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Novo Módulo de MD 2018 Unidade 1

Matemática Discreta
Tópicos da Linguagem e da Lógica Matemáticas
Texto da Semana 4, Parte 1

Enunciados Quantificados

Sumário
1 Introdução 1

2 Constantes e variáveis 3
2.1 Observação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2.2 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

3 Propriedades 6
3.1 Observação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
3.2 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

4 Formação de enunciados por meio de quantificadores 9


4.1 Observação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
4.2 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1 Introdução
Em Matemática, é comum nos deparamos com enunciados do tipo:

todos os números de 1 a 4 são positivos (1)


todos os números são positivos (2)
algum dos números de 1 a 4 é par (3)
algum número é par (4)

que se referem a uma totalidade de objetos fixada de antemão, nesse caso os números
naturais positivos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, . . .
Observe que o enunciado (1) afirma que cada um dos números 1, 2, 3 e 4 é
positivo, sem exceção. Assim, ele pode ser reescrito de maneira direta como uma
conjunção:

1 é positivo e 2 é positivo e 3 é positivo e 4 é positivo.

Analogamente, o enunciado (3) afirma que ao menos um dos números 1, 2, 3 ou


4 é par, sem especificar exatamente qual. Assim, ele pode ser reescrito de maneira
direta como uma disjunção:

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1 é par ou 2 é par ou 3 é par ou 4 é par.

De maneira análoga ao enunciado (1), o enunciado (2) afirma que cada um


dos números 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, . . . é positivo, sem exceção. Mas observe que estes
números são dados em uma quantidade infinita. Assim, não podemos re-escrever (2)
de maneira direta como uma conjunção já que, neste caso, a conjunção deveria ser
infinita e não poderia ser escrita.
Também, de maneira análoga ao enunciado (3), o enunciado (4) afirma que
algum dos números 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, . . . é par, sem especificar exatamente qual.
E, novamente, como os números em questão são dados em quantidade infinita, não
podemos re-escrever (4) de maneira direta como uma disjunção já que, neste caso,
a disjunção deveria ser infinita e não poderia ser escrita.
Observações análogas se aplicam a enunciados do tipo:

todas as pessoas merecem respeito (5)


algumas pessoas merecem confiança (6)

que, embora não mencionem uma quantidade infinita de objetos (pessoas, no caso),
mencionam objetos cuja quantidade exata, a princı́pio, não pode ser determinada.
Em muitas situações, na Matemática ou no dia a dia, nos referimos a objetos
dados em quantidade infinita ou não especificada e necessitarmos afirmar que todos
eles ou algum deles possui uma certa caracterı́stica. Ou seja, em muitas situações,
necessitamos escrever enunciados — como (2), (4), (5) e (6) — que se fossem re-
escritos como conjunções ou disjunções teriam que possuir uma quantidade infinita
de componentes ou não possuiriam um número finito e bem determinado de com-
ponentes (o que nos impediria de re-escrever estes enunciados).
Para contornar esta situação, a Lógica e a Linguagem Matemáticas fazem uso
das noções de domı́nio, variável e quantificador lógico. Como veremos:

(1) um domı́nio é empregado para especificarmos de quais objetos estamos falando;

(2) uma variável é usada para fazermos referência indireta a cada objeto deste
domı́nio;

(3) e um quantificador lógico é usado para afirmarmos que uma certa propriedade
vale para todos ou para ao menos um dos objetos do domı́nio.

É sempre bom ter em mente que a Lógica e a Linguagem Matemáticas não são
idênticas à lógica e a linguagem do dia a dia. Esta diferença se manifesta em al-
guns usos dos conectivos lógicos, que são empregados na Lógica e na Linguagem
Matemáticas de maneira bem diferente da maneira que partı́culas análogas são em-
pregadas no dia a dia. E é no uso de variáveis e quantificadores que as diferenças
entre a Lógica e a Linguagem matemáticas e a lógica e a linguagem do dia a dia se
fazem mais pronunciadas.

Ler enunciados que possuem ocorrências de quantificadores, entender


suas estruturas e seus significados e manipulá-los adequadamente são
habilidades básicas que todo estudante de Matemática deve possuir.

