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Tombamento do Centro

Histórico de Manaus
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

TOMBAMENTO DO CENTRO HISTÓRICO DE MANAUS

Presidente da República | Luiz Inácio Lula da Silva


Ministro da Cultura | Juca Ferreira
Presidente do IPHAN | Luiz Fernando de Almeida
Diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização | Dalmo Vieira Filho
Diretora do Departamento de Patrimônio Imaterial | Márcia Genesia de Sant’Anna
Diretora do Departamento de Planejamento e Administração | Maria Emília Nascimento Santos
Diretora do Departamento de Articulação e Fomento | Márcia Rollemberg
Coordenadora-Geral de Pesquisa, Documentação e Referência| Lia Motta
Superintendente do IPHAN no Amazonas | Juliano Marcos Valente de Souza

Projeto “Tombamento do Centro Histórico de Manaus”| ficha técnica


Supervisão e Coordenação | Dalmo Vieira Filho
Departamento do Patrimônio Material e Fiscalização - DEPAM/IPHAN

Equipe Técnica
Celma de Souza Pinto (historiadora)
Fátima de Macedo Martins (arquiteta)
George Alex da Guia (arquiteto)
Maria Regina Weissheimer (arquiteta)

Superintendência Estadual do Amazonas


Superintendente | Juliano Marcos Valente de Souza
Chefe da Divisão Técnica | Ghislaine Raposo Bacelar
Chefe da Divisão Administrativa |Heloíza Helena Martins Araújo

Créditos
Pesquisa Histórica e Textos | Celma de Souza Pinto e Fátima de Macedo Martins
Projeto Gráfico e Diagramação | Maria Regina Weissheimer e Tiago Bellon
Montagem | Tiago Bellon
Fotografias | Fátima de Macedo Martins, acervo do Centro Cultural dos Povos da Amazônia
e Superintendência Estadual do IPHAN do Amazonas

Realização
DEPARTAMENTO DE PATRIMÔNIO MATERIAL E FISCALIZAÇÃO - DEPAM/IPHAN
SBN - Quadra 2 - Ed. Central Brasília - 3º andar - CEP 70040-904 - Brasília/DF
Fone/FAX: 61 - 2024 6204/6205
depam@iphan.gov.br
www.iphan.gov.br

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Tombamento do Centro
Histórico de Manaus

Dossiê
Sumário

Apresentação..................................................................................................................................

Introdução..........................................................................................................................................

A Região Norte...............................................................................................................................

Processo de Ocupação da Amazônia.....................................................................................................................

O Ciclo da Borracha na Amazônia........................................................................................................................

Migração e Crescimento Econômico........................................................................................................................

O Segundo Ciclo da Borracha na Amazônia...........................................................................................................

Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus.....................................................

Dados Gerais da Cidade de Manaus.....................................................................................................................

Aspectos Históricos.................................................................................................................................................

O Modelo Europeu de Desenvolvimento Urbano.............................................................................................................

Os Códigos de Posturas - Reguladores do Espaço Urbano.............................................................................................

A Construção da Periferia..........................................................................................................................................

Modos de Viver na Belle Époque Manauara........................................................................................

A Influência da Zona Franca no Desenvolvimento de Manaus ....................................................

Configuração Atual da Cidade...............................................................................................................................

O Ecletismo e o Desenvolvimento Urbano....................................................................................


A Formação Urbana de Manaus.....................................................................................

Sobre o Conceito de Ecletismo...........................................................................................................

As Capitais do Norte...............................................................................................................................

O Rio Negro............................................................................................................................................

Manaus Provincial e Manaus Belle Époque...........................................................................................

A Praça como Centro da Sociabilidade.............................................................................................

Tipologia Arquitetônica e Morfologia Urbana..................................................................................

Relação Edifício/Rua........................................................................................................................................

Sistema Estrutural.............................................................................................................................................

Ornamentação...................................................................................................................................................

Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus...........................

Proposta de Tombamento.............................................................................................

Descrição da Poligonal de Tombamento do Centro Histórico......................................................

Descrição da Poligonal de Entorno do Centro Histórico..............................................................

Conclusão.......................................................................................................................
Manaus Século 21...................................................................................................................................

Bibliografia.....................................................................................................................

Glossário de Termos Empregados.................................................................................

Anexos

Anexo I...........................................................................................................................

Bens Tombados no Município de Manaus no Âmbito Estadual

Anexo II...........................................................................................................................

Legislação
Apresentação
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

A ampliação do estoque patrimonial do Brasil tem


sido diretriz seguida pelo IPHAN desde meados de 2006, como parte
do entendimento de que é urgente expandir as áreas protegidas para
todo o país, refletindo através do tombamento, a complexidade da
formação e consolidação do país e da sociedade brasileira. Dentre
as linhas estratégicas priorizadas, destaca-se a ampliação de áreas
tombadas nos centros históricos das capitais do Norte e Nordeste
do Brasil.

Essa nova perspectiva complementa a ênfase até


agora empreendida dos tombamentos de cidades na região sudeste
e nordeste - com a predominância de centros urbanos que guardam
prioritariamente legados do período colonial.

Assim, ampliar o estoque patrimonial em regiões onde


os bens culturais ainda não foram destacados, é um desafio proposto
para momento - em que amadureceu a preservação do patrimônio
cultural como parte indissociável da recuperação do papel simbólico
e referencial que as cidades exercem na história e na cultura do Brasil.

Reconhecer e proteger o patrimônio cultural é um


dos maiores trunfos que as cidades têm para os seus projetos de
futuro – premissas de e seus desenvolvimentos verdadeiros. Proteger
as referencias que identificam a cidade, sua história e sua gente;
impedir os excessos da globalização, onde edifícios são substituídos
por outros de qualidade a cada dia mais questionável, largos e
praças sacrificados para a passagem de viadutos, pistas elevadas e
estacionamentos, e onde a população acostumou-se a achar normal
o aspecto degradado dos centros, cada vez mais abandonados e
violentos, encontram-se dentre os desafios das cidades brasileiras
da atualidade.

O fortalecimento da identidade local é uma tendência


mundial. A valorização do patrimônio cultural e o destaque para a
singularidade dos espaços e das características históricas, artísticas
e sociais que as tornam únicas, são pressupostos do urbanismo
contemporâneo.

8
Apresentação

É nesse contexto que apresentamos o estudo realizado


com vistas a subsidiar o processo de tombamento do centro histórico
de Manaus, parte do esforço de ampliar a significância do patrimônio
no contexto das coisas importantes para o desenvolvimento do país.

Manaus é um dos maiores testemunhos de uma fase


econômica ímpar - o período da borracha, em que a exploração do
látex proporcionou o surgimento de cidades como Manaus, Belém e
Rio Branco, dentre várias outras, que são testemunho da ocupação
e do desenvolvimento daquela região no contexto do incremento
da industrialização em escala mundial.

Para o Brasil, é um imperativo preservar a excepcional


paisagem urbana ainda existente em Manaus e que interliga os
dois trechos mais carregados de aspectos simbólicos e densos de
realizações artístico-construtivas: a orla do Rio Negro e a área
envoltória do Teatro Amazonas.

Dessa maneira, e aceita a proposição do tombamento


nacional, a preservação do núcleo, que configura o coração urbano
da cidade garante a preservação de seu patrimonio singular e integra,
ainda que tardiamente, a cidade de Manaus no seleto rol das cidades
históricas do Brasil.

9
Introdução
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O presente estudo refere-se ao processo de


desenvolvimento urbano da cidade de Manaus-AM, com vistas à
rerratificação da área tombada para efeito de ampliação.

Manaus possui quatro bens tombados no âmbito


federal, o Teatro Amazonas e o Porto de Manaus, de 1966, o
Reservatório do Mocó, de 1984, e o Mercado Adolpho Lisboa, de
1987. Embora sejam bens de destaque na história regional, foram
vistos isoladamente sem uma maior integração com a cidade,
constituída especialmente a partir da exploração da borracha, em fins
do século XIX. Manaus possui uma infinidade de bens passíveis de
preservação que não foram priorizados nos processos de preservação
do Iphan nas últimas décadas, a exemplo do processo n. 1.192-T-86,
que trata do tombamento do conjunto arquitetônico e paisagístico do
porto de Manaus. De iniciativa da empresa que administrava o porto
na época, foi aprovado por unanimidade pelo Conselho Consultivo
do Iphan, justificando-se que “A importância da conexão deste trecho com
a área de tombamento e entorno do Mercado Municipal fecha exatamente com o
que o Conselheiro Roberto Cavalcanti definiu, muito bem, como o frontispício
de Manaus.” Muito embora a área do porto exprima a preservação
histórica da função portuária de Manaus e da origem do núcleo
urbano, não contempla os inúmeros bens passíveis de tombamento
e ainda existentes.

Assim, o presente estudo destaca a importância de


um período econômico específico, – o “ciclo da borracha” 1 – cujas
conseqüências per meiam a identidade manauara. Esse período
econômico, cujo auge se comprime entre 1890 e 1910, permitiu
melhoramentos urbanos e arquitetônicos ou, pode-se dizer, a
construção de uma cidade moderna, marcada por inúmeros edifícios
com estilo ditado pelo gosto europeu e dentro de um traçado urbano
específico.

A arquitetura resultante do ciclo da borracha, em


Manaus, possui características comuns a outras capitais brasileiras
mas, torna-se peculiar por vários fatores, entre eles a sua localização
em meio à floresta amazônica que parece sobrepujar o homem e, cujo
distanciamento geográfico, nos dá a impressão de estar dissociada
do resto do país. Nessa perspectiva, o processo de construção da
cidade, os aspectos arquitetônicos e urbanísticos tornam-se ainda mais

1  O termo “ciclo”’ é usado no texto como forma de maior entendimento do processo de


auge e decadência dos produtos primários no Brasil, como a borracha, não se referindo ao
término da exploração desses produtos.

12
Introdução

relevantes, indicando Manaus como referência urbanística relacionada


a um período econômico destacado não só para a Região Norte e a
Amazônia, mas para todo o país.

São evidenciados no estudo os aspectos históricos


do desenvolvimento urbano de Manaus, como meio de promover
um maior entendimento da história local e permitir a valorização
do patrimônio material da cidade, no período indicado. No entanto,
elementos materiais e imateriais que fundamentam a cultura
amazônica, como as populações ribeirinhas e a cultura indígena,
não foram privilegiados diretamente para efeito de tombamento
neste processo de rerratificação. Porém, tais elementos podem estar
presentes no processo de gestão da área e das construções a serem
preservadas, especialmente na ocupação de espaços com aspectos
representativos dessas culturas, com a criação de museus, centros
culturais, etc. No caso da cultura indígena, especificamente, a
preservação da área em estudo também favorece a preservação dos
sítios arqueológicos, uma vez que Manaus foi construída sobre as
aldeias que ocupavam o território antes do processo de ocupação
portuguesa.

Quanto aos aspectos metodológicos, foi realizada


uma revisão bibliográfica. A pesquisa iconográfica favorece os álbuns
fotográficos do final do século XIX e início do XX, atualmente
disponíveis em meio eletrônico. A primeira parte do trabalho se
atém aos aspectos históricos e, a segunda, a uma análise do estilo
arquitetônico das construções – o ecletismo – e a proposta de
tombamento.

Há que se ressaltar, entretanto, que o período aqui


denominado “ciclo da borracha” tem uma abrangência econômica e
social que extrapola o município de Manaus bem como o Estado da
Amazônia. Está relacionado com toda uma região em especial, que
é a Região Norte, ao possibilitar a criação e o desenvolvimento de
inúmeras cidades naquela região do país e a delimitação definitiva
de nossas fronteiras com a conquista do Acre 2, possibilitando o
processo de ocupação final daquela parte do Brasil. Nesse sentido,
a rerratificação do centro histórico de Manaus, fundamental para a
valorização daquela capital, não é uma ação isolada. Está integrada à
preocupação corrente de preservação de outros locais relacionados
com a exploração da borracha, como por exemplo as cidades de
Belterra e Fordlândia, no Pará, a cidade de Rio Branco, no Acre ou
relacionados com a vida do seringueiro e à própria paisagem dos
seringais em determinados locais, como a Casa de Chico Mendes em
Xapuri-AC, tombada em 2008 pelo Iphan.

2  Possível com a assinatura do Tratado de Petrópolis, em 1903.

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A Região Norte

Processo de Ocupação da Amazônia



O Ciclo da Borracha na Amazônia
Migração e Crescimento Econômico

O Segundo Ciclo da Borracha na Amazônia


Mapa da região Norte
Fonte: IBGE - http://www.ibge.gov.br/7a12/mapas/brasil/regiao_norte.pdf
Acessado em agosto de 2010
A Região Norte

Composta pelos Estados do Acre, Amazonas, Amapá, Rondônia, Roraima,


Pará e Tocantins, a Região Norte se caracteriza por ser a mais extensa e a menos populosa
das cinco macrorregiões do país. Compreende uma área total de 3.851.560 km2 (45,25%
da superfície brasileira) onde se distribui uma população de 10.030.556 habitantes (6,49%
da população total do Estado). Sua densidade demográfica é de 2,59 hab./km2.
Praticamente toda a região, exceto as áreas da Bacia do Tocantins-
Araguaia no Estado de Tocantins e parte do Pará, está inserida na Bacia Amazônica, cujo
clima equatorial quente e úmido, juntamente com outros fatores (relevo, solos, localização
geográfica, entre outros), é responsável pela extensa cobertura da floresta amazônica.
Ao norte faz fronteira com o Suriname, Guiana Inglesa, Guiana Francesa
e Venezuela; a noroeste com a Colômbia; a oeste com o Peru e Bolívia; a nordeste com
o Oceano Atlântico; a leste com os Estados do Maranhão, Piauí e Bahia e ao sul com os
Estados de Goiás e Mato Grosso.
Os principais rios são os rios Amazonas, Negro, Solimões, Xingú,
Tocantins, Madeira, Juruá, Branco, Tapajós, Paru e Uamutã.
Na agricultura, os principais produtos são a soja (crescimento expressivo
nos últimos anos), guaraná, arroz, mandioca, cacau, maracujá e cupuaçú.
A economia da região Norte baseia-se no extrativismo vegetal de produtos
como látex, açaí, madeiras e castanha-do-pará; no extrativismo mineral de ouro, diamantes,
cassiterita e estanho; e, na exploração de minérios em grande escala, principalmente o ferro
na serra dos Carajás, estado do Pará, e o manganês do município de Serra do Navio, estado
do Amapá. Duas ferrovias viabilizam o escoamento dos minérios extraídos da região: a
Estrada de Ferro Carajás, que vai de Marabá, estado do Pará, a São Luiz, capital do estado
do Maranhão (região Nordeste), que leva o ferro para os portos de Itaqui e Ponta da
Madeira e, a estrada de Ferro do Amapá, que transporta o manganês extraído na serra do
Navio até o porto de Santana, em Macapá, capital do estado do Amapá. No setor industrial
destaca-se o pólo industrial de Manaus, onde há grande produção de eletrônicos, relógios,
eletrodomésticos e suprimentos de informática.
As principais cidades da região Norte no estado do Amazonas são
Manaus (capital), Coari, Manacapuru, Tefé, Parintins, Tabatinga e Itacoatiara. No Pará,
Belém (capital), Santarém, Altamira, Marabá e Bragantina. Em Tocantins, Palmas (capital),
Araguaína, Porto Nacional, Gurupi e Paraíso do Tocantins. Em Rondônia, Porto Velho
(capital), Ji-Paraná, Ariquemes, Vilhena e Cacoal. No estado de Roraima, Boa Vista (capital),
Amajari, Alto Alegre, Rorainópolis, Mucajaí e Caracaraí. No estado do Acre, Rio Branco
(capital), Cruzeiro do Sul, Feijó, Sena Madureira, Tarauacá e, finalmente, no estado do
Amapá, Macapá (capital) e Santana.
Atualmente, o que se entende por Amazônia é a região formada pela
bacia do rio Amazonas, concentrando 10 dos maiores rios do planeta e 1/5 da água doce
da Terra. Possui 25.000 km de rios navegáveis, em cerca de 6.900.000 km2, dos quais
aproximadamente 3.800.000 km2 estão no Brasil.
Já a Amazônia Legal, estabelecida no artigo 2 da lei nº 5.173, de outubro
de 1966, abrange os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia,
Roraima, Tocantins, parte do Maranhão e cinco municípios de Goiás. Ela representa 59%
do território brasileiro, distribuído por 775 municípios, onde segundo o Censo Demográfico
viviam em 2000, 20,3 milhões de pessoas (12,32% da população nacional), sendo que 68,9%
desse contingente em zona urbana (IBGE, 2000).

17
Mapa do Estado do Amazonas
Fonte: IBGE - http://www.ibge.gov.br/7a12/mapas/ufs/amazonas.pdf
Acessado em agosto de 2010
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È
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Processo de Ocupação da Amazônia

O surgimento de Manaus está inserido no processo de


conquista e ocupação da Amazônia, realizado pelos portugueses no período
colonial. Esse processo de ocupação foi planejado, conduzido e executado
como prioridade política pela metrópole portuguesa, por meio de ações
militares, administrativas, políticas e diplomáticas que tinham por finalidade
manter e assegurar a posse desse território para o império colonial português.

Fonte de mitos e lendas, a Amazônia do século XVI fazia


parte do imaginário europeu como local de riquezas inimagináveis, rendendo
diversas incursões na área como a do espanhol Francisco de Orellana que,
entre 1540 e 1542, realizou a primeira expedição européia na região.

No século XVII, os portugueses foram forçados a iniciar


um processo de conquista definitivo, uma vez que enfrentavam o assédio
constante de espanhóis, franceses, holandeses, entre outros. Essas incursões
estrangeiras estimularam a intervenção da Coroa portuguesa, através da *Os mapas das págs. 20 a 23 foram
implantação de fortes, a princípio na embocadura do rio Amazonas entre copiados com base na cartografia
exposta no trabalho de REZENDE, Tadeu
Belém e Macapá, e do incentivo à ação de missões católicas utilizadas como Valdir Freitas de. A conquista e ocupação
linha de frente, especialmente de Jesuítas, Franciscanos, Mercedários e da Amazônia brasileira no período
colonial: a definição de fronteiras.
Carmelitas. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas, Departamento de História
Econômica, Universidade de São Paulo,
(tese de doutorado), São Paulo, 2006.
Principais missões religiosas na Amazônia até o século XVIII.

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A Região Norte

As vilas criadas no século XVIII estavam localizadas em pontos estratégicos, às margens do rio Amazonas ou na foz de seus principais afluentes,
e tinham como função a defesa, cobrança e controle de tributos, entreposto comercial de produtos extrativos e agrícolas, base para o preiamento
de índios, sede do poder temporal além de representação do Estado e do poder espiritual por meio das missões religiosas.

Até meados do século XVIII, as missões religiosas penetraram


nos confins da Amazônia viabilizando a exploração dos produtos da floresta
conhecidos como drogas do sertão – salsaparrilha, cacau, cravo, canela entre
outros – e, ao mesmo tempo, domesticavam a mão de obra nativa, facilitando
a hegemonia lusa. Porém, a maioria indígena tornou o tupi a língua geral. Em
1750, calcula-se que havia cerca de 50 mil índios vivendo em aldeias formadas
por jesuítas e franciscanos1.

Um dos fatores que facilitou a expansão portuguesa na


Amazônia foi a União Ibérica – 1580 a 1640 – , caracterizada pela união das
coroas portuguesa e espanhola, pois permitiu a ação portuguesa no interior
da região sem nenhum impedimento fronteiriço uma vez que pelo Tratato
de Tordesilhas, de 14942, cabia à Espanha grande parte do que conhecemos
atualmente como Amazônia brasileira. Durante a vigência da União Ibérica
sob as ordens do rei da Espanha, coube a Portugal a expulsão dos franceses
de São Luís do Maranhão – que ali pretendia estabelecer a França Equinocial,
uma tentativa francesa de colonizar a América do Sul – e a fundação, em
1616, do Forte do Presépio de Santa Maria de Belém, que deu origem a
cidade de Belém. A partir dessa posição, pescadores e comerciantes ingleses
e holandeses que iniciavam sua instalação no baixo Amazonas, eram expulsos
pelas forças portuguesas, que passaram então a controlar o acesso da maior
bacia hidrográfica do mundo.

1  Pela dificuldade de aprisionamento e pela vulnerabilidade às doenças, os índios não se


adaptavam a muitas atividades econômicas necessárias ao colonialismo. A partir da segunda
metade do século XVIII, assim como em outras regiões da colônia, a carência da mão de
obra foi suprida, ou amenizada, com a chegada dos negros trazidos da África na condição
de escravos. No Baixo Amazonas, os negros foram empregados nas construções, cada vez
mais numerosas, nas plantações de cacau, na agricultura de subsistência e na pecuária. O
negro incorporou-se ao ambiente das casas senhoriais e nas atividades domésticas. Poucos
subiam o Amazonas. A colonização portuguesa que os transportava ainda se concentrava
nas proximidades da foz do rio. Assim, a presença dos negros na população amazônica ficou
concentrada no Pará e no Amapá.
2  Por esse tratado foi feita a divisão do Novo Mundo entre Espanha e Portugal.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

A linha verde mostra a penetração portuguesa nos rios Negro e Branco

Com a criação do Estado do Maranhão e Grão-Pará, em 1621


– uma entidade política autônoma e independente do Estado do Brasil – a
administração desses territórios passou a ser diretamente subordinada ao governo
de Lisboa, iniciando-se um processo irreversível de exploração e penetração
territorial pela vasta rede hidrográfica amazônica. (RESENDE, 2006, p. 303).
Ao longo do curso do rio Amazonas, e partindo das fortificações
de Belém, os portugueses lançaram expedições oficiais destinadas a estabelecer a
presença colonial por todo o vale do grande rio. Entre as inúmeras expedições,
destacam-se a bandeira fluvial de Pedro Teixeira, 1637 a 1639, marco das
explorações amazônicas oficiais, e da epopéia do bandeirante Antônio Raposo
Tavares, entre 1648 e 1651.
A linha verde assinala o percurso da Expedição de Raposo Tavares realizada entre finais de 1647 a feveriro de 1651.

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A Região Norte

É importante ressaltar que as bandeiras foram importantes


para a construção espacial brasileira, pois ampliaram o limite do território
conhecido.

Para manter a expansão geográfica, a coroa portuguesa


mandava construir fortificações ao longo do perímetro exterior das expedições.
Assim surgiram os fortes de São Joaquim, em Roraima; São José das
Marabitanas, no Alto rio Negro; São Gabriel, no rio Negro; Tabatinga , no
rio Solimões e Príncipe da Beira, no rio Guaporé, balizando o contorno das
nossas fronteiras terrestres.

Principais fortificações construídas na Amazônia até o início do século XVIII.

Dessa forma, pode-se dizer que o primeiro modelo de ocupação


da Amazônia foi de ordem pontual. As vilas criadas até o século XVIII estavam
em locais estratégicos, às margens do rio Amazonas ou na foz de seus principais
afluentes, e tinham como função a defesa, a cobrança e o controle de tributos,
servir como entreposto comercial de produtos extrativos e agrícolas, base para
o aprisionamento de índios, representação do Estado e, também, do poder
espiritual, por meio das missões religiosas. Algumas das cidades fundadas,
como Belém, na entrada para a Amazônia, e Manaus, mais no interior, eram
em princípio portos, fortificações e missões, permitindo que durante o período
colonial português fosse determinado o contorno geral do território brasileiro.
O domínio territorial e o estabelecimento de povoados em locais
estratégicos estava atrelado ao modelo econômico colonial, centrado em uma
economia baseada na exploração cíclica dos recursos naturais, além do mais, para
os portugueses, a Amazônia representava uma alternativa ao império asiático,
perdido para outras nações européias no século XVII.
Em 1759, o primeiro ministro português, Marquês de Pombal

23
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

(1750-1777), determinou a expulsão dos jesuítas dos domínios portugueses e


apropriou-se de seus bens, pois os missionários, em especial os da Companhia
de Jesus, eram acusados de tentar criar um Estado próprio no reino luso. Pombal
pretendia também consolidar o domínio português nas fronteiras do Norte e
do Sul do Brasil através da integração dos índios à civilização portuguesa. Essa
jogada política garantiria o aumento das terras portuguesas de acordo com o
Tratado de Madri. Por isso, proibiu a escravidão indígena, transformou aldeias
amazônicas em vilas sob administração civil e implantou uma legislação que
estimulava o casamento entre brancos e índios, sendo que essa mestiçagem
deu origem à população cabocla da Amazônia, ação que ajudou a consolidar a
presença portuguesa no território brasileiro.
Em meados do século XIX, vários acontecimentos contribuíram
para a modificação da paisagem amazônica e determinaram, em linhas gerais,
o que viria a ser a malha urbana de suas cidades. Entre esses acontecimentos
estão a elevação do Amazonas à categoria de província, em 1850, a introdução
da navegação a vapor, em 1852, e a exploração dos seringais a partir de 1830
(OLIVEIRA, 2006).
A Província do Amazonas, instalada em 1852, possuía apenas
uma cidade, a Barra do Rio Negro, depois cidade de Manaus, capital da nova
Província, vinte e oito freguesias e trinta e um povoados. Desses acontecimentos,
a exploração do látex e a interiorização da navegação a vapor, foram os que
tiveram maior relevância na configuração da malha urbana, pois melhorou
a comunicação e transformou os povoados e vilas em pontos de parada
obrigatório para o embarque e desembarque de cargas, bem como de reposição
da lenha que servia de combustível para os vapores. No entanto, a fronteira do
território da Amazônia brasileira permaneceria móvel até o início do século XX,
quando os contornos políticos do Brasil seriam definidos com a conquista dos
territórios do Amapá e de Roraima, ao Norte, e do Acre, no extremo Oeste.
Esses extremos, especialmente as regiões dos altos rios, na parte mais ocidental
da floresta, permaneciam como área de refúgio dos povos indígenas que não
foram incorporados aos empreendimentos colonialistas, nem de Portugal nem
da Espanha.
Na metade do século XIX, o período das “drogas do sertão”
3
, motivou a construção das fortificações portuguesas contra invasores, havia
chegado ao fim e teve lugar um segundo modelo de ocupação, marcado pelo
extrativismo das seringueiras nativas, conhecido como ciclo da borracha4. O
número de vilas cresceu significamente e, na última década do século XIX,
além da expansão urbana da cidade de Manaus, consolidou-se, por meio da lei
nº 33 de 04/11/1892, a base da divisão municipal do Estado. Também foram
estabelecidos os critérios para a criação de novos municípios, sendo determinada a
estrutura do poder municipal e dos novos limites do Estado do Amazonas, que foi
dividido em vinte e três municípios, Manaus, Itacoatiara, Silves, Urucará, Parintins,
Barreirinha, Maués, Borba, Manicoré, Humaitá, Codajás, Coari, Tefé, Fonte Boa,
São Paulo de Olivença, São Felipe do Rio Javari, Canutama, Labrea, Antimary,
Moura, Barcellos, São Gabriel da Cachoeira e Boa Vista do Rio Branco, sendo
que a divisão atual é apenas uma variação dessa primeira (OLIVEIRA, 2006).

3  Baunilha, cacau, canela, castanha, guaraná, entre outros.


4  O termo “ciclo”’ é usado no texto como forma de maior entendimento do processo de
auge e decadência dos produtos primários no Brasil, como a borracha, não se referindo ao
término da exploração desses produtos.

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A Região Norte

O Ciclo da Borracha na Amazônia

Embora o delineamento de fronteiras e a criação de vilas e


cidades entre os séculos XVI e XIX tenham funcionado para a sedimentação
do poder do Estado naquela região, a Amazônia, em certo ponto, era um
mundo desconectado do contexto da formação da nação brasileira, não
só pelo isolamento geográfico mas, também, pela economia sem grande
expressão. Essa situação levou a um dos episódios mais marcantes da
história do Pará, quando, em 1835, parte da elite amazônica, ressentida de
não fazer parte das decisões políticas e econômicas do país, insurgiram-se
na revolta conhecida como Cabanagem. Os revoltosos tomaram Belém
e proclamaram a independência do Pará em uma circunstância de luta
que se prolongou até 1840 e cujo resultado foram milhares de mortos, a
destruição quase completa de Belém e a permanência da Amazônia em
decadência econômica e social.

A economia da Amazônia só iria experimentar um


crescimento expressivo a partir da primeira metade do século XIX , com
a exploração da borracha. Foram as inovações tecnológicas desenvolvidas
a partir da Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra em princípios do
século XVIII, que a borracha passou a se tornar um produto essencial. A
primeira utilização industrial da borracha foi para apagar traços de lápis5.
A partir de então, o produto ficou conhecido como impermeabilizante e
possuidor de elasticidade ímpar.

Os múltiplos usos da borracha se deveu ao aperfeiçoamento


da goma elástica, em 1842, por Charles Nelson Goodyear, nos Estados
Unidos, e Thomas Hancoock, na Inglaterra. Ambos descobriram o
processo de vulcanização, sistematizado em 1888, quando John Boyd
Dunlop inventou o pneumático e passou-se a usar o automóvel com quatro
rodas. A larga difusão do automóvel no último decênio do século
XIX tornou a borracha uma das principais matérias-primas industriais do
mundo moderno. (PRADO JR., 1986, p. 236). A fabricação de pneus de
borracha devido a crescente frota de carros levou o produto a uma ascensão
inigualável e, como o Brasil detinha a maior reserva mundial de seringueiras
nativas, o monopólio da borracha pela Amazônia foi uma conseqüência.

A seringueira, Hevea brasilienses, nativa dos trópicos


americanos, era utilizada pelos índios do México, da América Central e
da Bacia Amazônica para confecção de calçados, mantos, seringas e bolas

5  Descoberta que se deve ao químico inglês Joseph Priestley, em 1770.

25
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

elásticas que serviam para jogos. Tornou-se conhecida dos europeus no


século XVIII, principalmente depois que o cientista e explorador francês
Charles-Marie de la Condamine, chefe de uma expedição científica francesa
enviada à América do Sul, observou seu uso pelos nativos de tribos
amazônicas, e a descreveu como produto vegetal de grande elasticidade,
impenetrável à água, com que os portugueses do Pará fabricavam bomba ou
seringas sem êmbolo e dezenas de outros utensílios6 (DEAN, 1989, p. 18).

