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A arte e a educação

Maisa Antunes
Diálogos brincantes
Por Maisa Antunes

T raço passos numa cidade desenha-


da à beira do rio São Francisco que
coleciona histórias e fantasias. Os
pescadores convivem com um cotidiano de
lendas vivas; o tempo corre através de nós e do
rio e convida-nos a sonhar na profundidade de
suas margens. Cenário inspirador de despala-
vras, transvistas pela delicadeza do olhar poéti-
co.
De criança tornei-me menina-mulher e
professora. Na minha busca: “só há um luxo
verdadeiro: o das relações humanas” (Exupéry).
Em suas trilhas contraditórias “os homens”
travestidos de alunos ou de colegas (professo-
res) são espelhos e reflexos dos meus próprios
desejos, anseios e dores.
Em meu percurso docente passei pela
educação infantil e de jovens e adultos, ensino
fundamental, médio, espaços não-formais, e

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hoje atuo no ensino superior, onde trabalho com
o curso de formação de professores. Assumo,
dentre outros componentes curriculares: ARTE
E EDUCAÇÃO. Torno-me tão próxima deste
que sou freqüentemente convidada para contri-
buir em outros cursos de formação de professo-
res. Convivo cotidianamente com esse conceito
e passo a pensar mais sobre ele. Com isso, depois
de algum tempo revela-se em mim o desejo de
escrever um livro de entrevistas com um arte-
educador e um artista.
Meu convívio com os textos de Duarte
Júnior sobre arte-educação levou-me em 18 de
janeiro de 2011, final de manhã, a um encontro
com ele no aeroporto de Campinas-SP. Depois
de alguns contatos via e-mail, recebeu-me
carinhosamente em sua residência. Ele, Mary
(sua esposa), Daniel (seu orientando); e (não
podia esquecer) os cachorrinhos cuidados pelo
casal. Carlinho, sem nenhuma resistência,
encheu-me logo de carinhos, esfregando-se em
mim, como se fosse um gato; Lolly ficou me
observando de longe por muito tempo, no final
não resistiu, jogou-se em meus braços para um
afago, e Nina, que só se aproximava quando
estalava os dedos para ela, era uma cadela sofri-
da. Todos adotados... Duarte e eu trocamos
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livros e dedicatórias, depois iniciamos e finaliza-
mos a entrevista. Uma coleção de cactos embe-
lezava a sacada da janela frontal, os móveis da
sala, desenhados pelas mãos de um marceneiro
na década de 20 pertenceram ao avô de Duarte.
Lá estavam também dois baús - da sua bisavó -,
que possivelmente guardavam em suas memóri-
as, sensações, dores e amores de um enxoval
preparado por uma jovem que viajou da Itália
para o Brasil na metade do século XIX. Foi
cercada com esses símbolos que voltei para
minha cidade naquele mesmo dia, cansada, feliz
e protegida pelos gestos cuidadosos de Duarte
Júnior.
Do artista, há pouco tempo, eu só conhecia
suas obras por meio de exposições dos seus belos
e enigmáticos retratos. Marcos Cesário é um
poeta intimamente ligado a símbolos. Tem
conexão direta com seus sentimentos - e na
infância conviveu com um currículo nada
invejável de suspensões e expulsões de estabele-
cimentos de ensino -. Intenso e inquieto sabe
sempre o que não procura. Foi com revelações
inspiradoras que a entrevista com Marcos
Cesário aconteceu no dia 28 de janeiro de 2011.
Era início da tarde quando ele chegou, depois de
um forte suco de maracujá, contemplou por
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horas seus livros-irmãos - Wilde, Rubem Braga,
Exupéry, Hermann Hesse... - que habitualmente
relê. Quando o sol preparava-se para mais um
cochilo iniciamos e finalizamos uma entrevista
rápida, talvez menos de meia hora. Levei-o ao
terminal rodoviário, deixando comigo suas
palavras e risos no gravador que ouvi e muitas
vezes reli.
Duarte Júnior e Marcos Cesário falam da
mesma coisa dizendo-nos coisas diferentes?
Para Duarte a arte “educa” numa dimensão
não racional, refina nossa percepção e nossa
sensibilidade. A isto Cesário chama de desedu-
cação.
Duarte, mesmo reconhecendo as limitações,
os aprisionamentos e os instrumentos de ades-
tramento da educação escolar, ainda insiste em
acreditar na EDUCAÇÃO. Cesário, alimentado
por uma “revolta” da sua alma de poeta, argu-
menta, inspirado em Oscar Wilde que a lingua-
gem é mãe do pensamento, e assim sendo, esta,
segundo Cesário, deve ser mudada para que
também se mude o pensamento. Mudando
assim os equívocos cometidos ao tentar unir
“duas inimigas instintivas”: A ARTE E A
EDUCAÇÃO.

