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PESQUISA EM/

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


SOBRE ENSINO DE
ARTES VISUAIS

MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA.


LEVANTAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO MATERIAL.
ETAPAS DA PESQUISA. PESQUISA EM ENSINO
DE ARTES VISUAIS E PESQUISA SOBRE
ENSINO DE ARTES VISUAIS. ELABORAÇÃO
DE UM PROJETO DE PESQUISA.
INTRODUÇÃO
A proposta desta disciplina é prepará-los para a elaboração do projeto de pesquisa
e da monografia de acordo com as normas da ABNT de redação, apresentação,
citação, enunciado e estruturação de trabalhos acadêmicos e científicos.

O conteúdo do curso está dividido em cinco tópicos específicos:

1 Normalização dos trabalhos acadêmicos: as diversas modalidades de documentos

2 Processos de leitura

3 Leitura crítica

4 Normalização dos trabalhos acadêmicos: metodologia, recepção e registro

5 Estrutura do projeto e da monografia

Cada um dos tópicos discute questões práticas relacionadas à redação e às ferra-


mentas de pesquisa em/sobre Ensino de Artes Visuais, amparadas por reflexões
epistemológicas e conceituais.

1 NORMALIZAÇÃO DOS TRABALHOS ACADÊMICOS:


AS DIVERSAS MODALIDADES DE DOCUMENTOS
Cada vez mais as exigências em relação à pesquisa em/sobre arte na universidade
têm proporcionado debates em torno dos aspectos metodológicos e teóricos dos
processos produtivos nessa área de conhecimento.

No Brasil, a demanda de maior sistematização sob a forma de pesquisa tanto na


elaboração de produção em arte quanto em relação ao ensino e à análise teórico-
crítica e histórica da arte decorre, além das profundas transformações nos paradigmas
da arte no decorrer do século XX, das mudanças significativas nos parâmetros de
avaliação dos cursos de graduação pela CAPES e da criação sistemática dos cursos
de pós-graduação – níveis lato sensu e stricto sensu.

Assim, no meio acadêmico, as ações que envolvem processos criativos, educação


e reflexão são totalmente imbricadas e, nas últimas décadas, regidas pelas norma-
lizações definidas pelos paradigmas da ciência.

Toda a produção acadêmica dos cursos de graduação ou pós-graduação respeita


determinadas configurações que devem ser utilizadas. Esses trabalhos são fer-
ramentas para a ampliação da capacidade cognitiva e reflexiva e servem como
apoio no desenvolvimento das próprias idéias. É por meio do conhecimento

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dessas ferramentas que pesquisas, nas B. RESENHA, NOTAS
três grandes áreas que envolvem o produto OU RECENSÃO
artístico – produção, análise crítica/histórica A resenha consiste em uma síntese publi-
e ensino, são desenvolvidas. cada logo após a edição de uma obra,
aparece normalmente em periódicos ou
A. FICHAMENTO revistas especializadas e tem por objetivo
Uma das primeiras ferramentas de traba- divulgá-la e avaliá-la criticamente no seu
lho é o fichamento, concebido como leitura meio específico. A resenha não é apenas o
dirigida ou resumo. Por meio dele o aluno lê resumo do conteúdo de uma obra – o ficha-
um texto e re-elabora seu conteúdo. Deve mento trata disso – mas reflete também
conter as idéias principais do texto e ao a capacidade do pesquisador de elaborar
mesmo tempo as reflexões do leitor. Livros, uma leitura crítica, introduzindo-a em um
artigos, teses, dissertações e monografias, quadro de referência mais amplo. Resenhas
relacionados ou não ao universo artístico, de livros, artigos, periódicos e filmes podem
são fundamentais no processo de formação dialogar de uma maneira imediata e sincrô-
do aluno e imprescindíveis na sustentação nica com seu tempo histórico, promovendo
de suas discussões acerca de seus objetos um debate atualizado daquela produção.
de pesquisa. Os resumos devem conter
os dados da obra de origem, apresentados C. ARTIGOS
no modelo ABNT (Associação Brasileira de
Artigos são textos que podem figurar em
Normas Técnicas), sob a forma de enun- jornais, revistas, periódicos, anais e livros.
ciado, para que seja possível identificá-la Normalmente, congressos, simpósios e
e localizá-la. Assim, recomenda-se que no seminários exigem essa tipologia de texto
cabeçalho seja colocado: o nome do autor; o para compor as publicações deles resul-
título da obra; o local de publicação; a editora; tantes. Cada tipo de publicação tem uma
o ano e as páginas lidas (quando se trata de normalização interna – cabeçalho, fonte,
um fichamento parcial). espaçamento, número de páginas, formas
As citações literais do original – citação do de citação, notas de rodapé, apresentação
autor – devem aparecer em destaque, com o da bibliografia, dados do autor etc. – mas
número da página ao final entre parênteses, todos exigem que o texto seja resultado
e as observações próprias do leitor em texto de uma pesquisa – individual ou coletiva
corrente, para que seja possível distinguir – com conteúdo inédito, referências de
umas das outras. Esses textos autorais, pro- outros autores e desenvolvimento claro.
duzidos pelo aluno, são ferramentas de leitura Textos resultantes de orientação de inicia-
e podem ser utilizados como base para a ção científica, monografia de graduação ou
discussão, a análise-crítica e a construção de especialização, dissertação de mestrado ou
trabalhos de pesquisa. Pode ser organizado tese de doutorado devem ser apresenta-
dos com os devidos créditos do orientador,
por assunto, autor, disciplina etc.
que pode aparecer ou não como co-autor.
Após um certo tempo, “ler escrevendo” Neste caso, dependendo de sua projeção,
torna-se uma prática natural. É interessante, isso é significativo para o currículo do aluno.
ao longo da vida acadêmica, reler os textos O resultado de pesquisas feitas em parceria
e perceber que, em leituras sucessivas de deve apresentar os nomes de todos os parti-
uma mesma obra, o foco varia: idéias consi- cipantes: esses nomes aparecem ordenados
deradas relevantes em um primeiro momento por titulação (da maior para a menor), em
tornam-se secundárias em outro. Pontos des- ordem alfabética ou a partir de sua partici-
percebidos são recuperados... pação na escritura.

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D. PROJETOS DE PESQUISA
O projeto de pesquisa antecede a elaboração do ensaio monográfico e sistematiza
a discussão da proposta de investigação. Por meio do projeto, o aluno define seu
objeto de estudo, tema ou recorte, considerando uma determinada área de conheci-
mento e posicionamento teórico-conceitual (epistemológico). Normalmente, o projeto
consta dos seguintes itens: Título, Palavras-Chave, Introdução, Objetivo Geral,
Objetivos Específicos, Justificativa, Metodologia da Pesquisa, Cronograma e
Referências (ABNT). Caso o projeto esteja vinculado a uma instituição de fomento,
normalmente é solicitado o plano de trabalho do aluno, o qual deve contemplar esses
itens e vincular-se ao trabalho do orientador.