Embora existissem outros tipos de plantas produtoras do


látex como a maniçoba, caucho e mangabeira7, segundo Warrren Dean, a
espécie vegetal que produzia a borracha mais pura e elástica era a seringueira
da Bacia Amazônica, conhecida no comércio mundial como Pará Rubber,
ou borracha do Pará. A Hevea brasiliensis8, nome científico dado para a
seringueira brasileira, só crescia na margem direita do amazonas, num
imenso semicírculo que ia do oeste de Manaus até o sul do Mato Grosso,
atingindo também o Estado do Acre, o norte da Bolívia e o leste do Peru.
Dentro da porção dessa bacia, a altitude era de 800 metros com um índice
pluviométrico anual de até 1800 milímetros (DEAN, 1989, p. 24). Esse
fato fez que com que se estabelecesse um imenso esquema de tráfico da
borracha que, a partir de Belém, adentrava três mil quilômetros da floresta
amazônica, sendo que a área de maior produção ficava nos atuais estados
do Pará e do Amazonas.

No início do século XX, entrou em cena a região do alto


curso dos rios Purus e Juruá, ambos tributários do Amazonas. O avanço
dos seringalistas brasileiros nessa parte da floresta provocou o conflito
com os bolivianos, resultando na cessão, por parte da Bolívia, da região que
iria compreender o território do Acre, em troca da construção da ferrovia
Madeira-Mamoré, um episódio à parte da história da ferrovia no Brasil,
bem como da economia da borracha. O Acre começou a contribuir com
a produção do látex somente em 1904, mas em 1907, ocupava o primeiro
lugar entre as regiões brasileiras.

O Brasil começou a exportar borracha em 1827 com


31 toneladas, e a aparecer timidamente nas estatísticas de exportação do
Amazonas em 1853, junto com os produtos típicos da região como o
pirarucu seco, tabaco, salsaparrilha, café, cacau, óleo de copaíba, castanha
e manteiga de tartaruga. Nos sete anos subsequentes a borracha teve um
crescimento de mais de mil por cento. A maior parte da produção dos

6  Em Belém, perto da foz do Amazonas, atraiu a atenção das autoridades coloniais por-
tuguesas outro tipo de borracha, chamada “seringa” em referência a uma de suas principais
aplicações. Por volta de 1750, botas do exército, mochilas e outros artigos às vezes eram
mandados de Lisboa para Belém a fim de serem impermeabilizados.(...). em 1800, comer-
ciantes da Nova Inglaterra começaram a encomendar de Belém sapatos feitos de seringa.
Em 1939 Belém já exportava 450.000 pares in DEAN, Warren. A luta pela borracha no Brasil.
São Paulo: Nobel, 1989, p. 32.
7  Os índios do novo mundo sabiam extrair a borracha de pelo menos oito das muitas espécies
tropicais nas quais se encontra um fluido leitoso chamado látex, que corre por vasos especiais situ-
ados na parte interna da casca, provavelmente como defesa contra insetos. (DEAN, 1989, p. 30).
8  Nome científico dado à seringueira brasileira pelo diretor do Jardim Botânico de Berlim,
em 1811. Além da Hevea, outras espécies podiam ser encontradas na Amazônia, como a
seringa Itaúba e a seringa Chicote.

26
A Região Norte

seringais dos altos rios convergia para Manaus, cidade estrategicamente


situada no eixo da navegação. Por Manaus se fazia quase todo o comércio
da província que, em seguida, era transportado para Belém (GARCIA,
2004, p. 20).

Migração e Crescimento Econômico

Segundo Warren Dean, o fator interno no Brasil que


impulsionou a exploração dos seringais e o aumento da produção foi a grande
seca no interior nordestino entre 1877 e 1880, a qual levou rumo a Amazônia
um dos maiores fluxos migratórios registrados no Brasil (DEAN, 1989, p.
25). A disponibilidade dessa mão de obra aumentou de 7.000 toneladas,
em 1880, para 17.000 toneladas alguns anos depois. Mas não só migrantes
brasileiros rumaram para a Amazônia. A promessa de riquezas proporcionada
pela borracha propiciou uma intensa migração de homens vindos de todas
as partes do mundo. Sírio-libaneses, especializados no comércio, italianos,
franceses, portugueses, e ingleses em grande número, atravessaram o oceano
para ocupar as pequenas vilas da floresta.

Seringueiro, desenho de Percy Lau do livro


Tipos e aspectos do Brasil.

Seringueiros defumando a borracha.


Fonte: Jornal A Crítica, s/d.

27
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

No final do século XIX o volume da exportação da borracha


começou a se destacar e, partir de 1880, ganha franco dinamismo representando,
além da chegada de pessoas, capitais e mercadorias, facultando às elites de
Manaus – e de outras cidades da Amazônia, como Belém – um enriquecimento e
prosperidade inigualável, inaugurando o período de maior ascensão da borracha,
que vai de 1879 a 1912, momento no qual essas cidades conhecem o esplendor
proporcionado pela riqueza econômica.
A riqueza da exploração da borracha não foi somente regional.
Durante o decênio de 1901/1910 representou 28,2% das exportações do Brasil,
quase se equiparando ao café.
A prosperidade gerada com a exportação da borracha criou um
processo social próprio e mecanismos comerciais centrados em Manaus e Belém,
com ramificações econômicas típicas que iam desde o seringueiro em sua barraca
na floresta, aos patrões em seus barracões à beira-rio, às Casas Aviadoras nas
capitais, que por sua vez se ligavam aos exportadores.
Tudo girava em torno da borracha. Porém a exploração do látex
se deu de forma rudimentar, no aspecto da técnica, e desumana, no aspecto social.
Baseado no sistema de aviamento, constituía-se numa rede de créditos que se
espalhou nos imensos seringais que foram abertos em todos os vales amazônicos.
Esse sistema criou três tipos característicos, o aviador, o seringalista e o seringueiro.
O aviador era o elemento propulsor do negócio, pois era quem
concedia crédito aos seringalistas para explorar os seringais. As casas aviadoras
ficavam estabelecidas basicamente em Belém e Manaus e compravam das
firmas exportadoras as mercadorias que forneciam aos seringalistas, pagando
as exportadoras com a produção dos seringais. As casas exportadoras, em sua
maioria de origem inglesa ou alemã, se capitalizavam nos bancos europeus e norte
americanos para financiar o sistema de aviamento e obtinham um extraordinário
lucro com a venda da borracha nos mercados industrializados.
O seringalista, era o coronel, o patrão, o dono do seringal e
aviador do seringueiro. Comprava a crédito das casas aviadoras todas as mercadorias
que vendia aos seringueiros e pagavam seus débitos com a produção anual do
seringal.
O seringueiro era o extrator da borracha. Não tinha relação de
empregado com o seringalista porque pagava um tributo por parelha de estrada
que explorasse, vendendo ao seringalista o restante da borracha depois que saldasse
a sua dívida, correspondente ao aviamento de gêneros e gastos com passagem e
material de trabalho.
Como a seringueira se distribuía de maneira irregular, não
havendo mais de duas ou três espécies exploráveis em um hectare, os seringueiros
tinham uma vida isolada e cheia de privações. Ficavam de 6 a 7 meses para localizar
as árvores e abrir as “picadas” que os ligavam ente si. Construíam uma cabana na
boca da estrada que adentrava a floresta e, toda manhã, percorriam um caminho
de vários quilômetros para realizar a “sangria” na árvore e, à tarde, retornavam
para recolher o líquido que escorria nos recipientes deixados junto ao tronco9.
Normalmente cada seringueiro era responsável por 60 a 150 árvores.
Por várias semanas esperavam o transporte fluvial para receber
gêneros alimentícios e entregar sua produção. A folga se baseava na ida à venda

9  Com essa técnica rudimentar cada seringueira produzia em média 80 a 200 quilos de látex,
por ano.

28
A Região Norte

do seringueiro onde gastava seu pagamento. Era um sistema de exploração que


impedia que o seringueiro acumulasse dinheiro. No auge da produção do látex,
calcula-se que dezenas de franceses, judeus marroquinos, espanhóis e portugueses
operavam nos rios como comerciantes, proprietários de barcos e plantadores de
cacau, dominando inclusive as línguas nativas (PRADO JR, 1986, p. 55).
O tipo de exploração era excessivo, sem preocupação com a
conservação das árvores. Aquelas que ficavam mal cuidadas eram destruídas,
pois sempre havia outras. Esse tipo de exploração, pode-se dizer, predatório,
viria posteriormente a ser uma das causas da incapacidade do Brasil em manter o
poderio da borracha. Em 1912, a exploração da borracha no Brasil alcançou seu
máximo com um total de 42.000 toneladas, daí por diante foi o declínio.
Apesar da incredulidade brasileira diante da possibilidade de
outro lugar no mundo produzir borracha com a qualidade amazônica, o ciclo
da borracha teve um fim com data marcada. Deu-se a partir de 1910, quando o
Sudeste Asiático (Malásia, Ceilão, Conchichina, Sumatra e Java), passou a dominar
o plantio e a exportação. Essas localidades estavam ligadas às suas metrópoles e
vendiam o produto mais barato e em pouco tempo substituíram os brasileiros
nos mercados mundiais. Em 1919, da produção mundial de 423.000 toneladas, o
Brasil só contribuía com apenas 34.000. Ironicamente as mudas desenvolvidas na
Ásia haviam sido levadas da Amazônia, em 1854, pelo inglês Henry Wickham e
cultivadas no jardim botânico de Kew, na Inglaterra.
A brusca queda do valor de mercado fez com que muitos
aviadores fossem obrigados a vender toda sua produção em valores muito abaixo
do investimento empregado na produção. Entre 1910 e 1920, a crise da seringa
amazônica levou diversos aviadores à falência e endividou os cofres públicos que
estocavam a borracha na tentativa de elevar os preços.
Sem dúvida, o colapso da produção da borracha brasileira foi um
duro golpe para a Amazônia brasileira que durante o período áureo foi transformada
por meio da riqueza. A população da região subiu de 337.000 habitantes, em 1872,
para 1.100.000, em 1906. Manaus erguera-se nesse breve período e chegou aos
70.000 habitantes. Belém, o porto internacional da borracha, 170.000 habitantes,
e o Acre, em menos de uma década, a 50.000 habitantes (PRADO Jr., 1994, 240).
Muitas são as explicações para a queda brasileira no mercado
mundial, e mais ainda sobre o fato de não se ter investido em plantações de seringais.
Algumas dessas respostas são a falta de incentivo do governo brasileiro, focado na
produção cafeeira e no sudeste brasileiro, onde estava a incipiente indústria carente
de recursos e tecnologia. Por outro lado o governo brasileiro reclamava do gasto
excessivo dos estados do Norte. Mas, talvez, a reclamação dos amazônicos tivesse
fundamento. Warren Dean ressalta que “o Governo Federal não deu atenção ao
norte amazônico, apesar daquela gente com apenas 1/25 da população do país
ter contribuído com 1/6 da renda nacional” (DEAN, 1989, p. 22).
O fato é que o Brasil fazia um tipo de exploração primitiva,
predatória, da borracha10 e não havia recursos técnicos e financeiros como os
oferecidos ao Oriente pelos países europeus. Além do mais, o nosso país não
dominava o negócio da borracha como um todo, só cabendo a exploração
da matéria-prima. O financiamento, o comércio, a manipulação e o consumo
do produto industrializado lhe eram alheios, estando, assim, à mercê de seus
concorrentes (PRADO Jr., 1994, 240).

10  Assim como a borracha, a erva-mate, o guaraná, a castanha-do-pará, a salsaparrilha, entre


outros produtos naturais, foram explorados sem manter o cultivo simultaneamente.

29
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Com o sucesso da borracha asiática e, após 1911, quando o preço


do produto despencou, os seringueiros amazônicos reconheceram a necessidade
de se plantar seringueiras e várias iniciativas, embora tardias11, surgiram. Apesar da
Ásia, até 1923 houve investimento de estrangeiros na Amazônia.
Nas décadas de 1920 e 1930, milhares de nordestinos abandonaram
os seringais. Muitos retornaram ao nordeste e a Amazônia mergulhou em uma nova
crise econômica e populacional.

O Segundo Ciclo da Borracha na Amazônia

A seringueira saiu da Amazônia e plantações foram iniciadas em


outras partes do país como Bahia, norte do Mato Grosso, Espírito Santo e São
Paulo12. No início dos anos 20 havia cerca de 2 milhões de seringueiras plantadas
no Brasil (DEAN, 1989, p. 82), porém sem muito sucesso. No entanto, Warren
Dean credita o insucesso em parte à mentalidade dos seringalistas brasileiros, ou da
elite comercial brasileira daquele momento, que tinham como base a acumulação de
capital, buscando o enriquecimento rápido a partir do monopólio de algum produto
extrativo. Esse pensamento minava a possibilidade dos investimentos necessários
em plantações e, principalmente, em novas tecnologias.
Entre as iniciativas de retormar a expansão dos seringais no Brasil
está a de Henry Ford. Como os Estados Unidos consumiam a metade da produção
mundial de borracha, especialmente no setor de pneumáticos, esse fator foi decisivo
para que Ford iniciasse nos anos 30 grandes plantações da seringueira no Pará. O
americano criou a cidade de Fordlândia, em 1928, que chegou a ser a terceira maior
cidade da Amazônia, depois Belterra13.
A iniciativa em Fordlândia e Belterra foi considerada o único
intento significativo de se cultivar seringueira no Brasil, sendo as duas cidades os
postos mais avançados do conhecimento e da prática do cultivo da seringueira
na América Tropical daquele período. Apesar do alto investimento, as plantações
foram um tremendo fiasco, pois terminaram sendo devoradas por um fungo que
ninguém soube dominar na época. Esse fungo, conhecido como “mal das folhas”,
dizimou quase todas as tentativas de se cultivar a seringueira.
Posteriormente, as plantações mais importantes de seringueira
foram das fábricas de pneus que se instalaram no Brasil nos anos 40, como a
Goodyear, a Firestone e a Michelin. Essa última chegou a ter cerca de 20 mil hectares
da planta (DEAN, 1989, p. 235).14

11  Em 1911, foi realizado no Rio de Janeiro o Congresso da Borracha, onde foi apresentado o
Plano de Defesa da Borracha, que determinava a criação de estações experimentais para o cultivo
da seringueira extrapolando os limites da Amazônia e privilegiando outros estados (Mato Grosso,
Maranhão, Piauí e Bahia). O PDB não deu certo e o Amazonas entrou em depressão econômica.
12  Em 1915, em Gavião Peixoto, no estado de São Paulo, um seringal foi iniciado com sementes
enviadas do Mato Grosso pelo Marechal Rondon.
13  Henry Ford construiu no Estado do Pará, em 1928, a cidade de Fordlândia, e, em 1934,
Belterra. Fordlândia teve entre 2.200 a 2.500 trabalhadores, com toda a infra-estrutura necessária.
Era a melhor cidade da região. Em 1941, 70% das árvores foram afetadas por um fungo que
destruiu as ambições de Ford no Brasil.
14  Segundo o economista João Frederico Normano, há quem diga que a borracha fosse o pro-
duto bélico mais importante do grupo dos não minerais. Nos anos 40 existiam 40.000 aplicações
para ela. Sem a borracha, na época, a eletricidade não estaria difundida, bem como bicicletas e
automóveis, in NORMANO, João Frederico. Evolução econômica do Brasil. São Paulo. Companhia
Editora Nacional, 1939, p. 35.

30
A Região Norte

Um novo surto econômico advindo da borracha só iria ocorrer


na Amazônia entre 1942 e 1945, período conhecido como o segundo ciclo da
borracha. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Malásia passou ao controle
japonês, praticamente interrompendo a exportação do produto naquela região.
Assim, em 1941 os países aliados necessitavam dessa matéria-prima, principalmente
para a indústria bélica, voltando os olhos novamente para a Amazônia. Para reativar
a extração, o governo de Getúlio Vargas firmou alguns acordos com o governo
americano, os Acordos de Washington. Nesses instrumentos, ficavam estabelecidos,
entre outros, que os americanos comprariam toda borracha excedente do Brasil e,
para oferecer crédito, foi criado o Banco de Crédito da Borracha S.A., no Pará. Ao
governo brasileiro, cabia a responsabilidade de fornecer a mão de obra necessária ao
aumento da produção. Os trabalhadores seriam novamente os flagelados da seca,
principalmente do Ceará, que foram levados para a Amazônia com a promessa de
ganhos inimagináveis. Com isso, Getúlio Vargas pretendia não só a colonização da
região como também minimizar o problema gerado pela seca nordestina.
Para tanto, foi criado o Serviço Especial de Mobilização
de Trabalhadores para a Amazônia – Semta, a Comissão Administrativa de
Encaminhamento de Trabalhadores para a Amazônia – Caeta, que recrutavam
trabalhadores no nordeste com a propaganda “soldados da borracha”, uma tentativa
de retomar a corrida aos seringais de anos antes. Além desses, a Superintendência
do Abastecimento do Vale Amazônico – Sava, que levava provisões em aviões
anfíbios, e o Serviço Especial de Saúde Pública – Sesp, com médicos e enfermeiros
em vários pontos de “arregimentação” de trabalhadores. Esse aparato assemelhava-
se a uma convocação para a guerra, onde a mão de obra recrutada tinha como
missão extrair o látex.
A produção da borracha nesse período não chegou a ser
expressiva como no passado e tão logo a guerra chegou ao fim, os acordos foram
cancelados. O resultado da batalha da borracha foi o trabalho árduo, praticamente
escravo, de milhares de nordestinos, sendo que a maioria nunca viu o cumprimento
das promessas do governo ao término de seu trabalho.
A partir dos anos 60, especialmente em 1964, com o
estabelecimento do governo militar, iniciou-se um novo movimento de ocupação
na Amazônia denominado de Operação Amazônia com o qual o governo pretendia
colonizar a região amazônica, baseado na crença do “vazio amazônico”.
Cartazes de Pierre-Chabloz – Propaganda Um marco desse projeto foi a criação da Superintendência
governamental para arregimentação de
trabalhadores nos seringais. para Ocupação da Amazônia – Sudam, responsável por oferecer incentivos
Imagens extraídas do site fiscais, crédito, entre outros, para expandir a fronteira pioneira. Nos anos 70,
diariodonordeste.globo.com/materia.
asp?codigo, acessado em agosto/2009. mais investimentos em infraestrutura foram viabilizados. Desse período tem-se
o início da construção da Transamazônica, que objetivava assegurar o controle
brasileiro na porção sul da Amazônia. A partir de então, programas governamentais
como o Plano de Integração Nacional, propiciou a distribuição de terras para
uso agropecuário, mineração, construção de hidrelétricas, implantação do pólo
tecnológico e industrial da Zona Franca de Manaus e a construção de rodovias,
fato que impulsionou a migração, especialmente de famílias do sul do país.
Esse modelo resulta, até hoje, em diversos problemas
sócioeconômicos, culturais e, principalmente ambientais, com confrontos que
renderam histórias de tragédias e lutas pelo desenvolvimento sustentável da região
e, apesar, dos avanços, a Amazônia, pelo que é, por todos os mitos que a envolve,
traz sobre ela a atenção do mundo.

31
Aspectos Histórico do
Desenvolvimento Urbano
de Manaus

Dados Gerais da Cidade de Manaus


Aspectos Históricos

O Modelo Europeu de Desenvolvimento Urbano

Os Códigos de Posturas - Reguladores do Espaço Urbano

A Construção da Periferia

Migração d Aumento Populacional


Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Manaus no contexto do Estado da Amazônia e do Brasil.

34
Mapa da divisão geográfica de Manaus

Fonte: Instituto de Planejamento Urbano e Informática – Implurb da Prefeitura Municipal de Manaus

ZONA OESTE ZONA NORTE ZONA SUL

6 - São Raimundo 44 - Col. Santo Antônio 1 - Centro


7 - Gloria 45 - Novo Isrrael 2 - Aparecida
8 - Santo Antônio 46 - Col. Terra Nova 3 - Pres. Vargas
9 - Vila da Prata 47 - Santa Etelvina 4 - Pç. 14 de Janeiro
10 - Compensa 48 - Monte das Oliveiras 5 - Cachoeirinha
11 - São Jorge 49 - Cidade Nova 19 - Raiz
12 - Santo Agostinho 20 - São Francisco
13 - Nova Esperança ZONA CENTRO SUL 21 - Petrópolis
14 - Lirio do Vale 22 - Japim
50 - Ponta Negra 37 - Flores 24 - Educandos
51 - Taruma 38 - Parque 10 25 - Santa Luzia
39 - Aleixo 26 - Morro da Liberdade
40 - Adrianópolis 27 - Betânia
ZONA LESTE 41 - N. S. das Graças 28 - Col. Oliveira Machado
23 - Coroado 42 - São Geraldo 29 - São Lazaro
32 - Distrito Industrial 43 - Chapada 30 - Crespo
33 - Mauazinho 31 - Vila Buriti
34 - Col. Antônio Aleixo ZONA CENTRO OESTE
35 - Puraquequara
52 - Armando Mendes 15 - Planalto
53 - Zumbi dos Palmares 16 - Alvorada
54 - São João Operário 17 - Redenção
55 - Tancredo Neves 18 - Bairro da Paz
56 - Jorge Teixeira 36 - Dom Pedro I
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Dados Gerais da Cidade de Manaus

O Município de Manaus fica na Região Norte do Brasil,


no centro geográfico da Amazônia. A superfície total do Município é de
11.458,5km2, equivalendo a 0,73% do território do Estado do Amazonas,
que abrange 1.577.820,2km2.

O município tem os seguintes limites:

• ao Norte, com o município de Presidente Figueiredo;

• a Leste, com os municípios de Rio Preto da Eva e Itacoatiara;

• ao Sul, com os municípios de Careiro da Várzea e Iranduba, e

• a Oeste, com o município de Novo Airão.

Manaus está localizada aos 3º15’ de latitude sul e 60º15’


de longitude oeste, numa excelente posição geográfica. Para Ab’Saber1, é a
verdadeira capital da hinterlândia amazônica, por se encontrar exatamente
no meio da Amazônia Ocidental e Oriental, na confluência entre os rios
Negro e rio Solimões. O clima do município de Manaus é equatorial quente e
úmido. A pluviosidade média é de 2.000mm/anuais, com 60mm no mês mais
seco. O período mais chuvoso vai de maio a junho e a amplitude térmica, em
todos os níveis, é baixa, já que não há grande diferença entre inverno e verão.
É digna de registro também a alta umidade do ar, que chega a atingir 80%.

A rede hidrográfica do município de Manaus abrange quatro


bacias, todas contribuintes da grande bacia do rio Negro. Duas encontram-
se integralmente dentro da cidade – a do igarapé de São Raimundo e a do
igarapé dos Educandos – e duas parcialmente inseridas na malha urbana – a
do igarapé do Tarumã-Açu e a do rio Puraquequara.

Dentro da rede de cidades brasileiras, Manaus comparece


como o 12º maior centro urbano, sendo considerada uma metrópole regional.
Pelos dados de 2000, Manaus apresenta uma população total de 1.403.796
habitantes, com uma concentração de 99,35% na área urbana – 1.394.724
habitantes (IBGE, 2000) e 56 bairros e seis zonas administrativas.

A influência exercida pela cidade de Manaus sobre a região


abrange mais de duas dezenas de municípios localizados nas bacias dos rios
Negro, Solimões e Amazonas, em que pese sua área urbana estar cercada por
grandes extensões de florestas tropicais e pelos caudais destes cursos d’àgua.

1  Aziz Nacib Ab’Saber apud GUGLIELMINI, Luiza Angélica Oliveira. A reprodução do


espaço urbano de Manaus e sua conexão com o Rio Negro. Acessado no site http://geodesia.ufsc.br/
Geodesia-online/arquivo/cobrac_2006/117.pdf , acessado em agosto de 2008.

36
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Os núcleos urbanos da região foram implantados nas áreas


ribeirinhas daqueles rios e seus afluentes, uma vez que a mobilidade da
população e o escoamento da produção regional sempre ocorreram, via de
regra, pela água.

O porto de Manaus converge navios de passageiros e de


cargas, que garantem a conexão da cidade com portos nacionais e estrangeiros,
além das embarcações regionais de todo tipo, que viabilizam a ligação com
inúmeros núcleos da Região Amazônica.

Os municípios limítrofes de Manaus, localizados ao sul


e sobre as margens direitas dos rios Negro e Amazonas, são Iranduba,
Manacapuru e Careiro da Várzea e integram a Microrregião de Manaus,
juntamente com os municípios de Autazes, Careiro e Manaquiri.

Entre as rodovias que permitem o acesso a Manaus, destaca-


se a BR-319 que liga a capital ao Estado de Rondônia, partindo do porto de
Careiro da Várzea em direção ao sul e conectando as cidades de Humaitá,
Lábrea e Manicoré. Ao norte, Manaus interliga-se a Roraima através da
rodovia BR-174. Esta rodovia federal, em conjunto com a rodovia estadual
AM-10, forma um eixo de saída norte de Manaus, constituindo um dos
principais vetores de expansão da cidade. A rodovia AM-10 permite a ligação
aos municípios de Rio Preto da Eva e Itacoatiara, sob forte influência da
metrópole, e a outros municípios localizados a oeste da capital, que formam
a Microrregião de Itacoatiara.

Localização do Município de Manaus e Microrregiões.


Fonte: IBGE - Censo populacional do ano de 2000.

37
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Aspectos Históricos

As primeiras expedições a chegar ao rio Amazonas foram a


de Alonso Ojeda, Juan de la Costa e Américo Vespúcio, em 1499, seguida
pela de Vicente Yanez Pinzón, em fevereiro de 1500. Pinzón denominou o
rio Amazonas de Santa Maria de la Mar Dulce. Porém, quem deu o nome
de Amazonas ao grande rio foi Gonzalo Pizarro. Ele e Francisco Orellana,
que em 1540 fundou a cidade de Quito, partiram dessa cidade seguindo
o rio para o interior, onde esperavam encontrar o lendário El-Dorado
(Penningnton, 2001, p. 33). Ao encontrar índios que lhe contaram o “mito”
das mulheres guerreiras que viviam em um sistema matriarcal, passou a
chamar o rio de Amazonas, denominação que permaneceu.

Durante a União Ibérica em fins do século XVI, quando a


Coroa Portuguesa passou para domínio espanhol, houve grande assédio de
estrangeiros na região, holandeses, ingleses — que estabeleceram colônias
na boca do rio Amazonas —, franceses e mesmo espanhóis.

Para assegurar o domínio, os portugueses expulsaram os


franceses do Maranhão, e Francisco Caldeira Castelo Branco fundou, em
1616, o forte do Presépio, depois cidade de Santa Maria de Belém.

O governador de Belém, em 1623 tomou os fortes Orange


e Nassau (construídos pelos neerlandeses possivelmente entre 1599 e
1600) e derrotou os ingleses, franceses e holandeses. Após a expulsão dos
neerlandeses por Pedro Teixeira, finalmente os portugueses passam a ter
controle sobre a Amazônia.

As causas econômicas, entre as quais a captura de índios


e a coleta de drogas do sertão, e as questões políticas – dominação de
fronteiras – ensejou várias expedições mais para o interior, partindo de
Belém, para o resgate ou aprisionamento de índios, usados como força de
trabalho. E foi o “adentramento” dessas tropas de resgate que iriam abrir
frente para o povoamento do território.

Em 1657 e 1658, uma dessas tropas formou um arraial na


boca do rio Tarumã, favorecendo a construção do fortim de São José do
Rio Negro pelo capitão de artilharia Francisco da Mota Falcão, em 1699. O
objetivo do forte era controlar a circulação de embarcações holandesas ou
espanholas junto aos rios Negro, Solimões e Amazonas. O sítio foi escolhido
em função de suas características estratégicas militares: um grande platô
de desenho triangular, bastante irrigado, localizado na margem esquerda
do rio Negro, próximo à confluência com o rio Solimões. Na verdade
todo banhado pelo rio Negro, e delimitado pelos igarapés, denominados
posteriormente de São Raimundo e dos Estudantes (atualmente aterrados).

Segundo o geógrafo Aziz Nacib Ab’Sáber, o sítio onde


foi implantado o forte “possui uma situação absolutamente privilegiada
em face das extensões amazônicas e do gigantesco quadro de drenagem

38
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

da bacia hidrográfica regional. Estava lançado os fundamentos da futura


cidade de Manaus”2.

Além da fortificação, viviam na região do rio Negro várias


tribos indígenas como os Baniba, Caboquena, Munducuru, Pacé, Tarumã,
Mura, Manaos, Maiapena, Baré, entre outros. Os Manaos dominavam todo
o vale do Rio Negro e exerciam controle sobre os grupos menores. Logo,
estabeleceram uma relação comercial com os portugueses fornecendo
índios cativos em troca de armas, ferramentas e tecidos, tornando o rio
Negro, no século XVIII, um grande centro abastecedor de mão de obra
indígena para Belém. Essa relação teve períodos controversos, porém não
afetou a dominação.

O Lugar da Barra – gravura


de Joam André Schwebell, s/d.

*As gravuras das págs. 39 a


44 estão on-line no site, http://
www.povosdamazonia.am.gov.
br/prg_101.jsp?input=5,
acessado em agosto/2008.

Com a proteção do Forte e a presença dos religiosos


carmelitas, floresceu um povoado denominado São José da Barra do Rio
Negro ou Lugar da Barra.

Em 1751, com a finalidade de demarcar de forma mais


ágil as novas fronteiras portuguesas, sustentadas pelo Tratado de Madrid3,
o Marquês de Pombal nomeou seu irmão, Francisco Xavier de Mendonça
Furtado, para governador do então criado Estado do Grão Pará e Maranhão,
cuja capital era Belém.

Diante da imensidão da área ocidental é criada, em 1755,


a Capitania de São José do Rio Negro. A sede da capitania ficou em uma

2  Aziz Nacib Ab’Saber apud REZENDE, Tadeu Valdir Freitas de. A conquista e a ocupação
da Amazônia brasileira no período colonial: a definição de fronteiras, São Paulo, 2006, p. 156.
3  O Tratado de Madrid de 1750, estabeleceu as fronteiras entre as colônias portuguesas e
espanholas na América do Sul.

39
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

missão denominada Mariuá, elevada a categoria de vila para a ocasião, depois


denominada de Barcelos. Esta sede foi transferida provisoriamente para o
Lugar da Barra em 1791 e, definitivamente, em 1808.

