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TECNOLOGIA E SEUS

IMPACTOS SOBRE A
SOCIEDADE

Tema: Ciência, Tecnologia e Sociedade


CENTRO UNIVERSITÁRIO
LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, nº 1.040, Bairro Benedito
89130-000 - INDAIAL/SC
www.uniasselvi.com.br

Curso obre Tecnologias e seus Impactos Sobre a Sociedade


Centro Universitário Leonardo da Vinci

Autora
Maquiel Duarte Vidal

Organização
Elisabeth Penzlien Tafner
Meike Marly Schubert
Sonia Adriana Weege
Tatiana Milani Odorizzi

Reitor da UNIASSELVI
Prof. Hermínio Kloch

Pró-Reitoria de Ensino de Graduação a Distância


Prof.ª Francieli Stano Torres

Pró-Reitor Operacional de Ensino de Graduação a Distância


Prof. Hermínio Kloch

Diagramação e Capa
Letícia Vitorino Jorge

Revisão
Joice Carneiro Werlang
José Roberto Rodrigues
Tecnologias e seus Impactos sobre a Sociedade 1

CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE

Ementa

Sociedade entre ciência e tecnologia. Avanços tecnológicos. Relações de trabalho.

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, para adentrarmos nos assuntos relacionados à Ciência, Tecnologia


e Sociedade é necessário entendermos os fundamentos de cada tema, e, somente então,
relacionarmos com o todo.

Desta forma, convido você a discutir ciência sob diferentes óticas, analisar definições
e pensamentos acerca da tecnologia e algumas formas de interpretar a sociedade.

A seguir, abordaremos algumas relações sobre ciência e tecnologia, tratando sob o


contrato de neutralidade desta parceria; trataremos ainda do processo de análise da evolução
da sociedade sob algumas perspectivas; e, assim, analisar a entrada da participação da
sociedade nas discussões da, então, falida parceria ciência e tecnologia.

Somente então abordaremos a nova formatação da CTS com embasamento nas


discussões levantadas pelo trabalho dos pesquisadores Milton Santos e Wiebe Bijker. E para
finalizar, algumas considerações acerca de modernidade, pós-modernidade e globalização.

2 CIÊNCIA

Entender eventos, situações ou fatos novos é sempre uma tarefa fácil para você?
Se fosse designado para a incrível tarefa de defender um determinado episódio, como você
procederia? Essas indagações fazem-se necessárias para que ampliemos nossos horizontes
sobre o fato de que as pessoas constroem formas próprias para compreender a realidade, seja
observando pelo viés cultural, histórico, geográfico, ambiental, enfim.

A mitologia, a arte, a religião e até mesmo a ciência são observadas quando o foco é
explicar as situações que cercam os seres humanos. Você, com certeza, já deve ter ouvido
sobre Isaac Newton! Não se recorda? E sobre Isaac Newton e a história da maçã que caiu
sobre sua cabeça, originando assim a teoria da gravidade? Ficou mais fácil, não? Pois bem,
é desta forma que a sociedade explica situações do cotidiano: apoiando-se em diferentes
pensamentos para defender o que acontece ao seu redor.

Quando contrapomos a ciência natural à ciência humana podemos perceber o jogo de


conflitos, pois, conforme Omnés (1996), a ciência é capaz de explicar a realidade bastando para

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isso, princípios, regulamentos e normas. De qualquer maneira, tais conflitos são indissociáveis
da epistemologia e da política, uma vez que ocorre a tentativa de autoridade de uma ciência
sobre a outra. Desta forma, a realidade é comumente explicada pela ciência.

A ciência apresenta características que a fazem singular; é cumulativa, ou seja, não se


costuma descartar informações ou dados obtidos; é computável, permite o devido registro de
tais informações ou dados, e, além disso, é irrevogável. Segundo Abbagnano (2000), além de
utilizar sua própria linguagem, é baseada em métodos e fundamentos epistemológicos, o que
faz com que seja clara e objetiva.

Diversos são os métodos utilizados para explicar o cotidiano através da ciência.

