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Apelação cível n. 2006.

002392-7, de Tubarão
Relator: Jânio Machado

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO.


CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL. DEMONSTRATIVO
DE EVOLUÇÃO DA DÍVIDA QUE ATENDE OS REQUISITOS
DO ARTIGO 614, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL. SENTENÇA EXTINTIVA QUE NÃO MAIS SUBSISTE.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 515, § 3º, DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO DA LIDE DESDE LOGO,
UMA VEZ QUE AS QUESTÕES CONTROVERTIDAS NÃO
RECLAMAM A ABERTURA DA INSTRUÇÃO. CAUSA QUE
SE ENCONTRA "MADURA". NOTIFICAÇÃO DOS
DEVEDORES PARA CONSTITUIÇÃO EM MORA.
PROVIDÊNCIA DESNECESSÁRIA, APLICANDO-SE O
DISPOSTO NO ARTIGO 397 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 E
O ARTIGO 11 DO DECRETO-LEI N. 413, DE 9.1.1969.
ELEIÇÃO, PELOS CONTRATANTES, DA TJLP COMO
ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. POSSIBILIDADE,
NOS TERMOS DO ENUNCIADO N. VI DO GRUPO DE
CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL. CAPITALIZAÇÃO
MENSAL DOS JUROS PACTUADA. VALIDADE DA
CLÁUSULA, NOS TERMOS DA SÚMULA N. 93 DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA E SUA CUMULAÇÃO COM OUTROS
ENCARGOS. DISCUSSÃO ESTÉRIL SE NADA NESTE
SENTIDO FOI EXIGIDO. TARIFAS COBRADAS EM
CONFORMIDADE COM A CLÁUSULA DA CÉDULA.
MANUTENÇÃO QUE SE IMPÕE. PAGAMENTO PARCIAL
QUE FOI CONSIDERADO PELO CREDOR. EMBARGOS
JULGADOS IMPROCEDENTES.
1. Válido e suficiente é o demonstrativo do débito
atualizado que possibilita ao juiz verificar como o credor
chegou ao saldo executado.
2. Se a causa está "madura", a Câmara afasta a extinção
da execução e prossegue no exame das demais questões
controvertidas na origem.
3. Não se faz necessária a prévia notificação do devedor
para constituição em mora se há inadimplemento de
obrigação positiva e líquida no seu termo.
4. Se há pacto explícito acerca da capitalização mensal
dos juros na cédula de crédito industrial, válida é a sua
exigência.
5. O exame de questões envolvendo a cobrança de
comissão de permanência, e sua cumulação com outros
encargos, fica prejudicado se nada neste sentido constou do
demonstrativo de evolução da dívida executada.
6. Se todos os pagamentos parciais foram considerados
pelo exequente, prossegue-se na ação como pretendido pelo
credor.
7. As tarifas bancárias decorrentes de serviços prestados
ao mutuário, uma vez pactuadas, podem ser exigidas
juntamente com o crédito financiado.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n.


2006.002392-7, da comarca de Tubarão (2ª Vara Cível), em que é apelante
Banco do Brasil S/A, e apelados Tailor Salvan, Adenor Salvan, Giovany Salvan,
Jessel Salvan e Cerealista Otília Neto Ltda.:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Comercial, por


unanimidade, dar provimento ao recurso e, com fundamento no artigo 515, § 3º,
do Código de Processo Civil, rejeitar os embargos opostos pelos executados.
Custas legais.

