INVERNO 2018
Nº 305 – R$ 10,00
ISSN 2318-7107
A sustentabilidade do planeta carece de uma visão mais humanizada das organizações no tocante à respon-
sabilidade delas sobre a nossa mãe Terra.
Há um movimento muito claro pelas novas formas de se fazer as coisas e as inovações estão presentes em
todos os meios e em todos os lugares, alterando de forma profunda os ambientes sociais, políticos e econômi-
cos, mudando comportamentos, hábitos e atitudes.
Ecossistemas sociais, organizacionais ou corporativos e governamentais precisam planejar ações alinhadas.
Todos nós, cidadãos do planeta Terra, precisamos entender e nos reinventar rapidamente para transformar o
que é necessário.
Teremos que nos tornar híbridos, com uma versatilidade tal que nos permitirá transitar em terrenos novos,
ainda desconhecidos, mas que se fazem necessários.
Temos a impressão que a mais profunda mudança da raça humana já está em andamento.
Sabemos que o exagerado uso e supervalorização técnica leva ao tecnicismo, mas é uma constatação nem
tão difícil de se perceber, que uma nova sociedade está nascendo: mais consciente de si mesma, mais pronta
para viver a ética, sedenta por causas de impacto social e intrépida no coletivo para romper com as barreiras do
nosso momento. Um tempo em que os seres humanos escolhem o melhor para si e criam o futuro que desejam.
As escolhas atuais flutuam entre influenciar a mudança, ser influenciado por ela ou acordar um dia e per-
ceber que o mundo que você conheceu não existe mais.
A GLP está empenhada em andar no mesmo compasso destas mudanças, preservando seu cerne e o legado
da Tradição da qual é guardiã. Além dos benefícios para a preservação da natureza, tem implementado medi-
das que visam também a otimização de custos (papel, tinta, pessoal, correios etc.):
* Campanha para que todos os nossos membros recebam seus boletos, monografias e revistas de forma digital,
reduzindo drasticamente o consumo de papel e consequentemente ajudando na preservação do meio ambiente.
* Ambiente digital de estudos, chamado de Área do Afiliado, onde os rosacruzes podem estudar suas mono-
grafias, ler suas revistas e ficar inteirados das últimas notícias da AMORC.
* Disponibilização de um número de WhatsApp exclusivo para contato com todas as Divisões da Grande
Loja, facilitando o acesso a qualquer informação relacionada à Afiliação Rosacruz.
O frater e a soror estão inseridos neste contexto, afinal, são quase 4 bilhões de pessoas conectadas no Planeta.
Faça parte destas mudanças, utilize as opções digitais!
n MENSAGEM
10 A metacognição
04
Por SUZY GOLDSTEIN, SRC
14 Apolônio de Tiana
Por PERCY PIGOTT, FRC
18 Deus e a Ecologia
18
Por PIERRE-ANTOINE CRISAN, FRC
26 Canção da Paz
“LET THERE BE PEACE ON EARTH”
34 A Vida é o momento
Por ERNIE HOLYER, SRC
28
38 Em busca da Unidade e do Ser – A Feminidade
Por EMMANUELLE JEAN-PIERRE, SRC
45 Ao Luar
Por AUGUSTO DOS ANJOS
48 Sanctum Celestial
“Política cósmica” por H. SPENCER LEWIS, FRC
52 Ecos do passado
UMA HOMENAGEM À HISTÓRIA DA AMORC NO MUNDO
34
2 O ROSACRUZ · INVERNO 2018
O
s textos dessa publicação não representam a palavra oficial da
AMORC, salvo quando indicado neste sentido. O conteúdo dos
artigos representa a palavra e o pensamento dos próprios autores
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As demais jurisdições da Ordem Rosacruz também editam uma revista
do mesmo gênero que a nossa: El Rosacruz, em espanhol; Rosicrucian
Digest e Rosicrucian Beacon, em inglês; Rose+Croix, em francês; Crux
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Barajuji, em japonês e Rosenkorset, em línguas nórdicas.
CIRCULAÇÃO MUNDIAL
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Coordenação e Supervisão: Hélio de Moraes e Marques, FRC
Ordem Rosacruz n
A Ordem Rosacruz, AMORC é uma orga- n Editor: Grande Loja da Jurisdição de Língua Portuguesa
nização internacional de caráter templário,
místico, cultural e fraternal, de homens e
n Colaboração: Estudantes Rosacruzes e Amigos da AMORC
mulheres dedicados ao estudo e aplicação
como colaborar
prática das leis naturais que regem o uni-
verso e a vida.
Seu objetivo é promover a evolução da
humanidade através do desenvolvimento
das potencialidades de cada indivíduo e
n Todas as colaborações devem estar acompanhadas pela declaração do
propiciar ao seu estudante uma vida har- autor cedendo os direitos ou autorizando a publicação.
moniosa que lhe permita alcançar saúde,
felicidade e paz.
n A GLP se reserva o direito de não publicar artigos que não se encaixem
Neste mister, a Ordem Rosacruz ofe- nas normas estabelecidas ou que não estiverem em concordância com a
rece um sistema eficaz e comprovado de pauta da revista.
instrução e orientação para um profundo
autoc onhecimento e compreensão dos n Enviar apenas cópias digitadas, por e-mail, CD ou DVD. Originais não
processos que conduzem à Iluminação. serão devolvidos.
Essa antiga e especial sabedoria foi cui-
dadosamente preservada desde o seu n No caso de fotografias ou ilustrações, o autor do artigo deverá providenciar
desenvolvimento pelas Escolas de Misté- a autorização dos autores, necessária para publicação.
rios Esotéricos e possui, além do aspecto
filosófico e metafísico, um caráter prático. n Os temas dos artigos devem estar relacionados com os estudos e práticas
A aplicação destes ensinamentos está ao rosacruzes, misticismo, arte, ciências e cultura geral.
alcance de toda pessoa sincera, disposta a
aprender, de mente aberta e motivação
positiva e construtiva. nossa capa
A capa desta edição mostra a pintura de J.
Augustus Knapp que retrata uma imagem
idealista de um Templo de Mistérios Atlan-
te. Em Critias, Platão descreve a grande civili-
zação Atlante. Antes que a Atlântida submer-
gisse, iniciados levaram consigo as doutrinas
Rua Nicarágua 2620 – Bacacheri
82515-260 Curitiba, PR – Brasil
secretas que lhes eram confiadas para o Egito
Tel (41) 3351-3000 / Fax (41) 3351-3065 e outras partes da terra onde estariam a salvo
www.amorc.org.br da catástrofe, preservando seus ensinamentos.
