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Natal – RN
Outubro de 2005
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PANORAMA DA DESERTIFICAÇÃO NO
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Natal – RN
Outubro de 2005
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Coordenação Técnica
Consultor /Colaborador
SUMÁRIO
1 ANTECEDENTES 2
2 ASPECTOS GERAIS SOBRE O FENÔMENO DESERTIFICAÇÃO 14
3 DESERTIFICAÇÃO NO RIO GRANDE DO NORTE 18
3.1 Caracterização Geral do Território Norte-rio-grandense 18
3.2 As Áreas Susceptíveis à Desertificação do Rio Grande do Norte 32
3.2.1 Características 33
3.2.2 Áreas Susceptíveis à Desertificação 44
3.2.2.1 Áreas Semi-áridas 46
3.2.2.1.1 Núcleo de Desertificação do Seridó 48
3.2.2.2 Áreas Subúmidas Secas 52
3.2.2.3 Áreas do Entorno das Áreas Semi-áridas e Subúmidas Secas 53
4. CONVÊNIOS, PROGRAMAS E PROJETOS NO ÂMBITO DAS POLITÍCAS
PÚBLICAS DE COMBATE À DESERTIFICAÇÃO. 55
5. INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS E NÃO-GOVERNAMENTAIS
COM AÇÕES NA ÁREA SÓCIO-AMBIENTAL. 62
REFERÊNCIAS 70
ANEXOS 73
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1 ANTECEDENTES
A segunda metade do século XX e o limiar do século XXI foram marcados por um elevado
estágio de desenvolvimento científico-tecnológico, ampliando-se os horizontes da criação, inovação e
reinvenção do saber-fazer humano. Nesta fase, também foram dilatados o nível e a natureza das ações e
intervenções humanas sobre o meio ambiente, de modo que a exploração dos recursos naturais passou a
registrar maior produção/produtividade, traduzindo-se em maior pressão sobre os mesmos. Assim, a
ampliação de possibilidades criadas pelo meio técnico-científico-informacional é contemporânea à
elevação da magnitude dos problemas enfrentados pela humanidade.
Neste contexto, as relações entre os homens e entre estes e a natureza têm sido presididas
por uma racionalidade economicista, manifestando-se na exploração social (dos homens entre si) e
ambiental (homem x meio ambiente). Em conseqüência, expande-se a degradação social, transformando
pessoas em farrapos humanos, cuja existência se constitui um grosseiro simulacro da vida. A
espacialização deste processo assume a forma de degradação ambiental, cuja feição mais intensa é a
desertificação. Este fenômeno que se revela no desgaste dos solos, dos recursos hídricos, da vegetação,
da biodiversidade, por conseguinte, da própria qualidade de vida, manifesta-se sobretudo nas regiões
áridas e semi-áridas da Terra. Sobrepondo-se os indicadores sociais a estes recortes, constata-se que
neles há uma expressiva concentração de pobreza e miséria, cujas razões não se fundam em fenômenos
naturais, mas na trajetória histórica. “São mais de 1 bilhão de pessoas vivendo nas terras secas e
utilizando, em termos gerais, sistemas produtivos de baixo nível tecnológico e totalmente
descapitalizados” (PERNAMBUCO, 2001, p. 9), procurando sugar os escassos recursos na luta para
subsistir.
Nos últimos decênios, a expansão e os impactos da desertificação despertaram a
comunidade científica para a necessidade de se aprofundar os estudos sobre o tema e de formular
políticas que tenham como objetivo atuar sobre os agentes desencadeadores e/ou minimizar seus
efeitos.
As preocupações com a desertificação adquiriram proeminência, na década de 1930, em
função da intensa degradação dos solos verificada no meio-oeste americano, conhecida como “Dust
Bowl”, que atingiu uma área de 380.000 km². A ocorrência deste fenômeno motivou os cientistas a
desenvolverem estudos e pesquisas neste campo e a identificarem tal processo como sendo o da
desertificação.
Contudo, foi nos anos de 1970, quando o Sahel africano – região semi-árida abaixo do
deserto do Saara - vivenciou uma grande seca resultando, entre outras conseqüências, na dizimação de
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mais de 500.000 pessoas de fome, que a problemática repercutiu mundialmente (MMA, [199-], p. 2-3).
As precárias e dramáticas situações de vida da população africana, enredadas em secas, fome e guerras,
já vinham chamando a atenção da comunidade internacional desde a década de 1960. Intensos
movimentos migratórios e uma acentuada devastação ambiental pontilhavam o território africano,
especialmente o Sahel, e sinalizavam para a conformação de um quadro sócio-ambiental resultante da
associação entre pobreza, fome e destruição dos recursos naturais vitais como água, vegetação e solo.
A leitura deste processo conduziu à interpretação de que se tratava do fenômeno da desertificação, cuja
face ambiental manifestava-se pela destruição dos recursos naturais; a face econômica revelava-se pela
redução da produção e da produtividade agrícola e a face social mostrava-se através do
empobrecimento da população, expresso no aumento das epidemias e das taxas de mortalidade infantil.
Desta constatação inicial, a comunidade internacional construiu um outro entendimento: o de que o
fenômeno em pauta não se restringia à África, aparecendo nos demais continentes, mais especificamente
nas regiões sob climas áridos e semi-áridos - sujeitos à seca. Neste sentido, a desertificação passou a ser
considerada um problema de escala global e, como tal, tornou-se um tema recorrente na agenda das
organizações internacionais.
Neste cenário, as Nações Unidas patrocinaram as iniciativas primeiras e de maior
envergadura. Sob seus auspícios, em 1972, na Suécia (Estocolmo), foi realizada a Conferência
Internacional sobre Meio Ambiente Humano, sendo abordada a catástrofe africana decorrente da seca
(1967-1970) e dos problemas de desertificação. As proporções que a problemática assumiu foram
fundamentais para que, nesta Conferência, fosse decidida a realização de um outro evento específico
para abordar a desertificação.
Este ocorreu em 1977, no Quênia (Nairóbi), sob o título de Conferência das Nações Unidas
sobre Desertificação, e resultou “na consolidação do tema a nível mundial”, sendo incluídas no cenário
das discussões as regiões áridas e semi-áridas da Terra e questões pertinentes à relação entre pobreza e
meio ambiente, além da decisão de se elaborar o Plano de Ação Mundial contra a Desertificação
(MMA, [199-], p. 14-15).
Na seqüência dos eventos internacionais com repercussões sobre desertificação, sagrou-se a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Brasil, na
cidade do Rio de Janeiro, em 1992. A Rio 92 ou ECO 92, como ficou conhecida, representou um
marco nas discussões e ações sobre o tema, tendo em vista a consolidação e aprovação de cinco
documentos relacionados ao ambiente: Carta da Terra, Convenção do Clima, Convenção da
Biodiversidade, Declaração de Princípios sobre Florestas e Agenda 21. Este último é considerado por
muitos ambientalistas como o principal documento assinado pelas autoridades mundiais nesse evento e
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conforme registra textualmente “está voltada para os problemas prementes de hoje e tem o objetivo,
ainda, de preparar o mundo para os desafios do próximo século”.
Na Agenda 21, em seu Capítulo 12 (1997, p. 183), encontra-se sistematizada uma definição
para o termo desertificação, assim expressa: “a desertificação é a degradação do solo em áreas áridas,
semi-áridas e subúmidas secas, resultante de diversos fatores, inclusive de variações climáticas e de
atividades humanas”. A degradação da terra é entendida como correspondente à degradação dos solos,
dos recursos hídricos, da vegetação e da biodiversidade, significando, por fim, a redução da qualidade
de vida das populações afetadas (MMA, 2004, p. 4). Como resultado da implementação da Agenda 21,
merece ser ressaltada a sistematização e aprovação da “Convenção das Nações Unidas para o Combate
à Desertificação nos países que sofrem seca grave e/ou desertificação, particularmente na África”-
CCD, em vigor desde 26 de dezembro de 1996, que representa um progresso em termos de
enfrentamento do problema em níveis nacionais e internacionais.
Tecida no âmbito do entrelaçamento de fatores naturais e ações antrópicas, a desertificação
alastrou-se pelo mundo atingindo cerca de um sexto da população, 70% das terras secas e um quarto da
área do planeta (Agenda 21, 1997, p. 183). Considerando a dimensão e a extensão deste fenômeno é
possível admitir que a sociedade atual vive um momento de extrema periculosidade, posto que o
crescimento demográfico, embora desacelerado, ainda é positivo e se traduz em maior pressão sobre os
recursos naturais.