Severino (2007, p. 102) nos diz que um método científico pode ser “um conjunto de
procedimentos lógicos e de técnicas operacionais que permitem o acesso às relações causais
constantes entre os fenômenos”. Já para Omnés (1996, p. 272), é “um conjunto de regras
práticas que permitem garantir a qualidade da correspondência entre a representação científica
e a realidade”.

Nessa mesma perspectiva, Omnés (1996) também propõe que o método deve cumprir
ainda algumas etapas que visam diminuir a distância entre a cientificidade do conhecimento e
a proposta de explicação do mesmo, que seriam:

QUADRO 5 - ETAPAS PARA EXPLICAÇÃO DO COTIDIANO ATRAVÉS DA CIÊNCIA

FONTE: Adaptado de OMNÉS (1996)

Faz-se de suma importância a compreensão sobre ciência e o conhecimento gerado por


ela. Porém, não se pode deixar de lembrar que o conhecimento científico avança pelo campo
da prática e não só pelo patamar teórico.

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3 TECNOLOGIA

O que surge no seu pensamento ao ouvir a palavra tecnologia? Porventura seriam


máquinas sofisticadas, ou, quem sabe, computadores de última geração? Exatamente, esses
são sinônimos de tecnologia, mas convido você a aprofundar seus conhecimentos ainda mais.
Veja, pelo menos, outras três vertentes possíveis para a utilização dessa palavra, segundo
Ferreira (2004):

1. Linguagem peculiar a um ramo determinado do conhecimento, teórico ou prático. 


2. Conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria.
3. Aplicação dos conhecimentos científicos à produção em geral.

Por mais simplificadas que sejam estas três conceituações, elas permitem a análise
inicial acerca da discussão sobre tecnologia.

Vamos iniciar falando sobre conjunto de processos utilizados em uma determinada


área, neste estamos falando de teoria e prática aliadas a fim de atingir um objetivo. Isso nos
faz inferir que o conhecimento científico não ocorre somente na academia, mas também no
ambiente de trabalho, ou seja, não só há produção de conhecimento científico no ambiente
acadêmico, mas nas prestadoras de serviço, as quais testam a teoria promovida pela ciência,
agora no campo da prática.

NOT
A!

Sobre isso há de se destacar uma situação relevante nas questões
tecnológicas, no âmbito de país, a capacidade de produção de tecnologia
também diferencia os países desenvolvidos dos em desenvolvimento.

Você consegue perceber, nessa explanação inicial, a ação do ser humano em tudo o
que se refere à tecnologia? Normalmente, quando se fala nesse assunto, logo se pensa em
tecnologia de ponta, sondas espaciais, nanotecnologia, enfim; porém, a própria transformação
das peles de animais em roupas, dos elementos da natureza em utensílios domésticos, o uso
do fogo, entre outros ao longo da história, são exemplos de tecnologia. E, sim, a tecnologia
está presente desde muito cedo na vida do ser humano.

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FIGURA 12 - A PRIMEIRA RODA

FONTE: Disponível em: <http://waz.com.br/


blog/2013/08/26/cinco-tecnologias-que-
mudaram-o-mundo/>. Acesso em: 15 maio
2015.

Maior complexidade há quando analisamos a tecnologia do ponto de vista técnico, pois


incluímos o campo de atuação da atividade humana e aumentamos os dados acerca do que
vem a ser tecnologia. Como já exposto, a tecnologia está em todos os meios, seja científico,
cultural, social; com isso, ratificamos as colocações de que em todas as ações humanas há
técnica e, portanto, a tecnologia está amplamente disseminada, como preconiza Abbagnano
(2000). Outrossim, é relacionada às implicações sobre todo esse conhecimento desenvolvido;
segundo Claval (2005), o uso, o aproveitamento e os resultados são de acordo com o objetivo
para o qual foi desenvolvida e o meio em que está inserida.

Pode-se perceber que a técnica está tão enraizada entre a natureza e o ser humano
que, para Santos (2006), é quase impossível separá-la, pois o homem já não se vê mais sem
o uso de tecnologia, que facilita, medeia e auxilia em muitos processos. Talvez possa surgir
aí um fator de preocupação: substituição (em demasia) dos elementos naturais por processos
artificiais. Fica a deixa para você pesquisar e analisar o que se apresenta de prós e contras
nessas questões.

