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Equações Diferenciais de 1a.

Ordem
Reginaldo J. Santos
Departamento de Matemática-ICEx
Universidade Federal de Minas Gerais
http://www.mat.ufmg.br/~regi
19 de novembro de 2002

Sumário
1 Introdução às Equações Diferenciais 3
1.1 Classificação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.2 Soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.3 Equações Ordinárias de 1a. Ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

2 Equações Lineares de 1a. Ordem 9


2.1 Equações em que f depende apenas de t . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
2.2 Equações Lineares - Caso Geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

3 Equações Separáveis 15

4 Equações Exatas 20

5 Substituições em Equações de 1a. Ordem 24


5.1 Equações Homogêneas de 1a. Ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

6 Aplicações 26
6.1 Crescimento Populacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
6.1.1 Crescimento Exponencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

1
2 SUMÁRIO

6.1.2 Crescimento Logı́stico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27


6.2 Datação por Carbono 14 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
6.3 Trajetórias Ortogonais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


3

1 Introdução às Equações Diferenciais


Uma equação diferencial é uma equação em que as incógnitas são funções e a equação
envolve derivadas destas funções.

Exemplo 1. O movimento de um pêndulo simples de massa m e comprimento l é descrito


pela equação diferencial
d2 θ g
+ sen, θ = 0
dt2 l

Exemplo 2. Um sistema massa-mola composto de uma massa m presa a uma mola com
constante elástica k, sujeita a uma força de atrito Fa = −γ dx
dt
e uma força externa Fe (t)
é descrito pela equação diferencial

d2 x dx
m + γ + kx = Fe (t)
dt2 dt

Exemplo 3. Numa região em que não há cargas elétricas o potencial elétrico u(x, y, z)
em cada ponto (x, y, z) da região satisfaz a equação diferencial

∂2u ∂2u
+ = 0.
∂x2 ∂y 2

Exemplo 4. Um circuito RC é um circuito que tem um resistor de resistência R, um


capacitor de capacitância C e um gerador que gera uma diferença de potencial V0 (t). A
carga Q(t) no capacitor é descrita pela equação diferencial

dQ 1
R + Q = V0 (t).
dt C

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4 1 INTRODUÇÃO ÀS EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

1.1 Classificação
As equações são classificadas de acordo com o tipo, a ordem e a linearidade.

(a) Quanto ao tipo uma equação diferencial pode ser ordinária ou parcial. Ela é or-
dinária se as funções incógnitas forem funções de somente uma variável. Portanto as
derivadas que aparecem na equação são derivadas totais. Por exemplo, as equações
que podem ser escritas na forma

F (t, y, y 0 , y 00 , ...) = 0

são equações diferenciais ordinárias, como as equações dos Exemplos 1, 2 e 4. A


equação do Exemplo 3 é parcial.

(b) Quanto à ordem uma equação diferencial pode ser de 1a. , de 2a. , ..., de n-ésima
ordem dependendo da derivada de maior ordem presente na equação. Por exemplo,
uma equação diferencial ordinária de ordem n é uma equação que pode ser escrita
na forma
F (t, y, y 0 , y 00 , ..., y (n) ) = 0.

As equações diferenciais dos Exemplos 1, 2, 3 e 4 aparecem acima são de 2a. ordem.


Por exemplo, as equações dos Exemplos 1, 2 e 3 são de 2a. ordem e a equação do
Exemplo 4 é de 1a. ordem.

(c) Quanto a linearidade uma equação diferencial pode ser linear ou não linear. Ela é
linear se as incógnitas e suas derivadas aparecem de “forma linear”na equação. Por
exemplo, as equações dos Exemplos 2, 3 e 4 são lineares e a equação do Exemplo 1 é
não linear. Uma equação diferencial ordinária linear de ordem n com uma incógnita
é uma equação que pode ser escrita como

dy d2 y dn y
a0 (t)y + a1 (t) + a2 (t) 2 + . . . + an (t) n = f (t).
dt dt dt
As equações que não podem ser colocadas nesta forma são não lineares.

