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Humaniversidade Holística

Psicossomática

“Deve-se aprender para conhecer, conhecer para compreender, compreender para julgar”.
(Narada)
“Há grandes homens que fazem com que todos se sintam pequenos. Mas o verdadeiro grande homem é
aquele que faz com que todos se sintam grandes”.
(Gilbert Keith Cheston)
“Faça o que pode, com o que tem, onde estiver”.
(Franklin Roosevelt)
“A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para frente”.
(Soren Kierkegaard)

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Índice
Matéria Páginas:
Apresentação____________________________________________________________ 02
Prólogo_______________________________________________________________ 04
Introdução______________________________________________________________ 05
Quadro de referência_________________________________________________ 06
A proliferação das Escolas e Métodos______________________________________ 06
Esclarecimentos sobre alguns conceitos_____________________________________ 08
A bifurcação pós-iluminista________________________________________________ 13
Desenvolvimento psíquico_________________________________________________ 16
Imagem do corpo_________________________________________________________ 17
Fases do desenvolvimento libidinal___________________________________________ 19
O desenvolvimento do ego e as fases da vida___________________________________ 19
Primeira Infância e Infância________________________________________________ 20
Idade Adulta___________________________________________________________ 27
Velhice________________________________________________________________ 29
O Século de Jung / Séc. XXI________________________________________________ 34
Bibliografia_____________________________________________________ 37

Humaniversidade Holística 1
1º - APRESENTAÇÃO
A compreensão do ser humano e de sua existência no mundo tem sido uma preocupação constante
do homem através dos tempos. Entretanto, esta área do saber, embora já tenha acumulado muitos
conhecimentos, encontra-se, até os dias de hoje, repleta de perguntas que ainda não foram
satisfatoriamente respondidas.
Com o aparecimento da psicologia como ciência, a partir do final do século passado, a busca de
conhecimento do existir humano tem levado seus estudiosos ao levantamento de questões básicas, tais
como:
- No que consiste o psiquismo humano e como se desenvolve através da vida? Como vem a adoecer
e quais as possibilidades que existem de se recuperar?
Estas são questões que na vida cotidiana poderiam ser expressas do seguinte modo:
- Como viver para ser feliz e tornar felizes os nossos semelhantes?
Uma das dificuldades para os psicólogos encontrarem respostas às suas indagações é o fato do
psiquismo humano se revelar através do existir e este ser amplo e complexo. Assim, ele tanto
apresenta aspectos que podem ser observados nas ações dos indivíduos como também outros que
ficam ocultos aos mais competentes e atentos observadores, pois ocorrem no íntimo das pessoas. E
acontece que estas não são transparentes e geralmente não querem revelar a sua própria intimidade.
Além disto, o nosso existir cotidiano está repleto de ambigüidades. Assim, somos seres racionais e
livres, mas não podemos negar que também somos determinados pelos condicionamentos. Dedicamo-
nos ao bem estar de nossos semelhantes, mas também nos empenhamos na nossa própria auto-
realização. Convivemos com pessoas, animais e coisas deste mundo, mas também nos confrontamos com
a nossa solidão. Experimentamos momentos felizes e de grande tranqüilidade, mas não conseguimos
evitar nossas aflições. Enfim, vivemos mas também morremos, numa paradoxal simultaneidade, pois a
cada dia que passa estamos caminhando tanto para viver mais plenamente quanto para morrer mais
proximamente.
O nosso existir imediato é vivenciado como uma totalidade que integra todos os seus aspectos
complexos, mas o processo racional de teorização é parcial, delimitador. Todos nós sabemos, de um
modo vivencialmente global, tantas coisas que não conseguimos explicitar de modo completo. Assim
acontece com a ternura que sentimos por alguém, a alegria que nos envolve e que nos engrandece nos
momentos felizes, a tristeza que nos invade e nos oprime nos momentos de aflição. Quando me
perguntam se eu sei no que consiste cada uma destas vivências, eu digo que sim, mas se me pedirem
para defini-las eu posso tentar, porém, todas as minhas explicações deixam-me a sensação de não ter
conseguido fazê-lo de modo completo. Assim acontece nestas situações, em tantas outras da vida
cotidiana e também nas vivências do psicólogo nos momentos de atuação profissional.
Todas estas complexidades e ambigüidades têm dificultado a investigação no campo da Psicologia
pois, como ciência, ela precisa ser elaborada através de princípios claros e congruentes. Esta situação tem
levado seus estudiosos a investigarem o existir humano, focalizando ora uns, ora outros de seus múltiplos
e paradoxais aspectos. Assim, foram surgindo as várias teorias psicológicas, sendo cada uma delas um
conjunto de formulações coerentemente articulado que procura explicar o ser humano a partir de uma
perspectiva que abrange alguns de seus aspectos.
Como estudiosa da Psicologia, tenho vivenciado e refletido muito a respeito de todas estas dificuldades
e como professora tenho partilhado das inquietações de meus alunos, quando sentem que precisam adotar
uma posição diante da diversidade que percebem em várias teorias. E as inquietações aumentam nos
momentos em que ultrapassamos a situação de meros estudiosos e entramos na prática. Ou, dizendo de
modo mais abrangente, quando nos defrontamos com alguém que precisa de nossa atuação e competência
profissional, para ajudá-lo a superar suas dificuldades.
Freud, Jung, Skinner, Rogers, Binswanger e tantos outros... A quem seguir, ou quem adotar como
suporte para a nossa prática como psicólogo? Quais os autores que nos fornecem subsídios para
compreender o modo como vivem os nossos clientes e os meios para ajudá-los a viver melhor?
Mas acontece que o psicólogo também é objeto de suas investigações e de suas reflexões. E então as
perguntas tanto se voltam para os seus semelhantes como para ele próprio. O modo como tenta
compreender e ajudar os seus clientes é, basicamente, o modo como tenta se compreender e viver de
modo mais pleno.
As teorias surgem a partir das vivências dos estudiosos, vivências não só como estudiosos e
profissionais, mas também como seres humanos existindo cotidianamente nas mais variadas situações.
A ciência psicológica está entrelaçada à vivência do psicólogo. E é na alternância interligada entre as
teorias e as vivências que o psicólogo vai chegando às suas preferências teóricas e às suas convicções.
Vivências não apenas como profissional, mas como ser humano que experimenta alegrias e tristezas
semelhantes às de seus clientes. Convicções imbuídas não apenas de conceitos teóricos racionais, mas
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também de crenças que ele não consegue explicar satisfatoriamente, pois surgem não apenas da coerência
de seu raciocínio, mas também de seus sentimentos e de suas vivências imediatas globais. E convicções
que não estão estagnadas, mas continuamente abertas à revisão, à mudança, a ampliações conseqüentes
aos estudos contínuos e à constante abertura às próprias vivências.
Realizar um trabalho científico que estabeleça relações entre conceitos de várias teorias e interações
entre estes e as vivências profissionais e cotidianas é um empreendimento corajoso e difícil. Nisto
consistiu o trabalho de Annamaria, realizado pela primeira vez como uma dissertação de mestrado - da
qual tive a satisfação de participar como orientadora - tendo assumido, posteriormente, a forma de um
livro que, de certo modo, ficou um pouco delimitado pelo seu estilo acadêmico inicial (Sannino, 1986).
Agora, a autora apresenta mais uma vez o seu trabalho, que já não é exatamente o mesmo, pois foi
ampliado com os estudos e experiências posteriores e reelaborado com a liberdade de quem decidiu
escrever o seu livro, sem as delimitações vindas anteriormente. Nele explicita, de modo espontâneo, a sua
trajetória de psicóloga e psicoterapeuta, articulando-a com várias teorias.
Relata como percebe aproximações entre psicólogos que algumas vezes disseram coisas semelhantes
com palavras diferentes. Assim, Freud, Jung e até mesmo Skinner são passíveis de relações
aproximativas.
Além disto, referindo-se às suas vivências profissionais e às de sua vida cotidiana, mostra o quanto
ambas contêm ensinamentos que podem ser encontrados nas teorias.
Nas suas formulações percebe-se certa preferência por Jung, embora não se restrinja a ele, pois as
enriquece pela relação que estabelece com outros teóricos e pela inserção que faz de princípios e técnicas
fundamentais no trabalho corporal e na sabedoria oriental.
É um trabalho bem elaborado, útil para os estudantes e estudiosos da Psicologia não apenas pelos
subsídios teóricos que apresenta, mas também pelos aspectos vivenciais tão sensíveis e autenticamente
explicitados.
O texto também pode ser útil aos leigos que desejem obter conhecimentos do psiquismo humano, pois
está escrito em linguagem coloquial que torna a leitura agradável porque facilita a sua compreensão.

Yolanda Cintrão Forghieri

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PRÓLOGO
Existem diversas possibilidades de entender a terapia psicológica porque existem diversas
tipologias humanas.
Talvez um dos méritos de Jung seja o de ter-nos proposto, já no longínquo 1913, uma solução
psicológica do problema. De fato, ao criar uma tipologia de oito possibilidades básicas, ele nos
ofereceu um quadro bem vasto para interpretar a nossa psique. Não se trata de uma hipótese eclética
mas de uma tomada de consciência de quanto pode ser complexo o nosso mundo psíquico.
Vamos dizer que existe a necessidade de se ater a um modelo - só que esta necessidade nada tem a
ver com a verdade. E este é um ponto que necessita ser esclarecido.
A psicologia profunda, diferentemente dos outros campos do saber, ainda não possui fundamentos
teóricos seguros como, em parte, as ciências exatas possuem. O teorema de Pitágoras permanece até
hoje indiscutível porque foi usado muitas vezes sem nunca ser desmentido.
Na psicologia profunda percebemos que a construção teórica, a teoria, nada tem a ver com aquilo
que efetivamente se faz; então, como esta coligação não existe, é perfeitamente legítimo que se possa
dizer qualquer coisa sem receio de ser desmentido. Este é o motivo pelo qual, no mundo da psicologia
profunda pode-se encontrar tipos "originais" que não podem ser desmentidos porque faltam critérios
para esta finalidade.
Se Freud e Jung estivessem agora aqui, justamente como pergunta a professora Annamaria Sannino,
o que fariam? O que diriam? Eu penso que usariam a mesma prudência que usaram nos escritos deles.
Amiúde esquece-se que o próprio Freud afirmava o significado mítico das suas teorias; ou então
que mesmo Jung, no ensaio “O renascer psicológico” ficava por conta de seus alunos que não
tentavam desenvolver urna modalidade pessoal da psicologia, mas que se limitavam a ser alunos
estéreis e repetitivos.
Tudo isto deve ter um significado, um significado também doloroso porque Freud e Jung percebiam
o que poderia acontecer e de fato aconteceu. As escolas têm esclerosado aquilo que foi dito e fizeram
disto uma arma para combater os outros. Estes analistas cometem um erro ridículo porque não se dão
conta de uma coisa fundamental: Freud, Jung, Lacan etc. apresentaram um modelo. Este modelo
funciona quando usado sempre com o instrumento fundamental que é o analista.
Por experiência sei que este fato é sempre muito difícil de ser aceito, porque é quase ofensivo ouvir
dizer que não são tantas as coisas que se conhecem, mas é a personalidade do analista que funciona. É
preciso dizer que tanto a teoria quanto a prática do analista nada têm de objetivo, mas tudo aquilo de
que somos testemunhas é antes de mais nada uma confissão subjetiva. Lida-se com um modelo que
tem muito a ver com a profundidade daquele que o põe na prática. Embora seja doloroso, as coisas
estão assim se quisermos dizer a verdade. Porém pode-se também enganar as pessoas e, antes de mais
nada, a nós mesmos, se dissermos que adotamos um método específico.
Sem dúvida eu, enquanto psicanalista, posso sentir que um certo modelo é para mim mais
congenial, e então o usarei. Num certo sentido serei mais fiel a um modelo mas nunca direi que o meu
modelo é melhor que outro. A partir do momento em que sinto a necessidade de dizê-lo, alguma coisa
não funciona. A necessidade de ser missionário e de afirmar que se tem razão é típica das religiões,
mas não da ciência. A ciência não diz que tem razão, apenas funciona e então as outras modalidades de
falsa ciência estão destinadas a morrer. Não é assim com as psicoterapias. Todas funcionam mas, não
seria honesto perguntar-se o que funciona? Funciona o analista. Então quando Annamaria Sannino nos
apresenta a sua casuística, apresenta-nos tanto o método ao qual se refere, quanto o seu modo íntimo
de ser psicanalista. Pode-se concordar ou não, mas esta liberdade de aceitar uma teoria em lugar de
outra é o mínimo que se deve pedir aos psicanalistas com espírito crítico.
Erramos quando não respeitamos a dignidade humana, quando reprimimos a nossa criatividade,
porque a única coisa importante na vida é a consciência das próprias aspirações. A fidelidade a si
mesmo dirige a escolha. Eu, enquanto psicanalista, uso estes instrumentos, de modo sincero e com
muita força: uma contínua introspecção que não acaba nunca; um mal-estar indiferenciado que nunca
me abandona, e que é o elemento indispensável para que eu possa curar uma outra pessoa, e o
conhecimento mais amplo possível de todos os tipos de neuroses.

ALDO CAROTENUTO
Setembro de 1987

Humaniversidade Holística 4
INTRODUÇÃO
O maior incentivo para um trabalho
de pesquisa ininterrupto veio-me
da prática terapêutica, e consta
da pergunta impossível de ignorar:
Como você pode tratar de algo que
você não compreende? Carl Gustav Jung 1910

Este ensaio tem a finalidade de comunicar a minha experiência pessoal no caminho da formação
como profissional, tentando auxiliar aquele que queira alcançar a plenitude da sua integração na
profissão de psicólogo (individuação).
Horas e horas de reflexão e de estudo já dediquei a considerações de palavras-chave: ego, id,
persona, sombra, self, sexualidade, pulsão, etc. que tiveram que ser entendidas na situação de
casuística de consultório. "O mapa não é o terreno”, diz Alfred Korzybski. De fato, os conceitos
não são sempre fáceis de serem identificados com a representação da realidade porque esta se
apresenta de forma diferente da bem comportada e ordenada lógica da teoria. Albert Einstein disse:

“O homem tenta elaborar para si mesmo, de modo que melhor lhe parece, uma descrição simplificada
e inteligível do mundo. Depois, tenta até certo ponto substituir o mundo real por este universo por ele
construído para poder dominar toda a Natureza. Ele faz deste universo e de sua construção o centro de
sua vida emocional para encontrar assim a paz e a serenidade que não consegue dentro dos limites a
ele impostos pelo turbilhão de experiência pessoal do mundo que os rodeia”.

Este ensaio é a narração da contínua indagação que fiz e continuo fazendo a mim própria no curso
do trabalho diário para extrair e dar sugestões a quem interessar possa.
Neste ensaio, exponho a minha versão das duas teorias da personalidade que basicamente norteiam o
meu trabalho: a de Sigmu nd Freud e a de Carl Gustav Jung, escorada na visão holística
contemporânea de Aldo Carotenuto. Proponho-me também abordar algumas implicações que
constituem o tempero saboroso da nossa vida. 0 mundo que nos rodeia é bem diferente do mundo que
rodeava Freud, Jung e seus contemporâneos. À medida que os anos avançam, avançam também os
conhecimentos e a correspondente complexidade. A mim parece conveniente desenvolver a habilidade
para aproveitar de modo eficiente e coerente a realidade circundante. Para esclarecer esta minha idéia
uso como exemplo um fato, conseqüência do desenvolvimento tecnológico contemporâneo: hoje é
normal falar com pessoas de outros continentes, bastando para isto discar certo número e pagar o
preço correspondente. Por extensão, entendo que, para sermos coerentes, devemos fazer uso desta
habilidade mental também em outras esferas da nossa existência: especificamente na utilização prática
dos conhecimentos adquiridos. Ou seja: é necessária a compreensão dos conhecimentos e o
correspondente uso, adequando-os à realidade, e não apenas a repetição alienada. Do contrário,
também não deveríamos usufruir das criações tecnológicas da era contemporânea. Parece-me bastante
incoerente declarar-se, por exemplo, ortodoxo, e ao mesmo tempo utilizar retroprojetores, slides,
circuitos internos de televisão, forno de microondas ou coisas equivalentes. Estou me referindo à
polêmica do ecletismo.
O ecletismo, a meu ver, nos proporciona vantagens porque, assim como o Pequeno Príncipe que
precisava apenas mudar a posição da sua cadeira para admirar os seus queridos pores-de-sol, nós
também teremos a possibilidade de escolher o que e como dizer e fazer que mais rápida e
eficientemente modificará o nosso interlocutor e... nós mesmos! Do contrário, penso eu, corremos
o perigo de acabar como o velho monarca da região do asteróide 325 (Saint /Exupéry, 1982, pág.
37).
Podemos optar por não usar certos conhecimentos, mas o não uso não deve ser confundido
com ignorar, o que equivale imitar o avestruz que, para defender-se perante certa ameaça, afunda a
cabeça na terra e deixa o resto do corpo exposto.
No grande livro do mundo, aprendi que era importante "mudar antes os meus desejos do
que a ordem do mundo" (Descartes, R. 1637). Depois de alterar o possível, só me restava aceitar,
sem julgar (coisa difícil), o que não era possível transformar.
Para explicar isto é útil o conceito oriental de "passividade ativa", cuja denotação implica a
vigilância contínua que leva à ação no momento mais apropriado e que, por isto, geralmente
produz resultados satisfatórios.

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Pensava ter adquirido o hábito de assim encarar as coisas, até o dia em que, em contato com os
alunos, a realidade mostrou-se diferente: percebi que não era fácil aceitar a dificuldade deles em
articular os mais diferentes conhecimentos, além de uma patente reticência para expressar o próprio
pensamento, a própria criatividade: fatos estes que confundem as cabecinhas e deixam inseguros.
Uma vez que com muito esforço simplifiquei a minha vida, não me era fácil aceitar as
dificuldades, ou melhor, as confusões dos outros, sendo que muitas delas também tinham sido
minhas. Com os pacientes no consultório a coisa era fácil, mas com os demais não. Como os
demais limitavam-se a poucas categorias: estudantes do curso de psicologia, recém-formados,
supervisionados e poucos outros e, tendo eu percorrido um caminho semelhante, decidi dedicar-
lhes parte do meu tempo, escrevendo-lhes este ensaio que, como ainda diz Descartes: "Espero que
seja útil a alguém sem ser nocivo a ninguém e que todos me sejam gratos pela minha franqueza"
(Descartes, R. 1637).

QUADRO DE REFERÊNCIA
"Não basta ter a mente sã: o essencial é aplicá-la bem”.
Descartes

Por que se escolhe o curso de Psicologia?