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Nas aulas de Linguagem e Lógica Matemáticas, vamos estudar em detalhes o uso


de variáveis e quantificadores na simbolização e avaliação de enunciados. Por esta
razão, você deve estudar os conceitos e resultados apresentados neste texto com a
máxima atenção, até absorver todos estes conteúdos.

Este texto sobre enunciados quantificados complementa a Parte 1 do Texto da


Semana 2, sobre enunciados com conectivos.

Especificamente, neste texto, abordamos os conceitos de constante e variável


(Seção 2); propriedade (Seção 3); e quantificador lógico (Seção 4). Além disso, es-
tudamos a formação de enunciados por meio dos quantificadores lógicos aplicados
a propriedades re-escritas com o auxı́lio de variáveis (Seção 4). Depois de estudar-
mos este texto, vamos ser capazes de classificar certos termos como constantes ou
variáveis (Exercı́cios 1 e 2); re-escrever propriedades como enunciados com o auxı́lio
de variáveis (Exercı́cios 3 e 4); e re-escrever enunciados de uma maneira mais ade-
quada por meio dos quantificadores lógicos (Exercı́cios 5 e 6).

2 Constantes e variáveis
Na linguagem do dia a dia, usualmente, empregamos os nomes para nos referir-
mos a objetos determinados (concretos ou abstratos), em um dado contexto.

Exemplo 1 São exemplos de nomes:


Marly
passado
saudade
etc.

Por outro lado, para nos referirmos a objetos indeterminados (também concretos
ou abstratos) em um dado contexto, usualmente, empregamos os pronomes pessoais.

Exemplo 2 Os pronomes pessoais são:


eu
ele
nós
etc.

Em Lógica e em Matemática, os termos que são usados como nomes são chamadas
de constantes.

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Uma constante é um termo que denota um objeto fixo e bem determinado,


em um dado contexto, mas não deve denotar nenhum outro objeto naquele
mesmo contexto.

Exemplo 3 (a) O enunciado

1 é um número natural

possui ocorrência do termo


1
que denota um número especı́fico e bem determinado. Portanto, nesse contexto,

é uma constante.

(b) O enunciado
o eixo 0x é perpendicular ao eixo 0y
possui ocorrência dos termos
o eixo 0x
e
o eixo 0y
que denotam retas orientadas especı́ficas e bem determinadas. Portanto, nesse con-
texto,
o eixo 0x
e
o eixo 0y
são constantes.

Já os termos que são usados como pronomes pessoais são chamados de variáveis.

Uma variável é um termo que denota um objeto fixo e indeterminado, em um


dado contexto, mas pode denotar qualquer objeto (usualmente, do mesmo tipo
que o objeto já denotado), naquele mesmo contexto.

Exemplo 4 (a) O enunciado

se x é par, então x2 é par

possui ocorrência dos termos


x

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e
x2
que denotam números.
Como o valor de x — e, consequentemente, o de x2 — não está determinado,
nesse contexto, os termos
x
e
x2
são variáveis.

(b) O enunciado

o triângulo ABC é isósceles

possui ocorrência do termo

o triângulo ABC

que denota uma figura.


Como os valores de A, B e C — e, consequentemente o de o triângulo ABC —
não estão determinado, os termos
A
B
C
e
o triângulo ABC
são variáveis.

2.1 Observação
Observação 1 Em geral, nos estudos das disciplinas Matemáticas, devemos estar
sempre atentos às convenções adotadas, pois elas podem variar de texto para texto.
Em particular, não existe um consenso universal sobre quais termos da Linguagem
Matemática devem ser adotados como constantes ou variáveis.
De fato, alguns termos, como

o triângulo retângulo de lados 3, 4 e 5

e √
2
são universalmente empregadas como constantes; enquanto que outros, como

e
a função f (x)

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são universalmente empregadas como variáveis.


Porém, existem termos como
e
e
φ
cujo emprego como constante ou variável depende de certas convenções que podem
mudar de texto para texto.