Agora, partimos para a análise do último item sobre tecnologia, este pode ser traduzido
como tecnocracia, ou seja, o uso do conhecimento científico nos demais meios, porém, com
a divulgação exclusiva a partir do que a ciência e a técnica propõem como resultado. Neste
último, tal ação elimina as demais análises feitas a partir da concepção política, ideológica
e social, o que, por sua vez, pode causar o determinismo tecnológico. Não se esqueça, tais

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ações terão reflexo direto nas questões relacionadas à sobreposição das ciências humanas
às ciências da natureza.

Pelo que foi apresentado nesta breve explanação, pode-se perceber que as ações são
interligadas e que agem como reação em cadeia. Nesse processo, faz-se necessário entender
a sociedade como agente integrante e mediador de todos esses processos.

4 SOCIEDADE

Ao entender a importância de discutir a sociedade como parte integrante de todo o


processo relacionado à tecnologia, abre-se precedente para muitas indagações. As discussões
seriam inúmeras, pois seria necessário abrir alinhamentos no mais amplo sentido a fim de
ajustar as arestas para que se forme o conhecimento acerca do assunto. Seja no âmbito
político, econômico, social, cultural, ambiental, faz-se necessário apurar o contexto em que
ocorrem, a fim de compreender seu impacto. Lembrando que a ciência humana apresenta
grande diversidade de pressupostos metodológicos e epistemológicos, e estes serão abordados,
através de alguns autores e suas perspectivas, a seguir.

QUADRO 7 - PERSPECTIVAS DE TEORIAS E SEUS AUTORES SOBRE SOCIEDADE

FONTE: Adaptado de Tello e Mainardes (2012)


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Pode-se perceber que cada autor defende uma linha de pensamento, ora específica, ora
compartilhada por outro autor, porém, divergentes; no entanto, nas propostas de conceituação
sobre sociedade, cada um nas suas perspectivas defende seus pontos de vista. Vejamos, por
exemplo, Comte, em cuja teoria fez uso de leis e métodos das ciências naturais, entendendo a
sociedade como um grande organismo vivo, interligado e interdependente. O principal conceito
defendido por Comte era de que a sociedade evoluía apenas em uma direção, ou seja, sua
postura frente às mudanças era conservadora. Com base nesta teoria surgiram outras, nesta
mesma linha de pensamento, denominadas como Neopositivismo.

Por outro lado, Spengler entendia que a sociedade evoluía em ciclos que se encerravam
em grandes períodos, citando como exemplos as sociedades babilônica, egípcia, romana.

Marx, por sua vez, defendia a ideia de que a sociedade, como capitalista, começara a
dividir as classes sociais e tal divisão proporcionava observar a evolução da sociedade num
viés de produtividade e capitalismo.

Husserl tinha grande preocupação com a essência dos objetos e não com o materialismo.
Desta forma, considerava mais importante a experiência da consciência do que os demais
fatores materiais ou ideias.

Michel Foucault defendia a ideia de que o saber estava fortemente ligado ao poder,
e propunha uma genealogia para analisar a sociedade com a ideia de que o saber estaria
presente nas relações humanas e nas instituições disciplinadoras.

Assim, diversas são as teorias acerca da evolução da sociedade, que não se encerram e
tampouco foram todas apresentadas, mas que permitem dar-nos base para analisar, no contexto
da sociedade atual, a implicação da sociedade nas práticas atuais. Acertadamente, podemos
inferir que nenhum fator até aqui estudado age sozinho ou de maneira isolada, é no conjunto
da obra que a sociedade evolui, a ciência melhora e a tecnologia se adapta. (BAZZO, 2010)

5 SOCIEDADE ENTRE CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Já vimos a definição de tecnocracia, pela qual a ciência passa a ter razão sobre
tudo e todos. Pois bem, esta visão apresenta um modelo de progresso linear, pelo qual o
desenvolvimento social é apenas consequência do desenvolvimento proposto pela ciência,
que, por sua vez, geraria o desenvolvimento tecnológico e, somente então, chegaria no
desenvolvimento social.