Depois de longa reflexão concluí que a escolha de um curso, de uma profissão, não é arbitrária.
Penso que se escolhe o curso de Psicologia por inúmeras razões, mas que sejam as menos
contingentes. A necessidade de compreender e querer eliminar as "minhoquinhas" que começam a
ser percebidas na própria cabeça ou, e isto é pior, na cabeça dos outros, deveria ser uma razão
sempre presente. Como também o desejo de ser agente e não paciente, ou as duas coisas. A
respeito de Jung nos diz:
“De quantos destinos humanos nós vimos e de quantos deles tentamos indagar a secreta motivação,
tanto mais impressionante aparece a força através da qual agem os motivos inconscientes e temos que
constatar quão circunscrita e limitada é a liberdade e a intencionalidade da nossa escolha. O médico
sabe, ou pelo menos teria que saber, que ele não abraçou esta profissão por acaso. O psicoterapeuta em
particular tem que ter muito claro em sua mente que as contaminações psíquicas, mesmo se lhe
parecem desnecessárias, são na realidade fenômenos concomitantes cuja presença é até fatal no
seu trabalho e que, portanto, respondem à disposição instintiva de sua vida. Entender isto
significa também assumir a atitude justa perante o paciente. Neste caso, o destino do cliente será
importante para o psicoterapeuta e esta é a condição favorável para a cura” (Jung, C. G., 1946).

A proliferação das Escolas e Métodos

A revista Sinopses 6 publicou um artigo de Armando Espinosa que transmite informações


gerais e perfeitamente adaptáveis a todas as áreas do saber contemporâneo. Segundo o autor:

“Depois de analisar atentamente o assunto (roteiro de uma aula inicial para um curso a nível
de pós-graduação), chegamos à conclusão de que seria conveniente iniciar o curso esclarecendo
uma série de conceitos, de forma a estabelecer uma espécie de regras do jogo que nos
orientassem no emaranhado por onde andamos...” (Sinopses 6, 1984).

Uma olhada de soslaio na área da psicologia permite perceber o quanto estamos


emaranhados. Nem sempre percebemos as convergências ou alterativas que oferecem os
diferentes métodos psicoterápicos que continuam surgindo no campo fértil da psicologia.
Alguns estudiosos usam palavras diferentes com a mesma conotação. Raramente temos a
felicidade de nos enriquecermos com algo novo. Estes fatos nos confundem e geram confusões e
inseguranças. Estou pensando nos alunos e no número cada vez maior de sociedades, escolas,
instituições, seus adeptos e rótulos correspondentes. A respeito de Jung disse:

“Assistimos a uma proliferação de escolas, métodos e técnicas. O que se é um sinal de


vitalidade é também um índice de perplexidade e confusão. Mas o pior é que cada escola ou
subescola pretende ser a depositária de uma verdade absoluta e incontrovertível, com grande dano
ao progresso científico. O fanatismo, continua Jung é sempre irmão da dúvida” (Carotenulo.
A.,1997b).
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Portanto, não fundar escolas, mas estimular o outro a viver a própria criatividade.
Tais alternativas parecem-me representar uma saída para proteger-se da crescente complexidade da
vida contemporânea. A credulidade e a insegurança me parecem as características marcantes da nossa
época. Penso que as diferentes instituições e associações acolhem com a intenção de proteger, embora
mantendo um certo clima de autoritarismo. Todavia, sabemos que, como colocam com elegância os
nossos colegas:

“... os analistas, por terem nas suas próprias análises resolvidos seus conflitos transferências,
pouco se prestam a aceitar situações de submissão hierárquica” (Cesarotto, O. e de Souza Leite, M.
P., 1984).

O mundo contemporâneo cresce e se expande em ritmo cada vez mais acelerado e, para que
possamos viver nele de modo integrado, desfrutar os benefícios da situação e participar ativamente do
processo, é necessário adotar um novo "Instrumental para o Pensamento". Em seu livro, Waddington nos
diz:
“Vale a pena fazer ver que, qualquer que seja o modo escolhido para definir a complexidade, ela tende
a crescer mais depressa do que o número de elementos envolvidos...” (Waddington, C. H., 1977).
É fora de dúvida que seria mais acertado e justo apostar no ensino e contribuir para a formação de
pessoas livres.
Waddington termina o primeiro capítulo do seu apaixonante livro com algumas sugestões que nos
deixam mais otimistas. Como lidar com a complexidade que dificulta a nossa vida:
a) ensino de princípios gerais que se tornarão antiquados apenas lentamente;
h) métodos de ensino para buscar rapidamente e de forma bastante abrangente a informação fatual
atualizada que colocará carne sobre estes ossos quando se tomar necessário aplicar;
c) os métodos de ensino para classificar a informação em uma hierarquia de categorias, de modo
tal que os itens relevantes a um contexto particular possam ser rapidamente filtrados;
d) instilando motivação para continuar a auto-educação depois de cessado o período de educação
formal.”
Após a leitura de 'Instrumental para o Pensamento', será difícil continuar a ver o mundo da mesma
forma que antes, pois novas distensões do pensamento científico começarão a se insinuar em nossa mente
(Waddington, C. H., 1977).

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O presente diagrama, que Alfred Korzybski apresenta no seu livro Science and Sanity de 1933,
mostra a capacidade de abstração, níveis Hn, da mente humana perante um evento. E, mesmo com as
mais diferentes abordagens Vn, neste diagrama percebemos a capacidade limitada de captação
dos seus atributos. São poucos os furos interligados e de alguns surgem ligações que não se
completam.

“Hoje existem poucos estudiosos que se podem denominar matemáticos ou físicos ou biólogos sem
restrição. Um homem pode ser um topologista ou um acústico ou um coleopterólogo. Estará
impregnado do jargão de sua matéria e conhecerá toda a sua literatura e as respectivas ramificações,
porém, muito freqüentemente, considerará o tema vizinho como algo da alçada de seu colega que
está três portas adiante no corredor e julgará qualquer interesse dele em seu campo como uma
intromissão injustificável”. (Wiener, 1970).

Carl Gustav Jung dedica o capítulo XI da sua obra "Tipos Psicológicos" às "Definições" e nos diz:

“O leitor provavelmente pensará que seja supérfluo dedicar um capítulo inteiro a definir ternos. Mas
se o faço é porque muitas vezes notei, principalmente nos trabalhos de psicologia, que não existe nunca
a suficiente preocupação nos conceitos, nem nas expressões. A grande diversidade de sentidos
atribuídos a um mesmo termo provoca amiúde os mais persistentes mal-entendidos”(Jung, 1921).

Tais fatos me fizeram decidir de escrever este discurso em linguagem coloquial, por ser este o
prevalentemente usado no diálogo com pacientes em consultório.

Esclarecimentos sobre alguns conceitos


NORMAL - O conceito de normal, indispensável no arsenal intelectual do psicoterapeuta, é
fugidio. Apoiando-nos na geometria que diz que reta normal é aquela perpendicular à outra, ou seja,
aquela que não se inclina nem para um lado nem para o outro, poderemos dizer que normal é tudo
aquilo que apresenta um equilíbrio sem inclinar-se nem para um lado nem para outro.
A verdade é que este conceito somente pode ser apreendido a partir de uma estimativa estatística
que permite dizer que normal é aquilo aceito sem reserva pela maioria da sociedade entendendo esta
num certo momento histórico.
Por exemplo: hoje é normal a liberdade feminina, inconcebível cinqüenta anos atrás.

CULTURAL - Intimamente integrado ao normal está o conceito cultural que é a manifestação de


comportamento coerente com o nosso momento histórico.
É normal (e aqui normal integra-se ao natural) comer, porém é cultural comer hambúrguer.

NATURAL - Tudo o que se apresenta na natureza sem alteração. O conceito hoje é difícil de ser
usado apropriadamente, dada a maciça manipulação da natureza pelas técnicas do homem.
Perante o crescente aumento dos movimentos verde, naturista, red, etc. no mundo inteiro, podemos
prever que nos orientamos para uma sociedade em que a natureza será cada vez mais controlada e
modificada.
Esta parece ser a sina da nossa sociedade tecnológica.

ARTIFICIAL - Etimologicamente relacionado à arte, artefato, artigo, artelho é tudo o manipulado


(outra vez a presença da mão), aquilo que resulta de operações manuais direta ou indiretamente.
Tendemos a confundir com sintético, ou seja, sintetizado. A fibra acrílica não é artificial, é
sintética. O linho, tirado de plantas naturais depois de laboriosa elaboração, será artificial, assim
como o suco de fruta espremido das frutas, diferentemente do concentrado sintético que a assim
chamada indústria da alimentação nos oferece.

TEORIA - Síntese de idéias que especulativamente explicam de forma parcial ou limitada um


certo número de fatos reais relacionados a um mesmo assunto. A teoria, fruto dileto da epistente
teorique grega, se contrapõe ao real no sentido de ser uma produção do intelecto, ou seja, uma série
de idéias que, mesmo acertadas com o real, não consegue esgotá-lo e que, portanto, se lhe
contrapõe.

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Por esta razão podem existir diversas teorias referentes a um mesmo tema. Podem ser bem
diferentes e até antagônicas, mas pelo fato de coexistirem num certo momento histórico nenhuma
delas deve ser considerada mais verdadeira que as outras.
A história nos mostra que as teorias são progressivamente substituídas por outras, todas
intentando explicar o real que subsiste eternamente igual a si mesmo.
REAL ou REALIDADE - Pelo dito anteriormente, real ou realidade é o suporte ou estímulo
à nossa percepção e, para formular este conceito, os pensadores chegaram por vezes a conclusões
paradoxais, afirmando que o real só existe em função ou conseqüência do intelectual. Por exemplo:
a realidade das cores só existe por termos um sentido chamado visão que traduz a energia
eletromagnética de determinada freqüência na sensação visual. Mas o que é esta energia
eletromagnética? Os físicos que lidam com a realidade a concebem como expressões
matemáticas, ou seja, manifestações intelectuais.
Método
Do grego: literalmente 'caminho para algo' no seu sentido mais geral, maneira de alcançar um
objetivo, determinado procedimento para ordenar a atividade. Em sentido especialmente filosófico,
como meio de cognição, o método é a maneira de reproduzir no pensamento o objetivo que se
estuda...
Na base de todos os métodos de conhecimento, encontram-se as leis objetivas da realidade.
Metodologia
1. Conjunto de processos de investigação aplicáveis numa ciência. 2. Teoria sobre os métodos
do conhecimento científico do mundo e de suas transformações...
Técnica
Do Dicionário das Ciências Sociais de Alain Birou, destacamos:
1. Conjunto de regras práticas veiculadas pela linguagem, pela mão e pelos instrumentos, com vista ao
exercício de atividades produtivas.
2. Utilização racional e prática dos recursos naturais, e particularmente das leis da natureza, para a
satisfação das necessidades humanas.
3. Conjunto de processos de uma ciência, arte ou ofício, para obter um resultado determinado com
o melhor rendimento possível...
Tecnologia
A tecnologia é o estudo sistemático dos instrumentos, dos procedimentos e métodos que se empregam
nos diversos ramos da técnica. Esta disciplina, essencialmente prática, nasceu com o aparecimento da
ciência aplicada. Antes disso, os vários ofícios aprendiam-se empiricamente: a criação e utilização
dos instrumentos necessários faziam-se por transmissão direta, pela destreza, etc. A tecnologia é
a aplicação dos métodos das ciências naturais e das ciências físicas ao exercício de uma atividade a fim de
conhecer todas as leis intervenientes, de criticar e aperfeiçoar os processos e de comunicar o seu
conhecimento pelo ensino técnico... “(Gama, 1982).

Humaniversidade Holística 9
• Ha sempre urna interligação entre estas categorias, nos mais diferentes graus e qualidades.
• O pensamento científico se caracteriza pela precisão e coerência. Isto equivale a dizer que a
ciência se caracteriza pela ausência de ambiguidades e não por gráficos e números.
• Gráficos e números podem ser tão complicados e imprecisos (ambiguos), quanto as palavras e
v.v.
• Números, gráficos e palavras são apenas projeções da digna mente humana que se
desenvolveu e funciona sistematicamente (cientificamente) ou não. Quando não, provoca
inevitáveis e compreensíveis sofrimentos.
• Em síntese, no verde Globo Terrestre, existem: eruditos cientistas, cientistas não eruditos e
eruditos não cientistas porque cientificismo equivale à qualidade de pensamento. Ou seja, a como
se organizam (sistematizam) mentalmente os conhecimentos, a erudição adquirida.
• Se o profissional tem mentalidade científica, cria um método psicoterapêutico eficiente.

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Humaniversidade Holística 11
Humaniversidade Holística 12
A bifurcação pós-iluminista*
Quais as relações entre o processo civilizatório e a felicidade humana?
Os benefícios da civilização são tangíveis e passíveis de mensuração. Um conjunto expressivo de
indicadores biomédicos, sociais e econômicos atesta os ganhos objetivos em termos de longevidade,
saúde, escolarização, acesso a bens de consumo e tantos outros feitos derivados do progresso
científico e do aumento da produtividade. Mas quais têm sido os efeitos de todas essas brilhantes
conquistas no tocante à felicidade, ou seja, tendo em vista a nossa satisfação em viver e o grau de
realização que esperamos e alcançamos em nossas vidas? Até que ponto a civilização moderna tem
promovido ou dificultado a busca da felicidade? O que vem revelando o programa de pesquisa empírica
sobre as relações entre indicadores objetivos e subjetivos de bem-estar? Existiriam custos ocultos
embutidos no processo civilizatório?
E s e inventassem uma "pílula da felicidade instantânea", estaria resolvido o problema?
As questões centrais aí estão. Mas antes de abordarmos diretamente os grandes temas que elegemos
para nortear os nossos debates, o que sem dúvida faremos nos próximos encontros, imaginei que não
seria má idéia se abríssemos os nossos colóquios com um olhar retrospectivo. Creio que um exame, ainda
que ultra-sinóptico, da evolução das idéias sobre a relação entre civilização e felicidade constitui uma
preliminar necessária para um ataque frontal e profícuo do problema. O exercício, espero, renderá frutos. Ele
poderá nos ajudar a clarear os horizontes, armar o cenário e situar historicamente diversos pontos que
deverão aflorar em nossos debates.
Proponho, portanto, que voltemos um pouco no tempo e nos perguntemos como era o amanhã de ontem,
ou seja, como se pensou sobre o futuro da felicidade no passado. Mais especificamente: quais eram, em
grandes linhas, as expectativas e as visões de futuro das gerações que nos precederam e em que medida
elas se revelaram justificadas pelo que veio depois? Se é verdade que "a tradição de todas as gerações
mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos", então a história das idéias pode ter um papel
profilático e emancipador do pensamento em formação. Estudar o passado é uma condição necessária para
quem almeja - se for o caso - libertar-se dele. Afinal, como também já se disse, "é difícil saber o que torna
alguém mais retrógrado-não conhecer nada exceto o passado ou nada exceto o presente".
Nenhuma época do pensamento é homogênea, e toda comparação entre épocas distintas é temerária. Na
história das idéias, os rótulos fazem às vezes de muletas e são raras as proposições gerais que não se
desfazem em exceções. É necessário, no entanto, generalizar e comparar; abdicar de fazê-lo equivaleria a abrir
mão da possibilidade de uma perspectiva histórica.
Felizmente, a generalização de amplo alcance que nos servirá de ponto de partida está entre as mais robustas
de que a história das idéias é capaz. Ei-la: o grande divisor de águas no tocante à evolução da noção de
progresso civilizatório e do seu impacto sobre a felicidade humana foi o iluminismo europeu do século XVIII a
"era da razão" baseada na fé sobre o poder da própria razão. Exceções notáveis e precursores solitários -
quem poderia negar?-existem; mas pensadores desgarrados ou extemporâneos, assim como a proverbial
andorinha, não fazem um clima de opinião.
A meteorologia usa o barômetro para medir a pressão da atmosfera e prever as mudanças do clima. Se
a história das idéias possuísse um instrumento análogo, capaz de fazer leituras barométricas dos climas de
opinião em determinados períodos e de registrar as variações de expectativa em relação ao futuro em
diferentes épocas, então haveria pouca margem para dúvida de que o século XVIII deslocaria o ponteiro
da confiança no progresso e no aumento da felicidade humana ao longo do tempo até o ponto mais
extremo de que se tem notícia nos anais da história intelectual.
Como apontam os melhores especialistas no assunto, o conceito iluminista de progresso - e tudo o que
ele implicava em termos de otimismo quanto ao futuro terreno da espécie humana-assinala uma clara
ruptura em relação às idéias dominantes no mundo antigo, medieval e renascentista. Na aurora do
pensamento moderno, sob o efeito inebriante da "tripla revolução" (científica, industrial e francesa), a crença
no progresso foi aos céus.
A equação fundamental do iluminismo europeu pressupunha a existência de uma espécie de harmonia
preestabelecida entre o progresso da civilização e o aumento da felicidade. A resultante do processo, ou
seja, a construção gradativa de um mundo como nunca se vira na história desde a expulsão do primeiro
casal do paraíso era o efeito da combinação de vetores de mudança que não só corriam juntos mas que se
alimentavam e se reforçavam mutuamente. Eram eles:
• o avanço do saber científico;
• o domínio crescente da natureza pela tecnologia;
• o aumento exponencial da produtividade da riqueza material;
• a emancipação das mentes após séculos de opressão religiosa, superstição e servilismo;
• a transformação das instituições políticas em bases racionais, e
• o aprimoramento intelectual e moral dos homens por meio da ação conjunta d a educação e das leis.
Humaniversidade Holística 13
Se o homem é produto do ambiente em que ele se forma e se o ambiente tende a se tornar
cumulativamente melhor pela ação dos próprios homens, nada mais natural do que supor que, à medida que
o mundo ao seu redor progride, também os homens ampliarão a sua competência como produtores de bens
materiais e a sua capacidade de moldar a sua conduta de acordo com os princípios da razão. A ordem
natural da providência divina, as leis imanentes da história ou um coquetel judicioso das duas coisas
conspiravam para garantir que o rio do processo civilizatório, ainda que por vezes sinuoso ou inescrutável,
corresse rumo a um final feliz. O desconcerto do mundo era o efeito de causas inteligíveis e remediáveis.
Conquistas objetivas, colheita subjetiva. O horizonte resplandecia. Tudo prometia uma supersafra do bem-estar.
As variações em torno desta equação na "era da razão" são incontáveis e, felizmente, dispomos de uma
vasta literatura especializada de estudos cuidadosos que mapeiam as nuanças e os contornos próprios de
grande parte delas. Creio que vale a pena, entretanto, repassar uma pequena amostra de ilustrações
textuais que nos permitam tomar o pulso e apreciar melhor o teor e o colorido das expectativas
dominantes do iluminismo europeu acerca da relação entre civilização e felicidade.
Considere-se, por exemplo, o que afirmava o filósofo político e químico inglês Joseph Priestley, co-descobridor do
oxigênio (dephlogisticated air) e grande inspirador do que viria a se tornar mais tarde, com Jeremy Bentham e seus
seguidores, a grande bandeira do programa de reformas do utilitarismo clássico, ou seja, o princípio da "máxima
felicidade do maior número":

(Na vida em sociedade) são requeridos não mais do que alguns poucos anos para se assimilar todo o progresso
anterior de qualquer arte ou ciência; no restante de sua vida, na fase em que as suas faculdades estão mais perfeitas, um
homem pode se dedicar à expansão do saber. Mas se desse modo alguma arte ou ciência vier a se tornar ampla em
demasia para a sua fácil assimilação [...] uma subdivisão vantajosa .poderá ser feita. Assim, todo o saber será
subdividido e ampliado; e o saber, como observa Lord Bacon, sendo poder, os poderes humanos irão, de
fato, se expandir. A natureza, incluindo tanto os seus materiais como as suas leis, estará mais sob o
nosso comando e os homens tornarão a sua condição neste mundo enormemente mais tranqüila e
confortável; eles irão provavelmente prolongar a sua existência nele e tornar-se-ão dia após dia mais
felizes, cada um em si mesmo, e também mais aptos (e, creio eu, mais dispostos) a transmitir felicidade
aos demais. Dessa forma, seja qual tenha sido o princípio deste mundo, o final será glorioso e
paradisíaco, além de tudo o que a nossa imaginação possa no presente conceber.

