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IN@RODDGLO 1. OBJETO DE ESTUDO O problema da demanda efetiva — que até entao sé era abordado pe- los economistas "heréticos", desligados da tradigéo cldssica e néo-cléssica — finalmente ganhou destaque na década de 1930 e & partir def inseriu~se definitivamente na literatura econémica,, Essa mdange (de radical impliceg&o pera uma série de questdes) se deveu &s obras de trés eutores de diferentes formagoes teéri- cas: por ordem de entrada em cena, o sueco Gwinar Myrdal, o polo- nés Michel Kalecki e o inglés John Maynara Keynes, (1) A matriz teérica de que partiu Myrdal é constitufda pela Escola eustriace e por Wicksell, mas sua contrituicao para o esclareci- mento do problema da demanda efetiva é a mais limitada das trés A matriz te6rica que serviu de base a Keynes é bem menos "nobre": Thomas Malthus, J. A, Hobson e outros menos conhecidos, como Sil- vio Gesell. Pelo menos essa é a matriz reconhecida pelo préprio Keynes, mas na verdade ele sofreu influéicies de outros estudiosos mai's "diptintos" ao que os dotme citados, como Wicksell © Alfred Warshall, cuja obra principal (Principles of Eeononics, muito ben conhecida por Keynes) -contém algumas sementes da quest&o de deman- da ‘efetiva, De todos, fof Keynes quem obteve o maior reconhecimen- to pelo desenvolvimento da quest2o; isto se deve, em grande parte, ao fato de ele j& ser, quando escreven sua General Theory, um veo~ (2) 9 trevatio ae Wyrdal foi publicado em sueco em 1931 e em ale- n&o en 1933; em inglés, sob o titulo de Monetary Equilibrium, apa- receu em 1939. 0 primBiro trabalho teérico de Kalecki foi publice- do em polonés em 1933 e em francés e inglés em 1935. 0 livro de Keynes (The General Theory of Suployment, Intereet and Money) -sw giu em 1936. rofundamente nomista de projegfo mundial. Contuiie, quem matis tratou do probleme foi Kelecki, tomande por base « literatwra B precisamente 2 corrente econémica marxis & questio da demande efetiva que constitu o objete de ao presente trabalha. Quando Kalecki elaborow seu primeiro extwdo dentacands 0 pa- pel da denanda efetive no processe de acwmlacgho cepitulict: (mais especificamente, no movimento efclico dag ccononins ea~ pitslistas), jd havia sobre o assunto uma ve: sista, Nease. litpratura o problona da denanda efotiva eva conhen rassos. Contudo, no Anfoio an aéonaa ae 1930 ane hévia ‘praties+ mente @esaparcei.ac de.cena. Bin'nosgo onvéndex, .oss @ deanpareci.— tonto pode sex éxplicedo por dois notivos pAsicos! primciroy 0 fato de Lénin’ ter..criticado todos aguel 6. que: havi oni eo.lvaado om primeiro plano: a questo dos: inereedos ng processo de. desen- volvimentto go cabs Fels sna weginds.s com oO @: tabeiecim 9 do Smaciscd smo ofickal', Ber, Stélin no. fim da aécada “de 1920, a pom sicéo de Lénin'’em face do assunto foi elevada ao’ nivel de dogua. Assim, o problemé da realizagéo, gue era um ponto’ controvertide, -simiu da literatira narxiste por Tonge feinpo, .¢ até hoje econ tranos alguns $ébvidbs marxistas ave identifica o problema da, demenda cfetive oxes com ovtra deni gnagio; nada mois € do que g80) como mm tema ‘epee aa Booniomsa Lalecki, porém, gue nao era un marxista oficial, retonou o assunto. A grandé erise econémica mundial de 1929-33 abslou profundemente a produgdo polonesa, eujo nivel em 1933 havia mie on 1923; Kolec! do nivel: ox ecaice a meno da net v observava que a produgZo decrescia apesar de haver equipamento _ de capital e forga de trabalho suficientes para manter a econo- nia operando em nivel muito mais alto. Se havia disponibilidade de capacidade produtiva, a queda da produgio sé poderia ser ex- plicada como ume. crise de realiz Go, uma restrigao de mercados, una insuficiéncia de demanda efetiva, Para formular sua interpre- tacfo, Kalecki recorreu As concepgdes de Marx, Rosa