2.2 Exercı́cios
Exercı́cio 1 Classifique cada termo abaixo como constante ou variável.
2
(i) 22 (ii) x+1
(iii) Pelé (iv) um amigo de Pelé
(v) (x, y) (vi) o quadrado de vértices (0, 0),
(1, 0), (1, 1) e (0, 1)
x
(vii) 2× (viii) (1 + 2)3
2
(ix) algum aluno de MD (x) ela e ele

Exercı́cio 2 Classifique como constante ou variável:


(i) o número x que somado com 1 é par
(ii) o triângulo ABC de lados 3, 4 e 5

Antes de ler as resoluções, tente resolver os exercı́cios usando os


conceitos estudados.

Resolução do Exercı́cio 1: (i) Constante. Denota um número determinado. (ii) Variável. De-
nota um número indeterminado. (iii) Constante. Denota uma pessoa determinada. (iv) Variável.
Denota uma pessoa indeterminada. (v) Variável. Denota um par ordenado de objetos indeter-
minados. (vi) Constante. Denota uma figura determinada. (vii) Variável. Denota um número
indeterminado. (viii) Constante. Denota um número determinado. (ix) Variável. Denota uma
pessoa indeterminada. (x) Variável. Denota um par de pessoas indeterminadas. Resolução do
Exercı́cio 2: (i) Variável. Denota um número não especı́fico. (ii) Constante. Denota uma figura
especı́fica.

3 Propriedades
O uso de variáveis fornece uma grande flexibilidade à Linguagem Matemática.
Por exemplo, por seu intermérdio, podemos re-escrever as propriedades como enun-
ciados.

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Uma propriedade é uma caracterı́stica que pode ser atribuı́da aos objetos de
um determinado tipo, sendo atribuı́da a um objeto de cada vez.

Exemplo 5 As seguintes caracterı́siticas são propriedades:


ser homem,
ser positivo,
ser carioca,
ser quadrado perfeito.
De fato, elas podem ser atribuı́das, por exemplo, a pessoas, números reais, mo-
radores do Estado do Rio de janeiro, e números naturais, respectivamente.
Usando as variáveis de maneira adequada, podemos re-escrever as propriedades
como enunciados.
Exemplo 6 Usando as variáveis x, y, u e n, podemos escrever as propriedades do
Exemplo 5 do seguinte modo:
x é homem,
y é positivo,
u é carioca,
n é quadrado perfeito,
respectivamente.
Quando re-escritas como enunciados, as propriedades podem ser combinadas por
meio de conectivos lógicos na formação de propriedades mais complexas. Ou, visto
de outra forma, com o uso de variáveis, certas propriedades que podem ser vistas
como formadas a partir de outras propriedades por aplicações dos conectivos lógicos
podem ser re-escritas como enunciados que possuem ocorrências destes mesmos co-
nectivos.
Exemplo 7 As frases
ser infinito,
ser homem feliz,
ser número ou figura,
ser racional, se animal,
ser matriz é o mesmo que ser tabela de números.
envolvem as propriedades:
ser finito,
ser homem
ser feliz,
ser número
ser figura,
ser racional
ser animal,
ser matriz
ser tabela de números.

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Agora, usando as variáveis x, y, z, u e v, estas propriedades podem ser re-escritas


como:
x é finito,
y é homem
y é feliz,
z é número
z é figura,
u é racional
u é animal,
v é matriz
v é tabela de números,
respectivamente.
Finalmente, aplicando conectivos lógicos a essas propriedades re-escritas, as fra-
ses originais podem ser re-escritas como os seguintes enunciados:
não (x é finito)
(y é homem) e (y é feliz)
(z é número) ou (z é figura)
se (u é animal), então (u é racional)
(v é matriz) se, e somente, se (v é tabela de números)
respectivamente

3.1 Observação
Observação 2 Na re-escrita de propriedades como enunciados, qualquer letra pre-
viamente especificada para este fim pode ser usada como uma variável.
Assim, por exemplo, para a propriedade

ser batráquio

podemos escrever tanto

x é batráquio

quanto

b é batráquio

(e outras) desde que esteja claro que as letras x e b (e as outras) estão sendo usadas
como variáveis.
Por outro lado, em Matemática, em cada disciplina especı́fica, certas letras são
quase que universalmente adotadas como variáveis para objetos de certos tipos es-
pecı́ficos.
Por exemplo:

