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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO ​LATO SENSU

ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO TRIBUTÁRIO

MÓDULO: TRIBUTOS FEDERAIS (60 hrs/a)


PROF. MSC.GIOVANNI CHRISTIAN NUNES CAMPOS

A INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI FEDERAL Nº 13.670/18 E O DIREITO


DOS CONTRIBUINTES À COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA NO REGIME DE
APURAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA PELO LUCRO REAL COM
RECOLHIMENTOS MENSAIS POR ESTIMATIVA

Cleber Augusto de Souza Barbosa


Graduado em Direito pela UNICAP
Pós-graduando em Direito Tributário pela UNICAP
Advogado

1. INTRODUÇÃO

Recentemente, o Brasil passou por um momento de grave instabilidade política e


econômica, decorrente do movimento paredista, de âmbito nacional, promovido pelos
caminhoneiros. A greve, que durou cerca de onze dias, deixou o país numa situação de
crise de abastecimento de gêneros alimentícios e combustíveis, além de produzir um
impacto grave sobre o orçamento, em razão da perda de arrecadação oriunda dos dias de
paralisações das atividades no país.

Após uma intensa negociação entre o governo e os representantes da categoria


dos caminhoneiros, foi aprovado um pacote de medidas que estavam na pauta de
reivindicações dos grevistas, notadamente, a redução do preço do óleo diesel, que foi
levada a cabo, pelo Governo, por meio de renúncias fiscais relativas ao PIS e à COFINS
incidentes sobre a produção desse tipo de combustível. Segundo projeções oficiais1, a
greve dos caminhoneiros causou um impacto no orçamento de R$ 15,9 bilhões de reais,
o que representa cerca de 0,2% (zero vírgula dois por cento) do PIB.

Diante desse cenário, na tentativa de minimizar os impactos orçamentários


provocados pelas concessões que foram dadas aos grevistas, o Poder Executivo
encaminhou ao Congresso Nacional um projeto de lei para a reoneração da folha de
pagamento de alguns setores de produção.

1
Os dados são da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, que realizou um estudo
para avaliar o impacto da paralisação dos caminhoneiros, o qual está disponível no sítio eletrônico:
http://www.fazenda.gov.br/noticias/2018/junho/greve-dos-caminhoneiros-impacta-a-economia-em-cerca-
de-r-15-9-bilhoes
A Lei Federal nº 13.670/18, que foi sancionada pelo Presidente da República,
além de promover a reoneração da folha de pagamento para mais de vinte e oito setores
de produção, provocou uma relevante modificação no regime de compensação de
créditos tributários federais, pois suprimiu o direito dos contribuintes de se utilizarem de
créditos, que, eventualmente, tenham a seu favor, quando estes tiverem por objetivo a
compensação de débitos oriundos dos recolhimentos mensais por estimativa, no regime
de apuração do IRPJ pelo Lucro Real.

A alteração na sistemática de compensação de créditos tributários federais, que


foi realizada pela Lei Federal nº 13.670/18, a partir da inclusão de um inciso, no art. 74
da Lei Federal nº 9.430/96, ostenta traços evidentes de inconstitucionalidade e
ilegalidade, que merecem, portanto, maiores considerações.

Busca-se, portanto, neste breve estudo, analisar as modificações promovidas


pela Lei Federal nº 13.670/18, no que pertine, especificamente, à questão da
compensação de créditos tributários, passando, porém, pelo exame dos aspectos gerais
do Imposto de Renda e dos seus regimes de apuração.

2. O IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER


NATUREZA

2.1. Antecedentes históricos

A partir do momento em que o Estado passa a ser custeado precipuamente por


receitas de natureza não patrimonial, isto é, por receitas decorrentes da imposição do
poder de tributar, é que surgem a maioria dos tributos. O nascimento do imposto de
renda, portanto, está ligado, efetivamente, à transição do Estado Patrimonialista para o
Estado Fiscal2.

Os antecedentes históricos mais remotos do imposto de renda são encontrados


na Inglaterra, no final do século XVIII, período no qual o tributo foi instituído com a
finalidade de custear guerras3, sobretudo, aquelas travadas entre os ingleses e franceses,
à época de Napoleão Bonaparte. Nessa época, porém, a cobrança do tributo tinha
natureza excepcional, que era justificada por questões beligerantes.

Mais recentemente, já no século XX, o tributo passa a integrar a maioria dos


ordenamentos jurídicos dos países civilizados, sobretudo, após a primeira Guerra

2
TORRES, Ricardo Lobo. ​Curso de direito financeiro e tributário. 17ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2010. p. 379

3
BALEEIRO, Aliomar. ​Uma introdução à ciência das finanças. 17ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2010. p. 407
Mundial, e, hoje, é um tributo adotado, praticamente, em todo o mundo, à exceção de
alguns países considerados “paraísos fiscais”4.

No Brasil5, o imposto de renda apareceu pela primeira vez, numa Constituição,


em 19346, no art. 6º, I, “a”, do texto constitucional, embora já estivesse presente, no
nosso ordenamento jurídico, desde 1922, e tivesse havido tentativas frustradas de o
implementar nos anos 1848, 1864 e 1870.

