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INSTITUTO SUPERIOR DE ENGENHARIA DE LISBOA

Curso de Engenharia Civil

BETÃO ESTRUTURAL I

CAPÍTULO 8 — Durabilidade e recobrimento


Texto de apoio

Outubro 2012

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Índice
1  Introdução ...................................................................................................................... 3 
2  Corrosão das armaduras ................................................................................................. 3 
2.1  Ideias gerais ........................................................................................................... 3 
2.2  Medidas para aumentar a durabilidade face à corrosão ......................................... 5 

3  Classes de exposição ambiental ....................................................................................... 5 


4  Metodologia prescritiva relativa a recobrimento das armaduras ..................................... 7 

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1 Introdução
A durabilidade faz parte dos requisitos fundamentais das estruturas. De acordo com o
requisito da durabilidade, as estruturas devem manter-se numa boa condição (isto é, sem
deterioração significativa) durante o período de vida útil intencionado, sem que para tal
sejam necessários gastos com manutenção não previstos. De acordo com esta definição está
implícito que as estruturas requerem manutenção e que são necessários fundos para essa
manutenção. O requisito da durabilidade só deixa de ser cumprido quando a manutenção
prevista não é suficiente para manter a estrutura numa boa condição.
A regulamentação actual dá grande relevo a questões de durabilidade. Por exemplo, a
NP EN 206-1 (2007) dedica uma boa parte das suas cláusulas a questões de durabilidade e
o próprio EC2 contém um capítulo só dedicado à durabilidade — o Capítulo 4. Os
presentes apontamentos cobrem os aspectos essenciais desse Capítulo.
As metodologias para a verificação do requisito da durabilidade podem ser agrupados
em duas grandes categorias:
1) metodologia prescritiva, baseada em determinadas regras a respeitar, sem
consideração explicita dos mecanismos de deterioração.
2) metodologia baseada no desempenho (metodologia probabilística).
A metodologia base prevista no EC2 é a primeira. No entanto o Anexo Nacional (p252)
prevê a adopção de métodos probabilísticos como alternativa ao recurso à metodologia
prescritiva. Na metodologia baseada no desempenho, os mecanismos de deterioração são
modelados considerando a variabilidade (e a consequente incerteza) dos diferentes factores
intervenientes.
No domínio da durabilidade, dois documentos normativos relevantes devem ser
mencionados: são as especificações LNEC E464 e E465. A primeira contém elementos para
aplicação da 1.ª metodologia (metodologia prescritiva) e a segunda contém elementos para
aplicação da 2.ª metodologia.
Entre as diferentes fontes de deterioração das estruturas de betão armado podemos
mencionar: deterioração por corrosão das armaduras; deterioração provocada por ataques
químicos; deterioração provocada por reacções álcali-sílica; deterioração pela acção do
gelo/degelo. Entre essas, sem dúvida, a deterioração associada à corrosão das armaduras é
a mais comum.

2 Corrosão das armaduras


2.1 Ideias gerais
A corrosão das armaduras é um fenómeno electroquímico que se pode separar em 3
processos. Em primeiro lugar ocorre a perda de electrões dos átomos de ferro,
transformando-os em iões de ferro (D´Arga e Lima, 1988):
2Fe → 2Fe2+ + 4e-
Este processo é conhecido como processo anódico. A seguir dá-se o chamado processo
catódico, caracterizado pela reacção dos electrões com a água e oxigénio presentes na
vizinhança do aço, originando os chamados iões hidróxido:

3
4e- + O2 + 2H2O → 4(OH)-
Finalmente os iões hidróxido combinam-se com os iões de ferro anteriormente criados,
dando lugar a óxidos de ferro hidratados, comumente designados por ferrugem:
2Fe2+ + 4(OH- ) → 2Fe(OH)2
A Figura seguinte (extraída de http://www.cement.org/tech/cct_dur_corrosion.asp)
esquematiza o processo electroquímico acabo de descrever.

Observando as reacções químicas descritas acima, pode-se concluir que para existir
corrosão é necessária a presença de água e oxigénio. Assim, numa atmosfera seca (HR <
45%, como ordem de grandeza) não haverá corrosão por falta de água. Em ambiente
submerso também não haverá corrosão, mas agora devido à falta de oxigénio.
Os produtos da corrosão (óxidos de
ferro, ou ferrugem) têm um volume muito
superior ao volume dos produtos que lhes
dão origem (cerca de 7 a 8 vezes superior),
o que explica a delaminação típica em
estruturas de betão armado com corrosão,
como ilustrado na Figura ao lado.
O betão é um meio fortemente alcalino
(ph ~ 12) devido à presença de hidróxido
de cálcio ( Ca(OH)2 ), criando condições
para a formação e manutenção de uma
película envolvendo os varões (chamada
película passivante) que impede o
desenvolvimento da corrosão. A corrosão
tem inicio quando tal película é destruída.
Os dois principais agentes capazes de
destruir a película passivante são os iões
cloreto (Cl-) (abundantes em ambientes
marinhos) e o dióxido de carbono
(abundante em atmosferas poluídas).

