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Cadernos da

So c i e d a d e Br a s i l e i r a d e
D i n â m i c a d o s Gr u p o s

81
Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 111º
Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos,
realizado na cidade de Erechim, RS,
de 03 de novembro de 2004 a 28 de julho de 2006.

Coordenação:
Lídia Tassini Mancia, Didata
Solange S. de Oliveira, Especialista

Porto Alegre
2006

SBDG – Caderno 81 1
Travessa La Salle, 75
Bairro Menino Deus
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não representando necessariamente
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Suliani – Editografia Ltda.
Fone/fax (51) 3384.8579 e-mail: editor@suliani.com.br

SBDG – Caderno 81 2
NÚCLEOS

Núcleo RS
GESTOR GERAL: Mara Maru dos Santos
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suzana Zimmer
GESTOR DE EVENTOS: Doralício Siqueira Filho
VICE-GESTOR DE EVENTOS: André Beneduzi

Núcleo SC
GESTOR GERAL: Emiliana Simas Cardoso da Silva
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Carmem Sinzato
GESTOR DE EVENTOS: João Carlos Machado
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Maria Alexandra Cardoso da Silva

Núcleo PR
GESTOR GERAL: Helena Mª França Sundin
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suely do Rocio Pucci
GESTOR DE EVENTOS: Laucemir Pessine
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Ana Silvia A. Borgo

Núcleo PA
GESTOR GERAL Mauro Nogueira de Oliveira
GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza
GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira
VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira

Núcleo MS
GESTOR GERAL: Maria Selma Perez
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende
GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini

SBDG – Caderno 81 3
Apresentação

Quanto o medo superava a coragem


e a ação,
foi nascendo o movimento
e a atenção.

Um medo de se estragar que virou


Transformação.
Tudo, no início, tão fora do grupo, acabou com alguma
Conexão,
Coragem permeando a ação.

Nosso afeto
e nossos parabéns pela caminhada do Grupo
que se intitulou ora movimento ora metaformose.

Solange
e Lídia

SBDG – Caderno 81 4
Sumário

Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos


Cibele Fátima Schifel
Fabíola Griebler
Gisela Manchini de Carvalho
Solange Márcia Bandiera

Transferência e contratransferência nos fenômenos grupais


Iselda Pereira
Naiura Paludo Rossi
Patrícia de Fátima Mota

Treinamento para lideranças no ambiente organizacional


Giseli Cristine Zago
Selmar Luis Passini
Taís Regina Tibolla
Teresinha Albina Bordin

Vivenciando a coordenação
Lana Cristiane Erig
Misiara de Alcântara
Simone Alice Röhrig

Competências interpessoais em um grupo de formação


Iraci Maria Bohrer
Mara de Lima Campos
Paulo Morais

SBDG – Caderno 81 5
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Erechim – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira

Comunicação verbal e não-verbal


na dinâmica dos grupos

CIBELE FÁTIMA SCHIFEL


FABÍOLA GRIEBLER
GISELA MANCHINI DE CARVALHO
SOLANGE MÁRCIA BANDIERA

INTRODUÇÃO

Somos hoje um grupo constituído por quatro amigas, que, no início da formação,
apesar de não termos grande amizade, buscávamos idêntico objetivo: ampliar conheci-
mentos. Já se passaram dezoito meses e ousamos arriscar afirmando que as amizades que
eram superficiais ou que já tinham um vínculo estabelecido se tornaram ainda mais fortes
e intensas.
Para podermos desenvolver este trabalho coube-nos saber respeitar os limites e
desejos de todas, porém tínhamos um objetivo em comum; elaborar o trabalho. Assim,
nos deparamos com o estilo de cada uma, cujo anseio de todas constituía-se em buscar
titulação como Coordenadoras em Dinâmica de Grupo.
Acreditamos que o ser humano só existe porque se comunica e sendo assim ousa
comunicar-se de várias e inusitadas maneiras. Muitas vezes, não é falando, ou seja, não
lançando mão do suporte lingüístico, outras, é falando mas não dizendo nada, outras ve-
zes é seu corpo quem se comunica, noutras, ainda, são formas, cores, sons, ruídos, gestos,
trejeitos quem falam; enfim, são muitas as formas, as quais tentaremos demonstrar neste
trabalho.
Para que a comunicação tenha sentido devemos exercer um fluxo de mão dupla,
sempre tendo em mente que se torne comum esta comunicação entre duas ou mais pes-
soas, isto é: estabelecer dialogismo entre alguém que se comunica (ou pretende fazê-lo),
com outro, um presumível interlocutor.
Podemos afirmar que o ser humano só se inclui socialmente à medida que intera-
ge com seus semelhantes estabelecendo algumas regras que facilitam esta comunicação,
poderíamos denominar este movimento de um exercício de comunicação.
A humanidade, conforme evolui, passa a ter necessidade de comunicação, Cassi-
rer (1992, p. 21) afirma: “Os limites da minha linguagem, são os limites do meu mundo”
e o processo comunicativo pode ser verbal ou não verbal o qual vai depender da exigên-
cia do receptor em um maior ou menor grau de envolvimento das partes, significa dizer
que necessita de intencionalidade e receptividade.

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O grupo que deseja afirmar sua identidade e seus valores acaba criando uma lin-
guagem própria. E como aconteceu no nosso grupo do SBDG, turma “movimento”,
quando se criou uma linguagem e expressões que são genuínas deste grupo.
O grande grupo nos proporcionou evolução, já que se constitui como processo,
nos fazendo compreender os diferentes níveis de obstáculos, em que usamos a verdade e
a autenticidade, os feedbaks compreendidos e omitidos.

A COMUNICAÇÃO

A comunicação é uma das necessidades básicas do ser humano. Envolve a trans-


missão de conteúdos emocionais e intelectuais, e deve ser uma via de mão dupla, pois
algo deve ser tido como comum por duas ou mais pessoas.
Segundo a definição de Zimerman (2000, p. 168) “A comunicação se processa a
partir dos seguintes elementos: o emissor, a mensagem, o canal e o receptor. Cada um
deles, em separado ou em conjunto, pode sofrer um desvirtuamento patológico”.
O emissor e a fonte de sinais ou mensagens.
A mensagem é o conteúdo daquilo que deve ser emitido.
O receptor separa a fonte do destino que podem estar próximos ou distan-
tes.
O canal é quem recebe a mensagem enviada ao canal e a transforma em
algo compreensível.
A comunicação pode ser entendida como um processo social presente em todas as
sociedades, permeando suas ações, reflexões, estruturas e dimensões. É a transferência de
informação e significado de uma pessoa para outra, podendo ser considerada como o pon-
to que liga as pessoas para que compartilhem sentimentos e conhecimentos. Vygotsky
(1998, p. 157) defende que “Se os significados das palavras se alteram em sua natureza
intrínseca, então a relação entre pensamento e palavra também se modifica”. Assim sen-
do, as relações humanas, de qualquer natureza, sofrem modificações constantes.
Ainda segundo Ziberman (2000) é importante sempre levar em conta que cada
emissor tem seu próprio estilo de transmitir suas mensagens, o que de um certo modo, é
muito influenciado pela sua personalidade, dessa forma aparecem os diversos estilos, o
arrogante, o narcisista, o detalhista, o dramático, o defensivo, o auto-depreciativo, enfim,
cada um coloca o seu jeito singular de ser na mensagem.
O indivíduo extremamente narcisista reverte ao seu favor tudo o que ouve, ainda
que aparente estar em concordância com o mesmo, o arrogante, tenta provocar uma dis-
torção do verdadeiro propósito de quem emitiu a mensagem, o detalhista procura contar
tudo nos mínimos detalhes, detalhes estes que muitas vezes não teriam a menor impor-
tância senão para o que ele quis entender, o dramático está sempre fazendo “uma tempes-
tade em copo d’água”, o defensivo não espera nem o emissor concluir a mensagem e já se
coloca na defensiva, o auto depreciativo nunca ouve o que o outro quer transmitir, apenas
escuta e relaciona as próprias opiniões com às alheias e sempre acha que é inferior aos
outros.
Uma mesma mensagem pode ser entendida de diferentes formas, por um mesmo
grupo de pessoas, pois elas podem estar em diferentes estados emocionais. Ainda faz-se
importante ressaltar que alguns desentendimentos podem ocorrer devido ao significado
semântico das palavras, pois uma mesma palavra pode adquirir significados diferentes de

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uma pessoa para outra, os traços culturais, a visão de mundo, a vida pregressa, os conhe-
cimentos internalizados inerentes a cada indivíduo, tornam-no diferenciado perante os
episódios circunstanciais.
O que torna a comunicação humana um fenômeno único, é o fato de que cada pes-
soa é única em suas percepções, valores, motivações, interpretações, enfim, cada ser é
responsável pelo que fala, ouve, sente, filtra e entende.
Segundo Chiavenato (2000), todo ser humano possui uma percepção seletiva, que
além de ser um mecanismo de defesa, bloqueia as informações não desejadas, e que o
indivíduo considera irrelevantes. Dessa forma podemos dizer que aquilo que duas pessoas
comunicam é determinado pelas percepções que possuem naquele determinado momento
e pela cosmovisão que detêm.
Para entendermos a comunicação é importante entendermos os sentimentos en-
volvidos. Muitas vezes um determinado indivíduo se programa para agir de uma forma e
acaba agindo de outra, totalmente diferente e inesperada, pois o sentimento que o moti-
vou inicialmente, não é mais o mesmo no momento do seu agir já que a programação que
havia feito, pode sofrer alterações de natureza vária, inclusive de estado emocional.
As palavras nem sempre estão a serviço da comunicação, em alguns momentos,
falar não é o mesmo que comunicar, pois às vezes as palavras divergem da aparência.
Esta divergência pode ser vista como utilização de máscaras e estas dificultam a possibi-
lidade de uma comunicação ser autêntica.
A cognição ou conhecimento, representa aquilo que as pessoa sabem a respeito de
si mesmas e do ambiente que as rodeia. Neste ambiente estão compreendidos os valores
pessoais, as experiências psicológicas passadas e presentes e isto influencia profunda-
mente na personalidade de cada indivíduo, pois suas ações são guiadas pelo seu conheci-
mento, ou seja, pelo que ele pensa, acredita e sente.
Segundo a visão de Manosso (2003), um bom observador consegue identificar o
canal que uma pessoa está vivenciando ou se comunicando, através das palavras e dos
gestos que usa. As pessoas costumam utilizar em suas falas, palavras que especificam
processos de ver, ouvir, sentir, degustar e cheirar; é assim que se formam as comunica-
ções visuais, auditivas e sinestésicas. As pessoas se comunicam ainda pela postura, respi-
ração, suor, tensão muscular, relaxamento, isto é, a comunicação é entendida devido à
forma de colocação das palavras, postura corporal, gestos e expressões faciais.
Enfim, Fernandes (1991) assinala dois aspectos que são muito importantes no
processo de comunicação grupal: o primeiro é o de que “tanto o emissor como o receptor
fazem transformações o tempo todo. Desse modo, comunicação completa e verdadeira é
impossível”. O seu segundo assinalamento aponta para a relevante questão daquilo que
não é dito, sendo que “grande parte das confusões que ocorrem quando tentamos nos co-
municar, são desviadas pela omissão. Em muitos casos, o trabalho principal do analista
será tentar descobrir o que não foi dito”.
Não há outra forma de evoluir, senão a de nos comunicarmos com outras pessoas,
toda ação provoca uma reação, assim como os atos comunicativos, como veremos a se-
guir na apresentação dos conteúdos da comunicação verbal e não verbal.

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Tipos de comunicação

Comunicação verbal

A comunicação verbal e escrita ocorre de forma direta entre o emissor e o recep-


tor, mas é importante deixar bem claro que uma mensagem pode sofrer diferentes distor-
ções por ser recebida por diferentes pessoas ao mesmo tempo, sendo que estas podem
entender de formas distintas. Poderíamos dizer que o que está no imaginário destas pes-
soas, seria acrescentado à mensagem.
Em outras palavras, a comunicação verbal consiste na troca de informações reali-
zada entre duas ou mais pessoas através das palavras ou da escrita, para estabelecer um
contato com os demais, podendo, assim, expressar seus pensamentos e sentimentos.
Existem muitas diferenças na habilidade de cada indivíduo no uso da linguagem
falada, que estão relacionadas, principalmente, com o grau de inteligência, educação,
treino e classe social.
A seguir seguem alguns exemplos de comunicação verbal, extraídos do grupo
Movimento da SBDG.
– “O grupo anda no ritmo dos mais lentos”.
– “Um charuto é só um charuto”.
– “Este grupo vai me estragar”.
– “O grupo coloca só a pontinha”.
– “Aqui todos querem ser os fodões”.
– ”Vou me furar com a faquinha”.
– “Desejar o desejo do outro”.
– “Cala a boca e chupa, isto quer dizer”.
– “Tô me cagando todo”.
– “Não vou descer do salto”.
– “Só por Deus”.
– “Aqui dentro eu sou diferente de lá fora”.
– “Hoje eu gozei”.
– “Vou ter que elaborar”.
– “Vou levar para pensar”.
– “Estou tendo um insight”.
– “Não sei se volto no próximo encontro”.
– “Não sei se ocupo o meu espaço”.
– “Não tô entendendo”.
– “Nós mostramos como realmente somos”.
– “O lado saído do grupo”.
– “Este foi o meu encontro”.
– “Ir ao ponto”.
– “Matar um leão por dia”.
– “Vou largar um pum aqui”.
– “Cada um vai crescer até aonde se permitir”.
– “Sabor do chocolate e o amargo do limão”.
– “Eu não consigo, ou eu não quero”.
– “Destruir para construir”.
– “As coisas que não são resolvidas voltam”.

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– “O grupo não percebe quando atinge o objetivo”.
– “vou pegar o chicotinho”.
– “Você está sabonetiando”.
– “E o grupo se esconde atrás da técnica”.
– “O grupo da o poder para quem quer”.
– “Tira o microfone da...”
– “A serviço de que”.
– “este grupo quer se cuidado”.
– “Que jogo é este”.
– “Você conta tudo, tudinho para este grupo”.
– “Até que ponto eu valorizo eu valorizo o que tenho”.
– “Agora que ficou bom acaba”.
– “Engolir Goela abaixo”.
– “O que significa perder o poder para este grupo?”.
– “Não mexe mais comigo”.
– “O grupo se incomoda quando não se apropria”.
– “Síndrome da Gabriela”.
– “Minha verdade”.
– “Me ajuda que eu te ajudo”.
– “São sempre os mesmos”.
– “Este grupo não é um grupo terapêutico”.
– “A gente é assim, muito sério, muito rígido”.
– “Este grupo não se permite”.
– “O que tem por trás disso”.
– “O que esta fora..., o que esta aqui dentro”.
– “Do que este grupo tem medo”.
– “Este grupo só olha para o próprio umbigo, e esquece do resto”.
– “Que faceta deste grupo que esta depositada na...”
– “Qual é a perda que este grupo chora”.
– “Qual é o luto deste grupo”.
– “Estou emburrecendo”.
– “Fica na fantasia”.
– “Este grupo vai me acolher”.
– “Será que eu vou poder confiar neste grupo”.
– “Que investimento cada um está fazendo?”
– “Dar-se conta”.
– “Este grupo não se permite brincar”.
– “Porque que o riso dos membros incomoda”.
– “Vocês não estão fazendo os relatórios”
– “Tu fizeste uma escolha”.
– “Pegar alguém para Cristo”.
– “Alguma vez você disse o que espera dele?”
– “Talvez ele te dê tudo o que ele pode dar”.
– “Eu fiz falta neste grupo”.
– “Agora se abracem”.
– “Eu não sei se agüento o rojão”.
– “O grupo come para não falar”.

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Comunicação não-verbal

Segundo Kurt Lewin (1965), a comunicação não-verbal é todo recurso que possi-
bilite a comunicação além da fala. Neste contexto, podemos citar gestos, expressões fa-
ciais, posturas, enfim toda forma que expresse sentimentos sem utilizar as palavras.
Podemos considerar diversas formas de comunicação não-verbal.
Contato corporal é todo contato que possibilite proximidade física, como, por
exemplo, o grupo Movimento da SBDG, quando no início de todos os encontros o grupo
se cumprimentava com abraços, beijos, carinhos, sendo que era claro o desinteresse de
alguns por este tipo de contato, alguns saíam antes outros chegavam atrasados, e outros se
comprometiam com tarefas como limpar a cuia, preparar o chimarrão, arrumar as cadei-
ras, etc.
Proximidade física é todo convite de proximidade mais íntima, como, por exem-
plo, o grupo Movimento da SBDG sair para jantar, fazer um encontro em um local onde
todos os membros do grupo pudessem ficar juntos e dormirem em um acampamento,
como aconteceu com o grupo.
Postura corporal é a forma de inclusão expressa através do corpo, como, por
exemplo, o grupo Movimento da SBDG, quando alguns integrantes não se sentindo à
vontade demonstram seu incômodo não ficando sentados na cadeira, não se sentindo à
vontade para sentar no chão, afastar a cadeira para trás do círculo.
Gestos é a forma de expressar incomodação interior como, por exemplo, o grupo
Movimento da SBDG, quando alguns colegas caminham forte expressando indignação,
quando outros balançam a classe, batem a caneta, saem da sala para ir ao banheiro, ou
ainda gestos de finalização para encerrar uma situação.
Expressões faciais são a forma de expressar claramente, através dos músculos fa-
ciais, os sentimentos do aqui-e-agora, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG,
as caras e bocas do grupo, desânimo, frustração, incomodação, o bufar de alguns colegas,
expressões de surpresa, alegria e aceitação.
Movimento e expressão dos olhos são a forma declarada de demonstrar os sen-
timentos e buscar alianças nos sentimentos, como, por exemplo, o grupo Movimento da
SBDG, muito presente entre os membros dos subgrupos quando os mesmos, através de
olhares se comunicavam e os demais membros do grande grupo ficavam como “peixes
fora d’água”.
Aparência é a forma que o membro do grupo vê a si mesmo e como gostaria de
ser visto pelos outros, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, em que alguns
membros do grupo dizem que nunca vão descer do salto, outros sempre com cara feliz,
outros sempre se fazem de vítimas, doentes, e outros querendo ser os “fodões”.
Aspectos não-verbais da fala são a forma de desdizer alguma coisa falando algo
e demonstrando outra coisa totalmente diferente através da postura do membro, como
quando alguns integrantes do grupo Movimento da SBDG falavam que estavam felizes e
a expressão era de infelicidade, era o “tudo bem” do grupo.
É possível que a comunicação verbal não esteja sincronizada e sintonizada com a
comunicação não-verbal no mesmo indivíduo, no mesmo momento. “Às vezes o não-
verbal está em dissonância com o verbal, trai o eu íntimo que o verbal tenta camuflar”
(Mailhiot, 1970, p. 71). Para Manosso (2003), esse é o Princípio da Conformidade Ex-
pressiva, ou seja, a conformidade entre o que se expressa e o que se comunica, quando
isso não acontece causa o estranhamento, a desconfiança e a reprovação.

SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 6


Todo comportamento pode ser comunicado. Há casos, porém, em que os indiví-
duos querem evitar a comunicação e, dependendo do contexto, não podem se eximir. As-
sim, segundo Watzlawick (1967), algumas reações são possíveis de acontecer em função
do indivíduo não querer se comunicar, como:
Rejeição da comunicação – é identificada pelo não desejo de não se comunicar.
No grupo Movimento do SBDG esta situação se fez presente quando no encontro 17 foi
dada a oportunidade a uma integrante do grupo mediante a provocação, para comunicar-
se, e ela não se apropriou do espaço dizendo: “Não estou preparada para falar”.
Aceitação de comunicação – caracteriza-se pela tendência das pessoas em res-
ponder o mínimo necessário, evitando maiores informações sobre o fato. No Grupo Mo-
vimento do SBDG, constatamos isso quando supomos que, se aprofundássemos estes
temas, o que estava no imaginário do grupo iria de encontro às normas convencionadas e
crenças do grupo. Acreditamos que o grupo não aprofundou por medo de ressignificar
suas relações.
A desqualificação da comunicação – caracteriza-se quando o indivíduo invalida
sua própria comunicação ou a do outro. Abrange uma gama de fenômenos da comunica-
ção: incoerências, mudanças bruscas de assunto, interpretações erradas. O grupo Movi-
mento da SBDG, por várias vezes, não respeitou o silêncio ou o momento de seus inte-
grantes, mudando de assunto ou falando de outro problema latente, descontextualizado,
muito presente nos encontros do grupo esta atitude com relação a um integrante, que
mesmo em sua ausência, então, o grupo acabava por desqualificar algumas falas.

Silêncio

Dentre as forma de comunicação não-verbal muito utilizada pelo homem é o si-


lêncio. O silêncio é sempre uma das maneiras mais ricas de comunicação não verbal que
o grupo utiliza para expor uma faceta diferente ou para encobrir em determinado momen-
to, algo que não está conseguindo enfrentar.
O silêncio é sempre uma das mais ricas fontes de comunicação não verbal que o grupo
usa para expor uma faceta diferente ou para encobrir um determinado momento, algo que
não está conseguindo enfrentar. [...] Estar à vontade dentro dele ajudará o grupo a aliviar-
se de grande parte da tensão ansiosa (Castilho, 2002, p. 94).
O silêncio é uma expressão não-verbal do grupo, que nos comunica, às vezes,
muito mais do que as palavras. Para Castilho (2002), o silêncio é o “espinho na garganta
de muitos facilitadores de grupo”.
O silêncio marca freqüentemente o fim ou início de uma nova etapa do grupo. É
como se as pessoas estivessem procurando recuperar energias para uma nova fase, e no-
vamente se repete o ciclo do comportamento que, com outro enfoque e objetivo, quebra
resistências.
O silêncio é um fenômeno de grupo dos mais expressivos. O mesmo deve ser res-
peitado e considerado para o grupo poder ser interpretado e estudado. Sendo assim, per-
cebe-se que no começo dos grupos o mesmo é muito evitado e até incomoda, principal-
mente os membros mais ansiosos e impacientes. O grupo passa a depender dos integran-
tes que falam sem parar, fazem brincadeiras para evitar qualquer tipo de tensão.

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Mesmo com o empenho do grupo para abafá-lo, ele surge, obrigando os membros
do grupo a outras reações, como balançar os pés, escrever ou rabiscar sem parar, coar
café, tomar água ou chimarrão, trocar olhares.
Afirma Castilho (2002) que são várias as modalidades de silêncio que se fazem
presentes nos processos dos grupos. Os mais freqüentes são:
Silêncio de medo – Caracteriza-se por muita tensão, manifesta-se pela mudança
de postura física e psicológica, quando a angústia gerada pelo encontro leva para casa e
gera dor, como quando alguns integrantes do grupo Movimento da SBDG retornam no
dia seguinte após passar a noite com vômitos, dor de cabeça, enxaqueca, herpes e mal-
estar.
Silêncio da dor e perda – Este silêncio é vivido por perda real, dano muito sério,
vivido no grupo movimento SBDG como, por exemplo, a briga entre irmãos fora do gru-
po, a perda do diploma por um dos integrantes do grupo, a saída de dois integrantes do
grupo, movimentos que deixaram o eco de suas falas presentes nos demais membros.
Silêncio de expectativa – A fantasia sobre relatos que poderiam vir à tona, dei-
xando o grupo na expectativa. No grupo Movimento SBDG apareceu este silêncio em
vários momentos como, por exemplo, quando um membro do grupo falou sobre sua von-
tade de se mudar para a Bahia e, depois, nos demais encontros se calou e não relatou mais
nada.
Silêncio de solidão – É um sentimento de vazio, de estar só. Integrantes do grupo
freqüentemente citam a falta de intimidade com o parceiro e dificuldade de comunicação.
Silêncio de desinteresse – Caracteriza-se pela resistência ou bloqueio emocional
frente à situação. Presente nos encontros quando alguns integrantes saem da sala em meio
a discussões, ou quando colegas faltam a encontros e voltam como se nada tivesse ocor-
rido.
Silêncio por dificuldade de comunicação – É a dificuldade de se expressar.
Ocorre quando um integrante não ocupa o seu espaço.
Silêncio de mágoa – É sentimento de mágoa, decepção, perda de confiança em
alguém. Ocorreu quando um integrante do grupo movimento foi rejeitado por outro
membro e depois teve que fazer a co-coordenação com o mesmo. Quando um membro do
grupo rejeita o outro para não poder realizar o trabalho de coordenação, fica instaurada a
mágoa.
Silêncio de desconfiança – É o medo que o grupo tem de que exista a quebra do
sigilo ao que for colocado no grupo. No grupo, ficou depositado por duas vezes em uma
colega, quando fatos externos geraram a cobrança da possível quebra de confiança, mo-
mentos em que fantasias de integrantes desestabilizam a união e confiança do grupo.
Silêncio da reflexão – É momento de introspecção do grupo após experiência
emocional intensa. Presente no grupo movimento quando o grupo torna-se reflexivo, após
a emoção por relatos de integrantes.
Silêncio de atenção – É disposição para escutar, se colocar no lugar do outro.
Muito presente quando o integrante encontra-se motivado a falar e o grupo se dispõe a
ouvir. Ocorreu no grupo quando uma integrante trouxe para o grupo a problemática do
filho, que não conseguia ler, abalada pela perspectiva de ver sua história se repetir.
Enfim, as pessoas vivenciam inúmeras situações de silêncio, e de forma incons-
ciente ou não, esperam que ele resolva, decida ou faça tudo aquilo que elas não conse-
guem ou não querem enfrentar; contudo, percebemos no grupo, movimento que os maio-
res crescimentos, amadurecimentos e trocas, ocorreram quando a comunicação verbal foi
plena, o silêncio interpretado e a comunicação não-verbal decodificada.

SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 8


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inúmeras vezes no transcorrer do curso, ouvimos sobre a importância da comuni-
cação nos grupos. Mas o que significa exatamente comunicar? Quais são as formas de
comunicação? Há significado no silêncio? Houve efetiva comunicação no grupo que du-
rante dezoito meses integrou esta turma do SBDG?
Dessa forma, o tema escolhido por este subgrupo para o trabalho de conclusão do
curso não poderia ser mais apropriado, uma vez que a questão da comunicação nos gru-
pos é um dos cernes da própria dinâmica de grupos: a raiz da palavra comunicação é a
palavra comum. Comunicar seria o ato de tornar comum, conhecido. Este ato de tornar
comum a outras pessoas os sentimentos, as intenções, os conflitos poderia tranqüilamente
descrever um dos objetivos da dinâmica de grupos.
Durante a elaboração do trabalho, na medida em que a pesquisa teórica avançava,
surgiram, no grupo, alguns questionamentos em relação ao tema, objeto deste estudo, e à
sua relação com a prática vivenciada por todos nós, enquanto participantes do curso. Es-
pontaneamente brotaram questões como: de que forma deu-se a comunicação da turma
durante o período de duração do curso? Houve predominância de que tipo de comunica-
ção? Todos conseguiram se comunicar?
A reflexão sobre o tema levou à conclusão de que as falas dos integrantes não
transmitiram somente nossas idéias; transmitiram também um conjunto de informações
sobre nós mesmos. Certas palavras e gestos que empregávamos acabavam “denunciando”
quem éramos, o que estávamos sentindo, os conflitos conscientes e inconscientes que
estávamos vivenciando naquele momento. O uso da comunicação também informava
sobre nossa timidez, sobre nossa capacidade de nos adaptarmos a situações novas, nossas
inseguranças, limites, alternâncias, entre outras.
Por outro lado, detectou-se que, quanto mais a convivência se estreitava, mais era
possível estabelecer uma comunicação eficiente, sendo que as barreiras iniciais foram
suprimidas pouco a pouco, oportunizando a integração e o crescimento do grupo, mesmo
quando a comunicação revelava conflitos, problemas pessoais e diferenças entre os mem-
bros.
O desencontro entre o que se falava e o que se sentia gerou conflitos internos in-
dividuais que acabaram se alastrando para o grande grupo – abafados no início, os confli-
tos iam ganhando força e um dia, acabavam se exteriorizando, surpreendendo, às vezes, o
próprio autor da explosão, uma vez que estes indícios corporais, na maioria das vezes,
são sinais inconscientes até para quem os emite. A integração dos sentimentos, desejos e
anseios pessoais, com a prática da vida diária, exige um profundo autoconhecimento ou,
pelo menos, vontade sincera de se conhecer. Quanto mais distanciada está a pessoa do
que ela realmente é, mais perceptíveis são os sinais de distanciamento entre o que se ex-
pressa racionalmente e o que se expressa irracionalmente, através de todo um conjunto de
gestos corporais e atos falhos.
Nesta direção, Diana Cooper (1993, p. 127), no livro Ilumine sua vida, fornece
uma explicação interessante em relação aos sinais produzidos por nosso corpo e que se
constituem em efetiva comunicação: “O nosso corpo é um maravilhoso instrumento para
demonstrar o que está acontecendo em nossa mente. Podemos até mentir para nós mes-
mos, enganando sobre nossos sentimentos e emoções, mas nosso corpo jamais mente.”
Se alguém diz que quer fazer algo, mas seus olhos vagueiam, seu corpo está di-
zendo o contrário. Se afirmamos que gostamos de alguma coisa, mas cruzamos os braços,
nosso corpo diz que não estamos à vontade. Se, em seguida, retrucamos que cruzamos os

SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 9


braços porque nos sentimos melhor dessa maneira, significa que estamos tão habituados a
nos sentir ameaçados, que esta é de fato a única posição em que nos sentimos descontraí-
dos.
O grupo Movimento da SBDG – Erechim fez uso da comunicação não-verbal que
sempre esteve presente através dos nossos gestos, choros, nas dores de cabeça, nas en-
fermidades, nos abraços bem apertados ou na falta de cumprimentos, o excesso de cari-
nho ou a falta dele, no bom humor, enfim, o tempo todo passamos nos comunicando,
mesmo quando a intenção não era comunicar algo. Para tanto, a fim de enriquecer o tra-
balho e aproximar a teoria da comunicação nos grupos na prática vivenciada por nós,
selecionamos um conjunto de palavras, gestos e sinais que foram emitidos pela turma nos
dezoito meses de duração do curso.
Este trabalho nos proporcionou a compreensão de que a comunicação, sob qual-
quer forma que ela se manifeste, é um poderoso instrumento de ação social, transforma-
dora. Ela pode tanto facilitar quanto dificultar o nosso relacionamento com as pessoas e a
sociedade em geral. Proporcionou, igualmente, a reflexão acerca da importância do auto-
conhecimento, da análise crítica individual e do recebimento dos feedbacks: se a comuni-
cação clara do que queremos e do que pretendemos, é essencial para o nosso crescimento
nos âmbitos pessoal e profissional, antes de tudo precisamos nos comunicar com nós
mesmos. Uma mensagem confusa revela um emissor igualmente “perdido”. Uma mensa-
gem clara e objetiva, revela um emissor seguro e confiante. Como no verso “qualquer
vento ajuda para quem sabe a direção que quer tocar o barco”, quanto mais nos conhece-
mos melhor nos comunicamos e, conseqüentemente, mais perto estamos de atingir os
nossos objetivos.

REFERÊNCIAS

BION, Wilfred R. Experiência dos grupos. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1970.
CAPRA, Fritjof. As conexões ocultas: ciência para uma vida sustentável. São Paulo: Cultrix, 2002.
CASSIRER, Ernest. Linguagem e mito. São Paulo: Perspectiva, 1992.
CASTILHOS, Áurea. Dinâmica do trabalho de grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002.
CHIAVENATO, Idalberto. Recursos humanos. São Paulo: Atlas, 1994.
COOPER, Diana. Ilumine sua vida. São Paulo: Roca, 1993.
LEWIM Kurt. Teoria de campo em ciência social. São Paulo: Pioneira, 1965.
MAILHIOT, Gerald B. Dinâmica e gênese dos grupos. São Paulo: Duas Cidades, 1970.
MANOSSO, Radamés. Elementos de retórica. Disponível em:
<www.url:http://radamesm.sites.uol.com.br/autor.htm>.
MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 10. ed. Rio de Janeiro: LTC.
VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Pensamento e linguagem. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.
WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Janet H.; JACKSON, Don D. Pragmática da comunicação humana. São
Paulo: Cultrix, 1967.
ZIMERMAN, David Epelbaum. Fundamentos básicos dos grupos terapias. Porto Alegre: ArtMed, 2000.

SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 10


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Erechim – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira

Transferência e contratransferência
nos fenômenos grupais

ISELDA PEREIRA
NAIURA PALUDO ROSSI
PATRÍCIA DE FÁTIMA MOTA

™
EU NÃO SOU VOCÊ, VOCÊ NÃO É EU...
... MAS ME VEJO...
... ME SINTO EM VOCÊ...
“Eu não sou você
Você não é eu...
Mas sei muito de mim vivendo com você.
Eu não sou você
Você não é eu
Mas me encontrei comigo e me vi enquanto olhava para você
Na sua insegurança
Na sua desconfiança
Na sua competição
Na sua birra infantil
Na sua omissão
Na sua firmeza
Na sua impaciência
Na sua prepotência
Na sua fragilidade
Na sua mudez
Na sua indiferença
Na sua raiva
Na sua...
E você como se sentiu enquanto olhava para mim?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas você me reflete
No que ainda sou
No que quero vir a ser
Eu não sou você
Você não é eu
Mas me vejo, me sinto em você quando...

(Madalena Freire)

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 1


INTRODUÇÃO

Ao estruturar o tema do trabalho de conclusão, partiu-se do questionamento: “o


que despertou maior inquietude e/ou reflexão no decorrer da formação, de modo que te-
nha um sentido especial para se investigar?”.
Entre uma discussão e outra, acerca da tarefa a ser executada, resgatam-se vivên-
cias experienciadas no decorrer da formação do grupo “Movimento”, elucidando senti-
mentos que pairavam uma em relação às outras do subgrupo. Ou seja, se questionava:
“afinal, que sensações despertam e despertamos quando se percebe e percebemos reações
e sentimentos dos outros em relação a si e de si em relação aos outros?”.
Assim, se identifica a importância de examinar o conceito de transferência e con-
tratransferência, aliado aos mecanismos de defesa, focalizando suas peculiaridades no
contexto grupal. Na situação de grupo coexistem múltiplas transferências que os mem-
bros estabelecem entre si, potencializando uma gama de possibilidades de sentimentos,
tornando-se fundamental que os componentes do grupo desenvolvam a capacidade para
reconhecer os próprios sentimentos transferenciais que os outros lhe despertam, assim
como os que ele desperta nos outros. A partir disso, possibilita-se a objetivação de alguns
aspectos considerados importantes para a leitura grupal, que podem ser traduzidos no
auxilio a cada indivíduo para identificar o que é seu do que é do outro; facilitar o anda-
mento da livre tarefa e o atingimento dos objetivos do grupo; bem como, identificar as
necessidades para crescimento de cada pessoa, de que ela deve aprender a reconhecer,
por mais difícil que seja, aquilo que ela desperta nos outros.
Dessa forma o trabalho possui como objetivo estudar os fenômenos de transferên-
cia e contratransferência em grupos operativos de aprendizagem, evidenciando seu pro-
cesso e implicações no autoconhecimento, forma de interação dos membros, consecução
da tarefa e no alcance dos objetivos grupal. Visando, observar, a luz da teoria psicanalíti-
ca, alguns momentos em que o grupo de formação “Movimento” vivenciou os fenômenos
de transferência e contratransferência e seus reflexos no campo grupal.
O leitor poderá acompanhar no decorrer das próximas páginas, que desvelaremos
alguns momentos em que o fenômeno da transferência e da contratransferência ocorreu
nos encontros, precedidos da contextualização teórica, que dá suporte ao nosso entendi-
mento. Salientamos ao leitor que intencionalmente, no decorrer da nossa pesquisa, substi-
tuímos alguns termos para melhor entendimento da nossa construção literária; sem, con-
tudo, deturparmos o sentido do contexto de onde ele foi “recortado”.1
“Eu não sou você, você não é eu, mas vejo, me sinto em você quando...” Ah,
quantas projeções, sobre as quais desejamos despertar reflexões que permitam os mem-
bros de grupo lançar em seu mundo interior, na busca constante de seu autoconhecimento
como premissa para o estabelecimento de relações interpessoais que permitam a constru-
ção genuína do eu, você e nós.

1
Os termos substituídos são: terapeuta e facilitador por coordenador; paciente por grupo ou componente
de grupo.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 2


QUEM SOMOS?
UM BREVE OLHAR SOBRE O GRUPO MOVIMENTO

O 111º grupo de formação em Dinâmica de Grupo da SBDG, 2º grupo de forma-


ção da cidade de Erechim/RS, teve seu início marcado em 30 de setembro de 2004, com a
participação de 19 membros, entre os quais dois do sexo masculino, e duas coordenado-
ras, ambas de Porto Alegre-RS.
A interessante composição da educação acadêmica dos membros oferece, assim
como um “conjunto de notas musicais”, um tom complementar na construção da aprendi-
zagem. Os “tons musicais” contemplam enfermeiros (2), contabilistas (4), psicólogos (3),
advogados (3), administradores (3), pedagoga (1), assistentes sociais (2) e tecnologia da
informação (1). Cada um com conhecimentos e experiências das diversas áreas: agências
de empregos, empresas de material de construção, empresas de contabilidade, docência,
hospitais, grupos terapêuticos, consultoria, área de recursos humanos e instituições edu-
cacionais.
O grupo é convidado a construir sua “cara” através da “confecção” de seu nome,
melodia e grito de guerra. Nestes momentos, fica mais evidente a homogeneidade de al-
gumas características e dicotomicamente a heterogeneidade de outras que dão o ritmo no
funcionamento deste grupo. No decorrer da construção da melodia do grupo, surgem
inúmeras surpresas, entre as quais os tons oriundos das ciências exatas, que inicialmente
exclamavam “um charuto é só um charuto”, passam a olhar o que fica na sombra do gru-
po... o que está nas entrelinhas... E o sentimento inicial, depositado no grupo, de que in-
terpretações são restritas a psicólogos, passam a ser desmitificadas e apropriadas também
por eles.
Vários ensaios de acertos e elaborações foram construídos nos diversos encontros,
todos em busca de um significado coletivo, de uma identidade grupal que pudesse lem-
brar a “interligação” dos seus membros. No início, percebe-se foco maior em procedi-
mentos formais, como horários de funcionamentos, locais (diversas vezes foi alterados –
será o medo da afirmação deste grupo?), bem como conflitos originados pela seleção dos
“síndicos” do grupo. Estes ajustes em alguns momentos demonstravam serem necessários
para estruturação do grupo; no entanto, em outros, demonstravam que o grupo necessita-
va se conhecer, saber o que era “aceito” por todos, como também obscurecia outros as-
suntos que o grupo precisava discutir naquele momento. Aos poucos o grupo foi focando
as discussões para os assuntos que emergiam nas técnicas vivenciadas, e assim começava
ficar mais claro o que este grupo buscava.
O grupo sofreu duas perdas. A primeira relacionada a um membro que participou
do primeiro encontro e não retornou para o seguinte. O impacto desta saída se fez presen-
te nos movimentos que o grupo construiu. O sentimento foi de um desacorde, como se a
orquestra tivesse perdido um tom. O temor da separação, da perda, sondava constante-
mente o grupo: “ninguém pode desistir; temos um compromisso conosco”; “se houver
mais uma desistência eu não vou ter condições financeiras para suportar”. (Será que eram
as condições financeiras que não podiam suportar?) Ao final do segundo módulo, o grupo
sofre sua segunda desistência. E, pelo estágio de desenvolvimento em que se encontrava,
sente os reflexos e impactos deste evento, podendo ser exemplificado através da manu-
tenção (por vários encontros) da cadeira vazia no círculo, ou nos momentos de coordena-
ção que falas ficavam veladas sobre o assunto. Contudo, esta segunda desistência permite
ao grupo perceber seu funcionamento diante de perdas, dos temores e angústias que ron-
dam, bem como o seu trabalho de elaboração do luto e de fantasias de abandono, entre

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 3


outros temas e sentimentos que nos fogem no momento em que revivemos e resgatamos
transcrever esta história.
Diversos sons e melodias surgem no caminhar deste grupo, oscilando em suaves,
alegres, tristes, ruidosas, silenciosas, confabulosas, empáticas, agitadas, projetivas... E
neste balançar, entrelaçado de emoções, o 111º grupo vai construindo a sua história e
identidade grupal, contando ao término, após 19 encontros mensais, com 17 membros, ou
melhor, 17 tons musicais da mais bela sinfonia oportunizada pela Sociedade Brasileira de
Dinâmica de Grupo.

O FENÔMENO DA TRANSFERÊNCIA

Para melhor compreender o conceito de transferência, pode-se inicialmente rever


a definição da palavra transferir. De acordo com o dicionário Novo Aurélio Século XXI,
corresponde a “fazer passar (de um lugar para outro); mudar de um lugar para outro; des-
locar”. Conseqüentemente, designa-se por transferência o “ato ou efeito de deslocar,
transferir ou ceder a outrem a propriedade de algo”. Aproximando-se do conceito psica-
nalítico, equivaleria a transferir sentimentos e desejos inconscientes vivenciados no pas-
sado com pessoas importantes (por exemplo, pai, mãe, irmãos e outros personagens signi-
ficativos, que fizeram parte das primeiras relações estabelecidas no ambiente familiar) a
outras do presente.
Embora para a comunidade psicanalítica o termo “transferência” deva ficar restri-
to ao que se passa no campo analítico, daquilo que o paciente está revivendo e sentindo
com o seu analista, é inegável que não há como desconhecer que essa expressão já ga-
nhou grande extensão e uma analogia conceitual com aquilo que se passa na relação mé-
dico-paciente, professor-aluno, patrão-empregado, etc. Como afirma Zimerman (2005),
em qualquer campo grupal, seja terapêutico ou não, é inevitável que surjam manifesta-
ções transferenciais.
A percepção distorcida do campo relacional, resultante das expectativas do passa-
do que são projetadas inadvertidamente no presente, de modo totalmente indiscriminado
e inconsciente, é o que se convencionou denominar transferência. A pessoa impõe atitu-
des, sentimentos e expectativas adotados no passado a uma pessoa do presente; mas esta
percepção é completamente desprovida de sustentação na realidade, pois se enraíza em
um solo predominantemente inconsciente e, como tal, é regida pelo processo primário de
pensamento e embebida na vida de fantasia do sujeito (Gabbard, 1992).
Ainda que vinculada aos eventos do passado, transferência é um fenômeno, por
excelência, do aqui-e-agora. É nesta realidade precária e heterogênea do espaço da trans-
ferência que vigora uma dimensão da temporalidade complexa e não-consistente marcada
pela coincidência e não coincidências simultâneas entre o passado subjetivo do indivíduo.
Neste espaço, tanto o passado irrompe no atual, como o presente pode incidir sobre o
passado, desconcertando-o e ressignificando-o.

O FENÔMENO DA TRANSFERÊNCIA NOS GRUPOS

A transferência no grupo é multilateral, pois engloba não somente o relaciona-


mento dos membros do grupo com o coordenador, mas também dos próprios membros

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 4


entre si (Zimerman, 1999). Logo nos estágios iniciais do grupo, pode-se observar que há
alguns indivíduos que estabelecem uma transferência com o coordenador, enquanto ou-
tros o farão com determinados participantes. Nota-se, assim, que progressivamente vai se
estabelecendo uma rede de relações entre os membros do grupo e, paralelamente, confi-
gura-se a transferência dos membros em relação ao coordenador e deles próprios entre si.
Essa configuração multifacetada de vínculos leva ao desenvolvimento de um senso de
intimidade dentro do grupo, que contribui para fomentar um clima de confiança e de
maior liberdade em relação às inibições individuais.
Contudo, em grupos operativos não-terapêuticos, de ensino aprendizagem, por
exemplo, o coordenador nada fará para incrementar o surgimento das transferências e
somente trabalhará com as mesmas se elas estiverem muito emergentes e num grau im-
peditivo do livre curso da tarefa grupal.
Segundo Zimerman (2005), a transferência pode se manifestar em quatro níveis,
os quais serão elucidados através de um breve conceito e com exemplos extraídos dos
encontros de formação em diferentes datas:

a) Transferência Parental: de cada indivíduo em relação à figura central do coordenador


de grupo.
Caso: O membro R coloca para o grupo que tinha expectativa que suas interven-
ções fossem validadas pela coordenadora P. Esclareceu que isto fazia com que tivesse
uma grande exigência na elaboração de suas interpretações, inclusive gerando seu silên-
cio, devido o medo de não atender as expectativas da coordenadora.
Hipótese: O membro R transfere a sua própria auto-exigência de desempenho pa-
ra figura do coordenador e a necessidade de ser percebida, aceita, por figuras de autorida-
de.

b) Transferência Grupal: do grupo como uma totalidade em relação à figura central, ou


seja, o membro que está se manifestando.
Caso: No antepenúltimo encontro do grupo Metamorfose o membro N relata no
jornal a possibilidde de repetência de seu filho na escola. Diz que a professora apontou o
seu filho como o mais fraco da turma e ainda não consegue ler. Durante o relato, o mem-
bro N se emociona, relembrando que repetiu por duas vezes e diz sentir vergonha deste
fato. Abaixa a cabeça e não consegue olhar o grupo.
O grupo se mobiliza em torno do tema, e utiliza-se de teoria pedagógica, afirman-
do que a professora não tem uma postura adequada frente à questão, pois se deve respei-
tar o ritmo de cada aluno.
O membro P intervém e diz: “Gente vamos ouvir o sentimento dela!”
Hipótese: A totalidade do grupo (representado por N) identificou-se com a condi-
ção de fragilidade e medo de não atender as expectativas de membros diversos, de ser o
fraco do grupo.

c) Transferência Fraternal: de cada indivíduo em relação a outro(s) determinado(s)


indivíduo(s).
Caso: O membro O diz ter se sentido traído pelo subgrupo de estudos teóricos,
devido o membro C não ter falado sobre a sua escolha de outros pares para o trabalho de
conclusão. Fala sentir-se traído pelas coisas não ditas, não faladas sobre o que vinha
acontecendo e também traído pelo subgrupo não ter feito o trabalho de conclusão, mas ter
sido desmembrado.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 5


O membro C pergunta para O: “E o que você fez para contribuir para o nosso gru-
po se reunir? Você nem vinha participando dos encontros de estudo”.
O membro O responde: “muitas vezes quando tentei falar, senti você irônica co-
migo”.
Hipótese 1: O membro O transfere para o membro C sua insatisfação com as coi-
sas não ditas no grupo Metamorfose, e com a ironia do grupo em relação a ele em alguns
momentos.
Hipótese 2: Outra possibilidade seria o membro O transferir para o membro C a
angustia latente do grupo diante do penúltimo encontro e do questionamento sobre com
quem manter-se-á contato e com quem não manter-se-á contato? Como serão as esco-
lhas? O grupo conseguirá manter contato ou estabelecer-se-á subgrupos? Sentiremos-nos
traídos?

d) Transferência de Pertença: de cada indivíduo em relação ao grupo como uma enti-


dade abstrata.

Caso 1: Um dos momentos de auge coletivo no grupo ocorre no encerramento do


primeiro módulo, quando os membros divididos em subgrupos, realizam a técnica de
construção do nome do grupo, denominado Metamorfose, do grito de guerra, “eu posso,
eu quero, vamos nos experimentar”, da simbologia materializada num “aspiral de cor
verde” e de um single que em seu refrão diz “Eu prefiro ser está metamorfose ambulante,
a ter aquela velha opinião formada sobre tudo”.
Hipótese: Diante do desenvolvimento da técnica, os membros transferem ao gru-
po as expectativas, ideais e necessidades que são individuais e que se manifestam no co-
letivo.

Caso 2: O membro R exclama: “Será que este grupo, ao descobrir minhas fragili-
dades, vai me ajudar a superá-las ou vai reforçá-las, através de rótulos?”
Hipótese: O membro R, no início da formação, transfere para o grupo, enquanto
entidade abstrata, sua preocupação em demonstrar o seu “eu secreto” e a dúvida se
encontrará no grupo amparo ou exclusão, configurando um pedido para aceitar os
membros nas suas diferenças e na busca de cumplicidade.

Para melhor elucidar os exemplos citados acima, ressalta-se que a configuração


das diversas identificações parciais de cada indivíduo irá determinar, em grande parte, a
formação de sua identidade, tanto a individual como a grupal. Para Winnicott (apud Zi-
merman, 1999), as transferências acontecem muitas vezes com o auxílio de nossas expec-
tativas depositadas nos outros e oriundas de relações introjetadas.

Caso 2: O membro R se interroga: “Será que este grupo, ao descobrir minhas fra-
gilidades, vai me ajudar a superá-las ou vai reforçá-las, através de rótulos?”
Hipótese: O membro R, no início da formação, transfere para o grupo, enquanto
entidade abstrata, sua preocupação em demonstrar o seu “eu secreto” e a dúvida se
encontrará no grupo amparo ou exclusão, configurando um pedido para aceitar os
membros nas suas diferenças e na busca de cumplicidade.

Diante das modalidades citadas, cabe salientar que todas as transferências se pro-
cessam simultaneamente, embora haja momentos em que alguma prevaleça com maior

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 6


nitidez, constituindo o que se costuma chamar “transferências cruzadas”. Ou seja, as di-
versas situações que estão interligadas entre os membros do grupo.
Atualmente, sabe-se que desde seu primeiro movimento, qualquer membro de um
grupo está processando uma distorção em sua percepção do coordenador e dos demais
componentes. Na verdade, antes mesmo de ingressar no grupo cada membro já traz con-
sigo uma distorção perceptiva em suas expectativas iniciais de como serão os outros ou
de como irão tratá-lo. Devido à semelhança dos conflitos, frustrações e desilusões vivi-
dos, é possível que experiências emocionais intensas de natureza transferencial de um ou
mais membros despertem determinados conflitos de transferência em outros participantes
assim que são vivenciadas.

Outro aspecto relevante do fenômeno transferencial é a chamada Transferência


Negativa, citada por Freud (1912), que se refere às transferências nas quais predomina-
vam os sentimentos de inveja, ciúme, rivalidade, voracidade, ambição desmedida...
Caso 1: No momento do jornal o membro I comenta extensivamente a sua felici-
dade pela conquista de seu espaço residencial, e em encontros posteriores ele traz suas
conquistas profissionais e de bens materiais.
Hipótese: O membro I quando traz os seus desejos demonstra uma busca pela
aproximação de conquistas externas, pois como verbaliza “tem interesse de desejar o de-
sejo do outro”. Trazendo sua fala encontros posteriores o membro E verbalizar uma con-
quista da compra de seu carro.

Caso 2: O membro E recebe vários elogios da coordenação devido o seu desem-


penho no papel de coordenador do grupo, inclusive cita: “você surpreendeu o grupo!”. Na
técnica desenvolvida por E, usou metaforicamente os instrumentos “garfo”, relacionando
quando o grupo se espeta, a faca “quando o grupo se fere, se corta” e a colher “quando o
grupo acolhe, cuida”. Após os feedbacks positivos direcionados a E, o membro J questio-
na a ele: “Será que a coordenação não usou da ‘colher’ com você? O questionamento,
realizado perante outros membro do grupo, soa como se a coordenação de E não tivesse
sido tudo aquilo posto pela coordenação.
Hipótese: O membro J transfere o desejo de reconhecimento da coordenação em
relação ao seu desempenho no grupo, e exprime sentimento de ciúmes do membro E.

A expressão Transferência Positiva designa todas as pulsões relativas a senti-


mentos amistosos. No entanto, o mais importante é destacar que aquilo que muitas vezes
parece ser uma transferência positiva pode estar sendo negativa, do ponto de vista de um
processo analítico, porquanto pode estar representando não mais do que uma extrema e
permanente idealização, o que representa um entrave para um verdadeiro crescimento
(Zimerman, 1999).

Caso 1: O membro H vivenciando uma situação delicada que envolve sua família,
decide mudar de endereço residencial. Recebendo o apoio manifestado por todos os
membros do grupo.
Hipótese: O membro H oportuniza ao grupo um convite para trocar de “local, re-
sidência”, ampliar seu espaço de ação, com maior liberdade e poder de escolha, verbali-
zando e materializando uma ação que, inconscientemente, todo o grupo manifesta dese-
jar.Por isso que o grupo legitima e acolhe.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 7


Além das modalidades citadas acima, também encontramos o conceito Para-
Transferência, no qual a pessoa extravasa para fora da situação analítica (no caso do
ambiente terapêutico) os seus sentimentos transferenciais que estão sonegados e que não
aparecem diretamente no momento e acabam sendo levados para as pessoas do convívio
diário. (Zimerman, 1999).
Caso: Quando o membro N relata uma situação de frustração vivenciada com du-
as pessoas externas, diante da postura egoísta de uma delas e aceitada pela outra. Em re-
lação a esta última, o membro N tem maior intimidade de dizer que não aceitará o fato
ocorrido, pois entende falta de consideração. Neste contexto N provoca no membro U
forte emoção, já que se utilizou deste exemplo para deflagar em U uma postura indiferen-
te frente aos fatos importantes que vem ocorrendo em sua vida, os quais estão sendo acei-
tos de forma cruel com ela mesma.
Soma-se ainda o termo Transferência Perversa, se referindo quando os mem-
bros em geral, de alguma forma, tendem “perverter” as combinações que eles aceitaram
em relação ao trabalho, ou seja, buscam mudar as regras do jogo (Zimerman, 1999).
Caso: Quando os membros do grupo, como forma de transferir sentimentos depo-
sitados no grupo, chegam atrasados, ficam “saboneteando”, discutindo por várias vezes a
mesma situação, disponibilizam tempo reduzido para os seminários e estudos. Outra si-
tuação ocorre quando o grupo metamorfose, por várias vezes, não realizou um dos semi-
nários, pois se estendeu em discussões. Neste momento, alguns alertavam “ainda temos o
seminário para realizar”, mas não tinha eco no grupo. Outros membros se antecipavam e
propunham: “vamos realizar o estudo dos dois temas num único seminário”, unindo os
temas. Ou seja, trocavam-se as regras e no dia seguinte o grupo percebia a perda de con-
teúdo, face o tempo escasso para apresentar, decorrente da mudança das regras.
A transferência se expressa por meio de um ou vários porta-vozes. Estes dão indí-
cios que permitem ao coordenador entender os papéis que estão sendo assumidos por um
ou mais participantes e também conferidos a eles, pelo próprio grupo, e a partir dessa
compreensão ajudar o grupo a confrontar-se com a realidade concreta. Ou seja, é papel do
coordenador ajudar a explicitar o implícito. Como coloca Castilho (1997), poderá ocorrer
que um indivíduo procura falar por outros membros do grupo, que são mais reservados
ou calados, expressando os sentimentos, quando na verdade ele está apenas servindo de
meio para o sujeito externar suas próprias concepções ou sentimentos. Essas atitudes po-
derão, no futuro, vir a causar ressentimentos à pessoa “calada”, levando-a a uma atitude
de protesto.

TRANSFERÊNCIA E MECANISMOS DE DEFESA

No campo grupal há transferência em tudo, mas nem tudo é transferência a ser


trabalhada, pois, como afirma Freud (1895, p. 360), o termo “transferência” pode ser
também avaliado no sentido de uma forma de resistência, isto é, como um obstáculo à
análise, bem como, uma forma de um falso enlace, ou falsas conexões entre paciente e
terapeuta (no ambiente terapêutico). Após alguns estudos o mesmo autor conceitua a
transferência “como novas edições revistas” passando a considerá-la como uma inevitá-
vel necessidade.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 8


Caso: Quando o Membro O resiste à possibilidade de escuta de um feedback so-
bre as suas atitudes, buscando sempre uma justificativa sobre suas intervenções. O que
dificulta a elaboração do insight emocional na situação vivenciada.
Hipótese: O membro O, buscando resistir a tomada de consciência através da elu-
cidação que outros membros externaram, toma uma atitude “emburrecedora – de não-
entendimento” justificando sua ação.

Zimerman (2005) define a expressão “mecanismo de defesa” como distintos tipos


de operação mental que tem por finalidade reduzir as tensões psíquicas internas, ou seja,
das angústias. Salienta também que qualquer defesa, por mais primitiva que seja, inicial-
mente é útil para o desenvolvimento do psiquismo. Por esse motivo esta pesquisa busca
elucidar e elaborar esses aspectos, buscando o insigth, focalizando somente os mecanis-
mos de defesa que estão interligados no processo transferencial e contratransferencial.
Ressalta-se que a transferência é um fenômeno pelo qual emerge por muitas vezes
associado aos mecanismos de defesa, no entanto, é um aspecto singular, mas em relação
ao qual se busca reconhecer e legitimar a sua importância no processo intra e interpessoal.

a) Deslocamento: Essa defesa é um processo inconsciente pelo qual os sentimentos são


vinculados a uma fonte e redirecionados a outra. A transferência constitui um exemplo
evidente de deslocamento, visto que os sentimentos por uma pessoa do passado são trans-
feridos para uma figura do presente.
Caso: O membro F, quando cobrado pelo grupo devido sua postura reservada e si-
lêncio freqüente, se emociona e justifica que seu comportamento está atrelado a educação
que recebeu de sua mãe na infância: “não é bonito falar de você, sobre as tuas coisas com
outras pessoas”.
Hipótese: o silêncio foi mecanismo de defesa utilizado para não transgredir o mo-
delo de educação recebido na infância, além de transferir para o grupo o entendimento de
que não seria adequado se expor.

b) Isolamento do afeto: esse mecanismo divorcia o afeto da ideação. Uma recordação


traumática pode ser facilmente evocada, mas será destituída de qualquer sentimento in-
tenso concomitante. O isolamento freqüentemente age de mãos dadas com a intelectuali-
zação, que realiza uma função similar, de evitação do afeto.
Caso: O membro U recebe um feedback sobre sua atuação no grupo, onde não se
expõe, chega atrasado e já esteve ausente. Em seguida, “U” responde de forma intelectua-
lizada. Questionado sobre sua forma de resposta, uma vez que passou a imagem de não
ter acolhido o feedback como uma oportunidade de reflexão, fica sem graça e diz “eu não
desço do salto”; e continua, lembrando que quando era secretária sempre usava salto,
mesmo para limpar o chão do escritório.
Hipótese: o membro U utilizava-se de postura intelectualizada no grupo para se
proteger e evitar exposição emocional. O “não descer do salto” era como um escudo con-
tra a sinalização do grupo de acolhida e afeto para que pudesse falar sobre seus sentimen-
tos, já que era visível seu esforço para encobri-los.

c) Identificação Projetiva: Este mecanismo de defesa é um processo inconsciente


constituído de três etapas, pelo qual aspectos de si mesmo são renegados e atribuídos a
outrem. As três etapas incluem:

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 9


1 – O membro do grupo projeta uma representação do self ou do objeto no grupo
e em seus pares.
Caso: O membro D entrega convite de casamento para membro J, que surpreso
com o modelo do convite exclama: “seu convite quebrou a formalidade, e isto representa
para mim que poderei ser eu mesma no seu casamento”.
Hipótese: o membro J deposita simbolicamente no objeto convite um pedido de
espontaneidade e quebra de formalidades no grupo, na “união” do Grupo Metamorfose.

2 – O coordenador inconscientemente identifica-se com o que é projetado e co-


meça a sentir-se e comportar-se como a representação do self ou do objeto projetado, em
resposta à pressão interpessoal exercida pelos membros do grupo.
Caso: Quando os membros do grupo projetam no membro U a sua falta de afeto, e
este membro quando realiza suas atividades de coordenação traz técnicas e reflexões mais
“racionais”.
Hipótese: a pressão exercida pelo grupo no sentido de que o membro U não aja
com afeto, respaldos em declaração anterior do respectivo membro que afirma que evita
em suas decisões a emoção e afeto, contribui para que o membro U, no momento de sua
coordenação, realize o processamento da técnica de forma mais intelectualizada.

3 – O material projetado é “psicologicamente processado” e modificado pelo co-


ordenador, que o devolve aos membros do grupo via reintrojeção. Ressalva-se que nem
todo o material projetado deve ser foco de análise pelo coordenador, se tratando da espe-
cificidade do grupo pesquisado, e sim, somente nos aspectos que tiverem dificultando o
funcionamento da dinâmica do grupo.
Caso: O grupo com freqüência deposita no coordenador P o papel de autorizar e
decidir algumas regras: “Posso falar agora?”; “Podemos realizar o intervalo antes?” Dian-
te desta situação, P devolve para o grupo em forma descontraída: “Vocês parece que per-
guntam: mamãe posso ir? mamãe posso fazer?”.
Hipótese: P permite que o grupo perceba seu grau de dependência e necessidade
de aprovação, bem como, desperta para a importância da construção da autonomia do
grupo, de seu jeito próprio de funcionar.

Dentro deste contexto, Kernberg (1987b) verbaliza que a identificação ocorre


dentro do projetor, não no alvo da projeção. Mantendo esse vínculo empático ou identifi-
cação com o que foi projetado, o projetor tem a fantasia de controle sobre o material pro-
jetado. Sandler (1987) observou: “Aquilo de que alguém deseja livrar-se em si mesmo
pode ser-lhe colocado à disposição pela identificação projetiva, e pelo controle do objeto
pode adquirir a ilusão inconsciente de controlar o aspecto desejado e projetado do self”.
Já Zimerman (1999) acentua que as cargas de identificações projetivas, pelas quais o in-
divíduo que não consegue conter dentro de si próprio os seus aspectos maus e bons, os
projeta dentro de outros, que então passam a ser sentidos como idênticos a ele.
Caso 1: Quanto o membro A, relatando um evento erótico, diz para o membro R:
“Por que esta cara?”. R lhe dá a devolutiva: “Esta expressão é tua. Eu estou gostando”. E
não se deixa envolver pelo sentimento do outro.
Hipótese: A projeta no outro o receio ou repreensão de seus próprios pensamentos
e sentimentos.

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Negação: Refere-se a um processo pelo qual o sujeito, de alguma forma, inconsciente-
mente, não quer tomar conhecimento de algum desejo, fantasia, pensamento ou sentimen-
to, e assim faz como se esse não existisse.

Caso: Membro I relata no jornal que durante um jantar que realizou para sua famí-
lia corta o dedo e vai mostrar a todos o que houve. Diz no decorrer de sua fala: “Não sei
como consegui cortar o dedo numa lata!” Não obtendo a atenção da família, enrola a mão
na camiseta aglomerando sangue e mostra a todos novamente, gerando neste momento
preocupação de modo que levam-na para o pronto socorro. Após relata que não obedeceu
às orientações médicas sobre o tempo para retirada dos pontos, tendo ela mesma tirado os
pontos e posteriormente contado aos familiares a proeza que fez.
Após I relatar a situação, o membro C propõe ao membro I que reflita sobre a si-
tuação, questionando se não agiu daquela forma para chamar a atenção de sua família.
Diante desta colocação I contesta veemente, nega várias vezes, fica irritado e durante o
encontro cala-se.
Duas características principais da transferência são as inadequações ao relaciona-
mento atual e o fato de ser uma repetição do passado (Geenson, 1967). A pessoa incons-
cientemente reencena o relacionamento passado, ao invés de recordá-lo, e ao fazê-lo in-
troduz no tratamento grande quantidade de informações sobre os relacionamentos passa-
dos. Para ser mais preciso, todo relacionamento é uma mistura de relação real e fenômeno
transferencial, visto que a transferência superpõe-se às características reais.
Caso: Quando o membro A projeta no membro E sua fase de início de carreira e
traz este relato ao grupo, ficando indignada quando E não age no grupo como o membro
A gostaria que ela agisse.
Hipótese: O membro A projeta no membro E algumas situações suas passadas e
como forma de re-significá-las, fica indignada quando o membro E não realiza o que sua
necessidade está manifestando.

As manifestações de resistência estão presentes em toda parte e podem assumir


muitas formas, incluindo atrasos nos encontros, relutância em estudar para a socialização
dos seminários, esquecerem as datas dos encontros (quer seja do grupo ou do subgrupo),
silêncio ou omissão de contribuição nos encontros, conversa paralela, teorização ou “em-
bretamento” em assuntos não tão relevantes ao momento, falando sobre e não vivendo o
aqui e agora. Toda resistência tem em comum uma tentativa de evitar sentimentos desa-
gradáveis, seja raiva, culpa, amor, inveja, vergonha, tristeza, ansiedade, e assim por diante.
Caso: Membro N protesta sobre a necessidade de estudar para os seminários, ten-
do que reunir-se com o subgrupo, fazer resumos e preparar as apresentações. Exclama:
“Que saco, o meu tempo de fazer trabalhos passou com a fase da faculdade”.
Em encontro posterior, foi direcionado ao membro N elogio sobre sua capacidade,
inteligência. O membro emociona-se e expõe: “às vezes me acho burrinha e a minha fa-
mília sempre me tratou como se eu fosse fraca”. Ainda, compartilha com o grupo: “Vocês
não sabem o quanto é importante para mim este feedback. Vou colar este cartaz (fazia
parte da técnica) na minha geladeira, para todos da minha família verem”. A partir deste
evento, o membro N conquistou um espaço significativo nos seminários, oferecendo con-
tribuições importantes ao desenvolvimento do grupo.
Hipótese: Num primeiro momento, foi resistente aos seminários, talvez como uma
defesa diante da fantasia de não dar conta dos conteúdos teóricos.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 11


Psicanalistas pesquisadores norte-americanos, como Kantrowitz in Zimermann
(1999), que uma relação analítica, vai muito além de uma simples relação transferencial
repetidora de vivências passadas. E essas investigações, fizeram estes autores concluírem
que os aspectos pessoais de cada psicanalista (coordenador) em relação com os de um
determinado paciente (membro de grupo) constituem um match singular, o qual tem uma
decisiva influência na evolução, exitosa ou não, da análise (funcionamento de grupo).
Caso: Quando os membros J, R e B verbalizam, no momento de expor os seus
sentimentos em relação à experiência da co-coordenação, que receavam coordenar na
presença coordenadora P. Esta declaração ecoa no grupo, em especial no membro I que
diz compartilhar do mesmo sentimento, pois tinham a sensação que não dariam conta e
receavam as observações, desta coordenadora, não serem positivas.

Zimermann (1999) cita o termo Transferência Idealizadora, ou seja, os aspectos


transferências conduzidos do paciente (membros do grupo) para o analista (coordenado-
res), que se não atende às expectativas dos membros estes se sentem desamparados.
Caso: Quando o membro I chega ao primeiro encontro e tem como expectativa
presenciar “o quadro cheio de informações, orientações e instruções” e quando se depara
com um contexto diferenciado se questiona “Eu comprei até um caderno, não vamos
usar?”.
Caso: O grupo nos primeiros seminários aguarda a confirmação da coordenação
ou até mesmo solicita “palestra” sobre temas específicos, conferindo (idealizando) a co-
ordenação o saber da interpretação teórica.

CONTRATRANSFERÊNCIA

O fenômeno contratransferencial está intimamente ligado ao fenômeno da transfe-


rência, de maneira que são indissociáveis e muitas vezes superpostos. Assim, podendo
agir de forma benéfica ou inadequada, dependendo da utilização, bem como da consciên-
cia da sua existência.
Os pacientes têm transferência, os terapeutas têm contratransferência, em um tra-
balho de grupo o mesmo acontece entre coordenador para com os membros, uma vez que
cada qual inconscientemente, experimenta o outro como alguém do passado.
Enquanto a transferência é discutida e analisada como parte do processo grupal, a
contratransferência é controlada pela constante vigilância interna do coordenador, que
nota a emergência de poderosos sentimentos positivos e negativos em relação aos mem-
bros e reflete em silêncio acerca da possível origem de tais sentimentos no contexto de
relacionamentos passados. Esse processo de controle consiste numa tentativa deliberada
de recordar, que ajuda a evitar a repetição ou reencenação da antiga relação objetal (Zi-
merman, 1999).
A contratransferência se origina das cargas de identificações projetivas que os
membros depositam no coordenador e que, por isso mesmo, podem se constituir para este
como uma excelente bússola para a empatia e para a interpretação. A definição de Freud
referia-se a transferência do analista ao paciente ou a resposta do analista a transferência
do paciente. Implícita nessa conceituação está à emergência de conflitos não-resolvidos
do inconsciente do analista, que no processo grupal se refere ao coordenador (Bechelli e
Santos, 2006).

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O prefixo “contra” ganhou um claro significado de contraparte, ou seja, aquilo
que o coordenador sente é o que os membros o fizeram sentir, porquanto constitui os sen-
timentos do mundo interior deste último. Contudo, é indispensável que se tenha claro à
distinção entre o que é contratransferência propriamente dita, e o que é simplesmente a
transferência própria da pessoa do coordenador (Kernberg, 1965).
Para Bion (citado por Zimermann, 1999) a transferência não é estática e uniforme,
antes, ela resulta e comporta-se como um processo de transformações, dependendo de
como é vista a figura dos seus membros. Pois, partindo do pressuposto de Descarte o ana-
lista (na condição terapêutica), é visto como uma pessoa real e não unicamente como um
objeto, uma mera pantalha transferencial.
Caso: O membro U faltou alguns encontros do grupo, inclusive no encontro que
antecedeu a sua coordenação. Além disso, vinha sendo sinalizadas e questionadas pelo
grupo suas contribuições teorizadas, sem entrar em nível de sentimentos. Na coordenação
do membro U, teve que administrar durante a sua técnica atrasos de vários membros do
grupo, e a intervenção dos membros restritos a falar “sobre a técnica” de forma teorizada.
Hipótese: Os membros do grupo transferem para técnica a insatisfação em relação
à participação e comprometimento de U, já que não conseguiam fazer de forma explicita.

CONTRATRANSFERÊNCIA NOS GRUPOS

Da mesma forma como ocorre com a transferência, também a contratransferência


se processa no campo grupal, em quatro níveis:

1) Os sentimentos do coordenador em relação, separadamente, a cada um dos membros.


Caso: No evento de revelação do amigo secreto o membro M, o qual representava
a figura do coordenador, verbaliza que se identifica com o membro R por sua história de
vida semelhante.
Hipótese: Diante da manifestação de M poderia dificultar o funcionamento no
ambiente grupal, devidos provocar sentimentos de ciúmes, de competição pela atenção da
coordenação, de sensação de membro “favorito”, etc.

2) Os sentimentos em relação ao grupo como uma totalidade gestáltica.


Caso: O coordenador P ao se deparar com o não-aprofundamento teórico na socia-
lização dos seminários relata sua insatisfação e frustração: “Aí quando alguém questionar
com quem vocês fizeram a formação na SBDG e vocês responderem que foi comigo, a
pessoa vai pensar: Nossa, fez formação com P e não domina os conceitos? Não acredi-
to!”.
Hipótese: A coordenadora P contratransfere para o grupo sua idealização de com-
petência.

3) Os sentimentos que determinados membros do grupo desenvolvem e agem em relação


a cada um de seus pares.
Caso: O membro Q era tido no início da formação como alguém mais reservado,
com dificuldades de expor os seus sentimentos e ocupar o seu espaço. Várias vezes era
lembrado: “Q ainda não falou!” ou no jornal sempre era uma das últimas pessoas a falar.
No decorrer da formação, Q passou a ser percebido como um membro “especial”, que

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 13


transmitia energia, paz, tranqüilidade, e as suas intervenções passaram a ser entendidas
como simples mais profundas e verdadeiras. Este sentimento reflete no momento da esco-
lha de pares para co-coordenação, onde o membro Q foi escolhido por o membro J, V,
inclusive ficou emocionada e surpresa com a manifestação do grupo.
Hipótese: O momento de coordenar é tenso na maioria das vezes, e o grupo depo-
sita no membro Q, através de sentimentos prévios, a possibilidade de coordenar de uma
forma mais tranqüila e segura, ancorados na serenidade de Q. Foi dito por J: “Ela vai me
passar à segurança e tranqüilidade que preciso no momento de coordenar”.

4) Os sentimentos de cada indivíduo em relação ao que o grupo, como uma totalidade


abstrata, lhe desperta. São as contratransferências cruzadas, específicas do campo das
grupoterapias.
Caso: O grupo foi citado várias vezes, por alguns membros, como sendo sério,
conservador. Este assunto foi pauta de vários encontros, enfatizando a discussão diante de
técnicas onde alguns membros brincavam, davam risadas altas, e isto era compreendido
como falta de responsabilidade por outros membros. A coordenação chegou a propor para
o grupo, no primeiro módulo, que cada membro contasse um “mico” que tivesse passado.
A tentativa, entende-se, era de descontrair e assim atingir a espontaneidade.
Hipótese: O grupo despertava, para alguns membros, seriedade atrelada a atitudes
sérias, cometidas, porém isto representava um mecanismo de controle, já que os membros
estavam se conhecendo e descobrindo o quanto poderiam arriscar-se e expor-se na convi-
vência grupal.

A contratransferência resulta, essencialmente, das contra-identificações projetivas


e ela tanto pode servir como um instrumento de empatia (contratransferência concordan-
te), como, ao contrário.

O COORDENADOR NO FENÔMENO TRANSFERENCIAL


E CONTRATRANSFERENCIAL

Vielmo (2006) destaca a colocação de Zimerman quando o mesmo diz que “Em
qualquer campo grupal, quer seja terapêutico ou não, é inevitável que surjam manifesta-
ções transferenciais”. O que difere é a forma como o coordenador compreende e maneja
as manifestações transferenciais. Podendo auxiliar no esclarecimento do funcionamento
do grupo ou podendo “embretar o mesmo”. Sendo fundamental que o coordenador tenha
uma profunda consciência de suas necessidades, carências e limitações, para que não se
transforme dentro do grupo em um “cliente”, precisando mais de ajuda do que, no fundo,
podendo ajudar.
Dentro deste contexto, Castilho (1997), verbaliza que o coordenador deve ter uma
compreensão exata dos seus próprios sentimentos; o que se passa consigo, que repercus-
são tem aquele momento do grupo para ele. Isso requer certo grau de maturidade e auto-
conhecimento, pois implica entender e aceitar suas dimensões e limitações. Seu encora-
jamento capaz de considerá-las para que não venha a interferir de modo pouco produtivo,
para não dizer negativo, no desenvolvimento do grupo.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 14


Caso: O membro O, no papel de coordenador, é questionado sobre sua postura
enquanto membro, no entanto o mesmo ouve e busca uma continência em si e assim dá
seqüência nas suas atividades sem “pegar” para si a fala dos membros.
Hipótese: Quando membro O percebe o seu papel de coordenador, bem como tem
conhecimento da transferência e desejo dos membros do grupo de mandar seus recados a
ele no momento de sua coordenação, pois acaba sendo o depositário de vários sentimen-
tos do grupo, não se “embreta” nas falas. Como também, este membro pode não ter per-
cebido como sua esta atitude verbalizada pelo grupo.

Faz-se necessário também estar atento para perceber todas as reações individuais
para, num sentido gestáltico (de totalidade) dar-lhes unidade de compreensão. No grupo,
pequenos detalhes comportamentais expressam muitas vezes sentimentos comuns e laten-
tes dentro dele, e só o olho experimentado de um observador atento será capaz de perce-
ber e decodificar. É, portanto seu papel interpretar de forma clara e explícita, quando
achar necessário e conveniente, sua forma de ver e compreender o momento do grupo
(Castilho, 1997).
Caso 1: O membro L traz a luz, no momento da verbalização de sua observação, a
situação vivenciada pelo membro U em sua relação conjugal; questionando o que o grupo
tem desta fala.
Hipótese: o grupo queria falar sobre si, sobre suas relações, mas devido à dificul-
dade fica depositado no membro U esta demanda, que é elucidada no momento da socia-
lização da colocação da observadora.
Caso 2: Quando o membro J, na sua co-coordenação, insiste em concluir a técnica
segundo o seu planejamento, ignorando o movimento do grupo. O grupo realiza a con-
signa, no entanto sem se envolver de fato com a proposta.
Hipótese: O membro J, diante da situação posta acima, verbaliza, no momento de
compartilhar seus sentimentos decorrentes do exercício de co-coordenação, o seu desejo
de possibilitar ao grupo olhar para si. Enfatizando uma característica pessoal de acolhi-
mento.
Para Vielmo (2006), se o coordenador não souber identificar uma situação trans-
ferencial certamente não poderá fazer uma leitura adequada do que está acontecendo no
campo grupal.
Uma vez que quando o coordenador não se dá conta de uma situação transferen-
cial é quando “engata” contratransferencialmente. Nesta circunstância, pode ocorrer uma
distorção de percepção/compreensão do que está acontecendo no campo grupal, por parte
do coordenador, e este pode fazer uma intervenção inadequada e, que em vez de facilitar
o processo grupal, dificulta.
Caso: O membro J na sua co-coordenação apresenta dificuldades em se posicionar
enquanto coordenador e conduzir o trabalho, quando se depara com uma atitude do mem-
bro C que se emociona pelo fato de ter conseguido ganhar um prêmio proporcionado pela
técnica aplicada. Posteriormente, no momento de expressar seus sentimentos o membro J
verbaliza que se identificou como membro do grupo e não conseguiu dar seqüência,
membriando-se.
Hipótese: O membro J quando identifica sua história com o membro C introjeta
os sentimentos deste membro, dificultando a evolução do funcionamento do grupo.
Segundo Zimmerman, (1999) em relação aos sentimentos contratransferenciais, o
importante é que o coordenador do grupo saiba que eles são de surgimento inevitável;
deve esforçar-se para não permitir que tais sentimentos despertados invadam a sua mente,

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 15


de modo a se tornarem patogênicos; pelo contrário, a sua competência será medida pela
sua capacidade de utilizar os sentimentos contratransferenciais como um instrumento de
empatia; e que, finalmente, ele esteja atento para o risco de, inconscientemente, poder
estar envolvido em algum tipo de conluio com o grupo.
Com referência a problemas contratransferenciais, Castilho (1997) traz que, quan-
do se trabalha com grupos, corre-se o risco de comparação entre os participantes.
Observamos que alguns tendem a ter um ritmo de crescimento maior que outros, que al-
guns participantes comungam de valores que apreciamos, que outros tem um nível de
sensibilidade mais bem desenvolvido, etc. Corremos o humano risco de aceitar um parti-
cipante mais do que a outros, isso de forma consciente ou não. Por isso deve-se estar a-
tento a esses sentimentos que, verbalizados ou não, atingem os indivíduos e são apreen-
didos pelo grupo, de forma consciente ou não. Nada pode ser mais danoso a um partici-
pante que a percepção de um sentimento de rejeição por parte do coordenador.
Caso: O membro J relata ao grupo que sente que o coordenador P não tem senti-
mentos positivos em relação a ele, pois quando da chegada no grupo, em um determinado
encontro, no momento do cumprimento, o referido coordenador lhe dá as costas, num
movimento para alcançar um objeto de trabalho. E complementa dizendo que esse senti-
mento é reforçado pois ele – o coordenador não reforça e ou aprova suas falas (verbal ou
corporalmente) durante o desenvolvimento dos encontros.
Hipótese: Quando o coordenador P verbaliza diante da fala do membro J, que
aceita que este sentimento que as envolve se refere ao fato terem características seme-
lhantes.
O olhar do coordenador é importante, igualmente, para o “tempo” do grupo, ou
seja, para a fase e o foco em que o grupo se encontra, pois como afirma Castilho (1997)
quando um grupo tem um tempo de vida muito longo, começa a emergir o fenômeno da
saturação, ou seja, as pessoas sentem-se saturadas, com uma sensação de ineficácia do
gruo, que perde o seu poder de valência para o indivíduo. As situações tornam-se repeti-
tivas, a resistência torna-se cada vez maior, o envolvimento emocional vai pouco a pouco
decaindo, e o grupo carecendo de interesse para os seus membros. Isso pode ocorrer por
resistência do próprio coordenador, “enganchado” em suas próprias dificuldades pes-
soais, não sabe como sair de tal situação, ou porque os objetivos do grupo e os objetivos
individuais já não se integram... O grupo fica rodando em círculos sem nenhuma produti-
vidade. As pessoas se saturam... E o fenômeno da saturação está muito ligado ao fenôme-
no da resistência; portanto o coordenador deve estar sempre atendo para poder trabalhar
continuamente este mecanismo de defesa.
Caso: Quando o membro G e membro B verbalizaram, em dado momento do gru-
po, suas insatisfações com a evolução deste: “o grupo não está evoluindo, está morno”
“quando me perguntam o que se aprende aqui, não sei explicar, e isto me preocupa!”.
Assim, a coordenação do momento, na maioria das vezes, manifestava um gasto de ener-
gia para buscar esta evolução.
Hipótese: Quando os membros G e B verbalizavam, na verdade, estavam sinali-
zando o desejo de que algo acontecesse. Neste momento é de suma importância que o
coordenador ao invés de querer mostrar esta evolução, busque elucidar o que será que
significa evoluir para o grupo?
É importante que o coordenador possa manter um olhar constante sobre o funcio-
namento do grupo, uma “atenção flutuante” como verbaliza Freud, para que possa interli-
gar com o inconsciente coletivo do grupo, podendo assim perceber o funcionamento in-
dividual dos membros na interferência grupal, bem como o entendimento individual de

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 16


suas posturas com relação ao coordenador. Os membros do grupo tende a ver o coorde-
nador de acordo com o viés de sua própria história de vida, de acordo com suas expecta-
tivas e percepções decorrentes do desenvolvimento de cada um, coloridas pelas experiên-
cias relacionais modeladas no transcorrer de toda a vida. Entretanto, os participantes do
grupo não percebem apenas o coordenador de uma forma descolada da realidade, mas
também tendem a perceberem-se uns aos outros de maneira distorcida, de acordo com o
que aprenderam a esperar das pessoas – um tipo de aprendizagem que geralmente ocorre
muito cedo na vida e que tem uma função estruturante no desenvolvimento da personali-
dade.
Caso: O membro B verbaliza a sua dificuldade de se posicionar e realizar inter-
venções no grupo quando estava co-coordenando, em função de ter como observador o
membro P, o qual representa para ele a faceta da autoridade; bem como por ter experien-
ciado com P uma situação anterior desagradável (sonolência durante a sua primeira coor-
denação) e o receio que esta viesse à tona neste momento.
Hipótese: O membro B não verbaliza anteriormente sua angústia latente e que o
mobiliza significativamente durante os encontros. E que apesar de várias manifestações
agressivas durante os encontros este sentimento latente não veio à tona, emocionando o
membro P pela sua não percepção.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“... conto ao senhor é o que eu sei e que o senhor não sabe; mas principal quero contar é
o que eu não sei se sei, e que pode ser que o senhor saiba”.
(Guimarães Rosa – Grande sertão: veredas).

Este trabalho foi uma grande viagem, que nos permitiu olhar para muitos senti-
mentos que, as vezes, não queríamos revivê-los. Muitas transferências que teimávamos
em depositar no outro o sentimento vivenciado.
O dar-se conta e apropriar-se de muitos movimentos pessoais transferenciais e
contratransferenciais, traduziu-se em um momento riquíssimo de crescimento e também,
dicotômico entre a dor e a alegria de tornar consciente nosso próprio movimento.
A oportunidade de reviver e reconhecer a semelhança de algum aspecto com outro
vivido anteriormente, exteriorizando-o, nos empoderou na elucidação desta maravilhosa,
porém conturbada, conexão entre o presente e passado.
Relembrando os conceitos, definiu-se como Transferência o ato de transferir sen-
timentos e desejos inconscientes, vivenciados no passado com pessoas importantes, a
outras do presente. Ainda que vinculada aos eventos do passado, transferência é um fe-
nômeno, por excelência, do aqui-e-agora. Este conceito remete a algo complexo, já que
inconsciente, ligado ao passado e impactante (positiva ou negativamente) nas relações do
presente.
Diante da análise deste conceito e seus reflexos nas relações interpessoais, regis-
tra-se a importância da tomada de conhecimento por parte dos membros de grupo, aliado
a busca constante do autoconhecimento, como uma alternativa para compreender melhor
os seus sentimentos e obter uma atitude empática com os sentimentos dos outros.
A partir disto, o fenômeno da transferência no processo grupal, poderá ser visto
como uma oportunidade de crescimento individual e grupal. Despertando uma singular
importância das dinâmicas que perpassam as relações entre as pessoas no momento rela-

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cional. Aplicando isso, na esfera grupal é possível verificar a importância primeira de
possuirmos a percepção, ou seja, elucidar o que se apresenta no aqui-agora, buscando
tornar mais consciente e real as relações que se concretizadas de forma não perceptiva
pode ser construída na esfera da “ilusão”.
Já a contratransferência, atua como resultado, essencialmente, das cargas de iden-
tificações projetivas que os membros depositam em determinado sujeito. É importante o
coordenador de grupo compreender e manejar estas manifestações.
O coordenador, quando perceber que o fenômeno transferencial estiver emergente
e impedindo a tarefa grupal, deve recorrer à atividade interpretativa, oportunizando o
grupo indagar e refletir, através de perguntas, clarificações (enfoque de detalhes
significativos), confrontações e o eventual emprego de analogia e de metáforas. Fora isto,
é primordial que o coordenador tenha uma compreensão clara dos seus próprios
sentimentos; que repercussão tem aquele momento do grupo para ele.
O sentimento que fica é de pertencimento, atenção e clareza de nossos próprios
sentimentos e a repercussão de cada momento do grupo para cada um de nós. Sabendo
que o inverso também é verdadeiro. E cabe ressaltar os três R do Tantra Totem do Nepal:
respeito por si próprio, respeito pelo próximo e responsabilidade por seus atos.
Para se possibilitar trazer a “luz” as conexões construídas é de suma importância
que seja dado atenção aos comportamentos transferenciais, bem como as expectativas não
realistas envolvidas na transferência a assim, possibilitar ao grupo descobrir como e com
quem determinadas reações são desencadeadas, e assim oportunizando a resolução e ela-
boração das vivências.
Um aspecto observado no decorrer deste trabalho foi a dificuldade de falar dire-
tamente sobre as transferências percebidas, relacionando-as ao contexto em que elas se
encontram, bem como, das próprias transferência das pesquisadoras, descobrindo-se a
cada nova observação, suas próprias projeções e contratransferências. Uma vez que a
história foi e ainda estava sendo construída, também, por elas. Seria, inclusive, a histórias
de nossas transferências, de nossos vínculos, sempre vividos em dupla mão.
A consciência dos fenômenos transferencial e contra-transferenciais possibilitam
ao outro apropriar-se dos seus próprios sentimentos e assim ter mais consciência dos seus
comportamentos e construção de relações mais verdadeiras. Estas foram as relações que
podemos nos experimentar durante os encontros da construção do trabalho, uma vez que
muitos sentimentos no decorrer das elaborações surgiam e a percepção do outro elucidava
o que perpassava na vivência trazendo para a consciência situacional.
Durante a confecção das análises, bem como da elaboração dos exemplos, por ve-
zes nos deparamos com a resistência da percepção de certos movimentos que o outro co-
locava como demonstrativo do assunto discutido, principalmente se este nos impactava.
Este “impacto” fazia que por vezes não conseguimos seguir no trabalho pois nos “embur-
recia” desta construção, ou por estarmos analisando o nosso próprio comportamento e
com isso nos permitindo viver e sentir estes fenômenos estudados na nossa relação en-
quanto grupo.
Entre os diversos momentos de vivência que tivemos poderíamos citar aqueles os
quais “não conseguimos” encontrar um tempo comum para a confecção do mesmo, ou
esquecimento da data marcada, ou até a busca incessante por materiais teóricos que trata-
vam do assunto e discussão dos mesmos para que assim, quem sabe, encurtaríamos os
momentos para falar “sobre” e não “de”. Enfim, diversos momentos e sentimentos, mas
todos muito ricos que nos possibilitaram olhar o grupo com uma aproximação maior da

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 18


consciência, bem como nos conhecer entre este dois complexos fenômenos. Transferên-
cia e contransferência, que ocorre nas nossas relações.
Movimento... Metamorfose ambulante... “Eu não sou você, você não é eu, mas
vejo, me sinto em você quando...” Ah, quantas projeções... Muitas reflexões foram des-
pertadas. Muito nos permitimos. Fica a certeza de que nosso mundo interior é riquíssimo
e que encontramos na busca constante de nosso autoconhecimento a premissa para esta
descoberta.

REFERÊNCIAS

BECHELLI, Luiz Paulo de C.; SANTOS, Manoel Antonio dos. Transferência e psicoterapia de grupo.
Revista Latino-Americana de Enfermagem, jan.-fev. 2006. Disponível em: <www.eerp.usp.br/riae>. Aces-
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FERNANDES, Waldemar José; SVARTMAN, Betty; FERNANDES, Beatriz Silvério (Org.). Grupos e
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ZIMERMAN, David E. Fundamentos psicanalíticos: teoria, técnica e clínica – uma abordagem didática.
Porto Alegre: Artmed, 1999.
. Psicanálise em perguntas e respostas: verdades, mitos e tabus. Porto Alegre: Artmed, 2005.

SBDG – Caderno 81 ™ Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 19


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Erechim – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira

Treinamento para lideranças


no ambiente organizacional:
uma leitura sob o olhar de membros
em formação em dinâmica de grupo

GISELI CRISTINE ZAGO


SELMAR LUIS PASSINI
TAÍS REGINA TIBOLLA
TERESINHA ALBINA BORDIN

INTRODUÇÃO

Os treinamentos em grupo vêm assumindo espaços cada vez mais amplos nas em-
presas, já que, conforme Schutz (1978), o impacto da qualidade das relações que se esta-
belecem nos grupos é fato comprovado por diversos estudiosos e estas competências vêm
das profundas mudanças nos aspectos intrapessoais.
Pressupomos que as pessoas, através de encontros verdadeiros em grupo, possibi-
litam a emergência do seu potencial para o desenvolvimento e reconhecimento pessoal.
Segundo Moscovici (2002, p. 99), as pessoas que compõem o grupo trazem consigo seus
valores e crenças. “A interação permite conhecimento mútuo e identificação de alguns
pontos comuns que servirão de base para elaboração de normas coletivas, tácitas e expli-
citas, na dinâmica do grupo”.
Buscamos Rogers (1987) para dizer que o indivíduo tende a se conhecer a si pró-
prio e aos outros mais completamente do que lhe é permitido nas relações habituais de
trabalho. A partir do grupo a pessoa toma conhecimento profundo dos outros e do seu eu
interior, e relaciona-se melhor com os outros, não só no grupo, mas também mais tarde
nas diferentes situações da vida de todos os dias.
Associar o desenvolvimento humano ao desenvolvimento de lideranças constitui-
se num desafio, pois para gerenciar processos de mudança, projetos ou qualquer outra
atividade é preciso liderar pessoas, uma vez que são elas que realmente fazem acontecer
as mudanças. É necessário levar em conta as emoções, experiências de vida, modo de
pensar e agir dos líderes e dos liderados. Deve-se levar em consideração que o exercício
da liderança também é muito influenciado pelo ambiente que exige dos líderes aguçada
capacidade de análise e torna seu desafio mais instigante (Garrett e Dias, 2003, p. 42).
O coordenador de grupo, segundo Tatagiba e Filártiga (2001), que também pode
ser chamado de dinamicista, pode ser definido como aquele que tem o papel de propiciar

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 1


a identificação da realidade do grupo através da compreensão do processo que o grupo
esteja vivenciando a cada momento, a fim de poder intervir mais eficazmente, favorecen-
do o preenchimento das expectativas individuais de seus integrantes. Necessita assumir
uma postura motivadora e não impositiva, sem perder de vista os objetivos previamente
definidos para poder identificar o progresso e as realizações do grupo.
Este trabalho relata a caminhada de quatro componentes da formação em grupo da
Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupos, em uma cidade do interior do Rio Grande
do Sul que, ao término do curso, propuseram-se a investigar, a partir do seu olhar, o tra-
balho realizado por um dos seus componentes na empresa onde trabalha.

Objetivos

Os objetivos deste estudo foram descrever e analisar o aprendizado de um grupo


de líderes. Pretendemos também analisar e refletir sobre o modo como se fez o planeja-
mento e organização do encontro, e sobre o papel do coordenador do grupo.

Metodologia

A metodologia utilizada para realização deste estudo foi de natureza qualitativa.


Através de um Estudo de Caso, descrevemos e analisamos um encontro de grupo. A
pesquisa qualitativa que é aquela que possibilita ao pesquisador, a partir de dados
descritos, mediante contato direto e interativo com a situação objeto de estudo, a
interpretação do fenômeno (Neves, 1996).
Segundo propõe o método qualitativo, neste trabalho realizou-se a interpretação
dos fenômenos ocorridos durante um grupo que visava à aquisição do conhecimento e a
capacitação para liderar.
As pessoas envolvidas neste processo de desenvolvimento de lideranças eram em
número de onze, gerentes (sendo um, dono da empresa), supervisores e líderes de setores,
de uma empresa com doze anos no mercado e com cento e dez funcionários, em processo
de expansão comercial e organizacional. Trata-se de uma empresa que trabalha com re-
capagem de pneus que apresentou um índice de crescimento de 40% no ano de 2005 e
que não estava preparada para um crescimento tão elevado, necessitando se organizar
para atender a demanda interna e externa.
O coordenador foi um componente do grupo de formação da SBDG, com
formação em Psicologia e pós-graduação em Gestão de Recursos Humanos, que estava
aplicando os conhecimentos adquiridos no grupo, no contexto desta empresa. Foram
realizados dez encontros de duas horas e trinta minutos de duração, cada um, sendo que
neste estudo iremos analisar apenas o primeiro encontro.

DESENVOLVIMENTO

Os objetivos propostos pelo coordenador na ocasião em que concebeu aquele tra-


balho eram:

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 2


“Alinhar as expectativas quanto ao papel do líder, compartilhar os conhecimentos de
políticas, práticas, valores, códigos de conduta, comportamentos, auxiliar os gestores a
compreenderem como trabalhar cada membro de sua equipe, considerando interesses,
planejamento, perfil e necessidades, fortalecendo assim, a organização no sentido de se
criar um excelente ambiente de trabalho e, em contrapartida, maximizar os resultados do
negócio.”
Observamos que os objetivos propostos pelo coordenador eram audaciosos e este
corria o risco de não alcançá-los em função de que eram muitos e tratava-se do primeiro
trabalho a ser desenvolvido na empresa. No entanto, ele tinha consciência da necessidade
de respeitar o ritmo do grupo.
Refletimos que é importante ter um vasto conteúdo e ir dispondo dele conforme a
necessidade e o ritmo do grupo. Lembramos Moscovici (2002), que diz que o grupo as-
sume uma configuração própria, e que cada grupo constrói o seu próprio clima emocio-
nal, que pode afetar a tarefa e o desempenho do grupo.
O primeiro encontro, que foi denominado Módulo de Integração, foi planejado
pelo coordenador com o objetivo de promover o autodesenvolvimento, entendido como:
“capacidade para buscar o aperfeiçoamento, disponibilidade de aprender com os outros,
humildade para aprender e ou reaprender, aceitar mudanças, certificar-se das datas de
validade dos seus conhecimentos, saber aprender e desaprender, desacomodar-se sem-
pre”.
Recomenda-se que ao compor um grupo se tenha uma idéia bem clara do que se
pretende com este grupo, ou seja, para qual finalidade o grupo está sendo reunido, e de
como será operacionalizado este intento (Zimerman, 1997).
Inicialmente, o coordenador fez um diagnóstico na empresa, onde detectou a ne-
cessidade do treinamento, que foi proposto ao diretor da empresa que o aprovou e juntos
relacionaram os líderes que participariam do treinamento. O passo seguinte foi convidar
verbalmente e individualmente as pessoas.
Observamos que, conforme nosso aprendizado através do curso de dinâmica de
grupo, o número de participantes convidados para o treinamento foi adequado para ape-
nas um coordenador.
No dia marcado, o coordenador reuniu o grupo numa sala de treinamento e fez um
contrato com o mesmo. Segundo Castilho (1982) contratar um grupo significa compro-
meter-se com a definição da metodologia, freqüência dos encontros, carga horária, entre
outros pontos importantes, como: liberdade, tratar o “aqui e agora”, honestidade, autenti-
cidade, espontaneidade, franqueza, manter contato com os seus sentimentos, observar o
corpo, intervalos, pontualidade, assiduidade, exclusividade do grupo, afeição, rejeição,
tristeza, amor e ódio. Estas combinações feitas no primeiro encontro promovem a melhor
estruturação do grupo e podem ser adaptadas à realidade e aos objetivos.
Em seguida aplicou uma técnica de relaxamento que tinha como objetivo primor-
dial baixar as resistências e o nível de estresse, já que este encontro realizou-se ao final
de uma tarde de verão muito quente. Colocou uma música introspectiva e pediu para que
todos respirassem profundamente, sentissem seu corpo, a batida do seu coração, mentali-
zando o relaxamento dos pés, joelhos, braços, coluna, tórax, pescoço...
Segundo Lipp (2001), utilizam-se as técnicas de relaxamento (relaxar o corpo e
mente) a fim de reduzir o estado de excitabilidade, tensão e estresse da jornada diária de
trabalho. Assim, com a música e os direcionamentos de relaxamento do coordenador
criou-se um estado de quietude interior que desacelera o organismo e permite que ele se
recomponha.

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 3


Pressupomos que os grupos devam iniciar com uma técnica de apresentação, para
que todos possam se conhecer. No entanto o coordenador já havia identificado no grupo
que todos se conheciam, e optou pela técnica de relaxamento, já que o encontro aconte-
ceu no final do turno de trabalho e todos estavam cansados.
Acreditamos que o coordenador foi feliz nesta escolha e mostrou estar em sintonia
com o grupo com que iria trabalhar. Permitiu também que os líderes, com o relaxamento,
mudassem de papel e assumissem uma postura de membro de grupo. Além de que, con-
forme Brown (2000), a música incentiva nossas emoções para reorganizar e compor o
estado de espírito, deixando as pessoas com mais energia, conduzindo-as a um estado de
serenidade. Segundo Chopra (1999), freqüentemente o relaxamento pode produzir uma
consciência real sobre si mesmo e restaurar a memória da totalidade.
A seguir, o coordenador utilizou a técnica proposta por Rabalio (2001), chamada
“Grande Nó'', com a finalidade de mostrar a importância da cooperação e da comunica-
ção que deve haver entre as pessoas. Fizeram um círculo de mãos dadas e pediu-se que
cada um gravasse a pessoa que estava a sua direita e a sua esquerda. Em seguida todos
largaram as mãos e caminharam pela sala, trocando olhares. Ao sinal do coordenador
ficaram em posição de estátua e buscaram a mão da pessoa que estava na sua direita e
esquerda, formando um grande nó. O passo seguinte era desfazer o nó. Os componentes
do grupo reagiram de modo muito ágil e rápido.
O coordenador relatou que após todos voltarem aos seus lugares, houve um mo-
mento de silêncio, que foi respeitado, seguido por algumas reflexões a respeito da capa-
cidade que cada um tem para conseguir alcançar algum objetivo. Que muitas vezes não se
tenta fazer um movimento por medo de errar. Nem todos os membros do grupo falaram,
mas através das expressões corporais, percebeu-se que houve uma concordância com as
falas dos que haviam se pronunciado. A técnica, segundo Zimerman (1997, p. 33), “se
refere a um conjunto de procedimentos e de regras de aplicabilidade prática, e que fun-
damentam a exeqüibilidade da operação”.
Continuando, o coordenador sentiu necessidade de passar para a segunda técnica
para manter o grupo aquecido e assim o fez. Utilizando-se de um vídeo “Quem mexeu no
meu queijo”. “a fim de poder pensar o processo de mudança organizacional, as alternati-
vas de êxito e motivação para alcançar objetivos no trabalho”.
Utilizamos Cury (2002), que faz reflexões sobre a história do queijo, que conta a
divertida e esclarecedora trajetória de dois ratinhos e dois homenzinhos que vivem num
labirinto e procuram “queijo” para se alimentarem e viverem felizes. Esses quatro perso-
nagens comportam-se como seres humanos normais. “Queijo” é uma metáfora para signi-
ficar aquilo que desejamos na vida: um bom emprego, um bom relacionamento amoroso,
dinheiro, propriedades, saúde ou paz de espírito. E o “labirinto” é o local onde fazemos
essa busca: a empresa na qual trabalhamos, a nossa família ou nossa comunidade. Nesta
história, os personagens enfrentam uma mudança inesperada. Um dos “homenzinhos” é
bem sucedido e começa a escrever nas paredes do labirinto tudo o que aprendeu. Graças a
essas anotações, começamos a aprender como lidar com a mudança, de forma a sofrer
menos estresse na vida ou no trabalho.
Os lideres discutiram a importância da mudança usando, os seguintes termos:
“temos que correr atrás dos nossos objetivos”, “a nossa realidade está representada neste
desenho”, “vejo a empresa como neste vídeo, com necessidade de mudar de direção para
alcançar o queijo”.
Conforme Moscovici (2002, p. 10),

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 4


em treinamento de laboratório, consegue-se obter compreensão, insight e comportamento
funcional durante o processo de aprendizagem. Todavia, o verdadeiro teste de competên-
cia interpessoal está na transferência de aprendizagem da situação de laboratório para a
vida real, o que é bastante difícil na dinâmica interpessoal. É difícil porque exige do par-
ticipante insight e compreensão dolorosa de que algumas de suas formas usuais de reação
não são as mais adequadas, que é preciso mudar, experimentar novas formas e praticá-las,
criativamente, e assumir riscos.
Através das aprendizagens que tivemos no grupo de formação em dinâmica de
grupo, podemos verificar o início do processo de mudança descrito acima, pois os relatos
relacionados ao filme nos mostraram indicativos de insight e identificações de cenas do
filme com situações vividas no cotidiano da referida organização.
Dando continuidade à atividade o coordenador utilizou uma nova técnica, propos-
ta por Paiva (2005) denominada “O que levarei”, que consistiu na distribuição de “mali-
nhas” (material em formato de mala, feito em EVA, medindo aproximadamente vinte e
cinco centímetros. Em um dos lados desta “malinha” havia um cartão escrito seguido de
varias linhas em branco: “O que você quer levar deste treinamento?
O coordenador solicitou que os participantes escrevessem no cartão, no máximo
três palavras ou frases sobre o que desejavam levar do grupo, como processo de aprendi-
zado, ou do seu processo de desenvolvimento. Após solicitou que este material fosse fi-
xado na parede da sala de treinamento e apresentado oralmente para o grupo. Através
desta técnica o coordenador pretendia o comprometimento e determinação dos participan-
tes no treinamento e na busca dos mesmos objetivos dentro da empresa, com suas equipes
de trabalho. Este material permaneceu no local dos encontros até o final de todos os mó-
dulos.
O coordenador relatou que todas as vezes que o material descolava da parede e
caía no chão, os participantes juntavam e colavam novamente no lugar, e interpretava
isso como um cuidado que as pessoas estavam tendo com seus objetivos.
Avaliamos essa situação transportando-nos para o nosso processo de formação em
dinâmica de grupo, quando aprendemos a fazer leitura daquilo que não é falado, mas que
é percebido pelo coordenador ou pelos membros do grupo.
Algumas frases que foram escritas e que representavam a expectativa e compro-
metimento do grupo foram: “Melhorar a comunicação com seus subordinados”; “Correr
atrás do queijo”; Conseguir atender os pedidos do meu chefe”, entre outras. Refletimos
que se nos reportarmos ao segundo e quarto parágrafos deste capítulo, verificamos que
alguns objetivos já estão sendo alcançados pelo grupo.

CONSIDERAÇÃES FINAIS

Ao final deste estudo pensamos ter alcançado nossos objetivos que foram de
descrever um grupo de treinamento em liderança e analisar a forma como se desenvolveu
a organização e a coordenação do grupo. Gostaríamos de poder descrever todos os
demais grupos que sucederam este, e que foi difícil, nos atermos ao primeiro, já que
houve muitos desdobramentos nos grupos subseqüentes, ligados ao modo como foi
''amarrado” o primeiro encontro.

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 5


Concluímos que o primeiro encontro de grupo de uma série deles é muito impor-
tante no que diz respeito aos objetivos, ao contrato, ao comprometimento, à liberdade, ao
sigilo, ao respeito, entre outros pontos.
Relacionando o referencial teórico com o proposto para o primeiro encontro, ob-
servamos que eram muitos os objetivos, mas percebemos que o planejamento foi apro-
priado à finalidade para a qual este grupo vinha sendo criado e que os líderes correspon-
deram e “deram conta”, “porque tinham expectativas idênticas às do coordenador”.
O segredo dos líderes em organizações que estão dando certo no mercado é fazer
com que as pessoas acreditem e aceitem sua liderança, inspirem-se com suas idéias, com-
partilhem sua visão e, principalmente, comprometam-se com os objetivos propostos.
Através deste estudo podemos verificar que e possível desenvolver lideranças, comparti-
lhar idéias e reunir lideranças de diferentes posições dentro de uma empresa, através de
um encontro de grupo.
Observamos também que, como se tratava de uma empresa em franco crescimen-
to econômico e organizacional, o processo de grupo foi pertinente ao momento em que a
empresa vivia, proporcionando um desenvolvimento a todos os líderes envolvidos.
Refletimos que foi observado neste grupo que relatamos o respeito às característi-
cas da empresa e das pessoas envolvidas, e que as estratégias traçadas pelo coordenador
estavam ao alcance daquele grupo, uma vez que ele demonstrou responder e corresponder
às expectativas.
Concluímos que a técnica de relaxamento utilizada para iniciar o grupo foi ade-
quada, porque mostrou que o coordenador estava sensível ao grupo, demonstrando empa-
tia e facilitando a comunicação. Segundo Rogers (1987), quando comunicamos ao outro o
que estamos sentindo em relação a ele, abrimos um canal de comunicação.
Para finalizar, gostaríamos de registrar que realizar este trabalho em grupo consti-
tuiu-se num grande desafio, foram muitas discussões, opiniões, reflexões, encontros e
desencontros, porque na verdade nós, enquanto grupo em formação, também estamos
num constante processo de desenvolvimento que, acreditamos, não terminará com a con-
clusão do curso, ou com o término do trabalho com os outros grupos com os quais traba-
lharemos.

REFERÊNCIAS

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SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 6


NEVES, José Luis. Pesquisa qualitativa – características, usos e possibilidades. Caderno de Pesquisas em
Administração, São Paulo, v. 1, n. 3, 2º sem. 1996.
PAIVA, Edna. Kit T&D. Adquirido no Congresso Panamericano de Criatividade e Gestão de Pessoas. Re-
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RABALIO, Maria Odete. Seleção por competências. 2. ed. São Paulo: Educator, 2001.
ROGERS. Carl R. Grupos de encontro. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
SCHUTZ, Will. Psicoterapia pelo encontro. São Paulo: Atlas. 1978.
TATAGIBA, Maria Carmem; FILÁRTICA, Virgínia. Vivendo e aprendendo com grupos: uma metodolo-
gia construtivista de dinâmica de grupo. Rio de Janeiro: Dp&a, 2001.
ZIMERMAN, David E. Fundamentos técnicos. In: OSORIO, Luis Carlos; ZIMERMAN, David E. Como
trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

Giseli Cristine Zago: Psicóloga, Pós-Graduada em Gestão de Recursos Humanos, Gerente de Recursos
Humanos do Hospital de Caridade de Erechim e Assessora em Psicologia Organizacional e Desenvolvi-
mento de Recursos Humanos, formanda em dinâmica de grupo pela SBDG. E-mail: giselizago@bol.com.br
Selmar Passini: Contador, Pós-Graduado em Gestão de Pessoas, formando em dinâmica de grupo pela
SBDG. E-mail: passini@morlass.com.br
Taís Regina Tibolla: Enfermeira, Pós Graduada em Enfermagem do Trabalho e Formação Pedagógica em
Educação Profissional na Área de Saúde, Enfermeira do Trabalho na Comil Ônibus e Carrocerias, forman-
da em dinâmica de grupo pela SBDG. E-mail: taistibolla@bol.com.br
Terezinha Albina Bordin: Enfermeira, Mestre em Assistência de Enfermagem, Pós-Graduada em Admi-
nistração Hospitalar e Psicopedagogia Clínica e Institucional, docente do Curso de Enfermagem da Univer-
sidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – Campus de Erechim, formanda em dinâmica de
grupo pela SBDG. E-mail: terebordin@via-rs.net

SBDG – Caderno 81 ™ Treinamento para lideranças no ambiente organizacional 7


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Erechim – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira

Vivenciando a coordenação

LANA CRISTIANE ERIG


MISIARA DE ALCÂNTARA
SIMONE ALICE RÖHRIG

Se aventurar com seres humanos é ajudá-los na


travessia por um campo minado, onde a qualquer
momento podem explodir sentimentos de amor,
ódio, tristezas, alegrias, medos, raivas,
frustrações, realizações, sucesso e fracasso.
Nossa postura e conhecimento deve favorecer o
grupo na passagem por esse campo e que esta
travessia possa torná-los mais competentes
e hábeis para lidar consigo mesmo,
com o outro e com a tarefa.
(Mamede, 2005).

Resumo – Este estudo de caso visa compreender o funcionamento de um grupo, através


da vivência de coordenação de grupos, contribuindo com as discussões sobre o papel e a
função do coordenador. O estudo é qualitativo, de natureza exploratória, é foi realizado
através de um estudo de caso de um grupo onde os membros ocupam cargos de liderança
em uma instituição privada de saúde, localizada na cidade de Não-Me-Toque, RS.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 1


INTRODUÇÃO

Desde que nascemos, somos inseridos em grupos, na família, na escola, no traba-


lho e na sociedade. Passamos quase todo o tempo mantendo algum tipo de interação so-
cial. É no espaço grupal que podemos compartilhar sentimentos, viver a afetividade,
aprender, influenciar e ser influenciado, contribuindo e procurando reconhecimento en-
quanto pessoa.
As pessoas, que constituem os grupos, são o maior potencial das organizações.
Eis que surge, então, uma oportunidade para pesquisar e desvendar os fenômenos grupais
dentro das próprias organizações. Esta, por sua vez, passa a buscar profissionais compe-
tentes que possam coordenar este tipo de desenvolvimento. A coordenação de grupos,
portanto, passa a ser um recurso que permite aproveitar as forças poderosas dos grupos e
ajudar a facilitar os processos de aprendizagem e melhorar a qualidade dos processos
produtivos.
O papel do coordenador torna-se imprescindível já que sua forma de atuação im-
plicará substancialmente nas construções grupais. Este trabalho vem contribuir para o
aprofundamento da reflexão sobre a coordenação dos grupos e o estudo sobre as caracte-
rísticas pessoais e interpessoais do coordenador. No primeiro capítulo, descrevemos os
objetivos e a metodologia utilizada; no segundo, apresentaremos o referencial teórico que
baseia nossa compreensão sobre o estudo de caso relatado no terceiro capítulo.

Justificativa

Com as crescentes mudanças no mercado competitivo, as empresas têm sido sub-


metidas a novos desafios, o que as tem levado a repensar sua forma de atuação. Atual-
mente, poucas tarefas podem ser feitas individualmente e as empresas passam a exigir de
seus colaboradores maior eficácia na realização de seus trabalhos. O investimento no
desenvolvimento humano passa a ser o grande diferencial competitivo, pois o sucesso das
organizações está ligado ao seu pessoal.
Torna-se imprescindível atuar no desenvolvimento dos grupos de trabalho, para
promover maior integração entre os membros, melhorar a qualificação e elevar os pa-
drões de desempenho grupal. Redirecionar os programas de desenvolvimento organiza-
cional, objetivando identificar e compreender a dinâmica dos processos grupais, iniciando
pela compreensão e desenvolvimento comportamental de seus líderes, passa a ser essen-
cial.
Proporcionar que os líderes tomem consciência de seu papel enquanto condutores
de suas equipes e o quanto seu comportamento impacta e influencia nas mesmas, nos
levou a apresentar uma proposta de desenvolvimento para um grupo de líderes de uma
instituição.
Aliamos a este programa de desenvolvimento, a realização de um estudo de caso,
no qual nos propusemos a analisar o papel do coordenador de grupos, que conduziria o
referido programa. Este trabalho, portanto, irá contribuir com as discussões sobre o papel
e a função do coordenador de grupos, para compreendermos, na prática, a dinâmica de
um grupo dentro de uma organização.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 2


Delimitação do tema

Estudar a experiência de coordenação de um grupo, buscando a compreensão da


dinâmica grupal, alinhada à fundamentação teórica e à própria experiência da coordena-
ção.

Objetivos

Objetivo geral:
Compreender o funcionamento de um grupo, através da vivência do papel de co-
ordenador de grupo, possibilitando aplicar na prática o aprendizado obtido durante o cur-
so de Formação em Dinâmicas de Grupo.

Objetivos específicos:
Avaliar-se no papel de coordenador de grupo;
Experimentar o papel de coordenação no próprio grupo de trabalho;
Experimentar o rodízio de co-coordenações no mesmo grupo.

Metodologia

Este trabalho tem como base um estudo qualitativo, de natureza exploratória, rea-
lizado através de um estudo de caso de um grupo onde os membros ocupam cargos de
liderança em uma instituição privada de saúde, localizada na cidade de Não-Me-Toque,
RS, de propriedade de uma Congregação Religiosa, cuja sede é na cidade de Passo Fun-
do, RS.
O grupo foi composto por doze profissionais dos setores de Administração, Secre-
taria, Laboratório de Análises, Departamento de Pessoal, Lavanderia, Sanificação, Nutri-
ção, Fisioterapia, Enfermagem e Cozinha. Deste quadro, oito líderes tem formação reli-
giosa e seis são leigos e, destes, dois são do sexo masculino. Sobre o nível de escolarida-
de, nove tem formação superior. A faixa etária do grupo varia entre 24 a 56 anos, tendo
também dois líderes com mais de 60 anos de idade. Em relação ao tempo de atuação no
cargo de liderança nesta instituição, oito têm até 5 anos e três têm entre 10 e 17 anos no
cargo. A média do número de subordinados destes líderes varia entre dois a quatro cola-
boradores, destacando-se o setor de Enfermagem com dezoito colaboradores. O quadro
funcional da instituição é composto por 42 profissionais.
A escolha por este grupo deu-se a partir da necessidade percebida pela profissio-
nal do setor de Recursos Humanos desta instituição durante o diagnóstico das necessida-
des de treinamento e desenvolvimento da instituição, que estabelece diretrizes de capaci-
tação diferenciada para todos os níveis hierárquicos. A profissional deste setor é uma das
autoras deste trabalho e vivenciou, juntamente com duas colegas do grupo de Formação
de Grupos da SBDG, a coordenação deste grupo.
A proposta de desenvolvimento do grupo de líderes sugeriu a realização de três
encontros dentro da própria instituição, com duração de três horas, no turno da noite, du-
rante um mês, totalizando nove horas de atividades, sem investimento financeiro por par-

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 3


te da instituição. Essa proposta foi apresentada diretamente ao administrador e ao coor-
denador do departamento de pessoal, os quais aprovaram a realização do trabalho.
As coordenações foram realizadas em duplas, sendo que em cada encontro houve
uma mudança nas duplas de coordenação. Como uma forma de melhor estruturar a apre-
sentação dos resultados denominamos as três coordenadoras como A, B e C, sendo a co-
ordenadora A, a profissional de RH da instituição.

DESENVOLVIMENTO

Este capítulo tem como objetivo analisar e compreender o funcionamento de um


grupo, através da fundamentação teórica, focando o papel, atributos e função do coorde-
nador de grupos. Destacamos quatro autores principais que embasaram o nosso estudo:
David Zimerman, Paulo R. Helrighel e Carmen Silva de Arruda Andaló.

Papel e função do coordenador

Para Zimerman (1997) a pessoa do coordenador do grupo é um fator de funda-


mental importância na evolução do respectivo grupo, seja ele de que natureza for. O autor
destaca os seguintes atributos como um conjunto de condições desejáveis e, para certas
situações, imprescindíveis ao coordenador de grupos: gostar e acreditar em grupos; amor
às verdades, para que faça um discernimento entre verdades, falsidades e mentiras que
correm nos campos grupais; coerência; senso de ética, para não impor seus próprios valo-
res e expectativas, bem como para manter sigilo daquilo que lhe foi dado em confiança;
respeito e tolerância pelas falhas e limitações presentes em algumas pessoas do grupo,
assim como uma compreensão e paciência pelas eventuais inibições e pelo ritmo peculiar
de cada um; continente de possíveis fortes emoções que podem emergir no campo grupal;
função de ego auxiliar para emprestar às pessoas, durante algum tempo, as funções de
pensar, discriminar e comunicar; empatia, para que o coordenador possa entrar dentro do
“clima grupal”; síntese e integração.
Helrighel (1979) diz que o coordenador deve ser detentor de três tipos de compe-
tências: interpessoal (autoconhecimento, abertura pessoal, escuta ativa, honestidade, hu-
mildade e percepção), técnica (busca constante de conhecimento) e gestão (senso de
oportunidade). O autor destaca que o coordenador deve favorecer que as pessoas do gru-
po, tanto quanto possível, possam experimentar processos que permitam comportamentos
mais satisfatórios na vida quotidiana.
Muchielli (1979) enfatiza quatro qualidades que contribuem para o “perceber a
dinâmica de grupo”: não se implicar pessoalmente, não interpretar imediatamente o que
se passa, estar vigilante e presente integralmente e fazer prova de simpatia (compreender
no sentido humano).
Macedo (1998, apud Andaló, 2001) afirma que o coordenador deve agir como um
catalisador e intermediário do processo de reconhecimento da realidade por parte do gru-
po. E recomenda que, para isso, ele deve fluir com o grupo, não se impondo à realidade,
para não comprometer o livre curso das coisas, agindo com cientificidade, tecnicidade,
espontaneidade, sensibilidade, poder de entrega e capacidade para criar.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 4


Baremblitt (1986) define que o coordenador de grupo não pode trabalhar nem
como um característico psicanalista de grupo nem como um simples coordenador de gru-
po de discussão e tarefa. Sua intervenção se limita a sinalizar as dificuldades que impe-
dem ao grupo de enfrentar a tarefa. Tentará decifrar essas dificuldades e num processo de
estratégia, tática, técnica e logística, irá propondo ao grupo as hipóteses que lhe permitam
tomar a si mesmo como objeto de estudo e ir revelando as dificuldades que aparecem na
comunicação e aprendizagem. O coordenador não está ali para responder às questões,
mas para ajudar o grupo a formular aquelas que permitirão o enfrentamento dos medos
básicos.
A partir da nossa vivência podemos dizer também que o papel do coordenador é
como o de um mediador que ajuda a clarear os pontos percebidos e os pontos cegos do
grupo, levando o grupo a não ficar preso à tarefa, ou a técnica utilizada, mas ajudando-o a
interpretar seu funcionamento e movimentos, através de intervenções que possibilitem
levantar hipóteses para uma aprendizagem grupal.

Aspectos a serem observados no exercício da coordenação

Para Helrighel (1979), em relação às atividades utilizadas, o coordenador sabe


que a excelência não está na técnica, e sim no uso apropriado dela em determinada situa-
ção do trabalho do grupo. O autor recomenda que ao escolher um exercício é preciso pre-
ver o tempo, o ritmo individual dos participantes, evitar propor exercícios não vivencia-
dos anteriormente, conscientizar-se sobre “o porquê” da escolha de determinado exercí-
cio, a proposta de um exercício deve ser clara, não ambígua, além de esperar alguma re-
sistência no início de qualquer sessão e permitir que os participantes liberem sua agressi-
vidade. Para o autor, a gerência do tempo é função do coordenador. Em relação à posi-
ção, manejos e intervenções, o coordenador deve procurar abster-se de perguntas diretas a
determinado participante, dirigindo-as ao grupo, ter consciência dos desdobramentos pos-
teriores que suas intervenções poderão trazer ao grupo e permitir-lhe tempo para elaborar.
Helrighel (1979) diz ainda que o coordenador é um “não-membro participante”, portanto,
escrever e tomar notas durante a sessão, como regra geral, é contra-indicado.
Whitman (1975) define que as interpretações do coordenador devem tomar a for-
ma de perguntas ou de hipóteses que deseja examinar com o grupo. O autor enfatiza que
nunca deve encerrar um dia de trabalho, sem que haja oportunidade de realimentação por
parte do grupo, a não ser que deseje que o grupo saia como um “tema de casa” para a
elaboração de uma resposta a uma interpretação.
Para Andaló (2001), faz-se necessário que o coordenador esteja sensível ao que
está ocorrendo, procurando manter um contato visual com todos os membros, permanecer
constantemente atento ao sentido latente das verbalizações, aos comentários verbais e
não-verbais, às posturas corporais dos participantes, à sua distribuição espacial na sala e
aos seus movimentos. Para a autora, o coordenador de grupo, por não estar imerso na
situação vivida, consegue ter uma visão de distância que lhe permite captar aspectos mais
amplos e profundos. Sua ação é pautada por um processo de análise que vem de uma lei-
tura crítica da realidade, ou seja, sua função é provocar reflexão, trazer a dúvida, proble-
matizar o que está naturalizado (tido como verdadeiro, eterno e imutável), denunciar as
contradições, enfim, ajudar o grupo a pensar e encontrar suas respostas e construir o pró-
prio crescimento.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 5


Diante de todas esses aspectos apontados pelos autores citados, poderíamos che-
gar à conclusão da impossibilidade de se construir um tipo completo de coordenador, face
à utopia de um super-coordenador. No entanto, é importante manter-se consciente da im-
portância destes aspectos, e principalmente, na vontade de desenvolvê-los para a busca
contínua de aperfeiçoamento e sucesso no papel e função de coordenador, que precisa ter
a capacidade e flexibilidade de adaptar-se sempre a situações novas que lhe agregarão
mais experiência e aprimoramento.

Poder e liderança do coordenador

Andaló (2001) define que se fazem líderes aqueles indivíduos que num momento
determinado se mostram capazes de “ver o possível com olhos comuns,” isto é, se fazem
intérpretes dos desejos e intenções de todos, conseguindo ver, tanto os integrantes em sua
particularidade, como o movimento do próprio coletivo. Assim, a liderança pode ser es-
tabelecida através da figura de um coordenador ou de uma equipe de coordenação.
No entanto, Andaló (2001) adverte que um dos maiores riscos da liderança é a
adoção de posturas autoritárias respaldadas na situação de poder que lhe foi outorgada.
No que diz respeito à situação de poder do coordenador, Moreno (1972, apud Andaló,
2001) declara que a direção só adquire sentido se estiver em consonância com o movi-
mento grupal, ou seja, o líder dirige guiado pela direção do próprio grupo. O verdadeiro
líder é, de fato, o grupo.
Para Andaló (2001), convém deixar claro que as afirmações de Moreno a respeito
da simetria entre coordenação e grupo são perigosas, na medida em que podem contribuir
para negar ou disfarçar a questão do poder, que sempre existe nesta relação e que, perma-
necendo latente e maquiada, não é passível de questionamento ou denúncia.
O coordenador, de fato, exerce um papel de líder. Vale ressaltar, porém, que não é
sua função definir o rumo do grupo, sob pena de confundir seu papel de líder com autori-
tarismo. Nem tampouco, confundir-se como um membro do grupo, pois, como já foi dito,
ele é um não-membro participante que empresta seu olhar para fazer leituras do grupo e
proporcionar uma nova visão frente às situações que o grupo coloca, evidenciando e as-
sumindo, dessa forma, sua verdadeira característica de líder.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Neste capítulo descreveremos os principais aspectos da dinâmica de


funcionamento do grupo em estudo, levantando hipóteses baseadas no referencial teórico
e, principalmente, estimuladas pela aprendizagem obtida durante a nossa Formação e na
experiência enquanto coordenadoras deste grupo.

Reunião de contrato inicial

Data de realização: 02 de maio de 2006


A reunião de contrato inicial foi realizada com a presença da coordenadora A,
também colaboradora do setor de RH da instituição, e os treze colaboradores seleciona-

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 6


dos para participar do trabalho. O objetivo do trabalho apresentado ao grupo foi à cons-
cientização sobre os estilos de liderança e como este estilo influencia os liderados.
Também foi comunicado ao grupo que o trabalho seria realizado com a parceria
de mais duas coordenadoras, B e C, conhecidas da coordenadora A e que atuam na área
de recursos humanos. Não foi esclarecido ao grupo neste momento que o trabalho tam-
bém tinha o objetivo de compreender o funcionamento de um grupo e que seria alvo de
estudo para o presente trabalho de conclusão. Apenas dois membros do grupo, com car-
gos de liderança mais altos sabiam desta informação exposta no momento da proposta,
fato este que levou-nos a compartilhar a informação com todo o grupo no primeiro
encontro, conforme explicado mais adiante.
Inicialmente, o grupo manifestou algumas dificuldades para agendar as datas onde
todos pudessem estar presentes, mas, ao final, estabeleceu o calendário com as datas dos
três encontros, que se realizariam em três semanas durante o mês, no horário das 19h às
22h e no local que era a sala de treinamentos da instituição. Embora um dos participantes
tenha comunicado ao grupo sua impossibilidade de participar em uma das datas combi-
nadas, o grupo não alterou as datas propostas. Alegou que, pelo fato deste participante
estar com data de transferência da instituição marcada para os próximos meses, poderia
abrir mão de sua participação em um dos encontros. Percebe-se que houve a exclusão de
um membro na reunião de contrato inicial.
A coordenadora A enfatizou a importância da presença de todos nos encontros,
explicando que a metodologia do trabalho seria vivencial, ou seja, os próprios participan-
tes seriam objeto de estudo, embora não tenha repassado muitos detalhes sobre a metodo-
logia de laboratório que seria utilizada.
O grupo estava com grande expectativa para iniciar o trabalho, principalmente por
lhes ser dito que seria um trabalho vivencial, embora, acreditamos, não faziam idéia do
que estaria por acontecer. A expectativa também estava presente entre as coordenadoras,
pois teríamos a nossa primeira experiência de coordenação num grupo externo ao da
Formação de Dinâmica de Grupos e, além disso, por ser um grupo que pertence à insti-
tuição no qual uma das coordenadoras trabalha, trazendo a questão de aprovação e prova-
ção de competência para realizar este trabalho.

Dinâmica do grupo no primeiro encontro

Data de realização: 11 de maio de 2006.


Coordenadoras B e C realizaram o trabalho sem a participação da coordenadora
A, que trabalha na instituição. Definimos a não-participação da coordenadora A neste
primeiro encontro, por ser um encontro de conhecimento do grupo, o qual já era conheci-
do pela mesma.
Chegamos vinte minutos antes do horário de início combinado. Fomos recebidas
por um membro do grupo que as conduziu até a sala de treinamentos e voltou somente
quando mais membros começaram a chegar. Percebemos o constrangimento, ou timidez
deste membro, pois não éramos conhecidas pessoalmente da maioria do grupo. Verifica-
mos então a importância da presença das coordenadoras antes da chegada dos participan-
tes para fazer a leitura do funcionamento dos mesmos para o encontro.
Conforme o grupo chegava, percebemos conversas paralelas onde alguns mem-
bros falavam sobre a correria do dia-a-dia, o cansaço, o “sofrimento” por retornar para

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 7


casa tarde, e até manifestações de sintomas de pressão baixa. Percebemos que essas falas
representam a resistência em estar participando do encontro, e o cansaço pode não se
referir ao trabalho, mas talvez em relação ao próprio estilo de funcionamento do grupo.
O grupo foi disposto em círculo, possibilitando que todos os membros e inclusive
as coordenadoras pudessem visualizar uns aos outros. Esta organização foi mantida para
todos os encontros. O membro que expôs, na reunião do contrato inicial, sua dificuldade
em participar na data de um dos encontros, não compareceu, assim como nos próximos
encontros.
Realizamos nossa apresentação mencionando sua formação acadêmica e expe-
riência na área de atuação. Expuseram também que o trabalho teria o objetivo de aprendi-
zagem para o grupo e para a coordenação. Conforme mencionado anteriormente, senti-
mos a necessidade de demonstrar a relação deste trabalho com a Formação de Dinâmica
de Grupos, pois dois membros do grupo eram conhecedores desta informação, e perce-
bemos que isto poderia ser usado como um “segredo” com as coordenadoras, gerando
uma forma de controle sobre elas se esta informação não fosse uniforme e transparente
para todo o grupo.
Para apresentação dos membros, preparamos etiquetas-crachás com o nome dos
participantes. Em seguida, os membros foram convidados a realizar sua apresentação, de
forma livre, ficando como referencial mencionado o tempo de empresa, cargo e formação
escolar. Percebemos que estes também eram fatores que determinavam a autoridade e o
poder naquele grupo. Também vale mencionar que, apesar de não definirmos uma forma
padrão de apresentação, nós, coordenadoras, quando nos apresentamos por primeiro, po-
demos ter determinado o tom das apresentações por também falarmos da nossa formação
e experiência, levando o grupo a seguir o mesmo modelo de apresentação.
Chamou-nos a atenção que um dos membros questionou seu nome no crachá,
chegando a dizer, “[...] esta errado, mas já que esta escrito, tudo bem...”. O nome foi es-
crito de forma reduzida (exemplo: Tere para Terezinha), no entanto, no dia-a-dia, este
membro é chamado assim por todos seus colegas. Podemos levantar a hipótese de que o
membro estava questionando a intimidade das coordenadoras com o grupo.
No que se refere às técnicas utilizadas, todas foram vivenciadas anteriormente por
nós. Preferimos dessa forma, para termos maior segurança na condução e supostos assun-
tos que poderiam surgir, e também para conduzir ao objetivo do treinamento.
Utilizamos no primeiro encontro a técnica do Desafio da Garrafa (Anexo A). Nos-
so objetivo era perceber o desenvolvimento do trabalho em equipe, juntamente com as
manifestações de liderança, autoridade e poder que surgiriam. Após a realização da técni-
ca, em todos os encontros, o grupo era convidado a refletir sobre os acontecimentos e
principalmente a correlacionar os movimentos realizados com a realidade do dia-a-dia.
Esta sempre foi a parte mais rica dos encontros, e foco principal da realização deste traba-
lho, pois a técnica passaria a ser vista apenas como instrumento motivador e não para
objeto de estudo em si.
Um dos membros foi o voluntário que pegou a tesoura. Durante todo o desenvol-
vimento da técnica, rodeou o grupo, afirmando: “eu estou com a tesoura, hein”, sinali-
zando ao grupo que tomasse “cuidado” com ele. No entanto, não cortou nenhum
integrante do grupo durante a técnica, embora muitos não seguiram as regras. O desafio
foi cumprido em 5 minutos. Durante a análise grupal, os membros sinalizaram que este é
um comportamento típico daquela pessoa, pois, no dia-a-dia, não faz uso de sua
autoridade e poder frente à sua equipe de trabalho. O grupo sinalizou o comportamento
daquele integrante através de fatos e exemplos, e o membro, primeiramente, mostrou-se

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 8


grante através de fatos e exemplos, e o membro, primeiramente, mostrou-se bastante re-
sistente em ouvir e aceitar os feedbacks.
Solicitamos que o desafio fosse executado novamente, através de novos voluntá-
rios para as vendas e para a tesoura. Novamente a consigna foi posta para o grupo. Perce-
bemos que o grupo ficou mais atento, e a pessoa que ficou com a tesoura cumpriu tam-
bém a sua missão de cortar o barbante dos membros que infringissem as regras. Pudemos
perceber também que dois membros, apoiaram-se um no outro para que o grupo conse-
guisse cumprir o desafio. Esse movimento de apoio repetiu-se várias vezes durante o en-
contro, em que um se apoiava no outro para realizar feedbacks e lembrar comportamentos
diários dos outros membros. É provável que este funcionamento deva acontecer também
no dia-a-dia de trabalho, em que um utiliza o outro para mandar seus recados, situação
essa que parece muito comum no grupo. Ou seja, percebe-se que não há o hábito de con-
versar e dar feedbacks durante o trabalho, mas sim, muitos comentários paralelos entre
eles.
O grupo também correlacionou o fato de quem deixou o fio frouxo e de quem ar-
rebentou seu barbante por puxar demais. Disse que no dia-a-dia, percebem exatamente os
mesmos comportamentos de negligência em algumas situações e de altas exigências em
outras. Embora incentivados a falar mais sobre essas situações diárias, para motivar a
realização de feedback, percebe-se que o grupo ficou resistente a entrar mais fundo neste
assunto.
Um dos membros sinalizou sua dificuldade em realizar a técnica por ter proble-
mas físicos no joelho. Vale ressaltar a importância de conhecer o grupo para definir a
técnica, não incorrendo o risco de provocar constrangimentos desnecessários por parte
dos membros. Paralelamente, cabe uma avaliação do coordenador se não há uma situação
de fuga do participante, que acaba se escondendo atrás de suas limitações físicas como
forma de resistência à participação, hipótese mais provável para este caso.
Alguns membros também questionavam qual seria a “forma correta” para cumprir
o desafio e teorizavam conceitos de liderança. Sinalizamos o desejo do grupo em buscar
uma fórmula pronta, a receita mágica e depositaram na coordenação a expectativa das
respostas. Neste momento é importante que a coordenação sinalize ao grupo que o cres-
cimento vem da vivência e da troca, não necessariamente das coordenações e das teorias.
Assim, devolvemos o questionamento ao grupo, qualificando-o para entender e obter suas
conclusões por si mesmos, potencializando o feedback.
Então, o grupo falou sobre as pessoas mais exigentes da organização, dirigindo-se
superficialmente aos membros aos quais estavam referindo-se. O grupo manifestou sua
admiração sobre a autoridade e influencia que estas pessoas exerciam na instituição,
quando, na verdade, não conseguiram falar sobre seus medos e angústias em situações em
que esses membros eram demasiadamente exigentes, ou até mesmo intolerantes.
O grupo levanta a seguinte questão: “[...] quer dizer, então, que aqui dentro só vai
pra frente quem se impõe?”, o membro X volta-se para o membro Y e pergunta: “Você
pode me dizer então, por que quando eu te solicito um serviço, você não o faz?” e levanta
a hipótese se o membro Z lhe pedisse o trabalho como você reagiria? E complementa,
aposto que sua equipe iria atender imediatamente. Neste momento relatado, o grupo usa
um dos membros como “bode expiatório”, sem coragem de dar feedback direto para o
membro Z ao qual estavam se referindo, que após passa a ser admirado, ao invés de ques-
tionado. O membro Z não faz nenhuma menção de que o assunto teria alguma ligação
com sua pessoa – mantendo “cara de paisagem” (isenta da situação).

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 9


Outro momento desencadeia em relação ao membro-chefe da organização, onde
lhe é sinalizado que muitas vezes não demonstra interesse pelos problemas que são leva-
dos ao seu conhecimento. Inicia então um movimento geral de acusações e defesas entre
os participantes. Percebemos então claramente a dinâmica o funcionamento deste grupo.
Por um bom tempo, o grupo não ouviu as coordenadoras, e “lavou os pratos” sujos do lá
e então, após dado momento, a coordenação ajuda o grupo a retornar ao aqui e agora,
mostrando os benefícios de olhar para o momento e buscar o crescimento grupal, porém
foi tarefa árdua mostrar ao grupo a situação no qual se colocou.
Solicitamos ao grupo que, numa rodada final, falassem sobre seus sentimentos an-
tes de encerrarmos o encontro. Abaixo, alguns dizeres:
“Tivemos um momento precioso e perdemos tempo para ficar debatendo fatos
administrativos do passado”.
Às vezes é difícil falar porque o grupo não consegue ouvir, leva para o lado pessoal. Os
nossos funcionários são a nossa cara, então esse grupo é a minha cara e a minha cara não
é boa. (Membro chefe)
Temos uma oportunidade de auto-análise. Estou sempre atenta aos gestos, sou muito per-
ceptiva. Vocês acham que eu não percebo, mas eu percebo tudo. (Membro Z, citado aci-
ma)
Estou saindo bem pior do que entrei. Estou baqueado pelas críticas que recebi e tenho
medo que minha corda arrebente. (Membro que não cortou o barbante durante a técnica).
Não me sinto preparada para liderar. Quando fui transferida para cá, eu avisei a província
de que o grupo já estaria muito adiantado para mim. Faço o melhor que posso, mas é isso
que eu posso oferecer.
Sinto que é um trabalho válido para se analisar e tomar atitudes.
Em cinco anos, essa foi a oportunidade de lavar os pratos. Mais eles ainda não estão se-
cos. É um processo doloroso, mas é importante.
No final, o grupo recontratou novamente a data do próximo encontro, devido a
um dos participantes ter assumido outro compromisso. Quando um dos membros levan-
tou a hipótese de alterar a data, chegamos a pensar que seria uma tentativa de boicote a
continuidade do programa. Mas, em menos de três minutos, o grupo chegou a um con-
senso, e alguns integrantes, mesmo os que se mostraram mais fechados e resistentes du-
rante o encontro, manifestaram que abririam mão de outros compromissos em qualquer
data em prol da realização do próximo encontro.

Dinâmica do grupo no segundo encontro

Data de realização: 18 de maio de 2006.


Coordenadoras A e B.
No segundo encontro houve a desistência de um dos membros. O grupo somente
comunicou as coordenadoras dizendo que o membro sentia que o grupo seria muito “pe-
sado” para ele. Mais uma vez, o grupo não se mobilizou pela desistência de um de seus
membros, assim como aconteceu no contrato inicial. No decorrer do encontro, pergunta-
mos ao grupo qual seria a parte do grupo que estava representada nos membros ausentes,
mas o grupo não falou sobre o assunto.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 10


Iniciamos o encontro, solicitando que o grupo realizasse seu “jornal”, que consis-
tia numa rodada em que os membros deveriam falar e compartilhar os acontecimentos
desde o último encontro. Alguns membros falaram que se oportunizaram momentos para
conversar com o objetivo de promover melhorias no trabalho e isso só teria sido possível
a partir do último encontro. Outros mencionaram que tinha sido difícil encarar o colega
depois do que tinha acontecido, mas tentaram e conseguiram “se olhar de forma diferen-
te”.
O membro ao qual no último encontro o grupo identificou como “forte”, por usar
sua autoridade e poder na instituição, manifestou “[...] não consegui desligar daquilo que
conversamos, pois tinha sido um trabalho muito diferenciado que mexeu muito com o
grupo”. Expôs também que obtivera algumas respostas, mas que ainda queria obter outras
naquele grupo.
Um dos membros disse, “[...] o encontro me chocou porque muitas coisas foram
levantadas e jogadas [...]” e estava apreensivo para aquele encontro. Outro, falou que
seria impossível não ter pensado no que aconteceu no último encontro, falou: “[...] quem
fala sai ferido e se fere também, foi uma forma de falar aquilo que não está bem, e foi
difícil trabalhar nesta semana”.
Com estas falas, percebemos que o grupo estava assustado e, portanto, resistente
para o encontro. As pessoas falavam e não se olhavam, percebemos que o grupo estava
com medo das reações e do impacto que este encontro traria e, principalmente, pelo fato
medo de magoar o colega e ter de lidar com a situação no dia-a-dia de trabalho.
Um dos membros, que foi alvo de acusação por seu comportamento não ser iden-
tificado como comportamento de líder pelo grupo, falou que a semana tinha sido difícil
em função das feridas abertas. E trouxe: “[...] eu tive a oportunidade de ouvir pessoas
renomadas que entendem sobre liderança no final de semana e descobri que ainda não
somos uma equipe mas um grupo. Equipes não se agridem, somos grupo e temos que nos
trabalhar”. Percebemos, com isso, um movimento de desqualificação para com as coor-
denadoras e com o próprio grupo. Talvez uma forma de defesa utilizada pelo membro.
Pelo fato de uma das coordenadoras trabalhar na instituição, o grupo, através de
elogios pessoais e solicitando afirmativas sobre o comportamento dos membros no dia-a-
dia, fez várias tentativas de sedução para que a mesma “membreasse”. Nestes movimen-
tos, foi de fundamental importância a intervenção da co-coordenação dar suporte a cole-
ga, com o objetivo de sustentar seu papel de coordenadora. Depois de finalizado o encon-
tro a mesma expõe que sentiu-se protegida nestes momentos pois ficava sem saber o que
fazer.
Utilizamos a técnica Abrindo Janelas (Anexo B). Nosso objetivo era proporcionar
que o grupo se conscientizasse de seus sentimentos, inibições, medos e vergonhas, pois
esses sentimentos, se não fossem trabalhados não permitiriam um avanço no movimento
grupal.
Embora alguns rostos ficavam vermelhos conforme as perguntas iam surgindo e
outros estavam tensos, o grupo respondeu positivamente à técnica. No compartilhamento
dos sentimentos em relação ao que tinha sido proporcionado, um dos membros falou:
“Parecem perguntas bobas, mas nos revelamos, e o grupo não é íntimo”. Outro membro
complementou dizendo que, “A amizade não se conquistaria de uma hora para outra, se-
ria preciso tempo”. Levantamos a hipótese, junto ao grupo, de que estas falas poderiam
representar a vontade de reatar a amizade e o relacionamento que, na visão deles, fora
rompido no último encontro. O grupo mencionou várias vezes que tinha o medo do jul-
gamento e medo de passar uma auto-imagem que não condizia com sua realidade e dese-

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 11


jo. Pois, conforme suas falas, os líderes deveriam passar a imagem de ser os melhores, de
ser o exemplo, e ali estavam se mostrando realmente.
No entanto, como qualquer grupo que se depara com estas “novidades”, este tam-
bém realizava movimentos de querer e iniciar a mudança, mas depois recuar para o fun-
cionamento que já estava instalado. Emprestamos nosso olhar de coordenadoras aos
membros do grupo e sinalizamos estes movimentos quando o grupo falou sobre as cons-
truções e reformas físicas que estavam sendo realizadas na instituição e da dificuldade de
se chegar a um consenso para sua concretização, enfatizando as falas dos membros: “Vá-
rias vezes tentamos e não conseguimos”, “Quantos treinamentos já foram feitos, e esta-
mos aqui novamente porque as coisas não mudam”.