Embora se tenha conhecimento de que a apropriação das terras pelo homem é um processo
secular, é reconhecível que, na segunda metade do século XX, em decorrência de uma série de fatores
sociais, econômicos, políticos e culturais, a sociedade passou a intervir com maior avidez sobre a
natureza e a exigir vorazmente dos recursos naturais, em muitos casos levando-os à ameaça de
exaustão.
No Brasil, a trajetória da desertificação seguiu basicamente os (des)caminhos trilhados pelo
processo em nível mundial. As referências a uma preocupação com a destruição das matas, remontam
ao século XVIII, mais precisamente ao “ano de 1726, quando o governo colonial criou o cargo de juiz
conservador de matas”, com o objetivo de coibir as ações indiscretas e desordenadas que assolavam as
matas (VILLA, 2000, p. 65 apud MEDEIROS, 2004, p. 22). Fragmento textual extraído de um
discurso proferido por José Bonifácio, na Assembléia Geral Constituinte e Legislativa do Império, em
1823, expressa o quão antigo é o problema da degradação no Brasil: “[...] nossas preciosas matas vão
desapparecendo, victimas do fogo e do machado destruidor da ignorância e do egoísmo; nossos montes
e encostas vão-se escalvando diariamente, e com o andar do tempo faltarão as chuvas fecundantes, que
favoreção a vegetação, alimentam nossas fontes e rios, sem o que o nosso bello Brasil em menos de
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dois séculos ficará reduzido aos paramos e desertos áridos da Lybia” (BRITO, 1987, p. 57 apud
MEDEIROS, 2004, p. 23).
No decorrer do século XX, importantes contribuições foram dadas por estudiosos como
Phillip Luetzelburg, José Guimarães Duque, Thomas Pompeu de Souza Brasil, Thomas Pompeu de
Souza Brasil Filho, Thomas Pompeu Sobrinho, Carlos Bastos Tigre, Dárdano de Andrade Lima e Lauro
Xavier (MMA, 2004, p. 52). Além destes, há ainda estudos produzidos por Aziz Ab’Saber, Edmon
Nimer, Phillip M. Fearnside, Luciano José de Oliveira Acciolly, Magda Adelaide Lombardo, Alexandre
José Rego P. de Araújo, José Bueno Conti, Benedito Vasconcelos Mendes, entre outros.
Dentre os estudiosos do tema desertificação, merece um realce especial a produção de João
de Vasconcelos Sobrinho, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco. O referido
professor, além de publicar uma significativa produção bibliográfica nesta área, contemplando
principalmente a Região Nordeste, também atuou na elaboração do Relatório Brasileiro para a
Conferência das Nações Unidas sobre Desertificação e foi membro da delegação brasileira para a
Conferência em Nairóbi. Entre suas proposições científicas mais relevantes situa-se a teoria dos Núcleos
de Desertificação e a metodologia para identificação de processos de desertificação (VASCONCELOS
SOBRINHO, 2002).
Uma outra importante contribuição ao conhecimento das áreas susceptíveis à desertificação
do Brasil, correspondentes ao bioma Caatinga, foi produzida pelo Conselho Nacional da Reserva da
Biosfera da Caatinga. O Projeto “Cenários para o Bioma Caatinga”, envolve a montagem de um banco
de dados em ambiente SIG, com sistema interativo de consulta, e a elaboração de cenários, a partir do
diagnóstico e da identificação das potencialidades regionais. A publicação dos resultados deste trabalho,
sob o título “Cenários para o Bioma Caatinga”, foi sistematizada em tópicos que tratam das bases para
o desenvolvimento sustentável do referido bioma, do cenário tendencial, do cenário desejável, da
agenda de desenvolvimento sustentável e do diagnóstico. Neste último, são analisados os aspectos do
desenvolvimento regional, caracterizadas as dimensões econômicas, sociais, culturais e ambientais do
bioma caatinga e apresentados os impactos ambientais decorrentes do uso dos recursos naturais e os
impactos das políticas públicas sobre o desenvolvimento do mencionado bioma (BRASIL, 2004). Este
projeto se constitui o maior banco de dados sobre o bioma Caatinga, sendo uma referência para os
estudos que tratem de temas relativos a esta fração do território brasileiro.
Considerando a definição de desertificação, anteriormente exposta, vislumbra-se que uma
significativa parcela do Brasil é passível à ocorrência do fenômeno, mais especificamente, a região
semi-árida nordestina. No Mapa de Ocorrência da Desertificação do Brasil este recorte apresenta áreas
com processos de degradação intensos, muito graves, graves e moderados. As áreas de intensa
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Nacional de Combate à Desertificação – PNCD (1995), no qual o território potiguar foi avaliado sob a
ótica da ocorrência e da intensidade do processo de desertificação. As áreas susceptíveis ao fenômeno
foram classificadas segundo o Grau de Susceptibilidade, em áreas com intensidade muito grave, grave e
moderada (TAB. 01).
TABELA 01
Ocorrência do Processo de Desertificação no Rio Grande do Norte
FONTE: CARVALHO; GARIGLIO; BARCELLOS. Caracterização das áreas de ocorrência de desertificação no Rio
Grande do Norte, 2000, p. 9.
A identificação dos estudos sobre a desertificação no Rio Grande do Norte denota que a
preocupação com o problema já se fazia presente nos últimos decênios do século XX, sendo
sintomático que, em 1997, tenha sido criado o Grupo de Estudos sobre Desertificação no Seridó –
GEDS. O referido grupo, que envolve diversas instituições, “foi fruto de um processo de reflexão em
torno das questões da seca, das alternativas de convivência com a mesma e do combate direto aos
processos desencadeadores da desertificação” e tem como objetivo fomentar estudos e debates sobre o
tema, articulando ações capazes de promover o desenvolvimento sustentável no Seridó (IDEMA, 2004,
p. 11).
Nesta mesma linha de ação, em 17 de junho de 2004, através de Termo de Cooperação
Técnica e Científica Nº 004/2004, instrumento que visa implantar estratégias para combater e controlar
o processo de desertificação no Estado, a partir da criação de áreas pilotos e ações sincronizadas, foi
criado o Núcleo de Desenvolvimento Sustentável da Região do Seridó – NUDES. O referido Termo foi
celebrado entre a Procuradoria Geral de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio Grande do
Norte, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
a Escola Superior de Agricultura de Mossoró, o Departamento Nacional de Obras contra as Secas, o
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis e a Agência de Desenvolvimento do
Seridó. Os signatários do Termo se propõem a desenvolver ações conjuntas, de modo a integrar os
diversos recursos materiais e humanos existentes, bem como toda a experiência e conhecimento
adquiridos sobre o tema.
A criação do NUDES foi idealizada pelo Ministério Público, através do Centro Operacional
às Promotorias de Meio Ambiente (CAOPMA). Os trabalhos de elaboração do plano foram
deflagrados, no início de 2004, através de estudos de viabilidade sócio-econômica e de impacto
ambiental.
O arcabouço de ações desenvolvidas no âmbito do NUDES norteia-se por três vertentes:
educação ambiental, medidas jurídicas de proteção ao meio ambiente e introdução de propostas
econômicas alternativas, que conciliem a preservação ambiental e a geração de renda
(http://www.serhid.rn.gov.br). Nesta perspectiva, objetiva o desenvolvimento de ações visando à
redução dos problemas ambientais, sociais e econômicos numa área geográfica pré-definida.
A área piloto escolhida para implantação deste núcleo, abrange uma extensão de 80 km²,
localiza-se no município de Parelhas, mais especificamente nas comunidades rurais de Cachoeira,
Juazeiro e Santo Antônio da Cobra, inseridas na bacia hidrográfica do Rio Cobra. Conforme
informações obtidas na SERHID, nas três comunidades residem 391 famílias, totalizando 1.567
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habitantes, e existem nove cerâmicas, sendo uma comunitária, cuja produção é de 28 milheiros de
telha/dia.
As razões que levaram estas comunidades a serem escolhidas residem na conjugação de
alguns fatores, dos quais destacamos: o Município de Parelhas está entre aqueles que o PAN Brasil
relaciona como área piloto para investigação sobre desertificação no Semi-árido brasileiro; constitui-se
o principal produtor de cerâmica do Estado, usando a argila como matéria-prima e a lenha como fonte
de energia; há alguns anos, a problemática da degradação ambiental local é alvo de discussões e
reflexões entre as comunidades rurais e organizações governamentais e não-governamentais, sendo
notável a existência de uma consciência dos danos e dos limites ambientais e de uma tendência ao
associativismo.