Luxemburgo e Tugan-Baranovski — os autores que mais diretamente o.influen rem, Mas a obra de Kalecki, ao fugir do padrdo (de contetdo e - linguagem) do marxicmo oficial, aeatou sendo identificada como + keynesiana. Somente a pertir da segunda metade da década de 1950 sua formagZo’ marxista foi sendo pouce a povco reconhecida — em grande parte gragas & divulgagao Ge oua obra por Paul Baran, Peul Sweezy e Joan Robinson. Como j& aissemos, no presente trabalho pretendemos estudar a questao da demanda efetiva (ou, para sermos mais precisos, o pa- pel da-realizagao da mais-valia no processo de acumalagiio capi't: lista) no pensamento econSmico marzicta. Assim fanendo, daremos especial destaque A obra de Kalecki, posto que, em nosso enten~ der, foi com esse autor, que a referida quest@o encontrou seu ma- ion desenvolvimento. 2, CONTEDDO DO TRABALHO e so 0 presente trabalho & constitufdo de quatro cepftulos, or exaiinados, em seqtténcia, os seguintes assuntos:'{1) a influén- cia da chamada "lei de Sey" sobre @ teoria econ$mica. ortodoxa; (2) as concepgdes de Marx a respeito do processo de acumlacao capitalista e do papel exereido pela demanda efetiva; (3) as "3novagdes" introdugidas nér Kora Luxemburgo na teoria de (4) a obya de Kalecki acerca das economies capitalistas maduras, na quel ele esclarece a importéneia da realiza Gremos ser conveniente esclarecer desde logo duas. eventuais indagagdes: @) por que comegamos este trabalho pelo estudo da "lei de Sey"? (2) por que dedicamos especial ateng&o A obra de Kalecki (0 que se reflete no fato de o correspondente capf{tulo ser o mais longo dos quatro)? Comecemos pelo primeiro ponto. A "lei dos mercados" de Say (segundo a qual a produgdo gera sua prépria demanda, o que implica ndo haver restrigao de dexan- da para a continua expansdo da economia) foi adotada por Ricardo @ por John Stuart Mill e depois incorporada eos fundementos da ortodoxia néo-cléssica, tendo influenciade profundamente o en- tendimento de todo um conjunto de questdes. Um exame superficial da teoria de acwmlagéo de liarx, beseato apenas el seus esquemas de reprodugdo ampliada, pode lever & fal- sa cona@lusdéo de que também Marx seguia, embora sem o saber, & "Lei dos mercados" de Say; isto porque, nesses esquemas, ele ado~ tava a hipétese de continua aaumlago de capitel, deixandc de lado as poss{veis restrigdes impostes pela insuficiéncia de denen da. Foi desse modo que Tugan-Baranovski, por exemplo, wtilizou-se dos esquemas de reprodugiio., Até mesmo Rosa Iuxeinburgo, numa pas- sagem de seu livro sobre Acumulacdo de Capital, chegou a inter pretar dessa forma a teoria de Marx, como veremos no capitulo 3. Mas essa interpretagao é totalmente infundada, Marx devotave grande desprezo por Say e por sua "lei dos mercados" e nado perdo~ ave Ricardo por té-1g adotado e defendido. Podemos afirmer que foi. precisamente ao criticar a verso ricardiana dessa “lei apli- cada & anélise do processo capitalista de acumulagao que Merx co~ megou a formular sua concepgdo a respeité da importéncia da rea- ligag&o da maiis-valia, Isto pode ser constatado em seu livro Jeo- vias da Mais-Valia (especificomente na parte relativa ¢ Ricardo, onde Marx trata da acumulag&o de capital e das crises). vid Yoltamos entéio a perguntar: que faz, no-comego do presente se trabalho, um estudo da "lei de Say" e de suas influéncias? te um claro motivo para comegar o trabalho com esse estudo: pre- tendemos mostrar como a referida "lei" — com todas suas implica~ goes — encontra-se fortemente enrafzaia no pensamento econémico ortodoxo a partir de Ricardo, e isto serve, entre outras coisas, como pano de fundo para ressalter o quanto, nessa questéio (para ficarmos apenas nessa), 0 perisamento econdmico marxigta se dife- vereia de corrente ortodoxa. Bm suma, enquanto os economistas or todoxos levaram mais de wn século — contedo de Ricardo a Keynes — para descobrir a importancia de demanda efetiva no funcionamento das economias capitalistas, a teoria marxiste desde o infcio jé destacava essa questo, © segundo ponto a esclarecer.se refere & especial atenc&o dada a Kalecki. 