Você está na página 1de 19
CAPITULO 1 Sociologia e teoria critica do curriculo: uma introdugao Antonio Flavio Barbosa Moreira Tomaz Tadeu Ocurriculo hé muito tempo deixou de ser apenas uma irwa meramente técnica, voltada para questdes relativas a técnicas, métodos. Jé se pode falar agora ica do curriculo, guiada por questdes -as, politicas, epistemol6gicas. Embora questées “como” do curriculo continuem importantes, 6 adquirem sentido dentro de uma perspectiva que lere em sua relagdo com questdes que perguntem qué” das formas de organizagao do conhecimen- Nessa perspectiva, o curriculo é considerado um ar- io social e cultural. Isso significa que ele colocado na és ‘MorEMA-TADEU ‘moldura mais ampla de suas determinagdes sociais, de sua historia, de sua produgao contextual. O currfculo nao é um elemento inocente e neutro de transmissao desinteressada do conhecimento social. O curriculo esté implicado em relagées de poder, o curriculo transmite visoes sociais particulares e interessadas, o curriculo produzidentidades individuais e sociais particulares. O curriculo nao é um elemento transcendente e atemporal — ele tem uma his- t6ria, vinculada a formas especificas e contingentes de onganizacao da sociedade e da educacao. Este capitulo constitui uma pequena introducao a ‘essa tradicao critica e sociolégica do curriculo. Na pri- meira parte, fazemos uma breve incursao pela hist6ria dessa tradigao, mostrando sua génese e seu desenvolvi- ‘mento. Na segunda parte, destacamos os temas centrais dessa perspectiva hoje. Mais do que uma descrigao exaus- tiva desses temas e questdes, essa segunda parte preten- de ser apenas uma visio sintética da forma como se es- trutura hoje 0 campo da anilise critica e sociol6gica do curriculo. |. Emergéncia e desenvolvimento da sociologia e da teoria critica do curriculo Focalizamos, nesta parte do presente artigo, a emer- gencia de uma abordagem sociol6gica e critica do curriculo, tanto nos Estados Unidos, onde o campo se originou e se desenvolveu, como na Inglaterra, onde pela primeira vez se elegeu o curriculo como foco central da Sociologia da Educagio. ‘CURRICULO, CULTURA SOCIEDADE 1. As origens do campo nos Estados Unidos Mesmo antes de se constituir em objeto de estudo de uma especializacio do conhecimento pedagégico, 0 curriculo sempre foi alvo da atengio de todos os que buscavam entender e organizar 0 proceso educativo sscolar, No entanto, foi somente no final do século XIX inicio deste, nos Estados Unidos, que um signifita- ximero de educadores comegou a tratar mais siste- amente de problemas e questdes curriculares, ido inicio a uma série de estudos e iniciativas que, em espaco de tempo, configuraram o surgimento de ovo campo. Diferentes versdes desse surgimento podem ser en- (radas na literatura especializada (Cremin, 1975; Se- 1; Grumet, 1981). Comum s, destaca-se, por parte dos superintendentes mas escolares americanos e dos tedricos conside- \0 precursores do novo campo, a preocupacao istematizagao de modo a evitar que 0 comportamento e 0 do aluno se desviassem de metas e padrdes 108 uma breve descricao do contexto sécio-hist6- qual ela emergiu. 2. Ocontexto americano na virada do século ‘Ap6s a Guerra Civil, a economia americana passou a ser dominada pelo capital industrial, sendo o sistema de competicao livre entao prevalente substituido pelos mo- nopélios. Para a producdo em larga escala foi necessario aumentar as instalacées e 0 ntimero de empregados. O processo de produgao tornou-se socializado e mais com- plexo, enquanto os procedimentos administrativos sofis- ticaram-se e assumiram um cunho “cient ", ‘Umanova concepcio de sociedade, baseada em novas ptdticas e valores derivados do mundo industrial, comegou a ser aceita e difundida. Cooperacdo e especializacao, a0 invés de competi¢ao, configuraram os nticleos deuma nova ideologia. O sucesso na vida profissional passou a requerer de mérito na trajet6ria escolar. Ou seja, novas “chegar ao topo”. ‘Aindustrializagao e a urbanizagao da sociedade, entio em processo, impossibilitaram a preservatao do tipo de vida e da homogeneidade da comunidade rural. Além disso, a presenca dos imigrantes nas grandes metrpoles, com seus diferentes costumes e condutas, acabou por ameacar a cultura ¢ 0s valores da classe média americana, protestante, branca, habitante da cidade pequena. Como consequéncia, fez-se necessario e urgente consolidar e promover tum projeto nacional comum| assim como res~ taurar a homogeneidade em desaparecimento e ensinar as criangas dos imigrantes as crengas e 0s comportamentos dignos de serem adotados. | ‘CURRICULO, CULTURA E SOCIEDADE ‘Aescola foi, entao, vista como capaz de desempenhar papel de relevo no cumprimento de tais fungbes e facilitar a adaptagao das novas geracdes as transformagées econd- micas, sociais e culturais que ocorriam. Na escola, consi- derou-se o curriculo como o instrumento por exceléncia do controle social que se pretendia estabelecer. Coube, sim, A escola inculcar os valores, as condutas e os hébitos \lequados”. Nesse mesmo momento, a preocupagao com ‘a educagio vocacional fez-se notar, evidenciando o propé- ‘0 de ajustar a escola as novas necessidades da economia. cas de ordem, racionalidade ncia. Dai os esforgos de tantos educadores e tedricos surgimento de um novo campo de estudos (Moreira, 1992a, 1992b). 