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MODELAGEM TÉRMICA E SIMULAÇÃO DE UM DISSIPADOR DE

CALOR PARA UMA CHAVE SEMICONDUTORA


Nı́colas Eugênio Lima Basquera
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria - RS, Brasil
e-mail: nicolas.basquera@gmail.com

Resumo— Este projeto apresenta um estudo sobre a mode- iL(t) L iD(t) D IO


lagem e projeto de um dissipador de calor para sistemas de
potência. Ao longo do desenvolvimento, uma metodologia de Vin iS(t) iC(t)
projeto será estabelecia levando em consideração a temperatura GS C R0 V0
de operação do dispositivo, bem como suas caracterı́sticas cons- S
trutivas. A importância do trabalho consiste em dar atenção ao
projeto do sistema de dissipação de calor, já que sem ele um dos
principais dispositivos do sistema não funciona corretamente.
Por último, uma simulação será realizada para que os modelos Fig. 1. Topologia do Conversor Boost
estabelecidos sejam validados.

I. INTRODUÇ ÃO os componentes são ideais; Opera com Modulação PWM


Nem sempre os dissipadores de calor recebem a sua devida com frequência de chaveamento fs constante; A tensão de
atenção em circuitos que envolvem componentes de potência. saı́da possui um pequeno ripple de tensão vo (t) = Vo ; O
Os problemas relacionados com a dissipação de calor são conversor opera em Modo de Condução Contı́nua (CCM)
muito importantes e nem sempre são considerados. Sabe-se iL (t) > 0. Assim, é possı́vel inferir que esse conversor opera
que os dispositivos semicondutores usados na eletrônica de em duas etapas, ou seja, quando a chave S está ligada ou
potência possuem um limite teórico de temperatura interna de desligada.
funcionamento. Porém, as temperaturas de operação desses 1) Etapa 1 (0 < t < Ton ): Esta etapa começa quando
componentes costumam ser bem menores que a temperatura a chave S é fechada, fazendo com que o diodo D
máxima permitida. seja reversamente polarizado e a tensão de entrada Vin
Essa temperatura de operação é a temperatura que o fabri- seja aplicada diretamente sobre o indutor L. O indutor
cante garante que o dispositivo irá funcionar corretamente e é carregado enquanto a chave estiver fechada (Ton ).
como foi projetado. Uma das alternativas para manter esses A corrente que circula pela chave S é a mesma que
dispositivos semicondutores na sua temperatura de operação circula pelo indutor e a corrente no diodo D é nula.
é o projeto de um dissipador de calor para o circuito. O Essa etapa termina quando a chave é aberta.
dissipador é um dispositivo de baixa resistência térmica que 2) Etapa 2 (Ton < t < TS ): Ao abrir a chave S, a
deve ser colocado entre o componente e o ambiente, para energia armazenada no indutor é entregue ao estágio de
que a energia excessiva criada pelo componente possa ser saı́da do conversor. Nessa etapa, a corrente que circula
dissipada. pelo diodo D é a mesma que passa pelo indutor L e a
Esse trabalho tem por objetivo projetar um dissipador para corrente na chave S é nula. Essa etapa termina quando
a chave semicondutora de um Conversor Boost. O trabalho o perı́odo de chaveamento TS é completo, dando inı́cio
irá estabelecer uma metodologia para o cálculo adequado do novamente à Etapa 1.
dissipador, além de projetar o conversor.
Para esse trabalho, foi projetado um Conversor Boost com
II. METODOLOGIA as seguintes especificações:
A. Projeto do Conversor Boost – Potência de Saı́da Po = 500W
– Tensão de Entrada Vin = 100V
No conversor CC-CC elevador de tensão (Conversor Bo-
– Tensão de Saı́da Vo = 250V
ost), a tensão média de saı́da é sempre maior que a tensão de
– Ripple de corrente no indutor ∆iL% = 20%
entrada [1]. As suas principais aplicações são em fontes de
– Ripple de tensão de saı́da ∆vo% = 5%
alimentação, retificadores com elevado fator de potência e no
– Frequência de chaveamento fs = 40kHz
acionamento de motor de corrente contı́nua com frenagem
regenerativa. A estrutura básica do conversor é apresentada Utilizando a metodologia de projeto e as equações dedu-
na Figura 1. zidas em [1], os parâmetros para o conversor desejado são
Para a análise e projeto desse conversor, é necessário apresentados na Tabela 1.
assumir algumas hipóteses: O conversor será elevador; Todos Ainda na parte de projeto do conversor, é importante
Tabela 1 - Parâmetros do conversor
Além de possuir perdas em condução, a maior parte
Componente Valor da potência dissipada durante as comutações de MOSFETs
Ro 125Ω ocorre por sobreposições entre tensões e correntes na entrada
Duty Cyle D 0,6 e na saı́da de condução (Overlap). Os tempos em que ocor-
L 1, 25mH rem estas sobreposições são determinantes para o cálculo das
C 2, 4µF
perdas. Esses tempos são proporcionais a cargas e descargas
de capacitâncias parasitas presentes nesse semicondutor. Os
gráficos da Figura 3 ilustram o efeito de overlap entre a
destacar que a corrente média IS que circula na chave é:
tensão e corrente no MOSFET.
IS = Iin D = 3A (1) As perdas de comutação para o dispositivo entrar em
condução e sair de condução podem ser aproximadas, res-
E a corrente eficaz IS(RM S) é:
√ pectivamente, de acordo com [4], por:
IS(RM S) = DIin = 3, 873A (2)
1 1
B. Escolha da chave semicondutora Pon = Ion Vo tr fs + Coss Vo 2 (4)
2 2
A chave semicondutora para o conversor será um MOS-
FET. Essa chave é projetada de acordo com a sua tensão
1
máxima de operação vS,M AX e na sua corrente eficaz Pof f = Iof f Vo tf fs (5)
IS(RM S) . A tensão máxima para o MOSFET será igual 2
à tensão de saı́da do conversor Vo = 250V . Adotando- Para se obter a perda total da chave (P tot) semicondutora
se uma margem de segurança de 50%, a tensão máxima basta somar as equações (3), (4) e (5):
de operção vs,max do MOSFET passa a ser 375V . A sua
corrente eficaz IS(RM S) já calculada é de 3, 873A. Com
Ptot = Pcond + Pon + Pof f (6)
esses parâmetros definidos, é possı́vel escolher o MOSFET
IRFP450, fabricado pela Vishay, que possui uma tensão entre
Onde:
dreno-source de 500V e uma corrente de dreno de até 14A.
– Ion : Corrente instantânea aplicada ao MOSFET no
momento do inı́cio comutação
– Iof f : Corrente instantânea aplicada ao MOSFET no
momento final da comutação
– Vo : Tensão aplicada nos terminais de Dreno e Source
do MOSFET no momento da comutação
Fig. 2. Imagem do MOSFET IRFP450
– tr : Tempo de subida do MOSFET
– tf : Tempo de descida do MOSFET
Alguns parâmetros disponı́veis no datasheet [6] desse
– Coss : Capacitância de saı́da do MOSFET
dispositivo são mostrados na Tabela 2.
– fs : Frequência de chaveamento do conversor
Tabela 2 - Parâmetros IRFP540
Variável Valor Gs
Temperatura de Operação (TJ ) −55 até 150o C ON
Resistência Junção-Cápsula (RJC ) 0, 65o C/W OFF
t
Resistência Cápsula-Dissipador (RCS ) 0, 24o C/W
Capacitância de saı́da (COSS ) 720pF
Vo
Resistência Dreno - Source (RDS(ON ) ) 0.4Ω
Tempo de Subida (tr ) 47ns I
Tempo de Descida (tf ) 44ns

