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LIBRAS

Módulo 1
O QUE É LIBRAS?
Fundamentos para a Educação Inclusiva de Surdos

Adir Luiz Ferreira


Heloisa Lima Perales
João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Vale de Sousa

Projeto Institucional

Edital nº 015/2010/CAPES/DED
Fomento ao uso de tecnologias de comunição e informação nos cursos de graduação
Adir Luiz Ferreira
Heloisa Lima Perales
João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Vale de Sousa

Módulo 1
O QUE É LIBRAS?
Fundamentos para a Educação Inclusiva de Surdos
Adir Luiz Ferreira
Heloisa Lima Perales
João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Vale de Sousa

LIBRAS

Módulo 1
O QUE É LIBRAS?
Fundamentos para a Educação Inclusiva de Surdos

Natal – RN
Janeiro/2011
Governo Federal
Presidente da República
Dilma Vana Rousseff

Vice-Presidente da República
Michel Miguel Elias Temer Lulia

Ministro da Educação
Fernando Haddad

Reitor
José Ivonildo do Rêgo

Vice-Reitora
Ângela Maria Paiva Cruz

Pró-Reitoria de Graduação
Virgínia Maria Dantas de Araújo

Comitê Gestor
Presidente
Virgínia Maria Dantas de Araújo

Coordenação geral
Apuena Vieira Gomes

Coordenadores
Apuena Vieira Gomes/SEDIS
Adir Luiz Ferreira/CE – DEPED
Gleydson de Azevedo Ferreira Lima/SINFO
Marcos Aurélio Felipe/SEDIS
Maria Carmozi de Souza Gomes/PROGRAD
Rex Antonio da Costa de Medeiros/ECT

Secretária de Educação a Distância


Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo

Secretária Adjunta de Educação a Distância


Eugênia Maria Dantas

Secretaria de Educação a Distância (SEDIS)

Coordenador de Produção Revisoras de Língua Portuguesa Ilustradores Diagramadores


de Materiais Didáticos Cristinara Ferreira dos Santos Adauto Harley Ana Paula Resende
Marcos Aurélio Felipe Emanuelle Pereira de Lima Diniz Carolina Costa de Oliveira Carolina Aires Mayer
Janaina Tomaz Capistrano Dickson de Oliveira Tavares Davi Jose di Giacomo Koshiyama
Projeto Gráfico
Leonardo dos Santos Feitoza Elizabeth da Silva Ferreira
Ivana Lima Revisora das Normas da ABNT
Roberto Luiz Batista de Lima Ivana Lima
Verônica Pinheiro da Silva
Revisores de Estrutura e Linguagem José Antonio Bezerra Junior
Eugenio Tavares Borges Revisora Técnica Luciana Melo de Lacerda
Janio Gustavo Barbosa Rosilene Alves de Paiva Rafael Marques Garcia
Jeremias Alves de Araújo
Revisor Tipográfico
José Correia Torres Neto
Joacy Guilherme de A. F. Filho
Kaline Sampaio de Araújo
Luciane Almeida Mascarenhas de Andrade
Thalyta Mabel Nobre Barbosa

Catalogação da publicação na fonte. Bibliotecária Verônica Pinheiro da Silva.

O que é Libras? Fundamentos para a educação inclusiva de surdos: módulo 1 / Adir Luís Ferreira et al... – Natal:
EDUFRN, 2011.
54 p.: il.

Conteúdo: Aula 1 – O que é Libras? Aula 2 – Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum. Aula 3 –
Noções sobre a surdez.
Caderno nº 1 que compõe a disciplina a distância de Libras/UFRN.

ISBN 978-85-7273-766-1

1. Libras. 2. Inclusão. 3. Surdos. I. Ferreira, Adir Luís. II. Perales, Heloisa Lima. III. Weck, João Tadeu. IV.
Silva, José Edmilson Felipe da. V. Sousa, Margarete Vale de.

CDU 615.51.4
L697l

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida
sem a autorização expressa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Apresentação Institucional

A
Secretaria de Educação a Distância – SEDIS da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte – UFRN, desde 2005, vem atuando como fomentadora, no âmbito local, das
Políticas Nacionais de Educação a Distância em parceira com a Secretaria de Educação
a Distância – SEED, o Ministério da Educação – MEC e a Universidade Aberta do Brasil –
UAB/CAPES. Duas linhas de atuação têm caracterizado o esforço em EaD desta instituição: a
primeira está voltada para a Formação Continuada de Professores do Ensino Básico, sendo
implementados cursos de licenciatura e pós-graduação lato e stricto sensu; a segunda volta-se
para a Formação de Gestores Públicos, através da oferta de bacharelados e especializações
em Administração Pública e Administração Pública Municipal.
Para dar suporte à oferta dos cursos de EaD, a Sedis tem disponibilizado um conjunto de
meios didáticos e pedagógicos, dentre os quais se destacam os materiais impressos que são
elaborados por disciplinas, utilizando linguagem e projeto gráfico para atender às necessidades
de um aluno que aprende a distância. O conteúdo é elaborado por profissionais qualificados e
que têm experiência relevante na área, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O material
impresso é a referência primária para o aluno, sendo indicadas outras mídias, como videoaulas,
livros, textos, filmes, videoconferências, materiais digitais e interativos e webconferências, que
possibilitam ampliar os conteúdos e a interação entre os sujeitos do processo de aprendizagem.
Assim, a UFRN através da SEDIS se integra o grupo de instituições que assumiram o
desafio de contribuir com a formação desse “capital” humano e incorporou a EaD como moda-
lidade capaz de superar as barreiras espaciais e políticas que tornaram cada vez mais seleto o
acesso à graduação e à pós-graduação no Brasil. No Rio Grande do Norte, a UFRN está presente
em polos presenciais de apoio localizados nas mais diferentes regiões, ofertando cursos de
graduação, aperfeiçoamento, especialização e mestrado, interiorizando e tornando o Ensino
Superior uma realidade que contribui para diminuir as diferenças regionais e o conhecimento
uma possibilidade concreta para o desenvolvimento local.
Nesse sentido, este material que você recebe é resultado de um investimento intelectual
e econômico assumido por diversas instituições que se comprometeram com a Educação e
com a reversão da seletividade do espaço quanto ao acesso e ao consumo do saber E REFLETE
O COMPROMISSO DA SEDIS/UFRN COM A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA como modalidade
estratégica para a melhoria dos indicadores educacionais no RN e no Brasil.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


SEDIS/UFRN
Apresentação
Caro aluno,

Neste caderno, daremos início aos conteúdos que fundamentam o ensino da Libras
(Língua Brasileira de Sinais) para a formação de professores nos cursos de licenciatura. Não
se trata de apenas aprender sobre o uso da Libras, mas igualmente de compreender o seu sig-
nificado social, histórico e educativo para a inclusão dos alunos surdos na sala de aula comum
do ensino regular. Essa temática é importante para identificarmos os fundamentos políticos,
linguísticos e culturais que perpassam a educação inclusiva e, em especial, a educação dos
surdos, considerando-a como um direito legítimo da pessoa e do cidadão.
Inicialmente, trataremos de como as pessoas surdas se comunicam de forma eficiente por
meio de uma língua própria – a língua de sinais e – vamos descobrir que existe na comunidade
de surdos uma cultura que crescentemente afirma sua identidade no mundo. Em seguida, re-
fletiremos sobre alguns aspectos históricos relativos à educação de surdos no Brasil e ao uso
da Libras; estudaremos noções básicas sobre a surdez e a deficiência auditiva, assim como o
entendimento sociocultural da deficiência e sua relação com a capacidade de inserção e atuação
do surdo em diferentes atividades da vida cotidiana. O conteúdo deste Caderno está dividido em
três aulas – O que é Libras?; Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum; Noções sobre a
surdez –, para que você tenha a liberdade de fazer uma pausa sem perder a unidade de sentido.
É natural que as expectativas se concentrem nos conteúdos práticos e, de fato, eles serão
bastante valorizados no curso. Contudo, não podemos prescindir das questões de ordem con-
ceitual relativas à educação inclusiva e ao uso da Libras nas classes comuns do ensino regular
com alunos surdos, pois elas nos orientam para uma prática docente ética e competente.
Chamamos a sua atenção para o uso das vídeo aulas associadas a este caderno. A lei-
tura complementar é a nossa sugestão para que você possa avançar no conhecimento sobre
Libras e educação de surdos a partir de alguns sites e filmes que complementam os temas
abordados neste Caderno. As atividades propostas devem ser realizadas logo após o estudo do
material e tomadas como referência para a autoavaliação. Lembramos que os tutores estarão
à sua disposição, durante todo o curso, conforme agenda publicada no SIGAA, para eventuais
esclarecimentos e apoio ao uso dos materiais. Esperamos que aproveite o máximo!
Sumário

Aula 1 – O que é Libras? 5


Apresentação 7
Objetivos 7
A comunicação gestual de pessoas surdas 9
Atividade 13
Cultura, comunidade e identidade surda 14
Resumo 16
Autoavaliação 16
Referências 17

Aula 2 – Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 19


Apresentação 21
Objetivos 21
Um olhar sobre a deficiência e a diversidade 23
Uma história de conquistas e desafios 24
Atividade 39
A educação de surdos no Brasil 30
Resumo 33
Autoavaliação 33
Referências 34

Aula 3 – Noções sobre a surdez 37


Apresentação 39
Objetivos 39
Compreendendo a surdez 41
Atividade 45
A relação entre deficiência e funcionalidade 45
Resumo 49
Autoavaliação 49
Referências 51
Anexo 53
O que é Libras?

Aula

1
Aula 1 O que é Libras?
Apresentação

E
m nossa primeira aula, veremos que nem sempre a comunicação entre surdos e ouvintes
através das línguas conhecidas foi possível, pois as línguas orais-auditivas são difíceis de
aprender para quem não ouve e, consequentemente, tem dificuldade para falar, mesmo
que não haja problema com o aparelho fonador. Por isso, desde as suas origens, a elaboração
e a divulgação de uma língua de sinais foi motivada pela necessidade de uma língua comum
entre surdos-ouvintes e surdos-surdos.Todavia, é longo o embate histórico e político para o
reconhecimento de que as pessoas com surdez são plenamente capazes de realizar as mesmas
atividades que os ouvintes realizam, quando asseguradas as condições de comunicabilidade,
especialmente com a substituição ou complementação dos meios e recursos sonoros por visu-
ais. Também é resultado de muita discussão o reconhecimento de que a comunicação gestual
de sinais dos surdos tem status de língua e não de linguagem, pois apresenta um sistema
de signos, regido por uma gramática própria, que exprime ideias amplamente comunicáveis
para seus usuários.
Assim, a língua de sinais é essencial para a comunicação dos surdos, pois é a partir des-
ses sinais convencionados que eles organizam seus esquemas cognitivos para compreender
ideias, formar conceitos, relacioná-los e expressá-los. Portanto, é necessário que as pessoas
ouvintes, especialmente aquelas que se relacionam com surdos, aprendam a língua de sinais
de seu país (no Brasil é a Libras) e entendam que eles possuem uma cultura específica que
lhes confere uma identidade própria. Aprendam, ainda, a respeitá-los em suas necessidades
especiais, não apenas por força da lei, não por compreender a deficiência como incapacidade
ou doença que mereça piedade, mas por tratá-las como diferença ou diversidade inerente a
todos os humanos.

Objetivos
1 Compreender a importância da língua de sinais para os surdos.

Reconhecer a existência de uma cultura surda que se


2 traduz em um modo específico de ser, de ver e de comu-
nicar o mundo.

Aula 1 O que é Libras? 7


Aula 1 O que é Libras?
A comunicação
gestual de pessoas surdas

D
esde os primórdios da humanidade, antes mesmo do surgimento das línguas, a co-
municação vocal entre humanos acompanhou-se de gestos, expressões faciais e mo-
vimentos do corpo. Pesquisando as bases ancestrais da linguagem humana, estudos
sobre a comunicação de grandes primatas (chimpanzés, bonobos, gorilas, orangotangos) já
demonstraram que a riqueza das expressões corporais pode ser tão vasta quanto o repertório
das vocalizações (POLLICK; DE WAAL, 2007). Ambos, gestos e sons, buscam exprimir atitu-
des, intenções, informações, estados físicos e emocionais, de forma clara ou sutil, aos outros
membros da espécie. Então, como forma de comunicação simbólica, o gesto parece ter vindo
antes da palavra e a linguagem do corpo pode ter surgido antes da comunicação oral ou escrita.
Mesmo hoje, quando não conseguimos ou não sabemos falar uma língua estrangeira, usamos
intuitivamente os gestos, isto é, alguma forma de comunicação por sinais.

A comunicação com gestos é inerente ao homem e a outros primatas. A lin-


guagem com expressões corporais pode ser tão vasta quanto as formas de
comunicação oral, como no caso dos chimpanzés, bonobos e gorilas.

Isso significa que a comunicação por sinais utilizada pelas pessoas surdas não é uma
invenção de um grupo minoritário de deficientes, uma “prótese” simbólica para substituir a
voz por causa da deficiência auditiva, mas está na própria origem da linguagem humana. O
desenvolvimento das línguas de sinais, hoje consideradas como o modo natural e mais eficiente
para a comunicação de surdos, está, antes de tudo, baseado na capacidade linguística pri-
mordial de todos os seres humanos. É lógico, portanto, que com essa capacidade os usuários
das línguas de sinais podem dialogar sobre qualquer assunto de interesse humano: política,
filosofia, literatura, esporte, ciência, humor, sexo, cotidiano, entre outros.
Assim, o processo civilizatório da humanidade se assenta no uso de diferentes línguas e
linguagens que tornam possível a comunicação entre pessoas. Para tanto, os homens de um
mesmo grupo social compartilham e utilizam um sistema abstrato de signos linguísticos que
estruturam uma língua. Esses signos são a combinação entre os significantes (sinais, palavras
ou outro tipo de código) e seus respectivos significados ou conceitos. A língua é, portanto, uma
tecnologia de comunicação fundamental, porque permite aos usuários, que dominam o seu
sistema, interações linguísticas sofisticadas, no sentido material, simbólico, subjetivo e social.
E as línguas de sinais, como qualquer outra língua, também apresentam todos esses sentidos.

Aula 1 O que é Libras? 9


As pessoas surdas aprendem a se comunicar por gestos e por sinais conven-
cionados e organizados de acordo com uma gramática específica, sendo por
isso chamada de língua de sinais.

As línguas de sinais, nas sociedades ocidentais contemporâneas, têm suas origens no


século XVI, na Europa. Elas são construções históricas e culturais, desenvolvidas por dife-
rentes países, cada uma com sua gramática particular. No Brasil, adota-se a Língua Brasileira
de Sinais (Libras); na França, a Langue de Signaux Française (LSF); na Espanha, a Lengua
de Signos Española (LSE); em Portugal, a Língua Gestual Portuguesa (LGP); no México, a
Lengua de Senhas Mexicana (LSM); nos Estados Unidos e Canadá, a American Sign Language
(ASL); na Alemanha, a Deutsche Gebärdensprache (DGS), e assim por diante. Nenhuma dessas
línguas é considerada a língua oficial da nação, mas são reconhecidas como língua adotada
pela comunidade surda desses países. Porém, mesmo com estruturas gramaticais próprias,
relacionam-se com os idiomas utilizados e as culturas existentes nessas sociedades.

Saiba mais

Em cada país, existe uma língua de sinais reconhecida, no Brasil foi adotada a
denominação de Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Como em qualquer língua viva, nas línguas de sinais existem variações regionais e locais,
estilos pessoais, uso em contexto, norma padrão, gírias e constante invenção e transformação
de sinais. O que é denominado de palavra nas línguas orais-auditivas é chamado de sinal nas
línguas de modalidade gestual-visual ou visual-espacial. Citamos algumas características da
Libras que a diferenciam da Língua Portuguesa: não existe conjugação verbal nem concordância
de gênero, ou seja, os verbos são apresentados no infinitivo e para o gênero é acrescentado
o sinal correspondente a “mulher” ou “homem”. Todavia, não se deve pensar que as línguas
de sinais sejam a transposição direta das línguas de modalidade oral-auditiva, simplesmente
expressando através de gestos os significados (fonético, gráfico ou simbólico) das palavras
da língua falada.
Além da língua de sinais, existe o alfabeto manual, que é o conjunto de sinais representado
por uma posição de mão e dedos, correspondente a cada uma das letras do alfabeto escrito. Ele não
é uma língua de sinais em si, mas um recurso de soletração que só faz sentido para os surdos ou
ouvintes alfabetizados. O alfabeto manual é especialmente utilizado para soletrar nomes próprios
e outras palavras cujos sinais ainda não existam ou que sejam desconhecidos pelo sinalizador.
A soletração com o alfabeto manual é como a escrita à mão de uma pessoa, ou seja, a
execução do sinal é como uma caligrafia que sofre algumas variações de pessoa para pessoa.
Em ambos os casos a clareza é fundamental para a compreensão e a sinalização do alfabeto

10 Aula 1 O que é Libras?


manual requer fluência, isto é, a competência prática para executar os sinais com ritmo e rapi-
dez, sem preocupação excessiva com a execução precisa de cada letra; do contrário o sentido
fica prejudicado para quem os interpreta. Alcançar essa competência leva algum tempo, pois
requer treinamento e prática regulares. Mas atenção: não soletre palavras ou frases inteiras
se você não conhece o sinal correspondente. Fazer isso seria como estar pronunciando as
palavras letra por letra; fica estranho e difícil de entender. É como dizer: C-O-M-O-V-O-C-Ê-
S-E-C-H-A- M-A?

Em geral, a soletração é usada para informações específicas como:


 nome pessoal;
 nomes de lugares (cidade, estado, lojas);
 títulos de livros e filmes;
 comidas e pratos;
 definição do entendimento de um sinal;
 termos técnicos.

A B C Ç D E

F G H I J K

L M N O P Q

R S T U V W

X Y Z

Figura 1 –Alfabeto Manual

Aula 1 O que é Libras? 11


Para um estudante que está iniciando na língua de sinais, aprender como soletrar o seu
próprio nome é muito importante. Lembre-se de utilizar, junto com a soletração, os sinais
de Libras para as perguntas (“Qual seu nome?”; “Qual o nome dele(a)?”) e respostas (“Meu
nome é...”; “O nome dele(a) é...”). Veja como fazer essas perguntas e respostas na videoaula
nº. 1 (O que é Libras?).

Figura 2 – Língua de sinais – língua oral-auditiva

Para indicarmos nosso nome pela primeira vez a um surdo alfabetizado, utilizamos o
alfabeto manual, sinalizando letra por letra. Logo após, apresentamos nosso sinal, que é uma
simplificação, para facilitar a comunicação. Esse sinal pessoal geralmente é composto pela
gestualização da primeira letra do nosso nome seguida de outro gesto que faça referência a
um atributo (por exemplo, tipo de cabelo, altura, local de nascimento) que nos seja particular.

