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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
CAMPINAS
2016
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca da Faculdade de Educação
Rosemary Passos - CRB 8/5751
Título em outro idioma: The inequality between sexes by Pierre Bourdieu and Simone de
Beauvoir perspectives
Palavras-chave em inglês:
Bourdieu, Pierre, 1930-2002
Beauvoir, Simone de, 1908-1986
Sociology of education
Bodies - Education
Simbolic violence
Área de concentração: Sociologia da Educação
Titulação: Licenciado
Banca examinadora:
Maurício Érnica
Data de entrega do trabalho definitivo: 21-11-2016
Powered by
ii
_____________________________________________
Prof. Dr. Antonio Carlos Dias Junior
_____________________________________________
Prof. Dr. Maurício Ernica
iii
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÂO
e Simone De Beauvoir
Junior.
CAMPINAS
2016
iv
RESUMO
modo, a Mulher passa a viver o mito do Eterno Feminino, a barreira simbólica que a
enquanto o Homem possui maior liberdade para realizar-se no mundo e deixar suas
marcas nele. A literatura selecionada nos leva a concluir que existe um princípio de
BOURDIEU (1930-2002)
v
ABSTRACT
This work is focused in reflect about the masculine and feminine gender construction
by Simone de Beauvoir's (1908-1968) The Second Sex (1967; 1970 [1949]) and
Pierre Bourdieu's (1930-2002) The Male Domination (2003a [1998]), searching in the
(men and women) and atribute their own nature to each of them, when actually it is a
social construction of the role to be played and a ocultation of this arbitrariness. That
way, the Woman lives the Eternal Feminine mith, the simbolic barrier what prevents
her transcend from social object to a free and projects creator subject, while Man
keep greater freedom to realize himself and let his marks in it. The selected literature
lead us to conclude that exists a male domination principle on the femine which
have a bigger stock of symbolic capitol to develop their I and transcend it, while the
2002)
vi
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente ao meu irmão, Alex, com quem pude discutir alguns
problemas fundamentais e explicar coisas que nem eu entendia direito sobre este
trabalho; conversas que ajudaram a formular melhor os conceitos que eu li. Como
esta é a relação mais próxima que eu encontrei de uma moral existencialista, antes
À minha irmã, Agnes, simplesmente por existir, por me confiar seus segredos
nesse processo, inclusive aquele que não fica explícito quando nos desentendemos.
Ao meu orientador, Antonio, por me confiar certa liberdade nos prazos e nas
aparecendo, o que foi muito positivo (ainda que o começo de novembro tenha
começado com notícias extraordinárias sobre coisas que deixei de fazer); por
compreender (ou suportar) os e-mails mais esquisitos que alguém poderia ler; por
me incentivar a buscar uma bolsa da FAPESP; por não tornar a violência simbólica
esquecer que é uma relação professor-aluno com as conversas que nada têm a ver
vii
À toda a República Floresta, a saber: Augusto, Breno, Gabriel (melhor colega
preferência, O.K?), mais os agregados: Gabi e Victor, pelas festas, pelos Mario
através de Análise do Discurso toda vez que ele dá migué, por reclamarmos juntos
da cachoeira na sala toda vez que chove, por colocarmos toda a culpa no Breno, por
prestar atenção toda vez que o Gabriel fica naturalmente rosa, pelo Stalin que
disponibiliza aquela planilha de contas todo santo mês, por doarem uma fatia de
queijo quando preciso e por qualquer outra coisa que eu esqueci de colocar.
Agradecimentos que vão de sinuca a Super Smash Brawl; de Muse (e quero dizer
inícios de relacionamentos; pelos fins de semana em Itu; pelos rolês gourmet; por
À Julia, minha querida amiga de faculdade. Essa graduação seria muito mais
terapêuticos de botar tudo para fora; ver e discutir de séries a greves; sofrer juntos
por motivos que só nós graduandos pedagogia entendemos; pelas caronas muito
oportunas.
À Walter e Joyce, amigos de longa data, pelas conversas e pelo tempo que
passamos juntos.
Por fim, à Silvia e ao Fidel, dois quadrúpedes que me alegro por ter por perto,
embora o Fidel – cachorro ladrão de salsichas - esteja mais presente nos últimos
viii
“[...] Dizer de uma mulher de poder que ela é “muito feminina” não é
O Segundo Sexo.
ix
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................10
A. Casamento ............................................................................................ 61
B. Vida sexual.............................................................................................70
C. Lar..........................................................................................................77
D. Trabalho .................................................................................................81
E. Mercado .................................................................................................93
F. Educação .............................................................................................101
REFERÊNCIAS...............................................................................................123
x
INTRODUÇÃO
pela escola, uma instituição com fins sociais e que atende a um currículo que, por
Por este motivo, a sociologia da educação recebe críticas por reduzir-se a uma
vida e sobre o entorno social a qual diz respeito, e contribui para que haja a devida
compreensão entre o indivíduo e o coletivo que a partilham. Por este motivo, torna-
como objeto de estudo: quais práticas culturais esse currículo traz? (YOUNG, 2000).
circulação das ideias nos corpos ao trabalhar intensamente com o currículo, o que
10
existencialista que busca saber como existimos, como temos conhecimento de que
Esta perspectiva parte de algo que é anterior às escolas, que está no seio de
toda cultura e que contribui para resgatar uma sociologia da educação que reflete
práticas de exclusão.
O aprender a ser, desta perspectiva, resulta num ser capaz de dizer eu sou,
que pode trazer a seguinte pergunta filosófica: quem sou eu? A partir desse ponto
sujeitos podem se ver como homens ou como mulheres (geralmente são levados a
enxergarem seu sexo e buscarem o sentido nele, esse eu sou homem/eu sou
11
homens são biologicamente masculinos e as mulheres, femininas. Assim, homens
(HENRIQUES, 2004).
o segundo sexo, sob a justificativa de que estes conhecimentos iniciais que o sujeito
feminino. Educação essa que tende a ser carregada para a vida toda, que antes de
12
de convivência. Representa agir como esperado ou, ainda, cumprir determinado
imperceptível e automática, tão natural que passa a ser considerada traço biológico
e psicológico.
sociologia filosófica, mesmo que nem sempre preocupada com a escola (PETERS,
existencialismo como uma doutrina que torna a vida humana possível e que, por
outro lado, declara que toda verdade e toda ação implicam um meio e uma
***
13
reconhecida por inaugurar uma nova perspectiva para o feminismo no século XX,
mito do Eterno Feminino, trabalhado pelos autores sob óticas distintas que
edifício teórico bourdiesiano, “que se exerce com a cumplicidade dos dominados [...]
explicável como produto de uma socialização que os habituou a tomar sua condição
não como uma arbitrariedade, mas como parte da ‘ordem do mundo’” (PETERS,
2016a, p. 9).
14
educação a qual eles estão sujeitados. Consta no capítulo, ainda, uma divisão em
de 1908, em Paris, França. Pertencia a uma família da alta burguesia e teve muitas
Seu núcleo familiar era constituído pela mãe, Françoise Brasseur – cuja
e Hélène, aos 8 anos, ao Institut Adeline Désir para cursar o Cours Désir, uma
2 Poup é uma palavra de origem francesa que significa boneca. Uma possível tradução para o
apelido Pouppete seria bonequinha.
15
donas de casa. Em outras palavras, tratava-se de uma escola que tornava a menina
amizade que levará consigo até um acontecimento trágico. Antes disso, Elizabeth
alegre.
Já em sua adolescência, Simone almejava ser escritora, por mais que sua
para a literatura e o teatro. Sua vida futura como intelectual e escritora deve-se, em
grande medida, à identificação que ela estabelece com o pai, ou, numa livre
menina que vê o divino no pai e se apropria de tudo o que esse Deus tem a
oferecer. Todos os livros agraciam a menina Simone e seu desejo de ser como o
faz a jovem manter diários, de onde imaginava que pudessem originar romances.
sentia tanto orgulho da filha que, às vezes, ela lhe lembrava um filho homem
(FARIA, 2009). Enquanto a relação pai e filha era relativamente prazerosa, Simone
tinha sérios atritos com sua mãe, que envolviam o comportamento feminino que
família.
Simone teve muitos amores em sua vida, mas o primeiro foi seu primo
Jacques, aos 15 anos. Ele era mais velho que ela, e ambos gostavam de passar o
16
tempo conversando. A família esperava o casamento, mas Simone desistiu quando
mas guarda esse segredo consigo, longe do Institut Adeline Désir, da família e dos
amigos, o que faz com que a filosofia existencialista da jovem Beauvoir seja também
uma filosofia anticatólica, na qual Deus, materializado no homem, não é nada mais
que aquele que subjuga e engana o desejo da mulher de ser livre. Os estoicos foram
será uma importante referência para Beauvoir no que diz respeito à fenomenologia
ponto de reviravolta na visão que a autora passa a ter sobre a sociedade. Nesse
momento, entende que está dividida entre homens e mulheres e culpa a mãe
de Zaza pela educação que deu à filha, pois teria sido a educação tradicional e a
partir daí Beauvoir decide não se casar e sai da casa dos pais. Passará a ser
uma moça bem comportada,3 ou seja, uma mulher que preza pela sua liberdade,
enquanto as moças mal comportadas serão aquelas que escolheram uma vida
com quem manteve relação amorosa com liberdade consentida para amarem a
como a pessoa mais jovem a prestar o exame e a nona mulher a obter o título, que
seus romances, a viver uma vida de cumplicidades com Sartre e a viajar. O ano
Uma característica marcante dos romances da autora, então neófita, é que eles
Liceu de Rouen.
4 Ainda que o ciúme fosse inevitável e resultasse em ataques histéricos de Beauvoir, o que a
desgastava muito. Ver, a esse respeito, Faria (2009).
5 Na França, os cursos de agrégation estão abertos àqueles que já possuem diploma de estudo
universitário e buscam formação específica para docência no último ano do ensino secundário ou
superior; trata-se de um certame extremamente seletivo.