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Talvez aqui poderíamos defender juntos
que o sentimento vem primeiro. Que a sensação,
a paixão, a vaidade, a imaginação nos impulsio-
nam a viver, a criar. E como a escola se apóia em
instrumentos tão controladores, tão racionais,
como conciliar com a arte? Sobre isso, tanto
Duarte, como Cesário defendem que a arte deve
estar na escola, mas não refém do currículo
escolar.
Para Duarte, a escola atualmente é feita
atendendo a uma educação profissionalizante e
desenvolvendo capacidades lógicas e técnicas,
que corresponde a demanda do mercado de
trabalho. Nesse sentindo, segundo este pensa-
dor, a arte, a poesia é algo inútil do ponto de vista
da demanda deste mercado. E se a arte é inútil
qual o interesse pela arte por parte de institui-
ções educativas que estão a serviço de uma
sociedade capitalista, impulsionadora do consu-
mo desenfreado, ignorando o valor das coisas
materiais e espirituais?
O filotógrafo (filósofo-fotógrafo) Cesário
ao falar da arte e sua inutilidade nos provoca a
pensar sobre a sociedade que “mata” o indivíduo
em nome de um suposto bem estar para todos, e
ainda nos leva a pensar o caráter imprevisível e
livre da arte.
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Como educador sensível e entusiasta de
uma educação livre e com sentido Duarte
denuncia a forma como a arte está na escola. A
confusão que acontece, o absurdo que ocorre,
em que boa parte dos profissionais da educação
acha que a arte pode ser usada como um meio
para adquirir conhecimento. Diz ainda que as
aulas de Português “matam” a poesia e o poema
e os transforma em “cadáveres a serem disseca-
dos com os bisturis teóricos”, que o espaço
escolar “transforma uma obra de arte num corpo
sem vida e dele se vai extraindo os órgãos:
objetos diretos, sinédoques, metáforas, metoní-
mias etc”. Para Duarte esse procedimento
liquida qualquer prazer de um encontro poético.
Os estudantes são obrigados a ler um romance,
para fichá-lo ou para se submeter a uma avalia-
ção ou ainda porque tal obra literária será cobra-
da no vestibular.
Cesário, como artista, poeta, também
denuncia a estrutura dura da escola e adverte
que para a inspiração acontecer não precisa de
nenhuma atividade programada, ao contrário, é
na imprevisibilidade do encontro de contextos e
temperamentos que pode acontecer o nasci-
mento do criador e da criação. Diz ainda que a
educação quer confundir o hábito de medir, que
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é próprio da educação, “ao desejo descompro-
missado de contemplar e sentir”.
Coloco-me diante de Duarte e de Cesário
como alguém que quer desaprender o sentido da
arte-educação e como uma curiosa que quer não
descortinar o véu da arte, nem esgotar a compre-
ensão dos descaminhos da educação, mas como
uma menina que quer brincar, aprender e
desaprender quando as coisas aprendidas
estiverem sufocando. Quero educar-me e
deseducar-me para poder romper com os
regulamentos quando estes regularem demais.
Aqui recordo-me de uma passagem do livro A
escola que sempre sonhei sem imaginar que
pudesse existir, de Rubem Alves, que ao falar da
Escola da Ponte, ele inicia uma de suas crônicas
nos contando sobre os mestres Zen. Rubem diz
que esses educadores eram educadores estra-
nhos, uma vez que não pretendiam ensinar, estes
desejavam era desensinar. Avaliações de apren-
dizagem para estes mestres, nem pensar. Mas
estavam constantemente avaliando a desapren-
dizagem dos seus discípulos. Eles se interessa-
vam mesmo era pela desaprendizagem, quando
esta acontecia, riam de felicidade.
Tenho compartilhado com os estudantes os
poetas que gosto. E mesmo intuitivamente
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sabendo que a arte diz o indizível, que fala da
realidade fugindo dela, Nietzsche: “nenhum
artista tolera o real”. Sou capaz de apreender as
palavras que os poetas me dizem com suas
poesias em versos, imagens, pinturas, escultu-
ras...
Há experiências belas acontecendo, há
lugares habitados de sentimentos desenhados
por crianças e adolescentes, que com fome e
sede de beleza, se entregam à dança, ao teatro e à
música... Compondo cenários íntimos e lúdicos.
São espaços de encontros não-formais que vão
na contramão da lógica da educação formal.
A arte nos possibilita encontrarmo-nos? Ou
perdermo-nos em nosso próprio caminho?
Como Duarte, acredito na possibilidade de uma
educação menos adestradora, que verdadeira-
mente perceba outras dimensões do ser huma-
no, não apenas a razão, perceba outros canais de
apreensão do mundo como bem faz Cesário,
com a intuição, a estética e a imaginação.
Também sou provocada por Rubem Alves
quando diz no prefácio do livro Fundamentos
Estéticos da Educação (Duarte Jr., 1995), que a
educação na perspectiva da estética é uma causa
possivelmente derrotada, uma vez que esta,
pensada a partir da beleza “equivale afirmar que
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o poeta e músico são mais importantes que o
banqueiro e o fabricante de armas”.
Se esses diálogos não iluminarem a nossa
razão que ao menos nos desvele a desrazão, o
“acriançamento das palavras” como disse
Manoel de Barros.
Brinquemos então.

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(...) Se a própria vida é biologica-
mente estética e se o próprio
cosmo é primariamente um evento
estético, então a beleza não é
apenas um acessório cultural, uma
categoria filosófica, um domínio
das artes, ou mesmo uma prerroga-
tiva do espírito humano. Ela
sempre permaneceu indefinível,
porque é uma testemunha sensori-
al daquilo que está fundamental-
mente para além da compreensão
humana.

(James Hillman)

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Entrevista com o professor e psicólogo
Francisco Duarte Jr. – 18.01.11
Por Maisa Antunes

Maisa Antunes – Duarte Júnior, o que é arte-


educação?

Duarte Jr. – Olha, lá no início de minhas


reflexões eu comecei a pensar na arte como um fator
de conhecimento, como um tipo de saber, um saber
distinto de outros tipos de conhecimento, como a
ciência e a filosofia. Para mim, a arte-educação seria
uma maneira de utilizarmos a arte para desenvolver
o que, mais tarde, eu viria a chamar de saber sensível,
esse saber que o nosso corpo detém e embasa todo
o conhecimento intelectual. Porém, hoje, eu ando
pensando muito mais em educação estética, na qual a
arte-educação estaria contida, ou seja, a educação
estética seria uma maneira de educarmos esse saber
sensível, que é o saber não-racional, o saber que é
dado, basicamente, pelo nosso corpo, pela nossa
sensibilidade e que pode ser educado de muitas
maneiras. A arte seria uma dessas maneiras. Então,
arte-educação, para mim, hoje, estaria inserida nisso

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que eu chamo de educação estética ou educação do
sensível.

M. A. – Neste sentido, a arte assumiria uma


função pedagógica?

Duarte Jr. – Neste sentido, sim. Quer dizer, a


arte seria uma maneira de simbolizarmos, de
tornarmos concreto, visível, palpável, essa
dimensão intangível do saber humano que é o
sentimento, aquilo que é sentido pelo nosso corpo.
A arte é uma tentativa de se construir formas que
simbolizem isso. Ao ter contato com essas formas
eu reconheço, nelas, sentimentos meus –
sentimento num sentido mais amplo, não
significando apenas a emoção – sentimento
significando um estar no mundo, nosso perceber o
mundo, nossa percepção das coisas. Então, a arte
seria uma simbolização desse mundo sensível, disso
que está para além das palavras e dos conceitos
lógicos.

M. A. – Como seria essa relação entre a Arte


e a Educação?

Duarte Jr. – É uma relação complexa, em se


tratando do mundo em que estamos vivendo, no
qual a Educação é pensada tão-só para desenvolver
capacidades lógicas, capacidades técnicas. A arte
nessa visão educacional do mundo contemporâneo

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fica meio desajustada, mas existem experiências que
vão contra a corrente. Ao longo da história sempre
houve pessoas como Herbert Read, que pensou a
arte como fundamento da educação, quer dizer, a
educação, segundo ele, começaria na dimensão
sensível, e a razão e o pensamento surgiriam como
um aprimoramento de alguma coisa que começa
nessa dimensão sensível; esse seria o ideal: a arte
como base da educação. Infelizmente no mundo
que estamos vivendo a arte se tornou somente um
elemento curricular a mais, e o mais trágico é que
setores ligados à própria arte-educação, de certa
maneira, capitularam e passaram a entender a arte
assim, como um dos itens do currículo.