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1.2 Soluções 5

1.2 Soluções
Uma função y(t) é uma solução da equação se satisfaz a equação em algum intervalo.
As soluções podem ser dadas de forma explicita ou de forma implı́cita.
Exemplo 5. Considere a equação diferencial

dy 2x
=− , (1)
dx y

Vamos mostrar que a equação 2x2 + y 2 = C, em que C é uma constante, define duas
√ √
funções y1 (x) = C − 2x2 e y2 (t) = − C − 2x2 que são soluções da equação de duas
maneiras:

(a) Derivando as funções y1 (x) e y2 (x) obtemos

dy1 −2x dy2 2x


=√ e =√
dx C − 2x2 dx C − 2x2

Assim,
dy1 2x −2x 2x
+ =√ +√ =0
dx y1 C − 2x 2 C − 2x2
dy2 2x 2x 2x
+ =√ + √ =0
dx y2 C − 2x2 − C − 2x2
Assim, y1 (x) e y2 (x) satisfazem a equação (13). Elas são soluções dadas de forma
explicita.

(b) Derivando implicitamente a equação 2x2 + y 2 = C em relação a x obtemos

dy
4x + 2y =0
dx
ou
dy 2x
=− .
dx y
Assim, a equação 2x2 + y 2 = C define soluções da equação diferencial (13) dadas de
forma implı́cita.

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6 1 INTRODUÇÃO ÀS EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

2 4
y
3

5
1.5
2

4
4

5
1
3
1

3
2

0.5

2
5

0
x

4
4

5
−0.5
3

3
−1
2

2
5

−1.5
4 4

−2
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2

Figura 1: Elipses do Exemplo 5

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1.3 Equações Ordinárias de 1a. Ordem 7

1.3 Equações Ordinárias de 1a. Ordem


As equações diferenciais ordinárias de 1a. ordem são equações que podem ser escritas
como
F (t, y, y 0 ) = 0.

Vamos estudar equações de primeira ordem que podem ser escritas na forma

dy
= f (t, y)
dt
Quando resolvemos uma equação diferencial ordinária de 1a. ordem normalmente obte-
mos uma famı́lia de soluções que dependem de uma constante arbitrária. Se toda solução
do problema de valor inicial
dy
(
= f (t, y)
dt
y(t0 ) = y0
para um valor de t0 no intervalo de definição das soluções e para todas os valores de y0 ∈ R,
puder ser obtida da famı́lia de soluções que encontramos por uma escolha apropriada da
constante dizemos que a famı́lia de soluções é a solução geral da equação.

Exemplo 6. Considere a equação


dy
= 2y. (2)
dt
Vamos mostrar que a famı́lia de funções y(t) = Ce2t , para C uma constante arbitrária é
a solução geral da equação (2).

dy
(a) Derivando y(t) = Ce2t obtemos dt
= 2Ce2t . Assim,

dy
− 2y = 2Ce2t − 2Ce2t = 0.
dt
Assim, y(t) = Ce2t é solução da equação diferencial (2).

(b) A solução do problema de valor inicial

dy
(
=y
dt (3)
y(0) = y0

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8 1 INTRODUÇÃO ÀS EQUAÇÕES DIFERENCIAIS

2
y

1.5

1
2
1
3
4
0.5 5

2 1

0 0 0
x
−4
−0.5 −1
−5

−3

−1
−2

−1.5
−4

−2
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2

Figura 2: Soluções da equação do Exemplo 6

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9

pode ser obtida de y(t) = Cet . Pois, substituindo-se t = 0 e y0 em y(t) = Cet


obtemos
y0 = Ce0 = C

Assim, y(t) = Cet é a solução geral da equação diferencial (2) e y(t) = y0 et é solução do
problema de valor inicial (3).

2 Equações Lineares de 1a. Ordem


2.1 Equações em que f depende apenas de t
Se a função f não depende de y a equação anterior torna-se
dy
= f (t) (4)
dt
e é fácil de resolver integrando-se os dois lados. Assim a solução geral desta equação é
dada por Z
y(t) = f (t)dt + C.