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FIGURA 13 - O PROGRESSO DO PONTO DE VISTA DA TECNOCRACIA

FONTE: Adaptado de Auler e Delizoicov (2006)

Quando se trata do modelo linear apresentado, a perspectiva é de que tanto a ciência


quanto a tecnologia determinam as ações e melhorias, e a sociedade, por sua vez, somente
as recebe sem possibilidade de interação. Nesse modelo, a relação entre o desenvolvimento
científico e o social é casual, o que é fortemente criticado; outro fator de desagrado nesse
modelo, conforme Bourdieu (1983a) é da neutralidade da ciência. Segundo ele, esse fator é
tido como “utopia de interesses”, ou seja, coloca a ciência como melhor explicação da real
condição da sociedade.

Conforme pudemos observar, a tecnocracia, ou seja, a decisão de manter apenas


uma vertente entre ciência, tecnologia e sociedade não é neutra, pois age sobre interesses
políticos. O movimento ciência e tecnologia, ainda nos anos 60 e 70, foi duramente criticado
por promover, além do já exposto, problemas ambientais, além da aplicação da tecnologia
bélica, como, por exemplo, nas guerras mundiais.

Foi a partir das décadas de 60 e 70 que o movimento de neutralidade da dupla ciência


e tecnologia perdeu força e a sociedade passou a exercer seu papel de analisar criticamente
a parceria entre as duas frentes e participar das discussões técnico-científicas propostas pelo,
agora, grupo (ANGOTTI; AUTH, 2001 e AULER; BAZZO, 2001). A partir desse movimento,
outras frentes foram incorporadas às discussões sobre o que seria conhecimento científico e
tecnológico, bem como suas evoluções.

Como fora visto, mais precisamente após a II Guerra Mundial, a parceria entre ciência e
tecnologia passou por profundas mudanças, principalmente por começar a levar em conta o bem-
estar social. O primeiro avanço foi no sentindo de considerar o desenvolvimento tecnológico um
dos impulsionadores do progresso. A ciência, de certa maneira, também passou por mudanças,
ganhando a cada período maior importância. Passemos, agora, a analisar algumas reações
entre a parceria da ciência, da tecnologia e da sociedade, que se deu após essas grandes
adequações e modificações.

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6 CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE (CTS) – INTERPRETAÇÕES SOBRE A


NOVA FORMAÇÃO

Sob a nova ótica de formação, agora com o criticismo social, ciência e tecnologia passam
a ter uma conotação diferente e menos isolada. Para isso, convido-o para analisarmos, juntos,
duas interpretações, baseadas nos filósofos Wiebe Bijker e Milton Santos.

6.1 CTS SOB NOVAS ÓTICAS

Ao debater o tema CTS, procuramos trazer para a conversa a contribuição dos seguintes
pesquisadores: Wiebe Bijker e Milton Santos.

Wiebe Bijker (1951- ) é um construtivista social que trabalhou visando estabelecer


novas bases teóricas e metodológicas entre a CTS. O elo para esta nova parceria seria a
sociedade e, no momento em que assume este ponto de vista, começa a trabalhar com o
também construtivista social Trevor Pinch. Ambos envolvidos na divulgação de documentos que
debatem o relacionamento entre ciência e tecnologia, e destacando a importância da essência
social (BENAKOUCHE, 2005).

Outro pesquisador que traremos para a discussão é Milton Santos (1926-2001), um


geógrafo brasileiro que, por sua vez, tratou das questões relacionadas à CTS sob a ótica da
informação.

6.2 CTS SOB A ÓTICA DE MILTON SANTOS

Milton Santos traz à luz a discussão do meio ambiente e sua relação com CTS. Aborda
questões como o espaço e a sucessão de relacionamento entre o homem e a natureza, bem
como, a da organização humana. Desta forma, faz uma interessante análise sobre a divisão
do espaço geográfico. Para entender melhor, trazemos um trecho do texto “A natureza do
espaço”, que trata sobre as considerações do autor sobre meio natural, meio técnico e meio
técnico-científico-informacional.

O meio natural
Quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas partes
ou aspectos considerados fundamentais ao exercício da vida, valorizando, diferentemente,
segundo os lugares e as culturas, essas condições naturais que constituíam a base material
da existência do grupo.