M. A. – O que você acha disso?

Duarte Jr. – Eu acho um retrocesso, uma


regressão, uma destruição da proposta original de
arte-educação. Isso que está acontecendo hoje, na
escola – estou falando de uma maneira geral, é
evidente que existem as exceções – de se considerar
a arte como um conteúdo, é muito empobrecedor,
na medida em que o conteúdo entendido por essas
pessoas é lógico-conceitual, ou seja: História da
Arte, Crítica de Arte, Filosofia da Arte, quer dizer, o
que se chama hoje de leitura da obra de arte não é
nada mais do que se falar sobre a obra de arte. Eu
acho isso muito complicado. Perceba que ao longo
da história do ensino de arte se observa ora uma

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tendência de se pensar a arte como experiência, ora
de se pensar a arte como conteúdo; as coisas
oscilam entre esses dois pólos. Na verdade, isso é
uma falsa polaridade, pois a arte é essencialmente
uma experiência e o seu conteúdo é precisamente
ser ela uma experiência. Vamos falar
metaforicamente: você pode dar um curso de
natação e levar apostilas sobre água, sobre os
estados físicos e tipos da água: água limpa, água suja,
água de rio... todos os estudos possíveis sobre a
água; estudos sobre movimentos musculares;
estudos sobre natação e assim você faz um brilhante
curso teórico sobre o que é nadar; você apresenta
vídeos sobre nadadores e pessoas nadando e tal, e,
no final, os aprendizes fazem uma prova teórica e
você dá um diploma de nadador a eles. É mais ou
menos isto que está acontecendo com a arte hoje,
quer dizer, estão sendo ministrados cursos sobre a
arte dentro da escola sem as pessoas terem a
experiência da arte, sem as pessoas terem a
experiência de “caírem na água” e aprender com a
“experiência da água”, no caso, com a experiência
estética. Todo o saber que você pode ter sobre
natação e que, por certo pode ser aprimorado até
com teorias, tudo isso só tem sentido depois que
você “caiu na piscina”, que aprendeu a nadar, depois
que seu corpo conheceu a água. É a mesma coisa
com a arte, ou seja, História da Arte, Sociologia da
Arte, Filosofia da Arte, todos esses saberes são
importantes, mas depois que você tenha uma
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formação sensível com a arte. O que acho falta na
escola, hoje, é essa experiência: o mergulho na
experiência estética, o face a face com a arte.

M. A. – Nesse caso, qual seria a função da


Arte na Educação?

Duarte Jr. - A função da Arte na Educação


seria, exatamente, permitir experiências sensíveis de
se vivenciar realidades outras que não estão
acessíveis em nosso cotidiano, mas que, ao se
assistir um filme, ao se ver uma peça de teatro, ao se
ler um romance, torna-se possível se viver as
experiências de outros seres humanos – somos
capazes de vivenciá-las, ainda que de um modo
simbólico, ficcional, de “faz-de-conta”, digamos
assim. A arte é um grande “faz-de-conta”, no fundo,
um grande jogo. Alguns filósofos dizem mesmo que
quando você vai ao cinema, ao teatro, quando tem
um contato com a arte, você tem que suspender a
descrença, isto é, tem que acreditar no que está
sendo proposto, tem que aceitar o jogo. Se logo na
primeira linha eu não aceitar ser possível o fato de
Gregor Samsa estar acordando transformado num
enorme inseto eu não participarei o jogo proposto
por Kafka nas demais páginas de seu “A
Metamorfose”, não terei uma experiência estética
com aquele universo.

O jogo da arte consiste em você se emocionar

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com aquilo que está acontecendo na obra, como se
fosse verdade, é o jogo do “como se”, e é muito
parecido com um jogo infantil, por exemplo, aquele
em que a criança sobe em um cabo de vassoura e se
comporta como se ele fosse um cavalo. Na arte é a
mesma coisa: tem-se uma experiência e eu me
comporto como se estivesse vivendo uma realidade,
a qual, embora fictícia, e mesmo eu sabendo disso, o
meu cérebro faz com que eu a vivencie
intensamente. Isso é uma função muito importante
da arte: fazer com que a gente explore sentimentos,
tenha vivências e conheça realidades de outros seres
humanos, de outras culturas, mesmo isto
ocorrendo no modo do “como se”. A filósofa
Susanne Langer diz que é exatamente por eu saber
que é uma grande mentira, um faz-de-conta, o que
estou vivendo, que eu me permito viver
experiências aterradoras, como as que existem num
filme de terror. As experiências mais brutais eu
posso assistir no teatro ou no cinema porque eu sei
que aquilo é uma ficção e, portanto, eu me permito
sentir coisas das quais fujo em meu cotidiano. Eu
acho que isso constitui um dos papéis mais
fundamentais da arte: permitir que a gente vivencie
a experiência de outros seres humanos, que a gente
se entregue a elas sem medo ou preconceitos.

M. A. – A arte pode ser ensinada na escola?


Qual é a sua opinião?
Duarte Jr. - Acho que você tem níveis de
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aprendizado em relação à arte. O aprendizado mais
fundamental é o aprendizado do espectador, quer
dizer, você aprende a ser espectador. Mas como é
que se aprende a ser espectador de arte? Assistindo
arte, ouvindo arte, vendo arte, lendo arte. Você tem
que descobrir e aprender os códigos do cinema, do
teatro, da música, do poema, inclusive com seus
distintos subcódigos. As pessoas dizem: isso são as
linguagens da arte. Eu não gosto dessa
terminologia, prefiro dizer que são diferentes
códigos. Nós humanos possuímos vários códigos
distintos. Por exemplo, a chamada música erudita é
composta em códigos diferentes daqueles
empregados no samba, por exemplo; são músicas
compostas em códigos diferentes. E se
considerarmos a música indiana, ela constitui um
código ainda mais diferente. Como é que podemos
aprender esses códigos todos? Sendo espectador.
Assistindo, ouvindo, esse é o aprendizado mais
básico. Todos os outros decorrem deste. Como eu
disse anteriormente, é a experiência com a arte, a
experiência do ser espectador de arte, o nosso ponto
de partida. A partir dele se pode desenvolver a
reflexão; pode-se estudar Filosofia da Arte, Crítica
de Arte, História da Arte... E ainda se ter um
aprendizado técnico: aprender a pintar, a desenhar,
a tocar algum instrumento, aprender a
desempenhar um papel como ator, aprender a
dançar etc. Quer dizer: esse aprendizado de
técnicas artísticas precisa decorrer desse
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aprendizado básico, que se obtém primeiramente
como espectador.

O papel da escola formal não é levar até as


últimas conseqüências esse aprendizado técnico: o
seu papel deveria ser, fundamentalmente, o de
formar espectadores. E é evidente que se deveria ter
um espaço na escola onde as pessoas pudessem
aprender técnicas de pintura, de teatro, desde que
isso, inclusive, fosse opcional, isto é, o aluno que
quiser aprender pintura vai aprender sem ser
obrigado. Sei que a gente está falando de uma escola
ideal, mas a arte pode ser ensinada? Não sei se ela
pode ser ensinada, mas pode ser aprendida, e isto
significa entender-se o professor como um
facilitador da aprendizagem – sendo a primeira essa
aprendizagem dos códigos – é preciso que se
aprenda a ser espectador. Eu necessito aprender
que aqueles códigos que estão sendo colocados são
símbolos de sentimentos, de emoções, situações e
vivências humanas. Se você considerar, por
exemplo, a história de uma arte recente como o
cinema, que tem pouco mais do que cem anos, uma
das últimas artes surgidas — excluindo a internet,
os vídeos, que no entanto, decorrem do cinema – se
vê que ele foi construindo, educando os seus
espectadores. Pode-se partir dos filmes mudos lá do
começo do século passado e se perceber como
foram construídos os códigos, como eles foram
evoluindo e como o espectador foi tendo que
aprender tudo isso. No início do cinema havia a
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figura do explicador: uma pessoa que ficava de pé,
ao lado da tela explicando coisas para a platéia; por
exemplo: no filme alguém vinha e batia numa porta;
imediatamente se cortava a cena para dentro da
residência, e se via outra personagem abrindo essa
porta; mas o espectador do começo do cinema não
conseguia relacionar as duas coisas, que uma
personagem estava abrindo uma porta para a outra,
que havia batido nela uma cena antes. Era
necessária, então, a figura do explicador, que
descrevia esses detalhes do código cinematográfico,
e assim se foi formando um público, que
gradativamente aprendia os códigos daquela nova
arte: o espectador foi aprendendo a ser espectador.
Orson Wells, por exemplo, inventou o flash back no
cinema, em seu Cidadão Kane e o público teve que
assimilar essa nova forma de narrar.