No âmbito do NUDES, as principais ações foram desenvolvidas pelo IDEMA e consistiu na
avaliação e monitoramento da Sub-bacia Hidrográfica do Riacho Cobra e na realização de um Curso de
Capacitação em Educação Ambiental, que reuniu professores, representantes das atividades produtivas
locais, das organizações comunitárias e estudantes.
A justificativa para que o Seridó seja o objeto de análise em expressiva parcela da produção
bibliográfica referente à desertificação no Rio Grande do Norte e tenha sido o lócus da criação do
GEDS e do NUDES, fundamenta-se no reconhecimento de que, em nível de Estado, é a região mais
afetada.
A percepção de que a desertificação está relacionada à ocorrência de secas e à forma como
o homem se relaciona com o meio, principalmente para fins de exploração econômica é um forte
indicativo de que, em espaços como o Rio Grande do Norte, torna-se premente repensar as estratégias
de produção e de sobrevivência da sociedade. No cenário de reestruturação produtiva, delineado após a
crise do algodão e da mineração (1970-1980), em que emergiram novos segmentos produtivos
remodeladores da geografia econômica do território, a insurgência e/ou acentuação da degradação
ambiental foi uma forte motivação para se pensar estratégias que viabilizassem o desenvolvimento em
bases sustentáveis.
Nesta perspectiva ressalta-se que, a partir de demandas da sociedade, o Governo assumiu o
compromisso de desenvolver uma política de planejamento regional norteada pelos pressupostos da
sustentabilidade.
Em função de suas particularidades sociais, econômicas, políticas e ambientais coube ao
Seridó a primazia de vivenciar este processo que culminou com a elaboração do Plano de
Desenvolvimento Sustentável do Seridó - PDSS. O panorama em que germinou a idéia de sua
formulação, entre 1999 e 2000, foi marcado pela acentuação de problemas, com destaque para a
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escassez d’água. A sociedade, através de suas principais lideranças políticas, empresariais, sindicais e
religiosas recorreram aos representantes do Estado, em suas diversas esferas, reivindicando soluções
para os problemas existentes. Da associação de influências provenientes de uma conjuntura externa,
onde se discutia pobreza e ambiente como facetas de um mesmo processo de degradação da vida
humana e se colocava como paradigma alternativo o desenvolvimento sustentável à atuação local de um
pequeno coro de vozes que pregavam no deserto, chegou-se a uma experiência pioneira e inovadora em
termos de planejamento estratégico participativo.
O PDSS foi elaborado com base em uma metodologia que envolveu a compilação e análise
de dados e documentos extraídos de diferentes fontes, inclusive teses e dissertações que versam sobre a
região; a consulta à sociedade, através de reuniões municipais e sub-regionais, e a realização de
entrevistas com personalidades e lideranças de diversos segmentos da sociedade, conhecedoras da
problemática regional. A coordenação dos trabalhos foi desenvolvida por consultores do Instituto
Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA.
A adoção desta metodologia de planejamento objetivou possibilitar o envolvimento da
sociedade no processo de construção do seu plano de desenvolvimento. Nesta perspectiva, foram
convidados a participar das reuniões municipais, sub-regionais e regionais os representantes das várias
instituições e organizações públicas e privadas da região que tiveram um importante papel na
identificação dos problemas existentes, na indicação das possíveis soluções, no desvendamento das
potencialidades e na delineação dos cenários desejados, conteúdos informativos que serviram de
subsídios à formulação do plano.
Tendo como base a experiência de planejamento descentralizado e participativo e a adoção
dos princípios do desenvolvimento sustentável, cujas iniciativas devem ser geradoras de uma maior
eqüidade social, um elevado nível de conservação ambiental e uma maior racionalidade/eficiência
econômica, construiu-se um documento estruturado em dois volumes. No primeiro, tem-se um
diagnóstico do Seridó através da caracterização das dimensões ambiental, tecnológica, econômica,
sócio-cultural e política-institucional. Este meticuloso documento, além de uma análise consistente
sobre a região, ainda identifica suas fragilidades e potencialidades. No segundo, são demonstrados
estratégias, programas e projetos por dimensão e o sistema de gestão do Plano, na perspectiva de
apontar diretrizes que permitam a solução dos problemas e/ou delineação dos cenários desejados pela
sociedade. Desta forma, o PDSS se propõe a ser um norteador das ações que conduzirão o processo de
desenvolvimento sustentável e, neste, a dimensão ambiental assume uma expressiva relevância em
função do nível de degradação regional que se situa entre muito grave e intenso.
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não tem impacto significativo. Porém, a leitura difere quando a justificativa é a construção de
reservatórios artificiais. Os de grande porte submergem extensas áreas de cultivo e/ou cidades e
deslocam populações e os de pequeno e médio portes, subtraem áreas de cultivo nos terrenos mais
baixos. Apesar disso, “a possibilidade de degradação deve ser considerada, mas em geral, estas
construções trazem mais benefício que prejuízo, o que é esperado de ações planejadas e de custo alto”
(SAMPAIO et. al., 2003, p. 25).
A retirada da vegetação para fins de exploração do material do solo ou subsolo, típica da
atividade mineira, implica na retirada de areia de construção dos aluviais de beira de rio à remoção de
camadas de terra para acesso a veios de minério. Nas áreas de minas são comuns a formação de
depósitos de resíduos, freqüentemente tóxicos, e a presença de escavações, que parecem rasgar a terra
deixando expostas suas entranhas. A retirada do solo deixa um legado de terras imprestáveis para o uso
agropecuário.
As queimadas, embora tendam a se reduzir, ainda são praticadas, levando à perda de
nutrientes do solo e, dependendo do período em que o solo ficar despido, pode provocar erosão.
O corte da vegetação para lenha, a rigor, não poderia ser considerado como destruição da
vegetação, posto que, se área não for mexida, ocorre a recomposição. O problema se instala quando
não se concede à natureza este tempo para a recomposição e se realiza a queimada, após o desmate,
afetando as espécies vegetais e animais, o solo, enfim, a biodiversidade do lugar.
A substituição da cobertura original por outra com maior produção está ligada,
principalmente, à agropecuária e produz inquestionáveis benefícios, apesar de reduzir a biodiversidade.
Em Sampaio et. al. (2003, p. 27) encontra-se que “a substituição da vegetação nativa por espécies
cultivadas, por si só, dificilmente leva à degradação das terras. Para isto, a agropecuária precisa ser
praticada em condições que levem a outros processos de perda.”
No quesito sobre a agropecuária e a deterioração das propriedades do solo foram
identificados como principais fatores de degradação: a ausência de adubação, justificada pelo risco de
falha das colheitas por falta de chuvas; a perda por erosão, que tende a ser maior mediante a retirada da
cobertura vegetal e nas áreas de declive e o emprego de técnicas incompatíveis de produção.
A projeção deste elenco de fatores da degradação das terras, a partir das formas de uso do
solo, sob o espaço nordestino revela a sua ocorrência, embora existam alguns cuja interferência é mais
aguda e cuja manifestação é intensificada nos períodos de seca. Um exemplo é a utilização dos recursos
de solo para o fabrico de telhas e tijolos no Seridó potiguar, colocada como uma das principais razões
da existência do Núcleo de Desertificação na região (SAMPAIO et. al., 2003, p. 25).
20
A identificação das ASD brasileiras, foi estabelecida de acordo com a CCD, que se baseia
na definição de aridez formulada por Thornthwaite (1941). Conforme esta definição, o grau de aridez
de uma região depende da quantidade de água advinda da chuva e da perda máxima potencial de água
através da evapo-transpiração potencial. Em termos de Nordeste, a classificação de susceptibilidade à
desertificação, em função do Índice de Aridez, foi firmada conforme exposto na TAB. 02.
TABELA 02
Classificação de Susceptibilidade à Desertificação, em função do Índice de Aridez
O Rio Grande do Norte possui uma superfície de 52.796,791 km², ou seja, 0,62% do território
nacional. Sua cartografia (MAPA 02), historicamente construída, atualmente comporta 167 municípios
e, de acordo com o Censo 2000 (IBGE, 2000, p. 269), sua população somava 2.776.782 habitantes,
correspondendo a 1,64% da população do Brasil. A distribuição populacional pelo território estadual
indicou que 2.036.673 habitantes residiam em espaços urbanos e 740.109 eram moradores rurais.