2.2. Arcabouço normativo

Atualmente, a disciplina normativa do Imposto de Renda e Proventos de


Qualquer Natureza, espraia-se da Constituição da República de 1988 para a legislação
infraconstitucional (Código Tributário Nacional e as Leis Federais nº 7.713/88,
9.250/95, 8.981/95 e 9.430/96) e, em seguida, num movimento natural de afunilamento
de suas especificidades, deságua no âmbito dos regulamentos (Decreto nº 3.000/99) e
dos diplomas infra-regulamentares (Instruções Normativas da RFB).

Recentemente, inclusive, a Receita Federal do Brasil promoveu a consolidação


dos diplomas normativos infra-regulamentares do Imposto de Renda, a partir da edição
da Instrução Normativa nº 1700/20177.

Diante de tantas nuances, constata-se, por evidente, que o disciplinamento


normativo do Imposto de Renda, por ser extremamente complexo e vultoso, torna a
compreensão e o estudo deste tributo uma tarefa quase que hercúlea.

2.3. Competência para instituição e funções

A Constituição da República outorgou à União Federal a competência para a


instituição do Imposto de Renda (art. 153, III, da CR). Trata-se de um tributo cuja

4
Sobre os ditos “paraísos fiscais” é interessante fazer uma consulta à Instrução Normativa nº 1.037/10,
da RFB, que apresenta uma extensa relação de países com este perfil, a qual está disponível no sítio
eletrônico: ​http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=16002

5
Para uma interessante e didática exposição cronológica do Imposto de Renda, no Brasil, acesse o sítio
eletrônico da Receita Federal, no link:
http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/memoria/imposto-de-renda/cronologia-do-imposto-de
-renda

6
A íntegra da carta constitucional de 1934 está disponível no sítio eletrônico:
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1930-1939/constituicao-1934-16-julho-1934-365196-publicac
aooriginal-1-pl.html

7
Disponível a íntegra da IN RFB 1700/2017 no sítio eletrônico:
http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=81268
finalidade é eminentemente fiscal, sendo, inclusive, uma das maiores fontes de
arrecadação8 dentre os impostos de competência desse ente da Federação.

Destaque-se, entretanto, que embora o Imposto de Renda tenha natureza


precipuamente fiscal, ele tem servido, também, como instrumento de intervenção do
Estado sobre o domínio econômico, a partir, por exemplo, da concessão de incentivos
fiscais com o objetivo de estimular determinado setores.

Frise-se, ainda, que a capacidade tributária ativa da União Federal contempla o


exercício da competência legislativa plena, o que lhe possibilita, eventualmente, realizar
a delegação das funções de fiscalização e arrecadação desse tributo (art. 7º do Código
Tributário Nacional).

No passado, por exemplo, ocorreu a delegação a uma autarquia federal (INSS),


das atribuições de fiscalização e cobrança das contribuições previdenciárias. Embora
seja improvável, nada impede, porém, que a União Federal, ao invés de fiscalizar e
arrecadar o Imposto de Renda a partir de um órgão da Administração Direta, isto é,
dentro de sua própria estrutura, como ocorre, hoje, aliás, com a Receita Federal do
Brasil, opte, futuramente, por descentralizar tal atribuição.

2.4. Principiologia Constitucional

As limitações ao poder de tributar, que se desdobram nos princípios e garantias


constantes da Constituição da República, representam verdadeira salvaguarda dos
direitos fundamentais. A constitucionalização do Sistema Tributário Nacional não deve
ser considerada, apenas, como um obstáculo à realização de reformas tributárias mais
audaciosas, mas, sobretudo, como um vetor interpretativo que impõe aos operadores do
direito a adoção de posturas capazes de privilegiar a consagração dos direitos
fundamentais9 dos contribuintes.

Com relação, especificamente, ao Imposto de Renda, não poderia ser diferente,


aplicando-se-lhe, dessa forma, toda a principiologia constitucional na
operacionalização, pela União Federal, desse tributo. Logo, ao Imposto de Renda são
aplicáveis os princípios da legalidade estrita, isonomia, capacidade contributiva,
preservação do mínimo essencial, anterioridade de exercício, irretroatividade, proteção à
confiança do contribuinte, não afetação e a observância das imunidades em relação às
rendas dos entes por elas beneficiados. Não se submete, porém, o Imposto de Renda, à
anterioridade nonagesimal.
8
Estudo da RFB sobre a carga tributária no Brasil em 2017, disponível no sítio eletrônico:
http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-aduaneiros/estudos-e-estatistica
s/carga-tributaria-no-brasil/carga-tributaria-2016.pdf
9
TORRES, Ricardo Lobo. ​Curso de direito financeiro e tributário. 17ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2010. p. 63
Além disso, há outros princípios ou garantias que são especificamente aplicáveis
ao Imposto de Renda, quais sejam: a generalidade, universalidade, progressividade e a
proibição de discriminação de rendas.

2.5. Regra-matriz de incidência do Imposto de Renda

2.5.1. Elemento material

O elemento material da regra-matriz de incidência do Imposto de Renda é a


aquisição, pelo contribuinte, de disponibilidade econômica ou jurídica de renda e/ou
proventos de qualquer natureza, conforme a previsão constante do art. 43 do CTN.