0 fato deo cepftulo correspondente a Marx ter a meta de do miimero de paginas do capftulo relativo a Kalecki n&o signi- fica que atribufmos a Marx uma import@ncia menor, ou que o trate- »,(2) 1st & tolice. Os mos como um simples "precursor de Kaleck notivos de termos dedicado maior espaco a Kaleckt sdo: (1) sua obra é relativamente pouco conhecida e merece cer mais estudada; (2); especificamente na questio da demande efetiva (que & o tema central do présente trabalho), sua obra é mats completa e mais clara do que a de Merx.(para nao mencionar a de Rosa Luxewburgo e outros autores), Quento a este segundo motivo, é preciso resoaltar que Marx nao deizou inteiramente eselarecide a questo do papel da Gemenda ef tiva no funeionamento das. economias capitalistas. Na verdade, suas > (2) no prefécio & segunde edigio de sew livro Ai Egsay on 4 (Lonéres,, Naemillan, 1966), Joan Robinson. esereve que Economi. Piero Sraffa a atigave dizendo que ela "tratava Marx como um pou- co conhecido. precursor de Kalecki"; e ela concorda em que hé wha certa verdade negsa brincadeira. vid ‘eoncepgdes sobre ésse assunto se encontram dispersos em éiferen- tes partes dé sua“obra (tanto em © Capital como nas Reorias aa. Mais-Valia), n&@o constituindo uma completa e integral formulacgao do problema, Tanto isto é verdade que deu lugar’a wna série de aividas, e o livro de Rosa Luxemburgo sobre Acumuledo de Capttal & evidente exemplo disto. Com Kalecki a questao da demande efetiva pessou 9 ser o pré- prio ponto de partida para a interpretagaéo do movimento das eco- nomias cepitalistas, e por isto mesmo sua formulagdo do problema tinha de ser mais ubrangente do que a de Marx, onde a realizagao da mais-velia era vista apenes como wma das faces do processo ce~ pitalista de aeumlegao, Queremos aproveitar o momento para fazer uma comparagao entre Marx e Kalecki no tocante A andélise do processo de acumilagao, Considerando esse processo como um todo, a andlise de Kalecki é mais limitada, porque se atém &s condigdes de realizagéo da mei's— -valia dentro desse processo, enquanto Merx trata nao apenas des~ sas condigdes (embora, como dissemos acima, seu tratamento nao seja completo) may “também das condigdes de eriagéo da mais-valia. Sejamos mais claros, Marx trata da.maiis-valia, ou lucbo, tanto pe lo Angulo de sua geracdo (a qual & expliceda pela exploragfo da forga de trabalho assaleriade) como pelo prisma de sua realizado, que determina quanto do lucro produzido ou potencial é efetivemen— te auferido pelos cepitalistas; mas embora Warx tenha estudado exaustivaméente o processo de criagao da mat s-valia, 0 processo de sua realizagao nado ficou devidamente esclarecido. Com Kalecki aeontece: o contrdérios ele se dedicou exclusivamente ao exame do processo de realizagio. Nesse sentido espec{fico, sua anélise dec economies capitalistas é unilateral. ~~ En nosso entender, 6 essa unilateralidade que explica certes deficifncias de sua enélise. Onde isto se torna mais evidente é 3x, em sua-concepgéo dos determinantes do investi ento, Kaleokt for- mulou diversas explicagdes desses determinantes, mas jamais fi- cou, ele mesmo, satisfeito com elas. Im todas essas explicacées ele abordou o assunto inteiramente pelo éngulo da demanda efeti- va; somente em sue Wltima tentativa ele abandonow esse enfoque, passando @ considerer e concorréncia entre os capitelistas como © principal determinante do investimento, concorréncia esta que sé. pode ser bem entendida quando examinada pelo @ngulo da eria- gio fe mais-valia, Em sua tiltima formulagao