Na mesma linha de raciocínio, refletindo a crença iluminista na perfectibilidade humana e na


existência de um elo inabalável entre progresso e felicidade, o filósofo, matemático e agitador político
francês marquês de Condorcet se propôs a demonstrar, no seu Esquisse d'un tableau historique des
progrès de l'esprit humain (1795),. que "a bondade moral do homem [...] é suscetível de um
aprimoramento ilimitado e que a natureza vincula estreitamente, numa corrente indissolúvel, a verdade, a
felicidade e a virtude".
Escrita na clandestinidade, durante a fase do Terror na Revolução Francesa, a obra do último expoente do
iluminismo francês - um autoproclamado a t e u -t r aí a um fervor de fundo religioso. Na Terra prometida da
razão secular, vaticinava o marquês foragido, as desigualdades entre os indivíduos e as nações
diminuiriam, a paz internacional seria alcançada e a adoção do livre-comércio e de uma língua franca
universal selariam a fraternidade entre os povos. O avanço do saber científico e a difusão da educação
popular dissipariam as trevas da superstição e da intolerância. Ao refletir sobre a etapa histórica que as
transformações em curso anunciavam, Condorcet previu que "o progresso das artes mecânicas trará um
novo padrão de conforto e felicidade à massa da humanidade"; "o estado atual do conhecimento nos
assegura que o futuro será feliz, mas sob a condição de que saibamos coma auxiliá-lo com toda a nossa
força".
O enredo é familiar: a estrada da razão e da virtude leva ao regaço da felicidade. O presente é o berço do
futuro que sepultará o passado. Ao término da via-crúcis, a paz e a reconciliação. Crueldade, estupidez,
sofrimento - nada terá sido em vão. A grande mudança reside no locus temporal da trama. O devir
histórico - e não mais "a outra vida", o paraíso do além cristão passa a ser o palco da salvação. Tudo o
que é bom convergiria em algum ponto do porvir. Como afirmava o filósofo político inglês William Godwin,
pai da futura autora de Franknstein (1818) e também ele ateu confesso, "quanto mais os homens se
erguerem acima da pobreza e de uma vida de expedientes, mais a decência prevalecerá em sua conduta e
a sobriedade nos seus sentimentos". Diante da fé com que os filósofos ateus da "era da razão" se
agarraram à visão de um futuro feliz para a humanidade, como não lembrar da arguta observação de
Diderot, principal artífice da monumental Encyclopédie (1751-73), de que "a posteridade está para o
filósofo assim como o outro mundo está para o religioso"?
E mesmo o austero Kant, para citar um último exemplo histórico, não se furtou de nutrir esperanças
exaltadas em relação ao que o processo civilizatório faria, a longo prazo, em prol da felicidade humana.
Apesar de sua conhecida admiração por Rousseau, que neste ponto tinha uma visão oposta à vigente no
Humaniversidade Holística 14
iluminismo (como será visto, creio, nos debates); e a despeito de sua postura agnóstica quanto à
possibilidade de desvendar o segredo do que faz o homem feliz ("o problema de determinar de modo certo
e universal qual ação promoveria a felicidade de um ser racional é completamente insolúvel"), em sua
filosofia da história Kant sustentou a idéia de que os homens deveriam estar prontos a sacrificar o seu bem-
estar presente tendo em vista a felicidade de uma comunidade ideal futura que eles jamais chegariam a
presenciar. O sacrifício, ele assegurava, não seria em vão:

Deverá ser o destino feliz das gerações futuras tão-somente, o de poder habitar o edifício na construção do
qual os seus antepassados trabalharam arduamente, sem que a intenção deles fosse exatamente esta, mas ao
mesmo tempo sem qualquer possibilidade de desfrutar a felicidade cujas bases eles estavam deste modo
construindo [...] O mais alto propósito da Natureza será por fim realizado com o estabelecimento de uma
Instituição Cosmopolítica universal [um organismo] supranacional que zele pela paz nas relações entre Estados
soberanos] no seio da qual todas as capacidades e dotações originais da espécie humana irão por fim florescer.

Na ética kantiana, ao contrário do que ocorre na tradição mais empírica e mundana do utilitarismo, a felicidade
não é o bem supremo ou o fim último ao qual se subordinam todas as normas e todos os princípios da moralidade.
Mas nem por isso, vale notar, ela desaparece de cena. A expectativa é a de que haja uma convergência entre a
autonomia - o valor central da vida ética - e o bem-estar.
O exercício da liberdade sob a égide da razão e da lei moral conduziria à felicidade, isto é, à única felicidade
digna deste nome, e isso mesmo que não fosse possível especificar, em cada caso particular, os atributos concretos
da felicidade dos diferentes indivíduos. Aos olhos de Kant, portanto, a felicidade não se reduzia ao cálculo
hedonista ou à otimização do saldo de afetos positivos (prazer) sobre afetos negativos (desprazer). Ela seria uma
espécie de bônus ou prenda involuntária coroando uma boa-fé inquebrantável e a consciência do dever cumprido.
Todo pensador está ligado ao seu século por algum pressuposto questionável e do qual ele não se dá conta. Não
é preciso negar os extraordinários méritos e conquistas de ordem prática e intelectual do iluminismo europeu para
constatar a existência de um elo frágil e altamente duvidoso na sua equação de progresso. Razão = virtude =
felicidade? E se nem tudo o que é prima facie bom e valioso no mundo - o saber verdadeiro, a correção moral, o
belo estético, a livre escolha individual, a eficiência econômica e o bem-estar humano convergir no tempo ou for
necessariamente compatível? O futuro despe o passado. Nossas escolhas têm conseqüências imprevistas.
A perspectiva aberta pelo intervalo histórico põe em relevo as premissas ocultas, apostas incertas e ilusões de
uma época. A obviedade infundada aflora, ganha saliência e, sob o maçarico da crítica e da experiência adversa,
não mais convence.
Em retrospecto, há pouca margem para dúvida de que os avanços no campo da ciência, da tecnologia e da
produtividade trouxeram enormes benefícios na vida prática em termos de saúde, conforto, renda e condições de
trabalho. Mas o sucesso do projeto iluminista, parece justo dizer, não foi uniforme. Em certo sentido, ele
acabou ficando muito aquém do que sonhavam e prognosticavam os líderes do pensamento filosófico e
científico do século XVIII. À luz do que foram os últimos dois séculos, e tendo em vista o que sentimos e
observamos ao nosso redor, quem se arriscaria hoje em dia a vislumbrar um futuro, de bem-aventurança
terrena nos moldes de um Priestley, Godwin, Condorcet ou Kant?
Entre as crenças que povoavam a imaginação e a visão de futuro iluminista, uma em particular revelou-
se problemática: a noção de que os avanços da ciência, da técnica e da razão teriam o dom não só de
melhorar as condições objetivas de vida, mas atenderiam aos anseios de felicidade, bem-estar subjetivo
realização existencial dos homens. Sob este aspecto, seria difícil sustentar que o presente esteja à altura do
amanhã prometido de ontem.
Pois bem. A questão que proponho para o nosso primeiro encontro é a seguinte: o que falhou? O que
fez com que os resultados alcançados traíssem aquelas expectativas? Por que a promessa de felicidade do
projeto iluminista não se cumpriu? A crença no progresso continua viva, digna de crédito, ou teria se
transformado apenas num dogma vazio, como a carcaça de uma religião decrépita mas que, apesar de
moribunda, ainda assombra e oprime com seu feitiço o cérebro dos vivos?

(*) Ao distribuir antecipadamente o ensaio que preparou para este primeiro encontro. Melo sugeriu que
fossem lidos, na medida do possível, os seguintes textos de apoio: J. B. Bury. The Idea of progress, capítulos
10-13; John Passmore, The perfectibility of man, capítulos 8-11, e Isaiah Berlin,.”Historical inevitability”. Os
detalhes bibliogáficos das leituras de apoio de cada encontro e as fontes das citações que aparecem nos textos
de abertura e nos diálogos podem ser encontrados nas notas e na bibliografia ao final do livro.

Humaniversidade Holística 15
2º - DESENVOLVIMENTO PSÍQUICO

No início do desenvolvimento psíquico o Ser Humano está mergulhado dentro do Absoluto, sempre
tendendo ao infinito. Vivências de emoções, sentimentos e experiências sem limites - destrutivas ao
indivíduo.

SELF – si mesmo: conceito basicamente relacionado à existência. Engloba a relação do indivíduo com
toda sua vida. Conceito existencial.
EGO – Administrador da vida instintiva com a realidade. Rede de funções. Conceito funcional.

Momentos da Formação do Self – núcleos que se aglutinam até que o indivíduo tenha uma visão de
sua Totalidade. Os núcleos básicos do ego, registram os processos pelos quais o bebê passa: vivências de
si mesmo num nível pré-verbal, que vão criando a possibilidade do indivíduo se sentir um “todo” do
ponto de vista físico.
O papel desempenhado pela mãe e pelo meio ambiente é de fundamental importância neste primeiro
estágio do desenvolvimento emocional, onde o bebê encontra-se em absoluto estado de fusão e
dependência, não discriminando nenhum objeto como externo ao próprio corpo. Neste estágio, o bebê é
um ser imaturo que está sempre a pique de sofrer uma ansiedade inimaginável, evitada pela fundamental
função materna e por sua capacidade de se por no lugar do bebê e saber o que ele necessita no cuidado de
seu corpo e, por conseqüência, de sua pessoa.

3 Desintegração
3 Cair para sempre
3 Não ter conexão alguma com o corpo
3 Carecer de orientação

Angústia de aniquilação – vivências de dispersão de si mesmo. A criança necessita de vivências que


lhe permitam perceber que o corpo não se desfaz, não se dispersa, não se desintegra. As vivências de
aniquilação se dão quando existem rupturas intensas numa das funções básicas que organizam o ego, nos
períodos de integração do sujeito, que estão sustentando seu vir-a-ser.

Ruptura é a ausência da mãe além do tempo que a criança pode suportar, durante os períodos em que
os núcleos de sensações estão se organizando. Neste momento existe a dependência absoluta do
ambiente.

Preocupação Materna Primária - O primeiro estágio do desenvolvimento é de fusão e unidade mãe-


bebê. Unidade tanto pautada na imaturidade do bebê quanto na depressão (benigna) que a mãe sofre e a
leva a uma posição regressiva, tornando-a capaz de identificar-se com as flutuações do bebê. Isso permite
que a mãe seja capaz de selecionar os estímulos do ambiente que o bebê é capaz de suportar. Caso
contrário o bebê vive um estado de aniquilação.

Holding - Mãe fornece a matriz onde os núcleos de ego do bebê se organizam e se integram. Isso só é
possível graças a essa continuidade que a mãe tem com o bebê. Continuidade física e psíquica, ao
apresentar, de maneira uniforme, o pedacinho simplificado de mundo que através dela a criança passa a
conhecer, possibilitando ao bebê ter uma existência contínua ao longo de um tempo e uma integridade.(3
a 4 meses)

Coesão Física – Integração X Despersonalização


Uma importante função a ser conquistada é a capacidade de perceber-se reunido em si mesmo e que
este self, habita um corpo, o próprio corpo. A mãe, ao banhar seu bebê, acariciá-lo, manipular seu corpo
durante a higiene, vai fornecendo estimulações na epiderme que gradativamente vão sendo percebidas
pelo bebê e este passa a se dar conta então, de seu contorno corporal.
A ruptura nestes níveis leva à sensação de dispersão ao infinito – a falha neste núcleo leva aos
fenômenos de despersonalização.

Agente dos Atos – Importante que o indivíduo possa se dar conta de sua volição. Uma integração
entre a vontade e a movimentação do corpo – reconhecimento de uma intenção na produção de um gesto
e após isso o reconhecimento de um resultado produzido. O indivíduo percebe que existe uma vontade
que rege seu corpo com a qual está identificado. Disto depende a capacidade do indivíduo discriminar o

Humaniversidade Holística 16
que está fora e o que está dentro de si mesmo. A ruptura nesse núcleo ocasiona uma dissociação (alguém
move meu corpo).

Sentido de Continuidade – Quando o indivíduo percebe que é um ser total, que é agente e que é
agente ao longo de um tempo.Isso significa que o indivíduo vai sendo capaz de construir uma história e
vai se organizando a função da memória. A ruptura deste núcleo faz com que o indivíduo não se
reconheça o mesmo em diferentes períodos de sua vida - acontece por falta de continuidade entre o sujeito
e o objeto (mãe-bebê) ou o meio ambiente. Grupo de objetos que são muito importantes na estabilidade
da criança – representam a relação da mãe com a criança: travesseiro, berço, mobília, etc..devem
permanecer estáveis.

Grupo de sensações marcadas pelo ritmo (respiração da mãe e do bebê, batimentos cardíacos, etc) -
Quando o ritmo da mãe está em sintonia com o ritmo do bebê , o bebê se tranqüiliza, gerando a
possibilidade da vivência de continuidade.
O sono implica na perda total de contato sensorial com a mãe e com o ambiente, é a entrada no vazio,
no buraco.

Presença Afetiva – O indivíduo vai se percebendo como um ser que é permeado por afetos: alegria,
amor, ódio, etc... Os afetos estão relacionados ao tipo de meio ambiente que cerca a criança. A criança se
identifica com o afeto predominante que é expresso pela mãe de várias formas: tom de voz, cuidados,
tônus com que é acolhida. Sorrir diante do rosto materno (memória de reconhecimento) - a criança pode
encontrar o mesmo sorriso no rosto materno (espelhamento). Capacidade de comunicação via afeto –
afeto como linguagem. Indivíduos que não puderam encontrar a expressão de sua afetividade no rosto
materno, não vão poder entrar em contato com a própria afetividade, tendo uma vivência de que aquilo
que ele cria se perde, ou uma identificação com uma depressão da mãe (vivências psicóticas – esquizóides
ou depressivas).
A ruptura deste núcleo faz com que o indivíduo perca a possibilidade de sentir afetos – embotamento
afetivo.

Subjetividade – O bebê percebe que os seres, a mãe, têm uma subjetividade e começa a querer
investigar o que existe dentro da mãe: impulso epistemofílico.
Uma presença emocional (bebê) que interage com outras presenças emocionais (mãe). Neste momento
(por volta do 7º mês) podemos dizer que o bebê se humanizou. Gradualmente a criança vai sofrendo um
processo de humanização neste contato afetivo com o outro – a humanização se refere à codificação dos
afetos de acordo com o código da espécie
Fase do espelho (Lacan); Posição depressiva (M. Klein).
A ruptura neste núcleo faz com que o indivíduo sinta uma “solidão cósmica” : não existem outras
subjetividades com quem se relacionar.

Capacidade de Representação – Dá acesso à linguagem: uma imagem, um som que se é capaz de


representar. Simbolização – representação na ausência do objeto. Formação do espaço potencial – matriz
do imaginário; potencial criativo alucinatório. Comunicação inconsciente e narcísica – o indivíduo busca
no outro o que lhe falta.

IMAGEM DO CORPO

Não há possibilidade de nenhuma organização mental ou relação de objeto sem que haja uma
representação do corpo. A imagem do corpo está representando o eu do indivíduo em todos os seus níveis
de desenvolvimento – o ego é antes de tudo um ego corporal.

O indivíduo se representa por aquele aspecto do corpo que naquele momento tem predominância no
desenvolvimento e que vai organizar a relação do psiquismo com o meio ambiente.
A qualidade das experiências que o bebê teve com a mãe até este momento vai dando ao bebê a
possibilidade de integridade, continuidade, e o bebê pode vivenciar seu corpo como habitado por coisas
prazerosas - isso possibilita ao indivíduo perceber que tem dentro de si algo de valor. A noção do
indivíduo de que a sua pele, o seu envoltório guarda forças destrutivas ou construtivas, já começa a ser
formada nesse momento; aqui é um ponto focal para mais tarde ser estabelecida a auto estima.

Humaniversidade Holística 17
Na medida em que houve uma integridade, coesão do self, a criança passa a discriminar e registrar
sensações que ocorrem dentro do corpo (agradável/desagradável; dentro/fora, etc) – junto com isso vai
havendo também a maturação neurológica.
Bebê vai percebendo que a manutenção da sensação agradável depende de um outro que está fora dele
– momento da emergência de uma relação subjetiva alucinatória.
Meios que o bebê dispõe para lidar com o fracasso do cuidado materno:
3 A experiência do bebê, quase sempre repetida, de que há um limite temporal, no início quase
sempre muito curto, para a frustração.
3 Crescente sentido de processo.
3 Os primórdios da atividade mental.
3 Emprego de satisfações auto-eróticas.
3 Recordar, viver, fantasiar, sonhar; o integrar de passado-presente-futuro.

A partir daqui o bebê pode alucinar o objeto na sua ausência e a mãe, se coloca exatamente no lugar
desse objeto. (6 meses a um ano)

É importante que essa ausência não seja excessiva e que a mãe se coloque rapidamente diante do bebê,
onde ele a necessita. Se a mãe demora muito, não vem ou não se coloca no lugar adequado, o bebê vai
perdendo a capacidade alucinatória e gradualmente vai abandonando a busca do objeto e desinvestindo a
realidade.
Se tudo correu bem a criança vai ter uma confiança no objeto o que deriva uma confiança na realidade
– espontaneidade para ir ao encontro da realidade: a realidade passa a ser conhecida porque ela é amada, é
boa, “tem elementos para me satisfazer”.

