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Sabrina Plá
Universidade Estadual de Ponta Grossa
sabrinapla@gmail.com
Deste modo, como diz Freire, é inútil acreditar que essa educação que
oprime, exclui e marginaliza a população negra, venha corroborar com a
escolarização dos mesmos em igualdade de condições com os não-negros. Seria
ingênuo pensar que apenas por meio dessa educação conseguiríamos incluir os
negros na sociedade, realizando uma verdadeira transformação social. Pelo contrário,
o que percebemos é que essa escola ainda se prende e reforça o mito da democracia
racial, na qual idealiza-se uma nação unificada e igual para todos, na qual o poder
público dá um tratamento igualitário aos cidadãos, e isso é suficiente para construir e
manter a sua igualdade.
Freire era contra esse tipo de educação, que aliena, oprime e exclui.
Também, faz constantes alertas para a conscientização da população, não como uma
imposição, mas como uma atividade exclusivamente humana a partir da sua
realidade, fazendo um chamamento em favor da democratização da sociedade e da
escola. Daí a defesa de uma educação como prática da liberdade, na qual superando
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a visão mais ingênua pela visão mais crítica da sociedade, poderíamos dar conta dos
desafios postos para uma educação adequada aos dias atuais.
iguais aos negros. Para que essas ações sejam realmente efetivas, há que se
oferecer muito mais do que cotas nas universidades, e também garantir condições
materiais para que as dificuldades possam ser superadas. Essas propostas precisam
vir acompanhadas de outras medidas, como melhoria do ensino básico público,
redistribuição de renda, reforma tributária, reforma agrária, etc.” (SILVA, 2003 apud
BRANDÃO, 2005).
O debate sobre a questão das cotas pra ingresso nas Universidades Públicas
Brasileiras segundo Brandão (2005) iniciou-se no meio da década de 1990, com
ações ligadas à questão educacional, promovidas por organizações não
governamentais (ONGs). A participação da delegação brasileira na Conferência de
Durban, em 2001 foi um outro marco decisivo. Em 2002, o debate sobre cotas para
negros reaparece com a criação da Universidade da Cidadania Zumbi do Palmares,
bem como a partir de várias universidades brasileiras como a Universidade do Estado
da Bahia (UFBA), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade
Federal do Paraná (UFPR), que anunciaram a reserva de vagas no vestibular para
alunos negros. Entre as Universidades que participam deste movimento, está também
a UEPG.
escolas públicas e 195 (28,3%) candidatos oriundos das escolas públicas. Como
podemos observar no gráfico 1:
GRÁFICO 1
1ºVESTIBULAR 2007
Vagas
4000
Vagas para escola
3000 pública
2024 Candidatos escola
2000
pública
1000 690 448
195 Vagas para negros
47 165
0
1 Candidatos negros
1
Uma amostra disso está no texto seguinte, retirado da comunidade do Orkut “COTAS NÃO UEPG”:
"agora quem estuda a vida toda,se dedica,chega na hora e perde a vaga pra um vagabundo..."; "aqui
eh pros cara q naum passaram por causa desses nego caipora" e "se fossem mais inteligentes os
brancos seriam os escravos".
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GRÁFICO 2
2º VESTIBULAR 2007
Vagas
8000 7210 Candidatos total
7000
6000 Vagas universal
5000 4379 Candidatos universal
4000
2585 Vagas para escola pública
3000
2000 Candidatos escola pública
759
1000 449 256 246
54 Vagas para negros
0
1 Candidatos negros
GRÁFICO 3
1.600 1.482
1.323 1.345
1.400
1.184 1.217
1.200 1.068
1.000
1º VESTIBULAR
800
2º VESTIBULAR
600
400
200
0
COTA 1 COTA 2 COTA 3
Outro dado importante que se deduz desse gráfico é que a diferença média
entre as pontuações dos cotistas diminuiu, não porque os candidatos a cota de
2
Resolução UNIV n.º 9 de 26 de abril de 2006: Art. 6º Dentro do prazo fixado no art. 5º, os limites
mínimos definidos no § 1º do art. 1º serão aumentados: I- 5% a cada ano para estudantes oriundos de
Instituições Publicas de Ensino; II- 1% a cada ano para estudantes negros oriundos de Instituições
Públicas de Ensino.
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segundo vestibular é um fenômeno constante ao longo do tempo.