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Esse meio natural generalizado era utilizado pelo homem sem grandes transformações.
As técnicas e o trabalho se casavam com as dádivas da natureza, com a qual se relacionavam
sem outra mediação.

O que alguns consideram como período pré-técnico exclui uma definição restritiva. As
transformações impostas às coisas naturais já eram técnicas, entre as quais a domesticação
de plantas e animais aparece como um momento marcante: o homem mudando a Natureza,
impondo-lhe leis. A isso também se chama técnica.

Nesse período, os sistemas técnicos não tinham existência autônoma. [...]. A harmonia
socioespacial assim estabelecida era, desse modo, respeitosa da natureza herdada, no
processo de criação de uma nova natureza. Produzindo-a, a sociedade territorial produzia,
também, uma série de comportamentos, cuja razão é a preservação e a continuidade do meio
de vida. Exemplo disso são, entre outros, o pousio, a rotação de terras, a agricultura itinerante,
que constituem, ao mesmo tempo, regras sociais e regras territoriais, tendentes a conciliar o
uso e a “conservação” da natureza: para que ela possa ser outra vez utilizada. Esses sistemas
técnicos sem objetos técnicos não eram, pois, agressivos, pelo fato de serem indissolúveis
em relação à Natureza que, em sua operação, ajudavam a reconstituir.

O meio técnico
O período técnico vê a emergência do espaço mecanizado. Os objetos que formam o
meio não são, apenas, objetos culturais; eles são culturais e técnicos ao mesmo tempo. Quanto
ao espaço, o componente material é crescentemente formado do “natural” e do “artificial”.
Mas, o número e a qualidade de artefatos variam. As áreas, os espaços, as regiões, os países
passam a se distinguir em função da extensão e da densidade da substituição, neles, dos
objetos naturais e dos objetos culturais, por objetos técnicos.

Os objetos técnicos, maquínicos, juntam à razão natural sua própria razão, uma lógica
instrumental que desafia as lógicas naturais, criando, nos lugares atingidos, mistos ou híbridos
conflitivos. Os objetos técnicos e o espaço maquinizado são lócus de ações “superiores”,
graças à sua superposição triunfante às forças naturais. Tais ações são, também, consideradas
superiores pela crença de que ao homem atribuem novos poderes, o maior é a prerrogativa de
enfrentar a Natureza, natural ou já socializada, vinda do período anterior, com instrumentos que
já não são prolongamento do seu corpo, mas que representam prolongamentos do território,
verdadeiras próteses. Utilizando novos materiais e transgredindo a distância, o homem começa
a fabricar um tempo novo, no trabalho, no intercâmbio, no lar. Os tempos sociais tendem a se
superpor e contrapor aos tempos naturais. [...].

O meio técnico-científico-informacional
O terceiro período começa praticamente após a Segunda Guerra Mundial, e sua
firmação, incluindo os países de terceiro mundo, vai realmente dar-se nos anos 70. É a fase

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a que R. Richta (1968) chamou de período técnico-científico, e que se distingue dos anteriores
pelo fato da profunda interação da ciência e da técnica, a tal ponto que certos autores preferem
falar de tecnociência para realçar a inseparabilidade atual dos dois conceitos e das duas práticas.

Essa união entre técnica e ciência vai dar-se sob a égide do mercado. E o mercado,
graças exatamente à ciência e à técnica, torna-se um mercado global. A ideia de ciência, a
ideia de tecnologia e a ideia de mercado global devem ser encaradas conjuntamente, e desse
modo podem oferecer uma nova interpretação à questão ecológica, já que as mudanças que
ocorrem na natureza também se subordinam a essa lógica.

Neste período, os objetos técnicos tendem a ser ao mesmo tempo técnicos e


informacionais, já que, graças à extrema intencionalidade de sua produção e de sua localização,
eles já surgem como informação; e, na verdade, a energia principal de seu funcionamento é
também a informação. Já hoje, quando nos referimos às manifestações geográficas decorrentes
dos novos progressos, não é mais de meio técnico que se trata. Estamos diante da produção
de algo novo, a que estamos chamando de meio técnico-científico-informacional.

Da mesma forma como participam da criação de novos processos vitais e da produção


de novas espécies (animais e vegetais), a ciência e a tecnologia, junto com a informação,
estão na própria base da produção, da utilização e do funcionamento do espaço e tendem a
constituir o seu substrato. [...].