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alto Iniciado com quem podemos falar. Este para isso. Em primeiro lugar, uma vez que ele
Mestre também é o guardião da Sabedoria de encarna a Sabedoria de Deus dentro das pes-
Deus dentro dos humanos e contribui com a soas, enquanto os Mestres encarnados, sejam
sabedoria humana junto a Deus. Tudo o que eles quais forem, são apenas uma expressão
nos incomoda aflige esse sábio Mestre, e tudo dessa sabedoria, ele sabe muito melhor do
o que nos torna felizes também faz com que que eles quanto conhecimento podemos re-
esse Mestre seja feliz, pois o Mestre sabe que ceber em um determinado ponto em nossa
nossa angústia é a consequência de nossos evolução. Em segundo lugar, é ele e somente
erros e que nossa felicidade vem da verdade ele quem recebeu de Deus o poder de nos
interior. Não há perguntas que o Mestre não iniciar nos vários planos de consciência que
possa responder, mas há muitas respostas precisamos para entrar em contato com os
sobre as quais devemos questionar o Mestre. Mestres. Assim, por estas razões e muitas
Nosso Mestre Interior conhece tudo sobre outras que lhes deixo descobrir, nosso Mestre
o nosso passado e, como a rosa que desa- Interior é verdadeiramente o Hierofante que,
brocha para cumprimentar a luz do dia, ele em cada uma de nossas encarnações, garante
foi o primeiro a abençoar a vinda da nossa que o processo iniciático que continua den-
alma. Dia e noite, ele tenta, por todos tro de nós esteja em conformidade com
os meios possíveis, ser visto ou ou- o cumprimento da Lei Cósmica.
vido, mas dia e noite vendamos Como mencionado anterior-
nossos olhos e tapamos nossos mente, nosso Mestre Interior
ouvidos. Na verdade, não se é nosso melhor amigo, e seu
passa um único dia sem que maior desejo é que nos tor-
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retiremos do tumulto da vida profana e nos Como tentei esclarecer, nunca esqueça que
isolemos por horas, refletindo sobre alguma seu Mestre Interior sempre fará todos os es-
questão filosófica, pois, no final das contas, forços para aliviar o fardo da sua cruz se você
toda questão é filosófica quando se trata do der supremacia à beleza da sua rosa.
que é bom para a nossa própria evolução e a Assim como a meditação é o ideal inici-
dos outros. Mesmo assim, é verdade que pre- ático da razão, a oração é o ideal iniciático
cisamos nos isolar regularmente dentro do das emoções. Se os seres humanos sobre esta
silêncio de nosso Templo Interior, de modo a Terra amassem mais o Deus de seus corações
nos dedicarmos à meditação mística. e odiassem menos o Deus da compreensão
A questão que se apresenta é como pro- de outras pessoas, a consciência coletiva da
ceder na meditação de forma útil e eficaz. humanidade se acharia altamente purificada.
Conforme indicado nos ensinamentos rosa- Mas a verdadeira oração tornou-se o privilé-
cruzes, a meditação consiste de duas fases; gio de uma pequena minoria, e sua ausência
sendo uma passiva e a outra ativa. Durante atrai mais e mais adeptos da maioria. É, no en-
a fase ativa, devemos definir claramente o tanto, a Estrada Real que Moisés, Buda, Jesus,
tema da nossa meditação e dedicar todo o Maomé e muitos outros aconselharam que
nosso pensamento objetivo por alguns sigamos. Apesar disso, alguns fiéis se ata-
minutos. Após este período de con- cam enquanto oram em seus nomes.
centração, devemos prosseguir Por quê? Através da ignorância
para a fase passiva, que consiste do que é a verdadeira oração e
em transmitir ao nosso Mestre a quem deve ser dirigida. Se os
Interior o assunto que medi- seres humanos orarem a um
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metacognição pode ser abordada e entendimento do Universo e do mundo ao
como a busca do entendimento seu redor, para a sua capacidade de criação
de como os processos de apren- mental, para o fomento à qualidade das suas
dizagem acontecem no âmago emoções ou, simplesmente, para ajudá-lo
do nosso ser, com vista a aprimorá-los. Em a melhor entender como praticar um de-
sua acepção mais corrente, ela diz respeito terminado experimento e dele assimilar as
aos processos de aprendizagem em ambien- mais efetivas possibilidades apresentadas.
tes formais, de aprendizagem escolar, por Só para incitar a nossa curiosidade, tra-
exemplo, mas esse conceito também se apli- zemos aqui um caso típico de metacognição
ca ao universo das emoções ou dos proces- da emoção: sabem aquelas situações – que
sos criativos, dentre outras possibilidades. em alguma medida todos nós passamos um
John Flavell (Stanford University, 1970) dia na vida – em que ao percebermos um
definiu a metacognição como o conhecimen- pequeno animal nas proximidades, como
to que as pessoas têm sobre seus próprios pro- um camundongo, uma lagartixa ou um sapo,
cessos cognitivos e a habilidade de controlar por exemplo, subimos na primeira mesa ou
esses processos, monitorando, organizando, e cadeira que encontramos e nos colocamos
modificando-os para realizar objetivos con- a gritar desvairadamente por socorro?
cretos. Para ele, a metacognição está vincula- Como a metacognição da emoção,
da à habilidade de refletir sobre uma deter- especificamente, poderia ser utilizada
minada tarefa – por exemplo, ler, calcular, nessas situações? Qual seria a sua efetivi-
pensar, tomar uma decisão – e, por nossos dade? Ela ajudaria a melhor entender as
próprios meios e escolhas, selecionar e usar o nossas reações emocionais? Em que ela
melhor método para resolver aquela tarefa. transformaria o nosso comportamento?
Aqui, especificamente, propomos que No que ela nos auxiliaria na nossa percep-
você conheça esse recurso, reflita sobre ele ção de mundo? Afinal, sabemos que bi-
e o assimile, se possível, buscando utilizá-lo chinhos tão pequenos não nos causariam
para o aprimoramento das estratégias de problemas, caso deles não tivéssemos tan-
aprendizagem que contribuem para o de- to medo! Aqui entra, então, com a prática,
senvolvimento da sua senda mística, sejam a nossa capacidade de entendimento de
essas estratégias voltadas para a percepção como funcionam as nossas emoções.
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tar, pense no porquê da sua reação. O que está levando você a fazer tal
escândalo frente a um efetivo não-perigo? O que você carrega da sua
história que o leva a tal comportamento? Exatamente enquanto gri-
ta, perceba os componentes da sua reação, mesmo o seu exagero, e se
questione sobre a real necessidade de se comportar daquela maneira.
Ou em que raízes esse comportamento está respaldado. Isso é meta-
cognição da emoção: é a busca do entendimento de como os processos
ligados à emoção acontecem e como nós os desempenhamos no âmago
do nosso ser, visando à sua transformação e ao seu aprimoramento.
Provavelmente você, aos poucos, conseguirá transformar essa sua ca-
racterística, com base no apaziguamento, no entendimento, dos seus
processos e entraves emocionais. Claro que aqui se inscreve incontes-
tavelmente a necessidade do desejo de mudança, de transformação
de um estado atual, para outro com características aprimoradas.
