Você está na página 1de 58
COLABORAGAO Teoria geral do constitucionalismo José Aureno pe Ouivena BaRAcHo Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Livre-Docente ¢ Doutor em Diretto. SUMARIO. 1 — Antecedentes do constitucionatismo 2 — Principais aspectos do constituctonalismo: temas Jundamentais 3 — Constitucionalismo cldssico 4 — Constitucionalismo social 1 — Antecedentes do constitucionalismo A elaboracéo de uma Teoria geral do constitucionalismo constitui tema essencial para a formulacao dos aspectos da relacéio entre Estado e Constituicéo, tendo em vista o enquadramento juridieo dos fenémenos politicos. As indagacées sobre a Constituiggo do Estado aparecem nos autores classicos de Teoria do Estado. Entendem da necessidade de todo Estado ter uma Constituigéo, Essa abrange os principios juridicos que designam os érgéios do Estado, os modos de sua cria- $0, suas relagdes mutuas, fixam o circulo de sua atuacéo e a situagao de cada um deles no Estado. A palavra, constitucionalismo decorre das primeiras investiga- gGes sobre Constituigao. O significado de “Constituigao”, através dos tempos, coloca-nos ao lado das investigacdes em torno dos classicos gregos, com a tradigéo juridico-romana, com as idéias que surgiram no medievo, com a concepgao juridica germanica e com os sistemas da “common law”. ALESSANDRO PizzoRUsso afirma que na primeira fase dos estudos de direito constitucional existe @ sua vinculagéo com a ideologia politica denominada “constitu- cionalismo” (3). (1) PIZZORUSSO, Alessandro. Leziont dé Diritto Costituzionale, 1 Foro Italla- no, 1964, 3° ed. R. Inf. legisl. Brasilia a, 23 + 91 jul./set. 1986 5 O desenvolvimento do constitucionalismo, pelos estudos de suas manifestacdes doutrindrias e experiéncias institucionais impie- mentadas, mostra o lugar que a Constitui¢éio ocupa. A relagiio com as doutrinas e ideologias, que se manifestam na fixagdo do “Estado constitucional”, no “regime constitucional”, no Estado liberal, no Estado de direito e no Estado social de direito, fornece-nos os ele- mentos essenciais da evolugao do constitucionalismo, com destaque de temas como: significado da Constituicaio, formacio da Consti- tuigéo, contetidos da Constituigéo, variacdes da Constituigao, protecaéo da Constituicaéo, modelos e ciclos constitucionais (*). Esses estudos constituem o fulero da Teoria da Constituicéo, relacionada com o exame da Constituicao e suas implicagdes com a Teoria Geral do Direito e a Teoria Geral do Estado. Esse contato com a Teoria Geral do Direito e do Estado levara a um marco teérico basico no exame da Constituigéo, através do conhecimento de seus conceitos essenciais. O exame da Constituicéio demanda sélida fundamentagao te6rico-juridica. Os questionamentos acerca, da Constituigéo sugerem varias indagagées. Que é uma Constituicéo? Que fungaio tem? Como surge? Diversos discursos partem do exame da palavra Constituigiio € seus equivalentes. Como objeto imediato do constitucionalismo esta a procura do seu significado técnico e axiolégico. Essa metodologia parte da averiguacao de quais so os usos “‘paradigmaticos” da Constituicao, seus uSos € concepcOes originatias de um lado e os usos “modelos” que a palavra comporta. As diversas compreensées que a palavra acoberta estéo em , Locke, Rousseau, Kant, MoNrEsquizv, HAMILTON, , TOCQUEVILLE, JELLINEK, SCAMYIT, KELSEN, LOEWENSTEIN, Burpzav e outros. A tarefa da politica, no que ARISTOTELES estdé de acordo com PiatTao, consiste em encontrar