Exemplo 7. A equação
dy
= sen(2t)
dt
pode ser resolvida por integração direta obtendo
cos(2t)
Z
y(t) = sen(2t) dt = − + C.
2

Exemplo 8. A equação
dy
= e3t
dt
pode ser resolvida por integração direta obtendo
e3t
Z
y(t) = e3t dt = + C.
3
A seguir veremos várias técnicas de se encontrar soluções de equações de 1a. ordem que
se baseiam em transformar a equação inicial em uma equação do tipo (4).

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10 2 EQUAÇÕES LINEARES DE 1A. ORDEM

3 y
3
2
2
2

2
1
1
1

1
0
0
0
0 x
−1
−1
−1
−1

−2
−2 −2
−2

−3
−3 −2 −1 0 1 2 3

Figura 3: Soluções da equação do Exemplo 7

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2.1 Equações em que f depende apenas de t 11

1
y
2
0.8

−10
0.6

0
0.4

−4

−8
−2

−6
0.2
0
0
x

−10
−0.2

−0.4 −2
−4

−8
−6

−0.6 −2

−0.8

−1
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

Figura 4: Soluções da equação do Exemplo 8

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12 2 EQUAÇÕES LINEARES DE 1A. ORDEM

2.2 Equações Lineares - Caso Geral


As equações lineares de 1a. ordem são equações que podem ser escritas como
dy
+ p(t)y = q(t). (5)
dt
Seja
R
p(t)dt
µ(t) = e .

Observe que
µZ ¶
dµ d R
p(t)dt
R
p(t)dt
= p(t)dt e = p(t)e = p(t)µ(t) (6)
dt dt
Multiplicando-se (5) por µ(t), obtemos
dy
µ(t) + p(t)µ(t)y = µ(t)q(t) (7)
dt

mas como por (6), p(t)µ(t) = , então (7) pode ser escrita como
dt
dy dµ
µ(t) + y = µ(t)q(t).
dt dt
Mas o lado esquerdo desta equação é a derivada de um produto o que faz com que ela
possa ser escrita na forma
d
(µ(t)y) = µ(t)q(t) (8)
dt
A equação (8) é uma equação autônoma (do tipo (4)), ou seja,
dY
= f (t)
dt
em que Y (t) = µ(t)y e f (t) = µ(t)q(t). Assim, a solução de (8) é dada por
Z
µ(t)y(t) = µ(t)q(t)dt + C.

Dividindo-se esta equação por µ(t) obtemos que a solução geral de (5) é dada por
µZ ¶
1
y(t) = µ(t)q(t)dt + C
µ(t)

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2.2 Equações Lineares - Caso Geral 13

Atenção: Não se deve memorizar a fórmula obtida no final. O que fizemos aqui foi
mostrar o caminho que deve ser seguido para resolver uma equação linear de 1a. ordem.

No próximo exemplo vamos seguir os mesmos passos que seguimos no caso geral.

Exemplo 9. Considere a equação


dy 2
+ y = t3 .
dt t
O fator integrante é
2 2
R
dt
µ(t) = e t = e2 ln t = eln t = t2 .

Multiplicando-se a equação acima por µ(t) obtemos:

dy
t2 + 2ty = t5 .
dt
ou
d ¡2
t y(t) = t5
¢
dt
Integrando-se obtemos
2 t6
t y(t) = + C
6
4
t C
y(t) = + 2 .
6 t

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14 2 EQUAÇÕES LINEARES DE 1A. ORDEM

