Flavio M. Heinz Marluza Marques Harres (Orgs.) A Histéria e seus territérios Conferéncias do XXIV Simpésio Nacional de Histéria da ANPUH A 40i<0S.. anions anpHh 2008AINVENCAO DA ETNICIDADE NOS ESTADOS-NACOES AMERICANOS NOS SECULOS XIX E XX* Federico Navarrete** A pluralidade émnica ¢ cultural & uma realidade reconhecida em todas a nagSes americanas Nao hi um tinico pais em que niio existam grupos que se diferenciem por sua cor de pele, su a, sua origem, sta religio ou sua identidade étnica, Da mesma maneira, desde o nascimento das nagdes de nosso continente, as formas de convivéncia, assim como a dis- criminagio e os conflitos, entre os diferentes grupos, «la vida social e politica. Por isso, como veremos nesta conferénecia, a relacio entre os distintos grupos étnicos tem sido um elemento central para a defi io dos regimes politicos que se construiram e sucederam em cada um dos paises americanos. Hoje, a disctiminagio ¢ a desigualdade entre os grupos diferentes sio uma caracteristica importante de quase todas as sociedades de nosso continente. Por estas razbes, prestar atengio as relagées interétnicas per- mite compreender, de uma perspectiva diferente, a hist6ria politica e social de niossos paises. cultura, sua lin rm sido temas centrais, Diversidade primordial e diversidades emergentes Para poder empreender este tipo de anslise, € necessério, primeito, fazer algumas reflexdes conceituais. A primeira se relaciona com a propri natureza da pluralidade nas sociedades americanas. A pluralidade de grupos humanos que existe em nossos paises tem sido explicada geralmente como resultado da histéria do povoamento da América ppor sucessivas ondas de imigrantes, comegando pelos amerindios que chega- * Tialugio ao portuguas de Ed ** Insctuco de fnvestigages His ro Natalino dos Santos, eas, Universidade Nacional Autonoma do México{mais de 10 mil anos e culminando com os imigrantes africanos, asi suropeus que chegaram nos diltimos 500 anos, e continuam a che: Desta perspectiva, a pluralidade tem sido concebida como uma espé- pecado original” das sociedades americanas. A conquista dos povos dios e a colonizagio européia do continente tém sido condenadas como iroz destruigao desta pluralidade primordial ou vista como uma empre- entalizante ¢ homogeneizadora ainda no terminada. Para além de ‘osigo, ambas as perspectivas assumem que o mundo amerindio existe aeira mais ou menos continua desde antes de 1492 até hoje e o definem alheio e resistente, inclusive refratatio, até certo ponto, a0 mundo oci- Uma perspectiva semelhante se aplica aos grupos de afticanos que che- § América por meio do trafico de escravos. As atrocidades deste co- + bumano sio vistas como um elemento definidor da paticipagdo dos nericanos nas sociedades americanas até 0 dia de hoje. Como resulta- nbém se definem estes grupos a partir de sua alteridade primordial em » a0 resto das comunidades nacionais e de sua continuidade com sew 9 afticano e escravo, seja sob a forma de uma resisténcia continua ow a heranga terrivel que niio pode ser superada. A mesma visio essencialista que remete o amerindio ao pré-colombia- afro-americano & Africa ¢ a0 escravismo retine os diferentes grupos us que chegaram 3 América em funcio de sua origem geogrifica sob a -a simplista de ocidentais, o que os associa a uma posigio social de domi- ea uma identidade moderna. Isso impede o reconhecimento da plurali- ultural, social e ética do povoamento europeu da América, as de classe ¢ relagdes de poder existentes entre estes grupos. n das No que diz respeito aos imigrances asidticos, do Orience Médio, aftica- Ja Oceania que rém chegada nos diltimos 150 anos, este essencialismo ne também a partir de suas origens extra-americanas ¢ avalia sua par- fio nas sociedades americanas contemporfineas em fungio de uma di- a simplista: a continuidade com sua heranga estrangs © as culturas nacionais. As mesmas concepgdes se aplicam agora a0 ate niimero de emigeantes entre os paises americanos: la s EUA, nicaragiienses na Costa Rica, colombianos na Venezuela, boli- paraguaios na Argentina. Devo esclarecer que nio pretendo negar a importancia dos processos 20s de colonizagio, escravismo e migraco, que t8m constituido as na- s 2 ou sua assi- mericanas sociodemograficamente. Tampouco quero menosprezar KW Simple Nacional do Hits da ANPUH — A sti @ seus tee continuidades identitarias € culturais entre os grupos amerindios, afro-ame- ricanos, de origem curopéia © outros imigrantes; ¢, menos ainda, ignorar a importineia das formas de resisténcia que os grupos subalternos tem empre- gado, nem subestimar as formas de dominagio exercidas pelos grupos hege- ménicos. O que desejo questionar € a idéia de que a diversidade dos paises americanos é unicamente uma condigo origindria, 0 ponto de partida, 0 cenario prévio ¢ imével em que se dao os processos histéricos de colonizagao ¢ de construgiio nacional; e que estes, por sua vez, demonstram a tendéncia de fazé-la desaparecer. Também