Yoga
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Mestre Bhava
SANNYAS EDITORA
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Copyright © 2011 by Mestre Bhava
Direitos em Língua Portuguesa reservados ao autor através
da
SANNYAS EDITORA
Capa
Arthur Presta de Castro
Revisão
Ma Prem Kaliní Puri (Silvana Mara de Castro)
CIP
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SANNYAS EDITORA
Bahia - Brasil
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Prefácio
Este livro surgiu de um sonho, isto mesmo, eu sonhei que as pessoas haviam
compreendido o que elas são e o que elas podiam fazer por elas mesmas, e ao acordar
percebi a distância ainda a percorrer na divulgação desta busca de si mesmo e logo
imaginei um meio simples, direto, de comunicar uma mensagem que pudesse ter algum
tipo de efeito revitalizador sobre cada um. Conheço e ensino o Tantra, como uma
Semiologia surgida na Índia, o produto mais refinado do Yoga. Mas os nomes e os
contextos dificilmente podem ser levados para a pessoa comum, o que dificulta
qualquer comunicação desta filosofia. O sonho foi uma resposta a esta dificuldade, aqui
como um texto, fácil, a ser estudado, comparado, revisto, sem o hermetismo desta
filosofia.
O que somos nós? De onde viemos? Porque vivemos? Como aprendemos a Ser
alguém? Quem é este Alguém que somos? Porque sentimos angústia? Porque a
felicidade vem e logo desaparece? E a morte, como lidamos com nossa extinção?
O mundo todo sempre buscou uma resposta racional, lógica, sensata, para estas
questões, e desde que surgiu a palavra Yoga, ela parece oferecer ali a resposta, e está ali,
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sim, mas na forma que você jamais imaginou - como Tantra. Tantra é a forma e Yoga é
o conteúdo.
Mestre Bhava
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Examinando Yogas
Todos nós que dávamos aulas de Yoga ficávamos com a pulga atrás da orelha,
bem, pelo menos aqueles que buscavam algo ali que fizesse algum sentido, e que não
fosse pelo mero mercantilismo ou pela crença sempre presente nas linhagens de Yoga.
Muitos instrutores de Yoga no Brasil, e no mundo, e eu conheço centenas deles, eles
sabem que “aquilo” passa bem longe do que se denominou de Yoga, mas balançam a
cabeça, como se não pudessem e não podem mais voltar atrás. Eles se tornaram reféns
daquilo que praticam como uma verdade que lhes deveria libertar, não o fez, e eles
passam adiante este “embaraço”, nos dando um tapinha nas costas e falando algumas
palavras complicadas em sânscrito. Como ninguém entende sânscrito, fica o crédito de
que aquilo seja verídico.
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Yoga parece com aquela frase de Caetano Veloso, “Quanto mais se conhece (de
perto) pior fica (ninguém é normal)”
Quando lancei meu primeiro livro sobre Tantra, em 1996, o Tantra; Sexo , Amor
e Meditação, e neste livro eu expus como fiz nas palestras, a minha opinião sobre
Yoga, eu fiquei sendo “o amaldiçoado no meio do Yoga”, e agora venho dar as devidas
explicações, aqui no Livro Negro do Yoga. Não é uma reparação ou a busca de um
desagravo, e sim expor o Yoga fora de seu ambiente, sem tendências.
O título é O Livro Negro do Yoga e o sub título deste livro poderia ser Yoga
para não idiotas, e ele nem era provocativo, é fato, idiota vem do grego idiotes, que era
atribuído ao sujeito que imaginava que tinha alguma vida privativa, somente dele. E o
que é uma vida privativa? Não vem da cultura? Quem tem uma vida que não venha da
cultura? Então somente um idiotes pode imaginar que esteja fazendo algo que seja
privativo, só dele! Somos seres sociais, formados pela cultura, detentores de uma
linguagem que dá conta, bem, como veremos, pelo menos a linguagem tenta dar conta
de quem somos. Se o caro leitor pensa que possui uma vida privada, somente dele, eu
respeito, como uma imaginação ou como a crença em um futuro, ou na criação divina
do mundo. Mas nada disto tem a ver com Yoga. E aí surgiu o título atual, O Livro
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Negro do Yoga, pois quem vive uma vida privada vive sem luz, sem perspectiva sobre si
mesmo. Sem futuro.