Disponibilidade econômica é aquela de fato, ou seja, o valor que ingressa no


patrimônio do contribuinte e, efetivamente, resulta num acréscimo patrimonial.
Disponibilidade jurídica é aquela que resulta de direitos de crédito que estão à
disposição do contribuinte. Neste último caso, deve-se ter cuidado, pois, caso haja
qualquer obstáculo ao contribuinte que implique na impossibilidade de disposição do
crédito, não se poderá considerar ocorrido o fato gerador do Imposto de Renda.

Considera-se como renda quaisquer acréscimos patrimoniais decorrentes do


capital e/ou do trabalho. Quanto aos proventos de qualquer natureza, podem eles ser
caracterizados, de forma residual, como quaisquer outros acréscimos patrimoniais que
não decorram do capital e/ou do trabalho, como, por exemplo, o recebimento de uma
pensão por morte ou de um prêmio de loteria.

Há controvérsia doutrinária, porém, no que se refere à amplitude dos conceitos


de renda ou provento, isto é, se poderia o legislador ordinário enquadrar outras espécies
de ingressos patrimoniais nesses tipos de categorias, a fim de tributar determinadas
situações pelo Imposto de Renda. Parece-nos, contudo, que os conceitos de renda e
provento, embora não tenham sido exaustivamente definidos na Constituição,
encontram limites semânticos que devem ser respeitados pelo legislador.

Por fim, é importante frisar que só estará configurado, no caso concreto, a


ocorrência do fato gerador do Imposto de Renda, quando, efetivamente, ocorrer um
acréscimo patrimonial em benefício do contribuinte. No passado, já houve a sanha do
Fisco de, por exemplo, pretender tributar o cedente pela cessão gratuita de uso de
imóvel ou os sócios de empresas por lucros e dividendos que sequer foram distribuídos
pela sociedade10. Diga-se, de passagem, que à época deste último entendimento, os
lucros e dividendos distribuídos aos sócios ainda não eram isentos do Imposto de Renda

10
MACHADO, Hugo de Brito. ​Curso de Direito Tributário.​ 32ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 320.
da Pessoa Física, pois tal mudança somente ocorreu com o advento da Lei Federal nº
9.249/95.

2.5.2. Elemento espacial

A complexidade do Imposto de Renda salta aos olhos, mais uma vez, ao se


analisar o elemento espacial da sua regra-matriz de incidência tributária. Isso porque, o
tributo, além de incidir sobre atos, fatos ou situações ocorridas no Brasil, que resultem
para os contribuintes um acréscimo patrimonial decorrente da aquisição de renda e/ou
proventos de qualquer natureza, também poderá, eventualmente, incidir sobre operações
ocorridas no exterior, conforme prevê o art. 43, § 2º, do CTN. Trata-se da doutrina do
worldwide income taxation11, isto é, a tributação da renda em bases internacionais. A
extraterritorialidade do Imposto de Renda, porém, é um tema complexo que ultrapassa o
âmbito de investigação deste trabalho.

2.5.3. Elemento temporal

O fato gerador do Imposto de Renda é periódico, por se estender no tempo de


forma reiterada, e complexivo, por englobar uma série de fatos, atos ou situações
ocorridas num determinado espaço temporal definido pela legislação. Em regra,
verifica-se, anualmente, no dia 31 de dezembro, a ocorrência do fato gerador do
Imposto de Renda, porém, especificamente, no caso de pessoa jurídica, poderá ocorrer
trimestralmente, a depender do regime de apuração adotado.

2.5.4. Elemento subjetivo

Sujeito ativo do Imposto de Renda é a União Federal, que é o ente da Federação


ao qual foi outorgada a competência constitucional para instituição desse tributo. Sujeito
passivo do Imposto de Renda será o contribuinte ou o responsável.

Quanto aos contribuintes do tributo, serão eles as pessoas físicas ou jurídicas que
adquirirem disponibilidade econômica ou jurídica de rendas e/ou proventos de qualquer
natureza. Consigne-se, neste ponto, que há, ainda, na legislação do Imposto de Renda,
as pessoas jurídicas por equiparação e que o fato de tais entes não estarem regularmente
constituídos não tem o condão de elidir a imposição tributária, nos termos do art. 126,
III, do CTN.

Além disso, na legislação do Imposto de Renda, há uma série de hipóteses


específicas de responsabilidade, dentre elas, sobressai a responsabilidade daquele que

11
OLIVEIRA, Luciana Gualda. ​A elisão fiscal decorrente do planejamento fiscal: treaty shopping​.
Revista do Mestrado em Direito da Universidade Católica de Brasília. Edição nº 1, 2009.
https://portalrevistas.ucb.br/index.php/rvmd/article/download/2573/1566
tem por obrigação efetuar a retenção do tributo por ser a fonte pagadora dos
rendimentos. Neste caso, ainda que não tenha havido a efetiva retenção, de forma
intencional ou não, responderá a fonte pelo imposto devido.

