Você está na página 1de 81

EDVALDO RIBEIRO DE SOUZA

O SILOGISMO CATEGÓRICO
E A ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

FACULDADE CATÓLICA DE POUSO ALEGRE


POUSO ALEGRE
2009
EDVALDO RIBEIRO DE SOUZA

O SILOGISMO CATEGÓRICO
E A ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
Monografia apresentada como requisito
parcial para a obtenção do grau de
Bacharel em Filosofia, do Curso de
Filosofia da Faculdade Católica de Pouso
Alegre. Sob orientação do Prof. Ms. Pe.
Wilson Mário de Morais.

POUSO ALEGRE
2009
Ad Stagiritam.

Ad “Esse ipsum subsistens”, gratus fui,


sum et ero semper.
Ad familiam meam et amicos meos, gratus sum.
Ad patrem Willelmulum, magister et dux meus in
viam Logicae et syllogismi, gratia ago.
Ad fratres Seminarii Archidiocesani
omnesque etiam gratus sum.
Se A é predicado de todo B e B de todo C, A terá
necessariamente que ser predicado de todo C.

Aristóteles

Considero a invenção do silogismo uma das mais


brilhantes e mais úteis para o espírito humano.

G. Leibniz

... todo raciocínio que não pode ser feito sob esta
forma [a do silogismo categórico], é raciocínio de
que é preciso desconfiar.

V. Cousin
RESUMO

O objetivo desta pesquisa é demonstrar a possível atualidade do silogismo categórico.


Desse modo, o primeiro capítulo abrangerá os antecedentes históricos da sistematização
da Lógica feita pelo Filósofo de Estagira, e, em seguida, abordará a sistematização da
Lógica feita pelo Estagirita, partindo das obras lógicas do Organon. Ponto central desse
capítulo é a abordagem dos conteúdos dos Analíticos Anteriores, sobre o qual se
alicerça a teoria do silogismo categórico. Em um segundo momento, esta pesquisa
tratará sobre o percurso da Lógica Formal e do silogismo categórico na era pós-
aristotélica, mostrando a recepção dos mesmos pelos Estoicos e pelos filósofos
medievais, modernos e contemporâneos. Por fim, quando chegar ao terceiro capítulo,
será possível ter um arcabouço histórico-reflexivo para a abordagem de uma possível
aplicação na atualidade das leis e aspectos do silogismo categórico aplicados à
argumentação, em especial, à argumentação jurídica.

Palavras-chave: Silogismo, Lógica, Aristóteles, Analíticos Anteriores, Argumentação.


ABSTRACT

The aim of that research is to demonstrate the possible nowadays of the categorical
syllogism. Like this, the first chapter will include the historical antecedents of the
systematization of the Logic done by the Philosopher of Stagira, and, soon after, it will
approach the systematization of the Logic done by Stagirita, leaving of the logical
works of Organon. Central point of this chapter is the approach of the contents of the
Prior Analytics, on which the theory of the categorical syllogism is founded. In a
second moment, that research will treat about the course of the Formal Logic and of the
categorical syllogism in the post-Aristotelian era, showing their reception by the Stoics
and the Medieval, Modern and Contemporary philosophers. Finally, when it reach at the
third chapter, it will be possible to have a historical-reflexive outline to the approach a
possible application in nowadays of the laws and aspects of the categorical syllogism
applied to argumentation, in special, juridical argumentation.

Keywords: Syllogism, Logic, Aristotle, Prior Analytics, Argumentation.


Lista de abreviaturas

Cat. – Categoriae (Categorias)


De Interp. – De Interpretatione (Da Interpretação)
An. Pr. – Analytica Prima (Analíticos Anteriores)
An. Post. – Analytica Posteriora (Analíticos Posteriores)
Top. – Topica (Tópicos)
De Soph. Elen. – De Sophistae Elenchis (Refutações Sofísticas)
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 1

1 A SISTEMATIZAÇÃO ARISTOTÉLICA DA LÓGICA E OS FUNDAMENTOS


DA TEORIA DO SILOGISMO CATEGÓRICO ........................................................ 3
1.1 ANTECEDENTES DA SISTEMATIZAÇÃO ARISTOTÉLICA DA LÓGICA ...... 3
1.2 ARISTÓTELES E A LÓGICA .................................................................................. 6
1.3 O ORGANON ARISTOTÉLICO ............................................................................... 7
1.3.1 Categorias ............................................................................................................... 8
1.3.2 Da Interpretação ................................................................................................... 11
1.3.3 Analíticos Posteriores ........................................................................................... 13
1.3.4 Tópicos e Refutações Sofísticas ............................................................................ 14
1.4 OS ANALÍTICOS ANTERIORES E O SILOGISMO CATEGÓRICO .................... 15
1.4.1 O Silogismo Categórico ........................................................................................ 17
1.4.1.1 Os componentes, as figuras e os modos válidos de um silogismo ..................... 19
1.4.1.2 As regras da estrutura do silogismo categórico.................................................. 21

2 RECEPÇÃO DA LÓGICA E DO SILOGISMO CATEGÓRICO PELOS


PENSADORES PÓS-ARISTOTÉLICOS................................................................... 24
2.1 OS ESTOICOS E A LÓGICA ................................................................................. 24
2.2 OS PENSADORES MEDIEVAIS E A LÓGICA DO ESTAGIRITA .................... 27
2.2.1 Relação de Boécio e Abelardo com os Escritos Lógicos de Aristóteles ............... 30
2.2.2 Tomás de Aquino e a Ciência da Razão ............................................................... 33
2.2.3 A Nova Lógica de Ockham ................................................................................... 34
2.3 A LÓGICA E O SILOGISMO CATEGÓRICO SOB A APRECIAÇÃO DOS
PENSADORES MODERNOS E CONTEMPORÂNEOS ............................................. 35
2.3.1 Bacon e as Críticas ao Método Dedutivo .............................................................. 36
2.3.2 Descartes e o Discurso do Método ........................................................................ 37
2.3.3 Leibniz, Kant e Hegel ........................................................................................... 38
2.3.4 Escorço Histórico sobre as Correntes Lógicas Contemporâneas .......................... 40
2.3.5 A Lógica no Brasil ................................................................................................ 43

3 APLICAÇÃO DO SILOGISMO CATEGÓRICO À ARGUMENTAÇÃO


JURÍDICA ..................................................................................................................... 45
3.1 A ARGUMENTAÇÃO ............................................................................................ 46
3.2 A ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA ......................................................................... 48
3.2.1 Tipos de Argumentos Jurídicos............................................................................. 49
3.3 APLICABILIDADE DO SILOGISMO CATEGÓRICO À ARGUMENTAÇÃO
JURÍDICA ...................................................................................................................... 51
3.3.1 Formas Derivadas do Silogismo Categórico e sua Utilidade no Ato da
Argumentação Jurídica.................................................................................................... 55
3.3.2 Os Princípios do Silogismo Categórico Aplicados à Argumentação Jurídica ...... 58
3.3.3 Alguns Discursos Falaciosos Utilizados na Argumentação Jurídica e
Possibilidade de Refutação a Partir do Uso do Silogismo Categórico............................ 60
3.3.4 Considerações Finais sobre a Relação Entre o Silogismo Categórico e a
Argumentação Jurídica.................................................................................................... 64

CONCLUSÃO ............................................................................................................... 65
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 67
INTRODUÇÃO

Todo aspecto do conhecimento humano necessita do reto raciocinar. No


entanto, como é possível obtê-lo? Há alguma fórmula pronta que possibilite ao homem,
um animal racional, chegar a conclusões verdadeiras e válidas, ou pelo menos válidas?
Se há essa fórmula, quais são suas regras?
A partir das respostas a essas perguntas, torna-se possível voltar o olhar para a
Lógica aristotélica. Desde sua sistematização, a Lógica de Aristóteles tem sido utilizada
por filósofos, cientistas, matemáticos entre outros. Ela fornece um instrumento
característico seu: o silogismo categórico. No entanto, o mesmo foi exaltado por uns,
criticado por outros e olvidado por uma grande maioria dos filósofos e demais
pensadores.
Nesse ponto é evidente a necessidade de se buscar respostas a uma questão
premente que surge: é possível utilizar o silogismo categórico na atualidade, levando-se
em conta que ele foi aceito por uns e não aceito por outros ao longo da história da
Filosofia pós-aristotélica?
Dessa forma, essa pesquisa buscará explorar a Lógica aristotélica, retirando
dela os substratos necessários para que se possa falar de uma possível atualidade da
aplicação do silogismo categórico de Aristóteles, tomando como ponto de partida
experimental a argumentação jurídica.
No primeiro capítulo, será apresentada a sistematização da Lógica feita por
Aristóteles, o qual surge na história da Filosofia grega como um instrumento nodal que
une pontos diversos, mas coerentes, dos pensadores anteriores. Como não seria possível
deixar de fazê-lo, será feito um estudo dos escritos lógicos de Aristóteles reunidos sob o
título de Organon. É nessa coletânea lógica que se encontra a obra que lança as raízes
para a teoria do silogismo categórico, os Analíticos Anteriores.
Na segunda parte, a atenção será fixada na história pós-aristotélica, procurando
demonstrar o que ocorreu com o silogismo categórico (e a Lógica aristotélica) ao longo
dos séculos, perpassando-se os principais pensadores dos quatro períodos da história da
2

Filosofia: Antiga (Estoicos), Medieval (Boécio, Abelardo, Tomás de Aquino, Ockham),


Moderna (Bacon, Descartes, Leibniz, Kant) e Contemporânea (Hegel, as linhas lógicas
contemporâneas e a recepção da Lógica no Brasil).
O último capítulo tem por escopo demonstrar a atualidade da aplicação do
silogismo categórico à argumentação jurídica. É a partir desse diálogo interdisciplinar
(Filosofia-Direito) que se procurará responder à questão norteadora dessa pesquisa.
Dessa forma, serão abordadas as características da argumentação jurídica e a relação do
silogismo categórico com ela.
Desse modo, procurar-se-á demonstrar, nos três capítulos que compõem esse
trabalho, a importância, a amplitude e a atualidade do uso do silogismo categórico com
relação ao conhecimento humano.
1 A SISTEMATIZAÇÃO ARISTOTÉLICA DA LÓGICA E OS FUNDAMENTOS
DA TEORIA DO SILOGISMO CATEGÓRICO

Dentre todas as áreas da Filosofia, sem dúvida alguma tem importância a


Lógica. Segundo Santo Tomás de Aquino (apud Maritain, 2001, p. 17), ela é “... a arte
que dirige o próprio ato da razão, isto é, que nos permite chegar com ordem, facilmente
e sem erro, ao próprio ato da razão”1.
Muitos creditam de modo absolutizado a Aristóteles a sua criação,
desconsiderando, porém, as contribuições de pensadores pré-aristotélicos, como
Sócrates e Platão. Por isso, é interessante adotar o termo sistematização no lugar do
termo criação com referência à relação lógico-aristotélica.
Neste capítulo, portanto, serão abordados os antecedentes e a sistematização
da Lógica feita pelo filósofo de Estagira, além da teoria do silogismo categórico,
consequência dessa sistematização.

1.1 ANTECEDENTES DA SISTEMATIZAÇÃO ARISTOTÉLICA DA LÓGICA

A Lógica, como todas as reflexões filosóficas, desenvolveu-se ao longo dos


séculos da história humana, estando os seus primeiros movimentos, assim como o de
toda a Filosofia, localizados no problema cosmológico, na procura pela origem da
realidade.
Porém, a partir dos fins do século V a.C., aconteceu a guinada essencial que
levaria os filósofos gregos a voltarem o seu olhar para o problema antropológico, pois
os mesmos ficaram desencorajados a trilhar a via filosófico-cosmológica por causa da
exaustão das possibilidades da mesma. “Com efeito, todos os caminhos já haviam sido
palmilhados e o pensamento ‘físico’ chegara aos seus limites extremos. Desse modo, era
fatal a busca de outro objetivo...” (Reale; Antiseri, 2003, p. 74).

1
Segundo nota de Maritain (2001, p. 17), tem-se no original latino: “Ars directiva ipsius actus rationis,
per quam scilicet homo in ipso actu ordinate et faciliter et sine errore procedat”.
4

Por causa desse desgaste cosmológico2, os pensadores do período clássico


grego preferiram dar relevância a um estudo aprofundado do homem. Aqui se
encontram os sofistas3, os quais estão, segundo Thonnard (1968, p. 27), na transição
entre os naturalistas e os grandes filósofos gregos. Uma de suas mais importantes
características é a arte de persuadir os ouvintes, contra a qual se insurgiu Sócrates
(470/469-399 a.C.), contemporâneo dos pensadores da Sofística4.
A partir dessa refutação socrática contra o uso demasiado da persuasão,
começam a ser gestados5 os conceitos básicos da Lógica, pois no diálogo que Sócrates
travava com os sofistas utilizava dois paradigmas lógicos fundamentais: a indução e a
dedução.
Assim sendo, por meio da indução, ele remontava do particular para o
universal, da opinião para a ciência, da experiência para o conceito, além de fazer uma
comparação entre vários indivíduos de mesma espécie, a fim de lhes eliminar as
diferenças, de modo a ver-lhes a essência. Segundo Abbagnano ([198–], p. 106), “O
raciocínio indutivo, dirige-se, portanto, para a definição do conceito; e o conceito
exprime a essência ou a natureza de uma coisa, aquilo que verdadeiramente a coisa é”.
Com relação ao processo dedutivo, ele acontece com menos frequência no
pensamento socrático. De acordo com Thonnard (1968, p. 36), “Há, no entanto, alguns
exemplos em que Sócrates, partindo de princípios gerais já descobertos ou admitidos,
conduz o interlocutor pelas perguntas, quer a um caso particular, quer a uma
consequência necessária”6.
Além da indução e da dedução, em Sócrates são encontradas também as
estruturas do conceito e da definição, preocupações eminentemente lógicas. Entretanto,

2
As expressões que virão em itálico ao longo do corpo do texto e notas de rodapé serão consideradas
grifos meus. Caso haja alguma expressão com a mesma formatação (em itálico) ao longo do corpo do
texto e que não seja grifo meu, será especificado in loco como sendo grifo do autor. Quando nas citações
de até três linhas ou com mais de três linhas aparecerem aspas ou itálico, fique expresso que serão grifos
do autor, e não será especificado in loco, exceto se o grifo for meu. Palavras de língua estrangeira e títulos
de obras, como consta nas normas científicas, virão em itálico.
3
Russell (1969, p. 86) diz que a palavra sofista, não obstante seu sentido pejorativo, pode ser comparada
hoje à palavra professor. Além disso, ele diz que os sofistas eram homens que ganhavam a vida ensinando
aos jovens certas coisas úteis à vida prática, coisa que o Estado não proporcionava.
4
A Sofística se desenvolveu no contexto da vitória grega contra os persas na Batalha de Maratona (c.
490) e da consequente hegemonia político-cultural de Atenas.
5
Apesar de que hoje os estudiosos se mostram cautelosos, pois por muito tempo considerou-se que o
método socrático determinara os fundamentos da Lógica, ou seja, o conceito, a indução e a técnica da
argumentação. Sócrates colaborou sim para o nascimento da Lógica, de modo determinante. Porém, ele
não a alcançou de modo sistemático (Reale; Antiseri, 1990, p. 100).
6
De acordo com a nota de Thonnard (1968, p. 36), tem-se o seguinte exemplo para essa afirmação: “...
partindo do princípio que a ingratidão é uma injustiça, faz concluir a seu filho Lamprocles que deve
respeitar a sua mãe”.
5

ele não as estabeleceu, mas somente deu abertura para a via que levaria até elas.
Desse modo, o filósofo ateniense, segundo Reale e Antiseri (1990, p. 100),

... foi de um formidável engenho lógico, mas, em primeira pessoa, não chegou a
elaborar uma lógica ao nível técnico. Em sua dialética, encontram-se os germens de
futuras descobertas lógicas importantes, mas não descobertas lógicas enquanto tais,
conscientemente formuladas e tecnicamente elaboradas7.

Por meio do seu método, ele ensinava os seus discípulos e concidadãos a


usarem conceitos não mais para explicar as coisas ao acaso, mas para seguir os
contornos e as articulações da realidade. Assim, Sócrates deu fundamentos essenciais
para seu discípulo Platão (c. 429-347 a.C.), o qual elaborou um método dialético8, que
era embasado na teoria do mundo das ideias9.
A dialética platônica se apresenta em dois momentos: o primeiro é ascendente
(indução), pelo qual o filósofo ou dialético passa de ideia em ideia até atingir as ideias
superiores; o segundo momento é descendente (dedução), por meio do qual, partindo
das ideias superiores, e “... mediante a distinção progressiva das Idéias10 particulares
contidas nas Idéias gerais, consegue estabelecer a posição que determinada Idéia ocupa
na estrutura hierárquica do mundo das idéias” (Reale; Antiseri, 2003, p. 149). As
características do processo dedutivo, dessa forma, fazem com que a dialética platônica
se aproxime muito do silogismo categórico, guardando as devidas proporções.
Além disso, como processo de perguntas e respostas sobre o que é inteligível,
além de divisão e classificação das ideias, a dialética de Platão antecipa atitudes das
quais a Lógica aristotélica lançará mão.

7
Sobre uma formulação consciente e uma elaboração técnica dos problemas lógicos, estes se dariam com
Aristóteles.
8
“Por dialética entende Platão o estudo das vias que nos levam à ciência perfeita das idéias e destas idéias
em si mesmas, na sua realidade objetiva” (Franca, 1969, p. 50).
9
Platão concebia a existência de uma realidade superior ao mundo sensível, o chamado mundo das ideias,
onde se encontravam presentes todas as ideias, que não são meros conceitos mentais, mas são as essências
que subsistem por si e em si mesmas, havendo um tipo de hierarquia entre elas. Desse modo, para cada
coisa existente no mundo sensível, há uma ideia original no mundo suprassensível. Assim sendo, tudo o
que existe é uma mera cópia daquela ideia que se encontra no mundo das ideias.
10
De acordo com o Acordo Ortográfico assinado entre os países lusófonos (falantes do português), que
passou a vigorar em 01 de janeiro de 2009, ditongos abertos não mais se acentuam, como no caso de
ideia, heroico. Portanto, ao longo deste trabalho, as citações diretas de livros confeccionados antes da
reforma ortográfica poderão conter o acento nos ditongos abertos ei e oi. Como requisito metodológico-
científico, tais acentos serão mantidos, apesar de o restante do texto adotar as novas regras. O mesmo
ocorrerá com o trema e os casos específicos de hífens. Assim, não será indicada a discordância com as
novas regras utilizando-se do termo sic quando as mesmas ocorrerem dentro de uma citação direta, como
seria o indicado.
6

1.2 ARISTÓTELES E A LÓGICA

Aristóteles11 teve grande importância no desenvolvimento da Filosofia grega.


Sua atividade literária foi intensa e vasta, procurando abranger a totalidade dos assuntos
ligados à Filosofia, pois “... Assimilou todos os conhecimentos anteriores e acrescentou-
lhes o trabalho próprio, fruto de muita observação e de profundas meditações” (Franca,
1969, p. 53).
Todas as reflexões presentes em suas obras têm importância para o estudo da
Filosofia. Vale destacar que um de seus grandes méritos foi a sistematização da Lógica.
Franca (1969, p. 55) afirma que “A lógica de Aristóteles é talvez o seu maior título de
glória...”, e Russell (1957, p. 227), por sua vez, diz que “A influência de Aristóteles, que
foi muito grande em campos diversos, foi maior ainda no campo da lógica”.
Alejandro (1970, p. 8) ressalta que foi Aristóteles quem deu uma forma
sistemática e definitiva à lógica12, sintetizando e sistematizando os pensamentos dos
filósofos que lhe antecederam na história. Reale (1994 [b], p. 452) confirma essa
exposição ao dizer que a Lógica aristotélica

... nasceu de uma reflexão em torno aos procedimentos que os filósofos precedentes
tinham atuado, principalmente (como se viu) a partir dos sofistas, e, sobretudo, em
torno ao procedimento socrático, especialmente como foi ampliado e aprofundado
por Platão13.

Entretanto, enquanto para Platão a dialética conduzia o homem à ascese ao


mundo suprassensível, “Para Aristóteles, é a razão que, mediante o seu trabalho de

11
Aristóteles, filho de Nicômaco, nasceu em Estagira, na costa norte do Mar Egeu, por volta do ano de
384 a.C. Foi discípulo de Platão. Por se destacar no meio dos outros membros da Academia Platônica,
recebeu alguns apelidos como “A Inteligência da Escola” e “Leitor” (Faria, 1994, p. 20). Depois de se
tornar conselheiro de um governante da Ásia Menor, ele foi convidado por Filipe II, no ano de 343 a.C.,
para habitar a corte macedônica, a fim de ser o preceptor do príncipe Alexandre. Com a morte de Filipe
II, Alexandre ascendeu ao trono, por volta de 336 a.C. É nessa época que Aristóteles deixou a corte da
Macedônia e se instalou na cidade de Atenas, a qual caíra sob o poder dos macedônios. Ao perder a
possibilidade de dirigir a Academia de Platão, Aristóteles fundou a sua escola chamada de Liceu (assim
nomeada por estar nas proximidades do templo de Apolo Lício), também conhecida como Escola
Peripatética (do grego peripatós, “passeio”), pois “... Aristóteles ministrava seus ensinamentos passeando
pelas veredas do jardim anexo aos prédios...” (Reale; Antiseri, 2003, p. 189). Quando Alexandre Magno
morreu, no ano de 323 a.C., todas as pessoas ligadas de alguma forma ao mundo macedônico sofreram
oposição da parte dos atenienses. Aristóteles não ficou imune, sendo acusado formalmente, porque seu
nome permaneceu ligado ao de Alexandre Magno. Para não sofrer a pena de morte, deixou o Liceu e
refugiou-se na ilha Eubeia, onde morreu em 322 a.C.
12
Todas as traduções do texto de Alejandro serão feitas por mim. Assim, com relação à citação referente
a essa nota, encontra-se no original: “… una forma sistemática y definitiva a la lógica”.
13
Além do que foi exposto a partir do excerto de Reale, segundo Boll e Reinhart (1946, p. 11),
“Precedido (...) pelos Sofistas no estudo do discurso e por Platão nas primeiras análises do raciocínio,
7

abstracção14, opera esta separação das matérias; eis porque a lógica se torna um método
próprio e puramente intelectual...” (Thonnard, 1968, p. 91). É a Lógica que conduz,
então, o homem à verdade, objeto principal da Filosofia.
Aristóteles sistematizou a Lógica15, enquanto ciência especial, tendo por base
os princípios socrático-platônicos e por objeto de estudo a razão (Padovani; Castagnola,
1962, p. 75). Decorrente desse objeto, ela discorre de forma sistemática sobre os
conceitos, além de estudar as regras e as estruturas das argumentações corretas e seus
elementos, fornecendo os meios necessários para a ação investigativa16. Por isso, o
filósofo de Estagira a considerava como uma propedêutica (ou um estudo preliminar) de
todas as demais ciências.
A sistematização da Lógica se deu a partir da composição daquele que é
considerado o maior escrito lógico: o Organon. É imprescindível que o mesmo seja
estudado, pois nele se encontra todo o pensamento lógico do Estagirita.

