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ZCL1A MILAMEZ DE LOSSIO E SEISLlTZ

08 AR0UITET08 00 PARAÍSO

VOLUME 1

TESE DE DOUTORAMENTO APRESENTADA AO


PROGRAMA DE POS-GRADUACfcO EM
ANTROPOLOGIA SOCIAL DO MUSEU
NACIONAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO DE JANEIRO

•O

RIO DE JANEIRO

1992
ZELIA MILANEZ DE LOSBIO E 8EIDLITZ

OS ARQUITETOS DO PARAÍSO

VOLUME II

TESE DE DOUTORAMENTO APRESENTADA AO


PROGRAMA DE PÒS-GRADUAÇ&O EM
ANTROPOLOGIA SOCIAL DO MUSEU
NACIONAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO DE JANEIRO

RIO DE JANEIRO

1992
m u s e u n a c io n a l

DEP- OE ANTROPOLOGIA
BIB LIOTECA
000629-7
N.* RE6. 0 *■’/• A
FflHATA

ONDE SE LÈ: LFIA-SE:

pág.102 ,§2 ,1.•7 -Nota 5 Nota 3

pág.129,§3,L .4 -Nota 14 Mota 11

pág.20G ,'§2 ,L .10 -lcclário leclonárlo *

Pag.228,N.3,E .7 -...a afirma ...a afirmação rtc quo tod3®


ção, a separação... rellglÕea ac equivalem, n
clzação das Instituições. ® *—
paração...
pág.261,§2,L.3 -sobre sofre

pág.270,§3 ,L .7 -Nota 10 i Nota 19

pág.295,§3,L.1 -escapam ao extrapolam o

pág.299 -(conteúdo da Nota 16) Veja Nota 3 do Cap.Ilí (púg-228)

pág.320,§3,L .4 -...o quadro Verifique o Anexo a cata Errata


abaixo, ela‘orado...

pág•334,§2,L .7 -Estes, alertados Esta, consistia no alerta dado


padres que satanás está na polos padres de quo satanas es­
Assembléia, toemn os sinos i- tava na Assembléia, tocando os
nintorruptamento sempre que sinos ininterruptamorito sempre
se anuncia alguma pregaçao. que se anunciava alguma prega­
A hostilidade atual, porém, ção. A hostilidade atual,assim,
tem antecedentes... tem antecedentes...
ANEXO Quadro referente a pag.320

oMonjolinho 0 Ouro

©Pinheiro ° Murupi
©Boa Esperança © Amparo
o Cachoeira Ouro
©"S.Joao Demora
©Boa jj
Sort
9 Boa Vista

o Onça
0 Cedro
o Onça
e Fortaleza ©Onça °*Taqyara
mea

°-Prova.-
denc
oSts Antonio 3j|
Jacutmga ©Boa Sorte O-St® Antonio
do Paraiso
.° Confusa Bau
o Bom Destino . ' o Pombal
o Vista Alegre •Paraiso

©.Boa Vista ©Sts Cruz


©Boa Esperança
Onça dos Coimbra ° Bom Retiro
Vargem Alegre

°Arataca °VaÍ e Volta


aCruz da Ana

Q C/AlUlu-SAp °Monte Belo

oConfiança °Barra Funda


^Sta Fo
Floresta
°Boa Sorte
°Dcnde
°Candonga
a Providencia
Criciúma
Boa Sorto Ventania

o.Paciencia
Matlnada

d Bola Vinte
Haverá presente melhor do que
uma idéia?

Dedico este trabalho á amiga


Delma Pessanha Neves que me
incentivou a estudar a crise
religiosa na Diocese de
Campos. Fecundei a idéia dela
com a minha sensibilidade e
moldei o presente segundo
minhas limitações.

A meu pair José de Britto


Hilanez (in memorial).
AGRADECIMENTOS

Uma das belezas da vida repousa na dificuldade em

separar razão de emoção. Por issor gostaria que a ordem dos

agradecimentos que segue não sugerisse a proeminência de

qualquer das duas. Elas se interpenetram, tecendo essa

experiência intransferfvel que é o aventurar-se a conhecer o

"outro".

Agradeço ao meu orientador, O r . Rubem César Fernandes

que foi duplamente generoso comigo: acreditando na possibilidade

desta tese quando eu mesma duvidava e fornecendo os meios

intelectuais de realizá-la.

Um destes meios, além cias aulas no Museu Nacional, foi

introduzir-me ao Grupo de Estudos do Catolicismo, do Instituto

de Estudos da Religião (GEC-ISER), coordenado pelo Dr. Pierre

Sanchis* Com ele aprendi muito do que sei, e mais ter ia

aprendido, se me fosse dado começar tudo de novo. Sob sua

regência orquestrava-se uma peça singular: perspectivas tedricas

diferentes, abordagens espec Tf icas., experiências particulares

dialogavam no maior respeito, resultando no redimensionamento de

todos e no crescimento de cada um. Transitava-se da

Antropologia ^ Sociologia e à Histdria, Filosofia e Teologia,

podendo-se partilhar da riqueza de cada Perspectiva e

Favor n5o fazer anotado» ou (jrifot


i tinia nu & lápis ««*'» P'll,!'MçS*
relativizar nosso próprio enfoque. Podia-se também amar aquelas

pessoas tao diferentes entre si mas tao unidas no grupo e

solidárias nos sonhos de uma sociedade mais justa. Da amizade

antiga dos tempos da graduação no 1FCS - no caso de Regina

Novaes - ã admiração do cosmopolitismo de Ralph Delia Cava e

Carlos Rodrigues Brandão, passando-se por uma gama de

personalidades como o próprio Rubem César Fernandes, Pedro


Ribeiro de Oliveira, Francisco Cartaxo Rolim, Heraldo Maués,

Carmen Cinira Macedo - tao cedo levada ! E junto com idéias e

bibliografias trocávamos também as vivências de doutorandos com

Samyra Brollo Crespo, Nair Costa Mulls, Thelma Birchal, Patrícia

Birman, Mathias Martinho Lenz, José Ivo Follmann. E com nomes

novos que foram chegando, como Paula Montero, Ana Maria Doimo,

Ken Serbin e outros de mais recente ingresso ou de presença

esporádica, porém importante, como Alberto Antoniazzi. A todos

devo muito.

Agradeço aos professores do Museu Nacional que

participaram da minha formação como o Dr. Gilberto Velho, meu

orientador no mestrado e o Dr. Otávio Velho, sub-orientador

desta tese. E também aos professores Drs- Luiz Fernando Dias

Duarte, José Sérgio Leite e Lopes, Castro Faria, Moacir

Palmeira, Ligia Sigaud, Roberto Da Matta, dos quais muito me

orgulho de ter sido aluna.


Da Pontifícia Un iver a Idada do Rio de Janeiro, onde

leciono desde 1976, quero registrar o nome do F>e Luiz Garcia de


Souza, S.J. que com o zelo fraternal que o caracteriza,

conseguiu material bibliográfico de difícil acesso. E quero

também lembrar ex-alunas que se tornaram amigas e colaboradoras


como Ana Cristina Abreu, Ana Teresa Ven&rtcio e Nalr Palhano.

Agradeço ainda a Conceição de Maria Muniz e Gerson

Ramos, de Campos, com a ajuda dos quais pude chegar mais perto,

compreender respectivamente, dos bispados de D. Navarro e D*

Mayer. E também ao Rangel, da Livraria Noblesse, sempre

preocupado em articular as pessoas interessadas em conhecer


Campos•

Vai aqui minha gratidão para Jamilton Nunes Vieira,

Nazirinha Abib Vargas e D. Amélia de Oliveira Vargas que abriram

suas vidas e seus corações para que eu me aproximasse mais da

comunidade. Informantes privi1egiados que se tornaram amigos,

junte a eles outros nomes como os de Lucimeri Tupini, Marléia

Ramos, Aríete - a eficiente secretária do Pe Antonio -e tantos

que mesmo nSo escritos aqui estão registrados para sempre na

minha alma. E a toda a população de Varre-Sai que me recebeu de

braços abertos* Sem aquele carinho esse trabalho não existiría.


Agradeço ainda ao trabalho eficiente e devotado de Paulo
Roberto Queiroz da Motta e harllza Jose Murta que socorreram-me
na corrida final, possibilitando que minha desorganização fosse
recuperada.

Contei com bolsas de estudo do CNPq e do Museu Nacional

que permitiram não sd realizar o trabalho de campo como dedicar-

me exclusivamente ã pesquisa por expressivo período de tempo.

Para finalizar, e atravessando todas as dimensões Já

mencionadas, agradeço a minha mãe, Nair de Albuquerque Milanez

que me acompanhou no exílio de Friburgo, quando, ingenuamente,

pensava que seria fácil a minha tarefa; ao Maurício, marido de

sempre, que Já havia me ensinado, na prática, sólidos princípios


cr Ist aos.

Agradeço ainda aos meus filhos Nena, Paulo, Tetê e

Pedro, cujo carinho e estímulo constantes aliviaram de multo

minha ansiedade e também á Adalva, cunhada sempre pronta a ouvir

minhas lamentações. As minhas netas, Clara e Natália, pela

paciência com que aguardaram a vez de merecer as atenções de uma

avó sempre Vs voltas com livros, papéis e viagens.


Há luz bastante pmrm aqueles que desejam ver e
muita escurid&o para os que tèm disposição
contrária.

Pascal
REBUMO

Articulando tres plano® de analise* o local * o diocesano

e o universal* este trabalho ■focaliza a crise instalada na

Diocese de Campos na década de 80. Para pensar a atualização do

enfrentamento de duas correntes católicas* a "tradicionalista" e

a "progressista"* o relato se situa também a partir de tres

tempos: o da longa história da Igreja; o do bispado de D.

Antonio de Castro hayer e de D. Carlos Alberto Navarro* o do

cotidiano em Varre-Sari •

Esta* escolhida como o "locus" para a observação

intensiva* foi privilegiada em virtude da força com que al I se

verificou o conflito. Abordo o processo pelo qual a categoria

'tradição passa a ser de princípio informador da unidade* a

micleo inspirador de uma ideologia, o "tradicionalismo".

Apoiando-me no exame da homologia existente entre a instituição

família e a instituição Igreja, concluo qualificando o episódio


como uma radicalização da cultura.

favor não lazer anotardes ou QrilM


I Vmta «u k Vòpvs nesta fuWicaçd*
vi ii

ÍNDICE

PAGINA

RESUMO .....................................................vii

INTRODUÇÃO ................................................. 1

I - A UNIDADE COMO VALOR ................................. 25


1.1 - A Posse ......... ............................... 27
1.2 - A Unidade no Novo Testamento -----............. 43
1.3 - A Unidade como Valor ........... .......-........ 55
1.4 - A Operac ional ização da Unidade ............. . 70

NOTAS ................................................. 83

II - 0 CONFRONTO ........................................... 95
II. 1 - As Primeiras Medidas ....................... . 95
11.2 - Reorganizando aDiocese .............. 106

11.3 - 0 Decreto .......... ............. ......... 128

II .4 - Crise e Norma C a nônica.... .......... 131

NOTAS ...,............................................. 147

III-O ANTI-MODERNISMO EM CENA .............................. 168

111.1 - Exonerações ............ 169

111.2 - Raízes Ant i-modern ist a s ...... 180

111.3 - 0 Pensamento de D. Mayer ....... 189

III .4 - A Questão Litiirgica ..... ............ 205

NOTAS ............................................. -.....228

F»v-or não la:tr ariota-Oea ou grifo,


è tinta ou i lipi* naita publicaçâ.
ÍNDICE

IV - TRADIC&0 E TRADICIONALISMO..... ...................... 236

IV.í - A Igreja na Modernidade .................... 236

IV.2 - De Trento à Crise Modernista ........ 247

IV.3 - UmCisma Contemporâneo ? ............... 263

IV. 4 - Da Tradição ao Tradicionalismo ................. 283

NOTAS .............. ............... ........ . 296

V - 0 COTIDIANO CATOLICO ................................... 30 5

V. í - Uma Diocese Tradicional ..... 305

V.2 - Varre-Sais Um lugar c a t ó l i c o ...... ............. 317

V.3 - A Sombra do Padroeiro ........... . 332

V. 4 - Pausas no Cotidiano ........................ 351


NOTAS ................................................... 3 7 4

VI - SENTIMENTOr TRADICfiO E TRADICIONALISMO ................ 383

VI. 1 - A Noção de sentimento .................. . 383

VI.2 - As Bases do S e n t i m e n t o .... ...... ............ . 401

VI.3 - Conquistas ... ..................... 427

VI.4 - SentimentOr Tradição e Tradicionalismo ......... 437

NOTAS ................................................... 442

CONCLUSÃO ..................................................... 448

BIBLIOGRAFIA 476
INTRODUÇÃO

Em Campos
Planícies dc cana,
Planlcíct tão verdes,
Nio «ais...

Na rua.
Meninas tão novas
Sucumbem ã amores —
Fat a is

Na missa,
Trento presentes
V en eno » l a t i n o s -
L e ta is

No campo,
Peao e usineiros
Cobiça e loucura -
Morta is

Para o estranho que se aproxima do Norte Fluminense, a

massa e a densidade dos contrastes encontrados em Campos se

abate com tamanho impacto que sd o tempo — e a correspondente

cumplicidade que se estabelece entre os que convivem -permite

chegar a um ponto em que os fatos são interpretáveis e

comuni cdvei s •

Ao longo de sua tradição específica, a Antropologia pôde

consagrar o trabalho de campo como um bom mecanismo de

reiativização de etnocentrismo. Este pela sua universalidade,

finda sendo o limite da própria humanidade. Resta então

1
qual if icrf-lo em suas variad»s expresaB^gj ^ t n jCo, de classe.

religioso, c inet tf ico, etc.r p o js yÉ rf # condição da

experiência da alter idade, dos COl«BiexoB passos de seu

desenvolvimentoF da parcialjdade púl esforços para sua


neutrali zaçSo„

Digo p^rcialidade! Po r que a Própr |a ótica que formula e

disseca tal processo est^Presa, ela hlesin0r a quadros mais

amplos do ser humano, definitivamentê condenado 'a habitar o

espaço entre o pensar e o sent ir • Entre formas que se

exxpressam verbalmente e apreensões que hão passam pelos

conceitos, mas que são tão imperativas quanto as forças que

puderam sugerir a separação entre um saber erudito e outro mais

singelo, "feito em casa" e não legitimado pela ciência.

Minha intenção aqui é passar a exporiência de um

encontro, onde, além da arbitrariedade dos quadros teóricos e

ideológicos que informavam e reduziam meu campo de visão a uma

explicação objetivamente coerente, procuro réter aspectos que

escapam ã prisão dos conceitos e - subjetivamente palpáveis - se

instalam naquele plano onde se Predende go2ar. nas palavras, o

que se gozou na experiência v | vjda._ Por ,sso aB quadras

Iniciais, filhas da surpresa *nte 0 desconhecido com o

conhecimento prévio sobre o conflito r e l igioso que • se

desenvolveu na Diocese de Campos-


A década de 80 assistiu, perplexa', a um espetáculo
inesperado no âmbito da religião católica. Um grupo de padres e

fióis clamava pela preservação de um modelo de Igreja cujo

anacronismo parecia incompatível com a sensibilidade da ópoca.

Defasagem ainda acentuada pelo fàto de que expressiva parcela de

clero brasileiro posicionara-se, nos anos negros da ditadura

militar, ao lado das forças libertárias da sociedade. Tensões

internas na Igreja no Brasil havia, como havia tambóm tensões

com o Vaticano - mas ambas em nome de uma tendência vista como

excessivamente "esquerdizante", oposto daquilo que acontecia na


Diocese de Campos.

Assim, a emergência de um conflito religioso em que as

partes litigantes acionam todos os recursos disponíveis -

materiais e simbólicos -, em que a população é mobilizada e a

imprensa alimenta o debate em torno da "auto-demolição da

Igreja" ó, no mínimo, insólita. Que sucedia na Diocese d-e

Campos, onde uma facção do clero brasileiro, indiferente aos

apelos conjunturais, entregava-se com fervor a uma certa luta e

conseguia arregimentar adeptos entre os fióis?

Aparentemente, tudo começara quando o bispo diocesano de

Campos, D. Antonio de Castro Mayer, fora substituído em 15 de

novembro de 1981 por D. Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro,

ispo-aux 1 1 iar na Arquidiocese do Rio de Janeiro. Tal

medida, absoTutamente legal e legítima em termos do Direito

Canônico, trazia em si, no entanto, a possibilidade de

3
modificação na maneira de atual isar a prática religi°sa
espaço. Chegava à diocese uma "Igreja modernizada t â qja
imed jatamente as
opunha a "Igreja de sempre"r cunhando
categorias "progressist a" e "tradicionalist a para nomear

partidários das respectivas facções.

heu objetivo é compreender o conflito .religioso na

Diocese de Camposr cujos desdobrament os não só se estenderam ãs

instâncias competentes do Vaticano como tambám permearam os

cantos mais fntimos do imaginário local, trazendo à luz a

complexa imbricaçao da dimensão religiosa nos diferentes

domfnios da vida social.

Dentre as muitas questões que se colocavam, duas

ressaltavam! a sempre tensa relaçao entre diferentes


Interpretações doutrinárias no seio da Igreja e a força do

catolicismo na cultura local. A primeira, evidenciada na


compreesão particular que os dois bispos em pauta, príncipes da

Igreja e autoridade máxima em seu território, detinham ^

respeito da condução da vida católica na diocese. A segunda,

comprovada pelo fato de que os questionamentos do âmbito

religioso impeliam os fiáis a uma tomada de posição que chegava


a alterar relações pre-existentes no plano secular.

Ta is questões impunham ao trabalho etnográfico três

d imensoes s. a da análise da diocese enquanto território

ecles iást ico que delimita o conflito; a da análise de alguma

4
comunidade onde o mesmo
expressado com toda a sua
pujança; e abarcando amb^,
1* a compreensão da Igreja Católica
como um todo.

A busca na 1 it
^tura revelou-se ao mesmo tempo
frustrante e estimulante.
^ustrante porque muito da produção
da sociologia da religj*
contemporânea voltava-se para a
mudança na Igrejar não Pr
leg Iando a outra porção dessa
instituição milenar que Pr
• ^agonizava o drama que eu procurava
entender. Da mesma forma
9 não pretendia entregar-me a uma
análise institucional cl^
s*icar seja tomando-a como um bloco
monolítico, seja considere
hc*o sua diversidade interna.

Conceitos como o de a
influência ou mudança, presentes na
produção de alguns autores (B,lina!lll a 0-
7a u
vüruneau, 1974, Moreira Alves, 1974,
Paiva, 1985) não pareciam suficiente*
»u t i c lentes para meu . . ..
objetivo. Mas
era oportuna a sugestão de levar 1I conta a concepção de Igreja

que está em jogo, considerando o caráter Propriamente religioso

da instituição, as tensões dela com a sociedade e suas tensões

específicas (Mainwaring, 1983).

Estimulante porque me impunha construir meu próprio

referencial a partir de leituras sobre a história da Igreja, a

religiosidade no Brasil e as relações entre à prática clerical e

os fióis católicos. Assim, trabalhos como os de Azzi (1979,

1981), Oliveira (1985) e Fragoso <1980) se mostraram

imprescindíveis. Mas foi em Fernandes (1982) que encontrei boas


*>ista6 para Pcns - a "oposição complementar" que rege a re la çSo

tlero/fi^is, e as multas tensões que Bnvolvem | pra(tica

^ügiosa ou pensar a h istor ic idade de categorias como


'Progressista", "tradicionalista" <l983, 1989r i990)> Sanchis

<1986, 1983 e 1993a) me auxiliou a comPreender a identidade


Catdlica e força das festas bem como Carl0s BrandSo <1985, 1 9 8 6 ,
**^90) me familiarizou com o ethos camponês

Mais do que estimulante, porqn* _ , ^ L , a


atd ameaçadora, foi a
^ r o x imação com a leitura catdlica, Prr%
°Pr iamente dita. De uma
*queza e complexidade para M m
1 n*uditas, a literatura
cOnduziu-me ã histdria da Igreja e SUa
^ organizaçao (Poupardr
1 9 8 0 e Í98Í? Congar, 1964? Lubac Í9 R^
, r e Pierrard, 1986) ou aos
temas específicos concernentes ao meu ,
. “ °bjetivo (Poulat, 1969 e
*•982? Congar, 1960? Casei, Í983).

Querendo contar
*r - =
a» u-
h istór •
ia do
conflito religioso na
diocese de Campos e sua ren~
“epercussüio 5°bre os fidis, decidi-me
P®la descrição densa conm ^ ~ _
Propoe Geertz <í978). Seu conceito de
religião enquanto sistema
cultural ®stimuiava-me a pensar a
instituição Igreja como ■ I
fonte dds fortes disposições e
motivações nos homens Qtl^ .
viveram a situação que pretendia
Interpretar. Da mesma fot. _
>a, a cone>;ão il um inativa" que ele
sugeria (1983) como Proced. ►
“ mento para compreender o universo
simbdlico do observado me p
I, Grécia »it i1 , inclusive para pensar as
linguagens "diferentes" PUe>
6 falam o clero e o fiel.

6
No entanto, para não me restringir à prisão das "telas

de significado que o homem teceu e que o mantêm suspenso no ar".

Julgo, acompanhando Pe flano 11902),. que a descrição densa deve

se apoiar em categorias culturais historicamente situadas,

sociologicamente analisadas, considerando as mudanças que sofrem

no correr do tempo. Dessa forma, penso recuperar para o texto

etnográfico uma dimensão mais rica, onde ele é uma

" interpretação de autor" (que continuará sempre sendo) mas não

perde de vista o processo histórico no qual se inscrevem tema a

Interpretação.

Tres conceitos foram «Iteis para pensar a construção do

relato do conflito na Diocese de Camposs tradição, modernidade e

cotidiano. 0 primeiro por sua central idade no universo católico

e na Igreja, sendo a raiz da categoria que definiu um dos

grupos. 0 segundo por aludir ãs sérias dificuldades que aquela


instituição enfrentou, relativas ao fim de sua época áurea, a

cristandade. 0 terceiro por ser o nfvel onde se. atualizou a

crise e ela foi apreendida pelos fiéis.

No âmbito das Ciências Sociais e noção de tradição ganha

vulto com a chamada Sociologia do Desenvolvimento e da

Antropologia da Tradição, respectIvamente criticadas por Franco

(1972) e Leite e LopeL (1901).

Para Franco, o problema maior da Sociologia do

7
Desenvolvimento reside na aplicação particular e redatora do

pensamento de UeL;r, realizada quando de sua formulação básica.

Em Ueber, o conceito de tradição um princípio estritamente

tedrico, que colabora na constituição de um tipo de dominação.

É um princípio instaurador de sentido que preside a construção

de conceitos tIpológicos, como a "dominação tradicional". Já na

Sociologia do Desenvolvimento a noção de tradição perde este

estatuto para remeter a elementos, fatores que são combinados a

conceitos que pretendem descrever sistemas sociais'determinados•

Inspirada na Teoria da Ação social de Parsons, a

Sociologia do Desenvolvimento opera atravds do sistema

dicotômico que aquele autor concebeu - sociedade tradicional x

sociedade moderna - formas.abstratas que relevam da realidade

concreta de convivência entre os homens. Assim, o social está

reduzido a elementos analiticamente separáveis uns dos outros,

representados em formulações gerais e atõtratas e reconhecíveis

mesmo que se altere o contexto concrete em que se inscrevem.

Fica perdida a vinculação com a histórias tudo o que for

observado na realidade (fenômeno isolado ou formas permanentes)

deve ser incluído em algumas rubricas do sistema (cultural,

social, de personalidade). A tradição é um fator.

Neste quadro, o conceito de comunidade muito contribuiu

para a construção da noção de tradicionalismo. Ele inclui as

áreas em que o acordo das subjetividades se manifestas as

relações que derivam de proximidade espacial (vizinhança); as

8
que caracterJzam uma vida apoiada em condições comuns

(cooperação) e aquelas que exprimem o ser comum (parentesco).

Os elementos do conceito aparecem necessariamente inter1 igados*

a comunidade de sangue se especializa na convivência local e

desta, por sua vez, derivam a amizade e a cooperação, da f

resultando, finalmente, a comunidade espiritual.

Para Leite e Lopes, as distorções amplamente difundidas

do esquema weberiano inicial apresentam afinidade com a reflexão


antropológica que é subjacente as anál i-ses das "sociedades

atrasadas" e nos estudos de comunidade que proliferam a partir

do modelo de um continuum folk-urbano proposto por Redfield.

Aqui, "sociedades tradicionais" opunham-se a "sociedades

modernas''. Eram relativamente homogêneas e simples, dotadas de

relações espontâneas, informais, fntimas, intensas,

relativamente completas e permanentes, constituindo um fim em

si mesmas.

Mesmo que a "ideologia do tradicionalismo camponês" daí

resultante ganhe maior densidade quando Foster incorpora à sua

análise o estudo das orientações cognitivas, que estariam

guiando o comportamento dos camponenses, será pela contribuição

de Bourdieu (1963 e 1977) que a generalidade a que chegam as

análises Inspiradas na Antropologia da Tradição será superada.

Este autor, partindo do estudo da atitude da sociedade

camponesa em relação ao tempo, consegue mostrar a especificidade


da mesma, já que demonstra a
c*'*r iedade existente entre a
consc iênc ia temporal e o ethos
Pr<5
Pr'o a cada civilização.

Foi com o conceito de tr^ç».


•cão seletiva (Uilliams, 1977)
que me senti instrumentalizada
^ ^ra pensar a situação que me
desafiava e que não podia reduzir
* Uma análise intitucional da'
Igreja (tendo porám que consid
nem a um estudo de
comunidade (embora fosse estudar
a repercussão do conflito?
intensivamente, numa comunidade).

Apropr iando-se da noção


u de
ae ,
hegemonia em ~
Gramsc i,
Umiams afirma que, numa sociedade de classes, só com este
conceito podemos compreender a cultura. Na prática, o conceito
de hegemonia se assemelha ás definições de ideologia? mas difere
por sua rejeição ao equacionamento da consciência com o sistema
formal articulado que pode ser (e habitualmente é) abstrato como
a ideologia. Não exclue os significados, valores e crenças
formais e articulados que uma classe dominante desenvolve e
propaga? mas não os equaciona com a consciência. Não reduz a
consciência a eles. Vê? ao contrário? as relações de domínio e

subordinação? em suas formas como consciência prática, como

efeito da saturação de todo o processo da vida.

• A hegemonia é todo um conjunto de práticas e

expectativas sobre a totalidade da vidas nossos sentidos e

distribuição de energia, nossa percepção de nds mesmos e nosso

mundo* £ um sistema de significados e valores — constitutivo e

10
r

consti t u í d o - quer ao serem experimentados como práticas,

parecem confirmar-se reciprocamente. 6 , no sentido forte uma

cultura, mas uma cultura que tem tambám de ser considerada como

o domínio e subordinação vividos de determinadas classes. Por

isso, uma hegemonia vivida é sempre um processo. So

analiticamente é um sistema ou uma estrutura- Ê complexo

realizado de experiências a atividades e relações com limites e

pressões específicos e mutáveis. Daí que, na prática,a

hegemonia não pode ser nunca singular, e não existe apenas

Passivamente como for.ma de dominação. Tem de ser renovada

continuamente, limitada, alterada, desafiada por pressões que

nao são as suas prdprias presroes. Assim, há que acrescentar a

®ste conceito outros doiss o de contra—hegemonia e o de

hegemonia alternativa, que são elementos reais e Persistentes na

prática. Sugere ainda que é melhor usar hegemônico, em v e 2 de

hegemonia, e dominante, em vez de dominação, para expressar a

istinção entre o sentido prático e abstrato dentro cio conceito

^ realidade de qualquer hiegemonia é de que,


ora seja
dominante por definição, jamais será total ou ex c l ú s ;u
va « Sendo
um
Processo ativo, tem que ser visto mais do que
^ simples
ransmissao de um domínio e suas funções específicas
que ser
Ssaltadas, mas nunca de maneira a sugerir qual
' quer
--^r 1
* pr ínr i a , „ f% , , ^talidade
lori. A parte mais difícil e interessante
d* análise
C ul*ural é a que busca apreender o hegemônico e
m
at iv o Us
e for
mativo, mas também o transformaci Processos
1 on
term0 *1
o Processo cultural não deve ser Nesses
Co^ i d
*Plesmente adaptativo, ext ensivo e íncorporat Sr
^do como
,vo.

11
0 processo hegemônico, visto por •:«* ótica, só pode ser

compreendido se levarmos em conta os trc- aspectos que compõem

qualquer processo cultural: as tradições, as instituções e as

formações•

As instituições formais têm uma profunda influência

sobre o processo social ativo. EÜ através delas que se

estabelecem atitudes fundamentais e seletivas para si próprio,

para os outros, para a ordem social e para o mundo. Algumas

instituições são explicitamente incorporativas. De maneira

consciente ou inconsciente elas atuam em profundidade, exercendo

poderosas e imediatas pressões sobre as condições de vida,

ensinando, confirmando e impondo significados, valores e

atividades. Mas descreve-las assim não significa alcançar o

pleno entendimento da sociedade: há que atentar para os sistemas

de comunicação, que materializam notTcias e opiniões, e uma

variedade de percepções e atitudes selecionadas. A soma de

todas as instituições não implica uma hegemonia orgânica: por

ser um processo hegemônico complexo, a participação das

instituições apresenta-se como cheio de contradições e conflitos

não-solucionados• Uma cultura efet»va é mais que a soma de suas

instituições, não só porque a análise mostra que elas derivam da

cultura grande parte de seu caráter, mas também porque é no

nfvel* de toda uma cultura que as inter-relações cruciais

(confusões 0 conflitos) são realmente resolvidas.

Caracterfsticas comuns nas instituições são possíveis de ser

identificadas a partir da seleção que realizam, mas como elas a

12
i

l ....-■-'--• .. ,,__ >Tiim mnrémr.fm

atualizam Processos especfficos, a consequência prática ó, com

requência, confusão e conflito entre o que á considerado como

Propósitos e valores diferentes. Embora uma incorporação

efetiva sej^ realizada, cabe lembrar que nenhum treinamento ou

Pressão é verdadeiramente hegemônico. A verdadeira condição

hegemônica é a autozideatificataQ efetiva com as formas


hegemônicas! uma socialização especifica e internalizada que

deve ser positiva. Mas se isso não for possivel, terá como base

Um reconhecimento (resignado) do inevitável e do necessário.

Formações podem ser identificadas como movimentos e

tendências (literários, artísticos, filosóficos, científicos).

Perceptíveis com suas produções formativas. Têm importante

Papel na sociedade complexa e se relacionam, inevitavelmente,

com estruturas sociais reais, com relações variáveis e com

frequência oblfquas com as instituições sociais fundamentalmente

d iscernfve is. Algumas podem se tornar instituições, outras,

resistem a qualquer redução simples a uma função hegemônica

generalizada. £ nesse ponto que muitos se voltam com ênfase

indiferente na complexidade da atividade cultural, ou negam

totalmente (e teoricamente) a relação dessas formações e. dessas

obras com o processo social. Outros ainda, quando a realidade

histórica das formações é apreendida, referem-se novamente às

construções ideais (tradições nacionais, literárias e

artTsticas, história das idóias psicológicas, arquótipos

espirituais) que na realidade reconhecem e definem formações,

com frequência de forma muito mais substancial do que as

13
exposições generalisadoras de derivação social explícita, ou

função superestrutural,mas somente deslocando-as de forma

radical do processo cultural imediato. Em consequência desse

deslocamento, as formaçoes e suas obras não são consideradas

como a substância social e cultural que invariavelmente são. Em

nossa cultura, essa forma de deslocamento é, em si mesma, e

muito centralmente, hegemônica.

Vale acentuar que Williams reconhece o lugar da tradição

para a construção do processo hegemônico. A tradição, para ele,

não á um fator secundário (nem superestrutural, como no

marxismo, nem como segmento inerte, historicisado de uma

estrutura social, nem como sobrevivência do passado). Ê força

ativamente modeladora, expressão mais evidente das pressões e

limites dominantes e hegemônicos. E o mais poderoso meio

prático de incorporação. Deve-se considerar não apenas "uma

tradição", mas a "tradição seletiva", isto ás a versão

intencionalmente seletiva de um passado modelador e de um

presente modelado, que se torna poderosamente operativa no

processo de definição e identificação social e cultural. Passa

geralmente como "a tradição", o "passado significativo". Nesse

sentido é um aspecto da organização social e cultural

contemporâneo. E uma versão do passado que se deve ligar ao

presente e retificá-lo. Oferece, na prática, um senso de

CODtiQuidade ecediseosta- Há significados menos marcantes

CTradiçao x inovação) - i - são pontos de recuo ‘para grupos que

foram deixados à margem por algum acontecimento hegemônico


\

14

£
particular, restando-lhes agora apenas a afirmação retrospectIvn

dos "valores tradicionais": 2- "hábitos tradicionais" sXo

isolados, por algum desenvolvimento corrente, como elementos do

passado que têm de ser postos» de lado- Num nfvel mais profundo

(nem 1 nem 2 ), o sentido hegemônico na tradfição é sempre o maís

ativo: um processo deiiberadamente seletivo que oferece um.

ratificação histdrica e cultural de uma ordem contemporânea.

Ei um processo ao mesmo tempo marcante e vulnerável.

Marcante porque ligado a muitas continuidades práticas

experimentadas diretamente, como famflia, lugares, instituições

etc.); vulnerável porque tem de, na prática por de lados áreas

inteiras de significação, ou reinterpretá-las, ou dilui-las, ou

converte-las em formas que apoiam (ou pelo menos não

contradizem) os elementos importantes da hegemonia corrente. É

significativo que o trabalho mais acessTvel e influente da

contra-hegemonia é histdricos a recuperação de áreas rejeitadas,

ou a reformulação de interpretações seletivas e redutivas. Isso

porám, tem poucos efeitos, a não ser que as linhas para o

presente, no processo real de tradição seletiva, sejam claras.

Sem isso, qualquer recuperação pode ser residual ou marginal. E!

nos pontos de conexão vitais, onde uma versão do passado é usada

para ratificar o presente e indicar as direções para o futuro,

que uma tradição é w ao mesmo tempo vulnerável e poderosa.

Poderosa porque faz conexões sei etivas ativas, rejeitando como

desatualizadas as que não lhe interessam, atacando as que não

pode incorporar, como improcedentes. Vulnerável porque o

15
registro real ^ efetivamente recup®r^ve^ e muitas
continuidades prãt icasr alternativas oU opostasr ainda são
possíveis. £ também porque a versão seletiva deuma "tradição

viva" está sempre ligada a pressBes e limitescontemporâneos

explícitos. A luta a favor e contraas tradições seletivas é


uma parte importante de toda a atividade, culturalcontemporânea.

Sobre as noc3es de modernidade e cotidiano serei breve.

E! menor a importância delas para a análise, razão pela qual vou


me referir apenas a alguns aspectos que são fundamentais.

Estou tomando modernidade no seu sentido de "experiência

vital ligada ao processo de modernisação" (Giddens, 19 ) er

como tal, não deve ser pensada "em si mesma como unidade

isolada. £ parte, expressão parcial de um conjunto mais amplo"

(Fernandes, 19908i)^ Este autor chama ainda,a atençao para a

complementaridade entre a noção de moderno e a noção de

tradicional que, no entanto não são simétricas, a primeira tendo

o tempo a seu favor, ^ segunda lutando contra o tempo (Xdemz2 ).

Tais idéias são sobretudo importantes porque instalar;, a

compreensão de Problemas concretas no modo de articulação com

<*ue as categorias (moderno e* t rad ic ional) se relacionam. E isto

é particularmente interessante par* pensar sobre a noção de

tradiçao na Igreja, sua positividade e o consequente drama de

»ua atualização nas diferetes modernidades por que passou a

sociedade ocidental.

16
Talvez uma Pista para compreender a ênfaSe dada à
tradição pela Igreja esteja na refl eM=[0 de Vas
7*) quando
^uer compreender a modernidade de um ponto de vista ím ,
T *losofico.
firmando que a emergência da modernidade está
tiiretamente
^igada a uma mudança na concepção de tempo <mftico/cir
rcuiar para
^ í1 osdf Ico/h ist dr ico) r ou seja: que /7a modernidade pac.-a _
■<*ssa a ser
Um* categoria de leitura do tempo histórico somente q,Jainrl„ ___

^ assumido na conceptuaiidade filosófica" <Vazr Í9 <


este
autor aponta a originalidade do cristianismo.
"Como a
^Hosofia, o Cristianismo operou uma revolução Profunda na
representação do tempo. Mas o tempo cristão apresentava uma

s ingularidade iJnica de privilegiar de modo absoluto um segmento

d e l Imitado do tempo empírico no qual tem lugar 0 evento


cr
fsticor e que se estende da Encarnação ã Ressurreição. Esse,
se
*ssim se pode falar, é o dnico modecno^

Nessa linha, é possível d Iser que a tradição é o esforço


de
Preservação dessa modernidade cristã que, consequentemente, é
Inc
°mPat fvel com outras modernidades que a civilização ocidental
fo|
vivendo e, em nosso dias confunde com » simples
n o v •dad e, o artefato cujo modelo supera em eficiência um outro
que
° Precedeu.

* Quanto ã noção de cotidiano estou assumindo a postura de


Rému
<1982) que distingue duas dimensões para o conceitos uma
de*Cr.
■tiva, outra analítica. A primeira deve permitir delimitar
CO.
pr*cisão um campo de observação. isto é, não se trata de
L—

reduzir a vida cotidiana a ações individuais, dispersas, que se

opoem às ações coletivas, dotadas de expressão histórica. Na

perspectiva do autor, àquela primeira concepção de cotidiano


agrega-se a segundo, a qual "deve permitir indicar com exatidão

um estatuto analítico num paradigma interpretatjvo"

(Rémy,1982:260)• A análise da vida cotidiana incide sobre o que

é familiar para atores individuais, a partir das pressões de


espaços/tempos imediatos. Seu conteddo se diferencia conforme

as posições sociais. Igual mente, releva da vida cotidiana a

maneira pela qual esses espaços/tempos familiares são

atravessados pelo "acontecimento" Co não-repetitivo) e pelo


"distante" (desconhecido pela familiaridade).

0 estatuto interpretativo é construído por tres

hipóteses que revelam o paradigma interpretativo: íq) - o

conjunto das reações individuais ó suscetível de produzir

"efeitos coletivos porque eles são o lugar onde se engendram e

se reelaboram os valores sociais. 2q ) estas reações,

aparentemente mói ti pias e esparsas não são somente apropriações

secundárias: elas permitem compreender a gênese de um

determinante social global, de outra forma imperceptível. 3q )

na vida cotidiana combinam-se um conjunto dessas reações

individuais suscetíveis de produzir efeitos coletivos no nível

da produção e da transformação dos valores sociais <Idem:269).

Dado que o que me movia era compreender o conflito na

diocese e seus efeitos numa comunidade daquela circunscrição

18
eclesiástica, os conceitos de tradição seletiva e de vida

cotidiana foram os Principais 911 ias da minha observação.

0 "locus" da pesquisa foi a Diocese de Campos,

território eclesiático que compreende os seguintes municfpios do

Norte Fluminenses Campos (sede do bispado), Italva, São Fidells,

Cambuci, StQ Antonio de Pádua, hiracema, Lage de huriaá.

Natividade, Porc i(íncul a , Dom Jesus de Itabapoana, S. João da


2
Barra e Varre Sai. Cobre uma superfície de ll«90ikm e uma

população avaliada em 646.507 habitantes (Censo de 19B0).

Contava, em Í985 com 33 paróquias, das quais 13 se

situavam no município de Campos e as restantes nos demais.

Rearranjos posteriores alteraram este nOfmero.

Varre Sai, lugar selecionado para a observação intensiva

da população, era, no momento da investigação, o 2 q distrito do

município de Natividade, ao norte da diocese.

Os mapas que seguem permitem situar geograficamente a

diocese no estado do Rio de Janeiro (mapa 1) e Varre Sai na

Diocese de Campos (mapa 2).

19
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|IC *ta • K M M I

v,í>
A coleta de dados abrangeu pesquisa bibliográfica sobre

a história regional e observação participante em Varre Sal,

acompanhada das técnicas convencionais de entrevista. A

familiarização com o debate doutrinário e o conflito,

propriamente dito, dependeu das publicações específicas pelas

partes em litígio e do material publicado na grande imprensa.

Este material se revelou muito importante, na medida em que

interessava-me saber a quais informações os fióis tinham acesso,

para além do que era veiculado nas "sacristias" ou abertamente

comentado nas missas e encontros vários, quando a questão da

oposição "tradicionalismo"X " Progressismo" era sempre levantada.

0 trabalho de campo realizou-se em 29 viagens,

perfazendo 184 dias que se estenderam de agosto de 1985 a junho

de 1988. Onze destas viagens <62 dias) cobriram a diocese como

um todo, possibilitando a escolha de Varre-Sai como lugar para a

observação intensiva. Os critérios para tal seleção foram* a

auto-identificação do lugar como católico; a presença do antigo

Seminário Menor; a dramaticidade que envolveu o episddio da

substituição do pároco; o peso das modificações introduzidas

pelo conflito; a subjetivíssima certeza de que aquele seria o


melhor lugar para fazer este trabalho.

Num período de 1 1 meses (agosto de 1 9 8 7


1VU7 a junho de 1988 )
mantive residência em Varre-Sai, para onde volt»-
c ç i pôsteriormente
mais seis vezes, num total de 1 2 2 dias
«Prendendo com a
vizinhança o que era ser "tradicionalista" e
o que era ser
"progresslsta Fui ãs festas missas e enterros. T ive

insegurança e me desgastei, amei as pessoas e sinto saudade

delas. Fiz amigos.

A exposição está dividida em seis capítulos nos quais

procurei articular as tres dimensões da pesquisas o conflito

diocesano com a Igreja como um todo, as repercussões do conflito

numa comunidade.

- 0 1q capítulo descreve o ato da posse do bispo B.Navarro,

momento em que estão presentes os sinais da. diferença

doutrinária com relação a D- Mayer, agora bispo emérito. A

questão da autoridade na Igreja é introduzida via o princípio

da unidade, pensado nos seus fundamentos no Novo Testamento,

enquanto valor e nos mecanismos de sua operacionalização.

- 0 2 q capftulo relata os primeiros atritos do conflito e a

explicitação das diferenças, bem como as medidas tomadas pelo

bispo diocesano para enfrentar ã crise. Remete ainda ãs

muitas crises que constituiram a vida da Igreja e o correlato

desenvolvimento da dimensão canônica.

A exoneração dos illtimos padres "tradicionalistas" é tratada

no 3q capítulo, que também concerne ao anti-modernismo

introduzido na diocese por D. Mayer, expresso principalmente

na rejeição ao "Novus Ordo Missae" de Paulo VI. Trato ainda

da central idade dos sacramentos para o catolicismo.

23
I

— 0 4q capítulo se destina a pensar a Igreja na modernidade, a

gestação da chamada crise modernista e o episódio da

excomunhão de D. Lefebvre, que envolveu o bispo emérito de

Campos. Remete ã tradição, outra noção central para o

catolicismo e a relação daquela com o tradicionalismo.

— Para compreender a relação catolicismo e cultura parto da

caracterização da Diocese de Campos, examino o cotidiano numa

de suas paróquias e a presença da Igreja na configuração da


identidade da população. A noção de sentimento e as festas
sao ainda temas do 5 q capítulo.

— Aprofundo a análise do ethos, através do exame das bases da

noção de sentimento, para compreender a relação existente

entre ela, a tradição e o tradicionalismo católico.

Na conclusão reóno alguns elementos presentes nos

capítulos que me permitiram elaborar uma interpretação global do

que foi o conflito na Diocese de Campos para a Igreja e para o

catolicismo, em geral e no Brasil, bem como a repercussão que

teve numa pardquia daquela diocese..

24
I - A UNIDADE COHO VALOR

A dramaticidade que revestiu a substituição de b ispos na


Diocese de Campos, no final do ano de 1981, exige, para sua
compreensão, uma abordagem que dê conta não sd dos atos
institucionais como também das repercussões suscitadas por ela.

Embora a interpretaçao dos acontecimentos que envolveram


aquela igreja particular sd ganhe sentido mais completo com as

discussões que se desenvolverão Pôsteriormente, cabe iniciar

pelo relato dos fatos institucionais - o que também é uma forma

de construir o seu significado - no intuito de preservar a

memória de episddio que, se por um lado abalou profundamente um

expressivo mimero de cattílicos, por outro pode estar fadado a

diluir-se ante a inexorável voragem do tempo e a consequente


racionalização que isto impõe.

0 contexto de emergência de qualquer fenômeno social,

mantendo com ele uma relação dialética, constitui-se naqueles

pontos nos quais o observador se aPoia e retêm, embora de

maneira embutida e sd alcançável Por Procedimentos analíticos

específicos, uma consistente massa comPOsta pela sua histdria,

pelas interpretações que lhe vão Sendo pro3ressIvamente

agregadas, tudo isso em confronto com a dimensão cotidiana, na


qual se atualiza a vida social.
HÉílíifaí

Tempo, espaço e significado, configurando um sistema

solidário, estão na base de qualquer compreensão produzida» da


leitura dita ingênua do senso-comum, hs sofisticadas formulações

baseadas em reconhecidas teorias, das inflamadas argumentações


dos agentes envolvidos ao desinteresse dos indiferentes a

determinadas questões, o fato é que, da mesma maneira em que


certo contexto conforma as definições dos acontecimentos, estes
mesmo estão também atuando sobre as concepções comprometidas na
sua produção.

Assim que, mesmo relativizando a lógica causai que


aprisiona qualquer relato a teorias e ideologias, o mero impulso
Inicial de uma descrição - 0 limite cronológico, 0 aspecto

privilegiado no tema escolhido, a forma de utilizar as palavras

- situa o autor num campo pré-definido e zelosamente guardado


pela sociedade. E a solução, ao mesmo tempo Perversa

confortadora é dada circunstancialmente: o destinatário


investido do poder de julgar, finda sendo importante
condutor do
pensamento do autor, que busca aquele ponto situaria
c'ao entre a
razão e a emoção, e supostamente preservador do que w-/ j
n« de melhor
nas duas.

No plano mais imediato da redação, a escoiK.,


*ia oscilava
entre dois modelos aparentemente cômodos: o cronoi^ •
u,ogicQ e o
temático. Ambos porém, carregados de problemas - o .
r imeiro por
colocar questões relativas aos limites no tempo; o _
Segundo por
ameaçar cair em absolutizações ou reducionismo. PretB.
'■snc iosamente

26

ir
decidi-me por ambos, assumindo a precariedade relativa como o

preço da opção de assim relatar a est ór ia/h ist ór ia -do drama da

Diocese de Campos. Além disso, porque tempo e temas não podem

ser concebidos sem a necessária relação que os une.

Parto da hipótese que a dramaticidade dos acontecimentos

decorreu do fato deles se constituírem numa alteração de

contexto: a época é a década*de 80; o espaço já é definido pela

Igreja - uma diocese -; a temática, a da chamada - "modernidade"

ou seja: a atualização da proposta escatoldgica contida na

doutrina cristã.

As figuras-chave do espisódio: dois bispos, responsáveis

pela realização das promessas de Cristo, imbuídos "deste desejo


<í)
de Deus" , embora colocados um frente ao outro. E se ambos

possuíam teoricamente o mesmo valor, respaldados pela teologia e

consagrados pela cânones, é impossível desconhecer o * que os

diferenciava um vestido de armadura de cruzado, outro armado de

comunicativo sorriso.

I.l — A posse

Diferente de uma liça medieval, onde os nobres

cavaleiros se enfrentavam para a vitória de um e a derrota do

outro, o que se ia ver era, num certo sentido, uma prosaica ação

burocrática - uma transmissão de cargo - mas revestida aqui de

dens idade espetacular não sd pelo aparato v isuai mas


An

PrIncipalmente porque remetia atores e espectadores às questões


mais profundas de suas existências*

< 2)
0 poder estava em cena , num palanque instalado n

coração da diocese. Na praça principal, em frente ã Basílica

Menor de S. Salvador, onde tomavam assenta as figuras centrais


do drama -.o agora Bispo Emérito de Campos, D.Antonio de Castro

Mayer e o doravante Bispo Diocesano, D.Carlos Alberto Etchandy

Gimeno Navarro. Circundados por pessoas gradas, as autoridades

da Igreja e do Estado, expunham-se no palco, ã vista da multidão

aglomerada para testemunhar o fato.

A força da cena, que colaborava para a grandiosidade do

espetáculo, subtraia aos olhos dos observadores duas dimensões

do intenso trabalho que a antecederas as complicadas negociações

diplomáticas que resultaram no que ora se presenciava, e as

secundárias mas não menos imprescíndíveis providências para o

esplendor da encenaçãos a organização do espaço, os sons e as

luzes, a indumentária dos presentes, a figura física de cada um,

atores e espectadores, ali reunidos para o aato que condensava a

obra de 2 2 concílios, infinitos martírios e a fé na salvação

eterna.

Também presentes estavam os emblemas dos bispos, onde se

inscreviam os sinais diacríticos do antigo e do novo, mas que

uma estrutura hierárquica solidamente implantada em dois mil

anos, transformava em depósito de significados aparentemente

28
indcuos e acessíveis apenas a muito poucos. Que diziam tais

sinetes, que por m lado igualava os bispos, por outros os

diferenciava ?'

Ao "Ipsa Conteret" (Ela esmagará) triunfalista de

D.Mayer, correspondia o "Gratia et Apostolatu" (Pela graça e

pelo apostolado) de D.Navarro. E para que a divisa não se

perdesse pelas artimanhas da língua, outros sinais compunham o

brazão de cada um, escolhidos, provavelmente aprfs longa e

profunda reflexão alimentada pela tradição da heráldica e sob

inspiração do Espirito Santo.

Segundo a descrição oficial, o leão rompante de ouro que

figura no emblema de D.Mayer "lembra a imagem da Escrita em que

Jesus Cristo é designado como o Leão de Judá (Apocalipse V,5) •

Simboliza também a virtude da fortaleza, de que Jesus foi o

supremo modelo. 0 'tau' com que está marcado o leão, figura na

visão de Ezequíel (IX,4) como sinal distintivo dos que não se

conformam com os erros do paganismo, e com a Infiltração desses

erros no povo eleito. A double orla lembra, pela sua cor

vermelha, a luta pela Igreja atá a efusão de sangue"

(Cf. Guarer.ca Anos de Episcopado, 1988)

0 Anuário de 1988 da Diocese de Campos, ã página 2

comenta que o lema de D.Navarro é inspirado em São Paulo

(Rom.,15) e o escudo "é de prata, tendo no centra uma cruz

latina sobre uma base na forma da nova Catedral do Rio, entre

29
doze 1 ínguas de fogo vermelhas, postas de cada lado na ordem
2,1,2,1» Em chefe, campo vermelho. A referência ã nova Catedral

do Rio de Janeiro explica-se pelo fato do prelado ser nascidor

ordenado padre e sagrado bispo naquela cidade. 0 campo de prata,

sobre o qual se vêem doze 1 ínguas de fogo, representa a Igreja


de Campos a que o bispo serve, dirigido sempre pelo Espírito de
Pentecostes, simbolizado nas 1 ínguas de fogo que pousaram sobre
os Apóstolos, dos quais os bispos são sucessores. A cruz negra
sobre a silhueta da Catedral da Cidade do Rio (...) lembra a
Redenção de Cristo, pregada com amor pela Igreja Uni versai, cuja
missão exprime a sua cor vermelha. Como Maria é Mãe da Igreja,
também se pode ve-la de algum modo simbolizada na Catedral".

Não me deterei com mi miei as nos brazoes, visto que eles

são de penetração muito pequena, restrita ao timbre dos


documentos oficiais e familiares apenas ao circuito dos mais

íntimos ao bispado. Porque cristalizam um conjunto de valores


definidos no momento de sua confeccão são, por vezes, um pouco
incapazes de dar conta das ambivaiências que emergem quando os

associamos ãs imagens dos seus intérpretes. Mas, enquanto os

emblemas, fornecem pontos, linhas, sinais, de forma, - cor

proporção que o contexto tratará de agregar significados, com


(3)
capacidade de aglutinar vontades, mobilizar populações

A ênfase do brazão de D.Mayer recai na virtude da

fortaleza, não fosse Cristo ali o Leão de Judá que vence os

ímpios. Nestes termos, o que está em jogo é a distinção,


assinalada pelo Tau que já marcara Ezequiel. E o papel da

Igrejar tida como autêntica portadora da verdade tínica, d lutar

e vencer seus inimigos. 0 emblema sugere, pois, uma missão

herdica, onde cada fiel d um soldade pronto a derramar seu

sangue em defesa da causa.

No brazão de D.Navarro a ênfase recai sobre a virtude da

ordem institucionalizada, onde os apóstolos que a constituiram -

e continuam trabalhando atravds de seus sucessores - falam

porque iluminados pelo fogo de Pentecostes. Antes de aludir aos

inimigos, alude-se ao papel educativo da Igreja, difundindo-se

pelo universo enquanto catequização, como o*fez São Paulo. E

"catequizada" será agora a Diocese de Campos, missão de seu

bispo "pela graça e pelo apostolado".

Se é possível distinguir uma diferença na visão que cada

bispo tem da sua competência, esta se centra mais na modalidade

de levar a cabo a missão deles, que' afinal, é a mesma: preparar

a chegada do Reino, conforme lhes foi confiado pelo Espírito

Santo. E a questão da modalidade é justamente a marca do

processo histdrico, impondo os meios de pensar e agir, mesmo que

a finalidade seja idêntida. Príncipes e servos da Igreja, ambos

os bispos estarão lutando para convencer, seja sob o signo

triunfalista dos papas anti-modernista, seja nos termos do menor

formalismo hoje privilegiado.

31
Por mais que se queira tamfdm de inspír■„So divina, a
Igreja é uma instituição social e, como tal, seu alvo é a
soc iedade. E que sabia a sociedade daquela sucessão que faz ia
reun ir num palanque os representantes do poder nos seus
diferentes domínios ?

Sobre D.Navarro, o que chegava, uma mensagem amistosa,

publicada ã época de sua nomeação! "Eu quero dizer ao povo de

Campos que o desejo de me doar é muito grande. As informações

que me dao é que existe aí um povo dtimo. Espero desde jé a


<4>
oração e o apreço de todos". Além disso, um curriculum

funcional com vistas a situá-lo no âmbito da Igrejas carioca,

ordenado em 1959, coordenador da Pastoral da Arquidiocese do Rio

de Janeiro, onde foi elevado a bispo por D.Eugênio Sales, em


<5 )
1975. Coroando estes dados, D.Navarro apresentava uma figura

de irradiante juventude, que se casava bem com a descontração

com que subiu ao palanque, acenando felrz aos gritos de

"Navarro! Navarro!" que partia da multidão aglomerada na praça.

Sobre D.Mayer, apesar de sua invulgar austeridade e a

comprovada distância aos meios de comunicação de massa, havia um

passado comum! 33 anos <dos 38 de episcopado) dedicados ã

diocese e ao ensino universitério em Campos, que resultaram em

lhe conferir a identidade de "um homem de grande cultura". E

referendando os estereótipos que foram se constituindo durante

seu longo bispado, a carta circular emitida quando da nomeação

de seu substituto enfatizava a Preocupação com a pureza e a

32
k

integridade da fé, especialmente no critico período pds-

conciliar, onde avultam ambig(íidades, dávjdaB c Incertezas. Ao

mesmo tempo, constatando a presença do q,Je Consjdera uma versão

louca da verdadeira religião, exorta os catrflicos a resistir a


Io)
qualquer inovação-

A construção do texto, de Idgic* didátlca exemplar,


aponta para o caráter que D.Mayer imprimiu a seu bispado. Os

tres Parágrafos iniciais são dedicados a Passar a jnformação da

nomeação e aos cabfveis cumprimentos. 0s B e |s parágrafos

seguintes constituem numa espécie de prestação de contas,

devidamente respaldadas num aspecto do Pensamento de Paulo VI, e


os tres finais renovam a preocupação com a possfvel apostasia

decorrente da diferença entre as recomendações oriundas do

Concflio Vaticano II e a verdade tracidional revelada —

principalmente quanto a dois pontos: a liberdade religiosa e o


ecumenismo, razão que leva o autor a exortar os que são. unidos

pela Fé a resistir a toda e qualquer inovação que dela se afaste.

Ora, tal documento, excetuando os parágrafos iniciais,

ditados pelas circunstânciaSr apenas reproduz, de maneira

concisa, a circular de 30 de agosto do mesmo ano de 198Í, e que

será republicada no dia 17 de novembro, em página inteira, sob o

trtulo: "Dom Antonio, um Bispo conservador"! 0 texto básico,

escrito frente à expectativa de eleições ("a que tende a chamada

abertura democrática") e em resposta ao "pedido de diocesanos

que lhes dê uma palavra de orientasao com o fim de auxiliá-los

33
no como proceder, de acordo com a consciência católica,

especialmente na opção polftica", pode ser assim resumidos

1 - no que tange ã política e política partidária, há que

considerar que a participação na primeira é justa, no entanto o

ideal seria uma experiência do tipo Liga Eleitoral Católica,

que, pelo. supra-partidarismo, permitia a plena defesa dos

interesses religiosos sem a mistura com assuntos polftico-

partidários. Lembra ainda que o Partido Comunista está condenado

por um decreto do Santo Offcio, de 28 de junho de 1949, o que

aconteceu em virtude daquele partido apresentar uma ideologia e

estatutos que afirmam e propugnam algo contra a doutrina

revelada, ou as exigências da Moral e dos Direitos naturais.

2 - sobre a impossibilidade de um socialismo católico, diz o

textos erram os que supõem ser esta a melhor alternativa para os

problemas sociais e para o comunismo totalitário, pois que estão

se fixando no aspecto econômico do. Socialismo e esquecendo as

recomendações do papa Pio XI na Quadragésimo Anno. 0 socialismo,

defendendo a propriedade coletiva dos meios de produção, embora

não nas mãos do Estado, termina por não se ajustar á doutrina

católica, ainda mais no atual estado do mundo, trabalhando pelo

espírito de subversão contra a autoridade e a hierarqua sociais.

Segundo Pio XII, no Socialismo sossobram os mais altos valores

da humanidades a dignidade da famflia e a salvação da^ almas.

Isto porque a concepção solialista da sociedade omite a questão

da unidade do Cosmos emquanto U0l1cU m 1& ti&e.tttQQ.ÍQsar que refere

34
a um todo gozando de perfeita unidade mas composto vária»

partes desiguais, embora complementares. É este Princípio de

UQidade b.amuQaÍQsa que reflete a inesgotável onipotência de


Deus.

3 - Já explIcitamente mergulhado no tomismo, o autor remete «»

Aristóteles ao referi-se ao homem como animal social c portanto

sujeito ás mesmas exigências de uma unidade harmônica que rege o


universo. Assim como no nível individual há uma harmonia

hierárquica que distingue alma e corpo, com primazia da

primeira, também isso se aplica aos atributos do homen

(inteligência, vontade, sensibilidade), sendo ainda uma

exigência no plano da vida social, entre todos os seus membros.

Dessa forma, a desigualdade entre os homens é a

atualização do mesmo princípio de unidade b.ae.11)única, onde a

caridade é o instrumento de estreitar os laços de união entre as

várias classes sociais. Tomando São Paulo, Pio XII e Leão XIII,

na Rerum Novarum, como suporte, o texto reafirma- que o homem

deve aceitar com paciência a sua condição social. Afinal, a

desigualdade de condição é função de diferenças estabelecidas na

natureza que revertem em proveito de todos. 0 registro de

exigência natural de uma unidade harmônica na vida social mostra

que esta é a vondade de Deus, criador do homem (com sua natureza

social). Assim, quaiquer partido que vise o nivelamento dos

homens e a extinção de qualquer hierarquia, visa destruir a

ordem de Deus. Mais do que anti-cristão, é ímpio.

35
A argumentação do autor ultrapassa a esfera humana e

reconhece a ordem perfeita na divindade, exemplo máximo dela

mesmo - a Santíssima Trindade, o Deus Pai, Filho e Espírito

Santo, hierarquicamente organizados e constituindo o Um

absoluto, razão pela qual só uma sociedade hierarquizada

consegue dar a Deus a glória que lhe é devida, ou seja, consegue

levar os homens à contemplação do Mistério Altíssimo do Senhor,

0 Mistério da Santíssima Trindade. Por isso mesmo, é impossível

o igualitarismo proposto pelo Socialismo, onde a lógica

implfeita destroi essa unidade harmoniosa. Já Pio XII alertava

contra os perigos de certos pensamentos modernos, onde qualquer

referência ã vida humana ignorava a existência de Deus,

instilando uma mentalidade naturalista que é uma expressão do

atei smo. A crescente lai.cização da sociedade nada mais é que a

instalação deste ateismo no qual a sociedade vai mergulhando e

que é fonte de sua própria destruição.

E esta sociedade laicizada, como bem dissera o Padre

Julio Maria, é carente de entusiamo pela vida', da intrepidez da

verdade, da coragem da conviccão, da virilidade da inteligência,

e tem implantada, no lugar destas virtudes, a lassidão, nomeada

Tolerância, que nada mais é do que a aceitação de todos os

deuses e, daí, de todas as verdades e de todos os erros. Uive-

se, pois, um torpor de consciènc.ia e a alma entorpecida é uma

desgraça para o homem e para a sociedade. Para o homem, porque

reduzido ã sua dimensão de mortal tem a cova como limite e essa

consciência de destruição o torna mais infeliz que um bruto;

36
para a sociedade porque, ao reduzir a vida a um fenômeno

terrestre e transitório, o homem se vê no direito de exigir *

satisfação de sua vontade e a superação da desigualdade que rf a

exterIorIzação da ordem natural do universo. Assim que a arma


mais eficaz contra o socialismo é a oração, aliada ã penitência
e li mortificação.

Se a sdmula do pensamento acima - intencIonalmente

recuperada na fntegra (Cf. Folha da Manhã, Í7-ÍÍ-81) - pode ser

encontrada na frase exortatlva do discursso de D.Mayer

("Compete-nos mentermo-nos firme na verdade tradicional


resistindo a toda e qualquer inovação que dela nos afaste"), é
possível dizer que o ato da posse condensava todo o drama que

transcorria, reafirmado pelo discurso que o novo bispo iria


proferir instantes depois.

A nata da sociedade, religiosa e secular estava presente

no palanques os dois bispos ladeados pelas autoridades máximas

da Igreja e do Estados 0 Cardeal Arcebispo D.Eugênio Sales e o

Governador Chagas Freitas, e maiss o representante da CNBBB, o

Coordenador da Regional Leste I, D.Affonso Gregory, o Prefeito

da cidade, Raul Linhares, o Comandante do 53 q Batalhão de

Infantaria,*o Comandante da Polfcia Militar, vários bispos, como

os de Nova Friburgo, Volta Redonda, Itagual', o Metropolita de

N it erd i, etc.
Sab iamente, D.Navarro n*ut ral iz0.j possíveis

Intcrpretações negativas de seu estilo descontraído - que

incluía acenos, apertos de mão e crí»n C *n^am ao colo, obviamente

fora do cerimonial - com a forma que deu a seu discurso* Apds

invocar as autoridades presentes, "irmãos sacerdotes, religiosos

e religiosas, todos vds que me ouvis, irmãos e irmas em Nosso

Senhor Jesus Cristo", comunicou que entende a missão como

serviço, onde o bispo é o pastor que, para cumprf-la, precisa do

auxflio de todos: presb fteros, reli9 ,osos e leigos. Acentua

ainda que
a Igreja fez a opção pelo homem, mantendo-se livre
<7)
diante de sistemas opostos.

0 memorável discurso, consagrado ainda pela forma de

oração com que foi proferido, deixava transparecer a tendência

do bispado que ora se iniciava. Fiel aos princípios da Igreja,

mas de uma Igreja que não ser enraizava apenas nos mitos de sua

críaçao, mas que junto com eles, se atualizada nos recentes

concílios e pensamentos dos seus pontífices. Assim, se todo o

direito sagrado do bispo estava referendado, também estava

contemplada a perspectiva da colegialidade, quando D.Navarro

anuncia que sua missão sò pode ser cumprida com a colaboração de

todos aqueles que são responsáveis pela construção da unidade da

Igrejas Bispos mais presbíteros, mais religiosos e leigos.

Não deve ter passado despercebido aos seguidores de

D.Mayer a sutil diferenciação que se insinuava na fala de


D.Navarro » apesar dela em nada contradizer a estrutura mais
■ ■

ampla da Igreja- Mas a ênfase no trabalho coletivo não podería

sugerir uma menor import$nc ja àg questões disciplinares que

sustentaram até então a sagrada hierarquia ? 0 prdprIo objetivo

“ a opção pelo homem, 9 uiado pelo amor e pela miserlcédla -

parecia deslocar o empenho de um distinguir. Julgar, condenar

Para um complacente compreender e perdoar, muito menos bélico e


multo ma Is conci1 iador <epfteto, aliás, que um Jornal aplicou ao
novo b ispo)•

A este "conc 1 1 jador*" opunha-se um militante enérgico

egresso de duras batalhas que vinha travando contra a crescente

onda de laicizaçao da sociedade, ameaçadora daquela "unidade

harmoniosa" cuja lógica, se não fosse acessfvel ao homem comum,

devia ser preservada, para o bem de todos. 0 "resistir sempre a

toda e qualquer inovação que nos afaste da verdade tradicional"

estava presente, no momento em que parecia desmoronar um sonho e

um trabalho tão longamento acalentado e efetuado.

De fato, a Mitra e o Báculo, os símbolos do poder do

Bispo, do poder da Igreja, passaram, no Te Deum que se seguiu à

cerimônia administrativa, para as mãos de um bispo criado em

outra tradição, e que os recebia das mãos de D. Eugênio Sales,

com quem D.hayer se desentendia há mais de duas décadas em nome

de questões relativas àquelas mesmas velhas desigualdades que

ele definia como expressão da "unidade harmoniosa". Depois

disso, houve a recepção oferecida pelo Prefeito, e nada mais se

tinha a fazer <a não ser, para alguns, resistir).

39
Os me iíos de comunicaçáo de massa não foram insen * fve i©
às diferenças expostas em praça P'ib 1 Ica s do is .d ias depo is
expi ic itavaro o- antagonismo para os itores ? com reportagens

sobre os dois bispos. D.Navarro em entrevista coletiva b

Imprensa, abre a sua casa, que não quer chamada de Palácio

Episcopalr mas de "a casa do Bispo"? aproveitando para mostrar a

singeleza em que D. hayer viveu todo o seu mandato. A Folha da

Manha? "num esforço de bem informar", f a 2 uma reportagem com o

Bispo Emérito? intitulada "Dom Antoniò - um bispo, conservador"

(comentada anteriormente) e a partir das duas constrói um

quadro comparativo? como subsfdio para que o leitor perceba a


mudança que vem ocorrendo na diocese.

A partir desse quadro constatava-se que as diferenças


eram de variada ordem5

íq - Quanto a relaçao com a ^ P rensa <e? por extensão, na

comunicabi 1 idade com o público)* Q B^ayer não dá entrevistas e

resguarda sua pessoa de contatos diretos com a populaçao. Quando

o faz é em situações formais? Blt^mente ritualizada e mediadas

por seus auxiliares? hierarquic^mente escalonados. D.Navarro

abre "a sua casa" e se deixa ser vjsto como um irmão.

2 q - Quanto à polftica? o novo bi^po se aprfja nas orientações do

Papa Joáo Paulo Ilr via as r£flexSes contidas na Laborem

Exercens dizendo não apoiar nem 0 socialismo Coletivista nem o

Capitalismo Selvagem. Mas D-Mayer mostra a necessidade de

40
condenar os sistemas que, segundo ele, contradlzem a doutrina

admitindo portanto uma participação política nos moldes da


antiga Liga Eleitoral Católica.

3o - Quanto a relação Igreja/Estado, no caso do antigo bispo, há


que radicalizar pois este deve se submeter ^ Igreja, cuja
doutr ina aponta o sistema adequado à boa gestão da sociedade. D.

Navarro, ao cont rár io , reconhece que os jWtodos da lgreja e do


Estado são diferentes, sugeri ndo por isso que s© parta para um
d iálogo, sem rad ical izações que imped Irlam, de início, uma
poss fvel sa ída•

4o - Para D.Navarro, trata-se de promover a unidade na diocese,

agoras seu tempo não é nem o passado nem o futuro, é o presente.

Sobre o trabalho a desenvolver na diocese, D.Nayer alertara que

é preciso resister à qualquer inovação que se apresente e que


afaste os católicos da verdade tradicional revelada. Seu

referencial é um tempo anterior, quando a Igreja ~Q estava


contaminada pelo "modernismo".
%

5 q - Quanto ao alinhamento ideológico, D.Nayer, por enfatizar a

tradição, d dito como um conservador. D.Navarro, afirmando ter

ogerija a rótulos, diz que simplesmente "segue o p^pa. Se as

palavras dele forem consideradas liberais, serei Um liberal; se

taxadas de conservadoras, serei um conservador"„

41
Se a "anatlise" feita pelou Jornais chegava apenas a uma
parcela da população, uma coisa, no entanto, é certai os

simpatizantes de cada postura associavam os esterdtIpos


veiculados ãs lembranças de heterogêneas experiências
individuais e viam no ato que tão pomposamente se consumara uma

linha que separava o ontem do hoje, reacendia temores e


esperanças, distinguia posições. A simples e não questionada
familiaridade com o modelo de religiosidade desenvolvido por
D.Mayer possibilitava a apreensão de D.Navarro como introdutor
da divisão na diocese. No dizer simples do homem da ruas "Antes
não tinha nada disso... era tudo uma coisa sd ... depois que
esse bispo novo chegou é que ficou assim 8 tradicionalista e
progressista, um pr'a cada lado..."
1.2 - A Unidade no Novo Testamento

Mesmo que a posse explicitasse ênfases diferentes quanto

à questão da unidade, D. Mayer f r isando a "unidade harmoniosa"

do tomismo, D.Navarro marcando a legaijdade dos atos da

hierarquia, ambos apontavam para a unidade enquanto valor


indiscutível para a continuidade católica.

Sendo a unidade a "profissão da mesma fé e respeito aos


mesmos chefes" (Aurélio,s/d:1 4 4 1 > é interessante escapar do
Plano imediato em que o ato Se reai i2ava, para ir aos

fundamentos da Igreja, em busca da emergência deste valor que,


acompanhando os processos histtíriCos , torna-se pela tradição, a

base da instituição que se auto-intitula Una, Santa, Catdlica,

Apostdlica Romana. Por ai posso apreender a força moral inerente


à categoria unidade.

Imbui do da certeza que viera ao mundo para cumpri r um

desígnio divino e responder às necessidades de seu povo, Jesus

enfrentou a tarefa de estabelecer sua identidade, a qual exigia

testemunhas como as demais embora, em sua exclusividade, fosse


caucionada por forças sobrenaturais.

Como registro histórico dos passos deste processo,. o

Novo Testamento contém nao só o relato da presença do Cristo <o

ungido) entre seu povo, constituindo a ^prova^ de sua particular

identidade como também os elementos que sao invocados, como

43
fundamentais, para ^
que velo ser o crlsHanlsma. ,1 I
cono flé| e8o
encanto passíveis de
variação nas i n t e r p r e K ^ ,
bla^oes em funw «o de mu ifne
hiuixios fatores que
•-
vao
se constituindo no
processo histórico,r selas©jano plano ^
das
sociedades, seja n» ,
plano simbálico dos quais sSoelemento
consitutivo ou são, pp in ~
Pelo menos, referencial Importante.

Imperativo e extraordinário da missão do


Cristo era naturalisado, no momento de sua emergência, em
virtude de algumas condições presentes: o apreço que o povo das
tribos de Judá mantinha pela história, o passado doloroso de sua
unificação, regras culturais marcantes para sua distinção, um
jugo estrangeiro que toldava o brilho do seu desejado glorioso

destino. Campo propício ãs profecias, já que o imaginário

judáico repousava no Velho Testamento e ali se proclamava a


vinda de um Messias, as vicissitudes do cotidiano abriam-se para
a esperada mudança. Alóm disso, a presença forte da Lei,

defendida pelos "sábios da sinagoga" era um desafio, no plano da

prática, ã emergência de formulações que dessem conta não só das

dores do dia-a-dia como também das questões de maior


enver gadura•

Assim, a emergência de mais um profeta, que breve será

reconhecido por alguns como muito mais do que isto, como o

próprio "Filho de Deus", enquadra-se numa lógica judáica,

compreendondo-se a f as móltiplas contribuições que aquele povo

retinha - à despeito de seu sentimento de exclusividade - por

A 4
força das perambulações a que as circunstâncias histdrlcas o

submet ia .

S»cm pretender aqui discutir o incontestável sincretismo


subjacente às formulações cristas, para o que remeto a Geffcken
<8 )
r quero apenas frisar a compatibilidade entre a mensagem

trazida por Jesus (e seu conseqüente' reconhecimento) naquele

contexto especffico, considerando a heterogeneidade constitutiva

a qualquer sociedade.

As profecias eram o reverso da medalha de uma comunidade

altemante regulada pelas Leis e circunstancialmente subordinada

ao Impário Romano. Um mesmo mundo dividido entre homens que

participavam do Sinádrio,* encontravam-se no templo e, em algums

nfvel, entendiam-se com os romanos - adoradores de outros deuses

— e aquele dos críticos como João Batista, o que incitava o povo

à salvação, pensado por alguns como Elias, no seu esforço de

conduzir os Judeus à libertação.

6 muito provável que a massa de informações contida no

que foi excluído do Novo Testamento, exponha as inconsistências

prdprias às m»iltiplas variações nos relatos sobre um mesmo

tempo, e que a seleção que serve de base à reflexão teoldgica

guarde apenas aquilo que a referenda. Como alerta o tedlogo:

"Les traditions historiques rdsulte sans doute de 1 accumulation

d'une certaine catdgories de stdrdotypes que, à force de se

rdpdter, crdent 1'illusion d'une çontinuitd parfaite. Mais se


processus est en grande partie constrult pôster Ior i

<Wackenhe iro,1977*5).

Apesar dissor neste rápido esboço do que seja a Igreja

Católica, atenho-me apenas a textos teológicos, tentando


compreender, porém, a tradição - conceito chave para a Igreja -

enquanto txadicãa seletiya como si gere Williams (1977). Para


ele, tradição é a forma que conseguiu suplantar versões
concorrentes sobre um mesmo fenômeno ou problema. E este, em sua
dimensão mais geral, remete ã velha discussão sobre a finitude,

cuja construção monumental do cristianismo é um dos


equacionamentos possíveis. Não tendo recursos para entrar em

seara tão complexa quanto distante (no tempo e no espaço) do

catolicismo do século XX e no norte fluminense, resta-me apenas

reduzí-lo a seus traços mais amplos, onde ressalta a salvação do

homem, com toda a gama de relativizações históricas e culturais


que cabe considerar.

. A importância contida na mensagem cistã, incluindo aí

não só o Novo Testamento mas também a Igreja, se expressa em

dupla dimensão* como testemunho de uma distinção insuperável e

pré-existente - (Deus/homem e glória/cativeiro) - e aí residindo

sua originalidade como no fato de solucionar o impasse dado na

d icotom ização acima. Relat iv izando a an iqu ilação conseqííente de

um dos polos daquela visão dual, o modelo cristão lega ã

humanidade uma perspectiva de includència, fruto, provavelmente,

da fermentação de muitas tradições.

46
Como qualquer sfntese, el» não pode ser reduzida ao»

seus elementos const 1 1 utIvo», que no entanto alI permanecem


retidos, gozando da legitimidade anterior mas também Já

legitimados em outros termos. E a % -ttese crista parece-me um

discurso sobre a relação entre deuses e homens, no interior do

qual se opera a salvação. Não tf gratuito que alf está o Pai

(validando o sistema com sua autorldade), o Filho - que tf o

emissário da proposta e morre por ela - e o Espfrito Santo,

condensando em si a prdpria idtfla de processo. E valem-se os

tres, cada um dos outros, constituindo assim o misttfrio fundador


da Boa Nova.

Neste misttfrio que há 2000 anos ilumina o mundo com sua

fascinante proposta de equacionar a questão da finitude, a

ênfase está na presença dessa dimensões processual, simbolizada

pela pomba, aquela mesma que anunciara a Notf a proximidade da

terra, apesar do severo castigo infligido ã humanidade por Deus.

Destacada, mas ao mesmo, tempo integrante da Trindade, a ponba

Junta o velho e o novo, supera a distância da autoridade sem

dimjnuf-la, fecunda a razão com a emoção preservando ambas, o

que sá é compreensfvel pela ftf. Ultrapassando os limites da

palavra, condição de existência da humanidade e tambtfm fonte de

seus desencontros, ela "gera" a salvação, ou como que Santo

Agostinho: "columba copulat"*.

Proposta que não tf nem grega nem judáica, mas cristã,

ela introduz, entre o destino e a Lei, a consciência da

47
transformação, u \tda do antltético. A pomba, nestes termos, rf

a vida (não trouxer* ela a Noé a prova da existência da mesma) e

a esperança da possibilidade de sua preservação através da

mensagem (nao aparecera ela com suas doze línguas de fogo sobre

os apóstolos)• E se foi no processo vivencial de Jesus com seus

apóstolos que o sistema foi sendo esclarecido, ela já estava


(9)
presente anteriormente, na profecia de João Batista

A propagação de um corpo de idéias exige a presença de

um conjunto de agentes, que unidos por compromissos comuns

entregam-se ã tarefa de preservá-la e difundi-la, tarefa esta

vista nao como uma função externa - passível de ser substituída

por outra equivalente - mas como algo que sendo, reconhecido

como condição de transformaçao do agente, está nele encarnada.

Confundida com a própria existência, ultrapassando-a, ganha o

estatuto de missão, razão da vida.

Para isto, é preciso que este corpo de pensamentos seja

dotado de um sentimento tal que permita submeter o agente,

acrescentando-lhe um valor do qual não abrirá mão e que, nesse

processo, retorna ao sistema de idéias agora enriquecido pelo

testemunho do adepto. Centro e sentido de vida para o

convertido, a missão recpmpõe o indivíduo fragmentado pelas

dúvidas e ansiedades, levando alguns a defender a validade da

mensagem ao preço da própria vida, pois esta se confunde com

aquela.

48
A interdependência ent re mensagem e agentes .propagadores
reforçando-se • mutuamente. é - v
9 produzida e realimentada nao só
pelas crenças culturalmente rnncfif.,n uv
constitutivas do grupo como também
pelas experiências conip^rt i1 Knri^e — , ,,
p '*hadas e entendidas segundo os mesmos
valores» A unidade do c o n t .
udor defendida por quem formulou a
mensagem e respeitada p pelo* „
os seus seguidores - òs discípulos -
ganha densidade no Prdprio Processo d ,SSBra,naçik j alnda mala

Porque os seguidores são tambdm benef ic iados . Pel os ganhos


anunciados no conteiido.

A promessa de um reino de pazr a pomba, a expectativa de

um emissário da Boa Nova, o sofrimento do povo judáico, tudo ali

estava, aguardando a chegada do salvador, cujo reconhecimento £

feito pelo eco que o tema encontra entre alguns que se dispõem a

seguf-lo, fazendo disso uma missão acima de seus interesses

imediatos* /Então eles deixaram imediatamente as redes e o


seguiram" <Mateus,4, 2 0 ).

Ao grupo que se agrega ao Cristo será dado

prerrogativass autoridade para expelir os espfritos imundos e

curar toda sorte de enfermidades <Mateus,10,1), contatos com a

divindade, pois ele é reconhecido como constituído de apóstolos

(no grego, "enviados"). Ao povo que os ouve são anunciadas as


<Í0 >
bem-aventuranças • rt qualificação que agora distingue os

apóstolos daqueles que, mesmo simpatizantes, não se dedicam

completamente ã missão ), segue-se a recomendação que é, ao

49

1

mesmo tempo, a precaução necessária à propagação da Idéias e a


(1 2 )
confirmação de sua legitimidade •

0 tempo, lugar onde o processo tece mais visivelmente a

sua teia, está agora redimensionado. Por isso, sobre ele, a

tlnica recomendação possível é que se fique atendo, pois o "dia e


a hora ninguém sabe, nem os anjos do céu nem o Filho, senão

somente o Pai" (Mateus,26,36). Mas para o aprendizado com a

dignificação humana, decorrente do compromisso com a mensagem, o

convívio cotidiano é fundamental, tempo e lugar onde todas as

dificuldades são enfrentadas, onde é testada a fé de cada um.


Por isso, Jesus homem e também Filho de Deus, na sua vida entre
os apóstolos, sofre as vicissitudes de sua época mas não esquece
(13)
a providência divina •

A investidura, que sela o compromisso com a missão,

aparta os escolhidos dos homens comuns, pelos quais cabe zelar

(privilegiando inclusive
"as ovelhas perdidas de Israel"), e
(14)
exige a ruptura com as antigas, alianças , sendo a
(15)
exclusividade requerida generosamente recompensada •

0 aprendizado desta neva leitura do mundo, fundada ainda

na tradição'judáica, já aponta importante novidade em termos., da

autoridade» A inquestionável supremacia da divindade acopla-se a

singular relação entre os apóstolos» Junto a estes, que na Ceia

se perguntavam qual deles era o maior, o Cristo admoestas "o

maior entre vós seja como o menor; e aquele que dirige seja como

50
o que serve"
(Lucasr22,26) Ao mesmo tempo» destaca a
(16)
preeminência de Pedro *

Segando Poupard <1980), 0 ,ugar prjV |ie g iado de Pedro


deriva da exemplaridade da BUa f|gura cm relaçg0 k condlçSo

humana. A fraqueza de Pedro 4 recompensada pela força do Cristo,


< 17)
no qual o apóstolo tem fé * Não é, gratuito
. .. que nr
os auatro
quacro
evangelistas (Mateus, Marco* Lucas . Joao) cftam Pedro 120
vezes, contra 81 citaçSes Para 0 conJunto dos outrps apdstolos.

Pedro estard ainda Presente* tranSfiguraçSo


Cristo, de
(18)
devidamente teste munhada também
Por ^
T 1 ago e seu jrmao Joao

As vicissitudes passadas pelos apóstolos, acrescidas dos


muitos milagres que lhes era d a d o reali2ar, 5d podem ter
consolidado a
certeza e a cor**- .. ,
lança na missão para a qual se
engajaram. Muitiplicavam-se as
Provas quer em forma de previsões
que se concretizavam, quer c
°m° nas determinações às quais era
impossível fugir, como no e p i c ^ .
so d 1 o do Pentecostes, onde todos
ficaram cheios do Espírito San*.
e passaram a falar em outras
línguas, conforme o Espfrjtn ■. „
lhes concedia que falassem
<Atos,2,4).

Entre todos, é Pedro o s v


(19) 1nc*içado para dar cont inuidade a
obra iniciada . Objeto
* Providência divina, tal como
relatado no Novo Testamento,
e ^mpenhou-se em sua tarefa "com
Constância e humildade" (pot
w JPard r1980s1i). Responsável pela
Primeira expansão da Igreja ~
bacia do Mediterrâneo, foi

51
ar ti culador POIrt ico incansávelr possibilitando o trabalho de

conversão de muitos outros fióis. Ainda segundo o mesmo autor, a

Igreja, como Pedro, é dotada de um mesmo signo de contradição,

manifestando uma lógica paradoxal como ele, levada através dos

sóculos a abandonar toda idóia de supremacia temporal (para

estar de acordo com a afirmação de Cristos "Meu reino não é

deste mundo"), "toda ela mistério e graça, pura gratuidade

recebida do Cristo" (Poupard, 1980:13).

Sendo Pedro a cabeça da Igreja, não era menor nem

diferente a responsabilidade dos apóstoloswque, testemunhando a

ressurreição de Cristo ouviram-no d izer s "Ide, portante, fazei

discípulos por todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do

Filho e do Espírito Santo. Ensinando-os a guardar todas as

coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os

dias ató a consumação do século" (Mateus,28, 18-20).

Ainda na chamada era apostólica, que vai ató em torno de

70 DC, outra figura ressalta na constituição da Igrejas Paulo,

chamado ao apostolado quase 10 anos depois da ressurreição de

Jesus. Sua presença será uma constante no tempo, já que o rito

máximo Inclui a leitura dos apóstolos, e Paulo foi o que mais

deixou reflexões sobre a necessária unidade cristã, as virtudes

dos convertidos, os costümes no cotidiano e o ministório da

Igreja.
p

Paulo, o "apdstalo da tradição" ou o "ápdstolo dos

gentIos", convertido
apds o dramático episddio no caminho de
(20)
Damasco (Cf. Atos, 9,15) , centrará suas forças na divulgação
da universalidade da proposta salvífica do Reino de Deus e no

papel da fé para a consecução deste projeto. Sua itineráncia em

mais de 20 anos de apostolado, cobrindo as regiões onde já

chegara a palavra de Cr isto'ou levando-a a pontos onde aindas


não fizera adeptos, atinge a Palestina, Antidquia, Damasco,

Jerusalém, Roma, o Mediterrâneo, atravessa a Frígia, penetra a

Macedônia, alcança Atenas, Corinto, Efeso, a Síria.

Dos diferentes pontos, o jovem judeu de Tarso extrairá e

aprofundará lições que retira de sua experiência apostdlica e


que o Novo Testamento preservará, enquanto pensamento já

inscrito na realidade cristianizada. Escrevendo continuadamente


( 21)
a seus contatos, Paulo é tido como autor de 14 Epístolas

onde conclama os judeus e o gentio a sacudir definitivamente o


jugo da Lei, lembrando-lhes a origem e a força de sua prdpria

vocação; estabelecendo as normas da igreja, aqui entendida em

sentida pleno: os fiéis e a organização que está se esboçando;

enumerando as virtudes do cristão e o estatudo do povo da nova


alIança.

Entre as virtudes cristas Paulo salienta o amor, dom

supremo entre todos que Deus concedeu aos fiéis. Estes dons

espirituais são intensamente lembrados em várias epístolas: aos

53
Romanos , nas duas cartas aos Corfintios, ao- Colossences nas
<22)
duas aos Tessalonicenses, aos Hebreus •

0 cuidado com os costumes se expressa nas duas cartas

aos Corfntios, aos Efósios e aos Colossenses, ora tratando das

questões relativas ao casamento, & liberdade ou a maneira


<23)
adequada de orar . Assim como Paulo frisa a importância do
<24)
amor clama também pela necessidade de separação dós fmpios r

explicitando pois uma ótica e uma moral que devem distinguir o

convertido dos demais, sejam eles judeus ou gentio.

Tal moral deve ser tanto mais seguida


o fiel é se
(25)
ministro de Deus, como ressalta na carta aos Efósios ou* nas

duas endereçadas a Timóteo, onde


são explicitadas as
(26)
qualificações dos bispos e dos diáconos . o texto ainda

Incide sobre os deveres dos pastores para as vár ias classes de

pessoass aconsenhando os presbTteros, referindo-se às relações

entre servos e senhores, alertanto contra os falsos mestre e os

perígos das riquezas. Enfatiza a perseverança do fiel e suas

virtudes, como repetirá na carta a Tito.

conjunto de regras, delineando o perfil de uma

identidade ideal, marcada pela unidade na fó e nas ações

cocrentei com ela, á resumido na exortação contida na ia carta

aos Coríntios: "Rogo-vos irmãos, pelo nome de nosso senhor Jesus

Cristo, que faleis todos a mesma cousa, e que não haja entre vós

divisões? antes sejais inteiramente unidos, na mesma atitude

à utu r ^ >Uíiê
t 1>oU
mental e no mesmo parecer". Da mesma forma o apóstolo refere-se
<27
ã u n id a d e o r g â n ic a da Ig r e j a e a n e c e s sid a d e de lutar por
(28)
esta unidade

Segundo Pierrard <Í986>, o ensinamento de Paulo

assentava-se numa dialética nutrida no rabinismo e no helenismo’


.

Mas tanto a ética helênica quanto o legalismo judaico são ali

superados, na medida em que elas opõe a liberdade do cristão,


para quem a ressurreição do Cristo é justiça, santificação e

redenção.

Dessa forma, se o testemunho dos apóstolos conta e


reconta a presença do Cristo na terra, entre os homens, as

epfstolas de Paulo explicitam valores e normas que constituem

aquele sistema e que estão implfeitos nos relatos apostólicos.