A onipotência vai ser fundamental para que a confiança se estabeleça, para que a esperança se
estabeleça a espontaneidade e a criatividade, na medida que o bebê pode “criar” a mãe na sua ausência.

A frustração vai ocorrer se houver falha na relação mãe-bebê e então não resta outra saída a não ser ter
que se adaptar à realidade.

Espaço Potencial – para que esse espaço possa emergir.


3 Presença de uma capacidade imaginativa disponível para o bebê, a fim de poder criar o objeto
desejado.
3 O espaço existente pela ausência do objeto (mãe)
3 Tempo tolerável.
3 Comunicação compreendida pela mãe – comunicação compartilhada.

Criação de Objetos – O bebê utiliza a sua imaginação para criar objetos que ajudem a esperar a
mãe – objeto transicional. (natureza ambígua, ao mesmo tempo interno e externo; sujeito e objeto;
fantasia e realidade). Crianças nascidas no inverno tem OT felpudos, no verão mais ligadas a nylon,
algodão. Estão relacionados ao tecido da roupa que a mãe usa na época.

Capacidade de Comunicação Verbal – Consciente.


3 Maior autonomia com o ambiente, capacidade de se relacionar com o outro, de se reconhecer.
3 Linguagem regida pelo processo secundário, ganho de pensamento.
3 A relação com o outro passa a ser fundamental: tem sentido e significado – é fonte de prazer,
erótica, conhecimento e afeto.
3 Administrar pulsões sem destruir sujeito/ objeto.

Necessidade de comunicação – O que vai levar o indivíduo a conhecer a realidade é a busca de


satisfazer suas necessidades fundamentais. O ser humano tem um potencial inerente que o movimenta em
direção ao desenvolvimento. Indivíduo quase que intui o que ele necessita para completar o seu
desenvolvimento , é como se existisse uma pré-concepção disso.
Gradualmente o bebê vai poder se utilizar de objetos (acessórios, intermediários, transicionais) que vão
lhe permitir suprir algumas falhas do meio ambiente em relação aos cuidados que ele necessita e com isso
vai adquirindo certa autonomia.
Jogo – permite à criança conhecer e lidar com algo da realidade externa, conhecer e lidar com algo da
realidade interna e fazer a integração das duas realidades. No jogo a criança sabe que está no faz de conta.
O jogo tem um começo-meio-fim, é uma alucinação sob o domínio da criança. É gostoso começar a jogar

Humaniversidade Holística 18
e é um alívio que termine; é a capacidade que a criança tem de acordar. Na medida em que o jogo, o
brincar se estabelece, a criança adquiriu a capacidade de simbolizar.

FASES DO DESENVOLVIMENTO LIBIDINAL

Fase Oral - Fase de organização libidinal que se estende desde o nascimento até o desmame –
primazia da zona erógena bucal. Prazer de sucção independente de necessidades alimentares.
Prazer de “ter” e de “possuir”, se confundem para o bebê com o prazer de “ser”.
Forma passiva, incorporadora; a criança desenvolve-se armazenando passivamente as palavras, sons,
imagens, sensações.
Forma ativa: dentição acarreta desconfortos que são aliviados pela atividade de morder.
Fixação – formação de caráter egoísta do tipo captador: o indivíduo procura, na sua vida adulta, a
afeição exclusiva de um ser eleito de acordo com o modo de relação objetal oral – papel de mãe nutriente.
Regressão objetal – bulimia: substituto do ato sexual
Anorexia – recusa da sexualidade.

Fase Anal (1 a 3 anos) - Libido desloca-se para a zona anal – retenção lúdica das fezes e da urina.
Conquista da disciplina esfincteriana.
Esta fase tem Fixação na formação do caráter consciensioso, sóbrio, regular, trabalhador, sério e
científico, naqueles indivíduos que sentiram prazer em conformar-se às novas exigências que lhes forma
pedidas; nos outros, os obstinados, rabugentos, teimosos encontraremos os que se comprazem em
escandalizar ou causar sensações pelo seu desalinho, sua sujeira e sua indisciplina, ou ainda aqueles que
uma ordem meticulosa e próxima da obsessão torna insuportável o convívio.
O objeto de amor que estes indivíduos procuram na vida genital adulta, é aqueles com quem podem
desenvolver uma relação onde a ênfase recaia em subjugar ou ser subjugado. Ética de posse, poder e
domínio: homossexualidade latente e inconsciente, na escolha do objeto de amor. Dependência recíproca
Histeria e neurose obsessiva ; hipocondria

Fase fálica – 4 anos


Zona erógena fálica – pênis no rapaz e clitóris na menina.
Curiosidade sexual começa antes – visa inicialmente saber de onde vêm os bebês. Posteriormente: qual
é a diferença entre menina e menino?
Angústia de castração e descoberta da morte.
Rapaz entra em luta emocional com o pai e a menina com a mãe – Édipo. Situação edípica atinge seu
desenvolvimento máximo por volta dos 6 anos. Para se submeter à Lei a criança não só deve renunciar à
sua rivalidade com o genitor do mesmo sexo, como também se identificar com ele.
Retirada da libido, nítida depois dos 9 anos – acalma os conflitos, mesmo que não tenham sido bem
solucionados; até os 12 anos, um recalque empurra para o inconsciente todas as curiosidades e todos os
desejos sexuais que tinham sido tão vivos no 2º período da infância.

Fase de latência – Aquisição de conhecimentos necessários à luta pela vida, em todos os planos.
Ênfase na aprendizagem. Até o final da puberdade.

Fase genital – Ejaculação no rapaz, fluxo menstrual e desenvolvimento mamário na menina –


compreensão do papel recíproco do homem e da mulher na concepção.

Só com a liquidação do complexo de Édipo é que o pensamento pode colocar-se a serviço da


sexualidade oblativa – ultrapassar a busca de satisfações narcisistas sem que, entretanto as encerre.
Pensamento racional; bom senso, prudência, objetividade de observação. A fase genital oblativa
caracteriza-se pela fixação da libido no objeto de amor heterossexual, para uma vida a dois e para a
proteção do filho ou de seu substituto.

3º e 4º - O Desenvolvimento Do Ego E As Fases Da Vida


A evolução do ego é a evolução daquele aspecto do Self que se manifesta no tempo e no espaço; desse
modo, uma evolução contínua avança como interação entre uma personalidade realizada centrada no ego
e uma inteireza potencial centrada no Self. As formas características dessa interação variam nas
diferentes fases da vida. A esse respeito, diz Jung:

Humaniversidade Holística 19
A vida é (a) história da auto-realização do inconsciente. Tudo o que há no inconsciente procura a
manifestação exterior e a personalidade também deseja expandir-se para fora de suas condições
inconscientes a fim de se vivenciar como um todo.
O termo “self”, pareceu-me adequado para designar esse substrato inconsciente, cujo expoente
real na consciência é o ego. O ego está para o Self como o que é movido está para o que move, ou
como o objeto está para o sujeito, porque os fatores determinantes que se irradiam do Self circundam o
ego de todos os lados e são, portanto, supra-ordenados em relação a ele. Assim como o inconsciente,
o Self é um existente a priori a partir do qual o ego se expande. Ele é... uma prefiguração inconsciente do
ego. Não sou eu que crio a mim mesmo, mas sim aconteço para mim mesmo.

Essas duas afirmações são um resumo daquilo que diferencia a atitude junguiana em relação à
psique das outras abordagens. Esse deslocamento da noção de uma personalidade centrada em torno
do ego para o conceito de uma personalidade determinada pelo centro inconsciente e que gira em
torno dele, o Self, parece ser, para a maior parte das pessoas, tão difícil de reconciliar com fatos
observáveis como foi a teoria de Copérnico na época de sua introdução. Já pareceu óbvio que o Sol
girasse em volta da Terra; já pareceu óbvio para a maioria de nós, na atualidade, que nossa vida fosse
centrada em nossos egos ou em volta deles.
A abordagem junguiana da psicologia oferece-nos um modo de decifrar as manifestações do
centro hipostatizado em nossas vidas individuais. Esse é o método simbólico. Por meio dele, o ego
pode encontrar uma posição apropriada de parceria com o Self, o que tornará possível a cooperação
mútua.
A evolução do ego pode ser dividida em três fases. A infância é a fase de realização durante a qual
uma identidade total não diferenciada começa a "desintegrar-se", a identidade ego-Self gradualmente
se separa e elementos do meio ambiente interagem com potenciais arquetípicos para produzir uma
primeira personalidade real. Geralmente, nessa fase, as pessoas e coisas são vivenciadas como
"poderes" opressores ou ameaçadores; o ego percebe-os como se fossem entidades mágicas e,
posteriormente, mitológicas. O segundo estágio estabelece a separação entre ego e Self. Nessa fase da
vida média ou adulta, a fase do estranhamento ego-Self, as pessoas e coisas são apenas pessoas e coisas.
O único poder reconhecido é o do ego - e isso é expresso no ditado familiar "querer é poder". O terceiro
estágio é o do "retomo", o do preenchimento e realização do potencial da personalidade. O movimento
nesse estágio é em direção à totalidade do indivíduo. Os elementos não - racionais pressionam para que
haja integração; o ego é arrastado para o restabelecimento de um relacionamento com o Self, não na
identidade inconsciente, como foi na infância, mas sob a forma de um encontro consciente. Em
conseqüência, essa fase não pode ser explorada até que haja um ego suficientemente forte para encarar o
Self. Essa fase chega ao fim quando a vida termina; as imagens nas quais o inconsciente fala de morte
pareceriam sugerir que o ego então retoma à sua identidade original com o Self. Essa fusão final deve ser
preparada pelo encontro consciente, por um relacionamento ego-Self consciente. A existência é
simbolicamente vivenciada como um mistério além da própria pessoa, além da capacidade do ego para o
entendimento racional, além das pessoas e objetos, como um ser transpessoal que só pode ser
compreendido simbolicamente.
A evolução do ego para longe do Self e da volta ao Self pode ser expressa numa curva parabólica;
Jung compara-a à curva de um projétil. Suas fases acima enumeradas devem ser entendidas apenas como
aproximações de tendências evolutivas, não como estágios de desenvolvimento absolutamente separados.
Há muita sobreposição; por exemplo, há em geral aspectos do ego que não podem ser desenvolvidos até a
atitude simbólica do “retomo” se tornar disponível.

1. Primeira Infância e Infância

(a) Realidade Unitária

Na primeira fase, a primeira infância, a vida opera numa dimensão mágica, naquilo que Neumann
denomina uma "realidade unitária" do campo arquetípico. A psique da criança parece operar como uma
inteireza relativamente indiferenciada, um padrão de respostas instintivas, integradas num campo
abrangente, onde a separação sujeito-objeto no sentido adulto ainda não tem nenhuma validade. Essa
maneira de operar pode ser comparada ao modo como uma planta ou animal funcionam num campo total.
O desenvolvimento do ego divide gradualmente essa "realidade unitária" instintiva numa subjetividade
interior e uma objetividade exterior. Üxküll descreve essa completude do animal em seu Umwelt da
seguinte maneira:

Humaniversidade Holística 20
O sujeito e o objeto estão encaixados um no outro de modo a constituir um todo sistemático. Se
considerarmos que um sujeito está relacionado com o mesmo ou com diferentes objetos por vários ciclos
funcionais, obteremos insight dos primeiros princípios da teoria "Umwelt": todos os animais, dos mais
simples aos mais complexos, estão ajustados a seus mundos particulares com idêntica completude. Um
mundo simples corresponde a um animal simples; um mundo bem articulado, a um animal complexo.

Até o momento não há diferença racionalmente vivenciada entre dentro e fora, entre sujeito e objeto,
entre psique e soma; isso porque o ego que repousa na divisão dessas categorias ainda não está presente.
Neumann cita o exemplo de E.W. Sinnott a respeito do funcionamento da vida orgânica para demonstrar
a unidade funcional real de vida "interior" e "exterior", assim como a realidade desse "conhecimento
absoluto" pré-psicológico (pré-ego) do campo abrangente:

Num grupo de micetozoários, os indivíduos são células isoladas; cada um é um pedaço minúsculo e
independente de protoplasma que se assemelha a uma ameba diminuta. Eles se alimentam de certos tipos
de bactérias encontradas na matéria vegetal em decomposição e podem facilmente desenvolver-se em
laboratório. Multiplicam-se por simples fissão, em grandes quantidades. Depois que isso já aconteceu
durante algum tempo, ocorre uma curiosa alteração nos membros dessa sociedade individualista. Eles
deixam de se alimentar, dividir-se e crescer, e então começam a mobilizar-se de todas as direções rumo a
diversos centros e afluem para cada um deles, como descreveu um observador, do mesmo modo que
pessoas correndo para uma fogueira. Cada centro exerce sua influência de atração numa certa região
limitada e para ele convergem alguns milhares de células que formam uma pequena massa alongada de
um ou dois milímetros de comprimento. Essas simples células não se fundem, mas cada uma mantém sua
individualidade e liberdade de movimento. Então, a massa toda começa a se arrastar sobre a superfície
numa espécie de movimento ondulante, quase como um verme redondo, até chegar a um lugar
relativamente seco e exposto, e portanto favorável à formação de esporos, onde se estabelece e se reúne
num corpo arredondado. Então tem início uma curiosa atividade. Determinadas células se agarram com
firmeza à superfície e formam ali, coletivamente, um disco sólido. Outras, no eixo central da massa,
enrijecem as próprias paredes e formam a base de uma haste vertical. Outras ainda, passando por cima
das companheiras, dedicam-se ao contínuo crescimento da haste. Acima dessa haste, aglomera-se a
principal massa de células, até levantar-se vários milímetros acima da superfície. Estas... mobilizam-se
agora para dentro de uma massa esférica que termina a ténue haste, a qual permanece ancorada à
superfície pelo disco basal. Nessa massa terminal, todas as células se convertem num esporo
arredondado de paredes grossas, que, ao secar e ser soprado pelo vento, pode dar início a uma nova
colônia de células separadas do tipo ameba. Em outras espécies, a estrutura é ainda mais complexa, pois
a massa ascendente de células deixa atrás de si grupos de indivíduos que, por sua vez, formam rosáceas
de ramos, cada ramo terminando numa massa germinal. Nesse processo de agregação, um grupo de
indivíduos originalmente idênticos é organizado num sistema onde cada um tem sua função específica e
sofre uma modificação específica: algumas células formam o disco, outras a haste e as outras servem
como corpos reprodutores.
Neumann comenta que esse exemplo demonstra a força direcionadora de uma realidade unitária
transcendente. Um número infinito de indivíduos uni-celulares mutuamente independentes obedecem a
um plano aparente que resulta na formação de uma forma diferenciada, através de um desenvolvimento
seqüencial ordenado. Um desenvolvimento geralmente atribuído ao instinto (e, por isso, a uma entidade
quase psíquica) surge aqui, não num organismo, mas num grupo de "indivíduos" unicelulares; e o centro
de direção parece, pelo menos para o nosso estado de consciência e percepção, estar fora desses
indivíduos.

O estado da realidade unitária da criança também é caracterizado pela ausência relativa de qualquer
diferenciação entre sujeito e meio ambiente, comparável àquilo que Lévy-Bruhl denominou participation
mystique na psicologia dos aborígines; o bebê ou a criança age num estado de unidade com tudo o que
acontece em torno dele. A criança não é tão influenciada por aquilo que esse meio ambiente faz ou diz,
mas pelo que ele é. Mesmo as reações da mãe durante a gravidez podem afetar as reações e o destino da
criança e incorporar-se ao seu padrão emocional, como já sugeriu a evidência da regressão hipnótica. Co-
mo sabem todos aqueles que têm filhos, o bebê reage instantaneamente a toda alteração emocional ou
vibração da mãe e do meio ambiente, não apenas instantânea mais simultaneamente, não importa se a mãe
está ou não consciente de seu estado. Tanto a atmosfera psíquica é parte do bebê, como descreveu Spitz,
que uma privação de amor e proteção nas primeiras semanas e meses tem sérios resultados físicos
imediatos. Quando os bebês são criados com perfeita higiene e dieta cuidadosa, mas sem contato humano,
eles definham e morrem, apesar das excelentes circunstâncias.

Humaniversidade Holística 21
(b) Não-integração

A separação dessa realidade unitária inicia-se na primeira fase do desenvolvimento da vida, com o
propósito de estabelecer um centro de consciência, um ego. Já estudamos esse processo com alguns
detalhes e descrevemos o termo "não-integração", utilizado por Fordham, com referência a ele. Em suas
palavras:

Esse termo é utilizado para a divisão espontânea do Self em partes - uma necessidade manifesta, se é
que a consciência realmente vai poder surgir um dia.
Ao escolher essa palavra, tenho em mente uma diferença com desintegração, condição que está
associada, na experiência, à destruição ou divisão do ego em vários fragmentos. Ela [a desintegração]
pressupõe um ego que já está formado e, conseqüentemente, a experiência constitui um perigo para sua
integridade.
A não-integração, ao contrário, é concebida como uma propriedade espontânea do Self por trás da
formação do ego. Antropomorficamente falando, poderíamos dizer que ela surge de um desejo do Self de
tornar-se consciente, de formar um ego dividindo-se.

A partir da totalidade e da unidade aborígine, desenvolvem-se então as várias reações emocionais e


perceptuais, tendências arquetípicas, e, por último, mas nem por isso menos importante, a capacidade do
ego para a identidade, a consciência e a vontade. Importante observar mais uma vez que esse
desenvolvimento do ego é aparentemente iniciado e ocasionado pelo Self. Observa-se a primeira
indicação disso quando a criança começa a dizer "eu", aproximadamente no décimo oitavo mês, pois ao
mesmo tempo ela passará a desenhar círculos. Aqui, nos rabiscos espontâneos da criança, ocorre o
primeiro aparecimento daquilo que viemos a conhecer como uma representação simbólica do Self. Com
certa freqüência, também, quando a criança tenta afirmar-se ou defender-se do meio ambiente, ela o fará
desenhando um quadrado ou círculo? O Self manifesta-se pela primeira vez como ego dessa maneira.
A não-integração significa não apenas a formação do ego, mas também a divisão sujeito-objeto. A
presença de um ego postula uma dimensão de não-ego, o mundo dos objetos "de fora" e o mundo dos
arquétipos, emoções e anseios "de dentro". Isso significa a diferenciação inicial dos arquétipos a partir do
campo unitário e o desenvolvimento do potencial de percepção, emoção e ação. Fordham diz o seguinte:

Podemos descrever o não-integrado dizendo que é uma disposição para a experiência, uma disposição
para perceber e agir, mas ainda não há percepção ou ação. Ambas chegam juntas à consciência, sem
distinção entre sujeito ou objeto. Contudo, elas surgem de fora como se o bebê estivesse à procura do
objeto e como se estivesse tentando exprimir-se de maneiras específicas e selecionando seu objeto com o
maior cuidado. De fato, presumimos que apenas quando o objeto se ajusta com exatidão ao não-
integrado, é que pode ocorrer uma percepção, pois só então somos capazes de conceber um estado de
coisas, quando não há distinção entre sujeito e objeto no que diz respeito ao bebê.
Com vistas à amplificação, podemos considerar o que acontece se a correspondência entre o objeto e
o não-integrado não é exata. Em primeiro lugar, ela simplesmente não será percebida e nada acontecerá
mas, posteriormente, será desenvolvida uma tolerância do objeto que não consegue adaptar-se com
exatidão ao não-integrado. Daí surge uma consciência incipiente da distinção entre sujeito e objeto.