t
C. Potência dissipada na chave semicondutora tr tf tr tf
As perdas de condução Pcond do MOSFET são bastante P
significativas e isso se deve ao fato de o semicondutor possuir Eoff Eon
um comportamento resistivo quando em condução. Assim,
para determinados valores de corrente, torna-se inviável a
utilização deste tipo de dispositivo, pois a potência dissipada
durante a condução atingiria valores muito altos. As perdas t
durante a condução do MOSFET são estabelecidas em [3] e
são descritas através da equação abaixo: Fig. 3. Gráfico da saı́da e entrada em condução do MOSFET
Pcond = RDS(ON ) IS(RM S) 2 (3)
D. Modelagem térmica do dissipador Equação (6) e conhecendo-se as resistências entre junção-
Como já explicado, a corrente que circula no semicondutor cápsula e cápsula-dissipador do MOSFET, é possı́vel deter-
produz calor, tanto em condução quanto na comutação. Esse minar a resistência térmica máxima do dissipador através da
calor gerado deve ser transferido para o ambiente. Caso Equação (7):
contrário, a temperatura da junção do dispositivo se eleva RSA ≤ 6, 9785o C/W (8)
acima dos limites máximos permitidos e provoca falha no
componente. A corrente máxima e, portanto, a potência O dissipador escolhido é o modelo HS6524, produzido
máxima que um dispositivo semicondutor é limitada somente pela HS Dissipadores. O dissipador tem uma resistência
pela temperatura de junção desse dispositivo [1]. Para o térmica de RHS6524 = 3, 72o C/W/400 .
cálculo térmico será empregado o circuito equivalente ao da
F. Correção da Temperatura
Figura 4:
É importante destacar que a dissipação por convecção
Dispositivo Dissipador depende da diferença entre a temperatura ambiente e a
RJC RCS RSA temperatura do filme de ar que circunda o dissipador. O valor
TJ de resistência térmica tabelado no catálogo [5] analisado
TC TS TA
refere-se a um ∆T = 75o C.
Ptot TA Os dissipadores de calor são mais eficientes quando a
temperatura ambiente é baixa e à medida que a tempera-
tura aumenta, diminui a eficiência da troca térmica entre
o dissipador e o ambiente. O gráfico da Figura 5 mostra
Fig. 4. Circuito equivalente do Modelo Térmico proposto
quanto aumenta a resistência térmica do dissipador com a
diminuição do ∆T . Logo, os valores de resistência devem
As grandezas representadas na Figura 4 são definidas da ser corrigidos de acordo com as condições de trabalho do
seguinte maneira: dissipador. A diferença de temperatura para este projeto é
– TJ : Temperatura da Junção (o C) definida em ∆T = 50o C.
– TC : Temperatura da Cápsula (o C)
– TS : Temperatura da Dissipador (o C) 80
Diferença de temperatura ( T)