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Disciplina Variáveis Denotam


Álgebra linear M , N , O, P , Q Matrizes
Aritmética a, b, c, m, n Números naturais
Cálculo x, y, z, u, v Números reais
Cálculo f , g, h, F , G Funções
Geometria P , Q, R, S, T Pontos
Geometria r, s, t, u, v Retas
Geometria α, β, γ, δ, θ Planos
Mas, como dissemos — exceto pelo uso bastante difundido das letras x, y, z, u,
v e w, como variáveis — não há convenções aceitas universalmente.

3.2 Exercı́cios
Exercı́cio 3 re-escrever as seguintes propriedades como enunciados, com o auxı́lio
de variáveis:
(i) ser aluno (ii) estudar muito
(iii) tirar boas notas (iv) ser função
(v) ser contı́nua (vi) ser derivável
(vii) ser cı́rculo (viii) ter centro
(ix) ter diâmetro (x) ser figura
Exercı́cio 4 re-escrever as seguintes frases como enunciados, com o auxı́lio de
variáveis:
(i) estar insatisfeito (ii) ser aluno matriculado
(iii) gostar de bolo ou de sorvete (iv) ficar feliz quando está estudando
(v) estar alerta quando, e somente
quando, acordado

Antes de ler as resoluções, tente resolver os exercı́cios usando os


conceitos estudados.

Resolução do Exercı́cio 3: (i) x é aluno. (ii) y estuda muito. (iii) z tira boas notas. (iv) u
é função. (v) v é contı́nua. (vi) w é derivável. (vii) x é cı́rculo. (viii) y tem centro. (ix) z tem
diâmetro. (x) u é figura. Resolução do Exercı́cio 4: (i) não (x está satisfeito). (ii) (y é aluno) e
(y está mariculado). (iii) (z gosta de bolo) ou (z gosta de sorvete). (iv) se (u estuda), então (u fica
feliz). (v) (v está alerta) se, e somente se, (v está acordado).

4 Formação de enunciados por meio de quantifi-


cadores
As variáveis que ocorrem nas propriedades re-escritas podem ser vistas como
“lacunas” que quando preenchidas com constantes (nomes de objetos especı́ficos)
ou outras variáveis (que denotam objetos não especı́ficos) permitem a formação de
novos enunciados.

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Exemplo 8 (a) Reescrevendo a propriedade


ser professora
como o enunciado
x é professora
podemos formar os enunciados
Eliane é professora
Kátia é professora
Marı́lia é professora
e muitos outros, obtidos pela substituição da variável

por nomes próprios de pessoas (ou constantes) adequados; e também, os enunciados


ela é professora
y é professora
a irmã de z é professora
e muitos outros, obtidos pela substituição da variável

por pronomes pessoais (ou variáveis) adequados.

(b) Reescrevendo a propriedade


ser função invertı́vel
como o enunciado
y é função e y é invertı́vel
podemos formar os enunciados
h : (0, ∞) −→ R tal que h(x) = ln x é função e h : (0, ∞) −→ R, tal que
h(x) = ln x é invertı́vel

g(x) = x + 3 é função e g(x) = x + 3 é invertı́vel

ζ(s) é função e ζ(s) é invertı́vel

f é função e f é invertı́vel

e muitos outros, obtidos pela substituição da variável

por nomes de funções (e.g. g(x) = x + 3), constantes que denominam funções (e.g.
ζ(s)), ou variáveis que tomam funções como valores (e.g. f ).

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Agora, se queremos afirmar que todos os objetos ou alguns objetos de um de-


terminado tipo possuem uma certa propriedade, sem especificar nenhum objeto em
particular, podemos recorrer ao uso dos quantificadores lógicos.

Seja ϕ(v) um enunciado que possui ocorrência(s) de propriedade(s) expressa(s)


com o auxı́lio da variável v.

Seja D um domı́nio de objetos onde v toma valores.

Quantificar v, em ϕ(v) sobre D, consiste em prefixar ϕ(v) com uma das


expressões
para todo v
ou
existe ao menos um v
que são lidas como se referindo aos objetos em D.