Saiba mais

Linguagem é a utilização de meios e recursos variados, dentre eles as línguas e


outras formas de expressão, que viabilizam a comunicação entre os indivíduos.

Língua é um sistema convencional, composto por um conjunto de signos


(códigos com significantes e significados) e uma gramática própria.

12 Aula 1 O que é Libras?


Curiosidade

Os surdos e outros usuários que empregam a Libras, assim como os usuários


de outras línguas de sinais, são denominados de sinalizadores.

1 Assista à videoaula nº 1 (O que é Libras?).

2 Utilizando o alfabeto manual, gestualize seu nome.

Crie o sinal para o seu nome, conforme as instruções e exemplos oferecidos na


3 videoaula nº1 (O que é Libras?).

4 Enumere a segunda coluna de acordo com a primeira:

(1) Adriano ( )

(2) Carmem ( )

(3) Fernando ( )

(4) Gustavo ( )

(5) Jeferson ( )

(6) Kalina ( )

(7) Paloma ( )

(8) Sabrina ( )

(9) Tereza ( )

(10) Wesley ( )

Aula 1 O que é Libras? 13


Cultura, comunidade
e identidade surda
Diferente da concepção negativa que o senso comum atribui à surdez, a noção de cul-
tura busca compreender positivamente os surdos na sua dimensão antropológica, histórica,
psicológica e social. A dimensão cultural, associada à vida social e subjetiva das pessoas
surdas, destaca as capacidades individuais e coletivas que elas compartilham com todos os
seres humanos. Ao contrário, as visões discriminatórias representam as pessoas surdas como
meros deficientes físicos que apresentam uma incapacidade auditiva evidente, destacando,
dessa forma, o surdo como diferente de uma pessoa “normal”.
Há várias definições para a palavra “cultura”, contudo, a noção de cultura em sua origem
remete ao cultivo do campo pelos homens, às técnicas e sentidos para o cuidado com a terra,
derivando dessa história social a ideia de comunidade e a identificação ao território e seus
habitantes, nos seus produtos materiais e simbólicos. Ora, um dos produtos mais notáveis
da cultura humana foi as diferentes línguas que surgiram desse convívio para a garantia e
desenvolvimento da vida, baseadas na comunicação social, na organização política, na troca
de experiências tecnológicas, na elaboração filosófica e científica, nas narrativas poéticas, nos
relatos cotidianos, entre outros.
Nesse sentido, considerando que a surdez distingue sensorialmente um grupo particular
de humanos, criando um modo específico e compartilhado de ser, de ver e de comunicar o
mundo, podemos dizer, então, que a cultura surda preenche todos os critérios aqui definidos:
comunidade (indivíduos), identificação (sensorial), território (organizações e locais) e uma
língua própria (língua de sinais). A denominação cultura e comunidade surda é largamente
difundida na bibliografia e produção técnica sobre a questão da surdez, porém, alguns autores
defendem o uso da noção de “povo surdo” (STROBEL, 2009), ao invés de comunidade surda,
considerando a primeira como o coletivo exclusivo das pessoas surdas e a segunda como o
conjunto de surdos e ouvintes (familiares, amigos, estudiosos, interessados) envolvidos com
a surdez. É claro que esses diferentes posicionamentos estão envolvidos na adoção de um
sentido político. De um lado, destaca-se a luta de associações de surdos pelo reconhecimento
de uma cultura particular e por direitos específicos. De outro lado, buscam-se formas ampliadas
de inclusão e de participação na cultura social geral (local, regional, nacional, internacional).

Ao contrário das visões discriminatórias sobre os surdos, a noção de cultura


atribuída à surdez é compreendida em sua dimensão antropológica, histórica,
psicológica e social. A noção de cultura surda preenche os critérios conceituais
de: comunidade (indivíduos), identificação (sensorial), território (organizações
e locais) e língua própria (língua de sinais).

14 Aula 1 O que é Libras?


De fato, para os surdos, o aprendizado da Língua Portuguesa (oral-auditiva) não é o caminho
natural, sendo a Língua Brasileira de Sinais (visual-espacial) a mais adequada para o desenvol-
vimento cognitivo inicial. Todavia, pela convivência histórica e cotidiana com uma cultura de
ouvintes, a aquisição da Língua Portuguesa como segunda língua é fator imprescindível para a
inclusão das pessoas surdas na sociedade brasileira. Assim, a proposta de ensino bilíngue para
surdos, na qual a Libras é reconhecida como a língua natural e como pressuposto para o ensino
do Português, “atravessa a fronteira linguística e inclui o desenvolvimento da pessoa surda dentro
da escola e fora dela em uma perspectiva socioantropológica” (SILVA, 2008, p. 50).

O ensino bilíngue, tendo a Libras como a língua natural e o Português como


segunda língua, é visto como imprescindível para a inclusão democrática das
pessoas surdas na sociedade brasileira.

O reconhecimento legítimo de particularidades não pode estar dissociado da participação


democrática, para que não aconteça o isolamento cultural e este acabe fortalecendo estereó-
tipos ou criando novas discriminações. Para os fins da ação inclusiva na escola comum e da
prática pedagógica de professores ouvintes, preferimos a denominação genérica de pessoas
surdas ou alunos surdos.

Figura 3–Língua de sinais e cultura surda

Aula 1 O que é Libras? 15


Resumo

Nesta aula, vimos que as línguas de sinais surgiram da necessidade de uma


língua comum entre surdos-ouvintes e surdos-surdos, sendo o modo natural de
comunicação para quem é privado da audição. Aliás, a comunicação por gestos
entre primatas sugere que essa capacidade ancestral está na origem da linguagem
humana. As línguas de sinais são construções históricas de diferentes países,
cada uma com sua gramática particular. No Brasil, a denominação é Língua
Brasileira de Sinais (Libras). A Libras compreende variações regionais e locais,
estilos pessoais, gírias e invenção de sinais. Há também o alfabeto manual, com
posições de mãos e dedos para as letras do alfabeto escrito. Considerar, pela
convivência com a cultura de ouvintes, o português como segunda língua é fator
imprescindível para a inclusão dos surdos.

Autoavaliação
1 Por que é importante utilizar a língua de sinais na comunicação com pessoas surdas?

Leia o trecho abaixo, que apresenta o relato de um surdo e, em seguida, escreva


2 sua impressão acerca da vida de uma pessoa surda no mundo ouvinte.

RELATO DE UM SURDO
Rimar Carvalho Segala
Alguns pensam que sou louco, afinal até mesmo filósofos famosos na história pensaram
assim também de pessoas como eu. Certa vez, Platão e Aristóteles, observando um surdo,
chegaram a seguinte conclusão: “Não sabe falar, não sabe ouvir; és louco!”. Triste conclusão
estes tão sábios filósofos chegaram! Se tão somente Platão tivesse lembrado de suas palavras:
“Tudo que sei, é que nada sei”, talvez sua conclusão fosse diferente. Realmente, estes cultos
filósofos nada sabiam sobre aquele surdo. Talvez se tivesse “escutado” aquele surdo, digo,
prestado atenção, estudado, compreendido, esta frase não partiria deles na história. Talvez os
conceitos existentes sobre os surdos fossem bem diferentes. Que pena!
O surdo como qualquer outro deficiente possui uma compreensão natural, o que
os seus ouvidos não podem ouvir, os seus olhos ouvem. Ele é um estrangeiro brasileiro
no Brasil. Tem que aprender a língua dos ouvintes e isto não é fácil.
Fonte: Kojima e Segala, 200-?, p. 9

16 Aula 1 O que é Libras?


Referências
BUENO, José Geraldo Silveira. Surdez, linguagem e cultura. Caderno CEDES, Campinas,
v. 19, n. 46, set. 1998. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0101-32621998000300005&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 17 fev. 2011.

______. Diversidade, deficiência e educação. Revista Espaço, Rio de Janeiro: INES, n. 12,
p. 3-12, jul./dez. 1999.

KOJIMA, Catarina Kiguti; SEGALA, Sueli Ramalho. Libras – Língua Brasileira de Sinais – A
imagem do pensamento. São Paulo: Ed. Livros Escala, [200-?].

POLLICK, Amy S.; DE WAAL, Frans B. M. Ape gestures and language evolution. PNAS, v.
104, n. 19, 8 may 2007.

SILVA, Angela Carrancho;NEMBRI, Armando Guimarães. Ouvindo o silêncio: educação,


linguagem e surdez. Porto Alegre: Mediação, 2008.

STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda. 2. ed. rev. Florianópolis: ed.
da UFSC, 2009.

THOMA, Adriana; LOPES, Maura Corcini. A invenção da surdez: cultura, alteridade, identida-
des e diferença no campo da educação. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004.

Anotações

Aula 1 O que é Libras? 17


Anotações

18 Aula 1 O que é Libras?


Exclusão/inclusão:
os surdos na escola comum

Aula

2
Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum
Apresentação

N
esta aula, vamos abordar a educação de surdos nas classes comuns do ensino regular, o
que nos remete à necessidade de utilizarmos a Libras no contexto da sala de aula, ainda
que de maneira básica. Nesse sentido, discutiremos alguns aspectos históricos e legais
que garantem aos alunos surdos o direito de estudarem na escola comum, isto é, em escolas
que não organizam classes especiais. Significa, pois, reconhecê-los como pessoas plenamente
capazes de aprender os conteúdos curriculares das diferentes áreas de conhecimento.
Compreendemos que a educação especial na perspectiva inclusiva representa um avanço
na história da educação dos surdos porque reconhece tanto a necessidade de uso da Libras
na sala de aula como a necessidade de os surdos estudarem em classes comuns do ensino
regular. Consideramos que tal postura favorece a participação social e política dos surdos, em
detrimento do isolamento cultural ao qual estariam submetidos em classes especiais, porque
estas evidenciam e reforçam para a sociedade em geral a diferença (surdez e incapacidade) e
não a igualdade homem e diversidade).

Objetivos
Conhecer os marcos históricos da educação de surdos.
1
Considerar a inclusão de alunos surdos nas classes co-
2 muns como um direito assegurado por lei.

Identificar os fundamentos políticos, sociais, culturais,


3 humanos e filosóficos que defendem o direito de todos
os alunos estarem aprendendo juntos, sem nenhum tipo
de discriminação.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 21


Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum
Um olhar sobre a
deficiência e a diversidade

O
s estudos sobre os direitos das pessoas com deficiência não estão dissociados dos fatos
históricos. Desde a Antiguidade, a falta de entendimento sobre as diferenças entre os
seres humanos fez com que a deficiência fosse alvo de preconceito (MIRANDA, 2008).
Em torno dessas pessoas se criavam marcas – estigmas – que as rotulavam, discriminavam,
excluíam e, em alguns casos, as condenavam à morte. Expressões como anormais, retardados,
dementes, aleijados e outras evidenciam a deficiência ou a doença em detrimento da pessoa:
um sujeito de direitos, capaz de aprender e de participar das mais diferentes atividades da
vida social e cotidiana.

A forma como a sociedade encara as pessoas com deficiência varia em cada


época e local, estando essa visão condicionada por fatores culturais, políticos,
econômicos e filosóficos, dentre outros.

A exclusão das pessoas com deficiência significa impedi-las, em maior ou menor grau,
de exercerem algum ou vários dos direitos sociais que lhes outorgam status de cidadão.
Contrariamente, o movimento mundial contemporâneo pela inclusão das pessoas com defi-
ciência se fundamenta na concepção de direitos humanos, constituindo-se como uma ação
política, cultural, social e pedagógica. Reconhece, assim, a igualdade e a diferença como va-
lores indissociáveis, no sentido como afirma Boaventura de Souza Santos: “Temos o direito a
sermos iguais quando a diferença nos inferioriza. Temos o direito a sermos diferentes quando
a igualdade nos descaracteriza”(SOUZA apud SEESP, 2007, p.25).

Portanto, a educação inclusiva é antes de tudo uma postura que reconhece e valoriza em
cada aluno suas potencialidades e sua condição humana. Trata-se de um princípio filósofico
que agrega valores humanísticos e democráticos, através dos quais se busca assegurar, indis-
tintamente, a todos os indivíduos o direito de aprender na escola, com vistas ao crescimento,
à satisfação pessoal e à inserção social.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 23


Uma história de
conquistas e desafios
No curso da história da humanidade, as pessoas com deficiência sofreram com a ex-
clusão social, foram vítimas de tratamentos desumanos e até de extermínio. Na Antiguidade
(4000 a.C. – 476 d.C.), por exemplo, alguns povos abandonavam ou eliminavam as pessoas
“deformadas” por considerá-las um estorvo social. Os hebreus acreditavam que a deficiência
era uma punição de Deus. Em Roma, os patriarcas eram autorizados a matar seus filhos de-
ficientes e, em Esparta, os pais os lançavam do alto do Taigeto, que era um abismo de mais
de 2.400 metros de altura.
Em cada época e sociedade, a estrutura econômica, política e cultural influencia na forma
como as pessoas e as instituições encaram os deficientes. O contexto da Idade Média (476 a
1453) foi fortemente marcado pela influência religiosa cristã e pela ignorância da maior parte
da população. Logo, as pessoas com deficiência eram vítimas de superstições, consideradas
possuídas por demônios ou com poderes especiais de bruxos e feiticeiros. A literatura da
época revela que anões e corcundas eram ridicularizados e usados para diversão da nobreza.

Curiosidade
Você sabia que até a Idade Média a Igreja Católica acreditava que os surdos
não podiam salvar sua alma porque não conseguiam proferir os sacramentos?

A partir do século XVI surgem diferentes instituições que passam a cuidar das pessoas
com deficiência. Contudo, tratava-se de uma situação de segregação e isolamento social,
alegando-se que seria melhor para elas ficarem distantes, vivendo em um ambiente mais
tranquilo. Na verdade, era uma forma de livrar-se desses “inconvenientes”. Persistia uma
visão patológica do indivíduo que apresentava deficiência, o que trazia como consequência o
menosprezo da sociedade.

Saiba mais

A partir do século XVI, registra-se uma preocupação em relação ao cuidado e


educação das pessoas com deficiência em instituições especiais, embora ainda
houvesse muito preconceito e exclusão social.

24 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


Por outro lado, é nesse período que se tem registro do trabalho do monge beneditino
Pedro Ponce de Leon (1509 -1584), que iniciou a educação de doze crianças surdas, de fa-
mílias aristocráticas, no mosteiro de San Salvador em Oña (Espanha). Ele criou um alfabeto
bimanual com o objetivo de ensiná-las a ler e escrever e, com isso, obteve grande prestígio
entre seus contemporâneos. Mais tarde, o padre espanhol Juan Pablo Bonet (1573 -1633),
no ano de 1620, publicou o primeiro livro ilustrado com alfabeto manual, dedicado à educa-
ção de surdos, sob o título Reducción de las letras y arte para enseñar a hablar a los mudos
(Redução das letras e arte de ensinar a falar aos mudos). Assim, como Ponce de Leon, Pablo
Bonet dedicou-se à educação oral e manual dos surdos na Espanha.

Figura 1–Gravuras do libro Reducción de las letras y arte para enseñar a hablar a los mudos (Bonet, 1620)

Fonte:<http://en.wikipedia.org/wiki/Juan_Pablo_Bonet>. Acessoem: 17 fev. 2011.

No século XVIII, a educação em institutos especializados para atendimento de surdos e


de cegos se torna mais evidente. Em 1760, Charles-Michel de l’Épée criou o Instituto Nacional
de Surdos-Mudos em Paris – atualmente Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris – que
se tornou referência mundial. Também em Paris, no ano de 1784, Valentin Haüy inaugura o
Instituto Real de Jovens Cegos, hoje Instituto Nacional para Jovens Cegos, cuja finalidade é
instruir crianças cegas e adaptá-las ao convívio social.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 25


Figura 2–Charles-Michel de l’Épée instruindo alunos no Instituto Nacional de Surdos-Mudos em Paris

Fonte: <http://www.visuf.org/lectHistEpee.php>. Acesso em: 17 fev. 2011.

Passando do extermínio para a separação e proteção, até chegar a um período no qual


se buscou a emancipação, a integração e mais atualmente a inclusão, se pontuam os avanços
na defesa dos direitos das pessoas com deficiência. Hoje, amparadas por lei, elas contam com
uma abordagem mais humana, especialmente, nos campos da educação e saúde. Desse modo,
é longa a história de desafios e conquistas na luta pela inclusão da pessoa com deficiência,
isso porque coexistem diferentes perspectivas sobre o assunto.
Mesmo nos séculos XVIII e XIX, a despeito da influência iluminista que muito contribuiu para
evidenciar a capacidade e o talento de pessoas com deficiência, especialmente cegas e surdas,
elas não eram tratadas com igualdade de direitos. Somente no século XX, com a Declaração
Universal dos Direitos Humanos se iniciam os movimentos sociais em defesa das minorias e das
pessoas com deficiência, baseados em vários de seus artigos, principalmente o Art. II:

Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta
Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião,
opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou
qualquer outra condição (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948).

No século XX, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),


inicia-se um processo mais sistemático de reconhecimento legal dos direitos
da pessoa com deficiência.

26 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um primeiro passo que apontou para
a necessidade de se reconhecer o direito das pessoas com deficiência, mas carecia de espe-
cificidade. Por isso, a ONU adotou em 1994 a Declaração de Salamanca, que delibera sobre
princípios, política e práticas na área das necessidades educativas especiais, com o objetivo
de orientar procedimentos para a equalização de oportunidades para pessoas com deficiência.
No Brasil, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação e a Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC/SEESP, 2007) apontam e
orientam suas ações com base noutros documentos legais como, por exemplo:

 Constituição Federal (BRASIL, 1988);

 Lei nº 7.853/89, que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua
integração social e a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência (Corde), instituindo a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos
dessas pessoas e disciplinando a atuação do Ministério Público;

 Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Declaração de Jomtien,UNESCO, 1990);

 Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90);

 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96);

 Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra


a Pessoa Portadora de Deficiência (Convenção da Guatemala, Decreto nº 3.956/2001);

 Decreto nº 6.571/2008, que dispõe sobre o atendimento educacional especializado, regula-


mentando o parágrafo único do art. 60 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e acres-
centando dispositivo ao Decreto no 6.253, de 13 de novembro de 2007.

 Decreto nº 6.949/2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das


Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30
de março de 2007.