Embora apresente elevada taxa de urbanização (73,35%), em seu tecido urbano predominam as
pequenas cidades e ocorre uma concentração demográfica na Região Metropolitana de Natal, que
abriga 1.097.273 habitantes, equivalentes a 39,52% da população potiguar.
FONTE: FELIPE, José Lacerda Alves; CARVALHO, Edílson Alves de. Atlas escolar do Rio Grande do Norte, 1999.
O quadro natural do Rio Grande do Norte, principalmente os seus aspectos climáticos e sua
cobertura vegetal, são reveladores de características típicas de espaços semi-áridos. Sua trajetória
histórica foi marcada por um processo de ocupação territorial, baseado inicialmente na agricultura e na
23
FONTE: FELIPE, José Lacerda Alves; CARVALHO, Edílson Alves de. Atlas escolar Rio Grande do Norte, 1999, p. 26.
O Clima Tropical Quente e Úmido ocorre em uma pequena faixa na porção sul do Litoral
Oriental, que compreende parte da Microrregião Geográfica Litoral Sul, onde se registra uma
pluviosidade média de 1.200 mm anuais. Já o tipo Tropical Subúmido, apresenta uma pluviosidade
média entre 800 e 1.200 mm anuais, e abrange basicamente a Mesorregião Geográfica do Leste
Potiguar, exceto a porção úmida, e as áreas serranas do interior, onde a morfologia do relevo, com suas
expressivas altitudes, influencia as condições microclimáticas, favorecendo à ocorrência de
temperaturas amenas.
O Clima Tropical Quente e Seco ou Semi-Árido domina, de forma quase contínua, todo o
interior do território estadual, chegando inclusive a atingir o Litoral Setentrional. Este tipo climático
caracteriza-se pelas altas temperaturas, escassez e irregularidade das precipitações pluviométricas,
configurando-se como período chuvoso os meses de janeiro a abril. A média de precipitação de chuvas
é variável, podendo situar-se entre 400 e 600 mm, em algumas áreas centrais do Estado, ou atingir
25
índices um pouco mais elevados. As regiões submetidas a este clima são ciclicamente atingidas pelo
fenômeno da seca, quando as precipitações são acentuadamente reduzidas, situação que pode se
estender por alguns meses ou prolongar-se por anos consecutivos.
A análise dos dados demonstra que as áreas sob o domínio do clima Semi-árido, onde
impera a Caatinga hiperxerófila, correspondem basicamente à cartografia das ASD do Rio Grande do
Norte. De acordo com Sant’Ana (2003), a seca “não é ‘causa’ de desertificação, mas pode atuar como
um acelerador dos processos”.
Um outro aspecto interessante a ser ressaltado neste estudo sobre a desertificação,
constituindo-se um quesito diretamente relacionado ao clima, diz respeito aos recursos hídricos
superficiais. Estes são representados, principalmente, pelas bacias hidrográficas constituídas, em sua
maioria, por rios que têm um caráter intermitente e passam boa parte do ano com o leito seco, por
vezes mostrando-se caudalosos nos períodos chuvosos. No Estado, a importância dos rios é
evidenciada historicamente a partir dos registros da ocupação espacial, do papel que desempenharam no
processo de interiorização e na estruturação sócio-econômica do território.
Uma outra referência de águas superficiais são os açudes que, em alguns casos, ao barrarem
os cursos dos rios, permitem a perenização total ou parcial, repercutindo favoravelmente em termos
sociais e econômicos, em nível local/regional. Os açudes também resguardam sua relevância histórica,
inclusive como elemento impulsionador da formação de aglomerados humanos que se transformaram
em cidades.
A malha hidrográfica do Rio Grande do Norte é constituída por 16 bacias com extensões e
níveis de importância sócio-econômica variáveis (ANEXO 01). No quadro geral, as bacias hidrográficas
Piranhas-Açu e Apodi-Mossoró se destacam pela sua extensão, abarcando 60,1 % do território
estadual, e pela importância econômica através do desenvolvimento de atividades agrícolas e pecuárias.
Apesar das demais bacias apresentarem circunscrições mais reduzidas, estas também são relevantes para
o abastecimento humano, as práticas agrícolas, a dessedentação animal e as atividades industriais
(MAPA 04)
26
FONTE: Bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte. Disponível em : <http:serhid.rn.gov.br> Acesso em 17 mai 2005.
açudagem, o Inventário do Espelho D’água Superficial do Estado do Rio Grande do Norte (IDEC,
1993, p. 24-68), registrando dados relativos aos reservatórios acima de 100.000 m³ em 1992,
contabilizou 615 reservatórios que correspondiam a 27,4% dos açudes potiguares e totalizavam um
volume de acumulação de 443.727.000 m³ de água, ou seja, 11,13% do volume acumulado no Estado.
Dados da SERHID sobre açudes com capacidade superior a 5.000.000 m³ informam que mais 04
reservatórios foram construídos - Passagem (Rodolfo Fernandes), Rodeador (Umarizal), Santa Cruz do
Apodi (Apodi) e Umari (Upanema). No conjunto, estes novos reservatórios apresentam uma
capacidade de acumulação de 921.155.650 m³ de água. Desta forma, é possível considerar que o
volume de acumulação no recorte da bacia foi ampliado, passando para 1.364.882.650 m³ de água,
sendo a Barragem de Santa Cruz do Apodi, com seus 599.712.000 m³, responsável por 43,93% desse
total, e a de Umari, com 292.813.650 m³, por 21,45%.
A geologia do Rio Grande do Norte é basicamente formada pelo embasamento cristalino e
estruturas sedimentares. O embasamento cristalino corresponde a formações geológicas que datam da
Era Pré-Cambriana; conformam terrenos antigos, formados por rochas resistentes como granitos,
quartzitos, gnaisses e micaxistos, onde estão presentes minerais como scheelita, berilo, cassiterita,
tantalita, ferro, micas, ouro, águas marinhas (turmalina), entre outros. Ocupa grande parte do sul e o
centro-oeste do Estado, representando a sua formação geológica dominante. Caracteriza-se por
apresentar baixa capacidade de infiltração/retenção de água que aliada à elevada evapotranspiração
potencial e aos períodos de estiagem, são responsáveis pela intermitência dos cursos d’água. Os solos
derivados dessas rochas são predominantemente rasos, com baixa capacidade de infiltração, alto
escoamento superficial e baixa drenagem natural.
A estrutura geológica sedimentar data da Era Terciária, portanto, corresponde a uma
formação mais recente. No Rio Grande do Norte está representada por formações identificadas como
Calcário Jandaíra, Arenito Açu, Grupo Barreiras e Dunas. Nesta circunscrição geológica situam-se
recursos minerais de expressivo valor econômico, como petróleo e gás natural, além de águas
subterrâneas, calcário e argila.
Em relação aos solos do Rio Grande do Norte observa-se a ocorrência de certa diversidade,
sendo as principais classes assim identificadas: Bruno Não Cálcico, Litólico Eutrófico, Areia Quartzosa,
Latossolo Vermelho Amarelo, Regossolo, Podzólico Vermelho-Amarelo, Vertissolo,
Solonchaks-Solonétzico, Solonetz-Solodizado, Planossolo Solódico, Aluvial, Cambissolo Eutrófico,
Solos Gley, Rendizina e Solos de Mangue (MAPA 05).
28
FONTE: FELIPE, José Lacerda Alves; CARVALHO, Edílson Alves de. Atlas escolar Rio Grande do Norte, 1999, p. 24.
Apesar da diversidade de classes de solos, em que alguns redutos são considerados férteis e
com bom potencial agrícola, em decorrência das características ambientais do território, prevalecem no
Estado os solos rasos, erodidos e de fertilidade mediana. As características gerais dos principais tipos
de solo e suas respectivas áreas de ocorrência constam no ANEXO 02.
A distribuição espacial dos solos demonstra uma variável formação mesmo no domínio da
Caatinga, onde prevalece o clima Semi-árido. Em função da abrangência espacial, destacam-se os solos
Litólicos Eutróficos e os Bruno Não Cálcicos, que apresentam certas restrições ao uso agrícola, por
serem pedregosos, de pequena profundidade e muito susceptíveis à erosão.
Os tipos climáticos associados às formas de relevo e aos diferentes solos, permitem
reconhecer no Estado a existência de sete ecossistemas: Caatinga, Mata Atlântica, Cerrado, Floresta
das Serras, Floresta Ciliar de Carnaúba, Vegetação das Praias e Dunas e Manguezal (MAPA 06).