Enquanto místicos, ou aspirantes a esse lugar, pense em quantas
incontáveis vezes nos surpreendemos enunciando algum impropé-
rio em situações de indignação, quando estamos no trânsito, diri-
gindo, ou em alguma outra cena, em que nos sentimos indignados
com as ações e atitudes dos outros! Como sabemos que as nossas
expressões de rancor verbalizadas, ou não, criam sua contraparte no
Cósmico, esse exercício aqui proposto para que trabalhemos as nos-
sas emoções metacognitivamente seria de grande auxílio. Que tal
tentá-lo quando esses eventos ocorrerem? Isso é um convite, ok?!
É muito interessante observar que o maior ganho, nesses trabalhos
de observação sobre que mecanismos utilizamos nos nossos processos
de aprendizagem, é o empoderamento do nosso ser. Com eles, nós mes-
mos descobrimos os nossos entraves e buscamos resolvê-los. Ressalvado
o valor inestimável de ajudas possíveis que venham do nosso exterior,
somos nós mesmos que, a partir de recursos e técnicas que nos são ofere-
cidos, aprendemos a nos conhecer, a nos transformar e a avançarmos em
direção a uma melhor qualidade da nossa aprendizagem, da nossa exis-
tência, enfim. Esse é, em verdade, o eixo de toda a aprendizagem, pro-
posta pelas nossas monografias, para o nosso desenvolvimento místico.
Tomemos, pois, o caso da visualização. Os experimentos apresentados
ao longo dos nossos estudos rosacruzes, para que desenvolvamos as nos-
sas potencialidades místicas, indicam procedimentos que devemos ex-
plorar em detalhes, em situações específicas, para que bem conheçamos o
nosso ser, o aprimoremos e, quiçá, o elevemos a uma qualidade superior
de existência. No que tange, por exemplo, à visualização, indicações são
apresentadas para situações as mais diversas, como a de “olhar” para as
cores dos nossos centros psíquicos, com o objetivo de desenvolvê-los.
Mas como “visualizar” as cores corretamente? Qual o brilho que a elas
devemos imprimir? Qual tom lhes é mais apropriado? Ou mesmo, qual
N
beber vinho e deixou até mesmo
uma de suas obras, Bulwer-Lytton de usar calçados, passando a usar
afirmou que: “As almas pérfidas, somente vestes de linho. Submeteu-se,
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a maioria das que habitam o no devido tempo, a cinco anos de silên-
mundo, merecem a esperança e a cio. Em certa ocasião, durante esses cinco anos,
agonia das almas nobres, as poucas que aspi- chegou à cidade de Aspendo, na Panfília, onde
ram e sofrem eternamente”. Não é necessário os habitantes estavam prestes a matar um rico
concordar com esse ponto de vista, mas, mercador que comprara toda a safra de milho
naturalmente, é mera constatação histórica para exportação enquanto eles passavam fome.
o fato de que os homens atiraram pedras Apolônio, com seu semblante de dignidade,
em seus profetas, queimaram seus santos por acenos e gestos, obteve a atenção da turba,
e escarneceram a sabedoria de seus sábios. acalmou sua ira e, presumivelmente, distribuiu
Por causa de sua sabedoria, Apolônio tam- com equidade o milho. Após os cinco anos de
bém foi escarnecido. E quem foi Apolônio? silêncio, diz-nos Philostratus que “suas palavras
Temos um registro completo e razoavel- (de Apolônio) tinham a autoridade das senten-
mente confiável sobre a vida desse grande ças proferidas por um rei”.
místico grego do Primeiro Século. A im- Se é verdade, como S. Marcos afirma em
peratriz Julia Donna, esposa de Septimus seu Evangelho, que sempre podemos reconhe-
Severus, entregou a Philostratus as memórias cer um verdadeiro devoto (iniciado), porque
escritas por Qamis, devotado companhei- este coloca a mão sobre os doentes e os cura,
ro de Apolônio em todas as suas viagens. Apolônio era certamente um verdadeiro ini-
Philostratus foi incumbido de escrever a bio- ciado. Em Aegae havia um templo dedicado
grafia que chegou até nós. Além dessa biogra- a Asclépio, o deus da cura. Nesse templo suas
fia, existe uma história de Apolônio escrita curas eram tão numerosas, que acorriam
por um admirador chamado Maximus, e um multidões ao templo. Tanto era assim, que,
tratado, hoje perdido, escrito pelo próprio quando uma pessoa estava andando apressa-
sábio (algumas de suas cartas ainda existem). damente na rua, perguntavam-lhe: estás indo
Pouco antes do nascimento de Apolônio visitar o moço? Apolônio era conhecido como
de Tiana, na Capadócia, sua mãe teve uma “o moço”, porque então era muito jovem.
visão de um deus. Quando lhe perguntou Durante toda a sua vida Apolônio sempre
que tipo de criança ela daria à luz, ele res- buscou o saber, mais especialmente o saber arcano.
pondeu-lhe: “Eu Mesmo”. “Quem é você?”, Com esse intuito, foi à Pérsia, Babilônia
perguntou-lhe então. “Proteus, um deus do e Índia, entrando em contato com os Magos
Egito”, foi a resposta. e com os Brâmanes da Índia. A primeira ci-
Quando o nascimento estava próximo, dade a que chegou foi Nínive. Ali conheceu
foi ela aconselhada a dirigir-se a um prado Damis, que se tornou seu discípulo e cons-
e aí seu filho nasceu. tante companheiro. Juntos viajaram à cidade
Em tenra idade, Apolônio foi levado a da Babilônia. Apolônio disse ao sátrapa na
Aegae para estudar. Comparecia a discursos so- fronteira que gostaria de falar com o rei. Este
bre Platão e Epicuro, mas sentia maior atração revelou-se muito cordial, e Apolônio aceitou
pela filosofia de Pitágoras, por ele estudada com seu conselho de cultivar boas relações com
grande ardor, adotando a disciplina pitagórica os Magos, os quais, naturalmente, Apolônio
e seguindo-a rigidamente para o resto de sua visitou, descrevendo-os depois como “sábios,
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Roma, Apolônio testemunhou por clarivi- Nos Evangelhos não há nenhum
dência o ato, embora estivesse em Éfeso. relato de que Jesus tenha feito viagens longas.
Mas o Dr. H. Spencer Lewis, em seu livro A
O Iniciado e Vida Mística de Jesus, registra a viagem de
Jesus aos mesmos países (e pelas mesmas
o Mestre Jesus razões) a que viajou o místico de Tiana.