No decorrer deste curso voltaremos a discutir de maneira mais detalhada os modelos e


as fases de elaboração de projetos de pesquisa vinculados à área de Ensino de Artes.

E. MONOGRAFIAS, DISSERTAÇÕES E TESES


Monografias, dissertações e teses são variações de uma mesma tipologia de pes-
quisa acadêmica e são definidas a partir do grau específico de qualificação.

Monografias são exigidas como trabalho de final de curso de graduação (TCC) e


especialização.

Como o próprio nome indica - mono-graphia - indica, os ensaios monográficos cons-


tituem produto de leitura, reflexões e análise sobre um único tema.

No caso de Ensino de Artes Visuais, a pesquisa pode abordar:

a) Historiografia (História da história) do Ensino de Artes Visuais;

b) Avaliação de metodologias já desenvolvidas;

c) Ensaios epistemológicos das teorias já construídas, elaborados a partir de avaliações


críticas, comparativas e/ou contextualmente instaladas;

d) Desenvolvimento de metodologia aplicada ao Ensino de Artes Visuais em diversos


níveis de aprendizagem – pré-escola, ensino fundamental, ensino médio, superior ou
pós-graduação – e em diferentes ambientes – dentro ou fora do ensino regular;

e) Vinculação da prática poética à pesquisa pedagógica;

f) Vinculação da prática pedagógica à análise crítica, histórica e teórica da obra de arte


e à produção em artes.

Em pesquisa em poéticas visuais, o memorial descritivo pode substituir o ensaio


monográfico, mas este deve considerar tanto as relações técnico-construtivas da
obra produzida, como também o embasamento teórico-conceitual e as referências
artísticas. Cadernos de artistas também são usualmente aceitos, dependendo do
professor orientador, mas também devem ser regidos por normas de apresentação
específicas. Para a área de Ensino de Artes Visuais, a apresentação de um programa
de aula depende do caráter temático da mesma. Atualmente há comissões de espe-
cialistas da área na CAPES discutindo as formas de normalização desses trabalhos de
final de curso nas graduações. Para a pós-graduação lato sensu, que confere o título
de especialista, o formato do trabalho monográfico é definido no próprio programa.

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Dissertações e teses constituem o produto de pesquisas desenvolvidas em cursos
de pós-graduação stricto sensu – mestrado e doutorado, respectivamente. O Con-
selho Federal de Educação assim dispõe no Parecer 977/65:
Art. 9º - A dissertação de mestrado deverá evidenciar conhecimento da literatura
existente e a capacidade de investigação do candidato, podendo ser baseada
em trabalho experimental, projeto especial ou contribuição técnica.
Art. 10º - A tese de doutorado deverá ser elaborada com base em investigação ori-
ginal devendo representar trabalho de real contribuição para o tema escolhido.

O grau genérico dessas formulações, quando ainda não existia nenhum curso
de mestrado ou doutorado em artes no país – 1965 – deixa descoberta a área de
produção em arte: caso contrário, toda pesquisa em poética deveria ser direcio-
nada imediatamente ao doutorado devido ao caráter original do processo criativo.
O grau de relevância da pesquisa em Arte não é medida pelos avanços técnicos;
será mensurável, quem sabe, pela capacidade de reflexão.

2 PROCESSOS DE LEITURA

2.1. O MEIO
Por onde começar? Muito simplesmente pelo meio. É no meio que convém
fazer a entrada em um assunto. De onde partir? Do meio de uma prática, de
uma vida, de um saber, de uma ignorância. Do meio desta ignorância que é
bom buscar no âmago do que se crê saber melhor. (LANCRI, 2002, p.18)

Começar pelo meio é partir do princípio de que já se está preparado para desenvolver
uma pesquisa com base em experiências e inquietações próprias. Dentre as áreas de
conhecimento acadêmico/científico, o campo que abarca os saberes em Arte – Teoria
Crítica e Histórica, Produção em Poética e Ensino em/sobre Artes Visuais – esbarra em
um problema epistemológico (da teoria do conhecimento) importante: como tratar o
processo criativo enquanto um processo cognitivo? Jean Lancri afirma:
um pesquisador em artes plásticas, com efeito, opera sempre, por assim dizer,
entre o conceitual e o sensível, entre teoria e prática, entre razão e sonho. Mas
que a palavra entre, aqui, não nos iluda, pois para nosso pesquisador, se trata
de operar no constante vaivém entre esses diferentes registros. (2002, p:19)

Um projeto em/sobre Ensino de Artes Visuais resulta deste entrecruzamento. A


maneira como o aluno elabora as conexões é imprescindível.

O ponto de partida da pesquisa situa-se na prática da produção em artes visuais,


com o questionamento e a problemática que ela suscita.

Antes de tudo, mesmo que o projeto parta de uma singularidade – a escolha individual –
nenhuma produção é alheia ao meio social e hermeticamente fechada em si própria.

Relacionada às teorias do conhecimento, às estruturas de reflexão das poéticas e dos pro-


cessos de produção de arte ou das ações educativas, toda monografia deve estar ancorada
na percepção de que é por meio de referenciais, análises comparativas e compartilhamento
de posturas teórico-metodológicas que o trabalho deixa de ser um ente isolado.