29
FONTE: FELIPE, José Lacerda Alves; CARVALHO, Edílson Alves de. Atlas escolar Rio Grande do Norte, 1999, p. 26.
Em termos de Rio Grande do Norte, devido a extensão que ocupa (cerca de 80% do
território), destaca-se o ecossistema da Caatinga, em especial a sua formação florestal hiperxerófila que
recobre aproximadamente 60% do Estado (SEPLAN; IDEC, 1997, p. 23. Além disso, neste trabalho,
em função da relação existente entre o ambiente ecológico da Caatinga e as ASD, optou-se por
delimitar a análise as características do ecossistema mencionado.
O ecossistema da Caatinga é típico do Nordeste Semi-árido, caracterizando-se pelo
fenômeno do xerofilismo, que se refere à capacidade de armazenar água para sobreviver nos períodos
de seca. Devido a este dispositivo natural, a Caatinga muda seu perfil de acordo com a sazonalidade,
exibindo duas paisagens bem diferenciadas. No período chuvoso, suas plantas recobrem-se de folhagens
e se mostram exuberantes o suficiente para, em um verdadeiro emaranhado, produzirem um cenário em
que a tonalidade do verde assume diversas gradações. No período de seca, as plantas perdem as folhas
deixando à mostra seus galhos retorcidos. O tapete verde cede lugar a uma paisagem branca-acizentada
assumindo um certo ar de agressividade, expresso através de plantas aparentemente mortas com
salientes espinhos a desafiar o tempo e o espaço adverso. O significado da palavra caatinga – mato
branco, de origem indígena, remete à aparência que a vegetação assume no período de seca.
30
A despeito de apresentar uma certa uniformização no que diz respeito às diversas formas de
resistência à carência d’água, a Caatinga potiguar apresenta fitofisionomias diferenciadas, decorrentes
do seu porte. A Caatinga hipoxerófila é formada predominantemente por árvores e arbustos; sua
ocorrência é verificada no Agreste e em áreas de clima Subúmido seco e de transição para o
Semi-árido. A Caatinga hiperxerófila caracteriza-se por apresentar uma vegetação de pequeno porte,
seca, rala e resistente a grandes períodos de estiagem, sendo típica de solos pedregosos, rasos e de
pouca fertilidade; é típica das áreas quentes e secas que conformam o semi-árido norte-rio-grandense. A
composição florística desse ecossistema é representada pelas bromeliáceas (caroá, macambira),
cactáceas (xique-xique, facheiro, mandacaru, coroa-de-frade), leguminosas (jurema, sabiá, angico,
catingueira, jucá), euforbiáceas (pinhão bravo, faveleiro, marmeleiro), entre outros. A fauna também é
rica em espécies bem adaptadas às condições locais, destacando-se animais de pequeno porte como o
tatu-verdadeiro, o peba, o preá e o mocó.
Considerando a inter-relação entre clima, solo e vegetação e o fato de que a cobertura
vegetal é a expressão que marca visualmente a paisagem, tem-se que as ASD estão, sobremaneira,
circunscritas ao ecossistema da Caatinga. Segundo Vasconcelos Sobrinho (2002, p. 64), no semi-árido
nordestino, é possível detectar a existência de áreas em desertificação ao se sobrevoar em vôo baixo de
50m a 150m sobre o solo e, em seguida, realizar investigação in loco, posto que elas “apresentam uma
fisionomia denunciadora”: porte reduzido, espécies com sintomatologia de nanismo e concentração
diluída, ou seja, com maior permeabilidade do que nas demais áreas. O registro deste perfil geralmente
coincide com a presença da Caatinga hiperxerófila, cuja área de ocorrência é “presumivelmente
comprometida com o processo de desertificação, o qual se acentua a cada estio anual e principalmente
após cada seca. Quando o período chuvoso volta, verifica-se um esforço de recuperação que nem
sempre é recompensado integralmente. E assim, nesse balanço incerto entre recuperação e degradação,
é difícil descobrir qual a condição que prevalecerá. Mas se o homem interfere negativamente, então é
certo que a desertificação prevalece.”
A equação entre ação humana, degradação e recuperação ambiental tem se mostrado um
dos mais urgentes e imprescindíveis desafios a serem enfrentados pelas populações que vivem nas
regiões susceptíveis à desertificação no planeta. Neste contexto, inclui-se a sociedade nordestina, cujo
território representa as circunscrições das ASD brasileiras, e, nesta delimitação, insere-se o Rio Grande
do Norte.
Decerto a acentuação do quadro de degradação ambiental no Estado está relacionada à
dinâmica sócio-econômico empreendida nos últimos 35 anos. A literatura pertinente aponta que o Rio
Grande do Norte obteve um excelente desempenho econômico, entre 1970-2000, despontando como o
31
Estado que mais cresceu, a partir de 1970, na Região Nordeste. “Este ‘pequeno notável’ teve a façanha
de conseguir a maior taxa de crescimento do PIB do país na ‘década perdida’ e, como tem,
historicamente, uma base econômica pequena, os efeitos dos investimentos tiveram uma capacidade de
dinamismo muito forte.” (CLEMENTINO, 2003, p. 387). A correlação entre a taxa média anual de
crescimento do PIB do país, da região e do estado evidencia a situação anteriormente descrita (TAB.
03).
TABELA 03
Taxa Média Anual de Crescimento do PIB Real do Brasil, Região Nordeste e
Rio Grande do Norte – 1970-1999
TAXA (%)
PERÍODO Brasil Nordeste Rio Grande do
Norte
1970-1980 8,60 8,70 10,30
1980-1990 1,60 3,30 7,4
1990-1999 2,5 3,0 4,1
FONTE: FGV; IBGE.; SUDENE/DPO/EPR/Contas Regionais – Nordeste apud CLEMENTINO, Maria do Livramento
Miranda. Rio Grande do Norte: novas dinâmicas mesmas cidades, 2003, p. 389.
necessidades básicas sem trabalho e renda? Este contexto de múltiplas privações e situações-problemas,
estreitamente articuladas, parece embaçar o cotidiano das pessoas pobres, turvando seus sonhos e
desejos, estabelecendo cercas sociais que delimitam seus espaços de sociabilidade e vivências.
No âmbito deste diagnóstico, tratar da pobreza se faz pertinente como forma de trazer à
tona uma realidade que tem se mostrado, em alguns lugares, articulada à degradação ambiental. Embora
a pobreza esteja disseminada pelo mundo, sua configuração nas regiões áridas e semi-áridas do planeta
evidencia uma cristalina nitidez. Nestas áreas, que enfrentam longos e cíclicos períodos de seca, há
redução da produtividade agrícola interferindo na produção de gêneros alimentícios o que se traduz em
fome, onde já se vive a ameaça de sede. Assim, as nuances da pobreza, que não é causada pelos
fenômenos naturais, são aguçadas e o suprimento das necessidades humanas aumenta a pressão sobre
os recursos naturais, produzindo o seu constante e progressivo desgaste. Desta conjugação entre
degradação social e degradação ambiental têm-se como resposta a manifestação do processo de
desertificação.
O Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil apresenta dados relativos à indigência e à
pobreza. De acordo com o referido Atlas, vivenciavam a condição de indigência a parcela da população
cuja renda domiciliar per capita era equivalente a ¼ do salário mínimo vigente em agosto de 2000. A
pobreza envolvia a fração populacional que tinha uma renda domiciliar per capita correspondente a ½
do salário mínimo vigorante em agosto de 2000. Infere-se, portanto, que a indigência remete-se a uma
classe que vive a pobreza extrema ou miserabilidade.
As referências a estes índices, em termos de Brasil, denotam uma redução na proporção de
pessoas afetadas por estas situações, visto que, a proporção de indigentes passou de 20,24%, em 1991,
para 16,32%, em 2000, e a participação da população em estado de pobreza decaiu de 40,08% para
32,75%, nos anos focalizados. Apesar disso, é preciso atentar que os indicadores ainda permanecem
elevados.