O que seria uma vida privada que não tenha vindo da cultura? Está certo que
defendamos algum tipo de vida espiritual privada, mas o que ela nos diz? Como ela nos
responde? Que leis ela segue? Nada sabemos dela, pois tudo que fazemos é através de
um discurso, e este, vem da cultura, dos demais e da nossa relação com tudo.
Será que ele existe? Ou teremos que inventá-lo? Sempre se usou de motivos e
necessidades para a prática do Yoga, como um chamariz, pois geralmente se promete:
Bem, nesta busca pela melhor versão de você mesmo, um masoquista gostaria
mais ainda de sofrer e um perverso gostaria mais ainda de fazer os demais sofrerem, não
é mesmo? Ou será que Yoga muda a Psique de alguém ao ponto de curar? Creio que
não, Yoga cura tanto como uma caminhada diária, ou uma corrida diária. Nos meus
profícuos anos de Mestre de Yoga, na modalidade para pessoas que imaginam que
possuem uma vida privada, e assim são quase todos os Yogas que você encontra por aí;
Bem, nestes anos percebi que uma pessoa desmaiada fica flexível, até além do ponto
onde impediam as tensões psíquicas, mas o aumento da flexibilidade por alongamentos,
pelos Asanas do Yoga. Ele não mudava as tensões que a Psique exerciam sobre o corpo,
e pior, elas passavam a afetar os órgãos, e ai me lembrei muito do Analista Wilhelm
Reich na sua versão de Couraça muscular do caráter, e de Ida Rolf, na sua técnica de
desfazer as Fáscias, regiões de ligamento das estruturas que deveriam ser deslizantes
nos músculos. Rolfing funciona, mas Yoga não funciona, Rolfing dói, é terrível, mas
funciona, sabe-se lá como, mas funciona. Mas veremos que esta entrada do Yoga no
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mundo da ginástica é posterior a proposta original do Yoga. Entretanto não se pode
desprezar um século de desenvolvimento realizado pelos Hindus a partir das ginásticas
militares, origem dos Asanas.
Outra área defendida com verdadeiros milagres pelo Yoga é a área da respiração,
os Pranayamas. A respiração é uma parte da fisiologia muito complexa, ela funciona
pela concentração de gases, pressão interna e externa, posição e amplitude dos
conjuntos de músculos, ansiedade tec. e tudo isto monitorado por sensores localizados
no coração, na parte interior de artérias e no bulbo. E aí nesta área eu vi verdadeiros
absurdos, como respirações forçadas que produzem mais toxinas no sangue, oxidando
as células, e as pessoas ficam com uma sensação de leveza, intoxicadas pelo acúmulo de
CO². O nosso sistema nervoso evoluiu milhões de anos, e todos nós temos a última
versão do programa, e vem um sujeito e lhe diz que você deve respirar de certa forma e
em um certo ritmo. Bastaria uma reeducação respiratória, nada mais.
Se Yoga desse mais saúde aos seus praticantes, daria mais longevidade, e não é
o que vemos por aí, Yogues morrem cedo, com diabetes, câncer, infartos, exatamente
com todos os demais mortais do planeta. Dieta “Sattwica” para Yogue indiano é a
ingestão de açúcar, sorvetes, e de doces em profusão, dizem eles, aumenta a
capacidade espiritual, e mata bem rápido também, como Vivekananda, que morreu
diabético aos 39 anos, e Yogananada que morreu diabético aos 50 anos.
