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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

GABRIELA DUBRULL SAN NICOLAS RABELLO

Avaliação de Política Externa do Brasil II

Seropédica – Rio de Janeiro


2018
Segundo San Tiago Dantas, entende-se que a Política Externa Independente,
iniciada no governo Jânio Quadros e tendo continuidade no governo de João Goulart,
não foi planejada a priori, não estava nos planos de governo para ser implementada.
Na verdade, foi reflexo de um momento no qual o Brasil aspirava realizar seus desejos
nacionais, seu desenvolvimento e emancipação econômica. Ao mesmo tempo, reflexo
do contexto internacional, que dividia o mundo em dois blocos antagônicos. O Brasil,
dentro desse contexto, desejava conciliar o regime democrático com reformas sociais.
O autor divide a Política Exterior Independente em dois momentos: este, a
priori, que inspirou a tomada de decisões baseadas nos fatos acima citados; e o
momento posterior a esses fatos, que resultou no sistema que baseou toda a lógica
da Política Externa Independente e foi ordenado, segundo o autor, em torno de cinco
pontos, baseados nos planos de governo de João Goulart.
Primeiramente, na preservação da paz e no desenvolvimento econômico.
Dentre os fatores que representaram essa atitude, está o reatamento de relações
diplomáticas com a União Soviética, que tinha razões econômicas, como a
necessidade de ampliação do mercado brasileiro devido ao crescente aumento
demográfico da população. E razões políticas, com a defesa da coexistência se
contrapondo ao isolamento, que colocaria os dois campos políticos – socialista e
democrático – em competição. Isso acabaria por ser benéfico as próprias
democracias, que defendem as liberdades políticas e, portanto, seria um incentivo às
reformas sociais; Além disso, a coexistência também estava presente na posição
brasileira contrária ao isolamento de Cuba e à sua expulsão da OEA e à sua presença
e apoio na Conferência do Desarmamento em Genebra, aparecendo como nação não-
alinhada, afirmando, assim, sua posição de independência.
Segundo, na defesa dos princípios de não-intervenção e autodeterminação dos
povos. Uma das constantes do novo governo era a posição de apoio constante a
Organização dos Estados Americanos – OEA, que era o instrumento da não-
intervenção. Defendendo que as nações cumpram seus processos históricos
nacionais, sem pressões externas e imposições de limites à elas. O Brasil foi defensor
da não-intervenção nos negócios internos de Cuba, defendendo que as causas de
sua revolução tinham origem no seu subdesenvolvimento econômico e nas
desigualdades sociais. Portanto, as atenções precisavam se concentrar na correção
desses problemas para haver, assim, uma evolução plena para a democracia,
dependendo da autodeterminação do povo cubano.
Terceiro, na ampliação do mercado externo brasileiro, que se concentrou,
principalmente, na intensificação comercial com a América Latina e com os países
socialistas, mas sem desprezar o comércio com os Estados Unidos e a Europa
Ocidental. A conquista de novos mercados era crucial devido à crescente expansão
demográfica no Brasil, na qual, para conseguir importar mais, era necessário
aumentar as exportações. Com relação aos países latino-americanos, “o governo
deposita confiança no estabelecimento de uma Zona de Livre Comércio na América
Latina e sob a orientação da Associação Latino-americana de Livre Comércio (Alalc)”
(DANTAS, 2006, pg. 125) reduzindo, assim, as barreiras alfandegárias. Com relação
aos países socialistas, o Brasil viu uma oportunidade devido ao alto crescimento de
seus mercados no mundo, então, procurou realizar suas transações de modo a se
adaptar com a economia planificada. Com relação aos EUA e aos demais países
ocidentais, não haveria muitas alterações, “resguardada a linha de absoluta
independência” (DANTAS, 2006, pg. 127).
Quarto, no apoio à emancipação dos territórios não-autônomos. Essa defesa,
primeiramente, se apoiava na solidariedade moral aos povos que estavam sujeitos
aos interesses das metrópoles. O Brasil também explorava suas matérias-primas,
