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Introdução

Não sabes que antigamente o céu e os elementos eram uma coisa só, e foram separados um
do outro por artificio divino, para que pudessem dar origem a ti e a todas as coisas? Se souberes
disso, o resto não pode te escapar. Portanto, em toda geração é necessária uma separação desse
tipo.

... Nunca obterás dos outros o Um que buscas sem primeiro fazer de ti mesmo uma só coisa...

Gerhard Dom

Os príncipes e as princesas, como toda criança sabe, sempre vivem felizes para sempre. Apesar das feitiçarias, das
madrastas malvadas, dos ogres, dos gigantes e dos anões malévolos, o amor triunfa, o mal é vencido, e o feliz casal
desaparece de mãos dadas na névoa da imaginação, sem nenhuma alusão a varas de família ou pagamento de pensão
anuviando o para-sempre.

O processo de "crescimento, como toda criança aprende, com sua crescente maturidade e capacidade de encarar "a
vida como ela é", natural mente nos ensina de outra forma. Os príncipes e as princesas, junto com Papai Noel, o coelhinho
da Páscoa, os amigos imaginários e outras relíquias da vida de fantasia da infância, não são material adequado para os
adultos.

Começamos a aprender razoavelmente cedo na vida que ninguém vive feliz para sempre; precisamos fazer os
relacionamentos "darem certo", e isso é uma questão de responsabilidade, compromisso, disciplina, obrigação, auto-
sacrifício, comunicação e outros termos usados com tanta freqüência que seu significado deveria ser mais ou menos claro.
Mas, de alguma forma, na experiência de viver, esses termos se tomam cada vez mais ambíguos quando percebemos que
o outro, esse estranho que esta na nossa frente, seja marido ou esposa, filho ou amante, amigo ou professor, sócio ou
inimigo, ainda é um estranho.

O relacionamento é um aspecto fundamental da vida. É arquetípico, o que significa que é uma experiência que
impregna a estrutura básica não apenas da psique humana mas do universo em sua totalidade. Em ultima analise, tudo é
construído a partir do relacionamento, pois não teríamos consciência de nenhum aspecto da vida se não o
reconhecessemos através do que cada um deles tem de diferente de todos os outros aspectos. Reconhecemos o dia porque
existe a noite, e o relacionamento entre ambos de fine e identifica cada um deles. Se considerarmos ao menos um pouco
essa idéia. tornar-se-a cada vez mais evidente, que nos, seres humanos, só podemos nos conceber como indivíduos por
meio da comparação com aquilo que não somos.

Por uma série de razões, algumas obvias e algumas muito mais sutis, hoje em dia existe uma ênfase maior sobre a
experiência do relaciona mento do que houve durante outros períodos de nossa historia. Os relacionamentos sempre foram
um aspecto importante da vida, mas nem sempre se chamaram relacionamentos, e nem sempre se lhes atribuíram outros
propósitos além daqueles óbvios: alivio da solidão, satisfação do desejo, continuação da espécie, proteção do indivíduo e
da sociedade, experiência do amor (uma palavra completamente ambígua, como todo adulto sabe), promoção de ganhos
materiais. Todas essas razões bastante validas para que façamos o esforço – freqüentemente gratificante, e com igual
freqüência doloroso – necessário para conviver com outros seres humanos. Entretanto, principalmente com o trabalho da
psicologia durante os últimos setenta e cinco anos, tornou-se evidente que os relacionamentos não são apenas um meio de
se atingir a satisfação pessoal de um tipo ou outro. São também necessários para o crescimento da consciência e da
compreensão que o indivíduo tem de si mesmo. A pessoa não sabe que aparência tem. até se ver refletida no espelho, e
esta simples verdade se aplica não apenas a realidade física mas também a realidade da psique.

Inúmeros escritos esotéricos e psicológicos nos dizem que o homem esta para ingressar numa nova era. A palavra
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alemã Zeitgeist se refere adequadamente a este conceito, embora sua tradução não seja fácil. De uma maneira muito
geral, significa o "espirito da época", um novo vento que sopra através de uma era e anuncia alterações significativas e
dramáticas na consciência humana. Poderíamos dizer que as grandes mudanças ocorridas na perspectiva do homem, na
época da Renascença, na religião, na ciência, nas artes e em todas as áreas da atividade humana foram manifestações de
um Zeitgeist. Algo novo nascia, permitindo ao indivíduo ver um tipo diferente de realidade ou, mais precisamente, ver uma
porção da realidade maior do que ele percebia antes. As mudanças na consciência ocorridas na aurora da era crista
também podem ser consideradas manifestações de um Zeitgeist, pois é característico do inicio de uma nova era a morte dos
velhos deuses e o nascimento de novos. Aparentemente, estamos vivenciando outro Zeitgeist neste período histórico,
embora seus vagos contornos só sejam visíveis agora para aqueles que estudaram a linguagem do simbolismo.

É possível que esse redirecionamento da consciência, ao qual a astrologia deu o nome simbólico de Era de Aquário,
tenha, como um de seus motivos centrais, o esforço no sentido do conhecimento interior – um conhecimento que viria
complementar a ênfase sobre o conhecimento exterior, que já nos é muito familiar. O espirito da época atual parece estar
profundamente preocupado com a autocompreensão e com a procura do sentido. E embora se possa atribuir essa procura a
mudanças econômicas e políticas que inevitavelmente criam tensão, estresse e autoquestionamento, também pode ser
possível encarar essas duas tendências convergentes – o tumulto sócio econômico e o que pode ser descrito simplesmente
como uma busca espiritual – como acontecimentos sincrônicos. Isto é, um não precisa ser a causa do outro, mas ambos
podem ser sintomáticos de uma profunda mudança interior ocorrendo na psique coletiva.

Pode parecer que questões de tal peso, como a transformação da consciência humana e a entrada numa nova era,
tenham pouco a ver com os transtornos e problemas extremamente subjetivos que levam tantas pessoas a buscar
aconselhamento para suas dificuldades de relacionamento.

Se uma mulher deixa o marido por causa de um amante, ou se uma mulher esta lutando com sentimentos de
inadequação sexual que mutilam seu potencial para um casamento satisfatório, pode parecer irrelevante a comunicação de
que há um Zeitgeist em curso. Entretanto, essa relevância existe. Ouvimos dizer, com freqüência suficiente, que as
estatísticas de divorcio estão em alta; que os valores e padrões morais consagrados pelo tempo e que pautaram nossos
relacionamentos por muitos séculos estão desmoronando e perdendo o sentido para as gerações mais jovens; que a atual
conduta sexual entrou por meandros sem paralelo mesmo no decadente Império Romano. Parece que alguma coisa
definitivamente esta acontecendo com nossos critérios de avaliação dos relacionamentos e também com as formas de
lidarmos com nossos problemas. Antigamente, sofríamos em silencio. Agora, entretanto, Há um constante aumento do
numero de obras publicadas, assim como de artigos em jornais e revistas, sobre as dificuldades de conviver com os outros.
Também há um constante aumento da atividade do aconselhamento conjugal, dos grupos e seminários de "movimento do
crescimento", e de analise e terapia individuais – todos tentando, entre outras coisas, lidar, com maior ou menor sucesso,
com as necessidades, desejos, conflitos, medos e aspirações de cada pessoa nos relacionamentos. Quase não é
necessário mencionar fenômenos tais como o "Movimento de Liberação das Mulheres" e o "Movimento Gay de Liberação",
cada um tentando enfrentar certos aspectos dos problemas dos relacionamentos, a sua maneira. Mesmo a controvérsia
sobre a educação sexual nas escolas é uma questão centrada no relacionamento, como também o é a questão do aborto.

Toda essa reavaliação dos relacionamentos é tanto parte de uma busca geral de valores mais significativos e de uma
maior compreensão da psique, como do surgimento mais surpreendente do interesse por antigos estudos esotéricos como
a astrologia, a alquimia e outras supostas esquisitices. Todos estes são aspectos da mesma busca, e, quanto mais cedo
percebermos isto, tanto maior seria nossa perspectiva no contexto mais amplo que está por trás de nossos problemas
pessoais.

A ciência, que tem dado a ultima palavra sobre a realidade por muito tempo, esta se surpreendendo ao se aproximar
o domínio do que costumava ser chamado estudos ocultos. Para o nosso assombro, pessoas com títulos respeitáveis nos
dizem que as plantas reagem a emoção humana e apreciam a musica; que o Sol a Lua e os planetas efetivamente parecem
emitir energias que afetam a vida humana; que nossa mente é capaz de proezas tais como a telepatia, a telecinese e a
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clarividência nos limites nos limites rigidamente controlados e monitorados do laboratório; e que Deus talvez esteja to vivo e
bem além de tudo, escondendo-se secretamente na matéria. A esta altura não é apenas a dogmática estreiteza mental, mas
também medo, o que mantém as pessoas agarradas seus velhos conceitos do que é real e racional, porque a própria ciência
está no umbral de um universo surpreendentemente semelhante ao mundo magico e misterioso dos contos de fadas.
Quando se acredita estar firmemente postado numa sólida rocha, é difícil descobrir que a rocha começou a mudar, a se
dissolver, a se transformar em outra coisa. Nesta nova paisagem na qual todos nos, gostando ou não dessa idéia, estamos
sendo lançados, precisamos desesperadamente de mapas. Temos bem poucos roteiros, pois estamos aprendendo, numa
velocidade alarmante, que na realidade conhecemos muito pouco da natureza humana.

Com seu nome atual, a psicologia é uma ciência muito nova, e é, sob muitos aspectos, primitiva e inexperiente como
tudo que esta na sua fase inicial. Entretanto, a psicologia é um dos poucos mapas confiáveis que temos, embora esteja
sendo feito no próprio processo de exploração. Contudo, a psicologia, no seu sentido mais profundo, existe há muito tempo
com outros nomes, o mais antigo dos quais talvez seja a astrologia.

Os psicólogos podem se surpreender com isso mais do que qualquer outra pessoa, mas nossa palavra psicologia
vem de duas palavras gregas – psique, que significa "alma", e logos, que significa "sabedoria" –, e o estudo da alma
humana pertenceu ao domínio da astrologia muito antes de pertencer a qualquer outro." Em alguns círculos, a ciência mais
antiga e a mais nova parecem estar moldando um casamento muito curioso. A astrologia ultimamente tem tido um
renascimento, embora seu valor real não esteja, no conceito popular, desvirtuado dos prognósticos mágicos do futuro, mas
na função muito mais importante de se tornar um instrumento imensamente poderoso para exploração da psique humana.

Embora a psicologia e a astrologia usem diferentes linguagens e métodos de pesquisa e aplicação, o objeto de sua
investigação é o mesmo, e as duas juntas são potencialmente muito fecundas. O produto dessa união ainda está para ser
plenamente reconhecido, mas constitui o objeto deste livro. E se considerarmos a idéia de que os relacionamentos são,
entre outras coisas, um caminho em direção a autodescoberta, é provável que a antiga sabedoria da astrologia e a moderna
percepção da psicologia profunda, juntas, possam dizer-nos alguma coisa sobre nossas formas de relacionamento.

A carta astrológica de nascimento corretamente levantada é um mapa simbólico da psique humana individual. Esse
mapa é como uma semente, pois contém em microcosmo os potenciais existentes no indivíduo e os períodos de sua vida
em que esses potenciais provavelmente serão concretizados. Embora a imagética da astrologia seja diferente da
terminologia mais precisa da psicologia, o mapa astrológico de nascimento pode ser comparado aos modelos da psique que
nos foram oferecidos por homens e gênio e percepção no campo psicológico, como C. G. Jung e Roberto Assagioli. Mas
modelos são apenas modelos, não realidade; também não são eitos para serem interpretados como realidade. Um modelo,
na verdade, é uma sugestão, uma inferência, uma lente através da qual, se olharmos cuidadosamente, podemos vislumbrar
o que não pode ser articulado em palavras ou expresso em conceitos. O coração de cada ser humano é um mistério, e a
essência da atração e repulsa entre indivíduos é igualmente um mistério, por mais que tentemos defini-la em termos
conceituais. Mas com mapas adequados, podemos ao menos começar a entender o mistério com o coração, mesmo que
não possamos apreende-lo com o intelecto.

Não faremos aqui qualquer tentativa de provar ou negar a validade da astrologia. Já existe uma série de excelentes
livros a disposição do investigador interessado, tratando especificamente de provas factuais sobre o assunto e, no fim deste
livro, é fornecida uma bibliografia completa. Cada um deve, no final das contas, formar sua própria opinião sobre a
astrologia, e não se pode formar uma opinião autêntica sem ter algum conhecimento do assunto e sem dispor de alguma
experiência além das concepções e falsas interpretações populares. A esta altura, já devemos ter aprendido que ,tais
concepções e interpretações são extremamente falíveis; não faz muito tempo, acreditávamos que a Terra fosse plana e
sustentada no céu por uma gigantesca tartaruga, e isso com aprovação total dos cientistas da época.

Diz o provérbio que o bolo se prova comendo, e a opinião só pode ser de terminada quando o indivíduo tem
experiência e conhecimento diretos, que o ajudam a cristalizar seu próprio juízo – não um juízo de segunda mão.
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Se este livro não é uma tentativa de justificar a astrologia, tampouco é um manual para a montagem do seu próprio
horóscopo, em parte porque isso implicaria um outro volume, em parte porque já existem muitas obras desse tipo
disponíveis. Todo o material astrológico apresentado aqui, portanto, é interpretativo e não mecânico, de modo que, para
usá-lo com o máximo proveito, o leitor deveria obter, por seus próprios esforços ou recorrendo a um profissional, um
horóscopo corretamente levantado para si e para as pessoas com as quais está envolvido.

Há muitas formas de encarar a realidade, e algumas são válidas para algumas pessoas e não para outras. É
perfeitamente possível que ninguém veja o todo, porque só podemos ver através da perspectiva de nossa própria coloração
psicológica. A realidade, portanto, é subjetiva mesmo para a maioria das pessoas "de mente aberta" ou "desprendidas".
Aprendemos recentemente que mesmo as partículas subatômicas podem alterar seu comportamento de acordo com o
observador, e que o antigamente seguro campo da matéria inanimada não oferece mais segurança como ultimo baluarte da
"realidade objetiva". E esse reconhecimento da parcialidade de nossa visão talvez seja o princípio da sabedoria.

Talvez seja mesmo a hora de tirar a poeira dos nossos velhos livros de contos de fadas, porque o trabalho de Jung
demonstrou que os contos de fadas, como os sonhos, não são o que aparentam. Há uma sabedoria nos mitos e contos de
fadas que fala a alguma coisa em nós que não é o intelecto. As razões desse fato nos levam a um confronto direto com a
realidade da psique inconsciente e do mundo dos símbolos. Se o conto de fadas nos diz que o príncipe e a princesa vivem
felizes para sempre, existe algum sentido nesse final, pois, como até uma criança sabe, os contos de fadas não pertencem
ao mundo comum e não devem ser assim considerados. Eles pertencem ao mundo do inconsciente e são simbólicos. Se o
conto de fadas nos diz que o príncipe, para conquistar a princesa, precisa desafiar o dragão, matar a bruxa má e destruir o
poder da madrasta perversa com a ajuda de seus úteis companheiros animais, isto também tem um significado, e podemos
aprender muito sobre os caminhos que estão abertos a nossa frente quando olhamos a saga do príncipe com olhos
diferentes. Os mitos e os contos de fadas se constituem em mais um mapa para o nosso pais desconhecido. Nas suas
descrições das vicissitudes e lutas do herói em busca de sua amada, espelham uma jornada interior que cada um de nos
precisa fazer para se tornar inteiro. E só quando reconhecemos a nossa própria inteireza e possível reconhecer o estranho,
o outro. Talvez só então possamos verdadeiramente começar a nos relacionar.

Talvez precisemos crescer para baixo, em vez de crescer para cima, para que possamos olhar a nossa assim
chamada realidade com os olhos de uma criança e reconhecer que a verdade pode existir no mundo da psique
independentemente de correlações materiais, "Encarar a vida como ela é" pode, na verdade, ser uma atitude que contém
tremenda arrogância e muito pouca sabedoria, já que nenhum de nós sabe, na realidade, o que a vida é; só sabemos que
aparência ela tem para nós. Nossas vidas tem exatamente tanto ou tão pouco sentido quanto nelas colocamos. Estamos
todos aparentemente sozinhos, mas se deve necessariamente ser assim, ou se a solidão deveria significar o que pensamos
que significa, é questionável.

A maioria de nós precisa ter a coragem de experimentar novas ferramentas, e faze-lo sem preconceito. Jung, como
médico e pesquisador, teve a coragem de aprender a astrologia e usa-la na sua exploração da psique. Se, graças ao seu
trabalho, existe qualquer validade na maior compreensão de nós mesmos que agora possuímos, faz sentido que tenhamos
a coragem de nós explorar através de ferramentas semelhantes – principalmente quando essas ferramentas podem nos
ajudar a viver vidas mais significativas e desfrutar de relacionamentos mais significativos. A saga do príncipe contém muitas
surpresas, e uma das maiores é a descoberta de que cada um de nós é simultaneamente o príncipe, o dragão, a madrasta
má, o animal útil e a amada também somos a saga e o contador da historia, tudo ao mesmo tempo.
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1 A Linguagem do Inconsciente
O mundo e o pensamento são apenas a espuma de ameaçadoras figuras
cósmicas; o sangue pulsa com seu vão; os pensamentos são acesos por seu fogo; e essas
imagens são os mitos.

Andrei Bely

Tudo que passa é elevado a dignidade da expressão; tudo que acontece é elevado a
dignidade do significado. Todas as coisas são ou símbolos ou parábolas.

Paul Claudel

A maioria de nós, que nos acreditamos indivíduos pensantes, gostamos de presumir que sabemos um bocado sobre
nós mesmos. Provavelmente sabemos, sob o ponto de vista de que podemos enumerar nossas virtudes e vícios, catalogar
nossos aspectos, "bons" e "maus" e avaliar nossos gostos e antipatias e objetivos. Mas mesmo um autoconceito de âmbito
tão limitado é grande demais para muita gente, que parece perambular pela vida desprovida de qualquer senso de identidade
além de um nome que não escolheu, um corpo criado sem o seu controle e um lugar na vida que geralmente é o resultado
da necessidade material, do condicionamento social e, aparentemente, do acaso.

Entretanto, mesmo se tomarmos um indivíduo que tem a perspicácia de se "conhecer" em termos comportamentais,
ocorre um fenômeno muito curioso. Peça a ele que se descreva e, se ele for honesto com você e com ele mesmo – uma
premissa bastante rara, para inicio de conversa –, pode ser que lhe faça um retrato bem abrangente de sua personalidade.

Mas peça a sua esposa para descreve-lo, e pode parecer que ela esta falando de outro indivíduo. Surgem traços de
personalidade que o próprio homem parece desconhecer totalmente; são-lhe atribuídos objetivos que são os menos
importantes de seus valores; muitas vezes as qualidades a ele atribuídas são diametralmente opostas aquelas que ele
acredita constituir sua própria identidade. A gente começa a imaginar quem está enganando quem. Pergunte a seus filhos o
que acham de você e vai obter uma descrição totalmente diferente; seus companheiros de trabalho trarão novas
informações; seus conhecidos vão descrever um outro homem. Podemos tentar essa simples investigação e, por meio dela,
verificar que o mais observador de nós, o mais introspectivo, vê apenas o que decide ver através da lente de sua própria
psique; e como nossos conceitos da realidade, tanto a nosso respeito como a respeito dos outros, são sempre vistos
através de lentes tingidas, é inevitável que saibamos muito menos a nosso respeito do que suspeitamos.

Precisamos admitir que o que esta mais próximo de nós é exatamente aquilo que conhecemos menos,
embora pareça ser o que conhecemos melhor.

A despeito do que qualquer pessoa tenha a dizer sobre as teorias de Freud sobre o inconsciente, não podemos
evitar o fato de que o indivíduo registra muito mais em sua psique do que é acessível as limitações de sua percepção ao
consciente. Quer sejamos realmente motivados por necessidades biológicos, Freud sugeriu, ou pela vontade do poder,
como Adler sugeriu, ou pelo impulso em direção a totalidade, como Jung sugeriu uma coisa é clara: geralmente não
percebemos nossas motivações mais profundas e, por causa desse grau de cegueira, dificilmente podemos ter percepção
das motivações de qualquer outra pessoa.

Os conceitos de consciente e inconsciente ao difíceis de explicar porque são energias vivas que, diferentemente dos
órgãos do corpo físico, não se prestam a classificação. Não obstante, a psique contém vasto campo de material oculto,
geralmente só comunicável através de canais normalmente rejeitados ou menosprezados. A maioria das pessoas não
entendem seus sonhos e freqüentemente não fazem nenhum esforço para lembrar-se deles, ou os consideram sem sentido;
as fantasias são consideradas infantis, a não ser as eróticas, e nesse caso são consideradas pecaminosas; as explosões
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emocionais são consideradas embaraçosas e disfarçadas com desculpas variando da má saúde as dificuldades de negócios.

Em termos de relacionamento, talvez, o mais importante mecanismo que possuímos para ver dentro da psique seja a
projeção. Muitas vezes, usamos essa palavra em relação ao cinema, e seu significado nesse contexto pode nós ajudar a
entende-lo também no sentido psicológico. Quando vemos uma imagem projetada em uma tela, olhamos a imagem e
respondemos a ela, em vez de examinar o filme ou a transparência dentro do projetor, que é a fonte real da imagem; também
não olhamos a luz dentro do projetor, que nos torna possível ver a imagem. Quando uma pessoa projeta alguma qualidade
inconsciente, existente dentro de si, em outra pessoa, esta reage a projeção como se pertencesse ao outro; não lhe ocorre
olhar em sua própria psique para descobrir a origem. Ela vai tratar a projeção como se existisse fora de si, e seu impacto
geralmente aciona uma alta carga emocional porque, na realidade, a pessoa está encarando o seu próprio ser inconsciente.

Esse mecanismo muito simples funciona sempre que temos qualquer reação emocional altamente carregada ou
irracional, positiva ou negativa, a outra pessoa. É trabalho para toda uma vida introjetar, reconhecer e trazer de volta para
nos essas qualidades inconscientes, de modo que possamos começar a distinguir os vagos contornos da identidade do
outro. E, com certeza, não nos aproximamos mais, porém nos distânciamos, quando formamos ou rompemos
relacionamentos de acordo com respostas baseadas em nossas próprias projeções.

A projeção psíquica é um dos fatos mais comuns da psicologia....

Simplesmente lhe damos outro nome, e normalmente negamos que seja nossa culpa. Tudo que
é inconsciente em nos, descobrimos no nosso vizinho, e o tratamos de acordo com isso .

Por que deveríamos atribuir aos outros o que nos pertence? É compreensível se considerarmos as qualidades "más".
Se não gosto de uma determinada característica minha, se de fato a sua admissão é tão dolorosa que ela permanece
inconsciente, essa minha parte não-admitida vai me atormentar no seu ímpeto pela expressão, parecendo me confrontar a
partir do exterior. É mais difícil entender por que deveríamos rejeitar qualidades positivas. Para tanto, é preciso aprender
algo a respeito da estrutura e das leis da psique – sempre lembrando que qualquer coisa que a psicologia tenha a dizer
sobre a psique é, na realidade, a psique falando a seu próprio respeito, o que toma impossível a "objetividade completa".

Podemos agora voltar ao nosso assunto da projeção.

O ego é o centro do campo da consciência de todo dia, racional; de forma muito simples, é o que eu sei – ou penso
que sei – que sou.

A consciência consiste primariamente no que sabemos, e no que sabemos que sabemos.

Para a maioria de nós, o ego é tudo que sabemos de nós mesmos, e enquanto ficamos nesse ponto e olhamos o
mundo, o mundo nos parece colorido pelo ponto de vista particular do ego. Qualquer pessoa que tenha uma visão diferente,
presumimos que seja teimosamente dotada de estreiteza mental, ou esteja deliberadamente mentindo, ou seja
possivelmente anormal ou louca.

O ego parece se desenvolver de acordo com determinadas linhas desde o nascimento. Se fossemos totalmente o
produto de nossa hereditariedade, de nossos condicionamento e meio ambiente, as crianças nascidas nas mesmas
circunstâncias seriam exatamente iguais psicologicamente – o que evidentemente não acontece.

A disposição individual já é um fator na infância; é inata, e não adquirida no decorrer da vida" .

A astrologia também sugere que o temperamento do indivíduo é inerente ao nascimento, e uma compreensão da
astrologia pode ser útil na percepção da natureza dessa semente que desabrocha no ego adulto.

Ela pode não apenas nos falar do eu que conhecemos, mas também do que não conhecemos simbolismo do mapa
de nascimento também reflete a tendência humana natural de experimentar e avaliar a vida através do ego, pois o
horóscopo é uma mandala que tem a Terra, e não o Sol, no seu centro. Ele mostra, em outras palavras, como a vida
aparece, e como provavelmente será experimentada, pela consciência individual, e não o que a vida verdadeiramente é.
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Na medida em que crescemos, Há muitas qualidades de nossa natureza que não são incorporadas ao ego em
desenvolvimento, embora, mesmo assim, nos pertençam. Essas coisas devem ter permissão para viver, mas podem ser
inaceitáveis para os pais, podem conflitar com doutrinas religiosas, violar padrões sociais ou, finalmente, mas não menos
importante, simplesmente conflitar com aquilo que o ego valoriza mais. Algumas dessas qualidades rejeitadas podem ser
"negativas" por as julgarmos destrutivas; algumas podem ser "positivas" e ter muito mais valor, individual e socialmente, do
que aquilo que o ego fez de si próprio. Com efeito, um indivíduo pode valorizar a mediocridade – sem perceber o que esta
fazendo – e sufocar dentro de si as sementes emergentes de unicidade e criatividade; ou sua auto-imagem pode ser
excessivamente modesta, sendo então as qualidades mais excepcionais relegadas ao inconsciente. Todas essas coisas
serão projetadas num objeto adequado.

O objeto de uma projeção não se limita a indivíduos. Pode ser uma organização, uma nação, uma ideologia ou um
tipo racial que se torna o foco para a projeção do lado escuro, não-admitido, da pessoa. Uma pessoa que se opõe com
violência e irracionalidade ao capitalismo pode estar projetando tão fortemente quanto aquela que seja igualmente violenta e
irracional em sua reação ao comunismo. A qualidade característica da projeção não é o ponto de vista, mas a intensidade e
a alta carga da reação. Pode-se ficar no meio de uma discussão entre duas pessoas e ouvir, com espanto, como uma acusa
a outra do que ambas estão fazendo. Quando se está de fora, isso é engraçado e ao mesmo tempo trágico, como pode
atestar a maioria dos conselheiros conjugais. Mas quando se está envolvido, sob o sortilégio do próprio mecanismo de
projeção, com o inconsciente despertado, fica-se absolutamente convencido da própria razão. Aceitar a dolorosa e
onipresente possibilidade de estar errado é desagradável, porque significa abrir mão de ilusões Há muito alimentadas sobre
nós próprios. Viver a vida sem essas ilusões requer coragem e um senso moral que não tem semelhança com o conceito
social comum de uma moralidade já estabelecida. Não é de surpreender que projetemos, porque apenas assim podemos
continuar a culpar os outros pela nossa dor, em vez de reconhecer que a psique contém tanto a sombra como a luz e que
nossa realidade é aquela que nós mesmos criamos. Entretanto, na projeção e na subsequente descoberta, jaz um veículo
imensamente importante pelo qual podemos chegar a conhecer o que esta oculto em nos e o que não vemos nos outros.

É comum focalizar a projeção numa tela que tem uma ligeira semelhança com a imagem projetada, embora seja
também comum a semelhança ser interpretada como identidade. A pessoa precisa ser um bom "gancho" para acomodar a
coisa de que queremos nos livrar; e, além disso, desejamos ser um pouco seletivos nos relacionamentos. (Aqui também,
como veremos, a astrologia fornece uma importante chave para o que possivelmente projetaremos e que tipo de indivíduo
provavelmente vamos escolher para honrar ou insultar, outorgando-lhe nossa projeção .) Mas, a despeito da semelhança
entre a tela e a imagem, elas nunca são iguais, e a projeção é quase sempre um gritante exagero de alguma característica
que, por si só, poderia estar harmoniosamente integrada na natureza da pessoa ou do outro.

Há certos aspectos desagradáveis da projeção que entram nos relacionamentos. Se uma pessoa é eternamente o
alvo das qualidades inconscientes de outra, e se carece do autoconhecimento para discernir o que esta acontecendo, com o
tempo ela vai começar a se assemelhar a projeção. Todos nós sabemos de situações aparentemente inexplicáveis nas
quais, por exemplo, uma mulher parece ter o azar de atrair uma parceria dolorosa atrás da outra. Todos os seus amantes
podem bater nela, embora não tenham um histórico de tal comportamento anterior; balançamos a cabeça tristemente e
dizemos algo a respeito da condição lamentável da mulher, nunca reconhecendo o conluio inconsciente que sua situação
implica. Através das nossas projeções, damos um jeito de extrair das outras pessoas qualidades que, de outra forma,
poderiam ter permanecido sementes que nunca brotariam; e nenhum de nós pode dizer que sua própria psique não contém
as mesmas possibilidades tanto para o bem como para o mal. Nenhum de nós pode julgar sementes. Mas, com a cuidadosa
irrigação e com a luz do Sol de nossas projeções, provocamos essas respostas uns nos outros, de uma forma que as vezes
parece uma possessão demoníaca.

O homem que acredita que as mulheres são devoradoras, manipuladoras e destrutivas, porque há alguma parte
inconsciente dele que contém essas qualidades, pode mascarar tudo isso debaixo de uma atitude consciente de atração
pelo sexo oposto; entretanto, pode ficar horrorizado ao descobrir que toda mulher com a qual se envolve acaba, no fim das
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contas, tentando devora-lo, manipulá-lo e destrui-lo. Pode acreditar que descobriu uma verdade geral sobre as mulheres. No
entanto, é possível que ele mesmo tenha provocado essas qualidades nas mulheres, que poderiam nunca tê-las
demonstrado de outra forma. Em outro relaciona mento, a mesma mulher poderia se comportar de uma maneira totalmente
diferente; e como a opinião coletiva do sexo masculino não é unanime a respeito da misoginia, podemos, seguramente,
abrigar algumas suspeitas sobre nosso pobre cavalheiro devorado.

Mas de quem é a culpa aqui? Podemos dizer que alguém é responsável pelo inconsciente? Não é mais realista e
mais caridoso admitir que não podemos controlar aquilo que ignoramos? Até um tribunal reconhece que um crime cometido
em estado de insanidade merece tratamento psiquiátrico e não punição. O que dizer, então, de nossas projeções
inconscientes de hostilidade, raiva, estupidez, destrutividade, possessividade, ciúme, maldade, mesquinharia, brutalidade e
a miriade de outros aspectos de nosso próprio lado sombrio que julgamos eternamente ver nas pessoas que achamos
haver nos desapontado? Embora não sejamos responsáveis pelo inconsciente – afinal o ego é apenas um crescimento
recente da matriz do inconsciente –, é nossa responsabilidade tentar aprender um pouco sobre ele, tanto quanto possível
dentro das limitações da consciência. Talvez este desafio faça parte do nosso Zeitgeist. Depois de tantos milhares de anos
de história, já não somos crianças, e precisamos aceitar as responsabilidades da idade adulta psicológica. Uma dessas
responsabilidades é dar ênfase as nossas projeções.

Não sabemos muita coisa sobre o inconsciente, e isso é obvio uma vez que ele é, acima de tudo, inconsciente.
Sabemos que esse mar sem limites, do qual surge nosso pequeno farol da percepção, parece funcionar de acordo com
padrões de energia e leis diferentes; tem um modo de comunicação e uma linguagem diferentes, e deve ser explorado
levando em conta essas diferenças. Se um inglês viaja pela Alemanha, não pode esperar ser entendido se teimar em falar
apenas inglês, e o mesmo se aplica a relação entre o ego e o inconsciente. Infelizmente, o ego, em geral, tem a mesma
atitude do inglês, e fica espantado quando esse tipo de compromisso é requerido. Mas se nosso objetivo for investigar-nos e
desenvolver nosso potencial real, é preciso aprender a linguagem do inconsciente. E ele é sem duvida um alienígena – tão
alienígena que rimos nervosamente, ou nos encolhemos de medo quando o encaramos nos sonhos, nas fantasias, nas
explosões emocionais e em todas as áreas da vida onde uma qualidade magica ou estranha impregna a nossa percepção e
esfumaça os contornos do que acreditávamos ser a realidade nítida e bem definida.