O leitor desconfiado poderia dizer: Mas na meditação, aí sim, nesta área o Yoga
é insuperável! Então experimente perguntar o que é meditação para alguém do Yoga,
faça o teste, cada pessoa lhe dirá algo diferente, ninguém sabe exatamente o que seja
isto! Se existe uma zona do Yoga onde ninguém se entende, é quanto a natureza da
prática da meditação, Dhyánam, e aí nós vamos desde a imaginação de chamas que
sobem pela coluna, ou engrenagens que estão enferrujadas, chamadas de Chakras e que
a meditação desperta, as fazendo girar, esta das engrenagens enferrujadas como sendo
Chakras eu vi em um blog de um monge Natha de Santos, no Brasil, e ele segue a
tradição de Gorakshanatha! Outra que vi como meditação é imaginar entrar no coração
e lá pedir a uma árvore sagrada que os seus desejos sejam realizados e esta árvore
concede todos os desejos; ou então a um mestre de barbas longas que mora lá sentado
em um trono enjoiado; existe também a MT, Meditação Transcendental, que poderá
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fazer você levitar, bastando repetir o mantra da sua idade, tem uma tabela com os
mantras de cada idade; mas nada é mais bizarro quando se trata de meditação e
Kundaliní, exatamente o que conheço, pois eu ensino Tantra Yoga e quando se fala em
Kundaliní, a coisa fica bastante feia, dizem que se deve ter cuidado, pois uma vez
despertada o seu apetite sexual será insaciável, e para sempre! Relatos não faltam, como
o de uma senhora de seus 60 anos, dona de casa, que foi a uma sessão de Kundaliní
Yoga e a energia despertou, ela saiu do estúdio com os olhos vidrados, desceu as
escadarias do estúdio de Yoga, e ali na rua mesmo saiu convidando todos os homens
que passavam para um sexo selvagem! Esta última me lembra, e muito, a novela de
Orson Wells, sobre a invasão marciana, uma novela do rádio, e as pessoas acreditaram
que se estava relatando uma invasão marciana real, pelo rádio, entretanto tratava-se de
uma novela! Em poucas horas mais de 100 mulheres diziam ter sido estupradas por
marcianos! Ainda na área de Kundaliní temos a versão de fazer sexo sem ejacular e ou
gozar, pois o Bindu, a energia espiritual estaria no esperma e ele não pode ser
desperdiçado! Nesta versão, as mulheres não tem Bindu, tem Rajas, sendo, portanto
cidadãs desprovidas da capacidade iluminativa! Outro tipo de Kundaliní Yoga,
Daksihna Tantra Yoga é o alinhamento do Kanda, segundo eles, existe uma semente,
um órgão espiritual no corpo, o Kanda, e as pessoas precisam alinhá-lo, como se faz
com um carro, não ria caro leitor, é isto mesmo! Seus problemas podem advir de seu
Kanda desalinhado! E hoje os pais ainda estão preocupados com seus filhos, porque
eles estão jogando RPG!
Já vi de tudo neste universo Yogui, desde pessoas sentadas sob uma lâmpada
incandescente de 500 watts, cujo cabelo queimou; pessoas sentadas de costas para o
trem na linha férrea, para sentir Kundaliní despertando, e ali no último minuto sair
correndo; pessoas sentadas batendo o cóccix no chão para despertar esta força; pessoas
que fazem pactos com o demônio, ao estilo Aleister Crowley; pessoas que bebem urina
de uma mulher grávida de um monge celibatário; treinamento para ter cara e atitude de
General Patton, pois segundo este professor de Yoga famoso no Brasil, ele, Patton, tinha
sua Kundaliní atualizada. E eu me senti um idiota lá sentado recebendo um treinamento
de General Patton para atualizar minha Kundaliní! Enfim caro leitor, eu aqui lhe poupei
de coisas bem piores, é uma pena que pessoas que se dedicam ao Yoga tenham que
conviver com tudo isto.
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A única instrução possível para uma meditação seria: SS - Sente e Sinta. A
mesma de Hui Neng: ZZ - Za e Zen.
Se Yoga é a busca pela melhor versão de você mesmo, é natural que passemos
pelas versões mais toscas, elas também fazem parte do Humano, daquilo que os Gregos
diziam como a saída do homem idiota para o homem público. As fantasias que as
pessoas fazem com o Yoga deram-se muito, devido à linguagem metafórica de muitos
textos e mestres, e mesmo, e principalmente na Índia, existem pessoas que vem neste
exotismo uma forma de sustento, e garantia para a atração de ocidentais.
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O que é Yoga?
Os principais são Hatha Yoga, Asthanga Yoga, Raja Yoga, Jnana Yoga, Karma
Yoga, Bhakti Yoga, Kundaliní Yoga, e Tantra Yoga. Cada um deles ainda vem com um
pacote extra de ponto de vista religioso, filosófico, esotérico ou exotérico. Parecem
muita as obras de Niemeyer, lindas na frente e nos fundos tem um puxadinho anexo
onde tudo funciona.
Outros tipos, como o Swásthya Yoga, popular aqui do Brasil, e que eu conheço
bem, acrescentam ao pacote que ele é o único original, que é o mais antigo, e que é
matriarcal, sensorial e desrepressor! E ainda defendem a idéia de que ele existe há 5000,
6000 mil anos, e era praticado pelos Drávidas, que na verdade eram os aborígenes da
Oceania que migraram para o continente indiano e que antes vinham provavelmente da
Atlântida! Mas como eles foram massacrados pelos Arianos cruéis, e com isto o Yoga
ficou sendo secreto. Uma história da carochinha desmentida pelos antropólogos e
historiadores da Índia.