Os processos de corrosão associados a estes dois agentes têm sido amplamente


estudados. No caso dos cloretos, sabe-se que estes atravessam com relativa facilidade a

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película passivante, destruindo-a e deixando assim o aço desprotegido. A corrosão
resultante é bastante localizada (corrosão picada) e geralmente é acompanhada de perda
significativa de secção.
No caso do dióxido de carbono, sabe-se que reage com o hidróxido de cálcio do betão
produzindo carbonato de cálcio:
CO2 + Ca(OH)2 → CO3Ca + H2O
Esta reacção química (conhecida como carbonatação do betão) é acompanhada de uma
diminuição do ph fazendo com que a película passivante se torne instável. Ao contrário da
corrosão associada ao ataque dos cloretos (corrosão picada), a corrosão associada à
carbonatação do betão é superficial e geralmente não é acompanhada de perda significativa
de secção. A ocorrência de manhas avermelhadas na superfície de betão constitui um
sintoma típico de existência de corrosão por carbonatação.

2.2 Medidas para aumentar a durabilidade face à corrosão


De acordo com o acima exposto, uma medida lógica consiste em diminuir a porosidade
do betão, a fim de diminuir a sua permeabilidades aos gases (CO2) e aos líquidos (cl-). A
diminuição da porosidade consegue-se (1) diminuindo a relação A/C, (2) procedendo a uma
boa compactação e (3) realizando uma boa cura. A diminuição da porosidade e o
consequente aumento da compacidade está fortemente correlacionado com a classe de
resistência. Betões com elevadas resistências possuem elevada compacidade e assim
garantem uma melhor protecção das armaduras contra a corrosão. Refira-se a este
propósito que hoje em dia é muito frequente a adopção de betões de classe elevada não por
razões de resistência, mas, justamente, por razões de durabilidade.
Outra medida consiste em aumentar o recobrimento, a fim de diminuir o tempo
necessário para os iões cloreto ou o dióxido de carbono atingirem as armaduras.
A garantia da satisfação do requisito da durabilidade pode ainda ser conseguida pela
adopção de disposições particulares, como por exemplo a utilização de aço inoxidável, a
aplicação de revestimentos, a protecção catódica, entre outras.

3 Classes de exposição ambiental


Do ponto de vista da durabilidade o primeiro aspecto a definir é o tipo de ambiente
(que pode ser mais ou menos agressivo) onde se insere a estrutura que pretendemos
projectar. O EC2 prevê as classes de exposição ambiental indicadas no Quadro 4.1 (p57),
que se reproduz na página seguinte.
Conforme se observa, o EC2 agrupa as classes de exposição ambiental em 6 categorias,
consoante o tipo de deterioração mais provável:
1) Nenhum risco de corrosão ou ataque: X0.
2) Risco de corrosão induzida por carbonatação: XC1, XC2, XC3 e XC4.
3) Risco de corrosão induzida por cloretos: XD1, XD2 e XD3.
4) Risco de corrosão induzida por cloretos presentes na água do mar: XS1, XS2 e XS3.
5) Risco de deterioração provocada pelo gelo/degelo: XF1, XF2, XF3 e XF4.
6) Risco de deterioração provocado por ataque químico: XA1, XA2, XA3.

5
De reaalçar que os
o ambienttes secos ssão sempree menos ag gressivos ddo que os ambientess
húmidos e que estess, por sua vez, são m
menos agreessivos quee os ambieentes altern
nadamentee
secos/húm
midos.

Para cada umaa das classses de exxposição ambiental,


a a EN 11992-1-1 (Anexo E)
recomendaa classes de
d resistên
ncia a adop
ptar para o betão, que
q constaam no Qua adro E.1N
N

6
desse Aneexo. Todav via, o Anexxo Nacionaal alterou esse Quadro, substittuindo-o peelo quadroo
equivalentte que conssta na pagina 254 e qque se reprroduz de seeguida.

4 Meto
odologia
a prescriitiva rela
ativa a recobrim
r mento da
as armad
duras
Descreeve-se de seguida a metodoologia presscritiva reelativa aoo recobrim mento dass
armaduras conformee especifica
ada na EN N 1992-1-1. O recobrrimento daas armaduras, c, é a
distância mínima daas armadurras à face d
de betão, como
c se ilustra na Figgura seguin
nte:

O recoobrimento das arma


aduras é u um dos pa arâmetros importanttes a especcificar noss
mento, chaamado reccobrimentoo
desenhos de constrrução (Cl.. 4.4.1.1 (2)). Essee recobrim
nominal, é definido por:
cnom = cmin + Δcdev .