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Partilhar e compartilhar experiências: da Entender, dialogar e atuar: a intersecção das
crítica, do fazer ou do ensinar. Pelo método três vias que remete ao problema do objeto.
comparativo e pelo olhar sobre o “outro” As questões colocadas para a pesquisa não
– pesquisador, teórico, artista, educador, filó- se resolvem a priori, nem a posteriori, mas no
sofo, sociólogo – é que se estabelece uma trajeto: procurar, este é o primeiro paradigma,
distância crítica de si para si. modelo, percepção.
Se o desvio pelo outro abre o acesso
para si mesmo, se permite, por objeti- 2.2. SELEÇÃO BIBLIOGRÁFICA
vação progressiva, o acesso ao objeto É importante que, qualquer que tenha sido a área
de estudo que cada um escolheu para si
de escolha e o tema pretendido (considerando
na intimidade solitária de seu pequeno
que esse já é o ponto de partida), a primeira
monte de segredos, trata-se, sobretudo,
no fim de contas, de se desafiar, de des- necessidade posta seja a clareza em relação ao
denhar o segredo e de tratar a si mesmo objeto e aos objetivos para com a pesquisa.
como outro. (LANCRI, p.21) Mesmo que os objetivos venham a se modificar
no decorrer do trabalho!
Na bagagem do viajante, todas as experiências
anteriores são interessantes, mas algumas Um dos momentos fundamentais na organização
vezes deparamos, no decorrer da pesquisa, do projeto, base primeira, mas que prossegue até
com uma contradição fundamental: tudo a sua conclusão é: a seleção das fontes escritas,
aquilo que acreditávamos encontrar como o levantamento bibliográfico. Esse material,
resposta nos responde com a negação. concebido como documentos apropriados à pes-
quisa acadêmica, pode vir sob as mais variadas
Isso ocorre porque, muitas vezes, elaboramos
formas: livros, anais, periódicos, materiais carto-
um projeto pela(s) resposta(s) e não pela(s)
gráficos, gravações, arquivos eletrônicos etc.
perguntas(s). O meio como ponto de partida
é primordial, mas também pode ocasionar Com o avanço da internet várias consultas podem
armadilhas: meias-verdades, maquiagem na ser efetuadas sem a necessidade de se sair da
análise dos dados; pretensão do fazer; crença frente do computador: pesquisa por assunto, título
absoluta em conceitos dados como prontos e autor; periódicos eletrônicos; consulta on-line.
(dogmas) e a não permissão do aventurar, Essa ferramenta facilitou, e muito, a vida do pes-
dialogar, enfim, efetivamente aprender por quisador. Porém, é na seleção feita a partir de um
meio de um processo de investigação. A pes- levantamento exaustivo que a pesquisa se apóia.
quisa não é uma obra pronta no momento Para o primeiro levantamento deve-se considerar:
de sua partida – como um livro ou um filme
-, mas algo que se constrói no fazer: nem t pesquisas relacionadas ao tema proposto;
sempre o mordomo será o assassino no final t teorias críticas e metodológicas análogas à
e a mente aberta nos reserva surpresas. nossa percepção;
Armas de desejo, bagagens de linguagens,
de saberes e corpo podem servir de catapulta t análise de poéticas artísticas semelhantes à
nossa proposição;
no lançamento de um projeto, ou de barreiras
intransponíveis no processo investigativo. t obras (textuais) de relevância teórico-metodo-
lógica, independentemente de sua idade;
Começar pelo meio é, efetivamente, começar
pelo meio e não começar pelo fim... t obras (textuais) contemporâneas de relevância
teórica-metodológica.
No caso da monografia, não se exige uma
nova teorização, mas sim a capacidade do A seleção demonstra a sua intimidade com o objeto
aluno de fazer articulações e dominar o de estudo e é um meio de ampliar essa intimi-
campo de escolha pretendido. dade. Nesse momento, a orientação do professor

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é importante para a verificação das obras priori- se apresenta como algo espontâneo, e só
tárias, das lacunas, dos excessos, da relevância então se estabelece uma ligação efetiva
ou irrelevância de determinados textos. entre nós e esse texto, entre nosso objeto
e a escrita.
As referências apresentadas nessa seleção
devem seguir os padrões da NBR 6023 da Com freqüência nos contentamos, por
Associação Brasileira de Normas Técnicas economia ou preguiça, em ler superfi-
(ABNT). A tipologia do documento – sob cialmente, passar os olhos como se
formato impresso ou mídia eletrônica – define diz. Não acrescentamos ao ato de ler
algo mais de nós além do gesto mecâ-
a estrutura de apresentação.
nico de decifrar sinais. Sobretudo se
esses sinais não se ligam de imediato
2.3. LEITURA a nossa experiência, uma fantasia, uma
Quando falamos em leitura, um espaço necessidade nossa. Reagimos assim
amplo se abre: da leitura imediata de ao que não nos interessa no momento.
slogans, rótulos, manuais de instrução à Um discurso político, uma conversa,
uma língua estrangeira, uma aula expo-
leitura despretensiosa de literatura, gibis
sitiva, um quadro, uma peça musical,
ou revistas; da leitura reflexiva em relação
um livro. Sentimo-nos isolados do
às obras teóricas conceituais à leitura “dia-
processo de comunicação que essas
gonal” do texto obrigatório para a sala de mensagens instauram – desligados.
aula. Bastará, porém, decifrar as palavras E a tendência natural é ignorá-las ou
para acontecer a leitura? rejeitá-las como nada tendo a ver com
O ato de ler para um projeto de pesquisa, a gente. Se o texto é visual, ficamos
cegos a ele, ainda que nossos olhos
implica uma seleção e, portanto, uma
continuem a fixar os sinais gráficos,
exclusão. Implica a escolha de determina-
as imagens. Se é sonoro, surdos. Quer
das proposições em oposição a outras, de
dizer, não o lemos, não o compreen-
autores em detrimento de outros, de obras demos, é impossível dar-lhe sentido
em relação a outras. Nossa leitura, assim porque ele diz muito pouco ou nada a
como nossa pesquisa, também parte de nós. (MARTINS, 1984, p. 198)
um meio: as obras já vistas no decorrer
do curso, os autores “cult” e cultuados, a Tanto escrever quanto ler constituem um
moda, a bola da vez e as obras “eternas”. processo pautado pelo exercício, pela
regra, mas também pela fruição, inventi-
Ao ler uma obra pela primeira vez é impor- vidade e reflexão. Paulo Freire afirma: não
tante situar essa obra em relação a outras: apenas as palavras, mas também as pró-
de outros autores e outras obras do próprio prias frases devem ser simples. Porém, a
autor; é importante ler com os olhos da simplicidade depende de certa posição,
fé, numa primeira vez, e com os olhos da tanto do leitor quanto do escritor. Quanto
dúvida em um segundo momento. A refle- mais se lê, maior é o domínio da leitura e
xão, aceitação e compreensão da obra a o mesmo ocorre na escritura.
valida, então, como ponto de apoio na cons-
trução de nossa própria escritura. No entanto, para a pesquisa, uma prática
deve ser seguida: sempre fichar, resenhar,
Duvidar das verdades prontas e compartilhar
resumir, ou seja, reescrever o lido. Marcar a
das dúvidas postas
lápis as frases importantes pode ajudar em
Também ocorre que às vezes passamos um primeiro momento, mas escrever quando
muito tempo lendo textos inter-relacionados se lê é mais ou menos “Entendeu? Ou quer
sem perceber esta correlação; com o ama- que desenhe?”. Desenhe, escreva, reescreva
durecimento da pesquisa essa correlação que tudo fica mais claro.

