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Página Textos da Reforma

Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Solus Christus, Soli Deo Gloria
http://www.geocities.com/Athens/Bridge/3039
Responsável: Dawson Campos de Lima
E-mail: dawson@samnet.com.br

A ESCRITURA AFIRMA EXISTIR SÓ O DEUS VERDADEIRO EM


OPOSIÇÃO A TODOS OS DEUSES CRIADOS PELA SUPERSTIÇÃO DOS
HOMENS
João Calvino

I. A DOUTRINA BÍBLICA DE DEUS COMO CRIADOR


Pelo fato de havermos ensinado que o conhecimento de Deus se evidencia, de
modo não obscuro, sob outro aspecto na estrutura do universo e em todas as suas
criaturas – e que esse conhecimento se desdobra mais íntima e vividamente na sua
Palavra –, agora compensa verificar se o Senhor, nas Escrituras, se apresenta a nós do
mesmo modo como o vimos descrito em suas obras.

O assunto é bastante longo, se quisermos tratá-lo com mais


diligência. Eu me darei por satisfeito, no entanto, apresentando-o como
um resumo – que ajude as mentes piedosas a saberem que é que devem
investigar a respeito de Deus, nas Escrituras –, dirigindo-se ao exato
objetivo de sua indagação. Não faço referência ao pacto especial por
meio do qual Deus distinguiu a raça de Abraão de outras gentes (Gn
17.4). Ora, quando por graciosa adoção recebeu como filhos àqueles que
eram inimigos, mostrou-se, então, seu Redentor. Nós, no entanto, até
aqui nos movemos neste conhecimento que se limita à criação do
mundo e nem chega a Cristo, o Mediador. Ainda que mais adiante seja
necessário citar algumas passagens do Novo Testamento – visto que
dele também se pode provar não só o poder de Deus, como Criador, mas
também sua providência na preservação da natureza primária –, quero,
contudo, que os leitores, devidamente avisados, não vão além dos
limites estabelecidos, quanto ao que me proponho agora a fazer. Em
suma, que seja suficiente agora aprender como Deus, o Criador do céu e
da terra, governa o mundo que Ele criou. Na verdade, nas Escrituras,
celebra-se repetidamente não só a bondade paternal de Deus, mas
também a sua vontade inclinada à beneficência, oferecendo-se também,
nas Escrituras, exemplos de severidade de Deus, exemplos que mostram
ser Ele vingador dos feitos iníquos, especialmente onde sua tolerância
nenhum proveito traz aos obstinados.

II. A BÍBLIA E A CRIAÇÃO ATESTAM, IGUALMENTE, OS


ATRIBUTOS DIVINOS
Realmente, em algumas passagens da Bíblia apresentam-se descrições mais
vívidas, nas quais se exibe a verdadeira face de Deus, vista como imagem. Assim, Moisés,
ao descrevê-la, parece ter desejado claramente compreender, de forma sumária, tudo
quanto era próprio ser conhecido pelos homens a respeito de Deus. Diz Moisés: “Senhor,
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Deus misericordioso e claramente paciente e de muita compaixão, e veraz, Deus que


guardas a misericórdia para com milhares e que removes a iniqüidade e as transgressões,
Deus, diante de quem o culpado não será inocente, e que aos filhos e netos atribuis a
iniqüidade dos pais.” (Ex 35.6-7). Notemos que aí se proclama, repetindo-se duas vezes, o
nome magnífico de Deus – que traduz a eternidade (=aquele que tem existência própria).
Em seguida, suas virtudes são evocadas e, com base nelas, descreve-se não quem é
Deus, em si mesmo, porém, sim, quê Ele é para nós, de maneira que este conhecimento que
passamos a Ter dEle consista mais de viva experiência que de vazia e inútil especulação.
Na verdade, vemos, nas Escrituras, serem enumeradas as mesmas virtudes que
reconhecemos brilharem no céu e na terra, ou seja, vemos a clemência, a bondade, a
misericórdia, a justiça, o juízo e a verdade. Sim, porque virtude e poder estão contidos no
nome Elohim (=Deus).