3, Asprimeiras tendéncias © campo do curriculo tem sido associado, tanto em gens como em seu posterior desenvolvimento, as \s de controle social e eficiéncia social, considera- para desvelar os interesses subjacentes a teoria e 1, nao se deve entender 0 novo: jue outras intengdes e outros esses podem ser identificados, tanto em suas manifes- iais como nos estagios subsequentes. Yoltada para a elaboracao de um curriculo que valo- ‘08 interesses do aluno e outra para a construcio 8 ‘Mores -TADEY cientifica de um curriculo que desenvolvesse os aspectos da personalidade adulta entao considerados “desejav ‘A primeira delas é representada pelos trabalhos de Dewey e Kilpatrick, e a segunda, pelo pensamento de Bobbitt. A primeira contribuiu para o desenvolvimento do que no se chamou de escolanovismo ea segunda constituiu a semente do que aqui se denominou de tecnicismo. Pode-se dizer queas duas, em seus momentos inic representaram diferentes respostas as transformagies S0- ciais, politic micas por que passava o pais e que, inda que de formas diversas, procuraram adaptar a esco- Ja eocurriculo a ordem capitalista que se consolidava. As duas tendéncias, juntamente com vestigios e revalorizagées de uma perspectiva mais tradicional de escola e de curri- culo, dominaram 0 pensamento curricular dos anos vinte ao final da década de sessentae inicio da década seguinte. Alguns autores, como Harold Rugg ¢ Ralph Tyler, procu- raram superar os problemas encontrados em ambas e in- corporar suas contribuigGes em sinteses integradoras, nem sempre bem-sticedidas. As mudangas ocorridas nesse pe- riodo conduziram, ainda que no mecanicamente, a pre~ dominios, conflitos e aliancas temporérias, que configura- ram, entdo, as feig&es dos processos de escolarizacao e de desenvolvimento curricular (Kliebard, 1986). 4.0 desenvolvimento posterior Como principais marcos no desenvolvimento do campo,do inicio da década de vinte ao final da de cinquen- ‘CURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE ta, podemos citar: a publicacdo do 26° Anudrio da National Society for the Study of Education; a conferéncia sobre teoria curricular na Universidade de Chicago em 1947; a publi- cacao, em 1949, do livro Princfpios basicos de curriculo e en- sino, escrito por Ralph Tyler; e, finalmente, o movimento da estrutura das disciplinas, desenvolvido mais intensa- mente apés o lancamento do Sputnik pelos russos, em 1957. Aproximando-se o final dos anos cinquenta, os ame- ricanos culparam os educadores, principalmente os pra- lo que julgaram ser sua derrota na corrida espacial. Insistiram, entio, na necessidade de se restaurar ‘a supostamente perdida qualidade da escola. A ajuda fede- ada e recursos foram alocados para a reforma dos curriculos de Ciéncias, Matemética, Estudos Sociais etc. Novos programas, materiais, estratégias e propostas de inamento de professores foram elaborados e implemen- los. A intengao mais ampla, subjacente aos esforgos, era izar a redescoberta, a investigacdo e o pensamento lutivo, a partir do estudo dos contetidos que correspon- A énfase na estrutura, bastante associada ao nome de 1972; Kliebard, rece nao ter contribuido, de fato, para a revolucao ‘a que se pretendeu desenvolver a partir das las e reformas curriculares. Foi, ao menos em parte, izada pelos problemas que desafiaram a sociedade ina nos anos sessenta. Racismo, desemprego, vio- ica urbana, crime, delinquéncia, condigGes precirias de a para os trabalhadores, bem como 0 envolvimento ados Unidos na Guerra do Vietna representaram MOREIRA -TADED motivo de vergonha para os que desejavam ver a riqueza americana mais bem distribuida e sonhavam com a con- cretizacdo de uma sociedade mais democratica, justa e humana. A revolta contra todos esses problemas levou a uma série de protestos eao questionamento das instituicoes e dos valores tradicionais. ‘Um sentimento de crise acabou por instalar-se na sociedade: foi uma crise que chegou a envolver mesmo 0 significado € 0 sentido da vida (Silberman, 1973). Desen- volveu-se, como consequéncia, uma contracultura que enfatizava prazeres sensuais, liberdade sexual, gratificagao imediata, naturalismo, uso de drogas, vida comunitéria, pazelibertacio individual. Inevitavelmente,asinstituicoes ‘educacionais tornaram-se alvos de violentas criticas. De~ rnunciou-se que a escola ndo promovia ascensio social ¢ que, mesmo para as criancas dos grupos dominantes, ra tradicional, opressiva, castradora, violenta ¢ irrelevante. Seria necessario transformé-la e democratizé-la ou entao abolicla e substitu(-la por outro tipo de instituicao (Morei- ra, 1989). ‘Apésa vit6ria de Nixon, uma onda de conservadoris- ‘mo procurou neutralizar as ideias e os valores “subversi- vos” dos anos sessenta. A linguagem da eficiéncia ¢ da produtividade voltou a assumir papel destacado no cené- tio (Shor, 1986). Nesse momento, o discurso pedagogico resumiu-se as seguintes tendéncias: ideias tradicionais que defendiam uma escola eficaz, ideias humanistas que pre- gavam a liberdadena escola eideias utopicas que sugesiam 6 fim das escolas. Representando diferentes vers0es do jdeério