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Doenças Relacionadas com o Trabalho: Diagnóstico e Condutas – Manual de Procedimentos para os Serviços de Saúde

Ministério da Saúde – OPS – Capítulo 3

Capítulo 3

BASES TÉCNICAS PARA O CONTROLE DOS FATORES DE RISCO E A MELHORIA DOS


AMBIENTES E CONDIÇÕES DE TRABALHO

A eliminação ou a redução da exposição aos fatores de risco e a melhoria dos ambientes de trabalho para promoção e proteção
da saúde dos trabalhadores representa um imperativo ético, por vêzes respaldado pelos instrumentos legais e viabilizado
pela tecnologia disponível. Apesar da distância que ainda separa a realidade desta “declaração de princípios”, cresce na
atualidade, no âmbito da sociedade, a preocupação com o meio ambiente e a saúde das populações residentes na área de
influência das unidades produtivas, dando corpo a um movimento que busca a mudança de processos de trabalho
potencialmente lesivos para a saúde das populações e o ambiente.

No que se refere à saúde dos trabalhadores, as medidas de promoção da saúde e prevenção de doenças e agravos relacionados
ao trabalho podem ser classificadas em:
 Medidas aplicáveis aos processos e ambientes de trabalho; e
 Medidas aplicáveis ao trabalhador individualmente.

Qualquer que seja a alternativa adotada, preferencialmente ambas, de modo complementar, é


importante considerar a importância da participação efetiva dos trabalhadores em todas as etapas do
processo: desde a identificação e dimensionamento do problema, a definição das estratégias e
alternativas de controle, sua implementação, acompanhamento e avaliação.

As medidas de eliminação e controle de risco aplicáveis aos processos e ambientes de trabalho são
sempre mais eficientes e abrangem, em geral, o coletivo de trabalhadores da empresa ou
estabelecimento. São geralmente soluções técnicas ou de engenharia de processos direcionadas para:

 Substituição do agente ou substância tóxica por outro (a) menos lesiva ou tóxica - podem
ser substituídas matérias primas, produtos intermediários ou podem ser reformulados os produtos
finais, com a finalidade de diminuir a toxicidade das substâncias. A introdução de um material ou
substância nova deve ser considerada um primeiro passo, sendo necessário avaliar o impacto desta
medida, uma vez que outros efeitos à saúde podem aparecer. Partes ou processos inteiros,
maquinaria e equipamentos também podem ser substituídos por outros que ofereçam menos risco
para a saúde;
 Instalação de dispositivos e controles de engenharia: em geral, são mais factíveis do que a
substituição de materiais. Compreendem desde dispositivos que melhorem as condições gerais
físicas dos ambientes, como por exemplo, os sistemas de exaustão e ventilação, o redesenho de
máquinas e equipamentos, enclausuramento de máquinas, de processos e de atividades
potencialmente de risco. A manutenção preventiva e corretiva de equipamentos e processos
também compõem os recursos de controles de engenharia.
 Redesenho da tarefa ou do trabalho, mudanças na organização do trabalho e práticas
alternativas de trabalho: em geral combinam medidas de engenharia com medidas
administrativas, buscando a proteção da saúde dos trabalhadores. Como exemplo podem ser
lembrados: o enriquecimento do conteúdo das tarefas, nos trabalhos monótonos e repetitivos; a
mecanização de tarefas de modo a tornar o trabalho físico mais leve e confortável; o incremento da
participação dos trabalhadores, nos processos de decisão, garantindo-lhes a autonomia para
organizar o trabalho, diminuindo as pressões de tempo e de produtividade, entre outras.