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2.4. DO ENUNCIADO AO RECURSO DE CITAÇÕES
A) O ENUNCIADO é a forma padrão de apresentar os dados de uma obra escrita.
No caso de material impresso esses dados podem aparecer:

t na folha de rosto – teses, dissertações, monografias e similares;

t na ficha catalográfica – os Dados Internacionais de Publicação (CIP) – que se


encontra no verso da folha de rosto de livros, anais e revistas;

t no cabeçalho de jornais, periódicos e outros meios impressos.

Para material em novas mídias, como fitas magnéticas, CD-Rom etc., as informações
podem vir impressas na capa ou invólucro externo.

Para material disponível em meio virtual, a página e o endereço eletrônico utili-


zado como fonte documental trazem os dados significativos para seu enunciado.
Contudo, uma vez que esse meio é extremamente mutante/mutável, a data de
acessibilidade é importante. Deve-se salvar ou imprimir material disponível na
rede, uma vez que as páginas desaparecem, modificam-se e são construídas na
mesma velocidade com que as acessamos.

Os elementos essenciais de um enunciado são:

1 SOBRENOME DO AUTOR: O sobrenome do autor é grafado em maiúsculas e


separado do nome do autor por uma vírgula. Distintivos como Júnior, Filho, Neto,
Sobrinho aparecem na referência da mesma forma que nomes compostos: Ex.:
SILVA NETO. As partículas como de, da, e, não aparecem. Titularidade, incluindo
religiosa, não aparece nessa estrutura. Quando são dois autores, o sobrenome
dos dois é separado por ponto e vírgula (por ordem alfabética). Mais que dois
autores, deve-se usar a expressão latina et al. que quer dizer e outros, logo após o
enunciado do nome. Quando em coletâneas, a função do autor deve ser destacada
entre parênteses sob a forma de abreviatura escrita como substantivo próprio (Ex.:
Dir.; Ed.; Coord.; Org.). Entidades coletivas e eventos científicos têm entrada do
enunciado como se fossem os organizadores da publicação.

2 NOME DO AUTOR: O nome pode aparecer abreviado ou não; é complementado


com a partícula (posterior) ou a titularidade (anterior) e seguido de um ponto final.

3 TÍTULO: O título deve ter destaque tipográfico, preferencialmente em itálico.

4 SUBTÍTULO: O título é seguido do subtítulo não destacado, precedido por dois


pontos (quando houver).

5 NUMERO DA EDIÇÃO: O número abreviado da edição vem logo após o título (não
é número ordinal), entre dois pontos finais.

6 LOCAL DE EDIÇÃO: Nome da cidade de publicação, sucedido de dois pontos.

7 EDITORA: A editora pode aparecer com o prenome abreviado ou não, sucedida


de ponto final.

8 DATA DE PUBLICAÇÃO: O ano de publicação pode aparecer entre parênteses logo


após a autoria, principalmente para textos na área de exatas e biológicas. O usual para
a área de humanas é constar ao final, após a editora.

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O enunciado padrão sofre alterações específicas para publicações de periódi-
cos, jornais e novas mídias.

Cada caso é um caso, portanto recomenda-se que todo aluno tenha disponível um
manual atualizado para consulta (as regras da ABNT relacionadas às normatizações
de publicação têm mudado muito ultimamente em função das adequações da pro-
dução científica nacional ao cenário internacional). EX:

FRANÇA, Júnia Lessa. Manual para normalização de publicações técnico-científicas.


6. ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

Recomenda-se que em seu levantamento o aluno selecione tipos diversos de docu-


mentos – jornais; revistas; documentos da web; coletâneas; anais de congressos,
simpósios e seminários; textos avulsos; vídeos; registros sonoros etc – para treinar e
aprender o formato correto das diversas formas de enunciados.

B) A CITAÇÃO é o emprego de texto produzido por outro autore, seguido das


informações básicas a ele referentes. Toda citação deve ter a obra de referência
apresentada em formato completo ao final, nas referências bibliográficas.

Para o recurso das citações, é necessário dar destaque que possibilite diferenciar o
texto próprio do texto de outro autor que pode ser citado:

t literalmente/diretamente – em partes ou na íntegra;

t ou por meio indireto, mencionando as teses, os conceitos, as obras e os autores


que dão sustentação a uma discussão.

Relembrando: apropriar-se de idéias, textos ou frases de outras pessoas é


plágio!

Na citação direta podem ser adotados tanto o sistema autor-data como o


sistema numérico:

t No sistema autor-data as informações básicas – autor, ano e página – vêm


entre parênteses.

t No sistema numérico, as mesmas informações vêm em nota de rodapé.

Até cinco linhas, a citação literal pode manter-se no próprio parágrafo, como conti-
nuidade do texto autoral, destacando a sentença por meio do itálico ou de aspas.
O uso das aspas delimita a citação direta. Caso o texto citado já contenha sinal de
pontuação encerrando a frase, as aspas finais são colocadas após este sinal; caso
contrário, as aspas delimitam o final da citação (UFRP, 2000, V.7: p.2). Recomenda-se
a pontuação final após o uso do modelo autor-data-página para a referência escrita
entre parênteses logo após a citação.

O ponto final vem ao final, após o fechamento da referência, para não prejudicar
a continuação eventual do parágrafo e manter a lógica seqüencial de atribuição
das idéias. Não deixe de destacar, por meio de grafia distinta, textos pessoais
dos textos de outros autores.

A citação com mais de cinco linhas ou citação longa é transcrita em parágrafo distinto.
Inicia-se com configuração de margem em recuo de 4cm, sem tabulação ou deslo-
camento na primeira linha e com finalização na margem direita. O entrelinhamento

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pode ser menor que o do texto, mas não é preciso destacar o texto da citação em
itálico, letra menor ou com aspas, pois o recuo já tem este papel. Convém dar um
destaque de espaçamento entre a citação e o texto com o recurso da formatação de
parágrafo de espaçamento antes e depois de 6pt. A identificação do texto pode ser
feita ao final por meio do sistema autor-data ou numérico.

Citação de citação deve conter a expressão latina apud (citado por):


Monografia é um estudo sobre um tema específico ou particular, com suficiente
valor representativo que obedece a rigorosa metodologia. Investiga determi-
nado assunto não só em profundidade, mas em todos os ângulos e aspectos
[...] Contribuição importante, original e pessoal para a ciência. (MARCONI e
LAKATOS, apud FRANÇA, 2003, p. 29)

O uso de colchetes [...] intercalando a citação significa que há supressão de


partes do texto.