Saiba mais

A luta pelo reconhecimento dos direitos das pessoas surdas tem ganhado am-
paro legal nas últimas décadas, porém, é importante observar que as leis apre-
sentam uma hierarquia, na qual as de menor grau devem obedecer às de maior
grau. No direito brasileiro adota-se a seguinte hierarquia: Contituição Federal;
Emenda Constitucional; Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos; Tra-
tados Internacionais dos quais o Brasil seja signatário; Lei complementar; Lei
ordinária; Medida provisória; Resolução; Decreto e Portaria.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 27


Curiosidade

Helen Keller (Alabama, 1880 – Connecticut, 1968) foi uma célebre escritora e
filósofa que ficou cega e surda aos 18 meses de idade. Sua biografia foi regis-
trada no filme The Miracle Worker, em 1962, dirigido por Arthur Penn. Algumas
de suas ideias:

“Nunca se deve engatinhar quando o impulso é voar.”

“Evitar o perigo não é, em longo prazo, tão seguro quanto se expor ao perigo.
A vida é uma aventura ousada ou, então, não é nada.”

“As melhores e mais belas coisas do mundo não podem ser vistas nem toca-
das, mas o coração as sente.”

Apesar dos muitos avanços e conquistas, e da vasta legislação em defesa da total in-
clusão dos alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular, ainda há grupos
resistentes que pensam de maneira diversa. Esses grupos defendem as escolas especiais sob
o argumento de que nelas haveria maiores condições de atendimento educacional condizente
com as necessidades, por exemplo, dos alunos surdos. Caberia, segundo eles, aos alunos e
seus responsáveis optarem por um ou outro tipo de escola.
Todavia, o fundamento que nega essa posição considera que havendo separação dos
alunos com deficiência em escolas de educação especial estaremos, de fato, excluindo-os
porque negamos a pluralidade e a diversidade que existe no meio social, que é independente
de nossa vontade pessoal. Separá-los na intenção de melhor prepará-los seria um equívoco.
Por isso, a perspectiva oficial adotada pelo Ministério da Educação é de que a Educação Es-
pecial se constitua como Atendimento Educacional Especializado, de maneira adicional e não
substitutiva à escola comum (SEESP, 2007).

Saiba mais

A política de educação especial adotada atualmente no Brasil considera a in-


clusão do aluno com deficiência, incluindo os surdos, em classes comuns do
ensino regular como melhor alternativa de aprendizagem e participação social
democrática. A educação especial acontece por meio de atendimento educacio-
nal especializado, de maneira complementar à escola comum.

28 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


A discussão sobre o ordenamento legal da educação especial para surdos no Brasil será
objeto de estudo em outro caderno deste curso. Nosso interesse no momento é esclarecer que
a inclusão de alunos surdos nas classes comuns do ensino regular se constitui numa obrigação
estendida para qualquer escola, independente de quaisquer alegações que se possa apresentar
sobre a falta de condições para recebê-los.

Pesquise sobre as formas como as pessoas com deficiência já foram discrimina-


1 das ou eliminadas, ainda nos século XIX e XX.

2 Leia e escreva um comentário sobre os dois fragmentos de entrevistas com


alunos surdos.

Era muito difícil de acompanhar as aulas, as explicações do professor, todas em


língua oral não tinham sentido e quando eles utilizavam a escrita para nos fazer
entender ficava pior, pois não conhecíamos o significado das palavras. A fala
era sem sentido e a escrita mais ainda. Eu tentava clarear um pouco mais as
idéias perguntando aos amigos, porque o professor quando entra na sala tem
um horário de 55 minutos para cumprir o conteúdo e não tem tempo a perder
dando explicações para os surdos. (Orcenir)

A palavra correta não é inclusão, e sim uma forçada adaptação com a situação
do dia-a-dia dentro da sala de aula e na maior parte de tempo eu me sinto exclu-
ída pois não capto100% a leitura labial dos professores que tem diversos tipos
de articulações, tais como lábios finos, grossos, tortos, como espesso bigode,
ou falam rapidamente de boca fechada ou muito aberta, sem expressão facial,
etc. além disto, os meus olhos cansam de ler os movimentos dos lábios e uns
10 minutos depois já nem tenho ânimo de prestar atenção.(Karin)
Fonte:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Especial (SEESP).
Saberes e práticas da inclusão: desenvolvendo competências para
o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos. Brasília: MEC/SEESP, 2006. p. 103-106)

3 Reflita e escreva sua compreensão acerca do seguinte enunciado: “A comunicação é


parte fundamental no processo de socialização e desenvolvimento humano. A surdez
se torna um problema quando o código das mensagens é baseado apenas no som”.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 29


A educação de surdos no Brasil
Como já vimos, durante a maior parte da história da humanidade, as pessoas com defi-
ciência foram vítimas da exclusão, pois a ênfase era na sua incapacidade ou anormalidade. No
Brasil não foi diferente, a educação era privilégio de poucos, isto é, tanto as classes populares
como os negros escravos e as pessoas com deficiência não chegavam à escola. Entretanto,
sob a influência de instituições especializadas que surgiam na Europa, como os já citados
Instituto Nacional de Surdos-Mudos e o Instituto Real de Jovens Cegos, temos na então ca-
pital Brasileira, Rio de Janeiro, a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos em 1854 e
dois anos depois, em 1856, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, atual Instituto Nacional
de Educação de Surdos (INES).

Figura 3–Instituto Nacional de Educação de Surdos, bairro de Laranjeiras no Rio de Janeiro

Fonte: <http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1034271>. Acesso em: 17 fev. 2011.

O Imperial Instituto dos Surdos-Mudos foi a primeira escola especial para surdos no
Brasil, criada por D. Pedro II, por meio da Lei no. 839, de 26 de setembro de 1857. Teve como
primeiro diretor o professor francês Erenest Huet, que era surdo. O currículo que Huet desen-
volveu era constituído por língua portuguesa, aritmética, linguagem articulada e leitura labial.
O instituto funcionava em regime de internato, atendendo exclusivamente surdos do sexo
masculino. Somente em 1931 passou a atender alunas surdas, em regime de externato, com
oficinas de costura e bordado, consolidando seu caráter profissionalizante. Em1951, o INES
criou seu primeiro curso normal para professores na área de surdez e, no inicio da década de
1980, um curso de especialização para professores, também na área da surdez. A partir de
1993, com a mudança de seu Regimento Interno e através de ato ministerial, o INES passa a
ser um centro nacional de referência e, com esta nova atribuição, realiza ações que subsidiam
todo o país. Ao longo de sua existência, o INES já utilizou diferentes abordagens na educação
de surdos, chegando a proibir, no período de 1957 ate aproximadamente 1980, o uso da língua
gestual, adotando, assim, uma posição oralista.

30 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


O Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) foi a primeira instituição
especializada para a educação de surdos no Brasil, sendo atualmente um centro
nacional de referência em estudos, pesquisas e formação de professores na
área da surdez.

Destaca-se, ainda, na história da educação dos surdos no Brasil, a criação em 16 de maio


de 1987 da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis), que trabalha na
defesa dos direitos linguísticos e culturais da comunidade surda, propagando a Libras como
meio natural de comunicação das pessoas surdas.

Saiba mais

A Feneis é uma entidade representativa dos surdos que mantém relações dire-
tas com a ONU (Organização das Nações Unidas); Unesco (Organização Edu-
cacional, Científica e Cultural das Nações Unidas; OMS (Organização Mundial
da Saúde); OIT (Organização Internacional do Trabalho) e OEA (Organização
dos Estados Americanos). Dentre os objetivos da Feneis enumeramos dois:
1- promover a inclusão dos profissionais surdos no mercado de trabalho; 2-
realizar pesquisas para a sistematização e padronização do ensino de Libras
para ouvintes. Outras informações podem ser consultadas diretamente no site
da federação <http://www.feneis.com.br>

A educação de surdos no Brasil abrange diferentes abordagens, nem sempre compatí-


veis, pois em geral oscilam na disputa sobre a forma de ensinar os alunos surdos e como eles
devem aprender, se pela língua oral (tradição alemã, iniciada em 1754 por Samuel Heinicke)
ou pela língua de sinais (tradição francesa, iniciada em 1760 por Charles-Michel de l’Épée).
A tendência oralista defende o aprendizado oral com o objetivo de aproximar ao máximo
os surdos do modelo ouvinte, isto é, visa capacitar o surdo para utilizar a língua da comuni-
dade por meio da leitura labial.Todavia, já se sabe que a leitura labial só é possível quando o
interlocutor formula as palavras de frente para o surdo, com clareza e devagar, e ainda assim
há muita controvérsia quanto ao aproveitamento do que se fala em relação ao que é possível
compreender. Oralismo, segundo Sá (2006), é uma imposição aos surdos, uma vez que não
se aceita a língua de sinais como a maneira própria deles se comunicarem, discriminando a
cultura surda e ignorando a diferença entre surdos e ouvintes. O oralismo predominou a partir
do Congresso de Milão em 1880, cujo Comitê, composto apenas por ouvintes, decidiu proibir
o uso da língua gestual na educação de surdos.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 31


Perlin e Strobel (2006, p. 9), tratando dos fundamentos da educação de surdos, registram
que apesar de hoje os surdos começarem a ser vistos como cidadãos, com direitos e deveres
de participação na sociedade, “nós não podemos deixar de reconhecer que a história do povo
surdo mostra que por muitos séculos de existência, a pedagogia, as políticas e muitos outros
aspectos próprios do povo surdo têm sido organizados geralmente no ponto de vista dos
sujeitos ouvintes [...]”.
Como resposta ao fracasso do oralismo puro na educação da maioria dos surdos, surgiu
em meados de 1960 a proposta de conjugar a esse método a língua de sinais e demais recursos
de comunicação, resultando no que chamamos de comunicação total ou bimodalismo.Todavia,
o enfoque da comunicação total submete a língua natural das pessoas com surdez à língua oral,
acarretando em prejuízos e desvantagens de ordem cognitiva, afetiva, linguística, sociocultural
e política para os surdos (SÁ, 2006). Tanto o oralismo como a comunicação total assumem
o modelo da integração, que significa inverter o papel da língua de sinais, colocando-a em
segundo plano e concebendo suas práticas a partir do modelo ouvinte.

Na ótica da integração, cabe à pessoa surda adaptar-se ao mundo dos ouvintes,


esforçando-se para dominar um código sonoro difícil de ser aprendido, espe-
cialmente quando a língua de sinais não é valorizada como sua língua natural.

Por sua vez, a proposta bilíngue de ensino considera a língua de sinais como a primeira
língua e a língua oral como a segunda língua na modalidade escrita, visando capacitar a pessoa
com surdez para a utilização de duas línguas no cotidiano escolar e na vida social. Trata-se de
um grande desafio, tendo em vista que a Língua Portuguesa é difícil de ser assimilada pelo
aluno surdo, principalmente porque requer “mudanças estruturais e pedagógicas nas escolas
para romper com as barreiras que se interpõem entre esse aluno e o ensino” (SEESP, 2007). A
despeito disso, compreendemos, conforme pontua Quadros (in FERNANDES, 2010, p. 28), que
“conhecer várias línguas não representa uma ameaça, mas abre um leque de manifestações
linguísticas dependentes de diferentes contextos”.

A inclusão dos surdos na escola regular numa proposta bilíngue representa um


desafio, na medida em que os professores e demais profissionais da educação
desconhecem, em sua maioria, a Libras e uma metodologia de ensino que fa-
voreça a diversidade.

Há diferentes abordagens de ensino na história da educação de surdos. Em geral, elas


se distinguem pelo reconhecimento ou não de que a língua de sinais é a forma natural e mais
adequada de comunicação para os surdos. Destacam-se: o oralismo, a comunicação total e
o bilinguismo. A busca por uma abordagem mais adequada para a educação de surdos ainda

32 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


é tema de amplo debate nacional, apesar dos diversos avanços no sentido de romper com as
propostas educativas excludentes e seletivas para assumir uma perspectiva inclusiva, reco-
nhecendo o direito pleno de cidadania das pessoas surdas.

Resumo

Nesta aula, vimos que na história humana, as pessoas com deficiência


foram segregadas e até eliminadas. No entanto, a partir do século XVI, Ponce de
Leon inicia a educação de crianças surdas e, em 1620, Bonet publica o primeiro
livro com alfabeto manual para surdos. Em 1760, Charles-Michel de l’Épée
cria o Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris. Em 1948, foi elaborada
Declaração Universal dos Direitos Humanos que é vista como a base dos direitos
dos deficientes, mas só com a Declaração de Salamanca, em 1994, se delibera
sobre as necessidades educativas especiais. Foi exposto que no Brasil alguns
propõem escolas especiais para os surdos, mas a posição oficial vigente é a
de que a escola comum não seja substituída pelo atendimento especializado.
As experiências com o oralismo e a comunicação total colocaram a Libras em
segundo plano, o que levou a educação inclusiva bilíngue. Vimos, contudo, que
as abordagens para a educação de surdos ainda são tema de debate, apesar dos
avanços com a perspectiva inclusiva.

Autoavaliação
Explore o site do Ines<http://www.ines.gov.br> e o site da Feneis www.feneis.com.br
1 e, em seguida, registre o que você descobriu de importante em cada um.

Reflita e escreva um comentário sobre o papel da Libras nas salas de aula que
2 possuem alunos surdos.

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 33


Referências
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cação total ao bilingüismo. Revista Brasileira de Educação Especial, v. 6, p. 99- 116, 2000.
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gov.br/>. Acesso em: 17 fev. 2011.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Especial (SEESP). Saberes e práticas


da inclusão: desenvolvendo competências para o atendimento às necessidades educacio-
nais especiais de alunos surdos. Brasília: MEC/SEESP, 2006. Disponível em: <http://portal.
mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/alunossurdos.pdf>. Acesso em 17 fev. 2011.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Especial (SEESP). Atendimento educa-


cional especializado: aspectos legais e orientações pedagógicas. Brasília: MEC/SEESP, 2007.

MIRANDA, Arlete Aparecida Bertoldo. Educação especial no Brasil: desenvolvimento his-


tórico. Cadernos de História da Educação, n.7, jan./dez., p. 29-44, 2008. Disponível em:
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PERLIN, Gladis; STROBEL, Karin. Fundamentos da educação de surdos. Florianópolis:


UFSC, 2006. Disponível em: <http://www.Libras.ufsc.br/hiperlab/avaLibras/moodle/prelogin/
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de%20Surdos_Texto-Base.pdf>. Acesso em: 17 fev. 2011.

QUADROS, Ronice Muller de. O “BI” em bilinguismo na educação de surdos. In:


FERNANDES, Eulália (Org.). Surdez e bilinguismo. 3. ed. Porto Alegre: Mediação, 2010.

SÁ, Nídia Regina Limeira de. Cultura, poder e educação de surdos. São Paulo: Paulinas, 2006.

34 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


Anotações

Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum 35


Anotações

36 Aula 2 Exclusão/inclusão: os surdos na escola comum


Noções sobre a surdez

Aula

3
Aula 3 Noções sobre a surdez
Apresentação

D
ando continuidade aos temas já abordados nas aulas anteriores deste Caderno, introduzi-
mos algumas noções básicas sobre a surdez. Discutiremos como a surdez implica numa
realidade adversa para o surdo, pois vivemos numa sociedade em que as informações
sonoras compõem grande parte dos produtos culturais materiais e simbólicos. Além disso, a
vida é repleta de sons, como o trânsito, a música, o barulho de máquinas e motores, os sons da
natureza, os quais orientam atitudes comuns do cotidiano. A ausência da audição é compensada
pela maior sensibilidade às informações visuais, de modo que os surdos podem realizar todas as
atividades da vida comum que não dependam exclusivamente da percepção sonora.
As condições biomédicas que podem caracterizar os problemas de audição têm grande
diversidade nas suas causas: congênitas, patológicas ou traumáticas, cujos resultados físicos
vão desde a deficiência auditiva até a surdez. Entretanto, são os seus efeitos socioculturais
discriminatórios os maiores obstáculos para que as pessoas surdas tenham vidas ricas e
produtivas em todas as áreas da atividade humana: ciências, artes, esportes, política, lazer etc.

Objetivos
Conhecer aspectos biomédicos da deficiência auditiva e
1 da surdez.

Informar-se sobre dados da população surda no Brasil e


2 no mundo.

3 Compreender a relação entre deficiência e funcionalidade.

Aula 3 Noções sobre a surdez 39


Aula 3 Noções sobre a surdez
Compreendendo a surdez

T
odos têm uma noção aparentemente clara do que seja a surdez, considerada de forma
equivocada como sinônimo de deficiência auditiva. De fato, mesmo nos conceitos li-
gados ao modelo puramente médico, algumas vezes a denominação de surdez ainda é
utilizada para qualquer grau de perda auditiva. Entretanto, em geral, para os indivíduos com
perda leve, moderada ou grave, aplica-se o termo deficiência auditiva, ou hipoacusia, definida
como dificuldade em ouvir, mas permitindo um grau mínimo de audição e de comunicação
oral. Atualmente, o termo surdez, ou anacusia, é empregado somente para os indivíduos com
perda auditiva muito grave, para os quais não há benefício por meios de amplificação sonora
(PIATTO; MANIGLIA, 2001).
A denominação de surdo é o que tem significado médico correto, ao invés de surdo-mudo,
pois a perda da audição refere-se exclusivamente às deficiências do ouvido e não às cordas vocais
(pregas vocais, na terminologia científica), que mantêm a sua funcionalidade. Como se sabe, os
surdos podem falar, mesmo que não ouçam o som da própria voz, o que é imprescindível para
a automodulação das características vocais (tom, timbre, quantidade e intensidade). Como já
dissemos, a oralização foi durante muito tempo a abordagem predominante na educação dos
surdos, porém muito criticada por atender às necessidades de compreensão dos ouvintes e não
às condições reais de comunicação dos surdos que, evidentemente, têm dificuldades para uma
plena vocalização e cuja pronúncia se constitui alvo de discriminação social.
Fisicamente, a recepção sonora pode ocorrer por condução aérea (vibração do tímpano
provocada pela diferença de pressão do ar do ouvido externo e ouvido médio) ou por con-
dução óssea (a vibração dos ossos do crânio sensibilizando as células receptoras no ouvido
interno). Para tratar das deficiências na audição, os aparelhos auditivos que amplificam as
ondas sonoras de condução aérea são superiores na discriminação dos sons, porém, aqueles
de condução óssea podem ser usados por indivíduos que não tenham o canal auditivo ou nos
casos mais graves de deficiência auditiva condutiva. Ainda que a tecnologia dos aparelhos
auditivos esteja bem desenvolvida, assim como procedimentos cirúrgicos e protéticos, nos
casos tratáveis de deficiência auditiva grave ou muito grave, a audição dos sons da fala humana
não é completamente recuperada.

Aos indivíduos com perda auditiva leve, moderada ou grave, definida como di-
ficuldade em ouvir, aplica-se o termo de deficiência auditiva, enquanto o termo
surdez é empregado para os indivíduos com perda auditiva muito grave.

De acordo com a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS), a deficiência audi-


tiva é considerada como a diferença audiométrica (medida em decibéis) entre o desempenho
do indivíduo e a habilidade normal de detecção sonora, conforme tabela abaixo. Em geral,
considera-se como audição normal a capacidade de detectar sons no limiar de 0-25 dB.