A escola pode fazer isso. Seria esse o seu


trabalho fundamental: a escola facilitando o
aprendizado do espectador. Por certo essa
experiência pode e deve ser acompanhada de
reflexão, primeiramente uma reflexão sobre a
própria experiência estética que se está tendo como
espectador. Como complemento, então, poder-se-
ia ministrar História da Arte, Crítica de Arte,
Filosofia da Arte, Sociologia da Arte, tudo isso, mais
a experiência do aprendizado técnico: pintar,
dançar, tocar instrumentos, escrever poemas etc.

M. A. - Então, você defende o ensino da arte.


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Duarte Jr. - Sim, sim. Eu acho que a Arte deve
estar presente na escola, porém, em um sentido
ideal, talvez ela não devesse fazer parte de um
currículo, mas devesse fazer parte da escola. Em
outras palavras, penso que deveria haver um espaço
para as aulas formais e um espaço cultural no qual
houvesse teatro, dança, espetáculos para as pessoas
assistirem e discutirem com os professores, um
momento que não se caracterizasse como uma aula
formal, pois esse caráter de aula formal de cinquenta
minutos é uma das coisas que descaracterizam
muito a Arte na escola.

M. A. – A arte educa?

Duarte Jr. – Sim, em muitos sentidos.


Precisamente a arte educa essa nossa dimensão que
não pode ser educada racionalmente, a dimensão da
sensibilidade, do perceber e sentir o mundo de
outra maneira, de refinar a nossa percepção, os
nossos sentimentos. A arte educa primordialmente
neste sentido. Outras coisas também nos educam
esteticamente, não somente a arte, por isso eu disse
que hoje ando pensando a educação estética de um
modo mais amplo. Tenho, por exemplo, planejado
escrever sobre a comida como aprendizado
estético; refletir sobre como a comida mobiliza em
nós todos os sentidos: paladar, olfato, tato,
gustação, audição, e como, por isso, ela é um
elemento para a educação da sensibilidade e
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também da convivência, não é? A gente está
vivendo em um mundo que se verifica uma
regressão da sensibilidade, um mundo no qual o
espaço da convivência e o espaço da alimentação
vão se tornando insignificantes, no sentido de essas
atividades irem se tornando mecânicas, com as
redes de fast food se parecendo mais com postos de
combustível em que se para e simplesmente se
abastece. A alimentação cotidiana vem se tornando
muito mais funcional do que sensível. Mas isso é
uma discussão muito longa e que fica para outra
oportunidade.

M. A. – Duarte, a arte pode ser um


instrumento na formação das pessoas?

Duarte Jr. - Formação humana, você quer dizer?

M. A. – Sim.

Duarte Jr. – Creio que sim. Penso que seja ela


bastante responsável pela dimensão da
sensibilidade, da convivência, do compreender o
outro de que tanto necessitamos. As palavras
empatia e compaixão se aplicam bem ao que a arte
produz em nós. Sentimos empatia e compaixão
pelo outro quando compreendemos o que o outro
está sentindo. Compartilhar com ele um
sentimento, um sentido vivencial, é, de certa
maneira, o fundamento da Ética: saber a dor do
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outro. Esse é o aprendizado fundamental que a arte
nos dá: ter a experiência de outras pessoas, saber o
que o outro está sentindo, aprender o sentimento
do outro, inclusive de povos diferentes, de situações
diferentes. Essa formação humana, acredito, seja o
que de mais fundamental nos dê a arte. Contudo,
acho que não devemos ter uma visão muito
romântica de que a arte sozinha, por si mesma,
forma as pessoas, pois existe toda uma dimensão
ética que deve ser discutida ao lado da arte. E este é
um ponto que enfatizo muito no trabalho com
meus alunos.

Não sei se você conhece um documentário do


Peter Cohen que se chama “Arquitetura da
Destruição”, um filme fundamental sobre a
dimensão estética do nazismo. Hitler era um pintor
de aquarela, todos os membros da SS nazista
tinham um pé na arte: eram pintores, violinistas,
poetas... Precisamente esse documentário discute
como o nazismo era um fenômeno, antes de
político, estético. Hitler queria “embelezar” o
mundo, queria acabar com tudo aquilo que era
“feio” e “por acaso” os negros, os judeus e os
homossexuais faziam parte dessas “coisas feias”.
Assim, o que o filme nos mostra é o projeto nazista
como uma busca de Hitler de um mundo “bonito”,
ao modo dele, claro. A gente tem que tomar o
cuidado de não acreditar que apenas a arte em si
mesma consiga produzir pessoas boas, eticamente
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falando. No entanto, a arte é um fundamento a
partir do qual se pode discutir Ética, relações
humanas, cidadania, tudo isso, mas são dimensões
complementares: o sensível e o inteligível. Eu tenho
muito medo dessa visão romântica segundo a qual a
arte vai nos libertar... Da mesma forma como o
Nazismo era profundamente estético, existem
certos psicopatas, certos “Serial Killers” que
pretendem imprimir um caráter estético em seus
assassinatos. Vamos devagar com esse romantismo
que, inclusive, é muito perigoso.

M. A. - A arte ajuda a educação?

Duarte Jr. - Acredito firmemente que sim. Há,


inclusive, discussões se pessoas mais sensíveis, mais
atentas às percepções diferentes de mundo não se
tornam cientistas melhores. Por exemplo, como é
que as grandes descobertas da Razão se apoiaram
em sensações estéticas, em construções estéticas?
Einstein falava muito sobre isso: que a razão era um
produto final de todo um sentimento, de visões de
mundo, imagens ligadas à estética, ao sensível;
então essa conexão entre o conhecimento
inteligível e o saber sensível é bastante forte; Arte e
Ciência estão muito próximas e, infelizmente,
aparecem separadas na nossa educação, na nossa
modernidade. Uma pessoa que considero muito
interessante é o professor Jorge Albuquerque
Vieira, um engenheiro (de formação) que trabalha
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com Cosmologia e hoje é professor do curso de
Dança na PUC de São Paulo. Como exemplo, ele é
um dos muitos que refletem sobre essa conexão
entre Arte e Ciência. Em seus escritos e suas
palestras procura sempre mostrar que a nossa
humana visão do universo, a nossa construção dos
mais amplos sentidos, inclusive através da ciência, é
profundamente estética.

M. A. – Dentro desse contexto da arte-


educação, da arte na escola... A educação ajuda a
arte?

Duarte Jr. – Depende de que educação nós


estamos falando.