liberal, nenhuma questionava mais profundamen- ‘CURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE tea sociedade capitalista que se consolidara, nem 0 papel da escola na preservacio dessa sociedade. il compreender por que autores inconfor- mados com as injusticas e as desigualdades so ressados em denunciar 0 papel da escola e do curriculona reprodugéo da estrutura social e, ainda, preocupados em construir uma escola e um curriculo afinados com os inte- resses dos grupos oprimidos passaram a buscar apoio em teorias sociais desenvolvidas principalmente na Europa para claborar e justificar suas reflexes e propostas. Desse modo, o neomarxismo, a teoria critica da Escola de Frank- furt, as teorias da reprodugio, a nova Sociologia da Edu- agao inglesa, a psicandlise, a fenomenologia, 0 interacio- nismo simbélico e a etnometodologia comecaram a servir de referencial a diversos tedricos preocupados com ques~ curriculares. 5. Aemergéncia de uma nova tendéncia Em 1973, diversos especialistas em curriculo partici- ima conferéncia na Universidade de Rochester, ‘a uma série de tentativas de reconceituacao 1po. A despeito das diferengas entre eles, todos re- Jeltavam a tendéncia curricular dominante, criticando seu ‘taniter instrumental, apolitico e atedrico, bem como sua so de considerar o campo do curriculo como cién- Rejeitavam, em outras palavras, as perspectivas beha- ja e empirista que caracterizavam a ciéncia social wicana e a pesquisa em educagao (Van Manem, 1978). ‘Tratava-se de reconceituar o campo. Enfatizando que a compreensio da natureza é mediatizada pela cultura, 0 ‘grupo concebia reconceituagio como 0 esforgo por desve- lar a tensdo entre natureza e cultura, por descobrir as partes da cultura ndo guiadas pelas leis da natureza, assim ‘como as partes da natureza que ndo eram necessariamen- te obstéculos A ago humana, mas sim produtos do que os homens fizeram e que poderiam, portanto, desfazer. No caso especifico do curriculo, a intengao central era identi- ficar e ajudar a eliminar os aspectos que contribufam para restringira liberdade dos individuos e dos diversos grupos sociais (Pinar e Grumet, 1981). Duas grandes correntes desenvolveram-sea partir da conferéncia: (a) uma associada as Universidades de Wis- consin e Columbia, mais fundamentada no neomarxismo ‘ena teoria critica, cujos representantes mais conhecidos no Brasil sao Michael Apple e Henry Giroux; e (b) outra asso- ciada a tradicao humanista e hermenéutica mais presente na Universidade de Ohio, cujo principal representante pode ser considerado William Pinar. 4 Os reconceitualistas, como se pode observar, nao for- mavam um bloco tinico. Sérias divergéncias os separavam. Para os neomarxistas, os humanistas secundarizavam a base social e 0 carter contingencial da experiéncia indivi- dual, Estes tiltimos, por sua vez, acusavam os primeiros de subordinara experiéncia humana a estrutura de classes, dela eliminando a especificidade, a inventividade, bem como a capacidade de resisténcia e de transcendéncia. ‘Ao final dos anos setenta novas tendéncias ajudavam_ a compor o campo do curriculo, favorecendo a andlise €a ‘CURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE compreensio de outras questdes. Nao mais se supervalo- rizavam o planejamento, a implementacao e o controle de curriculos. Nao mais se enfatizavam os objetivos compor- tamentais. Nao mais se incentivava a adogao de procedi- ‘mentos “cientificos” de avaliagao. Nao mais se considera- va a pesquisa educacional quantitativa como o melhor caminho para se produzir conhecimento. Deslocaram-se e renovaram-se, em sintese, 0s focos e as preocupagées. Dentre os reconceitualistas, foram os autores associa~ dos & orientacao neomarxista os precursores, nos Estados Unidos, do que se convencionou chamar de Sociologia do Curriculo, voltada para o exame das relagdes entre curri- ¢ estrutura social, curriculo e cultura, curriculo e oder, curriculo e ideologia, curriculo e controle social etc. Reitere-se a preocupagao maior do novo enfoque: entender favor de quem o curriculo trabalha e como fazé-lo traba- a favor dos grupos e classes oprimidos. Para isso, discute-se o que contribui, tanto no curriculo formal como | no curriculo em ago e no curriculo oculto, para a repro- de desigualdades sociais. Identificam-se e valori- », por outro lado, as contradigGes e as resisténcias sno proceso, buscando-se formas de desenvolver ibertador. sngGes similares ocuparam a atencao, mais ou me- ‘hos na mesma ocasiao, de socidlogos briténicos que, sob a Jideranga de Michael Young, se esforcaram por definir ‘08 rumos para a Sociologia da Educacao. Enquanto nos Unidos uma andlise sociolgica do curriculo ca- os estudos de professores mais ligados a Depar- wentos de Curriculo e Instrugdo, na Inglaterra foram a MOREIRA TADEU principalmente os soci6logos do Departamento de Socio- logia da Educacio do Instituto de Educ da Universi- dade de Londres que conceberam a Sociologia da Educacdo como uma sociologia do conhecimento escolar, ou seja, ‘como uma sociologia do curriculo. Amatriz.desses esforcos recebeu o nome de Nova Sociologia da Educagao (NSE). 