RELATÓRIO

Tailor Salvan, Adenor Salvan, Giovany Salvan, Jessiel Salvan e


Cerealista Otília Neto opuseram embargos à execução promovida por Banco do
Brasil S/A com os argumentos assim sintetizados: a) o exequente carece da ação
porque é ilíquido e inexigível o crédito e não se fez a prévia notificação para a
constituição em mora; b) é ilegal a correção monetária com a adoção da TJLP e a
capitalização mensal dos juros contratados, bem ainda a cumulação da comissão
de permanência com a correção monetária; c) a multa contratual não pode
exceder a 2% (dois por cento) e nem cumulada com a comissão de permanência

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e d) são ilegais os encargos cobrados e não contratados, sob a rubrica
"ACESSÓRIOS-TAR. CONTR/REN" e "ACESSORIOS-COM AVAL FA".
Os embargos foram impugnados (fls. 48/53), além de colhida a
manifestação dos embargantes (fls. 60/64).
A audiência de conciliação resultou inexitosa e, ausente o interesse
na produção de outras provas, foram colhidas as alegações finais (fl. 82).
Em apenso são encontrados os autos da cautelar inominada
incidental ajuizada por Tailor Salvan, Adenor Salvan, Giovany Salvan, Jessiel
Salvan e Cerealista Otília Neto Ltda. contra o Banco do Brasil S/A, constando o
deferimento da liminar para que o requerido se abstenha de incluir o nome dos
requerentes da Serasa, sob pena de pagamento de multa diária. O requerido
apresentou contestação, que foi impugnada.
O digno magistrado Lédio Rosa de Andrade proferiu sentença única
(fls. 84/91), o que fez para acolher os embargos (declarou nula a execução) e
condenar o embargado ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios arbitrados em 20% (vinte por cento) do valor da execução, bem
ainda acolher o pleito cautelar e impor o ônus da sucumbência ao requerido (os
honorários advocatícios foram arbitrados em R$2.000,00).
Irresignada, a instituição financeira interpôs recurso de apelação
cível (fls. 96/102), com ênfase na existência de título executivo estrajudicial,
assim como na validade e suficiência do demonstrativo de evolução da dívida.
Com a resposta dos apelados (fls. 108/117), os autos vieram a esta
Casa.

VOTO

A execução encontra-se suportada na Cédula de Crédito Industrial


de n. 20/10004-3 (fls. 8/12), emitida em 8.12.2000, por intermédio da qual a
embargante, pessoa jurídica, obrigou-se a pagar a quantia de R$24.324,76 (vinte
e quatro mil, trezentos e vinte e quatro reais e setenta e seis centavos) em 54

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(cinquenta e quatro) parcelas mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira em
23.6.2001 e a última em 23.11.2005, mediante a incidência dos encargos desde
logo pactuados (encargos básicos calculados com base na TJLP, mais encargos
adicionais básicos à taxa nominal de 5,330% ao ano). O crédito financiado
destinou-se à aquisição de 1 (uma) máquina empacotadora automática e 1 (uma)
outra para controle de peso em empacotadora, além da importância de
R$5.613,41 (cinco mil, seiscentos e treze reais e quarenta e um centavos) para
"Capital de Giro associado" (fl. 13).
A devedora principal e os garantes foram notificados para o
pagamento, por meio de correspondências expedidas em 9.5.2003 e 28.7.2003
(fls. 14/18).
E porque o inadimplemento persistiu, o credor ajuizou a
correspondente ação de execução na data de 3.11.2003, tendo apontado a
importância de R$16.287,50 (dezesseis mil, duzentos e oitenta e sete reais e
cinquenta centavos) como sendo o saldo devedor.
O demonstrativo de evolução da dívida foi juntado com a petição
inicial (fls. 29/32), nele sendo discriminados os encargos exigidos (correção
monetária pela TJLP, juros de 5,33% ao ano, juros moratórios de 1% ao ano e
multa de 2%), bem ainda todos os pagamentos efetuados pela devedora ao longo
da contratualidade (foram discriminados os valores e respectivas datas de
pagamento). E tal como previsto no pacto, o valor financiado sofreu a incidência
de correção monetária e juros contratados, o que foi suficientemente indicado no
referido demonstrativo de evolução da dívida (referiu-se os valores para cada um
dos encargos pactuados e as respectivas datas).
Nos autos da execução, o digno magistrado ainda determinou que o
exequente emendasse a inicial, para que o demonstrativo fosse melhor
compreendido (fl. 35), o que fez o credor.
Era isso o quanto bastava para que o devedor pudesse
compreender o valor exigido e, se fosse o caso, impugnasse qualquer um dos