3 LEITURA CRÍTICA: A ALTERIDADE


E A ARTE DE LER O OUTRO
3.1. ALTERIDADE
Alteridade é uma das palavras que fazem parte do vocabulário atual, vinculada a conceitos
como diversidade cultural, multidisciplinaridade, multiculturalismo, pluriculturalismo.

No dicionário encontramos: s.f. caráter ou qualidade do que é outro. (MINIAURÉLIO,


2004, p.113)

A alteridade é a capacidade de ler o outro partindo de repertórios que lhes são


próprios – do outro e daquele que o interpreta. Assim, não é raro encontrarmos
a alteridade associada a reflexões, construções e textos vinculados às posturas
intelectuais que procuram enfrentar questões como preconceitos étnicos, cul-
turais, políticos, sociais e econômicos.

Contudo, o exercício de alteridade em relação à leitura de uma obra depende da


estruturação de um pensamento crítico que perceba a sua elaboração dentro de
um contexto ampliado. A alteridade no exercício da produção de uma resenha ou
recensão é questão fundamental, pois parte de uma leitura específica de uma obra
– sob a forma de texto ou imagem em movimento (filme, documentário e inclusive
vídeo-instalação) elaborada por um “outro”, e que deve ser compreendida a partir de
dois movimentos: interno e externo.

Desenvolvimento interno: o desenvolvimento interno encontra a obra em si, no


texto que lhe é próprio; na narrativa que lhe é única; no roteiro que a concebe;
nas relações internas de imagem, campo, tempo, assunto, tema. Envolve a leitura
imediata do visto, ouvido, lido e o universo de sensações, conclusões e interpre-
tações relacionadas à sua construção.

Desenvolvimento externo: o desenvolvimento externo procura na obra o conjunto


de referências que lhe é externo – anteriores e ulteriores –, tanto em relação ao
conjunto específico da obra que a precede (vinculada à produção do autor, diretor,

YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 79


roteirista, artista), quanto ao sistema de pensa- b) Descrever, de forma concisa, a aborda-
mento construído ao redor do tema primordial gem, o desenvolvimento do tema e a
que fundamenta a obra. O desenvolvimento construção das idéias;
externo depende do repertório daquele que
c) Ressaltar, de forma objetiva, as escolhas
executa a interpretação da obra e por essa
teóricas que fundamentaram o trabalho;
razão implica conhecimento especializado,
experiência e, acima de tudo, investigação. d) Discutir os resultados em relação às
teorias anteriores, salientando a contri-
Nesse trabalho duplo repousa a tarefa
buição da obra no seu universo de reco-
daquele que pretende produzir uma leitura
nhecimento epistemológico;
de uma obra, considerando sempre que essa
leitura é crítica e tem por objetivo desenvol- e) No caso de trabalhos acadêmicos vin-
ver uma análise fundamentada. culados às áreas de artes, apresentar
e identificar as técnicas, os princípios
O exercício de resenha é importante, pois
metodológicos e a ordem das operações
desenvolve a capacidade de elaborar resumos,
de maneira objetiva é importante para
sintetizar idéias, condensar textos. Na maioria
se reconhecerem os procedimentos que
das produções acadêmicas – artigos, mono-
envolvem a produção em poética;
grafias, dissertações e teses –, exige-se do
autor a elaboração de um resumo introdutó- f) Descrever as conclusões, no caso de obras
rio, com o objetivo de apresentar o tema e textuais, e as projeções, no caso de produ-
localizá-lo epistemologicamente. ção em poética. Parte-se do princípio que
uma produção em poética resulta em uma
3.2. RESUMO: obra aberta, que nem sempre admite uma
construção fechada limitada às relações de
De acordo com França (2004, p:73):
uso, aplicação e resultado imediato;
Resumo é a apresentação concisa e sele-
tiva de um texto, ressaltando de forma g) Os resumos, ao contrário das resenhas, não
clara e sintética a natureza do trabalho, são desenvolvidos por meio de parágrafos,
seus resultados e conclusões mais impor- não devem conter citações, ou fórmulas,
tantes, seu valor e originalidade. É impor- equações, símbolos e diagramas.
tante para os investigadores, sobretudo
por auxiliar na seleção de leituras. O resumo de trabalho autoral é elaborado após
a sua conclusão. É importante não esquecer
Na monografia de especialização, o Resumo que os resumos estruturados para trabalhos
é apresentados em folha separada, imedia- em poéticas dependem das especificidades
tamente na página anterior ao início do texto desse tipo de produção.
– a Introdução. Deve conter no máximo
500 palavras. No que concerne à categoria de “produção
em arte”, deve-se relacioná-la às referências
Em artigos, é apresentado para o aceite do que Baudrillard (2002, p: 81) faz com relação
trabalho e figura logo após o Cabeçalho – com aos “objetos antigos”, ao afirmar que estes
o Título e a identificação do(s) autor(es), nor- são marginais, acidente do sistema, pois
malmente é precedido por Palavra-chave. não correspondem à funcionalidade dos
Em trabalhos acadêmicos exige-se, normal- objetos modernos.
mente, o Abstract em outro idioma. Toda uma categoria de objetos parece
escapar ao sistema que acabamos de
Na redação de resumos é importante:
analisar: são os objetos singulares,
a) Ressaltar os pontos principais, como os objeti- barrocos, folclóricos, exóticos, antigos.
vos, os métodos e as conclusões do trabalho; Parecem contradizer as exigências do

80 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


cálculo funcional para responder a um propósito de outra ordem: testemunho,
lembrança, nostalgia, evasão. Pode-se ser tentado a ver neles uma sobrevivência
da ordem tradicional e simbólica. Mas tais objetos, ainda que diferentes, fazem
parte eles também da modernidade e dela retiram seu duplo sentido.

Voltamos ao velho problema: como estruturar academicamente um resumo que


trate de uma produção em poética sem subordiná-lo às convenções limítrofes e
limitantes, romper relações criativas, restringir efeitos ou anular intenções, lingua-
gens, proposições? Manter a poética do discurso, a coerência das referências,
o olhar para outras produções (o olhar sobre o outro) é uma boa pista para este
problema epistemológico. Coerência, clareza e consciência são fundamentais
tanto neste momento, quanto em toda a elaboração de um discurso propositor
da produção em poética.

No caso de leitura de outras obras, deve-se efetuar uma leitura sistemática. Entende-
se por “leitura sistemática” uma leitura subsidiada por outros textos, que auxilie no
processo de interpretação de seu significado.

Nos manuais de metodologia, não raro encontramos a seguinte recomendação:


é importante evitar o lugar comum, frases como “o presente trabalho trata de...”;
“o autor do trabalho descreve...”; ou o uso de “gerundismo”, “estar tratando”;
“estar falando...”