Dinâmica do grupo no terceiro encontro

Data de realização: 30 de maio de 2006.


Coordenadoras A e C.
No último encontro, um dos participantes antes de iniciar o trabalho, sentou-se na
cadeira que usualmente estava sendo utilizada por nós, verbalizando que naquele encon-
tro gostaria de permanecer ali. Este participante era um dos principais líderes da institui-
ção. Percebemos uma clara disputa de poder com a coordenação.
Diante da resistência estabelecida entre os membros, do medo de se expor e ouvir
feedbacks, ocasionados pela entrega no primeiro encontro e pelo recuo no segundo, neste
encontro buscamos realizar uma atividade que proporcionasse a realização de feedbacks.
Buscamos então alcançar este objetivo com a técnica da bala (Anexo C).
A consigna da técnica foi feita de maneira sucinta, dizendo aos participantes que
escolhessem a bala que quisessem para entregar a um de seus colegas, dizendo o porquê
de sua escolha. Deixamos livre a opção da quantidade de balas e do número de pessoas a
quem entregar. Também não ressaltamos sobre o sabor (doce, forte ou azeda) das balas,
que estavam no centro do círculo. Percebemos a importância da clareza e objetividade da
consigna da técnica utilizada para ajudar a direcionar o grupo ao que estava latente, bem
como as intervenções iniciais que proporcionaram ao grupo não ficar preso à discussão
da técnica. Embora não tenha levado em conta o sabor das balas – e o nosso objetivo era
que este sabor pudesse ser utilizado para ajudar nos feedbacks, o grupo conseguiu se pro-
porcionar um momento importante de intimidade.
Muitas vezes, o grupo não se dirigia diretamente às pessoas com quem gostariam
de falar, através de falas como “A participante Y mostra um comportamento X”, ou “Tem
gente que age assim [...]”. Realizamos intervenções solicitando que os participantes exer-
citassem o feedback dirigindo-se às pessoas as quais falavam. Essas intervenções foram
bem aceitas pelo grupo, tanto neste encontro, percebemos um crescimento em relação a
estas falas. O grupo percebeu que se continuasse praticando o mesmo comportamento no
dia-a-dia, em que os feedbacks eram feitos por caminhos em que era incluso um interme-
diário, certamente estaria prejudicando a relação de confiança e transparência no grupo.
Outro membro levanta e derrama o saco de balas no chão dizendo “deveríamos
todos derramar nossos saquinhos que estão cheios”, fazendo um convite para o grupo
sobre os “não ditos do grupo”. Frente ao silêncio estabelecido, intervimos motivando a
participante a “derramar o seu”, o que resultou num momento de feedback importante ao
grupo. Neste momento, realizamos um papel importante na coordenação, pois ajudamos a

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 12


clarear um momento de cegueira do grupo, ajudando-o a falar sobre o que estava nas en-
trelinhas.
O grupo teve momentos de discussão sobre os papéis de liderança e as funções
que ocupam, e principalmente sobre as ausências destes papéis. Entendemos que falavam
das ausências do grupo, do lado saído do grupo, dos participantes que não compareceram.
Mais uma vez, o grupo não conseguiu falar diretamente sobre os ausentes, sobre os mem-
bros que desistiram e no último encontro, mais um membro não havia comparecido.
Numa avaliação geral do encontro, percebemos e sinalizamos ao grupo que os
membros puderam reconhecer seu potencial de liderança e o caminho de aprendizagem a
trilhar. A técnica, que proporcionou momentos de elogios e críticas, também oportunizou
a este grupo de líderes a possibilidade de relacionar ternura e firmeza em seu comporta-
mento. Talvez ainda não tenham conseguido enxergar o feedback como algo a alicerçar
suas mudanças, que possa ser usado para o seu crescimento, mas certamente estão no
caminho.
Em se tratando ultimo encontro, solicitamos que o grupo falasse sobre a sua per-
cepção e sentimentos em relação a este trabalho. Um dos membros expôs que sua expec-
tativa quanto ao trabalho era maior. Na sua opinião, sente que dentro da instituição é ne-
cessário estar “revestido com um algodão” e estar sempre bem. Diz ainda “[...] pensei que
o trabalho iria fortalecer a pessoa para lidar diante desses sofrimentos”. Fica depositado
nesta fala uma característica do funcionamento do grupo, sua dúvida entre usar uma más-
cara ou mostrar-se realmente como é. É evidente que o grupo ainda busca ser aceito por
si entre seus membros.
Outro membro expôs que não obtivera nenhum resultado com o trabalho, mas que
talvez o resultado pudesse ser percebido daqui a alguns anos. Através desta fala podemos
perceber a resistência à mudança, que ficou depositada em um membro.
A maioria dos membros disse que ainda teria muitos comportamentos que ainda
precisavam ser trabalhados e manifestaram, timidamente, a vontade de dar continuidade
aos encontros, pelo menos uma vez por mês. Em alguns momentos, nos encontros, o gru-
po mencionou trabalhos e projetos que foram sucumbindo com o passar do tempo e te-
mos a hipótese de que o grupo também teme que isto aconteça com este trabalho. Deixa-
mos para o grupo pensar sobre a continuidade, mas, como tínhamos acordado, aquele era
o encontro de encerramento daquela proposta.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não existe uma resposta única e conclusiva sobre a melhor forma de exercer o
papel de coordenador de grupos. Procuramos fazer o melhor que pudemos, lembrando de
toda a nossa caminhada durante a Formação em Dinâmica de Grupos, desde os módulos
vivenciais, os de coordenação, até os de seminários de discussão, que hoje tornam mais
fácil a nossa compreensão da dinâmica grupal.
Moscovici (1998) afirma que “o conjunto de características pessoais e interpes-
soais do coordenador podem facilitar ou dificultar a aprendizagem dos participantes, ao
provocar reações de agrado ou desagrado por parte de um ou mais membros do grupo”.
Coordenador e grupo não são iguais, mas se complementam. Nossas consignas e interpre-
tações proporcionaram ao grupo compreender aspectos de sua dinâmica que talvez nunca
teriam acontecido sem o “empréstimo do nosso olhar”.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 13


Compreendemos a nossa missão, de ajudar o grupo a se experimentar, a se arris-
car, a elaborar, a se descobrir. O grupo que coordenamos não foi perfeito, tampouco nós.
Sempre tivemos preocupação e vontade de acertar, mas não deixamos que isso nos parali-
sasse. Permitimo-nos sermos nós mesmas, sendo espontâneas e, acima de tudo, humanas.
E é por isso que todas as alegrias, ansiedades, medos, frustrações, sustos e aborrecimen-
tos têm valor inestimável. Porque tudo foi aprendizado, tudo foi ganho.
Tivemos muitos momentos de dúvida, sim. Afinal, não tínhamos as nossas coor-
denadoras para nos sinalizar o caminho, mas ao final das coordenações, nos reuníamos e
proporcionávamos o nosso feedback. Durante toda a elaboração deste trabalho, refletimos
sobre nossa atuação, e também sobre quando deixamos de atuar. Em todos os momentos,
nos proporcionamos um verdadeiro aprendizado.
Também nos deparamos com o desejo de dar continuidade ao trabalho. Nosso
contrato inicial previa três encontros e, talvez mais por vontade nossa do que do próprio
grupo, gostaríamos de continuar. Pensamos, então, na clareza e honestidade para com a
instituição e com o próprio grupo e mantivemos nossa proposta inicial de encerrar no
terceiro encontro. Nossa esperança, é que venha do próprio grupo o desejo de nos encon-
trarmos em uma nova oportunidade futura.
Helrighel (1999) afirma que “é bom experimentar para vivenciar e aprender”. Este
foi nosso objetivo e, assim o atingimos. Temos a certeza de todos os ganhos que obtive-
mos em nossa trajetória. Um início de trajetória que já traz consigo uma grande bagagem
de vivências, de experiências.

REFERÊNCIAS

ANDALÓ, Carmen Silvia de Arruda . O papel de coordenador de grupos. Psicologia USP, São Paulo, v.
12, n. 1, 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php>
BAREMBLITT, Gregório. Grupos: grupo operativo. Mexican Institute of Group and Organizational Rela-
tions. Extraído de teoria e técnica. IBRAPSI. Rio de Janeiro: Graal, 1986. Disponível em:
<http://www.continents.com/Art34.htm>.
CARNEIRO, Danúzio. Introdução ao modelo teórico do grupo operativo. Fortaleza, 2001. Disponível em:
<http://www.campogrupal.com/grupoperativo.html>.
HELRIGHEL, Paulo R. Modelo de treinamento organizacional em desenvolvimento interpessoal. Mono-
grafia de Conclusão do Curso de Formação de Coordenadores de Grupos de Desenvolvimento Interpessoal,
pela SBPDGP – Sociedade Brasileira de Psicoterapia, Dinâmica de Grupo e Psicodrama, 20 fev. 1979.
Revista e divulgada na SBDG em nov. 1992.
MAMEDE, Willer Conhecendo e desvendando grupos. Disponível em: <http://www.rh.com.br>. Acesso
em: 20 jun. 2005.
MUCCHIELLI, Roger. Dinâmica de grupos – conhecimento do problema e aplicações práticas. São Pau-
lo: LTC, 1979.
RATTNER, J. Terapia de grupo – a psicoterapia do futuro. Petrópolis: Vozes, 1977.
WHITMAN, Roy M. Intervenções e instrução do coordenador de grupos T. Mexican Institute of Group
and Organizational Relations: programa de formação de coordenadores de dinâmica de grupo. Extrato de
Psicodinamica del Grupo T, Editorial Paidós, Buenos Aires, 1975 . Disponível em:
http://www.continents.com/Art53.htm
ZIMERMAN. D. E.; OSÓRIO, L. C. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 14


ANEXOS

ANEXO A
TÉCNICA DESAFIO DA GARRAFA

Nosso objetivo: perceber as manifestações de liderança, autoridade e poder e o de-


senvolvimento do trabalho em equipe.
Material utilizado: barbantes cortados em aproximadamente 1½ metro amarrados
por um nó na ponta, com pontas para todos os participantes; 1 garrafa; 1 caneta, amarrada
junto ao nó que une todos os barbantes; 6 vendas para os olhos; 1 tesoura
Disposição do grupo: orientar para que o grupo fique em círculo, em pé, num am-
biente que permita movimentação. Cada participante amarra uma ponta do barbante em
sua cintura.
Desenvolvimento:
Solicitar 6 voluntários, os quais receberão vendas para os olhos. E um voluntário,
ao qual será entregue a tesoura.
Informar ao grupo que terão um desafio para resolver e algumas regras deverão
ser observadas. Se alguém descumprir as regras do jogo será cortado (mostrar a tesoura).
O desafio consiste em transpor a caneta para dentro da garrafa, observando as se-
guintes regras:
As pessoas vendadas poderão se comunicar verbalmente
As pessoas sem vendas só poderão se comunicar por gestos
É proibido colocar as mãos no barbante
É proibido deixar o barbante frouxo.
Quem desobedecer às regras será cortado do grupo.
Em seguida, a colocar a garrafa no chão, afastada do círculo.

ANEXO B
TÉCNICA ABRINDO JANELAS

Nosso objetivo: Permitir um maior conhecimento pessoal;


Material utilizado: 1 folha para cada participante contendo as seguintes frases:
– Neste momento estou sentindo que...
– O que mais me inibe no grupo é...
– Às vezes eu me sinto como se...
– Tenho uma vergonha enorme de...
– Sinto-me mais próximo de alguém quando...
– Eu me sinto constrangido quando...
– Tenho muito medo de...
– Tenho vontade de retirar-me do grupo, quando...
– Neste grupo, não gosto de falar sobre...
– Neste grupo, gostaria de ser...
– Neste grupo, eu acho que causo...

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 15


Disposição do grupo: orientar para que o grupo fique em pé e faça dois círculos,
um dentro do outro, de modo que cada pessoa do círculo de dentro fique de frente para
outra pessoa do círculo de fora.
Desenvolvimento:
Entregar uma folha com as frases para cada participante.
Cada pessoa deverá escolher aleatoriamente um dos itens da folha, ler em voz alta
para o parceiro que está a sua frente e este, imediatamente, deverá completar a frase, co-
mo sendo sua.
A cada minuto, o coordenador dará o comando: “RODA” que significa que o cír-
culo de fora avançará um passo, de forma que cada pessoa terá um novo parceiro. Este
continuará lendo a frase para que o outro a complete.
Prosseguir até que todas as duplas tenham “conversado”.
Em seguida, reiniciar trocando os papéis: quem perguntou antes, completa a frase
nesta rodada.

ANEXO C
TÉCNICA DA BALA

Objetivo: permitir ao grupo um momento de feedback.


Material: um saco de balas doces (ex.: mel) e um saco de balas fortes (ex.: men-
ta).
Disposição do Grupo: orientar para que os membros fiquem sentados, em forma
de círculo, para possibilitar que todos se vejam.
Desenvolvimento:
Colocar no centro do círculo os dois sacos com as balas.
Comunicar que um participante de cada vez, deve pegar a bala e entregar a um co-
lega, dizendo o porquê de sua escolha (momento de feedback).

SBDG – Caderno 81 ™ Vivenciando a coordenação 16


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Erechim – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira

Competências interpessoais
em um grupo de formação

IRACI MARIA BOHRER


MARA DE LIMA CAMPOS
PAULO MORAIS

SUMÁRIO

Introdução ..........................................................................................................................2
Justificativa ..............................................................................................................2
Foco do tema............................................................................................................2
Objetivos ..................................................................................................................2

1 Fundamentação teórica .........................................................................................3


1.1 Aquisição da competência interpessoal .......................................................3
1.2 Suposto básico .............................................................................................5
1.2.1 Liderança..........................................................................................6
1.2.2 Comunicação....................................................................................6
1.2.3 Participação......................................................................................8

2 Procedimentos metodológicos ...............................................................................9


2.1 Caracterização da pesquisa ..........................................................................9
2.2 Coleta e análise de dados .............................................................................9

3 Análise dos resultados da pesquisa.....................................................................10

Considerações finais.........................................................................................................11

Referências........................................................................................................................12

Anexos ...............................................................................................................................13
A – Questionário ................................................................................................................14
B – Gráficos das respostas do questionário .......................................................................16

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 1


INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como base o estudo das competências interpessoais num grupo
de formação, pois acredita-se que seu entendimento é de fundamental importância para
que a convivência se torne produtiva e enriquecedora.
Procurou-se através do estudo teórico e “prático” identificar os pontos fortes e os
pontos fracos dessas competências na prática. Esta pesquisa foi elaborada com ênfase nas
três características das competências interpessoais, que são liderança, participação e co-
municação.

Justificativa

Quando o grupo se reuniu para discutir e avaliar sobre o tema de trabalho para
conclusão, várias idéias surgiram, porém, o tema de maior atratividade foi com relação às
competências comportamentais. Tema esse, experimentado e vivenciado em formação, o
que motivou a decidir por ele.
Encontra-se em Moscovici (2002) a base teórica para este trabalho.
Decidiu-se então, como fonte inspiradora, uma pesquisa com o grupo, pois possi-
bilitaria identificar as habilidades comportamentais; comunicação, liderança e participa-
ção, ou seja, àquelas que mais puderam contribuir ou interferir na dinâmica grupal.
Frente às informações, com base no referencial teórico e em percepções enquanto
membros do grupo procurou-se identificar e relacionar alguns desses momentos na dinâ-
mica grupal.
Acredita-se que assim conseguiu-se compreender alguns momentos das relações
interpessoais.

Foco do tema

Quais as características de competência interpessoais existentes no grupo e quais


identificam o mesmo?
De que maneira se estabelece a competência interpessoal no grupo?
Quais os pontos fortes e fracos que interferem ou contribuem para a competência
interpessoal?

Objetivos

Objetivo geral
Oportunizar investigação de como as competências interpessoais contribuem ou
dificultam o processo de desenvolvimento grupal.

Objetivos específicos
Caracterizar as formas de competência interpessoal e as apresentadas no grupo
avaliado;

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 2


estabelecer uma relação entre as formas de competências apresentadas no grupo e
as características de uma competência interpessoal;
identificar os pontos fortes e os pontos fracos das competências interpessoais den-
tro do processo de comunicação, participação e liderança do grupo pesquisado.

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O mundo psicológico se forma em cada indivíduo a partir de seu nascimento. As


experiências que o indivíduo adquire com a realidade constituirão seu mundo pessoal,
seus valores, suas crenças, hábitos, enfim, seu modo de vida.
Desta forma, o indivíduo reage ao mundo conforme sua percepção e experiência
de vida. Existem, portanto, dois mundos: um mundo objetivo, ao qual compreende a rea-
lidade externa e um outro mundo subjetivo que está ligado à realidade interna (psicológi-
ca).
Pessoas convivem e trabalham com pessoas; portam-se como pessoas. Reagem às
outras pessoas com as quais entram em contato. Essas interferências ou reações consti-
tuem o processo de interação humana, que se desenvolve de uma forma permanente entre
as pessoas, sobre as formas de comportamentos manifestos e não-manifestos, verbais e
não-verbais, pensamentos, sentimentos, reações mentais e/ou físico-corporais.
A forma de interação humana mais freqüente é representada pelo processo da co-
municação. Assim, quando uma pessoa começa a participar de um grupo, ela traz consigo
seu conhecimento, informações, experiências anteriores, ou seja, seu estilo comportamen-
tal, ocasionando inevitáveis diferenças de percepção, opinião e sentimentos no referencial
do indivíduo no grupo. Como serão encaradas e tratadas estas diferenças determinará a
modalidade do relacionamento entre os membros do grupo.
A forma que os membros do grupo lidam com as diferenças individuais, cria um
clima entre os mesmos e terá forte influência sobre a vida do grupo, principalmente nos
processos de comunicação, participação e liderança.
Na comunicação as diferenças são aceitas e tratadas em aberto, o entendimento
flui, as pessoas falam e ouvem as outras, pensam e sentem, dão e recebem feedback. Por
outro lado, se estas diferenças são negadas e suprimidas, a comunicação torna-se falha,
incompleta, gerando fofocas, distorções, barreiras e bloqueios, as pessoas não falam e
nem ouvem, só captam o que reforça sua imagem perante o grupo.
A comunicação, a liderança e a participação eficaz em grupo dependem essen-
cialmente da competência interpessoal do líder e dos membros.

1.1 Aquisição da competência interpessoal

A competência técnica é fundamental em cada profissão. Ela surge da necessidade


de agir assertivamente. É adquirida através de cursos, leituras, manuais, entre outros. Jun-
to com esta profissionalização vêm os vícios de comportamento, entre eles a falta de tole-
rância, insensibilidade, narcisismo, valorização do indivíduo.
Haverá sinergia no grupo quando os membros desenvolverem a competência in-
terpessoal, indo além da soma das competências técnicas individuais.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 3


A competência técnica por si só autoriza e habilita o desempenho da função, vali-
dando o processo inconsciente de atitude, não valorizando a flexibilidade, inibindo e en-
gessando outras capacidades importantes para o desenvolvimento grupal.
Em todas as profissões os dois tipos de competências são necessários, embora em
proporções diferentes, porém, é importante encontrar um ponto de equilíbrio para o de-
senvolvimento individual e do grupo.
Enquanto a competência técnica pode ser adquirida através de livros, manuais e
outros, a competência interpessoal requer treinamento constante para desenvolver as ha-
bilidades de forma adequada a cada situação.
Assim, segundo Moscovici (2002):
A competência interpessoal assumiu importância capital: a percepção e a habilidade pro-
priamente dita. O processo da percepção precisa ser treinado para uma visão apurada da
situação interpessoal. Isso significa um longo processo de crescimento pessoal, abran-
gendo autopercepção, autoconscientização e auto-aceitação como pré-requisitos de possi-
bilidades de percepção mais realística dos outros e da situação interpessoal.
Portanto, a habilidade em lidar com situações interpessoais requer disponibilidade
e coragem para desenvolver o exercício de dar e receber feedback, flexibilidade para acei-
tar e reconhecer novas possibilidades de atitudes e comportamentos, novos relacionamen-
tos, construindo assim, um desenvolvimento humano autêntico consigo e com os outros.
O grupo constitui um conjunto de pessoas, que existem em função de seus inter-
relacionamentos, na busca de sua identidade individual, grupal e social.
Estes grupos se renovam e se ampliam na trajetória da vida, seja no âmbito fami-
liar, educacional, profissional, esportivo, social, etc. Portanto, o individuo enquanto ser
gregário não existe separadamente, ele se constitui pelas relações sociais e interpessoais,
num conjunto de sistemas, de valores morais e sociais, de identificações, desejos, capaci-
dades, necessidades básicas, como a de dependência e de reconhecimento.
Diante dessas necessidades, busca-se conhecimento constante, tanto na capacita-
ção técnica como nas relações humanas. É nessa busca constante, que ele se depara com
o grande desafio do momento, o desenvolvimento individual e do grupo.
O processo do desenvolvimento humano é complexo e multidimensional, requer a
busca constante do conhecimento, de habilidades e atitudes. Onde iremos encontrar na
literatura alguns pontos para o conhecimento do processo na dinâmica dos grupos.
Segundo Moscovici (2002, p. 97),
Quando se deseja estudar um grupo em funcionamento e compreender a seqüência de
eventos, as modalidades de interação e suas conseqüências, faz-se necessário identificar
os componentes relevantes do processo de grupo... Pode-se analisar um grupo através de
sua composição, estrutura e ambiente. Neste caso, estuda-se as pessoas que compõe o
grupo, as posições que elas ocupam no grupo, suas relações entre si, o espaço físico e
psicossocial do grupo.
A Dinâmica do Grupo apresenta uma estrutura que vai além de seus membros.
Constituem forças em ação e que determinam os processos do grupo, formando-se então
um campo dinâmico, onde se cruzam necessidades, desejos, medos, culpas, defesas, pa-
péis, identificações e resistências.
Observa-se que no grupo de formação ficou evidenciado em vários momentos da
coordenação e co-coordenação o desejo de fazer uma coordenação perfeita. Inconscienti-
zou-se um papel ideal. Havia a intenção de ouvir o feedback, mas também a necessidade

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 4


latente de manter a imagem de “fodão”, fazendo uso da justificativa, perdendo assim, a
riqueza da observação do grupo. Outro momento forte que ocorrido, foi a percepção de
poder contribuir com um feedback genuíno, porém, preocupado com o conflito que pode-
ria ser gerado, muitas vezes perdeu-se a oportunidade de crescimento do próprio grupo.

1.2 Suposto básico

É o termo que Bion (1970) utilizou para qualificar a mentalidade grupal, ou seja, é
a existência de uma idéia comum, unânime e anônima em que o grupo passa, por um de-
terminado momento, em estado inconsciente. Na maioria das vezes, esses estados incons-
cientes são opostos às opiniões conscientes e racionais entre os membros do grupo. É
nestes estados que o grupo adquire as três formas de suposição básica: dependência, de
“luta e fuga” e de acasalamento.
As sugestões básicas são constituídas por fortes emoções que são de origem pri-
mitivas. Conforme Bion (1970), a participação na atividade de grupos, a suposição básica
não exige treinamento, experiência ou desenvolvimento mental. Ela ocorre de forma ins-
tintiva e instantânea, inevitavelmente.
O tempo não desempenha parte alguma, a dimensão da função mental não é reco-
nhecida. Qualquer atividade que exige uma consciência do tempo não é compreendida,
existe total ausência no processo de desenvolvimento, as reações ficam no âmbito da hos-
tilidade e competitividade, com idéias messiânicas entre um suposto básico e outro.
Neste processo, os grupos não sentem exigidos para a capacitação de desenvolvi-
mento, cuja principal compensação é o deslocamento de um suposto básico para o outro,
o que gera uma agradável sensação de vitalidade no grupo.
Este manejo entre os membros do grupo, promove a adesão de um grupo de supo-
sição básico ao outro, que aderem idéias estabelecidas e despojadas de qualquer qualida-
de que possa exigir algum esforço penoso ou doloroso no processo de desenvolvimento,
engessam qualquer possibilidade de insights e conflitos.
Entretanto, a forma como os três grupos de suposição básica se relacionam, é que
ajudam a dar forma e significado ao complexo estado emocional que o grupo demonstra,
através de seus medos, conflitos e inseguranças, pois de outra maneira não poderia deslo-
car de um grupo para outro, como também não surgiriam o grupo especializado de traba-
lho, para dar forma, contribuir e modificar as relações emocionais; amor, ódio, culpas,
ansiedades, medo, etc., para o processo de desenvolvimento grupal. Ainda para Bion
(1970), o permanente jogo de “adjudicação e de assunção de papéis” – significa um indi-
cador – de que está havendo uma boa evolução, e quando os papéis deixam de ser fixos e
estereotipados e adquirem uma plasticidade intercambial.
À medida que os papéis forem reconhecidos, assumidos e modificados, os indiví-
duos adquirem sua própria identidade, assim como uma identificação com os demais gru-
pos.
Na dinâmica grupal existem vários componentes que interagem nas relações in-
terpessoais, no entanto nosso grupo elegeu como objeto de estudo o processo de lideran-
ça, comunicação e participação.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 5


1.2.1 Liderança

A autenticidade do líder se dá através da conscientização de que não é possível


fugir das contradições inerentes à vida. A mente da liderança é ampla; ela tem espaço
para as ambigüidades do mundo, para sentimentos conflitantes e idéias contraditórias.
O atributo principal da liderança é a capacidade de administrar as polaridades.
Elas são inevitáveis em todos os aspectos da vida. Quer-se ser bons profissionais, mas
sabe-se que a família é importante. “Sou chefe, mas também sou amigo”. Como conciliar
as necessidades individuais com as necessidades da equipe? As polaridades fazem parte
da ordem natural das coisas. Como age-se e como reage-se a elas é que se percebe nas
ações de lideranças.
Bion (1970) fundamenta que qualquer grupo tenha uma necessidade implícita e
ter uma liderança no grupo. Para ele, o líder é aquele que é emergente do grupo, portanto,
ele surge da necessidade do grupo. Para continuar líder de qualquer tipo de grupo, a pes-
soa deve ter conhecimento e habilidade necessária para guiar o mesmo no cumprimento
de suas tarefas.
Um exemplo disso aconteceu numa de nossas co-coordenações, quando o objetivo
era de que os participantes, de olhos vendados, formassem um triângulo com uma corda.
No decorrer da vivência, várias discussões surgiram e num dado momento, os membros
do grupo deram autoridade a um participante para assumir a liderança, auxiliando o grupo
na tarefa.
Segundo Zimermann (1997, p. 141),
Pode-se entender a formação de líderes a partir da conceituação de supostos básicos de
Bion. Como sabemos, este autor descreveu três tipos de inconscientes de supostos bási-
cos. O primeiro é o de “dependência”, pelo qual o grupo se reúne a espera de ser susten-
tado por um líder de quem depende para sua alimentação material, espiritual e proteção.
Neste caso o ideal é um líder de natureza carismática. O segundo suposto é o de luta/fuga,
em que o grupo está reunido para lutar contra algo ou dele fugir: o seu líder terá caracte-
rísticas paranóicas e tirânicas. No terceiro suposto aparece o acasalamento, ao qual refe-
re-se fundamentalmente as demonstrações de esperanças do grupo. O perfil do líder é
messiânico.

1.2.2 Comunicação

Partiu-se do pressuposto de que o processo de comunicação intra e intergrupal é


considerado a maior causa de desgaste de relacionamento, bem como, de equívocos de
entendimento e, numa visão mais generalista, pode ser considerado “o grande mal da
humanidade”.
Tradicionalmente, as comunicações são dissecadas em três elementos: emissor,
mensagem e receptor. Enfatiza-se a clareza e simplicidade da emissão para que o receptor
a compreenda corretamente. Mas na verdade, isso não ocorre de maneira tão fácil, o que
acontece é que entre a emissão e a recepção da mensagem, origina-se o fenômeno da per-
cepção, isto é, a pessoa só recebe aquilo que percebe, tendo como referência seus valores
morais, sociais e éticos.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 6


Isso funciona como um crivo para o processo de comunicação, só recebe aquilo
que é coerente com sua realidade. Quando uma informação é contrária ao sistema exis-
tente, resistiu-se em modificar o sistema e isolar a informação.
Pode-se afirmar então que a comunicação também varia de acordo com os “ins-
trumentos” utilizados para estabelecer contato com o outro, podendo esta ser verbal ou
não verbal:
Verbal: Nesta, pode-se destacar a linguagem oral ou escrita para iniciar e estabe-
lecer contato com o outro. A comunicação verbal é a mais freqüente, a mais habi-
tual.
Não-verbal: Pertencem a este tipo de comunicação os gestos, as expressões faci-
ais, as posturas. Muitas vezes, neste grupo de formação, o silêncio falava alto, os
olhares, as ausências vinham carregadas de mensagens para o grupo.
Conforme Mailhiot (1985, p. 71),
A comunicação verbal e não-verbal não estão sempre sincronizadas e sintonizadas num
mesmo indivíduo. Às vezes, o não verbal está em discordância com o verbal, trai o eu ín-
timo que o verbal tenta camuflar.
Como exemplo, podemos citar os membros que tem saídas freqüentes, uso de ce-
lular, bocejos, gestos impacientes. Mas a pergunta persiste: como integrar o verbal e não-
verbal em uma mesma comunicação?
Antes, é preciso compreender a importância de desenvolver a autenticidade num
processo de comunicação. Para Mailhiot (1985, p. 71),
Somente a comunicação verbal e não verbal ao mesmo tempo tem condições de ser ade-
quada. Cada indivíduo deve descobrir por si e adotar a forma de integração destes dois
modos de expressão. Porém, esta integração não poderá ser considerada definitivamente
adquirida. Para que ela permaneça funcionando, é importante que o indivíduo faça ques-
tionamentos contínuos e que esteja sempre aberto a novas aprendizagens.
Pode-se dizer então, que:
Quanto mais o contato psicológico se estabelece em profundidade, mais a comu-
nicação humana terá possibilidades de ser autêntica;
Quanto mais à expressão de si conseguir integrar a comunicação verbal e a não
verbal, mais a troca com o outro terá condições de ser autêntica;
Quanto mais à comunicação se estabelecer de pessoa para pessoa, isto é, além das
máscaras, papéis e status, maior a possibilidade de ser autêntica;
Quanto mais à comunicação intragrupais for aberta, positiva e solidária, mais as
comunicações interpessoais terão possibilidades de serem autênticas e de não ser-
virem de evasão ou de compensação a uma falta de comunicação interna no nosso
próprio grupo.
Outra habilidade importante para o desenvolvimento individual e grupal consiste
em dar e receber feedback, sem o qual não se constrói um relacionamento humano autên-
tico.
Exemplificando o processo de feedback, pode-se trazer a fala da coordenação para
o grupo sobre a importância de buscar conhecimento teórico e técnico para exposição em
todos os seminários, e não apenas o que cada grupo iria apresentar.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 7


A Janela de Johari, idealizada por Joseph Luft e Harry Inghan (1961) auxilia na
percepção do indivíduo com relação a si mesmo e a interação com os outros. Neste caso,
estaremos abordando o II Quadrante: Eu Cego, ao qual representa nossas características
de comportamento que são facilmente percebidas pelos outros, mas das quais, geralmente
não estamos cientes.
Segundo Moscovici (2002, p. 45),
Há evidências de que é nesta área que somos mais críticos com o comportamento dos ou-
tros sem perceber ou darmos conta que estamos nos comportando da mesma forma. Esta
área leva mais tempo a reduzir-se porque, usualmente, há fortes razões de ordem psicoló-
gica para a recusa em ver o que se faz ou sente. Porém, algumas modificações podem ser
conseguidas entre indivíduos trabalhando juntos, com espírito de cooperação e compre-
ensão.
Daí a importância de desenvolver a autenticidade e confiança no indivíduo e no
grupo, em aprender a dar e receber feedback, sem reações defensivas.

1.2.3 Participação

Percebe-se que é enganoso pensar que existem apenas duas funções distintas: li-
derança e participação simplesmente. A própria liderança não pode ser assim tão marcada
e continuamente desempenhada por apenas um membro do grupo. Outros membros as-
sumem liderança informal, de acordo com as diferentes situações pela qual passa o grupo
em seu processo de interação.
A vida de um grupo passa por diversas fases e, em cada uma delas, os membros
atuam de forma diferente duplamente: em relação à etapa de vida do grupo e em relação
aos demais membros, dependo do tipo de grupo (formal, informal, de trabalho, social, de
treinamento, etc.).
O complexo processo de interação humana exige de cada individuo um determi-
nado desempenho, o qual variará em função da dinâmica de sua personalidade e da dinâ-
mica grupal na situação-momento.
Conforme Moscovici (2002, p. 125),
Assim, no plano intrapessoal, o indivíduo reagirá em função de suas necessidades moti-
vacionais, (sentimentos, crenças e valores, normas interiorizadas, atitudes, habilidades
específicas e capacidade de julgamento); no plano interpessoal influirão as emoções gru-
pais (o sistema de interação, os normativo e a cultura do grupo), no plano situacional
exercerão influência o contexto físico e social imediato (o contexto cultural, o sistema
contratado de relações e a dimensão temporal). Logo, personalidade, grupo e contexto
não podem ser ignorados no papel desempenhado por membros de um grupo, em diversas
circunstâncias.
Para que a participação flua, há papéis que devem ser desempenhados no grupo.
A classificação de papéis funcionais se dá em construtivos e não construtivos, dependen-
do das necessidades do grupo e de seus membros em cada ocasião. Um papel facilitará ou
inibirá as atividades e o desenvolvimento grupal. Essa classificação, não pode ser rigida-
mente aplicada. Um determinado papel desempenhado por um membro não pode ser jul-
gado em termos absolutos.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 8


Houve ocasiões no grupo em que a descoberta e a eclosão dos conflitos latentes
foram necessárias para posteriores tentativas de resolução das mesmas.
Segundo Benne e Sheats (1961) existem papéis em nível sócio-emocional, que
ajudam na manutenção dos grupos e são entendidos como facilitadores, são elas:
Conciliador: Busca um denominador comum; quando em conflito, aceita rever
sua posição e acompanhar o grupo para não chegar a impasses.
Mediador: Resolve as divergências entre outros membros, alivia as tensões nos
momentos mais difíceis através de brincadeiras oportunas.
Animador: Demonstra afeto e solidariedade aos outros membros do grupo. Bem
como compreensão e aceitação de outros pontos de vista, idéias e sugestões, con-
cordando, recomendando e elogiando as contribuições dos outros.
Ouvinte interessado: Acompanha atentamente a atividade do grupo e aceita as
idéias dos outros, servindo de auditório e apoio nas discussões e decisões do gru-
po.
Pode-se perceber que estes papéis perpassavam por muitos componentes do grupo
em vários momentos, ficando para alguns por mais tempo, como por exemplo, ser deposi-
tário do papel de “bode expiatório”, da super-proteção, do mais forte, do mais fraco.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.1 Caracterização da pesquisa

A pesquisa em questão é de natureza quantitativa. Foi elaborada utilizando-se do


Modelo de Pesquisa de Competência Interpessoal (Moscovici, 2002, p. 199). Conforme a
autora, “este tipo de pesquisa nos dá um parâmetro do desenvolvimento das dimensões
interpessoais”.
O objetivo desta pesquisa é identificar os pontos fortes e fracos dos membros do
grupo com relação às competências interpessoais, ao qual foram abordados três compo-
nentes: comunicação, participação e liderança.
Realizou-se um questionário, com perguntas fechadas, contendo 14 questões pon-
tuadas de 1 a 7, sendo 1 o mínimo e 7 o máximo, pontuando o uso das habilidades inter-
pessoais.
A pesquisa bibliográfica foi realizada através da leitura de livros, artigos, revistas
e publicações da Internet. O questionário foi encaminhado para 100% dos membros do
grupo via e-mail, sendo que 71% responderam. Esta foi encaminhada e entregue no pe-
ríodo de 03 a 07 de julho de 2006 com os participantes do curso de Formação Básica em
Dinâmica de Grupo de Erechim/RS.

2.2 Coleta e análise de dados

A coleta e análise de dados foram realizadas a partir das respostas aos questioná-
rios. Após essas etapas, as informações foram finalizadas, com a conseqüente elaboração
das conclusões.
Amostragem da pesquisa de campo:

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 9


Comunicação % RANK
1 - comunicação efetiva 66 10°
2- saber ouvir 92 3°
4 - reação a feedback 71 8°
6- expressão de feedback 66 11°
11- presuasão 63 12°
Liderança
10 - apoio catalisador 96 1°
13 - competição 88 5°
Participação
3 - espontaneidade 54 14°
5 - sensibilidade 84 6°
7- lidar com conflito 58 13°
8 - experimentação 75 7°
9 - relacionamento próximo 92 4°
12 - abertura 70 9°
14 - flexibilidade 96 2°

3 ANÁLISE DOS RESULTADOS DA PESQUISA

Conforme gráfico acima, observa-se que dentre os itens pesquisados, com relação
à habilidade comportamental de Liderança, os que apresentaram maior incidência foram:
Na liderança, o apoio catalisador apresentou um índice de 96% das respostas, on-
de os mesmos consideram que possuem habilidades para estimular e encorajar os outros a
desenvolver seus próprios recursos para resolver seus problemas.
Na comunicação, o item saber ouvir apresentou 91,5% das respostas, demons-
trando que apresentaram habilidade de compreender o que os outros dizem.
Na participação, o item que apresentou maior incidência foi flexibilidade, com
96% das respostas. Considerando-se com habilidade de modificar seu ponto de vista e
comportamento no grupo em função de feedback e dos objetivos a alcançar.
Observou-se que a pesquisa aponta como ponto fraco do grupo a espontaneidade,
com 46% das respostas, apresentando dificuldade em dizer e fazer as coisas de modo
natural, expressando livremente suas idéias, opiniões e sentimentos na ocasião em que
ocorrem.
Outra participação expressiva, com 42%, é a dificuldade de lidar com conflito,
que representa a habilidade de reconhecer, diagnosticar e lidar com a hostilidade dos ou-
tros.
Apesar de não representar a maioria, estes itens merecem atenção, pois é onde
aparece maior incidência dos pontos fracos das habilidades de grupo.
Um ponto que nos chama a atenção está relacionado à liderança. Enquanto que o
apoio catalisador aparece com 96%, onde o mesmo deve estimular e encorajar os outros a
desenvolverem seus próprios recursos, encontra-se na mesma proporção o seu desejo de
vencer, de ser o melhor, ressaltando o indivíduo e não o grupo.
Também, pode-se interpretar a pesquisa com base na Janela de Johari, no qua-
drante “Eu Cego”, onde o indivíduo tem comportamentos que são facilmente percebidos
pelos outros, mas dos quais geralmente não estão cientes. Pode-se citar como exemplo a
flexibilidade, onde 96% do grupo aponta que possui esta habilidade de modificar seu
comportamento em função de feedback dos outros. Ora, sabemos que num convívio de 18

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 10


meses pode-se começar a desenvolver esta habilidade, e não tê-la como sendo uma práti-
ca usual, pois partimos do pressuposto de que a mesma é um ponto de partida para o de-
senvolvimento de outras competências.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa contém dados de fonte fidedigna, extraída através de questionário


com os participantes do curso de formação.
Conforme os dados apresentados pela pesquisa, os pontos fortes que contribuíram
para atuação do desenvolvimento grupal, estão nas habilidades de flexibilidade, apoio
catalisador e o saber ouvir. Já os pontos fracos que dificultaram a interação grupal, estão
nas habilidades de espontaneidade, o lidar com conflito e a persuasão.
Tais fatores nos remetem a uma reflexão. Esses desejos podem ter sido idealiza-
dos quando na escolha de fazer o curso de formação pela SBDG, ou seja, que a mesma
pudesse realizar todos os nossos sonhos, como se num passo de mágica, dezenove meses
fossem suficientes para a concretização desses ideais.
Muitas vezes estas necessidades foram verbalizadas a cada encontro, elas repre-
sentavam à crença e esperança de que ao final do curso seriam atendidas em sua plenitu-
de, ou quem sabe, para outros, apenas o primeiro passo.
Acredita-se, no entanto, que o real do grupo ficou representado nas dificuldades
de se expressar livremente, de procurar se mostrar, brincar, e até mesmo com as próprias
situações que se apresentavam no grupo.
Os conflitos, muitas vezes foram evitados e ou abafados, aliados ao medo de que-
brar o encanto, pois o conflito desperta emoções e sentimentos mais primitivos, tais co-
mo o medo, amor, ódio, agressividade, cumplicidade, etc. No entanto, o conflito é o exer-
cício e a possibilidade do encontro com o verdadeiro, tão desejado e reprimido.
Acredita-se, também, que algumas das dificuldades reais, foram desencadeadas,
ainda, no processo de “seleção” para a entrada no curso. Portanto, os membros partici-
pantes foram “selecionados”, privilegiados, por terem a oportunidade de participar da
formação pela SBDG, que muitas vezes ficaram representados nas falas durante os en-
contros.
Criou-se, assim, uma mentalidade grupal, da qual se exigia um padrão de compor-
tamento que provavelmente não poderia ser revelado através da espontaneidade e do
exercício do conflito e da persuasão. Percebeu-se assim, o desejo idealizado do grupo de
atingir a perfeição, considerando altos índices ao uso das habilidades comportamentais,
causando a impressão que o mesmo não apresentava dificuldades nas relações interpes-
soais. O grupo era “muito competente”, “fodão”.
Acredita-se que essas necessidades refletem as exigências do meio, principalmen-
te no âmbito de trabalho, em que cada vez mais o mercado exige pessoas flexíveis, aber-
tas às novas idéias, mudanças e com disponibilidade de inovação. Que sejam lideres ca-
pazes de perceberem a si próprio e aos outros e, conseqüentemente, reconhecer as dife-
renças pessoais, as capacidades e aptidões para o desempenho profissional.
Enquanto que 70% colocam abertura para dar e receber feedback, percebe-se que,
na prática, o grupo tem outras atitudes, justificando suas ações e impossibilitando assim,
a espontaneidade do feedback. Um exemplo disso ocorreu no processo de feedback das

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 11


co-coordenações. Enquanto o grupo tentava elucidar comportamento, o indivíduo justifi-
cava “eu não fiz isso... não era essa a minha intenção... o que eu quero dizer é que...”.
Ao final de nossa formação, nos demos conta de que desenvolvemos algumas ha-
bilidades e que a informação por si só não produz o conhecimento e que o conhecimento
por si só, não ocasiona a mudança. A mudança é uma porta que se abre por dentro, e o
caminho a seguir é a busca pelo desenvolvimento das competências interpessoais.

REFERÊNCIAS

BION. Experiências com grupos: os fundamentos da psicoterapia de grupo. Rio de Janeiro, Imago, 1970.
CRUZ JÚNIOR. João Benjamin. Organização e administração de entidades públicas: aspectos políticos,
econômicos e sociais de um paradigma emergente. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, Fun-
dação Getulio Vargas, v. 22, n. 3, p. 3-21, jul.-set. 1998.
MAILHIOT, Gérald B. Dinâmica e gêneses dos grupos. 6. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1985.
MOSCOVICI, Fela. Equipes que dão certo. Rio de Janeiro: LCT, José Olympio, 1995.
. Desenvolvimento interpessoal. 12. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002.
PROGRAMA Liderar – Sebrae/SC.
ZIMERMAN, David E. et al. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
. Fundamentos básicos das grupoterapias. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
PESQUISAS. Disponível em: <www.sbdg.org.br/artigos>. Acesso entre 15 jun. e 15 jul. 2006.

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 12


ANEXOS

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 13


Anexo A

QUESTIONÁRIO

Leia os itens abaixo e marque com um x, na escala de 1 a 7, na posição que me-


lhor descreva sua atuação real mais freqüente. Nesta escala, 1 representa o mínimo e 7
significa o máximo.

1. Habilidade de comunicar idéias de forma clara e precisa em situações individuais e


de grupo.

1 2 3 4 5 6 7

2. Habilidade de ouvir e compreender o que os outros dizem

1 2 3 4 5 6 7

3. Dizer e fazer coisas de modo natural, expressar livremente idéias, opiniões e senti-
mentos na ocasião que ocorrem

1 2 3 4 5 6 7

4. Habilidade de aceitar críticas sem fortes reações emocionais defensivas (tornando-


se hostil ou “fechando-se”.

1 2 3 4 5 6 7

5. Habilidade de percepção e consciência de necessidades, sentimentos e reações do


grupo.

1 2 3 4 5 6 7

6. Habilidade de dar feedback aos outros de modo útil e construtivo.

1 2 3 4 5 6 7

7. Habilidade de reconhecer, diagnosticar e lidar com conflitos e hostilidade dos ou-


tros.

1 2 3 4 5 6 7

8. Experimentar fazer coisas diferentes, conhecer novas pessoas, testar novas idéias e
atividades com outras pessoas.

1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 14


9. Tendência a procurar relacionamento mais próximo com as pessoas, dar e receber
afeto no seu grupo.

1 2 3 4 5 6 7

10. Estimular e encorajar os outros a desenvolver seus próprios recursos para resolver
seus problemas.

1 2 3 4 5 6 7

11. Capacidade de organizar e de apresentar suas idéias de forma efetiva induzindo os


outros a aceitá-la.

1 2 3 4 5 6 7

12. Procurar conhecer as idéias dos outros, disposição para receber sugestões e influen-
cias dos outros.

1 2 3 4 5 6 7

13. Desejar vencer e ser o melhor no desempenho, superar obstáculos e conseguir reco-
nhecimento dos outros.

1 2 3 4 5 6 7

14. Habilidade de modificar seu ponto de vista e comportamento no grupo em função


de feedback dos outros e dos objetivos a alcançar.

1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 15


Anexo B

GRÁFICOS DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO

1. Habilidade de comunicar idéias de forma clara e precisa em situações individuais e de


grupo.
COMUNICAÇÃO EFETIVA

100%
90%
80%
70%
60%
50% 42%
40% 33%
30% 17%
20% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

2. Habilidade de ouvir e compreender o que os outros dizem.


SABER OUVIR

100%
90%
80%
70%
60%
50%
33%
40% 25% 25%
30% 17%
20%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 16


3. Dizer e fazer as coisas de modo natural, expressar livremente idéias, opiniões e sen-
timentos na ocasião que ocorrem.
ESPONTANEIDADE

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40% 25% 25%
30% 17% 17%
20% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

4. Habilidade de aceitar criticas sem fortes reações emocionais defensivas.


REAÇÃO A FEEDBACK

100%
90%
80%
70%
60%
50%
34%
40% 25% 25%
30%
20% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

5. Habilidade de percepção e consciência de necessidades, sentimentos e reações do


grupo.
SENSIBILIDADE

100%
90%
80%
70%
60%
50%
33%
40% 25%
30% 17% 17%
20% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 17


6. Habilidade de dar feedback aos outros de modo útil e construtivo.
EXPRESSÃO FEEDBACK

100%
90%
80%
70%
60%
50%
33%
40% 25%
30% 17% 17%
20% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

7. Habilidade de reconhecer diagnosticar e lidar com conflito e hostilidade dos outros.


LIDAR COM CONFLITO

100%
90%
80%
70%
60% 50%
50%
40% 25%
30% 17%
20% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

8. Experimentar fazer coisas diferentes, conhecer novas pessoas, testar novas idéia e
atividades com outras pessoas.
EXPERIMENTAÇÃO

100%
90%
80%
70%
60%
50%
34%
40%
25% 25%
30%
20% 8% 8%
10%

0%
1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 18


9. Tendência a procurar relacionamento mais próximo com outros pessoas, dar e rece-
ber afeto no seu grupo.
RELACIONAMENTO PRÓXIMO

100%
90%
80%
70%
60% 50%
50%
40%
30%
17% 17% 16%
20%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

10. Estimular e encorajar os outros a desenvolver seus próprios recursos para resolver
seus problemas.
APOIO CATALISADOR

100%
90%
80%
70%
60%
50% 42% 42%
40%
30%
20% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

11. Capacidade de organizar e apresentar suas idéias de forma efetiva induzindo os ou-
tros a aceita-la.
PERSUASÃO

100%
90%
80%
70%
60%
50%
33% 33%
40%
25%
30%
20% 9%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 19


12. Procurar conhecer as idéias dos outros, disposição para receber sugestões e influên-
cia dos outros.
ABERTURA A PARTICIPAÇÃO

100%
90%
80%
70%
60%
50% 42%

40% 33%

30%
20% 8% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

13. Desejar vencer e ser o melhor no desempenho, superar obstáculos e conseguir reco-
nhecimento dos outros.
COMPETIÇÃO

100%
90%
80%
70% 59%
60%
50%
40%
30%
17%
20% 8% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

14. Habilidade de modificar se ponto de vista e comportamento no grupo em função de


feedback dos outros e dos objetivos a serem alcançados.
FLEXIBILIDADE

100%
90%
80%
70%
60%
50% 42% 42%
40%
30%
20% 8% 8%
10%
0%
1 2 3 4 5 6 7

SBDG – Caderno 81 ™ Competências interpessoais em um grupo de formação 20


Cadernos da

Sociedade Brasileira de
Dinâmica dos Grupos

82
Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 110º
Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos,
realizado na cidade de Porto Alegre, RS,
de 23 de setembro de 2004 a 4 de agosto de 2006.

Coordenação:
Lídia Tassini Mancia, Didata
Alessandra Martini Moesch, Especialista

Porto Alegre
2006

SBDG – Caderno 82 1
Travessa La Salle, 75
Bairro Menino Deus
CEP 90130-120 Porto Alegre/RS
Telefone: (51) 3028.9114 e 3061.9115
E-mail: sbdg@sbdg.org.br
Site: www.sbdg.org.br

CONSELHO DIRETOR
Presidente Samara Mª M. Ferreira Costa e Silva

Vice-Presidente Eliane de Melo Meira Rank

Diretor Administrativo-Financeiro Geime Rozanski

Vice-Diretor Administrativo-Financeiro Roberto Scola

Diretora de Educação Carmem Maria Sant’Anna

Vice-Diretor de Educação Marcel Paranhos Dias

Os textos são de responsabilidade dos respectivos autores,


não representando necessariamente
o ponto de vista da SBDG.

Editoração e gravação:
Suliani – Editografia Ltda.
Fone/fax (51) 3384.8579 e-mail: editor@suliani.com.br

SBDG – Caderno 82 2
NÚCLEOS

Núcleo RS
GESTOR GERAL: Mara Maru dos Santos
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suzana Zimmer
GESTOR DE EVENTOS: Doralício Siqueira Filho
VICE-GESTOR DE EVENTOS: André Beneduzi

Núcleo SC
GESTOR GERAL: Emiliana Simas Cardoso da Silva
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Carmem Sinzato
GESTOR DE EVENTOS: João Carlos Machado
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Maria Alexandra Cardoso da Silva

Núcleo PR
GESTOR GERAL: Helena Mª França Sundin
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suely do Rocio Pucci
GESTOR DE EVENTOS: Laucemir Pessine
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Ana Silvia A. Borgo

Núcleo PA
GESTOR GERAL Mauro Nogueira de Oliveira
GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza
GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira
VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira

Núcleo MS
GESTOR GERAL: Maria Selma Perez
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende
GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini

SBDG – Caderno 82 3
Apresentação

Formar profissionais para trabalharem com grupos é um desafio delicado,


audacioso, edificante e extremamente compensador!
Os trabalhos aqui apresentados demonstram parte dessa exclamação,
pois representam o investimento emocional e intelectual de um grupo
que sonhou em terminar esta jornada juntos.
É com muito orgulho que apresentamos parte dos frutos
do grupo Soltando as Amarras.
Este grupo, tão especial, que um dia desejou estar conosco nesta trajetória
e cujo processo seletivo causou um “óoóó”, aguçando o seu nível de exigência
(já tão alto)... Este grupo que fez a descoberta que ser feliz é lidar
com o essencial. Que subiu e caiu do palco; que chorou junto, competiu,
afastou-se, aproximou-se e que construiu e desconstruiu muros, valores,
papéis, símbolos e vínculos. Um grupo que aprendeu a fazer escolhas,
a entender o valor de uma tristeza, a cultivar o vínculo e lidar
com as perdas e sobretudo a rir de seus “micos” e “mazelas”
Neste grupo, alguns se foram, casamentos se fizeram e se desfizeram,
parcerias se concretizaram, filhos nasceram e novos trabalhos apareceram...
Um grupo que foi soltando as suas amarras, à medida de suas descobertas
e que, mais do que isso, nos ajudou muito, como coordenadoras,
a também soltarmos nossas amarras. Foi muito bom podermos chorar
e rir juntos durante esta jornada!!!!

Lídia Mancia e Alessandra Moesch

SBDG – Caderno 82 4
Sumário

Educação de laboratório: uma alternativa metodológica para


o desenvolvimento da competência interpessoal em processos
de desenvolvimento de lideranças
Cristine Marques de Souza
Daniela Fernanda Mariotti
Fernanda Ferrão Guimarães
Maria da Graça Jacques Costi
Tatiana das Neves Oliva

Percepção do fenômeno de resistência à mudança no subgrupo


“Soltando as Amarras”
Fabíola Roberta Fitarelli Petry
José Ceccon de Barros
Marilane Gomes dos Santos
Reni Lúcia Finger
Rosemari Souza Stieven
Simone Brufatto

Humor nos grupos


Flávia Maria Lacerda Felippe
Maria Regina Burtet Vidal
Suzana Regina Kunz

A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal:


uma abordagem psicodramática através da Teoria dos Papéis
André Brufatto Schoenardie
Jorge Luiz Moraes Doval
Eduardo Warttmann
Walter Kayser
Maria Carolina Tarragô Chiste
Fernanda Bitencourt dos Santos

SBDG – Caderno 82 5
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Porto Alegre – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Alessandra Martini Moesch

Educação de laboratório: uma alternativa


metodológica para o desenvolvimento
da competência interpessoal em processos
de desenvolvimento de lideranças

CRISTINE MARQUES DE SOUZA


DANIELA FERNANDA MARIOTTI
FERNANDA FERRÃO GUIMARÃES
MARIA DA GRAÇA JACQUES COSTI
TATIANA DAS NEVES OLIVA

Na gestão, o universo fantasmático do dirigente, seu universo interior, seu imaginário


estão na origem de sua visão, de sua imaginação e de sua criatividade. O “gênio próprio”
do gerente (no sentido da palavra inglesa genuine significando original, autêntico) tem
sua fonte na interioridade. Além dos conhecimentos exteriores, dos fatos, das teorias e
dos métodos, o gerente encontra em si sua maneira de ser, de pensar, de agir e intervir.
É na interioridade que se encontra não somente a fonte da autenticidade,
mas também de sua verdadeira força.
(Laurent Lapierre)

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 1


AGRADECIMENTOS

A trajetória de realização desta formação foi marcada por experiências que jamais
teriam sido vividas se não fosse através de um espaço “especial” de aprendizado. Somen-
te neste espaço pudemos experimentar relacionamentos nunca dantes vividos (pelo menos
não em sala de aula), fundamentados na franqueza e autenticidade, que propiciaram a
desconstrução de “verdades” que antes regiam nossos comportamentos/pensamentos. As
marcas desta trajetória ficaram registradas no coração, não somente na memória – pois a
memória é falha, enquanto que os registros no coração são eternos, fazem parte da alma.
Gostaríamos, em vista disso, de agradecer à Sociedade Brasileira de Dinâmica de
Grupo – Núcleo RS (SBDG-RS), por nos ter propiciado viver um processo desta nature-
za. A oportunidade que nos ofereceu, de integrar este grupo de formação junto a esta ins-
tituição, não somente nos auxiliou no desenvolvimento técnico profissional, mas também
nos deixou lições para a vida. Quantas mudanças pudemos acompanhar, durante os 19
meses de formação, entre os integrantes de grupo.
A própria construção deste trabalho somente foi possível por uma destas mudan-
ças alcançadas: o case apresentado neste trabalho é resultado da capacidade de uma das
integrantes deste grupo a se lançar e desbravar caminhos desconhecidos como consultora.
Sentimo-nos todos co-participantes desta conquista!
É momento, então, de colocar nossos agradecimentos muito especiais a todos que
contribuíram com o enriquecimento da nossa jornada. Isaac Newton uma vez disse: “Se
pude enxergar mais longe que outros, foi porque subi nos ombros de gigantes”. Atribuí-
mos aos seguintes gigantes o auxílio em nos ajudar ver além:
Às nossas coordenadoras, Alessandra Martini Moesch e Lidia Tassini Mancia,
que através de seus mais preciosos dons, nos ajudaram a crescer, nos ajudando a enfrentar
os nossos medos, preconceitos, angústias e dores.
Ao nosso querido grupo “Soltando as Amarras”, que nos garantiu a confiança e o
amor necessários para que fossemos capazes de deixar, imbuído num espírito de ajuda
mútua, cair as máscaras e a ver nascer indivíduos cheios de graça, espírito e vontade.
E, por fim, não poderíamos deixar de agradecer aos nossos queridos “agregados”,
que tão carinhosamente compartilharam conosco desta maravilhosa jornada, participando
(mesmo que distantes) de todos os momentos vividos nesta formação. Agradecemos aos
ombros amigos e as palavras carinhosas nas crises de choro, as injeções de ânimo nos
momentos de fraqueza, e aos dedicados e incessantes amparos e continências nos mo-
mentos de crise.
A estas pessoas tão amadas por nós, os mais sinceros agradecimentos.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 2


Para o Grupo “ALPHA”,
Por sua coragem para empreender este difícil exercício de descoberta
de sua capacidade de autenticidade. O “encontro” com a trajetória de vocês
nos auxiliou na consolidação de nosso aprendizado técnico profissional, mas também
nos fez tomar contato com nossas jornadas pessoais ao reconhecermos
em seus movimentos muitas semelhanças com os movimentos que empreendemos
em nossas próprias trajetórias em busca de nossa autenticidade... Isso nos ajudou
a não esquecer que, definitivamente, é na relação “EU-OUTRO” que encontramos
a verdadeira possibilidade de nos conhecer e reconhecer.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 3


Resumo – O campo temático no qual se desenvolve este estudo é o do desenvolvimento
de lideranças, em especial, do desenvolvimento da competência interpessoal da liderança,
educação de laboratório e processo grupal. O objetivo do trabalho é analisar como a edu-
cação de laboratório pode representar, enquanto uma abordagem metodológica, uma al-
ternativa ao desenvolvimento da competência interpessoal, buscando identificar o dife-
rencial que esta pode agregar em processos de desenvolvimento de lideranças. As ques-
tões que orientam o estudo são: como a educação de laboratório e seu conjunto metodo-
lógico podem vir a constituir uma abordagem favorecedora do desenvolvimento da com-
petência interpessoal da liderança? Que benefícios esta abordagem pode trazer ao exercí-
cio do papel da liderança em contextos organizacionais? Quais são os desafios na adoção
desta abordagem neste contexto? A pesquisa foi orientada por uma abordagem qualitativa
e constitui-se de um estudo de caso único como método de investigação, tomando como
unidade de análise a filial brasileira de uma empresa multinacional do setor automotivo
localizada na região sul do país, inserida em um cenário empresarial competitivo e desa-
fiador. Neste contexto, a pesquisa analisa a educação de laboratório, buscando verificar a
hipótese teórica de que esta pode constituir-se uma abordagem alternativa facilitadora em
processos de desenvolvimento da competência interpessoal da liderança, capaz de influen-
ciar no padrão de interação que esta estabelece no desempenho desta função. Os resulta-
dos indicam uma associação significativa entre a adoção desta abordagem e a criação de
um espaço propício ao exercício de um padrão de interação mais autêntico entre os líde-
res, agregando-lhes um nível mais profundo de auto e hetero-conhecimento e atribuindo-
lhes uma maior disponibilidade e condição para o exercício de um padrão de inter-relação
mais saudável e eficaz entre si e com suas equipes na organização.
Palavras-chave – Desenvolvimento de lideranças. Competência interpessoal. Educação
de laboratório. Processo grupal.

Abstract – The thematic field where this study takes place is on the leadership
development process, specially, on the leadership interpersonal competency, laboratory
education and group process. The main objective of this study is to analyze how the
laboratory education can represent, as a methodological approach, an alternative for the
development of the interpersonal competency; trying to identify the differential it can
brings to the leadership development process. This study is oriented by the following
questions: how can the laboratory education and its methodological approach serve as
developmental tool for the leadership interpersonal competency? Which benefits can its
methodology brings to the leadership role in the organizational environment? What are
the challenges of its approach in this specific environment? This research was oriented by
a qualitative method, based on the investigation of a particular case from an automotive
multinational company that has a branch located in the south region of Brazil, which is
inserted in a competitive and challenging business environment. In this context, this
research tries to verify the theoretical hypothesis that the laboratory education can be an
alternative for the development of the interpersonal competency among leaders, capable
of influencing the interpersonal pattern that takes place in the leadership performance.
The results indicates a significant association between the use of the laboratory
methodology to the creation of a setting that propitiates the practice of a more authentic
interrelationship among leaders, bringing them a deeper level of self and hetero
knowledge and providing them a bigger disposition and condition for the practice of a
healthier and a more efficient interrelationship patterns among leaders and their teams
within the organization.
Key words – Leadership development. Interpersonal competency. Laboratory education.
Group process.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 4


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................7

1 REVISÃO DA LITERATURA.............................................................................9
1.1 Desenvolvimento de lideranças .............................................................................10
1.1.1 Histórico e conceito de liderança ...........................................................................10
1.1.2 Desenvolvimento de lideranças .............................................................................12
1.1.3 Desenvolvimento da competêcia interpessoal como base para a prática
de liderança ........................................................................................................................13
1.2 Abordagem educacional para desenvolvimento da competência interpessoal ......16
1.2.1 Andragogia: uma abordagem metodológica alternativa ........................................16
1.2.2 Educação de laboratório.........................................................................................17
1.3 Processo grupal ......................................................................................................23
1.3.1 Tarefa racional e tarefa afetiva ...............................................................................24
1.3.2 Movimentos de grupo ............................................................................................24
1.3.3 Fases do processo grupal........................................................................................25
1.3.4 O processo de autenticidade na comunicação do grupo ........................................28
1.4 Mapa conceitual: a educação de laboratório como espaço de vivência grupal e
base para o desenvolvimento da competência interpessoal – aspecto central em processos
de desenvolvimento de lideranças......................................................................................31

2 MÉTODO .............................................................................................................32
2.1 Método de pesquisa................................................................................................32
2.2 Método de trabalho ................................................................................................34
2.2.1 A unidade de análise ..............................................................................................34
2.2.2 Coleta de dados ......................................................................................................36
2.3 Análise dos ddos ....................................................................................................37
2.4 Delineamento do pocesso de psquisa.....................................................................38

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ................................................38


3.1 O contexto: a empresa “Alpha” e o Grupo “Alpha”..............................................39
3.2 Resultados da análise do caso do Grupo “Alpha” .................................................40
3.2.1 Desenvolvimento de lderanças...............................................................................40
3.2.2 Andragogia e Educação de Laboratório no desenvolvimento da competência
interpessoal da liderança ....................................................................................................40
3.2.3 Processo gupal........................................................................................................41
3.2.3.1 Fases do gupo.........................................................................................................41
3.2.3.1.1 Fase de Inclusão ..................................................................................................41
3.2.3.1.2 Fase de Controle .................................................................................................42
3.2.3.1.3 Fase de Afeição ...................................................................................................44
3.2.3.1.4 Fase de Separação ...............................................................................................45

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................46

REFERÊNCIAS ...............................................................................................................48

AVALIAÇÃO DE RESULTADOS ................................................................................50

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 5


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Objetivos da Educação de Laboratório .............................................................18


Figura 2 – Processo Vivencial de Aprendizagem. .............................................................21
Figura 3 – Fases do processo Grupal .................................................................................28
Figura 4 – Mapa Conceitual do Estudo: A educação de laboratório como espaço de
vivência grupal e base para o desenvolvimento da competência interpessoal – aspecto
central em processos de desenvolvimento de lideranças ...................................................32
Figura 5 – Configuração geral das etapas da pesquisa ......................................................38

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Conceitos de Liderança ...................................................................................11


Quadro 2 – Pedagogia e Andragogia: Pressupostos e Práticas ..........................................17
Quadro 3 – Especificação dos dados disponíveis sobre o caso para análise .....................37

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 6


INTRODUÇÃO

É consenso que as transformações ocorridas no cenário dos negócios trouxeram


mudanças significativas em várias dimensões de atuação das organizações. Tais mudan-
ças trouxeram um novo patamar de complexidade e suscitaram uma nova concepção de
gestão. Em um ambiente mais competitivo e caracterizado por contradições, ambigüida-
des e desafios às organizações tiveram de incorporar mudanças importantes em sua lógica
de gestão dos negócios, repensando e colocando à prova conceitos e paradigmas tidos até
então como verdades.
Neste contexto, em função da necessidade de uma gestão mais eficaz, o papel da
liderança emerge como um aspecto central, constituindo fator crítico de sucesso para os
modelos de gestão concebidos pelas organizações para fazer frente aos desafios coloca-
dos pelo ambiente.
Em conseqüência, observa-se nos meios acadêmico e empresarial um movimento
de maior atenção e investimento nos aspectos relacionados ao entendimento da natureza e
desenvolvimento da liderança. Este investimento, que inicialmente estava mais direcio-
nado a qualificação da gestão para uma atuação mais coerente aos novos desafios, am-
plia-se para a formação e desenvolvimento de lideranças. Conceitos relativos à natureza
da liderança são revisitados, e a partir da emergência da discussão sobre se liderança é
passível de ser desenvolvida, o desafio assumido pelas organizações passa a ser o de de-
senvolver o potencial de liderança que as pessoas trazem dentro de si.
Estudos desenvolvidos no campo da liderança revelam que as mais notáveis ques-
tões e tendências relativas ao desenvolvimento de líderes, nos últimos 20 anos, dizem
respeito à proliferação de novos métodos, e mais recentemente ao reconhecimento da
importância de se tratarem questões emocionais do líder na sua relação com os demais.
Ou seja, aumenta o reconhecimento da necessidade de líderes emocionalmente maduros,
com visão ampliada de seu papel no contexto social e organizacional, capazes de agir
com responsabilidade no exercício de sua influência sobre pessoas e organizações.
Neste sentido, faz-se importante reconhecer que a abordagem necessária ao de-
senvolvimento da competência interpessoal, que irá agregar ao líder esta maturidade
emocional, suscita a criação de um espaço capaz de fazer emergir este conteúdo latente à
vida na organização.
Contudo, nos programas usuais de desenvolvimento de liderança, observa-se a
tendência em desvalorizar a subjetividade em proveito da objetividade. Preconiza-se,
geralmente, a utilização de análises objetivas e quantitativas das realidades do mercado e
da realidade organizacional. Pouco importam as capacidades intelectuais, físicas e emoti-
vas das quais um indivíduo é dotado naturalmente e aquelas que pode adquirir ao longo
de sua vida, é sempre um “ser subjetivo” que pensa, opera e que escolhe utilizar ou colo-
car suas posições e desenvolver suas habilidades. Gerir implica necessariamente em esco-
lhas subjetivas, o uso adequado do poder, habilidades conceituais – visão, imaginação,
atitudes afetivas (tais como empatia), distância e habilidades interpessoais além de técni-
cas, procedimentos e métodos (Lapierre, 1994).
Daí a importância, de quando o foco é desenvolvimento de lideranças, se ter cla-
reza de que aspectos como a competência interpessoal necessitam um método específico
para ser desenvolvido.
Neste estudo, examina-se a questão da Educação de Laboratório como uma abor-
dagem alternativa para o Desenvolvimento de Lideranças, em especial, para o desenvol-
vimento da competência interpessoal do líder. O interesse desta investigação apóia-se em

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 7


referências da literatura que afirmam que, a partir da metodologia andragógica e expe-
riências de laboratório que preconizam o aprendizado a partir da vivência de experiências
que geram auto e hetero-conhecimento, cria-se um espaço adequado ao desenvolvimento
da competência interpessoal.
O propósito do trabalho é analisar a metodologia andragógica, em especial a
abordagem denominada Educação de Laboratório, como um método capaz de proporcio-
nar a criação deste espaço de vivência grupal e, portanto, um espaço de aprendizagem
propício ao desenvolvimento da competência interpessoal – aspecto central em processos
de desenvolvimento de lideranças.
Assim, pode-se afirmar que o problema formulado neste estudo refere-se à análise
da Educação de Laboratório como uma abordagem metodológica alternativa para o de-
senvolvimento de lideranças, capaz de contribuir para o desenvolvimento da competência
interpessoal – competência-chave ao desempenho eficaz do papel do líder. Entendemos
liderança como o resultado de relacionamentos que focam nas interações estabelecidas
pelo líder, indo além do arsenal puramente técnico e metodológico que compõe o ferra-
mental necessário ao desempenho eficaz de seu papel. As questões que orientam o estudo
são: como a educação de laboratório e seu conjunto metodológico podem vir a constituir
uma abordagem/espaço favorecedores do desenvolvimento da competência interpessoal
da liderança? Que benefícios esta abordagem pode trazer ao exercício do papel da lide-
rança em contextos organizacionais? Quais são os desafios na adoção desta abordagem
neste contexto?
O objetivo geral do estudo é, em síntese, o de analisar como a educação de labo-
ratório pode representar, enquanto uma abordagem metodológica, uma alternativa ao de-
senvolvimento da competência interpessoal, buscando identificar o diferencial que esta
pode agregar em processos/ programas de desenvolvimento de lideranças.

Os objetivos específicos são:

§ Identificar, a partir da revisão da literatura específica, referências acerca dos te-


mas Desenvolvimento de Lideranças e Educação de Laboratório – este último sob
a perspectiva de conjunto metodológico capaz de apoiar ao primeiro – e ainda so-
bre Processo Grupal – com ênfase na dinâmica e movimentos de grupo;
§ Explorar algumas experiências utilizadas no contexto organizacional para o de-
senvolvimento de líderes, buscando identificar a adoção da educação de laborató-
rio como alternativa quando o objetivo é o desenvolvimento da competência in-
terpessoal da liderança;
§ Compreender como a metodologia andragógica, em especial da Educação de La-
boratório, pode servir como uma abordagem facilitadora do processo de desen-
volvimento, quando o indivíduo tem a oportunidade de desenvolver sua compe-
tência interpessoal através de um processo de conhecimento intra, interpessoal e
intergrupal;
§ Investigar como esta abordagem é percebida e sua contribuição no contexto orga-
nizacional atual.

As questões propostas neste trabalho são analisadas através do estudo do caso de


uma empresa que adota a educação de laboratório dentre os métodos para o desenvolvi-
mento da competência interpessoal de seus líderes. Tanto a organização escolhida para
análise de seu processo de desenvolvimento de lideranças quanto o setor em que a mesma

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 8


atua caracterizam-se por um contexto de alta competitividade, evidenciando a necessida-
de do exercício eficaz da liderança como fator crítico de sucesso. Na condução do estudo
foram utilizadas técnicas qualitativas, como a análise global do relato do caso, e a análise
de conteúdo (em sua vertente de abreviação da análise do conteúdo) que serviram para a
exploração e interpretação dos dados coletados.
No intuito de orientar o leitor quanto à estrutura deste trabalho, segue a seqüência
em que está colocado: após esta primeira parte, que apresenta o tema proposto, a situação
problemática (questões a serem investigadas), objetivos e justificativa do trabalho, tem-se
os seguintes capítulos:

§ Capítulo 1 – referencial teórico que apresenta a fundamentação do estudo, centra-


lizando o Desenvolvimento de Lideranças como um conceito chave para o enten-
dimento do problema colocado. Apresenta-se, na seqüência, os demais conceitos
que apóiam o seu entendimento e contextualização, com destaque para os temas
Educação de Laboratório e Processo Grupal;
§ Capítulo 2 – apresentação do método, com a descrição da estratégia geral e deta-
lhamento das etapas do processo de pesquisa, incluindo os procedimentos utiliza-
dos. Este capítulo também irá descrever o contexto da pesquisa, ou seja, da orga-
nização e do grupo com o qual o estudo foi realizado, procurando caracterizá-los
de forma a já introduzir sua relação com os elementos centrais envolvidos no pro-
blema proposto para este estudo.
§ Capítulo 3 – apresentação da análise do caso.

Na seqüência são apresentadas as conclusões do estudo e sugestões para trabalhos


futuros. E, finalmente, constam as referências bibliográficas e os anexos.

1 REVISÃO DA LITERATURA

Este capítulo visa apresentar e descrever os conceitos-chave que embasam este es-
tudo. Inicia-se com a apresentação do tema de Desenvolvimento de Lideranças, abordan-
do-se o conceito de liderança, o processo de desenvolvimento de lideranças e, em espe-
cial, o desenvolvimento da competência interpessoal.
A seguir, é a abordagem educacional para o desenvolvimento da competência in-
terpessoal da liderança que ganha espaço devido a sua importância para a compreensão
do problema de ajustamento à mudança. Esta é colocada através da apresentação da an-
dragogia como uma abordagem metodológica alternativa – com ênfase na educação de
laboratório e sua contribuição em processos de desenvolvimento de lideranças, como
estratégia para o desenvolvimento da competência interpessoal.
Na seqüência, apresenta-se a idéia de Processo Grupal, com ênfase nos aspectos
relacionados à dinâmica e movimentos de grupo, buscando apoiar a compreensão de co-
mo a criação de um espaço grupal pode contribuir ao desenvolvimento da competência
interpessoal em processos de desenvolvimento de lideranças.
Por fim, segue o mapa conceitual que integra os conceitos-chave do estudo, a fim
de esclarecer a direção da análise que será apresentada.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 9


1.1 Desenvolvimento de lideranças

1.1.1 Histórico e conceito de liderança

A liderança é considerada como a força motriz das organizações, sendo tida como
a principal alavanca para o sucesso dos negócios. Por esta razão não é a toa que uma vas-
ta gama de autores tem abordado o papel do líder.
Porém, o tema “liderança” não tem origem explícita. Embora desde os tempos bí-
blicos haja menções sobre este assunto (Êxodo, 18, 21-22), somente no ano de 825 d.C
são encontrados registros com a palavra “liderar” (definida como comando, direção, con-
dução). Já a palavra “líder” é citada durante o século XIV (definida como “aquele que
conduz”), enquanto que a palavra “liderança” é encontrada somente no século XIX. Des-
de então, inúmeros autores, trazem sua conceitualização/definição acerca do papel do
líder (ver Quadro 1).
De acordo com Tolfo (2004) os primeiros trabalhos que abordaram a liderança
apresentavam uma forte tendência a percebê-la como uma “capacidade de exercer in-
fluência sobre os liderados”. Estudos sobre o poder, no início do século XX, também
foram fonte de análise sobre o tema. Considerava-se o poder como a capacidade de in-
fluenciar pessoas a cumprirem ordens. A partir de então, surgem estudos sobre os tipos de
autoridade, identificando-se características do líder. Ou seja, observa-se que os pressu-
postos iniciais sobre a liderança eram baseados nos modelos de grandes líderes, capazes
de levar os seguidores à obediência.
A autora refere que as primeiras escolas que consideraram a Administração como
um campo de conhecimento, também manifestaram interesse pelo assunto, porém a ênfa-
se estava na produção e na técnica que levasse a eficiência (por exemplo: o Fordismo).
É na interface com a Psicologia que, através das teorias sobre personalidade, dá-se
suporte para o entendimento que a liderança é prerrogativa de pessoas que detêm certos
traços. Até meados da década de 1940, foi bem aceita a idéia de que o líder era possuidor
de características que o tornavam mais apto a conduzir pessoas na execução de tarefas.
Com a Escola de Relações Humanas, se introduz a abordagem das “relações in-
terpessoais” que se processam no trabalho. Ao líder é, então, atribuído o papel de guiar os
liderados a atuarem cooperativamente no alcance de objetivos traçados. As necessidades
dos indivíduos passam a ser consideradas, bem como as possibilidades de autodesenvol-
vimento e crescimento.
A Escola de Relações Humanas dá grande impulso para as abordagens do
comportamento organizacional. Com as teorias comportamentais, as características inatas
de personalidade deixam de ser predominantes, dando espaço aos estilos
comportamentais, que passam a ser tônica das pesquisas da época (por exemplo: líderes
autocráticos, democráticos ou laissez-faire).
A partir da década de 1960, estudos marcam uma abordagem contingencial. De
acordo com Bitencourt (2004) “[...] a ênfase recai sobre a impossibilidade de formular
proposições acerca da liderança com base em um perfil ou em um rol de habilidades [...]
uma vez que a liderança exige capacidade de adaptação a diferentes situações” (p. 274).
Após a década de 1980, a literatura apresenta um farto material sobre a “mudança
como uma constante”, e cabe ao líder ser agente de mudanças, ter flexibilidade de liderar
durante períodos de instabilidade, ser visionário, motivador, desenvolvedor de relações
interpessoais de reciprocidade e agente de aprendizagem.
A autora concluiu que a globalização de mercados, a competitividade, as trans-
formações no contexto de trabalho atual têm conferido ao líder o papel de coach. Ou seja,

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 10


ao invés de ser um condutor de pessoas, o líder passa a ter o papel de treinador, prepara-
dor, técnico, que se preocupa não somente com os resultados, mas também com a realiza-
ção pessoal de seu grupo.

Quadro 1 – Conceitos de liderança

Conceitos de Liderança
Autor Conceito Ênfase

Hemphill e Coos “Liderança é o comportamento de um indivíduo Objetivos, comportamento


(1954, p. 7) quando está dirigindo as atividades de um
grupo em direção a um objetivo comum”.

Hersey e Blanchard “Definimos a liderança como um processo de Influência, objetivos


(1977, p. 87) influência nas atividades de um indivíduo ou de
um grupo, nos esforços para a realização de um
objetivo em determinada situação”.

Hall “A liderança é uma forma especial de poder, Poder de referência, caracte-


(1984, p. 113) estreitamente relacionada com a forma `referen- rísticas do líder e consenti-
te´[...] já que envolve, nas palavras de Etzione mento
(1965), `a capacidade, baseada nas qualidades
pessoais do líder, de despertar a anuência vo-
luntária dos seguidores numa ampla faixa de
assuntos`”.
Yukl
(1989, p. 253). “[...] influência nos objetivos e estratégias, Influência, comportamento,
influência no comprometimento e consentimen- objetivos
to com relação aos comportamentos necessários
para alcançar estes objetivos, influência na
manutenção e identificação do grupo, e influên-
cia na cultura de uma organização”.

Davis e Newstron “Liderança é o processo de encorajar e ajudar Encorajamento, objetivos


(1992, p. 150) os outros a trabalhar entusiasticamente na dire-
ção dos objetivos”.

Chiavenato “A liderança é um fenômeno tipicamente social Fenômeno social, influência,


(1995, p. 138) que ocorre exclusivamente em grupos sociais. objetivos
Podemos defini-la como uma influência inter-
pessoal exercida em uma dada situação e dirigi-
da através do processo de comunicação humana
para a consecução de um ou mais objetivos
específicos”.

Bowditch e Buono “A liderança pode ser considerada um processo Influência, objeivos


(1992, p. 18) de influência, geralmente de uma pessoa, atra-
vés do qual um indivíduo ou grupo é orientado
para o estabelecimento e atingimento de metas”.

Hesselbein “Liderança é a capacidade de administrar tendo Missão, mobilização de pes-


(1999, p.10) em vista a missão da organização e mobilizar soas
pessoas em torno dessa missão”.

Tichy “Liderança é a capacidade de ver as coisas Mobilização de pessoas


(1999, p. 265). como elas realmente são e mobilizar uma rea-
ção apropriada”.

Fonte: adaptado por Tolfo (2004, p. 276-277) de Kooter (2000) e Bennis (1995).

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 11


Ao revisarmos estes conceitos, constata-se a ênfase na liderança como uma rela-
ção em que o sujeito exerce influência sobre outros. No quadro acima, pode-se observar
que a maioria dos autores conceitua a liderança como um processo de influência. De
acordo com Tolfo (2004):
Ao conceito de influência subjaz o pressuporão de que os indivíduos são dife-
rentes entre si e nas formas como os seus comportamentos e atitudes impac-
tam sobre os outros – indivíduos ou grupos. A influência pressupõe uma forma
de relacionamento, de tal modo que o comportamento do líder gera efeito nos
liderados (Tolfo, in Bitencourt, 2004, p. 275).
Ao se falar em relacionamento e em influência, podemos verificar no que foi ante-
riormente discutido, que apenas descrever “traços de personalidade”, “conjuntos de com-
portamento”, “estilos” de liderança já não dão mais conta da amplitude e importância que
o tema abarca. As organizações têm sido inundadas por mudanças, e as dificuldades que
atravessam obrigam aqueles que trabalham no desenvolvimento de líderes a olhar mais
do que para “características”.
A capacidade de influenciar é tida como elemento fundamental na prática da lide-
rança, e sendo que a “influência pressupõe uma forma de relacionamento”, vê-se a impor-
tância dos líderes desenvolverem a competência interpessoal.

1.1.2 Desenvolvimento de lideranças

Pelos aspectos apresentados até aqui, é possível verificar que há uma significativa
discussão conceitual e prática sobre o tema da liderança. A partir da identificação de
inúmeros atributos, características, traços dentre outros aspectos elencados como necessá-
rios ao desenvolvimento eficaz da liderança, já há algum tempo, parte desta discussão
está direcionando-se para a seguinte questão: as pessoas nascem líderes ou liderança se
desenvolve? A resposta a essa questão dada por boa parte de pesquisadores dedicados a
este tema é de que liderança pode ser desenvolvida.
A partir daí o desafio que se coloca é desenvolver então o potencial da liderança.
Esse desenvolvimento é um processo contínuo, longo e complexo que requer investimen-
to e persistência.
O Center of Creative Leadership – CCL – define desenvolvimento de líderes co-
mo uma expansão da capacidade de uma pessoa fixar direções, criar alinhamento, e man-
ter comprometimento de grupos de pessoas que compartilham trabalhos comuns. Mais do
que simplesmente treinar novos conhecimentos, capacidades e habilidades, desenvolver
líderes significa integrar novas molduras de ver o mundo e o seu papel (O’Connor e Qui,
2004, apud Fernandes et al., 2005).
Segundo McCall, Lombardo e Morrison (apud Fernandes, 2005), atualmente
grande parte do desenvolvimento dos líderes acontece no ambiente de trabalho, a partir
de inúmeras iniciativas combinadas pelas organizações.
O Instituto Dinamarquês de Liderança e o Instituto Execsight de Desenvolvimen-
to Executivo desenvolveram um estudo sobre o Desenvolvimento de Liderança nas Or-
ganizações Européias, em 2004. Foram realizadas entrevistas com chefes de treinamento
administrativo/executivo, chefes de escritórios de aprendizado e vice-presidentes de de-
partamentos de mais de 50 corporações com base na Europa, incluindo inúmeras compa-
nhias multinacionais e transnacionais. Os resultados deste estudo revelam que o desen-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 12


volvimento de liderança vem ganhando cada dia mais importância. Além de apontar a
tendência em direção a integração das atividades de desenvolvimento de liderança com as
atividades do negócio bem como o envolvimento e compromisso da alta administração, o
estudo deixa evidente também a da variedade de práticas de desenvolvimento adotadas,
com destaque para aquelas ações que privilegiem não só o desenvolvimento individual,
mas também o desenvolvimento coletivo da liderança.
Neste sentido, mais uma vez fica evidente o aspecto privilegiado neste estudo e
que parece central quando o tema é desenvolvimento de lideranças: o desenvolvimento da
competência interpessoal.

1.1.3 Desenvolvimento da competência interpessoal como base


para a prática de liderança

Como alcançar um nível de inter-relação saudável entre as pessoas, quando o


mundo caminha para encontros empobrecidos? Observamos nas organizações (e também
fora dela) uma forte tendência a considerar a afetividade e a sensibilidade como um sinal
de fraqueza, algo que põe em risco a autoridade do líder. Então, como desenvolver indi-
víduos que tenham plenas condições de liderar pessoas, de influenciar grupos, de se co-
municarem e orientarem habilmente, se hoje percebemos relações pobres em vínculos,
marcadas de carências afetivas?
Buber (1974) falava do verdadeiro encontro EU-TU, onde o homem só se torna
EU através da relação com o TU (outro):
A palavra-princípio EU-TU só pode ser proferida pelo ser na sua totalidade. A
união e a fusão em um ser total não pode ser realizada por mim e nem pode
ser efetivada sem mim. O EU se realiza na relação com o TU; é tornando EU
que digo TU. Toda a vida é um “encontro” (p. 25).
Então, como propiciar aos líderes este verdadeiro encontro?
As relações humanas se desenvolvem em decorrência do processo de interação.
Partindo-se deste princípio, entendemos que a forma de garantir o verdadeiro encontro
entre as pessoas seria através do desenvolvimento da competência interpessoal.
De acordo com Moscovici (1985), a competência interpessoal “é a habilidade de
lidar eficazmente com relações interpessoais, de lidar com outras pessoas de forma ade-
quada às necessidades de cada uma e às exigências da situação” (p. 27). Esta autora des-
tacou em seus estudos a importância das relações interpessoais no dia-a-dia, principal-
mente quando afirma que pessoas reagem às outras pessoas por simpatia e atração, anti-
patia e aversão, aproximando-se e afastando-se, entrando em conflito, competindo, cola-
borando, desenvolvendo afeto.
O processo de interação humano ocorre permantemente sob forma de comporta-
mentos manifestos e não-manifestos, verbais e não-verbais, pensamentos, sentimentos,
reações mentais e físicas. É um processo complexo, decorrente de duas fontes: eu e ou-
tro(s).
As relações interpessoais são o alicerce do funcionamento da sociedade humana,
seja no contexto de trabalho ou social. Como aborda Moscovici (1985), o desenvolvimen-
to de líderes é, acima de tudo, autoconhecimento; e o autoconhecimento só é alcançado
através da interação com os outros.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 13


O autoconhecimento só pode ser obtido com a ajuda dos outros, por meio de
feedback, o qual precisa ser elaborado para auto-aceitação de componente do
eu cego... sem o que não se constrói um relacionamento humano autêntico,
conducente do encontro EU-TU, de pessoa a pessoa (p. 27 e 28).
O indivíduo que se conhece e se aceita, pode fazer opções mais realistas de mu-
danças pessoais e preservar sua autenticidade. Por esta razão, obter autoconhecimento,
desenvolver habilidades de percepção, diagnose e comunicação para dar e receber feed-
back é o caminho para que o encontro entre o EU-TU aconteça.
O autoconhecimento é entendido como um processo de qualificação profissional,
que depende de interesse e esforço. De acordo com Moscovici (1985) é necessário haver
um treinamento especial, demorado e sofrido, que exige coragem e disponibilidade psico-
lógica do treinando no exercício de receber feedback.
No desenvolvimento da competência interpessoal, feedback é um processo de
ajuda para mudança do comportamento. Porém, para as pessoas, receber feedback, muitas
vezes, é percebido como um risco à integridade. Nas situações de trabalho este receio
aumenta, pois, assim como Moscovici (1985) comenta “podemos sentir que nossa inde-
pendência esteja sendo violada ou que o apoio que esperávamos nos esteja sendo ‘nega-
do’” (p. 129).
Por esta razão, o desenvolvimento da competência interpessoal é tido como um
treinamento demorado e sofrido, visto ser necessário ultrapassar este estágio para só en-
tão ser capaz de, com a ajuda do outro, descobrir e (re)conhecer algumas facetas pessoais
que prejudicam nosso crescimento.
De acordo com Moscovici (1985) a competência interpessoal é fundamentada por
dois componentes: a percepção e a habilidade propriamente dita. A percepção precisa ser
treinada, ou seja, tornar-se acurada. Para que isso aconteça é necessário um longo proces-
so de crescimento pessoal, abrangendo autopercepção, autoconscientização e auto-
aceitação. Somente através destes pré-requisitos que a percepção sobre os outros e sobre
a situação interpessoal poderá torna-se mais realística.
Somente através do desenvolvimento da competência interpessoal é possível se
criar canais de comunicação e de união, constituídos através de vínculos de confiança e
cortesia. O trabalho em equipe, dificilmente será eficiente se a liderança e a participação
em grupo não tiverem desenvolvido sua competência interpessoal, conquistado vínculos
autênticos.
De acordo com Mailhiot (1981) os grupos proporcionam aos participantes ajuda
ao descentrá-los de si mesmo e situá-los em relação ao outro. O grupo leva os participan-
tes a se libertarem de suas fixações ou de seu egocentrismo, preparando caminho para o
aprendizado do alocentrismo. Cada participante pode adquirir: “1) novos níveis de vigi-
lância e de presença do outro; 2) esquemas mais adequados de percepção de si mesmo e
do outro; 3) modelos mais flexíveis, mais funcionais da expressão de si e de comunicação
com o outro” (Mailhiot, 1981, p. 105).
O processo de aprendizagem para se alcançar o alocentrismo depende dos recur-
sos psíquicos, do nível de aspiração, de expectativas, do grau de motivação de cada parti-
cipante. Ou seja, a busca alocentrismo dependerá do desejo de cada participante de se
questionar no plano interpessoal e do desejo de se abrir a relações mais autênticas com o
outro.
Para se atingir este estágio de maturidade, os participantes passarão por etapas. A
primeira delas é a objetivação de si. Mailhiot (1981) comenta que “[...] uma fonte cons-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 14


tante de nebulosidade nas comunicações com o outro é a distância e a diferença que exis-
te entre a imagem que alguém tem de si e a imagem que os outros têm dele” (p. 106).
Assim, para que os participantes descubram seu eu verdadeiro, seu eu profundo – sem
disfarces – é necessário aprender a distinguir entre o “eu atual”, “eu ideal” e “eu autênti-
co”.
A objetivação de si é entendida como um processo de exploração, de procura ao
eu autêntico. Porém, vale salientar, que a objetivação de si só é alcançada quando os in-
divíduos passam a aceitar a si mesmos, independentemente do conformismo dos outros
na busca em torná-los “aceitáveis” – que acabam por despersonalizá-los. Então, a autenti-
cidade é, em primeiro lugar, ser verdadeiro consigo mesmo, independente dos “moldes” e
“sugestões” alheias.
A segunda etapa deste processo de aprendizagem é aspirar relações mais autênti-
cas com o outro, é objetivar-se a respeito do outro; ou seja, conhecer a que ponto suas
percepções do outro são subjetivas e seletivas. Para conseguir ver o outro de modo dife-
rente é necessário se questionar as próprias imagens estereotipadas sobre o outro. En-
quanto os preconceitos não desaparecerem, as percepções sobre outro não poderão obje-
tivar-se.
O esforço nesta fase se dá no aprender a passar do plural ao singular, do impessoal
ao pessoal, não percebendo o outro como semelhante a outros, mas como um ser único.
Desta forma, uma comunicação que antes era formal passa a ser espontânea e natural.
A terceira fase se trata da conquista da autenticidade nas relações interpessoais. É
nesta fase em que a transparência é fundamental, para que haja uma adequada expressão
de si. Acentuamos aqui que, libertar-se dos preconceitos, é condição sine qua non para
aprender a se tornar transparente. Só se é capaz de ser transparente quando se aprendeu a
se desembaraçar dos disfarces, a renunciar o rodeio e os artifícios nas relações com o
outro.
A objetivação do outro cresce ao mesmo tempo em que a objetivação se si. Se-
gundo Mailhiot (1981) “a partir do momento em que alguém se objetiva com respeito às
imagens que apresenta ou projeta ao outro, torna-se capaz de se questionar e de objetivar-
se em relação às próprias imagens que tem de si mesmo, e depois, de se colocar à procura
e descoberta de seu eu autêntico” (p. 112). Para o autor esta capacidade se chama auto-
empatia (capacidade de tornar-se e de permanecer lúcido sobre as imagens que os outros
fazem de si).
A auto-empatia torna os indivíduos capazes de objetivar-se em relação às imagens
de si, enquanto que a alo-empatia torna-os aptos a objetivar-se com respeito às imagens
do grupo.
Mas por que isto é importante de ser mencionado? Porque somente através da alo-
empatia que se consegue adquirir uma percepção acurada acerca das relações interpes-
soais que se iniciam e se estabelecem entre as pessoas – ter clareza de quais membros se
aceitam, quais se rejeitam, quais se sentem isolados ou ignorados. Ou seja, somente atra-
vés da alo-empatia que se conseguirá participar e intervir no grupo de modo a favorecer
coesão, integração, crescimento e criatividade.
A última fase deste processo de aprendizagem é a capacidade de aceitar o outro
incondicionalmente; percebendo-o como um ser humano único em suas aspirações e ca-
pacidades de superação, aceitando-o como alguém possuidor de ritmos e modos próprios
de superação e atualização. Em outras palavras, é aceitar que cada indivíduo trás em si
possibilidade únicas de crescimento.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 15


Entendemos que propiciar aos líderes a vivência desta aprendizagem é fundamen-
tal para seu processo de desenvolvimento. Através desta experiência poderão ser “capa-
zes” de formar times coesos, de avaliar com perícia, de comunicar-se de maneira transpa-
rente (arte do feedback), de criar um clima de confiança dentro do grupo, de influenciar e
orientar (arte do coaching), de se desprender de preconceitos, de compreender e valorizar
as diferenças, de administrar conflitos, de se colocar no lugar do outro a fim de atender
suas necessidades.
Enquanto a competência técnica pode ser adquirida através de cursos, seminários,
leituras e experiência prática, a competência interpessoal só é desenvolvida através de
treinamento especial de “laboratório”. Educação de Laboratório é o nome dado à metodo-
logia utilizada para propiciar aos grupos aprendizado através de vivências. Discorreremos
mais profundamente sobre este tema no capítulo seguinte.

1.2 Abordagem educacional para desenvolvimento


da competência interpessoal

1.2.1 Andragogia: uma abordagem metodológica alternativa

A prática da andragogia segundo Moscovici (2002), deve orientar-se para capita-


lizar todos os aspectos relevantes e atender às necessidades e feições diferenciadas do
adulto como aprendiz. A tecnologia andragógica utiliza a motivação e a experiência dos
aprendizes adultos como molas propulsoras principais. O uso de técnicas de dinâmica de
grupo e de laboratório, de aprendizagem vivencial, possibilita comunicação mais fluente
entre os participantes no sentido de troca de experiências, comparação e discussão das
mesmas, levando a descobrir como podem aprender com os outros, como ajudar e serem
ajudados e como trabalhar com outros em várias modalidades de tarefa em grupo.
Segundo Knowels (apud Moscovici, 2002) em situação de aprendizagem os adul-
tos e as crianças e jovens tem algumas diferenças, como:

§ Autoconceito: jovens têm mais dependência do educador, enquanto os adultos


sentem-se mais responsáveis pelo próprio processo de aprendizagem;
§ Experiência: os adultos trazem mais experiências acumuladas ao longo da vida
utilizando-as como recurso de aprendizagem. É a partir dela que ele se dispõe, ou
se nega a participar de algum programa de desenvolvimento.
§ Prontidão: os adultos desenvolvem maturidade em áreas diferenciadas, de cunho
mais social, que os deixam mais aptos para desenvolver este campo da aprendiza-
gem. O adulto está pronto para aprender o que decide aprender. Sua seleção de
aprendizagem é natural e realista. Em contrapartida, ele se nega a aprender o que
outros lhe impõe como sua necessidade de aprendizagem.
§ Perspectiva temporal: crianças e adolescentes utilizarão o conhecimento, ou seja,
o aprendizado é para o futuro, e os adultos utilizam o aprendizado imediatamente;
§ Orientação da aprendizagem: A aprendizagem para a pessoa adulta é algo que
tem significado para o seu dia-a-dia e não apenas retenção de conteúdos para futu-
ras aplicações. Como conseqüência, o conteúdo não precisa, necessariamente, ser
organizado pela lógica programática, mas sim pela bagagem de experiências
acumuladas pelo aprendiz.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 16


No Quadro 2 é possível verificar algumas diferenças entre a educação de adultos e
crianças (andragogia e pedagogia).

Quadro 2 – Pedagogia e andragogia: pressupostos e práticas

Pressupostos
Pedagogia Andragogia
Autoconceito Dependência Autodireção crescente
Experiência De pouco valor Aprendizes como fonte de aprendi-
zagem
Prontidão Pressão social de Tarefas de desenvolvimento de
desenvolvimento biológico papéis sociais
Perspectiva Temporal Aplicação adiada Aplicação imediata
Orientação da Aprendizagem Centrada na matéria Centrada no(s) problema(s)
Elementos da Prática
Pedagogia Andragogia
Clima § Orientado pela autoridade § Mutualidade/respeito
§ Formal § Informal
§ Competitivo § Colaborativo
Planejamento Pelo professor Compartilhado
Diagnóstico de Necessidades Pelo professor Autodiagnóstico mútuo
Formulação de Objetivos Pelo professor Negociação mútua
Design Lógica da matéria Seqüência em termos de prontidão
Unidades de conteúdo Unidades de problemas
Atividades Técnicas de transmissão Técnicas de experiência (vivên-
cia/indagação)
Avaliação Pelo professor Rediagnóstico conjunto das neces-
sidades
Mensuração conjunta do programa

Fonte: elaborado por Knowels (In: Moscovici, 2002).

1.2.2 Educação de Laboratório

1.2.2.1 Educação de Laboratório – surgimento e noções

Moscovici (2002) refere educação de laboratório como um termo genérico, apli-


cado a um conjunto metodológico visando mudanças pessoais a partir de aprendizagens
baseadas em experiências diretas ou vivências. O nome laboratório indica, fundamental-
mente, o caráter experimental da situação de treinamento, no sentido de que os partici-
pantes são encorajados a experimentar comportamentos diferentes do seu padrão costu-
meiro de interação com outras pessoas em grupo.
Estas mudanças pessoais podem englobar desde aprendizagens de níveis emocio-
nais (emoções e sentimentos) a mudanças em níveis atitudinais (percepções e conheci-
mentos). Segundo Moscovici (2004) o alvo principal da educação de laboratório é o ati-
tudinal; o do ensino tradicional o cognitivo e o da psicoterapia é o emocional. Qualquer
destes níveis promoverá alguma mudança em maior ou menor grau, superficial ou pro-
fundamente.
De acordo com Gibb et al. (apud Rivapalácio) podemos definir o laboratório co-
mo um grupo relativamente inestruturado no qual os indivíduos participam para aprender.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 17


A aprendizagem esta focada no próprio individuo e nos demais participantes, bem como
nas relações interpessoais e nos processos de grupo.
Para Moscovici (2004) o aspecto mais marcante do método de laboratório é o
“aqui e agora”, considerando que a experiência presente é o ponto de partida comum a
todos os participantes do grupo. O método indutivo é ponto chave na vivência do aqui e
agora, onde se entende o ato de “inspirar, concluir, deduzir ou fazer incorrer”, confir-
mando assim o que a autora faz referência ao dizer que o aprendizado se dá pela expe-
riência.

1.2.2.2 Meta-objetivos da Educação de Laboratório

Aprender a aprender, dar ajuda e participação são os meta-objetivos essenciais da


educação de laboratório (vide Figura 1). Estes meta-objetivos expressam valores de pres-
supostos filosóficos que consideram o homem um ser que se desenvolve continuamente
em busca da realização (Moscovici, 2004).

Figura 1 – Objetivos da Educação de Laboratório

Atitude de
1. Aprender a aprender
• Conhecimentos Indagação
• Sensibilização
• Diagnose

conscientização
2. Aprender a dar ajuda
• Feedback
• Colaboração
Opção

3. Participação eficiente em Mudança


grupo
Competência
Interpessoal

Fonte: Moscovici (2002).

§ Aprender a aprender – aprendizagem que fica para a vida, é um processo de bus-


car e conseguir informações e recursos para solucionar problemas, com e através
de experiências de outras pessoas, conjugadas à sua própria.
§ Aprender a dar ajuda – estabelecer uma relação com o outro para crescimento
psicosocial conjunto dar e receber feedbacks (trocas autênticas e construção de
confiança e respeito mútuo).

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 18


§ Participação – opções conscientes para mudanças de comportamentos inadequa-
dos.
§ Interdependência verídica com os demais membros do grupo, de forma espontâ-
nea, sem recorrer a manobras manipulativas.

Isso equivale a dizer que uma vez apreendido este fica para vida toda,
independente do conteúdo, uma vez que foi vivenciada por si mesmo em conjunto com
outras pessoas. Neste conceito, o processo de dar e receber feedback são fundamentais,
pois conduzem a trocas autenticas e estabelecem a construção de confiança e respeito
mútuos.A participação eficiente em um grupo permite implementar mudanças em
comportamentos inadequados, de forma a exercitar uma interdependência mais
espontânea com o grupo. Quando estes objetivos são atingidos se desenvolve na pessoa
maior disponibilidade psicológica para continuar a aprender e aperfeiçoar os processos de
ajuda e participação em grupo.
Para Moscovici (2004), a peculiaridade deste método consiste em efetuar obser-
vações explorando idéias e sentimentos sobre os fenômenos que acontecem (eventos). O
foco é “como” as coisas acontecem e não “o que” acontece. De acordo com a autora:
Emoções e sentimentos, são hoje, considerados componentes essenciais
tão válidos quanto idéias e conhecimentos em qualquer situação huma-
na. Emoções e sentimentos também constituem fatos reais, ou variáveis
da situação, e não elementos acessórios que possam ser menosprezados
(Moscovici, 2004. p. 9).
Segundo Moscovici (2004) a educação de laboratório prioriza a vivência, a análise
dos eventos em seu duplo aspecto objetivo e subjetivo. Na educação formal, habitualmen-
te os treinamentos têm a ênfase na absorção do conteúdo e no conhecimento, enquanto
que na educação de laboratório o processo de integração é atentamente estudado.
Os fundamentos teóricos são utilizados na educação de laboratório, porém com in-
tuito de contextualizar e refletir sobre as experiências, sendo mais dinâmico, uma vez que
o que é compartilhado não é somente o conteúdo e sim toda experiência agregada a ele.
Na Educação de Laboratório se faz necessário um grupo de pessoas dispostas a
estudar o próprio comportamento, suas relações interpessoais e grupais, onde o grupo
possui liberdade para decidir o que e como fazer, sempre com a ajuda de um coordena-
dor.

1.2.2.3 Papel do coordenador

Para Moscovici (2004), na educação de laboratório, o coordenador funciona como


um suporte no sentido de ajudar a explorar as situações do próprio grupo, sem fazer inter-
ferência assumindo o papel de líder, proporcionando com isto, que os componentes
aprendam com a própria experiência.
É fundamental que o coordenador tenha habilidade, competência técnica e inter-
pessoal, para garantir uma relação de confiança com o grupo, em que os participantes se
sintam impulsionados experimentar novas maneiras de reagir, sem utilizar-se de subter-
fúgios por medo de magoar ou ferir os colegas do grupo.
A autora refere ainda que o coordenador de laboratório acima de tudo é um edu-
cador. Sua tarefa prioritária é criar condições tais que os treinados possam se desenvolver

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 19


e crescer como pessoas, confiando em si e nos outros como recursos importantes para
aprendizagem.
Este educador manipula o ambiente, proporcionando condições favoráveis para
uma real aprendizagem com sucesso psicológico e funcionamento eficaz do grupo, aten-
dendo sempre as necessidades dos membros, os processos do grupo, confiança recíproca
e liderança compartilhada.
Segundo Rivapalacio para um melhor aproveitamento destes grupos é fundamen-
tal observar alguns atributos do coordenador:

§ O coordenador deve ser uma pessoa que tenha amplos conhecimentos das ciências
sociais e comportamento humano;
§ O mesmo deve estar familiarizado com os processos e estruturas do grupo;
§ Deve ter conhecimento acerca das teorias de aprendizagem e comunicação;
§ E ter habilidade para instalar uma atmosfera de confiança no grupo.

Em relação a sua experiência profissional:

§ Deve ter conhecimento acerca de si mesmo e preferencialmente ter tido alguma


vivencia de processo grupal;
§ E ter passado por supervisão.

1.2.2.4 O processo de Aprendizagem em Laboratório

De acordo com Moscovici (2004) a educação vivencial compreende um ciclo de


quatro fases: atividade, análise, conceituação e conexão.

§ Fase da Atividade: consiste na vivência de uma atividade em que a pessoa parti-


cipa ativamente, como resolução de um problema, por exemplo, jogos, simulação
comportamental, dramatização etc.
§ Fase de Análise ou Reflexão: Consiste no exame e na discussão ampla das ativi-
dades realizadas, na análise crítica dos resultados e do processo de alcançá-los – o
como passa a ser mais importante do que o resultado em si. É uma fase muito
mobilizadora de energia emocional, pois cada participante deve expor seus senti-
mentos, idéias e opiniões livremente. Se na primeira etapa houve envolvimento e
abertura, nesta, o participante poderá praticar com maior auto-exposição, esponta-
neidade e autenticidade, troca de feedback com os companheiros do grupo, possi-
bilitando a elaboração de um processo diagnóstico da situação vivenciada e da
participação de cada um e de todos no desenrolar do processo grupal.
§ Fase de Conceituação: ocorre aqui contextualização de experiências, através de
fundamentação, informações, insumos cognitivos com objetivo de torná-la mais
esclarecedora. Mais conceitos surgem através de leitura e debates permitindo a
conscientização de aspectos pessoais e interpessoais levando aprendizagens ba-
seadas na vivência de cada um.
§ Fase de Conexão: etapa em que se fazem as correlações dos aspectos teóricos
com situações praticas da realidade. As conclusões e aprendizagens elaboradas

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 20


podem servir para uso imediato ou para o futuro, possibilitando aos participantes
“insights” de novas aprendizagens.

Para a autora, o processo de aprendizagem depende de alguns fatores que poderão


facilitar ou dificultar a aquisição do mesmo. Entre os fatores internos encontram-se a ma-
turidade, a motivação, as aptidões e habilidades do aprendiz. Como fatores externos é
possível citar diferentes elementos da situação de aprendizagem, como conteúdo,
metodologia, personalidade e desempenho do coordenador, os componentes do grupo,
relações entre eles, enfim, as situações que compõe o contexto da aprendizagem como
um todo.

Figura 2 – Processo Vivencial de Aprendizagem

Atividade

Contextualização
Análise

Conceituação

Fonte: Moscovici, 2002, p. 15.

1.2.2.5 Resultados do Laboratório

A experiência de viver um grupo pode significar mudanças significativas nos pro-


cessos cognitivos e emocionais do treinando.
Para Moscovici (2004), a compreensão desta vivência pode resultar novas formas
de resolução de problemas de liderança e habilidade de participação em grupo.
Atribui-se este possível resultado pelo fato do participante desenvolver maior ca-
pacidade para observar e refletir, como também pela troca com os demais, onde se apren-
de a empatia, colocando-se no lugar do outro.
Essas capacidades reforçam no indivíduo os sentimentos de segurança psicológi-
ca, a autoconfiança do treinando, possibilitando a autodescoberta e o exercício de sua
autenticidade como pessoa, para atingir maior competência interpessoal (Moscovici,
2004).
Ainda para esta autora, a educação tem componentes terapêuticos e as terapias
têm componentes educacionais. A educação de Laboratório tem sido chamada de terapia
para normais.
Os objetivos gerais são similares: ajudar o indivíduo a adquirir e desenvolver
comportamentos mais funcionais que os utilizados até o presente momento.
Os objetivos específicos são diferentes: os grupos de treinamento visam tornar os
membros mais sensíveis ao seu próprio funcionamento, as suas modalidades característi-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 21


cas de comportamento e os processos importantes que se desenrolam dentro do grupo,
para que alcancem insight sobre seus pontos cegos no seu relacionamento com outros e
assim desenvolver a sua eficiência como membros e líderes de outros grupos. (Moscovi-
ci, 2004).

1.2.2.6 Educação de Laboratório como metodologia eficaz no desenvolvimento


da competência interpessoal

Marchetti (2001) refere que há alguns anos ao fazer a contratação de um profis-


sional a competência técnica era considerada de maior importância.
Segundo a autora, com a evolução dos tempos a competência interpessoal passou
a ocupar um lugar igualmente importante, por tratar-se das relações entre as pessoas. É
visando o desenvolvimento destas habilidades interpessoais a educação de laboratório
encontra sua maior utilização.
Se a competência técnica pode ser adquirida em sala de aula e através de cursos,
seminários, congressos, leituras práticas; a competência interpessoal, que é considerada a
habilidade de lidar eficazmente com relações interpessoais, é adquirida através de um
aprendizado um pouco diferenciado.
A competência interpessoal é a habilidade de ildar com outras pessoas de forma
adequada às necessidades de cada uma e às exigências de cada situação e engloba uma
flexibilidade perceptiva e comportamental, que significa procurar ver vários ângulos ou
aspectos da mesma situação e atuar de forma diferenciada, não rotineira, experimentando
novas condutas percebidas como alternativas de ação, dessa forma, desenvolvendo, con-
comitantemente, a capacidade criativa para propor soluções novas ou menos convencio-
nais, com resultado duplamente compensadores: o de dar soluções diferenciadas e com
sucesso aos problemas encontrados e a auto-realização pelo próprio ato de criação da
solução.
Todo processo é monitorado também pelo recurso de dar e receber feedback –
com o intuito de aprimoramento pessoal e da própria técnica.
O processo de feedback, nos treinamentos de laboratórios, tem suas características
próprias:

§ Deverá ser descritivo e não avaliativo


§ Específico ao invés de geral, ex. ao denominar uma pessoa como “centralizadora
ou autoritária”, cite-a situação e seu comportamento para que ela também tenha
opção de concordar ou discordar da opinião, sempre se baseando em fatos e não
em preposições pessoais.
§ Compatível com as necessidades e motivação dos envolvidos no processo de en-
sino/aprendizagem
§ Dirigido para comportamento e habilidades passíveis de mudanças e identificação
concreta de características especificas, para que não haja frustrações ao reconhe-
cer limitações que não está sob controle e capacidade de modificações.
§ Solicitado ao invés de imposto
§ Oportuno
§ Esclarecedor, para assegurar comunicação precisa.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 22


Durante a educação de laboratório, se o processo for conduzido desta forma esta-
rão sendo minimizadas as resistências pessoais em analisar e modificar eventuais limita-
ções pessoais e de conhecimento, sempre lembrando que a confiança mútua, tanto em
comportamento quanto em posição pessoal e a coerência nas manifestações são à base de
todo processo de ensino e aprendizagem.

1.3 Processo grupal

Estar em grupo é condição permanente do Ser Humano, por isto se fala da condi-
ção gregária que cada indivíduo possui.
Nesse sentido, muitos são os autores que já apresentaram ou ainda estão desen-
volvendo conceitos e princípios relacionados ao processo vivido pelos grupos.
Segundo Mills (1970), o comportamento do homem é padronizado, o homem en-
quanto indivíduo e o homem em grupo segue ou cria uma forma ordenada, freqüentemen-
te ritualizada, de interagir.
À medida que aumenta o tamanho do grupo, o índice de inibição diminui, e à me-
dida que os membros passam a se conhecer melhor durante as reuniões, a inibição dimi-
nui mais para os grupos maiores do que para os menores. O comportamento interpessoal,
tende a tornar-se ordenado, e que os fatores situacionais influem nas características dessa
ordem.
Num grupo maior a liberdade física é restrita, enquanto a liberdade psicológica
aumenta. O membro do grupo tem menos tempo para falar, mais pontos de vista para
integrar e aos quais deve adaptar-se, a uma estrutura mais complexa a que precisa ajustar-
se. Ao mesmo tempo têm mais liberdade para ignorar alguns desses pontos de vista para
exprimir seus sentimentos de maneira direta e impositiva.
Mills (1970) acrescenta em sua obra o conceito de emoção do grupo que se refere
à configuração dos elementos conscientes e inconscientes, instintivos e emocionais, bem
como os processos que ocorrem nas pessoas e entre elas, as pessoas não ocultam seus
impulsos, desejos ou seus sentimentos quando ficam em contato com as outras. Na situa-
ção interpessoal, os sentimentos de determinada pessoa raramente estão isolados, ao con-
trário influem nos sentimentos de outros. Deste jogo de impulsos e sentimentos resulta a
configuração mais ou menos complexa que é denominada emoção do grupo.
Quando na presença de outros, as necessidades, os desejos e os sentimentos de
medo, frustração, afastamento, prazer, afeição e solidariedade são os ingredientes de
emoção do grupo, nada existe em isolamento, todos estão em algum tipo de interdepen-
dência. O que uma pessoa de um grupo faz, tem importância para os outros membros do
grupo, e o que uma pessoa sente tem efeito contágio sobre os sentimentos dos outros e
necessidade ou sinais de uma pessoa provocam respostas emocionais dos outros.
De acordo com Castilho (1999) a dinâmica do grupo se processa em um espaço
onde movimentos de vários fenômenos se enlaçam em vários ritmos, formas, pressões,
gravidade, etc.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 23


1.3.1 Tarefa racional e tarefa afetiva

Os grupos operam em duas dimensões: tarefa e emoção. É da interação destes dois


níveis que se definirá os movimentos do grupo em direção ao alcance dos resultados (tra-
balho-tarefa) e do atendimento de suas necessidades afetivas (emoção).
Moscovici (2004) apresenta o modelo trabalho-tarefa desenhado por Bion, onde o
grupo busca soluções para suas dificuldades através do uso da racionalidade consciente,
modo em que o grupo pensa sobre a situação, buscando dados necessários e relevantes.
Segundo Mancia (1998), os grupos ou equipes ao interagirem, inserem em si uma
ou varias razões que justificam sua existência. Portanto, sempre haverá no plano da ação
dos mesmos, atitudes relacionadas diretamente com o plano da tarefa na qual o grupo se
volta para o momento. E, o plano da emoção, referindo-se a todos os sentimentos produ-
zidos durante a execução dos objetivos e/ou tarefas.
Opondo-se ao trabalho-tarefa, outro modo de reagir é respondendo emocional-
mente à situação, sendo esta apresentada de várias formas:

§ Quando o individuo do grupo apresenta a necessidade de depender de algo ou de


alguém para a realização de seus objetivos Bion (1970) chama isto de Dependên-
cia, suposto básico que mostra o individuo procurando os grupos pela suas neces-
sidades primarias de obter segurança.
§ O suposto de Luta-Fuga refere-se ao desejo de não mais depender da relação com
o grupo e sim é percebida como perigosa, onde se pode atacar o que ou a quem se
vê como responsável, ou se distancia, causando esvaziamento ou queda de energia
do grupo.
§ O suposto da União contribui para que os membros do grupo não se sintam amea-
çados pelos sentimentos que se originam da relação e buscam através das relações
pessoais mais íntimas, expressar livremente a ansiedade, compartilhando senti-
mentos.

Na fase de união, segundo Mancia (1998) o grupo apresenta maturidade para lidar
com os conflitos, diferenças individuais, enfim com as variáveis sobre as quais está sujei-
to. Segundo a autora este processo não ocorre de maneira mágica e didaticamente, pois
nem todos os grupos atingem níveis de união e integração. Alguns permanecem nas fases
anteriores

1.3.2 Movimentos de grupo

O primeiro movimento do processo grupal referenciado por Castilhos (1999), re-


força o supostos de Bion, tende a ser de uma profunda relação de dependência da figura
da autoridade. O grupo espera que ela decida o que cada indivíduo deve fazer em cada
etapa do seu processo ou de suas tarefas. Se isso não acontece, os membros ficam irrita-
dos e lhe creditam toda a culpa da situação vivida. Se o coordenador atende a essas ex-
pectativas ocorre um reforço à referida atitude imatura e dependente, o que impede o
crescimento e a autonomia.
A contradependência é um movimento de rebelião, vivido por indivíduos ou pelo
grupo, na tentativa de libertar-se contra a figura de autoridade. Este movimento é expres-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 24


so de forma inconsciente. As pessoas contestam a autoridade o poder de influência. A
autoridade está em xeque.
Trata-se da confrontação necessária para a busca da identidade, da liberdade, da
maturidade, que nem sempre é compreendida pelos pais, como a postura rebelde do ado-
lescente.
Nas empresas, por exemplo, a contradependência é percebida como uma grande
ameaça à estrutura hierárquica do poder instituído. Este movimento é percebido como um
movimento instituinte (de contestação) de confrontação com as autoridades instituídas, o
que leva a crises gigantescas dentro do grupo.
A compreensão por parte da liderança/coordenação desse movimento como um
fenômeno processual, possibilita um grande nível de avanço do grupo nas relações com a
figura de autoridade psicológica, tornando possível viver a próxima etapa de interdepen-
dência.
A autora salienta que é o estágio onde o nível de maturidade relacional se instala.
Os membros compreendem as suas diferenças individuais e suas diferenças de papéis
com relação às figuras de autoridade representadas pelo coordenador/gerente a figuras
psicológicas de autoridade representada por diferentes membros do grupo.
No terceiro estágio o grupo vivencia um sentimento de compromisso e co-
responsabilidade com o seu próprio destino, dispensando a liderança para determinar o
que tem que fazer, tampouco competindo com ela.
A interdependência é considerada por Castilho (1999) como sendo a fase mais
produtiva de um grupo, onde a atmosfera é de aceitação interpessoal ocorre o aumento de
produtividade e qualidade das relações e do produto do grupo.
Como dinâmica é processo, portanto movimento, se um grupo tem a possibili-
dade de vivenciar, de forma qualitativa, todas essas fases, não quer dizer que
ele, ao chegar a última, aí se instale e daí não saia mais. Pensar desta forma é
negar o processo (Castilho, 1999, p. 47).

1.3.3 Fases do processo grupal

Segundo Schutz (1978), o grupo passa por quatro fases no seu processo evolutivo:
inclusão, controle, afeição e separação.
A fase de inclusão representa o momento do “reconhecimento do terreno”, que
ocorre no momento inicial do grupo. As pessoas procuram descobrir onde se enquadram.
Isto implica em estar dentro ou fora do grupo, firmar-se nele como um indivíduo especí-
fico e verificar se terá a afeição do grupo ou será ignorado. Neste momento cada partici-
pante tem o desejo de se sentir aceito e respeitado como membro do grupo. As pessoas
apresentam ansiedade em relação a estes problemas e tendem a mostrar um comporta-
mento individual centrado em si mesmo, como falar em excesso, retrair-se ao extremo,
exibir-se, discorrer sobre seus dados biográficos e sobre experiências anteriores.
Nesta fase as pessoas estão decidindo o grau de seu comprometimento para com o
grupo. As pessoas estão em dúvida sobre: quanto de si darão ao grupo, que importância
terão neste meio, serão apreciadas ou não. Os interesses principais estão voltados a ques-
tões de limite relativas a ultrapassar ou não os limites do grupo, bem como a pertencer-
lhe. Quanto mais o grupo é desconhecido, maior será o tempo de relação de confiança a
ser consolidada.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 25


O termo “questão de taça” mostra que cada pessoa usa um copo de bebida e olha
através do vidro, assim vão estudando as outras pessoas. Estas questões funcionam como
veículos para chegar a conhecer outros membros (o eu de cada um). Neste momento é
comum a experiência frustrante de assistir grupos discutindo tópicos intermináveis, de
nenhum interesse para qualquer membro. Por meio destas discussões os membros apren-
dem muito do outro. As pessoas se utilizam deste recurso para analisar os outros. As
questões de taça desempenham a função de testar, para que os membros possam decidir
como vão atuar no grupo.
Segundo o referencial de Schutz (1978), nesta fase, os membros do grupo têm
muito mais ni teresse pelos compromissos do líder do que pelos compromissos dos demais
membros. Observam a freqüência, interesse, preparo e pontualidade do líder nos encon-
tros. Os membros tendem a desinteressarem-se pelo grupo se sentem algum descuido por
parte do líder.
Ainda neste estágio, os membros interpretam uma falta de interesse por parte do
líder, como um perigo e sentem necessidade de autoproteção, depois de chegar a uma
conclusão sobre a inclusão do líder, o interesse é voltado para o grau de comprometimen-
to dos outros membros do grupo. Ausências, atrasos, empenho em participar e importân-
cia que cada membro atribui as atividades extras do grupo em detrimento dele. Os mem-
bros silenciosos, retraídos e os que vieram só para observar são reparados.
Para Schutz (1978) alcançado o senso de estarem juntos, as questões de controle
passam a predominar: tomar decisões, compartilhar responsabilidades e distribuir pode-
res.
Na obras de Castilho (1999) e Schutz (1978) a fase do controle é referida como
um ciclo que costuma ser muito conturbado já que o grupo não consegue angariar toda a
confiança dos seus membros. A dificuldade de comunicação é imensa e ocorre em função
da inabilidade e insensibilidade. Ocorre a luta pela liderança, competição e discussões
sobre procedimentos, sobre tomada de decisões e responsabilidades. Há um desejo de não
se deixar dominar. É comum o surgimento de facções e subgrupos que criam coalizões
momentâneas.
Schutz (1978) ainda salienta que as ansiedades dos membros são provocadas pela
tentativa de encontrar a medida em assumir responsabilidades mínimas ou excessivas, em
exercer muita ou pouca influência. As pessoas procuram situar-se no grupo de modo a
obter a soma de poder e de dependência mais convenientes.
O interesse do membro inicialmente concentra-se no relacionamento com o líder.
Inicia uma disputa com o coordenador em relação ao seu poder, influência, orientação e
estrutura. O desejo é de arrancar o poder do líder ou de obrigá-lo a assumir toda respon-
sabilidade pelas atividades e decisões do grupo. Aí está a ambivalência de autoridade: o
membro quer sobrepujar e fazer calar o líder ao mesmo tempo em que se sente desapon-
tado quanto à forma em que o grupo evolui e quanto à habilidade do coordenador.
Depois de resolver satisfatoriamente os problemas de controle com o líder, a aten-
ção volta-se para os sentimentos de competição com os outros membros. Os membros
lutam para obter a aprovação e garantir uma relação especial com o líder. A luta se trava
para controlar o grupo. Os aspirantes à liderança são derrubados em suas pretensões e os
que os tentam substituir conhecem o mesmo resultado. Ocorre o desejo inconsciente de
que ninguém tome o lugar do líder e a esperança de que, por fim, o líder tome o seu lugar.
Resolvidas às questões de controle, os membros começam a associar-se para for-
mar um grupo, diferenciam-se quanto à responsabilidade e ao poder e começam a inte-
grar-se emocionalmente.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 26


Para Castilho (1999) esta fase denominada de fase de afeição é o momento de
maior produtividade, para a qual o grupo preparou-se avançando na sua relação de con-
fiança mútua. Há um alto nível de respeito e aceitação dos membros, tolerando-se as dife-
renças individuais. O grupo torna-se construtivo, interdependente, sinérgico e afetivo
entre si, o que tende a levá-lo a uma alta criatividade e produtividade.
Neste estágio aparecem comportamentos afetivos: expressão de sentimentos posi-
tivos, hostilidade pessoal direta, ciúmes, formação de pares e emoções e sentimentos in-
tensificados entre pares.
As ansiedades primárias concentram-se em não ser apreciado, em não ser sufi-
cientemente íntimo ou ser íntimo demais, semelhança com os porcos-espinhos: os mem-
bros querem aproximação para receber calor e carinho, mas permanecer suficientemente
distante para evitar a dor dos espinhos.
Os primeiros problemas afetivos giram em torno do líder. Os membros já desco-
briram se gostam do líder e se são apreciados por ele. Nesta fase os membros já estabele-
ceram várias formas de apegos pessoais entre si e com o líder. Ciúme, amor não corres-
pondido, intercâmbio afetivo e atração sexual são questões que predominam. Aumenta a
sensibilidade em relação uns aos outros e a intimidade. Cada movimento do líder está
mais sujeito a interpretações pessoais.
O clima caloroso entre os pares se amplia, experimentam-se sentimentos ternos
para com todos os demais. Os sentimentos para com cada membro são mais profundos e a
comunicação torna-se mais adequada de pessoa para pessoa.
A partir daí, Schutz (1978) refere que a fase da separação é o momento terminal
do grupo, quando emergem intensos sentimentos de hostilidades para com situações mal
resolvidas ao longo do caminho. A perda afetiva é camuflada com sentimentos de hostili-
dade e agressão que podem estar sendo direcionados ao líder, responsabilizando-o por
tudo o que não foi suficientemente esgotado no grupo.
Os autores chamam a atenção que o grupo é superficial em seus sentimentos afe-
tivos, a vivência é de euforia, algazarras, brincadeiras, piadas. Nega-se a morte do grupo.
Quando os grupos chegam ao fim, tendem a dissolver as relações em seqüência inversa
das fases do processo do grupo: afeição, controle e inclusão, conforme é colocado a se-
guir:

§ Afeição – sentimentos pessoais negativos e positivos são abordados;


§ Controle – a discussão gira em torno do líder. Os membros discutem sobre os
motivos de submissão ou rebeldia aos desejos do líder;
§ Inclusão – conversa sobre possível continuidade do grupo e sobre o grau de com-
prometimento real de cada membro durante os encontros e, mais tarde, sobre o fa-
to de que todos irão participar de grupos diferentes e não mais do atual;

Os membros respondem de diversas maneiras à separação:

§ Retirada gradativa do investimento no grupo, com ausências freqüentes, atrasos e


participação reduzida;
§ Desvalorização e descrédito ao grupo;
§ Projeção da responsabilidade pela separação a outros membros do grupo, hostili-
zando-os e forçando-os à rejeição.
§ Alguns membros abstém-se de investir em pessoas desde o primeiro instante de
seu contato com elas.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 27


Baseada na teoria de Schutz, Moscovici (2002) refere que no desenvolvimento do
grupo é preciso considerar os aspectos de personalidade de seus membros com relação às
dimensões.
Segundo Moscovici (2002), as necessidades interpessoais apresentadas por Schutz
serão normalmente satisfeitas por um equilíbrio das relações entre as zonas de inclusão,
controle e afeição.

As zonas de necessidades interpessoais caracterizam três fases de desenvolvimen-


to grupal, embora muitas vezes não possam ser nitidamente distinguidas, pois os compo-
nentes do grupo não se encontram todos na mesma etapa ao mesmo tempo ao procurar
satisfazer suas necessidades, de acordo com seu ritmo pessoal (Moscovici, 2002, p. 108).

Figura 3 – Fases do processo de grupo

Fonte: Castilho (1999, p. 52).

Até aqui, vimos o desenvolvimento das etapas do grupo como um todo. Em sinto-
nia e simultaneamente a este processo vai ocorrendo o aprendizado individual da autenti-
cidade na comunicação entre os diversos membros do grupo.

1.3.4 O processo de autenticidade na comunicação do grupo

Segundo os estudos de Lewin (apud Mailhiot, 1973) a vivência em grupo ajuda o


membro a descentrá-lo de si mesmo e situá-lo em relação ao outro, levando-o do egocen-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 28


trismo ao alocentrismo, podendo este adquirir modelos de comportamento mais flexíveis,
mais funcionais de expressão de si e de comunicação com o outro, o que complementa os
referenciais anteriormente citados.
As etapas de aprendizagem interpessoal dependem da competência dos coordena-
dores e, principalmente, dos recursos psíquicos dos participantes, de seu grau de motiva-
ção e de sua abertura para relações mais autênticas com o outro.
Segundo Mailhiot (1973), a capacidade de comunicar-se com o outro, reencontrá-
lo psicologicamente, estabelecer diálogo, pode ser aprendido e não é, necessariamente,
uma característica nata da pessoa. Somente através do questionamento de sua maneira de
se comunicar com o outro e de suas atitudes a respeito do outro, o ser humano pode de-
senvolver a verdadeira comunicação humana. Portanto, este processo é muito particular e
pessoal.
As referidas etapas ou momentos de aprendizagem da autenticidade na comunica-
ção, segundo Lewin (apud Mailhiot, 1973), podem ser denominadas conforme segue a
seguir.

1.3.4.1 Objetivação de si

É o processo de exploração de si, a procura do EU AUTÊNTICO para além da


imagem si que o indivíduo quer projetar e aquela que de fato ele apresenta aos outros.
Este processo requer aceitação de si, daquilo que traz de único, da autenticidade interpes-
soal. O EU AUTÊNTICO é a “aceitação incondicional de si”.
Ser autêntico consigo mesmo/verdadeiro e autêntico com o outro constituem a au-
tenticidade interpessoal que significa revelar ao outro o seu “EU” profundo e revelar para
si mesmo o seu “EU” profundo.
Para que aconteça a autenticidade intrapessoal, conforme o autor, o membro do
grupo aprende a distinguir a diferença entre:

§ EU ATUAL – o que é ou acredita ser.


§ EU IDEAL – o que gostaria de ser.
§ EU AUTÊNTICO – o que poderia ser – potencialidades, recursos, capacidade de
superação.

1.3.4.2 Objetivar-se em relação ao outro

É o processo que envolve o questionamento das imagens estereotipadas sobre os


outros. Por exemplo, observe se suas percepções sobre os outros são subjetivas e seletivas
ou se você fabrica imagens do outro. Os preconceitos prejudicam as percepções, cristali-
zando-as.
Conforme Malhiot (1973) objetivar-se em relação ao outro significa aprender a
passar do plural para o singular, do pessoal ao impessoal e perceber o outro como um
“ser único”. Assim, as comunicações passam de formais e convencionais a espontâneas e
naturais.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 29


1.3.4.3 Aprendizagem da transparência

É o processo de abertura espontânea ao outro, onde tudo que é pensado e sentido é


verbalizado. Nesta fase o aprendizado é o de liberar-se dos preconceitos para aprender a
tornar-se transparente ao outro. Para tanto, é necessário desfazer-se dos disfarces, rodeios,
evasivas, artifícios nas relações interpessoais. Exige que o membro confie no grupo.
No desenvolvimento da transparência Mailhiot (1973) refere que, podem ocorrer
choques entre os membros do grupo hiperpessoais e hipopessoais, em torno do problema
da intimidade, quando os participantes mais fechados serão tensionados pelos membros
do grupo mais inclinados à transparência a fazerem a “revelação de si”. Em função disso
devem ocorrer aprendizagens conexas nas relações interpessoais e as fronteiras do inco-
municável e do inviolável devem ser respeitadas. É o momento de reconhecer que cada
ser humano tem direito à sua intimidade e permitir o acesso ao seu EU íntimo quando
assim o desejar.
A autenticidade não consiste em exprimir tudo o que se sabe, tudo o que se
sente, mas, em pensar verdadeiramente, em sentir realmente o que se acredita
poder ou dever comunicar ao outro (Mailhiot, 1973, p. 110).

1.3.4.4 Empatia

[...] despojar-se de seus mitos e de seus estereótipos, libertar-se de seus pre-


conceitos, renunciar a atitudes obstinadas e defensivas a respeito do outro
permite ao ser humano tornar-se transparente ao outro, revelar-se naquilo que
constitui seu modo de ser, apresentar uma imagem fiel de si (Mailhiot, 1973,
p. 110).
Empatia é ser capaz de colocar-se totalmente no lugar do outro, seja ele quem for.
Trata-se da aprendizagem complementar da AUTO-EMPATIA e da ALO-EMPATIA
para, de modo duradouro, ter comportamentos funcionais em grupo e relações autênticas
com o outro.

§ SIMPATIA: permite ao ser humano dividir o sofrimento e alegrias que já experi-


mentou, isto é, identidade de pensamentos e sentimentos.
§ AUTO-EMPATIA é a capacidade de tornar-se e permanecer lúcido sobre as ima-
gens que os outros fazem de si e ainda a capacidade de objetivar-se em relação às
imagens de si.
§ ALO-EMPATIA é a capacidade de objetivar-se com respeito às imagens de grupo
(movimentos, dinâmica, relações interpessoais), permitindo participar e intervir
no grupo de modo a favorecer a sua coesão, sua integração, seu crescimento e sua
criatividade.

1.3.4.5 Aceitação incondicional do outro

Com tudo aquilo que o faz outro: idade, sexo, cultura, nível sócio-econômico, ní-
veis ocupacionais e educacionais. A simpatia é seletiva, a empatia é incondicional.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 30


O ser humano, para ser totalmente transparente ao outro e tornar-se capaz de
se colocar em seu lugar deve ter aprendido a aceitar a si próprio sem reservas,
sem lástimas, sem ressentimentos, enfim de modo positivo (Mailhiot, 1973, p.
114).
Para Mailhiot (1973), aceitar-se ou aceitar o outro incondicionalmente não é apro-
vação incondicional de si ou do outro. Aceitar o outro incondicionalmente significa acei-
tar que cada ser humano seja único. Aceitar que cada ser humano possua seus ritmos pró-
prios e seus modos próprios de superar-se e atualizar-se.
Para tanto o autor faz referências sobre o quanto é necessário superar o mito igua-
litarista (todos devem buscar a igualdade/nivelamento), responsável pela rivalidade e
competição entre as pessoas que tem como meta ultrapassar o outro, desqualificá-lo, ven-
cê-lo, abatê-lo, situação que contamina as relações interpessoais.

1.4 Mapa conceitual: a educação de laboratório como espaço


de vivência grupal e base para o desenvolvimento da competência
interpessoal – aspecto central em processos de desenvolvimento
de lideranças

A inter-relação entre os constructos teóricos relativos a Desenvolvimento de Lide-


ranças, Desenvolvimento da Competência Interpessoal da Liderança, Educação de Labo-
ratório e Processo Grupal, fundamental ao desenvolvimento deste estudo é proposta em
um mapa conceitual apresentado a seguir (figura 1). Esse mapa conceitual realiza a sínte-
se e articulação dos conceitos-chave que ancoram o estudo.
Através da literatura têm-se indicações sobre as possíveis abordagens para o de-
senvolvimento de lideranças. Dentre estas abordagens identifica-se na metodologia de
Educação de Laboratório (Laboratórios de Sensibilidade) uma alternativa eficaz ao pro-
blema do ajustamento à mudança, condição sine qua non para o exercício do papel da
liderança no ambiente organizacional atual.
De acordo com o referencial pesquisado, por ser o exercício do papel da liderança
um processo interpessoal, torna-se importante que os processos de desenvolvimento de
lideranças possibilitem um espaço de autoconhecimento, conhecimento dos processos de
grupo e da interação eu-outros, como base para aprendizagem e sensibilização para a mu-
dança. É através de um conjunto metodológico que visa oportunizar aprendizagens a par-
tir da vivência de experiências em caráter experimental, que a Educação de Laboratório
emerge como uma abordagem alternativa e eficaz para o desenvolvimento da competên-
cia interpessoal, como um mecanismo base que deve integrar as iniciativas de desenvol-
vimento de lideranças para ambientes organizacionais.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 31


Figura 4 – Mapa Conceitual do Estudo: A educação de laboratório como espaço de
vivência grupal e base para o desenvolvimento da competência interpessoal em pro-
cessos de desenvolvimento de lideranças

Ambiente Organizacional Desafiador


Necessidade Exercício Eficaz da Liderança

Desenvolvimento de Lideranças
Desenvolvimento de Competências-chave da Liderança
C1

Competência C2
Interpessoal

C n... C3

Espaço de Vivência Grupal


Ciclo Vivencial de Aprendizagem
Atividade
Atividade

Contextualização Análise

Aplicação

Educação de Laboratório

Fonte: elaborado pelas autoras deste trabalho com base no referencial teórico pesquisado.

2 MÉTODO

2.1 Método de pesquisa

O presente trabalho desenvolveu-se através da adoção de uma abordagem qualita-


tiva. Esta escolha justifica-se por tratar-se de uma pesquisa voltada à compreensão de um
dado fenômeno, mais especificamente, a análise da educação de laboratório como uma
abordagem/método alternativo para o desenvolvimento de lideranças em ambientes orga-
nizacionais.
Minayo (2001), ao referir-se a pesquisa qualitativa, destaca esta abordagem como
capaz de responder a questões muito particulares em função de sua preocupação, nas ci-
ências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Isto é, ela traba-
lha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que
corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 32


não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Os autores que se utilizam de
tal corrente não demonstram grande preocupação em quantificar fenômenos, mas, sim,
em compreendê-los e explicar a dinâmica das relações sociais que, por sua vez, são depo-
sitárias destas crenças, valores, atitudes e hábitos.
A estratégia de investigação adotada neste estudo foi a do estudo de caso. O estu-
do de caso tem sido amplamente utilizado por pesquisadores que procuram responder
questões relacionadas a “como” e “por que” certos fenômenos ocorrem, e objetivam ana-
lisar intensivamente tal fenômeno, sendo que “o pesquisador vai a campo buscando cap-
tar o fenômeno em estudo a partir da perspectiva das pessoas nele envolvidas, conside-
rando todos os pontos de vista relevantes” (Godoy, 1995).
Para Yin (2001), o estudo de caso não requer necessariamente um modo único de
coleta de dados, sendo que se pode trabalhar com evidências quantitativas ou qualitativas.
Segundo o autor, a estratégia de pesquisa através do estudo de caso busca examinar o
fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto de vida real, caracterizando-se pelo
estudo profundo e exaustivo de poucos objetos, de maneira a permitir o seu amplo e deta-
lhado conhecimento. Gil (1999) esclarece que o estudo de caso vem sendo utilizado cada
vez mais pelos pesquisadores sociais, visto servir a pesquisas de diferentes propósitos,
entre os quais explorar situações da vida real cujos limites ainda não foram claramente
definidos.
Esta foi a perspectiva adotada para atender ao objetivo central deste estudo: com-
preender como a educação de laboratório, enquanto alternativa metodológica, pode cons-
tituir uma abordagem e/ou espaço favorecedor do desenvolvimento da competência inter-
pessoal da liderança.
O estudo foi conduzido realizando-se a análise documental, com ênfase na análise
de conteúdo através técnica de abreviação de conteúdo como abordagem de exploração
dos dados do caso transcritos/documentados (relatos dos encontros de grupo, notas de
campo, material de planejamento/proposição e de resultados do trabalho desenvolvido
com o grupo), buscando contribuir com o objetivo de aproximar pesquisadoras e o fenô-
meno pesquisado.
Neste processo, os dados coletados foram transcritos e analisados, beneficiando-se
neste estudo da condição de uma das pesquisadoras, que esteve na condução do trabalho
de desenvolvimento deste grupo no papel de consultora da organização estudada. Assim,
utilizando-se ainda de recursos de observação, o estudo se propôs a iluminar o tema da
educação de laboratório como alternativa para o desenvolvimento da competência inter-
pessoal da liderança, agregando uma abordagem mais interpretativa como uma maneira
de compreender a influência dos fenômenos grupais no processo de desenvolvimento de
lideranças em contextos organizacionais, buscando somar esforços a outras pesquisas
desenvolvidas no campo dos estudos de desenvolvimento de lideranças e da educação de
laboratório como abordagem metodológica para o desenvolvimento da competência in-
terpessoal.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 33


2.2 Método de trabalho

2.2.1 A unidade de análise

O caso sobre o qual este estudo foi desenvolvido, foi selecionado atendendo-se ao
critério de ser um grupo de liderança inserido em uma organização envolvida em um ce-
nário altamente competitivo, o que referenda a necessidade de uma gestão eficaz e, ao
mesmo tempo, um grupo de lideranças que evidenciava a necessidade de desenvolvimen-
to da competência interpessoal como foco central naquele estágio de seu processo de de-
senvolvimento.
A escolha do caso para realização deste estudo deu-se, assim, não só por tratar-se
de um programa e grupo de desenvolvimento de lideranças, mas pela especificidade da
situação, o que significa ressaltar o aspecto de um grupo de lideranças que já vinha em
um processo de desenvolvimento de suas competências para o exercício mais eficaz em
seu papel de gestão na organização. Naquele estágio era notável que após um investimen-
to inicial no desenvolvimento de outras competências relativas ao exercício do papel de
gestão e a realização de inúmeras outras ações e métodos adotados, era chegado o mo-
mento de investir em uma abordagem que privilegiasse o desenvolvimento da competên-
cia interpessoal de seus líderes como estratégia para a criação da identidade grupal e sen-
sibilização do trabalho em equipe.
A opção era privilegiar mudanças pessoais a partir de um processo de aprendiza-
gens baseadas em experiências diretas vivenciadas pelo grupo, com foco nos aspectos
intra e interpessoais, envolvendo aspectos cognitivos, mas em especial, afetivo-
emocionais, capazes de provocar mudanças de atitude (comportamentais) e conseqüen-
temente desenvolver habilidades sociais fundamentais para o exercício da liderança, bus-
cando os seguintes objetivos:

§ Ampliar o processo de auto e hetero conhecimento, como forma de melhorar as


relações interpessoais no grupo e desenvolver a competência interpessoal dos íl-
deres;
§ Ampliar o diálogo entre as lideranças de diferentes níveis hierárquicos (diretor,
gerentes, chefes de departamento e supervisores), visando através da comunicação
direta e eficaz o fortalecimento da parceria no trabalho;
§ Promover espaço de integração entre as diferentes áreas da manufatura, visando a
implementação de ações que consolidem a visão sistêmica da organização;
§ Fortalecer a relação de confiança no grupo, como forma de praticar a transparên-
cia e a honestidade como valor;
§ Construir coletivamente a Identidade do Grupo de Lideranças da Manufatura da
empresa, visando ampliar a consciência coletiva sobre o papel do grupo, o poten-
cial existente e as habilidades que ainda precisam desenvolver;
§ Trabalhar questões de liderança, em especial, a mudança do papel do líder na or-
ganização – do foco técnico/ operacional para o foco de gestores de pessoas e do
negócio;
§ Aprimorar algumas competências de gestão – feedback, motivação, delegação,
gerenciamento de conflitos, fundamentais ao processo de desenvolvimento do
grupo e da liderança;

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 34


§ Constituir espaço grupal para expressar e compartilhar percepções, sentimentos e
experiências, ampliando o fortalecimento grupal;
§ Oportunizar aos participantes a compreensão sobre o funcionamento do grupo e
desafiá-los/ sensibilizá-los para a constituição de equipe.