quero questionar a idéia de que as diversida- des existentes hoje sio o produto e a continuagio desta diversidade primor- dial, ou seja, que aquilo que torna diferentes os amerindios, os afto-america- 1nos, os ocidentais e os grupos provenientes da Africa, Asia ou Oriente Médio € 0 que eles conservaram de suas origens particulares, enquanto que sua experiéncia colonial e nacional nao teria demonstrado mais que a tendéncia de homogeneizi-los. Frente a esta concepcio de diversidade primordial, proponbo a exis- téncia de diversidades emergentes, quer dizer, de formas novas ¢ sempre cam- biantes de diferenciagao e pluralidade entre os grupos que for dades americanas. Denomino emergentes a estas diferengas porque elas surgitam ¢ sur- gem, hoje mesmo, dos processos hist6ricos de colonizagio e de construgio dos Estadas-nagées; algumas vezes de n ‘uma conseqiiéneia inesperada, Portanto, nao devem ser concebidas como uma simples continuagao, ou um remanescente, das diferengas primordiais, ¢ sim como fendmenos novos, que podem retomar elementos das diferengas previa- mente existentes, mas que Ihes dio sentidos ¢ fungées diferentes © novas. Por exemplo, em todas as nagées americanas, a distingio legal c politica entre cidadaos € nao-cidados se transformou, a0 longo dos iiltimos 200 anos, em uma geradora constante ¢ cambiante de diferengas emergentes. No Peru, Guatemala e México, as comunidades camponesas, muitas delas de tradig amerindia, tém definido formas proprias de participagio politica ¢ de exercicio da cidadania, as mesmas que foram rejeitadas e combatidas pelas elites libe- nais, apegadas a uma definicio ocidentalizante de tais concepgies.' O enfren- nas socie= weira deliberada e outras vezes como "Mauios, Hloréneis, Cimpesino y nacinela consteuccisn de México y Peri poscoloniales. Mésiea: CCHESAS, 2093, a186 9002 "e830, goyo gosonedg a, uo >n9g) HOD 9p SILUOIDIPeN 9 svanzjoo apepsudoxd ap -afput sop. 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As diferentes constelagies histéricas que constituein as eategorias ¢ as identi les émicas so invencées no sentido de serem construgbes histéricas. Entre- anto, isto n&o quer dizer que nao sejam reais, € (0 concretas como as mar- is € as ferragens que constrangiam os corpos dos escravos, as formas de vestir impostas aos indige ia identidade e controlar seus ‘novimentos ou seus rituais ¢ formas de comer. Da mesma maneira, as praticas lisciplinares e as campanhas médicas, os esteredtipos ¢ os preconceitos, as ebelides ¢ as praticas de resisténcia cotidiana tém dado as diferencas étni- cas uma concretude © uma visibilidade que todos nés, americanos, sabemos er € reconhecer em nossa conv as para verificar s iwéncia social cotidiana, As conformac: s © propésito destas reflextes teéricas é compreender de uma maneira liferente os processos de construgo nacional dos tltimos 200 anos no interior los Estados-nagdes americanos. Tradicionalmente, eles t6 sido vistos como processos de moderniza- fio de sociedades tradicionais heterog superagio de uas diferengas primordiais por meio da unifica émnica. A iden ado étnica cultural levou has quais 0 projeto moderiza- éneas que levaram 10 cultural ¢ ificagio entre modemizagio e homogene construgdo de narrativas histricas lineares lor se impunha a uma sociedade dividida pelo “pecado original” de sua di- versidade primordial e pelos estragos do colonialismo, levando assim & forma- sao de uma verdadeira comunidade nacional, moderna e homo Os grupos que encabegaram este processo se apresentavam como re- rresentantes dos valores universais da modernidade, acima de suas identida- les étnicas particulares, ¢ como inventores de uma identidade nacional que too -sn04 smposio nactona 09 Hsiona 6a ANFUN ~ A Mena © seus terntios supostamente superava as identidades particulares previamente existentes — ainda que na pritica apenas universal estas clites, bem como seus preconceitos contra os outros grupos. Retoman- do as idéias de Slavoj Zizek, as elites americanas tém identificado ideologi camente suas particularidades com o universal, 0 que Ihes cém permitido, assim, dissimulé-las e legitimé-las.° Segundo a perspectiva das tradigées historiog forcas dindmicas da modernizacio, encarnadas nas eli aspiragdes universalistas, tiveram que enfrentar as resisténcias, passivas e re- ativas, dos diferentes grupos étnicos, mas a tendéncia inevitavel era a des parigao destes ou sua preservacio como adornos folcloricos de uma identida- de nacional consolidada ¢ plenamente moderna. A maioria dos autores acei- tou que a homogeneizagio racial e cultural de suas nagies era um requisito indispensavel para o progresso e modernizaco, Mais recentemente, outros as condenaram como um etnocidio injustficavel. No entanto, todos estavam de se as caracteristicas Gtnicas préprias las. icas nacionalistas, as modemizadoras com acordo acerca da equivaléncia entre modemidade © homoigeneidade. Do mesmo modo, estabeleceu-se uma relacio de contradigao