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em aula.
O filme intitulado Cinzas da Guerra (The Grey Zone), é uma produção norte-americana que
foi dirigida pelo cineasta Tim Blake Nelson e lançada no ano de 2001. Com os atores David
Arquette, Steve Buscemi e Harvey Keitel em seu elenco, o drama tem a missão de retratar a
história da única revolta conhecida no campo de extermínio de Auschwitz, em 1944.
A intenção de Tim Blake Nelson era adaptar o livro Auschwitz: a Doctor's Eyewitness
Account, do médico húngaro Miklos Nyiszli. Este, por sua vez, foi um prisioneiro de
Auschwitz, que, entretanto, detinha de alguns privilégios por ajudar o famoso médico do Reich,
Josef Mengele, em suas pesquisas. Em seu livro, assim como é explorado no filme, o autor
retrata a experiência de vida dos sonderkommandos, esquadrões especiais de judeus
responsáveis pelo “trabalho sujo”, levar os prisioneiros para as câmaras de gás, dar fim aos seus
restos mortais e etc., em troca de mais algum mínimo tempo de vida. Os relatos de Nyiszli
evocam toda a complexidade e dor desses homens em ir contra seu próprio povo e como isso
fez com que eles planejassem uma revolta.
A escolha do filme, embora não muito aclamado pelas críticas, se justifica pelo modo como
o enredo é trabalhado, há a valorização de um duro realismo. A produção explora o cotidiano
do campo, os atos banais dos presos, os crematórios, os banhos, a combustão dos corpos. Um
misto envolvendo emigração, resistência, prisão, tortura, campos de concentração… as
principais memórias e relatos sobre o Holocausto, os principais autores e sobreviventes, em
muito se mesclam a esta produção cinematográfica.
Buscarei, com esta resenha, interligar momentos do filme com a historiografia do holocausto
analisada em sala, de modo que a proposta do curso seja valorizada e possamos assim,
compreender melhor este tema e sua relevância.
“Sem saber como, achei-me num caminhão, junto com uns trinta
companheiros. (...) Um soldado alemão, perguntou gentilmente um a um,
em alemão e em francês, se tínhamos relógios ou dinheiro para dar-lhe;
de qualquer modo já não nos serviriam para nada.” (LEVI, 1988).
Mais uma vez, o doloroso testemunho de Levi se relaciona ao filme de Nelson, ao retratar as
ações dos funcionários dos sonderkommandos.
O que também é visto no filme, é o trabalho nas fábricas. Algumas cenas mostram mulheres
com seus cabelos raspados e vestindo uniformes listrados e numerados, realizando serviços em
uma fábrica de armamentos. Ainda segundo Levi, “cada manhã, saímos do Campo em
formação, dirigidos à fábrica; cada noite, em formação, voltamos.”.
O filme retrata os gritos vindos das câmaras de gás, os corpos judeus sendo carregados, por
também judeus, e queimados, o horror, o pânico, a dor e o medo. Todo o cotidiano dos
sonderkommandos nos Campos foi abordado de forma a entender sua silenciosa dor e
indignação. Todo esse trauma se converteu em uma revolta. Na ficção, os sonderkommandos
se organizaram para promover um levante no Campo. Eles roubaram e esconderam pólvora e
armamento das fábricas e seu objetivo era explodir os crematórios, fazendo com que os
processos de morte fossem retardados. Em todos os diálogos do filme em que os homens
arquitetaram esse levante, fica clara a noção que tinham de que em determinado momento eles
iriam morrer, ao menos deveriam fazer algo. Mais um episódio em que a obra cinematográfica
retrata tão bem a realidade. A Revolta dos sonderkommandos em 7 de outubro de 1944
aconteceu quase que de forma idêntica ao que foi retratado no filme.
Ler a obra de Primo Levi e em seguida assistir ao filme de Nelson deixa a análise sobre o
Holocausto mais clara e profunda. O que líamos atordoados, podemos visualizar exemplificado
nas telas. Não há heroísmo nem exaltações, há apenas seres humanos vivendo um cotidiano
monstruoso e sentindo o peso disso em cada momento e ação de cada dia. Há diferentes tipos
de sofrimentos que se unem a uma só dor.
Samuel Kassow em “Quem escreverá nossa história?” conta sobre a vida do professor de
história Emanuel Ringelblum, que em 1940, no gueto de Varsóvia, cria o Oyneg Shabes, uma
organização secreta para documentar os aspectos da vida dos judeus confinados. Nos campos,
judeus corriam contra o tempo para escreverem suas últimas mensagens para as gerações
futuras, mensagens que foram enterradas e que carregavam em si um misto de esperança e
súplica de que fossem um dia encontradas.
1
Escritos de Graber, um jovem de dezenove anos de idade, que vivia no campo de concentração em Varsóvia.
Ringelblum acreditava que aqueles que escreviam estavam cumprindo uma missão de grande
importância. Era este um ato de resistência.
Não só este projeto de Ringelblum como inúmeros outros fatores são responsáveis por
produzir resistência nos campos de concentração. No filme, vimos a ação organizada e a
resistência brutal e direta, mas além disso, vimos também as resistências mais comuns
possíveis. Uma mãe que ensina seu filho a ler dentro dos campos, não significa um ato de
resistência? A marcha em que todos caminham em silêncio rumo à desinfectação, não significa
um ato de resistência? Produzir um cotidiano nos campos, de maneira tão heróica, não significa
um ato de resistência?
Referências bibliográficas
LEVI, Primo. É isto um homem? - tradução de Luigi Del Re. - Rio de Janeiro: Rocco, 1988.