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Curso de Fitoterapia Médica

Farmácia da Natureza e Centro Médico de Ribeirão Preto

Capítulo 1
Sistemas de prescrição fitoterápica

Um paradigma é um pressuposto filosófico, ou seja, uma teoria, um modelo


de conhecimento que origina o estudo de um campo científico.
Exemplos de paradigmas:
• Teoria heliocêntrica (N. Copérnico)
• Teoria da relatividade (A. Einstein)
• Teoria do inconsciente (S. Freud)
• Teoria da evolução (C. Darwin)
A Teoria dos Humores foi um paradigma médico vigente durante muitos
séculos no Ocidente. Esta teoria explicava a saúde a doença como uma combinação
de elementos temperamentais, físicos e fisiológicos

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Um exemplo significativo de mudança de paradigma na Medicina é a


‘revolução’ microbiológica. Uma nova área do conhecimento surgiu com os relatos
de Robert Hooke e Antony van Leeuwenhoek. Estes pesquisadores desenvolveram
microscópios que possibilitaram as primeiras observações de bactérias e outros
microrganismos a partir da análise de diversos espécimes biológicos.
A partir daí conceitos novos surgiram como microorganismos (bactérias, vírus,
fungos, protozoários), infecção, contágio, contaminação. Algumas doenças de
etiologias desconhecidas (p.ex: tifo, varíola, sífilis, cólera e peste) e de
comportamento epidêmico passaram a ser denominadas ‘infecciosas’.
Tais descobertas produziram um profundo impacto na compreensão da
evolução natural destas doenças e, consequentemente, na sua prevenção (medidas
de higiene, descontaminação e biossegurança) e tratamento. Na década de 30,
Alexander Fleming, incidentalmente, descobriu um composto produzido por um
fungo do gênero Penicillium, que eliminava bactérias do gênero Staphylococcus.
Este composto, denominado penicilina, teve um papel fundamental na desfecho da II
Guerra Mundial, uma vez que passou a ser administrado às tropas aliadas, enquanto
o exército alemão continuava a sofrer pesadas baixas no campo de batalha.

Paradigmas na Medicina
Em toda história da medicina sempre houve uma busca por compreender os
intrincados mecanismos do adoecimento humano. Algumas figuras se destacaram
em função de suas notáveis contribuições no campo do conhecimento médico. Estas
contribuições partiam de determinados paradigmas e influenciavam na construção
de outros mais novos que, ora substituíam os antigos, ora caminhavam
simultaneamente com a predominância de um sobre o outro.
Duas grandes ideias filosóficas permearam a história do conhecimento
médico:
Uma relacionada à compreensão do homem como uma unidade
psicossomática, com características singulares e únicas, animada por uma força
vital que se perturba diante de determinados agravos sejam físicos, psicológicos ou
ambientais. Este modelo entende o funcionamento do organismo dentro de uma
visão sistêmica na qual todas as partes deste funcionam de maneira integrada e

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interdependente (sistêmico). Desta forma, a doença se instala decorrente da


alteração do funcionamento desta força que, apesar de se manifestar com sintomas
semelhantes (doença), apresenta-se em cada indivíduo de maneira única (doente).
O tratamento, segundo este modelo, visa o doente. Há várias correntes de
pensamento médico, atualmente denominadas ‘medicinas naturais’, vinculados a
estes princípios como a homeopatia, a medicina tradicional chinesa e a medicina
indiana.
A outra considera o ser humano fragmentado em suas partes constituintes e
cada órgão/sistema é considerado separadamente do todo (organicista). A doença
apresenta-se como um fenômeno isolado, sem correlação com outros sistemas. A
terapêutica visa a doença e a remoção ou supressão dos sintomas,
independentemente das características pessoais do doente. Atualmente está
associado ao conceito de medicina ‘oficial’ de cunho fortemente biológico e
bioquímico.
Diante deste panorama histórico onde situa-se a fitoterapia? Com qual
sistema médico ela se identifica?

Fitoterapia)

Modelo!! Modelo-
Sistêmico- Organicista-
- -
- -
Fitocomplexo- Substâncias-
químicas-
isoladas-

A fitoterapia moderna tem seus fundamentos tanto no modelo


sistêmico/vitalista quanto no modelo organicista.