O Resumo é a base de uma Resenha, e por essa razão ambas as estruturas estão
fundamentadas na construção lógica, na concisão das idéias, na abordagem das
questões significativas e no desenvolvimento de um texto pautado pela clareza
das proposições. Cabe ressaltar que o estilo do discurso é individual, mas pode
atentar para essas orientações básicas.

4 NORMALIZAÇÃO DOS TRABALHOS


ACADÊMICOS: METODOLOGIA,
RECEPÇÃO E REGISTRO
Quando um projeto na área de Ensino de Artes Visuais é pensado, as etapas seqüenciais
que encaminham o processo devem ser guiadas pelos seguintes parâmetros:

a) A definição do objeto, dos objetivos, do recorte conceitual, sua contextualização,


justificativa e exeqüibilidade são estruturadas por meio de um projeto;

b) A seleção e o recorte da bibliografia de apoio promovem a sustentação das bases


teóricas e auxilia na definição dos rumos;

c) A formatação da metodologia ampara as questões práticas que envolvem as


relações da pesquisa, tanto no que concerne à prática pedagógica direcionada ao
Ensino de Artes Visuais, quanto no que diz respeito ao tratamento de fontes docu-
mentais relacionadas às investigações em ou sobre Ensino de Artes Visuais;

d) A compreensão das normas de redação acadêmica, apresentação de enunciados,


citações e estrutura de ordenação da monografia auxilia na confecção sistema-
tizada da escritura.

YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 81


Na condução da pesquisa, independentemente do tema escolhido, dois conceitos
são fundamentais: recepção e produção em arte.

As teorias de recepção dão sustentação às pesquisas que envolvem as análises


relacionadas ao ensino-aprendizagem em arte. Contudo, todas as projeções de
recepção encontram-se diretamente conectadas às produções artísticas – tanto
àquelas consideradas referenciais de aprendizagem, quanto àquelas produzidas por
meio e a partir dos processos desenvolvidos.

A conexão entre recepção-produção investigada no processo ocorre por meio do


registro. Registrar é um verbo conjugado em cada uma das etapas da pesquisa:
as escolhas marcam a memória inicial do projeto, quando o tema é definido;
a leitura da bibliografia levantada é registrada por meio dos fichamentos que
selecionam as idéias pertinentes ao projeto; as referências imagéticas/sonoras
existem por meio de registros; as ações e as produções são rastreadas antes e
durante o processo de consecução.

MÉTODOS DE PESQUISA
O conceito teórico-metódológico de uma pesquisa distingue-se do método definido
para a realização da pesquisa: o primeiro compreende os fundamentos teóricos que sub-
sidiam a escolha dos procedimentos (as bases epistemológicas), e o segundo trata das
ferramentas específicas definidas para alcançar os objetivos (gerais ou específicos).

Para a pesquisa em/sobre Ensino de Artes Visuais, a metodologia pode ser direcio-
nada por meio de alguns parâmetros ou modelos de investigação.

No caso de uma pesquisa histórica que procure investigar os rumos de deter-


minadas correntes, escolas, períodos e até mesmo biografias relativos à área
de Ensino de Artes Visuais – Pesquisa sobre Ensino de Artes Visuais –, alguns
protocolos são comuns:

t Levantamento, desenvolvimento e leitura de fontes primárias e secundárias


relativas ao tema;

t Análise do material levantado;

t Compilação e sistematização das idéias por meio de tópicos relacionais.

Nesse contexto, entende-se por:

t Fontes primárias: documentos originais impressos, digitais, fotográficos;


produções artísticas; entrevistas; outros meios específicos comprobatórios
dos dados;

t Fontes secundárias: são obras relacionadas ao tema, normalmente as


referências bibliográficas.

Duas tipologias de abordagem são mais usuais nesse modelo:

t Pesquisas estatísticas que comparam dados correlacionados;

t Análises críticas que discutem as lacunas, as falhas, os avanços, as


contribuições ou apenas as ações específicas, tanto no campo teórico
quanto no campo empírico.

82 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


Em ambos os casos, as ações desenvolvidas gravitam em torno de:
t Recortar e caracterizar o universo da pesquisa por meio da definição do
tema, do objeto e dos objetivos;
t Definir plano de amostragem, os documentos primários que serão utilizados
(incluindo entrevistas, formulários, questionários);

t Coletar os dados, compilando a documentação sob a forma de conjuntos


coesos que permitam uma análise sistematizada dessas fontes;

t Apurar e balizar os dados por meio da definição dos métodos ou ferramentas


de tabulação, análise e interpretação, principalmente quando as análises
estatísticas forem fundamentais ao projeto;

t Analisar, discutir e apurar resultados ou conclusões.


Estas relações tão caras às pesquisas sobre o Ensino de Artes Visuais também
são indispensáveis às investigações em Ensino de Artes Visuais.
Para o desenvolvimento de práticas metodológicas ou pedagógicas que envolvam
processos de ensino-aprendizagem, os temas mais comuns são referentes:

t À criação e ao desenvolvimento de propostas psico-pedagógicas relacio-


nadas ao universo artístico;

t À avaliação de propostas já sistematizadas.


Os procedimentos necessários para esse tipo de investigação são:

t Levantamento, desenvolvimento e leitura de fontes primárias e secun-


dárias relativas ao tema;

t Discussão do material levantado e elaboração de propostas empíricas;


t Definição do público considerando faixa etária, disponibilidade e exe-
qüibilidade das ações;
t Aplicação e registro das atividades relacionadas ao desenvolvimento de
procedimentos/processos/produção em arte;

t Análise do material resultante, com a compilação e a sistematização das


idéias por meio de tópicos relacionais descritos na monografia.

Toda pesquisa deve especificar a metodologia adotada no caso de pesquisa par-


ticipante ou estudo de caso – pois a modalidade envolve público criador que é ao
mesmo tempo receptor das relações engendradas. Assim, é indispensável:

t Recortar e caracterizar o universo da pesquisa por meio da definição do


público e da metodologia específica para a prática pedagógica em arte;
t Definir plano de amostragem, como tamanho, periodicidade, formas de
composição e características do público;
t Aplicar a metodologia, documentar as ações por sob a forma de registros
(sonoros, imagéticos ou imagens em movimento) e documentar a produção
gerada permite uma análise sistematizada do processo;

t Analisar, discutir e apurar resultados ou conclusões.

YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 83


Os fundamentos conceituais (metodologia) e as ferramentas ou instrumentos que
viabilizam a parte prática do projeto (métodos) são indispensáveis. Porém, devem
levar em conta que, no que tange as ações humanas – e as ciências que as estudam
–, as lógicas, os testemunhos, as projeções e as análises não são construídos por
intermédio de critérios herméticos ou fechados.