Só acreditamos que somos os senhores de nossa casa porque gostamos de nós lisonjear. Na verdade,
entretanto, somos dependentes, num nível surpreendente, do funcionamento adequado da psique
inconsciente, e precisamos confiar que ela não nos falhe.

Um dos postulados mais importantes estabelecidos por Jung sobre o inconsciente é que ele compensa o consciente.
A psique é um sistema auto-regulador que se mantém em equilíbrio da mesma forma que o corpo. Cada processo que vai
muito longe, imediatamente, e inevitavelmente, exige uma atividade compensatória .

Tudo, em outras palavras, que não está contido ou expresso na vida do ego. esta contido no inconsciente, de uma
forma nascente e incipiente.

Uma das características do ego consciente é que ele se especializa e se diferencia; o inconsciente, por outro lado, é
um mar fluido, mutável, indiferenciado que flui a volta, acima e abaixo da concha nítida do ego, desgastando algumas partes
e depositando partes novas, da mesma forma que o próprio mar flui a volta de um promontório rochoso. A psique como um
todo contém todas as possibilidades; o ego só pode funcionar com uma possibilidade de cada vez, já que sua função é
ordenar, estruturar e tornar manifesto um fragmento particular das ilimitadas experiências da vida.

Não é de surpreender que no mito e nos contos de fadas esse mundo do inconsciente seja com tanta freqüência
simbolizado pelo mar, e a jornada do herói nas profundezas é a jornada do ego nas profundezas da psique. O inconsciente
é um mundo submarino, cheio de criaturas estranhas e magicas; e para os pulmões humanos, acostumados a respirar o ar, a
imersão total naturalmente é a morte psicológica. Chamamos essa morte de insanidade. A luz de tudo isso, podemos
começar a entender por que a pessoa que cresceu com uma formação deturpada, cujo ego se desenvolveu por um
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caminho estreito e ao qual se negaram todas as outras expressões possíveis, também seja aquela que tem mais
probabilidade de fazer intensas projeções sobre os outros e ser mais assediada pelos aparentes defeitos dos outros seres
humanos.

O modo primário de expressão do inconsciente é o símbolo. Estamos rodeados de símbolos durante a vida toda,
vindos da nossa vida interior, da vida dos outros e do mundo a nossa volta, mas muitas vezes somos indiferentes a seu
significado e a seu poder. Um símbolo não é a mesma coisa que um sinal; não é simplesmente algo que representa outra
coisa. Os vários sinais que vemos na estrada, por exemplo, tem significados específicos: não vire a direita, não estacione,
obras adiante. Mas um símbolo sugere ou infere um aspecto da vida cuja interpretação é inesgotável e que, em ultima a
analise, escapa a todos os esforços do intelecto para limitá-lo ou determiná-lo. Não se pode nunca sondar totalmente as
profundezas de seus multifacetados significados, nem se pode catalogar esses significados em termos intelectuais, porque
freqüentemente contem antíteses que o ego consciente não consegue perceber simultaneamente. Além disso, os
significados de um símbolo não são ligados pela lógica, mas pela associação, e as associações podem irradiar-se numa
quantidade de direções contraditórias. Não podemos ter consciência de todas as associações ao mesmo tempo, nem
delimitar um perímetro para as ondulações da associação da mesma forma que fazemos para o caminho claramente
definido da lógica. Um símbolo é como uma pedra lançada no lago da psique. Estamos no meio do lago, por assim dizer, e
não temos olhos nas costas.

Um símbolo evoca uma resposta nossa em nível inconsciente, porque compreende associações não logicamente
relacionadas e que são fundidas num todo significativo. Um exemplo simples é o da bandeira de um determinado país. Para
um patriota, essa bandeira é o símbolo de tudo que o país significa para ele; na sua presença, todos os valores emocionais
e religiosos corporificados por ela, o senso de liberdade ou de sua falta, seu lar, suas raízes, sua herança, as possibilidades
do futuro e uma miriade de outras associações que nunca poderíamos explicar completamente explodem dentro dele em um
instante com alta carga emocional. Podemos ver, nesse simples e tosco exemplo, o poder do símbolo. Uma bandeira pode
evocar ódio, violência, paixão, amor, sacrifício, autodestruição ou heroísmo, e precipitar o indivíduo – ou uma comunidade de
indivíduos – numa reação emocional sobre a qual não Há controle consciente. O símbolo da suástica, usado com fria
inteligência e total conhecimento do seu poder, ajudou a lançar o mundo no caos Há apenas quarenta anos; e mesmo
agora, quando é vista numa parede de metro ou de um prédio, ele tem a capacidade de provocar poderosas reações
emocionais e uma multidão de pode rosas associações. De forma muito semelhante, os símbolos religiosos convencionais
podem ter imenso poder. O crucifixo prateado no pescoço de um cristão devoto, ou a estrela de Davi no pescoço de um
judeu, tem um significado que nunca pode ser comunicado em palavras, mas proporciona um vislumbre daquilo que, para
muitos, é o mais elevado e mais sagrado dos mistérios, corporificado numa simples forma geométrica.

A bandeira, a suástica, a estrela de Davi e o crucifixo são símbolos que podemos prontamente identificar como tal.
Mas há símbolos a nossa volta que não identificamos com tanta facilidade, porque são expressões dos padrões energéticos
subjacentes que moldam a própria vida, Jung chamou essas linhas básicas de energia de arquétipos, e, embora um
arquétipo não tenha forma, ele se comunica conosco através de muitos símbolos de natureza tão vasta que o ego
consciente recua assombrado. A própria natureza, como a humanidade, funciona de acordo com padrões arquetípicos, ao
mesmo tempo que os corporifica. No ciclo das estações, por exemplo – com a vida nova surgindo na primavera, a
maturidade e a frutificação no verão, a desintegração gradual e a colheita no outono, a esterilidade e a germinação
subterrânea secreta no inverno – podemos ver o ciclo de nossas próprias vidas, do nascimento á maturidade, decadência,
morte e renascimento. O ciclo do Sol no céu, nascendo no leste, culminando no Meio-do-céu, pondo-se no oeste, e
desaparecendo durante a noite apenas para nascer novamente, parecia aos antigos ser a face de Deus, porque viam
refletida, na jornada solar, a totalidade da vida. Diferentemente dos nossos antepassados. não mais adoramos o Sol, mas
ainda respondemos inconscientemente ao símbolo. O crescimento de uma planta, de semente a folha, a flor e novamente a
semente, simboliza mais uma vez esse processo da vida – assim como os quartos da Lua, os ciclos dos planetas e das
constelações. Aqui podemos começar a ver por que a astrologia era, para os antigos, um olho que se abria para o
funcionamento do universo – porque toda experiência da qual um ser humano é capaz, se vista simbolicamente, pode
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encontrar um correspondente num desses ciclos naturais no céu. A linguagem da literatura esta cheia de correspondências
semelhantes, assim como o mito e o conto de fadas; e nos também as empregamos no nosso discurso diário, quando
falamos das marés da vida, da fase crescente ou minguante da vida, do desejo, do amor. Essas coisas precisam ser
meditadas e sentidas, em vez de analisadas, pois os símbolos naturais da vida nos falam sobre a nossa inteireza e a nossa
ligação com os outros e com o próprio fluxo da vida; mas não é ..- possível discerni-los se olharmos apenas com o intelecto.
poderíamos ampliar mais ainda esse conceito e sugerir que mesmo nós, seres humanos, somos símbolos, pois todo o
universo é energia, e Há certos padrões energéticos subjacentes básicos sem forma, porém com qualidades definidas que
se corporificam como o homem.

Freud passou muito tempo tentando demonstrar que tudo, nos sonhos, é símbolo dos órgãos sexuais masculinos ou
femininos. O que não lhe ocorreu foi a possibilidade de estar considerando as coisas ao contrário, e que os órgãos
masculinos e femininos são, eles mesmos, símbolos das misteriosas energias, arquetípicas que os chineses chamam yin e
yang. Como se diz que Jung afirmou certa vez, até o pênis é um símbolo fálico. Aquelas qualidades que associamos com a
masculinidade: franqueza, vontade, clareza, abertura, força, são espelhadas no corpo de todo homem, e aquelas
associadas com a feminilidade: sutileza, ocultação, delicadeza, gentileza e suavidade, também estão espelhadas no corpo
de toda mulher. Em conseqüência do trabalho da vida de Jung, temos razões para acreditar que o arquétipo, a própria
energia básica, exista antes de haver uma forma através da qual ele possa manifestá-se. Ou, na expressão da Bíblia, no
principio era o Verbo.

Quando olhamos o rosto dos outros, vemos ali os símbolos de traços de caráter inerentes. Expressamos isso
instintivamente, quando falamos de queixo franzino, maxilar determinado, testa de erudito, nariz aquilino, mãos artísticas e
olhos penetrantes. Estamos colocando em palavras nossa percepção inconsciente) de que o próprio corpo pode ser um
símbolo do indivíduo, e vemos na forma física uma destilação cristalizada e concretizada do outro que está diante de nós.
Esse é um principio importantíssimo para ponderar, porque nos diz algo sobre o que é, de fato, a atração ou repulsa sexual.

Um mundo muito diferente abre-se para nós se entendermos que a, realidade manifesta é, em si mesma, um
símbolo. Esta é a base sobre a qual se estabeleceram todas as doutrinas religiosas, e todo o pensamento esotérico, a
tradição de sabedoria secreta de séculos, deriva desse milagre do símbolo que Emerald Tablet cristalizou na frase: "Assim
em cima como embaixo." Jung insinua a mesma direção em seu trabalho, mas, como cientista, foi obrigado a basear suas
idéias em observações empíricas e não em visão intuitiva – ou, pelo menos, apoiar sua visão em fatos verificáveis.

A psique surge de um principio espiritual que é tão inacessível ao nosso conhecimento quanto a matéria

Os mesmos padrões arquetípicos estão sob as duas.

Podemos começar agora a vislumbrar o que realmente significa o inconsciente. Freud acreditava ser uma lata de lixo
na qual se despejava a acumulação particular dos fragmentos rejeitados de cada pessoa; acreditava que seu conteúdo fosse
composto quase exclusivamente de desejos reprimidos inaceitáveis para o ego consciente e para a sociedade na qual o
indivíduo vivia. Sem duvida Há uma acumulação de sujeira no inconsciente de cada um – provavelmente em proporção
direta e compensatória á “limpeza" do ego consciente.

Ao mesmo tempo, também há uma acumulação de riquezas. Além do mais, a sujeira também é relativa; não é muito
apetitosa na mesa da cozinha, mas todo jardineiro sabe que sem seu adubo teria um jardim muito inferior O inconsciente
abre acima e abaixo de nós um repositório de (imensa energia criativa uma matriz da qual, surgem todas as coisas, e não
para no nível individual, mas se funde num grande mar coletivo, além das fronteiras humanas, que se estende até o
desconhecido. É possível que o que a psicologia moderna chama inconsciente fosse conhecido pelos antigos como os
deuses, ou Deus; e não é de surpreender, quando meditamos sobre essas coisas, que a ciência e a religião, depois de se
terem apedrejado mutuamente por tantos séculos, estejam começando a descobrir que viajam na mesma direção. rumo ao
mesmo mistério – por mais que seus veículos sejam diferentes.

Dessa excursão ao mundo em que se encontram a psicologia e a religião, vamos voltar aos problemas práticos dos
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relacionamentos. Podemos ver agora que a maior parte das coisas que ocorrem num relacionamento é inconsciente, porque
a maior parte do que uma pessoa é permanece inconsciente. O mistério de por que um homem é atraído por um certo tipo
de mulher, por que ele começa seus relacionamentos de uma determinada forma, por que eles seguem um determinado
rumo e por que ele encontra determinados problemas com os quais deve lidar, torna-se menor quando percebemos que
muito do que chamamos atração e repulsão é, na verdade, atração ou repulsão que pertencem à qualidades inconscientes
do próprio homem. É rara a pessoa que pode dizer que não há um elemento de projeção em seus relacionamentos, já que,
provavelmente, boa parte do inconsciente nunca pode tornar-se de fato consciente, e que assim vamos eternamente
projetar. Pode ser que projetemos até mesmo Deus. Quem, então, é a amada, e onde vamos encontra-la? No interior ou no
exterior? Ou em ambos?
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2 O Mapa Planetário do Potencial Individual


O que esta embaixo é como o que está em cima. E o que está em cima é como o que está
embaixo, de modo que o milagre da unidade possa ser cumprido.
Tabula Smaragdina
O fado e a alma são dois nomes do mesmo principio.

Novalis

O Mapa de Nascimento
Qualquer compreensão da linguagem da astrologia deve começar com um entendimento do que o horóscopo de
nascimento pode e não pode nós dizer. O horóscopo é um mapa astronômico altamente complexo, baseado não apenas na
data de nascimento, mas também no horário, ano e lugar. Em primeiro lugar, portanto, é preciso descartar todas as noções
preconcebidas e preconceitos baseados na astrologia das revistas populares, que não tem virtualmente nada que ver com o
estudo verdadeiro.

O mapa de nascimento não conjura o fado de um indivíduo de forma predestinada. Em vez disso, simboliza as linhas
básicas do desenvolvimento potencial de seu caráter. Com um mínimo de reflexão, percebe-se que uma pessoa agirá e
moldará sua vida de acordo com suas necessidades medos e capacidades, e que essas necessidades. medos e
capacidades derivam de sua disposição intrínseca. Nesse sentido, o caráter é o fado, e se formos ignorantes de nossas
próprias naturezas – como o é a maioria que nunca investigou o inconsciente –, os astros não poderão ser culpados pelo fato
de seguirmos precipitada e cegamente o caminho que nós mesmos escolhemos.

Esse ponto fundamental é critico para a compreensão de todo o estudo da astrologia. A interpretação mais superficial
de fado e livre-arbítrio – fado é o que estou "destinado" a fazer, enquanto livre-arbítrio é o que "escolho" fazer – nos
impossibilita ver o sutil paradoxo de que esses dois opostos são um e o mesmo.

Sabemos que além de toda vida, seja psíquica ou material, jazem os padrões arquetípicos, os ossos nus da estrutura
da existência. Ainda não sabemos se há qualquer base material para o fato de os dados astrológicos se correlacionarem com
o comportamento humano, embora não demore muito até que tenhamos as provas, através da nossa pesquisa sobre
relógios biológicos e os ciclos das manchas solares. A trabalhosa e rigorosa pesquisa estatística de Michel Gauquelin
demonstrou de forma dramática que tais correlações são válidas , mas a razão de sua validade ainda nos escapa. Os fatos
materiais referentes a astrologia, entretanto, como a possibilidade de emanações de energia dos planetas que afetam o
campo de energia do Sol, são apenas uma das pontas do espectro do arquétipo. A outra ponta é si e as posições o céu
num momento determinado, repetindo as qualidades daquele momento, também refletem as qualidades de qualquer coisa
nascida naquele momento, seja um indivíduo uma cidade, uma idéia, uma companhia ou um casamento. Um não causa o
outro; são sincrônicos, e se refletem mutuamente.

No que diz respeito a razão dessa sincronicidade, temos, de um lado, 4 arquétipos de Jung do inconsciente coletivo
e, de outro, os ensinamentos da doutrina esotérica. Esses dois pontos de vista parecem revelar a mesma verdade, que as
descobertas da física quântica e da biologia nos últimos vinte e cinco anos estão começando a asseverar. A vida é na
verdade um organismo, e as várias partes desse organismo, embora diferentes em forma e aparentemente separadas,
participam do mesmo todo e estão interligadas com todas as outras partes.

Paracelso, escrevendo sobre astrologia no século XVI, diz:

Se eu tenho "maná" na minha constituição, posso atrair "maná" do céu... "Saturno" não está apenas no
céu, mas também nas profundezas da terra e no oceano. O que é "Vênus" senão a "artemísia" que
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cresce no seu jardim? O que é "ferro" senão "Marte"! Isto é, Vênus e artemísia são produtos da rnesma
essência, e Marte e ferro são manifestações da mesma causa. O que corpo humano senão uma
constela o dos mesmos poderes que formaram as estrelas no céu? Aquele que sabe o que é o ferro,
sabe os atributos de Marte. Aquele que conhece Marte, conhece as qualidades do ferro .

O sistema solar não é apenas um arranjo do Sol e dos planetas físicos unidos pela força da gravidade e orbitando no
espaço. Também pode ser visto como o símbolo de um padrão de energia vivente, refletindo as formas menores de vida
contidas nele a qualquer momento. Na tentativa de compreender o simbolismo do horóscopo de nascimento, é útil considerar
o que conhecemos da psique, pois o mapa no nascimento é realmente um modelo, em termos simbólicos, dos vários
padrões de energia psíquica que compõem o indivíduo. Sabemos que o ego, como centro do campo da consciência, é um
centro regulador cuja função é iluminar as áreas do inconsciente tanto pessoal como coletivo, que estão procurando a luz; e
sabemos também que o é o delegado ou o reflexo daquele centro misterioso que Jung chama Self e o ensinamento
esotérico, chamado Alma. Sabemos também que na medida em que o indivíduo se desenvolve, é provável que bloqueie do
seu campo de consciência aqueles aspectos de sua natureza que na realidade lhe pertencem, mas que, por uma razão ou
outra, são incompatíveis com seus valores ou com os valores de sua família ou da sociedade. Finalmente, sabemos que é
extremamente importante, se busca a autoplenitude e uma vida significativa que realize também o propósito maior para o
qual se nasceu, trazer a luz esses aspectos da própria natureza em vez de condená-los à perpétua escuridão inconsciente.
Como projeção ideal dos primeiros dias da infância, a personalidade quase nunca é totalmente expressa; apenas uma parte
é realizada, e, no caso de muitas pessoas, essa parte é de longe menor do que constitui seu verdadeiro patrimônio
hereditário. Nesses casos, dizemos que a pessoa nunca desenvolveu realmente seu potencial, ou que desperdiçou
oportunidades ou talentos, ou que nunca foi realmente "verdadeira consigo própria".

O mapa de nascimento é uma semente ou esquema de tudo que, em potencial, pertence a personalidade de uma
pessoa – se florescer totalmente, em plena consciência. E o mapa de uma estrada no seu sentido mais autentico, pois o
objetivo de seu estudo não é "superar" as "influencias" dos planetas, mas sim dar espaço, na vida da pessoa, para a
expressão de todas as qualidades e impulsos nele simbolizados. Só então o indivíduo pode se aproximar do plano original
do desenvolvimento de sua vida conforme foi "concebido" – pois precisamos, no fim, concluir por um desenvolvimento
inteligente, com propósito – pelo Self.

Se isto parecer uma definição muito obscura ou elevada do horóscopo de nascimento, cabe lembrar que a astrologia,
antes de se tomar propriedade das colunas em revistas e jornais populares, foi um arte sagrada. Através dela, o estudioso
tinha acesso a uma percepção intuitiva do funcionamento das energias por trás da vida, que nenhum outro sistema antigo –
com exceção, talvez, do seu equivalente oriental, o I Ching – podia proporcionar. O grande esta refletido no pequeno, e o
fato de a astrologia também poder ser usada para esclarecer problemas mais mundanos não compromete seu valor
psicológico mais profundo. É apenas um reflexo do fato de que, mesmo nos menores detalhes de nossa vida refletimos
aquilo que é a nossa essência.

Visto por este prisma, torna-se claro que a compreensão do horóscopo de nascimento proporciona uma nova
dimensão a compreensão do caminho de vida de alguém. Da mesma forma, a comparação de dois horóscopos fornece
informação considerável sobre o interfuncionamento de duas vidas; e foi dessa arte de comparação de mapas que se
desenvolveu a sinastria o uso da comparação de mapas para investigar e avaliar os relacionamentos.

Em termos astronômicos, o horóscopo de nascimento é simplesmente um mapa – calculado com precisão, de modo
que não possa ser criticado pelo mais impertinente astrônomo – do céu, conforme aparece na hora e local exato do
nascimento do indivíduo. O círculo dos dozes signos zodiacais é um símbolo da totalidade, e em sua totalidade representa
todas, as possibilidades da vida. Nesse sentido, o zodíaco é como qualquer outro símbolo universal de inteireza coma o ovo,
ou o urobouros. (a serpente que devora a sua cauda), ou a cruz de braços iguais. É uma mandala, e como Jung
demonstrou, as mandalas são a expressão simbolica da inteireza potencial da vida e da psique humana. São ao mesmo
tempo símbolos do Self e símbolos de Deus, pois os dois são, em termos da percepção humana, a mesma coisa.
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Contra o cenário desse circulo do zodíaco (que é chamado eclíptica e é, na verdade, o circulo aparente do Sol
cruzando o céu) ficam o Sol, a Lua e os oito planetas conhecidos. As posições desses planetas, conforme se colocam na
roda zodiacal no momento do nascimento do indivíduo, formam o padrão interno do mapa de nascimento. Assim, temos um
quadro Simbólico, com a roda da inteireza no exterior e a combinação individual dos componentes psicológicos no interior.
Cada mapa é composto dos mesmos ingredientes: doze signos zodiacais, oito planetas, o Sol e a Lua. Entretanto, cada
mapa é diferente porque em qualquer momento particular o arranjo o de todos esses fatores é diferente, tanto no padrão
planetário como no relacionamento entre os planetas e o horizonte e a própria Terra.

Em outras palavras os seres humanos são construídos a partir da mesma matéria-prima, dos mesmos impulsos ou
energias, necessidades e possibilidades; mas existe um arranjo individual dessas energias que dá a ca de singularidade ao
padrão. As mesmas forças estão presentes em todos nós, fato com o qual nos deparamos sem cessar em qualquer trabalho
envolva aconselhamento ou terapia. Mas existe um singularidade criativa que faz dessas energias básicas uma obra de arte
única que é a vida individual. Essa forma criativa, é preciso entender, não deriva do ego, que é dificilmente capaz de tal feito;
ela deriva do self, e o Self, como tal, não está mapeado no mapa de nascimento. É o zodíaco inteiro. O mapa também não
de mostrar a decisão do indivíduo em qualquer momento de sua vida, de cooperar voluntariamente com os esforços de sua
própria psique rumo a uma maior consciência, e portanto a um uso mais completo dos potenciais que lhe pertence desde o
começo. Nessa decisão reside o significado mais profundo do livre-arbítrio individual.

Os Planetas
Os blocos básicos da construção no simbolismo astrológico são os oito planetas, o Sol e a Lua. No jargão astrológico,
referimo-nos também ao Sol e a Lua como planetas. porque isso torna as coisas mais fáceis. Em astronomia, esses dez
corpos celestes são os componentes do organismo do nosso sistema solar. Simbolicamente, formam o organismo da psique
humana. Nos antigos ensinamentos esotéricos, acreditava-se que o espaço não era "vazio", mas, na realidade, o corpo
vivente de uma vida gigantesca, um organismo que possuía os atributos de consciência e propósito. Sua forma física era o
sistema solar, e o Sol expressava o coração, em torno do qual a Lua e os oito planetas serviam como órgãos ou centros de
energia – da mesma forma que as órgãos do corpo humano servem a função primária do coração doador da vida. Antes da
descoberta de Urano em 1781, apenas cinco planetas eram conhecidos; mas podemos ver vagas sugestões dos outros três
na mitologia" invariavelmente simbolizados como deuses invisíveis, vivendo debaixo das águas ou da terra. Embora
possamos considerar esse conceito esotérico do sistema solar abstrato e difícil de imaginar, é um símbolo indispensável
para qualquer tentativa de compreender como os planetas funcionam no mapa de nascimento.

A astrologia, como o inconsciente coletivo do qual trata a psicologia, consiste em configurações


simbólicas: os "planetas" são os deuses, símbolos dos poderes do inconsciente .

Podemos agora começar a investigar o significado de cada um dos corpos celestes de acordo com os impulsos
básicos ou padrões arquetípicos que simbolizam no indivíduo.

O Sol e a Lua
O Sol, o coração do sistema solar e, isoladamente, o símbolo mais importante no mapa de nascimento, sugere, por
sua representação pictórica – um ponto no centro de um circulo – que reflete o impulso do indivíduo para se tornar ele
próprio. Embora isso pareça bastante simples, é tarefa para uma vida. O circulo é o antigo símbolo da inteireza, da
divindade e da eterna unidade da vida, porque não tem princípio nem fim; o ponto no centro sugere que o espirito, ou a
vida, ou o Self, se manifesta (em um lugar determinado e em um determinado momento) como um ego individual que
possui, como um de seus atributos, o impulso em direção à auto realização . Como qualquer outro símbolo vivo, o Sol no
mapa de nascimento não pode ser reduzido a algumas palavras-chave bem escolhidas. Mas podemos começar a penetrar
seu significado se soubermos que ele sugere o caminho que o indivíduo deve seguir para preencher seu impulso básico de
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obter um senso de identidade. Poderíamos dizer que o Sol simboliza o impulso para a autoexpressão, a auto-realização, a
autoconsciência ou uma série de outros termos que realmente não fazem sentido a não ser que se esteja consciente da
necessidade subjacente, na pessoa, para ser ela mesma, e a não ser que se possa ver essa necessidade em
funcionamento em todos os atos criativos executados não por qualquer motivo dissimulado, mas como um autentico reflexo
da essência da individualidade.

Os planetas do mapa de nascimento simbolizam as experiências arquetípicas da vida, e a astrologia é apenas uma
forma de retratá-las. Outra, como já vimos, é o mito e o conto de fadas, e o Sol pode ser considerado um reflexo do mesmo
principio expresso como o Herói. A saga do Herói é a mesma jornada expressa através do simbolismo do mapa de
nascimento, e o Herói, sempre e sempre, procura primeiro sua outra metade, para que possa ficar inteiro, e em seguida sua
origem, para que possa realmente identificar sua ascendência e seu propósito. Poderíamos também dizer que o Sol. no
horóscopo, é um símbolo do impulso, dentro do indivíduo, para identificar aquele centro ou força vital de que seu ego
consciente, seu "eu" pessoal, é um reflexo.

O Sol, portanto, é um símbolo da ego, no sentido que Jung da ao termo. Em ultima análise, é o recipiente ou veículo
para que a totalidade da psique, o Self, se torne manifesta. Como já observamos, o mapa não mostra o Self, que é
simbolizado pela roda zodiacal como um todo. O mapa de nascimento é apenas o caminho que o ego segue, a saga
especifica do herói individual; e aquelas qualidades que o indivíduo pode, potencialmente, concretizar na consciência – seu
pequeno quinhão no espectro maior da vida – são simbolizadas pelo signo que o Sol ocupa no nascimento.

Muito prejuízo não-intencional foi causado a astrologia pelas colunas de signo solar nos jornais e revistas populares,
e, infelizmente, até o mais sério estudante da astrologia freqüentemente cai na mesma armadilha que os leitores dessas
colunas: o signo solar geralmente é interpretado como um conjunto de padrões de comportamento cristalizados e
preexistentes. Podemos ler que se uma pessoa é de Áries, é cheia de vontade, impulsiva, temerária e gosta de desafios. Se
a pessoa é de Touro, é estável, confiável, sensual, teimosa e gosta de bem-estar material. E assim por diante.

Mas seria rnuito mais significativo, e mais de acordo com a compreensão da psique proporcionada pelo trabalho da
psicologia analítica, ver o Sol não como um mero catálogo de traços de caráter, mas como aquilo que a pessoa está se
esforçando para ser e o que ela é em potencial, em essência.

Na verdade, esse símbolo do ego totalmente integrado raramente é alcançado antes dos primeiros trinta anos de vida;
e o inicio do autentico auto questionamento geralmente vem logo em seguida ao ponto da crise dos vinte e nove anos,
chamada retorno de Saturno. Viver todo o potencial do Sol é a jornada de uma vida. Assim, podemos dizer que seu signo
solar não o "torna" algo em particular; em vez disso, simboliza aquelas energias, aquele mito especifico, do qual você esta
tentando aprender como se tornar consciente e tentando expressar de uma forma criativa Cada indivíduo tem a tarefa de
tornar consciente e canalizar, por meio de sua individualidade impar, o significado do simbolismo do signo solar, de modo
que ele seja caracterizado pela misteriosa essência do próprio Self. Ter nascido com o Sol em Áries pode não tomar uma
pessoa cheia de vontade e impulsiva, mas sugere que ela precisa cultivar um senso de vigor da vida, uma capacidade de se
afirmar no mundo exterior, de proceder a mudanças e enfrentar os desafios criativamente, para que se torne completa. Com
o risco de uma simplificação exagerada, podemos dizer, de forma semelhante, que Touro precisa aprender a se relacionar
com o mundo terreno e a construir nele um senso de valor permanente; Gêmeos precisa desenvolver seus poderes de
discriminação intelectual, para poder aprender mais sobre o mundo a sua volta; Câncer precisa aprender a abrir o fluxo de
seus sentimentos para os outros de modo a alimentar a nascente consciência daqueles que ama; Leão precisa aprender a
identificar, por meio de seus esforços criativos, aquele centro de si mesmo que é o verdadeiro criador e ao qual deve se
dedicar; Virgem precisa aprender a aperfeiçoar-se e purificar-se como um veículo de serviço para que possa exercer seu
papel na transmutação de tudo que d vil ou indiferenciado na vida; Libra precisa aprender a identificar os opostos dentro de
sua própria natureza e equilibrá-los, para podei relacionar-se com os outros; Escorpião precisa aprender a amar e integrar
sua própria escuridão, para poder eliminar a escuridão a sua volta; Sagitário precisa aprender a ver a consistência
subjacente a toda aspiração humana, de modo que seu senso de significado da experiência da vida possa ser ensinado a
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outros; Capricórnio precisa aprender a dominar primeiro o seu ambiente e depois a si próprio, para que brilhe como um
exemplo do poder da vontade humana; Aquário precisa aprender a se tornar consciente da vida do grupo do qual faz parte,
de modo que possa contribuir para o crescimento da consciência coletiva; e Peixes precisa aprender a se oferecer como
uma dadiva para a vida mais ampla, para poder executar a tarefa de salvar o que esta perdido. O signo solar dificilmente é
tão pessoal quanto um conjunto de padrões de comportamento, e não faz ninguém se tomar coisa alguma. É um símbolo do
que precisa ser alcançado. A probabilidade maior é de que o indivíduo só alcance esse objetivo com dificuldade.

É bom ter em mente que o Sol não é um ponto pessoal no mapa, no sentido de pertencer ao comportamento da
personalidade. Simboliza o caminho, o alvo, não a maquina em que se viaja – até que estes se tornem a mesma coisa. O
Sol é o coração do ser humano, e quantos de no conhecem verdadeiramente seu coração? Os planetas, como todo
simbolismo na astrologia, são divididos em l dois grupos de energias: masculinas e femininas. O Sol é considerado um
planeta masculino, porque esta associado com o lado da vida que diz respeito a vontade, a consciência, a decisão e ao
impacto sobre o ambiente – em outras palavras, é um principio ativo. Como seria de se esperar, é mais "acessível" aos
homens do que as mulheres porque reflete um impulso que é mais fácil aos homens tornar consciente. Quando chega aos
dezesseis anos, a maioria dos homens esta bem ciente da necessidade de ter uma identidade individual: muitas mulheres,
por outro lado, se contentam em encontrar sua identidade, durante a primeira metade da vida, através de seus parceiros e
de sua família. O principio da auto-realização através da irradiação da luz do ego no mundo é muito mais uma prerrogativa
da consciência masculina do que da feminina. No horóscopo de uma mulher, por tanto, o Sol geralmente sugere o que ela
espera do lado masculino da vida, a e dos seus homens, para se completar. Mas, no plano ideal, é claro, tanto as
polaridades masculinas e femininas do mapa precisam ser expressas por todos os indivíduos. Isto faz parte do desafio de
nossa crescente consciência.

O Sol reflete o impulso interno de todo ser humano para se expressar, para se tornar o que potencialmente é. A Lua,
ao contrário, simboliza o impulso para a inconsciência, para o passado, para uma imersão no fluxo de sentimentos, que
permite ao indivíduo ser parte das correntes de massa da vida, sem empreender a luta exigida para a autoconsciência.

A Lua também é símbolo da mãe, tanto pessoal com arquetípica, e é para esse ventre, com sua abençoada defesa e
segurança, que o nosso lado lunar deseja retornar. A Lua retrata o impulso para mergulhar na experiência de viver, sem ter
de avaliar ou entender a experiência; também simboliza o impulso para o conforto e para a satisfação das necessidades
emocionais.