2.5.5. Elemento quantitativo

O elemento quantitativo da regra-matriz de incidência tributária é composto pela


determinação da base de cálculo e pela aplicação da alíquota do tributo, a fim de que se
chegue ao ​quantum debeatur da obrigação tributária. No caso, especificamente, do
Imposto de Renda, a apuração do critério quantitativo deve levar em consideração a
existência das diferenças de tratamento legislativo do tributo, que é dado às pessoas
físicas em relação às pessoas jurídicas, o que justifica, portanto, uma abordagem em
separado dos dois regimes, ainda que sucinta.

2.5.5.1. Imposto de Renda das Pessoas Físicas

O Imposto de Renda das Pessoas Físicas tem como base de cálculo o rendimento
bruto do contribuinte, ao qual se chega a partir da soma de todos os valores que foram
por ele auferidos no ano-calendário. Ao final do exercício de competência do tributo, o
contribuinte apresentará ao Fisco uma declaração de ajuste, por meio da qual informará
a renda auferida no ano-calendário e fará as deduções que lhe são autorizadas pela
legislação, inclusive, eventuais retenções que tenham sido realizadas na fonte. Da
operação de ajuste, poderá resultar a necessidade de recolhimento de tributo ou haverá
uma restituição a receber.

Consigne-se, entretanto, que há determinadas espécies de rendimentos que se


sujeitam à tributação definitiva na fonte, como, por exemplo, os prêmios de loteria.
Além disso, há outros tipos de rendimentos que, embora não sejam tributáveis pelo
Imposto de Renda da Pessoa Física, deverão constar da declaração de ajuste anual.
Trata-se, neste ponto, de um dever instrumental que é imposto, pela legislação, ao
contribuinte, com o objetivo de que o Fisco obtenha maiores informações sobre as
transações que foram por ele realizadas ao longo do ano-calendário.

As alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Física podem variar de 7,5% (sete


e meio por cento) a 27,5 (vinte e sete e meio por cento) e estão discriminadas numa
tabela, que leva em consideração o valor da renda auferida, e possui uma parcela a
deduzir, com o objetivo de que se consagre a técnica da progressividade12. Há, ainda,
uma faixa de rendimentos que é isenta de tributação. O lançamento do tributo é feito por
homologação, nos termos do art. 150 do CTN.

12
Existem severas críticas sobre a forma como a técnica da progressividade de alíquotas é utilizada no
IRPF. Para muitos autores, a sistemática não tem o condão de consagrar a justiça fiscal, pois se trataria,
em verdade, de uma pseudo-progressividade.
2.5.5.2. Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas

O Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas possui, basicamente, quatro regimes


que são utilizados para a apuração de sua base de cálculo: Lucro Real, Lucro
Presumido, Lucro Arbitrado e Simples Nacional. Registre-se, contudo, que o regime do
Simples Nacional contempla a apuração unificada de outros tributos, além do Imposto
de Renda.

2.5.5.2.1. Lucro Real

Trata-se da forma ordinária de apuração da base de cálculo do IRPJ, por meio da


qual se busca chegar ao lucro líquido da pessoa jurídica, num determinado exercício, a
partir de adições, exclusões e compensações (art. 247 do RIR/1999). Diz-se ordinária no
sentido de que, em tese, é a forma mais precisa para a apuração do imposto de renda,
embora não seja a mais adotada, dada a sua complexidade, e nem sempre a mais
adequada para todos os perfis de contribuintes, notadamente, quando se trata de realizar
um planejamento tributário eficiente.

Da necessidade de se chegar ao lucro líquido do exercício, resulta a exigência de


que o contribuinte submetido ao Lucro Real possua um aparato contábil capaz de
realizar a escrituração regular de todas as suas operações, as quais deverão ser
materializadas no Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur).

O regime de apuração pelo Lucro Real poderá ser obrigatório em algumas


circunstâncias, por questões relacionadas, por exemplo, ao faturamento do contribuinte
ou ao tipo de atividade por ele explorada, conforme prevê o art. 59 da IN RFB nº
1.700/2017, sendo, porém, noutros casos, uma opção. A opção do contribuinte é
irretratável e deverá ser realizada, no começo de cada ano, até o último dia útil do mês
de fevereiro. A apuração e o recolhimento do tributo poderá ser trimestral ou anual com
pagamentos mensais por estimativa. O lançamento do tributo é feito por homologação,
nos termos do art. 150 do CTN.

A alíquota básica do IRPJ é de 15% (quinze por cento), havendo, ainda, uma
parcela adicional a ser paga pelo contribuinte sobre os valores que, eventualmente,
ultrapassarem R$ 20.000,00 (vinte mil reais), no regime de apuração anual com
pagamento por estimativa, ou acima de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), no regime de
apuração trimestral, cuja alíquota é de 10% (dez por cento), consoante a previsão
constante dos arts. 541 e 542 do RIR/1999.
De forma bastante singela, pode-se dizer que, do ponto de vista contábil,
efetua-se a contabilização das receitas do contribuinte, das quais serão subtraídas as
despesas e os custos de suas operações, para chegar-se ao seu lucro bruto.
Posteriormente, sobre o lucro bruto, faz-se as adições, exclusões e compensações
autorizadas pela legislação, a fim de que se chegue, então, ao lucro líquido, o qual será a
base de cálculo do IRPJ.