10
y
8

16
−3
2

32
6
0

−32
4 −16
−16

0
2
32
16

16
0
0
x

32
−2

−4
16

−6
32

−8

−10
−10 −8 −6 −4 −2 0 2 4 6 8 10

Figura 5: Soluções da equação do Exemplo 9

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15

3 Equações Separáveis
As equações separáveis são equações que podem ser escritas na forma
dy
M (x) + N (y) = 0. (9)
dx
ou
dy M (x)
=− .
dx N (y)
Sejam Z Z
H1 (x) = M (x)dx e H2 (y) = N (y)dy.
Então
dH1 dH2
= M (x) e = N (y).
dx dy
Substituindo-se estes valores de M (x) e de N (y) na equação (9) obtemos
dH1 dH2 dy
+ = 0. (10)
dx dy dx
Mas, pela regra da cadeia
dH2 dH2 dy
= ,
dx dy dx
o que implica que (10) pode ser escrita como
dH1 dH2
+ =0 (11)
dx dx
ou
d
(H1 (x) + H2 (y(x))) = 0 (12)
dx
A equação (12) é do tipo (4), ou seja,
dY
= f (x)
dx
em que Y (x) = H1 (x) + H2 (y(x)) e f (x) = 0. Assim, a solução geral de (9) é dada por

H1 (x) + H2 (y) = C.

Atenção: Não se deve memorizar a fórmula obtida no final. O que fizemos aqui foi
mostrar o caminho que deve ser seguido para resolver uma equação separável.

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16 3 EQUAÇÕES SEPARÁVEIS

As curvas que são soluções de uma equação separável podem ser vistas como curvas
de nı́vel da função z = g(x, y) = H1 (x) + H2 (y).

Exemplo 10. Vamos, agora, encontrar a solução geral da equação diferencial do Exemplo
5 na página 5.
dy 2x
=− , (13)
dx y
Esta equação é equivalente a
dy
y + 2x = 0
dx
que pode ser escrita como
y2
µ ¶
d
+ x2 =0
dx 2
Assim a solução geral é dada implicitamente por

y2
+ x2 = C
2
As soluções são elipses que são curvas de nı́vel do parabolóide elı́ptico

y2
z = g(x, y) = + x2 .
2

Exemplo 11. Considere a equação diferencial

(ax2 + b)y 0 + xy 2 = 0, para a, b ∈ R, a 6= 0.

Isolando-se y 0 , obtemos
x
2
xy ax2+b
y0 = − =−
ax2 + b 1
y2
1
Multiplicando-se por obtemos
y2
1 dy x
2
+ 2 =0
y dx ax + b

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17

que pode ser escrita como


µ ¶
d 1 1
− + ln |ax2 + b| =0
dx y 2a

Assim a solução geral é dada implicitamente por


1 1
− + ln |ax2 + b| = C
y 2a
Neste exemplo podemos explicitar y como função de x obtendo a solução de forma explı́cita
1
y(x) = 1
2a
ln |ax2+ b| − C

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18 3 EQUAÇÕES SEPARÁVEIS

2 4
y
3

5
1.5
2

4
4

5
1
3
1

3
2

0.5

2
5

0
x

4
4

5
−0.5
3

3
−1
2

2
5

−1.5
4 4

−2
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2

Figura 6: Soluções da equação diferencial do Exemplo 10

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19

5
y
4

1
0
3

2
0
1
0 −1
−1 −2
−2 −2
0 1 0 2 −2 −1 1 0 2 −2 −1 1 0
x
2 2
−1
1

−2

−3
1

−4

−5
−5 −4 −3 −2 −1 0 1 2 3 4 5

Figura 7: Soluções da equação diferencial do Exemplo 11, para a = b = 1

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20 4 EQUAÇÕES EXATAS

4 Equações Exatas
As equações exatas são equações que podem ser escritas na forma
dy
M (x, y) + N (x, y) =0 (14)
dx
em que as funções M (x, y) e N (x, y) satisfazem
∂M ∂N
= . (15)
∂y ∂x
Se a condição (15) é satisfeita, então vamos mostrar que existe uma função ψ(x, y) tal
que
∂ψ ∂ψ
M (x, y) = e N (x, y) = (16)
∂x ∂y
Substituindo-se estes valores de M (x, y) e de N (x, y) em (14) obtemos
∂ψ ∂ψ dy
+ =0 (17)
∂x ∂y dx
Mas, pela regra da cadeia
d ∂ψ ∂ψ dy
(ψ(x, y(x))) = + .
dx ∂x ∂y dx
Então (17) pode ser escrita como
d
(ψ(x, y(x))) = 0, (18)
dx
A equação (18) é do tipo (4), ou seja,
dY
= f (x)
dx
em que Y (x) = ψ(x, y(x)) e f (x) = 0. Assim, a solução geral de (18) e portanto de (14)
é dada por
ψ(x, y(x)) = C. (19)
Vamos, agora, ver como encontrar a função ψ(x, y). Integrando-se a 1a. equação de
(16) em relação a x obtemos
Z
ψ(x, y) = M (x, y)dx + h(y), (20)