Para eliminar ambiguidades, podemos usar parênteses (chaves, colchetes, etc)


escrevendo para todo v[ϕ(v)] ou existe ao menos um v[ϕ(v)], etc.

Exemplo 9 (a) A partir do enunciado


n é par
e considerando o domı́nio
D : números naturais
formado pelos números 0, 1, 2, 3, . . ., podemos formar os enunciados
para todo n (n é par)
existe ao menos um n (n é par)
obtidos pela quantificação da variável n sobre D.
Observe que, de acordo com o domı́nio fixado, estes enunciados significam:
todos os números naturais são pares
existe ao menos um número natural que é par
e são F e V , respectivamente.

(b) A partir do enunciado


y é bı́pede
e considerando o domı́nio
D : pessoas vivas
podemos formar os enunciados

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para todo y (y é bı́pede)


existe ao menos um y (y é bı́pede)
obtidos pela quantificação da variável y em relação a D.
Observe que, de acordo com o domı́nio fixado, estes enunciados significam:
todos as pessoas são bı́pedes
existe ao menos uma pessoa que é bı́pede
e são V e V , respectivamente.

As partı́culas

para todos e existe ao menos um

são chamadas de quantificadores lógicos, quando são usadas na formação


de enunciados da maneira que vamos especificar a seguir.

Do ponto de vista sintático, os quantificadores lógicos se comportam como o ¬, ou


seja, são aplicados a um enunciado dado na formação de um novo enunciado. Mas,
para que a aplicação do quantificador faça sentido, o enunciado dado deve possuir
a ocorrência de pelo menos um pronome pessoal ou variável ao qual o quantificador
é aplicado.

Generalizações

Uma generalização é um enunciado obtido pela aplicação da partı́cula

para todos

ou uma de suas variantes:

todo , toda , todos , todas , para todo , etc

a um único enunciado, que possui ocorrência(s) de propriedade(s) expressa(s)


com o auxı́lio de pronome(s) pessoal(is) ou variável(is).

Em Lógica e Linguagem Matemáticas todas estas partı́culas são consideradas


sinônimas.

Exemplo 10 (a) A generalização do enunciado


ele é sapo
é o enunciado

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todos são sapos.


Usando a variável x, o enunciado pode ser reescrito como
x é um sapo
e sua generalização como
para todo x (x é sapo).

(b) A generalização do enunciado


M é matriz invertı́vel
é o enunciado
todas são matrizes invertı́veis.
Usando a variável y, o enunciado pode ser reescrito como
(y é matriz) e (y é invertı́vel)
e sua generalização como
para todo y [ (y é matriz) e (y é invertı́vel) ].
Como veremos na Observação 5, esta generalização não pode ser re-escrita como
todas as matrizes são invertı́veis
ou seja,
para todo y [ se (y é matriz), então (y é invertı́vel) ].

(c) A generalização do enunciado


se ele é homem, então é mortal
é o enunciado
todos os homens são mortais.
Usando a variável z, o enunciado pode ser reescrito como
se z é homem, então z é mortal
e sua generalização como
para todo z [ se (z é homem), então (z é mortal) ].
Como veremos, na Observação 5, esta generalização não pode ser re-escrita como
todos são homens e mortais
ou seja,
para todo z [ (z é homem) e (z é mortal) ].

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Existencializações

Uma existencialização é um enunciado obtido pela aplicação da partı́cula

existe ao menos um

ou uma de suas variantes

há , existe , existem , existe ao menos uma , etc

a um único enunciado, que possui ocorrência(s) de propriedade(s) expressa(s)


com o auxı́lio de pronome(s) pessoal(is) ou variável(is).

Em Lógica e Linguagem Matemáticas todas estas partı́culas são consideradas


sinônimas.

Exemplo 11 (a) A existencialização do enunciado

ele é um prı́ncipe

é o enunciado

existem prı́ncipes.

Usando a variável x, o enunciado pode ser reescrito como

x é prı́ncipe

e sua existencialização como

existe x (x é prı́ncipe).

(b) A existencialização do enunciado

T é transformação injetiva

é o enunciado

existem transformações injetivas.