Embora outros apóstolos também toquem na ética cristã, como

Tiago, que enfatiza o valor da perseverança e os beneffeios das

provações passadas por todo fiel, entre todos sobresai a

r e f l e x ã o de Paulo sobre a unidade do cristão.

1*3 — A Unidade como Valor

A unidade é tanto um Princfpio como um valor

const,itutI vo do cristianismo. Ela s* cnrafza em seu momento de

emergência, forjado na fragmentada experiência por que passaram

as tribos de Judrf e temperada pelas diferentes situações a que o

povo Judeu teve que enfrentar, atrf a chamada Nova Aliança. E por
referência a este valor que se dão os grandes debates

doutrinários. Inclusive aqueles que fizeram aparecr o

Catolicismo, euquanto "expressão do cristianismo que privilegia

sobremodo a dimensão institucional da doutrina" (Sanch is,1990).

A importância deste princípio foi sendo fortalecida pelo

tempo e na forma pela qual a organização da igreja foi sendo

engendrada: sempre apontando para uma tradição - de conotação

divina enquanto passado irrefutável, e para a salvação —


também de origem divina -, enquanto futuro merecido para o fiel.

Assim, a vertende católica, termo já encontrado no sóculo II»

vem apresentando, em sua estrutura organizacional em formação,

uma tendência para um discurso que enfatiza o princípio da


un idade.

Desde a "afirmação lapidar" de Cristo (Poupard, 198Í),


instituindo ^ , ....
reüro como a base sobre a qual se edificaria o
cristianismo,9 , . , , .
acrescida ainda da ordem emitida na
.. . . ressurreição
< Ide e fazei discípulos"), não há como pretender a compreensão

fenômenos no âmbito desta tendência senão levando em conta a

construção Histórica do lugar e significado que ocupam na Igreja


os sucessores d* Pedro.

Apar ecendo já no Novo Testamento (Cf.A t o s ) na prática, a


atualização de ^ «5» ,, « «» . ., „
r tunçoes que, mutatís mutandl , continuam as
mesmas, é bom ~
lembrar que, embora a convocação dos doze remonte

Indubitavelmente ao próprio Jesus" (Stockmeier,1989:7)f a


estrutura d* ordem eclesial passou Por un, desenvolvimento cujo

processo, acredito, pode esclarecer a maneira como hoje se

explica não sd a centralidade do b ispor Como tamb^m, para os


catdlicos, a centralidade de Roma, ambas condiçSo da pretendida
unidade que Preside a doutrina-

A Uportância da g e s t ã o b< comprovada ' não stí pelos


indmeros debates que vem suscitando no‘ interior mesmo da Igreja,
como nos Procedimentos que se Const ,t u ,raro para a sua
elucidação. Falar da Igreja Catdlica ^ falar de RoBar é falar de
bispos. Ê falar de uma 1 iSa^ Q qUe; para Q fjel, é
inquestionável porque partiu da Drf<
propria divindade quando, em sua
Presença entre os homens,, anunciou ~
°u a possibilidade de salvaçao.

Como enfatiza
Poupard , „ .
a <op-cit.) Pedro é a "pedra
Aguiar", ponto de sustentacar, ,
do ed if fc io, aquele que é
indicado para realizar a
Promessa entre todos os povos A
consubstanciai idade entre ped
ro e * Igreja, para o crente
r*A^irmada na consequente (2?)
Sacra**2açao de Roma

A gestação da dj
mensao sagrada do lugar *cm
Antecedentes* al«5m do esforÇo
quc impeliu a escolha de um lugar
impróprio (nas Inclinações da
coíina onde os etruscos fazim seus
v*ticfnios>, há que considç
rAr a posterior preocupa^30 em
Arovar cientificamente" que q
lugar tem razão de ser o sfmboloi
r U e i r o uma tumba, depois
b*sriica (que permaneceu intacta

57
té o século X V , quando foi substituída pela atual Basflica de
(30)
SSo Pedro), residência e Estado (Poupard,í9Gi) ..

Os bispos e Roma, como centro da IgrejaJ devem também

ser vistos a partir da densidade histórica onde suas identidades


foram ganhando carnaturar pondo em evidência problemas que eram
nao sd internos ã instituição, como também outros, decorrentes
do relacionamento desta com seus interlocutores, no transcorrer
dos tempos»

Emergindo no mundo com os apdstolos, a Igreja tem, nos


seguidores destes, a sua coluna mestra. 0 bispo (do grego

episkopós, significando supervisor, intendente) é assim o


continuador por excelência do projeto que ela encerra.

Presidindo o rebanho no lugar de Deus (como fez Pedro, por

determinação de Cristo), são mestres da doutrina, sacerdotes do


culto sagrado, vigários de Cristo, ministros do governo,

pastores de leigos e fiéis. Ec1esialmente considerados em


comunhão com Cristo, não tidos como iluminados pelo Espfrito
Santo.

0 poder dos bispos e da Igreja foi posto ã prova, ainda

no tempo dos apdstolos, quando reunidos em Jerusalém, decidiram

como preencher o lugar vago por Judas, escolhendo Hat ias para

manter o Colégio apostólico tal como Cristo o deixara, com doze

membros (Atos,l). has se naquele episódio apelou~se para o

sorteio, que era procedimento habitual no contexto, as

58
(31 )
divergências foram solucionadas segundo um modelo que

Poupard chama de "poder de comunhão". Este, difere de um poder

de dominação* não emana do jogo de forças entre opositores, mas

sim pelo acatamento de uma mesma posição por todo o grupo, já

que identificado pelos mesmos princípios e iluminado pelo


EsplV ito Santo (Poupard,1980*37)•

E este poder de comunhão que é d i t o como presidindo a

Igreja e os conc n io s , que não s ão "nem u ma conferênci a

1n t e r c o n f e s s i o n a l , nem um parl a m e n t o , nem uma a s s e m b 1 é ia

c onst ituinte. n e m um c o n g r e s s o i ntern a c i o n a l , i


m as sim o c o n j u n t o

dos bispos unidos ao bispo de Roma, que são os sucessores do

colégio apostólico, tal como Cristo o constituiu, com Pedro à

frente" (Poupard,1980*37 e 38).

E em torno de Pedro e depois de seus sucessores, os

b ispos de Roma - os Papas - que se congrèga a Igreja (do

hebrái co Qahal, pelo latira Ecclesia), cuja reprodução guarda

elementos do modelo herdado do mundo judáico mas já referidos k


(32)
nova situação , inclusive na forma de legitimar os

escolhidos* "apresentaram-nos perante os apóstolos e estes,

orando, lhes impuseram as mãos" (Atos,6,6).

No decorrer dos 20 séculos de sua história, a Igreja vem

confirmando o valor especial do bispo de Roma, que também

responde por "Vigário de Cristo", Prfncipe dos Apóstolos, Cabeça

VislVel dm Igreja, Servo dos Servos de Deus, Romano Pontffice,

59
Sumo Pontífice da Igreja Uni versai, Patriarca do Ocidente,

Primaz da Itália, Soberano do Estado da Cidade do Vaticano,

Chefe do Colégio Apostólico, Papa (Pai), que não está ac ima da


Igreja , mas nela. Primeiro dos bispos, o bispo de Roma não está
ac ima do Colégio Episcopal, está no seu coração"

( P o u p a r d ,1 9 8 0 s 3 0 s s . )

0 Papa representa a união de toda a Igreja e é enquanto

tal que se dá sua infalibilidade. Também é nessa - condição que

tem poder s u p e m o r pleno imediato e universal sobre todas as

Igrejas Católicas. Ele é também um bispo entre os bispos, como

Pedro foi um apóstolo entre os apóstolos. um vigário como os

outros! seus sacramentos têm o mesmo valor que os de qualquer

outro sacerdote. Enquanto fiel é irmão de todos os outros. Os

sacramentos não altera a comunhão estabelecida pelo anterior -

cria outra comunhão. Assim, o papa segue sendo fiel (porque

batisado), presbftero (porque ordenado), bispo (porque sagrado).

Partilhada por todo o episcopado católico, a convicção

de "encarnar a verdadeira fé" leva á certeza de que o bispo de

Roma é inquestionável. Abalar seu trono é o mesmo que abalr

todo o episcopado, é questionar a sucessão apostólica. E nao

foram poucas as pressões que desde Constantino os bispos

enfrctaram para evitar que forças seculares se imiscuíssem no

governo da Igreja. Apesdar disso, uma impressionante

continuidade se afirma na história, com os bispos mesmos zelando

pelos limites das intervenções do bispo de Roma, garantindo a

60
figura do Papa como guardlSo ‘
a utorizado da fé. Luta-se por Boi*o

organizando o esforço missionário, combatendo as heresias,

defendendo a autoridade do trono de Pedro contra qualquer

tentativa de descrédito de sua autoridade espiritual.

Assim, é um erro opor, de um lado, a exaltação do

primado romano, e de outro, a proclamação da autoridade

episcopal e conciliar. Por vezes o Papa intervem no governo das

Igrejas, ao duplo título de defensor da fé e dos costumes, do

qual ele é o primeiro guardião. Mas isso não substitui o governo

ordinário dos pastores legitimamente constituídos, sob pena de,

no caso inverso, se ver chamado ã ordem.

Segundo Poupard, a vida da Igreja não se deduz por

razonamentos racionais, a partir de premissas dogmáticas. Mas

seu mistério se desvela progressívamente na espessura de uma

história, atormentada pelos homens e animada pelo Espírito.

Nessa história Pedro e seus sucessores ocupam um lugar singular,

sem ser, no entanto, ã parte. A tentação de opor o Papa aos

bispos (como Pedro aos apóstolos) resulta no esquecimento de que

Pedro era um apóstolo e o Papa um bispo. No Evangelho Pedro não

é um super-apóstolo, mas o primeiro entre eles, o p c í Dío lotee

filCCS- Pedro é o apóstolo e« que se encontra reunido tudo o que

é possuido em comum pelo colégio apostólico inteiro. Por isso é

•le que convoca os concílios, essas "experiências reguladores"

onde os p a r t icipantcs, exercendo o "poder de comunhão" que lhes

61

i
compete, podem, no final declarai "0 'splVlto Canto e nós mesmo»

decidimos que»»*" (Poupard,19(30) •

Mas, por mais corcrente e sedutor que seja o discurso

teológico acima, ií necessário contextual Iasrf-lo, apreendendo como

se estrutura o corpo institucional e os processos históricos de

sua constItuIção. Pois que "Corpo de Cristo"* "Templo de Deus"*

"Sacramento Originário", "Santa Madre", "Esposa de Cristo",

"Rebanho", "Casa", "Vinha", "Cidade", "Sociedade Perfeita",

"Povo de Deus", embora nomes que se refiram a uma mesma

entidade, cada um deles carrega atrás de si uma longa história -

cheia de esperança para os fidis e cheia de problemas para o

observador que deseja compreender a Igreja.

Católica, Apostólica e Romana, referIndo-se

respectivamente a sua universalidade - com destinação de

estender-se a todos, sem olhar diferenças de raca, nação ou

regime político; ao fato de derivar-se de Cristo, atravós seus

apóstolos; tendo o bispo de Roma por cabeça.

Enquanto instituição, a Igreja prossegue a tarefa dos

apóstolos que, unidos sob a chefia de Pedro, representante de

Jesus, prefigura a sua união. 0 sucessor de Pedro é o Papa, os

demais apóstolos são os bispos que, para exercerem o apostolado

contam com o auxílio dos presbíteros, seus delegados. Os

presb ít er os, portanto, só podem exercer seu poder de comunhão

coa os seus bispos, e estes, com o Papa. Nos 2000 anos de sua

62
existência, em que a Igreja complexfficou sua forma original

para atender as necessidades históricas, foi tentado manter sua

inspiração inicial.

Os presbíteros, enquanto pastores, congregam a família

de Deus numa fraternidade que tende para a unidade. Cooperadores

da ordem episcopal, formam, com seu bispo, um «ínico presbítero,

em razão do sacramento da ordem e do ministério. Unidos entre si

pela íntima fraternidade, consideram-se pais em Cristo dos fiéis

que eles espiritualmente geraram pelo batismo e pela pregação.

A ordem, sacramento exclusivo dos sacerdotes, admite um

primeiro grau que possibilita o "diácono" celebrar batisados e

abençoar casamentos. Feitos os votos, o bispo impoe as mãos a

este irmão que, no entanto, vinda não está autorizado pela

Igreja para celebrar a Eucaristia. Num segundo grau, o

presbítero recebe, além da imposição de mãos do bispo e dos

outros presbíteros presentes (significando que o recebem em sua

comunidade), a unção nas mãos, o que o inscreve entre aqueles

que, por instituição divina, são assinalados por um caráter

indelével e constituidos assim ministros sagrados. Agora

pastores, assumen os munus da Igrejas ensinar, santificar,

governar •

Embora no exercício do seu poder o presbétero dependa do

bispo, eles estão unidos na dignidade sacerdotal, como bem alude

o ritual da ordenação que se encerra com a solene declaração: "0

63
amor de Cristo nos uniu". São verdadeiros sacerdotes do Novo

Testamento, participando no grau prdprio do seu ministério, da

função do Cristo. Mediador dnico, o presbítero revive na missa o

sacrifício de Jesus.

Antes da ordenação, o presbítero terá feito tres votoss

o de pobreza, o de castidade e o de obediência. Na ordenação faz

um voto de obediência ao bispo e seus sucessores. 0 estado

constituído pela profgissão dos tres conselhos evangélicos, os

votos, não pertence ã estrutura hierárquica da Igreja,

rei acionando-se antes com a santidade, na medida em que seus

professos ficam mais desimpedidos dos cuidados terrenos.

0 presbítero pode ocupar certos cargos que recebem

títulos específicos, o que não afeta seu estado. Assim, ele pode

ser Vigário Castrense, ou Capelão Militar, quando cuida de uma

comunidade de militares; Reitor de Igreja, quando a comunidade

não é paroquial mas particular, anexa a uma comunidade

religiosa; Capelão, quando tem o cuidado pastoral, de forma

estável, de uma comunidade ou grupo particular de fiéis.

Em uma diocese, unidade territorial governada por um

bispo, este é auxiliado tanto pelo clero secular quanto pelos

c h a m a d o s religiosos, presbíteros que foram ordenados nos quadros

de uma ordem religiosa, como jesuítas, carmelitas, etc. Embora

tanto os presbíteros diocesanos quanto os religiosos participem

e exerçam o dnico sacerdócio de Cristo, na geralmente nomeada

64
4~-

tuca das alniasr os sacerdotes diocesanos têm pr ior idades ,na

medida em que se dedicam inteiramente à atividade pastoral numa

l9reja particular a diocese.

As relações entre o bispo e os sacerdotes diocesanos

devem se apoiar nos vfnculos da chamada caridade sobrenatural.

Ao mesmo tempo, o bispo deve cuidar para que sua autoridade não

prejudique a obediência que os religiosos devem a seus

superiores de ordem. Afinal, os religiosos são sacerdotes

consagrados ao offcio do presbiterato para serem, também eles,

cooperadores da Ordem Episcopal. Nestes termos, pertencem ao

clero diocesano, já que, sob a autoridade do bispo, tèm parte na

cura das almas e no exercício da obra do apostolado.

A elevação de um presbítero ao episcopado sé se faz

mediante escolha e ordem do Papa, a Sagração de um novo bispo

exige a presença de tres outros bispos. Coloca-se sobre a cabeça

do sagrando o Evangelho e quele recebe, após ungido, o anel de

bispo, o cajado de pastor e uma diocese na qual exercerá seu

ministério. Por esta sagração o novo bispo entra no Colégio dos

Bispos, que exprime a idéia de comunhão sagrada de todos os

bispos mais o Papa.

0 Colégio Episcopal sucede ao Colégio Apostólico, no

magistério c no regi*c pastoral. 0 termo Colégio Apostólico vem

ainda daquela primeira reunião com os apóstolos, no Pentecostes,

quando-para os fiéis-sobre eles derramou-se a graça do Espírito

65
Santo. Não existe sem o Papa, enquanto representante da comunhão
hierárquica de todos os seus membros, sendo assim a própria
Igreja. Por isso, as definições deste colégio t£ a mesma
extensão do depósito de Revelação Divina, pois são proferidas
com a assistência do Espfrito Santo. Este poder é exercido no
Concflio Ecumênico, também chamado Santo Sfnodo.

Mas hé também Sfnodos Episcopais, quando bispos


representantes de diversas regiões, escolhidos de acordo com
critérios estabelecidos pelo Papa, formam um conselho que o
auxilia, representando todo o episcopado católico. Os sTnodos
geralmente se instituem e debruçam sobre um tema pré-escolhido,
de interesse geral.

E prerrogativa do Papa convocar, presidir e confirma um


concilio, onde todos os membros do colégio (os bispos) podem
participar. Has fora dos concílíos, o poder colegial também pode
ser exercido Junto com o Papa, pelos bispos dispersos pela
terra, quando o Papa os convoca para uma ação colegial, ou
aprova ou aceita a ação conjunta dos bispos dispersos, de modo
que ele se torna um ato colegial. A idéia do colégio invoca a de
pares entre pares, membros que formam uma assembléia sem

presidência. 0 Papa é cabeça, não enquanto um poder a mais, como


Jé foi dito, mas enquanto simbolo da comunhão de todos.

Os bispos, conforme a conveniência, organizam-se também

nas chamadas Conferências Episcopais, que são formas atualizadas

66
2.

do* antigo® Sfnodo* do» ConeflIo» Provinciais, que eram


plenárias onde eles estabeleciam um teor comum de ação. 0
Cone H I o Vaticano II estimulou a emergência desta forma de
associação que, congregando o episcopado de uma nação, pode
elaborar planos mais sgerais e comuns para um conjunto., de
Igrejas Particulares. Nas conferênclcias Episcopais os bispos
diocesanos e os coadjutores (sucessores dos primeiros) têm voto
deliberativo. Os bispos auxiliares ou outro que haja, terão voto
deliberativo ou consultivo, de acordo com os Estatutos da
Conferência, que devem ser aprovados pela Sé Apostólica.

Estas Conferências, a bem de maior eficácia, devem


definir, nos Estatutos, cargos específicos, como um Conselho
Permanente, Comissões Episcopais, Secretariado Geral. As
decisões das Conferências (que nem sempre sao nacionais) quando
obtidas por maioria de 2/3, são obrigadas juridicamente, nos
casos prescritos pelo direito comum ou com ordem especial da Sé
ApomtdlIca.

Ao posto de bispo pode-se acrescentar ainda o tftulo de


Arcebispo e Cardeal. 0 primeiro rege dioceses onde atuam outros
bispos. Cardeal é o título máximo dos dignatários da
(33)
Igreja • Eleitores dos Papas, chama-se Carmelengo aquele
definido para presidir o conclave da eleição. São também os
admInistradores do» bens materiais da Igreja. Escolhidos

pesaoalnente pelo Papa no Consistòrio Secreto, recebem o chapéu


cardinaléclo que os distingue no Consistòrio Pdblico. Os

67
Cardeais são considerados príncipes de sangue e recebem o

tratamento de Eminência. Sendo os mais prdximos colaboradores do

Papa, geralmente sao designados para dirigir as principais

organizações Romanas como os dicastérios (espécie de ministério)

da Cdria Romana. Todos eles possuem uma igreja titular em Roma.

Ainda quanto a forma de organização, vale lembrar uma

modalidade ultra-diocesanas a Província Eclesiástica. Esta é a

reunião de varias dioceses vizinhas, para promover a ação

pastoral e estimular as relações entre os bispos de uma mesma

região. Preside a Província Eclesiástica o metropolita,

arcebispo da diocese principal daquela província. A Arquidiocese

é a Sé Metropolitana da Província. E maiss várias províncias

Eclesiásticas forma ainda as chamadas Regiões Eclesiásticas,

modalidade funcionais que foram consagradas a partir do Concilio

Vat icano I I •

Por singelo que seja o esboço que se faça da Igreja, não

há como deixar de fora o lugar ocupado pelas Ordens religiosas,

essas sociedades aprovadas pela autoridade eclesiástica

competente, cujos membros fazem votos de pobreza, castidade e

obediência, com o fito de alcançar a perfeição evangélica.

Importantes no movimentado primeiro milênio, quando a

Igreja Já se estruturava em moldes semelhantes ao que ainda hoje

apresenta, no milênio seguinte vão desempenhar papel

prtpondcrantc na expansão do cristianismo entre os povos,

68
principalmente no Novo Nundor onde algumas delas foram mesmo as

responsáveis pela evangelização. Franciscanosr Jesuítasr

Beneditinos, Carmelitas espalharam-se pelas terras recem-

descobertas, fazendo um trabalho missionário para o qual não

havia nem cler numericamente suficiente nem condições políticas


(34)
adequadas para tamanho projeto. •

As ordens, que em geral são distinguidas por uma

caracterfstica qualquer - seu "carisma" - ligam-se a algum

aspecto social (educação, saúde, catequese), a partir do qual

atualizam sua missão. Embora haja ordens que se voltem

inteiramente para a oração (como as comtemplativas, monacais),

as missionárias são em maior ndmero e de grande presença no

mundo cr istao•

0 candidato ã religioso passa por vários per Todos de

Preparação, de acordo com o regimento próprio da ordem que

escolheu. Em geral a preparação apresenta tres fases: na

Primeira, o aspirante é instruído na dis c jpijna da ordem, sem

contudo pertencer a ela. A segunda, chamada noviciado, é aquela

onde ingressa apds votos provIsdrios? na terceira profere os

Votos perprftuoo e torna-se membro pleno da mesma. Esta estrutura

btfslca é o esteio de muitas variações que ocorrem e que fornecem

* identidade da associação.

A» ordens, tal como ocorre no clero secular, admitem a

Participação de seus membro» em graus diferentes. Semelhante à

69

d i s tinção d iácono/presb ítero, os homens de uma ordem podem

permanecer apenas como "irmãos", sem alcançar o sacerdócio.

T a mbém os leigos podem pertencer a uma ordem, as quais, no caso,

chama - s e Ordens Terceiras. Ordens Segundas são as femininas.

Geral mente, nas ordens religiosas dé-se uma convivência

mais intensa entre os membros do que no clero secular. E embora

a hier a r q u i a das ordens religiosas também se assente em

princípios territoriais (províncias, capítulos), a organização

delas atravessa as dioceses, onde finalmente cumprem sua missão

de acordo com os carismas próprios, sob a tutela do bispo

d io c e s a n o .

I»4 — A Operacionalização da Unidade

A operacionalização da unidade católica se atualiza via

o apoio de do is pr inc íp ios s o da sucessão apostólica, que

sustenta a lógica da doutr ina e o da t err it*or ial id a d e , que

informa — no pl ano da prát ica - a organização da instituição, no

sentido de realizar sua pretendida universalidade. 0 primeiro

incide sobre o tempo, o segundo sobre o espaço. Ambos sao

fundamentais para fundar o mundo católico.

, 0 espaço católico é dividido em dioceses e subdividido

em paróquias. A diocese é administrada por um bispo, auxiliado

por presbíteros. A constituição de uma diocese é precedida por

u» estágio preliminar, quando o território é denominado

70
Prelazia, assim definido seja porque é área nova a evangelizar,

seja por desmembramento»

Numa Arquidiocese o trabalho pastoral é dividido entre

os bispos auxiliares, podendo ali residir o Bispo Emérito, isto

é& aquele que antecedeu o atual bisco diocesano. Este,

responsável pela política religiosa local,, pode incentivar

formas de atividades entre os leigos, sempre tendo ã frente um

membro do clero, ou fomentar a participação nos muitos

movimentos que a Igreja hoje promove. Expressões como as

Comunidades Eclesiais de Bases (CEBs) existem se o clero

propicia a sua emergência ou, pelo menos, nãb coibe esta forma

de organização. De toda forma, seja qual for a configuração que

surja, ela não contraria o modelo básico onde os presbíteros

estão unidos a seu bispo e este ao Papa.

A diocese, enquanto porção do "Povo de Deus*» confiada

ao pastoreio de um bispo, tem como governo a Sé Episcopal. A ela

equivalem: a Prelazia Territorial e a Abadia Territorial que,

por motivos especiais, é confiada a um relado ou abade de

mosteiro, que a governa ã semelhança de um bispo diocesano.

Viçar iato Apostólico, Prefeitura Apostólica e Administração

Apostólica referem-se a territórios que, geralmente por carência

de clero, ainda não são dioceses formadas, e por isso, sao

confiadas a um Vigário, Prefeito ou Administrador Apostólico.

71
As paróquias s§o unidades especiais em que se divide a

d io c e c.. , como r e 9 iões ou Vicariatos Forâneos r que servem par a

coordenação da atividade pastoral. A diocese deve ter os

segui n t e s órgãos colegiadoss

1 — Con s e l h o P r e s b i t e r I a l r representando todo o presbitério, que

deve ajudar o bispo no governo da -diocese, como seu senado.

2 — Con s e l h o Administrativo (para assuntos econômicos), sob a

d i r eção do padre Procurador da Mitra.

3 — Con s e l h o Pastoral, que avalia as atividades pastorais da

diocese, representando as regiões, condiçoes sociais e

c a t e gorias de clérigos, leigos e religiosos.

A — C o l égio dos Consultores, constituído por membros do Conselho

P r e s b i t e r i a 1, que toma as decisões mais importantes,

inclusive a eleição do Admin istrador Diocesano na vacância

ou impedimento da Sé Episcopal.

A Cdria Diocesana é um instrumento através do qual o

bisp o exerce o ap o s t o l a d o e a administração de sua diocese. 0

car go méximo da Ccfr ia é o de Vi çér io Geral , que pode ser

as si s tid o por um ou mais Vigério* episcopais (que gozam de

dir eit os eq u iv al ent es aos de Vigério Geral) para uma determinada

rcgi5o, um assunto especial ou os fiéis de um determinado rito

na diocese.

72
A C»Ir ia é integrada por sacerdotes e leigos e sus* funç*C
deve ser divjdida em sessões! administrativa, pastoral

jurídica. Esta, por exemplo, trata de processos vvlrios que,


conforme as circunstâncias, são encaminhados. Além da C- si e do
Conselho de Presbíteros as dioceses maiores podem ter outros
conselhos, como o Cabildo Diocesano ou Metropolitano, composto
por cônegos, que se encarregam dos bens de maior monta da

diocese e do governo desta, quando privada t emporar iamente de um


pastor•

(35)
A Ciír ia Romana é a de maior complexidade , fruto de
creações sucessivas de Papas preocupados em ter a sua disposição
imediata os meios de fazer face ãs tarefas incessantemente
crescentes e diversificadas, ã escala de Igreja universal. Para
isso eles se cercam de corselheiros e colaboradores escolhidos

entre os membros do clero romano e do Colégio dos Cardeais. A


primeira comissão cardinalícia de caráter estãvel foi instituído
por Paulo III em 21 de julho de 1542, sob o nome de Congregação
da Inquisição» Outras foram creadas por Pio IV, Gregdrio XIII e
Paulo V. A primeira organização de conjunto foi crada por Sisto

V, pela Cr»n^t it u iç So Iuiüieusa âeteCQl Dei, de 1598. Merecendo


sucessivos retoques. Pio X fez uma reforma de conjunto,
promulgada em junho de 1908, cujas disposições foram retomadas

pelo Código do Direito Canônico. Paulo VI, por sua vez, fez

vrfr itt reformas de conjunto, promulgado no Regolamento Generale


Del 1a Cur ia Romana, em 1o de março de 1968, complementando a que

existia até então, como 139 artigos e 3 apêndices.

73
Alguns órgãos foram suprimidos, outros criados,

desenvolvidos, denominações tradicionais substituídas para

melhor expressar as devidas competências, injetando sangue novo

no velho organismo. Esta reyitalização se verifica

principalmente com a presença de bispos diocesanos como membros

das congregações romanas, determinado pelo motu proprio "Pro

Compteor Sane", de Paulo VI, promulgado em 6 de agosto de 1968,

baseado na convicção da "necessidade inegãvel da Ciiria Romana,

enquanto instrumento de se.serve o Pontífice Romano para exercer

o poder supremo, que por vontade de Cristo mesmo, ele possui

sobre a Igreja Universal". Assim, sete bispos diocesanos são

agregados por 5 anos a cada congregação, mais tres religiosos

para as Congregações que os receberam (Cf-Poupard,1981:5i e 52).

Esta complexa estruturação é a concretização

contemporânea daquela mesma antiga Igreja, cujo munus foi

anunciado ainda na época dos apóstolos. Adequado aos tempos

atuais, o tríplice encargo da Igreja permanece o mesmo:


cvange1 izar, santificar e governar•

Evangelizar significa pregar a palavra de Cristo para a

conversão de todos os homens. Santificar é exortar a todos para

que se santifiquem seguindo o exemplo de Cristo e , especialmente

**r*v<^* sacramentos, que são os sinais da salvação.


Instrumentos de salvação para o mundo pela força do Espírito

Santo. Governar é por-se a serviço de todos os homens. Neste

7 A
quadro, o governo, pastoreio, c o m e ç a com C r i a t o e prossegue
com os apdstolos.

Os sacramentos, ou sinais da salvação, foram


estabelecidos em sete, pelo Concilio de Trento. Como

manifestação da graça do Espirito Santo, proporcionadora da


comunhão com Cristo, são considerado*? indeléveis- São eles:

* *" Batismo, através do qual a pessoa ingressa na comunidade


crista e, com ele, torna-se filho de Deus, recebendo o dom

do Espírito Santo. 0 batisado torna-se cristão.

2 — Confirmação, que é um reforça do batismo. Este sacramento

não existia or igí.nalmente. Marca a consciência do

relacionamento do fiel com Deus, uma vez que no batismo isto

em geral não se dé.

3 - Eucaristia - clímax da comunhão com Cristo e o Pai. Nesse

sacramento Cristo se torna presente, unindo a todos. Repete

o modelo da Santa Ceia, sendo assim o momento em que a

divindade renova a aliança com o seu povo.

Xnicialmente estes tres sacramentos constituíam uma dnica

liturgia. 0 batismo como entrada, a confirmação como seu segundo

momento e a eucaristia como alimento da comunidade colocada a

serviço do mundo. Através deles os fiéis tornam-se cristãos

adultos, plenamente aptos a assumir a missão de Cristo.

75
4 - Penitência, sacramento de reconciliação depois de uma

ruptura da comunhão com Deus, compreendida pela noção de

pecado»

5 - Unção dos enfermos, a antiga Extrema-Unção, enquanto força

emanada do Esp frito Santo para reconquistar a satide ou

enfrentar a morte.

6 - Matrimônios sacramento em que os ministros (ou seja, aqueles

que colocam os sinais e a palavra em nome de Deus) são os

nubentes. 0 sacerdote, aqui, apenas ratifica o ato.

7 - Ordem, sacramento em tres graus (diaconato, presb iterato e

episcopado), segundo o qual o fiel dedica sua vida ã vida da


Igreja.

Embora enquanto sacramento todos eles tenham a mesma

qualidade Impresc id fvel para o cristão, não hã como reconhecer a

importância de alguns deles enquanto identificadores de estado

ou condição: a eucaristia, que traduz o momento da mais íntima

comunhão com a divindade, o batisto que separa o cristão do n ã o —

cr latão, a ordem, que entre os cristão separa aqueles que

assumem o compromisso especial com a missão da Igreja. Por este

tíl11 mo o fiel ordenado pode chegar a ocupar o posto mais alto da

hierarquia, o de sucessor de Pedro.

76
A configuração atual da doutrina, cuja elaboração não

perdeu c< vista as mensagens deixadas pelos evangelist as,

al imentando—se na fé que os animava e realimentado esta fé entre

os povos, é fruto de longo trabalho teológico, canônico,

jurídico, exegético, que através das muitas "experiências

reguladores" que a Igreja promoveu, pode preservar-

A complexidade de manter a unidade de uma crença

duplamente centralizada (pois que todas as dioceses referem-se

Roma e cada uma a seu bispo), passa pela habilidade em mater

vivo o sentido da mensagem, orientando-o e negociando sempre em

nome da unidade do grupo. No contínuo dialogo com as sociedades

e as diferentes culturas, a Igreja Católica pôde chegar, ao

nossos dias apresentando uma dimensão jurídica muito elaborada,

para o que contribuiu a herança da longa tradição legislativa e

centra 1 izadora do Império Romano. Segundo Uackenheim(1977) desde

a época Patr fst ica os Papas incumbiam-se de legislar para o

conjunto da cristandade ocidental. Mas suas "Decretai s" diziam

respeito mais a pontos sedundários da disciplina, só depois

estendendo— sc às questões de estrutura e de doutrina. E mesmo a

penetração no Ociendente de elementos do Direito Gemânico não

reverteu esta tendência.

O renascimento do Direito Romano na Itália do Norte e na

frança, por volta do século XII se expressou na obra dos

canonietas» o que exerceu uma influência profunda não só na

organizçío da Igreja como também no pensamento teológico. As

77
grandes sfnteses doutrinais da tfpoca trazem a marca de um
espírito Jurídico forte que vai permear as quatões disciplinares
que eram tratadas nos concílios, onde as questões teológicas
também eram colocadas em termos jurídicos»

Assim, os tres primeiros concílios de Latrão <1123,1139


e 1179) serão pródigos na promulgação de muitos cânones, isto ó,
proposiçoes em forma de *lei, predominando no período a
valorização explicita de candidatos com formação jurídica quando
se tratava de eleições pontificiais. Por isso irão aparecer
naquela fase quatro grandes compilações, que depois receberão o
nome de "Corpus Iuris Canonici". Posteriormente, estes atos
legislativos foram recolhidos por compiladores privados, o que
resultou em aumentar a c.onfusão teórica e a incerteza prática
quanto d aplicação das disposições canônicas.

No sdeulo XIX vai se tornar premente a necessidade de


harmonisar, simplificar e precisar o teor do corpo tradicional
de leis. El o Papa Pio X que, em 1904 toma a'sl a empresa, da
qual resulta o Código de Direito Canônico promulgado em 27 de

maio de 1917, já no papado de Bento XV. 0 trabalho, conhecido

como Código Pio.Bcneditino, quesc sempre manteve a disciplina

vigente at é então. Breve, as condições externas da Igreja no

mundo e as progressivas disposições internas da comunidade

eclesiástica exigiram uma nova reforma das leis canônicas.

Sensível a isso, o Papa João XXIII, ao anunciar em 25 de Janeiro

de 1959 a celebração do Sfnodo Romano e do Concilio Vaticano II

78
anunciou também que estes acontecimentos seriam necessariamente
a preparação para instituir a desejada renovaçãc do código»

O atual Código de Direito Canônico difere do anterior

pelo fato de que não visava apenas uma nova ordenação das leis.

Tratava-se sobretudor |'duma reforma das normas que se devia

adaptar aos novos hábitos mentais e às novas necessidadesr

embora o direito antigo devesse fornecer o

fundamento"(C •D •C •,PrefáciosXVIII). Foi promulgado em 25 de

Janeiro de 1983 por João Paulo II, através da Constituição


Apostólica "Sacral Disciplinae Leges".

Dimensão jurídica de uma Problemática muito mais ampla

que os códigos de direito conseguem abarcar, é sintomático que


surjam preocupações de adequaçao à sociedade num momento em que

cia passa por visíveis e cada ves mais aceleradas

transformações. Estasr arrastam de roldão tudo o que compõe a

sociedade, inclusive os sistemas de pensamento que, como o


cristão, são constitutivos das culturas na dramática questão de

equacionar os problemas relativas ao destino do homem.

Sem reduzir o catolicismo a esta dimensão normativa mas

querendo incorporar as tentativas que, com maior ou menor

sucesso, forjaram uma "impressionante continuidade"(Poupard)

vale um comentário sobre os temas e os contextos dos concflios

poque eles expressam os diferentesw problemas que a doutrina e a

Igreja enfrctaram no decorrer do tempo. Entre as muitas

79
adversidades
'lUe x .
alcançados, Se colocavam, ® “espeito dos resultados

ênfase neste ',IJest ã o da unidade sempre e s teve Presente. A

denota sempr ec':o e o tratamento dado aos problemas imediatos

„ encontro entre uma lógica c o n e i 1 iatdri a r


da qual a P o n>b*
° grande símbolo, e conjunções disruptivas.

Para
°s firf,
'^is, esta é a condição mesma da existência da
Igreja: dado um
S 's t e m a de crençasr sacralizado e perpetuado na
tradição, expandi^
ás diferentes culturas e cuja promessa final
equaciona um
p|" o b l e m a 'comum, nao serão as desavenças
conjunturais que
f>re v a l e c e r ã o sobre á totalidade do sistema. De
algum ponto sur<
® 'r a o os defensores de 'dêjas tão fecunda,

servindo as ^ e r B ,as antes para C O n s o l id a r as certe2es dadas

pela té que para d i l u r _ l a s . A s s i m, o Prdprio Processo de difusSo

da doutrina cap it al j20U as d if ículdades que encontrava: Roma

tanto dará a i"sPiraç:-0 jurídica quanto o Cenário de m a r t rrios


vários, entre os quais, o de Pedro.

has inferências nesta ordem se sitUíUn num planQ tg |

geral que certamente perdem em poder e><Plicativo Da t a

necessidade de Procurar a correlação e*istente entre a


experiência catdl|ca vivida e as culturas onde elas se deram

para avaliar a interpenetração de ambas e, c0ni ,sso dimensionar

a força daquela mensagem. 0 probleme que se coloca reside no


fato de que, ainda neste plano geral, não há
como negar que o
desenvolvimento do mundo ocidental nao p-.j
H°de ser pensado
Isolando-se a P»rtlcipação da Igreja, e dos . .
e»rr»njos que ela

09
se auto-promoveu, visando a sua periwanênc ia em nome dos valores

que representa. 0 enriquecimento recíproco deve ter se dado em

virtude da dimensão processual que está contida na mensagem

crista e da qual a Igreja d guardiã, mesmo que em alguns

momentos as determinações emergentes pareçam se distanciar da

confortante promessa. Nestes termos é possível dizer que aquela

mensagem é v i t a l , no sentido de que tem potencialidade para

permitir-se assimilações sem descaracterização do fundamental.

Aqui vale relembrar o papel fundamental do bispor que

realizando em cada igreja particular, sua diocese, a

centralização necessária ao cuidado com o projeto global,

redefine a primazia de Roma, atualizando uma "descentralização

centrada" por meio do artifício do poder de comunhão que une o

episcopado e do princípio da sucessão apostdlica ao qual todos

aderem. A Igreja está em Roma onde o sucessor de Pedro tem seu

trono no lugar onde repousa agora aquele designado para

sinbolizar a Igrejar mas parodoxalmente, a Igreja está tambdm em

todos os lugares onde chega a palavra de Cristo.

São os bispos que reunem em si a dimensão c o n t r a d 1t ó r ia

de uma instituição que é temporal e se quer, ao mesmo tempo,

sacramento. Eles recuperam, para o fiel, a sacralidade que a

impregna, pela vontade de Cristo, pois assim como ele "á o

sacramento de Oeus, a Igreja é o sacramento de Cristo, ela o

representa"(Lubac,1983 *39). Esta sacralidade está neles não sd

porque sZo inspirados pelo Espírito Santo, mas tambdm porque são

81
os seus atual izadores, rçsp o n s á v is pelo * ísmo dos fiáís,

med ia d o r e s e n t r e o cáu e a terra-

M a s a p r i m a z i a do bispo de R o m a , apesar dos imperativos

simbdl icos in i lud Tvc i ve ío se contraindo na histdrfa, s e ndo

que o t e m o Papa, S o b e r a n o Pont í f i c e e Vigário de Cristo era

indiferentemente aplicado a qualquer bispo atá o sáculo

U K P o u p a r d r1 9 8 0 S 3 Í ) • De toda a forma, já o 4q Papa romano,

S •C l e m e n t e < 9 2 — i0 i ) r mesmo s»- .1 o respaldo j u r í d i c o que ia se

constituindo gradatívamenté, assim se dirigia aos c r i s t ã o s que,

na comunidade de Corínto e n f r e n t a v a m — se em divisões

intcrnsi&s Vrfs n o s c a u s a r e i s f e l i c i d a d e e alegria se o b e d e c e s s e i s

aos c o n s e l h o s que, no E s p í r i t o Santo, vos temos dado. Será grave

falta e perigo resistir a estas palavras de Deus", Como frisa

Poupard, é inegável a força moral d e sta advertência.

(Cf •P o u p a r d » o p , c i t s i 6 )
NOTAS

4 - D. Carlos Alberto Navarro, produzira, atá o momento, varias


''m issas" (em parceria com o compositor sacro Ma Ideei Farias
e poesias, pôster iormente publicada em A EoeS-ia de Iiido £
este deaeiQ de Qeua (Ed. Damadá ,It aperuna,s/d -) • D.Antonio
de Castro M a y e r , ao longo de sua ativa carreira, elaborava
muitos documentos onde explicita sua relação com a Igreja e
a divindade.

2 - Sobre o Papel do espetáculo para a construção manutenção dó


poder ver Q Eodec £ü) Cena» Balandíer, G . r Ed. Universidade
de Brasília, Brasília, 1982.

3 — A complexa relação entre morfologia e reconstrução histórica


á analisada por Cario Ginzburg em ^Sinais! Ra ízes de uma
parad igma indiciário", in Mitos Emblemas Sinais f São Paulo,
Companhia das Letras, 1989.

4 - Folha da Manhã, 18 de setembro de 1981.

5 - D i z a Folha da Manhã de 18 de setembro de 1981*

"Nascido em 30 de outubro de 1931, no Engenho Novo, Rio de


Janeiro. Cursou Filosofia e Teologia no Seminário Sao Josef,
no Rio Comprido. Foi ordenado sacerdote em 29 de junho de
1959 por D.Jaime de Barros Câmara, então Cardeal-Arcebispo
do Rio de Janeiro. Foi Prefeito de Disciplina no Seminário
São Josá em 1960 e 1961; diretor espiritual do Seminário
Menor (1962-1966); capelão da Irmandade de Santo Antonio e
N.Sra. da Boa Mista, no Cachambi (Rio de Janeiro) de 1964
atá a data da posse; assessor da CNBB para o Secretariado
Nacional de Seminários (de 1965 a 1971)* diretor do
Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso da
Arquidiocese do Rio de Janeiro desde 1971. Apds a posse de
D.Cugfnio Sales, em 1970, foi o 1q Coordenador de Pastoral
da Arquidiocese e tambdm foi Migário Cooperador da Paróquia
de N.Sra. do Rosário no Leme (1970); diretor da Divisão de
EducaçSo Religiosa da Secretaria de Educação e Cultura do
Rio de Janeiro de 1967 a 1974. Nomeado Bispo Titular e
Auxiliar do Rio de Janeiro em 2* de outubro de 1975, recebeu
a ordenação episcopal em 12 de drsembro do mesmo ano. Nos
dltimos tempos, além de Utgário Geral, era Coordenador das
1 inhas 2, 3 e 4 da Pastoral de Conjunto da Arquidiocese do
R i o d c Janeiro (referentes à animação missionária, catequese
e, 1 11ur g ia )"

63
- "Ao RevntQ Clero e aos ficais da Diocese de Camposs

Como publicaram os meios de comunicação s o c i a l , ° Santo


Padre João Paulo II nomeou bispo de Campo ao ExfflQ Sr.
Dom Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro.
Nascido no Rio de Janeiro no d Ia 30 de outubro de 1931 ,
ordenado no dia 39 de Junho de 1959, criado bispo auxiliar
do Emo Sr. Cardeal Arcebispo Eugênia de Araújo Bales, e s t e v e
ao lado do Sr. Cardeal Arcebispo do Rio cie Janeiro durante
seis anos. Com grande experiência pastoral em nosso Estador
v iv if icada por •Fervoroso zelo apostcíl ico, sua Exa Dom C a r l o s
Alberto Navarro será certamente o verdadeiro pai e pastor da
grei de Cristo que é a Diocese cie Campos. *C o n g r a t u l o — rner
assim, com o Revmu Clero e os fiéis desta c ircunscr ição
eclesiática, no momento em que envio fraternal e efusiva
saudação ao Exmo e Revmo Sr. Bispo Diocesano Dom Carlos
Alberto. Quando deixo o governo da Diocese de C a m p o s r c u m p r o
o suave dever de apresentar *a t o d o s , Autoridades Civis,
Judiciárias e Militares, ao Revmjo. Clero, «*s Insti t u i ç õ e s e
aos fiéis deste recanto, do Estado do Rio cie Janeiro, me u s
penhorados agradecimentos e colaboração que sempre me
dispensaram durante meu episcopado. Peço ao' S a n t f s s i m o
Salvador que, pelas maos maternais de Maria Sant Tssima,
recompense tanta bond«*de com abundantes graças de
perseverança no bem e de salvação.
Minha maior preocupação, na vida sacerdotal, foi a de
empenhar-me pela pureza e integridade da Fé, sem a qual é
imposs fvel agradar a Deus (São Paulo aos H e b r e u s ,X I ,6> .
Seja-me permitido, ainda uma vez, destacar a v i g i l â n c i a que,
neste ponto, nos impõe nossa adesão à Nosso Senhor Jesus
Cristo. E s p e c i a 1mente à vista da crise que, neste- p e r í o d o
pds-conci 1 iar, perturba e põe em risco a. p e r s e v e r a n ç a d os
fiéis. Quando seja profunda semelhante crise, m o s t r a - o c om
singular £*utor idade Paulo VI, na grande advertência que
enviou a todos os bispos do mundo, ao c o m p l e t a r — se o
primeiro lustro do término do 2o Concflio do Vaticano:
'Nesta a l t u r a , e x a t a m e n t e , e i s que m u i t o s f ié.i s se sentem
perturbados n a fé, por u m a c u m u l a r - s e d e a m b u igu id a d e s , de
Incertezas e de d d v i d a s , que a t i n g e m e s s a m e s m a f é no que
ela tem de ma is e s s e n c i a l . E s t ã o neste caso oso o g m a s
trinitário e c r i s t o l ó y i c o , o m i s t é r i o da E u c a r i s t i a e da
Presença Real, a Igreja como ins titui ção de salvação, o
m in Ist ir io s a ce rdotal no seio do P o v o de Deus, o valor da
o r a ç ã o cr d o s s a c r a m e n t o s , as e x i g ê n c i a s m o r a i s q u e dimanam.
Por e x e m p l o , da ind issol ub i 1 id a d r do matrimônio ou do
respeito à v i d a . M a i s * a t é a prcjpría a u t o r i d a d e divina da
Escritura chega a ser p o s t a e m d d v i d a , em nome de uma
~ d e s m it iz a ç a o " r a d i c a l .
'Assim, a o m e s m o l e m p o e m que o s i l ê n c i o c a i , p o u c o a p o u c o ,
sobre certos m i s t é r i o s f u n d a m e n t a i s do Cristianismo, nds
vemos m a n i f e s t a r - s e uma tendê nc ia para r e c o n s t r u i r , a p a r t i r
de dados p s ic o l d g *c o s e socioldgicos, um cristianismo
truncado da Tradição i n i n t e r r u p t a q ue o liga à fé dos
Apdstolosf e, além disso, para c a uc i o n ar u m a vida cristã

84
destituída de elementos, reiigiosos'(AAS.43,p.í03>, Cf* "Por
um Cristianismo autêntico'7r "Aggiornamento e Tr ad 1ção77,p .355
e ss.) 7
As palavras de Paulo VI são claras» trata-se de substituir a
Igreja Tradicional, por outra nova, com eleme n t o s
*psicológicos e sociológicos laicizados, sem vínculo com a
Tradição Apostdl ica•As palavras são claras e, podemos d iz e r ,
de quem sabia o que tinha pela frente.
Renovo, pois, aqui a observação que fiz quando vos escreví a
circular sobre a integridade e pureza da Fés sobretudo
tratadas no 2 q Concilio do Vaticano, têm dado ensejo às
posições destoantes da verdade tradicional revelada,
denunciadas por Paulo VIs a liberdade religiosa e o
ecumenismo, que leva o Estado à neutralidade diante das
várias confissões religiosas, e isso por princípio, não em
conseqüència de uma situação de fato. 0 que constitui a
negação do Reinado Social de Jesus Cristo. A c o nsequência
natural é a apostasia descrita por Paulo VI nas palavras que
acima citamos.
Compete-nos mantermo-nos firme na verdade tradicional,
resistindo a toda e qualquer inovação que dela nos afaste.
Nesta união na Fé que recebemos do Divino Salvador e s t a r e m o s
presentes nas nossas oraçoes junto ao Coração Maternal de
Maria Santíssima.

Campos, Í7 de setembro de 1981


(a) Antonio de Castro Mayer, Administrador Apostólico da
Diocese de Campos.

Que as minhas palavras sejam em forma de oração:Senhor Je s u s


Cristo, creio firmemente que vosso Pai misericordioso e n v i o u
a Vós Seu Filho, nascido da Virgem Maria, por obra de Deus
Espírito Santo, para salvar o mundo do pecado (MT.,i,2i).
Creio de sois o caminho, a Verdade e a Vida (Jo.,14,6),
Sois o Bom Pastor (Jo.,i0,í4) o Pastor Supremo e vi g i a de
nossas almas <l P e .,2,25 s5,4). Assim como fostes m a ndado por
vosso Pai, enviaste tambóm os Apóstolos ( J o . *20,21) e os
seus sucessores, que são chamados Bispos, para guardar a
Igreja de Deus. Os Bispos, juntamente com o Romano
Pontífice, Sucessor de Pedro, e sob sua autoridade, t o r n a m
eterna a vossa obra, com a missão de ensinar, santificar e
governar. £ de Vós, Senhor, por nomeação do c a r í s s i m o Joao
Paulo II, que recebo hoje a incumbência de presidir esta
Igreja particular de Campos.
Sei que a missão que me confiais como pastor de vosso povo é
um verdadeiro serviço (At.,25; Lumen Gentium,54). E eu vo s
peço que façais compreender a meus diocesanos que venho
rrvestido de Vossa autor idade, par a imitar Vosso e x e m p l o de
humildade, concí c*t izado no lava-pós da Ültima Ceia
<Jo.,13.12-15)- _ •
Fazei que todos compreendamos que o Bispo não é senão um
past or .
Ele nSo é um perito, um político, um cientista, um técnico,
por mais importantes que sejam tais funções (João P a u l o II,

OS
Discurso Inaugural de Puebla, no 1). Em vosso nome e com
vossa autor idade r o Bispo perpetua e torna visível ao mundo
a vossa pessoa e a vossa missão..
Como pastor sei per f e itament e que não fui instituído para
assumir s o zinho toda a missão salvTfica da Igreja de Campos
(Lumen Gentium, 75). A meu lado estarão os presbíterosr que
partilham do sagrado ministério, seus auxiliares e
conselheiros necessários <Presbiteroum Ordinlsl 1162). Como
também os r e i i g i o s o s e leigos. A todos exorto para, cada um
ero sua vocação, adotar como programa de vida da diocese,
Vossa palavras - "Nisto todos conhecerão que sois meus
discípulos se vos amardes uns aos outros" (Jo.,13,35).
Seremos assim, verdadeiros construtores da unidade, agentes
de participação e comunhão.
Lembro ainda. Senhor, as palavras pronunciadas por Vosso
Papa, João Paulo II no Méxicos "Não ignoro quan.tos problemas
se colocam hoje em relação ã promoção e defesa da dignidade
humana. Como bispos não podeis desinteressar-vos deles.Jesus
declarou que no Juízo Final se identificará com os
deserdados - enfermos, encarcerados, famintos, solitários -
a quem se tenha estendido a mão. Fiel a este compromisso, a
l 9 reja que m a n t e r - s e livre diante dos sistemas opostos para
optar sò pelo homem. Mediante a evangelização, chegaremos ao
Homem" (Discurso inaugual 3.1.2=3.5).
0 Santíssimo Salvador não basta porém ao mundo uma justiça
fria pela qual cada um reivindica apenas seus próprios
direitos. EÍ preciso notar - como diz o Papa em encíclica
memorável - que Vós ao revelardes o amor misericórdia de
Deus, exigíeis dos homens que se deixassem guiar na própria
vida pelo amor e pela misericórdia (Dives in M iser icor d ia ,
3-14). Termino, pois, esta prece, implorando a misericórdia
divina sobre mim, sobre nossa diocese, particularmente sobre
as famílias e os jovens, e para toda a geração contemporânea.
E agora, meu coração me pede que eu cumpra o dever de
grad idão •
Muito obrigado, Senhor Cardeal, por ne haver permitido
trabalhar a seu lado durante 10 anos, apesar de minhas
iniimerat falhas. Na pessoa de Vossa Eminência, quero
a flradecer a toda a Igreja do Rio de Janeiros seus Bispos
Auxiliares, Vigários Episcopais, presbíteros, religiosos e
le igos. Sou devedor a todos!
Muito obrigado, O.Antonio de Castro Mayer, por vosso longo
pastoreio de 33 anos ã frente desta porção do rebanho de
Cr ito. Por toda a vossa dedicação, por vossa coragem, por
vc cansei r a s , aceitai a homenagem deste povo aqui
reunido. C , portanto, com muita alegria que teremos Vossa
Excelência entre nós.
Exato*• Gr*. B i s p o s , minha gratidão, na certeza de que
a Pregação melhor que podemos fazer é a demonstração veraz e
visível que podemo* dar da comunhão entre nós <cf. João
P*ulo XX, D i s c u r s o aos Bispos, em Fortaleza,CE.)

86
8 - Geffcken (Í978) aprofunda a compreensão do cHistianismo ao
mostrar a prçsenca de elementos da religiosidade paga,
oriental, grega nas primeiras formulagSes dos fjóis. Sem
incidir sobre trocas concretas de "tragos culturais", o
autor aponta no encontro de vários planos (doutrinai,
ritual, cultural) aspectos que são provas do diálogo que se
atualizava entre diferentes culturas-

9 - "Vi o Espírito descer do céu como pomba e pousar sobre ele.


Eu não o conhecia; aquele, porém, que ive enviou a batizar
com água, me disse: 'Aquele sobre quem vires descer e pousar
o Espírito, esse é o que batiza com o Espírito Santo'. Pois
eu de fato vi, e tenho testificado que ele é o Filho de
Deus" (João,í:32-34).

10 -0 reino dos céus para os humildes de espírito; o consolo


para os que choram; a herança da terra para os mansos; a
saciedade para os que têm fome e sede de justiça; a
miser icórd ia, para os m iser icor cliosos; a visão de Deus para
os limpos de coração; o reino dos céus para os
pacificadores, injustiçados e injuriados (Mateus,5:1-12 e
Lucas, 6: 17-23).

íí -"Vós sois o sal da terra, a luz do mundo" (Mateus, 5: Í3)

12 -"Guardai-vos de exercer vossa justiça divina cios homens, com


o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte não tereis
galardão junto de nosso Pai celeste" (Mateus,6:1)

13- "Observai as aves do céus não semeiam, não colhem, não


ajuntam e celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta
(...) Considerai como crescem os lírios do campo: eles não
trabalham nem fiam. Contudo, nem Salomão, em toda a sua
glória, se vestiu como qualquer deles" (Mateus,6: 26 e 29)

H —"Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim, não é digno
de mi mt quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim
nao é digno de mim. E quem não toma a sua cruz e vem após
mim, não é digno de mim" (Mateus,10-37 e 38)

15 •"Quem acha a sua vida, perde-la-á; quem, todavia, perde a


vida por minha causa, acha-la-á" (Mateus, 10:39)

16- "St mão, «is que Satanás vos reclamou para vos peneirar romo
trigo. Eu, porém, rogue i por ti, para que tua fé não
desfaleça; tu, pois, quando te converteres, fortalece os
teus irmãos" (Lucas, 22:31 e 32)

17 -"Senhor, rstou pronto para ir contigo, tanto para a Prisão,


como para a morte. Mas Jesus lhe disse: Afirmo-te, Pedro,
que hoje, ires veres negarás que me conheces, antes que o
galo cante" (Lucas,22:33 « 34)

87
40 ***Uro» n u v v m l u m i n o s a os e n v o l v e u ; e eis v i n d o da nuvem uma
vo2 que dizia* 'este é o meu Fil h o amado, em q u e m me
compressos a e l e ouvi o que os fez p r o s t r a r - s e ao solo, de
MC d o" <Ma t eu s , 1 7 s2 - 6 ; frlarc o s ,9 s2 - 0 ; L u c a s ,9 s20-36)

-''Eu te d i g o q u e tu és Pedro, e sobre esta ped r a e d i f i c a r e i a


min h a I g r eja, e as p o r t a s do Hades n ã o p r e v a l e c e r ã o contra
ela". " D a r - t e - e i as c h a v e s do r e i n o dos céuss o que ligares
na t e r r a , t e r é s i d o l i g a d o n o s c^us ( M a t e u s , i ó s 18-20)

o0 ^ " S e g u i n d o ele e s t r a d a fora, ao aproximar-se de Damasco,


subitamente u m a luz do c é u b r i l h o u ao seu r e d o r . E,' c a i n d o
por t e r r a , o u v i u u m a voz que lhe d iz ia sSaul o , S a u l o , por que
me persegues? Ele p e r g u n t o u s Quem és tu. Senhor? e a
resposta fo i 2 Eu sou Jesus, a quem tu persegues; mas
l e v a n t a - t e e e n t r a na cidade, onde te d i r ã o o que te convém
faser •(...) E s t e é para m i m um vaso e s c o l h i d o para l e v a r o
meu n o m e p e r a n t e os g e n tios e reis, bem como perante os
filhos de I s r a e l ? pois eu lhe mostrarei q u a n t o lhe importa
sofrer p e l o m e u n o m e " <At o s ,9,3-6 e 15)

21 quatorze cartas atribuídas a Paulo d i r i g e m — se aos


Romanos, dua s aos C o r f n t i o s , uma aos Gélatas, uma aos
Efésios, aos Fili penses, aos Colossenses, duas aos
Tessalon icenseü, duas a Timóteo, uma a Ti to, a F i l e m o m e aos
Hebreus

22 “ 0 amor é p a c i e n t e , é benigno, o amor n ã o a r d e em ciúmes,


nao se ufana, não se ensoberbece, não se conduz
inconvenientemente, nao procura os seus i n t eressas, n a o se
exaspera, não se r e s s e n t e do mal; não se alegre com a
injustiça, m a s r e g o z i j a - s e com a ver d a d e ; t u d o s o u r e , tudo
cr &, t u d o e s p e r a , t u d o suporta. 0 amor j a m a i s ac « (...)
Quando eu era menina, falava como m e n i n o , se a como
menino, pensava c o m o m e n ino; quando cheguei a st * h o m e m ,
desisti d a s c o u s a s p r ó p r i a s de menino. P o r q u e agor.\. v e m o s
como em e s p e l h o , o b s c u r a m e n t e , então v e remos face a face;
ago r a conheço em parte, e n t ã o conhecerei c o m o também sou
conhecido. Agora p e r m a n e c e m a fé, a e s p e r a n ç a e o amor,
e s t e s t r e o l p o r é m o mai o r d e s t e s é o amor" (lCor,13)

23 - P o r q u e o h o m e m n S o d e v e c o b r i r a c a b e ç a por ser e l e imagem


e g l o r i a d c D e u s , m a s a mulher é glória d o h o m e m . P o r q u e o
homem nao foi f e i t o da m u l her; e sim, a m u l h e r do homem.
Todo h o m e m q u e ora, ou profe t i z a , t e n d o a cabeça coberta,
d e s o n r a a p r ó p r i a c a b e ç a . Toda a mulher que o r a ou p r o f e t i z a
com a c a b e ç a s e m véu, d e s o n r a a p r ó p r i a c a b e ç a ” (I C o r . 1 1 )

^ -"Nao sejais p a r t 1c í p a n t e s com e l e s ” <E f ,5,7) • " N ã o vos


ponhais e m j u g o d e s i g u a l c o m os i n c r é d u l o s ; p o r q u a n t o , que
sociedade pode haver entre a justiça e a iniquidade? ou que
c o m u n h ã o d a luz c o m a t r e v a ° " (2Cor,6). " F a z e i , pois, m o r r e r
a vossa n a t u r e z a t e r r e n a : p r o s t 1 t u i ção, i m p ureza, paixão

08
.0 -"Uma n u v e m l u m i n o s a os envolveu; e eis v i n d o da nuvem uma
vos que dizia” este é o meu F i lho a m a d o , em quem me
c o m p r a z o 2 a e l e ouvi o que os fez p r o s t r a r - s e ao solo, de
medo" ( M a t e u s , 1 7 s2-ó; M a r c o s ,9»2-8; L u c a s , ? s 28-36)

1?
-"Eu te d i g o que tu és Pedro, e sobre esta p edra e d i f i c a r e i a
minha igreja, e as port a s do N ades não p r e v a l e c e r ã o contra
ela". " D a r - t e - e i as c h a v e s do reino dos céus. o que 1 igares
na terra, t e r á s ido ligado nos céus ( M a t e u s , i ó s 18-20)

o# - " S e g u i n d o ele e s t r a d a fora, ao aproximar-se de Damasco r


subitamente u m a luz do céu br i l h o u ao seu r e d o r . E, caindo
por terra, o u v i u um a voz que lhe d i z i a s S a u l o , ôau l o , por que
nfe p e r s e g u e s ? Ele perguntou! Quem és tu. Senhor? e a
resposta fois Eu sou Jesus, a quem tu persegues; mas
l e v a n t a - t e e e n t r a na cidade, onde te d i r ã o o que te convém
f a z e r .(.• . ) E s t e é para mim um vaso e s c o l h i d o para l evar o
meu nome p e r a n t e os ge n t i o s e reis, bem como perante os
filhos de I s r a e l ; pois eu lhe mostrarei q u a n t o lhe importa
sofrer p e l o m e u n o m e " <At o s ,9,3-6 e Í5)

21 -As quatorze cartas atribuídas a Paulo dirigem-se aos


R o m anos, duas ao s Cor f n t i o s , uma aos Gélatas, uma aos
E f é s jo s , ao s Fili penses, aos Colossenses, duas aos
T es s a l o n c e n s e s , d u a s a Timóteo, uma a Ti to, a F i l e m o m e aos
Hebreus

22 ~;/0 amor é p a c i e n t e , é benigno, o amor nã o a r d e em ciúmes,


não se ufana, não se e nsoberbece, não se conduz
inconvenientemente, não p r o c u r a os s e u s i n t e resses, n ã o se
exaspera, não se r e s s e n t e do mal; não se áleyre com a
injustiça, m a s r e g o z i j a - s e com a v e rdade; t u d o s c o r e , tudo
crê, t u d o e s p e r a , tudo suporta. 0 amor j a m a i s ac t (...)
Quando eu era me n i n o , f a l a v a como m e n i n o , se a como
menino, pensava c o m o menino; quando cheguei a st * h o m e m ,
desisti d a s c o u s a s p r ó p r i a s de menino. P o r q u e a g o r a , vemos
como em e s p e l h o , o b s c u r a m e n t e , então v e r emos face a face;
agora conheço em parte, e n t ã o c o nhecerei c o m o também sou
conhecido. Agora p e r m a n e c e m a fé, a e s p e r a n ç a e o amor,
e s t e s tress p o r é m o m aior d e s t e s é o a m o r " <1C o r , 13)

23 - P o r q u e o h o m e m n ã o d e v e cob r i r a c a b e ç a por ser e l e imagem


e g l d r i a d e D e u s , m as a mul h e r é gló r i a d o h o m e m . P o r q u e o
homem não foi f e i t o da m ulher; e sim, a m u l h e r do homem.
Todo h o m e m que ora, ou p r ofetiza, t e n d o a cabeça coberta,
d e s o n r a a p r ó p r i a ca b e ç a . T o d a a - m u l h e r que o ra ou p r o f e t i z a
com a c a b e ç a s e m véu, d e s o n r a a p r ó p r i a c a b e ç a " (I C o r «í 1)

24 - "Não sejais participantes co m e l e s " ( E f ,5,7). "Não vos


ponhais em j u g o d e s i g u a l c o m os i n c r é d u l o s ; p o r q u a n t o , que
sociedade pode haver entre a justiça e a iniquidade? ou que
c o m u n h ã o d a luz c o m a t r e v a ? " (2 C o r , 6 ). " F a z e i , pois, m o r r e r
a vossa n a t u r e z a terrenas prostituição, impureza, paixão

88
lasclva, desejo maligno, c a avureza, que ó idolatria? i»or
esta» coutas ó que vem a iria cic Dou*./' <Colr3>
25 -"Rogo-vos po is r ©ur pr 1r»iono iro do Senhor , que andei r» de
modo digno da vacacSo a que fostes chamado» com toda a
humildade e mansidão, com longan imidade, suporl ando-vos uns
aos outros em amor? esforçando-nos diligentemente por
preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. Há
somente um corpo e um Espírito, coroo também fostes chamado
numa só esperança da vossa vocação. Há um só Senhor, uma só
fé» um só batismo. Um só Deus e Pai de todos, o qual é
sobre todos» age por meio de todos, e está em todos"(Ef ,4,1-
6) .
26 -//Se alguém aspira ao eplscopado, excelente obra
almeja"<ÍT im ,3) e lista seus atributos* irrepreensib11 Idade»
temperança» sobriedade, modéstia» hospitalidade, aptidão
para ensinar» não violência* cordura, inimizade com as
contendas, não avareza, Da mesma forma, os diaconos devem
ser respe itáve is , conservando o mistério da fé com a
consc iencia li mpa".
27 -"Assim como o corpo é um, e tem muitos membros» sendo
muitos, constituem um só corpo, assim também com respeito a
Cristo. Pois, em um só Espírito, todos nós fomos batizados
em um corpo, que judeu, quer gregos, quer escravos, quer
livres. E a todos foi dado a beber de um só espfrito"
(ICor,12)• .

28 -"Ui verei, acima de tudo de modo digno do Evangelho de


Cristo, para que, ou indo ver-vos ou estando ausente*, ouça,
no tocante a vós outros, que estais firmes, em um .só
espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé
evangélica. E que em nada estais intimidados pelos
adversários. Pois o que é para eles prova evidente de
perdição, é, para vós outros, de salvação, e isto da parte
de Deus"<Fi1,1).
29 -Roma, então centro do poder imperial, já contava com alguns
adeptos quando para 1á se di r ig iu Pedro como m iss ionár io.
A1 i fo i ma r t ir iza d o e se pu 11ado » a prox imac!amerit;e em 67 DC.
Por volta de 350, Constantino, o imperador convertido,
ordena a construção de uma basílica na necrópole onde,
segundo o romano Gaíus (no papado de Aniceto, em torno do
ano 200) esta va o mon umen to f.uner ár io a Pet:lro «

30 -Pesquisas arqueológicas realizadas de 1939 a 1949 e de 1953


a 1958 dão conta das dificuldades objetivas que os
construtores tiveram que enfrentar para concretizar seus
pr oj e to s . Elas deram subs fdi os para a afi rmaç ão de Paulo VI
em 2ó de junho de Í9Ó8* "As relíquias de São Pedro foram
identificadas ae man e ira tal que pod emas cons ider ar
convincente"(Poupard,1980*15)•

89
31 -0 que pode ser tido como o primeiro concilio da Igreja <cra
torno, do ano 48, em Jerusalém) foi o palco dc importante
debate, onde Pedro e Paulo defendiam posiçoes divergentes.
Da argumentação resultou que Pedro e os demais apdstolor»
acolheram o método paulino, vendo nele a presença da
inspiração divina (Poupard, 1980:37).
32 -w ...Irmãos, escolhei dentre vds sete homens de boa
reputação, cheio do Espfrito e de sabedoria, aos demais
encarregaremos deste serviço; e quanto a nds, nos
consagraremos ã oração e ao ministério da pal avra" (At os, 6 :3-
4) -
33 -Reunidos, os cardeais formam o Sacro Colégio dos Cardeais
que data de 1150. Desde 1179 sao eleitores do Papa e também
desde aquela época começaram a ser nomeados cardeais alguns
prelados não residentes em Roma, embora todos eles possuam
uma igreja titular em Roma. Participam do conclave até os
oitenta anos e, desde que devem dar o testemunho de sangue
pelo Pontífice e pela Igreja »a fidelidade que lhes juram,
são também chamados "purpurados".
34 -''Marcaram a missão no Brasil sobretudo os frstnc iscan os ou
"capuchos", os carmelitas, os beneditinos. Temos um sinal
fraco da presença dos agost in ianos na Bahia num documento da
Biblioteca Nacional,, nenhum dos dominicanos, alguns dos
mercedár ios no Estado do Maranhão, enquanto oratorianos e
capuchinhos atuaram sobretudo nos sertões do rio São
Francisco, como teremos oportunidade de verificar. As tres
ordens "clássicas" que encontramos em Olinda, Salvador e Rio
de Janeiro são as dos franc iscanos, beneditinos,
carmelitas". CHoornaert,1979:54)
35 -Em 1980 a Ciir ia Romana dispunha dos seguintes drgãoss
1 ~ ^SECRETARIA DE ESTADO - que responde por todas as
questões que lhe são confiadas pelo Papa.*
2 — CONGREGAÇÕES ROMANAS — que foram reduzidas de doze para
nove, por Paulo VI- São comissões estáveis de cardeais que
assistem o Papa em sua missão pastoral. Juridicamente
iguais, eventuais conflitos entre elas são submetidos ao
Tribunal Supremo do Vaticano. São elas:
2.1- CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FE, herdeira da
Congregação da Inquisição, depois Santo Offcio, foi
o primeiro drgão a ser reformado pelo Concflio
Vat icano II.

2.2- CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS, antiga Consistorial =


cuida da creação, condução e supressão de dioceses
propostas.

2.3- CONGREGAÇÃO PARA AS IGREJAS ORIENTAIS, criada em


1862 e fortalecida por Pio XI em 1936.

©O
2.A- CONGREGAÇÃO PAí O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS
SACRAMENTOS, c -da em 1975 a partir Ue duas outras
est abei ec idi\s Paulo VI.

2.5- CONGREGAÇÃO RARA O CLERO, nome atual da antiga


Congregação do Concilio, instalada por Pio IV em
1564, para velar pela boa interpretação e
observação prática das regras estabelecidas pelo
Goncflio de Trento. Sibdivlde-se em tres
departamentos: a) o da vida espiritual, intelectual
e pastoral dos padres; b) o do ministério da
palavra, da catequese; c) o do temporal, relativa ã
conservação e administração dos bens temporais da
Igreja.
2.6- CONGREGAÇÃO PARA OS INSTITUTOS DE VIDA CONSAGRADA E
AS SOCIEDADES DE VIDA APOSTÓLICA, fundada em 1601
por Sisto V. Tem total jurisdição sobre todos os
religiosos e religiosas de rito latino.
2.7- CONGREGAÇÃO PARA A EVANGELIZAÇÃO DOS POVOS OU "DE
PROPAGANDA FIDE", fundada por Pio V e Gregário XIII
para as missões das índias Orientais e Ocidentais,
para os ftalos-gregos, e para os negdcios
eclesiásticos em territórios protestantes na Europa.

2.0- CONGREGAÇÃO PARA AG CAUSAS DOS SANTOS: ocupa-se da


introdução, processo canônico, exame dos escritos,
julgamento da heroiridade das virtudes, milagres e
todas as complexas operações de canonização que
levam ao julgamento final dos cardeais. Presidida
pessoalmente pelo Papa, quando da congregação geral.

2.9- CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, erigida em


1588 por Sisto V. Após várias reformas apresenta a
seguinte subdivisão: a> para a vida dos seminários;
b) para as universidades, faculdades e ateneus; c>
para as escolas não-universitárias, paroquiais e
diocesanas, de qualquer gênero ou grau.

- TRIBUNAIS - tres, de antiqufssima existências

3.1- PENITENCIARIA APOST0LICA, fundada no século XIII.


Constantemente reformada, ficou restrita,
definitivamente, com Pio X, aos casos de
consciência, julgando à forointerno mesmo não
sacramental, isto é: fora do sacramento da
pen it ênc ia .

3.2- SUPREMO TRIBUNAL DA SIGNATURA APOST0LICA: remonta ã


época do anterior e visava a instituição de
'relatórios chamados "referendários", que preparavam
a rubrica das séplicas e das comissões de causas de
justiça e de graça.

91
3.3- ROTA ROMANA, constituída a partir d„ ntlrt,f
assistentes do Papa. £ um tribunal de apelação de
causaa já Julgadas pelos tribunais eclesiástico*-
part icularmente aquelas referentes l\s anulaçBes dé
casamento. Funciona nela um StudiQ voltado ú
formação de advogados, Jufzes, Promotores de
justiça e defensores.
A medida da necessidade, outros órgãos foram sendo criados:
4 - CftMARA APOST0LICA
ADMINISTRAÇÃO DO PATRIMÔNIO OA SÊ APOSTÓLICA
PREFEITURA DOS ASSUNTOS ECONOMICOS DA SANTA SE
5 - CONSELHOS, criados na segunda metade deste sóculo:

5.01- CONSELHO PONTIFÍCIO PARA A PROMOÇÃO DA UNIDADE DOS


CRISTÃOS .
5.02- CONSELHO PONTIFÍCIO PARA 0 DIALOGO COM OS NÃO-
CRENTES
5.03- CONSELHO PONTIFICAL PARA OS LEIGOS
5.04- CONSELHO PONTIFICAL DA JUSTIÇA E DA PAZ
5.05- CONSELHO PONTIFICAL COR UNUM
5.06- CONSELHO PONTIFICAL PARA A FAMÍLIA
5.07- CONSELHO PONTIFICAL PARA A INTEGRAÇÃO DOS TEXTOS
LEGISLATIVOS
5.08- CONSELHO PONTIFICAL DAS COMUNICARDES SOCIAIS
5.09- CONSELHO PONTIFICAL DA PASTORAL DOS AGENTES
SANITÁRIOS

5.Í0- CONSELHO PONTITICAL DA PASTORAL DOS MIGRANTES E


ITINERANTES
5.11- CONSELHO PONTIFICAL PARA O DIALOGO INTER-RELIGIOSO
5.12- CONSELHO PONTITICAL DA CULTURA
6 - COMISSÜES E COMITÊS , que tambóm respondem a interesses
contemporâneos:
6.01- COMISSÃO PONTIFÍCIA PARA A AMÉRICA LATINA

6.02- CONSELHO INTERNACIONAL PARA A CATEQUESE

92
<5.03-• CONSELHO PONTIFÍCIO PARA A CONSER VACÍ\0 DO
PATRIMÔNIO ARTÍSTICO E HISTÓRICO DA IGREJA
6.04-- COMISSftO PONTIFÍCIA PARA A REVISÃO DO CODIGO DO
DIREITO CANÔNICO ORIENTAL
6.05-• SALA DE IMPRENSA DA SANTA SE
6.06-- DEPARTAMENTO CENTRAL DE ESTATÍSTICA DA IGREJA
6.07-■ PONTIFÍCIA COMISSSO tllDLICA
6.08-• COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL
6.09-■ COMITÊ PONTIFÍCIO PARA REVISÃO E CORRECAO DA
VULGATA

6 .10-- COMITÊ PONTIFÍCIO PARA OS CONGRESSOS EUCARÍSTICOS


INTERNACIONAIS

6 .11-■ COMITÊ PONTIFÍCIO DA ARQUEOLOGIA SACRA


6 .12-■ COMITÊ PONTIFÍCIO DE CIÊNCIAS HISTÓRICAS
6.13-• PONTIFÍCIA COMISSÃO- CENTRAL PARA A ARTE SACRA NA
ITALIA
6.Í4-• COMISSÃO PONTIFÍCIA ECCLESIA DEI
6.15- ARQUIVO DO CONCILIO VATICANO II
6.16- COMISSÃO CARDINAL!ClA PARA OS SANTUÁRIOS
PONTIFÍCIOS DE POMPÊIA, LORETO E ElARI
6.17- COMISSÃO DISCIPLINAR CA CURIA ROMANA

OUTRAS INSTITUIÇÕES:
7.01- ARQUIVO SECRETO DO VATICANO
7.02- BIBLIOTECA APOSTÓLICA VATICANA
7.03- TIPOGRAFIA POLIGLOTA VATICANA
7.04- LIVRARIA EDITORA VATICANA
• 7.05- L 'OSSERVATORE ROMANO
7.06- RADIO VATICANA
7.07- CENTRO TELEVISIVO VATICANO

93
7.03- FrtDRICA DE S'AO PEDRO
7>09- ESMOLARIA APOSTÓLICA
7.Í0- PONTIFÍCIO colégio pio brasileiro ,
II - 0 CONFRONTO

II.1 ~ As primeiras medidas

Consumado o ato da posse do novo bispo, as primeiras

reações não se fizeram esperar. Os sinais da diferença, mais

reconhec fve is para uns e, da mesma forma, mais ou menos

ameaçadores para outros, constituíam a fronteira que separava os

dois grupos, cujos membros, sob tensão, pressentiam a iminência

do confronto. Cuidavam-se todos para não ferir suscct ib i1 idade&s

pelo lado de D.Navarro porque, vivendo a primeira fase do seu

programa <ver-jul gar-ag ir ), mostra-se desarmado e protegido pelo

epfteto de "cone i1 iador"; pelo lado de D.hayer porque, alám do

formalismo que caracter isava a conduta de seus simpatizantes,

estavam ainda bem frescas na memória as juras pdblicas de

obediência que fizeram parte do ato de posse.

E£ verdade que apenas um pequeno núcleo, constituído pelo

clero e pelos leigos mais envolvidos, estava capacitada a

prever desdobramentos desagradáveis frente às possíveis

modificações. A massa dos fióis só gradativamente vai tomando

consciência de como as diferenças de postura poderíam ser

problemáticas. Por isso, a maioria dos católicos foi definindo

sua posição no próprio processo, fazendo de cada ato expressivo

a causa e o efeito de sua opção. Tais fatos expressivos vão ser,

por sua vez, de caráter cada vez mais grave, partindo de

questões aparentemente supérfluas, mas aprof undando-se

95
prog^css ivament e atá chegar a filigranas teológicas cuja
complexidade e sutileza inibem soluções simples.

0 primeiro ponto da disedrdia recaiu sobre um elemento

aparentemente frágil e, literalmente, de fácil substItuIçSo* a


indumentária dos fiáis no templo. Como ainda hoje pode ser
visto na porta da Igreja do Carmo - reduto tradicionalista - ,
os templos ostentavam cartazes regulamentando os trajes

adequados 3

ATENC&0

Por respeito b casa de Deus e acatamento bs normas da

Santa Igreja, pedimos que as senhoras e mocas não entrem


com vestes masculinas, vestidos transparentes, sem
mangas ou decotadas.

DEUS ABENÇOA QUEM RESPEITA 0 LUGAR SANTO

Embora os católicos da diocese estivessem familiarizados

com o "estilo" de D.Mayer, nem todos, inclusive parte do clero,


tomavam ao pá da letra a admoestação bíblica segundo a qual "a

mulher vest ida de homem á abominável aos olhos do Senhor" - ou

por ignorá-la ou porque partilhavam- de concepções mais

atualizadas sobre questões do âmbito religioso. Mais foi

justamente este o tema que deu início b violência.


N° Prim eiro domingo ap<5s a posse 22 de novembro

D.Navarro rezava» em latim, a missa na BasTllc», &s 10 horas da


manha, quando um forte tumulto tem lugar na porta do templo*

Al I, um 9rupo de aproximadamente 15 homens, entre os quais


apenas 3 Jovens, impedia a entrada de mulheres que vestiam

calças compridas, bradando contra o que chamavam de profanação


do templo*

0 Pe.Ademir Regazzi, salesiano, que acompanhara o bispo

na missa anteriormente televisionada (em português), foi chamado

à porta e tentou conter os manifestantes* D.Navarro,


pôster iorroente, afirmou que a concentração que devotava «*
celebração o impediu de perceber o que sucedia. Masno final da

missa foi instada par seus paresa não ir ã porta da igreja

cumprimentar pessoalmente os presentes, como era seu desejo,

permanecendo no batistério em situação constrangedora.

A repercussão na cidade foi grande, e ninguém assumiu a

responsabilidade pelo agravo, embora alguns Jornais tenham

comentado que os participantes eram figuras locais conhecidas e

identificadas como membros da TFP (Sociedade Brasileira de

Defesa da Tradição, Famflia e Propriedade), organização

protegida por D.Mayer* Tais membros, muitos dos quais também

pertencentes à Congregação Mariana, vinham se reunindo

diariamente na residência do Bispo Enxérito, onde eram realizadas

cerimônias litüfrgicas nos moldes tridentinos.

97
Naquele mesmo domingo» o %ale«lanu que presenciara o

episódio não poupou comentários no sermão proferido na missa das

18 horas» por ele rezada na Igreja dc N.Sra Mãe dos Homens.

Atribuindo X TFP a atitude radical e incoerente» associava-a Xs

perseguições por ele sofridas» durante o bispado de D.hayer, que

ter ia chegado a pedir sua transferènc ia me nome ua adesão ãs

recomendações pds-conci1 iares• Qualificada o atual episódio como

expressão da extrema insegurança dos "fanáticos que não querem

perder o espaço no qual se satisfaziam de suas necessidades» por

falta de se satisfazerem em outros espaços sociais. Não

compreendem que os tempos mudaram e que hoje a palavra de Deus

precisa ser estendida a todos os lugares» prInci p * 1emtne aos

pobres". Disse ainda o padre que» tentando desfazer o tumulto

foi interpelado com a seguinte admoestaçãos "0 sr • não tem

autoridade alguma aqui na Igreja. Não reconhecemos padres que

não usam batina". (Folha da Manhã» 24/11/1981s2).

Por sua vez» D.Navarro declarou que a freqüêncía ã

Igreja ex ig iia "trajes cond izentes", mas convocou uma reun ião do

Conselho de Cônsult ore s da Diocese, com o fito de esczlarecer sua

posição. Em ent rev ist a aos jornais ele afi r ma que "A I gr e j a não

é uma democracia? é uma hierarquia/ e o poder do Conselho

Diocesano é consultivo? de acordo com o Código de Direito

Canônico, é o bispo quem deiibera. Com relação aos trajes, o

importante é que o Bispo e os padres decidam sobre as coisas da

Igreja, e não os leigos ('acrescentou ele numa referência tácita

aos incidentes do dltimo domingo, quando Congregados Marianos e

98
membros da TFP causaram tumulto à porta da Catedral trntando
impedir mocas g senhoras de ingressarem naquele templo vest idas

de calca comprida')" (Folha da Manha, 27/11/1981*5)

Do incidente resultou uma Carta Circular, datada de 26

de novembro de 1981, onde 3 pontos eram enfatizados* 1 — que na

Casa de Deus tofos devem trajar convenientemente; 2 - que ^ o

pároco que define


a veste adequada; 3 - que os fióis devem
(1)
acatar estas determinações.

Tumultos mais graves, no entanto, estariam para


acontecer. Entre os domingos 6 de dezembro e 17 de Janeiro de

1982 mais seis deles eclodiriam rias diferentes paróquias que o


bispo visitava e celebrava missa..E pior* nestes, a fntima
relação clero/leigos era posta em evidência.

0 primeiro deles ocorreu na Paróquia de N.Sra de Fótima,


na Vi nhosa, mun icTpio .de It aperuna. Ali, o póroco Geraldo
Gualandi recusou—se a concelebrar com D.Navarro, segundo quem o
pároco estaria "sublevando algumas ovelhas contra o Sumo Pastor
da Igreja (...) e muitos adolescentes e criancas subiram nos
bancos da Igreja gritando* 'Não queremos a Missa N o v a ! V « r i a s
testemunhas -ainda apontaram o pároco como mentor do grande
tumulto na frente do templo, que envolveu cerca de 600 pessoas —
muitas das quais sai ram feridas - onde os opositores do novo
bispo portavam faixas com dizeres contrários ao Novus Ordo
Missae, inclusive qualificando—o de heretizante.

99
Em circular ao clero datada de 8 de dt. wbro, D. N a v a r r o

comunicou a exoneração do Pe-Geraldo daquela Paróquia,

t r a n s f e r in d o - o para a Igreja de N.Sr a d o Rosário, em Campos,

onde era pároco outro padre que irá se posicionar como

tradicionalistas O Pe. Fernando Rifan. A g u a r d a v a — se uma consulta

deste grupo, encaminhada ã Santa Só por sugestão do bispo, para

supe r a r o. impasse criado. Como tornou ptlblico cm sua coluna

semanal "A Voz do Pastor", D.Navarro instara o padre a

explicar— se tres dias após o e p i s ó d i o ,t e n d o o mesmo se eximido

da r e s p o n s a b i 1 idade que lhe v i n d a sendo atribuída. No entando,

admitia que "a Missa Nova, eliminando expressões sobre dogmas

eucarfsticos, leva o -Piei à perda da -Fó (...) neste sentido ela

(a missa instituída pelo Conci"lioOaticano II) ó heret i z a nte"

(Folha d a Manhã, 10/Í2/Í98Í).

O documento enviado ao Vat i c a n o é d a t a d o de il de

dezem b r o , mas só virá á póblico em Í2 d e janeiro, provavelmente

•Frente ao rumo que tomavam as relações bispo/grupo de padres

‘ióis a D . M a y e r . N e l e , 23 padres diocesanos s o l idar i z a v a m - s e com

pároco repreendido e transferido, em termos dos seguintes

ítoss i — A impossibilidade de aceitar a Novus Orclo M i s s a e ? 2

fal postura não Feria a " o b o e d ie n t ia maior", desde que

nida pelo dogma e pelo direito. Ou sejas viam-se na

açao de contestar qualquer pronunciamento, mesmo vindo do

ór io Supremo, quando este não tivesse as notas de

'il i d a d e ou discrepasse dos ensinamentos tradicionais do

"io; 3 — Esta atitude corresponde a um problema de

1 C 0
consciência, comunicado desde a chegada do novo bispo, o qual,

portanto, não pode ser ententido como desrespeito ou


(2)
desobed iênc ia .

0 per Todo entre a redação da carta e sua publicidade foi

repleto de acontecimentos semelhantes: Em Campos, na Igreja do

Rosário, em Cardoso Moreira, então distrito de Campos e no

município de Sto Antonio de Pádua. Nas manifestações ocorridas

frisava-se a impossibilidade de acatar a Nova Missa e a

profanação dos templos com a recente regulamentação das vestes

introduzida pelo atual bispo. D.Navarro discute a questão com o

Niíncio Apostólico e com D.Eugênio Sales, mas não há informações

sobre medidas punitivas.

0 segundo grave episódio, com complicados desdobramentos

se deu no m u n i c ípio de Bom Jesus do Itabapoana. Embora o bispo

tenha encontrado a cidade engalanada, com faixas de boas-vindas,

a. visita episcopal acabou em confusão generalizada com alguns

feridos. Logo à chegada na matriz D.Navarro foi interpelado por

um leigo que, citando Sto Agostinho, informou que os católicos

não deveríam assistir a missa que seria celebrada. 0 Vigário

Emérito, Mons. Francisco Apoliano, que por seu reconhecido ri gor

recebera da população o apelido de Chico Sarrafo, permaneceu do

lado de fora do templo, ■ oride, acompanhado de congregados

marianos e liguistas, tantava impedir a entrada de pessoas na

igreja.

iOi
0 bispo, na ocasião, recebeu muitas demincia* de

paroquianos sobre o que consideravam arb itrar iedades do pároco,

o qual foi, no entando, convidado pelo bispo a concelebrar a

cerimônia. Aquele obedeceu, avisando porém que não deixaria que

o templo fosse profanado por mulheres em trajes masculinos#

Prosseguindo a missa, e não lhe tendo sido providenciado um

micronone para a Homília, D. Navarrou alertou que ao final

dirigir-se-ia ã população. 0 que fez aproveitando para lembrar

que a autoridade do padre na paróquia é conferida t>elo bispo.

Nesta primeira quinzena de janeiro D.Navarro recebera o

apoio da CNBB, frente aos agravos dos quais era alvo.

Respondendo a D.Luciano Mendes de Almeida, o bispo indaga "que

doutrina errônea inspira o comportamento deste pequeno grupo?" e

questiona se a problemática doutrinária não visa apenas encobrir

a gravidade de negócios escusos de terras que resultaram em


<5)
dem íncia p iíb lica .

A carta referindo-se ao episódio das vendas de terras

(que será comentado adiante), expressa bem a perplexidade do

bispo quanto ã rejeição que ele vinha sofrento por parte de uma

parcela dos católicos. Ao mesmo tempo, revela um certo

desconhecimento da forte penetração que o lonbo bispado de

D.Nayer alcançou no local e da importância que significava, pelo

menos para boa parte dos fiéis, a não alteração de um quadro com

o qual estavam familiarizados.