Em 1832, o Lugar da Barra passou à categoria de Vila e,


em 1848, tornou-se Cidade da Barra de São Jose do Rio Negro, ficando
com o nome de Cidade de Manaus a partir de 18504.

Quanto ao processo de urbanização, pode-se dizer que teve


início no governo de Manoel Lobo Gama D’Almada (1788-1799) que, ao
transferir a sede da província de Mariuá para o Lugar da Barra, em 1791,
“mandou instalar indústrias e alinhar o casario” (REIS, 1999, p. 47). Nesse
aspecto, é a partir do final do século XVIII e início do século XIX que é
possível verificar os esforços para o desenvolvimento local.

A g rande contribuição para o entendimento do


desenvolvimento urbano de Manaus vem do relato de exploradores que
transitaram pelo lugar. Desde o século XVII inúmeros viajantes, quase todos
estrangeiros, com as mais variadas finalidades, passaram pela cidade da
Barra e descreveram o local, que não passava de um povoado da Capitania
de São José do Rio Negro. Normalmente essas descrições demonstram o
olhar estrangeiro e, a partir de 1850, com a criação da província, se torna
recorrente a comparação de Manaus com outras capitais sem levar em
conta a dimensão geográfica e as condições econômicas da localidade. No
entanto, por meio desses relatos é possível observar o desenvolvimento
de Manaus, especialmente a partir do início do século XIX. Entre os que
passaram por aquela capital estão os cientistas alemães, Karl von Martius
e Johan von Spix, 1819 e 1865, o tenente da marinha britânica Henrique
Lister Maw, 1831, o historiador Antonio Baena, 1838, o naturalista Alfred
Russel Wallace, 1850, o pintor francês François Auguste de Biard, 1856,
o médico alemão Robert Ave-Lallemant, 1858 e o zoólogo suíço Louis
Agassiz e sua mulher Elizabeth Agassiz, 1865.

Apesar da descrição de um cenário precário, em termos de


habitação e infraestrutura, na maioria dos relatos, certamente o povoado
evoluiu ao longo dos anos. Segundo Mesquita (1999), em 1823 há o registro
da existência de onze pequenas ruas e uma praça de formato quadrangular,
com a presença de construções cobertas de telhas, muito embora os prédios
públicos como o Palácio do Governo, a Secretaria da Provedoria, e o quartel
militar serem cobertos com palha. Em 1828, a cidade era cortada por vários
igarapés e as ruas não eram calçadas, possuindo um aspecto inacabado. Por
essa época, já se via construído um hospital e a igreja com uma praça em
frente e o forte ao lado. Essa igreja havia sido erguida em frente ao rio e
próximo a ela podiam ser encontradas uma fábrica de algodão e uma de
louça, além de pontes construídas precariamente e sustentadas por estacas
(MAW, Henrique Lister, 1831, p. 210-211 apud MESQUITA, 1999, p. 24).
Dessa forma, o aspecto geral da cidade era “desorganizado”. Na verdade, as
ruas e construções simplesmente obedeciam ao relevo natural da localidade.

4  As datas de mudanças denominativas variam de acordo com o autor. Adotamos a datação


conforme MESQUITA, Otoni. Manaus – história e arquitetura (1852-1910). Manaus: Editora
Valer, 1999, p. 27-28.

40
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Lugar da Barra – Entrada norte da cidade, xilogravura de Riou e A. Bertrand, s/d.

Igarapé do Espírito Santo, xilogravura desenho de Franz Keller, gravado por A. Closs, s/d.

41
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Em 1832, quando o Lugar da Barra foi elevado à condição


de vila, o novo status não resultou em mudanças significativas. Em 1838,
Antonio Baena observa que na vila existiam duas igrejas sendo que uma
era a Matriz de Nossa Senhora da Conceição, um hospital militar, armazéns
da Provedoria, Armas e Pólvora e um local para construções de canoas e
batelões.

Verifica-se um crescimento lento, mas progressivo,


possibilitando, em 1848, a elevação da vila de Manaus à posição de cidade,
com a denominação de Cidade da Barra do Rio Negro. Dois anos depois,
D. Pedro II assinou a lei elevando a Comarca do Alto Amazonas ao posto
de Província do Império, com os mesmos limites da antiga capitania de
São José do Rio Negro.

A partir dessa nova condição política e com a abertura da


navegação comercial, em 1853, a cidade, bem como a região,transformou-
se em ponto de interesse internacional. Um dos relatos que descreve bem
a cidade, permitindo uma relação com décadas anteriores, é o de Alfred
Russel Wallace, comentado por Mesquita.

Esse viajante observou que a cidade assentava-se em um terreno irregular e era


cortada por dois igarapés, e sobre cada um deles havia duas pontes de madeira.
As ruas eram ‘dispostas de maneira regular’, mas não tinham qualquer tipo de
calçamento e além disso, eram ‘esburacadas e cheias de altos e baixos, tornando
bem desagradável caminhar-se por elas à noite’. As casas eram geralmente de um
só piso, cobertas de telhas e assoalhadas com tijolos. As paredes eram quase sempre
pintadas de branco e amarelo e as portas e janelas verde. No dizer do inglês era
‘bem agradável o aspecto do casario rebrilhando ao sol’. Havia na cidade duas
igrejas, mas eram ‘muito pobres e bem inferiores a de Santarém’. Da antiga
fortaleza, mantinha-se apenas o resto de suas muralhas. A população da cidade
estava calculada em torno de cinco ou seis mil habitantes, sendo em sua maior
parte composta por índios e mestiços, e Wallace suspeitava que era ‘bem provável’
não existir entre as pessoas nascidas no local uma única de ‘sangue inteiramente
europeu’, pois destacava que a miscigenação ente portugueses e índios tinha sido
‘considerável’ (Mesquita, 1999, p. 26).

Plano da Cidade de Manaus, onde é possível


verificar a localização do antigo forte (figura
em forma de estrela, na cor azul) próximo à
margem do rio Negro. Desenho de 1844, da
Engenharia Militar. Original no Ministério da
Defesa – Arquivo Histórico do Exército, Rio de
Janeiro. Imagem extraída do livro Formação de
42 Cidades no Brasil Colonial, de Paulo Santos,
p. 147.
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

43
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Em janeiro de 1852, foi oficialmente instalada a Província


do Amazonas em Manaus com a finalidade de garantir a soberania do
Império na parte ocidental da Amazônia brasileira e, também, de administrar
as mudanças econômicas e sociais que deveriam ocorrer no seu extenso
território. A posição de capital rendeu recursos à cidade com a chegada,
no mesmo ano, do presidente da província, João Baptista de Figueiredo
Tenreiro Aranha. O primeiro presidente da província se preocupou em
fazer melhoramentos locais e trouxe funcionários. No entanto, um dos
grandes problemas que Manaus enfrentaria naquele momento, e em várias
décadas seguintes, era a falta de mão de obra bem como materiais de
construção (Mesquita, 1999, p. 27). No entanto, com Tenreiro Aranha tem
início a primeira fase de remodelação urbanística da cidade e também a
navegação comercial, oficialmente inaugurada com a primeira viagem do
vapor Marajó, em 1853, que reduziu de dois meses para 10 dias a viagem
entre Manaus e Belém.

Em termos populacionais, ao se tornar capital da província,


em 1852, a população passou pulou de 3.000 para 4.000 habitantes.

Vista parcial da Cidade da Barra do rio Negro a partir do Largo dos Remédios, s/d.

44
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Além da pouca mão de obra, que era basicamente indígena,


e de materiais, Manaus também padecia da falta de gêneros de primeira
necessidade, uma vez que as famílias estabelecidas no local não se dedicavam
à agricultura. Muito do que se consumia era importado e carnes, legumes e
frutas eram escassos. Essa tendência de consumo baseado na importação
de produtos se manteria de forma mais intensa nas décadas seguintes.

Em 1858, a população de Manaus não ultrapassava 4.500


habitantes, entre os 55.000 mil habitantes de toda a província. O aspecto
urbano da nova capital não era muito diferente de anos atrás quanto à
organização e o estado das principais construções. A novidade era a estética
européia que começava a determinar o estilo das construções públicas.

A tropicalidade ainda era o traço mais marcante de Manaus,


ao que conclui Mesquita pelas observações de Lallemant: “apesar do aspecto
da cidade e da formação étnica de sua população, procuravam valorizar os
traços europeus e esconder as características de origem nativa, deduzindo-se
que tornar a cidade ‘mais civilizada’ era vestir-lhe de uma aparência européia
através das obras públicas”. (Mesquita, 1999, p. 38). Esse pensamento foi
um verdadeiro fantasma que rondou o crescimento da cidade resultando
no ápice conquistado na Manaus da Belle Époque.

Nas primeiras décadas da Província, o discurso dos


presidentes continua a apontar a carência de trabalhadores especializados
no Amazonas. A mão de obra indígena regional era a única força utilizada,
tanto por moradores brancos e autoridades provinciais. Todo o trabalho nas
roças, sítios particulares na periferia da cidade (Cachoeirinha, Mocó, São
Raimundo), além do próprio trabalho doméstico, era realizado por índios
trazidos da vizinhança. Para a execução de atividades mais complexas, que
exigiam conhecimentos técnicos específicos, o Governo Provincial recorria à
contratação de profissionais da Corte ou mesmo da Europa. Uma tentativa
do governo em suprir a necessidade de mão de obra especializada foi a
criação do Educandário dos Artífices que possuía oficinas para a formação
profissional de sapateiros, alfaiates, marceneiros, entre outros, e era destinada
a meninos índios.

A partir de 1861, o governo começa a se preocupar em


organizar uma repartição de obras públicas para continuação, ou melhorias
das existentes. No ano de 1867, foi dado prosseguimento à construção da
Matriz, do cemitério São José, e o funcionamento de uma olaria a vapor
que impulsiona a construção civil.

Com a necessidade crescente do governo “embelezar” a


cidade, em 1872 foi promulgado o rigoroso Código de Posturas Municipais
da Cidade de Manaus, que visante, dentre outros, a organização do espaço
urbano, destacando várias proibições como o uso de palha para cobertura
de casas em determinados locais da cidade. A este Código, se sucederiam
outros, sempre com o objetivo de tornar o espaço urbano mais organizado,
tanto no aspecto urbanístico quanto nos hábitos dos moradores, revelando a
preocupação das autoridades locais com o crescimento da cidade e, por meio
deles, procuravam educar a população para a convivência urbana ou citadina.

Civilizar Manaus, não ficou a cargo somente dos códigos,

45
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

a década de 1870 trouxe arborização para a cidade, conclusão de obras


públicas, como o Palacete Provincial, e a preocupação em abastecer a cidade
com água encanada.

Em 1872, Manaus ainda era considerada uma pequena


cidade com apenas vinte ruas, onze travessas, três estradas e sete praças, nas
quais se distribuíam quatrocentas e noventa e quatro casas, sendo duzentos
e cinqüenta e cinco cobertas com telhas e duzentas e trinta e nove com
palha, notando-se que entre as primeiras havia dezoito estabelecimentos.
O gênero de maior exportação era a borracha, seguida pelo pirarucu seco
e outros produtos naturais da região.5

Quando se iniciou a década de 1880, a prosperidade


econômica de Manaus já se fazia notar devido ao despertar do crescimento
econômido advindo da comercialização da borracha, sendo possível levar
a cabo inúmeras obras públicas por meio de empresas contratadas. Em fins
de 1880, a cidade tinha 38.720 habitantes, no entanto a elite que ali havia
se criou a viam como uma aldeia e sonhavam com uma nova cidade que
pudesse se distanciar da imagem da floresta que ainda estava por todo lugar.

Das obras desse período destacam-se o grande números


de aterros em vários pontos da cidade, o calçamento de ruas e da Praça
D. Pedro II, a conclusão da ponte de ferro dos Remédios, desaterro dos
dois lados de cada uma das pontes do igarapés de Manaus e Bittencourt,
e das escadas no cais da Imperatriz. O ano de 1884 foi marcado por mais
construções de melhoramentos de praças e calçamentos de ruas e reparos
em pontes. Tal fato pode ser observado na listagem de obras construídas
em 1884, feito pelo diretor da Repartição de Obras Públicas, Leovigildo
Coelho, à frente dessa repartição desde a sua implantação, Coelho relata a
construção do campo para depósito de gado, escada no cais da Tamandaré,
das Muralhas da Conceição e da rua Municipal além de reparos diversos
(Mesquita, 1999, p. 50).

Nos anos seguintes tais obras continuaram e, em 1886,


foi contratado o serviço pra nivelamento da cidade e iniciadas as obras
do trapiche Princesa Imperial, com a construção de um novo prédio de
alfândega.

Em 1888, a preocupação da Repartição de Obras Públicas


era com a arborização, tendo em vista o clima quente. Nesse mesmo ano,
o presidente da província Joaquim de Oliveira Machado regulamenta o
cargo de chefe da repartição de obras públicas, onde só poderiam assumir
engenheiros civis, geógrafos, agrimensores e bacharéis em matemática. Nessa
reorganização foi nomeado para o cargo o engenheiro Lauro Bittancourt e
Eduardo (Mesquita, 1999, p. 15).

Manaus encerrou o ano de 1889 bastante melhorada


porém ainda tinha o aspecto de uma aldeia, meio “desalinhada”, com
ruas esburacadas e irregulares. Os vários igarapés que cortavam a cidade
estabeleciam os limites de alguns bairros e as ligações entre esses era realizado
por meio de pontes.

5  Francisco Bernardino de Souza, 1873, p. 204 apud Mesquita, 1999, p. 45.

46
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Ponte Benjamin Constant, unia a cidade ao bairro da Cachoeirinha.


Fonte: Álbum Municipal de Manáos – 1929.

Igarapé da Cachoeira Grande.


Fonte: Álbum Amazonas 1901-1902.
47
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O desenho da parte mais antiga da cidade, com ruas estreitas e


mal conservadas ainda mantinha o mesmo feitio. De todos os relatos entre 1800
a 1880, destacam-se na arquitetura apenas a Igreja Matriz de Nossa Senhora da
Conceição, a Prefeitura Municipal de Manaus e o Colégio Estadual D. Pedro
II, talvez os prédios que indicavam certa monumentalidade.
Igreja de Nossa Senhora da Conceição, Xilogravura de Humpert e Michelet, s/d.

Planta de 1852 – Governo de Tenreiro Aranha.

48
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

A partir da Proclamação da República, em 1889, uma


nova etapa teria início para o Brasil no aspecto político e para Manaus
no aspecto econômico com os lucros da exportação da borracha e
maior liberdade adminsitrativa.

Entre 1889 e 1920, a cidade teve um salto de


crescimento. Passou de 10.000 para 75.000 habitantes. Foi justamente
nesse espaço de tempo, que Manaus sofreu seu primeiro grande surto
de urbanização, graças aos investimentos propiciados pela acumulação
de capital, via economia do látex, que desde meados do século XIX
havia se transformado numa das matérias-primas mais importantes
para a crescente indústria nos Estados Unidos e na Europa Ocidental.

Embelezar e modernizar Manaus se constituiu no maior


objetivo dos administradores dessa época. Era necessário que a cidade
se apresentasse moderna, limpa e atraente, para a imigração, o capital e o
consumo. A cidade assumiu, assim, características propriamente urbanas
através do incremento populacional e da montagem e funcionamento
de serviços urbanos, além da proliferação de atividade comercial ampla
e diversificada.

O Modelo Europeu de

Desenvolvimento Urbano

O período mais relevante das transfor mações


urbanas em Manaus ocorreu entre 1892 e 1896 quando teve lugar a
administração de Eduardo Ribeiro, um engenheiro militar que assumiu
o governo do Amazonas aos 28 anos e iniciou uma reforma que deu
visibilidade a Manaus como capital. O plano de governo de Eduardo
Ribeiro poporcionou à cidade todas as modernidades das grandes
metrópoles internacionais, como um novo projeto urbano, vias de
transporte e comunicação. Essa grande modernização só foi possível
graças ao grande acúmulo de capital gerado pela exportação da borracha
a partir de 1890.

O modelo urbanístico adotado era baseado num


traçado em forma de tabuleiro de xadrez. Assim, as novas ruas eram
largas, em traçado reto, e as obras, a partir daí, fizeram com que as
colinas fossem aplainadas, os igarapés aterrados, e as ruas avançassem
em direção à mata.

A parte mais antiga da cidade (planta anterior), voltada


para o rio Negro, foi modificada para se integrar ao novo traçado, que
adentrava trechos da mata.

49
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Planta da cidade de Manaus – 1893.

50
Avenida Eduardo Ribeiro, no início do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.

O novo eixo principal indicava o centro simbólico da


nova cidade. Quando foi inaugurado em 1901, recebeu a denominação de
Avenida do Palácio, posteriormente recebeu o nome de Eduardo Ribeiro,
numa homenagem póstuma ao revolucionário governador.

Para Manaus, o governo de Eduardo Ribeiro significou


um momento de ruptura a partir do qual se lançou as bases de uma nova
cidade, ansiosamente aguardada pela elite por todo o período provincial,
sendo que as reformas urbanas eram vistas como transformadoras da
Manaus aldeia numa capital moderna.

A cidade conquistada enunciava a efetiva viabilidade de civilização em tão


remota paragem: homens “civilizados” vivendo numa cidade subtraída à selva
circundante, embelezada e favorecida pelas benesses do consumo e da engenharia
urbana desenvolvida por europeus e norte-americanos. A intervenção urbana
promoveu aos olhos dos que ali viviam, a superação de um atraso histórico. Graças
à homogeneidade no estilo, nas funções ou nos usos que tiveram os novos espaços,
adveio uma representação de ampla e inequívoca aceitação para os amazonenses
sobre a ‘Manaus antiga”. Este é o cenário urbano da ‘Belle époque manauara’,
por vezes denominado de Manaus moderna (DAOU, 2004. p. 39).

O embelezamento da cidade foi resultado das alterações


urbanísticas e arquitetônicas estimuladas por uma legislação que procurava
modernizar os espaços púbicos e dotar de certas características as
construções, imprimindo nas fachadas dos prédios a estética, harmonia
e racionalidade condizente com as necessidades de ventilação e higiene
exigidas pelo clima.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Praça Oswaldo Cruz, em frente a Igreja Matriz, início do século XX.


Fonte: Jornal A Crítica.

Porém, as modificações radicais do governo de Eduardo Ribeiro


não foram uma invenção regional, muito menos um fenômeno brasileiro. Estão
contextualizadas dentro do espírito da época nos quais os princípios urbanísticos
tinham como paradigma a influência do urbanismo internacional que, no final do
século XIX e início do século XX , começavam a se consolidar e a se difundir no
Brasil e na América Latina através de manuais, tratados, periódicos e congressos.
Por outro lado, a renovação urbana que se verificou em Manaus
não estava atrelada tão somente à questão econômica mas, também, à ideologia da
nova classe republicana de negação do passado colonial e adoção de um modelo de
modernidade urbana representado na Europa e, no caso, Paris, a capital francesa.
Assim, a construção dessas cidades, verdadeiros cenários, era a continuação do
pensamento vigente desde o período imperial e

(...) estava alinhada com o pensamento progressista dos republicanos, que representavam
uma emergente classe social que tinha como proposta urbana criar áreas diferenciadas para
seu próprio usufruto: boulevards abrigando o comércio de luxo, com suas vitrines expondo
a última moda em Paris, casas de chá, livrarias, assim como através da criação de praças
com seus jardins à inglesa, seus coretos e quiosques favorecendo o footing e o lazer, numa
clara política de estetização do espaço público, apoiada por uma legislação segregadora de
usos (SIMÕES Jr., 2007).

A cultura francesa exercia verdadeiro fascínio nas elites


governantes do Brasil em fins do século XIX. A referência urbanística no Brasil era
o plano que o administrador francês Georges-Eugène Haussmann havia realizado
em Paris na década de 1850, quando a malha urbana e viária medieval da área
central daquela cidade foi substituída por largas avenidas, emolduradas por novas
construções esteticamente padronizadas, e servidas por modernos sistemas de
infraestrutura. Esse modelo acabou sendo transplantado para o Brasil de forma

52
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Solenidade pública, início do século XX.


Fonte: Jornal A Crítica.

simplista, denominada por muitos de “haussmannização”, ou seja, a transposição


do modelo de renovação urbana parisiense para outros contextos, mesmo que
estes possuissem uma realidade físico-espacial completamente diferente. O
modelo de Paris era o “remédio para a cura de todos os males urbanos – para
o descongestionamento das áreas centrais, para a melhoria da isolação e aeração
visando a salubridade, para a eliminação dos indesejáveis casarios velhos e
cortiços”. Simões Jr. Afirma que, verdade, era uma apropriação simplista do
projeto francês, enfatizando unicamente a abertura de uma ou mais avenidas,
largas e extensas, e, se possível, convergindo para uma rotonda, “uma praça ao
estilo da Place de L´Etoile”. (SIMÕES Jr., 2007).
Tanto Manaus quanto as outras cidades que abraçaram esse
modelo, foram objeto de projetos de renovação urbana e melhoramentos que,
em maior ou menor escala, em cada caso, contribuíram para a adequação de
suas estruturas físicas às necessidades econômicas do país, em grande parte
condicionadas pelo seu papel no contexto internacional. Manaus tornou-se a
“cidade vitrine”, atendendo às expectativas da elite comercial. No Rio de Janeiro,
então a capital do país, Pereira Passos, por meio de um discurso modernizante,
estabeleceu um novo traçado para a cidade, onde a Av. Rio Branco tornou-se o
eixo simbólico desse novo modelo, seguido por outras capitais brasileiras.
A partir de então, em Manaus foram instalados serviços urbanos
como rede de esgoto, iluminação elétrica, pavimentação das ruas, circulação de
bondes e o sistema de telégrafo sub-fluvial, que garantia a comunicação da capital
com os principais centros mundiais de negociação da borracha.
A monumentalidade dos prédios públicos, o ajardinamento das
praças, a construção de grandes avenidas, a tentativa de recriação de um espaço
cultural europeu por meio de restaurantes com cardápio francês e lojas de luxo,
nortearam as ações do poder público e privado para que Manaus pudesse ser
mostrada como uma cidade moderna tal qual Paris, Madri e Rio de Janeiro.

53
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Aspecto de uma rua, mostrando a


organização e asseio do espaço
urbano, início do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.

54
Teatro Amazonas, início do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.
Ajardinamento de praças, início
do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.

Praça Uruguayana, início


do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.

Vista parcial da rua


Municipal, atual Sete de
Setembro, início do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O Teatro Amazonas é singular nesse projeto de uma cidade


pujante. Foi uma obra excepcional para o seu tempo, construída como uma
jóia da Belle Époque e, no pensamento da elite manauara, capaz de nivelar
Manaus à civilização ocidental.

O teatro se transformou em ponto de referência da cidade


no mundo inteiro. A abertura foi no dia 31 de dezembro de 1896 com uma
Manaus já bem populosa, com cerca de 100 mil habitantes, e se transformou
no símbolo máximo do que se queria representar na Belle Époque. Sua Reservatório de águas – Mocó,
início do século XX.
localização é significativa dessa simbologia uma vez que o prédio podia ser Fonte: Álbum Vistas de Manaus.
visto de todos os lugares da cidade e por aqueles que estavam chegando pelo
rio. A cúpula, representava o Brasil presente também naquele pedaço de
mundo. Em termos simbólicos, então, não é errônea a afirmação de alguns
estudiosos que apontam o Teatro Amazonas como “a grande pirâmide”
de Manaus.

Atrás do teatro foi construído o Palácio do Governo e outro


conjunto de prédios públicos. Dessa forma, a avenida principal terminava
no local onde estariam sediados os órgãos representativos do poder local.

Do governo de Eduardo Ribeiro, portanto, temos a


planificação da cidade, com grandes desaterros e aterros, canalização
de água, construção de pontes, praças, calçamento de ruas, aterro de
igarapés e algumas das grandes construções da cidade como, por exemplo, Palácio da Justiça, início do século XX.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.
o Reservatório do Mocó, o Tribunal de Justiça, o Teatro Amazonas e o
Prédio da Alfândega.

Prédio da Alfândega, agosto de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

56
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

Os Códigos de Posturas Reguladores do

Espaço Urbano

Dentro da construção dessa cidade ideal, os Códigos de


Posturas tiveram grande importância pois, entre outros, estabeleceram as
regulamentações para a abertura de ruas. Funcionavam como instrumentos
do poder público para criar normas visando o estabelecimento de padrões
urbanísticos, bem como procedimentos para convivência dos habitantes.
No entanto, esses códigos privilegiavam um segmento da população que
podia se adequar e financiar o novo estilo arquitetônico exigido (COSTA,
1999, p. 85-127).

Os códigos de posturas, o patrulhamento sanitário e as


inúmeras leis de 1890, foram aos poucos regulando os hábitos de morar,
impondo medidas proibitivas e coercitivas naquilo que representava uma
alternativa de sobrevivência como hortas e criação de animais. Depois,
tais medidas se estenderam aos bairros próximos ao centro: Toco, Mocó,
Colônia Oliveira Machado. Além disso, havia a política de confinamento
da saúde pública onde o cemitério, o hospital da Caridade, o hospício
e o asilo dos alienados foram transferidos para lugares o mais distante
possível do centro, como forma de não interferir na harmonial tanto
visual quanto de costumes da nova cidade.

A nova Manaus surpreendente, inovadora e bela atingiu


dois objetivos, passou a ser vendida nos cartões postais cuja finalidade
era a de informar ao mundo as grandes potencialidades da região e as
oportunidades de investimentos que oferecia e, atender ao desejo da elite
de mostrar para o resto do país, que a cidade podia acompanhar o ritmo
de progresso e prosperidade de outros centros.

Quando se conta, aos que não sabem as belezas de Manaus, todo o seu progresso,
todo o seu maravilhoso poder de sedução, parece que o que se diz é uma nova lenda
da terra encantada, a maior de todas as lendas (...) uma cidade inacreditável
de contos de fadas. (...) parece tudo uma alucinação imensa, um delírio insano,
a ânsia de erguer nas selvas, para os gnomos e duendes, uma cidade cheia de
avenidas e de palácios... Uma cidade incrível que parece um sonho, cidade que é
enlevo dos que vivem em seu conforto e a imensa saudade dos que já viveram no
seu coração fascinante e meigo.6

No início da primeira década do século XX o desenho


da malha urbana já contava com parte significativa das principais
transformações físicas pelas quais passou a cidade. Grandes quantidades
de desapropriações haviam acontecido. As vias que saiam do ponto

6  “Manaus a cidade incrível”, Revista Amazônica, n. 44, julho de 1930 apud DIAS, 1999,
p. 27.

57
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

central da cidade, se estendendo para fora, já estavam traçadas e indicavam


a intenção do poder público em empurrar a selva amazônica para longe,
rumo ao norte, uma vez que as ações que objetivavam a adequação da cidade
à nova demanda populacional também caminhavam no sentido de dotá-la
de um traçado urbano que expandisse seus limites para além do núcleo
urbano provincial, estabelecendo algumas vias de ligação com futuras áreas
de povoamento, investimento no setor de transportes, nivelando aterros,
pavimentação e alargamento de ruas.

Entre 1890 e 1910, duas avenidas se destacaram em Manaus


como principais vias de comercialização de mercadorias importadas e para
exportação, bem como de artigos de luxo, a avenida Eduardo Ribeiro e a
rua Municipal, atual avenida Sete de Setembro.

Vista parcial da avenida Eduardo Ribeiro já com o sistema de bondes em Funcionamento,


início do século XX.
Fonte: Jornal A Crítica.

Propaganda jornalística sobre a avenida Eduardo Ribeiro, início do século XX.


Fonte: Jornal A Crítica.

58
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

O largo calçamento era destinado também aos passeios


regulares. Os bancos, dispostos no calçamento voltados para a avenida
exerciam a função de contemplação do seu interior. A calçada ou passeio
público, servia como prolongamento para botequins e mercearias muito
frequentadas, dispondo suas mesinhas e encenando a aparência de um
boulevard.

Assim, Manaus foi construída para atender a uma demanda


do capitalismo internacional visto que toda a modernização da cidade
atendia ao objetivo de se construir um aparato para atrair investidores e
Casa comercial Vinte e Dois, início profissionais mas, também, procurava atender a nova demanda populacional
do século XX. cujos maiores beneficiados era a elite citadina (profissionais liberais,
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.
autônomos, comerciantes etc.).

Modernizar, embelezar e adaptar Manaus às exigências econômicas e sociais da


época da borracha, passa a ser o objetivo maior dos administradores locais. Era
necessário que a cidade se apresentasse moderna, limpa e atraente para aqueles que
a visitavam a negócios ou pretendessem estabelecer-se definitivamente. A política
seria a transformação de Manaus, defendendo a dominação do grupo que vai geri-
la. Este grupo será constituído pelos extrativistas e aviadores, todos ligados ao
capital financeiro internacional, com estreita conexão com o poder público local
(DIAS, 1999, p. 30).

Casa comercial Quintas, início


do século XX.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.

A Construção da Periferia

Casa comercial Canto das Novidade,


início do século XX.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.

59
Periferia de Manaus, s/d.
Fonte: IBGE.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O código de Posturas de 1910, proibia o uso da palha


para cobrir as casas, material considerado antiestético e insalubre. Em
substituição orientava o uso do zinco ou o alumínio. Essa proibição,
entre outros motivos, era para enterrar a memória indígena, cuja
predominância cultural era vista como sinal do atraso amazônico. Os
moradores que não podiam obedecer ao Código de Posturas eram
empurrados para a periferia mais próxima: Mocó, Girau, Estrada do
Telégrafo, São Raimundo, Flores, Educandos, Constantinópolis e Colônia
Oliveira Machado. Entretanto o projeto urbano que modernizou a capital
da borracha não teve como prioridade reformas que privilegiassem a
população trabalhadora, migrante ou nativa, que era a mão de obra que
dotava a cidade de infraestrutura e prestação de serviços urbanos, suporte
necessário para o crescimento da população. Entre o perímetro urbano e
a periferia havia os igarapés, verdadeiras estradas de ligação, mas o poder
público não promovia aterros ou mesmo reformas nas pontes existentes.