Usando a variável y, o enunciado pode ser reescrito como

(y é transformação) e (y é injetiva)

e sua existencialização como

existe y [ (y é transformação) e (y é injetiva) ].

Como veremos, na Observação 7, esta existencialização não pode ser re-escrita


como

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existem as que, se transformações, são injetivas

ou seja,

existe y [ se (y é transformação), então (y é injetiva) ].

(c) A existencialização do enunciado

ele toma uma atitude, quando é forçado

é o enunciado

existem os que, se forçados, tomam uma atitude.

Usando a variável z, o enunciado pode ser reescrito como

se (z é forçado), então (z toma uma atitude)

e sua existencialização como

existe z [ se (z é forçado), então (z toma uma atitude) ].

Como veremos, na Observação 7, esta existencialização não pode ser re-escrita


como

existem os que são forçados e tomam uma atitude

ou seja,

existe z [ (z é forçado) e (z toma uma atitude) ].

4.1 Observação
Observação 3 Dada uma generalização

para todo v, ϕ(v)

de um enunciado ϕ(v) que que possui ocorrência(s) de propriedade(s) expressa(s)


com o auxı́lio de uma variável v; e dado um domı́nio D onde v toma valores, o
significado da generalização é a “conjunção” de todos os enunciados obtidos de ϕ(v)
pela substituição de v pelo nome de cada objeto em D.
Por exemplo, se D é formado por todos os matemáticos que já existiram, o
significado de

para todo x, x é inteligente

é a “conjunção”
(Tales é inteligente) e (Pitágoras é inteligente) e
(Euclides é inteligente) e (Arquimedes é inteligente) e . . .

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Observe que não é razoável esperar que alguém realmente escreva esta “con-
junção”.
É nestes casos que as variáveis, os domı́nios e os quantificadores mostram a sua
utilidade.

Observação 4 Analogamente, dada uma existencialização

existe ao menos um v, ϕ(v)

de um enunciado ϕ(v) que possui ocorrência(s) de propriedade(s) expressa(s) com o


auxı́lio de uma variável v; e dado um domı́nio D onde v toma valores, o significado
da existencialização é a “disjunção” de todos os enunciados obtidos de ϕ(v) pela
substituição de v pelo nome de cada objeto em D.
Por exemplo, se D é formado por todos os números complexos, o significado de

existe x, x2 = −1

é a “disjunção”
02 = −1 ou 12 = −1 ou (−1)2 = −1 ou i2 = −1 ou (1 + 2i)2 = −1 ou
√ 1 π
(−1 − 2i)2 = −1 ou π 2 = −1 ou ( + i)2 = −1 ou . . .
2 7
Neste caso, realmente não é razoável esperar que alguém escreva esta “disjunção”.
Ainda bem que temos as variáveis, os domı́nios e os quantificadores!

Observação 5 Quando analisamos um enunciado como

todos são alunos com dúvidas (7)

é comum ficarmos em dúvida se ele corresponde a um enunciado do tipo

para todo v (ϕ ∧ ψ) (8)

ou a um enunciado do tipo

para todo v (ϕ → ψ). (9)

Uma dúvida similar ocorre com um enunciado como

todos os alunos têm dúvidas. (10)

A qual dos dois tipos de enunciados, (8) ou (9), ele corresponde?


Para entendermos melhor esses enunciados, basta observarmos uma diferença
crucial que ocorre quando (8) e (9) são avaliados sobre um domı́nio D no qual
nem todos os objetos possuem a propriedade ϕ, mas todos os objetos possuem a
propriedade ψ. Ou seja, basta considerarmos um domı́nio D no qual:
Propriedade Situação
ϕ nem todos a satisfazem
ψ todos a satisfazem

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Em primeiro lugar, observe que (8) e (9) correspondem, cada um, a uma “con-
junção expressa pelo para todo”, cujos componentes são da forma ϕ ∧ ψ e ϕ → ψ,
respectivamente, um componente para cada valor que v assume em D.
Agora, como assumimos que nem todos os valores que v assume em D satisfazem
ϕ, temos que ϕ : F , para ao menos um valor que v assume em D. Assim, ϕ ∧ ψ :
F , para ao menos um valor que v assume em D, pois o primeiro componente da
conjunção é F . Portanto,

para todo v, (ϕ ∧ ψ) : F,

pois ao menos um dos componentes da “conjunção expressa pelo para todo” é F .