E o Hatha Yoga? E aí começam as maiores celeumas, pois se diz que foi criado
por um monge chamado Goraksha, no século VIII depois de Cristo, e que seu Guru, que
se chamava Matsyendra, fundou uma ordem Natha, assim Goraksha passa a ser
chamado de GorakshaNatha. Uma das versões do Hatha Yoga é deste Yoga Natha, e
que passou a ser Hatha. Eu ouvi estarrecido em um curso para Formar Instrutores de
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Yoga, ministrado pelo Prof De Rose, e era a seguinte a sua explicação: “Era Natha, mas
uma traça (isto mesmo caro leitor), foi uma traça que comeu a ligação do N, e as
pessoas passaram a chama-lo de Hatha.” Uma simples traça mudou o Yoga!
HathaYôgaPradípika
No século XI d.C., Gôraksha escreve seu livro Hatha Yôga, que logo passa a ser
perseguido por tratar-se de modalidade tântrica numa época de vigência
brahmácharya. Todos os exemplares são destruídos e os seguidores desse ramo
são torturados. Por medo do martírio, instala-se o censurável costume, que
perdura até os nossos dias, dos praticantes desse ramo de Yôga tântrico, o
Hatha, declararem-se contra o Tantra! O livro proibido de Gôraksha Natha,
por sua vez, é reescrito de memória por um discípulo, décadas mais tarde,
quando as coisas se acalmam.
Prof. De Rose
Sabe-se que Gorakhsa era analfabeto, portanto não escreveu livro algum, mas a
ele se atribuem livros, como o Goraksha Paddhati. Ele era um mágico, curava as
pessoas, dava passes, vendia amuletos, era como dizem os seus estudiosos, um
taumaturgo, um Siddha. Mas todas as teorias sobre ele caem quando se lê o Tantra
Aloka, onde o autor, Abinava Gupta presta uma homenagem ao seu Guru, Matsyendra, e
como Matsyendra e Abinava Gupta viveram no século X depois de Cristo, portanto
Goraksha que também foi discípulo de Matsyendra não poderia ter vivido antes, como
afirmam algumas seitas Nathas. Goraksha jamais poderia ter escrito o Hatha Yoga
Pradipika, livro que foi escrito por Svatmarama no meio do século XIV, então fica em
dúvida o que afirma o professor de Yoga brasileiro que este texto foi escrito por
Goraksha.
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Feuerstein, este livro é chamado de A Tradição do Yoga. Logo na pagina 35 da versão
em Português temos a definição:
Mais a frente, vamos explorar este êxtase extático, que é o Samadhi, em cuja
condição todos nós permanecemos sempre o mesmo, independente das alterações,
qualidades e estados do nosso pensamento.
A palavra Samadhi é composta pelos prefixos “Sam” e “a” e depois com a raiz
verbal “Dha”, sendo, portanto, colocar-se junto. Se Yoga é Samadhi, significa que
Yoga é colocar-se junto do que se é.
O que de novo nos traz o Yoga que já não trazem as grandes religiões? Qual é o
meio de colocar-se junto a si mesmo?
Dito isto, então vamos ver as 14 mais famosas definições sobre Yoga:
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1.Yoga é Samadhi - Yoga Bhashya Vyasa.
10. Yoga é impedir que a matéria mental tome formas variadas – Vivêkánanda
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Yoga é a restrição das modificações da matéria mental - Satchidánanda
Yoga é impedir que a substância mental tome formas variadas - Lin Yutang
Então o caro leitor já deve ter notado um padrão em definir Yoga como algo
que possa controlar, restringir, subjugar, dominar, retardar, inibir, impedir, suprimir a
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“mente’. Mas de onde veio a definição que deu origem a tantas interpretações? Exceto
aquelas que foram feitas antes do Yoga Sutras. É o que vamos veremos em seguida pois
sempre surge a palavrinha mágica “mente” que resolve a coisa, embora não resolva
coisa nenhuma.