entre as dliferengas éinicas e a igualdade, sustentando que esta iltima somente pode- Tia ser alcancada se as primeiras desaparecessem. Também neste terreno, 0 universalismo dos valores liberais serviu para disfarcar ideologicamente a im- posigio das particularidades culcurais das elites. Se examinarmos os processos de construgio nacional indo além das narrativas ideoldgicas das historiografias nacionalistas, no € muito dificil descobrir a maneira pela qual reproduziram e constituram constantem as diferencas étnicas que pretendiam eliminar. Podemos dizer que este 6 0 “lado obscuro” da construgdo nacional, porque nao ¢ visivel normalmente © se oculta sob “lado luminoso” da retériea unificadora. Apesar disto, ou melhor, gragas a isto, cumpriu fungses-chave na sustentagio do poder das elites modernizadoras sobre 0 resto da populagio. Para comegar, as elites dominantes dos estados americanos, chamem- se brancas, mestigas ou simplesmente modernas, legitimaram seu poder a pat- tir de seu acesso privilegiado as idéias, préticas e valores da modernidade, definidos de acordo com 0 sabor da temporada (liberal, nacionalista, marxis- * Zia, Slovo. EL multcultralismo ols Ligica eulural del capitalism multinaciona. In: JAMESON, Frodics Zire, Slav. Estudios culturales:reflexiones sobre el mulculturalismo. Buenos Aires Paid, 1995.9. 137-188,cor ¥ 9 alueziauatowoy opeprtopour e anus soul a sods oMsUEUAyLD ogSnmsuo> e “ewns wy jyStueURUOP ssx1]9 se IUY somudRIaW seSuosapP opueIes ‘sapepnudpr sens reruztUs9poww 9s ‘SenNO No e~domna woBUO ap ‘souRDUAE owinijeqns sodnas so anb ap esstwosd ep anied sowaaap | onno Jog “soma sep seiopezruapou noid se “easodenuos si[eUOIDIPeN apepiuALO> ap apeIUOA wUUN soy} -opuingine ‘sopiajoaua sodnal sop stexprowud seSuaspp sep ovSafoad ep mn cand v aiuerp wh ourstaeiose op opSyoge vp souestawKe-oxe sop soamtjod 501 -uotuyaotu 80 no BjeuIaIEND wUt a Nsag OW XX O[ND9S OP 9 O9INDPY OU XTX O|ND -98 op seipuysowie sogrfaqar se zeaydxo aaUDIOYNSUE 9 LUDqUIE “Osst LOY, sapod nas urereuni89] se. $9 onb wos seo18ojoopr sooSnzisuod se amusutonuse euras samy sep ipdouow yoy apepnutapout e anb 1913 -seaquuas9y sogSdo9u09 seis op yopou 2 opucuonsanb ‘opuer92e * tonyjod epra eu uresedisnaed sowaijeqns sodna8 so “eno 9 eruepepro ‘eanyjod ap steauapr2o soosdoa -Wo> sep vjuowasay vu sopod nas unEieaseq seioperRnapow saitja se ag “$91 Jp s1e2 wo> somywod 2 sooSerDoou sens wa sotmrpEqns sodnas sofad sepez euo}sunjas 9 sependorde opis wor sow sep s9ped 0 weuunga} 2 weruaisns anb sesiugwagoy seippt se anb 1a9anbso souapod ogu ‘ope] onno 10g ‘oxdjoud aasap soonpurtp -tied sojdwox oys zown{ onuag a seSnogoy pzpuy g'so1]9 seu epenuo ap onsinbar owos ogSezypeiuapio0 ep Jaap!908% jes BISUps9}O eAnEpDE eI ‘etLINS Wy SoUaPOUI 9 sfeIUApID0 sai0]EA so 9 eangIn9 & “enBuy] © wHesseiOpe anb apsap ‘eprruiod 10} eue>toUrE-oWyE 0 erpuyowe woo 9p sonprarpur ap augp x OpSexodioaM w ‘yseIg Ow 2 OOIKapy 0 ‘ojdwoxo sod “unssy “stesmyno sioapiiea se stew ureaeznejuD onb see -huapr sogStuyep sod wereado ‘sose> sonno wy «,sox80u, 9 ,souipep, sodnai sop saittaptiaase sozoias sexodioour opiqes weyuiat anb epun (wop ens 9P 2 apepnuapr ens ap jeer ausMTEUOMPUNy ovStuYap LUN WeaAnKEUE soulja seaso ‘sopitp, sopensg so > ejemareng v owod ‘sose> sunsje wa, “vnpnuopt ovStuyep a op5isod -luo9 ens OLUOD WHISSE "JeUOIDEH OBSNASUOD ap sossarord sojad weRUNOJsUED -oye ‘sorpuyowe Sisoduuy eu as-nowuowrepuny youd seSu: jo waé}20 ens ap an \dxo sequen ‘srewapy sy ‘sou: uso eu ATED BIDS | uuDpOUE sJeUO}DEL SOIY -eu-sopeisy sop 9 niepy op sagSooxo se ‘omueranug “smmuapuadap sep spay tuesan2oxd ‘oss 10¢ juojo9 sauder sop onuap epeBopad og5isod ewn ap weaezo8 anb -oina soiueafiwut sop sauossaons 9 saiuapus2sap sojad sorsoduto> ops tus eouioUe sagdett-sopersg SOp souEW 9p “eu Pog Se > opSnpordas ap sosson0rd so upg ous yp seudoud sep onuawer a eapaqeAP exapliuoD Lasgy ‘SeURDHAIUE SApEPAIIOS Se -sixo onb sopepyendisop se opuepunjoxde ‘s9[9 & ,tuowepenbope,, we Sunfasiod & a oysnppxo te ‘Sose souMU UD ‘OPED ap seisjesiaayun soupau9 sop ogSisoduas © anb wsse 103 sonuatiotua svSuaiayip ap *t 38 4g ‘aser9NOssIp © efou 9 owsyeu!IpeN ap omnpar umn grade, axduras -saufoxd ov o1sodo vfas anb sjeuojaeu sapeparoos seu ovuaWa[9 WN y49Ae jouoouy ossanord tun owo> euusoU Is ¥ age jeuoeu suas siod ‘pay ‘upznpodas anb ‘soiuafiowo seSu od sooSurisip se wepuryoade 9115 ap ogden vppd epeyuediose oudusas opys war seiopertuapow se ‘snuo sepemnoura 9 seongad sooSnjos senp ‘eulapp arsap weg xapod nas ap aiuoy & a apepiunisay ens assapsod ext 8 anb wos opuazes ‘epesene opSeindod e 9 euzapour arya e ant s e weurosoredesap ogius “eonn9 9 jeamyyno oeSesytun ens 2 fo. eafio] 9 ouajd omxg tassaan ovSejndod yp o1sa 0 sod sexsodury seonyjod se ag “SorBpliaud snas ap o¥Snjossip sun 2: 3a Soy sep eLOpexIousHoWoY > eZopetuDpoU OES e ‘opmLtOD 830% vumiage no oruawEafoauiasap ‘oySeLiaqy] ‘ogSezIwuapoul ‘oySeonps ‘oF -atfiy ‘ofodsop ‘orSeafi ‘onusumonburaquis ap seanyjod se