Registre-se, por oportuno, que havendo a demonstração de prejuízo, este poderá


ser objeto de compensação futura, nos próximos exercícios, a qual, porém, estará
limitada a 30% (trinta por cento) do lucro apurado no exercício em que se pretenda
levar a cabo a referida compensação. Nada impede, entretanto, que o contribuinte se
utilize de eventual saldo para a realização de compensação nos períodos subsequentes.

Outro fator interessante e que pode ser decisivo na realização de um


planejamento tributário, é que somente no regime do lucro real, poderá o contribuinte se
utilizar de deduções oriundas de incentivos fiscais, já que nas sistemáticas do lucro
presumido, arbitrado e do Simples Nacional, em regra, não há essa possibilidade.

Note-se, por fim, que, no caso do IRPJ, a existência de alíquotas fixas aplicáveis
ao tributo tem como consequência a consagração da técnica da proporcionalidade e não
da progressividade, o que, evidentemente, vai de encontro ao comando estabelecido no
art. 153, § 2º, I, da Constituição da República. A exceção fica por conta do regime de
apuração do Simples Nacional, que contém alíquotas progressivas.

2.5.5.2.1.1. Apuração trimestral

Caso o contribuinte opte pela apuração trimestral do IRPJ, haverá a necessidade


de elaboração de balanços trimestrais, com o objetivo de se chegar, após as adições,
exclusões e compensações autorizadas pela legislação, ao valor do lucro líquido
trimestral.

Constata-se, portanto, que tal forma de apuração exigirá um maior aparato e


organização contábil do contribuinte, já que, nessa sistemática, a tributação a ser
apurada no trimestre será definitiva, não havendo que se falar em recolhimentos por
estimativa.

O recolhimento do tributo deverá ser realizado em quota única, até o último dia
útil do mês subsequente ao período de apuração, ou em até 3 (três) parcelas, que serão
corrigidas pela taxa SELIC. Na hipótese de fracionamento, existem limitações quanto
aos valores mínimos das parcelas.
Por derradeiro, é importante chamar a atenção para o fato de que, neste regime
de apuração do IRPJ, na hipótese de existirem prejuízos, a compensação com eventuais
resultados positivos apurados ao longo dos trimestres do ano deverá obedecer a
limitação de até 30% (trinta por cento) do lucro líquido ajustado.

2.5.5.2.1.2. Apuração anual com recolhimentos mensais por estimativa

O contribuinte poderá optar, até o último dia útil do mês de fevereiro, pelo
regime de apuração anual com recolhimentos mensais por estimativa. A opção será
irretratável para todo o ano-calendário e se perfaz mediante o recolhimento, pelo
contribuinte, da estimativa de imposto devida no mês de janeiro.

Nessa modalidade de apuração, o contribuinte, embora somente tenha a


obrigação de realizar a apuração definitiva do seu lucro líquido ao final do exercício,
após o levantamento de balanço anual, isto é, no dia 31 de dezembro de cada ano, estará
obrigado a efetuar recolhimentos mensais por estimativa.

As estimativas são realizadas com base na aplicação de percentuais sobre a


receita bruta mensal, os quais constam expressamente do art. 32 da IN RFB nº
1700/2017. Da aplicação dos respectivos percentuais resultará a base de cálculo do IRPJ
e do eventual adicional de alíquota.

Ao longo de todo o exercício, o contribuinte fará os recolhimentos mensais com


base nas estimativas previstas pela legislação, e, ao final do ano-calendário, após o
levantamento do balanço anual, fará os ajustes necessários, com base na confrontação
dos valores já recolhidos. Após a realização dessa operação, poderá haver saldo positivo
a pagar de imposto ou, caso tenha havido prejuízo, saldo negativo, que poderá ser
utilizado para a compensação dos resultados positivos eventualmente apurados nos
exercícios subsequentes.

Observe-se, por oportuno, que, mês a mês, é facultado ao contribuinte a opção


de suspender ou reduzir os recolhimentos mensais por estimativa, nos termos do art. 230
do RIR/1999. A suspensão ou redução dos recolhimentos mensais poderá ocorrer, desde
que o contribuinte demonstre, por meio de balanços mensais, que os valores já
recolhidos por estimativa relativos aos meses anteriores são superiores aos valores a
serem pagos referentes ao mês em curso. Outrossim, havendo prejuízos fiscais
acumulados pelo contribuinte, nos meses anteriores, haverá a dispensa de realizar o
pagamento mensal por estimativa.

Percebe-se, portanto, com base no que foi exposto, que a sistemática de


apuração anual com recolhimentos mensais por estimativa contém peculiaridades que
permitem ao contribuinte utilizá-la como uma importante ferramenta de planejamento
tributário, quando comparada ao regime trimestral de apuração.
2.5.5.2.2. Lucro Presumido

Trata-se de forma simplificada de apuração da base de cálculo do IRPJ, que


pode ser escolhida pelos contribuintes que não estão obrigados a apurar o imposto pelo
lucro real, conforme prevê o art. 214 da IN RFB nº 1.700/2017. Nesse regime, o
imposto deverá ser recolhido trimestralmente e, portanto, a opção pela sistemática, que
é irretratável, deverá se realizar até o último dia útil do mês subsequente ao primeiro
trimestre do ano-calendário.