Δcdev = 10 mm (Cl. 4.4.1.3 (1))

O recobrimento mínimo deve asseegurar: (1) a transsmissão efficaz das forças dee
aderência,, (2) a prootecção do o aço cont ra a corroosão (durab bilidade) e (3) uma adequadaa
resistênciaa ao fogo (Cl. 4.4.1.2 (1)). É ob
btido pela expressão:
e

7





⎪cmin,b


cmin = max ⎨cmin,dur + Δcdur , γ − Δcdur ,st − Δcdur ,add
⎪ 




⎪ =0 = 20 mm = 5 mm



⎪10 mm

O valor cmin,b é o valor mínimo do recobrimento que garante uma transmissão eficaz
das armaduras, podendo-se considerar cmin,b = φ , sendo φ o diâmetro da armadura em
causa. O valor Δcdur , γ , para o qual o EC2 recomenda zero, representa uma tolerância
destinada a cobrir incertezas. Os valores Δcdur ,st e Δcdur ,add representam reduções no
recobrimento no caso de se adoptar, respectivamente, aço inoxidável e medidas de
protecção adicionais (revestimentos, por exemplo).
Relativamente ao parâmetro cmin,b , considere-se uma viga com estribos de diâmetro φt e
armadura longitudinal de diâmetro φl . Deve-se garantir que cmin ≥ φt e que
cmin + φt ≥ φl ⇔ cmin ≥ φl − φt . Assim, para este caso particular, a Equação acima pode-se
ser reescrita na forma:

⎪φt



⎪φl − φt
cmin = max ⎪


⎪cmin,dur + Δcdur , γ − Δcdur ,st − Δcdur ,add


⎪10 mm
φt ⎪

φl

A determinação de cmin,dur depende da classe de exposição e da chamada classe


estrutural. A EN 1992-1-1 classifica as estruturas em 6 classes estruturais, S1 a S6. A
classe estrutural correspondente a uma vida útil de projecto de 50 anos é S4 (NA-4.4.1.2
(5), p251). Para um tempo de vida útil de projecto de 30 anos, ou inferior, a classe
estrutural a adoptar é S3. A classe estrutural assim definida (S4 ou S3) deve ser encarada
como uma primeira aproximação, devendo ser corrigida em conformidade com o Quadro
4.3N. O Anexo nacional introduziu pequenas alterações neste quadro, substituindo-o pelo
Quadro NA-4.3N (p252), que se reproduz de seguida:

8
Observve-se que no caso de lajes, o quadro o acima prevê
p umaa redução na classee
estruturall, que se irrá traduzirr numa diiminuição do recobriimento nom minal. A razão
r paraa
esta reduçção tem a ver com facto do rrisco de co orrosão emm lajes ser inferior ao
a risco dee
corrosão eem vigas (ou em pila ares). Com
m efeito, co
omo se dep preende pella Figura abaixo, noo
caso de viigas (e espeecialmentee em varõess de canto)) existem dois
d caminhhos possíveeis para oss
agentes aggressivos atingirem
a as
a armadurras, enqua anto que no o caso dass lajes há apenas
a um
m
caminho:

Uma vvez atribuíd


da à estruttura em prrojecto um
ma classe esstrutural, ddetermina--se cmin,dur
com base no Quadroo 4.4N (p600), que tam
mbém se reeproduz dee seguida:

9
 Exem
mplo. Considere uma
a viga de b
betão arma
ado cuja seccção se reppresenta na
a Figura.

φ10
0

φ20
0 Betão: C30/37
e de exposiçã
Classe ão ambientall: XC1
a) Deetermine o recobrimento nomin nal das arm
maduras parra uma vidda útil de 100
1 anos.
b) Coom base noo recobrim mento que determinou na alínea anterior , determin ne a alturaa
útiil da viga, d, para efeeitos de dim
mensionam xão. Considdere h = 0.70.
mento à flex 0
Resolu
ução:
Determ
minação daa classe estrutural (Q Quadro NA--4.3N):
S44 é a classee estruturaal de partid
da.
Tempo de vida
v útil dee 100 anos: +2;
Betão ≥ C330/37: −1 ;
Portanto, a classe estrrutural é S55.
Do Quuadro 4.4N, tem-se cmin, m dur = 200 mm .
⎧⎪φt ⎧⎪10
⎪⎪ ⎪⎪
⎪⎪φ − φ ⎪⎪20 − 10
cmin = max ⎪⎨ = max ⎪⎨
l t
= 20 mm
⎪⎪cmin,,dur + Δcdur , γ − Δcdurr ,st − Δcdur ,add ⎪⎪20
⎪⎪ ⎪⎪
⎪⎪⎩10 m
mm ⎪⎪⎩10 mm
cnom = cmin + Δcdev = 20 + 10 = 30 m mm ;
Este seeria o valorr a indicar nos desen nhos de con nstrução.
b) d = 0.70 − 0.003 − 0.01 − 0.0250 / 2 = 00.65 m ;

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