1.3 O ORGANON ARISTOTÉLICO

Como foi dito acima, todo o pensamento lógico de Aristóteles está reunido nas
obras que formam o  ou Organon17. Essas obras procuram analisar vários
dados que se correlacionam com a razão, como o processo argumentativo, os princípios
dialéticos e, principalmente, os analíticos.
A palavra organon não foi usada pelo Estagirita, que utilizava o título
Analíticos para designar suas obras lógicas, mas sim pelos estudiosos bizantinos

Aristóteles nem por isso deixa de ser o criador da Lógica, pela sua sistematização dos resultados
adquiridos antes dele e pela criação do primeiro formalismo lógico, o silogismo...”.
14
Devido ao uso de obras editadas em Portugal, ocorrerão muitos casos de encontros consonantais de cc,
ct ou cç, como em abstracção, além de acentuação em advérbios de modo, como em sistemàticamente,
nas citações diretas. Assim, não será indicado sic quando esses aspectos específicos tipográficos
ocorrerem.
15
Quando de sua sistematização feita por Aristóteles, a Lógica possuía o nome de analítica, termo grego
que significa resolução. O termo lógica foi usado pela primeira vez, segundo Franca (1969, p. 64), pelos
estoicos e passou a ser usado definitivamente com Alexandre de Afrodísia.
16
Levando em conta esse aspecto de sistematicidade e investigação, segundo Padovani e Castagnola
(1962, p. 75), pode-se dizer que a lógica de Aristóteles “... representa a metodologia científica”.
17
Marías ([198–], p. 90) diz sobre essa obra de Aristóteles: “É a primeira obra em que se estudam directa
e sistemàticamente, os problemas da lógica, em que esta é constituída em disciplina, e a ponto tal que o
corpus inteiro da lógica aristotélica perdurou até hoje, quase sem alteração. Só em raros momentos da
história introduziram-se pontos de vista novos. A perfeição desta obra aristotélica gravitou – não sem
perturbação – sobre o pensamento lógico posterior, e talvez dificultasse a sua evolução. Mas não se pode
esquecer que a lógica usada tradicionalmente como aristotélica foi bastante formalizada e trivializada, e
que a fecundidade do Organon, na sua forma originária, não se esgotou”.
8

(especialmente Alexandre de Afrodísia e João Filipono18), que em suas investigações


decidiram reunir as obras de cunho lógico sob um único título19. Essa palavra grega
significa instrumento20, fazendo analogia à principal função da Lógica, que é a de ser
um instrumento eficaz no processo do raciocinar21.
Segundo Abbagnano ([198–], p. 245), “As partes do Organon aristotélico, na
ordem em que chegaram até nós, tratam de objectos que vão do simples ao
complexo...”. Desse modo, os livros que pertencem ao Organon são: Categorias ou
Predicamentos, Da Interpretação, Analíticos Anteriores, Analíticos Posteriores,
Tópicos e Refutações Sofísticas.
A seguir, essas obras lógicas serão abordadas de modo sucinto, deixando-se os
Analíticos Anteriores por último, visto que é a partir deles que será estudado o
silogismo categórico.

1.3.1 Categorias

O primeiro livro a constituir a lista do Organon é intitulado em grego


 (Kategoríai), que em latim resultou em Categoriae ou Praedicamenta
(Categorias ou Predicamentos). Traz como conteúdo o estudo dos elementos mais
simples da Lógica, as categorias, que são grupos sob os quais todas as ideias estão
reunidas.
A palavra categoria vem do verbo grego  (kategorein), cujo
significado é atribuir um predicado a um sujeito ou, segundo Faria (1994, p. 34), vem
“... de kat agorein, ‘declaração em praça pública, imputando alguma coisa a alguém’...”.
No livro das Categorias, Aristóteles trata “... de todos os termos que ‘não
entram em nenhuma combinação’, porque são considerados isoladamente como
‘homem’, ‘branco’, ‘corre’, ‘vence’, etc...” (Abbagnano, [198–], p. 246). Assim sendo,

18
Ferrater Mora (2001 [b], p. 2170) diz que esses dois pensadores bizantinos “... aplicavam o vocábulo
somente à doutrina analítica ou demonstrativa expostas nos An. Pr. e An. Post.”. Alves (2000, p. 146) nos
diz que o termo organon também foi utilizado por Diógenes Laércio.
19
É importante que seja dito que foi Andrônico de Rodes quem fez a organização final dos livros do
Organon.
20
Apesar de Aristóteles ter usado o termo organon em diversos trechos de seus escritos lógicos, o título
hoje utilizado como nome da obra não extraiu daí seu significado.
21
Sobre essa função instrumental da Lógica, Ferrater Mora (2001 [b], p. 2171) diz que “... parece certo
que os comentadores foram os primeiros a sublinhar o caráter ‘instrumental’ da lógica aristotélica, em
contraposição à conhecida opinião dos estóicos, que fizeram da lógica uma parte e não ‘só’ um órgão da
filosofia”.
9

se as duas palavras da proposição o homem corre forem separadas, isto é, se o sujeito e


o predicado forem separados, restarão somente duas palavras aparentemente sem
conexão. Dessa desconexão entre os termos provêm as dez categorias. De fato, o
próprio Aristóteles o diz:

Cada uma das palavras ou expressões “não combinadas” [grifo meu] significa uma
das seguintes coisas: o que (a substância), quão grande, quanto (a quantidade), que
tipo de coisa (a qualidade), com o que se relaciona (a relação), onde (o lugar),
quando (o tempo), qual a postura (a posição), em quais circunstâncias (o estado ou
condição), quão ativo, qual o fazer (a ação), quão passivo, qual o sofrer (a paixão)
(Cat. 4, 1 b1, 25) 22.

Ou seja, ao se decompor qualquer proposição, obtém-se cada um dos termos


aos quais se refere uma categoria específica, sendo a categoria fundamental a 
(ousía) ou substância, que “... é aquilo que não é nem dito de um sujeito nem em um
sujeito” (Cat. 5, 2 a1, 13). Ela pode ser, em primeiro lugar, uma coisa, uma pessoa ou
um animal; ou, em sentido secundário, uma espécie ou um gênero (por exemplo,
homem ou animal).
Ao caracterizar as substâncias, Aristóteles diz que elas

... jamais têm contrários. Como poderiam as substâncias primárias tê-los... este
homem, por exemplo, aquele animal? Nada lhes é contrário. E a espécie e o gênero
não têm contrários...
Nenhuma substância, pelo que parece, apresenta graus ou admite um mais e um
menos... (Cat. 5, 3 b1, 25).

No entanto, a categoria de substância contém uma característica peculiar, que é


a de poder receber qualificações que são contrárias, permanecendo, porém, a mesma e
una. Exemplo disso é aquele utilizado por Aristóteles: “Um mesmo indivíduo se torna
numa oportunidade pálido, quente ou bom, e em outra, mais escuro, frio ou mau” (Cat.
5, 4 a1, 20). Porém, é sempre o mesmo indivíduo. Ou seja, a substância é o receptáculo
dessas características que se contradizem, admitindo-as sem nenhum problema.
Com relação às demais categorias, Aristóteles as estuda com afinco do capítulo
VI ao IX.
A categoria de quantidade é por ele descrita como discreta ou contínua, nunca
possuindo contrários, tampouco um mais ou menos:

22
Para as obras reunidas no Organon será utilizada a consagrada numeração da edição referencial de
1831, de Bekker. Assim sendo, adotar-se-á, em primeiro lugar, para a citação da obra utilizada que se
encontra na lista de referências ao final deste trabalho, a abreviatura do nome latino da obra, o livro (se
houver), o número da seção majoritária e o da seção minoritária.
10

Uma quantidade parece não admitir um mais e um menos (...). Um três não é, por
assim dizer, três num maior grau de um outro três; um cinco não é, por assim dizer,
cinco num grau maior do que um outro cinco (...). Nem no tocante a qualquer outra
quantidade que mencionamos pode-se afirmar um mais ou um menos. A categoria da
quantidade, portanto, não admite, de modo algum, graus (Cat. 6, 6 a1, 20).

Já a categoria de relação é aquela que, como seu nome diz, aplica-se a coisas
que são do modo que são em relação à outra coisa. Por exemplo, “... Diz-se o dobro por
este o ser de alguma outra coisa (o dobro significa dobro de alguma coisa)” (Cat. 7, 6
a1, 42). E mais: se se sabe o relativo, sabe-se também de que coisa ele é relativo. E,
diferentemente da categoria anterior, a relação admite contrários.
Por sua vez, a categoria de postura é explanada por Aristóteles quando discorre
sobre a relação. Segundo ele, “... a posição ela mesma é um relativo...” (Cat. 7, 6 b1,
13), pois quando se diz que alguém está deitado, de pé ou sentado, isto o é em relação à
outra posição.
Outra categoria, segundo Aristóteles, é a da qualidade. Sua acepção pode ser
dividida em grupos: o primeiro, o da qualidade enquanto estado, hábito e disposição; o
segundo, enquanto capacidade; o terceiro, enquanto passiva e afeições; e o quarto,
enquanto constituída pelas formas e figuras das coisas. Essa categoria também admite
contrários, porém não em todos os casos. E “Se um dos dois contrários é uma qualidade,
o outro também é uma qualidade...” (Cat. 8, 10 b1, 18).
Depois dessas categorias, Aristóteles diz com relação às demais categorias:

A ação e a paixão apresentam contrários, bem como graus, ou seja, o aquecimento é


o contrário do arrefecimento, como também o ser arrefecido o é do ser aquecido, ou,
por outro, ser agradado é o contrário de ser desagradado. É desta forma que admitem
contrários. Adicionalmente, admitem graduação, pois podes aquecer ou ser aquecido
mais ou menos. Segue-se que a ação e a paixão podem admitir variações de
graduação.
Dessas categorias basta o que foi dito (...). Quanto às demais categorias, quais sejam,
tempo, espaço e estado, são tão claras que não preciso dizer mais do que disse no
próprio início... que o estado é indicado por expressões tais como “estar calçado”,
“armado” e [expressões] similares, enquanto o espaço (lugar) é indicado por frases
como “no Liceu”, etc. (Cat. 9, 11 b1, 1)

Depois de se dedicar ao estudo das categorias, Aristóteles examina o caso dos


opostos, no capítulo X. O capítulo XI, por sua vez, tem por objeto de estudo os
contrários; “... o capítulo XII, o anterior; o capítulo XIII, o simultâneo; e o capítulo
11

XIV, o movimento. O capítulo XV encerra o tratado com o estudo da categoria da


posse” 23 (Huisman, 2002, p. 413).

1.3.2 Da Interpretação

O segundo livro que aparece no Organon recebeu o nome de


  (Perí Hermeneías) ou De Interpretatione (Da Interpretação)24.
Todos os seus capítulos são voltados para o exame das  (prótaseis) ou
proposições25.
Aristóteles, nessa obra, classifica as proposições e as distingue de acordo com a
qualidade (a afirmação e a negação), a quantidade (a universalidade e a particularidade),
a modalidade (a possibilidade, a necessidade e a contingência) e a oposição (contrárias,
contraditórias e subalternas)26.
No início do livro, ele trata do nome – “... um som que possui significado
estabelecido somente pela convenção, (...), sendo que nenhuma parte dele tem qualquer
significado, se considerada separadamente do todo...” (De Interp., 2, 16 a1, 17) – e do
verbo – que “... não apenas transmite um significado particular, como também possui
uma referência temporal” (De Interp., 3, 16 b1, 7).
Nessa obra, a análise feita pelo Filósofo27 acerca das sentenças tem uma
importância singular, pois é o momento em que indica que nem todas elas são
necessariamente chamadas de proposições. Para que uma sentença seja denominada
uma proposição, ela deve encerrar em si a verdade ou a falsidade, garantindo a validade
ou não do discurso. Desse modo, ele exclui de seu estudo as invocações e exclamações
semelhantes, pois estas pertencem ao campo do discurso retórico e poético (Reale, 1994
[b], p. 456).

23
Segundo a nota do tradutor do Organon (2005, p. 68) “Todo este final do Tratado (Capítulos X a XV),
é geralmente considerado espúrio pela grande maioria dos eruditos”.
24
O nome Da Interpretação está ligado ao fato de que é a linguagem a responsável por exprimir aquilo
que é pensado. Ou seja, a linguagem é a intérprete do pensamento humano.
25
As proposições também podem ser chamadas de   (logoi apofantikoi) ou
enunciados declarativos. Toda proposição é formada por um sujeito, um verbo de ligação ou cópula e um
predicado, por exemplo “O homem é branco” (De Interp., 7, 17 b1, 10).
26
Segundo Abbagnano ([198-], p. 248), “... A relação entre a particular afirmativa e a particular negativa
foi chamada pelos lógicos medievais oposição subcontrária”.
27
Será adotada a prática de denominar Aristóteles como o “Filósofo”.
12

Como foi mencionado acima, as proposições são classificadas dentro de alguns


pontos-chave. O primeiro deles, analisado por Aristóteles em dois capítulos de sua obra,
é o da qualidade: a  (katáphasis) ou afirmação e  (apóphasis) ou
negação. A proposição afirmativa é aquela que afirma alguma coisa de alguma coisa.
Por exemplo, o homem é branco. Já a proposição negativa é aquela que nega alguma
coisa de alguma coisa: o homem não é branco. A partir dessa relação entre proposição
afirmativa e negativa, segundo Reale (1994 [b], p. 456), nascem o verdadeiro e o falso,
tendo-se “... o verdadeiro quando com o juízo conjuga-se o que é realmente conjugado
(ou separa-se o que é realmente separado)...” e “... o falso quando com o juízo conjuga-
se o que não é conjugado (ou separa-se o que não é separado)”28.
Com relação àquilo que foi denominado acima de quantidade, isso é expresso
nas reflexões de Aristóteles através da extensão da proposição:

... é universal quando o sujeito é universal (entendendo-se por universal “aquilo que
por natureza se predica de várias coisas”), por exemplo, homem; é singular quando o
sujeito é um ente singular, por exemplo Callia. Mas um mesmo termo universal
pode ser tomado numa proposição quer na sua universalidade, como quando se
afirma “todos os homens são brancos”, quer na sua particularidade, como quando se
afirma “alguns homens são brancos” (Abbagnano, [198–], p. 247)29.

Então, uma proposição pode ser um universal afirmativo, universal negativo,


particular afirmativo e particular negativo, opondo-se mutuamente. Desse modo,
“Aristóteles chamou de contrária a oposição entre a proposição universal afirmativa e a
universal negativa e contraditória a oposição entre a universal afirmativa e a particular
negativa” (idem, p. 247).
Outro ponto tratado pelo filósofo de Estagira em sua obra é o das proposições
modais ou da modalidade, quando ele estuda o  (dünaton) ou o ser possível, o
 (anankaion) ou o ser necessário, e o  (endechomenon) ou o
ser contingente. Através dessas espécies de modalidades, diz-se de que modo o sujeito e
o predicado em uma proposição se unem ou se separam.
Após o tratado Da Interpretação encontra-se o livro dos Analíticos Anteriores,
o qual será analisado por último. A seguir, será feita uma explanação sobre os três livros

28
A conjugação e a não-conjugação podem ser denominadas, respectivamente, como composição e
divisão.
29
A universalidade das proposições é expressa pelos termos todos (quando afirmativa) e nenhum (quando
negativa). Já a particularidade designa-se pelo termo alguns (seja afirmativa ou negativa). A classificação
das proposições quanto a sua quantidade será importante quando da análise do silogismo.
13

que se encontram depois dessa obra: os Analíticos Posteriores, Tópicos e Refutações


Sofísticas.

1.3.3 Analíticos Posteriores

A quarta obra lógica de Aristóteles recebeu o nome de


  (Analytiká Ýstera) ou Analytica Posteriora (Analíticos
Posteriores ou Segundos Analíticos). Depois de fazer uma análise sobre o silogismo
categórico nos Analíticos Anteriores, nos Analíticos Posteriores30 o Estagirita “...
examina as premissas do silogismo31 e o fundamento da sua validade” (Abbagnano,
[198–], p. 251), detendo-se na análise da aplicação prática do silogismo (Huisman,
2002, p. 414).
Nos Analíticos Posteriores se encontra o estudo da demonstração irrefutável32,
que, partindo de princípios considerados verdadeiros, imediatos e evidentes, levam a
uma conclusão válida. A partir dessa reflexão é apresentada “a idéia aristotélica de
ciência” (Reale, 1994 [a], p. 461), que expressa que todo o conhecimento gira em torno
do conhecer os seus princípios.
Aristóteles, na sua quarta obra lógica, apresenta que esses princípios do
conhecimento são alcançados mediante a indução, através da qual, partindo do
particular, apreende-se aquilo que é universal (An. Post. I, 1, 71 a1, 8). Porém, esse
conhecimento é tratado por ele como sendo secundário devido ao seu processo partir da
essência. Não obstante isso,

... a demonstração aristotélica parece constituir uma forma elevada de argumentação


extraída do modelo da matemática e que gera conhecimentos teóricos sobre um
campo relativamente restrito do real. O conceito de demonstração seria unívoco e
seu resultado constituiria a ciência demonstrativa para Aristóteles (Pinto, 1994, p.
170).

30
Russell (1969, p. 233) apresenta a questão em torno da qual gira o quarto livro do Organon: “Os
Analíticos Posteriores é uma obra em grande parte interessada numa questão que deverá perturbar
qualquer teoria dedutiva, isto é: Como obter-se as primeiras premissas?”.
31
As premissas e o silogismo serão estudados quando os Analíticos Anteriores forem analisados.
32
Pinto (1994, p. 169) diz que “Ali, [nos Analíticos Posteriores], Aristóteles equipara ‘saber’ a ‘conhecer
por demonstração’ e define a demonstração como sendo o silogismo científico (...). Dessa forma, a
ciência equivale ao conhecimento certo pela causa, conhecimento este que vem expresso pela forma
silogística. Daí a necessidade de conhecimentos prévios que funcionem como pontos de partida da
dedução silogística (...). Os princípios primeiros da demonstração são obtidos por indução (...), enquanto
as proposições que deles decorrem são obtidas por dedução silogística”.
14

Segundo Marías ([198–], p. 92), “Aqui [com os Analíticos Posteriores] culmina


a lógica aristotélica. Os dois últimos tratados, os Tópicos e os Argumentos Sofísticos,
são secundários...”.
No próximo livro, Tópicos, será visto outro objeto de estudo. Enquanto nos
Analíticos33 o foco de estudo é a ciência, Aristóteles funda as reflexões do quinto livro
do Organon na dialética (Abbagnano, [198–], p. 252). E no último livro, Refutações
Sofísticas, o Filósofo analisa “O raciocínio sofístico, os meios de o evitar e
desmascarar...” (Franca, 1969, p. 55).

1.3.4 Tópicos e Refutações Sofísticas

 (Topiká) ou Topica (Tópicos)34 é a quinta obra que aparece no


Organon35. Como já foi dito acima, esse tratado versa sobre a dialética, ou, segundo
Franca (1969, p. 55), Aristóteles estuda “A argumentação dialética ou problemática, que
leva a uma conclusão provável...”. Nesse tratado, o filósofo de Estagira discorre sobre
os métodos utilizados para o convencimento, sem haver, no entanto, preocupação em se
demonstrar a verdade ou a falsidade do discurso (Huisman, 2002, p. 414).
Aristóteles, logo no início da obra, apresenta o objetivo da mesma:

O propósito deste tratado é descobrir um método que nos capacite a raciocinar, a


partir de opiniões de aceitação geral, acerca de qualquer problema que se apresente
diante de nós e nos habilite, na sustentação de um argumento, a nos esquivar da
enunciação de qualquer coisa que o contrarie (Top. I, 1, 100 a18, 1).

Depois disso, o filósofo de Estagira volta a discorrer sobre o silogismo, mas


agora não mais o silogismo categórico ou o demonstrativo, analisado nos dois
Analíticos, e sim o silogismo dialético, o qual

... serve para tornar-nos capazes de discutir e, em particular, individuar, quando


discutimos com as pessoas comuns ou com as pessoas cultas (...): ensina-nos a
discutir com os outros, fornecendo-nos os instrumentos para sintonizar com eles
(Reale, 1994 [a], p. 466).

33
Subentenda-se aqui Analíticos Anteriores e Analíticos Posteriores.
34
Segundo Reale (1994 [a], p. 467), “O termo ‘tópicos’ (topoi) significa lugares e indica,
metaforicamente, os quadros ideais nos quais entram e, portanto, dos quais se extraem os argumentos...”.
35
Segunda a nota do tradutor do Organon (2005, p. 347), “... é quase certo que Aristóteles escreveu o
tratado Tópicos antes dos Analíticos Anteriores”. Decorrente desse fato cronológico com relação à escrita
dos dois livros, podemos inserir aqui um pensamento de Ross (apud Reale, 1994 [a], p. 467): “... ele
mesmo [Aristóteles] mostrou uma via melhor, a via da ciência. Foram os seus Analíticos que puseram
fora de moda os seus Tópicos”.
15

A dialética aqui apresentada por Aristóteles diferencia-se da ciência por meio


de seus princípios, os quais são prováveis ou “Opiniões de aceitação geral (...) que se
baseiam no que pensam todos, a maioria ou os sábios (...) ou a maioria deles, ou os mais
renomados e ilustres entre eles” (Top. I, 1, 100 b20, 18). Além disso, em Aristóteles ela
sofre uma transformação em relação ao modo como era apresentada em seu mestre
Platão, pois é confinada pelo filósofo de Estagira “... a uma zona marginal da ciência e
inferior a ela” (Abbagnano, [198–], p. 253).
Já a última obra encontrada no cânon do Organon foi denominada
   (Peri Sophistikon Elenchon) ou De Sophistae
Elenchis (Refutações Sofísticas ou Sobre os Argumentos Sofísticos), a qual se prende “...
à análise e refutação dos sofismas” (Marías, [198–], p. 92). Nesse livro, Aristóteles
deixa clara a sua oposição sistemática àqueles que, na época de Sócrates, erguiam-se
como bons adversários na argumentação, os sofistas36 (Huisman, 2002, p. 414).
Nas Refutações Sofísticas, o Estagirita cognomina de falácias os argumentos
dos sofistas (De Soph. Elen., 1, 164a, 20). Os sofismas ou argumentos erísticos não
possuíam premissas necessárias ou prováveis, mas só aparentemente prováveis. De
acordo com Abbagnano ([198–], p. 254), os sofismas são divididos, no último tratado
do Organon, em duas espécies:

... os que dependem do modo de se exprimir e aqueles que são disso independentes.
Exemplo dos primeiros é a anfibolia que consiste no uso de expressões que têm um
significado duplo e que são tomadas ora num ora noutro destes significados. Por
exemplo, quando se diz: “aquilo que deve ser é bem; mas o mal deve ser; logo é
bem”, o “deve ser”, na primeira premissa é tomado como aquilo que é desejável que
seja e na segunda como aquilo que é inevitável. Da segunda espécie de falácias, um
exemplo é a petição de princípio que consiste em tomar, de forma dissimulada,
como premissa da demonstração, aquilo que se deveria demonstrar.

A seguir, será estudado o livro dos Analíticos Anteriores e será apresentada a


teoria do silogismo categórico.