Na determinação do lucro presumido, deverá o contribuinte observar os


percentuais de presunção estabelecidos na legislação, consoante prescreve o art. 215 da
IN RFB nº 1700/2017. Os percentuais de presunção são variáveis, de 1,6% (um vírgula
seis por cento) a 32% (trinta e dois por cento), a depender do tipo de atividade exercida
pelo contribuinte.

Chega-se ao lucro presumido a partir da contabilização da receita bruta, da qual


serão deduzidas as devoluções e vendas canceladas e os descontos incondicionais
concedidos. Além disso, na dicção do art. 215, § 3º, da IN RFB 1700/2017, deverão ser
adicionados à base de cálculo da receita bruta alguns outros valores, como, por
exemplo: ganhos de capital, receitas de locação de imóveis, rendimentos decorrentes de
operações de mútuo, dentre outros.

A definição da receita bruta, consoante prescreve o art. 26 da IN RFB


1700/2017, compreenderá: a) o produto da venda de bens nas operações de conta
própria; b) o preço da prestação de serviços em geral; c) os resultados auferidos nas
operações de conta alheia; d) as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa
jurídica.

Interessante notar, ainda, que diferentemente do regime de apuração pelo Lucro


Real, no regime de apuração pelo lucro presumido, há a possibilidade de o contribuinte
adotar para a contabilização das suas receitas o regime de caixa (art. 223 da IN RFB
1700/2017), o que, embora exija uma maior organização contábil-financeira, poderá ser
uma eficiente ferramenta de planejamento tributário, a depender da natureza das
operações e das atividades do contribuinte.

2.5.5.2.3. Lucro Arbitrado

Trata-se de uma forma extraordinária de apuração da base de cálculo do IRPJ, a


qual estará sujeito o contribuinte, nas hipóteses previstas no art. 226 da IN RFB
1700/2017, que estão relacionadas, em regra, às situações em que haja descumprimento
da legislação ou impossibilidade material de realizar a apuração por quaisquer outros
regimes.
Nesse regime, quando a receita bruta do contribuinte for conhecida, adotar-se-á
os percentuais de arbitramento previamente estabelecidos pela legislação, com base nas
atividades e operações do contribuinte, nos termos do art. 227 da IN RFB 1700/2017.
Entretanto, nas situações em que não seja possível conhecer a receita bruta do
contribuinte, haverá a necessidade de arbitrá-la com base em critérios pré-estabelecidos
pela legislação, conforme prescreve o art. 232 da IN RFB 1700/2017.

Atente-se, por derradeiro, para o fato de que o procedimento administrativo de


arbitramento necessário à apuração do lucro do contribuinte, para fins tributação do
IRPJ, não pode se converter em arbítrio da autoridade administrativa fazendária,
havendo, portanto, que se garantir ao contribuinte o pleno exercício da ampla defesa e
do contraditório, que lhe são constitucionalmente assegurados.

2.5.5.2.4. Simples Nacional

A Constituição da República, em seu art. 179, estabeleceu a necessidade de que


fosse destinado às microempresas e às empresas de pequeno porte um tratamento
diferenciado em relação às suas obrigações, inclusive, aquelas de natureza tributária. A
consagração desse comando constitucional veio, certamente, após a promulgação da Lei
Complementar nº 123/2006, mais conhecida como Estatuto Nacional da Microempresa
e da Empresa de Pequeno Porte.

A Lei Complementar nº 123/2006, além de dispor sobre uma série de medidas,


de natureza administrativa, trabalhista e previdenciária, que são benéficas às
microempresas empresas de pequeno porte, trouxe uma verdadeira inovação, no âmbito
do Direito Tributário, ao criar o regime único de arrecadação de tributos denominado de
Simples Nacional.

O Simples Nacional permite ao contribuinte elegível a esta sistemática especial


de tratamento, efetuar a apuração e o recolhimento de seis tributos (IRPJ, CSLL,
PIS/Pasep, COFINS, IPI, ICMS, ISS e CPPJ) com base numa tabela progressiva de
alíquotas que leva em consideração o faturamento do contribuinte.

A apuração e o recolhimento dos tributos que compõem a “cesta” do Simples


Nacional ocorre, mensalmente, mediante a quitação de uma único DARF, e leva em
consideração o faturamento bruto do contribuinte, nos últimos 12 (doze) meses,
aplicando-se-lhe, ainda, uma parcela a deduzir, novidade esta introduzida, a partir de
2018, pela Lei Complementar nº 155/2016.
3. O DIREITO À COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS E A
INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI FEDERAL Nº 13.670/18

3.1. O direito à compensação de créditos tributários

O direito à compensação de créditos tributários pode ser extraído da própria


Constituição da República, por meio de uma interpretação ampla dos princípios da
isonomia, moralidade, razoabilidade e do devido processo legal substantivo (arts. 5º,
caput, L​ IV, 37 e 150, II, da CR). Afinal, não seria razoável13 impedir alguém que,
simultaneamente, seja credor e devedor de uma outra pessoa, de realizar um encontro de
contas, quando for por esta cobrado, ainda que esta última pessoa seja o próprio Estado.