Já descrevemos esse processo como a realização inicial dos arquétipos, como a acumulação de
material perceptual, emocional e comportamental em torno do "arquétipo como tal" por associação de
correspondência."
Agora surge o início da fala-fala no sentido de palavras diferenciadoras, em contradistinção com as
palavras prévias de significação "cósmica" geral, quando "mama", por exemplo, significava tudo desde
"leite" até "vá embora", ou "venha", ou "quero dormir". A diferenciação da fala inicia-se ao mesmo tempo
em que se diz "eu" pela primeira vez e em que se fazem os primeiros desenhos de círculos e quadrados, e
é precedida pelo movimento do "não" que, em nossa cultura, é o sacudir da cabeça. Segundo Spitz, o
aparecimento do ego, o dizer "não", a escolha e a diferenciação coincidem por volta do 18º mês. A
capacidade para rejeitar e escolher entre o certo e o errado são as características intrínsecas necessárias ao
desenvolvimento do elo e essas capacidades são produzidas pela intenção do Self.
Nesse estágio, é como se o fragmento do ego ou elo incipiente, que começa pela primeira vez a
perceber-se como um foco de permanência, se visse rodeado por uma vastidão de existência da qual é
inteiramente dependente, da qual está insuficientemente separado e que aparece como algo
completamente dominador. Essa fase na evolução da consciência, tanto do indivíduo como da espécie, foi
simbolicamente representada nas imagens do bebê divino (consciência incipiente) no colo da Grande
Mãe, isto é, a Mãe-Mundo, o inconsciente aborígine, o Self que é sentido como uma força cósmica
Humaniversidade Holística 22
opressiva. Para o bebê, a mãe verdadeira realiza esse Self continente. Ela é vivenciada como uma força
opressiva, amedrontadora, cósmica, doadora de vida. Seu comportamento, emoções e força servem para
intermediar os modos como a vida e o Self são antecipados. Para exprimir esse conceito de outra maneira,
o estágio de contenção da mãe segue o estágio de completa identidade psicológica entre o ego incipiente e
a mãe que, nessa fase, é verdadeiramente a Grande Mãe, o mundo e o Self numa unidade inseparável.
Quando o ego do bebê começa a emergir, essa experiência arquetípica da Grande Mãe é projetada na
mulher que por acaso é a mãe verdadeira do bebê ou preenche o papel de mãe.

(c) A dimensão mágica

A descrição acima é, naturalmente, uma descrição simbólica. Se quiséssemos utilizar uma imagem
mais moderna, um mitologema moderno, poderíamos falar do campo energético mãe-bebê. Mas o bebê
ainda não tem essa capacidade de distinguir entre a experiência simbólica e a literal. Nem o
esquizofrênico. Para eles, os objetos e as pessoas são as próprias forças que encaramos como
simbolicamente representadas ou projetadas. Esse fato pode ser visto na ausência de diferenciação, por
parte da criança pequena, entre uma imagem e o objeto que ela representa. Uma garotinha alimentará sua
boneca com leite de verdade ou oferecerá uma maçã ao cavalo do livro de figuras. A não-integração
inicial dessa singularidade pré-simbólica unitária, daquilo que também poderia ser chamado Umwelt ou
identidade de campo, engendra um estado que denominei de fase mágica do desenvolvimento. As leis sob
as quais a consciência incipiente se engaja no seu encontro com a realidade unitária ainda abrangente não
são aquilo que podemos chamar de racional. A operação dessa dimensão mágica do inconsciente também
pode ser observada em alguns aspectos da psicologia primitiva. À medida que o desenvolvimento da
consciência avança através dos estágios racional e mitológico, essa dimensão mágica retrocederá mas
continuará a funcionar como uma dimensão do inconsciente, sempre pronta a compensar, complementar
ou perturbar o panorama consciente. A dinâmica dessa dimensão parece estranha e inexplicável à
consciência racional. O termo mágica, tal como é utilizado aqui, não é empregado para referir-se à “arte
que pretende ser ou que acreditamos ser capaz de produzir efeitos nos espectadores por meio da ajuda de
forças sobrenaturais ou do domínio das forças secretas da natureza”. Ele não descreve essa manipulação
deliberada de forças; eu o utilizo para me referir a certos fenômenos energéticos específicos - físicos e
psicológicos - que correspondem a uma dimensão de funcionamento reconhecida de uma forma ou de
outra (e chamada de mágica) em toda cultura do passado. Essa dimensão de funcionamento se faz sentir
direta e opressivamente sem diferenciação entre imagem, emoção e padrão de ação, ou sem separação
entre estes.

Qualquer parte de um acontecimento evoca o todo (pars pro toto) e qualquer parte pode substituir a
outra. As imagens “são” afetos e desencadeiam a ação. Isso constitui aquilo que estamos acostumados a
chamar sugestibilidade. Num grau extremo, caracteriza a psicologia da criança e do aborígine. Tudo isso
é uma expressão direta da energia arquetípica que pode ocorrer até mesmo depois que a diferenciação do
ego já está se processando.
Para o bebê, pode-se presumir que todo objeto e experiência é uma experiência total
caracterizada pela equivalência de imagem, afeto e ação. O bebê é rodeado pelo mundo todo-
poderoso, focalizado na mãe, e depende dele. A consciência incipiente do ego estabelece uma vigorosa
resistência a essa "alteridade" que ameaça absorvê-la e subjugá-la de fora, assim como a "alteridade"
interior a dissolve em inconsciência e sono. É necessário um enorme esforço, a primeira luta de
poder para resistir ao inconsciente, de dentro e de fora. Na situação pré-simbólica primitiva
aborígine, o esforço de poder é conseqüentemente dirigido contra a Mãe, isto é, contra força, tanto
interna como externa, que seduziria e atrairia a consciência de volta para o abismo negro, para
dentro do ventre materno. Nos rituais primitivos, admite-se que o germe do ego deve ser protegido
para não ser devorado pela mãe, pelo mundo da natureza e pelas forças do desconhecido. Esses
ritos apotropaicos são, eles próprios, arquetipicamente determinados e não racionalmente
inventados. Trata-se de produções espontâneas do inconsciente não-integrado dirigido contra seu
próprio anseio de regressão. Tais elementos rituais podem, portanto, surgir espontaneamente do
inconsciente sob a forma de compulsões estranhas, tais como o "mooning".
No mundo do bebê (entre o nascimento e aproximadamente o segundo ano de idade), assim
como no do aborígine (que nos oferece o exemplo mais próximo e observável de um sistema de
referência mágico), descobrimos que as manifestações da energia psíquica são predominantemente
instintuais, emocionais e afetivas. Assim como o mágico primitivo, através do seu delírio estático,
"força" os acontecimentos naturais conforme a sua vontade, o bebê também, graças à mútua
identidade instintual, parece coagir a mãe para satisfazer suas exigências através de gritos
Humaniversidade Holística 23
insistentes e do apelo emocional irresistível de seu desamparo. Para a mãe, as necessidades da
criança são idênticas a seus próprios anseios instintivos de amor, e a criança lhes corresponde
instantaneamente como em identidade telepática.
Nesse estado de identidade primitivo e infantil, há uma total imersão na mãe, na família, no
clã, no grupo, na tribo e na natureza. O “fabricante” ainda está unido ao "fabricado", o que faz
ao que é feito, o lutador ao oponente (a fim de exorcizar um animal, o homem toma-se ele
próprio o animal; disfarça-se como o animal ou desenha o animal, como demonstram muitas
descobertas da magia das cavernas.). Assim, não apenas a mãe mas também ó grupo continente, a
coletividade social, são dotados de numinosidade e poder sugestivo no sistema de referência da
magia. Esse fato é importante para a compreensão da autoridade irresistível dos costumes grupais,
das convicções grupais e da moralidade coletiva que persiste quando o sistema mágico de referência
é conscientemente superado pela racionalidade do ego mas continua a operar como uma dimensão
daquilo que então é designado como o inconsciente. No campo das funções inferiores continua,
então, uma sensação de identidade irracional com as atitudes, costumes, emoções e julgamentos
do grupo, uma sensibilidade extraordinária em relação às suas influências sugestivas e um medo
de enfrentar os tabus do grupo, de modo que eles carregam consigo uma ameaça mágica quando
são ignorados. Sabemos que a susceptibilidade à sugestão, um aspecto típico da dimensão mágica,
atinge seu mais alto grau no aborígine, durante a infância e quando estamos cansados, sonolentos ou
sob a influência de um grupo. Sob hipnose, pode-se sugerir uma insensibilidade à dor suficiente para
um parto ou uma cirurgia indolor; nesse estado, a sugestividade já produziu até mesmo uma alteração
nos tecidos do corpo. Uma pessoa em transe hipnótico pode apresentar queimaduras de segundo grau
a partir do contato com um lápis que o hipnotizador lhe descreve como um fósforo aceso. Em todos
esses estados, a autoconsciência individual se enfraquece no que diz respeito à energia do
inconsciente e a dimensão mágica é atingida.
Quando o funcionamento mágico predomina, como acontece na primeira fase do
desenvolvimento que estamos discutindo, a consciência é incapaz de diferenciar entre a imagem ou
característica e o próprio objeto; não há nenhuma capacidade de abstração. Esse é um modo de
funcionamento pré-simbólico, inteiramente não reflexivo e emocionalmente atenuado. Na fase
mágica, algo que para nós seria um símbolo "é" aquilo a que ele meramente alude. Os aborígines adoram
animais, pedras e outros objetos; as crianças adotam um talismã - uma boneca, um paninho ou um
animal de estimação. A imagem "é" a força arquetípica; ela põe em funcionamento comportamento
e acontecimentos, e até mesmo estados biológicos, de modo análogo à evocação e à resposta
instintual, a identidade do campo de Umwelt observável em animais.

O funcionamento mágico também se caracteriza por uma predominância marcante de FES


(fenômeno extra-sensorial) ou fenômeno telepático que conduz à participação inconsciente e à
identidade psicológica com pessoas e acontecimentos que suscitam afeto; daí a extrema sensibilidade
do bebê para a qualidade emocional do seu ambiente e sua dependência dela. As dimensões de
tempo e espaço só são relativamente válidas ou ficam como suspensas.
Um efeito importante da identidade como um todo no funcionamento mágico é a ausência de
diferenciação entre causalidade, vontade, responsabilidade e culpa. Como não se distinguem as causas
objetivas, tudo é vivenciado como se fosse subjetivamente motivado e tivesse de ser tratado por
meio do tabu e do ritual. O que quer que aconteça - o que quer que seja dito, sentido, feito ou
vivenciado - foi desejado uma "força", por "eles", mas o sujeito se sente forçado a fazer algum
sacrifício para essa força a fim de aplacá-lo; o funcionamento mágico é caracterizado por temor
intenso, culpa e fatalismo. Vemos isso operar em crianças e em mentalidades primitivas, no hábito de
culpar invariavelmente a si mesmo e aos outros por todo infortúnio sem considerar a causa natural,
impessoal. Também o vemos surgir na psicologia de massa e do bode expiatório, e na desconfiança
geral irracional em relação ao estranho ou estrangeiro. O Negro, por exemplo, carrega a projeção do
medo que o homem branco tem do lado escuro, espontâneo e instintual que há nele mesmo, o qual
deve ser exorcizado quando o negro é encontrado apenas nesse nível; essa é uma área que Laurens Van
der Post explorou em seus meticulosos livros a respeito da África.
Nesse estado de identidade com o meio ambiente envolvente, magicamente dominador, a
sobrevivência psicológica e até mesmo física do bebê dependem inteiramente dos pais (sobretudo
da mãe) que são as principais figuras arquetípicas de poder; eles são deuses para a criança pequena. Ela
depende não apenas daquilo que os pais fazem ou dizem, mas do que eles são, não importa se sabem
disso ou não (de fato, quanto menos eles sabem, mais isso acontece). A psique do bebê ainda não está
separada do inconsciente dos pais. O nascimento é meramente físico até esse ponto; uma verdadeira
separação psicológica só ocorre muito mais tarde, talvez apenas no sexto ou sétimo ano. Essa
identidade psicológica próxima é revelada mais tarde pelo fato de que as crianças pequenas muitas
Humaniversidade Holística 24
vezes sonham com os problemas dos pais. E como elas próprias ainda estão imersas em seu mundo
onírico mágico, pode-se dizer que vivem esses problemas. Isso pode ser particularmente funesto
quando a atmosfera familiar é marcada por bondade e preocupação exterior e consciente, mas
mantém subjacente uma corrente de ressentimento, hostilidade e tensão não percebidos. Essa
atmosfera de hostilidade inconsciente é veneno para o bebê. A presença de conflitos não
percebidos e de tensão geral dentro dos pais ou entre eles sempre acrescenta, se é que não
origina, sentimentos de culpa nas crianças; a experiência do conflito e a experiência da culpa são
quase idênticas; todos nós reagimos à tensão conflituosa com a culpa. Os conflitos dos pais são
vivenciados pela criança como se fossem dela própria. A atitude repressiva dos pais ou a rejeição
de um em relação ao outro é vivenciada pela criança como repressão ou rejeição de sua própria
individualidade; já vimos isso no caso da garotinha asmática que sonhou que estava sendo afastada
da ilha pelo povo das cabras.
O desenvolvimento do ego ocorre durante a fase mágica em termos do corpo, e esse
desenvolvimento oferece o primeiro sistema de referência para a realização de faculdades
arquetípicas. A experiência consciente do mundo, a relação sujeito-objeto, surge primeiro em termos
da interação entre "eu” -corpo e "eles" - corpo. As imagens que representam conceitos mais amplos
quando a experiência do adulto se torna altamente diferenciada e simbólica são formadas no sistema de
referência do corpo.
As forças que a criança sente vagamente são corpos. Corpos e objetos constelam ou servem de
intermediários para aquilo que, de outro modo, é imperscrutável. É assim que funcionam o
animismo e o totemismo primitivos. Até mesmo o adulto altamente civilizado retém a imagética do
corpo; a maior parte desse material inconsciente se exprime em termos de simbolismo corporal. O
corpo tem sido escrito na literatura psicanalítica como a fonte ou origem da experiência simbólica, mas
parece mais apropriado dizer que o corpo oferece o sistema de referência básico para a experiência
simbólica.
As sensações de auto-aceitação, consciência e culpa da criança são basicamente modeladas pela
reação que os outros corpos, que são tão importantes, apresentam em relação ao seu próprio corpo e
suas funções. Portanto, na mesma proporção em que as expressões corporais - brincadeiras com o
corpo; expressões orais, uretrais, anais e genitais - são reprimidas com demasiada rigidez ou
emocionalmente rejeitadas, pode haver uma interferência com o desenvolvimento do ego. O aspecto
contido do ego que primeiro se manifesta como experiência corporal retém uma carga de
intensidade afetiva máxima - porque não liberada; o aspecto contido também se manifesta em sua
fixação nesse nível concretista original, na masturbação compulsiva ou na preocupação anal. Essas
primitivas "áreas cercadas" reprimidas podem continuar como fontes de perturbação psíquica, com
potencial neurótico ou até mesmo psicótico.

(d) Experiência mitológica

Gradualmente a preocupação volta-se do nível do corpo para a fantasia em imagens mais gerais e
depois em conceitos, e se desenvolve uma consciência de que as imagens ou conceitos não são
necessariamente idênticos aos objetos que presumivelmente representam. Esse desenvolvimento
pode ser encarado como o início do modo mitológico de experiência, que aos poucos substitui o
modo puramente mágico. O ego em desenvolvimento emancipa-se das ameaças mágicas da unidade
como um todo, devoradora e dissolvente, por intermédio da atividade da fantasia (pensamento não
diretivo, na terminologia junguiana). Os impulsos, afetos e elementos arquetípicos que tenderiam a
dissolver o ego nascente aparecem como forças ameaçadoras - bruxas, gnomos, demônios, dragões,
monstros, feras selvagens - para serem mortos ou aplacados por figuras heróicas, sábias e
beneficentes. O estado inicial de inconsciência tende a ser representado em imagens da mãe e do
Feminino. O desenvolvimento da consciência e da racionalidade - tal como se afirma contra as
"forças continentes" interiores e exteriores até então esmagadoras - é geralmente representado como
uma figura masculina que se envolve na busca heróica. É nessa fase mitológica, aproximadamente
entre os 6-7 e 12-14 anos, que o pai assume crescente importância: o arquétipo do pai - o impulso
para a ordem, a disciplina e a afirmação independente e autoconfiante - impõe a realização através de
um guia masculino.
Assim, o simbolismo primitivo mágico do corpo é amplificado e parcialmente substituído na
fase mitológica por um simbolismo de "outros" imaginários. Os elementos arquetípicos revelam-se -
são realizados - como imagens numinosas de fantasia que contêm certas implicações típicas
emocionais e comportamentais. Por exemplo, um sentido de inadequação poderia exprimir-se em
atividade oral ou masturbatória compulsiva no nível mágico-corpóreo; no nível mitológico, poderia
Humaniversidade Holística 25
manifestar-se em fantasias, de ameaças de destruição por monstros, feras ou bruxas, ou em redenção
pela boa fada. Apenas a consciência racional (depois dos quatorze anos) seria capaz de compreender
e verbalizar a experiência em termos simbólicos, abstratos, psicológicos, ou seja, de denominar esse
sentimento como uma "sensação de inadequação" e, portanto, adquirir maior distância do afeto.