Enquanto o Sol se empenha na diferenciação, a Lua se empenha no relacionamento e na fusão de identidades. O Sol
se furta aos relacionamentos pessoais em beneficio do desenvolvimento do ego independente; a Lua se furta a identidade
em beneficio dos relacionamentos, e anseia pela paz da noite quando todas as cores se misturam e tudo dorme. Esther
Harding, em seu livro sobre o significado psicológico do simbolismo da Lua, afirma: Nos tempos da adoração da Lua, a
religião se preocupava com as forças invisíveis do mundo do espirito, e mesmo quando a religião do estado foi transferida
para o Sol, um deus de guerra, de engrandecimento pessoal, e das coisas desse mundo, as qualidades espirituais
permaneceram com as divindades lunares; pois a adoração da Lua é a adoração dos poderes criativos e fecundos da
natureza e da sabedoria inerente ao instinto e a unidade com a lei natural. Mas a adoração do Sol é a adoração daquilo que
sobrepuja a natureza, que ordena sua plenitude caótica e subordina seus poderes a realização dos fins humanos. O Sol e a
Lua compõem um duo de macho e fêmea no mapa de nascimento, simbolizando a polaridade macho/fêmea em cada
indivíduo, e a tensão implícita entre eles é necessária. Sem ela, não poderia haver consciência nem vida. O Sol e a Lua se
assemelham a outros símbolos de pares, como escuro e claro, vida e morte e todos os outros pares de antíteses que
constituem os grandes pilares que sustentam o organismo da vida.

Esses opostos abrangem tudo, desde o sublime até o ridículo: o Sol não apenas indica, de forma muito ampla e profunda o
caminho do indivíduo em direção a plenitude, mas também diz algo sobre a imagem que ele vai projetar para a multidão; e
a Lua não apenas indica o caminho pelo qual o indivíduo pode restabelecer o contato com a vida da natureza que esta nas
raízes do seu ser, mas também diz alguma coisa sobre a forma como ele mantém sua casa e o tipo de hábitos pessoais
17

que manifesta. Esse espectro de significados muitas vezes confunde as pessoas em relação a astrologia: como pode um
símbolo ter um sentido tão significativo e ao mesmo tempo aparentemente tão insignificante? Mas todo símbolo, por sua
própria natureza, é sempre assim; e, além de tudo, estamos lidando aqui com arquétipos, e os planetas que os simbolizam
formam a estrutura básica da experiência do indivíduo. Tudo que pertence a eles, do mais superficial ao mais profundo,
obedece a um padrão.

Podemos discernir pelo signo da Lua no nascimento um pouco da forma pela qual o indivíduo se expressa quando
não é um indivíduo, e sim uma criatura de instintos. Em outras palavras, a Lua simboliza a natureza instintiva ou não-
racional. Também sugere, pela sua colocação no mapa de nascimento, a esfera da vida em que o indivíduo busca um sono
simbólico, uma inconsciência, uma fuga ou um refugio – em que é mais provável haver um predomínio de suas
necessidades, em vez da motivação de contar com sua própria vontade e capacidade de tomar decisões. Pode-se observar
a Lua quando o ego não está lutando por alguma coisa – quando a pessoa relaxa em seus padrões de resposta instintiva.

Um exemplo pode ajudar a esclarecer a polaridade do Sol e da Lua em nível interpretativo. Com o Sol colocado num
determinado signo no nascimento, os objetivos simbolizados por esse signo se tornam parte, de alguma forma, das
aspirações do indivíduo na vida. Com a Lua colocada num determinado signo, as necessidades instintivas simbolizadas por
esse signo se tornam parte das exigências do indivíduo para o bem-estar emocional. Assim, por exemplo, podemos ver a
pessoa com o Sol em Leão lutando pela auto-expressão criativa como um objetivo importante na vida, com uma valorização
consciente de honra, lealdade, integridade e singularidade individual. Por outro lado, podemos ver uma pessoa com a Lua
em Leão respondendo a vida de uma maneira intuitivamente dramática, com uma necessidade menos consciente de
exibição, aceitação, adoração e um palco para representar – não porque ela valoriza essas coisas, mas porque necessita
delas para sentir-se segura. A pessoa com o Sol em Leão, se está ver realmente seguindo o seu caminho, vai lutar para se
tornar o que Há de mais elevado e melhor na figura do Herói; com a Lua em Leão, simples mente se sente especial e reage
de acordo, com um sortimento de qualidades leoninas um tanto menos apurado, porém mais natural e relaxado.

Em geral, o Sol é um símbolo da consciência e a Lua, do inconsciente no horóscopo de um homem; no de uma


mulher, a Lua simboliza 4a consciência e o Sol, o inconsciente. Há exceções, naturalmente. Elas geralmente ocorrem, por
exemplo, quando uma mulher tem uma forte inclinação masculina, ou porque tenha uma mente poderosamente
desenvolvida ou porque esteja se rebelando contra seus instintos. Também ocorrem quando um homem tem uma forte
inclinação feminina, ou por que tenha sentimentos poderosamente desenvolvidos ou porque esteja se rebelando contra a
necessidade de lutar pela individualidade. Mas o Sol e a Lua são duas metades da mesma unidade, e ambos são
necessários em seu lugar adequado. É a integração harmoniosa desses dois símbolos que os alquimistas descreviam na
sua coniunctio ou casamento sagrado, e que nos contos de fadas é o final da historia, o herói e sua amada vivendo felizes
para sempre. Como já vimos, entretanto, é raro o indivíduo que consegue incluir todo o seu ser na sua experiência concreta.
Geralmente o instinto se choca com os objetivos da vida, porque esses objetivos são muito estreitos ou muito difíceis de ser
alcançados, ou proibidos pela sociedade ou pelos próprios valores; o indivíduo muitas vezes sente que precisa escolher um
dos dois, quando o que é realmente necessário é um casa mento entre eles, de modo que ambos possam ser expressos
como uma unidade viva. Se ele não puder realizar esse casamento interno, como pode esperar que um casamento externo
seja bem-sucedido?

Mercúrio
Em seguida, passamos para o planeta Mercúrio, em termos astronômicos o menor e mais rápido planeta do sistema
solar; na mitologia, uma estranha figura andrógina que possui as chaves do conhecimento e leva mensagens entre os
deuses e entre os deuses e os homens. Mercúrio, que esta ligado ao Hermes grego, ao Thoth egípcio e ao Loki norueguês
ou teutônico, é um símbolo da maneira pela qual não apenas percebemos, mas ordenamos as nossas percepções de modo
que possam ser entendidas e comunicadas. Ele é fundamentalmente o símbolo do impulso para entender, para integrar o
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motivo inconsciente e o reconhecimento consciente. Esse planeta não representa o intelecto, embora tenha sido descrito
dessa forma nos manuais mais antigos, pois devemos nos lembrar de que Há outros modos de percepção além do racional,
aos quais, no passado, não se dava muito reconhecimento. Pode-se perceber e entender através dos sentimentos, ou da
intuição, ou dos cinco sentidos. Mercúrio colocado em Câncer no nascimento sugere uma pessoa que percebe através do
inconsciente e avalia suas percepções através do sentimento; Mercúrio em Capricórnio, por outro lado, percebe através dos
sentidos e acumula fatos em sua cabeça mais ou menos dura, avaliando suas percepções de acordo com o que já foi
experimentado e provado. O planeta é um símbolo do modo pelo qual o indivíduo se torna consciente de seu ambiente
assim como de si próprio, e pode-se também dizer que simboliza o impulso para assimilar a experiência, para se tornar
ciente.

Mercúrio está ligado a estranha figura de Mercurius na alquimia medieval. Isto sugere – embora ele não seja
considerado especialmente poderoso ou significativo na astrologia tradicional, que geralmente o relega a função de
"comunicação" – que esse planeta pode ser mais do que aparenta a primeira vista. Na alquimia, Mercúrio é o grande
transformador; e talvez devessemos recordar que ele é o impulso da pessoa para entender o que a eleva acima dos outros
reinos da natureza, o que a leva a refletir sobre o seu desenvolvimento, e consequentemente a cooperar voluntariamente
com o inconsciente na sua luta por uma maior integração. Então podemos começar a ver por que Blavatsky diz, em A
doutrina secreta, que "Mercúrio e o Sol são um", subentendendo portanto a unidade entre o pequeno microcosmo do
entendimento do homem e o grande macrocosmo do propósito cósmico. Sendo o planeta mais próximo do Sol, Mercúrio é o
mensageiro do Sol, e enquanto o Sol é o símbolo da essência, Mercúrio é o símbolo da função que nos permite conhecer a
essência.

O signo de Mercúrio no nascimento sugere a forma pela qual o indivíduo aprende, como percebe e classifica ou
assimila o que aprende: qual o método pelo qual ele transmuta a experiência em compreensão.

Como mensageiro, Mercúrio é o símbolo da ponte entre o Self e o ego, assim como entre o ego e o ambiente; ele é o
grande unificador, assim como o grande destruidor. Através de sua perspicácia, o indivíduo tanto pode reconhecer a
interligação de todas as coisas, como apartar-se de todas as ligações por meio da proliferação de dados isolados e sem
sentido.

Vênus e Marte
Vênus e Marte, que eram amantes na mitologia grega e romana, são outra dupla masculino-feminino. São outra
forma de expressar o Sol e a Lua, isto é, o yin e o yang, ou macho e fêmea. Mas aqui o impulso basicamente feminino para o
relacionamento, a harmonia e o ajuste na esfera das relações pessoais. faz um delicado contraponto ao impulso
basicamente masculino para a conquista, o isolamento, a separação e a afirmação, em detrimento dos outros, para
satisfazer o desejo. Vênus simboliza a necessidade de buscar a partilha com o outro, mesmo ao ponto de se ser engolido,
Marte simboliza a paixão que busca se esgotar no outro, e atingir um alvo objetivo. Marte deseja; Vênus é o impulso para
ser desejado. Vênus nos permite reconhecer o que somos no relacionamento com os outros e, através de comparações,
tenta descobrir as semelhanças; Marte nos capacita a impor nossa vontade a despeito dos outros, e, através da auto-
afirmação, revela as diferenças.

Os antigos glífos astrológicos desses dois planetas são agora usados como símbolos biológicos de macho e fêmea.
Esses dois "deuses" são expressões da grande polaridade Sol-Lua de forma especializada: são os princípios cósmicos da
luz e escuridão, ativo e passivo, atuando especificamente no campo dos relacionamentos humanos. Editora Pensamento,
São Paulo. Se a Lua é a mãe, Vênus é o arquétipo da amante ou hetaira: essas são duas faces da mulher. Se o Sol é o pai,
Marte é o conquistador: essas são duas faces do homem. Cada um de nós tem essas quatro faces, mas optamos por nos
identificar com uma mais do que com as outras. Como diz D. H. Lawrence, as mulheres são esposas ou amantes, os
homens são maridos ou amantes. A expressão do impulso simbolizado por Vênus pode ser vista na forma como a pessoa
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se enfeita, seu gosto pessoal, sua resposta á beleza, e seus valores sociais; também pode ser vista no que o indivíduo mais
valoriza nos relacionamentos, o que ele procura na parceria ideal.

A expressão do impulso simbolizado por Marte pode ser vista na forma pela qual a pessoa consegue o que quer; a
qualidade ou modo de seu desejo é refletido por esse planeta, a maneira como ele conduz a caça, e a forma de expressão
que suas paixões assumem.

Como esses dois planetas são tão especialmente importantes no relacionamento interpessoal, vamos voltar a eles
mais tarde. A mesma lei geral, como no caso do Sol e da Lua, se aplica aqui: para os homens, Marte é uma energia mais
acessível, enquanto para as mulheres, Vênus é mais acessível. Consequentemente, assim como com o Sol e a Lua, o
planeta cuja energia é antitética ao sexo do indivíduo geralmente vai ser projetado num objeto adequado nos
relacionamentos interpessoais, e o indivíduo tentara viver seu lado transexual por meio do seu parceiro. Muitas vezes o
signo em que Vênus está colocado no mapa de um homem descreve o que ele busca na mulher como amante ideal; e o
signo em que Marte esta colocado no mapa de uma mulher descreve o que ela procura num homem. Uma mulher com
Marte em Capricórnio, por exemplo, pode achar as qualidades terrenas, a ambição, a força de vontade e a determinação
sexualmente atraentes num parceiro; um homem com Vênus em Peixes pode achar as qualidades de simpatia, compaixão,
gentileza, imaginação e capacidade de perdoar adoráveis numa mulher.

Júpiter e Saturno
Com esse par de planetas, deixamos para trás a esfera dos impulsos e desejos pessoais. O Sol, a Lua, Mercúrio,
Vênus e Marte são chamados planetas pessoais porque simbolizam impulsos que se manifestam de forma pessoal; são
orientados para o ego, em termos das energias psíquicas que simbolizam, e a consciência tem um acesso relativamente
fácil a eles, levando em conta as dificuldades na integração dos opostos. O reino de Júpiter e Saturno, ambos reis dos
deuses na mitologia antiga, leva o indivíduo para além da esfera da sua consciência de ego pessoal, e ele começa a
estabelecer contato com o que é transpessoal – tanto dentro como fora dele. Júpiter e Saturno são os grandes
exploradores, os guardiães do portão do mundo pessoal; ambos tem duas faces, uma voltada para dentro e outra para fora,
e ambos simbolizam impulsos para transcender os limitados, confins do pequeno self. Um vai para cima e outro vai para
baixo; são, respectivamente, como a cenoura que leva o burro adiante prometendo-lhe futuras possibilidades de
recompensa, e o chicote que o leva a mover-se porque é muito doloroso ficar parado. Obviamente, nossa tendência é
preferir a cenoura ao chicote, e somos inclinados a valorizar mais a sorte do que a dor; mas esses dois planetas simbolizam,
de maneiras opostas, impulsos em direção à consciência e ao crescimento. Poderíamos dizer que Júpiter é um impulso
masculino e Saturno, um impulso feminino; isto porque Júpiter, um deus dos céus e das tempestades, esta ligado às regiões
"superiores" da mente intuitiva, enquanto Saturno, um titã e deus da Terra, esta ligado as regiões "inferiores" do
inconsciente pessoal, ao lado escuro da natureza humana. Ambos são necessários e criam mais uma variação do tema de
luz e sombra, desta vez transferido para a esfera da realização do significado.

Como o símbolo de Saturno vai ser descrito mais completamente a seguir, não vamos dizer muita coisa sobre ele
agora. Júpiter, entretanto, merece uma descrição mais detalhada. Esse planeta esta ligado ao que pode ser chamado
impulso religioso, impulso que Freud e seus seguidores acre ditavam ser apenas uma sublimação do instinto sexual, mas
que Jung demonstrou ser tão básico, no ser humano, como qualquer um dos impulsos biológicos. O indivíduo não precisa
apenas sobreviver e propagar sua espécie; também precisa saber que de alguma forma, em algum lugar, a vida te um
padrão, uma ordem e um significado intrínsecos; é um todo do qual ele precisa ter ao menos um vago conhecimento
intuitivo, para ser capaz de ter esperança e crescer. Pode ser que tenhamos criado Deus; mas não podemos criar aquilo de
que não temos experiência, mesmo inconsciente, e podemos dizer que Júpiter simboliza a necessidade de experimentar o
numinoso, o divino projetando-o e nosso exterior em formas simbólicas que então podemos adorar e chamar de divindade.
O signo em que Júpiter está colocado no mapa de nascimento do indivíduo sugere a forma como ele procura essa
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experiência de sentido na vida. Um indivíduo com Júpiter em Virgem poderia, por exemplo, procurar vivenciar a razão do
objetivo do seu trabalho, porque este poderá proporcionar uma espécie de ritual, uma autopurificação e um auto-refinamento
rítmicos, capacitando-o a se tornar consciente de um padrão mais amplo. Como Júpiter procura expandir a experiência de
modo que seu significado brilhe através da forma, Júpiter em Virgem vai procurar meios mais amplos de
autodesenvolvimento através do trabalho, de modo a fazer dele alguma coisa "grande" e sentir que seu significado
ultrapassa a satisfação da necessidade. Esse planeta simboliza o principio criador de mitos, no sentido mais positivo da
palavra mito.

Júpiter, assim esta ligado a necessidade da psique de criar símbolos e isso nos leva a níveis profundos quando
consideramos o poder criativo que moldou os grandes mitos, as lendas e as religiões do mundo. O poder criativo que molda
o simbolismo de nossos sonhos não é menor, de modo que cada sonho é uma obra-prima de significado, que não pode ser
alterado para melhorar, de forma nenhuma. Nesse sentido, Júpiter é realmente um deus do caminho de entrada, pois
constituí um eIo entre o consciente e o inconsciente, através a criação e da compreensão intuitiva dos símbolos.

Como já vimos, os sim os símbolos são a linguagem primordial da vida, e Júpiter simboliza a função que os cria no
indivíduo e intui seu significado.

Os Planetas Exteriores
Uma vez ultrapassadas as fronteiras de Saturno, estamos no reino do inconsciente coletivo o repositório das
imagens arquetípicas – e de impulsos que não apenas nada tem a ver com as tendências da personalidade, mas também
muitas vezes são contrários a elas. Quase poderíamos considerar os planetas interiores, pessoais, e os planetas exteriores,
transpessoais, como mais um par de opostos, simbolizando, respectivamente, a vida do ego e a vida da matriz maior da qual
surge o ego, com sua ilusão de separatividade.

Os impulsos que os três planetas exteriores conhecidos simbolizam raramente são acessíveis a consciência do
indivíduo, pois marcam a transição de uma para outra fase da consciência, e a consciência não pode apreender tais
transições. Ela só pode apreender a fase na qual esta operando em dado momento. Saturno é o grande Senhor da Fronteira
e Mestre da Ilusão, fazendo o papel de Lúcifer e nos sussurrando que o mundo pessoal que experimentamos é o perímetro
da realidade, e ultrapassá-lo é, no melhor dos casos, bobagem e, no pior, loucura. Muitas vezes acreditamos nesse sussurro
e nos identificamos com o que chamamos realidade “objetiva", deixando de ver que ela é completamente subjetiva e que só
estamos criando nossa própria interpretação da vida. E, como Lúcifer, que – como Goethe ressalta – é secretamente a mão
direita de Deus, Saturno nos impulsiona a nos identificarmos mais e mais com nossas interpretações, de modo que no fim
nos isolamos tão completamente que ficamos de fato no Inferno – um inferno de dissociação das correntes subjacentes
mais profundas da vida. Nesse sentido, Saturno é o grande mestre, disfarça o como o portador da dor e da limitação, pois é
apenas no ponto de escuridão e decadência – que os alquimistas chamavam nigredo ou Caput Mortuum, Cabeça Morta, o
primeiro estagio do trabalho alquímico – que nos tornamos cientes do Outro dentro de nós, o verdadeiro poder criativo do
self . Isso pode parecer mais e mais uma visão mística; entretanto, é um processo psicológico empiricamente observável na
vida de qualquer indivíduo, embora as formas em que as pessoas o concretizam sejam muito diferentes.

Urano e Netuno formam outra dupla macho-fêmea, sendo Urano o pólo masculino e Netuno, o feminino. Podemos
aprender muito sobre esses dois planetas, ou "deuses", quando vemos suas personificações na mitologia. Urano é o antigo
deus dos céus, marido de sua mãe Géia, a Terra, e neto de Chaos, a noite primordial da qual emergiu a realidade manifesta
– ou consciência. Urano é um símbolo do mundo das idéias arquetípicas, os padrões subjacentes daquilo que algumas
correntes teológicas chamam Mente de Deus e que na doutrina platônica é o arcabouço das idéias divinas que sustenta a
estrutura do universo. Não é de surpreender que tenhamos dificuldade em chegar a um acordo sobre o significado desse
planeta na psique individual.

No mapa individual, Urano, o primeiro deus dos céus e do espirito, parece personificar a necessidade da mente de se
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libertar da identificação com a realidade material e vivenciar o mundo da mente arquetípica. Assim, a astrologia tradicional
diz que Urano simboliza o impulso para a mudança, para a liberdade para a invenção e para a liberação, e para o
desenvolvimento da mente além do reino do pensamento concreto limitado pelos fatos e pelo conhecimento empírico. Urano
tem sido chamado o Desperta dor, porque o impulso que simboliza, como todos os conteúdos inconscientes, é projetado.
Parece voltar ao indivíduo como um súbito evento emanando "de fora" e que despedaça a estrutura do que era até então
identificado como sua realidade, muitas vezes de forma altamente dolorosa. Ao mesmo tempo, permite ao indivíduo
vislumbrar a idéia coletiva subjacente sobre a qual se construiu sua pequena experiência pessoal. O fato de o próprio
indivíduo atrair esse tipo de experiência geralmente escapa a sua percepção; parece mais como a mão do "fado". Mas é
preciso admitir que a própria psique é o fado, se se quiser entender o significado do que ocorreu e utilizar a experiência como
ela deve ser utilizada: como um despertar para uma consciência maior.

É menos "coincidência" que sincronismo que Urano, símbolo ligado à liberação, à liberdade e à invenção, tenha sido
"descoberto" em 1781. Esse ano cai entre duas grandes revoluções políticas – ambas envolvendo idéias de liberdade, igualdade e
libertação do indivíduo em relação as limitações dos privilégios ou penalidades hereditirias – e :io alvorecer do que denominamos Era
Industrial, que, através do poder da mente para descobrir, dominar e aplicar tecnologicamente as leis do universo fisico, procurou libertar
o homem da escravidão da matdria. Pode parecer incon cebivel que a descoberta de um planeta tenha qualquer ligação com a Era da
Tecnologia e com as Revoluções Americana e Francesa; mas precisamos nos lembrar que a descoberta do planeta não "causou" esses
aconteci mentos. Simplesmente refletiu a sua ocorrencia. As mesmas alterações na consciência que produziram as duas revoluções e o
impulso em direção a descoberta cientifica e sua aplicação também produziram os meios téc aicos pelos quais o planeta fisico tornou-se
perceptivel a visão consciente do homem; e o significado simbolico do planeta, por seu lado, se refere ao espirito de aventura,
exploração e liberação que tornou todos esses acontecimentos fisicos possiveis. O planeta e o estado do mundo na época de sua
descoberta refletem-se mutuamente: são sincronicos.

A libertação da identificação com uma experiência especifica, ou um aspecto de


uma experiência, pode se aplicar a qualquer coisa. Podemos observar Urano no
impulso para mudar a compreensão de nós mesmos, o nosso trabalho, as nossas
crenças, ou os nossos relacionamentos. Os relacionamentos são experiências que
cada indivíduo interpreta a sua maneira – e existe, na psique de cada indivíduo, um
impulso para mudar constantemente as interpretações, de modo que possam tornar-
se mais inclusivas e mais conscientes.

Na mitologia grega e romana, Urano – ou Ouranos – é o pai de Saturno


(Cronos), e Saturno, um deus da Terra, incentivado por sua mãe terrestre, castrou o
pai e tomou seu trono. Diz-se que esses acontecimentos se deram porque Urano
ficou horrorizado com sua progênie; ele era um deus das regiões superiores, e
assustou-se com as criaturas escuras e restritas a Terra, que havia gerado. Pode-se
intuir muitas coisas desse trecho do mito. O ato de violência de Saturno contra o pai
pôs fim ao reinado do céu e iniciou o reinado dos titãs terrestres; e podemos ver o
mesmo padrão encenado na civilização humana através dos nossos milhares de
anos de historia.

Mas se prosseguirmos, veremos que dos pingos de sangue da terrível ferida


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derramados sobre a Terra surgiram as Erineas, as Fúrias ou deusas da justiça e da


retribuição (carma); e dos genitais cortados, arremessados no oceano, surgiu
Afrodite-Vênus, deusa do amor e da beleza e, astrologicamente, símbolo do impulso
para o relacionamento. Diríamos que através do relacionamento podemos encontrar
um caminho através do qual reviveremos – ou tomaremos consciente – o mundo dos
céus. Não se compreende a linguagem da mitologia somente com o intelecto; ela
deve ser ouvida com a intuição e com o coração, e só então vai revelar seus
segredos. Quando se considera essa trindade de planetas: Urano, Saturno e Vênus,
no mapa de nascimento, à luz do mito, há algo implícito sobre um processo, um ciclo,
que existe em cada pisque. Também podemos examinar a bem conhecida historia da
Bela e da Fera na qual a Fera rouba a Bela de seu pai e a mantém prisioneira até
que ela aprende a amá-la pelo que ela é; isto também nos fala do mesmo processo.
Algo dentro de nós repudia alguma outra coisa, e a parte repudiada procura a
vingança. É questão de uma confrontação dolorosa, muitas vezes violenta, dentro de
nós: com nossas origens e nosso patrimônio hereditário, com o que somos e o que
geramos ou criamos. Mas, desse choque discordante, surge a possibilidade de uma
nova harmonia e uma nova integração.

Ao contrario do deus das regiões celestiais, Netuno é uma divindade da água, e,


embora seja uma figura masculina na mitologia, personifica uma energia feminina.
Deus dos oceanos e das profundezas – e, como Poseidon-Hipios, senhor dos
terremotos e dos cursos de água subterrâneos –, Netuno é um símbolo do mar do
sentimento coletivo debaixo de nós, impulsionando-nos a mergulhar na massa,
sacrificando a nossa precária e duramente conquistada individualidade, de modo que
possamos nos purificar através da dissolução. Pode-se vislumbrar essa energia
funcionando em qualquer multidão, motivada por um único foco emocional: não há
mais indivíduos na multidão, apenas um único organismo em ebulição , motivado por
uma emoção dominante que precisa se liberar – em geral violentamente – antes que
a individualidade possa ser reivindicada. Aparente mente, o impulso para esse tipo de
desintegração da consciência individual existe em todos nós, e é altamente
contagioso – basta ir a um jogo de futebol para ver uma de suas manifestações
relativamente inofensivas, ou considerar a Alemanha de quarenta anos atrás para
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localizar uma manifestação bastante mais sinistra.

Netuno também está associado a If!i si deus do extase, e o extase sagrado da


imersão nas profundezas antigarnente fazia parte da maioria dos antigos rituais de
mistérios. De certa forma, o indivíduo que houvesse / experimentado essa
"benção do deus" era purificado, nascia de novo, era limpo do seu passado; podia
oferecer ao deus tudo o que tinha acumulado de si mesmo, e era devolvido nu a
Terra, pronto para iniciar uma nova

etapa de sua jornada. Embora uma face de Netuno seja inquestionavel mente
destrutiva em relação ao que chamamos civilização, uma outra face é profundamente
necessaria para a psique, pois a experiência da limpeza através da imersão no mar
do inconsciente é verdadeiramente uma expe riência religiosa"no. tido mais profundo
deste termo – cujas raizes latinas significam Qe-ligar."-. iVuma escala muito menor,
executamos esse ritual todas as noites, guando sacrificamos a nossa consciência e
descemos ao inconsciente para "dormir".

Também podemos verVetuno em funcionam.ento em todos os sim bolos da vida


de sentimentos coletivos que chamamos odag Seja uma moda de musica, de
vestimentas, de idéias ou de arte, o im pu só irresistivel . para fazer o todo mundo
está fazendo esta presente em odos nos – por muito que alguns lutem contra ele, as
vezes bem justifica amente, ja que ele diminui a supremacia do ego individual.
Nessas modas assa eiras ue em culturas – uit vezes as cren as as tem também
caracteristicas odemos ver simbolos das correntes da vida emocion ta
eternamente se desviando e mudando as omo as correntes do oceano. De muitas
formas, ser varrido durante algum tempo por essas correntes é uma experiência
revigorante, pois através dcla se descobre o tespeito pelo poder do inconsciente e se
adquire uma perspec tiva mais equilibrada do papel do ego.

No mapa individual de nascimento, Netuno simboliza o im uIso para o sacrificio


do "eu" pessoal e dõ sentunen o pessoal ao sentimento coletivo. Existem idéias
arquetípicas e sentimentos arquetipicos – e Netuno personifica esses ultimos, que
todos nos vivenciamos em algum momento. Fantasia, mm, e e visão mistica – tudo
isso é Netuno; c embora uma dieta ininterrupta de algum esses fatores acabe sendo
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destrutiva, esses aspectos da realidade são necessarios para a psique e precisam de


espaco para expressar-se na vida pessoal.

Netuno, como Urano, geralmente é inconsciente na maioria dos indivíduos.


Como poderia o ego ter consciência daquilo que mina sua supremacia, e mais, seus
alicerces? Seria uma admissão de que existem outras forças na psique além da
vontade pessoal, uma admissão muito desagraKvel para o ego. Assim, Netuno, como
Urano, em geral é projetado e vivenciado como um acontecimento que o indivíduo
inconscientemente atraiu para sua vida e que novamente assume a aparência de
"fado". Os "acontecimentos" netunianos são, em eral, aqueles ue enredam o indi- vid
o numa situa ao cu lica o c a lgla. ele não consegue enxer ar. Em conseqiiencia, a
certa altura ele se ve impotente para fazer qualquer coisa além de sacrificar um dese
muito acalentado. Ele é d.Q

submetido a um nivel de sentimento coletivo que o muda, o transforma, o


escraviza durante algum tempo, e depois o libera gentilmente, deixando -o o mesmo,
porém diferente, pois foi tocado pelo poder do deus e não pode, nunca mais, dizer
honestamente a si mesmo que tem seus senti mentos totalmente sob controle.

Netuno foi descoberto em 1846, com uma ambigiiidade bem carac teristica da
qualidade do simbolo: houve dois descabridores, e existe uma grande confusão a
respeito de quem é responsivel pelo que. Coincidiu com a descoberta o surgimento
de um generalizado interesse pelo espiri tualismo e pelos fenámenos psiquicos, a
hipnose, a sugestão e a associação livre, e o verdadeiro começo da investigação,
que foi gradualmente sendo aperfeiçoada, testada, verificada e re-verificada, até
eventualmente aparecer como psicanalise, o estudo da psique inconsciente.
Também coincidiu com uma onda de revoluções traumiticas que varreu a Europa
toda, irremedia velmente minando a ordem estabelecida, porém menos coerente e
menos estruturada que a do século anterior. Com a descoberta de Netuno, a própria
revolução – muitas vezes uma revolução pela revolução – se tornou uma "moda".

É aprópriado dar ao mais distante planeta até agora conhecido do sistema solar
o nome do pcuIar Sénhoi do Reino Subteãaneo,,como tam bém é compreensivel o
fato de que os astronomos não estejam nem mesmo certos se Plutão é de fato um
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planeta ou uma lua perdida de algum outro corpo celeste. Existe também muita
incerteza a respeito de Plutão, porque sua densidade é completamente
desproporcional ao seu pequeno tamanho, o que poderia sugerir que ele seja, na
realidade, muito maior do que o que foi possivel averiguar até hoje com os nossos
telescopios. Plutão tem essa caracteristica na mitologia, residindo debaixo da terra,
gover nando os mortos e a abundância da Terra, nunca se aventurando acima da
superficie a não ser com seu capacete magico, que o torna invisivel aos olhos
humanos.

Nos mitos de todas as nações, assim como em muitos contos de fadas, existe
um Senhor dos Mortos, e esse simbolo parece estar ligado I experiência arquetípica
dos começos e fins, da morte e renascimento.

Joseph Campbell, no seu livro Creative Mithology, afirma: ... Esta area da
existencia, que é tanto doadora como tomadora das formas que aparecem e
desaparecem no espaço e no tempo, embora sombria, não pode ser denominada
ma, a não ser que assim denominemos todo o mundo. A lição de Hades-Plutão...

não é que nossa parte mortal seja ignobil, mas que dentro dela – cn

ou unificada com ela – esta aquela Pessoa imortal quc os cristãos dividiram em
Deus e Demonio e julgam estar "lá fora" .

O "doador e tomador das formas que aparecem e desaparecem no espaço e no


tempo" é o arquétipo do incessante ciclo de morte e renasci mento personificado pelo
pianeta Plutão, e o processo da interminavel jornada e retomo esta presente em
todos os aspectos da vida. A vida ine rente a todas as formas é sempre vida; mas a
vida, por estar incessante mente mudando, inevitavelmente ultrapassa todas as
formas, que por seu tumo precisam morrer de modo que a vida possa ser liberada
num novo nascimento, numa nova forma. A natureza também pode nós falar sobre
esse processo arquetipico de milhares de formas. e se alguém exa minar a sua
própria vida verá que toda experiencia, toda atitude, todo rela cionamento, todo
sentimento, toda idéia – tudo, na realidade – tem um começo, um meio e um fim, e
um novo começo de alguma outra forma.