Por outro lado, como assumimos que todos os valores que v assume em D sa-
tisfazem ψ, temos que ψ : V , para todos os valores que v assume em D. Assim,
ϕ → ψ : V , para todos os valores que v assume em D, pois o consequente da
implicação é V . Portanto,

para todo v, (ϕ → ψ) : V,

pois todos os componentes da “conjunção expressa pelo para todo” são F .


Com isto em mente, voltemos aos enunciados (7) e (10).
Como vimos acima, (7) é F em um domı́nio no qual há não-alunos. Por ou-
tro lado, também como vimos, (10) é V em um tal domı́nio, desde que todos no
domı́nio possuam a propriedade ter dúvida — não é difı́cil imaginar um domı́nio
assim. Assim, (7) não pode corresponder a (9) e (10) não pode corresponder a (8).
Para ver que (7) corresponde a (8), basta observarmos — agora que entendemos
um pouco melhor como as generalizações são avaliadas — que quando (7) é V em
um domı́nio, todos no domı́nio devem possuir as propriedades ser aluno e ter dúvidas.
E isso é exatamente o que (8) representa. Finalmente, para ver que (10) corresponde
a (9), basta observarmos que quando (10) é F em um domı́nio, existe ao menos um
no domı́nio que possui a propriedade ser aluno mas não possui a propriedade ter
dúvidas. E isso é exatamente o que (9) representa.

Observação 6 Talvez a distinção mostrada na Observação 5 fique ainda mais clara,


se observamos o que acontece quando os enunciados (8) e (9) são avaliados sobre
um domı́nio D no qual nenhum objeto satisfaz a propriedade ϕ.
Neste caso, temos que ϕ : F , qualquer que seja o valor que v assume em D.
Assim, ϕ ∧ ψ : F , qualquer que seja o valor que v assume em D. E, portanto,

para todo v, (ϕ ∧ ψ) : F.

Por outro lado, novamente, temos que ϕ : F , qualquer que seja o valor que v
assume em D. Assim, ϕ → ψ : V , qualquer que seja o valor que v assume em D. E,
portanto,
para todo v, (ϕ → ψ) : V.
embora nenhum objeto satisfaça o antecedente da implicação!
Assim, por exemplo, de maneira surpreendente,
para todo n [ (n é negativo) → (n é positivo) ]

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é V , quando se referindo ao domı́nio dos números naturais.

Observação 7 Questões análogas as levantadas na Observação 5 ocorrem quando


analisamos enunciados como

existem alunos com dúvidas (11)

e
existem os que, se alunos, têm dúvidas. (12)
e nos perguntamos de que maneira eles correspondem a enunciados do tipo

existe v (ϕ ∧ ψ) (13)

e
existe v (ϕ → ψ). (14)
Para entendermos melhor estes enunciados, basta observarmos o que acontece
quando (13) e (14) são avaliados sobre um domı́nio D no qual:
Propriedade Situação
ϕ nenhum a possui
ψ todos a possuem
Em primeiro lugar, observe que (13) e (14) correspondem, cada um, a uma
“disjunção expressa pelo existe ao menos um”, cujos componentes são da forma
ϕ ∧ ψ e ϕ → ψ, respectivamente, um componente para cada valor que v assume
em D.
Agora, como assumimos nenhum dos valores que v assume em D satisfaz ϕ,
temos que ϕ : F , para todos os valores que v assume em D. Assim, ϕ ∧ ψ : F , para
todos os valores que v assume em D. E, portanto,

