Fausto Brito*
tendências de longo prazo se manifestam asiáticos, tem sido muito mais acelerada
de maneira aparentemente contraditória no do que naqueles desenvolvidos. No caso
curto e médio prazos. Um bom exemplo, e do Brasil, o declínio da fecundidade, após
que será o objeto de análise neste artigo, é 1965, teve impacto, lógico, na redução do
o crescimento populacional. crescimento da população. Resultados re-
Apesar de levar décadas, a transição centes levaram a uma revisão, para baixo,
demográfica no Brasil tem sido acelerada, das estimativas de fecundidade, pois a
como em outros países em desenvolvi- PNAD de 2004 indicou uma taxa de fecun-
mento, com um declínio rápido dos níveis didade total (TFT) de 2,1 filhos por mulher,
de fecundidade e do ritmo de crescimento ou seja, no nível de reposição da população
demográfico. Entretanto, como um pro- (IBGE, 2006). O horizonte da fecundidade
cesso recente, apesar de ter reduzido futura para o IBGE, considerando a TFT
o ímpeto do crescimento populacional, de 2030 como tendência, passou de 1,92
ele ainda será expressivo nessa primeira para 1,59 filho.
metade do século XXI, com o grande ciclo Esses dados levariam a uma revisão das
de incrementos absolutos da população projeções da população para o século XXI,
brasileira que se iniciou nos anos 70 do o que ainda não foi realizado. Portanto, as
século passado. projeções aqui utilizadas, a partir da fonte
Conseqüentemente, a transição da es- oficial, podem ser consideradas conserva-
trutura etária, ainda que tenha diminuído a doras. Segundo esses dados, alcançando
proporção de jovens e aumentado a dos uma fecundidade de 2,1 filhos por mulher,
idosos, possibilitará que no final dessa dé- entre 2010 e 2020, a população brasileira
cada, em 2010, a população jovem tenha chegaria à situação estacionária em torno
o seu maior tamanho absoluto. O cresci- de 2063, quando começaria a diminuir em
mento da população em idade ativa (PIA), termos absolutos. Tudo indica, com a re-
acompanhando a população total, ainda visão do IBGE, que o Brasil poderia alcançar
se manterá até 2040-2050. Isso, por um uma taxa de crescimento zero entre 2045 e
lado, pode ser um benefício, favorecendo 2055(IBGE, 2006).
as relações de dependência demográficas Não obstante, ainda devemos esperar
e, conseqüentemente, as transferências um crescimento expressivo da população
intergeracionais, quando o número de brasileira nas próximas décadas, em razão
dependentes, jovens e idosos, em relação dos efeitos da fecundidade passada sobre
à PIA, será extremamente baixo, mas, por a estrutura etária da população, marcada
outro, se o crescimento da economia e as por uma grande proporção de mulheres
mudanças na regulação do mercado de em idade reprodutiva, o que favorece o
trabalho não superarem seu comportamento crescimento populacional, a despeito dos
recente, a proporção de desempregados baixos níveis de fecundidade atualmente
e empregados na informalidade compro- predominantes. As projeções indicam para
meterá as oportunidades demográficas. 2050 que o tamanho da população brasileira
Permeando as discussões sobre cresci- será de 253 milhões de habitantes, a quinta
mento populacional e transição da estrutura maior do planeta, inferior apenas às da Índia,
etária, neste artigo, estão os agudos dese- China, EUA e Indonésia.
quilíbrios sociais que afetam o Brasil, com Haveria, então, um acréscimo de 90
a coexistência de diferentes etapas da tran- milhões de habitantes à população brasileira
sição demográfica, que caracterizam, como nessa primeira metade do século XXI, o
mencionado, a sua originalidade histórica. equivalente a 2,5 vezes a população da
Argentina em 2005, ou seja, 18 milhões de
Crescimento populacional e a transição habitantes por década, em média. Não se
da estrutura etária trata de se assombrar com a possibilidade
de uma explosão demográfica, mas o cresci-
A transição demográfica nos países mento populacional será, todavia, bastante
em desenvolvimento, latino-americanos e expressivo (Gráfico 1).