Instintivamente, fugimos desse ciclo porque, como Fausto, queremos que


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alguns momentos durem para sempre. A mudança é aceitavei quando é agradável,


mas quando chega aquela fase inevitivel do ciclo de mudança que requer a
passagem pela escuridao, nos recuamos: não confiamos no Senhor dos Mortos. Sob
muitos aspectos, a era cristK nos privou da com preensfo dele. porque o cristianismo,
recuando diante da perspectiva da perpétua renovacao, fixou nossa atenção em
apenas uma e delimitada vida apos a morte, com punição ou recompensa; e
substituiu o processo vital e dinamico por uma estase decididamente paralisadora. O
ego, carac teristicamente, deseja acreditar que a vida é constante. Feliz ou infelizmen
te, entretanto, a unica coisa constante que existe é a mudança. Plutão, con
seqiientemente, simboliza um impulso da psique que geralmente é incons ciente e,
como Urano e Netuno, o planeta parece operar por meio de expe riências que
"acontecem" ao indivíduo e que, de alguma forma, o forçam a sofrer uma morte
interior. Sempre Há um renascimento depois da morte, e a nova forma é sempre
maior que a velha; mas, quando posta a prova, a maioria dos indivíduos não acredita
nisso e sente que sofreu uma perda irremediável. Geralmente essa perda é de
alguma coisa (ou pessoa) com a qual existe um intenso vinculo emocional, e através
da qual, de alguma forma, o indivíduo esteve vivendo uma parte de sua vida – uma
parte que precisou ser resgatada para que ele pudesse vive-la por si mesmo. De algu
má maneira o vinculo é perdido, o relacionamenta é mudado, e existe a 6 Creative
Mythology, Joseph Campbell, Londres, Souvenir Press, 1974.

experiência de uma morte. E se a pessoa procurar, vai descobrir entre as


cinzas uma nova perspectiva e um novo nascimento.

Plutão é particularmente significativo na esfera dos relacionamentos, pois é


nessa esfera que muitas pessoas passam por mortes e renascimentos emocionais.
Plutão esta também ligado i sexualidade, na medida em que o ato sexual significa –
ou simboliza, em potencial – a morte do senso da separatividade individual pela
experiência do "outro" e pela nova força vital criativa que flui através de ambos. A
criação de uma nova vida sempre envolve algum tipo de morte, uma mudança na
atitude psicologica; a pro criação de filhos inevitavelmente vai produzir esse tipo de
mudança na psique, pois a pessoa passa de filho a pai que deu nascimento a um
filho, e começa uma nova fase da vida. A morte também, da forma mais literal, é
27

dominio de Plutão, pois ela, enquanto fim de um ciclo, marca o começo de um novo
ciclo. Embora o Ocidente como um todo custe a levar em consideração o principio da
reencamação, muitas grandes mentes iadivi duais – e o pensamento oriental em geral
– tem-no considerado aceitivel Há muitos séculos, ou como experiência literal ou
como um simbolo da vida etema do ser, da "esseidade", brilhando através da
transitoriedade dos ciclos individuais de vida e morte.

Plutão também é um simbolo do impulso para a autotransformação.

Em outras palavras, existe na psique um impulso em direção ao cresci mento,


que requer uma constante mudança das formas através das quais é realizado o
crescimento. O indivíduo precisa crescer, querendo ou não, e o ciclo de crescimento
exige um periodo de morte, decadencia, nova germinação, gestação e novo
nascimento. Toda a natureza sustenta esse principio. Q fato de o ser humano rejeitá-
lo e tentar nega-lo é caracteristico da falta de contato com as raizes da vida, tão tipica
da época em que vivemos.

Como o Parsifal de Wolfram von Eschenbach, a alquimia descreve o processo


r.o qual a astrologia denomina Plutão um belo mito. Existe um rei, diz o simbolismo
alquimico, que está velho, estéril, e ja não pode reinar eficazmente porque perdeu o
poder de criar vida nova. Suas terras não dão frutos, e seu povo esta morrendo de
fome e sede. É preciso que ele realize um casamento sagrado – com sua mae, ou
com sua filHá ou sua irma, e o tema do incesto sugere que se trata do casamento de
duas ener gias ou principios que emanam da mesma fontc. É preciso que ele desça
até as profundezas do mar, ou da terra, para consumar a união. No mo mento do
extase da consumação, ele morre e é feito em pedaços e devo rado pela mulher
misteriosa com quem se uniu. A rainha fica gravida e, depois do periodo de gestação,
da origem á vida nova – que é o rei, mas

( o rei renascido, com a juventude e a virilidade restauradas, com nova vida


fluindo através de si e de tudo que ele govema .

Somente o que pode destruir a si mesmo esta realmente vivo .

Os planetas, como vimos, são simbolos dos poderes do inconsciente;


simbolizam experiências ou energias arquetípicas, que existem em toda a vida e
28

também no homem, que é parte da vida. Uma vez que aprendemos o vocabulirio dos
planetas e seu significado no mapa individual de nasci mento, podemos examinar o
mapa e conseguir algumas indicações de como cada uma dessas energias vai se
expressar individualmente. O signo em que um planeta esta colocado é como um
adjetivo em relacão a um substan tivo, o omamento sobre o corpo: manifesta o modo
ou qualidade da expressão do planeta. Podemos agora começar a aprender alguma
coisa dos práprios signos zodiacais e de sua divisão entre as polaridades masculina
e feminina, c ampliada pela quadruplicidade dos elementos. Essa estrutura basica de
quatro também é, como veremos, arquetípica, e precisamos retomar nossa
investigação da psique pelos olhos do psicóllogo para adquirir uma maior
compreensão dos reinos do ar"da agua, da terra e do fogo.

7 Psychology and Alchemy, C. G. Jung. Londres, Routledge & Kegan Paul,


1953.

8 Ibid. C2

3 Ar, Agua, Terra, Fogo – Os Tipos Psicológicos A pessoa ve aquilo que


consegue ver melhor.

– C. G. Jung

Muito antes de a psicologia desenvolver seu divertido passatempo interminável


de dividir os seres humanos em tipos, a filosofia do Renas cimento postulou quatro
temperamentos básicos fundamentados na teoria dos "humores" do sangue. Eram o
melancolico (terra), o fleumático (água), o sanguineo (ar) e o colérico (fogo). George
Herbert, num dia de bom humor, escreveu em 1640: O Colérico bebe, o Melancolico
come, o Fleumatico dorme. O que o Sanguineo faz fica por conta da imaginação, mas
como ele é "etéreo" ou de ar, supoe-se que provavelmente filosofe.

Hoje em dia, uma pessoa ficaria horrorizada se o seu psicoterapeuta lhe


anunciasse num tom solene: "Estou virtualmente seguro de que seu problema reside
no fato de voce ter um temperamento colérico", e sem duvida haveria a imediata
exigência da devolução do pagamento. Mas ainda encontramos esses termos em
uso na linguagem coloquial, ainda CC

1 que como adjetivos insultuosos, mantendo ainda a conotação original. A


29

despeito da atual voga de "cada um ficar na sua", a idéia dos tipos ainda persiste.

Como Jung demonstrou, o fato aparentemente extraordinário de as pessoas


tenderem realmente a cair em certos grupos, conforme o temperamento, é uma
antiga preocupação da medicina, da filosofia e das artes. Antes disso, fai uma
preocupação da astrologia, que proporcionou, talvez, a primeira descriq o da
tipologia. Por isso, não é surpreendente – exceto para algumas escolas de psicologia
que insistem em que somos totalmente produtos da hereditariedade e do meio
ambiente – que os 1 quatro tipos funcionais de Jung se ajustem perfeitamente a
antiga divisão astrologica dos quatro elementos. Não se trata de uma visão ser
explicada pela outra, ou derivar da outra; em vez disso, cada uma é uma forma dife
rente de descrever a observação empirica do mesmo fenomeno.

Esse fenomeno é o simples fato de, embora unicas, todas as pessoas também
se agruparem em catcgorias gerais baseadas numa forma funda mental de ver,
avaliar, apreender e interpretar a vida. Além de ser um meio divertido de rotular
amigos e parentes, entendcr um pouco dessa tipologia basica é uma excelente
maneira de aprendcr a mais dificil das lições: nem todas as pessoas são iguais a
mim.

Todas as pessoas acham que a psicologia é o que conhecem melhor – a


psicologia é sempre a sua psicologia, o que somente elas sabem e, ao mesmo
tempo, a sua psicologia é a psicologia de todos os outros. Instintivamente, elas
supoem que a sua própria constituição psiquica seja generalizada, e que todas as
pessoas são essencialmente semelhantes as outras, isto é, a elas práprias...

como se a sua própria psique fosse uma espécie de psique-matriz que servisse
para todas as situações, e as autorizassem a supor que a sua própria situação fosse
a regra geral. As pessoas Gcam pro fundamente espantadas, ou mesmo
horrorizadas, quando essa regra, muito obviamente, não se aplica – quando
descobrem que outra pessoa é, na verdade, muito diferente delas. De forma geral,
não consideram essas diferenças psiquicas, de modo nenhum curiosas e muito
menos atraentes, mas, sim, falhas desagradáveis dificeis de tolerar, ou defeitos
insuportáveis que devem ser condenados . 1 Psychological Types, C. G. Jung.
30

Londres, Routledge & Kegan Paul, 1971.

2 Ibid. S6

.gpf JgX(.Qv(%" Torna-se de imediato evidente o que essa tipica atitude


humana pode fazer para uniformizar o mais promissor dos relacionamentos. Em
relacio namentos mais desiguai, cc o o de pa a filho, seus efeitos podem ser
positivamente tra os Um casal, ou um par de amigos, pode ser c de ngar por causa
disso e chegar a uma maior aceitação dos pontos de vist um do outro, mas uma
criança não é capaz de se defender. Ela está a merce das expectativas e suposições
que os pais projetam nela, e po agar por isso pelo resto O pro ema existente em
qualquer estu o de tipologia é que ela parece ser um sistema, mesmo que seja um
sistema natural; e embora pos samos aceitar as classificações por espécies nos
reinos animal e vegetal, temos um horror instintivo a sermos lembrados de nossa
própria falta de individualidade. É uma verdade que não é bem-vinda. Poucos de nós
podemos realmente alegat que somos seres humanos plenamente conscien tes,
expressando todo o nosso potencial; a maior parte do tempo, prefe rimos fingir que
somos, enquanto escorregamos com absoluta facilidade para um ou outro tipico
padrão de conduta. Parece que imaginamos que a individualidade, como realização ,
não é apenas um potencial nosso, mas um direito automatico que não reçoer
qualquer esforco; e faremos virtual mente qualquer coisa para evitar encarar a
realidade de que é preciso trabalhar nesse sentido. Conseqiientemente, qualquer
coisa que implique que podemos ser agrupados, como a tipologia de Jung ou
qu4quer outro exemplo da observação psicologica empirica, é pejorativamento consi
derada uma rigida estrutura que não dá espaço para as diferenças indivi duais.
Absolutamente não se trata disso. O próprio fato de partilharmos uma base comum
com outro segmento da humanidade, de acordo com certas semelhanças na
constituiyão psicoloyca, nos proporciona um am bito muito maior de expressio criativa
do nosso potencial unico enquanto indivíduos. Alérn do mais, nenhum mapa
representa o país. A tipologia de Sung, como qualquer outra, é apenas uma
ináicação que nos permite vislumbrar os padrões basicos de percepção, avaliação e
resposta que tiramos da mesma fonto coletiva.

Como a astrologin é um sistema simbolico, ela tenta expressar, através de sua


31

imagética e de sua estrutura, os padrões de energia que estão na base da vida e da


psique humana, como um aspecto da vida. A rimeira afirmação que a astrolo afaz
sohre a vida é ao mesmo tem o infantil mente simples e indescritivelmente profunda:
tudo deriv elaciona mento de dois opostos polares, que podem ser denominados
macho e femea, ativo e passivo, ym e yang.

O zodiaco, que simboliza, pela sua divisão dos.doze signos, todo ( - o espectro
do potencial da experiência humana, é assim dividido em dois grupos de seis si os:
seis sjiinos mãsculinos ou positivos, retratando dife rentes aspectos do arquétipo do
macho, e seis signos femininos ou nega: tivos, rMeratando eren es asjéctõs do
arquétipo da femea. MascuTino e feminino, em astrologia, não se referem, é claro, a
definição atual dos ter mos em nossa sociedade, e sim a qualidades da energia,
conforme exemplifi cam os hexagramas iniciais do Criativo e do ece tivo no I Ching.
Os sigtlos ositivos estão associados as ualidades d exirgversão manifestação, luz,
mente, atmdade, orientaggg déias o mundo objetivo e o futuro.

s signosqlegativos estão asso dos á introversão, recolhimento, escu s4ao,


sentimento, sensualidade, estabiTi ade, onentãjão para o mundo subjetivo é o
passadõ. Isso, na verdade, não nos diz muita coisa, pois esta grande polarização
simbolica da vida e de nós mesmos em masculino e feminino só faz uma alusão ao
que cada pessoa deve vivenciar diretamente dentro de si – os opostos dentro de sua
própria natureza, perpetuamente em luta porém, num sentido oculto, identicos.

A astrologia faz outra afirmação, de que ja falamos: toda pessoa c ntem em si


esma a semente dã aãé, s bolizada peIa roda zodiac . as embora ésta seja sua
herança e seu potencial, ela previvel mente só vai manifestar uma parte dela, e se
especializar coaforme sua gslção intrinsecaQ Sabemos que o indivíduo nunca pode
ser outra coisa simultanea mente, nunca pode ser completo – ele sempre desenvolve
certas qualidades em detrimento de outras, e a totaHdade nunca é :, gà atingiaa .

Já vimos que a-dispo mão inerent conforme encarada tanto pela trologia como
pela psicologia analitica, existe desde o começo da vida.

Essa disposição é espelhada naquelas frações da totalidade do zodiaco que, !


no mapa natal, estão diferenciadas, acentuadas e tomadas acossiveis á consciência
32

ou pela colocação de algum planeta num determinado signo, ( ou pelo


posicionamento de um determinado signo cm um dos quatro j angulos do mapa . A
interação dos dez planetas e dos quatro angulos da o esquema geral das areas de
experiência e dos aspectos da consciP.ncia Qque provavelmente serão
desenvolvidos pelo individuo. Se podemos ou não 5 3 Modern Man in Search o f
a Soul.

4 Para a descrição dos angu!os, veja o capitulo VIII.

CQ

ir além disso é uma questão em aberto, ja que a maioria das pessoas nunca
chega sequer perto da expressão do potencial psiquico simbolizado pelo mapa, muito
menos de ultrapassá-lo.

p essas rmggões a astro ogia acre snta mais llma 44acha fe a odem ser
subdivididos, de modo que Há dois os de si os mas culinos e ois grupos de si os
enuninos. Essa estrutura basica de quatro é a pedra angular da astrologia, re etid
aelos quatro elemento ;. ar, agua, terra e fogo. Sabemos que essa estrutura é ar
uetipica e inerente a todos os seres umanos, através do trabalho da psicologia
profunda nos ultimos cinquenta anos.

Todos no ossuimos as funções da consciência que Jung deno Illlll ensamento


sentimento, sensacão e intui (Um objeto) ... é percebido como algo que existe
(sensação) ; é reconhecido como isto e distinto daquilo (pensamonto) ; é avaliado
como agradivel ou desagradavel etc. (sentimento) ; e, finalmente, a intuição nos diz
de onde ele veio e para onde vai . Que nos não preenchemos a totalidade dessa
estrutura, também sabemos. Em vez disso, desenvolvemos primeiro uma função,
depois outra.

Talvez desenvolvamos parcialmente uma terceira, mas nunca realmente


chegamos a um acordo com a quarta, que permanece em grande medida
inconsciente. E muitas vezes procuramos, nos relacionamnitos, alguém que
personifique ou represente em nosso lugar aqueles aspectos da totalidade que nós
mesmos somos incapazes de expressar, ou não estamos dispostos a faze-lo.

A sua moda, aparentemente ingenua, os contos de fadas também nos falam


33

dessa quaternidade bisica das funções da consciencia. Em contos originarias de


todas as partes do mundo e de todas as épocas da h!storia, encontramos vezes e
vezes o mesmo motivo. Era uma vez um rei que tinha tres filhos. Qs dois mais velhos
eram sábios, bonitos e fortes, mas o terceiro era um idiota, de quem todos riam. Este
é um esplendido simbolo da forma de funcionamento da psique humana, pois a
função principal da consciência é o rei – que inevitavelmente, nesses contos, tem
algum tipo de problema, em geral envoIvando doença, esterilidade, ou proximidade
da morte, ou ataque de um inimigo cujas manobras eie não consegue superar. Os
dois filhos mais vo]hos tentam resolver o problema, e falham; 5 The BoundÁries of
the Soul, June Singer. Nova Iorque, Anchor Books, 1973.

e cabe ao idiota, o Louco Sagrado, o menos valorizado, o mais humilde, nossa


aspecto aparentemente mais inadequado, encontrar a solução e salvar o reino.

Agora, é muito divertido definir que sou do tipo pensativo e voce é do tipo
sentimental, e é por isso que eu sou inteligente, observador, articulado e razoavel,
enquanto voce é sempre tfo emocional, intransigente e irracior.al. Esse é um jogo
que todos nós jogamos quando iniciamos o estudo da tipologia, de um modo muito
semelhante ao que os leigos jogam o jogo do zodiaco. É claro que sou sempre
encantador, cortes e tolerante porque sou Libra, enquanto voce é obviamente
exigente, supercritico, autocentrado e de mente estreita porque é Virgem. Na
astrologia ou na psicologia, a tipologia pode ser usada como um maravilhoso "explica
-tudo" em relação aos defeitos dos outros, e na maioria das vezes é empre gada
dessa forma deturpada. Em primeiro lugar, tcmos medo de leva-la a sério; em
segundo, geralmente só captamos suas partes confortáveis, e ignoramos suas
implicações mais profuodas; e em terceiro, todo mundo, na verdade, esta
secretamente convencido de que as coisas que mais valo riza – de acordo com seu
tipo – são na verdade as melhores de todas, e tudo o mais é, de fato, um pouco
inferior.

Entretanto, existe uma penalidade autom4tica nesse jogo de classifi cação de


tipos. O problema de entender que funções da consciência foram enfatizadas com a
possivel exclusão das outras, e a eterna batalHá para conhecer o Outro que existe
em nos e chegar a um acordo com ele condu zem a aguas muito mais profundas do
34

que poderia sugerir uma interpre tação superficial dos tipos funcionais. E, de repente,
a, pcssoa percebe que não esta mais jogando um jogo, ou, se esta, as apostas são
muito mais altas do que imaginava. A psique luta pela inteireza. A verdade
subjacente da psicologia é uma afirmação terrivelmente simplista, porém
esmagadora mente importante, que deve ser vivenciada para ser plenamente compre
endida.

Inteireza não significa perfeição. A pessoa que passou muitos anos cultivando
uma snfisticação da expressão e percepção intelectuais, mas que não é capaz nem
de expressar nem de compreender sua natureza senti mental, não é inteira. Nem é
aquela que desenvolvou uma rica e plena vida sentimental e muitos relacionamentos
pessoais significativos, se não con seguir raciocinar ou vcr o ponto de vista "objetivo"
e josto que pode justi ficar principios e permitir as diferenças individuais. Nem é a
realista pra tica, com o mundo dos faios i sua disposição, que expressou o desabro
chamento pleno de suas capacidades organizacionais, mas não consegue enxergar
para cnde elas estaa camirAando, ou não consegve achar signifi

cado ou um sentido espiritual interior em sua vida. Nem é a visionária ou a


artista, que vive num mundo de infindáveis possibilidades, mas não conse que lidar
com a mecanica simples da vida terrena, nem concretizar seus inu meros sonhos.
Quantos de nós podemos alegar que operamos livre e satis fatoriamente com todas
as possibilidades da psique? Por que sontimos uma atração – ou repulsa – tão
compulsiva em relação as pessoas que parecem personificar estilos de vida, ou
valorizar a importância e o funcionamento daquilo que, de alguma forma, nos
escapa? Embora o zodiaco seja um simbolo da inteireza, essa inteireza não esta
contida em nenhum mapa, porque só há dez planetas para manejar, dos quais
apenas sete sio reahnente "pessoais", no sentido de que se referem a personalidade
ou a estrutura do ego do individuo; e existem doze signos e doze Casas ou setores
no mapa de nascimento nos quais os planetas podem estar localizados. Também
existem inumeras combinações possiveis das relações angdares entre os planetas.
Todo mapa contém uma superenfase e uma subenfase, assirn como toda psique
humana; é a natu reza do animal. A compreensão da tipologia, portanto, não equivale
35

a um sistema de classificação. 8 o mapa de uma estrada que pode lhe dizer onde
começar, onde provavelmente seri a sua primeira curva, onde é possivel que o seu
carro quebre e o que pade ser feito para conserta-lo e aonde, se tudo der certo, voce
podera chegar no tompo certo.

Inerente ao agradavel reconhecimento das funções da consciência que são


"superiores" – isto é, bern desenvolvidas, confiaveis, sob o con trole da vontade do
indivíduo – esta o reconhecimento muito menos agradavel de que existe um
problema com as funções opostas, que são "inferiores". Essas funções, muitas
vezes, são ingovernaveis, erraticas, imprevisiveis, excessivas, um pouco infantis ou
primitivas, e matizadas por uma peculiar qualidade de autonomia que, quando
afioram, fazem as pessoas dizer coisas tais como: "Desculpe, eu estava fora de
mim", ou "Alguma coisa tomou conta de mim." Essas desculp s tem o objetivo de
esconder o fato de que ficamos mais mortificados que os outros quando o
inconsciente se afirma por conta própria e nos leva a comportamentos que não
podemos explicar e não desejamos.

As funções opostas são assim chamadas porque não podem funcionar juntas. O
sentimento e o pensamento, por exemplo, são dois modos total mente diferentes de
avaliar ou reconhecer a experiencia; um deles, o sentimento, é totalmente mbjetivo
e realizado sem lágica, com base na resposta pessoal, enquanto o outro, o
pensamento, é totalmente "obje tivo" e dependente da logica, em detrimento da
resposta pessoal. Pos suimos as duas funções em potencial, mas vamos usar
principalmente 1

uma e não a outra; elas não podem ser usadas ao mesmo tempo. Os valores
inerentes a cada uma são totalmente diferentes e não se mesclam. É pos sivel
secundar uma com a outra, mas não usa-las simultaneamente. Muitas pessoas
baseiam seus valores completamente em uma fungo e fingem que a outza não
existe.

A intuição e a sensação, da mesma forma, são funções opostas, porque


representam dois modos totalmente diferentes de percepção. A intuição é muitas
vezes chamada percepção via inconsciente, e envolve a nãowonsideração da
36

realidade fisica de uma experiência ou objeto, de forma que o significado, as


ligações, o passado e as possibilidades futuras do objeto possam ser englobadas em
uma visão unificada. A sensação, por outro lado, é precisamente o que a palavra
sugere: significa perceber através dos sentidos, e os sentidos só vão registrar o que
é tangivel e possui forma. Portanto, a sensação olHá a superficie das coisas
detalhadamente, examinando meticulosamente o que é a coisa de acordo com sua
forma, enquanto a intoição olHá além, através, em volta e por tras da superficie, de
modo que o proposito e as implicações possam ser discernidos.

Quando o sentimento é o principal mado de avaliar a experieneia, a função


pensativa tem uma qualidade "inferior", o que geralmente é expressado como
dogmatismo. Quando o pensamento é o principal modo de avaliar a experiencia, a
função sentimental tem uma oualidade "inferior*, o que é geralmente expresso ou
como frieza ou sentimentalisino.

Quando a intuir,ão é o modo principal de percepção, a função da sensação tem


uma qualidade "inferior", muitas vezes expressa como falta de cui dado ou de senso
prático; e quando a sensação é o modo principal de percepção, a intuição tem uma
qualidade "inferior", muitas vezes demonstrada como credulidade ou fanatismo.

As funções "inferiores", aldm de serem um pouco primitivas, tem outra


caracteristica interessante: são habitualmente projetadas, e nos aparecem sob o
disfarce de outra pessoa ou situação que nos atormenta exatarnente com aquele
aspecto da vida que somos menos capazes de mancjar. Então, é claro, a
inferioridade (ou o que algumas vezes parece uma sólida superioridade) parece
pertencer a outra pessoa, o que é sempre mais agradavel do que se estivesse em
nos. O inconsciente dc uma pessoa é projetado sobre outra, de modo que a primeira
acusa a segunda do que não ve em si própria.

Esse principio tem uma validade tio alarmantemente genera lizada, que todo
mundo faria melhor, antes de denunciar os 67 J

outros, se sentasse e ponderasse cuidadosamente se a pedra não deveria ser


atirada em sua prápria cabeça .

Qualquer que seja a função da consciência com a qual nos identifi camos,
37

precisamos aceitar a existência do seu oposto em nos. Quase sempre isto é muito
dificil, porque – diferentemente dos "defeitos" dos quais estamos confortavelmente
conscios, não os sentindo de fato como defeitos – a inépcia das funções inferiores 8
uma genuina fonte de dor e inadequação, mesmo quando é parcialmente consciente.
Em consequen cia, encontramos muitas pessoas que criam um conjunto artificial de
res

t postas a que dão o nome de sentimento, pensamento, sensação ou intui po,


mas que são desajeitados simulacros que não enganam ninguém, a não ser o
próprio individuo, e que tem uma flagrante marca de insinceridade.

A admissão da própria identificação com um determinado aspecto da


consciência não significa que a pessoa esteja condenada a expressar apenas aquele
aspecto a vida inteira. As pessoas não são estiticas, e a pique sempre trabalHá para
obter o eçolhbrio. A pessoa cresce em direção ao seu oposto. Isto constitui, ao
mesmo tempo, uma das maiores batalhas,I uma das maiores alegrias e um dos
aspectos mais significativos da expe dincia de vida.l O Elemento Ar: o Tipo Eensativo
O intelecto é Deus em cada um de nos.

– Menander O elemento ar é outra forma de expressar, numa linguagem maisI


tipicamente produto de uma era em que o ser humano estava mais pro ximo da
imagética do inconsciente, o que Jung quer dizer pela função do pensamento. O ar,
considerado astrologicamente, é elemento positivo e masculino, e os signos aéreos –
Gêmeos, Libra e Aquario – são geral mente descritos nos manuais astrológicos como
desprendidos, comunica tivos, interessados no mundo das idéias e privilegiando a
racionalidade. São, em resumo, civilizados. O ar é o unico elemento da roda zodiacal
que não contém nenhum simbolismo animal: Gêmeos e Aquário são representados
por figuras humanas, respectivamente os Gêmeos e o aguadeiro, e Libra é retratado
por um objeto inanimado, a balança. O ar é o elemento mais 6 Qvilisation in
Transirion, C. G. Jung. Londres, Routledge K Kcgan Paul, 1964.

tipicamente humano, mais distânciado da natureza instintiva; e é o reinado


humano que desenvolveu – ou talvez superdesenvolveu nos ultimos duzen tos anos:
a função do pensamento como o seu grande dom.
38

Os tres signos aéreos, embora diferentes nos seus modos de expres são,
partilham a necessidade de relacionar as experiências da vida com um parametro de
idéias preconcebido. Esse parametro pode vir do exterior, extraida de livros,
ensinamentos e conversas com os outros, ou pode vir de dentro, cuidadosamente
criado pelo trabalho mental do próprio indi viduo; mas a existência do parametro é de
importância fundamental, e há uma tendenciz a procurar em todas as experiências o
padrão lágico subja cente que faz com que elas se encaixem i estrutura
preconcebida.

Fundamentalmente, o pensamento estabelece a diferença, através da logica,


entre "isto" e "aquilo", e toma-se evidente a razão de os signos aéreos serem
associados com um temperamento que coleta e classifica a informação, pesando
uma coisa contra a outra, e compondo um parametro filosofico a partir dos pedaços e
fragmentos.

O tipo aéreo – e isso não significa necessariamente o indivíduo nas cido com o
Sol num signo de ar, mas sim alguém cujo mapa, como um todo, contdm uma
predominância dos fatores aéreos – em geral se asseme lha, no todo e nos detalhes,
ás qualidades do tipo pensativo conforme des crito por Jung. Tem todas as bençãos
desse tipo: a mente altamente desen volvida, o senso de justiça e a capacidade de
avaliação impessoal das situa ções, o amor pela cultura, a valorização da estrutura e
do sistema, a cora josa adesão a principios, o refinamento. Também tem todos os
defeitos do tipo – em termos da função "inferior –, que são eufemisticamente
expressos nas caracteristicas atribuidas aos tres signos aéreos: Gêmeos tem horror
a se definir em reiacionamentos pessoais, Libra é notorio por ficar em cima do muro
e se recusar a se comprometer, e Aquirio é conhecido por seu frio distânciamento e
aversão a demonstrações emocionais, que com tanta freqiiência fazem parte do
relacionamento pessoal.

Em outras palavras, o tipo aéreo tem um problema com o senti mento. Com a
preponderância de ar num napa, esta implicita a proba bilidade de o mundo das
trocas emocionais pessoais ser o maior problema da vida do indivíduo – embora ele
possa não saber disso até ser aban donado pela esposa –, porque o sentmento, ao
contr5rio de tudo o mais que cai sob seu olhar microscopico, não pode ser
39

classifiaado, estruturado, analisado ou encaixado no parametro.

Há muitos aquarianos, mulheres e homens, que se orgulham do fato ãe que


nunca choram, porque encaram as demonstrações de emoção corno fr.aqueza. Esta
é uma virtude mais ou menos questionavel, conside

r rando-se o que inevitavelmente vai se acumulando no inconsciente através


dessa subestimação injustificada da função do sentimento. Pergunte a um geminiano
tipico o que sente a respeito de alguma coisa, e ele vai começar assim: "Bom, eu
penso..." Quando voce lhe diz que quer seus sentimentos, não seus pensamentos,
em geral ele simplesmente não sabe o que sente e precisa sair por meia hora para
descobrir. Gêmeos, sendo geminiano, provavelmente não vai voltar, e voce o perdeu
porque foi muito "possessivo" e "exigente". Ou temos o hábito caracteristicamente
libriano de simplesmente evitar qualquer contato com as subcorrentes emocionais
obscuras dos relacionamentos porque não são "bonitas"; o libriano prefere morar na
torre de marfim dos seus ideais romanticos, calculando exata mente como gostaria
que seus relacionamentos fossem e imaginando por que as coisas nunca tem o
resultado que ele almejou. E é preciso não esquecer a classica citação aquariana,
dita a uma mulher que reclamava de nunca ter recebido flores ou qualquer outra
demonstração de afeto, em quarenta anos de casamento: "Mas eu lhe disse que a
amava quando nos casamos.

Não é suficiente?" Será que esse problema, na verdade. pertence aos outros?
Ou será que o tipo adreo, cuja fria objetividade e sociabilidade lhe valeram a repu
tação de parecer ser o mais "normal" dos tipos, tem uma abordagem um tanto infantil
do mundo do sentimento? Pode ser que ele precise parecer desprendido, controlado
e razoável porque na realidade esta apa vorado com o que estaria fervendo la
embaixo, nas profundezas? Algumas pessoas de ar são demasiadamente cánscias
da desconfortavel autonomia de sua função sentimental, e a tratam como uma
espécie de besta sombria que de vez em quando foge por descuido, mas nos dias
bons permanece atrás das grades de modo a não perturbar a placida ordem da vida
racional.
40

Outras pessoas de ar são completamente inconscientes de seus sentimentos, e


confundem o que não podem autenticamente expressar com uma série de
substitutos superficiais: demonstrações de sentimentos, doações mone tarias bem
divulgadas para caridade e uma espécie de resposta aqucarada tipo "lágrimas nos
olhos" em relação a "crianças e cachorros".