6.Aemergénciada NSEna Inglaterra Na virada do século, enquanto nos Estados Unidos na Europa Continental a Sociologia difundia-se com rela~ tiva rapidez, na Gri-Bretanha seu desenvolvimento pro~ cessava-se com bastante lentidao. Mesmo assim, um grupo de académicos, inspirados em sua maioria pela obra de Fréderic Le Play, fundou a Sociological Society. Criou tam- bém o Instituto de Sociologia e passou a publicar por muitos anos a revista Sociological Review. Nessa ocasio, 0 tinico centro académico de estudos sociol6gicos era a Lon- don School of Economics (LSE). Durante 0 periodo de 1950-1980 novos rumos te6ricos © metodol6gicos transformaram a feicao do ensino ¢ da pesquisa de Sociologia na Gra-Bretanha. A base institucio~ nal da disciplina ampliou-se, 0 que facilitou sua expans40 nna educagao secundaria e na universidade, apesar da re- jeigdo inicial por parte de alguns renomados centros. Oxford e Cambridge, por exemplo, ndo ofereceram cursos de Sociologia até 1955 e 1961, respectivamente (Heath e Edmondson, 1981). (O gradual abandono do funcionalismo estrutural, que apés a Segunda Guerra Mundial se mostrava incapaz de CCURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE 2s dar conta tanto do surgimento como da permanéncia de crises econémicas, sociais e politicas na Gra-Bretanha, in- centivou a busca dos novos rumos acima mencionados. Dentre as novas fontes, destacaram-se a fenomenolo- gia, a etnometodologia, o interacionismo simbélico ¢ um marxismo reelaborado, cujas influéncias se fizeram sentir tanto nos estudos mais gerais de Soci ferentes dreas de especializagao (Abrams, Deem, Finch & Rock, 1981). mente a partir do inicio da década de sessen- es, dos negros, dos homossexuais etc. Os soci6- s voltaram-se entao para o exame da relagao entre \ecimento e aco e para a necessidade de eliminar do salho sociol6gico prevalente seus aspectos patriarcais e stas. No inicio dos anos setenta assistiu-se ao desapareci- mento definitivo do consenso tedrico e metodolégico antes jinante. Resumidamente, pode-se dizer que de 1950 a verificou o crescimento tanto da pesquisa social da como do ensino de uma Sociologia renovada. Ou ente com os propésitos deste artigo, pode-se dizer que os cinquenta apresentou desenvolvimento inci apesar da influéncia de Marx, Weber e Durkhein anilises sociolégicas da educagio (Karabel e Halsey, e MOREIRA -TADEL 1977). Segundo Bernstein (1975), 0s debates dos anos cin- quenta focalizavam tanto a estrutura ‘organizacional da escola como as origens sociais da inteligencia esua relacao com o desempenho escolar, tendo como pano de fundo a preocupacio simulténea com as necessidades da socieda- de industrial e com maior justica social. A intengdo era demonstrat, mais que compreender, as fontes institucionais da desigualdade em educagio, o que explica os grandes levantamentos, na metade do século, que evidenciavam 0 desperdicio em educacao. ‘A énfase no desperdicio ¢ nas disfung6es ligava-se, complementarmente, & busca de eficiéncia em educacio: desejava-se garantir oaproveitamento de fato dos recursos humanos disponiveis. As estruturas elitistas da educagao ‘no mais sejustificavam, quer em termos econdmicos, quer em termos politicos. A desigualdade em educagio era in- dubitavelmente injusta e ineficiente. Daf a tentativa, por parte dos sociélogos, de interferi através de seus estudos, na politica educacional vigente. Daf, ainda, o focoinsisten- tena relacio entre classe social e oportunidade educacional (Young, 1984). (& Apartir dos anos sessenta, 0 intenso desenvolvimen- 9 da Sociologia da Educagao pode ser atribuido aos se- ‘guintes fatores: (a) mudancas na formagio de professores, cujo curso passou de trés para quatro anos, ineluindo-se aadisciplina em pauta nos contetidos do ano adicional; (b) criagdo de cursos de pés-graduacao de Sociologia da Educacdo; (6) oferecimento de cursos da disciplina na Open University para professores formados; ¢ (4) conces sio de recursos para pesquisas e bolsas para estudos ‘CURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE pés-graduados pelo Conselho de Pesquisa em Ciéncia Social (Young, 1984). A Sociologia da Educagao inscreveu-se, entéo, no curriculo da formagao de professores. As novas influéncias te6ricas, que afetaram os rumos da Sociologia Geral, afe- taram também a Sociologia da Educacao ensinada aos futuros mestres, Uma nova Sociologia da Educagio flores- ceu e estabeleceu como seu principal objeto de estudo 0 \ curriculo escolar, aproximando-se, assim, da Sociologia do Conhecimento. ANSE constituiu-se na primeira corrente sociolégica de fato voltada para 0 estudo do curriculo, O grande mar- co de sua emergéncia tem sido considerado 0 livroeditado por Young, Knowledge and control: new directions for the logy of education (1971), no qual foram reunidos artigos ‘ersos autores, dentre os quais se destacam os de Bernstein, Nell Keddie, Pierre Bourdieu e Geoffrey land e o que se tornou classico na Sociologia do Curri- scrito pelo proprio Young, “An approach to the study of curricula as socially organized knowledge’. Tanto os primeiros textos da NSE como seus desdo- bramentos permanecem até hoje insuficientemente divul- Iva, 1990). Contudo, ainda que poucas es dessa abordagem, bem como reduzido mimero de itigos de Young tenham sido traduzidos e publicados :, foi consideravel a influéncia da NSE no desen- vimento inicial e nos rumos posteriores da Sociologia, Curriculo, tanto na Inglaterra como nos Estados Unidos. formulagées tém constituido referéncia indispensdvel los os que se vém esforcando por compreender as 8 relagSes entre os processos de selegio, distribuigdo, orga- nizacao e ensino dos contetidos curriculares e a estrutura de poder do contexto social inclusivo. _.l.Uma visio sintética dos temas centras da andlise critica e »°% sociolégica do curriculo © que se pode aprender dessa breve excursdo pela ia da teoria critica e da Sociologia do Curriculo é que o conhecimento corporificado como curriculo educa- sional nao pode ser mais analisado fora de sua constitui- ‘Gao social e hist6rica. Nao é mais possivel alegar qualquer » inocéncia a respeito do papel constitutivo do conhecimen- to organizado em forma curricular e transmitido nas instituigdes educacionais. A Teoria Curricular nao pode mais, depois disso, se preocupar apenas com a organiza- ao do conhecimento escolar, nem pode encarar de modo ingénuo e nao problemético 0 conhecimento recebido. O curriculo existente, isto é, 0 conhecimento, organizado para ser transmitido nas instituigdes educacionais, passa a ser visto nao apenas como implicado na producao de relagdes assimétricas de poder no interior da escola e da sociedade, mas também como hist6rica e socialmente contingente. O curriculo é uma drea contestada, € uma arena politica. E para um breve mapeamento das questoes ~ temas que continuam centrais na Teoria Critica e na Sociologia do Curriculo que nos voltamos agora. Orga- nizamos esse mapeamento em torno de trés eixos: ideo logia, cultura, poder. a Tuoi ro Seuidl CCuRRIcuLo, CULTURA ESOCIEDADE 2» 1. Curcaloeideologia Desde o inicio da teorizagao critica em educagio, ‘ideologia’ tem sido um dos conceitos centrais a orientar a anilise da escolarizacdo, em geral, e a do curriculo, em particular. O ensaio de Louis Althusser (1983), “A Ideologia 05 Aparelhos Ideol6gicos de Estado”, marca, naturalmen- te, o in{cio da preocupacio com a questo da ideologia em educagao. Aquele ensaio rompia com a nogo liberal ¢ tradicional da educagao como desinteressadamente envol- vida com a transmissdo de conhecimento e lancava as bases para toda a teorizagéo que se seguiria. Fundamentalmente, Althusser argumentava que a eclucagao constituiria um dos principais dispositivos atra- yés do qual a classe dominante transmitiria suas ideias sobre o mundo social, garantindo assim a reprodugao da " estrutura social existente. Essas ideias seriam diferencial- mente transmitidas, na escola, as criangas das diferentes classes: uma visdo de mundo apropriada aos que estavam “destinados a dominar, outra, aos que se destinavam as posigdes sociais subordinadas. Essa transmissao diferencial seria garantida pelo fato de que as criancas das diferentes classes sociais saem da escola em diferentes pontos da ‘carreira escolar: os que saem antes “aprenderiam” as ati- ules e valores préprios das classes subalternas, os que sm até o fim seriam s : \dos no modo de ver 0 indo proprio das classes dominantes. Além disso, er era explicito a respeito dos mecanismos pelos ‘essas diferenciadas visdes de mundo eram transmi- e forma geral, essa transmissao da ideologia estaria » conhecimento transmutado em curriculo escolar atua para produzir identidades individuais e sociais no interior das instituigdes educacionais. A ideologia certamente esté no centro desse proceso. Nesse sentido, falar de curriculo implica necessariamente levantat a questao da ideologia. 2. Curriculo e cultura Se ideologia e curriculo nao podem ser vistos separa- .'dos na teorizagao educacional critica, cultura e curriculo constituem um par insepardvel ja na teoria educacional tradicional. Nessa visio, que éa educacao e, em particular, \o curriculo, sendo uma forma institucionalizada de trans- mitir a cultura de uma sociedade? © "A teorizagao critica, de certa forma, continua essa iradigao, A educagao e o curriculo sao vistos como profun- ‘damente envolvidos com 0 processo cultural. Entretanto, hd diferencas importantes a serem enfatizadas. De forma geral, a educacio e 0 curriculo estado, sim, envolvidos com ‘esse proceso, mas ele é visto, ao contrario do pensamento convencional, como fundamentalmente politico. Na tradigao critica, a cultura néo é vista como um conjunto inerte e estético de valores e conhecimentos a serem transmitidos de forma nao problematica a uma nova geracdo, nem ela existe de forma unitéria e homogenea. Em vez disso, o curriculo ea educagio estao profundamen- te envolvidos em uma politica cultural, o que significa que sio tanto campos de produgio ativa de cultura quanto ‘campos contestados ‘CURRICULO, CULTURA ESOCIEDADE Em contraste com o pensamento convencional sobre a relagdo entre curriculo e cultura, a tradigao critica vé 0 curriculo como terreno de produgio e criagao simbélica, cultural. A educagao e o curriculo ndo atuam, nessa visio, apenas como correias transmissoras de uma cultura pro- duzida em um outro local, por outros agentes, mas s4o partes integrantes e ativas de um proceso de produgao ¢ ccriagdo de sentidos, de significagdes, de sujeitos. O curri- culo