18
As memórias de Beauvoir guiarão a escrita em todos os seus próximos
com situações sociais de uma mulher francesa nos meados do século XX. De forma
O Sangue dos Outros (1990c [1945]), Bocas Inúteis (1945), Todos os homens são
mortais (1995 [1945]) e Por uma moral da ambiguidade (2005 [1947]). Ela funda a
revista Les Temps Modernes com Sartre, em 1945, e escreve seu tão aclamado e
odiado O Segundo Sexo entre 1946 e 1948, com pesquisas feitas na Bibliothèque
Nationale de France.6
Viaja para os Estados Unidos em 1947 para a divulgação do seu novo livro
mulheres numa sociedade criada para e por homens, como denuncia Beauvoir
(1967; 1970).
chegou a ser catalogado no Índice dos Livros Proibidos da Igreja Católica. Demorou
a ser traduzido, e em alguns casos teve capítulos suprimidos (como o capítulo d’A
todo, e até hoje é rechaçado tanto por grupos feministas como por aqueles sem
uma teoria filosófica própria, ficando à sombra de Sartre. De fato, O Segundo Sexo
mantém muitas semelhanças com O Ser e o Nada de Sartre, embora não possa ser
concebeu era um ato de voluntarismo. Simone não praticou esse erro, ela não
cometeu esse erro” (SAFFIOTI, 2000)8. O casal de filósofos possui referências muito
aproximadas entre si, como no diálogo de ambos com Hegel, autor muito presente
si.
Marx também configura influência importante, uma vez que Sartre e Beauvoir
8Aqui voluntarismo é compreendido por Haleiath Saffioti (2000) como uma atitude não determinada
por nada ou ninguém, em oposição à falta de verdade do pós-modernismo: como não há verdades,
nada é determinado e, portanto, a liberdade deve ser voluntária.
20
combina as possibilidades de transformação do sujeito no mundo material a partir da
2013).
dominação de uma consciência sobre a outra. O marxismo pode ser visto nos
como utilizam os instrumentos a seu favor e como se apropriam dos bens materiais
Outro, ainda que o Senhor (Homem) só seja Senhor porque seu Escravo (Mulher) é
denota que a mulher não é dominada apenas pela consciência, mas também pelo
corpo. Seu instrumento mais particular, seu próprio corpo, não lhe pertence e, por
este motivo, sua consciência também não: são os homens que detém a posse da
configuram a terra por onde os homens andam; é por meio das mulheres que se
Hegel - inclusive por se apropriar de sua fenomenologia de uma forma muito original
21
(BAUER, 2001), do que com o materialismo histórico-dialético de Marx e Engels, ao
por parte de Beauvoir (1967; 1970), uma vez que representa o falo como objeto de
desejo e de poder. De forma similar aos argumentos biológicos que buscam justificar
Beauvoir, que aponta para as falácias de uma teoria que considera naturais as
estratificações para a vida toda, e propõe uma visão social para uma teoria
simbolicamente pelo pênis, visto que são os órgãos genitais que dividem os sexos
9 O falocentrismo pode ser lido como o falo é a medida de todas as coisas, o que significa dizer, na
psicanálise freudiana, que todo desejo se expressa na presença ou na falta do pênis, que é o objeto
de desejo, e qualquer objeto que lembre o pênis é denominado falo (charuto, bengala, tronco de
árvore etc.). Em Freud (2001), a interpretação dos sonhos considera o falo, representação do pênis,
como um símbolo central na interpretação do analista para a neurose do paciente; todo material
onírico tem uma relação com o pênis, fonte de todo o prazer (e todo prazer é viril).
10 O androcentrismo é a visão de mundo que supervaloriza os princípios masculinos e a sabedoria
dos homens. Desta vez, o homem é a medida de todas as coisas, e a mulher, enquanto
representação do feminino, é tratada como marginal à órbita masculina.
11 O Complexo de Electra (assim nomeado por Carl Jung) corresponde ao Complexo de Édipo
feminino na psicanálise freudiana, e consiste num processo imaginário pelo qual a menina é seduzida
pelo pai. A impossibilidade de a menina ver a mãe como objeto de desejo decorre da criança
imaginar que a mãe a castrou e, portanto, leva-a a imaginar ter possuído um pênis em algum
momento de sua vida. No Complexo de Electra, a justificativa para o pai ser o objeto de desejo
reside, portanto, no fato de a menina desejar possuir um pênis.
22
Beauvoir (1970), como um destino psicológico e não uma causa social. Para Freud,
o símbolo do pênis seria adorado pela menina porque o pai é uma figura adorada,
ele é poderoso: a menina quer possuir um pênis para ser como o pai. Beauvoir
subverte o desejo sexual da menina para os planos que faz para si a partir de como
coloque a mente num plano superior e até divino da existência humana, Beauvoir faz
mulher não existe para ela, não será capaz de pensar sobre si mesma, pois
pensar o próprio corpo, já que está acostumado com ele a ponto de poder esquecê-
questioná-lo e vigiá-lo, até mesmo odiá-lo por não ser como ela gostaria. Deste
emergem com as mais variadas identidades de gênero, para além de que qualquer
23
identidade que não é representada nem por homens ou por mulheres – que, em
grande medida, consiste nos temas da terceira onda do feminismo (LOBO, 2001).
Beauvoir como uma intelectual de seu tempo, e não atribuem a ela nenhuma
Paraíso, o tempo é eterno, nada muda porque nada passa, nada flui, nada se torna
Beauvoir estará mais interessada num ser temporal que está sendo, e mais
alemão afirma que a verdade é significada a partir da realidade, e tudo que não
pertence a ela seria mentira. Beauvoir, em A Mulher Desiludida [2010 (1967)] narra
como uma esposa percebe, aos poucos, que o marido a está traindo, recorrendo,
portanto, ao problema da verdade levantado por Heidegger, para o qual nem toda
que vive a mulher e as mentiras que lhe são contadas pelos homens para que seja
24
amontoado de mentiras sobre o sexo da mulher e suas possibilidades de ação no
mundo. São mentiras que limitam a sua liberdade, e que por serem tão próximas da
filósofa, visto que não poderia sê-lo num campo predominantemente masculino,
momento, “a filosofia que ela estudava e ensinava gastou muito tempo com nada”
25
Os estudos literários, como os de Leal (2013), Santos (2012) e Viana (2009),
bagagem filosófica que eles trazem. Segundo Buroway (2010), ainda que os autores
da autora, grande parte das vezes a crítica mais severa reside na comparação de
campo da literatura mais cobiçado pelos escritores na França. Não apenas com O
Segundo Sexo, mas agora com Os Mandarins (2006 [1954]), Beauvoir consegue um
destaque invejável. Não serão, contudo, seus livros a faceta mais comentada e
polemizada de sua vida, mas a sua vida íntima/sexual. Mais precisamente, viver uma
monogâmicas de seu tempo - essas que enxergam o profano nas ações que não
como Louis Althusser, Gilles Deleuze, Jacques Derrida, Michel Foucault, entre
12Uma moral que se opõe à sua filosofia existencialista, que preza pela liberdade consentida de
escolha nas relações e é completamente contrária à ideia de libertinagem que a moral de sua época
imagina ser aquela que Beauvoir propunha, o que prova a dificuldade da ética existencialista para
ampliar seus domínios.
26
estipulava o seguinte: somente a partir dos 15 anos o sexo consentido não seria
Burkcardt, presos por terem mantido relações sexuais com menores de 15 anos.
longo de sua vida (algumas delas bem mais jovens), chegando a criar triângulos
amorosos com Sartre.15 No caso da petição, para Beauvoir se tratava de uma lei
rigorosa que punia injustamente qualquer suspeita de pedofilia, e também feria algo
é capaz de desejar.
tentam revalorizar o que é dito sobre o desejo da mulher, a única realmente capaz
de enunciar o próprio desejo. Por ser uma filósofa da diferença, Beauvoir vê toda
realização do desejo como único, pois nenhum desejo é irredutível a outro; existir
significa ter uma história, e conseguir replicar o desejo é poder replicar uma história
existência, Beauvoir consegue ser uma escritora que fala sobre os seus conflitos
13 Marco bastante contraditório, sobretudo tendo em vista que o governo francês já distribuía pílulas
anticoncepcionais para meninas de 13 anos.
14 Le Monde, 26 de janeiro 1977, tradução nossa.
15 Embora todas tivessem idade para consentir.
16 Cabe lembrar que Sartre sempre incentivou Beauvoir a escrever sobre si mesma (FARIA, 2009).
27
Quando Beauvoir passa a publicar suas memórias, fica claro essa
característica de falar sobre si, ao mesmo tempo em que fala sobre e para um
A Força da idade (1984 [1960]), A Força das Coisas (1993 [1963]) e Balanço Final
parecidas com aquelas vivenciadas por suas personagens, o que gerou tamanha
identificação.
É, contudo, com Balanço Final (1990b), sua última obra de memórias, que
representa o seu último livro publicado em vida, “obra que é diferente das demais
porque está centrada totalmente nos últimos e difíceis momentos da vida de Sartre;
da mulher e sobre as novas formas das mulheres repensarem suas vidas como um
suas raízes fincadas n’O Segundo Sexo e em seus conceitos (LOBO, 2001), o que
mais precisamente, na educação identitária dos indivíduos que não escapam das
17É também a única obra de Beauvoir que Sartre não chegou a ler, visto que morre em 1980, um ano
antes da publicação.
28
influências sociais e seguem rituais padronizados - como é o caso do Eterno
humanas.
Presta serviço militar na Argélia, onde inicia seus estudos sobre a sociedade
tratar de assuntos práticos, como a revolução nos campos que ele acompanhava.
obras: A Sociologia da Argélia (2006 [1958]), Esboço de uma teoria da prática (2002
18 Por motivos de um habitus servil, segundo Bourdieu em seu Esboço de autoanálise (2005b), o
campo acadêmico francês não o fazia se sentir à vontade; ao contrário, sentia-se nele constrangido
devido à sua infância e início de juventude terem ocorrido no campo, local de oposição à cidade e à
academia. Ao interiorizar tal disposição, sente-se inferior nos corredores da universidade, que
exalavam erudição (BURAWOY, 2010).