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Ela se compatibiliza com os princípios sistêmicos na medida em que tem no


fitocomplexo um conjunto de substâncias que atuam simultaneamente em vários
sítios biológicos (multi-targeted approach). Temos como exemplo os constituintes
químicos da Curcuma longa que atuam em um amplo espectro de alvos
farmacológicos atingindo, assim, os mecanismos fisiopatológicos de inúmeras
doenças (doenças reumáticas, respiratórias, alérgicas, neurodegenerativas entre
outras).
A fitoterapia também pode ser utilizada no modelo organicista quando
substâncias químicas isoladas das espécies medicinais atuam especificamente em
determinado alvo ou doença, reduzindo ou removendo determinados sintomas.
Temos como exemplo a espécie Salix alba (salgueiro) cujo princípio ácido salicílico
atua diretamente na cascata inflamatória (inibidor inespecífico da enzima COX)
promovendo ações antitérmica e anti-inflamatória.

Medicina Natural e Prática Complementares


Em junho de 2005, o Ministério da Saúde apresenta a Política Nacional da
Medicina Natural e Práticas Complementares – MNPC – no SUS. Esta política
atende, sobretudo, à necessidade de se conhecer, apoiar, incorporar e implementar
experiências que já vêm sendo desenvolvidas na rede pública de muitos municípios
e estados, entre as quais destacam-se aquelas no âmbito da medicina tradicional
chinesa-acupuntura, da homeopatia, da fitoterapia e da medicina antroposófica.
O campo da MNPC contempla sistemas médicos complexos e recursos
terapêuticos, os quais são também denominados pela Organização Mundial de
Saúde – OMS – de medicina tradicional e complementar/alternativa (MT/MCA)
(WHO, 2002).
Sistemas Médicos Complexos são abordagens que possuem teorias próprias
sobre o processo saúde/doença, diagnóstico e terapêutica.
• Estimular os mecanismos naturais de prevenção de danos e
recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras.
• Escuta acolhedora, fortalecimento do vínculo terapêutico.
• Visão ampliada do processo saúde-doença.
• Promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado.

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• Integração homem-sociedade-ambiente

Modalidades de prescrição fitoterápica


Didaticamente é possível discriminar modalidades de prescrição terapêutica
de fitoterápicos em função do(a):

1) Especificidade bioquímica
Esta forma de raciocínio terapêutico baseia-se no conceito de conjunto
sintomático. É muito familiar e de fácil entendimento para o médico ocidental.
• Arnica montana: anti-inflamatório (terpenos e flavonoides)
• Pyrostegia venusta: antifúngica
• Phyllantus niruri: diurético
• Valleriana officinalis: sedativo
• Sambucus nigra: antitérmico

2) Tropismo fisiopatológico
Esta forma de raciocínio terapêutico baseia-se no conceito de fitocomplexo.
O fitocomplexo consiste no conjunto de compostos químicos
biologicamente ativos encontrados em uma espécie vegetal. Estes compostos
possuem múltiplas ações farmacológicas agindo em diversos ‘alvos’ de forma
sinérgica (herbal shotgun).
Para aprofundamento deste tema recomenda-se a leitura do artigo Herbal
medicines: old and new concepts, truths and misunderstandings (Rev. Bras.
Farmacogn. Braz. J. Pharmacogn. 23(2): Mar./Apr. 2013)

3) Potencial Homeofitoterápico
Esta forma de raciocínio terapêutico baseia-se no uso de fitoterápicos em
diluições decimais (DH1 a DH5). São geralmente utilizadas para espécies tóxicas
(p. ex. Atropa belladonna, Symphitum officinalis).

4) Potencial bioenergético

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Esta forma de raciocínio terapêutico baseia-se nos princípios vitalistas, da


medicina tradicional chinesa e da indiana (ayurvédica).
É pouco conhecido pelo médico ocidental. A ciência médica frequentemente
coloca em dúvida a efetividade e a validade destas terapêuticas.
Inclui a compreensão de conceitos complexos de energia vital, fisiopatologia
energética, homeostase e interação homem-Natureza.

Conclusão
Enfim, o médico irá buscar aqueles sistemas de prescrição que tem maior
afinidade ou facilidade de compreensão/manejo, mas sempre integrando-os ao
raciocínio clínico moderno.

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