Em síntese, o trabalho pretendeu fortalecer o grupo de líderes do processo/área de


manufatura da empresa e, conseqüentemente, fortalecê-los frente às suas equipes de tra-
balho, gerando melhorias na gestão de pessoas. Como resultado, esperava-se que, através
do exercício de seu papel de liderança, o grupo estratégico da Manufatura, contribuísse
consideravelmente para o alcance dos objetivos da empresa de ser o empregador preferi-
do, ser um excelente lugar para trabalhar; atrair e reter as melhores pessoas e comprome-
ter e motivar as pessoas para captar novos clientes.
Este processo de apoio ao desenvolvimento da competência interpessoal das lide-
ranças, desenvolvido no período de agosto a dezembro de 2005, foi realizado por uma
consultoria externa (integrada por uma das pesquisadoras/autoras deste estudo) contrata-
da pela área de recursos humanos da organização, utilizando-se das seguintes abordagens:

§ Abordagem de Coaching de Pequeno Grupo – encontros mensais com o diretor e


respectivos gerentes da área de manufatura, visando trabalhar os conteúdos/ temas
do programa no respectivo nível hierárquico;
§ Abordagem de Grupos de Desenvolvimento – Os líderes (Gerentes, Chefes de
Departamento e Supervisores) foram subdivididos em dois grupos (G1 e G2). Os
encontros ocorreram em uma sistemática mensal (agosto a novembro/ 2005), cada
qual com carga horária de 16h. Em dezembro os encontros dos grupos foram de
8h e ainda houve um evento de integração (8h) entre os dois grupos visando unifi-
car e alinhar o trabalho. Ao total foram 80 horas de trabalho com cada grupo;
§ Devolutivas Mensais para Diretores RH e de Manufatura e equipe de Recursos
Humanos – Essas reuniões (2 horas/mensais) tiveram por objetivo informar as
principais demandas apresentadas pelos grupos e promover a utilização deste con-
teúdo na gestão de pessoas e no desenvolvimento organizacional.

Esta abordagem foi proposta e definida junto à organização a partir da realização


de entrevistas previamente realizadas com os líderes participantes do programa associa-
das a outras reuniões com foco no diagnóstico da situação/necessidade junto à Diretoria e
Equipe de Desenvolvimento de RH e Diretoria de Manufatura servindo de subsídio para a
conclusão sobre o estágio de desenvolvimento do grupo de líderes e a necessidade e en-
foque específicos em relação ao seu processo de desenvolvimento.
Visando a confidencialidade das informações apresentadas, adotou-se a conven-
ção de denominar o grupo da empresa pesquisada por Grupo ALPHA. Assim, sempre que
se fizer referência neste estudo ao Grupo ALPHA, estará se fazendo alusão ao grupo,
objeto do estudo, ou seja, o grupo de lideranças do processo de manufatura desta organi-
zação em nível Brasil; quando a referência for à Empresa ALPHA estará se fazendo men-
ção à empresa. Esta opção se justifica uma vez que o nome da real da empresa tornaria
sua identificação imediata.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 35


2.2.2 Coleta de dados

Valendo-se da revisão da literatura partiu-se para a análise documental dos casos


disponíveis de Programas/Processos de Desenvolvimento de Lideranças acessados pelas
autoras a partir de sua prática profissional. Com a definição pelo interesse da investigação
sobre a compreensão da contribuição da educação de laboratório para processos desta
natureza, se buscou identificar qual (ou quais) dos casos disponíveis mais oferecia subsí-
dios para esta análise. Concluiu-se que a possibilidade de análise de um dos casos em
profundidade poderia melhor contribuir para o objetivo proposto de compreender como a
educação de laboratório pode servir como uma abordagem alternativa ao desenvolvimen-
to da competência interpessoal da liderança, colaborando nos programas/processos de
desenvolvimento de lideranças adotados pelas organizações.
A partir desta definição e a análise dos registros e outros materiais documentais
sobre o caso definido para a realização do estudo, optou-se por se trabalhar com a análise
documental e a análise de conteúdo como técnicas de apoio. Partiu-se do material dispo-
nível referente ao processo de diagnóstico, proposição e relatório de resultados do traba-
lho desenvolvido junto ao grupo de lideranças e do relato dos encontros mensais com o
grupo (5 encontros com cada grupo – G1 e G2 e um encontro final integrando os dois
grupos).
Para a etapa de análise foram criadas algumas categorias de análise que objetiva-
ram apoiar a identificação dos aspectos centrais a serem destacados na análise do caso e
que serviram de base para construção do texto apresentado no capítulo de análise dos
resultados da pesquisa.
A situação de grupo para o estudo foi escolhida valendo-se das percepções das
pesquisadoras sobre qual dos casos disponíveis era mais promissor e relevante no sentido
de melhor subsidiar a análise do tema em questão. Objetivamente, qual dos casos dispo-
níveis/relatados sobre desenvolvimento de lideranças oferecia maior riqueza de informa-
ções sobre como a abordagem de educação de laboratório contribui para oportunizar um
espaço de vivência grupal e, em conseqüência, para o desenvolvimento da competência
interpessoal dos líderes.
Em suma, ocorreu uma definição gradual do caso a partir de uma análise inicial de
5 casos disponíveis, tomando-se como critério para a decisão por um deles sua potencia-
lidade para proporcionar insights de mais conteúdo/profundidade sobre o propósito do
estudo.
Em anexo ao final deste trabalho apresentam-se os relatos dos encontros com o
grupo, material sobre o caso privilegiado no desenvolvimento da análise proposta no es-
tudo. São 5 relatos que apresentam o foco, abordagem e o desenvolvimento do processo
com o grupo ao longo dos encontros e um último relato que informa sobre o momento de
fechamento desta etapa do programa com o grupo, integrando os dois sub-grupos criados
em função do tamanho do grupo. O Quadro 3 apresenta mais detalhes sobre o mate-
rial/fontes utilizados na análise.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 36


Quadro 3 – Especificação dos Dados Disponíveis sobre o Caso para Análise

Material/Fontes de Dados do Caso Data do Do- Utilização


Nº Tipo Conteúdo cumento
01 Dados de diagnóstico (Ano- Informações sobre a Jun a Jul/2005 Elaboração da
tações de campo) empresa, grupo de apresentação
líderes, histórico dos da unidade de
trabalhos de desenvol- análise
vimento de lideranças
já realizados com o
grupo, entrevistas pré-
vias realizadas com os
participantes.
02 Proposta apresentada pela Entendimento da de- Jul/2005 Elaboração da
consultoria manda/necessidade, apresentação
(Documentação do caso) proposição de objeti- da unidade de
vos do trabalho, abor- análise e con-
dagem e metodologia a clusão do estu-
ser utilizada. do
03 Relato dos encontros men- Relato resumido dos 5 Jul a Dez/2005 Elaboração da
sais com grupo (G1 e G2) encontros com o grupo apresentação e
(Documentação do caso) e mais do encontro análise dos
final integrando os dois dados
subgrupos, com ênfase
nas temáticas emergen-
tes nestes encontros e
no movimento grupal
identificado.
04 Relatório Final do Projeto Relatório final do pro- Dez/2005 Elaboração da
(Documentação do caso) jeto apresentado à em- apresentação
presa contendo a análi- da unidade de
se dos resultados do análise e con-
processo/programa em clusão do estu-
relação aos objetivos do
inicialmente propostos

Fonte: Elaborado pelas autoras com base no material consultado.

O grupo em questão neste estudo era formado por 46 integrantes, todos do sexo
masculino, com uma faixa etária média em torno de 39 anos, que ocupava na estrutura
formal da organização posições de diretor (1), gerentes (7) e chefes de departamentos e
supervisores (38) alocados em 2 unidades na região sul do país.

2.3 Análise dos dados

Logo após a coleta de dados, se deu início a organização do material obtido. Os


dados de diagnóstico, proposição e de resultados do caso foram analisados de forma glo-
bal no intuito de se obter uma visão geral do caso. Já os relatos dos encontros com o gru-
po, disponíveis originalmente em um formato bastante extenso foram reescritos priori-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 37


zando-se nesta transcrição aqueles trechos que melhor contribuíam para oferecer uma
visão mais direta sobre o movimento e evolução grupal e as temáticas emergentes no
grupo. A adoção deste procedimento metodológico denominado de abreviação da análise
de conteúdo foi a opção como técnica para análise dos dados buscando-se uma redução
do material a ser analisado que contribuísse para se chegar a unidades de análise temáti-
cas capazes de favorecer a análise e interpretação dos dados em relação a questão de pes-
quisa.

2.4 Delineamento do processo de pesquisa

Para sintetizar o processo desenvolvido para realização deste estudo, apresentam-


se suas fases através da Figura 5.

Figura 5 – Configuração Geral das Etapas da Pesquisa

Pesquisa do referencial teórico sobre o tema e de casos práticos de


1 processos/programas de Desenvolvimento de Lideranças adotados pelas
organizações
2 Definição (delimitação) dos objetivos do estudo

3 Construção de um referencial teórico adequado aos objetivos do estudo


Etapas da Pesquisa

4 Definição da adoção do método do estudo de caso e de uma abordagem


qualitativa dos dados

5 Definição (seleção) do caso a ser estudado

6 Definição das técnicas a serem utilizadas: análise documental e análise de


conteúdo

7 Organização dos registros dos relatos e observações do caso transcritos

8 Análise dos dados com base nas categorias de análise definidas

9 Elaboração das considerações e conclusões finais

10 Proposição de sugestões para futuras pesquisas

Fonte: elaborada pelas autoras.

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Este capítulo apresenta os principais resultados obtidos a partir da etapa de análise


do caso. A partir da apresentação do contexto da empresa ALPHA, os resultados são

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 38


apresentados de forma descritiva de acordo com as categorias de análise definidas pre-
viamente: Desenvolvimento de Lideranças, Andragogia e Educação de Laboratório no
Desenvolvimento da Competência Interpessoal da Liderança e Processo Grupal – Fases
do Grupo.

3.1 O contexto: a empresa “ALPHA” e o grupo “ALPHA”

Faz-se importante referir que a identificação da necessidade de desenvolvimento


deste trabalho emergiu a partir de uma série de mudanças no contexto externo e interno
da organização. Em 2003, a empresa ALPHA Corporation – empresa inglesa de impor-
tante expressão no contexto competitivo do setor de componentes automotivos em nível
mundial assumiu o controle total da ALPHA no Brasil (que até então tinha seu controle
acionário dividido com outra multinacional americana atuante no mesmo setor – onde a
Empresa ALPHA detinha 49% do controle acionário e a outra empresa referida detinha
51%). Este fato imprimiu mudanças significativas na gestão do negócio e, conseqüente-
mente, ao nível de desafio para a gestão do negócio e para o exercício do papel da lide-
rança baseada em uma nova cultura. As novas perspectivas da empresa foram anunciadas
através da alteração da missão, visão, objetivos e valores. Além disso, a implementação
das estratégias da empresa contou com a ampliação dos investimentos na área técnica,
através da implantação de novos sistemas e programas, definição de metas ousadas e foco
nos resultados. Para as lideranças ficou explícito o desafio de alcançar a máxima eficiên-
cia e produtividade, através da alta performance de suas equipes.
Esse processo de mudança organizacional, também causou impacto significativo
nas pessoas, exigindo delas uma nova mentalidade para descobrirem e implementarem
um novo “jeito de fazer”. O aumento da pressão no ambiente de trabalho, visando melho-
res resultados somado às alterações operacionais, geraram um clima organizacional com
aumento de tensões e conflitos. A pesquisa de Clima Organizacional realizada em 2003
demonstrou que os colaboradores foram mais otimistas nas questões relacionadas à qua-
lidade e menos otimistas naquelas relacionadas com o item “Meu Gerente”. A percepção
geral apontada pela pesquisa era que a empresa geria bem o negócio, mas poderia melho-
rar na gestão e envolvimento dos colaboradores.
Com base nestes dados da pesquisa e na observação cotidiana dos fenômenos or-
ganizacionais, a área de Recursos Humanos buscou apoio para desenvolver um Programa
de Desenvolvimento dos Líderes da Manufatura – área/processo que reúne em torno de
900 pessoas das 1150 que compõe a empresa – como forma de buscar soluções para a
melhoria na gestão de pessoas e em conseqüência para os resultados da organização. Um
dado importante a considerar naquele momento era de que a maioria dos líderes da área
de manufatura já havia participado de treinamentos e programas de desenvolvimento com
foco em liderança, demonstrando conhecimentos teóricos e experiências importantes no
desenvolvimento de competências voltadas à gestão de pessoas. Tais constatações subsi-
diaram a decisão de que o foco do trabalho deveria ser o desenvolvimento do grupo de
líderes da manufatura, priorizando o processo coletivo e não apenas o desenvolvimento
individual das lideranças. Partiu-se do princípio de que para constituir equipes de alta
performance em cada Unidade da Manufatura era necessário e fundamental que o grupo
de líderes desta área se constituísse enquanto grupo e buscasse o desenvolvimento de sua
competência interpessoal para tornar-se também uma equipe. Assim, a proposta do pro-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 39


grama era possibilitar que os líderes vivenciassem e praticassem no próprio grupo os
princípios básicos da liderança, o que pressupunha examinar como estavam as relações
interpessoais dos líderes e o funcionamento e posicionamento deste grupo estratégico
frente às exigências organizacionais. Durante todo o processo os participantes foram es-
timulados a desenvolver atitudes de acordo com os valores adotados pela empresa, desta-
cando-se: transparência e honestidade, mentes abertas e disposição para considerar outros
pontos de vista, respeito aos colegas e à sua contribuição, compromisso com colegas,
equipes de trabalho e com a organização.
Este cenário encontrado na organização quando do diagnóstico da necessidade de
desenvolvimento desta equipe de liderança vem ao encontro de pesquisas na área de de-
senvolvimento de lideranças que referem que é a emergência de um cenário empresarial
desafiador o grande alavancador da necessidade de se ter um time de liderança treinado e
capaz, como estratégia para que as empresas se adaptem e sobrevivam.

3.2 Resultados da análise do caso do grupo “ALPHA”

Os resultados aqui apresentados revelam como a abordagem da educação de labo-


ratório – como alternativa metodológica para o desenvolvimento da competência inter-
pessoal – colaborou no contexto do caso estudado.

3.2.1 Desenvolvimento de lideranças

A realidade encontrada na Empresa “ALPHA” se mostrou alinhada a tendência


apontada no referencial teórico de que quando o foco é desenvolvimento de lideranças a
escolha tem sido por uma estratégia que integre a adoção de diferentes abordagens. Ou-
tros mecanismos para desenvolvimento das competências das lideranças já haviam sido
adotados anteriormente ou ainda se realizavam no momento da busca da empresa por um
trabalho que favorecesse o desenvolvimento da competência interpessoal. Neste momen-
to, a empresa identificava que o que poderia agregar um diferencial para o exercício mais
eficaz de sua liderança estava relacionado ao tratamento de questões emocionais do líder
na sua relação com os demais.

3.2.2 Andragogia e Educação de Laboratório no Desenvolvimento


da Competência Interpessoal da Liderança

A adoção da metodologia andragógica em sua abordagem de Educação de


Laboratório foi definida a partir da sugestão apresentada pela consultoria contratada pela
empresa “ALPHA” como estratégia para o atendimento da demanda identificada de se
desenvolver a competência interpessoal de seus líderes.
O entendimento sobre a demanda apresentada sugeria que o grupo poderia se be-
neficiar deste tipo de abordagem, uma vez que esta propõe trabalhar aprendizagens de
níveis emocionais até atitudinais, utilizando a abordagem vivencial que valoriza a expe-
riência de cada participante e serve como ponto de partida para a aprendizagem grupal.
Esta proposta de aprender vivenciando os conceitos, pode significar mudanças marcantes

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 40


nos processos cognitivos e emocionais dos participantes, resultando em novas formas de
resolução de problemas de liderança e habilidades de participação em grupo. O processo
vivenciado pelo Grupo “ALPHA” neste sentido passa a ser relatado a partir da apresenta-
ção da análise de sua evolução nas fases que compõem o processo grupal.

3.2.3 Processo grupal

A escolha pela configuração grupal para a condução do processo de desenvolvi-


mento da competência interpessoal do grupo de líderes em questão, foi realizada em fun-
ção da percepção referendada pela literatura de quando na presença de outros o indivíduo
é influenciado a responder emocionalmente, como uma espécie de efeito contágio. Os
grupos proporcionam aos participantes ajuda ao descentrá-los de si mesmo e situá-los em
relação ao outro. Este processo funcionaria como um mecanismo facilitador para a cria-
ção de disponibilidade psicológica para empreender processos de mudança pessoal e in-
fluenciar o ambiente.
Para a eficácia de um grupo são considerados variáveis como composição e tama-
nho, no caso do grupo estudado foi proposta uma divisão em dois subgrupos, onde o nú-
mero de participantes fosse menor, contribuindo positivamente nos momentos de troca,
auxiliando na desinibição e formação de vínculos e intimidade.
Os resultados apresentados a partir daqui ilustram este estudo, através da referên-
cia aos movimentos realizados pelo grupo e os fenômenos que emergiram durante seu
processo de desenvolvimento.

3.2.3.1 Fases do grupo

3.2.3.1.1 Fase de Inclusão

Conforme evidencia o referencial teórico, ao iniciar o trabalho de grupo, seus par-


ticipantes procuram ser considerados pelos demais membros, fazendo com que sua pre-
sença seja percebida e valorizada. Neste momento, cada um decide o quanto irá se com-
prometer com o grupo.
No encontro inicial, se realizou uma abertura com a participação dos diretores de
RH e Manufatura. O propósito era reforçar a importância do trabalho e a validação do
mesmo por parte da diretoria da empresa. Entretanto, esta colocação teve uma conotação
ameaçadora. E, na seqüência, quando da saída dos diretores alguns membros do grupo
trazem sua percepção sobre o posicionamento apresentado. Observou-se a partir da ocor-
rência desta situação a instalação de um movimento de resistência e não exposição por
parte dos membros do grupo. A leitura da coordenação foi de que a situação desencadeou
este movimento do grupo como uma tentativa de autopreservação, pelo risco que pode-
riam estar correndo caso demonstrassem algo não aceito pela organização. O G2 faz um
movimento mais aprofundado nesta situação, o desconforto gerado pelo posicionamento
dos diretores é questionado por um dos membros que explicita a dúvida do grupo sobre a
proposta que está sendo colocada com o trabalho: se de um processo avaliativo ou um
processo de desenvolvimento de uma maior abertura e transparência nas relações, o que
suscitaria um maior nível de comprometimento.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 41


Buscando proporcionar a inclusão grupal, os primeiros encontros propuseram ati-
vidades que visavam a apresentação dos membros do grupo de modo que cada um pudes-
se trazer mais informações sobre si, como conhecer semelhanças e diferenças, incluindo a
expressão de opiniões sobre o próprio funcionamento do grupo. Nestas situações, tornou-
se evidente o quanto seus membros ainda não se conheciam o suficiente, mesmo traba-
lhando na mesma empresa e setor, fator este identificado como negativo, visto que perce-
biam isto como necessidade favorável ao andamento das atividades da empresa.
No primeiro encontro dos grupos foi proposta a análise das expectativas e receios
e a contratação de funcionamento com relação ao trabalho, buscando apoiar o grupo no
estabelecimento de normas e padrões. O momento de análise das expectativas evidenciou
a expressão de alguns receios e questionamentos em relação ao trabalho, ainda sinalizan-
do a resistência instalada no grupo por um movimento natural nesta fase reforçado pela
abordagem inicial dos diretores. No momento de elaboração do contrato, o grupo reto-
mou as questões que haviam emergido na análise de expectativas e receios definindo co-
mo gostariam de relacionar-se naquele espaço a fim de favorecer o envolvimento e com-
prometimento com a proposta do trabalho e com o grupo. Observa-se o claro desconforto
do grupo com a discussão gerada em torno da conflitiva de como será o trabalho a partir
da necessidade de desenvolverem um relacionamento de mais proximidade e transparên-
cia.
Ainda no encontro inicial o grupo traz para a discussão informações sobre o seu
funcionamento e as inter-relações que estabelecem fora daquele espaço, correlacionando
fatos ocorridos no dia a dia de trabalho e que reaparecem neste momento, buscando com
isso fortalecer o envolvimento com a proposta de trabalho deste grupo. São reforçados
alguns aspectos do contrato de funcionamento como “ter liberdade de expressão”, onde
segundo eles a transparência é condição para o resultado positivo. Nesta fase percebe-se a
necessidade de ter todos os membros incluídos e comprometidos com o grupo. O descon-
forto observado com esta temática pode ser relacionado à dificuldade dos membros en-
contrarem segurança no grupo em um momento inicial quando ainda dependem de outros
para a realização de seus objetivos. Aqui é possível perceber o grupo em um movimento
dependência.
Em síntese, é possível afirmar que a fase inicial do trabalho foi marcada por um
movimento de questionamento em relação à confiança existente no grupo, como se o
mesmo estivesse querendo delimitar até que nível de profundidade e envolvimento iriam
e de resistência manifestada de diferentes maneiras, como, por exemplo: atrasos, saídas
antecipadas, dificuldade de compreensão e falta de envolvimento com proposta do traba-
lho, dentre outras.

3.2.3.1.2 Fase de Controle

A partir da possibilidade de mudança com a proposição deste trabalho, o grupo re-


torna no segundo encontro fazendo referências à experiência vivida no intervalo dos en-
contros de um treinamento técnico que realizaram e ajudou o grupo a se perceber nas
suas inter-relações quando no papel de lideres das suas equipes. Pode-se inferir que neste
momento o grupo demonstra sua ambivalência em relação ao trabalho proposto, como se
nas entrelinhas de sua fala trouxesse uma sutil comparação e com isso a desqualificação a

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 42


coordenação e a desvalorização daquele espaço. Este movimento pode ser entendido co-
mo uma tentativa de controle da coordenação.
Como refere a literatura, a partir do momento em que o grupo começa a confron-
tar a coordenação, também se inicia um movimento de controle entre os membros. Este
movimento pôde ser observado no grupo quando, no segundo encontro do G1, um inte-
grante do grupo fala de seu esforço e dificuldade para potencializar suas forças e minimi-
zar suas fraquezas no exercício de seu papel de liderança junto a sua equipe de trabalho,
se emocionando ao falar. Neste momento o grupo parece não perceber a emoção do inte-
grante, que controla sua expressão. Esse movimento do grupo pode ser entendido como
uma forma de controle. Controlando a expressão da emoção de um membro do grupo,
este controla a expressão e contato do grupo com sua própria emoção. Nesta mesma si-
tuação, é possível perceber que a coordenação também sofre influência do controle do
grupo, visto que fica em dúvida se houve ou não manifestação do sentimento do integran-
te, e assim não aponta ao grupo seu movimento de não valorização da expressão da emo-
ção do integrante. Através deste comportamento, o grupo de forma não verbal, expressa
sentimentos que denunciam sua dificuldade de experimentar um padrão de funcionamen-
to diferente que integre a emoção em sua interação como alicerce para desenvolver sua
competência interpessoal.
Em determinado momento no G1, quando do processamento de uma atividade
que suscitava a confiança e envolvimento do grupo para sua realização e se analisava o
quanto o grupo não se envolveu na realização da mesma, “matando tempo” um de seus
integrantes – um dos gerentes, validado pelo grupo como alguém com poder e influência
– faz uma crítica aberta à coordenação e ao trabalho que está proposto, de forma desqua-
lificadora. Nesta situação, identifica-se a disputa/contestação do papel de liderança (auto-
ridade) representado pela coordenação, demonstrando a necessidade que alguns partici-
pantes têm de ter para si o poder perante o grupo. A coordenação recebe a crítica referin-
do que iria avaliar o que estava sendo colocado, mas convidando este integrante a pensar
sobre a possibilidade do quanto sua dificuldade já manifesta – de valorizar os aspectos
relacionados à emoção – não estaria dificultando que qualificasse o que estava sendo
proposto no trabalho e do quanto seu posicionamento – por sua influência no grupo –
poderia direcionar o movimento do mesmo. Com este feedback ao integrante do grupo a
coordenação pontua o quanto cada um do grupo exerce influência sobre os outros, salien-
tando o que é destacado na literatura: que o exercício consciente desta influência em seus
relacionamentos, pode capacitá-los para a prática desta influência no exercício real de sua
liderança.
A coordenação ainda convida o grupo a examinar a hipótese do quanto à desquali-
ficação da proposta trazida pelo integrante pode representar também a dificuldade do
grupo de contatar e valorizar os aspectos relacionados à emoção e afeto que a proposta
convida a examinar naquele espaço. Propõe ainda que o grupo possa examinar o quanto,
com este movimento, exerce controle sobre o aprofundamento de suas relações e a evolu-
ção do grupo, o que priva o grupo da possibilidade de estabelecer uma verdadeira intera-
ção – condição para o desenvolvimento da competência interpessoal. Esta abordagem tem
eco entre os participantes, abrindo um canal de comunicação entre os mesmos.
Nesta situação, a posição final da coordenação foi de delegar ao grupo a possibili-
dade de escolha quanto à continuidade do trabalho. Esta posição foi percebida e sentida
pelo grupo como abandono da coordenação, o que ainda caracteriza o movimento de de-
pendência em relação à liderança – depositária das expectativas de direcionamento, su-
cesso, crescimento e evolução do grupo.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 43


O movimento realizado pelo grupo nesta fase, de confrontação da coordenação
buscando responsabilizá-la integralmente sobre o andamento do resultado do trabalho e
ao mesmo tempo o posicionamento assumido pela coordenação de convidar o grupo a
examinar a sua parcela de responsabilidade com processo faz o grupo experimentar um
sentimento de ambivalência em relação à coordenação (autoridade). O que evidencia o
movimento de contradependência realizado pelo grupo.

3.2.3.1.3 Fase de Afeição

A partir do segundo encontro, incluiu-se a proposta de iniciar o trabalho com a


atividade do “jornal”, onde os participantes foram convidados a compartilhar com o gru-
po os fatos importantes ocorridos no intervalo entre os encontros, os sentimentos que
puderam contatar e as reflexões que puderam realizar a partir do vivenciado no grupo e
da percepção sobre os movimentos de mudança que conseguiram empreender. De forma,
diferente da primeira vez que realizaram a atividade – onde o grupo trouxe um conteúdo
mais técnico e voltado exclusivamente ao dia-a-dia e as rotinas no trabalho – no terceiro
encontro o grupo solicita que a coordenação inicie a atividade, auxiliando o grupo a fazê-
lo de forma a incluir os aspectos relacionados aos sentimentos e a emoção. O grupo reali-
za a atividade ainda separando os aspectos do trabalho e da emoção que é trazida em uma
dimensão mais pessoal, ou seja, vivida fora do ambiente de trabalho e com figuras mais
próximas de suas relações do que os integrantes do grupo. De qualquer forma, este mo-
vimento pode ser compreendido como uma sinalização do grupo no sentido de pedir aju-
da para fazer o exercício de integração entre razão e emoção e um sinal de abertura para o
aprofundamento das relações interpessoais.
As temáticas emergentes a partir do terceiro encontro começam a revelar a abertu-
ra do grupo para compartilhar aspectos mais profundos de sua relação, como: situações
pessoais e seus sentimentos em relação às mesmas, dificuldades na tentativa de mudança
na forma de exercer sua liderança, suas fragilidades, um movimento de maior empatia
entre os membros, dentre outros aspectos. Este movimento pode ser verificado em inúme-
ras situações no terceiro, quarto e quinto encontros onde os integrantes do grupo passam
a referir com mais freqüência aspectos de sua vida pessoal – história de vida, relação com
pessoas próximas, etc. – até chegarem ao estágio onde passam a compartilhar sentimentos
de suas próprias relações e sentimentos experenciados em sua relação com a empresa
“ALPHA”, como, por exemplo, quando conseguem identificar que aspectos negativos da
diretoria, também estão presentes em si mesmos e contatar com o sentimento de frustra-
ção que isso lhes causa. Quando isso ocorre o grupo tem a oportunidade de no “aqui e
agora” melhor perceber seu funcionamento e rever sua atitude.
Este processo ganhou mais profundidade quando os integrantes do grupo começa-
ram a falar de si e o grupo passou a utilizar a prática do feedback com mais autenticidade
e transparência, o que permitiu que pudessem examinar aspectos como as diferenças in-
dividuais, papéis, competições, conflitos, sentimentos e percepções não ditos, escolhas e
preferências no grupo (alo-empatia). A evidência de que o grupo parece ter aproveitado
esta oportunidade, se dá no momento em que alguns integrantes podem expressar percep-
ções e sentimentos em relação a sua gerência – presente no grupo – fazendo referência à
importância de ter conseguido dar feedback e em contrapartida ter tido a receptividade
com esta atitude (auto-empatia). Outra parte do grupo refere o sentimento de frustração

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 44


por não ter tido a mesma oportunidade em função da ausência de seu gestor que fez esco-
lha de participar de outro evento e não estar ali com o grupo.
É possível inferir que este processo de aprofundamento nas relações interpessoais
no grupo tenha sido facilitado pela opção da coordenação de em um dado momento reti-
rar-se e deixar o grupo conduzir seu processo, tendo como tarefa fazer a leitura de seu
movimento enquanto grupo. Este exercício pareceu fundamental para que o grupo avan-
çasse no sentido de aprofundar sua compreensão sobre seu padrão de funcionamento e
contratar uma forma mais eficaz de funcionar. Esta experiência pareceu ter contribuído
para que se instalasse nos integrantes do grupo uma maior disponibilidade psicológica
para continuar e aperfeiçoar o processo de ajuda e participação no grupo.
Este movimento ilustra o que o referencial teórico aponta como o alcance de um
estágio de maior maturidade relacional, caracterizado por um momento onde os integran-
tes do grupo vivenciam sentimentos de maior solidariedade, compromisso e co-
responsabilidade com o seu próprio destino dispensando a necessidade de intervenção da
liderança (coordenação). Neste momento se instala a interdependência no grupo.
A possibilidade de vivenciar esta experiência nesse formato de laboratório parece
ter encorajado os participantes a contratar comportamentos diferentes que gostariam de
levar para o exercício de sua liderança junto a suas equipe de trabalho na empresa “AL-
PHA”.

3.2.3.1.4 Fase de Separação

A fase de término nos grupos é experenciada de formas diferentes, podendo ser


vivida predominante através da manifestação de sentimentos de hostilidade ou de valori-
zação do estagio alcançado pelo grupo e desejo de continuidade.
No Grupo “ALPHA” a fase de separação parece ter sido experimentada com o
predomínio de sentimentos positivos em relação ao processo vivenciado pelo grupo. Isto
é verificado quando no quinto encontro é proposto ao grupo a construção da “linha do
tempo”, como uma retrospectiva de seu processo de desenvolvimento, incluindo as situa-
ções marcantes vividas pelo grupo neste processo, sentimentos experienciados e compar-
tilhados, inclusões, ausências, movimentos do grupo, resultados alcançados pelo grupo
dentre outros fatores considerados importantes que contribuíssem para o resgate do pro-
cesso experenciado. Neste momento, é possível perceber no grupo um clima caloroso, de
descontração entre os integrantes que demonstram envolvimento com a atividade e valo-
rizam a possibilidade de relembrar momentos significativos na trajetória percorrida pelo
grupo. Este movimento do grupo parece significar o alcance de um padrão de funciona-
mento onde predomina a união, conquistada a partir de um maior nível de confiança e
vinculação.
Outra situação que parece reforçar a percepção positiva do grupo quanto ao pa-
drão de funcionamento alcançado é o esforço de alguns integrantes que ainda no último
encontro fazem um movimento de incluir-se no grupo, notadamente de forma diferente
do que haviam conseguido fazer até então. Este movimento parece apontar o desejo do
grupo de ainda aproveitar o espaço grupal criado antes da “morte” do grupo.
É possível pensar que o processo percorrido pelo grupo pôde levá-lo a um pata-
mar onde seus membros se tornaram mais capazes de perceber suas necessidades, difi-
culdades, padrão de interação (EU-OUTRO) dentre outros fatores que podem vir a auxi-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 45


liá-los na transferência da aprendizagem alcançada para a prática mais eficaz de seu papel
de liderança. Esta percepção é reforçada pelo depoimento do próprio grupo quando no
quinto encontro (G1 e G2), no momento de realização do balanço da aprendizagem, seus
integrantes referem e valorizam os ganhos alcançados com o processo.
Um aspecto importante de ser referenciado é o sentimento compartilhado pelos
G1 e G2 no momento de fechamento do trabalho, quando reconhecem a semelhança do
movimento de evolução realizado pelos grupos, apesar deste ter se realizado em ritmos
diferentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve como foco a análise de uma experiência de adoção da Educação
de Laboratório, como abordagem metodológica alternativa para o desenvolvimento da
competência interpessoal da liderança. A proposta foi analisar como a adoção desta abor-
dagem pôde favorecer o desenvolvimento da competência interpessoal da liderança a
partir do momento em que propicia um espaço de vivência grupal.
Assim, partindo-se do objetivo geral proposto de analisar como a Educação de
Laboratório pode representar, enquanto uma abordagem metodológica, uma alternativa
ao desenvolvimento da competência interpessoal da liderança, buscou-se identificar o
diferencial que esta poderia agregar em um processo/programa de desenvolvimento de
lideranças.
A partir do mapa conceitual apresentado, pode-se considerar que uma proposta de
viabilização de integração destes elementos – Desenvolvimento de Lideranças, Desen-
volvimento da Competência Interpessoal da Liderança, Educação de Laboratório e Pro-
cesso Grupal – foi identificada na análise do caso estudado.
Na análise das dimensões Desenvolvimento de Lideranças e Andragogia – Edu-
cação de Laboratório como Alternativa para o Desenvolvimento da Competência Inter-
pessoal da Liderança observou-se que, para a realidade do caso estudado, a escolha reali-
zada parece ter servido como fator facilitador do processo de vivência grupal.
Esta percepção pode ser confirmada a partir da análise das dimensões relativas ao
processo do grupo, quando foi possível observar a evolução no padrão de relacionamento
do mesmo, alcançado a partir do exercício de uma maior abertura na interação estabeleci-
da entre os membros do grupo.
Esta abertura fica evidenciada a partir da identificação de alguns movimentos rea-
lizados pelo grupo como, por exemplo, a maior facilidade de dar e receber feedback, o
exercício de uma maior capacidade de escuta, maior capacidade de reconhecer e respeitar
diferenças individuais, a redução no movimento de teorização sobre as situações, uma
melhor condição de realizar análise crítica de seu próprio comportamento, uma maior
expressão de seus sentimentos pessoais em relação ao grupo quando estimulados e a re-
dução da projeção de responsabilidade frente a situações problema.
Mesmo conseguindo realizar este movimento de maior abertura frente aos aspec-
tos citados, em contrapartida, em relação a aspectos como a confiança e o tratamento de
conflitos, competições, invejas, preferências e incompatibilidades, identificou-se uma
maior dificuldade do grupo em tratá-los. Esta dificuldade pode estar relacionada ao cará-
ter inovador da proposição para aquele grupo, relacionado à proposição da Educação de
Laboratório – que enfatiza a vivência como aspecto impulsionador da evolução do grupo.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 46


Mesmo com a imposição desta dificuldade é possível afirmar o caráter facilitador
da Abordagem Andragógica – em sua vertente da Educação de Laboratório – no desen-
volvimento da competência interpessoal da liderança. Faz-se necessário reconhecer que a
dificuldade encontrada não esteve relacionada direta e exclusivamente com a abordagem
adotada e sim à dificuldade inerente a um processo de aprofundamento das relações in-
terpessoais. A Educação de Laboratório, em realidade, serviu em inúmeras situações,
como evidenciado na análise dos resultados, como estímulo ao movimento do grupo de
aprofundamento de suas relações.
Apesar de haver por parte da Empresa “ALPHA” a percepção sobre o valor desta
abordagem para o desenvolvimento das questões emocionais da liderança e suas relações
com os demais, ainda parece que o sentimento experenciado pela organização é de uma
certa ambivalência em relação ao movimento realizado pelo grupo e os resultados alcan-
çados. A empresa ainda parece assustar-se com alguns movimentos empreendidos por
integrantes do grupo e com a própria tomada de consciência de que as mudanças de pos-
tura individual dos líderes irão suscitar mudanças culturais que as respaldem.
Em síntese, pode-se afirmar que os integrantes do Grupo “ALPHA”, em primeira
instância, parecem ter se beneficiado da experiência proporcionada com a adoção desta
abordagem. Em uma segunda instância, parece que a empresa “ALPHA” também se be-
neficiou com a escolha realizada, apesar de ainda não decodificar integralmente os ga-
nhos obtidos com o processo. De acordo com a literatura pesquisada, este sentimento de
estranheza é de alguma forma esperado. O que parece diferenciar o nível de aproveita-
mento e os resultados obtidos com processos dessa natureza pelas organizações é sua
capacidade de integrar o exercício de um padrão de interação mais autêntico – como pro-
põe a abordagem da Educação de Laboratório – em seu estilo de gestão, de forma a sus-
tentar e incentivar o movimento proposto e iniciado em sistema de laboratório.
A abordagem do problema e as análises realizadas não pretendem ser esgotadas
neste estudo. Os resultados encontrados sugerem outras possibilidades que podem ser
aprofundadas por futuras pesquisas, em especial, a questão de como integrar ao estilo de
gestão da própria organização o aspecto citado anteriormente, de incorporar e incentivar
um padrão de interação mais autêntico no dia-a-dia da organização que favoreça o desen-
volvimento e a assimilação da competência interpessoal do líder como uma estratégia
para o exercício mais eficaz de seu papel de liderança.
Considerando-se os objetivos inicialmente propostos para o estudo, pode-se afir-
mar que o mesmo parece ter alcançado êxito. Em relação ao objetivo geral, de analisar
como a Educação de Laboratório pode representar enquanto uma abordagem metodológi-
ca uma alternativa ao desenvolvimento da competência interpessoal da liderança, foi pos-
sível verificar no caso estudado uma associação significativa entre a possibilidade do
exercício no espaço grupal e a condição dos líderes de replicar esta experiência em sua
prática de liderança na organização. O caso estudado, corroborando outros estudos, suge-
re que no contexto competitivo atual, um time de liderança treinado e capaz de melhor
articular seus relacionamentos é a única maneira das organizações se adaptarem, cresce-
rem e se tornarem sustentáveis.
No que se refere às limitações do presente estudo, destacam-se primeiramente as
limitações tradicionais dos estudos de base qualitativa (Yin, 1994), com menção obriga-
tória à questão da impossibilidade de generalização estatística das conclusões obtidas.
Todavia, é importante ressaltar que, no que diz respeito ao caso estudado, a criação de
categorias de análise para entendimento dos resultados obtidos valeu-se do referencial
teórico pesquisado que, adotado como base para qualquer inferência, permitiu um razoá-

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 47


vel grau de segurança em relação às conclusões obtidas. Além da adoção desta aborda-
gem, algumas técnicas de triangulação – com observações, análise documental e análise
de conteúdo – atribuiu maior confiabilidade aos dados obtidos com o estudo.
Um segundo aspecto importante de ser mencionado como limitador do estudo é a
própria complexidade inerente a “inter” ou “multi” disciplinaridade dos temas-chave en-
volvidos no mesmo. A compreensão das dimensões envolvidas em processos de desen-
volvimento da competência interpessoal da liderança, suscitam uma maior aproximação
entre diferentes disciplinas, tais como Administração, Psicologia, Dinâmica dos Grupos e
Pedagogia, como alternativa para construção de um conhecimento mais integrado do te-
ma. Apesar de necessário, este movimento é um movimento mais ideal e por isso é apre-
sentado aqui como uma limitação, uma vez que apesar de ser percebido como necessário
ainda não é propriamente uma realidade conquistada, dadas as inúmeras divergências no
que se refere a métodos, teorias e ideologias de cada uma destas disciplinas.

REFERÊNCIAS

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SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 49


AVALIAÇÃO DE RESULTADOS

FOCO Desenvolvimento Interpessoal

Status Inicial Status Atual


Pouco conhecimento e interação entre os líderes, principalmente Melhoria significativa na interação entre lideranças de diferentes UMs,
entre diferentes UM’s. mas não entre todas, em função do trabalho ter sido realizado em
dois subgrupos.
Pouca abertura pessoal para relacionamentos mais autênticos. Maior abertura pessoal para prática de feedback e resgate de
Conteúdos “não ditos”, não revelados. Pouca prática de feedback situações de conflito não resolvidas no grupo.
entre as lideranças.
Pouca capacidade de escuta. Maior capacidade de escuta do grupo e dos feedbacks, com redução
do grau de defensividade pessoal.

Falta de credibilidade em trabalhos comportamentais, pouca Credibilidade no programa, através do reconhecimento dos resultados
motivação e resistência em relação ao programa e a metodologia. positivos em relação ao fortalecimento das pessoas e do grupo.

Relação de confiança fragilizada. Medo de exposição. Relação de confiança em processo de construção.

Relações pautadas pelo poder hierárquico. Relações pautadas pelo poder pessoal e impactos gerados no grupo.

Individualismo, reforçando a departamentalização das áreas da Grupo sensibilizado para trabalho em equipe, reconhecendo a
diretoria de manufatura. necessidade da unidade na ação.

FOCO Identidade Grupal e Sensibilização para o Trabalho em Equipe

Status Inicial Status Atual


Discurso teórico sobre liderança, pouca análise crítica do Redução da teorização, análise crítica do comportamento mais elaborada,
comportamento, dificuldade de expressar sentimentos quanto a maior expressão de sentimentos quanto a situações de trabalho – quando
situações de trabalho. estimulados.

Não se reconhecem como um grupo e sim como vários sub grupos Compreensão do poder do grupo para consolidar a liderança. Consideram-se
(UM’s). dois grandes grupos e manifestam desejo/ necessidade de se transformarem
em uma única equipe.

Liderança imposta pelo “grito”/autoritarismo. Consciência ampliada e crítica com relação a liderança pelo grito. Desejo de
mudança.

Resistência a falar de si, praticar feedback público e uso do silêncio Prática de feedback público com maior naturalidade. Entendimento do
como defesa. significado do silêncio na dinâmica grupal.

Projeção de responsabilidades frente a situações problema (na Tomada de consciência de que esta projeção é uma forma de eximir -se de sua
liderança hierárquica, no RH, na consultoria externa). parcela de responsabilidade enquanto líderes.

Dispersão, uso de brincadeiras para fugir do foco do trabalho. Redução destes comportamentos, com maior nível de consciência do quanto
estes retardam o crescimento do grupo.

Baixa tolerância às diferenças individuais/ utilização de rótulos e Maior compreensão das diferenças individuais e da desaprovação de alguns
apelidos pejorativos e desqualificadores. com os apelidos no grupo, mas ainda precisam aprofundar esse tema.

Dificuldade de perceber e tratar conflitos, competições, invejas, Reconhecem a existência destes fenômenos, mas receiam tratá-los.
egoísmo, preferências e incompatibilides no grupo.

Dificuldade de dar, pedir e receber ajuda. Pouca cooperação e Ampliação da cooperação e colaboração. Sensibilizados para a importância da
colaboração. ajuda.

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 50


Em relação às COMPETÊNCIAS DE LIDERANÇA da Empresa “ALPHA” na
opinião dos participantes o programa contribuiu, em especial, para o desenvolvimento
das seguintes competências:

Auto desenvolvimento e desenvolvimento da equipe 64


Colaboração e Trabalho em Equipe 64
Inovação, flexibilidade e adaptação 57
Habilidade de influenciar os outros 54
Comunicação Oral 46
Respeito pelos outros 43
Iniciativa 43
Delegação e responsabilidade 36
Competências

Facilitador 36
Eficácia pessoal 36
Visão Estratégica 32
Desafiador 29
Auto gerenciamento 21
Comunicação Escrita 14
Visionário 14
Organização e implementação 14
Orientação para o negócio 14
Orientação para o cliente 14
Consistência de propósito 7

0 10 20 30 40 50 60 70
%

SBDG – Caderno 82 v Educação de laboratório 51


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Porto Alegre – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Alessandra Martini Moesch

Percepção do fenômeno de resistência


à mudança no subgrupo “Soltando as Amarras”

FABÍOLA ROBERTA FITARELLI PETRY


JOSÉ CECCON DE BARROS
MARILANE GOMES DOS SANTOS
RENI LÚCIA FINGER
ROSEMARI SOUZA STIEVEN
SIMONE BRUFATTO

Resumo – Este trabalho apresenta um estudo da Percepção do Fenômeno de Resistência


à Mudança, num grupo de Formação Básica em Dinâmica de Grupos. Este projeto foi
dividido em duas etapas, para melhor compreensão do estudo. A primeira etapa contém a
introdução, justificativa e problematização do tema, abrangendo o problema em si, os
objetivos do trabalho (gerais e específicos), revisão da literatura. Na segunda etapa estão
a metodologia, análise qualitativa dos dados, conclusão e bibliografia. Primeiramente, na
introdução, apresentamos entre outros itens, o porque do interesse em realizar esse traba-
lho. Após, na justificativa e problematização do tema, identificamos os tipos de mudan-
ças, que podem ocorrer em grupos, sejam, família, organização ou grupo de formação. Na
seqüência, definimos os objetivos gerais e específicos do trabalho. Ainda na primeira
etapa, o grupo que realizou este trabalho, elaborou algumas percepções sobre o fenômeno
de resistência à mudança em relação ao Grupo “Soltando as Amarras”. O objetivo maior
foi mostrar a evolução e o desenvolvimento do grupo no decorrer da formação. Após foi
feita uma análise servindo para fundamentar a percepção do fenômeno de resistência à
mudança no grupo “Soltando as Amarras”, e ao mesmo tempo pontua e descreve situa-
ções onde o grupo demonstrou resistência. Na segunda etapa apresentamos a metodologia
de investigação utilizada neste trabalho. Após, realizamos a pesquisa qualitativa com o
grupo “Soltando as Amarras”. Essa pesquisa foi feita para identificarmos se cada membro
do grupo havia percebido o fenômeno de resistência à mudança em si ou no grupo. Na
seqüência fizemos a análise qualitativa dos dados e identificamos as percepções de quase
todos o membros do grupo de formação, sobre o fenômeno de resistência à mudança.
Elaboramos uma tabela em que criamos categorias para as respostas, a fim de facilitar a
análise das mesmas e a quantificação dos dados e também para preservar a identidade dos
membros que respeonderam. Por fim, a conclusão deste trabalho.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 1


SUMÁRIO

Introdução...........................................................................................................................3

1 Justificativa e problematização do tema: percepção do fenômeno


de resistência à mudança no grupo “Soltando as Amarras” .............................3

2 Situação problemática ...........................................................................................5


2.1 Contextualização e hipóteses de funcionamento do grupo “Soltando as Amarras”
conforme a percepção dos autores do trabalho ........................................................6

3 Objetivos do trabalho ............................................................................................9

4 Revisão da literatura ..............................................................................................9


4.1 Fenômeno...........................................................................................................9
4.2 Fenômeno gr upal................................................................................................9
4.3 Mudança.............................................................................................................9
4.4 Resistência .......................................................................................................11
4.5 Resistência à mudança .....................................................................................12
4.6 Percepção .........................................................................................................13
4.6.1 Percepção do fenômeno de resistência à mudança .......................................13
4.6.2 Estágios da percepção ...................................................................................13

5 Metodologia ..........................................................................................................14

6 Análise qualitativa ...............................................................................................14


6.1 Perguntas enviadas por e-mail .........................................................................14
6.2 Tabela de categorização e quantificação dos dados.........................................15
6.3 Análise dos dados.............................................................................................16

Considerações finais.........................................................................................................18

Referências........................................................................................................................20

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 2


INTRODUÇÃO

O tema “Resistência à Mudança” nos mobilizou desde o início, uma vez que está-
vamos vivenciando em nossas empresas grandes processos de mudanças. Nas discussões
iniciais percebemos que tratar de resistência à mudança nas organizações seria abrangen-
te demais.
Na busca da delimitação do tema focamos nosso estudo na análise e diagnóstico
do Fenômeno de Resistência à Mudança em nosso próprio grupo de formação, “Soltando
as Amarras”, pois nos encontros mensais a palavra mudança sempre esteve presente nas
falas e na expectativa de mudança pessoal de cada membro do grupo, através do com-
promisso com projetos de transformação pessoal.
A realidade mostrou que toda a mudança gera muita resistência, que pode dificul-
tar o processo de crescimento, como também servir para ajudar a perceber o funciona-
mento do grupo e dos seus membros, possibilitando assim nova mudança. Decidimos,
então, fazer uma pesquisa em nosso grupo de formação para identificar as manifestações
do Fenômeno de Resistência à Mudança, percebidas em nível pessoal e grupal.
Tentar entender a dinâmica do nosso grupo e os porquês das nossas dificuldades
trará algumas respostas ao que estamos vivenciando nos grupos nos quais interagimos,
como por exemplo, as empresas em que trabalhamos, uma vez que o micro-sistema ex-
plica o macro. Assim veio a inspiração do tema “Percepção do fenômeno de resistência à
mudança no grupo Soltando as Amarras”.

1 JUSTIFICATIVA E PROBLEMATIZAÇÃO DO TEMA: PERCEPÇÃO


DO FENÔMENO DE RESISTÊNCIA À MUDANÇA NO GRUPO
“SOLTANDO AS AMARRAS”

A mudança constante em nossa vida, decorrente dos grandes avanços científicos e


tecnológicos da era moderna, exige uma atenção especial para que possamos nos tornar
mais adaptáveis e capazes na luta pela sobrevivência.
Diante dessa necessidade, o tema resistência à mudança tem em nosso cenário
atual um lugar de destaque, uma vez que é preciso conhecer as implicações psicológicas
que geram resistência no ser humano, para lidarmos com mais êxito com os processos de
mudança, que a vida atual nos exige e oferece.
As mudanças sociais, culturais e econômicas ocorrem de forma cada vez mais
acelerada. O dinamismo com que acontecem muitas vezes, não dá tempo para que as pes-
soas as absorvam de forma consciente. A percepção fica oculta e as reações não parecem
ter relação com estas mudanças. Reações como o “stress”, por exemplo, que a cada dia
toma proporções nunca imaginadas há vinte anos.
A sociedade tende a atribuir o “stress” como conseqüência da rotina mal elabora-
da. No entanto os problemas do cotidiano como a falta de rotina são, na maioria das ve-
zes, conseqüência das mudanças sociais que enfrentamos e que se refletem no dia-a-dia
dos indivíduos, das famílias e das organizações.
O estresse pode ser uma forma física e psíquica de resistência do inconsciente às
aceleradas mudanças que abalam a vida do homem moderno e “que não foram aceitas
livremente e não correspondem ao superego do individuo”; 80); “[...] ainda existe a leal-
dade aos antigos valores e a hostilidade para com os novos” (Lewin, 1948, p. 80 e 81).

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 3


Assim ocorre em todos os grupos, seja religioso, família, organização ou grupo de
formação.
No entanto, para conduzir de forma eficiente e construtiva um programa de mu-
dança planejada o indivíduo precisa tomar consciência de seu próprio funcionamento
para assim entender quais reações provoca nas pessoas com as quais interage e o funcio-
namento destas pessoas, “uma vez que conclusões transmitidas não têm valor formador e
que o único conhecimento autêntico é o conhecimento inacabado e o conhecimento do
inacabado, conforme Rogers citado por Lapassade (1989).
Para tanto, conforme Mailhiot citando Lewin (1991) é “necessário colocar-se em
uma perspectiva ideal, tornando-se ao mesmo tempo agente e objeto de mudança para
descobrir e compreender as leis dinâmicas da mudança que se opera no indivíduo ou em
torno dele”.
[...] quando surge um projeto ou programa de mudança, cada pessoa, indivi-
dualmente, faz um balanço de ganhos e perdas em relação ao resultado de su-
cesso ou de fracasso do mesmo. Baseado no resultado estimado desse balanço,
ela irá apoiar ou sabotar o projeto. Mudar a si mesmo ou reforçar ainda mais o
padrão de comportamento que ‘eles’ estão querendo alterar” (Caderno 41,
SBDG).
A maioria das pessoas, que conduzem projetos de mudança nas organizações, não
percebe qual é a composição e o peso dos diversos tipos de ganhos e perdas envolvidos
pelo “iceberg” da resistência. Ignorar isso significa não considerar diversos fatores que,
no final das contas, irão definir se o projeto será ou não implantado, se ocorrerá ou não a
mudança.
Antes de iniciar esforços de mudança, poucos avaliam meticulosamente quem po-
deria resistir à iniciativa de transformação específica e por quais motivos, levando em
conta a diversidade de comportamentos que os indivíduos podem assumir. Uma das cau-
sas da ausência desse tipo de avaliação é a difusão de conceitos “sem sustentação” ou
preconceitos sobre as reações das pessoas à mudança que se quer implantar.
Podemos ser tentados a pensar que sabemos tudo a respeito ou que, se nós pes-
soalmente não sabemos tudo sobre resistência alguém há de saber.
No entanto uma pergunta permanece: se sabemos tanto sobre como preveni-la ou
superá-la, porquê o fenômeno de resistência à mudança ainda é considerado uma das
principais barreiras à transformação pessoal e organizacional bem sucedida?
Para observar plenamente o fenômeno resistência à mudança, se faz necessário
quebrar os limites da percepção aprendida sob a influência do meio social e cultural que
condiciona o indivíduo, adquirindo assim visão ampla, livre de preconceitos ou tabus.
Visão esta que se busca no grupo de formação, uma vez que se unem pessoas seleciona-
das aleatoriamente de diferentes ambientes e culturas, tendo em comum a busca do
aprendizado sobre movimentos grupais, propiciando uma melhor percepção sobre si mes-
mo e suas reações em relação às experiências vivenciadas no grupo.
Conforme Lewin (apud Mailhiot, 1991),
O aprendizado da autenticidade interpessoal exige duas condições: o desejo de
questionar e de atingir o modo mais adequado de comunicação com o outro; e
um clima de aprendizagem propício ao crescimento e ao aperfeiçoamento hu-
mano.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 4


Esta citação pode ser validada comparando com o que escreveu Moscovici (1985)
quarenta e três anos após Lewin (1948): “que toda mudança provoca resistência, e que
resistência à mudança é, portanto, uma fase inicial prevista em qualquer programa de
mudança planejada”, fazendo crer assim que é necessário, como pessoa que interage em
grupos e como coordenador de grupos, saber identificar em si mesmo, nos indivíduos e
nos grupos, as reações de “resistência” para assim aceitá-las, trabalhando e desenvolven-
do a mudança satisfatoriamente de forma madura, contribuindo para o crescimento indi-
vidual e coletivo.
Assim este trabalho tem por objetivo contribuir com os integrantes de novos gru-
pos de formação, trazendo a luz o fenômeno psicológico de resistência à mudança ocorri-
do neste grupo, o qual pode ocorrer em qualquer grupo a qualquer tempo e intensidade
diferente. Pretende-se assim que ao ler este trabalho, as pessoas tenham a possibilidade
de comparar e perceber o Fenômeno de Resistência à Mudança em seu grupo, pois é to-
mando consciência deste fenômeno que se pode entendê-lo e ajudar o grupo a superar os
entraves para seu crescimento.
O objetivo específico é comparar as vivências com a teoria estudada, através de
pesquisa qualitativa com os membros do grupo, e percepção dos autores deste trabalho,
identificando a ocorrência do Fenômeno Resistência à Mudança individual e coletiva
ocorridos durante o processo grupal, e os impactos que esta resistência provoca no grupo
de formação. Serão identificadas as fases vividas pelo grupo, em sua formação, relacio-
nando os movimentos de mudança e manifestações de resistência bem como a elaboração
de hipóteses a serem investigadas na análise do resultado da pesquisa.
Situações aqui colocadas com o propósito de facilitar a compreensão e ajudar na
percepção deste Fenômeno em outros grupos ou indivíduos.

2 SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA

Um dos objetivos do Grupo de Formação em curto prazo é o desenvolvimento dos


indivíduos baseado na aprendizagem do autoconhecimento e conscientização da percep-
ção das próprias reações e das reações do grupo, pois conforme Lewin (1948), “um indi-
víduo acreditará nos fatos que ele mesmo descobriu, da mesma forma acredita em si ou
no seu grupo”.
O processo desta aprendizagem requer a desconstrução de conceitos internos e
novas construções que libertam e ampliam a visão do indivíduo.
O desenvolvimento, aprendizagem, desconstrução e construção são mudanças.
Portanto se toda mudança provoca resistência, pode-se afirmar que todo o Grupo de For-
mação que alcança estes objetivos passa por movimentos de resistência.
Também, pode-se afirmar que todos os indivíduos que se desenvolvem, apren-
dem, se desconstroem internamente, sofrem mudanças e, portanto, também tem reações
defensivas ou de resistências. Pode-se afirmar, ainda, que todas as pessoas que sofrem
mudanças têm possibilidades de mudar seu modo de interagir nos grupos a que perten-
cem, o que Lewin (1948) chamou de mudança do mundo social percebido ou mudança do
seu superego.
A nova percepção de si mesmo e do mundo social a que pertence será o diferen-
cial adquirido por quem participa do grupo de formação.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 5


2.1 Contextualização e hipóteses de funcionamento do grupo “Soltando
as Amarras” conforme a percepção dos autores do trabalho

O Grupo “Soltando as Amarras” constituiu-se num processo de escolha mais


longo que o normal, com muitas entrevistas e um número grande de candidatos, o que foi
um fator de competição para os entrevistados, já que, ao que tudo indicava, as
coordenadoras em questão eram muito concorridas por seu prestígio nos trabalhos de
formação de grupos.
No entanto, tal demora na escolha talvez justifique a hipótese de que as mesmas
nutriam uma boa expectativa de sua primeira co-coordenação na SBDG (Sociedade
Brasileira de Dinâmica dos Grupos), após longos anos de conhecimento e parceria.
Outra hipótese é que este grupo talvez tenha tentado de forma individual e conjunta
satisfazer as expectativas das coordenadoras (ou o que na sua fantasia seriam as expectativas
das coordenadoras), lembrando aqui do termo bastante usado durante todo o primeiro módulo
e boa parte do segundo módulo “Fodão”, que na realidade era o nome de um outro grupo de
uma das coordenadoras. Fica aqui mais uma hipótese: que o grupo estaria tentando se igualar
ao irmão mais velho e melhor, “Fodão”, para atender as expectativas dos pais, no caso a
coordenação, trazendo no grupo a repetição dos modelos familiares.
As características comuns no grupo eram: maturidade profissional, busca de
crescimento pessoal e profissional, todos possuíam nível superior e todos colocados
profissionalmente em posições estratégicas em suas empresas. Saidon (1983) formula
hipóteses baseado em pesquisa de campo com terapeutas representativos da formação em
terapia grupal, nas quais diz que já existiria uma seleção em função do nível econômico
dos aspirantes, relacionado com o custo das formações e que a escolha da formação seria
determinada muito mais pelas promessas econômicas que contêm e pelas características
de personalidade dos aspirantes de acordo com as características institucionais, do que
por predileção teórica prévia, diz ainda que a preocupação com a solidez teórica ficaria
relativizada em função da necessidade de ocupar um mercado de trabalho.
O início, já no primeiro módulo, selou a configuração social do grupo através do
“desfile de currículos”, e mostrou sem sombra de dúvida a natureza competitiva deste
grupo, do qual a maioria das pessoas, ao desfilar os currículos, se dizia extremamente
exigentes consigo mesmo, formatando aí, uma das fortes características do grupo, a
exigência, que foi bastante utilizada durante todo o período da formação, como alavanca
social e uma forma padrão de inclusão.
A identidade do grupo foi construída com dificuldade pela ambivalência, “ser
autêntico” versus “não ser autêntico”, “confiar” versus “não confiar”, “ser espontâneo”
versus “falar da forma que o grupo aceita”. Também com grande pressão à conformidade,
ao “padrão”, a manutenção dos papéis e status quo, autenticando as validações da
coordenação e os preferidos do grupo, ainda ficou evidenciada a dificuldade de exclusão,
muito utilizado o termo “não escolho” ao invés de “te excluo”.
Dificuldade de aceitar a competição utilizando a desqualificação de membros
vistos pelo grupo como “menos influentes”, no momento em que estes ameaçam papéis
de membros “mais influentes”.
O padrão do grupo no primeiro módulo foi à igualdade ou conformidade de todos
aos papéis estabelecidos, sem chances para competição aberta, diferenciações e
enfrentamentos. Esse padrão de funcionamento forçou a exclusão de dois membros e um
dos dissidentes colocou abertamente para o grupo: – “eu não gostei deste grupo”,
fazendo, com isso, o grupo sentir-se rejeitado. Neste momento os membros deram-se

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 6


conta do seu padrão de funcionamento. No entanto, o primeiro módulo terminou com
poucas tentativas por parte dos menos preferidos a sair do padrão ou como classificou
Lewin, mencionado na primeira página, os “não conformistas”, se apagavam em meio ao
grande grupo, onde prevalecia a autoridade dos preferidos do grupo com a concordância
de todos.
Concluindo assim, que no primeiro módulo, não ficou claro para o grupo que o
padrão à conformidade era um fenômeno surgido no grupo como forma de resistência ao
crescimento e que para o grupo crescer, precisava rompê-lo.
No segundo módulo, o grupo se defrontou pela primeira vez com as escolhas
(dupla de coordenação/observação e subgrupos).
As escolhas foram feitas com base nas afinidades percebidas até aquele momento.
Assim, formaram-se três grupos, diferenciados por seu poder e influência no grande
grupo, de acordo com os papéis da maioria dos seus membros:

– “As Super Poderosas” intituladas pelo próprio grupo, integrado apenas por
mulheres, sendo que na maioria, pessoas de maior influência representando a
intelectualidade, exigência e poder no grupo;
– “ADOSG – As Amiguinhas dos Guris” intitulado por eles mesmos, como forma
de provocação e competição, constituído pelos homens do grupo mais duas “meninas”,
representando a sexualidade, sensualidade, divertimento e prazer;
– O terceiro grupo intitulado “O Resto” através de um comentário de uma das
coordenadoras a respeito de um assunto no grupo “... e o resto?”, que poderia ter sido
interpretado como “... e os demais?”, mas que foi percebido pelo próprio subgrupo e
pelos demais membros como “resto ou sobra”, constituído por mulheres e um homem, na
maioria, considerados menos poderosos ou influentes no grupo. Este subgrupo ficou
sendo o representante do descompromisso, falta de exigência e não-validação, reforçado
pela hipótese de que talvez estas pessoas estivessem com sua auto-estima baixa.

Começam a aparecer as preferências e as escolhas entre os membros do grupo e a


transferência do grupo em relação às coordenadoras e suas preferências. A competição
pela liderança ficou clara quando o grupo dificultou o seu crescimento em detrimento do
“status quo”, confrontando e não autenticando coordenadores, tentando chamar as
coordenadoras para o grupo ou validando outras pessoas como coordenadores, ou ainda,
fugindo do “aqui – agora”, “falando sobre”, “não atendendo as propostas”, “não ajudando
coordenações em dificuldades” quando o coordenador não era um membro “bonzinho”
para o grupo.
Na metade do segundo módulo, os membros começam a buscar afetividade e
necessidade de se vincular, mas de forma padronizada: querem amar e serem amados,
serem escolhidos sem escolher, serem os preferidos. No entanto, o grupo esbarra na não-
aceitação das diferenças, dificultando o estabelecimento de vínculos e laços afetivos. Os
grupos competiam pelas afeições através dos subgrupos. Começam a aparecer os
“espelhos” e aí veio a negação dos “espelhos”. Os membros se apontam, mas não se
vêem refletidos no outro. Desta forma sentem-se julgados, mas não julgadores.
Alguns membros começam a se diferenciar dos demais, em termos de mudança
dos papéis e o grupo resiste em aceitar tais mudanças, que desorganizam a hierarquia
social do mesmo, o que não impede alterações dos papéis: os mais influentes limitam
suas participações e os menos influentes fazem movimentos para modificar seus papéis, o
que é uma forma normal de funcionamento dos grupos, pois conforme Castilho p. 65

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 7


“quando o grupo ventila qualquer assunto que o ameace, ou atinja sua estrutura de
referência, haverá probabilidade de sua postura de defesa ser predominante”.
Entre o segundo e o terceiro módulo deu-se uma alteração na programação do
período de duração do grupo, tendo este, sido aumentado em quatro meses, sem a
alteração do número de encontros, devido a um congresso organizado pela SBDG, a
enfermidade de uma das coordenadoras, e a espaçamento maior de datas de um mês para
o outro para atender às necessidades de membros do grupo e programação de férias,
sendo que sempre houve concordância, e muitas vezes alívio geral do grupo.
Fica mais uma hipótese: o grupo já havia se dado conta do seu término e
inconscientemente começava a resistir.
Este medo ficou evidenciado para todo o grupo no início do terceiro módulo,
assim como a necessidade de criar novos vínculos, no que encontrou grande dificuldade
já que os membros não conseguiram trocar de subgrupo, tentando manter o “status quo”,
evitando a exclusão, “não escolha”, termo muito utilizado pelo grupo para amenizar o
significado de exclusão. Como conseqüência o grupo não deu abertura para novas
vinculações.
Na escolha das duplas de co-coordenação, ficou marcado a passividade de
aceitação em ser escolhido, não havendo rejeições e conflitos. A hipótese é que: nesse
grupo, o medo de rejeição leva as pessoas a não rejeitarem, o que também ocorreu na
escolha dos subgrupos para desenvolver o trabalho de conclusão.
Nessa fase, houve uma maior abertura, coesão e afinidade, o que leva a mais uma
hipótese: que a forma que este grupo encontra para estabelecer vínculos, confiar e
crescer é a afetividade.
Existiram do início ao final dos encontros “tabus” (interdito, proibido,
preconceito):

– medo da agrevessividade no grupo, dando feedback negativo e em seguida


procurando amenizar o efeito, reparando os danos com abraços de alívio;
– o grupo não conseguiu tratar situações conflitantes, por exemplo, na hora do
processamento grupal em que o grupo quer saber quem vai para o “paredão” ou vai ser
excluído, um membro faz sua escolha e dá o nome, o grupo foca nos dois membros, não
dando continuação ao processo de escolha, acontecem as fugas, longos silêncios,
ansiedades e tensão, provocando sentimento de culpa em quem se expôs;
– outras situações aconteceram quando alguns integrantes do grupo trouxeram a
tona o tema sexualidade, falando de sua atração por outro integrante do grupo do sexo
oposto. O grupo tenta aliviar o alto grau de tensão, expectativa e medo fazendo
brincadeiras e piadas sem que mais ninguém se manifeste sobre os próprios sentimentos.

Lapassade (1989), estudando Sartre, traz o conceito da “integração terror” que


purifica o grupo e elimina aqueles que desviam. “Esse grupo terror opõe-se ao ‘grupo
vivo’ do início, passando a ser ameaçado pelo ‘desviacionismo’ e risco de permanente
dissolução”.
“Fechar redondinho” é uma necessidade constante do grupo desde o momento em
que se deu conta do seu término, o que era expresso verbalmente.
Os membros que não atendem às expectativas de mudança do grupo são relegados
ao segundo plano. O que o grupo expõe claramente no penúltimo encontro.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 8


3 OBJETIVOS DO TRABALHO

Objetivo geral:
Analisar e compreender o fenômeno de resistência a mudança no grupo de formação.

Objetivos específicos:
§ contextualizar as manifestações do fenômeno de resistência à mudança ocorridas
no grupo de formação “Soltando as Amarras”;
§ elaborar hipóteses baseadas na contextualização do tema;
§ demonstrar e analisar a pesquisa qualitativa;
§ fundamentar teoricamente as hipóteses levantadas e a análise da pesquisa compa-
rando-as.

4 REVISÃO DA LITERATURA

4.1 Fenômeno

Conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1986), fenômeno é


qualquer modificação operada nos corpos pela ação dos agentes físicos ou
químicos. Tudo que é percebido pelos sentidos ou pela consciência. Fato da
natureza moral ou social. Tudo o que se observa de extraordinário no ar ou no
céu. Aquilo que é raro ou surpreendente; prodígio, maravilha. Pessoa ou obje-
to que tem algo de anormal ou extraordinário. Pessoa que se distingue por al-
gum talento extraordinário.

4.2 Fenômeno grupal

Segundo Wilson Castello de Almeida (1990), fenômeno grupal


é o que preenche o caráter da totalidade. Fenômenos psicossociais que ocor-
rem nos pequenos grupos é resultado de um sistema humano artic ulado como
um todo, uma gestalt. Entre esses fenômenos citam-se: coesão, comunicação,
conflitos, formação de lideranças, a procura de uniformidade, atração e equilí-
brio de forças, é o aqui e o agora do mundo grupal, é a configuração espacial
adotada regularmente por uma unidade grupal, assim como procura explicar a
unidade do grupo através da idéia de uma mentalidade grupal, muitas vezes
inconsciente para os membros do próprio grupo.

4.3 Mudança

Conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1986), a mudança é “o ato ou


efeito de mudar (-se), é alavanca de mudanças”.
Enfrentar e confrontar com a sua própria mudança é o desafio que evoca no
grupo sentimentos difusos de angústia e ansiedade que encobrem o medo das
perdas e do perigo frente ao desconhecido, ao mesmo tempo em que o atrai

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 9


pelas perspectivas de ganhos e esperanças com as quais a oportunidade parece
acenar (Castilho, 1999, p. 53).
Segundo Gérald Bernard Mailhiot (1981),
a mudança social implica em uma modificação do campo dinâmico no qual o
grupo se encontra e conforme se realize ou não, o experimentador preconizado
por Lewin, pode identificar três tipos de fenômenos distintos em relação à
mudança social.
I. Nenhuma possibilidade de mudar – Constância Social: os grupos não sentem nem
experimentam nenhum desejo, nenhuma aspiração a evoluir, a mudar, de tal modo
o status quo é valorizada. É o caso de todos os grupos conformistas que se
comprazem nas percepções estereotipadas da situação social e cujas atitudes
coletivas e comportamentos de grupo são determinados e condicionados por
preconceitos.
II. Pouca ou nenhuma possibilidade de se operar a mudança social: que é iniciada e
desejada pelos elementos não-conformistas do grupo. Mas estes últimos
encontram resistências da parte dos membros do grupo que tem interesses
investidos no status quo, os elementos conformistas estão em minoria, às
mudanças sociais não se operam senão lentamente e na superfície, em razão de
suas resistências à mudança.
III. O caso dos grupos não conformistas mencionado por Lewin no interior dos quais
a totalidade ou a maioria dos membros experimenta e sente uma inclinação para a
mudança. Nestes grupos, as percepções, as atitudes coletivas, os comportamentos
são polarizados por uma aspiração dos membros em crescer e em superar a si
mesmos como grupo. As estruturas formais são flexíveis e funcionais e favorecem
neste grupo, as relações interpessoais, laços de interdependência e interações cada
vez mais dinâmicos.

O fator determinante que tornará possível a mudança social será sempre o clima
de grupo dominante. O clima do grupo é sempre determinado pelo tipo de autoridade que
nele se exerce. Daí porque, modificar as atitudes coletivas ou produzir uma mudança
social consiste na quase totalidade dos casos, em introduzir um novo estilo de autoridade
ou uma nova concepção do poder no interior da situação social que se quer fazer evoluir.
Conforme Lewin (1948)
[...] a percepção social e a liberdade de escolha estão correlacionadas. Obedecer
à consciência é o mesmo que obedecer às exigências intrínsecas percebidas da
situação. Só quando o novo conjunto de valores é livremente aceito, só quando
corresponde ao superego do indivíduo, é que ocorrem aquelas mudanças de per-
cepção social que, como vimos, constituem condição prévia para uma mudança
de conduta e, portanto, para um efeito duradouro da reeducação.
O que se deve considerar, porém, essencialmente, é que na mudança, assim como
no processo educativo, por maior que seja o poder do modificador, quem controla a
transformação é o modificando. Carl Rogers (apud Lapassade, 1989) desabafa: “[...]
chego atualmente a acreditar que os únicos conhecimentos que possam influenciar o
comportamento de um indivíduo são aqueles que ele próprio descobre e dos quais se
apropria”.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 10


A mudança é desagradável, pois causa tensão, aflição e ansiedade no
modificando. Este tem de abrir mão de hábitos e conceitos. Certa perturbação que sofre é
comum ao processo.
Nesta fase de transição, diante das situações de frustração e conflito, poderão
ocorrer, portanto, manifestações de um lado de hostilidade e agressão, e de outro de
melancolia e passividade. Todavia é importante destacar que as pessoas só mudam
quando percebem que seu comportamento presente é inadequado e que outro caminho se
abre à sua frente, passando daí a livre introjeção à mudança.

4.4 Resistência

Conforme Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1986), a “resistência é o ato ou


efeito de resistir; força que se opõe a outra que não sede; força que se opõe ao movimento
de um sistema; oposição ou reação a uma força repressora.”
Lewin acreditava que tanto o indivíduo quanto o grupo poderiam ser considerados
“pontos de aplicações” das forças sociais. Segundo ele (1948),
o padrão de comportamento do indivíduo poderia ser diferente do padrão do
grupo ao qual ele pertence, sendo que essa diferença seria permitida ou
encorajada em culturas diferentes.
De forma geral, no entanto, o grupo tenderia a exigir a uniformidade de
comportamento dos seus elementos e quando o indivíduo mostrasse um padrão de
comportamento diferente do padrão de comportamento do grupo, ele correria o risco de
ser ridicularizado ou até mesmo excluído do grupo. No modelo original de Lewin, a
resistência individual poderia ser diferente da resistência grupal, dependendo do valor
social dado aos padrões de comportamento no grupo.
Segundo Zimerman (2000),
[...] a resistência costuma se dar por atos, palavras e atitudes do analisando
que se opõe ao acesso deste ao seu inconsciente. No entanto é de fundamental
importância que se faça à distinção entre as resistências realmente obstrutivas
ao livre curso do processamento do grupo e aquelas que devem ser acolhidas
como bem vindas, porque traduzem o funcionamento do grupo, a forma de
como cada um e todos se defendem diante das suas necessidades e angústias.
Para Bion (1970),
a resistência se organiza segundo as ansiedades emergentes no grupo, podendo
ser de natureza paranóide por medo da situação nova, de não ser reconhecido
como um igual aos outros e de não ser aceito por esses, do risco de vir a pas-
sar vergonha e humilhações, de vir a ser desmascarado; Ou de natureza de-
pressiva quando é comum surgir o medo de enfrentar a sua parte de responsa-
bilidade ou de eventuais culpas e o medo de confrontar com um mundo inter-
no destruído e sem possibilidades de reparações, o temor de ter de renunciar
ao mundo das ilusões.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 11


4.5 Resistência à mudança

Conforme Castilho (1999), “[...] resistência – Movimento inconsciente vivido pe-


los membros do grupo, que dificulta o avanço do processo da mudança. Defesa contra o
sentido como ameaça ou perda”.
Segundo Francisco Gomes de Matos (1989), as principais causas de resistência, são:

I. Medo de não assimilar as novas técnicas ou, conforme Castilho (1999), medo das
perdas e do desconhecido. O abandono de velhas rotinas por uma nova estrutura
de trabalho gera insegurança por parte daqueles que já estavam acomodados a
padrões convencionais, a sistemas rígidos e temem não se adaptarem às
inovações. “sentimento de rejeição e desconfiança, movimento de contestação
como somatização; irritação e brigas internas; hostilidade a outros grupos;
agressões veladas ou abertas à figura de autoridade; hostilidade à figura do
consultor que corporifica a representação dos valores da mudança”.
II. Contrariar hábitos. A rotinização de comportamentos bloqueia as tentativas
inovadoras quanto mais estas inovações forem de encontro às suas velhas crenças.
Conforme Lewin (1948), ocorre a lealdade para com os antigos valores e
hostilidade para com os novos.
a. Ameaça ao senso de competência. “As mudanças são boas para as pessoas
que as estão provocando. Elas compreendem as novas informações que estão
sendo acrescentadas ao universo. Ficam mais inteligentes em comparação
com o resto de nós. Só isto já basta para sabotar seus esforços...” pensamento
sarcástico do personagem “Dilbert” (Adams, 1996, p. 201).
b. Ameaça ao status quo, poder, imagem. Os elementos conformistas freiam
então ou tentam contrariar as tentativas de mudança. Suas manobras são
geralmente clandestinas e tendem a criar climas de grupo que tornam as
transformações sociais provisoriamente impossíveis, de modo a
III. Modificar atitudes. Com a mudança há necessidade de alterar o quadro mental,
com a substituição de maneiras de pensar e a modificação da escala de valores
antes estabelecida, o que se dá conforme Lewin (1948) “pela livre aceitação dos
novos valores e que este corresponda ao superego do indivíduo”. Conforme
Castilho (1999), “a dificuldade de perceber a nova realidade gera distorções da
percepção, levando a pessoa a julgar e até a perjurar, sem base na realidade ou na
informação”.
IV. Contrariar a lei do menor esforço. Sendo a mudança, a manifestação de
insatisfação frente à realidade, atenta contra o conformismo, exigindo esforço de
revisão e atualização. Daí, tudo o que é novo, parece à primeira vista, mais difícil,
senão impossível. Isto resulta da insegurança que gera descrença na eficiência das
inovações e como conseqüência final, a perda da motivação para mudar.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 12


4.6 Percepção

4.6.1 Percepção do fenômeno de resistência à mudança

Percepção – foi definida como o processo pelo qual um indivíduo seleciona,


organiza e interpreta os estímulos com o objetivo de formar representações
significativas e coerentes da realidade (Schiffman e Kanut, 1997).
O processo de percepção também depende da quantidade e da qualidade dos estí-
mulos interiores e exteriores. Os estímulos exteriores são proporcionados pelo ambiente e
detectados pelos sentidos. Como os indivíduos estão constantemente expostos a uma
grande quantidade de estímulos provenientes do ambiente, eles acabam por desenvolver
mecanismos de defesa para não ficarem completamente desorientados. Esse mecanismo
de defesa é representado pelos estímulos anteriores, que emergem na forma de predispo-
sições, tais como expectativas, motivos e lições aprendidas, todas baseadas em experiên-
cias anteriores. A combinação desses dois tipos de estímulos, interiores e exteriores, pro-
porcionam aos indivíduos representações distintas e individuais da realidade.
Quando aplicada ao estudo da resistência à mudança organizacional, essa linha de
pensamento é bastante útil para entendermos por que, dado dois indivíduos na presença
das mesmas condições de mudança, cada um deles terá percepções bastante distintas.
Embora possam compartilhar da mesma realidade objetiva, duas pessoas nunca terão
compartilhado as mesmas experiências, desejos, necessidades e expectativas.

4.6.2 Estágios da percepção

I. Teoricamente, o primeiro estágio do processo de percepção consiste na seleção


dos estímulos. A idéia de que os indivíduos tendem a buscar as mensagens de
forma seletiva, isto é, eles buscam as mensagens que tenham conteúdo agradável
e rejeitam aquelas com conteúdo ameaçador. Pelas mesmas razões, os indivíduos
tenderiam a prestar mais atenção às informações que preenchem as suas
necessidades e desprezar ou, até mesmo bloquear, a sua percepção de informações
consideradas irrelevantes. Conforme Watson (1971), “é o processo de seleção de
estímulos que explicaria porque um indivíduo pode não se dar conta que o ‘status
quo’ percebido por ele pode ser diferente do percebido pelo grupo em relação a
ele. Zaltman (1977) afirma “e que um indivíduo pode não ser capaz de ‘ver’
problemas que deveriam ser resolvidos ou, mesmo após a identificação do
problema, pode ser capaz de não ‘enxergar as possíveis soluções’.”
“Experimentos clássicos nessa área do conhecimento realizados com o objetivo de
provocar mudanças nas atitudes dos indivíduos revelaram que estes podem não
ouvir claramente, não se lembrar ou mesmo distorcer informações quando não
concordam com seu conteúdo cognitivo” (Levine e Murphy, 2001).
II. “O segundo estágio da dinâmica da percepção corresponde à organização dos
estímulos. A crença é a de que os indivíduos organizam, regularmente, os
estímulos em categorias que são recuperadas como um todo, uma vez que, se cada
indivíduo percebesse cada estímulo como sendo único, ele não poderia se lembrar
de mais do que uma mínima fração do que geralmente percebe” (Smith e Medin,
1981). Obviamente, diferentes indivíduos costumam organizar os estímulos de

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 13


diferentes formas e esse fato é também bastante relevante para se compreender as
situações de mudanças organizacionais. Por exemplo, Zaltman e Duncan (1977),
descrevem dois casos em que os agentes da mudança e os seus clientes
concordavam sobre a natureza do problema, mas não compartilhavam a mesma
percepção sobre como o problema deveria ser resolvido.
III. “O terceiro e último estágio, a interpretação perceptual, também tem uma natureza
individual, uma vez que depende das expectativas dos indivíduos originadas de suas
experiências anteriores, do número de interpretações possíveis que eles podem
antever e dos seus interesses no momento da percepção” (Leslie, 1997).

5 METODOLOGIA

Para a investigação do Grupo de Formação “Soltando as Amarras”, foi utilizado o


método qualitativo, como forma de compreender as subjetividades que o tema resistência
à mudança traz ao contexto deste trabalho. O que caracteriza esta metodologia é o estudo
em profundidade, tendo por objetivo a formulação de hipóteses que ajudem a elucidar as
complexidades das resistências ocorridas no grupo “estudo de caso” e a “pesquisa-ação”
realizada com os membros do grupo em questão.
Foram encaminhadas para o grupo duas perguntas, sendo que o número de respos-
tas não foi limitado, obtendo-se assim várias respostas para cada pergunta, por pessoa.
Do universo de 20 membros, 16 pessoas responderam as questões, ou seja, 80%
(oitenta por cento).
Estas questões foram limitadas às vivências nesse grupo. A análise será baseada
na comparação das resistências estudadas, conceitos teóricos (revisão da literatura) com a
percepção devolvida nos questionários e dos autores deste trabalho.
As questões foram enviadas por e-mail sendo que 40% (quarenta por cento) res-
ponderam imediatamente. Outros 40% (quarenta por cento), após duas solicitações. O
restante, 20% (vinte por cento) não responderam, após terem afirmado verbalmente que
responderiam. Seria isso uma clara forma de resistência?

As respostas foram tabuladas em categorias para facilitar a análise e quantificação


dos dados e não possibilitar a identificação das pessoas envolvidas.

6 ANÁLISE QUALITATIVA

Para iniciar a análise qualitativa é necessário demonstrar o conteúdo das perguntas


realizadas e a tabulação dos resultados, conforme segue:

6.1 Perguntas enviadas por e-mail

“GRUPO, o nosso trabalho de conclusão é sobre Percepção do Fenômeno de


Resistência à Mudança no Grupo de Formação. Segundo Scott Adams “as
mudanças são boas para as pessoas que estão provocando. Elas compreendem
as novas informações que estão sendo acrescentadas ao universo. Ficam mais

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 14


inteligentes em comparação com o resto de nós. Só isso já basta para sabotar
seus esforços”. E segundo Fela Moscovici, “a ameaça contida na percepção da
mudança pode ser real e imaginária, mas os seus efeitos são bem reais e con-
cretos em manifestações fisiológicas, psicológicas e sociais variadas”.
Então gostaríamos que você respondesse a duas questões para enriquecer o nosso
trabalho:

Você percebeu, de sua parte, alguma resistência à mudança no grupo? Quais?

E do grupo em relação às suas mudanças? Quais?

6.2 Tabela de categorização e quantificação dos dados

Categorização e quantificação dos dados


Membros Ocorrências Grupo Ocorrências
1. Fuga e resistência 3 1. Insegurança e dependên- 1
cia
2. Transferência com o grupo 1 2. Rigidez nos papéis 1
3. Faltas 1 3. Papéis es tereotipados 2
4. Dependência das coordenadoras 1 4. Não validação de coorde- 4
nações
5. Falta de confiança e medo de exposi- 10 5. Não aceitação pelo grupo 10
ção da mudança individual
6. Permanência na zona de conforto em 4 6. Falta de confiança e medo 2
decorrência da pressão para confor- de exposição
midade no grupo (medo de fazer
escolhas)
7. Silêncio na busca pelo poder 1 7. Pressão para conformida- 7
de
8. Não aceitação da pressão do grupo 1 8. Não validação de opiniões 3
diferentes
9. Dificuldade em ver a si mesmo como 3 9. Ciúme e sentimento de 3
os outros vêem rejeição pelas vinculações
entre outros membros
10. Sintomas físicos de resistência 3 10. Competição velada 2
11. Boicote aos seminários 2 11. Evitar conflito com medo 3
de rejeição
12. Não aceitação de mudança de papéis 1 12. Atrasos, faltas e saídas 3
no grupo antecipadas.
13. Dificuldade em enxergar os reflexos 1 13. Desafio às coordenadoras 2
dos espelhos
14. Não abrir mão do controle e poder 1 14. Resistência ao término do 2
grupo
15. Resistência aos e -mails 1 15. Dificuldade em enxergar 2
os reflexos dos espelhos
16. Não fazer relatórios 1 16. Não abrir mão do controle 1
e poder
17. Rejeição dos feedbacks 1 17. Medo do grupo em termi- 1
nar mal
18. Não ter vontade de ir aos encontros 1 18. Luta e fuga 1
19. Desafiar o grupo 1 19. Exclusão temporária de 1
membros do grupo
20. Desqualificar o grupo e a coordena- 1
ção

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 15


6.3 Análise dos dados

Ao se falar no fenômeno de resistência à mudança, a grande maioria, 62% (ses-


senta e dois por cento) dos membros que respondeu ao questionário, percebeu que a não
aceitação pelo grupo da mudança individual era uma forma de resistência “do grupo”
(item 5 da coluna grupo); dois membros, ou seja, 12% (doze por cento) dos que respon-
deram, citaram papéis estereotipados no grupo como manifestação de resistência (item 3
da coluna grupo); um, 6% (seis por cento) mencionou a rigidez dos papéis dentro do gru-
po (item 2 da coluna grupo).
Bíon (apud Saidon, 1983) observa que “as pessoas estão sempre fazendo uma es-
timativa da atitude do grupo em relação a si mesmas e ainda que o grupo baseia-se num
vínculo a fim de que os sujeitos expressem anonimamente os impulsos e desejos que pre-
tendem satisfazer, mas dos quais não querem assumir a paternidade”.
Baseado nesta suposição de Bion pode-se dizer que o grupo muitas vezes não
aceitou a mudança de papel de vários membros em detrimento de desejos anônimos indi-
viduais, também da mudança de papel.
Observa-se ainda que 62% (sessenta e dois por cento), respondeu que percebeu
como resistência sua, a falta de confiança e medo de exposição (item 5 da coluna mem-
bros); talvez aqui estejam contidos os desejos anônimos individuais de mudança de pa-
pel, não assumidos frente ao grupo ou “sem paternidade”.
Assim fica a pergunta: como o grupo vai perceber a mudança de papel do membro
ou ainda, que este deseja mudar de papel, se ele não se expõe e ainda dificulta a mudança
de papel de outros membros?
Por outro lado, se o membro tem medo de se expor e se o grupo não lhe é conti-
nente, fica cômodo permanecer na zona de conforto, identificado por 25% (vinte e cinco
por cento) dos respondentes, como resistência sua, permanência na zona de conforto em
decorrência da pressão para conformidade no grupo (medo de fazer escolhas) (item 6 da
coluna membros); aceitando a pressão para conformidade do grupo, que foi percebida
por 44% (quarenta e quatro por cento) dos respondentes (item 7 da coluna grupo).
Conforme Mailhot (1991, p. 56),
[...] por outro lado não pode subtrair-se, nem escapar a certos condicionamen-
tos. Ser-lhe-á preciso, em certos momentos, adotar tal tipo de comportamento
ou conformar-se com tal atitude para responder às expectativas do grupo. Em
outros momentos, atitudes e comportamentos lhe serão impostos pelo grupo.
Não mudar de papel dentro deste grupo, talvez seja uma tentativa de se moldar ás
expectativas do grupo, pois, conforme Lapassade, estudando a Dialética dos grupos de
Sartre (1989), o grupo define, dirige, controla e corrige sem cessar, a práxis comum, atra-
vés do juramento que é o poder de cada um sobre todos e de todos sobre cada um.
Vinte e cinco por cento responderam que identificaram como resistência no grupo,
a não validação de coordenações (item 4 da coluna grupo); outros 19% (dezenove por
cento) responderam que no grupo não eram validadas opiniões diferentes (item 8 da co-
luna grupo); talvez esta percepção de parte dos integrantes se explique “pelo medo do
grupo de não assimilar as novas técnicas, ou medo das perdas e do desconhecido”, con-
forme Castilho (1999).
Nota-se que 19% (dezenove por cento), três, das pessoas que responderam, perce-
beram dificuldade em ver a si mesmo como os outros vêem (item 9 da coluna membros) e
12% (doze por cento) duas pessoas, perceberam dificuldade em enxergar os reflexos dos

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 16


espelhos (item 15 da coluna grupo), como forma de resistência do grupo. “É o processo
de seleção de estímulos que explicaria porque um indivíduo pode não se dar conta que o
‘status quo’ percebido por ele pode ser diferente do percebido pelo grupo em relação a
ele”, conforme Watson (1971).
Percebe-se aqui um movimento em busca da individualidade que poderia conter
um movimento de resistência, tanto de quem percebe seu espelho em outro membro, pois
o esforço em demonstrar tal percepção talvez substitua o processo reflexivo de seu pró-
prio eu, como também do sujeito, objeto do espelho em sua negação, buscando a indivi-
dualidade acionada para preservar a fantasia de sua onipotência e afastar o sentimento de
ser acusado, perseguido e interpretado.
Conclui-se, da íntegra das respostas, que: quando um membro saía do seu papel
estabelecido, o grupo fazia pressão para este voltar e quando não saía do padrão percebi-
do pelo grupo, este dizia que o membro “não veio para o grupo”.
Como exemplo pode-se citar várias vezes em que determinado membro demonstra
no grupo seus sentimentos, então o grupo que deveria apenas acolhê-lo, se põe a interpre-
tar e criticar seu comportamento anterior de silêncio ou “moita” (característica vista nele
pelo grupo), dizendo que é “esse novo jeito que o grupo quer”. Assim o sujeito que se vê
desacomodado e confrontado, coloca-se na defensiva, passando a defender seu compor-
tamento anterior como sendo “uma forma de mudança premeditada do seu jeito habitual
de ser”. “O indivíduo que se mantém em silêncio acreditando permanecer neutro desem-
penha, sem o saber, para o grupo, o papel de freio ou de opositor mudo”, conforme Muc-
chielli (1979).
Assim o grupo debatia-se entre querer a participação dos membros e ao mesmo
tempo revidar a resistência oferecida por estes, dificultando sua mudança de papéis. Po-
de-se dizer que ambivalência foi uma grande resistência causada pelo medo do grupo à
acomodação de novos papéis e desacomodação de outros.
Das dezesseis pessoas que responderam ao questionário, 3 pessoas, ou seja, 19%
(dezenove por cento) responderam que perceberam sintomas físicos de resistência (item
10 da coluna membros); três membros, ou seja, 19% (dezenove por cento) perceberam
em si manifestações de fuga e resistência (item 1 da coluna membros); uma pessoa, 6%
(seis por cento), respondeu que o grupo resiste com luta e fuga (item 18 da coluna gru-
po); mais uma, também 6% (seis por cento), disse não ter vontade de ir aos encontros,
percebido como forma de resistência sua (item 18 da coluna membros); e uma pessoa, 6%
(seis por cento) que percebeu como resistência, desafiar o grupo (item 19 da coluna
membros).
Três pessoas disseram que o grupo não valida opiniões diferentes. Isto se explica
pelo medo do novo que conduz o grupo a pressão pela uniformidade que, em conseqüên-
cia, implica na rejeição daqueles que não adotam os valores, normas e finalidades do gru-
po, ao mesmo tempo este poderia trazer elementos novos de solução de problemas que o
grupo se coloca. Daí os esforços para uni-lo ao grupo, conforme Sartre citado por Lapas-
sade (1989). Este conceito explica ainda a percepção de uma pessoa, da exclusão tempo-
rária de membros do grupo.
Ao mesmo tempo, três pessoas responderam, ou seja, 19% (dezenove por cento)
que perceberam que o grupo evita conflito com medo de rejeição (item 11 da coluna gru-
po); 19% (dezenove por cento) responderam que identificaram como resistência do grupo
atrasos, faltas e saídas antecipadas (item 12 da coluna grupo); uma pessoa, 6% (seis por
cento) colocou que percebeu as faltas como sua resistência (item 3 da coluna membros);

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 17


outras três, 19% (dezenove por cento) responderam que percebiam no grupo ciúme e sen-
timento de rejeição pelas vinculações entre outros membros (item 9 da coluna grupo).
Uma pessoa, 6% (seis por cento), citou o movimento de transferência seu para
com o grupo (item 2 da coluna membros); 12% (doze por cento), o seja, duas pessoas,
identificaram que tiveram resistência através do boicote aos seminários (item 11 da colu-
na membros); uma pessoa percebeu que não abrir mão do controle e poder foi uma for-
ma sua de resistência (item 14 da coluna membros) e uma respondeu a mesma coisa com
relação ao grupo (item 16 da coluna grupo).
Também aparece a dependência das coordenadoras, como forma de resistência
para um membro (item 4 da coluna membros); e a insegurança e dependência do grupo
percebida por um membro (item 1 da coluna grupo); assim como desafio às coordenado-
ras por parte do grupo respondido por duas pessoas (item 13 da coluna grupo); uma per-
cebeu que desqualificava o grupo e a coordenação (item 20 da coluna membros); uma
pessoa respondeu como resistência sua, não fazer os relatórios (item 16 da coluna mem-
bros).
Duas pessoas citaram a competição velada no grupo (item 10 da coluna grupo);
duas responderam que perceberam no grupo resistência ao término (item 14 da coluna
grupo); e para uma pessoa, o medo de o grupo terminar mal (item 17 da coluna grupo), o
que deixa aberta a hipótese de que nos últimos encontros talvez o grupo tenha evitado
ainda mais o confronto preparando um término de amores e afetos.
Alguns modelos de comportamento grupal reincidem. Conforme Bion (apud Sai-
don, 1983), a dependência, luta e fuga, conjugação, e o acasalamento, representam rea-
ções defensivas diante das ansiedades psicóticas reativadas pelo dilema do indivíduo den-
tro do grupo, e expressam o conflito entre os desejos do sujeito e a mentalidade do grupo.
O grupo está sempre em movimento, não é estático, portanto, ele se modifica cada
vez que se concretiza uma nova idéia ou mudança, dá início a um novo ciclo percorrendo
novamente os mesmos caminhos. Conforme Sartre (apud Lapassade, 1989), o grupo se
trabalha: ele se faz grupo e só continua a ser grupo na medida em que se faz continua-
mente. Assim o grupo cada vez que faz um movimento de mudança interno passa nova-
mente por fenômenos grupais que já havia passado antes, variando entre momentos de
prazer e desprazer, por isto seu término será um novo momento do grupo que poderá ser
bom ou ruim e que faz parte do cotidiano dos grupos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Comparando a contextualização percebida com a pesquisa realizada conclui-se


que a pesquisa confirmou algumas das hipóteses levantadas, são elas:

§ A natureza competitiva do grupo sustentado pelas respostas que indicam: silêncio


na busca pelo poder; não abrir mão do controle e poder; desafiar o grupo;
desqualificar o grupo e a coordenação; não validação de coordenações; não
aceitação pelo grupo da mudança individual; ciúme e sentimento de rejeição pelas
vinculações entre outros membros (competição pelo afeto); competição velada;
desafio às coordenadoras;

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 18


§ A construção da identidade do grupo dificultada pela ambivalência, pressão à
conformidade, manutenção de papéis e status quo, não validação de alguns
membros do grupo;
§ Não se confirmou a dificuldade de exclusão, uma vez que uma pessoa respondeu
que aconteceu exclusão temporária de membros pelo grupo e ninguém citou este
fato como dificuldade;
§ Não aceitação das diferenças, confirmado na percepção de que o grupo não valida
opiniões diferentes;
§ Resistência ao término do grupo confirmado por duas pessoas em suas respostas;
§ A hipótese de que o medo de rejeição leva as pessoas a também não rejeitarem
ficou confirmada na resposta que indica a percepção de que o grupo evita o
conflito com medo de rejeição.

Também podemos dizer que se confirma a hipótese de que a forma que este grupo
encontra para estabelecer vínculos, confiar e crescer é a afetividade, visto que embora o
grupo não tenha entrado em enfrentamentos e conflitos abertos, este possibilitou mudança
de papéis, apesar de não serem ainda largamente flexíveis.
Por exemplo, se nota pessoas antes consideradas “não fede e nem cheira” pelo
grupo, que no penúltimo encontro não tiveram mais esta classificação ou a tiveram em
menor quantidade, demonstrado pelo grupo na técnica utilizada para percepção dos
papéis atuais. Nota-se também, mais pessoas nos papéis de influência ou “bons papéis”,
embora o grupo tenha encontrado dificuldade em colocar nomes nos papéis “ruins”.
Percebe-se ainda que o grupo teve dificuldade em colocar nomes aos papéis de
forma geral, e que no processamento grupal foi colocada e justificada esta dificuldade
através da expressão de alguns, do sentimento de que não se pode classificar um sujeito
em papéis determinados, sem considerar a possibilidade que este têm de mover-se por
outros papéis conforme a necessidade do grupo, e que o sujeito não é apenas “isto” ou o
papel no qual outro indivíduo o vê ou julga que o vê.
Concluí-se que o grupo não conseguiu quebrar totalmente suas maiores
resistências e que provavelmente fechará seu último encontro sem que todos se sintam
reconhecidos em suas mudanças individuais e do papel que vive ou gostaria de viver no
grupo.
Concluí-se também que o ganho real imediato das pessoas que participam de um
grupo de formação é a sensibilidade adquirida na percepção dos fatos, estes ficam mais
aparentes e vistos de perspectivas diferentes das habituais, com novas possibilidades,
novos prismas e nuanças antes não percebidos pelo observador.
Já, o ganho posterior serão as possibilidades de mudança abertas para cada
indivíduo, uma vez que este pode perceber do seu comportamento o que é resistência e o
que é seu que gera resistência nas outras pessoas, tendo assim a chance de modificar sua
forma de interagir nos grupos em que convive, mas só haverá uma mudança real quando
esta se der no nível do sentir, ou seja, quando falar o que pensar e pensar o que sentir,
conforme Paulo Gaudêncio (1999).

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 19


REFERÊNCIAS

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ALMEIDA, Wilson Castello de. O que é psicodrama. São Paulo: Brasiliense, 1990.
BION, W. R. Experiências com grupos: os fundamentos da psicoterapia de grupo. Rio de Janeiro: Imago,
1970.
CASTILHO, Áurea. Liderando grupos: um enfoque gerencial. 3. ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1999.
. Dinâmica do trabalho de grupo. 3. ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002.
GAUDÊNCIO, Paulo. Mudar e Vencer: como as mudanças podem beneficiar pessoas e empresas. São
Paulo: Gente, 1999.
HOLANDA, Aurélio Buarque. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova.
Fronteira, 1986.
LAPASSADE, Georges. Grupos, organizações e instituições. Tradução de Henrique Augusto de Araújo
Mesquita. Prefácio de Juliette Favez-Boutonnier. 3. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989.
LESLIE, Schiffman; AZAR, Kanut. Comportamento do consumidor. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1997.
LEVINE; MURPHY. Resistência à mudança – uma revisão crítica. Revista de Adm. de Empresas, São
Paulo, Fundação Getúlio Vargas, v. 41, n. 2, abr.-jun. 2001, p. 31-45. [Jornal Abn. Sociology & Psich, v.
38, p. 507-517, 1943].
LEWIN, Kurt (1948). Problemas de dinâmica de grupo. Organizado por Gertrude Weiss Lewin. Introdução
de Gordon W. Allport. Tradução de Miriam Moreira Leite. 3. ed. São Paulo: Cultrix .
MAILHIOT, Gérald Bernard. Dinâmica e gênese dos grupos, atualidade das descobertas de Kurt Lewin. 7.
ed. São Paulo: Duas Cidades, 1991.
MATOS, Francisco Gomes de. Administração para o crescimento empresarial. 3. ed. Rio de Janeiro: s.n.,
1989.
MOSCOVICI, Fela. Renascença organizacional. 10. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003.
MOTTA, Paulo Roberto. Transformação organizacional: o tema e a prática de inovar. Rio de Janeiro:
Qualitymark, 1997.
MUCCHIELLI, Roger. A dinâmica de grupo. Tradução de Renato Couto Bacelar Nunes. Rio de Janeiro:
Livros Técnicos e Científicos, 1979.
SAIDON, Osvaldo et al. Práticas grupais. Rio de Janeiro: Campus, 1983.
SCHIFFMAN, Leslie; KANUT, Lazar. Comportamento do consumidor. 6.ed. Rio de Janeiro: LTC, 1997.
SMITH, E. W.; MEDIN, D. L. Categories and concepts. Cambridge, Ma: Harward University Press, 1981.
WATSON, G. Resistance to change. American Behavioral Scientist, Thousand Oaks, v. 14 p. 745, May
1971.
ZALTMAN, G. E.; DUNCAN, R. Strategies for planned change. New York: Willey & Sons, 1977.
ZIMERMANN, David E. Fundamentos básicos das grupoterapias. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas,
2000.

SBDG – Caderno 82 v Percepção do fenâmeno de resistência à mudança... 20


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Porto Alegre – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Alessandra Martini Moesch

Humor nos grupos

FLÁVIA MARIA LACERDA FELIPPE


MARIA REGINA BURTET VIDAL
SUZANA REGINA KUNZ

“Ver naufragar as naturezas trágicas e ainda poder rir, apesar da mais profunda
compreensão da emoção e da compaixão, isto é divino”
(Nietzsche)

“ O humor nos permite ver, através do que parece racional, o irracional. Reforça nosso
instinto de conservação e preserva nossa saúde de espírito. Graças ao humor,
as vicissitudes da existência tornam-se mais suportáveis; desenvolve nosso senso das
proporções e nos revela que o absurdo ronda sempre em torno da exagerada gravidade”
(Charles Chaplin)

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 1


Dedicatória

Esse trabalho, mais do que o cumprimento de uma norma para a etapa de forma-
ção em coordenação de grupo, é o resultado de um processo de amadurecimento e
crescimento, pessoal e profissional, que dedicamos aos nossos queridos amigos e
companheiros de jornada do grupo “Soltando as Amarras”.

Alessandra Martini Moesch


André Brufatto Schoenardie
Cristine Marques de Souza
Daniela Fernanda Mariotti
Eduardo Luis Warttmann
Fabiola Roberta Fitarelli Petri
Fernanda Bitencourt dos Santos
Fernanda Ferrão Guimarães
Flávia Maria Lacerda Felippe
Jorge Luiz Moraes Doval
José Ceccon de Barros
Lídia Tassini Silva Mancia
Maria Carolina Tarragô Chisté
Maria da Graça Jacques Costi
Maria Regina Burtet Vidal
Marilane Gomes dos Santos
Reni Lucia Finger
Rosemari Souza Stieven
Simone Brufatto
Suzana Regina Kunz
Tatiana das Neves Oliva
Valter Maxson Kayser

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 2


Resumo – O tema desse estudo é o humor no grupo, entendido como uma modalidade de
percepção que capacita o sujeito a rir não apenas do outro, mas também de si mesmo,
constituindo-se numa tentativa de tornar a vida mais leve. Nossa experiência em um gru-
po de formação para coordenadores de grupo possibilitou um olhar atento ao processo
grupal, em especial à questão do humor, considerando seus aspectos influenciadores, fa-
vorecendo o crescimento do grupo, bem como seus aspectos ligados ao processo de “ali-
viar” as tensões, freqüentemente gerado pelos conflitos inerentes ao processo grupal. O
objetivo do trabalho é iniciar uma pesquisa para possível debate sobre o tema. Para isso
realizamos uma revisão literária que sinalizou tratar-se de um assunto pouco descrito na
literatura, em especial na literatura específica sobre grupos. Para verificar a relevância de
nossas hipóteses e ratificar os momentos que consideramos importantes em seus aspectos
humorísticos, utilizamos relatos anotados durante observação em nossos encontros de
formação. Realizamos, ainda, uma investigação com os membros do grupo, além de tro-
cas de correspondências virtuais. Esse material foi analisado, servindo de exemplo práti-
co para fundamentar o que ocorreu com o grupo “Soltando as Amarras” do ponto de vista
teórico e significativo, no sentido de ousarmos interpretar o sentido que cada evento teve
como marcante na memória do grupo.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 3


SUMÁRIO

Introdução ..........................................................................................................................5

Justificativa ........................................................................................................................6

Tema e objetivos ................................................................................................................7

Humor – o tema em questão ............................................................................................7

Cenas de humor em um grupo de formação .................................................................11

Soltando as amarras com humor ...................................................................................20

Concluímos que há muito a pesquisar e concluir..........................................................22

Referências........................................................................................................................23

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 4


INTRODUÇÃO

A proposta deste trabalho é entender e analisar o papel do humor no funcionamen-


to dos grupos, a partir da experiência vivida com o grupo Porto Alegre 110, autodenomi-
nado “Soltando as Amarras” que, desde os primeiros encontros, serviu-se deste recurso
em seu processo de formação de coordenadores de grupo pela Sociedade Brasileira de
Dinâmica dos Grupos – SBDG, no período de setembro de 2004 a agosto de 2006.
Por ser o humor uma qualidade muito rara nos seres humanos nos chamou atenção
o fato de se apresentar como uma característica tão marcante em nossa experiência gru-
pal.
Nossa expectativa com este trabalho é a de compreender quais os mecanismos in-
conscientes que estão por trás do humor quando ele se faz presente, nos mais diversos
momentos dos grupos, em especial da nossa vivência grupal.
Não localizamos, na revisão bibliográfica, estudos que fizessem uma relação entre
o humor e o desenvolvimento de grupos. Porém, entendemos ser possível traçar um para-
lelo entre os conceitos e interpretações dos diferentes autores consultados e o funciona-
mento de grupos utilizando, para tanto, a experiência do grupo de formação “Soltando as
Amarras”.
Por outro lado, vimos que também na área médica várias pesquisas têm-se reali-
zado em torno do tema. Segundo as pesquisas de Hassed (2001) o riso tem um importante
papel na redução dos hormônios envolvidos na fisiologia do estresse, melhorando a in-
tensidade e realçando a criatividade das respostas, reduzindo a dor e, sobretudo, melho-
rando a imunidade e reduzindo a pressão do sangue. O riso tem como função orgânica o
alívio de tensão, relaxa os músculos, solta a respiração, desobstrui os canais lacrimais,
umedece os olhos e anestesia momentaneamente o coração. Segundo esta visão, as pes-
soas que sabem se divertir e rir são, geralmente, mais saudáveis e mais capazes de sair,
com facilidade, de situações de estresse. Não é a toa que a organização “Doutores da
Alegria” faz tanto sucesso no mundo todo
A partir daí, pensamos na hipótese de que o uso freqüente do humor poderia ser
um fator que contribuiu para a saúde, equilíbrio e produtividade do grupo “Soltando as
Amarras”.
Por outro lado, no intuito de focar nossa pesquisa, outras hipóteses foram levanta-
das, todas, entretanto, convergentes e reforçadoras desta primeira hipótese:

1) Seria o humor um mecanismo de defesa grupal, a fim de ajudar a tolerar as difi-


culdades psíquicas e emocionais em momentos de tensão?
2) Seria o humor um mecanismo de sedução por parte daqueles que o articulam, com
o objetivo de buscar a atenção da platéia?
3) Seria o humor uma forma de quebrar as barreiras individuais que inibem o verda-
deiro encontro afetivo entre os membros do grupo?
4) Ou, pelo contrário, estaria o humor a serviço da defesa psíquica bloqueando a
entrega afetiva, especialmente na fase final da vida grupal?

Para responder estas questões, selecionamos algumas cenas do cotidiano do grupo


em questão, cuja tônica do humor tenha sido marcante. Estas cenas serão analisadas à luz
de autores que debatem o Humor como importante processo no auxílio às mudanças, re-
lacionadas, no nosso caso, à evolução dos grupos, em especial nos grupos de formação.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 5


O ponto de partida para o desenvolvimento desse trabalho emergiu do método de
Estudo de Caso, tanto do observado durante as vivências, como também na solicitação
para que os colegas de grupo sinalizassem as cenas de humor que marcaram o grupo.
A busca pela compreensão dos processos definiu nosso método, a partir do levan-
tamento de vivências, trocas de e-mail, enquete com os integrantes do grupo e da revisão
de literatura sobre o tema, se montou um arsenal de elementos para entender e analisar o
grupo de formação.
Inicialmente, realizamos uma revisão da literatura, verificando sua escassez, prin-
cipalmente relacionada com as questões vinculadas ao humor no grupo. A seguir traça-
mos paralelos entre os conceitos pesquisados, na sua maioria relacionados com o proces-
so terapêutico individual e o processo de desenvolvimento do grupo “Soltando as Amar-
ras”.
Em seguida, realizamos um levantamento e selecionamos algumas situações que
haviam mobilizado o grupo por serem engraçadas, divertidas e até desconcertantes. Defi-
nimos que essas situações seriam denominadas de cenas de humor e partimos para sua
análise.
Assim, iniciamos realizando uma revisão teórica iluminada por autores que se de-
bruçaram no estudo do humor, do ponto de vista cultural e, em especial, baseados na teo-
ria psicanalítica.
A seguir identificamos cenas cotidianas do grupo “Soltando as Amarras” que,
acreditamos, ilustram os conteúdos teóricos e justificam a escolha do tema.
Por fim, apresentamos a análise dos resultados, identificando os significados e en-
tendimentos da importância do humor no grupo.

JUSTIFICATIVA

Nossa vivência de laboratório em dinâmica dos grupos, propiciou momentos de


intensa descontração e diversão em paralelo ao processo de formação. O grupo, inicial-
mente formado por 22 pessoas, terminou sua trajetória com 20 pessoas, já que 2 retira-
ram-se durante o primeiro módulo. Assim, os 5 homens e 15 mulheres do Soltando as
Amarras foram marcados pela presença do humor que, segundo Freud (Slavutzky, 2005,
p. 7), “é um dom precioso e raro”.
Se o humor é um dom precioso e raro é de chamar atenção o fato deste grupo
apresentar tal característica de forma marcante. É natural que tenha surgido, de nossa
parte, uma curiosidade no sentido de compreender melhor o seu significado, já que pouco
se estudou teoricamente a respeito, durante o processo de formação.
Para nossa surpresa, também a bibliografia é rara, o que nos pareceu ainda mais
animador, já que o tema passou a ocupar em nossos corações uma relevância maior, pois
estávamos comprometidas em relacionar o que há de escrito sobre humor com o processo
grupal.
Imbuídas do espírito do entusiasmo inovador, demos início ao processo de gesta-
ção (porque engravidamos deste trabalho). Nasce agora uma proposta, fruto de nossa ne-
cessidade de analisar e fundamentar teoricamente a compreensão de um tema que, certa-
mente, deve estar presente com freqüência nos grupos em geral e, em especial, em nossa
intrigante experiência.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 6


Na verdade, o tema foi emergindo à medida que pudemos perceber a relevância e
pertinência do humor a serviço do avanço e proximidade, bem como no entrave do pro-
cesso de crescimento interpessoal no grupo.
Finalmente, poderíamos afirmar que o humor marcou o processo grupal, desde
seu primeiro encontro e, com todas essas reflexões, tomamos o desafio de estudar esse
tema, ainda pouco descrito na literatura, em especial nos grupos de formação. Esse desa-
fio passou a ser a compreensão e análise do humor no processo grupal, tomando como
ponto de referência nosso grupo de formação.

TEMA

Papel do humor no desenvolvimento dos grupos.

OBJETIVOS

Geral:
Entender e analisar a importância e o funcionamento dos grupos a partir da cate-
goria Humor.

Específicos:
Identificar os momentos de humor no grupo de formação analisando sua relevân-
cia;
Fundamentar teoricamente o processo de grupo e seu cruzamento com o humor.

HUMOR – O TEMA EM QUESTÃO

A Bíblia e a cultura grega formam, juntas, os pilares da cultura ocidental. Em am-


bas predomina o sofrimento do ser humano, o que fica demonstrado desde a expulsão do
Paraíso e o grande castigo divino que foi o dilúvio.
Durante a história da humanidade, as tragédias sempre estiveram em lugar de
maior destaque que as comédias, possivelmente, pelo efeito de catarse que proporcionam,
tão necessário para aliviar nossas angústias.
O caminho do humor permite ao homem aliviar-se do mal estar, intrínseco à hu-
manidade, relacionado com a própria finitude, criando um estado de graça que alivia as
desgraças. Pois, se por um lado, sabemos que não podemos tudo, que somos frágeis e
impotentes para muitas coisas, por outro, não permitimos que os medos, inclusive o da
morte, possam nos paralisar.
Pode-se dizer que o humor é a tentativa de tornar a vida mais leve. Ele funciona
como uma espécie de ingrediente que empresta à dureza do real o necessário e surpreen-
dente toque de descontração e, nesta medida, contamina positivamente as pessoas.
O humor ajuda a revelar o que somos e como gostaríamos de ser. Introduz a in-
ventividade, estimula a disponibilidade interna para perceber algo novo, desconhecido.
Através da surpresa e da perplexidade, o humor pode estimular a humildade, a compaixão
por si e pelo outro. Ajuda a não superestimar uma má experiência. Com o humor, o que

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 7


se experimenta não é uma realidade mais agradável, mas sim a condição humana que
implica experimentar compaixão.
O humor convida a transformar o absoluto em relativo, mostra que não há uma
causa e uma verdade, convida a perceber as contradições.
Foi considerado por Freud como um dom precioso e raro. É mais do que um esta-
do de espírito, é uma visão de mundo, intimamente ligada à irreverência que exige uma
visão especial da vida, um jeito peculiar de enxergar as coisas.
O humor como visão de mundo “permite um olhar sobre a vida e a morte, o su-
cesso e o fracasso meio alegre e meio triste, integrando as máscaras, construindo assim
um mundo mais leve para si e os demais” (Freud, 1977, p. 227).
Ele é próprio de alguns, cujo olhar aguçado permite perceber sob um outro prisma
os acontecimentos à volta e assinalar não o que está evidente, mas o detalhe que, de tanto
se ver, passa despercebido. Isso exige perspicácia e atenção para mostrar aquele ângulo
diferente de uma situação, aquele pormenor inusitado que ninguém havia notado.
O chiste, o humor e o riso se inscrevem no conjunto de instrumentos que o sujeito
lança mão para lidar com a tragicidade, inerente à condição humana, para lidar com mal
estar da civilização.
A intenção do humor é sempre reduzir seriedade e dramaticidade imprimindo lu-
dicidade e postura crítica. Os que o possuem não cansam de voltar-se para si mesmos e
de rir da própria desgraça, pois o humor “é a capacidade de criar uma ótica simbólica que
faz o sujeito rir de si ou de outro, gerando prazer onde poderia produzir-se dor.” (Sla-
vutzky, 2005, p. 206).
Conforme nos informa Slavutzky (2005, p. 206), Bremmer e Roodemburg no li-
vro Uma História Cultural do Humor o definem como “qualquer mensagem expressa por
atos, palavras, escritos, imagens, músicas, cuja intenção é provocar riso ou um sorriso”.
Esta definição de humor inclui a piada, a comédia e os jogos infantis que produzem riso
nos adultos.
Freud produziu dois importantes trabalhos sobre esse tema: “Os chistes e sua rela-
ção com o inconsciente” (1905) e “O futuro de uma ilusão, o mal-estar da civilização e
outros trabalhos” (1927), com o capítulo “O Humor”.
Freud define o humor como rebelde e opositor à realidade, um triunfo do princí-
pio do prazer, capaz de se afirmar, apesar das difíceis circunstâncias reais. É uma moda-
lidade de percepção ativa que capacita o sujeito a rir não apenas do outro, mas também e,
sobretudo, de si mesmo, gerando potência e alegria onde se esperava apenas dor.
A essência do humor consiste em economizar os afetos que uma situação exigiria,
logo, é um alívio. Mas Freud adverte que nem todos os homens são capazes de uma atitu-
de humorística, um dom precioso, uma forma de gozar.
O humor tem a capacidade de transformar o narcisismo para um nível superior,
atingindo um grau de sabedoria. Funciona como disfarce, como válvula de escape para a
angústia, pois mostra a realidade sem o seu peso cotidiano, nos faz mais leve.
Pode-se ainda defini-lo “como habilidade de se aceitar que toda verdade é parcial,
que o ser humano é insuficiente e que é onde a vida aparenta imperfeição que vale entoar
uma boa gargalhada” (Slavutzky, 2005, p. 8).
Porém, fazer humor também pode ser uma arte, de acordo com a contribuição de
Maria Lídia Dias de Castro no livro “O humor abre corações e bolsos” (Fedrizi, 2003),
pois envolve criatividade, destreza com as palavras. O resultado são articulações singula-
res, com uma gama de efeitos de sentido. Na dimensão de linguagem, utilizada através de

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 8


palavras e gestos pelo grupo, o humor centra suas raízes no princípio do jogo. Um jogo
que opera em duas dimensões: a intelectual e a emocional.
Em sua dimensão intelectual, o humor implica em modificações, quebras, destrui-
ção das evidências sociais, sempre em acordo com as “regras do grupo”, se comportando
mentalmente de modo normal e até lógico.
Ele desnuda a dependência do homem às contingências sociais, políticas, religio-
sas, comportamentais, morais e psicológicas vigentes. Aponta o choque entre dois códi-
gos de regras e de contextos, mostrando que a lógica normal não coexiste com o seu re-
verso. É como se o mundo fosse visto de cabeça para baixo.
Ainda na dimensão intelectual, a comicidade, segundo Bérgson (in Slavutsky,
2005, p. 69),
dirige-se à inteligência pura. É preciso produzir, intelectualmente, uma certa
distância afetiva de uma situação, para poder rir dela. O riso é incompatível
com a emoção; é uma forma de crueldade diante de situações que, vistas por
um ângulo afetivo, despertariam piedade. O riso é impiedoso.
O riso quer se trate de um ligeiro sorriso ou de uma gargalhada homérica, é des-
pertado – exceto no caso das cócegas – por um estimulo mental. É um reflexo que, dife-
rentemente dos demais, não se destina à sobrevivência como fica claro se pensarmos na
utilidade de dilatar as pupilas no escuro, ou no gesto automático de tirar a mão se algo a
ferir.
Já, em sua dimensão emocional, o humor é responsável pelo apelo, relacionado à
idéia de liberação. O humor exime o outro do sentimento de opressão e funciona como
alívio de tensões. Diante das pressões sociais e pessoais, ele funciona como uma espécie
de álibi, provocando emoções dinâmicas e gozo. Corresponde a um direcionamento posi-
tivo da energia, a uma demanda não despendida, a uma energia não gasta que parece ser o
segredo do efeito do prazer.
O movimento do humor consiste em descer ao fundo das coisas para revelá-las de
maneira não-convencional. Ele acentua, exagera, mas não inventa ou cria a partir do na-
da. Mostra a verdade de um outro ponto de vista.
A contribuição de Freud é fundamental para o estudo deste tema, pois, coloca fo-
co no humor como um fenômeno psíquico. Durante os primeiros anos do século XX,
Freud se dedicou a investigar a lógica do inconsciente, mostrando que ela está presente
não apenas nos sintomas e nos sonhos, mas ainda na vida normal – nos atos falhos, nas
piadas, nas práticas e crenças religiosas, na criação artística e no cotidiano.
Freud entende que o inconsciente diz alguma coisa para quem consiga escutar,
como na piada – nos sonhos, atos falhos e sintomas. O chiste e o inconsciente comparti-
lham, pois, uma estrutura comum. O acesso ao inconsciente se efetiva através da lingua-
gem e Freud percebe assim que a abertura da linguagem para o equívoco, para o duplo
sentido e para a alusão sutil é um dos meios pelos quais as fantasias inconscientes podem
se manifestar. O prazer, diz Freud, é uma sensação que nasce e que morre no interior da
psique, e consiste na percepção interna de que uma tensão foi eliminada.
Muitos afetos dolorosos podem ser substituídos pelo humor na pessoa que produz
a frase humorística. Dentre eles destacamos raiva, dor, medo, compaixão. Observa-se
nessa dinâmica um movimento para evitar o desprazer, convertendo-o em prazer. Freud
indica que, nesse contexto, há exaltação do ego, como se este se dissesse: “sou bom de-
mais ou grande demais, para me sentir atingido pelo que está me acontecendo” (Freud,
1977).

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 9


Freud em Os Chistes e sua Relação com o Inconsciente analisa o humor sob o
ponto de vista econômico, procurando descobrir a fonte do prazer que se obtém dele. Na
obra, demonstra que a produção do prazer humorístico surge de uma economia de gasto
em relação ao sentimento.
Um chiste é algo cômico de um ponto de vista inteiramente subjetivo, é algo que
nós produzimos, enquanto sujeito e não como objeto. Um chiste é um juízo que produz
contraste cômico. Em sua tradução seria um Joke, uma brincadeira. Chamamos de chiste
qualquer evocação consciente e bem sucedida do que seja cômico (Freud, 1977, p. 22).
Um chiste é um juízo lúdico, fazer chiste é jogar com as idéias e pode ser elabora-
do de diferentes modos. Ele é uma conexão ou ligação arbitrária, através de uma associa-
ção verbal, de duas idéias, que de algum modo contrastam entre si.
A brevidade é o corpo e a alma do chiste, sua própria essência. Mas o que aconte-
ce ao pensamento de modo a torná-lo um chiste que nos faz rir entusiasticamente? Ocorre
a abreviação, onde não é necessário dizer todo o pensamento, pois ele condensa as pala-
vras e nos leva ao pensamento completo. Ex: Como é que você anda? – perguntou um
cego a um coxo – Como você vê. Respondeu o coxo ao cego (Kant em Freud, 1977, p.
25-26).
Existem diferentes formas de chistes que convergem a diferentes fontes de prazer.
O chiste pode condensar uma idéia complexa, ter múltiplos sentidos, duplo sentido, omi-
tir fatos, pode ser uma alusão, não dizer toda a intenção, mas dar a entender. Também
existem diferentes técnicas de aplicação do chiste dependendo de seu propósito. Os chis-
tes de humor irreverente proporcionam prazer pela suspensão momentânea do recalca-
mento que nos impedia de ver o óbvio, ou de criticar uma verdade socialmente estabele-
cida. “Este é o segredo do humor obsceno e também, como lembra Kupermann, das pia-
das de fundo cético ou cínico” (2003, p. 73).
Os gracejos visam proporcionar prazer e se contentam em fazer com que aquilo
que dizem não pareça sem sentido ou completamente esvaziado de substância. Assim,
“Quando um gracejo possui substância e valor, torna-se um chiste” (Freud, 1977, p. 154).
Através do humor nos esforçamos para atingir a euforia, um estado de ânimo co-
mum de nossa infância, quando costumávamos operar nosso trabalho psíquico com pe-
quena despesa de energia. Nessa época ignorávamos o cômico, éramos incapazes de chis-
tes e não necessitávamos do humor para sentir-nos felizes em nossas vidas.
Uma das teses centrais do livro Os Chistes e sua relação com o Inconsciente é a
distinção que Freud faz do Witz daquilo que é cômico pois, para ele, o que faz de um
Witz um Witz não é o seu caráter cômico. Witz , vocábulo alemão, é de difícil tradução
pois se refere simultaneamente ao sujeito, ao objeto e à natureza da frase pela qual o su-
jeito enuncia algo sobre o objeto. Um Witz é um processo psíquico espirituoso, jocoso,
bem humorado, certeiro. Devido a isso o melhor é traduzi-lo por frase de espírito. “[...]
Witz é a permanência no adulto de certos modos infantis de obter prazer” (1977, p. 145).
Por definição, se é humor, faz bem. Mas é possível diferenciar o humor da ironia,
do deboche e também do riso cínico. Na ironia e no deboche rimos do outro por acreditar
que somos mais sábios e superiores. No cinismo, o riso é amargo, melancólico, porque é
o riso de quem, decepcionado, perdeu o gosto pela vida. Essas formas humorísticas fazem
mal, porque servem à ignorância.
Por outro lado, muitas vezes as piadas e o humor fora de hora, ou o uso de alguém
para se fazer humor é uma forma de se sobressair e chamar a atenção, inconscientemente,
sobre si mesmo.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 10


Uma pessoa nos parece cômica, em comparação com nós mesmos, se gasta ener-
gia demais em suas funções corporais e energia de menos em suas funções mentais. Não
se pode negar que em ambos os casos nosso riso exprime uma gratificante sensação de
superioridade com relação à pessoa (que achamos cômica), se a situação se inverte, a
despesa física é considerada menor e a mental maior, não rimos mais e somos tomados de
assombro e admiração.
É possível nos fazermos de tolos ou desajeitados para divertir as pessoas. Neste
caso, estaremos produzindo o efeito cômico sem nos tornarmos ridículos, assim o senti-
mento de superioridade não surge na outra pessoa, pois ela sabe que estamos fingindo.
Podemos também tornar a outra pessoa cômica, colocando-a nessa situação de embara-
çamento. A essa intenção surge a caricatura, a mímica, etc., já que existe um método para
tornas as coisas cômicas.
Com base na revisão bibliográfica aqui realizada, verificamos que o humor está
muito mais presente no cotidiano do que até então observávamos e que ele vigora espe-
cialmente na comunicação interpessoal, porque é no coletivo, na platéia, no conjunto de
indivíduos que está o seu maior poder de catarse e transformação de emoções e sentimen-
tos. Assim, iniciamos a analisá-lo especificamente em relação a sua função no desenvol-
vimento do processo grupal do “Soltando as Amarras”.

CENAS DE UM GRUPO EM FORMAÇÃO

Apresentamos a seguir flashes e cenas de um grupo de formação, selecionadas a


partir dessa vivência e seguidas de reflexões e análises realizadas a partir dos aspectos
teóricos investigados. Todas estas cenas foram registradas em nossa observação cotidiana
no grupo “Soltando as Amarras”, bem como capturadas nas conversações virtuais, que se
alongavam após os encontros. Também descrevemos situações, selecionadas e enviadas
por membros do grupo, convidados a relembrar momentos de humor durante a trajetória
da formação em grupo.

Humor a serviço da descarga de ansiedade

No primeiro encontro do grupo de formação, foi aplicada a técnica Tavistok, a an-


siedade do desconhecido e da falta de instrução pela coordenação deu lugar à risada
quando um dos membros apelidou as coordenadoras de “múmias”. O grupo estava parali-
sado, mas rindo muito (nervoso x ansiedade x deboche x desejo).
A ansiedade do grupo era tal, em função de sua impressão de total falta de dire-
cionamento, que um dos membros expulsou uma das “múmias” da sala, arrastando sua
cadeira para fora. Apesar de o comportamento ter sido reforçado pelo grupo, naquele
momento as pessoas ficaram confusas e criticaram o colega que tinha tido a coragem de
tal façanha. O grupo misturava sentimentos de medo, ansiedade, raiva pelo abandono e
desejo de ser acolhido. Estava, enfim, estreando seu convívio, em pleno início da fase de
aceitação, ávido pela maternal acolhida das coordenadoras, extremamente dependente.
Ao mesmo tempo, todos riam nervosos pela situação criada. O que fazer com uma das
“múmias” do lado de fora da sala?

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 11


Talvez este tenha sido o momento de maior sofrimento grupal e, antagonicamente,
de maior catarse através do riso. A situação mostra claramente que “[...] a essência do
humor é poupar os afetos a que a situação naturalmente daria origem e afastar com uma
pilhéria a possibilidade de tais expressões de emoção” (Freud, 1977, p. 190). O grupo,
neste contexto, afasta parte de sua dor através da comicidade.
Para Freud o humor significa não apenas o triunfo do ego, mas também o do prin-
cípio do prazer, que pode aqui se afirmar contra a crueldade das circunstâncias reais, que
no caso estavam trazendo dor psíquica ao grupo. O humor faz parte da extensa série de
métodos que a mente humana construiu a fim de fugir à compulsão de sofrer.
O riso, neste momento em especial do “Soltando as Amarras”, proporciona um re-
laxamento de tensão, uma liberação de uma restrição. Já o riso originário do chiste que se
traduz em apelidar as coordenadoras de “múmias” é uma indicação de prazer com proce-
dência econômica. Ou seja, uma forma de descarregar a energia psíquica utilizada no
recalque da ansiedade. Nessa visão, o humor pode ser entendido como “uma colônia do
princípio do prazer no território do princípio da realidade” e “transformar um afeto dolo-
roso em prazenteiro é uma de suas marcas registradas” (Slavutzsky, 2005, p. 218).
Ainda, segundo a teoria freudiana, a piada pode ser um meio para manifestar pro-
pósitos fundamentais da vida psíquica: exibição narcísica, sexual, agressão contra pes-
soas, instituições ou crenças que exigem respeito, ou contra as exigências da razão. Para
Freud, uma característica importante de toda a piada é a “economia de meios, a capacida-
de de veicular o implícito, o que nesses casos se dá por meio do duplo sentido de deter-
minadas palavras” (Slavutzky, 2005, p. 145).
Ora, a palavra “múmia” traz consigo diversas conotações extremamente agressi-
vas às coordenadoras que “nada faziam”. As múmias são mortas, desvitalizadas, não en-
xergam o que está acontecendo, são frias, insensíveis e, mais do que isto, pertencem à
cultura egípcia, muito distante da nossa, não compreendem a nossa linguagem. Esta
agressão sugere ser, além de uma tentativa de suavizar a tensão, a esperança velada de
revitalizar as “múmias”, trazê-las de volta ao grupo, mesmo que seja através da instigante
agressividade cômica.
Identificamos nessa situação a dimensão intelectual mencionada, onde o humor
está respondendo à quebra de regras. Em especial no primeiro encontro, onde as pessoas
não se conheciam e questionavam a condução do trabalho pelas coordenadoras. A dimen-
são intelectual permitiu que o grupo criasse, inteligentemente, uma cena bem humorada
permitindo risos e descontração, em um clima pesado e ansiogênico.
Como visto anteriormente, o humor implica em modificações, quebras, destruição
das evidências sociais, suspensão de uma ou de muitas delas, mas sempre se comportan-
do mentalmente de modo normal e até lógico, isto é, de acordo com as “regras do grupo”,
que no caso do “Soltando as Amarras” começaram a ser discutidas desde a retirada de
uma das “múmias” da sala.

Humor como ingrediente para amenizar a tragédia

Vários foram os momentos que a tragédia diária era trazida pelos membros do
grupo e, em inúmeras ocasiões, foi utilizado o humor para contrabalançar e aliviar as for-
tes emoções que são “contagiosas” e passam em cadeia, de membro a membro, pelo pro-
cesso de identificação.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 12


Uma dessas situações foi durante um aprendizado/experiência em co-
coordenação. Um das coordenadoras, durante o processo, pergunta a um membro do gru-
po se está precisando de “colinho”. O membro diz que sim. Ela levanta, pega o membro
do grupo pela mão com insistência, senta e o coloca em seu colo.
Um outro membro do grupo convida então a pessoa para sentar-se em seu colo,
para permitir que “a coordenação coordene”. Todo grupo ficou extremamente constran-
gido com a situação, mas não quis questionar, naquele momento, a atuação da coordena-
dora. Criou-se uma tensão intensa.
Depois dos feedbacks do grupo e da coordenação e do dar-se conta das coordena-
doras, o grupo comentou o fato e as gargalhadas foram intensas, inclusive por parte des-
tas, liberando, verdadeiramente, a tensão gerada pela situação e cena a que todos viven-
ciaram.
Em outro momento, um membro do grupo conta uma situação de conflito familiar
bastante difícil, em que conseguiu se posicionar, revelando maior segurança em si mes-
ma, quando briga com sua cunhada e irmão, defende os sobrinhos e pais. Relata chorando
e ao mesmo tempo rindo de si. Seu relato é divertido e engraçado. Quando esta pessoa,
em uma outra situação, se empoderou com o vizinho, revela-se corajosa ao grupo, fazen-
do sua história dolorida, tornar-se divertida. Aqui o humor é utilizado para facilitar o rela-
to de uma situação de importância fundamental para este membro do grupo relacionada
ao aumento da auto-estima a ponto de ser capaz de, verdadeiramente, defender seu ponto
de vista. É comum, depois de vivenciarmos uma situação difícil, rirmos de nós mesmos.
Este membro fez isto, com provável mistura de outros sentimentos como alegria da auto-
superação e a emoção, expressa pelas lágrimas, de ter conseguido vencer uma barreira
interna. O grupo riu solidário porque vinha acompanhando sua história de luta e auto-
superação, possivelmente demonstrando uma espécie de torcida organizada pelo cresci-
mento emocional de seu membro.
Birman (in Slavutzky, 2005, p. 85-86) nos afirma:
nossas gargalhadas podem até mesmo nos levar freqüentemente às lágrimas,
tal o que há de hilário em certas situações da vida diária. Por isso mesmo, os
piadistas e humoristas são tão valorizados por todos nós, pois conseguem não
apenas desarmar os espíritos numa situação considerada excessivamente gra-
ve, como também nos revelar, num breve comentário, a dimensão cômica da-
quilo que se quer apresentar como sério. Os canais dia lógicos podem então se
abrir, pelo desarme geral que provocam e pela revelação do que há de ridículo
numa dada circunstância.
Se, segundo Freud, o humor se opõe à realidade, fazendo triunfar o princípio de
prazer e se afirmando, apesar das difíceis circunstâncias reais, podemos entender que, em
ambas as cenas, o momento de humor ocorre após a tragédia e funciona como um alívio
psíquico. No primeiro caso, trata-se de um alívio grupal, ocorrido pela tensão gerada pela
coordenação que estava dificultando o processo grupal. O que ocorre é que, em grupo,
tanto a energia da tensão quanto a do alívio é multiplicada.
No segundo caso, ocorre o mesmo com o membro do grupo que contagia a todos
com o seu relato, enriquecido pela sua expressão corporal que chegava às lágrimas.
Conforme nos diz Cymrot (2003, p. 165), para Freud,
[...] a risada descarrega uma tensão interna reprimida e, essa idéia faz sentido
como o recurso da metáfora hidráulica – o acúmulo de pressão encontra uma
saída no ponto de menor resistência, tal como uma válvula de segurança que

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 13


se abre quando se acumula uma pressão demasiada. A risada proporcionaria
uma válvula de segurança semelhante para permitir o escapamento de energia
psíquica.

O humor como “arma” masculina

O número de cinco homens no grupo “Soltando as Amarras”, representando quase


um terço dos componentes que o constituem, possivelmente influenciou sobremaneira a
manifestação do humor como uma característica do grupo, pois, como nos diz Kuper-
mann (in Slavutzky, 2005), o número de humoristas homens é significativamente maior
que o de mulheres.
Efetivamente é possível constatar que os homens do grupo estão na vanguarda
quanto se trata de brincar e fazer piadas para enfrentar momentos de tensão, angústia ou
sofrimento. Salvo exceções, eles sugerem ter mais dificuldades em lidar com o “peso”
que algumas situações geram sobre o clima do grupo.
O grupo conta em especial com um colega reconhecido como gerador de senti-
mentos positivos em todos os membros do grupo. É altamente respeitado e detém uma
importante influência. Curiosamente é um dos membros mais espirituosos, no que diz
respeito à capacidade de trazer o hilário para o cotidiano.
O fato sugere que o afeto dirigido pelo grupo a este membro pode ter relação com
a sua facilidade e disponibilidade em proporcionar e presentear o grupo com momentos
catárticos, decorrentes da tentativa de ruptura com o pensamento razoável ou saber lógi-
co, enfeitiçando e emprestando outros sentidos à vida. Estes momentos compensam o
peso da vida, a rigidez de percepção e pensamento, criando um espaço para a esperança e
para a compaixão entre os membros, incentivando a benevolência e o otimismo.
Segundo Maria Lídia Dias de Castro em Humor abre portas,
O humor é um estado de ser, exige uma visão especial da vida, um jeito pe-
culiar de enxergar as coisas. Ele é próprio de alguns, cujo olhar aguçado per-
mite perceber sob um outro prisma os acontecimentos à volta e assinalar não o
que está evidente, mas o detalhe que, de tanto se ver, passa despercebido. Isso
exige perspicácia e atenção para mostrar aquele ângulo diferente de um objeto
ou situação, aquele pormenor inusitado que ninguém havia notado (Fedrizi,
2003, p. 132).
A esse respeito recordamos de duas cenas ilustrativas. Uma delas onde o subgrupo
eminentemente masculino elaborou em seu seminário teórico uma dramatização sobre o
“Analista de Bagé”. O seminário foi conduzido mostrando de forma criativa, mas espe-
cialmente humorística e carregada de significados, a sátira da condução de uma ação te-
rapêutica.
Uma outra cena de seminário envolvendo um dos homens do grupo foi quando
um deles solicitou que todos deveriam trazer uma toalha pequena, sem saber a finalidade.
A tarefa envolveu a aprendizagem, através da dança das toalhas, levando o grupo ini-
cialmente à surpresa pelo inesperado e, finalmente, a divertir-se e a relaxar.
Pensamos na hipótese dos homens terem mais tendência a usar o Witz que signifi-
ca “frase de espírito”, talvez como arma de sedução. Por definição, o Witz é uma quali-
dade mental, trata-se do que chamamos de “espirituoso”. É a habilidade de perceber o

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 14


lado pitoresco das coisas e exigindo rapidez de pensamento e inteligência, qualidades que
misturam percepção e raciocínio quase instantâneo.
Abraão Slavutzky, em Humor abre corações e bolsos, coloca que “o humor tem a
capacidade de transformar o narcisismo para um nível superior, atingindo um nível de
sabedoria. Aliás, um dos critérios de uma alta em psicanálise é a capacidade de humor,
junto a outras como a criatividade e sabedoria” (2005, p. 66).
A utilização do humor pode estar também a serviço da tentativa de atrair a simpa-
tia dos outros membros, já que o chiste e o humor têm um enorme poder de sedução. Eles
convidam o outro ao gozo e ao prazer pelo riso que provocam, de maneira quase gratuita.
Por isso mesmo, o chiste e o humor são sempre contagiantes e se disseminam pelo espaço
social, pelo prazer a que convidam e autorizam. Neste sentido, a platéia é fundamental,
tanto na experiência do chiste quanto do humor. Um não existe sem a presença do outro.
Rir com alguém pode ser um exercício de intimidade, que favorece a aproximação e aju-
da, portanto, o grupo a reforçar os laços afetivos.