Os profetas, aliás, caracterizaram a Deus com esses mesmos


epítetos (=nomes), quando querem realçar plenamente o seu santo
nome. Para que não sejamos obrigados a fazer uma lista de muitas
referências, contentemo-nos, por agora, com o Salmo 145, no qual se
enumera, de modo preciso, a súmula de todas as virtudes de Deus e
nada parece ficar omitido. No entanto, nada se diz nesse Salmo que não
possa contemplar nas criaturas. Portanto, guiados pela experiência,
como nossa mestra, sentimos que Deus é exatamente como a Palavra
diz que Ele é.
No profeta Jeremias onde Deus diz que de modo quer ser conhecido
como nós, o Senhor faz uma descrição não tão completa como a do
Salmo 145, descrição que, no entanto, acaba sendo praticamente a
mesma: “Quem se gloria, diz o Senhor, glorie-se nisto: Em me conhecer
e saber que eu sou o Senhor, e faço misericórdia, juízo, e justiça na
terra; porque destas coisas me agrado, diz o Senhor.” (Jr 9.24).
Certamente, nos é necessário conhecer estas três coisas: A misericórdia,
na qual repousa a salvação de todos nós; o Juízo, que todos os dias se
exerce contra os malfeitores, reservando-se-lhes, ainda mais
severamente, a ruína eterna; a justiça, pela qual Deus preserva os fiéis e
os assiste benignamente. Conhecendo essas três coisas, a profecia nos
assegura que temos matéria suficiente para nos gloriarmos em Deus.
Contudo, nem desse modo pode-se deixar de considerar em Deus a
verdade, o poder, a santidade e a bondade, pois de que modo se poderia
evidenciar o conhecimento que se requer da justiça, da misericórdia e
do juízo divino, a não ser que esse conhecimento estivesse calcado na
sua verdade inflexível? E como poderíamos crer que Deus governa a
terra em juízo e justiça, se não reconhecêssemos que Ele tem poder? E
de onde tiraria Ele a misericórdia, senão da bondade? Se, finalmente,
todos os caminhos de Deus são misericórdia, juízo e justiça, eminente
também, nesses caminhos, é a santidade.
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Portanto, o conhecimento que as Escrituras nos apresentam a


respeito de Deus, não tem outro objetivo senão aquele que brilha
gravado nas escrituras, ou seja, é o conhecimento que, em primeiro
lugar, nos convida ao temor de Deus; em seguida, convida-nos a cofiar
nEle para, na verdade, aprendermos a cultuá-lO não só com perfeita
inocência de vida, mas também com não fingida obediência e, desse
modo, aprendamos a depender totalmente de sua bondade.

III. DIANTE DA NOÇÃO QUE TEMOS DO DEUS ÚNICO, OS


IDÓLATRAS NÃO TÊM DESCULPAS
Nosso objetivo, porém, é fazer uma síntese da doutrina geral. Observemos,
primeiro, que as Escrituras, para dirigir-nos ao Deus verdadeiro, exclui e rejeita
expressamente a todos os deuses inventados pelos homens, visto que, por quase todos os
séculos, a cada passo, a religião foi adulterada. Certamente, é verdadeiro o fato de que o
nome do Deus único tem sido conhecido e celebrado por toda parte, pois mesmo aqueles
que adoravam grande multidão de deuses, falaram freqüentemente de acordo com o
próprio sentido da natureza, usando simplesmente o nome de Deus, como se apenas um
Deus único fosse suficiente. E isso Justino, o mártir, com muita propriedade, compondo,
para este fim, um livro intitulado A Monarquia de Deus no qual, por meio de muitas
testemunhas, mostra que a unicidade de Deus está impressa no coração de todos.
Tertuliano também, com base na linguagem comum, prova a mesma coisa.

Mas, em decorrência do fato de todos serem arrastados ou impelidos


pela vaidade a falsas invenções, e assim terem embotado os seus
sentimentos, tudo quanto pensaram do Deus único – em bases naturais
– nada lhes valeu, senão que se tornassem indesculpáveis. Até mesmo
os mais sábios de todos eles põem à mostra a divagação errante da
própria mente, quando anseiam pela assistência de um Deus – qualquer
que seja ele –, por isso, em suas preces invocam divindades incertas.
Acrescente-se a isso que, pelo fato de imaginarem que a natureza de
Deus é múltipla – ainda que o seu sentimento, em relação à divindade,
fosse menos absurdo do que o sentir do vulgacho em relação a Júpiter,
Mercúrio, Vênus, Minerva e outros deuses –, mesmo os mais sábios não
escaparam das enganosas sutilezas de Satanás. E como já dissemos em
outro lugar (nesta obra), todos e quaisquer artifícios que os filósofos
imaginaram com argúcia, não diminuem o seu crime de apostasia, mas
tornam evidente que a verdade de Deus foi corrompida por todos eles.
Por essa razão, o profeta Habacuque, onde condena a todos os ídolos
ordena que se busque a Deus no seu templo (2.20), para que os fiéis
não admitissem outro Deus, a não ser aquele que se revelou por Sua
Palavra.
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