Como Jesus, que entrou em contato com seus
Os registros sobre Apolônio de Tiana são antepassados na transfiguração, Apolônio
razoavelmente confiáveis e, segundo consta, conversou com Aquiles. Os dois sofreram
o grande místico e iniciado grego do pri- perseguições do poder civil. Os dois ressusci-
meiro século A.D. buscou o conhecimento, taram uma menina. Segundo discípulos seus,
especialmente o conhecimento arcano. os dois foram recebidos no céu estando ainda
No Museu do Capitólio existe um busto no corpo. As duas personalidades, depois da
de Apolônio. Sua testa larga e seu rosto bar- transição, apareceram na terra e converte-
budo dão a impressão de dignidade e serena ram a descrença dum discípulo em crença.
fortaleza. Infelizmente, quaisquer obras que Após o falecimento de Apolônio, erigiu-
ele tenha escrito foram perdidas. Muitas de se um santuário em Tiana, onde os devotos
suas cartas, porém, chegaram até os nossos dirigiram-lhe preces durante algum tempo.
dias. Numa carta a Eufrates, conta que Platão Mas, no geral, ele foi esquecido, talvez por
disse que “a verdadeira virtude não precisa causa de parcialidades fanáticas. Teólogos e
de mestre”. Escrevendo a Lesbonax, insiste historiadores cristãos temiam que ele fosse
em que este procure ser pobre enquanto in- revivescido, por autores anticristãos, como um
divíduo, mas rico enquanto componente da rival do fundador do cristianismo. Isso ele era
humanidade. “Não existir absolutamente é a algum grau, e por isso os teólogos cristãos,
nada”, escreveu a outro correspondente, “mas especialmente Eusébio, consideraram-no um
existir é dor e sofrimento”. E ainda, “os bons charlatão. Sua memória foi reavivada por
homens merecem o que possuem; os maus Voltaire, pelo mesmo motivo que tinham os
vivem mal mesmo que sejam prósperos”. antigos autores anticristãos. Foi esquecido
Não é necessária nenhuma instrução espe- novamente, até que Jacob Burckhardt, o his-
cial para notarmos a extraordinária semelhan- toriador alemão do período de Constantino,
ça entre a vida de Apolônio e a vida de Jesus, a ele se referiu como alguém “que anda des-
contada nos Evangelhos. O nascimento de calço, em vestes de linho, que não consome
ambos fora previsto, e foram acompanhados nem vinho nem carne, não toca mulher,
de profecias. Jesus nasceu numa manjedou- doa seus bens, conhece tudo e compreende
ra (sobre feno); Apolônio nasceu num local tudo – até a linguagem dos animais – surge
em que havia feno. Ambos se afirmavam em meio à fome e revolta como um deus,
imortais, e ambos foram considerados a en- realiza milagres após milagres, exorciza de-
carnação de um deus. Os dois foram traídos mônios e ressuscita os mortos”. Isso, uma vez
por um discípulo chegado. Jesus, com doze mais, parece levantar a questão de Apolônio
anos apenas, discutiu doutrinas teológicas de Tiana ter sido mortal ou imortal. 4
“Aprende-se muito mais coisas nos bosques que nos livros. As árvores e
as pedras vos ensinarão coisas que nenhum homem poderá dizer-vos;
vereis que se pode tirar mel das pedras e azeite dos rochedos mais duros.
Não sabeis que a alegria destila de nossas montanhas, que o leite e o mel
escorrem de nossas colinas e nossos vales transbordam de trigo?”.
D
emos uma visão geral da definição possível interação. Porém, antes de exami-
de ecologia, que é uma discipli- nar uma noção espiritualista da ecologia,
na científica. Pode parecer difícil vamos tentar definir um conceito de Deus.
querer aproximar a ciência da O homem frequentemente teve propensão
noção de Deus, mas é preciso reconhecer a fazer uma representação antropomórfica de
que, historicamente, uma separação entre os Deus. Efetivamente, ele se considera como a
conceitos científicos e místicos só apareceu espécie dominante no planeta e sendo assim, é
recentemente nas sociedades modernas. A difícil, para ele, representar um ser mais pode-
descrição da Criação apresentada por várias roso do que ele próprio. Sabemos que algumas
religiões, pode ter feito sorrir muitos cien- religiões dão a Deus verdadeiros sentimentos
tistas modernos que, decerto, não haviam humanos, como a cólera ou a vingança. Por-
compreendido o valor simbólico do texto; tanto, antes de tudo, é necessário abandonar
no entanto, nas escolas de mistérios egípcias esta visão antropomórfica de Deus.
eles aproximavam com muito mais intensi- O místico, por definição, se interroga
dade as noções científicas das espirituais. sobre essas noções. A esse respeito, é im-
Isto decorre em parte do que já dissemos portante esclarecer que a Antiga e Mística
anteriormente: a separação da ciência e da Ordem Rosacruz não impõe nenhum con-
espiritualidade pressuporia, de fato, a exis- ceito de Deus. Logo, o que está explicado
tência de dois sistemas de leis distintos, isto abaixo não corresponde a nenhum dog-
é, que não interagissem entre si. O estudo ma, sendo apenas uma reflexão pessoal a
do misticismo, pelo contrário, nos inclina partir dos ensinamentos da AMORC.
a pensar que existe apenas um único siste- Não se pode abordar o conceito de Deus
ma de leis reunindo os mundos espiritual e sob um aspecto unicamente intelectual: por
físico. A distinção entre os dois deriva, em isso os termos descritivos de Deus constituem,
grande parte, de nossos sentidos físicos, mas para o místico, apenas uma abordagem im-
também dos esquemas de representação perfeita. O vínculo unindo o homem, a Cria-
desses dois mundos. Se Deus existe, neces- ção e Deus é de natureza tão profunda e tão
sariamente Ele é único, por isso parece com- essencial que, às vezes, parece escapar à nossa
preensível que só exista um sistema de leis. lógica que, verdade seja dita, é construída por
Se a verdade relativa pode aflorar de nosso mental, quer dizer, pela parte mais “ter-
forma diferente, isso ocorre devido não só rena” de nossa consciência. Esta dificuldade,
à nossa compreensão, ainda limitada, do que se junta àquelas já relatadas é, em parte,
conjunto das leis, mas, sobretudo, de sua superada por técnicas místicas que consistem
Primeiro, foste mineral, depois, te tor- Deus está presente em cada espécie?
naste planta, e mais tarde, animal.
Como pode ser isto segredo para ti? A resposta mística é necessariamente sim, já
Finalmente foste feito homem, com que todas as espécies vivas emanam da mes-
conhecimento, razão e fé. Contempla ma Alma Universal.
teu corpo; um punhado de pó, vê quão Um dos exemplos interessantes no mundo
perfeito se tornou! Quando tiveres animal é na área do instinto ou comporta-
cumprido tua jornada, decerto hás mento inato. O instinto é a memória coletiva
de regressar como anjo. Depois disso, de uma espécie que evoluiu em um meio.
terás terminado de vez com a terra, e Esta memória situa-se simultaneamente na
tua estação há de ser o céu. Passa de parte espiritual, isto é, a alma, e na parte físi-
novo pela vida angelical, entra naquele ca, quer dizer, no suporte genético formado
oceano, e que tua gota se torne o mar,
cem vezes maior que o Mar de Oman.