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21

em que h(y) é uma função a ser determinada. ψ(x, y) dada por (20) é solução da 1a.
equação de (16) pois derivando a equação (20) em relação a x obtemos a 1a. equação de
(16). Substituindo-se a função ψ(x, y) encontrada em (20) na 2a. equação de (16) obtemos
µZ ¶
∂ψ ∂ dh ∂M dh
Z
N (x, y) = = M (x, y)dx + = dx + .
∂y ∂y dy ∂y dy

Daı́ obtemos uma equação diferencial para h(y):


dh ∂M
Z
= N (x, y) − dx. (21)
dy ∂y
Se a equação (14) é exata o lado esquerdo de (21) não depende de x, pois usando (15)
obtemos
µ ¶ µZ ¶
∂ ∂M ∂N ∂ ∂M ∂N ∂M
Z
N (x, y) − dx = − dx = − = 0.
∂x ∂y ∂x ∂x ∂y ∂x ∂y

A equação (21) é do tipo (4), ou seja,


dZ
= f (y)
dy

em que Z(y) = h(y) e f (y) = N (x, y) − ∂M


R
∂y
dx. Assim, uma solução é dada por
Z µZ ¶
∂M
Z
h(y) = N (x, y)dy − dx dy.
∂y

Substituindo-se este valor de h(y) em (20) obtemos


Z µZ ¶
∂M
Z Z
ψ(x, y) = M (x, y)dx + N (x, y)dy − dx dy.
∂y

Portanto a solução geral da equação exata (14) é, por (19),


Z µZ ¶
∂M
Z Z
ψ(x, y) = M (x, y)dx + N (x, y)dy − dx dy = C
∂y

Atenção: Não se deve memorizar a fórmula obtida no final. O que fizemos aqui foi
mostrar o caminho que deve ser seguido para resolver uma equação exata.

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22 4 EQUAÇÕES EXATAS

Exemplo 12. Considere a equação diferencial

2xy 2 y
+ y 0 = 1.
(1 − 2x2 )2 1 − 2x2
Para esta equação,

2xy 2 y
M (x, y) = − 1 e N (x, y) = .
(1 − 2x2 )2 1 − 2x2
Assim,
∂M 4xy
=
∂y (1 − 2x2 )2
∂N (−1)(−4x) 4xy
=y 2 2
=
∂x (1 − 2x ) (1 − 2x2 )2
∂M ∂N
Como = , então a equação é exata. Vamos encontrar uma função ψ(x, y) tal que
∂y ∂x

∂ψ 2xy 2 ∂ψ y
= M (x, y) = −1 e = N (x, y) =
∂x (1 − 2x2 )2 ∂y 1 − 2x2
Integrando-se a 1a. equação em relação a x obtemos

2xy 2 y2
Z µ ¶
2 −1 −1
ψ(x, y) = − 1 dx = y · − x + h(y) = − x + h(y)
(1 − 2x2 )2 2 1 − 2x2 2(1 − 2x2 )

∂ψ y
Substituindo-se a função ψ(x, y) encontrada na equação de = obtemos
∂y 1 − 2x2
y dh y
2
+ = .
1 − 2x dy 1 − 2x2
Esta equação é equivalente a
dh
=0
dy
que tem solução geral h(y) = C1 e uma solução particular é h(y) = 0. Assim, a solução
geral da equação é dada implicitamente por

y2
ψ(x, y) = −x=C
2(1 − 2x2 )

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23

y
1

0
0.8
−0.5

0.5
0.6

0
0.4
0

0
−0.5
0.2

0
x
5
0.5

−0.2 −0.
0

−0.4

0.5 0
−0.5

−0.6
0
0.5

−0.8

−1

−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

Figura 8: Soluções da equação diferencial do Exemplo 12

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24 5 SUBSTITUIÇÕES EM EQUAÇÕES DE 1A. ORDEM

5 Substituições em Equações de 1a. Ordem


Vamos estudar algumas equações de 1a. ordem que podem ser transformadas em equações
já estudadas em seções anteriores.