GRÁFICO 1
Incremento médio anual da população total
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
GRÁFICO 2
Quociente entre a população de 0 a 4 anos e a população feminina de 15 a 39 anos, segundo renda domiciliar
per capita (em salários mínimos)
Brasil – 1980-2000
TABELA 1
População total, segundo renda domiciliar per capita
Brasil – 1980-2000
Não há dúvida de que qualquer com- não é uma solução que ultrapasse seus pró-
promisso com a redução das desigualdades prios limites, como muitos ainda acreditam,
sociais passa, necessariamente, por reforçar servindo como único remédio para as maze-
na agenda política a necessidade de ações las sociais. Contudo, não se pode separar
visando o apoio à população mais pobre, a reprodução estritamente demográfica da
para que tenha condições de regular sua população da sua reprodução social. Elas
fecundidade, pois é este o segmento so- estão intimamente articuladas. No que se
cial com menos informação e acesso à refere ao segmento pobre, então, esta as-
contracepção. Para ter o exercício de sua sociação não pode ser desprezada quando
cidadania plena, as mulheres, em geral, se pensa em políticas sociais. Mesmo com
e as mais pobres, em particular, devem declínio da sua fecundidade, a dimensão
ter acesso às informações e aos meios de dessa população é tão grande que qualquer
regulação da sua fecundidade, para que incremento torna-se significativo. Pensando
possam decidir, segundo seus interesses, o na situação extrema, otimista do ponto de
número adequado de filhos. Evidentemente, vista demográfico, até mesmo no longo
GRÁFICO 3
População total jovem e idosa
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
cada vez mais rigorosos. O ensino médio seu maior tamanho absoluto na próxima
assume uma importância fundamental, prin- década. Entretanto, incrementos menores
cipalmente o profissionalizante. ou negativos significam, realmente, um alívio
O grupo etário que constituiria essa de- na pressão sobre o crescimento da oferta da
manda potencial para os ensinos fundamen- capacidade instalada para os serviços edu-
tal e médio, ou seja, a população entre 5 e 19 cacionais, o que deve ser aproveitado, como
anos, ainda crescerá, lentamente, até 2020, um benefício, pelas políticas públicas.
quando alcançará seu tamanho máximo, No entanto, a questão não é eleger
cerca de 53,5 milhões de pessoas (Gráfico uma nova panacéia, em que as condições
4). O atendimento ao ensino médio passa a da estrutura etária garantiriam o êxito das
ser o grande gargalo da educação brasileira, políticas educacionais. A situação demográ-
não somente pela pressão demográfica, fica favorável, por si só, pouco significará se
mas, também, pelo aumento significativo não for aproveitada com eficiência, quanto
da população que completa o ensino fun- aos meios, e com objetivo social de ampliar,
damental e deseja continuar os estudos. O pela qualidade, a capacidade de mobilidade
ensino médio enfrentará, dessa forma, dois social da maioria da população pobre,
grandes desafios: atender a toda a demanda reduzindo, desse modo, as desigualdades
e aumentar a qualidade do ensino, sem se sociais.
beneficiar, no curto e médio prazos, com a No caso brasileiro, os benefícios de-
redução da população-alvo. mográficos estão fortemente condicionados
Torna-se evidente que os benefícios pela gravidade da situação social. Isso fica
demográficos, no que se refere à demanda nítido quando se constata que a maioria
pelo ensino, ocorrem devido ao menor ritmo da população jovem, no Brasil, é pobre.
de crescimento do tamanho da população- Nos três últimos censos, a porcentagem
alvo. O passivo demográfico, determinado de jovens de família com renda domiciliar
pelo longo período de fecundidade alta, per capita inferior a um salário mínimo tem
ainda proporcionará à população jovem o diminuído, mas situava-se, em 2000, acima
GRÁFICO 4
População de 5 a 19 anos
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
TABELA 2
População de 0 a 14 anos, segundo renda domiciliar per capita
Brasil – 1980-2000
de 70%, mais de 32 milhões de pessoas. com 65 anos de idade ou mais é uma ca-
No nível mais baixo de pobreza ainda se racterística marcante da transição da estru-
encontravam 45%, cerca de 23 milhões de tura etária brasileira. Essa proporção será de
jovens. 7,0% em 2010, pouco mais de 13 milhões
Os investimentos maciços em edu- de idosos. Comparativamente, naquele ano,
cação, inclusive a escola integral com for- um grupo com 40 milhões de pessoas a
mação técnica até o ensino médio, implicam menos do que os jovens.