pode ser movimentado por intencdes oficiais de ansmissao de uma cultura oficial, mas 0 resultado nunta 4 intencionado porque, precisamente, essa transmissa0 se da em um contexto cultural de significagao ativa dos materiais recebidos. A cultura e o cultural, nesse sentido, inio estao tanto naquilo que se transmite quanto naquilo que se faz com o que se transmite. Obviamente, a visio tradicional da relacdo entre cul- Jura e educagao/curriculo nao vé o campo cultural como ‘reno contestado. Na concepgio critica, nao existe uma cultura da sociedade, unitaria, homogénea e univer- “galmente aceita e praticada e, por isso, digna de ser trans- futuras geragdes através do curriculo. Em vez a cultura é vista menos como uma coisa e mais como mpo e terfeno de luta. Nessa visio, a cultura é 0 :m que se enfrentam diferentes e conflitantes con- € aquilo pelo qual se luta e nao ‘Awsim, nessa perspectiva, a ideia de cultura ¢insepa- dia de grupos e classes sociais. Em uma sociedade da, a cultura é o terreno por exceléncia onde se da a jpela manutengao ou superagio das divisdes soc ediucacional, por sua vez, é o terreno privile- Rena -TADEL de manifestacio desse & isto, tal como na Vis Tradicional, como tim Local Je ama cuturaincontestada eunitéria, mas ‘ge tentard impor tantoa definicto esso de continui- vty eociedade como win tody é visto aqui al das divisdes produgao cultural esc! ‘Basa perspectiva da culture ‘como uum campo Contes: amplicagdes importantes para a teoria stica. Se combinamos e552 visso com aquela lonhecimento como FePre geatidade” S0m08 OP onal, do curriculo que 0 Y sr jo conhecimento como UMA culo 6, assim, um ter ral no qual 0S ria-prima dec e transgressa0- materials © jagio,recria a teorizaco edt Ge existe uma nose central curricular critica €2 46 poder: rigados a rejei- como um "coi ‘materiais inertes- jucacional fia visto de que # educa csi, CULTURA ESOCEDADE agbes de poder au 1o esto profundament® fe dé a teorizacio educ te politico. Iss0n30 mo daquilo que constitu © poder, conceituais sobre 0 Poder é se manifesta em 121200 « de poder, 20 8 riculo, S¢8 Para nao entrar em IONgAS representacao des individuais' suficiente grupos poder. Por ou fo curriculo, 52 a uma questio f forma, 0 curriculo tro lado, a presentar, no set ‘dos interesses dO esociais que ait tentes, fazendo com que OS jmplicados em re acional critica set quer dizer que no contexto facilmente cinterminaveis discusses afirmar aqui que © é,em elagoes estao subme- .. Na visao critica, tnhas divisorias que SP de classe, etniay constituidor: Por um + daquilo que ortante, express@ em vantage expresso ypesar de ‘ao expressar essa aspecto “Ofi- x» MORERA-TADED grupos subjugados continuem subjugados. O curriculo esté, assim, no centro de relagées de poder. Seu aspecto contestado nao 6 demonstracao de que o poder nao existe, mas apenas de que o poder nao se realiza exatamente 9 conforme suas intengSes. yo Reconhecer que o curriculo est atravessado por _o relagGes de poder nao significa ter identificado essas re- © lagdes. Grande parte da tarefa da anélise educacional critica consiste precisamente em efetuar essa identificacao. E exatamente porque o poder nao se manifesta de forma tdo cristalina e identificdvel que essa andlise é importan- te, No caso do curriculo, cabe perguntar: que forcas fazem com que 0 curriculo oficial seja hegeménico e que forgas fazem com que esse curriculo aja para produzir identida- des sociais que ajudam a prolongar as relagoes de poder existentes? Essas forcas vio desde o poder dos grupos € das classes dominantes corporificado no Estado — uma fonte central de poder em uma educagao estatalmente controlada — quanto nos intimeros atos cotidianos nas escolas e salas de aula que sao expressdes sutis e comple- xas de importantes relacdes de poder. Nesse sentido, € importante nao identificar 0 poder simplesmente com pessoas ou atos legais, o que poderia levar a negligenciar as relacdes de poder inscritas nas rotinas e rituais insti- tucionais cotidianos. Isso transforma a tarefa da teorizacao curricular criti- ca em um esforgo continuo de identificagao e analise das relagdes de poder envolvidas na educagao e no curriculo. Quais so as relagdes de classe, etnia, género, que fazem com que o curriculo seja 0 que é e que produza os efeitos ‘CunRicULO, CULTURA ESOCIEDADE » que produz? Qual o papel dos elementos da dinamica educacional e curricular envolvidos nesse processo? Qual éonosso papel, como trabalhadores culturais da educagao, esse processo? Saber que 0 poder nao é apenas um mal, nem tem uma fonte facilmente identificavel, torna, eviden- temente, essa tarefa mais diffcil, mas talvez menos frus- trante, na medida em que sabemos que 0 objetivo nao é remover o poder de uma vez por todas, mas combaté-lo, pre. Fssa luta levard nao a uma situagao de nao poder, sa relagdes de poder transformadas. O curriculo, como campo cultural, como campo de construgao e produgio de cages e sentido, torna-se, assim, um terreno central dessa luta de transformacao das relagdes de poder. “4, Outros temas e questées: os antigas e as emergentes Ideologia, cultura e poder, em suas relagdes com 0 ‘0 assim conceitos centrais e que sintetizam as se problematicas da teorizacao