19 Contudo, não poderia abrir mão da filosofia por completo, visto que ela lhe serviria de contrapeso
29
primeiros textos, Bourdieu se ocupa de um trabalho etnometodológico acerca do
e mantém-se ligado aos estilos de vida do povo argelino (BURAWOY, 2010). É esse
que segundo ele havia se tornado imaginação sem razão (PETERS, 2016a).
lista de uma facção de extrema direita, o que indicava uma ameaça à sua vida caso
continuasse por ali (PETERS, 2016c). Retorna à França para ser professor na
Paris (CATANI, 2004). Neste período, começa uma parceria produtiva com Jean-
Bourdieu permaneceu ligado à família até o fim de sua vida. Seu pai, Albert
as pessoas não lhe falavam como se ele fosse um pesquisador, mas como Pierre, o
vida diária de seu povo tal como ela era, já que era visto como um estranho para os
30
Depois da Faculdade de Lille, leciona no École des Hautes Études en
No mesmo ano.
sobre o fracasso escolar e para formular a teoria do capital cultural, que liga as
ligado à cultura que as famílias legam para os filhos, e somente aqueles alunos que
possuem tal capital cultural herdado, requerido pela escola, avançariam no sistema
31
A grande novidade em A Reprodução consiste na utilização do conceito de
escolaridade que funciona como expectativa para que se mantenha (ou supere) a
posição social dos pais, o que acentua a pressão social que cria sobre si mesmo.
suas competências; ao fazer tal projeção, ele remonta à sua trajetória social e vê
aonde é capaz de chegar e quais são os estratos sociais que imagina como
muito tempo, e acaba quando se faz uma omelete com o ovo (DESNOS apud
restritos num espaço social determinado que move as lutas entre classes ou grupos,
Cada campo encerra a sua própria realidade social, assim como os jogadores
nele contidos. As lutas nos campos resumem-se em impor determinada visão para
32
conservá-los ou transformá-los (AZEVEDO, 2003). A ideia da sociedade como um
publicada pela Editora Minuit quatro anos após conseguir criar o seu periódico,
Sociais), dirigida por ele durante toda a vida (NOGUEIRA & NOGUEIRA, 2014).
diferenciações sociais que podem existir entre sexos, entre raças ou entre nações,25
para a competição nos esportes26 e para sociologia das obras de arte,27 entre outros
temas.
campo escolar, isto é, os campos não estão isolados entre si e contam com alto grau
de complexidade e distensão, que são critérios para que ocorra a dissimulação das
regras no campo.
33
O campo, entretanto, só funciona em conjunto com a illusio, princípio
campo estivesse seguindo o curso natural das coisas, já que sempre foi assim.
lei fundamental. Quando se percebe a illusio, “a lei é a lei, e nada mais” (PASCAL
“[...] todo poder que chega a impor significações e a impô-las como legítimas,
dissimulando as relações de força que estão na base de sua força, acrescenta sua
PASSERON, 2008, p. 25). Com efeito, toda violência simbólica se reproduz num
34
Um dos espaços educativos mais importantes, para Bourdieu, é a família,
O sentido que um indivíduo cria sobre a própria vida estaria, desta forma,
indissociado da escolaridade dos pais, das músicas que ela ouve em casa, dos bens
materiais que possui a casa, dos locais (e a frequência) aos quais os pais levam os
filhos (cinemas, museus, óperas, bibliotecas, eventos culturais etc.), bem como da
renda econômica dos pais, da posição social e influência que possuem no campo
(podendo ser constatada pela profissão, pelos amigos, círculos sociais, contatos em
individual da criança.
com seu mundo familiar, fazendo com que não o dissocie de seu universo particular,
o que permite que toda educação secundária tenha maior eficácia quanto mais
próximo for o capital a ser adquirido do habitus constituído. Mesmo que haja uma
campo, sendo ajustável e reestruturável. Isto significa dizer que a educação primária
não implica na única educação possível para um sujeito, mas é aquela que
realidade à outra visão que corresponda ao ponto vista que aquele campo busca
35
A aprendizagem exige uma ação pedagógica, que pode variar dependendo
arbitrário cultural” (BOURDIEU & PASSERON, 2008, p. 26). Todo ensino, assim,
está baseado numa relação de forças e de sentidos entre grupos e classes por
Segundo Bourdieu, com efeito, toda ação pedagógica exige uma autoridade
legítima que reforça o poder arbitrário, que a estabelece e que ela dissimula.
indivíduos não apreenderam o fundamento das relações de forças nas quais estão
28Na qual repousa a ideia do foi sempre assim, ou, em termos bourdiesianos, amnésia de gênese
(BOURDIEU, 2001).
36
reproduzidos, que passam por relações de força e pela ideia do reconhecimento no
desconhecimento.29 É por este viés que uma pedagogia se torna uma prática
com validade a ser ensinado – e que será o fragmento que se ocupará de traduzir a
familiar privilegie o currículo escolar, mais apta a criança estará a ter seus esforços
reconhecidos pela instituição de ensino, uma vez que a escola é uma extensão do
que ele mede com outros fundamentos que também pretendem ser universais.
29Méconnaissance é o termo original que Bourdieu utiliza para se referir a este tipo de dissimulação
(PETERS, 2016a).
37
As ciências históricas buscam desmistificar os absolutos que percorrem o
mostrar como todo ponto de vista coletivo parte de um ponto de vista individual. A
históricas.
pensa seu objeto. Bourdieu proporá que se veja o pesquisador como sujeito, “esse
(sua trajetória social) e uma posição social, é exigido dele que possua um
30Que é também uma crítica da razão escolástica, que desconsidera o pensamento do sujeito que
pensa alguma coisa sobre o mundo. Cf. Meditações Pascalianas (2001).
38
Bourdieu nos convida a uma desconstrução da imparcialidade trans-histórica
arbitrários. Com isto, Bourdieu nos leva a pensar que nenhum conhecimento é
pensados por que uma sucessão de eventos permitiu que fossem pensados dessa
sobre si mesmo, mesmo que nisto esteja implícito a illusio de todo campo.
mecanismos que impedem que o sujeito reflita sobre a sua constituição, levando-o a
por Ganton Bachelard, baseia-se em: a) romper com o senso comum; b) construir o
objeto a partir de uma causalidade não percebida, mas que é real e invisível; e c)
39
constatar ou verificar empiricamente as hipóteses construídas (PETERS, 2016a;
PETERS, 2016c). Partindo de uma ordem social, que o senso comum compreende
agentes que persistem como estruturas exteriores à história, dando corpo à sua
2012, p. 3).
40
de Sociologia do Collège de France. Eleito, profere, no ano seguinte, a aula
inaugural Lições da Aula (1988 [1982]), cujo tema diz respeito a uma aula sobre a
aula, momento em que expõe sua sociologia da sociologia reflexiva, vale dizer, a
escrever sobre temas atuais, como a obra Sobre a Televisão (1997 [1996]). Já sua
obra Meditações Pascalianas (2001 [1997]) pode ser considerada, segundo Peters
relevância política. Para a confecção do livro, que se mostraria relevante não apenas
para as mulheres, mas também para o público LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e
sociólogos mais importantes do século XX, sobretudo por sua teoria dos campos
(CATANI, 2002). A recepção inicial do autor no Brasil foi objeto de severas críticas,
31Bourdieu expõe brevemente essa repercussão num trecho de A Dominação Masculina intitulado
Algumas considerações sobre o movimento gay e lésbico, ao final do livro.
41
mas isso se deve, ao que tudo indica, a uma má interpretação do seu conceito de
nos anos 70, momento em que Marx ainda configurava leitura em voga (ORTIZ,
2003).
adequadas aos objetivos sociais dos dominantes. Burawoy (2010) observa que as
habitus (BURAWOY, 2010). Por mais que a sociologia de Bourdieu seja vista como
(MIGUEL, 2015).
a educação, ele está falando a respeito de uma aprendizagem pelo corpo e pelos
sentidos, vale dizer, sobre uma educação que cria sentidos de se estar no mundo e
que nem sempre é intencional, o que mostra que não temos controle sobre o que
32Ainda que Beauvoir seja uma situação especial, visto mal ter sido citada por Bourdieu (BURAWOY,
2010).
42
a ter gostos parecidos com as pessoas que convivem conosco. Sobretudo,
responsável por modificar o habitus, mesmo que seja doloroso recusar, modificar ou
de desmistificar o mágico.
o simbólico).
43
3 - SER HOMEM, SER MULHER
os sexos (que atualmente pode ser considerada uma discussão sobre gêneros) e
servir. Por sua vez, o masculino vem a ser dominante, independente das
O ser homem e o ser mulher não são representações que partem de raízes
diferentes, senão de uma mesma raiz: o masculino. O homem tem como referência o
universo masculino e foi criado por ele, havendo uma autonomia relativa para que
as próprias regras e outras que tangem o mundo feminino. Beauvoir (1970) mostra,
44
de transformarem o mundo ao invés de estarem destinados a agir conforme ele se
apresenta.
Ser homem, para Beauvoir (1970), diria respeito ao ser Eu; para Bourdieu
(2003a) seria ser dominante. Ser mulher, em oposição, para Beauvoir, é o ser Outro,
45
Ser mulher, portanto, é ser o oposto do homem; enquanto ser homem seria
não ser mulher. O homem constitui-se como um oposto da mulher, mas não
necessariamente esta é geradora de oposições, pois quem define estas coisas são
ralação entre masculino e feminino, a partir das quais se criam homens ou mulheres,
que determina o habitus para serem moças bem-comportadas. Desde o uso dos
ela sente ao urinar de pé são disposições para que se torne a mulher que está
A divisão entre homens e mulheres é dada por fatores biológicos, mas ambos
os autores demonstram que além de fatos visíveis que são os órgãos sexuais
diferentes, ocorre uma valoração de distinção entre eles. O pênis e a vagina são
possui uma posição privilegiada em relação ao outro sexo, entendido muitas vezes
como vazio.
33 Beauvoir, em vários momentos nos dois volumes de O Segundo Sexo (e com ênfase no segundo
volume) fala sobre a maldição que é ser mulher, no sentido que é algo do qual não se consegue
libertar, e que persegue os corpos femininos como magia. Daí se pode perceber como são os mitos
sobre o corpo feminino, que configuram verdadeiras maldições que assombram as mulheres e
comprometem suas vontades, decisões, potencialidades e inserção no mundo masculino. O corpo
feminino é amaldiçoado porque está condenado a ser feminino, bem como a mulher. O corpo
feminino amaldiçoado é carne.
46
As desigualdades encontram respaldo nas diferenças biológicas para erigir
2014). “A divisão entre os sexos parece estar ‘na ordem das coisas’, como se diz por
vezes para falar do que é normal, natural, a ponto de ser inevitável [...]”
A partir disto, chegamos ao ponto em que o ser homem e o ser mulher são
naturalizações dos arbitrários culturais, e por isso podemos pensar propostas para
masculino como sendo bom. As desigualdades entre os corpos, que acabam sendo
decididas por suas sociedades para atender os interesses dos homens, para
34Beauvoir cita o seguinte trecho de Pitágoras como epígrafe no primeiro volume de O Segundo
Sexo: “Há um princípio bom que criou a ordem, a luz e o homem, e um princípio mau que criou o
caos, as trevas e a mulher”.
47
diferença anatômica entre os órgãos sexuais, pode assim
ser vista como justificativa natural da diferença
socialmente construída entre os gêneros e,
principalmente, da divisão social do trabalho (...).
(BOURDIEU, 2003a, p.18-20, grifos no original).