1.4 OS ANALÍTICOS ANTERIORES E O SILOGISMO CATEGÓRICO

  (Analytiká Prótera) ou Analytica Prima (Analíticos


Anteriores ou Primeiros Analíticos) é o tratado aristotélico que se encontra após o Da

36
Segundo a nota do tradutor do Organon (2005, p. 547), “Os sofistas, no tempo de Aristóteles,
constituíram um movimento filosófico (adjetivo que o Estagirita jamais usaria a eles se referindo) muito
16

Interpretação, sendo composto de dois livros. Colocado dessa forma no cânon das obras
lógicas, os Analíticos Anteriores permitem examinar a união das proposições, cuja
construção foi estudada no livro anterior (Da Interpretação). Tal união das proposições
é denominada de argumento, inferência37 ou silogismo (Huisman, 2002, p. 414).
Como foi visto quando do estudo das outras obras do Organon, os dois
primeiros livros são obras preliminares, fornecendo elementos importantes para a
construção de um raciocínio: os termos (Categorias) e as proposições (Da
Interpretação). É nos Analíticos Anteriores que Aristóteles passa a analisar esses
elementos no contexto de um silogismo categórico. E, para fazer essa análise38, ele faz
uso de um estratagema singular. Ele emprega letras no lugar de termos 39 para poder
expor aquilo que teoriza a respeito das proposições40 dentro de um silogismo categórico,
facilitando ao mesmo tempo a conversão das mesmas. Assim sendo, no lugar de dizer
que alguns animais marinhos são mamíferos, o Estagirita dizia somente que alguns A
são B41, para depois exemplificar. Assim, se alguns A são B, alguns B são A. Ou, se
alguns animais marinhos são mamíferos, alguns mamíferos são animais marinhos.
Com relação à primeira parte dos Analíticos Anteriores, Barnes (2001, p. 55)
diz que

... Aristóteles considera todos os pares possíveis de proposições simples e determina


a partir de que pares uma terceira proposição simples pode ser corretamente inferida
como conclusão, bem como a partir de que pares não se pode inferir corretamente
uma conclusão. Ele divide os pares em três grupos ou “figuras”, e sua discussão
prossegue de maneira rigorosa e organizada. Os pares são considerados segundo um
padrão fixo, e para cada par Aristóteles apresenta, e prova formalmente, que
conclusão, se há, pode ser corretamente inferida. O relato inteiro é reconhecido
como o primeiro ensaio sobre a ciência da lógica formal.

expressivo e difundido em Atenas, inclusive graças à existência da famosa Escola de retórica de Isócrates,
que foi lídima rival tanto da Academia de Platão quanto do Liceu de Aristóteles...”.
37
Segundo Chauí (2002, p. 367), “... Inferir é obter uma proposição a partir de uma ou de várias
proposições que a antecedem e que são sua explicação ou sua causa. A proposição inferida é uma
conclusão que já estava implicitamente contida na proposição inicial ou nas proposições iniciais e que o
raciocínio explicita”.
38
A partir dessa faculdade analítica presente nos Analíticos Anteriores (e também nos Analíticos
Posteriores), Alexandre de Afrodísia (1991, p. 49-50) ressalta o porquê do título Analíticos: “They are
called Analytics because the reduction of any compound to the things from which it is compounded is
called analysis”, isto é, “Eles são chamados Analíticos porque a redução de qualquer combinação às
partes das quais ela é composta é chamada análise” [trad. minha].
39
De acordo com Zingano (2002, p. 89), “Aristóteles tinha por ambição explorar (...) todas as formas
válidas de inferência; um recurso extremamente útil que utilizou foi substituir os termos por letras,
obtendo assim uma máxima generalização”.
40
Essa facilidade na conversão de sujeito e predicado de proposições só se dá, no entanto, com
proposições afirmativas ou negativas particulares.
41
Aristóteles, com certeza, utilizava letras gregas. Assim para a letra latina “A” ele faz uso da letra grega
 (alfa); para a letra “B”, a letra  (beta); e assim por diante.
17

Enquanto, como já foi apresentado em um trecho anterior, os Analíticos


Posteriores analisam o silogismo científico ou a demonstração, os Analíticos Anteriores
procuram analisar o silogismo categórico (seus componentes, regras e aplicações).

1.4.1 O Silogismo Categórico

A teoria silogística de Aristóteles está embasada nas leis do raciocínio correto,


o qual efetivamente acontece quando se analisa as diversas proposições conectadas
entre si, sendo uma a causa da outra, umas como antecedentes e outras como
consequentes (Reale, 1994 [a], p. 458).
O silogismo é “o raciocínio perfeito” (idem, p. 458). Etimologicamente, a
palavra  (süllogismos) significa raciocinar, usar o pensamento para reunir
aquilo sobre o que se faz uma análise. Segundo Keller e Bastos (2004, p. 49), o
silogismo “... é uma argumentação em que, de um antecedente que une dois termos a
um terceiro, infere-se um conseqüente que une estes dois termos entre si”, ou, segundo
Russell (1957, p. 228), “... é um argumento constituído de três partes: uma premissa
maior, uma premissa menor, e uma conclusão”. O próprio Aristóteles, no primeiro livro
dos Analíticos Anteriores, apresenta a sua definição de silogismo:

O silogismo é uma locução em que, uma vez certas suposições sejam feitas, alguma
coisa distinta delas se segue necessariamente devido à mera presença das suposições
como tais. Por “devido à mera presença das suposições como tais” entendo que é por
causa delas que resulta a conclusão, e por isso quero dizer que não há necessidade de
qualquer termo adicional para tornar a conclusão necessária (An. Pr. I, 1, 24b10, 19).

O Filósofo ainda faz uma diferenciação entre silogismo perfeito, “... que nada
requer além do que nele está compreendido para evidenciar a necessária conclusão”
(An. Pr. I, 1, 24 b10, 22), e o silogismo imperfeito42, “... que requer uma ou mais
proposições as quais, ainda que resultem necessariamente dos termos formulados, não
estão compreendidas nas premissas” (An. Pr. I, 1, 24 b10, 24).
Uma característica essencial do silogismo categórico é que ele é um argumento
dedutivo. Deduzir é partir de um conceito universal até a verificação de conceitos
particulares.

42
As formas imperfeitas de silogismo, entretanto, podem ser transformadas em formas perfeitas através
da transposição ou da conversão das proposições (Mondin, 2003, p. 83).
18

A dedução, portanto,

Progride desde aquilo que é primariamente na natureza para aquilo que é


primariamente para nós, e, por isso mesmo, tem um carácter completo e uma força
constrangente que está sempre ausente no caso da indução. Mostra-nos, não somente
que um determinado facto é verdadeiro, mas também a razão por que é verdadeiro
(Allan, 1970, p. 120).

Já a indução é o meio de raciocinar que passa do particular ao universal, do


concreto para o abstrato, partindo sempre dos fatos da experiência (Thonnard, 1968, p.
92). Para Aristóteles, o argumento indutivo é necessário somente para os primeiros
estágios da ciência e da arte, desaparecendo quando elas se aproximam de seus
objetivos (Allan, 1970, p. 120). É por isso que o Estagirita, mesmo reconhecendo esses
dois tipos de argumentos, prefere a dedução, a qual pode ser denominada em termos
modernos como argumento válido (Smith, 1996, p. 39), e que, de acordo com Copi
(1978, p. 35),

... envolve a pretensão de que suas premissas fornecem uma prova conclusiva (...).
Um raciocínio indutivo, por outro lado, envolve a pretensão, não de que suas
premissas proporcionem provas convincentes da verdade de sua conclusão, mas de
que somente forneçam algumas provas disso.

E, segundo Faria (1994, p. 38), “A indução é muito empregada, mas, por


comportar um certo grau de probabilidade, não goza do mesmo rigor e da mesma
garantia de veracidade que o raciocínio dedutivo”.
Com relação a essa veracidade garantida pelo raciocínio dedutivo-silogístico, e
também com relação à verdade das proposições, Zingano (2002, p. 88-89) diz que

A validez é uma propriedade do argumento; a verdade caracteriza as proposições


tomadas independentemente. Um argumento válido pode ter premissas falsas, assim
como um argumento inválido por ter premissas verdadeiras. É preciso fazer,
portanto, o inventário das inferências válidas; isso foi realizado (...) por Aristóteles
no seu tratado (...) Primeiros Analíticos, que é um extraordinário trabalho técnico de
lógica formal.

O silogismo é, portanto, para Aristóteles, o meio mais rigoroso e garantido de


se construir qualquer argumento devido a sua estrutura (duas premissas e uma
conclusão) e seus componentes (os termos).
19

1.4.1.1 Os componentes, as figuras e os modos válidos de um silogismo

Conforme Aristóteles, “A premissa43 é uma oração que afirma ou nega alguma


coisa de algum sujeito...” (An. Pr. I, 1, 24 a10, 16). Ou seja, é uma proposição que é
afirmativa ou negativa, podendo ainda ser universal ou particular44, sendo, em alguns
casos, uma verdade evidente. Ela é, ainda, assertiva, necessária ou contingente. Além
disso, as premissas são “... a expressão oral ou gráfica do juízo” (Keller; Bastos, 2004,
p. 55).
Todo silogismo categórico possui duas premissas (das quais, geralmente, a
primeira é chamada de premissa maior, e a segunda, premissa menor) e uma conclusão.
As duas premissas são chamadas de antecedentes e a conclusão45 é chamada de
consequente, isto é, aquilo que se consegue inferir das duas proposições anteriores.
Nas premissas e sua conclusão aparecem termos que permitem a união das
mesmas. Aristóteles diz sobre o termo: “Chamo de termo aquilo em que a premissa se
resolve, a saber, tanto o predicado quanto sujeito, quer com a adição do verbo ser, quer
com a remoção do não ser” (An. Pr. I, 1, 24 b10, 17). Dependendo do caso, um termo
pode ser unívoco (isto é, ter somente um sentido), equívoco (ter mais de um sentido,
cuja existência em uma premissa pode invalidar o raciocínio) e análogo (aplicado em
outro sentido).
Os termos são designados, dentro de um silogismo categórico, como maior ou
extremo maior, menor ou extremo menor e médio46, fazendo o termo médio a conexão
entre os outros dois. É a partir da correlação feita pelo termo médio47 entre os dois
outros termos que é alcançada a inferência (Chauí, 2002, p. 369), sendo que, segundo
Thonnard (1968, p. 94), ele deve ser único “para permitir a comparação”.
Para que um termo seja considerado médio, este deve aparecer na premissa
maior como predicado e na premissa menor como sujeito e, de forma alguma, deve
aparecer na conclusão. No exemplo clássico de um silogismo categórico, os três termos

43
Segundo Keller e Bastos (2004, p. 49), “Aquilo que no raciocínio é chamado de antecedente na
estrutura do silogismo aparece como premissas (o que é enviado antes)...”.
44
Aristóteles ainda acrescenta outro tipo de proposição: a indefinida, que é “... a oração que se aplica ou
não se aplica sem referência à universalidade ou particularidade...” (An. Pr. I, 1, 24 a10, 21).
45
Em uma argumentação silogística, a conclusão é iniciada por termos como logo, então, portanto, dessa
forma.
46
Quando da análise de um silogismo, geralmente são usadas algumas letras para designar os três termos
nas premissas e na conclusão: a letra “T” significa o termo maior; o “M”, o termo médio; e o “t”, o termo
menor (Faria, 1994, p. 38).
47
Aristóteles diz que o termo médio é “... aquele que tanto está contido num outro quanto contém um
outro em si mesmo e que ocupa a posição mediana” (An. Pr. I, 4, 25 b1, 35).
20

nas premissas e na conclusão podem ser vistos: Todo homem é mortal; ora, Sócrates é
homem; logo, Sócrates é mortal. Neste caso, o termo médio é a determinação homem
que aparece tanto na primeira quanto na segunda premissa, sendo excluído na
consequente.
O termo maior sempre tem maior extensão, ou seja, é o que tem maior
abrangência de sentido, incluindo os outros dois termos. No silogismo supracitado, o
termo mortal é o mais universal, abrangendo o conceito de Sócrates (que se aplica
somente a um indivíduo) e o conceito de homem (que se aplica somente a uma espécie
de entes).
A partir dos termos se originam as figuras e os modos do silogismo categórico.
As figuras ou schemata de um silogismo categórico são determinadas a partir
da posição do termo médio na construção de uma proposição. São quatro os tipos de
figuras possíveis, sendo que a primeira figura é vista por Aristóteles como a mais
perfeita, por apresentar o processo de mediação do termo médio de forma mais clara
(Reale; Antiseri, 1990, p. 215).
Sobre a importância dada por Aristóteles à primeira figura do silogismo
categórico48, Chauí (2002, p. 371) diz que

Aristóteles considerava os silogismos da primeira figura os mais perfeitos e afirmou


que, quando se tivesse um silogismo de outra figura e se desejasse ter certeza de que
estava correto, dever-se-ia tentar convertê-lo a um modo da primeira figura, como
uma espécie de verificação.

Já a segunda figura é caracterizada pelo termo médio como predicado nas duas
premissas (An. Pr. I, 5, 26 b1, 36). O exemplo dessa figura é: “Nenhuma pedra é
animal, todos os homens são animais, logo nenhum homem é pedra”. Aristóteles assim
diz sobre a constituição da segunda figura: “Quando o mesmo termo se aplica a um
sujeito universal e não se aplica a qualquer outro sujeito (...), ou quando se aplica ou não
se aplica tanto de um como de outro (...), chamo este tipo de figura de segunda” (An. Pr.
I, 5, 26 b1, 32).
A terceira figura se dá, por sua vez, quando o termo médio é sujeito em ambas
as premissas (An. Pr. I, 6, 28 a1, 13): “Todos os homens são substância, todos os
homens são animais, logo alguns animais são substâncias” (Abbagnano, [198–], p. 250).

48
É da primeira figura aquele silogismo que foi utilizado acima para a exemplificação quando se
discorreu sobre os termos.
21

E a quarta49 aparece quando o termo médio é predicado na premissa maior e sujeito na


premissa menor.
Enquanto as figuras do silogismo categórico se definem pela posição do termo
médio nas premissas, os modos são definidos pela “disposição das proposições na
argumentação” (Keller; Bastos, 2004, p. 87), ou, de acordo com Thonnard (1968, p. 94),
“... segundo a qualidade e a quantidade das premissas...”. A partir dos quatro tipos de
proposições surgem os sessenta e quatro modos do argumento silogístico, sendo apenas
dez considerados silogismos verdadeiros, pois realmente fazem uma dedução. A
combinação entre as quatro figuras e os dez modos fornece os dezenove tipos de
silogismos válidos50 (Chauí, 2002, p. 371).
Esses são os pontos essenciais sobre a constituição de um silogismo
categórico51. Ademais, é muito importante que sejam apresentadas as regras dispostas
para a sua construção, sem as quais não é possível supor a validade ou não do raciocínio
dedutivo-silogístico.

1.4.1.2 As regras da estrutura do silogismo categórico

Maritain (2001, p. 206) lança a seguinte pergunta ao falar das regras da


argumentação silogística: “Mas, então, como se deverá proceder para aplicar
convenientemente esses princípios supremos? É o que indicam as regras ou leis do
Silogismo”. Se todas as regras do silogismo forem obedecidas, haverá aí uma
argumentação válida. Caso contrário, se um raciocínio for reduzido a um silogismo
categórico e confrontado com as regras e não as obedecer, haverá uma argumentação
inválida.

49
A quarta figura também é chamada de primeira indireta, visto que nela o termo médio assume posições
inversas a que possui na primeira figura.
50
Para cada um desses modos válidos de silogismo, foram dispostas as letras de acordo com o quadrado
dos opostos. Os lógicos medievais, para facilitar o aprendizado dos modos válidos, criaram palavras para
a memorização dos mesmos: BARBARA (AAA), CELARENT (EAE), DARII (AII) e FERIO (EIO); para
a segunda, CESARE (EAE), CAMESTRES (AEE), FESTINO (EIO) e BAROCO (AOO); para a terceira,
DARAPTI (AAI), FELAPTON (EAO), DISAMIS (IAI), BOCARDO (OAO), DATISI (AII) e FERISON
(EIO); e para a quarta, BARALIPTON (AAI), CELANTES (EAE), DABITIS (AII), FAPESMO (AEO) E
FRISESOMORUM (IEO) (Keller; Bastos, 2004, p. 88-90). As vogais de cada uma dessas palavras
convencionais indicam a quantidade e a qualidade das premissas, como foi tratado quando se discorreu
sobre as proposições. Assim, por exemplo, em CAMESTRES tem-se o seguinte: a premissa maior é
universal afirmativa (A), a menor é universal negativa (E) e a conclusão é universal negativa (E).
51
Os princípios do silogismo categórico, indispensáveis para a construção de um reto raciocinar, serão
tratados no terceiro capítulo, a fim de serem relacionados com o tema da argumentação jurídica.
22

As quatro primeiras regras se ligam aos termos e as outras quatro dizem


respeito às premissas. Maritain (idem, p. 207) também apresenta as oito regras de
acordo com um texto que os lógicos medievais, baseados em Aristóteles, utilizavam
para a memorização das mesmas:

1. Três termos somente: Maior, Médio e Menor.


2. Nunca na Conclusão maiores que nas Premissas.
3. Que jamais o Médio entre na Conclusão.
4. Mas que uma vez ao menos seja universal.
5. De duas premissas negativas nada resulta.
6. Premissas afirmando, Conclusão não pode negar.
7. Conclusão segue sempre a pior Premissa.
8. E, finalmente, nada resulta de duas Particulares.

A primeira regra é a base de todas as outras. Se não for obedecida, não se terá
de fato um silogismo categórico, visto que ele só deve possuir três termos: maior, médio
e menor (Nascimento, 1991, p. 117). Destarte, é necessário que os termos sejam
unívocos. Se forem empregados com mais de uma acepção em cada premissa, deixam
de ser um argumento logicamente correto.
A segunda lei está ligada à extensão dos termos da conclusão, os quais nunca
devem ser mais abrangentes que os termos das premissas (idem, p. 117). Se se disser
que algum vivente é homem, e alguma planta não é homem, não é possível dizer que
nenhuma planta é vivente, pois o nenhuma planta é tomado em sua extensão universal
negativa, enquanto algum vivente e alguma planta não são, respectivamente, particular
afirmativa e particular negativa. Ou seja, a conclusão, necessariamente, deveria ser
particular.
Quando se diz que o termo médio não pode entrar na conclusão (terceira regra),
segue-se aquilo que já foi apresentado, que um termo [o médio] é o meio de
identificação entre o extremo maior e o extremo menor. Esse mesmo termo médio deve
ser ao menos uma vez tomado como universal (quarta regra). Keller e Bastos (2004, p.
78) apresentam essa regra relativa aos termos da seguinte forma:

A argumentação dedutiva parte, por definição, de princípios gerais aos casos


particulares que eles contêm. O termo médio, usado como elo de identidade entre os
termos, deve ser universal para que possa ser aplicado às partes. Se o termo médio se
apresenta como particular, não permitirá a dedução propriamente dita.

A quinta regra (e primeira relativa às premissas) enuncia que não há a


possibilidade de se concluir algo de duas premissas negativas. Se se disser: “Os
poderosos não são misericordiosos; ora, os pobres não são poderosos; logo os pobres
23

são misericordiosos” (Maritain, 2001, p. 208), não é possível concluir que seja um
argumento válido, visto que nem o termo maior (no caso, misericordiosos) nem o menor
(pobres) se relacionam com o termo médio (poderosos).
A próxima regra diz que se as premissas estiverem afirmando algo, a conclusão
não pode ser negativa. E a sétima regra diz, por sua vez, que a conclusão deve seguir
sempre a premissa mais fraca (ou pior, no excerto supracitado de Maritain). Isto é,
depende da relação oposicional entre as proposições.

... Nessa relação, a qualidade de negativa, em primeiro lugar, é mais fraca que a
qualidade de afirmativa, porque o juízo negativo significa meia afirmação, isto é, uma
advertência de que algo deve ser colocado no lugar. Em segundo lugar, a quantidade
particularizada é mais fraca que a quantidade universalizada, por motivos óbvios. Deste
modo uma proposição universal negativa é mais fraca que uma proposição particular
afirmativa. Segue daí que a conclusão, para seguir a mais fraca, deve ser negativa se
houver no antecedente premissa negativa, e particular se houver no antecedente
premissa particular (Keller; Bastos, 2004, p. 60-61).

Já a última lei do argumento silogístico diz que de duas premissas particulares


não é possível concluir algo. Esta regra está intimamente vinculada à extensão do
sujeito nela contido (se universal, particular, singular ou indefinido52). Se as premissas
forem particulares, não haverá, como no caso acima, uma argumentação dedutiva, que
tem necessidade de passar do geral para o particular. Por isso, Aristóteles diz que “...
não haverá silogismo se ambas as relações atributivas forem particulares, ou afirmativa
ou negativamente, ou uma afirmativamente e a outra negativamente, ou uma indefinida
e a outra definida, ou ambas indefinidas” (An. Pr. I, 4, 26 b1, 21).
Segundo Maritain (2001, p. 209-210), as regras do silogismo categórico “...
derivam da própria natureza do Silogismo...”, sendo úteis “... porque regulam mais
profundamente o trabalho silogístico”. Além disso, essas leis serão de valor imenso
quando for abordada a aplicabilidade do silogismo categórico ao campo da
argumentação jurídica no capítulo terceiro.
Antes de ser analisada essa relação entre o silogismo categórico e a
argumentação jurídica, será feito um escorço histórico sobre a recepção da Lógica e do
silogismo pelos pensadores pós-aristotélicos, a fim de se ver seus pontos de vistas com
relação ao que foi sistematizado pelo Estagirita.

52
Para o sujeito universal, faz-se uso do termo todo (Todo homem é mortal); para o particular usa-se o
termo algum (Algum homem é alto); e para o singular faz-se uso do termo este (Este homem é músico),
sendo o singular equivalente ao universal. Já quanto à “indefinição”, esta poderá ser universal ou
particular de acordo com o predicado (Keller; Bastos, 2004, p. 57).
2 RECEPÇÃO DA LÓGICA E DO SILOGISMO CATEGÓRICO PELOS
PENSADORES PÓS-ARISTOTÉLICOS

Após o período de sistematização da Lógica com o filósofo de Estagira, a


mesma permaneceu sem alteração substancial até os fins do século XIX (Alves, 2000, p.
146), sendo que muitos pensadores pós-aristotélicos fizeram uso das leis lógico-
aristotélicas e outros, no entanto, procuraram refutá-las, como se verá mais adiante.
Por isso, é imprescindível que não se deixe de perpassar a história da Lógica
pós-aristotélica, pois muitas contribuições foram dadas ao longo dos séculos com
relação à utilização dos conteúdos do Organon, em especial dos Analíticos Anteriores
(o silogismo categórico).
Destarte, para que se possa falar de uma atual aplicabilidade do silogismo
categórico do Estagirita a qualquer âmbito do saber humano (como essa pesquisa
procurará fazer com a argumentação jurídica), é mister que seja vista a recepção da
Lógica aristotélica nos séculos subsequentes a sua sistematização, pois se isso não fosse
feito, restaria uma lacuna no curso histórico da mesma53. Desse modo, serão vistas as
linhas lógicas54 que se desenvolveram após Aristóteles, desde a estoica até a
contemporânea.

2.1 OS ESTOICOS E A LÓGICA

Os pensadores da Estoá55 procuraram basear sua Ética nos critérios da


verdade56 fornecidos pela Lógica (Reale; Antiseri, 2003, p. 281). Para eles, esta se

53
“Para no perdernos en la línea quebrada de la marcha de la Lógica occidental, podemos dividirla en
los siguientes períodos: antigua (hasta s. VI p.C.); alta edad media (s. VII-XI); escolástica (s. XI-XV);
‘clásica’ moderna (s. XVI-XIX); matemática (s. XIX-XX). En cuanto a la Edad Media téngase presente la
siguiente división: logica vetus o antiqua (Corpus, Isagogé, Boecio); logica nova o ars nova (Corpus en la
parte de los Analíticos, los Tópicos y la Refutación de los Sofistas); Logica modernorum (las Summulae
logicales, Pedro Hispano y los lógicos nominalistas o terministas)” (Alejandro, 1970, p. 13).
54
Alejandro (1970, p. 11), por sua vez, diz que “La linea lógica es la de Aristóteles, y no puede hablarse
de lógicas opuestas, sino de lógicas complementarias”, isto é, a linha lógica é a aristotélica, e não se pode
falar de lógicas opostas, senão de lógicas complementares.
55
“O estoicismo é o movimento filosófico mais original do período helenístico e também o que teve a
duração mais longa: fundado nos fins do século IV a.C., continuou a florescer até depois do século III
d.C. Isto sem dizer que muitos autores cristãos da Antigüidade e da alta Idade Média se consideravam
herdeiros e continuadores da escola estóica” (Mondin, 2003, p. 109). Os principais representantes da
Estoá são: Zenão (336-274 a.C.), Crisipo (281-208 a.C.), Epicteto (50-138 d.C.), Sêneca (4 a.C.-65 d.C.),
Marco Aurélio (121-180 d.C.).
25

dividia em retórica (se versasse sobre os discursos contínuos) e dialética (se discorresse
sobre os discursos divididos em perguntas e respostas). Além disso, a Lógica possuía
como objeto de estudo “... as representações, as proposições, os raciocínios e os
sofismas” (Abbagnano, 1999, p. 13).
Segundo Kenny (2008, p. 177), sobre a relação entre os estoicos e Aristóteles,
cabe dizer que

Na Antiguidade tardia, a lógica aristotélica e a lógica estóica eram tidas como rivais,
e, embora os escritos dos próprios estóicos não tenham sido preservados, possuímos
evidência suficiente das polêmicas entre os apoiadores de cada um dos dois
sistemas. Com a percepção adquirida em milênios podemos ver que os sistemas não
foram, em geral, incompatíveis entre si, mas sim formulações de diferentes áreas da
lógica, e cada um deles precursor de diferentes mas complementares modernos
desenvolvimentos no cálculo proposicional e no cálculo predicado.