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Ministério da Saúde – OPS – Capítulo 3

As medidas de proteção individual e de vigilância da saúde ou de controle médico, aplicáveis aos


trabalhadores, apesar de necessárias, geralmente são menos efetivas; pois, potencialmente reduzem o
dano que pode resultar da exposição a um fator de risco, mas não removem a causa ou fonte do
problema. Nesse grupo estão:
 Educação e informação do trabalhador: a educação e informação sobre os riscos
ocupacionais presentes nos processos e ambientes de trabalho são medidas fundamentais. O direito
do trabalhador à informação correta a respeito dos riscos para a saúde decorrentes ou presentes no
trabalho é inalienável, bem como sobre as medidas que visam a redução desses riscos. Muitas
dessas medidas implicam em mudanças de comportamento, tanto dos trabalhadores quanto dos
empregadores, chefes e encarregados, as vezes, culturalmente arraigados. A experiência mostra que
o investimento em treinamentos e outras atividades educativas são insuficientes se não forem
acompanhadas de investimentos na melhoria geral das condições coletivas de trabalho e de uma
gestão do trabalho menos predatória;
 Equipamento de Proteção Individual (EPI): equipamentos de proteção como luvas,
máscaras, protetores auriculares, roupas especiais podem ser úteis e necessárias em algumas
circunstâncias, porém, não devem ser nem a única nem a mais importante medida de proteção.
Devem ser escolhidos equipamentos adequados às situações reais de trabalho e às especificações e
diferenças individuais dos trabalhadores. Além da garantia de qualidade, é importante que os EPI
utilizados tenham sua efetividade avaliada em seu uso cotidiano, uma vez que as especificações do
fabricante e testes de qualidade são feitos em condições diferentes do uso real. Os programas de
utilização de EPI devem contemplar ainda treinamento adequado para seu uso, acompanhamento e
manutenção e/ou reposição periódica e higienização adequada;
 Medidas organizacionais: algumas medidas organizacionais, que implicam em diminuição do
tempo de exposição, podem ser aplicadas a um ou poucos trabalhadores, ou pode envolver todos os
trabalhadores de um setor ou da empresa. Escalas de trabalho que contemplem tempos menores
em locais com maior exposição a fatores de risco para a saúde, rotatividade de tarefas ou setores,
devem ser cuidadosamente planejadas para evitar a diversidade de exposições atingindo maior
número de trabalhadores.
 Controle Médico: os exames pré-admissionais para identificação de características ou fatores
de risco individuais que possam potencializar as exposições ocupacionais, são consideradas
medidas administrativas preventivas, porém não devem ser realizados com o objetivo de exclusão
e de seleção de “super homens” e “super mulheres”. Comumente os exames pré-admissionais,
baseados em critérios duvidosos, adquirem um caráter muito mais restritivo, impedindo o acesso
ao emprego e aos postos de trabalho, do que uma preocupação real com a proteção da saúde e
prevenção de danos, substituindo a adoção de medidas de controle ambiental de caráter coletivo. O
mesmo raciocínio se aplica à realização dos exames periódicos de saúde. Na atualidade, a
legislação trabalhista vigente, particularmente, a Norma Regulamentadora No. 7 , que disciplina o
PCMSO estabelece os parâmetros para um Programa de Saúde, e não simplesmente a emissão de
“atestado médico de saúde”.
 Rastreamento, monitoramento e vigilância: o monitoramento ou vigilância da saúde visando
a detecção precoce de alterações ou agravos decorrentes da exposição a fatores de risco presentes
no trabalho são instrumentos importantes para a identificação da necessidade de medidas de
controle ainda não detectadas ou de falhas nas medidas já adotadas. Em geral, no âmbito das
empresas, esse monitoramento é feito através de exames periódicos de saúde, que devem ser
programados considerando os riscos ocupacionais a que estão expostos os trabalhadores. A
investigação de efeitos precoces em grupos de trabalhadores sob riscos específicos deve ser
realizada através de estudos epidemiológicos.

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Identificação e controle dos fatores de risco, na perspectiva da Higiene do Trabalho e da Ergonomia

Os princípios básicos da tecnologia de controle propostos pela Higiene do Trabalho, podem ser enunciados como:
 evitar que um agente potencialmente perigoso ou tóxico para a saúde seja utilizado, ou formado ou liberado;
 se isto não for possível, contê-lo de tal forma que não se propague para o ambiente;
 se isto não for possível, ou suficiente, isolá-lo ou diluí-lo no ambiente de trabalho e, em último caso;
 bloquear as vias de entrada no organismo por exemplo, respiratória, pele, boca e ouvidos, para impedir que um agente
nocivo atinja um órgão crítico, causando lesão.