A tendência a declínio também se verificou no Rio Grande do Norte. Em 1991, a população
indigente do Estado equivalia a 34,56% decaindo para 26,89%, no ano 2000. Com relação à
representatividade de pobres no universo populacional, registrou-se um declínio de 61,71% para
50,63%. Entretanto, a soma dos indicadores demonstra que 77,52% dos potiguares, em 2000, viviam
com uma renda domiciliar per capita correspondente a ½ do salário mínimo ou em extrema miséria,
constituindo-se um dado preocupante. A cartografia da pobreza e da indigência dos
norte-rio-grandenses pode ser avaliada nas representações a seguir (MAPA 07 e MAPA 08)
FONTE: PNUD. Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. Disponível em: http://www. pnud.org.br/atlas
34
FONTE: PNUD. Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. Disponível em: http://www. pnud.org.br/atlas
PIB real per capita, expresso em dólares e ajustado para refletir a paridade do poder de compras entre
os países. O IDH varia de 0 (nenhum desenvolvimento) a 1 (desenvolvimento humano total) e
estabelece a seguinte classificação: baixo desenvolvimento humano (índices até 0,499); médio
desenvolvimento humano (0,500 a 0,799) e alto desenvolvimento humano (maior que 0,800). O mapa
do IDH do Rio Grande do Norte revela a situação em que se encontra o Estado sob o ponto de vista do
desenvolvimento humano (MAPA 09).
FONTE: PNUD. Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. Disponível em: http://www. pnud.org.br/atlas.
3.2.1 Características
A história da ocupação do território que hoje compõe as ASD potiguares remete à presença
portuguesa nestas terras, cuja intervenção mais efetiva foi deflagrada no final do século XVI, quando
passaram a desenvolver a cana-de-açúcar, no litoral. Nos séculos seguintes, deu-se a apropriação do
espaço interiorano utilizado para a criação de gado, a agricultura de subsistência e, mais adiante, para o
cultivo do algodão. No decorrer dos séculos, outras atividades surgiram como a extração do sal, da
cera de carnaúba, da oiticica e do sisal e a mineração. Além disso, a população cresceu, as cidades se
expandiram e se multiplicaram, estradas foram construídas e muitas alterações foram impressas ao
espaço. Neste processo, elevaram-se as demandas em relação aos recursos naturais, mas também foram
ampliadas as possibilidades de intervenção do homem no espaço através do emprego de tecnologias.
Todavia, especialmente no recorte semi-árido do Estado, já são notáveis os sinais de descompasso entre
os recursos naturais disponíveis e o atendimento às demandas sociais.
Em um passado recente, o território potiguar foi afetado pelas crises da cotonicultura e da
mineração, que desestabilizaram a sua base produtiva (décadas de 1970 e 1980). A emergência de
novas atividades e a expansão de outras já existentes, se encarregaram de refazer a dinâmica econômica
que repercutiu diferentemente sobre as regiões, em função de especificidades locais e conjunturais.
No entanto, em meio ao elenco de atividades desenvolvidas existem algumas que têm se
mostrado extremamente danosas ao meio ambiente, inclusive contribuindo decisivamente para a
acentuação da susceptibilidade à desertificação, tanto nas circunscrições do semi-árido, quanto nas de
clima subúmido seco. Além das atividades econômicas um outro componente a incidir sobre este
processo são as práticas culturais, que estão diretamente vinculadas à forma de produzir e ao cotidiano
das pessoas, por exemplo o desmatamento e a queimada para uso do solo na agricultura e a extração da
lenha para fins domésticos.
38
Não é demais enfatizar que a circunscrição das ASD no Rio Grande do Norte corresponde a
97,6% de seu território e que a agropecuária ainda tem um papel importante no quadro econômico,
41
Na tessitura deste enredo de crises, que abalou a economia estadual, novos segmentos de
produção do setor mineral foram surgindo e outros, já explorados, tiveram a oportunidade de se
fortalecer e/ou ampliar. A Avaliação Preliminar do Setor Mineral do Rio Grande do Norte (SEDEC,
2004), documento elaborado com base nas informações do Cadastro Industrial da Federação das
Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte – FIERN, referente aos anos 2002-2003, e da listagem de
42
FONTE: SEDEC. Avaliação preliminar do setor mineral do Rio Grande do Norte. Natal, 2004.
No Pólo do Seridó os dados são mais expressivos: das 141 empresas produtoras de
cerâmica do Estado, 66 estão situadas na região (46,8%), dispersas por 14 municípios. Parelhas, com
suas 24 unidades de produção, se destaca como maior produtor do Estado. Em seguida despontam os
municípios de Carnaúba dos Dantas (13), Jardim do Seridó (6) e Cruzeta (6).
Indiscutivelmente, a mineração, praticada de maneira racional e econômica, se constitui uma
atividade básica da economia, que “deve ser operada com responsabilidade social, consolidando-se no
contexto do desenvolvimento sustentável, procurando um equilíbrio sistemático entre o trinômio
homem-recurso natural-território” (SEDEC, 2004, p. 35). Porém, os questionamentos acerca desta
atividade surgem em função de que o seu exercício nem sempre se pauta por estas prerrogativas ou pela
observação da legislação pertinente. Disto resulta que a mineração executada sem um devido
planejamento e sem critérios técnicos e ambientais torna-se uma atividade portadora de expressivo
poder de degradação ambiental.
A assertiva conduz a pensar sobre o desenvolvimento da mineração em um território com
elevada susceptibilidade à desertificação, como é o caso do Rio Grande do Norte, especialmente a
Região do Seridó, principal pólo de produção ceramista do Estado e onde se registram os mais altos
níveis de susceptibilidade (muito grave e intenso), responsáveis pela configuração de um núcleo de
desertificação.
A difusão da produção de cerâmica (FIG. 07 e 08) pelo Seridó coloca-se no contexto de
rebatimento da crise da base produtiva – algodão e scheelita -, insurgindo-se como uma alternativa
capaz de gerar ocupação e renda. Dados do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial –
SENAI/RN, revelaram que, entre 1989 e 2001, houve um expressivo crescimento do setor ceramista no
Rio Grande do Norte, principalmente, no Seridó. No período em foco, foi registrado um crescimento
relativo deste segmento da ordem de 93,9% no Estado e de 690% na citada região (MORAIS, 2005, p.
293).
45
Nos principais municípios produtores esta atividade tem sido responsável pela garantia de
trabalho e renda para um grande contingente da população. Mas, se por um lado pode parecer
promissora em termos de mercado de trabalho, por outro, contribui para acentuar a susceptibilidade à
desertificação, tendo em vista a origem da matéria prima argila e a rudimentar tecnologia de produção
que utiliza a lenha como fonte de energia. A fabricação de telhas e tijolos com base na utilização de
recursos florestais e de solos aluviais, antes usados para a lavoura de subsistência e o plantio de
pastagens, tem aguçado os problemas ambientais da região, cujo ecossistema predominante já apresenta
naturalmente tendência a processos de degradação. O uso de argila de açude para fins ceramistas
também tem contribuído para degradar e gerar conflitos em áreas de vazante dos reservatórios, cuja
destinação é a produção de hortifrutiganjeiros e de capim para o gado quando o volume d’água
encontra-se baixo. De acordo com Medeiros (2004, p. 74), a produção ceramista “é considerada pela
maioria dos estudiosos como a atividade que mais corrobora para degradar a região do Seridó
norte-rio-grandense”.
A forma como a produção é realizada recorrendo-se ao desmatamento de áreas recobertas
pela Caatinga, que deixa o solo desnudo, e a extração de argila em recortes férteis que aceleram a
erosão através das crateras que se formam no solo, torna-a um agente incisivo de degradação em um
cenário marcado pela semi-aridez. Outrossim, o baixo nível tecnológico utilizado no fabrico de telhas e
tijolos tem gerado grandes perdas de material que se transformam em resíduo, entulhado nas
proximidades das unidades de produção, denotando uma outra face da agressão ao meio ambiente.
Neste sentido, descortina-se o desafio que a sociedade potiguar precisa enfrentar, tendo em
vista a extensão da atividade mineira e, especialmente a dimensão que a produção de cerâmica assume,
nos dias atuais. Apresentando-se com alguns estabelecimentos dispersos e outros agregados em pólos, a
produção de cerâmica cristaliza a difícil equação entre dividendos econômicos e degradação ambiental.
Neste panorama, porém, há um dado que não se pode negligenciar: 97% das terras do Rio Grande do
Norte são susceptíveis à desertificação e, no Seridó, principal pólo ceramista, há um retrato sem
retoques produzido pela exaustiva intervenção do homem no meio, um legado de degradação que fez a
região ser perfilada entre os núcleos de desertificação do Brasil.
Uma outra atividade econômica que pode ser apontada dentre aquelas cujo
desenvolvimento colabora para a desertificação é a panificação. Embora ainda não se tenha dado
disponível sobre o assunto, é possível vislumbrar uma correlação entre o crescimento das panificadoras
e a elevação das taxas de urbanização, visto que, na atualidade, a quase totalidade dos municípios do
Estado, dispõe deste tipo de unidade industrial.