Aula 3 Noções sobre a surdez 41


Tabela 1 – Síntese da classificação da deficiência auditiva segundo a Organização Mundial de Saúde

Grau de audição Nível no audiômetro Teste de voz


Capaz de ouvir sussuros
Audição normal 25 dB ou menos
(a 1m ou menos)
Capaz de ouvir e repetir palavras em voz de
Deficiência leve 26 – 40 dB
conversa (a 1m)
Deficiência moderada 41 – 60 dB Capaz de ouvir e repetir palavras em voz alta (a 1m)
Deficiência severa 61 – 80 dB Capaz de ouvir algumas palavras gritadas no ouvido
Incapaz de ouvir e compreender mesmo gritos no
Deficiência profunda (surdez) 81 dB ou mais
ouvido

Nota: Considera-se a média do limiar por via aérea nas frequências de 500, 1.000 e 2.000 Hertz (Hz).
* Até 20 decibéis (dB) também pode ser considerado como normal.
Fonte: World Health Organization, 2006, p. 96).

Importante: Essa é a classificação adotada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) desde 1991. No Brasil, é
comumente utilizada a classificação de Davis e Silverman, proposta em 1966, que coloca a deficiência severa a
partir de 70 dB e a deficiência profunda a partir de 90 dB (Teste do Audiômetro). Também há outras classificações
que consideram a deficiência auditiva profunda a partir de 70 dB (Vieira; Macedo; Gonçalves, 2007). No sentido
mais amplo, de acordo com o Decreto 5296/2004, que trata da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiên-
cia, considera-se deficiência auditiva a “perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais,
aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz.” Todavia, o diagnóstico sobre o
grau de deficiência auditiva de uma pessoa, incluindo a surdez, só pode ser feito por um profissional habilitado,
médico ou especialista.

Como informação complementar, organizamos no quadro a seguir os principais tipos de


deficiência auditiva e suas respectivas causas.

42 Aula 3 Noções sobre a surdez


Deficiência auditiva condutiva Deficiência auditiva neurossensorial

Quando há prejuízo na transmissão do som


Descrição

entre o conduto auditivo do ouvido externo, o Quando, do ouvido interno até o cérebro, há ausência de
ouvido médio (tímpano, bigorna e estribo) e o recepção ou decodificação sonora por causa de lesão ou
ouvido interno (cóclea e nervo auditivo). Em disfunção nas células receptoras da cóclea ou do nervo
geral, esse tipo de deficiência tem tratamento auditivo. Esse tipo de deficiência é irrecuperável.
clínico e cirúrgico.
Causas pré-natais
– de origem hereditária – surdez herdada monogênica,
que pode ser uma surdez isolada da orelha interna por
mecanismo recessivo ou dominante ou uma síndrome com
– cerume ou corpos estranhos do conduto surdez; e surdez associada a aberrações cromossômicas;
auditivo externo; – de origem não hereditária (causas exógenas): infecções
– otite externa: infecção bacteriana da pele do maternas por rubéola, citomegalovírus, sífilis, herpes,
conduto auditivo externo; toxoplasmose; drogas ototóxicas e outras, alcoolismo
– otite média: processo infeccioso e/ou materno, irradiações (por exemplo, raios X); diabetes e
Causas prováveis

inflamatório da orelha média; outras doenças maternais graves.


– redução ou ausência do conduto auditivo Causas perinatais
externo (geralmente uma má-formação – prematuridade ou baixo peso ao nascimento;
congênita); – trauma de parto;
– inflamação da membrana timpânica ou – doença hemolítica do recém-nascido (icterícia grave);
infecções das vias respiratórias superiores; Causas pós-natais
– perfurações da membrana timpânica; – infecções – meningite, encefalite, parotidite epidêmica
– obstrução da tuba auditiva; (caxumba), sarampo;
– fissuras palatinas; – agentes químicos tóxicos: monóxido de carbono, mercúrio,
– otosclerose. tabaco, ouro, arsênico, álcool;
– drogas ototóxicas: antibióticos, diuréticos, medicamentos
antimalária;
– perda auditiva induzida por ruído excessivo;
– traumas físicos que afetam o osso temporal.

Quadro 1– Deficiências auditivas: descrição e causas prováveis

Observação: Além dos tipos de deficiência auditiva condutiva e neurossensorial, há o tipo de deficiência auditiva mista,
combinando as características de ambos os tipos.

Ouvido Ouvido Ouvido


externo médio interno

Bigorna Nervo auditivo

Orelha Martelo

Canal Cóclea

Tímpano
Estribo

Tubo de Eustáquio

Figura 1 – Fisiologia do ouvido

Aula 3 Noções sobre a surdez 43


Curiosidade
O surdo pode “ouvir” música? Sim, pela vibração direta (ressonância) de ins-
trumentos musicais, nos casos em que as células receptoras do ouvido interno
possam ser estimuladas pela condução óssea de ondas sonoras.
Você deve ter ouvido falar que Beethoven, um dos músicos mais famosos da
humanidade, compôs a 9ª Sinfonia quando já estava surdo. Segurando uma
vareta entre os dentes e encostando a outra extremidade no piano ou no violino
ele pôde ainda continuar “ouvindo” música.

Qual a população de surdos no mundo e no Brasil? Os números são controversos, pois os


órgãos de governos e as várias instituições locais e internacionais (médicas, técnicas ou associa-
tivas) utilizam-se de diferentes metodologias de levantamentos e estimativas sobre as pessoas
surdas. Também algumas estatísticas sobre a surdez são imprecisas e por isso discutíveis, pois
incluem todos os tipos de deficiências auditivas, enquanto outras são somente estimativas.

 A Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou que no ano 2000 o nú-


mero de deficientes auditivos na população mundial seria de 57 milhões de
pessoas.

 Aproximadamente 0,1% da população infantil no mundo nasce com defici-


ência auditiva severa e profunda.

 Mais de 4% do grupo de crianças consideradas de alto risco são diagnosti-


cadas como portadoras de deficiência auditiva.

 Aproximadamente 90% das crianças americanas portadoras de deficiência


auditiva de graus grave e muito grave são filhos de pais ouvintes (Northern
e Downs, 1991).

 Nos Estados Unidos, pesquisas indicam que a prevalência de deficiências


auditivas neurossensoriais é de 0,6% dos nascidos.

 De acordo com a OMS (1994), estimava-se que 1,5% da população brasileira–


2,86 milhões em 2010 – seriam portadores de deficiência auditiva.

 Segundo o IBGE, em 2000, o número de surdos no Brasil era de 166 mil,


sendo 80 mil mulheres e 86 mil homens. No mesmo levantamento, cerca
de 900 mil pessoas declararam ter grande dificuldade permanente de ouvir.

 Segundo o INES, no Brasil, a idade média de diagnóstico da perda auditiva neu-


rossensorial de severa a profunda é muito tardia, em torno de 4 anos de idade.

44 Aula 3 Noções sobre a surdez


Responda as seguintes questões.

1 Qual a diferença entre os seguintes termos: deficiência auditiva e surdez?

Pesquise sobre os números da população de surdos. A que razões você atribui as


2 diferenças sobre os números de surdos no mundo e no Brasil?

A relação entre
deficiência e funcionalidade

A
s definições de “deficiência” são constantemente objeto de estudos científicos e debates
sociais, entretanto essas definições não são apenas a convenção de termos linguísticos
ou biomédicos, mas também são usadas geralmente como denominações culturais, im-
plícitas e explícitas, carregadas de significados discriminatórios que variam de uma sociedade
a outra. No caso dos conceitos de deficiência, que inclui o de deficiência auditiva e surdez, os
problemas de compreensão e entendimento são reforçados pelo intenso debate contemporâneo
baseado na luta pelos direitos humanos, que estimulam a discussão acerca de uma linguagem
não discriminatória que oriente ações de governos e a reflexão social. Inegavelmente, apesar de
muitas leis para a definição e proteção de direitos, há uma relação profunda entre deficiência
e exclusão social. Como consequência, os surdos enfrentam: falta de oportunidades iguais
para o desenvolvimento humano; restrição aos recursos culturais e econômicos; e, reduzida
participação nas decições de direitos políticos e civis.

Aula 3 Noções sobre a surdez 45


Saiba mais

Os conceitos de deficiência, incluindo a surdez, estão presentes no debate con-


temporâneo sobre os direitos humanos, pois há uma relação profunda entre
deficiência e exclusão social.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), integrada por 191 países, é a instituição de


referência internacional para as convenções de termos e orientação para políticas e estudos
científicos sobre a saúde, e ela constantemente vem buscando definições mais claras e de
aceitação geral. Nesse sentido, devido à associação entre deficiência e incapacidade que é
discriminatória e causadora de sérios prejuízos sociais e psicológicos, a OMS promoveu uma
mudança de paradigma, abandonando os modelos tradicionais de referência médica sobre
a doença, e concentrou-se na qualificação da saúde. Com essa preocupação em definir as
condições de saúde, a OMS aprova em 2001 a Classificação de Funcionalidade, Incapacidade
e Saúde (CIF), que descaracteriza a deficiência como doença.

Estado de saúde
(distúrbio ou doença)

Funções & Atividade Participação


Estruturas Corporais

Fatores Fatores
Ambientais Pessoais
Fatores Contextuais

Figura 2 –Classificação de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)

Fonte: World Health Organization(2002).

A CIF (OMS, 2001) relaciona funcionalidade e incapacidade através de três conceitos


interativos:

46 Aula 3 Noções sobre a surdez


 as funções e estruturas do corpo das pessoas e o seu estado de saúde;

 as atividades e as tarefas que a pessoa exerce nas diferentes áreas da sua


vida (atividades e participação);

 os fatores contextuais (ambientais e pessoais) que influenciam essas expe-


riências (fatores contextuais).

A funcionalidade e a incapacidade não são mais vistas como atributos pessoais, mas
como um conjunto complexo relacionado à interação, positiva ou negativa, entre as condi-
ções próprias da pessoa, a sua participação como indivíduo e o seu meio social. Assim, a
incapacidade não é o resultado específico de um grupo minoritário, mas sim uma experiência
humana universal, para a superação da qual toda a sociedade deve contribuir. Nessa concepção
integrada, a alteração ou não na estrutura ou função do corpo da pessoa não tem uma relação
causal para o desempenho de suas capacidades. É a interação entre a pessoa, suas atividades
e os fatores contextuais, como a existência ou não de barreiras materiais e culturais, que vai
determinar de forma dinâmica as condições para uma boa qualidade de vida. O uso do termo
deficiência corresponde, assim, apenas às alterações do corpo, enquanto o termo incapacidade
é mais abrangente, indicando aspectos negativos da interação entre o indivíduo e seu contexto.
Nessa perspectiva multidimensional e dinâmica:

Um indivíduo pode apresentar uma deficiência (no nível do corpo) e não necessariamente
viver qualquer tipo de incapacidade. De modo oposto, uma pessoa pode viver a incapaci-
dade sem ter nenhuma deficiência, apenas em razão de estigma ou preconceito (barreira
de atitude) (DI NUBILA; BUCHALLA, 2008, p. 330).

Em resumo, se a surdez não é uma doença, sendo considerada apenas como uma forma
muito grave de deficiência auditiva, essa condição intrínseca não caracteriza por si mesma a
incapacidade do indivíduo para a participação em qualquer atividade. A efetiva capacidade de
participação de uma pessoa está mais propriamente relacionada à sua interação com fatores
culturais, o que para as pessoas surdas está associada à existência ou não de barreiras de
comunicação e participação social.
No caso brasileiro, apenas nas últimas décadas as pessoas surdas têm recebido a devida
atenção legal, cultural e educativa, para a superação do preconceito e para a ampliação do
seu reconhecimento e participação social. As lutas das organizações de surdos, a atenção
dos órgãos governamentais, os estudos multidisciplinares sobre a surdez, as experiências
com educação de surdos, a atuação de interessados e de familiares de pessoas surdas têm
contribuído para o desenvolvimento e a propagação da Língua Brasileira de Sinais. Logo, o
ensino da Libras, como a modalidade linguística mais adaptada às condições físicas da surdez,
tornou-se fator fundamental para que se reconheça e estimule o desenvolvimento pleno das
capacidades dos surdos, na escola e fora dela. Este, no seu sentido humano mais profundo, é
o papel da educação: a ampliação contínua da aprendizagem do homem sobre si mesmo, em
busca da satisfação pessoal e do desenvolvimento social mais justo.
Aula 3 Noções sobre a surdez 47
Leituras complementares

RAMOS, Cléa Regina. Libras: a língua de sinais dos surdos brasileiros. Disponível em: <http://
www.editora-arara-azul.com.br/pdf/artigo2.pdf>. Acesso em: 17 fev. 2011.
Nesse breve texto, a autora, que já foi ex-diretora da Revista da FENEIS, explora de manei-
ra fundamentada as raízes históricas das línguas de sinais no mundo e no Brasil, destacando
sua importância como língua natural das comunidades surdas.

CHARLES LIBRAS: blog. História da educação de surdos no Brasil e no mundo. 10 abr. 2010.
Disponível em:<http://charles-libras.blogspot.com/2010/04/historia-da-educacao-de-surdos-
no.html>. Acesso em: 17 fev. 2011.
Charles Anderson é tradutor intérprete de Libras certificado pelo MEC e palestrante.
Em seu blog, ele apresenta uma cronologia da educação de surdos no Brasil e no mundo.

FEDERAÇÃO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E INTEGRAÇÃO DOS SURDOS –FENEIS. Disponível


em: <http://www.feneis.com.br/page/>. Acesso em: 17 fev. 2011.
A FENEIS mantém um site bastante variado com acesso à legislação, material sobre
Libras, sala de bate-papo, conteúdo das suas revistas e outras informações importantes.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Disponível


em: <http://www.ines.gov.br/>. Acesso em: 17 fev. 2011.
O site do INES, que hoje é um órgão do Ministério da Educação, traz importantes infor-
mações e links sobre a educação de surdos, como cursos a distância, livros digitalizados sobre
surdez, mundo do surdo e prevenção, entre outros assuntos.

48 Aula 3 Noções sobre a surdez


Resumo

Nesta aula, vimos que os problemas de audição têm várias causas


biomédicas, mas são os seus efeitos discriminatórios os maiores obstáculos para
as pessoas surdas. Conhecemos que a denominação correta é surdo, ao invés de
surdo-mudo, pois a surdez refere-se às deficiências do ouvido e não às cordas
vocais, que mantêm a funcionalidade. Através de dados expostos na aula, foram
apresentadas controvérsias sobre o número de surdos no mundo e no Brasil,
porque os governos e instituições utilizam-se de diferentes metodologias de
levantamentos e estimativas. Mostramos também que desde 2001, a Organização
Mundial da Saúde adota a Classificação de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde,
a partir da qual a funcionalidade e a incapacidade são um conjunto complexo
relacionado à interação entre as condições da pessoa, a sua participação individual
e o seu meio social. Por fim, relacionamos diversos órgãos governamentais e
outras organizações com experiência na educação de surdos que têm contribuído
para que a difusão da Libras, vista como fundamental para o desenvolvimento
pleno das capacidades dos surdos, na escola e fora dela.

Autoavaliação
Pesquise na internet sobre como as pessoas surdas, no mundo e no Brasil, têm superado
preconceitos sociais e barreiras profissionais.
Assinale com verdadeiro (V) ou falso (F) para as sentenças abaixo:

( ) 1) As estatísticas sobre surdos são controversas: as estimativas para deficientes


auditivos em geral eram, em 2000, eram de 57 milhões no mundo (OMS) e de
900 mil no Brasil (IBGE).

( ) 2) O termo surdez, ou anacusia, geralmente é empregado para os indivíduos com


qualquer nível de perda auditiva.

Aula 3 Noções sobre a surdez 49


( ) 3) A funcionalidade e a capacidade de uma pessoa têm uma relação dinâmica
com as atividades que ela desempenha e com os fatores contextuais, o que
para as pessoas surdas estão associadas à existência ou não de barreiras de
comunicação.

( ) 4) As organizações de surdos, os órgãos governamentais e as experiências com


educação de surdos têm contribuído para a propagação da Língua Brasileira de
Sinais.

( ) 5) As definições de deficiência, incluindo a surdez, são apenas convenções biomé-


dicas, e não têm sido usadas como denominações culturais com significados
discriminatórios.

( ) 6) O ensino da Libras é a modalidade linguística mais adaptada às condições


físicas da surdez.

Exercite os seguintes sinais, pelo menos três vezes, cada um:

SURDO OUVINTE

LIBRAS PORTUGUÊS

50 Aula 3 Noções sobre a surdez


Referências
DI NUBILA, Heloisa Brunow V.; BUCHALLA, Cássia Maria. O papel das Classificações da OMS
– CID e CIF nas definições de deficiência e incapacidade. Revista Brasileira de Epidemiologia,
v. 11, n. 2, p. 324-335, 2008.

INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTATÍSTICA – IBGE. Informe sobre o censo de 2000. Disponível


em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/27062003censo.shtm. Acesso em: 17
fev. 2011.

PIATTO, Vânia B.; MANIGLIA, José V. Avaliação da audição em crianças de 3 a 6 anos em


creches e pré-escolas municipais. Jornal de Pediatria, v. 77, n. 2, 2001.

SEESP. Atendimento educacional especializado: deficiência auditiva. Brasília: MEC/SEESP, 2007.

VIEIRA, Andreza Batista Cheloni; MACEDO, Luciana Resende de; GONÇALVES, Denise Utsch.
O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria, São Paulo, v. 29, n. 1, p. 43-49, 2007.

WORLD HEALTH ORGANIZATION. Towards a Common Language for Functioning, Disability


and Health. Genebra: ICF, 2002.