(e) Medo

Nas fases mágica e mitológica, esse sentido de inadequação baseado na desproporção entre o
pequeno ego e o poder esmagador do mundo mágico que o rodeia provoca uma reação de medo -
medo porque o ego nascente, no qual todas as sensações, emoções, e experiências são encobertas,
encontra-se sob a constante ameaça de ser dissolvido pela entidade "maternal" circundante e porque a
tentativa de utilizar o próprio poder da pessoa pode levar à retribuição. A importância prática desse
fato é que o medo é a uma experiência normal para a criança e não precisa ser combatido, exceto
quando patologicamente excessivo. Ele certamente não pode ser completamente racionalizado. Esse
medo existencial nunca nos abandonará enquanto vivermos; ele opera como um estímulo transpessoal
para o desenvolvimento da consciência, com o qual se fará oposição àquilo que é temido. Em outras
palavras, sem esse medo não haveria desenvolvimento psicológico. Naturalmente, quando o
desenvolvimento do ego sofre séria interferência, esse medo pode assumir dimensões excessivas.
Mesmo então, ainda poderá ser muito eficaz não tentar apenas racionalizá-lo de modo superficial,
mas concretizá-lo e conciliá-lo no nível mitológico, quando esse nível se torna ativado.
Por exemplo, um menino andava tendo pesadelos com uma raposa que ficava parada olhando
para ele e não ia embora. Propus a ele que tentasse estabelecer contato com aquela raposa e
descobrir o que ela estava querendo. Ele disse o seguinte: “A raposa é um tipo muito arredio.”
Ao que sugeri: “Talvez ela queira que você também seja um pouco mais esperto; veja se consegue
acompanhar a raposa e aprender com ela.” Ele achou que poderia tentar; depois disso, a raposa
ficou satisfeita. O garotinho deu um passo adiante em seu desenvolvimento psicológico; ele
aprendeu a confiar em sua própria astúcia inata, em sua capacidade de raciocínio (e o medo pôde
movimentar-se até o ponto de desenvolvimento seguinte). Ao lidar com o medo mágico, é útil
portanto fazer uso do arcabouço mitológico, no qual a mente em desenvolvimento é uma mente de
imagens. Todos os contos de fadas descrevem como o herói é ameaçado por poderes ou seres
mágicos e como se pode lidar com esses poderes. Outro aspecto do medo infantil é que ele inclui o
medo do escuro, já que é o medo de ser novamente tragado pelo inconsciente aborígine - o
consciente é a luz e o inconsciente é a escuridão. Esse medo é uma ocorrência normal nas crianças.

(f) Consciência

A crescente separação do inconsciente e do automatismo inconsciente é. sentida como se fosse


uma ruptura na ordem natural, que acarreta a opção individual - opção entre certo e errado. Optar
significa "matar", sacrificar as múltiplas possibilidades em favor daquela que é escolhida. Optar
envolve o risco de estar errado - por isso leva à culpa. Além do mais, como já observamos,
causação, culpa e responsabilidade não se encontram separadas na fase mágica; portanto, um senso
de responsabilidade individual, enquanto oposto à ansiedade geral permeada de culpa, se desenvolve na
base de sentimentos de culpa pessoais, individualizados. O medo e a culpa, por serem ocorrências
naturais na infância, não devem ser combatidos como tais, mas dirigidos para padrões mitológicos
que oferecem caminhos psicologicamente viáveis de conciliação e personalização nesse estágio pré-
racional. Também é importante que a autoridade dos pais exprima padrões de certo e errado de
maneira suficientemente permissiva ou flexível de modo a não sufocar a capacidade do ego para
aprender cometendo seus próprios erros. Quando uma pessoa sente que cometer um erro é um
acontecimento catastrófico, é levada a evitar a escolha e a decisão. Assim, o desenvolvimento de
uma personalidade individual acaba sendo sufocado. É desnecessário dizer que o extremo oposto de
um relativismo moral que fracassa em fornecer quaisquer padrões de certo e errado pode ser
igualmente desastroso por fracassar em oferecer a primeira e indispensável orientação.
A tendência arquetípica mais importante para o ego em desenvolvimento é o impulso para o
estabelecimento de um padrão interior de certo e errado, em vez dos padrões de obediência
meramente conciliatórios do nível mágico. A consciência, no inicio, se desenvolve da forma que
Freud chamou o superego. Primeiro é vivenciada através da autoridade daqueles seres exteriores
que reivindicam o conhecimento do certo e do errado, isto é, os pais. A consciência torna-se
cristalizada nos termos em que acaba sendo vivenciada durante o estágio da infância e estes serão
predominantemente valores de persona, já que é a adaptação externa aos valores e exigências dos
pais e aos padrões culturais daquilo que é considerado como comportamento adequado que
Humaniversidade Holística 26
estabelece o primeiro sentido de certo e errado (às vezes, esse padrão exterior pode assumir formas
um tanto grotescas em relação à predisposição íntima do indivíduo). No início, a consciência parece
ser idêntica à persona e ao superego; uma consciência mais individual pode ser desenvolvida
quando o sentido da identidade da pessoa se torna idêntica aos julgamentos racionais do ego quando
atingimos a meia-idade e somos capazes de questionar a validade dos padrões do superego; apenas
mais tarde na vida, nossa consciência mais verdadeira, realmente individual, pode ser encontrada ao
preço do conflito e do sofrimento por meio do confronto entre o ego e o Self.
Uma característica da primeira infância é que os sonhos muitas vezes não são, em sua natureza,
arquetípicos. Trata-se, na verdade, de sonhos que lidam com a vida total em suas dimensões
fundamentais, e geralmente são horríveis e assustadores, já que estão carregados com a
numinosidade de um estrato do qual as forças do ego lutam para se libertar. Esses pesadelos não
devem ser encarados de maneira demasiado trágica, nem precisamos ser indevidamente perturbados por
seu caráter amedrontador ocasional, pois são arquetípicos e introduzem temas que pertencem a uma
fase inteiramente diferente e simbólica. Exemplo disso é o sonho de uma criança que se viu
dentro de uma banheira repleta de sangue, o qual fluía para dentro de todos os lados. A imagética
desse sonho é encontrada no mitraísmo. Nos mistérios mitraicos, colocava-se o iniciante num
buraco, abatia-se um touro e seu sangue era derramado sobre ele. Esse era o batismo de sangue,
isto é, a iniciação para o mundo do adulto maduro que mata o touro, que ultrapassa a força
compulsiva da instintualidade e da emocionalidade. O sonho implica que essa criança será um dia
iniciada, talvez drasticamente, na necessidade ou capacidade de “matar seu touro” da compulsão
do instinto.
Quando se aproximam da adolescência, meninos e meninas tendem a seguir caminhos um pouco
diferentes, como demonstrou Neumann, pois, a partir da identidade ego-Self original, a psicologia
masculina desenvolve-se em oposição a ela, isto é, em oposição à mãe e ao Self, e, afinal, luta
diretamente contra ela (simbolismo do combate ao dragão); já a jovem encontra a si mesma ao
manter a identidade original. Em conseqüência, o ego da mulher apresenta, de modo geral, a
tendência de nunca separar-se tanto do instinto e do inconsciente como é o caso do homem. Para
a mulher, a identidade e a preocupação com o "pertencer" às pessoas e coisas é natural. O mesmo
não acontece com o homem; ele muitas vezes tem dificuldades para encontrar o mundo do
pertencer. Portanto, para a mulher, os problemas de relacionamento tendem a surgir de sua
dificuldade para aceitar a separação; para o homem, "pertencer" e depender tendem a ser os
principais obstáculos.

2. Idade Adulta

No período médio da vida, o período do estranhamento ego-Self, as coisas e as pessoas não são
mais vivenciadas como poderes, mas parecem ser apenas pessoas e coisas. O sentido do “numinoso”
tende a perder-se. O ego, com sua racionalidade e controle consciente da vontade, é dominante, e
a única fonte de poder parece ser o meu "eu" e o "eu" da outra pessoa - está delineada assim a
área de combate competitivo. A conexão com o Self aborígine parece ter-se perdido e, quase
poderíamos dizer, deve ser perdida. O adulto normal acredita ser senhor do seu próprio destino.
Como observamos no Capítulo 15, Jung tem a dizer o seguinte:
É da maior importância para o jovem, ainda inadaptado e que ainda não realizou nada, modelar seu
ego consciente tão efetivamente quanto possível, isto é, educar sua vontade... Ele deve sentir-se um homem
de vontade e poderá seguramente depreciar tudo o mais que existe nele e resolver submeter tudo isso à sua
vontade, pois sem essa ilusão ele não poderá adaptar-se socialmente.
Isso já é diferente com uma pessoa que está na segunda metade da vida e que não precisa mais educar
sua vontade consciente mas que, para entender o significado da sua vida individual, precisa vivenciar seu
próprio ser interior.

Na meia-idade, o ego tem o comando supremo; a fase adulta é governada pela preocupação do
ego com a adaptação à realidade externa, com as pessoas e as coisas, principalmente em virtude
do impulso de poder que luta para satisfazer às suas necessidades de sobrevivência e controle
competitivo, e evitar o desprazer. Essa é a época do controle monárquico do ego, controle que
repousa num sentido de permanência, independência e racionalidade, que é estruturado e que se
mantém unido através da autodisciplina. A tarefa do ego, agora, é adaptar-se ao mundo “real” externo
através do desenvolvimento e da utilização das funções superiores; esse desenvolvimento também
envolve a repressão das funções inferiores. Essa repressão é agora inevitável em vista das adaptações
ao trabalho e à sociedade que exigem a utilização das nossas funções mais desenvolvidas. A
racionalidade, a vontade consciente e a determinação agora governam supremas.
Humaniversidade Holística 27
Como a adaptação se refere primariamente ao mundo externo, o introvertido tem muitas
dificuldades com ela. O introvertido natural pode com freqüência sentir-se um fracasso nessa fase
da vida, porque todas as exigências correm na direção oposta. O extrovertido que ingressa em clubes e
organizações tira isso de letra, enquanto o introvertido não consegue ter êxito. Não há remédio para
isso, a não ser dizer-lhe que um dia levará a melhor enquanto o extrovertido encontrará
dificuldades, quando os papéis se inverterem e 'a necessidade de introversão consciente surgir, na
segunda metade da vida. Naturalmente, a vida do introvertido não é nada facilitada pelo simples
fato de que o mundo em geral ainda deprecia a atitude introvertida e valoriza muito a adaptação
extrovertida.
Na meia-idade, a única realidade psíquica parece ser a experiência subjetiva que o ego tem de si
mesmo; ainda mal conseguimos tomar conhecimento de qualquer outro mundo interior. Isso
significa que, nesse estágio, deve ocorrer maior realização e confronto da energia arquetípica através
dos problemas de relacionamento interpessoais do indivíduo. A preocupação do ego é com o mundo
exterior; o inconsciente compensa isso ao confrontá-lo com a realidade psíquica interior em termos
de personalizações ou projeções externas. A realização arquetípica apresenta-se agora em termos de
imagética concreta pessoal - isto é, em termos de simbolismo pessoal dos seres e objetos familiares.
Bill e Susan tendem a incorporar o Yang e o Yin, ou o bem e o mal, em seus aspectos
problemáticos; já não lidamos mais com salvadores ou bruxas. Agora o ego também pode vivenciar-
se como uma pessoa psicológica concreta; apenas quando a sombra, aquilo que é mau, se realiza
no companheiro e não numa imagem mitológica remota é que eu posso tomar-me inteiramente
"eu" e medir minha vontade e meus esforços diante de uma realidade concreta. Enquanto a sombra
representava um vago terror na noite ou um duende, não houve possibilidade de encontrar o arquétipo
central na personalidade da pessoa. O passo para a conscientização arquetípica através das relações
interpessoais precisa ser dado, evitando a imprecisão da participation mystique, e deve ser
conscientemente vivenciado no simples valor nominal antes de ser reconhecido como uma expressão
externa de um fato interior.
Operamos agora em termos de nós mesmos versus o mundo que está ali, fora de nós, pois
descobrimos que não somos apenas os nossos corpos; contudo, ainda não descobrimos que também
não somos apenas os nossos egos. Portanto, todo o "não-eu" que não está aqui está ali, lá fora. O
único lugar em que podemos encontrar a sombra, o animus ou a anima - a parte ou aquelas partes de nós
mesmos das quais não estamos conscientes - é através da outra pessoa. As influências corretivas
em nossas vidas ocorrem, portanto, por meio da projeção, do encontro com nossos competidores,
com nossos inimigos e com os seres que amamos. No que nos diz respeito, eles todos são
obviamente aquilo que vemos neles (e como poderia ser diferente, já que o vemos com tanta
clareza?). Mas essa ilusão ainda é essencial, pois através dela chegamos a conhecer a nós mesmos
como “eu” e a testar nossa força contra o "não-eu" que encontramos no mundo exterior.
Por outro lado, o próprio fato de a personalidade estar exclusivamente revestida com a
consciência racional e com o ego significa que também há uma dissociação da personalidade cada
vez mais completa, pois tudo o que é inaceitável para esse ego é afastado sob a forma da sombra
oponente e projetada. A função de compensação do inconsciente só se inicia de fato nesse estágio
de completa dissociação ou de não-integração psíquica. Para a criança, o inconsciente é uma
extensão vagamente delimitada do seu consciente nebuloso, mas, na segunda fase, começa a estar
em desacordo com o funcionamento consciente. A personalidade se desenvolve quando enfrenta a
oposição e tem de aprender a transformá-la em compensação e cooperação, no estágio exterior.
Na última parte da vida, isso tem de ser alcançado em relação ao "tu" interior e ao “tu” ou Outro
infinito transpessoal, o Self.
À medida que a sombra se diferencia, ela passa a funcionar como uma personalidade separada que
consiste nas características pessoais inaceitáveis para os ideais do ego. De modo semelhante, o
animus ou anima (as tendências espirituais, separadoras e afirmativas ainda não assimiladas e os
ímpetos instintivos, emocionais e conectivos) fazem sentir suas influências nas projeções. As atrações e
aversões apresentam-se então para nós nos primeiros problemas externos com o parceiro. Pela
primeira vez, encontramos o desafio da necessidade de relacionamento, no qual um "eu"
desenvolvido, não mais idêntico ao "não-eu", confronta conscientemente um "não-eu" e é
confrontado pela necessidade de conviver bem com ele. Desnecessário dizer que, nessa fase inicial de
atração e repulsão em virtude da projeção, esse relacionamento real ainda está muito fora de alcance.
Nessa fase da vida, os relacionamentos são primeiro encarados em termos de seus elementos
extrovertidos - fazemos amizades, nos apaixonamos, vivenciamos a incompatibilidade, e tudo isso é
geralmente atribuído a outra pessoa.
O confronto com o mundo exterior - a necessidade de nos estabelecermos com êxito em relação à
sociedade, ao trabalho, à família e aos relacionamentos interpessoais - é agora a Vida. Mas o
Humaniversidade Holística 28
verdadeiro relacionamento requer uma consciência da sombra, do animus ou anima, para que eles não
distorçam nossa visão do "outro" através da projeção deles; por isso, a possibilidade de
relacionamento pertence essencialmente à segunda metade da vida.
A interpretação e o trabalho terapêutico, quando ocorrem durante essa fase, verificam-se primeiro
em termos de interpretação e direção no nível do objeto, através da descoberta de adaptações
defeituosas à realidade externa. Devemos nos preocupar particularmente com os efeitos na adaptação
externa da separação insuficiente do mundo dos pais e dos complexos disruptivos que foram
condicionados através das influências dos pais. Essa é, portanto, a fase em que se toma viável a
habitual interpretação psicanalítica redutiva - que interpreta os problemas da personalidade em termos
das dificuldades infantis. Nesse nível de experiência, é útil dizer o seguinte: eu reajo desse ou daquele
modo porque isso e aquilo aconteceram entre mim, minha mãe e meu pai, etc. O adulto tem de
entender como se tomou aquilo que é em termos de interação com as outras pessoas (podemos
acrescentar que os elementos infantis aqui encontrados também podem ser descritos em termos
diretos tais como "medos de castração" porque, no nível infantil, não há diferença entre castração
simbólica e real).
Quando ocorrem sentimentos de culpa no nível adulto, devem ser convertidos em
responsabilidade racional, promovendo-se a conscientização de que uma lei de causa e efeito está
operando. Quando alguém sente que está errado ou que algo está errado, então deve ter algo a ver com
isso e é pessoalmente responsável por tomar uma atitude e controlar-se - e até mesmo por mudar a si
próprio. A pessoa tem de aprender o que fazer e como fazê-lo, diferentemente da criança ou do
aborígine para os quais tudo é desejado por poderes que eles não podem controlar e dos quais
sentem que são vítimas.

O perigo dessa fase é a assimilação do ego pelo Self; uma separação insuficiente, na qual o ego é
fascinado pelo inconsciente coletivo, sucumbe a sonhos em vigília, vive na fantasia e confunde
fantasia com realidade; ou então as aspirações da pessoa são tão grandes e inflexíveis que, na
verdadeira realidade, nada ou muito pouco pode ser realizado. Isso porque a conscientização do aqui
e agora requer uma renúncia à infinidade de possibilidades da Grande Visão intuitiva em favor dos seus
poucos e finitos aspectos limitados, os quais podem concretizar-se através da concentração e do trabalho.
Esse problema apresentou-se para um jovem paciente no seguinte sonho: “Eu queria tomar um
ônibus, mas não tinha dinheiro para pagar a tarifa de quinze centavos porque não queria trocar
uma nota de cinco dólares. Logo, fui posto para fora do ônibus.” Se o ego falha ao fornecer
energias para as tarefas aparentemente pequenas e limitadas que se apresentam porque só quer lidar
com grandes idéias, então ele não pode se mover, perde o ônibus, e a personalidade não está pronta
para a próxima fase, a da reintegração ego-Self.

3. Velhice

As próprias observações de Jung esclarecem melhor nossa consideração sobre a fase final da vida.

As estatísticas mostram um aumento na freqüência de depressão mental nos homens de


aproximadamente quarenta anos. Nas mulheres, as dificuldades neuróticas em geral começam um
pouco mais cedo. Vemos que, nessa fase da vida - entre trinta e cinco e quarenta anos - está em
preparação uma importante alteração na psique humana. Inicialmente, não se trata de uma alteração
consciente e impressionante; é mais uma questão de sinais indiretos de uma mudança que parece surgir
no inconsciente...
Os freqüentíssimos distúrbios neuróticos da idade adulta têm todos uma coisa em comum; eles
querem levar a psicologia da fase jovem para além do limiar da assim chamada idade do
discernimento. . .
Assim como antes o neurótico não podia escapar da infância, agora ele não pode romper com sua
juventude. Ele recua diante dos pensamentos tristes relativos à idade que avança e, ao sentir que as
perspectivas que se lhe apresentam são insuportáveis, esforça-se sempre para olhar para trás. Do
mesmo modo que a pessoa infantil recua diante do desconhecido no mundo e na existência humana,
assim também o homem maduro recua diante da segunda metade da vida. É como se tarefas
desconhecidas e perigosas esperassem por ele ou como se fosse ameaçado por sacrifícios e perdas
que não quer aceitar. . .
As pessoas de mais idade deveriam saber que suas vidas não estão ascendendo e se expandindo, mas
que um inexorável processo interior força a contração da vida. Para um jovem, é quase um pecado,
ou pelo menos um perigo, preocupar-se em demasia consigo mesmo; mas, para a pessoa que está
envelhecendo, é um dever e uma necessidade consagrar séria atenção a si mesma...
Humaniversidade Holística 29
Um ser humano com certeza não chegaria aos setenta ou oitenta anos de idade se essa
longevidade não tivesse nenhum significado para a espécie. A parte vespertina da vida humana
também deve ter sua própria importância e não pode ser apenas um suplemento desprezível para a
manhã da vida... Quem quer que carregue para a tarde a lei da manhã... tem de pagar por isso com o
dano da própria alma, tão certamente como o jovem em crescimento que tenta levar seu egoísmo
infantil para a vida adulta tem de pagar por seu erro com o fracasso social...
Olhar para trás é particularmente fatal para essas pessoas. Para elas, uma expectativa e um objetivo no
futuro são absolutamente necessários. É por isso que todas as grandes religiões mantêm a promessa de
uma vida no além. .. que torna possível ao homem mortal viver a segunda metade da vida com tanto
propósito e objetivo como a primeira.