dos detcrminantes do investimento, Kalecki simpleamente voltou & explicagfo deda pelo + préprio Marx. (Este assunto seré tratedo ne Ultima segao do capf- lo 4.) Segundo dissemos antes, wn outre motivo para dedicarnos mais espago A obra de Kelecki é 0 fato de ela ser relativemente pouco conhecida, E mesmo quando conhecida, ela 6 freatlentemente coloca~ da ao lado da Teoria Geral de Keynes, Apesar de gua contribuigao para esclarecer a formagao marxista de Kalecki, Joan Robinson, por exemplo, jamais deixe de conparé-lo com Keynes’ e o mesmo foi feito, ei escala ampliada, por George Feiwel. (3)- mustos poucos siio os estudos sobre os fundamentos marxistas da obra de Kalec- 1i.(4) com o presente trabalho ceperanos contribuir para isto. (3)°6 f1timo artigo de-Joan Robinson sobre esse tema ericontre-se em Oxford Bulletin of Economies and Estatistics, fevereiro de 1977 (mimero especial dedicado a Kalecki), Ver tombém, nesse mes- mo minero, 0 artigo de Bprine Eshag, "Kaleckits Politioel Boonomy: 4A Comparison with Keynes", De George R. Feiwel, Phe Intellectual Capital of Michal Kalecki, Knoxville, The Un Press, 1975 (ver particularmente os dois primeiros capftulos). iversity of Tennessee (4) entre esses poucos, deve-se mencionar o-ariige de Warieno Dantonio, "Kalecki-e i] Marxismo", em Sinai Storici, n? de ja~ neiro-margo de 1978. Na introdugio que eserevenos pare o livro de enseios Ge Kalecki na série "Grendes Cienti'stas Sociais" da Tai to- ra Atica procuraios abordar, embora reswridamente, essa quest&o, 5. 0 QUE FALTA Como dissemos antes, 0 presente trabalho pretende ser um estuco do pensamento marxista sobre a questdo da demonda efetiva. Para ser um estudo mais abrangente do que realmente é, seria preciso incluir alguns temas ‘que foram deixados de lado. Entre eles ées~ tacamos 0 das crises econémicas e as contritmigées de certos av- tores. A nao inclusao desses temas fol intencionel, pelas razdes que passamos a emplicar, As crises econémicas estéo intimemente relacionades com e rea~ lizagéo da mais-valia, a tal ponto que uma corrente do pensamento marxista as interpreta como’ sendo fundementalmente crises de rea~ lizagazo —- isto é, momentos em que uma parte da produgdo criada ou potencial nao encontra mercados, nao pode ser vendida, gerando as conhecidas mazelas das criges econémicas: queda do nivel de ativi-~ deges, aumento do desemprego, etc. Assim, 6 diffeil trater do pro- blema da realizagao sem falar das crises. Apesar disso, preferimos no fazé-lo, As crises (ou, mais genericamente, o movimento cfcli- co das economias capitalistas) é um dos pontos mai's controvertidos na literatura merxicta (e na literatura econdmica em geral), haven- do pelo menos trés posigdes divergentes: quais sejam, as interpre- tagdes das crises como uma dificuldade de realizagao, ou como um resultado do desequilfbrio setorial, ou como uma consediiéncia da tendéncia decrescente da taxa de lucro, A discussio desse tema seria necessariamente longa e por isto deixames a questio das eri- ses fora de nosso trabalho; somente em um ou outro cepftulo refe~ rimo-nos circunstencialmente a clas. Poderfanos também ter inclufdo neste trabalno dois outros ca~ pitulos, .¢ chegamos a-pensar em fazé-lo. Um desses capfiulos, que deveria vir em seguida & diccusséio da "lei de Say", trataria da- queles autores’ que, na mesma época ou depois de Ricardo (como, por exemplo, 1, KR. Malthus, 5, de Sismondi, J. K. Rodbertus), de A wa modo ou de outro opuseram-se & concepcgao ricardiana de que a acumilagio de capital nao encontrava obsticulos por parte da de- manda, e, nesse sentido, poderiam ser considerados como "precur- sores" de Marx. 0 segundo dégses capftulos, o qual seria inserido entre o capitulo referente a Warx e o reletivo a Rosa Iuxembargo, abordaria o debate acerca do problema da realizagio (ou