A despeito disso, da mesma forma como Aristóteles concebia que o


conhecimento partia dos dados sensíveis, os estoicos conceberam que a mente do
homem era uma espécie de tabula rasa, onde ainda não se inscrevera conhecimento
algum. A razão, em cada processo de sensação, exprimia sua aprovação ou rejeição do
conhecimento recebido pelos sentidos. Recebendo o assentimento, a sensação se
tornava, então, compreensiva ou uma catalepsia. Sendo desaprovada, era logo
descartada pela razão57. A partir do momento em que era aprovada pela razão, a
catalepsia se transmutava em um conceito ou um universal, encontrando no silogismo
categórico a sua forma perfeita58.
Segundo Reale e Antiseri (2003, p. 282), a catalepsia é o ponto principal da
Lógica estoica. Entretanto, a outra parte da Lógica da Estoá59 é, geralmente,
marginalizada, deixada à margem do sistema estoico por muitos pensadores. Ela
procura versar principalmente sobre as proposições60 e os silogismos hipotéticos e

56
Conforme Abbagnano (1999, p. 13), “O primeiro problema da lógica estóica é o do critério da verdade.
É este o problema mais urgente para toda a filosofia pós-aristotélica que considera o pensamento apenas
como guia para a conduta...”.
57
Além da aceitação ou rejeição, a sensação podia sofrer uma suspensão, sendo assentida ou dissentida
mais tarde.
58
A respeito desse processo de conhecimento pregado pelos estoicos, Padovani e Castagnola (1962, p.
95) dizem: “Como em Aristóteles, o conhecimento parte dos dados imediatos do sentido; mas,
diversamente de Aristóteles, o conhecimento é limitado ao âmbito dos sentidos, não obstante as repetidas
e múltiplas declarações estóicas em louvor da razão. O conhecimento intelectual nada mais pode ser que
uma combinação, uma complicação quantitativa de elementos sensíveis. O conceito, pois, é destruído...”.
59
Essa segunda parte da Lógica dos estoicos seguiu a Lógica aristotélica, “... acrescentando-lhe um
tratado sôbre [sic] o critério da verdade que, para êles [sic], consistia na clareza da representação mental
que força o assentimento do espírito” (Franca, 1969, p. 64).
60
Segundo Kenny (2006, p. 173), “É importante recordar, contudo, que uma proposição estóica é
diferente de uma proposição aristotélica por não ser uma oração em si, mas algo abstrato que é afirmado
26

disjuntivos61, formalizando a Lógica herdada de Aristóteles em seu viés proposicional, o


que influenciou os lógicos medievais e modernos.
Como foi visto quando se estudou os Analíticos Anteriores, o filósofo de
Estagira fazia amplo uso de letras em suas análises lógicas. Os lógicos estoicos, por sua
vez, passaram a fazer uso de números. Kenny (2008, p. 171) explica a razão pela qual os
lógicos da Estoá agiram deste modo:

Trata-se de uma diferença trivial, mas muito importante: se as variáveis de


Aristóteles assumiam a forma de termos, as variáveis estóicas assumiam a forma de
orações inteiras, ou ainda de elementos que eram capazes de formar orações
completas. Em “Se as estrelas brilham então é noite”, nem o antecedente “as estrelas
brilham”, nem o conseqüente “é noite” são orações completas, mas cada conjunto de
palavras é capaz de figurar por si só como uma oração completa.

Além disso, os estoicos faziam distinção entre uma proposição simples, que
inclui um sujeito e um predicado (por exemplo, “Sócrates está caminhando”), e uma
proposição não-simples, formada a partir de uma proposição unida por um ou mais
conectivos62 (por exemplo, “Se é noite, então está escuro”). Um raciocínio do tipo “Se é
noite, então está escuro; é noite, então está escuro”, segundo Abbagnano (1999, p. 16),
não tem “... nada a ver com o silogismo categórico porque lhe faltam as suas
características fundamentais: é imediato (não tem termo médio) e não é necessário”.
Destarte, o silogismo estoico sempre é concludente e válido, mas nem sempre
verdadeiro, ou seja, só é verdadeiro se a premissa for verdadeira e corresponder à
situação de onde ela foi retirada, pois é limitada a um tempo e a um espaço63.

por uma oração; e que é diferente de uma proposição como a discutida pelos lógicos modernos por ser
algo que pode alterar seu valor de verdade no tempo”.
61
Sobre os silogismos hipotéticos e disjuntivos, estes foram pouco teorizados pelo filósofo de Estagira
(Reale; Antiseri, 2003, p. 282; Mondin, 2003, p. 110).
62
Os lógicos estoicos, assim como os lógicos modernos, fizeram amplo uso dos chamados conectivos
lógicos. Entretanto, há certas diferenças. De acordo com Kenny (2008, p. 174), “No cálculo moderno, o
sinal de negação é considerado um operador verofuncional, associado a conectivos binários como ‘e’,
‘ou’ e ‘se’. Os estóicos, ao contrário, classificavam as proposições negativas como proposições simples.
Contudo, reconheciam a possibilidade de negar uma proposição ao apor um sinal negativo à proposição
inteira, e não somente ao predicado, procedimento que é essencial à operação do cálculo proposicional
(...). Outra diferença entre a lógica estóica e a lógica proposicional moderna encontra-se no tratamento
dos conectivos individuais. Na lógica proposicional moderna, ‘ou’ é considerado convencionalmente um
conectivo inclusivo (...). Os estóicos parecem ter ficado indecisos entre esta visão e a interpretação
exclusiva (...)”.
63
Um exemplo de um silogismo estoico: “Se é noite, então está escuro; não: é noite, então não: está
escuro”. Ou seja, é necessário verificar na experiência se está escuro ou não para a conclusão ser
verdadeira.
27

Salvaguardando a diferença supracitada, a argumentação dedutiva para a


Lógica estoica segue a vertente da Lógica aristotélica, fundando-se sobre o silogismo64.
Um argumento para os estoicos era um “... composto ou sistema de premissas e uma
conclusão” (Bobzien, 2006, p. 113). Um argumento era válido e verdadeiro se tinha
premissas verdadeiras; era inválido e falso se tinha uma premissas falsas. Dessa
maneira, os lógicos estoicos apregoavam que só um argumento que fosse verdadeiro
poderia garantir a verdade do concludente.
Depois dos estoicos, a Lógica aristotélica se difundiu durante a Idade Média,
tomando rumos diversos entre seus pensadores.

2.2 OS PENSADORES MEDIEVAIS E A LÓGICA DO ESTAGIRITA

A Idade Média65 foi influenciada, de modo determinante, pela religião cristã.


Daí seus grandes expoentes na área da Filosofia e da Teologia.
Entretanto, não obstante a influência cristã sobre a Filosofia, os pensadores
medievais buscaram beber das fontes gregas. Assim, é possível ver um Agostinho de
Hipona se debruçando sobre os escritos platônicos e um Tomás de Aquino investigando
os pensamentos de Aristóteles66. Dessa forma, os escritos dos filósofos gregos
ganharam destaque no Ocidente. Mas foi em torno de Aristóteles que a maior parte dos
estudos e das disputas medievais se concentrou.
A Lógica aristotélica, por sua vez, não deixou de permear as reflexões dos
pensadores medievais, que deram grandes contributos para com o estudo dos conteúdos
lógicos67. O silogismo categórico, concebido como procedimento demonstrativo por

64
Conforme Bobzien (2006, p. 134), “A silogística estóica é um sistema que consiste de cinco tipos
básicos de silogismos e quatro regras argumentais segundo as quais todos os outros silogismos podem ser
reduzidos àqueles dos tipos básicos”.
65
Segundo Franco Júnior (2006, p. 14), a Idade Média é “... um período da história européia de cerca de
um milênio, ainda que suas balizas cronológicas continuem sendo discutidas. Seguindo uma perspectiva
muito particularista (às vezes política, às vezes religiosa, às vezes econômica), já se falou, dentre outras
datas, em 330 (reconhecimento da liberdade de culto aos cristãos), em 392 (oficialização do cristianismo),
em 476 (deposição do último imperador romano), e em 698 (conquista muçulmana de Cartago) como
ponto de partida da Idade Média. Para seu término, já se pensou em 1453 (queda de Constantinopla e fim
da Guerra dos Cem Anos), 1492 (descoberta da América) e 1517 (início da Reforma Protestante)”. O
mesmo autor ainda divide a Idade Média em Alta (meados do século VIII aos fins do X), Central (séc. XI
ao XIII) e Baixa (séc. XIV aos meados do séc. XVI).
66
Além de Tomás de Aquino, outros pensadores buscaram estudar as reflexões de Aristóteles. Destacam-
se, sobremaneira, os árabes Avicenas e Averróis e os judeus Avicebron e Maimônides, que contribuíram
para com a entrada dos escritos aristotélicos no mundo ocidental.
67
De acordo com Wyllie (2007, p. 148), “Do ponto de vista geográfico, cumpre ainda salientar que a
Lógica medieval restringiu-se a [sic] Europa Ocidental Latina, o que exclui tanto a Lógica Hindu e a
28

excelência, era a forma mais utilizada pelos pensadores medievais quando da exposição
de suas ideias. Por meio dessa herança do Estagirita, eles conseguiam refutar os
argumentos de seus adversários nas disputationes68 das escolas medievais. Nesse
sentido, autores como Boécio, Abelardo, Tomás de Aquino e Ockham (entre outros)
fizeram uso das leis lógicas do Estagirita69.
A Lógica na Idade Média70 passou por dois grandes períodos: o Pré-
Escolástico, que vai de 778 a 1080, e o Escolástico, de 1080 a 1429. O período Pré-
Escolástico ainda se subdivide em Carolíngio (778-896) e o Monástico (896-1080). A
etapa da Escolástica, por sua vez, foi dividida pelos estudiosos em três partes: o Inicial
(1080-1160), o Intermediário (1160-1301) e o Final (1301-1429).
Segundo Verger (1999, p. 33),

De Aristóteles, possuíam-se, há tempos, tratados de lógica, cujo conjunto formava o


Organon. A primeira parte deste último, ou Logica vetus, traduzida desde o final do
século V por Boécio, sempre fora conhecida e estudada no Ocidente; os tratados
seguintes (Logica nova), traduzidos na primeira metade do século XII, eram
ensinados nas escolas parisienses desde os anos 1150. No final da Idade Média, esse
conjunto havia já adquirido um uso quase universal: ao texto mesmo de Aristóteles
se haviam juntado alguns manuais mais recentes, sendo que o mais propagado destes
eram as Summulae logicales de Pierre d’Espagne71 (c. 1210-1277).

Lógica Bizantina, quanto a Lógica Judaica e a Lógica Árabe, não obstante a grande importância e
influência delas”. Disponível em http://www.aquinate.net/artigos.
68
Conforme Nascimento (2003, p. 26-32), o “mestre de teologia” tinha três tarefas: lecionar, disputar e
pregar. “A disputa (disputatio) constituía a segunda tarefa do mestre. Essa forma de debate universitário
resultou da institucionalização da quaestio (questão), que (...) teve suas origens no século XII (...). diante
de citações de autores (essas citações recebiam o nome de ‘autoridades’) divergentes ou até mesmo
contraditórias, colocava-se a necessidade de harmonizá-las ou escolher entre elas (...). No século XIII a
disputa se reveste do caráter de um verdadeiro torneio intelectual em que as armas são os argumentos...”.
69
Vários sãos os nomes ligados à Lógica no período medieval. Seria até interessante citá-los. Porém,
sabendo que quase todos os pensadores medievais de alguma forma estudaram a Lógica (sendo possível
dizer que foram lógicos), é preferível não o fazer. Para o conhecimento dos nomes dos lógicos medievais
conferir Alejandro (1970, p. 12-13), Wyllie (2007, p. 148-161), Hirschberger (1966, p. 126-129; 212-213)
e Libera (2004, p. 438-440).
70
Libera (1998, p. 385), a respeito dos períodos da Lógica dentro da Idade Média, apresenta: “Para que
não sejam confundidos com a antiga lógica aristotélica representada tanto pela logica nova como pela
logica vetus, os lógicos do final do século XII e o início do século XIII chamaram de ‘lógica dos
modernos’, logica modernorum, o conjunto dos conceitos, tratados, métodos, regras ou distinções que
acrescentaram ao Organon. Afinal, a lógica nova nada tinha de ‘novo’. Era a parte da lógica dos antigos
que havia sido adquirida novamente. Sua chegada tardia não a tornava moderna. Posteriormente, a lógica
modernorum foi chamada de lógica ‘terminista’ por causa da sua principal inovação (a teoria das
propriedades dos termos) e para distingui-la da semântica dos adeptos da gramática especulativa
(grammatica speculativa), os ‘modistas’, teóricos dos modi significandi...”.
71
Pierre d’Espagne ou Pedro Hispânico, futuro Papa João XXII.
29

Vale lembrar aqui uma das grandes contribuições dos lógicos medievais: o
quadrado dos opostos.

Figura 1: O “Quadrado dos Opostos”

Keller e Bastos (2004, p. 59) explicam as partes do quadrado dos opostos da


seguinte forma:

Chamam-se contrárias as proposições universais, que se opõem entre si pela


qualidade, uma afirma e a outra nega um mesmo predicado de um mesmo sujeito,
universalmente; Subcontrárias (as contrárias de baixo) são duas proposições
particulares que se opõem entre si pela qualidade, uma afirma e a outra nega um
mesmo predicado de um mesmo sujeito, particularmente; Contraditórias são duas
proposições que possuem o mesmo sujeito e o mesmo predicado, mas que diferem
entre si tanto em quantidade como em qualidade. Trata-se da oposição mais forte,
porque não há nada em que elas possam convir, ou seja, sua oposição é absoluta,
uma destrói simplesmente a outra. Chamam-se subalternas as proposições
particulares em relação às universais quando possuem a mesma qualidade. A
subalternação não é oposição propriamente dita, mas uma relação de superior e
inferior, porque diz a mesma verdade ou falsidade de modo restrito.

Desse modo, para designar os quatro tipos de proposições de acordo com a


quantidade e a qualidade, eles lançaram mão de quatro vogais, em que A é a proposição
universal afirmativa, E é a universal negativa, I é a particular afirmativa e O é a
particular negativa. A escolha dessas vogais para a designação quanto à quantidade e à
qualidade das proposições teve um motivo singular: A e I, que designam as proposições
afirmativas (sendo a primeira universal e a segunda particular) são as primeiras vogais
do verbo afirmar conjugado na primeira pessoa do singular: AfIrmo. Já E e O, que
designam as proposições negativas (respectivamente, universal e particular), são
30

retiradas da conjugação do verbo negar na primeira pessoa do singular: nEgO (idem, p.


58-59).
No entanto, será feita uma delimitação no que tange à explanação sobre a
recepção da Lógica aristotélica e do silogismo categórico por Boécio, Abelardo, Tomás
de Aquino e também por Ockham, depois do qual se inicia o declínio da atenção
dispensada às reflexões lógico-aristotélicas.

2.2.1 Relação de Boécio e Abelardo com os Escritos Lógicos de Aristóteles

Anício Mânlio Severino Boécio (470-525), o último representante da Filosofia


Ocidental antes do fim da Patrística, é quase a única fonte do aristotelismo da Idade
Média antes do século XIII, sendo notável também por ter feito a transmissão dos
pensamentos de Platão e dos estoicos. Sua importância maior no campo da Filosofia se
deu quando das traduções das obras lógicas aristotélicas, o que lhe permitiu passar para
a posteridade. Porém, Boécio também compôs algumas obras de cunho lógico, muito
utilizadas durante o período da Escolástica.
Boécio dividia a Filosofia em dois tipos: a especulativa ou teorética, e a ativa
ou prática (Boehner; Gilson, 2004, p. 211). Com relação à Lógica, ele, a princípio, não
sabia se a colocava como parte da Filosofia ou como seu instrumento. Porém, depois de
analisar a questão, colocou-a tanto como parte da Filosofia quanto como seu
instrumento. Abelardo (1994, p. 34) diz que Boécio resolveu a questão dizendo “... que
nada impede que o mesmo [a Lógica] seja tanto instrumento como parte de algo, da
mesma forma como a mão o é em relação ao corpo humano”, sendo ela instrumento de
si mesma ao apresentar questões através de argumentos diversos. Assim, esse filósofo
pré-escolástico pôde comentar o Organon, que até o período em que ele viveu não
circulara pela Europa Medieval.
Suas obras lógicas72 e seus comentários aos tratados Categorias e Da
Interpretação permaneceram como bases de estudo obrigatório por vários séculos. Seus
escritos pessoais, segundo Libera (1998, p. 250) “... transmitiram aos ocidentais a teoria

72
Os opúsculos de lógica de Boécio são: Introductio ad categoricos syllogismos (Introdução aos
silogismos categóricos), De syllogismo categorico (Sobre o silogismo categórico), De syllogismo
hypothetico (Sobre o silogismo hipotético), De differentiis topicis (Sobre os diferentes tópicos) e De
divisione (Sobre a divisão). Segundo Alejandro (1970, p. 12), nessas obras o núcleo central é a Lógica
aristotélica, “... pero con aportaciones de las lógicas platónica, megárica y estoica”, isto é, entretanto
com contribuições das lógicas platônica, megárica e estoica.
31

das inferências e dos silogismos...”. Daí sua importância com relação à trajetória
histórica do silogismo categórico. Além disso, Boécio teve sua importância por ter sido
o fundador da tradição europeia originária da lógica (idem, p. 252).
Segundo Reale e Antiseri (2003, p. 131), "A lógica de Boécio não é muito
original, mas bastante refinada. Aristóteles permanece a sua matriz de base, mesmo que
se possam localizar algumas influências da lógica estóica”. Sem Boécio, a Lógica não
teria conseguido permear os estudos medievais, pois é através dele que a Lógica antiga
e o silogismo categórico são introduzidos na Idade Média.
Por sua vez, Pedro Abelardo (1079-1142) é outro importante nome ligado à
trajetória da Lógica aristotélica no período medieval73. De acordo com Boehner e
Gilson (2004, p. 295), “Para avaliar da contribuição de Abelardo em prol de uma lógica
sã, estruturada ao modelo da de Aristóteles, basta comparar-lhe a obra com as
produções sofísticas de certos dialéticos daqueles dias [da Idade Média]...”.
Quatro textos foram deixados pelo Palatino74, nos quais ele dá uma nova face à
Lógica de Aristóteles e à de Boécio: as Introductiones parvulorum, a Logica
“Ingredientibus” (ou Lógica para principiantes), a Logica “Nostrorum petitione
sociorum” e a Dialectica75. Nessas obras76, Aristóteles se torna para ele como que um
mestre na Lógica.
A sua Lógica para principiantes gira em torno da querela dos universais, uma
questão que estava em aberto desde Porfírio (c. 232-304).

... Como se sabe, Porfírio deixara sem solução os seguintes três problemas, por ele
formulados:
1. Qual o modo de existência dos universais? Existem eles na realidade, ou apenas
no pensamento? (...).
2. Se se admite a existência real, serão eles de natureza corporal ou incorporal?
3. Estão eles separados das coisas sensíveis ou no interior delas? (idem, p. 297-
298).

A partir dessas questões, pensadores como Roscelin de Compiègne (c. 1010-


1120), Guillaume de Champeaux (morto em 1121) entre outros se posicionaram como

73
Abelardo foi tão importante para a Lógica medieval que uma de suas afirmações permite a
compreensão de qual era a sua atenção dispensada com relação à mesma: “Ser cristão significa ser
lógico” (Helferich, 2006, p. 92).
74
Abelardo é assim chamado por ter nascido em Pallet, na França.
75
De acordo com Hirschberger (1966, p. 94), a obra Dialectica foi editada completa pela primeira vez por
L. M. de Rijk, em 1956.
76
Além das obras lógicas, Abelardo ainda escreveu outras: Sobre a unidade e a trindade divinas,
Teologia cristã, Teologia, Sim e não, Ética ou Conhece-te a ti mesmo, História das minhas calamidades
(Boehner; Gilson, 2004, p. 295-286).
32

nominalistas ou realistas77 (respectivamente), ou seja, os universais poderiam ser


somente as emissões da voz (flatus vocis) ou o material comum das espécies ou dos
indivíduos (res). Abelardo, por sua vez, partindo do questionamento de em que lugar se
encontram os universais (ibidem, p. 298), posicionou-se contra Guillaume de
Champeaux, seu mestre78. Para resolver a questão, ele retomou a definição de
Aristóteles do universal ou o que se predica de muitos, opondo-o ao singular ou o que se
predica de um só, como o Estagirita no-lo apresenta no Da Interpretação.
Com relação ao estudo da Lógica, segundo o próprio Abelardo (1994, p. 34),
quando se faz um estudo sobre ela, é necessário que seja observada uma ordem
específica:

... uma vez visto que as argumentações resultam das proposições e as proposições
das palavras, aquele que põe por escrito de modo acabado a lógica deve escrever
primeiro sobre os termos simples, em seguida sobre as proposições, enfim consumar
o acabamento da lógica nas argumentações como o fez o nosso príncipe Aristóteles
[!] que compôs as Categorias sobre a doutrina dos termos, o Peri Hermeneias sobre
a das proposições e os Tópicos e os Analíticos sobre a das argumentações.

O Palatino deu contribuições ímpares com relação à Lógica aristotélica,


especialmente para com a argumentação dedutivo-silogística. Diz ele (idem, p. 36) que
são indispensáveis duas coisas a quem argumenta: “... primeiro, que descubra os
argumentos pelos quais argúa; depois, que saiba confirmá-los se alguém os atacar como
viciosos ou não suficientemente firmes”.
Por causa de sua resposta com relação à questão sobre os universais, Abelardo
foi combatido e perseguido pelo depois canonizado Bernardo de Claraval. Apesar disso,
ele já havia contribuído para que os pensamentos de Aristóteles continuassem
predominando durante a Escolástica. E suas as contribuições para com os mesmos não
foram esquecidas, apesar de sua condenação pelo Concílio de Sens, em 1140.

77
Outros nomes ligados ao realismo escolástico são: Odon de Tournai (morto antes de 1092) e Gerberto
de Reims, futuro Papa Silvestre II (morto em 1003). Com relação ao nominalismo tem-se Heirico de
Auxerre (c. séc. IX) (Hirschberger, 1966, p. 94-95).
78
Segundo Thonnard (1968, p. 290), “Na questão dos universais, Abelardo é, primeiro, um demolidor de
sistemas: contra o realismo de Guilherme de Champeaux, demonstra a existência exclusiva dos
indivíduos; contra a ‘sententia vocum’ de Roscelin, prova vitoriosamente a existência dum conceito
universal significado pelo termo concreto”. Por sua vez, Abelardo “Afirma com efeito que a ideia
universal (o que ele chama o ‘nomen’) exprime uma realidade comum, a saber, a natureza imanente dos
diversos indivíduos concretos”.
33

2.2.2 Tomás de Aquino e a Ciência da Razão

Santo Tomás de Aquino (1225-1274) é, indubitavelmente, o pensador ocidental


que conseguiu de forma elevada fazer uso dos conceitos de Aristóteles e aplicá-los ao
âmbito teológico. Na área da Filosofia procurou dar novo alento às ideias do Estagirita,
apropriando-se delas (Thonnard, 1968, p. 362).
Dessa forma, o Aquinate79 também se destaca na Lógica, sendo ela considerada
por ele como o “vestíbulo da filosofia” (Franca, 1969, p. 105), o instrumento80 pelo qual
se consegue atingir as elucubrações racionais.
Para Santo Tomás de Aquino, por meio da Lógica se conseguia trilhar
corretamente na razão, a fim de se obter o conhecimento da verdade. Por isso, para ele,
a Lógica aristotélica era a ciência da razão. Segundo Nascimento (1991, p. 177), a
Lógica, para o santo de Aquino, “... é a arte que ensina a pensar ordenadamente,
facilmente e sem erros” e que “... fornece à especulação seus instrumentos, isto é, os
silogismos, definições e similares, dos quais necessitamos nas ciências especulativas”
(Tomás de Aquino, 1999, p. 104).
Com relação aos tratados lógicos do Estagirita, diz o Aquinate:

Como a Lógica é dita Ciência Racional, é necessário que sua consideração trate de
coisas que pertençam às três operações mencionadas da razão81.
É no Livro das Categorias que Aristóteles trata das coisas que pertencem à primeira
operação do intelecto, isto é, das coisas que são concebidas por uma simples
apreensão.
No Livro da Interpretação o Filósofo trata das coisas que pertencem à segunda
operação, isto é, das enunciações afirmativas e negativas.
No Livro dos Primeiros Analíticos e no dos Segundos Analíticos, e nos que se lhes
seguem, o Filósofo trata das coisas que pertencem à terceira operação do intelecto.
Nestes livros ele trata do silogismo, em geral e das diversas espécies de silogismos e
argumentações.
Seguindo o modo como mostramos no item anterior que as diversas operações do
intelecto se ordenam umas às outras, devemos também dizer que o Livro das
Categorias, que trata da primeira operação do intelecto, se ordena ao Livro da
Interpretação, que trata da segunda, o qual por sua vez se ordena ao Livro dos
Primeiros e ao dos Segundos Analíticos e aos que se lhe seguem, que tratam da
terceira operação do intelecto82.