O humor como recurso da coordenação

As coordenadoras, durante o primeiro módulo, em que ainda vivíamos a fase da


inclusão, sugeriram uma técnica em que o grupo formou sub-grupos, onde as pessoas
foram eleitas para contarem fatos em que sentiram-se ridículos. A técnica foi extrema-
mente pertinente ao momento, em que o grupo estava fatigado pelo cansaço, já no final
daquele encontro.
As pessoas contaram as suas vergonhas de forma engraçada e garantiram muitas
risadas ao grupo. As cenas retrataram, no geral, algo que envergonhou ou que constran-
geu e isso foi motivo de graça. Parece que a brincadeira estabelece vínculo e garante pro-
ximidade, intimidade.
As coordenadoras, naquele momento serviram-se da capacidade do próprio grupo
em gerar humor que foi usado para “minimizar o excesso de dor, de rigor consigo próprio
e com o outro: os sujeitos deixam de ser vítimas da própria implacabilidade dos ideais, do
narcisismo, das expectativas do ego” (Cymrot, 2003, p. 166).
Naquele momento, em que o grupo se solta em muitas risadas, as pessoas riam de
si mesmas e umas em relação às outras. O humor estava a serviço da humanização, da
compaixão. As próprias coordenadoras se “humanizavam” aos olhos do grupo contando
seus desastres com leveza e graça. Os membros experimentaram a associação, transfor-
maram o absoluto em relativo e foram convidados a perceber as suas próprias contradi-
ções, viabilizando a espontaneidade infantil.
Conforme Slavutzky (2005), para Winnicot, “psicoterapia é uma atividade na qual
duas pessoas brincam juntas, constituindo-se em uma das tarefas do terapeuta trazer o
paciente de um estado em que não é capaz de brincar para um em que o é”. O autor reco-
nhece, ainda, “que é apenas no brincar que se frui a alegria e liberdade de criação e cons-
tata que, se o analista não tem humor, não é adequado ao ofício.”
Estabelecendo uma relação entre o papel do analista e das coordenadoras, a sua
postura com o grupo sugere que elas tenham encorajado as situações de humor e brinca-
deira visando colaborar para facilitar um grau de intimidade e de vínculo, uma vez que se
dividiram segredos. Ocorreu uma revelação íntima em que os membros passaram pelo
ridículo que pode ser doloroso, secreto ou constrangedor a ponto do indivíduo querer

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 15


esquecer. Esse momento de constrangimento quando revelado gera cumplicidade, garante
o sigilo grupal.
O grupo, apesar de divertido, em muitos momentos demonstrou resistência em
ampliar a intimidade e, mais uma vez, o humor construiu o caminho para uma relação
afetiva mais próxima. A compreensão, gerada pela brincadeira, possibilita sabermos uns
dos aspectos mais íntimos dos outros, estabelecendo confiança e permitindo o enlace no
envolvimento. Numa fase de necessidade de aceitação, todos passam a ter mais facilidade
de se sentirem incluídos, apesar e com todas as dificuldades de cada um, já que cada um
percebe, como que em espelho, as limitações do outro.
Podemos afirmar que no processo de coordenação do grupo “Soltando as Amar-
ras” as coordenadoras valorizaram essa característica marcante do grupo de brincar com
as situações, mantendo um canal permanentemente aberto para essa manifestação, en-
trando no clima. Por outro lado, desde o início do grupo, as coordenadoras mostraram
abertamente serem pessoas humoradas, o que sugere ter modelado o comportamento do
grupo, encorajando-o ao mesmo tempo para tal.
A comunicação pela via do humor foi utilizada para estimular a flexibilidade,
criatividade e, como contraponto à outra característica do grupo, a auto-exigência e à
autocrítica muito severas.
Sendo o humor um processo social e altamente contagiante foi integrado pelas co-
ordenadoras na dinâmica de funcionamento do grupo, possibilitando através dele minorar
a tendência à crítica exigente e severa do grupo, fluindo a percepção da relatividade dos
fatos.
O importante é que as coordenadoras não interpretaram as tiradas de humor, como
uma defesa maníaca ou uma tentativa do grupo de se manter na superficialidade dos fa-
tos. Não reprimiram essa característica do grupo e demonstraram acreditar que o humor
favorece a flexibilidade mental, a compaixão, a mudança psíquica.

Competir? Sim, com humor se pode.

Outra passagem é quando o grupo, demonstrando resistência, usa a brincadeira, o


humor e o deboche como estratégia de fugir da responsabilidade ou aprofundamento a
que está sendo chamado.
Os seminários teóricos, por vezes, são usados para proporcionar momentos de
descontração e brincadeira. Quando isso ocorre, é comum o lúdico chamar a atenção des-
viando, por outro lado, a tarefa do estudo e dirigindo para a ludicidade em detrimento da
compreensão teórica. Surge a hipótese deste fato ter ocorrido devido à dificuldade de
enfrentar a natureza competitiva dos membros do grupo e de sua relutância em assumir
sua extrema vontade de ir competir efetivamente.
No módulo II do Curso, o grupo foi orientado a dividir-se em pequenos grupos, a
partir de suas escolhas, para trabalhar os seminários teóricos. Estas escolhas já geraram
competição, enfrentamento e posicionamento. No encontro em que haveria a primeira
apresentação dos subgrupos nos seminários, a competição aflorou e foi surgindo no grupo
a denominação dos três subgrupos constituídos. Os homens permaneceram juntos e intitu-
laram-se ADOSG – “Amiguinhas dos Guris”, visto que o grupo concentrou quatro dos
homens e duas mulheres, ou seja o grupo era dos guris e suas amiguinhas, mostrando a
relação de poder e competição. Outro grupo cujos membros se escolheram mutuamente,

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 16


foi intitulado, pelo grande grupo, de “As Superpoderosas”, considerando que nesse sub-
grupo, o posicionamento e o destaque em termos de influência e manifestações nos traba-
lhos, chamava a atenção. Segundo depoimento do terceiro grupo, uma das coordenadoras
questionou sobre o restante do grupo: “– E o resto?” Assim ficou denominado, naquele
momento, o nome do outro subgrupo: “O Resto”, embora este subgrupo não se considere
assim denominado.
Interessante observar que alguns dos Seminários propostos pelo subgrupo apeli-
dado “na brincadeira” de “Resto” obrigam o grupo das “Superpoderosas” e da “ADOSG”
competirem acirradamente, usando a graça e a comédia para tal.
Aqui nos pareceu que o sentido do termo alemão usado por Freud como Witz se
aplica indiretamente, já que segundo ele “...Witz é a permanência no adulto de certos
modos infantis de obter prazer” (1977, p. 145). Nada mais prazeroso do que ver os con-
correntes numa luta de poder através da brincadeira proposta. Nada mais prazeroso que
competir veladamente, sob a bandeira do humor. Freud diz também que “o Witz.... é a
mais social das atividades mentais que visam a consecução do prazer”. E o que tem de
mais socialmente permissível que um inocente joguinho para avaliar saberes? Nossa so-
ciedade tende a julgar o excesso de competição no adulto, mas as crianças podem jogar e
competir em suas brincadeiras, inclusive treinando para competir mais tarde como adul-
tos. Sempre que jogamos com outros adultos estamos permitindo uma via de expressão
para a nossa competitividade, vista então de forma mais “inocente”, porque inserida no
contexto da brincadeira.
Ainda segundo Freud o Witz é um excelente meio para manifestar “[...] a agressão
contra pessoas, instituições ou crenças que exigem respeito, ou contra as exigências da
razão” (1977, p. 145). O Witz provoca uma satisfação intensa que é demonstrada através
de um riso muito mais forte. “Ele gratifica intenções proibidas: a vestimenta inocente ou
engenhosa engana a censura [...]. O prazer deriva portanto da economia de um dispêndio
psíquico que era necessário para manter a inibição – o que, em termos dinâmicos equiva-
le ao levantamento de uma repressão” (1977, p. 147-148). Neste sentido, o grupo “Resto”
executa sua inocente vingança e assiste, de camarote, e com ares professorais, as “Pode-
rosas” e o “ADOSG” digladiaram-se ante os olhos das coordenadoras, numa competição
pelo saber teórico.

Simples assim: tirando o prefixo “des” de desgraça, vira graça.

Num encontro específico, várias pessoas falam de seus problemas de forma muito
engraçada. Já no jornal um dos membros conta o sufoco com os sogros, mas fazendo to-
dos rirem, outro membro diz “eu não vi o tempo passar, mas me disseram que na semana
que vem é páscoa”, outra pessoa diz “não faz ondinha que eu me afogo”.
Nestes relatos tragicômicos percebemos a capacidade dos membros de rirem de si
mesmos e de mais entrega e confiança em relação aos outros membros do grupo. Este
encontro com relatos mais íntimos ocorreu quando as escolhas e afetos já estavam sendo
demonstrados. Por um lado, os membros sentiam-se mais à vontade de contarem suas
dores de forma espontaneamente cômica, por outro lado, o humor servia como catalisador
da capacidade de trazer a dor de forma menos penosa, transformando-a em energia risí-
vel, segundo a percepção de todos no grupo.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 17


O humor funciona, neste sentido, como uma válvula de escape para a angústia,
pois mostra a realidade sem o seu peso. Assim, nos faz mais leves. O humor serve ao
grupo “Soltando as Amarras” como asas que conferem leveza ante o peso e o sofrimento
que, em vários momentos, predomina no clima.
Os autores freudianos citam que o humor proporciona um momento de alegria.
Este momento é também um momento de gozo, um gozo que alivia o sentido trágico da
vida. Por isso, o humor remete o grupo ao sonho, a fuga à realidade, como forma de su-
portar o sofrimento que o dar-se conta de situações pessoais pode trazer.
Poderíamos afirmar que se as drogas, delírios e neuroses são a solução psíquica
para o final do sofrimento, que levam, ao abandono de si mesmo, o humor é um outro
caminho, muito mais vantajoso: ele faz triunfar o princípio do prazer mantendo a saúde
mental. Percebemos que o grupo utiliza a platéia como testemunha de suas dores existen-
ciais através do humor, forma inteligente de chamar atenção, para sublimar os aspectos
infelizes da existência.
Mais do que isto, a identificação com a condição do sofrimento humano, través do
humor, causa uma descarga de material inconsciente reprimido em todo o grupo, o que
potencializa o efeito catártico do mesmo, bem como o prazer e o gozo que provoca. As-
sim, inúmeras vezes, frente às situações de muito sofrimento vivenciadas pelos membros
do grupo, as piadas e brincadeiras favoreceram o alívio da tensão.

Brincando que se dizem as maiores verdades.


O humor como revelador.

Quando foram dados os apelidos durante uma das técnicas em que cada pessoa
desfilava no centro de duas fileiras compostas por membros do grupo, as pessoas usavam
termos engraçados e comparações caricatas para designar as qualidades e questões pes-
soais e dificultadoras do crescimento grupal. Por exemplo, um dos membros foi chamado
de Mônica (personagem do Maurício de Souza que demonstra muita agressividade).
Em muitos momentos como este, o grupo “Soltando às Amarras” usa o humor pa-
ra dizer a verdade. Observamos a tendência dos integrantes absorverem um feedback
negativo com maior facilidade, quando este é expresso com a leveza do humor. Isto per-
mite que a compreensão do recado seja mais efetiva e passe pela barreira do ego com
seus mecanismos de defesa, interagindo diretamente com o inconsciente da pessoa em
questão, bem como de todo o grupo.
O fundamento do humor é a realidade, a vida de todos nós. É nessa direção que
pode converter-se em um caminho para se chegar à verdade. Nesse caso, não é a verdade
que é engraçada e, sim, a maneira como o humor faz chegar a ela. Sempre que há humor
há verdade em jogo, sendo este um dos grandes ensinamentos de Sigmund Freud desde
seu clássico “O chiste e sua relação com o inconsciente”, publicado em 1905.
Numa brincadeira se pode dizer até a verdade, o que expõe a relação do senso de
humor com certa dimensão da verdade. Uma verdade que pode ser dita pela mentira, quer
dizer, “de brincadeira”.
O humor atua assim como álibi para o advento fulgurante de alguma verdade
que corresponde ao sujeito e que figurava até esse instante do impossível de
dizer...” “É por isso que qualquer tentativa de aprisionar ou classificar essa
verdade num discurso formal faria dela um saber ‘sério ou triste” do qual o su-

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 18


jeito poderá facilmente se livrar, seja pelo expediente da negação ou pelo mais
sutil da racionalização. Pelo contrário, por meio do atalho do humor, o sujeito
assiste – sempre de esguelha, tangencialmente – a sua própria divisão, sua
condição sexuada e mortal (Slavutzky, 2005, p. 119).
Se, por um lado, é mais fácil aceitar a revelação da verdade através da via humo-
rística, por outro lado, este caminho revela aos integrantes do grupo, como em espelho,
seu próprio comportamento que dificulta o desenvolvimento de todos e que, numa visão
mais ampla, trava a caminhada individual de cada membro junto aos outros grupos em
que atua. O grupo, ao se dar conta deste fato, falando, sentindo e explorando, decide man-
ter a escolha do caminho do humor por estar na sua essência, o que passa a ser reforçado
também pelo perfil das coordenadoras.
Em outras palavras: o grupo ao dizer as verdades aos seus membros, através do
humor, presta uma ajuda em direção às possíveis mudanças evolutivas pessoais e, como
conseqüência, grupais.
Em outros momentos, os chistes ou ditos espirituosos, com sua concisão e preci-
são, sinalizaram verdades difíceis de enfrentar, possibilitando “através da lente do hu-
mor... desnaturalizar o pensamento, descobrindo facetas originais da nossa experiência de
viver” (Slavutzky, 2005, p. 10).

O humor a serviço de Narciso

No dia em que houve a revelação do “amigo secreto”, por ocasião da festa de final
de ano, um dos colegas presenteia sua amiga com um quadro em que elabora criativa-
mente fotos da presenteada em situações cômicas na visão do grupo. Nas fotos, manipu-
ladas pelo fotoshop a colega aparece vestida de freira, tomando cerveja e sendo vigiada
por um cão da raça Pitbul, já que foi o apelido que ela recebera, durante a técnica do des-
file onde eram ditas as verdades, conforme já citamos.
Do ponto de vista do presenteador, consideramos pertinente o seguinte dito:
[...] Existe um prazer especial de se conhecer uma nova piada e de partilhá-la
com os outros, de forma quase gratuita. Digo “quase” pois o piadista se en-
grandece, infla o seu ego, pelo poder que assume e pelo prestígio que conquis-
ta diante de sua platéia de ouvintes, por ser justamente o catalisador do gozo
dos demais. O piadista é assim um sedutor empedernido, que seduz sempre a
todos, com suas tiradas e histórias bem-humoradas, buscando então ser reco-
nhecido pelos demais. [...] a platéia é uma instância fundamental, tanto na ex-
periência do chiste quanto do humor. Estes não existem, com efeito, sem a
presença daquela (Slavutzky, 2005, p. 86-87).
As piadas e ditos espirituosos proporcionaram prazer com economia de sofrimen-
to para o sujeito que os comunica porque, através dele, obtém prazer ao demonstrar seus
dotes inteligentes e reforçar sua auto-imagem. Os assistentes e ouvintes, membros do
grupo, driblam a repressão e se divertem com o que foi comunicado.
Em especial, poderíamos pensar que o membro em questão, seguidamente era
bastante criticado pelo grupo por não apresentar as mudanças segundo a expectativa geral
e por demonstrar um comportamento insensível frente às dificuldades vividas no proces-
so. O presente poderia estar representando uma tentativa no sentido de se fazer querido e
engraçado para o grupo.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 19


A propósito, a teoria postula que
[...] a comunicação ao outro da piada que fiz serve a várias finalidades, em es-
pecial a de me garantir que se trata de uma boa piada, que sou inteligente o
bastante para a ter feito e com isso provocar prazer no outro. Trata-se aqui de
um prazer claramente narcísico, ligado à imagem que faço de mim mesmo
(Slavutzky, 2005, p. 163).
O que faltou ao presenteador e ao grupo que riu foi empatia com a pessoa presen-
teada com o quadro. Ela, no momento em que o recebeu, riu nervosamente, junto com
todo o grupo, mas revelou no encontro seguinte o fato de ter ficado decepcionada com o
presente que, a seu ver, era de mau gosto e enfatizava situações que a magoavam demais.
Sua risada gerada pelo chiste do colega era nervosa e tensa, muito mais a serviço de dis-
farçar seus reais sentimentos e de não “estragar” o clima de festa do momento.
Nesta linha de pensamento lembramos a descrição de Darwin in Cymrot, (2003),
quando afirma que depois de fortes emoções pela exposição a um perigo, soldados garga-
lhavam pela menor piada. Diz ainda que quando crianças choram, algo inesperado pode
transformar subitamente seu choro em riso, o que parece servir de descarga e alívio.

SOLTANDO AS AMARRAS COM HUMOR

O grupo “Soltando as Amarras” é um encontro de muitas gerações. Um encontro


de idades que variam de menos de 30 a mais de 60 anos, diferença etária que enriqueceu
o grupo e possibilitou conviver com variações de tempo histórico e afinidades de princí-
pios e ideais. Um encontro de pessoas lutadoras, com trajetórias de vida que denotam boa
dose de sofrimento e uma imensa busca de transformação em suas relações afetivas e
profissionais. Idealistas, acreditam que é possível ser melhor e viver melhor. Enfim, trata-
se de um grupo maduro.
Uma outra característica marcante do grupo é o alto grau de exigência da maioria
de seus componentes, o que, em princípio, conduz à dificuldade em relação ao humor,
uma vez que a pessoa traumatizada pode ter seu senso de humor comprometido. Porém, o
clima de bom humor, que se manifestou desde os primeiros encontros, favoreceu a flexi-
bilidade mental, a compaixão, a humildade e a mudança psíquica frente à intolerância que
cada um tinha de si e do outro. Entendemos que isso ocorreu porque pessoas bem-
humoradas reconhecem com mais facilidade suas vulnerabilidades e falhas, não se exi-
gindo a perfeição e reduzindo o pensamento onipotente, permitem-se rir de si mesmas,
não se levar tão a sério, de forma a suspender as exigências implacáveis do “eu ideal”.
Podemos dizer que “Soltando as Amarras” se constitui como um grupo de pessoas
com senso de humor, característica predominante naqueles que apresentam pensamento
rápido e inteligente. Para Freud o Witz (frase de espírito) é “uma qualidade da mente que
tem capacidade de perceber o lado divertido da vida e que aqueles que o possuem podem
ser considerados espirituosos” (1977, p. 140).
O humor inteligente e respeitoso ligado à verdade e à empatia pelo sofrimento do
outro, foi usado pelo grupo como uma arma poderosa de ajuda recíproca, na medida em
que ajuda redimensionar os sentimentos de culpa e autodestrutivos.
A perspectiva do humor permitiu, aos membros do grupo, evidenciar e conviver
com sentimentos opostos e até contraditórios como amor-ódio, razão-irracionalidade,

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 20


repressão-espontaneidade, na mesma pessoa e no mesmo grupo, transformando em prazer
o que só traria dor.
Segundo o Jornalista e Chargista Augusto Franke Bier, para o humor funcionar,
ele precisa estar associado à identidade junto ao grupo. É bem verdade que alguns mo-
mentos e piadas que fizeram o grupo “Soltando as Amarras” rir muito, não teria a menor
graça em outro contexto, vivido por outras pessoas e circunstâncias. O humor no grupo
quebra o senso comum, revela uma realidade imprevisível e, se a tendência natural for
gritar por socorro, o grupo solta seu riso.
Outra condição importante para que o grupo possa desfrutar a piada ou o gozo do
hilário é o fato de estar culturalmente identificado. Por outro lado, é importante que os
componentes do grupo tenham condições de se comunicar com facilidade. A questão da
identidade entre os membros do “Soltando às Amarras” contribuiu para que a mesma
graça seja engraçada para todos.
Também pudemos observar muita dificuldade de confronto, de crítica direta. No-
vamente o humor marca sua presença como uma característica, quando o grupo lança
mão dos chistes, como estratégia de crítica e divergência sem enfrentamento, e do dito
espirituoso que pode brincar com a situação diretamente ou através do jogo lingüístico e
expor o avesso de uma verdade, sem discordar claramente dela. Pois, como nos ensina
Freud (1977) há uma “economia de sofrimento” ou um “ganho de prazer” que se processa
com o uso dos chistes.
Dentre as características, vistas pelo grupo e seus membros individualmente, ditas
inaceitáveis, observamos uma visão idealizada com forte negação dos elementos compe-
tição e inveja que, mais uma vez foram introduzidos na dinâmica de funcionamento do
grupo pela via do humor, possibilitando o desvelamento e a humanização desses senti-
mentos.
O humor transformou-se em um salvo conduto permitindo o trânsito das diferen-
ças, da novidade, da transgressão e da emoção sem a rigidez de padrões pré-estabelecidos
e a conseqüência foi a tendência para a construção de relações interpessoais sem burocra-
cia, leves, com cumplicidade e intimidade, ingredientes necessários para o estabelecimen-
to de vínculos emocionais mais estreitos.
Para Freud, o senso de humor é o principal sinal de um psiquismo sadio e a forma
privilegiada pela qual adultos mantém a capacidade de brincar e de não ser esmagados
pelos imperativos da vida em sociedade (Kupermann, 2006).
O grupo “Soltando as Amarras” apresentou um desenvolvimento adequado e sau-
dável, com relações grupais maduras, equilibradas e produtivas, no nosso entender, entre
outros fatores, pela presença de uma atmosfera de bom humor, manifesta nos chistes,
ditos espirituosos e piadas.
Este funcionamento desarmou os espíritos e propiciou que as verdades, as críticas
e os feedbacks pudessem circular com menor nível de obstáculos, isto é, com menor so-
frimento e mais prazer.
Essa forma de manifestação demonstrou eficácia ajudando os membros do grupo
a minimizarem a dramaticidade e fatalidade nos relatos de suas experiências de vida e
aceitar que toda a verdade é parcial, podendo brincar com seus defeitos, aceitando assim
as imperfeições da vida. Observamos, assim, o humor ajudando as pessoas do grupo a
enxergar as razões de seu sofrimento de outro ângulo.
Em última análise, revendo nossas hipóteses iniciais podemos afirmar que o hu-
mor está a serviço de todas elas, mas também de outras necessidades psíquicas, conforme
fomos descrevendo no desenvolver deste trabalho.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 21


Acima de tudo acreditamos que, apesar da heterogeneidade e das diferenças de
postura frente à vida, o grupo apresentou maturidade. Assim, foi capaz de desenvolver
um espírito lúdico contagiante e grande articulador da identidade grupal, pois permitiu
romper as barreiras de interesses egoístas, provocando intimidade e comunhão.

CONCLUÍMOS QUE HÁ MUITO A PESQUISAR E CONCLUIR

O humor demonstrou ser um importante aliado ao desenvolvimento do grupo


“Soltando as Amarras” a serviço de diferentes propósitos em todos os seus encontros,
conforme vimos detalhadamente em algumas cenas escolhidas.
Nossa hipótese inicial era a de que o humor no grupo poderia estar, principalmen-
te, a serviço do alívio, à medida que as dificuldades de enfrentamento, aceitação e de con-
fronto foram sendo estimuladas. Com o passar do tempo e analisando os momentos do
grupo, passamos a entender que a dimensão do humor representava uma verdadeira mar-
ca para esse grupo, já que, através dele, estabeleceram-se vínculos e relações valiosas no
auxílio às mudanças desejadas de seus integrantes.
Durante a realização deste trabalho, passamos a compreender, então, que o humor
assume uma importância fundamental e supomos que ele possa estar a serviço de ainda
outras possibilidades a serem pesquisadas. Entre outras instâncias, no caso do “Soltando
as Amarras” o humor serviu, conforme analisamos, para desvelar as verdades, competir
com menos culpa, descarregar ansiedades, reforçar egos enfraquecidos, liberar emoções
tensas, conferir graça e leveza às situações constrangedoras e também, não se pode negar,
para desviar a atenção sobre questões relevantes para o crescimento do grupo, mas de
difícil elaboração.
Supomos também que as coordenadoras, conforme vimos, utilizaram este impor-
tante instrumento tão espontâneo, no caso do grupo em questão, para facilitar seu desen-
volvimento, encorajando e dando suporte e continência através da intervenção humorada,
conferindo leveza. Interessante que, da mesma forma que não localizamos bibliografia
específica sobre humor nos grupos, também não foi possível encontrar conteúdos sobre o
papel do coordenador de grupos e o humor. Todas as referências que localizamos refe-
rem-se ao papel do analista. Mesmo assim, traçamos alguns paralelos entre o analista e o
coordenador de grupo no texto que fala sobre a coordenação, o que entendemos ser de
fundamental contribuição para análise do papel do coordenador e sua desejável “espiri-
tuosidade” no manejo grupal.
Entendemos que, neste caso, o grupo e as coordenadoras tenham-se retro-
alimentado no processo humorístico, estabelecendo o reforço simultâneo para o uso do
humor em benefício do crescimento de cada um dos participantes e do grupo como um
todo.
Dada a riqueza de conteúdo que o desenvolvimento deste tema nos foi mostrando,
finalizamos este trabalho, felizes no sentido de contribuir, quem sabe, para dar visibilida-
de ao tema e também perplexas com a escassez de bibliografia, já tanto mencionada sobre
o papel do humor nos grupos. Esta perplexidade se dá devido a nossa conclusão de que o
encorajamento do humor no convívio dos grupos de formação, em inúmeras situações, é
instrumento fundamental para o crescimento dos integrantes. Assim, enfatizamos aqui a
importância de dar relevância do tema, através ao incentivo à pesquisa, que certamente
contribuirá com a manutenção da saúde emocional no processo grupal.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 22


REFERÊNCIAS

CYMROT, Paulina. Ninguém escapa de si mesmo: psicanálise com humor. São Paulo: Casa do Psicólogo,
2003.
FEDRIZZI, Alfredo (Org.). O humor abre corações. E bolsos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.
FREUD, Sigmund. Os chistes e sua relação com o inconsciente. (1905). In: Obras completas de Sigmund
Freud. Trad. de J. Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1974, v. 8.
. O futuro de uma ilusão, o mal-estar da civilização e outros trabalhos. (1927). In: Obras completas
de Sigmund Freud. Trad. de J. Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1977, v. 21.
KUPERMANN, Daniel. Ousar rir, humor, criação e psicanálise. Rio de janeiro: Civilização Brasileira,
2003.
. A piada como terapia: Entrevista para a Revista Época, Rio de Janeiro, Globo, n. 399, 9 jan. 2006.
SLAVUTZKY, Abrão e Kupermann, Daniel (Org.). Seria trágico se não fosse cômico... Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2005.

Dados de identificação
Flávia Maria L. Felippe, Assistente Social, Doutora na área da obesidade, Terapeuta de Família, Professo-
ra, Coordenadora de grupos de obesos, Diretora da clinica de reeducação alimentar Leve Com Ciência.
Maria Regina Burtet Vidal, Assistente Social, Especialista em Metodologias do Serviço Social, Gestora
Pública.
Suzana Regina Kunz, Publicitária. Especialista em Administração de Marketing, Diretora da Imagem
Comunicação Estratégica.

SBDG – Caderno 82 v Humor nos grupos 23


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Porto Alegre – RS
Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Alessandra Martini Moesch

A influência dos papéis no desenvolvimento


individual e grupal: uma abordagem
psicodramática através da Teoria dos Papéis

ANDRÉ BRUFATTO SCHOENARDIE


JORGE LUIZ MORAES DOVAL
EDUARDO WARTTMANN
WALTER KAYSER
MARIA CAROLINA TARRAGÔ CHISTE
FERNANDA BITENCOURT DOS SANTOS

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 1


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................3
Justificativa ..........................................................................................................................4
Situação problemática ..........................................................................................................4
Objetivos ..............................................................................................................................5

1 PSICODRAMA......................................................................................................6
1.1 Breve histórico .........................................................................................................6
1.2 Conceito geral de Psicodrama..................................................................................7
1.3 Condições necessárias ao funcionamento do Psicodrama .......................................7
1.4 Aquecimento ............................................................................................................8
1.5 Dramatização ...........................................................................................................9
1.6. Teoria dos Papéis .....................................................................................................9
1.7. Classificação dos papéis .........................................................................................11
1.8. Vínculo e co- inconsciente ......................................................................................13
1.9. Aprendizagem emocional e dos papéis ..................................................................15

2 MÉTODO .............................................................................................................16
2.1 Participantes da pesquisa .......................................................................................17
2.2 Procedimentos metodológicos ...............................................................................17

3 ANÁLISE..............................................................................................................18
3.1 A vivência dos papéis no primeiro módulo ...........................................................21
3.2 A vivência dos papéis no terceiro módulo .............................................................23
3.3 Troca, permanência e surgimento de novos papéis ................................................25

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................25

REFERÊNCIAS ...............................................................................................................26

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 2


INTRODUÇÃO

Escrevemos o trabalho final a seis. Como cada um de nós era vários, já era muita
gente. Utilizamos tudo o que nos aproximava, o mais próximo e o mais distante. Com
esta paráfrase de Deleuze e Guattari (1995, p. 11), introduzimos um trabalho construído a
doze mãos, seis corações e mentes, que tentaram traduzir e analisar, em um estudo, parte
da multiplicidade presente em um grupo de vinte pessoas. Se entre seis já éramos vários,
entre vinte somos uma infinidade de emoções, sentimentos, encontros, conflitos e, ao
mesmo tempo, somos um só. Um grupo chamado “Soltando as Amarras”.
Um grupo de vinte pessoas, buscando soltar suas amarras e, como afirmou Bustos
(1982, p. 62), “investigando a fundo a verdade da alma mediante a ação”. Desta forma,
não é acidental a nossa escolha da abordagem psicodramática como a lente pela qual es-
tudaremos o desenvolvimento de um grupo.
O grupo é marcado por sua profunda busca pela autenticidade, pelo resgate da es-
pontaneidade, cuja presença Moreno (1975, p. 37) refere como “a cura”, “uma inteligên-
cia que opera no aqui e agora”, capaz de mobilizar nas pessoas experiências ainda sem
forma, que se encontram ocultas dentro delas. A espontaneidade vinculada à criatividade
é a forma de inteligência mais elevada de que se tem conhecimento, explica o autor, e
acrescenta: “ambas são as forças primárias no comportamento humano”. Isto é, a busca
da espontaneidade, não como a liberdade ilimitada de uma pessoa fazer tudo o que quiser,
como e quando quiser, mas como a capacidade desta pessoa dar uma resposta adequada a
cada situação, em cada momento em que se encontra, levando-a à decisão que achar mais
acertada, em função das variáveis de cada situação, mas sem o peso de papéis externa-
mente estabelecidos e validados.
Não bastasse esta contribuição da teoria psicodramática ao contexto do grupo,
Pierre Weil (1967), um dos precursores dos estudos em dinâmica dos grupos no Brasil,
afirma ser o Psicodrama o mais interessante e eficaz entre os métodos que proporcionam
a redução de tensões, como forma de facilitar o aparecimento da espontaneidade. O autor
ressalta a amplitude do método, uma vez que atinge ao mesmo tempo tensões individuais
e de grupo, e lida com estas combinando as realidades biológica e sociológica, as psico-
logias individual e social, além da sociologia e da antropologia.
Assim, nosso estudo enfoca o próprio grupo “Soltando as Amarras” e, sob a lente
da teoria dos papéis de Moreno (1975), procura responder à seguinte pergunta: De que
forma os papéis exercidos por membros do grupo “Soltando as Amarras”, podem in-
fluenciar o desenvolvimento individual e grupal?
Buscando responder a esta questão de pesquisa, este mergulho no campo do Psi-
codrama está organizado da seguinte forma: No capítulo dois (a seguir), realizamos uma
discussão acerca da relevância do tema para os estudos de dinâmica dos grupos e para um
melhor entendimento do processo do grupo “Soltando as Amarras”. Após, no capítulo
três, apresentamos uma problematização sobre a abordagem dos papéis no desenvolvi-
mento individual e grupal, bem como a contribuição do referencial psicodramático para
sua melhor compreensão. No quarto capítulo, são apresentados os objetivos do estudo, e
no quinto capítulo é realizada uma revisão teórica acerca dos temas estudados. O capítulo
seis apresenta a descrição do método utilizado durante a elaboração do estudo e, no séti-
mo capítulo são apresentados e analisados os papéis do grupo “Soltando as Amarras”. No
capítulo nove, por fim, são apresentadas as conclusões e considerações finais.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 3


Justificativa

O estudo dos papéis assume grande importância no processo grupal, uma vez que,
conforme Moreno (1975), dos papéis emergem o “eu” dos indivíduos. Cada membro de
um dado grupo desempenha papéis cuja escolha ocorre de forma complexa e relacional,
isto é, tendo como base variáveis como as funções vitais, o contato do indivíduo com o
meio-ambiente físico e as respostas de um indivíduo a outro. Ainda, os papéis são fun-
damentais para o estabelecimento dos vínculos que o tornarão um ser social, construindo
as ligações que venha a ter com os diferentes grupos, pessoas e situações da vida.
Devido a esta relevância dos papéis, cada membro do grupo acaba se apresentan-
do com um ‘modelo’ de atitudes, de acordo com aquilo que julga ser o mais adequado,
muitas vezes de maneira previsível. Trata-se da expectativa de papel, ou as condutas que
esperamos das pessoas do grupo (e, no contexto mais amplo, de todas as pessoas que nos
rodeiam).
Assim, fica clara a importância do estudo dos papéis como forma de propiciar
subsídios teórico-empíricos que oportunizem o aprofundamento do grupo estudado no
processo de soltar suas amarras, desejo expressado na própria denominação escolhida
pelos membros do grupo. Entendemos que a compreensão da questão dos papéis, traduzi-
da na necessidade do grupo estudado (e outros) em romper com as expectativas fixas e
com as atitudes prototípicas, possibilita a construção de novas formas de agir, através do
surgimento da espontaneidade, da comunicação e dos sentimentos.
Entendemos, conseqüentemente, que o estudo proposto por este trabalho, além de
contribuir no suprimento de uma necessidade expressa pelo grupo em sua identidade,
permitirá maior compreensão sobre os papéis e a forma como influem no desenvolvimen-
to de indivíduos e grupos de uma forma geral. Por se tratar de um grupo que passa por
um processo de formação e aprendizagem, adotaremos o enfoque pedagógico do Psico-
drama.

Situação problemática

O grupo “Soltando as Amarras” iniciou o seu processo de formação no ano de


2004 e, acreditamos, passou por todas as fases de desenvolvimento individual e grupal
amplamente descritas pela teoria. Diante de tamanha riqueza de possibilidades, pareceu-
nos destacar-se a questão dos papéis, e de como ela acompanhou o desenvolvimento do
grupo desde seus primeiros momentos.
Sob o ponto de vista individual, não foram poucas as ocasiões, desde os primeiros
encontros, em que os membros do grupo expressaram, com maior ou menor intensidade,
o desejo de realizar uma mudança de papel em suas famílias, ambientes de trabalho, en-
fim, em suas vidas. Em alguns casos, as mudanças ocorreram de forma mais rápida e ní-
tida, em outros de forma mais lenta e gradual. Em todos os casos, cada passo, cada expe-
rimentação em um papel diverso daqueles já conhecidos era recebida pelo grupo com
grande alegria, euforia até. Mas também foi perceptível o aparecimento, ainda que gra-
dual e tímido, das resistências, dos controles, da inveja e da competição que estavam vi-
vas no grupo, mas escondidas sob o ‘tapete’ da alta exigência de cada membro do grupo
consigo e com os outros.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 4


Ao longo do processo de formação, aqueles indivíduos que durante vários meses
traziam notícias de suas mudanças fora do grupo, tentavam também se experimentar em
novos papéis dentro dele e, através destes papéis, exercitar a sua espontaneidade. O grupo
se torna uma referência para os seus membros, mostrando sua faceta mais construtiva,
quando incentiva o desenvolvimento dos seus indivíduos através da experimentação de
novos papéis, de novas atitudes, da promoção de mudanças nos setores pessoal, social e
profissional de suas vidas. No entanto, o grupo também revela sua face destrutiva, ao
controlar as atitudes de seus membros no grupo, desqualificar o desenvolvimento de al-
guns e superqualificar o desenvolvimento de outros. Enquanto que a face mais construti-
va revela o que é bom no grupo, como solidariedade, a amizade e a união, a face mais
destrutiva se se apresenta muitas vezes de forma sutil, dissimulando assim a existência de
sentimentos considerados “menos nobres”, como a inveja e a competição.
A abordagem psicodramática vem, desde seu fundador, Moreno, buscando a libe-
ração da espontaneidade (a “cura”) através da dramatização, do exercício de novos pa-
péis, do colocar-se no papel do outro, do enxergar-se no outro. Em mais de um momento,
os membros do grupo puderam se experimentar em papéis diferentes, cantando, dramati-
zando ou simplesmente dando vazão ao espontâneo desejo de exercitar outros papéis,
demonstrando ao grupo que poderiam assumir uma diversidade de facetas. Consideramos
que estes momentos foram de grande valia para o desenvolvimento do grupo e de seus
membros, e elegemos estudar este contexto através da Teoria dos Papéis de Jacob Levy
Moreno, como forma de analisar como os papéis atuaram no desenvolvimento do grupo e
de seus membros, identificando aqueles que se destacaram, atuando de forma restritiva ou
alavancadora ao desenvolvimento do grupo.

Objetivos

Objetivo geral
Analisar de que forma os papéis desempenhados por membros do grupo “Soltan-
do as Amarras” podem influenciar o desenvolvimento individual e grupal.

Objetivos específicos
§ Identificar os papéis exercidos pelos membros do grupo no primeiro módulo do
curso de formação em dinâmica dos grupos;
§ Identificar os papéis exercidos pelos membros do grupo no terceiro módulo do
curso de formação em dinâmica dos grupos;
§ Classificar os papéis identificados quanto à influência no desenvolvimento indivi-
dual;
§ Classificar os papéis identificados quanto à influência no desenvolvimento grupal;
§ Analisar a troca, permanência ou surgimento de novos papéis, a partir do contexto
grupal.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 5


1 PSICODRAMA

1.1 Breve histórico

Mais importante do que a ciência, é o seu resultado,


Uma resposta provoca uma série de perguntas.
Mais importante do que a poesia, é o seu resultado,
Um poema invoca uma centena de atos heróicos.

Mais importante do que o reconhecimento, é o seu resultado,


O resultado é dor e culpa.

Mais importante do que a procriação é a criança.


Mais importante do que a evolução da criação é a evolução do criador.
Em lugar de passos imperativos, o imperador.
Em lugar dos passos criativos, o criador.

Um encontro de dois : olhos nos olhos, cara a cara.


E quando estiveres perto, arrancarei teus olhos
E os colocarei no lugar dos meus
E tu arrancarás meus olhos
E os colocarás no lugar dos teus.

Então ver-te-ei com os teus olhos


E tu me verás com os meus.

Assim, até a coisa comum serve ao silêncio


E o nosso encontro permanecerá a meta sem cadeias:
Um lugar indeterminado, num tempo indeterminado
Uma palavra indeterminada para um homem indeterminado.
(traduzido de Moreno, 1914, p. 3).

Jacob Levi Moreno nasceu em 1889, na Romênia, mas cresceu em Viena, onde
estudou medicina e psiquiatria. No final da década de 1920 mudou-se para os Estados
Unidos, tendo uma maior ênfase em suas publicações e reconhecimento por seu trabalho.
O foco ativo de Moreno, altamente personalizado, orientado para o grupo, repre-
sentou uma mudança radical na psiquiatria de 1920 a 1930. Moreno acreditava que nosso
mundo social, que veio a chamar de átomo social, era extremamente importante para nos-
so sentimento de bem-estar. De uma forma bastante dinâmica, escolhemos ou rejeitamos
pessoas, e elas fazem o mesmo em relação a nós. Muito de seu trabalho foi direcionado
no sentido de melhorar a posição do membro isolado.
No Psicodrama, o paciente, é convidado a compartilhar seu mundo interior e du-
rante esse processo sua individualidade é validada. Moreno foi criticado por estimular as
fantasias dos pacientes, mas ele realmente acreditava que esse era um primeiro passo para
o contato, para um encontro significativo entre terapeuta e paciente. Ele estimulava seus
clientes a não meramente contar, mas atuar seus sonhos, primeiro no teatro terapêutico e
depois no teatro da vida.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 6


Foi a partir do Teatro Terapêutico, fundado em 1922, que Moreno criou o termo
Psicodrama, uma técnica que trabalha com o psiquismo em ação. Esta abordagem de um
método psicoterápico que focaliza o ato ou a ação, onde todas as formas de expressão
estão incluídas ganhou, desde então, grande importância.

1.2 Conceito geral de Psicodrama

A denominação Psicodrama corresponde a uma das técnicas que se baseiam na


ação, que se encontra incluída em uma obra mais ampla que se denomina sociometria,
que é a ciência das relações interpessoais. Assim, Moreno define o Psicodrama:
Drama é uma palavra grega que significa ação ou algo que se realiza. Psic o-
drama pode, portanto, definir-se como aquele método que investiga a fundo a
verdade da alma mediante a ação. A catarse que ocorre é por isso mesmo uma
catarse de ação. (Moreno, 1974, p. 42).
O Psicodrama força os sujeitos a viver papéis alheios, desenvolvendo o sentimen-
to de empatia, permitindo assim a compreensão do ponto de vista do outro, viver e anali-
sar os diferentes tipos de distorções de uma mensagem, fatores inerentes ao receptor ou
ao emissor, e às percepções recíprocas, possibilitando uma real psicoterapia.

1.3 Condições necessárias ao funcionamento do Psicodrama

Segundo Fox (2002, p. 45), o Psicodrama pode ser definido como a ciência que
busca a “verdade”, por meio de métodos dramáticos, trabalhando com relações interpes-
soais e mundos privados.
O método psicodramático , segundo Kellermann (1998, p. 27),
[...] utiliza principalmente cinco instrumentos: o palco, o sujeito ou protago-
nista, o diretor, a equipe de ajudantes ou egos-auxiliares e a platéia ou grupo.
O primeiro instrumento é o palco, o local que o sujeito utiliza para dramatizar
suas ações. O psicodrama pode ter lugar em qualquer espaço aberto que per-
mita movimentação física, liberdade de expressão e que tenha garantia de pri-
vacidade, sem perturbações.
O segundo instrumento, o protagonista, é definido por Fox (2002) como o instru-
mento pelo qual o sujeito é convidado a ser ele mesmo no palco, a representar seu mundo
pessoal. Tem de agir livremente à medida que as coisas lhe ocorrem à mente; é por isso
que deve ter liberdade de expressão, espontaneidade.
Em ordem de importância, depois da espontaneidade, vem o processo de encena-
ção, em que o nível verbal é superado e incluído no nível da ação. Há varias formas de
encenação: simular um papel, reencenar ou atuar uma cena passada, viver um problema
que esteja pressionando no presente, ou testar-se para o futuro. Em seguida vem o princi-
pio da concretização. Possibilita-se ao protagonista não apenas encontrar-se com partes
de si mesmo, mas também com as outras pessoas que participam de seu conflito mental,
reais ou imaginárias. O teste de realidade torna-se, no palco, uma verdade concreta. O
objetivo das técnicas utilizadas para a representação não é transformar os sujeitos em

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 7


atores, mas mobilizá-los para serem no palco aquilo que realmente são na vida (Fox,
2002).
O terceiro instrumento é o diretor. Fox (2002) afirma que esse tem três funções:
produtor, conselheiro e analista. Como produtor, ele tem de estar alerta para transformar
em ação dramática as pistas que o sujeito oferece, para unir a linha de produção com a
linha de vida do sujeito, não permitindo que a produção perca sua relação com a platéia.
Como diretor, tem permissão para atacar e chocar o sujeito de vez em quando, assim co-
mo rir e brincar; algumas vezes, pode se tornar passivo e indireto, e para todos os efeitos
práticos, a sessão parece ser conduzida pelo protagonista. Como analista, pode comple-
mentar sua própria interpolação com contribuições advindas dos informantes da platéia.
O quarto instrumento é a equipe de egos auxiliares. Eles são extensões do diretor,
explorando e guiando, mas são também, extensões do protagonista, representando as pes-
soas reais ou imaginarias do seu drama vital. São três as funções do ego auxiliar: ator,
que representa os papéis requeridos pelo mundo do protagonista; orientador, que orienta
o protagonista; e investigador social, que analisa as possibilidades de intervenções através
das ações do sujeito e do meio. O quinto elemento é a platéia, que tem duplo papel. Ela
pode servir tanto para ajudar o sujeito como tornar-se o “problema”, à medida que é auxi-
liada pelo sujeito que está no palco. Ao ajudar o sujeito, eles constituem uma caixa de
ressonância da opinião pública. Suas respostas e seus comentários são tão improvisados
quanto os do sujeito; podem variar do riso ao protesto violento. Quando a platéia é ajuda-
da pelo sujeito, torna-se, portanto ela própria o sujeito, assistindo as síndromes coletivas
representadas no palco (Fox, 2002, p. 48).
Mediante a utilização de técnicas adequadas, as pessoas desenvolvem novas per-
cepções sobre si mesmas, sobre os outros e sobre o ambiente, permitindo o surgimento do
novo, da eventualidade, da resposta nova, uma linguagem com novo significado. No en-
tanto, este processo depende de um elemento muito importante, que é a presença de um
grupo/platéia. É través dos egos auxiliares – conjunto de pessoas que se dispõem a repre-
sentar um papel em benefício daquele que passa pelo Psicodrama – que a cura se efetiva.
Ao escolher, entre os membros do grupo/platéia participante, aqueles que irão representar
figuras vitais de sua vida passada, ou aspectos importantes de sua psique, o sujeito está
recorrendo à força coletiva do grupo, para reestruturar sua psique individual.

1.4 Aquecimento

Moreno (1975) constata a importância do aquecimento dizendo que quanto mais


abrangente é o processo de aquecimento preparatório de um papel, mais satisfatório se
torna o papel e mais inspira o desenvolvimento da iniciativa e da espontaneidade em todo
o contexto vital do sujeito.
À medida que a pessoa se aquece para desempenhar um papel, suas capacidades
de percepção e interpretação de si e do outro podem, ou não, contribuir para a manifesta-
ção da espontaneidade, naquele momento.
Segundo Bustos (1982), o grupo é instigado pelo aquecimento para provocar o
aparecimento do protagonista, que será mais sensibilizado para um determinado proble-
ma.
O aquecimento ainda poderá ser, conforme Bustos (1982):

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 8


§ Inespecífico: procedimento utilizado para identificar temas latentes a serem dra-
matizados. Poderá ser aplicado através de estímulos de comunicação não-verbal, a
partir de temas comuns identificados através da fala das pessoas do grupo, ou ain-
da através de temas sociais que despertem curiosidades nos grupos. Para o aque-
cimento inespecífico também pode-se utilizar formas alternativas de expressão,
como desenhos, imagens plásticas ou produções literárias.
§ Específico: procedimento preparatório para representação dramática dos temas já
mobilizados e identificados no aquecimento inespecífico que agora são canaliza-
dos para a cena.

1.5 Dramatização

A dramatização configura-se no “como se” do Psicodrama, espaço onde se perso-


nificam objetos e relações do mundo interno e externo e personagens reais ou imaginá-
rios, no “aqui-e-agora”. Destacamos abaixo, algumas das técnicas que consideramos co-
mo sendo as mais utilizadas na realização do Psicodrama, segundo Weil (1967):

§ Solilóquio Duplo: o ego-auxiliar pode adotar o mesmo papel que o protagonista.


Procura dizer tudo o que o protagonista pensa mas não quer dizer, ou mesmo re-
fletir os processos inconscientes dele.
§ Inversão de Papéis: é uma das técnicas mais importantes, pois permite ao prota-
gonista viver o papel de outro. Em determinado momento, o pai assume papel de
filho e o filho o do pai, por exemplo. Esse tipo de técnica permite que o protago-
nista desenvolva o processo de empatia.
§ Espelho: quando o protagonista sente-se inibido ou incapaz de representar, um
ego-auxiliar passa a representar seu papel. O protagonista guia a ação, o ego-
auxiliar o imita e mostra como ele é percebido pelos outros.
§ Interpolação de Resistência: quando a dramatização leva o protagonista a reafir-
mar suas defesas em vez de enfrentá-las com seus conflitos, o diretor pode mudar
a cena, fazendo com que o protagonista se defronte com as situações realmente
temidas e evitadas por ele.

1.6 Teoria dos Papéis

Assim como Shakespeare, que define o mundo como um palco, Moreno (1975)
acredita que todos nós desempenhamos, desde o nascimento, papéis. O autor nos afirma
que o eu emerge dos papéis, ou seja, antes mesmo de ter a noção do eu, da personalidade,
ou de construir a linguagem falada, já desempenhamos papéis.
Uma das definições morenianas de papel é
a forma de funcionamento que um indivíduo assume no momento específico
em que reage a uma situação específica, na qual outras pessoas ou objetos es-
tão envolvidos (Moreno, 1974, p. 27).
Complementando, Nery (1994) afirma que os papéis são formas de funcionamen-
to do indivíduo em relação ao meio, ou seja, o indivíduo se relaciona com o mundo pelo

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 9


desempenho de papéis, que são compostos por atos que consideram o contexto, o mo-
mento, as características do indivíduo e a sua cultura.
Em vários momentos de sua obra, Moreno afirma que “o desempenho de papéis é
anterior ao surgimento do eu. Os papéis não emergem do eu; é o eu que emerge dos pa-
péis” (Moreno, 1975, p. 25).
Quando a criança vem ao mundo, ela se insere num ambiente físico e num contex-
to de pessoas que se organizam para recebê-la. O meio ambiente desde quando a mãe
espera a criança já começa a se modificar. A família começa a se preparar para recepcio-
nar o novo ser. Forma-se uma “placenta social” para receber esse bebê e é a essa “placen-
ta” que Moreno chama de Matriz de Identidade.
Segundo Moreno (1975), a Matriz de Identidade constitui a base psicológica para
todos os desempenhos de papéis e lança os alicerces do primeiro processo de aprendiza-
gem emocional da criança. Moreno (1975) também afirma que a Matriz de Identidade é
existencial e pode ser considerado o lócus de onde surgem, em fases graduais, o eu e suas
ramificações, os papéis.
Os papéis se transformarão ao longo da vida da pessoa, afirma Moreno (1975), e
sua concepção de saúde mental considera o número, a adequação e a flexibilidade dos
papéis características fundamentais. A doença seria uma inadequação no desempenho
desses papéis.
Através do Psicodrama é dada, ao indivíduo, a oportunidade de libertar-se da rigi-
dez desses papéis – seja re-encenando momentos que foram vividos, experimentando
papéis que foram vividos por outras pessoas em sua história pessoal de vida e/ou viven-
ciando novos papéis. Em um tempo/espaço imaginário, mas que se baseia no real – na
experiência de vida concreta do indivíduo – lhe é concedida a liberdade última, a de se
compreender e, ao fazê-lo, se “reescrever” (Moreno, 1975).
Na visão de Nery, (1994) o papel pode ser definido como as formas tangíveis e
concretas assumidas pelo “eu”. A autora afirma que “é possível entendê-lo como as for-
mas funcionais que o individuo assume no momento específico em que reage a uma situ-
ação específica, em que outras pessoas ou objetos estão envolvidos”. A representação
simbólica dessa forma de funcionamento, percebida pelo individuo e pelos outros, é cha-
mada de papel. A forma é criada pelas experiências passadas e pelos padrões culturais da
sociedade em que o indivíduo vive e pode ser completada pelo caráter específico de sua
produtividade.
Também, a estrutura de funcionamento de um grupo será dada pela inter-relação
de mecanismos de aceitação e distribuição de papéis. Cada membro de um grupo constrói
seu papel em relação aos outros. Isto se dá a partir do que ele pensa de si, do que ele pen-
sa que os outros pensam dele e do que os outros pensam dele.
Assim, mesmo nos comportamentos espontâneos dentro do grupo, nunca escapa-
mos a esses papéis. Se interferirmos corremos o risco de sermos vistos como adversários
do grupo ou coisa parecida. Em outras palavras, não é o indivíduo quem decide o seu
papel, mas:

§ o papel que decidiu representar com anterioridade,


§ o papel que crê representar,
§ o papel que os demais esperam dele,
§ o papel que lhe dão,
§ o papel que realmente representou.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 10


1.7 Classificação dos papéis

Segundo Moreno (1983), as variáveis que influenciam na definição dos papéis,


acabam conduzindo para sua classificação. Este autor nos apresenta a classificação dos
papéis em psicossomáticos, psicodramáticos (ou psicológicos) e papéis sociais. No entan-
to, alguns teóricos também salientam a existência dos papéis imaginários.
Quanto aos papéis psicossomáticos, Moreno (1983) os define como os primeiros
desempenhados pelo ser humano e ligados às funções vitais. Definem as marcas gravadas
pela ordem vital e constituem os primeiros papéis a exigir do homem uma colocação
frente a sua própria existência. Assim temos, por exemplo, os papéis do ingeridor, defe-
cador, dormidor, respirador. Ao desempenhar os papéis psicossomáticos, a pessoa estabe-
lece contato com o mundo basicamente por meio de seu corpo e, a partir das necessidades
fisiológicas, capta e registra as vivências de sua matriz de identidade. Desta forma, Mo-
reno (1983) situa os papéis psicossomáticos na dimensão corporal e os concebe como
formas anteriores de experiência, nas quais se apoiará o desenvolvimento dos papéis so-
ciais.
Quanto ao conceito de papel social, Moreno (1983, p. 238) define como “[...] uma
experiência interpessoal que necessita, usualmente, de dois ou mais indivíduos para ser
realizada”.
Ainda, papel social é um conjunto de respostas de um indivíduo ao outro, que
também responde assumindo um contrapapel ou papel complementar, sendo, portanto,
através destes papéis complementares que há o estabelecimento de um vínculo social
(Moreno, 1983).
Deste modo, Nery (1994) afirma que papel social é a forma real que o eu assume
em seu contato com o meio, o elemento privado dos papéis, que também contém as nor-
mas de conduta transmitidas pela sociedade, -– os elementos coletivos dos papéis. Assim,
os elementos privados dos papéis proporcionam ao indivíduo a singularidade e a peculia-
ridade do desempenho dos papéis sociais aprendidos na sociedade.
Desta forma, os conflitos ou perturbações no desempenho dos papéis sociais
acontecem, em determinados momentos, como conseqüência da superposição de um dos
elementos dos papéis, ou dos privados ou dos coletivos, sobre a personalidade (Nery,
1994)
Para que um papel social seja exercido, exigem-se várias atividades. Aguiar
(1990) denomina essas atividades como funções, ou subpapéis. Por exemplo, podemos
citar o vínculo com a mãe, através do qual aprendemos, além dos papéis sociais de filho e
de mãe, as funções de papéis de cuidador, de protetor, de aconselhador, de mantenedor,
dentre outras.
Aguiar (1990) afirma também que os subpapéis podem pertencer aos projetos
dramáticos dos indivíduos num vínculo, ou podem ser exigidos na consecução de um
projeto dramático comum de um outro vínculo. Assim, a natureza de um vínculo social
pode prevalecer, em determinado momento, sobre a natureza do outro vínculo estabeleci-
do, a partir do predomínio dos subpapéis do primeiro vínculo. Os subpapéis também po-
dem ser denominados de papéis latentes e papéis paralelos. Os papéis latentes são as fun-
ções de papéis que aprendemos, juntamente com os papéis sociais, sendo, também, o con-
junto de papéis sociais pertencentes à personalidade. Nesse sentido, tanto as funções de
papéis como alguns aspectos do conjunto de papéis sociais estão, de certa forma, dispo-
níveis para serem exercidos, nos vínculos sociais, à medida que os projetos dramáticos
dos envolvidos exigem.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 11


Sobre os papéis psicodramáticos, na visão de Moreno (1983) eles ora definem a
emergência do potencial criativo, ora designam o mundo da fantasia e da imaginação em
oposição aos papéis sociais, que definem o mundo real e das relações sociais. Naffah
(1979), entretanto, caracteriza o papel psicodramático como o que, de imaginário, concre-
tiza-se espontaneamente em ação real, criado e desempenhado pelo ator no cenário psi-
codramático, contendo em si elementos do papel dramático e do papel pessoal. Afirma
que o papel psicodramático retoma e focaliza num mesmo eixo o ator e o drama como
duas partes implicadas entre si, possibilitando a emergência da espontaneidade e criativi-
dade, gerando uma nova síntese entre imaginação e ação.
Naffah (1979) também classifica os papéis como papéis imaginários, sendo estes
resultantes da fantasia e imaginação do indivíduo, opondo-se aos papéis sociais. Segundo
o autor, na matriz de identidade, no processo de diferenciação entre o real e o imaginário,
a atividade imaginativa tende a pertencer a um espaço restrito e imaginário. Este processo
desenvolve os papéis imaginários que resultam da fantasia e imaginação do indivíduo,
mas não são transformados em ação efetiva, ou seja, não são atuados ou desempenados.
Para Nery (1994), os papéis imaginários podem surgir de diversas maneiras:

§ Podem ser criados pelo próprio indivíduo, a partir de sua atividade imaginativa,
como os papéis ligados aos delírios e alucinações;
§ Podem ser aprendidos, por meio da observação do ambiente externo, e fazerem
parte do mundo da fantasia;
§ Podem surgir dos sentimentos e desejos, que, em alguns contextos, são reprimi-
dos, não realizados ou impedidos de serem expressos.

Na visão de Nery (1994) o resgate dos papéis imaginários é feito através dos pa-
péis psicodramáticos, no palco do Psicodrama, e, quando não concretizados, fomentam o
fenômeno da transferência nas relações do indivíduo. Desta forma, uma das manifesta-
ções do fenômeno da transferência e da co-transferência acontece quando os papéis ima-
ginários advindos das repressões dos desejos, ou de impedimentos de expectativas, se
associam aos papéis latentes e, dessa forma, encontram um canal para se manifestarem
num vínculo social.
Os papéis imaginários podem sair do seu reduto da fantasia e da imaginação e se-
rem atuados, em diversos graus de consciência, num vínculo social. Os papéis imaginá-
rios podem também surgir do redimensionamento psíquico de papéis arquetípicos, ou
seja, dos papeis que estão enraizados nos mitos e em toda cultura e sociedade com fun-
ções determinadas e objetivas, como por exemplo, o papel de salvador, do monstro, do
deus, da bruxa, da fada; ou de personagens históricos que incorporam essas funções como
o papel de Cristo, Napoleão, de Hitler. Ainda os papéis imaginários podem surgir da ca-
pacidade imaginativa do ser humano de dar vida psíquica e de se deixar ser interferido
psiquicamente por todos os elementos da natureza, animados ou inanimados. Portanto,
essas várias possibilidades das origens dos papéis imaginários e a sua natureza iminente-
mente intrapsíquica nos fazem deduzir que eles estão vinculados ao processo da transfe-
rência (Nery, 1994).
Na visão de Naffah (1979) o cenário psicodramático é o espaço no qual os papéis
imaginários vêm à consciência através da ação dramática e, portanto, podem ser atuados
terapeuticamente. Nesse contexto, os papéis imaginários são resgatados pelos papéis psi-
codramáticos, à medida que a especificidade dessa vivência viabiliza uma catarse de in-
tegração em relação aos papéis sociais. O cenário psicodramático possibilita uma realida-

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 12


de suplementar a partir da vivência de cenas que exteriorizam os personagens do mundo
imaginário ou do mundo social do protagonista. Assim o protagonista pode representar
vários papéis psicodramáticos, tais como o de “pai”, “amiga”, “bruxa”, ou de algum sen-
timento, objeto ou pensamento, dando vida, no cenário do Psicodrama, aos conflitos ou
aos temas por ele relatados.
Ainda Naffah (1979), coloca que a vivência dos papéis psicodramáticos poderá
propiciar, em diversos níveis, a catarse de integração, ou seja, o resgate de emoções e
experiências que influenciarão criativamente os papéis sociais do indivíduo. Segundo ele,
catarse é a parte culminante de um processo de transformação e de passagem para essa
nova forma, mais integrada, que toma o lugar da antiga, que é superada, elaborada, re-
assimilada e não apenas jogada fora. Para o autor, a catarse de integração é uma expe-
riência coletiva, que transforma o todo, a relação, o grupo e não apenas o indivíduo.
Moreno (1983) definiu os papéis psicodramáticos como pertencentes à dimensão
psicológica do eu, ou relacionados ao mundo interno do indivíduo e surgindo de sua ati-
vidade criadora, tais como os papéis fantasmas, e aqueles advindos de alucinações. Con-
cluímos, portanto, que os papéis psicodramáticos são os vividos no cenário psicodramáti-
co e que têm a função primordial de resgatar os papéis imaginários e os sociais para a
experiência da catarse de integração.
A partir deste ponto de vista, nossa personalidade é o conjunto de papéis que po-
demos representar, assim como a atitude para assumir o papel adaptado à situação atual e
às suas circunstâncias.

1.8 Vínculo e co-inconsciente

Segundo Nery (1994) a relação dinâmica entre as categorias de papéis em nossa


personalidade leva-nos a deduzir que os papéis sociais, por serem compostos pelas di-
mensões intra e interpsíquica, operacionalizam a expressão da personalidade através dos
vínculos e atualizam os papeis imaginários e os de fantasia, a partir do co-consciente e do
co-inconsciente. Tudo isso repercute no entendimento dos fenômenos tele e transferência.
Segundo esta autora, o co-consciente e o co-inconsciente são os conteúdos co-
muns conscientes e inconscientes, respectivamente, criados pelas pessoas nos vínculos.
Os conteúdos comuns fornecem aos vínculos uma dinâmica própria. Em determinados
momentos, o co-consciente e o co-inconsciente viabilizam a representação de papéis
imaginários a partir da complementação dos papéis sociais. Nesse sentido, os papéis ima-
ginários, pertinentes à dimensão intrapsíquica e diferenciados pelo grau de consciência,
podem ser atuados em qualquer vínculo ou contexto, bloqueando ou facilitando a co-
criação.
Nery (1994) coloca ainda que nos estados co-consciente e co-inconsciente, o fe-
nômeno da transferência, que tem origem no mundo interno da pessoa, ocorre paralela-
mente ao fenômeno tele, que é iminentemente intrapsíquico. O fenômeno tele é o respon-
sável pela formação dos vínculos e o promotor da criação coletiva, ou da co-criação, da
produtividade e da liberação das potencialidades dos envolvidos num vínculo. A manifes-
tação desses fenômenos também é contínua, pois a interpsiquê, ou a intersubjetividade é
uma realidade constante no campo vincular. O fenômeno tele tem origem no campo so-
ciométrico, ou seja, o campo das escolhas para complementações de papéis, viabilizadas
pela afetividade, pelo perceptual, pelos projetos dramáticos comuns e pelo encontro das

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 13


espontaneidades. Mas ao mesmo tempo, o fenômeno tele origina este campo, resultando
o vínculo.
A inversão de papéis pressupõe a capacidade de se vincular com o outro perce-
bendo-o e a si mesmo adequadamente. Essa adequação é a fluência emocional e cognitiva
do(s) envolvido(s) no vínculo, que integra criativamente o contexto, o momento e o de-
sempenho dos papéis que a situação exige. Portanto, o estabelecimento e a manutenção
do vínculo acontecem devido à complementaridade de papéis fomentadas pelos estados
co-consciente e co-inconsciente, cujos fenômenos tele e transferência dinamizarão a rela-
ção (Nery, 1994).
Moreno (1975) considera o conceito freudiano de inconsciente como o processo
mental cuja existência somos obrigados a assumir, pois o inferimos a partir de seus efei-
tos, e dele não estamos diretamente conscientes; ou seja, a pessoa nada sabe de seus con-
teúdos e é preciso despender um esforço extra para tornar-se consciente dos mesmos. No
entanto, Moreno (1983, p. 61-63) questiona que:
[...] devemos modificar o significado de inconsciente, procurando por um con-
traponto, uma espécie de chave musical que seja capaz de relacionar qualquer
acontecimento no inconsciente de A a cada evento no inconsciente de B, ou
devemos buscar conceitos construídos de tal modo que a indicação objetiva de
sua existência não decorra das resistências de uma psique individual, mas,
sim, de uma realidade ainda mais profunda na qual estejam entretecidos os in-
conscientes de diversas pessoas, um co-inconsciente.
O autor pressupõe que pessoas que vivem juntas desenvolvem ao longo do tempo
um conteúdo inconsciente comum, que só pertence aquele vínculo ou grupo. As pessoas
trocam inconscientemente conteúdos e se comunicam por meio de uma realidade mais
profunda e sutil, tornando a díade ou o grupo um todo peculiar, com dinâmicas e caracte-
rísticas próprias. É como se a díade ou o grupo formasse também uma “personalidade” a
partir do intercambio das subjetividades dos envolvidos. O co-inconsciente promove a
representação mental mútua dos parceiros do grupo, possibilitando a realização dos proje-
tos dramáticos e a maior ou menor coesão grupal (Moreno, 1983).
O vínculo resulta do contato entre dois estados de espontaneidade centrados em
duas pessoas. Assim, não há vínculos sem a manifestação da espontaneidade-criatividade.
Esse fator do núcleo antropológico do homem está em íntima conexão com o fenômeno
tele, que é o responsável pela formação e manutenção dos vínculos e pela co-criação.
Assim, podemos definir vínculo como resultado do fenômeno tele que viabiliza a com-
plementaridade de papéis sociais, repercutindo nos estados co-consciente e co-
inconsciente. Estes estados dinamizarão a interpsiquê e retro-alimentarão a psique, a par-
tir do jogo das complexas variáveis psíquicas, ambientais e interpsíquicas presentes na
complementação dos papéis, tais como: momento, contexto, capacidades de percepção e
interpretação de si e do outro, comunicação e expressão, afetividade (Moreno, 1975).
Para Moreno (1975), a aprendizagem emocional e dos papéis é contínua, ocorre
por toda a vida, pois nossos vínculos atuais podem resultar em reaprendizados emocio-
nais ou em novas aprendizagens de condutas. Assim, para o autor, há um determinismo
não absoluto nas condutas humanas, pois o fator espontaneidade, intrínseco à essência
criadora do homem, é o responsável por sua sobrevivência e evolução no universo aberto
e sujeito a mudanças.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 14


1.9 Aprendizagem emocional e dos papéis

Deduzimos, a partir do determinismo operacional e funcional, que a história e a


especificidade dos papéis sociais conjugam a espontaneidade-criatividade e o processo de
aprendizagem emocional e dos papéis, que ocorre principalmente na matriz de identida-
de, por ela ser o primeiro grupo sócio-cultural da criança. O impacto afetivo e cognitivo
desse grupo é notório no desenvolvimento da criança (Moreno, 1975)
Nos primeiros vínculos, afirma Moreno (1975), a criança não passa por fases es-
tanques do desenvolvimento, mas por processos dinâmicos de vinculação, que se movi-
mentam continuamente da total indiferenciação com o outro, passando pela diferenciação
eu-outro e pela capacidade de inversão de papéis.
Conforme Moreno (1975), todos os envolvidos com a criança também estão
aprendendo ou reaprendendo suas emoções e papéis. Trata-se, pois, da formação da iden-
tidade dos vínculos, não apenas da criança. Assim, em alguns momentos, com algumas
pessoas, a criança tem uma dinâmica vincular diferenciada, pois a pessoa a complementa
nessa modalidade; com outras pessoas, pode ser complementada na modalidade que lhe
facilita a diferenciação dela do outro.
Entretanto, focalizando uma parte da criança no vínculo criança/adulto, princi-
palmente nos seus primeiros anos de vida, observamos que o seu desenvolvimento bioló-
gico precário interfere no seu desempenho e no aprendizado dos papéis sociais de manei-
ra específica em relação ao outro que com ela se vincula. Nesse sentido, em sua aprendi-
zagem emocional e dos papéis sociais, a criança vive o primeiro universo, que é o mundo
da identidade total, da indiferenciação, no qual os papéis sociais de filho e de criança são
vivenciados numa relação estreita com as funções vitais. Nesse primeiro universo, a cri-
ança será complementada pelo outro, que lhe proporcionará vivências afetivas relaciona-
das ao conforto, alívio ou prazer corporal, ou relacionadas ao desconforto, à tensão ou ao
desprazer corporal. Nesse sentido a criança registra, em sua memória organísmica, a at-
mosfera afetiva presente em todos os vínculos de sua matriz de identidade, o que interfere
no aprendizado dos papéis sociais e por ele são influenciados (Moreno, 1975).
Quando o organismo na criança se desenvolve, coloca Moreno (1975), seu campo
vincular também se amplia e ela passa a experimentar o segundo universo, que lhe trará a
diferenciação do mundo da fantasia do mundo da realidade (ou do mundo social). Nesse
momento, surgem os papéis imaginários, os de fantasia e outros papéis sociais passam a
ser desenvolvidos e desempenhados.
Segundo Moreno (1975, p. 174), “[...] da divisão do universo em fenômenos reais
e fictícios, surgem gradualmente um mundo social e um mundo da fantasia, separado do
mundo psicossomático da Matriz de Identidade”.
Assim, deduzimos que a vivência desses universos proporcionará a cada ser hu-
mano um dinamismo próprio para o desempenho dos seus papéis. A passagem pela dife-
renciação do mundo de fantasia e do mundo real influenciará nas capacidades de discri-
minação dos contextos, da percepção e interpretação do outro e da comunicação da crian-
ça. A criança pode, a partir de experiências em vínculos desfavorecedores de seu cresci-
mento sócio-psíquico, se sucumbir num mundo de fantasia e de interpretação distorcida
de si e do outro ou reprimir see mundo imaginário.
A criança, portanto, no processo de aprendizagem vivencial da matriz de identi-
dade, passa a internalizar as características de seus primeiros vínculos e papéis e, ao
mesmo tempo, se expressa desempenhando seus papéis.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 15


Moreno (1975) sinaliza que papéis e padrões característicos de interação (vínculo)
num contexto, são precursores do comportamento anterior num papel. Portanto, as vivên-
cias na matriz de identidade:
[...] representam a base psicológica para todos os processos de desempenho de
papéis e para fenômenos tais como a imitação, a identificação, a projeção e a
transferência [...] (Moreno, 1975, p. 112).
Segundo Moreno (1975), no processo de aprendizagem dos papéis, é possível o
efeito cacho de papéis, que é a transferência de espontaneidade dos papéis não represen-
tados para os que serão representados. Essa transferência de espontaneidade se deve ao
fato de que os papéis não estão isolados, tendem a formar conglomerados.
No efeito do cacho de papéis não apenas ocorre transferência de espontaneidade
entre os papéis, mas também qualquer aprendizado que a pessoa tem em um papel pode
ser transferido para outros papéis. Portanto, na matriz de identidade, a criança age, tem
suas zonas corporais em ação e se relaciona com o outro. Nesse processo ele registra ex-
periências em sua memória organísmica, interiorizando condutas e modelos, aspectos e
cenas vividas nos primeiros vínculos que desenvolvem o vínculo interno (Moreno, 1975).
Na concepção psicodramática, trata-se de uma aprendizagem que está a todo o
momento se refazendo e se recompondo criativamente, pois, ao desempenhar papéis, no
contexto atual, a pessoa revive aspectos de vínculos, condutas e cenas internalizadas,
podendo recriá-los ou podendo transformar o mundo externo.
Portanto, embora a matriz de identidade seja fundamental para a formação da per-
sonalidade, não é sua determinante exclusiva, pois a complementação dos papéis atualiza
as experiências e as marcas afetivas vividas refazendo ou repetindo a fórmula estrutural
da conduta da pessoa.

2 MÉTODO

Para satisfazer aos objetivos deste estudo, nos propusemos a desenvolver um es-
tudo de caso comparativo, de caráter qualitativo e corte longitudinal. Roesch (1999) colo-
ca que estudos de caso comparativos de corte longitudinal são adequados quando se pre-
tende analisar o desenvolvimento do objeto de pesquisa ao longo do tempo. Ainda Roes-
ch (1999) aponta estudos de caráter qualitativo como indicados quando se deseja apro-
fundar significados complexos e subjetivos do objeto pesquisado.
Alertamos para o fato de que tudo que escrevemos está impregnado de nossas lei-
turas teóricas, mas também de nossas leituras e vivências do grupo e da vida fora dele.
Não almejamos desvelar a verdade, uma vez que cremos ser a verdade uma interpretação
de uma situação, a partir de um ponto de vista específico. Buscamos nada além de trazer
a nossa análise sobre a influência dos papéis no desenvolvimento das pessoas e do grupo,
à luz da teoria dos papéis de Moreno. Esta análise, ainda que rica em diversidade de vi-
sões, é restrita às nossas visões.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 16


2.1 Participantes da pesquisa

O grupo “Soltando as Amarras” é um grupo que realizou o curso de formação em


dinâmica dos grupos pela Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos. O processo de
formação tem formato de encontros mensais que duram duas tardes e uma manhã (apro-
ximadamente 16 horas), estando organizado em três módulos:

§ Primeiro Módulo: seis encontros de caráter vivencial, onde os membros participa-


ram de uma série de vivências (seguidas de processamento) propostas e coorde-
nadas pelas coordenadoras do grupo;
§ Segundo Módulo: sete encontros de caráter vivencial e teórico. Os participantes se
exercitaram na coordenação e observação das vivências do grupo. Cada membro
do grupo, como coordenador de sessão, tinha a responsabilidade de preparar a
sessão e coordenar a vivência e o processamento. Após, havia um momento para
que o grupo e a coordenação pudessem dar feedback tanto para o coordenador,
quanto para o observador. Ainda, em cada encontro ocorriam os seminários teóri-
cos, com temas ligados à dinâmica dos grupos;
§ Terceiro Módulo: cinco encontros de caráter vivencial e teórico. Permaneceram
ocorrendo os seminários, mas as coordenações passaram a ser em duplas, sem ob-
servador. Neste módulo os grupos realizaram seus trabalhos de conclusão do cur-
so.

O curso teve seu início em setembro de 2004 e o último encontro em agosto de


2006. Inicialmente, contava com 22 participantes do grupo e duas coordenadoras. Ao
final do primeiro módulo, ocorreu a desistência de uma pessoa e, alguns encontros de-
pois, durante o segundo módulo, uma segunda pessoa desistiu. Desta forma, 20 partici-
pantes concluíram o processo formativo.

2.2 Procedimentos metodológicos

Realizamos este estudo a partir de uma técnica utilizada pela coordenação do gru-
po em uma sessão realizada no primeiro módulo. Naquela ocasião, uma série de papéis
foi apresentada aos membros do grupo, escritos em folhas de flip chart, para que durante
aproximadamente quinze minutos, cada um associasse os nomes das pessoas do grupo
àqueles papéis que estas exerciam dentro do grupo, naquele momento. Não havia limita-
ções, sendo permitido associar vários papéis à mesma pessoa, bem como associar mais de
uma pessoa ao mesmo papel. Também era possível colocar novos papéis em folhas em
branco.
Após a aplicação da técnica, seguiu-se o processamento, onde os membros do
grupo tentaram expor seus sentimentos em relação aos papéis que lhe haviam sido atri-
buídos, oportunizando momentos de troca de feedback, trazidos por palavras de aprova-
ção e reforço, mas também de reprovação. As palavras traduziam os sentimentos resul-
tantes dos afetos, desafetos, escolhas, vínculos, competições, ciúmes, invejas, admira-
ções, projeções, fantasias, medos, conflitos e julgamentos, somente para citar parte da
riqueza da dinâmica grupal. Desta forma, fica clara a importância dos papéis exercidos

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 17


pelos membros do grupo no processo de desenvolvimento dos indivíduos e do grupo co-
mo um todo.
Quando nos decidimos por estudar a influência dos papéis no desenvolvimento
individual e grupal do grupo “Soltando as Amarras”, um desafio era como iríamos estu-
dar os papéis especificamente neste grupo. A solução veio através da possibilidade de se
repetir a técnica, passados cerca de doze meses da primeira aplicação, o que se daria atra-
vés da coordenação em dupla das colegas Fernanda Bittencourt e Maria Carolina Chisté,
co-autoras deste estudo. O grupo encontrava-se no terceiro e último módulo do curso de
formação, e a oportunidade de poder comparar dois momentos diferentes do grupo as
levou à decisão de re-editar a sessão, com a mesma listagem de papéis da sessão anterior.
É importante ressaltar que a decisão de trabalhar os papéis novamente em uma
sessão foi resultado de um processo em grupo entre todos nós, autores deste estudo, com
a supervisão da didata em dinâmica dos grupos Lídia Mancia. No entanto, é importante
ressaltar que respeitamos a liberdade e a autonomia da dupla de coordenadoras no sentido
de decidir o que fariam mais especificamente. Assim, acreditamos, conseguimos a con-
tento evitar alguns aspectos que poderiam prejudicar confiabilidade tanto da referida ses-
são, quanto de nosso estudo:

a) a “contaminação” que um conhecimento prévio do que seria feito na sessão traria


aos demais autores do trabalho;
b) a manipulação que significaria este conhecimento prévio, perante o grupo como
um todo, e;
c) a interferência dos demais autores na coordenação da sessão.

Ainda, é importante ressaltar que o grupo foi informado após a sessão que esta fa-
ria parte de nosso estudo. Esclarecemos que a informação não foi dada anteriormente
como forma de evitar que pudesse haver a perda da espontaneidade do grupo durante a
sessão.
Após a sessão, os papéis e respectivos nomes foram colocados em planilhas do
software Excel, para que pudessem ser realizadas análises estatísticas básicas (papéis
mais exercidos, pessoas com maior número de papéis, mudanças de papéis, entre outras)
e também para que pudessem ser comparados os dois momentos estudados, levando em
consideração a importância dos papéis.
Os nomes dos membros do grupo foram omitidos, como forma de preservar sua
privacidade.

3 ANÁLISE

Enveredemos, agora, para um estudo comparativo entre aqueles papéis desempe-


nhados no grupo, em seu passado e na atualidade. Inicialmente, trataremos de apresentar
e comentar os papéis exercidos pelos membros do grupo em dois diferentes momentos
para, após, analisar sua influência no desenvolvimento individual e grupal, bem como a
troca ou permanência de determinados papéis associados às pessoas, bem como o surgi-
mento de novos papéis.
O Quadro 1 apresenta um detalhamento dos resultados das duas vivências dos pa-
péis. É importante ressaltar que os papéis foram avaliados como restritivos ou alavanca-

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 18


dores, tanto no aspecto do desenvolvimento grupal, como no aspecto do desenvolvimento
individual. Esta classificação se deu em função da segunda vivência, por entendermos ser
mais próxima da realidade atual do grupo. O critério utilizado foram as percepções dos
membros do grupo, expressas de forma verbal ou não-verbal, por gestos, posturas ou ati-
tudes. No entanto, destacamos que alguns papéis tiveram uma transição de uma classifi-
cação para outra, como é o caso do papel ‘boxeador’, que inicialmente possuía uma cono-
tação mais restritiva ao desenvolvimento grupal, mas passou a ser visto como alavanca-
dor na segunda vivência. Esta mudança no status de determinados papéis está ligada à
concepção de saúde mental de Moreno (1975), que deve considerar o número, a adequa-
ção e a flexibilidade dos papéis como algumas de suas características fundamentais. Isto
é, os papéis mudam ao longo da vida. Como percebemos nos caso estudado, podem mu-
dar em um ano.

Quadro 1 – Resultados das duas vivências dos papéis

Quanto ao n° de Quanto ao número total


Quanto ao Quanto ao
Papéis participantes associados de associações feitas para
Desenvolvimento Desenvolvimento
Indicados a cada papel cada papel
Individual Grupal
1ª Vivê ncia 2ª Vivê ncia 1ª Vivê ncia 2ª Vivê ncia
Afetivo(a) Alavancador Alavancador - 7 - 18
Agregador(a) Alavancador Alavancador - 2 - 5
Alto-astral Alavancador Alavancador - 1 - 1
Ausente Restritivo Restritivo 4 0 10 0
Bobo da Corte Restritivo Restritivo 4 0 14 0
Boxeador Restritivo Alavancador 5 4 13 8
Brincalhao Alavancador Alavancador 4 5 15 13
Cirurgião Alavancador Alavancador 8 3 17 6
Confidente Alavancador Restritivo 13 5 29 7
Divertido(a) Alavancador Alavancador - 4 - 6
Espoleta Alavancador Alavancador 5 4 11 8
Estelionatário Restritivo Restritivo 2 0 4 0
Filósofo Alavancador Restritivo 7 2 25 3
Fujão Restritivo Restritivo 3 1 8 4
Gata(o) Den-
Restritivo
gosa(o) Restritivo 9 4 32 10
Intelectual Alavancador Restritivo 7 4 23 8
Juiz Restritivo Restritivo 6 2 16 6
Milionário Restritivo Restritivo 3 0 6 0
Moita Restritivo Restritivo 8 1 31 2
Padre / Freira Restritivo Restritivo 6 1 24 1
Radar Alavancador Alavancador 6 9 18 14
Rei / Rainha Alavancador Alavancador 7 3 22 9
Sabonetão Restritivo Restritivo 7 0 15 0
Sensível Alavancador Alavancador 5 7 14 11
Subversivo Restritivo Alavancador 4 2 12 2
Superficial Restritivo Restritivo 1 1 2 1
Vitima Restritivo Restritivo 3 1 12 3
Xerife Restritivo Restritivo 5 4 19 10

É importante ressaltar o surgimento de novos papéis na segunda vivência – “afeti-


vo(a)”, “agregador(a)”, “alto-astral” e “divertido(a)”, bem como uma diminuição tanto no

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 19


número total de associações, quanto no número de pessoas associadas a cada papel, da
primeira para segunda vivência.

Quanto n° de participantes associados a cada papel


14

12

10

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1ª Vivência dos papéis


2ª Vivência dos papéis

No gráfico acima, podemos perceber que, na segunda vivência, o número de


membros do grupo associados a cada papel teve considerável redução, com exceção dos
papéis “radar” e “sensível”, com um aumento de 40% e 50% no número de pessoas asso-
ciadas, respectivamente. Nos papéis considerados restritivos, a redução foi mais intensa,
como é o caso dos papéis “sabonetão” e “moita”, o primeiro não tendo nenhuma pessoa
associada e o segundo com uma redução de 90% no número de membros associados.
Merece também destaque o papel “confidente”, considerado restritivo do ponto de vista
grupal e alavancador no aspecto grupal, cuja redução foi além dos 60%.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 20


Quanto n° total de associações feitas para cada papel
35

30

25

20

15

10

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1ª Vivência dos papéis


2ª Vivência dos papéis

O mesmo fenômeno se observa no gráfico acima, onde fica clara a diminuição no


número de associações totais feitas a cada papel (“total de votos”), desta vez sem exce-
ção. Mais uma vez, devem ser destacados os papéis considerados restritivos, cuja redução
foi bastante significatica.
Cabe lembrar que estamos traçando um paralelo com a teoria do Psicodrama, em
sua natureza pedagógica, e não terapêutica. Assim, sabendo-se, também, dos campos de
força que atuam dentro dos grupos, temos que os papéis assumem uma nítida função de
comunicação da personalidade do indivíduo com o meio ambiente, no caso, o próprio
grupo, assim considerado como um todo. Em outras palavras, o próprio modo como o
indivíduo reage a uma situação específica. Feitas estas considerações, passamos a anali-
sar, ponto a ponto a questão dos papéis no grupo “Soltando as Amarras”.

3.1 A vivência dos papéis no primeiro módulo

No início do processo de formação do grupo “Soltando as Amarras” verificou-se


uma longa lista de papéis assumidos pelos seus membros. Cabe, no entanto, destacar
aqueles que, à época, eram tidos como papéis preferidos, aqueles que davam ao seu pro-
tagonista, ou protagonistas, maior projeção e validação dentro do grupo.
Tínhamos, então, alguns papéis como o “cirurgião”, o “rei/rainha” e o “radar”,
como nítidos alavancadores do processo grupal que se iniciava. Papéis catalisadores, de
partida, do processo grupal. Papéis estes que ajudaram, ou “levaram”, o grupo para o ca-
minho que ele desejava, ou estava “pronto” para ir, ainda que de um modo inconsciente.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 21


A importância dada a estes papéis poderia, à luz do referencial de Moreno (1983), estar
expressando o desejo do grupo de se vincular da forma mais positiva possível.
É importante ressaltar que seguir este caminho nem sempre significa que está ha-
vendo desenvolvimento ou crescimento grupal. Alguns papéis, tidos como alavancadores,
podem agir paradoxalmente como freio ao desenvolvimento do grupo, por reprimir o
aparecimento de outros papéis. Um dos papéis do Psicodrama seria auxiliar no resgate de
papéis antes ‘congelados’ do indivíduo (Moreno, 1975).
Verificamos que os três papéis positivamente destacados (radar, cirurgião e
rei/rainha) tiveram forte influência no sentido de evitar que o grupo se desviasse da busca
da espontaneidade, o “cirurgião” como aquele que intervém de forma precisa em aspectos
importantes ao desenvolvimento das pessoas e do grupo; o “radar” como aquele que
“capta” possíveis problemas, perigos ou entraves ao crescimento, e; o “rei/rainha” como
alguém que serve como exemplo a ser seguido. Assim, os três papéis representaram, na
época, tanto crescimento individual quanto grupal.
Por outro lado, estes papéis fizeram com que surgissem forças opostas dentro do
grupo. Portanto, é importante salientar aqueles papéis tidos como de menor valoração.
Trata-se dos papéis restritivos, ou seja, aqueles vistos como inadequados e, por isso, in-
desejados, de conotação negativa.
Destacaram-se negativamente os seguintes papéis: “confidente”, “gata (o) dengo-
sa (o)” e “moita”. Quanto ao “confidente”, queremos destacar uma peculiaridade: a prin-
cípio, muito embora este papel pudesse ser visto como sendo um aspecto positivo no âm-
bito individual, em relação ao desenvolvimento grupal, naquele momento, mostrou-se
absolutamente restritivo. Isto porque aparentemente estava a serviço apenas de relacio-
namentos “extra” grupo, conversas “na paralela”, impedindo o exercício da espontanei-
dade dentro do ambiente grupal. Neste caso, vemos que o aparecimento destes papéis
representam as respostas que os indivíduos dão ao meio, colocadas por Moreno (1975).
Isto é, a forma como o “eu” de alguns membros do grupo emerge dos papéis que exer-
cem, refletindo as resistências, os medos, as fantasias e os controles inerentes ao momen-
to da criação dos vínculos.
Quanto aos papéis “gata(o) dengosa(o)” e “moita”, temos que o seu desempenho,
tanto no aspecto grupal quanto individual, representavam, na época, vetores de valência
restritiva. Foram papéis que no decorrer do caminho de nosso grupo foram vistos como
estando a serviço do controle grupal, o papel de “gata(o) dengosa(o)” sendo visto como
aquele que se utiliza de artifícios (“dengos” e “manhas”), para obter a conivência do gru-
po, e o papel de “moita” sendo visto como aquele que se exime de uma participação mais
ativa, omitindo e reprimindo seus sentimentos e idéias, não os compartilhando com o
grupo. Os três papéis restritivos representaram um nítido exercício de poder e resistência
dentro do grupo, agindo como obstáculo ao aparecimento nítido de papéis até então ocul-
tos, bem como da circulação dos papéis dentro do grupo, tão necessária ao fortalecimento
dos vínculos (Moreno, 1975).
Como é possível perceber, tanto os papéis aqui considerados alavancadores quan-
to os restritivos, em sua grande maioria, estavam a serviço das forças atuantes sobre o
grupo. No entanto, é importante chamar atenção para a ambivalência como característica
marcante do processo neste grupo, cujos participantes tentam constantemente buscar “o
certo” e evitar “o errado”. Assim, várias pessoas se mostraram decepcionadas ou tristes
mesmo tendo sido associadas a papéis alavancadores, por considerarem mais fortemente
o seu aspecto restritivo. Segundo Moreno (1975), é da circulação e da complementarida-
de de papéis que surge a espontaneidade, e se criam os vínculos em um grupo mental-

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 22


mente saudável. De fato, nenhum papel será percebido como completamente alavancador
ou restritivo, e alguns dos papéis tidos como positivos muitas vezes foram assumidos
como negativos na história do grupo. Analogamente, alguns papéis restritivos foram con-
siderados de maneira positiva por alguns membros do grupo.
Outro fato que merece menção por corroborar com a idéia da ambivalência do
grupo é o fato de que algumas pessoas, mesmo tendo sido associadas com um número
maior de papéis alavancadores, se mostraram preocupadas com os papéis restritivos asso-
ciados a elas. Ou seja, deram maior importância às percepções negativas do que às positi-
vas. Este fato, ao nosso ver, é um indício de que a ambivalência do grupo se deve, em
grande parte, à necessidade da aceitação no grupo, podendo ser um entrave ao resgate da
espontaneidade e do reconhecimento do potencial de exercer uma variedade de papéis
que cada membros do grupo possui (Nery, 1994).

3.2 A vivência dos papéis no terceiro módulo

E na atualidade? Na atualidade, conforme verificado na reedição da vivência dos


papéis, temos que o grupo avançou em vários aspectos, em que pese o término do curso
estar muito presente dentro do grupo, o que tem sido indicado em relatos e através de
outros indícios (ataques às coordenadoras, juras de amor eterno, ou um ‘racha’ total, etc.).
O contexto, segundo Nery (1994), tem grande influência no desempenho de papéis dentro
de um grupo, o que se confirmou neste caso específico, para o resultado da vivência.
Consideramos que houve uma nítida circulação dos papéis entre as pessoas, den-
tro do processo grupal, o que segundo Moreno (1975) é bastante saudável. Além disso,
individualmente, houve o reconhecimento de diferentes facetas na forma como cada um
se mostra para o mundo. Assim, participantes do grupo que, na primeira edição da vivên-
cia, haviam sido associados mais a papéis restritivos, puderam ver seus nomes ligados a
papéis alavancadores. Trata-se de clara indicação do que aponta Moreno (1975) quanto à
modificação dos papéis ao longo do tempo. Ficou claro que outras facetas, bem como as
tentativas de mudança de papel, estão sendo reconhecidas pelo grupo.
Ainda, houve uma maior diversidade de pessoas associadas àqueles papéis tidos
como positivos. Outra questão que não podemos deixar de levantar é o fato de que houve
uma diminuição no número de associações de nomes com papéis, tanto alavancadores
quanto restritivos. Porém, a redução no número de associações foi mais expressiva no
que se refere aos papéis restritivos. Este aspecto traz a questão de Nery (1994), quando
esta se refere à influência do contexto. Em função do momento de término do curso de
formação, uma hipótese que levantamos em relação a isto se refere a uma disposição
maior por parte das pessoas em reforçar os vínculos já feitos, em relação à possibilidade
de apontar questões negativas. Ainda, nos parece que algumas pessoas “desistiram” de
dar feedback a determinadas pessoas em relação aos seus papéis restritivos. Trata-se, ao
nosso ver, de um desejo de fortalecer os afetos e simplesmente deixar os desafetos “para
lá”, fortalecendo os vínculos. Assim, os membros do grupo deixam de expressar um con-
flito, surgido da sobreposição de elementos dos papéis sobre a sua personalidade (Nery,
1994).
Outra hipótese que levantamos está relacionada ao surgimento de um novo com-
ponente que merece reflexão. Trata-se do “ninguém”, que passaremos a denominar tam-
bém como um “personagem”. Explicaremos a seguir.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 23


Na questão dos papéis negativos, em especial “vítima”, “superficial” e “pa-
dre/freira”, foi lançado no espaço correspondente à identificação a palavra “ninguém”.
Verificamos também, que este “personagem” denominado “ninguém”, foi inclusive mais
votado do que inúmeros membros reais do grupo. Levantamos a hipótese de que, se por
um lado a adição da palavra “ninguém” pode estar demonstrando o desejo (ilusório) de
que não haja papéis restritivos no grupo, por outro, este lançamento puro e simples da
palavra “ninguém” pode estar indicando o lado mais autoritário e conservador do grupo,
que tenta impedir a espontaneidade de vir à tona, caso esta espontaneidade não esteja a
serviço de suas fantasias.
Em outras palavras, seria um alívio, uma resistência, uma fuga. Ou seja, soa uma
das formas como o grupo reage ao momento de término: o controle, a resistência, con-
forme Nery (1994). Perguntamos: estaria o grupo refreando sua autenticidade ao somente
indicar papéis que lhe interessam pela vinculação positiva, não utilizando os negativos,
que seriam extremamente importantes para o crescimento individual e grupal, por gera-
rem um feedback sincero e espontâneo? Ainda, estaria o grupo temendo os possíveis
rompimentos resultantes de um feedback que trouxesse questões negativas?
Nossa resposta a ambas as perguntas é afirmativa. O grupo sofre com o medo fan-
tasioso de um rompimento generalizado, como se os vínculos construídos até o momento
não fossem fortes o suficiente para suportar a autenticidade de uma crítica sincera. Sofre
também com a fantasia de terminar o curso na mais perfeita harmonia, sem conflitos ou
desafetos, como se isto fosse possível. Envolto em tais fantasias, o grupo retorna a um
momento inicial no processo formativo: a padronização. No momento em que o grupo
“aceita”, sem contestação (verbal ou simbólica), que “ninguém” desempenha determina-
dos papéis no grupo, volta ao estágio de padronização. A palavra “ninguém”, escrita em
determinados papéis, exerce tal pressão sobre os membros do grupo que nenhum ousa
escrever qualquer nome naquele espaço, e mesmo em outros papéis “negativos”, os quais
restaram absolutamente em branco, sem nenhuma indicação, sequer o “ninguém” (ausen-
te, estelionatário, sabonetão, milionário e bobo da corte). Vemos que a reação dos mem-
bros do grupo foi a de ‘congelar’, voltar a ocultar estes papéis, numa ação oposta à colo-
cada por Moreno (1975) como necessária à busca da espontaneidade.
Outra pergunta nos surge: a quem “ninguém” representa? Acreditamos que, nas
circunstâncias em que surgiu, “ninguém” representa, em uma primeira análise, a própria
pessoa que escreveu que, profundamente sensibilizada pelo eco que os papéis em questão
suscitavam em sua personalidade, decide “bloqueá-los” ao grupo. Em uma segunda análi-
se, “ninguém” poderia estar representando um ou mais membros do grupo, ou ainda o
grupo inteiro. Neste caso, o receio compartilhado de estar associado a um papel indesejá-
vel encontrou um porta-voz na pessoa que escreveu “ninguém”. Assim, “ninguém” figura
na vivência a serviço de um acordo mórbido de não mais mexer em questões difíceis e
polêmicas no momento de término da formação. Entendemos que “ninguém” expressa o
desejo de terminar o curso “em paz”, “de bem” e, ao mesmo tempo, tenta ocultar os con-
flitos que o aumento da espontaneidade tornaram mais claros. Nery (1994) coloca que os
conflitos são um aspecto inerente à diversidade de papéis exercidos em um grupo, en-
quanto que Moreno (1975) coloca que os vínculos se formam desta complementaridade
entre os papéis.
Frise-se que estas considerações são lançadas tendo como base o ensinamento, o
aspecto didático, não servindo de meio terapêutico, pois, afinal, estão sendo lançadas por
integrantes do próprio grupo.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 24


3.3 Troca, permanência e surgimento de novos papéis

Aplicando-se a Teoria dos Papéis proposta por Moreno (1975), temos que efeti-
vamente os papéis se transformaram até o final dos trabalhos, decorrendo daí um cresci-
mento, tanto grupal quanto individual.
Os indivíduos tentaram a comunicação através dos papéis. Mas, muitas vezes, no
início dos trabalhos, ao assumirem estes papéis, não estavam assumindo a si próprios,
mas alguém de acordo com a vontade, ou resistência do grupo, o que, na atualidade, res-
tou, para muitos, modificado. Tratam-se das pautas de condutas colocadas pelos grupos,
conforme Nery (1994).
Houve um número considerável de papéis, houve alguma adequação, também al-
guma flexibilidade. Como nos ensina Moreno (1975), cada indivíduo pensa, sente e age
em decorrência de inúmeros fatores, sejam sociais, profissionais, etc. Ele é um “persona-
gem”.
Muitas vezes, dada a situação, o contexto em que inserido, utiliza “máscaras” para
representar algumas atitudes preconcebidas pela platéia, encarnando, assim, um persona-
gem que, no fundo, é diferente de sua própria personalidade. No decorrer do processo
grupal, quantas vezes ouvimos relatos do tipo “mas o fulano, lá fora, não é assim; é tão
diferente, mais amigo, mais carinhoso, legal, etc.”. Mas, no grupo este lado, que acredi-
tamos, está mais próximo de sua essência, não conseguiu vir à tona de um modo fácil. Foi
necessário muito esforço pessoal, auto-reflexão, vontade, atitude, para exercer e melhorar
os vários aspectos de sua personalidade.
No entanto, entendemos que o surgimento de papéis complementares foram se
dando ao longo do ano que separou as duas vivências. Segundo Moreno (1975), é nesta
complementaridade que ocorrem os vínculos, passo de suma importância para o surgi-
mento da espontaneidade do grupo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos às conclusões deste trabalho convictos de que houve, ao longo do pro-


cesso de formação do grupo “Soltando as Amarras”, uma considerável evolução, tanto no
sentido individual quanto no contexto grupal. Nosso argumento para defender este ponto
de vista se embasa na maior espontaneidade do grupo em aproveitar os momentos do
grupo para fortalecer os vínculos e os afetos, investindo sua capacidade emocional nas
relações que de fato lhe importam, lhe tocam e cativam de alguma forma. Esta situação
indica um aumento na autenticidade do grupo, que, mesmo que de forma lenta e gradual,
respeitando o seu tempo, permite que seus membros consigam expressar estes afetos e
escolhas de forma mais espontânea, menos preocupados com o que os “não escolhidos”
irão pensar ou sentir.
Ainda, vemos que os papéis exercidos no grupo tecem uma teia que interliga to-
dos a todos, alguns de forma mais direta e consistente, outros de forma mais indireta.
Apesar das resistências, dos medos e das fantasias comuns a qualquer grupo, vemos que
os vínculos foram feitos, mais fracos ou mais fortes, mais próximos ou mais distantes,
duradouros ou efêmeros. A qualidade destes vínculos irá garantir que os membros deste
grupo permanecerão em contato, com maior ou menor intensidade.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 25


O referencial de Moreno (1975) embasa esta conclusão, à medida que pôde-se ob-
servar o surgimento de papéis complementares, o fortalecimento dos vínculos, a maior
circulação de papéis entre os membros do grupo, e o conseqüente aumento da esponta-
neidade.
Assim, constatamos a importância dos papéis para o desenvolvimento dos indiví-
duos e do grupo como um todo, especialmente pela capacidade de aproximar as pessoas,
fortalecendo os vínculos e, a partir destes, fazendo emergir a autenticidade, que Moreno
tão apropriadamente definiu como “a cura”.

REFERÊNCIAS

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ALMEIDA, Wilson Castelo de. O que é psicodrama. São Paulo:Brasiliense, 1989.
BLEGER, José. Temas de psicologia: entrevista e grupos. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
BUSTOS, Dalmiro Manuel. O psicodrama: aplicações da técnica psicodramática. São Paulo: Summus,
1982.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. Mil platôs – capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Ed. 34,
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FOX, Jonathan. O essencial de Moreno: textos sobre psicodrama, terapia de grupo e espontaneidade. São
Paulo: Ágora, 2002.
KELLERMANN, Peter Felix. O psicodrama em foco e seus aspectos terapêuticos. São Paulo: Agora, 1998.
MORENO, Jacob Levi. Einladung zu einer Begegnung. Viena: Frühling, 1914.
. Psicodrama. São Paulo: Cultrix, 1975.
. Psicoterapia de grupo e psicodrama. São Paulo: F. de Cultura, 1974.
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NAFFAH NETO, A. O psicodrama – descolonizando o imaginário. São Paulo. Brasiliense, 1979.
NERY, Maria da Penha. Tteorias do vínculo e dos papéis: um estudo dialético da personalidade. Monogra-
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PICHON-RIVIÈRE, E. Teoria do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
WEIL, Pierre. Psicodrama. São Paulo: Cultrix, 1967.

SBDG – Caderno 82 v A influência dos papéis no desenvolvimento individual e grupal 26


Cadernos da

Sociedade Brasileira de
Dinâmica dos Grupos

83
Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 102º
Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos,
realizado na cidade de São Paulo, SP,
de 10 de outubro de 2003 a 5 de junho de 2005.

Coordenação:
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2006

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GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza
GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira
VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira

Núcleo MS
GESTOR GERAL: Maria Selma Perez
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende
GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini

SBDG – Caderno 83 3
Sumário

Leitura e análise dos processos presentes na formação / interação /


evolução / involução / desenvolvimento de um dos subgrupos
do Grupo de Formação SP11
Célia de Souza Mineiro
Cláudio Conceição Pereira
Karen Rumi Yoshida
Maria Lúcia Velasco da Silva
Stelamaris Nani Baffile

Will Schutz e Martin Baró


visitam o Grupo São Paulo 11
Aladim de Paula Freitas Júnior
Cecilia Carmen Jacinto Andrade
Margareth Mendes
Marisa Cavichioli
Maura Mazzeo Zurdo
Miriam Lamana

De que maneiras a astrologia contribui na leitura


e compreensão dos processos grupais
Angela Ruriko Sakamoto
Daniela Curioni
Flávia da Costa de Paula
Roberto Hirsch Wow
Sueli Maria Pondaco
Viviane Fontão Soubhia

SBDG – Caderno 83 4
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
São Paulo – SP
Coordenação: Genira Rosa dos Santos, Mauro Nogueira de Oliveira

Leitura e análise dos processos presentes


na formação / interação / evolução / involução /
desenvolvimento de um dos subgrupos
do Grupo de Formação SP11

CÉLIA DE SOUZA MINEIRO


CLÁUDIO CONCEIÇÃO PEREIRA
KAREN RUMI YOSHIDA
MARIA LÚCIA VELASCO DA SILVA
STELAMARIS NANI BAFFILE

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 1


SUMÁRIO

1 Contextualização ....................................................................................................3

2 Fundamentação teórica .........................................................................................3


2.1 Psicanálise – S. Freud ..............................................................................................3
2.2 Fundamentos de W. R. Bion ....................................................................................5

3 Os processos............................................................................................................6
3.1 A escolha..................................................................................................................6
3.2 A falta de acordo......................................................................................................7
3.3 A divisão de tarefas..................................................................................................7
3.4 Surgindo o inimigo ..................................................................................................8
3.5 Surgindo um lugar seguro........................................................................................9
3.6 Uma tentativa de privacidade.................................................................................11

4 Análise do processo do subgrupo de acordo com Schutz .................................13

5 Fundamentação teórica e análise do processo segundo Pichon-Rivière .........14


5.1 Rede de comunicação no grupo e os papéis...........................................................14
5.2 Papel e liderança ....................................................................................................15
5.3 Análise do processo do subgrupo ..........................................................................15

6 Considerações finais.............................................................................................16

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 2


1 CONTEXTUALIZAÇÃO

O 11º Grupo de Formação de Coordenadores de Grupo teve início em outubro de


2003 e término previsto em junho de 2005.
Iniciou suas atividades com 23 participantes e está sendo encerrado com 17, tendo
contado com a presença de dois coordenadores: Mauro Nogueira e Genira dos Santos, em
escala de revezamento, alternando-se a cada encontro e participações conjuntas ao térmi-
no/início de cada módulo.
Um grupo bastante heterogêneo que contava entre seus participantes: assistentes
sociais, psicólogos, administradores, pedagogos, médicos e engenheiros, na faixa etária
de 25 a 52 anos, e que desempenhavam funções bastante heterogêneas também, como:
profissionais liberais, consultores empresariais, professores, empregados do setor priva-
do, entre outras.
O objetivo do presente trabalho é fazermos a leitura e análise dos processos gru-
pais do nosso próprio subgrupo, proposta esta que surgiu da necessidade de apresentar-
mos um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), deste Grupo de Formação SP11, que
trouxesse à luz nosso processo de aprendizagem prático e teórico. Vislumbramos então,
uma grande oportunidade de colocarmos em prática os conhecimentos e técnicas adquiri-
das, realizando esta análise, ou se preferirem, auto-análise.
A idéia tomou forma e tornou-se uma proposta extremamente rica em conteúdo e
possibilidades, pois na medida em que resgatávamos os acontecimentos que envolveram
nosso subgrupo, desde a escolha até os acontecimentos mais recentes, íamos revivendo
cada momento, identificando e analisando os fatos, e relacionando com os fundamentos
teóricos. Mas dentro desta análise que nos envolvia e a tudo nos dizia respeito, se alter-
navam dinamicamente os papeis, pois no mesmo tempo em que éramos expectadores de
nossas vivências passadas, éramos protagonistas de vivências em tempo real, que se tor-
navam objeto de novas leituras e análises.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Fundamentando a análise da dinâmica do subgrupo, utilizamos o respaldo teórico


mais aprofundado de Freud e Bion e algumas análises utilizando Schutz e Pichon-
Rivière.

2.1 Psicanálise – S. Freud

Freud estabeleceu diversos conceitos dentro da teoria psicanalítica a partir de um


modelo individual (aparelho psíquico), que foram utilizados nas tratativas de trabalho em
grupo por outros teóricos da psicanálise.
A utilização destes conceitos associada à visão grupal de cada um deles resultou
em diferentes visões do trabalho da psicanálise com grupos.

Inconsciente
É a instancia psíquica que abriga elementos instintivos, que nunca foram cons-
cientes e que não são acessíveis à consciência, bem como, material que foi excluído da

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 3


consciência, censurado e reprimido. Este material não é esquecido ou perdido, mas não
lhe é permitido ser lembrado.

Mecanismos de defesa do ego


“Diante de conflitos, frustrações, inibições, sentimentos dolorosos ou insuportá-
veis o homem busca adaptar-se ou ajustar-se”. E ele o faz através de mecanismos que lhe
conferem, ainda que temporária e precariamente, a sensação de equilíbrio e estabilidade
emocionais – são os assim denominados mecanismos de defesa. Salientamos que todos
estes mecanismos são inconscientes. Destacamos dentre eles os seguintes:

ƒ Introjeção: Constitui a priorização, pelo indivíduo, do meio em que vive (valores,


idéias, costumes, etc.) em detrimento de si mesmo.
ƒ Projeção: é caracterizada pela tendência que determinadas pessoas têm de torna-
rem o meio em que vivem, responsável pelo que nelas próprias se originam.
ƒ Regressão: retrocesso da conduta a estágios anteriores ou menos maduros da atual
idade cronológica do individuo, porém que proporcionam a ele maior segurança.
ƒ Racionalização: processo pelo qual o indivíduo procura apresentar uma explica-
ção coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para
uma atitude, ação, idéia, ou sentimento, de cujos motivos verdadeiros não se aper-
cebe.
ƒ Negação: é a não aceitação de fatos ou situações reais que perturbam o individuo.
ƒ Recalque: operação pelo qual o indivíduo procura repelir ou manter no incons-
ciente representações (pensamentos, imagens, recordações) ligadas a uma pulsão,
impulsos que podem gerar prazer por si mesmo, porém ameaçaria provocar des-
prazer relativamente a outras exigências.

Resistências
Força oposta ao movimento de trazer a tona o material inconsciente.
Quanto maior a proximidade com o material inconsciente, maior será a resistência
para fazê-lo. Logo a resistência apresenta intensidades diferentes: cresce quando aproxi-
mamos do novo assunto, alcança a sua intensidade máxima, quando esta no clímax da sua
abordagem e diminui quando o assunto é posto de lado.
Algumas formas de manifestação das resistências. Os integrantes de um grupo
quando consultados a respeito de determinado assunto podem alegar que não lhes ocorre
nenhum pensamento a respeito, bem como tantos pensamentos lhe ocorrem que não con-
seguem apreender nenhum, críticas em relação a eles, explicações instruções e ensina-
mentos sobre o tema.

Transferência
Processo de deslocamento do indivíduo para o terapeuta de sentimentos perten-
centes ao seu histórico de vida. A transferência pode ser positiva (amor, carinho, admira-
ção, paixão etc.) ou negativa (raiva, hostilidade etc.).

Contratransferência
É decorrente da influencia do paciente sobre os sentimentos inconscientes do te-
rapeuta que fará as suas intervenções guiadas pelos sentimentos nele mobilizados.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 4


2.2 Fundamentos de W. R. Bion

Segundo Bion, em sua participação ativa como adulto, em vários grupos, o ser
humano dispõe de diferentes modos de reação. Ao reunirem-se várias pessoas para efe-
tuar uma tarefa podem discernir-se dois tipos de tendências: uma que se dirige à realiza-
ção da tarefa e outra que parece se opor a ela. A atividade de trabalho é obstruída por
uma atividade mais regressiva e primária.
Para referir-se a esses fenômenos, que Bion considera típicos, ele introduz uma
terminologia específica que dá certa unidade aos traços comuns observados em experiên-
cias diferentes. São esses os termos: mentalidade grupal, cultura grupal, supostos básicos,
grupo de suposto básico e grupo de trabalho.

Mentalidade grupal e cultura do grupo


A hipótese da existência de uma mentalidade grupal deriva do fato de que o gru-
po funciona em muitas oportunidades como uma unidade, ainda que seus membros a isto
não se proponham nem disto tenham consciência.
O termo designa, pois, a atividade mental coletiva que se produz quando as pes-
soas se reúnem em grupos. A mentalidade grupal está formada pela opinião, vontade ou
desejo unânimes do grupo em um dado momento. Os indivíduos contribuem para ela
anônima ou inconscientemente. A mentalidade grupal pode estar em conflito com os de-
sejos, opiniões ou pensamento dos indivíduos, produzindo-lhes desconforto, mal estar, ou
outras reações.
A organização do grupo em determinado momento pode ser vista como a resul-
tante do interjogo entre a mentalidade grupal e os desejos do indivíduo. Esta organização,
por mais primitiva e rudimentar que seja, é chamada por Bion de cultura do grupo. Este
conceito inclui a estrutura adquirida pelo grupo em um dado momento, as tarefas que se
propõe, e a organização que adota para a realização das mesmas. A cultura do grupo é um
fato observável dentro do contexto da situação grupal, que pode ser descrita pelo obser-
vador tendo este em conta a conduta dos integrantes do grupo, os papéis que desempe-
nham, os líderes que atuam, e o comportamento do grupo como totalidade.

Supostos básicos
Suposto básico ou suposição básica é um termo que qualifica a mentalidade gru-
pal. As suposições básicas estão configuradas por emoções intensas e de origem primiti-
vas, consideradas como básicas, por este motivo. Sua existência determina, em parte, a
organização que o grupo adota, e o modo pelo qual encara a tarefa que deve realizar.
Os impulsos emocionais subjacentes no grupo, as suposições básicas, expressam
algo assim como fantasias grupais, de tipo onipotente e mágico, relacionadas com o mo-
do de obter os seus fins ou satisfazer seus desejos. Esses impulsos, que se caracterizam
pelo irracional de seu conteúdo, têm uma força e uma realidade que se manifesta na con-
duta do grupo. É importante salientar que as suposições básicas são inconscientes, e mui-
tas vezes opostas às opiniões conscientes e racionais dos membros que compõem o gru-
po.
Os supostos básicos hierarquizados por Bion são três. O primeiro deles é o cha-
mado suposto básico de dependência (sbD): o grupo sustenta a convicção de que está
reunido para que alguém proveja à satisfação de todas as suas necessidades e de todos os
seus desejos, alguém de quem o grupo depende de uma forma absoluta. Em uma formu-

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 5


lação mais modelizada a crença coletiva é que existe um objeto externo cuja função é
prover a segurança do grupo.
O suposto básico de ataque-fuga (sbF) consiste na convicção grupal de que existe
um inimigo, e que é necessário atacá-lo ou dele fugir. Em outros termos, o objeto mau é
externo, e a única atividade defensiva diante dele consiste em destruí-lo (ataque) ou evitá-
lo (fuga).
O suposto básico de acasalamento (sbA) é, em termos narrativos, a crença, cole-
tiva e inconsciente, de que quaisquer que sejam os problemas e necessidades atuais do
grupo, um fato futuro ou um ser ainda por nascer, os resolverão, quer dizer, há esperança
de tipo messiânico. Esta esperança irracional e primitiva é fundamental para definir o
suposto básico de acasalamento. Muitas vezes a esperança é colocada num par cujo filho,
ainda não concebido, será o salvador do grupo. O importante neste estado emocional é a
idéia de futuro, e não a resolução no presente. Em termos religiosos é a esperança na apa-
rição de um Messias.
Os indivíduos que tomam parte na atividade chamada suposto básico o fazem de
forma automática e inevitável, não necessitando para isso de nenhum treinamento espe-
cial, de nenhuma experiência emocional ou maturidade mental. Bion propõe chamar va-
lência à capacidade instintiva de participar na atividade mental e no afazer grupal, de
acordo com os supostos básicos.
Valência, termo tirado da física, que designa a maior ou menor disposição do in-
divíduo para combinar-se na atividade de suposto básico.

3 OS PROCESSOS

3.1 A escolha

A formação de nosso subgrupo, após seis encontros com o grupão, contou com
um processo de escolha baseado em critérios individuais que só tomamos conhecimento
na realização do presente trabalho, a saber: pessoas cuja formação fosse mais ou menos
equivalente, que aparentemente fossem acolhedoras e cuidadosas, menos competitivas e
ameaçadoras e que possivelmente não permitissem a existência de conflitos e a exigência
de perfeccionismo.

Aqui surge o conceito de valência de Bion, na medida em que os membros tentam


combinarem-se através de critérios que assegurem as suas respectivas preservação e
segurança e que acabam por definir um acordo inconsciente de não lidarem com confli-
tos que eventualmente emergem no subgrupo.
No grupão verifica-se a existência de participantes acentuadamente racionais e
os emocionais. O subgrupo inconscientemente não quer considerar a inclusão dos pri-
meiros.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 6


3.2 A falta de acordo

O subgrupo não estabeleceu previamente nenhum acordo quanto à forma de en-


contro, desenvolvimento, distribuição de tarefas, horas e locais para a realização das tare-
fas atribuídas a cada encontro pelo grupo maior.
Ficavam então, os participantes, à mercê de e-mails, telefonemas, que nem sem-
pre eram recebidos por todos ao mesmo tempo acentuando ainda mais a dificuldade para
conseguirem um acordo comum. Tal fato gerava irritabilidade e insatisfação não expres-
sas no subgrupo.
Os locais que eram sugeridos giravam em torno do salão de festas do prédio de
um dos membros (cobrada uma taxa de cada participante para utilizá-lo), praça de ali-
mentação de shoppings, flats e algumas residências que eram descartadas por serem tidas
como “fora de mão” (estas últimas oferecidas somente por dois membros).
Este fato deflagrou o sentimento de falta de acolhimento, solidariedade, intimida-
de nos participantes do subgrupo, porém não expresso por ninguém.

Os sentimentos de irritabilidade e insatisfação gerados pela própria desorgani-


zação do subgrupo parecem caracterizar a existência de traços regressivos nele, tendo
em vista seus membros perceberem a disfuncionalidade de seu movimento e não expres-
sarem-na. A atitude evidente é a de que algo magicamente tivesse que acontecer como
solução, independente do esforço dos respectivos participantes. O que também expressa
a manutenção inconsciente do contrato de não conflito.
Por outro lado, os locais sugeridos parecem revelar que os participantes incons-
cientemente evitam a proximidade, dado serem locais impessoais, por receio de expo-
rem-se e terem que lidarem com possíveis conflitos.

3.3 A divisão de tarefas

A divisão de tarefas também não foi estabelecida, fazendo com que no subgrupo
surgissem os que pesquisavam o tema, mas nem sempre o liam, os que apenas liam o
material, os que liam e resumiam.
Assim estes últimos tomavam a frente das reuniões também pelo escasso tempo
que se tinha disponível para discutir, o que acabava por gerar, em alguns, diferenças na
participação do trabalho, o sentimento de rejeição e desrespeito do subgrupo.
Tais incômodos não eram revelados ao grupo, mas comentados entre os que se
consideravam “mais chegados”, fora dele.
Apesar de tais dificuldades os trabalhos eram apresentados. Com o passar do tem-
po, as tarefas ficaram mais centradas em três membros do grupo (pesquisa, confecção
final de texto, apresentação e confecção de transparências) liderados por um deles, apesar
do restante freqüentar as reuniões, pesquisar e opinar sobre questões do tema.
Para esses mesmos membros do grupo essa participação não era reconhecida co-
mo uma efetiva participação. Isto porque consideravam como “tarefa realizada” a forma
com que eles próprios desempenhavam tais tarefas (pesquisa, leitura e resumo), descon-
siderando outros modos tais como: questionamentos, esclarecimentos ou mesmo opiniões
levantados sobre o tema, no decorrer dos trabalhos. A impressão era de que não havia
sequer colaboração.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 7


A expectativa da liderança era que todos fizessem do mesmo modo as tarefas. A
“palavra final”, porém, ficava a cargo dos três membros e eram aceitas pelos demais,
apesar dos respectivos incômodos, não revelados abertamente.

Percebe-se a escolha inconsciente de um líder de tarefa, (por ser esse aspecto o


mais valorizado pelo subgrupo), através de critérios representativos da parte “racional”
do grupão que fora excluída no processo de escolha do subgrupo. A forma acadêmica,
exigente e formal, características do líder, é a representante dessa parte. O líder passa
então a ser o depositário dos papéis que não querem ser assumidos pelos membros do
subgrupo.
A negação das diferenças existentes no “modus operandi” dos participantes, é a
forma com que o subgrupo lida com a liderança à medida que os incômodos relativos ao
desenvolvimento das tarefas não eram considerados no subgrupo.

3.4 Surgindo o inimigo

Um dos membros começou a ser significativamente notado pela falta e desinteres-


se pelos encontros, bem como pelo não cumprimento de suas propostas para com o gru-
po. Em uma das vezes propôs ao grupo uma conference call, a fim de favorecer a realiza-
ção da próxima reunião do grupo através dessa via. Todos os membros então se organiza-
ram de modo a estarem em seus respectivos telefones no momento combinado. O referido
membro não só não a realizou como não se justificou posteriormente com nenhum deles,
agindo como se nada tivesse ocorrido.
Esse fato fez com que os integrantes do subgrupo manifestassem sua indignação e
raiva para com o referido membro e responsabilizassem-no pela falta de compromisso e
respeito. Porém tais insatisfações não foram dirigidas a ele, mas falada entre os integran-
tes do subgrupo.

Esse momento revela a projeção dos sentimentos de desrespeito, falta de com-


promisso, desorganização e insatisfação com o próprio grupo para um de seus membros
e ao mesmo tempo o suposto básico de ataque-fuga, com ênfase no ataque, pela convic-
ção da existência de um inimigo que deve ser atacado e eliminado.

Tal incidente culminou com a insatisfação do grupo maior a respeito do membro,


tendo em vista as suas faltas ou idas incompletas ao grupão (caso fosse na sexta-feira, não
iria no sábado e vice-versa).
O desconforto evidenciou-se pelos componentes do grupão acharem-se expostos,
colocando mesmo suas intimidades para alguém que não se comprometia com eles e que
não fazia o menor esforço para fazê-lo.
Convidado a posicionar-se a respeito, no grupão, o referido membro continuou
mantendo seu posicionamento, afirmando serem essas suas condições possíveis de parti-
cipação, fato que permitiu ao grupão convidá-lo a se retirar.
Para o subgrupo a saída deste participante confirmou suas impressões a respeito
dele, mas não foi um fato comentado exaustivamente pelo mesmo.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 8


O posicionamento do grupão frente ao referido participante parece ter confirma-
do tanto o suposto básico de ataque-fuga de Bion, bem como a projeção do subgrupo,
uma vez que identifica e ratifica a existência de um “inimigo” a ser retirado de cena
também no grupão, eximindo o restante dos membros do grupão de qualquer responsabi-
lidade sobre o fato, o que também é entendido pelos membros do subgrupo, haja vista a
inexistência de quaisquer questionamentos sobre a responsabilidade de seus participan-
tes sobre o ocorrido e o ataque ao participante.

As tarefas continuaram a serem cumpridas da mesma forma, ou seja, mantendo-se


dois membros como os responsáveis principais, sendo que um deles era quem liderava.
Nessa fase houve críticas sutis a respeito do líder que afirmavam ser ele muito
“formal”, na elaboração dos trabalhos e que se continuasse assim, o tempo disponível
para a conclusão das tarefas seria insuficiente. Tais críticas eram respondidas pelo líder
com brincadeiras e afirmações de que talvez fosse necessário o tempo despendido.
O comportamento do subgrupo de não expressar direta e verbalmente os seus in-
cômodos àqueles que os provocavam permanecia o mesmo, porém, notou-se o surgimen-
to de faltas, não leituras e participação reduzida nas tarefas de alguns membros do grupo.

Observa-se o aparecimento de uma resistência à figura do líder expressa pelas


críticas feitas a ele, bem como do suposto básico de luta-fuga de Bion, com ênfase na
fuga pelos comportamentos de faltas, não leituras e redução na participação das tarefas
no subgrupo.

3.5 Surgindo um lugar seguro

No grupão, passou a ser assunto de jornal de alguns membros do subgrupo, críti-


cas ao líder apontado como “exigente”, “formal” e “acadêmico” no modo de elaborar os
trabalhos. Geralmente tais críticas eram seguidas de justificativas, pelos próprios mem-
bros do subgrupo, sobre tal modo que indicavam que: “na verdade ele gostava mais dessa
parte que os demais membros”, “no fundo era boa essa sua forma de ser por obrigar as
pessoas a estudarem” e que, portanto apesar do incômodo, permanecesse assim. Tais crí-
ticas não provocaram desconforto para o referido líder e nem objeto de discussão no sub-
grupo.

A resistência ao líder prossegue, seguida de racionalização, dadas as justificati-


vas que os membros ressaltam para manterem-no. Tanto a resistência como a racionali-
zação parece defender os membros dos sentimentos de incapacidade de conhecimento e
de lidar com conflitos que o líder provoca nos mesmos. A exposição das insatisfações
sobre o líder no grupão caracteriza o suposto básico de dependência de Bion, dado sur-
gir o grupão como o que irá prover as insatisfações do subgrupo.

Um incidente no grupão com um dos membros resultou na possibilidade de saída


desse mesmo membro, tido como líder deste subgrupo, o que fez com ele não participasse
de metade desse encontro, onde várias decisões sobre as posteriores tarefas dos subgru-
pos foram tomadas (divisões de temas, datas, propostas de reuniões futuras, coordenações
em duplas).

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 9


O retorno deste membro na reunião seguinte do subgrupo foi marcado pela insa-
tisfação de um dos membros do grupo sobre o modo como os trabalhos eram realizados,
culminando na questão de porque só o “modo” deste membro fazer era levado em conta.
Houve discussão no subgrupo em que claras ficaram as posições dos que silencia-
ram e dos que colocaram “panos quentes na situação”. A discussão ficou entre o líder que
apontava de superficial o membro que dele se queixou e este de acadêmico o líder. A
resolução tornou-se possível entre eles, no momento em que ambos concordaram que
cada um tinha o seu próprio jeito, ficando cada um com a incumbência de refletir sobre o
seu.

Há uma tentativa de projetar em alguém (líder ou o membro incomodado) as fa-


lhas do grupo, tendo em vista que não há assunção de quaisquer falhas no grupo.

Verifica-se também a competição de um dos membros pela liderança, através do


suposto básico luta-fuga, com ênfase na luta.
Esclarece-se que o participante incomodado morava fora de SP, chegando duas
horas após o horário marcado, por dificuldades da própria viagem, e de comunicação
entre os membros do subgrupo, no momento em que o trabalho praticamente já estava
concluído.
Surgiu a partir daí, entre os participantes, a sensação de individualismo e egoísmo
de uns para com os outros.

Esta projeção apesar de continuar, parece expandir-se pelo subgrupo na medida


em que os membros acusam-se mutuamente e não refletem sobre os seus respectivos in-
dividualismo e egoísmo.
A comunicação distorcida vem expressar a dificuldade existente entre os mem-
bros do subgrupo de proximidade e intimidade.

Dessa reunião em diante, dois dos participantes do grupo começaram a levar para
o grupão as insatisfações com o funcionamento do subgrupo (modo de trabalho e dificul-
dades existentes) e após extenso relato de tal assunto, o líder do subgrupo presente no
grupão relata seu espanto e descontentamento em relação ao subgrupo, tendo em vista
não ter tido tão recentes notícias no subgrupo, bem como de seu interesse em discutir tais
insatisfações no subgrupo e não no grupão. O que não foi feito, pois não se voltou nova-
mente a esse assunto no subgrupo.
Houve reações por parte de alguns membros do grupão de tentar trocar ou substi-
tuir os membros do subgrupo na tentativa de melhorar sua dinâmica. O que foi mal rece-
bido pelo subgrupo dado ter este deixado clara a falta de necessidade desse procedimento
ante a possibilidade de seus membros poderem arcar com suas dificuldades.

O Suposto de dependência do subgrupo para o grupão tende a persistir com as


queixas sendo levadas a ele, numa tentativa de resolução. Porém ante a ameaça de dis-
solução, como proposta para sanar suas dificuldades, o subgrupo, reage através da coe-
são, de forma a não permitir a entrada de novos membros ou a saída dos já existentes.

Nessa época um dos membros comunica que não comparecerá aos trabalhos do
subgrupo e no dia da reunião com o grupão, questão de três h antes, telefona para alguns
membros do subgrupo comunicando sua saída do curso, o que causa em alguns a sensa-

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 10


ção de traição, desrespeito, falta de atenção e até falta de vínculo do mesmo para com o
subgrupo. De sete então o subgrupo passou a contar com cinco componentes.
A reunião do subgrupo seguida a esse fato foi realizada sem a presença física dos
participantes e elaborada através de e-mails.
Na combinação desse encontro é entendido pelos membros do grupo que o líder
não comparecerá, o que não corresponde à verdade, tendo em vista este informar que
teria dificuldade em marcar previamente a data, por ocasião de suas férias. O subgrupo
acaba por não informá-lo da data acertada para o trabalho.

Surge o desejo inconsciente de exclusão do líder, quando os membros entendem


erroneamente que o mesmo não participará da citada reunião, seguida de culpa, retrata-
do pelo não encontro pessoal com os participantes (se ele não for ninguém vai), bem
como a assunção da liderança por um terceiro, nesse momento.

3.6 Uma tentativa de privacidade

Cada reunião, a partir daí, passou a ser agendada previamente (no final dos encon-
tros com o grupão) ficando somente o local, bem como o material a ser pesquisado, a ser
discutido a posteriori.
Todos os participantes compareceram às reuniões seguintes. Paralelo às tarefas
iniciou-se o trabalho de conclusão do curso, optando o subgrupo em fazer uma análise
sobre a sua própria dinâmica, tendo a residência do líder, como local para os quatro últi-
mos encontros, por uma questão de logística para alguns e pela acolhida satisfatória para
outros.
Quando das reuniões onde já se realizava a análise do subgrupo, começaram a ser
expressas as discordâncias, bem como a afetividade entre os membros, auxiliadas pela
lembrança de situações passadas necessárias à análise. Fica a partir de então clara, para o
subgrupo a conquista de certa intimidade entre o grupo. Motivo de alegria para todos os
membros.
Na penúltima reunião em que por algum motivo a justificativa da escolha da resi-
dência do líder “por uma questão de logística” veio à tona iniciou-se uma discussão devi-
do aos sentimentos de uso, indignação e desrespeito gerados no líder e que foram expres-
sos na própria reunião pelo mesmo, o que fez com que alguns reafirmassem que os sen-
timentos de acolhimento também estavam presentes apesar da logística e um dos mem-
bros reafirmasse o seu posicionamento de que em primeiro lugar era a logística. Esse
membro era o que tinha se oposto claramente ao líder em reunião anterior. Ficou estabe-
lecido também que para a próxima reunião (última) todos os membros tentariam fazer
uma leitura teórica prévia do processo do subgrupo e que a partir dela seria elaborada a
leitura final.
O membro opositor ao líder propôs, através de e-mail, que a última reunião fosse
realizada em um hotel onde estaria hospedado. Para essa reunião um dos membros não
estaria disponível; dois deles concordaram com a proposta e o líder afirmou que não esta-
ria presente no encontro em razão de sua dificuldade em ir dirigindo até o local, pois não
sabia “andar” em São Paulo de carro. Alguns entenderam esta posição do líder como de-
finitiva e um dos membros ofereceu a proposta de combinarem em como irem. O acordo,
porém, ateve-se à explicação do itinerário que o líder poderia seguir, fato que não atendeu

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 11


a sua necessidade, dada sua dificuldade de localização, bem como gerou o sentimento de
exclusão no mesmo. Ante a proposta, o líder, através também de e-mail reafirma que não
irá comparecer, porém que enviará sua parte do trabalho por e-mail, como de fato o fez,
porém somente à na sexta-feira à noite para o e-mail profissional de somente um dos
membros, que não estava mais com acesso a este recurso no horário citado.
Diante do fato da não presença do líder, que como já citado anteriormente repre-
sentava e de fato detinha maior conhecimento intelectual sobre o assunto e os autores a
serem estudados, alguns membros do subgrupo não se sentiram seguros e levantaram a
possibilidade de uma supervisão teórica, o que daria segurança e aprofundamento teórico.
Como este fato foi definido na noite anterior ao encontro, para que o líder (que
não iria ao encontro) também ficasse ciente deste novo movimento, na manhã do citado
encontro o membro que sugeriu o local diferente, telefona para o líder comunicando-lhe
que a reunião se realizará na residência de um dos coordenadores do grupão para uma
supervisão e auxilío quanto à leitura do processo do grupo. Questionado pelo líder sobre
o recebimento do e-mail com o trabalho, o participante comunica o não recebimento e
também a dificuldade de realização da leitura teórica do processo do subgrupo por alguns
membros e a não realização da leitura por outros.
No horário e local estipulados todos os participantes estavam presentes na resi-
dência do citado coordenador, inclusive o líder.
A reunião foi aberta com a insatisfação de um dos membros do grupo em relação
à atitude do líder reafirmando que ele “só fazia as coisas do jeito que queria”, seguido de
um embate entre o líder e ele (membro que se opunha ao líder). Interrompidos pela coor-
denadora que sugeriu que cada um dos participantes se posicionasse sobre o ocorrido,
tendo em vista a tarefa de leitura ainda a ser realizada, os membros passaram a posiciona-
rem-se. Alguns evidenciaram a sua desilusão para com o grupo afirmando ter sido menti-
roso o processo de proximidade até então conquistado; outros que a tarefa seguisse e o
aprendizado fosse o foco principal do encontro após expressarem seus descontentamentos
com o ocorrido. Os descontentamentos gerais incidiam sobre a forma de expressão do
líder nos encontros e modo imperativo como até então conduziu as tarefas.
A partir daí, tendo a leitura teórica do líder como parâmetro para as discussões,
foram realizadas, com a ajuda da coordenadora, as adições e correções da leitura pelos
membros do grupo.

Esse momento parece retratar a hipótese do estabelecimento inicial de certa in-


timidade no grupo, tanto pela pessoalidade dos locais aceitos para as reuniões, como
pelas discussões geradas no grupo sobre sua dinâmica, em que ficam evidentes os afetos
e discordâncias entre os participantes. Porém torna-se inconscientemente ameaçadora
essa posição para o subgrupo à medida que a sugestão aceita para o encontro recai no-
vamente em locais impessoais.
Por outro lado verifica-se a competitividade com a liderança, na referida suges-
tão, bem como a tentativa de excluí-la. Porém em nome da tarefa, item bastante valori-
zado pelo subgrupo a liderança é mantida, dada a utilização de sua leitura teórica para
a análise e comunicação da mudança do local da reunião ao líder.
Outra hipótese que surge é a de que o temor presente no subgrupo em relação à
intimidade evidencia-se de tal forma, que faz com que os conflitos sempre nele existentes
surjam no último encontro como forma de não terem, seus membros, que lidarem com o
sofrimento das perdas decorrentes do término de seus encontros. Assim fechando a últi-

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 12


ma reunião com discussões, elimina-se a possibilidade da dor e mantém-se o contrato de
não mexerem nos conflitos.
Nesse momento fica evidente a regressão do grupo que segundo Freud o grupo
retrocede à conduta ou estágios anteriores ou menos maduros, porém que proporcionam
a ele maior segurança.

4 ANÁLISE DO PROCESSO DO SUBGRUPO


DE ACORDO COM SCHUTZ

Segundo W. Schutz no período inicial do desenvolvimento do grupo, a compatibi-


lidade de inclusão é muito importante. No entanto, pelas características de alguns elemen-
tos do nosso subgrupo, o mesmo teve seu início voltado estritamente à tarefa e à fase de
inclusão onde as pessoas manifestam e exercitam o desejo de receber atenção, de ter es-
paço para interagir e ser único aconteceu após alguns meses e de forma não satisfatória
para alguns elementos.
Em função do exposto, o comportamento dos membros era de queixas em relação
à participação, presença, horário, impedindo o aprofundamento nas relações interpes-
soais. De fato os membros não se sentiam e não percebiam sua importância ou signifi-
cância no subgrupo.
Podemos inferir que a manutenção dessa “queixa” em relação à presença, etc.,
deve-se à resistência em lidar com conflito por receio de rejeição e baixa auto-estima de
algumas pessoas.
A figura do líder demora a ser reconhecida pelos membros e esses durante os en-
contros ou fora dos encontros formais têm sua atenção voltada entre si.
Ao final da primeira fase dos seminários, há a possibilidade de mudança na for-
mação de subgrupos para os próximos seminários e, portanto, uma ameaça de mudança
de pessoas no subgrupo e entrada de novos membros. Nesse momento o grupo demonstra
o senso de estarem juntos e temporariamente o incômodo demonstrado pela ausência do
sentimento de pertencer é deixado de lado.
À medida que as relações começam a se desenvolver as pessoas almejam dife-
rentes papéis (líder, apoiador, brincalhão, oponente, conciliador). Com a mani-
festação dessas características o grupo passa então à fase do controle e de-
monstra estar nessa fase propriamente dita. A luta pelo poder começa a surgir
principalmente através de queixas em relação à postura do líder. O confronto é
demonstrado direta e na maioria das vezes indiretamente, fazendo uso também
da sabotagem. (brincadeiras, mudança de foco, atrasos).
A comunicação ou queixa se dá em pares e nunca diretamente aos membros do
subgrupo. Existe o ataque de um dos membros ao líder do subgrupo, atribuindo a mesmi-
ce e forma acadêmica nas apresentações dos seminários.
Nesse momento inicia-se a competição pela demonstração da competência, porém
com comunicação de forma inadequada, o que podia estar sendo representado pela baixa
auto-estima e sentimento de incompetência, impedindo que a escolha dos autores fosse
ampliada para autores do conhecimento deste membro competitivo (como Schutz, More-
no) e não somente pela justificativa relatada anteriormente de que seria uma oportunidade
de aprofundar os autores Bion e Freud.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 13


O controle entre os membros do grupo, ou seja, a competição entre a pessoa que
estava competindo com o líder poderia ter se manifestado com outro elemento que tam-
bém representava uma ameaça em termos de conhecimento e afetividade, porém esse
suposto membro ameaçador deixou o grupo e a competição ficou apenas localizada entre
duas pessoas (líder e membro).
A fase de abertura ocorreu quando o grupo iniciou a tarefa de análise de processo
do subgrupo.
Essa fase, segundo Schutz é caracterizada pelo grau no qual cada membro está
disposto a se abrir ao outro. A abertura varia no tempo, entre os indivíduos e dentro das
relações.
Os afetos começaram a ser demonstrados através de situações materiais como: a
acolhida com refeição, residência, o cuidado de dar carona aos colegas, brincadeiras, ca-
rícias e conversas sobre assuntos mais íntimos como fantasias sexuais se tornaram mais
comum e permitidas. Nessa fase o subgrupo e grupão estavam vivenciando a mesma fase:
carícias, conversas sobre fantasias sexuais, prazer do lúdico.
Essa fase de abertura foi sutilmente experimentada pelos membros do subgrupo,
que segundo as hipóteses e inferências citadas acima, pela dificuldade de vínculos, pas-
sou rapidamente para a fase de separação onde se dá o processo inverso do subgrupo, ou
seja, dissolução das relações –. Exemplo: os membros começaram a falar de possíveis
reencontros, porém lúdicos.
Segundo Schutz a reação ante a iminente separação dos membros depende de sua
área de maior necessidade e de seus métodos preferidos de enfrentar a ansiedade. Nesse
caso foi o conflito – dificuldades encontradas para não estar presente no subgrupo, rea-
ções às palavras, que provocam sentimentos de desprezo e dizer: “Não sentirei falta de
um grupo tão hostil”.

5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E ANÁLISE DO PROCESSO


SEGUNDO PICHON-RIVIÈRE

5.1 Rede de comunicação no grupo e os papéis

A comunicação pode-se instalar de várias formas:

• De um para todos, quando somente um fala e os demais ficam ouvindo passiva-


mente. Esse modelo pode criar dependência de um líder:
• De todos para um só. A situação que aí se instala é a de depositação em um “bode
expiatório”
• Entre dois, que se isolam do grupo criando subgrupos;
• Entre todos, quando o que é falado é escutado pelos demais, e a comunicação se
torna fluida entre todos.

