendorosa em ruas cheias de escombros - literalmente, ruas cheias de escombros porque as forças aéreas
aliadas haviam iniciado ataques devastadores contra importantes cidades alemães. Os relatos a respeito eram
relegados aos cantos melo escondidos dos jornais, enquanto que as páginas principais se enchiam com
notícias do heroísmo e do gênio das forças do deserto. Mudando-se, porém, os tempos, quando as batalhas de
Alamein fizeram Rommel recuar, tornou-se virtualmente impossível apresentar os fatos senão como fatos.
Nada podia ocultar que piorava a situação dos alemães na Frente Oriental, que Montgomery começava a
bater forte e a mudança de rumo no Extremo Oriente, após a Batalha de Midway. Com a vitória no deserto,
com os desembarques na costa norte-africana e com a grande batalha diante de Leningrado, aproximava-se o
momento decisivo da guerra. Goebbels viu-se obrigado a censurar seu pessoal dos jornais e do rádio por
desorientar o povo - especificamente no caso da vitória aliada em Tobruk, a qual eles transmitiram da
seguinte maneira, a 14 de novembro: "As tropas alemãs e italianas evacuaram Tobruk segundo os planos,
após a destruição de todas as instalações militares".

Na conferência do dia, "o Ministro... observa... que o moral do povo alemão já está bem baixo e que a
liderança não deve reduzi-lo ainda mais, abusando da confiança do povo".

E continuou-se a abusar da confiança do povo. (Naturalmente, é impossível travar uma guerra com o povo
confiando completamente nos generais: mas há graus de engano justificáveis.) Goebbels emitiu uma diretiva
que dizia: "Devemos neutralizar novamente e negar de maneira resoluta os números astronômicos publicados
pelos bolchevistas sobre nossas baixas na luta em Stalingrado". Todo o 6° Exército alemão, comandado por
Paulus, e parte do 4o Exército Panzer estavam cercados. As baixas sofridas pelo Eixo atingiriam a cerca de
meio milhão de homens. Mas somente dois meses depois, em janeiro de 1943, é que Goebbels faria um
comunicado escrito, e de maneira atenuada: "Na área de Stalingrado, nossas tropas, que há algumas semanas
estão empenhadas em heróica luta defensiva contra um inimigo que ataca por todos os lados, continuaram a
repelir ontem os poderosos ataques da infantaria e das formações blindadas inimigas, com pesadas baixas
para os bolchevistas. Desse modo, comandantes e soldados deram, mais uma vez, brilhante exemplo do
heróico espírito de bravura alemão". Duas semanas depois Paulus rendeu-se e teve início uma retirada geral
na frente oriental. No resto daquele ano só haveria as grandes batalhas da Curva do Dnieper. Em fins de
fevereiro de 1944 já a costa do Báltico estava desimpedida; e pouco mais de três meses depois teve início a
invasão da Europa ocupada. Foi uma época espinhosa para Goebbels.
A 8 de setembro de 1943, a Itália capitulou, registrando-se esse verdadeiro desastre político no pior momento
possível para a Alemanha. "O bloco anglo-americano não pode parar de exultar com a inversão da situação
de 1940, quando a França caiu." A capitulação da Itália só podia ser atribuída ao "traidor Rei da Itália, que
apunhalou pelas costas o aliado alemão". Goebbels não tinha outro argumento para usar até que Mussolini
foi salvo, por pára-quedistas alemães, da prisão para onde fora mandado pelo governo Badoglio e colocado à
frente de um governo títere instalado no norte da Itália, ainda ocupado por tropas germânicas. Ele valeu-se
do salvamento para transfundir ânimo no moral do povo. "Do ponto de vista do moral popular, o salvamento
de Mussolini foi tratado de modo a dar a impressão de uma batalha vitoriosa", observou em suas memórias o
comentarista oficial militar alemão, General Kurt Dittman. Mas não foi uma vitória: foi simplesmente uma
providência destinada a neutralizar o efeito dos desastres que vinham ocorrendo e dos que estavam
iminentes.