79
A denominação Aquinate é derivada do local onde nasceu o santo medieval, o condado de Aquino.
80
Segundo o próprio Santo Tomás de Aquino (1999, p. 104), “... as coisas de que a lógica se ocupa não
são das que se deseja conhecer por si mesmas, mas como um certo auxílio para as outras ciências. (...) a
lógica não é tanto uma ciência, mas antes instrumento da ciência”.
81
As operações às quais o santo de Aquino faz referência são três: a inteligência dos indivisíveis (por
meio da qual o intelecto consegue apreender a essência das coisas em si mesmas), a operação do intelecto
ao compor e dividir, e o raciocínio, que partindo do que é conhecido pela razão, atinge as coisas
desconhecidas por ela.
82
Texto extraído do condensado em arquivo htm dos comentários de Santo Tomás de Aquino às obras de
Aristóteles. Disponível no site www.4shared.com, acessado no dia 29 de março de 2009.
34

Com relação ao silogismo de Aristóteles, Santo Tomás vai tratar da


demonstração, evidenciada como ponto importante da teoria do silogismo, e que é nos
pensamentos do Aquinate uma passagem necessária do universal para o particular.
Porém, segundo Padovani e Castagnola (1962, p. 181), “... os universais, os conceitos,
as idéias, não são inatas na mente humana (...) e nem sequer são inatas suas relações
lógicas...”, pois a ciência é atingida através da demonstração (para Santo Tomás um tipo
de raciocínio dedutivo).
Em suma, a argumentação silogística nos pensamentos do Aquinate acontece
partindo-se das coisas mais evidentes às menos evidentes.

Neste procedimento racional [o da argumentação] ocupa lugar central a dialética,


um tipo de silogismo, pelo qual a razão investiga a verdade, a partir de proposições
plausíveis, para chegar à demonstração, que é uma espécie de argumentação, cujo
efeito é a ciência e a verdade, sendo só perceptível pela mente, embora com
fundamento no real (Faitanin, 2008, p. 143).

A partir daí, a razão consegue se ater aos conceitos que se relacionam com os
entes além da realidade física, ou seja, a metafísica.
Depois de Santo Tomás de Aquino, a Lógica de Aristóteles foi explorada em
seus pormenores pelos pensadores medievais. Guilherme de Ockham foi um desses
pensadores. Suas contribuições e reflexões sobre a Lógica aristotélica serão vistas a
seguir.

2.2.3 A Nova Lógica de Ockham

Guilherme de Ockham (c. 1285-1349) foi o último grande expoente da Lógica


do período escolástico83. Discípulo de João Duns Scot (1266-1308), ele concebia a
inteligência “... como uma potência activa, cujo papel é formar para si, com a
elaboração dos sentidos, ideias universais coordenadas em ciências...” (Thonnard, 1968,
p. 429). Porém, suas reflexões vão se diferenciar de seu mestre, tornando parte dos
conceitos metafísicos em conceitos lógicos.
Para Ockham, a Lógica era indispensável para que o conhecimento se
desenvolvesse, sendo ela o instrumento que forneceria maior segurança para que o
conhecimento fosse possível no âmbito das demais ciências. Segundo Reale e Antiseri
(2003, p. 302), Ockham procurou “... dar à lógica estatuto autônomo e mais rigoroso

83
Vale ressaltar aqui que Ockham foi um dos grandes nomes ligados ao nominalismo medieval.
35

que o dado por seus antecessores”. Desse modo, ele buscou criar uma radical dicotomia
entre o que era pertencente ao âmbito da Lógica e o que pertenceria à realidade. Em
outras palavras, entre o conceitual e o real. A consequência clara desta distinção é a
possibilidade de se tratar os termos como puros símbolos.
O filósofo inglês deixou uma obra lógica, a Summa totius logicae, a qual é
dividida em três partes: a primeira trata dos termos e sua função no processo da
linguagem, além de abranger os predicáveis do Isagoge de Porfírio e as categorias de
Aristóteles; na segunda parte discorre sobre as proposições, na qual ele faz amplo uso
do quadrado dos opostos proposicional; a terceira parte, por sua vez, que é subdividida
em quatro, trata do silogismo (incluindo a teoria do silogismo modal), do silogismo
demonstrativo, das discussões dos paradoxos semânticos e da discussão sobre as
falácias (Leite Júnior, 2008, p. 167).
Como comentador de Aristóteles, Ockham se prestou a desenvolver “... um
método de interpretação rigorosamente fundado na argumentação lógica e no destaque
das estruturas conceituais do texto comentado” (Libera, 2004, p. 427). “Utilizando o
aparato técnico da lógica e o rigor da análise lingüística, sua atividade reflexiva realiza
uma verificação dos pressupostos e aufere a consistência dessa tradição” (Leite Júnior,
2008, p. 178).
Depois de Ockham, outros pensadores buscaram, na Baixa Idade Média,
comentar Aristóteles e dar curso a sua Lógica. Entretanto, a mesma iria sofrer uma
oposição da parte dos pensadores modernos, sendo resgatada somente no século XX.

2.3 A LÓGICA E O SILOGISMO CATEGÓRICO SOB A APRECIAÇÃO DOS


PENSADORES MODERNOS E CONTEMPORÂNEOS

Depois do século XV, não aconteceram novas investigações ligadas ao


formalismo lógico. No entanto, com o Renascimento, uma mudança radical no campo
da Lógica começou a aparecer, colaborando para com o desenvolvimento da mesma
como cálculo e como epistemologia nos séculos subsequentes, havendo certo olvido
com relação às contribuições de Aristóteles (Alejandro, 1970, p. 14). Assim, surgiram
alguns pensadores que procuraram ora ser fiéis ao plano lógico-aristotélico ora rechaçá-
lo.
O italiano Galileu Galilei (1564-1642), por exemplo, colaborou para com a
história da Lógica ao propor um método indutivo-dedutivo composto de quatro fases:
36

“... análise da experiência, hipótese, confirmação da hipótese mediante fenômenos


provocados artificialmente e dedução de novas leis da lei estabelecida” (Mondin, 2006,
p. 68).
Já com relação aos filósofos opositores da Lógica aristotélica, um dos
primeiros nomes, segundo Fontana (1969, p. 370), que pode ser destacado é o de Pierre
de la Ramée (1515-1572), que a combate “... com o argumento de que ela, conforme se
ensinava nas escolas, não poderia chegar a resultado útil algum”.
Tendo esses dois pensadores como preâmbulo das idades Moderna e
Contemporânea, será feita uma análise da recepção da Lógica e do silogismo categórico
pelos pensadores desses dois períodos históricos importantes.

2.3.1 Bacon e as Críticas ao Método Dedutivo

Dentre os pensadores modernos, sem dúvida alguma, o filósofo inglês Francis


Bacon (1561-1626) foi quem se opôs mais veementemente a todo o sistema aristotélico,
especialmente à Lógica. Ao reagir contra a consideração dada pelos escolásticos ao
silogismo, escreveu o Novum Organum em oposição ao Organon aristotélico.
Nessa obra, Bacon apresenta suas conclusões acerca do silogismo, raciocínio
puramente dedutivo. Segundo ele, a dedução não teria grande eficiência com relação à
descoberta de verdades ligadas à realidade. Bacon, partindo daí, teceu sua crítica a
Aristóteles. Para ele, “... as premissas de onde partiam as deduções poderiam ser
simples invenção espúria da mente do filósofo sem nenhuma base na Natureza” (Tarnas,
2003, p. 296). Dessa forma, ele sistematizou o método experimental, fundamentado no
raciocínio indutivo84 (Teles, 1970, p. 122).
Dividido em duas partes, o Novum Organum baconiano apresenta o porquê de
a dedução ser ineficiente quando do processo do conhecimento. Sua primeira parte,
chamada comumente de pars destruens, procura destruir as bases sobre as quais se
assenta a defesa do silogismo dedutivo aristotélico, chegando a considerá-lo como inútil
com relação à obtenção da verdade (Fontana, 1969, p. 88). É nesta parte que o filósofo
inglês mostra “... que até então a ciência não tinha feito progressos porque vinha
seguindo um método inadequado, o dedutivo” (Mondin, 2006, p. 64), o qual, segundo

84
Segundo Alves (2000, p. 147), com relação à indução, Bacon apenas ampliou suas regras, “... pois
Aristóteles já as conhecia e delas havia tratado”.
37

ele, parte de conceitos universais e abstratos, o que impossibilitaria a verificação da


verdade na realidade particular e concreta.
É na segunda parte, chamada de pars construens ou aedificans, que Bacon
mostra o valor do método indutivo nas ciências naturais, apresentando um novo método
experimental, além de estudar as diversas fases da indução. Para ele,

O método indutivo é fecundo porque dos axiomas formados com ordem das coisas
particulares facilmente brotam novos conhecimentos que tornam fecunda a ciência.
Trata-se evidentemente de uma indução diferente da aristotélica... (idem, p. 64).

Para acontecer verdadeiramente a indução, a mente deve se ver livre dos erros
e preconceitos adquiridos. Tais preconceitos e erros foram chamados por Bacon de
idola ou ídolos: os idola tribus (ídolos da tribo), os idola specus (ídolos da caverna), os
idola fori (ídolos do fórum ou do mercado) e os idola theatri (ídolos do teatro).
Segundo Mondin (ibidem, p. 64),

Os idola tribus são causados pelas falhas e insuficiências dos sentidos; os idola
specus, pela educação e pelas inclinações pessoais; os idola fori (prejuízos do
mercado), pela tirania da linguagem; os idola theatri, pelo respeito exagerado para
com a autoridade.

Desse modo, antes de se dar início a uma investigação científica, deve


acontecer uma libertação dos preconceitos, reduzindo a mente a uma tabula rasa.
Porém, quanto ao objeto do conhecimento, Bacon não conseguiu retirá-lo do
campo de estudo das formas e das essências, lugar-comum a Aristóteles e aos
pensadores da Escolástica. E apesar de todo o esforço opositor de Francis Bacon ao
método silogístico-dedutivo de Aristóteles, ele não conseguiu superar o Filósofo, que
ainda permaneceu absoluto depois dele. “Por esta razão, para Kant (...), a única tentativa
lógica, válida, era a aristotélica: ‘saída acabada e completa’ do cérebro do filósofo,
segundo afirmava” (Teles, 1970, p. 122).

2.3.2 Descartes e o Discurso do Método

Renés Descartes (1596-1650) é um dos nomes que pode ser vinculado, depois
do de Francis Bacon, à perda de força da Lógica aristotélica durante a Modernidade.
Alejandro (1970, p. 14-15) ressalta que, ao propor a reforma do método, Descartes não
oculta sua antipatia com relação à Lógica escolástica: o silogismo aristotélico ou
dialético é muito apto para as discussões sem fim, porém ineficiente para a invenção
38

científica85. Tal postura fez com que Descartes se limitasse quase que exclusivamente à
metodologia, insistindo na inutilidade da Lógica aprendida nas escolas em seu tempo
(Fontana, 1969, p. 370).
Ao escrever o seu Discurso do método, o filósofo francês se propõe a elucidar
qual método era o mais eficiente para a aquisição da ciência, apresentando o método
silogístico de Aristóteles como sendo estéril (Mondin, 2006, p. 76). Mesmo assim, ele
faz a opção pelo método dedutivo, o qual permite que sejam feitas inferências corretas
que levariam à verdade, em detrimento do indutivo (que é falaz por partir da experiência
das coisas). Apesar dessa sua defesa da dedução, Descartes procurou fixar novas regras
para a mesma86, uma tentativa de superar o método dedutivo aristotélico.
Para ele, a dedução de um termo se realizava a partir de um [termo] que tivesse
certa prioridade na ordem do conhecimento. E esta ordem

... envolve uma oposição à lógica formal tradicional e sua noção fundamental de
silogismo. O silogismo é uma técnica que leva em conta a forma do argumento,
deixando de lado o conteúdo. A noção de ordem envolvida no método cartesiano, ao
exigir que o ponto de partida se autojustifique, exige que seu conteúdo seja intuído,
o que resulta na recusa de uma explicação meramente formal dos argumentos
(Rocha, 2008, p. 216-217).

No entanto, apesar dessa tentativa de superação do método dedutivo


aristotélico, Descartes, segundo Alves (2000, p. 147), “... não abandona, de todo, a
Lógica aristotélica, no que é seguido por seus discípulos de Port Royal. Daí por diante a
lógica perde a sua importância e passa a ser considerada como simples arte”.

2.3.3 Leibniz, Kant e Hegel

É importante apresentar que nem todos os filósofos modernos e


contemporâneos se opuseram à Lógica aristotélica. Alguns deles a tomaram como
matriz de base para depois lançar suas conclusões filosóficas.
O filósofo alemão Gottfried Leibniz (1646-1716), por exemplo, não rechaçou a
Lógica aristotélica, a qual seria a matriz geradora da Lógica universal. Segundo ele,
Aristóteles teria dado o ABC da Lógica; o Estagirita seria, então, o precursor da Lógica

85
“... no oculta su antipatía hacia la Lógica escolástica: el silogismo aristotélico o dialéctico es muy apto
para las discusiones sin fin, pero inepto para la invención científica”.
86
Descartes reduziu as regras fundamentais do método em quatro: intuição, análise, síntese e enumeração.
Para um maior aprofundamento quanto às quatro regras, conferir o Discurso do método.
39

universal e completa (Alejandro, 1970, p. 15). Além disso, o silogismo categórico, para
ele, foi a mais brilhante e útil invenção do conhecimento humano.
Por sua vez, o também filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) voltou o
seu olhar para a Lógica aristotélica, porém dando uma nova interpretação a toda a
concepção tradicional. Sua definição da Lógica é a de que ela é a ciência das leis
indispensáveis ao pensamento, ou, segundo Alves (2000, p. 147), ela seria a “ciência
formal e normativa”.
É em Kant que se vê uma forte defesa da Lógica aristotélica nesse período.
Segundo ele, como já foi citado em outros momentos, o Estagirita criou uma Lógica
perfeita em sua estrutura, vindo a este mundo com perfeição (Reale; Antiseri, 1990,
218), sendo que nada lhe foi feito em acréscimo ou em decréscimo pelos filósofos pós-
aristotélicos. No entanto, Alejandro (1970, p. 16) ressalta que Kant aponta a ineficiência
da Lógica aristotélica para com a ciência, dado que ela esvazia a consciência intelectual
de todo conteúdo, sendo útil somente nos casos das sutilezas estéreis e nas discussões
intermináveis87.
Não seria possível deixar de citar aqui, também, um dos nomes mais
importantes da filosofia alemã do século XIX e que pode ser ligado ao desenvolvimento
da Lógica: o filósofo alemão Georg Hegel (1770-1831), que a colocou como a “...
primeira etapa do saber absoluto...” (Fontana, 1969, p. 164), a qual estudaria o elemento
abstrato do pensamento88. Abbagnano (1978, p. 136) diz que o ponto de partida da
Lógica, de acordo com Hegel, seria o conceito mais universal e abstrato, o conceito de
ser. Partindo daí, a Lógica hegeliana é dividida em três partes: a lógica do ser, a da
essência e a do conceito.
Com relação ao silogismo categórico, Reale e Antiseri (2005, p. 122) dizem
que Hegel concebe o seu sistema como um silogismo em escala maior, “... no qual os
três momentos da ‘idéia lógica’, da ‘natureza’ e do ‘espírito’ são os três termos do
próprio silogismo, que se medeiam dinamicamente”. E, segundo Santos (2007, p. 145),
ao se comparar a Lógica aristotélica com o pensamento de Hegel,

87
“... vaciando la conciencia intelectual de todo contenido, con que habilitó un instrumento inútil y apto
para sólo sutilezas estériles y discusiones interminables. Por eso la Lógica de Aristóteles, tan perfecta en
su estructura, resulta ineficaz para la ciencia”.
88
De fato, o próprio Hegel (apud Helfer, 2008, p. 65) apresenta sua compreensão da Lógica: “... deve ser
compreendida como o sistema da razão pura, como o reino do pensamento puro. Este reino é a verdade
em si mesma, tal qual é sem véu, em e para si; por este motivo, pode-se dizer: este conteúdo é a
apresentação de Deus tal qual ele é em sua essência eterna, antes da criação da natureza e do espírito
finito”.
40

Se considerarmos o conceito apenas em si teremos a lógica de Aristóteles; em sua


relação com o absoluto ou como parte ou momento no devir da Idéia, teremos a
posição hegeliana já que, para ele a primeira constrói o princípio de identidade, que
apenas revela uma lei do intelecto.

Após Kant e Hegel, a Lógica como que tomou caminhos diversos e sua
universalidade se reduziu a um pluralismo de linhas, que, segundo Alejandro (1970, p.
17), nem admite o pensamento-forma nem a realidade pensada89, o que conduz à
conclusão de que a Lógica contemporânea tem como característica principal a variedade
de aspectos, os quais tratam daquilo que lhe é inerente (a saber: conceito, juízo, termos
etc.).
A seguir, serão apresentadas, de maneira breve, as correntes lógicas
contemporâneas, para, enfim, se tratar da aplicabilidade do silogismo categórico à
argumentação jurídica.

2.3.4 Escorço Histórico sobre as Correntes Lógicas Contemporâneas

Após a oposição baconiano-cartesiana à Lógica aristotélica, surgiram, como foi


supracitado, outros conceitos de Lógica. Dentre as várias linhas da Lógica
contemporânea90, destaca-se, em um primeiro momento, a da Psicologia, que via o
psíquico como regulamentador das necessidades e das evidências lógicas. Ou seja, a
Lógica dependeria quase exclusivamente da Psicologia (Alves, 2000, p. 147), sendo
apenas uma necessidade física do ser humano. Seus maiores defensores são Theodor
Lipps (1851-1947) e Wilhelm Wundt91 (1832-1920).
De acordo com Alejandro (1970, p. 32-33), as outras linhas92 mais importantes
são: a lógica experimental, que se atém à comprovação física da Lógica; a lógica
normativa, com Edmond Goblot (1858-1935) e Johann Herbart (1776-1841), cujo
escopo era buscar a correção do pensamento, no entanto, sem critérios lógicos; a lógica

89
No original: “... ni admite el pensamiento-forma ni la realidad pensada…”.
90
Fontana (1969, p. 371) destaca que essas linhas lógicas são, na verdade, formas evoluídas das antigas
concepções presentes na Lógica aristotélica. O mesmo autor cita as diversas correntes modernas: a Lógica
gnosiológica, a pragmático-instrumental, a existencial entre outras.
91
Wundt propõe, ademais, uma linha lógico-ética, a qual diria como o homem deve proceder quando do
conhecimento científico. A Lógica, desse modo, perderia sua universalidade legal, sendo mero meio de
regulamentar o bom comportamento científico (Alejandro, 1970, p. 17).
92
Além das linhas lógicas que serão citadas, destacam-se as seguintes correntes, as quais não serão
analisadas: metafísica, dialética, vitalista, histórica, orgânica, hermenêutica, fenomenológica, a do
pensamento concreto, a do pensamento essencial, a dialética do marxismo (idem, p. 73).
41

metodológica, ligada a Christoph von Sigwart (1830-1904) e Wundt, centrada sobre os


aspectos dos modos do raciocínio científico.
Por sua vez, Fontana (1969, p. 372) apresenta que a Lógica contemporânea se
direciona, de forma geral, para três vias: a lógica pura, que se opõe ao psicologismo e
trata a Lógica como “ciência autônoma” (Alves, 200, p. 147), cujos representantes
maiores são Edmund Husserl93 (1859-1938) e Bernard Bolzano (1781-1848); a lógica
transcendental e dos valores, para quem os juízos têm valor ontológico, ligada a
Wilhelm Windelband (1848-1915) e Emil Lask (1875-1915); e a lógica matemática ou
simbólica, cujos adeptos são Bertrand Russell (1872-1976), Gottlob Frege (1848-1925),
David Hilbert (1862-1943), Alfred Tarski (1901-1983) entre outros.
Essa última linha da Lógica contemporânea é a mais expressiva. Chamada de
Lógica Simbólica ou Matemática94, procura fazer uso de símbolos matemáticos para
resolver os problemas inerentes à Lógica95. Segundo Alves (2000, p. 148), a Lógica
Simbólica dá “... um aspecto muito mais flexível e formal à lógica, fazendo-a mais
adequada à linguagem científica moderna”.
O grande nome ligado a essa vertente da Lógica é George Boole (1815-1864),
que, através de suas elucubrações, procurou mostrar que era possível tratar
algebricamente não somente de grandezas matemáticas, mas também dos conceitos
lógicos de proposição, classes, termos entre outros96.

Desse modo, Boole conseguiu traduzir em uma teoria de equações a lógica


tradicional dos termos, particularmente a silogística, esboçando também uma teoria
algébrica da lógica das proposições. Foi assim que Boole (...) criou a “álgebra da
lógica” (...). Dessa maneira, Boole fazia a lógica tornar-se “lógica simbólica”, que se
configurava como “ramo da matemática”... (Reale; Antiseri, 2005, p. 336).

93
Husserl escreveu uma obra dedicada às reflexões sobre a Lógica, as Investigações lógicas, na qual ele
discorre sobre a chamada lógica pura. De acordo com seus pensamentos, “... A lógica, enquanto doutrina
pura da ciência (reine Wissenschaftslehre), tem como tríplice tarefa: fixar as categorias puras da
significação, dos objetos e de suas combinações segundo suas próprias leis; estabelecer as leis e teorias
cujos fundamentos encontram-se nessas categorias; e, finalmente, constituir-se como teoria das formas
possíveis de teorias ou como teoria pura de multiplicidades. No segundo volume das Investigações
lógicas, Husserl finalmente apresenta sua definição de lógica como ‘a ciência dos significados como tais
[Wissenschaft von Bedeutungen als solchen]’” (Oliveira, 2008, p. 235).
94
Sua origem se deveu ao pensamento de que a Lógica não deveria se ater somente ao campo do
silogismo categórico (Cyrino; Arantes, 1984, p. 9).
95
Ao fazer o uso de símbolos, a Lógica Simbólica procura facilitar a exposição das estruturas lógicas
presentes nas preposições e nos argumentos (Copi, 1978, p. 225-226).
96
Porém, não se pode esquecer de Gottlob Frege (1848-1895), que buscou, antes de Boole, “... extrair ‘as
leis mais simples do numerar’ com ‘meios puramente lógicos’ (...) para Frege, a lógica não é apenas o
fundamento ao qual reportar, por meio da aritmética, as variadas teorias matemáticas, mas também o
instrumento com o qual se deve construir de modo correto e rigoroso o próprio edifício da matemática”
(Reale; Antiseri, 2005, p. 335-336).
42

Essa vertente da Lógica quer mostrar, considerando tudo o que foi


supraexposto, que

... a matemática é de índole puramente lógica, não existindo para a formação das
noções matemáticas nenhum processo ou princípio que lhe seja próprio, peculiar ou
exclusivo, e os métodos da fundamentação matemática, tanto a prova como a
demonstração, são apenas os da pura lógica. Desta forma, a lógica é a base da
matemática, e tanto a Lógica como a Matemática passam a ser parte da Logística
geral (Santos, 2007, p. 92).