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reservadas para alunos negros, não houve candidatos inscritos em 12 cursos. Pode-
à cota de escola pública. Resta saber se esse fenômeno é linear, ou seja, se a
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MÉDIAS 2º VESTIBULAR COTA 1
3
O PSS se constitui numa modalidade alternativa para ingresso no ensino superior, através do
acompanhamento do desempenho do aluno nas três séries do ensino médio (Provas de
Acompanhamento I, II e III). A UEPG reserva 25% das vagas ofertadas em seus cursos de graduação
para esse sistema de seleção. A escolha da graduação ocorre na terceira etapa do processo (prova de
Acompanhamento III). Para habilitar-se às vagas ofertadas, o candidato precisará ter pontuação média,
nas três etapas do sistema, igual ou superior a 50%.
4
Foram selecionados seis cursos, um por setor da UEPG, sendo que estes apresentam o maior desvio
padrão da cota 3 com relação a cota 1.
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são de escola pública, ou seja, sem as cotas apenas 6 candidatos da cota universal
seriam beneficiados. Assim as cotas permitiram o acesso de oito candidatos pela cota
2, o que representa 20% das vagas.
No curso de Direito Noturno, das setenta vagas, quarenta e duas foram
preenchidas com a cota 1, treze com a cota 2 e quatro com a cota 3. Contudo dos
setenta mais bem classificados, sete são de escola pública. Assim, somente seis
candidatos da cota universal seriam beneficiados sem a política afirmativa, mas com
ela os candidatos das cotas 2 e 3 foram beneficiados: dezessete candidatos, o que
representa 2,4%.
No curso de Física – Noturno, das trinta vagas, vinte foram preenchidas com a
cota 1, nove com a cota 2 e uma com a cota 3. Dos trinta mais bem classificados,
nove são de escola pública, ou seja as cotas não interferiram para os candidatos da
cota 1 e cota 2. Para os candidatos pela cota 3, entretanto, o sistema de cotas foi
decisivo, pois este candidato não entraria sem o mesmo.
No curso de Letras - Português/Inglês - Noturno das vinte e quatro vagas, doze
foram preenchidas pela cota 1, nove pela cota 2 e um com a cota 3. Dos vinte e
quatro candidatos mais bem classificados no vestibular, doze são de escola pública.
Neste caso o sistema de cotas foi decisivo para a cota 3, não interferindo na cota 1
pois o próximo candidato que entraria seria da cota 2.
No curso de Odontologia, das 60 vagas ofertadas, mais da metade foi ocupada
pela cota 1, com trinta e cinco alunos, sete alunos da cota 2 e três alunos da cota 3.
Dos sessenta mais bem classificados, 2 são de escola pública, ou seja, sem as cotas
apenas dois candidatos da cota universal seriam beneficiados. Com o sistema de
cotas, 10 candidatos negros e oriundos de escola pública puderam ingressar nesse
curso.
Finalmente, cabe observar que os dados analisados neste texto referem-se ao
primeiro resultado dos Vestibulares 2007 da UEPG, sem levar em consideração as
matrículas não efetivadas, por qualquer motivo, nem as efetivadas por força de
convocações adicionais ou por determinações judiciais e, excluindo também o
universo dos alunos que optaram pelo PSS. Certamente, estudos posteriores sobre o
desempenho dos alunos, cotistas e não-cotistas, nos cursos da Universidade,
deverão levar em conta essas alterações.
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SABRINA PLÁ
Possui graduação em Pedagogia, com ênfase em Gestão e Séries Iniciais e
Especialização em Educação Científica e Tecnológica. Tem experiência na área de
Educação, com ênfase em Ensino-Aprendizagem. Atualmente é mestranda do
Programa de Pós-Graduação-Mestrado em Educação da UEPG.
REFERÊNCIAS
BRANDÃO. C. da F. As Cotas na Universidade pública Brasileira: será essa o
caminho? São Paulo: Autores Associados, 2005.
CANDAU. V. M. “A diferença na universidade ainda é mais um esbarrão do que um
encontro”. In: GARCIA, R. L. ZACCUR, E. (orgs.). Cotidiano e diferentes saberes.
Rio de Janeiro: DP&A, 2007; p. 41 - 58.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 11ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
_____; SHOR, I. Medo e ousadia - o cotidiano do professor. 4ª ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1986.
UNIVERSIDADE Estadual de Ponta Grossa. Resolução UNIV nº. 9, de 26 de abril de
2006.
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