Podemos então falar de uma cientificização e de uma tecnicização da paisagem. Por


outro lado, a informação não apenas está presente nas coisas, nos objetos técnicos, que
formam o espaço, como ela é necessária à ação realizada sobre essas coisas. A informação
é o vetor fundamental do processo social e os territórios são, desse modo, equipados para
facilitar a sua circulação. [...].

Os espaços assim requalificados atendem, sobretudo, aos interesses dos atores


hegemônicos da economia, da cultura e da política e são incorporados plenamente às novas
correntes mundiais. O meio técnico-científico-informacional é a cara geográfica da globalização.

FONTE: Santos (2006, p. 157-161)

Após esta leitura, você conseguiu identificar os aspectos importantes da relação entre
CTS que Milton Santos aborda? Como você pôde ver, essa questão é analisada na perspectiva
de que as relações foram sendo estabelecidas ao longo do tempo e de maneira dialética. O
autor destaca questões que merecem ser reanalisadas, como: a necessidade de determinar
as características do mundo atual (como modernidade, pós-modernidade e globalização),
assim como a história das relações entre CTS. Outro ponto que merece ser revisitado são as
relações entre CTS em uma lógica de mercado, ou seja, buscar reflexões sobre o sistema

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produtivo como um todo.

6.3 CTS SOB A ÓTICA DE WIEBE BIJKER

Um dos principais incentivadores do movimento construtivista social foi Wiebe Bijker.


Para entendermos melhor suas ideias e ideais, gostaria de compartilhar um pequeno trecho
do artigo “Tecnologia é Sociedade: contra a noção de impacto tecnológico”, de Benakouche
(1999), que aborda os principais vieses deste pesquisador.

Sustentando que os vários elementos envolvidos no processo de inovação tecnológica


constituem uma teia contínua (“seamless web”), Bijker pretende dar conta dessa realidade através
da elaboração de uma teoria que:
a) explique tanto a mudança quanto a estabilidade das técnicas;
b) seja simétrica, ou seja, possa ser aplicada tanto às técnicas que dão certo como às
que falham; c) considere tanto as estratégias inovadoras dos atores como o caráter limitador
das estruturas; e, finalmente
d) evite distinções a priori entre o social, o técnico, o político ou o econômico.

Diante de tal agenda, propõe o uso de alguns conceitos básicos e operacionais, postos
inclusive à prova nos vários estudos de caso que realizou, dentre os quais se destacam os de
grupos sociais relevantes, estrutura tecnológica (“technological frame”), flexibilidade interpretativa
(“interpretative flexibility”) e estabilização ou fechamento (“closure”).

Os “grupos sociais relevantes” são aqueles mais diretamente relacionados ao


planejamento, desenvolvimento e difusão de um artefato dado; na verdade, seria na interação
entre os diferentes membros desses grupos que os artefatos são constituídos. Nesse processo,
os atores não agem aleatoriamente, mas segundo padrões específicos, isto é, agem a partir das
“estruturas tecnológicas” às quais estão ligados; esta noção – central, neste quadro analítico-
descritivo – é ampla o suficiente para incluir teorias, conceitos, estratégias, objetivos ou práticas
utilizados na resolução de problemas ou mesmo nas decisões sobre usos, pois não se aplica
apenas a grupos profissionais especializados, mas a diferentes tipos de grupos sociais. Segundo
Bijker, existiriam diferentes graus de inclusão nessas estruturas, isto é, de envolvimento.

Na medida em que os grupos atribuem diferentes significados a um mesmo artefato, sua


construção supõe um exercício de negociações entre esses mesmos grupos, onde o uso da
retórica é um recurso poderoso, ou seja, é objeto de uma “flexibilidade interpretativa”. Quando
esta atividade de ajustes se estabiliza e um significado é fixado ou aceito, diz-se que o artefato
atingiu o estágio de “fechamento”. É justamente a prática da flexibilidade interpretativa que retira
dos artefatos sua obturacidade; é ela que explica porque os mesmos não têm uma identidade ou