Porém, dentre os pensadores contemporâneos, o mais ferrenho opositor da


Lógica aristotélica foi Stuart Mill (1806-1873). Em parte, Mill se aproximou de
Aristóteles ao considerar a Lógica como “... a ciência das operações intelectuais que
servem para a avaliação da prova” (Fontana, 1969, p. 371). No entanto, essa
proximidade só o é com relação à utilização dos termos demonstração e prova. Além
disso, seguindo a tradição baconiana, propôs que o silogismo categórico era estéril, não
sendo útil para o conhecimento, pois é daquilo que se experimenta – portanto, algo
particularizado – que se consegue chegar aos conceitos universais. No entanto, para
Mill, todas as inferências acontecem dos casos particulares para os casos particulares
(Reale; Antiseri, 2005, p. 308).
Todas essas vertentes da Lógica na Idade Contemporânea procuraram se
distanciar do pensamento aristotélico, partindo de princípios diversos dos da Lógica
tradicional. Porém, segundo Coelho (2000, p. 105), tanto a Lógica aristotélica quanto as
lógicas surgidas no século XX podem ser inseridas na atual conjuntura racional-
científica. E as linhas lógicas podem se relacionar com a Lógica tradicional de duas
formas: contemplando-a ou tentando substituí-la.
Apesar de todas essas oposições dos filósofos modernos e contemporâneos,
Reale (1994 [a], p. 469) diz que

... quaisquer que tenham sido ou possam ser as objeções levantadas contra a lógica
aristotélica, e por tudo o que de verdadeiro possa haver nas instâncias que vão do
Novo Organon de Bacon ao Sistema de lógica de Stuart Mill, assim como nas
instâncias que vão da lógica transcendental kantiana à hegeliana lógica da razão
(lógica do infinito) ou, enfim, nas instâncias lógicas das metodologias das ciências
modernas, contudo, é certo que a lógica ocidental, no seu complexo, tem raízes no
Organon de Aristóteles, o qual (...) continua sendo uma pedra miliar na história do
pensamento ocidental.
43

2.3.5 A Lógica no Brasil

No Brasil, a Lógica se difundiu através de textos traduzidos e comentados


vindos da Europa, como os textos do francês Jacques Maritain (1882-1973) e de outros
pensadores (L. Liard, B. Mates, W. Salmon etc.). Grande importância teve a Lógica
aristotélica (estudada, sobretudo, nas universidades católicas) e a Lógica simbólica (cuja
tentativa de difusão se deu mais em São Paulo e no Rio de Janeiro a partir dos anos de
1950, ganhando força, contudo, a partir de 1962).
No entanto, logo também se procurou produzir algo próprio no campo da
Lógica. Assim, destacam-se Goffredo Telles Júnior (1915-2009), autor de Tratado da
conseqüência (1949), e Paulo Roberto Margutti Pinto, autor de Introdução à Lógica
Simbólica (2001), entre outros. A partir dos anos de 1960, porém, os textos de Lógica
no Brasil se difundiram, havendo uma ampla produção nacional.
Vários estados brasileiros (São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Rio
Grande do Sul, Paraíba, Maranhão, Sergipe, Rio Grande do Norte) concentraram o
estudo de Lógica em núcleos especializados. No entanto, a importância dada à Lógica
verificou-se de modo elevado no Estado de São Paulo, em Campinas, a partir da criação
do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLE) da UNICAMP, em
1977. E dentre seus pensadores, destaca-se Newton da Costa, membro do CLE desde
1979.

Sua paixão no tocante à Lógica e Fundamentos da ciência, alicerçada por sólida


formação acadêmica e pela sua intensa dedicação aos campos da Lógica e da
Filosofia, fez dele um dos criadores das Lógicas Paraconsistentes97, laureando-o
com diversos títulos nacionais e internacionais... 98.

Segundo Miguel Reale (apud Nobre; Rego, 2000, p. 22), a criação da Lógica
paraconsistente por parte de Newton da Costa trouxe “... uma contribuição de
repercussão universal”. E ele é tão importante para os estudos lógicos no Brasil que “...
pode, sem favor, ser olhado como ‘o’ lógico do País”, conforme diz Jaime (2000, p.

97
“É uma forma de lógica onde não existe o princípio da contradição. Nesse tipo de lógica, tanto as
orações afirmativas quanto as negativas podem ser falsas ou verdadeiras, dependendo do contexto. Uma
das aplicações desse tipo de lógica é o estudo da semântica, especialmente em se tratando dos paradoxos.
Um exemplo: ‘fulano é cego, mas vê’. Pelo princípio da lógica clássica, o indivíduo que vê, um ‘não-
cego’, não pode ser cego. Na lógica paraconsistente, ele pode ser cego para ver algumas coisas, e não-
cego para ver outras coisas”. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Lógica, acessado em 08 de
outubro de 2009.
98
Disponível em http://www.cle.unicamp.br/arquivoshistoricos/?destino=newtondacosta_biografia.html,
acessado em 08 de outubro de 2009.
44

264), sendo um dos responsáveis pelo desenvolvimento da Sociedade Brasileira de


Lógica.
Muitos são os especialistas que no Brasil se esforçam por estudar e analisar os
conceitos lógicos clássico-medievais, modernos e contemporâneos.
Depois desse percurso histórico através da Lógica pós-aristotélica será
analisada, no próximo capítulo, a relação do silogismo categórico com a argumentação
jurídica.
3 APLICAÇÃO DO SILOGISMO CATEGÓRICO À ARGUMENTAÇÃO
JURÍDICA

Até o momento, nos capítulos precedentes, essa pesquisa se deteve na história


da Lógica pré-aristotélica (primeiro capítulo) e pós-aristotélica (segundo capítulo),
focando, além disso, a sistematização da mesma por Aristóteles e a composição da
teoria do silogismo categórico (primeiro capítulo).
Porém, ainda subjaz uma questão: será possível falar de uma atualidade do uso
do silogismo categórico mesmo frente a tudo quanto foi dito em sua oposição pelos
filósofos dos últimos quinhentos anos? Tem validade o método silogístico quando
aplicado à argumentação, em especial à argumentação jurídica?
Nos dizeres de Alves (2000, p. 290), o silogismo é uma “... arma muito
eficiente para descobrir o erro, ou desmascarar o sofisma (falácia)”. Evidentemente, o
silogismo categórico não tem a capacidade de inventar uma verdade. Ele tem sua
utilidade ao estabelecer, “... entre idéias conhecidas, relações ainda ignoradas e é,
portanto, elemento do progresso” (idem, p. 290). Além disso,

... O silogismo, em sua expressão lógica, rejeita todo (...) aparato logicamente
inútil, toda a linguagem artificiosa e colorida, todas as figuras de retórica, etc.,
pondo o pensamento exposto em sua essência lógica, em sua estrutura pura (ibidem,
p. 290).

Dado esse ponto de vista, procurar-se-á demonstrar, no presente capítulo, a


atualidade e a importância das reflexões lógico-aristotélicas, o que possibilitará
apresentar a utilização das regras e conceitos do silogismo categórico nos dias atuais.
No entanto, é importante levar em conta que tanto o silogismo quanto a Lógica
aristotélica, por serem abstratos (isto é, por trabalharem com as leis, princípios e
conceitos abstratos através dos quais o intelecto realiza suas operações 99), servem a
qualquer matéria e discorrem sobre qualquer conteúdo (ibidem, p. 398). Por isso, será
investigado um campo das atividades humanas que se assenta sobre as leis do raciocínio

99
Essas leis, princípios e conceitos abstratos das operações do intelecto que foram citados são, na
verdade, as próprias leis do silogismo categórico apresentadas no primeiro capítulo. Como foi citado
quando se discorreu sobre a relação das reflexões tomásicas com a Lógica, as operações do intelecto são
três: a inteligência dos indivisíveis, a operação do intelecto ao compor e dividir e o raciocínio. Sobre as
duas primeiras, que estão presentes no processo de abstração do intelecto, Santo Tomás (1999, p. 118) diz
que “... A primeira operação visa à natureza da coisa, de acordo com a qual a coisa inteligida ocupa um
certo grau entre os entes, quer seja uma coisa completa como um certo todo, quer uma coisa incompleta
como uma parte ou um acidente. A segunda operação visa ao próprio ser da coisa que resulta da reunião
46

(alvo do silogismo categórico): a argumentação. Ademais, como a própria


argumentação possui uma extensa área de atuação – já que pode ser utilizada nas
ciências humanas, exatas e biológicas, fazendo ser obrigatória uma explanação
pormenorizada da mesma, – esse capítulo se deterá em uma seção específica da mesma:
a argumentação jurídica. No entanto, antes, serão tratados o ato de argumentar e os tipos
de argumentos.

3.1 A ARGUMENTAÇÃO

O ato de argumentar é tema tanto do Organon (Analíticos, Tópicos e


Refutações Sofísticas) quanto do Dos Argumentos Sofísticos e da Arte Retórica de
Aristóteles.
Segundo Pinto (1994, p. 161), há uma lista considerável de atividades que
envolvem a argumentação, desde “... provar ou refutar teses em linguagem filosófica”
até a “... discussão entre os personagens de uma peça teatral ou de um filme”, possuindo
todas elas características próprias. Porém, o mínimo para que haja uma argumentação é
“... a existência da linguagem em comum, de uma técnica que possibilite a
comunicação” (Perelman; Olbrechts-Tyteca, 1996, p. 17). Assim, faz-se necessária uma
série de regras mediando, por assim dizer, o embate dialogal entre duas pessoas.
Mas o que é um argumento?
Um argumento, conforme Keller e Bastos (2004, p. 43), é uma elaboração
ordenada do intelecto, que utiliza meios conceituais oferecidos pela experiência
humana. Ou, como Smith (1996, p. 29) ressalta, um argumento é o discurso que tenta
provar um ponto: qualquer argumento pretende dar razões para aceitar alguma
proposição100.
De acordo com Walton (2006, p. 151), a base de qualquer argumentação são as
proposições, que, como foi visto quando discorrido sobre o Da Interpretação,
apresentam a validade ou não de um raciocínio. E, segundo Perelman e Olbrechts-
Tyteca (1996, p. 50), o objetivo de qualquer utilização de argumentos é fazer com que o
interlocutor faça adesão àquilo que é apresentado por outrem. Assim sendo,

dos princípios da coisa nos compostos ou acompanha a própria natureza simples da coisa como nas
substâncias simples...”
100
“Argument is discourse that tries to prove a point: any argument purports to give reasons for
accepting some proposition”.
47

... uma argumentação eficaz é a que consegue aumentar essa intensidade de adesão,
de forma que se desencadeie nos ouvintes a ação pretendida (ação positiva ou
abstenção) ou, pelo menos, crie neles uma disposição para a ação, que se
manifestará no momento oportuno (idem, p. 50).

E é em Aristóteles que se encontra uma ideia precursora da concepção de


argumentação como uma atividade que envolva diversas atividades discursivas. O
grande mérito do Estagirita é o de respeitar e procurar “... analisar com cuidado cada
uma das diversas formas de argumentação ao seu alcance” (Pinto, 1994, p. 169).
Como apresentado acima, há diversas atividades que fazem uso de argumentos
quando de um diálogo ou de uma exposição de proposições. Cada uma delas possui
características (positivas e negativas) e modos de se apresentar próprios.
Para que um argumento possa ser considerado um bom argumento, devem ser
cumpridas algumas obrigações básicas, dentre elas a troca de perguntas e respostas,
além de alcançar o objetivo através da cooperação entre as duas partes envolvidas no ato
de argumentar. A partir desse cumprimento ou não, chega-se aos tipos de colóquios
argumentativos101.
O primeiro deles é a da altercação pessoal, em que se discute com ardor,
acontecendo até mesmo ataques pessoais agressivos102. Aquele que faz uso desse tipo de
argumentação pode até apelar emocionalmente, sendo sempre o seu objetivo a vitória
sobre o interlocutor, e isso a qualquer custo. De acordo com Walton (2006, p. 5), “A
altercação não é amiga da lógica e, muitas vezes, representa o pior tipo de argumento”.
Um segundo tipo de diálogo argumentativo é o persuasivo. Conforme Shimote
(2008, p. 11), persuadir, em sentido geral, significa “... aconselhar, levar alguém a
aceitar um ponto de vista de modo suave, habilidosamente”. No diálogo persuasivo
ambos os participantes tentam se convencer mutuamente sobre seu ponto de vista com
relação à tese em questão, a partir de premissas e “... regras de inferência baseadas nas
concessões do outro participante” (Walton, 2006, p. 7). Por isso, este é um modelo
argumentativo importante ligado à Lógica.
Outro tipo de diálogo é o de negociação, em que o objetivo é o ganho pessoal e
o método utilizado é o da barganha, não se assentando sobre a verdade das proposições.

101
Além das formas que serão apresentadas, ainda existem a procura de informação (baseada na falta de
informação, usando o questionamento, tendo por objetivo descobrir informações), o diálogo educacional
(baseando-se sobre a ignorância do interlocutor, sendo seu método o ensino e seu objetivo a transmissão
de conhecimentos) e, por último, a procura de ação (que busca fazer com que uma parte siga um
determinado plano de ação) (Walton, 2006, p. 12-13).
102
Esse tipo de diálogo argumentativo está ligado ao argumento ad hominem.
48

E a última forma de diálogo que resta apresentar é a do debate forense. Similar


à altercação pessoal, o debate forense possui maior ordenação, visto que existem os
juízes, regras de procedimento, julgamento por parte do público ou de um grupo restrito
de pessoas. Esse tipo de diálogo é o que melhor se relaciona com o raciocínio lógico
(diferentemente da altercação pessoal), visto que há um mediador do embate
argumentativo (no caso, o juiz) e regras (idem, p. 6). Porém, as regras que regem o
debate forense são tolerantes com relação às falácias103. “Às vezes, tais lances falaciosos
não são apenas tolerados, mas valorizados como boa tática de debate” (ibidem, p. 6).
É no contexto do debate forense que se encontra a argumentação jurídica,
utilizada por juízes, desembargadores, advogados, promotores entre outros. A seguir, a
argumentação jurídica será analisada, para depois ser relacionada com o silogismo
categórico.

3.2 A ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

A argumentação jurídica possui uma característica essencial: a vinculação ao


direito vigente, isto é, ela obedece às leis do Direito que estão em vigor, pois depende
delas para propor suas conclusões acerca de um determinado fato. Além disso, ela
possui dois tipos de justificações: a justificação interna e a justificação externa (Alexy,
2005, p. 217).
A justificação interna é o meio pelo qual se consegue verificar se a decisão
tomada em determinado caso vem logicamente das premissas de uma inferência. É
nesse contexto da justificação interna que há o intercâmbio entre a Lógica e o Direito104,

103
Mais adiante as falácias serão estudadas, visto sua importância para o discurso argumentativo lógico e
jurídico.
104
Para se analisar a aplicação das regras do silogismo categórico à argumentação jurídica, deve-se levar
em consideração a existência ou não de uma lógica jurídica. Há duas posições acerca dessa questão: a
daqueles que defendem a existência de uma lógica jurídica (cuja característica principal é a práxis) e os
que se opõem a essa ideia. De acordo com Kelsen (apud Coelho, 2000, p. 60), não se pode dizer que
exista “... uma lógica própria para o conhecimento das normas jurídicas. No entanto, ele considera que há
uma lógica no direito”. Segundo Perelman (apud Alves, 2000, p. 398), “... do ponto de vista de uma
Lógica Formal pura aplicada ao direito (...) não há necessidade de chamá-la de “lógica jurídica”, pois se
assim fosse, seria necessário dividi-la também em lógica biológica, química, econômica, sociológica,
etc., e isso não tem sentido”. Desse modo, a Lógica seria instrumento para o Direito. E as características
da argumentação deste, por sua vez, são as características dos conceitos lógicos: uma norma pode ser
aplicada válida ou invalidamente, uma proposição jurídica pode ser verdadeira ou falsa, não há a
possibilidade de que uma proposição jurídica se contradiga a si mesma etc. No entanto, segundo Voese
(2006, p. 36), há uma adaptação dos mesmos “... às referências prescritivas e descritivas que sustentam a
prática jurídica”, isto é, há uma adaptação dos conceitos lógicos às normas que formam o arcabouço da
prática jurídica. Em sentido contrário, Alves (2000, p. 399) vai dizer que há sim uma lógica jurídica, pois
49

pois, segundo Alexy (2005, p. 218), “Os problemas ligados à justificação interna têm
sido amplamente discutidos sob o nome de ‘silogismo jurídico’”. Já o objetivo da
justificação externa, na argumentação jurídica, é verificar em que se fundamentam as
premissas usadas na justificação interna.
O importante, entrementes, é saber que a argumentação jurídica se aplica a
diversos tipos de discussões jurídicas, desde as deliberações dos juízes até os debates
entre advogados. Algumas diferenças existem entre elas: institucionalização (debates
perante tribunais, deliberações judiciais), resultado da argumentação com ou sem limite
temporal (discussões da Ciência do Direito), decisões vinculantes, preparação ou crítica
de decisões (que pode ser utilizada por advogados de defesas ou promotoria pública),
entre outros (idem, p. 209-210). A partir desses diferentes tipos de discussões que fazem
uso da argumentação jurídica surgem as formas de argumentos utilizados nos diversos
tipos de discussões jurídicas.

3.2.1 Tipos de Argumentos Jurídicos

Os argumentos em geral se apresentam com o intento de serem objetos de


persuasão entre indivíduos: atinge-se um público específico com argumentos para
persuadi-lo de alguma coisa (MacCormick, 2006, p. 17).
Porém, para que o argumento jurídico seja considerado correto no processo do
raciocinar, é necessário levar em conta que o argumentador deve

... realizar interpretações que sejam aceitáveis e defensáveis (...); procurar controlar
a heterogeneidade lingüística, o que exige, por sua vez, habilidades do argumentador
para definições e delimitações dos sentidos das palavras; adotar um modelo lógico
como orientação105 (Voese, 2006, p. 52-53).

A partir desses dados indissociáveis ao ato de argumentar, podem ser


nomeados os diferentes tipos de argumentos aplicados ao campo jurídico, os quais
podem ser divididos em: os que pertencem às formas concretas, os argumentos forenses

há a razão jurídica. Ele também apresenta que há questões que vão além da Lógica Formal e que se
encontram no campo de uma lógica prática, que “... trabalha com provas num patamar abaixo da certeza;
porém, trabalha com as questões relativas ao valor, ao preferível, à avaliação de cada caso e, portanto,
com a liberdade e a decisão” (idem, p. 398). Contudo, para o desenvolvimento da análise sobre o
intercâmbio Lógica-Direito, não se adentrará nesse campo de discussão, preferindo-se apenas aplicar
aquilo que é próprio do silogismo categórico à argumentação jurídica.
105
Também é importante levar em conta que em uma argumentação jurídica, quando utilizada em um
julgamento, “O apelo a técnicas de persuasão é uma das constantes” (Pinto, 1994, p. 166), isso porque
“Quem busca somente o acordo de um auditório particular, persuade...” (Alexy, 2005, p. 171).
50

e os relacionados à atividade linguística e à orientação lógica106. Esses últimos têm


especial importância, visto que possuem um teor lógico. Voese (2006, p. 53-70) oferece
uma lista considerável (da qual só serão citados os de orientação lógica, deixando de
lado os argumentos relacionados com a atividade linguística):
a) argumento da coerência: orientado pelo princípio lógico da não-
contradição;
b) argumento de reciprocidade: embasado na propriedade das semelhanças
entre dois fatos diferentes, havendo a possibilidade de se aplicar um juízo
sobre ambos na ordem correta e na ordem inversa (se A, então B; se B,
então A);
c) argumento de transitividade107: baseado na expressão lógica A = B; B = C;
logo, A = C;
d) argumento da inclusão da parte no todo: faz uso do modelo lógico-formal
do o que vale para o todo, vale também para suas partes, isto é, por
exemplo, se uma lei vale para o todo, então ela terá igual valor para as
partes desse todo (se A, então B);
e) argumento da divisão do todo em partes: diversamente do argumento
anterior, tenta demonstrar que o todo é formado por partes, as quais têm
sua importância;
f) argumento da analogia108: está sobre a base lógico-formal da analogia
expressa na fórmula A = B assim como C = D;
g) argumento da probabilidade: vale-se de estatísticas e do cálculo de
probabilidades para se chegar à verdade.
É importante que seja enfatizado “... que, apesar da força e da diversidade de
argumentos, só eles não garantem a adesão do auditório a teses e o acolhimento de
justificativas que as decisões e as sentenças exigem no Direito” (idem, p. 70). No
entanto, essas formas de argumentos constituem um importante arsenal presente na
argumentação jurídica. É levando em consideração a existência desses argumentos que

106
Essa classificação, no entanto, não esgota outros tipos de argumentos jurídicos não abordados por essa
pesquisa.
107
Desse argumento de transitividade, pode ser retirado o seguinte silogismo: não deve ser condenado (A)
aquele que para se defender matou em legítima defesa (B); ora, José (C) para se defender matou em
legítima defesa (B); então, José (C) não deve ser condenado (A).
108
Esse argumento se explica através do seguinte exemplo: “Agredir a mulher é como agredir o membro
central da família e, por isso, a célula da sociedade” (Voese, 2006, p. 59). Ou seja, “... ao fazer a
valorização do instituído social, cria condições de valorizar a família e a mulher, ao mesmo tempo que
reforça a acusação contra um eventual agressor” (idem, p. 59).
51

será possível, enfim, lançar mão do silogismo aristotélico e aplicá-lo à argumentação


jurídica.

3.3 APLICABILIDADE DO SILOGISMO CATEGÓRICO À ARGUMENTAÇÃO


JURÍDICA

Como foi visto anteriormente, a argumentação jurídica carece do raciocínio


correto. E uma das características indispensáveis para um reto argumentar é a adoção da
Lógica (ou um modelo a ela pertencente) como meio de o argumentador chegar à
verdade.
A Lógica, desse modo, contribui grandemente para a argumentação jurídica,
oferecendo esquemas e tipos de argumentação embasados nas leis corretas do
raciocínio, o que proporciona clareza e exatidão ao argumentador. Aqui, a característica
da Lógica como instrumento tem importância, sendo ela capaz de levar à interpretação e
à conceituação com enorme grau de assertividade, oferecendo um paradigma
importante: o silogismo categórico. Ao contrário daquilo que os pensadores modernos e
contemporâneos colocaram, como foi visto no capítulo anterior, o silogismo categórico,
para a argumentação jurídica (e a argumentação em geral), “... é um método que
proporciona a possibilidade de encontrar as premissas que faltam, controlando assim a
qualidade argumentativa” (Braatz, 2007, p. 142).
Também é importante que se dê atenção ao fato de que o silogismo categórico
garante que “... se as premissas forem verdadeiras e o raciocínio válido, então a
conclusão será verdadeira” (Coelho, 2000, p. 43). O silogismo categórico poderia ser
descartado como instrumento para a argumentação jurídica se admitisse que uma
conclusão inválida pudesse ser retirada de premissas válidas ou se de premissas válidas
viesse uma conclusão inválida.
Desse modo, a argumentação silogístico-dedutiva se torna um importante meio
de a argumentação jurídica provar ou refutar uma tese, baseando-se no princípio de que
“... ela [a argumentação silogístico-dedutiva] tem a pretensão de não ficar na
probabilidade porque parte de princípios gerais evidentes por si” (Keller; Bastos, 2004,
p. 47). As peças processuais, pareceres ou decisões podem ser traduzidos em
silogismos, os quais fornecem a eficácia do discurso, que “... é atingida quando suscita a
adesão ao apresentado como tese” (Passareli, 2008, p. 122). Além do que, “Reduzindo
um raciocínio a um silogismo, vemos suas partes em miniatura, então podemos discernir
52

o que é essencial do raciocínio e o que é inútil” (Hamilton apud Nascimento, 1991, p.


141).
As formas de aplicação do silogismo categórico aos raciocínios jurídicos são
definidas de acordo com as regras do mesmo109. Então, ao serem aplicadas, as regras do
silogismo categórico adotam a seguinte conformação:

... a) na premissa maior, o enunciado (...) contido na norma jurídica (a lei); b) na


menor, o enunciado de realidade sobre um fato pertinente à norma jurídica (o caso
concreto); c) na conclusão, a aplicação da norma jurídica ao fato (decisão) (Coelho,
2000, p. 83).