______. Primary ear and hearing care training resource: trainer’s manual. Genebra:
WHO, 2006.

Aula 3 Noções sobre a surdez 51


Anotações

52 Aula 3 Noções sobre a surdez


Anexo

A B C Ç D E

F G H I J K

L M N O P Q

R S T U V W

X Y Z

Figura 1 –Alfabeto Manual

Aula 3 Noções sobre a surdez 53


54 Aula 3 Noções sobre a surdez
LIBRAS

Módulo 2
APRENDENDO LIBRAS

Adir Luiz Ferreira


João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Ferreira do Vale de Sousa
Paulo Roberto de Andrade Santos

Projeto Institucional

Edital nº 015/2010/CAPES/DED
Fomento ao uso de tecnologias de comunição e informação nos cursos de graduação
Adir Luiz Ferreira
João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Ferreira do Vale de Sousa
Paulo Roberto de Andrade Santos

Módulo 2
APRENDENDO LIBRAS
Adir Luiz Ferreira
João Tadeu Weck
José Edmilson Felipe da Silva
Margarete Ferreira do Vale de Sousa
Paulo Roberto de Andrade Santos

LIBRAS

Módulo 2
APRENDENDO LIBRAS

Natal – RN
Novembro/2011
Governo Federal
Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff

Vice-Presidente da República
Michel Miguel Elias Temer Lulia

Ministro da Educação
Fernando Haddad

Reitora Comitê Gestor


Ângela Maria Paiva Cruz Presidente
Alexandre Augusto de Lara Menezes
Vice-Reitora
Maria de Fátima Freire Melo Ximenes Coordenação geral
Apuena Vieira Gomes
Secretária de Educação a Distância
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo Coordenadores
Apuena Vieira Gomes/CE
Secretária Adjunta de Educação a Distância Adir Luiz Ferreira/CE
Eugênia Maria Dantas Gleydson de Azevedo Ferreira Lima/SINFO
Marcos Aurélio Felipe/CE
Pró-Reitoria de Graduação
Maria Carmozi de Souza Gomes/PROGRAD
Alexandre Augusto de Lara Menezes
Rex Antonio da Costa de Medeiros/ECT

Secretaria de Educação a Distância (SEDIS)

FICHA TÉCNICA
Coordenador de Produção de Materiais Didáticos Revisora das Normas da ABNT Diagramadores
Marcos Aurélio Felipe Verônica Pinheiro da Silva Ana Paula Resende
Carolina Aires Mayer
Projeto Gráfico Revisora Técnica
Davi Jose di Giacomo Koshiyama
Ivana Lima Rosilene Alves de Paiva
Elizabeth da Silva Ferreira
Revisores de Estrutura e Linguagem Ilustradores Ivana Lima
Eugenio Tavares Borges Adauto Harley José Antonio Bezerra Junior
Janio Gustavo Barbosa Anderson Gomes do Nascimento Luciana Melo de Lacerda
Jeremias Alves de Araújo Carolina Costa de Oliveira Rafael Marques Garcia
Kaline Sampaio de Araújo Dickson de Oliveira Tavares
Luciane Almeida Mascarenhas de Andrade Leonardo dos Santos Feitoza
Thalyta Mabel Nobre Barbosa Roberto Luiz Batista de Lima
Rommel Figueiredo
Revisoras de Língua Portuguesa
Cristinara Ferreira dos Santos
Emanuelle Pereira de Lima Diniz
Janaina Tomaz Capistrano

Catalogação da publicação na fonte. Bibliotecária Verônica Pinheiro da Silva.

Aprendendo Libras: módulo 2 / Adir Luís Ferreira et al ... – Natal: EDUFRN, 2011.

64 p.: il.

ISBN 978-85-7273-872-9

Conteúdo: Aula 4 – Aprendendo Libras. Aula 5 –Parâmetros da Libras. Aula 6 – Formação de sinais e
classificadores.

Caderno nº 2 que compõe a disciplina a distância de Libras/UFRN.

1. Libras. 2. Inclusão. 3. Surdos. I. Ferreira, Adir Luís. II. Weck, João Tadeu. III. Silva, José Edmilson Felipe
da. IV. Sousa, Margarete Vale de. V. Santos, Paulo Roberto de Andrade.

CDU 615.51.4
A654a

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida
sem a autorização expressa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Apresentação Institucional

A
Secretaria de Educação a Distância – SEDIS da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte – UFRN, desde 2005, vem atuando como fomentadora, no âmbito local, das
Políticas Nacionais de Educação a Distância em parceira com a Secretaria de Educação
a Distância – SEED, o Ministério da Educação – MEC e a Universidade Aberta do Brasil –
UAB/CAPES. Duas linhas de atuação têm caracterizado o esforço em EaD desta instituição: a
primeira está voltada para a Formação Continuada de Professores do Ensino Básico, sendo
implementados cursos de licenciatura e pós-graduação lato e stricto sensu; a segunda volta-se
para a Formação de Gestores Públicos, através da oferta de bacharelados e especializações
em Administração Pública e Administração Pública Municipal.
Para dar suporte à oferta dos cursos de EaD, a Sedis tem disponibilizado um conjunto de
meios didáticos e pedagógicos, dentre os quais se destacam os materiais impressos que são
elaborados por disciplinas, utilizando linguagem e projeto gráfico para atender às necessidades
de um aluno que aprende a distância. O conteúdo é elaborado por profissionais qualificados e
que têm experiência relevante na área, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O material
impresso é a referência primária para o aluno, sendo indicadas outras mídias, como videoaulas,
livros, textos, filmes, videoconferências, materiais digitais e interativos e webconferências, que
possibilitam ampliar os conteúdos e a interação entre os sujeitos do processo de aprendizagem.
Assim, a UFRN através da SEDIS se integra o grupo de instituições que assumiram o
desafio de contribuir com a formação desse “capital” humano e incorporou a EaD como moda-
lidade capaz de superar as barreiras espaciais e políticas que tornaram cada vez mais seleto o
acesso à graduação e à pós-graduação no Brasil. No Rio Grande do Norte, a UFRN está presente
em polos presenciais de apoio localizados nas mais diferentes regiões, ofertando cursos de
graduação, aperfeiçoamento, especialização e mestrado, interiorizando e tornando o Ensino
Superior uma realidade que contribui para diminuir as diferenças regionais e o conhecimento
uma possibilidade concreta para o desenvolvimento local.
Nesse sentido, este material que você recebe é resultado de um investimento intelectual
e econômico assumido por diversas instituições que se comprometeram com a Educação e
com a reversão da seletividade do espaço quanto ao acesso e ao consumo do saber E REFLETE
O COMPROMISSO DA SEDIS/UFRN COM A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA como modalidade
estratégica para a melhoria dos indicadores educacionais no RN e no Brasil.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


SEDIS/UFRN
Apresentação
Car@ estudante,

Seja bem-vind@ a mais um módulo de Libras!

Continuaremos nossa viagem ao mundo dos surdos e da Língua Brasileira de Sinais


(Libras), rumo à educação inclusiva na proposta bilíngue. Isto é, a inclusão de alunos surdos
em classes comuns do ensino regular, respeitando a Libras como a sua língua materna. No
primeiro módulo, estudamos sobre a surdez, as diferentes concepções políticas e sociais que
incidiram na forma com a qual os surdos foram tratados ao longo da história, sobre a luta pela
conquista de seus direitos como cidadãos e pelo reconhecimento de sua cultura.
Neste módulo, de caráter mais instrumental, estudaremos alguns aspectos gramaticais
da Libras, imprescindíveis para quem vai utilizá-la, tais como: variações linguísticas, parâme-
tros de configuração dos sinais e classificadores. É importante lembrar que a comunicação
em língua de sinais não é gesticulação ou mímica, como pensa a maioria das pessoas. Assim
como as demais línguas de sinais, a Libras tem o status de língua, e não de linguagem, uma
vez que possui uma gramática própria, orientada por parâmetros de natureza gesto-visual que
independe da gramática da Língua Portuguesa ou de outras línguas orais. Por isso, evitaremos
comparativos – quase sempre precários – bem como a desvalorização de uma das línguas em
detrimento da outra. Pretendemos, também, que você compreenda que a independência das
línguas de sinais implica na possibilidade de o surdo comunicar-se exclusivamente em Libras
e desconhecer a Língua Portuguesa. Todavia, se a forma de comunicação predominante na
sociedade se faz por meio da palavra, especialmente em se tratando dos conhecimentos abor-
dados no currículo escolar, podemos defender que o domínio das duas línguas para o surdo
é um fator de inclusão social no mundo contemporâneo, repleto de informações codificadas
na escrita.
Durante toda essa jornada no mundo dos surdos e da Libras, estaremos sempre ao seu
lado. Nosso desejo é que você possa avançar mais e mais a cada lição. Buscamos usar uma
linguagem acessível para facilitar a apreensão dos conteúdos. Portanto, leia e releia – se for
o caso – o material, assista às videoaulas correspondentes e faça as atividades ao final das
leituras. Não se esqueça de consultar os sites e blogs que selecionamos e os filmes que su-
gerimos, a fim de complementar os estudos. Procure aprimorar seus conhecimentos sobre
o assunto com colegas que já cursaram Libras – a distância ou presencial – ou por outros
meios quaisquer. O importante é não ficar parado. Aliás, ficar parado, como veremos neste
módulo, tem pouco a ver com as línguas de sinais. Sendo assim nos resta concluir: mexa-se
e mãos à obra!

Um forte abraço em Língua Brasileira de Sinais!


Sumário

Aula 4 – Aprendendo Libras 9


Apresentação 11
Objetivos 11
Libras: uma língua completa 13
Atividade 16
Variações linguísticas 16
Resumo 21
Autoavaliação 22
Referências 24

Aula 5 – Parâmetros da Libras 25


Apresentação 27
Objetivos 27
Ponto de articulação 29
Atividade 33
Configuração de mãos 33
Atividade 37
Movimento 38
Atividade 40
Orientação 41
Atividade 42
Expressão facial e corporal 42
Resumo 44
Autoavaliação 45
Referências 46

Aula 6 – Formaçãode Sinais e Classificadores 47


Apresentação 49
Objetivos 49
Classificadores 51
Resumo 60
Autoavaliação 61
Referências 62
Aprendendo Libras

Aula

4
Apresentação
As mãos rompem o silêncio e fazem a comunicação
de quem não ouve, mas vê, sente e se emociona.
(Autor desconhecido)

Nesta aula, retomamos alguns conteúdos já anunciados no Módulo 1 (O que é Libras?),


tanto em relação ao alfabeto manual como em relação às variações linguísticas na Libras. Refor-
çamos a Libras como uma língua de modalidade gestual visual, que permite aos usuários tratar Sinais em Libras
de assuntos de qualquer natureza – fatos cotidianos, artes, ciência, filosofia, esportes – sem Os sinais em Libras são
signos linguísticos que
prejuízo de compreensão. Trata-se, pois, de uma língua capaz de atender a todas as demandas
independem da palavra
de comunicação necessárias a uma pessoa surda. Veremos, também, que as variações linguís- em Língua Portuguesa.
ticas da Libras acontecem tanto pelo uso de um mesmo sinal para designar coisas diferentes Cada sinal é convencio-
como pelo uso de mais de um sinal para designar a mesma coisa. Acontecem, ainda, muitas nalmente constituído pela
representação – na forma
variações linguísticas em relação à forma como o sinal é realizado, devido a características
de gestos – do que se
pessoais ou de uma comunidade em particular, produzindo algo equivalente ao sotaque e à deseja comunicar e a sua
prosódia nas línguas orais auditivas. A relação entre palavra e sinal não é direta; a constituição compreensão é diretamen-
dos sinais não provém da representação simbólica da sonoridade das palavras, eles partem te visual.

da ideia representada gestualmente em contexto.

Objetivos
Compreender que a surdez não restringe a capacidade
1 comunicativa e cognitiva do surdo, e que a Libras é a sua
língua materna.

Analisar a importância da educação inclusiva na proposta


2 bilíngue para a participação do surdo na sociedade.

Distinguir e utilizar alguns sinais polissêmicos e alguns


3 sinais sinonímicos.

Aula 4 Aprendendo Libras 11


Libras: uma língua completa
Os estudos sobre as línguas de sinais, principalmente aqueles realizados nos Estados
Unidos durante os anos sessenta e setenta do século passado, ampliaram nosso conceito de
língua, indo além da modalidade oral auditiva e introduzindo, também, as línguas gestuais.
Durante muito tempo os estudos sobre as línguas de sinais preocuparam-se em comparar
as duas formas – oral auditiva e gesto-visual – evidenciado suas semelhanças e diferenças.
Entretanto, as línguas de sinais apareciam quase sempre subordinadas à língua oral auditiva
de cada país, e só recentemente elas adquiriram o status de língua independente. As línguas
de sinais, amplamente aceitas e utilizadas pelos surdos, também passaram a ser reconhecidas
como sua língua natural.

Saiba mais

Gesto: movimento espontâneo, voluntário ou involuntário, do corpo, espe-


cialmente das mãos, braços e cabeça que revela estado psicológico ou in-
tenção de exprimir ou realizar algo. O gesto é igualmente uma forma de dar
ênfase ao discurso na interação comunicativa dos interlocutores.

Mímica: arte de exprimir os pensamentos e sentimentos, imitar seres e


representar objetos por meio de gestos, expressões corporais e fisionô-
micas. O mímico é o artista que comunica e se faz entender por meio da
mímica sem fazer uso da fala.

Pantomima: é um teatro gestual que faz o menor uso possível de palavras e


o maior uso de gestos. É a arte de narrar com o corpo. É uma modalidade cê-
nica que se diferencia da expressão corporal e da dança, basicamente é a arte
objetiva da mímica, sendo um excelente artifício para comediantes, cômicos,
palhaços, atores e bailarinos.

Sinal: é o signo linguístico na língua de sinais, o qual contém uma unidade de


informação convencionada por meio gestual pela comunidade surda e que ser-
ve para comunicar algo a alguém. Assim, o sinal se difere do gesto espontâneo
pelo seu caráter de código compartilhado e estruturado em uma língua.

Aula 4 Aprendendo Libras 13


Devido a essa identidade linguística própria das línguas de sinais nem sempre se torna
adequado buscar comparativos diretos com as línguas faladas, como o português. É por isso
que as propostas de educação para surdos na perspectiva do oralismo e da comunicação total
fracassam em seus resultados mais abrangentes, pois elas não reconhecem a autonomia da
língua de sinais e seu uso é tão somente admitido como um recurso complementar de comu-
nicação com surdos.
Em sentido oposto, o método bilíngue, indicado na Política Nacional de Educação Especial
(MEC/SEESP, 2008), parte da perspectiva da Educação Inclusiva, a qual contesta a segregação
dos alunos em classes ou escolas especiais e aponta para a necessidade de remoção das
barreiras linguísticas que dificultam a convivência entre surdos e ouvintes. O reconhecimento
tardio da Libras repercutiu em prejuízos na educação formal da comunidade surda, pois ape-
nas na última década deste século surgiram projetos educacionais para a implantação de uma
proposta bilíngue (Português-Libras) nas escolas brasileiras. O método de educação bilíngue,
que tem o respaldo legal do Ministério da Educação, busca a ampla inclusão do surdo. Nesse
sentido, a Libras é oficialmente respeitada e ensinada como uma língua completa em si, sendo
direito do aluno surdo receber instrução em sua língua materna, aprender a comunicar-se em
Língua Portuguesa na modalidade escrita e, se possível, realizar leitura labial.
A proposta bilíngue considera dois aspectos importantes para a educação dos surdos.
Primeiramente, reconhece a língua de sinais como língua materna dos surdos, pois numa re-
alidade sem sons, o sistema cognitivo para elaboração e narração de ideias, conceitos e fatos
se desenvolve por meio da percepção visual, e é por meio dela que se torna possível atribuir
sentido e significado ao mundo físico e social. Em segundo lugar, a proposta bilíngue avança
em relação ao oralismo porque respeita a cultura surda, mas ao mesmo tempo, enfatiza a
importância e necessidade de o surdo não permanecer segregado da cultura ouvinte. Nesse
sentido, a aprendizagem da Língua Portuguesa e a convivência escolar com alunos ouvintes
são fatores imprescindíveis para a inclusão e participação social e política dos surdos como,
por exemplo, em atividades de ocupação profissional, manifestações artísticas, desportivas,
culturais e de lazer.
É preciso considerar que a criança que nasce surda ou se torna surda antes de aprender a
A base natural da comu- falar irá desenvolver sua capacidade sociolinguística pela interpretação visual das expressões
nicação dos surdos é a faciais e corporais das pessoas e pela leitura dos gestos ou dos sinais que elas realizam em
imagem codificada nos determinado contexto. Quanto menor o nível de acuidade auditiva, maior o nível de dependência
sinais que formam o léxico
da língua de sinais para a comunicação e maior a dificuldade para aprender idioma falado em
da Libras, pois o processo
de formação de conceitos seu país.
não pode depender da Queremos reafirmar que o fato de o surdo ser privado da comunicação oral não afeta
audição ausente. seu desenvolvimento cognitivo, afetivo, sociocultural ou acadêmico, pois a língua de sinais
é completa em seus aspectos morfológicos, sintáticos e semânticos, permitindo às imagens
sinalizadas traduzirem qualquer pensamento. Além disso, a aprendizagem da Língua Portu-
guesa na modalidade escrita habilita o surdo na cultura ouvinte e lhe concede a possibilidade
de ampliar sua participação social, política, econômica e cultural.

14 Aula 4 Aprendendo Libras


Curiosidade

O escultor Douglas Tilden nasceu em 1860 na Califórnia e aos quatro anos


de idade ficou surdo após ser acometido de febre escarlatina. Formou-se na
Escola da Califórnia para surdos, sendo posteriormente professor dessa mes-
ma instituição durante oito anos. Muitas de suas esculturas monumentais são
graciosas comemorações aos temas californianos e podem ser vistas na cidade
de São Francisco. Com a escultura “The Baseball Player”, que foi exposta no
Salão de Paris no período de 1889 a 1894, Tilden conquistou o reconhecimento
internacional, sendo considerado um dos precursores da escultura moderna.

Figura 1 – The Baseball Player -1890


Fonte: <http://www.flickr.com/photos/9405610@
N02/3709376214/>. Acesso em: 18 out. 2011.

Aula 4 Aprendendo Libras 15


Leia o trecho a seguir e redija um comentário pessoal sobre a importância da proposta
bilíngue na educação de surdos.

A Proposta Bilíngue não privilegia uma língua, mas quer dar direito e condições
ao indivíduo surdo de poder utilizar duas línguas; portanto, não se trata de ne-
gação, mas de respeito; o indivíduo escolherá a língua que irá utilizar em cada
situação linguística em que se encontrar. (Kozlowski, 1998).

Variações linguísticas
É um fenômeno presente nas línguas humanas, independentemente de ação normativa
(gramática). Em qualquer língua oral e também na Libras é possível identificar variações
oriundas do contexto histórico, geográfico, sociocultural e comunicativo.

 O contexto histórico explica como ao longo do tempo as palavras e os sinais vão sendo
gradativamente modificados e até substituídos, esse é um processo que ocorre em qual-
quer língua viva.

 O contexto geográfico trata das mudanças identificadas em comunidades usuárias da


mesma língua, porém que habitam em regiões distintas.

 O contexto sociocultural produz variações relativas a atributos que identificam um grupo


como: grau de instrução, idade, gênero ou padrão econômico.

 O contexto comunicativo se reporta à situação, mais ou menos formal, à relação estabe-


lecida entre os interlocutores e ao conteúdo da mensagem.