35 A questão econômica é algo muito importante para Beauvoir, necessária para a afirmação da
existência, por isso a importância das mulheres nos espaços de trabalho como forma de conquista da
autonomia e independência em relação aos maridos ou outros homens. Este ponto será tratado mais
adiante no capítulo 5 - Onde está a violência simbólica?: D. Trabalho e E. Mercado.
48
ligação, disseram-no, será reconhecida, ou não, segundo
os preconceitos sociais (BEAUVOIR, 1970, p. 56-57).
a mistificação do corpo por uma junção entre a biologia e os valores sociais. Tanto é
toa que Beauvoir chama o subtítulo de seu primeiro volume de O Segundo Sexo de
Fatos e Mitos, e Bourdieu faz um estudo etnográfico do povo cabila, que segundo
ele é um povo muito fiel aos próprios mitos.36 Em outras palavras: a biologia não cria
O mito conta com um poder explicativo que tem a capacidade de interferir nas
vidas humanas. Está imbuído de valor e crença, e por isso de sugestão e condução.
36É interessante saber que Bourdieu chama Foucault de ingênuo por começar os estudos mitológicos
do segundo volume de sua História da Sexualidade por Platão, “ignorando autores como Homero,
Hesíodo, esquilo, Sófocles, Heródoto ou Aristófanes, sem falar nos filósofos pré-socráticos, nos quais
o antigo alicerce mediterrâneo aflora mais claramente? ” (BOURDIEU, 2003a, p. 15). Ou seja, a
ingenuidade de Foucault estaria em não procurar pelos mitos mais antigos, que é o que Bourdieu faz
com seus estudos etnográficos na cabília. Em comparação a Beauvoir, a provocação de Bourdieu a
Foucault acaba sendo uma faca de dois gumes, pois a filósofa existencialista busca nos primórdios
da história humana, com os povos nômades da Idade da Pedra e suas relações com a terra, e na
imagem da Grande Mãe, o início da ideia de propriedade, e por consequência, a servidão da mulher.
49
renegados e atenuados (MACEDO et al., 2005). O mito é uma das primeiras formas
de dar sentido à realidade; se as realidades dos homens e das mulheres são tão
distintas, poderíamos inferir que é por que os mitos vividos por eles sejam
diferentes, e seria preciso explicar como esses mitos não se misturam - o que
denunciam nos mitos uma forma desigual que acentua o poder dos símbolos
ser masculinos ou femininos (KOFES, 2009). Beauvoir, ao falar das lésbicas dedica
lésbicas desprezam companheiras femininas por não verem vantagem nesse tipo de
masculina. “O desejo masculino que a reduz aos limites de seu corpo choca-a tanto
quanto choca o jovem rapaz; pelas suas companheiras submissas ela sente o
mesmo nojo que o homem viril pelo pederasta passivo” (BEAUVOIR, 1967, p. 150).
sobre a vergonha do corpo efeminizado – enfraquecido, pouco viril, sem honra – dos
homens quando suas ações não são reconhecidas pelos outros homens do grupo;
as atitudes pouco viris são tomadas como “tipicamente feminina, dos “fracos”, dos
37 Ao ler Beauvoir, entendemos a mulher como uma nominação biológica, similar à fêmea; já o Outro
seria um termo mais apropriado para se referir às mulheres como seres sociais.
38 Que é um capítulo que inexiste nas edições de O Segundo Sexo em alguns países árabes e
identidade restrita aos homens, visto que nunca lhes será possível ser como eles.39
homem sendo viril, quando, na verdade, não é possível sê-lo. Os gays também
sofrem as consequências desse jogo social, uma vez que a relação sexual
39 Ver em Anjos (2000) um relato sobre a divisão política entre grupos masculinos e femininos num
grupo LGBT.
40 Foucault trabalha muito bem a ideia da penetração no ato sexual entre os gregos, relacionando à
sido sempre assim, que é suficiente para moldar o pensamento através de costumes
sendo assim, dificulta pensarmos que existe igualdade entre os sexos a partir do
vez, tenta desvincular-se das explicações mitológicas, desta vez encarnadas pelo
41Este tipo de visão pode ter, inclusive, reflexo na popular inferioridade mítica da pedagogia, cujas
salas dos cursos de graduação são majoritariamente compostas por mulheres, sobretudo em
comparação a outros cursos tidos como duros, difíceis, fortes, que requerem mais esforço, como as
engenharias, cujas salas de graduação possuem maioria de homens em sua composição. O
reconhecimento da honra e do respeito garantidos por se frequentar determinado curso dependeria
de sua composição de homens ou mulheres que, carregando mitos, preencheriam o espaço de
estudo com as características sociais dos agentes. Trata-se de uma alternativa para se pensar a
competição entre os cursos e as áreas do conhecimento, conhecidas como moles e duras, ou, no pior
dos casos, para arranjar marido ou para arranjar mulher.
52
As dificuldades desse trabalho são de diversas ordens, e Beauvoir encontra,
além dos mitos nos dois sexos, a cumplicidade destes em prol do que se diz eterno.
menina, embora com menos detalhes e mais focado na reprodução que homens
onipresente.
para Bourdieu). Será que convivemos com esses tipos de mitos? Bourdieu e
Beauvoir asseguram, em suas obras, que sim. Ser homem ou ser mulher exige a
presença dos mitos: há que se vivê-los para tornar-se algo. Seriam esses mesmos
4 - A VIOLÊNCIA À MULHER
53
violência, não é necessário agredir fisicamente para colocar a mulher numa posição
menos prestigiada que o homem; quando os mitos agem nas sociedades, eles
possuem um valor simbólico que dispensa qualquer forma de agressão física, pois
geram sentidos sobre o mundo. Aprender a agir socialmente significa, então, apoiar
Beauvoir).
desviantes desse padrão são vítimas da violência simbólica, já que são essas as
virtudes que elas podem esperar que os homens reconheçam (BOURDIEU, 2003a).
mulher, pois a força está para o homem assim como a fraqueza para a mulher, e
a determinar sua superioridade. A única coisa que impede que ambos tenham as
mesmas qualidades é a divisão natural que existe entre os sexos; quando aprendida
54
ela configura a base para separar até os fenômenos psíquicos, como sentimentos,
que o sexo oposto em alguma atividade, a qualidade sofre uma inversão e passa a
ser desprezada (as mulheres são popularmente mais emotivas e isso não as torna
propensos a progredir.
diante da Natureza, essa força incontrolável que por um tempo foi capaz de curvá-lo
sobre a fertilidade, passa a ser responsável pelas boas safras e pelo trabalho no
economia mística superior, legítima. Mas a mulher apenas cria a vida, quem a
entregue a forças que não são capazes de compreender e, por isso, também
fogo (que permite a criação de ferramentas), torna-se capaz de ter o controle que
55
Segundo Beauvoir, “Atribuindo a si próprio e exclusivamente sua posteridade,
domínio do mundo à mulher” (BEAUVOIR, 1970, p. 100). Assim, ele é muito mais
Beauvoir, não pode ser Eu, o que intensifica a violência simbólica na ótica de
Bourdieu, uma vez que “A virilidade, entendida como capacidade reprodutiva, sexual
2003a, p. 63).
sempre que fazer crescer sua honra quando uma exigência a ele se apresenta, o
tipo viril (e o mais detestável na visão dela) -, afirma que o homem “Apega-se à
mulher – ou melhor, pega a mulher – não para desfrutá-la, mas para desfrutar de si
42Escritor e romancista parisiense nascido a 20 de abril de 1896. Beauvoir tece críticas ácidas às
suas obras pitagóricas no segundo capítulo de O Segundo Sexo: Fatos e Mitos (1967), no
subcapítulo Montherlart ou o pão do nojo.
56
Os homens, em seus atos de honra, estariam por um lado alimentando um mercado
simbólico que traz um retorno em capital simbólico reconhecido por outros homens
e, por outro, constituindo-se como ser – ao recorrerem ao Outro para preencher seu
objetividade (as condições sociais) (NOGUEIRA & NOGUEIRA, 2014). Beauvoir não
descarta o macro, até porque fala em pluralidade, que não acontece sendo singular
baseia suas narrativas para estendê-las à totalidade do feminino (mais uma prova do
aceitam seus destinos femininos e vendem suas liberdades aos homens para, em
troca, receber luxos; fogem do trabalho que daria sentido às suas vidas e
57
homens) tende a se tornar constitutiva de seu ser
(BOURDIEU, 2003a, p. 82).
sentido particular que, por sua vez, é gerador do habitus. Conforme o corpo se
assemelha à carne para seus avaliadores, maior é a apreciação que se faz por parte
suscita nos outros e sua própria percepção dessas reações são elas mesmas
E ainda.
58
experiências concretas não se ajustam (BEAUVOIR,
1967, pp.59-60).
homem, que são canalizados posteriormente ao marido: “[...] não me afligirás nada
mais odioso do que o que eu me inflijo a mim mesma” (BEAUVOIR, 1967, p. 92). A
mulher (e principalmente a jovem) não tem escolha senão aceitar seu próprio
mistificações que ela se esforça por encher esse vazio” (BEAUVOIR, 1967, p. 95).
perpétuo, atemporal e, por isso, não requer uma história, pois ele é certo. Nisso,
começando por uma reflexão ética e passando para a introdução de uma moral e de
para que ele se adeque às experiências proporcionadas pelos bens simbólicos que
derivam do fato de que ela não é natural, mas dada historicamente. Beauvoir (1970)
59
momentos em que, diga-se de passagem, eles sequer existiram.43 A des-
historicização das mulheres é uma medida arbitrária para instaurar um mito que se
distinção entre a história dos homens e a história das mulheres, como se não
houvesse qualquer relação entre elas. Nem a universidade nem a ciência mostram-
43 Como no Antigo Egito, afirma a autora, local em que a mulher podia acumular capital, ter uma vida
luxuosa e ser comparada ao homem, por mais que não participasse da política.
60
mulheres que possuíram destaque na história foram ou fetiches masculinos (Ave
Fazer com que todos se esqueçam de que essa história das mulheres um dia
naturalizar a história sob a divisão história dos homens e história das mulheres.