102
0 ca*. dc Bom Jesus é exemplar: Mons. Apol iano, ao lado

do epfteto indelicado que carregava» possuía também a Imagem de

um santo homem que amparava os desvalidos, sendo ainda

responsável por uma ordem religiosa, um colégio c uai asilo de

velhos. Após o episódio de 10 de janeiro, e da publicação da

carta de li de dezembro, começa a crescer a suspeita que o

vigário, incardinado no Ceará, não terá seu uso de ordens

renovado. Organiza-se uma comitiva composta pelos notáveis de

Bom Jesus que, encabeçada pelo Prefeito, vai a Campos interceder

em favor do velho padre, "cuja figura extraordinár ia,

trabalhando incansavelmente há 25 anos na localidade, á um fator

de coesão dos 40.000 habitantes de Bom Jesus. Se o Mons.

Francisco Apoliano for afastado, isso será um transtorno para a

comunidade bonjesuense" (Folha da Manhã, 20/01/198253).

Mas esta era apenas uma "manisfestação oficial", pois

festa grandiosa realizar-se-á mesmo é em 27 de janeiro, data

comemorativa do Jubileu de Prata do Vigário naquela comunidade.

A imprensa apropriou-se do evento, que mereceu página inteira e

duas fotos, como sendo um desafio ao novo bispo. No entanto esta

versão foi negada pelo grupo, quando afirmou que a presença de

todos os padres tradicionalistas, acompanhados por caravanas de

seguidores justificava-se pelo caráter congratulatdrio da data.

De toda forma, naquele dia chegavam, desde as 10 horas da manhã,

simpatizantes de toda a diocese, reunindo-se no Abrigo Josá de

Lima, que ampara 50 idosos, e é conduzido pela Associação do

Imaculado Coração de Maria e São Miguel Arcanjo. Dali partiram

103
a missa c omeroorat iva, rezada pe 1 o Mons. A p o 1 ia n o • A
para CT
hoa | ] jar p ro fe r id a pelo padre mais J o v e m do gr u po * Ps , «Jostf
Onofre de Abreu, terminou com um patático "Pai , seja feita a
Vossa Vontade/"

No final de fevereiro» D.Navarro supõe encerrar o


episódio com a n o m e a ç ã o do Pe. Jose Ronaldo Menezes para V i g á r i o
Cooperadorr cm subst itu icão ao velho Monsenhor. Mas o problema

estender— s e — cfr c o m o sersí mostrado adiante» atá Junho.

Outras duas v i s i t a s episcopais tumu l t u a d a s foram as

I realizadas em Cambuci e São Fidális. Signatários ambos os


I
párocos da ca rt a de 11 de dezembro» subentend ia — se que os

paroqu/anos eram orientados no sentido de "resistir ãs

inovações"» como fr is a r a D. Ma y e r em seu d i s c u r s o de t r a n s m i s s ã o

do cargo. Além d i s s o o escândalo das terr a s da M i t r a Diocesana»

que será t r a t a d o a seguir, atingia pr inc ip a l m e n t e aquela região

da diocese» o sudoeste.

O caso de C a m b u c i foi de fácil solução» na medida em que

* influência do pároco não era muito forte» talvez pela

roximidade com Itaocara (pertencente a Diocese de Nova

'iburgo), para onde aflu i a m muitos fiéis em b usca de cumprir

us % c o m p r o m i s s o s religiosos fora da chamada intransigência

ma c t e r í s t i c a de sua própria diocese. Mas apesar da boa

lhida popular também houve hostilidade. Como relatou a

"ensa, D.Navarro chegou a ser h o m e n a g e a d o pelo prefeito e

104
pelo pároco, de quem recebeu uma placa de prata» comemorativa dm

ocas Ia o • No entanto» as palavras do Pe. Delgado, 00\n Ic ial ment e

dóceis e amenas foram se tornando graves, awarggas c

i rrever ent es s 'V.EXa. sabe que sou um dos 23 signatários da

carta de recusa ao Novus Ordo de Paulo VI'. Em seguida, passou a

acusar a imprensa de sansac ional ist a e disse que não admitia ser

rotuulado de rebeldo. 'Não somos rebeldes porque queremos

continuar naquilo que a Igreja, na sua tradição, sempre

observou, e que, no tempo de Sao Pio V, foi purificado. Temos o

direito de discordar do Papa neste particular da missa. Não

somos rebeldes. Não discordamos da obediência ao Sumo Pontffice

naquilo que ele nos pede. Acatamos o que precisamos acatar. Não

podemos admitir que a missa, como a nova, seja apenas uma Ceia*

Ela é ambígua. Nela há discrepância da fá'. Depois disso

retirou-se da Igreja dizendo que ia atender algumas confissões.

Na sacristia, ouviu somente quatro fiáis durante cerca de meia

hora. Depois foi para uma capela ao lado, rezar, solitariamente,

negando-se a participar do ofício celebrado para centenas de

fiéis" (Folha da Manha, 19 de janeiro, 19U2).

Em S. Fidélis, as associações leigas incumbiram-se de

dissuadir a presença dos paroquianos, na missa episcopal, num

trabalho real izado por toda a semana que a antecedeu. E embora o

Pe. Jonas dos Santos e o Vigário Emár ito Mons. Ovídio Simon

(fortemente im p 1 i caoo no caso das terras) não t enham

concelebrado com o bisspo, não h o u v e , pelo menos. tumuulto

Í05
p op u l a r . Oq adeptos de D.Mayer acompanharam seus d o is padres

deixando para momentos futur os as grandes manifestações.

XI. 2 - Reorganizando a Diocese

Logo na primeira semana de janeiro de 1982, o advogado

Antonio haria de Abreu Sardenberg abrira um processo tentando

solucionar a questão dos seus clientes Guilherme Tito de Azevedo

* seu genror o vereador Fidelis Veiga do Amaral. Tendo estes,

ew agosto de 1901, adquirido tres lotes de 30x3Qm no Loteamento

Parque Jardim São Vicente de Paula, em Bao Fidélis, constataram,

em outubro, que no local erguia-se a obra de uma capela.

Procurando o vendedor, Mons. Ovfdio S im o n , obtiveram como

resposta a proposta de receber outros tres lotes no lugar dos

já comprados. Insatisfeitos, já que os novos terrenos eram de

menor valor, o que lhes dava um prejuízo de 25% na transação,

decidiram instituir o advogado acima citado para resolver

juridicamente o problema.

0 causídico entrou com duas ações: de recisão de

contrato, cumulada com a ação de inden izaçãos por perdas e

danos. Mons. Ovfdio também constituiu advogado, Manoel da Silva

Ribeiro, e ter ia comentado, sobre os postulantes, que "a J u s t i ç a

não socorre quem dormi"] 0 advogado das vftimas, procurando a

Mitra para um acordo, trouxe à tona um co n j u n t o de

irregular idadess a documentação do processo de loteamento da s

terras ora incompleto? não foram localizados os documentos


capazes de esclarecer a negociação, ou seja: não fora prestado

contas & Mitra, nem fornecidas as informações necessárias por

quem detinha a- posse em razão de ofício e em nome da Mitra.

D.Navarro procede então ao levantameento dos bens da

Diocese, mandando vasculhar todos os cartórios para tomar

conhecimento dos bens imóveis da Igreja. Constitui como

procuradores os Senhores Lujz Augusto Nunes Teixeira, Antonio

Carlos Martins Coutinho e Ronaldo Luiz Damas Moreira de Sá, que,


por sua vez, constituem o advogado Roberto Uilson Fernandes para

defender os interesses jurídicos do bispado.

Em 6 de Janeiro é emitido um ofício circular a todos os

padres da Diocese, onde o bispo explica a necessidade de um

levantamento mais perfeito "de dados e informações sobre

assuntos e bens da Mitra Diocesana de Campos". Comunica ainda

que resolveu instituir mandatários e procuradores diocesanos

bastantes, munidos de instrumento hábil e com poderes certos ' e


prazo fixado, para o fim de visitar cada paróquia, recebendo

todas as informações e dados necessários, bem como vistas a

documentos substanciais. "Estes procuradores ainda podem

solicitar em nome da Mitra Diocesana, audiências reservadas,

previamente aprazadas, em Campos, com cada sacerdote ou pároco

para o mesmo fim" <Folha ma Manhã, 10/01/1992:7).

107
0 mie In ic ialmente compunha os oito processos dc São

Fidólis (pois altfra dos j ,( citados havia ainda aqueles levantados

pelos herdeiros de Celina Cramer Machado da Silva, co» base em

que os terrenos loteados por Mons. Ovfdio ter iam sido doados &

Mitra de maneira fraudulenta, e mais um processo na Justiça

Federal a respeito da venda de um terreno pertencente ao

Departamento de Estradas de Rodagem (DER), no centro de São

Fidélis, onde se achava je( edificado um imdvel do comprador de

Mons. OvTdio), desdobrava-se agora num emaranhado de casos

confusos:

- negócios pouco claros nos 4q e 5q distritos de São Fidélis*

Valão dos Milagres e Colônia, onde as vendas não foram

comunicadas ã Mitra.

- compra de um terreno para o próprio Mons. Ovfdio, registrada

no íq offcio da Comarca de São Fidélis.

- vendas de lotes no Farol de São Tomé, em Campos.-

- vendas de lotes da Igreja em lirurai' (Campos), Lage do Mur ia^ e

Varre-Sa i.

- Situação irregular de um prédio situado â rua Joaquim Távora

ng 37 (Campos), que fora doado â Igreja por Euzi Jorginete,

antes de entrar para o convento, cbnstanto da doação uma

déusula <que nunca fora cumprida) segundo a qual a Igreja

remetería ã doadora, regularmente, pequena importância para o

108
»eu sustento. Na ocasião, o Pródio esta alugado a terce. s.

- bens da Igreja do Terço e da Igreja do Rosário (Saco), n


Campos.

- mais de 200 lotes de terra em Bom Jesus do Itabapoan», sob a


gestão de Mons» Apolianor numa transação estimada em torno de 60
milhões de cruzeiros.

Embora nem todos estes problemas fossem recentes, o


levantamento constatou que 70X das transações ocoreram em 1981,
pr inc icpamente no óltimo trimestree do episcopado de D.Mager.

Sobre o loteamento de São Fidólis pesavam dois

agravantes: efetivado o registro sem o respeito ao Decretú 58 do

Registro de Imóveis, que obriga a publicação de editais <em


função da alegação de Mons. Ovfdio de que as vendas seriam todas

feitas ã vista) quando no entanto, 85 lotess foram negociados ã

prazo; o segundo, da Justiça Canônica, relativo ãs recomendações

sobre negóc ios em sede vacante. Ora, de fato, a D iocese de

Campos só se inclu i neste caso a par t ir de 15 de set embra de

1981 (data em que João Paulo II nomeou D .Navarro '' e,

consequentemente, D. Mayer passou a Adm inistradar Di ocesano). No

entanto, o volume dos negócios no período imediatamente anterior

abre e s p a ç o para suspeição, ainda mais quando ó a c o m p a n h a d o de

omissão de informação. E sta, por sua vez, tambóro contitui

objeto de c u i d a d o s especiais (Cf. Cân. 1257111 — T o d o s os bens

temporais q u e pertencem ã I g r e j a u n i v e r s a l , ã Só A p o s t ó l i c a o u a

109
outras pessoas Jurídicas na Igreja, saobens eclesirfs/ os e

rc9cw~se pelos cânones s e g u i n t e s e pelos e s t a t u t o s próprios" —*

Cddlgo do Direito Canônico, L i v r o V - dos bens 'emporais da

Igreja 8216-226) -

O caso das terras, q uee gradat ivaroeente -foi passando

para segundo plano, suscitou, no m o m e n t o de sua emergência,

uma e rta c e l e u m a , resultando em c a r t a s in d i g n a d a s que acusavam

a prensa de denegrir a imagem do c l e r o " t r a d i c i o n a l ista". O

advogado da Mitra f oi dito como ''fomentador de .tici sírio

difamatório", defendendo-se da a c u s a ç a o com a a l e g a g a o de qu e

era p o r t a d o r apenas de "animus na r r a n d i " , e demonstrando também

como a mesma matéria dos "tradicionalistas" era publicada em

diferentes jornais sob r e s p o n s a b i l i d a d e de m d l t i p l o s autores.

0 Pe. Fernando R if a n , a p o n t a d o c omo d i s c í p u l o dileto de

D.hayer t a m b é m se pronuncias afirma que a v e n d a dos t e r r e n o s do

litoral (Farol de São Tom é ) , de t r a n s a ç ã o m u i t o antiga, te r ia

sido função da queda de emolumentos decorrente* da pregação

tradicionalista e a c o n s e q u e n t e d i f i c u l d a d e de prosseguir com

obras pias j£Í i n i c i a d a s . Por sua vez, as t e r r a s r e l a c i o n a d a s a

Mons. O v f d i o eram doação d i r e t a do bispo, em r e c o n h e c i m e n t o aos

18 anos d e trabalho na comunidade e tamb é m p ara r e s s a r c i r gastos

particulares daquele padre co m o b r a s da Matriz, do Ginásio

Fidelense <de propriedade da Mit r a ) e com o A s i l o Sã o Vicente,

para v e l h o s .

110
Tais fatos, d e p o i s d e s s a fase de tdent if jcaç 5o t *1

das partes itigantes, foram perdendo lugar de dest »|.je,

superados p ur. novas e sensacionais questões. E possível supor9

no cm ttor que isto o c o r r e e u porque al i onde terminariam as

complc * s e n a o - c o m p r o v á v e is n egociações pol ft ico-f Inane e ir as d o

clero tradicionalista, e n c o n t r a v a m - s e as também complexas e

obscuras negociações Jur íd ico-pol ft icas, num emaranhado

burocrát ico iit í 1 e n e c e s s á r io à m a n u tenção do poder em

determ in a d a s r e d e s *
#

O fechamento do Se m i n á r i o Maior Maria Imaculada ocorreu

no quadro da p r e o c u p a ç ã o com o ensino religoso, que vai impor a

D.Navarro duas m e d i d a s drásticas, no sentido de enfrentar o

início do a n o letivo, pelo menos impedindo a r e p r o d u ç ã o oficial

nos moldes tradicionais. A primeira delas dizia respeito aos

novos p a r â m e t r o s p a r a o e n sino religioso, propr i a m e n t e dito, nas

escolas. A segunda, que fechava o S e minário Maior Maria

Imaculada, c r i a d o por D.Mager, impedia a formação do clero.

No d i a 5 de março, 72 dos 84 professores relacionados

para a área do e n s i n o r e l i g i o s o são instados a assi n a r um termo

de compr o m i s s o , submetendo-se inteiramento cis orientações do

Departamento D i o c e s a n o do Ensino Religioso. Seu diretor, o Pe.

Roberto Guimarães, a f i r m a na ocasião que o documento objetiva

"uma atidude irrestrita 'de total acatamento" a pastoral de

D.Navarro, que s e g u e as d i r e t r i z e s da CNBB e do Papa João Paulo

II. A Coordenadora do E n s i n o de Religião, Cecília Nogueira


Martins, sobrinha d Pe. Olivácio Martins (nomeado Vigário Oer a 1

do b Iup< •, em substituição ao hons. Conrado Fischcr f o 1q padre

deslocado de seu cargo) , estimou que pelo menos 200 p r o f essores

estarão dando aulas da matéria em todo o Norte Fluminense. C ies

| já pertenciam aos quadros do magistério estadual e foram

I declarados disponíveis por seus respectivos superiores


*
funcionais. Por sua vez, a Prefeitura Municipal de Campos

concedeu Í0 vagas específicas - já preenchidas - para

professores de religião.

Dois dias antes, em 3 de março, fora expedido o se g u i n t e

comunicados

Transferência dos Seminaristas Maiores e Reestruturação

do Seminário Menor.

Conforme previsto no Código do Direito Canônico, Cân.

1354113, Dom Carlos Alberto Etchandy Gimeno Navarro,

Bispo de Campos, comunicou à Direção do Seminário sua

determinação de que os atuais 7 (sete) Seminaristas do

curso de Filosofia e Teologia (Seminário Maior) tenham

sempre uma formação mais aperfeiçoada.

Assim sendo, estes alunos foram convidados a se

• transferirem para o Seminário Arquidiocesano de São

José, no Rio de Janeiro.

112
De outro lado, ficam suspensas , tempor ar it ut e. pmr m
uma r e s t r u t u r a ç ã o as at iv idades do seminár1u rt?nor q ut
tem, atualmente, 5 (ciinco) seminaristas#

Desses dois ato s , c o n s t a na Ciiria Diocesana Decreto

lavrado pelo Exmo.Revmo.Sr.Bispo Diocesano

P e. Joaquim Ferreira Sobrinho


C h a n c e l e r do Bi s p a d o

A expedição deste documento, de inegável i mpacto nos

meios tradicionalistas, coincide com a data marcada para o

encontro entre o bispo e o Pe. Geraldo Gualandi, cujo

afastamento s u s c i t a r a o íq d o c u m e n t o do grupo fiel a D.hayer# A

entrevista, que se r e a l i z o u ã portas fechadas, n ao chegou a

qualquer a cordo, dela se sa b e n d o apenas que o padre, ao se

retirar, recusando-se a falar à imprensa, ter ia sido lacônico,

dizendo apenas: "Tudo depende dele, que é a autoridade

diocesana" •

A frente da C a s a do Bispo, um grupo de paroquianos da

Vinhosa se posta r a , d e s d e as 7 horas da manha, c om a pretensão

de avistar-se com o bis p o e propor a vol t a do pad r e para

Itaperuna, já que d e s d e d e z e m b r o e n c o n t r a v a - s e em Campos. Os

fiéis, que p e r m e n e c e r a m al f atá as 9,30h a j o e l hados, rezando, ao

deduzir o d e s f e c h o d e s f a v o r á v e l , iniciaram um p r o t e s t o ruidoso,

onde denunciavam o absurdo que era não serem recebidos pelo

bispo, com quem s<4 qu e r i a m dialogar. Se g u n d o eles, n ão seria

113
proposto o retorno do padre a sua paróquia de origem, • 0Of«

entregue ao Pe. Lamar C a 1s o r a 1 i, que acuaulava fun«oí%, rüi que

ele fosse encaminhado para o bairro de Sao M a t e u s , a s s u m i n d o a

Igreja d e N.Sra Aparecida, ainda em construção. Comentavam ainda

que os templos se e s v a s ia v am com a ida dos Ministros da

Eucaristia, recentemente ordenados por D.Navarro e que o s mais

prejudicados eram as crianças. E completavam* "Jaustamente num

momento importante para a sua f o r m a ç ã o religiosa. Cerca de 100

meninos e meninas da Cruzada EucarTstica estão sem orientação

r e l i g i o s a e, deste jeito, vamos ter de abandonar a religião".

O silêncio d o bispo, quer para os paroquianos do Pe.

Geraldo Gualandi, quer para a imprensa, foi interpretado como

sintoma de duas coisas* por um lado, que o padre continuará

afastado de sua paróquia; por o u t r o lado, que a rebeldia dos

padres tradicionalistas contra as inovações do Con c i l i o Vaticano

II será tolerada na D i o c e s e a t á uma d e c i s ã o explicita da Santa

Sá. Ou seja* não vindo do Vaticano um indu l t o especial

permitindo a ce leb ração de missa no rito tridentino, o Bispo não

as t o l e r a r á .

No dia 5 de m a r ç o , D. Navarro confirma à imprensa que

suspendera as atividades do Seminário, p o r q u e seus professores

não podiam continuar formando padres c ont rário s tvs inovações

sugeridas pelo Concilio Vaticano II. Informou ainda que o s sete

seminaristas do curso de Teologia não haviam aceitado 3

transferência para o S e m i n á r i o S ã o Josá, onde ficariam sob 3


orIcnlatao dc D.Eugôn io Sales. Afirmando que viera para Campo*

com o propósito de unir o "rebanho de Deus" (nas que) "não é


novidade para ninguám a posição de alguns sacerdotes

tradicionalistas contrários ao Novus Ordo Missae e que fazem


restrições ao Concilio Vaticano II. C claro que estas

orientações divergem daquelas do Papa João Paulo II. Não posso

continuar permitindo que se formem padres com uma doutrina


contrária ao Papa. A decisão de transferir os seminaristas
maiores para uma formação cada vez mais aperfeiçoada está

baseada no Código do Direito Canônico" (Folha da Manhã,


05/03/1982:3).

Dois dias depois eclode mais um protesto: a partir de

Bom Jesus do Itabapoana, os tradicionalistas propõem-se a uma

grande panfletagem contra o bispo, que ó iniciada na missa

daquele domingo, dia 7 de março, c\s 9 horas. A expectativa de

que a não renovação do uso-de-ordem de Mons. Apoliano resulte no

real afastamento do pároco inspira um documento, intitulado

"Protesto Verdadeira Catástrofe na Diocese de Campos". Neste,

explica-se que tudo começou com a vinda de D.Navarro, que

transformou completamente o cenário da diocese, degenerando-se a

paz reinante ató então em inquietações e sobressaltos, com o

seguinte saldo atual:

i - 0. afastamento do RevmH Sr.Mons. Henrique Conrado Fischer das

funções de Cura da Catedral e Chanceler do Bispado.

115
2 “ 0 Re vmu • Gttr«lüu a 1a n d í ^ us t a n e n t e d ü k t 1 1 u Tdo dcj

cargo de pároco d» Vinho^d, tu Itaper u n a «

3 - 0 R tviiitJ Pfe. F e r n a n d o ftréas ífan, padre culto p zeloso# é

demitido do cargo de Diretor d o Lnsirto R e l i g i o s o da Diocese*

4 — 0 Car Tss inio Mons. Francisco Apoliano ó afastado» sem nenhuma

explicação das funções de. Vi 9 <ir io etu B uni Jesus do 11 « b a p o a n a »

cargo que o c u p a v a há 25 anos. .

5 — Fechamento do Seminário Diocesano, dificultando o

acolhimento das vocações.

6 — Os prepa r a d o s sacerdotes, professores ü o extinto Scininár i g ,

tiveram suas ativi d a d e s limitadas.

O panfleto indagas "Por que tudo isso? Unicamente porque

estes fervo r o s o s sacerdotes não aderiram ao Progressismo? então

estão fora da Igreja os que querem conservar a Fé e a lioral

pregados pelos Apóstolos, testemunhadas pelos Mártires e vividas

pelos S a n tos? São cismáticos os que querem seguir fiel mente o

que a Santa Igreja mandou e ensinou, em toda a parte e por

tantos s ó c u l o s ? "

Sugere então uma reflexão* "Se esses fervorosos padres

tivessem cedido, renunciando a Fé verdadeira, estariam todos em

seus cargos. (...) Mas, pela f é , perdemos tudo, atá a própria

116
vida ÜC Deu«» no*- cunudtr tamanha sldr ia*. e conelu«*

"Confiante» na promessa de Nosso Senhor Jesus Cristo - Ei» qve

estarei convosco até a consumação dos séculos - permaneceremos

f irmesr fntegras a nossa F é r na certeza de que não nos faltará a


graça de Deus e a proteção da Santíssima Virgem Maria. Queremos

viver e morrer como filhos da SANTA IGREJA CATÓLICA» AAPOSTOLÍCA

ROMANA".

O mes de abril será especialmente importantes é nele que

se situa a Semana Santa, festa máxima da Igreja, que inclui,numa

de suas cerimônias, a missa em que os sacerdotes renovam seus

votos de obediência, pobreza e celibato, e também ocorre o

chamado "lavapés" - réplica do que ter ia ocorrido na dltima cela

entre Jesus e seus Apóstolos, simbolizando a humlltade de Cristo.

Mas o espírito da Páscoa não consegue superar as

divergências no seio da Igreja de Campos. Ao contrário, parece

acirrá-las, na medida em que os dois grupos encontram na Semana

Santa a inspiração para expressar a sua adesão. E o resultado é

que sucedem-se comemorações na duas modalidades! ambas com

missas, procissões, encenações, mas cada uma com seu pdblico e

este, com a certeza de estar vivendo a verdadeira religião.

A Semana Santa, na primeira quinzena do mes, logo após o

fechamento do Seminário Diocesano, da regulamentação oficial do

ensino religioso e contemporânea do infeio das gestões para a

reforma da Catedral (que comentarei a seguir), foi um momento

i 17
importante na cunsolidacSo de identidade» até então de contorno»

um p o u c o v a g o s c, i->or isso mesmo ainda carentes de uma citrgur m

que os d e f i n i st»* om exatidão. Ledo engano, o de supor quem ao

aprisionar a rei de numa palavra, aquela estaria completamente

contida. Mas os esforços envidados para isso s a o respeitáveis.

Se a "igreja oficial" conta com os r e c u r s o s convencionais, de

onde vêm os recursos que sustentam o g r u p o de fanáticos» que

continuam agindo para que a ‘r e l i g i ã o não sucumba nas mãos dos

hecóticQ»?

Diz-se que os tradicionalistas recebem apoio da T F P , q u e

realiza trabalho de base para que n ã o cessem as atividades

deles. Um grupo de proprietários rurais alerta que membros

daquela sociedade visitam o campo e induzem os moradores a

permanecer fiéis a seus párocos, 'esist indo «is inovações que

foram t r a z i d a s pelo atual bispo. A partir de listagem obtida nas

Cooperativas de Produtores e nos Sindicatos, alcanga-se uma

população mais dispersa levando-se a ela uma palavra de

resistência e o pedido de c o n t r i b u i ç õ e s , que varia de 3 a 3 0 mil

cruzeiros mensais, p a r a a m a n u t e n ç ã o da igreja t r a c i c i o n a l e de

suas o b r a s .

Se a identidade de f a n á t i c o s é forjada desta forma, a de

btecátiCLQS é mais trabalhada, e vem à luz a t r a v é s de u m d o c u m e n t o

intitulado "Profissão de F é C a t ó l i c a — Face aos Erros Atuais",

onde o grupo ligado a D.Mayer explicita sua posição. Os 25

signatários do mesmo c o n f e s s a m — se católicos, apostólicos e

118
romanosr apoiando-se numa citação de Paulo VI que d In* "Diante

da nova religião que se instala, é preciso manter a verdadeira

ftí ao abrigo do erro” , razao pela qual rejeitam e anal cmat izam

tudo o que foi rejeitado e anatematizado por ela» Para serem

totalmente fi^is aos ensinamentos e doutrinas da Igreja, nao

acatam a ”Missa Nova” , a teologia "modernist a” , o ecumenismo, »

democratização da Igreja etc»..

(A)
Os 17 pontos assinalados sao, segundo eles,

incompatíveis com todo àquele que ama, louva e adota as

práticas, usos e costumes tradicionais da Igreja, que tanto

concorreram para a santificação dos fláis. Entre essas prática®,

ressaltam! "a confissão auricular, a estima da vida

contemplativa (com preeminência sobre a vida ativa), o uso da

batina e do hábito (pelos sacerdotes e religiosos, que tão bem

mostra sua separação do espfrito do mundo e alerta as

consciências para o espfrito de Cristo), a veneração das imagens

e relíquias dos santos, a comunhão recebida na língua e de

joelhos, as penitências e mortificaepes internas e, externas” .

Além disso, o texto refere-se a elementos materiais

condizentes com este quadros ”os ornamentos e magnificência das

igrejas, a* solenidade e pompa de suas cerimônias (que tanto

impressiona e comove o nosso bom povo e estimula a piedade), o

latim na liturgia (fator de unidade e universalidade da Igreja,

escrínio precioso, condizente com o que expressam as orações

11 tnír g ic a s ) , o conto gregoriano e espec ial ment e a devoção a

119
Nossa S e n h o r a , O Santo Rosário e o ce lib ato sace rd otal".

Os padres argumentam que, diante de todas «as

exposições não são nem rebeldes nem desobed ientes3 Nossa

posição é de fidelidade. Ê uma questão de lealdade à fé de nosso


batismo, de nosso sacerdócio, aos nossos legítimos superiores e

fiéis".

O documento, que em forma de panfleto çirculou pela

diocese, foi publicado pela Folha da Manha, em 25 de abril, na

mesma pagina em que D.Navarro define o que é agora aquela igreja


particular. Para o novo bispo, trata-se de partir para ..uma

Pastoral de Conjunto, enquanto instrumento hábil para somar as

forças existentes na diocese, "resposta específica, consciente e

intencional às exigências evangélicas". Como BacLiciBacaQ e

Uttidade são os princípios básicos que informam a nova realidade.

Comissões Diocesanas estão sendo


com o criadas f.ito de
(5)
implementar aquilo que o éltimo concilio propôs.

Nesta espécie de debate, em que cada grupo explicitava

suas concepções, cada ação reforçava o rótulo que o outro lhe

aplicava, negativizando as medidas adotadas que, evidentemente,

eram coerentes com o pensamento que as fundamentavam. Assim as

iniciativas do bispado para adequar os templos ás reformas

litérgicas previstas no éltimo Concilio não escaparam às

críticas dos tradicionalistas.

120
D.Navarro r e c e b e r a em abril de 1VÜ2 a visita de Hon».

Guilherme Schubert , e s p e c i a l i s t a em Arquitetura Sacra# para

opinar sobre a construção do novo altar# condizente com as

celebrações n os moldes propostos por Paulo VI. Foi sugerido,

além d isso, outras alterações, como a transferfcncia dos

púlpitos, da pia batismal e algumas imagens, o afastamento da

mesa da c o m u n h ã o e r e t i r a d a do docel e da parede de madeira da

cátedra e p i s c o p a l .

Depois de dois dias de estudo da Catedral, juntamente


com dois engenheiros de Campos, o especialista concluiu, sobre a
Catedral, que "seu estilo neoclássico é perfeito e portanto não
há necessidade de reformas". Opinou, no entanto, que algumas

modificações deviam ser feitas com vistas a "condicionar a


estética do interior do templo «\ maneira mais digna e correta de

celebrações litdrgicas, bem como oferecer maior espaço físico


para as funções episcopais - como crisma e ordenação de

sacerdotes, entre outras - dentro dos critérios estabelecidos

pelo Concilio Vaticano II".

Em entrevista coletiva ã imprensa, Mons. Schubert

antecipou-se ãs eventuais críticas, lembrando que as várias

inovações feitas pela Igreja Catélica sempre foram contestadas,

como, por exemplo, as modificações da Semana Santa introduzidas

por Pio XII, a instituição da missa vespertina, a nova

modalidade de jejum, a permissão dada por Pio X para que as

crianças também recebessem a Eucaristia. E continuavas o projeto

121
de wod If Ic r ui dtfwlotur Ia a pi* b*t ium a l , que do U d o cmuvrdo

passará par* u nave direita, próximo h Capela do Oantísslmo. 0

bat istór io atual será transformado em Capela de Oantoa,

abrigando as imagens do Senhor doa Passos, N.Cra dau Dores e G.

Miguel Arcanjo (atualmente na Capela do Bantfssimo) e S. Pio X

(que se encontrava no Presb 11 lír Io) • A Capela do Santfsslmo, onde

se adora a hdstia consagrada, deve ser riestInanda apenas a isso,

o que sIgi ica que não estaremos cassando nenhum santo, apenas

estamos viabilizando disposições mais corretas para a liturgia*

Os pdlpitos que estão nos dois lados da nave central do

templo devem ser transferidos para o primeiro patamar de acesso

a mesa da comunhão. Esta será avançada cerca de um metro,

possibilitando o aumento do espaço interno do presbltário (área

que vai da mesa de comunhão atá o altar-mor).

Um novo altar de mármore para a celebração da missa

deverá ser construído no centro do presbitário. 0 antigo "trono

do bispo" - agora denominado cátedra episcopal - perderá o docel

(teto de cima) e a parede de trás que porta as armas de D.

Henrique Mourão, íq Bispo de Campos.

A tela de N.Sra de Fátima lacrimejando, pintada pelo

artista Renato Peçanha, sera retirada do local onde está, acima

de uma cruz missionária - que será mantida - do lado direito de

quem entra na Catedral*


De icjFfl com Monw. Qchubert, todo o material não
aproveitado na reestruturação estática da Catedral deverá ser
guardado para um futuro Museu de Arte Sacra de Campos. Entre
suas sugestões ainda se inclui a retirada de alguns altares
abaixo de nichos de santos, como o de São José, que cederá
espaço para a pia batismal. Mas, "a decisão final sobre as
alterações será de D.Navarro" (Folha da Manhã, 7 de abril de
1982:4) .

Tamanho intervenção, ainda mais projetada por estranhos,


dificilmente encontraria boa acolhida entre os tradicionalista.
Uma semana depois a Folha da Manhã publica a matéria
"Demolições..." assinada por Célia Crua, a presidente da Pia
União das Filhas de Maria e figura muito conhecida em Campos
pelo seu devotamento à educação religiosa. Apds lamentar os
muitos exemplos de descaso á histdria, a autora comenta o
episddio da Catedral, enfatizando que sem tradição não existe
igreja. Frisa o que é, para ela, o escândalo de colocar
obstáculos «k formaçao de catdl icos e tratar o templocomo se
fosse propriedade privada do bispo, exortando o povo a defender
<ó>
seu patrimônio.

Se bem que a conclamação a um levante não tenha surtido

efeito, outras reclamações surgiram, como a publicada pela Folha


da Manhã de 17 de abril, quando o Sr. José Faez, em carta.
externava o "ma is veemente protesto por essa atitude de
destru içSo dos valore s religiosos e artfs t icos que visa o Bispo

123
de Campos proceder em nossa Catedral.<'•••) Sentimo-nos no dever
de protestar( .. .) por nós também termos uma humilde participação
na contribuição para a contrução da Catedral. 0 quadro pintado
no alto da parede que fica do lado esquero da Capela do
Santíssimo foi doado pela família Faez.(.•.) a Catedral<-.•) é
obra do povo campista (...) Sabemos da destruição de outros

templos igual mente soberbos que foram vítimas do vandalismo que


se assola em diversas regiões do nosso país. Catedrais
magníficas e igrejas históricas que são transformadas em um
salão vazio, onde não há arte, religiosidade e ambiente para uma
perfeita vida de oração e piedade. São verdadeiros salões moda
protestante.(...) Ped irnos, também ao Senhor Bispo que não dè
prosseguimento a essa sua idéia. A Catedral não é deste ou
daquele bispo. Ela é do povo para o serviço de Deus"

Mas, apesar de arrazoados culturais, bairristas e

sentimentais, as obras foram realizadas, e o altar-mor, de

mármore da região, foi sagrado na missa das 10h, no dia da festa

de São Salvador, em 6 de agosto de 1985, quando se comemorava o

jubileu de ouro da elevação do templo ã categoria de Basílica

Henor•

Entre tantas e diferentes contrariedades, atingindo

grupos diferenciados, não é de estranhar que no início de junho

a tensão tenha atingido aquele grau em que alguns derrotados

Partem para as agressões pessoais, preferencialmente protegidos

Pelo anonimato* Ameaças de morte, que o bispo vinha recebendo já

124
há alguns meses, findam por se tornar pdfblicas guando de •nua
exoneração que punha em diivida a palavra de D.Navarro.

O caso, ainda desdobramento do afastamento de ft-jns.

Apoliano, de Bom Jesus do Itabapoana, "ecebia a seguinte ve -*são

oficiais O Pe. Jose Ronaldo Menezes fora feito Vigário

Cooperador para substituir Mons. Apoliano, em fevereiro. No

entanto, argumentando o excessivo trabalho que sto

representava, eximiu-se do mesmo, mas foi instado pelo bispo a

obedecer - tendo sido, na ocasião invocado, o voto que fizera em

sua ordenação- Para aliviá-lo D.Navarro teria criado o "Curato

de Sta Clara", jurisdição que compreendia seis capelas e que

ficaria a cargo de outro padre- Mesmo assim, o Pe. Ronaldo

mostrou-se desinteressado ou incapaz de cumprir as tarefas de

Vigário Ecônimo, porque o Mons. Apoliano não lhe assara os

documento!-, necessários ao exercfcio de suas funções, o que levou

o bispo a exonerá-lo.

Mas a versão do Pe. era diferente, afirmava que não

pedira demissão e fora removido em função do avanço

progressist a , pela razão qual exortava os paroquianos a


<7>
permanecer firmes na fá

E nes t e clima que eclodem as queixas do Pe- Antonio

Paula da Silva (Italva), denunciando a coação psicológica que

vinha sofrendo. Segundo ele, já fora desrespeitado por alguns

paroquianos na festa de N-Sra de Fátima, que alegando terem

125
autorização do bispo, participaram da processão em trajes

indecorosos (leia-se: mulheres de calças compridas). 0 problema

agora mais graves festeiros independentes, m u n idos de l i c e n ç a do

bispo, a p r e s e n t a v a m - s e como organ izadores da -Festa de Sao João,

que se a p r o x i m a v a e, assim realizada, escaparia ão c o n t r o l e do

pároco. Nisto tudo o padre via uma guerra de nervos com intóito

de d e ixá-lo inseguro e a m e n d r o n t a d o , gerando um processo de

auto-afastamento• A simuitaneidade das reclamações acima c om o

tom pungente da "Desped ida" do Pe. Josó Ronaldo M e neses introduz

um fato n ovo no processos é posto em xeque a integridade moral

do novo b is p o .

C om o crescimento do desconforto, tanto em extensão

quanto em profundidade, chega ás ruas, no mês de julho, um novo

manifesto ass i n a d o em conjunto de padres fióis a D.Mayer. O

texto, intitulado "Solução para o Problema Relig i o s o de Campos:

Diálogo e Lóg i c a ou Código Penal" se centra na definição do

problema que atrav e s s a a diocese como uma questão doutrinári-a,

razão pela qual não querem um


indulto papal es p e c f f i c o para
(8)
favorecer a sua posição particular

Ainda neste mês estava prevista a eleição para a

diretoria da Pia União das Filhas de Maria, pleito que, a pedido

delas mesmas, findou anulado pelo bispo, em v i rtude do

desrespeito aos estatutos da Federação e de outras

Irregularidades apontadas. 0 episódio, que res u l t o u numa

^®**eat• das moças entoando cánt icos pela cidade, teve o apoio

126
de outra sociedade, masculina, a Congregação Mariana. Segundo o
instrutor desta, Sr. Gerson Ramos, o incidente pode ser assim
resumido: o Pe. Oltvácio Nogueira Martins, Vigário Geral e atual
Presidente da Federação, apresentou uma chapa dnica, quando, de
acordo com os estatutos, são necessárias tres para que ocorra a
eleição. Além disso, tal chapa era expiei tada com a "chapa de
D.Navarro". Para completar a arb itrar iedade, a votação era em
forma de plebiscitos sim ou não, para a chapa «inica. A despeito
da irr egul ar idade, e sob protesto, as associadas votaram! das
133 Filhas de Maria presentes, 99 foram contra, 28 a favor e 6
votaram em branco. 0 tumulto começou quando, apesar do
resultado, o padre quiz empossar a diretoria eleita por menos de
25% das associadas. Ante a pressão da maioria, Pe. Olivácio
recorreu ao bispo que decidiu marcar nova eleição, nos próximos
30 d ias.

Como resultado prático, pôster iormente foi empossada a


diretoria indicada pelo bispado, tendo a massa das associadas
Jurado fidelidade a D.Mayer, continuando as ser um dos bastiões
femininos do laicato tradicionalista.

A Voz do Pastor, do dia 25 deste mes, dedica sua


reflexão ao possfvcl encontro que haverá entre o Bispo Emérito
de Thulle, 0.Marcei Lefbbvre e o Papa João Paulo II, em busca de
uma solução para a postura tradicionalista daquele. Sem fazer
comentários diretos, D.Navarro apenas recomenda aos "Prezados

diocesanos, rezemos ao Santíssimo Salvador, cuja festa se

127
aproxima, para que eataiu palavra* do U^lmo mcuuitor <1®

S.Pedro sejam novamente cons Iderada®, diante de Di*u®, por Monn».

Lef&bvre e por aquele® que se deixaram Influenciar por %*o%

enganosos ens inamentos"..«

II. 3 - 0 Decreto

Tendo recebido da Santa Srf o parecer obre a consulta

enviada por parte do clero ainda en dezembro <j., ano anterior, o

Bispo de Campos apresenta o decreto baixado desde março p.p®,

iniciando uma nova fase no relacionamento com parte dos padre®

d iocesanos•

0 parecer do Vaticano, que concedia Irrestrito apoio ao

bispo, citava ainda a preocupaçSo com que o Papa tomara

conhecimento da sítuaçao, tanto mais grave porque criada por

sacerdotes que, recebendo o sacramento da ordem deveríam se

empenhar com maior responsabilidade a construir a comunhão

eclesíal. Dizia textualmente o documentos " A Santa 8é nSo

entende po absoluto conceder indultos gerais, consciente que tal

concessão só poder ia acarretar cis3e» graves na unidade da

liturgia romana, cuja reforma foi pedida pelo Concilio Vaticano

II, aprovada e lavada a efeito através de um trabalho paciente e

responsável, pelo Papa Paulo VI".

Numa "Mensagem do Bispo - ao clero incardlnado ou co»


Uso de Ordens na Diocese de Campos , D.Navarro, após 00

128
"considerando" cabfveis, decreta que os sacerdotes diocesanos
(9)
cumpram as normas vigentes na diocese.

Entregue a carta do Vaticano endereçada ao clero, em


I
mãos do Mons. LicTnio Rangel, por ser o nome que encabeçava os
signatários, o Bispo recebe, no dltimo dia aprazado, 25 de
setembro, a resposta dos padres. Tratava-se de' um documento
intitulado NOSSA POSICftO, mas que por exigência contida no
decreto, era "individualizado" por um cartão que Indent if icava o
remetente. 0 texto dos tradicionalistas visava dissiplar
qualquer ddvida sobre a coerência do procedimento deles,
visivelmente discrepante das novas orientações agora
( 10)
vigentes .

Dois dias depois, na coluna A Voz do Pastor, D.Navarro


expressa sua posição no artigo PLENA E AMOROSA ADESftO E
OBEDIÊNCIA AO SANTO PADRE?", onde fica caracterizada a postura
(14 >
cismaítica do grupo

Em 22 de outubro o bispo tenta, ainda uma vez, um acordo


com os padres tradicionalistas, através de uma consulta que, no

entanto, não teve resposta. Desanimado, declara aos jornais:


"Agora, tudo depende deles. Como pastor e pai, quero, mais uma
vez, usar de prudência e bondade" (Folha da Manhã, 26/10/90). No

tfia em que a nota é publicada, circula pela cidade um pequeno

livro. "A Missa Nova: um caso de consciência", onde são


arroladas as 60 razões pelas quais aquela porção do clero não

129
iu .\t. • ai» o r d e m » de seu superior.

0 encontro final chamado de "diálogo" por D.Navarro se

deu em 16 de novembro, foi, na verdade uma exposição de forças.

0* tradicionalistas - que contestaram o termo "diálogo", em


virtude da forma como a reunião foi iniciada, ■ tiveram, no
transcorrer da mesma, as provas de que o confronto lhes era

desfavorável. 0 Pe. Rifan, indagando ao bispo, logo ã chegada,

se "este diálogo que o Sr. Bispo disse continuar pode chegar a


conclusões contrárias ao decreto de 25 de agosto, e, se chegar,

serão válidas as conclusões?", não obteve qualquer resposta, e a

agenda da reunião, segundo eles, comprovava apenas o caráter


formal da mesma.

Segundo aquele padre, o dito "diálogo" constou de

exposições sobre teologia e a Missa Nova, a cargo de beneditinos

do Rio de Janeiro: D.Cirillo e D.Inácio Accioli, complementados

ainda por Mons. Tapajós, da Arquidiocese db Rio. Apds as

palestras foi dado 15 minutos para que os tradicionalistas

defendessem a posição deles, findo os quais foram interrompidos

por um questão de ordem. Tendo em vista o avançado da hora, não

foi aberto o debate, começando um processo de esvaziamento*

primeiro, sairam os beneditinos do convento do Mussurepe

(Campos), seguidos, 15 minutos apds, pelo Reitor dos

Rcdentorist as , a seguir, pelo Vigário Geral, o Pe. Olivácio

Hartins, depois pelos padres de Itaperuna.


t

Aos 12 de dezembro. D.Navarro comunica que não haverá


afastamento em massa» pois» embora os tradicionalistas prefiram
ser tratados em grupo, ele cuidará de cada caso individualmente.
Como pretende agir de maneira lenta e gradual, diz-se ainda
disposto a atender qualquer pedido de revisão de posição (o que
não acontecerá nenhuma vez). Cinco dias depois, convoca alguns
padres para anunciar a destituição do Pe. Eduardo Athayde,

pároco de Sto Antonio de Pádua do cargo de diretor do Colégio

Fidelense e que não renovará, apds 31 de dezembro, o uso de


ordens dos Hons. Ovfdio-Simon, Henrique Fischer, Francisco
Apoliano e Benigno de Brito Costa.

Em fins de janeiro de 1983, o Bispo de Campos vai a

Roma, pela la vez, quando será recebido por João Paulo 71 e

discutirá a grave situação da diocese. Volta de lá, porém, sem

qualquer sinal de uma intervenção ou algum reforço visível à

sua posição. Atormentado pelas pressões, D.Navarro é acometido

de um enfarte, submetendo-se a um implante de duas pontes de

Safena que o afastarão da direção da diocese até o 2q semestre,

quando o trabalho das substituições do clero será retomado.

II- 4 — Crise e Norma Canônica

Acompanhando o drama da Diocese de Campos o observador

aod* ser levado a suspeitar da tão propalada unidade dita como

presid indo o universo catdlico. Mas desde que esta forma de

atualizar o cristianismo - que se caracteriza pelo

131
K

pr ivi leg iamento da dimensão Inwt 1t uc Iuiva 1 do projeto do Cr loto

foi forjando/encontraridu a fac<t que apresenta ao mundo, at»

crises são uma constante. (Poulat, 1969)

Afinal, estava em Jogo a difícil tarefa de «nralzar-se

em diferentes culturas e, por isso mesmo, as consequentes trocas

e inevitáveis transformações. Mas desde os prlmórdlo» foi

mantida uma prática, exercitada ainda na era apostólica, a qual

se acreditava iluminada pelo Esp frito Santo e, por Isso,


geradora de um tipo de poder especifico oriundo da comunhão que

unia os membros do grupo.

Por deliberações tomadas em concilio, criticas e


construtoras da realidade, foi se constituindo o catolicismo.

Assim, pelos concilios ecumênicos é possivel acompanhar a

configuração juridica que foi moldando a Igreja e o poder que


dela emana.

Tais encontros, realizados por convocação do Papa a


todos os bispos, resultam em decisões coletivamente gestadas,

embora sua formulação final possa ser rcarranjada pelo Papa que,
em dltima instância, a aprova. As decisões conciliares têm a
forca de verdade porque representam a vontade de toda a Igreja
unida, e esta, em comunhão com Cristo tf, para os fiáis,

iluminada pelo Espírito Santo, e portanto. Infalível.

13
Assim ”To i desde: suele primeiro encontro , considerada

como a semente dos demais concilias, ainda na era' apostólica,

quando Pedro e Paulo, com argumentações diferentes discutiam o

preenchimento da vaga deixada por Judas no quadro dos doze que

acompanharam o Cristos terminaram por encontra-se num ponto

comum, até hoje lembrado como o testemunho da unidade que deve


informar a Igreja.

No entanto, tal fórmula não quer significar uma

uniformidade na postura, e sim, um esforço na manutenção de um

ideal partilhado mas sempre ameaçado pelas part icular idades

introduzidas pela história. Não é gratuito que Congar <1960)

define o concflio como uma "experiência reguladora", onde todos

se empenham em manter-se. fiéis à mensagem original e, ao mesmo

tempo, responder às exigências colocadas pelas sociedades onde

estão presentes.

Nesse sentido, o concilio é uma prova da vitalidade da

Igreja, expressa no reconhec inunto das tensões que a permeiam e

no desejo de buscar a aproximação entre eixos diferentes como o

estrutural e o conjuntural, o sacramento e a instituição. Para o

corpo eclesiástico e para o fiól, porém, a fé dá conta desse

desafio, na medida em que, na prática, os conceitos são

redefinidos, ou outros são criados de maneira tal à contornar as

inconsistências, tornando o sistema satisfatório. Mas as

diferenças de interpret ação são visfveis, resultando por vezes

tm cismas. Afinal, a hegemonia nunca é absoluta, como diz

133

À
Ui 11 i anis ( 1 9 7 8 )

A Igreja Católica, Apostólica, Romana, enni)í*nto

expressão do cristianismo, só se impará em sua plenitude a- o

chamado Cisma do Oriente, Berco da doutrina, esta região -foi

palco das muitas "experiências reguladores" que punham em

evidência a preocupação com a construcão/manutencão de uma linha

de pensamento constantemente ameaçada por outras "escolhas" (do

grego ha ires is).

Nos primeiros séculos, e emergente legitimidade do

cristianismo impunha estabelecer definições claras a respeito da

nova fé, dirimindo dóvidas e assentando as bases de uma unidade

iapresc ind fvel ã proposta de Cristo. Enquanto em Roma o império

(■esmo decadente-e talvez por isso) firmava uma aliança com o


sacerdócio (válida obviamente por todo o seu território), as

coaun idades do Oriente entregavam-se ao combate das correntes

antagônicas que viviam no seu seio. Assim, o Concilio de Nicéia

I voltava-se para o que ficou conhecido como a heresia


(12)
arianista .

Uma Justificativa histórica para a inexpressiva presença

de Roma nos debates cristológicos que caracterizaram os

priaeiros concílios repousa na instabilidade generalizada no

Ocidente naqueles séculos, com a Europa sendo alvo das

sucessivas invasões bárbaras. No entanto, cabe lembrar que

■quele período viu também florescer a vida monacal, cuja

134
experiência Bento de Nársia constitui um marco no
estol ic ismo.

Os dema concílios que se realizarão nt )riente,

durante o primeiro milênio, giraram em torno da verd*< * da fé


(14)
. Mas, por básicas que fossem tais discussões, é preciso

alertar, no entanto, para a distância (cultural, geográfica,

política) que se interpunha entre Bizâncio (Constantinopla, dita

por alguns como a Nova Roma) e Roma. Assim, se no Ocidente, na

segunda metade do milênio pode surgir a figura de um Gregdrio

Magno (Servo dos servos de Deus), Papa de 590 a 604;

desenvolver-se a conversão dos bárbaros; iniciar-se a missão


entre os eslavos (com Cirilo e Metddio, em 863); fundar-se o
ponto de renovação do cristianismo, com Clung, em 910; tudo isso

é condição para marcar o progressivo distanciamento entre duas

Igrejas, do Ocidente e do Oriente.

Tanto é que já no áltimo concilio deste período


(Const ant inopl a 10, em 869, com Adriano II) a diferença entre os
(15)
dois mundos era insuperável. Segundo Hortal (s/d) as
dificuldades repousavam na rivalidade átnica e política entre o
patriarcado de Const ant inopl a e os de Antiáquia e Alexandria. A
intervenção dos imperadores bizantinos, no entanto, algumas
vezes dificultava uma solução dos impasses, na medida em que
aqueles, eventualmente, apoiavam posturas semi-arianistas e com
isso entravam em choque com a Sá Romana. Assim, as muitas
disputas teolágicas "que se verificam estão num contexto de

135
I

Dpos/cão entre o Romanisno e o Heienjsmo. or»a^


° **P frita
jur fd ico-or gan izat ivo romano se choca com o esp /■>,•£
^
teoldg ico-
especulat ivo helên ico, até chegar ao chamado Ciso»« c/0 0 .
vr *ente.

Se o cisma do Oriente . >de ser visto como a consagrac


5o
definitiva de Roma como a Je do * cristianismo católico
I r fc
j preciso considerar que a gestação do primado do papa r o m ano ^
/
/ Jenta e passa por constricões d e variada ordem, Principalmente

I de caráter polftic:o e econômico os quais, entretanto, os homens

i de fé puderam impregnar com os princípios básicos ditados por


M,
I Cristo aos apóstolos- Da Lex Sálica * questão das
í l/;)
(16) «»>» f para a Igreja
invc><-___ —
Jnvest iduras , a relaeao trono/altar tra-
ocfabeJecimentos dos
muitas va n t a g e n s e desvantagens, como o estaoei

I Estados Pont if feios e o direito real de nomear o papa.

I
K-ricu lares <jue a
Em m e i o aos conteddo s substantivos e pare <
„ „ s garantindo a
/ história vai c o lo c a n d o , o "p o d e r de comunhão va
ada a gu a r d a —
/ sobrevivénc ia d a m e n s a g e m e d a organisaeao dest»n ^
. ri ia t a * im«*s
- Poder de med i a ç a o , nem sempre de v i t ó r i a i me
*" j ac a gir e
, atingir
.a perseverantemente, o momento possível de
guarda, Pers (tnsp irado
Oo íncr.mento— — #

«r C»-n„ «c— - — •*» .


a ;a lei oãf o c o m d 9 1e
f ' ' ™ 4' * .n»,r*nc.»
. xr, Colégio dos Carde»'*
I,rrJ» * e m e r g ê n c i a do doPapa.
ífc/„ V O para o pr o C e s s o de evoluca“o dos direitos

13á

«
Os
concílios seguintes verifjcar-se-ão no Ocidente* o»
Ci 7)
quatro primeiros no Palácio Pontificai, os cinco seguintes

em expressivas cidades da área, voltados mais para problemas

organizacionais e para as sempre tensas relações entre poder

religioso e poder secular, quando importantes decisões no campo

da liturgia foram tomadas.

Roma não vivia, na virada do milênio, uma situação

promissora, A cátedra de Pedro estava dominada por famílias do

patriciado romano, com papas de nível muito baixo, enquanto o

império bizantino conhecia um novo esplendor. 0 início da


(18)
chamada Reforma Gregoriana, sob o papado de Leão I X (1049-

1054), será o momento de reversão do processo de ref loresc imento

do papado romano. A tensão piora gradativamente e do ponto de

vista doutrinário, ã parte da questão do "F i1 ioque", a linica

razão dogmática invocada era a crença no purgatório. Os legados

romanos enviados para negociação não chegam a palquer • acordo,

excomugando de maneira Juridicamente nula o patriarca


(19)
bizantino Mas o grande cisma só se dará em 1054, com

excomunhões miituas.

Este cisma dá bem a medida da historicidade destes

processos* quando em 1965 o Papa Paulo VI e o Patriarca

Athanágoras levantam os anátemas, as novas concepções elaboradas

Permitem verificar que, se Roma não tivesse ficado surda às

trgumentações contr á r i a s o cisma não teria acontecido. Uma

simples confissão de fé teria sido suficiente para debelar a


crise, na medida em que as excomunhões não se dirigiam a

igrejas, mas a grupos. No entanto, quase mil anos antes, tal


raciocínio era impensável.

Apesar de terem sido enviados esforços no sentida de um

reatamento, todos eles foram baldados e obstaculizados pelo

movimento das cruzadas que confrontavam, por um lado, a amb içao

latina de consolidar sua primazia, por outro, o nacionalismo


grego.

Outros patriarcas orientais (de Antidquia, Jerusalém e

Alexandria) nao conhjeceram uma ruptura formal com Roma em 1054,

mas sob o influxo de Constantinopla acabaram por se distanciar

da Sé Romana. As igrejas eslavas (que constitu iam inclusive uma

das causas dos atritos entre Roma e Constantinopla), vão flutuar

entre a influência de uma e de outra. Acabou prevalecendo a

seguinte divisão: onde o cristianismo latino se impôs (Polônia,

Boêmia, Morávia, Croácia) a língua passou a ser escrita em

c*r*c^cres latinos? onde triundou o bizantinismo (Rissia,

Ucrânia, Bulgária, Sérvia), os caracteres empregados foram o

cir Tl ico, uma derivação do alfabeto grego.

A despeito de no chamado Cisca do Oriente estarem em

jogos visíveis fatores polfticos e* culturais, outras crises

acompanhadas de rupturas punham em evidência aspectos de ordem

filosdfico—d o u t r i n á r i a , como aqueles de inspiração maniqueista.

Aqui, a ênfase na oposição irreconc i1 iável entre o bem e o mal

138
vai forjar a condenação explícita de uns e a identi f icacão
exclusiva de outros como os legítimos detentores e defensores do
<20)
bem. Desde o chamado Gnosticismo , no século II ou o
<21 )’
Donatismo , no norte da África, no século IV, esta tendência

se apresenta.

Embora seja anacronismo e eclesiocentrismo ler aquele

quadro ã luz de uma percepção da Igreja como dotada de dupla

dimensão, uma visível, humana, outra, sacramento, princípio de

salvação, total izante; concepção que foi se construindo na

htstdria, não hã como ignorar a fecund idade da solução

encaminhada — no seu tempo - tanto por Irineu como por

Agostinho, no sentido de questionar o man ique ismo.

Mas não foi s d este aspecto que ameaçou o crescimento

das idéias hoje reconhecidas como cristãs. Críticas ao poder

secular. Estado, ao modo como era conduzida a Igreja estão

sempre presentes, gerando os chamados grupos " isolac ion istas"

que percebiam a instituição como se distanciando de uma mensagem


(22)
de fraternidade. Assim, Cétaros, Albigenses, Valdenses

estarao atuando desde o século XI e sendo devidamente condenados

pelos concflios romanos. Mas nem por isso suas raízes conseguem

ser completamente debeladas, rebrotando com novas roupagens por

vezes assimiláveis por Roma, como foi o caso dos fr anc iscanos.

0 período é de grande efervescência religiosa! com o


<231
surgimento de novas ordens , e, num outro plano, deve ser

139
<24 )
lembrado o papel lovlmenfco crusacl Iiiit.a, responsável , de

certa maneira, pr ' formál Ixacão cJw separação do "outro" no

tnbito popular . Refui «ando a opou içao, dificultando aprox Imacões

• a eiuerijínc Ia de hierarquias paralela», o cruzadlsmo contribuiu

para definir o» limite» do catollclwmo, preparando a chegada ao

itfculo XIV com a separação formalizada em todoo os níveis* o

popular, o doutrinário e o metodológIco«,

No entanto, falar assim pode parecer que eotou afirmando

que a Igreja fosse obra acabada. Pelo contrário* considerando-se

a essenc ia 1 idade da central idade da Igreja de Roma, é no século

XIV que se daí talvez a mais grave crise de sua h Ist dr ia, o Cisma
<25 >
do Ocidente . Este resulta das relações que a Cdria romana

vinha estabelecendo com diferentes príncipes, atualizando um

•ercant i1 ismo dificilmente compatível com o "poder de comunhão"

pelo qual pretendia se aut a-def in Ir . "Taxas de nomeação,

espólios, anatas, dízimos, reservações, taxas.de chancelaria (e

toda uma variedade de tributações legítimas) geraram a fama de

avareza para a corte romana" (Hortal ,op.c it .*20). No chamado

Cativeiro Babllônico conviveram tres papas, como resultado não

aò da corrupcão v decadência do papado exilado mas também das

forte» pressões dos interesses nacionais existentes.

Só em 1417 a crlstandade ocidental se viu novamente

reunida sob um papa, após um período em que nem a aparência de

unidade pode ser mantida. Naquele tempo, o trono de Pedro

»ubaeteu-se ao poder conciliar, o qual, mesmo superado em 1431

140
(Concilio d e B a s i 1 é ia - F e r r ar a — F1 or e n ç a r R o m a ) indicava as muitas

reformas que .a Igreja precisaria fazer para manter a posição

conquistada. Afinal r o c o n c i 1 iar is m o era um fator de descrédito

da autoridade papal, tão duramente abalada a partir de seus

problemas internos- Estes traduziam a subordinação da Igreja «*s

nações, subordinação também provada nos procedimentos

conciliares* o voto era atribuído por "nações" e não pela

represent a ç ã o episcopal ( C o n c H io de Constança, 1414— 1418),

abrindo c a m i n h o para a formação de " i g r e j a s nacionais".

Tal quadro vai estar presente por todo o século.* A

siaonta que imperava sucedeu um mecen a t o que, se por um lado

enriqueceu o patrimônio arquitetônico mundial, por outro

proporcionou a subordinação do papado a grandes banqueiros como

os Hédici de Florença e os Fugger da Alemanha. No plano

filosófico, a decadência da e s c o l á s t ica m a r c a v a a ascensão do

Huaanismo* Já no século XVI, Le ã o X (1513— 1521), tido como *o

primeiro papa humanista, membro da família M é d ic i , é alvo dos

primeiros a t a q u e s de Lutero.

Cabr frisar que isto significava verdadeiro despertar da

Isrcja: depois de 250 anos de lutas e anarquia, a autoridade

dela, a o m e s m o tempo monárquica e colegial, começava a se impor.

W e» Latrão, entre 1123'e 1312 vão se realizar mais quatro

concílios — e mais tres outros menores, em o u t r o s locais — que

**rf*xcrSo t a n t o s quanto aconteceram nos onze primeiros séculos

141
da erra cristã, ® ma ia do que acontecerão entre os séculos XV e

XX.

Mas esta efcrvescênc ia nao sifnifica um crescimento

homogêneo da Igrejas a reforma gregoriana que Roma tentava

implantar tem repercussões diferentes, de acordo com a situação

local dos diversos reinos, razão pela qual, aliás, em pleno


século do que convencionalmente passou ã histdria como a

Crístandade <1300), ocorrerá o Cisma do Ocidente'. De toda a

forma, a ápoca é promissora para a Igreja.

O que se percebe nos primeiros concflios ocidentais é o

esforço de estabelecer o lugar e o papel do papa e da Igreja

enquanto instituição responsável pelo domfnio do espiritual. A

Identidade da Igreja, num mundo se organizando em reinos, se faz

pela discussão do que seja o poder temporal e o espiritual

(distinção elaborada por Yves de Chartres), e a necessária

delimitação das fronteiras entre um e outro. É uma discussão de

e pelo poder entre reis e imperadores com o corpo eclesiástico,

di qual a concordata de Uorms é uma expressão visível.

Desde o Concilio de Latrão I está dado o esboço do que

terá a autoridade monárquica e colegial que vai caracterizar a

Igreja, tal como a conhecemos. E essa estruturação foi

acompanhada (ou construída) pelo fortalecimento da centralização

pontifícia que atinge seu ápice com o cenceito de "plenitudo

potetta*", pelo qual o poder temporal fica subordinado ao poder


espiritual» Mas a d e c U f í l
S a o de ! al poder, por sua magnitude,
vc* no b o jo de gr a nd
atr d u Ia ç õ e s : seja no d i f f c %j
relacionamento do c l e r o cç>
** o p o d e r s e c u l a r , seja no in te rio r da
i9reja, onde a discussão
teo ló g ica atinge ponto e le v a d o coa *
contribuição do toniism o.

^ Preocupação
Q Papa Inocèncio III (1198-1216) e-|
consolidar a igreja se e * &
Pressa em sua política, onde o conceito
Plenitudo potestas"
lfat iza a subordinação do temporal ao
espiritual, e este, ao et«s r- *
v^rno. Esta perspectiva, elaborada no
bojo das grandes tensões , . ~ ,
s que redundarão no chamado Cisma do
Ocidente (1378-1417), qu_ . . ~
^ * n d o surgirão os anti-papas, em plena
subordinação aos i n t e r e s s a ^
=»5»es franceses, vai se desenvolver até o
final do século passado ~ _ r_y, . ,,
u o * quando o Concilio Vaticano I define
esta plenitude de poder" do papa "como o supremo e imediato

poder de jurisdição sobre todas as igrejas, todos os pastores e

firfis, em comum e em Particular"<Huizing e Uaif,1980:3).

Naquele mesmo século XIII, enquanto o papa dedicava-se

aos princípios jurídicos que consolidariam o poder da Igreja, o

dosinicano Tomás de Aquino, como outros pregadores da época,

prcocupava-sc em fazer a ponte entre o corPO da sabedoria

profana e o depósito da fé cristã. Tentando tornar mteligfvel

aos ocidentais a ciência e a razão gregas. Personificadas e»

Aristóteles (cujos textos eram então traduzidos do grego e do

•^abt), Aquino partiu para uma sfntese teológica das verdades

•ctssívei s b razao. Para ele, o assentimento à Palabra de Deus

143
deve desencadear uma curiosidade em que natureza e graças são

igualmente solicitadas. A teologia torna-se a um tempo


contemplativa e especulativa! a fé está sempre h procura da

inteligência; razão e fé d ist inguem-se para se

unirero"(P ierrard,1982= Í30> .

O tomismo, que durante sua elaboração foi alvo de muitas

restrições, principalmente pelos franc iscanos, imbuídos que eram

do agostinianismo, foi muito fecundo, apresentando

desdobramentos posteriores que chegaram à modernidade. De acordo

coa o autor acima citado, o tomismo ^emergiu novamento no fim do

século XIX, graças a ação de Leão XIII, Papa que o considerava

coao a doutrina cujos princípios podem permitir o aprofundamento

da tradição e a solução dos problemas colocados pela evolução

das artes, das ciências, da sensibilidade humana e das

estruturas sociais" (Pierrard, 1986:131).

Os concflios seguintes, encaminham-se gradativamente

para uma diminuição do poder papal, seja pela pressão das forças
seculares, seja das próprias forcas conciliares.

0 concilio de Lião I (em 1345, com Inocêncio IV) é

doainado por questões imperiais; o de Lião II (em 1274, com

firegário X) não consegue realizar o sonho da unificação do mundo


;Crjst 2o t o de Viena (em 1311 e 1312, com Clement e V) Já se
fr*$1iza sob o chamado "Cativeiro Bab ilôn ico" dos papas de

AvinhZo. ocasião o papado perde o caráter de magistratura

144
soberana. O de Constanca (1414-1418, com Martinho V) Já mo * va

a marca da super ior idade do concilio sobre o poder papal. Se o

concilio seguinte, realizado em 1431 por Eugênio IV <em

Basiléia, Ferrara, Florença e Roma) consegue devolver ao papa

seu antigo poder, há que reconhecer os prejuízos causados não sò

pelas graves dissenções internas mas também pela pressão das

questões externas! a união com os orientais resulta efêmera e a

queda de Const ant inopl a , em seguida, encerra mel ancol icament e um

episódio tão importante para a unidade cristã.

A grande crise que prenuncia a chegada da Idade Moderna,

traz consigo o Cisma Anglicano e a Reforma. No Concilio de

Latrão V (1512— 1517), presidido por Julio II e Leão X) fica

patente a incompetência da Igreja para enfrentar a mudança que

se avizinhava. A necessidade de reformas profundas não vai além

da constatação, deixando espaço para contestações e cismas. Os

problemas serão retomados no Concilio de Trènto, o mais longo

da história <1545 a 1563, atravessado por cinco papas: Paulo

III, Julio III, Marcelo II, Paulo IV e Pio IV) quando nova face

da Igreja se inaugurará: estabelece-se a doutrina dos sete

sacramentos e afirma-se as fontes dnicas da verdade — Escritura


(26)
c Trad ição .

Este concflio, como os seguintes (Vaticano I - 1896 a

IB7«, com Pio IX e Vaticano II - 1962 a 1965, com João XXIII e

P*ul° * de implicação capital para esta reflexão, como se

Constatará. Agora cabe apenas antecipar as tres grandes questões

145
perme a r a m a ^ Po c a e que, de algu.a forBa se d e s d o b r a r a m ^
iá£
s ia> o a c i r r a m e n t o do c o n f l . t o f«í x razão, que c o l o c a Par
hoJe
lgreja un> c o n j u n t o de h e r e s i a s como 0 Jansenísmo, o Guietís.o,

Ca) icanismo, o Febronianismo, o Josefínismo, o P o m b a l i s « 0 , t

i iber alismo, o Modernismo, e suas r e s p e c t i v a s r e s p o s t a s . 2a > s

do d o g m a da infalibilidade papal ea 3a) a reforaulaç3c


e. i ^ So
da isrej3 a pa rt i r de m e d i d a s concretas v i s ando e e c u m e n i s m o , a
cole9 ial idade e p i s c o p a l e o papel da Igreja no m..r,a ^
Mr feJ d ,,ü « u n d o s o d e r n o .

Ass jn r o c on
j u n t o d e ssas e x p er.ências r e g u l a d o r e s d ã o a
.edida do dirflogo e s t a b e l e c i d o entre a I
9reja e o Bundo, onde a,
teaática -Foi senpr
e a niesraa — guardar o Papel dela de
responsável pel
° pr o j e t o d e salvação, discutindo e refinando
seus instrumentos
c u m p r jr Q que te|B CO(BO sua a j s s 3 o . E s t e v e
sempre em j o g o s ua defini
u e T , , M v a 0> como sacramento de Cristo, e coro
*ssor a n o ç ã o de
unidade, imprescindível k manutenção da
Pretendida a u t o r i d a d e .

146
NOTAS

Assuntos vestes d o s ficHu cm nossa Igreja

P r e z a d o . ••'

Certamente, s e r á do seu conhecimento um leve Incidente de


tumulto, P R O V O C A D O POR LEIGOS** h porta d» Catedral, suando
eu c e l e b r a v a al i , minha primeira ml sua no áltimo domingo.
0 root Ivo d a d isputa foi a veste, adequada ou nao, de pessoas
que e n t r a v a m no templo.
Na r e u n i ã o ext raor d Inár Ia dos Consultores Diocesanos e do
Conselho Pr eob iter ial , por mim corwocad» na illtmma terça-
fe ira, d ia 24, procurei ouvir o parecer desses queridos
cooper a d o r e s necessários, Já que n«io podia ouvir, no
momento, t o d o s os presbíteros.
Como bispo, deixei claro o meu pensamentos a -santidade da
Casa de D e u s exige que homens e mulheres, ao frequentá-la,
trajem— se c o n v e n ientemente.
Após uma longa troca de idó ias, cada um dos 8 (oito)
presbíteros presentes deu seu voto5 5 optaram pela solução
que e x p o n h o a seguir? i já segue o princípio de veste
conveniente, sem entrar em detalhes? 1 acha que a questão
deve ser levada com paciência e tem possíveis conseqtíênc ias ?
outro, final mente, suspendeu seu juízo no momento.
E sabido de todos que estes dois conselhos do bispo sáo
consultivos, e nao deliberativos. Assim sendo, depois de
ouvir esses representantes, como desejo sempre escutar todo
0 nosso pr esb it dr io , determino o que segue5
1 — na Casa de Deus, lugar sacrossanto, trajem-se todos de
forma conveniente?
2 - fica a cri t ó r i o de cada Pároco ou Reitor de Igreja,
ouvido o seu povo, determinar o que seja veste
adequada?
3 - em cada templo, os flóls respeitem e acatem as
d e t e r m inçõcü do sacerdote responsável, pois têm o apoio
do seu b is p o .
Cada s a c e r d o t e procurará comunicar a seus fióls, como acha
melhor a o r i e n t a ç ã o da Diocese. Entre outros argumentos,
recordo ac palavras de São Paulo5 "Cessemos pois, de julgar
uns aos outros... « p 1 iquemo-nos ao que contribui para a paz
e para a m<.ítua edificação" (Rom.,14,13,19) •
Assim f ormados no respeito imituo, no dever de tolerância e
na vivência da caridade - primeiro e maior de todos os
mandamentos - deixarão certos leigos, pouco esc 1arcc ídos, de
se aut onomear em em jufzcs do que compete ao bispo e, depois,
aos sacerdotes que estão unidos ao bispo.
Na certeza da compreensão de todos,
Pede e o f e r e c e oraçoes. ••

147
"Surpreenu os pela publicarão da imprensa da Circular de
8/12 do corrente, censurando a atitude do Vigário de Vinhosa
(Xtaperuna) « acenando para possfveis punições, os
signatários desta carta» sacerdotes com ministério na
Diocese de Campos» tendo em vista o bem das almas» queremos
manifestar a V.Exa as seguintes ponderaçõess

1- A razcio dltima das repreensões pdblicas e das eventuais


sansões contra o refer ido sacerdote» é uma pos ição
doutrinária comum a todos nóss a recusa de aceitar o
Novus Ordo M issae instaurado por Paulo VI.
2- Dentro da crise religiosa contemporânea» as amplas e
profundas modificações na liturgia da Santa Missa
causaram a inúmeros teólogos» prelados»- pastores de
almas e leigos <Cf»Carta do Emo Cardeais Ottaviani e
Bacc i » de 5 de outubro de 1969) uma dolorosa angdstia de
consciência. De um lado» o novo Ordo obscurece as
expressões que sublinhamos dogmas eucarísticos,
aproximando a Missa da ceia protestante e não envolvendo
mais uma nft i d a profissão de fé católica. Dé outro» ele
é a p r e s e n t a d o como que imposto pelo Papa. Diante desta
situação angust iante» alguns de nós escrevemos ao Santo
Padre d e c l a r a n d o a impossibilidade moral de aceitarmos o
Novus Ordo Mi ssae. De fato» não se tratava nem de um ato
que e n v o l v e s s e a infalibilidade» segundo a declaração
expl feita de Paulo VI* (Disc. de Í9/Í1/Í969)» nem de um
ato que obrig a s s e em consciência, por ser o novo Ordo um
rito ambíguo e, objetivamente, um rito ambíguo não
agrada a Deus, Nosso Senhor. Sabemos que o poder do
Papa, na Igreja, é supremo, mas não ilimitado. 0
Concflio Vaticano I lhe delineia os 1 imites * " O
Espírito Santo não foi prometido aos sucessores de Pedro
para que estes, sob a revelação do mesmo, pregassem uma
nova doutrina, mas para que, com sua assistência,
conser v a s s e m santamente e expulsassem fielmente o
depósito da fé, ou seja, a revelação herdada dos
A p ò s t o 1os" <Denz 3070).
3- Forçados por essas razões doutrinárias a recusar o novo
Ordo, no entanto, não deixamos de nos manter dentro da
o b e d iência a toda autoridade na medida em que o dogma e
o d i r e i t o o preservem. Com efeito, a doutrina da Igreja
afirma que diante de um documento, mesmo do magistério
supremo, que não tenha as notas da infalibilidade e que
d iscrepe dos ensinamentos tradicionais do Magistério, é
lcgftimo até ao simples fiel não só sustentar o seu
asse n t imento, mas também, conforme as circunstâncias»
. resistir. (Cf. S.Roberto Belarmino, D r o m •P o n t -L i b .1 1 »
C*29j S.Tuuiás de Aquino 33,4,2;Papa Inocêncio II» citado
por B i 11ot , Tract. de Eccl. Christi, Tomo I ,p p •6Í0-619)•
Se d e v e m o s o b e d i ê n c i a e demonstrações de acatamento aos
h ie r a r c a s , a c i m a de tudo devemos obediência e submissão
aos pr inc fpios Perenes emanados do Magistér io. A razao
principal de n o s s a obediência à hierarquia está em que
*1* €?, por missão, porta-voz dos ensinamentos divinos

14 8
aos quais devemos a "Oboedientia maior", que é o
"Obsequium fidei". A obediência está a serviço da fé
porque declara o IV Com. M l o de Constant Inòplas "Prima
salus est rectae fidei reyulum custodiré" (Denz.Sch.
3 Q ó ó >.

A- Desde que V.Exa. assumiu o governo da Diocese, com toda a


sinceridade e respeito patenteamos-lhe este problema de
consciência, respondendo a um membro do Conselho
Presb iter ial, não considerar contestação da autoridade
pontifícia nem episcopal o fato de um sacerdote explicar,
a quem lhe perguntasse, os motivos de sua adesão á Missa
trad ic ional .
Pelo exposto, V.Exa- pode verificar que nossa adesão ã Missa
tradicional e a rejeição ao novo Ordo é uma questão de fé,
na qual não podemos transigir. Esta atitude absolutamente
não envolve nem desobediência nem desrespeito u pessoas do
Papa e de V.Exa.
Para dissipar qualquer mal-entendido, pedimos a V.Exa. »
publicação desta carta.
Com filial respeito solicitamos sua benção.

"IN IESU ET MARIA"

Campos, ii de dezembro de 1981.

a) Mons. LicTnio Rangel — Reitor do Seminário


- Mons. Francisco Apoliano -.Vigário de Dom Jesus do
It abapoana
- Pe. José Ronaldo de Menezes - Vigário Cooperador de Bom
Jesus
- Mons. Henrique Conrado Fischer - Ex-cura da Catedral
(dest itu fdo )
- Pe.Emanuel José Possidente - Diretor Espiritual do
Seminário e Diretor da Obra das Vocaçoes Sacerdotais
- Pe. José Olavo Pires Trindade - Vigário de Miracema
- Pe. Fernando Arêas Rifan — Pároco <Je N.Sra do Rosário
(Bairro do Saco) e Diretor do Ensino Religioso
- Pe. Davi Francisquini - Pároco de Cardoso Moreira
- Pe. José Onofre Martins de Abreu - Capelão da Igreja de
N.Sra do Rosário
- Mons. Benigno de Brito Costa - Capelão do Carmo e do
Mosteiro da Santa Face
- Pe. José Eduardo Pereira — Pároco de S.Joao da Barra
- Pe. Antonio Alves de Siqueira - Pároco de Varre-Sai
- Pe. Antonio Paula da Silva - Pároco de Italva
- Mons. Ovfdio Siwon Calvo - Vigário Emérito de S. Fidélis
- Pe. Jonas dos S. >tos Lisboa - Pároco de São Fidélis
** Pe. Gervásio Gohato - Pároco de Lage do Muriaé
“ Pe. Eduardo At.iagde - Pároco de Sto Antonio de Pádua
“* Pe. Alfredo Gualandí - Vigário Cooperador de Sto Antonio
de Pádua
- Pe. José Moacir Pessanha - Pároco de Natividade
* Pe. José Maria F. Colaço - Pároco de Porciiíncula

149
- Pe. E d m u n d o G. D e l g a d o - V i g ário de C&mbucl
- Pe. Eílc io h u r u c c » - V i gár \o de Urura f

3 - Campos, Í3- d e j a n e i r o de Í982


Pr esado D •Lu c iano,

PAZ!
Apds ler h o j e a s d e c l a r a ç õ e s nos jornais, resolvo quebrar o
silêncio qu e por p r u d & n c i a . e esforço de caridade. tenho
tentado c o n s e r v a r , para, em sua pessoa de Secretári,. Geral
da CNBB, a g r a d e c e r o apoio que tenho recebido de tan t o s
bispos, p a d r e s e l e i g o s de várias partes do Brasil.
Dois f a t o s p r i n c i p a i s sucedem em Campos.
0 primeiro,, é o da c e l e b r a ç ã o das missas quanto v i s i t o ’ as
pardqu ias s
A a c l a m a ç ã o p o p u l a r nas ruas é vibrante, alegre e calo r o s a .
É a fé do p o v o que vê no bispo o sucessor dos'aptíst ol os de
Cr ist o .
Ao chegar ã s igrejas, sou saudado pelas a s s o ciações com
sinais de r e v e r ê n c i a . Entro no templo uso os paramentos que
me são o f e r e c i d o s .
Dirijo-me ao a l t a r para celebrar a missa em latiml lendo em
português os t r e c h o s que o pároco também o fas, em altar em
que fico de c o s t a s para o povo. Em certas pardquias, sucede
então o insdl ito: quando faço o sinal da cruz e digo "In
nomine Patr is, et Filii et Spiritus Sanct i.•." as pess o a s
das a s s o c i a ç õ e s , que dever iam ser as mais bem formadas pelo
sacerdote, c o m e ç a m a se retirar af r on t osamen t e .
Em resumo, a m i n h a simples atitude de celebrar segundo o
Missal Romano, a p r o v a d o por Paulo VI é considerada como
terr Tvel a g r e s s ã o que faço a alguns dos presentes.
Sem d e s e j a r a l o n g a r a questão, limito-me a perguntars Que
doutrina e r r ô n e a inspira o comportamento deste pequeno grupo?
E isto que t e n h o procurado aprofundar em contatos com -os
sacerdotes - a quem sugeri uma exposição de motivos a ser
enviada à A u t o r i d a d e Suprema da Igreja - bem como os leigos.
E claro que, c o m o pastor, venho formando meu juízo sobre o
assunto, para um a futura ação.
0 segundo fato, que também causou repercussão nacional,
trata da d e m i n c i a da venda de terras, apés a minha posse,
com procurações caducas. 0 senho sabe como o Direito
C#n6n ic p é s e v e r o no que se refere a este ponto.
0 assunto está sendo devidamente tratado conforme os
preceitos e c l e s i á s t i c o s e civis.
Nest es dltimos dias voltou h baila, muito fort ement e , a
questão doutrinária. Estarão levanto esta conh e c i d a
problemática — que nao é entendida pelo povo simples para
encobrir a s e g u n d a situação? Não sei.
Finalmente estou consciente de que, em cada diocese, o
principal j u i z é o Bispo, é claro que sempre em comunhão com
o Papa e. os d e m a i s Bispos unidos ao Santo Padre.
Fortalecido p ela graça de Deus e pelas preces de tantos
irmãos, continuo, suave ma is f irmement e , a pastorear as
ovelhas que me f o r a m confiadas por Jesus e pelo Papa João

1 oO
Paulo II-
Grato pela atitude de apoio,
Pede e oferece orações,
0 irmão e servo em Cristo e Maria

- 1- "A Missa Nova"r ©ro latim ou vernáculo, porque constitui


tanto no seu conjunto como em pontos particulares UIW
impressionante afastamento da teologia católica dw vu>trita
missar tal como foi definida na sessão XXII do Cone filo dü
Trento (Carta dos Cardeais Bacc I e Ottavlanl a Paulo VI em 5
de outubro de 1969). De fator o Novo Ordo obscurece na
expressões que sublinham os dogmas cucarftttI C O S , «prOMI mando
a missa a ceia dos protestantes e' nSo envolvendo mais um»
nítida profissão de f^ catdlica.

2- "A Moral Nova", subjetivista, © ituacionist a , eivada de


liberalismo permissivista, onde pouca coisa ou nada d
pecado.

3- "A Profanação das Igrejas" por vestes sempre considerada»


pela Igrejas como imodestas e por miisicas e instrumentos por
ela já reprovados.

4- "A Nova Teolog ia" modernista que fundamenta toda a


religião catdlica na evolução do instinto religioso das
primeira comunidades cristãs.

5- "Os Novos Catecismos", transmissores mais ou menos


velados dos erros modernistas e não raras vezes
doutrinadores da subversão.

6- "A Teologia da Libertação", que se baseia numa nova


Interpretação do Evangelho, completamente oposta h que a
Igreja sempre propôs, e se presta a manipulações
carxist izantes.

7- "A G u i nada para o Socialismo e o Comunismo", em


contradição flagrante com toda a doutrina social da Igreja e
com desprezo 1* excomunhão, lançada por Pio XII contra os. que
colaboram de qualquer modo com o comunismo.

8- "A Secular ízação do Clero", com grave escAndalko do»


fiáis e e s v a z i a m e n t o da vida cristã.

9- "A A s s i m i l a ç ã o do Espírito do Mundo" por parte do Clero e


dos f ié is em c o m p 1et a oposição aot uiu inament os de Nosoo
Senhor, e opos t o ao espírito de mortificação, próprio de
Jesus Crucificado.

10- R e f o r m a dos Seminários", feita de acordo com essas


novas o rientações.

151
1 1 - "A Obsedante Preocupação com’ a Promoção Humana" que
prejudica a especifica finalidade da Igreja, a salvação dai»
almas •
12- "A Diluição" da espiritualidade scérla num vayo
sentimenta1 ismo religioso.

13- "0 Ecumenismo" que arrefece a Pd e fax esquecer a nossa


identidade catrflica, tentando superar o antagonismo entre a
luz e as trevas, entre Cristo e Belialr e conduz a um
pancr ist ian ismo r erro dos mais graves capaz de destruir pela
base os fundamentos da fé católica»

14- "A Liberdade Religiosa*» entendida no sentido de uma


equiparação de direitos entre a verdade e q erro» dando
primado a um suposto direito subjetivo do homem,
independentemente dois direitos absolutos da verdade, do bem
e de Deus, e em consequência, laic. izando o Estado e
tornando-o agnóstico em relação verdadeira religião.

15“ "0 Hor izontal ismo da Religião do llomen", que concretiza


o que São Pio X chama de "monstruosa e detestável iniquidade
própr ia do tempo em que vivemos pela qual u homem se
substitui a Deus".

16“ "A Democratização da Igreja" e um seu governo colegial


em oposição à constituição hierárquica © monárquica que lhe
deu Nosso Senhor.

17- "A La ic izacão da Sociedade", que revive o grito dos


judeus na morte de Jesus, não aceitando a sua Realiza Social
nem o reconhecendo como Supremo Leg ialador da Soc iedade
humana -

5 - E is na íntegra o artigo "Resplandeça a unidade da D iocese",


publicado na coluna A Voz do Pastor, em 25-4-81 1:5.

Imag ino que é desej o de todos nós, catól ico s , darmos


incremento a uma Pastoral de Conjunto que venha somar as
forcas existentes em nosss Igreja Particular. *
Queremos por em prática o ensinamentos do Concflio Daticano
II que d iz: "Na diocese i eira, faca“«e, sob orientação do
Bispo, a coordenação e a i.-t ima conjugação de todas as obras
de apostolado. Assim, todas as iniciativas e instituições:
catequdticas, missionárias, caritativas, sociais,
familiares, escolares e quaisquer outras de finalidade
pastoral se canalizem a «ama ação de conjunto. Com isto, ao
mesmo tempo, resplandeçe mais claramente a unidade da
diocese". (Christus Dominus,17 ou 1055).
Ante mesmo do Concilio, já o querido Papa João XXIII pediu
aos bispos da America Latina para planejarem melhor sua ação
de pastores, juntamente com seus rebanhos, afim de evitar
desperdício de iniciativas.
Como nos ensina Puebla, unra pastoral de conjunto ou
orgânica compreende entre outras coisas: princípios

152
or I©ntadores, objetivo*», opções estrato«íQ ias, in ic iat ivas
prát icasy etc

"A ação pastoral planejada é a resposta específica,


consciente e intencional exigências da
evangeli z a ç ã o " (Pueb1a ,1307)•
Trata—se de um processo sempre emmarcha enl que os
católicos, em todos os n i've is das comunidades e pessoas,
sao chamados «v participação. Aos poucos, vamos aprendendo a
analisar a realidade (VER), depois, a refletir sobre ela com
critérios evangélicos (JULGAR) è, enfim, a optar pelos mais
aptos para a ação evangel izadura (AGIR).
Todos estamos convocados a participar» 0 Bispo, os padres,
os religiosos e os leigos. Falando ao Episcopado em
Fortaleza, o Papa João Paulo II pedia aos .bispos! "Sede
construtores da Comunidade Eclesial- 0 Concilio Vaticano II
sublinha uma dimensão essencial de nosso ministérios a de
convocar os que estão dispersos, reunir os que estão
separados, construir assim a Igreja e mante-la na unidade,
malgrado todas as forças de ruptura e de desunião" (6-3).
0 ministério hierárquico (bispos, presbíteros e diáconos) é
o principal responsável pela edificação da Igreja. Os outros
agentes de comunhão e participação sao os religiosos,
religiosas e leigos.
Em Campos, como em todas as dioceses, há várias formas
organizadas de apostolado leigo. Sua presença e participação
na pastoral de conjunto é necessária, tanto pela natureza da
Igreja (ministério de comunhão de diversos membros e
m in ist ér ios > ,como em vista de uma ação pastoral eficaz, pois
todos colaboram de forma coordenada»
0 laicato é chamado a participar na p« if icação, nas
decisões e, finalmente, na fase de execução do plano' de
pastoral de conjunto (Cf. Pueb1a , 807-808).
Assim sendo, sem maiores solenidades e antes das muitas e
necessárias reuniões para elaborarmos um definitivo plano de
ação, estão sendo criadas algumas Comissões Doicesanas. São
as que estão surgindo espontaneamente dentro de nossa
rea1 idade•
Nada porém, será concebido se não integrarmos em nossos
planos e programas evangel izadores a oração, tanto pessoal
como comunitária. Conto portanto. com a prece de toda a
Diocese nestas intenções.
Ao apr ox Imar-se do dia í q de maio,festa de São José e Mês de
Maria, peçamos a intercessão do chefe da Sagrada Família e
da Virgem Mãe em favor de nossa família diocesana.