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propriedades intrínsecas, as quais seriam responsáveis por seu sucesso ou o seu fracasso, seus
“impactos” positivos ou negativos. Em outras palavras, o não reconhecimento da importância
desse processo é que leva à crença equivocada do determinismo da técnica. Assim é que
tudo, numa tecnologia dada, do seu planejamento a seu uso, estaria sujeito a variáveis sociais,
e portanto, estaria aberto à análise sociológica. No entanto, pode-se perguntar: ao se adotar
essa perspectiva não se corre o risco de se cair num reducionismo social? Não, respondem
os pesquisadores identificados com a mesma. O reconhecimento da existência de estruturas
tecnológicas evitaria esse risco: na medida em que as mesmas influenciam a ação dos diferentes
grupos sociais relevantes, essas estruturas seriam justamente as pontes que ligam tecnologia e
sociedade, levando à constituição de conjuntos sociotécnicos (BIJKER, 1995).

FONTE: Benakouche (1999, p. 11-13)

Após esta leitura, você pode traçar os principais pontos elencados pelo autor?

Se você citou a questão da importância de debater as ações do trio CTS em conjunto,


com o enfoque nas ações sociais, você fez uma excelente leitura. Wiebe Bijker foi um dos
grandes defensores da participação da sociedade nas discussões relacionadas à ciência,
e como consequência, demonstra em todos os seus discursos o repúdio à parceria entre
sociedade e tecnologia.

A partir das colocações proporcionadas pelos dois autores é possível elencar pontos
que merecem ser revistos, como, por exemplo, a forma com que as comunicações de massa
são disponibilizadas e utilizadas pela sociedade, assim como a importância da tecnologia no
cotidiano e a dependência tecnológica.

7 CARACTERIZANDO O MUNDO ATUAL

Ao caracterizar o mundo atual, faz-se necessário observar três vertentes singulares:


modernidade, pós-modernidade e globalização. É importante analisar esses três pontos para
que se possa avançar nos estudos sobre CTS. Vamos lá?

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QUADRO 8 - PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS CONCEITOS DE MODERNIDADE, PÓS-


MODERNIDADE E GLOBALIZAÇÃO

FONTE: Adaptado de David Harvey (2003)

O que vem a ser a modernidade? Para muitos, o conceito de modernidade refere-se a


ideias bastante controversas, compreendendo desde pequenas práticas a formas de perceber,
conceber e viver o mundo. Para melhor situá-lo, relembramos três grandes eventos: Revolução
Industrial, Revolução Francesa e Revolução Científica.

A pós-modernidade ainda é complexa e a ideia não é amplamente aceita por todos


os cientistas e pensadores. As dúvidas e diferenças surgiram em torno de 1970 e 1990, mas
ainda assim pode-se verificar duas linhas de discursos, quando o termo é pós-modernidade:
a da continuidade e a do rompimento.

Agora, quando o assunto é globalização, o termo é mais conhecido, tendo em vista


que é assunto atual e amplamente divulgado e trabalhado na mídia. Como todo conceito,
este também apresenta seus prós e contras, pois está fortemente ligado à maneira como foi
apreendida pela sociedade. O marco inicial da globalização é fracamente indicado, como no
período da Revolução Tecnocientífica, porém, viu-se nesse uma importante ferramenta de
longo alcance, com ligações para diferentes partes do mundo.

A globalização está amparada, principalmente, nos avanços tecnológicos, assim


como nas relações sociais e econômicas, no mercado da conectividade e da virtualidade. A
compressão da globalização, conhecida como compressão tempo-espaço, é abordada como
sendo a responsável por alterar a forma de comunicação entre as pessoas, como a telefonia
móvel. (HARVEY, 2003). Porém, como tudo tem seu outro lado, assim também é na globalização,

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14 Tecnologias e seus Impactos sobre a Sociedade

podendo proporcionar tanto a inclusão como a desigualdade social.

Uma importante observação precisa ser feita sobre esse ponto: deve-se cuidar para que
os avanços tecnológicos não venham a causar o determinismo tecnológico, o que ocasionaria
o mesmo pensamento de que a ciência e a tecnologia são neutras. Nesse momento, o que se
deve buscar é usar a tecnologia como ferramenta e não como base.

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Referências bibliográficas

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