dos mer~ cados) que envolveu vdérios estvdiosos de Marx (marxistas e nao marxistas) na Rissia no fim do século passado e no comego do a~ tual: alguns “populistas" (naredniks), alguns "marxistae legais" (como eran chamedos), Tugen-Baranoveki, V. I, Lénin, Acontece, porém, que grande parte desses dois imaginados capf- tulos j& foi exposta por Rosa Luxemburgo na segunda parte de sew Livro Acumlacio de Capital, além disto, examinando o ossunto mais cuidadosamente, conelufmos que, com reras excegdes, os menciona~ dos eutores nada ou muito pouco contribuiram para elucidar a ques- +80 eldm de simplesmente se oporem (e &s vezes nem isto) & "lei ée Say". Assim, os dois imaginados capftulos tornem-se diepens4- veis; seu interesse seria puramente “ilustrativo". Talvex precisemos ser um pouso mais expliciton a respeito de Qugan-Baranovski e Lénin. Algumas concepgdes do primeiro destes dois autores tiveram una certa influéncia sobre a obra de Kalec- ki (conforme reconheciéo por este Ultimo) e, por isso, pode pare- cer que ele fez grandes contritigdes para o desenvolvinento do problema da demanda efetiva. Mas nao € verdede, Tugan~Baranovski exclufa'a possibilidadée de i: uficitneias da demande efetiva em sla Vis&o Go processo capitalista dc seumulagiio. Repetindo a "lei & Br de Say", ele escreve que "a produgéo ‘capitalista ceria um mercado para si mesma" e "vito que 4 expans&o da produgao é ilimitada em si mesma, o mereado, a capacidade de absor er seus proiutos, tombém no tem limites". (5) 9 curioso € que, para chegar a essa (5) sranserito de Rosa Luxenburgo, the Acownilstion of Ce (Londres, Routle“ige, 1963), cap. 23, p. 311. Conelus&o, Tugan-Boranoveki recorreu aos esquomes de reprodugao empliada de Marx. A efetiva contribuico de Tugan-Barsnovski estd apenas em res- saltar a import&ncie da demanda por novos tens de capital na ex- pans&o dos mereados. Opondo-se & ingénua idéia de que toda produ- g80 6 volteda para a satisfag&o de necessidedes humanas, ele in- siste em que o capitalismo 6 um sistema (denominado de "antagén: co" por Tagan) onde as mercadorias s&o produzidas para darem lu- eros, n&o importando se elas satisfazem ou nao as necessidades humenas. Assim, 0 capitelismo pode expandimse produzindo bens de consumo ou méquinas que servirdo para a produgdo de outras m&qui- nas, A insuficiéneia de demanda por bens de consuito (que é a tese dos chamados "subconsumistas") n&o constitui necersariamente um obstfculo & expans&o da economia: qualquer que seja o nfvel de consumo, o volume total da produgfio continua a crescer se o nivel de investimento (a demanda por novos bens de capital) for sufici- entemente alto para cobrir a diferenga entre o produto nacional e 0 consumo. Lamentavelmente, porém, Tugen-Baranovski coneluta daft que os capitelistas tendem a investir desse modo, do que re~ sulta nado haver insuficiéncia de demanda, ou restrigao de mercado. Considerando ainda que os novos investimentos criam uma demanda adicional por bens de consumo dos trabalhadores (resultante do acréscimo no volume de emprego), seria mantida uma certa “propor- gio" entre o investimento e o consumo; ‘somente wna ruptura nessa "proporgéo" (no cago, uma queda do investimento abaixo do n{vel neecssério) poderia levar & crise eco Quanto a Lénin, ele se limitou, om geral, a repetir os argu~ mentos de Marx e a eriticar os que sefam da linha, Na parte @e an: critica, ele combateu principslmente as teses dos is (po= P viaw pussibilidade de wi desenvolvimento capitalista na RWessis, porque esse pafs n&c diispunha de wr tere: do interno suficiente para ebsorver a produgéo cepitalista (tendo em vista ser a economia russa besicamente serfeoln, com vm cam pesinato extremamente pobre); a eventual alternativa seria, en- +80, conguistar um mercado externo, mag também teso se moctrava improvdvel, porque