– TA : Temperatura do Ambiente (o C) 70
– Ptot : Potência total produzida pelo componente (W ) 60
– RJC : Resistência térmica entre a Junção e a Cápsula 50
40
(o C/W )
30
– RCS : Resistência térmica entre a Cápsula e o Dissipa-
20
dor (o C/W ) 10
– RSA : Resistência térmica do Dissipador (o C/W ) 0
O objetivo do cálculo térmico é determinar qual o valor 0% 5% 10% 15% 20% 25% 30%
máximo de resistência do dissipador RSA será necessário Aumento percentual da resistência térmica
para que a temperatura da junção permaneça dentro do limite
imposto pelo fabricante. A Potência dissipada é calculada Fig. 5. Gráfico da variação da resistência térmica com ∆T
a partir das caracterı́sticas do componente e da corrente
que circula por ele, além da frequência de chaveamento fs Então, é necessário corrigir a resistência do dissipador para
também influenciar nesse valor. A temperatura de junção e as o novo ponto de operação de ∆T :
resistências térmicas RJC e RCS são fornecidas pelo fabri-
cante (Tabela 2). A temperatura TA é um valor determinado RHS6524 = (3, 72)(1, 106) = 4, 114o C/W/400 (9)
pelo projetista.
A partir da faixa de temperaturas para a junção do disposi- G. Correção do comprimento
tivo, é necessário definir uma temperatura de junção máxima Os valores de resistência térmica dos dissipadores dis-
TJ(M AX) e desse modo, é possı́vel determinar a resistência ponı́veis no catálogo [5] tem como referência 4 polegadas
necessária para o dissipador da seguinte maneira: de comprimento. Assim, todas as resistências térmicas mos-
tradas nos dissipadores do catálogo possuem como unidade
TJ(M AX) − TA
RSA ≤ − RSC − RCS (7) o
C/W/400 , ou seja, graus celcius por watt por pedaço de 4
P tot polegadas. Entretanto, é comum o uso dos dissipadores em
E. Escolha do dissipador outras medidas de comprimento.
Para se projetar o dissipador, é necessário definir a tem- O fator de correção do comprimento (F Ccomp ) pode ser
peratura do ambiente e a temperatura máxima de junção calculado através de:
de operação da chave: TA = 35o C e TJ(M AX) = 100o C. RSA
Calculando-se a potência total dissipada pela chave com a F Ccomp = (10)
RHS6524
3,50 O dissipador HS6524 escolhido para o trabalho pode ser
3,00 visto na Figura 8. Como o fabricante apenas informa que
o dissipador é produzido com uma liga de alumı́nio, a liga
Fator de correção

2,50
escolhida para o projeto foi a 2018.
2,00

1,50

1,00

0,50

0,00
0 100 200 300 400 500 600
Comprimento (mm)

Fig. 6. Gráfico da correção da resistência térmica para outros comprimentos


de dissipadores

Fig. 8. Desenho do dissipador HS6524


Ou seja, o fator de correção é igual a:
A montagem do MOSFET ao dissipador pode ser vista na
6, 9785 Figura 9.
F Ccomp = = 1, 6962 (11)
4, 114
Analisando-se o gráfico da Figura (6), pode-se determinar
que o comprimento do dissipador deve ser de, aproximada-
mente, 40mm.