opSeyndh ‘orsa2 08 roduuy san ‘osst 40g “Jeuor>eu ORSansHOD ep ns ap ypded ou exes0j09 se.9 sasjed snas ap opSejndod ep 03+ ANSUNSIp se OuLspour O WOD eperBopaud ovdejax eng -(PA0p% ad soversidade primordial, tradicional e passiva. Tem sido uma sucesso de con- tos € negociagdes politicas e ideoldgicas ao redor da definicio das ideologias 2gemdnicas e da modemidade e, também, em tomo da definigio da prépria 1gho, Destes processos tém participado os diferentes grupos que integram as cciedades americanas, tanto dominantes como subalternos, os quais se re- sfinem constantemente a partir deles. ma nova periodizagao A partir destas idéias, apresentarei a seguir uma proposta de period © geral das relagdes entre Estados-nagies © grupos étnicos, que se pode slicar 4s nagdes americanas que se tornaram independentes nos séculos XVIII XIX. Os perfodos que proponho nao sio etapas necessirias que foram sexu 1s por todos os Estados-nagées, nem marcam uma integragio progressiva dos upos étnicos nas comunidades nacionais; assinalam, na verdade, mudangas | maneira como foram definidos tanto a nagdo como os grupos étnicos bem. descont zaco € uma hip6tese de trabalho e como tal est aberta a ajustes e corre- ves. A idéia € que sirva para compara os processos histéricos de cada pais, ssaltando suas semelhangas e diferengas. Por outro lado, no pretende, de histérias das ridades nas relagies interétnicas. Este exercicio de petio- :nhuma maneira, abarcar e explicar todos os aspectos ges americanas, mas unicamente os que se vinculam com as relagies terétnicas, ainda que também espere mostrar quéio centrais estas 12 ra a evolucio politica e social de nossos paises, Proponho a existéncia de quatro grandes perfodos para as relagdes in- rétnicas dentro dos Estados-nagies americanos independentes, quatro pe- rdos que estio divididos por épocas de crises, freqiientemente v ses perfodos so: 1) O das magdes estamentais (da independéncia A segunda metade do século XIX); 2) O das repiiblicas liberais discriminatérias (do século XIX a primeira metade do século XX); 3) O das repablicas integradoras (da primeira metade ao final do sécu- lo XX); 4) O dos regimes multiculturais (do final do século XX aos dias de hoje) lentas. 1) O perfodo das nagdes estamentais Depois da independénci: nham importantes populagées amerindias ou afro-americanas mantiveram as pectos-chave das relagdes interétnicas que haviam imperado durante sua etapa colonial, particularmente as formas de classificagio e discriminagdo que permitiam a superexploragéo dos incligenas e escravos. No primeiro caso, os paises andinos (Peru, Bolfvia ¢ Equador) e tam- bem a Guatemala mantiveram um regime de tributagio especial para a pop: lacdo indigena. £ bem conhecido que Simén Bolivar tentou climinar o tribu- to indigena no Peru, mas descobriu muito rapidamente que era a principal fonte de ingressos fiscais do Estado e se vit obrigado a restauré-lo. A manu- tengo destes tributos implicou 2 continuidade das distingdes entre as anti- 08 castas coloniais e, portanto, uma contradigio flagrante com qualquer concepgio universal e igualitéria de cidadania."® Em segu de discriminacio ¢ exploragio enfrentow a tesisténcia das populagdes indigenas ¢ também de setores modernizadores das elites, que o consideravam um obsticulo a0 progresso nacional, nao ape- has pot razGes de principios, mas porque se baseava na manutengio da unida- de entre os indigenas e suas terras e impedia, assim, a apropriagio direta desta pelas estncias e a exploragao direta dos indigenas como mao-de-obra. No segundo caso, Estados Unidos, Brasil ¢ Cuba (que ainda nao era independente) mantiveram a escravidio dos afi uma instituigao-chave para o funcionamento de sttas economias. Este escra- vismo do século XIX quase todas as nagées americanas que t la, este regi anos e afto-americanos como. 1 foi uma sobrevivéncia anacronica do periodo ance- rior, mas uma expansio em todos os aspectos: o ntimero de eseravos aumentow em Cuba © nos EUA; 0 trafico para Cuba e Brasil foi incrementado; a 4 eogrifica e 0s tipos de atividades que empregavam a mio-de-obra escrava nos (és paises expandiram-se."” Em todos os casos, continuagio ¢ expansio do escravismo signitica- Tam um crescente conflito politico, tanto com a popu lo escrava € os grue * Bowitta, Heracho, Estrmetura y aniculeién politica de las comunidades indigenas de los Andes Centrales con sus estado macionaes. In Rens, Leticia (ed), La reinianisacion de América: Sito IX. México: Siglo XXIEditores, 1997, pp. 95108, * Dectes, Carl N. Neither Blick nor White: Slavery and Race Relations in Brasil and the United States: Madison: University of Wisconsin Pres, 1986: BIvaR MASQUE, Rafael de, Feitoresdo compo, Imisingnias da mente: senhores,letrados eo controle das ecravos nas Americ, 1660-1860. $0 Paulo: Companhiadas Letras, 2004 105€ afro-americanos libertos como entre as elites governantes, pois alguns 8.0 criticavam como uma instituigdo que impedia o verdadeiro