Abandona este filho que chamas corpo
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pelos cromossomos. Por isso, convém notar Para ilustrar, peguemos o exemplo do
que, de acordo com a definição de ser vivo “programa” de predação do sapo: o que
que demos acima, pode-se provar a exis- mexe é bom para comer. Se você puser
tência da alma pelo lado físico dos seres; é uma mosca morta diante dele, ele não
um pouco como o observador que olhasse terá nenhuma reação. Agite qualquer coi-
um iceberg de um barco: graças às leis, ele sa como chamariz diante dele e você terá
deduz que existe uma parte submersa, ainda grandes possibilidades de vê-lo se lançar
que não possa vê-la fisicamente. Contudo, avidamente em cima a fim de engoli-lo.
sem a parte submersa, a parte à tona não Outro exemplo de comportamento inato:
existiria! Nosso intuito não é demonstrar a a nidificação ou aninhamento, que consiste
existência da alma, mas sim incentivar a re- no processo de construir ou arrumar o in-
flexão sobre esta noção como um elemento terior de um ninho. Uma experiência foi le-
de explicação do mundo que nos cerca. vada a cabo com o tecelão malhado (Ploceus
Os comportamentos instintivos são com- cucullatus) ou tecelão africano, um pequeno
portamentos inatos, isto é, determinados ge- pássaro cujas técnicas de construção de ni-
neticamente e que não necessitam de aprendi- nho são especialmente complexas. Este pás-
zagem prévia. P. P. Grasse os definiu assim: saro constrói um ninho em forma de saqui-
nho com ajuda de fibras vegetais tecidas de
O instinto é a faculdade inata de rea- maneira elaborada, preso por um laço amar-
lizar, sem aprendizagem prévia e com rado de uma maneira específica. Na experi-
toda perfeição, alguns atos específicos, ência, os ovos do tecelão foram recolhidos
sob certas condições do meio exterior e chocados por canários. Os filhotes assim
e do estado psicológico do indivíduo. criados foram por todos os meios, impedidos
de construir seu próprio ninho, sendo colo-
cados em ninhos pré-fabricados. A experi-
ência prosseguiu durante quatro gerações. A
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construir o ninho são igualmente inatos.
Os animais são nossos irmãos menores Bibliografia: BIÈS (Jean), Sagesses de la terre: pour une écolo-
e as plantas, nossas amigas. gie spirituelle (Sabedoria da terra: por uma ecologia espiritual),
Paris, Les Deux Océans, 1996. PELT (Jean-Marie), RABHI (Pierre),
HULOT (Nicolas), GOLDSMITH (Edward), L’Homme entre Terre
et Ciel: nature, écologie et spiritualité (O Homem entre a Terra
Se tenho uma certeza, é que a vida forma e o Céu: natureza, ecologia e espiritualidade), Genève, Saint-Ju-
uma unidade tanto no plano cósmico, isto é, lien-en-Genevois, Jouvence, 2007. Le Temps (O Tempo), oeuvre
collégiale, Le Tremblay, Diffusion Rosicrucienne, 2005. Site da
unidade de alma, como no plano físico. Internet: Environnement et écologie – www.planetecologie.org
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C
erta noite, em 1955, 180 jovens de premiada com a Medalha de Honra George
várias raças e religiões, reunidos num Washington, pela Fundação Pela Liberdade,
seminário nas montanhas da Califór- como “extraordinária realização para promo-
nia, deram-se os braços, formando um círcu- ver uma compreensão melhor do modo de
lo, e cantaram uma canção de paz. Eles sen- vida americano”. Recebeu também um
tiram que o fato de as pessoas cantarem essa “Brotherhood Award” (“Prêmio Fraternidade”)
música, com seu singelo e sábio sentimento da Conferência Nacional de Cristãos e Judeus.
de “que haja paz na Terra e que ela comece Esta simples ideia, “Que Haja Paz na Terra
em mim”, ajudaria a criar um clima para a e Que Ela Comece em Mim”, que nasceu no
paz e a compreensão no mundo. topo de uma montanha, na voz da juventu-
Quando desceram da montanha, esses de, continua a viajar de coração a coração,
inspirados jovens trouxeram com eles a can- reunindo em toda parte pessoas que desejam
ção e começaram a difundi-la. E, como se tornar-se uma nota numa canção de compre-
tivesse asas, “Que Haja Paz na Terra” lançou- ensão e paz – paz para toda a humanidade.
-se numa espantosa viagem por todo o globo.
Essa canção, escrita pelo Frater Sy Miller e a “Que Haja Paz na Terra”
Soror Jill Jackson Miller, primeiro viajou com
aqueles jovens, para seus lares, suas escolas, Que haja paz na Terra
suas igrejas e seus clubes. Depois o círculo E que ela comece em mim.
iniciado por eles começou a se expandir. Logo Que haja Paz na Terra,
a música estava sendo cantada em todo o país A paz que almejamos ter.
– em escolas, Associações de Pais e Mestres, Com Deus como nosso Pai,
reuniões para comemoração do Natal e da Somos nós irmãos.
Páscoa, e como parte da celebração da Sema- Que eu viva com meu irmão
na da Fraternidade. Tornou-se o tema musical Bis
Em doce harmonia.
para o Dia do Veterano, o Dia dos Direitos
Humanos e o Dia das Nações Unidas. Inú- Que a paz comece em mim
meras entidades a cantaram com entusiasmo E que ela venha agora.
em suas reuniões. A canção foi gravada em A cada passo que eu der.
disco e fita, copiada, impressa em cadernos de Eu semeie a paz.
música, passada de boca em boca. Foi difun- Bis Da Rosa na Cruz da Vida e no Amor
dida pela Holanda, a Inglaterra, a França, a A desabrochar.
Alemanha, o Líbano, a América do Sul, a Ásia Que haja Paz na Terra
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Copyright 1955 por Jan-Lee Music – Versão: Angelina Caldeira Briski e Zaneli Ramos, FRC
Z
aratustra, cansado da solidão da montanha, se colocou diante do sol e de-
clarou que ele também precisava descer para o meio dos homens, pois tinha
se cansado de sua sabedoria e precisava de mãos estendidas para levá-la.
Ele então começou seus discursos incomparáveis para todos os
tipos de pessoas que conhecia em suas jornadas por muitas terras. Os discur-
sos consistiam em quatro séries. No entanto, após ter completado a primeira
série, chegou mais uma inspiração a Zaratustra, talvez tão inesperada quanto a
primeira – aquela que o tinha tirado de seu retiro na montanha. E ele foi cha-
mado de volta para a sua solidão.
Antes daquele momento, ele tinha doado generosamente sua sabedoria a
quem quer que o ouvisse. Palavras ousadas, revolucionárias, inexplicáveis ele
tinha proferido, e foram poucos os que conseguiam aceitá-las. Tinham duplo
sentido e apenas os sábios conseguiam interpretá-las corretamente. Mas ele fala-
va no ponto em que o relâmpago da inspiração o atingia, não se preocupando se
era ou não compreendido, se era elogiado ou condenado.