educacional iretanto, ha outras questdes e outros temas im- yntes que ampliam e estendem 0 alcance desses con- (ios. Mencionamos, a seguir, apenas alguns dentre {ios que mereceriam ser considerados. Um desses conceitos € 0 de curriculo oculto. Esse criado para se referir aqueles aspectos da expe- al nao explicitados no curriculo oficial, fa banalizacao decorrente de sua utilizagao ele continua importante na tarefa de * ‘MOREIRA TADED compreender 0 papel do curriculo na produgio de deter- minados tipos de personalidade. Entretanto, ao atribuir a forca e o centro desse processo aquelas experiéncias e itos, 0 conceito também oficial e formal de sua responsabilidade na formagio de sujeitos sociais. necessario reintegrar o curriculo oficial a andlise do papel do currfculo na produgio e reprodugio cultural e social, ao lado, evidentemente, do currfculo oculto. E central a essa tarefa de investigacao do curriculo oficial uma perspectiva que tenha um foco histérico. A contingéncia e a historicidade dos presentes arranjos cur- riculares 56 seréo postas em relevo por uma andlise que flagre os momentos hist6ricos em que esses arranjos foram concebidos e tornaram-se “naturais”. Desnaturalizar e historicizar 0 curriculo existente é um passo importante na tarefa politica de estabelecer objetivos alternativos e arranjos curriculares que sejam transgressivos da ordem curricular existente. £ por isso que uma historia do curri- culo deve ser parte integrante de uma Teoria Critica do Curriculo dedicada a construgéo de ordens curriculares alternativas. Ahist6ria do curriculo tem sido importante na tarefa de questionar a presente ordem curricular em um de seus pontos centrais: a disciplinaridade. Apesar de todas as transformagées importantes ocorridas na natureza e na extensio da produgdo do conhecimento, o currfculo con- ‘tinua fundamentalmente centrado em disciplinas tradicio- nais. Essa disciplinaridade constitu, talvez, 0 nticleo que CunnicuLo, CULTURA SOCIEDADE a primeiro deva ser atacado em uma estratégia de descons- trugio da organizacao curricular existente. Tem-se veicu- lado, com insisténcia, nesse contexto, o papel da chamada ““interdisciplinaridade”. Apesar de sua aparéncia trans- a, € preciso reconhecer que 0 movimento da inter- iplinaridade sup6e a disciplinaridade, deixando, assim, intacto exatamente o fundamento da presente estrutura ular. Seria necessdrio, talvez, um movimento mais ical para minar com mais profundidade essa estrutuga. central a esse movimento reconhecer a disciplinari- je da presente estrutura curricular néo como a traducao ‘a e racional de campos de conhecimento, mas como scrigdo e recontextualizacdo desses campos em um to em que processos de regulacio moral e controle \-se centrais. Nao é apenas a estrutura disciplinar do curriculo que rece constituir um daqueles elementos to “natu le ser inatacavel. As nogGes de conheciment 1s das experiéncias curriculares presentemente aos/as estudantes estao, também, em mais de imensdo, em descompasso com as modificaces com as profundas transformacdes na natureza wilo do conhecimento e também nas formas de con- Fim primeiro lugar, o curriculo escolar tem ficado wrente as formas pelas quais a “cultura popular” (te- )-muisica, videogames, revistas) tém constituido uma Central e importante da vida das criangas e jovens. profundo envolvimento implicado nas econo- edo desejo utilizadas pela “cultura popular”, m ficado solenemente indiferente a esse pro- a MOREIRA TADED cesso. Embora pouco saibamos sobre como essa situagao pode ser modificada, podemos esperar que essa questo logo se torne uma das mais importantes no ambito da teorizagaio educacional critica. Para isso é necessério que os analistas criticos se tornem menos “escolares” e mais “culturais”. Em segundo lugar, as novas tecnologias e a informa- tica ilustram as profundas transformacdes que se estao dando na esfera da produgdo do conhecimento técnico/ administrativo, transformag6es que tém implicagGes tan- to para o “contetido” do conhecimento quanto para sua forma de transmissao. Nao incorporar uma compreensao dessas transformagdes & nossa teorizagio curricular criti- ca significaré entregar a diregao de sua incorporacao & educagao e ao curriculo nas maos de forcas que as utiliza- rao fundamentalmente para séus objetivos mercadolégicos e de preparacao de uma mao de obra adequada aos fins de acumulacao e legitimagao. A teoria educacional critica nao pode ficar indiferente a esse processo, nem tampouco pode rejeité-lo em nome de um certo humanismo antitec- nicista. Em vez disso, é importante compreendé-lo e en- contrar formas de utilizé-lo de uma forma que seja com- pativel com nossos objetivos de democracia, igualdade e justica social. As profundas relagdes entre curriculo e produgio de, identidades sociais e individuais, tantas vezes destacadas na teorizagao critica, tém levado os educadores e educa- doras engajados nessa tradigao, a formular projetos edu- cacionais e curriculares que se contraponham as caracte- risticas que fazem com que o curriculo ea escola reforcem ‘cunpicuto, CULTURA E socieDADE a as desigualdades da presente estrutura social. Nesse con- texto, tem havido uma certa tendéncia a vincular curricu- lo