uma grande vontade política. Como foi Durante a primeira década deste
mencionado, o público-alvo ainda se man- século, a população idosa tem aumentado,
terá muito alto nas duas próximas décadas. em média, 387 mil pessoas por ano. Mas,
Numa hipótese pessimista, se for mantida, nos últimos dez anos da primeira metade
em 2010, a mesma proporção de jovens do século, estima-se que esse crescimento
pobres de 2000, ou seja, aqueles com renda corresponderá a mais de um milhão de
domiciliar inferior a meio salário mínimo, eles indivíduos por ano. Em 2050, a população
seriam mais de 24 milhões, quase a metade idosa será cerca de 3,7 vezes maior do
de todos os jovens. que a de 2000, próxima de 49 milhões. As
Por outro lado, a população idosa conseqüências deste grande incremento
tem apresentado uma velocidade no seu serão enormes, exigindo uma redefinição
incremento absoluto maior do que a da de todas as políticas públicas voltadas para
população total, aumentando, conseqüen- esse segmento populacional.
temente, sua participação relativa. Associe- A questão mais importante para as políti-
se, a esse fenômeno do envelhecimento da cas públicas, de fato, é a situação social dos
população, o aumento da sua longevidade, idosos. A proporção deles no estrato mais
bem traduzida pelos ganhos na esperança pobre da população tinha aumentado entre
de vida ao nascer, que já alcançava 72,1 1980 e 1991, mas teve uma grande redução
anos em 2005. Deve-se lembrar que os entre os dois últimos censos. Em 2000, 12%
países desenvolvidos, quando estavam na da população idosa possuía renda domiciliar
fase atual da transição demográfica brasilei- per capita inferior a meio salário mínimo, ou
ra, tinham não apenas uma economia com seja, uma situação inequívoca de pobreza.
crescimento sustentado, mas também um Ampliando a faixa de pobreza até um salário
Estado do Bem-Estar Social consolidado. mínimo, tem-se um terço dos idosos, cerca
O Brasil, ao contrário, não tem registrado de 3,5 milhões.
taxas satisfatórias de crescimento da sua Há uma relação positiva entre a pro-
economia, assim como se apressa em refor- porção de idosos e o nível de renda, quando
mar seu sistema de seguridade social, que se considera cada um dos grupos. Ela
ainda se encontra a uma enorme distância aumenta, certamente, devido a uma maior
da experiência dos países desenvolvidos. longevidade e menor fecundidade dos gru-
O envelhecimento da população, ou pos economicamente mais favorecidos da
seja, o aumento da proporção de pessoas população. O segmanto com mais de dez
TABELA 3
População de 65 anos e mais, segundo renda domiciliar per capita
Brasil – 1980-2000
salários mínimos de renda per capita familiar, solução. Todavia, não há como fugir às suas
em 2000, tinha 10% de idosos, enquanto os incógnitas, pois, fazendo um mero exer-
mais pobres possuíam apenas 2%. cício, os 57% de idosos (5,6 milhões) que
O fato mais notável, entretanto, quando em 2000 podem estar recebendo benefícios
se observa a distribuição de renda da dos programas de transferência de renda
população idosa, na última década, é a serão, em 2050, segundo estimativas do
diminuição, tanto em termos absolutos IBGE, 28 milhões. Sendo realista, a situação
quanto relativos, dos idosos mais pobres. social de parte da população idosa do Brasil
Por outro lado, aumentaram aqueles com será insustentável no futuro, se continuar a
renda domiciliar entre meio e um salário depender, como agora, de transferências
mínimo e, fundamentalmente, o grupo entre maciças de renda originárias do orçamento.
um e dois salários mínimos, em que se situa- Os contornos dessa situação ficam ainda
vam, em 2000, 57% dos idosos, contra 38% mais complexos quando se considera que
em 1991. Essas mudanças, provavelmente, a maioria dos jovens pobres, hoje, poderá
devem ter sido causadas pelas políticas de ser os idosos pobres de amanhã.