Pode-se, é claro, perguntar qual a necessidade de despertar a besta; sem


duvida, a vida não seria melhor se ficasse mansa, e a gente não fosse incomodada
com a bagunça toda das emogões? Quando se examina a grande dádiva do
comportamento coerente e harmonioso que o tipo aéreo geralmente expressa, por
que complicar as coisas? Otimo, se estiver pronto para viver numa caverna como o
Ioguim Milarepa, concentrando suas energias para derreter neve – mas não quando
voce vive no mundo com as outras pessoas. Não é que haja alguma coisa "errada"
com o tipo aéreo, ou 66

5 que ele seja "anormal"; ele é ele, e como tal tem o direito de ser ele.
Mas,a a não ser que aprenda alguma coisa a respeito do mundo do sentimento
e desenvolva alyuna capacidade de se relacionar com os outros no nivel do
sentimento, ele permanecera inapelavelmente cego aos valores do sentimento e
capaz de muita crueldade não-intencional. Um exemplo não O muito agradável da
repressão (e do subseqiiente surgimento) da função do sentimento é a Republica de
Weimar e o desenvolvimento do Terceiro is Reich, antes da ultima guerra – um
probiema sobre o qual Jung escreveu extensamente em OviIisation in Transition. Na
atual década, a ciencia, construida sobre principios do pensamento, corre o perpétuo
risco de ver suas descobertas utilizadas para a destruição maciça, se não conseguir
conservar alguma consciência da realidade do sentimento e do fato de que o
conhecimento, isoladamente, sem a sabedoria do coração, é não apenas incompleto,
como também decididamente perigoso. Se é possivel des culpar a inferioridade do
sentimento na vida pessoal porque "não machuca ninguém", deve-se levar em conta
as implicações sociais mais amplas. Em geral, entretanto, existe alguém machucado
no nivel pessoal, e na maioria dos casos é o próprio tipo aéreo.

n Um dos aspectos mais trigicos de tudo isso, no nivel pessoal, é que e


a personalidade do signo de ar, por estar raramente em contato com seus
41

sentimentos mais profundos, em geral é indiferente aos dos outros. Assim, leva um
choque brusco quando alguém mais istimo começa a expressar sua insatisfação com
o reiacionamento, ou parte batendo as portas e dando a o tiro de misericordia a
respeito de sua frieza e insensiblhdade. Se ela é a pessoa que termina o
relacionamento, em geral acredita que "conti nuando amigos" tudo está em ordem, e
raramente percebe a dor que pode causar. Se é a pessoa rejeitada, ern geral é
forçada a aprender o que mais teme sobre si proprio: por baixo da fria mente jaz uma
dependência do sentimento que, embora muitas vezes não admitida e não
expressa, é tão poderosa, que a partida de um parceiro ou de um filho pode destruir
completamente os alicerces de sua vida.

L; Outro perigo que freqiientemente espreita o tipo aéreo é a espécie de


fascinação fatal que o professor Rath, o pedagogo ernpertigado e a pedante,
sente por Lola Lola, a cantora de cabaré no filrne O anjo azul.

O Nenhum tipo de personalidade é tão dado a esse excesso emocional


como ,O o ar, porque, quando os sentimentos tomam conta dele, fazem-no com
LS flhia. Seus pensamentos, antes tão cristaiinos e claros, agora sio domi IS
nados por seus sentimentos e pelo indivíduo que recebeu a projeção do Q
lado inconsciente dele mesmo; e enquanto ele permanecer ignorante dos
niveis mais profundos de sua própria natureza, o outro vai parecer pmpor K7

cionalmente mais amoroso, mais caloroso, mais complacente e mais simpa tico
– uma caracteristica do sentimento –, ou inconstante, caprichoso, im pxevisivel e uma
verdadeira personificação da natureza elemental em todas as suas variantes. O
aspecto maternal do sentimento e sua fascinação pela pessoa de ar também estão
retratados em muitos contos de fadas, nos quais o ser amado esta sofrendo Há muito
tempo e pode ser redimido pela pacien cia, como Griselda, a Paciente; o aspecto
mais explosivo do sentirnento é retratado nos contos em que o herói se apaixona
desesperadamente por uma ondina, uma sereia, uma misteriosa criatura das
profundezas com corpo de mulher e cauda de peixe que, no final, ou o deixa ou o
destroi.

Alguns dos objetos das fantasias das pessoas de ar podem leva-la a ir


42

dancando até o inferno – o inferno de sua própria natureza sentimental vulneravel e


infantil. Mas nos criamos o nosso destino através do poder criativo do inconsciente,
e, quando um indivíduo se encontra nesse tipo de situação, é muito provável que
seja exatamente porque ela é necessária para ajuda-lo a se tornar consciente de sua
função do sentimento. O ar sente uma atração magnética pela agua, que sirnboliza a
função oposta: o sentimento. Mesmo que o parceiro não seja de fato uma ligação
ade quada – isto e, mesmo que o mapa do outro não mostre uma forte enfase em
planetas em signos de agua –, de alguma forma ele ou ela vai parecer idealmente
aquoso quando vestido pela projeção inconsciente. O ar é famoso por ser um mau
julgador de parceiros, porque escolhe tudo de acordo com a razao, até que Eros o
escolha. Ai ele não tem escolha, pois fica sob o dominio do inconsciente. Sua
insistência na logica e coerência em todas as coisas inevitavelmente provoca
tamanho stress no incons ciente, que ele se condena a uma explosão da função
inferior quando a pressão se torna demasiada.

Mesmo em relacionamentos menos dramaticos entre os tipos de pensamento e


sentimento, como os herois e as sereias, podemos ouvir esse dialogo tradicional:
Por que esta de tão mau humor, querido? Voce foi frio comigo a noite inteira.

– Do que está falando? Que humor? Estou otimo.

– Mas sei que voce esta de mau humor. Eu sinto isso. Diga-me o que esta
errado.

– Estou lhe dizendo que estou perfeitamente bem. Por que voce sempre exige
minha atenção canstante? – Mas não estou sendo exigente, é só que voce esta
sendo tão mal-humorado comigo... KQ

bem escuro. No sentimento não Há linhas nitidas de distinção baseadas l em


principios – "isto" não é diferente "disto". Em vez disso, tudo é um aspecto de um mar
em constante fluxo e mudança, no qual tudo é um e todas as diferenças se fundem.
A unica diferenciação que a agua faz é se um sentimento lhe parece aprópriado; mas
não é nem "bom" nem "mau".

O simbolismo dos signos de agua mostra tres criaturas de sangue frio: o


caranguejo, o escorpião e o peixe. Nos sonhos, essas imagens geralmente estão
43

associadas a energias instintivas, inconscientes, proximas das antigas raizes naturais


do homem, e muito distantes do mundo do pensamento humano diferenciado e
racional. A maior parte da avaliação da vida feita pela agua ocorre em nivel
inconsciente; a respeito desses signos, pode-se realmente dizer que a mão direita
não sabe o que a esquerda faz. A agua simplesmente responde, e suas respostas a
qualquer situação pessoal são quase infalivelmente corretas e adequadas. As
respostas do ar, ao con trario, são inventadas, baseadas em principios, em geral
aprópriadas em teoria mas completamente erradas na situação particular em que o
indivíduo se encontra. Enquanto o ar se ocupa forçando-se a comporta mentos
coerentes com um parametro preconcebido, a água é imprevisivel e responde a cada
situação como se nunca tivesse acontecido antes.

O tipo de agua geralmente conhece bem o lado mais sombrio da natureza


hmnana, o que garante a esses signos a reputação de compaixão e empatia. Existe
uma capacidade de sentir o que o outro sente e de avaliar as coisas de modo que
aparenta ser uma forma inteiramente irracio nal, capaz de enfurecer o tipo de ar, que
precisa raciocinar sobre tudo.

"Por que voce não gosta dele?" diz o ar, e a agua responde: "Não sei, não me
sinto bem com relação a ele." "Mas voce deve ter um motivo!" "Não preciso de
motivos; eu simplesmente sei." "Mas certamente voce não espera que eu aceite o
seu julgamento scm uma razao!" Numa situação dessas, a agua, em geral
intimidada diante dacapacidade logica superior do ar, normalmente inventa uma
razão tão cheia de opiniões imaturas, genera lidades e uma pretensa perspicácia
intelectual, que não é de surpreender que o ar a encare como um tipo não
particularmente inteligente. Entre tanto, o problema não é de inteligencia; na verdade,
em geral a agua é mais inteligente que o ar, em termos de sabedoria e compreensão
áas pessoas.

Quando pressionada, entretanto, ela revela o seu pensamento inferior; e como a


nossa época da um grande valor a destreza intelectual, a agua tende a ser
subestimada. Nas nossas modernas instituições educacionais, os dons da mente é
que são alimentados e estimulados, e não os dons do coração .
44

A agua tem todas as benção s do tipo sentimental: sensibilidade ao ambiente,


sutileza, encanto e compreensão, um forte senso de valores nos 7A

relacionamentos e a capacidade de juntar indivíduos e instintivamente entender


suas necessidades. Mesmo Escorpião, tão caluniado por causa de sua impenetravel
fachada de fria crueldade e sua fama, geralmente imerecida, de cometer excessos
sexuais – seria melhor dizer excessos emocionais –, é um signo verdadeiramente
sentimental, com um coração mole sob a carapaça dura. ao mesmo tempo, é claro,
a agua tem os de feitos do tipo, também expressos nas classicas descricões dos
signos que herdamos da antiga astrologia. Cincer, tradicionalmente, tende a se
apegar, ser possessivo, desconfiado e receoso do futuro; Escorpião tem fama de
fanatismo emocional e uma espécie de atmosfera sombria, pesada. fermen tadora,
que faz todo relacionamento parecer uma cena de Otelo; e Peixes é notorio pelo
efusivo sentimentalismo, o escapismo romantico, vacilação , falta de pontualidade e
de principios, e indefinição.

A agua, em resumo, tem um problema com a razao, e em geral é


completamente inconsciente do constante fluxo de opiniões, julgamentos e criticas
negativas irresponsáveis e de segunda mão – tanto a seu respeito como a respeito
dos outros – e idéias fixas que saem de sua boca e se introduzem sorrateirarnente
nos seus relacionamentos de sentimentos.

A agua, as vezes, é um pouco infantil em relação ao mundo das idéias.

Muitos homens podem achar encantador ter uma esposa quer"não sabe
absolutamente nada sobre esse negácio de politica", por "esta muito além" dela, mas
"sabe preparar uma boa refeição". Essa inferioridade inconsciente do pensamento
tem uma face particularmente feia quando se mostra como fofocas maldosas,
difamação e uma espécie de fanatismo ideológico. Na sua forma mais suave, essas
caracteristicas produzem uma pessoa que constantemente diz aos outros como
deveriam viver; na forma mais extremada, são esplendidos ingredientes para a
criação de um bom terrorista.

Existe uma historia tipica, a respeito de uma mulher que tinha uma associação
intima, porém inocente, com um terrorista do IRA pro curado por varios assassinatos
45

e atentados a bomba. Quando lhe pergun taram por que não entregava o homem a
policia, ela respondeu: "Mas, na realidade, é uma pessoa otima quando se conversa
com ele, e nunca fez nada que me magoasse." Esse pequeno exemplo diz mu!ta
coisa a respeito das conseqiiências menos agradáveis do pensamento inferior.

A agua carece de objetividade, e tudo que não caia no campo de visão pessoal
do tipo de agua, tudo com que não se possa relacionar através do sentimento não
tem significado real. Da medo imaginar o que seria um mundo habitado somente por
tipos sentimentais. Provavelmente não haveria mundo, pois qualquer preocupação
objetiva em relação a huma

71

nidade seria secundaria em relação ao que é bom "para mim e para os meus".
Assim como o tipo pensativo precisa adquirir uma consciência dos valores pessoais,
para evitar a brutalidade inconsciente, o tipo senti mental precisa adquirir a
consciência dos valores objetivos, para evitar uma brutalidade semelhante, embora
com motivação diferente.

Um dos maiores problemas que a agua encontra é que, através da superenfase


no sentimento, ela pode facilmente afastar aqueles que lhe são mais caros –
simplesmente porque não consegue entender que la fora existe um mundo que lhe
solicita energia e atenção . Embora seja sempre suscetivel a dor dos outros, muitas
vezes é incapaz de entender objetiva mente que as pessoas pensam de forma
diferente e tem diferentes neces sidades e valores, e tenta colocar o sufocante manto
de sua solicitude sobre tudo que perturbe da mesma maneira, o seu senso de
h.armonia. Assim fazendo, ela pode não perceber que algumas pessoas acham que
isso não é harmánico, e sim sufocante. Nos relacionamentos pessoais, a agua
muitas vezes é quem cai fora por se sentir ferida ou emocionalmente rejeitada;
nesses casos, o mais comum é ter encontrado um parceiro ainda mais "suscetivel",
para acabaz descobrindo, horrorizada, que o novo amante tem um rosto diferente,
mas é a mesma velHá pessoa. A agua tenta tomar conta de todos – e isso é valido
para os homens verdadeiramente de água e também para as mulheres – sem ver
que alguns filhos querem que os deixem crescer. E o tipo de água pode desencadear
46

a critica destrutiva de seu pensamento não-aceito sobre seus próprios filhos, sob o
disfarce do que é "melhor" para eles – receando, inconscientemente, o dia em que
vio partir e cortar o elo sentimental que o sustenta.

O tipo de agua é, com mais frequencia, a pessoa rejeitada nos rela cionamentos,
em grande parte porque, se o seu pequeno mundo pessoal estiver lhe parecendo
bom, ela não se da ao trabalho de imaginar que seu parceiro tem necessidade de um
alimento intelectual mais estimulante para poder crescer. A agua tem uma tendência
a viver através dos outros, o que é sempre uma empresa altamente perigosa; o seu
efeito sobre o outro é seme lhante ao do visgo sobre o carvalho. O parasita sufoca
seu hospedeiro.

A agua é magneticamente atraida pelo ar, e se esses dois tipos pudessem


terminar com suas infindáveis escar uças, aprenderiam muito um com o outro sobre
suas próprias vidas inconscientes. O maior desafio da agua residc nos indivíduos que
não conseguem responder prontamente através da linguagem do sentimento, pois o
tipo pensativo inevitavelmente proporciona uma oportunidade para que seu parceiro
sensitivo desperte, abra os olhos e faça uma boa e refrescante inalação áo ar limpido
das alturas. 71

O Elemento Terra: o Tipo Sensorial O problema de ter sempre os dois pés


firmemente plantados no chão é que voce nunca consegue tirar as calcas.

– J. D. Smith

O elemento terra se correlaciona com a função da sensa jao; e como um dos


propositos dessa função é determinar que algo existe, a terra da a impressão de ser
um tipo razoavelmente acessivel e mesmo simples.

Relacionamo-nos com o mundo dos objetos através dos sentidos, e é dificil


diminuir ou reprimir nossa resposta aos objetos da maneira que muitas pessoas
diminuem ou reprimem pensamentos, sentimentos ou intuições – principalmente
numa era em que a maioria das ciências empiricas só da o seu selo de aprovação ao
que tem forma concreta. Em consequencia, a maioria das pessoas acHá o elemento
terra relativamente facil de entender – exceto as próprias pessoas de terra.

O tipo de terra geralmente é descrito nos manuais astrológicos como pratico,


47

eficiente, cheio de senso comum, sensual, "realista", bem organizado e amante do


dinheiro, da segurança e do status. Essa descrição se aplica aos tres signos de terra:
Touro, Virgem e Capricornio. A sensação tem a "função da realidade", e nessa esfera
o tipo de terra se sobressai, conseguindo de alguma forma ordenar a bateria aleatória
de estimulos que assaltam os sentidos, relacionando-se com cada um
individualmente, saboreando-o, aprendendo sua natureza, e passando para o
seguinte.

Dessa forma, constroi um conjunto de fatos que lhe permite lidar suces
sivamente com todas as situações da maneira mais eficiente.

O tipo de terra tem todas as caracteristicas de sensações tipicamente


junguianas. Esta a vontade com seu corpo, identifica-se freqiientemente com ele e,
em geral, é saudavel porque consegue expressar diretamente seus desejos fisicos.
Esta a vontade com as coisas, e geralmente consegue lidar com o dinheiro e com as
responsabilidaes sem esforço, o que é um assombro para as pessoas mais intuitivas
por temperamento. Tem o dom de concretizar seus desejos, e essa capacidade de
"realização" mostra seu melhor lado quando combinada ou com o pensamento, que
resulta no pen sador cuidadoso, empirico, o estatistico ou pesquisador impecavel, ou
com o sentimento, que da origem ao sibarita feliz, o amante ou pai afetuoso, o
patrono da natureza e de todas as coisas bonitas.

O tipo de terra também tem todos os defeitos potenciais da su perenfatização da


sensação associada com a intuição inferior, mais uma vez corretamente resumidos
nas descrições tradicionais dos signos de terra. 7Z

Touro é famoso pela dogmatica estreiteza mental, superpossessividade em


relação ao que julga ser sua propriedade e pela tendência a subordinar as mais sutis
e complexas experiências da vida á seguinte filosofia: "Ou eu vejo ou não existe."
Virgem, proverbialmente, não consegue "ver a floresta por causa das arvores", e se
perde num labirinto de detalhes e minucias irrelevantes, sem nunca perceber a razão
de seu labor incessante, ou que algumas pessoas gostam de um pouco de caos em
sua vida. E Capricornio tem a reputação um pouco desagradavel de justificar os
meios pelo fim e moldar seu comportamento de acordo com as expectativas sociais;
48

isto lhe permite desfru o status que procura, sem sacrificar qualquer coisa de si
mesmo.

Em outras palavras, enquanto o tipo de terra se sobressai na acumu lação de


fatos, deixa de ver o significado das ligações entre eles, as relações que os unem
num significado comum; e embora se mova com facilidade entre a complexidade do
mundo dos objetos, esta sujeito a deixar de ver o significado interior de sua própria
vida. Sendo orientado para a sensação, o tipo de terra possui como função inferior
um senso intuitivo mais ou menos primitivo. Em alguns casos, essa intuição atrofiada
o cerca de medos irracionais e apreensões vagas de uma espécie negativa, que
constantemente interferem no seu simples mundo em brancow-preto. Em outros
casos, ele reprime inteiramente a intuição e vive num interminavel crepusculo
cinzento de trabalho e rotina que gradualmente aumenta a pilHá de objetos a sua
volta, mas não faz nada para aliviar o espaço vazio dentro dele – que clama por
algum sentido de propásito, por um sentimento de fazer parte de uma vida maior, por
alguma esperança no futuro que lhe permita descansar de seu trabalho e aproveitar
o presente de forma criativa. Outra maneira de descrever o problema do tipo de terra
é que ele não sabe ser criança, não sabe brincar. É velho na juventude; e a não ser
que consiga se soltar da rotina de sua escravidão do que considera realidade, fica
parti cularmente propenso a recear a morte como o juizo final – a somatoria definitiva
de sua vida, cujo significado subjacente lhe escapa, de alguma forma.

A terra sente um anseio pelo que chama de espiritual, embora isso muitas vezes
seja expresso como uma crença ou uma fascinação secreta por fantasmas,
psiquismo e outros fenomenos parapsicológicos, sem qualquer compreensão das
implicações da existência desse tipo de mundo "sobrenatural". É muito comum ve-lo
no encalço de um objeto de amor que personifica sua idéia do médium, do inspirador,
do guia, que possa, de alguma forma, partilhar com ele os segredos do cosmos e
aliviar sua pesada dor. Infelizmente, aqueles que estão em contato com os mistérios

interiores não podem distribui-los como se fosse pão e queijo, pois essa
experiência intuitiva é totalmente individual, intensamente pessoal e não pode ser
explicada da forma concreta como a terra gosta das expli cações. O tipo de terra não
aceita nada que não esteja apoiado no teste munho de seus sentidos. Há tipos de
49

terra que parecem cães amarrados a um poste com uma trela comprida; eles ficam
dando voltas, mas nunca conseguem ultrapassar o comprimento da corrente, que é
forjada por sua insistência em que os sentidos são o unico meio de aprender a
realidade.

O tipo de terra pode ser um maravilhoso construtor, provedor, admi nistrador da


casa e consciencioso servo das necessidades daqueles que ama.

Seu pior pecado, nesse caso, é a falta de visão, capaz de sufocar as pessoas
práximas a ele e esmagar a sua nascente criatividade e a dos outros, insistindo
exageradamente no lado pratico. Tor que esta perdendo tempo com essa besteira?"
diz o pai preso a terra a seu filho, que está aprendendo a pintar/tocar piano/estudar
filosofia/dominar a arquitetura dos anéis de fumaça. "Voce devia estar la fora
aprendendo a ganhar dinheiro." O dano realmente sério que essa atitude pode
ocasionar aos filhos é bem conhecido. Temos toda uma geração de marginais e
fugitivos que se rebelaram violentamente contra os valores terrenos constantemente
impin gidos por pais bem-intencionados – pais que, tendo passado por duas guerras
mundiais e uma aguda depressão economica, esqueceram que o futuro sempre
contém novas possibilidades. A sensação valoriza apenas o que pode perceber e,
em conseqiiencia, esta destinada a perder muita coisa.

O fato de alguém querer "desperdiçar" seu ultimo centavo em jacintos para a


alma é um ultraje e insulto as horas de labuta que o tipo terra gastou para
proporcionar aos outros as coisas que acredita que eles querem, porque ele próprio
as deseja.

A terra, se estiver razoavelmente satisfeita sexualmente e com uma situação


satisfatoria em termos de sua necessidade de estabilidade material, geralmente vai
permanecer em relacionamentos que deixariam os outros tipos loucos. Pelo fato de
basear a realidade no que esta á sua frente, o fato de o parceiro estar fisicamente
presente significa, para ela, que o relacio namento existe. ao mesmo tempo, as
nuanças mais sutis lhe escapam, como muitas vezes também acontece com o seu
parceiro. Por outro lado, a face intuitiva inconsciente, as vezes, surge como um
fascinio por alguém que personifica a vida, a vitalidade e o caos, o que naturalmente
50

introduz o caos no seu mundo cuidadosamente ordenado. Muitas vezes esse fascinio
é por algum tipo de movimento religioso ou espiritual, e essa é uma das expressões
mais estranhas da intuição inferior: um fervor religioso intenso e sincero, porém
crédulo.

Aqui, a busca intuitiva inconsciente de um significado na vida é estruturada e


cristalizada pelos sentidos como dogma, que tenta definir Deus, colocar a realidade
espiritual numa forma concreta, e transferir o numinoso para objetos sagrados – em
outras palavras, uma adesão a letra da lei, e esquecimento do seu espirito. A
Inquisição espanhola talvez seja um bom exemplo da intuição inferior irrompendo
numa cultura alta mente orientada para a sensação. A rigorosa e fanatica coerção da
crença dentro de uma estrutura, fora da qual qualquer um se torna um herege que
deve ser fisicamente destruido, exemplifica admiravelmente a face mais feia da
intuição inferior. A maior parte das caças as bruxas – quer sejam dirigidas por um
bando de puritanos do século XVII, por um bando de puritanos do século XX usando
a máscara do "realismo" exagerado, ou por um bando de velhos dos dois sexos
compelidos a enfiar a mensagem cristK pela garganta dos pobres paçãos ignorantes,
dos vizinhos e amigos – cheira a intuição inferior projetado em um bode expiatorio
conveniente.

Mais comumente, a intuição inferior nos tipos de terra mais bem equilibrados se
mostra como vagos pressentimentos negativos. O tipo de terra tenta ver o futuro, que
volta para ele enegrecido pela fuligem das suas próprias projeções inconscientes, de
modo que invariavelmente os outros querem "pega-lo", nada "nunca vai funcionar", e
ninguém é digno de confiança. Touro é famoso por seu horror a perder o que possui;
Virgem fica imobilizado de terror quando qualquer coisa do seu mundo
cuidadosamente arrumado fica ligeiramente desarrumada por causa da intromissão
de algum elemento irracional, inesperado; e Capricornio é bem conhecido pelas suas
suspeitas das pessoas que possam querer tira-lo da posição que conquistou. Esses,
naturalmente, são exemplos extremos.

Mas podemos considerar o caso de Richard Nixon que, com o Sol em


Capricornio e Virgem no ascendente, tem uma função de sensação forte mente
desenvolvida; e é plausivel sugerir que a paranoia e as suspeitas exageradas de uma
51

intuição inferior o levaram a adotar os métodos que tiveram como conseqiiência


inevitavel a sua queda. A maioria dos tipos de terra não leva vidas tão dramaticas,
nem é tão exagerada; mas o mundo obscuro da fantasia é sempre um terror e um
fascinio para esse tipo enga nosamente simples. A busca de alguma espécie de
realidade espiritual interior é absolutamente necessaria para o tipo de terra para que
encontre sua própria inteireza, pois sua mais profunda necessidade inconsciente é a
sede de significado, que, se não receber espaço para viver, vai danificar os alicerces
concretos sobre os quais construiu sua vida.

A terra sente uma atração magnética pelo fogo, e é comum encontrar pessoas
com uma preponderância de terra no horoscopo procurando inspi

7Z

ração e drama num parceiro de fogo. Os relacionamentos terra-fogo fre


quentemente são menos dificeis que os relacionamentos ar-água, porque a sensação
e a intuição são o que Jung chama fungões irracionais – isto é, não são irracionais
no sentido coloquial, mas não estão preocupadas com o julgamento, quer através de
principios ou de sentimento, mas simples mente pegam a experiência e a
experimentam. São, portantn, menos pro pensos a tentar mudar um ao outro e,
embora haja aljuns diilogos tipicos nesses relacionamentos, geralmente centrados
em acusações de um parceiro ser muito confuso e pouco pratico (fogo) e o outro ser
muito estreito de mente e escravizado a habitos (terra), este par parece ser mais facil
– mas não necessariamente melhor – que o ar-agua. A terra se inclina a achar que
esta sempre atras do fogo fazendo a limpeza, e o fogo, que está sendo repreendido e
criticado por coisas que considera pequenas e sem impor tância. A terra quer
garantias de que o futuro sera seguro, e o fogo ve a vida como um jogo no qual nada
é seguro e a verdadeira alegria de viver é dirigir as mudanças criativamente. A terra
geralmente se sente a doadora em qualquer relacionamento, porque expressa sua
afeição de formas tan giveis; o fogo, por outro lado, geralmente é mais autocentrado
e acHá que ele mesmo é sua melhor dadiva. Mas existe um interminavel fascinio
entre esses dois tipos opostos, pois o fogo procura a estabilidade e a forma da terra,
enquanto a terra anseia pelo drama e pela espontaneidade da grande visão do fogo.
O Elemento Fogo: o Tipo Intuitivo
52

As percepções do homem não estão limitadas pelos orgfos de percepção: ele


percebe mais do que o sentido (embora aguçado) pode registrar.

– William Blake

Chegamos finalmente ao elemento fogo, que na realidade começa o ciclo


zodiacal com Áries, e provavelmente seja o elemento que mais con funde quando se
tenta correlacionar seus atributos tradicionais com os do tipo intuitivo de Jung. Isso
acontece em parte porque muitos manuais astro lógicos parecem aceitar literalmente
as tradicionais afirmativas de que o fogo é "quente", "manifestativo", "autocentrado" e
"afortunado" sem questionar por que ele é assim e o que realmente motiva esse
curioso temperamento. Também existe uma confusão consideravel em torno do que
Jung quer dizer com intuicao. Ela é comumente associada a médiuns, 77

sessões espiritas e varias outras excentricidades que pertencem mais ao reino


do sentimento. Como a intuição é principalmente um processo inconsciente, sua
natureza é muito dificil de apreender. A funcão intuitiva é representada na
consciência por uma atitude de expectativa, pela visão e penetração... a intuição não
é a mera percepção ou visão, mas um processo ativo, criativo, que coloca tanto no
objeto quanto dele retira . June Singer assim descreve a intuição :

...um processo que extrai a percepção inconscientemente...

Assim como... a sensação se empenha em atingir a mais correta percepção da


atualidade, a intuição tenta abranger as mais amplas possibilidades . Se isso não é
claro para o leitor, não o é ainda mais para muitos tipos intuitivos que não
conseguem compreender sua constituição psiquica por meio da ciência e da
educação ortodoxas – e geralmente alegam que essa função não existe – muitas
vezes se sentem inseguros e desconfiados exafamente com relação ao aspecto
deles que é mais altamente desenvolvi do. Em geral, a intuição é admitida para as
mulheres com certa postura paternalista, pois nunca é levada muito a sério pelos que
não estão cientes de possui-la; entretanto, há tanto homens como mulheres
intuitivos, e eles sofrem por causa dessa falta de entendimento.

Os signos de fogo – Áries, Leão e Sagitario – partilham uma vita lidade e uma
53

espontaneidade que muitas vezes é alvo da inveja e do res sentimento por parte dos
signos mais tranqiiilos. Por dentro são crianças, e tendem a viver num mundo de
fantasia em que as pessoas são de fato cavaleiros com cavalos brancos, ou
princesas aprisionadas em castelos, ou dragões que precisam ser desafiados e
mortos. O tipo de fogo tem uma forte necessidade de mitologizar suas experiências e
relaciona-las a um mundo interior que pertence mais ao mundo dos contos de fadas
do que a "realidade". Não é de surpreender que tantos tipos de fogo sejam atraidos
para o mundo do teatro. O comportamento do tipo de fogo é muitas vezes
exagerado, mas é injusto acusa-lo de fazer isso unicamente para se exibir. 8
Psychological Types.

9 BoundÁries of the Soul. 7Q

Em geral, esta perfeitamente ciente de sua propensão ao exagero, dramati


zação e gosto pelo colorido, mas age mais para si do que para os outros, e é mais
importante para ele viver dramaticamente do que aceitar o mundo aparentemente
monotoão e algumas vezes ameaçador que os tipos mais pragmaticos querem que
ele aceite como o unico mundo real. "Temos mais facilidade em aceitar o
desagradável do que o inconseqiiente " como diz Goethe.

O fogo, na astrologia tradicional, é considerado um pouco insensivel e


egocentrico, o que sem duvida parece ser quando se trata dos detalhes praticos da
vida. Ele possui uma função de sensação inferior, e tende a reprimir sua consciência
dos objetos para chegar mais perto da esséncia de sua situação, de suas
possibilidades e de seu significado num contexto mais amplo. Não é que não possa
ser incomodado com detalhes; na realidade, eles ameaçam sua forma de perceber o
mundo. O tipo de fogo esta interes sado no futuro e no seu interminavel potencial. O
passado, para ele, é como uma novela escrita por outra pessoa, e o presente, uma
série de portas que podem levar a qualquer lugar e precisam ser abertas uma a
uma. Em confronto com as desagraMveis exigencias do mundo material, o tipo de
fogo pode muitas vezes abandonar uma situação e passar para outra, o que lhe vale
a reputa@o de irresponsabilidade ou insensibilidade. Ele não é nem uma coisa nem
outra; simplesmente não suporta ser aprisionado.
54

O tipo de fogo tem uma aptidão para pereeber as subcorrentes de uma situação
e chegar a uma conclusão num nivel totalmente incons ciente, de modo que, de
repente, eie tem um "palpit " muitas vezes não corroborado pela evidência dos
sentidos, mas infalivelmente correto. Isto envolve uma apreciacão dos componentes
de uma determinada situação simultaneamente e como um todo, em vez do processo
seqiiencial envol vido no raciocinio. Ele aparenta ter uma extraordinaria confiança na
"sorte", o que é mais uma convicção inata de que "alguma coisa" – o inconsciente –
vai acabar elaborando uma solução para tira-lo de suas dificuldades e preparar o
caminho para um futuro roseo. Isto enfurece os outros tipos, pois as bem-sucedidas
espiadelas que o fogo dá na esquina do futuro os desconcertam, e seus fracassos os
desconcertam ainda mais – porque ele não fica nem um pouco embaraçado. Tudo
"vai se ajeitar" mais tarde. Todos os signos de fogo partilham uma espécie de joie de
vivre, uma irreprimivel confiança infantil na generosidade do destino; e quem tem
deficiência desse elemento pode perfeitamente ficar pasmo com a iI forma como o
fogo joga com dinheiro, tempo, emoção, energia e as vezes com pessoas. Tudo para
ele é um grande jogo, e o objetivo não é vencer, mas ter estilo.

Muitas vezes o fogo evita os caminhos mais convencionais da aspi ração


religiosa, porque não suporta ver a vida aprisionada na forma, e também esta
instintivamente mais proximo do centro por causa de sua aberiura para o
inconscientc. Muitas vezes, vamos encontra-lo no mundo dos negócios e das
fina.nças, no qual ele pode satisfazer seu instinto de jogo elaborando magicas com
empresas e fortunas. É frequente ele chegar ao topo nessas areas, porque não está
muito seriamente preocupado com os resultados. O tipo fogo mais introvertido tende
a expressar sua percepção das correntes invisiveis da vida através da devoção ao
seu próprio e singular caminho espiritual, ou através das artes, em que o mundo
interior das imagens e simbolos prende sua atenção. Através da arte, consegue criar
uma realidade que exirai a essência da experiência diaria de vida e forma um mito
que transcende as limitações da época historica na qual vive.