todos os mereados externos j4 ne achaven sob domfnio das existentes poténeias capitalistas. Lénin reepondia, porém, que essa tese ere falsa, Primeiro, porque era desnecesad- “pio apelar pata um "mercado externo" a fim de tentar resolver o problema. Segundo, porque “o mercado interno para o cpp! telismo (6) & criado pelo desenvolvimento do préprio capitalism", '®? on se- ja,’ pera desenvolver-se o capitali'smo nfo precisa de um prévio mercado interno; esse mercado vai sendo criado e ampliado ne mem dida em que o capitalismo se expande. Até af tudo bem, Mas acontece que, em seu aff de combater a tese dos narodniks, Lénin passou a minimizar a importéncia da questao da realizagéo, e, assim fazendo, contribuiu para refrear 0 desenvolvimento dela, Essa atitude teve adicioneis conseqtén~ cias posteriormente, quando — com o stalinismo — suas concepgdes foram convertidas. em dogmas. Vejamvs como, ele trata da quest&o, Para comegar, ele transfe- re a diseuss&o acerca da cealizagao da mats-velia, que é o ponto central, para 6 problema da realizagho do capital o ital fixo mas também pital este que 6 constitufdo nfo sé do cay dos bens intermedidrios). Por exemplo, ao criticar dois autores ai iks, Lénin escreveut ‘ambos autores reduzem todo o problema da realizegio do produto A realizdgao da valia, evidentemente imaginando que = res~ Jivacgio do capital constante nao apresenta.dificuldades, Essa ingénua opiniso contém um profundo erro, que é & fonte de to~ dos os demais erros da teoria narodnik da realivag% “lidade, e dificuldad a de oxplicar a reslizegao de explicar'o realivdgao é pr: 0 capital constante, /Tenin, op. cit., cap. 1, secdo 4, p. 44.7 (5) ¥, 1. nenin, the Development of Copitelion in Russia, boscou, Progress Publishers, 1964; cap. 1, secéo 9, p. 69. xiv Dizemos nés que o profunde erro ert precisamente em ccentusy a retlizagdo do capital constante, porque a maior dificuldade ¢ a de explicer a realizagdo da mais-valia. Para produzir, os capi- talistas precisam comprar as mereadorias que constituem seu capi- tel constante; quando um capitalista efetua sua produgdo, ele con e pra de outros capitalistas esses mereadorias; quando se cons a produgdo em conjunto, os capitalistas esto comprando essas mer- cadorias uns dos outros, ou seja, elas estado sendo vendidas, rea~ ligadas. Logo, na produgao total, a porte eorrespondente ao valor do capital constante 6 automaticanente realizada (vendida) no pré~ prio processo de produgaéo, Com a parte equivalente & mais-valia total isso nao acontece, e af est& o grande problema. (Este & o tema centrel a ser discutido a partir da segfo 7 do capfiulo 2.) Alterando o eixo central do problema, Lénin passa e discutir 2 realizagao do capital constante em termos de reposig&> (por novo capital) do capital desgastado na produgio, o que é também vm e: tranho modo de colocar o problema, Tem-se af a nftida impresséo de que, com isso, Lénin quer deslocar a atengio de um ponto extrema tenes mente controvertido (a realizagaio da mais-valia) para outros j& suficientemente esclarecidos por Marx; quais sejam: (1) o erro de Adam Smith em n&o computar o capitel constante no valor total Ga produgao, e (2) a inter-relac&o entré o departamento produtor de meios de produgao (capital constante) e o departemento produtor de bens de consumo, B nesse ponto Lénin trarisforma o problema da reelizagao inteiramente num problema de inter-relagio entre os de. partamentos (ver, na ci'tada obra, a segio 6 do capftulo 1), 4, AGRADECTNENTOS Concluindo esta introdugiso, quero deixar registrados meus agrade- cimentos aos coleges Iniz Gonzaga Belluzno e Sérgio Silva, que nfo sé diseutiram comigo algumes pertes do presente trabalho mas tan~ bém manifestaram profundo interesse por todo ele e incent: ane a escrevé~lo.

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