Quando foram introduzidos como transporte público,


em 1899, pela empresa Manaus Raiway os bondes tiveram um papel
fundamental na ligação entre os vários bairros periféricos da cidade,
bem como deram a direção da expansão urbana7. As linhas de bondes
alcançavam, ao norte, os bairros da Vila Municipal e Mocó, seguindo
para a Colônia Maracaju (onde se formou o incipiente subúrbio de
Flores), na época bairros populares e, igualmente, lugar dos banhos de
igarapé das famílias pertencentes a um segmento médio urbano. Ao sul,
localizava-se o perímetro urbano central, contornando a área portuária.
A leste, chegava-se ao bairro Tocos – onde estava a Usina de Bondes do
Plano Inclinado. A oeste, a usina de viação ao final da rua Municipal,
alcançando-se parte do Bairro da Cachoeirinha8.

Com a crise gerada na Primeira Guerra Mundial, houve


uma dispersão das classes para os subúrbios da cidade. Muitas casas
comerciais abriram falência e a crise da borracha piorou o quadro de
desemprego que já ocorria desde 1912, e parte dos inquilinos do centro
partiu para a periferia.

No final de 1920, se acentua o processo de periferização


da cidade para outras direções, fato que se mantem nas décadas seguintes.

O cearense foi o migrante em maior número na


Amazônia e em Manaus. Havia um grande preconceito em relação aos
nordestinos – ao mesmo tempo em que era a força de trabalho que servia
às obras públicas e aos seringais – e um engrandecimento do imigrante
europeu visto como aquele capaz de desenvolver a cidade.

O crescimento populacional ocorria pelo processo


migratório e no período de chuvas, dezembro a março, quando os Migrantes nordestinos com destino à Amazônia, s/d.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.

7  COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem urbana. Trabalhadores
urbanos em Manaus (1890/1915), p. 122 in FENELON, Déa Ribeiro (org.). Cidades. São
Paulo: Editora Olho D’água. Programa de Pesquisa Pós-graduados em História, série Pes-
quisa em História, 1999.
8  Os bondes têm uma importância para a compreensão do aspecto de expansão urbana
porque a iconografia cartográfica representou como cidade apenas o que as leis municipais
definiam como perímetro urbano marcado pelos bondes.

60
Aspectos Históricos do Desenvolvimento Urbano de Manaus

seringueiros vinham para Manaus realizar transações comerciais, lotando


hotéis e pensões.

Em relação à concentração de residências e o número


de habitantes em fins do século XIX, tomamos como referência o
recenseamento geral da República, realizado em 1890, com o objetivo de
destacar o número de analfabetos na população. Por esse recenceamento
é possível verificar que havia no município de Manaus naquele ano (1890),
38.720 habitantes. Em relação ao número de ruas, o levantamento feito
pela Intendência Pública, em 1906, aponta o número de 24 ruas no centro
da cidade, local que abrigava mais da metade da população de Manaus.9

Denominação das ruas seguida pelo número de habitantes


(Dados relativos a 1900).

Dr. Almínio, 123, Lima Bacury, 323, Ramalho Júnior, 207, Andradas,
296, Mundurucus, 335, Visconde de Porto alegre, 125, Guilherme
Moreira, 70, Remédios (rua), 747, Remédios (praça), 158, Leovegildo
Coelho, 190, José Paranaguá, 401, Marcílio Dias, 272, Constituição,
52, Demétrio Ribeiro, 119, Barés, 176, Constantino Nery, 32, Beco da
Cadeia, 8, Tenreiro Aranha, 72, Quintino Bocaiúva, 395, Dr. Moreira,
379, Cândido Mariano, 122, Bittencourt, 58, Beco do comércio, 24
e Isabel, 267.

Em 1903, havia no perímetro urbano e suburbano de


Manaus 5.500 casas, relacionadas para o imposto predial, nesse número
não se incluiam muitas barracas cobertas ou fechadas com palha, taboas
de caixas de querosene e batatas ou com folhas de latas cortadas, onde
residiam famílias pobres e numerosas (CAMPOS, 1988, p. 100).

Os estrangeiros ficavam em sua maioria nas ruas


Munducurus, rua dos Remédios, rua Marcílio Dias, Demétrio Ribeiro,
Rua dos Barés, Constantino Nery, Tenreiro Aranha, Beco do Comércio.

HABITANTES/
ANOS
MANAUS
1872 29.334

1890 38.720

1900 50.300

1920 75.704

9  Dado relativo a 1900 in COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem
urbana. Trabalhadores urbanos em Manaus (1890/1915), p. 104 in FENELON, Déa Ribeiro
(org.). Cidades. São Paulo: Editora Olho D’água. Programa de Pesquisa Pós-graduados em
História, série Pesquisa em História, 1999.

61
Modos de Viver na
Belle Époque Manauara
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Manaus, situada ao sul do estado do Amazonas, quase


desabitado, cerca de mil e quinhentos quilômetros do Oceano Atlântico,
envolta numa floresta exuberante, era mais um povoado isolado do mundo
até a metade do século XIX, quando a ascensão da borracha no mercado
estrangeiro proporcionou uma revolução, urbana e social. A transformação
urbana acompanhou o ritmo de crescimento vertiginoso da economia,
impondo uma nova identidade visual bem como um novo estilo de vida,
denominado de Belle Époque.

Segundo o dicionário Houaiss, Belle Époque é definido como


uma fase de euforia e despreocupação vivida especialmente na Europa, entre
1871, final da guerra franco-prussiana, e 1914, ano do início da Primeira
Guerra Mundial, caracterizada por grande produção artística, literária e bom
desenvolvimento tecnológico. Em Manaus, essa fase se traduziu em um
comportamento europeizado durante os anos em que a economia gomífera
atingiu o auge em termos de ganhos, condizente com a cidade que emergira,
financiada pelo acúmulo de capital.

O responsável pela criação da Manaus cosmopolita foi


Eduardo Ribeiro (1892 – 1896) ao impor um traçado urbano internacional,
com ruas largas, formando um vasto quadrilátero emoldurado por prédios e
mansões. Leandro Tocantis diz que antes de Eduardo Ribeiro, a topografia
da cidade se dava por cortes hidrográficos: era o Igarapé do Salgado, o
Igarapé Castelhana, o Igarapé da Bica, o do Espírito Santo, o de Manaus,
o da Cachoeirinha, o de São Raimundo e dos Educandos (TOCANTINS,
1983, p. 190). Após a reforma positivista do jovem governador, a cidade
estava à altura de ser a capital do Amazonas e pronta para atender aos
ricos comerciantes e as famílias abastadas. Havia bancos ingleses, prédios
administrativos, dezenas de escolas primárias, um palácio da Justiça. Os
habitantes tinham à sua disposição várias facilidadades consideradas como
luxo para a época, entre eles, o sistema telefônico ou telegráfico da Amazônia.

Richard Collier chega a enumerar os serviços disponíveis na


“nova” capital. Havia o Grand Hotel Internacional, considerado como um
dos mais belos da época, aproximadamente 24 bares, 23 grandes magazines
de luxo, quinze grandes restaurantes, trinta e seis médicos, quase uma dezena
de modistas e alfaiates, bem como inúmeros salões de beleza, salas de bilhar Casa de Modas Au Bon Marché, uma das inúmeras
e livrarias. (COLIER, 1970, p. 21). existentes em Manaus, início do século XX.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus.
As nacionalidades eram diversas. Portugueses, turcos,
italianos, ingleses, peruanos, bolivianos , austríacos, alemães, americanos,
chineses, árabes e, até mesmo, russos compunham a aristocracia da cidade
e transitavam com mamelucos e poucos índios, pois o espaço urbano era
predominantemente branco (COLIER, 1970, p. 09).

Havia, inclusive, certa divisão de atividades de acordo com


a nacionalidade. Por exemplo, os ingleses, franceses, alemães e portugueses

64
Modos de Viver na Belle Époque Manauara

vinham para dirigir os trabalhos da borracha, enquanto os espanhóis,


italianos, sírios e libaneses imigravam para se dedicarem a outros tipos de
negócios na capital1. As modistas eram parisienses, os banqueiros de Stuttgart,
comerciantes de Lisboa e engenheiros de Liverpool, tudo para atender as
exigências da nova elite que ali se formara.

No comércio havia uma predominância inglesa. Eram eles


que comercializavam a borracha e monopolizavam o único banco de Manaus,
o que contribuía para a circulação da libra quase tanto quanto o dinheiro
brasileiro.

O comportamento cosmopolita da cidade deveu-se, assim,


aos estrangeiros que chegaram no Amazonas na década final do século XIX
e no início do século XX. Muitos eram ligados à exportação e importação
ou funcionários das firmas prestadoras de serviços urbanos e de navegação
e, em menor número, havia os profissionais liberais.

A rua Municipal, concentrava inúmeros estabelecimentos comerciais, início do século XX.


Fonte: Jornal A Crítica.

Esses moradores passaram a viver nos novos bairros, nos


quais as ruas seguiam o traçado geométrico do centro, sem a insalubridade dos
igarapés. A construção das casas refletia um estilo de vida distinto, com uma
nítida separação entre os locais de moradia e os de trabalho, valorizando-se
as residências situadas em amplos terrenos ou chácaras. No estilo das casas e
na disposição dos jardins e pomares, ficava expressa a diversidade das origens
dos que ali passaram a viver.

1  MOTA, João Nogueira da , “Flagrantes da Amazônia” Manaus, 1960, p.125 apud BURNS,
E. Bradford. Manaus, 1910 retrato de uma cidade em expansão (tradução Ruy Alencar). Manaus:
Separata do Jornal de Estudos Inter Americanos, Vol. VII. N. 3. Julho de 1965. Universidade
de Miami, Coral Gables, Florida, USA)., 1966).

65
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Daou explica que um dos fatores para a rápida urbanização


do modo de vida em Manaus foi a abertura dos portos ao comércio universal,
no final do século XIX, que agilizou as comunicações e a chegada de bens
de consumo diversos aos portos amazônicos (DAOU, 2000, p. 14). Por
toda a Belle Époque, os jornais anunciavam os artigos chegados do exterior
desembarcados no porto flutuante, inaugurado em 1903, com moderna
tecnologia inglesa.

A importação não era decorrente somente do gosto, mas da


necessidade de produtos, uma vez que atividades agropecuárias praticamente
inexistiam por causa da concentração de mão de obra nos seringais.

Como quase tudo era importado, Manaus tornou-se


uma cidade tão ou quase tão cara quanto Nova York. Entre os alimentos
importados havia o chucrutes, da Alemanha, a salsicha, da Inglaterra, a
mortadela, de Milão etc. E não era só a comida que vinha de fora. Manaus
era vila dos elegantes e dos dandis. Os homens, em geral, usavam o traje
completo da moda que incluía chapéu, camisas irlandesas, calças brancas,
coletes e gravatas com diamantes encravados, robes parisienses e bolsas de
crocodilo (COLLIER, 1970, p. 25).

A mudança nos costumes se dava pelo constante trânsito de


pessoas que deixavam o Amazonas e o Pará para viajar para a Europa e vice-
versa. Muitas famílias enviavam seus filhos para estudar no Rio de Janeiro,
na França, em Portugal, na Alemanha e na Inglaterra.

Assim, a presença regular de navios de vários países veio


garantir grande parte do abastecimento da capital, favorecendo a implantação
de um tipo de gosto e de consumo que valorizava o que vinha de fora e
enfatizava todos os sinais que promovessem uma aproximação com as capitais
européias, tidas como o paradigma do progresso e da civilização.

Segundo Fenelon, são as relações sociais desenvolvidas na


cidade que acabam por definir a paisagem urbana (FENELON, 1999, p.
6) e, no caso de Manaus, a recíproca também foi verdadeira. A criação de
remodelação urbana trouxe a ampliação dos espaços sociais intensificando
e transformando os usos tradicionais das esferas de sociabilidade.

É no dinamismo da vida social, na multiplicação das interações sociais, que a belle


époque amazônica parece ter sido mais espetacular. Praças reformadas com jardins,
sofisticado mobiliário urbano em ferro fundido, bancos, coretos para tardes com bandas
municipais, festas religiosas, procissões, boi-bumbás, opíparas merendas, encontros
promovidos pelas sociedades reuniões dançantes realizadas em salões da sociedade.
Agremiações e entidades as mais diversas e numerosas, associações partidárias,
lojas maçônicas, clubes de diferentes procedências nacionais, sociedades musicais e
agremiações científicas (DAOU, 2000, p. 41-42).

Em Manaus, verifica-se, então, uma clara definição do mundo


urbano com espaços específicos para morar, trabalhar e para a realização
de atividades de lazer, que incluía o consumo cultural, bailes, cervejarias

66
Modos de Viver na Belle Époque Manauara

e o teatro, em detrimento do típico lazer relacionado à natureza, como os


banhos de rio. Dessa forma, pode-se dizer que a introdução de um traçado
urbano racionalista não mudou apenas o aspecto urbanístico da cidade, mas
concorreu para impor um ritmo comportamental tipicamente urbano aos
moradores, para surpresa dos que chegavam na cidade pela primeira vez.

Burns relata que muitos visitantes viajavam milhares de


quilômetros para conhecer Manaus. Muitos “ficavam surpresos” com o que
encontravam. E esse espanto também se dava pelo fato da cidade de Manaus
estar “aprisionada” no meio de uma vasta e sedutora floresta.

“O visitante recém-chegado entrava na Praça do Comércio, limpa, arborizada e com


sua inevitável fonte, no caso uma com querubins pintados com muita fantasia. Por trás
da praça a cidade se expandia sobre colinas suaves. Quatro dessas elevavam os prédios
mais importantes a posições de proeminência. Um pouco à esquerda, ainda em frente
do visitante, elevava-se a grande catedral, no estilo arquitetônico austero dos Jesuítas.
Mais à esquerda, sobre outra elevação, encontra-se a mansão governamental, em estilo
neo-clássico. A colina diretamente à frente do observador, recebia os prédios públicos,
e era coroada pelo magnífico Teatro Amazonas, uma das esplêndidas casas de ópera
daquele tempo. Á direita, a imponente biblioteca estadual, com seus dez mil volumes,
e um dos melhores hotéis da cidade, o Grande Hotel. Esta capital de 50.000 mil
habitantes, era cercada por um anel de aço de quinze milhas de trilhos, cujos bondes
chegavam e saíam da praça.” (BURNS, 1966, p. 6-7).

Entre 1890 e 1900 havia clube para tudo e para todos. Burns
lembra que, proporcionalmente, Manaus suplantava as outras maiores cidades
luso-brasileiras em capacidade de entretenimento. Com seus 50.000 habitantes
O cinema foi uma atividades de lazer na Manaus da contava com cinco “casas de diversão”, uma para cada 10.000 pessoas; o Rio
Belle Époque, início do século XX.
Fonte Jornal A Crítica. de Janeiro, com seus 800.000, tinha onze , uma para cada 73.000 pessoas.
(BURNS, 1966, p. 10).

Homens praticando tiro em Manaus, início do século XX.


Fonte Jornal A Crítica.

67
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Apesar do domínio comercial inglês, o gosto dos moradores


para a moda e para a mesa era o francês. A língua francesa, inclusive, era a única
ensinada nas escolas normais (como se podia observar na educação da classe
abastada brasileira no resto do país). Havia os jornais, o teatro – que apresentava
peças francesas – e os restaurantes que ofereciam iguarias da França (escargot e o patê
de foie) que eram preferidos aos pratos brasileiros. Até os menus eram em francês.
Os passeios ao ar livre faziam parte da rotina social dos moradores
e a avenida Eduardo Ribeiro e a Praça do comércio eram locais habituais para essas
atividades.

“Á proporção que pessoas de todas as classes passeavam ociosamente pelas ruas e praças
trocando palavras amigáveis entre si, os restaurantes e cafés com calçadas à frente começavam
a ferver de gente. Trios, quartetos e quintetos davam os primeiros acordes nos principais
restaurantes, e o fim da tarde criava vida com melodias de Strauss, Schubert, Lehar, Puccini,
Wagner e Pacheco. Muitos deles se especializavam no chá das cinco horas. Pastelarias francesas
e alemãs eram oferecidas por outros. O café era consumido em toda parte”. (Burns, p. 12-13).

Nas primeiras horas da noite, as casas de lazer e os cinemas ficavam


lotados. O Teatro Amazonas, quando havia apresentação, recebia os elegantes da
cidade.
Para Manaus, o Teatro Amazonas representou um lugar especial,
o grande palco onde a alta sociedade agregava todos de uma mesma posição social
e que tinham ali a oportunidade de exibir sua riqueza, especialmente nas vestes.
Frequentar um a temporada lírica, mesmo que não fosse do gosto
ou do entendimento do público, era uma forma de distinção da elite assim como os
banquetes e os bailes. Nessas ocasiões era comum que se distribuíssem jóias como
lembrança da ocasião e sinal da riqueza e do consumo da Belle Époque. Jóias eram
um tipo de riqueza móvel, sinal de posição, e esse tipo de ostentação representa
bem o excesso de consumo tanto de bens de luxo quanto de iguarias. Collier
afirma que o consumo de diamantes em Manaus era um dos mais altos do mundo.
(COLIIER, 1970, p. 27). Embora o destino do Teatro fosse a ópera, foram poucas as
apresentações líricas; predominavam outras manifestações artísticas como operetas,
zarzuelas e, posteriormente, os espetáculos com o cinematógrafo (DAOU, p. 53).
Além da infraestrutura urbana e de lazer, Manaus também
contava com certas comodidades como câmaras frigoríficas e fabricação de gelo
que permitiam a conservação dos alimentos importados e a possibilidade de servir
cerveja e chope gelados em bares e confeitarias, como em qualquer outra grande
capital do mundo. Essas eram, aliás, as bebidas que animavam a sociabilidade
masculina, quando ao final do dia se reuniam nos clubes ou nos bares os recebedores
da borracha, fiscais da alfândega, representantes das firmas seguradoras e das
companhias de navegação, responsáveis pela saída da contrapartida amazônica na
tonelagem dos navios que cortavam o Atlântico em direção à Europa, os Estados
Unidos ou ainda o Rio de Janeiro. Refrescados pelo chope gelado ou pela cerveja,
viam a cotação da borracha, comemoravam a chegada de mais um navio inglês
carregado de mercadorias, liam os jornais com notícias de periódicos franceses ou
traduzidas no Jornal Amazonas, um dos principais jornais de Manaus. Mantinham
assim a proximidade com a Europa.
Aglomeração no porto flutuante de Manaus,
Em 1910, quando a borracha brasileira dá indícios de declínio início do século XX.
no mercado mundial, foi construída a Cervejaria Miranda Corrêa, que abastecia Fonte: Jornal A Crítica.

68
Modos de Viver na Belle Époque Manauara

Manaus com cerveja XPTO, refrigerante e gelo, além de promover bailes para a alta
sociedade tornando-se importante referência da Manaus desse período.
Apesar do excelente sistema portuário, serviço de coleta e
disposição de lixo eficiente, eletricidade, serviços telefônicos, belos edifícios públicos,
residências confortáveis, que atestavam a modernização da cidade, Manaus não
deixou de ser a capital da floresta, com infestações de malária e de outras doenças
decorrentes da pobreza e da falta de saneamento adequado do seu entorno.
A década de 1910 marca internacionalmente o fim da Belle
Époque, e expressa a dissolução da organização econômica do início do século
XX, contexto que certamente incluía a Amazônia. Em 1910, o preço da borracha
atingiu seu ápice, iniciando, em seguida, um declínio irreversível que atingiu
definitivamente a cidade.
Enquanto os estados do sudeste e do sul buscavam novas
soluções econômicas, o Amazonas sonhava, sem sucesso, com a recuperação da
borracha, pois não conseguiu acompanhar as transformações do capital no cenário
internacional e interno. Sem uma burguesia industrial e financeira, com uma classe
média palperizada e o setor rural em processo de agonia econômica, o estado passa
por um longo período de estagnação econômica, que só será novamente dinamizada
com a criação da Zona Franca de Manaus, nos anos 70.
Citamos, abaixo, trechos das cartas do fotógrafo George Hubner,
ao amigo Kock-Grunberg, que retratam a situação dos moradores de Manaus após
a queda comercial da borracha. Hubner, de nacionalidade germânica, morou na
cidade por 40 anos.

“O que poderia escrever-lhe daqui (INTERROGAÇÃO), a situação é tão desesperadora


que não poderia ser pior (...) Primeiro, o preço da borracha não parou de cair; depois foi o
Casa de Shopps na avenida Eduardo Ribeiro, valor das moedas estrangeiras; e agora, tudo está parado. Manaus era tão animada antes!
início do século XX.
Fonte: Álbum Vistas de Manaus. Agora, fileiras inteiras de casas, nas ruas que eram as mais frequentadas, estão vazias, e
cada vapor que sai para o sul vai lotado de passageiros fugindo de Manaus.
As pessoas sem fortuna que não podem pagar a viagem vão para os sítios no interior, de
forma que a cidade se esvazia cada vez mais. Neste momento, os negócios estão parados; (...)”2

“(...) hoje Manaus está deserta, mesmo sendo a época da colheita da castanha-do-pará, cujo
comércio atenua um pouco o prejuízo da borracha. Mas em maio as castanhas terão acabado
e só Deus sabe o que acontecerá então. Muitos comércios já fecharam e muitos outros deverão
fazer o mesmo dentro de pouco tempo. No interior, ao longo dos rios, a miséria gerou a
anarquia, os vapores e as lanchas que ali chegam são atacadas pela população faminta. Se
o governo federal não encontrar rapidamente meios de enfrentar uma tal calamidade , não
sabemos o que será do Estado do amazonas.”

Da Belle Époque ficaram o teatro, o traçado urbano que possibilitou


a construção de uma cidade moderna, prédios e praças que compunham a Manaus
da borracha. Hoje todos esses elementos, fazem parte da Manaus atual mas são
também marcos de uma época, espaços de memória.

2  Techo da carta do fotógrafo alemão e morador de Manaus George Huebner ao amigo, o


etnólogo Kock-Grunberg, em 5 de junho de 1915 e 15 de abril de 1921, in SCHOEPF, Daniel.
George Huebner 1862-1935 – um fotógrafo em Manaus. São Paulo: Metalivros, 2000, p.68-69.

69
A Influência da Zona Franca
no Desenvolvimento de Manaus

Configuração Atual da Cidade


Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Com a impossibilidade de se retomar o “ciclo da borracha”, ou outro tipo


de recurso que gerasse desenvolvimento, a região amazônica viveu uma fase de estagnação
econômica. No início dos anos 50, o governo federal tinha desenhado um Plano de Valorização
Econômica da Amazônia e, em 1957, foi criada a Zona Franca, por meio da lei 3.173 de 1957,
regulamentada em 1960, quando foi instalada numa pequena área do porto de Manaus. O
objetivo, naquele momento, era melhorar as condições de abastecimento da bacia amazônica,
bem como incrementar o comércio com países vizinhos.
Em 1967, o governo federal determinou uma política para desenvolvimento
da Amazônia – a chamada Operação Amazônia – que pretendia o desenvolvimento econômico
e a povoação da região, calcado no mito do “vazio amazônico”.
Nesse contexto, a zona franca foi criada formalmente em 1967, com a
instalação da Superintendência da Zona Franca de Manaus – SUFRAMA, efetivada no início
dos anos 70 com a implantação do Distrito Industrial na Zona Leste da cidade. Reestruturada
pelo Decreto-Lei nº 288, de 28 de novembro do mesmo ano, passou a ter isenção fiscal, com o
objetivo de oferecer vantagens fiscais para atrair investidores e, com isso, desenvolver a economia
regional. No seu artigo primeiro, ficava estabelecido que “A Zona Franca de Manaus é uma
área livre de comércio, de importação e exportação e de incentivos fiscais, estabelecida com
a finalidade de criar no interior da Amazônia um centro industrial, comercial e agropecuário
dotado de condições econômicas que permitam o seu desenvolvimento, em face dos fatores
locais e da grande distância que se encontram os centros consumidores de seus produtos.”
Além da possibilidade de se ocupar uma região “despovoada”, buscava dotá-la
de infraestrutura que atraísse força de trabalho e capital nacional e estrangeiro, imprescindíveis
para a dinamização das forças produtivas locais, além de condições de inserção na economia
global.
Para atender as novas demandas comerciais e de pessoas que visitavam Manaus
com finalidade comercial, a cidade foi remodelada, reformada, ampliada. Com a implantação
de empreendimentos econômicos no centro de Manaus houve a ruptura da cidade da borracha
para outra que surgia. A classe média, até então habitante tradicional do centro, foi para a
periferia, já em processo de urbanização.
Em 1968 foi definida a área do distrito industrial, que ficava distante cerca
de 5 quilômetros do centro da cidade. O distrito industrial de Manaus foi formado por cerca
de 500 indústrias, que chegaram a gerar mais de 100 mil empregos diretos, tornando-se um
forte pólo de atração de mão de obra, provocando a intensificação do fluxo migratório para
a capital do Amazonas, principalmente dos municípios do interior do estado, dos estados
vizinhos (particularmente do Acre e do Pará) e da região Nordeste, com destaque para o
Ceará e Maranhão.
Dessa forma, a Manaus atual é produto do processo gerado pela Zona Franca
que desencadeou a explosão demográfica, maior do que a do próprio estado, como pode ser
verificado na tabela ao lado1, e de uma expansão acelerada, tornando caótico o espaço urbano
da cidade.
Portanto, a história de Manaus que começou em 1699, com a construção do
Forte de São José do Rio Negro registrou dois momentos de acentuada importância econômica
e social, o primeiro, com o ciclo da borracha, entre a última década do século XIX e a primeira
do século XX e, o segundo, a partir de 1967, com a implementação da Zona Franca de Manaus,
cujos desdobramentos na atual configuração da cidade atingem diretamente a presevação dos
bens culturais local.

1  Censos demográficos de 1972 a 2000, IBGE – Adaptado de Heyer (1998) apud SILVA NETO, 2001, p. 35.
72
Mapa da evolução urbana de Manaus

Fonte: Instituto de Planejamento Urbano e Informática – Implurb da Prefeitura Municipal de Manaus

1 - Centro 9 - Vila da Praia 33 - Mauazinho


2 - Aparecida 10 - Compensa 34 - Col. Antonio Aleixo
3 - Presidente Vargas 11 - São Jorge 35 - Puraquequara
4 - Praça 14 de Janeiro 12 - Santo Agostinho 36 - D. Pedro I
5 - Cachoeirinha 13 - Nova Esperança 37 - Flores
6 - São Raimundo 14 - Lírio do Vale 38 - Parque 10
7 - Glória 15 - Planalto 39 - Aleixo
8 - Santo Antonio 16 - Alvorada 40 - Adrianópolis
17 - Redenção 41 - N. S. Das Graças
18 - Bairro da Paz 42 - São Geraldo
ANOS AMAZONAS MANAUS MAO/AM
19 - Raiz 43 - Chapada
1872 57.610 29.334 50,9 20 - São Francisco 44 - Col. Santo Antonio
1890 147.915 38.720 26,2 21 - Petropolis 45 - Novo Israel
1900 249.756 50.300 20,1 22 - Japim 46 - Col. Terra Nova
23 - Coroado 47 - Santa Etelvina
1920 363.166 75.704 20,8 24 - Educandos 48 - Monte das Cumbras
1940 438.008 106.399 24,3 25 - Santa Luzia 49 - Cidade Nova
1950 514.099 139.620 27,2 26 - Morro da Liberdade 50 - Ponta Negra
27 - Betânia 51 - Tarumã
1960 708.459 173.703 24,5
28 - Colônia Oliveira Machado 52 - Armando Mendes
1970 955.235 311.622 32,6 29 - São Lázaro 53 - Zumbi dos Palmares
1980 1.430.314 634.756 44,4 30 - Crespo 54 - São José Operário
31 - Vila Buriti 55 - Tancredo Neves
1990 2.103.243 1.011.501 48,1
32 - Distrito Industrial 56 - Jorge Teixeira
2000 2.840.889 1.403.796 49,41
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Configuração Atual da Cidade

A área central de Manaus concentra o comércio e nas áreas adjacentes


ao centro histórico, se localiza a zona portuária.
O núcleo da cidade, cujo contorno é dado pela rua Ramos Ferreira,
avenida Getúlio Vargas, avenida Epaminondas, avenida Floriano Peixoto e rua Marquês
de Santa Cruz, é a área com maior concentração das atividades econômicas. É o centro
das decisões e de serviços, com a presença dos escritórios centrais das principais empresas,
bem como das agências bancárias. O poder público tem forte presença nessa área que
concentra secretarias, delegacias fiscais e outros órgãos. Nesse espaço, há também
construções históricas, remanescentes do período áureo da borracha, que tem como
símbolo principal o Teatro Amazonas, localizado na Praça de São Sebastião.
Partindo do teatro em direção ao rio Negro, além da predominância do
comércio varejista e do setor de serviços, há grande número de camelôs e da população
excluída que habita as ruas. Essa situação é agravada pelo fato de que nessa área trafegavam
a maioria absoluta dos veículos, incluindo 80% da frota de transporte coletivo rodoviário,
que desemboca no terminal da Igreja matriz (dados de 2001).
Na zona periférica do centro estão localizadas várias repartições públicas,
com destaque para a Assembléia Legislativa do Estado e a Câmara dos Vereadores,
ambas situadas bem próximas ao cais do porto que recebe, diariamente, centenas de
embarcações que transportam cargas e passageiros. A zona periférica do centro se
estende, no sentido norte e leste, a partir do núcleo central pelas vias principais de acesso
e saída dessa área, como a rua Joaquim Nabuco e as avenidas Sete de Setembro e Getúlio
Vargas, que concentram grande quantidade de hotéis e pensões, enquanto nas avenidas
Leonardo Malcher, Constantino Nery e Boulevard Álvaro Maia o comércio é intenso
(SILVA NETO, 2001, p. 74).
A partir da área central, onde se localiza o núcleo original, e da periferia
imediata, onde estão situados os bairros mais antigos e consolidados, podemos observar
que a malha urbana de Manaus afastou-se do rio Negro, expandindo os domínios da cidade
pelas terras firmes e margens de igarapés, de forma tanto acelerada quanto desordenada.
A periferização da cidade constitui a marca fundamental do processo
urbanístico manauara entre 1960 e 1994, até porque a zona urbana da cidade passou por
um processo de inchaço populacional e não tem mais comportado seu contingente que,
cada vez mais, se dirige às zonas periféricas, tomando as áreas chamadas de expansão
urbana, em uma ocupação desordenada, rápida e agressiva.
A extensa periferia urbana de Manaus é constituída principalmente de
migrantes, da parcela da população natural do município que mudou de residência em
função da busca de novos espaços, e da população removida da área central nos anos 60.
Até a década de 80 do século XX, o número de bairros era de
aproximadamente 37, mais o distrito industrial. Dados de 2007, mostram a existência
de 56 bairros e inúmeras comunidades, muitos originários de ocupações irregulares e
sem reconhecimento oficial
74
A Influência da Zona Franca no Desenvolvimento de Manaus

O fato é que o grande crescimento urbano de Manaus verificado nas


últimas décadas foi o maior da região Norte, estando atualmente entre os 10 maiores
centros urbanos do país, tornando a capital do Amazonas uma metrópole regional,
superando Belém.
Os bairros que constituem a zona centro sul são considerados os
mais bem servidos com estrutura e equipamentos urbanos na cidade. Por terem uma
posição geográfica privilegiada que lhes garante acessibilidade, constituem um ponto de
convergência do comércio e serviços que estão se descentralizando dos segmentos da
área central da cidade.
Concluindo, verifica-se que atualmente Manaus é o oitavo município
brasileiro mais populoso, abrigando quase metade da população do estado do Amazônas.
Nos últimos dez anos, Manaus apresentou a maior taxa de crescimento anual, em
comparação com os municípios mais populosos do Brasil.
Esse grande crescimento urbano, aliado à falta de um planejamento
adequado, provocou uma concentração demasiada na zona urbana de Manaus, em
especial na região sul, importante em termos históricos, pois foi por onde a cidade
iniciou seu processo de desenvolvimento e que ainda tem construções significativas e
passíveis de preservação. Essa área atualmente corresponde a 4% do total do município,
(NOGUEIRA, 2006). No entanto, possui uma enorme concentração de comércio,
serviços e transporte público e, pensar em preservação nessa área, pressupõe o tratamento
conjunto das dinâmicas sociais e políticas.
Do estudo sobre o período áureo da exploração da borracha na amazônia,
depreende-se o fato de que esse produto significou para aquela região o mesmo que o ouro
nas Minas Gerais. Lenadro Tocantis chama a borracha de “ouro negro”, expressão que
trazuz todo o sentido que essa economia se tornou para o desenvolvimento daquela parte
do Brasil. O desenvolvimento das capitais do Norte em metrópoles regionais, equipadas
ao gosto da época, torna a questão geográfica fator determinante para valorização do
patrimônio material amazonense, na cidade de Manaus.
Atualmente, a cidade de Manaus já tem uma área protegida, que engloba
parte da área do processo de ocupação pioneira da cidade.
Embora já estejam circunscritas nessa área o porto, a alfândega, o
mercado Adolpho Lisboa, prédios administrativos, praças, a Igreja de Nossa Senhora
da Conceição e ruas comerciais importantes do início do século passado, fica fora desse
perímetro a maior parte do traçado urbano, bem como grande parte de prédios públicos
e privados representativos do período econômico marcado pela exploração da borracha,
que possibilitou a construção da Manaus moderna, ou da Belle Époque, que fundamentou
o sentido da existência da Manaus atual.
Construída em um curto espaço de tempo, entre 1890 e 1910/20, a
“Manaus da Belle Époque”, assim como Belém, representa a força do poder econômico gerado
pela exploração e comercialização da borracha na Amazônia entre o final do século XIX e
início do XX. Tem como principais características a arquitetura em estilo eclético e o traçado
urbano de inspiração racionalista.
O plano urbano da cidade, criado na administração de Eduardo Ribeiro
(1892 – 1896), ainda pode ser verificado. Dentro desse traçado, ainda permanecem inúmeros
prédios públicos e privados que mantêm sua originalide sendo que os mais destacados, em
geral, são aqueles que já possuem tombamento estadual e/ou compõem a lista de interesse
de preservação pelo município. Além desses, vale destacar alguns pequenos conjuntos de
casas que exprimem a variedade do eclético construído na cidade, no período em questão.