A comunicação mais utilizada no nosso subgrupo foi a de um para todos que cau-
sou a dependência do líder e entre dois, criando subgrupos.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 14


5.2 Papel e liderança

Cada um dos participantes de um grupo constrói seu papel em relação aos outros;
assim, de uma articulação entre o papel prescrito e o papel assumido, surge a atuação
característica de cada membro do grupo.
Os quatro papéis mais destacados, que se perfilam na operação grupal são: porta-
voz, bode expiatório, líder e sabotador.
O porta-voz é aquele que sendo depositário da ansiedade grupal, aparece, no gru-
po, expressando-a de diversas maneiras (através de palavras, atos ou silêncios). Nele se
inclui uma interação entre sua verticalidade e a horizontalidade do grupo, o que lhe per-
mite ser um emergente qualificado para denunciar qual é a ansiedade predominante que
está impedindo a tarefa.
É importante discriminar no processo de depositação que constrói os diferentes
papéis, os três elementos que a constituem: o depositante e o depositário, para permitir
assim, uma redistribuição da ansiedade e a ruptura do estereótipo dos papéis.
Outro papel que aparece freqüentemente nos grupos, o de bode expiatório, surge
como contrapartida ou decadência do chamado líder messiânico. Esta situação é caracte-
rística quando existe uma forte predominância do pólo paranóico. O bode expiatório é o
depositário de todas as dificuldades do grupo e culpado de cada um de seus fracassos. As
ideologias messiânicas, ou com tendência à idealização, que se fazem a cargo do grupo,
tendem constantemente a desenvolver este tipo de papel.
Outros papéis que Pichon-Rivière destaca em sua importância são: o de sabotador
e o do bobo do grupo. Estes papéis, quase universais, são depositários das forças que se
opõem à tarefa no interior do grupo (grupo conspirador), o que determina o aparecimento
de mecanismos de segregação. A segregação é o fantasma que ameaça constantemente o
grupo e é uma tentativa fracassada de redistribuirão da ansiedade, o que implica em difi-
culdades para enfrentar situações de mudanças. Podemos dizer que assim como a proje-
ção é o fantasma que ameaça constantemente a comunicação interpessoal, a segregação é
o principal inimigo na construção de uma comunicação grupal.
A detecção dos líderes tem uma importância fundamental na compreensão da di-
nâmica do grupo, tanto é assim, que a estrutura e a função do grupo se configuram de
acordo com os tipos de liderança assumidos pelo coordenador. A liderança pode ser as-
sumida tanto pelo coordenador como pelos diferentes membros do grupo e a análise e a
elucidação em ambos os casos é necessária para quebrar as estereotipias de funcionamen-
to.

5.3 Análise do processo do subgrupo

O processo do grupo para a realização do trabalho de conclusão de curso: Análise


do processo do subgrupo foi de muita coragem, pois revisitamos situações e fatos que
mexeram muito com o emocional de cada um.
Aparentemente as situações estavam resolvidas. A fala dos membros nos penúlti-
mos encontros foi: “nossa auto-estima está boa, nos aceitamos, podemos falar de nossos
medos, de nossas insatisfações. As divergências são consideradas como pontos de vistas
que se somam e não como competição”.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 15


O grupo estava muito envaidecido por saber que o tema escolhido, Análise do
Processo do subgrupo, era algo difícil, e que normalmente os subgrupos que escolhem
esse tema não chegam ao final.
No penúltimo encontro, realizado na residência do líder, apesar do conflito esta-
belecido em função de um elemento ter manifestado espontaneamente o motivo pelo qual
as reuniões eram realizadas na residência do líder, o grupo aceitou o parágrafo abaixo
como verdadeiro:
Em termos desse processo os membros perceberam que ao mesmo tempo em
que se surpreenderam com o processo de escolha, de sentimentos de que al-
guns não faziam as tarefas, não estavam comprometidos, da descoberta de que
foram taxados de grupo fraco etc.
O grupo hoje consegue fazer essa constatação com naturalidade, que nós denomi-
namos de maturidade. À medida que os fatos são apresentados, alguém chama a atenção
de que estamos analisando e não há julgamento. Os fatos são analisados e ampliados o
que fazem as pessoas do grupo crescerem, ao que chamamos de maturidade.
Na semana seguinte, inconscientemente os membros entraram em contato com a
perda, ou seja, a separação das pessoas. Os incômodos não tratados anteriormente se ma-
nifestaram através da regressão e resistência de mudança de local, e as conversas em du-
plas voltam a ser a forma de comunicação do subgrupo.
Houve necessidade de intervenção de um dos coordenadores, que o subgrupo
chamou de supervisão para aprofundamento teórico e só então o subgrupo pode entrar em
contato e fazer a análise do processo do mesmo, pois implicava em entrar no psicoemo-
cional que o grupo tinha negado desde o inicio – falta de um local fixo, preocupação ex-
cessiva com a tarefa.
Nesse momento o subgrupo entrou em contato com suas dificuldades, e os papéis
exercidos por cada um dos membros.
O bode expiatório – representado pelo membro que se desligou do subgrupo e do
grupão logo no início, porém sendo lembrado e depositário de todas as culpas dos insu-
cessos do subgrupo até as últimas reuniões.
O papel do sabotador foi vivenciado por três elementos com brincadeiras, desvio
de foco, segregação, porém mais claramente pelo membro que competiu por diversas
vezes com o líder.
O bobo do grupo também esteve representado por um dos membros que tinha a
postura de “desligado”, porém eventualmente fazia afirmações ou questionamentos que
levavam o grupo à reflexão ou mesmo a conflitos.

6 Considerações finais

No subgrupo estudado, relatamos o desejo dos membros de fazerem parte de um


grupo formado por pessoas acolhedoras, cuidadosas, fugindo do perfeccionismo, da ra-
cionalidade e da exigência. Era também uma característica dos membros deste subgrupo
a dificuldade de lidar como conflito e neste sentido foi selado entre os membros do sub-
grupo um contrato inconsciente para não haver conflito.
A análise do processo deste subgrupo nos revelou que um grupo que faz contrato
para não ter conflito e tem como objetivo uma tarefa a realizar acaba provocando a eclo-
são de coisas que não foram tratadas e ficaram inibidas. Neste grupo, esta eclosão aconte-

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 16


ceu no final do trabalho, podendo este ser um indicador de despedida, na medida em que
o conflito no momento final do grupo minimiza a dor da separação.
Foram observados outros movimentos que surgiram no grupo a serviço da neces-
sidade do não conflito, como por exemplo, os constantes movimentos para evitar a inti-
midade.
Alguns papéis que o grupo tentou fugir também apareceram no grupo, ficando
claro que os papéis existem e são circulares. Como exemplo podemos citar a escolha do
grupo em evitar pessoas que detinham grande conhecimento intelectual, mas acabou va-
lorizando este aspecto elegendo um líder por este deter exatamente esta característica que
se tentou evitar.
Permeando os processos revelados acima, a análise do processo deste subgrupo
trouxe várias possibilidades aos integrantes do grupo: aprofundar e principalmente anali-
sar a aplicabilidade dos fundamentos teóricos de Freud, Bion, Schutz e Pichon-Rivière na
prática vivenciada por este grupo.

SBDG – Caderno 83 ™ Leitura e análise dos processos presentes na formação... 17


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
São Paulo – SP
Coordenação: Genira Rosa dos Santos, Mauro Nogueira de Oliveira

Will Schutz e Martin Baró


visitam o Grupo São Paulo 11

ALADIM DE PAULA FREITAS JÚNIOR


CECILIA CARMEN JACINTO ANDRADE
MARGARETH MENDES
MARISA CAVICHIOLI
MAURA MAZZEO ZURDO
MIRIAM LAMANA

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 1
Dedicatória

Dedicamos este trabalho a todos que fizeram parte deste grupo,


mesmo àqueles que aqui permaneceram por tempo insuficiente
para criar os vínculos duradouros,
mas, apesar disso, em algum momento,
propiciaram oportunidades para tecermos relevantes ou restritos saberes.
Todos, mas todos mesmo, sem exceção,
foram elementos de importância vital
para enriquecermos nossas experiências
e constatarmos nossas diferenças.
Nosso reconhecimento eterno e afável “obrigado”.
Valeu!

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 2
Agradecimentos

Ao grupo SP11 e aos coordenadores:


Em princípio, apenas para cumprir uma regra e uma necessidade para os trabalhos
de conclusão de cursos.
O motivo principal é o de registrar que tivemos nos coordenadores agentes de in-
fluência determinante em nosso caminhar de grupo, mas, principalmente, assinalar que o
modo como o fizeram é que revela a qualidade desses seres humanos, que não contentes
de serem íntegros, surpreenderam pela competência e pelo zelo que demonstraram na
condução de meses de trabalho tão empreendedores.
Conseguiram ser agentes que nos impulsionavam em momentos de arrefecimen-
tos, e molas propulsoras em direção ao trajeto e à luta, que muitas vezes fomos forçados a
travar. Falamos de lutas mais internas do que grupais, que só existiram a partir de refle-
xões motivadas pelos coordenadores.
Inicialmente, devemos mencionar a colaboração prestada pela SBDG, através da
pessoa do Sr. Marcel Paranhos Dias, que apesar de não ter disponibilidade para ser nosso
coordenador, não mediu esforços para nos acompanhar, sempre que solicitado. Sua con-
tribuição não se limitou a nos prover de materiais teóricos, mas seu envolvimento com o
Grupo foi além, dando testemunho pessoal e experiência, de maneira despida de vaida-
des, com consistência e entusiasmo.
Um agradecimento especial também à Sra. Genira dos Santos, pela capacidade de
perceber o potencial de cada um, o entusiasmo pelo ensino, mas, sobretudo, em querer
aproveitar cada momento, por pequeno que pudesse parecer. Além disso, sempre de-
monstrou no olhar compreensão e desejo de visualizar aspectos mais avançados, que nos
mostrou ser possível a todos atingirem; portanto, nos envolveu constantemente.
Foi uma batalhadora incessante pela vitória individual, mas nunca se esqueceu do
processo grupal. Sua despretensiosa maneira de se portar foi admirável, pois apesar do
acúmulo de possibilidades, em nenhum momento se esquivou de colocá-los à nossa dis-
posição. Eis uma “amiga” que se transveste de coordenadora, mas, ao apagar das luzes da
coordenadoria, volta aos braços de seus companheiros de vida. Figura linda, cheia de
encantos, sorrisos e disposição para festejar e celebrar as conquistas de cada momento.
Eternos vivas!
Finalmente, o que dizer ao Sr. Mauro Nogueira? Homem de tantas terras e tantas
bravatas. Homem delicado, de gestos grandiosos e simples, dotado de intuição incomum
para a maioria dos homens, que se utiliza de tamanha atenção apenas para colocar-se a
inteiro dispor, a fim de possibilitar o entendimento grupal. Conhecedor não só dos teóri-
cos grupais, mas também dos teoremas e ensaios possíveis, sempre esteve disposto a co-
laborar, a exemplo dos longos deslocamentos que sua decisão o faz tomar. Capacidade
inacreditável e admirável de fazer leituras, tecer hipóteses, saber o momento absoluta-
mente correto de promover uma definitiva intromissão.
Em diversas oportunidades nos apresentou “grandes monstros”, de forma doce,
direta e cirúrgica.
Seria desnecessário agradecer a cada um de nós, membros do SP 11, que o fize-
ram ser o que foi, apenas isso, que na verdade é tudo. Possibilidade de se criarem vín-
culos duradouros, de aprender, de chorar, alegrar-se, rir de si mesmo, de se encolerizar,
de ser afetuoso e agressivo, sem perder o foco. Desejo de saber, de crescer, de errar, ape-
nas novos erros.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 3
Uma palavra de saudade a todos que de alguma forma passaram por esta inesque-
cível experiência.
Amamos todos e com um desejo de voltar sempre ao lugar, ao cerne, ao ventre
deste colo gostoso.
Obrigado ao SP 11.

Ao nosso subgrupo:
CARINHOSAMENTE CHAMADO DE GRUPO “T”
Obrigada pela companhia, pela leveza de nossos encontros, pela ajuda em todos
os trabalhos, pelos aprendizados conjuntos e pela parceria.
Realmente compartilhamos momentos de extremo prazer e alegria.
Aos meus queridos filhos, Carolina e Alexandre, que, com suas condutas e caráter
de jovens responsáveis e íntegros, me deram a alegria de contar nos nossos jornais muito
mais alegrias do que problemas.
Eu amo vocês!
Ao Marcel, por existir, uma fonte de amor, compreensão e de confrontos que me
fizeram crescer.
A minha mais profunda gratidão.
Cecília

Agradeço, de forma veemente, à minha mulher Magdha, pela paciência, capaci-


dade de entendimento, compreensão, tolerância, pois foi quem me deu suporte nos mo-
mentos de reflexão a que fui obrigado me dedicar, a partir dos feedbacks e das hipóteses
criadas por meses a fio.
A meus filhos, Larissa e Lucas, por serem capazes de abrir mão de minha presen-
ça física e também mental, por dias e por meses, apenas para possibilitarem algo novo,
cujo significado não entendem, mas conseguem depreender que foi determinante na bus-
ca do eu interior, e tenho certeza de que também os ajuda nos processos de reflexão pes-
soal a fim de buscarem um relacionamento interpessoal mais adequado.
Aladim

Agradeço a todos (inclusive aos que partiram antecipadamente) do Grupo SP11 a


Jornada de autoconhecimento nestes quase dois anos que passamos juntos.
Agradeço aos meus pais e irmãos pela demonstração de amor, carinho e cuidados
durante toda minha existência e que fizeram de mim uma pessoa melhor.
Agradeço também ao Paulo, meu companheiro que com seu viço, jovialidade e
força de vontade me faz acordar todos os dias e valorizar ainda mais a vida que tenho.
Margareth

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 4
Agradeço aos meus folhotes queridos João Marcos e Marianna, à minha gloriosa
mãe Norma e ao meu marido companheiro Ademar por terem me ajudado renascer, após
a fase difícil de minha vida. Agradeço também aos colegas do SP11 que contribuíram
para esse processo quando abriram o coração para me receber na reintegração.
Marisa

Agradeço especialmente aos pequenos João Pedro e Amanda por existirem e se-
rem felizes e, ao Pedro, por sempre complementar os papéis que exerço, sem – e não me
deixando – congelar.
Maura

Agradeço a todos que fazem parte da minha vida, pois meu amadurecimento é
fruto destas interações. Em especial ao meu esposo e filho, pela compreensão e apoio que
tenho.
Ao nosso grupo que muito me ajudou a crescer e a amadurecer.
Deixo uma frase do Paulo Gaudêncio que gosto muito “O feedback é um presente
que a gente dá a quem vale a pena”. Valeu!
Miriam

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 5
APRESENTAÇÃO

Esse trabalho apresenta a análise do processo grupal vivenciado pelo grupo São
Paulo 11 da Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos sob a luz da teoria tridimen-
sional do comportamento humano proposta por Will Schutz e a teoria crítica de Martin
Baró.
Em seu escopo apresentamos os aspectos teóricos e sua aplicação prática, a partir
das dinâmicas ocorridas nos encontros mensais durante o processo de formação do papel
de coordenador.
Sem deixar de considerar a importância das inúmeras teorias que oferecem supor-
te aos estudos de grupos e sem termos a pretensão de esgotarmos o assunto, escolhemos
Will Schutz pela riqueza, profundidade e simplicidade de seus conceitos, bem como pela
aplicabilidade. Essa teoria nos pareceu significativa para ilustrar a principal proposta dos
grupos de formação de coordenadores: a experiência de vivenciar as teorias na prática.
A teoria de Martin Baró foi escolhida por contextualizar os processos grupais sob
o ponto de vista histórico e social e mostrar como as mudanças podem se dar na socieda-
de, tendo o grupo como um de seus instrumentos mais significativos.
A escolha do processo grupal como foco de análise se baseia no desejo de fechar
uma gestalt sobre um processo que teve a participação de todos os que compartilharam a
mesma história e a construíram juntos.
O nosso trabalho tem como objetivo apresentar uma teoria não contemplada na
bibliografia da SBDG e suas aplicações práticas e aprofundar o estudo da teoria de Will
Schutz.

INTRODUÇÃO

O ser humano é gregário por natureza e somente existe e sobrevive em função de


seus inter-relacionamentos grupais. Desde o nascimento, o indivíduo participa de diferen-
tes grupos, numa constante dialética entre a busca de sua identidade individual e a neces-
sidade de uma identidade grupal e social. Um conjunto de pessoas constitui um grupo,
um conjunto de grupos constitui uma comunidade e um conjunto interativo das comuni-
dades configura uma sociedade.
Segundo David Zimerman (1997), a importância do conhecimento e a utilização
da psicologia grupal decorrem justamente do fato de que todo indivíduo passa a maior
parte do tempo de sua vida convivendo e interagindo em distintos grupos, desde a infân-
cia até a vida adulta, que vão se renovando e se ampliando.
A essência de todo ser, ainda de acordo com Zimermann, consiste no fato de ele
ser portador de um conjunto de sistemas: desejos, identificações, valores, capacidades,
mecanismos defensivos e, sobretudo, necessidades básicas, como a da dependência e a de
ser reconhecido pelos outros, com os quais é compelido a viver. Assim, como o mundo
interior e o exterior são a continuidade um do outro, da mesma forma, o individual e o
social não existem separadamente. Pelo contrário, eles se diluem, interpenetram, com-
plementam-se e se confundem.
Existem grupos de todos os tipos, desde os macrogrupos até os microgrupos que
reproduzem em miniatura as características socioeconômicas e políticas e a dinâmica
psicológica dos grandes grupos.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 6
Tanto nos grandes grupos quanto nos pequenos grupos, a existência de conflitos é
inerente à convivência grupal, uma vez que a escassez de recursos para satisfazer a todas
as necessidades e desejos individuais, principalmente de poder e afetividade, gera con-
tendas intermináveis entre os membros do grupo.
Por isso, a trajetória de um grupo pode ser entendida como uma contínua sucessão
de conflitos, pois nenhum está livre deles, e as mudanças no grupo e nas pessoas, seu
desenvolvimento e crescimento, resultam do modo como os conflitos são enfrentados e
resolvidos. Cada resolução, satisfatória ou não, caracteriza nova etapa na história do gru-
po.
Para Fela Moscovici (1994), há muitas maneiras de se enfrentar um conflito, des-
de a simples negação até a resolução adequada. O primeiro passo consiste em admitir que
o conflito existe e que é preciso enfrentá-lo. O reconhecimento da existência do conflito
predispõe as pessoas a agir.
Os pilares essenciais que sustentam o trabalho conjunto, segundo Felá são: o rela-
cionamento interpessoal, o desenvolvimento intrapessoal, o processo grupal e a comuni-
cação dialógica e negociada. São movimentos que ocorrem de forma interdependente e
concomitante.
O relacionamento interpessoal é o mais aparente e passível de observação direta:
quem fala com quem, o que fala, como fala, o que faz com as outras pessoas, comporta-
mentos não-verbais e emocionais de aproximação, afastamento, hostilidade, agressivida-
de, afeto, ternura, liderança, etc.
O nível intrapessoal representa o conjunto de processos que se passam no interior
de cada pessoa: como se sente em relação a si mesma, como se considera, o quanto se
motiva, o quanto quer participar, o quanto se conhece, etc.
O nível grupal compreende os aspectos do movimento do grupo e caracteriza cer-
tos climas emocionais ou de tarefa, que são simultâneos e interdependentes. O clima da
tarefa é os das atividades visíveis, observáveis, acordadas, tanto no nível formal quanto
informal. Abrange todos os esforços para a produção de resultados em direção aos objeti-
vos definidos.
O clima socioemocional abrange os aspectos interpessoais. É o nível da comuni-
cação, das sensações e sentimentos variados, já existentes ou gerados pela própria convi-
vência e atividades do grupo. Esse é o nível responsável pela manutenção do grupo, por
seu crescimento e amadurecimento e pela produtividade e satisfação de cada participante.
Se nesse nível emocional e de comunicação prevalecerem sentimentos positivos de reci-
procidade, clareza e transparência nas informações, o nível da tarefa é facilitado no senti-
do de maior canalização de energia para atividades concretas, produtivas e satisfatórias.
Se, pelo contrário, esse nível evoluir negativamente por causa de sentimentos de antago-
nismo e falta de transparência entre os participantes, a tarefa do grupo sofrerá os efeitos
nefastos de interações de desagrado, antipatia, boicotes, competições desleais, hostilida-
de, aversão, indiferença, desconsideração e agressividade.
Esses pilares permeiam os processos decisórios, a eficácia da liderança, a admi-
nistração de conflitos, a análise de processos, o estabelecimento de metas, a definição de
políticas e procedimentos, a atribuição de tarefas, etc.
A presença humana nos grupos significa tomar conhecimento das expectativas in-
dividuais de seus membros e do que desejam uns dos outros, o que preferem, em que são
diferentes, com que sofrem, como se expressam.
Mas, como trabalhar bem com os outros? Como entender a nós mesmos, os outros
e fazer-nos entender? Por que os outros não conseguem ver o que vemos? Por que não

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 7
percebem a clareza das nossas intenções e ações? Por que os outros interpretam erronea-
mente os nossos atos e palavras e complicam tudo? Por que não podemos ser objetivos no
trabalho e deixar os problemas pessoais do lado de fora?
Para responder a essas questões, temos de levar em conta que pessoas não são
iguais. São tão díspares quanto às impressões digitais. As equipes são bem sucedidas
quando visualizam essa diversidade natural e se esforçam para reconhecer e valorizar as
diferenças entre seus integrantes compreendendo que, com ou sem afinidades em comum,
as pessoas terão de produzir um resultado em conjunto. Umas serão muito capazes numa
área, mas normal ou abaixo do normal em outras.
Por sermos diferentes, temos necessidades distintas e precisamos saber manter um
equilíbrio constante entre as necessidades do grupo e as necessidades individuais. Quanto
mais cedo conhecermos essas diversidades e as esperanças pessoais uns dos outros, me-
lhor o resultado.
O complexo processo de interação humana decorre de relações e trocas sob a for-
ma de comportamentos manifestos e não-manifestos comunicações verbais e não-verbais,
pensamentos, sentimentos, olhares, reações mentais e/ou físico-corporais. Até quando
alguém se vira de costas ou fica em silêncio está interagindo e demonstrando significado,
comunicando algo com sua atitude. Quando as pessoas não realizam interação satisfató-
ria, as tarefas conjuntas são afetadas e comprometem os resultados desejados. Se não se
retomarem o convívio e a restauração das relações, a situação tende a se agravar e a tor-
nar mais difíceis a convergência de esforços e a colaboração real em prol do objetivo
comum.
O trabalho em conjunto traz o desafio da interdependência, do diálogo, da nego-
ciação e da colaboração: apresenta os conhecimentos, experiências e o discernimento de
diversas pessoas. É o complemento da iniciativa e da realização pessoal, uma vez que
envolve níveis mais elevados de compromisso com fins comuns. Desenraizar nossas vi-
das e prioridades individuais pelo bem de um grupo pressupõe um esforço de autoconhe-
cimento que deve ser realizado de forma consciente, que exige mudanças comportamen-
tais profundas, valorização de novos saberes, relações, valores e revisão de atitudes. Esse
processo pode estar associado a ameaças, por um lado, ou a oportunidades, por outro.
Portanto, os grupos são conjuntos de pessoas onde se vivencia de forma especial a
relação vivida entre os homens ao mesmo tempo em que ela se modifica. Grupos são, de
certo modo, cooperativas de explicitação e de transformação de relações (Max Pagés,
1975). Sua especificidade é a de um sistema de defesa coletiva, diferente de um grupo
para outro e, sem dúvida, influenciado pela história individual dos membros, pela história
do grupo e pela cultura.
Mas o grupo é uma realidade aberta, transitória e relativa e só tem sentido em re-
lação a conjuntos mais amplos, a outros grupos, entre os quais se situa.
Os grupos são, portanto, lugares em que se elabora, se trabalha e se modifica uma
relação universal, por meio da mudança de seus membros e da construção de sua dinâmi-
ca.
Para ampliar a chance da oportunidade, entretanto, existem recursos e técnicas pa-
ra a resolução de problemas e conflitos que contribuem para a formação e evolução das
equipes, concebidas por autores, como W. R. Bion, C. Rogers, Max Pagés, Pichon-
Rivière, Martin Baró, Kurt Lewin, Jacob L. Moreno e Will Schutz, entre outros.
Todos eles trouxeram inúmeras contribuições para a compreensão dos processos
humanos grupais e apontaram premissas que sustentam as equipes:

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 8
1. Ampliação do autoconhecimento, auto-imagem e auto-estima.
2. Relações eu-outros, atitudes, preferências comportamentais, consciência do im-
pacto dos próprios comportamentos nos demais.
3. Inteligência emocional e parceria entre razão e emoção.
4. Percepção dos processos de grupo, comportamentos coletivos, sentimentos
grupais, coesão, conflitos, relações de poder, liderança.
5. Valores, expectativas, sonhos, desejos, aspirações individuais.
6. Comunicação interpessoal: diálogo, negociação, feedbacks, motivação para a
auto-revelação, atitudes, valores, dificuldades e habilidades de comunicação, honestida-
de, transparência, etc.

Mas, como levar essas premissas para a prática?

A CONTRIBUIÇÃO TEÓRICA DE MARTIN BARÓ

Numa posição crítica e contextualizada historicamente, de acordo com Martin Ba-


ró (1989), há duas teorias básicas na psicologia, amplamente difundidas para o estudo dos
processos grupais: a teoria psicanalítica, baseada em Freud, e a teoria de campo, em Le-
win.
Para o primeiro, a identificação com a figura paterna, atribuindo-lhe ou lhe dele-
gando o papel de chefe, seria o grande responsável para que as pessoas se vinculassem a
um dado grupo. Para Lewin, as pessoas se uniriam, criando e se conformando a uma dada
situação grupal, a partir do momento em que houvesse convergência ou uma confluência
das suas necessidades, motivações e interesses. Em relação aos dois modelos, lewiniano e
freudiano, existem sérias criticas, visto que ambos concentram o peso de suas considera-
ções em grupos, cujas características se afastam, em muito, do que acontece nos macro-
grupos.
Quando se fala em grupo na perspectiva de Martin Baró, devem ser enfatizados os
fenômenos que acontecem no interior dele: a identidade do grupo, o poder de que o grupo
dispõe e o significado social que ele recebe por aquilo que produz num dado contexto,
historicamente concreto.
A identidade de um grupo não pode ser entendida de um modo estático e nem par-
tir do princípio de que todos os membros apresentam uma mesma forma de identificação
e autodenominação.
Na realidade, à medida que o grupo vai travando contatos, vínculos e relações
com outros grupos da sociedade, vão sendo criadas, na sua prática cotidiana, normas para
orientar as atividades rotineiras, que lhe dão referência de pertencer ou ser excluído da-
quele segmento social em que vive. O grupo passa a ter, internamente, uma estruturação
que se viabiliza pelas formas de regulação e institucionalização derivadas das ações de
seus membros. Por meio das relações estabelecidas com outros grupos, num movimento
dialético, dá-se a formalização organizativa, estruturando o grupo internamente e exter-
namente, dando-lhe a dimensão histórica da sua existência em relação aos outros grupos.
Quando o indivíduo toma como referência para si mesmo e para sua vida o fato de per-
tencer a um dado grupo, identificando na relação “eu-outro” e meu “grupo-outros gru-
pos”, ele adquire a consciência do seu grupo em relação a si mesmo e ao mundo exterior.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 9
Quando o grupo interage, interna e externamente, isto pressupõe que ele disponha
de alguns recursos que possam ser utilizados, quando do estabelecimento dessas relações,
visando obter algum tipo de influência ou efeito que lhe possa trazer benefícios. Assim, o
poder do grupo não é uma instância abstrata, mas adquire um caráter concreto, materiali-
zado na rede de relações do seu corpo organizado de elementos.
Para que o grupo exista como tal e continue no seu processo de construção histó-
rica, o terceiro elemento importante refere-se ao significado social que o produto de sua
ação adquire. Em outras palavras, a identidade e o poder do grupo estão intimamente li-
gados e dependem da atividade desse grupo. Aquilo que o grupo faz, segundo seus obje-
tivos e o significado que essa atividade adquire para seus elementos e para o sistema so-
cial, influenciam no processo de construção e no fortalecimento de sua identidade grupal,
assim como a atividade e a identidade estão intimamente relacionadas ao poder que esse
grupo possui e à forma como o exerce. Inúmeros são os exemplos de grupos que deixa-
ram de existir e de se constituírem, quando as condições históricas e sociais mudaram,
transfiguraram, ou mesmo, eliminaram o significado e a importância de suas atividades.
O surgimento do grupo depende dessa maneira, de alguma forma de consciência
social, condicionada pelas condições objetivas de que dispõe; enquanto sua manutenção e
a sua sobrevivência dependerão do poder que obtenha nas relações que estabeleça, em
termos de garantir a posse dos recursos necessários para poder imprimir alguma influên-
cia social na direção de seus interesses.
No caminho inverso, o grupo desaparecerá, quando a sua significação social se
perder; quando sua identidade se desconectar das suas raízes histórico-sociais e quando
não possuir recursos e for capaz de realizar ações eficazes, que atendam às suas aspira-
ções e aos interesses individuais e/ou coletivos.
O surgimento ou o desaparecimento de um grupo não implica um desligamento
dos indivíduos dos processos sociais. Ao contrário, a referência do individuo dentro do
sistema social dá-se mediatizada pela sua pertinência a um ou mais grupos que têm im-
portância fundamental na sua vida.
Como afirma Lane (1984), dentro do grupo ocorre uma dupla negação, necessária
para o processo de formação da consciência. Num primeiro momento, o indivíduo, consi-
derado como espécie, nega essa condição ao formar, entrar e constituir um grupo; afirma
e reafirma a sua identidade, opondo-se, negando e se diferenciando desse próprio grupo.
Num segundo momento, após o seu “eu” ter sido afirmado, nega-o, procurando eliminar
ou diminuir a sua diferença em relação aos demais. Cada elemento do grupo tenta reafir-
mar o “nós”, fortalecendo a identidade grupal e apontando para ações coletivas que po-
dem convergir para alguma tomada de decisão que leve a mudanças.
Admitindo-se que a minha vida só adquira existência e significado quando con-
frontada a outrem, cuja unicidade e singularidade se constroem na sua história cotidiana
(Heller, 1972), isto pressupõe que algum tipo de relação se estabelece entre esses dois
personagens: o “eu” e o “outro”, necessitando de um contexto concreto para acontecer.
Nesse momento, a relação eu x outro sai do âmbito particular de cada indivíduo, inician-
do um processo a que se poderia chamar de grupo. Assim, a identidade das pessoas só se
afirma, reafirma e se nega quando da relação com outras pessoas, nas mais diversificadas
situações.
[...] ao comparecer frente a alguém, eu me represento. Apresento-me como o
representante de mim mesmo (Ciampa, 1999, p. 170).

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 10
Ao interagir com outrem, uma parcela da minha totalidade é “destacada” – de
acordo com o lugar que ocupo na estrutura social, em um dado momento histórico – o
que se traduz nas relações e intercâmbios estabelecidos sob a forma de minha identidade.
Quando esta relação é considerada e percebida como imutável pode ser uma das explica-
ções de se atribuir uma espécie de “colagem” entre a pessoa e o papel que assume: faz-se
a representação de que as pessoas são aquilo que fazem ou exercem, quando na verdade,
as pessoas estão sendo aquilo que fazem. E o que fazem nada mais é do que a atividade,
delimitada pelos papéis sociais que foram assumindo, em função do lugar que ocupam na
estrutura social. Assim, nessa dinâmica, as identidades são construídas e podem ser re-
presentadas de modo estático e imutável, ou percebidas como mudança, em metamorfose,
como diz Ciampa (1999). O quanto de possibilidade de mudança ou de manutenção pode
existir vai depender da consciência que o indivíduo passa a ter sobre esse processo e do
fato dessa consciência transformar-se numa prática para a mudança ou para a conserva-
ção.
Esse movimento-atividade, representação, identidade e consciência dá-se nas re-
lações entre as pessoas. Essas relações não são esporádicas. Ao contrário, têm uma regu-
laridade determinada pela rede de conhecimentos, significados e normas que o grupo
social cria, a partir das diretrizes e da ideologia reinante na sociedade, cujos graus e signi-
ficado atribuído podem lhe permitir uma ação mais eficaz.
Como se processa, então, a relação entre o indivíduo e o sistema social? Ela se dá
não apenas no plano objetivo, mas também no subjetivo, em termos das próprias pessoas
contribuírem para a construção – ao nível das suas representações – de uma realidade
equilibrada e harmônica ou, ao contrário, um mundo em transformação acentuando as
contradições existentes.
No contexto natural, os grupos sociais dominantes criam normas a fim de regular
a vida social. Essa regulação ocorre mediante o exercício do poder que atravessa diferen-
tes instituições e que pauta a ação dos indivíduos. A internalização dessas normas, forne-
cendo ao mesmo tempo referência para que o indivíduo se situe diante do mundo concre-
to e de si mesmo, permite que, ao se relacionar com o mundo concreto, ele externalize
esses valores e normas, concretizando as diferenças que são ideologicamente estabeleci-
das pelos grupos dominantes e determinando quais são os lugares a serem ocupados den-
tro e entre as classes sociais. A linguagem, nesse contexto, desempenha um papel funda-
mental, na medida em que cria a mediação necessária entre o mundo subjetivo e o mundo
objetivo. Através da palavra, como diz Vigotski (1987), é possível que se faça uma repre-
sentação geral da realidade, fornecendo subsídios para termos acesso à consciência, visto
que por meio dela podemos captar o movimento que se dá entre os processos de interiori-
zação e exteriorização do mundo real e das suas representações. A linguagem cumpre
com a função de orientar não só as ações e rotinas socialmente aceitáveis, como de san-
cionar as concepções sobre a realidade, as atividades e a relação das pessoas nesses con-
textos.

A CONTRIBUIÇÃO TEÓRICA DE WILL SCHUTZ

Acreditamos que todo conhecimento só é válido, se pudermos praticá-lo no nosso


dia-a-dia. Como vimos anteriormente, as mudanças sociais acontecem a partir de proces-
sos de autoconsciência, explicitadas na realidade da vida cotidiana.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 11
Após essa contextualização e reflexão crítica a respeito da importância dos grupos
para os processos de mudanças sociais, optamos por relacionar a experiência vivida pelo
grupo SP11 com as contribuições de Will Schutz para a leitura dos processos grupais.
Sua metodologia e concepções teóricas foram se construindo a partir do Movi-
mento de Desenvolvimento do Potencial Humano que remonta aos “T Groups” do NTL,
que nasceram na Califórnia, em Bethel, fortemente influenciados por uma das vertentes
apontadas por Martin Baró: Kurt Lewin e suas idéias.
Esse Movimento considerava a psicanálise ultrapassada, embora reconhecesse sua
significativa contribuição para o estudo do homem e dos processos grupais. Enriqueceu-
se com a contribuição das filosofias orientais com forte potencial místico e com as con-
tribuições reichianas.
Nos seus primeiros tempos, Schutz era um intelectual clássico: depois do douto-
ramento em psicologia obtido na Universidade da Califórnia em 1951, ensinou relações
sociais em Harvard, em Berkeley e na Universidade de Chicago. Chegou também a for-
mar grupos para terapias e trabalhou em Bethel com os “T Groups”, colaborando na sele-
ção dos participantes.
Na década de 50, Schutz foi convidado a ingressar no navio da marinha americana
que seguiria para a guerra da Coréia ocasião em que começou a estruturar sua teoria e
metodologia tridimensional do comportamento humano.
Estudando o funcionamento das equipes naquele momento e depois por mais de
30 anos, constatou três núcleos de necessidades interpessoais existentes nos grupos hu-
manos que são a base para o trabalho conjunto:

• inclusão, controle e abertura no nível do comportamento;


• importância, competência e bem-querer no nível dos sentimentos;
• auto-estima e autoconceito no nível intrapessoal, suporte para os anterio-
res.

Esses conjuntos de necessidades, associados à transparência na comunicação e


co-responsabilidade, caracterizam etapas de interação no desenvolvimento de uma equipe
ao longo do tempo e é necessário termos consciência delas:

No âmbito do comportamento

Inclusão
Relaciona-se com associação, ou seja, pessoas estarem cercadas de pessoas. Tra-
ta-se da necessidade humana de interação: ter a atenção dos outros, pertencer a um grupo,
ser reconhecido como único. É a necessidade de obter o interesse dos outros para a nossa
presença e para a descoberta de quem e o quanto somos importantes.
Essa é a área relativa à obtenção da quantia certa de contato que necessitamos ter
com as pessoas, conforme nossa maneira de ser. Às vezes, gostamos e precisamos de uma
grande quantidade de inclusão. Somos expansivos, participativos, iniciamos conversas
com estranhos, procuramos nos relacionar, gostamos de festas e atividades em grupo.
Por outro lado, existem pessoas que preferem ficar sozinhas, são mais reservadas,
raramente começam conversas e evitam reuniões com grupos de pessoas.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 12
As pessoas diferem, então, em relação ao quanto desejam estar com as outras pes-
soas e o quanto desejam estar sozinhas, o quanto querem estar em grupos ou evitá-los.
Numa equipe, a fase de inclusão começa com a formação do grupo, em seus mo-
mentos iniciais, quer porque o grupo é novo e os participantes ainda não se conhecem,
quer porque se apresenta em sua fase inicial para realizar um projeto, mesmo que os
membros já tenham convívio.
A primeira decisão é querer fazer parte ou não, estar fora ou dentro, ter ou não a
atenção dos demais, ser ignorado ou prestigiado, ser ou não importante para o grupo. Es-
sa decisão de inclusão tem a ver com o esforço de ambos os lados de fazerem parte. É o
“reconhecimento do terreno” quanto ao desejo de cada participante de se sentir aceito e
respeitado como membro do grupo.
Quanto mais o grupo for desconhecido, mais essa fase é demorada, porque a rela-
ção de confiança não está consolidada. É comum as pessoas se exporem e falarem pouco;
quando o fazem, é com cautela e versam sobre assuntos banais.
O comportamento de inclusão é função de dois aspectos: o consciente (ou racio-
nal) e o inconsciente (ou defensivo). O consciente representa simplesmente a preferência
ou não para estar com pessoas. O defensivo representa a ansiedade em relação à inclusão.
O consciente é flexível e pode adaptar-se às situações e eventos. Já o defensivo é rígido,
não varia conforme a situação e resulta em comportamentos inadequados. Por exemplo,
se nos sentirmos ansiosos em relação à inclusão, podemos, por um lado, falar demais, e
por outro, nos omitir ou nos exibir.
Todos nós temos os dois aspectos, o racional ou consciente e o inconsciente ou
defensivo. O que vai determinar a prevalência de um ou de outro é o autoconhecimento e
a auto-estima. Ou seja, quanto mais nos conhecermos, maior a probabilidade de adotar-
mos comportamentos conscientes e produtivos.
Esses aspectos determinam basicamente a existência de três tipos de pessoas:

• Pessoa subsocial: aquela que, por medo de ser ignorada, não se arrisca a
se incluir, prefere ficar só, tem baixa inclusão.
• Pessoa supersocial: aquela que também tem medo de ser ignorada, mas
adota um comportamento oposto ao subsocial: inclui-se demais, forçando
os outros a prestarem atenção nela, tem altíssima inclusão.
• Pessoa social: é a pessoa que se sente bem tanto no grupo, quanto sozi-
nha. O que vai determinar a sua inclusão é a pertinência e a adequação de
sua presença e não sua ansiedade de estar incluída.

Controle
Refere-se às relações de poder, influência e autoridade entre as pessoas e à quan-
tidade de controle que se quer exercer.
Há pessoas que gostam de dar ordens, tomar decisões, querem que tudo saia se-
gundo seus planos, necessitam saber o que os outros vão fazer, desejam liderar e condu-
zir. Num debate, anseiam ter suas idéias acatadas, serem vencedoras.
Outros não gostam e procuram, no grupo, assumir posições em que não tenham
responsabilidades. Ficam satisfeitos em nunca ter que dizer às pessoas o que devem fazer.
Preferem seguir as determinações dos outros ou das situações.
As pessoas, então, diferem no quanto querem exercitar o poder que têm.
Comportamentos de controle também podem se manifestar por meio de resistên-
cia em não ser controlado, por exemplo, expressões de independência, rebelião, revolta,

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 13
argumentação. Por outro lado, complacência, submissão e facilidade em obedecer indi-
cam aceitação do controle.
Numa equipe de trabalho, podemos controlar e sermos controlados, preferir con-
trolar a sermos controlados, ou ainda, optar/escolher por seguir ordens a ter que dá-las.
As questões de controle estão relacionadas ao grau de confrontação que queremos adotar
ou evitar.
Algumas vezes, preferimos ser o “poder por trás do trono”, satisfazendo, simulta-
neamente, nossa necessidade de alto controle e baixa inclusão. Outras vezes, preferimos
ser “os bobos da corte”, satisfazendo nossa necessidade de alta inclusão e baixo controle.
As questões de controle surgem após a equipe compor-se e as afinidades começa-
rem a se desenvolver. Essa fase se apresenta muito conturbada, porque ainda não há mui-
ta confiança e existem dificuldades de comunicação. Há desejo pela liderança e pela do-
minação de um lado, e de não se deixar dominar, pelo outro lado.
As principais demandas no grupo passam a ser mostrar competências, compro-
missos, responsabilidades, etc. São comuns as disputas pessoais, mesmo que veladas. Há
luta pelo poder, competição pela liderança, pelo método de tomada de decisão, pela dis-
tribuição de tarefas e atribuição de papéis. As preocupações giram em torno de ter muita
ou pouca responsabilidade.
O objetivo de cada participante é ter tanto poder e influência até atingir o seu grau
de conforto, entre um estado de total impotência até a sobrecarga de responsabilidades.
Will Schutz mostra que a parte consciente (racional) tem uma preferência natural
por um certo controle da própria vida, até por questões de sobrevivência. Já a inconscien-
te (defensiva) tem origem no medo da incompetência e fraqueza perante os desafios bási-
cos da vida, da auto-sustentação e da realização dos próprios desejos e objetivos.
O lado consciente é flexível e pode adaptar-se às situações. O defensivo é rígido,
indiferentemente das circunstâncias. Quanto maior for nosso autoconceito e auto-estima,
mais nosso comportamento tende a ser consciente e racional e menos defensivo e incons-
ciente.
Também em relação ao controle, podemos agrupar as pessoas em três tipos:

ƒ Pessoa abdicrata: é rígida em baixo controle. Aquela que abdica seu po-
der e adota uma posição subordinada, de quem os outros não devem espe-
rar que assuma responsabilidades e tome decisões, nem quando isto for
necessário e apropriado. Ela quer que os outros a aliviem de suas obriga-
ções. Quando uma pessoa abdicrata assume posições de chefia, não faz o
que é necessário para corrigir aquilo que não está funcionando bem. É
omissa, não toma decisões e passa a responsabilidade para os outros. Age
assim muitas vezes, por medo de ser humilhada.
ƒ Pessoa autocrata: é rígida em alto controle. É a dominadora, que quer
controlar tudo, exercer poder, competir, influenciar. Tem receio de ser
dominada, humilhada e de não ser seguida. Sente o mesmo que a pessoa
abdicrata, só que adota o comportamento oposto: de assumir muitas res-
ponsabilidades, provar que é capaz. Por outro lado, também pode agir de
forma astuta, manhosa e sedutora para obter poder.
ƒ Pessoa democrata: quando a pessoa, desde a infância, resolveu de forma
satisfatória as questões relacionadas a controle, sente-se confortável para
exercer seu poder, liderando ou sendo liderada, recebendo ou dando or-

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 14
dens. Sente-se competente mesmo quando não está no comando e confia
em que, se for necessário, também pode dirigir e tomar decisões.

Abertura
Essa é a terceira dimensão do comportamento humano, segundo Will Schutz. Re-
fere-se a quanto queremos ser abertos com os outros, falar o que pensamos e sentimos.
Varia ao longo do tempo entre os mesmos indivíduos e relacionamentos, de acordo com o
grau de confiança existente.
Algumas pessoas preferem os relacionamentos em que possam falar sobre seus
pensamentos, sentimentos, fatos que incomodam, como gostam de ser tratadas, etc. Elas
querem ter a seu lado pessoas em quem possam confiar. Outras pessoas tendem a manter
a privacidade e falar pouco sobre o que pensam e sentem. Buscam relações mais impes-
soais e têm mais conhecidos a amigos.
As pessoas, então, variam na preferência por relacionamentos mais abertos ou
não.
Assim como a inclusão e o controle, a abertura também tem dois aspectos: o ra-
cional ou consciente e o inconsciente ou defensivo. O consciente resulta da preferência da
quantidade de abertura que queremos ter. O defensivo resulta do medo de sermos expos-
tos e, assim, ficarmos vulneráveis a sermos rejeitados e não-amados.
A forma consciente e racional permite a adaptação e o exercício da flexibilidade a
diferentes circunstâncias. O modo defensivo, por sua vez, leva à rigidez e às reações se-
melhantes, indiferentemente das exigências das situações.
Os dois modos estão presentes em cada um de nós. A prevalência de uma ou outra
forma de comportamento vai depender de como nos sentimos em relação a nós mesmos.
Quanto pior nos vemos, mais defensivos somos em relação à abertura.
O comportamento de abertura é construído com base em vínculos mais profundos.
Por isso, normalmente é a ultima fase a emergir nos relacionamentos e na equipe. Com a
evolução das relações, a abertura determinará o quanto as pessoas vão se “abraçar”, se
acolher, aprofundar a qualidade das relações, darem-se a conhecer.
Essa é a fase de maior produtividade, pois é o momento de consolidar a relação de
confiança entre os membros e tolerância às diferenças individuais, dada a compreensão
de todos em relação a elas. Nessa etapa, o grupo torna-se sinérgico, interdependente e
afetivo entre si, e tem condições de apresentar excelentes resultados com criatividade e
relações humanas satisfatórias. Quanto maior for o envolvimento afetivo, maior o estado
de coesão grupal.
Também no comportamento de abertura, podemos assinalar três tipos de pessoas:

• Pessoa impessoal: é a rigidez em baixa abertura como forma de defesa. O


relacionamento é impessoal. A pessoa evita revelar-se para os outros, fica
antagônica e ambivalente. Mantém relações superficiais, distantes e fica
mais confortável quando as pessoas fazem o mesmo, mantendo distância
emocional. Não fala sobre si com medo de que não gostem dela, mesmo
quando as pessoas demonstram afeto. A baixa abertura pode ser decorren-
te de experiências dolorosas em algum momento da vida. A pessoa impes-
soal evita proximidade por um lado. Por outro, pode procurar ter populari-
dade, porém, sem dizer o que pensa e sente.
• Pessoa superpessoal: é rígida em alta abertura também como forma de de-
fesa. Conta para todos os seus sentimentos e quer que todos sejam abertos

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 15
com ela. Relaciona-se de forma excessivamente pessoal e tenta obter
aprovação por meio da confidência e da insinuação. É ciumenta e posses-
siva em seus relacionamentos.
• Pessoal: é a pessoa que utiliza a abertura de forma adequada e tem suas
questões resolvidas em relação à transparência do que pensa e sente. Fica
confortável em uma relação próxima e também em situações que requei-
ram distância. Aprecia oferecer e receber afeto. Gosta de ser amada, mas,
se não o for, pode aceitar isso de forma natural e circunstancial. Não gene-
raliza e não conclui que não é amada por ninguém.

No âmbito dos sentimentos

Essas três dimensões do comportamento humano (inclusão/controle/abertura) se-


gundo Will Schutz, estão conectadas a três dimensões de sentimentos: importância, com-
petência e bem-querer, que são fontes para outros sentimentos de exaltação, raiva, de-
pressão, tristeza, e também podem reger o comportamento.
Quando somos convidados para participar de grupos de trabalho, de reuniões, ou
para contribuir com nossas idéias (inclusão), experimentamos o sentimento de importân-
cia. Se nossos líderes reconhecerem nossos esforços, elogiarem nosso trabalho, delega-
rem tarefas significativas (controle), experimentamos o sentimento de competência. Se as
pessoas nos revelarem como são, nos contarem seus segredos, serem amáveis e calorosos
conosco, nos falarem de seus sentimentos, pensamentos, desejos, sonhos (abertura), expe-
rimentamos o sentimento de sermos benquistos.
Por outro lado, sentimos que o outro é importante, quando ele existe para nós,
significa algo. Demonstramos isso quando prestamos atenção e reconhecemos a sua pre-
sença, percebemos a sua ausência, agimos como se ele fizesse diferença (importância).
Sentimos que o outro é competente quando percebemos que é capaz de lidar com
o mundo, de utilizar suas habilidades para satisfazer seus desejos e de lidar com os pro-
blemas que surgem na vida. Competência refere-se à habilidade de tomar decisões e de
resolver problemas (competência).
A capacidade de gostar das pessoas está baseada na habilidade que temos de criar
um ambiente no qual elas possam gostar de si próprias. Ou seja, as pessoas gostam de
nós, se gostarem da forma como se comportam e se sentem na nossa presença. Elas gos-
tam de nós, se gostarem de si próprias, quando estiverem conosco (bem-querer).

No âmbito da auto-estima

Nas três dimensões do comportamento humano (inclusão / controle / abertura) e


nas três dimensões dos sentimentos (importância / competência / bem-querer),Will
Schutz afirma que cada pessoa escolhe entre dois extremos, segundo sua posição de con-
forto: baixo ou alto; pouco ou muito. Essa posição de conforto tem sua origem na manei-
ra como fomos tratados pelas pessoas desde a nossa infância e que marcaram a nossa
memória, e também como nos sentimos em relação a nós mesmos e à nossa auto-estima.
Essa é a fonte de nossos comportamentos e sentimentos em relação às pessoas que vai

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 16
determinar os nossos relacionamentos e, conseqüentemente, a eficácia do trabalho em
equipe.
Para Will Schutz e também para Nathaniel Branden, a auto-estima (aspecto intra-
pessoal, base para os relacionamentos interpessoais e trabalho em equipe) é a disposição
para experimentar a nós mesmos como alguém competente para lidar com os desafios
básicos da vida e sermos merecedores da felicidade e das recompensas pelas nossas
ações.
A auto-estima é caracterizada por seis pilares que demandam um processo de
construção contínua:
ƒ auto-inclusão; autocontrole; auto-abertura na esfera do comportamento;
ƒ auto-importância, autocompetência e auto-estima na esfera dos sentimen-
tos.

Auto-estima e comportamentos

Auto-inclusão (estamos completamente vivos?)


Incluir a nós mesmos significa utilizar nossos pensamentos, sentimentos, sensa-
ções e movimentos em tudo que estivermos fazendo. É estarmos completamente atento.
Não estamos completamente vivos quando não estamos experimentando, paramos
de pensar, suprimimos ou abafamos nossos sentimentos, ficamos inconscientes das nos-
sas sensações e não utilizamos nosso corpo, músculos e força.
Algumas vezes não estamos tão vivos quanto gostaríamos de estar. Sentimo-nos
cansados, nulos, “meio mortos”. Nada nos estimula, ficamos entediados, não identifica-
mos nenhum sentimento. Estamos insensíveis perante o ambiente. Não diferenciamos
sensações. Precisamos nos estimular.
Outras vezes, nos sentimos mais vivos do que gostaríamos de estar, para os fatos
estimulantes ou dolorosos. Pensamos sem parar, queremos participar de tudo e podemos
nos sobrecarregar. Por outro lado, temos de enfrentar situações que não gostaríamos de
enfrentar: por exemplo, lidar com sentimentos de ciúme, medo, rejeição ou humilhação.
Nosso corpo não atende ao que queremos que ele faça. Precisamos nos acalmar.
A alegria e o equilíbrio vêm da sensação de estarmos totalmente vivos, sem so-
brecarga por um lado e sem tédio, por outro. Ficamos felizes quando experimentamos a
nós mesmos ao máximo com prazer, evitando ou administrando as sensações dolorosas.
“O interesse vital do corpo e da alma é a existência e tudo o que contribua para mantê-la”
(Espinosa).

Autocontrole (determinamos a nossa própria vida?)


Esse pilar é responsável pelos relacionamentos produtivos e atendimento dos nos-
sos objetivos. A partir do que queremos, determinamos o que fazemos. Somos os causa-
dores de nossa existência. Quando assumimos essa responsabilidade, colocamos a vida
nas nossas mãos e reconhecemos a necessidade de vivermos de forma útil e produtiva.
Somos completamente autodeterminados quando escolhemos nossa vida, nosso
comportamento, sentimentos, pensamentos, nosso corpo, doenças, reações, espontaneida-
de.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 17
Não somos autodeterminados quando permitimos que nossa vida seja determinada
somente por forças externas a nós: sorte, coincidências, destino, economia, ambiente,
infância, pais, etc.
Às vezes, sentimos que determinamos demais as nossas vidas. Gostaríamos que
alguém nos dissesse o que fazer. Sentimo-nos sobrecarregados. Preferiríamos ser como
crianças e não adultos responsáveis.
Outras vezes, sentimos que não determinamos a nossa vida o suficiente. Parece
que nunca estamos fazendo o que gostaríamos. Sentimo-nos pressionados por algo ou
alguém e impedidos de agir por forças maiores que as nossas.
Autodeterminação significa explorar as conseqüências de assumirmos que deter-
minamos a nossa vida e somos capazes de fazer quaisquer mudanças que quisermos, em
nós mesmos, nos nossos relacionamentos e no nosso trabalho.
Essa afirmação não é verdadeira nem falsa, ela é oferecida como uma afirmação
pragmática. Qualquer suposição de que somos incapazes de algo, imediatamente nossa
incapacidade torna-se verdadeira, pois eliminamos qualquer tentativa de transcender esta
limitação imposta por nós a nós mesmos. Supor que algumas coisas são imutáveis é im-
por limitações antes de tentar. Se não acreditarmos que podemos mudar, não temos moti-
vos para adquirir o poder pessoal. “Se você acha que pode ou que não pode, de qualquer
forma você está certo”. (Henry Ford).

Auto-abertura (estamos conscientes de nós?)


Sermos abertos conosco significa não passar pela vida como sonâmbulos e nos
tornarmos capazes de saber tudo que está ocorrendo dentro de nós.
Estamos completamente conscientes quando não censuramos a nossa experiência,
sobretudo, quando, num primeiro momento, ela não combina com a nossa auto-imagem,
e prestamos atenção ao que estamos experimentando, sejam desejos, propósitos, inten-
ções, sentimentos, emoções, vontades, etc.
Às vezes, estamos bem conscientes das experiências pelas quais estamos passan-
do e não gostaríamos de estar: por exemplo, algum desconforto físico ou emocional. Ou-
tras vezes, estamos inconscientes. Acontecem fatos que não entendemos e sentimos que
estamos nos iludindo. Dizemos a nós mesmos quem somos, mas parece que nossas ações
são contrárias em muitas situações.
Nós somos seres para os quais a consciência é volitiva. Isto significa que temos a
opção de querer perceber ou não. Essa capacidade de autodireção é nossa glória, mas
muitas vezes nosso fardo. Por meio das várias escolhas, estabelecemos uma noção de
quem somos e construímos nossa identidade, que é ação e metamorfose.
Viver conscientemente é mais do que ver e conhecer. É agir com base no que ve-
mos e conhecemos. Podemos notar, por exemplo, que estamos sendo indelicados com
alguém, mas isso não basta. Precisamos admitir o nosso comportamento e mudá-lo.
Por outro lado, estarmos conscientes não significa que devemos nos preocupar
com a solução de problemas em todos os momentos de nossa vida. Podemos decidir me-
ditar, por exemplo, esvaziando nossa mente de todos os pensamentos e tornando-a dispo-
nível a novas possibilidades de relaxamento, rejuvenescimento, criatividade, percepções e
espiritualidade.
Ter consciência é saber como agir quando gostamos bastante de nós e o que fa-
zemos quando não gostamos.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 18
Auto-estima e sentimentos

Auto-importância
Refere-se a sentirmos o quanto somos importantes, significativos e valorosos, ao
contrário de nos sentirmos insignificantes, sem importância e sem valor.
É honrar as nossas vontades, necessidades e valores, buscando formas apropriadas
de expressá-los na vida. É sentirmos que fazemos diferença, contribuímos com nossas
idéias, fazemos falta quando não estamos presentes.

Autocompetência
Relaciona-se ao fato de sentirmos o quanto somos competentes, inteligentes e for-
tes, ao invés de fracos, incompetentes e incapazes de enfrentar problemas.
Sermos eficientes é nos tornarmos capazes de produzir um resultado desejado,
aprender aquilo de que precisamos e realizar o que é preciso para atingir nossos objeti-
vos. É viver com propósitos e não à mercê do acaso. É ter autodisciplina, organizar nos-
sos comportamentos, nosso tempo e nossa agenda para realizar as tarefas necessárias.

Auto-estima
Ter auto-estima significa apreciar a nossa própria companhia e sentirmos bem em
saber quem somos. É a sensação de que somos adequados para a vida e suas exigências.
Desenvolver nossa auto-estima é expandir nossa capacidade de sermos felizes. É
ampliar a convicção de que somos capazes de viver com mais confiança, boa vontade e
otimismo, de realizar nossas metas e aumentar nossa produtividade. Para isso, precisamos
ter auto-respeito e desenvolvermos a certeza de que merecemos amor, amizade, recom-
pensas e felicidade como conseqüência de nossos esforços. Sem essa convicção, não sa-
beremos cuidar de nós mesmos, proteger nossos legítimos interesses, satisfazer necessi-
dades e desejos.
Estaremos satisfeitos com nós mesmos. quando assumirmos riscos equilibrados
(sem muito arrojo ou muito cuidado), não ficarmos arrasados por não ter apoio, seguir-
mos instruções sem ressentimentos, orientarmos sem culpa ou medo de represálias, acei-
tarmos críticas e as usarmos de forma construtiva. Falarmos direta e honestamente com
quem temos algum problema em vez de falarmos pelas costas.
Temos auto-estima quando assumimos o compromisso com o valor da nossa vida
pessoal e profissional e procuramos ter sucesso, sermos visíveis, amados, entendidos;
quando sabemos as respostas às perguntas: quem queremos ser? Por quais princípios
orientamos nossa vida? O que merece ser vivido? Como queremos viver?
Se nos sentirmos bem conosco, estaremos motivados para utilizar todo o nosso
potencial, desfrutar de nossos relacionamentos, encontrar um trabalho significativo, tra-
balhar bem em equipe, tomar decisões acertadas.
Assim como temos os comportamentos de inclusão, controle e abertura de forma
consciente e defensiva, também no caso da auto-estima podemos atuar de forma cons-
ciente / racional, ou de forma defensiva / inconsciente.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 19
MECANISMOS DE DEFESA

O conceito de mecanismo de defesa é uma importante contribuição feita pelos


psicanalistas à psicologia. Significa que algo desagradável é mantido fora do consciente.
É “qualquer estrutura que habilite a pessoa a não tomar conhecimento consciente de tudo
o que possa lhe suscitar ansiedade. O mecanismo é inconsciente, não intencionalmente
adquirido e opera automaticamente sem controle voluntário da pessoa” (CABRAL, A.,
Dicionário de psicologia e psicanálise. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1971).
Em certa medida, todos nós usamos mecanismos de defesa, que funcionam como
alívio temporário para as deficiências que não queremos enxergar em nós.
Além disso, como as condições raramente são favoráveis para que possamos lidar
com os conflitos, os mecanismos de defesa são úteis. Entre outras coisas, eles nos permi-
tem viver numa sociedade superpovoada, em que a expressão de certos impulsos poderia
ser complicada.
Todavia, o contínuo recurso de um ou dois mecanismos de defesa impede as ten-
tativas mais realistas de crescimento individual, de alteração de comportamentos disfun-
cionais, de melhoria dos relacionamentos interpessoais e de superação de situações desa-
gradáveis de forma produtiva.
Como os mecanismos de defesa agem no inconsciente, é muito mais fácil obser-
vá-los nos outros do que em nós. Por isso, é útil tomar consciência deles para que possa-
mos estar mais perto da pessoa que gostaríamos de ser. A forma como nos sentimos em
relação a nós mesmos determina todas as nossas relações com os outros, nas equipes, no
trabalho, etc. Quanto mais estivermos satisfeitos conosco, melhores serão nossas relações
interpessoais e menos esperaremos que os outros compensem nossas deficiências.
Entre os mecanismos de defesa mais comuns estão:
Negação: envolve a recusa em reconhecer condições desagradáveis e imaginar,
no lugar delas, condições mais felizes (negar que os problemas existem evita ter que lidar
com eles e confrontar com a dificuldade em fazê-lo).
Isolamento e anulação: são defesas afins. O isolamento envolve o despojamento
de impulsos e recordações dolorosas de todos os seus fortes componentes emocionais.Por
exemplo, as circunstâncias que cercam um divórcio podem ter acesso ao consciente, con-
tudo as emoções mais penosas, que estão associadas a esse evento, permanecem fora de-
le. Intelectualmente, a pessoa sabe que algo de ruim aconteceu, mas se dá um entorpeci-
mento das emoções associadas.
Já a anulação se relaciona com as tentativas para apagar impulsos ou recordações,
atuando de um modo que produza o seu oposto. Por exemplo, depois de participar de um
ataque que resulta na demolição de uma aldeia e no quase aniquilamento de seus habitan-
tes, um soldado pode apresentar-se como voluntário para ajudar a reconstruir a aldeia e
oferecer substancial ajuda aos sobreviventes.
Identificação: refere-se ao processo geral de assumir os atributos de outrem. Esse
processo constitui uma parte importante da socialização. Mas, quando a pessoa adota os
atributos do outro porque, segundo seu juízo, lhes são mais aceitáveis dos que aqueles
que lhes são próprios, a identificação torna-se um mecanismo de defesa.
Projeção: implica em atribuir a alguém nossos próprios atributos indesejáveis,
transformando-o em nossos algozes e nós, em vítimas. Por exemplo, podemos odiar nos-
so chefe exigente e querermos vê-lo despedido, mas evitamos o reconhecimento de nos-
sos impulsos rancorosos dizendo a nós mesmos: “o chefe está querendo nos despedir”.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 20
Sermos vítimas nos permite culpar as pessoas e não termos que lidar com as nossas ina-
dequações.
Racionalização: é uma desculpa inconscientemente engendrada para qualquer
manifestação de incompetência, inadequação ou fracasso moral, assim como na fábula da
raposa que não alcançava as uvas e dizia que elas estavam verdes. Por exemplo: “fiz isso
porque estou mentalmente enfermo e sou produto de uma sociedade doente”; “sei que
não deveria pegar esse dinheiro, mas é necessário para socorrer um amigo”.
Compensação: é um processo pelo qual tentamos fazer com que outras pessoas
compensem nossas deficiências. Exigimos que as pessoas façam por nós o que nós mes-
mos não fazemos e constantemente nos elogiem. Queremos cada vez mais e mais.
Formação de reação: estado em que os sentimentos são confusos e contraditó-
rios. É possível, por exemplo, amarmos e odiarmos alguém ao mesmo tempo, por um
lado pelas qualidades que reconhecemos e por outro, pelo poder que exerce sobre nós. A
formação de reação é o ato de banir o pedaço inaceitável (que odiamos) e dar ênfase ao
outro pedaço (que amamos).
Uma pessoa que quer todos os objetos pontiagudos bem guardados “para que nin-
guém se fira”, por exemplo, pode, na verdade, estar se defendendo de seus próprios im-
pulsos agressivos.
Regressão: consiste em recuar para um modo de comportamento associado a al-
guma fase anterior mais feliz da vida. Por exemplo, arruinada financeiramente, uma pes-
soa pode ingressar numa fase adolescente e inconseqüente. Esse mecanismo de defesa
não é útil como podem ser, eventualmente, os outros.`A medida que avançamos na vida,
adquirimos novas aptidões para enfrentar as dificuldades. Se regredirmos, essas aptidões
se perderão.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

ƒ 1º passo: análise dos relatórios elaborados por um dos participantes do


grupo (Aladim), que teve o empenho de relatar, detalhadamente, todos os
encontros.
ƒ 2º passo: divisão dos relatórios dos encontros pelos integrantes do grupo
para que cada um fizesse os recortes das ocorrências sob a luz da teoria de
Will Schutz.
ƒ 3º passo: elaboração da parte teórica com ênfase na teoria de Will Schutz e
Martin Baró.
ƒ 4º passo: solicitação aos demais membros do grupo para o preenchimento
de uma planilha com seus dados pessoais e o motivo pelo qual se interes-
sou pelo processo de formação de coordenadores da SBDG (vide anexo).
ƒ 5º passo: integração de todas as análises individuais e dados fornecidos pe-
los integrantes num só texto, procurando seguir a ordem dos encontros e o
processo grupal tal como ocorreu de forma a ilustrar o caminho percorrido
pelo grupo. Nesse momento, utilizamos, além dos relatórios já descritos,
as anotações de outras três integrantes do grupo para complementar as in-
formações.
ƒ 6º passo: fechamento do trabalho.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 21
ANÁLISE DO PROCESSO GRUPAL

O primeiro módulo: o desafio de ser membro de grupo

Ingressamos na SBDG com o intuito de buscar maior conhecimento sobre manejo


de grupos e as ferramentas adequadas para ampliar nossa capacitação como profissionais.
Embora soubéssemos que seríamos sujeitos e objetos dessa aprendizagem, só fo-
mos compreender a dimensão da proposta à medida que o grupo foi caminhando. Já no
primeiro encontro, todavia, sentimos o desconforto diante de um espaço vazio em que os
coordenadores se colocaram de uma forma a não interagirem com o grupo (técnica de
Tavistock), o qual deveria por si mesmo criar os vínculos, assumir papéis, definir lideran-
ça, cuidar de si. No desconhecimento de como deveríamos agir, optamos pelos caminhos
conhecidos pela maioria de nós e que caracterizaria o grupo por um bom tempo: um gru-
po mais racional voltado a teorizações e racionalizações. (“O que o grupo faz quando não
se tem nada para fazer?”)
Por outro lado, seguimos também um caminho ora pela emoção, ora pela razão,
num processo de exclusão de alternativas: ora razão, ora emoção. Ao vivenciarmos esse
momento, descobrimos que um espaço vazio é um espaço para fantasias, medos e des-
conforto perante o desconhecido. O grupo evitou os conflitos, convocou a coordenação
para que propusesse uma direção a ser seguida. O grupo foi contido, defensivo, polido;
faltaram-lhe a discordância e o confronto que poderiam propiciar maior inclusão e abertu-
ra. A polidez estava fortemente presente, a serviço da contenção, da não-exposição.
Ainda éramos indivíduos num grupo e não um grupo. Não tínhamos nesse mo-
mento ainda a percepção de que o convite que nos fora feito seria para aprender a ser
membro e ganhar sensibilidade no futuro papel de coordenador.
Aos poucos, fomos experimentando que nem sempre os desejos e expectativas in-
dividuais são congruentes aos grupais. Há ritmos diferentes e é necessário estabelecer o
respeito pelo ritmo do outro (“a velocidade de um grupo é sempre dada pelo ritmo do
mais lento”). Entretanto, isso não significa quantidade e sim qualidade das trocas e parti-
cipação.
A jornada para a descoberta da construção do papel de membro de grupo engloba
todos os aspectos do humano, ou seja, a parceria entre a intelectualização e as emoções, o
“lado feio e o bonito”, o colo e o pontapé, raiva e amor, fragmentação e auto-regulação,
teoria e prática, o bom e ruim e o que é especial e o não-especial. A tônica foi uma tenta-
tiva de inclusão por meio do controle. “Ainda não sabíamos que tudo faz sentido se for
sentido”.
Aos poucos, fomos nos deparando com nossas diferenças e nossas preferências.
Fomos experimentando fazer escolhas e constatando que escolhemos por critérios positi-
vos, pela admiração, o igual ou diferente que constrói ou destrói. Reconhecendo e concre-
tizando as diferenças pelas semelhanças ou diferenças, nos conhecemos mais com a opor-
tunidade de explicitar as nossas escolhas.
Como lidamos com o diferente? Como revelamos isso? Aprendemos que o cami-
nho normalmente é idealizado com base no papel que atribuímos à primeira impressão, à
nossa percepção e às fantasias, aos valores e às crenças que temos.
Aprendemos que a rejeição dói e que para sermos escolhidos temos de ter cora-
gem de nos revelar e mostrar nossa essência (abertura). O medo da rejeição e da não-

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 22
inclusão leva ao silêncio de si. Sabemos hoje que para sermos incluídos temos de nos
revelar.
O caminho de um grupo engloba mortes e renascimento. Aprendemos que se não
houver lugar para a insatisfação, também não há espaço para a alegria se sustentar.
As perguntas são: é possível esse grupo acolher minhas necessidades, valores, do-
res e tristezas? O que cabe nesse grupo? O que ele tolera e agüenta?
Aprendemos que, às vezes, ele vai agüentar, outras vezes, não, independentemen-
te das regras.
Qual é o limite? Como posso me expor sem machucar o outro?
O grupo cresce quando proporciona aos seus membros a possibilidade de circular
entre os papéis e se cristaliza quando escraviza os membros em um determinado papel. O
trabalho de grupo com o foco nos papéis de seus membros é um fator primordial. Toda-
via, como lidar com os medos e ameaças inerentes à mudança dos papéis. Seremos acei-
tos? Como sair do conforto do conhecido?
Se o crescimento se dá por meio da mudança, se congelarmos, só repetiremos o
que fazemos nos outros grupos. Se não transitarmos nos papéis, não haverá mudança.
O que fazer? Como fazer? Aquilo que é possível fazer naquele momento? O co-
ordenador leva o grupo a aceitar o que foi possível, sem idealizações. O aprendizado co-
mo membro vem da reflexão do que ocorreu e não como deveríamos ou poderíamos fa-
zer.
Há incômodos, expectativas, há diversidades.
Bem-vindos ao mundo real.
É difícil compartilhar, falar, por isso, às vezes, o melhor é o silêncio.
A complexidade de dois lados, duas posições.
Para o conflito e a dicotomia, entre ou esse ou aquele, vivenciamos a possibilida-
de de uma terceira via, em que possa ser contemplada uma mescla dos dois lados.
Aprendemos a força do grupo (controle) quando resolvemos que não teríamos um
encontro que ocorreria em janeiro, época de férias e de descanso. Estávamos exaustos. Se
para nos incluirmos, precisamos nos revelar, no aprendizado como membros de grupo,
aprendemos também que precisamos somar o feedback. Ou seja, se me expuser (abertu-
ra), qual será o impacto desse comportamento no outro? Exatamente essa é a mola regu-
ladora. Como estabelecer o limite entre a auto-revelação e a exposição? Descobrimos que
o pequeno grupo funcionou de forma diferente. Será a intimidade? A empatia entre as
pessoas? O espaço verbal maior? Assuntos que interessam mais? Afinidades? Maior pro-
teção para falar de si? Porque nos sentimos mais à vontade para nos revelar nessa arena
mais protegida? Quando me achego de alguém na intimidade só podem acontecer duas
coisas: me aproximar ou me separar. Qual é a distância ótima que quero ter com as pes-
soas do grupo? Como posso ter distâncias, não “engolir” nem “ser engolida”? O que afas-
ta? O que aproxima? Qual é a dose?
A intimidade é ameaçadora. Pode representar a perda da identidade, minha ou do
outro. O encontro da distância ótima é o grau de aproximação. Esse é um dos exercícios
essenciais para proporcionar maior grau de inclusão e abertura. Intimidade não necessa-
riamente é abertura total. Na intimidade, ninguém é normal. Mas, o que é normal? Para
encontrar a resposta a essas perguntas tem-se que experimentar a distância ou a proximi-
dade. E foi o que fizemos!
No grupo grande, a permissão é menor. Nunca vamos experimentar a mesma in-
timidade. Isso é uma fantasia.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 23
Para o nosso grupo, havia a exigência de que tudo fosse profundo para todos o
tempo todo. É necessário flexibilizar o grau de exigência sobre a profundidade.
O movimento do grupo está a serviço de quê? Da fuga de algo? De esclarecer? De
aprofundar? Mais um aprendizado. Um grupo não é somente a soma de seus membros, no
entanto, ele fala por meio de seus membros. Se alguém está falando tem a ver com o gru-
po. O que cada conversa quer dizer? O que está latente?
Num grupo, há muitos grupos. Cada integrante está lá com todos os seus agrega-
dos, familiares, outros significativos, etc.
Fomos aprendemos, por meio da influência e participação de cada membro, como
se dá o controle no grupo.
A capacidade do grupo de participar e influenciar é real. Se um brilha, o outro não
brilha.
Há um momento de negociação de espaço. Um só consegue espaço, se o outro ce-
der seu espaço.
Há autorização do grupo para flexibilizar os papéis e o grupo pode permitir ou
não.
As perguntas são o que estou fazendo com os espaços que estão sendo ofertados?
Estou entrando? Saindo? Fugindo?
Há a terceira via: eu brilhando e o outro brilhando de vez em quando eu, de vez
em quando o outro, na mobilidade. O trabalho alternado.
Quanto eu suportarei diminuir meu brilho para o outro brilhar?
O equilíbrio é medíocre, mobilidade é vida.
Alguns, entretanto, podem não querer brilhar. Medo do confronto? Competição?
Nesse momento, ele se torna vítima.
Como peço ajuda? O que provoco, quando peço ajuda?
Brigamos, sim, por espaço e temos de ter consciência disso.
Aqui os papéis giram em torno do controle. A posição dá status, poder, reconhe-
cimento, valor.
Papel dá espaço (participação e influência). Quando as posições são idênticas o
que me dá espaço é o papel que assumo.
Todo e qualquer grupo se estrutura nessas duas situações: posição e papéis. Papel
é espaço, participação e influência e posição é mando.
Flexibilizar papéis é andar no espaço do grupo.
Fechando nosso primeiro ciclo, tivemos oportunidade de questionar os espaços
que foram abertos no grupo, quais vínculos estabelecemos.
Há momentos mais profundos e outros mais superficiais.
Quando um grupo se reúne, a dinâmica está instalada. O trabalho com o grupo é
para explicitá-la, entendê-la e trabalhar as relações.
Escolhemos por projeção, por isso é importante o autoconhecimento, porque
quanto mais conheço meu lado sombra, mais tenho consciência das escolhas que faço.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 24
Segundo módulo: aprendendo a ser coordenador

Como aprender a ser coordenador?


Esse segundo momento se caracterizou por duas instâncias: manter a continuidade
do papel de membro e somar a ele o exercício do papel de coordenador. Dito de outra
forma, a associação do cognitivo com o vivencial.
Pôde-se detectar, nessa ocasião, alguns com mais medo, outros com menos. Além
disso, havia muitas expectativas e ansiedade quanto à administração do tempo, adiciona-
da à preocupação em dar conta do recado. Também foi o momento da revelação das
competências, mais estruturado, com a circulação de papéis: membro do grupo, coorde-
nador, observador.
Um momento difícil para o grupo representado por perdas de membros, doenças
de familiares ou dos próprios membros do grupo, faltas, baixo compromisso, questiona-
mentos sobre a continuidade ou não do processo, desmotivação, conflitos em subgrupos.
Experimentar a exposição, sermos avaliados, criticados, não atendermos as expec-
tativas dos demais.
Tínhamos necessidade do suporte da autoridade e do aval dos coordenadores para
ficarmos mais permeáveis.
Apenas no final desse módulo, fomos novamente recobrando o ânimo, reconhe-
cendo os membros que ficaram e, apesar das dificuldades, não desanimaram, escolheram
permanecer no grupo.
O momento seguinte foi caracterizado pelo restabelecimento de compromissos,
por novos contratos de conduta, além da solicitação para que os membros não faltassem.
Estes aspectos, porém, só foram superados ao final desta etapa, por meio de um
salto qualitativo que caminhou claramente para o exercício da abertura.
Um marco significativo foi a revelação da vontade de aprofundamento (abertura)
acompanhada pelo medo da exposição que significava a perda de controle.
Como abrir mão dele? Ir e vir era o movimento representante desse momento.
Quando conseguimos ultrapassar essa barreira, pudemos nos dar permissão (ou
nos permitir experimentar o novo) para experimentar o novo. Como ele seria?

Terceiro módulo: a união da teoria com a prática

Novamente um novo momento para o grupo. A teoria ganhou um cunho mais prá-
tico e aplicável e tivemos de experimentar novamente um outro papel de co-
coordenadores. Funcionaríamos bem em dupla?
Pudemos exercitar as duas dimensões do exercício grupal: a arena da tarefa e a
arena socioemocional, com maior qualidade e essência.
Foi um exercício tranqüilo, com baixo nível de competição entre as duplas, houve
muito apoio e cooperação e não se perceberam acordos tácitos de não criticar.
Os feedbacks se apresentaram abertos e construtivos.
Começamos esse terceiro módulo coincidente com o início do ano. A tônica era
“pegar mais leve”, do “deixar rolar”. Minimizamos o nível de expectativas e exigências e
nos dispusemos a usufruir da presença das pessoas, a dar maior espaço para o prazer,
sentiu-se mais leveza, os assuntos se tornaram mais íntimos.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 25
Pudemos exercitar a dinâmica tridimensional proposta por Will Schutz,ou seja, ti-
vemos momentos de inclusão alternados com controle e abertura, com maior permissão
para sermos e para estarmos em grupo com respeito às nossas individualidades. Essa foi
uma experiência de flexibilidade.
Um momento dolorido foi a perda de mais um dos membros, contudo, com uma
característica diferente das anteriores: o grupo tentou segurá-lo de todas as formas, mas
não conseguiu, apesar da certeza de que a perda maior seria dele. Todos queriam que ele
pudesse usufruir o que já estávamos percebendo e sentindo.
O tom mais leve nos levou a questionar: será que é isto que valorizamos?
O grupo se mostra permissivo e mais maduro e a caminhar sozinho a partir da
consigna oferecida pelas coordenações.
Ampliamos o exercício dos papéis, em virtude das nossas questões girarem em
torno da adequação do papel de coordenação. O que podemos fazer? O que não pode-
mos?
Aos poucos, fomos dando espaço para maior expressão de nossos sentimentos e
emoções: o quanto éramos importantes, competentes, aceitos e queridos por todos.
Os papéis de liderança e poder puderam fluir mais, assim como pudemos experi-
mentar os papéis dos ausentes. A afetividade e a sexualidade estavam no grupo e não em
pessoas específicas.
Passamos a tentar entender as pessoas mais com o coração do que com a razão
que era nossa tônica inicial.
Houve o exercício de maior intimidade. Desabafo grupal. Catarse representada
pelo diálogo franco e aberto entre dois membros do grupo que estavam congelados na
competição.
Fomos aprendendo como deveríamos agir no exercício de coordenadores.
Com a resolução desse conflito, o grupo pôde liberar a energia que estava imobi-
lizada em direção às trocas afetivas. Todos se sentiram aliviados.
Conseguimos perceber as voltas que o grupo dá para não entrar em contato com
aquilo que ele mais quer, mas tem medo de fazê-lo.
Obrigado a todos os membros do grupo por nos proporcionar um momento tão ri-
co e pleno “de entrar em contato”, abrindo uma nova porta para novos círculos que nos
propiciem entrar em contato com coisas que teremos medo de enfrentar.

“O que você mais teme é o que lhe vai completar/realizar.”


(WILL SCHUTZ)

Do ponto de vista de Matin Baró, é possível constatar no processo vivido pelo


grupo que o comportamento dos participantes no início seguia as normas definidas por
papéis institucionais, até o momento em que aprendemos que transitar nos papéis leva ao
crescimento e que podíamos experimentar essa alternativa, conscientemente. Desde o
começo, nos prendemos aos papéis prescritos enquanto esperávamos as consignas vindas
dos coordenadores. Depois constatamos que o grupo tem vida própria e pode determiná-
la, segundo seus próprios princípios.
Quebrada a determinação institucional surgiu a primeira questão: que fazer?
Os participantes começaram, então, a falar de si, contar suas histórias, experiên-
cias cotidianas, gostos e desgostos, escolhas e dificuldades com os próprios jeitos de ser,
etc. Nesses momentos de auto-revelação estiveram sempre presentes os sentimentos rela-
cionados às situações descritas: medo, frustração, alegrias, angústias.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 26
Aos poucos, o grupo foi se articulando em subgrupos de acordo com os vínculos,
diferenciações e identificações que se iam formando.
Estabeleceu-se durante todo o processo um encadeamento de trocas pessoais, de
experiências vividas, sofridas e superadas e o mais importante em dois determinados
momentos foi o compromisso para que o grupo continuasse após uma situação de “letar-
gia grupal” e, além disso, a disposição e coragem dos membros do grupo de aprofunda-
rem as vivências e a honestidade em falar de si mesmos e dos problemas intergrupais. Foi
a partir daí que o grupo efetivamente cresceu, caminhou e amadureceu.
Daí em diante, os participantes passaram a se expor com outro nível de qualidade
e as relações interpessoais também adquiriram outro “tom”.
Podemos dizer que houve um produto elaborado pelo grupo, uma aprendizagem
significativa de como ocorre um processo grupal com todas as variáveis envolvidas.
Aprendemos a ser membros de grupo, a coordená-lo, a não “membrear” enquanto coor-
denamos, aprendemos as muitas nuances que um grupo pode apresentar. Além disso,
também entendemos que nada é proibido desde que esteja claro a serviço de que cada
coisa que acontece está. Aprendemos que mais importante que as tarefas é a leitura do
processo e a consciência dele e percebemos como o grupo pode crescer a partir das ocor-
rências.
Adquirimos a compreensão de que cada coordenador tem um estilo e são infinitas
as possibilidades de coordenação. Temos certeza de que geramos um novo conhecimento,
individualmente e grupal. Somos hoje proprietários de uma aprendizagem vivida, refleti-
da e pensada. Experiência e vivências acopladas à teoria permitiram aclarar o desenvol-
vimento da consciência de cada um e do grupo.
O nosso aprendizado se deu desde a consciência de que éramos um grupo, intera-
gindo à procura de uma integração até o desvendar de características individuais, incluin-
do afetos e desafetos. Descobrimos os afetos negativos: irritação, antipatia, desacordos,
inveja e ciúmes, assim como os positivos: simpatia, identificação, amizade, alegria, etc.
Foi-nos revelado que os afetos negativos existem e não devem ser negados e que não há o
grupo ideal.
Papéis institucionalizados, linguagem adequada, conflito causado por esse ou
aquele e as subjetividades emergiram, objetivando-se no cotidiano do viver em grupo,
nos sentimentos e na ocorrência de uma produção de conhecimentos, que cada um regis-
tra a seu modo.
Cremos que conseguimos demonstrar a relação existente entre grupo e consciên-
cia, por meio da mediação da linguagem e dos afetos.
Assim que constatamos as diferenças entre as participações dos integrantes do
grupo em cada encontro, pudemos também registrar a importância das trocas no processo
grupal e nas contribuições elaboradas individualmente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das propostas de Will Schutz e Martin Baró, podemos concluir que cons-
truir um grupo é um desafio e, ao mesmo tempo, uma experiência gratificante.
Para trabalharmos bem juntos, temos de colocar o foco no indivíduo, porque ele é
a célula básica que compõe o grupo. Se lhe fornecermos ferramentas para que adquira
cada vez mais consciência de si mesmo, percebendo que é possível conduzir a própria

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 27
vida, criaremos condições para que ele se torne mais aberto e determinado para estar nas
relações interpessoais e grupais.
Sendo aberto e autodeterminado, expressando-se com honestidade e ouvindo os
outros com atenção, estará facilitando seu relacionamento interpessoal, diluindo conflitos
e flexibilizando alternativas para o entendimento de seus temores, da forma como se
comporta e se limita.
O desenvolvimento de um grupo só ocorre se as pessoas se desenvolverem e, para
isso, elas precisam ser abertas e expressarem o que pensam e sentem. Se isto não aconte-
ce, provavelmente é porque se sentem ameaçadas em seu autoconceito e auto-estima ou
convivem em ambiente de pouca transparência e confiança.
Esse é o ponto, segundo as pesquisas de Will Schutz, que é um obstáculo ao de-
senvolvimento das pessoas e grupos: uma pessoa com sentimentos de insignificância,
incompetência e autodepreciação, num contexto de pouca confiança, torna-se rígida e tem
medo das conseqüências provocadas pelo ato de mudar.
Essa rigidez pode levar à incompatibilidade com outras pessoas, bloqueando o
trabalho em conjunto. A insegurança pessoal leva à manutenção de preferências e dife-
renças além do limite do racional, como um escudo contra sentimentos não-desejados.
Leva também à desconfiança, dinâmica psicológica em que há a complementação da in-
formação com fatos negativos, ou seja, quando nos falta a informação sobre alguém, pre-
enchemos a lacuna. É um mecanismo de sobrevivência criado pelos seres humanos diante
do que é desconhecido e ameaçador.
Para lidar com alguém nesse estado e estabelecer um vínculo de confiança, a me-
lhor de todas as formas é dizer a verdade, cumprir as promessas e ser confiável.
Por outro lado, é preciso entender que são as diferenças entre os membros de uma
equipe que levam à solução de problemas.
Para trabalhar em equipe, o indivíduo precisa não só estar em contato com os pró-
prios sentimentos, como também se decidir quanto à quantidade e qualidade de energia
que quer investir nos relacionamentos que vão permitir a eficácia do trabalho em conjun-
to: o quanto deseja estar dentro ou fora, assumir muita ou pouca responsabilidade e in-
fluência, exercer ou não controle sobre os outros, executar tarefas? Expressar o que sente
e pensa de forma honesta e profunda, ou apenas superficialmente.
Essas dimensões que envolvem o ser humano: comportamentos, sentimentos, fa-
lar a verdade, ouvir com atenção, auto-estima e autoconceito são dimensões fundamentais
a serem consideradas quando pensamos na construção e desenvolvimento de grupos.

Para finalizar, gostaríamos de ilustrar o nosso fascínio diante dessa experiência


em grupo, com a fábula da convivência, de autor desconhecido.

Durante uma era glacial, muito remota, quando parte do globo terrestre
estava coberto por densas camadas de gelo, muitos animais não resistiram ao
frio intenso e morreram indefesos, por não se adaptarem às condições de clima
hostil.
Foi então que uma grande manada de porcos-espinhos, numa tentativa de
se proteger e sobreviver, começaram a se unir, a juntar-se mais e mais.
Assim, cada um podia sentir o calor do corpo do outro.
E todos juntos, bem unidos, agasalhavam-se mutuamente, aqueciam-se
enfrentando por mais tempo aquele inverno tenebroso.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 28
Porém, vida ingrata, os espinhos de cada um começaram a ferir os com-
panheiros mais próximos, justamente aqueles que lhes forneciam mais calor,
aquele calor vital, questão de vida ou morte.
E afastaram-se feridos, magoados, sofridos.
Dispersaram-se por não suportarem mais tempo os espinhos dos seus se-
melhantes.
Doíam muito...
Mas, essa não foi a melhor solução: afastados, separados, logo começa-
ram a morrer congelados.
Os que não morreram voltaram a se aproximar, pouco a pouco, com jeito,
com precauções, de tal forma que, unidos, cada qual conservava uma certa dis-
tância do outro, mínima, mas o suficiente para conviver sem ferir, para sobrevi-
ver sem magoar, sem causar danos recíprocos.
Assim suportaram-se, resistindo à longa era glacial.
Sobreviveram.

Foi fácil trocar as palavras,


difícil foi suportar os silêncios.
Foi fácil caminhar lado a lado
difícil foi saber como nos encontrar.
Foi fácil beijar os rostos,
difícil foi chegar aos corações!
Foi fácil apertar as mãos,
difícil foi reter seu calor!
Foi fácil sentir o amor,
difícil agora é conter sua torrente e ficar sem vocês!

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Cecilia C. J. Mediações afetivas num grupo empresarial: um estudo de caso. Tese de douto-
ramento. PUC/SP, 2002.
. Trabalho em equipe. Apostila didática FGV/SP, 2003.
BARÓ, Martin, I. Sistema, grupo e poder – psicologia social desde Centroamérica II. San Salvador: UCA,
1989.
DREYFUS, Catherine. Psicoterapias de grupo. Lisboa: Verbo, 1980.
LANE, Silvia; CODO, Wanderley Psicologia social – o homem em movimento. São Paulo: Brasiliense,
1984.
MOSCOVICI, Felá. Equipes dão certo – a multiplicação do talento humano. Rio de Janeiro: José Olympio,
1994.
PAGÉS, Max. A vida afetiva dos grupos – esboço de uma teoria das relações humanas. Petrópolis: Vozes,
1975.
ZIMERMAN, David; OSÓRIO, Luiz Carlos. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artmed, 1997.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 29
Material produzido pelo grupo

ANDRADE, Cecília. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.


CAVICHIOLI, Marisa. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.
FREITAS, Aladim. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.
LAMANA, Miriam. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.
MENDES, Margareth. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.
ZURDO, Maura. (2003/2004/2005) Apontamentos de sala de aula SBDG.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 30
ANEXO

GRUPO SÃO PAULO 11 – PERFIL DOS PARTICIPANTES E PRINCIPAIS


CARACTERÍSTICAS DO GRUPO

Nome Idade Formação Motivos para escolher a SBDG Quais características atribui a este grupo
Aladim 49 Graduação Simplesmente aconteceu em Grupo polido, até certo ponto, pois os
de Paula em Medicina - 1981 minha vida. Eu trabalhava na confrontos se desenvolvem, de um modo
Freitas Jr. Residência Médica empresa UNIMED, da minha geral, através de conflitos sub-liminares,
em Ginecologia - cidade, onde desenvolvia um onde os sujeitos envolvidos preferem não
Obstetrícia: trabalho na área de Educação colocar em risco as conquistas que fizeram,
1982/1983/ 1984 Cooperativista, um dos princípios mesmo não havendo um gráu de amizade
Pós-Graduação em básicos do cooperativismo. Ao profundo entre todos.
Gestão de Empresas final de minha pós-graduação, a Há um intenso desejo de troca e os
em Saúde: 2001 esposa de um dos membros da aprofundamentos se deram de forma lenta
minha equipe de TCC falou-me da e gradual, conseguindo atingir patamar, até
SBDG e me colocou em contato certo ponto, profundo e desejável, mas
com a Genira, a fim de possibilitar dentro de uma zona de conforto.
a formação a partir de um Grupo Além disso, devo dizer que existem nele
em Campinas. pessoas extremamente sensíveis,
Tive oportunidade de formatar um inteligentes, determinadas, estudiosas,
Congresso de Comitês Educativos respeitáveis, delicadas, simpáticas.
do Sistema Unimed, que se deu Enquanto grupo, há lugar para o humor, mas
em Gramado-RS. Na oportunidade não muito, e pouca ironia é tolerada. No
contratamos o serviço da Genira e início até houve um pouco mais de adesão
da Lídia Mância, uma colega às premissas contratuais, que logo foram
gaúcha. Assim foi o meu primeiro sendo deixados de lado, principalmente após
contato com as pessoas e não as dexistências, que neste caso não foram
com a SBDG. A partir disso, fui poucas. As pessoas pouco se compromete-
aguardando o grupo de Campinas. ram em relação às combinações, por exem-
Como esse nunca acontecia, plo: não faltar, apresentar os relatórios, não
decidi-me por procurar a formação sair da sala, não atender ao celular, etc. Veio
em São Paulo, fato que me com isso baixo controle e um comprometi-
agradou, apesar de ser muito mais mento apenas com o desenvolvimento
dispendioso e requerer dose extra grupal, isto pelo lado dos Coordenadores.
de determinação. Fica, no entanto, um saldo absolutamente
positivo e inesquecível para todos que se
dedicaram a esta formação. Acredito que
muitos aprenderam e se sentem estimulados
a se conduzirem à Curva de Maturidade
Angela 39 Bacharel em Confiei no BOB quando ele Acolhedor, questionador, aberto, receptivo,
Ruriko Matemática Aplicada me disse que este curso poderia auto-crítico e as vezes controlador.
Sakamoto Computacional me ajudar, profissionalmente
Mestrado em Adminis- e pessoalmente.
tração de Empresas
Cecília 46 Psicologia Desenvolver habilidades como Vontade de aprender
Carmen coordenadora de grupos. Vontade de estar com as pessoas
Jacinto Sistematizar e integrar Disponibilidade para mudanças
Andrade conhecimentos sobre grupos e amadurecimento
Conviver em grupo
Celia Mineiro 42 Assistente Social Busca de técnicas para trabalhar Grupo bastante teórico, com dificuldade
com grupos de envolvimento emocional
Claudio 47 Pós graduado Foi indicação, mas resolvi entrar - Competitivo
Conceição após a entrevista pelo principal - Desafiante
Pereira motivo de vir a me conhecer - Acolhedor
melhor e aprofundar
o entendimento
dos relacionamentos humanos.
Daniela 32 Psicologia Aprimorar minhas habilidades para Grupo bastante acolhedor, afetivo,
Curioni atuar como um agente facilitador com tendência à racionalização e um grau
nos processos grupais e ampliar de exigência muito alto na questão
minha percepção em relação às de rendimento e aprendizado.
pessoas.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 31
Nome Idade Formação Motivos para escolher a SBDG Quais características atribui a este grupo
Flávia 26 Administração Especialização em estudo São tantas... Dualidade, apatia x energia,
da Costa dos grupos numa instituição contato e apoio, camuflagem, crescimento,
de Paula conceituada. cobrança, perfeccionismo, fantasia
e expectativas, amizade...
Margareth 43 Psicologia com pós Na época escolhi a SBDG por Inteligente, algumas vezes competitivo (até
Mendes graduação em Adm. pensar ser a entidade mais quase agora no final dos encontros) pois
de Recursos confiável/conceituada para temos muitos mestres e doutores.
Humanos trabalhar com Dinâmica Abertura para expor os sentimentos
dos Grupos. e pensamentos.
Muita proximidade e "intimidade"
principalmente nos subgrupos.
Maria Lucia 47 Serviço Social por indicação de amigos Grupo heterogeneo com necessidades
Velasco consultores - pelo fato de na diferentes, com dificuldade de formar
da Silva ocasião estar iniciando a minha vinculos, porém extremamente afetivo.
carreira solo. As referências
foram: instituição idônea, curso de
alta qualidade, que poderia me dar
muito embasamento
para trabalhar com grupos.
Marisa 53 Psicologia, Estou sempre buscando novos Acho que o grupo sofreu um processo de
Cavichioli Especialização em conhecimentos, principalmente amadurecimento ao longo dos encontros,
Administração de na área de Treinamento / mas ainda teria muito mais a desenvolver.
Recursos Humanos, Desenvolvimento que é a minha Penso que as relações afetivas positivas
Especialização em paixão profissional. Participei estão hoje mais presentes, contudo tem
Psicodrama de um workshop com a Fela também alguns desvios que comprometem o
Moscovici, quando soube andamento dos trabalhos. Às vezes sinto
do SBDG. Tempos depois vi alguma falsidade nas relações. O grupo é
a divulgação do curso composto de gente inteligente, capaz e
de formação e então me inscrevi. conhecedora do assunto; apenas os “pes-
soais” interferem um pouco no crescimento.
Maura 39 Engenharia Desenvolver habilidades e Heterogeneidade de:
Mazzeo métodos de trabalhar com grupos; - formação
Zurdo Melhorar minha atuação como - de profissão
educadora e consultora. - de características pessoais
Miriam 42 Psicóloga Ampliar o entendimento e as Hoje acolhedor, aberto e próximo, resultado
Lamana possibilidade de desenvolver meu de um trabalho longo que proporcionou a
trabalho com maior qualidade e todos a oportunidade de não terem que se
eficácia proteger atrás de seu “status” profissional
Roberto 53 Superior 1. É a melhor entidade que 1. Grupo que durante algum tempo
Hirsch em Psicologia desenvolve formação escondeu-se na dificuldade de aprofundar as
em Dinâmica dos Grupos, pois relações, mas que ao aproximar-se do seu
os profissionais que atuam como encerramento passou a buscar aprofundar e
coordenadores, além d desenvolver estas relações sem o receio da
e experientes na prática exposição.
de condução de grupos, possuem Este contexto das dificuldades também
conhecimento teórico e formação se fez presente na forma como o grupo
específica no assunto. trabalhava as relações de conflito
2. Eu obter uma certificação 2. Um grupo que desenvolveu ao longa
com reconhecimento e respaldo. de sua caminhada uma maneira de controle
3. Poder me tornar par de alguns muito forte, como forma de não tomar
amigos que já são coordenadores decisões ou impedir a presença
da SBDG de “incômodos”, que se embasava
em algumas características: Conhecimento
e bagagem intelectual; Uso intenso da
palavra de forma “lógica e racional”; “Tomar
decisões” nos 15 minutos finais de qualquer
trabalho; Dificuldade em lidar com
as emoções e expressões corporais; Fixação
em alguns papéis,pois, os mesmos serviam
como forma de visibilidade e “status”;
desenvolvimento de troca mais próxima,
após a criação dos subgrupos de estudo;etc.
3. Há algumas expressões de troca intensa e
de proximidade, como “Valencia” em ser
membro do grupo: a troca afetiva

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 32
Nome Idade Formação Motivos para escolher a SBDG Quais características atribui a este grupo
e humorada de e-mails; compartilhar
conquistas pessoais ou familiares;
colaboração nas tarefas de apoio logístico;
encorajamento uma maior participação dos
participantes mais “quietos e calados”, com
elogios e incentivos, quando os mesmos se
expressavam por algum motivo;
autenticidade nos momentos de troca
de feedback; compartilhar outros
conhecimentos e experiências nas
apresentações teóricas e ou mesmo
vivenciais.
Stelamaris 46 Psicóloga,mestre em Aprimorar trabalhos com grupos Racional, com dificuldades de lidar com
Nani Baffile Psicologia da Saúde o afetivo, competitivo.
Sueli Maria 50 Licenciatura Plena Foi indicação do meu cunhado, Acolhedor; Crítico; Reflexivo; Questionador;
Pondaco anos em Pedagogia. quando solicitei sugestões de Abertura.
aprimoramento com grupos.
Viviane 28 Psicologia Fui indicada pela minha psicóloga Um grupo racional. Que quer também
Fontão para fazer um trabalho de grupo, desenvolver e deixar fluir o lado emocional.
Soubhia foi mais terapêutico do que Vivenciar mais o prazer. Também sabe
profissional, mas como demonstrar sua afeitividade, embora isso
futuramente quero trabalhar aconteça como menos espontaneidade.
com grupos achei que poderia Que quer aumentar sua "bagagem"
me ajudar também. de conhecimentos. Que quer conhecer mais
sobre o ser humano. Que quer aprender
a trabalhar com grupos.

SBDG – Caderno 83 ™ Will Schutz e Martin Baró visitam o Grupo São Paulo 11 33
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
São Paulo – SP
Coordenação: Genira Rosa dos Santos, Mauro Nogueira de Oliveira

De que maneiras a astrologia contribui na leitura


e compreensão dos processos grupais

ANGELA RURIKO SAKAMOTO


DANIELA CURIONI
FLÁVIA DA COSTA DE PAULA
ROBERTO HIRSCH WOW
SUELI MARIA PONDACO
VIVIANE FONTÃO SOUBHIA

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 1


O QUE É A VERDADE?

O que é a verdade?
Contam as lendas que a verdade foi enviada por Deus ao mundo em forma de um
gigantesco espelho. E quando o espelho estava chegando sobre a face da terra, quebrou-
se, partiu-se em inumeráveis pedaços que se espalharam por todos os lados.
As pessoas sabiam que a verdade era o espelho, mas não sabiam que ele havia se
partido.
E por essa razão, as que encontravam um dos pedaços, acreditavam que tinham
nas mãos a verdade absoluta, quando na realidade possuíam apenas uma pequena parte.
E quem deterá a verdade absoluta?
A verdade absoluta só Deus a possui e a vai revelando ao homem na medida em
que este esteja apto para conhecê-la.
Assim é que os inventores, os cientistas, os pesquisadores, vão descobrindo a cada
século novas verdades que se acumulam e fomentam o progresso da humanidade.
É como se fossem juntando os pedaços do grande espelho e conseguissem abran-
ger uma parcela maior.
E assim, a verdade é conquistada graças aos esforços dos homens e não por uma
revelação bombástica sem proveito para quem a recebe.
Ademais, depois que a verdade é descoberta, ninguém pode encarcerá-la, nem
guardá-la só para si.
Quem experimenta o sabor da verdade, não mais permanece o mesmo. Toda uma
evolução nele se opera e uma transformação radical e libertadora é inevitável.
Por vezes a nossa cegueira não nos deixa vê-la, mas ela está em toda parte, laten-
te, dentro e fora do mundo e é, muitas vezes, confundida com a ilusão. Retida na cons-
ciência humana, é, a princípio, uma chispa que as forças do autoconhecimento e do auto-
aperfeiçoamento transformarão em uma estrela fulgurante.
A verdade emancipa a alma e a completa. Infinita, vitaliza o microcosmo e ex-
pande-se nas galáxias.
Vibra na molécula, agiganta-se no espaço ilimitado, e encontra-se ao alcance de
todos.
É perene e existe desde todos os tempos e sobreviverá ao fim das eras.
A verdade é Deus. E para penetrá-la faz-se necessário diluir-se em amor como os
grãos de açúcar em um cálice de água em movimento.
Só agora podemos compreender o motivo pelo qual Jesus calou-se quando Pilatos
lhe perguntou: “o que é a verdade?”

Autor Desconhecido

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 2


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO......................................................................................................4

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA – DINÂMICA E FORMAÇÃO


DE GRUPOS ..........................................................................................................4
2.1 Funcionamento e desenvolvimento do grupo ......................................................4
2.2 Suposto básico de bion...........................................................................................7
2.3 Abordagem do elemento humano.........................................................................8
2.4 Teoria de campo...................................................................................................11

3 BASE ASTROLÓGICA ......................................................................................12


3.1 Os Atores do Mapa ..............................................................................................13
3.2 Temperamento .....................................................................................................14
3.3 Personalidade .......................................................................................................16
3.3.1 A Essência do Grupo – o Sol .................................................................................16
3.3.2 Reações Emocionais – a Lua .................................................................................18
3.3.3 Comportamento Visível – Ascendente ..................................................................20
3.3.4 Objetivos de Vida – Meio do Céu..........................................................................21
3.4 Comunicação e Aprendizado ..............................................................................21
3.5 Expressão Afetiva e Relacionamentos................................................................22
3.6 Amadurecimento do Grupo ................................................................................23

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................24

REFERÊNCIAS...............................................................................................................25

ANEXO 1 – MAPA NATAL DO GRUPO.....................................................................27


ANEXO 2 – QUADRO SINTÉTICO DO PRINCÍPIO DIMENSÕES
DO ELEMENTO HUMANO – WILL SCHUTZ .........................................................28
ANEXO 3 – RESUMO DOS SIGNIFICADOS DOS PLANETAS .............................29
ANEXO 4 – RESUMO DAS CASAS ASTROLÓGICAS ............................................30

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 3


1 INTRODUÇÃO

As organizações modernas, apesar de todo avanço tecnológico, continuam a de-


pender do fator humano. O potencial do ser humano é despertado, considerando-se sua
estória pessoal, sua autopercepção e as opções individuais na sua interação com os diver-
sos grupos que convive. A velocidade e a dinâmica do contexto atual exigem que os indi-
víduos se agrupem em busca da maximização do seu “bem-estar”, o processo passa a ser
grupal.
Através da leitura e entendimento dos processos grupais, é possível coordenar,
apoiar e desenvolver pessoas, atuando como facilitadores e contribuindo para o seu pró-
prio amadurecimento grupal.
Nesse trabalho, a nossa proposta visa explorar como a astrologia pode contribuir
no entendimento e leitura dos processos grupais. As nossas questões abrangem:

• a relação dos mapas individuais comparados ao mapa do grupo;


• o mapa de um grupo como instrumento para apoiar na descoberta de possíveis
caminhos de crescimento e amadurecimento;
• relação da análise e leitura do mapa com as situações vividas pelo grupo; e,
• o uso do mapa como uma “bússola” para os coordenadores identificarem os cami-
nhos optados pelo grupo.

Para explorar estas questões, utilizamos como objeto de estudo o décimo primeiro
grupo de formação de coordenadores de grupos da SBDG, iniciado em São Paulo capital,
no dia 10/10/2003 e finalizado no dia 4/06/2005, tendo como coordenadores Mauro No-
gueira e Genira Santos.
Nossa jornada no tema resgata os aspectos teóricos e técnicos da Dinâmica de
Grupo, que durante o estudo do mapa foram sendo correlacionados aos fatos e vivências
do grupo consideradas relevantes para embasar nossas hipóteses.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA – DINÂMICA E FORMAÇÃO


DE GRUPOS

Neste capítulo, selecionamos algumas referências teóricas consideradas necessá-


rias para embasar a análise dos aspectos do mapa astrológico do grupo. Suas correlações
com os fatos observados foram realizadas ao longo dos capítulos 3 e 4.

2.1 Funcionamento e desenvolvimento do grupo

Segundo Fela Moscovici, as pessoas que compõe o grupo trazem individualmente


seus valores, sua filosofia e orientação de vida. A medida que a interação é permitida, o
conhecimento mútuo e a identificação de alguns pontos comuns servem de base para a
elaboração de normas coletivas, tácitas e explícitas, que contribuem para a dinâmica do
grupo.
Os seguintes aspectos devem ser considerados no estudo do funcionamento e de-
senvolvimento dos grupos:

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 4


• a análise da composição, estrutura e ambiente do grupo, considerando: as pessoas
que o compõem, as posições relativas que elas ocupam, as relações entre si, o es-
paço físico e o espaço psicosocial; e,
• identificação dos componentes que constituem forças em ação, restritivas ou im-
pulsoras, que determinam os processos do grupo.

Estes aspectos associados aos campos de forças do grupo (derivados dos concei-
tos de Kurt Lewin, vide 2.5), em que umas concorrem para movimentos de progresso e
outras para dificuldades e retrocesso do grupo, contribuem para o estabelecimento da
Cultura e do Clima do grupo, passando, então, a caracterizar o próprio ambiente e a ima-
gem do grupo.
Os componentes que influenciam a definição de normas de funcionamento foram
listados abaixo. As respostas às questões associadas a cada componente ajudam a enten-
der o clima estabelecido no grupo.

Objetivos
ƒ Há um objetivo a todos os membros do grupo?
ƒ Até que ponto este objetivo é suficientemente claro, compreendido e acei-
to por todos?
ƒ Até que ponto os objetivos individuais são compatíveis com o coletivo e
entre si?

Motivação
ƒ Qual o nível de interesse e entusiasmo pelas atividades do grupo?
ƒ Quanta energia individual é canalizada para o grupo?
ƒ Quanto tempo é efetivamente devotado ao grupo (em termos de freqüên-
cia, permanência, ausências, atrasos, saídas antecipadas)?
ƒ Até que ponto a participação é plena e há dedicação espontânea nos pro-
cessos de grupo?

Comunicação
ƒ Quais as modalidades mais características de comunicação no grupo?
ƒ Todos falam livremente ou há bloqueios e receios de falar?
ƒ Há espontaneidade nas colocações ou cautela deliberada?
ƒ Qual o nível de distorção na percepção das mensagens?
ƒ Há troca de feedback aberto e direto?

Processo decisório
ƒ Como são tomadas as decisões no grupo?
ƒ Com que freqüência as decisões são unilaterais, por imposição de quem
detêm o poder?
ƒ É comum a decisão por votação, em que a maioria expressa a sua vontade?
ƒ Quantas vezes o processo decisório é alcançado por consenso, permitindo
que todos se posicionem, com respeito mútuo?
ƒ Qual a modalidade de tomada de decisão mais característica do grupo?

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 5


Relacionamento
ƒ As relações entre os membros são harmoniosas, propícias a cooperação?
ƒ As relações harmoniosas são apenas superficiais, de aparente cordialidade,
ou permitem real integração de esforços e efetividade que levem à coesão
do grupo?
ƒ As relações mostram-se conflitantes e indicam competição, clara ou vela-
da entre os membros?
ƒ Até que ponto essas relações conflitivas tendem ao agravamento, podendo
conduzir o grupo à desintegração?

Liderança
ƒ Como é exercida a liderança? Quem a exerce? Em que circunstâncias?
ƒ Quais os estilos de liderança mais usuais no grupo?
ƒ Quais as relações entre líderes e liderados?
ƒ Como se distribui o poder no grupo?

Inovação
ƒ As atividades do grupo caracterizam-se pela rotina?
ƒ Como são recebidas idéias novas, sugestões de mudanças nos procedimen-
tos?
ƒ Até que ponto estimula-se e exercita-se a criatividade no grupo?

A cultura grupal, resultante da interação entre os membros do grupo, reúne os


produtos materiais e não materiais desse processo, tais como: objetos, documentos, obras
de arte, conhecimentos, vocabulário próprio, experiências, sentimentos, atitudes, precon-
ceitos, valores, normas de conduta, entre outros.
O clima do grupo, por sua vez, tem uma relação circular com os componentes do
funcionamento e da cultura grupal, influenciando-os e sendo por eles influenciado cons-
tantemente. O clima se refere às “condições atmosféricas” do espaço psicosocial, que
afetam os membros do grupo durante o tempo que nele permanecem.
Em qualquer grupo podem ser observadas condições variáveis de calor humano,
tensão, movimentos, equilíbrio, restrições, alegrias, insegurança e crises. Estas condições
em conjunto formam a “atmosfera” responsável pelo que os membros do grupo sentem
ao seu respeito. O clima do grupo pode variar desde sentimentos de bem estar e satisfação
até mal estar e insatisfação, passando por gradações de tensão, estresse, entusiasmo, pra-
zer, frustração, depressão, entre outros.
A energia mobilizada nos comportamentos individuais pode direcionar-se para re-
sultantes ao longo de um contínuo. Este movimento estende-se desde o extremo da divi-
são de forças, representada pela individualização de esforços e resultados, até o outro
extremo do total dinâmico maior que a soma das parcelas, representado pela sinergia gru-
pal. Todos esses fatores concorrem para a qualidade do comportamento ou desempenho
grupal num determinado período.
Um grupo tem início, funciona durante algum tempo, modifica-se em sua estrutu-
ra e dinâmica e continua modificando-se gradativamente, em maior ou menor grau e ve-
locidade, ou fragmenta-se terminando como grupo original e/ou dando origem à outros
grupos.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 6


2.2 Suposto Básico de Bion

A teoria de grupo segundo Bion, considera os seguintes termos: mentalidade gru-


pal, cultura grupal, suposições básicas, grupo de trabalho e grupo de suposto básico.
Mentalidade grupal está formada pela opinião, vontade ou desejo unânimes do
grupo em um dado momento. Os indivíduos contribuem para ela anônima ou inconscien-
temente. A mentalidade grupal pode estar em conflito com os desejos, opiniões ou pen-
samento dos indivíduos, produzindo-lhes desconforto, mal estar e outras reações.
A cultura do grupo é a resultante do interjogo entre a mentalidade grupal e os de-
sejos do individuo.
Suposições básicas representam estados emocionais que levam o grupo a evitar o
aprendizado pela experiência, aprendizado este que exige contato com a realidade e que
pode ocasionar dor. Em outras palavras estes estados não são orientados para a realidade
externa, mas para a fantasia interna, do tipo onipotente e mágica. Elas são inconscientes e
opostas às opiniões conscientes e racionais dos membros que compõem o grupo.
Grupo de trabalho requer de seus membros capacidade de cooperação e esforço
que se da por um certo amadurecimento. É um estado mental que implica contato com a
realidade, tolerância, frustração e controle de emoções.
Grupo de suposto básico é a mentalidade grupal expressa através de três suposi-
ções básicas, descritas a seguir:

• Suposição básica de dependência (sbD)


O objetivo essencial do grupo de dependência é atingir segurança e ter seus mem-
bros protegidos por um indivíduo. É a crença de uma divindade protetora cuja bondade,
poder, sabedoria não se põe em dúvida.
Quando o líder de tal grupo não satisfaz as expectativas como se espera, o grupo
procura líderes alternativos.

• Suposição básica de luta – fuga (sbF)


A suposição é que o grupo se encontrou para se preservar e que isto só pode ser
feito lutando contra alguém ou algo.
O objeto mau é externo e a única atividade defensiva diante dele consiste em des-
truí-lo (ataque) ou evitá-lo (fuga). A ação é essencial para a luta ou para a fuga. Assim, o
líder apropriado para este tipo de grupo é capaz de mobilizar o grupo para o ataque ou
conduzir a fuga. Este grupo de suposição básica é “antiintelectual” e hostil à idéia de au-
to-estudo.

• Suposição básica de acasalamento ou pareamento (sbA)


A suposição é que o grupo se encontrou para propósitos de reprodução, produzir o
Messias, o Salvador. E em termos narrativos, a crença, coletiva e inconsciente, de que
quaisquer que sejam os problemas e necessidades atuais do grupo, um fato futuro ou um
ser ainda por nascer os resolverão, quer dizer, há esperança de tipo messiânico.
Embora o grupo enfoque o futuro, Bion chama a atenção para o presente, isto é, o
sentimento de esperança é evidente no grupo de pareamento mesmo que quando outra
evidencia não está clara.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 7


CULTURA DO GRUPO
Grupo de Trabalho

Grupo dos Supostos Básicos

Desconhecido Atua na:


e Temido – ƒ Dependência
Inconsciente ƒ Luta-fuga
Instinto ƒ Acasalamento
/ Pareamento

A função do coordenador é auxiliar o grupo a perceber em qual


espaço o grupo está atuando
Figura 1 – Cultura de Grupo (Bion).

2.3 Abordagem do Elemento Humano

A proposta do modelo do elemento humano de Schutz consiste de teoria e méto-


dos com o objetivo de aumentar a autopercepção, auto-aceitação e a auto-estima de forma
a despertar e trazer a tona o pleno potencial do humano, tanto do indivíduo como dele
como membro de um grupo. Para Schutz não há como desenvolver e/ou trabalhar grupos
sem desenvolver o elemento humano: “What a wonderful irony. If we want to improve
team performance, we must work on individuals” (Schutz, 1994, p. 117).
Os princípios associados ao Modelo Elemento Humano de Schutz são:

• Verdade – no ambiente onde impera a verdade os relacionamentos são simplifica-


dos, claros e energizados.
• Escolha – o direito a escolha – meus pensamentos, sentimentos, memórias, saúde,
tudo.
• Simplicidade – optar sempre pelo simples.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 8


• Ilimitado – o ser humano não tem limites no seu potencial. Nosso único limitante
são as nossas próprias crenças.
• Holismo – todos os aspectos da pessoa (pensamento, ambiente, sentimentos e o
corpo) são inter-relacionados.
• Completude – a efetividade e o prazer são alcançados na conclusão de experiên-
cias inacabadas.
• Dimensões – as dimensões básicas do funcionamento humano são a inclusão, con-
trole e abertura.
• Auto-estima – todos os comportamentos derivam da auto-estima. Para Schutz é o
core de cada pessoa, o centro de onde brota toda a criatividade, motivação e ques-
tões de trabalho produtivo. Um grande objetivo para as organizações é otimizar a
auto-estima de todos seus funcionários.

Nas questões de desenvolvimento do grupo Schutz considera que o entendimento


das dimensões pode nos tornar mais tolerantes com o que acontece com o grupo e tam-
bém nos auxilia a lidar de forma mais habilidosa com a evolução dos grupos. Ele agrupa
as dimensões como descrito a seguir:

Inclusão
No período inicial do desenvolvimento do grupo, a compatibilidade de inclusão é
muito importante. A fase de inclusão tem início na formação do grupo. É o olhar para o
grupo e vislumbrar onde o indivíduo se encaixa no grupo. A principal questão dos mem-
bros do grupo é “irão prestar atenção em mim ou serei ignorado?” A inclusão é a fase da
associação entre as pessoas: o desejo de receber atenção, de ter espaço para interagir e ser
único.
O comportamento nesta fase de inclusão é uma função de dois aspectos: racional
e defensivo. O aspecto racional representa a preferência pelo contato com os outros e o
aspecto defensivo representa a ansiedade em ser incluído, envolve resistência e rigidez.
Segundo Schutz, quanto mais saudável for a auto-estima e maior for a autopercepção do
membro, maior será o papel exercido pelo aspecto racional.
A base do comportamento de inclusão é o sentimento que acompanha a experiên-
cia individual de significância: “Eu me sinto significante quando o outro existe para mim
e é importante para mim e vice-versa”.

Controle
Uma vez que os aspectos de inclusão estão resolvidos, ao menos temporariamen-
te, as questões de controle ganham relevância: liderança, determinação de procedimentos
e medos de tomada de decisão e distribuição do poder. A questão é se o membro está
confortável com o quanto de poder, responsabilidade e influência ele tem no grupo.
À medida que as relações começam a se desenvolver, as pessoas almejam diferen-
tes papéis (líder, apoiador, brincalhão, oponente, conciliador) e começam as disputas de
poder, competição e influência, que passam a ser as questões centrais. Aparecem nesta
fase três perfis:

• abdicrata – postura defensiva e abdica do poder, quer uma posição de subordina-


ção, para se isentar de responsabilidades e obrigações.
• autocrata – postura defensiva e dominante ao extremo, busca a dominação e a
competição. Tendem a assumir várias tarefas para mostrar a sua capacidade.

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• democrata – para estes, poder e controle não são considerados problemas, sen-
tem-se confortáveis dando e recebendo ordens. Estes se sentem competentes e se-
guros para confiar nos outros e tomar decisões.

Abertura
É o grau no qual cada membro está disposto a se abrir ao outro. A abertura varia
no tempo, entre os indivíduos e dentro das relações. É baseada na construção de laços
mais profundos, sendo usualmente a última fase que emerge no desenvolvimento das
relações dentro do grupo. A abertura, assim como a inclusão, relaciona os aspectos racio-
nais e defensivos.
O aspecto racional resulta da preferência por abrir os aspectos da vida pessoal e o
defensivo resulta do medo de se abrir e ser rejeitado, não amado. Para Schutz a abertura
individual está associada a quanto o indivíduo gosta de si mesmo e da própria companhia,
pois se isso é real, ela acreditará que quanto mais o próximo conhecê-la maior é a chance
do outro gostar dela.
Nesta fase, tornam-se fundamentais outros princípios de Schutz como a verdade,
escolha e auto-estima. Se a verdade pode ser dita e compartilhada, haverá espaço para
que cada membro escolha o próprio caminho a ser tomado, criando espaço para aprendi-
zagem, mudança e crescimento; caminhos estes que levam ao aumento da auto-estima,
por conseqüência com grande possibilidade para a abertura no grupo.
Em síntese, a Inclusão envolve o quanto nós queremos nos encontrar com cada
um do grupo, envolve a decisão de continuar ou não no relacionamento. As questões de
Controle estão associadas com o grau que confrontamos o outro e o quanto estamos dis-
postos a trabalhar a forma de nos relacionar. A medida que o relacionamento continua, a
Abertura tem a ver com o grau no qual nos “abraçamos/acolhemos” um ao outro. Para
Schutz nenhum dos princípios pode ser visto isoladamente ou de forma seqüencial, eles
se intercalam e alternam, formando um todo sistêmico, cujo objetivo é apoiar a compre-
ensão e desenvolvimento do Elemento Humano.
Schutz convida todos a explorarem o que acontece quando:

• diminuímos nossas barreiras defensivas e nos comunicamos aberta e honestamen-


te um com o outro;
• diminuímos a nossa “culpa” e passamos a reconhecer e conspirar um com o outro
para criar/inovar; e,
• diminuímos a autocrítica e permitirmos nos olhar internamente, nos conhecendo e
reconhecendo o nosso melhor.

Para ele, à medida que percebermos o tremendo poder da verdade, reconhecermos


nossa fantástica capacidade de determinar nossas próprias vidas e vencermos os nossos
medos, olhando aberta e honestamente para nós mesmos, nós poderemos alcançar níveis
ilimitados de produtividade e satisfação pessoal dentro das organizações, nas relações e
com nós mesmos – atingindo a nossa real essência.
Vide quadro resumo no Anexo 2.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 10


2.4 Teoria de Campo

Teoria de campo é o nome dado à teoria criada por Kurt Lewin. Seu nome deriva
da tese básica segundo a qual o comportamento é o produto de um campo de determinan-
tes interdependentes, conhecidos como “espaço de vida” ou “espaço social”. As caracte-
rísticas estruturais desse campo são representadas por conceitos da topologia e da teoria
de conjuntos, e as características dinâmicas são representadas através de conceitos de
forças psicológicas e sociais.
Para Kurt Lewin, a Teoria de Campo entende que o ser humano age num mundo
de forças (vetores) com cargas (valências) positivas ou negativas. Assim, Lewin usa ter-
mos como locomoção, vetor, valência, retrogressão, pouco comuns em outras obras de
psicofisiologia. Para Lewin, a percepção de um objeto ou fenômeno pode dar nascimento
a uma tensão psicológica (por exemplo, um desejo), ou pode comunicar-se com um esta-
do de tensão já existente, de tal modo que esse sistema de tensão assuma com ele o con-
trole da conduta motora.
Podemos considerar que a teoria de campo é um método de analisar relações cau-
sais e construir teorias científicas, caracterizadas pelos seguintes atributos:

• Utilização de um método de construções, e não de classificações;


• Interesse pelos aspetos dinâmicos dos acontecimentos;
• Perspectiva psicológica e não física;
• Análise iniciada pela situação como um todo;
• Distinção entre problemas sistemáticos e históricos;
• Representação matemática do campo.

Segundo a teoria de campo, é possível apreciar a ênfase posta por Lewin sobre a
necessidade de substituir em Psicologia, os conceitos de classe (que remetem a essências
que determinariam, a priori, a direção e a qualidade dos vetores) por conceitos de campo
ou série (construtivos, relacionados a leis). No caso dos conceitos de campo, cada vetor
depende da inter-relação de vários fatores, que incluem o objeto – em nosso caso o do
indivíduo – e seu ambiente.
Ao definir campo psicológico, Lewin usa a conceituação de um campo de forças
que compreende a totalidade dos fatos coexistentes e mutuamente interdependentes. O
campo psicológico consiste no espaço de vida considerado dinamicamente. Compreende
tanto a pessoa como o meio, sem se esgotar na percepção que o indivíduo tem dele, pois
envolve também variáveis não-psicológicas (biológicas, sociais e físicas), que incidem na
zona de fronteira.
A Valência para Lewin corresponde às atrações e repulsões de objetos atuando
como forças ambientais que guiam a conduta humana. Então essa conduta leva ao sacia-
mento ou à resolução da tensão, de modo que haja aproximação de um estado de equilí-
brio.
As características principais da teoria de campo de Lewin podem ser assim resu-
midas:

• o comportamento é função do campo que existe no momento em que ele ocorre;


• a análise começa com a situação como um todo, e da qual são diferenciadas as
partes concretas: (P) Pessoa e M (Meio);

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C = f (P.M)
O comportamento (C), é função (f) ou resultado da interação entre a pessoa (P) e
o meio (M)

Lewin fala que só os fatos concretos no espaço vital podem produzir efeitos. Fala
também do princípio de contemporaneidade, segundo o qual só os fatos presentes podem
criar um comportamento atual. Além das noções de energia (força presente no ser huma-
no localizada em algum sistema), devem ser considerados também os conceitos de tensão
(estado alterado de uma região com relação a outra região), valência (valor que se dá a
necessidade) e vetor (força que pode operar mudança e que possui direção, energia e pon-
to de aplicação).
Ao apresentar os principais atributos da teoria de campo, não se pode omitir a im-
portância de que se reveste, para Lewin, a distinção entre causalidade histórica e causali-
dade sistemática, em suas vinculações como princípio de contemporaneidade do campo.
A teoria de campo rejeita não apenas a explicação teleológica, como a explicação pelo
passado: os fatos passados, não existindo atualmente, não podem ter influências presen-
tes, a não ser de forma indireta. Não há dúvidas de que o campo passado é uma das ori-
gens do campo presente – o que justifica a validade das pesquisas históricas.

3 BASE ASTROLÓGICA

O mapa astrológico é a representação gráfica do céu no momento de nascimento


de uma pessoa, um grupo, empresa, evento, etc. Neste trabalho o foco do nosso estudo
será o mapa astrológico do grupo SP 11, que teve seu início no dia 10 de Outubro de
2003, às 14:00 na cidade de São Paulo.
O mapa de uma pessoa nos indica seus potenciais, suas características inatas, seus
desafios e formas de amadurecimento ao longo da vida. Ele funciona como um mapa de
vida, que orienta o indivíduo a encontrar seu caminho, a entender os obstáculos a superar
e como aproveitar melhor os recursos que já possui para enfrentá-los.
Já o mapa de um grupo representa mais do que a soma dos mapas natais de cada
membro do grupo. Tem vida própria e um caminho de desenvolvimento. Como disse Fela
Moscovici, temos que considerar o grupo como mais do que a somatória de seus mem-
bros. Assim sendo, pode-se dizer que o mapa astrológico do grupo indica características
próprias a este grupo, seus recursos (forças impulsoras) e suas limitações (forças restriti-
vas); indica também os desafios a serem vencidos e os possíveis caminhos de amadure-
cimento. Finalmente, pode-se dizer que ele indica pontos específicos ao grupo que, ob-
servados pelos coordenadores e/ou pelos membros do grupo, podem acelerar o entendi-
mento do funcionamento do grupo nas diversas esferas de sua atuação.
O mapa natal não deve ser entendido como algo fatalista ou determinista. Muito
menos deve servir de desculpa para justificar o comportamento do grupo. Não deve exer-
cer o papel de bode expiatório, mas pelo contrário, pode ser utilizado como uma ferra-
menta na identificação de comportamentos, tensões e dificuldades. Ao identificá-las e
trazê-las para a consciência do grupo, é possível trabalhar com as mesmas e minimizar a
ocorrência de mecanismos de fuga, de defesa e de controle, observados com freqüência
nos grupos.

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3.1 Os Atores do Mapa

Por ser a leitura de um mapa sistêmica e complexa, para efeito didáticos iremos
fazer simplificações ao longo deste trabalho. Entretanto, é importante que se tenha um
conhecimento mínimo de como funciona a relação entre o trinômio planetas-signos-
casas, que são a base de sustentação de um mapa astrológico.
A astrologia usa os planetas como planos de energia e forças propulsoras que
existem dentro de nós. Para entender melhor este funcionamento, podemos fazer uma
analogia com uma peça de teatro. Neste contexto, pode-se dizer que o planeta é o ator; o
signo é o papel por ele representado, e a casa astrológica, o cenário onde ele está atuando.
Vejamos um exemplo: o planeta marte é o responsável pela energia de ação e iniciativa.
Ele é o guerreiro. Se estiver no signo de Câncer, será um guerreiro menos agressivo, mais
preocupado com o ambiente à sua volta do que somente com a sua vontade. E finalmente,
suponhamos que este marte esteja na casa 3, a casa da comunicação, do aprendizado, do
estudo básico. Neste cenário ele irá atuar, ou seja, será neste campo de atuação que a
energia de iniciativa e de competição irá aparecer mais fortemente.
Vale ressaltar que os planetas não atuam sozinhos. Eles recebem influências de
outros planetas. Estas influências são representadas no mapa astrológico pelos aspectos:
trígono, sêxtil, quadratura, oposição e conjunção. Tais aspectos podem facilitar ou difi-
cultar a expressão deste papel vivido pelo planeta. Normalmente as quadraturas e oposi-
ções são tensões e conflitos internos que geram dificuldades. O trígono e o sêxtil são li-
gações favoráveis, que denotam potenciais e caminhos facilitadores. E finalmente, as
conjunções são neutras e seu potencial positivo ou tenso depende da natureza dos plane-
tas em questão.
Os Anexos 3 e 4 exibem as tabelas que resumem o significado dos planetas e das
casas, respectivamente.
Para que fosse possível realizar uma análise do mapa frente às vivências do grupo,
fez-se necessário eleger alguns pontos a serem trabalhados e analisados. O mapa astroló-
gico apresenta infinitas características de personalidade e comportamento, expressas nas
diversas esferas de atuação – comunicação, expressão afetiva, relacionamentos, aspectos
de grupo, aspectos inconscientes, medos, valores, filosofia e crenças, entre outros. Neste
trabalho não pretendemos esgotar todos estes aspectos, mas sim selecionar aqueles que
nos permitem fazer as correlações entre as teorias da Dinâmica dos Grupos com as vivên-
cias e o movimento do grupo SP11.
Os temas presentes no mapa escolhidos para nossa análise foram:

• Temperamento – Indica o canal de expressão mais fácil para o funcionamento do


grupo. Ele é identificado a partir da distribuição dos planetas nos tipos de signos –
fogo, ar, água e terra. A concentração dominante em um dos elementos indica
qual o temperamento do grupo, ou seja, sua função predominante. Vale ressaltar
que o temperamento é o padrão básico, mas não é o único canal existente. É ape-
nas uma simplificação para começar a entender a complexidade natural de todo e
qualquer grupo.
• Personalidade – formada por quatro pontos básicos do mapa astrológico. São os
quatro pontos mais importantes na análise de um grupo e revela muito sobre seu
funcionamento:

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♦ Sol: essência do grupo, seu propósito principal, o potencial de crescimento
e realização. O sol, quando realizado, é o astro com maior capacidade de
gerar a sensação de plenitude e felicidade.
♦ Lua: aspectos emocionais, reações instintivas e mecanismos de defesa,
história e passado, primeiras experiências.
♦ Ascendente: comportamento aparente, “máscara” usada pelo grupo para
ser visto, atitudes visíveis.
♦ Meio do Céu: objetivos do grupo, para onde se deseja caminhar, rumo,
conceito de sucesso.
• Comunicação e Aprendizado – identificados principalmente pelo planeta Mercú-
rio e pelas casas 3 e 9.
• Expressão Afetiva e Relacionamentos – observados pelo planeta Vênus, pela casa
5 e pelo eixo dos relacionamentos (casas 1 e 7).

3.2 Temperamento

Leitura do Mapa – Temperamento AR


O temperamento é a forma mais básica do grupo se manifestar. Representa o ca-
nal, a freqüência e o ritmo em que ele vive com mais naturalidade.
Um temperamento AR representa a importância do PENSAR. Ele entende o mun-
do, as pessoas, as relações e até os sentimentos através da lógica, da racionalização, do
pensamento. Tende a ser muito abstrato e aéreo; está sempre em busca de conceitos e
novas idéias; em princípio, não tem preconceitos com relação à inovação e à criatividade
intelectual.
Uma outra faceta é a tônica dos RELACIONAMENTOS, onde, o “outro” é im-
portante e a sua opinião é levada em conta. Há uma preocupação em não desagradar, em
ser “político” e em resolver os conflitos através da negociação e das trocas. As relações
aqui são importantes porque o grupo aprende através da troca, da vivência com outras
pessoas.
Palavra-chave = RAZÃO

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Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses
A seguir, levantamos algumas atividades ou vivências do grupo que representam a
descrição do temperamento acima:

Atividade Fato Hipótese


13/Dez/2003 Cada pessoa fez a sua escolha indivi- H1:
Auto-Percepção dual. Os resultados individuais foram O grupo percebe que sua
do Grupo: “qual validados pelo grupo, que chegou atra- função predominante é o pen-
a sua característica vés do consenso na distribuição final: samento.
predominante: Grupo do “Pensar” – 10 pessoas
Pensar, Sentir Grupo do “Sentir” – 7 pessoas
ou Agir”? Grupo do “Agir” – 5 pessoas
Coordenações Os coordenadores começam a sinalizar H2:
do Segundo módulo a importância de não deixar os conteú- O grupo, através da disper-
(maio/2004) dos importantes para os 15 minutos são, da racionalização e das
finais. justificativas, foge, pois não
“quer entrar” em contato com
os seus sentimentos, incômo-
dos do momento e/ou outras
questões que necessitam ser
trabalhadas.
13/Dez/2003 A partir das forças restritivas e impulso- Evitando conflito e permane-
Qual o papel ras identificadas nas pessoas, houve a cendo na zona de conforto,
que eu mais exercito dificuldade em dar e receber feedback. consigo:
do grupo? Na maior parte das vezes, os mesmos H3:
– o quanto permito vinham acompanhados de uma longa Consigo garantir meu espaço
tramitar/circular justificativa e ou elogios rasgados, como no grupo.
nos papéis. forma de compensação. Devido a esta H4:
dificuldade acima citada, surgiu uma Posso manter um “bom” nível
nova atividade que solicitava a identifi- de relacionamento.
cação da circulação ou cristalização de
papéis.

Aqui cabe ressaltar a importância das forças da Teoria do Campo de Lewin (vide
2.4). Pode-se dizer, pela astrologia, que a função pensamento é predominante neste gru-
po. O uso da razão é algo natural e até fácil para ele. Entretanto, se considerarmos esta
função no contexto de todo o campo de forças do grupo, ela pode, em alguns momentos,
se tornar uma força restritiva, que emperra e atrapalha o grupo a: amadurecer, trazer con-
teúdos para a consciência e realizar análises mais profundas. Observamos isto em inúme-
ras situações, quando o grupo deixou os conteúdos importantes, que realmente precisa-
vam ser trabalhados, para os 15 minutos finais. Este é um exemplo claro do uso negativo
deste potencial, o que não impede que o grupo o utilize, em outros momentos, como força
impulsiva.
O aspecto do relacionamento, também característica do elemento AR, é explorado
no tópico abaixo – Personalidade – item 3.2.1.

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3.3 Personalidade

A personalidade do grupo pode ser definida ao analisarmos quatro pontos princi-


pais do seu mapa natal: Sol, Lua, Ascendente e Meio do Céu. Com base nestas quatro
“funções” básicas podemos observar a base dos comportamentos e da estrutura de fun-
cionamento do grupo, como descrito a seguir.

3.3.1 A Essência do Grupo – o Sol

O Sol, astro mais importante, o centro ao redor do qual giram os demais planetas.
Ocupa posição dominante em um mapa, é um centro de consciência, o centro de luz, for-
ça e energia.

Leitura no Mapa – Sol em Libra na casa 9


Aspectos do Sol: Oposição à Lua, Quadratura com Saturno, Sêxtil com Plutão
O Sol é o caminho para a realização do grupo, o que ele é de fato, como ele sente
a vida e expressa sua personalidade e individualidade.
O Sol em libra é diplomático e harmônico. O caminho para sua realização se dá
através dos relacionamentos, do equilíbrio, da harmonia e negociação entre os participan-
tes. Ele sente a vida através da troca, do contato com as pessoas e se expressa através
destas relações de forma diplomática. Vivido de forma positiva, ele considera a opinião
do próximo, ponderando e avaliando antes de decidir. Porém, quando vivido de forma
negativa, pode ficar “em cima do muro”, se deixar influenciar e não decidir nem agir de
acordo com sua vontade; pode criar relações de co-dependência com os outros, chegando
ao extremo de perda de sua identidade.
O desafio do sol em libra é encontrar a sua identidade através das relações que es-
tabelece, mas não deixar de ser quem ele realmente é em função delas.
A casa onde ele se encontra, representa onde o grupo quer brilhar e ser reconheci-
do, e também o lugar onde ele deixará sua marca por meio da expressão criativa e utiliza-
ção da sua vontade.
O sol do grupo está na casa 9, ou seja, na casa dos saberes, da filosofia, dos estu-
dos especializados e profundos, da ciência, dos sonhos e visões, das culturas estrangeiras,
do comércio exterior. Fala das lições que aprendemos na vida. Assim, o grupo aprende,
se realiza e encontra seu brilho e seu reconhecimento ao se aprofundar nos estudos das
relações, no entendimento fundamentado das coisas. Para ele, a ética e os valores são
muito importantes. Entender outras culturas, idéias e filosofias é um veículo que reforça
sua identidade, que estimula seu conhecimento.
Os aspectos recebidos pelo sol são campos de energia que facilitam ou dificultam
a sua expressão. O aspecto de Saturno é um limitador no que diz respeito a expressão
afetiva, como veremos abaixo.

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Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses
Atividade / Fato Hipótese
Movimento
06/02/2004 Desconforto de alguns em ouvir H.5:
Sessão de feedback – feedback, e frustração de outros Dificuldade em dar feedback
foram formados dois por não receber feedback mais verdadeiros, principalmente os
sub-grupos. Ambos profundos. negativos, que pode estar asso-
tinham a tarefa ciada à necessidade de ser “polí-
de avaliar os membros tico”, de agradar a todos para
do outro sub-grupo ser aceito no grupo. Medo da
e dar a devolutiva rejeição.
individualmente.
1º Módulo – Grupo desde o primeiro encontro H6:
Outubro de 2003 sente falta da teoria, da explicação Necessidade do grupo de ter
a Abril de 2004 metodológica, de realizar ativida- conhecimento teórico estrutura-
des mais direcionadas. Ainda ape- do.
gado ao modelo de “sala de aula”, H7:
com expectativas do coordenador Espera que isso venha de al-
assumir o papel de “professor”. guém (dependência)
Feedback aos coordenadores no
encontro de encerramento do pri-
meiro módulo

Analisando a hipótese H6 desta tabela o fato foi um marco de evolução no grupo.


Pode-se arriscar dizer que o grupo saiu da fase de inclusão (vide Schutz, 2.3) neste en-
contro, ou pelo menos, tirou o foco desta etapa. Para algumas pessoas foi muito difícil
explorar o lado negativo do feedback. As pessoas do grupo ainda estavam se conhecendo
e precisavam de apoio, se sentir parte, e serem aceitas. Somando esta fase de inclusão
vivida pelo grupo com a sua natureza de libra, da necessidade do social, do equilíbrio, da
valorização da harmonia e do consenso, pode-se afirmar que uma grande barreira foi ven-
cida ao realizar esta sessão de feedback.
Aqui vale ressaltar alguns aspectos que dificultam a expressão positiva e cons-
ciente desta identidade. Em alguns momentos o grupo pode reforçar negativamente a sua
dependência em relação às outras pessoas e às opiniões alheias. De alguma maneira, há
uma sensação de limitação e restrição que impede o grupo de ser original, autêntico. Pode
ser o excesso de cobrança pela perfeição, pelo acerto, por ser o melhor, para receber a
recompensa necessária. Pode ser a insegurança de ser “rejeitado” afetivamente pelos ou-
tros ao expressar sua vontade. Pode ser alguma figura de autoridade que esteja dentro ou
fora do grupo, que exerça o papel de “cobrador”, ou seja, do “pai” que chama o filho para
a responsabilidade.
A questão da rejeição é um ponto forte no grupo, no que diz respeito à sua insegu-
rança. A expressão livre do afeto e do carinho, o cuidar, o lado “maternal” do grupo, o
contato e o toque são assuntos delicados e importantes para o amadurecimento do grupo.
Há uma necessidade em aprender a fazer tudo isso, que vem acompanhada de medo e
insegurança. Aprender a expressar seus sentimentos livremente, a se entregar, a vivenciar
o toque e o emocional dentro do grupo é um desafio a seguir, um aprendizado do grupo
rumo à sua maturidade. Aqui não adianta ser somente cordial e simpático, é preciso
aprender a ser afetivo.
Já a hipótese H7 nos remete os suposto básico da dependência de Bion (vide 2.2).
Pela sua natureza, o grupo apresenta um desejo de aprofundar seus conhecimentos, de

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fundamentar as teorias e ampliar seus saberes. Porém isto ainda não é vivenciado pelo
grupo em sua plenitude. Como esta é uma questão forte para o grupo, de um desejo ainda
não realizado, ele espera que isto venha “pronto”, que seja oferecido por alguma “divin-
dade”, no caso, os coordenadores. Aí se estabelece uma relação de dependência entre o
grupo e a figura da coordenação, que na fantasia do grupo os levará para o caminho da
realização, no que diz respeito aos aprendizados teóricos.
Novamente, aqui encontramos o desejo pelo conhecimento, pelos estudos e pela
razão como forma de expressão criativa da sua identidade.