Quando o fogo de uma sabedoria mais elevada toma posse de um homem,
ele não consegue discutir com ela, nem consegue picá-la ou diluí-la para agradar
ou conciliar aqueles que a ouvem. E, considerando que uma considerável porção
das escrituras se constitui desse tipo de elocução que pessoas de todas as nações
aceitam sem muito questionamento – porque se acredita que seja inspirada –
nos espantamos com a inconsistência da natureza humana.
Por que o mesmo espírito de inspiração, quando encontra uma voz entre os
homens, deveria atualmente ter uma recepção bem diferente? O mesmo aconte-
ceu com Zaratustra. Pois ele olhava para as pessoas e dizia no seu coração:
”
pode ser uma inspiração e um grande guia.
Tudo vai depender do tamanho e da quali- diminui ou ofusca.
dade do pensamento do leitor. E pode-se dizer
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deiras e jogos. Desfrutamos do momento que elas não sentem prazer. Onde não há va-
propiciado por Deus, sem compreendermos les não há montanhas para serem escaladas.
que ele poderá prover uma existência de Quando a vida não oferece “baixos”, está ca-
memórias. Os adultos que se defrontam com rente de “altos” verdadeiros. Sem contraste não
a morte, muitas vezes revivem a fase da in- há comparação: há apenas existência, rotina.
fância, de modo que à semelhança do poeta Permita-me citar alguns casos de vidas
flamengo Paul van Ostaijen podem, uma vez que se transformaram. Uma senhora que
mais, “apreciar o mundo com a admiração de conheço perdeu os dentes e quase todo o
uma criança que vê coisas pela primeira vez”. rosto quando um motorista embriagado
Meus dias encheram-se com momentos abalroou seu carro, de frente. Durante os
de profunda alegria. Comecei a verdadei- meses necessários para restaurar sua mas-
ramente ver, sentir, cheirar, ouvir e tocar. tigação, ela não podia ingerir qualquer
Adquiri compreensão e percepção. Todos alimento sólido (sua boca estava fechada
sabem que quando o corpo está paralisado com fios metálicos). Agora, ela saboreia
a natureza propicia compensação expandin- todo petisco que passa por seus lábios.
do os sentidos do inválido para uma vida Uma de minhas amigas ficou subitamente
de percepção extraordinária e vibrátil. enferma, e perdeu a voz. Comunicava-se
Lutas com o sofrimento imprimem em com a família fazendo uso de uma campai-
seus sentidos a mesma agudeza do melhor nha. Após sofrimento demorado, agradece
aço Solingen. a Deus diariamente por ter podido falar
Por que tantas pessoas passam pela novamente. Um vizinho sofreu uma pa-
vida sem apreciá-la? Por que necessitam ralisia. Depois de anos de caminhar com
de estímulos artificiais, cigarros ou drogas muletas e, mais tarde, com bengala, tem
estimulantes para trabalhar, coquetéis para certeza de voltar a andar normalmente.
relaxar, reuniões regadas a álcool, para se- Apesar de suas fraquezas, as pessoas imo-
rem realmente “felizes”? Em sua busca de bilizadas podem ser as mais felizes. Tendo
felicidade, a maioria das pessoas evita pensar conhecido o aspecto oposto a tempos felizes,
em sofrimento. No entanto, a ausência de estão conscientes do significado de conten-
sofrimento nos deixaria dessensibilizados! tamento. Sua felicidade brota de uma fonte
Quando participei de excursão à costa que não depende de coisas materiais. Elas
do Pacífico, observei focas-elefantes, gigan- enfrentam períodos em que o sofrimento
tescos mamíferos marinhos considerados agudo impede o simples pensamento de
como pouco sensíveis à dor. Não se podem prazer. Quando a dor diminui, manifesta-se
notar sinais de preocupação afetiva entre imenso alívio. O sorriso de um amigo, uma
esses animais enormes. Mesmo as mães pa- flor sobre a mesinha, um travesseiro refrige-
recem indiferentes à sua prole. Os machos rado junto às faces quentes, até mesmo raios
descuidadamente esmagam seus recém-nas- de sol no teto, tornam-se delícias divinas.
cidos em sua ânsia de lutar com outros ma- Essas três pessoas se transformaram,
chos. Esses mamíferos marinhos gigantes- agigantaram-se e descobriram recursos
cos abrem cortes na pele, um do outro, com interiores. Todas elas apreciam a vida e a
derrame de sangue em profusão, mas isso saúde mais do que o faziam antes de serem
fazem de maneira completamente estoica. golpeadas pela desventura. O sofrimento
Se é verdade que as focas-elefantes não lançou nelas uma base para a humildade, a
sentem dor, então, pode também ser verdade compaixão e a estima pelos semelhantes.
AGES
TYIM
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puramente patriarcal. Essa visão que herda- à imagem de Deus; ele os criou, homem e
mos do mundo ainda nos dias de hoje con- mulher os criou (Gn 1). A segunda história
tamina todas as esferas de nossa existência. revela uma degradação da primeira pela
Ao explorar os diferentes âmbitos de nossa passagem da visão à interpretação teológica:
vida cotidiana, profissional, familiar, afetiva Eva, tirada de uma costela de Adão, nos é
e espiritual podemos ter uma ideia de a que apresentada como um agente do mal que
ponto as raízes históricas são duradouras! desproveu o homem de uma felicidade per-
Os valores ditos “femininos”, como a pétua, convidando-o a partilhar o fruto proi-
doçura, a capacidade de escuta, a expressão bido pelo assédio da serpente. Sabe-se que
das emoções, a intuição etc., são indispen- o Judaísmo foi a religião exclusiva do Deus
sáveis ao equilíbrio do ser humano tanto masculino e sabe-se dos esforços de Moisés
quanto ao da sociedade. Seria uma utopia para evacuar a imagem da Deusa-Mãe; o
pensar num mundo de paz, num universo argumento maior foi iden-
em que o amor orientaria os com- tificar a mulher com o
portamentos e promoveria um demônio e impedi-la
verdadeiro sentimento de “Adão e Eva”,
por Marcantonio
de participar do culto
fraternidade entre todos Franceschini, por causa da impu-
os seres? Ainda é possí- cerca de 1680
reza. Entretanto, não
vel realizar tal sonho? somos todos oriundos
“Ousar o femini- da mesma centelha
no” já não é apenas de Vida? Não possuí-
querer ser rentável, mos os ensinamentos
eficaz, acumular e as informações que
bens e poderes: é recebemos como
assumir a vulnera- presentes em nossas
bilidade, aceitar a células? Enquanto
passividade, ou seja, a face do casal pri-
poder ser cauteloso an- mordial, de cujo casal
tes de reagir, saber receber humano é a imagem, é
e não apenas dar. É ainda absolutamente estranha às
optar por escutar o outro e pri- religiões monoteístas, os prin-
vilegiar a negociação antes da força. É cípios feminino e masculino existem
também poder ser mulher sem ser mãe. A em quase todas as tradições espirituais
geração “pós-feminismo” ousará reabilitar que concordam em dizer que os dois prin-
o feminino? Para a reconquista da unidade cípios são de igual importância. Isso não
divina de seu ser as mulheres não deve- quer dizer que o valor do feminino seja
riam ter um olhar novo sobre si mesmas e tão importante quanto o do masculino?