progres- seus paises. O movimento abolicionista foi ganhando forga e se tornou dversirio significativo da ordem estabelecida.” © final das nagées estamentais, na segunda metade do século XIX, © marcado por insurreigdes na Guatemala, Cuba e Equador, por uma enta guerra civil nos Estados Unidos ¢ por uma mudanga de regime no Brasil perioclo das reptblicas liberais discriminatorias Estes regimes se caracterizavam pela adocio do prinefpio liberal da lade universal dos cidados, mas ao mesmo tempo pela implantacéo de $ de exclusio e discriminagio que privavam amplos setores de sta po: fio da cidadania ou impediam seu exercicio pleno. Ao mesmo tempo, os mandatirios desses regimes realizaram campa- militares para submeter € despojar de suas terras as sociedades amerin- dependences, que viviam além das fronteiras de controle efetivo dos nos dos Estados-nagdes. Igualmente, implantaram reforms legais para ver as formas de propriedade comunitéria dos indigenas e dos ex-escra- buscaram formas de explorar diretamente a mao-de-obra desses grupos ascentes setores da agricultura, mineragio e industria de exportacéo. ‘Também adoraram 0 “embranquecimento” de stias nagées como objeti- atral de suas politicas de modernizacio, fomentando a imigragtio euro- com a esperanga de conseguir a dissolugio ou o deslocamento dos gru- 3o-brancos. Estes regimes geraram novas formas de integracio de seus paises a0 do mundial em expansio, principalmente como exportadores de produ- mericanos, ¢ também como ricolas e minerais, no tores industriais, no caso dos Estados Unidos e, incipientemente, de 5 outros paises. Em cada um destes terrenos, os regimes liberais acompanharam a im- © dos principios explicitos de igualdade liberal, com uma série de priti- mais ¢ informais, que geraram diferencas emergentes ¢ afetaram ser todos os grupos subalternos. wo dos patses latino- se, Jacob. A eseravidlo reailradn Sao Paulo: Axia, 1990. © caso do México metece ser mencionado em primeiro lugar porque foi o tinico pas com uma populagio amerindia ¢ afto-americana significativa que nio passow pela etapa estamental, mas proclamou, desde sua indepen- déncia, a igualdade universal, ainda que os prine(pios liberais tenham demo- rado mais de 50 anos para impor-se. Desde meados do século XIX, implanta- tam-se politicas e reformas legais que tendiam a desteuir a propriedade indf- gena comunitéria € provocaram um longo e violento ciclo de insurreigbes camponesas, que terminaria apenas no século XX."! Igualmente, empreende- ram-se campanhas violentas para submeter os indios “bravos” do norte do pas ¢ os rebeldes da penfnsula de Iucata. Mas as politicas de embranqueci- mento por meio da imigragio européia fracassaram, e 0 pafs niio conseguit seu desejado “clareamento” populacional. A partir de 1870, 0 triunfante regime liberal na Guatemala implantou politicas similares, mas ainda mais radicais. Para comegar, despojou as com nidades indigenas de suas melhores terras e depois instaurou o trabalho for- ‘ado dos indigenas nas fazendas exportadoras que se instituitam nessas mes- mas terras, muitas delas propriedade de imigrantes europeus recém-chega- dos. Ainda que estas politicas paregam contradizer os princfpios liberais de igualdade universal, so, na realidade, uma manifestacao particularmente explicita das dimensoes discriminatérias e excludentes do liberalismo ameri- cano e de sua capacidade de gerar diferengas e segregar os setores subalter- nos. Por isso, stia diferenga com os outros regimes liberais é de grau ¢ nao de qualidade. Nas reptiblicas andinas, os regimes liberais mantiveram priticas politi: cas que exclufam efetivamente da cidadania as maiorias indigenas por meio de mecanismos senhoriais de controle politico, como o “gamonalismo” perua- no." Isto impediu que neste pais se liberasse a mio-de-obra indigena para o desenvolvimento da economia de exportacio, o que facilitou a importagéo. de trabalhadores da China e do Japao em fins do século XIX. 2 Karz Friedrich, Lasrebelionesrurales enol México precortesianoy colonial ns ide) Revuela, rebel yrevoluctin: a lucha rural en el México del XVI al siglo XX. Meco: Editorial Era, 1990, 1-65.95 Problemas de México}; Ress, Leticia. Las rebelones canpesinasen Mexico (1619-1906). Mésxico: Siglo XXI Editores, 1986, (Coleeein América Nuestra, Caminos de Liberacién) *® Camwack, Robert M. Spanith-ledian Relations in Highland Guatemala, 1800-1944 In: Maceo, Murdo: Wasseastaos, Robert (eds). Spaniards and Indians in Southeastern Mesoamerica: Essays ‘onthe History of Lincoln / London: Univesity of Nebraska Press, 1983. 215-252, ® Ossto, Juan Maria. Los sel ora. Madi: Editorial Mapfee, 1992. 