Ademais, há alguns raciocínios na argumentação jurídica em que as regras do


silogismo categórico são amplamente utilizadas. No caso da petição inicial110 “... é
norma vir a premissa menor em primeiro lugar, uma vez que o Código de Processo Civil
assim o ordena...” (Nascimento, 1991, p. 145), sendo a premissa menor o fato e a
premissa maior a normal legal, como foi supracitado111. Por exemplo, um advogado que
atende a um caso tem honorários para receber de seu cliente. Então, ele propõe ação de
procedimento sumaríssimo112, conforme prescrito na lei113, pedindo, então, a
condenação de seu cliente nos honorários. Como o fato é verdadeiro e a norma utilizada
corresponde ao fato, então o pedido é deferido (ibidem, p. 146). Ou seja, houve uma
relação dedutiva entre a norma legal (premissa maior) e o fato (premissa menor),
resultando na consequente.
Contudo, não só a petição inicial faz uso do silogismo categórico. Os recursos
também o fazem. Basta ver a apelação, o agravo de instrumento114, o recurso

109
É válido lembrar a existência do silogismo deôntico, muito utilizado também na argumentação
jurídica. Enquanto no silogismo aristotélico o raciocínio acontece por meio da correlação entre os termos
de uma proposição mediados pelo verbo ser, no silogismo deôntico essa correlação se dá por meio da
expressão verbal dever ser. Por exemplo: “... se M deve ser P, e S é M, então S deve ser P”(Coelho, 2000,
p. 84). O silogismo deôntico (não abordado por nós devido à delimitação do tema) é considerado
normativo, em contraposição ao silogismo aristotélico, que é teorético.
110
“... formulação escrita de pedido, fundada no direito da pessoa, feita ao juiz competente” (Houaiss,
2004, p. 568).
111
Assim se encontra no art. 282 do Código de Processo Civil: “A petição inicial indicará: (...) III – o fato
e os fundamentos jurídicos do pedido; IV – o pedido, com as suas especificações...” (2009, p. 408).
112
“No antigo direito luso-brasileiro, o procedimento era ordinário, sumário, sumaríssimo e executivo
(...). A virtude do procedimento sumaríssimo está em que ele se desenvolve simpliciter et de plano ac sine
streptu. O que o caracteriza é a simplificação de atos, de modo que as demandas sejam processadas e
decididas em curto espaço de tempo e com o mínimo de despesas” (idem, 2009, p. 379).
113
A lei prescreve que se observará o procedimento sumário em casos específicos. Assim, no artigo 275
do Código de Processo Civil, tem-se que o procedimento sumário deverá ser observado “... nas causas,
qualquer que seja o valor: (...) de cobrança de honorários dos profissionais liberais, ressalvado o disposto
em legislação especial...” (ibidem, p. 407).
114
“... recurso a uma instância judicial superior, para que se mude decisão de juiz de instância inferior”
(Houaiss, p. 23).
53

extraordinário entre outros. Assim, a disposição das proposições da apelação se dá


quando a premissa maior são os fundamentos do Direito, a premissa menor é o fato e a
conclusão é o pedido de nova decisão115. Com relação ao agravo de instrumento,
acontece da seguinte forma: a premissa maior é a exposição do Direito, a premissa
menor é o fato e a conclusão é o pedido de reforma116. Por sua vez, o recurso
extraordinário tem a exposição do Direito como premissa maior, o fato como a premissa
menor e o pedido de reforma como conclusão117 (ibidem, p. 147-148). Mas a estrutura
sempre será essa: premissa menor – fato; premissa maior – normal legal; e conclusão,
que

... contempla a subsunção 118 do caso à norma, ou – o que é o mesmo – a aplicação


do direito traduzida por uma decisão. Se o silogismo diz respeito à petição do
advogado, ao libelo119 do promotor ou ao parecer do procurador, a conclusão
apresentará a decisão postulada, e no caso de sentença judicial ou acórdão 120, a
decisão adotada (Coelho, 2000, p. 84).

Também a sentença em seus elementos se identifica com os requisitos


essenciais do silogismo categórico121, em que, como ressalta Camagna (apud
Nascimento, 1991, p. 149), a sentença é um silogismo do qual a lei é a premissa maior;
o fato concreto é a premissa menor; a aplicação do direito ao fato é a conclusão122 [trad.
minha].
Mas o silogismo categórico não se relaciona somente com a aplicação de
normas. Na argumentação jurídica não-escrita pode-se valer também das regras do
raciocínio dedutivo. Por exemplo, em um julgamento o advogado de defesa se expressa
da seguinte forma:

115
Assim aparece no Código de Processo Civil, art. 514: “A apelação, interposta por petição dirigida ao
juiz, conterá: (...) II – os fundamentos de fato e de direito; III – o pedido de nova decisão” (2009, p. 426).
116
Para o agravo de instrumento, tem-se no art. 524: “O agravo de instrumento será dirigido diretamente
ao tribunal competente, através de petição com os seguintes requisitos: I – a exposição do fato e do
direito; II – as razões do pedido de reforma da decisão...” (idem, p. 427).
117
Para o recurso extraordinário, tem-se no art. 541: “O recurso extraordinário e o recurso especial (...)
conterão: I – a exposição do fato e do direito; (...) III – as razões do pedido de reforma da decisão
recorrida” (ibidem, p. 429).
118
Ou seja, considerar como aplicação de uma lei um fato.
119
“... apresentação, oral ou escrita, de uma acusação” (Houaiss, p. 455).
120
“... sentença definitiva dada por tribunal” (idem, p. 12).
121
Reza o Código de Processo Civil, art. 458, que os requisitos importantes para uma sentença são os
fundamentos através dos quais o juiz analisar as questões do fato e do direito, além do dispositivo pelo
qual se resolverão as questões (2009, p. 419).
122
No original em italiano: “... la seconda è un silogismo de cui la legge è la premessa maggiore; il fato
concreto è la premessa minore; l’aplicazione del diritto al fato è la conseguenza”.
54

Sabemos, porque é até truísmo123, que todo homem que é honesto obedece às leis.
Pedro, segundo todas as testemunhas, é obediente às leis do país; portanto, o
promotor de justiça não pode negar que Pedro é um homem honesto; logo, merece a
consideração do júri (Nascimento, 1991, p. 143).

Deixando o argumento em forma silogística, tem-se: “Todo homem honesto


obedece às leis; ora, Pedro obedece às leis; logo, Pedro é um homem honesto” (idem, p.
143). Aplicando as regras relativas ao termo e às premissas, vê-se claramente que o
silogismo é da segunda figura, pois a expressão obedece às leis, que faz as vezes de
termo médio, ocupa o lugar de predicado em ambas as premissas. Além disso, as duas
premissas são afirmativas. Então, conclui-se “... que o termo médio é particular nas
duas, pois que nas afirmativas o predicado é particular” (ibidem, p. 144),
desobedecendo-se, assim, à regra número quatro do silogismo válido124, o que leva à
seguinte conclusão: o argumento utilizado pelo advogado é incorreto, beirando a uma
falácia.
Com relação às regras do silogismo categórico aplicadas à argumentação
jurídica, segue-se que aquelas devem ser tais e quais quando aplicada a um raciocínio
lógico-dedutivo comum. De acordo com Alexy (2008, p. 219), “Para a fundamentação
de uma decisão jurídica deve-se apresentar pelo menos uma norma universal”. Ademais,
“A decisão jurídica deve seguir-se logicamente ao menos de uma norma universal, junto
a outras proposições” (idem, p. 219), o que remete à quarta regra recém-supracitada do
silogismo categórico e à oitava regra relativa às premissas, que apresenta que de duas
premissas particulares não se obtém conclusão alguma.
Algumas propriedades do silogismo categórico que não foram tratadas no
capítulo segundo serão abordadas nas próximas subseções devido a sua importância
quando se correlaciona silogismo categórico e argumentação jurídica. Dessa forma, essa
pesquisa perpassará as formas derivadas do silogismo, para em seguida serem
explanadas as falácias ou sofismas, cujo conhecimento também é essencial.

“... verdade incontestável ou evidente” (ibidem, p. 738).


123
124
A regra quarta é aquela que diz que o termo médio deve ser uma vez ao menos universal (Maritain,
2001, p. 206).
55

3.3.1 Formas Derivadas do Silogismo Categórico e sua Utilidade no Ato da


Argumentação Jurídica

Muitas vezes, um silogismo não assume a forma categórica que leva a partir do
mais geral ao menos geral, sem, no entanto, perder sua validade (Keller; Bastos, 2004,
p. 97), fazendo surgir outras formas do silogismo, que “... guardam certa analogia com o
silogismo regular” (Teles, 1970, p. 143) e recebem o nome de silogismos compostos,
irregulares, mistos ou incompletos. O conhecimento dessas formas derivadas do
silogismo categórico é muito importante no tocante à argumentação jurídica, visto que,
muitas vezes, os argumentos jurídicos aparecem sob essas formas, sendo assim
necessário o seu rápido reconhecimento.
O primeiro silogismo derivado do silogismo categórico recebeu o nome de
epiquirema125 (palavra derivada do grego, significando prova). “Chama-se epiquirema
um silogismo em que uma das duas premissas, às vezes as duas, são provadas por um
prossilogismo126 incompletamente expresso” (Liard, 1979, p. 55). Em outras palavras,
uma das premissas – ou mesmo ambas – traz em sua construção proposicional a sua
prova ou comprovação de verdade, chegando mesmo a constituir outro silogismo dentro
do próprio silogismo127.
Essa forma derivada, ao ser aplicada à argumentação jurídica, é, de acordo com
Nascimento (1991, p. 129), “... uma forma das petições iniciais em que o autor busca
provar o fato e adequação dele na lei”. Ademais, tanto o advogado quanto o juiz adotam
essa forma derivada do silogismo categórico nas razões e sentenças, visto que tanto uma
quanto a outra não se dá sem alguma prova ou argumento. Como exemplo de
epiquirema aplicado à argumentação jurídica, Nascimento apresenta o seguinte:

A é credor de B, como prova a nota promissória vencida e não paga; ora, B deve
pagar a A em 24 horas, sob pena de penhora, como prescreve o art. 652 do Código
de Processo Civil128; logo, A pede o pagamento no prazo da lei, ou penhora de bens
(idem, p. 129).

125
Conforme Alejandro (1970, p. 281), o epiquirema “Es un silogismo abundante y agresivo; no falla en
la forma lógica, pero es oratorio”, isto é, “É um silogismo abundante e agressivo; e apesar de não falhar
com relação à forma lógica, é oratório”.
126
O prossilogismo será tratado junto com a explanação sobre o polissilogismo.
127
Maritain (2001, p. 278) exemplifica tal forma derivada da seguinte forma: “Todo mártir é santo,
porque todo mártir possui a caridade heróica; ora, Pedro é mártir; logo, Pedro é santo”. Tomando a
premissa maior, ela pode ser reduzida a outro silogismo categórico: “Todo homem que possui a caridade
heróica é santo; ora, todo mártir possui a caridade heróica; logo todo mártir é santo”.
128
“... §1.° Não efetuado o pagamento, munido da segunda via do mandado, o oficial de justiça procederá
de imediato à penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se o respectivo auto e de tais atos intimando, na
mesma oportunidade, o executado...” (2009, p. 438).
56

Depois do epiquirema, há outra forma derivada chamada entimema129 ou


“silogismo truncado” (Keller; Bastos, 2004, p. 98) ou “silogismo abreviado” (Alves,
2000, p. 281). No entimema, uma das premissas fica subentendida (podendo até mesmo
a conclusão o ser), por causa da evidência da mesma130. Quando expresso pela fala ou
escrito, o entimema parece carecer de algo – isto é, de sua premissa oculta. Já na mente
ele se torna um silogismo completo, pois a mente não tem a capacidade de admitir um
raciocínio incompleto (Alejandro, 1970, p. 281).
Quanto a sua utilização, o entimema é mais usado que o próprio silogismo
categórico completo. Copi (1978, p. 208) explica o porquê disso:

A razão disso é fácil de se entender. Na maioria das polêmicas, há uma grande


quantidade de proposições que se pressupõe ser de conhecimento comum. A maioria
dos oradores e escritores evita muitas complicações por não ter que repetir
proposições bem conhecidas e, talvez, trivialmente verdadeiras, que os seus ouvintes
ou leitores podem perfeitamente suprir por sua iniciativa própria.

Por isso, tanto o cientista quanto pessoas simples fazem uso dessa forma
derivada do silogismo categórico. Quanto ao Direito, o mesmo acontece, por causa de
facilidade do entimema no ato do discurso, sem que haja necessidade de se recorrer a
um silogismo completo. Dessa forma, quando se diz que “Paulo é advogado; logo
conhece as leis” (Nascimento, 1991, p. 128), quer-se subentender que todo advogado
tem conhecimento das leis.
Ademais, é importante que seja ressaltado que, para a verificação da validade
de um entimema, basta ser suprida a premissa ausente e testar o silogismo segundo os
critérios (as regras) de validade lógica do silogismo completo131.
Já a terceira forma derivada é o polissilogismo (vários silogismos), que se dá
quando há uma cadeia de silogismos interligados, em que a conclusão de um silogismo
passa a ser a premissa menor do outro. Dependendo da forma como se apresenta, cada
silogismo dentro do polissilogismo ganha uma designação diferente: “O silogismo
precedente é o prossilogismo, e o seguinte é o epissilogismo”132 (Alejandro, 1970, p.

129
Segundo Teles (1970, p. 143), a palavra entimema origina-se na expressão grega    (en
timo ménei), isto é, “que fica na alma” [grifo do autor], visto que uma das premissas fica como que oculta
na alma de quem usa do entimema.
130
“Esse tipo de silogismo é extremamente útil na teoria da argumentação, porque pressupõe sempre uma
situação dialogal, onde ao receptor se dá grande responsabilidade de interpretação de nossos próprios
argumentos” (Alves, 2000, p. 282).
131
Às vezes, o entimema pode permitir o erro, pois “... su misma rapidez formal no deja, a veces, lugar a
la reflexión lógica…” ou seja, “... sua mesma rapidez formal não deixa, às vezes, lugar para a reflexão
lógica...” (Alejandro, 1970, p. 281)
132
“El silogismo que precede es el prosilogismo, y el que sigue episilogismo”.
57

282-283). Assim, quando se parte de um silogismo e se atinge outro acontece um


processo sintético ou epissilogístico. Do contrário, se se retornar logicamente de um
epissilogismo para uma prossilogismo, acontece um movimento prossilogístico ou
analítico.
No caso da argumentação jurídica, o polissilogismo é utilizado quando se quer
provar algo através de uma sequência de raciocínios.
Como exemplo dessa forma derivada, tem-se:

Quem age de acordo com sua vontade é livre. Ora, o racional age de acordo com sua
vontade. Logo, o racional é livre. Ora, quem é livre é responsável. Logo, o racional é
responsável. Ora, quem é responsável é capaz de direitos. Logo,... (Keller; Bastos,
2004, p. 99).

Segundo Alejandro (1970, p. 282), há uma mecânica que rege o polissilogismo


e que, se não obedecida, pode levar ao erro. Ele diz que, se um raciocínio em um
polissilogismo começa como pertencente à primeira figura ou à segunda, não é possível
passar ao próximo se este não for da primeira ou da terceira. Ademais, se o primeiro
silogismo da cadeia polissilogística começa na terceira figura, deve seguir nesta figura
até o fim, além de ser impossível um polissilogismo com silogismos pertencentes
somente à segunda figura. E podem aparecer nessa forma derivada as três figuras
silogísticas, no entanto, sendo sempre a primeira a segunda, a seguinte a primeira e a
última a terceira. Assim, evita-se a incongruência lógica do raciocínio.
Outro silogismo derivado do silogismo categórico é o sorites133, “... em que a
conclusão é inferida de mais de duas premissas” (Alves, 2000, p. 283), chegando a
configurar uma espécie de polissilogismo.
O sorites é utilizado quando não se consegue alcançar uma conclusão desejada
a partir de um conjunto de premissas com somente um silogismo categórico. No
entanto, difere do polissilogismo através da transformação do predicado de uma
premissa em sujeito da outra (e assim subsequentemente entre todas as premissas).
Além disso, a conclusão do sorites deve unir o sujeito que aparece na primeira premissa
com o predicado daquela que se apresenta por último na estrutura do raciocínio
(Fontana, 1969, p. 421). Por isso, o sorites é considerado como capcioso, dado o espaço
fornecido para o erro134 (Maritain, 2001, p. 279). Não obstante isso, como exemplo há o

133
Segundo Liard (1979, p. 55), a palavra sorites vem do grego  isto é, acumulação, devido à
acumulação de raciocínios em sua estrutura.
134
O romano Cícero (apud Alejandro, 1970, p. 282) corrobora tal consideração ao dizer: “... vitiosi sunt
soritae”, isto é, “viciosos são os sorites” [trad. minha].
58

seguinte sorites: “Pedro é homem prudente. O homem prudente é estimado. Quem é


estimado é feliz. Logo, Pedro é feliz” (Nascimento, 1991, p. 130).
Cada uma dessa formas de derivação do silogismo categórico permite a quem
faz uso da argumentação jurídica a apreciação da verdade ou a verificação da falsidade
de determinado fato ao qual se aplica determinada lei. No entanto, essas formas
derivadas do silogismo categórico trazem em si a possibilidade para o erro, as falácias.
Além do uso das regras para a confecção de um silogismo categórico, há na Lógica os
princípios que regem o mesmo, os quais garantem a validade de uma consequente
inferida de premissas válidas (e verdadeiras).

3.3.2 Os Princípios do Silogismo Categórico Aplicados à Argumentação Jurídica

Os princípios do silogismo “... decorrem da natureza do silogismo” (Jolivet,


1965, p. 48). Há quatro princípios: o princípio de identidade, o da contradição, o da
exclusão do meio e o da tríplice identidade. Todos esses princípios auxiliam quando se
quer demonstrar uma conclusão eficaz através de um silogismo categórico. Além disso,
segundo Coelho (2004, p. 14), “Para que uma inferência (relação premissa-conclusão
entre duas idéias) tenha o caráter lógico...” esses princípios devem ser obedecidos. Do
contrário, pode incorrer em raciocínio “... paradoxal ou mesmo ilógico ou falacioso...”
(idem, p. 14).
De acordo com Keller e Bastos (2004, p. 47), o princípio de identidade diz que
aquilo que é é, isto é, A é A. Por exemplo, homem é homem. Assim, por meio desse
princípio, é possível saber que um homem é um homem, e não outra coisa. Esse
princípio permite fazer uso de palavras sinonímicas para se referir a um mesmo
conceito.

A linguagem comum e por exceção algumas vezes a linguagem técnica contêm


termos equivalentes. É claro que a linguagem técnica do Direito (...) não deve ter
sinônimos, porém a literatura jurídica assinala: procuração – instrumento de
mandato; petição inicial conta com estes equivalentes; [sic] libelo cível inaugural,
peça vestibular, etc. Essas expressões equivalentes permitem verificar a identidade
A é A; todavia, a melhor orientação em linguagem forense é empregar sempre os
termos da lei. Como compreenderíamos o Direito se não se mantivesse o mesmo
pensamento com expressões diferentes? Imagine que o advogado com determinadas
palavras se referisse ao crime a que o promotor se reportou com palavras diferentes
das do réu ao mesmo crime e o juiz condenou, ainda com outras palavras. Não se
saberia o resultado (Nascimento, 1991, p. 20).
59

Portanto, fica clara a importância desse princípio do silogismo categórico com


relação à argumentação jurídica135. Além disso, tudo aquilo que é escopo do
conhecimento jurídico tem de ser necessariamente “... idêntico a si mesmo”, pois “O
que não está proibido é permitido. Se se tivesse o direito de fazer o que está proibido
(juridicamente), a mesma ação seria ao mesmo tempo permitida e proibida, o que seria
contradição; por outro lado, o que se não proíbe é permitido” 136 (idem, p. 25-26).
O segundo princípio (o da contradição) é um dos mais valiosos quando da
argumentação em geral. Por meio dele, o argumentador sabe que uma coisa não pode
ser e não-ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, o que resultaria em uma
contradição137. Ou seja, A é A ou A não é A, não podendo ocorrer que A é e não é A.
Assim, “Duas normas legais contraditórias não podem ser ambas válidas. A
circunstância de existirem num ordenamento jurídico prescrições contraditórias não
destrói o princípio, pois que no plano da Lógica se cuida do possível e do impossível”138
(ibidem, p. 26).
O terceiro princípio que auxilia na confecção de um raciocínio silogístico é o
da exclusão do meio (ou do terceiro excluído), que diz que uma coisa deve ser ou não
ser. Quando há duas idéias que se contradizem, uma delas deve ser verdadeira e a outra,
falsa. Ou seja, não há um meio termo (Keller; Bastos, 2004, p. 47).
Esse princípio ainda se subdivide em dois tipos: o dictum de omni e o dictum
de nullo139. Alejandro (1970, p. 250) apresenta que o dictum de omni quer significar:
“... o que se predica universal e distributivamente de um S [sujeito], há de ser predicado
da mesma forma de todo singular incluído na extensão desse S”140. Em um silogismo
categórico esse princípio é utilizado quando se diz que todo homem é racional; Pedro,
Antônio, Joaquim são homens; logo, Pedro é racional, Antônio é racional, Joaquim é
racional.

135
Conforme aponta Nascimento (1991, p. 25), “O Código Tributário Nacional vale-se do princípio de
identidade no seu art. 4°, estabelecendo ‘que a natureza específica do tributo é determinada pelo fator
gerador e não pela denominação’. É o princípio A é A. Tributo é tributo qualquer que seja a denominação
que se lhe aponha”.
136
Conforme Nascimento (idem, p. 25), “É importante o princípio de identidade em Direito para
determinar cousa julgada. Muitas vezes propõe-se a mesma ação com nome diferente, devendo o juiz
verificar antes de tudo se a segunda é idêntica à primeira, mesmo com nominação diferente. Se idênticas,
a saber, A é A, a primeira passou em julgado, a segunda não pode prosseguir...”.
137
Assim, reportar-se ao pensamento parmenidiano que diz que o ser é e não pode não-ser e o não-ser não
é e não pode ser.
138
Na Lógica, de fato, o princípio de contradição se aplica de forma exclusiva a juízos, enquanto que no
Direito é aplicado às normas (idem, p. 26).
139
“Dito do todo” e “dito de nenhum”, respectivamente (trad. de Nascimento, 1991, p. 22).
60

Já o dictum de nullo diz que aquilo que é negado do todo, é negado também em
suas partes. Se se diz que nenhum homem é quadrúpede, logo pode-se afirmar com
certeza que Pedro, Antônio e Joaquim não são quadrúpedes, pois todos são homens. Ao
ser aplicado ao Direito, esse princípio age sobre as normas, sendo que, “Quando duas
normas de Direito se contradizem não podem ambas carecer de validez, uma tem de ser
válida e a outra sem validade” (Nascimento, 1991, p. 26).
O quarto e último princípio é o da tríplice identidade. Duas coisas que são
idênticas a uma terceira são necessariamente iguais entre si, porém na medida e nos
aspectos em que há identidade com essa terceira (Keller; Bastos, 2004, p. 47).
Negativamente, esse princípio é chamado de discrepância: duas coisas não idênticas a
uma terceira não podem ser idênticas entre si.
Nascimento (1991, p. 25) apresenta esse princípio aplicado ao uso do recurso
extraordinário:

No caso de recurso extraordinário urge que o advogado demonstre que a fatos iguais
aplicou-se diferentemente uma mesma lei federal, para tanto invocando um acórdão
do Tribunal Regional ou do Supremo Tribunal Federal. O raciocínio consiste na
aplicação do princípio lógico.
O fato A é igual sob certo aspecto ao fato B. Se se aplicou a A a lei C, pela mesma
razão deve-se aplicar a B.

De modo geral, esses são os princípios que regem um raciocínio silogístico.


Eles são importantes, pois auxiliam na identificação de raciocínios errôneos que
pretendem se passar por corretos, as chamadas falácias, largamente utilizadas por
argumentadores.

3.3.3 Alguns Discursos Falaciosos Utilizados na Argumentação Jurídica e


Possibilidade de Refutação a Partir do Uso do Silogismo Categórico

Como foi apresentado até este ponto, o silogismo categórico fornece


instrumental importante para a verificação de erros em raciocínios, desde raciocínios
comuns até os mais elaborados (como no caso da argumentação jurídica). Todas as
regras que regem a construção do silogismo categórico nos auxiliam na verificação de
erros.