sobre os homens a fim de levá-los a tomar O reconhecimento do eterno Feminino
consciência da parte feminina de seu ser? nos levará talvez a melhor compreender
Na Bíblia, a Gênese nos transmite duas a importância de nossa origem – o sen-
histórias da criação do primeiro casal que tido de nossa vida de seres viventes no
vêm de duas tradições independentes. A Universo! Annick de Souzenelle especifi-
primeira diz respeito à androginia primor- ca: Descobriremos três níveis do feminino:
dial: Deus criou o ser humano à sua imagem, a mulher no plano biológico, o feminino
A
queles que se afiliarem a Ordem Rosacruz, estarão se unindo a
uma Ordem Iniciática, que perpetua a tradição dos Mestres e
da Grande Fraternidade Branca. Dessa maneira, é natural que
se sucedam experiências místicas, ao longo de suas práticas e
estudos rosacruzes. Uma dessas experiências é a Iniciação Psíquica.
Note-se inicialmente que não é o corpo físico que é Iniciado, mas sim
o corpo psíquico, razão pela qual no Ocidente, essa Iniciação se dará
naquilo que para o Estudante é um sonho. O Eu Objetivo, em sua eterna
luta para manifestar em sua plenitude o Eu Interior, também se beneficia
da Iniciação, através do conhecimento e da energia recebidos naquele ato.
“
Aqueles que
estiverem preparados,
verão o nosso Sol.
”
46 O ROSACRUZ · INVERNO 2018
Excepcionalmente a presença do Mestre se fará sentir à consciência de vigília
do Estudante, mas isto não é necessário ao ato de Iniciar. Essa presença, não do
Mestre, mas de seu nível vibratório, se faz sentir antes nas harmonizações e
muitas vezes em sensações ao tato, que serão sentidas nas palmas das mãos.
Fato notável na Iniciação Psíquica é a presença de Luz. É uma Luz
indescritível, mais clara que o Sol do meio-dia, mesmo em nosso país
tropical. Essa Luz foi chamada de “O Sol da Meia-Noite” ou “O Sol dos
Iniciados”; para mim, com justiça, ela pode ser chamada de “O Sol dos
Rosacruzes”. Essa Luz tem um comportamento similar em todas as
Iniciações. Inicialmente ela preenche todo o cenário. Depois ela se
condensa, diminui, transforma-se em círculo e envolve o Estudante.
Normalmente ela se transforma em pássaro, ou seja, um pássaro pousa
sobre o Estudante, então Iniciado. Conforme a tradição será a descrição
do pássaro, assim, para os cristãos, será a pomba; para outros, a águia.
Alguns ensinamentos transmitidos podem superar o nível
evolutivo do Eu Objetivo, dizendo respeito apenas ao Eu Interior;
assim o Pássaro poderá dizer palavras que não serão ouvidas
pelo Estudante, antes de anunciar a vinda do Mestre.
Resta o clímax da Iniciação, que é a presença do Mestre, que
dá o Novo Nome e a Bênção. O nível do Mestre e da Bênção
dependerá do nível Iniciático a ser alcançado naquela ocasião.
Desta maneira há mais de uma Iniciação Psíquica a ser alcançada,
antes de se atingir a Maestria ou o Grau de Rosacruz. Ressalto que a
presença do Mestre é essencial para reconhecer-se uma Iniciação.
Sabemos que a evolução não termina com a Maestria, ao contrário,
a evolução do nível humano é que termina aí; assim, se a Iniciação for
ainda mais elevada, aquele que a preside também o será, até que, em
nosso Planeta, será o Mestre da Grande Fraternidade Branca o Iniciador.
Quando o Mestre da Grande Fraternidade Branca não preside a Iniciação,
a presença da Estrela ou da Luz, é tida por sinal de sua aquiescência.
O Cristo foi Iniciado publicamente, quando do Batismo por João
no rio Jordão. Aqueles que relerem o Evangelho de Mateus, Capítulo
3, versos 13-17, encontrarão na Iniciação ali descrita todos os detalhes
anotados acima. Resta saber quem foi o Iniciador do Cristo. Para mim
foi o próprio Logos Solar, pois aceito a teoria de que cada estrela é, em si
mesma, e em função de seu Logos, um berçário de vida. Por este motivo
a bênção de Lucas “Tu és o meu Filho, eu, hoje, te gerei!” é diferente da
de Mateus “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (Lucas 3,
21-22 e Mateus 3, 16–17. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002).
Tenhamos em mente que há vários níveis de Iniciação. O
Estudante, mesmo sendo Iniciado, ainda não será um Mestre, pois
haverá várias etapas a serem cumpridas ainda até a Maestria.
Finalizando, não nos esqueçamos das palavras do Mestre:
“Aqueles que estiverem preparados, verão o nosso Sol”. 4
O
místico e o estu- co intervém e escolhe, suprema, divina e onipo-
dante de filosofia para ocupar sua posição, tente das necessidades do
podem tender a a pessoa que está mais ser humano, bem como
crer que a política consti- qualificada para pôr fim ao uma intervenção na qual
tui um ramo de atividade estado de crise. Com efeito, podemos ter confiança
e de estudo que está in- na intervenção do Cósmico da parte de Deus e das
teiramente fora dos seus temos uma revelação espe- Forças Cósmicas quan-
campos, mas eles esquecem cial da penetração política do temos necessidade de
que o Cósmico está muito e da compreensão das coi- uma direção suprema.
interessado na política; sas políticas aqui na Terra. Isto não significa, toda-
sem um plano político O nascimento cíclico de via, que não viremos a estu-
de qualquer espécie que um Avatar em cada nação, dar as situações que surjam
seja, o Cósmico não po- a ascensão periódica de um nos problemas do mundo.
deria pôr em obra seus grande guia para orientar Sendo o erro humano inevi-
princípios universais. os pensamentos dos seres tável, nós nos equivocamos
No decorrer de muitos humanos, e a poderosa de tempos em tempos e
anos notei com muita sa- influência de um Salvador estes erros devem ser corri-
tisfação que, nas situações nos tempos de angústia, gidos. Isto está em grande
complicadas, o Cósmi- indicam uma compreensão parte nas nossas mãos.
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dos. Eles só podem ser resol-
vidos por uma compreensão
comum e pela aplicação das
interpretações sensíveis dos
princípios fundamentais.
Deveríamos então ana-
lisar cada situação política
de um ponto de vista in-
ternacional e universal em
lugar de um ponto de vista
estritamente local. O prefeito
de uma pequena cidade não
é apenas o administrador
dos interesses dessa cidade,
mas ele se torna também um
membro de uma hierarquia
mais ou menos universal de
administradores mundiais.