107\ Primeira Repiblica brasileira compartilha muitos tragos com estes liberais, tanto pelo fomento, com muito mais éxito, da imigragio ex quanto pelas formas de exclusio que implantoti na relago com os exe 5 © 0s indigenas € pelas campanhas de expansio de suas fronteiras a 1s das populagdes indigenas independentes. ) mesmo se pode dizer dos Estados Unidos da Reconstrugio, que subs- © escravismo por novas formas de segregago dos afro-americanas aram a “Conquista do Oeste” para povoar s inde massa de imigrantes europeus, chineses € mexicano la segunda metade do século XIX, 0 auge do darwinismo social e da racial deu um novo vids as ideologias ¢ préticas discriminatétias nos ages americanos. A hererogeneidade da populacio foi concebida 11 problema bioldgico-racial que devia ser resolvide com as novas téc- » biopoder, tal como o defini: Foucault: controle da populagio, enge- acial, higienismo, insticuigoes disciplinares e educagio das massas.* ns paises, como os Estados Unidos ¢ a Guatemala, exaltou-se a busca za e se aprofundou a segregacdo como caminho para superar estes us vastos territérios com ‘m outros, como o Brasil e 0 México, propés- (0 € que as racas hibridas resultantes reunitiam todas as virtudes da nnca, da negra e da indigena, respectivamente. Nestas ideologias da yem, porém, 0 papel dominante correspondia sempre a raga branca, ‘ada como a mais evoluida. n varios paises da América, os regimes liberais discriminatétios ter 1 em violentas crises. No México, a grande Revolucio de 1910 fe- lo de rebeliGes camponesas ¢ indigenas que haviam enfrentado por adas as politics liherais de despojo de terras. 0 Brasil, © Estado Novo dos anos 1930 terminou com a primeira repti- zral e estabeleceu um regime de tipo integrador. © peronismo argen- le ser interpretado nesta mesma ditecio. 1 outros parses da América, os regimes liberais entraram em colapso va metade do século XX, mas néo foram substitufdes por um novo aque a mistura racial era 7 Michel. Soceey muse he deonuad New York: Pealog 2003 Alan, Racism, Revolution and Indigenismo: Mésico, 1910-1540. In: Gravy Rha fe), ‘of Race in Latin America. Austin University of Texas Press, 1990. p. 71-113; Scmeance, tite, Oespetieulo dis ragas:cieptists, instituigdes e questo racial to Brasil, 1870-1930, o: Companhia das Leas, 1993, rogime de relagdes interétnicas, fazendo com que o vazio de poder resultante provocasse guerras civis brutais. Na Guatemala, © governo nacionalista de Atbenz aboliu as leis de trabalho forcado dos indigenas em 1945, mas foi derrotado por uma contra-revolucio militar que abortou o processo de forma- 0 de um regime integrador, o que conduziu a uma guerra civil que duraria mais de 30 anos". Algo parecido aconteceu em El Salvador, a partir da rebe- ligo de 1931 e sua brutal repressio. Igualmente, no Peru, na década de 1960, colapsaram 0 regime liberal e suas priticas de segregagio e dominio senhorial da populagao indigena; no entanto, os governos militares populistas da época nao conseguiram consolidar um regime integrados, e 0 vazio politico resultan- te levaria ao surgimento do Sendero Luminoso 20e anos depois.” Nos Estados Unidos, por sua vez, © movimento de direitos civis dos anos 50 ¢ 60 provocou o fim do regime liberal discriminatério e conduziu diretamente ao surgimento de um regime multicultural. 3) © perfodo das repiblicas integradoras Ost identidade nacional, que permitiram a inveng3o € formagio de novas maio- rias nacionais. Estas identidades se baseavam em ideologias raciais integra- doras que glotificavam a mestigagem, ou a integragio nacional, e também ncorporavam elementos estratégicas das identidades étnicas dos grupos st- balternos (como o passado pré-hispanico e o folclore indfgena no M samba © as religides afro-americanas no Brasil ¢ © gauchismo na Argentina) Assim, permitiram que estes setores © grupos anteriormente discriminados pudessem ser incorporados 8s novas maiorias nacionais ¢ se consider partes delas." Deve-se assinalar que enquanto no México, Brasil e Argentina estas identidades integradoras se definiram a partir do Fstado, no Peru coube & esquerda revoluciondria construi-las ao redor da idealizag: caico ¢ da utopia da revolucio indigena ¢ camponesa.” nes integradores do século XX construfram definigdes novas de ico, 0 ssem. “40 do passado in- * Sum, Capel A. (ed). Guatemalan Indias an the Seae: 1540 c0 1988. Austins University of Texas Press 1990 Stent, Steve . Shining and other Paths: War and Society in Peru, 1980-1995, Durham: Duke Universcy Press, 1998. (Latin America Otherwise. ° Srarnoee, Thomas. Preto no brane. So Palos Pas Tera, sd * Fioees Gauisno, Alberto, Buscando un Jaca. entidad y topo en fos Andes Mésico: Grialho! ENCA, 1995, 109Ao mesmo tempo, o crescente poder politico, econdmico e administra: estes Estados thes permitiu implancar politicas muito mais eficazes para F sua nova definigdo de identidade nacional e para dirigit e aceletar a anga cultural dos grupos diferentes. O indigenismo mexicano e sua pol sientifica de mudanca cultural dirigida por anteopdlogos e instituci ida no Instituto Nacional Indigenista so exemplo mais claro. Da mes- saneira, o desenvolvimento dos sistemas educativos nacionais e dos meios municagio de massa permiticam que a cultura das maiorias fosse influen- de maneira