ARTE E INTERATIVIDADE: AUTOR-OBRA-RECEPÇÃO


Várias abordagens relacionadas à teoria da recepção podem auxiliar na condução
de pesquisas vinculadas ao Ensino de Artes Visuais, uma vez que os processos de
recepção são fundamentais para a compreensão das metodologias desenvolvidas
e para o diagnóstico com relação à sua validade.

Da fenomenologia do sujeito à gestalt fundamentada em teorias comportamentais


vinculadas à psicologia e à fisiologia da percepção; do estruturalismo sedimentado
nas relações sociais de poder às teorias da cultura que retomam as correlações
históricas; todas essas abordagens procuram explicar os processos de recepção por
meio de parâmetros que oscilam entre a autonomia do individuo e a determinação
do social. Mediar essas relações não é tarefa facial, principalmente no que tange à
construção de processos criativos, a produção em arte.

Diante da variação dos formatos de produção, vários autores apontam três


fases produtivas na arte:

t 1ª geração: a obra-artefato. Remete à polissemia, à ambigüidade, à multiplici-


dade de leituras, à riqueza de sentido. Demanda relações culturais de ordem
individual e coletiva.

t 2ª geração: industrial. Incorpora o espectador e se identifica com alterações


estruturais e temáticas radicais. Introduz a “arte-participativa”, pois incorpora
processos de manipulação e interação física com a obra. Acrescenta atos de
liberdade sobre a mesma.

t 3ªgeração: eletro-eletrônica. Interatividade tecnológica na relação homem-máquina


mediada por interfaces técnicas. É marcada pelo hibridismo de formas, de lingua-
gens, técnicas e expressões.

Considerando esta classificação, a inclusão do espectador pode ser decodificada


pelo grau de interação com a obra. Dessa interação decorre também a capacidade
de ampliar o repertório (individual; coletivo) e desse modo alargar os horizontes da
produção artística:
t Participação passiva: contemplação, percepção, imaginação, evocação, leitura,
decodificação;
t Participação ativa: exploração, manipulação do objeto artístico, intervenção, modi-
ficação da obra pelo espectador;
t Participação perceptiva e interatividade: arte cinética alterando relações de tempo/
espaço a partir do corpo-olho do espectador; relação recíproca entre o usuário e
um sistema inteligente.

Para Bakhtin a primeira condição de uma obra é sua intertextualidade, ou seja,

84 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


sua capacidade de interagir e se comunicar por referências, repertório, oposições
ou equivalências com outras obras, com o mundo. A intertextualidade parte do
princípio de que as obras são “inacabadas”, uma vez que se abre a re-significações
diante do continuum do tempo.
Todo signo resulta de um consenso entre indivíduos socialmente organizados
no decorrer de um processo de interação (...) que não deve ser dissociado da
sua realidade material, das formas de comunicação social1. 1 BAKHTIN,
Marxismo e Filosofia
A abordagem triangular, ao encontrar na leitura e na contextualização a base de uma da Linguagem. São
relação tríplice, compreende que os vértices complementares ao processo de criação Paulo: Brasiliense,
1979, p: 32.
são indispensáveis para que este efetivamente aconteça.

1ª Geração: 2ª Geração: 3ª Geração:

PICASSO, Pablo. CLARK, Lygia. Máscaras Net Arte (Grupo de Pesquisa


Guitar. Paris, 1914 Abismo. Rio de Janeiro, Corpos Informáticos)
(cartão e metal - 77.5 1968 (Sacos em rede
http://corpos.org/folds.
x 35 x 19.3 cm) de nylon com pedras e
sacos plásticos cheios)
http://www.moma.
org/images/collection/ http://www.sbi.org.br/
FullSizes/00033083.jpg sbinarede/SBInarede63/
LygiaClarkMascara
Abismo1968.jpg

REGISTRO
Ao longo das discussões levantadas, vários tópicos foram abordados com o intuito
de dar sustentação às relações de pesquisa em/sobre Ensino de Artes Visuais:

t Arte e Ciência – a possibilidade de trocas no meio social (o contexto de produção


teórica relacionada ao Ensino de Artes Visuais no mundo contemporâneo)

t Arte e Academia – a construção do saber criativo dentro da estrutura univer-


sitária (a metodologia do projeto de pesquisa como um ponto de partida)

YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 85


t Arte e Alteridade – a construção de um projeto por meio de um pensamento
ancorado no outro (o apoio bibliográfico e as referências artísticas)

t Arte e Interatividade – as relações com o público (linguagem inteligível, per-


cepção sensorial, abstração e cognição – consciência, emoção e ação)

Em todas as etapas da pesquisa, da elaboração do projeto à produção final da


monografia, o pesquisador deve compreender que em cada um dos segmentos do
processo o registro é fundamental:

t O primeiro formato de registro é o projeto: nele estão esboçadas as idéias


que deram a origem à pesquisa;

t O formato intermediário e contínuo que acompanha o projeto até o


final é o registro sob forma de resumos e/ou fichamentos da biblio-
grafia e documentação consultada;

t Eventualmente gráficos, tabelas, mapas são registros base de pesquisas


quantitativas que podem figurar nos anexos ou no corpo do texto;

t O registro aparece como forma de memória das atividades, em formatos


e mídias diferentes – fotos analógicas ou digitais; gravações sonoras ou
de imagem em movimento;

t Da compilação, tratamento e discussão ancorada em todas as formas


anteriores de registros, o registro da pesquisa sob forma de monografia
é construído.

O aluno deve compreender que a manutenção constante da memória da pesquisa


sob a forma de registros diversos é o que a viabiliza.