M. A. – Da educação escolar.

Duarte Jr. – Do jeito que ela está ocorrendo


hoje, acho que até afasta as crianças da arte. A escola
atualmente é feita para a educação profissio-
nalizante, uma educação para se prestar vestibular,
para se entrar no mercado de trabalho, quer dizer, a
arte, vale dizer a poesia em sentido amplo, é algo
inútil do ponto de vista do mercado de trabalho.
Para esse tipo de escola a Arte é vista como algo não
sério, algo que não tem utilidade. Para uma escola
que pretenda a formação do ser humano, sim, a arte
é importante e a escola é importante para a arte, elas
se complementam, mas para uma escola baseada
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numa visão profissionalizante, numa visão
funcionalista, não, a aula de arte atrapalha, esse
tempo poderia muito bem ser ocupado pelo ensino
da matemática ou do português, que são mais úteis.
Esse é o tipo de escola que a gente construiu e na
qual a esmagadora maioria acredita.

M. A. – Em seu novo livro – A montanha e o


videogame – qual reflexão você traz sobre arte-
educação?

Duarte Jr. – O que eu estava falando acerca de


se ficar ensinando Teoria da Arte e não se ter
experiência estética nenhuma é algo que acontece
há muito tempo dentro das aulas de Português.
Digo isso porque nesse novo livro há um ensaio
intitulado “O Poético, a Poesia e o Poema na
Educação Estética” no qual discuto um pouco isto.
Penso que a Poesia, no sentido dos poemas, é algo
que tem que ser tratada dentro das aulas de arte e
não ficar restrita à aula de Português, porque em
geral os poemas nas aulas de Português se tornam
cadáveres a serem dissecados com os bisturis
teóricos. Transforma-se uma obra de arte num
corpo sem vida e dele se vai extraindo os órgãos:
objetos diretos, sinédoques, metáforas, metonímias
etc. E o que, com esse procedimento, acaba morto
no estudante é qualquer tesão pela literatura,
qualquer prazer de um encontro poético. A mesma
coisa se faz com os romances, não é? Obriga-se o
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estudante a ler um romance, depois a fichá-lo e por
fim a se submeter a uma avaliação teórica acerca
dele. E em geral um romance construído numa
linguagem que não é mais a dele, uma linguagem do
século XIX: José de Alencar, Machado de Assis...
Machado de Assis é uma leitura extremamente rica
e prazerosa, mas para depois que você se torna um
leitor; para um adolescente de 14, 15 anos,
Machado de Assis não emprega a linguagem com a
qual ele está acostumado – a questão do código
discutida anteriormente. É preciso que ele leia os
autores contemporâneos, que falam do universo
dele, e não ler por obrigação de fichar, de fazer uma
prova. O que acaba acontecendo é que essas aulas
matam na criança e no adolescente o prazer da
leitura, tornando a leitura uma coisa chata e não
uma aventura.

Estão fazendo a mesma coisa com a arte.


Acabam tornando a aula de arte algo maçante,
chato; você tem que ficar vendo qual é o período em
que foi produzida tal obra, qual é o estilo da outra...
Não é isso. Assim, aquilo que se vê acontecer em
uma aula de Literatura, de Português, está
ocorrendo na aula de Arte também. A obra de arte,
seja ela um poema, um filme ou um quadro, nesses
casos se torna simplesmente uma desculpa, um
pretexto, para se aprender teoria, seja Português,
História da Arte, qualquer coisa nessa direção. Essa
- 28 -
é a questão: a arte só passa a ser valorizada na escola
à medida que você pode usá-la para adquirir uma
sabedoria, um conhecimento considerado sério,
como a Gramática ou as Escolas Literárias, no caso
do Português, ou a História da Arte no caso das
artes plásticas. Então, é como se a escola só
admitisse a arte na medida em que ela fosse um
pretexto para aprender disciplinas consideradas
sérias, reflexivas. Um teórico da Literatura chamado
Tzvetan Todorov passou a vida fazendo teoria
literária —semiótica e todas aquelas coisas
complicadas dos linguistas – e agora, já entrando
nos anos, escreveu um livro chamado “A literatura
em perigo”, no qual procura discutir exatamente isto
que estou apontando. Afirma ele que tudo aquilo
que passou a vida estudando no âmbito da teoria
literária deve servir apenas para especialistas, não é
jamais para ser ensinado nas escolas, para as
crianças e jovens. As crianças e os adolescentes têm
que ter o prazer da leitura, não devem ler por
obrigação e para fazer uma prova. O Jorge Luis
Borges falava isso também: se você começar a ler
um livro —pode ser o livro que um crítico indicou,
uma grande obra da literatura universal, qualquer
coisa monumental —e começar a achar chato, não
leia, porque tal livro ou não foi escrito para você ou
ainda não é o seu momento de lê-lo. Haverá sempre
outro livro de que você vai gostar. Não somos
obrigados a ler porque determinado livro é um
- 29 -
clássico, nada disso! O Borges dizia e reafirmava:
“só leia o que lhe der prazer”. É assim que
aprendemos a ler: lendo aquilo que nos dá prazer. A
arte, qualquer forma de arte, deve ser, sobretudo,
um convite ao prazer. E parece que este sempre foi
mal visto nas escolas. Aliás, nelas se aprende a opor
o dever ao prazer.

M. A. – Como você chegou à arte-educação?

Duarte Jr. - Cheguei naturalmente, ao longo de


minha história de vida. Comecei a ler com três anos
de idade e aprendi a ler brincando. Eu ia para a praça
em Limeira (onde nasci e passei minha infância)
com meu avô, todos os dias, e nela havia bancos de
granito que eram doados por firmas da cidade, nos
quais os nomes dessas firmas estavam gravados:
“Casa Agrícola”, “Ao Rei do Armarinho” etc. Assim,
em cada banco estava escrito algo e eu queria saber
o que eram aquelas coisas, aqueles traços que
estavam lá, e o meu avô ia me explicando, me
ensinando as letras, as palavras. Foi dessa forma que,
brincando na praça, eu aprendi a ler de forma
prazerosa. Cheguei a me tornar uma espécie de
“atração turística” da cidade, pois as pessoas que
passavam me pediam para ler isso ou aquilo e eu
ganhava balas e elogios depois. Portanto, aprendi a
ler brincando nos bancos de jardim e não nos
bancos de escola – apesar do que diz o Paulo Freire,

- 30 -
a minha educação foi uma educação bancária que
funcionou (risos).