3.3.2 Reações Emocionais – A Lua

Leitura no Mapa – Lua em Áries na casa 3


Aspectos da Lua: Oposição ao Sol, Sêxtil com Ascendente, Trígono com Plutão
A lua no mapa natal representa nossas necessidades emocionais, indica como de-
senvolvemos nossos mecanismos de defesa e reações emocionais às situações externas.
Ela indica o que o grupo precisa para se sentir seguro emocionalmente. Neste caso, a lua
está em Áries, ou seja, suas reações emocionais tendem a ser explosivas, intensas e ins-
tintivas, mesmo que não sejam explícitas. Normalmente, reage ao meio quando sente que
sua identidade e/ou liberdade são ameaçadas. Há necessidade de se sentir em movimento,
de competição, de novidades, iniciar coisas, e viver um ritmo dinâmico. Não espera, já
quer logo atuar. Toda vez que isto é posto em xeque suas reações emocionais aparecem,
normalmente de forma instintiva e até agressiva. Muitas vezes, o “querer fazer algo” para
não ficar parado é uma defesa do grupo. A “não ação” o ameaça. Quando vivida de forma
positiva, a lua em Áries possibilita crescimento, iniciativa, movimento, ousadia, pionei-
rismo, competição saudável, coragem e tomada de decisões com prontidão. Porém, vivida
de forma primitiva, leva à arrogância, ao domínio e disputa pelo poder, ao egoísmo cego,
à violência, agressividade e intolerância.
O local onde a lua se encontra representa a área onde o grupo sente segurança e
está sujeito às instabilidades. A lua em Áries está na casa 3, a casa da comunicação, dos
estudos básicos, do meio ambiente mais próximo.
Sol e Lua no mapa de um grupo representam suas energias mais fortes, os pontos
de sustentação, as energias dominantes. Vale ressaltar a oposição entre estes dois plane-
tas. Uma oposição significa um desafio constante, indica onde é necessário fazer acordos
para que se possa vivenciar bem uma situação. É um aspecto que tende a ser passivo e se
o grupo não encarar o problema como tal, sempre o terá como um incômodo. Normal-
mente o que acontece nestes casos é a oscilação entre um pólo e outro.

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Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses
Atividade Fato Hipótese
Atividades do grupo Momentos de tensão, feedback ou H8:
que demonstram reações instintivas a incômodos O grupo tende a ser bonzinho até
reação emocional observados. o momento em que é ameaçado,
com agressividade – feedback “agressivo” e direto de provocado ou cobrado.
e espontaneidade. um membro do grupo para outros H9.
dois (Encontro 15/10/2004); Quando sente que precisa ser
– reação de um membro do grupo autêntico e expressar sua opinião
tido com “calado” a outro, que o individual e isto não é “respeitado”,
acusou de não ter participado com reage de forma instintiva, com
sua opinião até aquele encontro silêncio agressivo, falas ríspidas e
desde o início do grupo atitudes invasivas.
(Encontro 05/11/2004);
– Discussão entre coordenação e
um membro do grupo, que quase
resultou na sua saída do grupo
definitivamente.
(Encontro 05/11/2004).
10/10/2003 Grupo a todo momento ficava in- H10:
1ª Atividade ventando coisas para ocupar o Desconforto do grupo vem da ne-
do Grupo – tempo. Sensação de desconforto cessidade de estar atuando, fa-
TAVISTOCK com os silêncios, com o “não saber zendo algo, qualquer coisa. A rea-
o que fazer”, e com a “omissão” dos ção emocional a esta ameaça é a
coordenadores. atitude (propor várias atividades),
ou a agressão (brincadeiras irôni-
cas com os coordenadores).
13/08/2004 Votação para a exclusão de um dos Este membro representava a falta
Exclusão membros do grupo que faltava com de entrega e intimidade, o não
de um membro freqüência e pouco se expunha. comprometimento com o coletivo.
do grupo. H11:
Autopreservação do grupo.
H12:
Eliminar aquilo que o grupo não
quer ser.
19 / 09/ 2004 Grupo se permitiu entrar na brinca- H13:
Atividade deira e se divertir. Competição Momento marcante em que o gru-
de competição “saudável”. Contato com o lado po começa a vivenciar a sua “lua”
para estourar lúdico e natural sem se preocupar de forma positiva: Movimento.
os balões com conteúdos teóricos, formas e
dos outros. explicações.

As emoções e reações do grupo se manifestam principalmente através da comuni-


cação e da fala, e não necessariamente da “disputa física”. O grupo se sente seguro quan-
do lida com conhecimentos básicos, quando está no seu “meio conhecido”. Tem certa
facilidade para se adaptar a diferentes situações, desde que isto não ameace a sua identi-
dade. Há uma certa instabilidade e oscilação na forma de expressar suas emoções, de se
comunicar com as outras pessoas.
Uma hora o grupo vive uma ponta e outra hora vive a outra, sem nunca chegar a
um acordo ou meio-termo. Neste caso, as duas energias mais fortes do grupo estão em
oposição – o sol e a lua – representando a polaridade entre o masculino e o feminino,
entre a individualidade e a parceria, entre o passivo e o ativo. E o curioso é que esta dua-

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 19


lidade acontece no eixo do conhecimento (casas 3 e 9 – vide quadro 4). É aqui, na área do
saber, que este dilema acontece.
A questão da fala e da comunicação é um fator de extrema importância para este
grupo. Falar, saber das coisas, ter as informações que “se deseja”, “na hora que se dese-
ja”, é um fator de segurança para o grupo. Quando isto é ameaçado, o grupo reage, entra
em seus mecanismos de defesa, que podem ser manifestados pela lua em Áries (agressi-
vidade, brigas, disputas, silêncio “vingativo”) ou pela racionalização do pólo oposto, o
sol em libra!

3.3.3 Comportamento Visível – Ascendente

Leitura no Mapa – Ascendente em Aquário


Aspectos: Conjunção com Urano, Sêxtil com Plutão, Sêxtil com Lua, Trígono com Sol
O Ascendente representa a nossa imagem, a forma como queremos ser vistos e
como as pessoas nos vêem. O Aquário é o signo da comunidade e dos grupos. Passa uma
imagem de grupo, de união, de vanguarda, modernidade, de ser alternativo e independen-
te. Ao mesmo tempo, lógico e racional; preza suas idéias e não gosta de mudá-las, pois as
considera muito boas, às vezes melhores que as demais. Por isso tende a defender seu
ponto de vista e pode ser até radical. É muito dinâmico e agitado. Tem muita energia
mental. Como recebe aspectos do sol e da lua, sua imagem também reflete muito clara-
mente a dualidade entre o instinto e o social, descrita anteriormente. Em alguns momen-
tos mostra o seu lado negociador, social, político e racional, em outros, mostra mais seu
instinto, suas emoções intensas e individualistas.
Aquário fala de rompimentos com a busca de uma nova ordem. Revolucionários e
com ações extremadas.

Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses


Atividade Fatos Hipótese
Característica – O grupo dos que falam e o grupo H14:
do grupo observada dos que não falam; preferência porDificuldade do grupo em encon-
durante toda atividades racionais e emocionais; o
trar o caminho do “meio”, do equi-
a formação: gostar e o não gostar das atividades;
líbrio, de dar espaço para as dife-
Dualidade ação e omissão. renças. Esta dualidade foi mais
e Polaridade marcante no início da formação e
a polaridade esteve presente
durante toda a formação.
10/12/2004 O grupo fala sobre si, vivencia as H15:
Inicio das dualidades e há menos cristalização Circular nos papéis deixou de ser
co-coordenações de papéis. uma ameaça.
e propostas H16:
de atividades A “demora” na permissão do gru-
que proporcionavam po em viver a Abertura.
a percepção
de possibilidades
não só polares.

Aquário é um signo fixo o que significa dificuldade em ser flexível e continuar os


processos de mudanças. Cria um ideal e fica “congelado” nele. (Vide H16).

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 20


3.3.4 Objetivos de Vida – Meio do Céu

Leitura no Mapa – Meio do Céu em Escorpião


Assim como a casa 4 representa o nosso passado e a nossa origem (vide quadro
4), o Meio do Céu, que abre a casa 10, significa nosso futuro, o caminho que desejamos
seguir, nosso objetivo de vida e realização. Analisadas em conjunto, as duas casas repre-
sentam a estrutura do indivíduo – sua origem e seu rumo/futuro.
O signo de Escorpião fala de transformação. Deseja se aprofundar em seus conhe-
cimentos e no entendimento do elemento humano. Busca a compreensão de como as pes-
soas funcionam na sua complexidade, e principalmente nos aspectos psicológicos. Obser-
va, analisa, procura as respostas que estão implícitas. É investigador nato, um estrategis-
ta. Tem um tom de mistério e sedução. Por conhecer as pessoas e seus “pontos fracos”
pode se tornar manipulador. Mas se usado positivamente, seu potencial transforma, reno-
va, quebra padrões que já não servem mais. É um signo de intensidade. Tudo que é feito
por ele é profundo, intenso e verdadeiro. Seu dilema é a entrega ou o controle. Quanto
mais tenta controlar, mais difícil será sua transformação e renovação.
Assim levantamos a seguinte hipótese: o meio do céu em escorpião indica que es-
te grupo se identifica com as questões do inconsciente, do humano e de suas transforma-
ções. Seu papel social é transformar, romper paradigmas, se aprofundar naquilo que estu-
da, renovar, reciclar, entender os aspectos humanos. É assim que ele deseja ser reconhe-
cido, admirado, elogiado e respeitado. A renovação e a transformação, entretanto, passam
por perdas, por mortes, rompimentos e renascimentos. E para este grupo, o sucesso signi-
fica também vivenciar estes processos.

3.4 Comunicação e Aprendizado

Leitura no Mapa – Mercúrio em Libra na casa 8


Aspectos: Trígono com Netuno
Mercúrio representa a comunicação, como o grupo se expressa, se comunica, co-
mo ele aprende e ensina, e quais são suas áreas de interesse e estudos.
O mercúrio do grupo está no signo de libra, reforçando todas as características do
sol, também em libra. É fácil para este grupo trocar, socializar e usar o canal da razão. É
assim que ele aprende, especialmente quando o assunto é racional e envolve o lado social.
Um aspecto interessante é a posição do planeta mercúrio no mapa. Ele está na casa 8, a
casa do inconsciente, do subjetivo, do sexo e da morte. Assim, pode-se afirmar que a co-
municação do grupo também acontece nesta esfera. É comum que se fale sobre isto.
Um outro ponto que esta posição favorece, é o entendimento de assuntos nem
sempre lógicos e concretos. Há certa facilidade para compreensão de assuntos subjetivos,
de entender o subliminar, seja do grupo seja de seus membros. Entretanto, em alguns
momentos, o conflito entre o lado lógico e racional e o lado sensível e abstrato pode en-
trar em tensão.
O grupo tem interesse por assuntos do inconsciente, da mente humana, do funcio-
namento das pessoas e da sociedade, por temas profundos e/ou ligados à transformação
do ser humano.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 21


Uma hipótese que se levanta é que o grupo percebe e entende aspectos incons-
cientes e subjetivos, mas nem sempre consegue trazê-los para a razão e explicação con-
creta.

3.5 Expressão Afetiva e Relacionamentos

Leitura do Mapa – Vênus em escorpião na casa 9


Aspectos: – trígono Marte, trígono Urano
Vênus fala de como o grupo vive o seu lado social, o prazer, o feminino e como o
grupo expressa seu afeto. Vênus está no signo de escorpião, um signo de intensidade, de
entrega, de vínculo, porém, de receio e de controle. Com relação ao prazer, ao toque e ao
afeto, vale ressaltar sua importância para este grupo. Ele precisa de afeto e que isto seja
vivido de forma intensa e profunda. É erótico e sensual na sua expressão. Apresenta dese-
jos ocultos, mistérios e tem medo de rejeição. Há medo de muito envolvimento e perda
de controle e por isso oscila entre amor e ódio, entrega e controle.
Um dos canais para expressar o afeto vivido pelo grupo é o estudo, o aprendizado,
a evolução em termos de conhecimento e de trocas sociais. Isto reforça todas as questões
de sua personalidade já vistas anteriormente. Isto acontece, pois o planeta Vênus está na
casa 9, a área do saber e do conhecimento. Ou seja, este grupo sente prazer e alegria em
estudar, em se aprofundar nos assuntos, em fundamentar seu conhecimento e em se rela-
cionar.
Outro ponto que reforça como funciona a expressão do afetivo neste grupo é a ca-
sa 5, Esta casa, por natureza, fala da expressão dos nossos afetos. Para este grupo, o ca-
minho mais fácil de expressar o que “sente” é através da “razão”. O toque e o contato
físico não são tão comuns. Há medo e insegurança impedindo que isto aconteça. Há con-
teúdos inconscientes, medo de perdas e rompimentos que dificultam este tipo de expres-
são. Um dos caminhos de evolução do grupo é superar estas barreiras. Não será da natu-
reza deste grupo a expressão constante, livre e intensa de afeto no sentido de toque, do
sensorial, mas é importante que ele o faça, para seu amadurecimento, mesmo que seja de
forma mais racional.

Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses


Atividade Fato Hipótese
Característica – No início do grupo não havia qua- H17:
do grupo observada se nenhuma proposta de atividades No início do grupo não havia inti-
durante o primeiro que estimulassem o sensorial, o midade suficiente e durante o se-
e segundo módulo. lúdico, o toque e a expressão do gundo módulo, havia muito contro-
afeto. le.
05/11/2004 – reação explosiva de dois mem- H18:
O que sinto bros do grupo frente a um feedback Muitas vezes o afeto é demonstra-
em relação provocativo: “em 13 encontros vo- do por impulso, de forma explosiva
ao grupo cês não se colocaram em nada/não e intensa. É como se o grupo fosse
e eu no grupo tem opinião”. uma panela de pressão, que vai
controlando, controlando e contro-
lando, até que chega algum estí-
mulo que faz com que esta energia
contida se liberte.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 22


No início do grupo não havia muito espaço para atividades que estimulassem o
toque, o sensorial, a expressão não verbal do afeto. Uma das hipóteses que levantamos é
que o grupo ainda se encontrava na fase de inclusão, onde é preciso ser aceito pelo grupo
e a intimidade pode ser ameaçadora, pode revelar coisas pessoais não tão agradáveis, o
que corresponde a um risco dentro deste contexto. Levando-se em consideração os dados
fornecidos pelo mapa astral de que o grupo não tem, na sua natureza, facilidade para en-
trar neste canal cinestésico de expressão, esta fase ficou ainda mais forte. Após esta fase,
o grupo entra na fase do controle. Somente quando o grupo chega na fase de abertura é
que estes estímulos são recebidos com mais naturalidade e explorados mais intensamente
pelo grupo. Isto foi observado principalmente após a metade do segundo módulo (vide
Schutz 2.3).

3.6 Amadurecimento do Grupo

Normalmente, no mapa de uma pessoa, analisamos sua evolução e amadureci-


mento através de duas etapas. A primeira delas, representada pelo ascendente e pela lua,
indica os primeiros comportamentos da pessoa, os modelos que ela aprendeu no meio
próximo, seu passado (origem/família) e como formou sua base emocional. Esta “heran-
ça”, nos acompanha por muitos anos, mas o real desenvolvimento se dá quando conse-
guimos viver nossa essência (o Sol) com consciência. A energia do SOL representa o que
devemos buscar para nos sentirmos plenos. Muitas vezes, vivemos o sol, atuamos naque-
la energia, mas sem consciência. Um sol “maduro” tem a consciência de quem ele é e
atua na total plenitude desta energia. Uma pessoa leva muitos anos até que consiga atingir
esta segunda fase. No caso do grupo, com um tempo de vida muito curto, não se pode
garantir a veracidade desta afirmação.
O desafio deste grupo, em termos de desenvolvimento, será o de ir de um conhe-
cimento mais básico e primário (que fornece a base) para um nível de aprofundamento,
de questionamento, de buscar respostas fundamentadas. Existe uma zona de conforto no
conhecimento “básico”, e por isso é necessário buscar sempre o “por quê” das coisas, o
fundamento e a análise profunda. A razão e a lógica pautam as duas fases, mas na primei-
ra o conhecimento é mais disperso, mais superficial, e na segunda fase, deve ser mais
profundo e ter o caráter de pesquisa e investigação.
Um dos grandes dilemas do grupo é: ser eu mesmo e respeitar minha identidade,
minhas idéias, ou ser político e fazer o que os outros querem para agradá-los e receber o
afeto deles? Na primeira fase do grupo, onde se vive mais intensamente a Lua e o Ascen-
dente, a questão da identidade, de ser autêntico e de estar em movimento, atuando, fazen-
do algo, mesmo sem questionar o “por quê” é mais forte. Há também nesta fase uma pre-
dominância do “não envolvimento”. É preciso preservar o espaço da individualidade e
por isso não há vínculo ou entrega. O caráter “defensivo” é maior e há muito espaço para
a razão. Na segunda fase, em que se vive mais conscientemente seu sol em libra e o meio
do céu em escorpião, já aparece uma necessidade de intimidade, de estabelecer relações
mais duradouras e com profundidade.
A questão do poder pode ser uma força propulsora dentro deste contexto. Num
primeiro momento de vida do grupo esta busca de poder/conhecimento é algo mais indi-
vidualista, relacionado aos projetos futuros individuais embora a imagem que o grupo
passe seja de interesse coletivo (aspectos observados no grande sêxtil: lua-ascendente-

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 23


plutão). Num segundo momento, a busca pelo poder ganha novo enfoque; aqui já é ne-
cessário fundamentar o conhecimento para se obter poder de fato, mas agora no âmbito
grupal; as relações se tornam mais importantes que o “eu” e o sentido de fraternidade do
ascendente em aquário ganha verdadeira força (aspectos observados no grande sêxtil:
ascendente-plutão-sol).

Leitura no Grupo – Levantamento de Hipóteses


Atividade Fato Hipótese
13/Dez/2003 Foram colocados papéis com estas H19:
Identificar forças no chão, em dois blocos: Forças restritivas são na verdade as
as forças restritivas restritivas e impulsoras: tensões e os incômodos que fize-
e impulsoras Forças Restritivas: Falta de con- ram o grupo se movimentar durante
do grupo. fiança, dar a abertura para falar, toda a sua existência e reagir em
medos e pouco aprofundamento busca de modificações destas for-
em alguns assuntos. ças.
Forças Impulsoras: Vontade de H20:
crescer e aprender; espaço para Ao longo dos encontros, algumas
diferenças, alegria e humor. destas forças restritivas foram se
transformando em forças impulso-
ras.
Característica Um dos membros comenta que H21:
do grupo não quer dormir no sítio durante o Desejo de conhecimento que impli-
observada durante encontro de encerramento e o ca em auto-conhecimento e auto-
o terceiro módulo. grupo “aceita” sem julgamento ou aceitação põe o grupo em movimen-
crítica. to. O grupo opta pela experimenta-
28/04/2005 ção da fase de abertura. (Vide 2.3)
Alguns membros do grupo passam
a comentar sobre seu “lado es-
curo”.
19/03/2005

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O mapa astrológico pode significar muitas coisas. Segundo Liz Green, ele é um
mapa da psique do indivíduo, um modelo de energias e comportamentos que o compõe.
Ele representa o potencial do indivíduo. A palavra-chave é “potencial”. É como uma se-
mente. Ela já contém dentro de si o ciclo completo de evolução que potencialmente vai
gerar uma árvore: semente, muda, planta, árvore, flor, fruta e semente. Todavia, muita
coisa pode acontecer com esta semente até que ela complete seu ciclo, e por isso a impor-
tância da palavra “potencial”. Se eu ficar com esta semente na palma da minha mão, ela
não irá crescer e nem completar seu ciclo. Mas se ela for plantada, nutrida e cuidada, po-
de gerar uma árvore frondosa, que pode ou não, gerar frutos. E aí entra o livre-arbítrio e a
opção de escolha (vide Schutz 2.3). Somos todos contemplados com nossos potenciais,
mas o que fazemos com eles, é decisão nossa.
No caso de um grupo, o mapa natal nos indica seu potencial, sua natureza, seus
valores, crenças, desejos inconscientes, limitações, forma de comunicação, expressão de
afeto, relacionamentos, etc. Pode-se fazer uma analogia destas dimensões com o que Fela
Moscovici chama de Cultura do Grupo – conjunto de características que influenciam e
determinam o funcionamento e desenvolvimento dos grupos. Mas afinal, para que nos
serve conhecer todos estes elementos através do mapa natal de um grupo?

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 24


Em primeiro lugar, ele pode ser uma ferramenta de apoio e orientação para os co-
ordenadores. Ele pode sinalizar e indicar uma série de aspectos do grupo, que irão facili-
tar a condução do mesmo. Ele nos ajuda a formular hipóteses sobre as seguintes questões:
padrões que o grupo tende a formar; onde estão pautados seus valores; o que é necessário
desenvolver; quais são seus pontos de limitação; quais são seus canais de comunicação
mais evidentes; qual o grau de individualidade e de cooperação existente; onde estão os
principais pontos de tensão; quais são os mecanismos de defesa mais comuns; as reações
emocionais e a expressão do afeto e da emoção, e principalmente, alerta para os desafios
do grupo e seu potencial de realização.
O conhecimento prévio destas questões permite ao coordenador atuar de forma
mais orientada. Não deve ser usado como um limitador, que diminui as possibilidades do
grupo e/ou do coordenador, mas pelo contrário, deve ser mais uma ferramenta para levan-
tar hipóteses. O coordenador precisa respeitar o ritmo e as necessidades do grupo sem
impor sua vontade ou sua visão. Neste contexto, a análise do mapa funcionaria como uma
“bússola” que pode orientar o coordenador nos momentos de escolher caminhos a seguir
com o grupo, nas técnicas propostas, na forma de interagir com as pessoas e nas sinaliza-
ções que deve e pode fazer para auxiliar o crescimento do grupo.
O resultado que obtivemos com a análise do grupo SP 11 nos mostrou que existe
correlação entre o potencial observado no mapa, os fatos vivenciados pelo grupo e a for-
mulação de hipóteses.
Entretanto, é preciso frisar que este trabalho não pretende esgotar o assunto, mas
sim abrir as possibilidades de novos estudos de caso, de novas experiências. Para que se
desenvolva um modelo mais estruturado ou um padrão de leitura de mapa para grupos é
preciso estudar outros cenários, fazer mais testes e ampliar o escopo de estudo.
“Considerando a hipótese de que o Grupo SP11 tivesse continuidade”, para que
ele mantivesse seu processo de amadurecimento seria importante que ele se deixasse le-
var também pelo seu lado sensível, não ficando tão preso ao seu lado racional. Isto ficou
muito visível nos últimos encontros do grupo, e principalmente no último encontro, vivi-
do e “sentido” intensamente por todos. Para o amadurecimento pleno seria preciso mais
momentos como este, onde haja mais espaço para o sensível, para o afeto e para as trocas
mais íntimas. Neste caminho de crescimento do grupo SP11 não adianta ser somente cor-
dial e simpático é preciso ser afetivo”.

REFERÊNCIAS

BAREMBLITT, Gregório. Grupos: teoria e técnica. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1986.
BION, W.R. Experiências com grupos. Rio de Janeiro: Imago, 1970.
CARTWRIGHT, D.; ZANDER, A. A dinâmica de grupo. São Paulo: EPU, 1967.
CARUTTI, Eugenio; Las Lunas. Buenos Aires: Casa X1 Editorial, 1997.
DE CASTRO, Maria Eugênia; Astrologia e as dimensões do ser. São Paulo: Campus, 2002.
GREENE, Liz. Os astros e o amor. São Paulo: Cultrix, 1980.
GRINBERG, Leon; SOR, Dario; BIANCHEDI, Elizabeth Tabak. Introdução às idéias de Bion.
LEWIN, K. Problemas de dinâmica de grupo. São Paulo: Cultrix, 1970.
MOSCOVICI, Felá. Desenvolvimento interpessoal. Rio de Janeiro: José Olympio, 1994.
SAIDON, Osvaldo. Psicoterapia de grupo. São Paulo: Campus, série II, 1983.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 25


SAPORTAS, Howard. As doze casas. São Paulo: Pensamento, 1985.
SCHEIN, Edgar H. Organizational Culture and Leadership: a Dynamic View. San Francisco: Jossey-Bass
Publishers, 1985.
SCHUTZ, Will. The human element: productivity, self-esteem, and the bottom line. San Francisco, EUA:
Jossey-Bass Publishers, 1994.
ZIMERMAN, D. E. Bion, da teoria à prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 26


ANEXO 1 – MAPA NATAL DO GRUPO

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 27


ANEXO 2 – QUADRO SINTÉTICO DO PRINCÍPIO DIMENSÕES
DO ELEMENTO HUMANO – WILL SCHUTZ

INCLUSÃO CONTROLE ABERTURA


QUESTÃO Dentro ou Fora Topo ou base Aberto ou Fechado
(distinção) (dominância)
COMPORTAMENTO Inclusão Controle Abertura
COM O OUTRO
COMPORTAMENTO Sentir se vivo, Auto- Auto-percepção.
CONSIGO MESMO intenso, com energia determinação,
escolha.
EMOÇÃO Significância Competência Qualidade que
BÁSICA agrada,
amabilidade.
INTERAÇÃO Encontros Confronto Abraçar a causa,
ou reuniões envolvimento.
MEDO Ser ignorado Ser humilhado, Ser rejeitado,
INTERPESSOAL ou abandonado exposto, não agradar,
vulnerável. desprezado.
MEDO Ser insignificante, Ser incompetente, Não ser querido
PESSOAL sem importância ou incapaz, embuste e amado.
inútil. (impostor).

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ANEXO 3 – RESUMO DOS SIGNIFICADOS DOS PLANETAS

PLANETA SIGNIFICADO / POSITIVO NEGATIVO


ARQUÉTIPO
Essência Revitaliza Egocentrismo
Ego Dá reconhecimento Autoritarismo
SOL Personalidade Vitalidade Doença
Expressão Ânimo
Pai
Reação ao meio Sensibilidade Instabilidade
Passado/ Origens Emotividade Desestabilização
LUA Instintos Proteção (Cuidado) Insegurança
Mecanismos de defesa
Mãe
Expressão intelectual Racionalizar Engano
Comunicação Entender Dissimulação
MERCÚRIO Habilidades Interpretar Mentira
Decisões Comunicar Fofoca
Racionalização
Auto-Estima Prazer Futilidade
Contato social e afetivo Proteção (Sorte) Luxúria
VÊNUS
Amor Beleza / Desejo Superficialidade
Mundo Físico Sociabilidade Preguiça
Energia / Ação Iniciativa Agressividade
Iniciativa Impulso Acidentes
MARTE Agressividade / Força Coragem Perigo
Libido Atividade Nervosismo
Impulso Ação Raiva
Expansão Proteção Excesso
Confiança Favorecer Negligência
JÚPITER
Fé / Valores Ampliar Desperdício
Fortuna Expandir Arrogância
Responsabilidade Realizar Sensação de limitação
Estrutura Dar forma Impedimento
SATURNO Deveres Estruturar Tristeza
Realidade Amadurecer Autoritarismo
Consciência Medos
Liberdade Liberta Rompimento
Comunidade Renova Anarquia
URANO Inovação Revoluciona Atitudes drásticas
Revolução Inova Tensão
Criatividade Cria Insatisfação
Inspiração Dá compreensão Engano (Fraude)
Sublimação Perdoar Falta de direção
NETUNO
Sensibilidade Imaginar Decepção
Perdão Sublimar Escapismo
Poder Modifica Medo que paralisa
Força Interna Transforma Pânico
PLUTÃO Magnetismo Elimina o que não serve Destruição
Terror / Destruição Medo (que faz reagir) Derruba o necessário
Transformação

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 29


ANEXO 4 – RESUMO DAS CASAS ASTROLÓGICAS

CASA SIGNIFICADO
ASTROLÓGICA
CASA 1 Maneira pela qual conhecemos a vida: imagem que valori-
Isto faz meu tipo? zamos da nossa percepção do mundo; imagem que passamos
para o mundo através das nossas formas de expressão.
CASA 2 Descreve aquilo que queremos possuir: valores, posse, di-
Isto me agrada? nheiro e aspectos materiais.
CASA 3 Movimentação e busca do conhecimento e novas experiên-
O que posso dizer cias – mente concreta: estudos, expressão, linguagem e pe-
através disso? quenas viagens.
CASA 4 Representa o lugar para onde vamos quando nos voltamos
Que lembranças isto para dentro de nós: família, passados, origens, lar e alma.
evoca em minha alma?
CASA 5 Reflete a necessidade de brilhar e criar algo – habilidade de
Isto é mérito da minha produzir: expressão criativa, auto-expressão, esportes, re-
conquista? creação, lazer, filhos, sedução (maneira como criamos o
romance) e lúdico.
CASA 6 Necessidade de conectar corpo e mente: saúde, trabalho,
Como vai o andamento serviço, ajustes às necessidades e rotinas.
do dia-a-dia?
↑1 A 6 CASAS INDIVIDUAIS ↓7 A 12 CASAS SOCIAIS
CASA 7 União de duas ou mais pessoas para atender um propósito,
O que o outro acha? O onde se aprende a cooperar com os outros: casamentos, par-
que ele quer comigo? cerias e sociedades.
CASA 8 A casa dos bens/dinheiro do outro, tudo que vem do coleti-
Que perigo isto vo, aprender a compartilhar: casa das crises, sexo, regenera-
me oferece? ção e morte (transformação).
CASA 9 Necessidade de uma visão mais ampla, busca respostas a
Como provar a veraci- respeito de “porquês e para quês” – mente superior: longas
dade desta afirmação? viagens (tudo que esta distante), filosofia, crenças e religião.
CASA 10 Necessidade de reconhecimento social e contribuição para a
Qual o status/ sociedade: papel social no mundo, realização, objetivos de
valor social disso? vida e carreira.
CASA 11 Pressão para tornarmos maiores do que somos: Grupos,
Qual meu projeto amigos, esperanças e projetos futuros.
de vida?
CASA 12 Revela padrões, anseios, compulsões e opera em níveis
Qual o sentido abaixo do consciente: compaixão, espiritualidade e inimigos
disto acontecer agora? ocultos.

SBDG – Caderno 83 ™ De que maneiras a astrologia contribui na leitura... 30


Cadernos da

Sociedade Brasileira de
Dinâmica dos Grupos

84
Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 115º
Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos,
realizado na cidade de Florianópolis, SC,
de 4 de março de 2005 a 21 de outubro de 2006.

Coordenação:
Emiliana Simas Cardoso da Silva, Didata
João Carlos Vieira Machado, Especialista

Porto Alegre
2006

SBDG – Caderno 84 1
Travessa La Salle, 75
Bairro Menino Deus
CEP 90130-120 Porto Alegre/RS
Telefone: (51) 3028.9114 e 3061.9115
E-mail: sbdg@sbdg.org.br
Site: www.sbdg.org.br

CONSELHO DIRETOR
Presidente Samara Mª M. Ferreira Costa e Silva

Vice-Presidente Eliane de Melo Meira Rank

Diretor Administrativo-Financeiro Geime Rozanski

Vice-Diretor Administrativo-Financeiro Roberto Scola

Diretora de Educação Carmem Maria Sant’Anna

Vice-Diretor de Educação Marcel Paranhos Dias

Os textos são de responsabilidade dos respectivos autores,


não representando necessariamente
o ponto de vista da SBDG.

Editoração e gravação:
Suliani – Editografia Ltda.
Fone/fax (51) 3384.8579 e-mail: editor@suliani.com.br

SBDG – Caderno 84 2
NÚCLEOS

Núcleo RS
GESTOR GERAL: Mara Maru dos Santos
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suzana Zimmer
GESTOR DE EVENTOS: Doralício Siqueira Filho
VICE-GESTOR DE EVENTOS: André Beneduzi

Núcleo SC
GESTOR GERAL: Emiliana Simas Cardoso da Silva
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Carmem Sinzato
GESTOR DE EVENTOS: João Carlos Machado
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Maria Alexandra Cardoso da Silva

Núcleo PR
GESTOR GERAL: Helena Mª França Sundin
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suely do Rocio Pucci
GESTOR DE EVENTOS: Laucemir Pessine
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Ana Silvia A. Borgo

Núcleo PA
GESTOR GERAL Mauro Nogueira de Oliveira
GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza
GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira
VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira

Núcleo MS
GESTOR GERAL: Maria Selma Perez
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende
GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini

SBDG – Caderno 84 3
Apresentação

O resultado do trabalho de um grupo é sempre


uma esperança: novas idéias, novos temas, novos rumos.
Estes artigos do Grupo 115 (Grupo Aconchegos)
representam, não só uma conquista dos participantes,
como de toda a Sociedade Brasileira de Dinâmica
dos Grupos, pois os temas abordados são propostos
mediante pesquisa e indagação sobre a essência
do trabalho em grupo.

Estamos orgulhosos pelo resultado e desejamos


aos autores uma jornada repleta de sucessos.

Que a leitura de seus trabalhos seja estimulante


a todos os participantes de nossa Sociedade.

EMILIANA SIMAS CARDOSO DA SILVA, Didata


JOÃO CARLOS VIEIRA MACHADO, Especialista

SBDG – Caderno 84 4
Sumário

Grupo, subgrupo e a manifestação de uma nova estética


na vida coletiva: o (sub)grupo
Carlos Altemir Schmitt
Terezinha Maria Pinto da Silva
Valdete da Silva Sant’Anna

Escolher, não escolher ou ser escolhido:


eis a questão!
Marlene Viero

Na subjetividade da vivência do grupo:


O compromisso como atitude.
Carin Iara Loeffler
Marinês Luz de Oliveira
Miguel Ângelo Gobbi

Qual a influência dos líderes nos grupos


em um contexto organizacional?
Maria Carolina Jorge de Linhares
Simone Ferreira

Da morte anunciada à imortalidade da relação construída


no grupo: uma reflexão acerca da finitude
Fernanda Silva Destri
Jordelina Schier

Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento


para a preparação do jovem para o mercado de trabalho
Anamália Thorstenberg Ribas
Claudia Rita F. J. Souto Petrus
Sonia Aparecida de Oliveira Balster
Vanusa Souza Cardoso

SBDG – Caderno 84 5
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Grupo, subgrupo e a manifestação de uma nova


estética na vida coletiva: o (sub)grupo

CARLOS ALTEMIR SCHMITT


TEREZINHA MARIA PINTO DA SILVA
VALDETE DA SILVA SANT’ANNA

Resumo – Este estudo tem origem nas reflexões desenvolvidas com análise e observação
de pequenos grupos, e se fundamenta na prática de Formação em Coordenação de Dinâ-
mica dos Grupos, realizado em vinte encontros, durante dois anos de trabalho num pe-
queno grupo auto-analítico. Tivemos como objetivo conceituar o (sub)grupo enquanto
ente que participa das relações e inter-relações na dinâmica dos pequenos grupos.
Palavras-chave – Grupo. Subgrupo. Ética. Estética. Dinâmica dos grupos. Relação. In-
ter-relação.

Abstract – The origin of this study is the reflections developed with analysis and com-
ment of small groups, and it bases on practice of Formation in Dynamics of the Groups
Coordination, carried through in twenty meeting, during two years of work in a small
auto-analytical group. We had as objective to appraise the (sub)Group while participating
the relations and Inter-relations in the small groups dynamics.
Key words – Group. Sub-group. Ethics. Aesthetic. Dynamic of the groups. Relation. In-
terrelation.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 1


INTRODUÇÃO

O estudo que construímos fez uma viagem teórica a partir de uma prática viven-
ciada no cotidiano de um grupo de trabalho, que pretendemos apresentar sem com isso
trazer à tona a identidade individual dos sujeitos que fizeram parte desta base de análise,
reflexão e síntese.
O movimento que aqui fazemos traduz-se dentro de uma epistemologia freireana,1
isto porque, utilizamos elementos, argumentos e postulados de sua práxis pedagógica.
Todo o nosso pensar fluiu dentro de um pensamento dialético-sociointeracionista que
perpassa o ensinamento de Freire, ação-reflexão-teorização.
Trata-se de uma breve síntese de nossas síncrises que passaram por análises e que
ora aqui devolvemos, para que o leitor formule movimentos sincréticos para uma nova
construção do conhecimento, se não em dinâmica de grupos, para a vida.

1 O TEXTO: NO TEMPO E NO ESPAÇO

Todo o texto tem um momento histórico, a história dos sujeitos que o tecem, que
o costuram com as mãos de costureiros, de alfaiates, de educadores, de médicos, ou de
pescadores.
A economia foi globalizada; as comunicações viajam a velocidades outrora incal-
culáveis, as distâncias se encurtaram, as guerras deixaram de ser corpo-a-corpo, a socie-
dade se transforma em algo sem nome, sem objetivos; as imagens tomam conta da fala, o
subjetivo passa a ser institucionalizado, o indivíduo é manipulado pelo medo que através
das imagens o invade, como o mar quando em ressaca invade a terra, sem permissão e o
Estado perde a cada dia sua identidade (Souza Santos, 1996; Ferreira dos Santos, 2005).
Estamos vivendo um tempo em que tudo parece depender da imagem, em sentido
freudiano, pode-se dizer que o acesso ao objeto (realidade simulada, pela mídia e pelos
meios de comunicação) é direto,2 não existe um terceiro que se interponha a esse objeto
que almejamos. Percebe-se uma cultura na qual o consumo triunfa, o sujeito consome a si
mesmo, em partes de imagens, de novos rostos, de novas roupas, venera tudo o que há de
fútil, banal e superficial. O sujeito atomizado rejeita a profundidade, a troca, a diversida-
de, o outro (Souza Santos, 1996; Touraine, 1997; Ferreira dos Santos, 2005).
Vivemos numa época em que presenciamos “o acaso de uma modernidade esgo-
tada em seus sonhos, valores e instituições. Nossa vida de todos os dias humilhada pela
emergência caótica das trivialidades, e por uma ofensiva contra a política como criação
do devir das autonomias”. 3

1
Vide a vasta obra de Paulo Freire. Por exemplo: Pedagogia do Oprimido; Pedagogia da Autonomia:
saberes necessários à prática educativa; Pedagogia da Esperança; Pedagogia dos Sonhos Possíveis ; Edu-
cação e Mudança; dentre outras.
2
O fato pode ser melhor compreendido a partir de uma leitura do livro Matrix: bem-vindo ao deserto do
real. Coletânea de William Irwin, São Paulo:Madras, 2003.
3
“O ocaso de una modernidad agotada en sus sueños, valo res e instutuciones. Nuestra vida de todos los
días humilliada por la emergencia caótica de las trivialidades, y por una ofensiva contra la política como
creación de devenir de las autonomias.” WARAT, Luis Alberto. Por quien cantan las sirenas: informe
sobre eco-ciudadania, género y derecho – incidências del barroco en el pensamiento jurídico. UNO-
ESC / CPGD-UFSC. 1996. Págs. 14/15.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 2


O homem narcisicamente chamado a si, numa visão de si mesmo, isolado, fulcra-
do numa ilusão de imagens a espera de seu fim. Uma realidade cultuada por um “irreal”,
que se apresenta, através de uma avalanche de imagens, mais “real” do que o próprio real
– simulacros. Todavia, segundo Warat (1990a, p. 27), para darmos continuidade à vida
não devemos confundir as ficções do real com a realidade fictícia.
Warat (1990b, p. 16) salienta que o narcisismo primário não é outra coisa que a
defesa do vazio pelo qual se constitui simbolicamente a autonomia, impondo uma distân-
cia que não poderá ser obturada entre o Eu e os objetos. Diz ainda (1990b, p. 80) que no
universo narcísico não há o Outro e não há possibilidade de realização do prazer.
O mundo das imagens nos mostra um homem sem limites, completo. O culto ao
corpo como objeto de produção de prazeres. O desprezo dos sentidos. O desprezo do Ou-
tro como constituição do Eu. O fetiche e a castração são, para Warat (1990a, p. 36) ver-
dades que vieram ocupar o lugar da vida: um efeito de desejos idealizados que provocam
o efeito de saberes plenos.
Guattari (1999, p. 7) coloca com propriedade que
As redes de parentesco tendem a se reduzir ao mínimo, a vida domésti-
ca vem sendo gangrenada pelo consumo da mídia, a vida conjugal e fa-
miliar se encontra freqüentemente “ossificada” por uma espécie de pa-
dronização dos comportamentos, as relações de vizinhança estão geral-
mente reduzidas a sua mais pobre expressão...
A vida dos homens e mulheres é uma constante união de contrários, de paradoxos,
de complexas formas de agir e sentir, de contemplar e criar, através da ação e do simbóli-
co, mais vida, mais forma, mais relação. Os devaneios que homens e mulheres têm sur-
gem de uma poção mágica e mística de contemplar o paradoxo material e espiritual no
qual estão inseridas suas existências. As coisas existem. As coisas da natureza, porque
aqui estão. E, as da humanidade, porque foram criadas, construídas e inventadas a partir
de uma humanização desde a hominização do homem (Morin, 2003; 2005b), que é raiz
sensível de sua parte mais animal. Homens e mulheres buscam a sobrevivência racional e
afetiva num mundo cada vez mais carregado de ilusões e de desafios que nascem de per-
plexidades4 às quais estamos todos sujeitados em nossos paradigmas ético-estéticos.
Entendemos ser de suma importância situar o contexto no qual estamos inseridos
e, principalmente no momento em que estamos escrevendo este texto. Nosso interesse é o
de marcar o tempo histórico em que se encontram os sujeitos deste estudo, um tempo em
que alguns denominam de continuação da modernidade (Habermas), outros de trans-
modernidade (Warat; Nicolescu) e, outros ainda, de pós-modernidade (Souza Santos;
Touraine; Ferreira dos Santos). Mas que, em nossa análise, retrata o que descrevemos
acima não no sentido de “a morte do sujeito”, mas da sua plasticidade em relação ao ob-
jeto, isto é, o sujeito deixa de produzir seu próprio conhecimento através de um ato refle-
xivo-ativo para consumir um conhecimento superficial e abstrato através do mundo das
imagens, o que de certa forma dificulta as relações e formações grupais.
Desta forma, o trabalho que pretendemos apresentar tem origem nas reflexões de-
senvolvidas com análise e observação de pequenos grupos, bem como se fundamenta na
prática de Formação em Coordenação de Dinâmica dos Grupos, realizado em vinte en-
contros durante dois anos de trabalho. É importante ressaltar que o que deu base para esta

4
Neste sentido, vide SOUZA SANTOS, Boaventura de. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-
modernidade. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1996.

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análise foi um pequeno grupo auto-analítico, isto é segundo Mills (1970, p. 18), um grupo
que se constitui com o objetivo de compreender a dinâmica de grupo através da explora-
ção de seus processos, em vez de ser estudado por estranhos, é estudado pelos próprios
membros.
A questão que levantamos deriva do grupo, mas não é dele propriamente que ire-
mos falar, ou melhor, falaremos de uma espécie de grupo secundário originário do Grupo
de Formação.
A primeira hipótese que se levanta a respeito deste grupo secundário, que a partir
de agora passaremos a chamar (sub)grupo5 (para distinguí-lo do grupo e do subgrupo
originais), é a de que: o fenômeno do subgrupo aparece localizado no grupo, porém,
quando ele se desloca para outro ambiente, ele se torna o (sub)grupo.
Segunda hipótese: O fenômeno do (sub)grupo tem etapas de vida tal qual as do
grupo original, inclusão, controle e afeição ou abertura.6 E, quando tais etapas não são
trabalhadas pelos seus participantes, ele, o (sub)grupo, se torna improdutivo, não resiste,
e lentamente acaba morrendo, podendo inclusive, implodir o grupo de origem.
Terceira hipótese: O fenômeno da morte ou dissolução do (sub)grupo é disfarçado
pelo Grupo que age como elo de ligação do subgrupo em seu espaço geográfico limitado
(espaço formal), desconsiderando o que se passa à margem dele ou seja, no espaço do
(sub)Grupo.
Quarta hipótese: O (sub)grupo para sobreviver deve em sua gênese procurar se es-
truturar construindo suas regras e estabelecendo-as como marco inicial de suas ativida-
des; caso contrário ele não existe enquanto grupo e sim, como um ajuntamento de indivi-
dualidades.
Quinta hipótese: O (sub)grupo quando não se estrutura, relaciona-se superficial-
mente sob forma de: disputa pelo saber, pela liderança, pelo fazer mais, pela aparência e
pela competência individuais, em detrimento do sentido associativo do grupo.
O objetivo deste estudo foi o de conceituar o (sub)grupo enquanto ente que parti-
cipa das relações e inter-relações na dinâmica dos pequenos grupos.
Buscaremos em prática: conceituar grupo e subgrupo através de revisão bibliográ-
fica; descrever as etapas da vida de formação dos grupos; e, conceituar e descrever o
sub(grupo) através das possibilidades encontradas, ao longo das observações, de sua ma-
nifestação como ente distinto da de subgrupo.
Esperamos que com este trabalho se possa apresentar uma nova entidade ou, pelo
menos, demonstrar o que se está descortinando nas páginas deste artigo.

5
O (sub)grupo tem origem no grupo formal, reúne-se por necessidade funcional, difere dos grupos infor-
mais chamados “panelinha”.
6
Vide obras de Schutz (1978) e Moscovici (2005). Para Schutz (1978), são três as zonas de necessidades
interpessoais existentes em todos os grupos: Inclusão, que significa a necessidade de se sentir considera-
do pelos outros, de sua existência no grupo ser de interesse para os outros; Controle, que significa res-
peito pela competência e responsabilidade dos outros e consideração dos outros pela competência e res-
ponsabilidade do indivíduo; Afeição ou abertura, que significa sentimentos mútuos ou recíprocos de
amar os outros e ser amado, ou seja, sentir-se amado.

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2 O QUE É UM GRUPO?

Eu não sou você


Você não é eu
Mas sei muito de mim
Vivendo com você
E você, sabe muito de você vivendo comigo?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas encontrei comigo e me vi
Em quanto olhava para você
Na sua, minha, insegurança
Na sua, minha, desconfiança
Na sua, minha, competição
Na sua, minha, birra infantil
Na sua, minha, omissão
Na sua, minha, firmeza
Na sua, minha, impaciência
Na sua, minha, prepotência
Na sua, minha, fragilidade doce
Na sua, minha, mudez aterrorrizada
E você se encontrou e se viu, enquanto
olhava pra mim?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas foi vivendo minha solidão
Que conversei com você
E você conversou comigo na sua solidão
Ou fugiu dela, de mim e de você?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas sou mais eu, quando consigo
lhe ver, porque você me reflete
No que eu ainda sou
No que já sou eu e
No que quero vir a ser...
Eu não sou você
Você não é eu
Mas somos um grupo, enquanto somos capazes de diferenciadamente,
Eu ser eu, vivendo com você e
Você ser você, vivendo comigo.
(Madalena Freire)
O outro significa o semelhante e o dessemelhante; semelhante pelos traços huma-
nos ou culturais; dessemelhante pela singularidade individual ou pelas diferenças étnicas
(Morin, 2005a, p. 77). Neste conceito de complexidade Morin, em sua consideração, para
nós o Outro não é o outro da relação dual, mas o Outro da relação grupal, ou seja, o ter-
ceiro que se interpõe à relação e cria uma inter-relação. Aquilo que para Bion (1975, p.
28) passa a ser um número mínimo para a existência de um grupo, pois para o autor, dois
sujeitos têm relações pessoais, enquanto que três ou mais farão uma mudança qualitativa
e uma modificação de relação para inter-relação – resulta numa nova estética.

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Neste sentido, o grupo insere, além de uma ética fundada em normas, as quais são
construídas e seguidas pelos seus integrantes; uma nova estética social, isto é, a estética
da inter-relação. Quando um sujeito se filia a um outro grupo ele recria uma nova ordem
social. Se ele pertence a um determinado grupo social (família) ao se filiar em um novo
grupo (amigos), ele modificará as duas estruturas, ou seja, um novo movimento estético
ressurge na ordem social.
Cooley (apud Mucchielli, 1980, p. 14-15), referindo-se a grupos primários, escreve,
eu entendo aqueles que são caracterizados por uma associação e uma
colaboração íntimas, de pessoa a pessoa e ‘face a face’. Eles são primá-
rios nos diversos sentidos da palavra, mas sobretudo porque são funda-
mentais na formação da natureza social e dos ideais do indivíduo. A
forma mais simples de descrever este conjunto talvez seja dizendo que é
um nós. Ele contém esse tipo de simpatia e de identificação mútuas para
as quais nós é a expressão natural. Cada um vive com o sentimento do
todo, e encontra nesse sentimento os alvos principais de sua vontade.
Salienta-se, segundo Davis (apud Mucchielli, 1980, p. 15), que no grupo primário
não importa nem a proximidade física, nem a duração das relações, nem mesmo a peque-
na dimensão do grupo considerada isoladamente. O que conta segundo o autor é a quali-
dade da relação pessoal, espontânea, sentimental e inclusiva, e a comunhão do objetivo.
Para Cartwright e Zander (1975, p. 54)
Deve-se observar que a capacidade de um grupo para satisfazer os dese-
jos de um indivíduo pode não depender totalmente das ocorrências no
interior do próprio grupo. Todo grupo existe num ambiente, e os atribu-
tos que uma pessoa vê num dado grupo são, em parte, determinados,
para ela, pela posição do grupo no ambiente. Se, por exemplo, o grupo
tem um grande prestígio na comunidade, será visto com a capacidade
para satisfazer as necessidades de status ainda não atingido por um gru-
po de pouco prestígio. Esta é uma qualidade do grupo, derivada de fon-
tes exteriores a ele.
Zimermann (2000, p. 82-83), por outro lado, considera a definição de grupo vaga
e imprecisa, isto porque, ele pode designar conceituações muito dispersas, num amplo
leque de acepções. O autor define grupo como um conjunto de três pessoas, uma família,
uma turminha ou gangue de formação espontânea, uma composição artificial de grupos
como, por exemplo, o de uma escola ou um grupo terapêutico; uma fila de ônibus; um
auditório; uma torcida no estádio; uma multidão num comício. Diz ainda, que se poderá
conceituar grupo de forma abstrata como um grupo de pessoas sintonizadas num progra-
ma de televisão, ou abranger uma nação unificada no simbolismo de um hino ou de uma
bandeira. O autor salienta que existem grupos de todos os tipos e que por isso se faz ne-
cessária uma divisão entre grandes grupos (objetos de uma macrossociologia) e pequenos
grupos (objetos de uma micropsicologia) e, nestes últimos, cabe também uma segunda
distinção, entre grupo e agrupamento. Como grupamento o autor entende ser um conjunto
de pessoas que convivem partilhando de um mesmo espaço e que guardam entre si uma
certa valência de inter-relacionamento e uma potencialidade em virem a se constituírem
como um grupo propriamente dito.
Casado (2002), define grupo como sendo o conjunto de pessoas que compartilham
valores, crenças visões semelhantes de mundo, possuem uma identidade e pode ser con-

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 6


siderado um todo. Sua unidade é decorrente dos laços afetivos estabelecidos entre seus
membros. As atribuições e as responsabilidades individuais estão claramente definidas e
são do conhecimento de todos. A autora ressalta que no grupo as ligações afetivas unem
as pessoas.
Machado (1998), por exemplo, define grupo pela estabilidade relativa, pelas rela-
ções dinâmicas e complexas entre seus membros, por serem reconhecidos por outras pes-
soas fora de seu ambiente, como um grupo, pelo compartilhamento de técnicas, regras,
procedimentos e responsabilidades, necessários ao desenvolvimento das atividades no
trabalho e por terem objetivos comuns.
Amaru (1986), coloca que o grupo se caracteriza por quatro fatores, são eles: or-
ganização, interação motivação e percepção. Para o autor o grupo de trabalho, pode mani-
festar simultaneamente dois tipos de comportamento, (1) os dirigidos para a execução da
tarefa, e (2) os dirigidos para a eficiência e o bem-estar das relações pessoais (para a ma-
nutenção do próprio grupo).
Para este trabalho, entretanto, consideremos as afirmações de Davis (1973, p. 4)
que nos diz que
a palavra “grupo” pode não se referir tanto a uma entidade estável, mas
a um local de ação ou confluência de sistemas individuais de compor-
tamento. Para ele, um grupo é um conjunto de sistemas mutuamente in-
terdependentes de sistemas comportamentais que não apenas exercem
influência mútua, mas também respondem a influencias externas. A no-
ção de grupo pode parecer menos misteriosa se for imaginada como
composta, em primeiro lugar, de um conjunto de pessoas e, em segun-
do, de uma coleção de pessoas interdependentes.
São diversos os autores e por conseqüência as conceituações que encontramos na
literatura, contudo, percebe-se que algumas condições se fazem necessárias para estabe-
lecermos os conceitos7 de grupo, e daí derivar o conceito de subgrupo; para uma concei-
tuação de (sub)grupo, são necessárias todas as condições acima relatadas e, ao mesmo
tempo, estabelecermos a necessidade de salientar a importância do que podemos chamar
de espaço-tempo-geográfico no qual os sujeitos estão “ajuntados”.
Assim, é o contexto espacial no qual estamos inseridos, o local em que se observa
a forma de atuação desse “ajuntamento de pessoas”, que nos permitirá descrever o con-
ceito ao qual ele pertence, grupo, subgrupo ou (sub)grupo.

3 GRUPO, SUBGRUPO E ESPAÇO-TEMPO-GEOGRÁFICO:


A RAIZ DO CONCEITO EM QUESTÃO – O (SUB)GRUPO

Podemos encontrar na literatura a descrição da estrutura do Grupo de Formação


(Castilho, 1995; Mailhiot, 1977); Mailhiot (1977, p. 95), por exemplo, nos traz uma des-
crição precisa quanto à estrutura relatando a duração de uma sessão de 20 horas, conside-
rando o ideal de 40 horas; quanto ao número de participantes considera um mínimo de
dez e, um máximo de vinte, sendo ideal um número entre doze a quinze participan-

7
Consideramos que conceitos numa disciplina são freqüentemente, apenas, metáforas em outras, por mais
vizinhas que se encontrem. Entretanto, Metáforas são flashes isolados, não se dão em sistemas e não
permitem teorizações (Santos, 1996, p. 70).

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 7


tes.Quanto à composição o citado autor considera que quanto mais heterogêneo for o
grupo maior as possibilidades de aprendizado, contudo, há de se considerar que as dife-
renças requerem um tempo maior para a equalização desses conhecimentos; outra ques-
tão citada pelo autor e que entendemos interessante para este trabalho, é que quanto ao
contexto espaço-temporal da experiência, diz ele: é importante que seu início e seu tér-
mino sejam previstos, que os momentos e a duração de cada sessão sejam fixados, que a
experiência seja vivida em um mesmo lugar determinado, e reservado ao grupo para a
realização inteira da experiência. No Grupo de Formação que foi objeto de nosso estudo,
consideramos de fundamental importância, a delimitação desse espaço e tempo, não só
físico, como também, simbólico, porque situa o sujeito como membro no grupo.
Berque apud Maffesoli (2000, p. 23), faz uma consideração sobre o grupo no qual
o grupismo, diferentemente do gregarismo, cada membro do grupo, conscientemente ou
não, esforça-se, sobretudo, para servir ao interesse do grupo ao invés de, simplesmente
procurar refúgio nele. Maffesoli complementa ressaltando que o termo “grupismo”, ain-
da que não seja especialmente eufônico, tem o mérito de sublinhar a força desse proces-
so de identificação, que possibilita o devotamento graças ao qual se reforça aquilo que é
comum a todos.
Observa-se que no grupo o processo ético-estético permeia o resgate do outro
quando o sujeito compartilha novas possibilidades de relação individual-coletiva, cum-
prindo assim o papel de aceitar o mundo e o outro como limite. Diante disso, o sujeito
aceita as diferenças como geradoras e criadoras do novo, pois as inter-relações são a base
de todo o trabalho de grupo desenvolvido.
Para Maffesoli (2000, p. 20-21) a sensibilidade coletiva ultrapassa a atomização
individual e suscita condições de possibilidade para uma espécie de aura, que vai parti-
cularizar uma ou outra época. É possível que se assista agora, a elaboração de uma aura
estética, na qual, encontrar-se-ão em proporções diversas, os elementos que remetem a
uma pulsão comunitária, a uma propensão mística ou a uma perspectiva ecológica. A
estética fundamenta-se numa base relacional, na união do macrocosmo, do macro com o
micro, e das inter-relações. A emoção e a sensibilidade devem ser consideradas num mis-
to de objetividade e subjetividade.
Neste sentido ainda gostaríamos de emprestar as palavras de Maffesoli (2000, p.
18-22) para quem, na estética do “nós”, predomina a atitude grupal, o dispêndio, o acaso,
a desindividualização, isto é, um misto de indiferença e energia pontual que caracteriza a
estética do sentimento, que de modo algum é uma experiência individualista ou interior,
mas a abertura para os outros, para o Outro. Para o autor (2000, p. 27), a estética (o sen-
tir-comum), o que ele chama de sentir-junto, faz-se por um viés relacional e a sensibili-
dade coletiva (originária da forma estética) constrói uma relação ética.
Enquanto que a Estética é o sentir-junto, a Ética caracteriza-se pelo estar-junto. A
ética pode ser definida como conseqüência da estética relacional e representa a fidelidade
às regras do grupo, sujeitas a múltiplas variações (Maffesoli, 2000, p. 22). O estar-junto é
colocado como fundamento de ética comunitária – de grupo. A ética é construída por
força da circunstância. Isto se dá porque existe proximidade (num sentido dionisíaco,
existe promiscuidade), porque existe partilha de um mesmo território e porque existe um
ideal comunitário (Maffesoli, 2000, p. 24).
Deste modo, para Maffesoli (2000, p. 24-28), se considerarmos as regras de con-
vívio dentro de uma ética fundada na estética da convivialidade grupal, ela (a ética) privi-
legia menos aquilo a que cada um vai aderir voluntariamente (contratualismo) do que
aquilo que é comum a todos (aura estética, empatia, agrupamento, ajuntamento – o estar-

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 8


junto que gera aquilo que o autor chama de experiência ética). A comunidade esgota sua
energia na sua própria criação, há o surgimento do trágico que se apóia no instante que se
faz eterno e dali faz emergir a solidariedade que lhe é própria. Na partilha sentimental de
valores, de lugares ou de ideais há um aspecto coesivo na experiência social. O ideal co-
munitário de bairro ou aldeia age mais por contaminação do imaginário coletivo do que
por persuasão de uma razão social, o que também acontece nos pequenos grupos.
Neste sentido, a ética é o cimento que fará com que diversos elementos de um da-
do conjunto formem um todo. É a expressão mais característica do querer-viver grupal, é
a expressão de sensibilidade coletiva. É o laço coletivo. Como elementos internos ao seu
conceito podemos trazer: a solidariedade, a fidelidade, a coesão, a sensibilidade coletiva,
a partilha, o ideal, a empatia, o imoralismo, os sentimentos vividos, o co-
mum=comungar=comunidade.
Neste artigo não assumimos a posição literal de Maffesoli, no que diz respeito a
não aceitação de regras preestabelecidas num contratualismo anterior à convivialidade,
porém aceitamos o contratualismo como forma de regular em último recurso àquilo que o
convívio não pôde dar conta no decorrer da vida do grupo, por exemplo.
Queremos inserir o Grupo de Formação num locus, num espaço privilegiado, num
lugar em que as relações e as inter-relações acontecem. Lugar no qual o indivíduo possa
construir seus laços de solidariedade, de fidelidade, de coesão, de sensibilidade coletiva,
de partilha, de ideal de grupo, de empatia, e compartilhar os sentimentos vividos, o co-
mum. Neste espaço tempo-geográfico o grupo se encontra e divide suas expectativas,
suas angústias, seus medos, seus sonhos; constrói seus conceitos ético-estéticos de vida; é
o endereço com hora, dia mês e ano, o ambiente reservado para este fim. Comporta no
conteúdo do Contrato do Grupo,8 espaço reservado aos trabalhos do grupo, às etapas de
construção do conhecimento e da manifestação da figura do subgrupo.
Simbolicamente, é o lugar em que o grupo existe, em que me referencio quando
existo no e para o grupo. É uma massa que funciona tanto física como espiritualmente.
Naquele “lugar” está o facilitador9 , eu e os outros, nós. Eu-tu, enquanto presença, ser de
presença, de valor, de história, independente das imagens ou da relação eu-isso, eu-
coisa.10 O outro dentro da minha semelhança e dessemelhança (Morin, op.cit.).
Um exemplo deste lugar no qual se encontram o grupo e seus subgrupos, deli-
neamos com a representação da dinâmica na figura que segue.

8
Contrato do Grupo – é um pacto moral de normas a serem seguidas pelos integrantes do grupo, pode ser
escrito para compor os documentos produzidos pelo Grupo ao longo do tempo de Formação, ou não.
Não há sanções contratuais, permanecem apenas no âmbito moral, funciona como a Lei maior que regu-
lamenta o caminho do grupo no trajeto de sua formação. Pacto construído por todos os integrantes pode
ser reivindicado a qualquer momento que se fizer necessário para dar conta da regularidade do grupo.
Funciona como norma de coesão. Lembrando Maffesoli, é o amalgama que cimenta os indivíduos como
grupo. Caso seja necessário consulta a alguma teoria de cunho mais formal, sugerimos consultar: CAS-
TILHO, Áurea. A dinâmica do trabalho em grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1995.
9
Neste artigo utilizamos a figura do facilitador e do coordenador de grupos, indistintamente, para desig-
nar aquele que facilita a decodificação do processo sincrético-analítico-sintético na construção do co-
nhecimento, a partir da vivência do participante, de dinâmica de grupos.
10
Neste sentido ver: BUBER, Martin. In: Eu e tu. 8. ed. São Paulo: Centauro, 2001.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 9


Espaço–tempo–geográfico

Coordenador

Inter-relação entre os Inter-relação entre os


membros do subgrupo membros do subgrupo

Inter-relação entre os membros do grupo

Figura 1 – Representação do espaço-tempo-geográfico,


local onde se dá a dinâmica do grupo e subgrupo.

Esta estética resulta numa ética onde, os participantes externam seus valores de
convivialidade, possibilidade, e de regularidade de manutenção da massa. Massa esta,
que cimenta os integrantes até o fim dessa história, a história que o grupo delimita como
o tempo para a sua formação (Mailhiot, 1977), passando a existir como um grupo e não
somente como um ajuntamento de individualidades.

4 O (SUB)GRUPO: QUANDO UMA NOVA ESTÉTICA SURGE


E O SUBGRUPO DÁ ESPAÇO A UM NOVO ENTE
NA DINÂMICA GRUPAL

O Grupo de Formação foi para nós elemento chave na construção da síntese que
elaborou em nosso pensamento uma nova estética chamada (sub)grupo. Isto porque nos
possibilitou validar percepções que observávamos nos trabalho com grupos de empresa,
grupos ligados a comunidades de educação, dentre outros, para os quais apenas tínhamos
hipóteses. Um registro que se faz importante é o de que no Grupo de Formação, várias
foram as anotações que fizemos de queixas dos integrantes quanto ao desenvolvimento
dos trabalhos dos subgrupos fora de seu ambiente natural – o ambiente formal, isto é, o
espaço-tempo-geográfico ao qual nos referimos no subtítulo anterior. Tais registros foram
a expressão mais pura de uma realidade presente na percepção dos sujeitos, sujeitados a
um modelo que fora disponibilizado pelos coordenadores para o seu desenvolvimento ao
longo de vinte encontros, no decorrer de dois anos.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 10


Tal modelo previa trabalho no grande grupo e subgrupo, onde os participantes
passaram por um processo de inclusão, controle e afeição ou abertura (Schutz, 1978;
Moscovici, 2005). Contudo o mesmo processo não foi desenvolvido nos (sub)grupo, pas-
sando a ser, como destacado em apontamentos que fizemos ao longo dos encontros, im-
produtivo, desgastante, angustiante e até mesmo, em determinados momentos, desagre-
gador.
No check-in, realizado no início de cada encontro, espaço reservado aos comentá-
rios iniciais de inclusão do participante, eram freqüentes os integrantes de trabalho de
subgrupo de seminários (aqui por nós chamado de (sub)grupo) relatarem que se sentiam
“desestimulados”, “cansados” e, muitos externavam sentimentos de irritação e desassos-
sego “me sinto irritada, isso me irrita”, “fico bem perdida quando isso acontece” e, outros
sentimentos de desestímulo quando diziam: “às vezes eu tenho vontade de desistir” por-
que “a coisa não flui”, “falta compromisso do pessoal”, “as pessoas não comparecem”,
dentre outras coisas. Além do que se falava nos corredores, nos intervalos e em momen-
tos mais íntimos, em duplas, nas saídas em grupos menores, por exemplo. No sub(grupo)
as falas, as questões que vinham eram: “ah! eu não li.”, “não tive tempo”, “assim vai dar
muito trabalho pra gente fazer! vamos fazer coisa mais simples.”, “cada um lê a sua parte
separado, depois a gente junta!”, “ah! eu vou viajar, não posso”, “ah! pra mim, como vo-
cês fizerem tá bom”, “o texto que eu fiz, fica como está, ninguém mexe!” “mandei dois
textos, vocês já mandaram algum?”, “pode deixar que eu faço tudo, depois eu mando pra
vocês lerem.” ainda registramos a falta de contribuição de membros, ausência nas reu-
niões, dentre outras.
Salienta-se que as falas, não estão para marcar a externalização de sentimentos
depreciativos do sujeito em relação a outros participantes de seu (sub)Grupo, mas como a
percepção de que a forma como conduzimos o subgrupo fora de seu espaço-tempo-
geográfico não está de acordo com a sua necessidade, isto porque, fora desse espaço o
subgrupo funciona como um novo grupo e é a isto que chamamos de (sub)grupo.
Outro fato importante a relatar é que, quando os integrantes dos subgrupos tinham
a oportunidade de compartilhar seus problemas no grupo, o grupo, reagia de forma apre-
sentar conversas paralelas, mudança de assunto, ou outro integrante solicitava a oportuni-
dade de fala e abria outro tema. A “deixa” também era dada pelas dinâmicas realizadas,
ou até mesmo pelos coordenadores. Porém, o espaço era, simplesmente, um espaço de
fuga que se dava na reclamação, na queixa e na falta de fazer, o que se podia verificar nos
relatos do check-in no próximo encontro, que trazia as mesmas queixas e reclamações (e
que tinham a ver com o subgrupo, fora de seu espaço original).
Nessas condições, o (sub)grupo só existe porque existe o grupo maior, original e
seu objetivo está vinculado ao objetivo do grupo, todavia, há uma nova configuração es-
tética. Os sujeitos fora do espaço-tempo-geográfico vinculam-se em novas formas rela-
cionais e inter-relacionais, novos modelos mentais, novos desejos e novas necessidades
surgem para os integrantes deste (sub)grupo. Algo completamente novo surge, um novo
espaço, um novo sujeito se apresenta, algo que na ordem do conhecimento Nicolescu
(1999, p. 27-35) chama de terceiro incluído, isto é, aquilo que não se manifesta fisica-
mente, mas está presente, pois é da ordem do sujeito, algo que a razão não mede, porém a
emoção sente. As diferenças podem ser visualizadas nas figuras metafóricas das constru-
ções abaixo:

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 11


Espaço–tempo–geográfico no Grupo

Coordenador

Inter-relação entre os Inter-relação entre os


membros do subgrupo membros do subgrupo

Inter-relação entre os membros do grupo

Espaço–tempo–geográfico no (sub)Grupo

Contrato de convivialidade estabelecido pelos inte-


grantes

Inter-relação entre os membros do (sub)Grupo

Figura 2 – Diferenças estéticas entre Grupo e (sub)Grupo.

Entendemos que, para o (sub)grupo, o estabelecimento de conceito de normas e


regras de convivialidade deve ser na razão do “dever ser” instituído por todos os integran-
tes do (sub)Grupo, isentando de responsabilidade qualquer que seja o sujeito como indi-
viduo, e resgatando o coletivo como forma de proteger a ordem estética coletiva. A figura
do facilitador desaparece, tomando forma no contrato estabelecido entre os integrantes do
grupo, todos coordenam, em tempos preestabelecidos e determinados.
Outra questão a ser considerada é que nos subgrupos não há o estabelecimento de
normas e regras de convivialidade, pois eles estão diretamente ligados às normas do grupo.
Nesta direção, seguimos os pressupostos de que toda o ordenamento desse novo
ente, o (sub)grupo, criado a partir de uma nova configuração, deve passar pelas fases
propostas por autores como Schutz (1978) e Moscovici (2005), ordenamento este, que
será o amálgama a que se refere Maffesoli, e que poderá dar a possibilidade aos indiví-
duos de conviverem com mais conforto, e harmonia na construção e elaboração do co-
nhecimento individual-coletivo durante o processo de Formação.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 12


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nosso estudo pretendeu mostrar uma nova categoria na dinâmica da relação e das
inter-relações nos pequenos grupos, o que entendemos foi neste artigo, apresentado e
validado.
Ficou evidenciado que o subgrupo se torna um novo ente – o (sub)grupo, quando
deslocado do seu espaço formal, bem como a necessidade de que, fora deste espaço, se-
jam construídas formas de trabalhar as etapas de vida dessa nova entidade.
Percebemos que o fenômeno da morte ou dissolução do (sub)grupo é disfarçado
pelo Grupo, que age como elo de ligação do subgrupo em seu espaço formal, desconside-
rando o que se passa à margem desse espaço, fato que evidenciamos através dos relatos
dos participantes.
Registramos que o (sub)grupo para sobreviver, diferentemente dos subgrupos, de-
ve procurar se estruturar construindo suas regras e estabelecendo-as como marco inicial
de suas atividades; caso contrário ele não existe enquanto grupo e sim, como um ajunta-
mento de individualidades.
Ao longo do artigo apresentamos ainda, as conseqüências da não estruturação do
(sub)grupo tais como, relacionamento superficial sob forma de: disputa individual pelo
saber, pela liderança, pelo fazer mais, pela aparência, e pela competência, em detrimento
do sentido associativo.
Assim sendo, dever-se-á considerar a figura do sub(grupo) como ente que partici-
pa da figura de pequenos grupos, tendo identidade própria, etapas associadas ao grupo
original, porém, diferentes. E, para isso se dar de forma harmônica em direção à constru-
ção de um conhecimento positivo, numa disputa construtiva pelo saber, pela liderança,
pela competência, individual-coletiva, almejando o espírito de grupo,11 consideramos que
seja necessária tal aceitação, como também o trabalho das etapas paulatinamente o que
poderá diminuir os conflitos, a rejeição, a fragmentação do sub(Grupo) e, inclusive, do
grupo original.

REFERÊNCIAS

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1993.
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ro, 2001.
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Walderedo Ismael de Oliveira. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago; São Paulo: EDUSP, 1975.
CARTWRIGHT, D.; ZANDER, A. Dinâmica de grupo: pesquisa e teoria. Tradução de Dante Moreira
Leite e Miriam L. Moreira Leite. 3. reimpressão. São Paulo: EPU/EDUSP, 1975.

11
Para Bion (op. cit.) o bom espírito do grupo se acha associado a algumas qualidades, são elas: (a) propó-
sito comum; reconhecimentos dos limites e sua posição em função a grupos maiores; (b) capacidade de
perder e receber novos membros; (c) o valor do subgrupo para o grupo principal deve ser geralmente re-
conhecido; (d) cada membro individual é valorizado por sua contribuição ao grupo e possui liberdade de
movimentação dentro dele; (e) o grupo deve ter a capacidade de enfrentar o descontentamento dentro de
si e possuir meio de tratar com ele; (f) o tamanho mínimo do grupo é três. Dois membros têm relações
pessoais com três ou mais a uma mudança de qualidade.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 13


CASADO, Tânia. O indivíduo e o grupo: a chave do desenvolvimento. In: FLEURY, Maria Teresa Leme
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CASTILHO, Áurea. A dinâmica do trabalho em grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1995.
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FREIRE, Madalena. Eu não sou você, você não é eu. In: GROSSI e BORDIN (Org.). Paixão de aprender.
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GUATTARI, Félix. As três ecologias. Tradução de Maria Cristina F. Bittencourt. Campinas, SP: Papirus,
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SOUZA SANTOS, Boaventura de. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 2. ed. São
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ZIMERMAN, David E. Fundamentos básicos das grupoterapias. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
2000.

SBDG – Caderno 84 v Grupo, subgrupo e manifestação de uma nova estética... 14


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Escolher, não escolher ou ser escolhido:


eis a questão!

MARLENE VIERO

... a forma mais profunda de desespero


é escolher ser outra pessoa que não a si mesmo.
Kierkegaard

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 1


1 INTRODUÇÃO

Este artigo foi elaborado para cumprir o requisito de conclusão do Curso de For-
mação Básica da SBDG – Grupo Aconchegos.
Pode-se dizer que produzir um trabalho de conclusão de curso é tarefa complexa e
difícil. Complexa porque o Curso de Dinâmica dos Grupos propiciou uma multiplicidade
de vivências. Confrontar e elaborar sentimentos próprios ao ser humano, em toda a sua
riqueza e complexidade, cria oportunidade de entrar em contato com temas instigantes e
envolventes.
Difícil porque não bastou a identificação com o tema e a motivação para desen-
volvê-lo. Um caminho de pedras se apresentou: encontrar uma forma de abordá-lo, bus-
car suporte teórico e decidir pela inclusão ou não de um trabalho empírico: ouvir os cole-
gas de curso sobre a escolha.
Existe uma semelhança entre o caminho de pedras e o tema escolhido. Os cami-
nhos da vida estão repletos de momentos que nos convocam à decisões e escolhas. Es-
quinas e encruzilhadas surgem, sempre com multiplicidade de veredas.
A divisão se instala. Prenunciamos: a cada caminho escolhido, outros tantos são
preteridos. Não seriam mais coloridos e fáceis de trilhar do que o escolhido?
Hamlet, o atormentado príncipe da Dinamarca, já se questiona diante dos cami-
nhos da existência:
Ser ou não ser... Eis a questão. Que é mais nobre para a alma: suportar
os dardos e arremessos do fado sempre adverso, ou armar-se contra um
mar de desventuras e dar-lhes fim tentando resistir-lhes? Morrer... dor-
mir... mais nada... Imaginar que um sono põe remate aos sofrimentos do
coração e aos golpes infinitos que constituem a natural herança da car-
ne, é solução para almejar-se. Morrer.., dormir... dormir... Talvez so-
nhar...1
A atriz Meryl Streep no filme de Alan J. Pakula, A Escolha de Sofia, vive o papel
de uma polonesa que sobreviveu aos horrores de um campo de concentração nazista du-
rante a segunda guerra mundial. Ela tenta reconstruir sua vida nos Estados Unidos, mas
ainda é atormentada pelo fantasma da escolha que foi obrigada a fazer em Auschwitz.
Um sádico oficial nazista ordena a Sofia escolher entre qual dos dois filhos – juntos com
ela no campo – irá sobreviver. Ela terá de determinar aquele que irá para o forno crema-
tório. A angustiante escolha que teve de fazer popularizou-se e é utilizada para tipificar
escolhas difíceis nos mais variados campos de atividade humana.
Como a vida pode imitar a arte, durante o Curso vivemos vários momentos de es-
colhas. Algumas foram feitas para situações de grupo de breve duração. Outras para per-
durarem meses e algumas durante todo curso. Quiçá, muitas para toda a vida.
O tema da escolha esta presente não só no cinema e na literatura. Na Psicologia e
na Filosofia, campos de conhecimento com áreas de superposição, muitos autores têm
dedicado reflexões sobre o tema. Aleatoriamente escolhemos ouvir alguns deles. Este
trabalho é o resultado da escuta realizada, assim como aquela feita às vozes dos partici-
pantes do grupo 115 do Programa de Formação Básica da SBDG.

1
William Shakespeare, A Tragédia de Hamlet, Príncipe da Dinamarca, Aro III, Cena I –
www://2dmais.com.br/livros/William Shakespeare/Hamlet1.pdf

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 2


2 O PERGUNTAR SOCRÁTICO

Sócrates foi o iniciador da ética ou da filosofia moral. Em Atenas perguntava aos


indivíduos o que são os valores nos quais eles acreditam e que respeitavam ao agir: o que
é a virtude? o que é a justiça? que é o bem?
Normalmente os atenienses ficavam irritados porque percebiam não saber respon-
der. Confundiam valores com fatos da vida cotidiana. Sobre a coragem, diziam ser os
feitos da guerra contra o inimigo. Contrariamente, tomavam os fatos da vida cotidiana
como se fossem valores morais. Diziam ser certo fazer guerra contra os inimigos porque
seus antepassados a fizeram.
Perguntava sobre a essência das virtudes, o sentido dos costumes estabelecidos e
buscava saber das pessoas, se ao agir, possuíam consciência do significado e da finalida-
de de suas ações, se seu caráter ou índole eram virtuosos e bons. Para ele importava for-
mular perguntas adequadas e estabelecer um método de investigação que levasse o pen-
samento em direção à essência das coisas.
Sócrates, filho de parteira, explicava qual era seu trabalho dizendo que a ação do
filósofo é semelhante ao da arte de partejar, ou seja, fazer parir a verdade de dentro de
seu interlocutor por meio de perguntas.
Sobre essa metáfora, Nicola,2 descreve que Sócrates:
[...] sustenta que a tarefa do sábio não é propor afirmações verdadeiras,
mas favorecer o nascimento da verdade na alma do interlocutor. O tra-
balho que leva a tal resultado, um verdadeiro processo de gestação, pre-
vê um método de investigação maiêutico, baseado no colóquio indivi-
dual, na arte de escutar e de objetar e no sistemático emprego da ironia
para abalar as defesas intelectuais preestabelecidas.
A ironia é empregada no sentido de se dizer uma coisa quando se pretende dizer
outra, fingindo-se de totalmente ignorante ao interlocutor para enfatizar a sabedoria do
outro.
Sua frase mais famosa resultou de seu pensar. Dizia que o filósofo é mais sábio do
que aqueles que se orgulham do conhecimento que têm das coisas sobre as quais, na ver-
dade, nada sabem. Por isso declarou: “Só sei que nada sei”.
Estava interessado no ser humano e em suas ações, estimulando o pensar racional
sobre as questões morais. Esse pensar implicava em desmascarar tudo aquilo que apare-
cia como virtude, mas que estava baseado na falsidade. Buscava descobrir definições
claras e universalmente válidas para o certo e o errado e entendia que a capacidade de
distinguir o certo do errado está na razão das pessoas e não na sociedade.
Afirmava, portanto, que o homem só age erradamente por desconhecimento e
aquele que tem o verdadeiro conhecimento só pode agir bem.
Com Sócrates aprendemos a arte de fazer perguntas a nós mesmos e de buscar res-
postas, refletindo sobre nossa capacidade e finalidade de conhecer e agir. Entendemos a
importância de reconhecer que estamos sempre aprendendo e que podemos buscar o
conhecimento pela razão. Talvez sejamos capazes de distinguir as escolhas certas das
erradas, se procurarmos ter consciência do significado e das conseqüências de cada uma
delas, para nós e para os outros.

2
NICOLA. U. Antologia Ilustrada da Filosofia – das origens à idade moderna. 1. ed. São Paulo: Globo,
2005, p. 57.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 3


3 A APARÊNCIA E A ESSÊNCIA EM PLATÃO

Com Platão, discípulo de Sócrates, aprendemos a fazer a distinção entre a aparên-


cia e a essência das coisas. Ele tratou das aparências e das idéias, afirmando que o ser
humano não conhece a essência das coisas. Assim, permanecemos no nível das aparên-
cias, que é o modo como as coisas se apresentam para nós e o modo como as percebemos
por meio das nossas sensações e sentidos – mundo dos sentidos. Nesse mundo sensível
tudo é variável e instável e nos apegamos a um aspecto das aparências e o transformamos
em verdade.
Para Platão, precisamos ficar afastados da vida prática a fim de buscarmos a ver-
dade por meio da dialética – diálogos que permitem o encadeamento preciso do raciocí-
nio. Com afirmações e objeções chegaremos a uma autêntica unanimidade de pensamen-
to, conseguindo separar o que é essencial do aparente.
Dizia que devemos buscar o verdadeiro conhecimento das essências, que é a ciên-
cia, ou seja, o verdadeiro mundo real que ignoramos. Afirmava que o mundo sensível e o
mundo inteligível são relacionados. Não considerava a hipótese de que as idéias derivam
dos sentidos, mas que elas são a ‘visão intelectual’, uma representação na tela da mente.
As idéias se originam das recordações (anamnese): conhecer é, para a alma – mente hu-
mana –, lembrar o que já sabia antes de encarnar em um corpo. A percepção não contri-
bui para o conhecimento. Este se dá através do intelecto:
[...] a percepção do mundo externo não fornece nenhum conhecimento,
somente um estímulo à recordação. O conhecimento se dá por meio de
uma visão intelectual, quando conseguimos conhecer na complexidade
do mundo real as formas essenciais e prototípicas, ou seja, as idéias.3
Platão ensina que nossa mente é capaz de reconhecer as idéias e de fazer a ligação
entre os dois mundos – sensível e inteligível –, por meio do amor que deseja a verdade.
Só alcançamos o verdadeiro caminho do conhecimento quando temos a visão da realida-
de, que surge quando nos libertamos das amarras da ignorância, representadas pela per-
cepção sensível (sombras). Quando descobrimos a verdade ficamos temporariamente
confusos, porém esta descoberta produz um rápido acréscimo ao nosso saber. O resultado
final é a contemplação do Bem, que deve ser adotado por base como o verdadeiro conhe-
cimento.
Considerando os ensinamentos de Platão, vemos a importância de distinguir o
aparente do essencial nas decisões que tomamos. Devemos ter consciência da realidade
que nos cerca a fim de evitarmos escolhas ilusórias. A verdade e o bem podem servir de
guia ao nosso caminhar pelo mundo.

4 A ESCOLHA EM ARISTÓTELES

A distinção entre o saber teorético e o saber prático devemos a Aristóteles. O pri-


meiro trata do conhecimento de seres e fatos que existem e agem independentemente de
nossa vontade ou interferência. O segundo é o conhecimento daquilo que só existe como
conseqüência de nossa ação. A ética, por exemplo, é um saber prático.

3
NICOLA, op. cit., p. 64.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 4


Aristóteles definiu o campo das ações éticas e abordou a questão da realidade na
qual cabem a deliberação e a decisão ou escolha: não escolhemos as estações do ano, não
deliberamos sobre o movimento dos astros, portanto, não decidimos sobre nada que é
regido pela natureza. Entretanto, escolhemos e decidimos sobre tudo aquilo que, para ser
e acontecer, depende de nossa vontade e de nossa ação.
Acrescentou o entendimento da vontade guiada pela razão, tendo a prudência co-
mo virtude condicional. O ser humano prudente é aquele que sabe avaliar qual é a melhor
atitude a tomar em cada situação, ou seja, entre as várias escolhas possíveis sabe distin-
guir qual é a mais adequada a fim de realizar o bem para si e para os outros.
Contrariamente a Platão e seu desprezo pelo mundo sensível, procurou integrar a
percepção deste mundo ao conhecimento científico e filosófico. Os sentidos que captam
as coisas individuais são o ponto de partida, pois a percepção é que produz no intelecto as
imagens a ela correspondentes e as separa em aspectos acidentais e essenciais. Esse pro-
cesso é a abstração, pelo qual se dá o conhecimento – o intelecto produz conceitos uni-
versais; a percepção do mundo sensível mostra que tudo está em constante transforma-
ção.
Para Aristóteles, a virtude consiste na disposição em escolher o ‘meio termo’ ou o
‘justo meio’. Adquirimos essa capacidade pelo exercício, que exclui sistematicamente os
excessos dos vícios e da escassez, realizando uma mediação controlada pela razão.
Afirmava que, apesar de vivermos num mundo marcado pela violência e imper-
feição, nosso objetivo final e supremo é a felicidade que deve ser algo perene e tranqüilo.
A fim de conquistá-la devemos ter uma conduta moral moderada, sem excessos, o ‘justo-
meio’. Portanto, agir de acordo com os costumes e regras vigentes na sociedade é mais
valioso do que praticar uma série de boas ações de forma isolada.
De alguns pensamentos de Aristóteles, podemos considerar que somos responsá-
veis por nossas escolhas – dependentes de nossa vontade e ação – e suas conseqüências.
O ato – nossas opções – e a potência – o resultado destas opções. A razão está presente
em nossos atos e a prudência é tida como a virtude necessária para identificar o melhor
caminho que leve ao bem individual e coletivo.

5 CARL ROGERS: A LIBERDADE DE DECISÃO

No processo de ‘vida plena’, como concebido por Rogers, tornamo-nos capazes


de ouvir a nós mesmos e experimentamos o que se passa em nós. Ficamos mais abertos e
livres para viver nossos sentimentos subjetivos e tomarmos consciência deles. Tendemos
a viver plenamente cada momento da vida como algo novo, com flexibilidade e o máxi-
mo de adaptabilidade. Isso significa deixar de lado as estruturas ou idéias pré-concebidas
e a rigidez de comportamento. A cada experiência nos permitimos descobrir a estrutura
existente naquele processo específico. Para Rogers
[...] o indivíduo é capaz de confiar mais no seu organismo no que se re-
fere ao seu funcionamento, não porque seja infalível, mas porque pode
estar completamente aberto às conseqüências de cada um dos seus atos
e corrigi-los se eles não satisfizerem. 4

4
ROGERS. C. R. Tornar-se Pessoa. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991, p. 171.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 5


Aprendemos essa forma de ser e de agir por meio da aprendizagem significativa,
que pode orientar nossas escolhas:
[...] entendo uma aprendizagem que é mais do que uma acumulação de
fatos. É uma aprendizagem que provoca uma modificação, quer seja no
comportamento do indivíduo, na orientação futura que escolhe ou nas
suas atitudes e personalidade. É uma aprendizagem penetrante, que não
se limita a um aumento de conhecimentos, mas que penetra profunda-
mente todas as parcelas da sua existência.5
Para Rogers o indivíduo é livre e tem o poder de escolher. Sentimos liberdade de
decisão em relação às possibilidades que a vida nos oferece. O homem
[...] é livre – para se tornar no que é ou para se esconder atrás de uma
fachada; para progredir ou para retroceder; para seguir por caminhos
que o destroem ou que destroem os outros, ou caminhos que o enrique-
cem; ele é literalmente livre para viver ou para morrer, tanto no sentido
fisiológico como no sentido psicológico destes termos.6
Por outro lado, quando nós atuamos em atitude de defesa (não plenamente) nos
deparamos com o determinismo, o entendimento de que nossas escolhas são determina-
das por fatores existenciais. Se escolhermos agir em um determinado sentido e descobri-
mos que não podemos atuar de acordo com nossa escolha, adotamos atitude de defesa,
negação ou distorção de aspectos importantes da realidade. Parece-nos claro que não fica-
remos plenamente satisfeitos, porque não somos livres para fazer escolhas eficazes, mas
sim determinados pela vida.

6 WILL SCHUTZ: A SIMPLICIDADE NA ESCOLHAS

A abordagem de Schutz sobre as escolhas se fundamenta na sua convicção de que


a pessoa é responsável e leva em conta o conceito de honestidade interpessoal: estar aber-
to à evolução, ser verdadeiro e genuíno em relação aos sentimentos e desejos Acredita
que escolhemos nossas próprias vidas e, dessa forma escolhemos nossos sentimentos,
comportamentos, pensamentos, doenças, reações.
Por vezes deparamo-nos com situações que apresentam dificuldades de escolha. É
comum nestes casos não nos permitirmos estarmos conscientes de que estamos fazendo
uma escolha, o que não altera o fato de estarmos tomando uma decisão. Diz Schutz:7
De algumas destas escolhas, escolho tomar consciência, e de algumas
outras, escolho não tomar consciência. Geralmente opto por não perce-
ber sentimentos com os quais não quero me confrontar, pensamentos
que são inaceitáveis, e algumas das relações de causa-e-efeito entre de-
terminados eventos.

5
ROGERS, op. cit., p. 258.
6
ROGERS, op. cit., p. 172.
7
SCHUTZ. W. C. Profunda Simplicidade – uma nova consciência do eu interior. São Paulo: Ágora,
1989, p. 33.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 6


De acordo com essa visão o conceito de inconsciente fica modificado. Ele passa a
ser todas as coisas das quais escolhemos não tomar consciência, ou seja, em alguns casos
não aceitamos saber que quem escolhe somos nós.
Quando não estamos dispostos a nos defrontarmos com nossas fragilidades de
sentimentos, passamos a adotar o comportamento de ‘enganar’ que “passa a ser um ato
que escolho executar e que não me permito perceber que realizo”. 8 Surge a dúvida frente
às nossas capacidades:
Existe tão somente um medo: o medo de não ser capaz de dar conta – de
minha própria incapacidade... Não é necessário crer no conceito de es-
colha para examinar suas conseqüências. Se você assume que a escolha
é uma verdade, você tem a oportunidade de descobrir se ela é verdadei-
ra. Se você presume que grande parte da vida é casual, você jamais sa-
berá se é ou não. O que há a perder?9
Ao aceitarmos nossa liberdade para decidir deixamos de atribuir aos outros a res-
ponsabilidade de nossas decisões. Não podemos alegar pressão do grupo e lavagem cere-
bral. Quando o grupo faz pressões no sentido de fazer com que mudemos de opinião e
isso acontecer, não foi por manipulação ou tirania do grupo, e sim porque nos permitimos
e consentimos mudar, percebendo nossas fraquezas e incertezas quanto ao que pensamos.
Para completar sua abordagem, o autor trata o ‘lado yin’ da escolha. Ao percebe-
mos o mundo com clareza passamos a vê-lo com simplicidade, as opções são reduzidas a
ponto de tornar óbvio o caminho a ser escolhido, ou seja, importa o que é essencial. Exis-
te um caminho mais simples e a simplicidade final é a escolha pelo caminho correto.
Reconhecer os caminhos significa entender que o Universo é simples e as esco-
lhas se tornam óbvias. Quando não entendemos algo, buscamos argumentações comple-
xas, usamos linguagem complicada, caracterizando uma explicação intermediária e su-
perficial. Porém, quando realmente compreendemos a ordem simples que existe no mun-
do, somos capazes de dar uma explicação verdadeira e profunda possibilitando que todos
a entendam.
Assim, o entendimento de algo passa por três etapas: simplista, complexa e pro-
fundamente simples. Ao iniciarmos o estudo ou a análise de um tema novo, julgamos
tudo muito simples e não conseguimos entender porque as pessoas complicam algo que
parece tão óbvio. Aos poucos vamos percebendo que não conhecemos tanto quanto pen-
samos e tudo parece ficar mais complicado. Por fim, passamos a um novo estágio de
compreensão, novamente simples, porém profundo, trata-se do conceito de profunda
simplicidade abordado por Schutz. 10
A profunda simplicidade tem uma grande fé nos processos naturais: a
simplicidade dos alimentos, o poder curativo do corpo, a evolução natu-
ral dos relacionamentos interpessoais [...] Estas origens são simples.
Deverão revelar soluções simples.
Afirma, ainda, que se o mundo é simples e o Universo oferece caminhos, existe
um fluxo natural que torna nossas escolhas simples e óbvias.
Ao tornamo-nos conscientes – no sentido de ter consciência daqueles fenômenos
dos quais não temos ciência – as decisões ficam sujeitas à nossa vontade; vontade enten-

8
SCHUTZ, op. cit., p. 36.
9
SCHUTZ, op. cit., p. 35.
10
SCHUTZ, op. cit., p. 67.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 7


dida como uma escolha feita deliberadamente. Portanto, para o autor, “o princípio da es-
colha descreve a realidade segundo a qual eu estou no comando de minha vida. Eu a es-
colho por inteiro, sempre o fiz, sempre o farei”. 11

7 ECONOMIA: A TEORIA DAS ESCOLHAS

A abordagem dos economistas para o comportamento humano no momento da es-


colha é fundamentada em duas idéias simples. Na primeira, temos preferências ou gostos
pessoais que determinam nossas escolhas. Essas preferências se manifestam em relação a
bens e serviços, mas também sobre um conjunto de outros bens intangíveis, como por
exemplo: na alocação do tempo (estudar, passear ou trabalhar), nas ocupações econômi-
cas (ser secretário, professor ou bancário), nas relações com o mundo (viver na cidade em
que trabalha ou viajar pelo mundo), no local de domicílio (morar em aglomerados urba-
nos ou em regiões mais pacatas), na participação social (fazer doações ou atuar ativamen-
te em ações de voluntariado).
Na segunda idéia, estamos dispostos a fazer escolhas compensatórias, ou seja,
dentro de um mesmo nível de preferências, estamos abertos a trocar bens, tangíveis ou
intangíveis, que nos proporcione o mesmo grau de satisfação. Por exemplo, entre viajar
nas férias e conhecer um lugar novo ou passar as férias com a família e fazer um curso
que nos interessa, podemos entender que qualquer uma das opões nos trará o mesmo ní-
vel de satisfação, assim, qualquer uma das opções pode ser a escolhida, sem nos sentir-
mos prejudicados.
Um conceito de teoria de valor, desenvolvido por volta de 1870, por Stanley Je-
vons, economista inglês, que vigora até os dias atuais também deve ser considerado. Tra-
ta-se do conceito de utilidade. Hubeman12 aborda o pensamento de Jevons: “a reflexão e
a pesquisa levaram-me a opinião mais ou menos nova de que valor depende inteiramente
da utilidade”.
Utilidade é uma palavra que expressa nosso sentimento ao adquirirmos uma mer-
cadoria ou um bem intangível, em relação a essa mercadoria ou a esse bem. Se quisermos
muito desse bem, atribuiremos grande utilidade, quanto maior a necessidade, tanto maior
a utilidade. Sua utilidade servirá de medida do valor e do preço que lhe atribuiremos
quando estivermos efetivando a compra. “A utilidade difere para cada homem, varia com
a margem de satisfação que ele espera obter dela, uma vez comparada. Ou seja, e um
valor subjetivo”.13
Traçando uma comparação entre a teoria econômica e as escolhas da vida, pode-
mos inferir que levamos em conta as nossas preferências no momento da decisão por um
caminho ou outro e que podemos analisar qual dos caminhos será mais útil ou nos trará
mais benefícios e satisfação.

11
SCHUTZ, op. cit., p. 68.
12
HUBERMAN, L. História da riqueza do homem. 18. ed. Rio de Jjaneiro: Zahar, 1982, p. 247.
13
HUBERMAN, op. cit., p. 247.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 8


8 A ESCUTA AO GRUPO 115

A partir da reflexão sobre as escolhas que fizemos no decorrer da nossa formação


em Dinâmica dos Grupos, surgiu o desejo de saber como foi o processo de escolha dos
demais integrantes do grupo. O que cada um considerou ou deixou de considerar no mo-
mento que fez determinadas escolhas? quais os aprendizados que leva consigo?
Decidimos ouvir as pessoas com quem convivemos durante quase dois anos e
com as quais compartilhamos angústias, incertezas, alegrias, aprendizados. Optamos por
ouvi-las por meio de questionário com perguntas abertas.
O questionário solicita às pessoas voltarem o pensamento ao processo de escolhas
vividas durante o curso da SDBG, desde a decisão por participar do curso, passando por
momentos que denominamos de ‘pequenas escolhas’ (escolher um par para caminhar de
olhos vendados, escolher os vizinhos, escolher alguém para compartilhar um fato mar-
cante da vida), até a escolha dos colegas para formar os subgrupos para realização dos
seminários.
Entregamos quatorze questionários, quantidade equivalente ao número de pessoas
a serem ouvidas. Desses, onze foram entregues pessoalmente. Três foram enviados via
e-mail, por impossibilidade de agendar o encontro. Obtivemos doze retornos.
A partir dos conteúdos trazidos pelos colegas do nosso grupo, podemos ter uma
noção das percepções, dos sentimentos, dos aprendizados que estiveram presentes no
processo de escolhas vivenciados durante a formação. Os tópicos a seguir evidenciam o
conteúdo das questões e das respostas dadas. A transcrição de algumas respostas preser-
vou o anonimato dos respondentes.

A entrada no grupo Aconchegos

Em relação às informações que auxiliaram na decisão de freqüentar a Formação


Básica da SBDG, os colegas relatam que o conhecimento do Curso se deu por intermédio
de indicações de amigos, colegas de trabalho, parentes ou professores de graduação.
Outras informações foram consideradas: o fato de ser uma formação vivencial, a
observação da maneira diferenciada de atuação de professores e profissionais que haviam
participado de formação na SBDG e o depoimento de alunos de turmas anteriores sobre a
contribuição do aprendizado adquirido para a melhor condução de grupos.
Percebo na prática que os profissionais que possuem a Formação da
SBDG conseguem um resultado mais efetivo.
[...] e principalmente pela Emiliana, de quem fui aluna e por quem sem-
pre tive admiração, pelo conhecimento técnico e humano, por saber “li-
dar”, cuidar de pessoas.
Também houve quem precisou interromper a formação anterior na SBDG e quis
retornar:
Eu já havia iniciado com um outro grupo anteriormente e precisei sair
por mudança de cidade [...] e sempre fiquei aguardando um novo grupo
para dar, digo, fazer formação. Não le mbro que informações na época
me levaram a escolher, mas voltar para o grupo era meu desejo, gostei
da proposta que vivenciei [...].

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 9


Outro fato mencionado por várias pessoas é a credibilidade dos Coordenadores.
Conhecer e confiar no trabalho da Professora Emiliana.
[...] o fato de ser um curso vivencial e, além disso, ser coordenado pela
Professora Emiliana.
Minha conversa com o João Carlos foi decisiva para a escolha, pois a
forma como ele conduziu as explicações me fizeram perceber que este
seria efetivamente o melhor curso para que seguisse meus trabalhos
com grupos.
Dentre as motivações surgem a credibilidade na SBDG como instituição e nos
seus prepostos (coordenadores do curso) e a metodologia adotada.
SBDG – Por ser uma instituição conhecida, referência para formação
em DG [...]
Trabalho com dinâmica de grupos há mais de 10 anos [...]. A SBDG foi
a forma que encontrei para sistematizar este conhecimento.
Depois, recebi o telefonema do João e da Emiliana [...]. A palavra firme
e a visão clara de que eles acreditavam no grupo, nesta metodologia, foi
decisivo na minha escolha.
O aperfeiçoamento profissional – conhecimento técnico e vivencial –, o conheci-
mento de nova metodologia de trabalho e de referencial teórico para dar suporte à prática,
a necessidade de saber lidar com grupos como facilitador e a troca de experiências, foram
lembrados como mobilizadores para a formação da SBDG.
Eu queria poder trabalhar melhor com grupos, entender melhor seu fun-
cionamento, conhecer melhor as pessoas e também, é claro, me conhe-
cer. Acho que busquei me qualificar mais para trabalhar melhor com
eles.
[...] buscam, como eu, um novo referencial de trabalho, mais abrangente
(no sentido de atingir mais clientes/pacientes) para as diversas realida-
des institucionais.
Realmente o que me fez freqüentar foi o fator intelectual, busca de mais
conhecimento sobre as técnicas e processamento.
Atuar de forma responsável, consciente, compreender meu papel em ní-
vel micro e macrocosmo.
Alguns citaram que o gostar de trabalhar com pessoas os trouxe para o Curso; já
outros disseram que o desafio foi o de vivenciar situações de confronto com seus senti-
mentos.
Se fosse para pensar em ordem afetiva somente o que tenho a dizer que
amo realizar o trabalho com grupos, é algo mágico, a cada término de
um desenvolvimento me sinto muito realizada.
Também buscar afetividade. Eu sempre me relacionei bem com pes-
soas, mas andava meio “bicho do mato” [...]. Queria saber como essa
coisa de sentimento funciona.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 10


O funcionamento no grupo

Durante a Formação vivemos vários momentos de pequenas escolhas. Pergunta-


mos como se deu a escolha por determinadas pessoas nesses momentos. De forma geral
as escolhas se deram por afinidade, proximidade circunstancial, simpatia, empatia, amo-
rosidade, identificação.
[...] O quanto a pessoa se mostrou no grupo e me conquistou.
[...] poder me experimentar trabalhando com pessoas que eu não convi-
via.
Querer conhecer melhor o colega (uma escolha pontual e assertiva para
ter a oportunidade de conhecer a todos do grupo).
[...] o risco, a necessidade de aprender, o enfrentamento, o desejo de
olhar mais de perto.
O temor de não ser escolhido também foi manifestado.
[...] ansiedade de escolher logo pode às vezes ter me levado a fazer es-
colhas sem pensar muito. Escolher logo para não ficar sobrando!
Alguns participantes refletiram sobre a razão, a emoção e a realidade, envolvidos
nos momentos das pequenas escolhas.
As escolhas sempre tiveram muito a ver com o momento do grupo e
como eu me sentia nele, sendo assim algumas vezes busquei por pes-
soas que me demonstravam a segurança que necessitava naquele mo-
mento, e em outras vezes busquei exatamente o contrário, pessoas que
me desafiassem.
Não há como considerar algo sem nos remetermos ao contexto e, em
contrapartida, este contexto nos leva a outros contextos (emocionais, in-
telectuais, sentimentais), às vezes a razão, às vezes a emoção. É melhor
fazer esta escolha por “X” que está mais próximo afetivamente, ou é
melhor fazer por “Y” porque é possível desenvolver melhor esta ativi-
dade, tudo dependia do momento, do texto e do contexto.
Houve também quem recorreu à poesia para auxiliar na descrição dos seus senti-
mentos e sensações.
Peço permissão para citar Gide, um de meus poetas prediletos, para
quem: ‘A incerteza de nossos caminhos atormentou-nos durante toda a
vida. Que te direi? Toda escolha é assustadora quando nela se pensa: as-
sustadora uma liberdade que um dever não guia mais. É um caminho a
escolher em uma região de todos os lados desconhecida, onde cada qual
faz sua descoberta e – observa-o com cuidado – só a faz para si’.
Uma das etapas importantes do processo de formação foi a escolha do subgrupo
para estudos de temas vinculados aos seminários. A afinidade e o conhecimento das pes-
soas escolhidas foram apontados como critério de escolha Um participante manifestou-se
dizendo que o processo foi tranqüilo, pois permitia a troca de subgrupo ao início do pró-
ximo módulo. Muitos relataram ter se deixado escolher, escolheram apenas um ou dois

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 11


colegas ou se incluíram em algum subgrupo sem ter claros os critérios e os sentimentos
envolvidos nesta decisão.
[...] não fui muito criteriosa. Não elegi muitos fatores [...] lembro-me de
juntar-me às colegas que me pediram [...]. Se existiram fatores de não
inclusão foram de ordem inconsciente e eu não sei identificá-los.
[...] escolhi uma das colegas, ou melhor, duas. Uma delas desistiu [...]
eu me vi muito só, contando apenas com aquela escolhida. As demais se
agregaram, eu acho.
[...] deixar as pessoas verem como queriam ficar e eu ver o que sobra
para mim. Não me dei o direito de lutar pelo que queria, fiquei com o
receio de atrapalhar, pois estava com medo de não me comprometer à
altura. Foi uma escolha estranha. Mas no final, eu gostei mais deste
subgrupo do que daquele que eu imaginava que queria.

Os aprendizados

Quanto ao que não foi levado em conta na decisão de participar do Curso, alguns
entendem que caso a escolha se desse hoje, gostariam de ter mais informações e maior
conscientização sobre a metodologia de trabalho adotada, conhecimento da composição
do grupo de participantes e maiores esclarecimentos quanto ao tempo necessário para
estudos e leituras.
Esclarecer e gastar mais tempo conversando com os professores sobre o
Método de Aprendizagem deste Curso, ao qual só compreendi melhor
durante o Módulo III, no Seminário sobre Andragogia.
Eu ingenuamente imaginava que o curso seria mais focado em técnicas,
aprender dinâmicas [...]. Não imaginei que fosse necessário tanto estudo
[...] não consegui avaliar o esforço necessário.
Não levei em conta a forma, o modo como este conhecimento é cons-
truído e sistematizado. O grupo é muito heterogêneo e muito descom-
promissado e isso de fato não levei em consideração, o que me levou a
uma grande desmotivação e conseqüentemente a um grande gasto de
energia para, segundo meu entendimento, pouco resultado.
A percepção de alguns é que aproveitariam melhor a capacitação se já possuíssem
mais experiência e vivência com trabalhos em grupos. Houve também quem entendesse
não ter levado em conta o seu momento de mudanças em termos de vida pessoal. Fatores
citados e que não foram considerados: se compromissar com o grupo, a participação efe-
tiva no subgrupo e a maturidade necessária para participar desse tipo de formação.
Considerando a característica vivencial deste Curso, poderia ser firmado
um Contrato Psicológico mais consistente no sentido de estabelecer a
importância do compromisso individual de cada membro do grupo ES-
TAR PRESENTE [...].
A maior participação nos subgrupos, maior responsabilidade com os
subgrupos e disponibilidade de tempo. No momento da escolha não ti-
nha idéia que isto seria necessário e me atrapalhei com isto.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 12


Quando perguntados sobre os fatores que levariam em consideração se o processo
de escolha do subgrupo fosse hoje, alguns se mostraram satisfeitos com os critérios ado-
tados. Outros considerariam a afinidade, o compromisso, o comprometimento, a flexibili-
dade, a empatia ou trabalhariam de forma diferente.
[...] Seria mais objetiva e trabalharia com mais elementos de realidade
do que com desejos, percepções etéreas [...] a vivência com as dificul-
dades de nosso subgrupo me ensinaram muito [...] onde tem fumaça
TEM fogo [...] não existem equipes perfeitas [...] mas acho que deixa-
mos o grupo rachar [...]. Não fiquei feliz com isto e não consegui agir
mais eficazmente para evitar que isso acontecesse.
COMPROMISSO comigo e com o subgrupo [...] AFINIDADE (conhe-
cer um pouco mais o PERFIL do colega em relação a tarefas intelec-
tuais [...] se sabe dar e receber feedback de forma funcional e não des-
qualificadora, contribuir de alguma forma respeitando o colega). FLE-
XIBILIDADE (o subgrupo é um espaço importante para exercitar vá-
rios papéis).
[...] ‘de perto todos nós temos alguma pinta’. Aprendemos muito nas re-
lações e inter-relações. O que penso é que não escolheria outro subgru-
po, mas trabalharia de outra forma com este subgrupo, não acredito que
escolher ‘A’ ao invés de ‘X’ irá resolver o problema, mas trabalhar com
‘X’ diferentemente, encontrar uma solução para os conflitos ou resolu-
ção de conflitos momentâneos, isso fará a diferença. É no que eu acredito.
Hoje tudo mudou, vejo o subgrupo com um propósito totalmente dife-
rente que via inic ialmente, acho até que descobri tarde demais, porém o
que importa é que descobri. Então, hoje escolheria pessoas que fossem
mais... Não na realidade deixaria rolar, pois não iria depender muito da
escolha das pessoas e sim da maneira como eu iria me comportar e en-
tender estas pessoas... Afinal seríamos a soma de várias pessoas for-
mando um só, um grupo.
Há quem percebeu que gostaria de ter se desafiado mais.
[...] acho que arriscaria mais escolher aqueles que tivesse mais receio de
trabalhar.
Por fim, questionamos sobre os aprendizados construídos durante o Curso e a sua
contribuição nas futuras escolhas. Como resultado desta reflexão as pessoas citaram:
escolher com maior cuidado, a necessidade de flexibilidade; o compromisso com as esco-
lhas e com os outros, a maior responsabilidade, a maturidade e o estar atento para tomar
as decisões necessárias, conhecendo-se mais e melhor.
Acho que outra coisa importante é efetivamente atuar na escolha e não
se deixar escolher. Muitas vezes em diversos aspectos deixei “a vida me
levar”, me deixei ser escolhida e não escolhi. Em algumas vezes os re-
sultados não foram como eu esperava.
Aprendi a atentar para outros valores das pessoas que não somente os
aparentes.
A observação das pessoas, o significado de seus comportamentos [...]
efetivamente atuar na escolha e não se deixar escolher.

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 13


9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sócrates enfatiza o questionar, ponto de partida para o conhecer. É o que se traduz


pela adequada formulação do problema. Uma dúvida bem formulada já é parte do escla-
recimento dessa dúvida. O conhecimento claro das opções envolvidas numa escolha é o
caminho para uma boa decisão. O conhecimento das possibilidades dos vários caminhos
se fundamenta no “conhece-te a ti mesmo” a partir do “só sei que nada sei” – primeiro
ignorar seu saber para depois conhecê-lo.
Conhecer nossas reais possibilidades e motivações para trilhar as veredas que a
vida nos apresenta.
Platão aborda a importância de se buscar diferenciar o que é aparente do que é es-
sencial. Sua dialética sugere o espírito se elevar do mundo sensível para o mundo das
idéias. Assim, por etapas, a caminho das idéias verdadeiras. Com alguma “licença filosó-
fica” podemos dizer que seria o ir ao “fundo das questões”. Remover a maquiagem dos
produtos da sociedade de consumo. No escolher não confundir gato por lebre.
Aristóteles aponta para o campo das ações éticas, local onde devem acontecer as
escolhas. Nos aponta também para nossos limites: não escolhemos as estações do ano,
não deliberamos sobre o movimento dos astros, portanto, não decidimos sobre nada que é
regido pela natureza. Contudo, resta o mundo humano. Escolhemos e decidimos sobre
tudo aquilo que, para ser e acontecer, depende da vontade e da ação do homem.
A liberdade para Rogers é da ordem subjetiva. Daí a importância do autoconhe-
cimento. Sua terapia centrada na pessoa pode ser um caminho para autodescoberta. Po-
rém, o indivíduo tem que estar aberto para experimentar pessoas. Isto não implica em ter
de deformar o que experimenta para conservar o afeto das figuras significativas na sua
auto-estima. Podemos entender como um alerta para o papel das emoções no processo de
escolha. Elas estão presentes e, muitas vezes, decidem. Não podemos negar esse fato.
Implica, como sempre, equilibrar razão e emoção.
Schutz chama atenção para o entendimento simples no ato de escolher. Não signi-
fica conhecimento raso. Recordamos suas etapas: simplista, complexa e profundamente
simples. No primeiro encontro com o objeto vemos a sua simplicidade, sua obviedade.
Mas ele não se esgota aí. Existe uma complexidade que não está “a flor da pele”. Somen-
te enfrentando-a pode-se chegar a um entendimento “profundamente simples”. Aproxi-
mar-nos um pouco das coisas como elas são. O grande aceno da filosofia.
Para Schutz devemos discriminar nas decisões o quanto de responsabilidade: a
que é nossa e a que dos outros. Para ele não podemos atribuir a pressões do grupo as nos-
sas escolhas. A manipulação ou a tirania do grupo não serve de desculpa para nossas mu-
danças de opinião. Mudamos porque consentimos em mudar. Porque percebemos através
dos outros nossas fraquezas e incertezas.
A liberdade do indivíduo frente à influência do grupo, para nós, deve ser pondera-
da. A lavagem cerebral e a manipulação das massas podem se dever à falta de conscienti-
zação dos indivíduos? A uma certa forma de aquiescência inconsciente? Se, como em
Sartre, nós somos o que escolhemos ser, os outros (o inferno para ele) não determinam as
nossas possibilidades de escolha?
A teoria econômica nos leva a refletir sobre a tangibilidade/ intangibilidade em
nossas escolhas. Na compra de um objeto qualquer o que mais se evidencia é sua “con-
cretude” e sua “utilidade”. Dentro de limites, possíveis de conhecer e facilitadores nas
nossas aquisições. E quando a mercadoria, outro conceito muito caro à economia, não
apresenta essa tangibilidade?

SBDG – Caderno 84 v Escolher, não escolher ou ser escolhido: eis a questão! 14


Uma questão que devemos nos propor: na escolha de “objetos humanos” não esta-
remos utilizando, inconscientemente, o mesmo referencial utilizado nas trocas de “mer-
cado”? o quanto de “lucro” pode advir dessa “operação”?
A escuta feita aos colegas do curso foi motivada por uma busca de coerência.
Acreditamos que o conhecimento pode e deve, preferencialmente, ser construído no e
pelo grupo. Portanto, decorrência natural eleger o grupo como foro privilegiado de escu-
ta. As questões propostas para provocar suas vozes poderia ter sido sintetizada numa úni-
ca: o que vocês entendem estar subjacente nas escolhas humanas?
Essa formulação, tal sua abrangência, iria exigir de cada colega um mini tratado
sobre escolhas. A procura de um foco mais objetivo para a questão, levou-nos a oferecer
como mote para a resposta perguntas relacionadas com a escolha pelo nosso curso de
formação. Outra escolha poderia ter sido o foco.
Na medida em que procuramos facilitar o trabalho dos colegas dificultamos o nos-
so. A escuta implicou numa decodificação. Não das sentenças colocadas nas folhas de
papel-almaço, mas na tradução dos mecanismos subjacentes e comuns a todas escolhas.
Uma aventura a qual nos lançamos na esperança que a leitura crítica deste trabalho resul-
te num feedback de todos colegas. Assim, estaremos dando continuidade à construção do
tão almejado conhecimento do grupo.
A aparência é o que surge da primeira aproximação com o objeto de escolha. Não
poderia ser de outra forma. O ouvir dizer, o ter lido e as experiências anteriores ligadas
parcialmente a ele contribuem para um pré-conceito a influir na escolha.
O conceito surgirá a partir da ação, da experiência com o objeto, do con-viver
com ele. Como diz Somerset Maughan, ninguém pode conhecer as coisas por ouvir dizer,
mas apenas se as tiver vivido. Esse conhecimento surge ao final do curso, momento de
aplicação do questionário. As respostas à questão o que não foi levado em conta na deci-
são de participar do Curso diz um pouco desse desconhecimento inicial
O crescimento “técnico” e “vivencial” – a tendência atualizante em Rogers14 – foi
uma das motivações na escolha do curso. A educação, ou melhor, o ensino institucionali-
zado tem sido o meio preferido para o “crescimento técnico”. A certificação – forma de
simbolizar esse crescimento –, pela sua importância no mundo do trabalho pode desvir-
tuar nossas escolhas.
A escolha de colegas para formar subgrupos de curta ou maior duração não revela
um critério mais objetivo. Como a “vida lá fora”, são momentos em que a possibilidade
de escolha não está presente. Não escolhemos a família que queremos ter. A religião para
ser iniciado. Com poucas exceções, a escola que desejamos estudar e o trabalho que gos-
taríamos de realizar.
Nesses momentos as escolhas são intuitivas. A intuição, esse “contato imediato da
mente com real”, é uma forma de conhecimento que pode estar a serviço das escolhas.
Mas, sua utilização isolada pode ser um descaso pelo pensamento racional e acobertar o
uso exclusivo das emoções.
A escolha pode ser, ainda, a opção pela não escolha. Deixar-se escolher ou não
exercer o poder de decisão. Omitir-se ou acomodar-se diante das oportunidades. Escolher
ser a pessoa que se é significa, ao deparar-se com os caminhos que surgem em nossa vi-
da, fazer as escolhas que se harmonizem com as nossas possibilidades de ser.

14
“Todo organismo é movido por uma tendência inerente para desenvolver todas as suas potencialidades e
para desenvolvê-las de maneira a favorecer sua conservação e seu enriquecimento” (ROGERS, Carl.
Psicoterapia e relações humanas. Belo Horizonte: Interlivros, 1977, p. 159).

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REFERÊNCIAS

CHAUI, M. Convite à filosofia. 8. ed. São Paulo: Ática, 1997.


EATON. B. C.; EATON. D. E. Microeconômica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
HUBERMAN. L. História da riqueza do homem. 18. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
ROGERS. C. R. Tornar-se pessoa. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
ROGERS. C. R.; KINGET. G. M. Psicoterapia e relações humanas: teoria e prática da terapia não diretiva.
2. ed. Belo Horizonte: Interlivros, 1977.
ROSSETTI. J. P. Introdução à economia. 17. ed. São Paulo: Atlas, 1977.
SCHUTZ. W. C. Profunda simplicidade – uma nova consciência do eu interior. São Paulo: Ágora, 1989.
. Psicoterapia pelo encontro – um guia para a conscientização humana. São Paulo: Atlas, 1978.
SOUZA, R. T. Sobre a construção do sentido – o pensar e o agir entre a vida e a filosofia. São Paulo: Pers-
pectiva, 2004.
ABRAO, B. S. História da filosofia. São Paulo: Nova Cultural, 1999. (Coleção Os Pensadores)

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Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Na subjetividade da vivência do grupo:


O compromisso como atitude.

CARIN IARA LOEFFLER


MARINÊS LUZ DE OLIVEIRA
MIGUEL ÂNGELO GOBBI

A vida em sociedade depende da eficiência dos grupos que a compõem. Seus mais
valiosos recursos são os grupos encontrados nos lares, igrejas, escolas, empresas e demais
setores.
A característica de que a maioria das pessoas desempenha suas atividades em inter-
dependência nos leva à necessidade de desenvolver tecnologias que possam conhecer a
fundo porque os grupos se formam, funcionam e desaparecem, qual a natureza dos grupos e
“principalmente sobre as forças psicológicas e sociais a eles associadas” (Cartwright, 1975,
p. 5).
O estudo do funcionamento dos grupos remonta um passado distante, entretanto
apenas há algumas décadas que o método científico foi aplicado para conhecer os fenô-
menos intragrupais.
A dinâmica de grupo aparece como possibilidade de campo de pesquisa nos EUA
no final da década de 30 e surge como especialidade a partir das contribuições de Kurt
Lewin (1890-1947) que foi quem estabeleceu a primeira organização dedicada especifi-
camente à pesquisa nesse campo.
A dinâmica de grupo não nasce sozinha, criada por Lewin. O surgimento das pro-
fissões liberais como o Serviço Social, a Psicoterapia de Grupo, a Educação e Adminis-
tração, associadas ao momento histórico e político da sociedade no pós-guerra, foram
fundamentais para reconhecer a importância dos grupos e das relações humanas em todos
os ambientes da sociedade.
Autores como Carl Rogers, Kurt Lewin, Cartwright e Zander, entre outros, nos
trazem o conhecimento sobre Dinâmica de Grupo e é por meio dos seus olhares que po-
demos vislumbrar a apaixonante experiência do que é um grupo e o que ele pode significar.
De acordo com Bany e Johnson (1970), um grupo só pode ser percebido como
grupo quando seus componentes têm objetivo em comum, agem em interação, têm estru-
tura, coesão e um padrão de conduta.
À medida que o interesse pela experiência com grupos cresceu, as variadas moda-
lidades e formas diferentes assomaram mostrando a diversidade de grupos existentes tais
como: Grupos T, Grupo de Encontro, Grupo de Treino de Sensibilidade, Grupo Centrado
na Tarefa, Grupo de Percepção Sensorial, Grupo de Percepção Corporal, Grupos de Mo-

SBDG – Caderno 84 v Na subjetividade da vivência do grupo 1


vimento Corporal, Grupos de Criatividade, Grupo de Desenvolvimento da Organização,
Grupo de formação de Equipe (Rogers, 2002, p. 5-6).
Ao observarmos as descrições do funcionamento destes grupos percebemos que
em essência todos têm o mesmo desafio: aprender a convivência, estabelecer relações
interpessoais, fazendo a leitura do comportamento humano nas suas relações sociais. Ha-
bitualmente este processo é vivencial por meio da Dinâmica de Grupo.
A Dinâmica de Grupo utiliza-se de técnicas que, de acordo com Miranda (2003, p.
31):
As técnicas de dinâmica de grupos propõem-se, fundamentalmente, a
orientar seus participantes na direção das mudanças desejadas pelo gru-
po, simulando circunstancias vivenciais que beneficiem o meio social
onde se está inserido, a explorar lideranças, a promover motivação, a
favorecer entusiasmo e outras competências básicas importantes. A en-
grenagem mestra que imprime movimento na direção das mudanças é a
perceptiva, que habilita o indivíduo a conhecer e a reconhecer em si os
outros e o contexto com uso de seus sentidos.
Assim, podemos dizer que, embora tenha todo um cabedal teórico que embase o
conhecimento científico das técnicas de Dinâmica de Grupo, é o seu aspecto subjetivo,
aquilo que está subjacente à teoria, ou seja, a percepção do vivenciado é que consegue
trazer à tona ou fazer florescer os fenômenos que movimentam as relações sociais.
Alguns aspectos subjetivos da vivência em grupo como a maturidade, a motiva-
ção, as aptidões, a inteligência, o compromisso, são importantes para a manutenção e
existência do grupo.
Ao vivenciarmos a experiência de formação em Dinâmica dos Grupos, tivemos a
oportunidade de perceber, ao longo do processo, além das etapas pelas quais o grupo pas-
sa, alguns dos seus aspectos subjetivos.
Um dos aspectos que nos cativou para compreender o processo vivencial do gru-
po, se refere ao compromisso de cada membro para com ele.
Durante a formação, ouvimos os discursos, observamos as práticas e levantamos a
hipótese de que “será um dos aspectos que mantém o grupo, o compromisso de seus
membros para com o ele?”.
Partindo desta hipótese, realizamos uma enquete entre os membros do grupo utili-
zando um questionário com perguntas abertas que oportunizaram, entre outros, conhe-
cermos o significado da palavra compromisso para este grupo, neste momento de apren-
dizagem.
Buscando na literatura a compreensão da palavra compromisso, encontramos em
Mills (1970, p. 175), como sendo “um acordo de dar e receber entre as pessoas. Implícito
ou explícito, é uma disposição pela qual cada pessoa concorda, na realidade, em desistir
de alguma coisa, ou dar alguma coisa a outra pessoa, com promessa de receber algo em
troca”.
Fazendo eco com o que nos diz Mills, um dos participantes nos coloca que
[...] ter compromisso, às vezes, significa que eu devo escolher entre o
que tenho que fazer e o que eu quero fazer, considerando as perdas e
ganhos que eu possa ter. Isto quer dizer que se eu me comprometo em
participar do grupo, abro mão de outras coisas que eu poderia estar fa-
zendo naquele momento, para estar com o grupo e só farei isto se tiver
algo em troca. Este algo em troca pode ser o aprendizado, as amizades,

SBDG – Caderno 84 v Na subjetividade da vivência do grupo 2


a admiração, ou qualquer outra recompensa que me faça querer estar no
grupo e não em outro local.
Schutz (1978, p. 27), em seu livro Psicoterapia pelo encontro, diz que “Vir a um
grupo de Encontro é sempre um ato voluntário. Pela sua simples presença num grupo,
presume-se que você escolheu participar dele”.
Podemos compreender que neste ato voluntário está implícito o compromisso as-
sumido com alguém ou com um grupo, assim como para este participante que compreen-
de compromisso como “envolvimento, com responsabilidade, numa ação. É um ato cons-
ciente e livre. Ao mesmo tempo em que é livre, pois cada pessoa pode ou não assumir um
compromisso, é também um ato de co-responsabilidade, pois cria laços entre os envolvi-
dos”.
A palavra responsabilidade fez parte de praticamente todos os discursos ouvidos
durante os encontros, quer fosse relacionada ao horário dos encontros, ao comparecimen-
to, à entrega dos trabalhos ou ainda a participação nos trabalhos dos sub grupos, o que
nos aponta para o entendimento da responsabilidade como parte do compromisso.
E assim sendo, podemos refletir sobre nossa responsabilidade neste grupo. Res-
ponsabilidade que temos em manter a palavra firmada através do contrato verbal explíci-
to, da manutenção do sigilo, da disponibilidade ingênua e da espontaneidade para com-
partilhar os momentos, as emoções, as opiniões, em estar com o outro, em estar e fazer-se
presente. Presente aqui, compreendido não somente como “o corpo no local” mas tam-
bém como uma dádiva na existência sua, do outro e do grupo.
Ao compararmos os discursos com a prática, pudemos observar que, embora sem-
pre fosse presente a fala da responsabilidade e do compromisso, as explicações ofereci-
das, quando da ausência destes, não eram discutidas, simplesmente eram aceitas, muito
possivelmente pela relação social já estabelecida. Também poderíamos pensar, em seme-
lhante circunstância, como sendo este comportamento, um movimento próprio do grupo
na tentativa de manter sua existência ou não querer o confronto aberto entre os seus
membros.
Mills (1970, p. 176) fala do compromisso como
[...] fundamentalmente uma promessa, a pessoa desiste de alguma coisa
como sentimento de uma promessa, ou com a promessa de que algo virá
em troca disso. É precisamente essa disposição de desistir de mais do
que aquilo que recebe como troca imediata (e o sinal desta disposição)
que dá à relação a confiança, e a torna social.
No grupo, enquanto promessa, a palavra compromisso foi explicitada da seguinte
forma A palavra compromisso traz em si o radical da palavra promessa, que significa ser
fiel ou jurar realizar algo, que será feito hoje ou no futuro”.
Nesta palavra vem o prefixo com, cujo sentido é de que algo será feito junto com
alguém ou ao lado de alguém.
Para mim, então, compromisso é cumprir o que foi previamente combinado (tare-
fas, acordos, relacionamentos) com o(s) outro(s), seja pessoa(s), grupo(s) e/ou entida-
de(s), num tempo e num lugar determinados.
O compromisso implica estar presente de corpo e alma no encontro marcado, ter
atitude de escuta e de respeito pelo outro, cumprir o que foi combinado no contrato for-
mal (jurídico, administrativo) e também no contrato psicológico (acordos de vivência).
A assiduidade e a participação no encontro ajudam a estabelecer e a manter o vín-
culo das relações humanas formadas e a fortalecer o compromisso entre as pessoas.

SBDG – Caderno 84 v Na subjetividade da vivência do grupo 3


Penso que compromisso também é avisar sobre nossos limites e possibilidades
neste encontro, justificando ausências, deficiências e omissões de potencialidades (no
caso de tarefas não realizadas, por exemplo).
Sendo o compromisso explicitado desta forma, para este participante, a reflexão
que fazemos é de que o comprometimento de cada um no grupo ocorre de modo particu-
lar, dependendo de variáveis como maturidade, conhecimento, além das especificidades e
do movimento do próprio grupo.
É também um processo paradoxal, pois ao mesmo tempo em que vai se dissol-
vendo dentro da relação, de outras formas se reconstrói. Assim, num mesmo momento do
encontro do grupo podemos ter o compromisso dissolvido nas ausências, na não partici-
pação nas atividades, ao mesmo tempo em que o temos sendo reconstruído pela presença,
esforço e união dos participantes presentes. Os elementos que determinam as forças deste
processo estão relacionados aos vínculos estabelecidos entres os membros.
A compreensão, de um dos participantes, de que compromisso é a “Adesão ni -
condicional a uma relação com pessoas ou grupos. Essa adesão tem componentes racio-
nais e emocionais”, nos leva ao encontro do aspecto do relacionamento interpessoal que
nasce pelo comprometimento e nos é apontado por Crivelaro (2005, p. 28).
Seguramente, no nosso relacionamento interpessoal, quando conseguimos o com-
prometimento da outra pessoa, temos então, um relacionamento adequado e conseguimos
a adesão total dela. É fato que devemos obter comprometimento das outras pessoas para
termos sua aceitação total; também é fato que devemos saber conquistar isso. É bom sa-
ber que nada ocorre como um passe de mágica. Para se conseguir o comprometimento e a
aceitação das outras pessoas, temos de lançar mão de algo que está dentro de nós e que,
se feito de forma adequada e, principalmente, sincera, é praticamente impossível não ob-
ter o relacionamento interpessoal adequado.
Esta adesão, embora não explicitada claramente, é compreendida por outro parti-
cipante como: “Compromisso significa estar presente, fazer e ser parte, participar do jogo
e não estar na platéia”, ou ainda “Compromisso para mim é estar com; fazer algo com
alguém, ou várias pessoas, ou por si mesmo de forma intensa, responsável. Compromisso
é não estar omisso, é querer resolver, partilhar, participar, estar envolvido e inteiro”, co-
mo refere outro participante.
Percebemos que a intensidade das relações é capaz de estabelecer o grau de com-
promisso dos integrantes do grupo. Quando os membros sentem-se aceitos e de certa
forma amados, desenvolvem laços e estabelecem compromissos entre si. Este clima de
aceitação, doação, participação, constitui uma das formas do compromisso estar manifes-
to na relação grupal.
Embora nem todos os membros do grupo tenham contribuído neste trabalho,
acreditamos que a amostra foi significativa, inclusive pela não participação dos demais,
posto que isto evidencia a dinâmica do processo vivencial deste grupo.
Pensamos que esta forma de participar – não participando – possa ser uma das ex-
pressões do compromisso dentro do grupo. As razões para tal opção, neste momento, nos
são desconhecidas e qualquer hipótese que viermos fazer diante deste fato, terá sido única
e tão somente, uma hipótese nada tendo a ver com a intencionalidade dos fatos.
Avaliando as respostas, consideramos que o aspecto comprometimento, embora
subjetivo, aparece de forma objetiva e contundente na interface com responsabilidade,
comparecimento, participação e envolvimento dos integrantes do grupo.
Implícito no comprometimento está a relação com o outro, relação esta construída
na vivência cotidiana e seus aspectos paradoxais.

SBDG – Caderno 84 v Na subjetividade da vivência do grupo 4


É nesta relação que a presença e a participação de todos os integrantes contribuem
para o crescimento individual e coletivo do grupo; assim nasce a co-responsabilidade que
desta forma se expressa no entendimento de um participante:
Penso que a presença do outro é fundamental para que o ciclo de aprendizagem
seja completo e perfeito. Explico: o compromisso do outro-manifesto em atitudes de falar
o seu ponto de vista, de expor sua leitura do tema, de ouvir com respeito a opinião do
colega, de trocar informações, enfim, de transformar seus conceitos a partir da rodada de
conteúdos que estão sendo debatidos – colabora na obtenção e na absorção dos temas
aprendidos.
Com a presença ativa do(s) outro(s), muitas idéias são veiculadas, sendo algumas
mantidas, outras descartadas e outras mais polêmicas, permanecendo em discussão, numa
gostosa troca de sínteses e antíteses que ajudam a ampliar o aprendizado, tornando-o mais
holístico.
Na ausência recorrente do(s) outro(s) (sinal de descompromisso), não tenho a
oportunidade de estabelecer novas referências e ampliar o horizonte da visão sistêmica
dos conteúdos.
Ao lermos este depoimento, ficamos face a face com o aspecto da construção do
conhecimento relacionado ao compromisso de uns com os outros dentro do grupo e as
perdas que todo o grupo tem quando da omissão/ausência de um dos seus membros.
Retomando nossa hipótese inicial, podemos dizer que na medida em que se estrei-
tam os laços afetivos, se constrói um compromisso que ultrapassa o compromisso indivi-
dual para ser um compromisso do grupo na construção de conhecimentos ou na própria
construção das relações no grupo.
Refletindo sobre o até aqui exposto e que foi compartilhado com os nossos cole-
gas, ousamos dizer que o compromisso transcende o indivíduo e o próprio grupo ao
mesmo tempo em que indivíduo e grupo transcendem o compromisso e atingem a pleni-
tude.

REFERÊNCIAS

BENNETT, W. J. O livro das virtudes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995.


CARTWRIGTH, D.; ZANDER, A. Dinâmica de grupo: pesquisa e teoria. São Paulo: EPU, 1975.
CRIVELARO, R.; TAKAMORI, J. Y. Dinâmica das relações interpessoais. São Paulo: Alínea, 2005.
GAHAGAN, J. Comportamento Interpessoal e de grupo. Rio de Janeiro, 1976.
MILLS, T. M. Sociologia dos pequenos grupos. São Paulo: Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1970.
MOSCOVICI, F. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 11. ed. Rio de Janeiro: José Olym-
pio, 2005.
PLATTS, D. E. Autodescoberta divertida: uma abordagem da Fundação Findhorn para desenvolver a con-
fiança nos grupos. São Paulo: Triom, 1996.
ROGERS, C. R. Grupos de encontro. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
SENGE, P. M. A 5ª disciplina. São Paulo: Best Seller, 1990.
SCHUTZ, W. Psicoterapia pelo encontro. São Paulo: Atlas, 1978.
ZIMERMAN, D.; OSÓRIO, L. C. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

SBDG – Caderno 84 v Na subjetividade da vivência do grupo 5


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Qual a influência dos líderes nos grupos


em um contexto organizacional?

MARIA CAROLINA JORGE DE LINHARES


SIMONE FERREIRA

“Onde cruzam meus talentos e paixões com


as necessidades do mundo, lá está a minha direção”.
(Aristóteles)

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 1


1 INTRODUÇÃO

Para compreender a relação das lideranças nos grupos de uma organização, o pre-
sente trabalho, sendo um estudo bibliográfico, está composto das seguintes partes: no
capítulo primeiro se esclarecerá os principais assuntos discutidos neste estudo, seguido da
problemática da pesquisa, objetivos gerais e objetivos específicos; posteriormente, a justi-
ficativa do tema que norteia o trabalho; no capítulo seguinte, tem-se o referencial teórico
aprofundando os temas os grupos e sua dinâmica, que aborda sobre os diversos estudio-
sos acerca deste assunto, bem como as principais características e os contextos grupais,
enfatizando os grupos organizacionais. O próximo assunto são os líderes nas organiza-
ções e suas atribuições, que descreve o histórico deste tema e as tipologias de liderança.
O próximo tema abordado é a influência dos líderes no grupo de trabalho, que explana
sobre a importância da intervenção do líder no seu ambiente de trabalho, podendo, assim
trazer características positivas e negativas para vida dos indivíduos de um grupo e conse-
qüentemente para a organização como um todo.
Em seguida, no capítulo terceiro, tem-se a conclusão. Seguem-se as referências.
Esta pesquisa é de suma importância para futuros estudos acerca destes temas,
principalmente para empresas que têm visão de futuro e se importam com a qualidade de
suas pessoas e seus serviços.

1.1 Problemática

Por muito tempo, os líderes trabalharam baseados nos modelos autocráticos de


comando e controle. Os grupos, por sua vez, estavam voltados unicamente para a produ-
ção, decorrente do ambiente industrial. No entanto, com a evolução do ambiente organi-
zacional cada vez mais rápida e necessitando de inovação continua, cede-se lugar á lide-
res que conseguem compreender seus liderados com os objetivos organizacionais e a lide-
rados com um perfil diferente, grupos diferentes, onde a consciência de seus direitos e o
papel das organizações trilham para um ambiente de trabalho saudável participando e se
co-responsabilizando por todo o processo organizacional.
A relação do líder com seu grupo de trabalho merecem cada vez mais atenção, ha-
ja vista que o papel dos líderes está sendo mais cobrado devido a sua importância no su-
cesso ou insucesso nas organizações. Os grupos, por sua vez, estão cada vez mais reivin-
dicando seu espaço, almejando líderes que prezam pela gestão participativa, envolvendo-
os nos processos organizacionais e contribuindo para o seu desenvolvimento como pro-
fissionais. Em virtude disso pode-se considerar como quase impossível o homem saudá-
vel no âmbito físico, psíquico e social, se em sua organização não houver uma política
participativa possibilitando um crescimento mútuo, dos grupos de trabalho e da empresa.
Com base nisso, tem-se como pergunta norteadora: Qual a influência dos líderes
nos grupos em um contexto organizacional?

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 2


1.2 Objetivos

Objetivo geral
• Analisar a influência dos líderes nos grupos em um contexto organizacional.

Objetivos específicos
• Entender sobre os grupos no contexto organizacional;
• Descrever sobre estilos de liderança;
• Verificar quais as influências dos líderes nos grupos em uma organização.

1.3 Justificativa

A relação do homem com o trabalho vem passando por grandes transformações


em todo o mundo, transformação essa que vem sendo causada por mudanças na forma
como as organizações efetuam a gestão de pessoas, mudanças estas no relacionamento
entre as organizações e as pessoas, no modo pelo qual as pessoas encaram sua relação
com o trabalho, o comportamento do mercado de trabalho.
Com a mudança do enfoque há um grande esforço em repensar o papel dos líderes
e das organizações nas relações com os grupos de trabalho. Com isso, torna-se relevante
o estudo que relacione o papel dos líderes nas organização e dos grupos geridos por eles.
Por este motivo, considera-se pertinente o estudo que correlacione os fatores para
que possibilitem o maior desenvolvimento dos grupos no contexto empresarial, haja vista
que cada vez mais há a necessidade dos líderes de estarem valorizando a força que move
as organizações: os grupos.

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 Grupos e sua dinâmica

Ao nascer, o ser humano é inserido em um contexto social tendo que se adaptar ao


sistema que está vigente, tendo que aprender a viver nele desenvolvendo habilidades e
apropriando-se delas. Em outras palavras, é no grupo que o homem aprende elementos
básicos de sobrevivência, do cotidiano e aos poucos assume diversos papéis na sociedade,
tais como papel de filho, de irmão, de vizinho, de colega de escola, dentre muitos outros,
e ao desenvolver-se cada vez mais nesta sociedade este individuo amplia sua dimensão
no mundo.
O significado de sociedade e grupo estão altamente intrínsecos, pois são aspectos
inerentes ao homem e ao homem é oferecido o livre arbítrio, as escolhas. A partir delas o
individuo pode ampliar suas possibilidades e participar de vários grupos, como de traba-
lho, de lazer, de religião, de sindicatos etc. Os indivíduos que participam de determinados
grupos, tem um objetivo, uma meta, um caminho comum a ser seguido.
Historicamente a menção aos grupos aparece no século XVIII com os chamados
socialistas utópicos, mas foi aprofundado quando as empresas tornaram-se mais comple-
xas e o ato do trabalho e da produção foi burocratizado por Taylor. Por volta de 1924

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 3


com Elton Mayo, através de pesquisas relacionadas à produção industrial, se desvendou a
importância do grupo no rendimento organizacional, comenta Andaló (2001).
Sob a perspectiva da Psicologia Grupal, Kurt Lewin, formou um centro de pesqui-
sas em dinâmica de grupo, termo este que perdura no vocabulário de todos até nos dias de
hoje.
Lewin, segundo a mesma autora, foi o fundador de uma dinâmica de grupo e sa-
biamente dizia que o “todo é distinto da soma de suas partes”, onde os indivíduos inter-
agem e criam um estado de equilíbrio que resulta das forças de uma situação, constituin-
do totalidades dinâmicas que resultam das interações entre os membros.
Outros estudiosos das dinâmicas ou movimentos de um grupo estão o psicodrama-
tista Moreno, o humanista Rogers, o gestaltista Perls e estudiosos oriundos da psicanálise
como Freud e Pichon-Rivière, estes pretendiam constituir olhares próprios sobre o pro-
cesso grupal.
Graças a estes estudiosos, hoje se dá a importância pelos processos grupais, po-
dendo através disto, entender mais plausivelmente a dinâmica de grupos nos mais varia-
dos contextos.
Na atual conjuntura, vem se dando cada vez mais importância aos processos gru-
pais, o que torna este conhecimento um instrumento riquíssimo e até mesmo imprescin-
dível na eficácia para atingir objetivos, realizar tarefas ou medir rendimentos, ou seja,
para detectar lideranças, obter coesão, resolver conflitos e tensões, etc, comenta Andaló
(2001).
Essas características são facilmente vistas em qualquer grupo, seja grupo de traba-
lho, de igreja, grupos terapêuticos, comunitários ou de qualquer outra natureza, é impor-
tante que entenda-se sobre a dinâmica dos grupos formados.
“Pode-se analisar um grupo através de sua composição, estrutura e ambiente. Nes-
te caso, estudam-se as pessoas que compõem o grupo, as posições relativas que elas ocu-
pam no grupo, suas relações entre si, o espaço físico e psicossocial do grupo” (Moscovi-
ci, 1996, p. 96).
Complementa ainda, Beal, Bohlen e Raudabaugh (1967), que é importante dife-
renciar um membro do outro dentro de um grupo, pois cada um traz consigo interesses
próprios, motivações, esperanças, aspirações, valores, atutides, hábitos, sentimentos e
crenças bem definidos, os quais até então aplicados a si mesmos e a posteriori projetados
em outros membros.
Complementa Saraydarian (1990) que um grupo somente é bem sucedido quando
as pessoas mantêm o seu interesse próprio fora do grupo e buscam o interesse do grupo
como um todo, onde efetivamente inclui o interesse individual, mas somente se renuncia-
rem a seus interesses próprios pelo bem do grupo e pelo propósito do grupo é que haverá
integração e harmonia para o desenvolvimento de todos.
Partindo do particular para o geral, dentro de um processo grupal, pode-se obser-
var outros aspectos inseparáveis ao grupo como motivação, comunicação, processo deci-
sório, relacionamento, planejamento, criatividade, conflito, liderança. (Considera-se que
para todos os aspectos citados, o líder tem grande influência no clima que rege o grupo,
podendo contribuir positiva ou negativamente.)
A partir das características citadas anteriormente e pensando em grupos dentro de
um contexto organizacional, pode-se dizer que o grupo tem um objetivo comum na em-
presa, e partindo deste princípio, a principal razão de um grupo existir é ajudar a alcançar
seus objetivos, proporcionar competitividade à organização, desenvolver qualidade em
serviços, proporcionar mudanças positivas, fidelizar clientes dentre outros. Mas para que

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 4


isso ocorra com sucesso, este grupo precisa estar altamente motivado e condizente com a
identidade da organização, características estas, que os líderes são importantes pontes
entre a real necessidade da organização e os multiplicadores dessas idéias.
Confirma Castilho (2003) que as organizações sempre precisam saber como atuar
com seus grupos, porque de um modo ou de outro elas precisam que seus colaboradores
atuem conforme seus sistemas. Cabe ressaltar a importância dos líderes em saber manejar
ou gerir o grupo atendendo e conciliando o conflito de interesses de pessoas, grupos e
organizações.