ão lado dessas virtudes incomuns, o tipo de fogo também possui alguns vicios
um tanto dramaticos, bem exprimidos nos atributos tradi cioaais dos signos de fogo:
Áries tem a fama de ter um individualismo exa gerado e uma tendência quixotesca a
55

investir contra moinhos de vento quando todas as outras pessoas só querem um


pouco de paz e sossego; Leão é conhecido por seu autocentrismo algumas vezes
ditatorial e pela suposição tacita de que, como é um filho dos deuses, ninguém mais
pode ser; e Sagitirio é notorio pela irresponsabilidade de suas promessas, o horror a
rotina e a sua tendência ao exagero e aos "modismos".

Em outras palavras, o fogo tem problemas em lidar com o mundo que,


infelizmente para ele, esta cheio de objetos e da presença de outras pessoas; e
precisa conquistar o mundo em grande estilo ou retirar-se dele e refugiar-se em suas
visões. O mundo pode parecer frustra-lo a toda hora.

Essas frustrações podem assumir a forma de estruturas governamentais, leis de


transito, hnpostos, contas, necessidade de ganhar dinheiro e do problema de lembrar
de se alimentar, vestir e cuidar do corpo. O mundo da sensação é frequentemente
uma verdadeira pedra no caminho do tipo de fogo. Isto não se aplica somente a
objetos, mas também i sociedade, que em geral é conservadora, pelo menos vmtc a
cinqiienta anos atras da veloz intuição do fogo, e consequentemente insensivel as
promessas de suas idéias e visões.

O tipo de fogo pode ser maravilhosamente bem-sucedido nos negocios – se o


deixarem especular em vez de ficar preso a detalhes – ou pode ter uma clara
percepção dos mais profundos manânciais da sua vida espiritual; entretanto,
freqiientemente, não consegue sair de casa sem esquecer as chaves do carro ou a
carteira, ou passar por uma rua sem come ter alguma infração de transito – se ele
conseguir fazer o carro pegar.

É esse tipo de comportamento que muitas vezes lhe da a sensação de que a


sociedade está contra ele, ou esta denegrindo seus esforços. Mas, na ver dade, seus
sentidos inconscientes é que estão contra ele. Também Há mui tos tipos de fogo que
conseguem funcionar satisfatoriamente em socie dade, mas encontram o seu maior
inimigo em seu próprio corpo. Nesse caso, isso aparece como apreensão com a
doenca fisica ou hipocondria, que precisa ser compensada por umz enérgica
disciplina atlética ou dieté tica; ou como um sentimento subjacente, e muitas vezes
profundamente inconsciente, de fracasso sexual, o que cria muita dificuldade nós rela
56

cionamentos.

O tipo de fogo é mais propenso ao que gostamos de chamar pro blemas sexuais,
que não são tanto problemas mas sim um indicio do quanto ele próprio e os outros
não entendem suas necessidades. Quase sempre, o sexo para ele significa algo
diferente de um simples ato fisico; é um simbolo, como o é tudo que afcta seus
sentidos, e o elemento de fantasia em seus relacionamentos em geral é muito forte.
Isto geralmente parece, de alguma forma, "pervertido" para os tipos mais prosaicos.
Na verdade, os elementos de expectativa, antecipação e fantasia romantica e
erotica muitas vezes são muito mais importantes para o tipo de fogo do que o ato
fisico em si mesmo. Isto se torna um problema quando Há extre mismo, e ele não
consegue mais se relacionar a não ser através da fantasia.

Como é comum que escolHá um parceiro orientado para a sensação , sobre o


qual ele projeta sua função inferior, o fogo pode ficar ressentido porque acHá que se
espera dele um bom desempenho – essa situacão pode ter conseqiiências
desastrosas. A impotência e a frigidez, termos que tendemos a usar em relação a
problemas fisicos, são comuns com os tipos extremamente igneos, mas a dificuldade
não é realmente fisica. O fogo simplesmente não consegue ter um bom desempenho
a não ser que sua imaginação o acompanhe, e se não conseguiz aprender a apreciar
a experiência sexual como um prazer, ele pode culpar o parceiro pelo seu fracasso.
É preciso que ele aprenda a se relacionar com o corpo pelo corpo; de outra forma,
pode ser levado a procurar sucessivos relacionamentos, sempre buscando a imagem
ideal que, no fim das contas, existe em sua própria psique; e nenhum parceiro vai
satisfaze-lo, porque a experiência fica sempre abaixo da expectativa.

O fogo muitas vezes supercompensa seus sentimentos de inferio ridade sexual


"provando-se"; assim, temos o Don Juan nos dois sexos, procurando a confiança por
meio da conquista. Como as situações romanticas, para os tipos extremamente
igneos, podem começar como um conto de fadas e terminar como uma prisão, as
vezes ele não é confiável nos relacionamentos. E como também tem um problema
para articular suas neces sidades – sendo muitas vezes incapaz de objetiva-las, seu
parceiro pode ficar sem saber as razões por que ele começou a se afastar. Em geral
a res posta é: "Não sei"d sá que esta faltando alguma coisa nesse relaciona mento."
57

O que está faltando é sua crença de que não Há mais possibili dades para explorar.

Também é o tipo de fogo que receia ser controlado através de sua sexualidade,
e que muitas vezes se envolve em lutas de poder nos relacio namentos, pois precisa
estar no comando para se proteger. Ou ele pode ser altamente inibido na expressão
do afeto fisico, o que é aceitável para um parceiro compreensivo, mas altamente
destrutivo para um filho.

O tipo de fogo é mais propenso que qualquer outro a subitas pai xões fisicas –
que ele chama amor –, que o fazem romper os relaciona mentos existentes um tanto
brutalmente, para ir ao encalço do objeto desejado. Esse entrecho lamentavel
freqiientemente termina com a triste descoberta de que "de noite todos os gatos são
pardos", e o novo objeto de amor não é mais satisfatório que o antigo. Qualquer
pessoa familia rizada com a vida de Henrique VIII vai reconhecer esse padrao, que
parece corresponder bem a seu ascendente sagitariano e seu temperamento
intuitivo extrovertido.

Também existe um tipo de fogo ascético, intensamente motivado


espiritualmente e capaz de reprimir ferozmente sua sensualidade por acreditar que
ela seja ma. A classica historia de Lewis, The Monk, é um excelente exemplo desse
padrao, assim como da tipica vingança de um inconsciente violentado.

Podem-se ver facilmente, a partir dessa descrição, os problemas tipicos dos


relacionamentos terra-fogo, já mencionados. Esses relaciona mentos muitas vezes
tem uma qualidade altamente magica ou compulsiva, mas, uma vez firmados, surge
um padrão comum. O coração do tipo de fogo é sincero mas é sincero em relação a
um ideal e não a um individuo;e, a não ser que consiga estabelecer algum contato
com a realidade dos senti dos, ele esta sujeito a perder sua confiança infantil no
felizes-para-sempre.

O resultado vai ser uma série de relacionamentos rompidos e uma sensação de


não ter construido nada permanente em sua vida. Se o fogo não quiser que suas
experiências sejam "como uma historia contada por um idiota, cheia de sons e furia,
sem nenhum significado", precisa aprender a enten der seu lado sombrio, para poder
ancorar suas visões e construir algo de t valor no mundo. Seus sonhos são
58

necessários para o mundo, mas precisam ser comunicados com alguma adaptação
aos termos do mundo.

82

Podemos, agoza, ver mais claramente os problemas dos quatro


temperamentos: cada um deles ve, e valoriza, um diferente aspecto da realidade e
tende a presumir que a sua é a unica realidade. As descrições que demos dos quatro
tipos são caricaturais, e foram propositalmente exageradas; raramente serão
encontradas no mundo real, porque nenhum indivíduo é totalmente composto apenas
de um elemento, ou de uma função psicológica. 8 preciso lembrar que possuimos
todas as quatro, mas inevitaveImente havera um desequilibrio para mais ou para
menos, e uma função vai ser muito mais desenvoIvida, enquanto outra perma necera
relativamente inconfiavel. Também é preciso lembrar que, por volta dos trinta anos, a
maioria das pessoas tem pelo menos duas dessas funções da consciência
desenvolvidas em grau razoavel, uma função "superior" e uma "auxiliar"; a segunda
respalda e enriquece a primeira, de modo que nossa visão se toma mais extensa.
Essa função "auxiliar" nunca é oposta a função dominante; por exemplo: se o
pensamento é o principal modo de se relacionar com a vida, ele sera respaldado pela
sensação ou pela intuição, mas nunca pelo sentimento. O mapa de nasci mento
muitas vezes da uma clara indicação desse padrão de desenvolvi mento através da
proeminência relativa de um segundo elemento. Assim, podemos falar de mapas ar –
fogo, sugerindo o pensador intuitivo; mapas ar – terra, descrevendo o pensador
empirico; mapas agua – fogo, expres sando o sentimento intuitivo; e mapas água –
terra, retratando o senti mento sensorial.

Algumas vezes o mapa de nascimento mostra um predominio de dois


elementos, implicando um equilibrio de duas funções opostas, como ar-agua ou fogo
– terra. Isso quase sempre sugere uma grande tensão dentro do individuo, pois um
dos lados desse par de opostos provavel mente vai ser expresso como função
dominante e o outro como função inferior. Os impulsos psicológicos simbolizados
pelos planetas no elemento "perdedor" vão então operar inconscientemente, mas,
como são poderosos no mapa de nascimento, não podem ser evitados, e o problema
da inte gração da função inferior se torna critico. Quando um elemento é fraco ou
59

esta ausente no mapa, a função simbolizada por eie geralmente vai ser fra ca; mas o
indivíduo pode conseguir evitar o problema durante muito tempo.

Quando os opostos estão presentes no mapa, geralmente o problema é


identificado no começo da vida e permanece até o fim, muitas vezes de modo
altamente criativo.

Somos sempre inconscientemente atraidos pelo que nos falta, e esses quatro
temperamentos são inexoravelmente atraidos por seus opostos porque os
relacionamentos desse tipo proporcionam a oportunidade de

desenvolver uma maior integração interior. Existe, quase sempre, muita


projeção nessa espécie de relacionamento, e os problemas começam quando cada
um dos indivíduos tenta reformar seu parceiro. Na verdade, eles estão tentando
reformar a si proprios, o que é totalmente possivel desde que percebam o significado
de suas etemas criticas. Se conseguis semos ficar no topo de nossa pequena
montanha e olhar a paisagem perce bendo que os outros ficam em topos diferentes
vendo paisagens diferentes, poderiamos compreender que a riqueza da vida só se
torna acessivel quando existe uma partilHá de diferentes realidades e quando se
admite o mérito dos valores dos outros. E não podemos fazer isso enquanto não
pararmos de desdenhar, rejeitar e recear a nossa "inferioridade" interior.

O fogo aprendera a viver com seu parceiro de terra, e aprendera com ele,
somente quando se dispuser a vivenciar ao maximo os seus sentidos, reco nhecenda
a sua importância; a texra só aceitara seu parceiro de fogo, e aprenderá com ele,
quando enfrentar seu práprio anseio profundo pela liberdade e admitir que a visão é
tão importante quanto a forma que a hospeda. A água poderá aprender a se
relacionar com o ar. e a valorizá-lo, quando entender que nem tudo na vida é
avaiiado em termos das próprias respostas emocionais pessoais; e o ar começara a
entender a agua e apren dera com ela quando admitir suas próprias necessidades
emocionais e reco nhecer que os relacionamentos são um campo de experiência
humana tio valido quando o mundo das idéias.

O iMapa de Aascimento e os Tipos Psicológicos É sempre dificil "tipificar" um


mapa, e isto geralmente não pode ser feito sem algom conhecimento pessoal do
60

individuo. Na verdade, se quisermos usar a astrologia de uma maneira produtiva para


ajudar no processo de autocompreensão, primeiro precisaremos ser capazes de nós
relacionar com o indivíduo e experimentar diretamente alguma coisa de sua
identidade, antes de examinar o mapa natal para ver como essa reali dade vai ser
expressa. A pessoa vem antes do mapa, fato que muitos astro logos tem tendência a
esquecer. Deve-se lembrar que esse mapa poderia igualmente ser o de uma galinha,
um cavalo, um prédio, uma companhia de opera; é o refiexo de um ponto no tempo.
O mapa não é humano; o individuo, sim. O horoscopo mapeia um conjunto de
potenciais, mas não se pode dizer o que o indivíduo fez com aquele potencial. E Há
muitos fatores importantes que não estão refletidos no mapa, sendo o mais impor
tante o sexo do individuo. 84

Homens e mulheres tendem a reagir a diferentes aspectos do mapa natal, e


criam uma vida real muito diferente a partir desse mapa de pos sibilidades. Não se
trata simplesmente de contar o numero de planetas que ocupam um detenninado
elemento, pois os planetas especificos, assim como o sexo do individuo, vão afetar
essa contagem. Para um homem, os planetas masculinos, como o Sol e Marte,
parccem ser mais "acessfveis" – isto é, as energias que esses planetas simbolizam
são mais prontamente acessiveis a consciência masculina. Os planetas femininos,
como a Lua e Vênus, parecem ser mais acessiveis a consciência feminina. Como já
t vimos, os planetas se agrupam em masculinos e femininos, da mesma forma
que os signos, e pode-se dizer que o principio da feminilidade é simboli zado pelos
seis signos fcmininos: Touro, Câncer, Virgem, Escorpião, Capri cornio e Peixes, e
pelos quatro planetas femininos: Lua, Vênus, Netuno e Plutão. Pode-se dizer que o
principio da masculinidade é simbolizado pelos seis signos masculinos: Azies,
Gêmeos, Leao, Libra, Sagitario e Aquario, e pelos quatro planetas masculinos: Sol,
Marte, Jupiter e Urano.

Mercurio é um planeta androgino e parece relacionar-se com a sintese; e


Saturno, o mais misterioso dos planctas, pode ser considerado feminino mas
aparentemente passa de um lado para outro e também é um pouco andrógino.

Muitos outros fatores afetam o equilibrio de elementos no mapa natal. Não se


pode desenvolver uma fármula para extrair o tipo psico lágico de um indivíduo a partir
61

do horáscopo; primeiro deve-se sentir o individuo, e então aplicar esse conhecimento


ao mapa. De outra forma, a tipologia de Jung se torna estrutura inanimada, e não
uma realidade viva que serviu de base ao seu trabalho. É preciso muita intuição para
ver que partes do mapa foram "acentuadas" pelo desenvolvimento na consciencia.

As pessoas, às vezes, também se supercompensam quando percebem uma


carência em si mesmas, e essa tendência é peculiar a natureza humana mas não
refletida no próprio mapa.

Por essa razao, um horáscopo vindo pelo correio, baseado nos dados de
nascimento mas sem o conhecimento direto do individuo, tem a proba bilidade de ser
um triste fracasso do ponto de vista da investigação psico logica. A astrologia usada
dessa forma é um interessante mapa caracterolo gico, mas de pouca valia como
irmtrumento para ajudar o indivíduo em sua jornada para o desenvolvimento pessoal.
Mas, uma vez que haja alguma noção da orientação do individuo, o que deve vir do
contato pessoal e não do mapa, é fácil ver como os planetas nos elementos
"inconscientes" pro vavelmente vão funcionar e o que pode ser feito para ajudar a
integra-los.

Sem duvida, o predominio de um determinado elemento sugere que essa j l

função da consciência precisa ser desenvolvida, mas ela pode não se prestar a
tal desenvolvimento sem um esforço consciente, principalmente se for uma função
"indiferenciada".

Existe outro problema na "tipificação" do mapa, fenomeno que June Singer, em


The BoundÁries of the Soul, c4ama o tipo virado. Esse é o indivíduo que, por
temperamento natural, deveria ter desenvolvido uma determinada função, mas que,
por causa da influência de um genitor particularmente poderoso, ou das pressões
sociais ou educacionais, foi forçado a violar sua inclinação e a desenvolver uma outra
função em seu lugar, freqiientemente a "inferior", para sobreviver psicologicamente.

Isto sempre acarreta grandes prejuizos e um forte sentimento de inferio ridade,


pois se a pessoa se identifica com o que ela faz de pior, é inevitavel pagar um preço.
O processo de romper as camadas que mascaram a iden tidade verdadeira não é ficil,
e muitas vezes o indivíduo não é capaz de realizá-lo sozinho. Aqui, o mapa fornece
62

pistas significativas, pois, quando Há predominância de um dado elemento, não


desafiado por uma enfase simultanea do elemento oposto e, entretanto, o indivíduo
não está usando a primeira, Há uma forte sugestão de que algo interferiu na linha
natural de desenvolvimento. Por exemplo: um indivíduo cujo mapa mostra uma
inclinação para o elemento agua e nenhuma enfase em ar, mas que está alienado de
sua natureza sentimental e acHá dificil lidar com suas emoções, pode ser suspeito de
ser um "tipo virado".

Algumas vezes o "tipo virado" é produzido por algo mais complexo que um
genitor insensivel. Em nossa sociedade, tendemos a presumir – possivelmente não
sem razões historicas e biolágicas, mas talvez com expectativas injustificadamente
rigidas – que o mundo do pensamento e da sensação pertence aos homens, e o
mundo do sentimento e da intui ção as mulheres. Isso pode ser verdadeiro em geral,
num nivel arquetipico; pode ter sido verdadeiro na maior parte da nossa historia. Mas
é possivel que a divisão esteja menos acentuada do que antes e pode não se aplicar
ao individuo, que sempre contém todas as potencialidades em sua natu reza. Existem
razões para supor que quanto mais dominados somos por nossa herança biolágica e
historica, menos somos capazes de usar o es quema individual do mapa de
nascimento; e também existem razões para supor que parte do que o Zeitgeist
contemporaneo envolve é a capacidade de equilibrar essa herança com uma
crescente percepção do potencial de desenvolvimento individual. Há tantos homens
nascidos com tendência a função do sentimento quanto mulheres, e tantas mulheres
com incli nação para a função do pensamento quanto homens. Embora antiga mente
possa ter sido dificil para o indivíduo transcender os fatores circuns

RC

tânciais e lançar mão dessa inclinação para a sua própria expansão, tal
transcendência parece ser cada vez mais possivel na medida em que iagres samos
numa nova era do desenvolvimento da consciência humana.

O apelo do passado cria sua prápria dor. O homem orientado pelo sentimento,
por exemplo, com preponderância de igua no mapa natal, ou o intuitivo, com
preponderância de fogo, em geral aprende bem cedo na vida que os outros vão
63

considera-lo fraco, afeminado, covarde, irracional ou um homossexual latente se der


livre curso i sua predisposição natural.

Esses homens, as vezes, aprendem a ser muito diferentes de seu tempe


ramento natural, para se portar como um homem "deve". O próprio pensamento
negativo do tipo sentimental vai ajuda-lo a chegar a essa con clusão, ja que ele é
terrivelmente dado a absorver os valores sociais em bloco, sem refietir sobre eles e
sem questionar a aplicabilidade a sua situa ção particular. E o sentimento de
inadequação do tipo intuitivo a respeito de sua "capacidade" freqiientemente vai leva-
lo a questionar o valor de suas visões. Ocorre, então, uma enorme divisão entre a
identidade real e a mascara e uma carência muito desagradavel que a pessoa sente
que precisa supercompensar.

Isto também se aplica i mulher yensativa e i sensorial, muitas vezes descritas


como "brutais", frias, ambiciosas, sem coração, sem feminilidade, diffceis e
neuráticas, se seguem suas inclinagões rio mundo das idéias e da realização
mundana. O sentimento inferior conspira para ajudar a mulher de pensamento em
sua faJta de auto-aceitação, porque ela se sente inadequada nos relacionamentos; e
a intuição inferior muitas vezes vai convencer a mulher com a sensação de que ela é
apagada, cansativa, sem imaginação e capacitada apenas a servir os que possuem
maiores dons. Essas mulheres podem se tornar amazonas encouraçadas, ou tentar
desenvolver a função "inferior" desempenhando o papel da mae e esposa arrogante
e ambiciosa, usando uma mascara de sentimento e efusiva demonstração emocional
sobre a determinação fria e dura de fazer alguma coisa de seus filhos, de seu marido
e de qualquer pessoa que venha a ser sua propriedade. De alguma forma, é preciso
encontrar o delicado equilÃ)rio entre o sexo fisico, com sua concomitante inclinação
psicoIo gica, e a disposição intrinseca sugerida pelo horoscopo no nascimento.

Esta não é uma tarefa pequena, principalmente se esses fatores estiverem em


oposição. Entretanto, essas oposições, se tratadas gentilmente, com compreensão e
sem vioIentar qualquer um dos polos, podem levar a um indivíduo verdadeiramente
equilibrado e enriquecido.

O mundo esta cheio de "tipos virados", que causam danos a si e aos outros sem
64

perceber que o verdadeiro ser esta aprisionado e sofrendo

sob a impenetravel armadura das expectativas dos outros. O conselho de Jung


é "seja o que voce sempre foi", e este é o verdadeiro caminho para a integração
interior e para o relacionamento com os outros. Uma das maiores vantagens do
mapa, com seus padrões entremesclados, principal mente se tomado em conjunto
com a tipologia, é que pode proporcionar um quadro mais rico e mais abrangente
daquilo que a pessoa sempre foi – que é também o que ela potencialmente seria.

nn

4 A Belae a Fera 8 vão tentar endireitar a sombra, se o corpo que faz a sombra
é torto.

– Stefano Guazzo 1

Alguma compreensão da natureza dos tipos psicológicos nos facilita l a


abordagem do ambiguo dominio do lado destrutivo da natureza humana, que Jung
chama sombra e na astrologia esta associado a Saturno, o Habi tante do Umbral.

"Ve bastante quem de fato ve sua escuridao", t diz Lord Herbert de Cherbury,
mas embora esta pareça uma tarefa I relativamente simples, a maioria de nós faz de
tudo para evita-la. Diversas pessoas, muito compreensivelmente, desejam deixar em
paz os caes ador mecidos, e contanto que as coisas não se tornem muito
insuportáveis, existe uma certa sabedoria nessa atitude – até um certo ponto. E
muito mais agradavel achar que se é um sujeito bom e decente – talvez com alguns
defeitos, mas hasicamente corrcto –, é muito mais facil, também, supor que o
governo, os negms, os hippies, os comunistas ou os imigrantes criaram iodo o mal no
mundo. Para algumas pessoas, é mais ficil supor que o Demonio criou todo o mal no
rnundo, tirando wsim dessa questão, ao rnesmo tempo, a responsabilidade humana.

Infelizmente, as conseqiiências desse tipo de apatia e cegueira podem, embora


não atingindo o indivíduo durante muitos anos e as vezes mesmo durante a vida
toda, desembocar na formação de um problema social importante e mesmo
devastador. Todos estamos bem familiarizados com esse tipo de atitude – se não
acontece na porta da minha casa, não há hipotese de ser minha responsabilidade; e
65

é só quando sua própria escuridão o alcança e o submerge que o indivíduo começa a


se questionar.

Edward Whitmont descreve o fenomeno da "proje@o da sombra", como é


conhecido na psicologia analitica, de forma muito adequada, em seu livro The
Symbolic Quest: Esse tipo de situação é tão clássico que quase se poderia fazer um
jogo de salão com ele – se se quisesse procurar a ruina social.

Peça a alguém para dar uma descrição do tipo de personaiidade com quem
acHá mais impossivel se entender, e ele vai fazer uma descrição de suas próprias
caracteristicas reprimidas – uma autodescrição totalmente inconsciente e quo,
portanto, sempre e em toda parte o tortura, a medida que recebe a sua influência
vinda da outra pessoa. Infelizmente, embora esse lado sombrio da personalicade
costume ser "totalmente" inconsciente no individuo, não é tão oculto para os outros,
e quanto mais inconsciente e reprimido for, tanto mais obvio sera para os outros.
Muitas vezes ouvimos um homem declarar: "Sirnplesmente detesto as pessoas
despoticas; elas tornam a vida dos outros miserivel" e, então, em outra ocasião, sua
esposa ou um amigo diz: "Bom, ele ás vezes realmente se comporta como um tirano,
mas sempre que tento lhe dizer isso, ele fica furioso e não Há jeito de eu me fazer
entender." Pode ser alguém autoritario, pregu!çoso, estupido, egoista,
preconceituoso, de mau genio, dominador ou insensivel que nos deixa loucos, mas a
cegueira quanto ao próprio lado sombrio – e a projeção desse lado sobre os outros –
é incrivelrnente comum, e poucos de nós estão isentos dessa expressão.

O que geralmente não fazemos, com ocasianais exceções, é entender o que


significa.

É importante compreender um pouco das implicações da sombra antes de


examinarmos o mapa astrológico para ver que indicações podem ser tiradas dele. O
ideal, talvez, fosse não precisarmos de coisas como horoscopos para nos ajudar a
ver nossas sombras: mas a sombra, como seu l. 17ie Symbolic Quest, Edward
Whitmont, Nova Iorque, GZ. Putnams Sons, 1969.

OA
66

nome implica, é quase sempre inconsciente, e não é uma questão de vontade


ou perspicácia intelectual, nem de boas intenções, quando se tenta lidar com esse
aspecto extremamente desagradavel da personalidade.

Naturalmente, o caminho para o inferno esta cheio de boas intenções e, com


certeza, também de perspicacia intelectual.

A sombra é um probiema moral que desafia toda a personalidade <go, pois


ninguém pode se tornar consciente da sombra sem considerável esforço moral.
Tornar-se consciente dela implica admitir os aspectos escuros da personalidade
como presentes e reais. Esse ato é a condição essencial para quaIquer espécie de
autoconhecimento, e portanto, como regra, encontra consideravel resistencia .

Admitir a própria escuridão parece ser um pré-requisito não apenas para o


autoconhecimento, mas também para o conhecimento e a aceitação dos outros.
Como tudo mais no inconsciente, a sornbra, se não for trazida para a luz, vai ser
projetada. O problema da sombra não é apenas significa tivo no próprio
desenvolvimento de um indivíduo e em sua capacidade de estabelecer
relacionamentos pessoais; também é extremamente impor l tante num sentido
coletivo. Se fossemos mais conhecedores dessa nossa escuridao, seria totalmente
possivel que os fenomenos coletivos que mani f festam a projeção da sombra de
um grupo – tais como perseguições, inqui t sicões, expurgos, intolerância e
preconceito racial. e outros fenomenos que envolvem o sacrificio de um bode
expiatorio nunca ocorressem. Mesmo entre crianças, encontramos esta manifestação
de repulsindade: em qual quer grupo, inevitaveImente há uma criança que, por razões
que podem ser inerentes a sua psicologia mas raramente por sua culpa, atrai a
projeção da )ombra do grupo e se torna o bode expiatário, o proscrito, e é
escarnecido e ridicularizado. Ele recebe a descarga dessas atitudes selvagens e
brutais, que, se não forem censuradas na infância, vão acabar expressando seu lado
menos destrutivo através da inioIerância, podcndo dar sous mais horriveis frutos em
exemplos de medonha bestialidade como Auschwitz e Belsen.

Temos uma noção misericordiosamente vaga do alcance de nossa crueldade


potencial em reiação aos outros, mesmo nas menores coisas; e embora muitas
67

pessoas achem melhor esquecer Auschwitz e correlatos porque "outra pessoa" foi
responsivel (com certeza não pessoas decentes como j 2. Aion, C. G. Jung. Londres,
Routledge K Kegan Pzul, 1959.

voce e eu), podemos ver um palido reflexo desse mecanismo na velhissima


pratica da segregação social.

A sombra é formada por todas as qualidades inerentes a consciência potencial


do indivíduo mas que, devido a sua aparente escuridão ou destru tividade, são
excluidas da consciência durante o desenvolvimento. O indi viduo fica, assim,
confortavelmente inconsciente de que essas qualidades lhe pertencem. Já vimos
como cada tipo psicológico tem seu lado "inferior"; e os componentes da função
iMerior da consciência matizam forte mente a natureza da sombra. A eles se
acrcscentam outros fatores que o indivíduo acHá intoleraveis, como componentes de
sua própria configu rar,ao, e que são reprimidos pela influência dos pais ou da
formação reli giosa. A sombra geralmente aparece para a consciencia, em primeiro
lugar, como uma figura humana, uma imagem muito comumente identificavel nos
sonhos em que o sonhador é caçado ou atacado por um inimigo misterioso e maligno
de seu próprio sexo.

Normalmente, a projeção da sombra cai sobre alguém do mesmo sexo da


pessoa, e por ai é possivel obter uma grande compreensão, exami þ nando
honestamente as qualidades que achamos mais detestiveis nas outras pessoas do
nosso sexo. Basta ouvir uma mulher dizer: "Detesto o tipo da dona-de-casa instintiva
e chata, que só pensa em fraldas e recei þ tas, e não tem a menor independência
mental," para termos uma clara idéia do seu hdo sombrio; e Há o seu oposto polar,
cuja fala pode ser: "Mas que mulher insuportavel, só se preocupa consigo e com
seus prazeres! É tão antifeminina, não sabe o que quer dizer sacrificio!" Se as
mulheres, nesses dois extremos, pudessem ver quem estão na realidade
descrevendo com essas observações impensadas, provavelmente ficariam
embaraçadis simas. São cliches, mas incrivelmente predominantes. Existe o homem
que abomiaa os homens fracos, delicados, afeminados e domiriados pelas esposas;
e existe seu oposto, aqueie que condena os sujeitos brutais, agres sivos e selvagens
que adaram a glária da guerra e não tem nada para fazer além de se encontrar nos
68

bares a noite para discutir os méritos do corpo de suas secretirias. O pacifista contém
dentro de si um valentão, e o herói, um covarde; como Mick Jagger canta em
Sympathy for the Devil: Todo "tira" é um criminoso E todo pecador é um santo. Como
o antigo deus romano Jano, todos nos temos duas faces, e é prcciso que o indivíduo
reconheça isso para poder tar voz ativa na questão da lado a ser expresso aos seus
semelhantes: o luminoso ou o escuro. A l

Algumas vezes, a projeção da sombra cai sobre uma instituição ou uma


religião, em vez de cair sobre um individuo. Esse fenámeno é facil mente observável
em todos os tipos de odios ideológicos fanáticos. A sombra e o ego fazem um todo, e
a totalidade, como ja vimos, não é sim ples ou necessar.iamente perfeita; é,
entretanto, completa.

Todas as nossas opiniões que contem uma alta carga emocional são suspeitas.
Quando nos encontramos na posição de vitimas de uma reação emocional
desproporcionada em relação a situa o, ou quando temos tal reação em relação a
alguma situacão, que realmente não é da nossa conta mas diz respeito
exclusivamente a outra pessoa, devemos suspeiiar que estamos reagindo a alguma
coisa nossa que não identiGcamos como nossa...

Ja vimos como cada tipo, e conseqiientemente cada. elemento astro lógico, porta
uma fraqueza da fuaçan oposta. Quando vemos essas quali dades como mas, as
julgamos e as empurramos para o inconsciente, e elas se deterioram e se tornam
exatamente tão más quanto acreditamos que sejam. É o nosso ponto de vista em
relação ao inconsciente que causa sua aparente inimizade. O inconsciente sá tem
uma postura inimiga ou desapiedada em relação ao consciente quando o ultimo
adota uma atitude falsa ou pretensiosa . E uma das atitudes mais pretensiosas de
que os seres humanos são capazes é a crença de que a culpa é sempre de outra
pessoa.

As crianças conhecem instintivamente a autonomia da sombra, e muitos


companheiros imaginarios são personificações dela. Essas criaturas da "mera"
fantasia muitas vezes são responsabilizadas pelos aspectos mais bagunceiros, mais
inaceitáveis do comportamento da criança; foi o compa nheiro que quebrou todos os
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pratos, rabiscou as paredes, puxou o rabo do gato, ou roubou as abotoaduras do


papai, mas é claro que não foi a criança. Quando é acusada de mentira, ela fica
defensiva e contrariada; entre tanto, a sua maneira, esta dizendo a verdade e certa
em afirmar que essa fi gura é "outra pessoa", porque esta totalmente fora de seu
controle cons 3 The land the iVot I, M. Esther Harding. Nova Jersey, Princeton-
BoUingen, 1965.