III. RESULTADOS
A chave semicondutora IRFP450, conforme seu datasheet,
possui o encapsulamento T0-247. De acordo com [7], o
formato desse encapsulamento pode ser resumido ao desenho
da Figura 7.

Fig. 9. Desenho da montagem completa

Como a convecção é natural, ou seja, sem o uso de


ventiladores auxiliares, o coeficiente de convecção do ar fica
em torno de 15a25W/m2 K [7]. Na simulação, foi usado
valor equivalente a 15W/m2 K.
O sistema foi simulado no software SolidWorks e a
distribuição da temperatura do pode ser vista nas Figuras
10, 11, 12 e 13.
Fig. 7. Desenho do MOSFET IRF450

As Tabela 3 apresenta caracterı́sticas definidas em [7] dos


materiais presentes no encapsulamento do MOSFET.

Tabela 3 - Caracterı́sticas das camadas isolante e plástica do TO247


Caracterı́stica Isolante Plástico
Densidade [kg/m3 ] 11000 2000
Calor especı́fico [J/kg.K] 134 820
Condutividade térmica [W/m.K] 32, 3 1 Fig. 10. Resultado da simulação - vista superior
Capacidade térmica [J/K] 0, 00828 0, 206
Fig. 11. Resultado da simulação - vista frontal Fig. 13. Resultado da simulação - vista traseira

[2] CHRISTEN, D. STOJADINOVIS, M. BIELA, J. ”Energy Efficient


Heat Sink Design: Natural Versus Forced Convection Cooling”. IEEE
Transactions on Power Eletronics, VOL. 32, NO.11, Novembro 2017.
[3] SARTORI, H. C. ”Projeto de Conversores Estáticos fazendo uso de
uma metodologia de minimização de volume/perdas/custo”. Tese de
Mestrado. UFSM, 2013.
[4] BELTRAME, R. C. DESCONZI, M. I. HEY, H. L. MARTINS, M.
L. S. CAMARA, H. T. ”Decentralized Multi String PV System with
Integrated ZVT Cell”. VXIII Congresso Brasileiro de Automática
(CBA), 2010.
[5] Catálogo HS Dissipadores (2008-2009). [Online].
www.hsdissipadores.com.br
[6] Datasheet IRFP450, SiHFP450. Vishay Siliconix. www.vishay.com
[7] FARCAS, C. CIOCAN, I. PETREUS, D. PALAGHITA, N. ”Thermal
Modeling and Analysis of a Power Device Heat Sinks”. IEEE 18th
International Symposium for Design and Technology in Eletronic
Packaging (SIITME). 2012
Fig. 12. Resultado da simulação - vista lateral

IV. CONSIDERAÇ ÕES FINAIS


A análise térmica de um sistema é muito importante no
processo do desenvolvimento de um produto eletrônico e
nem sempre os dissipadores de calor recebem a atenção
necessária. Nesse projeto foi proposta uma metodologia de
projeto de um dissipador de calor para uma chave semicon-
dutora atuando em um conversor chaveado.
É importante destacar que essa chave é uma das principais
fontes de potência de energia dissipada em um sistema cha-
veado. Além das perdas em condução, que ocorrem quando
uma corrente circula pela resistência interna do dispositivo, a
chave também dissipa calor para poder entrar em condução
ou para sair de condução, sendo essas perdas diretamente
proporcionais à frequência de chaveamento em questão.
Na simulação realizada, a temperatura de junção do MOS-
FET foi de aproximadamente 110o C, quando, na verdade, o
projetado foi de 100o C. Esse pequeno erro pode ter sido cau-
sado devido a erros de simulação relacionados a constantes
de temperatura e constantes dos materiais dos componentes
utilizados. Além disso, o coeficiente de convecção do ar
escolhido para a simulação não é levado em consideração
na hora do projeto teórico do dissipador, também podendo
acarretar em um possı́vel erro. Mesmo assim, a simulação
pode validar o funcionamento da metodologia de projeto
proposta, também validando os modelos térmicos utilizados.
R EFERENCIAS
[1] BARBI, I. ”Conversores CC-CC básicos não-isolados”. Ed. UFSC,
2006.

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