Naturalmente, o Serviço de Inteligência alemão sabia que estava em planejamento a invasão, mas não sabia
ao certo o local em que se verificaria. O Serviço de Inteligência britânico desorientara deliberadamente o
Alto Comando Alemão quanto ao local do principal peso do ataque e quanto à Ordem de Batalha Aliada. O
logro foi muito bem sucedido. Embora impossível a ocultação do fato de que o ataque seria desfechado na
área geral de Cherbourg-Dunquerque, a incerteza sobre se ele ocorreria na parte leste ou oeste daquela ampla
faixa de costa e se haveria ataques simulados, confundiu consideravelmente os planos defensivos alemães.

Em sua propaganda, Goebbels adotou o blefe da indiferença e da ameaça de novas armas, de grande poder de
devastação, "para reduzir Londres a cinzas" à medida que se tornava cada vez mais certo que o verão de
1944 traria consigo o ponto culminante da guerra. Ele mandou fazer transmissões para a Grã-Bretanha,
destinadas a solapar a confiança no sucesso da invasão: "Só estamos esperando que vocês cheguem aqui!
Então lhes faremos uma recepção que jamais esquecerão! Não pode haver defesa ou aviso contra nossa nova
arma, que jogará Londres no chão enquanto suas forças invasoras estiverem sendo obliteradas nos locais de
desembarque que vocês acreditam ser tão secretos".

Às 04:00 h de 6 de junho, ele foi despertado com os primeiros informes dos desembarques Aliados. "Graças
a Deus eles finalmente chegaram!" exclamou ele para seu criado de quarto. "Agora começa o último
assalto!"

Embora não pudesse fazer muita coisa para difundir a crença de que a invasão Aliada era um fracasso, já que
os ataques, culminando com a penetração em Avranches, deixaram indiscutivelmente claro que foram um
sucesso, ele recorreu à insinuação velada: "Não quero discutir o fato de que o inimigo conseguiu alguns
êxitos iniciais. Contudo, posso muito bem imaginar - embora não queira afirmá-lo claramente - que nossa
estratégia admite uma penetração maciça do inimigo no continente para, desse modo, infligir-lhe uma derrota
decisiva". Embora Goebbels não percebesse nada de estratégia e todos soubessem disso, a insinuação sutil de
que ele tinha informações bem fundadas foi eficaz. E ele acentuou o feito com energia. Os informes oficiais
deixavam transparecer que os exércitos aliados estavam recebendo a corda com que se enforcariam, que, tão
logo estivessem refestelados na França, o nó seria apertado. As tropas foram informadas disso por meio de
panfletos singularmente tolos. Eram escritos de maneira tosca e a grafia era pior ainda, certamente por
pensarem que o soldado britânico ainda se considerava um Tommy e o marinheiro um Jolly Jack Tar -
apelidos que haviam desaparecido com a guerra do Kaiser; supunham que ele se retrairia pela ameaça
subentendida:
"Tommy! Você acha que Gerry lhe permitiria penetrar tanto, se não tivesse planos para rechaçá-lo quando
chegar a hora? Você sentiu a urgência na atmosfera e no fundo sabe que a vingança está próxima. Renda-se
agora, antes que sua mulher e sua namorada não possam mais aguardar a sua volta."

Havia outros papéis que falavam dos perigos que ameaçavam os entes queridos que haviam ficado em casa:
"Seus oficiais não lhe disseram nada sobre a arma secreta do Gerry que está bombardeando dia e noite as
casas e os castelos de sua pátria e que neste exato momento pode ter arrasado seu lar, com seus entes
queridos dentro? O Alto Comando Alemão não é tão ingênuo quanto você pensa. A invasão já fracassou.
Você jamais chegará ao solo alemão! Espere e verá!"

Outros panfletos se concentravam na pornografia grosseira. Sefton Delmer, o jornalista britânico que foi
transferido para o Departamento de Inteligência Política do Ministério das Relações Exteriores durante a
guerra, diz-nos que na França, em 1939, "um risonho tenente francês" lhe mostrou uma das tentativas de
Goebbels de desmoralizar as tropas francesas. "Ela consistia de um pequeno retrato, impresso em papel
muito fino, mostrando um soldado francês cumprindo seu dever na frente de batalha. Mas quando se
colocava esse retrato contra a luz, a cena mudava completamente. No lugar do bravo poilu, via-se, com todos
os detalhes, um soldado britânico fornicando com o que a legenda chamava de a noiva do francês." A
tentativa foi bem sucedida, pois intensificou uma situação de desmoralização que já existia; mas a repetição
do golpe fracassou, quando dirigido ao soldado britânico de invasão. Neste caso, o cérebro que bolou a trama
colocou um pracinha americano fornicando, segundo a legenda, com a namorada de um inglês.