4. Two Essays in Analytical Psychology, C. G. Jung. Nova Jersey, Princeton-Bol


lingen, 1953.

ciente. Esse tipo de duplo destrutivo freqiientemente aparece quando a criança


é forçada a ser "boazinha" duiante a maior parte do tempo. Os adultos reagem de
forma semelhante quando são acusados de algum comportamento que é uma
manifestação do seu lado escuro, pois a som bra, quando confrontada, é um ponto
dolorido proporcional a própria falta de compreensão em relação a ela. Dizer a
alguém que ele esta expres sando suas mais detestadas qualidades inconscientes é
ameaçar toda a sua auto-imagem, o que geralmente provoca extrema raiva e uma
explosão de defesa furiosa, largamente desproporcionais a observação – que pode
ser verdadeira e bem-intencionada. Se fossemos tão hanestos quanto as crian ças,
diriamos, muito aprópriadamente: "Não, isso não era eu, era minha sombra de novo."
Melhor ainda, poderiamos dizer: "O que sera que ela quer " Como todos os
conteudos inconscientes, a sombra busca a cons ciencia, e talvez fosse mais util
parar de julgar tão severamente esse aspecto da psique, parar de tentar combate-lo
nos outros, e encara-lo objetiva mente para descobrir o que tem a oferecer. Para
muitas pessoas, a sombra é um segredo vergonhoso que precisa ser escondido a
todo custo, e temos a extraoráinaria noção de que não devemos mostrar aos outros
nossa huma nidade comum, que afinal de contas é meio animal, por medo da conde
nar,ão moral. Em consequencia, tentamos mostrar aos outros somente perfeição, e a
tensão desse esforço é tanto uma carga intoleravel como garantia de que nossas
esperanças vão sempre se frustrar.

A sombra é um arquétipo, isto é, uma experiência interna comum a toda a


humanidade, em todos os séculos e em todas as civilizações.
70

A arte e os contos de fadas nos mostram aqui sua sabedoria, faiando-nos do


heroi servido por um companheiro esquisito e muitas vezes primitivo, feio ou
ligeiramente mau, ás vezes um animal, que cria infindáveis proble mas por causa de
sua bestialidade ou estupidez. ao mesmo tempo, essa figura é sempre quem, através
de sua sabedoria instintiva e natural, salva o heroi is voltas com algum problema para
cuja solução sua própria cora gem ou nobreza são inuteis. Um exempo classico é o
de Dom Quixote e Sancho Pança. Em outras ocasiões, a figura da sombra é um
inimigo, uma feiticeira ou um guerreiro selvagem que tenta destruir o heroi.
Entretanto, sempre, curiosamente, a maldade intencional da sombra torna possivel
ao heroi atingir o seu objetivo, mesmo que seja, as vezes, dc forma tortuosa.

Os contos de fadas nos mostram um fato importantissimo sobre a sombra:


secretamente, por tris do mau jeito e da escuridao, ela oculta mvitas qualidades que,
longc de serem "mas", em forma embrionaria sio necessarias para que o ego se
torne um todo integrado. A sombra não pode ser remo vida tentando-se tornar o
comportamento consciente "melhor" e, se não ni

integrarmos suas qualidades, elas padem se vingar formando seu alter ego ou
Dõppelgãnger – a sinistra figura que freqiienta as obras de Poe, Dostoiévski e R. L.
Stevenson. Não se pode mudar a própria sombra, quanto mais dissipa-la ou
exorcizá-la, através da critica ou da condenação; o que é necessário é uma mudança
na atitude consciente. Quanto mais equilibrada uma pessoa, deixando que alguma
inferioridade se expresse em sua personalidade, tanto mais equilibrada é sua
sombra; porém, quanto mais duramente intransigente ela é, tanto mais nogra e
destrutiva a sombra.

Como a sambra é uma experiência arquetípica, podemos supor que esteja


representada na hierarquia pIanetaria, e parece haver uma intima ligação entre ela e
o simbolo do planeta Saturno. Na mitologia, Saturno tem uma fama particularmente
desagradivel, tendo castrado seu pai Urano para tomar o trono dos deuses e
devorado scus filhos para garantir o seu poder. Na astrologia tradicional, Saturno
também tem uma fama um pouco desagradavel, sendo considerado um plsneta
"maléfico", isto é, portador de aflicão e má sorte. Provavelmente, a astrologia
tradicional entendeu menos esse misterioso planeta do que a alquimia medieval, que
71

considerava Saturno o material basico do qual, depois da transmutação, poderia ser


extraido o ouro espiritual; e aqui temos um reflexo do que nos dizem a arte e os
contos de fadas, ou seja, no lado escuro da natu reza humana jaz a semente da
verdadeira integração interior. Também podemos ver ecos desse tema na figura de
Lucifer, Sata ou Mefistofeles.

Aparentemente, ele é o inimigo de Deus, reinando sobre as legiões do inferno.


Secretamente, porém, e a despeito de si mesmo, ele d a mão direita de Deus,
levando avante o plano divino quando da a humanidade uma escolHá por meio da
qual ela pode chegar a compreensão do problema do bem e do mal e dos opostos
neles contidos. É Lucifer, Sata ou Mefistáfeles que permite ao indivíduo ser livre, pois
ele aprende através da dor de suas escolhas. Como escreve Goethe no Fausto: jf

Diz finalmente – quem és tu? Sirvo aquele Poder Que sernpre deseja o mal
Mas sempre faz o bem. A posição de Saturno no mapa de nascimento sugere uma
esfera da vida do indivíduo na qual ele foi, de certa forma, atrofiado, ou teve AP

seu crescimento interrompido, na qual ele pode se sentir inadequado,


supersensivel ou desajeitado, ou na qual tende a se supercompensar ten tando exibir
uma face corajosa e algumas vezes insensivel. Nenhum ponto do mapa pode ser
interpretado literalmente, e Saturno não faz exceção; mas precisamos também
lembrar que o lado inconsciente da personalidade é parcialmente formado pelas
qualidades que nos pertencem mas que não podemos, ou não ousamos expressar.
Podemos, assim, deduzir, pela colocação de Saturno, a érea em que a sombra vai
se expressar mais rapi damente, na qual a pessoa talvez seja mais defensiva e critica
em relação aos outros, e onde é mais possivel que ela atraia a hostilidade e a
oposição do meio por causa de sua própria atitude inconsciente de inferioridade.

A posição de Saturno suge:e em que area é mais provavel z pessoa ser


mesquinha, pequena, estreita; e desde que as pessoas estão prontas a culpar o
mundo por seus infortunios, a posição do planeta no nascimento certa mente sugere
de onde o infortunio virá. Entretanto, se a pessoa estiver preparada para trabalhar
com a sombra e examinar o que existe em si mesma que esta servindo para atrair
esse infortunio, poderá descobrir que – tal como o companheiro esquisito dos contos
72

de fadas – Saturno se torna uma fonte de força e um faroI iluminando o caminho para
o alvo.

Saturno tende a ressaltar as piores qualidades do signo em que esta colocado


no nascimento, porque intensifica medos associados com os atributos especificos
daquele signo. Isso acarreta simuitaneamente uma sensação de inadequação, e em
geral a reação a isto é um de dois extremos.

Ou o indivíduo se retira, intimidado por sua aparente desvantagem, e se


atormenta por causa dela, ou procura supercompensa-la exagerando os atributos do
signo no qual Saturno esta colocado. As vezes, ocorrem as duas reações no mesmo
individuo, e as vezes, ele não tem consciência disso. Por exemplo: um indivíduo com
Saturno em Áries pode achar que seu maior medo é ser o segundo, ou perder; ele
vai achar dificil expressar o natur J amor ariano ao desafio e a confiança em sua
capacidade de fazer frente a vida e conquista-la. Pode tornar-se passivo, deixando-
se dominar facilmente, e nesse caso vai abrigar ressentimento secreto e raiva, o que
vem a tona como uma petulante critica aos que conseguem expressar mais
honestamente os impulsos. Ou pode tornar-se um valentão, e supera firmar-se
porque esta muito inseguro a respeito de sua coragem. Correndo o risco de uma
supersmplificação, diriamos que, em Touro, Saturno ressaltz o medo Qe perder o
que se possui, ou de fracassar materialmente, ou o medo da natureza instintiva e de
sua integridade; em Gêmeos, ressalta o medo de assumir compromissos, ou de
perder a liberdade de investigar o mundo das idéias; em Câncer, ressalta o medo do
isolamento emocional OA

e da rejeição ; em Leio, ressalta o medo de ser ridiculo, passar desperce bido e


não ser amado; em Virgem, fomenta o medo do caos e do desconhe cido; em Libra,
estimula o medo da escuridão e do poder destrutivo do intenso envolvimento
emocional; em Escorpião, acentua o medo da domi nação ou controle por parte dos
outros através da vulnerabiIidade emocio nal; em Sagitario, aumenta o medo da falta
de sentido e da escravidão as rotinas fixas; em Capricornio, exacerba o medo do
eontrole pelo ambiente material ou pela autoridade dos outros; em Aquário, enfatiza
o medo de ser diferente e de ser excIuido do grupo; e em Peixes, intensifica o medo
da dissociação de um todo emocional maior e da solidão emocional.
73

É muito comum uma pessoa detestar profundamente as pessoas nascidas sob o


signo no qual Saturno esta coIocado em seu nascimento; é igualmente comum a
pessoa acha-las atraentes e fascinantes. Provavel mente, a segunda é a resposta
mais saudavel, pois pode promover um relacionamento que fomenta o crescimento
de forma positiva. A primeira também vai fomentar o crescimento, mas de forma
muito mais dolorosa.

Saturno é um planeta freqiientemente presente na comparação dos mapas de


pessoas envoIvidas em relacionamentos intimos. Na verdade, pode-se dizer que o
relacionamento que não contém pelo menos um forte contato de Saturno seria
agradivel, mas não afetaria a vida emocional mais pro funda dos indivíduos
envolvidos.

Pode-se fazcr um exercicio muito util examinando a posição de Saturno no


horoscopo de nascimento e em seguida os mapas de parceiros, parentes ou socios
para ver se qualquer um de seus planetas cai num raio de oito a dez graus do seu
próprio Saturno, no mesmo signo. Também são significativos os planetas que estão
em oposição direta ao seu próprio Saturno, a uma distãncia dc cento e oitenta graus.
O ingulo de noventa graus é igualmente significativo. Esses tres aspectos, ou
relações anydares I – respectivamente chamados conjunção, oposicão e
quadmtum, na astro j logia – são os mais comuns na comparação de mapas, e
inevitavelmente ocorrem em relacionamentos que de alguma maneira forçam o
indivíduo cujo Saturno está envoIvido no exame de si mesmo e de suas respostas,
para poder descobrir algo a respeito do funcionamento de sua sombra. Em qualquer
reIacionamento envolvendo esses aspectos saturninos entre mapas, é possivel
prever um bocado de projeção da sombra. O importante é que o indivíduo reconheça
que ele é a fonte do problema, através de suas reações defensivas ou supercriticas,
em vez de culpar o parceiro pelos desacordos que possam surgir. Tamhém é preciso
aprender a vivenciar o significado do signo do Saturno, mesmo se for esquisito ou
embaraçoso, em vez de fugir e em seg«ida ficar ressentido quando ele é expresso
pelos outros. Ai, final i

mente, a sambra pode ser admitida e ter espaço para respirar, o que é um
excelente remédio para muitas de suas qualidades menos atraentes.
74

As ambigiiidades e paradoxos de Saturno merecem um trabalho separado, o


que na realidade foi feito, e realmente considerar apenas o signo no qual o planeta
está colocado é simplificar grosseiramente.

A Casa na qual está colocado também precisa ser considerada, as relações


angulares que tem com os outros planetas no mapa de nascimento, e o mapa de
nascimento como um todo, com sua inevitável inclinação para uma determinada
direção de desenvolvimento consciente. Porém, inter pretando-se esse planeta com
um pouco de atenção, pode-se ter uma boa idéia dos maiores obstaculos da vida da
pessoa, porque Saturno é, de fato, o materiai basico a partir do qual – atraindo as
experiências que levam a uma maior compreensão através da luta – a psique tenta
atingir uma maior integragão.

O mapa a seguir ilustra, com bastante nitidez, o funcionamento autonomo da


sombra, assim como as formas pelas quais o indivíduo pode se tornar consciente de
seu problema e tirar dele algum significado para o seu próprio crescimento e a
realização de seus mais caros ideais.

Paul é um tipo intuitivo extrovertido, cuja visão do futuro, como a de tantos


intuitivos, levouw a engajar-se numa empresa onde seria possivel exterioriza-la: ele
queria ajudar as pessoas que julgava pouco privilegiadas e que sofriam nas mãos de
uma sociedade que, segundo ele, sufocava a criatividade do individuo. EIe fundou
uma escola informal em Nova Iorque, cidade onde nasceu, destinada a ajudar a
desenvolver os dotes criativos dos grupos minoritirios mais pobres. As taxas dessa
escola eram nominais; Paul usava suas alentadas economias, pagando do próprio
bolso o salario dos auxiliares. Havia aulas de ingles falhdo e escrito; espaço para
tomar conta de crianças enquanto os pais freqGentavam as aulas; aulas de pintura,
escultura, modeiagem, tecelagem, costura e outras expressões criativas que
ajudariam essas pessoas a levar um pouco de beleza e luz a sua triste lata pela
sobrevivencia, que no mais das vezes constituia sua vida.

A idéia par trm disso refletia o anseio caracteristicamente intuitivo de Paul de


preencher sua função oposta: o retorno a valorização do artesanato individuai numa
sociedade que reduziu o indivíduo a um componente anonimo e sem rosto de uma
75

cidade sem nenhum apreço pela dignidade de seus esforços criativos.

Os colegas de Paul, assim como as pessoas que vieram a sua escola em busca
do autodesenvolvimento, logo começaram a confiar nele, que 5 Saturno, Liz Greene,
Editora Pensamento, 1986.

98

não tinha qualquer arrogância nem demonstrava a distáncia psiquica tão


frequente entre o idealista bem-intencionado e as pessoas que ele tenta ajudar. A
bem desenvolvida função de sentimento de Paul o ajudava a ver a necessidade
desse contato pessoal, principalmente porque muitas das pessoas que vinham para
os cursos tinham um histárico de violência e de odio em relação aos membros do
extrato social representado por Paul.

O Sol em Sagitário, a Lua e Plutão juntos em Leao, dois signos de fogo, refletem
o lado intuitivo predominante do temperamento de Paul; e o ascendente em Câncer,
um signo de agua, parece simbolizar a sensibilidade de sentimento e resposta
pessoal que caracteriza o seu trato V com as pessoas. A colocação do Sol na
sétima Casa, a dos relacionamentos, sugere que a auto-realização de Paul precisa
vir da sua função de catalisador para os outros, reunindo os opostos entre os quais
ele próprio é a ponte.

Existe uma enorme .quantidade de energia e criatividade nesse mapa, e Urano,


planeta que simboliza a necessidade de liberdade e percepção de um mundo mais
amplo de idéias, está colocado diretamente sobre o ascen dente, impIicando a atitude
marcadamente inconvencionai e visionaria em relação a vida, uma das
caracteristicas predominantes de Paul. O agru pamento de Mercurio, Jupiter e Marte
em Capricárnio, signo de terra, indica o potencial de uma extraordinaria
autodisciplina, a capacidade de trabalhar duro e por muito tempo para atingir um
objetivo, e o senso comum pratico necessario para fundamentar a visão.
Potencialmente, é um mapa dinamico e criativo. O problema esta na sua integração,
pois fogo e terra são opostos psicológicos mas aqui estão com peso equivalente, e
sem duvida vao, mais cedo ou mais tarde, provocar uma batalHá na psique.
76

O historico de Paul é extremamente convencional. Ele veio de uma familia


abastada c freqiientou as escolas certas; esperava-se que ele se acomodasse. Isto é
esperar muito de um intuitivo de fogo com Urano no asccndente. O primeiro
obstaculo residiu na falta de compreensão do seu temperamento por parte de seus
pais, mas como tantos outros pais da sua geração, os de Paul não tinham a minima
idéia de que um filho possuisse uma disposição própria e seguisse um caminho seu,
individual, na vida.

Para eles, o filho era um receptaculo vazio que seria preenchido com os seus
valores, cresceria e viveria o lado não-vivido de suas próprias psiques.

Da mesma forma que outros com o seu temperamento, Paul percebia muita
coisa errada no ambiente em que se encontrava. O casamento dos pais era um
maravilhoso exemplo de hipocrisia bem comportada, e lhe parecia haver estagnação,
auto-ilusão e resistência a mudança em demasia – e essas coisas são um anatema
para o intuitivo.

O agrupamento de planetas de terra no mapa de Paul equilibra a visão auto-


expressiva do fogo, mas eles não estão operando como quali dades conscientemente
disponiveis em sua natureza. Talvez isto esteja ligado ao fato de Saturno, que rege
Capricornio e, portanto, esses planetas, também estar colocado num signo de terra,
Virgem, e posicionado na quarta Casa – que se relaciona a vida doméstica na
infância e a ligação com o pai.

As projeções da sombra geralmente se expressam na esfera da vida


simbolizada pelo signo e Casa em que Saturno esta colo ado no nasci mento. É
nessa esfera da vida que o inimigo é coisificado e exteriorizado.

Assim, a função de sensação inferior de Paul, matizando fortemente o lado


escuro de sua natureza, era naturalmente projetada sobre seu pai.

A sombra de Paul se expressava como um poderoso materialismo incons ciente,


rigido convencionalismo, supersensibilidade as opiniões das pessoas detentoras de
autoridade, sensualidade rude e propensão a violência fisica.

Paul negava a maioria dessas caracteristicas; a unica que admitia era a


sensualidade, porque se harmonizava com sua auto-imagem. Essas quali dades
77

menos agradáveis pareciam, naturalmente, pertencer a seu pai, que aos olhos dele
era como Saturno: autoritario, convencional, avarento e preocupado só com dinheiro
e valores materiais. A projeção ia além do pai e encampava a sociedade, que
também lhe parecia Saturno – e ele odiava ambos. Sem duvida, o pai proporcionava
um gancho para pendurar essa projeção, mas não era melhor nem pior que muitos
outros homens de sua geração, e tinha muitas qualidades extraordinarias.

Através do pai e da sociedade que o pai aprovava, Saturno em Virgem também


simbolizava, para Paul, uma sufocante inibição e adesão a normas sem sentido,
coisas abomináveis para o seu tipico amor sagita riano pela liberdade pessoal. O
mundo parecia cheio de uma ordem exces siva, ameaçando petrificar a vida fora dele.
Nunca lhe ocorreu que o lado positivo dessas aborrecidas qualidades da terra fosse
a sabedoria pratica necessaria para por em pratica seus sonhos.

Como muitos outros intuitivos, Paul se considerava sua própria lei, mas não
levou em conta o lado escuro de sua natureza. Conscientemente, estava cheio de
idéias brilhantes e realmente preocupado com o desenvol vimento de seus
semelhantes. Inconscientemente, nas raizes de sua psique, o lado escuro
simbolizado por Saturno funcionava usando suas habilidades naturais com o
proposito de controlar os outros; isto o afastou primeiro de si mesmo e depois de
seus colegas, através de explosões de comporta mento tiranico, genio violento,
agressões fisicas e certa ambigiiidade nós assuntos de dinheiro – padrões de
conduta que ele freqiientemente atri

in

buia as figuras de autoridade como a policia, o governo e principalmente o seu


pai. Essas explosões, que sempre racionalizava da forma clissica – "Alguma coisa de
repente tomouconta de mim!" –, começaram, natural mente, a afastar as pessoas de
cuja ajuda ele mais precisava. A organizacão comecou a afundar, porque ele adquiriu
a fama de ser um pequeno Hitler que não vivia os ideais que pregava tão
convincentemente aos outros.

Paul se sentiu muito ferido por essas acusações, que acreditava totalmente
injustificadas.
78

A ausencia, no mapa natal, de planetas pessoais em ar contribuia para exagerar


as dificuldades de Paul. Isto sugere que lhe faltava uma avaliação e analise objetivas
e impessoais dos seus motivos e do seu com portamento, o que poderia ter-lhe
permitido perceber o que estava fa zendo. Como instrumento da consciencia, a
função de pensamento de Paul era tão pouco confiavel como sua sensação.

Seria injusto acusar Paul de hipocrisia premeditada. Ele não podia mais
controlar essa coisa dentro de si, assim como uma criança não con segue controlar
seu lado destrutivo; ele fez o possivel para não enxergá-la, cometendo assim o
mesmo pecado que a maioria de nos. Mas não se pode forçar a sombra a
permanecer no inconsciente sem sofrer as conseqQencias.

Reprimindo quase completamente a função da sensação, negando a vali dade


dos ralores da sensação, ele condenou a sombra a viver no subter raneo, e como
encarava qualquer apreço pelas coisas materiais como coisa ma, a sombra começou
a se comportar de uma forma má. Seu procedi mento nos relacionamentos homem –
mulher era rude e insatisfatorio.

Mantinha um verdadeiro harém e se gabava publicamente de suas conquistas,


procurando assim desesperadamente compensar a vaga sensação de inadequação
sexual que atormenta tantos intuitivos. Entretanto, nunca consemiu, de fato, ter
confiança na sua condição masculina, nem manter um relacionamento valido por
mais de alguns meses. Quando se interessou em fazer examinar seu mapa natal,
estava perturbado com uma estranha série de sonhos altamente caracteristicos de
uma sombra selvagem: era perseguido e torturado por figuras escuras vestidas como
policiais brutais ou oficiais da Gestapo, que ele imediatamente associava a seu pai.
Que essas figuras representassem seu próprio inconsciente era um fato que ele não
conseguia admitir.

Se um elemento predomina no mapa de nascirnento, não se pode negar


expressão ao lado da psique que ele simboliza. Mas, por causa da extrema
relutância de Paul em aceitar seu lado escuro, os quatro planetas de terra no mapa,
todos canalizados através de Saturno, ficaram não-inte grados e se comportavam
como uma entidade separada, querendo destrui
79

102

-lo. E a sombra, nesse caso, realmente visava a destruição, mas não arbi
trariamente, pois o inconsciente sempre tenta compensar a parcialidade da atitude
consciente, e as vezes apela para a necessidade de derrubar o 1 ego para alcançar
o equilibrio que almeja. Assim, nos contos de fadas, é preciso que haja um inimigo
que tenta destruir o heroi, pois apenas dessa forma o heroi pode atingir o seu
objetivo.

O caso de Paul é um exemplo classico de alguém envolvido numa violenta luta


com um aspecto de sua própria psique. Saturno posicionado numa casa associada i
infância sugere um intenso sentimento de inade i quação e uma desesperada
necessidade de recriar aquele mundo, que nunca foi convenientemente
experimentado – uma infância que seu tempera mento, altamente inclinado para o
sentimento, demandava, mas que sua familia não lhe proporcionou. Em
conseqiiencia, a pequena e vulneravel criança constantemente se altemava com o
tirano. E os sentimentos de inferioridade encontraram uma compensação, através do
inconsciente, como uma enorme inflacão que começou a assumir proporções
homéricas, arquetípicas: Paul, no intimo, se achava uma espécie de messias martiri
zado, um profeta incompreendido e difamado, perseguido por todos, um rei oferecido
em sacrificio ritual para que seus suditos pudessem compar tilhar o seu poder. Ele fez
a ronda de varios terapeutas, e sempre inter rompia o tratamento – ou se tornava
reticente quanto ao pagamento dos honorarios – toda vez que o problema de sua
sombra entrava em discussão. Como uma criança, queria que alguém fizesse todas
as coisas ruins desaparecer. Mas como nos diz o conto de fadas, é preciso aprender
a amar a besta como ela é, antes que ela possa transformar-se num belo principe.

Como resultado do problema de Paul, sua organização, que signi ficava mais
para ele do que qualquer outra coisa na vida, acabou expul sando-o. Até continuou a
operar com sucesso sem ele, o que foi um golpe ainda pior para o seu ego. Embora
pudesse ter-se integrado num meca nismo maravilhosamente produtivo, a terrivel
divisão entre o claro e o escuro de sua natureza acabou gerando a pior situação
possivel para um indivíduo tão fortemente necessitado dos outros: o completo
isolamento.
80

E através desse tipo de experiência que Saturno, disfarçado de Lucifer, nos


coloca de joelhos. Entretanto, é só através desse tipo de experiência que podemos
nos tornar conscios do pleno potencial da psique.

A cxperiência da sombra poderia ter sido um trampolim para um vexdad.eiro


passo no crescimento psicológico, se Paul estivesse disposto a empreender a tarefa
moral de aceitar sua própria escuridao. Não existe uma solução facil para esse tipo
de problema, pois, como diz Jung, tomar 103

-se consciente da sombra demanda um esforço enorme e muitas vezes desa


nimador. Essa figura psiquica epitomiza tudo que mais desprezamos em nos
mesmos; e para admitir que ela personifica a nossa outra metade, o centro da
consciência precisa deslocar-se da tipica perspectiva do ego para outro lugar no
centro, entre a atração dos opostos. É uma empresa ardua, pois o ego acHá que
sera destruido com esse deslocamento. Na verdade, o que vai ser destruido não é
nem a capacidade nem a identidade, e sim a crença de que o ego é o senhor da
casa. É uma lição de humildade muito diferente da que aprendemos na ética crista,
pois o deus interior ao qual devemos obediência tem, como Jano, uma face dupla.

Enquanto isto está sendo escrito, Paul ainda se afunda, sentindo-se perseguido,
desiludido e traido. Não consegue compreender por que foi rejeitado, e prefere
acreditar que alguém queria a sua posição de poder na organiza o. É muito possivel
que o significado real dessa experiência im portaate e potencialmente valiosa sá
venha a tona, para Paul, na época do seu retomo de Saturno, quando o planeta
transitar novamente por Virgem, signo em que esta colocado no nascimento. Na
idade critica em que isso ocorre, como mostrou Marc Robertson em The Transit of
Saturn, tudo que é falso na estrutura do ego começa a desmoronar, e o inconsciente
faz uma iavestida cerrada em direção á integração. Para Paul, essa época ainda
esta dois anos a frente, e daqui até la tem a oportunidade de aprender a lição de
Saturno: nada morre antes de ser vivido, e embora a gente possa ver o que pode ver
sozinha, esta é uma visão pobre e estreita comparada com a sabedoria da psique
integrada. E o que não se pode ver continua sendo o verdadeiro mestre.

Saturno, como simbolo astrológico, é tanto nosso maior inimigo como nosso
81

melhor amigo, pois através de nossa dor e de nossa frustração aprendemos a


essência de seu significado: a sombra é um inimigo porque fazemos com que seja.
Não podemos nos livrar completamente de nosso lado inferior e primitivo, mas talvez
seja apenas o nosso ideal humano de perfeição que nos faz desafiar a natureza e
negar-lhe o direito de incluir o que chamamos de inferioridade no trabalho da criação.
Um exarne cuidadoso de Saturno no mapa de nascimento deveria lembrar-nos de
que precisa haver torpeza para que haja nobreza; e uma analise astrologica do
planeta pode ajudar a colocar em perspectiva uma energia psiquica que é esquiva e
dificil, as vezes destrutiva, mas sempre lutando ern favor da integração. 6 The
Transit of Saturn, Marc Robertson. Seattle, The Astrology Center of the Northwest,
1973.

104

5 O Phrceiro Interior Terminado o trabalho da visão, começa o trabalho do


coração sobre todas as imagens aprisionadas dentro de voce; pois voce as
conquistou, mas ainda não as conhece.

Contemple, o homem interior, a moça dentro de voce! – criatura extraida de mil


naturezas, criatura apenas arrancada, mas nunca, ainda, amada.

– Rainer Maria Rilke Não tem muita importância saber com quem a gente se
casa, ja que é certo descobrir, na manha seguinte, que foi com outra pessoa.

– Samuel Rogers Quando Rider Haggard fez essa descrição de AyesHá na


novela She, obviamente tinha em mente uma imagem clara e bem definida da mulher
ideal, uma persanificação de tudo que é misterioso, fascinante e poderoso no
feminino. AyesHá dificilmente é o retrato de uma mulher de carne e osso; é um
simbolo de todas as mulheres, contendo, como todos os sim bolos, os opostos
aparentemente irreconciliáveis do principio feminino.

Ela possui a lucida sabedoria de séculos, no entanto se comporta de forma

incrivelmente tola e cruel; ama com intensa paixão e abandono, entretanto é


capaz de extrema frieza e distânciamento; personifica toda a gentileza e a cura, no
entanto é capaz de ações selvagens de grande crueldade com um terrivel
desrespeito pela vida humana. Ela é tanto super-humana como sub-humana e, no
82

conjunto, não se parece muito com uma mulher comum.

O mesmo pode ser dito dos retratos de qualquer artista ou escritor que tenha
sido bem-sucedido em dar forma a suas mais intimas fantasias sobre o feminino;
citariamos um incontavel numero de exemplos (desde a Mona Lisa de Leonardo até
Nastasya Ivanovna de Dostoiévski em O Idiota, A Mulher do Tenente Frances de
Fowles e Justine de Durrel). Em con trapartida, a imagem do homem retratado por
mulheres escritoras e artistas não está t5o bem representada. Poderiamos
considerar, como exemplos, Heathcliffe, a extraordinaria criatura da fantasia de Emily
Bronte, os he róis das novelas góticas de Anne Radcliffe, O Pimpinela Escarlate, e,
recentemente, Francis Crawford de Lymond, retratado nas novelas histo ricas
campefs de vendas de Dorothy Dunnett – que não seriam "grande literatura" mas se
prestam admiravelmente para demonstrar o fenomeno.

Essas criações artfsticas podem ser baseadas num homem ou mulher


existentes, mas não são retratos reais de nenhum individuo; todas tem as qualidades
curiosamente arcaicas, super-humanas e sub-humanas do arqué tipo, uma dimensão
mitica, exagerada. São retratos da imagem ideal inconsciente que o homem ou a
mulher existentes tem a capacidade de ativar no artista. E essa imagem pode, na
verdade, ser poderosa a ponto de exigir expressão, havendo ou não um indivíduo
real que sirva como catalisador.

Aqueles que não são artistas também podem portar essa imagem interior, e
muitos homens e mulheres são capazes de descrever um tipo de indivíduo que
personifica tudo o que procuram no sexo oposto. Essas imagens interiores são
curiosamente fascinantes e autánomas; conteudos da psique inconsciente; como
todos os outros conteudos do inconsciente, serão projetados em pessoas reais que,
de alguma forma, constituam um gancho adequado. Temos, assim, a situação tipica
do homem que tem uma imagem interior e uma interpretação da mulher claramente
defini das – embora freqiientemente inconscientes –, que projeta continuamente nas
mulheres que encontra; ele acredita ter encontrado essa mulher per feita quando se
apaixona; e quando a projeção se desgasta um pouco e a mulher real começa a se
tornar visivel, é forçado a reconhecer que precisa fazer ajustes na sua atitude de
relacionamento. Muitas vezes ele reage se sentindo profundamente desapontado,
83

como se tivesse sido iludido ou logrado – e nesse caso deixa de perceber que foi
enganado pela sua própria

projeção . É impressionante o numero de pessoas que acusam os parceiros


depois da lua-de-mel: "Mas voce mudou!", quando na realidade o parceiro não
mudou em nada, só a projeção. Ou então o homem pode aceitar o desafio e tentar se
relacionar com a mulher como ela é, como uma pessoa integral, ao mesmo tempo
que assume a imagem interior como sendo sua e tenta tornar conscientes, dentro de
si, as qualidades simbolizadas por ela. Afinal de contas, a imagem pertence a sua
própria psique. Essa classica encruzilhada é o que se chama vulgarmente de
desapaixonar-se; é uma fase critica que inevitavelmente atinge todo casal depois de
algum tempo.

Em poucas palavras, essa é a trajetoria seguida por tantos relacionamentos, e é


ai, sobretudo, que estragamos as coisas, porque não conseguimos ver o significado
do acontecimento.

Todo homem contém uma mulher dentro de si, e toda mulher contém um
homem; essa verdade basica não é só biologica – pois todos nós contemos os
vestigios hereditarios do sexo oposto em nosso corpo, em forma recessiva – mas
também psicologica. Jung definiu essas imagens transexuais inconscientes como
animus e anima, e a astrologia conclui pelo mesmo inter-relacionamento de
masculino e feminino no indivíduo pela presença tanto de signos como de planetas
masculinos e femininos no mapa de nascimento. Não é preciso muita perspicacia
para ver que a crescente consciência dessa dualidade inerente em muitos
movimentos atuais se direcionou para a modificação dos papéis sexuais tradicionais,
e mesmo que pareça um pouco embaraçoso para algumas pessoas, a verdade subja
cente a esses movimentos é evidente na própria psique. Mas viver a duali dade
sexual de forma criativa e construtiva, sem violentar nem a herança biológica nem o
inconsciente, requer um esforço consideravel.