75
O Ecletismo e o
Desenvolvimento Urbano
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O Ecletismo, enquanto produção arquitetônica que se iniciou


no século 19 e adentrou o século 20, tem recebido inúmeras interpretações
de seus estudiosos – todas com pelo menos dois aspectos comuns: o papel
preponderante das novas tecnologias construtivas e a presença de uma
ornamentação retirada do vocabulário formal de estilos anteriores ao Barroco.
Uma única conclusão: com o Ecletismo, surge uma nova estética urbana.
Um dos aspectos mais interessantes dessa arquitetura é a
conciliação de tendências aparentemente opostas: de um lado, a adoção do
repertório de estilos históricos que assumem configurações mais ou menos
ortodoxas conforme o período, de outro, os avanços tecnológicos promovidos
pela nascente Revolução Industrial e pelas noções de modernidade e
progresso.
Para Le Goff 1, na esteira dos sucessos da Revolução
Francesa, o século 19 foi o grande século da idéia do progresso, possibilitado
pelas descobertas científicas e tecnológicas. Esse progresso, na acepção de Le
Goff, não se resumia ao conforto material dos povos mais desenvolvidos, mas,
incluía os ideais do liberalismo, da alfabetização, da instrução e da democracia.
No Brasil, representava o desejo de ruptura com o passado
colonial rural que, no entanto, veio reforçar os laços de dependência com
a metrópole devido à importação maciça de produtos industrializados,
principalmente ingleses2.
Em termos gerais, a base econômica que possibilitou essa
transformação pode ser explicada pelo excedente de divisas gerado pelo
cessamento do tráfico negreiro em 1850 e pela substituição de escravos por
operários imigrantes europeus, que se transformariam em “instrumentos”
de civilização que se requeria para o momento 3.
Nas cidades do norte do país, enriquecidas pelo comércio
da borracha, as idéias de modernização contaminaram a burguesia comercial
ascendente. De acordo com Castro4 : “No afã de incorporar o país aos padrões
arquitetônicos e urbanos de cunho europeu, desenvolve-se uma campanha
permanente em favor do progresso e da civilização, que toma a França como
parâmetro superior”.

1  Le Gof, História e Memória, 2003.


2  Reis Filho, Quadro da Arquitetura no Brasil, 1995,p.183.
3  História da Vida Privada, p.37 e p.293.
4  Derenji in: Fabris, org. Ecletismo na Arquitetura Brasileira, 1987, p.213.

80
O Ecletismo e o Desenvolvimento Urbano

Clube Ideal, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Academia Amazonense de Letras,


junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Grands Magasins au Bon Marche, 81


junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Marquise na Praça Tenreiro Aranha,


junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

No imaginário dessa burguesia comercial enriquecida, a sofisticação


emanada das nações européias mais civilizadas – França e Inglaterra – se colocava
como objeto de desejo e objetivo a ser alcançado. Isso não era difícil graças ao dinheiro
produzido pelo extrativismo da borracha e o interesse das nações industrializadas
em conseguir novos mercados consumidores para seus produtos, assim como a
necessidade dessas mesmas nações em obter matérias-primas produzidas nas vastas
regiões abaixo da linha do Equador: látex, algodão, carnaúba, café, entre tantas outras.
De modo geral, o que se pode observar é a avidez de exibir a riqueza
recém-adquirida através de externalidades, numa clara mensagem de ligação entre a
idéia de modernidade e o surgimento de uma ascendente classe social – a burguesia
comercial. Trata–se de uma arquitetura na qual “o falso historicismo, o excesso
de ornamentação, a liberdade de usar os estilos do passado, estavam destinados
primordialmente a representar de modo simbólico o poder econômico dessa classe
e o seu novo posicionamento social”5 .
Essas manifestações se traduzem de várias maneiras na arquitetura
urbana, variando conforme a situação financeira do proprietário – tanto se pode
encontrar aposições do léxico eclético sobre as velhas estruturas coloniais – mantém-
se a implantação na testada do lote, a volumetria e a planta e a fachada recebe uma
nova aparência (Foto Rua Bernardo Ramos) ou, de outro modo, erguem-se novos
edifícios nos quais ocorre a adoção de partidos totalmente vinculados aos estilos
em voga.
Na Manaus eclética de Eduardo Ribeiro6 , prevalece o apelo à
individualização e à intenção de se ajustar aos novos tempos de pujança econômica
e também ao alinhamento com as tendências do mundo Ocidental, dito “civilizado”.
De acordo com Derenji7 : “A arquitetura tornava-se, assim, uma das linguagens da
construção de uma identidade social para esses segmentos da sociedade nortista”.
O mesmo fato ocorreu em cidades que viviam ciclos econômicos excepcionais no
período: São Paulo/SP, Pelotas/RS, Rio Grande/RS, Laguna/SC, entre outras.

5  Derenji, Arquitetura Nortista: a presença italiana no início do século XX, 1998, p.35
6  Governador do Estado do Amazonas entre 1892 e 1896, época de maior prosperidade econômica
do Estado. Foi responsável pelo início da reestruturação urbana de Manaus seguindo os princípios
aplicados pelo Engenheiro Hausmann em Paris. Fonte: Mesquita, 1999
7  Derenji, op.cit. p.109

82
O Ecletismo e o Desenvolvimento Urbano

Rua Epaminondas, maio de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Sobrados à Praça São Sebastião,


dezembro de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

83
Alfândega, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Palácio da Justiça, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Grande Hotel, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

84
O Ecletismo e o Desenvolvimento Urbano

Nessa esteira, as renovações urbanas se colocaram na ordem


do dia, pois a uma nova arquitetura deveria corresponder um novo urbanismo
com espaços mais generosos para atender funcionalmente e simbolicamente às
aspirações da burguesia emergente. Surgiram praças, passeios públicos ajardinados,
teatros, cafés, locais onde essa nova sociabilidade encontra espaço para se exprimir:

O jardim público era o local de encontro das elites ou dos segmentos derivados, passarela da
demonstração, das vaidades expostas, das vestimentas equilibrando ou escamoteando classes
distintas – um espaço das trocas sociais legitimado pelos valores aceitos pelas sociedades
que constituíram tais recantos. A percepção, a apropriação e o usufruto de jardins públicos
tornam-se produtos de uma construção social.8

Manaus, espelho do urbanismo que, na época, se praticava na


Europa como símbolo de progresso e modernidade, reflexo dos desejos e ambições
de uma burguesia ascendente e preocupada em afirmar seu prestígio por meio de
manifestações concretas da arquitetura e do urbanismo, da moda, dos eventos
sociais, das apresentações teatrais, entrou em declínio em um tempo relativamente
curto. Todavia, sua herança cultural permanece como símbolo indelével da
grandiosidade das realizações humanas movidas por forças econômicas e pela
vontade de poder.
Praça Heliodoro Balbi e prédio da polícia, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

8  Segawa, Ao amor do público, 1996, p.221.

85
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Teatro da Instalação, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Praça da Saudade.
Postal Antigo.

86
O Ecletismo e o Desenvolvimento Urbano

Praça São Sebastião, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Praça São Sebastião, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

87
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

88
A Formação Urbana
de Manaus

Sobre o Conceito de Ecletismo

As Capitais do Norte

O Rio Negro

Manaus Provincial e Manaus Belle Époque

A Praça Como Centro da Sociabilidade

Tipologia Arquitetônica e Morfologia Urbana


Relação Edifício/Rua

SistemaEstrutural

Ornamentação
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

O período correspondente ao Ecletismo se vincula


à revolução tecnológica que mudou os rumos do capitalismo a
partir da segunda metade do século 19, e, no âmbito da arquitetura
o “divórcio” entre as disciplinas de arquitetura vinculada às “belas-
artes” e as da engenharia, ligada às escolas politécnicas. O arquiteto
era considerado o artista cuja liberdade de escolha era puramente
subjetiva enquanto que o engenheiro se valia da razão e, portanto,
do cálculo, das matemáticas e demais ciências. Ao arquiteto cabia
projetar a arquitetura simbólica do poder enquanto que ao engenheiro
estavam reser vadas as constr uções de caráter eminentemente
utilitário como fábricas e galpões industriais. Ao mesmo tempo,
romper com padrões estéticos presentes por séculos no gosto e no
imaginário coletivo vai exigir uma longa maturação até que as duas
atividades se aproximem e se amalgamem.

Isso explica porque a produção arquitetônica desse


período, ainda que tenha abraçado com entusiasmo todas as novas
tecnologias de produção, não assimilou de pronto seu despojamento,
sua “honestidade” e o resultado foi o escamoteamento dos materiais
de construção, notadamente o ferro. Um exemplo emblemático
dessa situação é a construção da Galeria Printemps e da Gare d’Orsay
em Paris, ambas com estrutura em ferro e fachadas mascaradas pela
ornamentação visando a encobrir seu processo construtivo.

A expressão formal correspondente a uma nova era


seria finalmente encontrada com o advento do Modernismo. De
acordo com Gomes da Silva 1 , devido aos preconceitos estéticos,
a arquitetura do ferro realizada durante o século 19 permaneceu
presa a um formalismo que atestava o estado crítico no qual essa
se encontrava.

1  Silva, Geraldo Gomes: Arquitetura do Ferro no Brasil, 1987.

90
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Mercado Adolpho Lisboa, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Coreto da Praça D.Pedro II, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

91
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Sobre o Conceito de Ecletismo

Vários estudiosos se debruçaram sobre a questão do


Ecletismo, apresentando, algumas vezes, divergências e um maior ou
menor número de subdivisões em grupos estilísticos.

Uma das divergências que costuma aparecer nessa


discussão é saber se o Neoclássico faz ou não parte da corrente eclética.
Benévolo2 o considera como um período à parte na história da arquitetura
sendo que o ponto de inflexão com relação às outras fases é a mudança
que se opera nas referências às regras – claramente mais estritas nesse.

Já Carlos Lemos3 o define como a primeira manifestação


do Ecletismo e o divide em duas sub-categorias: construções neoclássicas
ortodoxas, as quais seguiam rigorosamente os cânones do Classicismo e
construções neoclássicas com ornamentação de inspiração renascentista
como as bossagens, momento que marca o início do descomprometimento
paulatino do Ecletismo com as regras clássicas.

Aliás, Lemos é o mais pródigo de todos os autores


consultados, pois classifica o Ecletismo em doze períodos diferentes
abrangendo inclusive o Art Nouveau e o Neocolonial. Já Fabbris 4 é
mais sintética e apresenta uma divisão para o período eclético que, em
nosso entendimento, o define apropriadamente através de três correntes
principais:

1) A da composição estilística baseada na adoção imitativa coerente e “correta”


de formas que no passado haviam pertencido a um único e preciso estilo;

2) A do historicismo tipológico voltado, predominantemente, a escolhas


apriorísticas de cunho analógico que deviam orientar o estilo quanto à finalidade a
que se destinava cada um dos estilos (Românico para as igrejas, Renascença para
os edificios públicos, Neogótico para o lazer, Neoclássico para os edifícios solenes;

3) A dos pastiches compositivos que, com uma maior margem de liberdade


“inventava” soluções estilísticas historicamente inadmissíveis.

No âmbito do estudo sobre Manaus, consideramos que as


duas caracterizações, a de Lemos e a de Fabbris, facilitam a compreensão
do fenômeno denominado Ecletismo no Brasil enquanto que Benévolo
se aplica mais ao caso europeu.

2  Benévolo, Leonardo: Introdução à Arquitetura, 1987, p.203.


92 3  Lemos in: Fabris, org. Ecletismo na Arquitetura Brasileira, 1987, p.72.
4  Fabbris, Ecletismo na Arquitetura Brasileira, 1987.
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Penitenciaria Estadual do Amazonas, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Biblioteca Pública, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Prédio do Banco Itaú, junho de 2008. Capela do Cemitério São João Batista, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
93
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

As Capitais do Norte

Propiciado pela economia gomífera, as capitais do norte


do país foram surpreendidas com o desenvolvimento da vida urbana, sendo
que a relação entre a tipologia arquitetônica e a morfologia urbana revela
uma nova forma de organização da paisagem da cidade, baseada não mais na
monumentalidade do edifício isolado, mas na idéia do conjunto urbano.

Nesse sentido, Reis Filho5 relaciona a monumentalidade


arquitetônica com o poder aristocrático e os conjuntos urbanos monumentais
com a burguesia mercantilista. Tal assertiva pode ser comprovada em uma
leitura espacial da Manaus eclética – a praça surge como elemento organizador
do espaço. Em torno dessa, em geral, um edifício de grandes proporções se
destaca dos demais, porém a preocupação com a noção de conjunto se revela
através de construções homogeneizadas pelo gabarito e pela relação de cheios
e vazios, diferenciados segundo a natureza de sua ornamentação.

Sobre o aspecto da nova paisagem desenvolvida sob a


regulamentação das construções, Derenji6 aponta:
Reservatório Castelhana, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Essas exigências, cumpridas, aliás com rigor, foram as responsáveis por uma paisagem
urbana volumetricamente equilibrada, onde se estabeleciam composições impecáveis entre
espaço construído, ruas arborizadas e focos de interesse: prédios públicos e parques.”O
gabarito das edificações varia entre um e dois pavimentos, sendo que as residências térreas
apresentam porão alto, o que lhes confere uma certa monumentalidade.

A mesma autora7 destaca a amplitude com que se espalhou


o poder transformador do Ecletismo:

A evolução arquitetônica no período mais favorável ao comércio da borracha, 1870 a


1912, deixou de privilegiar os prédios de exceção, fossem eles oficiais ou destinados à
população abastada, estendendo-se a todo o conjunto urbano, refletindo a emergência
de novas estruturas sociais.

De qualquer maneira, a maior alteração de cunho urbanístico


sob o signo do Ecletismo é, sem dúvida alguma, a mudança de escala dos fatos
urbanos, entre eles, o aumento da população urbana e a necessidade de se
criar edifícios para os novos usos que se impunham: as ferrovias, as fábrica, os
reservatórios de água, as escolas, os teatros, os hospitais, os serviços de bonde.

5  Cadernos de Pesquisa do LAP.


6  Derenji in: Fabris, org. Ecletismo na Arquitetura Brasileira,1987DERENJI: Ecletismo na Arqui-
tetura Brasileira, 1987.
Escola Rio Branco, junho de 2008.
7  Derenji, Arquitetura nortista, 1998. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

94
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Planta de localização de praças e monumentos.


Fonte: Iphan.

95
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Apresentação da ópera Turandot na lateral externa do Teatro Amazonas, Manaus, junho 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Hospital da Beneficência Portuguesa, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

96
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

O Rio Negro

O Rio Negro descrito por Hatoum8:


[...] A visão do Rio Negro derrotou meu desejo de esquecer o Uaicurapá. E a paisagem
da infância reacendeu minha memória, tanto tempo depois. Costelas de areia branca
e estirões de praias em contraste com a água escura; lagos cercados por uma vegetação
densa; poças enormes, formadas pela vazante, e ilhas que pareciam continentes.

Durante os últimos anos do século 19 e até meados dos Novecentos,


Belém e Manaus foram os principais portos de escoamento dos produtos
amazônicos – a borracha e demais matérias primas oriundas do extrativismo.
De acordo com Ab’Saber, Belém “comportava-se como o
terminal de um corredor exportador eminentemente fluvial, enquanto Manaus
funcionava como grande centro relais, em posição marcadamente central, no fecho
de um grande leque de longos roteiros fluviais dos rios da Amazônia ocidental.” 9
O Negro, o rio que atravessa Manaus, se une ao Rio Solimões nas
imediações da cidade para formar o Rio Amazonas. O encontro das águas “pretas” do Negro
com as águas “brancas” que se estendem por quilômetros até se misturarem, constitue um
espetáculo à parte. Os termos utilizados para definir esses cursos de água são extraídos de
suas características e segundo Ab’Saber, “essa nomenclatura popular para os diferentes
cursos d’água na Amazônia possui alta significância científica e tem um caráter referencial.” 10
Os rios negros são rios que nascem e correm entre terras firmes,
excessivamente florestadas: rios autóctones da região não poluídos por sedimentos
retirados de outros domínios da natureza11 . Uma característica geomorfológica
dos rios amazônicos é o igarapé. O igarapé, estrada líquida, foi fundamental para
a ocupação indígena da Amazônia e foi nos igarapés de boca larga, localizados
na margem esquerda do Negro, que se desenvolveu a cidade de Manaus.12
Nela, a vida girava em torno do rio. De seu porto, produtos amazônicos
eram embarcados e produtos europeus desembarcavam num vai-e-vém constante.
Nos arredores do porto, além dos edifícios institucionais como a Alfândega, os
armazéns, as instalações da Marinha e o mercado público, formaram-se aglomerações
de pescadores e pequenos comerciantes que viviam (vivem ainda) do que conseguiam
extrair do rio. Essas populações, de baixa renda, instalaram-se em condições precárias
em terras menos valorizadas, às margens dos igarapés. O que se assiste atualmente é o
aterro dos igarapés para a construção de moradias populares. Ponto de efervescência
urbana e principal referência de seus habitantes, o Negro mantém sua relevância, já que
ainda hoje é a mais acessível via de comunicação de Manaus com o restante do Brasil.

8  Hatoum, Milton: Órfãos do Eldorado, 2008.


9  Ab’Saber: Os Domínios de Natureza no Brasil, 2005, p.79.
10  idem , p.69.
11  idem, p.70.
12  idem p.72.
97
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Igarapé aterrado, maio de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Pôr-do-sol no Rio Negro, maio de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

98
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Encontro das águas do Rio Negro com o Rio Solimões, junho de99
2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Manaus Provincial e Manaus Belle


Époque

O governador Eduardo Ribeiro dissera certa vez “que encontrou


uma aldeia e fez dela uma cidade”.13
O cenário urbano preparado para acomodar a arquitetura acima
descrita em nada lembrava a Manaus dos primeiros séculos de ocupação - uma cidade
obediente à topografia do terreno, como era regra do bom urbanismo português,
recortada de igarapés, com suas casas suspensas por palafitas, construídas em madeira
e cobertura de palha. O anseio antigo de reverter essa situação e transformar Manaus
em uma legítima cidade capital encontrou oportunidade de se realizar com o incremento
da exploração do látex e o empenho de governantes e de uma elite social recém
surgida. Necessidades geradas por novos sistemas de vida e de hábitos de consumo
demandam novos programas de uso, o que significa que a cidade passou a operar
em outra escala – incomparavelmente maior. Segundo Fabbris14: “[...] seja nos anos
do Império (1805-1815), seja naqueles das cidades capitais (1850-80), o urbanismo
estabeleceu uma hierarquia precisa das estruturas urbanas (que coincide, naturalmente,
com a hierarquia econômica e das classes sociais.)”
Mesquita15 atribui as mudanças radicais ocorridas em Manaus na
virada do século a outros fatores determinantes, além da comercialização da borracha
– a proclamação da República16 , a imigração nordestina, a abertura dos portos, a
indústria automobilística e a administração do governador Eduardo Ribeiro. A fim
de adaptar o plano urbanístico haussmanianno de ruas amplas e retilíneas à geografia
acidentada do sítio, valendo-se ainda do argumento de se implantar medidas
saneadoras, promoveu-se o aterro de diversos igarapés e o nivelamento de colinas, o
que modificou sobremaneira o cenário urbano original. Segundo Derenji17 as obras
ocorreram no centro histórico e resultou no nivelamento de 2/3 de seu terreno. De
acordo com Mesquita18, o governador Antônio Ribeiro Bittencourt em 1909, ao
contrário de seu antecessor Eduardo Ribeiro, defendia a manutenção e tratamento
dos igarapés, referência essencial do mundo amazônico, que daria a Manaus certa
semelhança com Veneza, “uma Veneza mais poética, sutil e menos sóbria, enfeitada
pela luxuriosa vegetação amazônica”. Porém os relatórios da Inspetoria de Serviço
Sanitário indicavam que aterrar era a única maneira de extinguir os focos de mosquitos
transmissores de impaludismo e febre amarela, promovendo a salubridade pública. Palácio Rio Negro, junho 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

13  ANDRADE, Manaus, 100 anos de arquitetura, 1996.


14  Fabbris, op.cit., p.23.
15  Mesquita, Manaus, História e Arquitetura, 2006.
16  A República adota os valores tributários do credo liberal: “Essa entrada triunfal teve expressão
particular no Brasil, num momento em que se atrelavam às transformações advindas da dinâmica da
sociedade liberal em expansão o projeto republicano – que, no Brasil, expressará a redenção da situação
colonial e a consoante implantação de uma nova ordem de progresso.” Fonte: Daou, op. cit., p.17.
17  Derenji, op.cit., p.84.
18  Mesquita, op.cit.

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00
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

A Praça como centro da Sociabilidade

Os Oitocentos foi o século da ciência e da medicina científica –


introduziu a noção de salubridade que, juntamente com o imperativo de “embelezamento”
promoveu a criação de ruas, praças e parques arborizados. Essa cultura “atribuiu à
vegetação uma pragmática função, muito além do sentido pitoresco ou romântico que
a arte impusera sobre a paisagem natural”19 . Desse modo, as áreas livres públicas se
tornaram espaços de lazer. Os jardins públicos, palcos privilegiados para ver e ser visto,
locais onde jogos sociais aconteciam ao ar livre. A inclusão da natureza no âmbito da
cidade se deu a partir da Renascença com o cultivo de jardins e parques particulares.
Segawa20 faz uma distinção entre praça e jardim ou parque público.
A praça é “um espaço ancestral que se confunde com a própria origem do conceito
ocidental de urbano. O mesmo não se pode afirmar do jardim ou do parque públicos,
criações efetivamente materializadas – enquanto espaços públicos urbanos.” É desse segundo
conceito que iremos tratar, ainda que o espaço receba o nome genérico de praça. Pois
é no espírito da Manaus da belle époque, onde prevalecem os ditames do salubrismo e do
“embelezamento”, que praças e parques públicos são criados.
A Praça da Saudade e a Praça Oswaldo Cruz (hoje desaparecida)
apresentam o traço característico do jardim oitocentista de inspiração francesa – canteiros
regulares, formas geométricas, obras de arte como esculturas e lâminas d’água nos
pontos focais.
Uma das principais praças de Manaus desde o período provincial, a
Praça Oswaldo Cruz passou, no decorrer do tempo, por várias transformações. Em
1880, foi aprovada uma lei que autorizava desapropriação dos terrenos em volta da
praça, ampliando assim sua área21. Já na administração de Adolpho Lisboa (1902-1907),
foi construído o Parque da Matriz da Conceição, o qual contava com vários elementos
do repertório paisagístico da época: um lago cortado por uma ponte de cimento, um
pavilhão para música, um chalé para residência do jardineiro, repuxo com tanque e uma
gruta de cimento armado encimada por quiosque estilo chinês. Reformas sucessivas
descaracterizaram o parque que, em 1936, chegou a contar com um pequeno zoológico
denominado de Aviário Municipal.22
De acordo com a iconografia antiga, a vegetação era ordenada em
canteiros geométricos segundo a estética oitocentista: “Plantas e flores raras, dispostas
com gosto e com arte”23 . Atualmente, encontram-se nas áreas livres públicas, alguns
exemplares de seringueira (Hevea brasiliensis) na Praça D. Pedro II, árvores nativas ou
adaptadas como o flamboyant (Delonix regia) e, principalmente, renques de oiticica
(Licania rigida) no Largo São Sebastião e na arborização das ruas.

19  Segawa, op. cit., p.211.


20  Idem, p.31.
21  Mesquita, op.cit. p.278.
22  Monteiro, Mário Ypiranga: Roteiro Histórico de Manaus, 1998 p.448/452.
23  Gov. Eduardo Ribeiro (1894) cf. Mesquita, op cit. P.175.
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01
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

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02
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Praça 15 de Novembro e Igreja Matriz, junho de1


03
2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Praça da Saudade, Postal Antigo.

Praça Oswaldo Cruz (demolida), Postal Antigo.

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04
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Tipologia Arquitetônica
e Morfologia Urbana

Na tentativa de melhor compreender as tipologias


arquitetônicas, Argan 24 esboçou esquemas de distribuição: “ainda que
se possam designar quantas classes e subclasses tipológicas se queira,
normalmente as tipologias arquitetônicas são diferenciadas segundo
três grandes categorias, a primeira das quais compreende configurações
inteiras de edifícios, a segunda, os grandes elementos construtivos, a
terceira, os elementos decorativos”.

De acordo com Argan, há três sub-categorias tipológicas:

1. Relação edifício/rua e edifício em si: áreas livres públicas,


afastamento frontal, afastamento lateral, escadas, porão alto, hall
de distribuição;

2. Sistema estrutural: tijolo maciço, abóbodas, cúpulas, estrutura


metálica;

3. Ornamentação: gradis de ferro, bandeiras de porta ou janela,


vitrais, janelas e portas almofadadas, vasos ânforas, esculturas,
luminárias.

A fim de caracterizar o ecletismo em Manaus, lançamos


mão dessa classificação, a qual permite compreender a sintaxe urbana
da cidade.

R elação E difício /R ua

Os princípios de higiene, como a aeração e a insolação


dos cômodos, foram adotados no Brasil com a chegada da Missão
Francesa em 1816 e, aos poucos, modificaram a implantação do
edifício no lote – primeiro foi o afastamento de um ou dos dois lados
da construção dos limites do lote, em seguida o recuo frontal e, por
fim, a localização do prédio no centro do terreno, em geral cercado de
amplos jardins.

Na área mais central da antiga Manaus, é comum


encontrar residências implantadas na testada do lote, geminadas e sem
porão alto, à feição do urbanismo colonial. Também se encontram na
área estudada, edifícios com afastamento lateral providos de varanda,

24  Argan: Projeto e Destino, 2000.

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05
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

porão alto e entrada lateral. O denominador comum dessas tipologias é


a existência de uma ornamentação exuberante, notadamente platibandas
e frontões.

Edificações implantadas no centro do terreno com


afastamento frontal são menos numerosas – alguns prédios públicos e
palacetes, esses encontrados nas zonas mais distantes do centro antigo.
Quanto aos primeiros, o isolamento do edifício em todas as suas faces
decorreu da aplicação do Neoclassicismo, “devido às ordenações
estilísticas que exigiam volumes definidos”. 25

O desenho urbano da “nova” Manaus tem como


parâmetros malha ortogonal com ruas largas e arborizadas, as quais
confluem para uma praça onde estão instalados os edifícios institucionais
monumentais e “arquitetura de acompanhamento”. Essa relação entre
espaço aberto/edifício público e a preocupação de dispor nas áreas
livres, obras de arte/pontos focais – coretos, esculturas, fontes -
compõem o cenário ideal para a vida urbana manaura da época.