A arma secreta citada era, naturalmente, o avião sem piloto que o próprio Goebbels batizara de "a arma da
vingança [Vergeltung]". A primeira dessas bombas-voadoras foi lançada nove dias após o Dia "D", a 15 de
junho, e os primeiros foguetes fizeram as suas devastadoras parábolas a 8 de setembro. Visavam os nazistas,
com tais armas, tanto à desmoralização quanto à destruição; mas os sucessos Aliados nos arredores de Caen e
na França Ocidental, no Extremo Oriente (onde as tentativas que os japoneses fizeram de invadir a Índia
foram repelidas na batalha de Imphal), e na Frente Oriental, onde o avanço russo até a Polônia e o levante da
resistência em Varsóvia haviam dizimado o que restava dos exércitos alemães, foram como goles de vinho
tonificante para um povo que havia sofrido calamidade atrás de calamidade até o ano decisivo de 1942. Era
impossível a mais leve sombra de desmoralização. A "arma secreta" chegou tarde demais para vingar-se. O
avanço de cinco dias do 2o Exército de Montgomery, desde o Sena até Antuérpia, havia levado de vencida
todos os locais de lançamento no Passo de Calais, e os ataques realizados por bombardeiros pesados aos
centros de produção reduziram seriamente as quantidades fabricadas. Muita destruição foi causada (mais de
um milhão de casas foram destruídas ou danificadas) e as baixas entre civis foram numerosas, mas nada
podia ocultar o fato de que a Alemanha estava sendo submetida a um verdadeiro processo - de esmagamento
pelos Aliados. E, embora houvesse reveses - os desembarques aeroterrestres em Arnhem e o ataque final de
Hitler nas Ardenas foram exemplos disso - a situação na Grã-Bretanha foi aliviada, em todos os sentidos,
inclusive pela notícia do atentado contra a vida de Hitler, a 20 de julho, e pela suspensão do black-out. Para
Goebbels, não tendo mais cabida a propaganda, tudo terminado. Com os exércitos aliados nas fronteiras
alemães, nada justificava qualquer tentativa de convencimento de que havia esperanças e muito menos
possibilidades de triunfo. Mas, houve uma medida que lhe aumentou ainda mais o poder pessoal. No dia
seguinte ao atentado em Rastenburg (20 de julho), Hitler conferiu-lhe o titulo de Diretor do Reich para
Guerra Total. Ele disse numa transmissão radiofônica: "Ontem o Führer baixou uma ordem, publicada hoje
pela imprensa, determinando uma reformulação dos órgãos do Estado, ferrovias, correios, instituições
públicas em geral, as organizações e empresas particulares, com vistas a liberar o maior número de homens
para a indústria de armamentos e para as Forças Armadas, através de um emprego ainda mais racional dos
que agora servem nas mencionadas empresas, eliminando ou diminuindo as tarefas menos importantes para o
esforço de guerra, e através de uma simplificação da organização e dos procedimentos. Também de acordo
com essa ordem, toda a vida pública tem de ser adaptada, em todos os aspectos, às necessidades da guerra
total. A atividades públicas têm de se conformar com os objetivos da guerra total e, em particular, não podem
tirar ninguém das forças armadas nem da indústria de armamentos; numa palavra, a guerra total está em
prática. A orientação dessa gigantesca reforma cabe ao Curador do Reich para a Guerra Total, que para se
desincumbir da missão receberá do Führer amplos poderes. A pedido do Marechal do Reich, o Führer
confiou-me essa tarefa e nomeou-me Curador do Reich para a Guerra Total"

A primeira "medida prática" foi chamar às contas os conspiradores do complô de Rastenburg. Eles atingiram
a casa dos milhares, pois os arquivos de Himmler foram cuidadosamente examinados em busca dos que
tivessem, em qualquer momento, deixado margem à mais leve suspeita de envolvimento. Todos foram
assassinados ou mandados para campos de concentração sem julgamento. Mas os participantes mais
importantes da conspiração tinham de ser transformados em exemplo. Somente Rommel, um dos envolvidos,
teve permissão de cometer suicídio para escapar ao julgamento. Os oito líderes da conspiração foram
surrados, torturados, submetidos a um arremedo de julgamento e enforcados em cordas de piano amarradas
em ganchos de carne, sendo o garroteamento bem prolongado, para infligir o máximo de dor.