transferência de renda definidas pela Cons- Desse modo, ainda que aparentemente
tituição de 1988. Boa parte dessa parcela possa parecer contraditório no curto prazo,
da população tem sido objeto de políticas pois são segmentos etários com demandas
de transferência de renda, como a aposen- competitivas de receitas públicas, não é
tadoria rural e o Benefício de Prestação possível pensar as políticas para os idosos,
Continuada (BPC). no médio e longo prazos, separadas das
A título de exemplo, tome-se o Benefí- políticas para os jovens. Será decisivo, para
cio de Prestação Continuada (BPC). Seria equacionar a questão dos idosos, uma rigo-
razoável esperar que o volume de recursos rosa política de investimentos no curto prazo
a serem dispensados nesse programa de na população jovem pobre, com o objetivo
transferência de renda varie em proporção não só de garantir sua sobrevivência hoje,
muito semelhante àquela da população como pobre, mas, principalmente, que
idosa (CEDEPLAR/MDS, 2006). Por se tratar crie condições para sua mobilidade social,
de transferências puras, o BPC não envolve possibilitando sua definitiva inclusão social,
contrapartida por parte dos beneficiários, no futuro.
mas sim recursos orçamentários. Em outras Por outro lado, o sistema de previdên-
palavras, esse benefício é financiado por cia social, no qual, em princípio, haveria uma
recursos fiscais pagos por outros segmen- contrapartida adequada da parte dos futuros
tos sociais. A continuidade das políticas de beneficiários, precisa se compatibilizar com
transferência de renda deve ser equaciona- o padrão demográfico emergente. A situa-
da, politicamente, no contexto de um projeto ção demográfica é favorável, o número de
fiscal – fundamentalmente social – de trans- contribuintes potenciais, em 2010, é quase
ferência de renda favorável aos segmentos dez vezes maior do que o de idosos. A
mais pobres da população. Não se trata, dificuldade, então, não se encontra, neste
no caso brasileiro, de uma equação de fácil momento, nas relações intergeracionais,
GRÁFICO 5
População ocupada e contribuinte, segundo faixa etária
Brasil – 2000
mas sim na maioria da PIA que não con- ser objetivo prioritário do Estado. Caso isso
tribui, gerando graves problemas para o seu não ocorra agora, a situação previdenciária
financiamento. ficará comprometida, pois, no médio prazo,
O Censo de 2000 mostra uma relação provavelmente, haverá maior proporção de
entre população ocupada e população trabalhadores não-contribuintes e, no longo
contribuinte muito desfavorável à política prazo, mais dependentes de programas de
previdenciária: praticamente, a metade dos transferência de renda.
ocupados não contribuía para a Previdência Equacionar o sistema de previdência
(Gráfico 5). social, sem que o país tenha alcançado os
O cenário para a definição das políti- primeiros degraus de um Estado do Bem-
cas de previdência social, em particular, e Estar Social, é um desafio para as políticas
da seguridade social, em geral, não pode que visem aumentar a justiça social e reduzir
deixar de levar em conta quem são os as desigualdades sociais, sem as quais as
idosos hoje e como serão no futuro, do oportunidades demográficas serão des-
ponto de vista da sua renda. Atualmente, perdiçadas. Deve-se sublinhar, novamente,
a dimensão absoluta da população idosa, que, apesar de as implicações da transição
vis-à-vis a da população em idade ativa, demográfica sobre o sistema previden-
ainda não é tão relevante como será no ciário serem observáveis, elas ainda estão
futuro e, só por isso, a situação dos idosos distantes de expressar uma das principais
ainda pode ser minimizada pelas políticas causas da sua crise, ao contrário da situação
de transferência de renda definidas pela atual dos países desenvolvidos.
Constituição. Já a situação futura dependerá Correntemente, enquanto se aumenta
das possibilidades criadas pelo crescimento o peso relativo dos idosos, também cresce
da economia, principalmente da geração de a população em idade ativa, de quem se
mais empregos e ocupações que aumentem espera, pela produção, poupança e inves-
o número de contribuintes, somando-se, timentos, que seja a fonte de transferência
como mencionado, as políticas públicas de renda para os idosos, pelo menos
referentes aos jovens pobres, que devem teoricamente (TURRA; QUEIROZ, 2005).
GRÁFICO 6
População em Idade Ativa
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
GRÁFICO 7
População de 15 a 24 anos
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
GRÁFICO 8
Incremento decenal da população em idade ativa e dos dependentes (jovens e idosos)
Brasil – 1940-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
TABELA 4
Razão de dependência total, de jovens e de idosos, índice de idosos e idade mediana
Brasil – 1950-2050
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1950, 1960 e 1970.