6 - Parte do arti go "Demolição", publicado em 14-4-82 diz


tegu ínt c =

"Somos tradicionalistas, não sé em defesa da Tradição


católica, pois sem ela não existe Igreja, mas também por
amor a todo patrimônio artístico, cultural, histórico e tudo
de bom que o passado nos 'eguu. Lamento (...) que o
Seminário Diocesano fosse fechado sem nenhuma consideração

153
C o m o * b e n f e i t o r e s q u e o er g u e r m m e mantinham? para com
o* J n v r n u 1 e v 11 ttb q u e al I e w t u d a v a m e dedicavam ao latim*
rtn wr^yur UitOr tudo que a Constituição *Sacr o b a n c t u m
C o n e I 1 Iu m mandou (.onser vai* i sos J o v e n u» que <t\1 i faziam
•*«t Ir o a * m e d i t a n d o na o v e r d a d e » e ternas para* c o m t e m o r de
D^u»* nKü c a í r e m n o d e s c a l a b r o » d a 1 Ic e n c Io s Id a d e que Já
invadiu atií otu r e c i n t o s s a g r a d o » ; p a r a c o m o s menino» do
C a t e c i s m o p a r o q u l w l q u e wl l r e c e b i a m a f o r m a ç ã o r e l i g i o s a e
t u recreavam ao» domingo»? para com os professores que
fic ar am u c m t r a b a l h o n e m teto»
*"* que Gacerdoteiu uár l o w r cultos* z e l o s o s sejam punidos*
destituídos de seus c a r g o s ou convidados a deixarem a
dluiruw', a l g u n s J á e m idade a v a n ç a d a ? e aqui radicados h«(
wuito tempo. I? preferível nau ter sacerdotes a termos
tradldionali&tafor por que est e s n S u podem calar-se ante
t a n t a a r b i t r a r Itfdadtf •
A Catedral construída com esmola do puvo, - e m campanhas
aemor tfve i» e n c a b e ç a d a s por h o n s . J o ã o d e B a r r a s Uchoar que
nao se a c a n h a v a d e mendigar r c o m o nds o a j u d á v a m o s r s e r á o
p r ó x i m o » ] v o d o u d e m o l i dor e s * d o s m o d e r n o s i c o n o c l a s t a s que
** i n s t a l a r a m na I g r e j a para demolirem. Ê preciso que o
provo se levante por m a i s e s t e a t e n t a d o contra o nosso
patrimônio r e l i g i o s o e artístico.
0 h o n s . G i l b e r t o Schubert: d e c l a r o u q u e o r e m p l o " d e estilo
ni'íu. 1 áviii Ic o p e r f e i t o " nao exige reformas. Mas... em função
d. n u s s a l l t u r g i a r d p r e c i s o s m u t i l a r o t r o n o * t r a n s f e r i r o s
pú J p i t o s tu. 1 f o u i m o » de mármore* a mesa de comunhão* o
b*t ist tfrio r d e m o l i r u m d o s a l t a r e s l a t e r a i s . . . T e r e m o s quem
srja c a p a z d e f a z e r t a n t a s m o d i f i c a ç õ e s s e m d a n i f i c a r o que
há d c a r t íst l e o c* v a i io u o ?
D.Carlos Alberto precisa l e m b rar-se de que ele nao é o
primeiro e n e m s e r á o tiltimo b i s p o d e C a m p o s para mandar
a p a g a r a l e m b r a n ç a ciou a n t e c e s s o r e s .
A Catedral n ã o d dc n e n h u m bispo* d do provo que a e r g u e u . 0
brnimcfrito G o n ç n l o d e V a s c o n c e l o s d o o u um d o s piilpitos a n t e s
que hons. U c h o a »e ajoelhasse diante dele* implorando a
doacZo. Outros doadores ainda.vivem como este. Que sejam
ouvidos.
Sr há recursos para estas d e s t r u Iç o e s * por que nao
canalizá-los para r e s t a u r a r os vitrals d a n i f i c a d o s e p a r a a
c o n s e r v a ç ã o d o u o u t r o s p e r f e i t o s a i n d a ? Que as r e c o m e n d a ç õ e s
do V a t i c a n o II v e j a m c o n c r e t I z a d a s n o s t e m p l o s e m c o n t r u ç ã o *
t temos v á r io*. n a d i o c e s e * c o m p r e e n d e - s e * embora nao se
just if i q u e m •
Has que Igrejas cm ótimos estado de conservação sejam
d e f o r m a d a s n S o se e n t e n d e » <••*)
Guc algumas imagens sejam removidas* não estranho*
Pr inc ip a 1 m e n t e d r G a o P i o X q u e d e v e i n c o m o d a r m u i t o a quem
#*
Por e l e f o i c o n d e n a d o . ••

154

040 U W m m *•» •*
4 tmtft 4 lápsi nfit® pübliciçai
7 - Publicada na imprensa ao mesmo tempo em que come ç a v a m a vir
à tona r e c l a m a ç õ e s do Pároco de Itâlva, compõe com estas um
episódio mu i t o constr a n g e d o r . Eis o teor da carta do liltimo
exonerado s

DESPEDIDA
Meus c a r í s s i m o s paroquianos
de Bom Jesus do Itabapoana

Hoje é o t r i s t e dia de minha despedida. Por disposição de


S.Exa. Dom C a r l o s Alberto Navarro, amanha devo entregar a
Paróquia.
Aqui passei pouco mais de um ano como coadjutor de no s s o
caríssimo V igário, Mons. Francisco Apoliano, meu e vosso
mestre. Aqui passei as pr Bifei as* de meu sacerdócio,
compartilhando co n v o s c o a l egrias e tristezas, auxiliando-
vos com as b e n ç ã o do Cáu e sendo co n f o r t a d o por vossas
oraçoes. R e n d a m o s junto a Deus nossas ações de graça.
Quando, com grande estu p e f a ç ã o geral, Foi exnonarado da
Paróquia de Bom Jesus o Exmo. Mons. Francisco Apoliano,
depois de 25 anos de e s p ê n d i d u trabalhos apostólico na
Matriz e em t o d a s as capelas, como vós mesm o s podeis dar
testemunho d i a n t e de Deus Nosso Senhor 1 o Sr. Bispo *qu iz
nomear-me V i g á r i o Ecôriomo para s ubstitui-lo. Eu escrevi ao
Sr, Bispo que não podería aceitar, por me sentir incapaz de
desenvolver t r a b a l h o á altu r a do r e a l i z a d o pelo Exnia Mons.
Francisco Apoliano, e tamb é m porque minha aceitação
envolvería uma p acífica a p r o v a ç ã o ã med i d a tomada c o n t r a o
nosso v igário, u que em c o n s c i ê n c i a não poder ia aceitar.
Apesar desta m i n h a atitude, o Sr. Bispo persistiu na dua
disposição e e s p o n t a n e a m e n t e m a n d o u - m e a p rovisão cJ V i g á r i o
Ecônomo. Foi nesta c o n d i ç ã o de V i gário Ecônonio que fui
surpreendido co m a ordem de deixar a Paróquia. De maneira
que quero que m e u s p a r o q u i a n o saibam que nao fui eu que quiz
deixá-los. Eu fui removido. Nao pedi demissão. Nao preciso
dizer,meus q u e r i d o s paroquianos, o grande pesar que s i n t o e m
deixar e s s e v o s s o tão e d i f i c a n t e convívio. Não obsta n t e , o
que mais me pesa ó o temor de que algum dia possa esta
paróquia t r a n f o r m a r - s e em um b a s t i ã o da Igr e j a p r o g r e s s i s t a .
Não faço a m e u s c a r o s p a r o q u i a n o s a injdria de por em d d v i d a
a sua fidelidade ã Igreja de No s s o Senhor, mas queria
preveni-los de que a ação diu t u r n a e persistente do
progressiswo n ão deixa de por cm perigo as m ais tenazes
r e s i s t ê n c i a s •P e s a - m e a v isão que a p r e s e n t a m m u i t a s p a r ó q u i a s
dominadas p elo p r o g r e s s i s m o : a 1 tares profanados, diminuição
do f e r v o r , v e s t e s indecentes nas igrejas, arrefecí m e n t o da
Fé* eis o t r ist e saldo do progressismo n os lugares
onde penet r o u .
Cferfssimos paroquianos, minha dlt ima p a l a v r a s erá a da
Sagrada E s c r i t u r a s perman e c e r e i firme na F«5. D e u s não nos
abandonará. As h e r e s i a s e n o v i d a d e s passarão. As p o r t a s do
inferno n a o p r e v a l e c e r ã o .
Que o S a g r a d o C o r a ç ã o de J e s u s e o Coração Imaculado de
Maria, a q u e m e s t a p a r ó q u i a foi c o n s a g r a d a , n os g u a r d e na

155
fidelidade à Igreja de sempre*
Amém •
Bom Jesus do I t a b a p o a n a r 10 de junho de 1982
Festa de C o r p u s Christi

g ~ <mm m)
Embora nos a c u s e m do contrário (somos chamados de f a n á t i c o s
Intolerantes, v i o l e n t o s ) r sempre agimos de acordo com
princfpios e x i g i d o s pela dignidade humana e r mesmo quando
vítimas de cal dn ias e arb it r ar ie d a d e s , jamais revidamos com
insultos ou violências. Apesar de certa publicidade
difamatória e malévola, nosso modo de proceder desmente
qualquer d e s t a s acusações.
Na questão s u s c i t a d a em Campos, fomós os primeiros a propor
o d i álogo e no s empenhamos em conduzir o caso num nível
elevado de d e b a t e doutrinário, em qúe c\ argumentos se opõem
argumentos, de m a n e i r a a chegai* *se a uma concórdia na posse
da verdade demons t r a d a . Neste sentido, atendemos a sugestão
do Exrno Sr. B i s p o Diocesano, encaminhamos à Santa Sé m o t i v o s
doutrinários que fundamente nossa posição. Aliás, e ssa
lealdade co m os superiores hieráquicos sempre foi nossa
forma de p r o c e d imento.
Tínhamos o d i r e i t o de esperar, da parte de nossos opositore,
um t r a t a m e n t o análogo. Nao obtivemos essa lealdade. Somos
vítimas de uma injusta campanha de desprestígio de
desmoralização. A pretexto de nada, cria-se um tumulto
publicitário que impede a solução normal da essência do
problemas a q u e 1,t ao doutrinária.,
(...)
Hoje há c e r t a s itudes, gestos e ensinamentos da H i e r a r q u i a
que não po d e m .r aceitos, pois promovem uma 'renovação',
que não e stá em iinha de continuidade com a Tradição, com os
ensinamentos tradicionais do Supremo Magistério, mas
constituem um ro m p i m e n t o com eles está nesse caso o "Ordo
M is s a e " .
(...)
Mais do que a quantidade, a qualidade da vida religiosa
decaiu, f a l t a de convocação profunda na fé, permissividade
M o r a 1, naturalismo, falta de piedade sólida, incoerência c o m
as pr á t i c a s da Religião, geral mente superficial, e a vida.
(...)
Que fique b e m c l a r o a todos, que não estamos pedindo nenhum
privilégio que acomode nossa situação pessoal.
Absolutamente, não pedímos isso, mas queremos que se
conheça e s o l u c i o n e uma questão que angustia não s o m e n t e a
nós mas *a m i l h a r e s de nossos fiéis, podendo dizer, a m a i o r i a
de noss o s f i é i s que n ã o . r econhecem aquilo que se passe em
muitas paróquias e dioceses 'renovadas' o que estavam
acostumados a ver na Igreja Católica.
Não r e s p o n d e r a isso é fugir ã seriedade do debate ou do
diálogo, é fugir da verdade, é temê-la. Oualqer medida que
viesse c o n t r a n ó s r e s p o n d e n d o a esses questões, seria c o n t r a
toda a m a n e i r a t r a d i c i o n a l de agir na Igreja".

156
9 - Tendo em vistas i~ "quanto consta na carta r.l«* Bagrada
Congregarão para os bispos a Nôs d irígida pelo Lhmu.Sr Cardea* •
Prefeito. D . S e b a s t i ã o Bayglo; 2 Que a Santa S(í já respondeu
diretamente no mesmo mentido e amplamente aos gue a ela
recorreram? 3- as normas gerais da Igreja com especi a 1 menção
dos Cânones 1 3 r17,22,24,79,00*1257 c 2195 com seus respectivos
pará gr af o s , do C ó d i g o do Direito Canônico? 4~ Depois de madura
reflexão sobre o C â n . 2214112 que á t ran»c ri rao literal do
Cone í1 io Tr ident ino» sess.XIXI, cap •X? bavemos euc bem baitfac u
seguinte

DECRETO

1- A t o d o s e a cada um dos sacerdotes incardinados ou .com


uso de o r d e n s nesta Diocese de Campos se preceítuas
a) resp o n d e r - n o s , por escritor ind iv idual ment e , ató 25 de
setembro, se acata, como esperamos, a decisão do Santo
Padre;
b) A partir do dia 25 de outubro cie 1982, o uso EXCLUSIVO
dos Livros Litiirgicos «xprovados pela Santa Só Apostólica, em
vigor na Igreja .Latina, Baafenyda-se especial menção da
const it u ç a o Apostó l i c a do Santo Padre Paulo VI de 3 de abril
de 1969, que promulga o M issa 1 Romano restaurado, com a
cláusula: "Tudo o que aqui estabelecemos e ordenamos,
queremos que seja válido e eficaz agora e no futuro, nao
obstante qualquer coisa em contrário nas Constituições e
Ordenações A p o s tólicas de Nossos Predecessores e outros
estatutos, e m b o r a dignos de menção e derrogação especiais";
2- Se algum presbítero ousar desobedecer a quanto se
prescreve n e s t e Decreto, o que esperamos nao aconteça, fica
desde já canon icamente advertido de que seremos obrigados a
dar c u m p r i m e n t o aos Sagrados Cânones, com especial menção
dos cc 2331111 e 2 e ou 2337111 e 2, dentro das normas do
direito em vigor.
Este decreto entra en vigor a partir da data de sua
comunicação ao Clero, inclusive para aeueles que já se
recusaram a recebê-lo, do que o Revma Chanceler fará fó
pób 1 ic a •
Dado e p a s s a d o nesta Episcopal cidade de Campos, sob nosso
selo e armas, no dia 25 de agosto dc 1982, memória de São
Luiz de F r a nça.
(Seguem-se as a s s i naturas do Dispo e do Chanceler da Cdr ia).

^ -Nossos paroquianos e Intímeros fióis olham para nós com


anciosa e x p e c t a t i v a . Que resposta damos à intimação feita
pelo Sr; B i s p o D i o c e s a n o atravós do Decreto de 25 de agosto?
Aceitamos ou n a o o novo "Ordo M issae"?
Neste momento crucial, em que se suspeita da ortodoxia de
nossa fé e se põe em diívida nosso acatamento à autoridade
sagrada do Papa; em que somos ameaçados de demissão de
nossos cargos r de outras severas penas, mais do que em
nenhum outro m o m e n t o de nossa vida, não poderiamos omitir
uaa palavra de esclarecimento para aqueles que sempre
confiaram em nòs*

157
Nosso s i l ê n c i o c a u s a r i a grave* escândalos aos d im n 1 ce
dos quais t e m o s o dever de dissipar qualquer ddvida sobre a
coerência de n o s s o procedimento com a fé cattíbVca. Cf pois,
diante de. D e u s Ju iz Supremo que um dia vai julgar a todo*
nós, que ■Pagemos esta dec 1ar ação - Temos presentes as
consequências que nos possam advir da parte dos h o m e n s r mas
teremos m u i t o m a i s as que nos adviríam da parte de Deus»
i- Somos s a c e r d o t e s catélicos apostdl icos romanos filhos da
Santa Igreja que ama m o s com todas as veras de nossa alma e
eiw cujo seio q u e r e m o s viver e morrer, como esperamos pela
graça de Deus.
Renovamos, pois, nossa profissão de fé, já conhecida de
nossos fiéis. Mais particularmente, declaramos que damos
plena e a m o r o s a a d e s ã o e obediência ao Santo Padre, o papa,
Vigário de J e s u s Cr isto*na terra, Chefe Risível da Igreja.
Aceitamos t odos os direitos e. atr ibu iç.8es, honras e
privilégios que ao Romano Pontífice conferem a*Tradição e o
Direito Canônico, dentro dos limites especificados no
Concilio V a t i c a n o I, ao definir o dogma da Infalibilidade
Pontifícia. R e c o n h e c e m o s o primado e o magistério do Papa
sobre a Igreja Universal, Pastores e fiéis. Baseados, no
entanto, na Tradição, não temos diividas em afirmar que, uma
medida que ponha em risco a pureza e a integridade da Fé não
deve ser aceita, seja ela qual for o Superior que a ordene.
E esta d o u t r i n a da Igreja que nos leva ã, em consciência,
não poder aceitar e por em prática a nova ordenação da Santa
Missa instaurada em 1969.
Toda obediência, na Igreja, está condicionada ã fidelidade ã
Fé. Ora n e s s a nova ordenação do Santo Sacrifício do Altar,
extenuam-se e obscurecem-se os dogmas eucarísticoss da
Presença real e substancial de Jesus Cristo na Hdstia
Consagrada? da Transubstanciação? da Missa como verdadeiro
sacrifício p r o p i c i a t ó r io; do sacerdécio hierárquio
especificamente distinto do sacerddcio comum dos fiéis. E . o
no 7 da "Inst it ut io" que precede e explica o novo Missal
reformado, chega a afirmar, contrariamente ao ensino do
Concilio de Tren t o e de acordo com a doutrina luterana, que
a ação sacrifical é de toda a assembléia, e não
exclusivamente do sacerdote hierárquico.
Santo Tomás de Aqui no "(...) havendo perigo prdximo para a
Fé, os prelados devem ser arguidos, até mesmo publicann.nte
pelos sdditos. Assim, Sao Paulo, que era siidito de São
Pedro, arguiu publ icamente em razão de um perigo iminente tle
escândalo em m a t é r i a de Fé". (Summa T e o l o .I I - I I ,33,4,2.)•
São Roberto B e l a r m i n o "(•••) Assim é licito resistir ao
Pontífice que a g r i d e o corpo, assim também é lícito resistir
ao que agride as almas, ou que perturba a ordem civil, ou,
sobretudo, aqu e l e que tentasse destruir a Igreja. Digo que é
lícito r e s i s t i r - l h e não fazendo o que ordena e impedindo a
execução de sua vontade..." (De Rom.Pont • ,L ib •II «c .29) •

158

1
2- Nossa rRCUttü ^ mot i v a r i a , portanto* ju^tam ^nt^ pt f l f t
obediência a o s e n s i n a m e n t o s p e r e n e s cia S a n t a I g r e j a .
Será JustOr s e , ao nos dirigirmos aos nossos superíores *
u&amos as m e s m a s palavra! de São Bruno de Segui ao Papa
Pascoa1 II- "Eu * os est iino como a meu pai e' senhor <---)
Devo amar— vos? por i-m devo amar mais Aquele que criou a vós e
a mim - ?
Esta a t i t u d e n ã o é p e r f e it a m e n t e c o e r e n t e c o m o ensinamento
de S a o Pedros "Importa obedecer antes a Deus que aos
homens?" <At o s , 5 , 2 9 ) .
A r e s i s t ê n c i a é u m a f o r m a h e r ó i c a de o b e d i ê n c i a - Repetimos
com Sao B e r n a r d o ! " A q u e l e q u e f a z u m mal p o r q u e m a n d a m , faz
menos u m a t o d e o b e d i ê n c i a d o que d e r e b e l d ia". ( C a r t a 2 3 r e m
"Cartas D i v e r s a s " ) .
3- N o s s a p o s i ç ã o , por o u t r o lado, se a j u s t a ao propósito
explícito do Concilio Vaticano IIr quando declara, na
Const it u iç a o sobr e a Sagr a d a L 1 1 ur g ia (Pr o ê m io nu A ) , que -
"Obedecendo fielmente ã Tradição, a Santa Mãe Igreja
considera t o d o s os ritos legitimamente reconhecidos com
igual d i r e i t o e h o n r a e, p a r a o f u t u r o , o s q u e r "defender"
e r de t o d o s o s m o d o s , " f a v o r e c e r " (Gr if o s n o s s o s ) .
Afirmamos o u t r o s s i m , q ue n o s s a a t i t u d e ó patrocinada pelo
mesmo C o n e Tl io V a t ic a n o II ao e s t a b e l e c e r que, em m a t á r i*a
religiosa, n i n g u é m p o d e ser i m p e d i d o de a g i r , s e g u n d o a sua
consciência, em p r i v a d o o u em p d b l i c o , s ó ou associado a
outrosr d e s d e q u e se r e s p e i t e m os d i r e i t o s a l h e i o s , s e g u n d o
a justiça e a b e n e v o l ê n c i a -<D e c 1. sobre a Liberdade
religiosa n a 2 e 7).
Conclui m o s d i r i g i n d o u m a s d p l i c a f ilial e c o n f i a n t e c* V i r g e m
Santíssima, M ã e d o S u m o S a c e r d o t e e n o s s a Mãe, p a r a q u e nos
obtenha d o s e u D i v i n o F i l h o a g r a ç a de p e r m a n e c e r m o s fiéis
até a m o r t e , & M i s s a C a t ó l i c a .
SUB TUUM P R A E S I D I U M C O N F U G I M U S , S A N C T A DEI G E N I T R I X
(DEBAIXO DA V O S S A P R O T E Ç Ã O NOS REFUGIAMOS, Ò S A NTA MAE DE
DEUS)
Campos, 2 6 d e s e t e m b r o d e 1 9 8 2 ( segue a a s s i n a t u r a ) .

U- L a m e n t a v e l m e n t e , vinte e cinco sacerdotes que trabalham


nesta D i o c e s e d e C a m p o s d istr ibuiram, o n t e m , m a i s u m a b a i x o -
assinado dirigido aos fiéis das paróquias que não lhes
pertencem, masque lhes foram confiadas pelo Bispo- O
documento foi reproduzido na imprensa, ao e x p i r a — se o
primeiro p r a z o q u e r e c e b e r a m .
Dizem eles q ue várias pessoas os olham com ansiosa
expectat Iva para saber se a c e i t a m ou não o novo "Ordo
Missae". Cont i n u a m just i f i c a n d o se e a f i r m a m que h á pessoas
que s u s p e i t a m d a o r t o d o x i a de súa fé e p o e m em dóvida seu
acatamento à a u t o r i d a d e s a g r a d a do Papa. D e s e j a m , p o i s , dar
uma palavra de "esclarecimento" e procuram evitar grave
escândalo d o s f i é i s , c a s o g u a r d a s s e m s i l ê n c i o .
Proclamam-se "romanos" e reconhecem o primadado e o
magistério d o P a p a a o qual d e c l a r a m " p l e n a e a m o r o s a adesão
e obed iênc Ia • A p ó s e s t a s e o u t r a s b e l a s a f i r m a ç õ e s , c o n c l u e m
"nao poder a c e it ar e por e m p r á t i c a a nova ordenação da

159
Santa ^Missa, instaurada ew 1969. Lembramos que uta
ordenarão foi promulgada por um Papas Paulo VI. Resuin 1 0002 o
Papa tem poder, dfve-st amá-lo e obedecer — 1h e , Las eles, "em
consciência", não se submetem ás suas ordenações»
E por que? - perguntará alguém? Explicam eles que o Pap«
Paulo VI errou gravemente, contrariou o Concilio de Trento,
defendeu doutrina luterana, obscureceu vários dogmas
eucar ist icos. E depois dele, cont.nuam a incidir* no mesmo
fatal engano João Paulo I e João P«‘ ia II1 Observe-se, de
passagem, que o nome de João Paulo I I não aparece nem uma
vez no documento- Qual seria a razão? ... As assertivas são
gravíssimas. Mesmo tendo o atual Papa reafirmado sua
orientação para a Diocese de Campos, eles continuam a
responde com uma"recusa".
E depois perguntam se é justo alguém appntá-los como
"rebeldes, desobedientes e cismáticos". - -
0 pior é apelarem para alguns trechos isolados e mal
entendidos do Concilio Vaticano II para alicerçarem sua
"recusa" em o b e d e c e r .
Realmente, como me escrevia desde março o Cardeal Baggios
"... é com profunda pena e preocupação que o Papa toma
conhecimento de uma situação tanto mais grave quanto criada
por sacerdotes.. Mais grave ainda porque provoca escândalo
dos fiéis no âmbito da Diocese e muito além deste.
A verdade se inipoe por ela mesma. Não carece de farta
impressão e distribuição de folhetos nem de manifestações de
pessoas em praça piíblica, nem de passeatas e pseudo—
procissões. Tudo isso é subversão da ordem, desrespeito á
Autoridade religiosa. El grave por confundir ainda mais as
mentes, já que se cobre de cantos e orações piedosas. 0 que
deveria ser expressão de fé é int r ument al izado para, em seu
bojo, levar uma mensagem de condenação ao Papa, á Igreja e
ao Bispo Diocesano.
Apesar de ter sido recebido, desde os primeiros dias, de
forma agressiva e destituída de fé, tenho procurado dialogar
até agora. Mesmo sofrendo, como a maior parte dos católicos
da Diocese, cont inuo a levar a todos uma palavra de
conforto, de perdão e de amor, por intercessão de Maria e de
São José."

A questão girava em torno da interpretação de um presbítero


de Alexandria, Ari o, que afirmava possuir Jesus apenas uma
divindade secundária e subordinada. Contra a idéia
arianista, segundo a qual o Cristo era uma criatura do Pai,
superior aos homens mas tão criatura quanto eles, levanta-
se um grupo que, no Concilio de Nicéia (325) define a
consubst anc ia 1 idade entre o Pai e o Filho, idéia que só será
definitívamcnte formulada depois do Concilio de Calcedônia
(451). 0 concilio de Nicéia, convocado pelo próprio
Constantino, terminou definindo a crença "no Filho de Deus
gerado pelo Pai, incriado, consubstanciai ao Pai e que se
fez carne para a salvação dos homens". Mas, como considera
Píerrard (1982543)5 "Nicéia não trouxe a pazs divididos á
propósito da palavra coDSubiitaucjLiàlr os bispos hesitavam

160
entre diversas férmulas. A fé nicena encontra seu arauto na
pessoa do Jovem bispo de Alexandria, Atanásio, que
Constantino - .depois de transformado em partidário de Ar io -
fez exilar em Tréveros"

-Segundo P i e r r a r d , o elemento essencial da obra de Bento é


sua regra- "Um regra vivida, feita de experiência p
intuição, u ma ob r a - p r i m a de discrição e equilíbrio: um molde
suave, do qual sai ram centenas de milhares de monges, vinte
e tres papas, ci n c o mil bispos. Em sua base está a bQQ£âtââ
CüMduaúr a a n t i g a probidade, qua transcende a humildade e a
obediência e vangélicas- Desse texto emana tal serenidade que
se chega a ter dificuldade em acreditar que foi elaborada
numa ép o c a tão movimentada: a reconquista da Itália por
Bizâncio e as invasões lombardas" (Pierrard, Í98ó:58).

4- Os demais c o n c f l i o s do Oriente, que cobrirão p restante do


íq milênio, preocupavam-se com a verdade da fés
Const ant inopl a I (em 381, pelo Papa Dâmaso I>, onde se
estabelece a divindade do Espfrito Santo; Efeso (431, com
Celestino I) discutindo a natureza de Jesus e reconhecendo a
identidade de Maria enquanto Mãe dt Deus- 0 que estava em
jogo aqui era a natureza de Jesus: Nestdrio, 0 Patriarca de
Const ant inopl a , e a escola de Antidquia, defendiam a tese da
dupla natureza, oposição à escola de Alexandria que afirmava
a natureza dnica (divina) de Jesus- 0 concilio decide pela
unidade de pessoa em Jesus e pela maternidade divina de
haria. Mas sd no 4 q concilio, o de Calcedonia (em 451, sendo
Papa Leão I) é que a heresia monofisita será definitivamente
condenada (P i e r r a r d , o p . c i t : 6 Í ). Este concilio tratou também
do nestori an is m o , perspectiva defendida pelos tedlogos da
escola de Antidquia, fortemente marcados pela tradiação
judáica- De acordo com aquela vertente do cr ist ian.i smo, a
transcendência de Deus e sua respectiva incorruptibi1 idade,
geram a v i s ã o de que o Filho de Deus e o Homem Jesus seriam
duas r e a l i d a d e s plenas, inconfundíveis, com uma união apenas
moral- A f o r m u l a ç ã o acabada da doutrina se dá com Nestdrio,
Patriarca de Const ant inopl a , que'defendia Maria como mãe de
Cristo <Cr ist ot dk o s ) mas não Mãe de Deus (Theotdkos). No
concilio de Efeso o nestorianismo é condenado, sendo a
expressão Mae de Deus aprovada como plenamente ortodoxa- Mas
a nova formulação não logrou se impor completamente,
persistindo o nestorianismo na Igreja da Pérsia e da Caldéia-
A separ a ç ã o formal, neste caso, não foi com Roma, mas
com Bizâncio, sendo possível que o malentendido repousasse
na compreensão insuficiente da terminologia grega quanto a
noção de pessoa, natureza e substância- Fatores culturais
cristalizavam as igrejas em oposição, em seu isolamento da
corrente principal do cristianismo, composta pelas porções
latina e grega- E mesmo entre estas, a unidade não estava
garantida: pequenos conflito não-resolvidos estarão gestando
a crise que irá eclodir no século IX.
Outro cisma ainda ocorre por conta do nestorIanismo-
Para combater a divisão que ele introduzia na pessoa de

161
Cristo» » c o r r e n t e m o n o f i s i t a acentuava a unidade dele ao
ponto d e n e g a r a rei idade plena* do D e u s - H o m e m . A natureza
humana de C r i s t o era absorvida e desaparecia na natureza
d i v i n a . Es.ta p e r s p e c t i v a t a m b é m foi c o n d e n a d a pelo Cone f1 io
de C a l c e d ô n i a .

No bojo das tensões g e r a d a s na sociedade feudal e no


relacionamento R o m a / C o n s t ant inopla» o d i á l o g o e n t r e estes
d ois grandes centros cristãos era f reqííent ement e
interrompido pelas diferenças culturais» principalmente
expressas na 1 íngua. As s i m diz P e r r a r d <1982>2"0
restabelecimento d o I m p é r i o roma n o em favor de um bár b a r o »
no ano de 800» h a v i a sido recebido com reticências por
B iz â n c io • < . . . ) O C c e d Q de N i c é i a - C o n s t a n t i n o p l a » de 381»
dizia: 'Creio no E s p frito Santo» que procede ao Pai
(Credo... in Spiritum S a n c t u m qui ex Padre procedit)'?
portanto» a o r i g e m eterna do E s p f r i t o Sa n t o era r e l a c i o n a d a
e x p l i c i t a m e n t e a p e n a s c om o Pai. Ora» desde o fim do século
VI» a I g r e j a d a E s p a n h a e depos a Igreja fran c a v u l g a r i z a r a m
a fórmula 'que p r o c e d e do Pai e do Filho' ( - - •Eiliogiifí
ficocedlt> - C a r l o s M a g n o e n t u s i a s m a - s e com essa adição» que
tinha a vantagem de pegar os gregos qm falta» pois eles se
haviam escal izado por o u v i r e m cantar e s s e EiliQílLie pp l o s
latinos de Jerusalém. 0 imperador mobiliza então seus
t e ó l o g o s . M a s R o m a r e s i s t e às in junções imperiais e» em 810»
a questão foi e n c e r r a d a » f i c a n d o assim durante sessenta
a n o s " (Pi e r r a r d» o p . c*i t :86) .
A d i s p u t a c e n t r a d a em torno da forma latina do Credo»
que i n c l u í a o " F i l i o q u e procedit"» contra a fórmula grega
que se l i a " C r e i o no Es p frito Santos que procede do Pai"»
c o n t i n h a e m b u t i d a p r o b l e m a s outr o s de ordem polftica (Carlos
Magno enfrentando os gregos» por exemplo» a p r essão do
islamismo e tantas out r a s ) . A indicação de Fócio para
substituir o P a t r i a r c a Iná c i o encontrou a resistência do
Papa N i c o l a u I ( 8 5 8 — 8ó7> e a solução final foi a separação
das I g r e j a s n o c h a m a d o C i s m a Grego. As t e n s õ e s progr i d e m at é
1054 q u a n d o s e c o n s u m a a questão.
No s é c u l o IX n o v a c r i s e se configura em Cocnst an t inopl a »
com o e n f r e n t a m e n t o de duas tendências: uma reformista e
ou t ra ^c on t e m por iza d or a em r e l u ç a o ao poder imperial. A
situaçao» a g r a v a d a por um c o n f l i t o de j u r i s d i ç õ e s ( a lgumas
regiões vacilavam entre a sujeição à Roma ou à
C onstant í n o p l a ) , d u r a n t e o império de F ó c i o faz surgir uma
opos iç a o a algumas pr á t i c a s ocidentais: o pão ázimo» o
celibato dos clérigos» o jejum dos sábados» o uso dos
l a t i c f n i o s du r a n t e a q u a r e s m a e pr inc ipa 1ment e » a pretensão
romana ao primado de jurisdição. A crise» que ficou
conhecida como a do " F i l i o q u e " foi acirrada ainda pela
fundaçao do Sacro I m p é r i o R o m a n o - G e r m â n ic o » em 962. Ao
c é s a r o - p a p is m o bizantino os latinos pro p o o e m o ideal de
concórdia entre dois poderes iguais ou» inclusive» com
p r e d o m i n â n c ia t e ó r i c a do e s p iritual.
16- S e a Lex Sal ica fo rm aliza e dependência d* Igr e j a a o ví
t m p e r a d o r e s , a pai* t í i' d a c o n v e r s ã o clt C l u v i 5, (§* e 1 f r < * n c o , 0
prim eiro soberano barbar u católico 481 ' 5 1 1 ) r a c h a 111ci d a
Questão das Investiduras» q u e s e p r o l o n g a por d o l S séculos
(X e X I ) m a r c a um p o n t o eiu q u e p a l t a r m o s t r aa sua força
f r e n t e a o t r o n o . < P i e r r a r d »1986) .

i 7- 0 Cone f 1 i o d e L a t r ã o I <em 1 1 2 3 / c o m o Papa C alixto II)


est abei ece a condenação da sintonia» confirm ando a
Cone o r d a t a d e Worms. F i c a v a a ss im c o n s a g r a d a a r e n d n c ia do
imperador quanto ã in v e stid u ra pela béculo e pelo anel »
con qui s t a alcançada via a teoria do canonista Yves de
Chart r e s » que d i s t i n gui a invest idura e s p 1r i t u a i de
i n v e s t »d u r a t em pora1, Al^m disso» o poder tem poral
c o m p r o m e t i a —s e « respeitar 1iberdade das eleiçõ es
p o n tifíc ia s e episcopais» g u a r d a n d o p o r em do d ireito de
exercer sua a u to r id a d e propriam ente feudal sobre o b ispo
e le ito ( P i e r r a r d f 1 9 8 2 S9 4 ) .
O Cone f 1 io d e L a t r ã o IT (em 1139» com Inocêncio II)
contribui p a r a o f o r t a l e c i m e n t o da c e n t r a l i z a ç ã o p o n t i f f e i a »
e o de L a trã o III <1 1 7 9 » c o m A l e x a n d r e II) estabelece a
r e g u l a m e n t a ç ã o da e l e i ç ã o papal» quando s e consegue que o
C o l é g i o d o s C a r d e a i s d e t e n h a 2/3 d o s v o t o s » o q u e sig n ifica
dim inuir a i n f l u ê n c i a do poder s e c u l a r s o b r e a v i d a e os
negócios d o c l e r o - L a t r ã o I V <em 1 2 1 5 » c o m Inocênc io III)
e s t a b e l e c e a o b r i g a ç ã o d a c o m u n h ã o p a s c o a l » bem c o m o l e g i s l a
sobre o c a sa m e n to , enquanto ato sagrado-

18- C o m p r e e n d e —s e por Reforma G reg o ria n a as medidas que foram


sendo a d o t a d a s d e s d e L e ã o I X < 1049-1054 > e q u e c u l m i n a m com
G regórío V II ( 1 0 7 3 —1 0 8 5 ) d a s q u a i s r e s u l t a r a m o crescim ento
da au toridade e da dominação papal, bem como no
desen volvim ento d o s e s t u d o s canôn c o s e , consequentem ente.
d e m o d o s d e p e n s a m e n t o J u r í d i c o em m a t é r i a d e e c 1e s i o l o g i a •
Se a época a s s is te a m issão sobre os Eslavos e o
dei ineairiento m ais preciso d e uma Europa cr is t a , não é
possível e s q u e c e r o q u ã o c o n f l i t u o s o f o i o p r o c e s s o , com o
p róprio G re g ó río VII m o r r e n d o n o e x í l i o d e S a l e r n o em 1 0 8 5 .
V i v e —s e a q u e s t ã o d a s I n v e s t i d u r a s e o s s é r i o s desencontros
entre trono e a lta r que, por m dltiplas determ inações
e x p l o d i r ã o n o C is m a O c i d e n t a l , m ais de d o i s s é c u l o s d e p o i s -

A nu lidad e Ju ríd ica da excomunhão do patriarca de


C onstantinopla, M iguel C erulério, r e s i d e no fato de o
l e g a d o p a p a l » C a r d e a l H um berto, t e r s e p r e c i p i t a d o no a t o d e
depositar no a lt a r d a S a n t a S o f i a , - n o m o m e n t o d e um serviço
s o l e n e » a e x c o m u n h ã o do p a t r i a r c a - Nulo p o rq u e o papa que o
designara para i n t e r m e d i a r ac sempre t e n s a s r e l a ç õ e s entre
Ro ma e C o n s t a n t i n o p l a » J «/ f a l e c e r a t r e s m e s e s antes e
gesto su c i t ou a sim patia de toda a B i zân c i o para
patr ia r c a r e a v iv a n d o a a n tig a posição anti-rom ana.

163
2®- Desenvol vendo-se pr inc ipalmente nos primeiros séculos
cr it sos r a gnose tem como fundamento u dualismo. Pela ética
da igreja nascente, a gnose representa um perigo porque
corrompe a idéia judaica da transcedencia divina.
Pretendendo um conhecimento direto, intuitivo, total e
beat if icante, seus "iniciados" opõem o caráter
essenc ial ment e mau das operações da matéria e da carne, ao
esp frito puro. Pautando-se em evangelhos apécrifos e outros
ensinamento nuster iores da ant iguidade, "A maior parte
recusa—se a crer na encarnação e na morte de Cristo? cm seu
espfrito, os sacramentos cristãos diferem dos mistérios
pagãos e das iniciações ocultas. Suas posições morais são
extremas! um **.%•;et ismo inumano e ou amoral ismo total. Já que
aqueles que pu .uem a gnose salvadora estão colocados acima
das leis mor ^ instituídas pelo demiurgo, o criador- du
mundo visfve* < que por sua ve;£ opõe—se a um deus
desconhecido que é luz e bondade".- Nos primeiros séculos do
cristianismo proliferaram confrarias gndsticas. (Pi errard,
op.c it .?33>

21- Para os Donatistas, assim chamadas em função de um de seus


expoentes, o bispo Donato, a Igreja é uma sociedade de
pessoas s a n t a s e portanto, a ver de ira .1 gr e ja é aquela que
guarda a s a n t i d a d e de seus membros, excluindo todo aquele
que caia em pecado mortal. Combatidos pelo bispo de
Hipona, d e p o i s StQ Agostinho, os Donatista irão desaparecer
sob os bárbaros, no século VII. 0 Caráter exclusivista do
grupo, e n f a t i s a n d o a eliminação dos pecadores, vai aparecer
em o u tros movi m e n t o s posteriores, como o Novat ismo e o
Mont an i s m o .

22- Cátaros, Alb igenses, Valdenses são, de certa forma, uma


cont i n u i d a d e dos movimentos orientais isol acionistas em
relação à igreja oficial. Para os Cátaros (do grego
Káthar os=pur o ) , o mundo era uma criação de L*ic if er ,
irreroediavelmen te perdido. Os "puros" deveríam portanto
a fastar-se do mundo, dedicando-se a uma vida de castidade
perfeita. Tal idéia rejeita o mistério central da religião,
que é a e n c a r n a ç ã o e a redenção proclamada pelo Cristo- Os
Cátaros ainda tentavam restaurar o ideal da pobreza de
Cristo e d os apéstolos, confrontado-se não sd com as
a u t o r i d a d e s e c l e s i á s t i c a s como com as civis, que viam neles
uma am^dça a ordem estabelecida. 0 centro mais vital do
catar ismo foi a cidade de Tuulouse, no sul da França, e, por
se localizarem também na cidade de Albi, são chamados
igualmente de albigenses. A primeira condenação dos Cá t a r o s
aparece no concMío de Verona, em 1184. F racassada as
t e ntativas de conversão por meio dos cistercenses e
dominicanos, o papa Inocèncio III (1198-1216) decidiu
guerreá-los, e x t e r m i n a n d o - o s numa cruzada dirigida por S i m a o
de M o n t f o r t , n u m a guerra que se estendeu entre 1209 e 1229.
Cátaros e A l b i g e n s e s foram solenemente c ondenados no IVq
Coneflio de Latrao (1215). Semelhante a este m ovimento,
«urgiu em Lyon, na França, no século XII, o grupo dos
Valdenses <seguidortíü de PecBo VaIdfes) que abrav. ^am um
ideal de pobreza, Presavaiw a reforma dJ lareja, num discurso
permeado de intenso biblismu. Sem se enquadrar na disciplina
eclesiást icar os valdenses rejeitavam a idéia de purgatório,
as missas' pelos defuntos e a confissão com sacerdotes df:
vida desr t irada. Perseguidos como os cátaros mas não
exterminada r efug iaram-se na Itália setentr ional ,un indo-se
pôster iormente a grupos reformados* Sobrevivem, inclusive no
Brasil , agregados Igreja Batista (Cf. Hortal, s/d) -

23- Além dos conc Í1 ios, entre 1084 e 1256 surgem novas famílias
religiosas importantes^ os Cartuxos (1084), os Ciscertenses
(1098) , os Pr emonst rat enses (1120)., Os Carmelitas (1156) r os
Franciscanos (1209), os Dominicanos (1229) , os Heremi tas de
St q Agost inho, como união de vár ios ramos agost in ianos *

24- Esta é também a época das Cruzadas, com tres grandes ordens
militares vivendo o sonho da conquista de Jerusaléms
Templários (1119), Joanitas ou os Cavaleiros de Malta (1137)
e Teutòn icos (1190). Destinadas ao fracasso, com quer
Pierrard <Op.c it * -107) foi no entanto este espírito de
^cruzada'7 que devolveu o cristianismo á penfnsula Ibérica* Eí
instituída também a festa de Cor pus Christi e começam a
surgir os grandes marcos da Cistandade - as Catedrais e as
Un ivers id a d e s .

25- 0 cisma do Ocidente é marcado pelo chamado "cativeiro


babi1ò n i c o " , fase em què atua o papado de Avignon, no século
XIV* 0 cenário é a corrupção e a decadência de um papado
exilado e pode ser assim resumidos com a morte de Bonifácio
III os cardeais, franceses e italianos, elegem Clemente V
para sucede-lo. 0 rei Felipe IV pressiona Clemente V, um
francês, a mudar-se para Avignon em 1309, permanecendo al i
até 1377, A sêde de independenc ia frente ã dominação
francesa vinha no bojo da necessidade de proteção das
posições italianas. Os romanos ameaçaram eleger outro papa
caso Gregdrio XI (1370-1378) não. voltasse para Roma. Em
janeiro de 1377 ele chi ga a Roma. Com sua morte em 1378, os
cardeia e legeram o ita: iano Urbano VI (1378-1389), porque a
maioria dos cardeais, franceses, se submeteu ã pressão
popular. Urbano VI iniciou imediatamente reformas na Ctir ia
Romana, eliminando a influência francesa. Os cardeais
franceses então elegem outro papa, Clemente VII (1378-1394)
que segue para Avignon. Começa, verdadeiramente, neste
ponto, o cisma do Ocidente. A segunda eleição não seria tão
importante se os dois papas tivessem sido eleitos por
grupos de c a r d e a i s diferentes, e não tivesse contado com o
apoio de várias constelações de interesses nacionais. A
linha roma n a do cisma foi contida na seguinte sucessãos
Bonifácio IV (1389-1404), Inocência VII (1404-1406) e
Gregdrio XII (1406-1415). A linha dc Avignon manteve-se por
Bento XIII (1394-1423). A inconsistência da situação levou
os c ardeais à convocação de um concflio em 1409, em Pisa
que, c o m p o s t o por bispos, cardeais, abades, chefes de ordens

165
r e l i g i o s a s e r e p r e s e n t a n t e s legislativos populares elegeram
um novo p a p a » A l e x a n d r e 9 ( 1 4 0 9 — 1.4.10)» s u c e d i d o por João
XXIII < 1 4 1 0 — 1 4 1 5 ) » n o lugar dos papas de R o m a e de Avignon?
ambos depostos. 0 r e c e n t e m e n t e e l e i t o imperador do Sacro
I m p é r i o R o m a n o r S i g i s m u n d o (1410-1437) e o papa A l e x a n d r e 9
c o n v o c a r a m n o v o c o n c i l i o » em C o n s t a n ç a (1414). Neste» c o m a
v o t a ç ã o d e t e r m i n a d a por n a ç õ e s » d e c l a r o u — se o representante
da I g r e j a C a t ó l i c a R o m a n a » t e n d o sua a u t o r i d a d e diretamente
d e f i n i d a p o r C r i s t o . J o a o XXIII e Bento XIII f o r a m d e p o s t o s »
e G r e g ó r io X I I a b d i c o u » c e d e n d o \\ e l e i ç ã o de Martinho 9
(1417-1431). A ação do concilio devolveu a unidade
tempo r a r i a m e n t e perdida» mas representou uma ameaça ao
pap a d o enquanto 1ugar d a aut or idade s u p rema na Ig r e j a .
(B o o j a m r a » in El i a d e » 1 9 B 7 )• E interessante frisar que» na
c r o n o l o g ia o f i c i a l da Igr e j a esta c o n f u s ã o é diluída pela
supressão daqueles n o m e s indicativos do cisma. Assim» a
sucessão e p i s c o p a l da ú p o c a mostras Urbano 91(1378-1389)?
B o n i f á c i o I X ( 1 3 8 9 — i404>? Inocènc to 9 1 1 (1404-1406)? Gregór i o
XII ( 1 4 0 6 - 1 4 1 7 ) ? M a r t i n h o 9(1417-1431) (M at o s »1986).

26- Eis o s p o n t o s m a i s imp o r t a n t e s d e f i n i d o s pelo Concilio de


Trentos
lUâ SciãsSíJ (abril de 1546) - definiu que as tradições
apostólicas devem ser a c e i t a s com o m e s m o r e s p e i t o que a
Escrita (cujo cânone também foi fixados a 9ulgata de
S.Jerònimo foi c o n s i d e r a d a autêntica» ou seja» suficiente
para a d e m o n s t r a ç ã o d o g m á t i c a .
9a Sessão ( j a n e i r o de 1547) — incide s o b r e a d o u t r i n a da
just if ic a ç ã o s i n s i s t e — se pr inc ipal mente na colaboração da
vontade h u m a n a c o m a graça sant if icant e « No mes seguinte»
elabora—se u m a m e d i d a que diz r e speito ao cleros o decreto
sobre a n a o r e s i d ê n c i a dos bispos» o que no entanto nao
passa d e f r á g i l s o l u ç ã o » já que incide a p e n a s no s c a s o s de
a u s ê n c i a i n i n t e r r u p t a de 6 meses.
911a Sessão ( m a r ç o de 1547) - define a d o u t r i n a sobre os
sacramentos» além de interditar o a c ú m u l o de bispados e
regular o quadro epis c o p a l em função das exigências
ep iscopa is .

Em 1551 é c o n s a g r a d o o t e r m o transubstanc ia ç ã o ? a u n ç ã o do s
enfermos é d e c l a r a d a sacramento e é definida a necessidade
da confissão oral. Alguns problemas organizacionais sã o
tambóm a b o r d a d o s : o da s comendas» das v e s t e s c l e r i c a i s » do
direito de padroado.
No final d a d é c a d a de 50 o p e r a - s e uma t r a n s f o r m a ç ã o no S a c r o
Cológio dos C a r d e a i s » t ido agora como o c u p a d o apenas por
homens p r o b o s e ins t r u í d o s ; orde n a - s e a Dataria» sede do s
favores p o n t i f f c i o s e principiai fonte de r e c e i t a da Santa
Sé e em f u n ç ã o da p e n e t r a ç ã o do Calvin ismo na França»
d e c i d e - s e p e l a c o n v o c a ç ã o dos padres» num r e c o n h e c i m e n t o da
i m p o r t â n c i a d e s t e s e t o r do clero.
Em julho de 1562 sã o elaborados cânones relativos ao
sacrifício da missa» considerada como comemoração e
reiteração d o s a c r i f í c i o de Cristo. A f ase é especialmente
conturbada na m e d i d a e m que ose s p a n h ó i s e os franceses
i m p e r i a i s q u e r i a m m a i o r f o r t a l e c i m e n t o d o pocler e p i s c o p a l e m
o p o s i ç ã o a o s i t a l i a n o s , d e f e n s o r e s da s u p r e m a c i a do papa.
Novembro ed e z e m b r o de 15625 aparece o decreto "De
R e f o r m a t i o n e " , c o n s i d e r a d o a e s s ê n c i a da r e f o r m a t r i d e n t i n a ,
que definiu a nomeação e os deveres dos cadeais, «•*
organização dos s f n o d o s e dos s e m i n á r i o s d i o c e s a n o s , a
reforma d o s c a p í t u l o s e das ordens monásticas. P a r a l e l a m e n t e
foi b a i x a d o o d e c r e t o " T a m e t s i " , que r e g u l a v a a s condições
de validade do m a t r i m ô n i o s aldm disso, estabeleceu-se os
cânones s o b r e o p u r g a t d r i o , as i n d u l g ê n c i a s e o culto aos
santos.
J a n e i r o d e 1 5 6 4 — P i o IV, na b u l a B e n e d i c t u s Dei c o n f i r m a a s
d e c i s õ e s d o c o n c T l i o e a s t r ansm-i t e â c r i s t a n d a d e .

167
III
- 0 ANTI-MODERNISMO EM CENA

Na devida escala
r os acontecimentos da Diocese de Campos

realidade que é a viabilização da promessa da salvação eterna.

Ao bispo, príncipe da Igreja, autoridade máxima em uma


diocese, cabe defender no seu territdrio, a plenitude da
«ensagem, lançando mão dos recursos jurídicos possíveis -
eclesiásticos e seculares -, historicamente disponíveis, num
esforço que procura adequar uma ldgica utdpica (derivada da
aensagem divina) a uma ldgica tdpica (datada pela sociedade

concreta onde atua).

situados no
Assim foi com D.
seus
sent ido de
entanto, segundo

legítimos ambos, na real idade


c°nteddos diferentes, embora

CüHural brasileira.

168
jll.i - Exonerações

A retornada dos processos de afast 'T)to, que na verdade

já haviam se iniciado com as notificações emitidas para os

párocos de Miracema (Pe. Olavo Trindade) e de S.Fidélis (Pe.

Jonas dos Santos L i s b o a ) , desde novembro de 1982, vai se dar com

todo o vigor a partir do retorno de D.Navarro à direção do


bispado.

Embora tais processos possam ser teoricamente resumidos

a medidas relativamente simples <i-solicitação do bispado para

que o padre renuncia às suas funções? 2-recusa do padre,

alegando motivos de consciência; 3-intimação do bispo a que

entregue os bens da mitra que estão sob sua responsabilidade; 4 —

segunda recusado padre; 5—not if icação Judicial para que o

direito do bispo se faça cumprir; 6-entrega dos bens - imediata

ou retardada por possíveis contestações), vale frisar ' que na

prática se mostravam como situações muito complexas, e m b ebidas

na densidade do cotidiano, atualizadas sob forte comoção humana.

A explicitação dessa complexidade é, em si, um processo:

se os primeiros foram mais simples (com reações populares, e, de

todo o clero tradicionalista, que se deslocava em caravanas co m

•eus fiéis, de um município para outro, prestando solidariedade

•o intimado), a experiência que foi se acumulando transformou o

| tpisódfo das substituições num fenômeno que se arrastou até

; de 1987, tendo seu pique em 1984 e 1985.

169
Detalhar cada ura deles, apesar das particularidades

seria fastidioso e repetitivo, mas cabe tocar em alguns pontos


que denotara o ascenso e o descenso do processo, coro vistas a dai'
abstrair relações mais amplas, concernentes ao desenvolvimento
9eral da administração da diocese e a sua posição no mundo
catdlico.
.
Dois critérios estiveram presentes na ldgica das
substituições, que, em dltima instância remetem ã estrutura
hierárquica da Igreja: o da simplicidade e o da or gan ic idade.
Informados pelo princípio da hierarquia sagrada, eles foram
acionados de maneira a solucionar os problemas imediatos,
conjunturais, sem afetar as questões de fundo, estruturais.

Acionadas em função de uma ameaça â ordem interna diocesana, as


medidas no entanto, articulam—se com os acontecimentos que
extrapolam estes limites e que serão tratados nos capítulos
seguintes.

Por simplicidade estou entendendo o fato de o bispo


responder com ações aparentemente destituídas de peso político,
quando toda a histríria da vida episcopal de D.Mager,
constituindo um séquito de ordenados e leigos não poderia
sugerir expectativa diferente. Assim, os afastamentos incidiram
sobre aqueles envolvidos com afrontas visíveis, encabeçadas de
for» do clero, embora no plano doutrinário - endossadas por
este. Por sua vez, a emergência do íq documento possibilitou.
Por um lado, a indução a envolver o Vaticano no processo, dos

170
-ividosr Por outro
por outro, a seleção (a h espeito das determinações
efW°*
,rc«"=
ci,rUn5tanciaÍ5 que rpoderíam surgí,, v
a,r), •a
_ ,
montagem ,
de uma
estratégia infalível para imobilizar 0 inimigor POr mais que
este desejasse e lutasse por uma r e v e r ^ de tendência.

Esta e s t r a t é g i a consistiu em Proceder por d e s l o c a m e n t o s ,

o que possibilitava inclusive manobras táticas de recuo, se

fosse necessário, e pela utilização de expediente legal, que é a

não renovação do uso de ordem do clero incardinado em outras

dioceses. Com esta pr át ica' envol ve negociações de t r a n s f e r ê n c Ia

para outro local, fica, de certa forma, escamoteado o caráter

iapositivo da exoneração. E claro que o artifício tem sua

contrapart ida: a cada padre afastado corresponde a necessidade

de conseguir um substituto, o que, no caso, era resolvido

pr inc ipal roent e através da Arquidiocese de orígem do bispo.

Ainda de acordo com este critério, as solicitações de

renéncia vão ser dirigidas, pr ime irament e , às pardquias mais

distantes, num sentido estrutural. Esta distância remete à

hierarquização interna anterior, na medida em que os postos—

chaves, em geral mais centrais, estariam ocupados por

Personalidades destacadas. Assim é de supor que em determinadas

Pardquias " d i s t a n t e s " estivessem padres menos e x p r e s s i v o s , muito

Idosos e acom o d a d o s em suas funções ou r e c e m - o r d e n a d o s , e ainda

**• experiência acumulada. De toda a forma, a em p r e s a e r a sempre

ua risco, na m e d i d a em que tais atributos m enos P o s i t i v o s para o

claro Podem ser c ompensados por fatores e x t e r n o s e or|undos da

17i
• comunidade, como o grande apego sentimental ã velhos párocos, a

presença de grupos organizados na área imediata, enf

protetores leigos que diminuíam a carência possfvel do padre e

fomentavam a mob i l i z a ç ã o popular.

Por organic Idade estou entendo o fato ^e as ações

estarem preocupadas com a reprodução da Igreja, seja para d e n t r o

em termos de atualizar com justeza as normas do Direito

Canônico, seja para fora - quanto a manutençãQ/preservaçSo da

correta imagem que a instituição pretende apresentar. Coerente

com este critério, é enquanto funcionário da Igreja que os

padres são instados a se expressar, deixando-se, de maneira

velada, a discussão doutrinária subjacente ãs ações que c a u s a r a m

o problema. E da mesma forma, ignora-se a participação do Bispo

Emérito, figura que, pelo menos s imbol icamente, aglutinava

aquele conjunto de açoes.

Esta organic idade impõe um formalismo nas relações que

gifante a perene integridade do agente, a despeito de quão

escandalosa seja sua participação em determinado assunto. O

agente dilui"®* na categoria, o que promove, de ® a f d a r a sua

fceparaçSo dos leigos e, num segundo momento, a su a

hlerarq u Ização entre os próprios pares.

Estes dois critérios, subjacentes aos Procedimentos

adotados P*lo litigantes, resultaram numa conf \guração do

Processo *** deter m ianadas fases, das quais a Pr U\eira já foi

172
descrita- Naquele r as surpresas eram muitass das afrontas

inesperadas às r e a ç õ e s cuidadosas, como que temendo chegar a um

ponto impensável. 0 limite parece ter s-do a ameça de morte, ou

o afastamento con c r e t o da missào para a qual o indivfduo foi

sagrado- Até o decreto, á como se algum milagre pudesse s u c e d e r ,

propiciado pelas mui t a s orações e vigflia s -

Nesta fase foram afastados il cios 25 signatários do

documento de 11 de dezembro de 1981 e parece que se e s p e r a v a que

o problema fosse resolvido numa outra esfera, de m a neira tal que

a paz interna à diocese náo fosse tão afetada- Entre os onze

contavam-se os quatro monsenhores, por nao serem incardnados na

Diocese de Campos? tres padres, pelo mesmo motivo? quatro

Incardinados porém diretamente envolvidos com as c o n t e s t a ç õ e s : o

Pe. Geraldo Gualandi, de cuja questão resultaram as demais, e

que foi transferido para Campos? o Pe- José Ronaldo, transferido

para Ururaf? o Pe- Jonas Lisboa, de S.Fidelis e G e r a l d o Gobato,

de Lage do huriaé, cujos processos se estenderam em v i r t u d e da


licença de D . N a v a r r o e porque, quando do retorno
bispo, eles
recorreram a outras instâncias- Da mesma forma ~
** um dos nao
Incardinados, abandonara as negociações que
v lnham sendo
aantidas para merecer o mesmo destino dos seus p^^

A segunda fase, predominantemente Jurfdi


em termos
Civis* ou canônicos- parece ter sido presidida
^ i ntenção de
aproveitar o e s p a C amcnto temporal para p r o s s e g ^
tr
^as t ent at ivas
recuo, e também na não superposição
Pr­oc e s s o s , que

173
podería agrava 1 gu*nj c a s o p o r v e n t u r a mais simples. Nada d is s o

aconteceus d. primeiro ao tíltimo caso» com raras e parciais

excessões, episódio m o v i m e n t o u uma massa de padres e fiéis

que s e p e n t e a v a pela diocese, a p o iando o indiciado, soci ali z a n d o

informações r consolidando um tipo de comportamento. E os

processos se s u p e r p u s e r a m , seja porque quase t o dos os padres

recorreram r seja pela morosidade da Jus t i ç a Civil ou das

decisões d e R o m a .

Uma terceira fase co r r e s p o n d e ã concretização das

exonerações e m quase s u a total idades apenas dois padres estavam

para ser a f a s t a d o s a p artir de Janeiro de Í985 - e duas figuras

iaportantes - O P e- F e r n a n d o R i f a n y pároco, fundador de um

colégio particular e c o m e K pressivo traba l h o comunitário na

favela da B a l e e i r a , e m Campos, e o Pe. Jose G u alandi, pároco de

una das m a i s antigas igrejas orientados nos m o l d e s de D.Mayer,

onde se sed ia v a os t r a b a l h o s de resistência. Por que deixados

para o final? Talves uma táticas a g u a r d a n d o s i n a i s do Vaticano

para a melhor manobra que permitisse a l c ançar os o b j e t i v o s com

ua mfnimo d e desgaste; talvez porque as investidas do Vaticano,

ea suas n e g o c i a ç õ e s c o m L e f & b v r e e x i g i s s e m uma r e l a t I v i z a ç a o ou

una m o d u l a ç ã o n o tom d a s a titudes; talvez na e x p e c t a t i v a d e uma

desnobi1 Iz a ç a o e esvaziamento da propo s t a tradicionalista;

talvez a hipótese de que, f a l t a n d o a p e n a s 8% do trabalho a

realizar, o m a is P r u d e n t e fos s e e n f a t i z a r a produção de novas

causas, a b a n d o n a r aquela trste dimensão terapêutica e voltar-se

Para uma e s p e r a n ç o s a profilaxia. Penso que t o d o s e s t e s aspectos

174
estavam envolvidos, razão pela qual vai predominar, a partir de

janeiro, um clima de otimismo, o qual, apesar de tudo, parece

ser um traço caracter íst ico de D.Navarro.

Aliás, o sopro criativo não vai ser apanágio do grupo

que se identificava com o bispo diocesano. Também entre os que

se opunham à Igreja pds-conci1 iar grassou um surto de


iniciativas que permitiu não s<5 a continuidade e o crescimento

dos projetos iniciados como a emergência de novas obras - todas

elas nos quadros do ant igo- esquema.

0 afastamento dos 14 padres restantes se processou de

acordo com a função que o implicado exercia na diocesse. Assim,

os padres envolvidos com o Seminário, por exemplo, extinto em

março de 1982, estavam obviamente exonerados. 0 problema


residia, portanto, nos párocos responsáveis por uma parcela da
diocese, incumbidos de atualizar al i 'as determinações
diocesanas. Entre estes, alguns não reagiram, como o Pe. Elcio

Nurucc i, na ocasião o mais jovem do grupo, e que atuava em

Ururaf. Também o idoso Pe. José Maria Colaço, pároco de


Porc I«incul a , que pouco depois da exoneração é acometido de um
colapso cardíaco ou Alfredo Oelkers, (não signatário), de

avançada idude e saáde precária, que foi poupado pelo bispo.

Intimado ainda em 1982, juntamente com Olavo Trindade,


de Mlracema <e que não contestou por ser incardinado em outra
diocese >, o Pe. Jonas dos Santos Lisboa foi o primeiro pároco

175
Incard inado a que D.Navarro solicitou a remiría ia. Negando-se a
fazê-lo, o pároco impetrou recurso junto à Sagrada, Congregação
para o Clero,- o que retardará de muito a solução. Encerrado em
setembro de 1983, com a entrega dos bens da Mitra em juízo, o
caso se revestirá de aspectos insólitos, com o Juiz sentindo-se
ofendido, com o bispo querendo envolver o padre com o Serviço de
Segurança Nacional e, finalmente, com a mudança do pároco e sua
provisária Matriz Tradicionalista para o prádio abandonado do
antigo Cinema São Josá.

Simultaneamente ocorre o caso do Pe. Gervásio Gobato, de


Lage do Muriaá, que em carta mostra as razões pelas quais não
pode renunciar, lembrando ao bispo a forma pelo qual fora
recebido em sua paróquia. Longo abaixo assinados foi encaminhado
a D. Cario Furno, Niincio Apostólico. Contestando a ação que o
exonerou, o padre apresentou agravos de instrumento ao Tribunal
de Alçada contra a concessão da liminar e a posse iniedi.ata dos
bens pela Mitra. Em 22 de setembro de Í983, o Juiz da Comarca de
Lage do Huriaá, D r . Eduardo Guimarães Pessoa, dá ganho de causa
1 Mitra e esta recupera seus bens.

No cies de abril de 1984 são abertos mais dois processos*


o do Pe. Antonio Paula da Silva, de Italva, e o do Pe. Moacir
Pcssanha. O primeiro transcorreu de maneira rotineira, mas o
segundo colocou uma questão, alóm de coincidir com as
coeemoraçoes populares dos 2® anos de presença do pároco de

Natividade. Entre moção da Câmara dos Vereadores, manifestações

176
diversas» inclusive a clássica caravana dos tradicionalistas de

outras pardqu ia s , dá~*se o inesperado- o pedido da Mitra á

indeferido pelo Juiz porque tanto a Matriz, quanto a casa

paroquial e as capelas encontravam-se em nome do pároco.

Ante tal impasse, nova audiência de instrução é marcada

para 29 de Junho, cabendo ainda duas instâncias onde a Mitra

pode vir a recorrer: o Tribunal de Justiça do Estado e o

Tribunal Federal de Recursos. Sd em 9 de agosto o bispo entrará

co» ação re iv ind icat dr ia para provar o domfnio sobre aqueles

bens e em 17 de outubro o Juiz Ronmlo Colli dá ganho de causa à

Mitra. O recurso impetrado pelo padre junto a Sagrada

Congregação para o Clero só terá resposta (negativa) muito

depois: em 28 de agosto de Í988, juntamente com os processos de

Geraldo Gualandi, Jonas Lisboa e Fernando R ifan .

Barra e do Pe. Antonio Alves Si


1Rueira, de VArre-Sai

Todos estes dltlmos


*>l'oceBsos desta fase Já encontraram
os Indiciados devidamente prep
rados para o piora capelas ou
ímpios templos encontravam-.^
em contrução, garantindo a
continuidade do trabalho do pj(ri
oco exonerado. Em São João da
Barra, por exemplo, aldm destas
Providências, a forte Irmandade
de Sao J o r g e r que possui uma igrejar colocou-se à d i s p o s i ç ã o do

pároco exonerado* e n q u a n t o e r a m f i n a l i z a d a s as obras do seu

próprio templo.

De t o d o s e s t e s , o caso mais c o m p l i c a d o é o de V a r r e - S a i s

tendo como prazo final para deixar a p a r d q u i a o dia Í4 de

setembro de Í 9 8 4 r o p á r o c o ne g a - s e à faze-lo. E? promovida uma

concentração r e a l i z a d a em 1*6 de setembro, r e u n i n d o em torno de

6000 pessoas. A missa c o n c e l e b r a d a por Í7 s a c e r d o t e s e a c o l i t a d a

por 8 seminaristas, foi c o n s i d e r a d a a mais i m p o n e n t e da ópoca.

Os ânimos f o r a m a i n d a a c i r r a d o s por dois fatoss o acidente com

u«a cr ianca, que s o f r e u q u e i m aduras c a u s a d a s por um artefato

junino a ceso por um " p r o v o c a d o r " du r a n t e a manifestação? o

"desencontro" - intencional ou não - do exonerado com as

autoridades para e n t r e g a dos bens, que r e s u l t o u no arrombamento

da porta da M a t r i z , para grande co m o ç ã o geral, inclusive dos que

apoiavam o bis p o .

Do ponto de v i s t a Jurídico, o caso tambóm apresentou

coapl ícações* o J u i z F e r n a n d o Muller. que d e f e r i r a a liminar,

retorna a sua c o m a r c a de origem, Itaocara, com a volta do

titular, Dr. Luiz Pereira. Frente a resistência de algumas

capelas na z o n a r u r a l , a Mitra que dar c o n t i n u i d a d e à questão,

ao entanto, o Juiz considera-se impedido, por ser irmão do

advogado do r é u, e transfere o processo para a comarca de

^orcíJncula. A l i , a J u í z a D e n i s e F r o s s a r d Losch I cassa a liminar

inter iornent e e x p e d i d a e d e v o l v e os b e n s ao p á r o c o . Em m e n o s de

178
2* horas, porém, a situação se inverte, pois o Desembargador
Harcos Faver, da 4a Câmara, reintegra os bens a Mitra. Em

fevereiro de 1985, a pardquia passa outra vez aos


tradicionalistas, com quem fica até 19 de junho de 1985, quando
a Mitra, tendo apresentado recurso prdprlo ao Tribunal de Alçada
- onde a questão foi examinada pelo pleno de sete juTzes —
obtem, finalmente, ganho de causa.

Os dois processos finais, embora envolvendo


personalidades importantes, acontecerão num contexto diferente,
coso será apresentado no tdpico seguinte, o que os tornará menos
explosivos, apesar de contarem com todos os ingredientes dos
deaaiss pedido de remlncia, negação, resistência, saída sob
pressãos judicial. Entregando as chaves em íq de setembro de
1986, o Pe. Rifan recorre ao Vaticano, como o maior dossiê
elaborados uma carta acompanhada de 265 laudas onde pretende
provar a a r b i tr ar iedade do ato episcopal. Em íq de abril de
1987, o Pe. José Gualandi recebe a notificação do Bispo,
entregando as chaves da Igreja do Terço em Cartdrio no dia 23 de
Junho de 1987.

Encerradas as exonerações, no entanto, não signiticava


que a Mitra tivesse reavido todos os seus bens, cujo mímero era
Inclusive incerto, sendo estimado en torno de 400 capelas,
espalhadas pela diocese. Párocos seguidores de D.Mayer, no
entanto. Já não havia, pelo menos reconhecidos pelo Bispo
I

III.2 - R a íze s A n ti-p o d e rn io ta s

A existência de uma força contrária às "novidades"

legitimadas com a chegada do novo bispo em 1981 nao foi fruto de

um posicionamento gratuito nem expontâneo- Os que se definiram

como "tradicionalistas" estavam tão imbuídos do desejo de

Preparar a chegada do Reino quanto aqueles que, ocupando agora

legitimamente o poder, dispunham-se a fazê-lo-

Para compreender a firmeza com que cada grupo enfrentou

a situação, explicitando significados que estavam embutidos em

suas práticas, é preciso voltar às experiências por eles vividas

e que forjavam o sentido que davam ao mundo e a Igreja- É

preciso voltar ao " e s p f r i t o "


que p r e s i d i a a e me r g ê n c i a de uma
(!)
"estrutura de sentimento" <U i 1 1 iams,1978,í989) especifica a

qual cabia agora defender ou eliminar- Para uns, tratava-se de

ub cpisddio decisivo na luta contra o "modernismo", para outros,

tratava-se de superar o que chamavam de obscurantismo que se


instalara nos limites da diocese.

Quando foi eleito BisPO Cnadjutor para a Diocese de

Campos, em marCO de 1948, substituindo no final do ano o bispo


0.Otaviano Pereira de Albuquerque
'■«j c , D
u. Rntonio *. n
Antnnir* hde *.
Castro u
hayer
estava bem farai1 iarizado com os Prohlpmac
^roDiemas da Igreja no Brasil e
coa o projeto romano em andamento i ~ *. ,.
o- Nao foi gratuitamento que o
jovem bispo, sagrado em maio
daquela ano pelo então Niínc io

180

» I
Apostólico, D. Ci*rlos Chiar ior e tendo como co-sagrantes os

bispos de Pirau. .\ba <D.Ernesto de Paula) e de Jacarezinho (D.

Geraldo de Proeiv. S igaud ) , definido post er iorment e como "devoto


( 2)
fervoroso e terno da Virgem Sant íss ima" , coloca em seu

brasão o lema guerreiro "Ipsa conteret" (Ela esmagará).

0 combate às heresias do modernismo não sd faziam parte

do "modus vi vend i" da Igreja h d um sóculo, como a própria

experiência do novo bispo como assistente geral da Ação Católica

na Arquidiocese de S. Paulo combinavam-se para forjar um

programa marcado pela militância como bem prenunciava o lema

epi scopal

Mas para compreender o que era esse tão temido

aodernismo é preciso não rei ficar a noção, antes, problemat izaí—

la, como sugere Fernandes (1990) pensando-a em contextos de

significação específicos, onde a experiência de articular o

problema da tradição e da modernidade possa ser examinado, assim

como a forma caracter fst ica de projetar as alternativas

visíveis para o seu enfrentamento•

Para tando, repasso sucintamente a questão teológica em

torno do modernismo e a posição adotada por D.Mayer, no s entido

dc apreender o significado que foi imputado àquela categoria e

compreender como aquela diocese qualificou o problema.

181
Para Poulat (19B2), o termo raoiJcrn íbido, no vocabulário

católico d novo. Surge em 1093 na Itália, ganhando mais vulto

quando Pio X o consagra na encfclica Pascendi, em 1907, onde

era condenado o conjunto de doutrinas etiquetadas com esse nome.

Mas o fenômeno já estava presente há mais tempo, nos muitos

debates que marcaram a vida da Igreja no sáculo XIX. Na

verdade, a Pascendi é o desenvolvimento lógico da orientação

vigorosamente afirmada por Pio IX, quase meio sáculo antes, no


(3 >
Syllabus , quando são catalogados os principais erros daquele

tenpo.

Assim como Pio IX denunciara os erros "ad extra", ou

•eja, os que ocorriam no mundo, o papa Pio X <1903-1914) vai se

ocupar dos erros "ad intra", isto ás a infiltração dos mesmos na

Igreja, onde tomavam forma e criavam rafzes. A laicização do

Estado Moderno e a secular izacão da sociedade endossadas pelos

valores vitoriosos da Revolução Francesa constituem-se em

••eaça para os princTplos católicos tal como definidos pelo

Vaticano. Por isso a Igreja vai se voltar para a restauração da

ordem cristã, que permanecera seu ideal histórico concreto,

configurando uma oposição onde enfrentar—se— Iam uma Europa


cristã com a nova sociedade, moderna, liberal.

P*ra a Europa cristã <de onde e Igreja excluia

evidentemente a reforma protestante) a fé nos fundamentos

religiosos (Trindade, Encarnação, Redenção e Salvação, Céu e


Inferno, Revelaçao) continuavam f-izendo Parte das evidênc i*®
comuns cotidianas: a teologia era o ápice do saber, o temporal
permanec ia subordinado ao espiritual. Para a sociedade moderna ©
1iberal , dando crédito a outros critérios, apagava-se este
passados o mundo livrava-se gradatIvamente da tutela da Igreja*
Olhando para novos horizontes, a modernidade dá ãs relações
humanas outras regras, outros objetivos ãs atividades dos
homens, outras bases de saber. Fala em riqueza. Progresso,
ciènc ia r direitos do homem e da razão, liberdade de pensamento»

As questões acima, colocadas pela modernidade são


espec ial mente cruciais para o catolicismo, na medida em que esta
religião tem um caráter não sd social - ao afirmar para o homem
um destino transcendente e para a humanidade um destino comum —
como histórico — desde que a salvação do gênero humano toma
naturalmente a forma de uma história: a história da penetração
da humanidade pelo Cristo - <Lubac,i9B3).

Esta condição do catolicismo se sustenta na força e na


autoridade da £cadÍ£ão — enmquanto ação pela qual a Igreja
transmite seu ensinamento e o que ela quer transmitir: a boa—
nova da salvação — e do uaai&ttfciQ " enquanto lugar
1*8 itimamcnte reconhecido pela tradição catdlica como dotado da
faculdade de dizer, autcntlcamcnte, o sentido da Escritura e
*1* fé da Igreja (Uackenhe im, 1977)
Neste quadro, o n d e a t r a d i ç ã o tem valor estruturanter

qualquer mudança, qualquer Inovação, para fazer sentido

Internamento, precisa ser p e n s a d a no interior da comunidade.

Assim, as questões d e m u d a n ç a são f o n t e s de t e n s ã o , expressando

a contradição básica do c a t o l i c i s m o , onde o fato acabado (a

salvação p e l o Cristo) e o processo (o .desenvolvimento histórico

onde e l a s e r e a l i z a ) convivem.

Mas tais c a r a c t e r ístIcas gerais sofrem as mediações

específicas de seu lugar de atualização, no caso brasileiro

apresentando os efeitos das contingências a que se viram

submetidas. O catolicismo no Brasil apresenta as marcas da

superposição do processo de romanizacão sobre as

particularidades da r e l i g i ã o ató então v i g entes, afetando ató

princípios organizacionais fundamentais como o da

territorial idade.

O p r i n c í p i o da t e r r i t o r i a l i d a d e se r e f e r e ã propriedade

que tem a Igreja de cobrir todos o espaço em que está

organizada, nSo só enquanto instituição, mas t a m b ó m no plano

tiabólico. P r o p r i e d a d e e n r a i z a d a nas m e n s a g e n s dos a p ó s t o l o s ,

f por e l a que "a i g r e j a se a p r e s e n t a como c o e x t e n s i v a c o m todo

o universo ordenado por Deus. Pelos seus r i t u a i s , o b t e m — se a

ucnliziç^o d a s r e l a ç õ e s mundanas, submetendo a v a r iedade das

*rocm* •oculares a u m a h i e r a r q u i a de v a l o r e s referendada pela

maneira, o p r o fano e o sagrado d ist i n g u e m

184
diferentes aspectos (espaços e tempos) de um mesmo mundo

ordenado por D e u s " (Fernandes, 1982:108) „

A t e r r i t o r i a l i d a d e é o rebatimento, no plano espacial,

da contradição existente no plano temporal, onde a tr a d i ç ã o

expressa a c o n t i n u i d a d e na mudança. No plano espacial, a Igreja

Particular, ou diocese, não é uma igreja que compõe a totalidade

da Igreja Romanas ela é a Igreja, atualizando al i todas as

pronessas c o n t i d a s na mensagem cristã. Dito de outra formas o

particular é universal, para ser coerente com o nome que define

esta forma de atualização do cr ist ian Ismo s a católica. Por este

caráter cont r ad it ór Io é possível dizer que a crise é

constitutiva da Igreja, sendo a condição de existência de uma

realidade que quer unir o agora com o sempre, o aqui com todo o
<4)
lugar

Mas como alerta Fernandes (1990), no Brasil a Igreja

nSo reproduziu a identificação com o territdrlo tal como se deu

n* Europa. Por razoes de caráter histdrlco, as partIcular Idades

do seu processo de implantação, o diálogo que foi mantido entre

a instituição igreja e as demais instituições sociais, foi

gerada uma modalidade particular de catolicismo que contára em si

os elementos prdprios para as crises que atualizará.

Assim, as tensões subjacentes a um conflito diocesano

rtfercm-sc ao encontro dos problemas particulares al i v i v idos

Co* * questão mais geral para a Igreja, que é o enfrentamento

ies
com as caract er Tst i wodernidade quer de uma forma ou de

outrar se inf l l t r a r ^ J na sociedade. No caso da Diocese de

Camposr a q u e stão do mo(jernismo na Igreja é exacerbado por

algumas medidas danadas do Vaticano e endossadas por

recomendações do C ° n c f i | 0 Vaticano II r num quadro nacional que

pòde fazer a v u ltar a tendência de pastorais preocupadas com as


questões soc Ia is r c informando atividades diferentes daquelas
trad Ic ional ment e em ^so no Norte Fluminense. A luta contra os
K . <5)
resquícios de um catoi1 ic ismo luso-bras .~1L
ile > Ji
iro ... .
r juntava-se o
cuidado de evitar a
Entrada de leituras do catolicismo vistas
cowo "pern ic iosas'' •

As r a í z e s do " ant j-modern ismo" que será implantado na


Diocese de C a m p o s enc^i. „ ^ ,
^intram -se na a n t i g a Açao C a t ó l i c a da década
de 30r e n q u a n t o movin.» a.
mento leigo que projetava a apr o x i m a ç ã o
entre o c l e r o e os . .. . A
^léis, superando a distância tradicional

ambos q u e eempr e e x |s t j u no Brasil, E para c o m p r e e n d e r o


W .l d a q u e l a e l i t e e , tòll„ d prcci,0 vol[J ,0 te „ po ^ ^

então P e . C a s t r o Ma y e r _ , . . ~
era assistente geral da Aça o Católica na
Arquidiocese de São Paulo.

Criadas por P io X I <1922-1939), com vistas *


Promovei- e
articular o a p o s t o l a d o leigo, estas organizações tio»
•veram tam b e m
» sua h i s t ó r i a nacional. A Ação Católica no Brasil
9 f u n dada em
1929, com seus primeiros estatutos em 1935r
viverá as
vicissitudes do 1 q 9overno Vargas e só sobrevivo-.-/
tra enquanto
^urar 0 apoio que aquele ditador deu às prQ
Postas ali
defend idas. Seu -Fundador. © animador o cardeal Leme que
assistiu ao sucesso das suas pretenções no episódio das eleições
A ,. <6)
para a Assembléia Constituinte de 1934 morre praticamente

com elas em 1942, o organismo já estava Inerte, minado pelas

questões internas e pela mudança na relação Igreja-Estado (Souza

Lima,1984).

Cabe enfatizar que uma das metas da Ação Católica da

Arquidiocese de São Paulo era a formação de um Estado


(7)
Católico cujos requisitos repousariam em tres pontos* a> o
reconhecimento de que a Igreja é a portadora da verdade; b> que
o Estado a auxiliaria na tarefa da salvação das almas,
fornecendo os elementos necessários para que a sociedade
recebesse influência, afastando a possibilidade de existência de
doutrinas ímpias ou subversivas; c) organizando toda a sociedade
- quer as relações do Estado com o indivíduo, as famílias e os
demais grupos sociais, quer as relações dos indivíduos, dos
Brupos entre si, segundo os princípios da justiça e da caridade

de acordo com as leis de Deus e da Igreja.

Esta postura era defendida através de 0 Legionárlo,


mensárlo e depois folha quinzenal da Arquidiocese, fundado em
1927 para combater o liberalismo. Reestruturado em 1933, passa
k direção de Plínio Correa.de Oliveira a partir de 1936, quando
•e tornou um semanário. Mas tal posição não tra partilhada por
•uItos católicos, que viam nela a mesma intransigência dos
grupos que a publicação condenava, tanto V esquerda quanto k

187
direita, • identificados respectivamente através da Aliança

Nacional Libertadora e da Ação Integralista. Divergiam também no

âmbito religioso, pois não viam a premência de harmonizar a

atuação da Ação Católica com as Associações de leigos, do tipo

Congregação Mar iana, Filhas de Maria etc. Por sua vez, o grupo

do 0 Legionário via tais católicos como expressão da Igreja

infiltrada pelo modern is m o " c a t ól icos mornos", numa época em


que se exigia "radicalismo e heroísmo" (Lima, 1984»95)

Já em 1944, o novo arcebispo de São Paulo, D. Carlos

Camelo de Vasconcellos Motta tenta apaziguar os ânimos que


continuavam em conflito a partir da Ação Catdlica. A influência

do maritanismo , absorvida por catdlicos expressivos como Alceu

Amoroso Lima, faz tornar cada vez mais anacrônica a posição dos

membros de 0 Legionário, do qual Plínio Corrêa de Oliveira é


afastado em 1947. Logo no ano seguinte, a indicação de D'. Castro

Hayer para a Diocesse de Campos parece significar o fim daquela

corrente que se inspirava diretamente nas sugestões de Jackson

de Figueiredo. No entando, a mesma " intolerânncia ao erro"


reaparecerá, contundente, nas páginas do 0 Catolicismo, mensário

que aparece em 1950, apoiado pelo bispo docessano de Campos.

E do grupo, cujo projeto idiológico ruira com a onda de


redemocrat Izaçao do Brasil, a partir de 1945, novo movimento se

conforma em 1960, com a fundaçao da Sociedade Brasileira para a

defesa da Tradição, Família e Propriedade, a TFP, que tentará

188
realizar o papel que Plfnio Corrêa de Oliveira sonhou para a
Atao Catdlica da década de 30.

III.3 — 0 Pensastento de D.Mayer

A caracter fst ica marcante do pensamento do bispo e m é r i t o

de Campos é a sua aversão «i mudança, a qual atravessa tanto os


significados da ordem doutrinária quanto da ordem prática.** No
plano doutrinário ele a vè como operando verdadeira subversão,
pois que m u d a n d o — se os termos da linguagem mudam-se também os

conceitos, abalando-se consequentemente, a fé, agora envolta em

drfvidas e incertezas.

A inviabilidade da mudança passa assim pelo seu caráter

destruidor da verdade, tando mais quanto esta é verdade

revelada, portanto isenta da necessidade de reformulações. As

concepções estabelecidas em tempos imemoriais, com base na


Bíblia Sagrada devem portanto permanecer intocadas, salve se

pudesse surgir uma maneira melhor de expressar a mensagem


desejada e maiss desde que as novas fdrmulas dimanassem

organicamente das Já existente (Cf. Quarenta Anos de


Episcop*doS?C> .

Para D. Mayer, no plano da prática, a mudança introduz

dois efeitos pernlciosost além de confirmar a inverdade

concretizando a piausib i1 idade de uma concepção diferente

c o n s agrada pelo costume e pela Igreja, ela corrompe a f é

1B9
na medida em que relaxa a postura do fiel, agora abandonado

vicissitudes humanas. A Igreja# autora real das revelações#

vivendo sob um r e gime de mudança# opera subversão irreversível

ao superestimar o homem. Estabelecendo uma religião do homem e la

elimina tudo que possa significar obstáculo ã liberdade de l e ou

repressão a sua expontaneidade# o que resulta em atirai— lo num

quadro de diividas e incertezas'por que já nao mais amparado pela

d IvIndade.

Nesse sentido é heretica porque substitui o criador por

sua criatura# introduzindo o caos na ordem do mundo. Ao mesmo

tempo, desconhece a queda original# decorrente da desobediência#

extenuando assim a noção de pecado. Tal posição, gerando uma

religião natural com base nas experiências paicoldgicas e

soc íoldgicas# não compreende o sentido da remincia evangdlica.

Por Isso, a mudança não sd relaxa a humanidade como d

tempre Inconveniente <Idems3i). E D.Mayer a Identifica com a

mentalidade modernista que terla se instalado no seio da prdpr ia

Instituição, orlentando-a no sentido de uma adaptação ao mundo

Com Isso# membros da hierarquia operavam uma Inversão

Inaceitável* ao Invds da Igreja ensinar ao mundo, ela curva*

ante os caprichos mundanos, com que se esgotando em sua d Imensa


terrena e perdendo seu carrftfcr divino.

A situação é tanto mais perigosa porque o mundo Já não


está regido por normas como as anteriores, el as mesmas geradas ã

190
gorobra da Mitra e do báculo. Todas as inovação sociais que foram
| implantadas entre o Concilio de Trento e o século XX colaboraram

f na contrução de uma sociedade onde o espaço da Igreja é cada ves:

menor, onde o direito de Deus é superado pelos direitos do

homem, a quem a cc'cepção de bem e de verdade devem se

subord inar .

Para Justificar a posição que adota, D.Mayer vale-se do

conceito de religião autênticas aquela revelada e cuja revelação

é perpetuada segundo a tradição, ou seja* de acordo com o


testemunho dos apóstolos e os cânones da Igreja. A autenticidade
te* base portanto, no caráter legal das práticas e na
consagração que o tempo lhes conferiu.

As caracter fst icas substantivas da religião autêntica


sãos a consciência da pequenez humana frente ã transcendência
divina, devidamente manifestada em comportamentos que o denotem.
Disso resulta que qualquer transformação na liturgia sd é
concebfvel se aprofunda a primeira afirmação, sendo assim
oimanada organicamente da fdrmula que a precedeu no tempo.

O que D.Mayer lamentavelmente constatava é que a Igreja

vinha perdendo seu caráter de religião autêntica desde a chegada


dos tempos modernos, atravás de um processo de acomodações

sucessivas que relaxam não sd a fd do fiel mas atd do corpo


clerical. Enquanto zeladora da mentalidade cristã cabe à Igreja

fazer chegar ao fiel os sacramentos, sem usurpar o direito


divino je obter a confissão dos p e c a d o s do f i e l e sd entuo

entrar comunhão com a d i v i n d a d e . A graça, diferente dos

protestantes, é um estado q ue passa necessariamente pela

hierarquia* dnica instância autêntica de c o n f e r i r tal situação*

Assim, todos os homens devem va s sal ag em a De us, a quem cabe o

direito de co n d u zi-lo s atd a salvação.

Tal d ire ito , de caráter divino, vê-se atualmente

ameaçado, na m edida em q ue a s o c i e d a d e mo d e r n a enfatísa as

questões re la tiva s ã dignidade humana, diminuindo a distância

que separa os elem entos hierarquicamente dispostos que

compreendem, por um lado a polarização Deux X h o m e n s , por outro,

os homens entre s i. Da mesma f o r m a s que o homem t em obrigações

de vassalagem com a divindade, a sociedade, em s u a totalidade,

deve tender para esta posição, inspirada na S o c i e d a d e Perfeita

<que é a Ig re ja ) e que deve zelar para que os princípios e

no r ma s que inform a a sociedade sejam aqueles mesmos guardados

Ptl m t r a d i ç S o c a td l ica.