Terminados seus dias de propagandista, Goebbels transformou em válvulas de escape a maldade e a profecia
sombria. Sua maldade, exemplificada na carnificina que promoveu entre os pretensos atacantes do Führer,
foi uma demonstração da capacidade que tinha de se mutifacetar. O talento natural que possuía para deturpar
a mente do povo transmudou-se em talento para torcer corpos. Quanto às suas profecias sombrias, elas
tomaram a forma de negativas de que ainda houvesse flechas na aljava alemã. "Não nos enganemos", disse
ele na conferência da manhã de 29 de novembro de 1944, "não nos resta nada. Não existem armas
miraculosas!"
Era o reconhecimento da falência da sua própria propaganda. Desde a invasão, ele vinha berrando por todos
os meios ao seu alcance, que a situação seria salva pelas armas miraculosas, pela brilhante estratégia do
Führer, pelo heroísmo das forças alemães e pela implacável resistência do povo germânico contra as "hordas
bolchevistas" que avançavam. Depois das V-1 e V-2 não houve surpresas em armas; o valor das forças
alemães foi superado pelo simples peso dos números; a estratégia do Führer era tão louca quanto ele próprio;
e a ameaça das hordas bolchevistas que se aproximavam fazia com que a população das cidades por onde
deveriam passar arrumassem seus pertences e fugissem, bloqueando as estradas para tropas e suprimentos.

Apesar do desespero com que encarava o futuro, Goebbels conseguiu animar um pouco o perdido
entusiasmo quando a batalha das Ardenas foi travada, no Natal de 1944. Ele arengou que o inimigo teve de
abandonar todos os planos de ataque diante da arremetida dos exércitos alemães. Anunciou alegre que o
Comandante do 47° Corpo Blindado alemão exigira a rendição da Bastogne e que o final vitorioso da
campanha das Ardenas estava próximo. (Ele não acrescentara que o comandante americano dos defensores
da Bastogne havia respondido, com vigor, com uma única palavra: "Nuts!") Realmente, o fim estava
próximo - da campanha das Ardenas e de tudo o mais; mas não com a vitória das forças nazistas. Os berros
de alegria de Goebbels transformaram-se em resmungos de possível concordância entre a Grã-Bretanha,
Estados Unidos e Alemanha numa luta unida contra o Terror Vermelho do Bolchevismo. Se podia acreditar
em tal fantasia, ele podia acreditar em qualquer coisa - inclusive na possibilidade de um movimento de
resistência da ralé da cidade, chamado "Os Lobisomens", para defender Berlim até a última trincheira.

Não havia nada mais que uma defesa simbólica de Berlim. A 22 de abril de 1945, as tropas russas entraram
nos subúrbios norte da cidade. Hitler estava em seu abrigo subterrâneo, na Chancelaria, tendo acessos de
fúria e ditando comunicados radiofônicos dirigidos ao povo, afirmando que o Führer ficaria em Berlim e
morreria com o povo, se necessário. Ele então mandou chamar Goebbels, Magda e seus filhos, certo de que
eram os únicos seguidores que ficariam na sua companhia até o fim - "Tudo o mais é traição, corrupção,
mentira e covardia". Ele tinha boas razões para a explosão. Goering estava em Obersalzburg, aguardando a
ordem para assumir a liderança do Reich e Himmler estava em Lübeck, cooperando secretamente com o
Conde Bernadotte para apresentar uma nota de rendição ao General Eisenhower, contanto que ele, Himmler,
recebesse poderes ditatoriais. Goebbels veio imediatamente, trazendo Magda e as crianças. Durante seis dias
eles permaneceram com Hitler e sua amante, Eva Braun, enquanto os russos cercavam a cidade e as bombas
caíam sobre a Chancelaria. Na manhã de domingo, 29 de abril, ele foi convocado para a tarefa macabra de
ser padrinho do casamento do Führer. Imediatamente após a cerimônia, ele o nomeou Chanceler designado
do Terceiro Reich por decreto (Goering, Himmler e Ribbentrop sendo eliminados como traidores) e ordenou-
lhe que deixasse Berlim, com sua família, enquanto - segundo se pensava - havia tempo.