existe v, (ϕ ∧ ψ) : F,

pois todos dos componentes da “disjunção expressa pelo existe ao menos um” são F .
Por outro lado, como assumimos que todos os valores que v assume em D sa-
tisfazem ψ, temos que ψ : V , para todos os valores que v assume em D. Assim,
ϕ → ψ : V , para todos os valores que v assume em D, pois o consequente da
implicação é V . Portanto,
existe v, (ϕ → ψ) : V,
pois todos os componentes da “disjunção expressa pelo existe ao menos um” são V .
Com isto em mente, voltemos aos enunciados (11) e (12).
Como vimos acima, (11) é F em um domı́nio no qual ninguém é aluno. Por
outro lado, também vimos que (12) é V em um tal domı́nio, desde que todos no
domı́nio possuam a propriedade ter dúvida — não é difı́cil imaginar um domı́nio
assim. Assim, (11) não pode corresponder a (14) e (12) não pode corresponder
a (13).
Para ver que (11) corresponde a (13), basta observarmos — agora que entende-
mos um pouco melhor como as existencializações são avaliadas — que (11) é V em

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um domı́nio se, e somente se, há no domı́nio quem possui ambas as propriedades
ser aluno e ter dúvidas. E isso é exatamente o que (13) representa. Finalmente, para
ver que (12) corresponde a (14), basta observarmos que (12) é V em um domı́nio
se, e somente se, existe ao menos um no domı́nio cuja propriedade ter dúvidas está
condicionada a a propriedade ser aluno. E isso é exatamente o que (14) representa.
Observação 8 De maneira análoga à Observação 6, tavez a distinção mostrada
na Observação 7 fique ainda mais clara, se observamos o que acontece quando os
enunciados (13) e (14) são avaliados sobre um domı́nio D no qual nenhum objeto
satisfaz a propriedade ϕ.
De fato, neste caso, temos que ϕ : F , qualquer que seja o valor que v assume em
D. Assim, ϕ ∧ ψ : F , qualquer que seja o valor que v assuma em D. E, portanto,
existe v, (ϕ ∧ ψ) : F
Por outro lado, neste mesmo caso, como ϕ : F , qualquer que seja o valor que v
assume em D temos que ϕ → ψ : V , qualquer que seja o valor que v assume em D.
E, portanto,
existe v, (ϕ → ψ) : V
embora nenhum objeto satisfaça o antecedente da implicação!
Assim, por exemplo, de maneira surpreendente,
existe n [ (n é negativo) → (n é positivo) ]
é V , quando se referindo ao domı́nio dos números naturais.

4.2 Exercı́cios
Exercı́cio 5 Reescreva cada enunciado abaixo como uma generalização, usando
variáveis e conectivos de maneira adequada:
(i) todos são inteligentes
(ii) todos são indefinidos
(iii) todos são figuras planas
(iv) todos são preguiçosos ou vagabundos
(v) todas as figuras são triângulos
(vi) para cada um, ter direitos é o mesmo
que ter deveres
Exercı́cio 6 Reescreva cada enunciado abaixo como uma existencialização, usando
variáveis e conectivos de maneira adequada:
(i) existem indiferentes
(ii) há infelizes
(iii) alguns são ricos e poderosos
(iv) há circulares ou quadrangulares
(v) existem os que ficam felizes quando se
sentem poderosos
(vi) para ao menos um, ter direitos é o mesmo
que ter deveres

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Antes de ler as resoluções, tente resolver os exercı́cios usando os


conceitos estudados.

Resolução do Exercı́cio 5: (i) para todo x (x é inteligente). (ii) para todo y não (y é definido).
(iii) para todo z [ (z é figura) e (z é plana) ]. (iv) para todo u [ (u é preguiçoso) ou (u é vagabundo)
]. (v) para todo v [ se (v é figura), então (v é triângulo) ]. (vi) para todo w [ (w tem direitos) se,
e somente se, (w tem deveres) ]. Resolução do Exercı́cio 6: (i) existe x (x é indiferente). (ii)
existe y não (y é feliz). (iii) existe z [ (z é rico) e (z é poderoso) ]. (iv) existe u [ (u é circular) ou (u
é quadrangular) ]. (v) existe v [ se (v se sente poderoso), então (v fica feliz) ]. (vi) existe w [ (w tem
direitos) se, e somente se, (w tem deveres) ].

c 2018 Márcia Cerioli e Petrucio Viana


Coordenação da Disciplina MD/CEDERJ-UAB

Atualizado em 12 de agosto de 2018.

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