A anima e o animus são duas das figuras mais misteriosas investá gadas pela
psicologia analitica; e embora os termos de Jung sejam alta mente descritivos –
anima, o feminino, significa alma, enquanto animus, o masculino, significa sopro,
84

folego ou espirito –, tem sido conhecidos por outros nomes através de toda a histária,
e tem sido retratados nos mitos, contos de fadas, temas religiosos e artes de todas
as culturas através dos séculos. Mesmo com o grande numero de descrições dadas
no trabalho de Jung, essas imagens inconscientes continuam sendo conceitos
abstratos, exceto para as pessoas que vivenciaram consciente e diretamente o seu
poder. Entretanto, por abstratas que possam parecer a principio, vale a pena fazer
um esforço para entende-las um pouco, e, mais ainda, para conseguir uma relação
significativa com elas, pois é em tomo desses sim bolos que se assenta todo o mundo
da interação homem – mulher em toda sua complexidade. 1R7

O anirnus é uma escolta psiquica, um mediador entre o consciente e o


inconsciente e uma personificação desse ultimo... O animus dá a consciência da
mulher a capacidade de reflexao, deliberação e autoconhecimento. A mulher que é
capaz de reconhecer, m smo superficialmente, os atributos do animus, e diferenciar
dele sua consciência feminina do ego, pode começar a trabalhar em cooperação com
o lado transexual inconsciente de sua própria natureza; assim, começa a se libertar
do habito usual de projeta-lo num homem real. Conseqiientemente, torna-se capaz
de relacionar-se mais significativamente com os valores masculinos de seu parceiro,
em vez de ficar confusa com os dois; ela também aumenta a sua percepção da
própria condição de mulher, assim como do potencial cria tivo da sua mente e do seu
espirito. A psicologia da mulher esta enraizada no instinto e na resposta instintiva ao
fluxo da vida. A grande dadiva do animus conscientemente desenvolvido é a do
significado, que permite que ela reflita, discrimine e descubra o significado de sua
própria vida e seus práprios atos.

Assim como toda mulher contém dentro de si essa energia masculina, todo
homem contém dentro de si um aspecto feminino. Pertence a ele, essa perigosa
imagem da Mulher; ela representa a lealdade, a qual, no interesse da vida, algumas
vezes ele precisa renunciar; ela é a tão necessaria compensação pelos riscos, lutas,
sacrificios e tudo que termina em desapontamento; ela é o con solo por toda a
amargura da vida. E, ao mesmo tempo, ela é a grande ilusionista, a sedutora, que o
atrai para a vida com seu Maya – e não apenas para os aspectos racionais e uteis da
vida, mas também para os assustadores paradoxos e ambivalencias em que o bem
85

e o mal, o sucesso e a ruina, a esperança e o deses I pero contrabalançam um ao


outro .

O homem que tem alguma compreensão da anima e admite sua auto nomia
pode começar a cooperar com esse seu lado feminino inconsciente.

Assim fazendo, ele vai ser muito mais capaz de perceber a identidade de sua
parceira, permitindo-lhe portanto ser ela mesma. Também vai con seguir uma maior
aceitação de sua própria condição de homem, a medida 1 Aion.

2 Ibid.

que se torna consciente da fonte oculta e secreta de seus sentimentos e de


sua capacidade de amar, enquanto abre novas possibilidades para a expressão da
imaginação criativa e da sensibiIidade.

Um obstaculo para a compreensão desses parceiros interiores com os quais


estamos casados para toda a vida é que estamos acorrentados a defi nipxs sociais de
masculinidade e feminilidade, o que torna dificil para o animus e a anima
encontrarem espaço para uma expressão mais constru tiva. Para muitas pessoas, a
masculinidade e a feminilidade se definem como um conjunto dc atos ou padrões de
comportamento, e não como energias arquetípicas que impregnam a totalidade da
vida. De acordo com essa visão limitada e bidimensional, homem é alguém bem-
sucedido, agressivo e dominador, e mulher é alguém domesticada, passiva e
submissa. O pro blema de tentar definir o indefinivel é ainda mais complicado pela
violenta rebelião atual contra os "papéis" sexuais. Embora talvez isso seja neces s&io
e inevitável neste momento, obscurece e complica qualquer tentativa de entender e
apreciar a dinamica do masculino e do feminino dentro de si.

Quando se esta disposto a prestar ateação nas pessoas e experiência -las,


torna-se claro que existe uma diferença básica entre a psicologia mas culina e
feminina. Como diz Swinburne, o homem personifica o amor da verdade e a mulher
personiQca a verdade do amor. Essa diferença basica, que Jung descreve como a
polaridade do Logos (mente) e Eros (amor), existe em toda a vida e é um reQexo dos
arquétipos. Para muitas pessoas, entretanto, parece constituir uma ameaça –
principalmente para a ala extrema do Movimento de Liberação das Mulheres, que
86

considera tal dife rença um rebaixamento dos direitos das mulheres. A psicologia
analitica nunca postulou que os homens só são capazes de pensar e as mulheres de
sentir; a existência da anima e do animus em cada um é testemunha da inteireza de
todas as pessoas. Mas os valores e as fontes mais profundas de motivação são
difereates na psicologia masculina e feminina. É uma pena que tenham ocomdo
tantos malwntendidos nos ultimos tempos, e também é uma pena que o conceito de
Freud de "homossexualidade latente" ainda seja um bicho-papão para muitos
indivíduos que acham que expressar o lado transexual de sua natureza vai dealguma
maneira tomá-los homos sexuais. Se tanto, é mais provavel que o oposto seja
verdadeiro, pois o que chamamos homossexualismo é frequentemente o resultado
de uma com pleta repressão das figuras inconscientes, que – como qualquer outro
componente do inconsciente – se tornam antagonistas e esmagam a cons ciência
quando tratadas com arrogáncia ou desprezo pelo ego.

É inutil postular, como teoria, que as mulheres, por mais dotadas


intelectualmente, tendem a valorizar mais os relacionamentos, e que os

homens, por mais criativos e sensiveis, tendem a valorizar mais a realiza ção, a
estrutura e o mundo das idéias. Essas coisas precisam vir da expe riência própria.
Para muitos indivíduos, a anima e o animus permanecem totalmente inconscientes e
são projetados; ou podem se rebelar contra a repressão do ego e subitamente se
apoderar da consciencia, a tal ponto que prejudicam a relação natural do indivíduo
com sua própria sexua lidade. O indivíduo pode, então, identificar-se, sem perceber,
com esse seu elemento inconsciente, achando que é o seu lado melhor; e não é um
espetaculo bonito, pois qualquer coisa inconsciente é um pouco primitiva e "inferior",
sendo indiferenciada. A esse fenomeno podemos coneta rnente aplicar a palavra
"animosidade", que é o resultado caracteristico da ideniificação inconsciente com a
anima ou com o animus.

A mulher domiaada pelo animus freqQentemente é cega para o fato de que os


argumentos que saem de sua boca e as opiniões aparentemente bem iaformadas,
mas muitas vezes dogmáticas, que governam sua mente não foram conseguidas por
reflexão própria, mas emprestadas; e geral þ mente não são proclamadas pelo bem
da verdade, mas simplesmente para que ela possa parecer que sabe mais. Ela anda
87

por ai com uma postura terrivelmente belicosa e a convicção secreta de que todos os
homens pla nejam domina-la, nunca percebendo que quem a domina é o homem
inconsciente dentro de si mesma; assim, acHá que precisa provar sua supe rioridade
aos homens, primeiro. Isto não é, em absoluto, o mesmo que a mulher realmente
empenhada em compreender e desenvolver a mente; existe uma imensa diferença
na aura emanada pelas duas, e em geral pode-se reconhecer a primeira não apenas
pelo tipo de seus argumentos, curiosamente cheios de cliches, mas também porque
quando ela entra numa sala todos os homens se encrespam. O homem possuido
pela anima, inconsciente dos seus desagradiveis caprichos, compulsividade, vaidade
pessoal e melindres, anda por ai espalhando uma nuvem de atmosfera venenosa;
exibe uma mesquinbaria e wrogância peculiares, falta de fran queza, fragilidade
diante do conflito e uma manipulatividade completa mente escorregadia;
imediatamente desperta a descanfiança das mulheres.

Ou então pode ser que ele espalhe uma delicada patina de glamour em tudo
que diz ou faz, de modo que se fica com a nitida impressão de que ele esta sempre
num palco, desempenhando um papel, e não se relacionando com indivíduos. Como
o animus gosta do argumento, a melhor forma de ve-lo em funcionamento é em
disputas em que as duas partes acham que tem razao. Os homens também são
capazes de discutir de 110

uma forma muito feminina, quando estão possuidos pela anima e foram assim
transformados no animus de sua própria anima Com eIes, a questão se toma um
caso de vaidade pessoal e meIindre (como se fossem mulheres); com as mulheres, é
uma questão de poder, seja de verdade, justiça ou de outros "!smos" – pois o
costureiro e o cabeleireiro ja cuidaram de sua vaidade .

Não é apenas uma negação do movimento da psique humana em direção a


inteireza recusar a admissão consciente da anima e do animus; também é, em geral,
aItamente destrutivo para os relacionamentos pessoais.

... Quando o animus e a anima se encontram, o animus desem bainha sua


espada de poder e a anima lança seu veneno de ilusão e sedução . Enquanto a
nuvem de "animosidade" que rodeia o homem é composta principalmenie de
88

sentimentalismo e ressentimento, na mulher ela se manifesta como pontos de vista,


interpretações, insinuações dogmaticas e deduções erradas, tudo com o propo sito
(algumas vezes alcançado) de romper o relacionamento entre dois seres humanos .
Em todo relacionamento, como muitos escritores notaram, não existem simplesmente
duas pessoas; existem quatro. O ego consciente do homem e o ego consciente da
mulher parecem ser os protagonistas, e tam bém existem os dois parceiros interiores.
Não é preciso muito esforço para observar a sutil mudan que ocorre quando esses
dois arquétipos invadem a consciencia, quase sempre durante as convulsões de
violentas emoções.

Se não fosse tão constrangedor, seria interessante andar com um pequeno


gravador para poder escutar o que se diz durante uma briga e ouvir a voz l do
inconsciente. Depois de alguns minutos de escuta, dificilmente a anima e o animus
continuariam sendo conceitos abstratos. Em vez de supor que esses arquétipos
sejam mera teoria e sempre se tenha controle das palavras e dos atos,
provavelmente é sabio tratar essas figuras inconscientes com o respeito que
merecem, como entidades autonomas coexistindo conosco e vivendo dentro da
mesma pele, pois sem duvida é o que acontece.

Como a sombra, a anima e o animus freqiientemente são percebidos como


imagens, primeiramente nos sonhos e nas fantasias. Elas permanecem livres,
autonomas e fora do controle do individuo, pois são parte da vida natural da psique
inconsciente e nunca podem ser totalmente subordinadas aos desejos do ego. Com
efeito, o contrario está mais perto da verdade, pois o ego é o objeto e o inconsciente,
personificado pelo animus ou pela anima, é o sujeito. Como parceiros fisicos vivos,
esses dois arquétipos não podem ser dominados sem que haja graves
conseqiiéncias de sabotagem inconsciente, e eles exigem nossa cooperação na sua
demanda de reconhe cimento consciente, assim como um pouco de humildade por
parte do ego. Os dois são poderes inconscientes, "deuses", de fato, como muito
justamente foram concebidos pelo mundo antigo. Chama-los por esse nome é dar-
lhes a posição central na escala de valores psico lágicos que sempre foi deles, com
ou sem reconhecimento cons ciente, pois seu poder cresce proporcionalmente ao
grau em que permanecem inconscientes. Aqueles que não os veem estão em suas
89

mãos... Apenas com o esforço para reconhecer essas figuras pode ocorrer uma
verdadeira união dentro do individuo, de modo que ele possa expres sar os dois lados
de sua psique de forma criativa. ... a integração da sombra, ou a percepção do
inconsciente pes soal, marca o primeiro estagio do processo analitico, e... sem ele o
reconhecimento da anima e do animus é impossivei. A sombra só pode ser percebida
através da relação com um par ceiro, e a anima e o animus, apenas através da
relação com um parceiro do sexo oposto, pois unicamente em tal relaçio suas
projeções se tornam operanies . Os relacionamentos que contem um elomento de
"apaixonar-se" inevitavelmente contém projeções da anima e do animus, e a curiosa
sensação de familiaridade que se tem em relação ao ser amado é facil mente
explicavel pelo fato de a pessoa, na realidade, estar apaixonada por si mesma. O
que distingue esse fato do narcisismo é que o "amado" não é o ego consciente, mas
um aspecto do self inconsciente. A sensação 6 Aion.

7 Ibid. 1 1

de familiaridade tem sido, com muita freqiiencia, explicada pela reencar nação.
Esses relacionamentos, sup5e-se, são a continuação de um encontro começado em
outra vida, dai o reconhecimento do ser amado. Esse argu mento não é
necessariamente irreconciliavel com o que dissemos sobre a anima e o animus, pois
não conhecemos realmente a verdadeira natureza dessas imagens, nem de que
raizes primordiais elas surgem. A despeito da reencainação, entretanto, a projeção
esta envolvida com toda certeza no "amor a primeira vista",. embora isto não
signifique que tais projeções sejam prejudiciais ou negativas. ao contrario, são um
catalisador neces sario para o relacionamento, assim como o relacionamento é um
catali sador necessario para a autoconsciencia; a busca do parceiro interior é
responsavel pela nossa aceitação da vida. A anima e o animus são, por conseguinte,
guias no sentido mais profundo, pois ligam o indivíduo a grande herança de imagens
e experiências coletivas que jazem além de sua vida pessoal; e são efetivamente
instrumentos do fado, direcionando -nos para situações que, de outra forma, sem
duvida evitariamos – evi tando assim toda luta e toda consciencia. Embora
procuremos esses par ceiros interiores fora de nós, eles vivem dentro de nós e nos
impulsionam exatamente para aquelas experiências opostas aos nossos desejos
90

cons cientes. A anima continuamente seduz o homem para o mundo escuro do


sentimento e do envolvimento emocional, que esta tão em desacordo com sua
psicologia natural quanto a vida submarina esta para o gato; e a mulher é
continuamente conduzida pelo animus para o isolamento, a independência e a auto-
realização, que são antitéticas a sua propensão instintiva a viver a vida através de
relacionamentos e identificação incons ciente com os outros. As vezes, podemos ter
vontade de amaldiçoar nossos traiçoeiros guias, que em vez de nós trazer a
felicidade nós levam para a beira do precipfcio e muitas vezes nos jogam de cabeça
I5 dentro; entretan to, sem eles não haveria crescimento algum, aIegria alguma,
compreensão alguma e nada que justificasse a palavra vida. Nas figuras do animus e
da anima reside o mais profundo mistério, e é através delas que se pode real mente
ver como os relacionamentos são um caminho para o desenvolvi mento interior e a
personificação viva de uma jornada ao mais profundo centro do práprio ser.

Como outras figuras arquetípicas, a anima tem dupla face. Muitas vezes isso
coloca um problema real para a aceitação consciente de seu valor por parte do
homem, pois enquanto a face "luminosa" – criativa, inspiradora, migica – pode ser
assimilável, muitas vezes a face mais escura e mais selvagem não o é. É muito mais
fácil projetar essa ultima em mu lheres reais, e ve-las como destrutivas e
devoradoras. Entretanto, a luz não

pode existir sem a escuridao. A anima personifica toda a experiência cole tiva do
homem com o feminino, e é portanto um simbolo do principio feminino arquetipico.
Esta vinculada á relação e ao sentimento, e perso nifica o aspecto do inconsciente do
homem que se empenha na união com os outros. Sob alguns aspectos, a figura da
anima é igual para todos os homens; diriamos que existe apenas urna Mulher, uma
essência do feminino que nunca pode ser realmente verbalizada, mas que possui os
mesmos atributos para todos os homens. É essa identidade, essa unidade coletiva,
que produz figuras de anima como Ayesha, ou mesmo mulheres do tipo anima como
Marilyn Monroe, com seu grande poder de fascinio.

Mas junto com essa face coletiva da anirna existe também um lado pessoai.
Para um homem, a imagem interior pode ser morena, sensual e languida; para outro,
pode ser loura, exuberante e inocente. A anima, enquanto personificação coletiva,
91

também é fortemente matizada pela experiência individual que o homem tem das
mulheres, principalmente de sua mae. Assim, enquanto a essência do feminino
permanece a mesma, a imagem interior é diferente para homens diferentes. As
ninfas e deusas gordinhas retratadas por Rubens podem ter agradado a Rubens,
mas para outro homem a figura esguia e de menino de uma atriz como Mia Farrow é
muito mais magnética. Também é possivel observar a entrada em moda de tipos
fisicos durante diferentes periodos da historia; a imagem ideal da mulher bonita na
época elizabetana, ou mesmo vitoriana, era muito diferente da que é cansiderada
bonita hoje. Os romanos tinham uma filo sofia para essa questão: de gustibus non
disputandum est, gosto não se discute. As qualidades fisicas da imagem são
simbolicas, e personificam qualidades interiores muito mais dificeis de verbalizar. Se
se permite que os traços fisicos falem ao coracão e a intuição , eles revelam a
essência da pessoa.

Em The Symbolic Quest, Edward Whitmont desenvolve uma "clas sificação


tipolágica experimental do Feminino," descrita por Toni Wolff . É uma interpretação
arquetípica e não pode ser feita muito lite ralmente, mas as mulheres tendem
inconscientemente a se identificar com, ou personificar, um desses quatro aspectos
bisicos do principio feminino.

E as mesmas quatro imagens também sio aplicáveis a anima. São deno minadas
a Mãe, a Hetaira, a Amazona e a Médium. Geralmente uma dessas faces da anima
esta voltada para cima, em direção a luz da consciência de um homem, que o atrai
para aquele tipo de mulher como representante do feminino. 8 The Symbolic Quesr.

A mãe é uma figura cheia de qualidades protetoras, alimentadoras, cuidadoras.


Sua face brilhante é a do lar e da segurança, do conforto e do perdao; personifica
toda a compaixão e a sabedoria instintiva. Sua face escura é a da possessiva,
devoradora e destruidora, o utero sombrio que puxa o homem da vida para a morte.
O homem que esta acorrentado a essa imagem, que não consegue compreender as
muitas facetas do femi nino mas que esta ligado a apenas esta, em geral vai ser
atraido por mu lheres que possam realmente cuidar. dele; e geralmente vai lutar
contra a dependencia, o desamparo e a paralisia que um relacionamento continuo
desses acarreta. A Hetaira é um tipo muito diferente, e as antigas cortesas são
92

simbolos aprópriados dessa figura da anima: intelectualmente bem dotadas, cultas,


estéticas, dedicadas aos aspectos pessoais do amor e da corte, caprichosas,
instaveis, promiscuas e voluveis. A face luminosa dessa imagem é a do sentimento
sintonizado com a cultura e o amor da beieza.

O lado escuro é frio, impiedoso, imprevisivei, enganoso e inconstante, incapaz


de manter a fidelidade em qualquer relacionamento. Para um homem preso a
imagem da Hetaira, a mulher pode parecer uma borboleta brilhante, trazendo beleza,
brilho e colorido, mas não merecedora de confiança, mutavel como o vento, incapaz
de proporcionar qualquer sensação de segurança ou enraizamento.

A Arnazona – cujo nome vem das guerreiras da mitologia grega que adoravam a
deusa virgem – é uma figura de terra, forte e capaz, eficiente, apoiadora, prática e
cheia de sabedoria terrena. Sua face luminosa é a capa cidade de lidar com a
realidade, com o mundo material e suas complexi dades, de proporcionar seguranga
e estabilidade. Sua face escura é domi nadora, mandona, arrogante, cerceadora,
estruturada, dogmatica, escra vizada a tradição e a lei. O homem ligado a anima
como Amazona pode procurar relacionamentos nos quais sua vida seja
eficientemente dirigida e organizada para ele, deixando-o livre para ir ao encalço da
sua visão criativa. Do lado negativo, pode-se chegar a um discreto aprisionamento
num estado de perpétua infantilidade, que não lhe permite fazer nada rozinho. A
Médium, antitese da Amazona, é a visionaria e vidente, a profetiza que desvenda os
segredos do universo. Ela comunga com os deuses, e traz espontaneidade, alegria,
extase e abandono ao fluxo do momento. Sua face luminosa é a da intuitiva, a
inspiradora, o veículo do espirito criativo; sua face escura é a histeria, a loucura, o
caos, a frenética rendição as forças do coletivo e os demoniacos poderes da visão e
do deli rio. O homem ligado a anima como Médium pode achar que encontrou uma
musa, um catalisador para a expressão da criatividade e do significado de sua vida.
Alternativamente, pode aehar que foi sacrificado no altar do 11C

caos, com sua vontade, sua estrutura e sua necessidade de conseguir algo de
valor no mundo se desintegrando num redemoinho fantasmagorico, ou num mundo
de sonho que o leva a acreditar que se tomou um heroi sem ter realizado nenhum
feito.
93

As qualidades personificadas por essas quatro figuras são aspectos da psique


inconsciente do próprio homem. No seu todo, essas figuras não podem ser
confundidas com uma mulher real, pois são simbolos; porém, algumas mulheres são
ganchos melhores ou piores para receber a projeção de um ou outro simbolo. O
problema reside em trazer a sabedoria e a vida intrinsecas a esses simbolos para a
consciencia; pertencem a própria pessoa, e não podem ser vivenciadas através de
uma parceira se o homem quiser realizar o verdadeiro casamento interior pelo qual
ele estabelece um relacionamento com a anima. Se ele tenta permanecer
inconsciente, sua parceira, carregando o fardo da projeção, geralmente vai continuar,
cons cientemente ou não, a representar a anima para ele. Mais cedo ou mais tarde,
isso vai causar algum no emocional que o tira de seu sono e o força a se tornar
consciente da mulher dentro dele, que secretamente está dire cionando suas
escolhas.

Algumas vezes o homem procura a anima em personificações de femi nino não-


humanas, como o misticismo (a Mae Igreja é um bom exemplo) ou a criação artistica;
mas quer a anima esteja vestida de mulher ou não, sua essência permanece a
mesma. Mas qualquer que seja a imagem, o homem nunca vai encontra-la in toto
fora dele, porque nenhuma mulher real pode personificar o espectro mitológico de
opostos contido na anima.

A mulher de verdade, uma vez ou outra, fatalmente vai pegar um resfriado,


deixar roupa suja no banheiro, ser surpreendida de mau humor, com creme no rosto
e bobs no cabelo. Nenhuma anima que se prezo se deixaria ver em tal wstado.
Muitos homens tem uma curiosa repugnância pelos hábitos femininos comuns e
pelos atributos biológicos – principalmente o ciclo menstrual e o mal-estar que o
acompanha – porque eles denigrem a ima gem que ele esta projetando na mulher;
servem para lembra-lo de que ela é humana e demanda um relacionamento humano.

Mesmo um entendimento minimo de algumas das qualidades mais pessoais da


anima pode ajudar o homem a se tomar mais conscio dos padrões que adota nos
relacionamentos. A experiência da raiva, da amar gura, da recriminação e da magoa
quando a mulher real não realiza as expectativas inconscientes da anima é tão tipica,
que quase não precisa ser discutida. É literalmente encontrada em toda parte, e o
94

ressentimento que emana dos pressupostos e expectativas inconscientes é como um


fluxo pernicioso que torna o relacionamento impossivel, mas que o homem é 116

capaz de negar quando alega não estar de mau-humor, não haver nada errado
e se ela poderia, por favor, parar de importuna-lo com suas exigen cias emocionais.
Talvez só as mulheres, sensiveis a esta atmosfera emocio nal, saibam quanto
sofrimento emocional vem desse tipo de critica e de desapontamento não-
verbalizados. Se o homem não consegue reconhecer a diferença entre sua mulher e
sua anima, e respeitar as duas, então vai sempre esperar que sua mulher se ajuste a
imagem interior – e, inevitavel mente, ela vai malograr.

Um dos atributos da anima é sua praticidade; a mulher, simbolica mente, é terra,


matéria, e muitos homens, assim, inconscientemente a responsabilizam pelo
cuidado, fomento e arrumação de sua vida material.

Outro componente da anima é o sentimento, e assim a mulher é respon


sabilizada pela criacão de uma atmosfera de amor e cuidado no lar, e de impregna-la
com as qualidades da compaixao, brandura, sensibilidade e receptividade. Essas
qualidades são, sem duvida, aspectos do principio feminino – no homem ou na
mulher – e, em maior ou menor grau, ine rentes a psicologia das mulheres. O
problema, entretanto, é a questão do grau. No plano arquetipico e historico, as
mulheres sempre serviram como guardias de certos valores na sociedade e para os
homens; mas, por mais válida que essa custodia seja em principio, cada mulher tem
sua forma individual de expressa-la – o que cria muitas dificuldades nas situações
especificas. Não é tanto que o cuidado, a proteção e a receptividade não devam ser
atribuidos ao feminino; é que os homens, seduzidos pela anima, tem a tendência a
esperar dela esses atributos em grau desmesurado, esque cendo que as mulheres
também tem um componente masculino que requer a expressão independente. Uma
determinada mulher pode não estar muito preocupada com o lado material ou
emocional da vida, se ela for do tipo intuitivo ou pensativo; embora ela ainda seja
mulher, pode querer ter tempo para desenvolver seus interesses independentes. Isso
depende da disposição da mulher. Um dos muitos problemas enfrentados pela
mulher que luta pela consciência é a dicotomia entre o seu temperamento e a sua
natureza instintiva. O problema é complicado por uma segunda dicotomia, composta
95

pela sua solução do primeiro problema e pela projeção da anima de um homem


sobre ela. Não Há uma saida simples para esse problema pa ra nenhum dos
parceiros; provavelmente seja impossivel até chegar perto de uma solução, sem
varios erros criticos. Mas os homens podem dar uma enorme ajuda tornando mais
conscientes as qualidades da anima, de modo que ele possa encontrar sua parceira
na metade do caminho e valorizar a sua luta, em vez de inconscientemente esperar
que ela personifique, num delica do corpo e durante uma curta vida, o arquétipo da
Mulher na sua totalidade. 1 þ

O animus é a imagcm arquetípica do homem existente dentro de cada mulher.


Ele é o caçador, o guerreiro, o estadista e o intelectual, o construtor tanto do plano
material como mental. É poderoso e cheio de propósito; possui as chaves das leis
que fazem a vida funcionar e o signi ficado do plano de seu dcsenvolvimento, Esta
relacionado com mente e espirito, e personifica objetividade, vontade, conhecimento,
direção e perspectiva impessoal. Como a anima, ele tem uma face brilhante e uma
escura. Sua face brilhante é como o Sol, e traz iluminação e claridade, proposito e
força, enquanto sua face escura é o destruidor, que rompe o relacionamento e traz a
morte do sentimento e a frieza do isolamento eterno. Da mesma forma que a anima,
o animus contém tanto um com ponente coletivo como um componente pessoal; o
relacionamento com o pai, principalmente, vai matizar o ultimo, enquanto o primeiro
perso nifica toda a experiência coletiva das mulheres com o masculino através das
eras. O animus, para algumas mulheres, pode ser uma poderosa força da natureza,
como Heathcliffe; pode ser brutal, viril, agressivo, lascivo e onipotente – alguma coisa
cntre Jeová e Tarza. Ou talvez devessemos citar o Frankenstein de Mary Shelley,
ande o barão e a "criatura" epi tomizam a face dupla do animus. Para outras
mulheres. o componente intelectual ou espiritual do animus é de suma importância, e
ela vai pro jetar sobre o seu homem as qualidades de visão, logica, brilho, capacidade
de planejamento e organização, ou mesmo sabedoria e compreensão espirituais. O
animus pode até aparecer em forma plural para muitas mulheres, como um conselho
dos mais velhos ou de um grupo de sabios.

Como tal, ele também personifica a autoridade da sociedade, da estru tura, da


lei.
96

Whitmont sugere que o animus, da mesma forma que a anima, pode assumir
uma de quatro formas basicas. Cada uma é uma corporificação do principio
mascuiino, e ele as denomina o Pai, o Puer Aeternus (Jovem Eterno), o Heroi e o
Sabio. Enquanto os homens podem se identificar inconscientemente com uma
dessas quatro figuras como simbolo de sua expressão masculina especifica, as
mulheres também geralmente estão ligadas a uma ou outra como a face mais
consciente do anirnus.

Q Pai é a figura que proporciona apoio, abrigo, cuidado; como é um homem,


personifica a ordem social hierarquica, o costume, a tradição, a sacralidade do
passado c os valores da familia. Sua face luminosa é prote tora, fortalecedora e
tranquilizadora, proporcionando a mulher o senso de segurança no mundo maior em
que ela vive; sua face escura sufoca o cres cimento, pois ele a mantém como uma
eterna menininha, negando-lhe o direito de descobrir seus próprios valores. A mulher
ligada a tal figura do 118 I

[ animus muitas vezes se ve num relacionamento com um homem que


representa um pai, abriga-a, toma conta dela, patrocina-a e espera que obedeça i
sua lei, aprisionando-a assim numa perene infância. O puer é antitético ao Pai e,
como sua contrapartida feminina, a Hetaira, é leviano, aéreo, estético, alegre e
incapaz de um relacionamento fiel ou permanente.

Tanto o Filho (puer) como a Hetaira fazem o tipo ame-os e deixe-os, mas com a
Hetaira motivada pelo Eros a enfase maior é no ame; o puer é mais forte no deixe ."
A face brilhante do puer é como o mercurio: simboliza a atuação brilhante, mutavel,
inconstante da mente diferen ciada, e é como o espirito do vento, trazendo a
mudança e a animacão do voo. Sua face escura é fria e despida de sentimentos,
cruel, dura, dada a critica destrutiva e á palavra venenosa. A mulher ligada a essa
figura do animus pode se acorrentar exatamente a um homem assim: magnético.

irresponsavel, infantil, cintilante e muito melhor na hora de se desvencilhar de


um relacionamento do que de mante-lo.

O Heroi é um guerreiro, uma criatura de terra, e como sua contrapar tida


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feminina, a Amazona, se empenha em lutar e vencer no mundo obje tivo. Ele pode
ser o bem-sucedido homem de negocios, o politico influente e carismatico, o soldado,
o estadista; sua face brilhante proporciona garra, assertividade, coragem, senso
comum, tenacidade, persistência e uma vontade poderosa. Sua face escura é
sensual, materialista, insensivel, brutal, dominadora, possessiva e destrutiva em
relação aos dons criativos e as coisas do espirito. Uma mulher ligada a essa figura
de animus, se for incapaz de expressar ou reconhecer qualquer outra faceta, pode
ver-se envolvida – projetando – com um homem cuja preocupação primordial na vida
seja a sua posicao. Ele, em busca do poder e do ganho material, pode arrasta-la
consigo (ou melhor, ela vai se deixar arrastar, sob o do minio do animus) porque tudo,
inclusive os relacionamentos, precisa ser sacrificado pela conquista. ao contrário, o
Sabio, antitético do Heroi e correspondendo a Médium feminina, é um simbolo da
criatividade, da sabedoria, da visfo, da compreensão espiritual e uma ponte para a
Mente de Deus. Sua face luminosa é a do magico, do profeta que esclarece os mis
térios do significado maior da vida; sua face escura é o abismo, o poder cauterizante,
fanatico e totalmente impessoal do caos. Ligada a um tal animus, uma mulher pode
permitir que seu homem aja como um guru e guia espiritual, manâncial de sabedoria
e profeta que ve tudo; pode esperar que ele viva por ela a sua criatividade não-
nascida e devote a sua vida ao 9 Ibid.

serviço das necessidades mundanas dele, de modo que ele possa prosseguir
com sua nobre visão. E ela pode nunca perceber que possui inspiracão e sabedoria
próprias. Citaria como exemplo negativo desse animus o poder inconsciente que
hipnotizou as seguidoras de Charles Manson levando-as a ve-lo como um Messias.
Através do animus, a mulher é atormentada por um problema, tal como a
anima faz com o homem: o problema dos pressupostos e expec tativas inconscientes,
e do ressentimento resultante quando as exigencias não-verbalizadas não são
atendidas. Se não cooperar conscientemente com o homem