Mas Goebbels negou a si mesmo, e à sua família, a pequena possibilidade de fuga. Assim fazendo, provou o
seu amor fanático pelo Führer, tão monotonamente expressado nos seus primeiros diários.

"O Führer ordenou-me", escreveu ele, "caso a capital do Reich caísse, que deixasse Berlim. Pela primeira
vez na vida tenho de recusar-me, categoricamente, a obedecer o seu comando. Minha mulher e meus filhos
concordam com a recusa. Para não me considerar, pelo resto da vida, um traidor desonrado e um vil canalha
que perdeu o amor próprio e o respeito do seu povo.

"No torvelinho da traição que cerca o Führer nestes dias críticos da guerra, há de haver pelo menos um que
permaneça a seu lado até a morte.

"Acredito que, assim fazendo, estou prestando o melhor serviço ao povo alemão que, nos tempos difíceis que
o aguardam, precisará de exemplos, mais que de homens. Sempre se pode encontrar quem conduza a nação
no caminho da Liberdade. Mas a reconstrução da nossa vida plena como nação seria impossível se não se
fundamentar em exemplos claros, vívidos. Por esta razão falo em nome de minha mulher e dos meus filhos,
que são jovens demais para falarem por si mesmos, mas que concordariam plenamente com minha decisão se
fossem mais velhos, e expresso minha decisão irrevogável de não deixar a capital do Reich, se ela vier a cair.
Terminarei ao lado do Führer uma vida que nada valeria para mim se não estivesse a seu serviço e a seu lado.

O último dos Chanceleres do Reich Alemão, Paul Joseph Goebbels, prestou juramento no cargo, como
sucessor de Hitler, às 15:30 h da segunda-feira, 30 de abril. Alguns minutos antes, Hitler se suicidara, com
um tiro na boca, após presenciar a morte de Eva Braun, envenenada por ela própria. Seus corpos estavam
sendo cremados no jardim da Chancelaria. "Quanto a mim", disse Goebbels a Schwügermann, seu ajudante,
"também haverá uma pira funerária. Minha mulher e meus filhos se juntarão a mim. Mortos a tiros - no
coração e na cabeça. Depois, o fim ardente. Será um pequeno Valhala aqui no jardim. Götterdämmerung".

Eram estranhos deuses aqueles cujo crepúsculo caía. Mas que foram deuses, em seu tempo, não havia
dúvidas. Hitler, doente do corpo e do espírito, tinha os olhos fanaticamente voltados para o domínio do
mundo; Goering, corrupto e monstruosamente vaidoso; Himmler, fraco e eternamente em busca de alguém a
quem se apegar enquanto tramava seus loucos planos de "purificação" da raça alemã; e Goebbels, o mestre
da subversão das mentes, que obrigou um povo à obediência, pelo embuste e pela crueldade. Realmente
estranhos esses deuses.

Goebbels, enquanto as granadas caíam sobre a Chancelaria e à aproximação do inimigo - os sons das vozes
russas eram já ouvidos - levou calmamente os filhos à cama e começou a contar-lhes uma história para
dormir. Quando já dormindo, fez um sinal a Magda para que trouxesse o médico de Hitler, Dr. Ludwig
Sumpfegger, que durante as duas últimas semanas permanecera de serviço no abrigo subterrâneo. Uma a
uma, as crianças receberam uma injeção mortífera. A expressão que tinham na morte era tão pacífica quanto
o fim da história.

Alguns minutos depois, Goebbels e Magda saíram do abrigo para o jardim. Schwägermann os esperava com
uma pistola. No chão, ao lado dele, havia uma lata de gasolina. Ouviram-se dois tiros. Obedecendo ordens,
Schwägermann incendiou os corpos que foram descobertos, carbonizados, algumas horas depois, pelas
tropas do Marechal Zhukov. Fotografados os cadáveres, juntamente com os corpos inanimados das crianças,
desceram a uma vala comum - cujo local nem sequer foi anotado. Ironicamente, no anonimato de uma
sepultura perdida tombaram os restos do evangelista do Terceiro Reich.

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