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Para Hegel, é logicamente impossível pensar o algo sem remeter ao conceito de outro. A
implicação recíproca dessas duas determinações do pensar já é uma refutação eficaz da
crítica de Trendelenburg à dedução do outro a partir do algo, a qual seria obtida somente
através da intervenção da intuição sensível1. Inicialmente, o outro é, ele mesmo, fechado
em sua unilateralidade positiva, em seu ser em si. A dialética do algo e do outro entende
mostrar como a indiferença inicial dessas duas categorias é suprassumida por sua
progressiva identidade, sem extinguir, com isso, a diferença que é essencial para sua
estruturação opositiva.
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TRENDELENBURG, F.A. Logische Untersuchungen, I. Leipzig: 1870; reimpressão. Hildesheim: Olms,
1964, pp.45-sgg.
em relação a um outro, para seu diálogo predileto, o Parmênides, saudado como a mais
famosa obra-prima da dialética platônica. No Sofista, de fato, o diverso não está
contraposto ao uno; nele, pelo contrário, afirma-se a superioridade do uno sobre o ser e
também sobre o diverso. Mas é no Parmênides que o uno se torna o tema central do
exercício dialético. Aqui, na primeira hipótese (se o uno é uno), Platão, segundo Hegel,
contrapõe ao uno, no modo da negação, o outro de si mesmo, o qual, como um dos
momentos da totalidade, isto é, do conjunto dos predicados que devem ser negados ao
uno, tem, portanto, uma natureza própria.
A alteridade não é mais somente a propriedade negativa do algo de não ser o outro (ou a
propriedade de ser outro em relação a um algo), mas se torna parte constitutiva ou
momento do algo e, ao mesmo tempo, origem de sua alteração (Veränderung) e
finitude. A alteração do algo não é extraída, como pretende Trendelenburg, da
representação do movimento espacial, mas coincide com o passar lógico do conceito de
algo para aquele de outro, ou melhor, coincide com a passagem do algo para a
alteridade que lhe é imanente.
O outro nele mesmo é “o pura e simplesmente desigual em si, aquilo que se nega, aquilo
que se altera” (§8, p. 123). A alteridade é necessariamente alteração: o que se altera não
é igual a si, mas se torna outro de si. Ao mesmo tempo, aquilo que se nega permanece
idêntico a si, porque aquilo em que se muda tem sua mesma determinação, ou seja, a de
ser o outro. Desse modo, aquilo que se altera “está posto como refletido dentro de si
com o suprassumir do ser outro, como algo idêntico a si, do qual, com isso, o ser outro
que é, ao mesmo tempo, momento do mesmo, é um diferente, o qual não lhe compete
como ao próprio algo” (§8, p. 123). Isso significa que, pela primeira vez, num conceito
de negação, a duplicação da alteridade produz a autorrelação e a identidade consigo.
Aquilo que se altera é, portanto, a desigualdade que se relaciona consigo mesma. O
aspecto de positividade do algo, com efeito, se restabelece, mas através da negação que
se relaciona consigo, de modo que a alteridade se torna “momento” do algo.