a melhor forma de Estado. Afirma- tiva acolhida, também, na £tica a Nicémaco. Comecamos por juntar (2) VERGOTTINI, Giuseppe de. Diritto Costituzionale Comparato, Padova, CEDAM, 1961; AMORTH, Antonio, Curso di Diritto Costituzionale Compa- ; MANNA, Giovanni, Napoli, 1879; McILLWAIN, C. H, Constitutionalism and the Changing World (1917-1947). New York, 1989; idem Constitutionalism Ancient and Modern (1940). Ithaca, 1987; DI RUFFIA, Biscaretti. Costitueionalismo. Milano, Ed. D. XI, 1962; MATTENCCI, N. Costituzlonalismo, em Dizionario dt Politica, Torino, 1976. 6 R. Inf. legis!. Brosilio a. 23 n. 91 jul./set. 1986 os fragmentos bons que sdo encontrados nas declaragdes de nossos predecessores. Depois de examinar as “Constituigdes” que colecio- namos, trataremos de averiguar que classe de coisas mantém ou destréi as comunidades e quais so as distintas “Constituigdes parti- culares”; a causa pela qual algumas séo bem administradas e outras mal; apds essas investigacdes podemos chegar a uma visio mais penetrante de qual é a “melhor Constitui¢do”, que classe de regulagGes, de leis e de costumes é melhor (). A constatacéo da importéncia desse posicionamento leva AnpRE Havuriou a afirmar que o berco do direito constitucional encontra-se no Mediterraneo Oriental e, mais precisamente, na Grécia. Mais tarde, localiza-se em Roma. ARISTOTELES demonstrou, em obra que infelizmente desapareceu, a existéncia Aquela época de 158 Constituigdes. O didlogo entre Poder e Liberdade, consta- tado em outras sociedades politicas anteriores, é claro na Grécia, pelo que o publicista francés refere-se a uma “constitucionalizagao do poder” (*). O sentido originério de Constituigao remonta 4 Grécia e Roma; sob a denominagao de Athenaton politeia conhece-se o trabalho de ArisTOTELES em que ele analisa a forma, a estrutura e administra- ao do governo de Atenas. A expresso 6 traduzida como Athenien- sium Respublica, conhecida universalmente como a ‘“Constituigio de Atenas”. Potiteia € traduzida pela grande maioria dos filésofos como a expresséo moderna Constitui¢éo. Muitos autores escolhem como ponto de partida a analise do conceito de Constituigao prove- niente de ArisToreLes, especialmente tomando por base a descricio de uma Constituicao, a de Atenas, A palavra “politeia” refere-se & maneira de ser da “polis”, sua forma, estrutura e organizac&o, As indicacdes seguintes revelam a importaneia da teorla constitucional grega, quando destacamos os seguintes aspectos, assinalados por ROLANDO TAMor0 ¥ SALMORAN: @) Politeia (Constituicéo) como forma de ser da “polis”: seu funcionamento indica o tipo de governo e a sua identidade com a “Constituigéo”, oo MAYER, J. P. Trayetoria del Pensamiento Politico (Com a colaboragio de R. H. S. CROSSMAN, P. Kecskemeti, E. Kohn-Bramstedt, C. J. S, Spaigge). Méxleo, Fondo de Cultura Heonémica, 1941, trad. de Vicente Herreno, p. 54. (4) HAURIOU, André. Droit Constitutionnel et Institutions Politiques. Paris, ‘ditions Montchrestien, 1970, 4* ed., pp. 32 € ss; CLOCHS, Paul. La Démo- cratie Athénienne, Paris, Presses Universitaires de France, 1951; MOSCA, Gaetano. Historta das Doutrinas Politicas. Desde a Antigiiidade, completada com as Doutrinas Politicas desde 1914, por BOUTHOUL, Gaston. Rio de Ja- neiro, Zahar Editores 1958, trad. de MARCO AURELIO DE MOURA MATOS; MAILLET. Institutions Politiques et Sociales de L’Antiquité. Dalloz, 1971, 2 ed. R, Inf. legisl, Brosilia a. 23 n. 91 jul./set, 1986 7

Você também pode gostar