2.2 O líder na organização e suas atribuições

O estudo sobre a liderança aborda o papel de estilos de liderança e suas atribui-


ções e para tanto, far-ser-á uma análise da teoria das organizações do ponto de vista do
estilo de liderança situacional estudada por Hersey e Blanchard e suas atribuições.
O estudo sobre liderança teve seu princípio no século XX com a administração ci-
entífica preconizada por Taylor, que considerava as pessoas como instrumentos ou má-
quinas a serem manipuladas por seus líderes e na década seguinte surge Elton Mayo que
acreditava na administração voltada aos benefícios dos problemas humanos e a função do
líder era de facilitar a realização cooperativa de objetivos pelos seus seguidores, segundo
Hildedrand (1988).
Segundo Hersey e Blanchard (1986, p. 107), desde que se evidenciou o conflito
entre as duas teorias expostas anteriormente, caracterizou os estudos sobre liderança,
sendo que a liderança é encontrada não só nas organizações como também no cotidiano,
por exemplo, família, escola, igreja, enfim onde haja um grupo de pessoas, necessaria-
mente há um líder. A partir disto o conceito de liderança tem uma amplitude muito gran-
de, assumindo uma significação para cada pessoa.
Tem-se como conceito de liderança a pessoa que conduz ou representa uma socie-
dade, que guia o caminho a ser seguido pelos demais, ou seja, que influencia o grupo de
alguma maneira para que sejam alcançados os objetivos propostos.
De acordo com Schein (1982) a liderança é uma questão que consiste em harmo-
nizar entre si as características pessoais de líder, as características pessoais dos subordi-
nados, a natureza da tarefa e a situação que circunda a tarefa, por exemplo, limites de
tempo e circunstâncias históricas.
As principais características que definem um líder são: iniciativa, inteligência, cri-
atividade, sociabilidade, autoconfiança, entre outras. No entanto, a recíproca nem sempre
é verdadeira, uma pessoa com estas características não necessariamente desenvolveria a
função de liderança.
Pereira (1984) considera que para ser um líder, precisam existir seguidores e os lí-
deres muitas vezes são escolhidos por desempenhar bem a tarefa e/ou pelo seu envolvi-
mento com o grupo.
Ainda sob o comentário da mesma autora, algumas pessoas estão motivadas para
liderar, outras para serem dependentes, outras para estabelecer relações associativas.
Sendo que esta relação não se trata somente em uma relação hierárquica, o que Hersey e
Blanchard (1986) sugerem é que sempre uma pessoa procura influenciar o comportamen-
to de outra, a primeira é o líder potencial e a segunda o liderado potencial, não importan-
do se esta última é o chefe, um colega, subalterno, amigo ou parente.

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 5


Contudo, o papel do líder perante o grupo que trabalha é, dentre eles determinar as
tarefas para determinado fim, dar prazo para as mesmas serem cumpridas, contribuir para
um clima motivacional, tomar decisões, avaliar, atribuir, controlar, recompensar, unir e
ainda ser mediador entre os subordinados e outros superiores.

2.2.1 Liderança situacional

Segundo Bergamini (apud Dazzi, 2002) etimologicamente o termo estilo origina-


se do ponteiro com o qual os antigos escreviam em tabuinhas enceradas. Este ponteiro era
único para cada pessoa, com o intuito de identificar cada um. Segundo a autora, os estilos
de liderança são as formas especiais de comportamento dos líderes, determinadas por
uma configuração única da personalidade e que é própria de cada pessoa e conduz deter-
minadas ações.
Com base nisto, o estilo caracteriza, de maneira peculiar, como os líderes reagem
frente a problemas do cotidiano, relacionam-se com seus subordinados, tomam decisões,
etc.
Liderança é um tema bastante estudado, entretanto, há várias formas de entender
os estilos de liderança, segue algumas teorias acerca do assunto.

2.2.1.1 Tipologia de Likert

De acordo com os estudos feitos por Dazzi (2002) sobre a teoria de Likert, este
pesquisador realizou estudos sobre liderança e seu principal objetivo era definir os estilos
de líder que mais se ajustavam ao contexto organizacional, procurando comprovar suas
suposições sobre como orientações comportamentais diferentes afetam situações de tra-
balho diferentes. Partindo dos sistemas de administração, verificou que se pode derivar
padrões prováveis de liderança, características organizacionais e comportamentos típicos
de cada sistema. A seguir será apresentado uma tabela com as características relacionadas
ao objeto de pesquisa de Likert, a liderança (apud Dazzi 2002).

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 6


Quadro 1: Sistemas organizacionais
Variável SISTEMA DE ORGANIZAÇÃO
organizacional
Autoritário Participativo

Rígido Benevolente Deliberativo Grupal


Relação de confi- Não há confiança Possuem condes- Há bastante con- Há irrestrita con-
ança gerente e cendente confian- fiança fiança
colaborador ça
Abertura para Não há nenhum tipo Os colaboradores Há algumas oportu- Há absoluta liber-
discussão de de abertura para não se s entem nidades para a dade para discutir
assuntos impor- este tipo de discus- muito à vontade discussão esse tipo de ques-
tantes para o são para discuti-los tão
trabalho entre
gerente e colabo-
rador
Freqüência de Raramente Às vezes Geralmente Sempre
solicitação de
idéias e opiniões
aos colaborado-
res
Motivação Medo, ameaças, Recompensas e Recompensas, Recompensas fi-
punições e ocasio- algumas punições punições e algum nanceiras baseadas
nais recompensas. reais ou potenciais envolvimento do num sistema de
colaborador. compensação d e-
senvolvido através
da participação
Proximidade Nenhuma proximida- A proximidade Há bastante proxi- Em geral há proxi-
psicológica dos de poderá ocorrer midade midade muito gran-
líderes e colabo- eventualmente se de
radores for uma questão
de conveniência
Responsabilidade Envolvimento único Envolvimento Grande número de Todos os níveis
no alcance das dos altos escalões. principalmente da colaboradores, sentem -se respon-
metas Em geral, os colabo- alta administração sobretudo os dos sáveis pelo alcance
radores são hostis às com alguma res- níveis hierárquicos das metas da orga-
metas da organiza- ponsabilidade dos superiores, envolvi- nização e compro-
ção demais dos para o interesse metem -se no senti-
do alcance das do de atingi-las.
metas.
Atitudes com os Atitudes subservien- Atitudes subservi- Atitudes cooperati- Atitudes favoráveis
colegas tes em relação aos entes em relação vas em relação aos e cooperativas se
superiores, hos tilida- aos superiores, demais colegas; observa mútua
de em relação aos competição por pode haver, contu- confiança e lealda-
superiores e aos status, hostilidade do, certo espírito de de.
colegas e desprezo em relação aos competição entre os
pelos níveis mais colegas, condes- colegas, gerando
baixos cendência com os certa hostilidade.
níveis mais baixos.
Nível de satisfa- Frustração e irritação Misto de irritação e Quase nenhuma Orgulho e elevada
ção moderada satisfa- frustração, tendên- satisfação
ção cia à elevada satis-
fação.
Características Muito pouco volume Pouco volume de Bastante volume de Muito volume de
da comunicação de interação. Fluxo interação. Na mai- interação. Fluxo de interação. Fluxo
prioritariamente de oria das vezes o informação para intenso para baixo e
cima para baixo. fluxo é cima para baixo e para cima, para cima, comuni-
Encarada com des- baixo, a comunica- comunicação lateral cação lateral de
confiança ção ascendente é de razoável a boa. bom a excelente. É
limitada, a lateral é Freqüentemente geralmente aceita,
muito influenciada aceita, mas às nos casos em que

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 7


muito influenciada aceita, mas às nos casos em que
pela hostilidade do vezes com certa não ocorre, é aber-
grupo. Encarada à desconfiança, sen- tamente discutida e
vezes com descon- do è contestada e contestada.
fiança, outras não discutida.
Volume de inte- Pequena interação Pequena intera- Moderada intera- Interação, amistosa
ração entre o sempre com dom ínio ção, geralmente ção, com razoável e amiudada, com
líder e colabora- da desconfiança com alguma con- quantidade de con- elevado grau de
dor descendência por fiança. confiança mútua.
parte dos superio-
res, temor e caute-
la por parte dos
subordinados.
Nível hierárquico Alta administração As diretrizes prin- As diretrizes gerais Processo decisório
que ocorre a cipais emanam do e as decisões prin- difundido por toda a
tomada de deci- topo, mas muitas cipais vêm do topo, empresa, através
são decisões são to- mas decisões mais de vínculos bem
madas na estrutura específicas são estabelecidos p elos
dos níveis inferio- tomadas em esca- grupos existentes.
res lões inferiores.
Cooperação no Nenhuma Relativamente Moderada Substancial e notó-
trabalho em e- pouca ria
quipe
Como são acei- As metas são decla- As metas são As metas são decla-
As metas são fran-
tas, rejeitadas ou radamente aceitas, declaradamente radamente aceitas,
ca e lealmente
criticadas as mas sofrem velada e aceitas, mas s o- mas às vezes com
aceitas, sem resis-
metas estabele- forte resistência. frem velada resis- velada resistência.
tência de qualquer
cidas pela firma? tência, de forma espécie, já que têm
moderada. inspiração no con-
senso grupal.
Forma de estabe- As ordens e os co- As ordens e os As metas são fixa- Exceto nos casos
lecimento das municados são sim- comunicados são das e as ordens de emergência, as
metas e diretrizes plesmente emitidos, secamente emiti- emitidas após dis- metas são geral-
sem maiores comen- dos, mas às vezes cussão com os mente estabeleci-
tários. há oportunidades subordinados, sen- das em grupos.
de comenta-los. do então traçado o
rumo a seguir.
Existe na firma Existe uma organi- Nota-se à vezes a A organização in- As organizações
uma organização zação informal organização infor- formal às vezes se formal e informal
informal apoian- opondo-se à metas mal resistindo às manifesta e tanto são uma coisa
do as metas da da organização for- metas da organi- pode apoiar como única: todas as
organização for- mal. zação formal resistir em parte à forças vivas da
mal ou opondo-se metas da organiza- empresa apóiam os
a elas? ção formal. esforços p ara al-
cançar suas m etas.
Fonte: Likert (apud Dazzi 2002, p. 51-52).

No Quadro 1 são apresentadas as características de cada um dos tipos de líder es-


tudados por Likert e analisou-se dentre as variáveis o grau de confiança, a abertura para
as discussões, solicitações de idéias e opiniões, a motivação, responsabilidade, atitudes,
satisfação, comunicação, proximidades, interação, trabalho em equipe, tomada de deci-
são, estabelecimento de metas e diretrizes e organização informal.

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 8


2.2.1.2 Hersey e Blanchard

Segue então, as características do estilo de liderança situacional de Hersey e Blan-


chard em virtude da amplitude e da magnitude de conhecimentos no campo da pesquisa
de liderança.
Para Hersey e Blanchard (1986) os liderados têm uma importância fundamental
em qualquer situação, pois apenas eles podem aceitar ou rejeitar o líder como também os
grupos efetivamente determinam o poder pessoal que o líder pode ter.
Os autores adotam a linha da liderança situacional, na definição dos estilos geren-
ciais, que esta por sua vez esclarece que o estilo que um líder deve adotar depende do
nível de maturidade das pessoas que deseja influenciar. E sobre essa perspectiva Hersey e
Blanchard, desenvolvem o Modelo Tridimensional da Eficácia do Líder que trabalha da
seguinte forma:
a) a quantidade de orientação e direção (comportamento de tarefa) que o líder
oferece;
b) a quantidade de apoio sócio-emocional (comportamento de relacionamento
dado pelo líder);
c) o nível de prontidão (“maturidade”) dos subordinados no desempenho de uma
tarefa, função ou objetivo específico.
Apenas para uma melhor concepção do leitor, sem a intenção de aprofundar sobre
este conceito, maturidade para Hersey e Blanchard (1986), quer dizer como a habilidade
e disposição das pessoas de admitir a responsabilidade de conduzir seu próprio compor-
tamento. Essas variáveis de maturidade devem ser analisadas somente em relação a uma
tarefa peculiar a ser atingida.
Para entender melhor a representação entre a maturidade relativa à tarefa e os esti-
los de ilderança adequados a serem adotados à medida que os subordinados passam da
imaturidade para a maturidade, Hersey e Blanchard (1986) elaboraram um gráfico expli-
cativo.

Figura 1 – Curva da Maturidade, relativa a tarefa e aos estilos de liderança da Tipologia de Hersey e Blan-
chard (apud Gil, 2001, p. 227).

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 9


O estilo I “determinar” é compatível com as pessoas que não possuem nem capa-
cidade, nem desejam assumir responsabilidades. São consideradas pessoas de maturidade
baixa. É um diretivo, no qual o líder define as funções e especifica o que as pessoas de-
vem fazer, como, quando e onde devem realizar a tarefa. Em suma, é um estilo de lide-
rança autoritário, conforme foi fornecido o conceito anteriormente, é orientado para a
tarefa e com um sistema de controle altamente estruturado, requerendo um comando dire-
tivo do líder.
O estilo II “persuadir” é adaptável às pessoas que não possuem capacidade, mas
estão dispostas a assumir responsabilidades. Estas características cabem a pessoas com
maturidade entre baixa e moderada. O líder fica responsável pela maior parte da direção,
aliando explicações e comunicações bilaterais para convencer seus colaboradores a adota-
rem determinados comportamentos. Esse estilo envolve comportamento de alta tarefa e
alto relacionamento.
O estilo III “compartilhar” consideram que o líder e o liderado participam juntos
da tomada de decisão e o líder tem o papel de facilitador da tarefa. É um estilo participa-
tivo de apoio e não diretivo, que tem a maior probabilidade de ser eficaz com pessoas que
se encontram no nível de maturidade entre moderada e alta.
Por sua vez, o estilo IV “delegar” está mais apropriado a pessoas dispostas para
assumirem responsabilidades, pois exige maturidade alta. Ainda que a responsabilidade
de detectar o problema seja do líder, a responsabilidade de executar e decidir os planos
cabe a esses liderados maduros.
Com base nas descrições e definições realizadas anteriormente, os estilos são de-
corrência da inter-relação entre estas variáveis e o grau de suas variações. É um estilo que
dá a direção, ou seja, o líder define as funções e orienta quem, como, quando e onde a
devem realizar.
Segundo Hersey e Blanchard (1986), os líderes devem analisar as exigências do
ambiente e adaptar o estilo de liderança a elas, desenvolvendo meios para mudar algumas
ou todas as variáveis situacionais. Se o desempenho estiver aumentando, é adequado aos
líderes que desloquem seu estilo para a esquerda do gráfico, ou se a performance estiver
decaindo, os líderes devem deslocar seu estilo de liderança para a direita do gráfico.
Se este modelo for usado de forma correta, ou seja, de acordo com o nível de ma-
turidade do grupo, trará resultados positivos para o desempenho das relações e das ativi-
dades do grupo que está gerindo.

2.3 A influência dos líderes no grupo de trabalho

Ao longo da história houve momentos marcantes quanto à importância da poten-


cialidade dos grupos liderados por gestores competentes e suas conseqüências. Partindo
disso, pode contextualizar este momento com os estudos do pai da administração, o en-
genheiro Frederick W. Taylor, que segundo Hildebrand (1998), este considerava as pes-
soas como instrumentos ou máquinas a serem manipuladas por seus líderes.
Ainda nesta época não se dava a real importância para o potencial de um grupo
dentro da organização, apenas em meados da década de vinte e início da década de trinta,
surge o movimento das relações humanas, com Elton Mayo, que tinha a administração
voltada aos benefícios dos problemas individuais e grupais e a função do líder era de faci-
litar a realização cooperativa de objetivos pelos seus seguidores, ou seja, do grupo de

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 10


trabalho que liderava (Hildebrand, 1998). Com isso procurou-se minimizar o sofrimento
no trabalho e logo aumentar a produtividade, pois Mayo percebeu que só a remuneração
não era suficiente para fazer com que o grupo de trabalhadores se sentissem motivados a
produzir e que o líder assumia um papel importante para o desempenho do trabalho.
As organizações estão passando por grandes transformações decorrentes de pres-
sões exercidas pelo ambiente interno e externo, sendo ai que entra o importante papel do
líder nas organizações, pois este é co-responsável pelo sucesso ou insucesso da organiza-
ção, uma vez que este precisa ser um grande aliado para a concretização dos processos, o
melhoramento do clima organizacional, a prática dos valores, a missão, os objetivos, as
metas a serem alcançadas na empresa, na influência das relações interpessoais, na criati-
vidade, na motivação, ou seja, nas relações e necessidades que permeiam o grupo e a or-
ganização de uma forma holística.
Segundo Carvalho e Serafim (1995), o líder deve motivar sua equipe a opinar, ao
mesmo tempo identificar-se com seu grupo sem perder sua posição de liderança espontâ-
nea.
Acredita-se que é atribuição do líder manter suas equipes sempre motivadas, pre-
cisam ser facilitadores da comunicação para evitar desentendimentos, precisam construir
e/ou manter equipes competentes, ser fornecedores de feedback, e ainda, para que todos
esses itens ocorram com sucesso, permitir que consigam obter mais êxito, por meio de
suas competências para suas organizações.
Entende-se que ao atender as necessidades dos grupos que gere, o líder contribuirá
para o desenvolvimento da empresa como um todo, pois o grupo terá mais forças orienta-
das para o desenvolvimento da organização. Em contrapartida (Moscovici 1996, p. 132)
comenta que,
Parece pouco provável, portanto, que se consiga estabelecer um modelo
ou padrão ideal de comportamento do líder, uma fórmula ou receita in-
falível de estilo de liderança que funcione perfeitamente para qualquer
grupo em qualquer situação, a qualquer tempo.
Complementa Minicucci (1997) que a sabedoria da liderança está em adaptar
quando usar tal e qual método, ou seja, usar condições e pessoas com as quais se defronta
em seu trabalho. Para tanto, ainda é preciso conhecer o indivíduo / grupo para poder utili-
zar a liderança compreensivamente.
Há necessidade do líder não apenas criar uma cultura, mas também sustentá-la e
até mesmo ser um agente de mudança. Um líder sábio é um verdadeiro propagador de
energia ao seu grupo, dando assim vida a organização, pois é através desta energia que o
líder consegue forças para enfrentar desafios sem deixar que sua equipe perca esta identi-
ficação que são transmitidos pelas crenças, valores e premissas destes líderes.
No tipo de liderança estudada por Hersey e Blanchard, “está implícita a idéia de
que o líder deve ajudar os liderados a amadurecer até o ponto em que sejam capazes e
estejam dispostos a fazê-lo” (1986, p. 193).
Partindo desse pressuposto, ainda sob o ponto de vista dos mesmos autores, quan-
do os grupos liderados apresentam-se imaturos em relação a uma tarefa específica a ser
realizada, é conveniente que o líder tenha um posicionamento firme, um comportamento
dirigido a tarefa, afim de que se tornem produtivos. Paralelo, quando há um significativo
aumento de maturidade, deve ser recompensada recebendo apoio sócio-emocional, e este
é um comportamento norteado ao relacionamento. Por fim, quando os grupos liderados

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 11


alcançam altos níveis de maturidade, o líder deve reduzir o comportamento de tarefas,
bem como o comportamento de relacionamento.
“Quer dizer, um indivíduo ou um grupo não é maduro ou imaturo num sentido to-
tal. Todas as pessoas tendem a ser mais ou menos maduras em relação a uma tarefa”,
confirmam os autores” (Hersey e Blanchard, 1986, p. 186-187).
Caso o líder não atenda as necessidades do grupo, este pode perder forças para
continuar lutando para o crescimento da empresa, podendo desmotivar pessoas, gerar
conflitos, diminuir o rendimento lucrativo e ao modo de pensar de (Angeloni, 2002, p.
52):
Os estilos autoritário rígido ou benevolente não suprem mais as neces-
sidades da organização. As pessoas devem ser envolvidas no processo;
devem sentir-se parte dele e, principalmente, responsáveis por ele. Para
tanto, o estilo gerencial que parece mais apropriado nas organizações do
conhecimento [...], é o participativo grupal, pela sua capacidade e astú-
cia em coordenar o grupo, engajando-o.
No novo modelo de gestão que o mercado competitivo exige é que a visão seja
compartilhada, dividindo os problemas com seu grupo, aproveitando as idéias advindas
destes, capacitando-os e delegando tarefas para a solução do problema, buscando sempre
adequar o estilo de liderança de acordo com a necessidade dos indivíduos e do grupo co-
mo um todo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A forma de gerir pessoas pelas organizações vem passando por profundas trans-
formações, onde há um grande esforço em repensar o papel dos líderes nas organizações,
pois a pressão sobre, exige que repensem conceitos, premissas, técnicas e ferramentas
para a gestão de pessoas, uma vez que na atual conjuntura dá-se importância para um
modelo que o líder envolva seu grupo preocupando-se com o desenvolvimento pessoal e
profissional destes.
Em virtude disso, esse é o pano de fundo para o surgimento da necessidade de
uma nova forma de pensar a importância dos líderes na desenvoltura dos seus grupos,
onde a ordem é que o gestor também aprenda com as experiências e habilidades do seu
grupo e que de forma adequada, sem podar talentos, use seu poder para capacitar pessoas
e desenvolver a empresa.
Considera-se hoje em dia inadmissível é que o modelo reducionista perdure e ain-
da seja aplicado nos tempos atuais, pois na grande maioria das organizações encontra-se e
preza-se por homens parentéticos, ou seja, homens livres, criativos, inovadores e não
mais podados por seus líderes.
Saraydarian (1990) confirma este pensamento comentando que um verdadeiro íl-
der não tenta fazer do seu grupo marionetes e sim tenta despertar neles suas originalida-
des, ativando algum talento especial, criando um trabalho sinfônico. Ao contrário, quan-
do tenta fazer do seu grupo uma extensão de si mesmo, impede o progresso, a superação
dos obstáculos e por fim, o desenvolvimento.
O modelo que os líderes vêem assumindo, o de contribuir positivamente para a
desenvoltura dos seus grupos bem como das suas organizações, não é mais um novo mo-
delo a ser aplicado, mas sim uma resposta para as novas necessidades dos grupos que

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 12


estão cada vez mais exigentes e em conquista a fim de não serem mais considerados ape-
nas como peças de engrenagem, mas sim, reivindicam espaço para serem vistos como
sujeitos dotados de competências e habilidades técnicas e comportamentais.
No entanto, as mudanças de comportamento não ocorrem somente por parte dos
colaboradores, mas também por parte dos líderes, uma vez que este líder deve ser o arti-
culador responsável pela mudança, isto é, deve ajudar e mostrar aos seus grupos as novas
possibilidades, fazendo com que estes se engajem no processo com um todo. Em suma, o
líder deixa de ser chefe ou gerente e assume o papel de facilitador em todo o processo,
possibilitando e capacitando seu grupo a ter mais liberdade e contribuir para o processo
organizacional e o pensamento sistêmico.
Atualmente as organizações estão passando por esse período de amadurecimento,
por isso almeja-se que esta presente pesquisa possa vir a auxiliar os líderes de organiza-
ções da importância da aplicação de estilos de liderança adequados aos seus grupos,
completando-se, identificando-se e possibilitando um crescimento mútuo e holístico.

REFERÊNCIAS

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1.
ANGELONI, Maria Terezinha. Organizações do conhecimento: infra-estrutura, pessoas e tecnologias. São
Paulo: Saraiva, 2002.
BEAL, George M.; BOHLEN, Joe M.; RAUDABAUGH, J. Neil. Liderança e dinâmica de grupo. 3. ed.
Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
CARVALHO, Antônio Vieira de; SERAFIM, Ezilea Clen Gomes. Administração de recursos humanos.
São Paulo: Pioneira, 1995. v. 2.
CASTILHO, Áurea. As organizações do futuro e os pequenos grupos. Grupo & Ação, Porto Alegre,
SBDG, jun./jul. 2003. Disponível em:
<http://www.sbdg.org.br/artigos/pesquisa_mostra.asp?pMatCod=353>. Acesso em: 13 set. 2006.
DAZZI, Márcia Cristina Schiavi. Influência do capital de liderança na mudança organizacional rumo a
gestão do conhecimento: o caso da WEG. Florianópolis: UFSC, 2002. Originalmente apresentado como
monografia do curso de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina, 2002.
HERSEY, Paul; BLANCHARD, Kenneth H. Psicologia para administradores: as teorias e as técnicas da
liderança situacional. São Paulo: EPU, 1986.
HILDEDRAND Juliana Mães. Estilos de liderança e satisfação no trabalho: um estudo de caso na comp a-
nhia catarinense de águas e saneamento – CASAN. Florianópolis: UFSC, 1988. Originalmente apresentada
como monografia do curso de Administração, Universidade Federal de Santa Catarina, 2002.
MINICUCCI, Agostinho. Dinâmica de grupo: teorias e sistemas. 4. ed. Sao Paulo: Atlas, 1997.
MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 5. ed. Rio de Janeiro: Jose
Olympio, 1996.
SARAYDARIAN, Torkom. A psicologia da cooperação e consciência grupal. São Paulo: Aquariana,
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SCHEIN, Edgar H. Psicologia organizacional. 3. ed. Rio de Janeiro: Prentice Hall do Brasil, 1992.
PEREIRA, Edna Maria Arrais. Liderança: um fenômeno interacional e emergentista. [S.l.]: [s.n.], 1984.

SBDG – Caderno 84 v Qual a influência dos líderes nos grupos em um contexto... 13


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Da morte anunciada à imortalidade


da relação construída no grupo:
uma reflexão acerca da finitude

FERNANDA SILVA DESTRI*


JORDELINA SCHIER**

Resumo: Trata-se de uma reflexão teórica apresentada como trabalho de conclusão do


Curso de Formação em Dinâmica de Grupo da Sociedade Brasileira de Dinâmica dos
Grupos (SBDG) cujo tema em questão é o processo de perdas e finitude do grupo. Apre-
sentamos algumas estratégias como contribuição de um possível caminho para processar
a finitude de um grupo e ressignificar as suas experiências, tendo como base a literatura e
a vivência grupal. Através da seleção de alguns pontos da trajetória e da história de um
grupo de formação, buscamos uma reflexão teórica contextualizada, apontando para a
compreensão da finitude do grupo, que sinaliza a morte anunciada, como uma possibili-
dade de imortalidade da relação construída no grupo com um novo sentido à experiência
vivida, experiência esta ressignificada no processo de viver e conviver.
Palavras-chave: Finitude do grupo. Morte. Dinâmica de grupo.

*
Psicóloga do TRT/SC, Mestre em Psicologia do Desenvolvimento Humano da UFRGS, Especialista
Clínica em Psicoterapia Familiar Sistêmica.
**
Enfermeira do HU/UFSC, Mestre em Assistência de Enfermagem, Doutoranda em Enfermagem do
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC.

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 1


1 INTRODUÇÃO

Trata-se de uma reflexão teórica apresentada como trabalho de conclusão do Cur-


so de Formação em Dinâmica de Grupo da Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos
(SBDG) cujo tema em questão é o processo de perdas e finitude do grupo.
A Dinâmica dos Grupos é um conhecimento sistematizado que tem como foco o
estudo das leis e pressupostos do funcionamento dos pequenos grupos. O estudo do pro-
cesso grupal, processo este que ocorre em nível manifesto e em nível latente, objetiva um
melhor funcionamento do grupo a partir da ampliação das consciências individuais. O
grupo é algo além da soma dos indivíduos e seu funcionamento é expresso através do
processo grupal (SBDG, 2006).
O grupo formado pela SBDG para o curso de formação básica em dinâmica de
grupo tem um tempo de vida predefinido. Nele, seus participantes firmam contrato de
convivência, conhecem-se entre si, estabelecem trocas, criam vínculos, estabelecem me-
tas e tarefas a cumprir, elaboram suas vivências grupais, sofrem perdas e, finalmente,
separam-se. É, portanto, no aspecto temporal, um grupo finito.
Apresentamos neste ensaio uma reflexão teórica apoiada nos diversos pensares de
estudiosos acerca do processo de perdas, finitude e seus ritos de passagem, nos seus as-
pectos individuais e grupais, tendo também como referência a experiência de vivências,
enquanto participantes de um grupo finito.
A finitude do grupo é aqui entendida como o processo de vivência no grupo que
finda. Tal processo implica em ritos de passagem e despedidas e em elaboração do luto
frente à morte anunciada e o morrer em suas mais variadas formas de apresentação.
Neste caso, não falamos da morte do corpo físico, inevitável e ainda temida por
muitos; mas, sim, acerca das perdas, como um modo de morte e morrer, vivenciadas no
dia-a-dia de um grupo finito e no seu processo de fechamento. Algumas dessas situações
e sentimentos vivenciados pelos membros do grupo passamos a descrever a seguir:
§ A possibilidade de desistência de um membro do grupo, como fator ameaça-
dor de morte precoce do grupo;
§ A desistência, propriamente dita de um membro, nem sempre anunciada ou
compartilhada previamente, caracterizando-se como elemento surpresa na re-
lação grupal. Tal surpresa gerando desilusão inesperada das expectativas do
grupo.
§ O encontro grupal com o ser ausente, ou seja, os faltosos no grupo.
§ A razão que aprisiona a emoção, interferindo no crescimento grupal por meio
do processamento das vivências.
§ O medo que paralisa as ações e emoções na relação grupal.
§ O dito e o não dito, ora sentido, ora calado, ora não ouvido;
§ O grupo que finda;
§ A despedida.

Tais inquietações nos levaram a esta reflexão na tentativa de compreender quais


os caminhos que o grupo pode seguir para vivenciar, reconhecer, elaborar e processar
suas perdas e finitude de modo pleno e consciente. Plenitude e consciência que afloram
da emoção.
Nesta experiência grupal vivenciamos situações de perdas e enlutamento, bem
como realizamos ritos de passagem. As situações aqui destacadas foram eventos
recorrentes, pontos nodais, na história de um grupo finito:

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 2


§ A “presença ausente” de um ou mais participantes do grupo, evidenciada
quando o participante está presente no encontro, porém sua entrega emocional
é manifestada de modo parcial.
§ A ausência física e concreta no encontro grupal (justificada ou não).
§ A quebra do contrato de convivência, evidenciada no pouco comprometimen-
to presencial de alguns membros, em ameaças constantes de saída do grupo e
na dificuldade de participar com disponibilidade ingênua das atividades pro-
postas.
§ A desistência de participantes no grupo, em sua fase inicial de inclusão.
§ A morte de familiares de integrantes do grupo; entre outras.

Ressaltamos que esta reflexão não objetiva formular respostas acerca desse pro-
cesso, mas sim, apresentar algumas possibilidades para a elaboração das perdas e finitude
de um grupo. Neste olhar, que se orienta pela filosofia e a metodologia andragógica da
SBDG, buscamos as interfaces desta vivência no que tange o indivíduo enquanto membro
participante de um grupo, e o grupo propriamente dito, enquanto coletivo heterogêneo e
diverso.
Ousamos, então, formular as seguintes hipóteses:
§ Os membros ausentes e/ou aqueles que ameaçam freqüentemente sair do gru-
po agem assim por não encontrarem um ou vários objetivos a compartilhar
com os membros presentes, o que possibilita a realidade de finitude antecipa-
da do grupo.
§ O membro do grupo com disponibilidade ingênua para vivenciar plenamente
suas experiências de perdas e finitude é capaz de processar e ressignificar tais
experiências em nível individual e grupal, processamento este que contribui
para os ritos de passagem necessários na evolução das etapas de um grupo e
sua transformação.
§ A interface dos aspectos do indivíduo e do grupo com o processo de perdas e
finitude possibilita o surgimento do novo. Um novo sentido à experiência vi-
vida, experiência esta ressignificada no processo de viver e conviver.

Perdas e finitude no grupo é um tema aqui abordado com o sentido de ressignifi-


car a sua compreensão, enquanto um acontecimento natural no processo de viver e convi-
ver. Ressignificar para possibilitar a transformação da experiência vivida por uma pessoa
enquanto indivíduo e enquanto participante de grupos, duradouros ou finitos, que co-
existem na sua vida.

2 FASES NA VIDA DE UM GRUPO

De acordo com Moscovici (1980), os acontecimentos da vida grupal têm intrigado


estudiosos como Mills (1967), Bennis e Shepard (1961), Lundgren (1972) e Schutz
(1955) na busca de compreender, relacionar e prever o modo de funcionamento dos gru-
pos. A autora considera irrelevante e ingênuo pensar que a formulação de um modelo de
funcionamento de grupo pode abranger toda a complexidade que envolve um grupo hu-
mano; entretanto, reconhece a necessidade de estudos continuados para a sua compreen-
são.

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 3


A dependência e a interdependência são dimensões das relações intragupais apon-
tadas como presentes no desenvolvimento do grupo.
Lundgren (1972), estudando o desenvolvimento de grupos de treinamento, apre-
sentou cinco estágios de desenvolvimento grupal: o encontro inicial; a confrontação do
coordenador; a solidariedade grupal; o intercâmbio de feedback interpessoal; e a termina-
ção. Destes, interessa-nos apresentar este último, a terminação, objetivando compreender
o processo de perdas e finitude do grupo. Neste estágio final de desenvolvimento do gru-
po, a interação apresenta alta proporção de referências e feedback positivos, com a com-
pensação de mágoas e ressentimentos, e com a expressão de solidariedade entre os mem-
bros. As preocupações estão mais voltadas para a dissolução do grupo, bem como para
com o retorno ao ambiente original e com a transferência das aprendizagens consolida-
das.
Schutz (1958) apresenta a elaboração de três zonas de necessidades interpessoais
existentes nos grupos, as quais se caracterizam como fases, dinâmicas e não lineares, de
desenvolvimento grupal, são elas:
§ Fase de inclusão: na qual o grupo se estrutura de forma ativa e experimental.
Cada membro encontra o seu lugar, os seus limites de participação e o seu pa-
pel.
§ Fase de controle: são determinadas as relações de poder no grupo, a distribui-
ção e o controle das atividades. As normas de conduta no grupo são estabele-
cidas de modo influente e com responsabilidade.
§ Fase de afeição: é quando se dá a busca pela expressão e integração emocio-
nal. São estabelecidos os intercâmbios e os limites quanto à intensidade e qua-
lidade das trocas afetivas. O clima emocional oscila entre extremos de amor e
desafeto.

“Em grupos de treinamento observa-se uma inversão do ciclo nas últimas sessões,
passando de afeição para controle, e inclusão como etapa final de despedida” (Moscovici,
1980, p. 61).
Yalon (1975, apud Hansen, Warner e Smith, 1980) cita três tipos de término de
grupo:
§ Término do cliente mal sucedido: caracterizado pela desistência do membro
individual à participação no grupo. É comum na fase de inclusão ou no início
do grupo e não deve ser atribuída falha ao facilitador do grupo.
§ Término do cliente bem sucedido: Uma característica funcional do indivíduo
que pretende sair do grupo é a sua capacidade de se envolver e de envolver os
membros do grupo de forma clara e significativa em sua decisão. Ele procura
discutir as razões, o momento para a resolução e escuta os participantes de
forma ativa. Através da reflexão sobre o “objetivo ou finalidade da saída do
membro”, é possível discutir os sentimentos não resolvidos entre os membros
remanescentes. Discutindo abertamente, o grupo trabalha seus conceitos de
perda.
§ Término do grupo inteiro: O facilitador e os membros devem promover dis-
cussões para falar sobre seu término. Se houver progresso, haverá diversos ní-
veis de acordos de prontidão. Nem todos os indivíduos alcançarão insight de
forma igual, pois cada qual tem seu processo pessoal no grupo. Os membros
devem discutir seus medos e dores, considerando a perda do grupo, a qual fre-
qüentemente conduz ao compartilhar de experiências do que foi ganho no de-

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 4


correr da aprendizagem em comum. O facilitador deve estimular o comparti-
lhamento de sentimentos de separação.

Próximo ao fim do grupo, os membros antecipam a perda e sentem a necessidade


de abertura. Segundo Moscovici (1980), o Institute for Applied Behavioral Science
(NTL) aponta como uma das dimensões fundamentais representativas do processo de
crescimento grupal a habilidade do grupo para criar novas funções e grupos quando ne-
cessário para terminar sua existência se e quando necessário.
A partir destas considerações teóricas iniciais, embasamos as hipóteses apresenta-
das neste estudo.

3 CAMINHOS PARA O PROCESSAR DA FINITUDE

Assim como preconizam os contos de fada, a história natural ou esperada de um


grupo humano que inicia é a de que ele percorra uma trajetória com princípio, meio e fim.
A finitude desejada é aquela que encerra a história com um final lógico e que fe-
cha a narrativa desenvolvida com coerência de fatos, encerrada, preferencialmente, com
acontecimentos felizes. Um dos primeiros aspectos a destacar na história de nosso grupo
foi a presença fatídica do fantasma da provável antecipação de uma “morte anunciada”,
no início de seu caminhar. Seria possível lidar e aceitar a morte no começo da caminhada
de grupo?
Tendo como base a literatura e a vivência grupal, apresentamos aqui algumas es-
tratégias como contribuição de caminho possível para o processamento das experiências
de perdas e finitude de um grupo.
Tais estratégias se relacionam com o desenvolvimento do grupo aceitando a morte
como parte integrante do viver; sentindo e não racionalizando; reconciliando-se com si-
tuações não resolvidas; falando continuamente acerca das perdas vividas; recapitulando e
ressignificando a história de elaboração psicológica de lutos e perdas; entendendo as par-
tes envolvidas no processo; construindo e vivenciando os ritos de passagem individual-
mente e no grupo; e conhecendo as principais reações G (do Grupo). Passamos, então, a
descrever cada estratégia elencada.

3.1 Aceitar a morte como parte integrante do viver

Diversos autores descreveram a trajetória histórica de como o ser humano viven-


cia a morte e o morrer. Sabe-se que tempos atrás a morte era tida como parte integrante
do viver. Pessoas de todas as idades presenciavam tal episódio sem estranheza. Depois,
ao longo do tempo, o corpo morto foi se tornando algo profundamente incômodo em fun-
ção da possibilidade de trazer à consciência a idéia da própria finitude, tornando-se, por-
tanto, passível de ocultação (Carvalho, 1996).
A morte pode ser lembrada, no processo de perda e finitude, como um episódio
cujo sentimento que aflora é o medo oriundo da surpresa e da incerteza.
A possibilidade da morte está presente a todo o momento da vida
e esta consciência tem um poder transformador no que diz respei-
to ao tipo de relação que estabeleceremos com o viver. Se estabe-

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 5


lecermos contato com a idéia de nossa própria finitude dificilmen-
te deixaremos de viver um processo de ressignificar a vida e aí
transformarmos nossa relação com o viver, dando, geralmente,
uma nova qualidade a esse ato (Carvalho, 1996, p. 39).
Outros autores, Giusti (1987), Gray (2000), Kübler-Ross (1998), Kübler-Ross
(2005), Viorst (2003), também corroboram a tese de que os indivíduos como pacientes e
participantes de grupo, bem como os facilitadores de grupo e profissionais das áreas hu-
manas que aceitam sua própria mortalidade e procuram aprender a lidar com ela, podem
falar do assunto de forma tranqüila, não havendo uma projeção mútua de medos, ansie-
dades e inseguranças.

3.2 Sentir e não racionalizar

Sentir e não racionalizar é um segundo comportamento identificado pelos mem-


bros de nosso grupo, no decorrer dos encontros. A literatura reforça que comportamentos
eficazes no enfrentamento de situações de vida surgem do processamento daquelas situa-
ções vivenciadas de modo não racionalizado, mas sentido. A consciência emocional favo-
rece a compreensão da situação e os sentimentos aflorados e vivenciados propiciam que a
pessoa tome contato consigo mesma, perceba-se como um indivíduo participante do cole-
tivo e que, portanto, age como autor e ator de uma história em construção permanente.
O medo de expressar as emoções é o medo de fazer contato consigo mesmo e de
despertar as sensações de dor, raiva e/ou pesar decorrentes desta emoção, conforme Gius-
ti (1987), Gray (2000), Kübler-Ross (1998, 2005) e Viorst (2003). Tais sensações podem
se apresentar de modo latente, mas não inexistentes, porém, por vezes não afloradas. En-
tretanto, este contato abre espaço para viver o momento plenamente, elaborar e ressigni-
ficar os sentimentos, e transformar o agir dando um novo sentido à experiência vivida.
Findar um grupo é como colocar o ponto final numa história, sem fechar para a
possibilidade de transcendência com outra história. A etapa de fechamento do grupo é o
momento de, por meio de atitudes, pôr em prática o aprendizado desenvolvido nas diver-
sas fases do grupo. O indivíduo leva consigo a história construída no grupo finito, mas
não leva o grupo. Porém, ele pode se “utilizar” desta história para viver outras, em outros
grupos. Desse modo, o próximo capítulo da história poderá ser construído a partir da res-
significação das experiências vividas no grupo.
Os momentos de perdas e finitude de um grupo que finda podem se apresentar de
modo conflitante, solitário e difícil.
O término de um grupo finito é contratado, entretanto, o enlutamento pelas perdas
ocorridas, desistências de membros, presenças “ausentes”, logo na fase de inclusão, m i-
plicam em disponibilidade para sentir, expor, interagir, co-responsabilizar, permitir.

3.3 Reconciliar-se com situações não resolvidas

Além do medo, o findar de um grupo poderá despertar em seus participantes a ne-


cessidade de reconciliação com situações não resolvidas e desentendimentos. Tal neces-
sidade vem ao encontro da possibilidade de enlutamentos menos dolorosos ou mais sau-
dáveis.

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As situações de perdas e finitude servem como estímulos de auto-avaliação e fe-
edback de comportamentos não elaborados, desencadeadores de sentimentos e ações que
oportunizam o ressignificar da própria existência, dos valores, das crenças, enfim, daqui-
lo que norteia o viver do indivíduo e do grupo.
Gray (2000), descrevendo sobre o processo de cura do coração, durante o período
de luto, revela que a elaboração e a reconciliação com as situações não resolvidas só será
completa se as quatro emoções primárias forem exploradas e elaboradas pelo ni dividuo.
Além do medo, portanto, o trabalho completo de elaboração do luto implica inventariar a
raiva, a tristeza e o pesar.
Apesar de nossa tristeza, um membro precisou optar pela desistência de nosso
grupo em função de doença terminal de um ente querido seu muito próximo. Alguns me-
ses depois, tivemos a experiência de reconciliação e de resgate desta perda, quando deci-
dimos juntos participar do funeral deste ente familiar, oferecendo nosso apoio ao ex-
membro do grupo.

3.4 Falar continuamente sobre as perdas vividas

Trocar idéias sobre o assunto perdas e morte deve ser uma vivência contínua para
o indivíduo e para o grupo, de acordo com Kübler-Ross (1998, 2005), Imber-Black
(1995) e Walsh e Mcgoldrick (1998). Em geral, estes temas são ventilados apenas quando
há uma eminência, como por motivo de acidente, doença terminal e outros de impacto
semelhante, como a proximidade do fim do grupo.
Numa situação de jornal, quando nosso grupo pôde oferecer seu apoio a um outro
membro do grupo que perdeu um familiar, foi possível ouvir de muitos participantes suas
vivências pessoais sobre a morte e o morrer, contribuindo para uma visão conceitual,
manifestada e sentida, da finitude para o membro e também para o grupo.

3.5 Recapitular e ressignificar a história de elaboração psicológica


de lutos e perdas

O processo de elaboração da perda, da morte, do luto é permeado pelo acúmulo de


percepções de nossas histórias de elaboração psicológica de perdas, mortes e lutos.
Conforme Parkes (1998), Kübler-Ross (2005), Imber-Black (1995), Walsh e Mc-
goldrick (1998), se costumamos reagir às perdas com um processo de aceitação, ao invés
de negação e revolta, naturais na fase inicial do luto, e buscamos um fechamento criativo
do período de lamentação, na fase final do luto, a tendência é vermos e agirmos assim nas
diversas situações de finitude.
Num exercício de dinâmica de grupo proposto no sentido de focalizar o tema das
ausências de participantes no grupo, a consigna declarava a ausência de personagens que
antes participavam ativamente da tarefa. No processamento desta dinâmica, o grupo pôde
recapitular e ressignificar, dando um sentido coletivo à importância da presença de cada
membro na construção do processo de aprendizagem emocional e cognitiva do grupo.
Desta forma, foi evidenciado um novo momento na recapitulação da história psicológica
de elaboração da ameaça da finitude, posto que alguns membros declararam suas razões
de estarem ausentes, permitindo ao grupo refletir sobre o tema.

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3.6 Entender as partes envolvidas no processo

No grupo, as duas partes envolvidas – facilitador e membros do grupo – são im-


portantes no processo de finitude do grupo, embora, no modelo andragógico, o segundo
elemento – os membros – tenha maior ascendência neste processo, aumentando sua res-
ponsabilidade pelo processo, à medida que evolui em suas fases de desenvolvimento. De
acordo com Hansen, Warner e Smith (1980), próximo ao fim do grupo, os membros ante-
cipam a perda e sentem a necessidade de abertura. Eles fazem várias tentativas para negar
o total impacto de sua separação.
À medida que os membros se aproximam dos últimos encontros, eles gastam al-
gum esforço gerando novas interpretações para seus problemas. Enquanto não existe ne-
nhum evento bem sucedido, eles duelam algumas falhas do grupo. Alguém procura
estreitar um relacionamento íntimo com o facilitador. Há uma pressão para o facilitador
assegurar e afirmar a extraordinária qualidade do grupo e dar suas “bênçãos” ao grupo.
Algumas frustrações, inseguranças e raivas podem emergir antes do término. Pode
ser que estes sentimentos não tenham sido expressos e revelados no decorrer dos encon-
tros. Então, o ressurgimento da ansiedade e da hostilidade serve como um devir distan-
ciador preparatório da separação. Os membros freqüentemente expressam primeiro os
seus sentimentos negativos sobre os outros e, depois, conseguem expressar seus senti-
mentos positivos. Os membros insistem que o grupo “nunca terá um fim” porque cada
pessoa “carregará o grupo dentro dela”. Cada membro fala de seus ganhos pessoais signi-
ficativos, de seus papéis no grupo, buscando confirmações entre os outros de suas opi-
niões, tanto quanto agradece e expressa suas contribuições mutuamente.

3.7 Construir e vivenciar ritos de passagem individualmente e em grupo

O processo de ressignificação, de transformar sentidos, é construído na vida e em


cada dinâmica de grupo proposta. Como os indivíduos e o grupo desenvolvem este pro-
cesso?
Imber-Black (1995), Friedman (1995) e Van Gennep (1977) com suas perspecti-
vas antropológicas indicam a importância fundamental dos ritos de passagem na elabora-
ção da finitude vivida pelos grupos humanos. As funções dos rituais que Imber-Black
(1995) lista em relação à família, se aplicam aos diversos grupos. São elas: tornar mane-
jável a mudança, na medida em que os membros a experienciam como parte de seus sis-
temas, e não como ameaça a ele; contribuir para a “identidade” do grupo, para o seu sen-
so de si mesmo através do tempo, facilitando a elaboração de papéis, fronteiras e regras,
tornando possível um senso de eu e um senso de ser parte de um grupo; ajudar na resolu-
ção do conflito, considerando que as contradições podem ser resolvidas, conforme os
rituais incorporem elementos contraditórios; uma vez que o evento ritual é limitado em
tempo e espaço, cria-se um contexto seguro e manejável para a expressão de fortes emo-
ções; os rituais também assinalam transições normativas de ciclo de vida e funcionam,
em muitos níveis, possibilitando a mudança individual, a mudança no relacionamento, a
mudança no grupo e a mudança na comunidade; podem funcionar para conectar um gru-
po com gerações anteriores, proporcionando um senso de história e enraizamento, ao
mesmo tempo em que implicam futuros relacionamentos.

SBDG – Caderno 84 v Da morte anunciada à imortalidade da relação... 8


O desempenho e a participação em rituais unem o grupo à comunidade mais am-
pla, por meio da repetição de ritos culturais e podem funcionar para evitar um isolamento
disfuncional, especialmente crucial em momentos de tristeza e perda.
Conforme a autora, os rituais terapêuticos, construídos e vivenciados pelo indiví-
duo e pelo grupo, pretendem atingir os níveis comportamental, cognitivo e afetivo. Espe-
ra-se que o grupo e o indivíduo improvisem, de modo a adequar o ritual a circunstâncias
particulares e pessoais. A eficácia destes rituais decorre da utilização de símbolos e ações
simbólicas que podem ter múltiplos significados. Portanto, ao planejá-los devem-se des-
cobrir os símbolos que são apropriados, aqueles que representam a possibilidade de novas
opções de relacionamento e que possuem familiaridade suficiente para não serem total-
mente estranhos, podendo destacar semelhanças com outros rituais culturais, ao mesmo
tempo em que os rituais devem incluir elementos incomuns, capazes de afirmar diferen-
ças em vez de escondê-las.
Os rituais terapêuticos curativos devem começar com uma afirmação da tristeza, e
depois conduzir a um processo gradual de deixar os sentimentos dolorosos para trás, res-
peitando o ritmo do indivíduo e do grupo. A ação simbólica nos rituais terapêuticos cura-
tivos freqüentemente espelha o que acontece nos rituais normativos curativos, tais como
queimar e enterrar, sendo seguidos por rituais de celebração.
No início do caminhar de nosso grupo, quando a ameaça de finitude estava emi-
nente, houve uma proposta de coordenação que propôs um pacto entre todos os membros,
no sentido de permanecermos juntos até o final da formação. Os símbolos utilizados para
selar o contrato psicológico coletivo foram a declaração verbal do sim e o recebimento de
uma rosa vermelha, que na nossa cultura estão ligados à celebração de vínculos afetivos
nobres e duradouros.
Friedman (1995) expressa que a cerimônia não é o rito de passagem. A passagem
muitas vezes começa meses antes e termina meses depois da cerimônia. De um ponto de
vista de sistemas emocionais, elas não são eficazes em si mesmas. Pelo contrário, seu
efeito é determinado por aquilo que já vinha se desenvolvendo dentro do sistema emo-
cional historicamente. Entretanto, as cerimônias realmente focam os eventos, no sentido
de que põem os membros de um grupo num contato consciente uns com os outros, e no
sentido de que levam os processos a um ponto culminante. A tese do autor reforça a im-
portância da atenção à trajetória histórica do grupo em relação à elaboração de suas per-
das passadas para a compreensão dos processos de luto presentes.
No nosso grupo, um membro ofereceu sua casa para a celebração de uma festa,
alusiva ao final do segundo módulo da formação e houve uma participação expressiva do
grupo naquele momento em que (nossa hipótese) parecia haver um compromisso maior
do grupo com as presenças nos encontros e, por conseguinte, com os vínculos emocionais
construídos. Numa outra oportunidade de celebração, contudo, apesar das combinações
prévias, o grupo mostrou-se desmobilizado para participar da festa, optando por não rea-
lizá-la, o que, nossa hipótese, denunciava que a ausência recorrente de alguns membros
nos encontros antecedentes não favorecia o clima de celebração.
Van Gennep (1977) oferece um panorama dos ritos de passagem nas diversas cul-
turas, classificando-os e revelando especialmente a importância dos ritos funerários, que
lidam com as perdas e lutos dos grupos. Ele reforça que a etapa final formal de muitos
rituais funerários envolve a reincorporação dos sobreviventes na comunidade, por meio
de visitas ou refeições e enfatiza a importância de que a finalização do ritual funerário ou
de separação seja feita com uma celebração da vida.

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Numa dinâmica proposta de “colocar e de tirar debaixo do tapete” todos os temas
pendentes que o grupo gostaria de refletir ou de oferecer um feedback para um ou vários
participantes ou para todo o grupo, foi realizada a primeira parte de um rito de passagem
de finitude, ao qual objetivava “enterrar” os problemas pendentes.
Outras propostas semelhantes foram feitas com consignas que visavam uma revi-
são da história grupal com colagem de gravuras e outras com feedback verbal e escrito,
com a utilização de outros símbolos, como uma vela acesa. Destacamos, especialmente, a
proposta de um membro de recapitular a história do grupo, enviando diariamente para o
endereço eletrônico (e-mail/site) do grupo seu álbum de fotos digitalizadas, no mês ante-
cedente à formatura. Este ritual cotidiano de receber o registro das imagens vivenciadas
nas dinâmicas de grupo, nossa hipótese, favoreceu a elaboração da finitude de forma in-
dividual e coletiva, preparando todos para a cerimônia oficial de encerramento.
Em outro momento, numa dinâmica de confeitar coletivamente o bolo do grupo,
foi estabelecido o segundo passo da finitude proposta por Van Gennep (1977), qual seja,
de celebrar a vida e a continuidade de aprendizagens grupal, independente da existência
formal do grupo até então constituído.

3.8 Conhecer as principais reações G (do grupo)

Castilhos (1998) enriquece a reflexão sobre formas de lidar com a finitude men-
cionando a importância do facilitador e do grupo conhecerem suas principais Reações G
– do grupo– que são formas de defesa que o grupo possui na tentativa de manter sua ho-
mogeneidade, visando à preservação e à consecução de seus objetivos.
Dentre as Reações-G mais comuns na fase terminal que encontramos no nosso
grupo, reunimos dois conjuntos característicos por suas complementaridades, conforme o
que segue:

1. Ressonância, apoio, permissividade, espelho e acordo


A ressonância demonstra o quanto a resposta dos indivíduos no grupo, em uma si-
tuação qualquer, dependerá dos seus diferentes níveis de processo de maturação. O apoio
do grupo é o reflexo da necessidade real de se ajudar o outro, de se criar um elo dentro do
grupo, ou seja, a busca da integração e da coesão grupal, da necessidade de ter realmente
dentro do grupo, aqueles indivíduos, de criar um sentimento de pertencer a.
Ao colocar-se em sua pequenez humana, o participante do grupo percebe que tais
experiências, sentimentos e emoções são, na maioria das vezes, não só compartilhados
como vividos pelo restante do grupo, ou pelo menos por alguns deles. A permissividade
oferece a oportunidade de o indivíduo realisticamente viver o seu aqui e agora, com plena
consciência de suas responsabilidades, de seus limites e respeitando o limite do outro. A
consciência de ser aceito e compreendido e de aceitar e de compreender as demais pes-
soas leva o indivíduo e o grupo paulatinamente a aprender, a falar e a ouvir empaticamen-
te, de tal sorte que permite a ajuda, pacientemente, a aqueles que ainda não sabem falar a
se expressarem com maior desenvoltura e naturalidade. O indivíduo reflete no grupo a
sua própria imagem, e este devolve ao participante os seus diferentes aspectos, propician-
do-lhe a análise de algumas facetas nunca vistas por ele, ajudando-o a organizar ou reor-
ganizar certos aspectos pessoais.

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Durante a vida do grupo, encontramos Reações-G de ressonância, apoio e permis-
sividade. Especialmente na última fase do grupo, ouvimos muitos membros verbalizarem
sua aceitação do limite de participação do outro, referindo que o envolvimento de cada
qual era diretamente proporcional à sua maturidade, manifesta em escolhas, em compro-
misso com o grupo e com as situações particulares de vida experenciadas individualmen-
te.
O acordo é uma das primeiras Reações-G dentro de um grupo e consiste na nego-
ciação de expectativas. Quando há uma ruptura de algum lado nas expectativas partilha-
das haverá um desequilíbrio nas relações interpessoais e o grupo pressionará o indivíduo
para voltar para aquele nível de expectativas, ou seja, de reassumir o compromisso de
manter as coisas como “deveriam ser”. A falta de foco de imagens e a ruptura nas expec-
tativas compartilhadas criam um grau de incerteza nas relações, ocasionando ansiedade
no grupo, levando, por conseguinte, à necessidade de um novo acordo para o estabeleci-
mento de novas expectativas e imagens. Se a negociação se estabelece antes da ruptura
das expectativas, em um período de estabilidade e de produtividade do grupo, quando
ocorre uma tensão ou inquietação no relacionamento do grupo, há uma grande chance de
se obter um relacionamento franco, aberto, produtivo e mais duradouro. Entretanto, se a
ruptura das expectativas e imagens se dá quando o nível de tensão já está em área de satu-
ração e a incerteza das relações se faz de forma acentuada, haverá certamente um relacio-
namento fechado e pouco produtivo.
Observamos na trajetória de nosso grupo que os acordos ocorreram durante todo o
processo de formação, com a hipótese de que os acordos tácitos foram mais freqüentes do
que as outras modalidades de acordo, havendo poucos registros de discussões polarizadas
e conflituosas ao extremo.
Nosso grupo manifestou grande sensibilidade quanto ao fenômeno do espelho, re-
velando em muitos processamentos descobertas quanto ao funcionamento individual e
coletivo. A necessidade de compartilhamento e de troca de experiências era tão presente
nas reflexões que uma consigna proposta no sentido de usar máscaras que despersonali-
zavam as faces dos membros gerou muita inquietude e ansiedade entre a maioria do gru-
po, que declarou preferir falar abertamente das questões incômodas.

2. Mecanismos de defesa, teorização, coalizões, fragmentação, saturação, saí-


da de um participante e desintegração
Os mecanismos de defesa funcionam como um radar que alerta e detecta a longa
distância as situações que pareçam ameaçadoras aos padrões estabelecidos pelo grupo. O
uso deles será tanto mais intenso quanto mais freqüente for a ameaça sentida pelo indiví-
duo. Como exemplos: profundos silêncios, “dar o branco”, conversas repetitivas e emis-
são de opiniões evasivas, do tipo “nada tenho a dizer”.
A teorização indica falas e percepções desprovidas de conexão com os próprios
sentimentos, as chamadas racionalizações, e revelam que quando um grupo é profunda-
mente teórico e racional é necessário averiguar o que realmente está ocasionando esse
comportamento.
Nossa hipótese é de que a predominância da teorização apresentou-se como me-
canismo de defesa de alguns membros de nosso grupo, especialmente nos últimos encon-
tros. Estas racionalizações estavam a serviço do não aprofundamento psicológico da frus-
tração da expectativa de não reconhecer o comprometimento físico e emocional mais
íntimo de certos membros no grupo, amenizando o sentimento de finitude de alguns.

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As coalizões são movimentos internos no grupo, onde um conjunto de pessoas,
voluntárias ou não, conscientemente ou não, se articula em função de um objetivo co-
mum e de modo ordenado. Tais coalizões desaparecem quando se atinge o objetivo e já
não há um interesse comum. Quando um grupo está insatisfeito com o desempenho do
facilitador é comum o seu aparecimento, como forma de expressão da insatisfação do
grupo. Assim, é importante distinguir esse fenômeno da questão transferencial.
Não observamos esta Reação-G nas dinâmicas em nosso grupo, mas a citamos
como hipótese de fenômeno existente nos subgrupos. Algumas vezes, pares de indivíduos
pertencentes ao subgrupo refletiam sobre suas insatisfações e sobre suas inquietudes nos
momentos grupais, revelando suas perdas no exercício de subgrupo.
A fragmentação e a saturação são fenômenos que surgem quando o grupo já não
busca os mesmos objetivos e os membros do grupo se vêem como uma série de indiví-
duos, mas não como uma unidade. A fragmentação pode ser um mecanismo de defesa
suicida do grupo porque pode levar o grupo à sua desintegração e se faz freqüente em
períodos próximos ao término do grupo, e no qual o medo proveniente da perda é masca-
rado com comportamentos de indiferença, de desinteresse ou de agressão. Atitudes agres-
sivas, de descaso ou de desqualificação do grupo ou do facilitador são presentes neste
momento, mas isso de modo inconsciente, para evitar a dor da separação, do afastamento,
do saber-se agora só assumindo-se sem a certeza de ter sempre aqueles com quem tanto
conviveu, deu e recebeu. Nos últimos encontros, o grupo se mostra desmotivado, desinte-
ressado, as pessoas tendem a deixar de se colocar e entram em seus casulos evitando a
exposição individual com medo do sentimento de ameaça pela afetividade ou pela depen-
dência. Às vezes, a intensidade das atitudes muito hostis é dirigida à figura do facilitador.
Essas reações só aparecem em grupos de duração longa, não se observando tal fenômeno
em grupos breves, onde, aliás, a reação tende a ser inversa, de muita afetividade, coesão e
integração do grupo.
A saturação, por sua vez, aparece numa sensação de ineficácia do grupo, que per-
de o seu poder de valência para o indivíduo. As situações tornam-se repetitivas, a resis-
tência torna-se cada vez maior, o envolvimento emocional vai pouco a pouco decaindo e
o grupo carecendo de interesse para os seus membros. O facilitador do grupo deve estar
atento às suas próprias dificuldades pessoais na fase de término do grupo e observar se o
grupo fica rodando em círculo sem nenhuma produtividade, correndo o risco da evasão
de seus membros. A saturação está muito ligada ao fenômeno da resistência do grupo.
A desintegração consiste não no seu fracionamento, mas na real desintegração,
chegando a sua morte como encerramento. Os motivos que podem levar a esse fenômeno
são muitos variados. Normalmente, a reação do grupo quando está já próximo do seu fim,
quatro a três meses antes do seu término o número de participantes passa a decair em
produção e freqüência, quase que forçando o grupo a terminar antes do seu tempo previs-
to. Essa é uma forma de defesa grupal para evitar a dor da separação. Ou ainda, eleva-se
tanto o nível de agressividade dentro do grupo que eclodem reações em cadeia e de con-
densador de queixas, desconfianças, mágoas e etc., provocando-se situações insustentá-
veis com a saída total ou parcial de um ou de alguns elementos.
Com certeza, as Reações-G citadas da saturação e da fragmentação foram as mais
consistentemente observadas em nosso grupo, especialmente nos últimos encontros, com
a ausência, consciente ou não, de muitos membros, por diversos motivos alegados. Con-
tudo, não observamos o movimento de evasão a ponto de uma desintegração, conforme
conceituada por Castilhos (1998), havendo sempre alguns membros referendando a pos-
sibilidade de sermos poucos membros presentes, mas convictos do sentimento de perti-

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nência ao grupo. Esta participação manifesta no compromisso de estar presente até o fim,
parece-nos indicar que o grupo escolheu a identificação como fenômeno preponderante
para aceitar e elaborar sua finitude.
Por fim, gostaríamos de refletir sobre a saída de um participante do grupo, que
pode fazer surgir fortes sentimentos de perda ligados a figuras representativas do passado
para o indivíduo. Neste sentido, o facilitador deve estar atento para aproveitar os encon-
tros finais e explorar esses sentimentos. Se o grupo é pequeno, a saída ou morte de um
dos seus elementos poderá trazer sérios sentimentos de ameaça de extinção.
Também, como apresentado nas hipóteses norteadoras deste ensaio, a saída de
participantes do grupo foi uma ameaça constante no grupo, ao qual no leva a hipótese que
este fenômeno possibilitou a coordenação de algumas dinâmicas que buscavam a confir-
mação constante do pacto e da aliança do grupo para a sua manutenção e coesão.
Além das Reações-G, Castilhos (1998) cita o fenômeno do “silêncio de adeus”,
que sempre está impregnado de muitos sentimentos ao mesmo tempo, tais como a sauda-
de, o amor, a ternura, o medo, o afeto e outros. Também está relacionado com a perda
definitiva ou temporária de alguém. É um silêncio muito profundo, podendo ser muito
suave. Está quase sempre presente quando da saída de alguém do grupo e/ou ao término
de um grupo. Este aspecto também foi observado em nosso grupo, mas em proporção
pequena.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As percepções individuais dos membros do grupo sobre o processo de elaboração


de perdas juntamente com a percepção do grupo, percebida na retrospectiva dos proces-
samentos das dinâmicas dos encontros com as respectivas hipóteses formuladas pelo gru-
po, nos ofereceram, neste ensaio, os ingredientes necessários para uma compreensão de
como o grupo lida com seu processo de perdas e finitude.
Esperamos que os vários caminhos citados, assim como a tentativa de reconstru-
ção da trajetória da história de um grupo finito, possam contribuir no sentido de ajudar
futuros facilitadores e membros de grupos a reconhecerem e elaborarem de forma mais
funcional seus processos de perdas e finitude. Este processo aponta para a possibilidade
de imortalidade da relação construída no grupo com um novo sentido à experiência vivi-
da, experiência esta ressignificada no processo de viver e conviver.

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Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Florianópolis – SC
Coordenação: Emiliana Simas C. da Silva, João Carlos V. Machado

Dinâmica de Grupo: um instrumento


de desenvolvimento para a preparação
do jovem para o mercado de trabalho

ANAMÁLIA THORSTENBERG RIBAS


CLAUDIA RITA F. J. SOUTO PETRUS
SONIA APARECIDA DE OLIVEIRA BALSTER
VANUSA SOUZA CARDOSO

Resumo: Este trabalho constitui-se na proposição de uma estrutura de programa para


preparação de jovens para o mercado de trabalho, utilizando-se do referencial teórico e
prático apresentado no curso de formação em dinâmica dos grupos segundo a metodolo-
gia da SBDG. Este é um projeto teórico que tem como objetivo ser colocado em prática
com jovens do último ano de graduação, na busca de melhor prepará-los para a participa-
ção em processos seletivos do primeiro emprego. A proposta estrutura-se sobre as seguin-
tes etapas: desenvolvimento de competências intrapessoais, desenvolvimento de compe-
tências interpessoais, entendimento das etapas e objetivos de um processo de recrutamen-
to e seleção e finalmente, a reflexão e motivação para a busca de oportunidades no mer-
cado de trabalho.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 1


1 INTRODUÇÃO

A entrada, ou o reposicionamento no mercado de trabalho após a realização do


curso superior, é um momento muito importante na vida do jovem. Momento este que
traz consigo muita ansiedade, pressões pessoais e da família e expectativas de construção
de uma nova etapa da vida, com mais independência e autonomia para seguir seu próprio
caminho.
Entre a conclusão do curso, e a obtenção de uma nova oportunidade profissional,
existe uma etapa a ser vencida que é o processo de recrutamento e seleção. Este processo
é utilizado pelas organizações como forma de chamar e escolher aqueles que melhor se
encaixam no perfil de uma vaga.
A motivação para o desenvolvimento deste estudo nasceu da percepção das auto-
ras, através de suas experiências cotidianas em atividades de recrutamento e seleção de
jovens, de como estes chegam, em sua maioria, despreparados, ansiosos, frágeis e princi-
palmente sem a noção de suas potencialidades e de qual rumo querem dar à sua carreira.
Normalmente não se percebem de que a eles também cabem escolhas: “Qual ramo de
atividade mais me atrai? O que gosto de fazer? Que tipo de organização? Que empresa
mais se adequa ao meu estilo?”
Sabe-se que o mercado de trabalho é muitíssimo disputado e que as oportunidades
são limitadas, mas mesmo assim, as autoras acreditam ser fundamental a reflexão por
parte dos candidatos, sobre que direcionamento dar à sua carreira.

2 OBJETIVO

O objetivo deste estudo é propor uma estrutura de programa voltado para auxiliar
jovens, em seu último ano de graduação, a preparar-se para a participação em processos
de recrutamento e seleção visando conquistar uma nova, ou melhor oportunidade no mer-
cado de trabalho. Busca-se, por meio deste programa, o desenvolvimento de uma percep-
ção mais apurada de suas potencialidades, trabalhar questões intra e interpessoais que
potencializarão suas chances de ser bem, ou melhor sucedidos em processos de recruta-
mento e seleção. Obviamente não é possível oferecer garantias, e este ponto será sempre
explicitado quando se fizer o contrato com o grupo!
Todo o programa será estruturado de acordo com os conceitos teóricos e técnicos
da dinâmica de grupo.
Espera-se, como resultado da aplicação prática deste modelo, que os jovens alcan-
cem um maior entendimento de suas dinâmicas internas e de seu funcionamento em gru-
po. E também por terem conhecimento das etapas, processos e instrumentos utilizados em
processos de recrutamento e seleção, possam: escolherem de forma mais focada os pro-
cessos em que participarão, mostrarem com mais segurança seus talentos e administrarem
melhor as frustrações advindas de resultados negativos – no caso de não serem seleciona-
dos.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 2


3 MERCADO DE TRABALHO: QUAL É A NOSSA ATUAL REALIDADE?

O desemprego tem sido um dos maiores problemas da sociedade contemporânea


e, por esta razão, um dos temas mais debatidos e analisados. Pochmann (1999) ressalta
que, em uma população economicamente ativa mundial estimada em três bilhões de pes-
soas, há cerca de um bilhão de trabalhadores vivendo com sua capacidade de trabalho
sub-utilizada, o que significa dizer que, em cada três trabalhadores no mundo, um se en-
contra na condição de desemprego ou de subemprego.
No Brasil, o desemprego vem crescendo de forma significativa, principalmente
nos últimos vinte anos. Segundo Pochmann (1999), as transformações ocorridas na eco-
nomia brasileira, a partir da segunda metade da década de 1980, têm gerado um desem-
prego sem precedentes na história do país.
Complementando, Mattoso (1997), afirma que, atualmente o desemprego apresen-
ta uma amplitude nacional e caracteriza-se pela sua extraordinária intensidade. Além dis-
so, seus índices não têm paralelo com outros momentos da história nacional.
Tal fenômeno é confirmado pelas duas agências brasileiras de pesquisa que são
responsáveis pelo acompanhamento sistemático do desemprego – de um lado, o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge), que realiza a Pesquisa Mensal de Emprego
(PME) e, de outro, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-
econômicos (Dieese) e a Fundação Sistema Nacional de Análise de Dados (Seade), que,
juntos, realizam a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED). Para a PED, são conside-
rados desempregados aqueles trabalhadores que estão na situação de desemprego aberto e
desemprego oculto pelo trabalho precário e pelo desalento.
De acordo com o dados divulgados no dia 14 de setembro de 2006 no Jornal Zero
Hora localizado na cidade de Porto Alegre, jovem de 16 a 24 anos representam 45% dos
desempregados do país. O brasileiro de 16 a 24 anos enfrenta dificuldades para conciliar
estudo e serviço, conforme levantamento do Dieese. De cada 4 pessoas que integram a
população economicamente ativa nas grandes cidades metropolitanas do país, 1 tem entre
16 a 24 anos de idade. Quando se considera apenas os desempregados, a proporção é
maior, num universo com 3,241 milhões de trabalhadores sem emprego com mais de 16
anos, 1,473 milhão estão na faixa etária entre 16 e 24 anos, o que corresponde a 45,5% do
total. Um número surpreendente.
A procura por trabalho tem atrapalhado, na maioria dos casos, o esforço para con-
tinuar os estudos. A proporção de jovens ocupados que apenas trabalhava foi maior que a
proporção dos que conseguiam conciliar as duas atividades. O rendimento recebido pelos
jovens que trabalham e estudam, oscila em média entre R$ 318, e R$ 573. Muitos estão
se sujeitando a jornadas de 42 a 44 horas por semana, “no limite da jornada máxima legal
no Brasil”, para conciliar estudo e trabalho.
Esta pesquisa recente só vem reforçar a necessidade de um acompanhamento do
jovem profissional, em início de carreira, pois demonstra como está no Brasil a dificulda-
de em estar inserido no mercado de trabalho e ao mesmo tempo estar se especializando
para este.
Pois quando um jovem precisa trabalhar e estudar, no Brasil, dificilmente será por
desejo próprio, mas sim por necessidade econômica, e é sabido que muitos destes jovens
não conseguem ter um bom aproveitamento/ rendimento de seus estudos, em função de
sua dupla jornada, visto que estão com tempo e energia divididos entre duas funções.
E é neste ambiente de poucas oportunidades e muita oferta de mão de obra que o
jovem egresso de cursos superiores se depara. Apesar deste mar de desalento, é preciso

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 3


reconhecer e acreditar que oportunidades existem! Para encontrá-las é necessário iniciati-
va, persistência, preparo e confiança em si mesmo.
A estrutura descrita no escopo deste artigo propõe-se preparar os jovens para en-
frentarem os desafios que o processo de busca por uma oportunidade no mercado de tra-
balho impõe.

4 ESTRUTURA DO PROGRAMA

O programa de desenvolvimento foi estruturado em quatro módulos, sendo utili-


zados os conhecimentos aprendidos no curso de formação em dinâmica de grupo e tam-
bém as experiências profissionais das autoras. Para cada módulo propõe-se uma carga
horária de 8 horas de trabalho, concluindo-se o programa com 32 horas no total.
Considerando diversos referenciais teóricos, o aprendizado construído durante o
curso de formação em dinâmica de grupo, bem como as experiências profissionais das
autoras, conclui-se que os processos de mudança no ser humano acontecem e precisam
ser trabalhados sempre “de dentro para fora”. Por esta razão o Módulo I foi desenvolvi-
do buscando-se trabalhar e vivenciar questões intrapessoais – Módulo I: Quem sou eu?
Auto-estima e formação da personalidade.
No módulo II o foco do trabalho volta-se para questões interpessoais: percepção,
comunicação, dar e receber feedbacks e trabalho em equipe.
No módulo III trata-se de explorar questões técnicas, no entanto essenciais, para a
formação do jovem, tais como: postura profissional, ética nas relações de trabalho, como
se apresentar em uma entrevista de seleção, como elaborar um currículo etc. Todas estas
temáticas serão desenvolvidas utilizando-se de dinâmicas de grupo.
No módulo IV, também se utilizando dinâmica de grupos, cada um dos partici-
pantes fará uma reflexão sobre sua trajetória até o momento, quais áreas se identifica e
perguntará a si mesmo que norte quer dar para sua carreira profissional. Estas reflexões
são importantíssimas para jovem pois: definem rumos para sua carreira profissional;
identificam em quais áreas gostariam de trabalhar e auxiliam a filtrar em quais processos
seletivos irão participar.
Este último módulo será finalizado com reflexões sobre o que é automotivação,
como lidar com as frustrações e os diversos percalços e desafios que o mercado de traba-
lho lhes impõe. Atividades com foco motivacional serão desenvolvidas buscando-se sen-
sibilizar e motivar os jovens para se lançarem na busca por uma oportunidade profissio-
nal que os aproximem de seus objetivos e sonhos.

5 DESCRIÇÃO DO PROGRAMA À LUZ DO REFENCIAL TEÓRICO

Por saber-se da grande responsabilidade e complexidade da proposição e aplica-


ção de um modelo como este, todos os cuidados éticos e técnicos relativos à atuação do
facilitador de grupo serão referenciados e a aplicação prática do mesmo se dará com su-
pervisão de um(a) didata.
De acordo com Cansian (2000), um coordenador de grupo precisa ser um facilita-
dor do processo de aprendizado e não um dificultador.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 4


A primeira recomendação para quem vai formar um grupo é a de que
tenha bastante claro o objetivo quanto ao que se pretende com esse gru-
po e como vai operacionalizá-lo. Quando isso não fica previamente es-
tabelecido, o grupo sofre as conseqüências. Então é comum acontecer
mal-entendidos e confusões que não permitem o desenvolvimento do
grupo (Cansian, 2000, p. 7).
Embora este programa tenha algumas temáticas estruturadas de acordo com o ob-
jetivo, o olhar para o grupo respeitará as fases do grupo, ou seja, as necessidades inter-
pessoais apresentadas por Shultz (1978) que são inclusão, controle e afeição. Abaixo re-
sumidamente apresenta-se o significado de cada fase:
• Inclusão: É vista como a necessidade de se sentir aceito, valorizado e considera-
do pelas pessoas que compõem o grupo. Um membro é capaz de perceber-se re-
almente aceito quando consegue participar de todas as fases do grupo. Ser uma
pessoa sub-social é ter pouca inclusão, ser super-social é quando as pessoas têm
tendências à extroversão, contato, necessariamente precisa de companhia, não su-
porta ficar sozinho. Ser sociável é quando a pessoa consegue interagir com as pes-
soas, sente-se bem com ou sem as pessoas. “O problema de inclusão é estar dentro
ou fora, a interação concentra-se no encontro, e seu aspecto físico é a energia”, p.
52.
O coordenador deve estar atendo e oferecer condições para que cada pessoa co-
nheça os demais e se deixe conhecer, estabelecendo características particulares
para cada pessoa e que encontre o seu lugar no grupo.
• Controle: Nesta fase predominam questões voltadas para o compartilhar respon-
sabilidades e a distribuição de poder. O controle manifesta-se pelo comportamen-
to daqueles que procuram controlar, refere-se a relações de poder, em vez de bus-
car proximidade emocional, difere do comportamento de afeição. “Se procuro in-
clusão ou proeminência (elevação) quero participar da argumentação, se procuro
controle, quero ser o vencedor ou estar do mesmo lado do vencedor”, p. 53.
• Afeição: O comportamento de afeição refere-se a emoções íntimas, de contato
estreito entre duas pessoas. Afeição é uma relação didática, isto é, ocorre entre pa-
res, ao passo que as relações de inclusão e de controle podem ocorrer entre pares
ou entre uma pessoa e um grupo.

Cabe ao facilitador ter essas três fases muito bem definidas para conseguir atuar
de forma profissional diante das argumentações, evitando contra-transferências. O facili-
tador necessita perceber estes funcionamentos, não para classificá-los como certos ou
errados, mas para preparar-se para o encontro com o grupo e entender que o mesmo pos-
sui fases e perfis, sem julgamentos pessoais.

5.1 Módulo I – Desenvolvendo a competência intrapessoal

Viver hoje em um ambiente onde a constância é a mudança, é um desafio emo-


cional para todos. De acordo com Moscovicci (2002), o indivíduo precisa se auto-
conhecer mais realisticamente, conhecer o outro e o processo de interação que se dá em
grupo e assim, construir uma melhor maneira para utilizar seus recursos e potencialida-

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 5


des, confiar em suas habilidades e competências, enfim, aproveitar seus pontos fortes e
lidar com seus aspectos menos desenvolvidos.
Quando o indivíduo aprende a pensar de forma dialética, a enfrentar situações no-
vas e que podem trazer frustrações, estará melhor preparado para superar os percalços da
vida. Esse módulo tratará de focar a elaboração de conteúdos internos mais profundos,
angústias, fantasias, frustrações, ansiedades e emoções, aspectos que um processo seleti-
vo mobiliza. Obviamente que o programa estará a todo o tempo retomando tais questões,
pois as mesmas fazem parte da personalidade do indivíduo.
Quando se fala em personalidade faz-se referência à soma total das maneiras co-
mo uma pessoa reage e interage com as demais pessoas.
Quando um psicólogo fala de personalidade, ele se refere a um conceito
dinâmico que descreve o crescimento e o desenvolvimento de todo o
sistema psicológico de um indivíduo. Mais do que analisar aspectos de
uma pessoa, a personalidade se refere a um total agregado que é maior
que a soma das partes (Robbins, 2002, p. 88).
A personalidade de um indivíduo adulto é considerada, de maneira geral, como
resultado dos fatores ambientais e hereditários, moderados pelas circunstâncias situacio-
nais. Se as características de personalidade fossem completamente ditadas pela heredita-
riedade, nenhuma quantidade de experiência poderia alterá-las. Mas a cultura dentro da
qual estamos inseridos, as condições de nossa infância, norma vigente entre famílias,
nossos grupos sociais, além de outras influências que experimentamos na vida, são fato-
res que exercem pressão sobre a formação de nossa personalidade. A hereditariedade
determina os parâmetros ou limites, mas o potencial total de um indivíduo será determi-
nado pelo seu ajuste às demandas e exigências do ambiente.
Um terceiro fator, a situação, influencia os efeitos da hereditariedade e do ambien-
te sobre a personalidade. A personalidade embora coerente e estável de maneira geral,
pode mudar em determinadas situações. O que interessa ficar claro é que as situações
parecem ser substancialmente diferentes no que se refere às limitações que impõem ao
comportamento. Algumas situações, por exemplo, participar de uma entrevista para um
emprego, impõe alguns limites podendo gerar alguns comportamentos como: ansiedade,
medo do inesperado etc. Enquanto em outras situações como: fazer um passeio em que a
pessoa se sinta confortável, os comportamentos no geral se dão com mais espontaneidade
e menos ansiedade.
Percebe-se de acordo com a experiência prática das autoras que a forma com que
os jovens têm se articulado com os processos seletivos na busca de seus primeiros em-
pregos, tem impactado diretamente em sua auto-estima e auto-imagem. Constata-se na
prática que o atributo auto-estima pode ser facilmente abalado em um processo seletivo,
quando não adequadamente elaborado, dificultando os processos seletivos posteriores,
pois a auto-estima é um requisito que pode ser utilizado pelo selecionador como possível
previsor de comportamentos. Alguns atributos específicos da personalidade são vistos
como poderosos previsores de comportamento nas organizações, entre eles auto-estima
(Robins, 2002, p. 92).
Para o autor ainda, a auto-estima é o grau em que os indivíduos gostam de si
mesmos. Esse traço de personalidade está diretamente relacionado com as expectativas de
sucesso. Para Robins (2002) os indivíduos com auto-estima elevada acreditam possuir a
capacitação que necessitam para ter sucesso. Enquanto os indivíduos com baixa auto-

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estima são mais vulneráveis às influências externas, dependem da avaliação positiva dos
outros.
Esse módulo, também dará abertura para se trabalhar as questões de “escolhas”,
possibilitando o trabalho das outras temáticas que emergirem do grupo.

5.2 Módulo II – Desenvolvendo a competência interpessoal

No passado falava-se muito da importância da inteligência para obter sucesso na


carreira e se dar bem na vida, o chamado QI – coeficiente de inteligência era considerado
decisivo para o sucesso profissional. No entanto hoje já se tem cientificamente compro-
vado de acordo com Goleman (1995) que o QE – coeficiente emocional é muito mais
importante na definição do sucesso da carreira profissional das pessoas. Pois não basta
somente ter conhecimento, mas é preciso saber utilizá-los em harmonia com as pessoas
que estão a sua volta, e é isso que se considera como competência interpessoal, é o ser
humano ter a habilidade de se relacionar com os outros de maneira sadia, sem perder sua
individualidade e autonomia.
Outro autor muito conhecido que vislumbra formas diferentes de lidar com a inte-
ligência é Gardner (2000), este ressalta sobre a importância das inteligências múltiplas, e
do quanto o educador precisa estar atento aos talentos das pessoas para desenvolvê-las.
Outra influência teórica importantíssima que consideramos como base de nossa
formação é Moscovici (1998), a autora ressalta que competência interpessoal não é um
dom ou talento inato, mas que é uma competência que poderá ser desenvolvida através de
treinamento. A autora afirma que a competência interpessoal se dá por meio da interação
humana:
Pessoas convivem e trabalham com pessoas e portam-se como pessoas,
isto é, reagem às outras pessoas pelas quais entram em contato: comu-
nicam-se, simpatizam e sentem atrações, antipatizam e sentem aversões,
aproximam-se, afastam-se, entram em conflito, competem, colaboram,
desenvolvem afeto. Essas interferências ou reações, voluntárias ou in-
voluntárias, intencionais ou inintencionais, constituem o processo de in-
teração humana, em que cada pessoa na presença de outra não fica indi-
ferente a essa situação de presença estimuladora (p. 32 e 33).
A autora complementa ainda que o processo de interação humana é complexo e
ocorre permanentemente entre pessoas, sob forma de comportamentos manifestos e não
manifestos, podendo os mesmos ser verbais e não verbais, utilizando-se de pensamentos,
sentimentos, reações mentais e físicos corporais.
Competência Interpessoal ainda para Moscovici (1998) é a habilidade de lidar efi-
cazmente com relações interpessoais, de lidar com outras pessoas de forma adequada às
necessidades de cada uma e às exigências da situação. A autora ressalta sobre dois com-
ponentes da competência interpessoal que são: a percepção e a habilidade propriamente
dita. Neste módulo II, a ênfase de abordagem estará na percepção e como habilidades se
trabalhará a comunicação e o feedback.
A percepção precisa ser treinada, para isso necessita de um longo processo de
crescimento pessoal, abrangendo auto-percepção, auto-conscientização e auto-aceitação
como pré-requisitos de possibilidades de percepção mais realística dos outros e da situa-
ção interpessoal. Não é um processo fácil, requer muito treinamento, por vezes poderá ser

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demorado e sofrido, exigindo coragem e disponibilidade psicológica do treinando no
exercício de receber feedback. Para que ocorra o autoconhecimento necessariamente pre-
cisa se praticar o dar e receber feedback.
Moscovici (1998) entende as dimensões interpessoais em três grande categorias e
nestas inclui as seguintes habilidades:

DIMENSÕES INTERPESSOAIS
A COMUNICAÇÃO
1. comunicação efetiva
3. saber ouvir
1. reação a feedback
11. expressão de feedback
17. persuasão
B. LIDERANÇA
4. liderança efetiva
6. autoconfiança
2. iniciativa
10. independência
13. resistência a estresse
16. apoio catalisador
19. competição
C. PARTICIPAÇÃO
2. impacto
5. espontaneidade
3. sensibilidade
12. lidar com conflito
14. experimentação
15. relacionamento próximo
18. abertura
20. flexibilidade

Figura 1 – Ordenação geral (ranking) das dimensões interpessoais criadas por Moscovici (1998, p. 41).

A percepção é o ponto de partida da dimensão interpessoal e determina como se


dará a comunicação e os relacionamentos interpessoais. O modo, o jeito de a pessoa estar
em qualquer situação, depende de como ela se reconhece naquela situação, e isto a leva
ao reconhecimento do outro e da situação em que se encontra. Reconhecer quem sou eu,
como sou, como falo, ouço, me relaciono, como conduzo as minhas ações no mundo,
como reajo diante do outro, diante de desafios, diante do novo, diante do inesperado, é,
por si só, um processo de amadurecimento capaz de fazer o ser humano ver suas próprias
limitações. Reconhecer como o outro é, no que ele se assemelha e no que ele é diferente
de nós, amplia a visão de mundo, de homem, de vida, de trabalho e de sociedade.
Neste módulo apresenta-se de forma teórica e vivencial a temática comunicação,
ressaltando a complexidade sobre a mesma. Esta complexidade fica evidenciada com os
conceitos de Gil (1994). Segue abaixo uma citação do autor que sintetiza todo o processo
de comunicação apresentando seus elementos.
Uma pessoa “EMISSOR” tem uma idéia “SIGNIFICADO” que pretende
comunicar. Para tanto, vale -se de seu mecanismo vocal “CODIFICA-
DOR”, que expressa sua mensagem em palavras. Essa mensagem, vei-
culada pelo ar “CANAL”, é interpretada pela pessoa a quem se comunica
“RECEPTOR” após sua decifração por seu mecanismo auditivo “DECODI-
FICADOR”. O receptor, após constatar que entendeu a mensagem “COM-

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 8


PREENSÃO”, esclarece a fonte acerca de seu entendimento “REALIMEN-
TAÇÃO” (p. 34).

Gil (2001) e Weisinger (1997) trazem os seguintes conteúdos e habilidades relati-


vos à comunicação:
• Habilidades comunicativas: a importância do saber ouvir; do saber ler; do saber
falar; do saber escrever.
• Ruídos de comunicação – decorrentes do emissor: falta de clareza nas idéias; co-
municação múltipla; problemas de codificação; bloqueio emocional; hábitos de
locução; suposição acerca do receptor.
• Ruídos de comunicação – decorrentes do receptor: audição seletiva; desinteresse;
avaliação prematura; preocupação com a resposta; crenças e atitudes; reação ao
emissor; preconceitos e estereótipos; experiências anteriores; atribuição de inten-
ções; comportamento defensivo.
• Comunicação não-verbal: postura corporal; expressões faciais; controle do tom
de voz.
• Barreiras da comunicação: físicas; semânticas; pessoais; variáreis intervenientes.
• Barreiras inconscientes: Esta barreira divide-se em mecanismos de defesa e fil-
tros pessoais.
a) Mecanismos de defesa: os mais comuns de acordo com os autores são a
racionalização; reação; substituição ou compensação; projeção; repressão;
identificação.
b) Filtros Pessoais: De acordo com Weinsinger (1997) existem quatro filtros
pessoais que são nomeados como o filtro da predileção; o filtro do quem;
o filtro dos fatos e o filtro da distração.
• Barreiras conscientes: estas barreiras poderão ser passivas; agressivas ou asserti-
vas.

Ser assertivo é uma das grandes habilidades interpessoais. Considera-se assertivi-


dade a capacidade de o indivíduo expressar de forma adequada seus pensamentos e sen-
timentos.
E esta é mais uma busca corajosa deste programa, de juntamente com todos os ob-
jetivos já apresentados, também fazer uma reflexão com estes jovens sobre esta habilida-
de tão significativa que é a assertividade, buscando com que os mesmos se conscientizem
e percebam a importância deste conhecimento.
Em paralelo com a assertividade está a capacidade de dar e receber feedback que
será também trabalhada de forma teórica e vivencial neste módulo. O feedback torna-se
uma forma de ajuda a outra pessoa ou grupo, considerando a possibilidade de mudança
na conduta. É um momento mágico de crescimento tanto para quem recebe quanto para
quem dá o feedback, e se bem conduzido, aproximará ainda mais os laços existentes entre
as pessoas ou entre os grupos.

5.3 Módulo III – O processo de recrutamento e seleção

O objetivo deste módulo é apresentar de forma clara e objetiva como se dá um


processo de recrutamento e seleção desde a abertura de uma vaga até o seu efetivo fe-
chamento. Chiavenato (2004) ressalta que o processo de recrutamento é:

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 9


Um conjunto de técnicas e procedimentos que visa atrair candidatos po-
tencialmente qualificados e capazes de ocupar cargos dentro da organi-
zação. É basicamente um sistema de informação, através do qual a or-
ganização divulga e oferece ao mercado de RH oportunidades de em-
prego que pretende preencher (p. 165).
Este mesmo autor e obra conceituam o processo de seleção como:
A tarefa básica da seleção é a de escolher, entre os candidatos recruta-
dos, aqueles que tenham maiores possibilidades de ajustar-se ao cargo
vago e desempenhá-lo bem. O objetivo básico da seleção é o de esco-
lher e classificar os candidatos adequados às necessidades da organiza-
ção (p. 185).
De um modo geral, pode-se definir um processo de recrutamento e seleção como
sendo composto das seguintes etapas: aprovação da vaga, definição do perfil, definição
da estratégia de recrutamento, definição da estratégia de seleção, aplicação da estratégia
de recrutamento, aplicação da estratégia de seleção, integração do novo funcionário.
Considerando que o controle do custo relativo à folha de pagamento é sempre
uma grande preocupação de toda organização, uma nova vaga (seja de substituição ou
aumento de quadro) é sempre muito questionada e analisada e depende, na maioria das
organizações, de um processo formal de aprovação em nível de diretoria (ou outro nível
equivalente). Para sua afetiva abertura é necessário estabelecer claramente qual o objeti-
vo, funções a serem desempenhadas e detalhamento do perfil do candidato a ser buscado.
O esclarecimento desta etapa aos participantes deste módulo é muito importante,
pois vai lhes mostrar que para cada vaga há um perfil sendo buscado e que, em muitas
vezes, seu perfil poderá não se adequar à oportunidade, sendo não um problema seu em
particular, mas reflexo da necessidade identificada pela organização.
Como estratégia de recrutamento entende-se os meios através dos quais a organi-
zação vai divulgar a oportunidade, buscando atrair um número suficiente de candidatos
que atendam ao perfil estabelecido. Publicação em jornais, divulgação através de sites
especializados, entidades de classe, eventos da área, contratação de empresas de recruta-
mento e seleção especializadas, universidades, escolas, centros comunitários, murais os
mais diversos, etc. são possibilidades a serem estudadas. O importante para identificar a
melhor estratégia de recrutamento é tentar identificar onde está o público alvo, ou seja,
onde estão os candidatos que potencialmente atendem ao perfil buscado e, a partir daí,
selecionar os melhores meios de divulgação da vaga.
Gil (2001), cita e descreve os seguintes meios de divulgação de uma oportunidade
de trabalho: cartazes, recomendação, pessoal dispensado, agências, associação de profis-
sionais, anúncios, headhunters e internet.
Apresentar as diversas possibilidades e estratégias de recrutamento aos jovens que
estão buscando uma colocação no mercado de trabalho é importante, pois vai mostrar a
eles que “procurar trabalho dá muito trabalho!” Eles precisam buscar continuamente
através dos mais diversos meios, identificar onde estão as oportunidades que possam lhes
interessar.
Despertar o espírito investigativo, realçar a importância da persistência e do foco
na busca é um dos principais objetivos deste módulo. É mostrar a importância da ação
sistemática na busca de uma colocação profissional.
A seleção diz respeito ao processo de dentre todos os candidatos recrutados, sele-
cionar aquele que está mais próximo do perfil estabelecido. Cabe ressaltar a importância

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 10


da ética profissional e o respeito com o ser humano na aplicação destas técnicas, pois o
momento de realizar um teste normalmente gera ansiedade, sendo assim, o profissional
necessita de muita sensibilidade para conduzir o processo de forma adequada.
Segundo Gil (2001), os principais métodos de seleção são: análise de currículo,
testes escritos, testes práticos, testes psicológicos, entrevista e dinâmica de grupo.
As técnicas de seleção envolvem direta ou indiretamente o contato entre a organi-
zação selecionadora e os candidatos recrutados. Através destes contatos a selecionadora
inicia um processo que vai comparando, etapa a etapa, o perfil ideal buscado, com o per-
fil de cada candidato.
Normalmente o currículo é a primeira forma aplicada de seleção, de filtro, em um
processo seletivo. Apesar de muito se falar da importância de um currículo bem elabora-
do, a vivência das autoras como recrutadoras mostra que, com uma freqüência bastante
alta, encontram-se currículos mal estruturados, incompletos, com erros de português, que
não sinalizam qual é o foco de atuação que está sendo buscado e não direcionados para a
oportunidade para a qual foram encaminhados.
A entrevista é a melhor oportunidade do candidato se mostrar, falar de suas expe-
riências e descrever como poderá contribuir. Nesta etapa do módulo os participantes se-
rão envolvidos em atividades vivenciais que os prepararão para conhecer em mais deta-
lhes o que é uma entrevista. É claro que não existem modelos prontos, mas vivenciar, de
forma mais protegida, processos como estes deverá trazer mais calma e tranqüilidade
quando se estiver participando de processos reais.
Os testes psicológicos e de personalidade trazem informações importantes sobre o
perfil comportamental do candidato. Os módulos I e II foram planejados para, através de
atividades vivenciais, trazer uma melhor percepção de como cada participante é, e como
se comporta em grupo – auto-conhecimento e percepção da interação grupal são os focos
destes dois módulos. Assim sendo, a realização de testes não deve trazer alta ansiedade,
pois os participantes terão aumentado o seu auto-conhecimento – os teste mostrarão o que
eles já deverão ter percebido de si mesmos através das atividades, processamentos e re-
flexões realizadas.
Uma vez que, a maioria das atividades em cada módulo serão realizadas utilizan-
do-se de dinâmica de grupo, espera-se que os jovens participantes do programa, enten-
dam o propósito deste tipo de instrumento e sintam-se mais confortáveis e confiantes ao
participar das atividades propostas.
Em cada um dos módulos a coordenação, diretamente ou através de convite à re-
flexão, deverá trazer a todo o momento a importância de “ser você mesmo”, o caminho
para uma atuação profissional bem sucedida passa primeiramente por poder ser o que
cada um é! Mentiras, dissimulações não são bons companheiros na busca de uma nova
oportunidade.
Acredita-se que um maior auto-conhecimento, a visualização da forma de atuação
em grupo e um pouco mais de clareza sobre o tipo de oportunidade que se busca são co-
nhecimentos importantes para a participação bem sucedida nas diversas atividades e eta-
pas que se constitui um processo de recrutamento e seleção.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 11


5.4 Módulo IV – Reflexão e motivação para a ação

Este módulo será de fundamental importância no processo de desenvolvimento,


pois busca-se resgatar com o grupo os sentimentos, frustrações, mudanças ocorridas em
todo o processo.
Busca-se repensar sobre quais eram seus objetivos profissionais no início do tra-
balho de desenvolvimento, visando fazer uma reflexão sobre suas escolhas, sobre quais
caminhos estes jovens querem seguir profissionalmente.
Resgataremos neste módulo todos os aprendizados vivenciados nos módulos ante-
riores na busca de reforçar conforme citado no início deste artigo que a mudança aconte-
ce de “dentro para fora” e por isso o programa estruturou-se primeiramente visando de-
senvolver os aspectos intrapessoais, em seguida os aspectos interpessoais para concluir
com aspectos técnicos, e, somente por fim resgatarmos tudo e conectarmos com a auto-
motivação e motivação que considera-se ser a base para que o jovem siga seus rumos.
Bergamini (1997), ressalta sobre a origem etimológica do termo motivação como:
Motivação deriva originalmente da palavra latina movere, que significa
mover. Essa origem da palavra encerra a noção dinâmica ou de ação
que é a principal tônica dessa função particular da vida psíquica. O ca-
ráter motivacional do psiquismo humano abrange, portanto, os diferen-
tes aspectos que são inerentes ao processo, por meio do qual o compor-
tamento das pessoas pode ser ativado (p. 31).
A autora complementa ainda que motivação é composta das diferentes necessida-
des que coexistem no interior de cada um, estas são comparadas ao que se chama de de-
sejos ou expectativas e têm como origem carências dos mais diversos tipos, tanto no as-
pecto físico quanto no aspecto psíquico. E diante destes conceitos que se escolheu traba-
lhar a temática motivação somente neste último módulo, pois tudo se resume a um grande
ciclo e que o centro é o querer, e para existir este querer preciso de uma motivação, e esta
é diferente para cada um dos indivíduos.
E após toda a reflexão sobre a temática motivação busca-se colocá-la em prática,
sendo assim as autoras propiciarão atividades de energização e motivação, visando elevar
o astral do grupo, na busca de uma motivação grupal.
Diversas teorias sobre motivação poderiam ser ressaltadas neste módulo, no en-
tanto a busca é pelo foco, e este é de reforçar nestes jovens sobre a importância em acre-
ditarem em si mesmos, sobre a importância de não desistirem diante de tantas portas que
se fecham e principalmente do quanto, neste nosso mundo real, a persistência e perseve-
rança fazem a diferença para que os objetivos e sonhos sejam alcançados.

6 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considera-se este artigo estruturado em uma lógica que respeita as condições e ca-
racterísticas dos participantes, bem como traz em si uma coerência metodológica que
esperar-se, consiga atingir os resultados a que se propõe – a preparação de jovens univer-
sitários para a participação em processos de seleção para uma oportunidade de trabalho.
Seu desenvolvimento sustentou-se nos referenciais teóricos citados, aprendizados
adquiridos no curso de formação em dinâmica de grupos, experiência das autoras e tam-
bém na crença de que há nele um grande potencial para aplicação prática. Sabe-se que

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 12


este é um projeto ambicioso e que necessita de muito trabalho e persistência para que seja
viabilizado na prática.
Cada módulo proposto tem um objetivo claro e definido. Obviamente que há
imensa quantidade de conteúdo possível e de interesse de aplicação. Há inúmeras compe-
tências que poderiam ser propostas e trabalhas em um modelo como este. Julgamos que
os focos propostos para cada módulo são adequados para o objetivo a que este trabalho se
propôs. Este programa, conforme já ressaltado, foi dividido em quatro módulos descritos
no escopo do artigo.
No entanto, como a metodologia utilizada é a dinâmica de grupo não há como se
definir um “programa pronto”, mas sim um foco e uma estrutura. As pessoas são únicas e
os grupos são diferentes, sendo assim cada ser humano e cada grupo crescerá o quanto se
entregar, de acordo com o seu momento, demonstrando e descobrindo o seu brilho pouco
a pouco.
Este artigo está sendo finalizado com um sentimento de alegria e realização, pois
por meio de uma “vontade” criou-se um modelo e deste modelo pretende-se desenvolver
muitos jovens. Sabe-se que a sociedade possui muitos problemas e que o desemprego e o
despreparo fazem parte deste grande mal. No entanto não se pode cruzar os braços diante
desta realidade. Sendo assim, compara-se esta contribuição à metáfora de “uma pétala no
meio de tantas rosas”, de que se busca contribuir mesmo de forma singela para uma so-
ciedade com jovens mais preparados e conseqüentemente mais motivados.
A seguir apresenta-se uma reflexão que sintetiza o maior objetivo de todo este
trabalho que é instigar os jovens à vontade de tentar e de não desistir de seus sonhos!!!
“Ao vencer um obstáculo, o sábio se sente muito bem consigo mesmo
porque descobriu uma força que não conhecia. E, mesmo que não che-
gue ao sucesso na primeira vez, o esforço de experimentar e o aprendi-
zado adquirido vão inevitavelmente levá-lo à vitória. Eleve seus pa-
drões. Mudar e evoluir exigem que se olhe para o alto. Quando quere-
mos algo ambicioso precisamos desenvolver uma nova atitude. Existem
ações que levam ao sucesso. Elevar o padrão é procurar melhorar sem-
pre a qualidade das idéias, dos sonhos, das ações, dos amigos. Não mu-
de o sonho, mude a estratégia”.
(Autor desconhecido).

REFERÊNCIAS

BERGAMINI, Cecília Whitaker. Motivação nas organizações. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1997.
CANSIAN, Maria M. Coordenador de grupos: facilitador ou dificultador do processo? Revista CRP, ano 4,
n. 37, mar. 2000.
CHIAVENATO, Idalberto. Recursos humanos: o capital humano das organizações. 8. ed. São Paulo: Atlas,
2004.
GARDNER, Howard. Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: Artmed, 2000.
GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1994.
GIL, Antônio Carlos. Gestão de pessoas: enfoque nos papéis profissionais. São Paulo: Atlas, 2001.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.
MATTOSO, Jorge; BALTAR, Paulo. Estrutura econômica e emprego no Brasil: a experiência recente. Rio
de Janeiro: José Olympio, 1997.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 13


MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 8. ed. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1998.
. Equipes dão certo: a multiplicação do talento humano. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002.
POCHMANN, Marcio. O trabalho sob fogo cruzado: exclusão, desemprego e precarização no final do
século. São Paulo: Contexto, 1999.
ROBBINS, Stephen Paul. Comportamento organizacional. Tradução de Reynaldo Marcondes. São Paulo:
Prentice Hall, 2002.
SHULTZ, William Carl. Psicoterapia pelo encontro. Tradução de Mercedes Patrício. São Paulo: Atlas,
1978.
WEISINGER, Hendrie. Inteligência emocional no trabalho. Rio de Janeiro: Objetiva, 1997.

SBDG – Caderno 84 v Dinâmica de Grupo: um instrumento de desenvolvimento... 14


Cadernos da

Sociedade Brasileira de
Dinâmica dos Grupos

85
Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 120º
Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos,
realizado na cidade de Londrina, PR,
de 20 de maio de 2005 a 21 de outubro de 2006.

Coordenação:
Isabel Cristina Moraes Doval, Didata
Suely do Rocio Pinto Pucci, Especialista

Porto Alegre
2006

SBDG – Caderno 85 1
Travessa La Salle, 75
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CONSELHO DIRETOR
Presidente Samara Mª M. Ferreira Costa e Silva

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Vice-Diretor Administrativo-Financeiro Roberto Scola

Diretora de Educação Carmem Maria Sant’Anna

Vice-Diretor de Educação Marcel Paranhos Dias

Os textos são de responsabilidade dos respectivos autores,


não representando necessariamente
o ponto de vista da SBDG.

Editoração e gravação:
Suliani – Editografia Ltda.
Fone/fax (51) 3384.8579 e-mail: editor@suliani.com.br

SBDG – Caderno 85 2
NÚCLEOS

Núcleo RS
GESTOR GERAL: Mara Maru dos Santos
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suzana Zimmer
GESTOR DE EVENTOS: Doralício Siqueira Filho
VICE-GESTOR DE EVENTOS: André Beneduzi

Núcleo SC
GESTOR GERAL: Emiliana Simas Cardoso da Silva
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Carmem Sinzato
GESTOR DE EVENTOS: João Carlos Machado
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Maria Alexandra Cardoso da Silva

Núcleo PR
GESTOR GERAL: Helena Mª França Sundin
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suely do Rocio Pucci
GESTOR DE EVENTOS: Laucemir Pessine
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Ana Silvia A. Borgo

Núcleo PA
GESTOR GERAL Mauro Nogueira de Oliveira
GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza
GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira
VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira

Núcleo MS
GESTOR GERAL: Maria Selma Perez
GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende
GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto
VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini

SBDG – Caderno 85 3
Sumário

A influência dos grupos na humanização do trabalho


Ana Olympia V. Marcondes Dornellas
Fabíola Ancioto
Iracelis Mancore Varea Gonçalves
Soraya Tiyomi Tokunaga

Interferência da comunicação nos resultados das organizações


Cláudia Maria Moraes Lima
Cleusa Cristina Casarin Andrello
Márcia M. Salomão
Weber Guimarães

Construção do ambiente organizacional partindo do perfil do líder


Alessandra Mie Taketomi Koguishi
Alexandre Lourenço Ferreira
Luis Henrique Pennacchi
Naira Gisele Pissinati
Tania Belizario Mastelari

Relacionamento interpessoal como variável causadora


de estresse no trabalho e no grupo
Cláudio Pinheiro da Silva
Denize Maione Grande
Elisângela Cristina Duarte Ramos
Giovana Augusta Piton Volpi

Vínculo com autoridade: do vínculo primitivo


ao grupo profissional
Dayse Betânia da Silva
Denise Regina Carollo Kloster
Mari Clair Moro Nascimento
Marlene Mariotto Gaspar

SBDG – Caderno 85 4
Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Londrina – PR
Coordenação: Isabel Cristina M. Doval, Suely do Rocio P. Pucci

A influência dos grupos na humanização


do trabalho

ANA OLYMPIA V. MARCONDES DORNELLAS


FABÍOLA ANCIOTO
IRACELIS MANCORE VAREA GONÇALVES
SORAYA TIYOMI TOKUNAGA

Resumo – Esta pesquisa é o resultado da análise da vivência que permeia as relações no


trabalho. O objetivo foi identificar o quanto as relações interpessoais e grupais podem
influenciar na humanização do ambiente de trabalho, baseando-se na Teoria das Necessi-
dades Interpessoais de Will Schutz. Para o desenvolvimento da pesquisa, foi utilizada a
técnica de entrevista gravada e semi-estruturada focada na metodologia quantitativa, onde
participaram seis profissionais de uma Instituição de Saúde Pública de Londrina. Os re-
sultados demonstraram que, embora as relações de trabalho já estejam formadas há algum
tempo, o grupo estudado ainda passa por comportamentos que evidenciam a necessidade
de inclusão, controle e abertura quando se referem à relação entre subgrupos. Levando-
nos a concluir que toda equipe possui uma identidade própria e se organiza influenciando
de alguma forma suas relações, sendo melhor reconhecida enquanto grupo quando a con-
vivência é mais próxima, tornando então, tais relações mais humanas e possibilitadoras
de abertura para evolução das competências interpessoais.
Palavras-chave – Humanização. Processo de grupo e trabalho.

Abstract – This research is the result of the analysis of experience which pass through
the relations at work. The objective was to identify how much the interpersonal and
group relations can influence the humanization of work environment, based on the The-
ory of Interpersonal Needs of Will Schutz. To the development of the research, it has
been used a technique of recorded and semi-structured interview focused on the quantita-
tive methodology, in which six professionals of a Public Health Care Institute of Lon-
drina have participated. The results have demonstrated that, although the work relations
have been already formed for some time, the studied group still experiences behaviors
that evidence the need of inclusion, control and affection when refer to the relation
among subgroups. That lead us to conclude that every team has an own identity and or-
ganizes itself influencing somehow its relations, being better recognized as a group when
the cohabitation is nearer, transforming then, such relations more humane and capable of
opening for evolution of interpersonal competences.
Key words – Humanization. Group process and work.

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 1


INTRODUÇÃO

Pessoas que compõem um grupo de trabalho estabelecem de alguma forma, rela-


ções interpessoais e grupais levando-nos a pensar que a humanização tanto do ambiente
de trabalho quanto do serviço oferecido, depende diretamente da qualidade interacional
desse grupo. Assim, esse estudo visa a análise da vivência que permeia toda relação de
trabalho focando identificar o quanto as relações interpessoais e os movimentos de grupo
podem influenciar na humanização do mesmo. A preocupação com o trabalho é tão im-
portante quanto a preocupação com o homem, porque é pelo trabalho que o homem se
constrói, uma vez que este é o modo de ser do homem e, como tal, invade todos os níveis
de sua atividade, de seus afetos e de sua consciência. O conforto, a sobrevivência, os vín-
culos pessoais estabelecidos, o ganho financeiro, o sentir-se útil, a auto realização, as
amizades feitas, a afirmação de virilidade, são significados extrínsecos e intrínsecos do
trabalho.
O caráter mediador da atividade do trabalho opera uma dinâmica com duplo efei-
to, onde os indivíduos transformam o contexto de produção e, ao mesmo tempo, são
“transformados” por ele. Os seres humanos se relacionam entre si e em grupos seja no
contexto profissional, familiar ou social. No trabalho, interatuam profissionais que se
relacionam num processo grupal informal ou formalmente, pois um grupo se faz através
das relações estabelecidas de seus membros entre si e com o meio em que vivem. Ao
tentar compreender e aperfeiçoar o comportamento humano no trabalho nota-se o reco-
nhecimento do funcionamento e o mau funcionamento dos grupos como um dos princi-
pais problemas. O ser humano que não toma contato com sua própria vida, seus próprios
conflitos e frustrações, corre o risco de desenvolver mecanismos rígidos de defesa que
podem prejudicá-lo tanto no âmbito profissional como no pessoal. Quando falamos em
humanização, referimo-nos a um processo vivencial que engloba toda a atividade do local
e das pessoas que ali trabalham. Envolve uma ligação direta com o comprometimento,
com a colaboração, favorecendo diversos outros aspectos que envolvem ambiente, pro-
cessos históricos, pessoais, políticos, culturais e até religiosos. Segundo o Ministério da
Saúde (MS, 2002), humanização é a valorização dos diferentes sujeitos, é o aumento do
grau de co-responsabilidade entre eles e o estabelecimento de vínculos solidários que
fortaleça o trabalho em equipe fomentando a transversalidade e a grupalidade, entenden-
do como grupalidade a experiência que não se reduz a um conjunto de indivíduos nem
tampouco como uma unidade ou identidade imutável, mas um coletivo em agenciamento
e transformação. Humanizar é garantir à palavra a sua dignidade ética – o sofrimento, a
dor e prazer expressos pelos sujeitos necessitam ser reconhecidos pelo outro. Depende da
capacidade de ouvir, falar e agir com nossos semelhantes.
No âmbito profissional do dia-a-dia das atividades, exercer essa dignidade parece
ser um processo ainda em desenvolvimento nas relações grupais, onde a falta de habili-
dade e competência para (re)conhecer e valorizar os diferentes sujeitos e o não fortaleci-
mento da co-responsabilidade do trabalho em equipe podem gerar conflitos frente às rela-
ções pessoais, grupais, ambiente físico e organizações do processo de trabalho. Conflitos
esses, que se não reconhecidos e trabalhados como experiência construtiva impede o au-
toconhecimento que é imprescindível para a promoção do equilíbrio e amadurecimento
do indivíduo.
Embasamos nosso estudo na Teoria das Necessidades Interpessoais de Will
Schutz, que enfatiza que cada pessoa busca integrar-se desde o momento em que suas
necessidades fundamentais e interpessoais são satisfeitas pelo grupo, necessidades estas

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 2


referidas como inclusão, controle e afeto visto que todo indivíduo que se reúne em grupo
as experimenta, ainda que em diferentes proporções. Refere ainda a necessidade da to-
mada de decisão, isto é, fazer escolhas, reconhecer a influência dos sentimentos nestas
escolhas e aprender a lidar com o medo de ser rejeitado, de ser humilhado e de não ser
amado. Acreditamos que satisfeitas tais necessidades, as relações de trabalho podem ser
mais humanizadas. É a integração do Eu = Competência Interpessoal.

NECESSIDADES INTERPESSOAIS SEGUNDO AS BASES


PSICOLÓGICAS DO ENCONTRO DE SCHUTZ
E DESENVOLVIMENTO DE GRUPO

Inclusão – O comportamento de inclusão refere-se a associações entre pessoas,


aceitação, posse, companhia. Esta necessidade de sentir-se incluído manifesta-se pelo
desejo de receber atenção. A inclusão não implica vínculos emocionais fortes com outras
pessoas, como acontece na abertura. A preocupação aqui é mais na linha do predomínio.
Os interesses principais nesta fase são questões de limite relativas a ultrapassar ou não os
limites do grupo, bem como lhe pertencer. Uma vez que esta necessidade envolve o pro-
cesso de formação grupal, geralmente ocorre como a primeira questão interpessoal na
vida de um grupo.
Controle – O comportamento de controle refere-se ao processo de tomar decisões
em conjunto em áreas de poder, influência e autoridade. O exemplo de uma discussão
ajuda a distinguir entre a inclusão e o controle. Ao procurar inclusão ou proeminência,
têm-se o desejo de participar da argumentação, no controle, o desejo é de sentir-se com-
petente ou estar do lado de quem está por cima. Difere da inclusão na medida em que não
implica destacar-se.
Abertura – O problema da abertura é estar próximo ou distante. A interação afe-
tiva é o abraço e a ansiedade é ser ou não capaz de ser amado. O comportamento de aber-
tura refere-se a emoções íntimas, de contato estreito entre duas pessoas. Como se baseia
num estabelecimento gradual de laços emocionais, é geralmente, o último aspecto a
emergir no desenvolvimento de uma relação humana ou de um grupo. Ao chegar nesta
fase, os membros do grupo já estabeleceram várias formas de apegos pessoais entre si e
com o líder. Todos ficam envolvidos numa atmosfera mais calorosa e íntima, e cada con-
cessão do líder, careta ou movimento estão sujeitas a interpretações pessoais.
Portanto, defini-se a inclusão primariamente pela formação do relacionamento, ao
passo que o controle e a abertura referem-se a relações já formadas. Em relações já exis-
tentes, o controle diz respeito à função de tomada de decisões, enquanto abertura se refere
ao grau de intimidade ou distanciamento entre as pessoas. Essas três dimensões – inclu-
são, controle e abertura – nesta ordem, geralmente predominam no desenvolvimento de
um grupo. Porém, deve-se destacar que essa ordem não é rígida, mas parece que a nature-
za da vida em grupo é tal que as pessoas tendem primeiro a determinarem se querem per-
tencer a um grupo ou não; segundo, qual o grau de influência exercerão; e terceiro, qual o
grau de intimidade que manterão com os outros membros.

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 3


TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

Trata-se de uma pesquisa realizada segundo a abordagem qualitativa, onde para


coleta de dados foi utilizado um roteiro de entrevista individual, semi-estruturada e com
perguntas abertas, a qual foi gravada para melhor aproveitamento das informações. Se-
gundo Lobiondo-Wood e Haber (2001), a entrevista é um tipo de pesquisa em que o en-
trevistador faz questionamentos verbais ao sujeito da pesquisa tendo como vantagem,
além de possibilitar dados mais ricos e completos, propiciar esclarecimentos de dúvidas,
especialmente quando as perguntas são abertas.
O instrumento constituiu-se de duas partes, uma de identificação do sujeito cons-
tando idade, sexo, categoria profissional e tempo de trabalho no local e uma segunda par-
te com 10 questões norteadoras da entrevista, sendo elas: O que você entende por huma-
nização? O que você acredita ser importante para a humanização das relações interpes-
soais no trabalho? O que para você é impeditivo para o bom relacionamento no trabalho?
Como se dá a sua relação com as outras pessoas do seu trabalho? Quais sentimentos você
tem pelo seu grupo de trabalho? Estes sentimentos são percebidos/reconhecidos pelo gru-
po? Você se sente parte deste grupo? Qual a sua contribuição para este grupo? Existe
situações de conflito nas relações interpessoais e grupais no contexto do trabalho? Cite e
comente porque acha que acontecem. Como o conflito é enfrentado pelo grupo?
Participaram desta pesquisa seis pessoas, todas do sexo feminino, escolhidos de
acordo com a maior disponibilidade no momento da entrevista, uma vez que a mesma foi
realizada em horário de trabalho, pertencentes a uma instituição se saúde pública de Lon-
drina. Primeiramente foi contactuado o setor responsável por autorizar pesquisas nessa
instituição, que autorizou mediante declaração da orientadora do trabalho e didata da
SBDG quanto a responsabilização das questões éticas da mesma. Tendo os participantes
sido orientados sobre os objetivos, aspectos éticos e metodológicos da pesquisa, bem co-
mo da importância da gravação da entrevista e concordando em participar, assinaram o
termo de consentimento livre e esclarecido e foi assegurado o sigilo absoluto dos depoi-
mentos e a não implicação de qualquer tipo de prejuízo, conforme a resolução CNS
196/96 do Ministério da Saúde. As entrevistas foram transcritas e digitadas previamente e
posteriormente exaustivamente lidas e ouvidas buscando a análise do conteúdo e os signi-
ficados embasados na Teria das Necessidades Interpessoais de Schutz, questões propostas
neste estudo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Significados associados à humanização

A maioria dos entrevistados consideram como fato gerador do processo de huma-


nização o respeito, a honestidade, a amizade, o companheirismo, ajuda mútua, dedicação
de tempo e trabalho responsável, o que é concordante com a definição do Ministério da
Saúde. Um determinado depoimento foi diferenciado quando relaciona humanização com
“deixar vir a razão e criar vínculos, transformação, segurança, confiança”, mostrando
uma maior consciência de si mesmo, honestidade e abertura preconizado por Schutz co-
mo primordial para a evolução das pessoas no grupo.

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 4


Um outro fator levantado foi a questão de limites, que são identificados quando
valorizam o respeito pelo ritmo e individualidade de cada um, o tempo que se pode dedi-
car e a omissão de opiniões para evitar conflitos, como atributos importantes para huma-
nizar as relações interpessoais no trabalho. Aparecem nas falas a existência de um sub-
grupo e o reconhecimento maior das necessidades deste enquanto o verdadeiro grupo a
que pertencem, e não a equipe como um todo enquanto um único grupo. Tal fato relacio-
na-se aos diferentes turnos de trabalho o que não é explicitado abertamente, ficando a
suposição de que se consideram um único grupo. Segundo Schutz reter segredos requer
um corpo tenso, restringe a espontaneidade, requer vigilância e preocupação excessiva
com a própria segurança, o que foi observado na presença acentuada de imposição de
limites e nos risos quando questionavam se era para falar do seu “grupo” de determinado
turno de trabalho ou do grupo como um todo. Na fala da maioria, não está claro a cons-
ciência de si mesmo nem o sentimento da própria importância, dificultando o aprendiza-
do em ser auto-responsável (ou co-responsável, segundo o MS) no processo humanizador
e nas relações interpessoais e iludir-se ao próprio respeito leva a um comportamento ma-
nipulatório, a exploração e a desumanização. Questões de limites são problemas de inclu-
são, onde os interesses são relativos a ultrapassar ou não os limites do grupo, bem como
lhe pertencer.

Significados associados a relacionamento interpessoais e grupais

Tratam a ausência de feedback como “fofocas”, omitem respostas dizendo que


“não tem nada” ou mantém-se em silêncio caracterizando dificuldade em externalizar
sentimentos e a dificuldade de afinidade com outro turno de trabalho, ou seja, mais uma
vez aparecendo o subgrupo. Uma pessoa reconhece como fator dificultador das relações
interpessoais e grupais, as próprias pessoas, que se impedem de dar e oferecer soluções
para os problemas. Apesar de considerarem as relações de trabalho como “boas” e se
sentirem parte do grupo, referem ter um vínculo maior com as pessoas do subgrupo (lê-se
mesmo turno) e os sentimentos existentes vão do amor ao ódio relacionado a determina-
dos comportamentos, prevalecendo sentimentos familiares, fraternos e de amizade.
Para Schutz somos nós que escolhemos interpretar o comportamento do grupo
como uma dádiva para nos ajudar a ter consciência do quanto estamos certos ou não da
nossa posição. O grupo não pressiona, ele simplesmente reage a gritos, críticas ou proce-
dimentos semelhantes, que neste estudo pode estar representado como “fofocas”. Estabe-
lece que a cultura do encontro enfatiza responsabilidade individual, onde cada um é res-
ponsável pelo que é, portanto, pode mudar; é o enfoque do prazer do “aqui e agora”; não
exclui recordações ou expectativas emocionais, mas reconhece que o agora é tudo que se
tem para experimentar. A resposta sintetizada do “é boa” para referir-se as relações entre
as pessoas, pode evidenciar uma falta de responsabilização individual e resistência a mu-
dança. Quanto a referência aos subgrupos, Schutz coloca que para que o grupo possa
existir os limites devem ser estipulados para determinar quem está dentro ou fora dele,
assim, o fato dos subgrupos serem mais bem reconhecidos, pode muitas vezes ser fato
gerador de conflitos entre quem está dentro ou fora do subgrupo ou turno de trabalho.
A necessidade interpessoal de abertura, segundo Schutz, ocorre sempre entre pa-
res ao passo que a inclusão e o controle podem ocorrer entre pares ou entre uma pessoa e
um grupo. Ao passar por esta fase, os membros do grupo já estabeleceram várias formas

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 5


de apegos pessoais entre si e ficam envolvidos numa atmosfera mais calorosa e íntima,
mostrando relações já estabelecidas, nesse caso, melhor percebida entre os subgrupos,
onde também melhor reconhecem sua contribuição. Algumas pessoas não têm claro qual
sua contribuição para com o grupo e outras pautam sua contribuição em limites auto-
estabelecidos, o que Shutz explica como receio de transgredir ou não aos limites do grupo
com medo a não pertencer mais a ele.
Sinais claros de controle são as disputas pelo poder e influência no grupo, o que
não apareceu claramente nas entrevistas, levantando a hipótese de que informações foram
camufladas. Essa hipótese pode ser fundamentada na limitação que sofre a confiança em
virtude da existência dos aspectos omitidos.

Significados associados a conflito

Reconhecem a existência do conflito como importante para soluções de proble-


mas, mas se omitem com a justificativa de não gerar mais conflito ou referem um “jogo
de empurra” sem atitude resoluta. Colocam dificuldades em enfrentar o conflito, barreiras
para compartilhar as responsabilidades, comunicação ineficaz e falta de resolutividade.
Há divergências quanto à intermediação ou não da chefia, enquanto uma pessoa deixa
claro que não precisa levar tudo para chefia, outra reforça que: “se entro em conflito já
levo o chefe junto”. Parece haver uma disputa pelo controle e poder entre os subgrupos
estabelecidos, onde o desejo é de ser competente, diferindo da inclusão na medida em que
não implica destacar-se. O problema do “controle segundo Schutz é ‘estar por cima” ou
“por baixo” sendo a interação primária o confronto, e a ansiedade que aqui permeia é o
sentimento de incompetência e o medo de ser humilhado. Pessoas diferentes assumem ou
procuram funções diferentes e via de regra, a luta pelo poder. Competição e influência
tornam-se questões centrais, gerando o conflito e o debate. Nesta fase, o relacionamento
com o líder é bem concentrado, começa uma luta relacionada ao poder, influência e
orientação, sem contar a expectativa em cima do líder para dizer o que grupo deve fazer.
Com essas definições de Schutz ficam claras as necessidades de controle e de abertura
identificadas entre subgrupos (turnos diferentes de trabalho).
Mesmo que o grupo não resolva seus conflitos, e permaneça com a energia presa
na fase de controle, isso repercute na fase seguinte - abertura, impedindo a intimidade,
bem como a integração do grupo. A existência de subgrupos representa justamente a im-
possibilidade do grupo de integrar todas as suas partes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vida não é tão complicada porque agora vejo como posso influenciá-
la (Schutz, 1989, p. 185).
A presente pesquisa nos mostrou que toda equipe possui uma identidade própria,
seja no contexto de equipe como um todo ou no contexto dos subgrupos formados pelos
diferentes turnos de trabalho. Cada subgrupo se organiza e se influencia de uma forma,
mostrando um funcionamento diferente um do outro, possibilitando a análise de que a
convivência mais próxima facilita o reconhecimento do grupo de modo a usarem melhor
suas capacidades e perceberem a sua própria forma de agir. Capacidades esta reconheci-

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 6


das quando satisfeitas as três Necessidades Interpessoais de Inclusão, Controle e Abertu-
ra, que se manifestam nos comportamentos e sentimentos para com outras pessoas e estão
arraigados nos sentimentos para com si mesmos. O grupo estudado permanece focado na
necessidade de inclusão quando evidencia aspectos camuflados que fragilizam uma apro-
ximação que faça evoluir o processo. Já as dificuldades relacionadas ao controle, são
apenas decorrência – se uma necessidade está precariamente atendida, o reflexo será so-
bre a próxima. Quanto à abertura, o grupo mostra interação afetiva quando dá sinais de
ansiedade entre as relações estabelecidas pelos seus membros. O grau de intimidade é
maior entre as pessoas da mesma categoria profissional e mesmo subgrupo; e o distan-
ciamento entre os subgrupos está diretamente relacionado ao ser ou não aceito pois o di-
fícil é a aproximação de partes diferentes o que significa uma fixação na inclusão, levan-
do ao conflito maior entre os subgrupos sob a forma de confronto, mostrando uma luta
pelo poder e competição e posteriormente o debate onde alguns se manifestam verdadei-
ramente com atitudes de mudança e outros silenciam ou usam o “bom senso” mantendo
as “aparências” de um bom ambiente de trabalho. Embora o relacionamento já esteja es-
tabelecido, uma vez que trabalham juntas há anos, ainda passa por comportamentos que
demonstram necessidade de inclusão e controle quando se referem à existência de sub-
grupos. E são estes subgrupos que evidenciam a dificuldade de abertura quando demons-
tram afeto somente com “iguais”, uma vez que esta fase afirma a possibilidade de aceita-
ção de cada um com suas diferenças tal como é, estabelecendo uma proximidade madura
e íntima entre os membros do grupo.
Acreditamos que um grupo de trabalho desenvolve a percepção do eu e do outro
quando possibilita condições para se fortalecer como tal, reconhecendo o papel do coor-
denador e se desenvolvendo por meio da autoconsciência, influenciando as relações ni -
terpessoais no trabalho e tornando-as mais prazerosas com práticas mais humanizadoras,
possibilitando maior abertura para evolução de competências interpessoais e reconheci-
mento enquanto um grupo integrado.

REFERÊNCIAS

AGOSTINI, R. O conflito como fenômeno organizacional: identificação e abordagem na equipe de enfer-


magem. Ribeirão Preto, 2005. 106 f. Dissertação (Mestrado) – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto,
Universidade de São Paulo. 2005.
CARTWRIGHT, D.; ZANDER, A. A dinâmica de grupo. São Paulo: EPU, 1967.
DEJOURS, C.; ABDOUCHELLI, E.; JAYET, C. Psicodinâmica do trabalho: contribuições d a escola
dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento e trabalho. São Paulo: Atlas, 1994.
. O fator humano. 2. ed. São Paulo: FGV, 1999.
JACQUES, Maria da Graça; CODO, Wanderley (Orgs.). Saúde mental e trabalho: leituras. Petrópolis:
Vozes, 2002.
LOBIONDO-WOOD, G.; HARBER, J. Pesquisa em enfermagem: métodos e avaliação crítica e utilização.
Tradução Ivone Evangelista Cabral. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001.
MAILHOT, G. B. Dinâmica e gênese dos grupos. Rio de Janeiro: Duas Cidades, 1976.
MS (Ministério da Saúde). Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar. Brasília.
2000a.
. Manual do PNHAH. Brasília. 2000b.

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 7


MOSCOVICI, F. Desenvolvimento interpessoal. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005.
NOGUEIRA, Martins; FANTINI, Maria Cezira. Humanização das relações assistenciais: a formação do
profissional de saúde. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2001.
VERGARA Sylvia Constant. Métodos de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas, 2005.
WILL, Schutz. Psicoterapia pelo encontro. São Paulo: Atlas, 1978.
. The human element. Traduzido por Ane Cristina Amorim Araujo. Workbook, ed. 1994.
. Profunda simplicidade: uma nova consciência do eu interior. São Paulo: Ágora, 1996.

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 8


ANEXOS

Anexo I

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Autarquia do Serviço Municipal de Saúde de Londrina

Esta pesquisa tem como objetivo analisar as influências do grupo na humanização


das relações de trabalho em qualquer organização.
Para atingir nosso objetivo, nós, alunas do Programa de formação básica em di-
nâmica dos grupos da Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupo (SBDG), solicitamos a
autorização dessa Autarquia para a realização da coleta de dados através de entrevista por
nós realizadas, a equipe de trabalho da Unidade de Saúde Guanabara, desse Município,
para pesquisa intitulada “A Influência do Grupo na Humanização do Trabalho”.
Esta pesquisa será realizada como monografia obrigatória para a conclusão do
curso de Formação em Dinâmica de Grupo, realizada pela SBDG.
Agradeço antecipadamente a atenção dispensada,

Ana Olympia Velloso Marcondes Dornellas


Fabíola Ancioto
Iracelis Mancore Varea Gonçalves
Soraya Tiyomi Tokunaga

Data: _____/______/______

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 9


Anexo II

Termo de consentimento esclarecido

Eu ______________________________________________________________,
após ser devidamente informado(a) e esclarecido(a) a respeito dos objetivos desta entre-
vista, concordo em responder perguntas para o trabalho sobre “As Influências do Grupo
na Humanização do Trabalho”, que tem como objetivo analisar as relações interpessoais
no trabalho que possam influenciar na humanização desse ambiente coletivo.
Entendo que serão feitas perguntas de identificação pessoal como: idade, escolari-
dade, além de perguntas sobre algumas condições do processo de trabalho.
Estou ciente que as informações fornecidas por mim são confidenciais, e a divul-
gação dos resultados do trabalho será feita de forma global e anônima.
Também estou ciente que não receberei nada e nem terei que efetuar qualquer pa-
gamento para responder as perguntas.
Em caso de dúvidas posso esclarecê-la (o) com o próprio entrevistador, Ana
Olympia, pelo fone 3336-8249, e tenho a liberdade de aceitar ou não responder à entre-
vista ou a qualquer pergunta.
Londrina ___/___/___
Ass____________________________________________

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 10


APÊNDICE

Entrevista Nº:
Data: Local:

A – Identificação do sujeito:
Idade: Sexo: Categoria profissional: Cargo:

Tempo que trabalha neste local:

B – Questões Norteadoras:
1. O que você entende por humanização?
2. O que você acredita ser importante para a humanização das relações interpessoais no
trabalho?
3. O que para você é impeditivo para o bom relacionamento no trabalho?
4. Como se dá a relação sua com as outras pessoas do seu trabalho?
5. Quais sentimentos você tem pelo seu grupo de trabalho?
6. Estes sentimentos são percebidos/reconhecidos pelo grupo?
7. Você se sente parte deste grupo?
8. Qual a sua contribuição para este grupo?
9. Existe situações de conflito nas relações interpessoais e grupais no contexto do traba-
lho? Cite e comente porque acha que acontecem.
10. Como o conflito é enfrentado pelo grupo?

SBDG – Caderno 85 v A influência dos grupos na humanização do trabalho 11


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Londrina – PR
Coordenação: Isabel Cristina M. Doval, Suely do Rocio P. Pucci

Interferência da comunicação nos resultados


das organizações

CLÁUDIA MARIA MORAES LIMA


CLEUSA CRISTINA CASARIN ANDRELLO
MÁRCIA M. SALOMÃO
WEBER GUIMARÃES

DEDICATÓRIA

Aos nossos familiares, pais, maridos, esposas e filhos,


pela compreensão; e por acreditarem sempre
em nosso sucesso e comemorarem conosco
cada pequena vitória alcançada.
Aos nossos amigos do grupo, pelo carinho,
compreensão e amizade; que colaboraram
e compartilharam conosco o aprendizado obtido.
As orientadoras Isabel Doval e Suely Pucci
pelo conhecimento que nos foi passado, além do amor
pelo trabalho realizado, que nos faz acreditar
que estamos no caminho certo para alcançar um
mundo melhor, acreditando sempre no ser humano.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 1


AGRADECIMENTOS

A Deus que nos guiou, protegeu e deu força.


Às coordenadoras Isabel Doval e Suely Pucci,
que contribuíram com seus ensinamentos, e que,
carinhosamente possibilitaram transformar
este curto período, em bons momentos e conquistas.
Às famílias que sempre nos incentivaram e deram
força, para que alcançássemos mais esse objetivo
em nossas vidas profissionais.
Ao nosso grupo pela integração e coesão
que oportunizou o aprendizado e o desenvolvimento
de nossas potencialidades, no atingimento
de um objetivo comum.

“A palavra é aquilo que o homem usa quando


todo o resto falha”. (autor desconhecido)

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 2


Resumo – Este trabalho busca analisar a influência da comunicação humana em suas
diversas formas, e as conseqüências desta nos resultados das organizações. Buscou-se
compreender os fatores que contribuem para o desenvolvimento da comunicação, que
passa pelo aperfeiçoamento da competência interpessoal, resultando no aprimoramento
da capacidade de dar e receber feedback. O trabalho teve como base a revisão literária de
teorias da psicologia voltadas para a administração.
Palavras-chave – Comunicação. Competência interpessoal. Feedback.

Abstract – This work search to analyze influence the communication human in sundry
foms, and consequence this is in results organizations. Search to understand this is factors
than contibute to development communication, than to pass for improvement of compe-
tence interpersonal, to resultant in aprimoramento of capacity of to give and to receive
feedback. This work had since base revision literary of theories this is psychology to turn
out administration.
Key words – Communication. Competence interpersonal. Feedback.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 3


INTRODUÇÃO

Durante o processo de formação em dinâmica dos grupos tivemos a oportunidade


de vivenciar o desenvolvimento do grupo como um todo a partir do momento em que
houve o processo de auto-conhecimento individual, propiciado pela abertura a dar e rece-
ber feedback, pela exposição e comunicação.
Vivenciamos ao longo dos encontros as etapas de interação no desenvolvimento
do grupo, descritas e elaborados por Schutz, como os três núcleos de necessidades inter-
pessoais: inclusão, controle e abertura.
Nessa perspectiva, o presente artigo pretende analisar como a comunicação hu-
mana nas organizações interferem nos seus resultados.
Traremos para análise o estudo das teorias de Lewin e Schutz, sobre a gênese de
um grupo e sua dinâmica, enfatizando a importância do aprendizado de uma comunica-
ção autêntica.
Pretende-se o desenvolvimento de um trabalho cujo objetivo é discutir a impor-
tância da comunicação entre as pessoas e a organização, de forma a contribuir para o seu
aprimoramento, garantindo a obtenção de resultados positivos no âmbito pessoal e profis-
sional.

JUSTIFICATIVA E PROBLEMATIZAÇÃO DO TEMA

Desde sempre, a convivência humana é difícil e desafiante, mas talvez um dos


maiores dilemas do ser humano, nos dias de hoje, seja como entender os outros e fazer-se
entender (Moscovici, 1985).
É difícil entender a complexidade da personalidade humana, especialmente em
suas relações com os outros. A maneira de lidar com diferenças individuais cria um certo
clima entre as pessoas e tem forte influência sobre toda vida em grupo, principalmente
nos processos de comunicação, no relacionamento interpessoal, no comportamento orga-
nizacional e na produtividade (Moscovici, 1985).
Ao considerarmos estes aspectos até aqui expostos, surge para nós a seguinte in-
dagação: Como podemos utilizar a comunicação e suas ferramentas no desenvolvimento
do potencial humano para alcançar o melhor resultado/desempenho dentro das organiza-
ções?
Partindo dessas perguntas que nos inquietam em nossos ambientes de trabalho, e
as quais desejamos buscar algumas respostas, pretendemos analisar estas questões e com
base em estudos de teóricos da área apresentar um ensaio para o desenvolvimento da co-
municação dentro das organizações.

FOCO DO TEMA OU SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA

Partindo destes questionamentos, o presente trabalho consiste na constatação atra-


vés de pesquisas bibliográficas das áreas de psicologia e administração que a comunica-
ção é uma ferramenta importante no desenvolvimento do potencial humano dentro das
empresas.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 4


OBJETIVOS DO TRABALHO

Geral:
Verificar como a comunicação interfere no resultado das organizações.

Específicos:
– Levantar os fatores envolvidos na comunicação que interferem no resultado das
organizações;
– Mostrar de que maneira poderemos contribuir para o desenvolvimento organiza-
cional através da abordagem da comunicação.

MÉTODO

Este trabalho caracterizou-se por pesquisa bibliográfica, com objetivo de buscar


conhecimentos acerca de um problema, para o qual se procura comprovações científicas.

REVISÃO DA LITERATURA

Comunicação humana e as relações interpessoais

Em trabalhos com grupos, a partir de esquemas guestaltistas e no interior de


projetos de pesquisas-ações sobre os micro-fenômenos de grupo, Kurt Lewin (apud
Mailhiot, 1973), descobriu três problemas chaves ligados à dinâmica dos grupos:
• A comunicação humana;
• O aprendizado da autenticidade;
• O exercício da autoridade em grupos de trabalho.

Lewin (apud Mailhiot, 1973, p. 64) chegou a tais conclusões na vivência prática
do seu próprio grupo de trabalho, enunciando a seguinte hipótese: “se a integração entre
nós não se realiza e se, paralelamente, nossas pesquisas progridem tão pouco, tal fato
pode ocorrer em razão de bloqueios que existiriam entre nós ao nível de nossas comuni-
cações” (grifo nosso). Desde que se conseguiu assinalar as fontes de bloqueio e de filtra-
gem nas comunicações, as relações interpessoais evoluíram, a coesão e a solidariedade
resultantes mudaram profundamente a atmosfera de suas sessões de trabalho, com ritmos
crescentes de produtividade e de criatividade.
Segundo Lewin (apud Mailhiot, 1973), a gênese de um grupo e sua dinâmica, são
determinadas, em última análise, pelo grau de autenticidade das comunicações que se
iniciam e se estabelecem entre seus membros. Partindo destas considerações formulou as
seguintes hipóteses:
1.1. a integração não se realizará e em conseqüência, sua criatividade não poderá
ser duradoura, enquanto as relações interpessoais entre todos os membros
não estiverem baseadas em comunicações abertas, confiantes e adequadas;
2.2. a capacidade de comunicar de modo adequado com o outro, estabelecendo o
diálogo não é um dom inato, mas aprendida. Somente aqueles que aprende-

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 5


ram a abrir-se ao outro e a se objetivar a seu respeito tornam-se capazes de
trocas autênticas com ele;
3.3. não é senão consentindo em questionar seus modos habituais de comunicar
com o outro e suas atitudes profundas a respeito do outro, que o ser humano
pode descobrir as leis fundamentais da comunicação humana, seus requisi-
tos e seus componentes essenciais, as condições de sua validade e de sua au-
tenticidade.
Quem buscou desenvolver ainda mais o tema, foi o psicólogo W. Schutz (apud
Mailhiot, 1973), com a “Teoria das Necessidades Interpessoais”, que defende a idéia de
que os membros de um grupo não consentem em integrar-se senão a partir do momento
em que certas necessidades fundamentais são satisfeitas pelo grupo. E que por outro lado,
estas necessidades são interpessoais no sentido de que somente em grupo e pelo grupo
elas podem ser satisfeitas adequadamente.
Schutz consegue identificar como fundamentais três necessidades interpessoais:
Inclusão – É a que experimenta todo membro novo de um grupo em se perceber e
em sentir-se reconhecido e de ter significado, importância para o grupo. Sentindo
proximidade e pertença em relação àqueles aos quais se junta.
Controle – Consiste para cada membro, definir para si mesmo suas próprias
responsabilidades no grupo e também as de cada um que com ele forma o grupo; é a
necessidade de ser reconhecido por suas competências, de sentir-se responsável por
aquilo que constitui o grupo: suas estruturas, suas atividades, seus objetivos, seu
crescimento, seus progressos. É referente ao processo de tomada de decisão, autoridade,
poder e influência.
Abertura – Necessidade que indica a integração do grupo, portanto é indicação
de maturidade e integração, sendo observada como um desejo do indivíduo em ser
percebido de forma insubstituível no grupo, como reconhecimento pela pessoa que é.
Nesta fase pode surgir a autenticidade interpessoal, pois, respeito e confiança se
apresentam em alto nível, como tolerância às diferenças individuais.