Encontram-se ainda, na área ocupada desde o período


colonial, edifícios que seguem o modo de construir tradicional da época
provincial e que, durante o Ecletismo, receberam uma fachada nova. As
principais diferenças entre as construções dos dois períodos são: i) na
construção tradicional, inexistência do porão alto, telhado de duas águas
com cumeeira paralela à rua, cobertura de telhas de barro cônicas e beiral
aparente; ii) na construção de gosto eclético, presença constante do
porão alto e da platibanda, telhado com telhas de barro cônicas ou tipo
“francesa” com cumeeira perpendicular à rua. Exemplares da Manaus
provincial que receberam decoração eclética podem ser encontrados
no núcleo originário de Manaus como a Rua Frei José dos Inocentes, a
Rua Epaminondas e a Rua da Instalação.

Rua da Instalação, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

25  Lemos in: Fabris, org. Ecletismo na Arquitetura Brasileira, p.78.

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06
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Com o Ecletismo apareceram, além do tradicional partido


retangular, volumes mais complexos com telhados em vários planos.
Nesses, o escoamento das águas pluviais é realizado através de rufos e
calhas, introduzidos após a abertura dos portos aos países industrializados.

Outro compromisso do léxico ecletizante era a platibanda,


que se tornou uma constante – algumas, ornadas com simples frisos,
outras, com balaustradas, frontões decorados tendo no centro um brasão
e a data da construção, ânforas vasos, pinhas, esculturas, enfim uma série
de ornamentos, geralmente importados da Europa.

A partir do acervo arquitetônico remanescente na cidade,


podemos distinguir as diversas manifestações do ecletismo em Manaus.
Edificações monumentais do período provincial como o Paço Municipal
e o Prédio da Polícia, com partido horizontal e sem porão alto, que à
época receberam fachadas ecletizantes. O primeiro recebeu frontão de
gosto neoclássico e beiral aparente e o segundo, ainda mais despojado,
foi dotado de fachada com superfície lisa, com os elementos estruturais
ressaltados, além de frontão semicircular e platibanda reta.

Planta de localização do Prédio da Polícia.


Fonte: Iphan.
1
07
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Já as residências do período provincial, mormente encontradas


nas já citadas ruas Frei José dos Inocentes, Epaminondas e Instalação, hoje
passam desapercebidas a um olhar menos atento, já que exteriormente
correspondem ao repertório eclético. De outro modo, se a dispersão pela
qual atualmente esses edifícios se apresentam não justificaram por si só seu
tombamento, o fato de o traçado urbano ter sido mantido íntegro desde os
tempos coloniais representa um testemunho desse período histórico.

As edificações monumentais surgidas em decorrência do auge


da exploração gomífera localizam-se, em sua maior parte, nas proximidades
do Teatro Amazonas. São edifícios institucionais, em geral isolados na malha
urbana, compostos de volumes poliédricos simétricos, tratados em todas
as suas faces em uma acepção de “paisagem de objetos”26. Entre esses se
destacam o Hospital da Beneficência Portuguesa (1893) e o Palácio Rio Negro
cujos padrões construtivos se enquadram no grupo que Lemos27 denominou
neoclássico ortodoxo.

Ainda nas ruas adjacentes ao Teatro Amazonas, encontram-se


vários conjuntos de residências de padrão eclético – alguns com dois ou três
exemplares, outros abrangendo toda a face de quadra. De qualquer maneira,
esses pequenos conjuntos, pela sua proximidade espacial, em poucos minutos
de caminhada, proporcionam uma imagem que se aproxima daquela Manaus
dos áureos tempos. Trata-se de construções dotadas de porão alto, apresentando
fachadas ricamente decoradas com adereços em argamassa: falsas pilastras,
cornijas, entablamentos, platibandas e frontões de grande variação. As janelas,
amplas, em geral são em arco pleno com bandeiras de madeira recortada e
vidros coloridos. São arrematadas por sobrevergas em arco pleno ou por
tímpanos também em massa.

Casario à Antiga Praça Osvaldo Cruz, junho 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Antiga Faculdade de Direito, dezembro de 2008. Rua 10 de julho, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

26  Em contraposição à “paisagem de lugares” na qual o casario é que conforma o espaço


público. Brasília é o melhor exemplo de uma “paisagem de objetos”.
27  Op.cit, p.74.

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08
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Rua Lobo da Almada, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Rua J.Clemente, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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09
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Palácio Rio Negro, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Com relação ao vocabulário arquitetônico que Lemos


denominou neoclássico com decoração renascentista, os exemplos são
muitos: o Reservatório do Mocó (1899), a Alfândega (1908), o Palácio da
Justiça (1900) - esse último dotado de escadaria de acesso que lhe confere
ainda mais monumentalidade. Nos três exemplares é uma constante o uso
da pedra da região, o arenito, em bossagens no embasamento do referido
palácio e no revestimento da fachada do Reservatório do Mocó. Também
foi utilizado o tijolo aparente em detalhes como no prédio da Alfândega
e na Fábrica de Cerveja (1912).

As alusões ao Neogótico “comparecem”, principalmente


nos edifícios religiosos como a capela do Cemitério São João, a Capela do
Pobre Diabo e a Capela da Santa Casa de Misericórdia, alguns mausoléus
do Cemitério São João Batista, entre outros. São edificações em pequena
escala e, nesse sentido, se distanciam do Gótico original, caracterizado
principalmente por sua escala monumental. No entanto, primam pela
delicadeza e apuro formal.

1
10
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Com relação a esse grupo, Castro 28 assinala seu caráter


superficial: “Na arquitetura, porém, as nossas versões do ‘neogoticismo’
cingiram-se apenas a alguns elementos característicos, geralmente
aplicados em igrejas, tais como os telhados íngremes, os pináculos e a
torre axial única”.

Há ainda, algumas edificações que nos chamam atenção


pela imaginação fantasiosa que levou seus autores a combinar repertórios
de vários estilos. Esse grupo de obras foi denominado por Lemos 29 de
neo-renascentistas despoliciadas, nas quais ele engloba as colagens imaginosas.
Como exemplos mais evidentes, há o Reservatório da Castelhana, o Clube
Sport Luso e a Penitenciária. Um exemplar que pode ser enquadrado
nessa caracterização de ecletismo despoliciado faz parte de um conjunto
que, infelizmente, encontra-se bastante deteriorado, localizado na antiga
Praça Osvaldo Cruz.

Outros dois exemplares encontrados fora da área proposta


para tombamento merecem destaque: o sobrado à Rua Simão Bolívar,
onde funciona a Escola Superior de Magistratura do Amazonas, em estilo
mourisco, com janelas em forma de bulbos, sacadas circulares e cunhais e
molduras enfatizados por bossagens; e a casa de moradia localizada à Rua
Sete de Setembro – implantada no meio do lote, dotada de afastamento
frontal com mureta e grade de ferro, apresenta as fachadas revestidas com
elementos decorativos em profusão: colunas arrematadas por três tipos
de capitéis superpostos, uma linha de cornija com elementos florais, uma
segunda linha com elementos geométricos, uma terceira com elementos
antropomorfos, além de palmas, guirlandas e tudo mais que se pode
conceber em termos de repertório eclético.

Da tipologia denominada chalet, inspiradas nos chalés


alpinos, foram encontrados dois exemplares: um ao lado do Hospital da
Beneficência Portuguesa e outro na Rua Quintino Bocaiúva, próximo à
Zona Franca de Manaus.

O Art-nouveau em Manaus apresenta um caráter superficial


– elementos decorativos em ferro exibindo formas sinuosas com motivos
fitomórficos, figuras humanas estilizadas e estruturas de marquises e
de varandas em ferro e cobertura de vidro. À Praça Tenreiro Aranha
encontra-se um edifício, hoje sede do Banco Itaú, com ornamentação
em azulejos com motivos florais de inspiração Art-nouveau.

Ainda que pareça ser um exercício de dilentatismo


que pouco ou nada viria a acrescentar ao estudo em pauta, essa rápida
classificação tem o intuito de demonstrar a capacidade apresentada por
Manaus em absorver e produzir um acervo considerável no qual se
encontram todas ou quase todas manifestações do Ecletismo. Os edificios
monumentais mantem um afastamento da rua, às vezes acessados por meio
de escadarias, enquanto a arquitetura corrente, em geral, está implantada
na testada do lote sem afastamento.

28  Castro, José Liberal in: Fabris, org. Ecletismo na Arquitetura Brasileira, 1987.
29  op. Cit.
Alfândega, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Rua 7 de Setembro, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Palácio da Justiça, junho de 2008. Capela do Pobre Diabo, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Clube Sport Luso, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Prédio do Tribunal de Contas da União, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Igreja Nossa Senhora dos Remédios, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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13
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Sistema Estrutural

Foi a partir da segunda metade do século 19 que empresas


inglesas e escocesas passaram a oferecer ao mercado externo, uma grande
quantidade de componentes arquiteturais em ferro30. No portal leste que dá
acesso ao Cemitério São João Batista, há referências ao nome do fabricante,
à origem dos gradis e portões em ferro e à datação: Walter Macfarlane
– Glasgow/Scotland – 1905, o mesmo da escadaria e hall de entrada da
Biblioteca Pública.

Disfarçadas sob cascas de alvenaria, estruturas em ferro


comparecem em grandes construções como o Reservatório do Mocó e a
Fábrica de Cerveja. Do mesmo modo, os palacetes que possuíam grandes
vãos se valiam das estruturas metálicas que eram cobertas pela alvenaria,
com exceção dos alpendres e varandas aparentes.

Outros componentes arquiteturais nos quais o ferro se


destacou são as escadas e as mãos francesas, leves e delicadas como rendas.
Essas vinham prontas da Europa e a escolha do modelo era feita por meio
de catálogos, como ocorria com os demais elementos arquitetônicos.

Foi durante o governo de Eduardo Ribeiro que Manaus


passou a prescindir dos “aguadeiros”31, pois foram concluídos o Reservatório
do Mocó, ainda em funcionamento e o Reservatório da Castelhana, hoje
desativado.

Além do Reser vatório do Mocó, algumas obras de


engenharia e de infraestrutura eram fabricadas em ferro – por exemplo,
no final da Avenida Sete de Setembro, um dos eixos estruturadores da
cidade, há uma obra monumental em ferro aparente – trata-se da Ponte
Benjamin Constant.

A tecnologia inglesa estava presente no variado material


construtivo importado (elementos em ferro, louça sanitária, metais), mas
foi no fornecimento de infraestrutura urbana que os ingleses mais se
destacaram. Foram os ingleses os principais responsáveis pela implantação
das obras de infraestrutura de Manaus, pois dominavam a tecnologia e
produziam os principais materiais. Como retorno, obtinham a concessão
desses serviços por dezenas de anos.

A firmas inglesas coube a instalação e controle de serviços


públicos em Belém e Manaus. Nesta última cidade, Ribeiro registra:32

Instalações portuárias: Manaus Harbor Ltd.; Luz e bondes: Manaos


Tramways & Light Cy.Ltd.; Transporte fluvial: The Amazon River Steamship
Na; Mercado e matadouro: Manaos Markets & Slaugher-house Ltd.vigation
Cy Ltd.; Esgotos e águas: Manaos Improvements Ltd.; Telégrafo: The
Amazon Telegraph; Banco: The London & Braziliam Bank; Estaleiro naval;
The Amazon Engineering CY.
30  Idem.
31  Índios e negros que vendiam água à população. Fonte: Mesquita, 2006, p.112.
32  Ribeiro, 1990 apud Loureiro 1982 p.177.

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14
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Cemitério São João Batista, junho de 2008. Fábrica de Cerveja, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Reservatório do Mocó, junho de 2008. Alpendre de residência a Rua Ramos Ferreira, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Ponte Benjamin Constant, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Ponte do Igarapé Educandos, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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16
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Ornamentação

De modo geral, o repertório ornamental, apesar da


variação oferecida, pautava-se sempre pela fidelidade aos modelos
eruditos europeus, esses extraídos das antiguidades greco-romanas.
Platibandas arrematadas por ânforas, palmas, cachorros ou leões, vindos
da Europa ou confeccionados pelos artífices aqui imigrados. Os materiais
e as representações são os mais diversos: metais como o bronze para
esculturas e apliques – seres bizarros extraídos da mitologia, figuras
femininas e masculinas, animais simbólicos (o leão, a serpente, a águia);
o ferro para gradis e portões com motivos florais, elementos estilizados
derivados do repertório clássico; o zinco para calhas, rufos e buzinotes;
a louça esmaltada para ânforas, pinhas, esferas, vasos e figuras humanas
ou de animais; o cimento para frisos, cornijas, platibandas, balaústres
e frontões.

A despeito de muitas vezes ser camuflado por caixas de


alvenaria, o ferro se revela em toda sua plasticidade em elementos como
coretos, grades, postes de luz, portões e gradis, os quais contribuem
para a identidade configurativa da cidade do século 19. Vale assinalar
seu caráter pioneiro no ramo da construção civil, já que as peças eram
pré-fabricadas, feitas em escala industrial, e montadas in loco.

O coreto em ferro, construção típica do receituário


paisagístico do Ecletismo, está presente na Praça D.Pedro II e na
Praça Heliodoro Balbi, e atua como ponto focal desses espaços. Locais
pensados para a realizar a sociabilidade, nas praças não faltavam
elementos decorativos – além do coreto, a Praça D.Pedro II apresenta
um magnífico chafariz em ferro, além de postes do mesmo material.

Já o Largo São Sebastião, que se abre para o Teatro


Amazonas, exibe um conjunto escultórico com uma alegoria celebrando
a abertura dos portos da região ao comércio internacional. O autor
da obra foi o italiano Domenico De Angelis que, morto em 1900, a
deixou inconclusa sendo terminada por outro italiano, o escultor Enrico
Quatrini. 33

Outras obras de escultura são encontradas no Cemitério


São João Batista, já que esses espaços, “até meados do século 20
constituem uma galeria onde estão presentes os maiores mestres da
escultura”. 34

Pela iconografia antiga verifica-se que as inúmeras praças


de Manaus eram adornadas com fontes, chafarizes e estátuas, aparato
necessário à ostentação conforme requeria a Belle époque. Nas praças
remanescentes, esses elementos permanecem, sendo que, no momento,
as áreas livres do centro histórico estão sendo requalificadas pelo poder
público.

Outros elementos de ornamentação que se destacam são


33  Bicca e Bicca, orgs: Arquitetura na formação do Brasil, 2006, p.306.
34  Idem, p.300.

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17
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

as bandeiras de porta e os pavilhões em ferro do Mercado Central, estes


últimos de delicada influência mourisca. O ferro também comparece nas
estruturas e guarda-corpos de varandas como a do Palácio Rio Negro,
do alpendre do palacete eclético da Praça dos Remédios e das mãos
francesas que formam a marquise do edifício que abriga atualmente a
C&A, esses dois últimos com cobertura em vidro. Nesses elementos
reconhecemos a inspiração francesa e, a partir dessas reminiscências,
num exercício de abstração, é possível vislumbrar a Manaus da Belle
Époque, tão “parisiense”.

Se a ornamentação das áreas externas é composta, em


sua maioria, por materiais e elementos formais de inspiração totalmente
européia, nos interiores, o ponto focal dos ambientes internos ficou
por conta do uso de madeiras da flora amazônica. Escadas, balaústres,
assoalhos e forros que propalam o luxo em que viviam os nobres e
endinheirados da época. As madeiras nobres da Amazônia e outras
como o pinho de riga foram usadas abundantemente na confecção
dos pisos, trabalhados com pelo menos duas espécies de coloração
diferente, criando mosaicos. Dos poucos edifícios visitados – Hospital da
Beneficência Portuguesa, Palácio Rio Negro e Palácio da Justiça – além
do uso intensivo da madeira nos revestimentos, foram encontradas peças
de mobiliário, sendo grande parte de procedência européia, mas, também
vindas da Ásia e outras fabricadas no Brasil. Esculturas em bronze e óleos
sobre tela retratando personagens ilustres, pinturas parietais com moldes
vazados e frisos de acabamento ou escaiola, lustres de cristal, toda sorte
de bibelôs em porcelana e cristal complementavam a decoração interna.

A or namentação interior dos principais templos


religiosos, a Igreja Matriz e a Igreja São Sebastião, não apresentam o
requinte e o esplendor das igrejas barrocas do período colonial, no
entanto, são condizentes com o gosto excessivo próprio do período.

A Igreja Matriz apresenta em seu interior pinturas


parietais em escaiola nas quais predominam cores vivas e contrastantes
como o azul e o amarelo. Os forros abobadados são em madeira pintada
em azul e branco e ornados com medalhões centrais. A nave única
é composta por oito altares laterais, alguns em mármores variados,
outros em escaiola, mantendo sempre a mesma linguagem de inspiração
neoclássica. Essa também é a linguagem do púlpito e do baldaquino. O
piso é em ladrilho hidráulico, material largamente utilizado no início do
século 20 com a introdução do cimento no Brasil. Apresenta desenho
em quadriculados de duas cores. Um destaque é a porta principal em
madeira entalhada e pintada de verde.

A Igreja de São Sebastião, localizada no largo de mesmo


nome, é totalmente decorada em seu interior: apresenta pinturas parietais
em tons terrosos retratando cenas e personagens religiosos nas paredes
e no vão da cúpula, e, em alguns detalhes, como pilastras e molduras de
vãos, empregou-se a técnica de escaiola. A lanterna da cúpula é pintada
em azul com representações de anjos pairando na abóbada celeste; em
azul com medalhões centrais são os forros da nave e do nártex. Vitrais
coloridos com motivos geométricos filtram a abundante luz equatorial.

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Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Relógio à Avenida Eduardo Ribeiro, Frontão, dezembro 2008.


junho 2008. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Frontão, dezembro de 2008. Frontão, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Frontão, dezembro de 2008. Frontão, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Detalhe de Conjunto escultórico da Praça São Sebastião, junho de 2008. Poste de luz no pátio da Alfândega,
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. junho 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Mercado Municipal, junho de 2008. Poste de luz à Praça D.Pedro II,


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. dezembro de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Mercado Municipal, junho de 2008. Palácio da Justiça, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

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Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Palácio Rio Negro, dezembro de 2008. Palácio Rio Negro, dezembro de 2008. Palácio Rio Negro, dezembro de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Igreja Matriz, junho de 2008. Igreja Matriz, junho de 2008. Palácio da Justiça, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Praça Heliodoro Balbi, junho de 2008. Igreja São Sebastião, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

1
21
Questões Acerca da
Ampliação da Área de
Preservação de Manaus
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Atualmente, a cidade de Manaus já tem uma área protegida,


que engloba parte da área do processo de ocupação pioneira da cidade.

Embora já estejam circunscritas nessa área o porto, a


alfândega, o mercado Adolpho Lisboa e prédios administrativos, fica fora
desse perímetro a maior parte do traçado urbano, bem como grande parte de
prédios públicos e privados representativos do período econômico marcado
pela exploração da borracha, que possibilitou a construção da Manaus moderna,
ou da Belle Époque, que fundamentou o sentido da existência da Manaus atual.

Construída em um curto espaço de tempo, entre 1890 e


1910/20, a “Manaus da Belle Époque”, assim como Belém, representa a força
do poder econômico gerado pela exploração e comercialização da borracha na
Amazônia entre o final do século XIX e início do XX. Tem como principais
características a arquitetura em estilo eclético e o traçado urbano de inspiração
racionalista.

O plano urbano da cidade, criado na administração de Eduardo


Ribeiro (1892 – 1896), ainda pode ser verificado. Dentro desse traçado,
ainda permanecem inúmeros prédios públicos e privados que mantêm sua
originalide sendo que os mais destacados, em geral, são aqueles que já possuem
tombamento estadual e/ou compõem a lista de interesse de preservação pelo
município. Além desses, vale destacar alguns pequenos conjuntos de casas que
exprimem a variedade do eclético construído na cidade, no período em questão.

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24
Vista parcial do Teatro Amazonas, junho de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Embora tais construções na maioria dos casos não possuam


continuidade em termos de conjunto, agregam-se num contexto espacial que,
relacionados ao significado histórico, tornam a sua preservação fundamental para
a manutenção da história urbana da cidade, bem como do processo de ocupação
da Amazônia. Nesse sentido seria oportuna a ampliação da área preservada de
Manaus, especialmente se pensarmos nos aspectos da cidade relacionados à
economia, à geografia e à identidade.
No aspecto econômico, pode-se dizer que poucas cidades
mudaram tanto em vinte anos quanto Manaus, entre 1890 e 1910. Originária do
Forte São José da Barra do Rio Negro, construído em 1699, a cidade só se formou
depois de se tornar capital da Província do Amazonas, em 1850. Mesmo assim,
até 1885 ainda tinha o aspecto de uma vila, um pequeno povoado espraiado,
seguindo a condição geográfica do local, cortado por igarapés.
Foi a partir da descoberta e do domínio tecnológico da borracha,
em consonância com o desenvolvimento e utilização do automóvel, que a
Província do Amazonas, e também Manaus, conheceram o desenvolvimento
tão esperado para aquela parte do Brasil. A borracha extraída das seringueiras
naturais da Bacia Amazônica, em especial, ficaram conhecidas no mundo pela
excelência de sua qualidade. Começou a ser exportada nas primeiras décadas do
século XIX e teve um crescimento vertigonoso entre 1880 e 1910, permitindo,
nesse período, a criação de uma cidade completamente nova, com características
e estilo totalmente contrastantes com aquela região dominada pela floresta. O
porto foi determinante nesse processo porque permitiu a conexão de Manaus
com o mundo, trazendo um progresso ocidentalizado, tanto nos aspectos material
quanto no social, por meios dos inúmeros navios que chegavam e partiam pelo
rio Negro.
Para a história do Brasil, a borracha, como outros produtos,
tem seu lugar no tempo. Por meio dela, o norte do Brasil se tornou um eixo
econômico, possibilitando ao país, embora temporariamente, uma supremacia
econômica mundial.
Para o Norte do Brasil, a borrracha tem um lugar ainda maior,
pois conduziu o avanço econômico e demográfico para aquela região, assim
como o ouro para o Brasil central.
Embora Caio Prado Jr., tenha afirmado que a riqueza da
borracha não serviu para nada “sólido e ponderável” e que “a opulência de
Manaus foi fictícia e superficial, pois a riqueza se construiu em poucos anos e se
dissipou feito fumaça” (PRADO Jr., 1994, p. 241), os vestígios da transformação
urbana e arquitetônica daquele período ainda permanecem em inúmeros edifícios,
praças e no traçado urbano.
J.F. Normano ressalta que a história da economia brasileira
“(...)constitui-se da história do aparecimento e desaparecimento de sistemas
econômicos inteiros em que a nação baseia sua existência, numa permanente
mudança dos chamados “produtos-reis” como o açúcar, cacau, ouro, fumo,
borracha e café” (J.F. Normano, 1938, p 54). E, o que permanece desses períodos
econômicos intensos, são os vestígios materiais caracterizados, muitas vezes, por
uma aquitetura específica que merece ser valorizada enquanto patrimônio cultural
e histórico uma vez que são testemunhos de um momento econômico peculiar
e hoje desconhecidos na maior parte do território nacional.

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25
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Praça do Teatro Amazonas, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

Quanto ao aspecto geográfico, há de se levar em conta a


localização de Manaus em meio à Floresta Amazônica, em um período de
tempo no qual o distanciamento geográfico do local somado às condições
de acesso àquela parte do Brasil, tornaram a presença do homem muito
significativa em relação ao domínio e à vontade de incluir Manaus nas
transformações urbanas, tecnológicas, sociais e culturais que estavam
acontecendo no mundo.

A Amazônia levou muito tempo para ser integrada ao


contexto brasileiro. Uma viagem entre o Rio de Janeiro e Belém podia
durar até cinco meses, enquanto do Rio de Janeiro para Lisboa, em 1790,
durava noventa dias; entre Belém e Lisboa, na mesma época, trinta dias. A
Amazônia, assim, era como se fosse uma colônia à parte do resto do Brasil,
seus habitantes, inclusive, eram chamados de portugueses americanos e não
brasileiros como no resto do país1.

Nesse contexto, Manaus, a capital da floresta, localizada a


mais de 1500 quilômetros do Oceano Atlântico, só passou a ter um significado,
a “existir” no país a partir da intervenção urbana entre o final do século XIX
e início do XX, que criou uma cidade moderna. Dessa forma, foi o domínio
da natureza pelo homem, em um lugar até então dissociado geograficamente
do mundo urbano que elevou essa cidade a um reconhecimento do que seria
comum a outras cidades brasileiras.
1  SOUZA, Márcio. Afinal, quem é mais moderno neste país? Revista de Estudos Avançados.
São Paulo,vol. 19, n. 53, p. 87-96, 2005.

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26
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

Cassino do Chinelo, Praça D.Pedro II, dezembro de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

E, se a riqueza da borracha desapareceu, a cidade resistiu. O


símbolo maior daquele período, o Teatro Amazonas, se mantém hoje como
ícone de uma época que permitiu que a Amazônia se tornasse conhecida
além da idéia de uma floresta exótica.

O identitário, que agrega à Manaus uma diversidade única


a partir dos vários tipos humanos que, a partir do final do século XIX,
passaram a se dirigir para a cidade, vindos de outras regiões do Brasil e do
exterior, mesclando-se com as culturas das populações indígenas e ribeirinhas,
em função da economia gerada pela borracha. Seu crescimento a partir da
constante migração tornou Manaus cidade de todos os povos.

E hoje tal característica permanece. Atualmente, a cidade é


a grande metrópole da Amazônia, centralizando não só a economia como
mais da metade da população do estado.

Atualmente, a área relacionada com a renovação urbana


de 1890-1920 contempla as áreas próximas ao rio Negro, onde estão
concentrados a maioria dos imóveis preservados, até a rua Malcher. Essa área
também é reconhecida pelo município de Manaus como de preservação, no
artigo 1º, do Decreto Municipal n. 4673/85. Por esse decreto a área protegida
limita-se ao norte pela rua Leonardo Malcher (entre o igarapé São Raimundo
e a avenida Joaquim Nabuco), a leste pela avenida Joaquim Nabuco, ao sul
pela orla do rio Negro e a oeste pelo igarapé São Raimundo.

1
27
O mesmo Decreto, no artigo 2, estabelece que “o setor
de Unidades de Preservação fica constituído pelas edificações que possam
concorrer significativamente para preservar as tradições e a memória da
Cidade”. Basicamente, essa área hoje de interesse do município, do estado
e do IPHAN é a mesma que pode ser vista no mapa de 1893.

O patrimônio tombado de Manaus e os programas de preservação

Atualmente, os bens tombados no centro histórico


dividem-se em três categorias, os de tombamento federal, estadual e os
de interesse municipal. No âmbito federal, o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN tem sob sua responsabilidade
quatro monumentos:

• Teatro Amazonas (Tombado no Livro Histórico Vol. I, em


1966 – Processo nº 673-T-66);
• Porto de Manaus (Tombado no Livro Arqueológico, Etnográfico
e Paisagístico, número de inscrição 100, e no Livro de Belas Artes Vol.
2, em 1987 – Processo nº 673-T-66);
• Mercado Adolpho Lisboa (Tombado no Livro Histórico Vol. I,
em 1987 – Processo nº 1.179-T-85 1987), e,
• Reservatório do Mocó (Tombado no Livro de Belas Artes Vol.
2, em 1985 – Processo nº 1.127-T-84).

No âmbito estadual, existem 28 bens tombados, todos


construídos nas primeiras décadas do século XX e localizados, em
sua maioria, no centro histórico da capital. Esses tombamentos foram
realizados por meio de decreto entre as décadas de 80 e 90 (conforme
anexo 1).
No âmbito municipal, existem centenas de bens com
interesse de preservação, a partir da Lei Orgânica do Município de 1990,
pelo Decreto n. 4. 673/85 e Portaria da Semplurb, n. 26/852.
Atualmente, o governo do estado tem implementado
programas de recuperação de algumas áeas que inclui o aterro de igarapés
para construção de moradia popular e melhoria do aspecto visual da
cidade, além da recuperação de fachadas, como no caso do casario anexo
ao Palácio Rio Negro. O Programa Monumenta3 também teve atuação na
cidade por meio do Projeto de Regeneração do centro antigo, associado
a três pontos, o Mercado Adolpho Lisboa e seu entorno, o conjunto
arquitetônico, paisagístico e arqueológico do Paço da Liberdade e o
conjunto arquitetônico e paisagístico do Porto Flutuante. Aliado a esses,
estão em processo de requalificação e/ou regeneração, os logradouros
públicos e casario de interesse para preservação, todos contidos na área
do Centro Histórico de Manaus, tombado em 1990 pela Lei Orgânica do
Município (art. 342).
2  Secretaria do Estado de Cultura e Urbam, dados de 2002.
3  O Monumenta é um programa de recuperação do patrimônio urbano brasileiro, executado
pelo Ministério da Cultura e financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID. Vista parcial da cidade de Manaus, dezembro de 2008.
Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.
Questões Acerca da Ampliação da Área de Preservação de Manaus

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29
Proposta de Tombamento

Descrição da Poligonal de Tombamento do Centro Histórico

Descrição da Poligonal de Entorno do Centro Histórico


Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Traçado urbano - Manaus 1893.


Fonte: Arquivo Iphan.

Um dos aspectos que chamam a atenção ao se comparar


uma planta de Manaus do início do século XX com uma planta atual, é o
fato de o traçado urbano se manter inalterado assim como pode-se atestar
a permanência dos principais edifícios monumentais do final do século
XIX e início do XX. O mesmo não ocorre com a arquitetura corrente do
conjunto, a qual apresenta perdas significativas.

A fim de representar o universo maior que corresponde à


Manaus provincial e aquela criada no auge da exploração gomífera, definiu-
se para efeito de tombamento, dois grandes conjuntos compostos por
quadras que apresentam valores históricos e estéticos, os quais propiciam
a compreensão do que foi Manaus no período estudado.

1
32
Proposta de Tombamento

Rua Sete de Setembro, junho de 2008. Rua da Instalação, junho de 2008.


Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan. Fonte: Fátima Macedo/Acervo Iphan.