A cadeia de transmissão do risco deve ser quebrada o precocemente possível. Assim, a hierarquia dos controles deve buscar,
seqüencialmente, o controle do risco na fonte; o controle na trajetória (entre a fonte e o receptor) e no caso de falharem as
anteriores, o controle da exposição ao risco no trabalhador. Quando isto não é possível, o que freqüentemente ocorre na
prática, o objetivo passa a ser a redução máxima do agente agressor, de modo a minimizar o risco e seus efeitos sobre a
saúde.

As estratégias para o controle dos riscos devem visar, principalmente, a prevenção, através de medidas de engenharia de
processo que introduzam alterações permanentes nos ambientes e nas condições de trabalho, incluindo máquinas e
equipamentos automatizados que dispensem a presença do trabalhador ou de qualquer outra pessoa potencialmente
exposta. Dessa forma a eficácia das medidas não dependerá do grau de cooperação das pessoas, como no caso da utilização
dos equipamentos de proteção individual (EPI).

O objetivo principal da tecnologia de controle deve ser a modificação das situações de risco, através de projetos adequados e de
técnicas de engenharia que:
 eliminem ou reduzam a utilização ou a formação de agentes prejudiciais para a saúde, como por exemplo a substituição
de materiais ou equipamentos e modificação de processos e de formas de gestão do trabalho;
 previnam a liberação de tais agentes nos ambientes de trabalho, como por exemplo, os sistemas fechados,
enclausuramento, ventilação local exaustora, ventilação geral diluidora, armazenamento adequado de produtos químicos,
entre outras;
 reduzam a concentração desses agentes no ar ambiente, como por exemplo a ventilação local diluidora e limpeza dos
locais de trabalho.

A informação e o treinamento dos trabalhadores é um componente importante das medidas preventivas relativas aos ambientes
de trabalho, particularmente, se o modo de executar as tarefas propicia a formação ou dispersão de agentes nocivos para a
saúde ou influencia as condições de exposição, como por exemplo a posição em relação à tarefa/máquina; a possibilidade
de absorção através da pele ou ingestão, maior dispêndio de energia, entre outras. Em situações especiais podem ser
adotadas medidas que limitem a exposição do trabalhador através da redução do tempo de exposição, treinamento
específico, e utilização de EPI.

Deve ser enfatizado que todas as possibilidades de controle dos fatores de risco nos ambientes de trabalho através da proteção
coletiva devem ser esgotados antes de se recomendar o uso de EPI, particularmente para proteção respiratória.

As estratégias de controle devem incluir os procedimentos de vigilância ambiental e da saúde dos trabalhadores. A vigilância da
saúde permanente pode contribuir para a identificação de trabalhadores hipersensíveis e com problemas particulares e para
a detectar falhas nos sistema de prevenção.

As etapas para definição de uma estratégia de controle incluem:


 Reconhecimento e avaliação dos agentes e fatores que podem oferecer risco para a
saúde e o meio ambiente, incluindo a definição de seu impacto: devem ser determinadas e
localizadas as fontes de risco; as trajetórias possíveis de propagação dos agentes nos ambientes
de trabalho; os pontos de ação ou de entrada no organismo; o número de trabalhadores expostos;
e a existência de problemas de saúde entre os trabalhadores expostos ao agente. A interpretação
dos resultados vai possibilitar conhecer o risco real para saúde e a definição de prioridades para
ação;
 Tomada de decisão: resulta do reconhecimento de que há necessidade de prevenção,
com base nas informações obtidas na etapa anterior. A seleção das opções de controle deve ser
adequada e realista levando em consideração a viabilidade técnica e econômica de sua

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implementação, operação e manutenção, bem como as disponibilidade de recursos humanos e


financeiros e a infra-estrutura existente.
 Planejamento: uma vez identificado o problema, tomada a decisão de controlá-lo,
estabelecidas as prioridades de ação e disponibilizados os recursos, deve ser elaborado um
projeto detalhado quanto às medidas e procedimentos preventivos a serem adotados; e
 Avaliação.