^ im pregnação da Igreja por uma m e n t a l i d a d e liberal vem

Incapacitando a hierarquia de levar 4 termo sua m i s s ã o , o que se

constata eiM d i v e r s o s níveis» desde o princfpio fundamental da

distinção Deus/homem, verdade inquestionável porque r e v e l a d a . A

va o r i x a ç j ^ <ja dignidade h u m a n a sem o reconhecimento desta

verdade §n o r -c l! ml Introuz distorções crescentes que v ã o afetar

192
os os dom Tolos da sociedade. A verdade passa a ser u ma
istrução humana, dependendo do raciocínio humano e das regras
riais, escamoteando sua origem divina, e portanto. Int o c á v e 1«

Tal postura rompe com a ascética crista, que instala a


emaventurança nos C^us, transformando a terra no lugar da
>lenitude da humanidade, o que contraria as. palavras do
£vangelho. Esta inversão abre as portas para um conjunto de
efeitos perniciosos que configuram, confirmam e comprovam a
negação de Deus porque elevam o homem a sujeito de sua verdade e
de sua vida. Esta, seja no plano pessoal, pdblico ou
estritamento religioso, fica permeada pelo erro primordial*

Assim, verifica-se no plano das relações conjugais, onde


o princfpio da "st ab i1 itas" tao necessário à preservação da
fanflia crista, á conspurcado pelo enaltecimento do amor,
sobrepondo o prazer ao dever num aberto atentado ao caráter
sacramental do matrimônio. Para a Igreja, o dever deve sobrepor—
se ao prazer, no sentido de resguardar a famflia de sentimentos
efêmeros e pcrec íveis que, ao acarretar a desordem moral apontam
sua fonte principal, que é o pecado original.

Ao mesmo tempo, esquecido o pecado original e entregue


desordem moral decorrente, os homens encaminham—se para uma
série de posicionamentos lesivos divindade e,
consrquQent emente, a sí próprio. Dessa forma, abre—se espaço
a dissolução do matrimônio (ou seja, reduz—se o sacramento


A
a wero cont
entre os homens) v ia. mecan israo JurTdico do ..
divdrcio,
experimenta-se o controle sobre a natalidade num
abusivo „
°cesso de decisão sobre a vida; abre-se can'inho a
permissiviri
a «de, via a compreensão das diferenças anti“faturais
aceltando-~s
se o homossexualismo, numa escalada que se • ,
inicia
desde a u, ,.
anaiizaçao dos papéis sexuais adotadas na Pr|m e jra
infância. A ^
A educaçao mista leva ao desconhecimento das
diferenças - m
das regras que devem gerir os comportamentos de
hoaens e mulheres aptos futuramente a acc:
uramence a assumir o sacramento do
p at rimônio.

Também na vida pdbl|


ca, a valor j do princfpjo de
igualdade conduz
ao menost).
Hrezo da iroportância da hierarquia
sagrada e social conduziría
o» por conseqüènc ia, ãs desordens
na soc iedade.

Desde que a secular


**;aeao at in g |n as diferentes formas
de Estado, cabe evitar que Sç chegue
ao eXtremo do liberalismo,
suando as forças sociais e*t ar iam lifc-, f iriaç e
r«'lment e incont
conduzir iam ao socialismo.

No plano da vida r*1


.. . . ,*. 0f>Mamcnte dita, ou
Plano filosdfIco, a *ltuaçSo nSo a# a
convivência das filosofias
4 t teenos cala
.ntropoc*,^ sobrePujando
pensamento tomista, leva , .. ..
Pluralismo aceita
r0lÍQÍOSO C|U^
miitas verdades, cada uma
*ua re],*'9ISo ,Pcend° °
desmerec
mlor da verdade revelada, d* „ . _ “° r .
qual a Igr aatênt Ica
deve ser a aU

19 4
e legft \t . guardiã. Este relaxamento se percebe nas pretençoes
de e c u m e n is m o „ n a crescente secular ização do clero, nos debates
sobre o q u e s t i o n a mento do celiL.vo sacerdotal, todas elas
indicativas da desvalorização da Igreja como represent ant e
tín ica da ilnica religião que sal va e do clero como cor po
consagrado exclusivamento no 4 serviço do altar. Tal
desmerec iw e n t o do sacerdote, rebaixado à condição de
represent ant e d o povo, expressa a mudança no conceito de verdade
revelada .

Ê fundamental que a Igreja se mantenha fiel ao tomismo


para sue as a m b i g u i d a d e s derivadas da intromissão de outras
filosof ias permeadas de liberalismo não desest rut arem os
alice r c e s da ■Pd’, sem o que a salvação ficará irremediavelmente

compromet ida. Frente a este quadro é 1 feito que o clero se


atenha h tradição, acatando os papas que se posicionaram

firmemente contra esta au to - d e m o l i ção da Igreja e que são os

lutént icofi s u c e s s o r e s de Pedro.

Se na p r d t l c a a Ig re ja teve que adaptar-se ao m u n d o , t a l

I o m a o te n t o " não pode ser compreendido c o mo uma s e q u C í ê n c i a d e

Con bs Id e o lo g ia s srcular/zadas, mas c omo obra de

Fen i t ò n c l a , . reniíncia, mortificação» Assim o e x I ge o dogma do

Pccmdo o r i g i n a l D escartado este, o "aggiornamento" é um

* »c * n d a 1o , p o r gue c o n t r i b u i para a perda das almas, favorece as

comod I d a d e s da n a tu re x a humana decaída, diminui o fervor da

C m rid a d e p a ra com Deus.

195
A d i gn i d a d e i man a que reduz o papel de Deus é uma

falácia n a medida em que aquela procede de Deus, logo, não pode

sobre p o r - s e à. o b r i g a ç ã o fundamental do homem, que d a de cultuar

a Deu s na verdadeira religião. Da mesma forma, outra posição

lesiva do direito d i v i n o está implTcita no princifpio de que o

Estado deve ser neutro em matária religosa. Isto está. em

contradição com o ensino católico tradicional, porque a

sociedade — tambóm c r i s t u r a de Deus — tem o dever de cultuá-lo

na verdadeira religião, dài' que o Estado não pode permitir os

falsos c u l t o s .

Todas estas quest õ e s foram condensadas em um manifesto!

co—a s s i n a d o por D. leffebvre, e enviada ao Papa João Paulo II em

novembro de 1983, para que, usando de seus poderes pontificiais


"confira seus irmãos" (Lucas ,22,32) .

A a u t o — d e mol ição da Igreja, consentida pelo prdprio


clero se expressas

1 — No conceito 1at itud inar ista (condenado pelo

Sul 1 a b u s >

2 — No g o v e r n o colegial e democrático (condenado pelo


Condflio Vaticano I>

3 — No f a l s o c o n c e i t o de direitos naturais do homem

condenado p e ’» Quanta Cura (Pio IX) e Libertas (Leão


XIII >
A — Na fa ls a c o n c e p ç ã o do poder do papa

19 6
5 - N a concepção Protestante da missa (condenada na
S e s s ã o XXI I do (Cofic f^ •,0 de Trento)

Á - Na livre difusãQ de erros e heresias, caracterizada


pela supressão do Santo Ofício.

Ê importante notar a influência de unt "campo de apoio"

composto por encíclicas de papas que, vindos de Trento a nossos

dias, conc e n t r a m - s e mais no período crítico da chamada crise


modernista da Igreja. Senão vejamos!

A questão da missa (Pio V - 1566/1572, Clemente VII - 1592/1605)

A questão da estrutura hierárquica da Igreja - o duplo poder


supremo do papa e do colégio dos bispos (Pio VI-1775/1799, Leão
XIII — 1878/1903)

A questão do abuso do poder do papa (Pio IX- 1846/1878)

A questão do falso direito natural do homem, a questão da

verdade, da Igualdade Jurídica entre as falsas e a verdadeira

religião, a questão da falsa dignidade humana (Gregdrio XVI-


1831/1846, Pio IX, Pio X 1903/1914) Pio XII-1939/195B)

A questão do 1at 11 ud Inar isi»o na igreja (Leão XIII,* Pio XI e Pio


XII)

Se o. elem entos de*** Procedimento já se encontravam na


prdpr i
m form ação e infclo da vida sacerdotal de D.MaUer, é
import
»nte reconhecer qur *1* Bmnha corpo no prdprlo processo da
tarefa
ep iscop al na Dioce** de Campos e na subsequente crise
após
m us su b stitu ição , já no Papudo de João Paulo II e sob a
or l * n t s ç ã o Plena d a s recomendaçties do Concilio Vaticano XX.

1
At é porque a Diocesse de CAmpos foi implantada em pleno

momento da realização do programa de roman izacão do Brasil., a

ênfase nos aspectos ant i-modern Ist a» contidos na importância da

adesão b tradição será uma constante na tarefa episcopal de

D.Mager. £ sob tal inspiração que vai se estruturando uma

concepção de tradição e do papel do magistdrio, delineando um

perfil específico para a diocese que ele governava.

Vale lembrar que a concepcão de tradição al i

desenvolvida e defendida remete a um posicionamento que é

anterior ao Concilio Vaticano II, sendo este tido como a acabada

irrupção do "novo" na Igreja, e um novo que não lhe é


conveniente. E não o é porque as recomendações dele emanadas não

são redutfveis bs antigas posições, pautadas na Sagrada

Revelação. Nesse sentido, as indicações de uma organização mais

colegiada c aberta para os problemas sociais foram vistas por

D.Mager como capazes de corromper a doutrina catdlica.

Mas acritica direta ao Concilio Vaticano II, implicita

em definições e atitudes que vigoram atd o fim do episcopado de

D.Mayer na Diocese de Campos (1981), sd gradativamente vai se

txpl Ic it ando. Inclusive na medida em que são reforçadas as

alianças com grupos catdlicos estrange Iros, principalmente o de

0. Marcei Leffcbvre. £ desta dpoca que as mensagens dos

trad Ic Ional Ist as de Campos enveredam por questões mais

teológicas. abandonando a superficialidade das oposições mais

simples Invocadas no inicio.

198
o que nao significa diser que a argumentação importada

fosse mais densa, mas ela agora se reveste de uma roupa g e l

européia valorizada a b c í q c X que desconhece o passado h i s t t í r l j

da Igreja no Brasil e, portanto, suas reais condições de

existência aqui. Nesse sentido, a sociedade de que fala D.Nayer,

e depois o grupo a ele alinhado, é uma sociedade abstrata,

idea , onde, e onde, poder iam vigorar as modalidades de

atualização dos Princípios católicos como eles explicitam.

O exame das cartas pastorais de D.Mayer <Cf. Quarenta


Anos de EpiscoDarir^
^ u o ' m o s t r a que as c a tegorias que a p a r e c e m s ã o a s
mesmas apl icarfac
as Por pjQ x e transformadas em Propostas
concretas pela -. d
Pastoral Coletiva de 1915. A Ig r e j a luta com os
erros do modo™ i
n|smo e contra a ignorância do povo, de onde
resulta que
Papel do magistério d a vigilância contra a
penetração d e 6f . .
estes erros.

D.Mayer, em " 'AggI ornamento ' e Tradição", <Cf.


ôuarenta Anos x» c
ae Episcopado: 9 a 27), a tradição d a norma de
Julgamento
*r* ** novidades, mas não é imobilismo: é
crescimento no
mesmo sentido, na mesma direção, crescimento dos
seres vivos
que *e conservam sempre os mesmos, E são muitos os
modos de c or
romper a tradição: ou pela oposição aberta até o
d e sv io m ais
imperceptível) ou por deduções que ampliam o
conteddo d a s *
ciuissas até formas mais sutis, como novos usos na
Liturgia qu%
nio são dotados da mesma riqueza dos a n t i gos ou
insinuam nov&
conceitos rei ig iosos.

199
A vigilância deve ser constante e aguçada porque o«

tutores destas ações corruptoras são de natureza vrfriat assl»

como hâC gente de boa fd, que por ignorância ou ingenuidade tenta

apenas obter uma nova expressão da verdadeira Igreja» hrf tamtxfm

t astdcia do demônio que se serve destas testas intenções para

desgarrar os fidis da ortodoxia catdlica .

Por isso, a norma dò Magistdrio Eclesiástico deve ser


aquela sintet izada por S. Paulo: "ainda que algudta - nds ou um

Anjo baixado do Cdu — vos anunciasse um evangelho diferente do

que temos anunciado, que ele seja anát ema" <Gál •i ,8 >. f! tal valor

da Tradição que as Encíclicas e out ros documentos do Ma g ist dr Io

ordinário do Papa sd são infalíveis nos ensinamentos

corroborados pela Tradição, ou seja, por uma doutrinação

contínua, atravds de vários papas e por largo espaço de tempo.

De acordo com esta ldgica, o bispo e seus auxiliares

devem não sd transmitir a sã doutrina como fazer viva profissão

de fd atravds de atos piedosos que vivificam a fd! meditação,

exame de consciência, oração contínua e, de modo especial, a

reza cotidiana do terço de Nossa Senhora. Tal disposição, embora

partilhada por todo o sacerddcio catdlico, sem ddvida,

encontra, como obstáculo, a disposição para ênfase em outros

aspectos, como a atenção pela dimensão social dos problemas

vividos pela População e que parte do clero vinha adotando

legitimamente, principalmente após as recomendações do Concilio


Vaticano II
Por sua vez, a exploração pela «filia da participação da

Igreja junto aos problemas sociais das populações de baixa r e n d a

tornava aguda, a distância entre estes "padres progressist as" c

aquela parte do clero que se dedicava CKdutlvaaentt á vida

espiritual e, em termos materiais, apenas a um ass ist enc ia 1 Isao

nunca suficiente. Ao mesmo tempo, tal diferença era «ala

expressiva na medida de que D.Mayer e seus seguidores mantinham**

se distanciados da imprensa, resumindo sua presença V coluna

semanal no jornal de Campos.

Na concepção de tradição e magistério que adotava, a

tinica relação possível com a massa era de distanciamente de sua

rudeza, sempre carente de evangelização — nisso contido a

catequese nos moldes tradicionais - ou a aproximação relativa

via uma linguagem comum, senhor ial, onde se resguardasse o

reconhecimento do poder espiritual sob. e o secular. A todos

eles, ricos e pobres, sd lhes cabia curvar-se ante a Sociedade

Perfeita e atende-la em suas exigências. Sem nada ter a aprender

no mundo, a Sociedade Perfeita expressava a sua soberania

através da qualidade de guardiã da verdade revelada, sempre

super ior à ordem da contingência.

E neste quadro que vai se conformando a crescente

desilusão com as recomendações do Concilio Vaticano II. Se no

início da década de 70'ainda era possível Interpretar as

intenções do mesmo de maneira relativamente serena, tal atidude

®>sigia a vigilância que desembocará em desencanto. Assim na

201
Cl^cul^r «fcO Clerof de 197® ICf • Ounr ent n Anos d® E p Iteo^sdo^ J 1®

i 37) D>Hayer afIrma* o concilio dese ja que m 1 grejp rtnove p

sua face» mediante a sant If Icacao Maior de %g \a% atubrot» f

nesse eent Ido sue se há de entender o 'aggiornaacnto' d® que

falava João XXIII. E mediante a santificação de seus filhos que

a Igreja atrai ao suave Jugo de Jesus Cristo o s que se acham

fora se seu grêmio. Assim declara o Papa, assim atesta a

Hlstdria da Igreja, assim testemunha a Sagrada Escritura*

(Cf.Idems 35). Mas este aparente alinhamento do Cone filo

Vaticano II com Trento exige a explicitação das categorias

chaves, que aparecerão na Carta Pastoral de 1971,


wAgg Iornament o * e Tradição", cujo teor Ja examinei acima.

Os acontecimentos que envolveram o Vaticano e

D.Lef&bvre, com quem DAC partilhava concepções b ásicas

defendidas pelo grupo COETUS INTERNACIONALIS PATRUM, culminando


com a suspensão "A divinis" de Lef&bvre em 1976, acirrou a

certeza da inviabilidade de um diálogo com o Vaticano,


confirmado pela direção que era dada à religião pelo substituto

de Paulo VI, j«í em 1978. E neste quadro que é construído o

discurso da transmissão do episcopado, em 1981 e o manaifesto

escrito em colaboração com D.Lefbvbre em 1983, numa postura que

culmina com a consagração dos bispos tradicionalistas em 30 de


Junho de 1988.

A postura anti-modernista, defendida em nome da

preservação da apoiava-se na encfclica Pascend i, onde Pio X

202
condenava a a p o s t a s ía dos sodern 1st as. Estes ter Iam abandona4o a

ctcolastica» Pr Inc ipal »ent e o tomismo» cujo v ito r re sid e —

segundo s e u s d e f e n s o r e s - na capa. 1ade de apreender a coisa t a l

coao e, nao como querem construções filosóficas outras soe

escapam a este p r i n c í p i o do senso—comum. Nao s e n d o considerada

como um sistema arbitrário, coao qualquer outro» o tomismo é

tido como c u r v a n d o — se sobre a realidade. Por isso Leão Xlll


afirmava na Aeterni Patris que o tomismo d uma filosofia

solidamente f i r m a d a nos princípios das coisas'*.

Segundo D.Maycr , a crítica dos teólogos do novo


cristianismo» acusando o aristoteli smo como uma f or mu l a d o
dogmática tradicional à qual a Igreja não deveria permanecer

amarrada» pe l o fato de Justificar muito dos seus dogmas» era


destituída de fundamento.

Isto porque os dogmas são verdades imutáveis» não


podendo evoluir de um sistema para outro» de acordo com as

necessidades cultu r a i s . Se um grupo da Igreja aponta as

possíveis revisões que o desenvolvimento do conhecimento pode


trazer isso é T ou a p r o x i m a — se de uma heresia» já que as fórmulas
instituídas pela Igreja têm que ser Imutáveis» pois que

elaboradas sob a assistência do Espírito Santo e fixadas pelos

Cone ílios e pela Tradiçao» exprimindo com exat idão o conceito

revelado.

203
Seguindo este racioc T m o , para O.Mayrr o para oa

males do "agglornamcnto'' é a fidelidade à t r a d U a o # Por iaao

cier seguindo as palavras de P a u l o VI insta que a palavra dm

Deus chegue aos f id is c o n t e m p o r â n e o s ea sua plenitude, que as

obras realizadas por Deus sejara a p r e s e n t a d a s sem alteração* O

que s d é p o s s Tvel mediante a f i d e l i d a d e "à t r a d i ç ã o initerrupta

que liga nosso cristianismo à f é dos Apdstolos* Assim, o Bispo

deve estar atento para que os e s t u d o não venham a a t r a ícoar

nunca a verdade e a c o n t i n u i d a d e da do u t r i n a da Fé* A verdadeira

teologia se apoia sobre a p a l a v r a de Deus fnseparrfvel da S a g r a d a

Tradição como sobre um fundamento perene"

Como o campo da L i t u r g i a é onde mais visivelmente se

expressam as transformações por ventura introduzidas na m e n s a g e m

religiosa aquele espaço deve ser resguardado de qualquer

mudança. O rito sagrado, externai izando os s i g n i f i c a d o s dados

aos muitos aspectos da c rença, não repositórios tf* verdade

revelada, pr in c i pal m e n t e n u m a r e l i g i ã o que se c e n t r a no f a t o de

a divindade ter operado o m i l a g r e de conviver entre os h o m e n s e

trazer diretamente a s u a m e n s a g e m de r e d e n ç ã o através de um

sacrifício que os fiéis podem presenciar em cada missa que

ass ist e m *

O impacto do N ovus Ordo Missas sobre D.Mayer r vai

t omando vulto no próprio processo de a u to-exc 1usão em que o

grupo se confinou. J u n t a m e n t e c o m os "t r ad ic iona 1 Ist a s " de D,

Leffebvre- Seja porque a c o n v i c ç ã o do b i s p o foi crescendo no


processor ou Por u m a m a n o b r a estratégica, o falo 4 m um t%m

Diocese de C a m p o s , a n t e s da substituição, a missa n o r i l o » n t i » o

*ra celebrada apenas em a l g u m a s pardquias, sendo " t o l e r a d a 4* a

posição oficial c u j a " i w p r o p r iedade" tornou-se cada vti ma Im

Insuportável «a m e d i d a em que as mudanças que a acompanhavam

atingiram d i r e t a m e n t e os h á b i t o s culturais em r e l a ç ã o ao ato.

As c r í t i c a s a uma in'f i1 tração modern Ist a vão cncont r ar ,

na oficial iz a t ã o da Nov u s Ordo, levada b Diocese de C a m p o s pelo

bispo D.Navarro, um combustível para alimentar o debate

doutrinário al i v e r i f i c a d o . E para entender seu peso é preciso

verificar o lug a r que a liturgia ocupa na prática católica.

III.4 - A Q u e s t ã o L i t d r g i c a

Tomando de Mau s s <Í968> a definição de rito rei ig Io s o

como ação que e x e r c e seus efeitos graças à interv e n ç ã o de

potências s a g r a d a s , não 4 de estranhar que a crise na D i o c e s e de

Campos t e n h a e l e i t o a missa como um dos pontos r e f e r e n c i a i s do

antagonismo que o bis p o emérito e um grupo de padres vinham

conformando com relação à Igreja Romana. 0 aparecimento da

"Novus O r d o M is s a e " soou, em alguns ouvidos, como a mai s clara

prova de que a I g r e j a estava em franca adesão ao "modernismo",

, Já que m o d i f i c a v a a "Missa Tradicional".

Fixando-se num trecho do decreto "Quo Primum", do pa p a

[ S. Pio V, de 19 de julho de Í570, onde se lês "... Com este


decreto, a v a l e r NA P E R P E T U I D A D E , d e terminamos e ordenamos que

O
UUKCA *er* nada acrescentado, o.ititfo ou alterado neste

um grupo de diocesanos, clero e iíl*# encontrou

argumentos para alimentar um posicionamento, visível desde m


(8)
ípoca do Concilio Vaticano I I , vem construindo tua

especificidade até nossos dias.

A " N o v u s Ordo", anunciada cm abril de 1969 por Paulo VI,

representa uma das expressões mais visíveis da nova perspectiva

que se abria para a Igreja com aquele concilio, cuja

Constituição "Sacr osanct um Concilium*, promulgada em 4 de

dezembro de 1963, refere-se h Liturgia. Esta constituição foi a

primeira do concilio porque a liturgia 4, ela mesma, um meio de


<9 >
renovação

Porque "não é abstrata, desencarnada, é P antes, do reino

das mediação sensíveis e constitui-se de uma linguagem simbólica

e ritual" (Revista de Liturgias4), a liturgia é histórica,

adequando-se na forma de expressar os sentimentos da comunidade

e ciente da doutrina que os constitui em comunidade. Um breve

resumo da histdria da Liturgia Cristã o prova, mostrando a

importância que tiveram as inovações introduzidas e a validade

das sugestões propostas no Concilio Vaticano II.

Segundo Valentini (1903), nos seus primórdios a igreja

não possuía culto próprio porque ainda não estava totalmente

destacada do Judaísmo. As formas tipicas de culto vão se

constituindo no processo de consol idação/expansão do


cristianismo» o importante, a finalidade dl ti ma era a reunião

206
dos crIstãos, que não tinham ainda regras precisas para estes
ti '
| encontros. Mantinham apenas uma tradição comum, com as devidas
variações nos costumes en função das diferenças culturais.
|
A uma primeira fase de improvisações 1 Iti/rgicss (até o
século IV) sucede a época dos "satrament rfr ios", colccSes de
orações para todas as cerimônias litérgicas, que deram orfg e m

aos diversos ritos* o alexandrino, o antioqueno, o romano.


Naquela época, teve relevo o Sacramentário Gregoriano, elaborado
sob Gregór io Magno, que foi bispo entre 590 e 604. Da f até o
século XVI, já nSo há tanto criacão de novas fórmulas 1 Itiirglcas
e sim, importações e adaptações «*s existentes. Por volta do
século XII, por exemplo, já estava fixado o calendário, o
leciário e o canto litórgico. No entanto, a liturgia voltava-se
mais para os clérigos e religiosos que para os fiéis, que
desenvolviam suas devoções paralelas.

Com o Concflio de Trento assiste-se a publicação de


decretos dogmáticos e disciplinares que apontam para uma
renovação litdrgica. Na linha da doutrina, eles afirmavam o
valor do sacrifício da Missa, a legitimidade dos ritos que a

celebram, destacando as duas mesas da assembléia eucar fst ica* a

mesa da palavra de Deus e a mesa da refeição do Senhor,


manifestando o desejo de que os fiéis se aproximem dela com

freqüència para a comunão eucarística. Quanto ã disciplina, são

apontados os abusos que devem ser evitados na celebração da


Missa. Em continuidade, foi promulgado após o Cone Í1Io, em 1568,

07
obrevlário reformado, e em í 70, foi publicado o ftltaa »«<».

também conhecido como Missal de S. P V.

A preocupação daquele tone fI io em n o rm alizar ■ vid a

católica se expressa ainda na elaboração de um catecismo e d c u m

Index, onde eram listados os livros proibidos aos flrfls» bem

como na criação da Congregação dos Ritos, dest inada m

estabelecer os detalhes tanto da missa como dos sacramentos, Mas

o período de estabilidade que se segue, garantido pela

uniformização litdrglca, parace dar mais laportlnc ia bs relacocs

externas da Igreja que b vivência espirituais o calendário se

enche de festas de santos, inclusive para provar a suprrmacia d a

Igreja romana diante da Igreja luterana.

Só no início do século XX o apego bs normas vai ser

superado pela consciência da necessidade de uma r e novação

pastoral: □ papa Pio X, em 1903, busca revitalizar o v e rdadeiro

espírito cristão pela participação de todos na Cele b r a ç ã o

littírgica. Favoreceu a comunhão freqííente, a comunhão das

crianças e a reforma do canto gregoriano. Por sua vez, em 1939,

Pio XII modificou as leis do jejum e as missas vespertinas,

possibilitando ainda a publicação dos textos da missa em duas

línguas, para facilitar a participação do povo.

Mas é com o Concilio Vaticano II que o esforço de

renovação se completa, como se pode verificar pelos Princípios

que informam o que tange b liturgia:

200
P princípio da participação at < « consciente do p o v o , que v» l

Incidir sobre aqueles aspectos que impedia» um* m»tor « »«j«

frutuosa participação dos fiéis?

2) princípio da natureza comunitária da Liturgia, co rre lato Jk

idéia de que a natureza da Igreja é ser comunidade, expressai

no afirmação de que as ações litdrgicas não são ações

privadas, mas celebrações da Igreja, que é o sacramento da

un idade .

3) princípio da descentralização na Liturgia, que reafirmando os

direitos e deveres do papa e dos bispos quanto «*• questões


(10 >
litdrgicas diz que "cabe também «is competentes

conferências territoriais dos Bispos, de vários tipos,

1egitimamente constituídas (...) orientar na sua região tanto

a ação pastoral litdrglca como promover os necessários

estudos e experiências, toda vez que se trate de adaptações a

serem propostas ã Sé Apostólica" (Cf.SC 44, apud Valentini,

1985S33) .
princípio de fidelidade ã tradição, que lembrando as
enriquecedoras experiências com que o Mistério foi vivido,

recomenda que cada uma das partes da Liturgia a ser reformada


deve ser precidida de cuidadosa investigação teoldgica,

histérica e pastoral.

. Tais princípios informadores da liturgia corroboram o

dignificado crucial que é dado por Geertz aos ritos religiosos,


* ^ missa, em particular, por Casei. Aproximando a linguagem dos
d°is, digo que a missa é uma "realização cultural", pois não
representa apenas o ponto no qual os aspectos d is p o s 4c io n a !a r

conceituais da vida religiosa convergem para o crenta» «as o

ponto no qual pode ser melhor examinada pelo observadoe o

Interação entre eles (Geertz,1970*12?).

Levando em conta a par t icu 1a r idade da p e rsp e ctiva

reiigosa frente às perspectivas do senso-coaum, da ci#ncla ou da


<ii )
arte , Geertz afirma que o papel do ritual d dar origem b

convicção "de que as concepções religiosas sSo verfdicae • da

que as diretivas religiosas são corretas (Idcmii20>. "No ritual,

o mundo vivido e o mundo imaginado fundem-se, sob a mediação da

um dnico conjunto de formas simdlicas, tornando—se um mundo

üfnico e produzindo aquela ' transformação idiossincrática no

sentido de realidade que fez Santayana afirmar* 'Cada religião

viva e saudável tem uma idiossincrasia marcante* seu poder

consiste em sua mensagem especial e surpreendente, e na direção

que essa revelação dá à vida. As perspectivas que ela abre e os

mistér ios que propõe criam um mundo novo em que v iv e r , e um

mundo novo em que viver, quer esperemos ou não usufrui -lo


totalmente. é j ust amente o que desejamos ao adot arnos uma

religião" (Geertz,1978*Í29 e í01) .

No âmbito da literatura católica. Casei (1983) afirma

que a missa é o centro da liturgia. E ela que contem o mistério

redentor na sua fonte mesmo - a paixão e a ressurreição do

Senhor. Liturgia, aqui, não é tomada como um ritual ismo, que se

esgota na estética nem na ostentação pomposa e calculada. Para

210
Casei, é preciso ver a liturgia como " a revelacao e a r e a l i z a ç ã o

do mistério do Cristo, tal como foi revelado no N o v o Testam ento

e tal como se continua através dos séculos na Igreja, para a

santificar e para a sobrenatural izar. A liturgia dos santos

mistérios d a atividade central e vital para a religião cristã"

(Cf .Casei , 1983:4?) .

Como frisa o prrfaciador de Casei, Neunhauser, "a

liturgia tem a conotação de ação sagrada e pode ser entendida

como mistério, sacramento. Na verdade, celebrando » obr a

redentora de Cristo nestes atos sacramentais da liturgia, sob o

veo dos signos sagrados, em virtude da palavra dada pelo Cristo,

participa-se da realidade original da obra do Cristo. A ação

salvffica do Cristo torna-se presente a nds, que celebramos ess a

obra. Não se trata, pois, de uma repetição de um ato h i s t órico,

mas de uma presença sacramental .su i generis, diffcil de

explicar". <Idem:XXIII>

Este caráter pedagógico da missa, como acontece

pr inc ipal ment e em "rituais mais elaborados e geralmente mais

piíblícos que modelam a consciência espiritual de um povo, aquele

nos quais são reunidos, de um lado, uma gama mais a m p l a de

disposições e motivações e, de outro, de concepções

metafísIcas"<G e e r t z ,o p •c i t .:129>, transparece no sentido que é

dado a esta celebração: "E certamente o efeito da obra do C r i s t o

que nos é comunicado. Mas isso não é suficiente: nòs nos

tornamos participante da obra do Cristo, "con-sepulti , con-


rcsuc ítat í , c o n - v l v l f icat i", segundo a expressão de S ã o P a u l o km

tuas E p í s t o l a s (Casei , 19B3*XXIII)«

Como ensina C a s e i , o ;,cr ist ian is b o , pela sua herança»

teria, na N o v a Aliança, Novo Testamento, abolido os s a c r if f e i o s

exteriores, r i t u a i s e materiais do paganismo e do jud« ítto, O

cristianismo a s s u m e que sd há um sacr if fc io espiritual, segundo

a expre s s ã o v iva , a " O b 1at io rat ional is" do Canon da missa

romana. Mas esse sacr if fc io esplr11uai se ident if ica com o

sacr 1f fc io da missa. por t ant o , também com a 1 it ur g ia ext eri or ,

real izada em comum pelo padre e pelo povo . Ele é 1 igado a

elementos materiais do pão e do v in h o , mas a celebração

sacri f ic ial continua pura de toda a adjunção material e externa,

porque sua ação visfvel e objetiva que releva do dom fn io

superior e s e n s T v e l se prende à realidade totalmente espiritual,

sob o veo das e s p é c i e s místicas, o Cristo, Filho de Deus,

revestido na n a t u r e z a humana torna presente o dom do amor total

e espitirual que ele fez ao Pai celeste, por sua morte na

cruz"< Idcm s i29 > .

Ao e x p l o r a r o caráter sacrificial da missa, Jung <1979)

lembra que e s t e é o ritual em que o projeto cristão é melhor

simbolizado. E na missa que se dá todo o mistério: é o momento

do sacrifício e da transformação a que é capaz o conteiído

religioso. O a c o n t e c i m e n t o ritual da missa assume essa situação

e a transforma, gradativamente, até o momento culminante. que d


a consagração, em que Jesus Cristo» na qualidade de s a c r í f i c a d o r

e sacrificado pronuncia as palavras decisivas» pela boca do

sacerdote. A partir desse momento» Jesus Cristo está presente*

no tempo e no espaço. Mas sua presença não é um reaparec imentof

consequentemente a consagração não é a repetição de um ato

histór ico e ónico, mas é a expressão visfvel de um fato que

perdura eternamentes o rasgar-se da cortina dos c o n d i c i o n a m e n t o »

temporais que separa o espírito humano da visão do

eterno"<Cf.Jung, Í979:3 ss>.

A universalidade da missa d ainda o ponto de encontro

das muitas formas de espiritualidade contidas na Igreja» cujo

mistério pode ser celebrado numa pequena capela ou numa grande

catedral» entre "eremitas e missionários» como StQ Antonio ou S.

Francisco Xavier; uma Teresa de Lisieux, que nunca deixou seu

pequeno carmelo; reis e papas, como S.Luiz e S.Pio V, e n v o l v i d o s

com a história dos seus tempos; S. João Crisóstomo e StQ

Agostinho» grandes gênios da oratória ou teológicos; Bernardete

e João Maria Vianney, os simples StQ Tomas de Aquino, a

santidade da inteligência e S, Bento Labre, o da p o breza


peregr inante" (Congar, Í964si07).

Da mesma forma que a. Igreja recobre esta diversidade de

esp iritualidades» de escolas teológicas etc.» os rituais

católicos - e nestes, principalmente a missa - exercem uma

espécie de "Pax Cathol ica", ao atualizarem em seus discursos uma


<Í2>
sistemática "neutralização" de posições, grupos e catego r i a s
sociais (Cf-Da M a t t a ,1979*55) .

Com a importância que tem a missa para o c a t o l i c i s m o , a

promulgação do Novus Ordo Missae representou uma intcrvenclo

delicadíssima num ponto vital da vida religiosa. Com ela

expressava-se a efetivação dos princípios informadores da

Liturgia, ant er iorment e mencionados r que continham em sl

elementos muito valorizados pela contemporaneidade* maior

participação dos fiéis? certa descentralição da autoridade

romana; maior receptividade á diferenças culturais adaptáveis


ao modelo catdlico.

Mas dois significados antagônicos aí se pressentia* de


um lado, o arejamento dá Igreja e a possibilidade de adequação

plena aos sentimentos de fraternidade e liberdade; de outro, a


implantação do tão temido modernismo. E as reações logo se
fizeram presentes. Não sò em dioceses como a de Campos, onde o
bispo e alguns padres procuravam seguir á risca o modelo
tridentino (embora convivendo com o desagrado de muitos fiéis e
com a insatisfaçao de alguns padres), de vários pontos do mundo
catdlico, a começar por Roma mesmo, de onde partiu a primeira
<Í3>
crítica ao Novus Ordo

Os principais pontos da crítica dos Cardeais Ottavfni e


Bacci incidiram sobre o afrouxamento de princípios tomistas como
o da unicidade da verdade, cuja reiat iv ização representa absurdo
ldBico Inaceitável. Segundo eles, a Ml*»* Mov» 1*v « • pensar que

"as verdades podem ser alterada ou Ignoradas « infidelidade

para com aquele sagrado depdsito da doutrina j qual m Fá

catdlica se encontra eternamente ligada".

Essa postura.
catdl ica da M 1ssa, tal
Cone íl io de Trento, t a o incoveniente de, Ignorando os
Cânones al 1 propostas, evantar as barreira contra qualquer
heres 1a que atacasse a itegridade do Mistério". Além disso,
verdades perenes ter iam o tratadas como aspectos secundários,
de cerimonial, sendo substituídas sem se levar em conta seu

caráter fundamental para o rito.

A expressão mais Importante disso é "o quão


ultrajanteniente a fé no dogma da Real Presença é implicitamente
repudiada". Um grande ndmero de pequenas mudanças são
Indicadores deste repiidio: a diminuição das genuflexoes (como
sinal de reverência ã presentea sagrada), que foram reduzidas a
tres; a retirada da pedra do altar e de relíquias sagradas; a
forma de purificação dos dedos do sacerdote, a facilidade de

contato profano com as espécies sagradas.

Esquecia-se, na Nova Missa, a natureza redendora do

sacrifício atualizado, na medida em que as tres novas preces

Eucarfsticas omitiam a referência ao estado de sofrimento dos


que faleceram e r consequentemente, ficava prejudicada a Iú é i» «*a

função salvffica da adesão è» doutrina do Cristo.

Tão grave lacuna era ainda secundada pela diminuição da


importância de outras mediações fundamentais, como a da

Santíssima Virgem, dos Apóstolos e de todos os Santos, não mais


invocados no "Libera Nos" da Missa. Escamotear estes
intercessores é abalar a doutrina em sua estrutura, 4 criar um
novo rito quando S.Pio V havia determinado que NUNCA será nada
acrescentado, omitido ou alterado no Missal por ele promulgado

em 1570.

0 que mais estranheza causava aos críticos era a


inadequação entre as razões pastorais alegadas por Paulo VI e as

inovações de fato introduzidas no rito. Este, na verdade,


surtia dois efeitos negativos! a) frente aos fiéis, aumentando-

lhes o desnorteamento, ante a reforma dos símbolos da fé, de si


já tão afrouxada? b) frente ao clero, o resultado prático é a

agonia da consciência, já verificada entre os melhores elementos

com que a Igreja conta.

Assim, as duas dimensões do rito eram abaladas! a


jurídica, na medida em que antigas normas, devidamente

justificadas, eram substituídas; e a simbólica, já que os

significados veiculados não correspondiam as verdades

características da doutrina. 0 impasse que se formava residia

em como compatibilizar a Igreja com os valores que a sociedade

216
partilhava c mais# se isso era questão passfvel de solução»

0 que nao se pode negar d que o Cardeal Ottavlanl# por

ocasIao do C i n c i l i o Vaticano I I f cra o Presidente da CoalttSo

Tcoldg ica r s e c u n d a d o pelo P.Trom, SJ, "tedlogo oficial" da CJr Ia

Romana r que logo na instalação daquele co filo viu suas

pretensões r u irem sob a pressão da aaioria dos bispos presentes#

que resultou inclusive na substituição daquela toda-poderosa

comissão por uma outra, mista com membros do Secretariado pela

União dos Cristãos, presidida pelo Cardeal Qea (Cf» Beozzo#

1990:6) .

Isto significa que a aceitação ou nao do Novus Ordo de

Paulo VI indica um alinhamento, ou não, com a perspectiva de

João XXIII quando convocou o dltimo concilio (em cujo disc u r s o

de abertura "condena os profetas da desgraça, que sd veím erros

por toda a parte e pedem punições", segundo Beozzo (op.clt:7).

De toda forma, a ambfgua posição posterior de Paulo VI, que leva

o mesmo analista a colocd-lo entre os que se arrependeram de

algumas conseqüèncias trazidas pelo Concilio Vaticano II, foi

contrabalanceada por aquela iniciativa que, de f a t o r é um passo

no sentido de oxigenar a Igreja.

A oposição que se instala parece ser aquela que coloca

de um lado os defensores de uma perspectiva juridica que esquece

0 presente e seus imperativos, e uma outra, onde ficam aqueles

que buscam enfrentar os dilemas, sem esquecer os principios da

217
d o u trin a íi qual são devotados» mas a c a t a » #ara a t u » I t t  - 1a

dimensões o u t r a s c o r r e s p o n d e n t e s ks novas sensibi l i d a d e s que se

vão conformando. Paulo VI» "o Papa d i1ater » d o * , c m o quer

Plerrard (19136:277) estaria entre os tíltímos. Ao reforaar o

rito, b u s c a v a , c o m p r o m e t i d o que era co» a perspectiva de dirflogo

de João XXIII, avançar no sentido de usa 1 inguagera sais

atualizada e» portanto, mais inteligível para a tfpoca e

aproveitando, para realize-la, colaborações de outros caspos,


< 14 >
como o da e s tdt ica

Na ocasião, o Dispo de Campos, em circular ao clero,

comunica as n o v a s diretrizes sobre a Missa, mas d na "Circular

sobre a R e v e r ê n c i a aos Santos Sacramentos", de 21 de n o v e m b r o de

1970, que a p e r s p e c t i v a dele é plenamente exposta, com o Jd foi

visto anter iorme n t e .

Para D.Mayer, a questão fundamental, que estava em Jogo,

era a da fd n u m a divin d a d e infinitamente superior ao homem. Por

isso, os p r o b l e m a s do relacionamento hoinem/d ív indade p r e c i s a v a m

ser esclarecidos, analisados, ponderando-se as vantagens e

desvantagens de qualquer alteração proposta quanto ãquele

relacionamento, com vistas a preservar a identidade de a m b o s e,

c o n s e q uentemente, a distância que os separa.

A fé no C r i s t o — Deus implica a certeza de sua presença

| real, verdadeira, substancial, no Santís s i m o Sacramento do

[ Altar. Tal p r o f i s s ã o de f é que é a do catdlico, se e x p r e s s a n ã o

210
tá através da inteligência e do« bios» ela 4 «•

atos coerentes com essa crença, atos cuja modificação In. •

ou a ignorância dos mesmo ou a nào-concor dSnc ta com os meamos.

Daí que o fiel não pode escapar de explicitá-los, sob pena «*e

ameaçar a fó que deposita na divindade.

Assim que o primeiro princípio do fiel é por •*

evidência a especificidade desta relação, o que


mediante faz
(16)
gestos consagrados pelo uso e contidos na Santa Escritura . A

genuflexão, alt'-m de atos de reverência, é ainda uma forma de

marcar a diferença entre o fiel e o infiel, na medida cm que


manifesta "reparação pelas injiirias com que a soldadesca Infrene
ludibriou do m iser icord ioso Salvador, após a flagelação e

coroação de espinhos: 'de joelhos diante d'Ele, d'Ele zombavam'

(Hat.27,29)" (Cf. Quarenta Anos de Episcopado, 1988:30).

Reverência e reparo, o ato não pode ser omitido, salvo

impedimento fisiológico, por qualquer fiel. A postura ajoelhada,

exprimindo o reconhecimento da pequenez do homem ante a

transcendência inefóvel de Deus, remete diretamente à fé nos


mistórios superiores da qual partilham os batizados, os irmãos

em Cristo. Nesse sentido, a recepção da Sagrada Comunhão não

pode ter outra postura, nem para o sacerdote, que sd enquanto

celebrante do offcio disto estã dispensado, jsC que al i ele "Agit

in persona Christi", ou seja faz as vezes de Cristo como

sacrificador, função que de modo algum compete ao fiel.

Acatar estas premissas é acatar tambóm as normas que


regem a Igreja, < que dimanam de sua tradição milenar

referendada pelos scun santos, cuja vida foi dedicada a esmerar—

se nessa humildade • nte ao sagrado. Coao neles, tal postura

não é apenas um fo> na cerimonial, e sim, a expressão de uma

pureza dessa intenção, que o fiel buscará através dos mecanismos

que a Igreja oferece, no sentido de alcançar o estado de graça

que lhe permita aproximar-se da divindade.

Demonstação de fé (via reverência às coisas sagradas) e

estado de pureza no contado com a divindade devem ser princípios

imutáveis, cuja modificação sd se justificaria - segundo S.

Tomás de Aquino - se a nova forma fosse de excelência superior

tão grande que compensasse também o mal que há em toda mudança,

quanto aos hábitos que dão vida às leis. 0 proprío Concilio

Vaticano II reforça esta posição quando afirma (na Sacrosanctum

Concilium, no 23) que não se devem introduzir modificação na

Liturgia, a não ser quando verdadeiramente necessárias, e assim

mesmo, manda que as novas fdrmulas dimanem organicamente das já

existentes. (Cf. Quarenta anos de Episcopado, Í989:3l).

Defendendo o espaço sobre o qual tem responsab i1 Idade

especial, afirma D.Mayer: "Por isso, deve-se conservar o hábito


de comungar de joelhos. E no Bispado, comungar de joelhos

sempre foi, e continua a ser determinação diocesana, que todos

devem seguir. Tanto mais que, interrogada a Sagrada Congregação

para o Culto Divino, sobre se, com o novo "Ordo" se fazia

obrigatória a comunhão de pé, aquele Dicastério romano respondeu

220
<jue, onde o costume é conunyar de Joelhos, esse costume sem s

menor ddvida convém sue seja conservado." (Idem).

0 estado de graça necessário à comunhão é alcançado por

disposição do Concilio de Trento (Ses.XIlI cãn.7) via a

Confissão Sacramental, individual e auricular, medida que foi

corroboradora por Inocência III (1676-168V) e renovada por Pio

XII (1939-1958) .

Tais recomendações se completam ainda com dois tdplcos

relativos l\s mulheres: um sobre a cabeça coberta, para

participar dos sacramentos, e que se funda no hábito imemorial,

apoiado na Sagrada Escritura (São Paul o ,ICor .11,5 ss) ; outro

sobre a modéstia nas vestes, sem o que as pessoas tornam— se

indignas de receber osSantos Sacramentos. A manutenção das


virtudes cristãs, onde "não há espaço para o sensualismo
banalizado pela sociedade, é uma forma de evitar a profanação do
Sagrado, sem o que o fiel perde sua chance de salvação e a
(17)
sociedade, como um todo, perde seus referenciais

A questão das ambiguidades introduzidas a partir do

Concilio Vaticano II são tratadas na dltima circular ao clero e


fiéis emitidas por D.Mayer enquanto bispo diocesano, datada ce

1q de* junho de Í98Í. Quanto questão litdrgica, propriamente


dita, os problemas são ressaltados no folheto "Por que a Missa
(18)
^adicional Latina ? Porque fclSQ a Nova Missa ?"
Neste, onde não falta uma foto pol leromada de uma cena

22i
ÍHPHBHHBflflM flHH

da concagração sobre a legenda "A ni«»« am


MoJ c * ••Awanhil •• • * ç uiaa Coto menor ov)df aa yf

Paulo VI com os se is pastores protestantes <pi* colaboraria coo m

"Invenção" da Missa Nova, contem ua quadro simplificado onde se

opõem as características de cada uma, preparando o leitor atra •

seqflênc ia exaustiva de sessenta e duas razões pelas quais, "em


consciência, não podem assistir a Nova Missa".

Os critérios utilizados para a conformado do quadro


são* o tempo (2000 anos de uso venerável X "fabricada" em 1969);
a natureza do rito (sacrifício X refeição); a finalidade
(centrada em Deus - estruturada para a reverência X centrada no
homem - um convite ao abuso); a origem (codificada no Concilio
de Trento X artificialmente arranjada com a aprovação de seis
ministros protestante); a potencialidade do rito (fecunda —
multidão de santos, mártires, vocações religiosas X infecunda -
seminários vazios, declínio da assistência k Missa, deserções em
massa).

Entre as razões alegadas para a não aceitação da Missa


Nova, o prejuízo da fé, a intromissão da novidade, o aviltamento
da verdade, as consequências nocivas, a negação da tradição, a
aproximação com o protestantismo, as ambiguidades que favorecem
as heresias, a negação do poder santificador do rito
|tradicional, mais da metade se concentra na intromissão da
[novidade e na aproximação com o protestantismo, indicando a
[fidelidade ao Concilio de Trento (apds o qual a Missa de 8.Pio V
foi codificada) e h per*pectlva Juridicista que da 1 i
reforçou, em oposição ha iddis de diálogo (para dentro e

para fora da Igreja) que inspirara» a convoc ação do Cone M i o

Vat Icano II.

0 confronto dos ritos expressava, assim, posturas

teológicas antagônicas, enraizadas nos seus respectivos

contextos, e com a diferença dos argumentos de defesa girando

ainda em torno dos mesmos aspectos: a tradição, o magistério r a

autoridade na Igreja e da Ig re ja no mundo.


#

Frente as pressões que recebe de várias d ioceses t»

respeito da Nova Missa, João Paulo II, concede um induto


<í9)
especial pelo qual o rito, segundo o Missal Romano de 1962,

possa ser celebrado pelo que o desejaram. £ muito provável que

esta medida seja o reflexo da polftica restauradora do atual

papa. Afinal, este pontificado, iniciado em 1978, vai se

caracterizar pela restauração tanto da disciplina e da

hierarquia no interior da Igreja, quanto pela reafirmação da

autoridade eclesiástica em face do mundo. £ sintomático que logo

em 1979, ano da condenação de alguns teólogos progressistas, com

Hans King e Sch i1 lebeeckx, o Cardeal Oddi tenha sido no m e a d o

prefeito da Congrecão para o Clero, (Cf.Lesbaupin,1990:17).

l£ este membro da Cdr ia Romana, afastado por Paulo VI por

sua atitude hostil ao Concilio Vaticano II, cuja substituição


Posterior pelo Cardeal Innocent i será lamentada pelos

223
tradicionalistas de C a mp o s q u a n d o do envio d« recursos ao

Vaticano em f u n ç ã o das m e d i d a s de 0 . N a v a r r o <Cf. C a p .il).

Mas o indulto papal r que pode ser qualificado como uma

medida restaurador» já que r e f o r ç a a a u t o r i d a d e Pont i f T e i a em

detrimento da perspectiva de maior autonomia das Conferências

Episcopais, ainda as s i m , não d eixa de ser criticados pelos

seguidores de D.Mayer. Para este, o indulto sd p o d e r í a agradar

aos modernistas, po i s a p a r e c e r a como c o n c e s s ã o ao sabor das

aberturas s ò c i o - c u l t u r a i s do mundo atual. Cm m a t é r i a publicada

no Jornal da T a r d e <6 de n o v e m b r o dc 1904) o ato é r o t u l a d o de

medida d o l o s a , por t r e s motivos: 1q — porque t o m a n d o o t f t u l o de

indulto, insinua que ab r o g a o indulto perpétuo anterlormcntc

concedido por S . P i o V, a todos os s a c e r d o r e s para s e m p r e , e em

qualquer parte, de c e l e b r a r seg u n d o o missal tradicional; 2o

porque com a a p a r ê n c i a de ser favorável aos que são fiéis &

missa t r a d i c i o n a l , na r e a l i d a d e c o n d i c i o n a - o s ã b o a v o n t a d e dos

bispos c o n t r á r i o s a e s s a missa. 3 q - doloso a i n d a porque, antes

dele, n i n g u é m , seriamente, punha em diivida a l i c e i d a d e d a missa

trad ic ional .

Mesmo de c a r á t e r restaurador, o ato pontificial merece

as cr ft ic a s de D.Mayer, em sua dimensão jur fdi ca. £ a est a

dimensão que se r e f e r e m as razões teológica s e 1 itdr g ic a s , po is

reconhecendo a relação indeclinável entre a m i s s a e a fé (n ã o

existe missa sem fé), afirma que será o r t o d o x a a missa que

contiver uma p r o f i s s ã o de fé ortodoxa, e a missa p ò s - c o n c I1 iar

224
«colhe no culto cinco postulados d» heresia luterana» por la%o»

não é aceitável.

Projetando a sua perspectiva quando ao r« 1ac Ionaoent o

devido aos outros credos, o bispo caérlto enfatiza que querer

impor a Hissa Nova caracteriza uaa perseguição religiosa,

análoga e das autoridade pagãs, que inpunhaa aos cristãos

queimar Incenso aos ídolos. E enumera os tres pontos essencias

da missa católica que estão em oposição frontal ao luteranlsmoi

1 ~ para os católicos, o sacerdócio hierárquico é distinto e

super ior ao sacerdócio comum dos fiéis; 2 - nesta doutrina, pela

transubstanciação realizada na missa, Jesus Cristo está

fisicamente presente sob as espécies do Pão c do vinho; 3 — a

missa é um sacrifício propiciatór Io , não apenas de louvor e acão

de graças, como querem os protestantes.

(2 0 )
Corroborando este viés juridicistas , em 11 de

agosto de 1985, D.Mayer publica, no Monitor Campista, um texto

intitulado "Mesma Missa ?". Neste, onde só o primeiro terço é do

autor, está reproduzido parte de um ensaio publicado em

"Itineraires", de dezembro de 1968, do dominicano P.Calmei, que

demonstra que o Cânon da Missa Nova não corresponde ao original.


(2 1 )
Ou seja, o Cânon Romano é falsificado . E o dominicano

termina sua argumentação afirmando* "É, por um verdadeiro abuso

de confiança que os tradutores se permitem chamar de "Cànon

Romano" um formulário de sua lavra, que não é nem uma tradução

nem mesmo uma parafrase... algo combinado para afastar a atenção

t'J
da essência da Missas sacrifício pr opr |c I at dr I o pr l»« nosso»

pecados. .. que não é um louvor perfeito senão porque d, e n tes de

tudo, satisfação infinita..." (Cf. Mer I et Hodie, no 7%, o u t u b r o

de 1989) .

Do confronto entre os ritos tridentino e aquele p r opo st o

no Novus Ordo de Paulo VI, dois aspectos devem ser ressaltados

na argumentação que vai conformar o grupo chamado

"tradicionalista"! primeiro, a inspiração normatizadora que

levou a destriçar as mudanças substantivas propostas, caindo

fifnalmente nas conseqüências que elas traria» para este m o m e n t o

de exposição do catolicismo que é a Missa. Segundo, subjacente a

este posicionamento normat ivista, está a idéia da simplificação

da complexidade do universo simbdlico e o consequente

etnocentr ismo de um sistema de significados dito como fechado e

fixado no tempo.

Do ponto de vista dos teólogos nos quais me apoiei, tal

intransigência liga-se ao privi1egiamento de uma concepcão

objetiva da tradição, acatada por Roma no Século XIX, e nquanto

depósito de doutrinas ou instituição transmitida pelos Antigos e

que exige testemunhas! os monumentos da tradição. Segundo a


origem, a
tradição pode ser divina, apostdlica ou
(2 2 )
eclesiástica . Esta concepeão é o ponto de debate teológico

e talvez o lugar onde melhor se explicita as tensões entre as

diferentes correntes católicas.

226
Numa perspectiva sociológica u t 11 I t a r l a t a , ligada á Umm

postura da Bwmiologta, onde o rito 4 uma 1 Inguagvn *, como tal

seu poder é o poder delegado do portador daquela 1 Inguagem,

questão Ge reduziría a um fato de autoridade. "0 siabol i««0

ritual não opera por si mesmo, mas apenas enquanto representa -*

no sentido teatral do termo a delegação* a observância rigorosa

do código da liturgia uniforme que rege os gestos e as palavras


sacramentais constituem, ao mesmo tempo, a manifestação m a

contrapartida do contrato de delegação que faz do padre o


detentor do 'monopdl io de manipulação dos bens de salvação '» ao

contrário, a abdicação de todos os 'atributos simbólicos' do


magistério, a batina, o latim, os lugares e os objetos
consagrados, manifesta a ruptura do contrato de delegação antigo

que unia o padre aos fiéis por intermédio da Igreja"

(Bourd leu,1982:115).

De um ponto de vista antropológico, há que fr isar que a

leitura acima, tal como a teológica, é uma leitura possfvel <&

partir de determinado desenvolvimento de uma escola de

pensamento) e não a leitura, como querem alguns. E enquanto

lejLlucas fiosslveis, expressões de "est rut uras de sent iment os"

espec rf icas, o maior mérito delas é dar as P ist as para as

tensoes existentes nos diferentes momentos hi st ór icos e nas

respectivas culturas. A .compreensão dos fenômenos nesta

perspectiva, emerge do jogo entre as tensões e os conceitos

empregados para "explicá-las", levando-se em conta, sempre, o

caráter redutor da palavra, incapaz de reter a densidade total

do acontecimento vivenciado.

22 7
NOTAS

Por " e s t r u t u r a s d e s e n t i m e n t o " W i l l i a m s e n t e n d e " i r p e r i l n c l a t


sociais e m s u l u c u O t d i s t i n t a s dr o u t r a s f o r m a ç õ e s sewAnticmn
sociais que foram eCKLivil ada s «' c K i s t c m de forma m m ia
evidente e I m e d i a t a " <.,.)
£ uma e s t r u t u r a de e l o s p a r t i c u 1 a r e s , ê n f a s e s r supressSet
particulares e, em suas formas mais rrconh«cfvcis, de
produndos pontos de partida e conclusões pari i c u l a r c t "
(Williams, 1 9 7 9 s136)

2- C f . âuanizota ôuos de E g i s c o e a d c * 5

3- 0 " S y l l a b u s e r r o r u m " foi o c a t á l o g o de oitenta proposições


consideradas inaceitáveis pela igreja, qu e acompanha a
enc f c l i c a Quanta Cura, de d e z e m b r o de 1 D A 4 . C uma crfticm
radical aos p r i n c í p i o s liberais, pr inc ip a l n c n t e tonceptao
liberal da r e l i g i ã o e da soci e d a d e . C o n d e n a a rslvlnülc*ç«o
do monopólio e s c o l a r pelo Cstado, a h o s t i l i d a d e ortlcni
religiosas, a afirmação, a separarão Igreja e Estado, m
liberdade de c u l t o e de imprensa. 0 S g l l a b u s foi recebido
como uma c o n f i r m a ç ã o da i n c o m p a t i b i l i d a d e r a d i c a l entre «a
dout rina c a t ó l i c a e os s i s t e m a s de p r n S a m e n t o e tíe vI d * do
século XIX <L im a ,1984 só).
Alóm disso, é int e r e s s a n t e cotejar o resumo dmm
condenações do Syllabus (o progresso, o natural ismo, o
racio n a l i s m o , o s o c i a lismo, o c omu n ismo, »» sociedade*
secretas e o 1 iberal ismo sob q u aisquer dc s u a s f o r m a s ) c o m a *
condiçoes h i s t ó r i c a s que t o r n a r a m p o s s í v e l a e x p e r i ê n c i a da
modernidade. í q ) a d e s t r u i ç ã o do g e o - c e n t r im o , i m p l i c a n d o a
emergência da i mportância da r e l a t i v i d a d e como experiência
central d a q u e l e período.
2 jb> a conquista de n ovos mundos, que significa o
d e s c e n t r a m e n t o da Eu r o p a e o r e c o n h e c i m e n t o d a e x i s t ê n c i a de
um homem universal. £ a possibilidade de c r e s c e n t e
p r e e m inência da c a t e g o r i a indivíduo. 3 a )a i n d u s t r i a l i z a ç ã o e
a t e c n o l o g i a , implicando g r a d a t i v o s c r e s c i m e n t o s d o domínio
da natureza, fim dos ciclos vitais " n a t u r • is". Estas
condições se r e f l e t e m na Igreja, a b a l a n d o os sust ent á c u 1o s
que a mantinham e eram coerentes com uma outra ordem,
diferente, de r e l a ç õ e s sociais. A r e l a t i v i d a d e , po r e x e m p l o ,
que incide diretamente s obre a questão da verdade, se
expressa. nos nuíltiplos sistemas filosóficos que estarão
competindo com o tom ismo que, a t ó então, dera conta da
reflexão s o b r e o mundo. Com o a l a r g a m e n t o d o m u n d o , a noção
de d i v e r s i d a d e se intromete, e x i g i n d o r e s p o s t a s , impondo a
necess i d a d e de catequese mai s am p l a , d e alguma forma de
relacionamento com outras ’ crenças. Por sua vez, o
d e s e n v o l v i m e n t o da I n d u s t r i a l i z a ç ã o e da tecnologia estarão
afetando as r e l a ç õ e s sociais, g e r a n d o a n e c e s s i d a d e d e nova
compreensão da família. A e m e r g ê n c i a do E s t a d o n a c i o n a l , da
s o c i e d a d e d e m a s s a s c o l a b o r a r a m no e s t r e m e c i m e n t o d o s m o d e l o s
h ieraír qu icos c a r a c t e r íst icos da Igre j a . E m termos gerais,
estas c o n d i ç õ e s toda.s a t u a l i z a r a m p r o c e s s o s d e r u p t u r a dos

228
estamentos» abalando laços tradicional* dr lealdade*»
delineando nova sensibilidade que ser J m«tr>i»«nt al i2 «da pelo
desenvolvimento dos meios de eomun icação. De ima forma ou de
outra» a Igreja ter i de dar conta destas tr ansf or m a s ô e s »
concomitantes com as c;<iyênci«s que vão surgindo no seio do
prdprio corpo ec 1c» idst ic o , áviduv de pol ft ícas capazes dc
enfrentar a nova realidade que vai se impondo.

4 - Cf.P o u l a t , 196?.

5- Por catolicismo 1uso-brasi 1 e ir o Azxi (1977) compreende •


forma pel a qual o catoli c i s m o foi atualizado no Brasil, no
per Todo que vai do início da c olonização atrf a época
imperial. Segue-se a fase do catoli c i s m o romanlaado»
implantado d e s d e o século passado» com o m o v i m e n t o dos b i s p o s
reformadores. C abe notar que a reforma catól i c a teve sua
culminação co m o Concilio Plenário B r asileiro (193V). que
r e p r e s e n t o u a o f i c i a l i z a ç ã o do espírito t r í d e n l i n o no país. A
ênfase no a s p e c t o devoc iona 1 t em suas ra íze s na hlstdrla*
tendo n a s c i d o e se desenvolvido sob a proteção ■ dependência
do p a d r o a d o p ortuguês, vai guardar esta c o n o t a ç ã o p a r t i c u l a r —
é p r e d o m i n a n t e m e n t e leigo e com caráter n i t i d a m e n t e m e d i e v a l .
Nele, dois aspectos são relevantes: 1- permitia a
p a r t i c i p a ç ã o b a s t a n t e acentuada do povo na vida da religião.
0 povo assumia a Iniciativa de diversas manifestações
r e l i g iosas» t a n t o no âmbito familiar como na vida p d b l i c a ; 2 -
a p r e s e n t a v a p r o e m i n e n t e aspecto social» pois as m a n i f e s t a ç õ e s
religiosas» impregnando toda a vida da sociedade colonial,
conduzem a religião a fazer parte, efetivamente, do
patrimônio cultural do povo. Manifestava-se através da
d e v o ç ã o ã C r u z e aos santos, cultuados em c a p e l a s e ermidas,
pela organização do povo em Irmandades e Confrarias, pela
import â n c i a dada ás romarias e procissões. A reforma
tridentina, que enfatiza o caráter sacramental do
catolicismo, vai atuar pr incipalmente neste aspecto
devocional do c a t o l i c i s m o 1 uso-br as i1 e ir o . Mas o e s f o r ç o da
r o m a n i z a ç ã o , l imita-se, in icia 1m e n t e , ao c orpo c l e r i c a l . Com
o seu d e s e n v o l v i m e n t o <que corresponde á é poca da separação
Igre j a / E s t a d o ), a entr a d a de ordens e c o n g r e g a ç õ e s v i n d a s d a
Europa a u m e n t o u a leva de agentes r o m a n i z a d o r e s . A e s t r a t é g i a
• destes conseguiu fazer deslizar o interesse das devoções
tradicionais para santos cujo culto fav o r e c i a a p r á t i c a dos
s a c r a m e n t o s e a s u b o r d i n a ç ã o maior ã h i e r a r q u i a e c l e s i á s t i c a .
Destacam-se aqui as devoções ao Sagrado C o r a ç ã o de J e s u s , à
I m a c u l a d a C o n c e i ç ã o e a São José, A Pstoral C o l e t i v a de 1915
enfatiza a i n d a o c u l t o à Sagrada Família, a d e v o ç ã o de São
Miguel Arcanjo e aos Santos Anjos da Guarda. As antigas
confrarias e irmandas vão, gradatí v a m e n t e c e d e n d o l ugar a
novas a s s o c i a ç õ e s , como a Co n g r e g a ç ã o M a r i a n a e a P i a União
das Filhas de Maria, A p o s t o l a d o da O r a ç ã o e a Liga Jesus,
Maria e J o s é , t o d a s elas sob controle clerical. Mas esta
"purificacão" do c a t o l i c i s m o foi mais e f i z a s nas paróquias
u r b a n a s . 0 m u n d o r u r a l , por seu isolamento e d i s p e r s ã o , f i c o u
r e l a t i v a m e n t e f o r a d e s t e processo. < 0 1 i v e i r a , 1985) .

229
6- Se gundo t ima (1984), os catdlicos or <ü»n ( da década dr 30
eram a c nerasa de moralizarão do paT*. Dr acordo com cl*r*
"Superada a fase em que a I q n j a esteve «ob a 'tutela
sufocante, do Estada (monarquia) »• aquela em que rstcvr
'expulsa ua vida pública' (primeira repdblica), tiicontr«vn-«c
naquele m o m e n t o alicerçada e» uma 'florescente açSo c a t ó lica'
que podia aspirar um 'Estado mtcgral m e n t e católico'" (Lima,
op.cít.:50). Foi a intensa mobilizarão dos católicos que
garantiu r e l a t i v o sucesso da Liga Eleitoral Católica, para o
que m u i t o con t r i b u i u a atividade dos Congregado» hariann».
Plínio Correia de Oliveira, então com 24 anos de idade,
obteve a maior votação individual de todo o país, 0»
católicos de São Paulo que representaram a LEC inscrrvrraw-se
como candidatos da "Chapa llnica por São Paulo Unido",
composta, alóm dos católicos, por membro» do Partido
Republicano Paulista, Partido Democrático e integrante» d»
Federação dos Vo 1u n t á r i o s . A vitória foi superva 1 orisada
pelos c a t ó l i c o s na medida em que a chapa conseguiu eleger 1/
repre s e n t a n t e s de uma bancada de 22 deputado» (Lima, 1904347),

7- Extraindo do 0 Le g ion árI o a reflexão que define o "Estado


Católico", Lima (1984) isola os seguintes a 9 pectosi 1 - que o
Estado católico, no sentido de uma determinada forma de
Estado, como a monarquia, a ar Istocracia , democracia, não
existe. Mas ó possível falar dele, seja qual for a forma que
tome, d e sde que reconheça na Igreja uma sociedade perfeita
superior. "Será, pois, católico, todo o Estado que
reconhecer c ertos princípios fundamentais da sua organização,
princípios que resultam da moral, isto é, da lei natural
confirmada e reforçada pela lei divina do Cristianismo de que
a Igreja é a única intórpretc infalível". Tal Estado, para
atender estes requisitos, deverá garantir pelo menos tre»
pontos básicos! í - reconhecer que a Igreja é a portadora da
verdade, da n d o - l h e plena liberdade de acão no desempenho de
su missão essencial, a salvação das almas; 2 -coadjuvá - 1 a nessa
tarefa, f a v o r e c e n d o a ação católica e dispondo a sociedade a
receber a influência da Igreja por uma organização adequada
em que, por exemplo, não haja perigo de se desenvolver o
gernie de d o u t r i n a s ímpias e subversivas; 3 - organizar toda a
sociedade, quer as relações do Estado com o indivíduo, as
famílias e os demais grupos sociais, quer as relações dos
indivíduos, da família, dos grupos entre si, segundo os
princípios da justiça e da caridade, de acordo com as leis de
Deus e da Igreja. (Lima, o p . c i t .:82>.

A p o t e n c i a l i d a d e de mudanças que se colocou com a c o n v o c a ç ã o


do C o n c i l i o V a t i c a n o II, em janeiro de Í959, por João XXIII,
suscitou r e a ç õ e s diversas. Uma delas expressava o cuidado de
preservar o que fora estabelecido no Concilio de Trento,
reforçado pelo Vaticano I e, mais tade, pelos papas anti-
modernistas. Constituiu, durante o concilio, o "Coetus
Internaciona 1 is Pat r u m " , batalhando pela condenação do
comunismo, pela rejeição do ecumenismo e da liberdade
religiosa. C o m p o s t o por figuras que detinham, ató então, "o

230
controlc cio c ^ n t r o roM&no , o nQotn 9 ^ upo t^fif em 0«H^rcvl
Lcf bbvrc b b u cour dcnndor *a 1 s jM(>ar ( aitt c > e cunu arcrct 4r ,u_
geral, D.Geraldo de Proença Sigaud, bisra de Oiawanttna.
Hinas^ . (Cf. B e o z z o , 19V 0 ) Chaao a atenção para a «*nt ig«
rei acao entre D.Sigaud e o então bispo da Diocese dr Caaros.
D.Antonio de Castro M a y e r , sagrado em maio de 19<MJ por
D.Car 1o Chiaro, na época NiJncio Apostólico no Brasil (c t e n d o
como um dos c o — sagrante o bispo de Diamantina), Hintrrii co»
D.Sigaud forte afinidade de posicionamento* a mbos «c
al Inharao contra os anseios por refor m u 1ações poIfticas t i d a s
como imprescindíveis por parte da população b r a s i l e i r a , como
a Reforma Agrária. Pôster iornenle, acirradas as tensões c o m o
golpe mil itar de Í964, os dois bispos se destacarão como
defensores da Igreja contra o que c h a mavam sua
"esquerd i z a ç ã o " .

9~ Na Introdução deste documento pode—se ler* "O sacrossanto


concílio p r o p õ e — se fomentar sempre mais a vida cristã entre
os f ié is ; acomodar melhor lis necessidades de nossa é poca as
instituições que são suscetíveis de mudanças; favorecer tudo
o que possa contribuir para a união dos que crfcem em Cristo;
e promover tudo o que conduz ao chamamento de todos ao s eio
da Igreja" (GC í) tC f .Vaientini,1905*31) .

Í0-A dependènc ia a Roma está consagrada nos seguintes cânones s


a> "Sò o Sumo Pontífice tem o direito de recon h e c e r e
estabelecer qualquer costume litdrgico, de introduzir e
aprovar novos ritos e mudar aqueles que julgar deverem ser
mudados (Cân.í2í7); b): "Os Bispos, por seu turno têm o
direito e o dever de vigiar diligentemente que as p r e s c r i ç õ e s
dos sagrados cânones relativos ao culto divino sejam
pontualmente observadas" (Cân.í2ói> (C f .Vai ent in i , 1985*33).

ii-Usando um critério Instumental para a distinção das t res


. p e r s p ectivas,Geertz diz que a religiosa difere da p e r s p e c t i v a
do s enso— comum porque se move além das realidades c o t i d i a n a s ,
em direção a outras mais amplas que as corr igem e as
completam. A preocupação definidora dela não é. a acão sobre
estas r e alidades mais amples, mas sua aceitacão* a fé nelas.
Nesse sentido, diferencia-se também da perspectiva c i e n t i f i c a
que questiona as realidades da vida cotidiana, a partir de um
ceticismo institucionalizado, que dissolve o dado em um
espiral de hipóteses probabi1 ísticas - e ainda da p e r s p e c t i v a
da arte, porque em vez de afastar toda a questão da
fatualidade, manufaturando deiiberadamente um ar de p a r e c e n ç a
e de ilusão, ela aprofunda a preocupação com o fato e p r o c u r a
criar uma aura de atualidade real. Assim, " a perspectiva
religiosa repousa justamente nesse sentido de
'verdadeiramente real' e as atividades simb ó l i c a s da
religião, como sistema cultural, se devotam a p r o d u z i — lo,
intensificá-lo e, tanto quanto possível, torná-lo inviolável
ks relações discordantes da experiência secular. Mai s uma
vez, a essência da acão religiosa constitui, de um ponto de
vista analítico, imbuir um certo complexo específico de

23i
invert idas : Deur» desce sobre os homens c os homens sobem ml é
D e u s r o b j etos sagrados são incor por ados aos hssf um
local apropriado para a confusão de cat egor tasw . (
interessante perceber que a purificação exigida para a
participação em certas situações da missa va í ser ponto de
discórdia na Diocese de Campos)* "A consc q(16nc ia éf
paradoxalment e * a conjunção na disjunção* c o resultado é uma
evitação que se manifesta no conjunto dos gestos controlados»
Mas <í preciso observar que estes dois momentos s3o
gramat icalmente relacionados! a inver são vem depois do
reforço* depois que se acentua a posição de pecador é que a
comunhão é real izada e o perdão* concedido* Creio que esse
exemplo revela bem o caráter e m irv temente paradoxal do
momento chamado religioso* Pois aqu • trata-se de criar um
jogo onde não haver ia perdedores nem ganhadores* E de
Inventar e manter uma relação onde as partes que estão em
ligação têm que estar necessariamente separadas e divididas"
<Cf. Da Matta* 1978:44).

13- Em 13 de setembro de 1969 os Cardeais Ottaviani e Bacc i


enviaram documento a Paulo 91* acompanhado de um Estudo
Crítico sobre o Novus Ordo Missae* onde alertaram para
problemas de variada ordem: filosóficos* teológicos*
evangólicos* passíveis de trazer efeitos nocivos para a fé
católica. <Cf. "Porque a Missa Tradicional Latina?* s / d ) •

14- Sensível a importância do espaço para a realização de


qualquer rito* Paulo VI assim se dirige aos artistas* num
momento em que as sugestões do Novus Ordo Missae estavam em
elaboração s
Para todos vós* agora* artistas que sòis,
prisioneiros da beleza
e que trabalhais para elas poetas e letrados* pintores*
escultores* arquitetos** mJsicos* homens de teatro e
c in e a s t a s ...
A todos vós* a Igreja do Concilio afirma pela nossa vozs
Se sois amigo da autêntica arte* sois nossos amigos*
Desde há muito que a Igreja se aliou convosco.
Vós tendes edífiçado e decorado seus templos*
na linguagem das formas e das figuras
a tornar perceptível o mundo invisível.
Hoje. como o n t e m , a Igreja tem necessidade de v<$» e volta-se
para v ó s .
E vos diz pela nossa voz* não permitais que se rompa uma
aliança entre todas fecunda. Não vos recuseis a colocar o
vosso talento ao serviço da verdade.
Não fecheis o vosso espírito ao sopro do Espírito Santo.
0 mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para não
cair no d e s e s p e r o
A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coracão dos
homens,
é esse fruto precioso que resiste ao passar do tempo,
que une as gerações e as faz comungar na admiração.
E isto por vossas mãos." -
(Cf. Rev i s t a de Liturgia, na 75, maio/junho 191)6*4)

15-Em maio de 1988 , seguidores de D.Mayer que se assinam "Os


padres de Campos ", publicaram um opiísculo (Quarenta Anos de
Episcopado) com alguns de seus escritos. Na ocasiSio,
comemorava~se o 40u aniversário da chegada daquele bispo cm
Campos. Nesta p ublicagão encontra-se* 1) a Carta Pastoral
" 'Agg ionament o ' e Tradição", de 11/4/1971; 2) Circular
sobre a reverènci a aos Santos Sacramentos, de 21/11/1970;
3) a Carta a Paulo VI, de 25/1/1974; 4) a Circular
"Observações sob re a pureza e a integridade da fé", de
ÍQ/6/Í981; a Carta Aberta ao Papa, co-assinada com
D.Marcei Lef&bvr e, de 21/11/1983; e uma "Breve síntese dos
pr inc ipa is erros da eclesiologia conciliar' »em data.

16-Na Santa Escritura, a genuflexão é o sinal da adoração.


"Assim, são louvados os milhares de judeus que 'não curvaram
os joelhos diante de Baal ' (Rom.,11,4); e, a respeito- do Deus
verdadeiro, diz o Senhor em Isaías que, 'a Ele se curvará
todo joelho' (44,2 3 - C f .R o m .í4 ,i 1) . Mais diretamento a J e sus
Cristo, declara o Apóstolo que ao seu nome 'dobra-se todo
joelho, no Céu, na terra e nos infernos '<F i 1.2,10 ) .
Alias, era a maneira como externavam sua fé no Salvador
aqueles que lhe pediam algum benefício (C f .M a t .17,14 ) ;
Marc.i,40)" (Cf. "Quarenta Anos de Episcopado, 1988*30).

17-"a Sagrada Escritura lembra que 'as vestes do corpo, o riso


dos dentes e o modo de andar de um homem fazem-no conhecer '
(Ecl.19,27). E Pio XII comenta* 'A sociedade, por a s sim
dizer, fala com a roupa que veste, com a roupa revela suas
secretas aspirações, e dela se serve, ao menos em parte, para
construir seu próprio futuro' (Disc e Radiornes
vol .í9. p é g .578)" (Cf. Quarenta Anos de Episcopado, 1988*35).
A ênfase neste aspecto faz lembrar a preocupação com o
retorno de uma "cr istandade" perdida mas desejada ainda, como
o foi, no projeto de um "Estado católico", já comentado na
nota ii.

233
18-0'Folheto pol Icromado que «prevenia as sessenta e duas rasõ«:s
porque a " Missa Nova" não deve ser aceita ^ apdcrifo. Os
erros de o r t o g r a f i a que apresenta levas a crer que não passou
pelo crivo dos padres, sempre muito cuidadosos cos este
aspecto. Além disso, o folheto contrasta cos a singeleza do
material p r o d uzido e distribuído pelo grupo tradicionalista.
Ao mesmo tempo à guisa de identificação da autoria. podc-se
ler na base da illtima página: "Rogai pelos Catdl icos
americanos que lhes oferecera este folheto". Que ligação
haverá entre esses "Católicos americanos" e o grupo
tradicionalista dos Estados Unidos, para onde viajaras, no
início da década de B0 alguns padres de Caspos c de onde
teria vindo a imagem de N.Sra. de Fátima que peregrina entre
os trad i c i o n a l i s t a s e cuja estampa identifica as casas que
aderiram ao bispo emérito ?

19- 0 parágrafo decisivo do indulto, tal como transmitido pela


Santa C o ngregação do Culto Divino, diz* "0 Sumo Pontífice
concede aos Bispos diocesanos a faculdade de usar um indulto
pelo qual os sacerdores e fiéis (...) possam celebrar a Missa
de acordo com a edição de 1962 do Missal Romano" (...) 0 Papa
concede este indulto como sinal da sua preocupação por todos
os seus filhos" (Cf. "Porque a Missa Tradicional Latina ?").

20-Este juridicísmo é uma exacerbação de um aspecto do


catolicismo - sua estrutura jurídica que o distingue de
outras expressões do cristianismo, como o de rito oriental ou
o protestantismo. Como afirma Wackenheim (1977:49) "No
Catolicismo a regulamentação canânica ganhou tal importância
que podemos ver nisso uma marca distinta da Igreja Latina".
Os pontos altos do desenvolvimentos histórico da dimensão
jurídica da Igreja seriam: a intenção de Constantino (Séc.
10) de reoarginar simultaneamente o Império e a Igreja; o
hábito dos papas, já na época patrfstica, de legislar sobre o
conjunto da cr istandade ocidental: seus "decretais", que eram
concernentes a pontos secundários de disciplina, não tardaram
a se estender sobre questões de estrutura e de doutrina; as
grandes sínteses doutrinais do século XII (época do
renascimento do Direito Romano na Itália do Norte e na
França) que se exprimem nas preocupações dos coneflios
romanos em promulgar cânones, onde questões teoldgicas eram
postas em termos jurfdicos; o surgimento do "Codex Iuris
Canonici" (CIC) idealizado por Pio X em 1904 e promulgado por
Bento XV em 1917.
Eu acrescento aqui o Código do Direito Canônico (CDC)
promulgado por João Paulo II em 1983, quando era grande a
expectativa no Concilio Vaticano II em torno da idéia de que
cada grande Igreja pudesse edificar o seu corpo de normas
dentro de uma "Lex Fundamentalis" (Beozzo,1990:15).
IV - TRADIÇAO E TRADICIONALISMO

XV.1 - A Igreja na Modernidade

Estou comprendendo por modernidade a experiência vital

ligada às transfarmações materiais e simbdlicas objetivamente


ocorridas na sociedade ocidental e cujos sinais sao cada vez
mais inelutáveis a partir do século XVI. Para aprender os
efeitos desta experiência sobre a Igreja d necessário atentar
para as tensões resultantes da relação entre o "tradicional" e o

"moderno", tanto mais porque a Igreja tem na categoria LcaditaQ


um dos seus princTpios fundamentais.

Considerando ainda que a Igreja vive a tensão constante

de uma instituição ao mesmo tempo universal e particular, ela


conheceu no amanhecer da modernidade, intenso debate
ec1csioldgico , do qual as crfticas de Erasmo ou de Ockham são
exemplos.

A piedade ext er ior izarit e da Baixa Idade Media segue-se


uma procura pu>" uma piedade interior que a Igreja ter ia perdido.
Ao mesmo tempo, a difusão da leitura da Sagrada escritura, apòs

a invenção da imprensa e das primeiras traduções do latim para o

vernáculo, começam a permitir o acesso direto à palavra divina.

Todos estes aspectos associados às perseguições sofritas pelos

crfticos da religião e acompanhados do crescente mundanismo do

papado formam um conjunto de razões religiosas que tendiam para


a cobrança de serias reformas.

236

fwof não lazer tnctaroe: ou Qnto*


à tinta tu à I4pw> neua pubiitaçAa
As crises do mundo feudal em deterioriação* entre elas o

Cisma do Ocidente* fomentam exigências por reformas que se

expressam no nacionalismo religioso que vai se tornando cada vez

mais nítido. Na Inglaterra* o episddio de Wycliff e dos Lolardos


<i>
espanhando-se pelo continente* na Tchecoslováquia* o caso

Huss, com subdivisões e desdobramentos vários - sem falar nos


movimentos de espiritualidade que a corte papal não absorvia*

fascinada que estava pelo humanismo renascentista que crescia.

Assim* o clima era de reforma* no início do século XVI* reformas

que o Concilio de Latrão (15Í2-Í5Í5) não pode capitalizar para o


fortalecimento da vida da Igreja.

Neste quadro cabe ressaltar as tensões existentes entre

os diferentes povos que compunham a Europa* tendo relevo a

oposição entre o povo latino e o povo germânico. Enquanto o

primeiro grupo (constituído por Portugal* Espanha* França e

Inglaterra) encaminhava-sc aceleradamente para o poder secular

centralizado* deixando para traz o feudalismo* a Alemanha* ainda

um conjunto de pequeno principados* diferenciados entre si

apresentava apenas a casa da Áustria (com os Habsburgos) como

exemplo de centralização.

As novas forças mercanti1 istas que vinham se impondo

mostravam um bloco onde o poder estava nas ma o da burguesia

emergente e tía alta nobreza* por oposição à decadência dos

fidalgos e a peniíria crônica dos camponeses. No plano da

sensibilidade* a redescoberta da cultura greco-romana* marcando

237
o esp frito renascentist a , vai opor uma perspectiva humanista

onde a razão vai se Impondo em detrimento da antiga visão

sacrallaado do mundor identificada com a Idade Média. 0 mundo


começa a esboçar a modernidade enquanto processo onde será

possfvel explorar ao máximo a potencialidade do homemr

transformando radical e gradativamente as relações de produção,


alargando o espaço geográfico, sugerindo novos continentes de
conheci mento•

A necessidade de uma releitura da religião, ã partir do


descontentamento com a forma pela qual os negócios eclesiásticos
eram geridos, esvaziando bolsas individuais e coletivas e

aparentemente distanciando-se cada vez mais do que disseram os

apóstolos, vai ser a bandeira levantada por um conjunto de

clérigos e fiéisr ávidos pela fidelidade ã Palavra de Deus. As

experiências de ZwinglÍor Latero, Calvino, a que genericamente

se dá o nome de Reformar têm desdobramentos váriosr com pequenas

particularidadrsr mas que têm em conjunto a valorização do que

se poder ia chamar uma Igreja Invisível e a negação do papel de

mediação da Igreja para a salvação. Listá em jogo a redefinição

do magistério* só a fé salva o homem (Sola Pi des); é no Novo

Testamento que se encontra a verdade (Sola Scriptura)? é através

da graça que Deus opera (Sola Gratia).

Imposta de fora para dentror esta reforma da Igreja, que

condena seus cr fticos e os expulsa de seu seio, resulta na

reordenaçao das bases de apoio: a Igreja tem perdas expressivas

230
nao sd na massa de fié is como no plano dos Sovernos, 0 que se

pode re unir sob o nome de protestantes espalha-se com d i f e r e n ç a s

re gio n a is e nacionais, mantendo uma ligação com o cristian ism o ,

que nunca negaram , mas rompendo com a Sd Romana. 0 caso da

In g la te rra , onde se estabelece uma relação s in g m ar entre Roma e

» Ig re ja A nglicana, oscila entre a ênfase ora mais catd lica, ora

m a *s ca lvin ista , m antendo-se, por isso mesmo, como uma ponte

entre a Igre ja © os reform ados. Em t o r n o de 1560 as posições Já

estão definidas: há te rritd rio s catd licos, luteram os,

ca lvin ista s. o anglicanism o se firm a definitivam ente na

In g la te rra , no O riente continua o desenvolvim ento peculiar das

ig reja s ortodoxas.

Este cism a, situado no in te rio r da Igre ja O cidental

respondeu as transform ações que marcavam o nascim ento da

m odernidade. 0 desafio de Lutero á estrutura eclesia l, onde ele

assinalava o papel norm ativo do pode papal punha em e v i d ê n c i a a

suprem acia da Escritura sobre a hierarq uia. Foi neste quadro

que convocou -se o C o ncflio de Trento, que estabelecerá as base

da Ig re ja na m odernidade. Ele contém aquilo que os católicos

romanos chama de Reforma C a t d l i ca R Qs prote8tantes rotulam de

C o ntra-R cfo rm a. £ a rigidez que aPresenta no campo da teolo gia,

qu* im pediu que por quase qU a t r o séculos se explorasse

fU xive lm e n te a po tencialidade da doutrina, deve ser rem etida ao

Panorama c rític o da época.

23?
Enquanto a Igreja na Europa se debate nos problemas

nacionalistas que introduzem complicadores ã pretendida unidade

cr istSr o que será vivido em termos de uma polarização fé X

razão que chega ao cl ímax com a Revolução Francesa, a Igreja na

península ibérica está as voltas com suas colônias. E neste

quadro que o Brasil é colonizado e evangelizado, recebendo

representantes de um igreja que procurara superar seus problemas

internos. Paradoxalmente, a colônia viverá em termos


religiosos, a conjugação úos problemas que são da Igreja

universal, complicados pela particularidade de sua implantação


nas novas terras.

A concepção de Igreja como entidade dotada de dupla

dimensão, instituição e sacramento, traz em si a condição de

viver em tensão 2 "Sem ddvida, num sentido, é toda a h ist dr ia da

Igreja que é feita de crises" (Poulat, 196953).

No âmbito da vida'reiigiasa, alguns autores distinguem

duas modalidades de crise, diferenciadas segundo o critério

baseado no objeto sobre o qual incide a dissidência. Assim, uma

crise pode evoluir no sentido de um cisma ou de uma heresia.

Ambas as categorias designam uma divisão grave e durável do povo

cristão, mas atingem diferentes níveis de profundidade. 0 cisma

^ uma ruptura na comunhão hierárquica; a heresia é uma ruptura

na prdpria fé. (Cf. Vocabulário Teoldgico Bíblico, 1977).


Apesar da clareza formal da distinção, perdura uma

ambiguidades mesmo que nem todo cismático seja herejc, os dois

tipos muito se aproximam, na medida em que um dos princípios

básicos do catolicismo é a sucessão apostólica e com isso,

questioná-la implica, no mfnhno, abalar os alicerces de um dos

sacramentos, a ordem. "Comprende-se (...) o horror que o cisma

sempre inspirou ao verdadeiro crente, e porque, desde o início

o vemos maldito como a heresia* (Lubac,1983:51).

Em termo de eclesiologia, o cisma é uma categoria

fundamental per conta da ênfase posta na unidade e integridade

da palavra que ela corporifica. Por isso a preocupação com o

cisma, que pode ser atestada desde o Novo Testamento- Al iF Joao,

na primeira e na segunda carta acentua a central idade da

harmonia eclesiástica e o perigo das distorções heréticas no

ensino da doutrina- Da mesma forma Paulo, na primeira Epístola


( 2)
aos Coríntios, refere-se a questão das divisões

Sr esta postura já está presente entre os evangelistas,

o desenvolvimento do catolicismo resultou na fomentacão de tres

grandes planos onde especialistas lhe explicitam o suportes os

teólogos que a explicam, os concílios que a definem, o

magistério que Intervem para concretizar a doutrina entre os

homens•

2 41
Lubac, no plano da teologia, contribuiu com uma reflexão

que fundindo filosofia e teologia, propriamente dita,afirma a

validade que tem a Igreja de ser chamada "católica", nome pelo


qual é conhecido desde o século II. Segundo ele, embora o termo

etimologicamente signifique uma proposição universal, " a Igreja


não é catdlica atualmente por ser espalhada, distribuída por
tada a face da terra e contar com grande ruimeros de adeptos
(...) Essencialmente, a catolicidade não é um caso de geografia
ou de cifras. Ele d, desde o início, em princípio, esta unidade"
(Lubac, 1983525). Citando Stsa Agostinho, ele lembra que "mais
que simples universalismo, é a capacidade de ser 'um liame de
paz', a coesão que ela estabelece em todo o lugar onde estende
seus braços (...) ela faz dos seres que reune um só ao Todo."

Repousando na afirmação da unidade teoldgica e

eclesiástica, a Igreja reforça o problema da possibilidade de


cismas e as questões relativas ã evitacão e controle dos mesmos.
Por isso ela enfrenta duas dificuldades inerentes a qualquer

religião, a saber: o estabelecimento dos seus limites e a


diferenciação com tudo aquilo que está além de suas fronteiras;

o refinamento do controle político entre seus agentes de maneira


tal a garantir o primeiro objetivo.