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lançamentos, o que se diz a partir da regra encontrada no artigo 614, inciso II, do
Código de Processo Civil, na redação anterior ao advento da Lei n. 11.382, de
6.12.2006:
"Art. 614. Cumpre ao credor, ao requerer a execução, pedir a citação do
devedor e instruir a petição inicial:
I - com o título executivo, salvo se ela se fundar em sentença (art. 584);
II - com o demonstrativo do débito atualizado até a data da propositura da
ação, quando se tratar de execução por quantia certa;
III - com a prova de que se verificou a condição, ou ocorreu o termo (art.
572)."
A respeito, esta Corte já decidiu:
"APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CÉDULA RURAL
PIGNORATÍCIA E HIPOTECÁRIA – RECURSO DOS EMBARGANTES –
PROCESSO CIVIL – PRELIMINAR DE NULIDADE DA EXECUÇÃO PELA
DEFICIÊNCIA NO DEMONSTRATIVO DE DÉBITO – APRESENTAÇÃO DO
VALOR EXECUTADO QUE PERMITE AFERIR A ORIGEM E EVOLUÇÃO DA
DÍVIDA – PREENCHIMENTO DO REQUISITO DISPOSTO NO ART. 614, II, DO
CPC – TÍTULO EXEQÜÍVEL – NULIDADE INEXISTENTE – RECURSO
IMPROVIDO.
Não é tido como deficitário o demonstrativo de débito que explicita os
juros, a correção monetária e outros encargos aplicados, possibilitando-se,
assim, aferir a evolução da dívida até a data da propositura da ação, em
consonância ao preceito delineado no artigo 614, inciso II, do Código de
Processo Civil.
(...)." (Apelação cível n. 2004.025167-0, de Lages, Terceira Câmara de
Direito Comercial, relator o juiz Paulo Roberto Camargo Costa, j. em 8.6.2009.
Disponível em: <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 17 set. 2009).
Some-se:
"APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA
EXTINTIVA DE AÇÃO EXECUCIONAL EM FACE DE SUPOSTA DEFICIÊNCIA
NO DEMONSTRATIVO DE DÉBITO. PLANILHA QUE, NO ENTANTO, ATENDE
O REQUISITO DO ART. 614, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PRO-VIDO.
Apresentado demonstrativo da dívida, com a memória discriminada e
atualizada do cálculo, explicitando, de forma lógica, os valores excutidos, não há
falar em nulidade na execução (art. 614, II, do Código de Processo Civil).
Ademais, caso o demonstrativo de débito fosse reputado insuficiente ou
incorreto para evidenciar a evolução da dívida, a medida a ser ministrada
consistiria na aplicação do comando do art. 616 do mesmo Codex, ou seja,
determinar a sanação da irregularidade em um decêndio, sob pena de, se
positivada a inércia, aí sim, coarctar a pretensão execucional." (Apelação cível
n. 2008.042632-5, de Seara, Câmara Especial Regional de Chapecó, relator o
desembargador João Henrique Blasi, j. em 27.3.2009. Disponível em:
<http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 17 set. 2009).