47
a partir da desestruturação familiar motivada pela necessidade de emigrar para centros urbanos, devido
à perda da capacidade produtiva da terra, o que gera novas demandas sociais e aumenta a pressão sobre
os serviços, principalmente os oferecidos pelo Estado. Na dimensão econômica destacam-se a queda na
produtividade e produção agrícolas, sobretudo a agricultura de sequeiro mais vulnerável aos fatores
climáticos, e a redução da renda e do consumo da população. Acrescente-se a repercussão sobre a
arrecadação de impostos e na circulação de renda decorrente da perda da capacidade produtiva
(IDEMA, 2004, p. 13-14).
Tomando como referência o PAN Brasil (MMA, 2004), que estabelece uma regionalização
em áreas semi-áridas, subúmidas secas e de entorno, segundo os estados, foi possível sistematizar
alguns dados sobre as ASD do Rio Grande do Norte que desnudam a problemática da desertificação,
revelando o quão é preocupante a situação no Estado, em termos de extensão e contingente de
população afetado (TAB. 06).
TABELA 06
Áreas Susceptíveis à Desertificação no Rio Grande do Norte segundo o PAN-Brasil – 2004
MAPA 10 - Áreas Susceptíveis à Desertificação no Rio Grande do Norte segundo o Pan-Brasil - 2004
FONTE: MINISTÉRIO do Meio Ambiente. Secretaria de Recursos Hídricos. Programa de ação nacional de
combate à desertificação e mitigação dos efeitos da seca – PAN Brasil, 2004, p. 189-194.
51
Conforme foi analisado anteriormente, as áreas semi-áridas que conformam as ASD do Rio
Grande do Norte correspondem ao espaço onde predomina o ecossistema da Caatinga e se manifestam
as características climáticas da semi-aridez.
Dentre os 159 municípios que compõem as ASD norte-rio-grandenses, 143 compreendem
as Áreas Semi-áridas e totalizam uma extensão de 48.706,01 km², ou seja 92,3% do território. Nestes
rincões sertanejos moram 1.563.478 habitantes, um pouco mais da metade da população potiguar
(56,3%). Deste universo, 66,61% da população vivem em espaços urbanos.
A tentativa de estabelecer uma correspondência entre este recorte e as divisões regionais do
Estado (vide MAPA 02) permite identificar que dele fazem parte as mesorregiões Oeste Potiguar,
Central Potiguar, Agreste Potiguar e alguns municípios da Mesorregião Leste Potiguar. As
especificidades encontradas nas escalas microrregionais tornam possível admitir que ocorrem diferentes
níveis de degradação.
Entrecruzando a leitura de Carvalho; Gariglio; Barcelos (2000) com a classificação do PAN
Brasil (2004), é possível delinear recortes a partir da intensidade do processo de desertificação.
Assim, dentre as áreas semi-áridas do Rio Grande do Norte, afetadas por este fenômeno, a
porção sul da Mesorregião Oeste Potiguar ou sul-oeste do Estado, onde se situam as microrregiões de
Pau dos Ferros, Serra de São Miguel e Umarizal, apresenta um estágio de degradação moderada.
No outro extremo, registrando níveis de degradação muito grave e intenso, está uma fração
da Mesorregião Central Potiguar, mais especificamente as microrregiões do Seridó Ocidental e Oriental
e os municípios de Jucurutu (Vale do Açu), Florânia, Tenente Laurentino e São Vicente (Serra de
Santana), localizadas na parte centro-sul do Estado, cuja gravidade da situação resultou na identificação
de um núcleo de desertificação, objeto de análise a seguir.
Os demais espaços semi-áridos susceptíveis à desertificação no Rio Grande do Norte foram
parcialmente identificados pelo estudo de Carvalho; Gariglio; Barcelos (2000), de forma que é possível
apontar como áreas de ocorrência grave apenas as microrregiões Chapada do Apodi, Médio Oeste,
52
Mossoró e frações do Vale do Açu (Messoregião Oeste Potiguar); a microrregião Macau (Mesorregião
Central Potiguar); a microrregião de Baixa Verde (Mesorregião Agreste Potiguar) e alguns municípios
da microrregião do Litoral Nordeste (Mesorregião Leste Potiguar).
A análise destes recortes sob a ótica da intensidade da pobreza, da indigência e do IDH-M
mostra um quadro bastante variado. Com relação à pobreza e a indigência, os municípios que
evidenciaram maior intensidade estão situados, principalmente, nas microrregiões de São Miguel, Pau
dos Ferros, Umarizal e Agreste Potiguar. Os índices menos expressivos concentraram-se em municípios
do entorno de Mossoró e das microrregiões do Seridó Ocidental e Oriental. Nos demais espaços, os
indicadores apresentaram uma situação intermediária. Em termos de IDH-M, as situações mais críticas
aparecem na microrregião do Litoral Nordeste e em alguns municípios dispersos pelo território
estadual, pontilhando os espaços regionais. Os índices mais favoráveis se sobrepõem às regiões em que
a pobreza e a indigência registraram menor intensidade.
Nas áreas semi-áridas susceptíveis à desertificação norte-rio-grandenses a agropecuária
ainda desempenha um importante papel no tecido sócio-econômico, estando o Seridó entre as principais
bacias leiteiras do Estado; a produção ceramista assumiu expressividade, passando a representar uma
das relevantes fontes de renda, e a urbanização intensificou-se, nos últimos 35 anos, gerando novas
demandas sociais e o aumento da pressão sobre os recursos naturais. Neste recorte inclui-se o núcleo de
desertificação.
53
núcleos desertificados” (MMA, 2004, p. 17). No Seridó, a extração de argila de solos aluviais, tendo
como destino a produção ceramista, foi apontada como causa principal da desertificação.
Sobre a inclusão do Seridó potiguar como núcleo de desertificação assim se manifesta
Vasconcelos Sobrinho (1982 apud 2002, p. 68): “No Rio Grande do Norte, quase toda a região
fitogeográfica do Seridó vem sendo submetida a intensos trabalhos de prospecção e mineração, criando
núcleos de desertificação”. O autor salienta que esta atividade, juntamente com as condições climáticas
de baixa pluviosidade, tornam o Seridó um dos exemplos mais graves da presença da desertificação no
Nordeste. Um outro agravante é a produção de cerâmica, cujos efeitos nefastos extrapolam a formação
de crateras para a retirada do barro [argila], grassando pela destruição da cobertura vegetal para
obtenção de lenha a ser usada nos fornos. “O Seridó, principalmente nos municípios de Equador,
Parelhas, Carnaúba dos Dantas e Acari, 104 (cento e quatro) cerâmicas competem entre si pelo volume
de argila retirado do solo para fabricação de telhas e tijolos, incentivadas pela qualidade do barro, que
permite um tipo especial dos artefatos fabricados.”
Considerando que este estudo foi realizado em 1982 e que nos dias atuais (2005) a
produção ceramista é ainda identificada como uma das principais atividades a gerar ocupação e renda
para os seridoenses, sendo ainda marcada pelo emprego de baixa tecnologia, conclui-se que decorreram
23 anos de intensa degradação dos solos e da vegetação em terras seridoenses.
Os dados coletados sobre a área e a população do Núcleo de Desertificação do Seridó,
segundo a regionalização adotada pelo PAN Brasil (MMA, 2004, p. 17), delineiam a extensão territorial
e a abrangência demográfica do fenômeno (TAB. 07).
TABELA 07
Núcleo de Desertificação do Seridó
2005
MUNICÍPIOS ÁREA (km²) POPULAÇÃO
Total % Urbana Rural Total %
Acari 608,565 1,2 8.841 2.348 11.189 0,4
Caicó 1.228,574 2,3 50.624 6.378 57.002 2,1
Carnaúba dos Dantas 245,648 0,5 5.035 1.537 6.572 0,2
Currais Novos 864,341 1,6 35.529 5.262 40.791 1,5
Equador 264,983 0,5 4.324 1.340 5.664 0,2
Jardim do Seridó 368,643 0,7 9.297 2.744 12.041 0,4
Parelhas 513,052 1,0 15.606 3.713 19.319 0,7
Núcleo de Desertificação 4.093,806 7,8 129.256 23.322 152.578 5,5
Estado (total) 52.796,791 100 2.036.673 740.109 2.776.782 100
FONTE: IBGE. Censo demográfico 2000, 2000, p. 269-271.
IBGE. Área territorial oficial. Resolução nº 5 de 10 de outubro de 2002. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/geociencias.
