A mãe-da-lua-gigante, Nyctibius grandis (Nyctibiiformes: Nyctibiidae)
no Parque Estadual do Morro do Diabo, São Paulo
Wilton Felipe Teixeira1,2
& Paulo Antonio Silva1,3
Nyctibiidae compreende sete espécies de
um único gênero (Nyctibius), conhecidas po-
pularmente como urutaus, urutáguas ou mães-
-da-lua1,2. Embora bastante populares pelo
canto melódico e fantasmagórico, essas aves
permanecem cientificamente desconhecidas,
talvez devido aos hábitos noctívagos e críp-
ticos2,3. Dentre elas, destaca-se a mãe-da-lua-
-gigante, Nyctibius grandis (Gmelin, 1789), o
maior táxon da família, com 54 cm de com-
primento, 360-600 g de massa corporal e 1
m de envergadura, sendo um representante
florestal insetívoro especialista4. Sua distri-
buição geográfica abrange, sobretudo, regiões
da Mesoamérica e Amazônia, onde habita as
florestas úmidas, bem como matas de várzeas
e de terra firme, além do Brasil Central, nas
matas ciliares e de galeria1. Ocorre também
nos estados do sudeste brasileiro4, na Mata
Atlântica Ombrófila Densa e Semidecidual1.
O estado de São Paulo é o seu limite meridio-
nal de distribuição3, onde havia sido registrada
por meio de coletas na década de 1930, ape-
nas nos municípios de Presidente Epitácio (na
extinta Reserva do Pontal do Paranapanema)
e São José dos Campos (na Serra do Mar)3.
Em 1 de agosto de 2017, em pleno meio
do dia, às 12:31 h, observamos um indiví-
duo de N. grandis em seu típico comporta-
mento, isto é, pousado em postura ereta em
um galho de angico-branco, Anadenanthera
sp., Fabaceae (Figura 1). A observação foi
feita próximo à sede do Parque Estadual do
Morro do Diabo (PEMD), em Teodoro Sam-
paio, no Pontal do Paranapanema, extremo
sudoeste do estado de São Paulo, nas coor-
denadas 22º37’16’’S, 52º10’21”W, a 275 m
de altitude. A detecção da ave foi rotineira
nos arredores dessa área de uso intensivo na
PEMD, ao menos até 22 de agosto. Sempre
pousada em árvores próximas a postes, ela
provavelmente estava aproveitando a ilumi-
nação artificial, na perspectiva de capturar
insetos noturnos atraídos pelas luzes5. Isso
é conveniente, pois a vegetação do PEMD
é, sobretudo, de Mata Atlântica Estacional
Semidecídua, cujo pico de queda de folhas,
substrato de muitos artrópodes, ocorre prin-
cipalmente em agosto, sugerindo depleções
na oferta e atividade de insetos6.
Diferentes estudos avifaunísticos foram
realizados no PEMD7,8,9,10,11, entretanto, em
nenhum deles houve registro de N. grandis,
nem mesmo durante inventários sistemáticos
Atualidades Ornitológicas, 202, março e abril de 2018
relacionados ao plano de manejo do parque12.
Nossa observação representa o primeiro re-
gistro de N. grandis para o PEMD e também
marca o reencontro da espécie no Pontal do
Paranapanema após cerca de 80 anos sem re-
gistros na região.
O registro para São José dos Campos repre-
senta o limite sul de distribuição de N. grandis
através da costa brasileira. Já o registro para
Presidente Epitácio representava o limite sul
de distribuição da espécie pelo interior do
Brasil. Agora, o avistamento da espécie no
PEMD é, possivelmente, o registro mais ao
sul da distribuição conhecida de N. grandis
via interior brasileiro. Uma questão que emer-
ge é se N. grandis tem vagado pelas matas das
várzeas do Rio Paraná e adjacências, nas divi-
sas dos estados de São Paulo e Mato Grosso
do Sul, expandindo sua distribuição geográ-
fica em direção ao sul. Algumas observações
recentes dão indícios disso: em consulta à pla-
taforma WikiAves (www.wikiaves.com.br),
salvo nossas observações13, constam registros
de N. grandis em Três Lagoas, mesorregião
leste do MS14 e Castilho, noroeste paulista15,
municípios alocados opostamente, às mar-
gens do Rio Paraná.
Naturalmente vulnerável devido à baixa
densidade, sedentarismo e requerimento de
florestas, N. grandis é categorizada como
criticamente ameaçada de extinção no estado
de São Paulo3 – veja também o Decreto Nº
60.133, de 7 de fevereiro de 2014. A presen-
ça da espécie no PEMD, portanto, reforça
a ideia de que as Unidades de Conservação
(UCs) são essenciais à sua proteção3, aten-
dendo ao seu requerimento de habitat. Cabe
notar a existência de outras UCs nas adjacên-
cias ou curso do rio Paraná. Na borda leste
do Mato Grosso do Sul consta a Reserva
Particular de Patrimônio Natural Cisalpina,
com seus limites já protegidos, porém não
deferida pelos órgãos de licenciamento, bem
como o Parque Estadual das Várzeas do Rio
Figura 1. Mãe-da-lua-gigante (Nyctibius grandis)
no Parque Estadual do Morro do Diabo,
extremo sudoeste do estado de São Paulo.
Foto: Wilton Felipe Teixeira.
Ivinhema. Na borda oeste do estado de São
Paulo, estão situados a Reserva Particular de
Patrimônio Natural Foz do Rio Aguapeí, o
Parque Estadual Aguapeí, o Parque Estadu-
al Rio do Peixe, além da Estação Ecológica
Mico Leão Preto, próxima ao PEMD. Essas
UCs podem funcionar integradamente, e.g.,
como corredores de biodiversidade, o que é
elementar para a manutenção de populações
viáveis de N. grandis3. A manutenção dessas
UCs também pode promover uma maior mo-
bilidade a essa espécie sedentária, bem como
potencializar a sua ampliação geográfica em
direção ao sul. Inventários acurados, no sen-
tido de detectar N. grandis pelas matas das
várzeas do vale do Rio Paraná, áreas flores-
tadas adjacentes e UCs, poderão dar mais
suporte a tais ideias.
Agradecimentos
Ao Alessandro P. Nunes e Fernando C.
Straube, pelas críticas e sugestões ao manus-
crito. Este estudo foi viabilizado pela Funda-
ção Florestal, Instituto Florestal e Comissão
Técnico Científica, mediante documentos
regulamentadores da Portaria Normativa FF/
DE n°236 de 01/03/2016.
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1
Universidade do Oeste Paulista,
Rodovia Raposo Tavares, Km 572,
Bairro Limoeiro, CEP 19026-310,
Presidente Prudente - SP, Brasil.
2
E-mail: wilton.felipe@outlook.com
3
E-mail: pauloantonio@unoeste.br
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