16 Aula 4 Aprendendo Libras


Em qualquer que seja o contexto produtor das variações linguísticas (histórico, geográfi-
co, sociocultural ou comunicativo), elas são marcadas por diferenças observadas no repertório
de palavras/sinais utilizados (léxico), na forma como as palavras são pronunciadas ou os sinais
são executados (morfológico) e, ainda, nos significados que lhes são atribuídos (semântico).
Segundo estudos da linguística, os signos ou itens lexicais (sinais na língua dos surdos
ou palavras na língua dos ouvintes) expressam ideias, ações ou conceitos, que podem ter dife-
rentes significados, conforme o contexto. “Os signos são assim instrumentos de comunicação
e representação, na medida em que, com eles, configuramos linguisticamente a realidade e
distinguimos os objetos entre si” (VILELA; KOCH, 2001).
Em qualquer situação comunicativa o contexto se torna fundamental na produção de
sentidos; ele permite preencher lacunas e fazer escolhas dentre algumas possibilidades, de
modo a produzir interpretações ajustadas, especialmente quando se trata de uma linguagem
conotativa, do uso de expressões idiomáticas ou de signos polissêmicos. A linguagem cono-
tativa se caracteriza pelas alterações ou ampliações que as palavras agregam ao seu sentido
literal (denotativo). Vejamos alguns exemplos comuns da linguagem conotativa, em que as
figuras de linguagem e de construção possuem um significado subjetivo e indissociável de
seu contexto, assim como algumas expressões idiomáticas, cuja compreensão depende da
participação do indivíduo na mesma comunidade usuária.

Expressões idiomáticas e figuras de linguagem

“Tirar água do joelho”


“Pagar o pato”
“Mão na roda”
“Engolir sapos”
“Dar com os burros n’água”
“Chorar sobre o leite derramado”
“Eles passarão eu passarinho” (Mário Quintana)
“A neve pôs uma toalha calada sobre tudo” (Fernando Pessoa)

Figura 2

Fonte: <http://beerevolutionss.blogspot.com/2008/12/pequeno-dicionario-de-expresses.html>. Acesso em: 18 out. 2011.

Aula 4 Aprendendo Libras 17


Como sugerem os exemplos demostrados anteriormente (Expressões idiomáticas e figu-
ras de linguagem), seria ilógico fazer uma tradução literal da Língua Portuguesa para a Libras,
pois o sentido não é óbvio na cultura surda por duas razões. A primeira é porque não existe
relação unívoca de sentido entre as palavras e os sinais. A segunda, porque as expressões
idiomáticas e as figuras de linguagem e de construção (metáforas, metonímias, aliteração,
sínquise etc.) são produzidas em padrões culturais específicos. “A Língua Brasileira de Sinais
é, antes de tudo, uma imagem do pensamento do surdo. Por isso, a palavra e o sinal muitas
vezes não têm o mesmo significado e um mesmo sinal tem vários significados” (KOJIMA;
SEGALA, s/d, p. 108).
Outro aspecto que precisamos entender é que a sintaxe da Libras difere bastante da Língua
Portuguesa, isto é, a forma de organizar os sinais em um enunciado (frase, oração ou período)
na Libras depende mais do contexto comunicativo (encadeamento das ideias; assunto tratado
e interação entre os interlocutores) do que de regras inflexíveis.

Saiba mais

Sintaxe em linguística refere-se ao “componente do sistema linguístico que


determina as relações formais que interligam os constituintes da sentença, atri-
buindo-lhe uma estrutura” (HOUAISS, 2007, p. 2581). Em Libras, refere-se à
disposição dos sinais na frase e das frases no discurso, incluindo a sua relação
lógica, entre as múltiplas combinações possíveis para transmitir um significado
completo e compreensível.

Podemos abordar as variações linguísticas do ponto de vista da relação entre signo e


significado. O signo é a unidade linguística (sinal ou palavra) que a representação simbólica de
algo, cujo significado pode ser de natureza denotativa ou conotativa. A Libras, como a Língua
Semântica é o “ramo da
linguística que se ocupa
Portuguesa, apresenta variações linguísticas determinadas pela existência de um mesmo sinal
do estudo da significação com significados diferentes (polissemia), ou de sinais diferentes que remetem um mesmo
como parte dos sistemas das
línguas naturais” (HOUAISS, significado (sinonímia).
2007, p. 2540). Em Libras é o
significado que o sinal assume
nas interações comunicativas
com os surdos. Sinonímia é
a relação estabelecida entre
signos linguísticos diferentes
com significado semelhante.
Polissemia é a presença de
mais de um significado para
um mesmo signo linguístico.

18 Aula 4 Aprendendo Libras


Sinais polissêmicos e sinonímicos

FORTALEZA (CE)
Exemplo 1 – Polissemia: O sinal usado
pela comunidade surda de Fortaleza/
CE para indicar o nome de sua cidade é
o mesmo sinal usado noutras regiões
do Brasil para indicar “duro” ou “sem
dinheiro”. Assim, o mesmo sinal
(imagem 1) pode representar a capital
do Ceará ou indicar uma condição
financeira precária.

Imagem 1 – SINAL FORTALEZA

Exemplo 2 – Sinonímia: O mês de


setembro pode ser indicado por
Imagem 2 – SINAL 1 SETEMBRO sinais diferentes. Em alguns lugares
do Brasil, o sinal para designar
esse mês lembra um desfile marcial
(imagem 2), enquanto em outros faz
alusão ao assessório sob o queixo
dos soldados que segura o capacete
(imagem 3).

Imagem 3 – SINAL 2 SETEMBRO

Figura 3

Aula 4 Aprendendo Libras 19


É importante ressaltar que as variações linguísticas reportam-se ao contexto, o qual
indicará significados distintos no uso dos sinais. Se por um lado a polissemia possibilita que
com um pequeno número de sinais tenhamos um grande número de significados, por outro
lado, isso reforça a ambiguidade e a imprecisão, prejudicando a compreensão, especialmente
no contexto bilíngue Libras-Língua Portuguesa. Por exemplo, se dissermos “fulano é uma
pessoa difícil” e utilizarmos o sinal “difícil” na tradução direta, o sentido pode ficar prejudicado,
uma vez que podemos atribuir ao adjetivo “difícil” diferentes acepções: ocupado, irritadiço,
tímido, etc. Havendo necessidade de manter o sinal “difícil” na tradução, aconselhamos sua
contextualização, acrescentando uma informação mais objetiva: “fulano é difícil, porque não
aceita negociar”. Nesse caso, o acréscimo se justifica para dizer em que sentido está sendo
empregado o sinal de “difícil”, uma vez que esse adjetivo tem um significado polissêmico.
Convêm esclarecermos que no contexto bilíngue Libras/Português a polissemia ou
sinonímia se faz presente em ambas as línguas de forma independente. Por exemplo: em
Língua Portuguesa, a palavra “manga” é polissêmica, podendo significar a fruta ou a parte
da roupa que cobre o braço, enquanto que em Libras existe um sinal diferente para cada
acepção de “manga”.
Além das variações linguísticas oriundas da relação signo-significado, podem acontecer
variações na execução de um mesmo sinal, produzindo o que poderíamos comparar ao so-
taque nas línguas orais auditivas. Outras variações dizem respeito ao estilo pessoal de cada
sinalizador, na forma como ele executa os sinais, o que corresponderia, nas línguas orais, à
entonação, dicção e ritmo da fala, ao que chamaríamos de prosódia. Apesar de as variações
linguísticas serem inevitáveis e, por isso, aceitáveis, é importante buscar realizar os sinais
de maneira bem articulada, ritmada e coerente com as expressões corporal e facial, pois a
compreensão dependerá dessa desenvoltura.

Saiba mais

Sotaque é uma forma típica de falar de um grupo linguístico, cujas variações


em ritmo, entonação ou pronúncia das palavras acontecem conforme a região,
classe ou grupo social, etnia, sexo e idade. Em Libras seria a forma de articular
o sinal.

Prosódia são as variações na entonação, ritmo e pronúncia das palavras, dando


realce ao texto em contexto. No caso da Libras estaria presente na ênfase das
expressões corporal e facial e no ritmo da gestualização dos sinais.

20 Aula 4 Aprendendo Libras


Para finalizar esta aula, pode parecer óbvio falar do caráter espacial da língua de sinais,
contudo, é preciso destacar que a posição do sinalizador é fator imprescindível para a com-
preensão dos sinais. A execução dos sinais deve considerar a posição e a postura adequadas
do sinalizador, isto é, o corpo do sinalizador e os sinais executados devem estar no campo
de visão do(s) interlocutor(es). Dependendo do ângulo de visão que se tenha do sinalizador
(frente, lateral) ou da distância, a compreensão do sinal pode ser difícil ou impossível. Devemos
lembrar que esse aspecto merece a maior atenção do professor que faz uso da Libras em sala
de aula, sendo aconselhável que o aluno surdo ocupe seu lugar nas primeiras carteiras e que
o professor evite falar enquanto escreve, caso o aluno realize leitura labial.

Curiosidade

Você sabia que existem dois sinais diferentes para dizer “abacaxi”, sendo que
um deles também significa a cidade de Aracati/CE, conhecida pela produção
dessa fruta?

Resumo

Nesta aula, vimos que a Libras não deve ser estudada tendo como base
a Língua Portuguesa, pois as línguas de sinais não são derivações das línguas
orais auditivas, elas possuem uma gramática específica e independente. A
Libras reflete a forma natural de o surdo processar suas ideias, compreender
e expressar o mundo. Percebemos que o contexto comunicativo é fundamental
na produção de sentidos para os sinais executados e na compreensão dos
seus significados, permitindo que os interlocutores se expressem e interpretem
adequadamente a mensagem. Vimos também que como em qualquer língua,
a Libras possui variações linguísticas relacionadas a mudanças no contexto
histórico, geográfico, sociocultural e comunicativo. As variações produzidas
são identificadas no uso de signos polissêmicos ou sinonímicos, bem como
na maneira como eles são realizados.

Aula 4 Aprendendo Libras 21


Autoavaliação
As variações linguísticas são oriundas de contextos históricos, geográficos, sociocul-
1
turais e comunicativos, descreva com suas palavras o que você compreende por:

 Variações linguísticas em contextos históricos

 Variações linguísticas em contextos geográficos

 Variações linguísticas em contextos socioculturais

 Variações linguísticas em contextos comunicativos

22 Aula 4 Aprendendo Libras


Assista à videoaula correspondente à Aula 4 do Módulo 2 e, considerando o con-
2 texto da situação comunicativa, identifique qual o sinal mais adequado para a pala-
vra grifada, colocando nos parênteses o número da imagem correspondente.

 A prova de matemática foi muito difícil. ( )

 O dia hoje é de sol e céu claro. ( )

 – Você quer ir comigo? – Claro!. ( )

1 2 3

Figura 4

Pesquise no dicionário on-line<http://www.acessobrasil.org.br/libras/> os sinais


3 usados para indicar:

 Matemática  Difícil

 Dia  Céu

 Sol  Cinema

Assista à videoaula correspondente à Aula 4 do Módulo 2 e compare a maneira


4 como os sinais pesquisados no exercício anterior são executados pela sinalizadora
do dicionário on-line e como eles são realizados pelos professores da videoaula.
Procure, em seguida, memorizá-los e repeti-los algumas vezes.

Aula 4 Aprendendo Libras 23


Referências
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Rio de Janeiro: INES/MEC, 2003.

______. Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade: atendimento educacional


especializado: pessoa com surdez. Brasília: MEC/SEESP, 2007.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de


Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008.

BRITO, L. F. (Org.) Língua Brasileira de Sinais – Libras. In: Programa de capacitação de


recursos humanos do ensino fundamental: Língua Brasileira de Sinais. Brasília: SEESP,
1997. p. 19-61. v 3.

CAPOVILLA, F. C.; RAPHAEL, W. D. Enciclopédia de Língua Brasileira de Sinais: o mundo


do surdo em libras. São Paulo: Fundação Vitae; Favesp; Capes; EdUSP, 2004. v 1 e 2.

FELIPE, T. A. Introdução à gramática da Língua Brasileira de Sinais – Libras. In: BRITO, L.


F. (Org.). Programa de capacitação de recursos humanos do ensino fundamental: Língua
Brasileira de Sinais. Brasília: SEESP, 1997. v 3.

INSTITUTO ANTONIO HOUAISS. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:


Objetiva, 2007.

KOJIMA, C. K; SEGALA, S. R. Língua Brasileira de Sinais: a imagem do pensamento. São


Paulo: Escala, 2008.

KOZLOWSKI, L. A proposta bilíngue de educação do surdo. Revista Espaço, Rio de Janeiro:


INES, 1998.

______. O modelo educacional bilíngue no INES. Disponível em: <http://www.ines.gov.br/


paginas/revista/espaco18/Reflexao03.pdf>. Acesso em: 18 out. 2011.

QUADROS. R. M.; KARNOPP, L. B. Língua Brasileira de Sinais: estudos linguísticos. Porto


Alegre: Artmed, 2004.

SILVA, J. E. F. da. A construção da língua portuguesa escrita pelo surdo não oralizado.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Pernambuco, Recife, 2009..

SANCHES, C. La educación de los sordos en un modelo bilingüe. Mérida: Lakonia, 1992.

VILELA, M.; KOCH, I. V. Gramática da língua portuguesa. Coimbra: Almedina, 2001.

24 Aula 4 Aprendendo Libras


Parâmetros da Libras

Aula

5
Apresentação
[A língua de sinais], nas mãos de seus mestres, é uma língua extraordi-
nariamente bela e expressiva, para a qual, na comunicação uns com os
outros e como um modo de atingir com facilidade e rapidez a mente dos
surdos, nem a natureza nem a arte lhes concedeu um substituto à altura.
J. Schuyler Long
The sign language, 1910

Nesta aula, veremos que a aprendizagem da Libras requer atenção para a forma como os Morfologia é o estudo da
estrutura, da formação e da
sinais são executados, de modo que as variações linguísticas (conteúdo da Aula 4), especifi-
classificação das palavras,
camente no que se refere ao “sotaque” e a “prosódia” não comprometam a compreensão de independentemente de
seu significado. Desse modo, existe uma morfologia dos sinais, presente na maneira como se sua função sintática na
combinam os parâmetros da Libras para formar um signo linguístico ou item lexical. Todas as participação da frase
ou oração. Em Libras, a
línguas têm suas próprias regras para a formação de seus signos (sinal em Libras ou palavra
morfologia refere-se ao
em Língua Portuguesa). O conjunto desses signos forma o léxico de uma língua. Nesta aula, modo como os sinais são
então, estudaremos o modo como as mãos se posicionam, as formas que elas assumem, o estruturados segundo
movimento que realizam (ou não) na sinalização, bem como a postura corporal e a expressão seus parâmetros de
configuração. Morfema
facial que complementam o contexto de produção dos sentidos na comunicação. Não existe
refere-se às partes
consenso entre os estudiosos sobre quantos e quais são os parâmetros da Libras, por isso constituintes das palavras,
adotamos a divisão que parece mais largamente aceita, a qual compreende: ponto de articu- em sua menor unidade
lação, configuração de mão, orientação, movimento e expressão corporal/facial. Porém, nem gramatical. Em palavras
como “infelizmente” temos
todos os sinais reúnem esses cinco parâmetros em sua composição.
o prefixo “in”, o radical
“feliz” e o sufixo “mente”.
Em Libras os parâmetros
de configuração
equivalem aos morfemas,

Objetivos que combinados


formam o sinal. Cada
morfema (parâmetro de
configuração) reúne, por
sua vez, unidades menores
Conhecer e distinguir os parâmetros da Libras na consti-
1 tuição dos sinais.
diferenciadoras de sentido
chamadas de quiremas
(quiro em grego significa
Executar os sinais conforme seus parâmetros de confi- mão), equivalendo aos
2 guração.
fonemas em línguas orais.

Utilizar os sinais de maneira apropriada em situações co-


3 municativas com surdos.

Aula 5 Parâmetros da Libras 27


Ponto de articulação
Para cada sinal existe um Ponto de Articulação (PA), isto é, o local onde ele é realizado
ou iniciado. A execução dos sinais acontece no espaço que se situa diante do emissor, desde
a linha da cintura até o alto da cabeça (Figura 1 – espaço de sinalização).

Figura 1 – Espaço de sinalização

Para a execução dos sinais, a(s) mão(s) toca(m) alguma(s) parte(s) do corpo (cabeça,
face, pescoço, tórax, braços). Há sinais, porém, em que a(s) mão(s) pode(m) se tocar (ou não)
sem tocar noutras partes do corpo. Nesse caso, dizemos que o sinal é executado em espaço
neutro. Vejamos, na Figura 2, os sinais “televisão”, “namorar”, “barco” e “inclusão” que são Espaço neutro
executados em espaço neutro. O ponto de articulação,
local onde o sinal se
inicia e é realizado, pode
estar marcado pelo
SINAL “TELEVISÃO” SINAL “NAMORAR”
contato da(s) mão(s) em
alguma parte do corpo.
Quando as mãos se
tocam sem tocar outra
parte do corpo, dizemos
que o sinal é realizado
em espaço neutro. Há
sinais executados com
apenas uma mão e
SINAL “BARCO” SINAL “INCLUSÃO” outros com ambas.

Inclusão
O sinal de inclusão
apresentado neste módulo
corresponde ao uso
nacional da Libras, já o
adotado na videoaula e é
uma variação regional.

Figura 2 – Sinais executados em espaço neutro


Aula 5 Parâmetros da Libras 29
Na Figura 3, veremos sinais com pontos de articulação variados:

 Pensar e esquecer – (PA) cabeça/testa

 Silêncio e máscara – (PA) face

 Morrer e sujar – (PA) pescoço

 Sentir e amigo – (PA) tórax

 Banheiro e debruçar – (PA) braços

SINAL PENSAR SINAL ESQUECER

(PA) – Testa (PA) – Testa

SINAL SILÊNCIO SINAL MÁSCARA

(PA) - Boca (PA) Rosto

SINAL MORRER SINAL SUJAR

(PA) - Pescoço (PA) - Pescoço

30 Aula 5 Parâmetros da Libras


SINAL SENTIR SINAL AMIGO

(PA) – Peito (PA) – Peito

SINAL BANHEIRO SINAL DEBRUÇAR

(PA) – Braço (PA) – Braço

Figura 3 – Diferentes pontos de articulação

Vários sinais são morfologicamente estruturados num mesmo ponto de articulação, como
exemplifica a Figura 3. O ponto de articulação pode ser definido em alguns sinais a partir do
campo semântico ao qual pertencem. Sinais como medo, compaixão, raiva, amor, saudade,
alegria e tristeza possuem um mesmo campo semântico – sentimentos – e, por isso, têm em
sua morfologia o mesmo ponto de articulação – peito esquerdo. Outros sinais relacionados
a atividades cognitivas, como no caso de aprender, esquecer, lembrar, pensar, compreender,
entender, imaginar, definir, sonhar e acreditar têm em comum o ponto de articulação na testa.