GRÁFICO 9
Razão de dependência total, de jovens e de idosos
Brasil, 1940-2050
Por 100 pessoas em idade ativa
Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica
Demográfica, 2004. Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970.
etária, serão utilizados os três grandes gru- Uma população em idade ativa, com
pos etários, os jovens, a população em essa dimensão, pode realmente constituir
idade ativa e os idosos. A PIA será subdi- um grande benefício? Do ponto de vista
vidida em três faixas: 15 a 29 anos; 30 a 49 estritamente demográfico não restariam
anos; e 50 a 64 anos. dúvidas, pois as razões de dependência são
A definição estritamente demográfica contundentes. Pelo menos teoricamente,
não está tão distante da realidade. Entre os poderia ser considerado um dividendo de-
ocupados, em 2000, 96% encontravam-se mográfico (GUZMAN, 2006) Como na PIA
entre 15 e 64 anos, sendo o grupo modal está a maioria dos que trabalham, geram
o de 30-49 anos (Gráfico 10). As pessoas receita, em tese, produzem mais do que con-
neste grupo, mais aquelas de 15-29 anos, somem e, ainda, transferem renda através
os jovens da PIA, correspondiam a 84% de impostos e contribuições, não haveria
dos ocupados. Apenas 4% estavam entre como discordar. Esse dividendo, chamado
os grupos dependentes. de primeiro, por alguns, é considerado
Considerando, ainda, a população ocu- transitório, pois depende do comportamento
pada em relação à não-ocupada, em termos favorável da razão de dependência. No
absolutos, nota-se que os não-ocupados caso brasileiro, pelo menos até 2040, esse
formam uma curva decrescente à medida benefício poderia ser usufruído. Se esse
que aumenta a idade (Gráfico 11). Na PIA, benefício é considerado transitório, o cha-
situavam-se 63 milhões de pessoas ocupa- mado segundo dividendo seria permanente,
das. Este contingente, somado ao pequeno já que depende do efeito combinado do en-
número dos ocupados nos grupos de jovens velhecimento e do aumento da longevidade.
e idosos fora da PIA, perfaz um total de 66 Populações mais envelhecidas e com maior
milhões de pessoas ocupadas, no Brasil, expectativa de vida, tendência inexorável
em 2000. da transição demográfica, estariam mais
GRÁFICO 10
Distribuição da população ocupada, segundo grupos etários
Brasil – 2000
Em %
propensas a gerar maior poupança e, por das duas curvas é semelhante, ficando,
hipótese, aumentar o potencial de cresci- logicamente, a de contribuintes mais abaixo.
mento da economia e do bem-estar social A modalidade permanece no grupo de 30
(QUEIROZ; TURRA, 2006). a 49 anos.
Entretanto, quando se considera a rea- Levando em conta a população con-
lidade da sociedade brasileira, em que o tribuinte da previdência social, 34 milhões
número de pessoas desocupadas é ainda em 2000, poder-se-ia calcular uma outra
muito grande, a razão de dependência razão de dependência, baseada na relação
demográfica pode não ser um indicador su- entre contribuintes e não-contribuintes de
ficiente. Considerando uma razão de depen- todos os grupos etários: para cada 100
dência mais restrita, quando se tomariam, contribuintes, haveria 506 não-contribuintes.
em todas as idades, os não-ocupados como Uma relação completamente adversa para
dependentes dos ocupados, a proporção o sistema de seguridade social. Sem au-
dos dependentes fica muito maior: 161% mentar o número de pessoas ocupadas e,
em 2000, ou seja, para cada cem pessoas conseqüentemente, o número de contribuin-
ocupadas, ter-se-iam 161 não-ocupadas, o tes, facilitando seu acesso ao mercado de
que significa que a carga econômica daque- trabalho formal, maiores serão os encar-
les que estão realmente ocupados é muito gos fiscais necessários para financiar as
maior do que revela a razão de dependência políticas relativas à seguridade social. Em
estritamente demográfica. outras palavras, o dividendo demográfico
Entre os ocupados, a população con- transitório só se efetivará, plenamente, se a
tribuinte da previdência social, 34 milhões razão de dependência demográfica estiver
em 2000, representava um pouco mais da próxima da relação entre não-contribuintes
sua metade, 52% (Gráfico 12). A quase to- de todas as idades e contribuintes. Uma ob-
talidade dos contribuintes está na PIA, com servação deve ser feita: o primeiro dividendo
uma grande concentração no grupo de 30 refere-se a uma relação entre produtores e
a 49 anos. Em termos absolutos, o formato consumidores, segundo seus respectivos
GRÁFICO 11
População total ocupada e não-ocupada, segundo grupos etários
Brasil – 2000
GRÁFICO 12
População total ocupada e contribuinte, segundo grupos etários
Brasil – 2000
perfis etários, não podendo, portanto, ser São Paulo, chega a 22 pessoas para cada
retratado, exclusivamente, pelos indicadores 100 indivíduos em idade ativa (Tabela 5).