Agora as repressões da primeira metade da vida que serviam ao desenvolvimento do ego já não
podem mais ser mantidas. Agora será apresentada a conta daquilo que se evitou nos anos anteriores.
Tudo o que foi deixado para trás tinha mesmo de ser deixado para trás porque não era adequado à
adaptação externa, ao sucesso e à utilização prática, exigências essas que agora devem ser ouvidas
e compreendidas. As questões se apresentam: quem sou eu? Para que estou aqui? Qual é o
significado da minha existência? Em que direção estou indo? Qual é a minha própria história - isto é,
qual é o significado ou mito atrás daquilo que aparece como o conflito ou (muitas vezes) o aparente
caos da minha existência?

As exigências do inconsciente não forçam mais a adaptação externa - a menos que, naturalmente,
as necessidades da fase precedente não tenham sido atendidas de forma adequada. Se nos atrasamos
durante a jornada ainda teremos de compensar as tarefas não efetuadas. Mas quando o
desenvolvimento do ego e a adaptação externa forem adequados, as necessidades de
desenvolvimento mudarão nessa altura. Sentiremos a exigência de adaptação ao mundo de dentro
relativamente desconsiderado, o mundo do Urgrund psíquico, o terreno aborígine do ser que "não é
deste mundo", que não é idêntico ao mundo externo "real" e às suas necessidades. A psique
objetiva, o transpessoal, o infinito, tal como se manifesta no aqui e agora como um anseio de
reconhecimento individual em termos do mito do ser da pessoa, deve ser agora encarada
conscientemente. A exigência de adaptação dirige-se para o Self como uma realidade transpessoal
simbólica e um mistério. Isso significa que a abordagem simbólica da existência - a abordagem na qual os
fenômenos da vida apontam para além de si mesmos em direção à experiência do inefável - deseja ser
aceita.
Não se pode mais lidar com a sombra, a anima e o animus unicamente através das suas
projeções nas outras pessoas. Eles devem ser confrontados. interiormente. O Self exige ser
confrontado com a lei de "inteireza" da vida individual da pessoa; a moralidade coletiva já não basta.
Tomamo-nos especialmente conscientes dos conflitos intrínsecos da existência: conflitos de
tendências, deveres, amores, responsabilidades e compromissos, de exigências externas versos
necessidades interiores. A existência parece confrontar-nos sob a forma de opostos aparentemente
irreconciliáveis que nos crucificam; a divisão interior abre-se amplamente diante de nós. Esse estado
pode conduzir à realização daqueles opostos que não devem ser resolvidos por esforços do ego
racionais ou determinados pela vontade, que devem ser suportados e finalmente reconhecidos em seu
significado simbólico como expressões do próprio jogo da vida.
Os impulsos e anseios que antigamente tinham de ser reprimidos em favor da unificação da
personalidade sob o domínio do ego, as tendências ou características que eram inúteis ou até mesmo
constituíam um estorvo à adaptação externa, pedem agora para ser realizados em nome de uma
totalidade integral do ser da pessoa como um todo. O ego encontra-se delimitado pelo Self.
Antigamente, a personalidade era comprometida por afirmação insuficiente do ego; agora o perigo
psicológico vem da tentativa do ego de manter sua atitude ditatorial e de auto-suficiência. Mas
paradoxalmente o ego não pode e não deve sequer tentar renunciar ao controle. Em vez disso, tem de
vivenciar conscientemente suas limitações e sua relativa falta de poder diante da realidade da psique
objetiva - o mistério do "tu" transpessoal. Como diz a lenda judaica:

Quando chega o momento de sair do ventre para o mundo exterior, o anjo dirige-se à alma:
"Chegou a hora de saíres para o mundo exterior." A alma objeta:
"Por que queres fazer-me entrar no mundo exterior?" O anjo replica: "Saiba que, assim como
foste formada contra a tua vontade, agora também nascerás contra a tua vontade, e contra a tua
vontade morrerás, e contra a tua vontade prestarás conta de ti mesma diante do Rei dos Reis, o
Ente Sagrado, seja Ele louvado." Mas a alma reluta em deixar seu lugar. Então o anjo dá um piparote de
encorajamento no nariz do bebê, faz extinguir a luz em sua cabeça e carrega-o para o mundo contra a sua
Humaniversidade Holística 30
vontade. Imediatamente a criança se esquece de tudo aquilo que sua alma viu e aprendeu, e entra no mundo
chorando, pois perdeu um lugar de proteção e segurança e sossego.
Quando é chegada a hora de o homem deixar este mundo, o mesmo anjo surge e lhe diz: "Tu me
reconheces?" E o homem retruca: "Sim; mas por que vieste até mim hoje e não vieste em nenhum outro dia?" O
anjo responde: "Para levar-te embora do mundo, pois a hora de tua partida é chegada." Então o homem põe-
se a chorar e sua voz penetra todos os cantos do mundo, mas nenhuma criatura pode ouvir sua voz, a não ser
o galo. O homem argumenta com o anjo: "De dois mundos levaste-me embora e para este mundo me
trouxeste." Mas o anjo o faz lembrar: "Não te disse que foste feito contra a tua vontade, e que nascerias contra a
tua vontade, e que contra a tua vontade morrerias? E é contra a tua vontade que terás de prestar contas de ti
mesmo diante do Ente Sagrado, louvado sela Ele.”

O conflito aberto entre o ego e o não-ego e a experiência das limitações do ego prepara a
consciência para sua última limitação: a morte física. Aproximadamente na metade da vida costumam
surgir os primeiros sonhos com a morte, numa forma um tanto mascarada e velada, via de regra,
simplesmente como um lembrete de que agora ela tem de ser levada em conta. É como a jusante
para um barco que subiu, atingiu a altura máxima e agora está começando a descer. Não é possível
manter a altura; o progresso da vida agora está declinando, mas continua tão dirigido para um
objetivo como foi na subida. O Self, que criou o ego e depois se retirou, ressurge agora para ser
encarado e engajado no diálogo. Vivencio agora a mim mesmo como um "não-eu", antagonizado por
entidades psíquicas pelas quais não posso responder, que tem desejos, intenções e significados
muito diferentes daquilo que eu desejo e pretendo.
Se o ego não pode reorientar-se conscientemente para essa “mudança de vida”, que ocorre para
ambos os sexos, e não se torna consciente de seus limites nesta fase, isso tende a resultar em
psicopatologia. Todos nós conhecemos exemplos de depressões "inexplicáveis" em pessoas bem-
sucedidas; parece impossível para todos que o executivo no auge do sucesso se torne um alcoólatra
ou que decida pular da janela do vigésimo andar no dia do jantar em sua homenagem.
A função compensatória do inconsciente e do Self produz agora cada vez mais símbolos e
imagens de uma realidade transcendental, unitária. A força motriz da existência não é mais investida em
nós mesmos ou em outras pessoas, mas em algo que está além de nós ou por trás do mundo dos
objetos. Agora é a hora da conscientização de que “tudo o que é transitório é apenas um símbolo”.
A liberdade e a iniciativa criativa tornam-se possíveis através da experimentação consciente com as
possibilidades de compreender nossas naturezas até o momento inacessíveis, que com freqüência se
revelam diferentes daquilo que esperamos - ou mesmo receamos.
Foi a respeito dessa fase que Jung originalmente formulou seu conceito do processo de individuação -
quando nos tornamos nós mesmos e cumprimos nosso papel à medida que nos movemos de uma
origem desconhecida e incognoscível do ser para a existência separada através da ilusão da
permanência do ego e da supremacia da vontade do ego e depois nos voltamos à fonte aborígine,
carregando conosco os frutos da consciência que conseguimos enquanto percorríamos a trajetória da
curva. Toma-se particularmente importante durante a descida olhar para nossos problemas e nossas
delimitações e dificuldades em termos mais simbólicos que causalistas e redutores; não mais dizer
que somos dessa ou daquela maneira porque mamãe e papai fizeram isto ou aquilo para nós, mas
perguntar: "Que proveito posso tirar disso? O que significa, em termos de minha inteireza
potencial, que eu tivesse de me tornar assim a fim de desenvolver o como e o aonde? Qual é o
significado dos meus problemas e o que tenho de realizar nesta vida?" A liberdade e a iniciativa criativa
devem ser encontradas na utilização das capacidades do ego consciente para trazer à consciência as
intenções da sombra, do animus, da anima e do Self dentro dos limites daquilo que é humanamente
possível. Desse modo, fazemos um jogo de improvisação experimental e o jogo que jogamos é a
vida.
Lembremo-nos do sonho da jovem que descrevemos no Capítulo 6. Seu padrão de personalidade
foi deformado pela constante invasão disruptiva de ódio e ressentimento que reiteradamente a
levavam a assumir atitudes e situações que pareciam estar solicitando punição, às quais ela então
reagia com martírio paranóide e com mais ressentimento. Sua análise revelou tanto o
condicionamento infantil como o efeito deste em suas reações psicológicas. Mas o que deveria ela
fazer com esses insights, apenas? O sonho dá uma indicação: "Eu estava sentada numa sala de aula. O
professor apresentava uma charada numa língua estrangeira, cuja resposta era: É a crucificação porque
a cruz é a árvore da vida. " Esta foi a resposta que o inconsciente forneceu à charada do significado
vital do seu dano durante sua infância: a destrutividade deveria ser vivenciada como se fosse inflingida
sobre ela de modo que ela pudesse crescer ao sofrê-1a no confronto consciente. O mito da sua vida
lhe foi revelado como o de favorecer a vida ao sofrer conscientemente o mal - não apenas o da
outra pessoa mas principalmente o seu próprio - em vez de representá-lo. Desse modo, o mistério
Humaniversidade Holística 31
do Self fundamental deveria ser encontrado por ela - talvez um martírio mais profundo e mais
verdadeiro no sentido literal, original do termo, que significa "testemunha" do mistério.
Outro exemplo de apresentação simbólica do mistério da existência da pessoa é o de um homem
que começou a fazer análise tarde na vida. Como resultado da sua educação estritamente fundamentalista,
ele conhecia todas as regras de certo e errado, mas seus sentimentos estavam sufocados: sua vida,
paralisada (trata-se do mesmo homem que teve o sonho de um navio que navegava contra o vento, mas
que estava completamente parado)." Ele se viu defrontado com a necessidade de encontrar
significado nessa estagnação. No decorrer da análise, aprendeu a compreender a natureza do seu
problema; percebeu que era incapaz de estabelecer contato com seus sentimentos, mas não
conseguia ir além dessa conscientização. Então teve os seguintes sonhos, com apenas uma semana
de diferença:
“Eu estava numa carruagem, uma carruagem fora de moda, do século XIX. Ia comigo uma mulher
muito atraente, toda vestida de preto, com uma gola alta e dura, e uma expressão muito séria num
rosto inteiramente pálido. Ela estava em silêncio e eu me senti profundamente atraído por ela; tive
a sensação de que ela guardava consigo os significados preciosos da minha vida. A carruagem co-
meçou a mover-se, e enquanto a mulher aparentemente segurava as rédeas nas mãos, gradualmente
começou a deixar o solo e subir no ar.”

“Eu estava na cama com meu irmão, em posição invertida. Um cachorrinho tentou subir na cama,
mas meu irmão jogou-o longe. Então ouvi, vinda de muito longe, a voz da minha avó a chamar-me:
Faltam cinco minutos para as quatro!”
A esse irmão, ele associou uma perspectiva de vida rígida, tradicional, inflexível e condicionada
pelo orgulho; ao cachorrinho, a vida instintiva e emocional. A avó já estava morta há muito tempo.
Quatro horas foi a hora em que ele teve um ataque do coração no dia anterior (ele tinha vivido
com uma doença crônica do coração nos últimos vinte anos). Quatro horas também era, para ele,
o momento do cafezinho quando, como dizia, a gente deixa de lado o que está fazendo, sai para
comer ou beber alguma coisa e volta ao trabalho revigorado.
No primeiro sonho, esse homem está na carruagem com um aspecto de sua anima que parece
pertencer a outro mundo, a um passado remoto. Algo que precede sua vida atual leva-o para longe
da Terra, em direção ao céu, isto é, em direção à morte. Ela parece guardar a realização pela qual
ele tanto anseia, enquanto a carruagem deixa o solo. A avó no segundo sonho é a mãe ancestral,
o "solo básico", a "origem" que o avisa que faltam cinco minutos para o intervalo, a interrupção
temporária do trabalho, que deverá chegar sob a forma de um ataque do coração. Ele morreu no
mesmo dia em que teve esse sonho. Contou-me o sonho de manhã e, naquela tarde, entrou em
colapso e morreu instantaneamente de ataque cardíaco.
Esses sonhos contêm uma mensagem impressionante. A morte é apresentada como um intervalo para
o cafezinho, uma interrupção transitória do trabalho diário que visa ao descanso. O sonho diz o
seguinte: você se confronta com seu irmão; você está preso ao seu problema de sombra, que o
torna incapaz de aceitar o novo impulso, o cachorrinho que quer pular para dentro. Não se preocupe. É
hora de fazer um intervalo, uma pausa, antes de voltar ao trabalho. A estruturação da sua alma ainda
está sintonizada com um período passado e não pode adaptar-se a novas exigências; por isso ela leva
para longe da Terra. A morte surge aqui não como uma ameaça, mas como uma realização, uma
próxima fase temporária, em vista das limitações inerentes à estruturação consciente desse homem
dentro da sua vida.
Jung ressalta a importância de tal atitude em relação à morte em seu ensaio "The Soul and Death"
["A alma e a morte"].

Muitos jovens têm, no fundo, um medo apavorado da vida (embora, ao mesmo tempo, a desejem
intensamente), e um número ainda maior de idosos tem o mesmo medo da morte. De fato, sei que as
pessoas que mais temiam a vida quando jovens acabaram sofrendo da mesma maneira por medo da morte.
Quando elas são jovens, diríamos que têm resistências infantis em relação às exigências normais da vida;
deveríamos realmente dizer o mesmo quando são velhas, pois estão igualmente amedrontadas pelas
exigências normais da' vida. Estamos tão convencidos de que a morte é simplesmente o fim de um
processo, que em geral não nos ocorre concebê-la como um objetivo e uma realização como
concebemos sem hesitação os objetivos e propósitos da vida jovem em sua ascensão.
... A vida é teleologia par excellence; é a luta intrínseca por um objetivo, e o organismo vivo é um
sistema de objetivos dirigidos que procuram realizar-se. O fim de todo processo é o seu objetivo. O
fluxo de energia é como um corredor que luta com o maior esforço e o máximo dispêndio de energia
para alcançar seu objetivo. A juventude que almeja o mundo e a vida, para a realização de grandes
esperanças e objetivos distantes, e o anseio teleológico óbvio da vida que imediatamente se transformará
Humaniversidade Holística 32
em temor da vida, em resistências neuróticas, depressões e fobias, se em algum ponto permanecer
agarrado ao passado, ou se evitar os riscos sem os quais o objetivo despercebido não pode ser
atingido. Com a chegada à maturidade, no zênite da existência biológica, o impulso da vida para um
objetivo não se detém absolutamente. Com a mesma intensidade e irresistibilidade com que abriu caminho
para a subida antes da meia-idade, a vida agora empreende a descida; isso porque o objetivo já não reside
mais no ápice, mas no vale onde a ascensão se iniciou. A curva da vida é como a parábola de um
projétil que, ao ser perturbado em seu estado inicial de inércia, sobe e depois volta a um estado de
repouso.
A curva psicológica da vida, no entanto, recusa-se a entrar em conformidade com essa lei da natureza.
Às vezes, a falta de harmonia inicia-se logo na ascensão. O projétil ascende biologicamente, mas
psicologicamente se retarda. Perambulamos atrás dos anos, acariciando nossa infância como se não
pudéssemos nos separar dela. Fazemos parar os ponteiros do relógio e imaginamos que o tempo ficará
parado. Quando, depois de um certo atraso, alcançamos finalmente o topo, mais uma vez nos fixamos
psicologicamente para descansar e, embora possamos nos ver escorregar do outro lado, agarramo-nos
(mesmo que apenas com olhares saudosos ao passado) ao cume que uma vez foi alcançado. Assim
como, anteriormente, o medo era um estorvo para a vida, agora ele se interpõe no caminho da morte.
Podemos até mesmo admitir que o medo da vida reteve-nos na subida da ladeira, mas é exatamente
devido a esse atraso que mais reivindicamos o direito de nos agarrar firmemente ao cume que agora
atingimos. Embora possa ser óbvio que, apesar de todas as nossas resistências (agora tão
profundamente deploradas), a vida se reafirmou, não prestamos nenhuma atenção e continuamos tentando
fazê-la parar. Nossa psicologia perde, então, sua base natural. A consciência fica lá no alto, enquanto a
curva da parábola desce e afunda com velocidade cada vez maior.

A vida natural é o solo nutriente da alma. Quem fracassar ao acompanhar a vida permanecerá
suspenso, tenso e rígido no ar. É por isso que tantas pessoas ficam enfadonhas na velhice; elas olham
para trás e se agarram ao passado com um medo secreto da morte em seus corações. Retiram-se do
processo da vida, pelo menos psicologicamente, e em conseqüência permanecem fixas como pilares
nostálgicos de sal, com lembranças vívidas da juventude mas nenhuma relação viva com o presente. Da
metade da vida em diante, só permanece fundamentalmente vivo aquele que está pronto a morrer com a
vida. Isso porque, na hora secreta do meio-dia da vida, a parábola é invertida e é a morte que nasce. A
segunda metade da vida não significa ascensão, desdobramento, crescimento, exuberância, e sim morte,
já que o fim é seu objetivo. A negação da realização da vida e sinônimo de recusa em aceitar seu
fim.Ambas significam não querer viver, e não querer viver é idêntico a não querer morrer. O crescimento e
o definhamento perfazem a mesma curva.

É vital encararmos o fato de que devemos viver nossas vidas à luz - e à sombra - da consciência
de que, por um lado, a permanência é uma ilusão mas que por outro, no que diz respeito à psique, há
uma continuidade de desenvolvimento e existência psíquica. Não viveremos plenamente a
não ser que possamos viver como se cada momento a ser vivido fosse o último, e ao mesmo
tempo como se o período da nossa existência fosse infinito; como se o tempo à nossa
disposição fosse limitado e ilimitado, insubstituível e descartável.