E meu pai tinha uma boa biblioteca, na qual eu


também passava muito tempo. No começo lia
muito histórias em quadrinhos: Tio Patinhas, Pato
Donald, essas coisas. Depois comecei a ler livros da
biblioteca do meu pai; pegava o que eu queria.
Comecei a ler Monteiro Lobato e sempre fui lendo
tudo; pegava Shakespeare e olhava, e se não gostava
deixava. Eu lia coisas do tipo “O Amante de Lady
Chatterley”, contos de terror do Poe e outras coisas
adultas. Li todo o Sherlock Holmes e as demais
obras do Conan Doyle. O universo da leitura, deste
modo, eu descobri sozinho, e lia aquilo que me dava
prazer. A leitura em minha vida foi algo surgido da
experiência, não de uma obrigação, tanto é que,
quando na escola tinha que fazer uma análise
sintática, não conseguia, eu sempre fui mau aluno
de português, sempre escrevi e li desde criança e até
hoje não sei fazer análise sintática (risos), tenho
apenas uma idéia vaga do que seja análise sintática;
quer dizer, eu até sei aquelas conjunções, mas
aprendi-as com a prática, não pelo estudo da
Gramática. Isso vem depois, as regras e o nosso
interesse em conhecê-las vêm após do prazer da
leitura.
A arte para mim sempre foi algo natural, a
Teoria da Arte é que veio posteriormente. Só me

- 31 -
interessei em estudar Teoria da Arte muito mais
tarde, porque para mim a arte era uma vivência. E
em minha época de menino – em 1957, 58, quando
tinha quatro ou cinco anos – a televisão era
diferente dessa de hoje. Existia a TV Tupi, a mais
famosa, localizada aqui no estado de São Paulo, e
em sua programação havia três programas de
teatro: Grande Teatro Tupi, TV de Vanguarda e
TV de Comédia, os quais apresentavam sempre
uma peça da dramaturgia, ou um conto, ou um
romance adaptado para a televisão – não existia
videoteipe na época, tudo se fazia ao vivo. Tinha-se
então um bom teatro semanal com Paulo Autran,
Tônia Carrero, Fernanda Montenegro,
Gianfrancesco Guarnieri, todos eles atuando ali, ao
vivo, na televisão, e eu pequenininho, com cinco ou
seis anos, assistia a tudo aquilo: Shakespeare,
Gogol, Nelson Rodrigues... Via e ficava fascinado
com aquele universo, uma coisa deslumbrante. E
essa emissora também levava ao ar o “Concertos
Para a Juventude”, em que orquestras executavam,
também ao vivo, as principais peças do repertório
erudito. A televisão, na época, era uma coisa de elite
cultural, depois é que foi se popularizando. Então,
minha experiência com a arte foi assim: vivia em
uma cidade do interior, em Limeira, em que
raramente se tinha teatro; às vezes, aqui e ali, era até
possível se assistir a algumas peças infantis, mas era
coisa muito rara, e não havia orquestras tocando.
- 32 -
Mas eu tinha o acesso ao universo da arte através
dos livros e da televisão e sempre me foi um prazer
assistir tudo isso, um universo que me fazia sonhar.
Foram experiências fantásticas, marcantes. Tem
coisas de que me lembro até hoje desses
espetáculos, cenas que marcaram muito minha
vida. Meu interesse por arte surgiu dessas
experiências marcadamente emotivas. Depois eu fiz
violão, fiz teatro amador, cursos de pintura,
desenho, e comecei a escrever poemas muito cedo,
com doze anos, mas nada disso deu certo e, por isso,
fui ser professor (risos).

A arte fez parte da minha vida, e o pensar sobre


ela e as experiências que me proporcionava foi
posterior. Enquanto eu cursava psicologia na
faculdade, fazia paralelamente um curso de desenho
e pintura. Pela manhã fazia esse curso, à tarde
psicologia e à noite lecionava no Sindicato dos
Metalúrgicos. Quando fui fazer mestrado é que
comecei a pensar: “a arte foi algo tão importante em
minha vida, contribuiu muito com a minha
educação, com a minha formação humana, então
ela deve ser algo fundamental para a Educação”. Foi
quando eu descobri que existia algo chamado arte-
educação e comecei a pensar nisso, a partir da
minha própria experiência de vida. Eu aprendi com
a arte a vida inteira: literatura, teatro, cinema,
televisão. Eu acho que a escola faz é inverter isso:
- 33 -
dar reflexão antes da experiência. Todavia, se você
não “cai na piscina” não pode pensar sobre o ato de
nadar, só pode pensar sobre o ato de nadar após
haver nadado! A mesma coisa é a experiência com a
arte. E ainda ninguém aprende a escrever com
gramática, você aprende a escrever, escrevendo;
depois é que você começa a ver: “ah, não posso
escrever isso, por isso, por isso, por isso...” Aí você
aprende a escrever escrevendo e lendo. O Rubem
Alves diz que “se as crianças precisassem aprender
gramática antes de aprender a falar elas só
começariam a falar em torno dos vinte anos”. Vale
dizer: você aprende a falar falando, não precisa de
gramática para aprender a falar, as pessoas vão lhe
corrigindo enquanto fala. Se você está num meio
em que as pessoas falam com português correto,
com verbos usados em seus tempos certos, os
pronomes bem colocados, as concordâncias bem
feitas, você vai sendo corrigido e vai aprendendo a
usar os tempos verbais certinhos, a fazer as
concordâncias, sem saber a gramática, e depois é
que você aprende porque está falando daquele jeito.
Na arte é a mesma coisa; infelizmente, a escola
inverte isso. A escola quer que você aprenda a teoria
antes da experiência, quer dizer, não há teoria antes
da experiência, não há reflexão antes da experiência.
Você só pode refletir sobre aquilo que
experimentou, se não, é um pensamento vazio e
sem sentido.
- 34 -
M. A. – Duarte, você fala sobre a experiência
de como você chegou à arte-educação, pela sua
própria história de vida. Mesmo reconhecendo
a importância que a Arte tem para a Educação,
você percebe, por outro lado, que a escola
confunde e trata a arte como conteúdo, ou como
um meio para ensinar um conteúdo.
Atualmente, você conhece alguma experiência
em escola que chegue próximo a isso que você
considera como arte-educação e que você
defende em seu trabalho?

Duarte Jr. – Olha, a gente sabe de alguma


experiência aqui e ali, mas muito pontuais. Não que
eu as tenha conhecido pessoalmente. Acho que
atualmente o trabalho realizado por algumas
ONG's vem se revelando muito mais rico neste
sentido do que a escola formal. Lá na Bahia, seu
estado, em Salvador existe a experiência
educacional do Olodum, que começou com um
trabalho de arte; no Rio existe o Afro-reggae; aqui
em Campinas havia um pessoal com um trabalho
chamado Bate-lata, uma orquestra de percussão
com latas e instrumentos improvisados que eles
mesmos faziam; chegaram até a gravar um LP
inclusive com a participação do Caetano Veloso.
Esses espaços de educação não-formal, não-oficial,
estão muito mais próximos disso que eu entendo
por arte-educação do que a escola propriamente
- 35 -
dita. Na escola oficial são poucas as experiências
dignas de nota. Mas há tentativas até bem sucedidas.
Existem experiências pontuais animadoras em
educação, porém penso que as mais fortes estejam
fora do ensino oficial público, em trabalhos não-
formais ou mesmo em algumas escolas particulares
que, obviamente, destinam-se a poucos. Escolas que
seguem a Pedagogia Waldorf parecem interessantes
ao se basearem numa educação dos sentidos,
embora algumas sejam muito radicais; mas a
metodologia Waldorf é interessante por privilegiar
os sentidos e a experiência.