55
Com o declínio do binômio algodão-gado foi retomada a produção pecuária, com incentivo
governamental, determinando um processo de expansão que incidiu sobre o território, entre outras
formas, através da ampliação das áreas com plantio de capim. Além do rebanho bovino, também
cresceu significativamente o de caprinos e ovinos. A questão do aumento dos rebanhos se torna
problemática mediante a ocorrência de superpastoreio.
Pesquisa realizada por Sampaio et. al (2002, p. 121) aponta para uma contração na área de
lavoura permanente na Região do Seridó, após 1985, que se deve à redução da área plantada com
algodão arbóreo. No entanto, observando que, em 1995-1996, alguns municípios como Carnaúba dos
Dantas, Acari e Parelhas apresentaram reduções maiores que a região, inferiu que “a desertificação
parece, [...], ser elemento agravante da contração da área cultivada com lavoura permanente no
núcleo.” Além da contração na área cultivada, também foi evidenciada queda na produtividade,
destacando-se os municípios de Equador e Parelhas.
Ressalta-se que dos sete municípios do Núcleo de Desertificação, cinco fazem parte do Pólo
Ceramista do Seridó (exceto Equador).
Desta forma, nos municípios que compõem o Núcleo, a prática da agricultura, da pecuária e da
mineração acompanharam o enredo da história regional, mas deixaram como legado um horizonte
turvo, embaçado pela avidez do machado para retirar a lenha e pela fumaça que emana dos fornos das
cerâmicas, onde a argila é transformada em telhas e tijolos, e dos bacuraus ou trincheiras (fornos), onde
a vegetação é queimada para produzir carvão. Assim, impulsionada pelo desmatamento, queimadas e
atividades econômicas desenvolvidas de forma inadequada, as terras vão ficando despidas, expostas ora
ao sol causticante, ora às chuvas torrenciais; a erosão vai rasgando o solo, deixando à mostra suas
entranhas, formando crateras, gerando uma paisagem chocante que se torna ainda mais agressiva
quando se concebe que, embora havendo uma predisposição natural, sua conformação atual foi lapidada
pela ação humana.
Neste cenário, considerando a importância da gestão no âmbito da problemática ambiental,
buscou-se informações a respeito da estrutura institucional dos municípios formadores do Núcleo de
Desertificação, como forma de identificar o tratamento dispensado a dimensão ambiental. De acordo
com os dados fornecidos pelas prefeituras, os municípios de Parelhas, Caicó, Currais Novos, Jardim do
Seridó, Carnaúba dos Dantas e Acari apresentam em sua estrutura administrativa uma Secretaria
Municipal com atuação sobre o meio ambiente, porém, não de forma específica. Geralmente esta
secretaria abrange também a agricultura, o abastecimento e/ou serviços urbanos. Em nível de aparato
institucional do Estado, registrou-se a presença da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural –
57
EMATER nos sete municípios. Em termos de atuação direta do Governo Federal, há um escritório do
DNOCS apenas em Caicó.
As informações obtidas sinalizam para um avanço na estrutura institucional em nível de
municípios. Todavia, é preciso atentar que a gestão ambiental não se faz apenas através da criação de
organismos, mas, principalmente, a partir de decisões e ações aglutinadoras de divergentes interesses,
pautando-se em uma construção social participativa e descentralizada, em que o Estado e a sociedade
compartilhem as responsabilidades sobre o uso e a conservação/preservação dos recursos naturais.
Do universo de 159 municípios formadores das ASD do Rio Grande do Norte, apenas 13
(8,2%) compõem as Áreas Subúmidas Secas. São municípios que, de modo geral, localizam-se na faixa
de transição entre o litoral e o sertão, resguardando em sua paisagem traços de uma ou outra região
geográfica, dependendo da sua localização.
A relação entre esta regionalização e a adotada pelo IBGE torna possível a seguinte
identificação: na Mesorregião Leste Potiguar estão Rio do Fogo e Maxaranguape (Microrregião Litoral
Nordeste); Ceará-Mirim, São Gonçalo do Amarante e São José do Mipibu (Microrregião Macaíba) e na
Mesorregião Agreste Potiguar situam-se Pedro Velho, Montanhas, Várzea, Judia, Espírito Santo,
Passagem, Brejinho e Monte Alegre (Microrregião Agreste Potiguar).
Sua abrangência territorial é de 2.396,834 km² correspondentes a 4,5% da área total do
Estado. A população residente soma 260.290 moradores, dos quais 40,22% residem em ambientes
urbanos, segundo o Censo 2000.
Nestas áreas há predominância de índices de pobreza e indigência, situando-se em em uma
escala de média a alta intensidade. O IDH-M é variável, sendo ressaltados os baixos indicadores dos
municípios do Litoral Nordeste.
Neste recorte a agricultura e a produção ceramista também são representativas. Nos
municípios litorâneos, a infra-estrutura turística se fortalece e irradia-se pelas áreas adjacentes,
dinamizando a economia.
Financiament
x MMA
Programa Água o U$
1 2004/2007 MMA / SRH
Doce 6.000.000,00
Execução e
x SERHID
operação
R$
Programa de 2003 / 2004
Financiament 16.665.256,71
2 Desenvolvimento x SEAS BIRD
o e Execução R$
Solidário 2005/2006
25.491.000,00
Subprograma de
Financiament
Desenvolvimento x ANA
o
Sustentável de
Recursos Hídricos R$
4 1998/2005 BIRD
para o Semi-árido 50.000.000,00
Brasileiro –
PROÁGUA /
x SERHID Execução
Semi-árido
60
Convênios Recurso
/ s
Órgão Gestor
Programas Envolvid
Item
e os Período de Fontes de
Estadua Financiame
Federal Municipal Nome Atribuição R$ Implementação
Projetos l nto
Projeto
Manejo x MMA Financiamento
Sustentável 152.365, MMA/FNM
9 2005-2006
de Uso 00 A
EMATE
Múltiplo no x Execução
R
Seridó/RN
Projeto
Recuperaçã x MMA Financiamento
o da Área
300.000, MMA/FNM
10 Desertificad 2005-2006
00 A
a da Bacia
x SERHID Execução
do Rio
Cobra
Levantamen
to da x MI Financiamiento
situação dos
Perímetros
x SAPE Execução
Irrigados 10.774.0
11 2005 MI
dos Estados 00,00
do Rio x DIBA Execução
Grande do
Norte e
Paraíba
Plano
534.443. Estado do
12 Plurianual - x SERHID Execução 2005/2007
000,00 RN
2004/2007
63
Programa de arranjo
x DNPN Financiamento
produtivo - Estudo dos Governo
16 pegmatitos envolve os 1.000.000,0 2004/2007 Federal e
Estados do Rio Grande do SEDE 0 Estado
x Execução
Norte e Paraíba C
SEDE
x Financiamento
Projeto Gasoduto C
Governo do
17 Açu/Seridó - Orçado no ano 86.636,671, 2004/2007
RN
de 2002 99
Execução
762.167.33
Total dos Recursos 5,67
FONTES: Diário Oficial do Estado do Rio Grande do Norte - Janeiro de 2004 a Setembro de 2005.
RIO GRANDE DO NORTE. SEDEC, SERHID, SEAS, SAPE
SEAPAC - Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários
EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
IDEMA - Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente
65
ADESE/MDA
Programa de Cursos de Aperfeiçomaneto em operacionalização de GPS e
Desenvolvimento Manejo Anima e derivados do Leite
Sustentável de
Territórios Rurais
74
REFERÊNCIAS
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Acesso em 3 mar 2004.
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ANEXOS
ANEXO 01- Abrangência das Bacias Hidrográficas do Rio Grande do Norte – 1998
ANEXO 02 - Principais Classes de Solo do Rio Grande do Norte
ANEXO 03 - Recursos Minerais do Rio Grande do Norte por Municípios e Número de Empresas -
2002-2003
ANEXO 04 - Municípios Produtores de Recursos Minerais por Número de Empresas
ANEXO 06 – Plano Plurianual do Estado do Rio Grande do Norte: Ações sócio-ambientais a serem
desenvolvidas no período 2004 – 2007.
ANEXO 08 - Projetos desenvolvidos pelo Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários -
SEAPAC no Rio Grande do Norte através do PAPP e do PCPR - 2004 a 2005, no âmbito das ações de
geração de emprego e renda, implantação de hortaliças comunitárias, abastecimento d’água (Poço
tubular, dessalinizador, cisternas de placas, barragens assoreadoras, reforma e ampliação de açudes,
passagem molhada).