5.1 Equações Homogêneas de 1a. Ordem


As equações homogêneas de 1a. ordem são equações que podem ser escritas como
dy
= F (y/x) (22)
dx
Ou seja, o lado direito da equação (22) apesar de depender de x e de y, depende apenas
do quociente y/x. Seja
v = y/x.
Então
y = vx
e derivando o produto vx em relação a x obtemos
dy dv
= x + v.
dx dx
dy
Substituindo-se este valor de e y/x = v na equação (22) obtemos a equação
dx
dv
x + v = F (v)
dx
ou
dv
x + v − F (v) = 0.
dx
1
Multiplicando-se por esta equação se torna
x(v − F (v))
1 dv 1
+ = 0, (23)
v − F (v) dx x
que é uma equação separável. Podemos encontrar a solução geral desta equação usando
a técnica apresentada na Seção 2.2, página 15. Depois de encontrada a solução geral da
equação (23) devemos substituir
v = y/x

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


5.1 Equações Homogêneas de 1a. Ordem 25

para encontrar a solução geral de (22).

Exemplo 13. Considere a equação


dy 2y − 4x
=
dx 2x − y
Dividindo numerador e denominador por x obtemos

dy 2y/x − 4
= .
dx 2 − y/x

Seja v = y/x. Então y = vx e derivando o produto vx em relação a x obtemos

dy dv
= x + v.
dx dx
dy
Substituindo-se este valor de e y/x = v na equação obtemos
dx
dv 2v − 4
x +v =
dx 2−v
dv
Isolando-se dx
obtemos
2v−4 −v 2 +4 1
dv v − 2−v 2−v x
=− =− =− 1 .
dx x x v+2

1
Multiplicando-se por esta equação se torna
v+2
1 dv 1
+ =0
v + 2 dx x
ln |v + 2| + ln |x| = C1

ln |(v + 2)x| = C1

(v + 2)x = C

Substituindo-se v = y/x obtemos


y + 2x = C

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26 6 APLICAÇÕES

6 Aplicações
6.1 Crescimento Populacional
6.1.1 Crescimento Exponencial

O modelo mais simples de crescimento populacional é aquele em que se supõe que a taxa
dy
de crescimento de uma população dt
é proporcional a população presente naquele instante
y(t).
dy
= ky.
dt
Esta é uma equação linear, que pode ser escrita como

dy
− ky = 0. (24)
dt
Para resolvê-la precisamos determinar o fator integrante
R
−kdt
µ(t) = e = e−kt

Multiplicando-se a equação (24) por µ(t) = e−kt obtemos

d −kt
(e y) = 0
dt
Integrando-se ambos os membros obtemos

e−kt y(t) = C ou y(t) = Cekt

Exemplo 14. Uma população de bactérias cresce a uma taxa proporcional a população
presente. Sabendo-se que após uma hora a população é 2 vezes a população inicial, vamos
determinar a população como função do tempo e o tempo necessário para que a população
triplique.
A população cresce a uma taxa proporcional a população presente significa que a
população y(t) satisfaz a equação
dy
= ky.
dt