No Brasil se teve uma experiência bastante


marcante em educação na década de sessenta: os
Ginásios Vocacionais. Foram seis ou sete
estabelecimentos montados no estado de São Paulo
a título experimental, com a esperança de que
fossem bem sucedidos e depois se espalhassem pelo
Brasil. Neles havia uma grande preocupação com a
experiência e a vivência prática, e contavam com
boas oficinas de artes, de marcenaria, de solda etc.
Trabalhava-se com teatro, cinema, artes plásticas,
música e outras manifestações artísticas. A própria
gestão das escolas era compartilhada por alunos,
pais e professores. Quem coordenou sua
implantação foi a professora Maria Nilde Mascelani,
já falecida. Com a ditadura, no entanto, toda a
experiência foi interrompida. Professores foram
presos, responderam a inquéritos militares e a maior
- 36 -
parte de seu acervo, isto é, de sua memória, foi
destruída. Penso que hoje precisamos resgatar essa
experiência, ao menos como história e objeto de
reflexão.

Mas aqui perto de mim conheço uma


experiência interessante em arte-educação,
desenvolvida por um orientando meu, de mestrado,
o Edson Beleza. Ele é professor e hoje também
Secretário de Cultura da cidade de Atibaia, próxima
a Campinas. Pois foi lá que, a partir de suas aulas de
artes plásticas, numa escola da cidade, ele recuperou
uma antiga tradição do município que havia sido
esquecida: os bonecões de carnaval. Começou a
trabalhar com seus alunos confeccionando bonecos
e a coisa se espalhou, primeiro entre os pais e depois
junto à população, que em grande parte aderiu às
oficinas de confecção de bonecos e assim se
reeditou um carnaval familiar na cidade. Após
alguns anos com desfiles dos bonecos ao som de
uma bandinha, hoje já saem às ruas mais de cem
deles, e esse número aumenta ano a ano, com o
patrocínio oficial da prefeitura. Sua dissertação trata
exatamente desta bem sucedida experiência em
arte-educação que começou formalmente no
interior de uma escola e ganhou as ruas, num
trabalho não-formal de educação estética. E o
interessante é que em sua pesquisa ele descobriu
uma foto dos anos dez do século passado em que
um bonecão aparece desfilando junto a músicos
- 37 -
numa esquina daquela cidade. Vale notar que o
primeiro bonecão de Olinda, em Pernambuco, o
Homem da Meia Noite, apenas ganhou as ruas nos
anos trintas. E ainda é preciso dizer que a própria
decoração carnavalesca de Atibaia tornou-se um
trabalho educacional, pois os enfeites e adereços
também são confeccionados em oficinas mantidas
pela prefeitura e destinadas às crianças do
município. Afora o fato de que os bonecos
representam tanto personagens consagrados da
mídia e das artes, como figuras pitorescas e até
importantes do município, escolhidos pelas
crianças, pelos pais ou demais pessoas da cidade que
se entregam à sua feitura.

Essa dissertação, com o título “Folia com


Bonecões: Uma Experiência em Arte-Educação”,
está quase pronta e certamente deverá ser
publicada, pois se trata do relato de como uma
experiência em educação estética pode ser bem
sucedida e contaminar toda uma comunidade.

- 38 -
“Arte é fome”
(Rubem Fonseca)

- 40 -
Entrevista com o artista filósofo-fotógrafo
(filotógrafo) Marcos Cesário – 28.01.11
Por Maisa Antunes

Maisa Antunes - Como você vê a disciplina


arte-educação?

Marcos Cesário - Não vejo. A arte e a educação


se vêem com frequência? A academia é uma
sacerdotisa esquisita, unir em matrimônio duas
inimigas instintivas! Foi um casamento mal
arranjado (risos). Os representantes do poder,
nossos eternos moralistas, sempre desejaram a arte
como sua serviçal. É o seu sonho antigo e medíocre.
A história nos lembra, mesmo sendo ela tão
esquecida (risos), que alguns artistas, como
Michelangelo, Da Vinci, se saíram mais ou menos
bem enfeitando superficialmente a pompa estúpida
dos tiranos e introduzindo com sutileza e delicadeza
formas, luzes e sombras, mas outros como Van
Gogh, Walt Whitman... não tiveram tanta sorte.
Arte na escola, tudo bem: ela nasce, renasce,
ressuscita e sobrevive em todos os tempos e lugares,
mas arte no currículo escolar é uma demonstração
de pretensão, de insensibilidade e mau gosto. A
educação tenta limitar, violenta a arte, e arrota uma
união estável e feliz, não para a arte.
- 41 -
M. A. - As duas não podem ao menos se
ajudar?

M. Cesário - Eventualmente. A educação pode


colaborar reproduzindo o conhecimento da técnica
usada por alguns artistas, mas sabemos que a técnica
é só um meio para alcançar um determinado “fim”,
ou um recomeço, a obra. Mas ela deve ser
assimilada, como instrumento que é, e o que não é
raro, pode, ser reinventada e ultrapassada. Para
Wilde “a obra de arte é um resultado singular de um
temperamento singular” e para chegar ao que
chamamos de original em arte só se ultrapassarmos
os limites cartesianamente ensinados. O
“professor” Gabriel García Marquez alertou:
“façam tudo ao contrário que te ensinaram na
escola”, em um poeta podemos acreditar. A história
da educação é a história da repressão, palmatórias e
derivados... a educação é um corpo machucado,
reprimido e magoado e tanto ressentimento afeta
de forma negativa a arte. Esta última é impulsionada
pelo ódio, pelo amor, pela dor, pela paixão, mas
dificilmente pelo ressentimento. E a educação
munida de tal sentimento (o ressentimento)
confunde seu hábito de medir, ao desejo
descompromissado de contemplar e sentir.
Exupéry sabia o que dizia “os intelectuais
desmontam o rosto para explicá-lo por partes, mas
não sabem apreciar um sorriso”, para vivenciar,
criar, reinventar, os únicos e confiáveis caminhos
- 42 -
são as trilhas raras e humildes da contemplação.

M. A. - Há muitos professores realizando


junto com os estudantes experiências de
natureza poética, estética, através do teatro,
literatura, contos, que você conhece. Que nome
você sugeriria a essas iniciativas de
contemplação de mistério e beleza?

M. Cesário - Arte e deseducação! (Risos).


Conheço professores como você, chegados a uma
bela utopia, que encaram o currículo como uma
resistência que deve ser sabotada e ultrapassada.
Oscar Wilde disse que a linguagem é mãe do
pensamento, mudamos a linguagem e
transformamos um conceito pretensioso de arte-
educação em tentativa verdadeira e humilde de
contemplação. Seja como for arte não educa. Arte
deseduca.

M. A. - Você sempre fala de comunicadores


de beleza. Poderia definir melhor aqui?

M. Cesário - Como já disse, contempladores,


diletantes, amantes da imaginação. Edgar Allan Poe
no prefácio de um dos seus livros nos presenteou
com a seguinte dedicatória: “dedico este livro aos
que sentem mais do que aqueles que pensam”. Para
comunicar a beleza tem que amar o desconhecido,
aceitar o mistério, matéria invisível e concreta que

- 43 -
sustenta o mundo que reinventamos e vivemos. Só
poetas travestidos de professores sabem que “a
realidade é o que a gente vê e não o que ela é”
(Gabriel García Marquez). Que a vida... “o que vejo
e que sou e suponho não é mais que um sonho num
sonho” (Edgar Allan Poe). Sendo assim, os únicos
que são capazes de ensinar são aqueles que são
capazes de desaprender o aprendido, assumindo
um eterno caso de amor com o mistério da beleza,
terreno sempre desconhecido. “A arte é um véu e
não um espelho” (Oscar Wilde). E a interpretação
desse véu é algo imprevisível... Schopenhauer, “você
pode fazer o que quer, mas não pode querer o que
quer”.