e construgdo da cidadania e do cidadao. Embora esse movimento tenha raizes genuinamente democraticas, ele pode também ser regressivo na medida em que nao esteja atento para flagrar, no seu proprio desejo de formagao de um tipo de identidade, sutis mecanismos de controle e poder. Qualquer projeto que esteja disposto a contestar e ificar suas proprias condicdes de producao e suas s de poder poderd fugir as tendéncias que suposta- ‘mente quer criticar, arriscando, assim, apenas a substituir uma forma de governo — dos individuos e da populacao = por outra. A historia da educagao institucionalizada Mostra que o objetivo de produzir (novos) cidadaos acabou mpre implicado em novas e talvez mais sutis formas de uilagao e padroes de controle e governo (Popkewitz, 9%), jalmente, tem havido importantes modificagGes nas de conceber 0 conhecimento e a linguagem, com icagdes para a teorizacao sobre o curriculo. ligada as nossas concepgdes convencio- dle curriculo, o conhecimento ea linguagem sao vistos, iepresentacio e reflexo da realidade e se fundamen- tum modelo racionalista e humanista do i@ncia. O chamado movimento pés-modernista e ‘virada linguistica” em xequ ‘vém colocar em xeque sm o nticleo mesmo de nos- «le educagao e curriculo. A contestacdo pés-mo- loca em questao o papel das “grandes narrativ: Wo de razdo e racionalidade que tém sido centrais o MORERA-TADEU a0 projeto cognitivo moderno e, derivadamente, Aquilo que entendemos como conhecimento educacional (curri- culo). Ao mesmo tempo, a “virada linguistica” descentra ‘0 sujeito soberano, auténome, racional, unitério, sobre o qual se baseia nossa compreensao convencional do conhe- ‘cimento eda linguagem e, naturalmente, da educagio edo curriculo. Nessa visio, é a linguagem, o discurso e 0 texto que ganham importancia central. Isso tem que ter conse- quéncias profundas e importantes ndo apenas para a forma ‘como analisamos o curriculo, mas também para a forma como vamos organizé-lo. Sao essas consequéncias que ainda nao tém sido suficientemente exploradas, mas que devem ganhar crescentemente ‘mais atencao. ‘Como se vé, a teorizacao critica sobre curriculo, da quala Sociologia do Curriculo é um importante elemento, 6 um processo continuo de andlise e reformulagio. A Teo- ria Critica do Curriculo é um movimento de constante problematizacdo e questionamento. Nesse processo, novas {questdes e temas vém-se incorporar aqueles que, desde o seu inicio, estiveram no centro de sua preocupacao. E isso que constitui sua vitalidade e seu potencial. Esta é uma hist6ria que evidentemente ainda nao terminou. Na ver dade, talvez esteja apenas comecando. Referéncias bibliograficas ABRAMS, P; DEEM, R.; FINCH, J ROCK, P. (Eds.). Practice and progress: British sociology 1950-1980. Londres: George Allen & Unwin, 4 ‘cuRRiCUL0, CULTURA ESOCIEDADE 6 ALTHUSSER, L. Aparelhios ideolégicos de Estado, Rio de Janeiro: Graal, 1983. APPLE, M. W. Community, knowledge and the structure of disciplines, The Educational Forum, v. XXXVIL n.1,p. 75-82, 1972. STEIN, B. Sociology and the sociology ofeducation: abrief wunt. In: REX, J.(Ed.). Approaches to sociology: an introduction jor trends in British Sociology. Londres: RKP, 1975. |,P.Ladistinctiom: critique socialie du jugement. Paris: _ 1979. IN, L. Curriculum making in the United States. In: PINAR, wurriculum theorizing: the teconceptualists. Berkeley: MeCutchan, 1975. RANKLIN, B. M. The curriculum field and the problem of social 1938: a study in critical theory. Tese (Doutorado) ; HALSEY, A. H. Power and ideology in education. ford University Press, 1977. \ Touchers College Record, v. 66, 1.7, p. 598-603, 1965. ‘The development of certain key curriculum issuesin the (Eds.). Curri- ‘CURRICULO, CULTURA ESOGEDADE a MoneHRA-TADEU YOUNG, M. E. D. Knowledge and control: new directions for the MOREIRA, A. FB. Acontribuigao de Michael Apple para © desenvolvimento de uma teoria curricular critica no Brasil. 1971. Férum Educacional, v.13, n. 4, p- 17-30, 1989. proferida no semi Universidade Cat6lica, Rio de Janeiro, 1984. ____.Currfcutoe controle social. Teoria e Educagio,n.5,p.13-27, 1992. _O curriculo como campo de estudos: origens e desenvolvi- mento nos Estados Unidos. Palestra proferida no Curso de ‘Atualizagdo em Pedagogia. Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1992b. PINAR, W; GRUMET, M. Theory and practice and the recon- ceptualisation of curriculum studies. In: LAWN, Ms BARTON, L. (Eds) Rethinking curriculum studies: a radical approach. Lon- dres: Croom Helm, 1981. alization in teaching and teacher history, ideology, and potential. 10,1. 1, pal-H4, 1994. POPKEWITZ, T. Profes education: some notes ‘Teaching & Teacher Educa SEGUEL, M, L. The curriculum field: its formative years. Nova York: Teachers College Press, 1966. : ‘SHOR, I. Culture tars: school and society in the conservative restauration. Londres: RKP, 1986. SILBERMAN, C. Crisis in the classroom: the remaking of American ‘ood House, 1973. ‘education. Londres: SILVA, T. T, Curriculo, conhecimento e democracia. Cadernos Pesquisa, n. 73, p- 59-66, 1990. VAN MANEN, M. Reconceptionalist curriculum thought: view of recent literature. Curriculum Inquiry, v.8,n.4, p-365-3 1978.

Você também pode gostar