A questão decisiva para o homem é a seguinte: estará ele ou não relacionado a algo infinito? Essa é a
questão indicativa da sua vida, apenas se soubermos que aquilo que verdadeiramente conta é o
infinito, poderemos evitar fixar nosso interesse em futilidades e em todos os tipos de objetivos que
não são verdadeiramente importantes. Por isso, exigimos que o mundo nos ofereça o reconhecimento de
qualidades que encaramos como posses pessoais: nosso talento ou nossa beleza. Quanto mais um homem
coloca ênfase em haveres falsos e quanto menos sensibilidade tem em relação ao que é essencial,
menos satisfatória é sua vida. Ele se sente limitado porque tem objetivos limitados, e o resultado é
inveja e ciúme. Se compreendemos e sentimos que aqui nesta vida já temos uma ligação com o
infinito, então os desejos e atitudes se alteram. Na análise final, só valemos alguma coisa devido ao
essencial que incorporamos e, se não o incorporamos, a vida é desperdiçada. Também em nossos
relacionamentos com as outras pessoas, a questão crucial é saber se um elemento de infinidade está
expresso no relacionamento.
O sentimento do infinito, no entanto, só pode ser atingido se estivermos ligados ao extremo. A
maior limitação do homem é o "self '; ela se manifesta na experiência: "Mas eu sou apenas isso!"
Somente a consciência do nosso estreito confinamento no Self forma o elo com a ilimitabilidade do
inconsciente. Com essa consciência, vivenciamos a nós mesmos simultaneamente como limitados e
eternos, como uma coisa e outra ao mesmo tempo. Quando sabemos que somos únicos em nossa

Humaniversidade Holística 33
combinação pessoal - isto é, basicamente limitados - possuímos também a capacidade de nos tornar
conscientes do infinito. Mas não antes disso!
A vida sempre me pareceu como uma planta que vive do seu rizoma. Sua verdadeira vida é invisível, está
oculta no rizoma. A parte que aparece acima do solo dura apenas um único verão. Depois ela definha -
aparição efêmera. Quando pensamos no crescimento e na decadência sem fim da vida e das civilizações,
não podemos escapar à impressão de absoluta nulidade. Contudo, nunca perdi a sensação de algo que
vive e resiste por debaixo do eterno fluxo. Aquilo que vemos é a flor que passa. 0 rizoma permanece.

5º - O Século de Jung / Séc. XXI


Falecido aos oitenta e cinco anos em 1961, Carl Gustav Jung deixou uma vasta obra oficial publicada em
vinte volumes em tradução para o português pela Editora Vozes. Seus seminários, dentre os quais se destacam
aqueles sobre sonhos infantis, visões, Kundalini e Zarathoustra, porém, equivalem ao dobro das obras
completas. Acabam de ser editados os seminários sobre o Zarathoustra, em que Jung realiza um profundo
estudo psicológico sobre a personalidade de Nietsche. Disto tudo darei aqui hoje apenas uma noção.
Jung hesitou muito antes de decidir institucionalizar a sua obra. Somente em 1948, foi fundado o
Instituto C.G.Jung de Zurique para formar analistas. Hoje, os institutos de Psicologia Analítica
formam analistas em 24 países. Estes analistas são filiados á Sociedade Internacional de Psicologia
Analítica que conta com mais de mil membros. No Brasil, a Sociedade Brasileira de Psicologia
Analítica foi fundada em 1977 e congrega hoje 32 membros analistas e 37 analistas em formação.
O coração da teoria de Jung é o conceito de Arquétipo, em torno do qual ele descreveu a pujança
criativa do inconsciente coletivo. Ao descrever o arquétipo como a matriz do imaginário criadora das
imagens que transformam a energia psíquica e propiciam o desenvolvimento da consciência individual e
coletiva, Jung arrancou a psique de três perigosas camisas de força. Uma, é a sensualidade com a qual
Freud identificara a libido. Outra é a patologia da qual nasceu a psicologia moderna, o que fez com que
até hoje um grande número de analistas dê muito mais importância às defesas do que à criatividade da
psique. Finalmente, a infância. De fato, o papel da causalidade no pensamento cientifico é tão central e as
descobertas da importância da infância para a formação normal e patológica do Ego foram tão
importantes que a psicologia passou a empacotar no varejo e despachar no atacado para o jardim da
infância, como se depois da puberdade, a psique nada mais fosse que uma repetição.
Através da teoria dos arquétipos, Jung abriu a psicologia para o estudo simbólico mas não redutivo da
antropologia, da sociologia, da religião, da história, da pedagogia e da arte. Com esse método, percebeu na
Alquimia a raiz comum da Psicologia e da Fisico-Química. Na própria psicologia, a consideração do
arquétipo como origem instintiva da criatividade inconsciente permitiu situar o fenômeno patológico
secundariamente ao processo criativo normal e reconhecer a importância da intuição, da vidência, da
mediunidade e dos oráculos cujo estudo havia sido marginalizado preconceituosamente pela ciência
oficial. Por isto tudo, talvez, ouve-se já em mais de um setor cultural, que provavelmente a teoria
arquetípica dos processos criativos empolgará o próximo século com o mesmo fascínio que a teoria do
inconsciente reprimido exerceu sobre este século.
A perspectiva arquetípica traz à interpretação dos símbolos uma característica essencialmente criativa
dentro da totalidade dos processos conscientes e inconscientes que Jung denominou Self (infelizmente
traduzido nas obras completas em português por "si-mesmo"). Seja na patologia ou na obra criativa, o
símbolo expressa sempre a totalidade do Self, daquele aqui e agora. Assim, descobrir significados de
símbolos é muito mais que interpretá-los de acordo com uma posição teórica preestabelecida. É necessário
se acompanhar com sensibilidade a energia do símbolo para se perceber sua expressividade em função do
Self, naquele determinado aqui-e-agora. Não só na vivência criativa, mas, também, no sintoma neurótico e
até mesmo no psicótico Jung postula a existência de um significado que envolve o todo da personalidade.
De pé ou rastros, a psique para Jung se expressa sempre como um todo que busca sua auto-realização
existencial.
Conta-se que, já idoso, Jung foi ao instituto assistir uma palestra de um antropólogo sobre xamanismo
entre os esquimós. Dentre os casos relatados, foi descrito o de uma mulher ameaçada de morte por intensa
depressão. O inverno fora longe demais e desesperada de fome ela comera seus dois filhos. Passando o
inverno ela foi encontrada em depressão profunda, recusando-se a sair da cama e alimentar-se, o que
motivou a vinda do xamã. Inteirado do que ocorrera, ele iniciou o ritual mágico de tratamento com cantos,
fumo e ervas durante o qual entrou em transe e subitamente agarrou a paciente e sacudindo-a, berrou-lhe:
"-Por que você fez isso? Por que?". Intensamente emocionada e desesperada ela lhe reponde: "Para não
morrer! Eu ia morrer! Eu ia morrer!". No mesmo tom, o xamã voltou a berrar-lhe: "E então por que é que

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você está agora morrendo ai nessa cama?". Nesse momento da conferência, Jung deu um pulo na cadeira e
interrompendo o orador exclamou: "Isso é psicoterapia!".
Assim, a teoria dos arquétipos requer do analista um engajamento profissional que envolve a totalidade
da sua personalidade diante da totalidade da personalidade do paciente.
Baseado na atividade e permanente dos arquétipos formando os símbolos da consciência, Jung não
admitia que um analista se escondesse de si mesmo atrás de uma técnica ou de uma teoria. Claro que, para
o paciente, se mostra aquilo que ele está em condições de ver, mas para o analista, a busca do ser como um
todo, do "Anthropos" ou do Self é uma tarefa de cada momento. Desta forma, o analista junguiano,por
definição, deve trabalhar seus sonhos, fantasias e outros símbolos do seu Self em sua vida particular, mais
ainda que com seus pacientes. Assim, os sonhos, como manifestação dos arquétipos que são, expressam
espontaneamente e de forma simbólica a comunicação do Self com a consciência do sonhador. Como o
vento, a chuva e as marés mostram o que se passa com a natureza, os sonhos, sem censura e sem disfarce,
expressam numa linguagem simbólica o que ocorre com a psique. Paralelamente ao método da associação
livre desenvolvido por Freud, Jung descreveu o método da amplificação para a compreensão dos símbolos.
Buscam-se paralelos dos símbolos nas vivências de outras pessoas, na arte, na mitologia, na história e até
mesmo no comportamento dos animais, para se tentar apreender o possível significado de um símbolo. Daí
a importância que Jung dava á cultura de um analista.
Os arquétipos, por certo, são incontáveis. Os mais comuns nos mitos são os da Grande Mãe, fada no seu
pólo agradável e bruxa no seu aspecto ameaçador, o Grande Pai, o Herói, a Criança Milagrosa, os Velhos
Sábios, o Bufão, o Salvador e muitos outros. Contrariamente aos arquétipos da mãe e do pai que regem as
origens da consciência, os Arquétipos da Anima no homem e do Animus na mulher coordenam o
desenvolvimento da personalidade adulta e trazem o sentido único e profundo do processo de individuação
para cada pessoa. Seus símbolos podem ser conjugais ou vocacionais. São eles que trazem as paixões
amorosas, religiosas, artísticas, científicas ou políticas. A ativação desses arquétipos principia na
adolescência quando sua função colidirá frontalmente com os arquétipos da Grande Mãe e do Pai. A crise
de adolescência exemplifica que as grandes crises da vida são uma verdadeira guerra de arquétipos.
Freqüentemente, a função integradora do Self tem grande dificuldade cm compor criativamente um
conflito de arquétipos. É isto que torna a participação do Ego no desenvolvimento também uma tarefa
moral, como dizia Jung, porque o Ego nesses casos deixa de ser um mero resultado do conflito dos
arquétipos, para se tornar, também, agente consciente do processo de individuação. Vejamos, por exemplo,
um caso de Don Juanismo no qual um homem de meia idade passava de mulher em mulher, sempre se
encantando, mas incapaz de se aprofundar no relacionamento afetivo. Sua Anima era constelada, mas o
Ego era impedido de passar da paixão ao amor, devido á força do Arquétipo da Grande Mãe, que mantinha
suas vivências dominadas pela sensualidade. A mulher só lhe podia ser fonte de satisfação e não do
companheirismo, imprescindível ao amor.
Apesar de ser grande conquistador, sua sexualidade estava a serviço do Arquétipo da Mãe, como no
mito dos jovens deuses, Adonis, Osiris e Atis, filhos-amantes das deusas mães que morrem precocemente e
são celebrados como mártires da fertilidade. Seu pênis era como o zangão que fertiliza a abelha rainha para
ser morto em seguida. Logo após cada conquista sua personalidade adulta sofria uma verdadeira morte ao
ser seu vinculo afetivo profundo interrompido por nova onda de carência e sensualidade. Paralelamente ao
Don Juanismo, sua propensão à bebida o situava na beira do alcoolismo. Como no Mito de Narciso, sua
imaturidade e vaidade ameaçavam "dissolver" seu Ego na intensidade do Arquétipo da Grande Mãe. É
difícil se analisar adolescentes e adultos somente com função da relação com os país sem inter-relacionar
sua problemática também com os símbolos dos Arquétipos da Anima e do Animus. No caso da terapia de
casal e família, o mesmo ocorre.
Em outros casos podemos observar a neurose se deflagar devido á luta do Arquétipo da Anima com o
Arquétipo do Pai. Um empresário de meia idade buscou a terapia com enorme ansiedade, crises de pânico
e insônia. Pai de família, apaixou-se por uma artista plástica e desde então não consegue mais ter paz ou
trabalhar, sentindo que está se destruindo profissional e socialmente. Sua história mostra que a dominância
da tradição em sua família foi de tal ordem que ele jamais pensou em sua vocação. Como primogênito,
todos esperavam que seguisse a mesma profissão de seu pai. Quase não teve crise de adolescência. Fez
algumas aprontações, mas logo se transformou no adulto "normal" que todos esperavam. Namorou muito,
mas acabou casando sem paixão com a moça de uma família que seus pais muito admiravam. Tinha
enorme propensão para literatura mas durante o curso de administração de empresas a considerou um
romantismo tolo a ser ultrapassado. Seu processo de individuação se estagnara pela repressão maciça do
Arquétipo da Anima tanto na conjugalidade quanto na vocação profissional pela força tradicionalista do
Arquétipo do Pai.

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A crise dos quarenta geralmente ocorre como uma segunda adolescência através de uma reativação
intensa dos Arquétipos da Anima e do Animus. É o Self buscando corrigir o rumo existencial enquanto é
tempo. A vivência da finitude da vida faz com que a Anima seja ativada para ultimar o potencial da
personalidade em direção à sua plenitude. Temeroso de destruir sua família e sua brilhante carreira, o
empresário cortou sua relação com a artista plástica e voltou a compensar-se vez por outra com gatinhas
que encomendava por telefone. Um ano mais tarde, inexplicavelmente, seu carro saiu de uma estrada em
alta velocidade e ele teve morte instantânea. O Arquétipo da Anima, como qualquer outro arquétipo,
dentro da teoria das polaridades descrita por Jung, tem seus aspectos positivos e negativos que podem ser
tornar existencialmente terríveis. De um lado estão as imagens das musas inspiradoras que levam os
aventureiros à glória e, do outro, as sereias que seduzem os navegantes para o naufrágio.
Como os demais arquétipos, a Anima e o Animus não se reduzem à psique individual e se encontram
também na psique coletiva ou Self cultural. Haverá símbolo mais significativo para expressar a
permanência da Espanha no Renascimento e seu despertar, hoje, para a sofisticação do Mercado Comum
Europeu, com suas tradições preservadas, do que D. Quixote lutando contra os moinhos de vento, em meio
as grandes façanhas de cavalaria, tudo inspirado na paixão de sua bela Dulcinéia? Elimine-se a inspiração
quixotesca da alma coletiva espanhola e o que sobrará da sua identidade profunda?
Nesse sentido, observa-se em nosso país atualmente, como em toda América Latina uma exaustão de
tutelas paternais elitistas e autoritárias. Esse fenômeno pode explicar o desgaste e o descrédito das atuais
classes dirigentes e a esperança de algo novo que marque o caminho de nossa identidade profunda. Nesse
sentido as campanhas eleitorais ora em curso tenderão a expressar, em graus maiores ou menores, o
chamado criativo para nossa vocação como nação devido à ativação dos símbolos no campo arquétipico da
Anima e do Animus a nível coletivo. Fica no ar, no entanto, a dúvida angustiante se o pronunciamento de
15 de Novembro que dará início a viagem em 15 de Março será guiado pelas musas ou pelas sereias.
Nesta altura, o leitor que me acompanhou até aqui estará se perguntando: - "Mas se Jung é tão
maravilhoso assim, por que ainda é tão pouco conhecido?". A resposta ao meu ver se deve não a um
defeito, mas à sua maior descoberta que é a do Arquétipo Central que propicia a integração do Self através
dos símbolos de totalidade, inclusive das imagens de Deus, o que demonstra cientificamente o
enraizamento da religiosidade no centro do inconsciente coletivo humano. Isso foi demais, ou pelo menos
tem sido até hoje, tanto para a maioria dos cientistas quanto dos religiosos.
Jung já estava intuindo em 1920 a existência de um arquétipo cuja função era integrar criativamente os
símbolos do inconsciente e integrar os opostos na totalidade psíquica. Já havia percebido que as mandalas -
que em sânscrito quer dizer círculo mágicos e eram usadas para meditação na Índia - tinham a função de
propiciar essa vivência de totalidade. No entanto, foi o presente de Richard Wilhelm (o famoso tradutor de
I Ching para o alemão) de um texto alquímico chinês chamado "O Segredo da Flor de Ouro" em 1928, que
lhe deu a prova final. Daí para perceber que as imagens de Deus nas diferentes religiões são expressão
desse arquétipo foi um passo.
Na medida em que grande parte da ciência psicológica e das religiões cristãs se fechara para Jung
principalmente por haver descoberto o Arquétipo Central como matriz dos símbolos de totalidade na
psique, porém, a cultura oriental e os físicos teóricos se abriram para sua obra. Traduções importantes do I
Ching, do Livro Tibetano dos Mortos, do Livro Tibetano da Grande Libertação e do Zen-Budismo entre
outros, foram por ele prefaciados. Sua descrição do principio da sincronicidade lado a lado com o principio
da causalidade para explicar e natureza atraiu físicos nucleares. A abertura de Oriente para a descoberta do
Arquétipo Central como coordenador dos símbolos de totalidade veio compensar Jung por sua maior
descoberta e afirmar mais uma vez a maturidade e a sabedoria da China, da Índia e do Tibet diante da
juventude do Ocidente. O sábio que afirmou nos Upanishads ‘’que Deus é um só, mas no decorrer dos
tempos, a humanidade tem lhe dado muitos nomes’’, encontrou milênios depois sua confirmação cientifica
no conceito de Arquétipo Central.
A obra de Jung é imensa e da maior importância para a cultura moderna hoje e no futuro ,pois muitas de
suas abordagens estão nela apenas iniciadas. Para continuá-la ele nos legou uma bússola que é o exemplo
de sua vida. Através da abertura do seu dia a dia, Jung nos ensinou como continuar a desenvolver suas
pesquisas através da espontaneidade das imagens da criatividade, da fantasia e dos sonhos com os quais
podemos nos relacionar através do método da imaginação ativa que ele inventou e, assim, perceber e
participar na grandiosa tarefa de busca de totalidade que o Self empreende através dos símbolos do
cotidiano na alma individual e coletiva.

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BIBLIOGRAFIA
“Métodos de tratamento corporal da psicoterapia Junguiana”. Annamaria Sannino. Ed. Moraes, 1992. Pags: 2 à 12 na
Apostila.

No livro: 11 à 17 + 21 à 23 + 29 à 33 + 40 à 43 + 68 e 69 + 98 à 102
“Felicidade”. Autor: Eduardo Gannetti. Editora: Cia das Letras, 2002. Págs: 13 à 16 na Apostila - No livro: 19 à 30.

Tudo começa em casa – D. Winnicott


Brincar e a Realidade - D. Winnicott
Pediatria e Psicanálise - D. Winnicott Págs: 16 à 20 na Apostila
A Natureza Humana - D. Winnicott

O que é Psicanálise – Primeiros Passos (coleção) – Fabio Hermann


A busca do símbolo. Autor: Edward C. Whitmont. Editora: Cultrix, 1993 Pags: 20 à 34 na Apostila - No Livro: 235 à 256.
O século de Jung - Século XXI – Carlos Byngton – Jornal da Tarde – 29/07/1989 Pags: 34 à 37 na Apostila.

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