M. A. - A arte pode ser ensinada?

M. Cesário - Não! Albert Camus “os homens


não aprendem com as circunstâncias, mas com o
contato do seu temperamento com as
circunstâncias tornam-se o que são”. Demorei
muito tempo para entender racionalmente – se é
que entendo hoje – o que despertou em mim o
gosto pelo transcendente e aparentemente irreal.
Há pouco tempo lembrei de um episódio em minha
adolescência, numa festa provinciana, o poeta
Jotacê Freitas me saiu com essa: “ovos de avião”, o
que a religião e a educação nunca conseguiram
despertar, este fragmento do poema me revelou, e
hoje conscientemente sinto a presença desta
- 44 -
influência no meu temperamento e na minha arte.
Isso nem eu, nem o poeta em questão poderíamos
prever, e duvido que alguém possa. Não é só uma
questão de acessibilidade à arte. E sim da
sensibilidade, e como sabemos, esta é intraduzível.
Encontrar em um momento indefinível, algo que
possa impulsionar uma tendência individual e
natural. E isso pode acontecer na igreja, numa sala
de aula, ou em um presídio. Conheci um rapaz que
foi preso acusado de tráfico, privado de quase tudo,
em um ambiente que alguns talvez diriam
inartístico, desencantado e magoado descobriu-se
compositor e músico dentro de uma cela, ali
naquele confinamento, o seu temperamento em
contato com tão degradantes circunstâncias
encontrou a música através de uma combinação
imprevisível de fatos, gostos, desgostos e desejos.
Aprender a tocar violão e aprimorar a técnica foi
uma consequência. Arthur Bispo do Rosário,
internado em um manicômio, revelou-nos através
do lixo, e dos restos, do “nada” retratou e reinventou
um todo. Sua desrazão encontrou uma lógica só
dele e tão nossa... este encontro é irreproduzível.
Bob Marley indica: “inspiração ao invés de
educação”.

M. A. - A arte pode ajudar o criador a uma


convivência melhor na sociedade?

M. Cesário - A criação só acontece com uma


- 45 -
postura de exclusão da vida cotidiana. Oscar Wilde
afirma que: “pensamento e linguagem são para o
artista instrumentos de uma arte. Vício e virtude são
para o artista materiais para uma arte”. O que o
filósofo Dandy sabia é que a arte é “inútil” para uma
sociedade que julga e subjuga o indivíduo pelos seus
dotes operários. Por condição, o artista é levado a
ignorar os limites simplórios da educação que está a
serviço da religião e da moral. Se assim é, como
poderá a arte tornar melhor a convivência do
criador com os reprodutores e os reféns das bases
hipócritas que sustentam nossa sociedade? A igreja,
sabemos, inventou e reinventou um inferno, usou
grandes artistas para reproduzir o medo através da
escultura, da pintura (...), estes artistas executavam
com perfeição uma idéia arcaica, por conta disso,
pela forma elevada que os artistas introduziam a um
conceito castrador, os sacerdotes conseguiram
forjar uma sociedade fraca e covarde. Estas obras,
“isoladamente” podem ser apreciadas pela sua
delicadeza e perfeição, mas o uso feito pelos
educadores religiosos destas expressões artísticas,
foi não só nociva, como letal.

M. A. - Então a arte não torna o artista


melhor?

M. Cesário - Na maioria dos casos não. Em


entrevista, Ariano Suassuna afirmou: “só acredito
em fanático”, um fanático, já sabemos, é aquele que
- 46 -
exclui quase tudo em prol de um quase nada, para os
outros, mas que é tudo para ele, “alguém que acredi-
ta apaixonadamente e vive desesperada-mente com
base naquilo que acredita” (Henry Miller). Tenho
um amigo querido, um pintor, que toda fase de cria-
ção “simplesmente” surta. O que de simples não
tem nada. Lembro do meu constrangimento ven-
do-o sedado depois de o terem levado quase amar-
rado a uma clínica psiquiátrica. Visto de lá e ainda
hoje daqui ele não parecia muito próximo das pon-
tes cognitivas que tornam um homem aceitável e
melhor para a convivência social e não parecia que
sua mulher e seus filhos tinham muito interesse em
apreciar um talento que por vezes impulsionava um
carinhoso marido, um bom pai, a chutar a TV e
esmurrar a porta do armário. Entre os infinitos casos
que a história comprova, não isolo este artista em
questão. O genial escritor Proust teve que ser pego a
força pelo irmão, que era médico, para medicá-lo,
porque como fanático ignorava sua fragilidade física
em busca de seu perfeccionismo fanático. Isso não
só não ajudou muito sua reputação moral, como
acelerou sua morte. Ele era muito deseducado,
tanto que afirmou “boas intenções é uma coisa, arte
é outra” e “tudo que se tem de belo no mundo deve-
se aos nervosos”. Se há uma finalidade na arte, ela
não é a ética, e sim a estética.

M. A. - A arte torna o espectador melhor?

- 47 -
M. Cesário - O fim da arte é a própria arte...
Tornar o espectador, alguém "melhor" ou "pior", é
função de quem acredita nas cartilhas, e nos resulta-
dos sempre previsíveis. E o que faz da arte, arte, é a
imprevisibilidade, a espontaneidade. O que a arte
provoca e revela é o individuo e ela só pode ser apre-
endida (não aprendida) pelo temperamento tem-
perado, pelo individualismo. Albert Camus pode
nos ajudar, "a verdade só alcança o homem carnal
pela carne. Por isso seus caminhos são imprevisíve-
is". E cada carne, cada temperamento encontra-se
ou perde-se em si mesmo através das circunstâncias
ou circunstancialmente através de uma obra de arte.

M. A. - O que é arte para você?

M. Cesário - A Arte é minha ilha. É meu com-


promisso com o descompromisso. Minha brisa
furacão. Nunca ferramenta! É meu pássaro colorido
e mutante que só voando torna-se o que é, essencial-
mente livre e saborosamente “inútil”.

- 48 -
FICHA CATALOGRÁFICA

LINS, Claudia Maisa Antunes.


A Arte e a Educação. /Claudia Maisa A. Lins. Juazeiro:
Fonte Viva, 2011.
50 p. il

1.Arte 2. Educação 3. Arte-Educação 4. Entrevista I. Título

CDD 707

Bibliotecária: Gerluce Lustosa – CRB 5ª Região 712

Ficha Técnica

Edição: Maisa Antunes, Edmar Conceição, Emiliana Carvalho


Fotografias: Marcos Cesário (www.marcoscesario.com.br)
Texto Orelha: Edmar Conceição
Decupagem: Emiliana Carvalho
Revisão: Rosângela Gonçalves Cunha
Diagramação: Mário Pires (www.mariopires.com.br)

Impressão: Editora Fonte Viva – Fundação Aloysio Penna


Av. Apolônio Sales, 1059 – Centro
48601-200 – Paulo Afonso – BA
Fone: (75) 3501-3000 – Cel: (75) 9968-2968
Email: contato@editorafonteviva.com.br

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