Quanto a primeira, trata-se da construcão/manuter.cão de

uma identidade do cristão, para a qual se conjugam o mito de

origem e a prática religiosa ha história. Quanto a segunda,

trata-sc de direcionar as relações políticas internas no sentido

2 42
* atualizar o chamado "poder de comunhão". Ambas as

^iculdades acompanharam toda a história da Igrejas nos

•"«melros 500 anos em que ela se implantava, procurando um lugar

*Hre os o u t r o s credos? no milênio seguinte em que se deu sua

* *s t e m a t i z a ç ã o completa? nos dltimos 500 anos em que batalha

^ra manter-se num mundo do qual já não é a principal

'Hs n i r a d o r a dos princípios informadores do conhecimento e da

^ e n s ib i1 id a d e .

A t r a v e s s a n d o todos estes períodos, a relação com outros

credos sempre foi problemáticas d i f erenciar— se é h i e r a r q u i z a r , é

Precisar m a n ipular politicamente a diferença com vistas a

capitalizar seu próprio domínio ou, pelo menos, manter a

relevância, t atentar para que "o outro" se converta ou mantenha

a esperada distância, e no mesmo movimento, impedir que

internamente sejam geradas interpretações que obscureçam a

d íferenc i a ç ã o .

Desde que a Palavra de Deus já foi emitida e

testemunhada pelos e v a ngelistas, cabe preservá-la e evitar novas

escolhas que alterem os signifi c a d o s dados pelas fontes

legítimas, cabe p r e caver-se contra as heresias

(ctimologicamrnte, "escolha", do grego haíresis, pelo latira

haeres»»). Dessa forma ope r a - s e Um deslizamento das

raciona!izações teológicas para o c a m p 0 das ideologias. Quem e

como um grupo consegue impor a v e r d a d e ?


f

No âmbito dos fiéis, sd a igreja pode definir o que d

uma heresia, pautada que estd nos relatos de que as dlvisSes

contradizem a vontade do Cristo. Se nos relacionamentos com o


.-
exterior esta premissa pode levar até âs guerras, no espaço

interno as dissençoes devem ser resolvidas segundo o critério

fundamental de manutenção da unidade, da qual o primeiro grande


<3)
exemplo é a "crise Judaizante •

Mas se tais dificuldades são superadas pelo exercfcio do

"poder de comunhão", isso não impede de reconhecer nos casos

concretos a visível presença de determinações seculares, embora

o discurso transcorra como se fosse norteado apenas no âmbito

teológico. Considerando a muitivocalidade dos símbolos, e os

discursos como resultado da 1 inguagem, ela mesma um sistema

simbólico, comprende-se como a tensão existente numa entidade

como a Igreja, que se quer ao mesmo tempo sacramento e

instituição, "santa e pecadora" pode redundar em "erros", e

estes serem rrabsorvidos, realimentando-a perpetuamente.

Definindo cisma como o processo pelo qual um corpo

religioso se divide para torna-se dois ou mais corpos distintos,

independentes, Ammerman (1937) elabora uma tipologia baseada na

autoria da definição do desviante. Mesmo considerando a crítica

a uma "Teoria do Desvio" realizada por Velho <1978), vale

examinar a classificação dali resultantes

244
1> o grupo de origem acusa o gruPO que se afasta de estar
divergindo da verdadeira fé. A acusação contra ele (comumente
ao seu 1fder) é de heresia. Ironicamente, tais heréticos não
se movem para deixar o grupo dc orfgem: em geral tèm apenaB

novas idéias sobre como a fé deve ser praticada ou como o


corpo religioso deve ser organizado. 0 melhor exemplo é o
cisma da Reforma Protestante.

® * 0 grupo que se separa acusa o grupo original de ilegítimo, e


este procura reter os cisméticos no seu âmbito. Este tipo
ocorre mais quando o cisma se verifica paralelamente a
divisões políticas ou étnicas. 0 grupo de origem busca reter
uma definição ampla de si mesmo e do poder, enquanto o grupo
cismático procura um controle mais local e independente. Um
exemplo são os muitos cismas entre o protestantismo americano
no século XIX, a partir de diferenças étnicas e culturais

introduzidas pelos imigrantes.

3) 0 tipo mais comum é aquele em que tanto o grupo de origem

quanto o grupo dissidente vCem o outro como tendo se desviado


do verdadeiro caminho. Embora ambos tentem por algum tempo
converter o outro, a separação final é o reconhecimento de
que não podem mais trabalhar e conviver. 0 exemplo é do

protestantismo americano, das divisões regionais dos meados


do século XIX até as saidas fundamentalistas dos anos 20.

24
Embora qualquer classificação seja melhor do que nenhuma
pergunto-me se a acima apresentada não peca pelo simplismo de
reduzir matéria tão complexa e de forte envolvimento político-
afetivo. Nessa tipologia a racionalidade é maximizada ao ponto
de desaparecer o universo inexplicável que é o da fé. Minha
questão é ainda reforçada pelo desenvolvimento do verbete, que
se dedica, após a tipologia, a- dar relevo aos fatores
ideológicos, sociais e econômicos como determinantes dos cismas.
Indubitavelmente presentes, não fora o cisma um fenômeno
cultural , a segmentação naqueles aspectos aponta para uma
perspectiva mecânica que não deixa espaço quer para o imaginário
que está no âmago de qualquer cultura, quer para a
inconsistência e ambivalência que preside as relações e
relacionamentos sociais. A força do universo simbólico sucumbe
ante um pragmatismo que, se pode ser fundamental em certos
credos, ou vertentes de credo, não o é em todos.

Daí a necessidade de pensar o cisma na relação que os


grupos mantêm com seus princípios, segundo a interpretação
diferenciada que fazem deles, compondo um sistema onde o
fenômeno religioso se articula com outros sistemas de
significados, guardando o peso específico que a matéria
religiosa retem. Dessa forma acredito ser possível identificar a
flexibilidade que algumas doutrinas apresentam ou não, sua
potencialidade de dialogar com transformações que não sendo
originalmente religiosa implicam mudanças no seu domínio. Tal
comprensão revela ainda da observação de como cada cisma se dá,

246

1
de como as partes em litígio lançam mão dos recursos
|S
disponíveis, religiosos ou não. E assim que procuro interpretar
o "cisma tradicionalista".

IV.2 - De Trento ã Crise Hodernista í

A segunda metade do século XVI foi palco de tensQes e


lutas onde se confundiam quesfões de identidade confessional e
fatores políticos, na gestação do Estado moderno que se
avizinhava. 0 período, que viu o di1aceramento da Europa cristã,
resguardou, num certo sentido, o Novo Mundo, na medida em que
as grandes terras descobertas estavam sob o controle legítimo de
Portugal e Espanha, onde predominava a adesão irrestrita à Sé
Romana.

Assim, os problemas internos da Igreja foram exportados


para a colônia mediatizados por outros fatores, fazendo
sobressair a dimensão cultural da religião. 0 tratamento dado ãs
crenças autóctones deixou a impressão da inferioridade das
mesmas: elas conheceram um destino semelhante aos infelizes que
não desapareceram com a decestruturação cultural de seus povos.
Na colônia, "mutatls mutandi", a situação de Intransigência para

com os nativos correspondia ãquela que se verificava com relação


aos "herejes". E bem verdade que aqui a oposição era enfrentada

com mais facilidade: anulada a legitimidade das formas


autóctones, desconsideradas aquelas que vieram com os africanos

escravizados, a Igreja não encontrava discurso forte nem

2 47
de como as partes em litígio lançam mão dos recursos
disponfveisI religiosos ou não. & assim que procuro interpretar
o "cisma tradicionalista".

IV.2 - De Trento ã Crise hodernista

A segunda metade do século XVI foi palco de tensões e


lutas onde se confundiam questões de identidade confessional e
fatores políticos, na gestação do Estado moderno que se
avizinhava. 0 perfodo, que viu o di1aceramento da Europa cristã,
resguardou, num certo sentido, o Novo Mundo, na medida em que
as grandes terras descobertas estavam sob o controle legftimo de
Portugal e Espanha, onde predominava a adesão irrestrita à Sé
Romana.

Assim, os problemas internos da Igreja foram exportados


para a colônia mediatizados por outros fatores, fazendo
sobressair a dimensão cultural da religião. 0 tratamento dado ãs
crenças autóctones deixou a impressão da inferioridade das
mesmas: elas conheceram um destino semelhante aos infelizes que
não desapareceram com a desestruturação cultural de seus povos.
Na colônia, "mutat is mutandi", a situação de intransigência para
com os nativos correspondia ãquela que se verificava com relação
aos "herejes". £ bem verdade que aqui a oposição era enfrentada
com mais facilidade: anulada a legitimidade das formas

autóctones, desconsideradas aquelas que vieram com os africanos


escr av ízados, a Igreja não encontrava d iscurso forte nem
potências com argumentos (de qualquer ordem) para encaminhar
alguma reiativização. Vive-se a época do colonialismo er nas
metrópoles, gesta-se o absolutismo.

Na Europa, a oposição era clara: saia do Concilio de


Trento uma Igreja reforçada em sua definição de entidade
hierarquizada e monárquica; atualizada segundo um magistério
infalível, portanto, com ênfase na realidade sensível; animada
pela idéia de unidade como sendo fundamental para sua verdadeira
missão. Os protestantes, por sua vez, assumiam concepcões
diferentes: organizados numa comunidade invisível dos
"verdadeiros crentes", viam-se como dotados todos de .. um
sacerdócio universal, centrados na Palavra de Deus e sentindo-se

participantes de uma "ecclesia reformata semper reformanda".

Serão necessários quatro longos séculos e muitas


transformação de caráter não-religiooo para que se verifique
alguma distensão que sd no século XX começa a se formalizar numa
perspectiva ecumênica. Gradativamente os protestantes se
encaminharam para um liturgia mais cálida, para o mistério
sacramental, a vida monástica e a mariologia; e os catélicos
para o melhor sentido da Bíblia, a necessidade de um retorno a
maior simplicidade nas relações entre os membros da Igreja ao
fortalecimento da calegia 1idade e o crescimento do papel do
leigo. A oposição será rclativizada já num outro contexto: por
iniciativa dos reformados e sob a pressão de um crescente

248
processo de secular Ização que se desenvolveu sobretudo apds a
Revolução Francesa.

Do ponto de vista da Igreja, o Concflio de Trento <1545-


1563) é um marco na reconstrução do catolicismo romano» a
^•"egação é renovada através de algumas ordens recem-cr iadas ou
revitalizadas (Jesuítas, capuchinhos, teatinos etc). Reorganiza-
®e a Ciíria Romana e o "Corpus Iuris Canônica" <CIC), que é
editado numa forma corrigida - a chamada edição dos "corretores
1ridentinos". São publicados um "Catecismo Romano" para os
Párocos, um novo missal e um breviário. Florescem as associações
leigas, como as Misericòrdias, as congregações marianas e as
confrarias. Tudo isso fornece um certo sentimento de vida nova e
um impulso de reconquista.

Mas a divisão entre as igrejas cristãs continuava


constrangedora, seja para os cismáticos, seja para a Sé Romana.
Vivia-se uma"teologia da controvérsia" <Hortal,s/d) e de muitas
m 'ssões entre os protestantes. Em 16 2 2 a Ciír i a Romana instala a
<4>
Congregação De Propaganda Fide e os territdrios orientais são
considerados "pafses de missão". Ali são fundados Vicariatos
Apostdlicos, dedicados à "conversão" dos fiéis ortodoxos, numa
Perspectiva que endossava os malentendidos anteriores e que
Justificará porque o apelo de Pio IX, já em 1848, para que a
iffreja oriental volte S unidade, é rejeitado imediatamente.
Desde a criação daquela congregação ficava claro que as
Autoridades da Igreja Católica colocavam os ritos orientais como

249
igualados ao "povo infiel", da mesma forma que os protestantes
(conforme se depreende do relacionamento com a Igreja da
Inglaterra, Escandinávia e Paises Baixos). Berá preciso chegar o
decreto AD GEENTES (Concilio Vaticano II), sobre a atividade
missionária, para que se distingua a ação pastoral exercida
entre os fiéis, das iniciativas emprendidas para restaurar a
unidade entre os cristãos.

Por opasicão ã Confissão de Augsburgo, o Concilio de


Trento enfatisava tres pontos essenciais para definir o
católico: a Escritura, o papel da fé, os sacramentos. Nesse
sentido, à Bfblia, que para o protestante é fonte énica da
Revelação (diretamente apreendido e livremente interpretada),
opõe-se a missão magisterial da Igreja, que é velar pela
integridade das duas fontes de fé: a Escrita e a Tradição, rf fé,
que para o protestante é alimentada pelos sacramentos enquanto
sinais da salvação, não se descola da idéia de sacramento como
portador da própria graça e devidamente ministrado pela Igreja.

Estas concepções se esclareceram nas medidas conciliares


onde já é possfvel perceber sinais do posterior ultramontanismo
e seu correlato anti-romanismo universal. Aquelas medidas
incidiram sobre as fontes de fé, os sacramentos, o caráter do
magistério e a própria reforma trldentinn, assentando enfim, as
bases de uma identif icação sem ambuiguidades.

2 50
Se as medidas s d refinaram a doutrina (a colegialida.de

continuava restrita aos dignitários de Igreja), formalizam-se as

instâncias de defesa - 0 Santo Ofício é de Í542 e o índex é de

1547 - >y elas ganharam maior precisão a partir de aplicações


(5)
práticas daquele trabalho dogmático . Foi definida a estrutura

hierárquica e o regime beneficiai? as condiçoes de uma liturgia

viva e da vida sacramentária? os deveress dos clárigos e dos

pr fnci pes-

A despeito de um contexto adverso, onde os acordos com

os prfncipes forçavam a adoção de medidas dificilmente aceitas

como de inspiração cristã, o final do sáculo apresenta alguns

avanços. Assim, por um lado havia o arraigamento e certos

hábitos que dificultavam um trabalho pastoral mais eficaz (como

a vida sedentária dos papas e o monopólio dos italianos sobre

este posto), que promoviam a centralização, aumentavam

suscetibi1 idades nacionalista e com isso perdiam de vista a

unidade pretendida pela doutrina. Acrescia-se ainda os

problemas do relacionamento com o poder secular (dáva-se a

ingerência dos prfncipes nos conclaves e mesmo veto efetivo de

certos Estados cristão h aplicação dos decretos de Trento), mas


(6 )
as conquistas foram expressivas

Por sua vez, os Padres suo estimulados a uma maior

partIcépação, desde que existe preocupação com a formação

intelectual a espiritual dos futuros sacerdotes, supostamente

aptoas a responder melhor & "devotio moderna*. As ordens que

251

É b flt>
aparecem são provas de uma revitalização que aponta em várias
direções. A vida espiritual da Igreja foi renovada e as figuras
de Antonio Maria Zacarias, Inácio de Loyola, Felipe Neri, Teresa
de Ahuada, João da Cruz. Desenvolve-se um estilo estético, com o
florescimento da arte barroca.

Mas cresce também a tensão entre os interesses religosos


e a tendência absolutista dos monarcas do século XVI. Os dois
séculos seguintes ao das descobertas serão vividos na Europa sob
o impacto das nuíltiplas transformações cuja gestação vinha
lentamente se produzindo e afetando cada um dos planos da vida
social. Enquanto ainda se sonha com as máquinas e a produção
emerge das incipientes fábricas-presídios, cada espaço dinamiza
sua presença, diferenciando-se ao mesmo tempo em que ainda
mantem os fortes laços que o prendem ao passado. Também é assim
no plano do pensamento religioso: a semente de crítica ã Igreja
desabrocha em variações do modelo que, se não conseguirão abalar
0 rochedo de Roma, mostrarão a existência de outras
1ntcrpretações possíveis que não aquela defendida pele Vaticano.

(7)
0 Jansenismo é uma delas, introduzindo uma reflexão
onde, em termos teoldgicos, a graça é tida como suficiente para
fazer o bem mas seu efeito sd se atualiza pela intervenção do
1 ivre-arbítri o. Em termos ec1esioldgicos, numa inequívoca
tendência prtsbitcriana, o epi scopado é exaltado em detrimento
da» ordens religiosas e do papado. Esta perspectiva, expandido—
*e para o» Países Baixos, contitui o chamado grupo dos Velhos
Católicos* expressão de uma reaçao à tendência oficial na ópoca,

recusando o que o ConeflIo de Trento pode integrar do humanismo


renascentista ao catolicismo. Tratava-se de radical
teocentriswor uma crise religiosa interna que prolonga na
ortodoxia o choque inicial da Reforma quanto ao problema da

graça. Paradoxalmenter surprende no Jansenismo a ativa


participação dos leigos, a luta por uma vida espiritual pessoal,
alimentada pela Bíblia que acentua e reforça a tendência
individualista do homem moderno - saído da corrente luterana, da
"dovotio moderno" dos pafsses ndrdicos do sóculo XVI. Paradoxo
ainda porque lança-se em guerra contra o homem para exaltar a
magestade divina mas trabalha pela consciência individual, que
no curso dos tempos os opoe às sociedades espirituais ou
eroporais que o perseguiram, fortaleccendo os anseios de obter a
salvação por caminhos individualistas.

(8)
Já o Galicanismo defende a independência absoluta do
em questões temporais, constituindo-se em dogma que tanto
para o parlamento quanto para o clero francêsa este zela
que as liberdades e os costumes da Igreja Galicana sejam
protegidos contra o absolutismo romano. 0 clímax se dá na

'ada Questão Regaiista, com a declaraçao de Bossuet onde se


proclama a absoluta independência do rei do Ponto de vista
temporal e a superioridade do concflio sobre o papa.

A despeito de uma retratação do monarca francês <Luiz


XIV
* em Í693), o clero sob os dois luizes seguintes é bem pouco

25:
romano, in fluenciado pelo jansenism o, enquanto espécie de

p r e s b i t e r ?a n i s m o ca tó lico . Ele cede so surto do anti~

m onasticism o e é um a g e n t e da futura revolução- Sob Luiz XV os

je su íta s são expulsos da França, tomados c o mo agentes do

ultram ontanism o (Í764)# 0 galicanlsm o, movimento francês cuja

pressão atravessa as fro nte ira s nacionais, pode ser

responsabilizado pelo veto que a C o m p a n h i a de Jesus recebe nove

anos depois, no papado de C l e m e n t e XIV <í 7 6 9 ~ i 7 7 4 ) •

A Igre ja está em f r a n c a desvantagem s os papas «me Be

sucedem não têm meios de lutar contra a onda de f é no Progresso

ilim ita do d o h o me m, a dessacralização do mundo, a hostii\dade

aos dogmas um n ã o - c o n f o r m i s m o crescente e crescente c r rttca a

toda autoridade <a I g r e j a é vista como o b a s t i ã o da in tolerância

do dogmatismo). No plano filo só fico impera V o lta ire , com um

deismo va^o, e os E n c i c l o p e d i s t a s anunciam a nova humanidade*

livre das re ligiõ e s positivas e necessitada de uma re ligiã o

natural que mantenha o s h o m e n s em ordem mas descartada

relevação e das "supesticoes" que a mantenham# A Física propoF*

as explicações, a caridade transform ar-se-á em b e n e f i c ê n c i a , ^

regra universal será a razão. Em t e r m o s lo cais, os sina is s &°

claros: Portugal t a mb é m expulsa os jesuítas e na I t ã l^

in sta u ra -se o casamento c iv il.

<9>
0 Febronism o , por sua v e z , critica a forma m o n á r q u lC*^

da Igre ja romana, apelando para uma m a i o r autonomia dos bisp°^*

Na Q a v i e r a suprjm e-se os monastérios, a ação do Index é llm lt*^*


apenas a livro s dogmáticos, assim como s ã o lim itados os bens

comuns da Igre ja © se exige a form alidade civil para o

casamento. 0 auge deste movimento se dá no ch a ma do


(Í0>
Josefinism o r quando as questões religiosas sao v i s t a s como

negócios de E s t a d o s a final, m antinha-se o catolicism o porque era

ele que ligava as d i f e r e n t e s populações q ue constituíam os

estados hereditários da r a i n h a Maria Teresa e de s e u filh o , José

II. Mas o s sem inários são o r i e n t a d o s pela coroa e os sermões são

censurados.

Estes exemplos mostram como mesmo dentro da Igreja

certos pontos eram questionados. E se* eles incidiam

principalm ente sobre a igreja visíve l, chegam também a uma

dimensão mais intim a, ao a r r a n h a r a autoridade da hierarq uia.

Contra esta tendência aparece esforços de um catolicism o

esclarecido, partindo da A l e m a n h a , pelo final do S é c u l o X V III,

pugnando por uma r e f o r m a que p e r m i t a a I g r e j a uma inserção na

vida contemporânea. Uma c e r t a e lite do c l e r o rechaça tanto o

integrism o dos seguidores do Concilio de Trento quanto o

jansenismo ou a p i e d a d e b a r r o c a já anacrônica. Mas a influência

alemã é pequena e o a n t i - c l e r i c a l i s m o se d i f u n d e , principalm ente

na Franca- Espanha e Portugal continuam com uma Igreja

orientada pelo luxo e pela Inquisição. Na I n g l a t e r r a cresce o

defsmo, de c e r t a forma alimentado pelas idéias filo sóficas que

melhor se a dequam a uma r e l i g i ã o natural. 0 u tilitarism o e o

ceticism o e sensualismo de H o b b e s , Locke, Hume, abrem caminho

para a maçonaria, que mesmo c o n d e n a d a por Roma, conta com o

255
apoio de m u i t o s padres. E
o fim da C r i a t a n d a d e f c e d e n d o 1
u 9*r a
uma l a i c i z a ç ã o das mental
idades, terreno p r o p lc io a s u g e r i r
uma
nova ordem informada pela
liberdade, Igualdade, fraternIdade

Mesmo n e s t e quadro _ > , ,


« aaverso, 0 provavelmente incentivado
por ele, floresceram expressões p c Dí „ i , , , .
ressoes e s p i r i t u a l i s t a s que vingaram,
c o mo a ação de Afonso L
u i1asuuoorri1 , ano
que *
t.a n *
t.o f« u n dj a uma ordem

(Redentoristas) de importante trabalho futuro, como dá m a i s um

santo para a Igreja. Se o f i n a l do s é c u l o X V III, marcado Pela

Revolução Francesa, vê a I g r e j a francesa se desestruturar em

função das exigências colocadas Pel a po lítica, vê t ambém

opositores ao " c l e r o constitucional» 4>, seja polemizando como

o P. L a M e n n a i s ou na o b s c u r i d a d e do P . João Maria V i a n n t y . As

crises, doravante, situam -se em p l e n a m o d e r n i d a d e .

Em termos religiosos, o m o d e r n i s m o é, segundo Poulat

(Í9 6 9 )r o reencontro e confrontação atuais de um passado

religio so h«í m u i t o v i x a d o com um P r e s e n t e que encontrou, fora

dele, as f o n t e s de s u a inspiração. Se a s c i ê n c i a s e a sociedade

foram levadas a rever seus fundamentos, o mesmo o c o r r e com as

re ligiõ e s, e principalm ente com o catolicism o, re ligiã o

histórica por excelência.

Problemas relacionados com o m o d e r n i s m o s e verificaram

em quatro paises - Alemanha, Inglaterra, Itá lia e França -

apresentando em cada um uma fisionom ia particular e daf

difundindo-se com m a i o r ou menor intensidade para o u tro s lugares

256
e p a rtir de uma r e d e senão constituída Por sim ples* seguidores,

pelo menos pe i as repercussões que c h e g a v a m de Roma.

N* Alemanha, a crise se desenvolve na corrente do

libe ra lism o universal e d o r e f o r m i smo c a t ó l i c o , d I f c r e n c I a n d o —s e

daquelas que se verificam nas tres outras nações. Na

In gla te rra , sua influência lim itou-se aos meios anglicanos, onde

o inspirador da crise francesa. P. Alfred Loisy, tinha

discípulo s fió is, c o mo T y r r e l . Na Itá lia enraizou-se na tradição

do "R isorgim ento", desenvolvendo-se no campo da a ç ã o social e da

cultura re ligio sa <Murrl e B o n a iu ti). Na França nasceu da

necessidade de satisfazer uma a t r a s o cie n tífico acumulado. Se na

Itá lia ela ^ separável d e uma a ç ã o de massa e de propaganda,

onde e xistia forte desejo de emanei r a ç ã o em r e l a ç ã o á tu te la

ecle siá stica , na França a ênfase recai numa m e d i a ç ã o entre duas

culturas, e não na reforma de uma s o c i e d a d e re ligio sa .

Embora se possa estabelecer estreitas ligações entre

m odernistas e m odernizantes da In glaterra, Itá lia e França,

constituída atravás de afinidades in te le ctu a iss, am izades

pessoais, Preocupações comuns, relações e p istola re s, viagens

o casionais que f i z e r a m surg ir um p e q u e n o mundo d e n t r o do mundo

ca tó lico , os fatos ita lia n o s e franceses são os mais im portante©

para o meu inte»"esseS idóias e sím bolos então distinguido©

reaparecerão no episódio que procuro comprender.


Fruto do encontro do ensinamento eclesiástico

r i c I anal com a s j o v e n s ciências religiosas que s e c o n s t r u i r a m

0r*9e cio controle das o r t o d o x i a s - multa vez contra elas - e

nsPiradas num p r i n c f p i o revolucionários a aplicação de métodos

Positivos à um d o m í n i o e à textos tidos até e n t ã o como f o r a da

alçada d o s me s mo s , a crise modernista nã o d e v e s e r reduzida nem

circunstâncias que a engendraram, a decalagem entre a

m ediocridade do e n s i n o eclesiástico e o dinamismo das ciências

re ligio sa s, ou, num s e g u n d o mo me nt o , aos h á b i t o s de pensamento,

m todos de governo e o gosto pela polêmica que a imprensa

cattílicca reflete? nem às c a r a c t e r f s t i c a s que relevaram no

desenvolvimento daquele Processo: as anim osidades e dissensoes

que m a r c a r a m partes em o p o s i ç ã o -

Para
Poulat (o p .cit.) ela foi a e x p r e s s ã o do e s f o r ç o da
busca d e um
equ i 1 Tbr i o P e r d i d o quando a f r o n t e i r a do "críve l"
foi deslocad
a pela m o d i f j c a ç § 0 na concepção do "conhecrvel"
i n t r o d u z i da
pelos diversos r a mo s da histdria religio sa,
p r i nc i p a l m e n t
e a bfb lica. Asssim, no âmago do d e b a t e estão* os
t r ©s c o n c e i t o
s que s u s t e n t a m a I a r e i a * -> cr„ .L x .. ~
1,1 4:1 a Escritura, a Tradiçao e
° M agistério.

P o n t o de v i s t a antropológico, tentanto entender de

9uardar uma d i s t â n c i a que p e r m i t a relativizar essa

eto ao problema da s e m p r e incompleta aproximação que

* poss f v e l alcancar sobre q u a l q,i e r f e n ô me no . R e me t o à

•ncapacidade relativa do c o n c e i t o de e x p r e s s a r a c o m p l e x i d a d e de

25
um casa, o qual, como aqui tratado, vem èt tona numa época da

grande euforia trazida pela perspectiva científica. Resta pois,

procurar comprender o fenômeno, frisar suas características,

talvez compará-lo com outros, nas definálo, será reduzí-lo à sua

dimensão conceituai.

0 exemplo da crise modernista na França dá bem a medida

do que foi dito acima. Trinta anos antes da sua eclosão, em

1878, em seguida à lei que estabelecia a liberdade do ensino

superior, os bispos protetores do Instituto Teológico de Paris,

por insistência de Roma, fundaram uma Faculdade de Teologia.

Titular da cadeira de História Eclesiástica, o historiador Luis

Dechesne vai dar uma orientação crítica ao ensino que muitos


( 12)
problemas lhe trará . Se hoje ó possível dizer que aquela

orientação não era '"modernista", pode-se afirmar que ela dava

condições para as colocações do P. Loisg, seu discípulo e

professor de Exegese na mesma instituição. 0 afastamento deste,

em 1893, vai abrir o debate em torno das ciência religiosas.

A excomunhão de Loisy em 1903, no entanto, não foi um

fato isolado, ela refletia a vontade.de compreensão da religião

a partir do novo instrumental oferecido pelo desenvolvimento da

exegese, carregando, provavelmente toda a conturbada história do

relacionamento da Igreja na França com os domínios seculares.

Mas o debate não foi assim entendido pelo Vaticano, que golpeou

também outros padres e intelectuais envolvidoss em debate


(13)
doutr inár io
Com a generalização da controvórBia teológica, outro»

pensadores e mesmo o grande público - apesar de não

instrumentalizado como os especialistas - tambúm tomam partido e

configura-se a imagem de um grupo "modernista"r sem que muito

percebam as sutis diferenças que afastam alguns dos nomes

aproximados. E todos foram arrolados na mesma reprovação quando


em 1907 Pio X decidiu "condenar solenemente o modernsimo

teológico, exegótico, filosófico e histórico" (Pierrard,


19805256).

0 decreto "Lamentabili Sane Exitu" de Pio X, que

condenou sessenta e cinco proposições heterodoxas relativas à

autoridade do magistúrio da Igreja, à inspiração e historicidade

dos livros sacros, às noções fundamentais da revelação, ao


desenvolvimento do dogma, à instituição e contituição da Igreja

foi seguido pela encfclica "Pascendi" (de 8 de setembro de 1907)

que visava os dois principais traços da filosofia modernista* o

agnosticismo, que anulava todas as demonstrações de base


racional e a imanência vital, que fazia emanar a verdade

religiosa das necessidades da vida (Pierrard, op.cit).

A reação romana se completa tres anos depois, quando Pio

X, pelo motu proprio "Sacrorum Antistitum "impõe a todos os

sacerdores o juramento antimodernista. Do ponto de vista da

Igreja, está formalmente encerrado um episódio desgastante, n,as

que nem por isso deixará de ter desdobramentos, seja na

260
continuação das discussões anatew®^Izadas, seja n as formas de

contrad iz e -la s .

Uma d e s t a s formas, q ue é de particular para

a comprensão da c r i s e vivida na Diocese de Camposr ^ a reaçao

in te g rista , categoria q ue como qualquer outra sobre distorçroes

ou por ser colada ao fenômeno q ue a gerou ou, ao c o n t r a r i o r pela

generalização abusiva com q ue a linguagem comum s e a p r o p r i a dos

termos uma veza p lic a d o s . Assim, o valor pejorativo que

acompanha o termo " integrism o" na segunda metade do nosso

sáculo, deve ser examinado p a r a que s e j a compreendida a maneira

pela qual está sendo usado ou e v i t a d o . Agora ele remete a um

catolicism o fechado, voltado ã devoção ao passado e sua recusa

ao mu ndo moderno, sig n ifica o partido das demlncias e das

condenações, parecendo fadado ao d e s a p a r e c i m e n t o completo depois

da c h e g a d a do " P r o g r e s s i s m o " , apòsa segunda guerra mundial

(P o u la t ,1909)

Este mesmo a u t o r não vê como e n t e n d e r o intransigentism o

que ca racteriza esta postura sem r e m e t e r a uma d e s u a s maiores

expressões, o Mons. Benigni que, no fragor das condenações à

crise m odernista desenvolve uma a t i v i d a d e intensa no campo da

comunicação *"eljgiosa, no sentido de o b s t a c u l i z a r a penetração

da modernidade na Igre ja . Para tanto, tenta dar a esta atividade

uma base r e l i g j osa in stitu cio n a l, numa f d r m u l a semelhante aos


<i4>
atuais in stitutos seculares: funda o "Sodalitium Pianum" ,

cuja dificuldade de aprovação pela Sá Roma na a e m p u r r a para um

261
terreno duvidosos semelhante a uma sociedade secreta. A

organização, sob o nome de Saplnlfere em sua vida clandestina, é

finalmente suprimida em 1921, por Bento XV.

A presença de uma postura intransigente e atenta ao

interior da Igreja não pode, por sua vez, ser desvinculada de


uma sensibilidade católica fartamente alimentada no século XIX,

quando a Igreja sofre fortes reveses. As lutas pela unificação


italiana, no
inTcio do papado de Pio IX e a defesa que faz,
<15)
posteriormente dos territórios da Igreja , a publicação do
(16)
Syllabus e do "Non expedit" (decreto pelo qual os católicos
estavam impedidos de participação política), conjuga-se com a
visão dantesca que a Igreja guardou das conseqüèncias da
Revolução Francesa, gerando uma espécie de cruzadismo. Voltado

agora não para os herejes de fora, mas para aqueles que, de


dentro mesmo da Igreja, pareciam heretizá~la.

Assim como a vida da Igreja na história pode suscitar


perocupacões com as condições sociais tfpicas do mundo moderno,

ermo o fez Leão XIII em 1891, com a encfclica "Reruro Novarumw ,

(onde lembra aos católicos que existia" uma verdade obscurecida


desde o fim da Idade Média, a de que a moral evangélica tinha
prolongamentos sociais que nenhum fiel tinha o direito de

desconhecer" (Pierrard,op.cit!248), pode também pender para o

lado oposto e, movida pelo medo, constituir grupos, forças,

instâncias voltadas exclusivamente para a vigilância e a

condenação de tudo o que lhes parece pernicioso.

262
Segundo Poulat, o Intransigentismo do Sodalitlum Pianum

é a expressão de um momento da tensão entre sensibilidade

católica, que corresponde ao longo perTodo da "Igreja em estado

de tribunal que se estende da Igreja em estado de missão dos

nossos dias até a Igreja en estado de cristandade, cuja

nostalgia só agora começa a desaparecer" (Poulat,1969826). Mas

formulado e concretamente institucionalizado o fenômeno, a raiz

permanece viva mesmo que condenada em sua forma exterior, para

rebrotar onde as condições forem favoráveis.

IV.3 —Um Cisma Contemporâneo?

Espaço de tensões várias, a Igreja segu idamente vô


emer g ir cri ses internas nas suas d ioceses e crises de

relacionamento entre elas e o Vaticano. De acordo com a história

de cada Igreja particular, com a sensibilidade do povo que a

habita, a atualização da vida cristã pode apresentar problemas

diversos, exclusivos, embora relacionados a uma mesma questão, -


a de sua unidade - , refratada em cada porção de maneira

espec ffica.

Mesmo que o termo "aggiornamento" (tãp em evidência na

segunda metade do século XIX) já não seja capital, sem sobreviva

o clima de acusações e anátemas, é sempre problemática a relação

óa Igreja com o mundo secular. A tendência à colegial idade

invade todas as instituições, a informalidade torna-se valor e,

Para entrar diretamente no âmbito religioso, um espfrito

263
ecumênico começa a se impor constituindo um aspecto importante

na sensibilidade religiosa contemporânea. A expectativa criada

pela convocação do Concilio Vaticano II, os problemas relativos

à interpretação e aplicação de certas recomendações nele

elaboradas, constituem-se novos pontos críticos que a Igreja

enfrenta, num mundo agora preocupado não apenas com regimes

políticos e ideologias vistas como antagônicas à fé cristã, mas

questões da prdpria sobrevivência no planeta.

Num quadro desse, o católico, clero ou fiel, volta-se

para a Igreja no sentido de reajustá-la para continuar cumprindo


o papel de salvação que para eles sempre teve, seja redefinindo

significados de acordo com a nova modalidade de vida, seja


caminhando lado-a-lado do oprimido., seja corrigindo pontos que

impeçam a evasão dos fiéis. Sofisticados os recursos

institucionais da Cdr ia Romana para lidar diplomaticamente com

tais prob1emas , equilibrando a tensão entre as mudanças

possíveis e a manutenção da tradição cri stã, mesmo as sim a

Igreja enfrenta situações de im passe, corno par ece ser o "caso

trad ic ii ona 1 ist a" do bispo Marce'1 Lefbbvre, que ocas ionou nada

menos que se is excomunhões simultâneas em 30 de junho de í988,

um das qua is r a do bispo emérito D. Castro Mayer, da Diocese de

Campos.

Para comprender uma das mais recentes crises na Igreja,

g retornar ao próprio Concilio Vaticano II, onde Beozzo

<1990) identificava a presença de grupos que posteriormente

2 64
estarão entravando o desenvolvim ento de algumas posIcSem

decorrentes daquele encontro. Analisando os dez anos do papado

de João Paulo II (comemorados em 1 9 8 8 ) o autor lo calizo u no

interior do concilio as raízes dos elementos que frearam a

evolução esperada por alguns.

(17)
Na c l a s s i f i c a ç ã o de B e o z z o o Coetus Inte rn a cio na li%

Patrum foi um g r u p o que surgiu logo na ia sessão do c o n c i l i o e

quer por todo o tempo batalhará pela condenação do co munism o e

pela rejeição do ecumenismo e da liberdade re ligio sa . Era

m ino ritário e sem organização prévia, já q ue seus membrosr

m uitos deles pertencentes ao c e n t r o de c o n t r o l e romano, detinham

poder de d e c i s ã o em s u a s e s f e r a s de o r i g e m . Im pelidos a entrar

num jogo dem ocrático de d i s c u s s õ e s e a exercer uma forca de

persuasão a qual não esBLuam ..


ceavam fam ilizarizados, lim itaram a
participação a uma s é rM I . „ e
cie conclenaçoes. Sem conseguir
introduzir nos textos c o n & i^ H
1« r e s suas posicoes mais radicais, o
grupo era liderado por
L e<pv D.
e b v r e e t i n h a como s e c r e t á r i o g e r a l
o então arcebispo de Dia
H ^ n t i n a . D. Geraldo Sigaud. Se
in icia lm e n te , e em piib 1 i Co
► a d e r i r a m ao c o n c i l i o , em caráter
privado o atacavam. 0 ac’
1l a m e n t o das crítica s vai num
c r e s c e n d o que l e v a o g r u p 0 ^
G* t i n ç ã o em Í 9 7 6 .

Antes de detalhar ^
icionamento de L e f f e b v r e frente ã
Igreja vale uma r e f e r ê n c i ^
r *Pida ao lugar que o c u p a q u a n to à
P o lítica secular. Lefhh^
adotou abertamente uma postura
co lo n ia lista quando exercí^
mi S s ã o na Á f r i c a ? d a mesma f o r m a , na

2Ó5
campanha eleitoral francesa de 1 9 8 1 ,•alertou os eleitores a não

votar nos candidados socialistas; defendeu o governo Pinochet,

em 1987 - momento em que várias campanhas mundiais pelos

direitos humanos condenavam as atrocidades dos regimes

ditatoriais; apoiou as declarações de Le Pen, porta-voz do

conservadorismo político francês em 1988. £ inegável a

semelhança com a posição adotada por D.Mayer durante a ditadura

militar, quando aliou-se ás forças repressoras e não mediu

esforços nas acusações aos membros do clero mais diretamente


comprometidos com a defesa dos perseguidos políticos.

Segundo o suplemento especial do mensário Jesus

(julho,1988) dedicado ao Caso Leffebvre, á afirmação que ele faz


sobre a doutrina que defende com sendo "aquela que recebeu no

seminário, em Roma, transmitida pelo magistério desde a morte do

dltimo apóstolo, que marca o fim da Revelação" (Cf. 30

Dias,julho,1989!18) contém um visível equívocos o de confundir

certo aprendizado com a "doutrina de sempre". Tal raciocínio

apresenta duas certezas estritamente associadas! i) aquilo que

ele cre é 2 tradição; 2) a tradição üãQ EStá afeecta á mudança.

<grifos meus)

Duas objeções podem ser colocadas a estas certezas! a

noção de tradição aqui está sendo reduzida a um aspecto seu, o

qual é privilegiado e pretende ser totalizador, quanto a segunda

certeza, ela prima pelo simplismo ao não nuançar a questão.

Afinal, o que é absolutamente certo? Tal fixismo transparece em


outras falas do bispo, quando afirma que "para a fé, a evolução

é a morte".

Por trás destas declaração está o velho inimigo, o

liberalismo, tão presente na luta da Igreja contra o modernismo.

A influência de Maurras é visíveis para este o catolicismo era

essencialmente o triunfo do princípio hierárquico sobre a

ideologia igualitária e libertária da democracia. E a supremacia

daquele princípio era salutar contra a subversão possível

causada pelo fermento evangélico.

0 reducionismo teológico realizado por Lefêbvre para

defender sua posição, apoiada em concepções produzidas no bojo

de um debate específico, é compensado quando ele traça o perfil

do desenvolvimento histórico da Igreja, embora discorde de seu

resultado. Aqui, a argumentação é mais consistente, quando ele

identifica uma evolução que parte da Reforma Luterana,

desenvolve-se na filosofia das luzes, explode na tormenta da

revolução francesa, encontra apoio no cristianismo liberal do

século XIX ("contaminando" a consciência eclesial - inclusive a

hierarquicO e triunfa no Concilio Vaticano II. Para ele, é esse

assalto liberal que traz os males da atualidade! a liberdade

religiosa, o ecumenismo, a renovação da catequese, da liturgia e

da exegese. Desde que não procura discernir a complexidade desse

processos de transformações, Leffebvre fecha-se na negação, vendo

no ecumenismo, por exemplo, apenas uma espécie de concessão

feita pela Igreja aos apelos protestantes.

267
Incapaz de perceber que as d IferenciaçBcs ocorrida»,

mesmo consagradas pelo tempo, foram, na sua época, efeito de um

diálogo da doutrina com a realidade social mais ampla, o bispo

emérito de Tulle, sintomaticamente, agarra-se a uma concepção de

tradição para fazer dela a bandeira com a qual enfrentará o

processo histórico da Igreja.

Mas o conceito de tradição que endossa é aquele

anunciado na reforma tridentina, pleno das marcas da época. A

atual volta às fontes, possibilitada pelo Concilio Vaticano II,

é fruto da reflexão de tres séculos de história, que permite

questionar, hoje, até quando uma- Santa Inquisição foi de

inspiração apostólica. A tradição para ele é dotada de uma

objetividade que a empobrece, ao aprisioná-la aos fatos

concretos em que ela se expressou. Esse tipo de raciocínio faz o

argumento voltar-se contra ele mesmo, como, por exemplo, no caso

da liturgias a missa de S.Pio V não é a "missa de sempre". E

latina, inovação do Concilio de Trerito com vistas a enfrentar as

questões colocadas pela Reforma Protestante. Supostamente

facílitadora da comprensão do povo, como é hoje o vernáculo

introduzido na liturgia.

0 mesmo é possível dizer das simplificações dos rituais

que após o Concilio Vaticano II reaproximam-se mais da Igreja

Primitiva. Por isso, a chave da polêmica de Lefêbvre está na

afirmação da impossibilidade da fé evoluir, que leva a supor que

ele confunde a fé com seus sinais de expressão. Ora, para o


fiel, a fé está no coração do mundo, que se anima com a

confrontação com o outro, ou, como quer a reflexão paullna» "A

igreja hebraica se heleniza, entrando numa cultura diferente da

sua". E se a riqueza dos encontros com muitos povos em muitas

épocas pode ser sempre fecundo, só resta reconhecer a

negatividade do intransigentismo que impede o fluxo das trocas

possíveis.

A construção de uma sensibilidade marcada pela rigidez

passa pela experiência v iv-?nc iadas e pela opção de encam inhar-se

para um ponto em que é possível rejeitar as transformações que

vão se configurando. 0 exame de alguns dados da trajetória de

Leffebvre são um exemplo de como este caminho que desembocou na

excomunhão vinha sendo traçado, mesmo que ele tenha colocado nas

mãos de Oeus o seu destino.

Nascido em 1905, Lefêbvre estudou em Roma, no Seminário


Francês, ordenando-se em 1929 como sacerdote da Congregação do

Santo Spirito. Teria sofrido a influência do cardeal Billot, SJ,

que à época dirigia o seminário. Este, criado cardeal em 1927

por Pio X, acatou do geral da Companhia de Jesus que renunciasse

ao cardinalato, em função do seu protesto póblico contra a


<10)
condenação da Ação Francesa . Além dessa influência < e do

seu inspirado, Maurras) no plano da moral política, no plano

teológico há em alguns textos referências a Garrigou Lagrange,

tomista de conhecida intransigência <Cf.J e s u s ü ó ) . Por dois anos

269
Leffebvre é superior do ensino escolástIco-fIlosófico em Mortais,

na Franca.

Ordenado, o jovem padre segue para o Gabão, onde

permanece em missão até 1945. Após os dois anos na Franca,

retorna à África como vigário apostólico em Dakar, no Senegal.

Sagrado bispo no mesmo ano (1947), ao ser estabilizada a


hierarqui diocesana torna-se seu arcebispo, em 1955. Entre 1940

e 1959 exerce também a função de delegado apostólico para a

África Ocidental Francesa. No papado de João XXIII (1958-1963)


deixa este cargo para D.Maury, então encarregado de organizar o
episcopado africano. Segundo D.Maury, Lef&bvre não estaria de

acordo com esta "africanização da Igreja" e lastimava que a

Franca se encaminhasse no sentido da descolonização daquele

continente. Com a independência da colônia, em 1962, o bispo é

transferido para a Diocesse de Tulle, sendo eleito no mesmo ano

superior dos Padres do Santo Spirito. Fala-se que, na ocasião,

alguns presbíteros ter iam se afastado da ordem, optando por uma

qualificação diocesana.

E com esta bagagem que Lefêbvre chega ao Concilio

Vaticano II, como um dos organizadores do esquema preparatório.

Chegado a Roma, lastima ter encontrado o Seminário Francês tão

diferente daquele que conhecera entre 1920-1930. 0 mesmo diz da

Universidade Gregoriana, que segundo ele encontrava-se invadida

pelo liberalismo e pelo modernismo. A decepção com as mudanças


( 10)
ocorridas constatadas na abertura do concilio deve ter sido

270

1
um fator determinante para a imediata constituição do "Coetus

Internacional is Patrum".

Terminado o concilio, D.Lefêbvre não tem mais diívidass a

decadência da Igreja prende-se ao modernismo que a invadiu e o

concilio será responsabilizado por todos os problemas que

ocorrerem a partir de 1965. A convocação de um capitulo geral

extraordinário, na ordem da qual é superior, com vistas a

alinhar a constituição interna aos princfpios conciliares,

resulta no seu afastamento, já que o capftulo geral detem o

poder supremo, acima mesmo do superior da ordem.

Bispo, porém sem função eclesiástica, Lefêbvre resolve

dedicar-se a formar seus próprios padres, numa linha que ele

nomeia de "tradicional". Com a aquiescência do bispo de

Fribourg, D. Chiarrifere, abre um centro para seminarista que

continuariam a receber a formação na Universidade. No ano

seguinte, 1970, ano marcado pela promulgação do Missal Romano de

Paulo UI e pela consagração da reforma litiirgica, funda em

Ecône, na Suiça, a Fraternidade Internacional Sacerdotal S.Pio

X, uma sociedade de vida sem votos, que compreende padres,

irmãos e religiosos. Logo em 1971 começa a funcionar um

seminário em Ecône, já que o bispo considera que a formação

oferecida pela Universidade não é suficientemente segura.

Para definir com clareza a situação da nova instituição

(a experiência concedida por D.Charriêre limitava-se a 6 anos),

271
Paulo VI nomeia uma comissão constituída pelos cardeais Garrone

<da Congregação para a Educação), Wright (Congregação para o

Clero) e Tabera (da Congregação para os Religiosos) destinada a

dialogar com Ecône e qualificar a relação que ela mantinha com

as recomendações conciliares. Até 1975 a comissão esteve, por

duas vezes, examinando a experiência e em maio daquele ano

informa a D. Mamie, substituto de D.Charriére, que está

autorizado a retirar a aprovação dada à Fraternidade e a seu

estatuto. Assim, Ecône perde canonicamente o direito de existir.

Diante dos fatos, Leffebvre decide ordenar tres padres em

junho daquele mesmo ano. Apesar do descontentamento de Paulo VI,

ordena mais treze, em junho de 197ô. No mes seguinte, recebe do

papa a declaração de que está suspenso "a divinis", isto é,

impossibilitado de celebrar missa e administrar outros

sacrament o s .

A reação é imediatas num encontro em Lille, na França,

reunindo em torno de seis mil pessoas, fica patente a

continuidade de uma sensibilidade católica muito arraigada ao

estilo pre-conci1 itar. Numa missa rezada em latim Leffebvre

pronuncia violento discurso pol ftico-religioso- Em agosto Paulo

VI recebe o bispo penalizado e inicia uma discussão que

prolongar-se-^ por cartas. Em setembro de 1977 os

"tradicionalistas" tomam a igreja de Saint Nicolau-du-

Chardonnet, em Paris, espécie de capital do anti-conci1 io.

272
Apds a eleição de João Paulo II» em 1978, prosseguem as

conversações entre Lefêbvre e o Vaticano, ago^a no âmbito da

Congregação para a Doutrina d Fé. Seper, e depois Ratzinger

■Foram os inter locutores de um bispo que não deixou passar

qualquer fato interpretável, para ele, coroo um sinal da auto-

destruição da Igreja! » nomeação do cardeal Lustiger para o


(20)
cargo de arcebispo de Paris em fevereiro de 1981? o

encontro de Assis promovido por João Paulo II em outubro de


(21 >
1986 e a visita ã sinagoga de Roma, em dezembro do mesmo
( 22)
cUlO ■

Embora em outubro de 1984 Roma tenha reconhecido o

direito de serem celebradas missas no rito tridentino (sob a

condição, é logico, de que seus realizadores acatem as

recomendações do Concflio Vaticano II), as investidas continuam.

No ano anterior (1983) D. Lefêbvre escrevera um Manifesto

Episcopal, co-assinado por D.Mayer, onde enumera erros do

Concilio enquando trabalha incessantemente para a implantação de

instituições que garantam a formação de um "clero

tradicionalista". E assim que, em 1986 inaugura-se em Flavigny o

primeiro seminário integrista da França. Ao mesmo tempo, o

movimento expande-se pelo mundo, apesar de numericamente


(23)
pequeno

E num quadro otimista pelas inovações e pessimista pela

leitura que o Vaticano faz do seu projeto, que se impõe, para

Lefêbvre, a urgência de sagrar um novo bispo, capaz de dar

273

1
continuidade a sua obra. Mas o descrédito que a mesma merecia

frente às instâncias declsdrias romanas resultará apenas no

agravamento da relação entre as partes, cujo processor que

descrevo abaixor fornece elementos.para a comprensão de seu

significado e de como as partes viam-se a si próprias.

0 impasse se caracteriza no fato de que, embora iniciem-

se formalmente as negociações, cada parte vê a justificativa de

sua postura como inquestionável. Do lado dos "trad ic ional ist as17,

cada informe vem acompanhado de argumentação histórica que,

segundo eles, confirma a justeza das decisões tomadas. Do lado

do Vaticano, os fatos são detalhados sem o tom apologético do

outro, assumindo e confirmando o lugar que a Igreja ocupa no

mundo cristão. As notícias, como não podería deixar de ser,

foram apropriadas politicamente pelos meios de comunicação de

massa. A sánflla que segue apoia-se na versão oficial, divulgada


(2 4 )
pelo Boletim da Rádio Vaticana

Após a Visita Apostólica do cardeal Gagnon à

Fraternidade S.Pio X (em novembro e dezembro de Í987), João

Paulo II escrevera para o cardeal Ratzinger (em 8 de abril de

1988) exprimindo seu desejo de que fosse feito todo o possível

para aproveitar a disposição de Lefêbvre no sentido de encontrar

uma solução conjunta que permitisse àquela instituição obter

uma colocação regular na Igreja, em plena comunhão com a Sé

Apostólica. Com este fim, reuniram-se de 12 a 15 do mesmo mes

represcntantes das duas partess teólogos e canonistas da

274
Congregação para a Doutrina da Fé e da Fraternidade S.PioX. As

conversações resultaram num outro encontro, em 4 de maio, agora

entre Leffebvre e Ratzinger, ao fim do qual seria redigido um

protocolo. Elaborado este, foi assinado em 5 de maio de 19QQ.

Estabelecido de comum acordo, o documento que servia de base

para o trabalho de reconciliação, seria submetido aindá à

decisão de João Paulo II.

0 protocolo comprendia uma Declaração de ordem doutrinai

e o projeto de um dispositivo jurídico destinado a regular a

situacao canônica da Fraternidade e das pessoas a ela ligadas.

Na primeira parte do texto, Lefbvbre frisava, em seu nome e em


nome da Fraternidade S.Pio Xs

1 - prometer fidelidade á Igreja Católica e ao Pontífice Romano,

cabeca do corpo dos bispos;

2 - aceitar a doutrina contida no no 25 da Constituição Lumen


Gentium (texto do Concilio Vaticano II sobre o magistério

eclesiástico e a adesão que lhe é devida;

3 - empenhar-se numa relação de estudo e comunicação com a Sé


Apostólica, evitando toda polêmica ã propósito dos ponto

ensinados no dltimo concilio e da reforma posterior que a

ele parecia dificilmente conciliável com a Tradição;

275
4 - reconhecer a validade da Missa e do Sacramento celebrado com

a intenção requerida, e segundo o rito da edição típica,

promulgada por Paulo VI e João Paulo II?

5 - prometer respeitar a disciplina comum da Igreja e da lei

eclesiástica, especialmente aquela contida no Cddigo do

Direito Canônico de 1983, acompanhada da disciplina especial


concedida ã Fraternidade por lei particular.

Na segunda parte, quanto ã reconciliação das pessoas


previa-se que:

1 - a Fraternidade S.Pio X seria ereta em sociedade de vida

aposttílica de direito pontifício com estatuto apropriado de

acordo com o CDC (Cân.731-746) e dotada de certa isenção,

resguardando a culto piiblico, a cura das almas e a atividade

apostdlica, tendo em conta o Cân. 679-683 do CDC;

2 - seria concedida à Fraternidade a faculdade de utilizar os


livros litdrgicos em uso até a reforma pds-conci1 iar;

3 - para coordenar a relação com o s vá rio s d ica sté rio s da Cdria

Romana e os bispos diocesanos, como para resolver eventuais


problemas e contenciosos, seria consitituida pelo papa uma

Comissão Romana, compreendendo dois membros da Fraternidade,

provista da faculdade necessária; .

276
4 - tendo em conta a situação peculiar da Fraternidade, sugeria-

se ao papa que nomeasse um bispo escolhido entre seus

membros, o qual, normalmente, não deveria ser o superior ao

geral.

No entanto, em 6 de maio, um d ia apds assinar o


protocolo. Lefbbvre volta a escrever a Rat zi n ger insi st indo
sobre a data <30 de junho), sem levar em conta o livre poder do

papa reconhecido no protocolo, acrescentando ainda que, caso a

resposta fosse negativa ele se via obrigado, em consciência, a

proceder igualmente a esta consagração. Ratzinger lhe respondeu


imediatamente, convidando-o a reconsiderar tal propósito,
contrãrio ao protocolo assinado na véspera.

Os dois se reencontram em Roma, no dia 24 de maio e

Ratzinger comunicou que o papa, segundo os critérios e


procedimentos da Igreja, estava disposto a nomear um bispo

escolhido no interior da F:rat ern idade, e faze-lo de medo que sua


ordenação viesse a ser relizada em Í5 de agosto, no encerramento

do Ano Mariano, mas ã condição de Leffebvre lhe dar uma

verdadeira prova de reconciliação, na base do protocolo firmado

e que remetesse ã decisão do papa enquanto aguardava a ordenação

do bispo. De sua parte, Lef&bvre apresenta duas cartas, uma ao


papa, outra a Ratzinger, nas quais insistia sobre a data (30 de

junho) e repropunha seu anterior pedido de nomear tres bispos

para 9arantir a vida e a atividade da Fraternidade. Além disso,

pedia ainda que fosse concedida ã Fraternidade o direito de

possuir a maioria entre os membros da futura Comissão Romana.

2 77
r

Por instrução do papa, Ratzinger responde a Leffebvre em

30 de maio frisando que:

1 - para a Comissão Romana, a questão da maioria não cabia,

visto que aquele era um organismo da Santa Sé ã serviço da

Fraternidade, de caráter consultivo (desde que decisões em

definitivo eram do papa) e que Leffebvre devia se ater aos

princípios fixados no Protocolo de 5 de maio?

2 - para que houvesse a ordenação de um bispo era preciso que

Lefkbvre renunciasse a consagração em 30 de junho ("com ou

sem acordo de Roma") e se colocasse em plena obediência à

decisão do papa, cuja disponibilidade era por outra conta.

Em 2 de junho o bispo escreve ao papa alertando que, à

despeito do clima de cortezia, os encontros com Ratzinger não o

haviam convencido de que o momento de uma colaboração franca e

eficaz tinha chegado. Que era para guardar a fé do batismo que

ele se opunha ao espírito do Concilio Vaticano II e às reformas

por ele inspiradas. Que o falso ecumenismo, na base de todas as

inovações do concilio, na liturgia, nas relações da Igreja e do

mundo, na concepção da própria Igreja, conduziam-na à ruina e os

católicos à apostasia. Por tudo isso, reconhecia a necessidade

absoluta de ter autoridades eclesiásticas que os ajudassem a

defender-se do espírito do Concilio Vaticano II e do espírito de

Assis. Por isso querem mais bispos escolhidos na Tradição e a

maioria dos membros da Comissão Romana. Se Roma se recusa a


considerar tais requerimentos, Leffebvre diz preferir esperar

tempo mais propTcio à volta de Roma à tradição. Enquanto isso,

dar-se-á os meios de seguir a obra que a Providência lhe

confiou, sabendo que ela não é contrária á Santa Sé.

Entrementes, continuará rezando para que Roma volte a

ser católica e rencontre sua tradição bimilenar...

0 comentário do Boletim que venho utilizando ressalta a

falta de fundamento na argumentação de Leffebvre, pois em

contraste com tudo que aceitara no protocolo, ele retoma sua

radical polêmica contra o concilio e afirma que a ordenação

episcopal não seria contrária á vontade da Santa Sê. Sobre este

illtimo ponto, é evidente que a ordenação só se realizaria após o

ato formal de reconci1 iação e no quadro da solução canônica

global. Além disso, a escolha do candidato e seu nome estava

reservada á livre decisão do papa. Assim, a carta de Lefèbvre

interrompe o processo de reconciliação, e uma ordenação

episcopal feita nestes termos seria contrária à vontade da Santa

Sé.

Em 9 de junho .João Paulo II escreve a Lefêbvres relembra

a Visita Apostólica providenciada e o Protocolo assinado, fatos

inspirados no cuidado de manter a unidade da Igreja na

fidelidade à Verdade Revelada. Dizendo que na carta de 2 de

junho o missivista reje'ta não só as prescrições do Direito

Canônico como os termos do protocolo assinado, ele exorta ao

''Venerável Irmão a renunciar" a um projeto que aparecerá como um


ato cismático, cujas conseqííônc Ias teológicas e canônicas são

conhecidas. Pede que "em nome do Cristo que, na vigília de sua

Paixão, orou por seus discípulos 'para que todos sejam um'
(João, 17,20)"...

0 boletim sublinha ainda que durante todo o processo o

papa foi mantido informado, dando ele mesmo a orientação

fundamental da posição da Sá Apostólica. Da mesma forma, por

ordem dele, todos os cardeais chefes de Dicastários estiveram

informados. Dado a gravidade das conseqüèncias, caso Lefèbvre

viesse a concretizar seu projeto, foi enviado aos interessados

um "monitum" como previsto na legislação eclesiástica. Com tal

nota a Santa Sá afirma sua preocupação e reforça o apelo para

que os fiáis da Fraternidade repensem suas posições e queiram

permanecer unidos ao Vigário de Cristo, sendo assegurado que

todas as medidas serão tomadas para garantir a identidade deles

na plena comunhão da Tgreja Católica.

Em 15 de junho Lef&bvre comunica que sagrará tres

bispos. Em 30 de junho, tendo D.Castro Mayer como co-sagrante,

são elevados á categoria episcopais D.Bernard Tissier de

Mal lera is, D. Richard Wi 11 iamson, D. Bernard Fellay e D. Alfonso

de Galarreta. Automaticamente, os seis incorreram na excomunhão,

de cor do com o CDC <Cctn.i382) que diz* "0 bispo, que, sem

mandato pontifício, conferir a alguám a consagraçao episcopal, e

tambám dele receber a consagração, incorre em excomunhão latas

seotltiae reservada á Sá Apostólica" (Cf.CDC5240)•

280
Tão grave episódio foi vivido» sem diívida, com grande
sofrimento de ambas as partes. Afinal» estava em Jogo nada menos

que a salvação e, num plano mais singelo mas não menos

importante, os sentimentos que unem irmãos, ainda mais quando

pertencentes a uma família que tem a unidade como um de seus

maiores valores. Na Igreja, aci lado da elaborada reflexão

Jurfdica que regulamenta o certo e o errado, corre terna

sensibilidade voltada para o perdão e o rencontro. Assim, ã

despeito de exercer sua autoridade de direito, o Papa expressa

sua paternal bondade ao orar pelo pecador e remete à Mãe comum

para que guie os agora desamparados.

Também Lefèrbvre, apesar do formalismo com que recebeu a

penalidade. não deixou de expressar o sentimento forte que o

acompanhou no momento de romper com a negociação! as 24 horas

que separaram a assinatura do protocolo e a seguinte

desistência, assim como os dias imediatamente anteriores ã

sagração.

No primeiro caso, o fato chega através de uma entrevista

concedida em julho de 1988 a Stefano Paci para o mensário 30

Dias é onde Lefêbvre relata a desconfiança que o assaltou após

um diãlogo com o cardeal Ratzinger em 4 de maio. Eí provãvel que

a consciência de jã dispor de pouco tempo (contava o bispo 83

anos, na ocasião) tenha aumentado a ansiedade de um homem que

conhecia bem a h istó ria da Igreja, a m odalidade demorada com

que ela conduz a pretendida unidade e afinal, esta convicto de


(25)
sua posição

2 81
Sobre os dias que antecederam o ato, a Informação é

indireta! chega atravds de uma entrevista do fildsofo catdlico

Jean Guiton, concedida e Robert Serrou, e publicada no Paris


hatch de 5 de agosto do mesmo ano.Nela ressalta a consciência de

Leffcbvre sobre o grande drama que vivia, verdadeiro martírio,


( 26)
esperando um "sinal do cdu" para que não consumasse o ato .

Mas apesar de tanta dramaticidade, o fato se deu. E

sobre ele se debruçaram os adeptos de ambas as partes, todos

perplexos com a ruptura na tún ica incon sáti1 e ans iosos por

conhecer os desdobramentos que v ir iam n De um ponto de vi st a

prát ic o , os part ic ipantes ret ornam sua s vidas, passados os

momentos ma is tumultuados.

Um ano depois Lef&bvre afirma que os esforços envidados

para sagrar os bispos foram recompensados. Restou a certeza de

que, com tantos obstáculos colocados por Roma, findou convencido

que a única solução era fazer o que fez <30 dias, julho,1989).

Na ocasião satisfazia-se porque a perda prevista <em torno de

10%) não chegaram aos 7%. E fora compensada com o aumento do

número de sacerdotes. E b em verdade que sofria muito como o

abandono de alguns antigos colaboradores, como o P . Bising, da


(27)
Alemanha. Mas não podia haver arrependimentos porque tudo

que fizera estava pautado no que aprendera na Universidade

Gregoriana. assim, reconhecendo o Papa João Paulo II como

legftimo chefe da Igreja Catdlica, ora por ele, na medida em que

seu atos modernistas favorecem a heresia.

282
IV.4 - Da Tradição ao TradiclonalIsao

Par~ apreender a forca que moveu o grupo auto-defInI do

como "tradicionalista", é preciso atentar para o significado da

categoria tradição para o católico e o peso que ela concentra no

que tange autoridade da Igreja e da hierarquia.

Constitutivos da autoridade na e da Igreja, as noç3es de

tradição e magistério conformam nrís, pontos de tensão gerados na

atualização daqueles princípios e das práticas que eles


engendram numa realidade dada.

0 tempo e o lugar do meu interesse, a década de 80 na

Diocese de Lampos é a expressão de um desses nós, configurado

pela inadequação entre a concepção de Igreja assumida pelo

bispado de D.Mayer, onde aquela se definia como Sociedade

Perfeita, e as sutis correções a este modelo que estavem em

gestação há um século. Refiro-me a sutis correções remetendo ks

lentas e pequenas retificações impostas na prática eclesiástica

em seu diálogo com a sociedade, diferente, portanto, de medidas

incisivas e taxativas como o foram o Syllabus e ou o Sacrorum

Antistitum, respectivamente a condenação do modernismo por Pio

IX (1846-1878) e a imposição ao clero do juramento antl-

modernista por Pio X <1903-1914).

A concepcão de Igreja como Sociedade Perfeita, onde a

hierarquia finda sendo confundida com aquela, é fruto, segundo

283
Wackenheim <1977) das regulamentações canônica» qu«

introduziram, desta forma, a marca distintiva da Igreja Latina,

onde impera, como pode se detectar pelo Code* luris Canonici,

uma teologia investida de valor normativo. E a parte do clero de

Campos que se alinhou com D. Mayer tinha muito bem introjetada

esta concepção, seja porque fazia parte de uma rede

vigorosamente alinhada com a romanização, seja porque fora


formada segundo este modelo.

Olhando pelo prisma da autoridade papal, a continuidade

com o pensamento tridentino é visíveis a Constituição Pastor


Aeternus, do Concflio Vaticano I reforça o primado e a

infalibilidade do papa e sd com a Lumem Gentium, do Concilio

Vaticano II são introduzidas nuances que relativizam o

absolutismo que caracterizava a estruturação hierárquica da

Igreja. Assim, se esta Constituição Dogmática corrige a

concepção jurídica da Igreja, herdada da escolástiea e do século

XIX, mantem- se a cont inu idade com aquela const itu ição do
Conc H io Vat icano 1, deslocando acentos e inscrevendo os
privilégios do papa numa nova teologi a da Igreja e do
ep iscopado.

E assim que pode emergir a qualificação de poder de

comunhão em oposição ao de dominação. Segundo (Poupard(1900), os

detalhes introduzidos pelo Cone flio Vaticano II não afetam a

hierarquia da Igrejí., constituída pelos ministros e pelo Vigário

de Cristo, o papa. A eles compete a tríplice tarefa de

284
santificar, governar e ensinar, que o papa exerce em comunhão

com o colégio episcopal, do qual ele é o chefe e a cabeça,

Se em termos canônicos o poder do papa sobre a Igreja é

universal, supremo, total, ordinário e imediato, e, por outro

lado, ele se estende ao conjunto da Igreja, independendo de

qualquer outro, ele compreende a plenitude dos poderes confiados

por Cristo a sua ingreja - é preciso não tomá-lo numa concepção

absolut ista . mas aca tá -lo enquanto exerc íc io de um poder de

comunhão que une todos os p a rticip a n te s da Ig re ja , nSo apenas a

hierarquia.

Dessa forma, a condição de "primus inter pares" remete a

um tipo de poder que emana de um grupo identificado pelos mesmos

princípios e, no caso, guiado pelo Espírito Santo. Nesse

sentido, é possível dizer que o poder exercido pelo papa, apesar

de seu caráter de cabeça da Igreja, não é visto como um poder de

dominação. Ora, tal posicionamento é coerente com uma concepção

de Igreja como paradoxo, humana e divina, diferente da Sociedade

Perfeita onde a unidade se confunde com a unanimidade, levando,

consequentemente, ás posturas vigilantes tão conhecidas.

Ao mesmo tempo, se o poder de dominação alude a uma

estrutura marcada pela verticalidade, que se exerce tanto no

interior da hierarquia quanto nas relações desta com o grupo de

fiéis, o poderde comunhão - embora resguardando a

característica hierárquica, aponta para uma tendência à

285

horizontalidade, que deve ser entendida não como a inversão do

modelo anterior, mas como o reconhecimento da autoridade

específica de cada um cios membros da Igreja, compreendida como

comunidade dos fiéis em Cristo e onde cabe, com sua relevância

própria o leigo e o simples fiel.

A compreensão desse deslocamento operado pelo Concilio

Vaticano II é possfvel quando se recorre ã história da Igreja.

Como afirma Congar (1962) as circunstâncias históricas foram


conformando a doutrina ec1esioldgica e a noção de autoridade.

Momento decisivo nesse processo foi o papado de Gregdrio VII

(1073-1081), quando se verificou verdadeira purificação do poder

na Igreja, até então muito dependente do poder secular. Aquele

papa reivindicou para si mesmo um direito próprio, plenamente

autônomo e soberano, de sociedade espiritual.

Assim como o fundamento do edifício eclesiástico residia

no papa, cuja.autoridade emana direto, ente de uma institução


divina positiva, os direitos soberanos desta autoridade

estenderam-se para além da Igreja, sobre os reis e os reinos.

Tal reforma ainda determinou poderoso movimento de estudos

canônicos que a transforma num marco, num novo capítulo da

história da noção de autoridade. E, para o autor, se ela logrou

tamanho êxito, deve-o a presença de uma mística ampla e profunda

que atravessou o papado de Gregório VII.

286
No entanto, esta mística se formulou e investiu em teses

de direitop numa teologia política. Textos que pertenciam ao

domínio de uma antropologia espiritual foram traduzidos em

termos de direitos e é neste quadro - e a partir dele - que os

padres, e mais soberanamente, o papa, ficaram dotados do direito

de julgar poderes seculares. A concepção de


os vigário é o
(28 )
melhor exemplo deste quadro

Tal juridicismo, apesar de neutralizado por condições

histdricas que modificaram a relação da Igreja com outras


instituições, principalmente com o Estado Moderno, no entanto,

ainda perdura como ideologia que prioriza a validade formal da


autoridade, a seu título legalmente possuida, sem se prender a

marcar a necessidade de uma intervenção atual e graciosa. De

fato, o juridicismo engendra uma teologia estranha a uma

antropologia espiritual, onde a Igreja deixa de ser o conjunto

dos cristãos para ser um sistema, o aparelho, a Hierarquia

(Congar, 1962:170).

Como frisa este autor, não foram poucos os movimentos

espirituais, mais ou menos eclesiásticos, que se rebelaram

contra tal perspectiva. No sentido de lutar por uma autoridade


mais ligada aos dons espirituais, aparece a figura do "direito
de consciência" - que consistia no direito de resistir ao

tirano, na ordem política, e o direito de admoestar, advertir e

desobedecer <"filialiter et obedienter") a autoridade maior, na


ordem religiosa. Por volda do Concilio de Trento, no entanto.

287
seu uso f o i suprim ido, num g e s t o de c o n d e n a ç ã o ao a b u s o que d e l e

se f a z i a .

A questão da autoridade vê-se assim reafirmada e

concentrada pelo C o n c i li o de T r e n t o q u e r ao mesmo t e m p o , opera

uma certa revisão nela e de s u a prática, no plano moral e

pastoral. E é e s t a mesma q u e s t ã o que c o n t i n u a r á dominando os

séculos seguintes, por c o n t a do e s p a ç o c a d a v e z mais reduzido

que a sociedade mo d e r n a v a i deixando para o c a t o l i c i s m o . Com o

Cone T l i o Vaticano I trata-se da a u t o r i d a d e da R e v e l a ç ã o e de

Cristo, que na s u a f ó r m u l a C r i s t o - R e i chegará ao Brasil com

alguns a n o s de a t r a s o .

Com a s r e c o m e n d a ç õ e s do C o n c f l i o Vaticano II presencia-

se a p o s s i b i l i d a d e da n o ç ã o de a u t o r i d a d e s e r a b s o r v i d a p o r um
(
senso v i v o de r e s p o n s a b i l i d a d e p a s t o r a l e a p o s t ó l i c a , quando o

exercTcio da autoridade se ma r c a p e l a d o m i n ã n c i a do pastoral

sobre a prelatura, das t a r e f a s e responsabilidades sobre a

reivindicação de p r i v i l é g i o s . Neste s e n t i d o é p l a u s í v e l supor a

tendência do c l e r o empenhado na b u s c a de r e e n c o n t r a r o caráter

espiritual da Igreja, onde p o d e r é responsabilidade e autoridade

é serviço (Congar, idemsí77).

Por s ua v e z . a n o ç a o de a u t o r i d a d e como s e r v i ç o só pode

se atualizar p l e n a m e n t e num e s p a ç o de m a i o r diálogo, onde fica

facilitada a troca de i n f o r m a ç õ e s e de o p i n i ã o entre leigos,

padres e bispos, quadro inconcebível em t e r m o s de uma Igreja

como S o c i e d a d e P e r f e i t a .

288
E esta flexibilidade emergente que o grupo dito

tradicionalista da Diocese de Campos condena como efeito do

modernismo, atendo-se a uma perspectiva que prioriza a

verticalidade das relações no magistério? condenando a

colegialidade que aproxima bispos e numa concepção de tradição

como vinculada ao tempo. Por isso mesmo utulizaram tanto o

direito de questionar a própria autoridade superior a eles, se

auto~definindo, finalmente, em alguns momentos, como anti-

conciliares. Há que manter a fidelidade ao modelo antigos a

adesão ao conteúdo do objetivo da fé é condi cão para a salvação.

E preciso lembrar, no entanto, que mesmo no bispado de

D. hayer, a unanimidade não era alcançada. Só a metade do clero

levou ás 'iltimas conseqências a postura do bispo. Muitas

paróquias eram conduzidas de acordo com algumas recomendações

emandas do Concilio Vaticano II. E como o confronto se resumia,

até 198Í, á mensagens ao clero ou a clmoestacões ao Vaticano que

não resultaram em qualquer medida de ordem prática, a diferença

foi assumida com fragilidade da prática religiosa, tão difundida

no Brasil.

A relativa convivência pacífica com paróquias que

esboçavam os formas de organização dos leigos nos padrões deste

século, dita no fragor do conflito como por exemplo do zelo

fraterno do bispo, inscreve-se também num quadro de uma

avaliação objetiva do pessoal disponível para atuar naquela

circunscricão, dos acordos pré-exist entes com várias ordens ali

289
instaladas e culturalm ente acomodadas ã r e g i ã o , a opção por uma

po lítica não diretamentede de c o n f r o n t o com o Vaticano e o

impulso que v i n h a ganhando, no B r a s i l - em o u t r a s dioceses

desdobramentos das recomendações mais radicais do Concflio

Vaticano II quanto ao papel da Igreja frente àis questões


s o c i ai s »

Os ventos soprando a favor do V a t i c a n o , a substituição

do b i s p o tra dicio na lista se deu r a s p a l d a d a na d i m e n s ã o j u r T d i c a ,


. . <29)
conforme o Codigo do D i r e i t o Canônico v ig e n te podendo ser

mantida a aparência do perfeito relacionamento que une a

hierarq uia. Mas a e s c o l h a do s u c e s s o r , cujo nome n ã o partiu do

próprio grupo ligado a D. Mayer dá s i n a l da c o r r e l a ç ã o de f o r ç a s

existente. De qualquer forma haverá punição, indiretam ente, com

a excomunhão de D . Mayer, por sua p a r t i c i P * ç ^ ° como co-sagrante

de b i s p o s no s e m i n á r i o de D . Marcei Lefbbvre. S i g n i f i c a r i a isto

que Roma c o n s i d e r o u in sifig n ifica n te s as c r f t i c c a s que partiam

da Diocese de C a m p o s , as admoestaçoes que d e s d e o papado de

Paulo VI ch ega va m ao V a t i c a n o alertando o perigo da m o d e r n i z a ç ã o

da Igre ja ?

Talvez uma h i p d t e s e - r e s p o s t a resida no f a t o de que, bem

mais preocupante para o papa João Paulo II fosse o

desenvolvim ento das experiências ligadas ã Teologia da

Libertação <já « me as medidas posteriores or i ent a r a m -s e no

sentido de punir teólogos, neu tra liza r a força da CNBB,

desmembrar a Arquidiocese de São Paulo ou fechar certos

290
seminários) do que o pequeno grupo ligado a um modelo
"ultrapassado".

Já no plano das questões sociais, a historia correu a

favor do grupo tradicionalistas a antiga batalha contra a

Reforma Agrária, carro-chefe de D. Mayer e de 0 Catolicismo ha

década de 60, se desenbocou numa impressionante demonstração da

força que a Igreja pode aglutinar quando se coloca na defesa de

certos problemas sociais, findou sendo neutralizada, tradada por

procedimentos exclusivamente jurídico-polfticos, numa hora em

que o Vaticano investia contra a facção mais "progressist a" do

clero brasileiro.

Mas mudanças na conjuntura política brasileira, se

permitiram tornar anacrônicas as acusaoes de bispos como D.

Mayer ou S. Sigaud a uns pretensos "bispos vermelhos" não

encerraram as manifestações dos catdlicos quanto as questões

soc ia is : a Com issão Pastoral da Terra (CPT) continua sua luta

contra a v iolônc ia no campo <Cf. Caderno do CEAS, no 104),

en quanto 0 Cat ol ic ismo, mesmo apôs a ruptura com D. Mayer


pers ist e em acusar a infiltração comunista no clero (Cf.

Catolicismo no 424 e 426 de abril e junho de 1986), E se novos

atores entram em cena, como a União Democrática Ruralista (UDR),

apoio lhes será dado em nome de velhos princípios partilhados.

Assim, a presença de um "tradicionalismo" na Diocese de

Campos foi possibilitado pela presença de um bispo romanizador

291
frente a um e s p » C ° que praticava o catocilism o tradicional e

que, num segundo momento, viu -se premido a e xp licita r sua

posição, l e v a n d o —o a p o s i c i o n a r —se contra algjn s aspectos

ca ra cte rístico s da re lig iã o defendidos por parte do clero.

Conform a-se desta maneira uma ideologia religio sa cuja

vita lid a d e depende dos recursos m aterial® » h u ma n o s e slr^d licos

que consegue a g lu tin a r.

Não é gratuito que o s tradicio na lista da Diocese de

Campos, com v i s t a s a garantir sua presença na Igre ja , busquem

reforçar sua rede, dando visib ilid a d e a si mesmos a f i m de não

serem absorvidos pela corrente hegemônica da Igreja universal.

Os padres que por sua atuação no e p i s d d i o de substituição do

bispo ganharam o epfteto de tra d id io n a lista s, organizaram -se


O0> <3i>
numa assoe i açao r o r i c i osament e s a g r a r a m um bispo r

laboriosam ente reforçaram c o n e x õ e s com sim patizantes que em


<32)
momentos anterio res corriam paralelo à eles

Se o momento U não produz as condiçSeB para a

e xistê n cia de algo semelhante ã A ç So c a t d l i c a nem à T F P , a obra

se expande no plano mais Propriam ente re ligio so , m ultiplicando-

se os lugares de culto nos moldes "tra d icio n a lista s", Para além

das fro n te ira s da d io ce s e r re -unindo


0 R e m a n e s c e n t e s de m o v i m e n t o s
sem elhantes; reforçando o assistenr
n(- , * l i s m o e a educacaor pontos
facilm ente cativantes num p a i s cu jQ . _ ^ ^
00 P r o j e t o social sera número
cada vez m aior de deserdados de u ^ » .
r 1q u e z a teoricamente dita de
t odoo.

292
Tres c a r a c t e r fst i cas es tã o p r s e n t e s no t r a d i c i o n a l I siko

da Diocesse de Campos e que j á f o r a m a p o n t a d a s na analise da

vertente tradicionalista de D. Marcei Leffevbre, feita p o r Rámond

(1988)* Bão elas* a postura paradoxal frente à autoridade na

Igreja? a compreensão negativa do processo histdricor a

constituição de um s i s t e m a de c a r á t e r intransigente.

No que t a n g e â a u t o r i d a d e , os t r a d i c i o n a l i s t a s acionam

um mecani smo j á condenado p e l o C o n c i l i o de T r e n t o <C o n g a r , 1 9 6 2 ) ,

voltando-se contra a autoridade c o n stitu íd a em nome d o s mesmos

princTpios que a f u n d a m . 6 em d e f e s a da I g r e j a que j u s t i f i c a m o

questionamento i n t r a n s i g e n t e de c e r t a s me di da s que emergem em

dado momento, no q u a d r o de uma i n s t i t u i ç ã o e de uma d o u t r i n a de

caráter hístdrico. " Não é a p r i m e i r a v e z que os ma i s a g a r r a d o s à

a u t o r i d a d e se r e v o l t a m c o n t r a e l a , nem que os ma i s f i á i s ao Papa

crêem, em consciência, dever lhe desobedecer (...) é a mesma

c c e r t e z a de t e r razão, a mesma c o n v i c ç ã o de p o s s u i r a v e r d a d e e

manter, contra todos, a tradição imutável, o mesmo Processo

i m p u t a d o à h i e r a r q u i a . . . ( Rámond, 1 9 8 8 * 9 6 ) .

Quando à comprenssão do Processo histdrico, os

tra d icio n a lista s aferram -se a uma Perspectiva rom anizadora,

deixando de perceber a possibilidade que a Igreja tem de

Permanecer viva em d i f e r e n t e s contextos, à despe it o das mudanças

ocorridas nos relacionam entos contemporâneos. Na busca de

reproduzir um estilo de r e l i g i o s i d a d e que c o n s i d e r a m o Jnico

verdadeiro, a b r e m mão d a s formas q u e stí a h i s t t í r j a pode liberar

293
porque "sacralizam o momento como forma perfeita que projetam n a

eternidade" (Rémond,1988S99). No caso de Campos, este "momento"

não se reporta tanto á uma época passada, mas a um estilo de

ser Igreja, constituída no período tridentino e que nunca foi


vivido no Brasi1.

Tal estilo remete ao chamado "integrlsmo católico" que,


como quer Rémond (op.cit), se constitui enquanto sistema por

ocasião de um evento históricos a revolução de 1789, da qual foi


sistematicamente contrário. Como a contra-reforma tridentina se

definiu por relação à inspiração e aos enunciados da Reforma, o

integrismo tomou forma por conta - dos acontecimentos


revolucionários. Forma histdrica datada, modelada por

ciscunstâncias singulares, inscreve-se numa maneira de depender

desta história que eles recusam o julgamento. "Fixando a Igr ‘ja,

e r igem em verdade intemporal uma idade da história de uma

instituição que há 2000 anos não parou de crescer, de criar, de


evoluir" <Idem:99).

Ainda semelhante ao integr iorno, que segunuc Re.rcnd fecha

° catolicismo em limites estritamente definidos, o

tradicíonalismo associa, P°r encadeamento dedutivo, uma


teologja> Uma eclesiologia, uma filosofia social e Uma política,

uma idéia de relação entre A Igreja e o mundo, entre a religião

e a Política, uma filosofia da história, formas de sensibilidade


religjosa, de piedade específica e devoções Pr<ípr jaSii ^ este

sistema corresponde um comportamento militante e Uma estratégia

de- exclusão.

294
Mas se o tradicionalismo é essa ideologia que se atém a

uma leitura da Igrejar e leitura que se fecha às conquistas que

o desenvolvimento da teologia pôde trazer, é preciso notar q-te o

tradicionalismo tal como apareceu na Diocese de Campos ganhou

projeção pela articuclação realizada com o grupo francês,

porquanto os pontos de apoio nacionais já não possuiam grande

peso no debate ideológico que se travava, nem no plano secular

nem no plano religioso.

Nestes termos, a Diocese de Campos, na década de 80, foi

uma expressão exemplar da Igreja, permeada de ideologias

conflitantes, dividida, com grupos enfatizando ora o

juridicismo, ora o misticismo, ora o assistencialismo, Incapaz

de realizar o sonho (ou pesadelo ?) trcíd ic ional ista de uma

cultura estática sob o comando de uma religião uniforme.

E se tal não se deu, por circunstâncias que espapam ao

poder diocesano propriamehte dito, resta examinar o papel que

cumpriu na emergência do trad ic ional ismo e nas condi ç'ôes de sua

continuidade, a massa dos fiéis, seja qual for o seu grau de

inserção na Igreja. A caracterização da Diocese de Campos se

completará, pois, com a análise de uma dé suas paróquias, onde

será possível uma aproximação maior com o imaginário local e,

portanto, com os significados dados ao conflito religioso ali


NOTAS
1 - Já sob a realidade; de uma Igreja anglicana, onde a ruptura
do monarca inglês com Roma significaria, provavelmente, a
adesão nacional,a emergência dos lolardos, grupo que pregava
uma vida cristã baseada unicamente na autoridade da
Escritura, era uma espécie de desdobramento do pensamento
de John Uyclif. Para este profeessor de Oxford, as
Escrituras eram suficientemente clara3, podendo ser
compreendidas sem os comentários da Igreja. Além disso, ele
negava a suzeran ia do papa como condenava as indulgências,
preconizando a secularização dos bens do clero.
0 anticlericalismo e o antipapismo da plebe era alimentado
pelo pensamento de Wyclif, que pode ser visto corço um
precursor do anglicanismo.

2 - "Rogo-vos, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo,


que fales todos a mesma cousa, e que não haja entre vòs
divisões; antes sejais inteiramente unidos, na mesma
atitude mental e no mesmo parecer"<ICor.1 'Í0).

3 - A "crise judaiaante" é provavelmente o primeiro momento em


que é acionado o chamado "poder de comunhão" como exercício
cie poder no interior da Igreja. Naquela crise reconhece-se a
presença de determinações seculares, sendo indiscutível a
importância da dimensão política na questão que se colocava
e onde Pedro e Paulo tinham, inicialmente, posições
diversas. E no deslizamento da questão política para o plano
teoldgico que se realiza o "poder de comunhão" que, naquele
caso concreto dizia respeito a necessidade ou não
(respectivamente as posições do Pedro e Paulo) de os gentios
convertidos ao cristianismo serem submetidos ao ritual judeu
da circunscisão, e sd depois tornarem-se cristãos.
(Vocabulário Teoldgico Bíblico:402)

4 - Esta Congregação, instituída por Pio V e Gregdrio XIII com


vistas á evangelização e ao combate à heresia, tem sua
competência atualizada na ênfase'que o Concilio Vaticano II
deu à responsabilidade colegial dos bispos em anunciar o
Evangelho para toda a terra, daí a parte que deve ser deles
na organização da atividade m i s s i o n á r i a . Sua composição
interna atual é particular# s ã o 24 r e p r e s e n t a n t e s com voz
deliberativa; Í2 prelados das m i s s õ e s ; 4 de o u t r a regiões; 4
diretores de institutos; 4 de obras pontificiais, convocados
todos eles duas vezes por ano. Os membros deste conselho são
nomeados por 5 anos e í/5 é renovado anualmente. Os
representantes de institutos religiosos em missão de obras
regionais para as missões, de conselhos laicos também,
sobretudo os internacionais, têm lugar nas reuniões deste
dicastério, em caráter consultivo.

296

r %
5 - As aplicações práticas daquela obra dogmática sãoí o
aparecimento do catecismo (em 1566), a edição da Vulgata (em
1568), a reforma do breviário (em 1568) e do missal (em
1570), a reelaboração do calendário e do martirológio (em
1582).

6 - Pio V (1566-1572) impõe que o catecismo, o breviário e o


missal entrem nos hábitos clerEcais; Gregdrio XIII (1572-
1585) funda mais de vinte seminários e a Universidade
Gregoriana, dando caráter definitivo às nunciaturas
permanentes; Sisto 0(1585-1590) promove a visita canônica
aos conventos, impõe a visita ail lituiua, organiza as
congregações cardinalícias, fixando em setenta o námero de
cardeais para a administração judiciária nos Estados
Pontifícios e na Igreja universal; Clemente VIII (1592—
1605) consegue transformar o Sacro Colégio num corpo de
elite; Paulo 0 (1605-1621) concluiu a Basílica de São Pedro.

7 - 0 termo deriva do bispo Jansênio, doutor em Louvain que se


tornara bispo de Ypres em 1636. Entre 1628 e 1636 ele
presidiu a elaboração do "Augustinus", vasta suma do bispo
de Hipona sobre a relação entre uma graça todo-poderosa e a
miséria e a decadência do homem. Se Agostinho elaborara seu
pensamento no combate ao pelagianismo, doutrina do monge
bretão Pelágio que proclamava a força da vontade do homem
em detrimento da graça divina, a suma de Jansênio reacende a
discussão, recolocando-a em nova conjuntura, onde a querela
se instalava entre os religiosos de Port-Royal e os
jesuítas, acusados de laxismo. Forma-se assim um "partido
jansenista", composto de gente que levava uma vida santa e
se opunha aos clérigos galicanos (Pierrard,op,cits198s>.

8 - 0 termo refere-se à postura desenvolvida na França em


relação ao papado e que resuulta na subordinação do clero
aos interesses da coroa. Luiz XIV, que abolira pessoalmente
o protestantismo na França, interveio diretamente no debatee
jansenista e Port-Royal sd existiu enquanto lhe interessou.
A autoridade temporal do rei sobre o clero, legitimada pela
concordata em 1516 tem aqui sua expressão mais forte no que
tange à obstaculização do reconhecimento da autoridade
suprema do papa (Pierrard,op.cit.s201s).