Devemos tentar responder: “Como é que o gênero funciona nas relações sociais
Cabe agora restaurar algo dessa história para desnaturalizar os costumes que
A. Casamento
1967). Esta mística que permeia a crença da menina/moça sobre o seu corpo
61
habitus em Bourdieu. Essa magia a qual Beauvoir se refere, o sociólogo denominará
das mulheres conta com dados inequívocos sobre o assunto. Beauvoir, ao falar da
mulher casada, ressalta a obrigação social compulsória em gerar filhos. Mesmo num
cenário socialista, conta ela, seria necessário que a mulher se submetesse a prover
privado – a casa, o lar. A mulher acaba confinada entre quatro paredes, sendo
mediada pelo marido, que transita entre os espaços público e privado, trabalha e
afirma seu Eu: “De uma maneira mais ou menos velada, sua juventude [da moça]
44Beauvoir menciona, no Capítulo III Do ponto de vista do materialismo histórico, no primeiro volume
de O Segundo Sexo, a mulher como presa da espécie e, posteriormente, afirma que ela não é uma
Vida da espécie, mas uma espécie da Vida. Ela existe para a Vida, para dar Vida, e não por causa
desta. Decorre daí a dificuldade de afirmar a Existência da mulher como um ser para-si.
62
Bourdieu (2003a), por sua vez, menciona um mercado de bens simbólicos45
Serão as trocas simbólicas, para Bourdieu, que indicarão “às mulheres seu
dela – para partir ao encontro de outra família de mesma posição social, senão
maior.
realizam entre si, neste caso, entre pai e esposo. A mulher é um objeto enquanto
“Já disse que isso que Freud chama complexo de Electra não é, como ele pretende,
narcisismo infantil.
O marido é uma extensão do Deus que ela viu no pai e associou aos homens,
como algo divino. O pai é a figura que representa a mediação entre o mundo externo
sua apoteose ao casar-se, tornando-se Deus: “Presa a seu papel de dona de casa,
1967, p. 37).
afirma que a espera pelo marido é uma situação social e economicamente dada, que
opõe à visão econômica marxista (a qual Beauvoir adere, mas não ao materialismo
Strauss.
Beauvoir pensa de forma parecida ao dizer que o casamento acontece nas mesmas
utilizam para se referir à posição social que o matrimônio garante. Beauvoir liga a
economia do capital gerado pelo trabalho, nos moldes marxistas, à ascensão social
importante fator para determinar o capital social, ainda que não exclua o capital
econômico – meio de ascender a uma posição social ou adquirir bens que suscitem
na de ser cumprido: é um pedido social para tornar-se objeto, para ser o Outro,
brutalidade contra a noiva: os risos e chistes dos convidados que sabem o que
47 Há uma diferença substancial entre o primeiro e o segundo volumes de O Segundo Sexo. No último
volume temos constantemente o uso da literatura para expressar a situação subjetiva da mulher - os
trechos não costumam ser tão longos e contam com extensões bem variadas. No início deste livro, há
diversos relatos de sexólogos sobre casos de histeria (como Stekel e Deutsch) em conjunto com
trechos de literaturas. Posteriormente, o uso da literatura perduraria (principalmente biográfica). Já no
primeiro tomo vemos os escritores míticos e seus respectivos vieses sobre a mulher, que partem do
mito do Eterno Feminino. Esse uso da literatura, a nosso ver, é uma das marcas de O Segundo Sexo
que, segundo Santos (2012), configuram memórias que dão sentido à intersubjetividade feminina e,
representam o vivido pelo narrado.
67
espera a noiva após a cerimônia: seu defloramento (BEAUVOIR, 1967, p.184). Os
contrato que faz da mulher uma posse. Eles ditam os costumes da cultura
que a mulher adquiriu em seu habitus servil e que o homem dispõe na libido
dominandi.
O homem dirige a mulher que, por sua vez, é a responsável pela casa e
garante o sucesso e a estabilidade dessa união na qual cada um faz jus à sua
trabalho que o marido não pode cumprir, pois está ocupado cumprindo seus deveres
de cidadão (está trabalhando). Ela é levada a crer que o seu trabalho é igualmente
importante e insubstituível.
atribuída ao marido: ele deve manter a ordem e decidir por aqueles que não
o casal, mas que são moralmente concebidas ao homem, que dispõe da virtude de
fazer bom uso delas. Já as mulheres são intemperantes no uso dos prazeres e não
todos os mitos que ele cria nesses esquemas mítico rituais nos quais sua posição
conta Beauvoir, são outorgados pelos homens, sempre relacionados aos deveres da
mesmo período histórico, nos quais o homem apresentava ligação afetiva apenas
segundo Beauvoir, nos quais a mulher pode requerer o divórcio e herdar bens
divididos na relação marido-esposa, mas que foi possível apenas nos casos de o
esposa era muito mais severa, como Beauvoir nos mostra em História, segunda
69
A infidelidade da mulher, nos casamentos ocidentais, é duramente
condenada, enquanto as mesmas ações para o homem são, na maioria das vezes,
homem trai sua esposa, ele é ativo e viril; já a mulher, esquece-se da passividade e
segue sua natureza e justifica a sua infidelidade como fruto das suas pulsões
B. Vida sexual
recepção do homem em seu corpo. A relação sexual é um selo que legitima a união.
Quando o homem toma a mulher (nas palavras de Beauvoir) demonstra que ela está
a seu serviço; não é diferente para Bourdieu (2003a), que entre os cabilas percebe a
A relação sexual é guiada pelo homem: fica por cima da moça inexperiente,
tem a liberdade para apertar a carne do corpo dela e preenche o vazio dela com
70
suas virtudes masculinas. A mulher está amaldiçoada a uma cultura do (dar) prazer;
(BOURDIEU, 2003a).
centra-se na Cabília, onde os costumes não permitiam à mulher tal atitude ativa em
buscar o parceiro: ela deve ser paciente e esperar que ele a reclame como um
troféu.50
50Termo bem adequado para ilustrar as categorias utilizadas por Bourdieu sobre a acumulação de
capital simbólico: prêmios, medalhas, títulos, diplomas etc., como formas de capital institucionalizado.
71
passo que, num mundo em que a mulher é
essencialmente definida como fêmea, é necessário que
seja integralmente justificada enquanto fêmea. Por outro
lado, vimos que a ligação do geral e do singular é
biologicamente diferente no macho e na fêmea:
cumprindo sua tarefa específica de esposo e reprodutor, o
primeiro encontra certamente seu prazer; ao contrário, há
muitas vezes na mulher distinção entre a função genital e
a volúpia. Embora pretendendo dar à vida erótica uma
dignidade ética, o casamento, em verdade, propõe-se
suprimi-la” (BEAUVOIR, 1967, pp. 176-177).
2003a).
maior parte das mulheres casadas, conta Beauvoir, atinge o orgasmo em relações
Dominação Masculina devido ao tabu que isso representa nas sociedades cabilas -
feminino. Beauvoir (1967), por outro lado, na França, percebe mulheres que
72
procuram liberdade nas relações, por mais que elas sintam que devem prestar
do casamento.
desejo e o prazer. Eles se servem e vão embora. O amor que prometem à menina
51 Ambos os autores têm consciência disso, por mais que Beauvoir seja mais assertiva nesse sentido.
No anexo Algumas questões sobre o movimento gay e lésbico em A Dominação Masculina, é difícil
acreditar que Bourdieu coloque casamento e vida sexual na mesma categoria analítica, até pela
forma como descreve o amor. É sempre bom ter em mente que os estudos etnográficos levados a
cabo por Bourdieu dizem respeito ao povo cabila e não aos franceses, como faz Beauvoir - por mais
que as notas de rodapé de Bourdieu contemplem o mundo exterior à Cabília e a própria França.
52 Beauvoir (1967) diz que é comum as relações lésbicas começarem entre amigas: já possuem
confiança, dividem toques sem segundas intenções, partilham segredos, contam seus problemas
sobre os rapazes e fofocam sobre os maridos. As amigas partilham uma intimidade que, em alguns
casos, configura uma potencial relação amorosa, e não veem mal algum em experimentar toques
diretos, carícias ou beijos. E não há o medo da penetração, o que torna mais libertadora a relação
sexual. A sensação de ser carne não acontece, pois não há nada que ameace o corpo como faz o
pênis.
73
A virgindade da mulher tem uma repercussão no macho e instiga o seu
desejo. (BEAUVOIR, 1967; BOURDIEU, 2003a). É a terra a ser semeada nos mitos
fecundação e a fertilidade são valores que o macho personifica nos corpos, e a eles
não escapa nenhuma dessas qualidades. A vida sexual não os prestigia por refletir o
desejo dos sujeitos, embora seja no matrimônio sua contemplação: o casal deve
Desta forma, a vida sexual se confunde mais uma vez com o casamento, pois
A vida sexual parece estar sempre atrelada a algum ritual ou, quando não, a
campos além da própria sexualidade; ademais, parece que são vistos, em última
hímen aguarda para ser rompido pelo pênis. O prazer é um interesse secundário.
mulher: ela fala sobre as mulheres e o Eterno Feminino que as atormenta. Bourdieu,
por seu turno, fala da construção social dos corpos, e o prazer é pouquíssimas
1967, p. 183). Não apenas o casamento, mas outras situações sociais contribuem
que ela [a esposa] não traz em si um germe estranho; quer [o esposo] a propriedade
integral e exclusiva dessa carne que se torna sua” (BEAUVOIR, 1967, p. 18).
Atos de honra destacam ainda mais a virilidade num homem. O prazer, por
outro lado (ou o desejo do prazer) é sempre objeto moral sujeito à negação,
seu casamento, e que refletem na visão que outros homens terão de seu marido se
atividade que os sujeitos podem ter uma vida sexual e não uma Vida sexual. 55 O
54 Imaginamos que Beauvoir não pense apenas nas pessoas casadas, mas em relações entre pares
de forma geral.
55 Beauvoir utiliza esse jogo de palavras quando refuta argumentos biológicos. Vida (com maiúscula)
é uma essência filogenética de todas as mulheres, ao passo que vida (com minúscula) é
ontogenética, singular e depende das experiências vividas pelo corpo feminino.
75
Desta forma, as mulheres se comprazem na união com homens cujas economias e
posição social sejam próximas de sua família de origem ou de sua posição atual.
desejo aplicado aos corpos é provocado pelos valores que se associam ao corpo,
mais jovens e menores que eles (BOURDIEU, 2003a). Beauvoir (1967) denuncia no
capítulo A Mulher Casada o medo da mulher de tornar-se velha: o corpo perde sua
casamento, que conduz o desejo da mulher pelos valores sociais que a tornam um
Beauvoir (1967), é a vida sexual livre que permite à mulher escolher os seus
machos sedentos pela carne e, assim, desfrutar de seu próprio corpo pelo encontro
e desejar o noivo escolhido pela família (ou tentar acreditar que o deseja e que isto
seria o melhor a ser feito por seguir a moral que visa uma vida feliz e duradoura).
qual ele a desvirgina, mostra que é a carne que importa: seu corpo, rasgado pelo
76
masculino arranca da mulher a possibilidade de prazer por não ver nela um ser
desejante, uma vez que os mitos nos levam a crer que o desejo da mulher é o que
há de mais pecaminoso.
mulher, visto que uma mulher preenchida por prazer é uma mulher que sentiu a
potência masculina: a masculinidade preenche o vazio feminino. Por mais que isto
seja considerado, no universo masculino, como ponto de honra, vale mais a intenção
(2003a).