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Dessa forma, é certo que o instrumento que suporta a execução
embargada constitui título executivo, nos termos dos artigos 583 e 585, inciso VII,
ambos do Código de Processo Civil, e mais o artigo 41 do Decreto-lei n. 413, de
9.1.1969, revestindo-se a execução dos requisitos exigidos pelo artigo 586 do
Código de Processo Civil: "a execução para cobrança de crédito fundar-se-á
sempre em título líquido, certo e exigível" (na redação vigente à época dos fatos).
Afastado o argumento acolhido pelo julgador de primeiro grau,
prossegue a Câmara no exame dos demais pontos debatidos na origem (artigo
515, § 3º, do Código de Processo Civil), anotando-se que a controvérsia está
limitada a questões de direito e, por isso mesmo, encontra-se "madura" a causa.
As notificações realizadas pelo exequente eram as suficientes. Diz-
se mais: inexistia a obrigação de o credor notificar os devedores para constituí-
los em mora se o pacto previa datas certas para o pagamento das parcelas, nos
termos do artigo 397 do Código Civil de 2002 e, mais especificamente, o disposto
no artigo 11 do Decreto-lei n. 413, de 9.1.1969:
"Art 11. Importa em vencimento antecipado da dívida resultante da cédula,
independentemente de aviso ou de interpelação judicial, a inadimplência de
qualquer obrigação do eminente do título ou, sendo o caso, do terceiro prestante
da garantia real.
§ 1º Verificado o inadimplemento, poderá, ainda, o financiador considerar
vencidos antecipadamente todos os financiamentos concedidos ao emitente e
dos quais seja credor.
§ 2º A inadimplência, além de acarretar o vencimento antecipado da dívida
resultante da cédula e permitir igual procedimento em relação a todos os
financiamentos concedidos pelo financiador ao emitente e dos quais seja credor,
facultará ao financiador a capitalização dos juros e da comissão de fiscalização,
ainda que se trate de crédito fixo."
Nem se ignore que o vencimento antecipado da obrigação constou
da cédula executada (fl. 9), o que mais reforça a desnecessidade de prévia
constituição em mora do devedor.
A Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP foi o índice pactuado, nada
havendo nele de abusivo, conforme o que já se encontra pacificado nesta Casa,
por meio do enunciado n. VI do Grupo de Câmaras de Direito Comercial: "A Taxa
Referencial (TR) e a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) podem ser utilizadas como
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fatores de correção monetária em contratos bancários, desde que expressamente
pactuadas.".
Os juros remuneratórios contratados estão bem abaixo da taxa
anual de 12% (doze por cento) ao ano, e nem mesmo foram objeto de
questionamento por parte dos devedores (em verdade, aplaudiram-na).
A capitalização dos juros remuneratórios, em se tratando de cédula
de crédito industrial, há de ser mantida, nos termos da súmula n. 93 do Superior
Tribunal de Justiça: "A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e
industrial admite o pacto de capitalização de juros.".
Inexistiu cobrança de comissão de permanência, conclusão que se
retira do exame do demonstrativo de evolução da dívida, ali sendo encontrados,
como encargos da mora, os juros de 1% (um por cento) ao ano e a multa de 2%
(dois por cento).
Mais: deixou-se bem esclarecido que a multa não incidiu sobre os
juros da mora.
Então, porque essas questões extrapolam o que foi praticado pelo
credor, tem-se por inúteis e desnecessárias a apresentação de quaisquer outras
considerações.
As 2 (duas) tarifas cobradas da mutuária no dia 22.12.2000
encontraram apoio em cláusula contratual, nominada de "TARIFA" (fl. 9 dos autos
de execução), a razão de serem mantidas.
O "comprovante de recebimento com aviso" de fl. 39 (autos de
embargos), datado de 12.8.2003, não demonstra qualquer "descontrole" por parte
do credor. O que o documento evidencia é, unicamente, um depósito na conta
corrente da devedora, sendo ele pouco superior ao que foi contabilizado como
pagamento na cédula executada.
O processo de execução é hígido e deve prosseguir como de
direito, afastando-se a carência de ação, bem ainda a alegada cobrança abusiva
de encargos, estabelecida desde logo a inversão do ônus da sucumbência.

Gabinete desembargador Jânio Machado


DECISÃO
Ante o exposto, a Terceira Câmara de Direito Comercial, por
unanimidade, dá provimento ao recurso e, com fundamento no artigo 515, § 3º,
do Código de Processo Civil, rejeita os embargos opostos pelos executados.
O julgamento, realizado no dia 14 de outubro de 2010, foi presidido
pelo desembargador Marco Aurélio Gastaldi Buzzi, com voto, e dele participou o
desembargador Cláudio Valdyr Helfenstein.
Florianópolis, 19 de outubro de 2010.

Jânio Machado
RELATOR

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