9 - 0 nome é derivado de Justino Febronius, apelido do bispo


João Hontheim, coadjutor do arcebispo de Tréveros
(Alemanha), cujo livro, publicado em 1763, critica a forma
monárquica da Igreja de Roma. 0 livro teve grande
repercussão, na medida em que a retratação formal do bispo
acomodava-se a uma realidade muito particular da Alemanha de
então, onde a independência dos bispos fortalecia-se com a
posição sobrana de uma Alemanha federalista.
(P ierrad,op.c it.s207)

297
1

10- 0 nome vem de José II, filho de Maria Teresa da casa dos
Habsburgos, cuja aceitação do catolicismo era bem
instrumental. Na forma de política religiosa assim chamada,
a ação de Roma deveria ficar limitada exclusivamente ao
domínio dogmático. Ao mesmo tempo, o josefinismo visava
unificar a legislação dos diversas Estados, levar a Igreja á
pureza primitiva e combater o misticismo (Pierrard,
op.c it .s 207).

íi- Por "clero constitucional" estou compreendendo com Pierrard


<1982) a parcela do clero que se submeteu à situação
vigente na França revolucionária. "Em 12 de julho de 1790,
sem consultar Roma, a Assembléia Nacional votou uma lei
reorganizando a Igreja na Franças não somente as
circunscrições eclesiásticas passavam a ser calcadas na
organização administrativa do pais como também o clero
tornava-se um corpo de funcionários remunerados pelo Estado
ou pelas comunas, eleito pelo povo e inteiramente submetidos
à autoridade civil, de vez que a prestação de juramento de
fidelidade á constituição civil do clero garantia essa
submissão". Dividida entre padres jurantes <o clero
constitucional) e padres refratários, a Igreja na Franca
distanciava-se cada vez mais deRoma. (Pierrard,
op.c it.:212) .

12- Luis Duchesne (1843-1922), afastado da Faculdade de Teologia


do Instituto Católico foi para a Escola Superior de Letras.
Mais tarde, em 1912, sua História Antiga cia Igreja seria
colocada no Index.
13- Além dos já citados Loisy e Duchesne, inclue-se ainda os
nomes des P. Lucien Laberthonniêre, cujos "Ensaios de
Filosofia" foi colocado no Index de 1906, assim como o
"Dogma e Crítica", do filósofo Edouard Le Roy. 0 P. Marcei
Hébert, seguindo as pegadas do pastor Alberto Sabatier,
chegou a considerar os dogmas como simples símbolos,
destituídos de fundamentos históricos. Exigida a sua
retratação, Hébert nega-se a atender a ordem e abandona a
Igreja. Duas obras do P. Albert Houtin ("A Questão Bíblica
entre os Católicos da França no Século XIX" e "Minhas
dificuldades com o meu bispo" são também atingidas pelo
mesmo decreto do Santo Oficio que puniu Loisy, fazendo com
que seu autor abandone a Igreja em 1912, para tornar-se um
historiador do modernismo.
14- "Sodalitium Pianum" é o nome latino do "Sodallcio São Pio V"
que foi inicialmente dirigido^por uma dieta de quatro
eclesiásticos, afiliada ás sessões locais ou "Conferências
de São Pedro", que eram abertas a padres e leigos que
aceitassem seus estatutos e programa.

298
15— Em meio as lutas pela unificação da Itália, a anexação dc
Roma era considerada essencial. Seus partidários também
apontavam a miséria e os abusos que reinavam nas terras
pontifícias. Por sua vez, tanto o papa quanto muitos
católicos consideravam que a posse de um Estado
representava para o papado a unica caução de sua
independência e espiritual. Os territórios pontifícios eram
o líltimo Estado cristão da Europa, cuja espoliação
significaria grave atentado ao direito piiblico, um ato
revolucionário e sacrílego. Assim, após excomungar Vítor
Emanuel, "Pio IX organizou um exército de voluntários
estrangeiros - chamados de suavos pontifícios - que,
comandado por Lamoricifere, foi batizado em Castelfidardo <ÍB
de setembro de 1860). A partir de então aceleram-se os
ataques e as conquistas dos Estados pontifícios pelo
exército italiano; de novembro de 1860, quando as Marcas e a
Umbria voltaram sua anexação ao reino sardo - logo reino da
Itália - até a sombria jornada de 20 de setembro de 1870,
que viu o exército italiano ocupar Roma
(P ierrard,op.c it.:250).

16- Se a Lex Salica formalizava a dependência daIgreja aos


imperadores, a partir da conversão de Clovis (rei franco, o
primeiro soberano bárbaro católico 481-511), a chamada
Questão das Investiduras, que se prolonga por dois séculos
(X e XI) marca um ponto em que o altar mostra sua força
frente ao trono.(Pierrard,1982).

17- Analisando a presença de uma reação conservadora ao Concilio


Vaticano II, 8eozzo(1990) faz uma tipologia onde aloca as
diferentes formas de recusas surgidas. Assim, ele reconhece
cinco posições, a saber:

is)-A do abade de Nantes e pequenos grupos na França,


Holanda e Alemanha, para as quais a Igreja ter ia rompido
com a tradição ao assumir a colegialiade e introduzir
mudanças na liturgia. 0 concilio acatara heresias já
condenadas, como o modernismo e o liberalismo. A Igreja
Católica tornou-se herética, é sede vacante.

2a>-A dos grupos "Una Voce","Opus Sacerdotalis" e "Credo",


que consideram o concilio válido porque foi
'legitimamente convocado mas,tendo caráter pastoral e nao
dogmático, suas decisões não precisam ser completamente
acat adas.

3a)—A do "Coetus Internac. ional is Patrum", de adesao


meramente formal ao concilio mas sempre lutando por
condenações que não conseguiu introduzir nos textos
conc i1 Iares.

Aa)—A do grupo representado pe’os teóricos do movimento


"Comunhão e Libertação", que se recusaram a ver no
concilio uma virada histórica, ou seja, o encerramento

299
da era trldentina, do que foi o concilio Vaticano I, do
confronto de um lado com a Reforma, de outro, com a
cultura moderna.,

5a)-0 que constituía na época a maioria conciliar, mas que


conformaram posteriormente um bloco de "arrependídos" de
determinadas conseqtíências dele. Entre eles estão:
Maritain e bispos elevados ao cardinal ato como Daniélou,
Urs von Balthasar, De Lubac. Todos eles referem-se ao
fato de a Igreja estar se adequando ao espírito do
tempo e com isso, perdendo autoridade»

18- A Ação Francesa foi um movimento chefiado por Charles


Maurras, cuja doutrina, aos olhos de Pio XI (1922-1939)
misturava o naturalismo positivista - pois o catolicismo sd
exercia para Maurras o papel de "princípio de autoridade" -
a um nacionalismo integral e, portanto, monarquista.
Exercendo forte atração sobre a juventude, não sd na França
mas também na Eíélgica, tanto as obras de Maurras como o
jornal Ação Francesa foram condenados por decreto do Index,
em 29 de dezembro de 1926. A excomunhão e o interdito
golpeariam os contraventores até 1939, entre os quais
encontravem-se padres e intelectuais que viam na Ação
Francessa uma espécie de "prolongamento natural"! de sua fé
<Pierrard, 1986:164).

19- Embora a convocação do concilio Vaticano II tenha trazido a


esperança de que finalmente, acabara-se a era da "contra-
reforma", período nitidamente ant i-ecumên ico, os votos
preparatdrios para o encontro apresentavam-se como que
ignorando esta importante dimensão» Asim é que a preparação
conciliar decepcionou a muitos por reduzir~se a pequenos
reajustes na disciplina interna da igreja. No entanto, em
tres momentos esta perspectiva conservadora foi rompida: í q )
quando a Asembleía não aceitou a lista de novos membros das
comissões propostas pelo secretariado do concilio e propôs
que os bispos discutisem a constituição das comissões. 2q >
quando a assembléia rejeitou, em 20 de novembro, o chamado
esquema sobre as "duas fontes da revelação: por ser
antiecumênico. Depois, todos os esquemas preparados pela
Hiria caíram. Nenhum dos 72 esquemas foi aceito com base
para a aiscussão com exceção do que tratava da Liturgia. ?q )
quando se constituiu a comissão mista, como fruto da
exigência de elaboração de novo esquema. A comisão
Teológica, presidida pelo cardeal Ottaviani e o secretário
geral P. Tromp. SJ, , homens da Díria e teológo oficial do
Vaticano, tem que se emparelhar com membros do Secretariado
pela União dos Cristãos, presidido pelo Cardeal Bea, que
tinha posições opostas ã comisão original.

20- Escandalizado com a nomeação do cardeal Lustiger, em


fevereiro de 1981 para a Arquidiocese de Paris, D. Leffebvre
desabafa: "E surprendente que se encontre á frente da maior
diocese da França alguém que não é de origem verdadeiramente

300
Mm

francesa"r numa alusão à descendência alemã e polonesa,


daquele a quem chama de "judas convertI do". (Nouvel
Observateur no 1230, julho de 1988)

21- Além de vários pronunciamentos sobre o encontro de Assis


promovido por João Paulo IIr D- Leffebvre redige uma
Declaração em 2 cie dezembro do mesmo ano onde reafirma a
ruptura dentro da Igreja - nao produzida por ele, mas por
Paulo UI e João Paulo II que ter Iam rompido com 4*us
predecessores. 0 bispo emérito de Campos, D. rtayer,
concorda plenamente com a declaração e a faz sua. (Herl et
Hodic, no 37, janeiro de 1987).

22- A visita 1* sinagoga causou a mesma repercussão que o


episódio de Assis.

23- Além da sede principal do movimento lefebvrI ano, a


Fraternidade São Pio X, em Ecòne foi a residência oficial de
D. Lefbbvre, até a sua morte, em 25 de mar to de 19^1. 0
centro administrativo fica num cantão vizinho, em
R ickenbach, e a casa geral no pr iorado de S. Nicolnu de Füe,
0 superior d o P. Franz Sch im iriber ger , nomeado em 1982 que
coordena os 210 sacerdotes da Fraternidade espalhados em PH
paises, repartidos em dez distritos internacionaíso
Alemanha, Grã-flretanha, Austrália, Canadá! Estados Unidos,
França! México, Suiça, America Latina e Itália. A
distribuição por este espaço é irregulars o coração é a
Europa, onde existe tres seminárioss o de S c h i e r l i n g , na
Alemanha, o de Flavigny, na França e o de Ecòne, na Suíça,
com aproximadamente duzentos seminaristas. Menos de cem
alunos frequentam os outros dois seminárioss o de Francesco
Alvarez, na Argentina e o de Ridgefield, nos Estados Unidos.
0 setor mais vital na Europa é o francês, representado pelo
P. Paul Aulangner, superior do distrito francês. Conta com
aproximadamente 500 lugares de culto, igrejas ou capelas
abandonadas ou providenciadas pela Asociação dos Amigos da
Fraternidade. Há ainda quinze priorados e tres mosteiros
(dos quais o mais importante é o de Elarroux, em Vaucluse) e
cinco carmelos, todos fundados por Madre Maria Cristina,
irmã de D. Lef&bvre. 0 quartel-general é a igreja parisiense
de S. Nicolas-du-Chardonnet, ocupada em 1977. Em termos de
educação, a Fraternidade posui 23 escolas particuclares, com
ensino para meninos ou meninas. Para o curso superior há o
Instituuto Un iver s itár io São Pio X, fundado em 1980 em
Paris. Fideli ter é a casa editora do movimente, situada em
Lyon. Há movimentos jovens, como os Escoteiros Católicos da
França e os Escoteiros de São Jorge. Oficial mente os
recursos financeiros vêm das ofertas dos fiéis, com loterias
e subscrições, e também das peregr inações tradicionalistas c*
Ecòne. Em 1973 duas heranças foram doadas ao fundador e
revertidas para a obra (Jesus,1988s4).

301
24- "Nota informativa delia Santa sede sul caso LcfVovre" (16
guigno 19B8) Radio Vattcana - Comunicazione de! SCOOC no
1543
25- Vale registrar o relato de D. Lefêbvre: "No dia 4 de maio
encontrei-me com o cardeal Ratzinger em Roma. Estavam
presentes também os teólogos que elaboraram o acordo. Depois
do encontro, com o texto definitivo já pronto, perguntei ao
cardeais 'Agora que decidimos que eu posso ter um bispo,
quando podemos fazer a consagração ?' Eu queria que fosse no
dia 30 de junho; havia tempo suficiente para escolher o
bispo entre os tres nomes que propus, que há muito tempo
estavam nas mesas da Céria. 0 cardeal me respondeu! '30 de
junho é impossível, é muito cedo'. Propus dia 15 de agosto.
'Não, de 15 de julho a 15 de setembro ninguém trabalha no
Vaticano'. i de novembro ? 'Não posso prometer ' No Natal?
'Não sei '. Então eu diss! chega. Eles estão bricando
conosco. Naquele momento perdi a confiança e entendí que
todas aquelas negociações serviam para enganar a
Fraternidade e fazer-nos aceitar o Vaticano II (30 Dias,
julho, 1980:12).

26- Eis a fala de Guiton: "Eu o vi dilacerado: preso entre dois


deveres contrários - de ordenar quatro bispos e fazer um
cisma, e não ordená-los e não fazer o cisma. Eu o vi - e
isto era dramático - desejando não fazer aquilo que estava
certo que faria. Ele estava profundamente calmo. Ao mesmo
tempo, resignado a morrer, porque pensava que o ato que ia
cometer era uma espécie de morte» Morte para ele, morte para
seus fiéis. Ao mesmo tempo, esta persuadido que esta morte
era uma e_>pécie de martírio que lhe era pedido por Deus"
(Paris Match, agosto,1988).

27- 0 Pe. Bising dirige a Fratern idacle São Pedro, aberta para
receber os seminaristas e sacerdotes que não quisessem
seguir Leftebvre após a excomunhão. Logo após a penalidade
foi criada a Comissão Ecclesia Dei, sob a responsabilidade
do cardeal Paul Augustin Mayer, encarregada dos contatos com
os tradicionalista fiéis a Roma. A Fraternidade São Pedro
obteve a aprovação da Santa Sé e foi reconhecida como
sociedade apostólica de direito pontifício. Juridicamente
dependente da Comissão Ecclesia Dei, teve seu decreto de
reconhecimento canônico enviado em novembro de 1988 ãs
conferências episcopais dos paises em que existem seminários
e priorados lefebvrianos, nos quais poderíam haver
"deserções" para a Fraternidade São Pedro. Sobre boatos de
problemas entre Bising e o bispo Josef Stimpfle, de
Augsburg, diocese em que se situa a Fraternidade São Pedro,
Bising é taxativo: "Não há problemas - os tradicionalista
que desejarem permanecer na comunhão ccat óli ca precisam
apenas acatar 0 protocolo de 5 de maio, preparado pelo
cardeal Ratzinger".

302
28- A noção de Vigário de Cristo, enquanto título papal — no
sentido antigo do termo na teologia católica — remetia a um
poder transcendente ou celeste que agia atualmente em seu
representante terreste. 0 quadro e o clima da noção era o
atualismo da açãos de Deus, numa concepção multo
sacramental, iconológica, ligada á ideia de exaltação
constante de Deus e das forças•celestes na nossa esfera
terreste. E esse valor atual ista que se encontra em Lucas
<10,lá). Ora, sem que este valor desapareça, ele se recobre
de outro valor que, sem ser inteiramente novo, apenas é
enfatizados a idéia de um "poder" entregue por Cristo a seu
"vigário", isto ás a um representante que o substituirá e
transmitirá, depois dele, segundo uma cadeia histórica de
tranémissão e sucessão, o poder assim recebido. A dominante
não é de verticalidade, mas de atualidade, de representação
iconológica, mas de transmissão horizontal de um poder que
reside na instância terrestre e que, recebido do alto. é
ainda possuído por esta instância, que a usa a sua maneira,
donde toda autoridade pode usar de poder que lhe é agregado
(Congar, 1962:167).

29- C ó d i g o do D i r e i t o C a n ô n i c o . L i v r o II (Do Povo de Deus),


Parte II (Da c o n s t i t u i ç ã o h i e r á r q u i c a da Igreja): Cân.40ittl.

30- E m 15 de a g o s t o de 1988, Festa da A s s u n ç ã o de N. S e n hora, os


padres de Campos fundaram uma associação religiosa
i n t i t u l a d a "liniao S a c e r d o t a l São João M a r i a B a t i s t a V i a n e u " ,
sob a proteção do p a t r o n o dos vigários. Sem pretender
substituir a h i e r a r q u i a , ela v i s a dar apoio espiritual e
moral as e u s membros, bem com a preparação ou o
aperfeiçoamento de sua formação teológica e pastoral,
c e n t r a d o s na " T r a d i ç ã o Integral da S a n t a Igreja". 0 C a p i t u l o
I dos E s t a t u t o s (Da d e n o m i n a ç ã o e Finali d a d e ) lembra que a
instituição é dos p a d r e s que querem "permanecer fiéis à
Tradição d o u t r i n á r i a , litórgica, pastoral e espirutual da
I g r e j a de s e m p r e , tal c o m o nos foi t r a n s m i t i d a por t o d o s os
Papas, C o n c i l i a s , S a n t o s e Doutores, t r a d i ç ã o essa que nos
foi próxima e c o n c r e t a m e n t e , legada por Sua Excelência
R e v e r e n d fss ima D o m A n t o n i o de C a s t r o Mayer". E o parágrafo
ónico deste lo a r t i g o diz que "a p o s ição doutrinária da
União Sacerdotal foi c l a r a m e n t e e x a r a d a na 'Profissão de
Fé a s s i n a d a na P á s c o a de 1982 pelos P a d r e s D i o c e s a n o s de
C a m p o s f i é i s â T r a d i ç ã o , a n e x a d a aos p r e s e n t e s Estatutos".
0 C a p í t u l o XII (Dos T r a b a l h o s P a s t o r a i s ) fala de uma ação
q u e a b r a n g e a t i v i d a d e s e s p e c í f i c a s do Seminá r i o , Paróquias,
Colégios católicos, Religiosas, c a t e q u e s e e O b r a s Sociais.
(Cf. O n t e m , H o j e e sempre, ano II, no 8, o u t u b r o / n o v e m b r o de
1 9 9 0 : 4 e 5).

303
31- Em 28 de julho de 1991 foi s a g rado bi s p o Mons. Llcfnlo
R a n g e l r e s c o l h i d o pelo prdprio D. Mayer, antes de falecer e
pelos p adres da U n i ã o Sacerdoral São João Maria Batista
Vianey. Teve como s a g r a s t e s os b i spos s agrados em Econne, no
espisddio que r e s u l t o u na e x c o m u n h ã o de D. L e f ê b v r e e D.
M a y e r : D. Bernard Tissier de Mal lerais e co-sagrantess D.
Richard W i 1 1 iamson e D. A l f onso de Galarreta. 0 ato contou
com a pres e n ç a da ciípula do clero tradicionalista
i n t e r n acional, que veio testem u n h a r em São Fidélis a
elevação episcopal do Diretor do Centro de Estu d o s Maria
I m a c u l a d a e da a c i m a citada União Sacerdotal.

32- 0 grupo Perman ê n c i a , o r i g i n a r i a m e n t e d irigido por Gustavo


Corç^o, c o n t i n u a em atividade, com sede no Rio de Janeiro,
onde funciona a E d i tora Permanência, responsável pela
d i v u l g a ç ã o , em português, de alguns tTtulos asinados por D.
Leffcbvre. Semanal mente, em sua sede no Cosme Velho, cele b r a -
se a mi s s a tradicional na Capela de Sao Miguel. Da mesma
forma, em Sao Paulo, na sede da A s s o ciação Cultural M o n f o r t ,
c e l e b r a — se duas missas a cada primeiro domingo do mes.
V - 0 COTIDIANO CATÓLICO

V.i - liam Diocese Tradicional

A Diocese de Campos foi criada em 4 de dezembro de 1922,

pela Bula "Ad Supremae Apostolicae Sedis Sol ium", do papa Pio

XIr no bojo das recomendaçoe» emanadas da Pastoral Coletiva de


(1 )
1915 . Esta visava a reforma do aparelho eclesiástico,

9arantindo a unidade e autoridade dos bispos, a disciplina do

clero e a rcgeneraçSo religiosa do povo.

Embora não houvesse determinação explfclta de quantas ou

onde erigir dioceses, "de direito e de fato, a Pastoral Coletiva

de 1915 funcionou como constituição eclesiástica e como guia

pastoral da Igreja Catdlica no Brasil atd o momento em que as

reformas Propostas pelo Concflio Vaticano II começaram a ser

aplicadas" <Cf. Bcozzo, apud Oliveira, 1985c297). Neste sentido,


a Pastoral foi um elemento Importante para tornar efetiva a
MB

romanizacao, enquanto processo que pretendia afinar o

catolicismo no Brasil com a restauração que a Igreja implantara


na Europa desde o Stfculo XVI.

0 Próprio contexto da romanlração tf tambtfr uma expressão

da uoder n itiade, enquanto conjunto dr transf ormaçces sociais e

culturais % cujo imperativo e aceleração nada fica indene no

mundo ocidental* nem pafses como Brasil, que ocupava uma posição

periftfrica «ntre as nações capitalistas, nem a Igreja, tSo

3*3
d u r a me nt e abalada pelo liberalismo que e r a o pano ds fundo

d a q u e l a mudança*

Assim, a r e v i t a l i z a ç ã o da I g r e j a no B r a s i l está ligada

ao movi ment o u l t r a m o n t a d o encet ado p e l a Sant a S é r que procurava

reforçar os l a ç o s que v i n c u l a r a m os b i s p o s à a u t o r i d a d e papal,

padronizando a a t i v i d a d e do c l e r o b r a s i l e i r o segundo o modelo

europeu. E a e n t ã o r e c e n t e procl amação da repdblícar com a

implantação de um r e g i me p o l f t i c o que e s t a b e l e c i a a s epar ação

entre Igreja e Estado, com f o r t e cont eddo p o s i t i v i s t a , tornava

ainda mai s urgente, par a a Igreja, a reformulação de sua

estratégia de s o b r e v i v ê n c i a e o r e s p e c t i v o a l i n h a me n t o dos seus

quadros•

A r e a ç ã o u l t r a m o n t a n a e x p r e s s a v a a desar moni a e n t r e os

fundamentos da reii g ião cat ò 1 1c a e a nova sociedade, desarmon ia

essa que se referi a cfcS concepções des a) 1 iberdade de

cansei t n c ia e opinião, b ) questões relati vas ao 1 ibc^alis mo

c c o n f i m Ic o , c> o problema da 1eg it im idade do poder. Por aí é

possível se i?st abeiecer uma ponte entre as condenações do

S y l l a b u s e o p l a n e j a m e n t o da r e c a t o l i z a ç ã o do B r a s i l e como i sso

mer eceu t a n t a a t e n ç ã o por p a r t e dos b i s p o s .

Como reaultado prático, a primeira metado do século

assistiu ao aumento da f o r ç a c a t ó l i c a no n f v e l organizacionais


< 2>
o ndmer o de d i o c e s e s q u i n t u p l i c o u e n t r e 1900 e 1940 . Ao mesmo

t empo, a I g r e J * d e s e n v o l v e u uma e s t r a t é g i a de a r r e g i m e n t a ç ã o das


c a ma d a s medias urbanas no s e n t i d o . de conter o avanço de

ideologias secularizadas. Com i s s o o p e r o u - s e uma espécie de

d e s a p ro p r iaçSo do catdlico leigo de s u a s práticas religiosas

tradicionaiSr sem contudo atingir o nível provavelmente

idealizado•

Como o c a t o l i c i s m o tradicional era incompatível com os

valores que le g i t i m a m as r e l a ç õ e s capitalistas de produção?

visto que sacralizava as estruturas prd-capitalistas Já

existentes, a romanlzaçao pode s e r dita como t e n d o representado

importante aliada na i m p l a n t a ç ã o das r e l a ç õ e s econômicas que

superavam a estrutura econômica e s o c i a l tradicionais. E o que

demonstra o conteiido da Pastoral Coletiva de Arcebispos e

Bispos das P r o v í n c i a s Meriodionais do B r a s i l .

Mas a t r a n s p o s i ç ã o de um u l t r a m o n t a n i s m o para o Brasil

Passou por mediações particulares que são as r e s p o n s á v e i s pelo

catolicism o possível aqui existente er consequentemente, pela

Problemática que se intalará nos anos s u b s e q u e n t e s . Tres pontos

Precisam ser lembrados se pretendo, no transcorrer deste

capTtulo, caracterizar a Diocese de Campas! a concepção de

liberalism o em Jogo, a d i v e r s i d a d e no e s p a ç o diocesano e a

prdpria dimensão daquela unidade a d m i n I s t a t iv a da I g r e j a .

Quanto U noção de liberalism o, cabe ressaltar a

Particularidade da mesma, em t e r m o s de sua a t u a l i z a ç ã o na E u r o p a

Cque exportava o modelo ultramontano) e no Brasil <cuja


realidade histdrlca iria impor uma r e c o n c e p t uai i zaçao àquel a

lddia) .

Segundo Lara ( 1980) quando se f a l a tíe liberalismo, em

geral se enfatiza aspectos p o i r t i c o s e econômi cos, mas na

f u n d a me n t a ç ã o do l i b e r a l i s m o p o l f t i c o ou econômi co, está uma

maneira especffica de i n t e r p r e t a r a t o t a l i d a d e da realidade.

Assim, ainda que n&o a r t i c u l a d o em si st ema bem travejado, o

liberalism o constitui-se num c l i m a f l l o & d f i C Q que definia ou

delimitava um horizonte marcado pel o naturalismo, pel o

ra cio na lIsm o e individualismo.

E naturalismo porqie dispensa forças para aldm da

natureza humana que venham a demarcar o campo do cognoscfvel.

Por sua vez, o naturalismo se apoia todo na confiança absoluta

d e p o s i t a d a na racionalidade da natureza, a qual, deixada à livre

m a n i f e s t a ç ã o de suas forças atingir ia, normal e infalivelmente,

o melhor , o mais racional. £ a m b o s , naturalismo e racionmlIsmo,

e nc o n t r a m no indivTduo a sede privilegiada de sua existência. 0

indlvTduo rf o elemento s in t et izador dos outros dois.

Sem questionar a Presença da categoria como "natureza

h u m a n a " que aparece na tese do autor de I C B C i d i o ü a l i s m o C a t d l i c o

ca f.etQài)b.uC2, que resulta do nfvel da análise realizada e -

c u jo desenvolvimento posterior atá relatlviza esta postura

general i zant e - não ha como discordar de que naturalismo

raclonalimmo e Individualismo sao aspectos que eclodem da

3*8
atitude nova que o homem v a i assumindo frente & vida, no Período

Renasc i raento-R evolução -

Diferente das c o n c e p ç õ e s m e d i e v a i s r o nde predominava o

caráter teológico da m o d a l i d a d e de c o n c e b e r o social, com o

liberalism o enfatiza-se o caráter antropológico das mesmas. A

relação homem/Deus, f u n d a m e n t o do inqérito socialr sofre um

deslocamento, dando preeminência á relação homem/homem,

c a r a c t e r fst ica de uma nova teoria po lítica, de uma nova

concepção de v i d a .

Com isso, coloca-se em c o n f r o n t o a maneira relíglosa-

ca tdlica de ver o mundo e a m a n e i r a secular que vai sendo

reforçada nas práticas sociais. Na concepção liberal

(n a tura lista , racionalista, individualista) o homem e n c o n t r a em

si mesmo a explicação de s u a c o n d i ç ã o e princípios para uma

conveniente vida moral, tanto na or dem p e s s o a l como no plano

social. Na c o n c e p ç ã o c a t ó l i c a (exemplarmente representada por

Leão X III - 1070/1903) até e n t ã o a mp l a me n t e v i g e n t e , a razão

humana (e a "natureza humana") vai pedir ã princípios

transcendcntais a explicação e a f u n d a m e n t a ç ã o d l t i ma da or dem

moral social. A transcendência destes princípios torna-se

contudo, I mu n é n c i a histórica, transform a-sc em Vecdadei,

tradições e instituições que a t r i b u e m a s i o caráter de d i v i n a s .

3t9
Ora, as partícularidades do processo histórico

brasileiro impeliram a Igreja a uma posição ambígua frente ã

ideologia liberal: por um lado, a dependência ao padroado, por

outro, os anseios de libertar-se da metrópole vão gerar tensBes

especificas com soluções como as da chamada Questão


(3 )
R e i ig iosa .

As relações entre a Igreja e o Estado, na ía Repóblica,

caracterizavam-se pelo mótuo apoio e colaboração, apesar de duas

questões que incomodavam o clero: o laicismo do Estado e a não

Inclusão do ensino religioso no currículo das escolas oficiais.

Ao mesmo tempo, o descontentamento de muitos setores da


sociedade com o governo, colocava em xeque a Igreja, em função

da aliança que ela mantinha com o Estado. Criava-se um fosso

entre os fiéis e a Igreja, que impelirá esta a desenvolver

estratégias de ma ior aproximação com os católicos, como foi a

experiência de mobilização dos leigos já na década de 10, quando


o Arcebispo (depois cardeal) Leme impulsionará o projeto do

Centro 0. Vital.

O pensamento que se desenvolve em torno deste Centro e

da publicação A Ordem, de Jackson de Figueiredo, embora restrito


fc intelectualidade da época, tinha como característica espelhar

alguns padrões elitistas europeus: o regime democrátr Ico era

considerado uaa "anarquia prática"» o liberalismo, "um

romantismo político". Tidos como regimes falidos, política e

aocialaente, a elite católica aprrsent«va-se como defensora dr

310
regimes fortes, escudando-se no pensamento de M aritaln,

atribuindo ao Estado um autoridade absoluta, desde que

devidamente sob a influência da Igreja. A forma ideal seria pois

uma monarquia crista , o que, no e n t a n t o não era consensual i

muitos autores da é p o c a preocupavam-se m a i s com a m a n u t e n ç ã o da

ordem e da h i e r a r q u i a como c o n d i ç o e s . I nd i s p e r i s á v e i s superação

da c r i s e bra sile ira .

Rebeldia, d e s o b e d i ê n c i a , i n s u b o r d i n a ç ã o er am condenados

enquanto posturas incompatíveis com o c a t ó l i c o , na me di da em que

a c d p u l a e c l e s i á s t i c a e s t a l i g a d a cis o l i g a r q u i a s d o m i n a n t e s . Po r
isso, o movimento T e n e n t i s t a foi execrado pela Igreja, num mesmo

impulso que defendia o nacionalismo. Esta ideologia

nacion alista, por s ua v e z , i mp r e g n a d a de c o n o t a ç o e s m oralistas,

confuandia os princípios nacionalistas com a defesa da


constituição fam iliar.

A consequente valorização da f a m í l i a casava-se com a

defesa da i n d i s s o l u b i 1 i d a d e dos laços m atrimoniais e o direito

do pais a educação dos f i l h o s . Lutava-se também com a má

imprensa, difusora da 1 i c e n c I os I dade c o b s c e n i d a d e que chegava

aos lares e corrompia a formação moral dos Jovens e das

cr i anças.

Quanto questão s o c i a l , a c o m p ^ n b a v a - s e n p o s i ç ã o de P i o

XX <1922-193?). q ue aconselhava o operariado a "levar com

resIgnaçSo e cspTrito de p e n i t ê n c i a privaefles e as fadigas

311
que lhes eram im postas". Isto porque as causas da desigualdade

social e das d ificu lda de s dos menos favorecidos eram tidas como

decorrência da crise m oral, fruto do in dividualism o * do

r a c i o n a l ismo que se desenvolveram após a Reforma. 0 cfrculo

e x p lica tivo retornava à fa m H la , prejudicada pela entrada da

mao de obra fem inina e in fa n til no mercado de t r a b a l h o e pelas

extensas Jornadas que afrouxavam os laços fam iliares.

Embora a década de 20 veja surgir o Partido Comunista,

e le ain da nao m erecia a carga de negatividade que é d irigid a aos

protestantes e po sitivista s, c o mo r e p r e s e n t a n t gb do pensamento

ant i -c a t dl i co. Sd na década seguinte vai s e c o n f i su*' o horror

ao com unism o, ao mes mo tempo tm que a Igre ja busca in te rfe rir

m ais diretam ento na p o lftlca , embora o fizesse nao através d e um

p a rtid o , mas por melo da Liga E le ito ra l Católica (que assim

podia a g lu tin a r e le ito s de vários p a rtid o s), que significa va a

u n iã o eni torno de p rin cíp io s considerados fundam entais. Com a

expcnsao dos p rin cíp io s m arxistas, a Ênfase continua na crítica

V dim ensão m oral, d Ifu n d in d o -se ingênuos "exem plos" da perversão

existentes na Rússia...

Na década de 30 a d ficussÜo Já nSo é tanto a forma de

Bovtrno, monárquica, ou republicana» mas a moral daqueles que

Preencher iam os cargos póblleos e o compromisso que afirmavam

Com a visão da Igreja quanto U questão social. Dessa forma, é

possível dizer que a doutrina católica tinha como princípio

Poítlco o elltlseo e o autoritarismo. deixando ao Estado, no

312
i u r 1"
pUfcÜUV**
n
I v*ta h k
campo político, a tarefa de regular a propriedade privada e

tutelar os direitos de cada um» pr inc ipalmente os que por sua

fraqueza social deveríam encontrar todo o amparo,

Ê neste cenário amplo que surge a Diocese de Campos»

desmembrada da Arquidiocese de Niterói e cobrindo toda a região


<4 >
do Norte Fluminense. Com sede em Campos dos Goytacazes»

compreende atualmente 14 munierpis de tradição agrícola-

pastoril. Mas é preciso relativizar a homogeneidade daquele

espaço onde a Igreja deve realizar seu tríplice nmnus de

santificar» ensinar, governar. As diferenças históricas tíe cada

local introduzem variações que são um desafio à presença da

Igreja. Atualizando-se nas pardquias dos diferentes municípios

que são
autônomos e têm sua histdria particular - fundadores
(5)
uns, desmembrados outros a Igreja convive com um imaginário

semelhante onde ora se mitifica a intrepidez do nativo» a

sagacidade do desbravador branco, a piedade do devoto das

capelas, padres santos, padres pecadores, nostálgicas lembranças

de um passado glorioso que o processo histdrico transformou em

estagnação deprimente. Relacionando-se uns com os outros, medem-

se esc a)onam-se, classificam-se, fazendo emergir pretensas

capitais, segundo um jogo de distancia estrutural (Cf. Evans-

f r 11chard »1970 >•

£**** rivalidades comuns* potencializadas pela política

de centralização tributária, acirra os sentimentos, ora de

admiração, ora de revolta» dos qusis nada escapa - a Igreja,

313
identificada que ó, circunstancialmente, com algum grupo de

Poder- E no interior de cada município, no pequeno distrito, na

Paróquia, reproduzem-se as <nem sempre) tensas relações de

classe, de cor, de posição. E a esta variedade que a Igreja

f ala .

Outro aspecto que não deve ser minimizado é a dimensão

da diocese* quanto maior, maior a chance da diversificação e a

Possibilidade do plano pastoral encontrar pontos críticas para

a sua viabilização. 0 que parece acontecer á a expansão do

Projeto na h o r i z o n t a l i d a d e , com perda de profundidade, que fica

♦"estrita a alguns bolsões onde as recomendações episcopais se

realizam em plenitude. Percorrendo as 33 paróquias da diocese, é

Possível perceber estes locais, onde por circunstâncias várias.

Preservou-se um " c a t o l i c i s m o t r a d i c i o n a l " o u o n d e d e i t o u rafzes

ntais frágeis.

Vale lembrar ainda a autonomia relativa da paróquia que,

embora ciscunscrita a autoridade do bispo diocesano, retám, pelo

papel de mediação que o pároco exerce - entre a Igreja e o fiel

— uro Poder de criar sua própria identidade, em função de

part 1cular Idades locais. De toda u forma, é possível falar de um

monopólio da Igreja, ma Io expressIvamente centrado na sede

d iocttenk (Município de Campos) c dai I lrradiando-se para ou

outros pontos. Uma maior densidade encaminha-se no sentido

Campos/Noroeste. Passando pela proximidade dos limites coa o


••tido dt Hinit Gcriii, por onde flui una Intensa troca de
*r*m "1

pessoas e padres de d i o c e s e s vizinhas. Na d i r e ç ã o Campos/LItoral

as r e l a ç õ e s re ligio sa s são menores, talvez pela maior rarefação

populacional e pela endêmica carência de padres, que obriga os


<6 >
mesmos a s e dedicarem a intimeras localidade •

Paradoxalm enter esta faixa mais rarefeita conta com a

Presença antiqufssim a dos beneditinos <o M o s t e i r o de Mussurepe,

que data do século XVII, constitui desde Í9AÍ a Paróquia de

N .Sra do R o s á r i o e S ã o B e n t o de M u s s u r e p e ) que, Juntamente com

Os je su íta s, fazem parte da h i s t ó r i a de Campos ( L a m e g o , 1945)•

Outras ordens religio sas vieram colaborando no t r a b a l h o pastoral

da diocese, principalm ente depois da romanizaçao e novos

Convênios foram estabelecidos a partir de 1 9 8 1 r p a r a solucionar

Problemas im ediatos de pessoal, introduzidos com a substituição

de D.Castro Mayer. Apesar da h a r m o n i a com que foram selados

^stes acordos, eles continuam sendo f o c o de t e n s ã o , não tanto

^ela par t i c u l a r i dade dos carismas de cada ordem, mas pela

Presença d e um c l e r o flutuante e pela constante possibilidade de

^ão-renovação destes contratos.

Um dltim o ponto de t e n s ã o na D i o c e s e de Ca mp os é a

P r e s e n ç a d e um s i n a l da m o d e r n i d a d e no mundo r u r a l , representado

Pela crescente penetração d o s m e i o s de c o m u n i c a ç ã o de massa,

Prjncipalm ente a televisão. Ela r o mp e o isolamento que f o i pano


< 7)
fundo para as r e l a ç õ e s de d o m i n a ç ã o pessoal moment o que

v iu florescer o catolicism o lu so -b ra sile iro e assistiu sua

Pretendida adequação ao c a t o l i c i s m o romanizado.

315
Neste quadro de t r a n s f o r m a ç õ e s ganham maior peso as

religiõ es concorrentes, algumas delas de formulação muito

recente. Livres jé das f o r t e s campanhas d i s c r i m i n a t d r i a s , quando

não de aberta perseguição, m ultiplicam -se os templos -

favorecidos por suas normas flexfveis - r entregando-se seus

adeptos a intenso proselitism o. Se a m a ç o n a r i a js( nSo é m a i s a

quela sociedade secreta que a me a ç a v a a I g r e j a e podia lançar no

descrédito alguns homens pi!blicosr ela continua a t u a d a no melo

rural , fazendo vereadores, prefeitos e deputados, enquanto a

massa corre para o cultos pentecostais e é alcançada pelas

propostas de e s p i r i t u a l i d a d e de o r i g e m o r i e n t a l .

A despeito da especificidade de certas tensões, é

próprio dizer que t o d a s elas se i n s c r e v e m no p r o b l e m a m a i o r da

adaptação da Igreja ao mu nt o c o n t e m p o r â n e o . Por isso, dois

bispos, o emérito e o diocesano, lutaram para preservar a

integridade da religião, c a d a um d e l e s , porém, exercendo a

devida autoridade, de a c o r d o como c o m p r e e n d i a m a I g r e j a . Não f o i

gratuito que o s p r i m e i r o s atritos g i r a r a m em t o r n o do r i t o , da

missa, lugar que expressa os significados ma i s caros ao

catolicism o. Conjugando planos tão d ive rsos quanto o J u r f d i c o e

canônico com o s i m b ó l i c o , propriamente dito, neste rito estão

presentes os fu nd am ent os que s u s t e n t a m e s t a r e l i g i ã o * tradição e

m agistério hierárquico, noçoes que geram a f o r ç a de onde emana a

autoridade da I g r e j a .

316
V.2 - Varre-8»i um Lugar Católico

Encravada na Serra da Sapucaia, ao norte do estado do

Rio de Janeiro e noroeste da Diocese de Campos, o então 2q

distrito de Natividade cobre o terço superior do município,


2
estendendo-se numa área de 205km (IEJGE-Censo Demográfico de
2
1930). A sede se instala num patrimônio de 20km e naquela

década possuía 6.069 habitantes, distribuídos entre a área

urbana e a rural (respectivamente com 1.751 e 4.318 habitantes).

Em 1990 a população é estimada em 11.000 habitantes, na

proporção de 1:2 (urbana para rural). A área urbana apresenta

700 edificações, dois bancos, um clube, comércio reduzido e

pequenas fábrica de roupas, móveis e temperos. A área rural

dispõe de 283 pequenas e médias propriedades que absorvem a mão

de obra disponível, segundo o regime da produção. Pequenas levas


de migrantes regionais ali chegam para culturas rápidas, como a

do tomate. Maior produtor de café do estado, Varre Sai colheu

8,4 toneladas em 1989. Na primeira metade da década de 60

desenvolveu-se a pecuária e incrementou-se o plantio de arroz e

feijão quando da decadência da agricultura cafeeira e da


erradicação dos cafezais anti-econòmicos. Na década de 70,

graças ao Programa de Renovação 1 Revigoramento do Café,

executado pelo agora extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC),

assitiu-se ao renascimento desse cultivo, com a atualização de

técnicas agrícolas racioanis para evitar o desgaste do solo. Nos

317
. ■. ■■ ; , •1 » W'P1«.U W P ljH ^lg a ip ^P P IM ff — '«■■ » :

ÍO anos que se seguiram a este procedimento (1975-1983) a

produção cresceu 10 vezes» (FontesJornal do Brasil,)

0 patrimônio ocupa um pequeno vale cujos tres acessos

são protegidos por templos católicos- 0 maio importante, a

Matriz de S.Sebastiao de Varre Sa if é próximo «i estrada Varre

Sai/Nati v i d a d e , dnica asfaltada. A saída de Varre Sai para

Tombos (Já em Minas Gerais) é guardada pela capela de St*

Teresinhap a saída para Guaçui (no Espírito 8anto) está

guarnecida, desde meados da década de 80 com a igreja de N.Sra

das Graças, erigida pelo ex-pároco, o tradicionalista P.Antonio

Siqueira. 0 espaço entre o» dois primeiros templos (Matriz e

capela de Sta Teresinha) é dividido pela capela de Sta Filomena,

atrás da qual se acha o cemitério- Por trás da Matriz encontra-

se o Calvário, série de cruzés que marcam as estações da Via

Sacra, encimado pela maior delas, onde se realiza uma das

cerimônias da Semana Santa-

As terras do patrimônio de Varre Sai foram doadas a

S.Sebastiao em 18ó3, por Felicíssimo de Faria Salgado,

Proprietário de grande fazenda na região, por conta da devoção

ao santo. Segundo a publicação escolar comemorativa do

centenário da elevação ã categoria de distrito (1979), o nome do

lugar der iva do racho de tropeiros em torno do qual se formou o

Povoado. 0 rancho Varre Sai era assim chamado porque a zeladora

cio mesma nada cobrava aos que ali pernoitavam, exigindo apenas

318
quer o varressem quando partiam r para q ue o u t r o s o encontrassem

limpo quando chegassem.

Mas há o u t r a versão* associando o nome ã e x i s t ê n c i a de

um te rre iro comunal para a secagem dos grãos de c a f é . A lí, os

produtores mais poderosos* com v o z r í s p i d a , ordenavam a r e t i r a d a

im ediata do produto de t e r c e i r o s , de a c o r d o com suas próprias

necessidades. Variante desta versão encontra-se em LemtaCãQíiaâ e

R. e£l e«s5e& d e um ELadce (Rosário, 1985), onde a d i s t â n c i a social

entre produtores é substituída pela categoria de tropeiros,


( 8)
autores da ordem

Amb a s as versões, no e n t a n t o , apontam para

características típicas da r e g i a o a uma g e n e r o s i d a d e e gratuidade

coerentes com as frouxas relações sociais com patíveis com o

catolicism o bra sile iro , complementadas com o m a n d o n i s m o próprio

do coronelism o rural bra sile iro que f l o r e s c e u no in terior do R i o


(9)
de Janeiro.

A situaçãop o lític o -a d m in is tra tiv a do lugar sofreu

várias alterações até chegar a sua c o n d i ç ã o atual. Criado pelo

decreto no 2 . 3 8 9 de 20 de n o v e m b r o d e Í 8 7 9 , o então 7o d istrito

da V ila de S . José do A v a h g , Varre Sai permaneceu menos de 10

anos nesta situação. Isto porque em 1 8 8 7 , a V ila é elevada ã

categoria de c i d a d e , com o nome de Itaperuna. Mas em 1 8 9 0 , esta

foi divid ida em t r e s m unicípio, entre os quais o de Bom J e s u s do

Itabapoana, ao qual Varre Sai ficou p e r t e n c e n t o por dois anos.


após os quais retornou a sua c o n d i ç ã o anterior <7 q d i s t r i t o de

Itaperuna). Com a c r i a ç ã o de n o v o s m unicípios no e s t a d o do Rio

de Ja n e iro , em 1 9 4 ó r é d e s l i g a d o de Itapcruna e incorporado a

N a tivida de do C a r a n g o l a f como s e u 2 q d i s t r i t o . Emancipou-se em

1990.

A economia é predominantemente b a s e a d a no café, numa

h istó ria que sofreu altos e baixos como acontece no mundo

agríco la b ra sile iro . Nessas variações desapareceu, pratIcam enter

a figura do colono - fo rtalecida no. i n í c i o deste século - para

dar lugar ao b d ia -fria , requisitado nos moment os adequados

ciquela lavo ura. Esta categoria de t r a b a l h a d o r é constituída não

sé da descendência dos antigos colonos e m e e i r o s como também de

m igrantes das localidades vizinhas.

A d istrib u içã o da população pelo espaço define a

im portância dos habitantess uma p r i m e i r a divisão se dá e n t r e a

"roça" e o patrim ônio, t a mbé m c h a ma d o " r u a " , o quadro abaixo,

elaborado pelo Ndcleo de Ensino de N a t i v i d a d e , segundo o IBGE

<1977), mostra o alomerado das propriedades rurais carecendo, no

entando de uma r e i a t i v i z a ç ã o s a divisão deste espaço da roça

sofre variações por herança ou v e n d a das terras. Elas se

repartem , se somam, aumentando ou dim inuindo continuamente.

C la ssifica d a s todas elas c omo ' ' p e q u e n a Propriedade" pelo INCRA,

<INCRA/SERPRO, 1987) , desta c a t e g o r ia escapa penas a fa ze nda B e la

U ista , do ex-deputado Francelino França, no lim ite sul do

d is trito .

320
Na "roça" moram nao sd trabalhadores, agregados e

meeiros como t a mbé m, por vezes o p r o p r l e t á r I o , se e s t á em I n f c l o

de vida, tendo herdado terras ou tido acesso a elas por

casamento» Tira -se dali o s u s t e n t o e s o n h a - s e com o platlo do

Se o p r o c e s s o de a c u m u l a ç a o d poslt ivo, p a r t e —se para

a aquisição de uma c a s a na " r u a " .

Na "rua", em g e r a l as c a s a s sao m u i t o v e l h a s , passando

Para os herdeiros que se de d i c a m às a t i v i d a d e s que a cidade

oferece. Q u a s e t o d o s e l e s têm al guma c o i s a na " r o ç a " , por vezes

ma I s de um s f t i o , c o n s e g u i d o p e l o s mecani smos já mencionados.

Algumas casas, na "rua", no e n t a n t o , permanecem fechadas, a

espera de d a t a s que f a z e m v o l t a r seus donos do l u g a r e s p a r a onde

migraram, o que se g e r a l m e n t e nos d i a s de festas, quando

r ^vêm parentes-

Os que nada têm a h e r d a r também podem mo r a r na "rua",

Po r é m em p o n t o s menos v a l o r i z a d o s : as mar gens do Ribeirão de

^ rre Sair i r ò n i c o - a f e t u o s a m e n t e a p e l i d a d o de A v e n i d a A t l â n t i c a ,

nos lugares ma i s pobres: o a n t i g o Buraco Quente, hoje Rua

Nova <depois que r e c e b e u c a l ç a m e n t o e nome o f i c i a l homenageando

o paj do p r e f e i t o ) a Chácara, onde t e r i a existido uma Pemba

<nom local p a r a c a s a de c u l t o s a f r o ) e um p r o s t í b u l o * e o r ecém

. D a i rro de St q A n t o n i o , loteamento incrementado pelo


c r i a do 1r r
j - - *. i t u i do • Esta área, que ultrapassa os lim ites
^^roco ut»'-
. . luf)5 da " r u a " , c o n f i n a - s e com a Rua N o v a , seus lotes
* d mi n i s t r a t í v o a

321
sendo negociados prtncIpalmente entre adeptos dos

tradicionalistas e parentes deles.

As ruas principais situam-se no fundo do vale,


acompanhando o curso do Ribeirão, que corre no sentido

Norte/Sul. A rua de Baixo (da Matriz ã capela de Bta Filomena) e

a rua de Cima (dali até o final do calçamento, prdximo à capela

de Sta Teresinha) são as principais. Embora tenham nomes de


personalidades locais ilustres, continuam sendo ditas de Baixo e

de Cima, e delas partem tres transversais que chegam ao


Ribeirão. 0 comércio concentra-se na rua de Baixo, e o colégio
na rua de Cima. 0 hospital fica na colina ã margem esquerda do

Ribeirão e a dnica e modesta pensão esté na ía transversal à rua

de Baixo. Fora deste ndcleo, a i km da entrada principal situa-

se o recém-inaugurado hotel instalado em 19B8, o Clube Village e

a Cooperativa de Laticínios e do Café do Norte Fluminense

(COPERCANOL).

3 22
323
Das e s t r a d a s dc a c e s s o a V a r r e Sai saem o u t r a s que l evam

fes fazendas, algumas delas com c a p e l a s de ma i o r ou menor

atividade, Há 6 d e l a s recuperadas pela M itra Diocesana, outro

tanto p e r ma n e c e n d o sob o c o n t r o l e do e x - p á r o c o , ou construída*

após sua e x o n e r a ç ã o - quando o p o n t o ó c o n s i d e r a d o importante,

como f o i o c a s o da c a p e l a de C r u z da An a , á 500n> da a n t i g a .

A história religiosa do l o c a l ó semelhante a tantas

outras das p e q ue n a s c i d a d e s b r a s i l e i r a , não f o r a o dramático

episódio da dó c a d a de 80. Há pungentes apelos por uma

ass ist £nc ia sacerdotal cont Tnua desde o in fc 1o do sóculo.

Elevada à paróquia em 1912, tendo como p r 1meiro vi gár io o P.

Josó Mar ia Janeiro Moita Caieiro, Varre 8a i acolheu, ató hoje,

poucos párocos residentes, apesar dos insistentes pedidos feitos

a cada visita episcopal. Toda dócada via passar de quatro a

cin c o vigários, em cujo interregno os católicos eram atendidos

por padres de outras dioceses, como a de Mariana e Carari9 Qla, de

h Inas Gera is .

Há um certo f 1orescimento na dócada de 30, ópoca do

embelezamento da Matriz, per Todo que corresponde ao apogeu do

cafó e a intensificação da vida religiosa, expressa nas recem-

criadas associações como a Liga Católica (1930) e a Pia União

das Filhas de Maria (1933). É deste mesmo ano a ereção da capela

de Cruz da Ana, que, no entanto, permanecerá por multo tempo b

margem da história religiosa oficial.

324
A capela de C r u z da Ana t e v e s ua prim eira missa oficial

rezada em 3 de j a n e i r o de 1 9 4 3 , dez anos após sua ereção* Doada,

juntamento com o cruzeiro à M itra Diocesana por seu

propr ie tá r io , Sebastiao Machado de M o r a i s (dono da Fazenda

Paraíso), foi conhecida como S a n t a C r u z do P a r a í s o e atualmente

é no me a da como de S a n t ' a n a . embor a o p o v o insista em d i z e - l a com

Cruz da A n a - Construída em a ç ã o de g r a ç a s , fica ao l a d o de uma

nascente de águas d i t a s milagrosas. A veneraçáo toma vulto

depois, quando se instala o cruzeiro ao pé da água m i l a g r o s a - Na

década de 50, o então pároco P. Abaeté Cordeiro, evitava o

lo cal, por conta do f o r t e cheiro de e n x o f r e que dizia sentir.

Cruz da Ana r e c e b e u a p r i m e i r a visita episcopal em 1 9 8 8 , Já no

emp e nh o de D.Navarro de e s t e n d e r a evangelização a todas as

capelas da " r o ç a " , lugar tido como r e d u t o t r a d i c i o n a l i s t a .

Outro surto de c r e s c i m e n t o vai ocorrer na d é c a d a de 50,

contemporâneo à s mu d a n ç a s na u r b a n i z a ç ã o . Na o c a s i ã o , o bispo

D.Mayer, em visita episcopal de 1952, promete atender aos

pedidos da c o m u n i d a d e . Já que d e s d e a r e mo ç ã o do p á r o c o a n t e r i o r

os católicos vinham sendo assistidos pelo responsável por

N atividade, Mons.Manuel dos R e i s M e l l o .

Em 1953 c h e g a o j o v e m p a d r e A b a e t é B e n e v i d e s Cordeiro,

que por dois anos a s s u m irá a p a r ó q u i a . Porém, a n i ma d o p o r planos

mais largos, empenha-se Ju n to aos proprietaários locais para

começar a construção de um c o l é g i o que s e r á a s e me n t e do futuro

Seminário Maior Maria Imaculada. No colégio, P.Cordeiro


observaria e prepararia possíveis vocações pra o sacerdócio,

fugindo ao modelo disseminado onde as famílias induziam a


escolha dos filhos. Sua meta era formar padres para o mundo

rural e o colégio tornou-se um centro de preparação para os


filhos da elite das redondezas.

Breve, porém, este ideal foi deslocado em função de dois


fatores! io> a situação irregular do colégio frente as
exisgências do Ministério da Educacão, episódio talvez associado
ãs tensas relações entre o bispo e ensino oficial (D.Mayer, na
visita epirsopal de 1952 havia amaldiçoado o Colégio Pdblico de
Natividade em virtude de inexistência de ensino religioso); 2a)
a orientação dada por P. Cordeiro era alvo da pressão exercida
por padres da confiança do bispo, cujo objetivo era formar
padres numa linha "integrista" (D. Mayer, na ocasião, estava
fortemente empenhado com as idéias do grupo do mensério "O
Cat oli c ismo")

Embora P.Cordeiro negue a defasagem entre seu pensamento


e o do bispo, ex-alunos do colégio afirmam que o ideal izador da
instituição relativizava os conteiidos do mensério 0 Catolicismo,
revista fundada em 1950 e onde D.Mayer, afinado com membros da
posterior Sociedade Brasileira para a Defesa da Tradição,
Família e Propriedade (TPF), expunha suas idéias. Pressionado,
P.Cordeiro concorda em abandonar o colégio, trocando a casa que
possuia nos fundos do mesmo por terras na estrada de Guaçui .
Doente, resigna-se a celebrar na capela de sua fazenda, onde o

326
I .

povo pobre é seu meeiro nos cuidados do gado e do café que cobre

o* morros.

De sua passagem como pároco ficou a reforma da capela de

Sta Fllomena e a concepção rígida que possuia a respeito da

relação dos homens com a Igreja. Segundo informantes, o pároco


banira a alegria de viver e o prazer descontraído de uma
população entregue â flexibilidade do catolicismo l'BO-
brasileiro. Pe. Cordeiro teria iniciado, provavelmente inspirado

e respaldado pela figura severa de D.Mayer, um processo de

contenção das expressões populares de religiosidade que ia do


controle da festa de rua dos santos de devoção ató a militância

aberta contra o proselitismo evangélico.

Para não me restringir a justificativas de ordem


psicológica nem minimizar o poder persuasivo de P. Cordeiro,

lembro o contexto religioso da época, onde a Igreja amargava a


relação com um Estado efetivamente lèigo, o avanço das chamadas
"seitas", os sinais modernizantes do período pós-ditadura
Vargas, o florescimento das "ideologias exóticas". Neste quadro,

o imaginário religioso popular, poupado de maior disciplina por

conta da deficiência da própria Igreja, realimenta-se na sua

prática, marcada pela carência das várias instâncias reguladoras

da sociedade. (A instalação de uma Comarca Judiciária em

Natividade dá-se em 1952).


Da memdrla do povo fazia parte as pirâmides de metal
para o esforço de guerra, as missas com igrejas embandeiradas da
ditadura Vargas, os discursos apologétlcos com qu*- rs recebia

alguma autoridade que al i fosse ter, o ambivalente »ti<t iicento em


relação às coisas populares, como a banda de mvísica onde se
misturavam descendentes dos italianos e filhos das famílias
trad ic iona is .

Breve, o anátema cai sobre os grupos de Caxambií e Boi


Pintadinho, cala os bailes memoráveis que ter iam existido num
passado recente e agora associados ao mesmo cheiro de enxofre
que P.Cordeiro dizia sentir ao passar por Cruz da Ana. Mesmo o
pároco seguinte, o alemào 0t\o Mutting <de que se justificava o
horror aos fogos de artifício com uma "neurose de guerra"), que,

para uns, até tentava amenizar o rigor clerical, não conseguiu


introduzir um modelo mais flexível de relacionamento dos fiéis
com a Igreja. Sucumbiu ante a rigidez das duas posturas
legítimas* a do ex-pároco, agora reitor do Seminário e a do
Bispo, que enviava pregadores leigos e seu secretário particular
para garantir a postura religiosa desejada por ele.

P.Mutting é transferido para Sta Clara, no vizinho


município de Porcidncula, sendo substituído pelo P. José

Possidente, filho de família tradicional da região e um dos

signatários da carta-estopim da crise da década de 80. A ele

segue-se o P.Manual Henrique Ferreira, que permanecerá na


pardquia até 1972, A intransigência religiosa associa-se a
r*Pressao própria d o r e g i m e de e x c e s s ã o , d o qual D.Mager era

^ i - r e nho defensor. Em 1973, desloca-se p a r a a p a r ó q u i a um padr©

^ o * t 1 1 izado pelos flrfls.de u m a c a p e l a em L a g e do Muriarfr em

V|rtude do não-acatamento a costumes locais habilmente

d *fendldos. E o P.Antonlo Alves Siqueira, Já d e s t i t u í d o e m í ? 8 4 r

^°r D.Navarro.

0 período deste pároco reforçou a visão exclusivista e

controladora da Igreja, impondo aos f i é i s m a i o r submissão ao

clero. A banda silencia gradatIvamente, manifestada pelas

condições impostas: tocar nos atos pdbllcos significar comungar

e, logicamente, submeter-se & confissão aurícular. Reduzia-se o

número de fiéis ks celebrações, na m e d i d a em que uma po s s í v e l

acusação pública de pecador ultrapassava os limites do

c o n f i s s i o n á r Io e a l c a n ç a v a q u a l q u e r um em qu a l q u e r lugar. Viver

na comunidade i m p l i c a v a s u b o r d in a r - s e , sob c o n t r o l e c l e r i c a l , «ts

virtudes cristãs, p a r a d o x a l m e n t e com d e s v a l o r i z a ç ã o do perdão.

Mas a p o p u l a ç ã o n ã o era insensível ao que v i v i a : ansiava

por permanecer católica e, e n q u a n t o presenciava o cafrf dos

padres crescendo e seu g a d o se m u l t i p l i c a n d o , deslocava-se para

paróquias d i t a s m e n o s o p r e s s i v a s e o n d e f o r m a s n o v a s de exercer

a religiosidade se infiltravam. Em t o r n o do pároco foi se

constituindo um n ú c l e o d u r o de pessoas que e n c o n t r a v a m s e g u r a n ç a

na d i s c i p l i n a frfrrea d o padre <da qual a ditadura militar era o

melhor exemplo), e uma massa de d e p e n d e n t e s d o s a d e p t o s : colonos

e meeiros que, nas roças, viam garantidas as condições de uma

329
suposta estabilidade. Para isso pagavam com a obediência

religiosa, com um voto esporádico, recebendo ainda de troco,

condução para o patrimônio para atuar como figurande em

espetáculos de maior monta.

Se o modelo a uns incomodava, principalmente os que

questionavam a forma de e x e r c e r sua religiosidade, a outros

satisfazia^ porque assim viam esconjurados os m a l e s introduzidos

pela modernidade, tão propalados pela f a c ç ã o do c l e r o que lhes

era destinado- De t o d a forma, a Igreja continuava sendo vista

como reguladora dos relacionamentos sociais, ditando padrões de

comportamento entre pais e filhos, marido e mulher, patrões e

empregados. Os desmandos eram assimilados em termos

psicológicoss era a i n t r a n s i g ê n c i a do padre que i m p e l i a o fiel a

procurar outra paróquia, onde fosse possível reencontrar a

religião ensinada pelos pais. Além disso, assumiam-se como

pecadores e, consequentemente, culpados - embora, dignos de

perdão.
*

despeito da pressão, a vida religiosa do fiel foi

ali ment a d a nos velhos moldes d e v o c ionais, embebidas nas

Promessas e nos terços rezados em família, nas festas de

P a d r o e ir o . Estas eram as que m a i s escapavam do poder da

c o m u n id a d e , p o i s sobre elas recaia a ação do vigário, zeloso em

manter o afastamento entre o sagrado e o profano. Com a

Posterior d u p l i c a ç ã o da paróquia, segundo a linha pro ou c o n t r a -

Concilitar, o quadro reaparece multiplicado por dois.

330
atualizando-se nas mesmas procissões, quermesses e outras

práticas, sem o que provavelmente, a comunidade nSo se sentir ia

católica, nem as sempre deficitárias finanças paroquiais se

sustentar iata.

Mas, para não reduzir a religiosidade do povo «* sua

relação com a Igreja, nem tomar a religião como fenômeno

fundamental da vida social (efeito da confusão entre a dimensão

descritiva e interpretativa do conceito de cotidiano, segundo

R é m y r 1932), é preciso dizer que as respostas dadas ãs questões

colo c a d a s pela dialética da vida e da morte, do bem e do mal,

e n c o n t r a m outras formas de expressão,onde sagrado e profano nem

sempre coincidem com as definições que o clero impõe-

Assina, as celebrações da vida são muitas, incluindo as

r o m a r i a s a Cruz da Ana, as lembranças nostálgicas dos grupos de

C a x a m b á e Boi Pintadinho, as brigas de galo (que desde a década

de 70 estão em decadência), a sobrevivência da banda - que

f undada nos anos 20 enfrenta, cada vez mais, a mudança de

sens ib í1 id^de musical da população. A criatividade que fez

surgir o Festival do Vinho (1975) ou a Festa do Ridículo (1982)

ve-se, no entanto, a m e a ç a d ? , quando as autoridades conseguem

proibir a Quinta do Judas, que, a meu ver, é o carnaval local,

ponto máximo da inversão dos valores daquela sociedade.

Em meio a tantas formas de expressão da identidade do

lugar rf preciso cuidado para anunciar a gravidade dos efeitos

331
causados pela emergência do c o n f l i t o da d i o c e s e . Por leso, vou

buscar compreender o sentido do mesmo na v i v ê n c i a das pessoas,

agora alocadas cm c a t e g o r i a s antagônicas! t r a d I c I o r a l I Pt a s ou

Progressistas. Ê para destrlnchar o significado rale denso

destes emblemas, cabe o mergulho em aspectos aparentemente

vagos, ligados tanto aridez do racionalism o quanto aos

Pântanos do i r r a c i c n a l i S" ( G i n z b u r g ) , o n d e se d e s t i l a o sentido

do mundo. Cabe acompanhar a tessitura desses significados,

exacerbados pela mudança, e com isso chegar àqueles planos mal»

profundos onde as c a t e g o r i a s - e s c u d o acima m e ncionadas, nfio

sao suficientes para abarcar t u d o o que vêm p r o t e g e n d o .

V .3 - A Sombra do P a d r o e i r o

Anualmenter entre outras formas de celebrar sua

identidade, o varressaiense o faz nas f e s t a s em h o m e n a g e n s a

S .Sebastião e Sta Filomena. 0 prim eiro é patrono e proprietário

do patrim ônio local? a segunda, também a l v o de n u m e r o s a d e v o ç ã o ,

é guardiã da terra o n d e moram os que, ainda repousando no

patrim ônio, já partiram deste mu ndo.

Mas n ã o são apenas estes os moment os em que a c o m u n i d a d e

celebra a vida. 0 calendário é p l e n o de e v e n t o s , como se pode

ver abaixo:

Janeiro - São S e b a s t i ã o

Março/Abril - Semana Santa (Quinta do J u d a s )

332
Abril - A n i v e r s á r i o da cidade

Maio - C r u z da A n a

J u n h o - S t q Antonio. S. Joao. S. Pedro

J u l h o - F e s t a do Vinho

A g o s t o - S t a Flloroena

S e t e m b r o - Dia da Independência

Outubro - N.Sra Aparecida

N o v e m b r o - F e s t a da Lira Sta Cecflia

D e z e m b r o - N a t a l , (Festa do Ridfculo)

A estes grandes marcos é preciso acrescentar outras

atividades que t r a nsformam o cotidiano, como o dia de Finados,

as c o m e m o r a ç õ e s de Maria, em maio? S.Josá, em março? N.Sra de

Fátima, S a g rado Coração de Jesus e as já acima mencionadas

Q u i n t a do Judas (na madrugada e manha do Sábado Santo) e a Festa

do R i d f c u l o (no sábado entre o Natal e o Ano Novo). Alám disso,

cabe registrar festas circunstanciais, não sd religiosas (que

envolvem novenas, campanhas financeiras e missas solenes,

v i s i t a ç ã o de imagens pelas casas) como c (v i c a s / e d u c a t i v a s •

Embora estas festas mobilizem grupos que se superpõem,

vale dizer que a festa de S.Sebastião e Sta Filomena - com seu

duplo c a r áter (sagrado e profano) recuperado - absorve a quase

t o t a l i d a d e da população, acrescida ainda de uma masa flutuante,

c o m p o s t a de m o r a d o r e s das localidades vizinhas Interessados nas

atrações prometidas e pela parentela que escolhe aqueles dias

para v i s i t a ç ã o regular.

333
I s t o n ã o S i g n i f i c a a e x c l u s i v i d a d e da r e l i g i ã o católica,

e m b o r a a p r e s e n ç a de u m a I g reja B a t i s t a e uma A s s f m b l é i a de Deus

nao c h e g u e m a configurar uma concorrência religiosa. A I g reja

Batista, a é p o c a do meu t r a b a l h o de campo, estava desativada, e

a Assembléia de Deus sofria as coseqúèncias da contumaz

perseguição levada a efeito pelos padres.

Atualmente a A s e m b l e i a de Deus é fi l i a d a a Igreja de


Jacarezinho, e s t a m e s m a a n t e r 1o r m e n t e ligada a de Madu r e ira. Seu

ministro desde 1982, atua ainda em dois templos um na sua

prtípria r o ç a , o u t r o em Purilándia, d i s t r i t o do v i z i n h o m u n i c í p i o

de P o r c i ó n c u l a . Nos t r e s locais o m i n i s t r o c o n g r e g a em t o r n o de

40 pessaos, f r i s a n d o a d i f i c u l d a d e em c onseguir novos adeptos,

por c o n t a da p r e s s ã o católica. Estes, a l e r t a d o s pelos padres que

satanás está na Asse m b l é i a , tocam os sinos In i n t e r r u p t a m c n t e

sempre que se a n u n c i a a l g u m a pregação. A hostilidade atual,


<Í0>
porém, t e m a n t e c e d e n t e s - e de e x p r e s s ã o mais aguda

Dessa forma, as c o m e m o r a ç o e s cat ó l i c a s é que e x p r i m e m a

religiosidade do lugar, ma r c a d a ainda por iniciativas de a l guns

padres em colocar n i c h o s com Imagens de s a ntos protetores em

pontos estratégicos. Isso a s s o c i a d o aos grandes m a r c o s e s p a c i a i s

Já comentados, c o l a b o r a m para que tudo na vida, e por toda a


<íl>
vida, a população se v eja r e f e r i d a à r e l i g i ã o c a t ó l i c a

Assim c o m o os grandes marcos dos t e m p l o s e os pequenos

sinais que os p á r o c o s foram a g r e g a n d o ao espaço, as f e s t a s são

334
marcos temporais que seguidamente mostram ao varressalense sua

Ident idade. Colocadas no continuo temporal, elas reforçam o

sentido do lugar- Esta linguagem silenciosa” que é o tempor

compreendido no Ocidente” como uma estrada ou fita que se

desenrola em d i r eção ao futuro ã medida em que se avança”

<H a l i rÍ 9 Q 4 ■2 3 > tem sua eloquência apreendida não só na interação

dos s i n a i s c o l o c a d o s no seu contínuo como os demais aspectos da

sociedade, mas, principalmente, na especificidade das marcações

que lhe sao aplicadas.

0 peso das subdivisões, \ despeito da subordinação ao

relógio que marca a contemporaneidade com o mundo

industrializado ( T h o m p s o n ,1967) e os significados dados a elas,


fM
sao elementos que fincionam qual barras de compasso de uma

partituras figuras que definem as características rítmicas*

imp o r t a n t e s para entender a mósica da vida social e a

orquestração plausível de dado momento, num certo lugar- Por

Isso, correi acionar os marcos temporais com os marcos espaciais

pode ser um caminho para recuperar o cotidiano, ele mesmo

” devorador do tempo, transformador do espaço- Mantenedor dos

c o s tumes, gerador do novo- Teia da ambiguidades da vida” (Macedo,

1990, 1 1 8 1 5 9 ) .

Incorporados ao calendário, os sinais que dão

significado ao con t í n u o temporal têm tambóm a sua história,

1 e g i t i m a n d o - s e com o correr das gerações e sendo naturalizado e

c o n f u n d i d o com o próprio terpo. Podem se perder as motivações e

335
o* argumentos que os geraram e sustentaram, mas enraizados nos

costumes, tais marcos retêm sempre fragmentos das emocSes que

cercaram sua gestaçSo e emergência, distinguindo, dando cor,

criando saliências que pontilham um contfnuo que, de outra

forma, estaria submetido apenas ao critério do mundo natural. No

calendário encontram-se o plano cdsmico e o plano social,

relacionados pelas experiências dos homens e, ao mesmo tempo,

afetando-as.

A c b I® o domingo, como o Dia do Senhor, além de ser o

repouso após uma seqüência de seis dias iguais, foi o grande

marco para o cristão, que dessa forma se distinguia dos Ju ú c u s ,

que tinham no sábado o dia de descanso com finalidade religiosa»

(Vaientíní ,1986) » Hui tos séculos foram necessários para que o

ano litdrgico, tal como vigente, se estabelecesse. No Brasil,

dada a importância do catolicismo na constituição da cultura, a

c o ntagem clstã do tempo findou por permear todas as atividades


(1 2 )
sociais, inclusive de outra tradições religiosas

Num plano geral, as festas religiosas operam uma dupla

mulaçao, quase semple implícita, seja no eixo do espaço, seja

no eixo do tempo. A festa a realizar-se pretende-se sempre

Incomparável com os similares. Os critérios utilizados para este

Julgamento, quese sempre sSo subjetivos: relatos idealizados de

episódios passados que seriam os responsáveis pela excelência e

singularidade do que vai acontecer. Da mesma forma, qualquer

elemento desabonador merecerá Justificativas multo objetivas.

336
mesmo que sejam de parcialidade indisfarçável. A festa do ]ugar

^ vista então como melhor que as démais. No eixo do tempo, o

Procedimento é semelhante, cada comissão organizadora esmerando-

se para superar o que já houve até então. Velhos antagonismos

são desenterrados para se Justificar o que se considerou

relativo fracasso em qualquer aspecto organizacional.

(13)
A festa religiosa em Varre Sal , em termos

estruturais, não difere


das demais do mundo rural, nem das
(14)
Pardquias da Diocese de Campos . Persiste a centralização

das dec í s o e j na esfera clerical, com delegação de poderes

operacionais, financeiros e executivos Para gru POs legitimados

Pela Pároco, escapando apenas alguns aspectos menores, em geral

relativos á festa de rua, dnica parte que tem alguma margem

de* autonomia fVente aos organ izadores„

A divisão de trabalho para a realização de uma festa

religiosa apoia-se nos grupos de leigos da pardquia. Na festa de

St2 Filomena que descreverei ad|ante, era csta a

responsabilidade dos grupos: Procissão, Novenar MÍB3as: Legião

de Maria. Leilões e Bingos: Apostolado da Oração. Cantos,

Gincanas, Orincadeiras : Grupo Jovem. Barracas e outros:


Comunidade Católica de Sa i«

Se a divisão da Igreja em Varre S a , introduziu elementos

diferencladores numa Prática longamGnte Presente na comUnidade,

a festa de santo continuou sendo um fato da comunidade: razão

337

1
pela qual a festa da igreja oficial recobre Praticamente todm

população de órgãos oficiais e legítímosr e * da jgrejm

"tra d i c i o n a l I s t a " reduz-se sempre ao mesmo grupo de adeptos,

tendo que inchá-lo com convidados de outras paróquias, de forma

a reproduzir os diferentes aspectos que a tornem

verdadeiramente, uma festa de santo. Nesse sentido, ambas

atualizam os sentidos caros aos varressaIenses, que os ®xpreasam

nos diferentes momentos do acontecimento.

Nas a igreja oficial conta com uma segunda vantagem alrfm

da sua legalidade: a topografia da cidade que, conformando uma

espécie de cenário sempre montado, propicia um efeito mais

convincente de alteração do cotidiano. Dessa formar torna-se

mais organicamente comprometida com a reproduçrao cultural,

realimentando o caráter católico do lugar. Além disso, a

a r r e cadação financeira é expressiva: os 5.0% que as paróquias

enviam para a Ciir ia Diocesana, oriundos das festas de padroeiros

e capelas representavam 3% do total da a r r e c a d a d a do conjunto


<15 >
dos templos

Tomando como exemplo a festa de Sta pil°mena de 1989,

ver 1 f ica-se que o evento, do ponto de vista reli9*oso , é aberto

c encerrado por uma procisfão . No 1 q dia, aP^nas um pequeno

grupo sai da casa da devota responsável pela guarda do mastro,

o qual será fincado na frente da capela. Um foguet ór io anuncia a

todos o acontecimento que, no entanto, só mobiliza os

338
organizadores da fetata e alguns membros mais ativos das
com Issoes paroqu ia Is.

A festa, cuja duração completa é de des dias <dc íq a 10

de agosto), guarda, no Infcio, um caráter muito doméstico* a

devota, sintomaticamente D. Phílomena, é neta de portugueses que

trouxeram a primeira imagem para a capela. Posteriormente,

quando da reforma da mesma, a imagem foi substituída, sob a

gestão de P.Cordeiro, voltando a peça original para o oratório

familiar, apesar de alguns paroquianos terem questionado a

mudança.

O levantamento do mastro não se reveste da importância

que Neves <i?80) pôde observar na festa de Sto Amaro, na Baixada

Campista. Também são poucos os que assistem a missa e fazem a

novena, compromiSso que implica em assiduidade do fiel. Também

os primeiro leii 5 es são singelos: num tabuleiro improvisado na

rua ofercce-oe feijão, bolo e pão caseiros. A afluência é

Pequena, e os Presentes arrematam as prendas trazidas pelos

demais. Exalta-BG a qualidade dos produtos expostos,

prInc ipalmente Quanto ã excelência da safra ou a habilidade da


dona de casa que 0 PrGparou.

Do d,a 2 ao dia 9 continuam as missas diárias e a


novena, aceler*nrjQ_sc os preparativos da festa de rua e
aumentando o interesse fi^i3 em geral. A Prefeitura menta o
coreto c barraca* maiores para vencia de comidas e o leilão Gc

339
Prendas. 0 final de semana, inserido nos dez dias, pode

significar uma oportunidade feliz para o esplendor da festa, com

muita gente preferindo acorrer nestes dias que no encerramento

da mesma. A iluminação da rua é reforçada e decora-se o trech em

frente V capela com bandelrlnhas coloridas feitas de revistas ou

papel de embrulho doado pelo comércio local.

0 dia da festa, propriamente dito, imprime a cidade um

ar de feriado- Desde cedo circulam pessoas endomingadas, Já que

a missa é ás íôh. da manhã. As Í5h há um leilão de bezerros e às

17h sal a grande procissão. Esta, desce por uma transversal até

o Ribeirão, tomando depois uma paralela da primeira para

novamente alcançar a rua de Baixo, de onde se encaminhará até a

capela. Al i , após a benção final, o povo se dispersa,

misturando-se àqueles que já estão na rua. 0 alto-falante, que

vem sendo testado desde cedo, vai agora cumprir sua função de

difundir a animação das atrações previstas.

As barracas apresentam-se mais sortidas e com prendas

mais estimulantes, embora se vejam ainda os mesmos pães e bolos,

pudins e a "cela" - prato que consiste num frango assado e

decorado com azeitonas, tomate, cebola, farofa e salada de

alface. 0 apelo aos lances é sempre feito em nome das pretensas

qualidades da prenda ofertada e da vantagem de arrematá-la.

Fala-se não &ó bom negdcio como também da oportunidade de

liberar as esposas das obrigações com a alimentação da famflla.

340
A emulação e n t r e o» compet Idores 4 Jocosa, frIsanáv-**

c a r a c t e r fet Icas das pessoas envolvidas, est Imui an d o - a »

arremates altos c o m v i s t a s ã p r o t e ç ã o da santa. Mas a avaliação

prática é Justa a cxplfcitao tal p r enda n ã o v a l e mal» ***** *r

embora uma disputa cordial e n t r e dois a m i g o s possa causar


4
valorização artificial da mercadoria leiloada. Isto

acompanhado pelos c o m e n t á r i o s do l e i l o e i r o que n S o poupa « 1 ° ® * °

<k generosidade do a r r e m a t a d o r , ou, em tom de galhofa, alaude A

razões esconsas para tal b r a vata. 0 clima é de alegria

descont ração, mas n ã o a b a r c a a massa que circula Ind Iferent * *

conversando e olhando as moças que desfilam com tr»J * ®

esmerados, ao l a d o de c r i a n ç a s que c o r r e m e gente da roça 3a *

perambula c o m f i l h o s d o r m i n d o no c olo ou s i m p l e s m e n t e se a b ane*

na soleira das po r t a s .

Observando estes leilões, pe r c e b o a presença de um*

espécie de a n i m a d o r e s de festa, em o p o s i ç ã o a f i gura do padre

que participa multo discretamente - apenas o tempo suficiente

para prestigiar a b a r r a c a da igreja. Nesta, o prato forte é o

angu: creme dc f u b á c o b e r t o com m o l h o à b o l o n h e s a sobre o qual

se coloca g e n e r o s a c a m a d a de queijo M i n a s ralado. Tal prato,

além de fornecer uma base segura para o abuso posterior de

álcool, t e m * i n d a a c a p a c i d a d e de aq u e c e r no fri o impiedoso de

uma festa a o ar l i v r e no m e s de agosto, é p o c a de m u i t o vento.

0 bingo é o u t r o m o m e n t o de interesse, atraindo mai s

gente q u e as demais atividades. Em geral Já s e m a presença do

341
padre, abre-se espaço para brincadeiras mais ousadas. Pequenas

1 icenciosidades, contruidas em cima do duplo sentido e do Jogo

de palavras parecem resgatar o tempo perdido em contenções do

comportamento, Da assistência alguém grita para o cantador de


pedrass - "Balança o Saca, Fulano!" ou - "3icrano quer ver teu

saco balançando!, imediatamente seguido da risadaria cios homens


e de sorrisos discretos e compreensivo das mulheres.

Tal permissividade consentida, no entanto, é restrita às


festas de rua da igreja oficial. Entre os chamados
tradicionalistas isso nao ocorres todo o apelo ã participação
sendo feito em nome de angariar fundos para saldar os pesados
compromissos que têm com as obras que executam, envolve os
encontros num clima que oscila entre a crise e a obrigação de
enfrentá-la. Com isso, fecha-se a chance de brincadeiras mais
espontâneas. Ao mesmo tempo, bingos e leilões são uma constante,
o que lhes tira o caráter de excepc ional idade. Além disso, os
fiéis são instadas a participar das indmeras campanhas! do
cimento, das telhas, da lage, des vitrais etc., cada qual
segundo as suas possibilidades. Propaga-se, com orgulho, a
estória da pobre mulher que "tirou na enxada" o saco de cimento
que doou para as obras.

Assim, diferente da igreja dita progressista no local,


que promove as festas nos moltes tradíc ionais encontrados no
Brasil , a igreja tradicionalista assume abertamente sua condição
de dependente do fiel, pelo menos em termos dos compromissos
financeiros que a crise religiosa impôs ao grupo. Aqui* a

d Iferenciaçao do cotidiano se produs pelo engrandecI mento da

dimensão clerical, as festas sendo oportunidade para a vinda de

padres de outras paróquias* projecto de "slides" que

supostamente reforça» a causa tradicionalista* visitas de

tradicionalistas estrangeiros ligados ao seminário de


D.Lef febvre.

Por Isso, não aparecem nos arredores da Igreja d« N.Sra

das Graças a» barracas de vendedores de bu 9 Íqaopas que se

instalas na proximidade da capela oe Sta Fllomcna. Estes

ambulantes, que percorrem o circuito das festas da região

oferec en do quinquilharias de plástico que dificilmente

interessar iao ao morador da "rua", atraem apenas uns poucos

M or ad or es da "roça" ou crianças que ainda se deslumbram com

o b j et o s coloridos ou imitações toscas de bens de prestígio»

Deslocando-se de ura festa para outra, uma família

destes ambulantes procurava obter recursos para uma pretensa

s i tua ção de estabilidade futura, identificada com a instalação

de u» pequeno negocio, coou uwa quitanda, numa cidade maior,

como Niterói ou Catapos. Na festa de 89, o srupo por mim

c o n ta c ta do esta decidido a abandonar o lugar, antes do final,

porque "não estavam tirando nca para o almoço • Supunham que o

insucesso se devia a divisão religiosa* que mantinha a maior

parte de seus clientes potenciais subjugados a ordem de gastar

apenas co» a Igreja. Contra esses ambulantes, que circulam numa

343
velha Komb i atufada de m e r c a d o r i a s , ainda se u s s o c »a o fator

natural: os aguaceiros de Jan e i r o , f e s t a de S . S e b a s t l a o , e o

frio de a g o s t o , festa de S t a F l l o n e n * . T a l v e z por Isso a festa

de C r u z d a Antv, n o inicio tíe maio, apresente, par a d o x a l n e n t e ,

uma verdadeira r u a de a m b u l a n t e s , Al | 9 c u j a a f l u ê n c i a se resume

a dois ou tres dias, numa estrada sem qualquer loja nas

Proximidades, oferece-se artigos de tod o s tipos roupas e

tecidos, objetos para a casa e s u p é r f u l o s como os exi b i d o s na©

grandes festas.

M a s o a s p e c t o em que mais se d i s t i n g u e a festa de santo

nas duas correntes religiosas é a presença de atr a ç õ e s

tipicamente populares, c o m o o " s h o w " de a r t i s t a s vindos de fora.

Inexistente entre os tradicionalistas, que con d e n a m a

promiscuidade e as i n s i n u a ç õ e s c o n t i d a s nas apresentações, as

festas da igreja oficial nao dispensam a participação de

conjuntos musicais, c o m o as "Pr incesinhas da Serra"- 0 grupo,

composto por tres moças que toc a m v i o l ã o e acordeon, acompanha-

se em canções sertanejas, d i v i d i u com os d a n ç a r i n o s de Caxambu,

os aplauso© de u m a platéia entusiasmada.

E claro que os m a i s jovens, a f i n a d o s com o repertório

vulgarizado pela televisão, faziam q u e stão de mostrar o quanto

aquilo tudo e s t a v a d i s t a n t e deles, P o r é m os mais v e l h o s e os

moradores da rcça a p r e c i a v a m as mdsicas, que num estilo

p r d p r io falavam de r esperança de felicidade, tragédias

p a s s iona is e desencantos Sob r e as artistas,


art istas quas^
quas^ tão

344
despojada* de recursos como os saltimbancos da Idade Média, nío

deixa de cair uma aura de magia, formulando-se estdrias a

respeito delas como costuma acontecer com os fdolos. Uma das

vorsBes refere-se ao pai, que as gerencia, como sendo um tirano

explorador das filhas, que teria inclusive proibido uma delas de

casar-se a bem de manter o conjunto com o qual circula pelas

mesmas festas e com um repertório que pouco se altera.

Verdadeira ou n S o , a versão dá a medida de quanto tais

9 rupos fazem parte da sensibilidade do povo e lhe proporciona

experiências de ordem estética. G possTvel ouvir comentários

como: — "Essa nuísica tem artes tem refrão". Indagado sobre o que

Seria isso, disse—rne o populars — "G assim? a pessoa canta

quatro versos e pode ver que o dl ti ma rima com o primeiro. 6

muito insp ir a d o ... Isso sim que é musica boa !" Mas nao falta

quem ridicularize o "anacronismo" dos temas e do estilar apesar

do animador garantir, desdobrando-se em elogios aos dotes das

Cantoras, que elas são as autênticas sucessores da Banda Tupini,

~da qual muitos jamais esquecerão".

Os ndmcros musicais sao entremeados de falas que se

Pretendem cômicas, de comerciais e de tentativa de aproximar-se

dom animadores dc programas de auditório üe televisão,

Procurando prender a atenção e manter um diálogo provocador a

que ninguém parece dar ouvidos. Mas a noção dos limites até onde

Pode ir o animador está bem clara na cabeça dos or gan Izadores e

*implcs apreciadores da festa. Assim, no momento intitulado

345
"Correio do Amor"
* o n d e rapaizes e mocas enviam recados, a
maioria deles c |~
r ^dos ou querendo fazer crer que o sSo, o
a p r e s e n t a d o r foi r
" ^ e e n d ido por* ter lido ura b i l hete que dizia?
''Fulana? você $
tesão". De ram ura basta na brincadeira,
considerada desres­
peitosa e Imediatamente imputada a rapazes
1r r e s p o n s á v e i s ? f Qr , . .
iros ou boi a s - f r i a s do Buraco Guente.

Em g e r a l r 0 p r |m e |ro sermão da igreja tradicionalista,

apds uma destas festas, é dedicado a condenar estes " e x emplos do

modernismo", m a r c a d o s pelo d e s respeito ias famílias e aos bons

constunes. Por Isso, os "verdadeiros catdlicos" nao devem

participar destas festas e, os que simplesmente são vistos

a p r e c i a n d o a l g u m espetáculo, são repreendidos. Afinal, uma festa

reli g i o s a não pode ser um "ajuntamento animado por prostitutas".

A c r í t i c a da igreja tradicionalista ãs festas da igreja

oficial r e d u z h c o n d i ç ã o lúdica as diferentes dimensões que o

evento apresenta: da alegria dos fiéis que al i expressam sua

devoção, da s o c i a b i l i d a d e atualizada sob forma tradicionalmente

consagrada, das t r o c a s entre pessoas do lugar e os de fdra, das

experiências excepcionais para os que vivem confinados nas

roças, d o a p r e n d i z a d o de vida que é, para todos, um momento em

que, em c o n j u n t o , a comunidade quebra a rotina do cotidiano e,

num certo distanciamento, tem possibilidades de aguçar q

eapfrito crftico.

346
Por volta da mela noite os grupos se dispersam, caindo a
cidade em profundo silêncio, por vezes afetado por algum baile
que se realiza no Duraco Quente, onde a camada mais abastada naci
vai. 0 antigo Forrd, salão de dança existente numa casa em
ruinas na rua de Daixo, desapareceu aptís um crime passional •al i
consumado. Até então, competia com a festa da rua, já que as
pessoas se espalhavam numa üírea razoável nas proximidades da
capela. Bailes populares, agora, sd no Buraco Quente.

Apesar das diferenças entre ricos e pobres, da


assistência da festa e dos frequentadores ao antigo Forrd, da
desigualdade social dos participantes, das críticas - justas ou
injustas que sempre são feitas à gestão que produziu a festa, o
evento celebra a coesão social, a solidariedade que deveria
vigorar entre devotos de Sebastião e Filomena, sob a proteção de
quem todos se colocam e que, em maior ou menor grau, lhes servem
de modelo.