A complexidade crescente dos novos processos de trabalho organizados a partir da incorporação das
inovações tecnológicas e de novos métodos gerenciais tem gerado formas diferenciadas de sofrimento e
adoecimento dos trabalhadores, particularmente na esfera mental. Em muitas dessa situações, todas as
prescrições clássicas da Higiene do Trabalho já foram atendidas, porém permanecem presentes ou por
vêzes, são acrescentados fatores de risco ergonômicos e psicossociais decorrentes da organização do
trabalho .responsáveis pela pordução do adoecimento. Neste caso, torna-se necessário buscar o auxílio da
Ergonomia, da análise ergonômica do trabalho, para identificar os momentos críticos no processo
produtivo, potencialmente geradores de doença, e definir as intervenções para que estes sejam
modificados ou corrigidos.

Sobre as medidas organizacionais e gerenciais a serem adotadas visando a melhoria das condições de
trabalho e qualidade de vida dos trabalhadores, particularmente para a prevenção dos transtornos mentais
e do sofrimento mental relacionado com o trabalho e das LER/DORT sugere-se que sejam consultados o
Capítulo 10 (Transtornos Mentais e do Comportamento Relacionados com o Trabalho) e o Capítulo 18
( Doenças do Sistema Osteomuscular e do Tecido Conjuntivo Relacionadas com o Trabalho).

As medidas recomendadas visando a melhoria das condições de trabalho podem ser resumidas em:
 o aumento do controle real das tarefas e do trabalho por parte daqueles que as realizam;
 o aumento da participação real dos trabalhadores nos processos decisórios na empresa, e facilidades para sua
organização;
 o enriquecimento das tarefas, eliminando as atividades monótonas e repetitivas e as horas extras;
 o estímulo a situações que permitam ao trabalhador o sentimento de que pertencem e ou de que
fazem parte de um grupo;
 o desenvolvimento de uma relação de confiança entre trabalhadores e demais integrantes do grupo,
inclusive superiores hierárquicos;
 o estímulo às condições que ensejem a substituição da competição pela cooperação

Referência bibliográficas e leituras complementares recomendadas


ATLAS - Segurança e Medicina do Trabalho – Portaria 3214/78. 45 ed. São Paulo, Atlas. 2000.

BURGESS, W.A. - “Identificação de Possíveis Riscos à Saúde do Trabalhador nos Diversos


Processos Industriais”, ERGO Editora Ltda., Belo Horizonte, 1995.

ILO – Encyclopaedia of Occupational Health and Safety. 4th ed. Geneva. ILO, 1998.

Instituições de Referência:

FUNDACENTRO – Centro Técnico Nacional. Rua Capote Valente710. São Paulo, CEP 05 409-002.
Fone: (xx) 1130666258

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IARC – International Agency for Research on Cancer. 150 Cours Albert Thomas, F-69372, Lyon
Cédex 08, France

INRS – Institut National de Recherche et de Sedurité. 30,Rue Olkivier-Noyer, 75680, Paris, Cedex 14,
France

IPCS - International Programme on Chemical Safety, World Health Organization.


1211 Geneva, 27. Switzerland

ILO - CIS (International Occupational Safety & Health Information Centre)


International Labour Organization. 1211 Geneva, 22 . Switzerland

NIOSH – National Institute for Occupational Safety and Health – Public Health Service
4676 Columbia Parkway - Cincinnati, Ohio 45226 USA

OPS –Organização Pan-Americana da Saúde – Representação do Brasil


Setor de Embaixadas Norte, Lote 19, Brasília, DF 70800-4

UNEP/IRPTC - Registro Internacional de Produtos Químicos Potencialmente Tóxicos


E-mail: irptc@unep.ch

3.5

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