C. Lar
subentende suas tarefas e mostra que a esposa está encerrada a quatro paredes.
quando a casa se transforma em lar que sua carga simbólica se acentua, pois até
BOURDIEU, 2003a, p. 28). A fonte é onde o homem encontra a mulher pela primeira
77
vez; é também o lugar no qual ela o domina, montando-o para ensinar-lhe o prazer
do sexo: “A mulher, mais astuciosa, ensinou-lhe muitas coisas: ‘Deita-te, disse ela, e
2003a, p. 28). É na casa, com efeito, que o homem recupera seu domínio sobre o
mundo.
é iniciada, na mocidade, ao seu destino social, que implica também seu papel
sexual, momento em que seu corpo passa a ter um sentido confuso: é vivido por ela
em relações nas quais sente o corpo distante, como se não lhe pertencesse.
Seu corpo passa, assim, da tutela do pai para a do marido e, com isso,
diferenciado (está casada) e a jogar neste mercado de bens simbólicos no qual o lar
torna sua própria imanência: é nele que se refugia de outros homens, estando à
disposição apenas daquele que escolheram para ela ou com quem escolheu casar-
se.
para aliviá-lo das tensões, permitindo que faça uso de seu corpo. A mulher, no
Anjo na Casa (MACEDO, 2005), por vezes comparada aos anjos assexuados de
e responde: “Elas não são nem anjos nem demônios, nem esfinges, são seres
1970, p. 286).
progresso de seu marido, mesmo que não queiram, que a gravidez lhes pareça
aterrorizante ou que não queiram cuidar do filho. O lar delimita os mitos e os encerra
à mulher.
destaca nas cozinheiras um ar de maestria ao lidar com a magia do fogo, quando ela
são suficientes para que ela se contente com seu trabalho doméstico assim como o
produtora de transformações tal qual os homens. Mas, nem por isso, deixam de ser
É na cozinha, domínio da mulher no lar, que mostra seus dons e sua natureza
que estes não fazem como aquelas: eles reinventam a prática culinária adaptando-a
56 Ora são anjos ora são demônios; ora são santas ora são feiticeiras; são também a vida e a morte.
Beauvoir (1967; 1970) está o tempo todo apresentando as diversas faces que os homens atribuem às
mulheres. Já Bourdieu, em A Dominação Masculina, não toma as inversões simbólicas em
consideração, embora o faça em outros livros, como n’O Poder Simbólico (2003b), em que as
inversões não dizem respeito especificamente às representações simbólicas da mulher, mas às
renovações dos estilos de vida das posições sociais, por meio das quais funciona a distinção.
57 Daí surgem os concursos gourmets entre chefs, na França (2003a). O fato é que, porém, a
culinária não oferece um capital simbólico tão denso quanto o de um lutador profissional, jogador de
futebol ou advogado.
80
Isto serve para mostrar como a necessidade de novos elementos de distinção
cozinha, mesmo legitimado entre seus congêneres, não passa a ser mais viril que
habitat natural da mulher que, nascida para realizar sua função nesse espaço, deve
acredita possuir o dom para criar, cuidar e cozinhar, e que possui o dom da
D. Trabalho
senhor-escravo, a qual elas costumam se submeter por não terem materiais para
58 Que guarda semelhança ao que os gregos chamavam de telos: o fim particular de todas as coisas;
o seu lugar no cosmos. Pode-se dizer que Beauvoir questiona o telos da mulher ao negar-lhe o lar
como fim que dá sentido à sua existência.
59 Habilidade dita feminina que funciona como uma espécie de clarividência que não é senão a
valor, elas não contribuem para os ganhos da vida: não têm poder aquisitivo, não
saem para trabalhar, não são instruídas para os bons serviços, são vistas como
mulher] procurará um marido de situação superior à sua própria, esperando que ele
‘vença’ mais depressa, vá mais longe do que ela seria capaz” (BEAUVOIR, 1967, p.
170). Durante sua transformação em mulheres, são levadas a acreditar nas regras
do jogo social que as conduzem a um capital matrimonial que as fazem crer que o
marido é aquele que faz mais,60 e que instaura o habitus como disposição às
NOGUEIRA, 2014).
Segundo Sexo, que os tempos estavam mudando para as mulheres, que estariam
em O Segundo Sexo.
60 [...] não visem nem alto nem baixo demais; não sejam romanescas e sim realistas” (BEAUVOIR,
1967, p. 173).
61 Beauvoir mostra, em O Segundo Sexo, resultados do inquérito de Claire Laplae, realizado entre
1945 e 1947, respondido pela burguesia belga, em que: 1 em 2 mulheres escolhem seus
casamentos; 1 em 2 mulheres dispõem do imprevisto para tornarem-se noivas; 8 em 10 mulheres
tomam a iniciativa em procurar o casamento. Outros dados são: 1 em 4 mulheres pensam em não
casar a casar-se mal; 2 em 10 pais conservariam as filhas consigo; 1 em 5 mulheres creem que o
casamento ainda é um negócio.
82
próprio da classe. Este comportamento insinua a competição entre agentes de um
mesmo campo, como relata Bourdieu (2003b), por um prêmio, adquirindo todo tipo
de vantagem (todo tipo de capital) para vencer a disputa que, para Beauvoir, giraria
(OLIVA, 2013).
construção de identidade social e coletiva” (ALVES, 2014, p. 25). Contudo, isso não
precisar, a um não viver sem, enfim, a uma relação de estreita dependência que
conquistas dos homens que admiram como as suas próprias, o que as impede do
62Bourdieu (2003 b) fala das disputas regionalistas e identidades de regiões quando se refere ao
tema.
83
É especialmente no período da Segunda Guerra Mundial que as mulheres
A igualdade formal, por outro lado, não significa igualdade material, muito
de ser dependentes dos homens. E alguém que não depende de outro para existir
materialmente está condenado a fazer algo de si mesmo com a liberdade que lhe é
84
este trabalho. A esfera do trabalho parece explorá-la, acumulando funções
de alto valor estético, são prostitutas aos olhos de Beauvoir (1967). O trabalho delas,
doar seu corpo e seu tempo aos homens para que eles façam algo delas (OLIVA,
mulher do homem, e que permite não se vender ou ser comprada, já que possui
existência e constitui um material que lhe é próprio, antes obtido por meio do
homem: o capital econômico, com o qual tem a oportunidade de escapar das antigas
desejos. A vida sexual tal qual se apresentava não é mais uma obrigação, tornando-
se uma opção; a casa/lar não é uma restrição, mas uma transcendência entre o
1970).
consciência, pois escolhe fazer algo de si e mostra aos outros o que escolheu fazer.
A partir daí, entra no jogo de classes sociais como os homens fazem, porém, os
85
O trabalho, em Beauvoir, adquire uma conotação muito próxima daquela
para transformar a natureza. É pelo trabalho que o homem63 deixa suas marcas na
história,64 que só pode se tornar produto humano (deixando de ser produto natural)
sentido de Marx) dos homens, sendo, portanto, transformada para servir aos seus
dos homens impresso na mulher. Ela se torna o que é por que seus dominantes
fizeram dela o que queriam. Dessa forma, a mulher cumpre o papel de servir às
necessidades dos homens, assim como como as janelas foram trabalhadas para
ventilar a casa, o teto para proteger do sol e da chuva e as paredes para impedir a
que ela faça o que o homem necessita (LESSA & TONET, 2011). O trabalho do
funcionamento da ideologia pelo habitus, afirmando que a dominação da consciência (da mente)
passa antes de tudo pelo corpo, logo, libertar-se da ideologia (coisas na mente) não significa libertar-
se do habitus (coisas no corpo).
86
historicamente construídas, fazendo da mulher um objeto entre tantos. A diferença é
sua força de trabalho para transformar esse meio, produzindo história. Entretanto,
dominação masculina. A força de trabalho da mulher pertence aos homens, pois são
eles quem orientam os projetos delas pela objetivação do trabalho feminino aos fins
desafio de apropriação de sua própria força de trabalho para, a partir daí apropriar-
Ainda assim, para Beauvoir, o trabalho no mundo capitalista não garante total
liberdade para a mulher, uma vez que a extração da mais-valia continua sendo um
empecilho para a mulher trabalhadora (MARX, 1996). Por esse motivo, o estudo de
outras mulheres veteranas e têm total liberdade para lidar com seus negócios, além
67Alves utiliza a palavra sororidade para se referir à união entre mulheres, enquanto solidariedade é o
termo cunhado para referir-se à mesma ação coletiva dos homens entre si. Por ser uma herança da
Revolução Francesa na qual, mais uma vez, os homens foram os protagonistas, predominou o uso da
palavra solidariedade.
87
Para Marx, o trabalho não transforma apenas o mundo objetivo, mas também
natureza, ele passa a possuir novas habilidades e a pensar o mundo em que vive de
outra forma (LESSA & TONET, 2011). A prévia-ideação de Marx, vale dizer, a
trabalho não apenas transforma a mulher como permite que a ideação apareça na
forma de projetos que a desdobram num vir-a-ser. A mulher que domina o seu
mesma e produz valor e conhecimento, faz-se essencial que ela se aproprie deste
seus pares: como todo conhecimento versa sobre a interação com a natureza, a
88
A maior qualidade do homem, segundo Beauvoir, é a transcendência,
que seja algo a todo instante. O homem está num mundo construído para si, lugar
onde é permitido transitar e no qual “[...] encontra em todo caso sua salvação por
(LESSA & TONET, 2011, p. 26), mas também das mulheres. É pelo trabalho que
com mulheres cuja imagem de si mesma está ameaçada por mitos que dividem
a mulher o acata como patrimônio social, ainda que seja uma naturalização visando
materialidade da existência.
freudiana, é tratada como trabalho por Beauvoir por ser indissociável dos mitos
sobre a mulher - ou mesmo no sentido prático que a mulher encontra para disfrutar
Assim, a sexualidade da mulher deve estar alinhada com aquilo que a espera
em seu futuro trabalho: como esposa, sua força de trabalho para limpar, cozinhar,
costurar e até fazer compras é a mesma demandada para dar prazer ao marido e
cuidar dos filhos. A sua sexualidade, muito bem orientada para a feminilidade servil,
direciona o desejo preparando o corpo para vender-se de bom grado e que faz crer
que são tarefas habituais de todas as mulheres, isto é, deveres naturais a serem
mulher ao acreditar no discurso veiculado pelos homens, que prepara o seu trabalho
filhos e o marido).