do mercado de trabalho aqui analisados, As proporções de jovens em relação
apesar de estar intensamente condicionado à PIA da Região Norte e do Nordeste Se-
por eles. Trata-se somente de um exercício tentrional ultrapassavam 60%, enquanto a
para suscitar a imaginação analítica, sem do Rio de Janeiro, a mais baixa razão de
a pretensão de testar a validade ou não da dependência dos jovens, ficava próxima de
teoria dos bônus demográficos (BLOOM; 37%, em 2000. Próximos a esse último valor
CANNING; SEVILLA, 2003). situavam-se São Paulo e o Extremo Sul. A
diferença entre as razões de dependência
Desequilíbrios regionais e sociais: dos jovens nos dois casos extremos, o Norte
possíveis conclusões sobre a transição e o Rio de Janeiro, era de 26 jovens para
demográfica e as desigualdades sociais cada 100 pessoas na PIA.
Somente as Regiões Norte e a Centro-
No caso brasileiro, os desequilíbrios Oeste tinham uma razão de dependência
regionais tornam a discussão sobre as dos idosos menor do que a média nacional,
relações intergeracionais mais complexas. ambas próximas a 6%, contra 8% do total
A razão de dependência total, assim como do Brasil. Novamente, o Rio de Janeiro é
o índice dos idosos no Brasil, varia entre os o destaque, com 11 idosos para cada 100
Estados e regiões, segundo suas diferentes pessoas em idade ativa. No caso dos idosos,
etapas na transição demográfica. A dife- cuja proporção em relação à PIA cresce em
rença entre a maior razão de dependência velocidade menor do que diminui a dos jo-
total, o Nordeste Setentrional, e a menor, vens, a diferença entre os casos extremos, o
TABELA 5
Razão de dependência total, de jovens e de idosos e índice de idosos, segundo regiões e
alguns Estados do Brasil – 2000
TABELA 6
Razão de dependência total, segundo renda domiciliar per capita
Brasil – 1980-2000
Por 100 pessoas em idade ativa
e rapidamente decrescente à medida que a causa da queda da razão total. Entre aqueles
renda familiar per capita aumenta (Gráfico com renda familiar per capita acima de dez
13), o que seria de se esperar, sendo ela a salários mínimos, a RDJ era de 17 por 100,
GRÁFICO 13
Razão de dependência de jovens, segundo renda domiciliar per capita (em salários mínimos)
Brasil – 1980-2000
Por 100 pessoas em idade ativa
GRÁFICO 14
Razão de dependência de idosos, segundo renda domiciliar per capita (em salários mínimos)
Brasil – 1980-2000
Por 100 pessoas em idade ativa
GRÁFICO 15
Índice de idosos, segundo renda domiciliar per capita (em salários mínimos)
Brasil – 1980-2000
Por 100 jovens
Referências bibliográficas
Resumen
Abstract
This article examines the idiosyncrasies of demographic transitions in Brazil caused by the
extreme disparities among regions and socioeconomic groups. While ubiquitous, demographic
transition in Brazil shows a number of different facets. It is far from being a neutral process and
creates opportunities as well as broad socioeconomic disparities. Because of differences in
fertility rates by SES, those in lower-income brackets constitute the fastest growing populational
group, as well as the group with the youngest age distribution. This article argues that
socioeconomic differences are related to demographic disparities. Therefore, the development
of public policies to improve the well-being of the poorest may help increase demographic
dividends for the entire population.
Keywords: Demographic transition. Demographic dividends. Social inequalities.