muito mais profunda pelo Estado. Estas novas politicas de integragio foram acompanhadas por politicas dmicas desenvolvimentistas, que conseguiram manter altas taxas de cres- to econdmico durante periodos proton; >s setotes da populagio, ainda que também tenham aprofundado a mar- zagtio dos setores que ficaram, ou se mantiveram deliberadamente, fora ocesso de integeagio. Os regimes integradores definiam a identidade nacional em termos se buscavam a homogeneidade por meio de politicas ¢ priticas que diam a integrag3o cultural com a mistura racial. De acordo com as vgias da epoca, concebiam a nacao como um ente bioldgico cuja saiide aprescindivel manter: por i880, 08 grupos e as priticas culturais que nao tatam a seu projeto integrador-desenvolvimentista foram definidos como ismos patogénicos ¢ externos a0 corpo nacional. Os diferentes — sejam. idos e elevar o nivel de vida de ‘nas recaleitrantes, afro-americanos atrasados, imigrantes refratérios — considerados ignorantes, degenerados, anti-higignicos ¢ impuros. Por outro lado, esses Estados criaram um marco de instituigées polt vigs cotporativo, para processar os conflitos sociais entre atores politi sfinidos em termos de classe: opersitios, camponeses, militares ¢ empre- Esse marco exclufa, por definigio, as questdes étnicas. Desta maneira, ay diferengas culturais foram biologizadas ¢ definidas um problema técnico, ¢ no politico, que devia ser resolvido pelo Esta T meio de ferramentas cientificas e clinicas. Tais concepgSes nfo estio distantes do que Mark Mazower definiu como “Estado de bem-estar ", que imperou na Europa do Entreguetras e foi compartilhado pelos +s fascistas, comunistas e liberais da época.”” Rovwe solo ‘vik, Mark, Dark Continent: Euro jot La. Eindgenimen by Taumar: dent conuniad ecionesinterics la Sierra de Chuo, México tito Nacional IalgenstorINAH, 2002 Twentieth Century New York: Vintage Books, 2000. Os regimes integradores entraram em crise nas tiltimas décadas do século XX por razées miltiplas. Uma delas foi 0 surgimento dos novos movi- mentos sociais feministas, estudantis, de minorias sexuais e de esquerda radi- cal. Também as afro-americanos, os amerindios ¢ alguns grupos de imigrantes centraram sua luta na reivindicagio de suas identidades étnicas e culturais, Estes novos atores politicos se inspiraram, em parte, nos movimentos anticolonialistas da Asia e Africa & no movimento de diretos civis dos Estados Unidos. Os regimes integradores nao foram capazes de incorporar estas rei- vindicagées as definigGes raciais e organicistas da nagao e, por isso, nto pur deram enfrenté-los com suas ferramentas politicas e técnicas tradicionais. Ao mesmo tempo, os Estados fortes que haviam “brilhado” como ce tro dos regimes integradores comegaram a desmoronar. Por um lado, nao pu deram processar as divergéncias politicas e eairam num autoritarismo auto- descrutivo. Por outro, perderam a capacidade para dirigir e impulsionar o desenvolvimento autonomo de seus paises, ¢ as profuundas crises econdmicas do fim do século terminaram por destruir sua legitimidade. 4) O periodo dos regimes multiculturais Na atualidade, a maioria dos pafses americanos tem transitado ou est transitando em diregdo & constituigio de regimes multiculturais. Este novo paradigma para as relagées interétnicas parte da premissa de que as diferen- «gas culturais € éinicas entre os grupos que constituem as nagdes sto realidh des essenciais e inquestionaveis e que os sistemas politicos devem eflet-las € preserviclas. As comunidades politicas formalmente igualitérias dos regimes liberais © as nagoes organicas das regimes integeadores foram substituidas por conglo- merados de grupos diferentes, articulados geralmente sob a forma de uma maioria dominante frente a uma ou 1 is minorins suhalternas. O papel do Estado nestes regimes & garantir os direitos das minorias, sem, com isso, colo- car em perigo a hegemonia da maioria. Paralelamente, o Estado deve se encarrogar de obtet a integragio mais eficiente possfvel da economia nacional & economia global, garantindo 0 vre fluxo de capital e de mercadorias, a docilidade da forga de trabalho e as melhores condigdes possiveis para o investimento do capital em seu territério. Por isso, como prope Slavoj Zizek, o limite inegocisivel que se impée & minorias num regime multicultural é no colocar em risco a légica da acumu- lacao do capital. Os grupos diferentes podem expressar suas diferengas no m4alcural, ¢ inclusive politico, mas todos devem submeter-se as leis do. © s condicées impostas pelo capital global. ntro desta ligiea ios haviam construido em etapas anteriores e nao concebem mais as s como um problema politico ou técnico a ser solucionado. Por isso, am para que as redes mundiais de comércio e de migracao incorpo- versos grupos de suas populagdes, abrindo as tltimas fromteiras co- tettivotiais, biol6gicas € gendmicas ao despojo em beneficio da acu- Jo capital. O resultado foi uma situacio que Héctor Diaz-Polanco no