90
marxistas e freudianas, seguidas por uma complementaridade entre ambas pela
produtivo - dado que projeção, sublimação e recalque são termos utilizados para
sua praxiologia (teria das práticas), ou seja, conjuntamente com uma perspectiva
para evidenciar a perspectiva objetiva do mundo. Com efeito, o trabalho não pode
Segundo Passos (2000, p. 46), “Nós [mulheres] não somos por causa do
nosso sexo, mas nos tornamos pelo que nos é ensinado e cobrado, em decorrência
“Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” (BEAUVOIR, 1967, p. 9). Só existe divisão
sexual do trabalho por uma perspectiva biológica do destino de cada sexo e pela
91
sexual é o desejo do trabalho, sendo que, em Bourdieu, se reflete no habitus
que eles são levados a desejar, o que permite que escolham os seus respectivos
futuros a partir do que a sociedade espera deles (BOURDIEU, 2001). A solução não
é outra senão tomar as rédeas da liberdade e ter consciência dos atos de má-fé,
gênero: nem toda mulher precisa ser feminina e nem todo homem, masculino. Esta
dos projetos pessoais das mulheres no mundo do trabalho para além da casa, da
Quando a mulher se casa, segundo Beauvoir (1967), ela não transcende, pois
não é convidada a agir sobre o mundo público, sobre a infinidade do universo.68 Ela
logo encontra o tédio e a fatalidade do tempo. Angustia-se com o chão sempre sujo,
não encontra nada que a satisfaça como quando era menina e desfrutava do lar
materno. Com o trabalho, a mulher encontra certa liberdade, mas para isso é preciso
que o mundo público do trabalho seja comum às atitudes tanto masculinas como
68 Para Beauvoir (1967), algumas mulheres se casam por não haver trabalho melhor que o de
esposa, portanto, são sustentadas pelos maridos e permanecem a maior parte de suas vidas dentro
da casa.
92
femininas, como somos levados a entender pelas leituras de O Segundo Sexo e de
A Dominação Masculina.
E. Mercado
indivíduo dê sentido ao futuro que se projeta por meio de ações imbuídas de algum
alteridade, que não são as mesmas entre os trabalhos de homens e das mulheres, o
que nos conduz à realidade da divisão sexual do trabalho. Com isso, as expressões
homem.
93
reconhecem como tais por cumprirem as exigências morais dos códigos masculinos,
A ida ao mercado físico, para os cabilas, segundo Bourdieu, faz parte do rito
negatividade à classificação que se opõe à primeira (quem é) por ela não ser como
vale dizer, à representação que se sobrepõe às outras, que é definida como natural
94
(aquilo que é) e que marca a violência simbólica como assimetria de poder de uma
natural do homem, conforme os mitos que decidem o curso que deve tomar a esfera
pública (FOUCALT, 2014). Ele também se reproduz no lar pelo fato dos mitos
o valor que o masculino encerra por não poder ser banalizado. Mesmo entre os
masculino a ser reconhecido por outros homens como o mais viril, o mais honrado, o
mais homem.
homem é melhor que o outro. É por meio do jogo que lutam entre si para alcançarem
95
que estabelece um arbitrário cultural (a cultura a ser seguida) e cumprem instituir
femininas, até o momento em que ocorreu a separação entre uma porção masculina
vontade para reivindicar suas pautas políticas, enquanto o último divide a luta
Mesmo quando se abordam questões das atuais políticas dos grupos LGBTs,
o masculino conta com uma atuação mais livre do que o feminino; o habitus
masculino permite que os agentes que se identifiquem como tais reconheçam seus
que se sente apreensivo por ocupar um espaço ao qual sente que não pertence,
sobre os homens decidirem a cultura a ser vivida, uma vez que a mulher não é
androcêntrica.
96
Trata-se, sobretudo, de uma dimensão política do trabalho, no sentido que ele
Em outras palavras, é por todos serem livres para escolher e agir que podem
maior contrapeso entre o mercado e o trabalho é o tipo de capital mais influente que
da mulher. Por outro lado, para Bourdieu, trabalhar, conseguir seu sustento,
aumentam o capital social e o capital cultural, bem como o capital simbólico, mas o
pelos mitos, contudo, não pode ser comprado em face do capital econômico. Há
limites, para Bourdieu (2004), na conversão possível entre os tipos de capitais, que
bens simbólicos que permitem o exercício da cidadania (SILVA & SANTOS, 2008),
público do trabalho não é suficiente para a autonomia das mulheres, pois consiste
98
apenas num capital econômico que pode ser parcialmente convertido. Seria
desfrutando dos mesmos prestígios, ainda que talvez nunca chegando a extingui-los
- já que o campo requer a competição por bens sociais escassos (MIGUEL 2015;
PETERS, 2016a).
mulheres ocupam apenas perifericamente, já que não têm acesso aos bens
como igual.
nos leva a crer que a dupla educação destinada aos corpos já separa de antemão as
masculino.69
relação social é pautada no conflito. Para Kergoat, classe, gênero e raça, nas
69Isto consiste numa dedução e dupla significação do mercado físico das práticas mítico-rituais e do
mercado de bens simbólicos. Bourdieu dedica grande parte de A Dominação Masculina à discussão
da aquisição do habitus, quase sem margens para uma proposta de mudança, o que reforçaria ainda
mais a tese de que Bourdieu é um pessimista (BURAWOY, 2010; MIGUEL, 2015).
99
desatado” e que são coextensivos, uma vez que “se reproduzem e se co-produzem
ao seu sexo: por serem do sexo oposto é que os homens não as levam ao mercado
interessada numa mulher que vive longe das regras da dominação - o que
significaria inferir, bourdiesianamente, que deve estar dentro do jogo sem jogar pelas
regras. Nunca é demais lembrar, de toda forma, que aqueles que desobedecem as
Sexo, responsável pela mudança nas estruturas sociais (sejam elas mudanças
70Podemos evocar os escritos de Bourdieu sobre a Argélia: a raça é essencial para uma análise
entre nação-colônia, seguindo a análise social de Kergoat (2010).
100
símbolos masculinos e ensinando-o a reconhecer e apreciar as situações de honra e
homens (BOURDIEU 2003a). O capital simbólico está para o mercado assim como o
capital cultural está para a escola: ambos, mercado e escola, consistem na exclusão
ademais, há uma influência familiar que determina o destino dos filhos e filhas, seja
F. Educação
casamento como início da docilidade feminina junto com a vida sexual, como
é o ritual que legitima a posição social da mulher, enquanto a vida sexual é o que a
prepara para a servidão: a mulher aprende a postura correta, o que vestir, como
71A própria Beauvoir comenta que as lésbicas são viriloides para os homens: não são homens para
serem masculinas, mas também não se comportam como mulheres: tentam ser algo que não são.
101
falar, e deve compreender as leis naturais que a torna inferior aos homens, e por
de um habitus servil que reconhece em sua illusio a libido dominandi, utilizando aqui
mulher deve se submeter. No lar (podendo ser chamado também de casa) seu
habitus encontra maior expressão criativa, mas sempre tendo em mente que esse é
seu lugar natural, ao passo que aprecia as jornadas de trabalho do marido para o
mercado – representação simbólica da reunião política dos homens, este ser que
homem será capaz de fazer algo da mulher, pois ele é a essência criadora,
casamento é um trabalho e não precisa ir ao mercado; não é essencial que seja ela,
também, agente no mundo público, pois, como sugerem os arbitrários sociais, não é
ali o lugar das mulheres.72 No transcorrer de toda a vida da mulher percebemos que,
desde jovem, ela está sujeita ao ensinamento dos mais velhos, daqueles que
72 Embora seja por intermédio do trabalho, como vimos, para Beauvoir, que a mulher adquire sua
liberdade e justifica, por seus próprios atos, a sua existência, experimentando, assim, a
transcendência.
102
O processo educativo da menina é antes uma violência simbólica, como
demonstramos tanto por Beauvoir quanto por Bourdieu73 que não se restringe à
estamos o tempo todo conhecendo (OLIVA, 2013; 2014). Encontramos, ainda, nos
capital econômico ou do capital cultural, visto que o campo joga com esses tipos de
economia dos povos ditos primitivos consistiam na coleta, na caça e na pesca, entre
73 Ainda que o conceito de violência simbólica seja utilizado aqui exclusivamente como referência
direta à teoria de Bourdieu.
103
educação que divide sexualmente o trabalho e subordina seus agentes ao capital -
acima citado dotado dessa essência mantenedora que reproduz, que perpetua, que
cuida para sobreviver, que alimenta e sustenta os mitos sobre a mulher. Uma
104
incorporados, tornam-se disposições internas que possibilitam as ações individuais
determinados pelo coletivo, que não são qualidades intrínsecas dos seres, mas
sociedade pressupõe uma educação informal que percorre toda a existência desse
grupo, condenando as negativas. A moral ocupa seu lugar nas relações a partir de
ações individuais que mantém a ordem social. A liberdade dos agentes, de outro
modo, não está restrita ao que é a moral: faz-se necessária uma rede de códigos a
ser repassada que, por um lado, não reduz a individualidade humana ao social e,
sua liberdade.
dos sujeitos que vivem segundo essa moral, e suas existências são forjadas nos
mitos eleitos, que são validados coletivamente como propícios para a vida em
sociedade.
esse fetiche de que fala Alves, resgatando Marx em sua reflexão sobre a circulação
então como trabalho de um grupo interessado em sua formação: são homens que se
ocupam desse mercado no qual investem o seu trabalho, logo são eles que gozam
existe” (BAUER, 2001, p. 50). Esta afirmação condensada questiona a liberdade que
a mulher possui – se e como ela possui alguma liberdade para dar sentido à sua
a desigualdade entre os sexos está embasada numa educação que busca construir
qual vivem. Os homens são coagidos pela violência simbólica gerada pelo controle
sociológico sobre as escolas, mas o trabalho demonstra que a educação não está
unicamente nas mãos da instituição escolar, posto ser essencial e estar contida em
discurso. A ação pedagógica (ampliando seu sentido para além da escola), para
inculcação exigido para fazer valer o arbitrário como estrutura social de pensamento,
o que significa um maior grau de violência simbólica quanto mais distantes forem as
75 As aspas enunciam que não há um conteúdo planejado a ser seguido, há a força dos costumes
trabalhando a disciplina dos corpos a responderem da forma esperada a determinadas situações.