Aula 5 Parâmetros da Libras 31


Saiba mais

Campo semântico é o conjunto de signos linguísticos (no caso da Libras é


o conjunto de sinais) cujos elementos significantes estão inter-relacionados,
compartilhando certas características comuns ou referenciais. Por exemplo:
cachorro, gato e papagaio pertencem ao mesmo campo semântico de animais.
Na Libras, os parâmetros de configuração dos sinais podem ser definidos pelo
campo semântico. É o caso, por exemplo, do ponto de articulação no peito para
os sinais ligados a sentimentos.

Figura 4 – Imagem de mãos formando a palavra libras

Adaptado de: <http://sharepoint.sterling.k12.nj.us/Career%20Art/Class%20of%202005/Delp,%20Sara/Expressive%20Hands%20in%20Conte%20Pencil.JPG>. Acesso em: 18 out. 2011.

32 Aula 5 Parâmetros da Libras


Atividade 1

Pesquisa na Internet – dicionário on-line <http://www.acessobrasil.org.br/libras/> – e


liste alguns exemplos de sinais conforme o que se pede.

a) Dois sinais executados em espaço neutro

b) Dois sinais com ponto de articulação na face

c) Dois sinais com ponto de articulação no braço

Configuração de mão
As mãos são as articuladoras dos sinais. Assim, a Configuração de Mão (CM) se refere às
diferentes formas de posicioná-las na composição dos sinais. Por isso, é importante relembrar
nosso conhecimento sobre a mão (dedos, palma e dorso) para que ao fazermos a descrição
de um sinal ele seja compreendido com clareza.

r
Indicado Médio

Polegar An
ela
r


nim
o

Palma
Dorso

a) Palma da mão b) Dorso da mão

Figura 5 – Mãos: dedos, palma e dorso

Aula 5 Parâmetros da Libras 33


A execução dos sinais pode acontecer com apenas uma mão ou com as duas. Os sinais
articulados com apenas uma mão são produzidos pela mão dominante, que pode ser a direita
ou a esquerda, segundo a conveniência de quem os realiza. Os sinais articulados com as duas
mãos são determinados pelo tipo de interação entre elas, podendo, por exemplo, estarem
sobrepostas ou espelhadas.
A compreensão de uma mensagem em Libras depende tanto do contexto comunicativo
como da fluência do sinalizador para a realização adequada dos sinais. Boa parte das configu-
rações de mão segue as formas representativas das letras no alfabeto manual e alguns alga-
rismos: 0, 1, 2, 3, 5, 6, 8, 9. Ferreira-Brito (1995) registra 46 configurações de mão agrupadas
em 19 categorias, enquanto outros estudos em Libras apresentam até 64 configurações, mas
nesse texto adotaremos uma tabela com 60 configurações. Você aprenderá as configurações
à medida que for utilizando-as progressivamente.
A Figura 5 serve para você identificar as principais configurações de mão e sua referência
ao alfabeto manual. Objetivando tornar o conteúdo mais didático, convencionamos, nesta
disciplina, numerar cada uma das configurações de mão para que possamos citá-las pelo
número. Assim, quando formos descrever um novo sinal, faremos referência ao número da
Configuração de Mão (CM) e você consultará a imagem correspondente.

34 Aula 5 Parâmetros da Libras


1 2 3 4 5 6

7 8 9 10 11 12

13 14 15 16 17 18

19 20 21 22 23 24

25 26 27 28 29 30

31 32 33 34 35 36

37 38 39 40 41 42

43 44 45 46 47 48

49 50 51 52 53 54

55 56 57 58 59 60

Figura 6 – Configurações de mão (CM)

Aula 5 Parâmetros da Libras 35


Observe, por exemplo, que a CM 1 e 5 correspondem às letras “A” e “I” do alfabeto ma-
nual, respectivamente. Procure quais outras configurações são idênticas às letras do alfabeto
manual. Por outro lado, há configurações de mão que são independentes do alfabeto manual,
como no caso da CM39 em que os dedos, mínimo e indicador, são distendidos enquanto os
demais se fecham na palma da mão. A descrição dos sinais serve para auxiliar o ensino da
Libras, ela informa os parâmetros necessários para a execução correta do sinal.
Embora em Libras várias configurações de mão sejam baseadas no alfabeto manual, é
importante dizer que os sinais produzidos não têm relação direta com a grafia das palavras na
Língua Portuguesa. Analise os exemplos a seguir na Figura 6.

Exemplo 1
SINAL CHAVE SINAL FAZER

(PA) – Espaço neutro (PA) – Espaço neutro


(CM) – 1 (CM) – 1

Exemplo 2
SINAL LEMBRAR SINAL OLHAR

(PA) – Cabeça (PA) – Neutro


(CM) – 49 (CM) – 50

Exemplo 3
SINAL SOFRER SINAL PERDOAR/DESCULPAR

(PA) – Cintura (PA) – Queixo


(CM) – 4 (CM) – 4

Figura 7 – Exemplos de configuração de mão em sinais

36 Aula 5 Parâmetros da Libras


Notamos, a partir dos exemplos da Figura 6, que a configuração de mão pode variar
bastante, seja pelo número de dedos flexionados, pela contração da mão ou pelo contato/
separação dos dedos. A combinação dos parâmetros da Libras é bem variada, de modo que
sinais com a mesma configuração de mão possuem movimento, direção, ponto de articulação
e expressão corporal/facial distintos.

Curiosidade

Os fumantes passivos que não consomem cigarros, mas respiram a fumaça dos
outros, têm um alto risco de sofrer de surdez, segundo revela um estudo. Os
autores examinaram 3.300 adultos estadunidenses com idades compreendidas
entre 20 e 69 anos, classificados como fumantes passivos depois de medir em
seu sangue as concentrações de cotinina, um produto derivado da nicotina.

Os dados do estudo, publicado na revista Tobacco Control, revelaram que:

 14% dos indivíduos expostos com frequência à fumaça do cigarro havia


perdido a audição nas frequências baixas e médias;

 46% da amostra havia perdido a audição na faixa de frequências altas.

Os especialistas acham que a fumaça do fumo pode afetar o fluxo sanguíneo


nos pequenos vasos do ouvido, privando este órgão de oxigênio. Os danos
causados pelo fumo na audição são diferentes daqueles provocados pela ex-
posição ao ruído ou pela velhice. “A perda de audição poderia ser acrescentada
à lista de consequências para a saúde associadas à exposição à fumaça do
fumo”, concluem os autores.

Fonte: http://www.jkg.com.br/curiosidades/660/a-fumaca-do-cigarro-provoca-surdez

Atividade 2

Pesquise no dicionário on-line de Libras <http://www.acessobrasil.org.br/libras/> e iden-


tifique a configuração de mão utilizada para os seguintes sinais:

Exemplo: televisão – (CM) 38

a) borboleta – (CM) ____ d) altura – (CM) ____

b) café – (CM) ____ e) perigo – (CM) ____

c) magro – (CM) ____ f) faca – (CM) ____


Aula 5 Parâmetros da Libras 37
Movimento
É um parâmetro complexo porque, durante a realização do sinal, engloba o deslocamento
de uma ou ambas as mãos no espaço, abrangendo também dedos, pulso, braço e antebraço.
Tomando emprestados os conhecimentos da Física, podemos dizer que o movimento nas
línguas de sinais resulta da relação entre três elementos: mãos-espaço-tempo. Isto é, o mo-
vimento resulta do deslocamento das mãos configuradas no espaço de articulação do sinal,
no decorrer do tempo gasto para executá-lo.
Desse modo, o parâmetro de movimento na Libras possui diferentes propriedades ou
características relacionadas aos seus elementos, variando em:

 Direção é o sentido ou trajetória em que o sinal é realizado: para cima ou para baixo, para a
esquerda ou para a direita, para frente ou para trás. O movimento pode conter uma ou mais
direções (unidirecional, bidirecional ou multidirecional). Em alguns casos, a inversão na di-
reção do movimento pode funcionar para expressar um sentido oposto, isto é, um antônimo.

SINAL EDUCAÇÃO SINAL AMIGO SINAL SAPO

(PA) Braço (PA) Peito (PA) Braço


(CM) 38 (CM) 57 (CM) 30
(M) Unidirecional, deslocando a (M) Bidirecional, horizontal. (M) Multidirecional para cima e
mão sobre o braço, desde o para baixo, da direita para
ombro até o pulso. a esquerda, isto é, do pulso
para o cotovelo.

Figura 8 – Direção no movimento dos sinais

 Forma – modo pelo qual as mãos e dedos seguem uma trajetória na execução do sinal. O
movimento segundo sua forma pode ser extenso ou curto, deslocando-se em linha reta
ou curva. Algumas vezes as linhas combinam suas formas para reproduzir a geometria do
objeto, conceito ou sentimento convencionada pelo sinal.

38 Aula 5 Parâmetros da Libras


SINAL LIXAR SINAL COISA ou VÁRIOS

(PA) Sobre a palma da mão de apoio. (PA) Espaço neutro


(CM) 57 (CM) 37, mãos espelhadas
(M) Bidirecional retilíneo, fazendo o (M) Multidirecional, fazer as mãos se afas-
movimento de lixar. tarem na posição horizontal, ao mesmo
tempo em que os dedos indicador e
médio se movimentam repetidamente.

SINAL DOCE SINAL PROFESSOR SINAL BRASIL

(PA) Boca (PA) Espaço neutro (PA) Espaço neutro


(CM) 57 (CM) 50 (CM) 53
(M) Unidirecional circular sobre a boca. (M) Bidirecional semicircular – (M) Unidirecional sinuoso
arco superior repetido.

Figura 9 – Forma do movimento dos sinais

 Frequência ou repetição do movimento na realização do sinal, sendo que essa repetição


só acontece em alguns sinais. Observamos repetição em sinais como “doce”, “professor”
e “lixar” e ausência em “macarrão” e “Brasil”.

 Velocidade e intensidade na execução do sinal. Alguns movimentos são mais rápidos


outros mais lentos e suaves. No caso, por exemplo, de “martelo” o sinal requer ênfase na
intensidade e velocidade, enquanto o sinal “sonhar” é mais brando e lento.

Aula 5 Parâmetros da Libras 39


SINAL MARTELO SINAL SONHAR

(PA) Espaço neutro (PA) Testa


(CM) 1 (CM) 55
(M) Bidirecional, diagonal (M) Unidirecional retilíneo horizontal para
retilíneo, como se estivesse mão e bidirecional repetitivo para
martelando, movimento os dedos indicador e médio, que se
intenso e veloz. movimentam de forma suave e lenta.

Figura 10 – Velocidade e intensidade do movimento

Atividade 3

Pesquisa na Internet – dicionário on-line <http://www.acessobrasil.org.br/libras/>– os


sinais solicitados a seguir e relacione-os no quadro, conforme o tipo de movimento.

abdômen – agora – apagador – bicicleta – elevador – férias – fogo – magro – panela – repetir
– resposta – saúde

Forma do movimento Exemplo de sinais

Movimento circular

Movimento em semicírculo (arco)

Movimento retilíneo vertical

Movimento retilíneo horizontal

40 Aula 5 Parâmetros da Libras


Orientação da mão
Para realizarmos um sinal de maneira adequada, isto é, da maneira como ele foi conven-
cionado pela comunidade surda, precisamos conhecer seus parâmetros constituintes. Alguns
autores como Felipe (1998), compreendem que o parâmetro de orientação se refere à direção
do movimento, já explorado no item anterior. Outros autores, como Brito (1995) e Quadros;
Karnopp (2004) explicam que o parâmetro de orientação se refere à posição da palma das
mãos. Adotamos, aqui, a segunda referência.
Assim, enquanto a Configuração de Mão (CM) determina a forma que as mãos e dedos
devem assumir, a Orientação da Mão (OM) indica a posição da palma das mãos para a exe-
cução do sinal, tendo o corpo do sinalizador como referência. São basicamente sete tipos de
orientação da palma das mãos: para cima ou para baixo, para o corpo ou para a frente, para a
direita ou para a esquerda ou, ainda, em diagonal.

SINAL TRABALHAR SINAL ESTUDAR

(PA) Espaço neutro, na altura do peito. (PA) Espaço neutro, na altura do peito.
(CM) 38 (CM) 57
(M) bidirecional linear horizontal e repetitivo. (M) bidirecional linear vertical repetitivo.
(OM) Palma das mãos para baixo. (OM) Palma das mãos para cima.

SINAL MAQUIAGEM SINAL TELEVISÃO SINAL BEIJAR

(PA) Rosto sem tocar. (PA) Neutro na altura do rosto. (PA) Espaço neutro.
(CM) 57 (CM) 38 (CM) 26
(M) Multidirecional circular. (M) bidirecional linear vertical repetitivo. (M) Bidirecional linear horizontal.
(OM) Palma das mãos para o corpo. (OM) Palma das mãos para frente. (OM) Mãos espelhadas, uma com a
palma virada para a direita e a
outra para a esquerda.

Figura 11 – Orientação das mãos

Aula 5 Parâmetros da Libras 41


Observando os exemplos da Figura 10 é possível perceber que os sinais “trabalhar” e
“televisão” são muito parecidos, sua principal mudança é na orientação das mãos. Apesar de
nos exemplos vistos para orientação das mãos termos selecionado sinais em que se usam as
duas mãos, lembramos que há muitos sinais realizados com apenas uma delas e outros tantos
com ausência de movimento.

Atividade 4

Pesquisa na Internet – dicionário on-line <http://www.acessobrasil.org.br/li-


bras/>– os sinais solicitados a seguir e relacione-os no quadro, conforme a
orientação da mão.

abdômen – agora – apagador – bicicleta – casa – fogo – governador – magro –


poesia – por favor – queimadura – soldado

Orientação da mão Nome dos sinais

Para cima

Para baixo

Para o corpo

Para frente

Para a esquerda ou para direita

Diagonal

Expressão facial e corporal


Por ser de caráter gestual visual, a expressão facial e corporal na Libras referencia o
contexto comunicativo e de interação entre os interlocutores, sendo muitas vezes imprescindível
na decodificação.
A expressão facial e corporal deve ser feita com a maior naturalidade possível, e isso só
acontece com a prática cotidiana. O sinal “alegre” e “triste” sem uma expressão correspondente
fica demasiadamente estranho, dificultando ou impossibilitando sua compreensão. Por outro
lado, existem sinais semelhantes que se distinguem quanto ao significado em função da ênfase
na expressão do sinalizador, como no caso de “silêncio” e “cale a boca!”. A expressão facial e

42 Aula 5 Parâmetros da Libras


corporal completa também a intensidade do movimento de um sinal, determinando suavidade
ou vigor que atribuídos às características do objeto, ideia ou sentimento do que está sendo
representado. O sinal martelo/martelar, por exemplo, é realizado como se a mão estivesse
segurando no cabo da ferramenta e golpeando uma superfície, a expressão facial acompanha
a intensidade vigorosa do movimento; já para sinalizar “sonho/sonhar”, a expressão facial é
de tranquilidade e relaxamento.
A expressão facial e corporal faz, ainda, a marcação de construções sintáticas, imprimindo
ideia de pontuação (afirmativa, negativa, exclamativa, interrogativa) ou de estados emocionais
como medo, raiva e outros.

SINAL “ALEGRE” SINAL “TRISTE”

(PA) Peito (PA) Queixo


(CM) 60 (CM) 4
(M) Circular (OM) Palma da mão para o corpo
(OM) Palma da mão para o corpo

SINAL “SILÊNCIO” SINAL “CALE A BOCA!”

(PA) Boca (PA) Boca


(CM) 14 (CM) 14
(OM) Palma da mão para esquerda (OM) Palma da mão para esquerda
ou direita, a depender da mão ou direita, a depender da mão
utilizada pelo sinalizador. utilizada pelo sinalizador.

Figura 12 – Expressão facial e corporal

Ao buscar mais informações sobre a gramática da LIBRAS, perceberemos que os teó-


ricos não são unânimes quanto aos parâmetros, seja em relação ao número e nomenclatura
ou à importância de cada um. Para alguns estudiosos os parâmetros são divididos em duas
categorias: primários e secundários. O conjunto dos parâmetros primários é formado pela
configuração de mão, ponto de articulação – também chamado de ponto de contato – e pelo
movimento. Por sua vez, o conjunto dos secundários é composto pela orientação da mão e
expressão facial/corporal.

Aula 5 Parâmetros da Libras 43


Curiosidade

Os surdos podem dançar? Precisamos nos despir de preconceitos! É assim


que as 21 dançarinas surdas do Grupo de Artes Performativas da Associação
Chinesa de Pessoas com Deficiência exibem o seu número mais conhecido, a
dança Qianshou Kuanyin ou Bodhisattva. Esse espetáculo prende a atenção de
todos, pois as dançarinas surdas formam uma fila vertical e 42 braços promo-
vem diferentes gestos harmoniosos simultaneamente, reproduzindo a imagem
do Buda de Mil Mãos, encontrada em muitas grutas da China. Os métodos
para a percepção dos sons pelas bailarinas vão desde a marcação rítmica no
próprio corpo, até a utilização de uma sala especial, com caixas acústicas co-
locadas sob o piso de madeira, o que favorece a percepção dos ritmos através
da vibração provocada no corpo. Esse espetáculo foi criado por um famoso
coreógrafo chinês, Zhang Jigang, e o vídeo está no site do Youtube desde junho
de 2007, permanecendo disponível desde então. Assista você mesmo: <http://
br.youtube.com/watch?v=Iq9IOkWYlyY>

Resumo

Nesta aula, você viu que a realização dos sinais em Libras obedece a
parâmetros que orientam o ponto de articulação, a forma assumida pela mão, o
tipo de movimento executado, a posição da palma da mão e as expressões facial
e corporal que acompanham o gesto. Alguns sinais não são constituídos por
todos os parâmetros. Você também viu que a gramática da Libras ainda apresenta
alguns pontos que merecem maior formalização, pois só recentemente passou
a ser estudada com mais interesse pelos linguistas. Contudo, a insuficiência
desses estudos não significa a inexistência de uma gramática da Libras, sendo
necessário conhecê-la, pois alterações inadvertidas na realização dos sinais, isto
é, a inobservância de seus parâmetros, pode provocar problemas na compreensão
e até inverter o sentido do que se está tentando comunicar.

44 Aula 5 Parâmetros da Libras


Autoavaliação
Pesquisa na Internet – dicionário on-line <http://www.acessobrasil.org.br/libras/> –
1
e liste alguns exemplos de sinais conforme o que se pede:

a) Dois sinais executados com movimento circular

b) Dois sinais com movimento forte/intenso

c) Dois sinais com ponto de articulação no braço

2 Identifique a orientação de mão utilizada para os seguintes sinais:

Exemplo: televisão – (OM) mãos para frente

a) borboleta – (OM)

b) martelo –(OM)

c) Brasil – (OM)

Explique com suas palavras de que maneira você compreende a importância da


3 expressão facial no uso Libras.