1
33
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Em Manaus, a proposta de tombamento representa a extensão


da área já protegida do complexo portuário (Processo 1192 -T- 86) incluindo
áreas complementares a esse. Abrange partes relativas ao núcleo inicial da cidade
e próximas ao porto e partes da Manaus remodelada por Eduardo Ribeiro,
representada pela Avenida Sete de Setembro e pelo trecho vizinho ao Teatro
Amazonas. Urbanisticamente essas áreas se distinguem devido à diferença
do traçado, porém, em termos de tipologia arquitetônica são semelhantes,
pois, mesmos os remanescentes da Manaus provincial receberam fachadas
ecletizantes.
No caso da Avenida Sete de Setembro, antiga Rua do
Comércio, a proposta se desenvolve linearmente, abarcando edificações
monumentais próximas à Igreja Nossa Senhora da Conceição e, seguindo
o eixo da via, abrange o Palácio Rio Negro, a Ponte Benjamin Constant e
a Penitenciária do Estado. Apesar do isolamento, também fica incluída na
proposta a Igreja Nossa Senhora dos Remédios e praça fronteira, cuja visual,
hoje obstruída, alcança o Rio Negro.
No trecho vizinho ao Teatro Amazonas, destacam-se os
prédios institucionais que se pautam pela monumentalidade, sendo que a
arquitetura corrente apresenta, em alguns trechos, conjuntos homogêneos. Na
Praça do Congresso descortina-se uma visual que através da Avenida Eduardo
Ribeiro vai até o Rio Negro, semi-obstruída por uma edificação.
Na área vizinha ao Porto, a arquitetura se mostra mais
despojada e seus conjuntos apresentam, geralmente, um certo grau de
descontinuidade. Como representante do período provincial, a Rua Frei José
dos Inocentes apresenta expressivo conjunto limitado por igarapé, o que garante
uma ligação com o Rio Negro. Um conjunto bastante preservado é aquele da
Rua Bernardo Ramos juntamente com o Paço Municipal e a praça D.Pedro II.
De modo geral, pode-se dizer que, apesar das descontinuidades
apresentadas no tecido urbano, as alterações de gabarito são pouco expressivas,
apenas nas imediações da Avenida Eduardo Ribeiro que estas se acentuam.
Uma característica a ser valorizada no centro histórico é a
existência de praças que se abrem aos monumentos e edificações, fruto do
urbanismo de Eduardo Ribeiro, a qual propicia uma unidade ao centro histórico.
Se a continuidade não é o ponto forte, o apuro formal e o bom estado de
preservação de suas edificações monumentais caracterizam o centro histórico
de Manaus.
A arquitetura de Manaus é bastante heterogênea e, para evitar
uma fragmentação excessiva, tomou-se como premissa para a definição do
tombamento selecionar quadras inteiras, as quais apresentam situações diversas
com imóveis preservados e outros descaracterizados. Ainda que do ponto de
vista da proteção pelo tombamento, o grau de proteção seja único, os critérios
de intervenção poderão variar de acordo com o estado de preservação do
bem em questão. A opção por um perímetro regular é fornecer uma idéia de
conjunto sendo que a portaria que irá regulamentar o centro histórico tombado
deverá conter normativas que tomem como referenciais para intervenção,
imóveis que apresentarem alto grau de preservação. Em imóveis passíveis
de alteração, as intervenções terão como base os imóveis preservados que
estiverem localizados nas suas proximidades, os quais irão regular questões
como volumetria, gabaritos, ritmo das aberturas, cheios e vazios.

1
34
Proposta de Tombamento

As diretrizes gerais para a proteção da área tombada de todos os conjuntos


morfológicos devem privilegiar os seguintes aspectos:

1. Manutenção dos imóveis ecléticos e art déco buscando-se preservar


suas características originais;
2. Manutenção do traçado urbano, impedindo a abertura, alargamento
e diminuição das áreas livres públicas, bem como abertura de novas vias;
3. As áreas verdes devem ser preservadas e, quando necessário,
recuperadas;
4. Para a realização de obras novas, observar o gabarito médio existente
na face de quadra na qual se localiza a nova construção;
5. No caso de se proceder a uma intervenção em edifício já
descaracterizado, tomar com parâmetro de intervenção, as características
de gabarito, recuos frontais e laterais, ritmo e proporção das envasaduras de
imóvel na vizinhança preservado em suas características essenciais;
6. Promover estudos para embasar a requalificação arquitetônica e
urbanística das áreas livres públicas da Zona Franca;
7. Requalificar a área da antiga Praça Oswaldo Cruz;
8. Requalificar a área da Praça da igreja dos Remédios restabelecendo
sua ligação com o Rio Negro ;
9. Promover estudos com o objetivo de regulamentar o uso das calçadas
pelos ambulantes, de forma a garantir ao pedestre a livre passagem em
condições adequadas;
10. O mobiliário urbano de época (postes, quiosques, gradis) deverá ser
mantido e valorizado;
11. Elaboração de um plano diretor de publicidade visando desobstruir
as fachadas proporcionando sua percepção e valorização;
12. Para o estabelecimento das normas de preservação, deverão ser
preenchidas as fichas M201, M202 e M203 do SICG.

As diretrizes gerais para a proteção da área de entorno de todos os


conjuntos morfológicos devem privilegiar os seguintes aspectos:

1. Manutenção do traçado urbano, impedindo a abertura de novas vias,


bem como a proibição ao uso privativo das vias existentes;
2. As áreas verdes devem ser preservadas e, quando necessário,
recuperadas;
3. Para a área de Entorno E1, embora esta já esteja comprometida com
a existência de alguns edifícios em altura, a norma vigente local permite a
construção em até 4 (quatro) pavimentos mesmo considerada a outorga
onerosa do direito de construir e a transferência de direito de construir.
Portanto, para a área de Entorno E1, a altura máxima total será de 15m;
4. Para a realização de obras novas na área de entorno E2, observar
o gabarito médio existente na face de quadra na qual se localiza a nova
construção;
5. Para o estabelecimento das normas de preservação, deverão ser
preenchidas as fichas M201, M202 e M203 do SICG.

1
35
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Descrição da Poligonal de Tombamento


do Centro Histórico

O perímetro evolui em sentido horário, iniciando na


cabeça da ponte Benjamin Constant, no canto do bordo leste (marco
T1). Segue pelo bordo sul da Av. Sete de Setembro até a interseção
com o limite do terreno da Penitenciária Estadual (marco T2),
contornando seu perímetro até voltar ao bordo da Avenida Sete de
Setembro (marco T3), continuando por esse até o limite do terreno
do Palácio Rio Negro (marco T4), contornando seu perímetro até
retornar à Av. Sete de Setembro (marco T5), e daí até a interseção
com o bordo oeste da Av. Floriano Peixoto (marco T6). Desse
ponto inflete à esquerda até a interseção com o bordo nordeste da
Rua José Paranaguá(marco T7), e daí inflete à direita, contornando
a Praça Heliodoro Balbi, até encontrar a Rua Guilherme Moreira,
esquina com a Av. Sete de Setembro (marco T8). Desse desse ponto
prossegue pelo bordo noroeste da Rua Guilherme Moreira até a
interseção com o bordo sudoeste da Rua Teodoreto Souto (marco
T9) na Praça Tenreiro Aranha, e por esse bordo até a interseção
com o bordo noroeste da Rua Marcílio Dias (Marco T10) e deste
até a interseção com o bordo sul da Avenida Floriano Peixoto
(marco T11). Prossegue pelo bordo norte da Av. Floriano Peixoto
até a esquina da Rua dos Andradas (marco T12). Segue pelo bordo
nordeste da Rua dos Andradas até a interseção com o bordo sudeste
da Rua Leovelgildo Coelho (marco T13), e por esse bordo até a
interseção com a o bordo sul da Rua dos Barés (marco T14), e por
esse até a interseção com o bordo noroeste da Rua Sergio Pessoa
(marco T15). Desse ponto segue pela rua Sergio Pessoa, incluindo
os terrenos e edifícios de nº 115 e nº147 (Faculdade de Direito)
até encontrar o bordo sudoeste da Rua dos Andradas (marco T16).
Segue por esse bordo até a interseção do bordo sudoeste da Av.
Floriano Peixoto (marco T17) e pelos bordos sudoeste dessa avenida
e trecho subseqüente da Rua 15 de Novembro até a interseção com
o bordo sul da Rua Monteiro de Souza (marco T18). Segue por esse
bordo e subsequentemente pelo bordo da Rua Vivaldo Lima até a
interseção com o bordo oeste da Rua Taquerinha (marco T19) e
deste ponto inflete à direita até a interseção com o bordo sul da

1
36
Proposta de Tombamento

Rua Visconde de Mauá (marco T20), e deste até a interseção com


o bordo oeste da Rua Visconde de Mauá(marco T21) e por esse até
a interseção com o bordo sul da Av. Sete de Setembro (marco T22)
e por esse bordo até o limite do terreno da Marinha (marco T23)
e por esse limite até a interseção com o bordo norte da Rua Frei
José dos Inocentes (marco T24). Por esse bordo até a interseção
com o bordo oeste da Rua Governador Vitório (marco T25) e por
esse bordo até a interseção com o prolongamento dos limites dos
fundos dos lotes nº 264, 282, 369, s/n, 385, s/n e 109 da Rua Frei
José dos Inocentes (marco T26) e por esses limites até a interseção
com o bordo oeste da Rua Itamaracá (marco T27), donde transpõe a
Rua Itamaracá e contorna os fundos dos lotes nº 79, 88 e 439 e da
Rua Frei José dos Inocentes, até o bordo oeste da Rua da Instalação
(marco T28). Desse ponto inflete à direita até a interseção com o
bordo norte da Rua Henrique Martins (marco T29) e por esse bordo,
incluindo o imóvel de nº 64 até a interseção com a Av. Eduardo
Ribeiro (marco T30). Desse ponto segue pelo bordo leste da Av.
Eduardo Ribeiro até a interseção com o bordo norte da Rua 24 de
Maio (marco T31). Segue por este bordo até o imóvel de nº 225,
inclusive (Marco T32), prosseguindo pelos limites lateral e fundos
desse imóvel e dos demais com frente para as ruas 24 de Maio e
José Clemente até a esquina com a Rua Lobo D’Almada (marco
T33). Prossegue pelo bordo oeste da Rua Lobo D’Almada até a
interseção com o bordo norte da Rua José Clemente (marco T34).
Segue por esse bordo da Rua José Clemente até o limite dos fundos
dos lotes dessa mesma rua (marco T35) e por esses limites até a
Rua 10 de Julho e atravessando-a até interceptar seu bordo norte
(marco T36), seguindo pelos limites frontais dos lotes fronteiros
da Rua 10 de Julho até a esquina com a Av. Epaminondas (marco
T37), seguindo contornando a lateral e os fundos desses mesmos
lotes e pelos fundos dos lotes fronteiros às ruas Ferreira Pena e
Monsenhor Coutinho, até o cruzamento da Av. Epaminondas com a
Rua Monsenhor Coutinho (marco T38). Desse ponto prossegue pelo
bordo leste da Av. Epaminondas até a interseção com o bordo norte
da Rua Ferreira Ramos (marco T39) e desse ponto até a interseção
com o bordo leste da Rua Luis Antony (marco T40) e desse até a
interseção com o bordo norte da Rua Simão Bolívar (marco T41).
Prossegue por esse bordo da Rua Simão Bolivar, incluindo os
imóveis de nº 215, nº 231 e nº245 até a interseção com o bordo
oeste da Rua Ferreira Pena (marco T42). Segue por esse bordo até a

1
37
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

interseção com o bordo norte da Rua Ferreira Ramos (marco T43)


e por esse bordo até o imóvel da Academia Amazonense de Letras
(marco T44). Contorna os imóveis da Academia Amazonense de
Letras e do Instituto Benjamin Constant até a interseção com o
bordo oeste da Rua Tapajós (marco T45). Prossegue pelo bordo
oeste da Rua Tapajós até a interseção com o bordo sul da Rua
Ferreira Ramos (marco T46). Desse ponto prossegue contornando
os lotes fronteiros ao bordo leste da Av. Tapajós até a esquina com
a Rua 10 de Julho (Igreja de São Sebastião) – Marco T47. Prossegue
pelo bordo sul da Rua 10 de Julho até a interseção com o bordo
norte da Rua Dona Libânia (marco T48), e por essa rua, excluindo
os lotes nº 215, nº 251 e lote do CREA-AM até a interseção com
o bordo norte da Rua Marçal (marco T49), prosseguindo por esse
bordo até a interseção com o bordo leste da Av. Getúlio Vargas
(marco T50), e por esse bordo até a interseção com o bordo sul da
Rua 10 de Julho (marco T51) e desse até a interseção com o bordo
leste da Rua Joaquim Nabuco (marco T52) e por esse bordo até
o imóvel da Escola Barão do Rio Branco, inclusive (marco T53).
Desse ponto prossegue pela Rua 24 de Maio incluindo o imóvel
do TCU até a interseção com o bordo leste da Av. Getúlio Vargas
(marco T54), prosseguindo por esse bordo até o alinhamento do
bordo sul da Rua Marçal (marco T55). Segue por esse bordo até
encontrar os limites dos lotes nº 174 e nº 198, fronteiros à Rua
Costa Azevedo (marco T56), contornando-os até essa mesma Rua
(marco T57). Desse ponto segue pelos fundos dos lotes da Rua
10 de Julho até o imóvel de esquina com a Rua Eduardo Ribeiro,
inclusive (marco T58). Desse ponto prossegue pelo bordo leste da
Av. Eduardo Ribeiro até a interseção com o bordo norte da Rua
Henrique Martins (marco T59). Prossegue pelo bordo norte da Rua
Henrique Martins até o bordo oeste da Av. Getúlio Vargas (marco
T60) e por esse bordo até o bordo norte da Av. Sete de Setembro
(marco T61) e por esse bordo prossegue até o bordo norte da
cabeça da Ponte Benjamim Constant (marco T62) e deste retorna
ao marco 1, fechando a poligonal.

1
38
Proposta de Tombamento

Descrição da Poligonal de Entorno


do Centro Histórico

O perímetro evolui em sentido anti-horário, iniciando no eixo


da cabeça da ponte Benjamin Constant (marco E1). Prossegue em uma linha
que contorna as margens do igarapé (marco E2). Prossegue em uma linha
paralela à ponte a 150 m de distância desta (marco E3). Prossegue pelos fundos
dos lotes que margeiam a Av. Sete de Setembro, e a linha de prolongamento da
divisa do lote de esquina das duas vias, até o eixo da Av. Getúlio Vargas (marco
E4). Prossegue pelo eixo da Av. Getúlio Vargas até a interseção com o eixo
da Travessa Huascar Figueiredo (marco E5). Prossegue pelo eixo da Travessa
Huascar Figueiredo até a interseção com o eixo da Rua Walter Rayol (marco
E6). Prossegue pelo eixo da Walter Rayol até a interseção com o eixo da Rua
Ipixuna (marco E7). Prossegue no eixo da Rua Ipixuna até a interseção com
o prolongamento do limite dos fundos dos lotes que dão para a Rua Joaquim
Nabuco (marco E8). Prossegue pelos fundos desses lotes e pelo limite lateral
do lote fronteiro à Rua Rotary e seu prolongamento até encontrar a interseção
do eixo das ruas Joaquim Nabuco e Rotary (marco E9). Prossegue pelo eixo
da Rua Rotary até a interseção com o eixo da Av. Getúlio Vargas (marco E10).
Prossegue pelo eixo da Av. Getúlio Vargas até a interseção com o eixo da Rua
Ramos Ferreira (marco E11). Prossegue pelo eixo da Rua Ramos Ferreira
até o limite lateral do imóvel nº. 1095 inclusive (marco E12), prosseguindo
pela lateral desse lote e pelos fundos dos lotes da Rua Tapajós (lado leste) e
seu prolongamento até a interseção com o eixo da Rua Leonardo Malcher
(marco E13). Prossegue pelo eixo da Rua Leonardo Malcher até a interseção
com o eixo da Rua Luiz Antony (marco E14). Prossegue pelo eixo da Rua
Luiz Antony até a interseção com o eixo da Rua Pe. Chisland (marco E15).
Prossegue por uma linha paralela e distante 75 metros da Rua Frei José dos
Inocentes, sentido leste-oeste, prosseguindo e mantendo essa mesma distância
contornando a margem do Igarapé São Raimundo e do Rio Negro (incluindo
o terreno da Marinha e as instalações do Porto de Manaus) até a interseção
com o prolongamento da Rua Joaquim Nabuco (marco E16). Prossegue
pelo eixo da Rua Joaquim Nabuco até a interseção com o prolongamento dos
fundos dos lotes da Av. Sete de Setembro, lado sul (marco E17) e pelos fundos
desses lotes até a interseção com a divisa do terreno da Penitenciária Estadual
(marco E18). Deste ponto, desce 150 m em linha reta contornando o terreno
da Penitenciária até o lado leste do Igarapé de Educandos (marco 19) e deste
ponto prossegue até encontrar o marco 1 fechando a poligonal (marco 20).

1
39
Conclusão
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Manaus Século 21

Lamentavelmente, a cidade muda mais depressa que o coração humano.1

Manaus é uma cidade autofágica, como tantas outras. Do pequeno núcleo


colonial, resta apenas o traçado urbano, orgânico em contraponto à racionalidade do traçado
saído das pranchetas do planejamento urbano, ainda no século 19 enquanto que na arquitetura
preservam-se uma boa quantidade de edifícios ecléticos.
O Ecletismo dominante nesse século, como as demais correntes
arquitetônicas que antecederam ao Modernismo, devem ser entendidas como um ritual de
passagem – um processo – um protomodernismo, período necessário à assimilação dos
progressos tecnológicos e que, aos poucos, construiu uma nova estética coerente às inovações
introduzidas.
Neoclassicismo, outros “neos”, o Art-nouveau, o Art déco, representam
momentos e movimentos nos quais a sociedade buscou conjugar a representação de seus
anseios que, se de um lado, necessita da confirmação através de revivals clássicos, de outro não
abriu mão das prerrogativas propiciadas pelo progresso técnico.
Ao contrário de São Paulo que, quando da derrocada da cultura cafeeira,
já havia iniciado o processo de industrialização com proveito da mão de obra européia,
principalmente italiana, Manaus viveu em um marasmo por mais de 40 anos, até que o governo
militar, em seus ímpetos desenvolvimentistas, criou a Zona Franca com o objetivo de revitalizar
a capital e promover a ocupação da região amazônica.
O resultado dessa operação, aliado a outros fatores, provocou uma onda
migratória sem precedentes à cidade de Manaus e, como em geral acontece nessas situações,
o centro histórico, já em franco processo de degradação, tornou-se o lugar de referência para
essas populações.
E eis o que parece ser o retrato do centro histórico de Manaus no século 21:
porção urbana formada por edificações do período áureo da cidade, alguns bem preservados,
outros nem tanto, mesclada a edifícios modernos, os quais não primam pela preocupação
estética ou ajuste de gabaritos com relação ao antigo, lugar no qual uma população vinda do
interior instalou-se, entregue a ocupações informais e tomando as ruas com barracas com
toda sorte de artigos.
No presente contexto das metrópoles, o IPHAN tem claro que se vive um
novo momento histórico onde se faz necessário traçar novas estratégias para se proteger os
bens culturais, diferente daqueles “tempos áureos” nos quais cidades inteiras justificavam seu
tombamento pela integridade de seus elementos.
A fúria desenvolvimentista dos anos 70, a maciça migração em direção
às cidades, a industrialização acelerada provocaram grandes perdas no que diz respeito ao
patrimônio cultural construído.
Há que se interagir com esse novo tempo e, para conciliar-se a ele, é necessário
se construir novos valores – em vez de se eleger um território extenso, destacar fragmentos de

1  Baudelaire.
1
42
Conclusão

cidade que, unidos pelo fio da pesquisa histórica e da recuperação arquitetônica, promovam o
sentido e a relevância dos bens culturais, no caso selecionados para representar um universo
maior que foi a história de Manaus, resultado de um dos mais importantes ciclos econômicos
brasileiros do século 19, a borracha, expressa pelo Ecletismo e pelo urbanismo racionalista
de Hausmann.
A localização desses exemplares, em sua maior parte no núcleo colonial
e nos limites entre a Avenida Eduardo Ribeiro e a Rua Leonardo Malcher, permite ao
observador uma leitura da Manaus de outros tempos.
Desse modo, o que afinal se revelou com a pesquisa elaborada foi uma
cidade que, ainda que fragmentada, possui um vocabulário arquitetônico vasto e diversificado,
no qual todas as correntes ecléticas se encontram representadas. Um aspecto controverso
revelado na presente pesquisa é o fato de que a verticalização, apesar de já estar presente
na área de estudo, ainda não compromete completamente a percepção do espaço criado
na Belle époque.
Outro processo em curso, que corrobora no sentido da preservação do sítio
histórico de Manaus, é o investimento na realização de várias obras por iniciativa dos poderes
municipal, estadual e federal voltadas para a revitalização de edifícios e de áreas públicas.
A situação acima descrita é indicativa de que este é o momento para se
pensar a cidade de Manaus como um espaço urbano formado por monumentos, arquitetura
corrente, áreas livres públicas, enfim, um conjunto que celebra e representa o ecletismo no
norte do país e, portanto, requer que seja protegido.
Do ponto de vista dos ciclos econômicos que chegaram a alterar a
configuração das cidades, provocando afluxo de migrantes de todos os rincões da terra
que chegaram trazendo seus usos e costumes, Manaus, juntamente com Belém, são as mais
representativas cidades do ciclo da borracha no Norte do país.
Nessa amálgama de culturas, o nativo dispôs aos forasteiros seus
conhecimentos do rio e da floresta, compartilhou seus alimentos, aceitou sua influência,
mas, principalmente, compartilhou com esses suas ilusões sobre o Eldorado.
Numa passagem do Livro Órfãos do Eldorado, Hatoum2 se refere à questão
do mito:

Anos depois, ao ler os relatos de conquistadores e viajantes europeus sobre a Amazônia, percebi que o
mito do Eldorado era uma das versões ou variações possíveis da Cidade Encantada, que, na Amazônia,
é referida também como uma lenda. Mitos que fazem parte da cultura indo-européia, mas também da
ameríndia e de muitas outras. Porque os mitos, assim como as culturas, viajam e estão entrelaçados.
Pertencem à História e à memória coletiva.

A proposta de tombamento explicitada às páginas 132/135, teve como


objetivo lançar uma luz sobre os espaços da cidade, compreendendo aí os edifícios, as ruas
e os logradouros públicos ainda não tombados em nível federal. Alguns edifícios notáveis
já foram tombados individualmente pelo Estado do Amazonas, porém, as premissas que
nortearam nosso trabalho partem de uma concepção urbanística do patrimônio cultural,
selecionando elementos passíveis de evocar uma visão da capital amazônica como um todo,
na qual o patrimônio público e o patrimônio privado se interrelacionam para dar à Manaus
um sentido de cidade como espaço de memória e trocas sociais.
Para o tombamento, recomenda-se a inscrição a inscrição de Manaus no
Livro de Tombo Histórico e no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.
2  Hatoum, Milton, Órfãos do Eldorado, p.106, 2008.
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43
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

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1
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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Glossário de Termos Empregados

A legoria. Maneira figurada de representar um pensamento abstrato.


O termo é usado para designar uma obra de arte que representa uma
idéia abstrata por meio de formas concretas e reais. Por exemplo, figuras
humanas representando os vícios e as virtudes ou, ainda, as estações do ano.

Alpendre. Em geral, cobertura auto-sustentada ou apoiada em suportes


verticais, que cobre um vão de acesso. Por extensão, todo acesso abrigado
corresponde a um alpendre. O alpendre pode ser saliente em relação à fachada
ou estar incorporado nela. O termo refere-se à cobertura e não ao espaço que
ela cobre. No entanto, no uso corrente, é a segunda acepção a mais usada.

Altar. Local ritual, primitivamente um espaço de sacrifício em cujo ponto central


ou principal localizava-se uma pedra (ara), sobre a qual se realizava a oferenda.
Dessa forma primitiva evoluiu para espaços e mesas de materiais e adornos
diversos, nos altres rituais tradicionais em várias religiões - católica, budista,
brâmane, entre outras, e também para a tradição de tomar as refeições à mesa,
sendo esta local de reunião e alimentação com variados rituais nas diversas culturas.

Ânfora. Vaso usado para guardar e, às vezes, servir vinho ou óleo. Forma
ovóide com pequeno pescoço tendo duas alças laterais. Pode ou não possuir
pés e quando não os possui é enterrada em areia ou fica sobre um tripé.

Arco pleno. Aquele formado por um segmento de circunferência cuja extensão


é de 180°, isto é, uma semicircunferência.

Arquitetura. É a arte de compor espaços plasticamente sobre suportes verticais


– colunas ou pilares – para vencer o vão entre eles, recebendo e transmitindo
para os apoios as cargas colocadas sobre ela. Na arquitetura clássica é a primeira
parte do entablamento que repousa diretamente sobre os capitéis das colunas.

Art Nouveau. Estilo de características acentuadamente assimétricas que se


espalhou por toda a Europa, nas últimas décadas do século XIX e a primeira do
XX. Ele usa formas onduladas de todas as espécies, notadamente as chamadas
“curvas de chicote” ou hastes vegetais, mas também chamas, ondas e cabelos
flutuantes nas figuras femininas estilizadas. A maior importância do Art Nouveau
é sua rejeição ao historicismo do século XIX. Por um lado, ele é um ramo do
Simbolismo e por outro do movimento Arts & Carfts. O nome se origina de
uma loja aberta em Paris, em 1895, que vendia objetos “originais”, em contraste
com aqueles que obedeciam às características de estilos do passado. Jugenstil é o
movimento correspondente na Alemanha, Modern Style, na França, e Stile Liberty,
na Itália. Uma grande diversidade de denominações está associada a esse estilo.

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Glossário de Termos Empregados

B a l da q u i n o.
Espécie de cobertura sustentada por colunas, situada
sobre o altar-mor das igrejas.
Balaustrada. Conjunto de pequenas colunas de perfil sinuosos, obtidas por
torneado, colocadas enfileiradas e regularmente dispostas. Ela serve como
elemento decorativo ou funcional, no coroamento de edifícios ou como grades,
e guarda-corpo de balcões e escadas, constituindo a sustentação de corrimão.
Barroco. Termo inventado pelos historiadores do século XIX para o estilo
predominante no século XVII (de 1580 ao início do século XVIII), na Europa
ocidental, sendo essa expressão artística essencialmente extravagante e ornada
demais. De fato, o Barroco combina muitas coisas, como a revolta contra o
Maneirismo com seu intelectualismo, elitismo e frieza emocional, além do
desejo de servir ao impulso religioso da Contra Reforma. Caracteriza-se pela
criação de modelos religiosos que são acessíveis às massas e, também, pelo
interesse no movimento dinâmico e nos efeitos teatrais. As mais significativas
obras de arte produzidas no Barroco combinam a Arquitetura, a Escultura e a
Pintura para criar uma síntese que tem maior impacto que qualquer uma delas
tomada isoladamente. São os seguintes os aspectos fundamentais do estilo:
grandiosidade, dinâmica acentuada, luxo teatralidade e exagero decorativo. Essas
características aparecem em graus variados, de acordo com a região analisada.
Por exemplo, o Barroco italiano é muito mais exuberante que o Barroco sueco.
Belas-artes. Denominação associada às criações, principalmente como uma
expressão estética, para serem contempladas ou fruídas pelo seu próprio valor.
Elas também são conhecidas como Artes Maiores, aquelas criadas por artistas,
em contraste com as chamadas Artes Menores, elaboradas por artesãos apenas
habilidosos. Ao contrário das Artes Aplicadas, elas não são usadas como um
instrumento para qualquer função prática. Elas são constituídas pela Pintura,
o Desenho, a Escultura, a Gravura e a Arquitetura, embora a á ultima tenha
um aspecto funcional.
Belle époque. (bela época em francês) foi um período na história da Europa
que começou no final do século XIX (1871) e durou até a eclosão da Primeira
Guerra Mundial em 1914. A expressão também designa o clima intelectual
e artístico do período em questão. Foi uma época marcada por profundas
transformações culturais que se traduziram em novos modos de pensar e
viver o cotidiano. A Belle Époque foi considerada uma era de ouro da beleza,
inovação e paz entre os países europeus. Novas invenções tornavam a vida
mais fácil em todos os níveis sociais, e a cena cultural estava em efervescência:
cabarés, o cancan, e o cinema haviam nascido, e a arte tomava novas formas
com o Impressionismo e a Art Nouveau. A arte e a arquitetura inspiradas no
estilo dessa era, em outras nações, são chamadas algumas vezes de estilo “Belle
Époque”. (disponível em http://pt.wikipedia.org, acessado em 01/07/09).
Bossagem. Saliência, com feitio de almofada de superfície irregular, em relação
ao plano de uma parede. Pedra rústica e saliente em relação à argamassa de união.

Brasão. Símbolo heráldico que serve de insígnia a uma pessoa ou família


da nobreza, a uma nação, a uma corporação ou a uma cidade. Formado
por um escudo com seus elementos e decorações complementares.

Buzinote. Cano situado no piso de balcões e sacadas para recolher e escoar


as águas pluviais, a fim de que as mesmas não escorram pela parede.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

C apitel. Denominação dada à parte superior de um suporte vertical,


com caráter decorativo e funcional, que age como elemento terminal e
intermediário entre o fuste e a parte sustentada, geralmente uma viga ou arquitrave.

Cornija. Moldura ou conjunto de molduras na parte superior de uma parede,


geralmente servindo de coroamento ou elemento intermediário entre ela e o
teto. No exterior de um edifício serve de terminação à parede no seu encontro
com o beiral. É a parte mais elevada do entablamento de uma ordem clássica,

Chalé. Transformação da palavra francesa chalet, para designar uma construção


campestre com telhado de águas muito inclinadas, geralmente com águas-
furtadas, imitando as casas da Europa Central, principalmente da região dos Alpes.

Cosmopolita. Indivíduo que se considera cidadão de todos os países. /


Fig. Que se acomoda aos usos estrangeiros. (disponível em http://www.
dicionariodoaurelio.com, acessado em 01/07/09)

E scaiola .Técnica de acabamento liso, contínuo, que dispensa a


pintura. Preparada à base de pó de gesso, cal, cimento e pigmentos,
aparece em variações imitando veios de mármore ou de outras pedras.