Quanto mais disciplinado é o corpo, mais provável que reproduza o que foi aprendido no momento
certo, e mais identificado com a sua prática ele se torna, bem como mais propenso fica o sujeito a
expandir esse aprendizado para outras situações, generalizando-o (BOURDIEU, 2001; 2003b; 2008).
107
Por mais que a violência simbólica aconteça para homens e para mulheres, a
educação destas parece a mais débil, como reafirma Beauvoir (1967; 1970)
inúmeras vezes, pelo fato dela não existir como consciência de si. As experiências
as forças do seu destino para a imanência, enquanto o capital simbólico traz aos
homens (pai, filhos e maridos); o homem, por sua vez, é um aventureiro e explorador
no mundo, não há limites para as suas conquistas. Por ser constrangido a trabalhar,
vida dos homens, podem ser vistos como puro capital simbólico que levam à
relação.
108
e são capazes de se inserirem em toda e qualquer instituição que abrigue adultos e
crianças.
devido à uma moral pensada tendo o sexo biológico como parâmetro, podem ser
falar, cumprimento com beijos ou aperto de mão etc. A educação passa, então, a ser
familiar, mas também um bem social mais amplo, uma vez que a educação dos pais
aos filhos se molda a partir de suas próprias experiências sociais com o sexo - e
como enxergam o sexo oposto, como exposto por Bourdieu (2001; 2003a) e
que podem ser muito distintas entre eles (até únicas), Bourdieu (2003a) e Beauvoir
educação do corpo.
109
partir dessa história, feita por homens e mulheres, encontra narrativas dos grupos
com efeito, uma história de homens e, com ela, práticas educativas por eles
pensadas.
têm o poder sobre a educação (formas de conhecer), bem como sobre a sua
se insere nas relações, a educação se dá por meio dos interesses dos grupos
ideais para o corpo masculino, além de outros idealizados para o grupo dominado
(as mulheres), que receberiam uma educação que docilizaria o corpo (BOURDIEU,
2003a).
lacaniana, a qual evidencia que a criança percebe outros sujeitos quando é objeto
de um olhar.76
76 Ainda que a escritora rejeite, de forma geral, a psicanálise lacaniana (LOBO, 2001).
110
A criança tem consciência da dimensão social quando é percebida como um
objeto, exposta a um olhar estranho, mesmo que seja o seu próprio olhar no
para ser percebida sem levantar constrangimentos, isto é, para adequar a imagem
forma de se comportar diante do Outro para proteger seu Eu. Ela regula o seu
próprio comportamento, embora isso não seja totalmente verdade, já que, como
tenderão a constrangê-la (pela aversão à ação, por princípios morais etc.) até que
111
O Eu só tem consciência de sua existência porque o Outro lhe confere
aprende a adequar o seu Eu a partir de como o Outro vê o Eu, criando uma tentativa
culturais que agem sobre eles. Essa educação (fora das escolas) respeita a
percepção comum ou, ainda, o senso comum acerca dos corpos e o aprendizado
que advém de uma coerção social sobre os indivíduos via senso moral do coletivo,
112
sociedade, que são explicados pelos mitos do surgimento do homem e da mulher
Como a legitimidade das práticas se pauta num duplo arbitrário que des-
educativas que são reconhecidas e tidas como legítimas pelos demais grupos que
passa então a agir sobre os corpos dos indivíduos por meio de agentes que contam
com um habitus ajustado às práticas dominantes, que são vistas como autoridade,
campos e se instala neles pelas práticas dos indivíduos que adentram novos
para inscrever uma educação que vise a funcionar como se fosse primária (as
mais que a casa seja um símbolo ortodoxo, a educação dos corpos masculinos e
77 Que podem ser enquadradas no termo educação secundária (BOURDIEU & PASSERON, 2008).
113
femininos adentram com facilidade qualquer outro campo, ou seja, podem ser
encontradas com facilidade em todo tipo de relação social por ser um conhecimento
perguntar-se “como devo agir sabendo quem eu sou?”. A educação não acontece
somente na casa, mas também no mercado, marco importante para todo homem por
acordo com o fetiche dos homens, e que ser mulher não configura um ser-para-si,
que a mulher está sujeitada a nunca transcender, pois ela está voltada para a
imanência: aprender a se doar eternamente para o homem, como uma boa menina.
7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
78Ainda que, mais tarde, essa ida ao mercado seja vista como mais um dia qualquer na vida de um
homem.
114
passiva; os argumentos biológicos que justificam qualidades mentais pelas
iniciação ritual para meninos e meninas que dificulta perceber os arbítrios das regras
Os autores franceses aqui considerados nos levam a pensar que todas essas
Ser uma coisa entre coisas significa ser um objeto entre objetos. É por
ao seu corpo, portanto, corpos diferentes do seu), que nos tornamos sujeitos.
O Outro antecede o Eu: antes de dizer eu sou alguém nos diz isto é, motivo
pelo qual não estamos livres das influências sociais. De forma idêntica, Beauvoir
(1967; 1970) estabelece a mulher como o Outro pela dificuldade que ela encontra
em conseguir dizer o que ela é, e quando diz eu sou, pode cair na armadilha do
feminino, para Beauvoir, é uma má-fé por confiar sua liberdade às decisões
masculinas; ela não faz algo de si mesma, terceiriza seu poder de escolher e, se o
faz, não é porque não considera importante a sua liberdade, mas porque nunca foi
levada a pensar sobre a sua liberdade e sobre o poder de decidir por si mesma.79
discurso do isto é, visto que é levado a pensar que é livre para escolher dizer eu
sou. O Eu que se diz masculino e o Outro que se diz feminino estão ambos
abarcados pelo mito do Eterno Feminino,80 um discurso que confere qualidades aos
sujeitos, inicialmente coisas entre coisas para depois criar consciência de suas
ações.
mulheres, sempre objetificadas, podem também objetificar aos homens, que são os
essa ambiguidade das relações, afirmando que ora somos sujeitos, ora objetos.
Quando a criança percebe que é um objeto entre objetos, ela alcança um duplo
Sexo. Bastaria viver as contradições entre ser sujeito e ser objeto para perceber que
79 E isto é circunstancial para diferenciar as filosofias de Sartre e Beauvoir, para a qual a má-fé pode
ser resquício de dominação, e nem sempre é um ato consciente. Embora Beauvoir traga a
cumplicidade como fator para pensar a mulher como ser responsável pela própria dominação,
podemos interpretar que ela só é cúmplice da dominação que sofre por agir com má-fé nos
momentos em que é capaz de fazer algo de si mesma. A partir do momento em que possui condições
para pensar sua existência e seguir seus próprios projetos, ela é cúmplice porque já é responsável
pela própria liberdade (BAUER, 2001).
80 O Eterno Feminino, por estar baseado num sistema de oposições criado pelo universo masculino,
usufrua de sua liberdade; porém, alguém que doa sua liberdade o tempo todo não
autora.
é agir com má-fé: na primeira situação optamos por realizar uma escolha que
de igualdade entre sexos, que nada mais é que a igualdade em conviver cuidando
para que não falte liberdade para o outro na relação. Essa moral existencialista
exige a confiança de que o outro terá poder de decisão, o que, muitas vezes,
117
O amor, para além dos casais apaixonados e das relações sexuais entre os
meio familiar, local no qual a criança-objeto não tem outra opção que não seja
condena faz parte da ambiguidade das relações, o que não significa dizer que seja
(TEIXEIRA, 2010).
seria trivial, para Bourdieu, desgarrar o habitus de um corpo, uma vez que não há
Bourdieu parece ser mais incisivo que Beauvoir ao denominar que somos
efeito, o ser para Bourdieu é uma imprecisão entre objeto e sujeito: somos sujeitos
como tais por cobrirem todas as aptidões para o desempenho desse papel:
atividade, nobreza, força, resistência, código de honra e virilidade. Não passaria pela
118
cabeça dos homens que, por estarem no controle, também poderiam ser
Bourdieu leva adiante o raciocínio para dizer que a dominação do homem sobre a
existe e não precisa ser uma preocupação, desde que o diálogo e o consentimento
costumes, dos rituais, das instituições e das práticas que circulam nos meios
públicos e privados. Toda dominação seria, então, uma antinomia pelo fato do
ambivalência que vive o dominante: ele só tem poder porque há outro poder exterior
Pautada numa lei que define como as coisas devem ser, para Bourdieu, o mito do
dos corpos. A lei é o poder arbitrário visto como sobrenatural exercido sobre os
corpos para diferenciá-los; entretanto, ela não poderia existir sem que fosse
81 Nas relações entre parceiros, as posições sexuais geralmente pedem esquemas de oposição,
como os clássicos em cima/embaixo, que denotam superioridade/inferioridade, descrição simbólica
presente tanto n’O Segundo como n’A Dominação Masculina.
82 O que não significa ser determinista ou merecer o rótulo de reprodutivista.
119
elaborada e promulgada por um grupo social, neste caso os homens, a partir de
A lei, para Bourdieu (2001), representa então uma arbitrariedade que leva
(toda narrativa histórica é parcial) as pessoas envolvidas pela lei esquecem das
naturais e que, portanto, não advém de nenhum princípio de visão e divisão, sempre
arbitrário.
É por meio dessa amnésia de gênese da lei que a naturalização cumpre seu o
lembra as origens dessa lei e, portanto, resta a percepção de ser algo natural aos
adquirir vantagem sobre os demais jogadores, o que sugere tanto uma grande
83Características refutadas por Beauvoir no capítulo Destino de seu volume inaugural de O Segundo
Sexo (1970), seguidas de críticas sobre o materialismo histórico dialético de Marx e Engels.
120
concorrência de todos em relação a todos como uma competição pela distinção, cujo
sobre o mundo e moldando-o a seus interesses, tendo como desafio todos os outros
mulheres aliam-se aos homens, fazendo das conquistas daqueles as suas próprias.
Isto se deve, nos dois casos, à incorporação de um capital simbólico que cria
campo.
sobre esse tipo de violência. Entendemos ainda, de forma análoga a Burawoy, que a
denota o que Bourdieu nomeia como senso prático da dominação, vale dizer, a
121
O maior acordo entre Beauvoir e Bourdieu, a nosso juízo, reside na afirmação
de saberes específicos que cada corpo deve desempenhar de acordo com a sua
últimos sem, muitas vezes, saber as razões sociais que os levam a agir dessa forma.
(PETERS, 2016b).
122
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