Destaque-se, porém, que embora seja sedutor o entendimento de que a


compensação tributária é um instituto de índole constitucional, não se desconhece que o
Superior Tribunal de Justiça tem um posicionamento diametralmente oposto14, no
sentido de que, no âmbito tributário, para que a compensação seja levada a efeito pelo
contribuinte, deve haver lei autorizadora específica emanada do ente da Federação
titular da respectiva competência tributária.

Logo, do ponto de vista prático, não basta, apenas, a previsão genérica do


instituto da compensação de créditos tributários no Código Tributário Nacional, nos
seus arts. 156, II, e 170 e ss., para que o contribuinte tenha o direito de realizar o
encontro de contas, havendo, portanto, a necessidade de que o ente tributante edite lei
específica disciplinando a matéria.

No âmbito federal, a compensação tributária foi disciplinada pela Lei nº


9.430/96, que promoveu uma verdadeira unificação15 dos regimes de compensação
anteriormente existentes, ao prever em seu art. 74, a possibilidade de utilização, pelo
sujeito passivo, de quaisquer créditos oriundos de tributos federais, passíveis de
restituição ou ressarcimento, para a compensação de débitos tributários que possua
perante à União. Adotou-se, nesse contexto, segundo doutrina16 autorizada, a
universalidade dos créditos compensáveis, isto é, a ampla possibilidade de o sujeito
passivo utilizar-se de quaisquer créditos tributários federais, desde que eles sejam
líquidos e certos, para efetuar a compensação dos seus débitos.

13
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. ​Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao
Código Tributário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6ed. rev. atual. São Paulo:
Saraiva, 2018.

14
​STJ, AgRg no REsp 331.323/RJ, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Rel. p/ ac. Min. José Delgado, j. em
26/11/2002, m. v., DJ de 10/3/2003

15
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. ​Processo Tributário.​ 9ed. São Paulo: Atlas, 2018. p. 201.

16
Por outro lado, há um rol de limitações ao regime de compensação tributária,
que foi estabelecido pelo § 3º, do art. 74, da Lei 9.430/96, com o objetivo de abarcar
situações em que será vedada a realização da compensação tributária pelo sujeito
passivo. Mais recentemente, foi editada a Lei nº 13.670/18 que ampliou as referidas
restrições, para nela fazer incluir a impossibilidade de compensação tributária em
relação aos débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do IRPJ e CSLL.

3.2. A inconstitucionalidade da Lei Federal nº 13.670/18

No dia 30 de maio de 2018, foi publicada, no Diário Oficial da União (DOU), a


Lei Federal nº 13.670/18, que além de promover a reoneração da folha de pagamento,
para mais de vinte e oito setores de produção, fez relevantes modificações no regime de
compensação de créditos tributários federais. As mudanças realizadas decorreram da
inclusão, pela Lei Federal nº 13.670/18, de alguns incisos no § 3º, do art. 74, da Lei
9.430/96.

Dentre todas as alterações promovidas pela Lei nº 13.670/18, merece destaque,


por ser objeto deste trabalho, especificamente, o teor do seu art. 6º, que foi responsável
pela inclusão do inciso IX, no § 3º, do art. 74, da Lei 9.430/96:

“Art. 6º A Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996​, passa a vigorar com as seguintes


alterações:

“Art. 74. ..............................................................................................................................

§ 3º.......................................................................................................................................

V - o débito que já tenha sido objeto de compensação não homologada, ainda que a
compensação se encontre pendente de decisão definitiva na esfera
administrativa;

VI - o valor objeto de pedido de restituição ou de ressarcimento já indeferido pela


autoridade competente da Secretaria da Receita Federal do Brasil, ainda que o pedido
se encontre pendente de decisão definitiva na esfera administrativa;

VII - o crédito objeto de pedido de restituição ou ressarcimento e o crédito informado


em declaração de compensação cuja confirmação de liquidez e certeza esteja sob
procedimento fiscal;

VIII -​ os valores de quotas de salário-família e salário-maternidade; e

IX - os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do Imposto sobre a


Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º desta Lei. ​ ​(g. n.)

.............................................................................” (NR)
Com a modificação, suprimiu-se, portanto, o direito dos contribuintes de se
utilizarem de créditos, que, eventualmente, tenham a seu favor, quando estes tiverem
por objetivo a compensação de débitos oriundos dos recolhimentos mensais por
estimativa, no regime de apuração do IRPJ e CSLL pelo Lucro Real.

A mudança, que fora promovida à toque de caixa pelo Governo, com o objetivo
de minimizar os impactos fiscais decorrentes das concessões que foram dadas aos
caminhoneiros, após o movimento grevista que parou o Brasil, entre os dias 21/05/18 e
02/06/18, padece de graves inconstitucionalidades.

Chama-se a atenção, inicialmente, para a grave violação ao princípio da


segurança jurídica, cujo fundamento reside na própria noção de Estado Democrático de
Direito (art. 1º, CR), já que a segurança das relações jurídicas dele é pressuposto
inseparável. Nesse contexto, ganha relevo a dimensão dinâmica17 do referido princípio,
que se relacionada com a proteção à confiança do contribuinte e à intangibilidade das
situações jurídicas consolidadas.