1.2 Yogashcittavrrtinirodhah
O leitor poderá perceber que não está escrita a palavra Manas na descrição de
Patanjali, e sim a palavra Citta. Manas significa Mente, mas ela é usada pelos
interpretadores, Gurus e professores de Yoga, o que confere um caráter diferente a
formulação do Yoga. Como um controle da mente, um detalhe pequeno, mas
fundamental, e que irá fazer toda a diferença como veremos.
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Um outro erro bem grosseiro é na palavra Vrrti, como função, idéia, processo,
atividade, modificações etc A palavra Vrrti significa redemoinho, dando a idéia de algo
que venha de fora e seja captada pelo Yogui, ou seja, percebido, então a palavra Vrrti no
sentido dado por Patanjali é percepção e não idéia (até mesmo por que a idéia surge
depois da percepção) ou modificação. Patanjali não cria uma tecnologia da Psique, mas
relata com uma precisão impressionante como ela funciona.
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várias palavras somente existiriam muito mais tarde, e, portanto, o texto sofreu
alterações posteriores.
E agora o leitor deve estar se perguntando, como e porque tivemos todas estas
alterações até hoje, e em centenas de tipos de Yoga, se na verdade Yoga era aquilo que
foi compilado por Patanjali? É claro que aqui eu não posso fazer um estudo comparativo
de todo o Yoga Sutras [dois bons professores que fazem este estudo são João Carlos B,
Gonçalves e Carlos Eduardo Gonzales Barbosa], a proposta deste livro é alertar para as
pessoas que existe sim um Yoga verdadeiro e autêntico e que pode ser praticado, porém
ele é completamente diferente do que se divulga por aí, O livro Negro do Yoga é esta
apresentação. Os conhecedores da semiologia na Índia, eles riem disto tudo, e balançam
a cabeça dizendo que é o Karma de cada um que atrai estas barbaridades, ditas sob o
nome do Yoga, e deve ser mesmo.
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Introdução a um Yoga Real
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Mestre Bhava – Sutras do [Tantra] Yoga
Abaixo segue um Sutra com 18 frases, feitas por mim em 1997, uma adaptação
de um possível Yoga segundo o contexto Tantrico, uma breve mas importante
introdução ao Tantra, sem as metaforizações que são tão comuns nesta filosofia, fica a
critério do leitor ou do estudante meditar nestes sutras, cujo objetivo é o de conciliar,
unir, costurar a verdade, proporcionando uma abertura espiritual, um conhecimento
superior que seja capaz de produzir o Svavidya, o Autoconhecimento. Nos círculos mais
fechados do Tantra se chamava este conhecimento de Svatantra, conhecer a realidade
equivale a conhecer a si mesmo.
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8. Estes três passos reunidos são o [Samyama] (meditação
automática);
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tudo o que restou, aquilo que não combina e que não está
identificado, é recalcado. E o que é identificado é um fenômeno, uma imanência
subjetiva que coloca o sujeito percebedor ao lado, junto da Consciência [A mesma nos
dois, e em todos, Ideen]. Dito isto, o Samadhi é inconsciente, é um fenômeno tão
instantâneo e rápido, Tan, que quando temos consciência dele, ele já é uma meditação
[Dhyánam, experiência continuada do Samadhi], há ainda um sabor de magia, uma
expansão, abertura. Logo depois temos o fechamento, a sua restrição como um objeto,
como Dhárana. E começa a fase de conhecimento [Vidya] do que foi expandido [Tra].
O Yoga foi a descrição do processo de Ser, a que todos nós humanos estamos
submetidos, e o Tantra já aprofunda o conhecimento deste processo, e o coloca como
natural, próprio do Ser dentro de um contexto naturalista.
Isto ocorre a todo instante, tão rápido que não podemos perceber, pois perceber a
percepção já é um ato posterior à própria percepção, é a meditação. No instante seguinte
temos a volta do que foi recalcado, negado, para ser comparado com a identidade. Logo
a meditação é uma admiração, um maravilhar-se por tudo que é a identidade, por um
breve momento em que a identidade está anulada de sua egoidade. E no instante
seguinte temos o fim do ciclo, Samyama, o Dhárana. Aí vemos e retemos o que foi
recalcado, negado, e logo somos também este resto, o objeto, a linguagem.
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meditação [Dhyánam] precisa possuir um ar espiritual do Samadhi e pelo outro lado e
possuir a determinação do Dhárana.