Aula 5 Parâmetros da Libras 45


Referências
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Rio de Janeiro: INES/MEC, 2003.

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______. Estrutura Linguística da LIBRAS. Disponível em: <http://pt.scribd.com/


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2011.

CAPOVILLA, F. C.; RAPHAEL, W. D. Enciclopédia de Língua Brasileira de Sinais: o mundo


do surdo em libras. São Paulo: Fundação Vitae; Favesp; Capes; EdUSP, 2004. v 1 e 2.

FELIPE, T. A. Introdução à gramática da Língua Brasileira de Sinais – Libras. In: BRITO, L.


F. (Org.). Programa de capacitação de recursos humanos do ensino fundamental: Língua
Brasileira de Sinais. Brasília: SEESP, 1997. v 3.

INSTITUTO ANTONIO HOUAISS. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:


Objetiva, 2007.

KOJIMA, C. K.; SEGALA, S. R. Língua Brasileira de Sinais: a imagem do pensamento. São


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QUADROS, R. M. de. O bi do bilinguismo na educação de surdos In: SURDEZ e bilingüismo.


1. ed. Porto Alegre: Editora Mediação, 2005. p. 26-36. v 1. Disponível em: <http://www.
ronice.cce.prof.ufsc.br/index_arquivos/Documentos/bilinguismo.pdf>. Acesso em: 18 out.
2011.

QUADROS. R. M.; KARNOPP, L. B. Língua Brasileira de Sinais: estudos linguísticos. Porto


Alegre: Artmed, 2004.

SANCHES, C. La educación de los sordos em un modelo bilingüe. Mérida: Lakonia, 1992.

SILVA, J. E. F. da. A construção da língua portuguesa escrita pelo surdo não oralizado.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), Recife, 2009.

SILVA, L. C.; DECHICHI, C.; MOURÃO, M. P. (Org.). Professor e surdez: cruzando caminhos
produzindo novos olhares. Uberlândia: EDUFU, 2009.

46 Aula 5 Parâmetros da Libras


Formação de Sinais
e Classificadores

Aula

6
Apresentação

N
as Aulas 4 e 5 aprendemos sobre o significado dos sinais para uma língua de modali-
dade gesto visual e os parâmetros básicos para a sua execução, segundo a gramática
da Libras. A formação dos sinais resulta da combinação de seus parâmetros, sendo
que alguns sinais podem derivar da união de outros sinais, a exemplo do que acontece com as
palavras compostas nas línguas orais. Como em qualquer língua, os sinais também pertencem
a categorias gramaticais distintas: verbos, substantivos, adjetivos e outros. Algumas categorias
gramaticais como artigos, conjunções e preposições não existem na Libras. Porém, há outra
categoria na Libras, que não existe na Língua Portuguesa, chamada de classificadores. Trata-se
de configurações específicas de mãos – sinalizadas junto ao verbo, ao sujeito da oração ou
ao objeto/coisa referente –, que atuam complementando o sinal com informação de número,
gênero ou propriedade física do objeto a que se refere. O conteúdo da Aula 6 será ampliado
no próximo módulo, no qual abordaremos mais sobre a estrutura morfológica e sintática da
Libras por meio da elaboração de pequenos diálogos.

Objetivos
1 Compreender a formação de sinais na Libras.

Conhecer alguns classificadores na Libras e a sua função


2 gramatical.

Identificar alguns classificadores e as situações adequadas


3 para seu uso.

Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 49


Classificadores
Na Libras há sinais que se formam pela composição de dois ou mais sinais, semelhante
ao que acontece nas línguas orais com as palavras compostas. Porém, esses sinais não têm
relação direta com os substantivos compostos da Língua Portuguesa, pois a Libras provém de
uma lógica linguística focada no gesto, o qual tenta exprimir um sentido que seja visualmente
captável. São exemplos dessa iconicidade e composição de sinais em Libras:

 ZEBRA = CAVALO + LISTRAS

 ESCOLA = CASA + ESTUDO

 CEMITÉRIO = MORRER + CRUZ

 FRUTAS = MAÇÃ + VARIADOS

 MECÂNICO = HOMEM + CONSERTO

 ORFANATO = CASA + CRIANÇA + ADOTA

Saiba mais

Os sinais classificadores são formados quando dois ou mais vocábulos se jun-


tam para formar um conceito novo, diferente do sentido isolado dos termos
componentes. Por exemplo, arco-íris é uma palavra composta porque o seu
significado (fenômeno da natureza) é diferente dos significados de arco e de
íris separadamente.

Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 51


ZEBRA (CAVALO + LISTRAS)
Fazer sinal de cavalo e, em seguida, listras.

CAVALO LISTRAS

(CM) 36 (CM) 18
(PA) Lateral da cabeça acima da orelha tocando (PA) A frente do corpo tocando o centro do peito.
com o indicador. (OM) Palma da mão virada para cima, mãos espe-
(M) Curvar o polegar e o médio para baixo duas lhadas.
vezes. (M) Unidirecional, vertical, encostar a mão na altura do pei-
(OM) Palma para frente. to, movimentar para baixo na altura da cintura, repetir
três vezes para baixo, imitando o desenho de listras.

Sinal ESCOLA (CASA + ESTUDO)


Fazer o sinal de casa e, em seguida, o de estudar/estudo/estudante.
Estudante
Em Libras, muitos sinais CASA ESTUDO
podem ser utilizados como
verbo, substantivo ou
outra classe gramatical,
dependendo do contexto,
como é o caso do sinal
usado para estudar/estu-
do/estudante.

Morte
(CM) 56 (CM) 57
O sinal de enterro, quando
(PA) A frente do corpo, na altura do peito. (PA) A frente do corpo, na altura do peito.
para compor o sinal de
(OM) Palma das mãos em vertical espelhadas, (OM) Palma das mãos viradas para cima, uma
cemitério é utilizado de tocando a ponta dos dedos, imitando um sobre a outra cruzando.
forma abreviada, sem a telhado. (M) Bater duas vezes a mão superior na inferior.
primeira parte que faz
referência à morte
CEMITÉRIO (CRUZ + MORTE )
Fazer o sinal de cruz e, em seguida, o sinal de morte.
CRUZ MORTE

(CM) 14 (CM) 53
(PA) A frente do corpo, na altura do peito. (PA) Ao lado do pescoço.
(OM) Pontas dos dedos indicadores se cruzando, (OM) Palma da mão para baixo.
um dedo na horizontal e outro na vertical. (M) Deslizar a mão pelo pescoço de um lado para outro.

52 Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores


FRUTAS (MAÇÃ + VÁRIOS)
Fazer o sinal de maçã e, em seguida, o sinal de vários.

MAÇÃ VÁRIOS

(CM) 29 (CM) 37
(PA) Um pouco abaixo da boca. (PA) A frente do corpo, na altura do peito.
(OM) Palma da mão para dentro, como se estivesse (OM) Palma das mãos viradas para baixo, próximas.
segurando uma maçã. (M) Movimentar de maneira rápida e repetida os dedos
(M) Levando a mão em direção à boca. indicadores e médios de cada mão. Ao mesmo
tempo, ir afastando as mãos, em sentido horizontal.

MECÂNICO (HOMEM + CONSERTO)

HOMEM CONSERTO

ORFANATO (CASA + CRIANÇA + ADOTA)


CASA CRIANÇA ADOTAR

Figura 1

Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 53


De acordo com a gramática atual da Libras, os sinais não fazem marcação de feminino
ou masculino, são semelhantes aos substantivos comuns de dois gêneros ou sobrecomuns
(estudante, lojista, colega, cônjuge, monstro ou vítima). Assim, quando é necessário determinar
o gênero, acrescenta-se o sinal homem ou mulher, conforme os exemplos a seguir. Note que
por conta da ausência de flexão de gênero na Libras convencionou-se usar o símbolo @, a fim
de mostrar essa particularidade morfológica.

 MENINO = HOMEM + CRIANÇA

 MENINA = MULHER + CRIANÇA

Benção  PAI = HOMEM + BENÇÃO


O sinal de benção no
contexto religioso é rea-
 MÃE = MULHER + BENÇÃO
lizado de forma diferente
de quando se refere à mãe
ou pai. O sinal lembra uma  IRMÃO = HOMEM + IRM@
unção sobre a pessoa e, no
caso de relação paterna,
 IRMÃ = MULHER + IRM@
lembra o pedido do filho
que estende a mão para
ser abençoado.  VOVÓ = MULHER + VELH@

 VOVÔ = HOMEM + VELH@

HOMEM MULHER

CRIANÇA BENÇÃO

54 Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores


IRM@ VELH@

MENINO MENINA

+ +
HOMEM + CRIANÇA MULHER + CRIANÇA

PAI MÃE

+ +
HOMEM + BENÇÃO MULHER + BENÇÃO

IRMÃO IRMÃ

+ +
HOMEM + IRMÃO MULHER + IRMÃO

VOVÔ VOVÓ

+ +
HOMEM + VELHO MULHER + VELHA

Figura 2
Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 55
É preciso dizer que a combinação utilizada entre sinais para a marcação de gênero se
aproxima mais da aposição das palavras macho e fêmea que fazemos em português quando
queremos esclarecer o sexo de um referente que não admita flexão de gênero, como em
cobra macho ou jacaré fêmea. Na Libras, há a possibilidade de variação na ordem dos sinais,
facultando aos sinais “homem” ou “mulher” de serem realizados antes ou depois do referente.
Em Libras não existe flexão de gênero (masculino/feminino), número (singular/plural)
ou grau (aumentativo/diminutivo). Quando é necessário especificar o gênero, o número ou o
grau, incorpora-se aos sinais outros sinais que assumem esse fim, que são chamados de sinais
classificadores quando utilizados nesse contexto. Exemplo: “casinha” (CASA + PEQUEN@)
Ainda sobre a formação de sinais é importante observar a existência de alguns verbos que
resultam da combinação de outros sinais, como no caso de “acreditar” (SABER+ESTUDAR).
Entretanto, essas formas de composição ainda estão em estudo pelos linguistas da Libras, não
havendo consenso entre os autores mais conhecidos como Quadros, Strobel, Ferreira Brito,
Capovilla, Tanya Felipe e outros.
Partindo dos estudos já sistematizados em Libras, podemos dizer que os classificadores
são modos especiais de realizar um sinal, cuja finalidade é descrever algumas propriedades
particulares do referente. Em geral, os classificadores são acréscimos feitos ao sinal para
esclarecer, por exemplo, o tamanho, a forma ou tipo de movimento do que está sendo repre-
sentado. Assim, como explica Quadros; Schmiedt (2006, p. 21) os classificadores podem ser
usados para “expressar formas de objetos, bem como o movimento e trajetórias percorridos
por tais objetos”.

Exemplo 1: Para dizermos “Feche a porta, por favor”, não é necessário fazer
um sinal para “fechar” e outro sinal para “porta”. Nesse caso, os sinais se
aglutinam formando um classificador e o artigo “a” não é sinalizado, porque na
Libras não se faz uso de artigos para definir gênero (masculino/feminino) ou
número (singular/plural).

Figura 3 – Sinais para “Fechar a porta”

56 Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores


Os classificadores podem expressar também ideia de quantidade (muito/pouco) e de
intensidade (forte/fraco/lento/rápido). Dizendo de outra maneira: os classificadores permitem
qualificar o sujeito referente (seres animados ou inanimados) da ação ou a própria ação,
unindo ao sinal configurações específicas de mão, ou expressões faciais, ou movimentos que
se somam ao sinal principal.

Exemplo 2:

Figura 4 – “Copo cheio”

Observamos que os classificadores em Libras podem ser entendidos em diferentes pers-


pectivas; talvez porque se trate de uma língua que só foi oficialmente reconhecida no Brasil a
partir de 2002 com a Lei nº 10.436, apesar de sua origem datar desde a fundação do Instituto
Nacional de Educação de Surdos (INES) em 1856. Como consequência desse atraso, os estudos
sobre a Libras ainda estão em fase de sistematização da sua gramática.
Se por um lado Brito (1995) e Felipe (2002) entendem que os classificadores são confi-
gurações de mão, que vindos juntos ao verbo funcionam como marcadores de concordância
para discriminar o referente (pessoa, animal ou coisa) que está ligado à ação do verbo. Por
outro lado, Capovilla (2005, p XXXIII) parece não estabelecer relação necessária entre classi-
ficadores e verbo, como vemos a seguir:

O conceito de classificador diz respeito aos diferentes modos como um sinal é produzido,
dependendo das propriedades físicas do referente que ele representa. Os classificadores
geralmente representam algumas características físicas do referente como o seu tama-
nho e forma, ou seu comportamento ou movimento, o que confere grande flexibilidade
denotativa e conotativa aos sinais. O sinal telefone celular, por exemplo, é classificador,
pois sua forma varia de acordo com o tamanho e modelo do objeto referido. Quando um
sinal funciona como um classificador, [...] sua forma específica varia dependendo das
circunstâncias particulares de seu uso [...].

Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 57


Exemplo 3: “Largou a mochila pesada sobre a mesa”

MOCHILA PESADA SOBRE A MESA

Figura 5 – “Largou a mochila pesada sobre a mesa”

É importante frisar que os classificadores não se referem apenas a objetos (seres inani-
mados), mas também a pessoas e animais. Assim, diante do que já exploramos neste tópico
e a despeito da falta de consenso entre os teóricos acerca dos classificadores, podemos
entender que os classificadores cumprem um papel descritivo (aspectos físicos) e locativo
(relação espacial) do referente (seres animados e inanimados), muitas vezes associado ao
verbo (ação praticada ou sofrida).
A partir dos exemplos dados, vemos que a iconicidade é algo comum e quase inevitável
nas línguas de sinais, uma vez que sua base é gesto-visual. Por isso, a iconicidade está muito
presente nos classificadores, por aglutinarem num mesmo sinal descrições de forma, tamanho,
movimento, textura e relação espacial de seus referentes. Para melhor entendermos, vejamos
o emprego de classificadores noutros exemplos.

Exemplo 4: Se desejamos dizer “O menino escova os dentes” em Libras, faremos isso utilizan-
do um sinal classificador que aglutina o objeto escova (CM 11), os dentes (PA na boca com os
dentes à mostra) e a ação praticada (movimento repetido da escovação). Não faria sentido em
Libras realizar um sinal para escovar e outro para dentes. A mesma lógica também se aplica na
frase “Mamãe escova os cabelos”, na medida em que um mesmo sinal dirá escovar os cabelos,
pois reúne a ideia de escova (CM11), cabelos (PA nos cabelos do sinalizador) e a ação praticada
(movimento repetido de pentear).
ESCOVAR OS DENTES ESCOVAR OS CABELOS

Figura 6 – Escovar dentes e escovar cabelos

58 Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores


Exemplo 5: Se desejamos dizer “Fechar a tampa do pote” em Libras, faremos
isso utilizando um sinal classificador que aglutina a ideia de fechar (movimento
de girar uma tampa) e de tampa (CM 59, forma de segurar uma tampa).

Figura 7 – “Fechar a tampa do pote”

Resumindo, podemos dizer que um sinal classificador é uma representação que mostra
claramente detalhes específicos, permitindo a descrição de pessoas, animais e objetos, bem
como sua movimentação ou localização. Para finalizarmos esta aula, precisamos dizer que a
aprendizagem da Libras pode, muitas vezes parecer difícil, porém, é natural porque a base lógica
da comunicação passa do som, que estamos acostumados, para a imagem, sinais realizados com
as mãos. Um pouco de paciência e perseverança será necessário e muito ajudará a consulta do
material complementar (videoaulas) e das leituras recomendadas ao final deste módulo.
Por último, não é exagero repetir que a fluência na Libras dependerá do quanto você
pratica a partir dos exercícios propostos e de sua interação com outros usuários de língua de
sinais, surdos e ouvintes.

Leituras complementares

SACKS, Oliver. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo: Companhia das
Letras, 2010.
Numa fascinante incursão pelo universo dos surdos, Oliver Sacks procura responder a
questões sobre o que acontece conosco se não aprendermos língua alguma e se a linguagem se
desenvolve de modo espontâneo e natural ou se requer contato com outros seres humanos. Sua
preocupação não é simplesmente apresentar ao leitor a condição daqueles que não conseguem
ouvir. Acompanhando a história, os dramas e as lutas dessas pessoas, o leitor será levado a
refletir sobre problemas antiquíssimos (linguagem, biologia, cultura) de modo diferente.

Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores 59


Sites recomendados
http://www.editora-arara-azul.com.br/pdf/artigo2.pdf
http://www.ines.gov.br/ines_livros/35/35_PRINCIPAL.HTM
http://www.ronice.cce.prof.ufsc.br/index_arquivos/Page435.htm
http://www.folhadirigida.com.br/htmls/hotsites/professor_2003/cad_05/EntCarlosSkliarFdg.htm
http://www.surdo.org.br/Apostila.pdf
http://www.ufsm.br/edu.especial.pos/images/libras.pdf
http://www.youtube.com/watch?v=NtM29Y2IXAQ

Resumo

Nesta aula, você viu que na Libras há uma categoria gramatical que não existe
na Língua Portuguesa: os classificadores, que são configurações específicas de
mãos que complementam o sinal. Os classificadores são modos especiais para um
sinal, que descrevem propriedades particulares do referente. Em geral icônicos,
os classificadores são acréscimos para esclarecer ou complementar o sentido do
sinal representado. Podem expressar ideia de forma, quantidade e intensidade.
Viu também que os classificadores servem tanto para objetos (seres inanimados)
como para pessoas e animais. Por fim, percebeu que eles especificam o sujeito
da ação ou a própria ação, unindo ao sinal principal configurações específicas de
mão, expressões faciais ou movimentos, que definem claramente as propriedades
do referente.

60 Aula 6 Formação de Sinais e Classificadores


Autoavaliação
1 Explique com suas palavras o que você entende por classificadores.

Pesquise seis exemplos de sinais classificadores na internet. Você pode consultar


2 os sites sugeridos e outros que achar interessante.

Referências
BRITO, Ferreira L. Por uma gramática das línguas de sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasi-
leiro, 1995.

CAPOVILLA, Fernando Cesar; RAPHAEL, Walkiria Duarte. Dicionário enciclopédico ilustra-


do trilíngue: Língua de Sinais Brasileira: LIBRAS. São Paulo: EdUSP, 2001. v 2.

PIMENTA, Nelson; QUADROS, Ronice Muller de. Curso de Libras 1. Rio de Janeiro: LSB
Vídeo, 2006.

QUADROS, Ronice Müller de. Ideias para ensinar português para alunos surdos. Brasília:
MEC/SEEPS, 2006.

QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de Sinais Brasileira: Estu-
dos Linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004. v 1. 222 p.

VILELA, M.; KOCH, Ingedore Vilhaça. Gramática da língua portuguesa. Coimbra: Almedina, 2001.

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Anotações

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