Dentro dessa perspectiva, sabe-se que os contribuintes, ao optarem, no começo


do ano-calendário, pelo regime do Lucro Real Anual, com recolhimentos mensais por
estimativa, nos termos do art. 232 do RIR/1999, fazem-no de maneira irretratável para
todo o ano-calendário. Com isso, vinculam-se a um regime jurídico pré-estabelecido,
com todas as peculiaridades que o cercam, o qual, de outra banda, também deve
vincular o próprio Estado, sob pena de burla à boa-fé que deve reger as relações entre o
Fisco e os contribuintes. Pode-se falar, ainda, neste ponto, em ofensa ao ato jurídico
perfeito e ao direito adquirido (art. 5º, XXXVI, CR).

Além disso, a possibilidade de compensação de créditos tributários, pelo


contribuinte, para pagamento das estimativas mensais de recolhimento do IRPJ, é fator
de planejamento tributário que é levado em consideração pelas empresas, quando da
opção por esse regime, já que pode ter implicações diretas sobre o fluxo de caixa desses
contribuintes. Por tal razão, a mudança repentina de tal regime jurídico, também viola a
livre-iniciativa (art. 4º, CR), pois, efetivamente, poderá causar embaraços injustificáveis
e prejuízos às atividades das empresas.

Como se não bastasse, houve a criação de situações não isonômicas que afligem,
portanto, a isonomia tributária (art. 150, II, CR), já que os contribuintes que optarem, no
início do ano-calendário, por outro regime de apuração do IRPJ, não terão que suportar
alterações repentinas na sistemática escolhida, o que pode resultar, ainda, em prejuízo à
livre concorrência (art. 170, IV, CR).

17
​ÁVILA, Humberto. ​Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito
tributário.​ 2ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p.
Por fim, há violação à anterioridade tributária (art. 150, II, b, CR), já que a
modificação introduzida pela Lei Federal nº 13.670/18 entrou em vigor no exercício em
curso, e implicará, efetivamente, na majoração de tributos, ainda que de forma indireta,
pois os contribuintes terão a necessidade de realizar um desencaixe financeiro para fazer
face aos recolhimentos mensais por estimativa, ainda que tenham créditos que, outrora,
poderiam ser utilizados para a compensação.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se, neste breve estudo, analisar as modificações promovidas pela Lei


Federal nº 13.670/18, no que pertine, especificamente, à questão da compensação de
créditos tributários federais, e examinar, ainda que de forma geral, os aspectos inerentes
ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, notadamente, o seu espectro constitucional e
os seus respectivos regimes de apuração.

Observou-se, ao final dessa pesquisa, que o disciplinamento normativo do


Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, por ser extremamente complexo e vultoso, torna a
compreensão e o estudo deste tributo uma tarefa extremamente difícil.

Constatou-se que existência de alíquotas fixas aplicáveis ao tributo tem como


consequência a consagração da técnica da proporcionalidade e não da progressividade,
o que, evidentemente, vai de encontro ao comando estabelecido no art. 153, § 2º, I, da
Constituição da República.

Verificou-se, também, que a sistemática de apuração anual com recolhimentos


mensais por estimativa contém peculiaridades que permitem ao contribuinte utilizá-la
como uma importante ferramenta de planejamento tributário, quando comparada ao
regime trimestral de apuração.

Pretendeu-se, ainda, enfatizar a índole constitucional do direito do contribuinte à


compensação tributária, sem, entretanto, desconhecer os entendimentos que se opõe a
essa tese, notadamente, aqueles capitaneados pelas decisões dos Tribunais Superiores.

Por derradeiro, após uma análise mais detida das modificações introduzidas pela
Lei Federal nº 13.670/18, concluiu-se pela inconstitucionalidade da supressão, no curso
do exercício da competência fiscal, do direito dos contribuintes de realizarem a
compensação tributária em relação aos débitos oriundos dos recolhimentos mensais por
estimativa, no regime de apuração do IRPJ pelo Lucro Real, já que tal expediente feriu
de morte os princípios mais comezinhos da Constituição da República.
REFERÊNCIAS

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direito tributário. 2ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2012.
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 8ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2010.
BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 17ed. rev. e atual. Rio de
Janeiro: Forense, 2010.
CARNEIRO, Cláudio. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 4ed. São Paulo,
Saraiva, 2016.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 24ed. São
Paulo: Malheiros, 2008.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ed. São Paulo: Malheiros,
2011.
MACHADO, Hugo de Brito. Os princípios jurídicos da tributação na Constituição de
1988. 5ed. São Paulo: Dialética, 2004.
OLIVEIRA, Luciana Gualda. A elisão fiscal decorrente do planejamento fiscal: treaty
shopping. Revista do Mestrado em Direito da Universidade Católica de Brasília. Edição
nº 1, 2009.
PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário: Completo. 8ed. rev. atual. São Paulo:
Saraiva, 2017.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 12a ed. Porto Alegre:
Livraria do advogado, 2014
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anotações à
Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e
116/2003. 6ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2018.
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Processo Tributário. 9ed. São Paulo: Atlas, 2018
SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e
eficácia. 1. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 17ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2010.

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