TAN
Nirbijasamadhi > Dhyánam > Dhárana
TRA
Sabijasamadhi < Dhyánam < Dhárana
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Desta forma o Tan é produzido por um Samadhi chamado de Nirvikalpa ou sem
semente, Bija, também chamado de Nirbijasamadhi, pois a semente foi a existência de
um outro percebido, como também portador da mesma identidade comum, Cósmica,
idêntica a si mesmo. Existe um meio secreto de fazê-lo acontecer pela Diksha, onde o
Guru em Samadhi produz o mesmo no outro, pela sua identidade comum.
....EU > EU SOU ISSO > ISSO SOU EU > ISSO TAMBÉM SOU EU > EU...
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O momento em que somos é muito rápido, como que atingidos por algo, como
um raio, que nos impacta, é o Samadhi, não como Insight, mas puro, fenômeno do
Universo, e que desta forma mantém separados em corpos a mesma Consciência, e a
linguagem como algo que tenta dar conta desta separação, gerando uma versão cada vez
melhor de si mesmo. O insight virá depois quando Dhyánam dará continuidade ao sabor
de ser si mesmo, de ter estado ali, junto de si mesmo, da Consciência única, e daí surge
um Dhárana, um EU SOU ISSO. O Insight virá depois neste ciclo do Tra, passando
pelo Dhyánam como um ISSO a ser colocado na cadeia de significantes, e lá ele surge
como Samadhi, mas com semente, com ISSO SOU EU. Na verdade não existem dois
tipos de Samadhi, ele é um só, o tempo todo ele é um só. As identificações é que
produzem um ciclo de percepção e depois uma volta ao estado natural forçada pelos
sonhos e pelo sono.
No Yoga Sutras, Patanjali coloca esta testemunha que se cria com o nome de
Ishvara, que significa a semente da onisciência, abrindo uma possibilidade de um
Principio de Consciência, mas muito longe de determinar a existência de um Deus ou
como age este Princípio, pois ele mesmo não pode agir em nada, ele é imutável, para
sempre. Não fica claro se ele se refere a Consciência em cada um de nós, mas não
poderia ser diferente, já que ele formaliza o processo, a partir da identificação entre a
mesma Consciência.
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coisa que não existe em nenhum lugar na matéria que sempre tem uma atividade
incessante de diferenças de potencial. Nós não sabemos o que ocorre quando duas
coisas idênticas são postas frente a frente, e não é pelo desejo de nenhum dos dois que
algo ocorre, então a Consciência frente a ela mesma não produz desejo algum que não
seja representar esta Consciência de alguma forma em um terceiro. E aí se dá a
passagem do:
Por este motivo o Tantra afirma que a Consciência se manifesta como linguagem
no ser humano, e após o fenômeno da imanência subjetiva, o Samadhi, produz-se uma
percepção, Vrrti, como pensamento, Citta. O Ser [Ishvara] no Tantra, ele surge quando
Eu Sou Isso, quando crio aquele que percebo [Vrrti] e depois surge a percepção como
meu Pensamento [Citta]. Sendo o percebedor um Purusha [ o Homem] e o percebido
Prakriti [ a substância, o dado]
O Tantra surgiu quatro ou cinco séculos depois de Patanjali, que expôs o Yoga
no Século III, e nem mesmo existe até hoje a descrição de Kundalinì antes do Século X
depois de Cristo, pois o Tantra foi uma síntese dos conhecimentos sobre a Psique, sobre
a Alma, que se faz vivente no ser humano, Jivatman. Como ser que se cria a partir da
identificação como criador de si mesmo, Ishvara.
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que Lacan fez agora no século XX, e nem ainda foi bem assimilado pelos analistas e
filósofos, e isto já estava sendo feito no Século X na Índia.
No Ocidente Freud começa a construir uma Psique, pois o ocidente não tinha
nem uma vaga idéia de como deveria ser e funcionar a Psique em 1910! Ele bebeu desta
fonte oriental? Com certeza que sim, pois eram idéias que causavam um grande
alvoroço na Europa na época.
Depois desta apresentação o sistema do Tantra Yoga fica claro, pois não existe
Tantra sem Yoga e nem Yoga sem Tantra. Este último surge na região conhecida como
Bengala, Nordeste da Índia, e desta forma nós já temos uma base teórica, Yoga; e a sua
prática como uso da linguagem, Tantra. Ficando claro um caminho que é Dvaita, dual,
em que a realização como Samadhi é um processo de Ser, e não o fruto de uma
disciplina, e este viés, o da promessa de uma realização perene é, e foi, durante séculos,
prometida aos seguidores, praticantes e estudiosos, como algo realizável sob o rigor de
um sistema. O Sagrado que está sendo vendido como coisa a ser buscada na sabedoria
de um outro, estabelecendo um compromisso de fidelidade sobre algo que é sempre
inalcançável, não é o Yoga e nem é o Tantra.