5 ESTRUTURA DO PROJETO
E DA MONOGRAFIA
A monografia é uma das primeiras experiências de relato científico e, portanto,
constitui-se numa preparação metodológica para futuros trabalhos de investiga-
ção. Para uma especialização – pós-graduação lato sensu – o tema selecionado
pode ser um desdobramento de pesquisas da graduação – iniciação cientifica
ou TCC – e poderá ser ampliado como objeto para dissertações de mestrados e
teses de doutorado para cursos ao nível stricto sensu. A NBR-14724 da ABNT
é a que define a nomenclatura para a monografia para cursos de especialização
ou aperfeiçoamento. Para efeito de classificação:
Monografia é a exposição exaustiva de um problema ou assunto específico,
investigado cientificamente. O trabalho de pesquisa pode ser denominado
monografia quando é apresentado como requisito parcial para a obtenção de
título de especialista, ou pode ser denominado trabalho de conclusão de curso,
quando é apresentado como requisito parcial para a conclusão de curso. A
monografia pode ser defendida em público ou não. A monografia publicamente
comunicada em congressos, encontros, simpósios, academias, sociedades
científicas, segundo normas estipuladas pela coordenação dessas reuniões e/
ou entidades, é denominada memória. (UFP, 2001, 2: p.2)

86 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


Nesta aula estaremos apresentando o modelo sugerido para Projeto de Pesquisa,
e o modelo estrutural de monografia definido pelas:

t NBR 6023 – informação e documentação;

t NBR 6024 – numeração progressiva das seções de um documento;

t NBR 6027 – sumário;

t NBR 6028 – resumos;

t NBR 10520 – apresentação de citações em documentos;

t NBR 10524 – folha de rosto;

t NBR 12225 – títulos e lombadas;

t NBR 12226 – apresentação de originais;

t NBR 12899 – catalogação na publicação de monografias.

Um modelo será apresentado em anexo, em documento sob formato PDF, e deve


ser seguido para a elaboração do próprio projeto de pesquisa e para a monografia.

A proposta será utilizada pelo aluno como parâmetro para a elaboração do exercício
desta aula: a confecção do projeto de pesquisa. Inclusa nesse texto encontra-se
uma proposta de estruturação de monografia que o aluno deverá utilizar ao longo
da preparação de seu ensaio monográfico.

Justifica-se o formato estrutural do modelo de Projeto de Pesquisa, uma vez


que este exemplo incentiva o aluno a utilizar elementos pré-textuais específicos
do formato da monografia – capa, folha de rosto, resumo, lista de ilustrações,
lista de tabelas, lista de abreviaturas, lista de notações e sumário.

Algumas recomendações na escritura são fundamentais:

t Procure digitar todos os fichamentos, resumos, apontamentos, anotações e pensa-


mentos em um único formato – letra, configuração de página, tamanho de papel.

t Abra uma pasta resumos e salve o documento de maneira que você o localize
pelo nome (o nome do autor ou o tema é uma boa dica).

t Não se esqueça de atribuir data, quando houver a leitura de mais de um texto do


mesmo autor, para você não correr o risco de salvar em cima de outro documento.

t Abra pastas específicas para textos colhidos na internet e salve com a identificação
da data de acesso.

t Sempre identifique o texto lido e faça seu enunciado conforme indicação da ABNT.

t Mantenha a lista bibliográfica atualizada.

t Nos processos de digitação de texto, utilize as ferramentas disponíveis no programa


para espaçamento; tabulação; recuo; quebra de página; inserção de imagens,
moldura de quadro de texto, símbolos; formatação de listas, fonte, parágrafo,
tabelas, gráficos; inserção de notas de rodapé; configuração de cabeçalho etc. Este
procedimento é indispensável para a manutenção da configuração do texto.

t Sempre numere as páginas do texto.

YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 87


t Não use a tecla de espaço para definir t Capítulo 1: contextualiza o objeto em
tabulação; a tecla de “enter” para quebrar relação ao seu referencial teórico, consi-
páginas ou o próprio “tab” para dar a tabu- derando a revisão da literatura;
lação de uma linha para a outra; formate
t Capítulo 2: discute a base metodológica e
por meio da operação formatar, parágrafo
a define as ferramentas, bem como apre-
e então defina o alinhamento, o recuo
senta o delineamento experimental dos
especial, e o espaçamento.
processos empregados;
t O texto deve ser apresentado com o alinha-
t Capítulo 3: discorre sobre a aplicação dos
mento justificado, pois facilita sua leitura.
métodos e a análise dos resultados. É
t Recomendamos o modelo autor-data-página importante comparar os resultados alcan-
para a referência da citação, escrita entre çados pelo estudo com aqueles levantados
parênteses logo após a citação. O ponto final na revisão de literatura;
vem ao final, após o fechamento da referên-
t Conclusão: fecha o trabalho com sua
cia, para não prejudicar a continuação even-
síntese final. Nem sempre responde total-
tual do parágrafo e manter a lógica seqüencial
mente à hipótese enunciada na introdu-
de atribuição das idéias. Não deixe de des-
ção; pode alertar para o desdobramento
tacar, por meio de grafia distinta, os textos
futuro da pesquisa a partir das lacunas e
pessoais dos textos de outros autores.
dos novos questionamentos produzidos
t Notas de rodapé podem ser utilizadas para durante o processo de investigação. Não é
discussões ampliadas. Para inserir notas, permitida a inclusão de dados novos nesse
utilize a barra de ferramentas: inserir, refe- capítulo.
rência, nota, nota de rodapé, numeração
Tendo clareza dessa estrutura, o aluno pode
contínua.
construir ao longo do processo as bases para
t Aproveite o texto escrito para o projeto, ele é a escritura do trabalho.
aplicado para a introdução da monografia.

t Faça cópias de segurança em CD-ROM


(backup) de tudo – fichamentos, trabalhos, DISCUSSÃO FINAL
ensaios, projetos, seções da monografia.
A base da pesquisa em/sobre Ensino de Arte
t Não se esqueça de que os extremos são implica na produção de um sentido – epis-
prejudiciais – excessos e carências. A temológico, metodológico ou historiográfico
monografia é um exercício sistematizado – das relações da arte com os diversos níveis
de pesquisa que é definido por um recorte
de formação, construção ou apreensão de
específico de um tema.
conhecimento.
Organize as idéias em conjuntos coesos e
O exercício de competências manifesto no
tenha em mente sempre três seções para a
texto, nas obras produzidas ou na condução
monografia, além da introdução e da conclu-
das atividades pedagógicas impõe-se como
são. Assim, a estrutura pode ser desenvolvida
uma possibilidade de reflexão, interpreta-
da seguinte maneira:
ção e conexão da produção em poética, do
t Introdução: apresenta o objeto da pesquisa, desenvolvimento da metodologia de ensino
delimitando o recorte conceitual, as bases em arte, da prática pedagógica ou de sua
teóricas, os objetivos e a justificativa, bem localização epistemológica. Dessa dicoto-
como a formulação introdutória de hipóte- mia, do fazer e do pensar, surge o projeto
ses. Finaliza com a definição dos capítulos de pesquisa.
e sua apresentação sucinta.

88 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENSINO DE ARTES VISUAIS – VOL. 1


REFERÊNCIAS
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BRITES, Blanca; TESSLER, Élida.(org.). O meio como ponto zero: metodologia da


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Escuta, 2001.

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YACY-ARA FRONER PESQUISA EM/SOBRE ENSINO DE ARTES VISUAIS 89

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