As teorias de Schutz sobre as necessidades interpessoais marcaram um progresso


sobre algumas das descobertas de Lewin. Schutz conseguiu explicar experimentalmente o
que Lewin percebeu intuitivamente: como e porque um grupo que não concluiu sua inte-
gração é incapaz de criatividade duradoura.
Segundo Pimenta (2004) a comunicação, para os agrupamentos humanos, é tão
importante quanto o sistema nervoso para o corpo. Sem a comunicação, todas as relações
que se estabelecem entre as pessoas e os diversos grupos humanos seriam impossíveis,
sejam relações comerciais, de trabalho ou afetivas.
Comunicação, objetivamente, é quando uma pessoa faz com que sua idéia seja
captada e compreendida por outra(s) pessoa(s). Ela só existe realmente, quando se estabe-
lece entre duas ou mais pessoas um contato psicológico.
A comunicação pode ser verbal se alguém utiliza a linguagem oral ou escrita para
iniciar e estabelecer o contato com o outro. Todo outro recurso utilizado que permita ou
favoreça o contato com o outro, é comunicação não verbal, pertencendo a esta os gestos,
as expressões faciais, as posturas. Mesmo o silêncio e as ausências no interior de certos
contextos podem tornar-se significativos e carregados de mensagens para o outro e se-
gundo as situações, ora podem ser percebidos pelo outro como expressões de coragem,
ou omissões ou covardias (Mailhiot, 1973).

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 6


Comunicação verbal e não verbal não estão sempre sincronizadas e sintonizadas
no mesmo indivíduo. Às vezes o não verbal está em dissonância com o verbal, trai o ní -
timo que o verbal tenta camuflar. Como integrar os dois em uma mesma comunicação? A
partir de Lewin, a dinâmica dos grupos tem contribuído muito para revalorizar a comuni-
cação não verbal e a expressão corporal do indivíduo. Ela estabelece que somente uma
comunicação que seja verbal e não verbal ao mesmo tempo tem condições de ser adequada.
As comunicações de grupo podem ser distinguidas entre intragrupos (entre mem-
bros de um mesmo grupo), e intergrupos (troca entre dois ou vários grupos).
Mailhiot (1973), levanta os seguintes teoremas:
1) quanto mais o contato psicológico se estabelece em profundidade, mais a
comunicação humana terá possibilidades de ser autêntica.
2) quanto mais a expressão de si conseguir integrar a comunicação verbal e não
verbal, mais a troca com o outro terá condições de ser autêntica.
3) quanto mais a comunicação se estabelecer de pessoa a pessoa para além das
personagens, das máscaras, do status e das funções, mais terá possibilidade
de ser autêntica.
4) quanto mais as comunicações intra-grupo forem abertas, positivas e solidá-
rias, mais as comunicações inter-grupos terão possibilidade, em conseqüên-
cia de serem autênticas e de não servirem de evasão ou compensação a uma
falta de comunicações internas em seu próprio grupo.
5) quanto mais as comunicações humanas forem consumatórias (encontros de
sujeito a sujeito), menos ela será instrumental (manipulações do outro) e
mais possibilidades terão de se tornarem autênticas.

Para Edward Sapir (apud Davis, 1979, p. 19), “Reagimos ao gesto com extrema
atenção e poder-se-ia dizer que o fazemos segundo um elaborado código que não está
escrito em lugar nenhum, que ninguém conhece, mas que todos compreendem”.
Para Gahagan (apud Dance, 1967), a interação social depende da comunicação.
As pessoas podem estar presentes fisicamente umas com as outras, mas se não mostrarem
de algum modo o reconhecimento desse fato, não estão interatuando. A interação social
nos seres humanos depende tanto da linguagem como de pistas fornecidas pelos movi-
mentos corporais.
Sendo comunicação um fenômeno humano, é difícil conceber um modelo que ex-
presse sua complexidade e os vários aspectos envolvidos (Pimenta, 2004).
No modelo elaborado por Robinson (1991), é apresentada uma visão do fenômeno
como processo (apud Pimenta, 2004):

1 2 3

CONCEPÇÃO DA MSG CODIFICAÇÃO DA MSG SELEÇÃO DA MSG

FEEDBACK INTERPRETEÇÃO DA MSG DECODIFICAÇÃO DA MSG

6 5 4

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 7


As três primeiras etapas são realizadas pelo emissor e as três últimas pelo recep-
tor. O feedback (retroalimentação, retroação) pode ser definido como: reação ao ato de
comunicação. Ele possibilita que o emissor saiba se sua mensagem foi aprovada, desa-
provada, compreendida ou não.
Quando a comunicação se estabelece mal, ou não é estabelecida entre pessoas ou
entre grupos, resultam alguns fenômenos psíquicos. Quando ela é interrompida há o blo-
queio. Ao contrário quando não é comunicada senão uma parte do que os interlocutores
sabem, pensam ou sentem, a comunicação subsiste, mas é acompanhada de filtragens
(Mailhiot, 1973).
O ruído é um fator determinante no processo de comunicação, consistindo de
qualquer interferência ou barreira que possa dificultá-la. Ele pode localizar-se no emissor
– a mensagem não é bem formulada, dificultando a compreensão por parte do receptor;
no receptor – este pode não prestar atenção suficiente à mensagem; no veículo utilizado –
pode não ser adequado; e por fim no ambiente onde o processo de comunicação acontece
– pode haver algum tipo de poluição sonora ou visual que impeça a boa percepção do que
se quer comunicar.
O ruído em uma comunicação pode ter várias origens:
a) No emissor ou receptor:
§ Psicológica: o estado mental e emocional: preocupação, estresse,
descontentamento e;
§ Perceptual: a concepção de mundo e de pessoa, a formação cultural e
religiosa, os preconceitos e os estereótipos;
§ Fisiológica: dor de cabeça (e outras), dificuldade visual ou auditiva.
b) No ambiente: excesso de barulho, pouca luz, movimentação de pessoas.
c) Na mensagem: tipo de linguagem e de vocabulário utilizados, seqüência lógica,
velocidade de emissão.

A exatidão na comunicação é um processo difícil e se refere ao ponto até onde o


sinal básico transmitido pelo emissor é recebido sem distorções pelo receptor sendo que
entre a mensagem enviada e a recebida há um hiato, em que diversos ruídos podem apa-
recer, afetando a mensagem. Assim, a comunicação não estará completa enquanto o re-
ceptor não tiver interpretado a mensagem.
O feedback é um dos recursos usados para anular ruídos, é o processo de se dizer
a uma pessoa ou a um grupo, como sua atuação está afetando outras pessoas. Como enfa-
tiza Moscovici (1985, p. 41), “no processo de desenvolvimento da competência interpes-
soal, feedback é um processo de ajuda para mudanças de comportamento”.
Porém, para que se torne um processo útil, ele precisa ser tanto quanto possível:
• descritivo ao invés de avaliativo;
• específico ao invés de geral;
• compatível com as necessidades (motivações) do comunicador e receptor;
• dirigido;
• solicitado ao invés de imposto;
• oportuno;
• esclarecido para assegurar comunicações precisas.

Em relação a receber feedback, pode ou não haver dificuldades, pelos seguintes


fatores: aceitação das ineficiências, a confiança na outra pessoa, reação defensiva (não
ouvir ou negar a validade), e preparo psicológico.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 8


Em relação a dar feedback, exige-se habilidades de comunicação a serem desen-
volvidas, e envolve alguns riscos: usá-lo para demonstrar inteligência e habilidade (perde
o sentido para o receptor); enfocar aspectos vistos no comportamento do outro baseado
em motivações próprias (alívio de tensão ou agressão – velada ou manifesta); temer rea-
ções (mágoa e agressão), uma vez que é cultural a percepção do feedback como crítica e
com implicações emocionais e sociais muito fortes.
O feedback de forma estruturada e oportuna acelera o processo de mudança e au-
xilia na aquisição de comportamentos mais assertivos dentro da organização, porém não é
um processo simples.
Para superar as dificuldades devemos:
·§ estabelecer relação de confiança recíproca;
·§ reconhecer o processo de feedback como um processo de exame conjunto;
·§ aprender a ouvir – receber sem reações defensivas intensas;
·§ aprender a dar – sem conotações emocionais intensas;
·§ compreender que tanto o feedback positivo quanto o negativo é necessidade
humana e contribui para a melhoria do processo de comunicação.
·§ relacionar o feedback a um instrumento de controle para correção das
ineficiências e manutenção dos acertos, com benefícios recíprocos num
relacionamento;
·§ reconhecer as dimensões éticas e psicológicas do feedback – ética (o que se
diz), há duas possibilidades: verdade e mentira que corresponde a percepção
que tenha o transmissor a respeito da mensagem que emite, não
necessariamente verdade absoluta, mas de sua verdade subjetiva daquilo que
ele honestamente crê ser verdadeiro; psicológica (por quê se diz), ele pode
ser motivado por Amor ou Desamor (ódio), sendo amor aqui, respeito
genuíno pela dignidade de outrem, sentimento de responsabilidade pelo seu
bem-estar e crescimento.

Para superar as dificuldades de comunicação e possibilitar o desenvolvimento de


competência interpessoal é imprescindível desenvolver habilidades que precisam ser trei-
nadas e praticadas constantemente para que se obter bons resultados, sendo as principais:
paráfrase, descrição de comportamento, verificação de percepção e descrição de senti-
mentos (Moscovici, 1985).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este e apenas um ensaio para reflexão de um assunto atual e de fundamental m i -


portância, para as organizações preocupadas com o ser humano.
Sendo assim, partimos do princípio que quando se deseja estudar um grupo em
funcionamento e compreender a seqüência de eventos, as modalidades de interação e suas
conseqüências, faz-se mister identificar os componentes relevantes dos processos de gru-
po (Moscovici, 1985).
Pode-se utilizar uma abordagem analítica, com suas vantagens e desvantagens;
pode-se analisá-los através da composição, estrutura e ambiente, estudando neste caso as
pessoas que o compõem, as posições que ocupam e o espaço físico e psicossocial do gru-

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 9


po; pode-se também estudá-lo considerando sua dinâmica, os componentes que consti-
tuem forças em ação e que determinam os processos do grupo.
Em trabalho com grupos, para a formação de equipe e resolução de problemas em
grupo, as atividades devem focalizar a percepção de si mesmo e dos outros; os processos
de grupo; a comunicação interpessoal e o processo de feedback como instrumento de
mudança e crescimento pessoal, interpessoal e profissional.
Quando visualizamos o grupo como um campo de forças, onde umas se movimen-
tam para o progresso do grupo e outras para seu retrocesso, algumas destas forças in-
fluenciam o funcionamento grupal, ou seja, os objetivos, motivações, comunicação, pro-
cesso decisório, relacionamento, liderança e inovação.
Este artigo enfoca a importância do desenvolvimento de um dos componentes
principais do funcionamento de um grupo: a comunicação. Quanto a esta temos que le-
vantar as seguintes indagações: quais as modalidades mais características de comunica-
ção no grupo?Todos falam livremente ou há bloqueios e receio de falar? Há espontanei-
dade nas colocações ou cautela deliberada? Qual o nível de distorção na recepção das
mensagens? E se há troca de feedback aberto e direto?
Pela abordagem dos processos intra e interpessoal, que nos remetem às questões
do autoconhecimento, autopercepção, aceitação das diferenças, flexibilidade e empatia há
um aprimoramento da habilidade na comunicação a qual se torna fator determinante para
obtenção de melhores resultados nas organizações.
Percebemos a importância que tem o processo do autoconhecimento, passando pe-
lo desenvolvimento intra e interpessoal, para que se alcance o aprendizado de uma comu-
nicação autêntica, sendo este um dos principais fatores para a integração dos grupos.
E para que esta ferramenta seja mais bem aproveitada, a organização deve-se va-
ler das propriedades positivas que o feedback possui, devendo este ser praticado e incen-
tivado.
Assim, através do uso adequado do feedback podemos criar condições para que
nos grupos haja o desenvolvimento da percepção do eu e do outro, e que o grupo caminhe
no sentido de alcançar uma sinergia.
Buscando subsídio na literatura compreendemos que saber se comunicar é enten-
der a si mesmo e ter capacidade de avaliar os efeitos de suas ações sobre os outros.
Quando utilizamo-nos da percepção e da observação do eu e do outro, ou quando revisa-
mos nossas próprias crenças e padrões, objetivamos atingir competência interpessoal
consciente e inconsciente de forma a gerar mudanças que nos levam ao desenvolvimento
pessoal e grupal.
A integração de um grupo não se realiza, se não houver a conquista de cada um
em relação à sua autonomia pessoal, à possibilidade de descobrir que a autenticidade das
relações interpesssoais pressupõe a aceitação incondicional de si e do outro.
Trabalhar com grupos, tendo como orientação básica os estudos de Lewin (1973),
que nos indica onde devemos buscar fundamentos dos problemas ligados à gênese e a
dinâmica dos grupos, sendo: a comunicação humana; o aprendizado da autenticidade e o
exercício da autoridade em grupos de trabalho.
Que quando conseguirmos identificar e assinalar nos grupos as fontes de bloqueio,
e de filtragem nas comunicações, poderemos fazer com que as relações interpessoais evo-
luam, que haja coesão e solidariedade, e conseqüentemente poderemos obter produtivida-
de e criatividade.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 10


Enquanto as relações interpessoais entre todos os membros dos grupos não estive-
rem baseadas em comunicações abertas, confiantes e adequadas não haverá integração no
interior de um grupo, e sua criatividade não será duradoura.
Poderemos propor que esta atitude seja adquirida através de aprendizado, e que
através dos questionamentos da maneira de se comunicar com o outro, o ser humano po-
de descobrir as leis fundamentais da comunicação humana, seus requisitos e seus compo-
nentes essenciais, as condições de sua validade e de sua autenticidade.
Precisamos analisar, embasados pelas orientações da Teoria de Schutz, em que
momento o grupo está quanto às suas necessidades interpessoais, e entender que sua
integração passará necessariamente, pela satisfação destas necessidades, e trabalhar este
grupo de maneira que visualizem e entendam este processo complexo e dinâmico que
ocorre no grupo e que só pode ser satisfeito em e pelo grupo do qual fazem parte.
Identificar em qual das três necessidades, inclusão, controle ou abertura, está cada
membro do grupo, e se esta condição avança ou impede o crescimento do grupo. Pois
assim entenderemos que um grupo que não concluiu sua integração é incapaz de
criatividade duradoura.
Levy (apud Pimenta) compara o fenômeno da comunicação a um jogo de xadrez.
Segundo essa visão, a cada lance do jogo (ato comunicativo) um novo cenário se apresen-
ta. Vão fazer parte dele os novos valores, atitudes e demandas entre os envolvidos, com-
binados de infinitas formas, gerando novas situações com vários encaminhamentos pos-
síveis.
Desenvolvimento interpessoal passa a ser uma necessidade de desenvolvimento
organizacional e social.
A solução passa pela busca do desenvolvimento interpessoal, na abordagem indi-
vidual e grupal, e no desenvolvimento de equipes baseado, no âmbito da comunicação,
em técnicas de feedback.
Passa também pelo desenvolvimento e implantação de novas áreas, processos e
ferramentas que implementadas, visam promover a comunicação interna e externa das
organizações.
Sendo assim, podemos afirmar que a comunicação, em diversos níveis, tem se
tornado um processo vital para a satisfação do ser humano, seja ele em âmbito do indívi-
duo, de pequenos grupos ou mesmo de uma sociedade.
Assim concluímos que, é imprescindível nas atividades que as empresas desen-
volvem, que estas propiciem espaço para a exposição dos integrantes, onde haja estímulo
para o autoconhecimento, abertura para conhecimento do outro e assim possa promover a
integração dos componentes que dela fazem parte.
Promover dentro das organizações treinamento e oportunizar a utilização princi-
palmente do feedback, como ferramenta autêntica, para que as comunicações sejam aber-
tas, válidas e adequadas, é o caminho para a busca do sucesso das organizações, partindo
da qualificação do indivíduo, dos grupos que se transformam em equipes, das organiza-
ções, enfim de toda uma sociedade.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 11


REFERÊNCIAS

DANCE, F. E. X. Teoria da comunicação humana. São Paulo: Cultrix, 1967.


DAVIS, F. A comunicação não verbal. São Paulo: Summus, 1979.
MAILHIOT, G. B. Dinâmica e gênese dos grupos. 2. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1973.
MOSCOVICI, F. Desenvolvimento interpessoal. 3. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1985.
. Equipes dão certo – a multiplicação do talento humano. 6. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2001.
PIMENTA, M. A. Comunicação empresarial. Campinas: Alínea, 2004.

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

Claúdia Maria Moraes Lima


Formação em Dinâmica dos Grupos/SBDG. Especialista em Qualidade Total/UNIFIL-Londrina.
Graduação em Psicologia /UNIFIL-Londrina.

Cleusa Cristina Casarin Andrello


Formação em Dinâmica dos Grupos/SBDG. Terapeuta Comunitária/UFC-Universidade Federal do Ceará.
Especialista em Administração de Recursos Humanos/CESULON-Centro de Estudos Superiores
de Londrina. Graduação em Psicologia/UEL-Universidade Estadual de Londrina.

Márcia M. Salomão
Formação em Dinâmica dos Grupos/SBDG. Graduação em Psicologia/UNIFIL.
Especialista em Análise do Comportamento.

Weber Guimarães
Formação Em Dinâmica dos Grupos/SBDG. Graduação em Arquitetura e Urbanismo/Faculdade
Metodista Izabela Hendrix. Pós-Graduação em Belas Artes e Estilo/UFMG.

SBDG – Caderno 85 v Interferência da comunicação nos resultados das organizações 12


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Londrina – PR
Coordenação: Isabel Cristina M. Doval, Suely do Rocio P. Pucci

Construção do ambiente organizacional


partindo do perfil do líder

ALESSANDRA MIE TAKETOMI KOGUISHI


ALEXANDRE LOURENÇO FERREIRA
LUIS HENRIQUE PENNACCHI
NAIRA GISELE PISSINATI
TANIA BELIZARIO MASTELARI

DEDICATÓRIA

Aos nossos familiares, pais, maridos, esposas, filhos


e amigos do grupo pela compreensão, carinho
e amizade; que colaboraram e compartilharam
conosco o aprendizado obtido.
As orientadoras Isabel Doval e Suely Pucci
pelos ensinamentos que nos transmitiram
para nosso desenvolvimento, acreditando sempre
no potencial do ser humano.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 1


Resumo – Este trabalho pretende apresentar um estudo realizado com um público de
colaboradores que laboram na área de prestação de serviços, tendo como campo de traba-
lho a área médica. Através da importância do perfil do líder no ambiente de trabalho,
considerando a contextualização do problema que envolve a cultura, o clima organizacio-
nal e as ações mercadológicas (cliente externo, legislação vigente).
Palavras-chave – Relação interpessoal. Tomada de decisão. Comportamento do líder em
relação à tarefa.

Abstract – This work intends to present a study carried through with a public of collabo-
rators who works in the area of rendering of services, having as work field the medical
area. Through the importance of the profile of the leader in the work environment, con-
sidering the context of the problem that involves the culture, the organizational climate
and the marketing actions (external customer, current law).
Key words – Interpersonal relation. Taking of decision. Behavior of the leader in relation
the task.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 2


INTRODUÇÃO

Liderança é uma palavra que traz certa imponência. Por conseguinte, as pessoas
que tem liderança são comuns tanto nas organizações como nas situações do dia-a-dia. A
capacidade de liderar é importante não somente nas situações da vida social, mas também
para todos os tipos de organizações e gestores. Cada um tem objetivo próprio e sua reali-
zação depende da capacidade de liderança, quando se avalia o sucesso ou o fracasso na
realização desses objetivos.
A gestão é utilizada tão freqüentemente no dia-a-dia que não parece haver dúvidas
em relação ao seu significado. O mesmo ocorre com gerência, eficácia, eficiência, lide-
rança, entre outros. Seria importante tratar de todos esses assuntos. Entretanto, em função
de seus objetivos, o tema central abordará duas das competências do líder no que tange a
seu estilo de liderança: o comportamento em relação à tarefa e a relação interpessoal.
No que se refere às estratégias organizacionais utilizadas pelos líderes, fica claro
que, as organizações vêm passando por transformações, por influência política, econômi-
ca e social em seu ambiente. Hoje, para competir no mercado, os líderes necessitam am-
pliar seu escopo de atuação. Um exemplo disso, são as empresas que prestam serviços na
área da saúde. Elas necessitam de um trabalho de forma integral desenvolvendo a opera-
ção de um produto ou serviço, com o objetivo de ampliar seu mercado, estabelecem uma
estrutura própria com toda prestação de serviço em um único local, deixando a distribui-
ção próxima dos consumidores. Há, enfim, a necessidade das empresas definirem melhor
sua visão estratégica, para estarem bem posicionadas no mercado competitivo de traba-
lho. E isso pode se dar através das competências do líder, ao qual justifica a utilização de
um modelo de competências nas organizações.
Pode-se definir a palavra competência no senso-comum, que designa uma pessoa
qualificada para realizar algo. Dois pontos primordiais são ligados a esse conceito: co-
nhecimento e tarefa. Esse conceito é primordial na tomada de decisão do líder. É impor-
tante também, ele estabelecer se seu comportamento vai ser orientado para a tarefa ou
para o liderado.
Diante dessas colocações, elaborou-se um estudo com o objetivo principal de ana-
lisar dois aspectos da liderança de uma empresa de Assistência Médica, situada em Lon-
drina – Paraná: o comportamento em relação à tarefa e a influência da relação interpes-
soal na tomada de decisão. Para tal, o trabalho apresenta-se em dois momentos: no pri-
meiro, abordou-se o gestor que utiliza o modelo de liderança através do desenvolvimento
de competências, a fim de analisar aspectos de liderança quanto ao comportamento em
relação à tarefa e quanto à relação interpessoal. Num segundo momento, realizou-se uma
pesquisa de campo descritiva na empresa analisada, para por fim, concluir de acordo com
o objetivo proposto.
Para fundamentar a pesquisa, foi utilizado o conceito teórico de Wilfred R. Bion,
ao qual ele aborda experiências com grupos – os “pequenos grupos terapêuticos” como
objeto de estudo, na ala de reabilitação de militares no hospital psiquiátrico durante a
Segunda Guerra Mundial. Depois estudou inúmeros grupos terapêuticos na Clínica Tavis-
tock e em seu consultório. Muitos dos conceitos desenvolvidos em sua pesquisa se torna-
ram relevantes para a compreensão de grupos de trabalho e dos fenômenos emocionais
subjacentes a eles, desenvolvendo em sua obra uma teoria sobre a dinâmica de grupos.
Portanto, a importância do binômio liderança/competência justifica uma pesquisa
científica.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 3


1 JUSTIFICATIVA E PROBLEMATIZAÇÃO DO TEMA

Entendemos que a Liderança é um processo social no qual se estabelece relação


de influências entre pessoas. O núcleo deste processo de interação humana é composto do
líder ou líderes, seus liderados, um fato e um momento social. O processo de liderança se
verifica em infinitas situações e ambientes como: na família, na escola, no esporte, na
política, no comércio, entre outros. Ao observar o processo de liderança em qualquer dos
espaços citados, nota-se que toda pessoa é capaz de exercer influências sobre as outras,
portanto, toda a pessoa é potencialmente um líder.
O presente trabalho tem como foco o ambiente organizacional, a partir da visão e
missão da empresa, abordando questões referentes aos aspectos da liderança. Muitos
questionamentos seriam pertinentes em função da complexidade do tema proposto. A
questão investigada é sobre os estilos do líder no desenvolvimento do grupo, nas relações
interpessoais e sua influência no processo de tomada de decisão.
Para F. Moscovici (1995) as pessoas convivem e trabalham com pessoas, reagindo
uns aos outros, através da comunicação, sintonia, sentindo atrações, antipatias ou sentin-
do aversões, aproximam-se, afastam-se, entram em conflito, competem, colaboram, de-
senvolvem afeto. Estas interferências e reações, conscientes ou inconscientes, intencio-
nais ou não intencionais, segundo a autora, constituem o processo de interação humana,
em que cada pessoa na presença de outra não fica indiferente a essa situação estimulado-
ra. A interação humana é um processo complexo e ocorre permanentemente entre pes-
soas, através de comportamentos manifestos, verbais e não verbais, de pensamentos, sen-
timentos, reações mentais ou físicos corporais. Em referência a isso, a importância de
uma das competências do líder: as relações interpessoais.
Com isso, todo problema começa com a percepção do mesmo como tal. Levantar
indagações abre caminho para o novo. Assim, questiona-se como se dá o processo de
relações interpessoais na empresa analisada?
Outro aspecto a ser abordado, é como é o comportamento do líder em relação à ta-
refa? Qual a influência desses aspectos na tomada de decisão?
Qualquer problema para ser solucionado, precisa ser bem percebido. A sua enun-
ciação define a espécie de dados relevantes à sua resolução. Diante disso, buscou-se ana-
lisar os aspectos que determinam um estilo de liderança de uma empresa de Assistência
Médica, sendo o comportamento em relação à tarefa e a influência da relação interpessoal
na tomada de decisão.

2 FOCO DO TEMA OU SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA

O líder de um grupo é o responsável pelo desenvolvimento de sua equipe no dia-


a-dia e por todas as atividades presentes e futuras. É sempre um desafio desempenhar
esse papel. Dentre os estilos de liderança estão à relação interpessoal e o comportamento
em relação à tarefa. Sendo assim, qual é a influência da relação interpessoal na tomada de
decisão do líder de uma empresa de Assistência Médica e, qual é o seu comportamento
em relação à tarefa?

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 4


3 CARACTERÍSTICAS DA EMPRESA ANALISADA

Empresa prestadora de serviços na área de Assistência Médica, sediada em Lon-


drina – Paraná. Foi fundada em 1984 por médicos londrinenses. Possui um quadro fun-
cional de aproximadamente 72 funcionários distribuídos nos departamentos: recepção,
administração, setor de exames e medicina do trabalho.
Apresenta uma estrutura própria e integrada, onde proporciona ao paciente aten-
dimento médico com todas as especialidades, realização de exames e procedimentos mé-
dicos cirúrgicos, no mesmo espaço físico durante 24 horas/dia, assim como, um hospital
que atende cirurgias eletivas e de pequeno porte. Assim, oferecendo atendimento diferen-
ciado.
Apresenta como visão: “ser a melhor empresa de assistência médica objetivando a
excelência no atendimento” e, como missão: “dar atendimento médico sustentado no co-
nhecimento técnico e científico”. Além do que, a regra de ouro da empresa é: “nenhum
paciente sai sem ter atendimento médico”.
A empresa não conta com um portifólio de competências. Ela se baseia em ações
desse modelo de gestão (Gestão de Competências) definindo objetividade, mas não apre-
sentando exatidão e clareza nas competências. Para isso, o trabalho propõe a verificar a
aplicabilidade desta ação, inclusive procurando validar competências necessárias à pres-
tação de serviço, já que nesta empresa temos de um lado o cliente muitas vezes angustia-
do pela resolução de seu problema, incluindo aspectos psicológicos que acabam se mani-
festando diante da equipe que lhe atende, e estas por sua vez tendo que apresen-
tar/desenvolver competências para que o atendimento e a satisfação sejam gerados de
forma satisfatória, já que esta é uma das características mantenedoras da prestação de
serviço.

4 OBJETIVOS DO TRABALHO

Objetivo geral:
Analisar aspectos dos estilos de liderança de uma empresa de Assistência Médica:
o comportamento em relação à tarefa e a influência da relação interpessoal na tomada de
decisão.

Objetivos específicos:
§ Identificar as características da liderança;
§ Identificar as competências associadas à liderança;
§ Analisar a abrangência do comportamento em relação à tarefa;
§ Verificar a influência das relações interpessoais no processo de tomada de decisão
do líder.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 5


5 LITERATURA

5.1 Contexto da liderança

Os primeiros estudos sob a denominação Liderança, ganharam mais visibilidade


com a Teoria de Necessidades de Abraham Maslow nos anos de 1950. Segundo Maslow,
as necessidades humanas estão arranjadas numa pirâmide de importância e influência no
comportamento humano. Tais questões tiveram origem nas raízes sociológicas do poder
político e da burocracia institucional.
Essa teoria sugeriu que os seres humanos são motivados por uma hie-
rarquia de necessidades que progride através de diferentes tipos, a sa-
ber, fisiológicas, sociais e psicológicas” (Morgan, 1996, p. 45).
Os seres humanos tendem a viver em grupos. A tendência de um grupo é apresen-
tar a necessidade de um líder. O autor também coloca que, a partir do momento em que o
grupo apresenta três ou mais componentes, a relação é interpessoal. O grupo necessita de
um líder que apresenta determinadas características, nem sempre desejáveis. Entretanto, a
tendência é segui-lo (Bion, 1975).
O tipo de liderança que é reconhecido como apropriada é aquela que mobiliza o
grupo para atacar alguém ou mobilizá-lo para fuga. “Aprendemos que líderes que nem
lutam nem fogem não são facilmente compreendidos” (Bion, 1975, p. 17).
Bion coloca também que a mentalidade de grupo é a expressão unânime da sua
vontade; a cultura, por sua vez, é a função do conflito existente entre os desejos do indi-
víduo e a mentalidade do grupo. Trata-se da suposição básica de que o grupo se reúne
para obter segurança de um indivíduo de quem depende. Isto significa que uma pessoa é
sempre sentida como se achando em posição de suprir as necessidades do grupo, e o res-
to, numa posição de serem supridas as suas necessidades.
Liderança possui diversos conceitos, de acordo com cada autor, ao qual para Ma-
ximiano (2005, p. 283) é: “O processo de conduzir as ações ou influenciar o comporta-
mento e a mentalidade de outras pessoas. Proximidade física ou temporal não é importan-
te no processo”.
Ou ainda, pode ser definida como: “liderança é o processo de encorajar e ajudar
os outros a trabalharem entusiasticamente nos direção dos objetivos” (Davis e Newstrom,
1992, p. 50).
Quando se refere ao processo de Liderança, podemos dizer que ela seja um pro-
cesso de influência de alguém sobre um grupo, sempre na busca conjunta do atendimento
de objetivos comuns propostos, apresentando dimensões que tem como objetivo identifi-
car características relacionadas com a eficácia e de definir os estilos de liderança. Assim,
a pessoa que comanda com sucesso seus colaboradores é um líder.
Cada líder ocupa uma posição dentro de uma hierarquia regida por normas impes-
soais, e essa posição possibilita o direito de tomar decisões. O seguidor obedece ao líder
porque tem a obrigação legal de fazê-lo. Em contrapartida, as normas definem os limites
dentre os quais esses poderes podem ser usados (Maximiano, 2005).
Um elemento importante para a definição de líder é o consentimento dos lidera-
dos. Esse consentimento pode depender da crença, na validade da missão ou no desejo de
receber uma recompensa. Essa identidade cria no grupo motivação para fazer o que o
líder propõe. Quanto mais pessoas consentem em seguir o líder maior será sua influência
(Maximiano, 2005).

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 6


A pessoa do líder é dotada de virtudes extraordinárias, qualidade singular e inata.
Porém, não se deve enxergar a liderança apenas como habilidade pessoal, mas como pro-
cesso interpessoal dentro de um complexo, no qual há a presença de outras pessoas (Ibid.,
2005).
Algumas pessoas são mais eficazes que outras. O entendimento para essas dife-
renças são as características individuais como as habilidades e a motivação. Outro com-
ponente importante no líder é a maneira como se relaciona com sua equipe. Além disso, o
papel do líder (ou uma de suas competências) é promover um ambiente no qual o poten-
cial das pessoas possa ser liberado para o trabalho. A competência, por sua vez, é deter-
minante no processo da liderança (Ibid., 2005).
Conforme Fela Moscovici: “Um líder é a pessoa no grupo à qual foi atribuída,
formal ou informalmente, uma posição de responsabilidade para dirigir e coordenar as
atividades relacionadas à tarefa” (1997, p. 126).
Entretanto, é preciso especificar a distinção entre líder e estilo de liderança. Se-
gundo Moscovici (1995, p. 126), estilo de liderança é: “A maneira pela qual uma pessoa
numa posição de líder influencia as demais pessoas no grupo”.
O padrão global das ações do líder é chamado de estilo de liderança. Ele apresenta
a filosofia, as habilidades e atitudes do líder na prática. Segundo Davis e Newstrom
(1992), eles diferem basicamente quanto à motivação, poder ou orientação para tarefa e
pessoas.
Tanto as orientações para o empregado (relações interpessoais) quanto para a tare-
fa, são estilos de liderança. Há evidências que os líderes seguros estão aptos a obter de-
sempenho e satisfação no trabalho, preocupando-se com as necessidades humanas dos
seus subordinados. Eles tentam montar um verdadeiro time de trabalho, dão apoio psico-
lógico e ajudam seus empregados na solução dos problemas. Quando orientado para tare-
fa, por outro lado, acreditam que obtém resultados mantendo as pessoas constantemente
ocupadas e pressionando-as para que produzam (Davis e Newstrom, 1992).
O comportamento voltado para as relações interpessoais (consideração) e o orienta-
do para tarefa (estrutura) parecem ser independentes. Entretanto, um líder que se torna mais
considerado, não se torna, necessariamente, menos estruturado. Ele pode ter ambas as ori-
entações em graus diferentes. Assim, “parece que os líderes mais bem sucedidos são aque-
les que combinam de forma relativamente alta tanto a consideração quanto à estrutura,
dando, de alguma forma maior, ênfase à consideração” (Davis e Newstrom, 1992, p. 163).
Muitas pesquisas foram feitas sobre esse assunto e os resultados demonstraram
que a mistura dos estilos leva a satisfação no trabalho e produtividade, bem como uma
diminuição nas queixas por parte dos funcionários, diminuição do giro de mão-de-obra e
baixa do stress dentro do grupo.

5.2 Desenvolvendo competências gerenciais

O desempenho das organizações está mais do que nunca em pauta. A capacidade


de posicionar-se corretamente perante os desafios de um ambiente em contínua transfor-
mação, exige revisões constantes de metas e estratégias em todas as áreas das organiza-
ções. Como forma de atuar diante destes novos cenários, muito se tem dito acerca do pa-
pel que as pessoas desempenham nas organizações, reconhecendo-se que são elas que
fazem à diferença nos momentos cruciais de mudança.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 7


Neste sentido, é cada vez mais claro que o sucesso de planos e estratégias depende
de pessoas comprometidas com a missão e os objetivos das organizações, assim como, do
desenvolvimento de uma série de competências para que as pessoas estejam à altura de
assumir desafios. Isto faz com que uma das prioridades de uma política de recursos hu-
manos seja definir as áreas de desenvolvimento para seus membros, como forma de po-
tencializar a capacidade de ação e proposição das organizações.
Sendo assim, o desenvolvimento de competências gerenciais se alinha ao objetivo
mais amplo de tornar as organizações melhores preparadas para enfrentar os desafios
atuais e futuros. Em termos genéricos, poderíamos dizer que toda organização necessita
de quadros com as seguintes competências gerenciais básicas: liderança; persuasão; tra-
balho em equipe; criatividade; tomada de decisão; planejamento e organização; e deter-
minação. A estas, cada organização pode acrescentar aquelas que consideram críticas
para o alcance de seus resultados específicos. O importante é que as competências geren-
ciais expressem o espírito da organização e a ajudem a alcançar maiores e melhores resul-
tados (Reis, 2006).
A seguir foi descrita cada uma delas, sugerindo indicadores positivos e negativos.
A partir de seu próprio conjunto de competências gerenciais e indicadores, será possível
que cada organização decida como desenvolvê-las e, futuramente, utilizá-las na avaliação
de desempenho de seus membros.

PERSUASÃO
Definição
• Eficaz na comunicação dos pontos de vista e na apresentação de seus argumentos;
• Negocia com habilidade para conseguir os melhores resultados para a organização;
• Tem presença e credibilidade dentro e fora da organização.
Indicadores positivos
• Exerce influência na apresentação de argumentos;
• É eficaz nas negociações;
• Consegue apoio a suas idéias, através do envolvimento de outras pessoas;
• É capaz de defender suas idéias, sem humilhar aqueles que se opõem a elas;
• Obtém a colaboração das outras funções, para assegurar o sucesso dos objetivos
que propõe;
• É claro e preciso na apresentação de idéias e pontos de vista;
• É visto como pessoa que tem presença e credibilidade;
• Representa bem a organização junto a parceiros e outros públicos da organização.
Indicadores negativos
• Comunica-se formalmente e sem naturalidade;
• Não é claro e preciso na apresentação das idéias;
• Sua comunicação não enfatiza prioridades críticas;
• Não defende bem seu ponto de vista (torna-se agressivo e não muda de posição ou
se rende ao enfrentar desacordo);
• Não sabe ouvir.

TRABALHO EM EQUIPE
Definição
• Integra-se bem na equipe;
• Coopera na divisão de recursos;
• Participa do intercâmbio de idéias para melhorar o desempenho da equipe.

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Indicadores positivos
• É bem aceito pelo grupo;
• Trabalha bem com o grupo, coopera na divisão de idéias e recursos;
• Direciona as atividades da equipe;
• Estimula a participação.
Indicadores negativos
• É isolado da equipe;
• Prefere trabalhar sozinho;
• Não se envolve com as atividades do grupo.

CRIATIVIDADE
Definição
• É aberto a novas idéias;
• Produz soluções inovadoras para os problemas da organização;
• É um agente de mudança.
Indicadores positivos
• Produz idéias não convencionais;
• Está preparado para discutir posições radicais;
• Está disposto a tentar novas soluções;
• Encontra soluções novas para problemas comuns;
• Cria condições para que os outros explorem novas idéias;
• Age como pioneiro (novos sistemas, serviços), na busca de resultados para a or-
ganização;
• Pensa lateralmente quando enfrenta problemas.
Indicadores negativos
• Fixa-se em caminhos convencionais;
• Reage negativamente a novas idéias;
• Necessita que a nova abordagem lhe seja comunicada;
• É resistente a mudanças;
• Tem a mente fechada para abordagens radicais;
• Desencoraja os outros a explorarem caminhos não convencionais;
• Reluta em abandonar “velhas” abordagens.

TOMADA DE DECISÃO
Definição
• Adota enfoque analítico frente às situações complexas;
• Capaz de avaliar alternativas criticamente, levando em conta a organização como
um todo;
• Está apto a assumir a responsabilidade por suas decisões;
• Oferece recomendações sólidas.
Indicadores positivos
• Toma decisões baseadas em bom conhecimento da área/função;
• Capaz de tomar decisões sob pressão (pouco tempo, variáveis desconhecidas, ris-
co);
• Adota enfoque analítico para problemas complexos;
• Capaz de analisar informações e compreender as implicações para a organização
(por exemplo, financeiras);
• Aproveita oportunidades no momento certo para tomar decisões;

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 9


• Trabalha bem com conceitos, trabalhando em “áreas cinzentas” de situações com-
plexas;
• Utiliza a intuição, além do julgamento racional.
Indicadores negativos
• Prefere passar a responsabilidade para outros tomarem as decisões (colegas, supe-
riores);
• Cauteloso em excesso, tornando-se lento para fazer recomendações;
• É avesso ao risco;
• Tende a se basear no passado, na experiência, sem utilizar o pensamento concei-
tual para resolver problemas e tirar conclusões;
• Trabalha a partir dos sintomas, ao invés de focalizar a causa dos problemas;
• Vê as coisas somente em “preto e branco”.

PLANEJAMENTO E ORGANIZAÇÃO
Definição
• Amplo conhecimento da organização como um todo;
• Elabora estratégias para atingir objetivos de curto, médio e longo prazo;
• Eficaz na execução de estratégias;
• Organizado na coordenação de recursos para atingir os objetivos da organização.
Indicadores positivos
• Possui larga visão sobre a organização e seu ambiente;
• Aprecia os fatores em escala abrangente;
• Compreende o impacto de suas atividades sobre outras áreas da organização;
• Projeta futuras exigências e tendências;
• Possui visão estratégica, podendo implementar e controlar para atingir os objeti-
vos;
• Traça estratégia para atingir resultados em longo prazo;
• Percebe oportunidades e adapta seu planejamento para aproveitá-las;
• Programa e concentra-se nas prioridades para cumprir prazos e objetivos.
Indicadores negativos
• Focaliza apenas uma área (por exemplo, sua própria função/papel);
• Pensa e age no curto prazo;
• Enfoque desorganizado, desperdiçando recursos (tempo, pessoas, dinheiro) ou
falta de controle;
• Desvia-se facilmente dos objetivos traçados;
• Não elabora cronogramas claros para a execução de planos.

DETERMINAÇÃO
Definição
• Voltado, continuamente, para melhorar resultados;
• Reavalia e atualiza o próprio nível de conhecimento profissional;
• Perseverante e determinado, apesar de contratempos.
Indicadores positivos
• Trabalha para melhorar o próprio desempenho;
• É independente ao traçar suas metas, padrões e direções próprias;
• Tem senso de urgência;
• Não é rígido, sendo perseverante diante de obstáculos;
• Mantém o otimismo, procura tentar novamente quando as coisas não dão certas;

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 10


• Procura constantemente aumentar seu próprio conhecimento profissional;
• Possui um alto grau de dinamismo e motivação pessoal.
Indicadores negativos
• Precisa que as metas sejam traçadas para ele;
• Fica contente em alcançar apenas o esperado, sem buscar novos desafios;
• Tende a desistir quando enfrenta obstáculos ou barreiras;
• Perde a motivação e o rendimento quando as coisas não dão certas.

Contudo, o conceito de competência pode ser atribuído a diferentes elementos, de


um lado tem-se a organização e de outro, as pessoas. A organização apresenta um conjun-
to próprio de competências, e para as pessoas: “saber agir de maneira responsável [...]
implica mobilizar, integrar, transferir conhecimento, recursos, habilidades, que agregam
valor econômico à organização e valor social ao indivíduo” (Fleury apud Dutra, 2001, p.
28). As pessoas ao desenvolverem sua capacidade individual, transferem para a organiza-
ção seu aprendizado, dando-lhe condições para enfrentar novos desafios (Dutra, 2001).

5.3 Competências do líder

O perfil do líder comprometido com o modelo de gestão por competências exige


conhecimentos, habilidades e atitudes que mais atendam às expectativas e particularida-
des da organização. Por conseguinte, este perfil deverá ser aberto e flexível, demonstran-
do um líder que aprende todos os dias, tornando-o mais valioso.

5.3.1 Uma das competências do líder (Relações interpessoais)

Competência interpessoal é a habilidade de lidar eficazmente com rela-


ções interpessoais, de lidar com outras pessoas de forma adequada as
necessidades de cada uma e as exigências da situação (Moscovici, 1995,
p. 36).
As relações interpessoais desenvolvem-se em decorrência do processo de intera-
ção. Em situação de trabalho há as atividades predeterminadas a serem executadas, assim
como, interações e sentidos recomendados como a comunicação, cooperação, respeito e
amizade. Os sentimentos positivos provocam aumento de interação e cooperação, reper-
cutindo de forma favorável nas atividades e como conseqüência, a produtividade (Mos-
covici, 1995).
O relacionamento interpessoal pode tornar-se e manter-se harmonioso e prazero-
so, permitindo trabalho cooperativo, em equipe, buscando a sinergia. Quando este rela-
cionamento não é positivo leva a dissolução do grupo (Moscovici, 1995).
Esse ciclo não se relaciona com a competência técnica de cada pessoa e sim, na si-
tuação de trabalho e por influência do grupo. Portanto, o grupo engloba conhecimento,
informações, atitudes, experiências, valores, etc. (Moscovici, 1995).
Relações interpessoais e clima de grupo influenciam-se recíproca e cir-
cularmente caracterizando um ambiente agradável e averso, ou neutro e
monótono. Cada modalidade traz satisfações ou insatisfações pessoais e
grupais (Moscovici, 1995, p. 35).

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 11


A liderança e a participação efetiva em grupo dependem da competência interpes-
soal do líder e dos membros, somando os esforços para obter mais que a simples soma
das competências técnicas individuais como resultado conjunto do grupo (Moscovici,
1995).

5.3.2 Outra competência do líder – Comportamento em relação à tarefa

Os passos que circundam a tarefa representam apenas parte do processo de lide-


rança. Os líderes oferecem apoio à tarefa assim como, dão apoio psicológico a seus em-
pregados. Eles oferecem apoio para a tarefa quando reúnem recursos, orçamentos, poder
e outros elementos que são essenciais para que o trabalho seja feito. Também é importan-
te que eles removam as restrições ambientais que algumas vezes inibem o desempenho
do empregado. Todavia, o apoio psicológico também é necessário e, os líderes devem
estimular as pessoas a quererem fazer o trabalho.
As modalidades de trabalho tarefa envolvem:
– Uma orientação de resolução de problemas;
– Tentativas de compreender e lidar com problemas;
– Respostas visando ajudar a consecução das metas do grupo;
– Sugestões para analisar e lidar com um problema específico.

Bales (apud Moscovici, 1995) apontou categorias que representam funções de


participação num grupo de trabalho, cujo principal objetivo consiste na resolução de pro-
blemas. As categorias distribuem-se em duas áreas de ocorrência: o da tarefa e a socio-
emocional. A área da tarefa compreende as funções ao nível de interação de conteúdo
para conclusão dos objetivos comuns do grupo. Os papéis assumidos com mais freqüên-
cia tendem a caracterizar a atuação do indivíduo no grupo. Assim, ao nível da tarefa, uma
pessoa quase sempre inicia as atividades, propõe ou sugere ao grupo maneiras de abordar
as tarefas, enquanto outra dinamizará os esforços, estimulando o grupo para melhor qua-
lidade dos resultados.
Como relatado anteriormente, um dos estilos de liderança é o orientado para con-
trole/tarefa. Esse estilo recebe várias denominações conforme as observações dos autores
que a estudaram. Tanto Tannenbaum e Schimidt quanto Kurt Lewin e seus colaboradores
mostraram a dicotomia dos estilos autocrático e democrático de liderança. O estilo auto-
crático é voltado para tarefa, enquanto o democrático é voltado para relações. Alguns
autores, mais ligados à administração, elaboraram teorias de liderança em que os estilos
autocrático e democrático aparecem conjugados a dimensões organizacionais como pes-
soas (satisfação) e tarefa (produtividade), caracterizando estilo gerencial – administrado-
res em grupos organizacionais.
Outros enfoques foram estudados, como Fiedler apud Moscovici (1995) coloca
que tanto os estilos autocráticos, voltados para produtividade/tarefa, quanto os estilos
participativos, voltados para as pessoas/relações, podem ser eficazes ou ineficazes, a de-
pender da relação interna de fatores situacionais, tais como a natureza da tarefa, a conjun-
tura, o clima organizacional, a estrutura de recompensas, os valores, motivações e expec-
tativas do líder e dos liderados, a maturidade do grupo.
É importante que o líder tenha certa flexibilidade para usar estilos diferentes, da
mesma forma como atende às expectativas de diferentes papéis sociais, desempenhando-

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 12


os com comportamentos mais ou menos adequados resultantes de sua flexibilidade, moti-
vação e experiência.

6 MÉTODO

6.1 Método de pesquisa adotado

Foi realizada uma pesquisa de campo, com aplicação de um questionário fechado,


abordando aspectos quantitativos e qualitativos da empresa pesquisada em relação aos
aspectos da liderança, relações interpessoais e a tarefa.

6.2 Público alvo e amostra da população

O público alvo foi os colaboradores da empresa de Assistência Médica, que parti-


cipam diretamente da tomada de decisão no atendimento ao cliente, perfazendo um total
de 37 funcionários. A amostra da população compreende os colaboradores de diversos
setores: recepcionistas, auxiliares de enfermagem, auxiliares administrativos e líderes de
todos os setores.

6.3 Modelo de pesquisa utilizada

6.3.1 Aspectos da liderança

Objetivo: Identificar o estilo do líder.

1) O comportamento é orientado para o relacionamento


Fraco Retirado do grupo, encabulado
Regular Reservado, sério, pensativo
Bom Afetuoso, amigável, animado, tem empatia
Excelente Muito extrovertido, fluente estimulante, sociável

2) O comportamento é orientado para a tarefa


Fraco Foge da responsabilidade, deixa que os outros o conduzam
Regular Trabalha com disposição, mas se aborrece com facilidade
Bom Orientador, iniciador de coisas, minucioso
Excelente Tomador de decisões, compromete a equipe

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 13


Objetivo: Identificar os estilos de liderança.
Seu chefe imediato pode ser classificado como:

1) Tirano
Fraco Apresenta abuso de autoridade e excesso de poder
Regular Apresenta às vezes abuso de autoridade e excesso de poder
Bom Apresenta esporadicamente abuso de autoridade e excesso de poder
Excelente Não apresenta abuso de autoridade e nem excesso de poder

2) Autocrático
Fraco Apresenta centralização de poder de decisão
Regular Apresenta às vezes centralização de poder de decisão
Bom Apresenta esporadicamente centralização de poder de decisão
Excelente Não apresenta centralização de poder de decisão

3) Democrático
Fraco Apresenta pouca divisão dos poderes de decisão
Regular Apresenta às vezes divisão dos poderes de decisão
Bom Apresenta esporadicamente divisão dos poderes de decisão
Excelente Apresenta divisão dos poderes de decisão

6.3.2 Dimensões interpessoais

Objetivo: Identificar as características individuais dos líderes.


As características de seu chefe imediato podem ser resumidas em:

1) Quanto à motivação
Fraco Apresenta pouca energia
Regular Apresenta às vezes pouca energia
Bom Apresenta energia na maioria do tempo
Excelente Apresenta alto índice de energia

2) Trabalho em Equipe
Fraco Apresenta comportamento arrogante, pouco participativo
Regular Apresenta às vezes comportamento arrogante e pouco participativo
Bom Apresenta esporadicamente comportamento arrogante e pouco parti-
cipativo
Excelente Não apresenta comportamento arrogante e pouco participativo

3) Tomada de decisão, planejamento e organização


Fraco Apresenta muito receio em correr riscos
Regular Apresenta às vezes receio em correr riscos
Bom Apresenta esporadicamente receio em correr riscos
Excelente Não apresenta receio em correr riscos

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 14


Objetivo: Identificar a liderança em relação à tarefa.

1) Comunicação da decisão tomada pelo líder


Fraco Apresenta comunicação incompleta, descuidada e sem cautela
Regular Apresenta às vezes comunicação incompleta, descuidada e sem cau-
tela
Bom Apresenta esporadicamente a comunicação incompleta, descuidada e
sem cautela
Excelente Apresenta a comunicação de forma completa, precisa e cautelosa

2) Venda da decisão
Fraco Apresenta pouca persuasão
Regular Apresenta às vezes persuasão
Bom Apresenta na maioria das vezes persuasão
Excelente Persuasivo

3) Promoção do debate
Fraco Apresenta pouca abertura na tomada de decisão
Regular Apresenta às vezes abertura na abertura na tomada de decisão
Bom Apresenta na maioria das vezes abertura na tomada de decisão
Excelente Apresenta abertura na tomada de decisão

7 RESULTADOS

7.1 Aspectos da liderança – Objetivo: identificar o estilo do líder

- Líder é orientado para o relacionamento

COMPORTAMENTO ORIENTADO PARA O


RELACIONAMENTO

Excelente Fraco
11% 16%
Fraco
Regular
Regular
22% Bom
Bom Excelente
51%

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 15


- Líder é orientado para a tarefa

COMPORTAMENTO ORIENTADO PARA A TAREFA

Fraco
Excelente 8%
16%
Regular Fraco
14%
Regular
Bom
Excelente
Bom
62%

7.2 Estilos de liderança – Objetivo: identificar os estilos de liderança

TIRANO

Excelent
e 8%
Fraco
Bom 32% Fraco
19% Regula
rBom
Excelent
Regula eeEe
r 41%

AUTOCRÁTICO

Excelente Fraco
5% 19%
Bom Fraco
27% Regular
Bom
Excelente
Regular
49%

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 16


DEMOCRÁTICO

Excelent Fraco
e 19% 14%
Fraco
Regular Regular
22% Bom
Excelent
Bom e
45%

7.3 Dimensões interpessoais – Objetivo: identificar as características


individuais do líder

MOTIVAÇÃO

Fraco
Excelente 8%
30% Fraco
Regular
Bom
Bom
5% Regular Excelente
57%

TRABALHO EM EQUIPE

Excelente
8%
Fraco
Bom 32% Fraco
19% Regular
Bom
Excelente
Regular
41%

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 17


TOMADA DE DECISÃO, PLANEJAMENTO E
ORGANIZAÇÃO

Fraco
Excelente
19%
27% Fraco
Regular
Regular
16% Bom
Excelente
Bom
38%

7.4 A liderança em relação à tarefa

COMUNICAÇÃO DA DECISÃO TOMADA PELO


LÍDER

Excelente Fraco
19% 24% Fraco
Regular
Bom Bom
19% Excelente
Regular
38%

VENDER A DECISÃO

Fraco
Excelente
22% 8%
Fraco
Regular
27% Regular
Bom
Excelente
Bom
43%

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 18


PROMOÇÃO DO DEBATE

Excelente Fraco
11% 16%
Fraco
Regular
Bom Bom
Regular
39% Excelente
34%

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na análise dos resultados, pôde-se constatar a incompatibilidade e inconsistência


nas informações obtidas no grupo pesquisado na empresa de assistência médica. Ao estu-
dar a organização, foi possível observar como certos símbolos são criados e os procedi-
mentos implícitos e explícitos para legitimá-los.
Dentro da cultura organizacional, verificamos a empresa como uma grande famí-
lia, onde exemplifica a criação do mito, integrando vários significados e os processos de
sua legitimação. Há o envolvimento do líder com toda a arquitetura e decoração do pré-
dio da empresa, com o tema sobre vida, arte e viagens do mesmo, onde o mito da figura
do líder tem um estilo autocrata, que dispõe de meios de punição e recompen-
sa/gratificação com seus colaboradores. Um exemplo disso, é a existência de um espaço
de convivência onde os colaboradores se reúnem junto com o líder para se confraternizar,
como o almoço de família no domingo.
Na tomada de decisão, a empresa dispõe por um lado de uma autonomia que che-
ga ser tirana no cumprimento da regra de ouro: “nenhum paciente sai sem ter atendimento
médico” e por outro lado, as decisões no que se refere a temas importantes na gestão dos
resultados da empresa são fechadas e enclausuradas na figura do mito, onde muitas vezes
o mesmo usa dos encontros informais (exemplo: almoço de família) para comunicar a sua
decisão, “vendendo a ilusão” de participação – sua opinião é importante. Contudo, o líder
consegue reunir o grupo para a realização da tarefa, onde a capacidade de cooperação é
grande. Conforme relatado por Bion (1975, p. 88) em suas experiências com os grupos de
trabalho.
No desenvolvimento do nosso grupo na realização do trabalho de conclusão, ti-
vemos um impasse, onde um integrante do grupo faz parte da liderança – o self da orga-
nização. Observamos que o seu papel na empresa se mistura com o papel do mito, por
esse motivo, o integrante não aplicou a pesquisa no público alvo por validar o mito e de
certa forma, até participar desse mito. Isso gerou para o grupo certa preocupação para que
o resultado não fosse influenciado na coleta de dados e nem de expor esse integrante para
o mito da empresa, de maneira a desgastar a sua imagem perante a organização.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 19


Portanto, na primeira fase do trabalho o nosso grupo tentou trabalhar de maneira a
omitir esses fatos na tentativa de preservar o membro do grupo e a organização, com re-
lação ao resultado não positivo em relação à gestão de competências.
Já na fase final do trabalho, depois da orientação das coordenadoras da SBDG, o
grupo percebeu a importância de expor os fatos, pois conforme relatado anteriormente, os
resultados da pesquisa de campo realizada se tornaram confusos e inconsistentes. Pois
uma parte dos entrevistados tem uma visão verdadeira do que acontece na organização e
outra parte, tem uma visão corrompida pelo posicionamento da empresa. Com isso, o
grupo (liderados) é um grupo de dependência, que espera que o líder atue com autoridade
como líder do grupo, embora não da maneira que o grupo espera. E essa situação está
carregada de emoções que exercem uma influência poderosa e freqüentemente inobser-
vada sobre o indivíduo, segundo Bion (1975).
Um detalhe interessante que pôde-se perceber, embora a figura do mito até mes-
mo do integrante do nosso grupo seja muito forte e persuasiva na empresa, notamos que
na organização os colaboradores trabalham num ambiente organizacional agradável, gra-
tificante, pois demonstram disposição para tal e satisfação. Além disso, há um sentimento
de família onde todos se preocupam com o bem-estar do outro.
Para Bion (1975), em determinadas circunstâncias, o grupo parece mobilizado por
forças ou impulsos, denominado de mentalidade de grupo. Tal mentalidade de grupo difi-
culta a satisfação das necessidades do indivíduo e desenvolvem uma cultura de grupo,
relacionando-se segundo certos padrões, onde escolhem líderes com determinadas carac-
terísticas. Diante disso, é inevitável que um grupo satisfaça alguns desejos e frustre ou-
tros.
Para a conclusão do trabalho, o nosso grupo se reuniu diversas vezes na empresa,
assim pôde verificar e presenciar de fato que a figura do líder nesta empresa é realmente a
do “paizão”, onde ele precisa ser convencido pelos seus filhos para mudar uma decisão
ou uma das coisas, mas trata a todos com amor de pai, ou seja, unindo e recompensando
seus filhos e, por outro lado mantendo-se no controle das decisões, indicando baixo grau
de autonomia das demais posições de liderança da organização. Segundo Bion (1975),
quando o grupo (líder e liderados) se reúne, tornam-se algo tão real e tão parte da vida
humana como uma família, mas ele não é de maneira alguma, a mesma coisa que uma
família. O líder de um grupo é muito distante de ser o pai de uma família.
Partindo desses pressupostos acima e tendo a Gestão por Competências por algo
inovador e moderno, esse processo, no momento, não é aplicável à empresa, devido a
pouca diferenciação que existe entre o pessoal e o privado. Apenas será possível, na me-
dida em que os papéis possam ser clarificados, gradualmente, para a organização. Além
do que, a Gestão por Competências é de co-responsabilidades, o que, em função, do estilo
atual do líder e da organização, impossibilita tal gestão. Assim, considerando-se que, mu-
dança na cultural organizacional demanda tempo para que todo o grupo possa caminhar
na mesma direção e comungando um caminho que, com as resistências a mudanças, ha-
verá a concordância em relação ao processo da Gestão por Competências.

REFERÊNCIAS

BION, W. R. Experiências com grupo: os fundamentos da psicoterapia de grupo. 2. ed. São Paulo: Ed.
Universidade de São Paulo, 1975.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 20


CHANLAT, J. F. O indivíduo na organização: dimensões esquecidas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1996.
DAVIS, Keith; NEWSTROM, John W. Comportamento humano no trabalho. São Paulo: Pioneira, 1992.
DUTRA, Joel Souza. Gestão por competências. São Paulo: Gente, 2001.
FRANÇA, Ana Cristina Limongi; ARRELLANO, Eliete Bernal et al. As pessoas na Organização. São
Paulo: Gente, 2002.
MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru. Teoria geral da administração – da revolução urbana à revolução
digital. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 4. ed. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1995.
. Equipes que dão certo: a multiplicação do talento humano. 7. ed. Rio de Janeiro: José Olympio,
2002.

SBDG – Caderno 85 v Construção do ambiente organizacional partindo do perfil... 21


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Londrina – PR
Coordenação: Isabel Cristina M. Doval, Suely do Rocio P. Pucci

Relacionamento interpessoal como variável


causadora de estresse no trabalho e no grupo

CLÁUDIO PINHEIRO DA SILVA


DENIZE MAIONE GRANDE
ELISÂNGELA CRISTINA DUARTE RAMOS
GIOVANA AUGUSTA PITON VOLPI

Resumo – O objetivo deste trabalho foi investigar se as relações interpessoais impactam


no desenvolvimento do trabalho, gerando estresse no grupo tático em uma Prestadora de
Serviços do Segmento de Saúde do Município de Londrina. Participaram da pesquisa 19
profissionais. Os resultados demonstraram que as relações interpessoais impactam no
desenvolvimento do trabalho, principalmente nas relações com nível hierárquico supe-
rior, cujo processo de mudança de gestão na organização é apontado como a maior causa
pela maioria dos entrevistados. Esta situação permeia todas as demais, dentro do grupo
tático (mais explicitamente) e com a equipe de trabalho (mais sutilmente), causando es-
tresse nos membros e dificultando o trabalho. Outro fator que reforça esta conclusão é a
necessidade de desenvolver a inclusão no grupo.
Palavras chave – Relacionamento interpessoal. Estresse no trabalho. Estresse no grupo.

Abstract – The objective of this research was to investigate if the interpersonal relation-
ship affects the job’s development, generating stress in the tactical group in a Lender of
Services of the Health’s Segment from Londrina. There were 19 professionals participat-
ing in the research. The results had demonstrated that the interpersonal relationship im-
pacts the job’s development, mainly with superior hierarchic level, whose management’s
change process in the organization is pointed as the biggest cause for the majority. It oc-
curs inside the tactical group (more explicit) and in the teamwork (more subtle). Another
factor that strengthens this conclusion is the necessity of developing the group’s inclusion
process.
Key words – Interpersonal relationship. Stress on the job. Stress and teamwork.

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 1


1 INTRODUÇÃO

O estresse se instala em um indivíduo quando o senso de autodomínio, de poder


agüentar as tempestades emocionais, está comprometido. Quando isto ocorre o equilíbrio
mental e psicológico não existe. Schutz (1989) afirma que o indivíduo não precisa evitar
sentimentos desagradáveis, apenas impedir que eles desloquem todos os demais estados
de espíritos agradáveis.

2 OBJETIVOS

Objetivo geral:
Investigar se as relações interpessoais impactam no desenvolvimento do trabalho,
gerando estresse no grupo tático.

Objetivos específicos:
a) Identificar os agentes estressores no desenvolvimento do trabalho; b) Analisar o
relacionamento interpessoal dentre o grupo tático; c) Analisar as reações do grupo tático
ao estresse; d) Mensurar a habilidade de negociação dentre o grupo tático; e) Verificar as
formas utilizadas para lidar com o estresse.

3 JUSTIFICATIVA

Considerando-se o grupo de trabalho, foco da atual pesquisa, percebe-se que a ati-


vidade laborativa exerce grande influência sobre o comportamento do indivíduo, devido
ao aumento de responsabilidade, estando sujeito a uma sobrecarga psicofísica, forçando o
organismo a reagir e adaptar-se à agressão do ambiente, surgindo assim o estresse, que
por sua vez poderá interferir nas dimensões intra e interpessoais.
Como este quadro interfere sobremaneira na qualidade de vida dos indivíduos e na
produtividade do grupo, considerando estas três variáveis: indivíduo como ser grupal,
trabalho e relacionamento interpessoal, o presente trabalho justifica-se pela necessidade
de analisar o relacionamento interpessoal como variável causadora de estresse no traba-
lho e no grupo.

4 METODOLOGIA

4.1 Tipo de pesquisa e universo da amostra

Para o desenvolvimento desse trabalho foram realizadas pesquisas de natureza ex-


ploratória, bibliográfica e de campo, com entrevistas semi-estruturadas, considerando os
possíveis aspectos relacionados a agentes estressores, ambiente de trabalho, relaciona-
mento interpessoal, e demais fatores correlacionados com o tema. O roteiro básico foi
elaborado pelos integrantes do grupo, com colaboração da Didata e Especialista que co-
ordenam o grupo SBDG Londrina 2005/2006. (Apêndice 1)

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 2


O universo possível a ser pesquisado consistia de 20 pessoas do nível tático, dis-
tribuídas em 2 níveis hierárquicos: 03 Superintendentes; 17 Gestores, Assessores e Coor-
denadores de Áreas, (conforme organograma abaixo) de uma Prestadora de Serviços do
Segmento de Saúde, de porte médio, com duzentos e noventa e cinco colaboradores.

ESTRUTURA ORGANIZACIONAL

ASSEMBLÉIA
GERAL

COMITÊ ÉTICA CONSELHO


MÉDICA FISCAL

PRESIDENTE

COMITÊ EDUCATIVO: DIRETORIA COMITÊ EXECUTIVO

DESENVOLVIMENTO
CONSELHO TÉCNICO
HUMANO

ASS. IMPRENSA E ASSESSORIA


COMUN.CORPORATIVA JURÍDICA

SUPERINTENDÊNCIA DE SUPERINTENDÊNCIA
SUPERINTENDÊNCIA
DESENVOLVIMENTO E DE PROVIMENTO DE
ADM. / FINANCEIRA
MERCADO SAÚDE
Assess. de Planej. E Núcleo de Qualidade
Gestão em Saúde em Saúde
Assessoria de
Marketing Audit. Médica
Audit. Enfermagem

Serviço Social

Gestão de Gestão de Gestão Relac. Gestão de Gestão de Gestão Gestão da Gestão de Gestão de Gestão de Central de
Vendas Fidelização Com Clientes Apoio Adm. Control. Financeira Informação Produção Relac. Prest. Relac. Coop. Serviços

Med Prev
CDU
DOM

O grupo tático apresenta os seguintes momentos de interação promovidos pela or-


ganização: a) Foco na tarefa: tarefas do dia-a-dia; reuniões de projetos; reunião ordiná-
ria mensal (não há presença dos superintendentes). b) Foco no relacionamento: grupo
de relacionamento (não há presença dos superintendentes); confraternização anual.

25
20
15
10
5
0
FEMININO MASCULINO TOTAL
21.00 a 40.99 8 4 12
41.00 a 50.99 3 3 6
51.00 a 60.99 1 1 2
Subtotal 12 8 20

Gráfico 1 – Distribuição dos membros do grupo tático por sexo e faixa etária.

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 3


9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
FEM - CASADO FEM - SOLTEIRO MASC - CASADO MASC - SOLTEIRO
21.00 a 40.99 4 4 3 1
41.00 a 50.99 3 0 0 3
51.00 a 60.99 1 0 0 1
Total geral 8 4 3 5

Gráfico 2 – Distribuição dos membros do grupo tático por estado civil, sexo e faixa etária.

4.2 Limitações do método

O método escolhido para a pesquisa apresenta certas limitações: abranger somente


uma parte da organização (grupo tático); os entrevistados podem ter fornecido respostas
duvidosas, não correspondendo às suas reais opiniões, por razões conscientes, como me-
do, ou inconscientes; alguma falha do entrevistador, podendo ter influenciado nas respos-
tas. Cabe mencionar neste momento que um dos possíveis entrevistados preferiu não res-
ponder o questionário, logo de 20 pessoas que poderiam ser entrevistadas, só foi possível
realizar 19 entrevistas. Então os dados coletados e analisados referem-se as respostas de
19 pessoas que participaram da pesquisa.

5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.

5.1 Conceito de grupo

Grupo pode ser definido como dois ou mais indivíduos interagindo que se juntam
para atingir objetivos. www.gruposhumanos.com.br (consultado em 08/06/2006)
De acordo com Moscovici (1999) no que diz respeito a grupos, é necessário con-
siderar as dimensões intrapessoal e interpessoal. A dimensão intrapessoal é decisiva na
interação com os outros, pois a apreensão e a interpretação de cada situação interpessoal
e grupal são influenciadas pelo repertório relacional, motivação e ideologia da pessoa.
Ela desenvolve-se em decorrência do processo de interação entre os membros e pode
assumir formas afetuosas e de cooperação ou formas conflitivas, competitivas e de apa-
rente cordialidade.
As dificuldades intrapessoais não resolvidas aparecem nas situações de grupo, de
forma direta ou indireta. A ausência de habilidades interpessoais dificulta o estabeleci-
mento de objetivos e metas grupais.
Segundo Guimarães (2000) o indivíduo ao longo de sua sobrevivência, forma vá-
rios grupos, exerce papéis, e habita vários contextos, podendo citar como exemplo de
contextos: trabalho, escola, família, lazer, etc; é necessário mencionar que, independente
do contexto o qual o indivíduo esteja inserido, todas as relações existentes impactam dire-

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 4


tamente no próprio indivíduo e nas pessoas com o qual se relaciona. Assim é inegável
que o trabalho, tal como é entendido na atualidade, exerce notável influência sobre o
comportamento humano. As pressões sociais e profissionais, o aumento de responsabili-
dades, dentre outras variáveis, podem submeter o indivíduo a uma grande sobrecarga
psicofísica, que obriga o organismo a colocar em marcha seus mecanismos biológicos e
fisiológicos para a adaptação e defesa das agressões desse ambiente.
No entanto, independente da eficiência do grupo, para que o mesmo possa sobre-
viver, Schutz (1989) afirma que devem ser criados vínculos pessoais entre seus membros,
pois se nenhuma atenção for dada aos sentimentos das pessoas umas pelas outras, cres-
cem as rivalidades, os desejos pessoais não satisfeitos, de modo que as pessoas sabotam
ou abandonam o grupo e a vida grupal se encerra.

5.2 Conceituação do estresse

Lazarus e Folkman (apud Guimarães, 2000), definiram o estresse como uma relação
particular entre a pessoa e o ambiente, que é avaliada como algo que excede seus recursos e
ameaça seu bem-estar. Moraes, Cooper, Swan apud Guimarães (2000) também contribuí-
ram para a definição de estresse dando um passo além desta visão mais biologicista, resga-
tando a importância de se observar o homem e sua rede de significados e relações.
Corroborando com os autores citados acima Guimarães (2000), relatou que as
pessoas reagem de diferentes formas a presença de estímulos semelhantes, porque os per-
cebem e valorizam dentro de critérios pessoais. Esta teoria propõe que a estrutura física,
psíquica e bioquímica do homem, bem como seus valores, hábitos e ambiente social de-
terminam, em parte, o tipo e a freqüência das manifestações de estresse.

5.3 O estresse e o relacionamento interpessoal no trabalho

O relacionamento interpessoal entre os membros de um grupo resulta na criação


ou na destruição de sua eficácia como equipe. Uma empresa por ser composta de pessoas,
representa uma comunidade, um grupo, que por sua vez se divide nos mais diversos sub-
grupos, cujos membros mantêm relacionamentos constantes entre si, bem como com o
mundo externo à empresa. Partindo do princípio que um grupo é a reunião de dois ou
mais indivíduos em torno de um objetivo comum, é fundamental que haja um relaciona-
mento positivo entre os seus membros, o que nem sempre ocorre de forma natural e es-
pontânea, uma vez que grupos são compostos por pessoas cujos interesses e necessidades
individuais raramente são totalmente semelhantes e essas diferenças podem causar ten-
sões que geram conflitos tanto dentro do mesmo departamento quanto entre departamentos.
Diferenças individuais trazem naturalmente diferenças de opiniões, expressas em
discordâncias quanto a aspectos de percepção de tarefa, metas, meios ou procedimentos.
Essas discordâncias podem conduzir a discussões, tensões, insatisfação e conflitos, que
disseminam sentimentos e emoções que afetam e reduzem a objetividade, transformando
o clima emocional do grupo. Isso aumenta os níveis de estresse já que não cria harmonia,
o que por sua vez, resulta em menor eficácia no trabalho.
Atualmente, a grandeza de agentes estressores presentes nas sociedades têm exi-
gido do indivíduo uma adaptação constante ao seu meio, o que o leva muitas vezes a um

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 5


estado de permanente tensão. Desta forma, com o mecanismo de reação do organismo
constantemente ativado e experimentando níveis contínuos de pressão, o indivíduo passa
a agredir-se a si mesmo, afetando também o grupo com quem se relaciona.
Os níveis de estresse a que são submetidos muitos chefes e gerentes variam um pou-
co. Muitos se sentem sobrecarregados por enfrentar problemas, pressões e até exigências de
seus subordinados, além da pressão das exigências feitas por seus superiores. A administra-
ção intermediária pode ser uma das áreas mais frustrantes da vida da organização.
Assim pode-se afirmar que o estresse no trabalho tornou-se uma preocupação
mundial, motivando pesquisadores a desenvolver estudos que possam levar à compreen-
são das causas, efeitos e prevenção do estresse no local de trabalho, e conseqüentemente,
no relacionamento interpessoal.
Conforme Rossi, Perrewé e Sauter (2005), diversas pesquisas detalharam muito
bem algumas das principais causas do estresse no local de trabalho, sendo elas: incerteza,
sobrecarga de trabalho, falta de controle, demandas do trabalho, estresse interpessoal,
incapacidade de administrar o tempo, lidar com problemas emocionais, falta de feedback,
conflito da função, mudança no ambiente e falta de participação.

5.4 Níveis de organização social, segundo Schutz

De acordo com Schutz (1989), o homem é um organismo integral e unificado que


realiza diversas funções mantendo determinados equilíbrios.
Nem todas as escolhas são conscientes, ou para dizer com mais exatidão, em al-
guns casos o homem não se permite saber que quem escolhe é ele. Assim Schtuz (1989)
caracteriza os níveis de desenvolvimento organizacional: inclusão, controle e abertura
que possibilitam a compreensão da fonte dos desequilíbrios e das motivações das pes-
soas, grupos.
Na dimensão da inclusão o comportamento é determinado pelo modo como o in-
divíduo se sente a respeito do que significa como pessoa. As interações de inclusão con-
centram-se nos encontros. Os desequilíbrios aqui ocorrem quando a inclusão do indivíduo
no grupo não é cuidada pela organização. Neste contexto, é natural o estresse aparecer
tanto na pessoa quanto no grupo que não aceita a inserção do novo membro.
O comportamento de inclusão pode ser: a) subsocial: quando o indivíduo é introver-
tido e retraído. Quer manter distância dos outros e não quer se misturar a eles, pois se o
fizesse perderia a privacidade. Inconscientemente, quer sem dúvida que os outros prestem
atenção nele; b) ultra-social: quando o indivíduo é extrovertido. Busca incessantemente as
pessoas e quer que elas o procurem ou; c) social: o indivíduo cujo problema de inclusão foi
bem resolvido na infância, não havendo dificuldade na interação com as pessoas.
O comportamento de controle se refere ao processo de tomada de decisão entre
pessoas na área do poder, da influência e da autoridade. O desejo de controlar varia desde
o desejo de ter autoridade sobre os outros até o desejo de ser controlador e isentado de
toda responsabilidade. No comportamento de controle, as pessoas diferentes assumem ou
buscam papéis diversificados e as lutas pelo poder, a competição e a influência passam a
ter uma importância central.
As posições adotadas na dimensão de controle são: a) abdicrata: o indivíduo que
abdica de seu poder. Aceita uma posição subordinada na qual não tenha que assumir a
responsabilidade pela tomada de quaisquer decisões; b) autocrata: o indivíduo extrema-

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 6


mente dominador. É fanático pelo poder, um competidor ou; c) democrata: o indivíduo
que resolve bem durante sua infância o problema de suas relações nas situações de con-
trole, o poder e o controle não são mais problemáticos.
O comportamento de abertura descreve sentimentos de proximidade, pessoais e
emocionais, entre duas pessoas. A abertura é uma relação diádica, quer dizer, ocorre entre
pares de pessoas, ao passo que tanto a inclusão quanto o controle são relações que podem
ocorrer ou em díades, ou entre uma pessoa e um grupo.
Os tipos de comportamento de abertura são: a) subpessoal: indivíduo que evita
elos íntimos com outras pessoas; b) superpessoal: é o indivíduo extremamente próximo
dos outros e quer que os outros se aproximem de si; ou c) pessoal: é o indivíduo que re-
solve bem as relações de abertura na infância, a interação emocional íntima com outra
pessoa não constitui problema.

6 TABULAÇÃO DA PESQUISA

6.1 Resultados

Questão 1) Como você classifica o grau de relacionamento dentro do grupo


tático?

Grau de Relacionamento dentre o Grupo Tático

12

10

0
Excelente Muito bom Bom Ruim Péssimo
Qtde. respostas 1 3 12 3 0
% Representatividade 5% 16% 63% 16% 0%

Questão 2) Como você classifica o grau de relacionamento entre o grupo táti-


co e as suas equipes?

Grau de Relacionamento entre Grupo Tático e Suas Equipes

12

10

0
Excelente Muito bom Bom Ruim Péssimo
Qtde. respostas 0 5 12 2 0
% Representatividade 0% 26% 63% 11% 0%

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 7


Questão 3) Como você classifica o grau de relacionamento entre o grupo táti-
co e os superiores?

Grau de Relacionamento Grupo Tático e Superiores

10

0
Excelente Muito bom Bom Ruim Péssimo
Qtde. respostas 0 1 9 8 1
% Representatividade 0% 5% 47% 42% 5%

Questão 4) O relacionamento interpessoal dentro do grupo tático* impacta


na realização da sua tarefa de forma:

Relacionamento impacta na realização da tarefa de forma:

Negativa
33%

Positiva
67%

Positiva Negativa

Questão 5.a) Você tem habilidade de negociar suas idéias com a sua equipe?

Habilidade Negociação junto à Equipe

20

15

10

0
Sim Não Ás vezes
Qtde. respostas 19 0 0
% Representatividade 100% 0% 0%

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 8


Questão 5.b) Você tem habilidade de negociar suas idéias com outro membro
do grupo tático:

Habilidade de Negociação junto a outro membro do Grupo


Tático

10
8
6
4
2
0
Sim Não Ás vezes Não
respondeu
Seqüência1 8 0 10 1
Seqüência2 42% 0% 53% 5%

Questão 5.c) Você tem habilidade de negociar suas idéias com seus Superio-
res:

Habilidade de negociação junto aos Superiores

10

0
Sim Não Ás vezes
Qtde. respostas 8 1 10
% Representatividade 42% 5% 53%

Questão 6) Existe vínculo de abertura entre você e o grupo tático? Em qual


proporção?

Proporção de abertura junto aos membros do Grupo Tático

7
6
5
4
3
2
1
0
Com Com Com 2 Com 3 a 5 Com 6 a 10 Com todos
nenhuma somente 1 pessoas do pessoas do pessoas do do grupo

Qtde. respostas 0 1 1 5 5 7
% Representatividade 0% 5% 5% 26% 26% 37%

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 9


Questão 7) Ao interagir com outro membro do grupo, seu instinto é de:

Ao interagir com outro membro do grupo, seu instinto é:


Não respondeu
Deixar que o
11%
outro controle as
relações
16%

Controlar as
relações
73%

Controlar as relações Deixar que o outro controle as relações Não respondeu

Questão 8) Você participa de todas as decisões que envolvem a sua área?

Participação nas decisões da área

Não
47%
Sim
53%

Sim Não

Questão 9) Você acha que suas relações no trabalho interferem na sua vida
familiar? Por quê?

Relações de trabalho interferem na vida familiar

Não
21%

Sim
79%

Sim Não

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 10


Questão 10) Assinale os 10 itens que mais interferem no desenvolvimento do
seu trabalho:

Itens que interferem no desenvolvimento do trabalho:

18
16
14
12
10
8
6
4
2
0 Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item Item
A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T

Item 10 11 5 8 14 10 5 10 5 5 11 3 9 14 18 8 8 13 8 5
% Repres. 5 , 6 % 6,1% 2 , 8 % 4 , 4 % 7 , 8 % 5 , 6 % 2 , 8 % 5 , 6 % 2 , 8 % 2 , 8 % 6,1% 1,7% 5 , 0 % 7 , 8 % 1 0 , 0 % 4 , 4 % 4 , 4 % 7 , 2 % 4 , 4 % 2 , 8 %

Legenda: A – Incerteza; B – Sobrecarga de trabalho; C – falta de controle; D – Demandas de


trabalho; E – Relacionamento interpessoal; F – Incapacidade de administrar o tempo; G – Es-
tresse tecnológico (novas ferramentas); H – Conflito da função (não poder realizar o que é corre-
to); I – Tarefas rotineiras; J – Recursos inadequados; K – Lidar com problemas emocionais; L –
Falta de capacitação, treinamento; M – Assédio moral; N – Falta de feedback; O – Mudança da
alta administração; P – Falta de participação; Q – Falta de informação; R – Falta de planejamen-
to; S – Pouca participação nas decisões da empresa; T – Falta de perspectiva de crescimento
profissional.

Questão 11) Como você se sente como membro do grupo tático?

Como se sente como membro do grupo tático

10

0
totalmente aceito e aceito com restrições e aceito com restrições e
importante para o grupo sem grande importância com grande importância

Qtde. respostas 9 4 6
% Representatividade 47% 21% 32%

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 11


Questão 12) Como você se sente como membro da equipe de sua superinten-
dência?

Como se sente como membro da equipe da sua Superintendência

10

0 totalmente aceito e aceito com restrições e aceito com restrições e


importante para o grupo sem grande importância com grande importância
Qtde. respostas 10 4 5
% Representatividade 53% 21% 26%

6.2 Análise dos resultados

Foi possível verificar que as interações de inclusão do grupo tático predominam


nos encontros formais e com foco nas tarefas, havendo oportunidade para momentos de
informalidade, descontração e socialização. Estes momentos se fazem necessários para
criar vínculos pessoais entre seus membros, proporcionando descobrir como cada com-
ponente se sente como pessoa e sua significância junto ao grupo.
Observa-se que uma parte do grupo, representada por 52%, apresenta problemas
de inclusão, não se sentindo aceitos por inteiro. O modo fundamental da inclusão é a co-
municação e dentro de uma estrutura organizacional deve haver absoluta clareza sobre a
visão, estratégias e políticas estabelecidas pela cúpula, de modo a exercer a função inter-
mediária de interlocução entre os níveis que não se comunicam diretamente. No entanto,
parte do grupo, representada por 47% dos seus membros, sinaliza que não participa das
decisões que envolvem sua área, ocasionando problemas de comunicação.
O grupo pesquisado é vinculado a macro áreas específicas e estas, ao apresenta-
rem problemas de comunicação, contribuem para a luta por poder e influência. Os dados
obtidos demonstram que a maioria do grupo, representada por 73%, dos membros tem
elevado grau de instinto de controle, tendendo a controlar a interação nas relações. Nota-
se que o grau de dificuldade para habilidade de negociação é ascendente nos níveis hie-
rárquicos, pois uma parte do grupo, representada por 53% dentre o grupo tático e por
58% dentre este e os superiores, apontam que não conseguem promover as negociações
das suas idéias em algumas situações ou em todas elas.
Subjacente ao comportamento de controle está a percepção de competência pois,
não se sentindo reconhecido, predomina o papel formal que acaba sendo exercido sem
pessoalidade, ocasionando que as questões do controle também sejam vividas de forma
polarizada: ou se sujeita ou é sujeitado.
A fase de abertura baseia-se na construção de vínculos emocionais e é geralmente
a última fase a emergir no desenvolvimento de uma relação humana ou de um grupo. A
maioria do grupo, representada por 63% dos seus membros, ainda não atingiu o estágio
de abertura com todos os membros do grupo, podendo estar atuando com os comporta-
mentos subpessoal e superpessoal.

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 12


Constatou-se que os maiores agentes estressores que afetam o indivíduo e seu tra-
balho, representando por 18 respostas das 19 possíveis, refere-se a mudança na alta ad-
ministração, característica peculiar do sistema cooperativo que gera um momento de ins-
tabilidade pois pode representar alterações na linha diretiva, na condução de processos e
na composição de pessoas do grupo. Outros agentes estressores apontados: o relaciona-
mento interpessoal e a falta de feedback com 14 respostas cada dentre as 19 possíveis,
dificultando uma condição que é fundamental para a adaptação – e conseqüentemente
para amenizar o estresse – que é o sentimento de pertencer e ter clareza sobre o seu espa-
ço e tempo. Aparece também a falta de planejamento com 13 respostas dentre as 19 pos-
síveis, tornando evidente que falta clareza sobre a visão, estratégias e políticas estabeleci-
das.
De modo geral percebe-se que os agentes estressantes identificados neste trabalho
assemelham-se com os listados na pesquisa de Rossi, Perrewé e Sauter (2005) exigindo
das pessoas diversas competências individuais e grupais, abertura à mudança e aprendi-
zagem contínua.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As respostas apontam que o grupo tático encontra-se num cenário de mudanças


constantes que tem ocasionado tensão, estresse e interferência na qualidade do relacio-
namento interpessoal. Nota-se, entretanto, esforços individuais para melhorar este rela-
cionamento, o que pode ser fruto de um trabalho de desenvolvimento de grupo iniciado
pela organização (MBA, SBDG, Coaching, encontros mensais de desenvolvimento de
grupo).
A falta de sintonia na comunicação durante o processo de mudança promove inse-
gurança nas pessoas, levando-as a sujeitar-se ou ser sujeitado nas relações. Por ser esta
uma especificidade da natureza da organização, sugere-se fortalecer as pessoas para que
haja um processo de transição participativo. Quanto aos possíveis novos dirigentes, a
criação de um programa de conhecimento organizacional pode diminuir a ansiedade e o
estresse.
Considerando a sucessividade das dimensões sociais, é preciso desenvolver ações
busquem maior equilíbrio nos níveis de inclusão e de controle para depois se investir na
abertura. Assim, para fortalecer os vínculos de relacionamento interpessoal diminuindo a
angústia e aumentando a inclusão, indica-se: processo formal de troca de feedback entre
gestores e superiores, eventos de confraternização mais assíduos e participativos em am-
bientes descontraídos, utilização dos canais de comunicação para compartilhamento do
planejamento estratégico da organização, incremento de mudanças no processo de recur-
sos humanos (por exemplo – perfil do funcionário aniversariante por tempo de casa), den-
tre outras.
Abordagens de desenvolvimento interpessoal isoladas, que não incluem essa
perspectiva, resultam em mudança limitada e alívio de ansiedade e de responsabilidade
de quem precisa promover essa grande mudança e fica investindo em intervenções palia-
tivas, que acabam a serviço da resistência. Isso será o que promoverá o desenvolvimento,
para uma integração e, conseqüentemente, abertura (participação, bom clima psicológico,
co-responsabilidade, etc, baixo estresse, e melhores resultados). Recomenda-se desenvol-

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 13


ver questões como tomada de decisão, compartilhamento de responsabilidades e distri-
buição de poder, nos processos da empresa.
Na dimensão de controle é indicado trabalhar a cultura organizacional que tem
como dentre outros valores: a transparência e o espírito de equipe. Também se sugere
tornar os procedimentos claros e compartilhados de modo que cada um possa perceber
como sua ação impacta no todo. Um programa de desenvolvimento de lideranças conjun-
to entre superiores e gestores pode auxiliar a clarear as questões de poder e competição.

REFERÊNCIAS

ALBRECHT, K. O gerente e o estresse. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.


CARDOSO, A. Stress no trabalho. Uma abordagem pessoal e empresarial. 2. ed. Rio de Janeiro: Revinter,
2001.
GUIMARÃES, L. M. Série saúde mental e trabalho. 2. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
KRAUSZ, R. R. Compartilhando o poder nas organizações. São Paulo: Nobel, 1991.
LIPP, M. E. N. Pesquisas sobre stress no Brasil: ocupações e grupos de risco. 2. ed. Campinas: Papirus,
2001.
MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 4. ed. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1995.
. Equipes dão certo: a multiplicação do talento humano. 5. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1999.
. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 15. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005.
REZENDE, J. M. Modificado do livro Linguagem Médica. 2. ed. Reprodução autorizada pela editora
CEGRAF da Universidade Federal de Goiás. Atualizado em 29/10/2002. Disponível em
<http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/stress.htm>.
ROSSI, A. M.; PERREWÉ, P. L.; SAUTER, S. L. (org.). Stress e qualidade de vida no trabalho: perspec-
tivas atuais da saúde ocupacional. São Paulo, Atlas, 2005.
SCHUTZ, W. Profunda simplicidade – Uma nova consciência do eu interior. São Paulo, Agora, 1989.
SHERMERHORN, J. R.Jr., HUNT, J. G.; OSBORN, R. N. Fundamentos do comportamento organizacio-
nal. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 1999.
VERGARA, S. C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1998.
www.gruposhumanos.com.br (consultado em 08/06/2006)

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 14


ANEXO I

Questionário de entrevista

Este questionário visa investigar o relacionamento interpessoal pode ser conside-


rada uma variável causadora de estresse no trabalho e no grupo tático e superindentes
desta prestadora de serviço, bem como reconhecer alguns agentes causadores de estresse.
Ele faz parte de um trabalho de conclusão do curso de formação em dinâmica de grupo da
SBDG (Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos). As informações aqui contidas
serão mantidas em sigilo e contamos com sua colaboração para que este trabalho possa,
porventura, ser revertido em projetos para a sua qualidade de vida no trabalho.
1) Como você classifica o grau de relacionamento dentro do grupo tático?
( ) Excelente ( ) muito bom ( ) bom ( ) ruim ( ) péssimo
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

2) Como você classifica o grau de relacionamento entre o grupo tático e as suas equipes?
( ) Excelente ( ) muito bom ( ) bom ( ) ruim ( ) péssimo
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

3) Como você classifica o grau de relacionamento entre o grupo tático e os superiores?


( ) Excelente ( ) muito bom ( ) bom ( ) ruim ( ) péssimo
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

4) O relacionamento interpessoal dentro do grupo tático* impacta na realização da sua


tarefa de forma: ( ) positiva ( ) negativa
Explique:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

5) Você tem habilidade de negociar suas idéias com:


a) ( ) sua equipe ( ) Sim ( ) Não ( ) às vezes
Em caso negativo ou às vezes, indicar quais os fatores que dificultam:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

b) ( ) gestores ( ) Sim ( ) Não ( ) às vezes


Em caso negativo ou às vezes, indicar quais os fatores que dificultam:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

c) ( ) superintendentes ( ) Sim ( ) Não ( ) às vezes


Em caso negativo ou às vezes, indicar quais os fatores que dificultam:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 15


6) Existe vínculo de abertura entre você e o grupo tático? Em qual proporção?
( ) com nenhuma pessoa
( ) com somente 1 pessoa do grupo
( ) com 2 pessoas do grupo
( ) com 3 a 5 pessoas do grupo
( ) com 6 a 10 pessoas do grupo
( ) com todas as pessoas do grupo

7) Ao interagir com outro membro do grupo, seu instinto é de:


( ) controlar as relações
( ) deixar que o outro controle as relações

8) Você participa de todas as decisões que envolvem a sua área?


( ) Sim ( ) Não
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

9) Você acha que suas relações no trabalho interferem na sua vida familiar? Por quê?
( ) Sim ( ) Não
________________________________________________________________________

10) Assinale os 10 itens que mais interferem no desenvolvimento do seu trabalho:


Incerteza
Sobrecarga de trabalho
Falta de controle
Demandas do trabalho
Relacionamento interpessoal
Incapacidade de administrar o tempo
Estresse tecnológico (novas ferramentas)
Conflito da função (não poder realizar o que é correto)
Tarefas rotineiras
Recursos inadequados
Lidar com problemas emocionais
Falta de capacitação, treinamento
Assédio moral
Falta de feedback
Mudança da alta administração
Falta de participação
Falta de informação
Falta de planejamento
Pouca participação nas decisões da empresa
Falta de perspectiva de crescimento profissional

11) Como você se sente como membro do grupo tático?


( ) totalmente aceito e importante para o grupo
( ) aceito com restrições e sem grande importância para o grupo
( ) aceito com restrições e com grande importância para o grupo

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 16


12) Como você se sente como membro da equipe de sua superintendência?
( ) totalmente aceito e importante para o grupo
( ) aceito com restrições e sem grande importância para o grupo
( ) aceito com restrições e com grande importância para o grupo

* grupo tático = superintendentes, gestores, assessores e especialistas

SBDG – Caderno 85 v Relacionamento interpessoal como variável causadora... 17


Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos
Londrina – PR
Coordenação: Isabel Cristina M. Doval, Suely do Rocio P. Pucci

Vínculo com autoridade: do vínculo primitivo


ao grupo profissional

DAYSE BETÂNIA DA SILVA


DENISE REGINA CAROLLO KLOSTER
MARI CLAIR MORO NASCIMENTO
MARLENE MARIOTTO GASPAR

Resumo – Este trabalho trata do vínculo com autoridade por meio de estudo referenciado
na teoria psicanalítica, propondo revisão de literatura e pesquisa de campo. A revisão de
literatura utiliza o recurso da reflexão, análise critica para atingir a dimensão investigati-
va do objeto de estudo da pesquisa que tem como objetivo identificar a influência do vín-
culo com a autoridade no desempenho profissional de um grupo da Empresa X.
Importante salientar que dentre a pesquisa psicanalítica efetuada, encontrou-se e
registrou-se a fundamentação de vários teóricos, os quais embasaram a pesquisa de
campo e a análise crítica.
Palavras-chave – Vínculo. Autoridade. Grupo.

Abstract – The authority “delegates” crafts demonstrating confidence. This work deals
with the bond with authority by studies of the psychoanalytic theory, considering litera-
ture revision and field research. The literature revision uses some resources like the re-
flection and analysis criticizes, in order to reach the investigative dimension study of this
research that has as aim to identify the influence of the bond with the authority in the
professional performance of a group in the Company X. It’s very important to point out
that amongst the effected psychoanalytic research, it met and it registered the recital of
some theoreticians, which had based the field research and the analysis criticizes.
Key words – Bond. Authority. Group.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 1


INTRODUÇÃO

Ainda no ambiente intra-uterino, tem início a formação do vínculo entre a futura


mamãe e seu bebê. O vínculo é de importância vital para o feto, pois precisa se sentir
desejado e amado para propiciar a continuação harmoniosa e saudável de seu desenvol-
vimento.
O amor e a rejeição repercutem sobre a criança muito precocemente, mas, para
que possa dar significado a estes sentimentos é preciso maturidade neurofisiológica. As-
sim, até os três primeiros meses de vida intra-uterina, as mensagens enviadas pela mãe
são, em grande parte, incompreendidas pelo embrião, muito embora possam causar-lhe
desconforto se percebidas como desagradáveis.
À medida que vai evoluindo, o feto torna-se capaz de registrar e de dar significado
às emoções e sentimentos maternos. É quando, então, começa a se formar sua personali-
dade.
Com o decorrer do tempo, a experiência de desconforto transforma-se em emoção
e tem início à formação de idéias sobre as intenções maternas em relação a si mesmo.
Não sendo muito diferente do ambiente uterino, no trabalho os atores do processo
movem-se entre sensações, emoções, posturas, palavras, imagens, etc. Neste campo com-
põem-se estratos junto ao grupo, tentativas de dar voz aos afetos, dar novas formas ao
mundo, falar dos temores secretos, dos desejos, das dores profundas, de explorar cami-
nhos.
Na realidade é um espaço de intimidade vincular, intimidade no sentido de conta-
to com o conhecido, familiar, um espaço próprio de abertura no trabalho por meio do e
pelo vínculo, onde muitas vezes emerge desconhecido em nós, o estranho, o novo.
O vínculo propicia um ambiente favorável para enfrentar as muitas adversidades,
para suportar níveis altos de angústia e falta de sentido. O vínculo é um dos elementos
básicos do processo de relacionamento com o outro e com a autoridade.
O vínculo com a autoridade muitas vezes propicia experimentação de modos no-
vos de vinculação, de diferenciações em relação aos padrões conhecidos e de confronta-
ção com os modos habituais.
Para análise do vínculo com a autoridade e o desenvolvimento do processo de um
grupo, faz-se necessário conhecer o estabelecimento do vínculo primitivo o qual terá
grande influência na relação com autoridade e com o grupo profissional, objeto este da
pesquisa e revisão bibliográfica deste trabalho.

1 VÍNCULO: CONCEITO

O termo vínculo tem sua origem no étimo latino vinculum, que significa união,
com características de ligadura, uma atadura de características duradouras. Também pro-
vém da mesma raiz que a palavra vinco, que reporta a alguma forma de ligação entre as
partes que estão unidas e inseparáveis, embora claramente delimitadas entre si. Conclui-
se que vínculo é um estado mental que pode ser expresso através de formas variadas, com
a função de proteger a sobrevivência do indivíduo contra os agentes predadores externos.
Segundo Zimerman vínculo é uma estrutura relacional-emocional entre duas ou
mais pessoas, ou entre duas ou mais partes separadas de uma mesma pessoa. Bion esten-

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 2


deu o conceito de vínculo a qualquer função ou órgão que, desde a condição de bebê,
esteja encarregado de vincular objetos, sentimentos e idéias uns aos outros.

2 ORIGEM DO PRIMEIRO VÍNCULO

O nascimento é considerado a primeira grande experiência vivida pelo ser huma-


no. Embora previsto pela natureza, constitui o primeiro obstáculo a ser vencido no pro-
cesso de desenvolvimento.
Desde os primeiros momentos de vida, institui-se que cada pessoa tem sua própria
maneira de ser, de estar e de fazer no mundo. Desde o seu nascimento o bebê irá estrutu-
rando sua personalidade, descobrindo e conquistando o mundo dos objetos e das pessoas
que o rodeiam por meio dos sentidos e das percepções.
No conceito freudiano o que impulsiona esse processo de estruturação e de cres-
cimento da pessoa é a pulsão – impulso biológico, função de conservar a integridade do
corpo e a preservação da espécie – função ontogenética e filogenética, portanto, é uma
função de sobrevivência e de continuidade do ser humano. Assim, nos primeiros momen-
tos da vida do ser humano manifestam-se as necessidades fisiológicas que se tem de satis-
fazer para manter o organismo com vida, isto é, que buscam o prazer e evitam a dor –
princípio do prazer. Dessa forma, o recém-nascido, em estado de total desamparo, expe-
rimenta uma necessidade. Esta instala no organismo uma tensão, submergindo-o numa
comoção generalizada, a ponto de colocar em perigo sua própria integridade. Nessas cir-
cunstâncias, o até então organismo grita, e a mãe (ou qualquer outro), acudindo em seu
auxílio, transforma essa manifestação inintencional numa demanda de alimento, no ins-
tante mesmo em que o acolhe em seus braços e lhe oferece o seio.
Assim, o grito se faz demanda e a criança passa de um estado de radical inanição
à satisfação completa. O gesto do adulto é significante, aí onde antes só reinava a pura
indiferenciação orgânica. Porém, o outro não responde na mesma medida da voz anterior:
demora,exagera, oferece menos, etc.., não sendo bem aquilo que se lhe demanda. Assim,
entre um e outro oferecimento cai um resto, uma diferença, que deixa para sempre o su-
jeito com uma falta.
Segundo Lajonquière, o fato de estar em falta chama-se desejo e o objeto que o
causa com sua falta chama-se em Freud, “a coisa” e, em Lacan, “objeto a”. Progressiva-
mente, esse impulso biológico deixará marcas no psiquismo, lembranças de prazer e de
bem-estar. O prazer que nasce desses impulsos satisfeitos pelo “outro”: a mãe ou a pessoa
que realiza a função materna permitirá à criança registrar suas lembranças de prazer liga-
das a esse impulso biológico.
Desde os primeiros instantes de vida, o vínculo materno exerce influência na for-
mação da personalidade da criança, mesmo sem comunicação verbal. A maneira como a
mãe soluciona os problemas decorrentes de seu novo papel, expressada pelos gestos e
sentimentos em relação ao filho, irá provocar respostas de prazer e desprazer no organis-
mo infantil e isto terá um efeito duradouro na sua concepção com a realidade.
Os princípios do prazer e da realidade visam o mesmo fim: alcançar a satisfação e
evitar a dor, a pulsão e a busca do bem-estar é indissociável e caracterizam-se por esta-
rem ligados aos afetos de prazer e desprazer.
A criança nasce à vida, mas para sustentar-se nela deve ser ratificado co-
mo vivo, como um sujeito, pelos outros, pelo desejo historicizado desses

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 3


outros no interior de um ordenamento simbólico, em resumo, no campo
do outro. Ou, de outra ótica, digamos que, para manter-se na vida, a cri-
ança precisa que o outro a pulsione viver (Lajonquière, 1996, p. 178).
Na consideração do desenvolvimento do sujeito, Freud nos apresenta que esse
processo se expressa através de necessidades psicológicas e do objeto de gratificação de
tais necessidades, e que a natureza desses fatores influencia de forma importante as rela-
ções que o sujeito estabelece ao longo da vida. Baseada na teoria Psicanalítica, a natureza
das relações com o objeto nos diferentes estágios do desenvolvimento do sujeito, é um
importante fator determinante das relações que o sujeito estabelece ao longo de sua vida.
Os objetos primeiros podem permitir ou motivar certa forma de expressão das ne-
cessidades, ao mesmo tempo em que impedem outras. Desse modo, esses objetos exer-
cem também, influência importante na natureza dos mecanismos de integração, por meio
dos qual o sujeito procura o equilíbrio, bem como nas interações com objetos subseqüen-
tes, em fases posteriores de seu desenvolvimento. Freud nos diz que as necessidades psi-
cológicas são as expressões da Libido, energia subjacente aos processos psíquicos, que se
centralizam em diferentes partes do corpo do sujeito.
Logo que nasce essa energia concentra-se na porção do trato digestivo, fase deno-
minada “oral”, associada ao processo de alimentação, a qual não deve ser entendida como
uma simples incorporação de material nutritivo para que a vida se torne possível, mas,
também, o contato e o calor humano providos da figura materna, isto é, toda a gama de
afetos que acompanha a dieta. Nesta época, a mãe é a única fonte de satisfação da criança.
Na percepção não realista da criança, dada a impossibilidade de, nos primeiros
meses após o nascimento, distinguir o “eu” do “não eu” e as partes do todo, o seio mater-
no reapresentará, como fonte de nutrição e como elemento da ligação com o exterior, o
próprio mundo. A necessidade de satisfação oral pode vir independente da necessidade de
alimento: apenas há necessidade de levar objetos à boca. Afora isso, a criança tem outras
necessidades além das orais, como ver, tocar e ouvir a mãe. No início do período a crian-
ça não distingue o mundo externo de si mesma: sujeito e objeto confundem-se num todo
e o seio materno é parte integrante da criança.
Aos poucos a criança vai percebendo a mãe como uma pessoa independente. Aos
três meses, a relação com o objeto não é total, a criança relaciona-se com partes da mãe
que se confundem com partes de si mesma. Por volta dos seis meses, já há uma percepção
da mãe como uma pessoa total, integrada em seus aspectos bons e maus, de confiança e
desconfiança. Naturalmente, a mãe, como primeiro objeto de satisfação dos impulsos e
também o primeiro objeto restritor, é a base para a configuração que a criança fará do
mundo.
A fase oral termina, mais ou menos no fim do primeiro ano de vida. Isto, obvia-
mente, não significa que as atividades orais deixem de existir, porém o prazer está cen-
trado na outra extremidade do aparelho digestivo, a região anal. O prazer relacionado a
essa zona provém, em primeiro lugar, da satisfação física de esvaziar os intestinos e, em
segundo, da satisfação psicológica que a criança experimenta no controle dessa função,
ao agradar dessa forma as figuras parentais, e ser recompensado por isso, com o amor
das mesmas. Nessa fase o poder e a independência podem entrar em conflito com o dese-
jo de agradar. A dualidade ativo x passivo. Essas duas atividades são dirigidas para obje-
tos diferentes, simultaneamente: à satisfação auto-erógena e ao objeto parental externo.
Neste período de desenvolvimento da personalidade, a criança assume a posição
de doador estabelecendo com o meio, tendo que contribuir com sua conduta para satisfa-

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 4


zer as suas demandas, percebe, agora, que há formas de conservar o amor dos pais e evi-
tar a punição e, o vínculo com as figuras parentais é constituído de sentimentos positivos-
amor e sentimentos negativos-ódio ocorrendo simultaneamente.
Por volta do terceiro ano até sexto de vida, o prazer é dirigido para objetos dife-
rentes: à satisfação auto-erógena e ao objeto parental externo.A atenção aos genitais e a
constatação da diferença entre os sexos, faz surgir o estágio genital – estágio Édipo-fálico
– fase mais alta de organização da energia psíquica, quando a criança alcança a capacida-
de para o amor objetal.
Nesta fase, Doval cita que segundo Freud, originalmente o corpo da mãe desperta
na criança sentimentos ambivalentes: prazer/amor quando lhe satisfaz, desprazer/ hostili-
dade, quando lhe frustra. Gradativamente, o objeto de amor passa a ser percebido como
um todo pela criança – o que satisfaz é o mesmo que frustra.,surgindo as expressões de
amor e a capacidade de investir energia psíquica em outras pessoas, obtendo satisfação a
partir do reconhecimento do outro. Nesse momento as relações interpessoais de criança
caracterizam-se pela seleção de um objeto sexual bem definido. Os impulsos eróticos são
acompanhados de fantasias relativas ao objeto, as quais se associam à masturbação, e isto
estimula o aparecimento do conflito. A presença dos conflitos não é novidade para uma
criança nesta fase, pois ela já os experimentou nas fases anteriores (p. 9).
O conflito dessa fase está ligado ao fenômeno conhecido como complexo de Édi-
po, – Édipo é um relato mítico do incesto. Segundo D’Andrea, Freud diz que o complexo
de Édipo, consiste, na forma mais simples, no amor do menino pela mãe e no ódio pelo
pai. Sentindo, pelo pai, apenas ódio, o conflito é menos complicado e manifesta-se em
hostilidade aberta contra a figura paterna, tornando-se, portanto uma luta externa. No
sentido inverso, o mesmo ocorre com a menina, porém para a menina é mais difícil, pois
precisa desligar-se emocionalmente da mãe, ou melhor, trocá-la pelo pai e passar a consi-
derá-la uma rival. Intimamente ligado a esses desejos, encontra-se o medo à castração, ou
seja, no senso estrito, refere-se aos órgãos genitais, mas, simbolicamente, representa
qualquer tipo de lesão ou separação. Assim, a ameaça de perder o amor de pessoas signi-
ficativas tem um significado de grave injúria para o ego, como se lhe fosse tirar uma parte.
A natureza e a qualidade do relacionamento do ser humano com pessoas
do seu sexo, ou do sexo oposto, são determinadas nos primeiros seis
anos de vida. Mais tarde, podem se desenvolver e se modificar em de-
terminadas direções, mas nunca desaparecem. Os objetos desse tipo de
fixação são os pais [...]. Todas as pessoas tornam-se substitutas dos
primeiros objetos desses sentimentos... sendo assim obrigadas a arcar
com esse legado emocional (Freud, apud Viorst, p. 42).
A resolução do complexo de Édipo leva a criança a dirigir seus interesses para ou-
tras pessoas que não os pais, preparando-a para estabelecer relações interpessoais com
outras pessoas.

3 TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA

Transferência é o processo inconsciente pelo qual uma pessoa tende a relacionar-


se com outra de maneira análoga a um relacionamento primitivo, geralmente de figuras
paternas ou de autoridade, com a qual o objeto atual foi identificado.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 5


De acordo com Doval o que se processa através da transferência não é a realiza-
ção dos desejos do sujeito, mas a atualização do significado desses desejos. Sendo a repe-
tição a forma pela qual o modo infantil se torna presente, a transferência obedece a fina-
lidades conservadoras da vida psíquica do sujeito, e se coloca a serviço da resistência.
Aquilo que precisa ser repetido não transitou nunca pela consciência, segundo a teoria
Psicanalítica. Como o reprimido original jamais foi consciente, não pode ser vinculado a
signos verbais que permitiriam a sua rememoração. Só pode manifestar-se através do
comportamento, sem conceitos. Sendo assim, a transferência não é simplesmente a reedi-
ção de experiências e tendências do passado: é o movimento pelo qual o infantil se mani-
festa na atualidade (p. 9).
Contratransferência é o processo no qual o facilitador, terapeuta ou outros profis-
sionais que atuam com relacionamento humano, reagem inadequadamente à realidade do
aqui-agora, com suas forças e desejos inconscientes baseadas em seus relacionamentos
primitivos, pois como qualquer ser humano possui resíduos de conflitos psíquicos in-
conscientes desde a infância. Considerando que contratransferência é a manifestação de
sentimentos e reações do facilitador para com o sujeito ou grupo, ela é uma resposta do
facilitador, às expectativas transferências deste sujeito ou do grupo. Portanto, a contra-
transferência poderá produzir resultados negativos no desenvolvimento do grupo se o
facilitador fizer uso inconsciente dela.

4 VÍNCULO POR PICHON-RIVIÈRE

Em primeiro lugar, faz-se mister salientar que Pichon-Rivière critica a idéia de


instinto de Freud e a substitui pela de necessidade, achando que esta permite exprimir
melhor a determinação da estrutura social.
A Psicologia Social, por Pichon-Rivière, centrada na compreensão dos fenômenos
de interação e na análise do processo social, traz grande contribuição para o entendimento
dos processos grupais, principalmente através de seus estudos sobre o ECRO – Esquema
Referencial Conceitual e Operativo e os estudos sobre a Teoria do Vínculo.
Esquema Conceitual Referencial Operativo – ECRO é um conjunto organizado de
conceitos universais que permitem uma abordagem adequada da situação concreta a re-
solver, aplicável a qualquer setor de tarefa e investigação, ponto focal da aprendizagem,
uma estrutura em contínuo movimento. É o esquema de referência próprio de cada inte-
grante do grupo, suas ideologias, experiências, formas de pensar, afetos, etc., que con-
frontados com os esquemas conceituais referenciais dos outros membros do grupo, irá
através de um movimento de espiral dialética, configurar um ECRO comum.
Pichon concebe o homem numa só dimensão: a humana, integrada por três dimen-
sões: a mente, o corpo e o mundo exterior, sem estabelecer separações formais entre elas.
Com a Teoria do vínculo, Pichon-Rivière consegue dar um salto qualitativo de
uma teoria psicanalítica, com predomínio do intrapsíquico, para uma psicologia social,
centrada no estudo das relações.
Podemos definir vínculo como uma relação particular com o objeto. Es-
sa relação particular tem como conseqüência uma conduta mais ou me-
nos fixa com esse objeto, formando um pattern, uma pauta de conduta
que tende a se repetir automaticamente, tanto na relação interna quanto
na relação externa com o objeto (Pichon-Rivière, 2000, p. 17).

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 6


Dentro do processo grupal o indivíduo é visto como um resultante dinâmico no in-
terjogo estabelecido entre o sujeito e os objetos internos e externos e sua interação dialé-
tica através de uma estrutura dinâmica que Pichon-Rivière denomina de vínculo, uma
estrutura complexa que inclui um sujeito, um objeto, e sua mútua inter relação com os
processos de comunicação e aprendizagem, onde sujeito e objeto se realimentam mutua-
mente, em forma de uma espiral contínua. Segundo o autor, os vínculos são internos e
externos são integrados num processo de espiral dialética, ou seja, o vínculo, que primei-
ro é externo, torna-se interno, depois, externo novamente e depois volta a ser interno, de
maneira simultânea.
A estrutura vincular apresentada tem um caráter social, pois compreende que,
mesmo quando duas pessoas se relacionam, há entre elas outras figuras internalizadas,
que estão presentes nessa relação, tendo dessa forma uma estrutura triangular: bi-corporal
e tri-pessoal. Isto é, em todo vínculo há a presença sensorial corpórea dos dois, mas há
um personagem do mundo interno, que está sempre interferindo nessa relação, que é o
terceiro. Estrutura essa que rege as relações humanas, ao incluir, no esquema de referên-
cia, o conceito de um mundo interno em contínua interação.
Essa estrutura triangular, que rege todas as nossas relações, possibilita
abandonar o esquema de uma psicologia individual, que Freud já nega-
va, e adotar os postulados de uma psicologia que sempre será social, ao
incluir no esquema de referência o conceito de mundo interno em contí-
nua interação, origem das fantasias inconscientes (Pichon-Rivière,
2005, p. 162).
Assim, Pichon-Rivière considera o indivíduo como uma resultante dinâmica do
interjogo estabelecido entre o sujeito e os objetos internos e externos por meio de uma
interação dialética, sempre em movimento, com expressões internas e externas, que inter-
ferem uma com a outra durante todo o tempo.
A indagação analítica desse mundo interno levou-me a ampliar o con-
ceito de “relação de objeto”, formulando a noção de vínculo, que defino
como uma estrutura complexa que inclui um sujeito, um objeto e sua
mútua inter-relação com processos de comunicação e aprendizagem.
Estas relações intersubjetivas são dirigidas e estabelece-se sobre a base
de necessidades, fundamento motivacional do vínculo. Tais necessida-
des têm uma matriz e intensidades particulares, em que já intervém a
fantasia inconsciente. Todo o vínculo, assim entendido, implica a exis-
tência de um emissor, um receptor, uma codific ação e decodificação da
mensagem. Através desse processo comunicacional, torna-se manifesto
o sentido da inclusão do objeto do vínculo, o compromisso do objeto
em uma relação não linear, e sim dialética, com o sujeito (Pichon-
Rivière, 2000).
O autor salienta que, em toda estrutura vincular, o sujeito e o objeto se interin-
fluenciam, realimentando-se mutuamente, nessa interinfluência, ocorre a internalização
dessa estrutura relacional, a qual adquire uma dimensão intra-subjetiva, essa internaliza-
ção terá características determinadas pelo sentimento de gratificação ou frustração que
acompanha a configuração inicial do vínculo, constituindo um vínculo “bom” ou um vín-
culo “mau”.
O que é o vínculo normal? Para que possamos compreendê-lo devemos
partir da análise de uma das principais características das relações de

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 7


objeto: o objeto diferenciado e o objeto não-diferenciado. Isto é, das re-
lações de independência e de dependência. Considera-se que um objeto,
em uma relação adulta normal, é um objeto diferenciado, ou seja, que
tanto o objeto quanto o sujeito têm uma livre eleição de objeto (Pichon-
Rivière, 2000, p. 14).
Segundo o autor existem algumas alterações do vínculo, as quais ele chamou de
patológico, por exemplo: o vínculo paranóico, caracterizado pela desconfiança, pela exi-
gência que o sujeito experimenta em relação ao outro. O vínculo depressivo caracterizado
por estar permanentemente carregado de culpa e expiação, já o vínculo obsessivo se rela-
ciona com o controle e a ordem. O vínculo hipocondríaco é aquele que o indivíduo esta-
belece com os outros através do corpo, da saúde e da queixa. O vínculo histérico é o vín-
culo da representação, sendo sua principal característica a dramaticidade e outros.
A análise da negação do vínculo leva-nos ao estudo da despersonaliza-
ção. Podemos definir a despersonalização como uma tentativa de perda
do ser, do si-mesmo ou do eu, uma tentativa de não ser aquele que quer
se vincular mas de ser outro. Ou de não ser ninguém para não ter com-
promisso no vínculo (Pichon-Rivière, 2000, p. 12).
O vínculo é sempre social, mesmo sendo com uma só pessoa, segundo Pichon-
Rivière, através da relação com essa pessoa repete-se uma história de vínculos determi-
nados em um tempo e um espaço.
A pessoa pode se mover em um jogo harmônico ou desarmônico de suas partes
integrantes, mas não pode separar aquilo que é do Id, do Ego e do Superego em uma rela-
ção de objeto, ou seja, não ocorre à relação de objeto apenas com uma parte do aparelho
psíquico freudiano, o mesmo se comporta como uma estrutura dinâmica, como uma tota-
lidade.
[...] Podemos dizer que um vínculo está preponderantemente em relação
com o Id, ou seja, que a relação pode ser mais amorosa ou mais agressi-
va nesse sentido. Em relação à preponderância do Ego, podemos dizer
que o vínculo é mais operacional ou que tem mais sentido da manipula-
ção da realidade; enquanto, se o vínculo for predominantemente em re-
lação do Superego, é mais culpógeno. Mas em qualquer das situações
todo o aparelho psíquico está implicado e complicado (Pichon-Rivière,
2000, p. 32).
O conceito pichoniano de vínculo está relacionado com o de comunicação e o de
conduta, assim como com a noção de papel. Estes assumidos ou atribuídos pelo indiví-
duo, regem as relações interpessoais entre os sujeitos, em diferentes circunstâncias cada
indivíduo pode desempenhar diferentes papéis, assumindo-os conscientemente ou quando
o ambiente ou os outros atribuem um determinado papel, pode-se assumi-lo de forma
inconsciente.
Os papéis se formam de acordo com a representação que cada um tem de si mes-
mo que responde às expectativas que os outros têm de nós. O acontecer grupal faz-se em
um interjogo de papéis, destacados: porta-voz, bode expiatório, líder e sabotador: – Porta-
voz – é o membro do grupo que num momento denuncia o acontecer grupal, as fantasias
que o movem, as ansiedades e necessidades da totalidade do grupo.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 8


As necessidades, as ansiedades e as fantasias enunciadas pelo porta-voz
e sua maneira de formulá -las fazem referência a sua história pessoal,
enquanto o fato de formulá -las num dado momento do acontecer grupal
assinala o caráter horizontal do emergente (Pichon-Rivière, 2005, p.
180).
– Bode expiatório – membro de grupo que se faz depositário dos aspectos negati-
vos do grupo e atemorizantes do grupo ou tarefa, num acordo tácito no qual tanto ele co-
mo os outros estão comprometidos.
– Líder – membro do grupo que se faz depositário dos aspectos positivos do gru-
po. Esses últimos papéis (bode expiatório e líder) estão ligados entre si, um surge como
preservação do outro.
– Sabotador – membro do grupo que se faz líder da resistência à mudança.

A compreensão dos papéis pode indicar o que está acontecendo no campo grupal.
Segundo Taragano (2000) a investigação dos diversos papéis que a pessoa assume
simultânea e sucessivamente durante sua existência, a análise do grau de coerência entre
eles, assim como a seqüência com que são assumidos, são fundamental para que se possa
determinar o grau de maturidade da personalidade do sujeito em questão.

5 DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO GRUPAL

A ciência evidencia que grupo é um sistema de interação social, caracterizado pe-


la existência de objetivos comuns, um sistema de papéis, regras e normas que regulam o
comportamento e a inter-relação dos sujeitos que o integram, segundo Bion, todo grupo,
por casual que seja, encontra-se para fazer algo, nesta atividade, de acordo com as capa-
cidades do indivíduo, eles cooperam (p. 131).
O grupo apresenta as mesmas características de um indivíduo que na sua forma-
ção foi influenciado pelas figuras que interferem no seu comportamento, Bion atentando
aos estudos de Freud diz que a psicologia individual e a psicologia de grupo não podem
ser de modo algum diferenciadas, porque a psicologia do indivíduo é ela própria uma
função da relação existente entre uma pessoa e outra (p. 155).
Doval afirma que as três fases de desenvolvimento de um grupo correspondem às
três esferas de necessidades interpessoais – Inclusão, Controle e Abertura (p. 35), sendo
que em cada fase a relação com o líder é a referência para a relação que será estabelecida
com os demais membros.
Na Fase de Inclusão o sujeito decide o quanto quer investir nesse grupo e abrir
mão de outros compromissos. O comportamento de Inclusão se refere à associação entre
os sujeitos no grupo: exclusão, inclusão, pertinência e proximidade.
A Inclusão não implica vínculos emocionais fortes, mas sim na decisão se quer ou
não fazer parte do grupo, sendo evidenciados os limites. O comportamento é determinado
pelo modo como o sujeito se sente a respeito do que significa como pessoa, sendo ansioso
o reconhecimento do ter ou não ter importância.
O início do grupo é o momento da aproximação e reconhecimento, inclusão, onde
há procura da compreensão, idealiza-se a figura do facilitador numa condição de depen-
dência, o qual busca no grupo satisfazer sua necessidade de ser reconhecido como impor-
tante ao mesmo tempo em que é reconhecido como aquele responsável pela frustração, o

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 9


que gera agressividade, a qual evidencia a crença do grupo na capacidade do facilitador
satisfazer suas necessidades.
Formado o grupo, começam as diferenças e a busca dos papéis, ou seja, as lutas
pelo poder, a competição e a influência passam a ter uma importância no processo do
grupo. A definição sobre a forma como irão se relacionar, o compartilhamento de respon-
sabilidades e a distribuição de poder e controle caracterizam a próxima fase do processo
grupal, a Fase de Controle, onde o grupo testa sua competência, se estrutura e estabelece
regras e limites, com o objetivo de aproveitar e realizar sua tarefa e seus objetivos.
É o processo de tomada que varia entre o desejo de ter autoridade sobre os outros,
até o desejo de ser controlado e isento de toda a responsabilidade, ocorrem disputas pela
liderança, tanto entre os membros, do grupo como com o líder.
O grupo já está formado e diferenciam-se no que se refere à responsabilidade e ao
poder, agora investigam a questão de se tornarem emocionalmente integrados. As mani-
festações de sentimentos positivos, de hostilidade, ciúme, expressão da sexualidade e
intensificação das emoções entre pares, tornam-se manifestações típicas: é a terceira Fa-
se, inicialmente denominada como Abertura.
Na Abertura descreve sentimentos de proximidade, pessoal e emocional, entre
duas pessoas, baseia na construção de vínculos emocionais, é geralmente a última fase a
emergir no desenvolvimento de uma relação humana e de um grupo que avança na sua
relação de confiança e apresenta um alto nível de respeito, aceitação e tolerância às dife-
renças. Cada sujeito se empenha em encontrar a posição mais cômoda, no intercâmbio de
afeto com os demais. O grupo torna-se construtivo, independente, criativo e produtivo.
Na Fase de Abertura verifica-se o estar próximo ou distante, sendo a ansiedade re-
lacionada ao medo de ser ou não capaz de ser amado.
Instalado o afeto, surge o problema da separação, surgindo processo de dissolu-
ção do grupo primeiro com os sentimentos positivos e negativos e posteriormente com
ataque ao líder. Após este processo passa a discutir a possibilidade de continuar o grupo,
o grau de comprometimento real de cada sujeito que o integra, e o sentimento que cada
um experimenta ao separar-se dos demais.
Quando a separação é de um membro, e se esse é percebido pelos demais como de
alto valor e significado, sua saída desestabiliza o grupo, que passa a ter uma outra dinâ-
mica com sua ausência. Se a separação está relacionada com o término do grupo, quanto
maior for o nível de envolvimento afetivo e de coesão grupal, mais sofrida e dolorosa
será.
Para evitar a dor da perda, pode ocorrer um aparente comportamento de indiferen-
ça e hostilidade ao líder, responsabilizando-o pelo que não foi suficientemente esgotado
no grupo.
Atentando para Zimerman, “[...] um grupo sem nenhuma liderança tende a disso-
lução” (p. 111), e segundo Bion “[...] o grupo se reúne a fim de ser sustentado por um
líder de quem depende para nutrição, tanto material quanto espiritual, além da proteção”
(p. 134) tendo o comportamento do líder grande influência no desempenho e desenvol-
vimento do grupo, o qual tem apoio quando cria condições de avanços, sendo sucedida a
relação da liderança que apóia, cria condições e facilita para que as dificuldades sejam
superadas, auxiliando o grupo na escolha de comportamentos que impeçam o retorno das
dificuldades e assim seu desenvolvimento.
O desejo de mudança é consciente e fornece motivação para o desenvolvimento,
ao passo que manter-se em uma situação já conhecida é inconsciente o que promove a
instalação e manutenção de resistências à mudança e situações novas, as quais provocam

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 10


ansiedade, instabilidade, incertezas e crise. A ansiedade é a propulsora para a mudança,
não acontecendo mudança sem perda de valores e resistências.
Ser líder é ser facilitador, o qual deve ser capaz de escutar o que é evidenciado no
discurso do grupo o que proporcionará o desenvolvimento dos desejos individuais do
grupo, sua atitude implica ativamente no processo de desenvolvimento do grupo. Quanto
mais fortes os aspectos inconscientes do facilitador, mais provável será que as decisões
que tome no grupo, não venham no melhor interesse.
Quanto maior a consciência do facilitador a respeito de aspectos de sua subjetivi-
dade, maior é a sua possibilidade de reconhecer a influência desses aspectos, exercida
sobre seus julgamentos.
O papel do facilitador deve ser ditado pela estratégia geral de aprendizagem e pe-
los objetivos do grupo, ainda que as táticas individuais sejam influenciadas pela relação
que se estabelece entre facilitador e grupo em determinado momento.
O alcance da atividade do facilitador vai desde o escutar tranqüilamente, até inter-
vir e manejar de maneira vigorosa as manifestações do grupo.
Quando o facilitador escuta o que o grupo diz, precisa escutar o que ele quer dizer
realmente, usando sempre de sua honestidade e transparência, aspectos que serão referên-
cia para o desenvolvimento do grupo.
O facilitador precisa acreditar nos talentos do grupo para então extrair o que há de
melhor, precisa permitir que o grupo fale livremente, atentando para os processos de co-
municação.
Todos os integrantes do grupo fazem transferências, sendo deslocada para a figura
de autoridade do facilitador, que tem papel preponderante no grupo neste momento, é
visto como a figura parental que satisfaz as necessidades da criança que testa o facilitador
para validar seus sentimentos. Para Bion, todos os grupos estimulam e ao mesmo tempo
frustram os indivíduos que o compõem, porque o indivíduo é impelido a buscar a satisfa-
ção de suas necessidades em seu grupo e, ao mesmo tempo, é obstado neste objetivo pe-
los medos primitivos que o grupo desperta (p. 175).
Na fase de Controle o facilitador é compreendido como figura competitiva, mo-
mento em que o grupo joga, testando sua competência, o qual lida com seus conflitos a
partir de seus modelos parentais, fazendo suas escolhas baseadas em suas motivações e
necessidades individuais, o papel do facilitador neste momento é de pai, que conduz o
grupo de forma a realizar seus objetivos e necessidades, considerando as necessidades
dos demais e a realidade vivida no grupo. Quando o facilitador não tem habilidade e
competência para lidar desta forma, o grupo elege os bodes expiatórios, os quais são ex-
cluídos, sendo depositários daquilo que não foi resolvido no processo grupal.
O facilitador deve ser reconhecido como o responsável pela integração de cada su-
jeito, onde as escolhas devem ser realizadas para atender ao grupo, o que será possível a
partir do processo de maturação, não sendo o facilitador o objeto que irá satisfazer suas
necessidades, mas sim o grupo, havendo o respeito e o compartilhamento das experiên-
cias dos sentimentos e da troca de afetos.
No processo grupal, as três fases estão sempre presentes, mesmo que uma delas
esteja evidenciada.Segundo Zimerman, o fenômeno transferencial é indissociável do re-
sistencial, no fundo, a transferência é o veículo das resistências, e estas é que devem ser
analisadas (p. 264), trabalhando a transferência, reduz a resistência do grupo, partindo
para a fase da Abertura, o caminho que possibilita mudanças adequadas à realidade atual,
ao aqui e agora.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 11


Nesta fase facilitador e grupo ocupam espaços onde as transferências são de figu-
ras parentais com profundo significado para os integrantes do grupo, proporcionando
troca de afetos.A relação de transferência é um investimento de amor, e a relação amoro-
sa implica na capacidade de renunciar a satisfação imediata de seus desejos para no en-
contro com o outro encontrar também satisfação.
Pertencendo o sentimento do amor e do afeto, surge o problema da separação, o
que provoca dor, momento em que o grupo fala da morte, ou da sua própria separação,
devendo o facilitador resgatar experiências que evidenciem quando o grupo alcançou
autonomia e segurança, seu valor e competência.
Doval cita que o facilitador cumpre seu papel quando o grupo consegue satisfazer-
se a pesar dos limites impostos pela realidade, abrir mão de posições absolutistas e de
critérios polares, de sentir-se valoroso e significativo, de acreditar que é reconhecido e
capaz de realizar trocas verdadeiras e amorosas, de reconhecer a continuidade de seu pro-
cesso e que aquilo de aprendeu tem relação com sua vida atual e é aplicável fora do grupo
(p. 53).

6 GRÁFICOS DOS DADOS DA PESQUISA

Na sua infância qual era a pessoa com maior


Gráfico 1 vínculo?

38%

Mãe
62% Pai

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02 Que sentimento existiam neste vínculo?
0% Empatia
5% Aceitação
0%
0% 5% Afeto
10% 9% Admiração
Amor
Proteção
Companheirismo
13%
Compaixão
Fraternidadee
28% Segurança
Respeito
10% Carinho

5% Medo
0% 5% 10% Cuidado

03 Na sua infância qual era a figura de maior autoridade?

38%
Mãe
Pai
62%

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 13


04 Como era seu vínculo com esta autoridade?
9% Tranqüilidade
0% Aceitação
0% 18% Confiança
9% Medo
Amor
9% Proteção
Compaixão

9% Fraternidade
Respeito
0% Segurança
46%
0% Afeto
Carinho

Qual o vínculo que estabelece com a autoridade


neste local? Confiança
05 Diálogo
9% 0% Respeito
Compromisso
Profissional
18% 37%
Pessoal
Segurança

0% Amizade
Admiração
9% Honestidade
0% Obediência
De Trabalho
27% Afeto

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 14


06 Que sentimento você sente por esta autoridade neste
local?
Carinho
0%
15% Simpatia
23%
Confiança
Companheirismo
8%
Cumplicidade
0%
Amizade
8% Proteção
Admiração
23% 8%
Respeito
0% Empatia
15%

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo é uma pesquisa qualitativa com análise de dados quantitativos na área
de Vínculos com autoridade: do vínculo primitivo ao vínculo profissional, tendo com
sujeitos de pesquisa uma população de um universo de 60% dos funcionários da Empresa
X, 40% estavam em férias ou em trabalhos externos nos dias da pesquisa, entrevista.
O objetivo dessa pesquisa foi identificar a influência do vínculo com a autoridade
no desempenho profissional de um grupo da Empresa X.

Os dados levantados foram através dos instrumentos de coletas de dados, questio-


nário e entrevista face a face com perguntas semi-estruturadas, com as seguintes ques-
tões:
Tempo que trabalha na entidade.
O que é vínculo para você?
Na sua infância qual era a pessoa com maior vínculo?
Que sentimentos existiam neste vínculo?
Na sua infância qual era a figura de maior autoridade?
Como era seu vínculo com esta autoridade?
Para você, qual é a figura que representa maior
autoridade no seu local de trabalho?
Qual o vínculo que estabelece com esta pessoa?
Que sentimentos você sente por esta autoridade neste local?
Como você se comporta frente a esta autoridade?

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A partir desse levantamento pode-se estabelecer a relação do vínculo e autoridade
primitiva com vínculo e autoridade profissional, fundamentadas na teoria psicanalítica.
Obtendo-se os seguintes dados:
Nos gráfico um e três verificou-se que as figuras parentais, especialmente a mãe,
são os vínculos mais significativos no começo de vida do ser humano, ou seja, até aos
seis anos, com relação à autoridade a evidência maior foi à figura do pai.
No gráfico dois foram evidenciados vários sentimentos que podem estar relacio-
nados à infância, segundo Doval temos uma memória afetiva que registra o que nos afe-
tou ou encantou, memória imperturbável que não morrerá jamais e que transforma o psi-
quismo em uma coleção de cenas.
Contatou-se no gráfico quatro que o vínculo com a autoridade na infância, 62%
faz referência ao pai, eram de sentimentos variados, mas o que predominou foi o respeito
com base no medo, firmeza, confiança, autoritarismo.
Os gráficos cinco e seis representam o vínculo e sentimentos presentes no local de
trabalho pesquisa, segundo as entrevistas, com relação à autoridade, que unanimente foi
reconhecida como tal.
Cinco, neste gráfico verificou-se que vínculo com a autoridade no local de traba-
lho predomina o respeito e o compromisso profissional. Pichon-Rivière salienta que, em
toda estrutura vincular, os seres se interinfluenciam, realimentando-se mutuamente, com
a internalização de características determinadas pelo sentimento de gratificação ou frus-
tração que acompanha figura inicial do vínculo, evidenciamos uma interação dinâmica no
universo pesquisa, de forma nenhuma estática, com influências dos objetos interiorizados
pelos sujeitos, porém como diz Pichon-Rivière, um movimento por meio de uma intera-
ção dialética.
No gráfico seis constatou-se, através destes dados, que os sentimentos pela autori-
dade no local de trabalho são sentimentos positivos que envolvem cuidados, proteção. Foi
possível perceber a estrutura triangular do vínculo, pois nas relações vinculares estabele-
cidas com a autoridade, estão presentes figuras internalizadas, principalmente na infância.
O vínculo sempre é um vínculo social, mesmo sendo com uma só pessoa, segundo Pi-
chon-Rivière, por meio da relação com essa pessoa repete-se uma história de vínculos
determinados em um tempo e um espaço.
Vínculo com autoridade é inerente ao ser humano. A conexão original entre mãe e
filho; um estado de fusão harmoniosa interpenetrante, uma gratificante união ilusória,
chamada de simbiose é o que todos nós vivemos antes de começarmos a encontrar as
separações inevitáveis da vida e, é a partir desse primeiro vínculo que aos poucos na in-
fância, nos construímos como seres independentes As referências de vínculo e autoridade
com as figuras parentais nessa fase da vida irá influenciar as nossas relações futuras, afe-
tivas ou profissionais.
Através da análise de dados da pesquisa realizada foi possível verificarmos que há
relação entre vínculo/autoridade primitivo com vínculo/autoridade profissionais. Senti-
mentos originários dos afetos primitivos amor e ódio: respeito, carinho, proteção entre
outros vividos nas primeiras relações com figuras parentais, especificamente com mãe e
pai, repetem-se com outras autoridades. As frases relatadas na entrevista expressam essa
consideração:
De medo e amor ao mesmo tempo.
Autoridade igual a da minha mãe [...] proteção na infância [...] amizade,
companheirismo.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 16


Autoridade na infância, meu pai [...] vínculo afetivo, respeito, carinho
[...] ele era reservado, falava pouco (falava e chamava para perto); Au-
toridade profissional, ele é estilo meu pai, reservado, mas com um sorri-
sinho, um olharzinho que leva a gente para ele, para apoiar as minhas
decisões. (Respostas retiradas da entrevista)
Dessa forma, confirmamos o que a teoria psicanalítica nos fundamentou em rela-
ção a essa consideração, pois de acordo com Freud o “destino é em grande parte determi-
nado [...] por influências da primeira infância” (Freud, apud Viorst)
Os primeiros objetos de amor da vida de um indivíduo permanecem registrados
em seu inconsciente para os objetos presentes, segundo Doval, Freud descreve aconteci-
mentos que considerou comuns no desenvolvimento de todos os indivíduos e estabelece
que a forma como se elabora acontecimentos irá determinar o conceito que se tem de si
próprio e a relação que se estabelecerá entre figuras representativas na atualidade e figu-
ras significativas da infância, especialmente figuras de autoridade. E em grupo as mani-
festações estão ligadas a sentimentos que circulam inconscientemente e podem aparecer
na relação com a figura de autoridade e esta, com competência interpessoal e gerencial
pode desenvolver seus próprios recursos e potencialidades no contexto da organização.

REFERÊNCIAS

BAREMBLITT, Gregório (org.). Grupos – teoria e técnica. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1986.
BION, W. R. Experiências com grupos. São Paulo: Imago, 1975.
D’ANDREA, F. Fortes. Desenvolvimento da personalidade. Rio de Janeiro: Bertrande, 1989.
DOVAL, Isabel. Desenvolvimento grupal: influências do facilitador.
LAJONQUIÈRE, Leandro. De Piaget a Freud: para repensar as aprendizagens. Petrópolis: Vozes, 1992.
PICHON-RIVÈRE, Enrique. O processo grupal. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
PICHON-RIVÈRE, Enrique. Teoria do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
VIORST. Judith. Perdas necessárias. São Paulo: 1999.
ZIMERMAN, David E. Bion: da teoria à prática – uma leitura didática. Porto Alegre: Artmed, 2004.

SBDG – Caderno 85 v Vínculo com autoridade 17


POEMA

No início da SBDG,
Afloravam – se vários sentimentos...
Sentimentos de curiosidade, incerteza, felicidades,
Para conhecer o grupo, a atividade, o desenvolver do mesmo.

Com o decorrer da formação,


Os sentimentos ainda se mantiveram
De diferentes formas a cada momento
E os laços se entrelaçando cada vez mais.

Sabemos que o grupo irá “terminar”,


Mas a experiência vivenciada e aprendida
Será inesquecível,
Para cada um de nós!!!

Alessandra Mie T. Koguishi


Eu venci

Decidir vir foi fácil


No que daria...eu não sabia
Mas o primeiro passo estava dado
E retornar já não queria

No início um silêncio
Uma ansiedade que não conhecia
Mas o tempo me mostraria
Que era este o caminho que percorreria

Veio o primeiro tombo


Que me pegou desprevenido
Mas no segundo foi percebido
Que o caminho já era percorrido

Do giro em único ponto


O grupo me ajudaria
A sair deste turbilhão
E encontrar uma solução
Pra tanta agonia

Hoje eu venci
Com o apoio do grupo consegui
Ver novas formas de agir
E um novo caminho seguir

A ansiedade ainda existe


Agora mais sob controle
Mas novos desafios surgirão
E vou me lembrar do grupo...
No momento da decisão.

Cláudio Pinheiro
Poema SBDG

O eu queria ?
Tenho certeza que sabia...
O que encontrei ?
Sei que nem tudo eu gostei....
O que descobri ?
Que sou uma pessoa que pouco e muito vivi e
Muito quero aprender e fazer....
Para minha vida percorrer.

Márcia Salomão
Estar aqui é...

Estar aqui é ...


Experimentar, mergulhar, conhecer,
Descobrir o obscuro
Revelar os segredos
Ter contato com i mesmo

Estar aqui é...


Permitir-se ao que é novo
Ao que dói
Ao que alegra
Ao que engrandece a alma

Estar aqui é...


Poder ser o que há de mais puro
O que há de mais verdadeiro
É se enobrecer com as experiências
Dos outros e com as tuas próprias

Esta aqui é...


O aqui e agora
O nu e o cru
O amor e a dor

Estar aqui é...


Uma sensação indescritível
Uma batalha vencida
O despertar para uma nova vida.

Fabíola Ancioto
Em meio a turbulência, uma luz

Uma luz que ora apagava, ora iluminava

Mas que era uma luz

Aquela que aquece, ilumina e brilha

Também escurece e esconde

Esconder o que? O que não quer mostrar

Mostrar o que? O que não quer;

porque o que quer não é preciso esconder.

Esconder é tornar visível aos olhos alheios

Aquilo que não se quer ver.

O que quis iluminar? O passado

Passado?!! É aquele que hoje marca o presente, o que fui e

o que sou

Sendo luz agora o momento que vivo o aqui e o agora...

relacionado ao mundo lá fora...

Mari Clair Moro Nascimento


Poesia
Aqui estou.

Para onde vou?

Sei de onde vim.

Sei hoje melhor que ontem quem sou.

Mais amigos verdadeiros encontrei!

Isso significa e dignifica e é o que fica.

Mais leve e consciente estou.

Diferente!

Como grupo, nele entrei e sei, que dele não sairei.

Grupos vem e vão mas, neste sei, que não foi em vão.

Outros grupos chegarão e crescerão.

Sei que nesse me encontrei.

É. Eu encontrei.

Naira Pissinati
VER O OUTRO

Ver o outro, compreendê-lo,


objetivo primeiro.
Uma realidade nova.
Eu, mais uma prova.
Começar, relutar, resistir,
afinal, o objetivo estava no outro, não em mim.
Fazer contato com sentimento,
não era para o meu momento.
Um pulo, talvez quem sabe, um pequeno mergulho.
O que procuro?
Me desafiei, mergulhei.
Um encontro, bem lá no fundo...
comigo mesmo, com meu mundo.
Entendi enfim que o que buscava estava lá dentro.
Santo momento!
Perto do outro, mas compreendendo que é meu o tempo.

Weber Guimarães

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