“Primus modus unionis est, quo Deus, ratione suæ immensitatis est in omnibus
rebus per essentiam, præsentiam, et potentiam; per essentiam ut dans omnibus
esse; per prmentiam ut omnia prospiciens: per potentiam ut de omnibus
disponens.” – “O primeiro modo é uma forma de união, em que Deus, em razão
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da imensidão de si é em todas as coisas, por essência, presença e poder, a dar a
essência de ser para todas as coisas; e assim prometia supervisionar todas as
coisas, pelo poder de que todas as descarte”
É deste Tantra Yoga “super natural”, maior do que o primeiro que tratamos aqui
como Yoga, que é a realização desta identidade, a qual existe, embora não conhecida,
mas que produz o conhecimento. É pela destruição da falsa aparência de separatividade,
que depois surge como o poder [Shakti] de descartar aquilo que não é, daí é que surge
uma linguagem, capaz de lidar com o mundo, pelo que não é o Eu, não é a Consciência,
mas dela vem este poder, e este processo é natural – a transcendência. Logo tudo que
existe está como produto de uma única causa primeira, duas identidades, duas coisas
que são uma só. E por favor não me fale em união Shiva e Shakti pois isto é um grande
bobagem metafísica.
Não há melhor amigo do que o conhecimento, Jñāna, nem pior inimigo do que o
egoísmo, Ahamkara. Assim, para aprender o Tantra Sastra, se deve aprender o alfabeto,
assim o Yoga é necessário para a aquisição de Tattvajñāna, da verdade, que nos
colocará na nossa posição natural e nos dará pleno acesso ao poder. Por isto o que pode
libertar é a educação, aprender a ler e a falar, para um dia ter a mínima condição de se
libertar, sem isto o homem apenas crê cegamente, sem um motivo racional, sem saber
que ele mesmo se criou.
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Tantra é este conhecimento que converge para a liberdade, com cada ciclo de
Tan e de Tra, de como o Yoga nos afeta como Ser no mundo. Não pela aceitação cega
de um Eu, de uma Consciência única, nem de um Deus inoperante, mas pelo
entendimento deste processo, é este entendimento que liberta, que cura, e por fim nos
torna humanos.
Após esta introdução podemos nos aprofundar mais, e assim começo o que se
chama de Diksha, que é a iniciação no assunto do Tantra Yoga e primeiro temos que
entender o que é Mantra.
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Mantra
Neste livro antes eu lhes disse que as letras chamadas de Varna, do alfabeto,
estão distribuídas através dos centros do corpo nas pétalas dos Chakras. Aqui agora eu
vou lhes iniciar no Tantra, trazendo o contexto da Índia para que se possa iniciar um
entendimento sobre Tantra Yoga, aqui falarei sobre Tantra, a forma de realizar o Yoga.
Kundaliní é ambos, ela é a Luz, Jyotirmayí; e é o Mantra, Mantramayí, e o Mantra é
usado no processo de seu despertar na Diksha.
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hipnótica, as projeções mentais, Mokshana, e proteção mental, Grahana, estão se
tornando conhecidos e praticados, nem sempre com bons resultados. A doutrina
Lingüística, da Semiologia, ela é muito antiga na Índia e as suas práticas encontradas
nos Tantras são mantidas geralmente em segredo para prevenir o abuso de poder.
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A percepção deste som é que é transitória para a Dhvani que manifesta as idéias
em uma linguagem que sempre está buscando um sentido nela. Mas o som soletrado,
assim como é em si mesmo – é eterno. Ele não foi produzido no momento em que é
percebido. Ele só foi manifestado pela Dhvani, pelo uso do ar no espaço. Ele existe
antes, como existirá depois, buscando a manifestação por uma possibilidade de
expressão. O ar em contato com os órgãos vocais revela o som na Forma, como a das
letras do alfabeto, e as suas combinações em palavras e sentenças. Tantra é a Forma. As
letras são produzidas pela audição e no esforço das pessoas que desejam falar, e assim
se tornam audíveis para o ouvido dos outros, através da operação do som não soletrado,
ou Dhvani. O último, como som Dhvani, sendo um manifestador somente, como som
não soletrado é somente outro além do que seu manifestador. Assim sem o significado,
o significante não tem lugar na cadeia de significantes do pensamento, é o Ser quem dá
o Significado pela necessidade de expressar algo.