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.1 Crescimento Populacional 27

que como vimos acima tem solução geral

y(t) = Cekt

Se chamamos de y0 a população em t = 0, então substituindo-se t = 0 e y = y0 obtemos

y0 = Cek·0 = C ⇒ C = y0

Como em uma hora a população é o dobro da população original, então substituindo-se


t = 1 e y = 2y0 obtemos
2y0 = y0 ek ⇒ k = ln 2

Assim, a equação que descreve como a população de bactérias varia com o tempo é

y(t) = y0 e(ln 2)t

Agora para sabermos em quanto tempo a população triplica substituimos y(t) = 3y 0 e


determinamos t que é
ln 3
t= .
ln 2

6.1.2 Crescimento Logı́stico

Para levar em conta que a população y(t) tem um valor limite yF podemos supor que a
taxa de crescimento é proporcional também a diferença entre yF e a população presente.
Neste caso a população y(t) satisfaz a equação diferencial

dy
= ky(yF − y)
dt
Para simplificar as contas que virão defina r = kyF . A equação se transforma em
dy
= ry(1 − y/yF )
dt
Esta é uma equação separável e pode ser escrita como
dy r
= ry(1 − y/yF ) = 1
dt y(1−y/yF )

19 de novembro de 2002 Reginaldo J. Santos


28 6 APLICAÇÕES

1
Multiplicando-se a equação por y(1−y/yF )
obtemos

1 dy
−k =0
y(1 − y/yF ) dt
1
Vamos decompor y(1−y/yF )
em frações parciais:

1 A B
= +
y(1 − y/yF ) y 1 − y/yF
Multiplicando-se a equação acima por y(1 − y/yF ) obtemos

1 = A(1 − y/yF ) + By = (−A/yF + B)y + A

Comparando-se os termos de mesmo grau obtemos A = 1 e B = A/yF = 1/yF . Assim,


1 1 1
Z Z Z
dy = dy + (1/yF ) dy = ln |y| − ln |1 − y/yF |
y(1 − y/yF ) y 1 − y/yF
Logo
1 dy
−k =0
y(1 − y/yF ) dt
pode ser escrita como
d
(ln |y| − ln |1 − y/yF | − kt) = 0
dt
que tem solução
ln |y| − ln |1 − y/yF | − kt = C1
¯ ¯
¯ y ¯
ln ¯
¯ ¯ = C1 + kt
1 − y/yF ¯
y
= eC1 ekt = Cekt
1 − y/yF
Seja y0 a população no instante t = 0. Então substituindo-se t = 0 e y = y0 na equação
y0 y0 yF
acima obtemos que C = 1−y0 /yF
= yF −y0

y = (1 − y/yF )Cekt ⇒ y + Cekt y/yF = Cekt

Portanto a solução da equação é


y0 yF kt
Cekt yF −y0
e y0 yF ekt y0 yF
y(t) = = y y = =
1 + Cekt /yF 1 + yF −y0 ekt
0 F
yF − y0 + y0 ekt (yF − y0 )e−kt + y0

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.2 Datação por Carbono 14 29

6.2 Datação por Carbono 14


A proporção de carbono 14 (radioativo) em relação ao carbono 12 presente nos seres vivos
é constante. Quando um organismo morre a absorção de carbono 14 cessa e a partir de
então o carbono 14 vai se transformando em carbono 12 a uma taxa que é proporcional a
quantidade presente:
dy
= −ky
dt
Já vimos que esta equação tem solução

y(t) = y0 e−kt ,

em que y0 é a quantidade no instante t = 0.

Exemplo 15. Em um pedaço de madeira é encontrado 1/500 da quantidade original de


carbono 14. Sabe-se que a meia-vida do carbono 14 é de 5600 anos, ou seja, que em 5600
anos metade do carbono 14 presente transformou-se em carbono 12. Vamos determinar a
idade deste pedaço de madeira.
y(t) = y0 e−kt
ln 2
y0 /2 = y0 e−k·5600 ⇒ k=
5600
y0 ln 500 5600 ln 500
= y0 e−kt ⇒ t= = ≈ 50200anos
500 k ln 2