Suas ações, suas resolu-
ções, seus regulamentos, suas
decisões, suas interpretações
e suas ideias não podem es-
tar separados dos interesses A análise É provavelmente ver-
dadeiro que em média o
universais. A cada hora do
dia durante seu período de do indivíduo candidato político esteja
ardentemente desejoso de
administração ele pode se Analisando o indivíduo, ser um administrador me-
tornar uma importante per- não devemos ser guiados lhor do que o seu antecessor
sonalidade nacional ou mes- pelos laços e as afiliações e de fazer da sua administra-
mo ter uma influência inter- com um partido, nem pelas ção um testemunho da sua
nacional. Sua influência so- promessas feitas antes da integridade, da sua bondade,
bre as pessoas da sua própria eleição, qualquer que seja da sua honestidade e dos
cidade pode assumir uma seu grau de honestidade e seus poderes criadores. Mas
importância nacional. Um de sinceridade. Devemos este desejo e esta intenção
presidente é, não somente o considerar as tendências do honesta não são as coisas
administrador dos interesses candidato em situações que mais importantes a serem
do país, mas também faz não podem ser previstas ou consideradas. Devemos
parte do plano de adminis- aguardadas no presente. De- analisar seu caráter, suas
tração internacional. De- vemos julgá-lo, não segundo capacidades, seus métodos
vemos levar em conta suas o que ele quer fazer no fu- de reflexão e sua aprecia-
qualificações para enfrentar turo, mas segundo o que ele ção fundamental das Leis
os problemas internacionais pode fazer nos estados de Cósmicas e Universais.
que podem surgir paralela- crise ou nas circunstâncias Há milhões de pessoas
mente aos problemas locais. atualmente desconhecidas. que votam cegamente para
”
da mesa, vão reger as ações afetaria as Leis Cósmicas.
do candidato quaisquer que A paz universal se torna- pública.
sejam suas proclamações. ria uma condição imediata e
Trata-se da má manei- imutável. Quando a opinião
ra de considerar as coisas pública numa localidade ou assim como é o senhor da
e de votar, visto que ela numa nação está centrada sua vida pessoal. Ele deve
alimenta a situação que é em certas reivindicações que então assumir a responsabi-
tão seriamente criticada. são justas, razoáveis e respei- lidade de seus próprios atos.
Houve no passado can- táveis, em particular para o É correto e conveniente
didatos que foram eleitos bem geral de todos, os pode- que os membros da Antiga e
segundo suas promessas res políticos, os partidos e os Mística Ordem da Rosacruz,
e eles sacrificaram seu dirigentes não contam mais tentando trabalhar em har-
sucesso futuro e sua repu- e nada podem fazer ante a monia com as Leis Cósmicas
tação permanecendo fiéis decisão dos seres humanos. universais, analisem as si-
às promessas feitas e cum- Um indivíduo eleito para tuações políticas, escolham
prindo suas obrigações sem uma função pela opinião da seus candidatos e votem
levarem em conta pressões maioria que crê e que quer naqueles que acreditem
exteriores e tentações. que aquilo que ele faz seja honestamente que vão se
Podemos encorajar os correto, recebe do Cósmi- ajustar às Regras Cósmicas
homens que tenham uma co o poder de realizar as e prestar ao povo o melhor
bela personalidade e uma reivindicações do público. serviço possível. Faz parte
bela inteligência a se in- Ele tem receio de não sa- dos nossos deveres o tentar-
teressarem pelas questões tisfazer perfeitamente essas mos tornar justas as condi-
políticas, mostrando por reivindicações. Neste caso, ções mundiais num sentido
nossos votos que damos o público deve assumir toda nacional ou no seio de uma
prova de discriminação e a responsabilidade do seu comunidade, assim como no
que abordamos o assunto de julgamento. Esse indivíduo âmbito social e particular.
maneira analítica e Cósmica, se encontra numa posição Afinal, somos os guardi-
após termos orado. Não há em que pode exercer uma ães dos nossos irmãos num
na Terra poder de natureza profunda influência e ser amplo sentido e o carma de
mundial maior do que a opi- o senhor do seu próprio uma nação pode se tornar
nião pública. É um segundo destino no sentido político, uma parte do nosso. 4
3 Legendas:
Texto inspirado em O Pantáculo nº. 13 – 2005 – Eckartshausen – Viagem através da nuvem sobre o santuário.
S.I.
A
humanidade recebe de tempos em tempos personalidades-
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Louis-Claude de Saint-Martin –
Filósofo e místico francês, Louis-Claude de Saint-Martin era de
uma família nobre de Amboise, em Touraine, na França. Nasceu
no dia 18 de janeiro de 1743 e cedo manifestou uma inteligência
intensa, ávida de idealismo e sentimentos piedosos que, quando
adulto, foram plenamente expressos e fizeram dele, não somente um grande místico cristão, mas também
uma das mais prestigiosas personalidades do Iluminismo. Com o pseudônimo de “Filósofo Desconhecido”
Louis-Claude de Saint-Martin escreveu vários livros e tornou-se um dos maiores influenciadores para
nobres franceses e europeus criando a Sociedade dos Filósofos Desconhecidos, uma sociedade iniciática.
Sua grande mentora foi sua madrasta, a quem ele se referia como uma pessoa amável e de bom coração
que lhe proporcionou uma sábia educação. Foi ela quem iniciou Louis-Claude de Saint-Martin na leitura
de livros de Jacques Abbadie, ministro protestante de Genebra.
Formou-se advogado, mas suas aspirações interiores e o interesse que tinha pela filosofia o levaram a
largar a profissão. Ao fazer essa escolha ele abraçou a carreira militar. Lá um de seus amigos do círculo de
oficiais era membro da Ordem dos Cavaleiros Maçons Elus-Cohen do Universo, fundada por Martines de
Pasqually. Foi então que o “Filósofo Desconhecido” conheceu o Mestre Supremo e sentiu-se atraído por sua
personalidade e seus conhecimentos.
Estudioso de esoterismo e pesquisas místicas, seu maior objetivo era afastar os homens de suas
preocupações materiais e sensibilizá-los para o mundo espiritual. Além se seguir Martines de Pasqually,
Saint-Martin se aprofundou nas obras de Jacob Boehme a quem ele considerava seu segundo mestre e,
em parceria de Jean Baptiste Willermoz, lançou as bases do Martinismo, onde passou a difundir os seus
ensinamentos.
Seus escritos filosóficos despertam o interesse de seus contemporâneos até os dias de hoje,
principalmente daqueles que se interessam pela espiritualidade e pelo sentido profundo da existência.
Louis Claude de Saint-Martin faleceu no dia 14 de outubro de 1803 por ocasião de uma crise de apoplexia.
“Eu desejei fazer o bem, mas não quis fazer barulho, porque senti que o barulho não fazia bem,
assim como o bem não fazia barulho.”
– Louis-Claude de Saint-Martin