“... lo que se predica universal e distributivamente de un S, hay que predicarlo de la misma manera de
140

todo singular incluido en La extensión de ese S”.


61

Esses erros são chamados, na linguagem lógica, sofismas ou falácias. As


falácias são tentativas de convencimento incorretos e ilegítimos, que enganam 141 o
raciocínio (Keller; Bastos, 2004, p. 24), demonstrando por meio de premissas uma
conclusão válida e verdadeira, porém, sempre partindo de argumentos que são falsos.
Com relação aos tipos de falácias, há uma diversidade de classificação. Para
Keller e Bastos (2004, p. 24) há dois tipos principais: os de plano linguístico e os de
plano psicológico. Alves (2000, p. 292), Nahra e Weber (1997, p. 133-134) e Liard
(1979, p. 181-190), por sua vez, dividem as falácias em formais e informais (materiais).
Dentro dessas divisões, existem diversos tipos de falácias. Para este estudo,
porém, serão analisadas as seguintes: equívoco, conclusão irrelevante, acidente, apelo à
piedade, ignorância de questão e pergunta complexa142. Assim sendo, cada uma dessas
falácias será analisada, a título de exemplificação de como elas ocorrem.
A primeira falácia – a equivocação – consiste em utilizar uma mesma palavra
de sentidos diferentes para fatos ou coisas diferentes. Desse modo, em um silogismo
categórico completo, através dessa falácia, podemos ter mais de três termos. Um
exemplo clássico é aquele que diz: “O cão ladra. Ora, o cão é uma constelação. Logo,
uma constelação ladra” (Jolivet, 1965, p. 66). Em uma argumentação jurídica, por
exemplo, pode acontecer que alguém tente convencer a outrem o seguinte: “Um
prisioneiro não pode agir contra a lei, porque, pelo fato de já ser prisioneiro, ele não tem
liberdade; e quem é privado de liberdade é justamente aquele que não pode agir”
(Keller; Bastos, 2004, p. 31). Neste exemplo, os termos “liberdade” e “ação” são
tomados ora em sua acepção física ora em sua acepção jurídica, o que compromete o
raciocínio, pois há mais de três termos, infringindo a primeira regra do silogismo
categórico.
A conclusão irrelevante, outra falácia, conduz o raciocínio para uma conclusão
que não pode ser garantida pelas premissas utilizadas. E isso pode ocorrer de maneira
propositada ou não. Por meio dessa falácia, conclui-se uma coisa de outra, sem que, no

141
O termo falácia vem do verbo latino fallere, que por sua vez vem do grego sfalo, significando
enganar, trapacear.
142
As demais falácias, as quais não serão analisadas nessa pesquisa, são: argumentum ad hominem,
argumentum ad verecundiam, argumentum ad baculum, argumentum ad populum, dicto simpliciter,
generalização apressada, falácia de cooptação, falsa dicotomia, falácia de ênfase, falácia de eufemismo,
falsa analogia, falsa causa, petitio principii, falácia de composição e de divisão (Nahra; Weber, 1997, p.
134-168). Além dessas, há ainda: círculo vicioso, causa comum, ad ignorantiam (Keller; Bastos, 2004, p.
25-26); confusão de sentido oposto, metáfora, falsa conversão e oposição ilegítima (Jolivet, 1965, p. 66-
67); diversidade, tautologia, por observação inexata, ignorância da causa (Alves, 2000, p. 293-295);
mudança de predicado, enumeração imperfeita (Nascimento, 1991, p. 170-171).
62

entanto, haja nexo entre elas. É o caso, por exemplo, de acontecer em um julgamento a
utilização de argumentos que tentem “... incriminar alguém, tratando-se demoradamente
do horror do delito sem considerar os atenuantes e as exceções que possa haver em
determinados casos” (idem, p. 25).
Já a falácia de acidente ocorre quando se utiliza regras universais sem
considerar suas possíveis exceções. Também consiste em fazer com que algo que seja
um simples acidente se torne um atributo extremamente essencial ou habitual, podendo
ocorrer o contrário também (que um atributo essencial se torne acidental). Ao
argumentar, um promotor pode tentar demonstrar que o comportamento do réu se
enquadra em padrões que a maioria dos réus possui em caso semelhante,
desconsiderando que “Há casos, em circunstâncias especiais, em que tais regras não se
aplicam ou até mesmo exigem uma regra contrária” (idem, p. 27).
O apelo à piedade, ou argumentum ad misericordiam, consiste na utilização de
aspectos emocionais no ato da argumentação, forçando alguém a aceitar certo ponto.
Ela, geralmente, é utilizada em julgamentos, tornando-se instrumento forte nas mãos de
quem argumenta. Nahra e Weber (1997, p. 158) citam um exemplo retirado do livro O
estrangeiro de Albert Camus:

Mal ouvi o advogado gritar para concluir que os jurados não quereriam certamente
condenar à morte um trabalhador honesto, perdido por um instante de desvario, e
pedir as circunstâncias atenuantes para um crime cujos remorsos eternos, o mais
seguro dos castigos, eu trazia já comigo.

Segundo os mesmos autores, esse argumento pode ser escrito em forma


silogística, não conseguindo, entretanto, provar a validade ou não das premissas e de sua
conclusão. O que eles deixam claro é que as premissas do argumento supracitado “...
são irrelevantes para provar a conclusão” (idem, p. 159), ou seja, que o réu não deve ser
condenado à morte, porque é um trabalhador honesto e já traz consigo o remorso eterno.
A ignorância de questão, mais uma falácia, é utilizada com frequência “... nas
discussões humanas” (Liard, 1979, p. 189). Nascimento (1991, p. 169-170) diz que essa
falácia é amplamente utilizada no tribunal do júri, pois, com ela, um advogado de defesa
utiliza premissas válidas para se afastar da gravidade da acusação, elencando aspectos
positivos do réu, acontecendo assim um deslocamento do ônus da prova. Ou pode
substituir os aspectos graves da acusação repentinamente, fazendo uso de outra questão
sobre o réu que perturbe os ouvintes:
Acusam um homem de fabricar moeda falsa; apreenderam em seu poder os objetos
mais convincentes de sua culpabilidade. Como procederá o advogado? Não poderá
63

negar o crime, mas dirá: este homem foi bom filho; foi bom soldado (...), pai
dedicado; devido a essas qualidades, desaparecerá o crime e comovido o júri o
absolverá da referida culpa... (Liard, 1979, p. 190).

Prosseguindo no estudo das falácias, surge a falácia da pergunta complexa, que


ocorre quando se combinam duas ou mais perguntas em uma só, resultando em
confusão da parte do interlocutor, pois à pergunta inicial (que se compõe de duas outras)
pode-se responder afirmativa ou negativamente. Essa falácia é muito “... utilizada por
repórteres, mas também é uma estratégia comum de promotores e advogados de
defesa...” (Keller; Bastos, 2004, p. 30). É como exemplificam Nahra e Weber (1997, p.
146):

Promotor (dirigindo-se ao réu): – De que forma o Sr. ocultou as provas?


Réu: – Eu não as ocultei.
Promotor: – Então o Sr. admite que há provas, conforme eu havia suspeitado desde o
princípio.

Ou seja, o réu caiu em um engodo.


Para que essa falácia possa ser colocada em uma forma silogístico-categórica, a
pergunta complexa deve ser transformada em uma das premissas do argumento. Assim,
transformando o excerto acima, chega-se à seguinte forma: o Sr. ocultou as provas; o
Sr. respondeu que não ocultou as provas; logo, o Sr. admite que há provas, conforme
eu suspeitara desde o início.
Depois de serem vistas as principais falácias, é importante ressaltar que o meio
eficaz de se evitar os raciocínios dúbios e errôneos é o conhecimento e a aplicação das
regras relativas ao raciocínio válido. Conforme Copi (1978, p. 184), “A vantagem de
dispor de um conjunto de regras claramente formulado e de fácil aplicação é manifesta.
Pode ser avaliada a correção de qualquer silogismo de forma típica, observando se as
regras foram ou não violadas”.
Além disso, “... Uma premissa ou duas premissas de uma vez podem ser falsas
ou ambíguas. Se são falsas, é preciso negá-las; se são ambíguas, é preciso distingui-
las...” (Jolivet, 1965, p. 68).
64

3.3.4 Considerações Finais sobre a Relação Entre o Silogismo Categórico e a


Argumentação Jurídica

Ao final deste capítulo cabem algumas considerações a respeito da relação


entre o silogismo categórico e a argumentação jurídica.
Depois da análise das regras, das figuras e dos modos do silogismo, além da
análise dos tipos derivados do mesmo, busca-se afirmar que ele [o silogismo categórico]
é um instrumento necessário a quem faz uso do reto raciocinar, especialmente no campo
do Direito.
O silogismo categórico e suas regras podem ser aplicados à argumentação
jurídica, visto que, quando se coloca um raciocínio jurídico-deliberativo na forma
silogística, “... é através da conclusão que ficamos sabendo do conteúdo das premissas e
por conseqüência não se pode negar a utilidade do silogismo” (Fontana, 1969, p. 421).
Decorrente disso, é muito importante saber que algumas formas de argumentos
jurídicos são válidas mediante a dedução silogística, que leva a construir uma cadeia de
argumentos válidos, a fim de se alcançar uma conclusão verdadeira (Walton, 2006, p.
154). Entretanto, há argumentos que envolvem muitas fases, não havendo uma livre e
rápida passagem das premissas para a conclusão (Salmon, 1973, p. 72). Por isso, é
necessário o conhecimento das regras e outras propriedades do silogismo categórico,
como foi apresentado no primeiro capítulo e, mais propriamente, neste capítulo.
O silogismo categórico, portanto, é um meio de legitimar a decisão judicial143
ou qualquer outra decisão presente no âmbito jurídico. Desse modo, um advogado, um
promotor ou um juiz pode fazer uso do silogismo categórico e aplicá-lo aos seus
argumentos, pois a argumentação dedutivo-silogística só pode levar a uma conclusão
necessária, que vem de uma sequência de raciocínios válidos.

143
O termo judicial refere-se àquilo que é próprio do juiz ou de seu juízo. O termo jurídico, por sua vez, é
relativo ao Direito (portanto, é o que tem maior extensão, é mais amplo) (Houaiss, 2004, p. 438-439).
CONCLUSÃO

A atualidade dos pensamentos de Aristóteles parece imitar o mito da fênix,


renascida das pretensas cinzas. Muitas pesquisas têm focado suas elucubrações,
redescobrindo o seu valor indispensável para diversas áreas do conhecimento. Com
certeza, dentre essas áreas temos a Metafísica, a Ética e, mais propriamente, a Lógica.
Essa pesquisa se enveredou por esse mesmo caminho. Ao longo dos primeiros
capítulos, procurou-se demonstrar que Aristóteles foi o grande sistematizador da
Lógica. Sem ele, a Lógica não teria existido como tal.
É válido afirmar que o silogismo categórico, mesmo sofrendo oposições
modernas e contemporâneas, tem seu valor ainda hoje. Certamente, a oposição de
alguns pensadores se deveu a um exagero escolástico. Por isso, houve (e há) a
necessidade de expurgar o silogismo categórico das críticas destrutivas que lhe foram
imputadas. Foi a partir disso que houve a possibilidade de se demonstrar que as leis do
silogismo categórico podem ser utilizadas nos dias atuais.
É importante que seja ressaltado que a Lógica de Aristóteles não se restringe
somente ao silogismo categórico. O campo é vastíssimo e abre possibilidades ímpares
para futuras pesquisas. Muitos aspectos lógicos (como o silogismo hipotético, o
silogismo condicional, o silogismo modal, a indução, as proposições, a recepção das
reflexões lógicas pelos filósofos pós-aristotélicos, especialmente pelo Círculo de Viena,
entre outros) podem ser alvos de pesquisas.
Nessa pesquisa foi analisado um aspecto da Lógica aristotélica (o silogismo
categórico) aplicado a uma área do conhecimento humano (a argumentação jurídica).
Certamente, não foi olvidada a existência de aspectos imprescindíveis para a
argumentação jurídica, como o caso das leis retóricas e as leis lógico-deônticas, além
das teorias de outros pensadores sobre a argumentação jurídica. Mas o intercâmbio
Lógica-Direito é válido, ainda mais se se levar em conta que a Lógica, como a
apresentaram grandes pensadores, é um organon (isto é, instrumento) que possibilita
dirigir retamente a Razão.
66

Desse modo, pode-se afirmar que todo aspecto do conhecimento humano que
necessita do reto raciocinar tem no silogismo categórico garantias de alcançar a validade
de seus argumentos e conclusões. Como foi demonstrado, a argumentação jurídica é um
desses aspectos. Logo, a argumentação jurídica tem no silogismo categórico garantias
de alcançar a validade de seus argumentos e conclusões.
Para finalizar, é importante ressaltar, também, algo que Nahra e Weber (1997,
p. 126) afirmam: a Lógica não é capaz de “... se pronunciar sobre a verdade das
premissas”. Decorrente disso, surge espaço para a ação da Ética. No entanto, enquanto a
Ética diz se algo é bom ou mau, somente à Lógica (e, consequentemente, ao silogismo
categórico) cabe o pronunciamento final sobre a validade ou não dos argumentos.
REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, N. História da Filosofia. Trad. Armando da Silva Carvalho. 2. ed.


Lisboa: Presença, 1978. v. 9.

______. História da Filosofia. Trad. António Borges Coelho et al. 2. ed. Lisboa:
Presença, [198–]. v. 1.

______. História da filosofia. Trad. António Borges Coelho. 5. ed. Lisboa: Editorial
Presença, 1999.

ABELARDO, P. Lógica para principiantes. Trad. Carlos Arthur Ribeiro do


Nascimento. Petrópolis: Vozes, 1994.

ALEJANDRO, J. M. de. La lógica y el hombre. Madrid: Biblioteca de Autores


Cristianos, 1970.

ALEXANDRE DE AFRODÍSIA. On Aristotle’s Prior Analytics 1.1-7. Trad. Jonathan


Barnes et al. Ithaca: Cornell University Press, 1991.

ALEXY, R. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como


teoria da justificação jurídica. Trad. Zilda Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005.

ALLAN, D. J. A Filosofia de Aristóteles. Trad. Rui Gonçalo Amado. Lisboa: Editorial


Presença, 1970.

ALVES, A. C. Lógica: pensamento formal e argumentação. 3. ed. São Paulo: Quartier


Latin, 2003.

ARISTÓTELES. Órganon: Categorias, Da Interpretação, Analíticos Anteriores,


Analíticos Posteriores, Tópicos, Refutações Sofísticas. Trad. Edson Bini. Bauru:
EDIPRO, 2005.

BARNES, J. Aristóteles. Trad. Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. São
Paulo: Loyola, 2001.

BOBZEIN, S. Lógica. In: INWOOD, B. (Org.). Os Estóicos. Trad. Paulo Fernando


Tadeu Ferreira e Raul Fiker. São Paulo: Odysseus, 2006.

BOEHNER, P.; GILSON, E. História da Filosofia Cristã. Trad. Raimundo Vier. 9. ed.
São Paulo: Vozes, 2004.
68

BOLL, M.; REINHART, J. A História da Lógica. Trad. A. J. Pinto Ribeiro. Rio de


Janeiro: Edições 70, 1946.

CHAUÍ, M. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. 2. ed.


rev. e ampl. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. v. 1.

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (Lei n. 5.869, de 11-1-1973). In: Vade Mecum. 7.


ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 369-509.

COELHO, F. U. Roteiro de lógica jurídica. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 2000.

COPI, I. M. Introdução à lógica. Trad. Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo: Mestre Jou,
1978.

CYRINO, H. F. F.; ARANTES, F. A. Lógica matemática e lógica digital. Campinas:


Papirus, 1984.

DESCARTES, René. Discurso do Método. Trad. J. Guinsburg e B. Prado Júnior. 2. ed.


São Paulo: Abril Cultural, 1979. [Col. Os pensadores].

FAITANIN, P. São Tomás de Aquino. In: PECORARO, R. Os filósofos: clássicos da


Filosofia, de Sócrates a Rousseau. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. p.
139-164. v. 1.

FARIA, M. do C. B. Aristóteles: a plenitude como horizonte do ser. São Paulo:


Moderna, 1994.

FONTANA, D. F. História da Filosofia, Psicologia e Lógica. 3. ed. São Paulo:


Saraiva, 1969.

FRANCA, L. Noções de História da Filosofia. 20. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1969.

FRANCO JÚNIOR, H. A Idade Média: nascimento do Ocidente. 5. reimpressão. São


Paulo: Brasiliense, 2006.

JAIME, J. História da Filosofia no Brasil. Petrópolis: Vozes; São Paulo: Faculdades


Salesianas, 2000. v. 3.

HELFER, I. Hegel. In: PECORARO, R. Os filósofos: clássicos da Filosofia, de Kant a


Popper. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. p. 57-82. v. 2.

HIRSCHBERGER, J. História da filosofia na Antigüidade. Trad. Alexandre Correia.


2. ed. São Paulo: Herder, 1969.
69

KELLER, V.; BASTOS, C. L. Aprendendo Lógica. 13. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.

KENNY, A. Uma nova história da filosofia ocidental: Filosofia antiga. Trad. Carlos
Alberto Bárbaro. São Paulo: Loyola, 2008. v. 1.

LEITE JÚNIOR, P. Ockham. In: PECORARO, R. Os filósofos: clássicos da Filosofia,


de Sócrates a Rousseau. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. p. 165-189.
v. 1.

LIARD, L. Lógica. Trad. Godofredo Rangel. 9. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1979.

LIBERA, A. de. A Filosofia Medieval. Trad. Nicolás Nyimi Campanário e Yvone


Maria de Campos Teixeira da Silva. São Paulo: Loyola, 1998.

MACCORMICK, N. Argumentação jurídica e teoria do direito. Trad. Waldéa


Barcellos. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

MARÍAS, J. História da Filosofia. Trad. Alexandre Pinheiro Torres. 8. ed. Porto:


Sousa & Almeida, [198–].

MARITAIN, J. Elementos de filosofia II: a ordem dos conceitos, Lógica menor. Trad.
Ilza das Neves. 13. ed. Rio de Janeiro: Agir, 2001.

______. Introdução geral à Filosofia. 9. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1970.

MONDIN, B. Curso de filosofia. 12. ed. São Paulo: Paulus, 2003. v. 1.

______. Curso de filosofia. 10. ed. São Paulo: Paulus, 2006. v. 2.

NAHRA, C.; WEBER, I. H. Através da Lógica. Petrópolis: Vozes, 1997.

NASCIMENTO, C. A. do. Santo Tomás de Aquino: o Boi Mudo da Sicília. 2. ed. São
Paulo: EDUC, 2003.

NASCIMENTO, E. D. Lógica aplicada à advocacia: técnica de persuasão. 4. ed. rev. e


ampl. São Paulo: Saraiva, 1991.

NOBRE, M.; REGO, J. M. Conversas com filósofos brasileiros. São Paulo: Editora
34, 2000.
70

OLIVEIRA, N. Husserl. In: PECORARO, R. Os filósofos: clássicos da Filosofia, de


Sócrates a Rousseau. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. p. 231-253. v.
2.

PADOVANI, H.; CASTAGNOLA, L. História da Filosofia. 5. ed. São Paulo:


Melhoramentos, 1962.

PASSARELI, L. G. Prática Argumentativa no Direito. In: CORRÊA, L. (Org.). Direito


e argumentação. São Paulo: Manole, 2008. p. 116-138.

PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da argumentação: a nova


retórica. Trad. Maria Ermantina Galvão G. Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia: Antigüidade e Idade Média. São


Paulo: Paulinas, 1990. v. 1.

______. História da Filosofia: Filosofia Pagã e Antiga. Trad. Ivo Storniolo. 2. ed. São
Paulo: Paulus, 2004. v. 1.

______. História da Filosofia: Patrística e Escolástica. Trad. Ivo Storniolo. São Paulo:
Paulus, 2003. v. 2

______. História da Filosofia: do Romantismo ao Empiriocriticismo. Trad. Ivo


Storniolo. São Paulo: Paulus, 2005. v. 5.

REALE, G. História da filosofia antiga. Trad. Henrique Cláudio de Lima Vaz e


Marcelo Perine. São Paulo: Loyola, 1994 [a]. v. 1.

______. História da filosofia antiga. Trad. Henrique Cláudio de Lima Vaz e Marcelo
Perine. São Paulo: Loyola, 1994 [b]. v. 2.

ROCHA, E. M. Descartes. In: PECORARO, R. Os filósofos: clássicos da Filosofia, de


Sócrates a Rousseau. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. p. 213-237. v.
1.

RUSSELL, B. História da Filosofia Ocidental. São Paulo: Companhia Editora


Nacional, 1957. v. 1.

SALMON, W. C. Lógica. Trad. Leonidas Hegenberg e Octanny Silveira Mota. 3. ed.


Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1973.

SANTOS, M. F. dos. Lógica e Dialética: Lógica, dialética, decadialética. São Paulo:


Paulus, 2007.
71

SHIMOTE, C. A. A Retórica de Aristóteles. In: CORRÊA, L. (Org.). Direito e


argumentação. São Paulo: Manole, 2008. p. 1-51

SMITH, R. Logic. In: BARNES, J. The Cambridge Companion to Aristotle.


Cambridge: Cambridge University Press, 1996.

TARNAS, R. A epopéia do pensamento ocidental: para compreender as idéias que


moldaram nossa visão de mundo. Trad. Beatriz Sidou. 6. ed. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2003.

TELES, A. X. Introdução ao estudo de Filosofia. 5. ed. São Paulo: Ática, 1970.

THONNARD, F.-J. Compêndio de História da Filosofia. São Paulo: Herder, 1968.

TOMÁS DE AQUINO, Santo. Comentário ao “Tratado da Trindade” de Boécio.


Trad. Carlos Arthur do Nascimento. São Paulo: UNESP, 1999. (Questão V, artigo 1).

VERGER, J. Homens e saber na Idade Média. Trad. Carlota Boto. Bauru: EDUSC,
1999.

VOESE, I. Argumentação jurídica. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006.

WALTON, D. N. Lógica Informal. Trad. Ana Lúcia R. Franco et al. São Paulo:
Martins Fontes, 2006.

ZINGANO, M. Platão e Aristóteles: o fascínio da Filosofia. São Paulo: Odysseus,


2002.

DICIONÁRIOS

BLACKBURN, S. Dicionário Oxford de Filosofia. Trad. Desidério Murcho et al. Rio


de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

HOUAISS, A.; VILLAR, M. de S. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. 2.


ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

HUISMAN, D. Dicionário de Obras Filosóficas. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São


Paulo: Martins Fontes, 2002.

MORA, J.-F. Dicionário de Filosofia. Trad. Maria Stela Gonçalves et al. São Paulo:
Loyola, 2001 [a]. Tomo II.
72

______. Dicionário de Filosofia. Trad. Maria Stela Gonçalves et al. São Paulo: Loyola,
2001 [b]. Tomo III.

FM, 2004, Tomo IV

ARTIGOS

BRAATZ, T. H. É preciso argumentar? Reflexões sobre a argumentação jurídica e a


teoria de Manuel Atienza. Revista Jurídica. FURB, v. 11, n. 21, p. 133-147, 2007.

PINTO, P. R. M. A contribuição das Segundas Analíticas de Aristóteles para uma


análise da argumentação. Síntese Nova Fase. Belo Horizonte, v. 21, n.65, p.159-181,
1994.

FONTES ELETRÔNICAS

<http://pt.wikipedia.org/wiki/Lógica>. Acesso em: 8 out. 2009.

<http://www.cle.unicamp.br/arquivoshistoricos/?destino=newtondacosta_biografia.html
>. Acesso em: 8 out. 2009.

TOMÁS DE AQUINO, Santo. Comentários a Aristóteles. Disponível em


http://www.4shared.com. Acesso em: 29 mar. 2009.

WYLLIE, G. Um panorama histórico da Lógica Medieval I. In: Aquinate, 2007, n. 5, p.


147-165. Disponível em <http://www.aquinate.net/artigos>. Acesso em: 19 mar. 2009.

Você também pode gostar