sendo crucial “eliminar as condições de prestação de trabalho que os colocam em
posição artificial de concorrência no mercado internacional” (DANTAS, 2006, pg.
125). Ademais, essa defesa anticolonialista é condizente com a preservação da paz.
Quinto, na política de auto formulação dos planos de desenvolvimento
econômico e de prestação e aceitação de ajuda internacional. A “Aliança para o
Progresso”, que funcionaria como uma forma construtiva de americanismo, não
favorece apenas o financiamento de projetos de caráter técnico e econômico, mas de
programas sociais. Ademais, esse auxílio econômico seria aplicado pelos órgãos
nacionais dos países receptores, imprimindo seus sentidos de desenvolvimento,
garantido na formulação do Convênio sobre Auxílio ao Desenvolvimento do Nordeste.
Então, esses cinco pontos, segundo o autor, resumiram os objetivos segundo
a Política Externa Independente, que apresentou sua ruptura com o golpe de 1964,
com a consumação da deposição de João Goulart e o início do período militar.
O texto de Carlos Fico introduz os detalhes dos procedimentos sobre a posse
da presidência após o golpe militar e a tentativa dos norte-americanos de demonstrar
legitimidade e reconhecimento no exterior, com a sucessiva posse do general Castelo
Branco como presidente do Brasil.
Ainda no contexto da Guerra Fria e na pós tentativa fracassada de invasão de
Cuba em 1961, a “Operação Brother Sam”, liderada por Lyndon Gordon, foi
caracterizada como a tentativa de desestabilizar o governo de Goulart com o apoio
militar, político e econômico norte-americano para tal, demonstrando uma
interferência estadunidense na política interna brasileira jamais vista antes.
Como resultado, sucedeu-se um comportamento subserviente do marechal
Castelo Branco em relação aos norte-americanos, levando a uma convergência
ideológica com os EUA e retrocedendo toda a Política Externa Independente que se
estabilizava desde o governo de Jânio Quadros, com a implementação do Ato
Institucional e suas medidas repressivas. Nesse período, a ideologia dominante da
política externa era o “liberal-imperialismo”, tendo como principal fundamento os
interesses da burguesia institucionalizada, sendo preponderantes os interesses das
elites nacionais dependentes do capital estrangeiro.
É importante frisar, segundo o autor, a relação de profunda amizade entre
Castelo Branco e o militar norte-americano, Vernon Walters, que implicou em diversas
contradições. Ao mesmo tempo, revelava a aproximação explícita entre os dois
países. Essa afinidade entre o Itamaraty e o Departamento de Estado foi expressa
pela alternância de Vasco Leitão da Cunha na embaixada em Washington e Juracy
Magalhães no Ministério das Relações Exteriores. Essa colocação é de extrema
importância, pois ambos eram americanófilos e formalizaram diretrizes de política
externa opostas a Política Externa Independente, propondo, em seu lugar, uma
“interdependência”. “Para Juracy Magalhães, o Brasil reconhecia os EUA como ‘líder
do mundo livre e principal guardião dos valores fundamentais da civilização’”. (FICO,
2008, pg. 151).
A boa vontade era tamanha que intimidava os próprios norte-americanos, com
ofertas de colaboração vindas diretamente da parte do Brasil. Castelo Branco só não
enviou tropas ao Vietnã em apoio aos EUA porque não obteve apoio do Congresso.
Entretanto, conseguiu os apoiar ao romper relações diplomáticas com Cuba e na
invasão da República Dominicana, onde colaborou militarmente. Um episódio que ia
contra diretamente aos princípios de não intervenção e autodeterminação dos povos,
definindo-se em favor da “segurança coletiva das Américas”.
“A premissa da hegemonia incontestável dos Estados Unidos ia de par, no
plano econômico, com a premissa da associação desenvolvimentista dependente e
ambas, por sua vez, remetiam ao esquema de repartição internacional de tarefas, ao
conceito de soberania limitada e ao ideal de irmandade e comunhão pan-americana.
[...] A política externa brasileira ia na direção oposta à da unidade latino-americana”
(MARTINS, 1975, pg. 65).

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