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percebe. Segue-se que o pensamento tem dois aspectos, em um dos quais ele é o
percebedor, Ishvara e, em outro, o percebido na forma de pensamento, Vrtti, que
precede a criação da percepção em sua projeção externa, e até depois da criação o
percebedor segue como sendo a impressão produzida na mente através da detecção de
um objeto físico bruto. A impressão “mental”, pois aqui já há uma mente e ela é deste
percebedor, o Ishvara. Ele e o objeto físico correspondem exatamente, pois o objeto
físico é, de fato, senão uma projeção da imaginação do Ser que criou, embora ele tenha
a mesma realidade como a mente dele agora tem; não mais e não menos. A “mente” do
Ishvara é assim, ambos - o conhecedor e o conhecido Grahaka-Grāhya, revelador e
revelado Prakāshaka-Prakāshya.
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Artha, sutil. Assim nós pensamos. A percepção de um objeto está assim, conseqüente e
simultaneamente, funcionando na mente do Ser como Shabda , Som e Artha, objeto, os
quais tem relações indissolúveis com um outro como sendo o conhecedor (Grahaka) e
conhecido (Grahya), o Ser criado e a sua mente.
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sutil; e o som proferido, o grosseiro, são os aspectos do Mantra, o qual é o Shabda-
brahman, som do todo manifestado pelo Ser que se cria, Ishvara.
Assim como todo efeito deve ter uma causa, Karana, esta Karana é o Shadba,
ou nome Nama, sutil, inaudível e o audível, grosseiro, e que corresponde àquele objeto
em particular. Quando uma palavra é proferida, como “cadeira”, isto evoca na mente do
Ishvara a imagem de um objeto – uma cadeira – assim como a apresentação daquele
objeto faz. O ser vive pelas suas impressões como Samskaras trabalhados, o que evoca
as suas imagens mentais no sonho e o pensamento na vigília. O mundo inteiro é então
Shabda e Artha – ou seja, nome e forma Nama-Rupa. Os dois estão inseparavelmente
associados como os lados de uma folha de papel. Portanto não existe Shabda sem Artha,
ou Artha sem Shabda, som sem objeto ou objeto sem som. A palavra grega Logos
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também significa o pensamento e a palavra combinados. Existe, assim, uma linha dupla
de criação, Shabda e Artha, idéias e linguagem juntos com seus objetos, representações.
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A partir do relato acima será entendido que quando se diz que as “letras” estão
nos seis Chakras do corpo, não é para supor que se destinam a confirmar a absurda
afirmação de que as letras, como formas escritas, ou como sons proferidos, estejam lá.
As letras neste sentido, ou seja, como coisa grosseira – são manifestadas somente no
discurso e na escrita. Isto é muito claro. Mas o significado preciso desta declaração é
uma matéria de grande dificuldade técnica. Nenhum assunto apresenta maior
dificuldade do que o Mantra-vidya, quer seja considerado no geral ou em relação a um
assunto em específico. Em primeiro lugar deve-se manter atento constantemente contra
as possíveis armadilhas, ou seja, a obtenção correta de métodos prescritos de realização
para a atualidade, no sentido comum do termo. Os primeiros métodos criados pelo
Tantra no século X são convencionais, e os últimos são reais. Dúvidas sobre este
assunto são incrementadas por algumas variações nos relatos descritivos da Forma. Por
isto o Tantra tradicional não serve mais para no nosso tempo.
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então o objeto surge, brilha para a mente que o criou, é como eu dizer que: vou com
alguém amanhã ao cinema. Isto é um milagre, que ocorre em todos os momentos! Os
Mantras são assim uma fonte de Samskara, das impressões do Ser, do Ishvara, o Artha
pelo qual ele se torna manifesto para a Consciência que está apta para percebê-la. A
essência de tudo isto é – concentrar e vitalizar o pensamento e a força de vontade como
um dom que nos é dado como poder [Shakti]. Mas para tal propósito, um método é
necessário – ou seja, a linguagem e as suas variedades determinadas na prática, de
acordo com o fim almejado...
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