Ecletismo. De uma maneira ampla, o termo serve para designar a prática


artística de apropriação e combinação do vocabulário formal de vários estilos.
[...] Esse é, também o caso do estilo do fim do século XIX, de caráter eclético,
denominado especificamente de Ecletismo e que se constitui num estilo
definido, que se apropria de elementos de vários estilos, integrando-os de
maneira uniforme. Em virtude de seu aspecto decorativo e sobrecarregado
de ornamentos, foi menosprezado pelos artistas dos movimentos modernos,
sobretudo pelos arquitetos ligados ao Funcionalismo.

Elemento antropomorfo. Elemento decorativo cujas composições são


baseadas no corpo humano ou em figuras humanas da mitologia.

Elemento floral. Elemento decorativo com motivos vegetais, em geral,


estilizados.

Embasamento. Base de sustentação de um edifício, alicerce.

Entablamento. Nas ordens arquitetônicas clássicas, é a parte situada acima


das colunas e composta por: arquitrave, friso e cornija. Por extensão, qualquer
elemento semelhante encimando uma abertura – porta, janela, arcada ou colunata.

Escolas politécnicas. É um título comum a diversas instituições universitárias


especializadas no ensino e pesquisa das diversas engenharias. (disponível em
http://pt.wikipedia.org, acessado em 01/07/09).

Estilo. Conjunto de características, constituídas por motivos ornamentais


subordinados a determinados critérios estéticos e estabelecendo um vocabulário
formal, que define a criação artística de um determinado período histórico, de
uma região ou de um artista.

Estilo chinês . Conjunto de características, constituídas por motivos


ornamentais retirados da cultura chinesa tais como lanternas e pagodes.

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50
Glossário de Termos Empregados

F riso. Banda, faixa ou tira com motivos decorativos. Geralmente pintada


ou esculpida.

Frontão. Elemento construtivo de forma triangular, contornado por


molduras, que fecha a empena dos telhados de duas águas. A origem desse
elemento está nos templos gregos, sendo a base do triângulo a cimalha, as
duas empenas os lados inclinados e a parede de fechamento o tímpano.
Posteriormente, ele transformou-se em elemento também de caráter
decorativo, passando a assumir as mais diversas formas, como, por exemplo,
o frontão curvo, o frontão interrompido e o frontão com volutas, entre
outros. É ainda usado para adornar a parte superior de portas e janelas ou
para coroar a entrada principal ou a frontaria dum edifício.

G abarito. Termo usado como sinônimo de modelo, padrão. É o


parâmetro a ser seguido na construção de um edifício por força de
legislação específica. O termo serve, também, para designar um instrumento,
geralmente uma folha de plástico recortado, que serve de modelo para a
representação gráfica de elementos arquitetônicos, mobiliário e símbolos
diversos.

Gótico. Palavra usada, atualmente, para descrever toda a Arte Medieval


que vai do fim do período Românico, meados do século XII, ao início do
Renascimento, início do século XV. O termo foi inventado, segundo a tradição,
pelo pintor Rafdaek (Rafaello Sanzio, 1483-1520), em documento enviado
ao papa Leão X (1475-1521), para ridicularizar o estilo que o precedeu,
como sendo derivado dos Godos ou bárbaros. A denominação é aplicada,
especialmente, à Arquitetura que utiliza o arco apontado (ogival), a abóbada
de nervuras e o arco botante.

H ausmann. Prefeito de Paris entre 1852 e 1870 foi o responsável pela


modernização do centro histórico medieval dessa cidade. Seu projeto
abarcou todos os domínios do urbanismo, no coração de Paris e em seu
entorno: ruas e bulevares, regulamentação das fachadas, espaços verdes,
esgotamento sanitário e reservatórios de água tratada, equipamentos e
monumentos públicos. O alargamento das ruas visava obedecer aos preceitos
higienistas e salubristas, os quais defendiam a circulação de ar e de luz solar
como meios de afastar os miasmas portadores de várias enfermidades.
(disponível em http://pt.wikipedia.org, acessado em 02/07/09. Tradução
livre de Fátima Macedo)

Historicismo. Diz-se da reutilização dos estilos históricos do passado,


durante o século XIX, principalmente na Arquiteturae nas Artes Decorativas.
Revival.

J ardim Público. Aquele que é propriedade dos habitantes de uma cidade


ou coletividade. Qualquer pessoa pode utilizá-lo, dentro das normas que
orientam sua abertura, fechamento, conservação e uso.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

L adrilho hidráulico. Ladrilho artesanal de cimento prensado, de cura


hidráulica por submersão em água, razão do nome. O processo de
fabricação é feito unidade por unidade, com prensa manual do tipo rosca e
contrapesos. Trata-se de um material “frio” e de boa resistência à abrasão, cuja
padronagem também é mantida devido à espessura da camada de acabamento
- 2 a 3 milímetros.

Lanterna da cúpula. Corpo cilíndrico ou prismático, mais alto que largo,


situado sobre uma cúpula, com aberturas para a entrada de luz. Tem função
de iluminação semelhante à clarabóia.

Liberalismo. O Liberalismo é uma filosofia política que prima pela autonomia


moral e econômica da sociedade civil em oposição à concentração do poder
político. Apesar de diversas culturas e épocas apresentarem indícios das idéias
liberais, o liberalismo definitivamente ganhou expressão moderna com os
escritos de John Locke (1632-1704) e Adam Smith (1723-1790). Seus principais
conceitos incluem individualismo metodológico e jurídico, propriedade privada,
governo limitado, ordem espontânea, estado de direito, e livre mercado.
disponível em http://pt.wikipedia.org, acessado em 02/07/09).

M ão francesa. Elemento estrutural inclinado, geralmente apoiado numa


parede, que serve para diminuir o espaço entre dois suportes verticais
de uma viga, sem diminuir o vão útil da abertura entre esses dois elementos de
sustentação. Espécie de braço ou cantoneira, de ferro ou de madeira, destinado a
sustentar um elemento em balanço, como, por exemplo, o beiral de um telhado.

Marquise. Laje em balanço na fachada de um edifício.

Medalhão. Qualquer ornato de forma oval, poligonal ou circular, possuindo


elementos decorativos em seu interior. Pode ser plano ou em relevo. O termo
é também usado para designar uma medalha de grandes dimensões.

Movimento Moderno. Termo, mais ou menos abrangente, usado para


designar a sucessão de movimentos de vanguarda em arte e arquitetura, que
dominaram o mundo ocidental durante o século XX.

Modernidade. A modernidade costuma ser entendida como um ideário ou


visão de mundo que está relacionada ao projeto de mundo moderno, empreendido
em diversos momentos ao longo da Idade Moderna e consolidado com a
Revolução Industrial. Está normalmente relacionada com o desenvolvimento
do Capitalismo. (disponível em http://pt.wikipedia.org, acessado em 02/07/09)

Motivo fitomórfico. Designação usada na decoração baseada em elementos


vegetais estilizados

N ave. Cada um dos espaços longitudinais em que se divide um templo.


É o local onde se realizam as cerimônias do culto e onde se alojam os
fiéis. As igrejas têm variado muito o número de suas naves, que se apresentam,
quando existe mais de uma, os espaços paralelos são separados por arcadas
ou colunatas.

1
52
Glossário de Termos Empregados

Neocolonial. Movimento ligado sobretudo à Arquitetura, que se estende


também às Artes Decorativas, e que aparece nos países das Américas. Seu
vocabulário formal se inspira nos elementos utilizados nas obras realizadas
nas colônias espanholas e portuguesa, americanas. No Brasil, corresponde à
utilização do vocabulário formal derivado da arte de características portuguesas,
desenvolvida no período colonial, que corresponde aos séculos XVII e XVIII.
Aparece, às vezes, misturado com influências da América colonial espanhola,
através de uma corrente dita “californiana”.
Neoclássico. Estilo artístico baseado nos modelos clássicos da arte da Grécia
e de Roma antigas, que faz seu aparecimento em torno de 1750, como reação
aos caprichosos excessos do rococó, e estava plenamente restabelecido em 1770.
Uma das causas de sua eclosão é a descoberta e as escavações arqueológicas,
das cidades romanas de Pompéia e Herculano, soterradas por uma erupção do
Vesúvio, no ano 79 da Era Cristã. Ele é caracterizado pela adoção de soluções
lineares e simétricas. Em termos de vocabulário formal é a volta dos elementos
clássicos.
Nártex. Pórtico elevado na frente da nave das basílicas cristãs, onde
ficava os catecúmenos. (disponível em http://www.dicionariodoaurelio.
com, acessado em 01/07/09).

P aisagem. Denominação usada para designar um conjunto de elementos


da natureza, observados em um lance de vista e com um sentido
estético.
Período provincial. Denominação dada ao período que se iniciou com
a fundação de Manaus no século XVII e vai até meados do século XIX
quando começam a ocorrer as primeiras grandes transformações na cidade.

Pinha. Ornato que imita o fruto do pinheiro. O termo é também usado


para designar o ornamento que lembra um abacaxi. Por extensão, qualquer
motivo ou objeto decorativo que lembre a mesma forma.

Pintura parietal. Diz-se da pintura executada sobre a superfície de um


muro, parede ou cobertura em um monumento arquitetônico, isto é, sobre
um suporte em alvenaria.
Pitoresco. A palavra deriva do termo “pinturesco”, isto é, aquilo que
merece ser pintado. No jardim, o termo está associado a um qualificativo
da paisagem.
Púlpito. Tribuna onde pregam os sacerdotes no templo. (disponível em
http://www.dicionariodoaurelio.com, acessado em 01/07/09).

R enascença. Denominação usada para designar o movimento artístico


italiano, baseado nos modelos clássicos da Antiguidade greco-romana
e ocorrido nos séculos XV e XVI. Intelectualmente, ele foi inspirado pelos
ideais do pensamento humanista e, nas Artes Plásticas, também pelo uso
do vocabulário formal greco-romano.

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53
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Revival. Denominação geral para o conjunto de estilos que, no século


XIX, reutilizaram o vocabulário formal dos vários estilos que apareceram
na História da Arte, desde a Antiguidade até o século XVIII.

Revolução Francesa. era o nome dado ao conjunto de acontecimentos


que, entre 5 de Maio de 1789 e 9 de Novembro de 1799, alteraram o quadro
político e social da França. Em causa estavam o Antigo Regime (Ancien
Régime) e a autoridade do clero e da nobreza. Foi influenciada pelos ideais
do Iluminismo e da Independência Americana (1776). Está entre as maiores
revoluções da história da humanidade. (disponível em http://pt.wikipedia.
org, acessado em 02/07/09)

R evolução I ndustrial . Termo adotado para designar as profundas


transformações econômicas e sociais, decorrentes da modificação do
sistema produtivo – o industrial substitui o artesanal – ocorrida a partir da
segunda metade do século XVIII, com a introdução gradual, da máquina
e dos novos sistemas de geração de energia motriz.

S alubridade pública. Medidas empreendidas pelo poder público para


promover a saúde e a higiene da população.

Sobreverga. Denominação dada a qualquer ornamento colocado sobre a verga


de uma porta ou janela, geralmente em forma de moldura.

T estada do lote. Largura de um lote pela parte da frente.

Tímpanos. Para interior do frontão. O tímpano pode ser liso ou decorado. No


frontão triangular é a parede limitada pela cimalha e pelas empenas.

U rbanismo. Ramo do conhecimento relativo aos problemas da cidade,


isto é, à elaboração de projetos para a construção e/ou à reorganização
de cidades. Embora ligada à arquitetura é um campo multidisciplinar.

V aranda. Espécie de alpendre à frente e/ou em volta das casas.

Valor cultural. O Decreto-Lei 25/37 estabelece que deve-se constatar o


interesse público vinculado a fatos memoráveis da história do Brasil, ou à
excepcionais valores artístico, arqueológico, etnográfico e bibliográfico.

1
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Fontes Consultadas

Fontes Consultadas

CUNHA, Almir Paredes. Dicionário de Artes Plásticas. Rio de Janeiro: EBA/


UFRJ, 2005.

GALVÃO, José Leme. Glossário (em elaboração).

http://pt.wikipedia.org.

http://www.dicionariodoaurelio.com.

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Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

Anexos

Anexo 1

Bens Tombados no Município


de Manaus no Âmbito Estadual

1. Academia Amazonense de Letras (Fundado em 1918);


2. Agência Central dos Correios e Telégrafos (Construído em 1905);
3. Agência do Banco Itaú (Construída em 1913);
4. Biblioteca Pública do Amazonas (Inaugurado em 1910);
5. Capela de Sto. Antônio (Ou do Pobre Diabo) (Construído em 1987);
6. Catedral Metropolitana de N. Sra. da Conceição (Inaugurada em 1977);
7. Cemitério São João Batista (Inaugurado em 1892);
8. Centro Cultural Palacete Provincial (Construído em 1895);
9. Centro Cultural Palácio da Justiça (Construído entre 1894 e 1900);
10. Centro Cultural Palácio Rio Negro;
11. Colégio Amazonense Dom Pedro II (Inaugurado em 1886);
12. Conselho Estadual de Educação (Inaugurado em 1895);
13. Escola Estadual Barão do Rio Branco (Final do Século XIX);
14. Escola Estadual Euclides da Cunha (Construída em 1895);
15. Escola Estadual Nilo Peçanha (Construída em 1898;
16. Escola Estadual Ribeiro da Cunha (1925);
18. Estação da Castelhana (1887);
19. Faculdade de Direito (Construído entre 1904 e 1907);
20. Igreja de Nossa Senhora dos Remédios (1878);
21. Igreja de São Sebastião (Inaugurada 1888);
22. Instituto Benjamin Constant (Inaugurado em 1896);
22. Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (Igha) (Fundado em 1917);
23. Penitenciária Central Desembargador Raimundo Vital Pessoa (Inaugu-
rado em 1907);
24. Ponte Benjamin Constant (Inaugurado em 1895);
25. Relógio Municipal (Concluído em 1927);
26. Teatro da Instalação (Início do Século?);
27. Tribunal de Contas da União (TCU) (Início Século XX);
28. Usina Chaminé (1910).

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Anexos

Anexo 2.- Legislação

Evolução da Legislação
de Proteção em Manaus

Sobre a legislação, extraímos na íntegra parte do parecer


que consta do Estudo de Viabilidade sócio-ambiental do Projeto Manaus/
AM do Programa Monumenta.

“A Lei Orgânica do Município de Manaus – LOMAM,


editada em 1990, reafirmou a necessidade de dotar a cidade de Manaus
de instrumentos que garantam seu crescimento equilibrado, ao estabele-
cer que o Plano Diretor deve ser elaborado e mantido atualizado – com
revisões a cada dez anos – como instrumento básico para o planejamento
das atividades do Governo Municipal e para a execução da política urbana.

A LOMAM definiu e delimitou o Sítio Histórico de Ma-


naus, que compreende a área situada entre a avenida Sete de Setembro e
a orla do rio Negro, inclusive o Porto Flutuante de Manaus, Praças Tor-
quato Tapajós, 15 de Novembro e Pedro II, ruas da Instalação, Frei José
do Inocentes, Bernardo Ramos, avenidas Joaquim Nabuco (em toda a sua
extensão), Visconde de Mauá, Almte. Tamandaré, Henrique Antony, Lauro
Cavalcanti e Governador Vitório. A mesma carta fundamental do Municí-
pio estabeleceu que, para fins de proteção, acautelamento e programação
especial, é considerado tombado o Centro Antigo de Manaus, compreen-
dido entre a rua Leonardo Malcher e a orla fluvial, limitado a direita pelo
Igarapé S.Raimundo e a esquerda pelo Igarapé de Educandos, tendo como
referência a ponte Benjamim Constant.

Somente em meados da década de 1990 foram realizadas


as primeiras tentativas de atualização do PDLI, através de um conjunto
de leis e decretos que estabeleceram novos conceitos e parâmetros para
o direcionamento do crescimento urbano de Manaus. Entre 1995 e 1997
foram editados mais de uma dezena de atos legais, complementados por
inúmeras resoluções normativas, que abrangeram variados aspectos sobre
o controle urbano e ambiental.

Dentre estes instrumentos merecem destaque:

• a Lei nº 2.79/95, que alterou a divisão territorial do Município (redefinindo


os limites das Áreas Urbanas, de Expansão Urbana e Rural), fixou novos

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57
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

critérios para os processos de produção do espaço urbano (instituindo o


instrumento do Solo Criado) e estabeleceu as Áreas Especiais de Interesse
Urbanístico (para aplicação do Solo Criado);

• o Decreto nº 2.742/95, que regulamentou as normas referentes à apli-


cação do Solo Criado;

• a Lei nº 283/95, que redimensionou as Regiões Administrativas da cidade;

• a Lei nº 287/95, que redelimitou os bairros de Manaus, diante da nova


delimitação das Regiões Administrativas;

• o Decreto nº 2924/95, que instituiu nova divisão geográfica da cidade,


mediante a delimitação de Zonas Urbanas;

• a Lei nº 321/95, que definiu as áreas que constituem o Sistema Municipal


de Unidades de Conservação, criou e delimitou as Unidades Ambientais
do Município;

• a Lei nº 353/96, que estabeleceu normas para a regularização de parce-


lamento do solo para fins urbanos, implantados irregularmente na Área
Urbana, e criou as Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS (para fins
de aplicação dos procedimentos de regularização).

As atividades de elaboração do Plano Diretor Urbano Am-


biental e de atualização dos instrumentos urbanísticos para o planejamento
e a gestão territorial do Município foram concluídas em outubro do mesmo
ano. O Município de Manaus adotou formas diferentes para a preservação
do patrimônio construído localizado na área central da cidade, com ênfase
na proteção de conjuntos urbanos.

Em 1985, o Município já havia estabelecido normas de


proteção para os bens culturais localizados na área central de Manaus, ao
instituir um Setor Especial de Unidades de Interesse para Preservação,
mediante o Decreto nº 4.673, constituído “pelas edificações que possam
concorrer significativamente para preservar as tradições e a memória da
Cidade”. O setor foi descrito como a área edificada limitada ao norte pela
rua Leonardo Malcher (entre o Igarapé S. Raimundo e a av.Joaquim Na-
buco), a leste pela av. Joaquim Nabuco, ao sul pela orla do rio Negro e a
oeste pelo Igarapé S. Raimundo.

Dentre os objetivos fixados pelo Decreto nº 4.673/85 foi


determinado que as Unidades Interesse de Preservação deveriam receber
“tratamento específico, visando adequá-la à valorização mais imediata e,
sempre que possível, integrá-la ao patrimônio da Cidade”. Para efeito de
aplicação da norma, a Seção de Preservação do Patrimônio Histórico e
Artístico, da então Secretaria Municipal de Planejamento Urbano – SEM-
PLURB, realizou extenso levantamento na área delimitada como Setor
Especial de Unidades de Interesse para Preservação com a finalidade
de identificar e inventariar as edificações consideradas merecedoras de

1
58
Anexos

proteção. Neste levantamento foram inventariados cerca de 1.000 bens


históricos e culturais, classificados em duas categorias, segundo o grau de
interesse de preservação, conforme metodologia adotada pelos técnicos
do órgão. (Grifo nosso)

A proteção destes bens foi efetivada através da Portaria


SEMPLURB nº 26/85(Grifo nosso), na qual foram relacionadas 284 edifica-
ções como Unidades de Interesse de 1º Grau e 585 edificações classificadas
como Unidades de Interesse de 2º Grau, além de 11 edificações/conjuntos
construídos considerados como Unidades de Interesse de Preservação da
Orla Portuária e 11 logradouros públicos classificados como Praças Anti-
gas. Segundo esta Portaria, as Unidades de Interesse de Preservação ficam
submetidas à tutela da Municipalidade e as intervenções nos bens inventa-
riados passam a sujeitar-se à apreciação especial pela Seção de Preservação
do Patrimônio Histórico e Artístico da SEMPLURB.

Dentre estes bens, figuram quase todos os monumentos


sob a tutela da União, através do IPHAN, e grande parte dos bens pro-
tegidos pelo Estado do Amazonas, podendo-se considerar, portanto, que
as leis e os atos decretados pelo Município de Manaus correspondem a
um, sobre tombamento dos bens já protegidos pelas demais esferas da
Administração Pública.

Muitos proprietários e empresários de Manaus questionam


o tombamento determinado pela LOMAM para o Centro Antigo de Manaus,
por considerá-lo indiscriminado e abrangendo uma extensa área urbana,
sem nominar os objetos específicos da proteção, já que a área tombada
pela Carta Municipal, contém inúmeras edificações e espaços urbanos que
não apresentam qualquer interesse histórico ou cultural. (Grifo Nosso).

Porém, é importante destacar que apesar de a Prefeitura


não ter utilizado o instrumento específico do tombamento para efetivar a
proteção dos bens inventariados a partir do Decreto nº 4.673/85, sua pre-
servação está plenamente garantida em função do que estabelece a legislação
vigente em nosso país, complementada pelas normas locais. Isto porque,
segundo nossa legislação e fundamentado nos conceitos internacionalmente
adotados e aqui praticados, o reconhecimento da importância histórica e
cultural de qualquer bem, material ou imaterial, através de seu inventário e,
conseqüente definição de formas e critérios de tutela, determina garantias
plenas de sua proteção.

Diante da extinção da SEMPLURB, a responsabilidade pela


análise das intervenções nos bens protegidos é realizada, atualmente, pela
Divisão de Controle Urbano, da Diretoria Técnica da Empresa Municipal
de Urbanização – URBAM, vinculada à Secretaria Municipal de Obras,
Saneamento Básico e Serviços Públicos – SEMOSB.

Em 2001, a Prefeitura Municipal logrou produzir um novo


Plano Diretor Urbano Ambiental para Manaus, que incluiu a atualização

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59
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

de instrumentos para a gestão territorial do Município e o planejamento


da cidade. A elaboração do Plano Diretor foi conduzida por uma equipe
de dirigentes e técnicos da Administração local, com o assessoramento do
IBAM, em um processo aberto que contou com a contribuição de diversos
segmentos da sociedade civil, através de dois seminários públicos e inúmeras
reuniões de consulta.

Observa-se que os antecedentes em relação às primeiras


iniciativas de proteção ao patrimônio histórico cultural de Manaus remotam
à 1984, portanto quando Manaus era um escritório técnico da 1a Diretoria
Regional sediada em Belém, e o Teatro Amazonas (1966) era o único bem
tombado pelo Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
SPHAN na Amazônia Ocidental.

Na época, a Secretaria Municipal de Planejamento Urbano,


da Prefeitura de Manaus, pressionada pela especulação imobiliária, em face
da inexistência de regras no Plano Diretor (1975) para disciplinar a verti-
calização na vizinhança do bem tombado, à exceção do Decreto-lei 25/37,
determinou a elaboração de um Projeto de Proteção ao Entorno do Teatro
Amazonas. Esse primeiro projeto constou da proposta urbanística e da
proposta de legislação, uma vez que essa regulamentação incluiria restrições
ao uso e ocupação do solo, matéria afeia à legislação urbanística. A partir
daí iniciou-se uma parceria informal entre o SPHAN/ Manaus e a equipe
técnica da SEMPLURB, parceria positiva para ambos já que o órgão federal
não dispunha de quadros no SPHAN/Manaus para a fiscalização técnica.

Essa parceria foi formalizada através de um Protocolo de


Intenções (17/10/1984) firmado entre a Prefeitura de Manaus e o Governo
do Estado do Amazonas, com a interveniência da SPHAN/PróMemória.
Entre outros projetos, resultaram daí a delimitação do entorno do Teatro,
com o apoio do arquiteto Jorge Derenji, continuando em 1986 com o do
Reservatório do Mocó, elaborado com a colaboração dos colegas arqui-
tetos, José Pessoa e Jurema Amaut, da antiga Diretoria de Tombamento e
Conservação, DTC/SPHAN, no Rio de Janeiro. Em 1987, com o tomba-
mento do Mercado Adolpho Lisboa e do Conjunto Arquitetônico do Porto
de Manaus, foi também elaborada a delimitação de suas áreas envoltórias
de proteção. Naqueles tempos, utilizava-se a Portaria n° 10 do SPHAN
e a fiscalização paralela efetuada pela Prefeitura e pela recém-criada 11a
Diretoria Regional do SPHAN/PróMemória.

Em 1988, dentro do novo espírito de autonomia municipal


trazido pela Constituição, a direção do SPHAN à época, Dr. Osvaldo Cam-
pos Mello, desestimulava a adoção das “portarias de entorno” por entender
essa medida como uma ‘invasão de competência’ do órgão federal nas
questões de uso e ocupação do solo. Dessa forma, a 118DR encaminhou
à administração municipal os estudos com as respectivas delimitações de
entornos para que fosse providenciada legislação específica de proteção
nas áreas do centro antigo e vizinhança dos bens tombados que permitiam
gabaritos de 12 e 18 pavimentos.

1
60
Anexos

A partir de 1990, a LOMAM de Manaus encampou os con-


ceitos e diretrizes da proteção ao patrimônio edificado, assimilados através
do exercício de colaboração que mencionamos, avançando na definição de
uma área da cidade tombada como Centro Histórico de Manaus (artigo
342), e na delimitação de uma área envoltória de proteção de no mínimo
300 metros, para os entornos dos imóveis tombados como patrimônio
histórico, por qualquer das esferas administrativas (artigo 235).

As circunstâncias que passaram a exigir a edição de uma


Portaria de Entornos do IPHAN, em caráter de urgência, são as seguintes:

1) o novo Plano Diretor Urbano e Ambiental de Manaus, que passou a


circular em 08 de novembro de 2002, faz menção ao atendimento às exi-
gências da legislação de proteção do patrimônio histórico da cidade em
vários artigos de seu conjunto de leis, que são elas:

• Lei n ° 671, de 04/11/2002 - regulamenta o Plano Diretor, estabelece


diretrizes para o desenvolvimento da Cidade de Manaus e dá outras pro-
vidências relativas ao planejamento e à gestão do território do Município;

• Lei n ° 672, de 04/11/2002 - institui as normas de uso e ocupação do


solo no município de Manaus e dá outras providências;

• Lei n ° 673, de 04/11/2002 - institui o Código de Obras e Edificações


do município de Manaus, e dá outras providências;

• Lei n ° 674, de 04/11/2002 - relativo ao licenciamento e fiscalização de


atividades em estabelecimentos e logradouros, que integra o Conjunto de
Posturas do município de Manaus, e dá outras providências;

• Lei n ° 644, de 08/03/2002 - regulamenta o perímetro urbano do mu-


nicípio de Manaus e descreve os limites da cidade, conforme as diretrizes
do Plano Diretor Urbano e Ambiental de Manaus;

• Lei n ° 665, de 23/07/2002 - regulamenta o parcelamento do solo ur-


bano no município de Manaus.

Numa leitura preliminar dos textos acima referidos,


constata-se um enorme avanço em relação à legislação anterior, de 1975,
com a adoção de um modelo de gerência do território urbano-ambiental.
Na questão da preservação, a Lei n° 671, de 4/11/02, traz uma proposta
inovadora de gestão no que denomina Estratégia de Qualificação Ambiental
e Cultural do Território, que tem como objetivo geral “tutelar e valorizar o
patrimônio cultural e natural de todo o município de Manaus” (art. 7° ) e
entre seus objetivos específicos “a proteção, conservação e potencialização
do uso dos bens de interesse de preservação que integram o Patrimônio
Cultural de Manaus (inciso IV do art. 7°), com a implantação do gerencia-
mento ambiental integrado que garanta a proteção dos patrimônios natural
e cultural do Município (inciso V do art. 7°);

1
61
Tombamento Federal do Centro Histórico de Manaus

No mesmo Capítulo II da Lei n° 671, de 04/11/02, na seção


H - Do Patrimônio Cultural, os artigos 11, 12, 13 e 14 definem conceitos,
diretrizes e o Programa de Valorização do Patrimônio Cultural a ser exe-
cutado em articulação com as demais instâncias de governo.

O estabelecimento de novos parâmetros de uso e ocupação


do solo e de incentivos construtivos, vai impulsionar os investimentos nos
terrenos que estão vazios ou subutilizados, em outros imóveis vai provocar
sua substituição por outros de maior gabarito. Contudo, o desenvolvimento
esperado só advirá de uma rigorosa fiscalização do cumprimento da le-
gislação pelo próprio poder público, e das correções e ajustes na própria
lei, sempre observando as condicionantes de qualidade do meio ambiente
urbano.

Entre essas condicionantes se inclui a manutenção de uma


parte da paisagem urbana, identificada com a história da construção da
cidade, onde estão contidos os marcos da memória coletiva, essenciais para
a referência do cidadão manauara com sua cidade e sua cultura;

As novas Leis n° 671 e 672, de 4/11/2002, tratam de uma


nova configuração da área urbana de Manaus, com figuras como “Macrou-
nidades”, “Unidades de Estruturação Urbana” ou UES e os “Corredores
Urbanos”, que criam novos limites e zonas com características redefinidas.
Como exemplo, na UES Centro Antigo, na Macrounidade Centro (art. 8°
inciso VI), é mencionada a “concentração de bens de interesse cultural, com
incentivo às atividades de comércio e serviços” ( o que é discutível, pois
pode criar uma zona sem vitalidade em determinados horários) e à manu-
tenção da volumetna atual em três bairros. No entanto, esta UES contém
o ‘Setor Sítio Histórico’ definido na Lei Orgânica, para a qual “os usos e
atividades estão condicionados à presença de bens tombados” (art. 8°).

O monumento federal Reservatório ou Caixa d’Água do


Mocó, tombado pelo IPHAN em 1986, inscrito no Livro Histórico e no
Livro de Belas Artes, situa-se na antiga Vila Municipal, junto ao Cemité-
rio S. João Batista, limite entre os atuais bairros da Praça 14 de Janeiro e
Adrianópolis, e portanto fora do limite tombado do Centro Histórico. Na
nova legislação, o Mocó está inserido numa UES Centro, com verticalização
média (gabarito máximo da edificação - 12), e próximo ao Corredor Urbano
Boulevard, onde o gabarito vai a 18 pavimentos. Numa análise apressada
podemos dizer que há um incentivo à ocupação intensa e verticalizada no
entorno desse bem tombado, o que poderá caracterizar o que chamamos de
uma “zona de potência conflito” de interesses nessa área de vizinhança.”

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