etnofagia, na qual a diversidade cultural ¢ deixada & mereé do e do sistema capitalista global, para que estas forcas minem suas refuncionalizem em seu proprio beneffcio.”” isso, nos regimes multiculturais, as diferencas étnicas se tornam tunidade mercantil: os diferentes grupos sto redefinidos como ni- tercado ¢ seus costumes ¢ valores sio refuncionalizados como prati- ates de consumo. Ao mesmo tempo, as caracteristicas culturais mais 18 dos amerindios, afto-americanos e imigrantes de todas as origens ormadas em mercadorias que satisfazem o apetite global pelo exotis- nostalgias da new age. Estas diferencas emergentes sio funcionais ‘ia do mercado e 0s Estados-nacoes renunciaram as atribuigies que ‘ema enquanto legitimam e confirmam a suprem: : novo regime comegou a se formar nos Estados Unidos na década quando 0 Estado incorporow legalmente as principais demandas do 0 de direitos civis dos affo-americanos e, por sua vez, evitou que cordem social. O resultado foi o estabelecimento ema que mantinha a segregagio tradicional entre os grupos étnicos sempre em termos taciais, como branco, negro, indigena e hispa- :riava mecanismos para repartir melhor entre eles as oportunidades 38 € educativas, os contratos governamentais e os servicas estatais stat, Nos anos 1970, 0 Canada adotou um regime parecido para © emergente nacionalismo dos franco-falantes de Quebec e os os amerindios, batizando-o como multicultural. * isse a subverter a p78 160, Hetoe Flap de da diversiad global litres, 2006, (il. Cina mutculturl una oor bral de los derechos de ls minora. Batcelona 6. (Pais, Estadesy Soxielad). 3 multculeuraidad yewnfagia. Ménicos Nos tiltimos 20 anos, este paradigma se estendeu a outros pafses da América. No caso da Nicaragua, Equador, Colémbia e México, também foi uma resposta do Estado € das elites ao surgimento dos movimentos pol amerindios e afto-americanos, buscando sempre enquadrar as demandas por rmucangas no terreno das reivindicagies minoritirias. Potém, como aconteceu com os regimes de relagées interétnicas ante~ riores, 05 grupos subalternos ou as minorias, segundo a linguagem multicultu- ral, tém enfrentado e resistido ativamente 3 imposigio deste novo sistema, particularmente no ponto-chave da expansio da fronteira do despojo e a subordinagao subseqiiente das “novas” regiSes e grupos ao sistema capitalista mundial, Os movimentos amerindios tém defendido concepgdes de autono- mia cultural e territorial que implicariam colocar travas efetivas ao capital, ctiando espagos onde a I6gica de sua acumulagio poderia estar subordinada a valores e pritticas culturais diferentes. No entanto, os governos reconhecido estas pretenses de autonomia e propdem outras formas, muito mais limitads, as quais, longe de assinalar limites para a légica de acumula- jo tem io capitalista, permitem legitim: deste enfrentamento se encontram as disputas sobre as definigies de territo- rialidade e 0 controle dos recursos naturais, sobre o reconhecimento da pro- priedade intelectual tradicional e a biopirataria e sobre o estabelecimento de reservas ecolégicas nas zonas de assentamento de grupos amerindios afro- americanos. ¢ estendé-la. Entre as manifestagies As possibilidades da invengio Espeto que estas reflexDes tenham permitido ver a maneira complexa e mutavel pela qual as diferengas étnicas tém sido construidas ¢ modificadas a0 longo da hist6ria nos paises ameticanos. Estes processos sf, sem diivida, muito mais complexos que o esboco apresentado neste texto. Interessava-me apenas mostrar © que considera suas linhas principais para refletir sobre a natureza das categorias € das identidades étnicas. Enfatizar o fato de que as etnicidades sio inventadas significa reco- nhecet os modos pelos quais foram criadas e modificadas e também a maneit ‘como as reproduzimos em nosso presente. Significa também mostrar os meca- niismos de dominagio, despojo e exploragio que as construfram e utilizaram, mas, também, a maneira pela qual as identidades étnicas serviram para sus- tentar as Tutas © as negociagbes dos grupos subalternos. Significa, finalmente, 113sorter sSy-0-9g07 80m O28 OWESNA 5 Lnjouery ‘pessoas “oyjug wo soap eweavoy ty ooyga nib 3 onpe ap stodap 9s seul 2 soye soyuejo> ure sope2adiso 22s: ap soroyo sou suss0u sH)2}294 2p jus _forupf anbuanbngyy ap ziunyy peainqy OUISTISVHE OINOLINHAL Od OVS¥WWHOS 3a SVALLWHUVN SYN SOLNAWY901S3d 4 SOSvdSa “VIHOLSIH ‘OLN3AA O ‘OLN3A 0 ‘Od O * 2 apepinba e seasnq ap 2e ‘ered onxarord wn 94201 28 Ogu apepisioalp ep o1uaUI4UOIaI O and 2 oF! euiiiew @ oeSeuunstp ep aseq € efas oKU Jem|N> apeprfemnyd eu epE ‘eueuny 9 yemyno ezonby e anb opout ap Ys anua sep-enpen ap waoue seasnq ap omuswout 0 ¥I9s XX 0]Nd9s OU ‘zaafey, “eSURLONP EP e 2 apep| tp b ssioanedurosut a se1onpentios owio> waqastios as anb seanyjod strat senp ‘soue QQz soumyn so aiueanp ‘ope[ey wigr sopeparsos sesson, 1U0D ap sewO} SeAOU sMsHOD exed prUsUIEAN juaauIa1 soutapod se anb a Zax enno 2 ewN soulEUDAtND! se anb reps