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30 6 APLICAÇÕES

6.3 Trajetórias Ortogonais


Considere uma famı́lia F de curvas que pode ser representada por uma equação diferencial
da forma
dy
= f (x, y). (25)
dx
Dado um ponto qualquer (x0 , y0 ), o coeficiente angular da reta tangente a uma curva
da famı́lia F que passa por este ponto é dado por tan α = f (x0 , y0 ), pois como a curva
dy
satisfaz (25), este é o valor da derivada em (x0 , y0 ). Uma curva que passa por (x0 , y0 )
dx
de forma que a sua tangente neste ponto seja ortogonal à tangente da curva da famı́lia F
tem reta tangente com coeficiente angular dado então por tan β = −1/f (x0 , y0 ). Assim
a equação diferencial que representa a famı́lia de curvas que interceptam ortogonalmente
as curvas da famı́lia F é
dy 1
=− .
dx f (x, y)
As curvas que são solução desta equação são chamadas trajetórias ortogonais às curvas
da famı́lia F.

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.3 Trajetórias Ortogonais 31

β
α
y0

x0

Figura 9: Trajetórias Ortogonais: a curva que passa por (x0 , y0 ) que tem reta tangente
com inclinação tan α = f (x0 , y0 ) é ortogonal à curva que passa por (x0 , y0 ) que tem
1
inclinação tan β = − .
f (x0 , y0 )

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32 6 APLICAÇÕES

1.5
y

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5
−1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5

Figura 10: As parábolas de equações y = cx2 (preto) são as trajetórias ortogonais das
elipses de equações x2 + 2y 2 = c (azul).

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.3 Trajetórias Ortogonais 33

1.5
y

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5
−1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5

c
Figura 11: As hipérboles de equações y = (preto) são as trajetórias ortogonais das
x
hipérboles de equações x2 − y 2 = c (azul).

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34 6 APLICAÇÕES

1.5
y

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5
−1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5

Figura 12: As circunferências de equações x2 + (y − c)2 = c2 (preto) são as trajetórias


ortogonais das circunferências de equações (x − c)2 + y 2 = c2 (azul).

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6.3 Trajetórias Ortogonais 35

1.5
y

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5
−1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5

Figura 13: As curvas de equações y 2 + c(1 − 2x2 ) = 0 (preto) são as trajetórias ortogonais
2 2
das curvas de equações xe−x −y = c (azul).

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36 6 APLICAÇÕES

Exercı́cios
Determine as trajetórias ortogonais às famı́lias de curvas dadas. Faça um esboço dos
gráficos.

1. x2 + 3y 2 = c
c
2. y =
x3
3. y 2 = 2(x − c)

4. y = cx4

5. x2 − 2y 2 = c

6. y = ce2x

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.3 Trajetórias Ortogonais 37

Respostas dos Exercı́cios


1. y = cx3

1
y
0.8

0.6

0.4

0.2

0
x
−0.2

−0.4

−0.6

−0.8

−1
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

2. 3y 2 − x2 = c

1
y
0.8

0.6

0.4

0.2

0
x
−0.2

−0.4

−0.6

−0.8

−1
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

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38 6 APLICAÇÕES

3. y = ce−x

2
y

1.5

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5

−2
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2

4. x2 + 4y 2 = c

1
y
0.8

0.6

0.4

0.2

0
x
−0.2

−0.4

−0.6

−0.8

−1
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002


6.3 Trajetórias Ortogonais 39

c
5. y =
x2

1
y
0.8

0.6

0.4

0.2

0
x
−0.2

−0.4

−0.6

−0.8

−1
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

6. y 2 = −(x − c)

2
y

1.5

0.5

0
x

−0.5

−1

−1.5

−2
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2

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40 REFERÊNCIAS

Referências
[1] William E. Boyce and Richard C. DiPrima. Equações Diferenciais Elementares e
Problemas de Valores de Contorno. Livros Técnicos e Cientı́ficos Editora S.A., Rio de
Janeiro, 7a. edition, 2002.

[2] Erwin Kreiszig. Matemática Superior. Livros Técnicos e Cientı́ficos Editora S.A., Rio
de Janeiro, 2a. edition, 1985.

[3] Dennis G. Zill and Michael R. Cullen. Equações Diferenciais. Makron Books, São
Paulo, 3a. edition, 2001.

Equações Diferenciais Lineares de 1a. Ordem 19 de novembro de 2002

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