Enquanto comunidade que se organiza para prestigiar seus


patronos, Varre Sai tem na festa dos santos um momento especial
de explicitar seu ideal de coesão social, constituindo a cidade
no "espaço feliz" (Bachelard,Í9ü9> de cada um, e os santos, na
síntese dos valores que endossam. Coesão social e integridade
moral caminham juntas no imaginário local, expressas na grande
quantidade de Sebastiãoo e Filomenas, embora na dltima geração
já comecem a dar lugar para nomes tidos como modernos,
inspirados nos ídolos da TV, estrangeiros e neologismos que

347
agridem o vernáculo e n expectativa dos padres na hora da
inscrição para batismo.

Neste espaço abençoado, onde se reproduzem idealmente


réplicas pecadores de Sebastião e FII amena, desenvolve-se ainda
uma prática que supostamente promove a ligação de cada Indivíduo
com seu protetora a consasracão das crlancas a determinado
santo. Rara a missa <princIpalmente solene) em que não se vè,
apds a cerimônia, aproximar--se a mãe, um casal ou uma família,
encaminhando a criança ao padre para que ele a consagre a um
santo. E visível a emoção de todos, principalmente do
consagrado, geral mente criança e m torno de S ou 6 anos,
paramentada ã moda bíblica, ouvlnuo dos pais e do padre, a
declaração de um compromisso feito para toda a vida.

Ambas as correntes catálicas exploram os atributos


específicos de Sebastião e Filomena: cm primeiro lugar, porque
eram mártires - qualidade que Im e d 1a t a m e n t e se adequa aos
múltiplos sofrimentos do cotidiano e desencantos da v ida;
depois, porque condensam os símbolos das virtudes masculinas e
femininas, possibilitando a cada um, em algum nível, uma
aproximação ideal. Tudo isso d reforçado pela presença concreta
dos templos a eles dedicados e, em conseqdÊncia, as grandes
festas que se realizam a n u a l m e n t e . Além das homílias
particulares dos dias de festa, quando se repete a biografia de
cada santo, qualquer sermão abre u m a brecha para alusões a e.es.

340
fití * *í»í ( jS « ¥té*% * t Vv#

popular í4*4*#

'14 /
A » b i o g r a f i a # d * £*sa*t í«9 e aFpr(

*«po**ra* w j
* ccrage» e a pvrtzaf virtudes vff C*-* mrt-ai* 4 1*c atSTfl
aglutinara» forca* que> wtaa rti*çS< íal^i Ica c om * mer o*
»ov la r póde tranaf orad­ loo em fiAtdt da *<*olaOo^es
os f \éi% z a dívindac e# fora® cori^íi-cs, er^ff^ta^s a
«ortc para n3o traír * crcrija r» s« iv x í Ic ctersa* f a
cot tvaçüo foi a cessa, a * a* *•** ccn igug ç/^y c 1 3 3 ,^i.a a st.
-*- ac-
de ceder coisas «und anas f e r a » dí f e ^ e s t e s s p r d p r í a s «-"a c a d a
gênero - a valentia t*>cul ína e a cast íd94e f ea iiaílra#

No caso aascui iao, c destescr e qRses ^ w t c c*

autoridade se J u s t i f i c a ceio c o m p r o u * s s c i s s ^ a r ' ^ * ísreja


<17>
enquanto coaun idade de f idís - a t2 n ^ p ^ • cas a*:«s de

S e b a s t í a o c o a o atos úe c c r a g e » iá frisada c e l a s cfr r-ste o r as ca


conjuntura ea que viveus c c r t e i p r í r c o de u a per Tc

dos naís violentes da h í s t d r i a da Igreja Cs<^>


- cc*ecíaxc>

ocupara c a r g o de fntiea l i g a ç a o c c a a m a n u t e n ç ã o
pocer (era
comandante da G u a r d a Xcperlal).

0 caso feminino, validado inclusive pc ro.ç


r »I c m e r a

viveu no mesmo per fedo de Sebastiao. te® no tema da


re -a seu

Ponto mais alto. Consagrada a Cristo aos ” ■** wS . ^ da


conversão dos pais, preferiu c aartíria »
•w ** to«F«C*Uif c 3n qç*e»

3*9
perseguia os cristãos. Afastou-se, assim, definitivamente, de

toda a corrupção possíveis da carne, das idéias, do poder»

A Importância
de Sebastião e Filomena para a
(18)
constituição de um ethos local é um episódio particular da

importância geral que teve a e m e r g ê n c i a do culto aos santos no

processo de construção e crescimento da Igreja na Europa

Ocidental. Este, s e gundo alguns autores, foi o resultado da


combinação de um c o n junto de tradições pre-existentes, com
estruturas administrativas e um poder (potentia) ideal ligado a
seres invisíveis, bem como a seus representantes visíveis, os
bispos das cidades. Como afirma Brown (1984si53>s "0 progresso

do c r i s t i a n i s m o fora cias cidades era o progresso da 'praesent ia '

dos santos".

Minha hipótese é que, por grande que tenha sI do a


vitória do processo de romanização sobre o catolicismo luso-

brasileiro dominante no Brasil, a resultante é uma combinatória


de uma religião clericalicada (portanto, sacramental), mas que

não pode abrir mão dessa dimensão particulariçada de devoção dos


fiéis a seus santos, enquanto mediadores privilegiados com a

divindade e também Intercessores poderosos frente a problemas


imedi atos.

Em Varre Sal aqueles santos colaboraram na formulação de


um modelo ideal de pessoa, dotada de firroeca de caráter, sentido
de solidariedade e pureza, que comumente se expressa na

350
categoria seatim eato. Dentre tanta gente provida de seQtiQieatQr

isto ds, atenta ao modelo fornecido pelo santo de devoção, a

certeza da possib ilidad e de um m i l a g r e é uma constante. Está

presente no discurso das pessoas do lugar e dos arredores. Nada

especial ou diferente da tradição r u r a l r onde o processo de

efetivação da graça alcançada usa e abusa de e l e m e n t o s locais,


< 19)
c o mo no caso de S t a F i l o m e n a ou C r u z da An a

A inexistência de um l o c a l com e x - v o t o s em q u a l q u e r dos

tem plos pode sugerir que o s p r o b l e m a s com s a » i d e , apesar de sua

inequfvoca presença, não são os que m a i s m obilizam a comunidade.

Embora haja as promessas para restabelecim ento de sadde e as

ig rejas se encha: .) no dia de S .B raz, para a benção das

gargantas, o m ilagre parece remeter mais a questões

e xiste n cia is, de ordem d t i c a , como um c l a m o r para que se faça

ju stiça entre os homens, por intercessão dos s a n t o s . Tal fato,

coerente com o ideal de c o e s ã o s o c i a l , é t ambdm indicativo das

m uitas tensões presentes na c o m u n i d a d e , onde, à despeito do tao

valorizado discurso de f r a t e r n i d a d e , campeia a p r e p o t ê n c i a , as

in ju stiça s e espoliações.

V. 4 - Paisas no C o t i d i a n o

Aprisionado entre um m o d e l o ideal e as c o n t i n g ê n c i a s que

sugerem soluções nem sempre compatíveis com o medeio, o

varressaiensc vive essa tensão Luscandc tooos os recursos

disponíveis para, num e s f o r ç o de b r i c o l a g e m , a p r o x » mar — r>e dos

351
d o is poloos sa tisfa se r-se enquanto in d ivid u a lid a d e e nSo negar o

discu rso que o acalenta desde o berço.

£ porque tal m odelo pa ira cobre ele desde o nascim ento,

que na hora da m orte e le se revela tao essencial, como s e assim

o homem resgatasse, ante o fato ir r ever s f v e l, toda a sua

in te ire za : no memento da co nting ência áltim a, há que e n fre n tá -la

como todos os va lo re s que o id e ntifica m . Desta form a, nos

enterros se expressa, agudam ente, o que é ter sentim ento, nab só

como condição humana mas como marca do lu ga r.

Os enterros em Varre Sai se assemelham a todos das

pequenas cidades do in te rio r, onde a questão da morte sc coloca

com a força que têm os elem entos vita is para o im aginário do

povo, como bem frisa Brandão <1986siô 9 ss > . Eles suscitam uma

s o lid a rie d a d e que não pode ser re strin g id a ao mundo rural 5

referendando os valo res m orais da sociedade, a im portância da

unidade fa m ilia r, a com petência dos diferentes papdis socia is.

Mas al T, tambdm avulta outra questão: a da opção por uma das

correntes ca td llca s agora existen tes. Mas atá para estas

cobranças, feitas com a d iscreçSo que a gravidade do momento

impoe (afinal, presene ia -s c num sem elhante o maior mistério da

vida), a questão do u e d t .im e n .L Q se impõe, recorrendo para a

fdrm ula catdlica que contíer a os que se arvoram em ju^z:es da

hum anidade, ''c o is a s que nem N o s s o Senhor qu i z f a z e r /;- ^ frase,

o uvid a num desses momentos, aludia abertam ente c* parábola da

352
mulher addltera, em João 8 , 1 - l i c cortava Impiedosas pretensões
de analisar méritos terrenos naquela hora.

A mobilização para um enterro em Varre Sai deve ter suas

raizes nas dimensões do lugar e na proximidade das pessoas em


função da intrincada rede de parentesco que, direta ou

indiretamente, envolve a todos. Ningóm se furtará de participar,


expressando pela presença o quanto de recursos retira da

religião para alimentar o tão desejado atributo de pessoa de


sentloento.

A dispersão espacial pela "roça" é neutralizada par um


serviço de utilidade pdblica, que consiste na divulgação, via
carro da Prefeitura provido de alto-falante, do falecimento e
seus rituais próprios. Além de circular pelo patrimônio, avança

ainda para pontos mais afastados, de cordo com a identidade do


morto. Da mesma forma, em Varre Sai sabe-se de casos que
acontecem nos distritos vizinhos, possibilitando assim a tomada
de providencias.

0» velórios quase sempre são na casa do morto, sendo o

corpo levado para os serviços religiosos na capela de Sta


Filomrna ou na igreja de N.Gra das Graças quando se trata de um
tradicionalista. A divisão religiosa, ã despeito da

solidariedade mais ampla que envolve estas ocasiões, introduziu


um compllcador! alguns acompanhantes participam do cortejo

fünebre mas negam-se a entrar na igreja que não é a sua. 0 fato

353
7* n

B ttÊ íiie É ísrfÉ É flttyÍB iíÉ iiíi

<é tanto mais constrangedor quan d o a d i v i s ã o r e l i g i o s a a b r i u um

grande f o s s o no s e i o da pr ó p r i a f a m T l í a nucle a r , entre os que

tomam d e c i s õ e s s o b r e o corpo, supondo satisfazer a vontade do

f a l e e ido.

0 cortejo, e n t r a n d o ou não em algu m a das Igreja, dirige-

se h n e c r ó p o l e f o r m a n d o dua s filas sem d i f e r e n ç a de sexo, c o m as

pessoas l e v a n d o f l o r e s singelas, a p a n h a d a s sem p r e o c u p a ç ã o com o

efeito e s t ó t i c o das raeams ou a função a que estão d estinadas.

Arrasta-se pela rua rezando o terço que soa pesaroso,

acompanhado p elo d o b r e de finados da capela.

Dependendo da identidade do morto, a rua se enche de

gente da " r o ç a ", t r a z i d a em caminhões, que introduz na " r u a " um

certo ar de sábado. No s e p u l t a m e n t o r p r o p r iamente dito,. as

expressões de dor f i c a m rest r i t a s àqueles mais diretamente

ligados ao defundo, os d e m a i s e n t r e g a n d o - s e ao s i l ê n c i o ou a

comentários fi l o s ó f i c o s , à identidade do m o r t o e o significado

daquela marte para a comunidade. Em cada cova que se

abre revolve-se a terra p r o funda d»' cada um, r e a v i v a n d o a m o r e s e

rarcorcs há muito enterrados e o brigatcr 1 amen t e exumados em

f u n ç ã o do n o v o sepultamento.

Fato dc c o t i d i a n o , o en t e r r o opera nele urra sispensao

algo semelhante àquela introduzida pelas festas, ss as defino

c o m o " u m a c o m u n i c a ç ã o com o e n g l o b a n t r que a precede, a sustém e

a penetra - 'condição h u m ana', ' n a t u r e z a ' p r o d u n d id a d e ',

354
'sagrada' - ao mesmo tempo que oe traduz por um acontecimento
colectlvo 'violento', 'gesto g rito', que faz entrar a sociedade

numa relação consigo prdpr1® diferente daquela 'de todos os


dias'. Para a infirmar ou para a confirmar, para a fazer existir

num duplo que poderá ser ela prdprla ou outra, ela prdprla e

outra" <Sanch is,1983:36).

A reflexão de Sanchls <op.clt.) apoiada nos diferentes


<20 >
autores que teorizaram sobre a festa , satisfaz minha
preocupação em compreender o cotidiano de Varre Sai, af
incluindo essas suspensões que são as festas e dando a elas o
elemento significativo imprescindível para ela mesmo, sem o qual
o sentido da sociedade seria outro. Necessária, portanto, «í
reprodução cultural, parte constitutiva da cultura, como as
pausas o são pura as notas que conformam uma melodia, relação
cuja essência "sd oe deixa apreender como refractada no gesto
social que a incarna e, para o observador, a constitui.<...> f£
uma sociedade organizada, estratificada, articulada,
estruturada, que d a se produz e toma forma. No prdprla acto de
se constituir, será portanto tambáro e inc! Issoluvelmente a
resultante do funcionamento sccial em seu sentido prdprio, com
os níveis, dobragens, cli vagens e conflitos que
d isse»os"<SanchIs,1983:37).

Reconhecendo nas festas esta Importância, como


interpretar a» que oe relizaro em Varre Sai, cujo denso
calendário faz o povo dizer com orgulho ser al 1 "a cidade que

355
mais festeja... depois da Bahia"? Como marcar a especificidade

destes encontros, olhados aqui de maneira diferente daquelas de


N e v e s <1980> que privilegia a questão da diferenciação social, no

interior mesmo da Diocese de Campos? as de Macedo (1986 e

1990), Lenz (1990), onde se perscruta estas experiências

sociais frente- á presença de inovações teoldglcas como as

C o m u n idades Eclesiais de Base; ou como Brandão (1985) e Sanchis

(1933) que enfatizam a questão da religiosidade popular, entre

nds e entre o povo que trouxe a devoção de Sfca Filomena ?

v21)
Atenta ao imaginário local , busco principalmente a

relação que as festas de Varre Sai mantêm com a noçao de

sentimento* reforçando-a, direta ou indiretamente, apesar das

mudanças conjunturais que se verificam no campo religioso e que

a f etaram o cotidiano das pessoas. Isto porque, com

D a r n t o n (1986), acredito que é insuficiente supor que o perfil de

um conteúdo cultural relevará do esboço do panorama social,

detectado a partir de "dados consagrados" como "o mimero das

missas para os mortos (...) e o peso da cera das velas queimada

para os santos patronos das igrejag" (Darnton, 1986:330). Antes,

ele se delineará por pontos insuspeitos e inconscientemente

deslocados, no Jogo das pressões *medi atas dos relacionamentos

sociais, jogos informados por princípios estruturais como o

seQtiQentQ* e outros que interconectam domínios diversos

compondo uma espácie de magma sempre em devir.


Olhando a relação entre as festas e os sentimentosr

enquanto ideal auto-proposto ao varressaiense, é possfvel

apreender o sentido que eles dão a suas instituições e valores,

montam formações (no sentido que lhes confere Uilliams, 1978)

enfim» constroem sua própria realidade- £ possfvel compreender

tanto a dita " ind if erença dos padres7' como o chamado "despreparo

dos fiáis".

Classificações amplas como festas particulares ou

coletivas devem ser respeitadass as primeiras celebrando eventos

de estreita circunscrição, como os aniversarios, batisados ou

mesmo envolvendo conjuntos maís amplos, como casamentos e os

enterros- Algumas, apoiando-se num trabalho que envolve

instituições piíbllcas, reverenciam entidades como a pátria, a

comunidade, valores compartilhados, etc. Tambám a clássica

divisão entre festas profanas ou religiosas é mantida, embora

nao vá eu entrar na cansada discussão da religiosidade popular,

nas pressões eclesiásticas para manter afastados os domínios do

sagrado e do profano, nas pequenas vitórias e derrotas expressas

nas concessões feitas pelo provo e oela Igreja. Religiosas ou

profanas, ac festas se reencontram no processo de gestação,

elaboração e difusão deste bem primordial que é em Varre Sai ter

&QQtim&ntG&.

Embora reconheça que algumas festas são mais

tradicionais que outras, que umas congregam pessoas mais idosa©

ou mais Jovens, ou são esportivas, religiosas, liidicas etc., o

357
fato é que o máximo que posso afirmar é que r.So são excluBivas,

apresentando apenas a preferência de certos grupos definidos por

idade, sexo, etnia, E a dependência da comunidade à elas pode

ser comprovada no conflito religioso vividos as festas

devocionais se duplicaram.

Ao mesmo tempo, a divisão da cidade em seguidores da

Igreja oficial e da igreja tradicional funciona como critério

para apoiar e participar mais diretamente nas diferentes

festividades, seja ela de qualquer natureza. Há moralistas, de

um lado e do outro, e se a duplicação da igreja acirrou certos

exc1usivismos e preconceitos decorrentes, nem por isso apagou o

gosto pelas festas, que, a meu ver, alimenta a idéia de se

pensarem como um povo dc üEQtiaiEata-

Assim, resta verificar como e em que grau as festas


estão comprometidas com estes processo, mesmo que as

racionalIzações produzidas nem sempre explicitem a relação. Por


isso abandonarei as celebrações individualizadas, mesmo que

envolvam mudança de estado, como os casamentos e formaturas.

Todas elas, legitimadas por celebrarem ações positivas, situam"

se num plano tão geral que suponho não definir qualquer


particularidade local.

A população de Varre Sal, orgulhosa de sua condicão

católica dedlca-Bc com entusiasmo ãquela dimensão da festa de

devoção em que o "efeito exposição" é mais fortes as procissões.

358
Nelas, torna-se piíblico o respeito devido aos santos e o
reconhecimento às virtudes dele. Afirma-se a fidelidade à
Igreja, independente de que facção seja. 0 espoucar dos fogos de
artifício completa o clima de "efervescência" que vem à luz
após dia» de preparação e chega ao clímax quando o santo
protetor desfila pelas ruas com seu séquito de protegidos.

Se os devotos que acompanham a procissão que sai d»


Matriz contam com um cenário propício às cemonstraçoe»
espetaculares (escadarias, ruas centrais e calçadas, casas
alinhadas em frente ao templo), os que saem da igreja em
construção, num palco de andaimes © vergalhoes, enfrentando o
lamaçal das chuvas de janeiro ou o frio cortante de agosto,
avançando por ladeiras já de si penitenciais, também ostentam o
orgulho e a disposição de dar testemunho.

Por isso, todos eles, não importa a opção religiosa,


merecem o respeito dos que não desfilam» o olhar conivente mesmo
do adversário, o abaixar rápido e provisório de alguma porta de
casa comercial, a suspensão momentânea de algum ato condenável»
discussões, castigo às criancas, arrulhos de namorados. Naquela
hora a procissão atualiza seu "duplo movimento» a projeção do
que é sagrado para fora do santuári o, sua trIunfanta ep ifan ia à
luz do dia e, paralelamente, uma sacralização do
espaço"(SanchIs,1983a»16).

359
Correlato a ente duplo movimento de sacralIzação, aquele
que participa da procissão goza também de duplo prestígios
frente ao santo, a quem eotã homenageando condIgnamenteJ frente
aos pares - simplesmente com nua presença ou, mais valorizado
ainda, como colaborador das intímeras e invisíveis atividades
anteriores que garantem o esplendor do acontecimento.

A produção de uma procissão envolve um piimero grande de


providências que mobilizam, em geral, aquelas pessoas
familiarizadas com a sacristlns a conservação da Imagem, roupas
e adereços dos santos, a preparação dos andares e sua decoração,
a organização do pessoal, a recepção das autoridades religosas
especialvmente convidadas etc. Tanto na igreja progressista
quanto na tradicionalista, e nesta, com mais empenho e
dificuldade en função da entSb precariedade da situação, pude
presenciar verdadeiros mutirões, com as pessaos saiando de sua
rotina diãr1a para limpar, brunlr, adornar, at^ tudo ganhar,
Indiscutivelmente, um ar de festa.

Estes eventos consagram-se ainda como marcos tempooralss


as coisas acontecem antes ou depois da procissão de Sta
Fllowena, de S. bebnstiuo, e servem tambdm como momentos de
balanço da opção religiosa assumida* somando as palavras da
homília das missas que as antecedem ã cooperação efetiva nos
atos prepatdrlos ou o simples tu .temunho dado rol» presença
cada um reafirma a posição tomada de valor corroborado pela
solidariedade dos pares.

3Ó0
Sai ando do plano religioso para o da vida secular, tres

outras comemorações marcam a identidade do varressaiense. Agora

Já não é o sagrado na rua, mas a ordem, que se celebra cm tres

ocasiões* o desfile do 7 de setembro, o menos expressivo de

todos* a Festa da Cidade, em 24 de abril, animada pelo

entusiasmo que o nativo tem por seu lugar, a ordem aqui

associada Á esperança, e a festa da Lira Sta. Cecília, em 21 de


novembro, que alia esperança, religiosidade e alegria.

A festa de setembro, por ser comemorada nacionalmente (o

que impede a presença de autoridades de fora para abrilhantar o


evento), fica reduzida a um desfile escolar. Seja porque o
distrito não dispõe de nenhum destacamento militar, seja pelo
forte apego dedicado ao local imediato, tão fortemente inculcado
e a ausência de símbolos que integrem Varre Sai numa unidade
maior, a festa tem um toque de obrigatoriedade que não mobiliza
a população.

Exalta-se a ordem e a disciplina corporificadas no


trabalho das professoras de espalhar o verde e amarelo pelos
alunos* nos intruiaentos da banda escolar, nos aros das
bicicletas da aia dos ciclistas, nas bandeirolas empunhadas, nas
rosetas-crachás da lapela dos mestres. Parece mais uma exibição
de trabalho de normalistas, ciosas de seu papel de educadoras,
fiéis á3 recomendações do Ndcieo de Ensino e retr ibu idor as da
confiança que as famílias nelas depositam para moldar as cianças
num certo padrão. A assistência é pequena* alguns pais vão ver

361
(e fotografar) seus filhos» e depois repreende-los vivamente se

os viram fazendo caretas ou em postura desatenta.

A mesma ordem e disciplina estará presente na Festa da

Cidade» mas aqui o espaço para a criatividade d maior,


envolvendo professores preocupados em transmitir outras

mensagens, explorando recursos culturais e materiais de variada


gama. Em torno de uma temática expressiva, os alunos mais
velhos participam da feitura de carros alegdricos, figurinos,
desenterram tradições, ensaiam mdsicas e danças, dando vasao
aos anseios de experiência estáticas que terminam por constituir
um espetáculo original.

Além disso, exaltando a leitura interna de valores


universais, confundidos aqui com a alma do lugar, orgulham-se os
participantes de poder exibi-los para os de foras a festa é
sempre prestigiado pelo Prefeito, pelo Secretário de Educação,
deputados e vereadores (seja lá quais foram suas motivações),
cuja importância reverte para a prdpria cidade, capaz de
convocar tantas autoridades.

0 momento costuma ser filmado e fotografado mas nem


todos partilham desse entusiasmos alguns alunos, filhos de pai»
tradicionalistas são proibidos de desfilar sob a alegação de que
a festa ultrapassa os limites do decoro. Os que participam
exultam frente a possibilidade de .mn exibição incomunt no lugars
o tradicional vital izado pelas novidades. 0 clima de- animaçao
cresce até a apoteose final, defronte ao palanque oficial sob

os aplausos de uma multidão variada: os dali, os da roça, os de

f ora.

Tal espírito de festival é repetido também na festa da

Lira, que tem ainda o seu ''avor a procissão de Sta Cecília,


padroeira dos mtísicos e a visita de uma banda convidada que
abrilhanta o aniversário. Embora este tipo de festividade seja
bastante difundido nas cidades do interior, Varre Sai lhe dá

especial atenção. A hlstéria dos maestros, compositores e


benfeitores da banda coloca desde o passado a alegria como
elemento constitutivo da indentidade deles, reforçada pelo
esteredtipo de uma natural ligação entre a Itália e a nuíslca.
Além disso, poder aproximar outra ves religião e nuísicos parece

ser o encerramento definitivo de uma época em que alegria e


catolicismo foram incompatibi1 izados.

Desta forma, o gosto pela banda se perpetda, apesar de


outras barreiras que objetivamente existem, como a dispersão dos
miisicos para tocar em bailes de cidades maiores ero Minas ou no

Espírito Santo c a crescente penetração de estilos musicais

diferentes levados pela televisão. A fidelidade ã banda ganha


então foros de tradição e esta, uma marca do hcmem d£ sentimento.

Transformada em orgulho municipal, a banda é incentivada


a manter-se sempre pronta, fazende-se campanha para uniformes
novos, recrutando-se colegiais para estudar instrumentos e

343
repetir o glorioso episddlo da vinda à Feira da Providência do

Rio de Janeiro para representar Varre Sair como já aconteceu.

Não sd se prova o valor individual dos mdsicos como se eleva o

estatuto do lugar, introduzindo-o em circuitos mais amplos.

Tanto cosmopolItisnor no entanto, precisa ser

r el at iv izado s pequenos desencontros acontecem, .ião sd rftinicos e

harmônicos, mas decorrentes da pouca familiaridade com o

cerimonial que, por vezes, faz eclodir situações insólitas.

Assim foi na festa de Í9B7. Na Matriz lotada e festivamente

decorada de amarelo e branco, duas bandas ocupavam lugar de

honra, a an iversar iante e a visitante Lira Í9 de Marçor da

cidade de S.Josd do Calçado, no E s p frito Santo. Tudo transcorria

no clima respeitoso da Santa Missa, em meio ao silêncio e

contrição geral da consagração da hdstia quando irrompe,

retumbante, o Hino Nacional. Desconforto generalizado ! Algumas

pessoas não sabiam se continuavam ajoelhadas ou se levantavam-

se, outras se conservavam as mãos postas ou a levavam ao peito.

Muitos st* olhavam, procurando ver o comportamento do outro e

conferir o seu prdprio. A hesitação coletiva teve fim porque o

padre, com presença de espiVito, houve por bem pousar suavemente

a mao sobre o cálice e aguardar, pacientemente, que terminasse o

furor cfvico-est ét ico que dominava os nuísicos.

Penso então que estas celebrações - a da procissão e as

festas cívicas - referem-se noção de ssntiQJÊDtQr seja

colocando o sagrado na rua, seja colocando ordem e a alegria na

364
rua, do toda forma, afirmando publIcamente a adesão àquele

princípio estrutural.

Comentarei agora tres outras festas, que bem poderíam

ser rotuladas de " irr ever entes" pc:lo caráter de Inversão que

apresentam. Talvez estas festas cumpram o papel de carnaval, so

que dispersam, entre elas, os elementos típicos das festas


<22 >
carnavalescas do Brasil urbanos o abuso do álcool, as
fantasias, a inversão dos papá is. Talvez isto ocorra porque,
segundo informantes, há mais de 3® anos o carnaval foi banido

das ruas de Varre Sai. Dizem eles que blocos e bailes


desapareceram ante a pressão exercida pelos padres.

Embora se tenha prova dos retiros promovidos pela Igreja


no período carnavalesco - o que não é part icular idade do lugar,
pois sempre houve retiros espirituais nesta ápoca condenada iela
Igreja sob alegação de que satanás estava solto nas ruas e as
fp.mÍ1 Ias d e v u » evitá-lo, este fator não pode ser desv invulado
de outros ma 1s prosaicos. Assim, o melhoramento dos transportes
e a correlata possibilidade de deslocar-se para cidades vizinhas
maiores? a f«m i1 Iaridade com outros tipos de festejo,
possibilitada pela maior facilidade de locomoção; tais saídas
como forma de distinção Interna; as alternativas sugeridas pela
televisão etc., se não ameaçava diretamente os folguedos (já
tolhidos pela pressão dos padres sobre os mdsicos) deixava cair
sobre eles a qualificação negativa de provincianos.

363
Mas se as tres festas» Juntas» poderíam ser ditas como o

carnaval local» cada uma de per si tem suas part Icul ar ídades em

termos da promoção» organização e abrangência- A Festa do Vinho

é oficial. Patrocinada pela Prefeitura» tem fins turísticos e

visa o cunsumo do vinho artezanal produzido pelas muitas adegas

do lugar. A Festa do Ridículo» a menor e mais recente de todas»

é promovida por um grupo de rapazes com vistas a oferecer um

atrativo aos visitantes de fora; A Quinta do Judas tinha <foí

proibida desde Í989> promotores anônimos e objetivava criticar

os comportamento dos moradores.

Se das duas últimas sò tive o relato de pessoas

envolvidas com e por elas» pude participar de duas Festas do

Vinho. Ela é antecipada por brincadeiras de rua cujo objetivo é


mobilizar a comunidade de maneira tal que a chegada do
forasteiro ou da parentela encontre o ambiente aquecido para a

grande confraternização• Duas equipes disputam uma gincana cujas

provas se estendem pelos tres dias que antecedem o ultimo

domingo de julho» quando se realiza a festa. Há uma equipe de

adultos, rapazes e moças que estão terminando o colégio» e uma

de crianças, devidamente apoiados por adultos, para compensar a

desvantagem da idade e da experiência no que tange á execução

das provas. Em cada uma das tres noites, numa hora aprazada, as

equipes dirigem-se à frente do palanque e prestam conta das

tarefas exigidas na véspera. Além destas» há outras tarefas para

cumprimento imediato e o Julgament. da animação do grupo. Nesta

366
emulação apela-se para roupas» faixas, "slogans" e tudo o mais

que possa carnct er I*.á“ lo»

Em meio a uma barulhelra confere-se o trabalho de cada

equipe, aval ia —se e conta—se os pontos que cada grupo va'

acumulando. Gritos, aplausos, vaias, rísadaria acompanham as

decisões da comissão julgadora, composta de voluntários onde não

faltam Professores da escola, e que podem — por ser per Todo de

farias - dedicar-se tres dias à formulação das tarefas, garantir

a existência de dados para o cumprimento das mesmas, guardar

segredo e evitar espionagem, providenciar os troféus da

premi açao. Fica-se na rua atd de madrugada, no sábado, bebendo e

dançando. Os mais velhos recolhem-se mais cedo, mas a maioria

permanece acordada, aproveitando a extravagância.

No domingo, ao meio dia, um foguetdrio acompanha a banda

até o campo do Serrna Futebol Clube, abrindo oficialmente a

Festa do Vinho. 0 movimento d grande desde cedo. Há barraquinhas

vendendo chur r asqu inho e cachorro-quente e muitos postos de

venda da c a n e c a —ent r a d a , ambulantes vendendo cordinha para

pendurar a caneca ao pescoço e pequenas lembranças.

O campo está decorado com bandeiras verde e vermelho e

folhas de palmeiras. Nele estão dispostas as barracas das adegas

— Bendia, Ramos, Righet i e outras. Determinadas fazendas levam

queijo, que é vendido aos pedaços, frio ou aquecido. 0 vinho

seco ti o pr imeiro a acabar, embora todos continua:* jebsndo o

36
suave e o xa r o p o s o vinho doce de Jabutiçada. Comenta-me a

e x c e l ê n c i a dos vinhos, indlca-se as melhores adegas daquele ano,

afirma-se que a distri b u i ç ã o para comercialização só não é

nacional porque os produtores não querem arcar com os impostos.

Nu m grande palanque conjuntos musicais se alternam,

tocando in int erruptament e os sucessos do momento e miimlcas

populares a n t i g a s consagradas. Vez por outra o animador pára a

musica e pede que sejam contidos os excessos, não Jogando

objetos para o alto ou bebidas nas pessoas.

A libação legitimada é aproveitada por todoss crianças,

jovens e velhos entregam-se ao vinho, agradecendo a generosidade

da terra que oferece aquele prazer e a competência dos

produtores. Danç a m velhos e moços estimulados pelo vinho e pela

miJsica. As crianças circulam livremente algumas simulando

estarem b êbadas sendo tratadas com condescendência. Adultos

alcoolizados amparam-se em amigos que lhes aconselham a não

parar de beber ou sd beber rfgua, daí em frente. Fotografa-se

grupos! de amigos, de parentes, bêbados engraçados, a

respeitável s e nhora que, naquele dia, toma em pdblico formideCvel

carraspana.

Impreterivelmente ãs Í8h a festa se encerra, mas não a

animação. Uma banda desce do palanque e dando uma espécie de

volta ol í m p i c a no campo, sal do estãdio. Seguida pela rua do

Ribeirão por a n i m a d o s foliões, torna a rua Bcrnardino Santos e

368
chega ao palanque central onde na véspera se Julgava a gincana.

Al i9 outra bando ou trio elétrico se incumbirá da miJsica até

mais de meia noite.

Gradativamente o cansaço vai se apoderando das pes^aos

que se despedem prometendo não perder a próxima festa. Esta Já é

prevista corno a melhor de todas porque vai haver mudança na

diretoria do Serrano, porque tal adega faltou neste ano mas Já

avisou que virá no prdximo, porque a Prefeitura destinará verba


maior etc, etc , etc. Last ima-se também o preço da caneca.
pro ib it ivo para mu it os (embora haja meios de não-paganfces
cnt r ar em d iiscr et amente pela porta da saTda) e comenta-se a
intransigência do ex-pároco tradicionalista que proibe a seus
fiéis de comparecerem. Sem diivida que o pároco atual também não

está presente mas a barra da Igreja está lár vendendo o


indefectível c delicioso angu.

A Festa tio Ridículo realizou-se a primeira vez em 1982.


Alguns rapazes e moças decidiram promover um encontro de dança

para o sábado entre o Natal e o Ano Novo, época em que a cidade

hospeda muitos parentes que moram em outras localidades. Para

eles era inconceb Tvcl que uma situação ext raord inár ia como

aquela não tivesse uma comemoração organizada e administrada por


eles mesmos. Assim, conseguiram que o pai de um deles cedesse a
casa, cotizaram-se para as bebidas e estabeleceram como

condição de entrada o convite (pago para compensar os gastos


com comida e bebida) e uma roupa o mais ridícula que

consegu issem inprovi sar


Eram poucos os convites e jamais v e n d i d o s para e s t r a n t o s

ou p e s s o a s d o lugar que n ã o t i v e s s e a l g u m t i p o de a f i n i d a d e com

os o r g a n i s a d o r e s . Bebia-se muito e dançav«-se ainda mais. Breve

a p o p u l a ç a o se d e u c o n t a do perigo que e l a r e p r ç s c n t a v a para os

costumes do lu g a r . A fe s t a , segundo se d » z i a , cra uma festa de

cidade grande: devia haver muita droga e promiscuidade. As

famílias, zelosamente, p r o i b i a m as m o c i n h a s de irem, mas nem

sempre eram bem sucedidas. D i z i a - s e de j o v e n s que engravidaram,

porque depois de a l g u m a s d o s e s de v o d k a os rapazes já não

respeitavam ninguám.

Segundo um inf ormante, to da e s s a image m negativa é

apenas a expressão do qu a n t o é insuportável, para os mais

velhos, que os j o v e n s se d i v i r t a m sem o c o n t r o l e direto deles.

Por isso f a l a m de um t e m p o em que h a v i a " d i v e r s õ e s s a d i a s " , sem

se lembrar que n a q u e l a s o c asi õe s, se p o s s í v e l , os j o v e n s também

ultrapassavam os limites dados pela geração anterior.

Dada a mobilidade d o s jov ens, que se ca sa m, vão estudar

ou t r a b a l h a r fora, a f e s t a já não c a u s a tan t a a p r e e n s ã o : o grupo

que a g e r o u e s t á se t r a n s f o r m a n d o . A dlti ma f e s t a já c o n t o u coro

muita g e nte que n ã o se c o n h e c i a : forasteiros amigos de amigos

dos a m i g o s . A cidade acomodou-se e suporta a sua existência.

Já a Q u i n t a do Judas, cuja orígem niguám s a be, está

proibida desde 1903, embora repouse numa velha tradição. Segundo

um informante, n ã o d e v i a ser t i d a c o m o um c o s t u m e local : e sim

37*
um mau-costume, promovido por rapazes de fora do lugar, com a
conivência dos varressaienses irresponsáveis.

Consiste em duas atividades que se realizavam na


madrugada do Sábado Santo. Num terreno baldio, de preferência
num ponto de muita visibilidade, amanhecia montada a casa do
Judas, composta por objetos retirados de varandas, quintais ou
quaisquer elementos que caracterizassem uma residência. Vasos de
plantas, peças de roupas dos varais, automóveis, placas, enfim,
tudo que pudesse ser transportado era conduzido para instalar a
casa do Judas.

Na mesma manhã do Sábado Santo circulava pela cidade um


jornal apócrifo, colado nas paredes, distribuído sem que se
soubesse a origem. 0 folheto continha estórias marcantes,
conhecidas ou ignoradas, envolvendo pessoas do lugar. Talava de
falcatruas, adultérios, politicagens, traições e deslizes de
toda ordem e gráu.

Sintomaticamente realizada no período em que o diabo


está solto, entre a morte de Cristo e a Ressurreição, esta festa
constituía uma ameaça de várias maneiras. Em primeiro lugar,
pelo fato de instalar no patrimônio de um santo o sfmbolo da
traição, o que compromete a respeitabilidade de cada um. Tal
desastre era acompanhado da apropriação indébita de partences
alheios que, é certo, podiam ser recuperados, mas o proprietário

371
e s t a v a s u j e i t o ao a b o r r e c i m e n t o de r e c o n h e c e r - s e lesado e passar

por d e s l e i x a d o e av a r e n t o , indo atrá s de seus objetos.

Mas o pior m e s m o era a lama que se Jogava nos mor adores,

explicitando casos q u e r se sabidos, eram tido s como ignorados.

Expunha-se a f a c e o c u l t a da com unidade, o av es so dos ho m e n s de

sentimentos, e t ã o sem sen t i m e n t o s eram os que organizavam a

brincadeira que o f a z i a m num mom ento crucial para a Igreja, o


(23)
T e m p o da Q u a r e s m a , c i c l o de penitência

Em 1938, um dos su po sto s implicados, que inclusive

chegara ã maioridade, foi informado por p e r s ona li dad es locais

que, caso houvesse a Qu in ta ele seria res po n s a b i l i z a d o ,

provavelmente tendo que r e sp on der a processo. A brindaceira era

tida como ofensiva hs famílias, desacato ã autoridade e

d e s r e s p e i t o ao lugar. Assim, o que era um al e r t a e um c o n v i t e a

um exame de c o n s c i ê n c i a — s e gun do o u t r a s regras, as do J u d a s —

nao pôde ter continuidade. E s péc ie de ef ei to per v e r s o da

valorização do seotimentor a brincadeira foi imputada a

estranhos e proibida peremptoriamente.

Atentando pa ra e s t a s tr es festas 99 1r r e v e r e n t e s ^ ocorre-

me u m a reiaçao delas t o d a s cora a n o ç ã o de seo ti m e n t O r que mesmo

acatada como princípio informador, es tá s u jei ta a nulltiplas

intcrpretacoes. A F e s t a do Vinho, que foi inaugura da em 1975,

período da grande repressão pol í t i c a e, em V a rre Sai, também

religiosa, é uma forma de, alcoolizado, o indivíduo ro m p e r co m a

372
vigilância da consciência. Legitimamente é permitido sair de

embriagando-se com a produção dos descendentes de imigrantes. A


Festa do Ridículo propõe que o indivíduo olhe para sir assuma
seus desejos e ria das regras consagradas na sociedade.
Sintomaticamente foi inaugurada em Í982r treze meses apds a

mudança do bispo, embora o pároco de Varre Sai ainda nSo tivesse


sido exonerado. Se o "sair de si" da Festa do Vinho d um convite
a todos, o "olhar para si e seus padrões" é um convite para
poucos. Jã a terceira festa simula o mundo dominado pelo inimigo
de Cristo. Enfrenta a Igreja e envolve a todos que sustentam o
discurso dos &£Qtim£Q.t.Qs. Mais antiga e mais profunda, não
incide sd sobre os atores, mas sobre um dos princípios que os

rege.

373
NOTAS

1- A Pastoral Coletiva de 1915 foi o resultado prático do


documento "Pontos de Reforma da Igreja no Brasil", assinado
por D.Macedo Costa, então bispo da Bahia, que visava,
centrado na busca de uma unidade do clero e na sua
moralização, coibir abusos como a "indisciplina eclesiástica"
(imoralidade, uso de vestes profanas, simonia, negligência na
administração dos sacramentos não-lucrativos, dispensas
matrimoniais sem critério, falta ao dever de pregar e dar o
catecismo, residência fora da pardquia) e de casos de
"negligência do culto" (falta de rigor na escolha do pão e do
vinho, falta de tabernáculo conveniente para o Santíssimo
Sacramento). Ali se sugeria: 1—que se promovessem
conferências episcopais com vistas a uniformidade de ação dos
bispos; 2- que a unidade episcopal tanto se atualizasse para
dentro da diocese (unidade do clero) quanto para fora
(unidade com Roma); 3-que o clero fosse coibido tanto na
indisciplina eclesiástica quanto na negligência do culto,
dedicando-se á pregação, catequese e exercícios pios para as
festas religiosas, visitações etc. Estimulava-se ainda o
estudo da moral, promoção de exercícios espirituais, as
reuniões mensais com o clero; 4- que se incentivasse a
implantação de Seminários considerando estes como a obra das
obras de um bispo; 5-que se realizassem missões, com vistas a
regenerar a fé e atrair candidatos ao sacerddcio; 6- que se
utilizasse a colaboração de congregações religiosas
européias, notadamente para alimentar a fé entre os
emigrantes; 7 -que membros destas congregações viessem dirigir
conventos ou fundar e dirigir escolas catrílicas; 8- que se
expurgasse das irmandades e confrarias os elementos
perniciosos (na época, os niaçoris); 9- que se aumentasse o
ndmero de dioceses, já que tendo encerrado o per Iodo de
interf erênc ia do Estado rios negócios da Igreja, poder-se-iam
criar novas, desde que dispusessem de dotação suficiente. A
Santa Sé estaria disposta mesmo a conceder provisoriamente as
necessárias dispensas ás prescrições c:anôn icas. (Cf .01 ive ira,
1985:297 ss).
2- Bruneau (1974) apresenta os seguintes ruimeros para mostrar o
cresc imento das unidades eclesiásticas na primeira metade do
século s
1900 - 17
1910 - 30
1920 - 58
1930 - 88
1940 - 100
1950 - 113
Para outros dados quantitativos veja o Apêndice da obra
citada (p:419ss) e também a análise de Oliveira, 1985.

374
"A Questão Religiosa foi, em seu contexto histdrico, /fruto
de uma união híbrida entre a Igreja ultramontana e um Estado
liberal '" (Fragoso, 19005109). Segundo este autor, nos meados
do século XIX, tanto a Igreja quanto o Governo estavam jfv'dos
por reformas, embora dessem conteádos diferentes a esta
categoria. Se o poder civil buscava perpetuar sua autoridade
sobre a Igreja, esta se esforçava para conquistar autonomia
espiritual. A partir de 1863 conforma-se um movimento que
terá como expoentes os bispos D. Vital, de Olinda, D. Macedo
Costa do Pará, D. Romualdo Seixas, arcebispo da Bahia, D.
Antonio Viçoso, de Mariana e outros, que sustentavam a luta
contra o pensamento liberal e o regaiisme imperial. A
motivação Jurfdica do epioddio foi a suspensão por parte de
D. Vital (depois acompanhado por C. Macedo Cesta) oe várias
irmandades e ordens terceiras que se negaram, eni
desobediência formal txs exigências rio bispo,a afastar de seus,
quadros os membros macons. Recorrendo ao Imperador em 1873,
as irmandades e ordens terceiras tiveram seus recursos
atendidos, já que apoiados pelo Decreto m q 19í 1 de 28 de marco
de 1857. A rejeição de D. Vital e D. Macedo Costa, para quem
"importa obedecer antes a Deus que aos homens", suscitou
forte reacáo das autoridades civisa o presidente do Supremo
Tribunal de Justiça expediu mandato de prisão para os dois
bispos que incorreram no artigo 96 do CddIgo Criminal. D.
Vital foi preso em janeiro de 1874 e D. Macedo Costa em abril
do mesmo ano. Condenados a 4 anos de prisão com trabalhos
forcados, foram anistiados uij ano depois, determlando-se
porém que ficassem "em perpétuo silêncio os processos que por
esse motivo tenham sido instaurados" (Fragoso, op.cit•s188).
Desmembrada em 1922, a Diocese de Campos teve como 1q
Administrador Apostdlicos Mons. Henrique Cesar Fernandes
Mourão <1924-1925), seu in Bispo entre 1925 e 1935. Sucedeu-o
D. Otaviano Pereira de Albuquerque, que governou de 1935 a
1949, quando ela passou para as mãos de Dr. Antonio de Castro
Mayer, até 1981. (in Folha da Manhã 6/12//87).
Se o municfpio de Campos pode se vangloriar de ter surgido
com a ia Expedição Colonizadora (1530 - Martim Afonso de
Souza), quando Pero de Gó is recebeu a capitania de São Tomé
(Cf.Lamego, 1945853), nem todos os municípios vizinhos têm
lugar tão proeminente na hi st ária do Brasil. São João da
Barra, cuja primeira capela data dc 1630, d desmembrada de
Campos em 1850. Outros, na região oeste, são frutos da ação
desbravadora dos "bandeirantes mineiros", que desciam os rios
Carangola e Muriaé em busca de novas terras,como Porc í«incula,
que Já foi distrito de Campos e cie Itaperuna, que por sua vez
ainda incorporava Natividade, Muriaé e Bom Jesus
doltabapoana• Cambuci desmembra-se de São Fidélis em 1914p
Miracema, de StQ Antonio de Pádua em 1936. A luta pela
autonomia continua, embora os métodos "coronelistas7 (Cf.
Monteiro,1980) tenham adquirido outras feições. Italva
tornou—se município em 1987 e, o mais novo. Varre—Sai, ganhou
autonomia de Natividade em 1990.

375
6- Embora motorizados, a maioria dos padres da Diocese de Campos
não vive uma situação muito diferente daquela descrita pelo
P. Rosário quando, em 1936, assumiu a Paróquia de Qto Antonlo
de Guarus e a de Morro do Coco! "A paróquia de Morro do Coco,
com suas numerosas capelas filiais, absorvia grande parte do
meu tempo. Vivia eu visitando cada dia um lugarejo. Parecia
um caixeiro-viajante, percorrendo as praças. Chegava a um
lugar, sempre a tarde e hospedava-me no hotel. Ensinava o
cat ec ismo ^5 cr ianças, e de noite rezava com os fiéis. No dia
segu inte, pela manhã, celebrava a Missa e fazia batizados •
casamentos. Term inados os trabalhos, rumava para outra
capela. E assim, dias seguidos" (Rosário,1985!104) . Compare-
se agora com o Horário das Missas, afixados na Matr iz da
Paróquia de N. Sra da Piedade (em Lage do Muriaé) , assinado
pelo Admini strador Paroquial, P. Oto Campos Praga , em 1990!
Mat r iz ! domingos (8:00 e 19:00); quarta-feira (20:00) ia
sext a-fe1ra<19:00)
Capelas s lQ sábado São Sebastião do Alto 19100
ia dom ingo Belo Monte 10:00
2a sext a-fe ira Sal gado 19:30
2o dom ingo Vai e Volta 10:00
Boa Esperança 12:00
2c sábado Córrego Pando 19:30
3a sext a-fe ira Vent an ia 19:30
3o sábado StQ Ant on io 19:30
3o dom ingo Bom Jardim 11100
Itajara 15:30
4a sext a-fe ira Capela do hospital 19:30
4o sábado São Jerônimo 19:30
4o dom in go Guararema 10:00
Cabe lembrar que Lage do Muriaé é um dos menores municfpios
da diocese contanto com 31 capelas, menos 10% da totalidade
desses pequenos templos.
7- Estou usando aqui "dominação pessoal" com o sentido que lhe
dá Oliveira (1980 e 1985) ao se referir a um relacionamento
onde o subalterno se coloca sob a proteção de um superior,
retribuindo este "favor" com uma lealdade que inclui
obrigações várias. "A dominação exercida pelo senhor sobre os
camponeses é lida através do código familial, devido ã
instituição do compadrio. 0 compadrio cria laços de tipo
familiais entre o senhor e seus dependentes, transfigurando
suas relações! sendo compadres, eles contituem uma espécie de
famflia espiritual consagrada pela religião. Assim, as
obrigações entre eles — ajuda nuftua, lealdade, proteção etc.
— são revestidas de valor moral" (Cf.01 iveira,1980s171>.

376
8- Pe.Rosário, capelão do Educandárlo Sta Teresinhm, situado ao
lado da capela do mesmo nome, substituiu, no final do ano de
1933 o então vigário de Varre 8alr Pe. Gaspar Agulló, por
breve períodos ''Dizem que a orígem do nome - Varre-Sai se
prende U história do lugar. Referem os antigos que outrora os
transportadores de café faziam obrIgatcr Iamente pouso
naquelas paragens, para descansar os animais da tropa.
Encontrando no local escolhido outros tropeiros com café
espalhado na eira, ficavam impacientes por ter a sua vez de
derramar o seu, fazendo cara feia, intimavam-nos a desocupar
o beco, bradando fortes 'Varre e sai!'" (Pe.Rosário, 1985*100).
9- 0 coronelismo, como fenômeno que-teve seu apogeu durante a
Repdblica Velha (1889-1930), foi a prática política e social
própria do meio rural e das pequenas cidades do interior
brasileiro. 0 título de coronal cabia sempre a pessoas
localmente influentes, da confiança dos governos provinciais
e central. Embora as prerrogatIvas do coronel não aparecessem
formalizadas em leis, na sua qualidade de "potentado" (Nunes
Leal, 1975) ele indicava ou afastava os ocupantes de cargos
federais ou estaduais (Juizes, fiscais, policiais, coletores
de impostos, professores etc...) existentes em seus domínios.
As tranformaçoes político-sociais do Brasil no decorrer deste
século neutralizaram esta forma de poder, mas creio ser
possível associar nao só a política c1ientelística como
certas formas de fidelidade cobradas no interior com o
fenômeno. Pereira de Queiroz (1976) aponta como dois aspectos
principais da estrutura social coronelista o domínio tia
parentela e de um círculo de agregados, e a posse de bens de
fortuna, fatores ainda presentes atualmente. Exemplo forte
deste mandonismo foi o coronel Firmo de Araiijo, do município
de Palma, Minas Gerais, cujas fazendas alcançavam as terras
de Miracema e Pádua e tinha por lema a fórmula "quero, posso,
mando" (Monteiro, 1980).
10-0 relacionamento conflituoso, porém, tem antecedentes. Debate
publicado em A Voz do Povo (16 de setembro de 1952) compara
Varre Sai a uma "possessão do Vaticano", que não respeita a
Constituição em seu Art. 141, que iguala, perante a lei, os
brasileiros quanto á liberdade religiosa. Ressaltando ainda o
fato de agressões (gestos indecorosos, bolas de breu atiradas
ei comitiva evangélica etc.), lastima que os católicos de
Varre Sai, "lendo só pela cartilha de Roma, não conhecem o
Sermão do Mont e ; ignoram o que é cristianismo e o que têm sido
os protestantes no mundo". A argumentação católica do Vigário
de Natividade foi sintomática* "lendo conhecimento da
pretensão de uma pregação no patrimônio de S.Sebastião de
Varre Sai, em nome dessa vila católica, a Igreja Católica,
usando dos direitos de propriedade que a esta lhe faculta a
Constituição Federal, solicito que não sejam permitidos tais
cultos nessa vila de S.Sebast ião. lo> Há mais de 80 anos
Felicíssimo de Faria Salgado doou 20 alqueires de terras para
S.Sebastião, e não obstante a Igreja ainda não ter promovido
os documentos respectivos e a inscrição no Registro de

377
Imeíveis, f o i e s t a doação recomendada e r e c o n h e c i d a pelo povo
até o p r e s e n t e . 2 q > A f a l t a tíe d o c u m e n t o compr o b a t ó r i o nio
t i r a o s d i r e i t o s d e a d m i n i s t r a ç ã o da I g r e j a , considerando-se
que a voz do p o v o é a v o z de Deus. 4q ) A violação do
patrimônio é c o n s i d e r a d a n ã o s ó uma p r o f a n a ç ã o ^ I g r e j a e a
s e u p a t r o n o , c o mo a i n d a d i z r e s p e i t o ã m e m ó r i a d e F e l i c í s s i m o
Salgado, o d o a d o r , M a n o e l Ramos P e r e i r a , J o ã o Ramos (Segue
uma l i s t a d e n o m e s i m r o r t a n t e s n o l u g a r ) . 5 q ) De a c o r d o com
as estatísticas, no p e r í m e t r o u r b a n o de V a r r e Qa j há 624
habitantes e apenas 6 protestantes que desejam ser
s a t i s f e i t o s na sua r e a l i z a ç ã o . "

ii-Após j a sua chegada em 1973, o pároco Antonio Siqueira


e m p e n h o u - s e n a c o l o c a ç ã o de m a r c o s c a t ó l i c o s n a s e s q u i n a s de
Varre Sai, para manter literalmente presentes aqueles
símbolos e l e m b r a r o c a r á t e r p r o t e t o r de c a d a entidade. Do
p r o c e s s o s u r g i r a m t r e s n i c h o s : um co m a imagem de 8. José, no
e n c o n t r o d a s r u a s J o s é Tupin i e O c t á v i o M o n n e r a t , o u t r o c o m a
imagem de N . S r a n o final da rua Joã o R a m o s Pereira e uma
S a g r a d a F a m í l i a n o iní cio da Rua Nova. A j u s t i f i c a t i v a para a
campanha q u e p e r m i t i u a e n t r o n ização da p r i m e i r a imagem no
l o c a l foi a p r e s e n ç a de d u a s m a r c e n a r i a s al I ins ta lad as.

1 2 - S e g u n d o V e r gol i n o - H e n r y < 1987) , o an o l i t d rgi co , de a c o r d o c o m


o C a l e n d á r i o L i t á r g i c o da CNBB, de 1986, " e s t á dividido em
p e r í o d o s de d u r a ç ã o d e s i g u a l d e n o m i n a d o s /T e m p o s /. E s t e s são
cíclicos e se s u c e d e m na s e g u i n t e ordem: tED&BQ d.Q Êd.V££Q.t.Q
(que abre o ano litárgico), IeoBQ d.Q NaLalr IeoiEQ íq
Q u a c e s m a r l e m e o P a s c a l - I n t e r c a l a d o e n t r e o T e m p o do Natal e
o Tempo da Quaresma e novamente entre Pentecostes (que
acontece em 50 dias a p d s a Pá sc oa) e o Adv en to, vamos
e n c o n t r a r u m p e r í o d o m a i s long o c h a m a d o de teoiRQ C qüjUQí ; (...)
O á p i c e tío a n o l i t d r g i c o é o T e m p o da Qu a r e s m a , que se inicia
na Q u a r t a —Feira de C i n z a s e se e s t e n d e até o Domingo da
R e s s u r r e i ç ã o . ( . . . ) (Neste, s i tua -s e) 0 T r í d u o Pascal (Quinta-
Feira S a n t a , S e x t a - F e i r a S a n t a e S á b a d o Ganto ) é o á p i c e de
t o d o o a n o litiirgico e a V i g í l i a Pascal f que a c o n t e c e na n o i t e
d o S á b a d o S a n t o , é t i d a c o m o a 'mãe de t o d a s as v i g í l i a s ' . E
n e l a qu e a I g r e j a a g u a r d a v i g i l a n t e a r e s s u r r e i ç ã o de Cr isto.
Ela. é t a m b é m c o n s i d e r a d a o c u m e de t o d o o an o l i t á rg ico.
(...) Complementando o T e m p o da Quaresma temos o Tempo
Pascal, que corresponde ao s 50 dias entre o Domingo da
Ressurreição e o Domingo de Pentecostes. 0 Domingo de
P e n t e c o s t e s r e p r e s e n t a o c o r o a m e n t o e o r e m a t e do T e m p o Pa scal,
e esses d i a s m e n c i o n a d o s c o n s t i t u e m uma p r e p a r a ç ã o para a
vinda d o E s p í r i t o S a n t o P a r á c l i t o " ( O p . C i t . :59) . 0 conjunto
destes Tempos c o n s t i t u e o C i c l o Tem por al. 0 conjunto dos
T e m p o s C o m u n s c o n s t i t u e m o C i c l o San tor al.

13-A f e s t a d e i g r e j a e n v o l v e um c o n j u n t o v a r i a d o de t a r e f a s qwue
ocupa grande nilmero de fiéis, previamente designados, em
gera l, d e s d e a r e a l i z a ç ã o da m e s m a no an o ant er ior. A l é m da
preparação espiritual, já co m a t i v i d a d e s específicas tomo
n o v e n a s o u c i c l o s de o r a ç õ e s r e a l i z a d a s na igreja ou na casa
dos interessados, há tambóm cuidados para s» dimensão
profana, como a coleta de recursos financeiros para o
festejo, aquisição de prendas para os jogos, de alimentos que
serão vendidos nas barraquinhas, patrocinadores para os
editais, contratação de aparelhagem de som ou luzes
especiais, artistas para os espetáculos de rua etc. Uma festa
grande abre-se com uma pequena procissão que conduz o mastro
do santo ató a frente do templo, onde ó fincado, dando-se
inicio ao período das novenas, que geralamente sucedem a uma
missa. As atividadesdas barracas de comidas e venda de
pequenos objetos (que podem não ter qualquer ligação com a
Igreja), com os leilões que revertem para a paróquia,
verificam-se sempre após a novena. No óltimo dia, em geral o
dia do santo homenageado, faz-se a procissão e apresentam-se
as atrações de rua mais importantes, com afluxo maior da
população.

14-A programação abaixo, da festa de Sta Filomena, de 1989, é


praticamente igual a dos anos anteriores, e a de outras
paróquias da região:
Dia 01/08 -- 17h: Procissão com o Mastro de Sta Filomena
saindo da residência de D.Philomena Pires de
Almeida (D.Neguita). Logo após. Santa Missa
e inicio da Novena.
De 2 a 7/08-18h: Santa Missa e Novena l\ Sta Filomena
Dia 08/08 - 17h* Santa Missa e Novena
Dia 09/08 - 17:30.: Santa Missa e encerramento da Novena.
TODAS AS NOITES AP0S A NOVENA! Leilões, BINGOS, BARRACAS
Dia 10/08 - 10h.s Santa Missa
15h.s Leilão de bezerros
17h.s Procissão de Sta Filomena
20.: Bingos. Leilão de ricas prendas. Show etc...
15- Boletim da Diocese de Campos, ano V na 76 <jan/fev.1991.)
16-Sebastiao, Comandante da Guarda Imperial, viveu sob
Diocleciano, que imperou entre 284 e 305. Convertido ao
cristianismo, dedicava-se a minorar os problemas dos cristão
perseguidos. Operando conversões e milagres, caiu em desgraça
e foi mandado martirizar. Salvo por uma cristã, dirigiu-se ao
imperador exigindo maior complacência para com os cristãos. A
insolência custou-lhe a vida, após o que foi atirado na
cloaca romana. Resgatado o corpo por outra cirstã, foi
enterrado ao lado de Pedro e Paulo, em 237. Em 680 seus
restos foram transladados para uma basílica contruida por
Constantino, ato este considerado como responsável pelo fim
da peste que grassava em Roma, na ocasião. Pôsteriorroente, a
peste de 1575, em Roma, e a de 1599, em Lisboa, foram tidas
como debeladas pela Intercessão deste santo. Filomena era
filha de um príncipe grego, convertido ao cristianismo. Tendo
Diocleciano declarado guerra ao pequeno principado, partiu a
família real para Roma, afim de negociar um acordo. Neste,
Diocleciano exigia a mão de Filomena, que negou-se a atender

3 79
os rogos dos pais em virtude de seu casamento místico com
Cristo- Presa, torturada e decapitada* foi enterrada nas
catacumbas* seus restos tendo si cio encontrados mais de 500
anos depois- Ao lado dele, o vaso com o sangue e a palma que
Identificava os martirizados. Símbolo da pureza, tem grande
penetração na penfnsula Ibérica e no Brasil.

17-Na hagiografia,alguns nomes assumem característIcas


guerreiras, como Sebastião, Jorge da Capaddcia, ou N-Sra do
Rosário, também conhecida como N-Sra da Vitória. Hoornaert
(apud 01 iveira,í985) afirma que "muitas cidades e igrejas do
século XVI são dedicados a esses santos guerreiros, como
expressão de reconhecimento dos colonizadores pelas vitórias
obtidas contra os índios. (Mas eles) "São invocados também
nas guerras contra os invasores estrangeiro» - aliás
protestantes - de modo a conferir um caráter de guerra santa
ás lutas que opunham os portugueses aos demais colonizadores"
(Oliveira, 1985*35).
18- Estou utilizando aque a noção de ethQS no sentido que lhe dá
Brandão (1990a),acompanhando a definição de Geertz (1970*143)
e que se refere aos aspectos morais <e estéticos) de uma dada
cultura, os elementos valoraiivos. "0 ethos de um povo é o
tom, o caráter e a qualidade de sua vida, seu estilo moral e
estético e sua disposição, é a atidude subjacente em relação
a eles mesmos e ao seu mundo que a vida reflete." A relação
entre ethos e visão de mundo de um povo, ou seja, os aspectos
cognitivos, existenciais é reciprocamente necessárias o ethos
torna-se intelectualmente razoável porque é levado a
representar um tipo de vida implícito no estado de coisas real
que a visão de mundo descreve, e a visão do mundo torna-se
emocionalmente aceitável por se apresentar como a imagem de
um verdadeiro estado de coisa cio qual esse tipo cie vida é
expressão autêntica- Sendo a ética a dimensão normativa do
ethos <0p . c it-,324), Brandão constata duas caracterfsticas da
ética do catolicismo popular* 1 q ) apoiar-se no "suposto que
ele é uma religião para todos - para todas as pessoas que
quiserem ser dele e para todos os tipos e categorias de
pessoas sociais, étnicas e éticas"? 2q ) "ela é francamente
CfilaciQDal - Não se dirige com prioridade nem ao auto-
aperfeiçoamento individual, solitário e nem á fidelidade
subordinada do indivíduo a uma instituição, como a própria
Igreja" <Brandão,1990a *28o)
19- A promessa a Sta Teresinha põe em evidência a importância do
aspecto relacionai para a consecução de objetivos* feito o
pedido e a promessa de agradecimento através de velas acesas,
missas especiais etc-, num acordo em que prevalece o critério
proposto pelo fiel, o encaminhamento do processo inclui
terceiros- Assim, na quinzena seguinte ao pedido, se alguém
ofertar uma rosa ao devoto, é certo a graça será alcançada.
Para Cruz da Ana acende-se velas e ata-se fitas no cruzeiro,
testemunhando a graça alcançada e incentivando outros a fazer
o mesmo. 0 potencial milagroso da água está associado ás

380
virtudes femininas que a martlrlzada Ana de Jesus ó dita
posou idora.
20- Na revisão bibliográfica sobre noção de festa, Sanchls
explora a corit r ibu ição dou seguintes autores» BATAILLE,G.-
Ibéocie de la celiaion ,Par I«, Ed.Gall Imard,1973, La cact
maudit. Paris, Minuit,i967} CAILL0I8,R ,-LJhamme et J e sb cc í í .
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Encyclopedia Universal is, vol.651046— 1031. MAU88.M. "Essai
sur les var iat ion oa iuonn Iferes des soei et d eskimos", in Annóe
sociologique, 1904— 1905.
21- 9ovelle, um dos expoentes da chamada História da»
Mental idades, mostra a importância do conceito de
mentalidade: este, opondo-se «fc noção de ideologia, "integra o
que não está formulado (...) remete, portanto, de modo
privilegiado, ã lembrança, ã memória, e\c formas de
resistência. Em resumos aponta aquilo que se tornou corrente
definir como "a focca de lnth'C.i.j» das estruturas montais"
(Vove11e ,1987»19>. Grifo meu. Não fora a concepção de
tradição de Wi'1'1 iams (19/9) que põe em relevo a dimensão
ativa de fatos vistos como inertes, outros autores, no campo
da História alargam esta crítica! Assim, Darnton (1986)
enfatiza os problemas de procedimentos analíticos dos adeptos
da História das Mental idades (Chaunu, Roche, Arífes, Plongeron
— respeitadas as nuances que os diferenciam), que reduzem a
cultura a um 3o nível, subordinado a dois outros» Economia
e Demografia; Estrutura Social. E mais» o fato deste 3a nível
receber tratamento quantitativo. Segundo cie, os mlmeros "não
passam de sintomas produzidos pelo próprio historiador e
podem ser interpretados de maneiras desenntroladamente
diferente" (Darnton, 19865330). Por isso, este autor
aproxima-se da Antropologia, que, a despeito do clássico
debate sobre o conceito de cultura e dos problemas relativo©
ãs provas e representai 1vldade, trabalham em termos de
avanços e recóos, entre textos e contextos, abrindo mão da
ilusão de chegar a uma resposta definitiva.

22- Estabeiecendo confronto de suas conclusões com as de Roberto


da Matta, Brandão alerta que, "Aparentemente, o carnaval
carioca estudado por ele (...) é um caso limite de oposição
ãs festas da Igreja Católica. No entanto, teremos
oportunidade de comprovar que o significado dessa oposição —

381
e o que pode haver de relevante em tentar estabelecô-lo aqui
- não deve ser procurado em uma esfera superficial e
aparente de modalidades de construção dos simbólico e do
ritual Izado, seja na £eata Eltuiauar seja no £ttâtej.3 do
saatado" (Brandão, 19855195). Ao mesmo tempo, a concepção de
carnaval como instituição paradigmática de um Brasil urbano
deve ser questionada! "Essa ideologia fantasiada que serve de
cenário & análise do carnaval carioca, é estranha ár»
populações rurais do Brasil Central. Ali, o próprio 'cosmo
nacional' é visto como ordenado sob a dominâncla de uma ordem
de valores centrados sobre o trabalho, a religião, e o
sofrimento." (Idem!197>

23-Para a questão veja Ver golino-Henry, 1987.

382
VI. SENTIMENTO, TRADIÇAO E TRADICI0NALI8H0

Com vistas a apreender a relaçSo entre a noçSo de

sentimento e a noçSo de tradição vale agora aprofundar o

enraizamento de ambas na comunidade observada para - analisando

o caráter co n stitu tivo das mesmas — sugerir u ma hipótese sobre a

repercussão que teve o conflito religioso diocesano entre os

católicos de Varre Sal.

V e rifica re i o estatuto da categoria sentimento para a

comunidade, as baseo onde oe fundamenta, as alt eraçees no

contento introduzidas pelas mudanças ocorridas com o c o n flito ,

pensando finalm ent e a relação entre a noção de sentimento e de

t r a d 1ç a o •

V I •1 — A N o ç l i o d e Sentimento

A de sc r I c S o de Varre Sal como um lugar de t ho excelsas

virtudes náo pode sig n ifica r a Inexistência dc problemas

concretos ligados * prática dos homens, "estes pecadores". Por

vez, a recorrência aos santos para solucionar os obstáculos

do cot Id I a n o , dá a medida da confiança que a população deposita

i n t e r m e t í i á r •o s e da fragilidade de sua própria condição.

303
Por sua vez, a idéia de um l u g a r pacifico exige uma

explicação para os comuns desacertos que qualquer sociedade

apresenta. E de uso corrente a justificativa apoiada num

passado idealizado, anterior à mudanças vistas como perniciosas.

Não vai longe o tempo em q u e o s mo r a d o r e s se diziam

habitando um lugar tranquilo, sem a s dificuldades da cidade

grande. Tempo em que da "esquina da f o f o c a " (encontro da rua

José Tupini com a rua de Baixo) se difundia, de pessoa à pessoa,

as dl t i mas novidades, devidamente acompanhadas de J u í z o s de

valor sobre os atores em j o g o . Os assuntos se desdobravam

depois, nas rodas de cadeiras nas calçadas, aprofundando os

julgamentos, reforçando-se o passado idealizado, jogado cada v e z

ma i g para trás, de acordo com o s palestrantes.

Em torno de 1962 uma n o v a temática se i mp õ e , determinada

pela chegada dos primeiros aparelhos de televisão, inicialmente

restrito* aos mais abastados moradores da rua de Cima. A

difcrrnçã interna ganha um r e f r ^ ç o s a l é m de d o t a d o s de mai or

poder aquisitivo, tèm t a mb é m a c e s s o a I nf or maçBer » diferentes,

menos paroquiais e, pelo me n o s teor icamente, capazes dc a b s o r v e r

outros crité rio s para julgar as questões locais. Mas e s t a lenta

trtn »fo m »ç Io encontrava, na prática, um mesmo s o l o sobre o qual

enraizar* a ligação dos moradores com a t e r r a - nos dois

aentidost enquanto matéria sobre a qual trabalham e enquanto

•d e a l onde assentam o sentido de s u a s vidas, c omo gessas de

aeotimeutQ.

384
Por sealimeulQ estou entendendo aqui um dos princípios

informadores de varresaiense. Lá, diz-se que uma pessoa é de

sentimentos quando se comporta segundo a ática idealizada,

constituindo-se assim num digno filho do lugar, morador nas

terras pertencentres a S. Sebastião. E grande a semelhança

entre a noção de sentimento e a noção de honra, tal como


descrito por Pitt-Rivers (1977).

Este
autor, analisando a noção de honra na área
<2 >
mediterrânea considera-a em dois níveis! o de princípio geral

de conduta, que informa os relacionamentos dos indivíduos

(consigo mesmo, com os outros e com o mundo); o de qualidade,

concepção particular e etnograficamente encontrada. 0 primeiro

é explicado, ideal tornado pdblico e defendido sempre que a

situação exige uma definição dos argumentos que sustentam as

posições adotadas; o s e g u n d o e s t á implícito nas ações.

Como princípio informador, o sentimento apresentava


vário* atributos que permitem a sun atualização nas diferentes
c ircunst ânc ia*, da vida social. Minha hipótese é que, em Varre
£>al, a igreja proporciona os meios desse processo de atualização
do princípio estrutural daquela cultura. Possibilita portanto a
passagem de um nível a outro da noção, realizando uma ligação do
plano ideal com o prático.

A Primeira observação sobre a noção de SBOtiBEBíB


refere-se a *u* dupla abrangência* ela tanto é Individual quanto

365
coletiva. Enquanto questão individual é um a t r i b u t o que exige

aprendizado e cultivo, zelando-se por ela para que tenha a força

de um m a r c o que sinaliza os lim ites do possTvel. El , ao mesmo

tempo, a possibilidade de lim ites. Enquanto questão c o le tiva

remete às regras de ordenação das relações, implicando o padrão

e o exercfcio de uma solidariedade social, capazes de manter a

soc i e d a d e •

Expressa-se, no plano da prática, na capacidade de

conduzir os relacionamentos de maneira tal que as expectativas

sobre as posições sejam satisfeitas- Inclui uma disponibilidade

para a proteção, material ou simbólica, enquanto doador ou

receptor, respeitando a distância social entre os integrantes.

E neste plano que a categoria consagra as pessoas de bem,

d is t i n gu i n d o - a s dos igaQcaates, que no caso é sinônimo de

grosseiro, rude, estdpido, numa conotação mais moral que

Intelectual •

Quanto à origem, o sentimento é considerado herdado,

podendo, no entanto ser aprimorado no transcorrer da existência.

Como p a r t i c u 1 a r i d a d e herdada resulta em f o n t e de valorização da

famflia, e s p e c I a 1 me n t e n o que tange à estabilidade, financeira,

mo r a l e emocional, como é ressaltado no modelo Idealizado desta

f o r ma d e organização da sociedade. Enquanto atributo gerenciado

Por cada indivíduo, remete à noção de rem ponoabi1 idatíe, l'v re

arbítrio* voltado, no entanto, ao r e f e r e n c i a l mais amplo que é m

f f cmf l êa. A associação entre sentiDCOto e fam ília é denunciado

586
pela fdrmula atravds da qual o desconhecido é Introduzido» um
s
filho de Seu Fulano* comadre de D» Sicrana ©tc» 0 nome tem um

peso moral, dando azo a longas reconstituições de parentela,

cujo fim parece ser encontrar um indivíduo de relacionamento

comum que funcione como avalista para a aceitação do membro

apresentado.

Talvez o mais importante atributo deste princípio

estrutural seja a transversalidade, a propriedade que tem de

atravessar as muitas formas pelas quais os indivíduos podem ser

agrupados, independente da posição que ocupam. No entanto,

desde que intimamente associado ao nome, espera-se encontrar

eessoas de sentimentos "naturalmente" entre os que descendem dos

primeiros moradores, nomes antigos e consagrados por quaisquer

ligações com os problemas da cidade. Neste sentido, sentiBieatQ

aproxima-ae da noção de tradição, bem que sd o tempo pode


produzir, cabendo a seus portadores preservar.

Esta particu1ar Idade poder ia levar a supor que os

despossu fdos de tradição encontrariam obstáculos em serem

reconhecidos como tendo sentimentoâ• Engano. Assim como há

mecanismos para incluir pessoas como portadores de seQtiaieQtQ,


há mecanismos culturais impedindo que o indivíduo saia da
categoria honorrfvel *> caia na desprezível condição de

ignorante". Seja pelo comadrío. seja por relações de

dependência publicaaente assumidas, opera-se uma cspácie de

c°ntaminasSo que neutraliza a dlmenvSo exclusiva da categoria.

387
Ao mesmo tempo, o principio funciona também no interior

de grupos d e i i m 11 a d o s r reconhecidos por sobrenomes, como é o


(3)
caso dos descendentes dos imigrantes italianos . Pela

condição de est range i ro s , ou descendentes delesr tiveram que

consquistar prestfgior progredindo c omo a l g u n s q ue s e tornaram

propr ie t á r i o 5 r ou homens respeitados, mesmo que pobres. Entre

os ricos há também os que permanecem " i g n o r a n t e s " . Entre todos,

no entanto, algumas práticas trazidas da Itália se constituiram

em mecanismos de valorização, c omo o g o s t o pela mi i s l c a <e o

consequente envolvimento com a Lira S t a . Cecflia) e a produção

do v i n h o artezanal.

A a m b i g u i d a d e do princípio de SEDtÍD)£QtQ vem ã tona no

cotidiano, lugar ond e se dá a junção do plano ideal com o plano

das práticas, s u j e i t a s estas c* pressões e interesse de variada

ordem, sue findam por mostrar o estatuto da categoria, de

pr i nc fp io informador . No entanto, desde que contando com forte

enraizamento na cultura local, e>;Presso no rígido código

compor t a m e ntal e e m b u t i d o nas ações correntes, a categoria se

completa nas formas de controle difuso, como a fofoca e uma

refi n a d a a r t e de simulação. Mas são estas pequenas mentiras,

atrás de c u j a s curtas pernas há sempre um Personagem incumbido

de tirar t u d o a limpo (jocomamentc apelidado de Jornal Local)

Sue reequilibram a de f a s a g e m entre os dois planos, sobre os

*uats o âEDti&tDtO ** situa.


Tomando a categoria acQti.D)SQtQ como central no
imaginário varressaIense, percebo a correlação entre cate e o
universo doutrinário catdllco. Aqui» a nocSo de redenção exerce
função semelhante, atualizando uma homologia entre o plano
religioso e o secular. Em termos católicos, o Indivíduo,
vivendo na misdria humana do pecado, tem na noção de redenção a
possibilidade de retorno a uma situação de graça. A Igreja
fornece os recursos necesadrios para essas mudança de estado,
atravds dos sacramentos (confissão e penitencia), abrindo o
caminho para a comunhão com a divindade. Em termos seculares,
as ações virtuosas, que denotam um homem dc eent imentor»,
acentuam-lhe o prest(0 Io entre os pares.

A expressão mais geral 0a relação entre ui c» nt 1m?ntut


da comunidade e o catolicismo é a naturalização (eu duplo
sentido) deste. Cer católico, cm Varre Sai, d sinônimo de "ser
um dos nossos", embora reconheçam que nem todo catól'co d
varressaiense, é lógico. 0 não-catdl leo é o "outro", o
estrangeiro, o que não partilha dos mesmos significados.
Pertencendo o patrimônio a 8. Oebastiao, nada Justifica, aos
olhos do» nativos, que um não-catól ico reconheça o lugar como
“sua terra". Para o forasteiro o lugar retdm apenas o
significado aludido pelo rome, enquanto ponto de passagem.
Reserva-se o colo de mie, o côncavo do vale, aos filhos que al I
permanecem ou para alI retornam nos dias de festa, embora se
abra espaço para uma rede mata anpla de parentes e afine,
afilhados e amigos convidados a partilhar do calor e da proteção
maternos.

30V
0 sentido que é dado ao lugar, a importância que tem

Para seus moradores, confunde-se com a histdria de cada um! seja

Porque ali nascerem os antepassados e, com eles, o espaço, seja

Porque foram adotadas e viram sua sina ligada aos destinos da

cidade. Com exceçõo dos que sairam- e têm suas justificativas-,

só retornando em situações especiais, os demais retêm em si uma

forte identidade com a cidade, o que-os faz lastimar a vida dos

que não têm a mesma sorte.

Tao agudo sentido de pertencimento nSo deve ser reduzido

a argumentos de ordem instrumental, como o valor da terra.

Provavelmente ele repousa em dados ligados à ocupação daquele

espaço enquanto marcos significativos nas diferentes biografias.

Há herdeiros dos desbravadores; beneméritos de uma ou o itra

forma; há os que, migrantes das regiões vizinhas, ali fundaram

uma famf1 Ia e alcançaram estabilidade econòm ica e prestigio; há

descendentes de antigos escravos: alguns que permaneceram por

conta de um pedaço de terra ofertado como para redimir as

ant i relações, outros, em nome de relações dc dependência que

se reproduzem sob nomes diversos; c há ainda os descendentes dos

iai grantes italianos, vindos no infcto do século, como colonos,

em funçlo dos problemas relativos & abolição.

Sobre estes, se» explorar aqui as agruras d» adaptação

•o Novo Mundo, vale dizer que, apesar da diferença de ITngua, o

*ertencimento a uma cultura mediterrânea deve ter favorecido as

►'«•tiras trocas, inclusive matr imoniais. Até porque os

39t
imigrantes, iguais enquanto italianos, diferenciavam -se em

termos de status e nfvel social no país de origem , o que

facilitou a mesclagem com f a m í l i a s daqui, me s mo aquelas com

prestígio acumulado.

As pessoas do lugar, oriundas da migracao interna ou

italiana ou os descendentes dos ex-escravos encontram-se unidos

pelo amor ^ terra, identificam -se como possuidores de

SEQtimeütQr orgulhosos da sua condição de varressaienses. Mesmo

os que a b a n d o n a r a m a cidade Por questões de trabalho, por

constituirem fam ília em outros pontos e os que comentam a

pressão exercida pelo controle difuso da sociedade,

reencontrados nos dias de festa eram unânimes em afirm ar a

excelência do lugar, justificando de alguma forma a

circunstância que os fez sair.

Há, pois, um f o r t e discursa apologético sobre Varre lal #

baseado cm valores que sio t a mb é m valores católicos (ou

facilmente assim iláveis ao discurso do catolicism o luso—

brasileiro), inspirado quaee sempre nas virtudes que os santos

e x c mp l i f I c a r am c que sao comprovados, para o nativo, pelo poder

que a q u e l r m têm de continuar operando m ilagres.

C o n « i der ando que nratIcamante toda* ms f a .íll t ttu um

eaao de wll&src a contar, é possível dtzrr que tais m i 1agres

«o»#»ticoa r* d u ze .-* e a m t.p l.m absorcío da catego ria aso, mas


a % % ! a» d i t o -9 fSar m u ___• _ _ afc í *.
Produzem um d u p l o efeitos reproduzem a crença no
poder do santo, r e f o r ç a n d o a f é do d e v o t o ? alimentam a sensação

de que o c o t i d i a n o e s t á sob relativo controle, dependendo da

fidelidade do devoto.

Se a d e v o ç ã o aos s a n t o s é a primeira condição para o

recebimento d esta graca, a imaginação popular não se submete

completamente á Igreja na c r i a c ã o desses mediadores entre os

dois mundos. Aproveitando traços que se a d e q u a m a critérios

mais gerais indicativos de uma s u p o s t a santidade, um sem ndmero

de fenômenos se espalham pelo B r a s i l , não sendo gratuito o

empenho da
Igreja em c o n t r o l a r a emergência e a devoção aos
<4 )
"verdadeiros sant o s "

Varre 3a í não é i n d i f erente a e s t e processo. & 7Km do

patrimônio há um lugar de v e n e r a ç ã o . Cruz da Ana, e ã. 17 Km,

ainda no mun i c í p i o de N a t i v i d a d e , o santuário da Virgem da Pedra

tenta atrair devotos. Assim, num r a i o de 2 4 K m há dois locais de

romaria, ambos com suas respectivas águas milagrosas. O

primeiro se o r g a n i z o u em t o r n o do c r u z e i r o e da capela» e teve

seu período áureo na déc a d a de 40. ap e s a r da crescente c r ft i c a

do clero local. o s e g u n d o te m uma h i s t ó r i a mais recente, por

vezee assoe Iada a tnt er esses m a t e r i a i s d o h o m e m que t e r ia visto

as aparicòes de Maria. Por c o n t a de l a s , o vidente foi levado a

construir uma réplica da c asa de M a r i a e m Cfcso, onde está

depositada a pedra a l u d i d a na a p a r i ç ã o .

392
Comparando essas duas devoções e descontando os quase

Í0O anos que separam a emergência delas, é possível reencontrar

a imbricação entre os conteddos religiosos, o valor do santo e o

ethos caracterfstico de uma população. Vale lembrar que ambas

as devoções não têm o reconhecimento oficial da Igreja. Mas a

recente visita episcopal de D.Navarro (1908), com vistas à

valorização das capelas da "roça" provavelmente será

reapropriada em nome do miraculoso lugar. Não é gratuita a

construção de uma capela tradicionalista quase defronte da

or ig inal.

0 que ressalta no santuário da Virgem de Pedra é o

estatuto erudito de sua origem. 0 santuário foi construído nas

terras de um mddico, a quem a Virgem ter ia aparecido algumas

vezes, desde 1967. As aparições têm uma histdria mais longa,

cujos fragmentos ainda não foram sistematizados. Prado Pinto


(19Q3) relata o processo de busca da explicação do fenômeno,
tomado pelo vidente, Inicialmente, como um distárbio
psiquiátrico. Afastada esta hipdtese, deu-se a urbanização do

sítio, com vistas a atender o pedido da Virgem da Pedra.

Como no cmso de Fátima há uma dltlma mensagem. que se

abre para o futuro, mas cujo conteddo ainda não foi divulgado.

A existência de uma tecnologia de turismo (loja de lembranças.


Postais, terços, canalização racional da água curativa,
eatac tonamento para veículos, etc,), pode ter contribfdo para a

difusão de düvlâas quanto a veracidade do acontecimento. A

393
clientela é de turismo Interno, prIncInalmente de Minas Gerais
de onde chegam ônibus de Murlaé, Leopoldina e Carangola.

Crus da Ana, ao contrário, só dispõe mesmo da fé de quem


lá vai acender uma vela, a capela tendo sido inclusive
despojadt», segundo herdeiros do benfeitor, de adornos de altar,
retirados por descendentes de um segundo casamento. Diferente
do caso anter iormente comentado, sobre o lugar só existe um
cordel onde ressaltam dois pares de oposições: a valorização do
nome de família X ausência do nome de família? presença de ética
católica X ausência da mesma.

Resumidamente! Ana, era de Jesus, família que embora


comum a todou os batlsados, generalizando a identificação,
4 compensada porém pela excelência do nome. Seu algoz José
Pernambuco, cruel e contumaz aosasino, não tinha nome de
família, sendo identificado apenas pelo nome do lugar de origem.
Este, além de remoto, satisfazendo o estereótipo do perigoso
estrangeiro, era um jagunço, homem que "matava por dinheiro" a
serviço dos coronéis. Ana morre defendendo a sua castidade, e
de seu corpo, encontrado dias depois, exala forte perfume de
rosas.

A estas oposições é possível superpor uma outra: a fé


tsl como professada rio catolicismo luso-brasi le íro ( o milagre
enquanto acontecimento prdximo) X a fé sob o controle do mundo
clerical <o milagre subordinado ao reconhecimento da Igreja).

394
Ou seja a religiosidade popular como fato autêntico e o

controle da religiosidade pelos agentes Institucionais.

Ora, desde que a tríade divindade-santos-humanidade

configura o circuito onde a religião se atualiza, posso dizer

que estou frente a um exemplo da relação de circularidade que

envolve a prática da religiosidade popular e a prática da

Igreja. Esta, com zelo, reserva-se o direito de definir quem

são os santos e como venerá-los, e, da mesma forma, a população,

de onde eles emergem, se pensa no direito de identificá-los no

cotidiano. Afinal, como disse Paulo VI em seu discurso de 7 de

julho de 1965: "A Igreja precisa de santos e o mundo também".

A devoção ã Cruz da Ana pode ser tomada como exemplar em

termos de enfrentamento entre o plano clerical e o popular, com

a Ênfase oscilando, respectivamente, da exemplaridade para o

companheirismo. Se quanto ã canonização a história da mártir

nao preenche os requisitos sequer á abertura de um processo, no

que tange k aceitação popular ela é pleria: oferecendo aos fiéis

aquele "amigo invisível", tomado como o eu mais profundo de cada

um, protetor- mas protetor no sentido de uma extensão elevada do

Indivíduo (Drown, 1984i7laa).

Parece-me, no entanto, que mais forte do que uma


competição entre santos promovidos pela Igreja e santos "feitos
em casa" é o testemunho da certeza cia milagre que, airida hoje -
« sempre- pode s.e verificar, como bem relata o fato abaixo.
Nos primeiros dias da novena de Sta Filomena, no ano de

1988, com a cidade já vivendo a expectativa da festa, propagou-

se uma notícia terríveis um chefe de família desapareceraI

Falava-se abertamente em sequestro e, á boca pequena, não

faltavam "sher1ocks" que elucidavam o mistério, sugerindo

Inclusive o nome da família dos culpados. Ocorrera o seguintes

X trabalhara para Y por muitos anos e forte amizade os unia.

Enfermo, Y doara a X dois alqueires de terra, devidamente

legalizados. Y falecera há pouco e X dedicava-se a plantar as

19.000 mudas de café que enviveirara. Quatro desconhecidos vão

a roça onde X trabalhava e, informados pela esposa de X do justo

lugar onde se encontrava o marido, vão ter com ele. X não

retorna à casa.

No dia da festa de Sta Filomena X é encontrado em

deplorável estados havia sido surrado, amarrado e encaixotado

quando o supuseram morto. 0 caixote foi encontrado abandonado

nu» canavial existente à margem da estrada Varre Sai/Natividade,

já bem próximo a esta cidade. Levado para o hospital de

Jtaperuna, rtcuperou-ie. 0 episódio foi imediatamente associado

a um milagre de Sta Filomena, que protegera a vítima desde o

início dos acontecimentos.

E claro que especulações corriam, paralelas a uma

segunda versão da estória, segundo a qual as terras de X teriam

sido conseguidas por ordem judiciária, na medida em que Y não

recebera seut# direitos trabalhistas e o juiz determinara os dola

396
alqueires como o pagamento devido. Idependente disso,

comentava-se que um herdeiro de Y ter ia vendido as terras doadas

a XF recebendo 50X por con :a do negócio, e o final quando X

desocupasse o sítio. 0 raciocínio era simples* só este herdeiro

e seu comprador ter iam interesse no desaparecimento de X,

logo... os formuladores desta hipótese, no entanto, garantiam

que o mistério jamais seria elucidado, em virtude do poder

econômico da família Y e comentavam balançando a cabeças "Deus

me perdòe, mas a justiça aqui é coisa que se compra com

d inhe iro"•

Os poderes dos santos de r e a l i z a r milagres, alterando o

fluxo negativo das condutas humanas, caminha paralelo à

consciência de um duplo perigos a possível maldade individual e


<5)
a incapacidade dos recuros sociais de coibir o crime • Por

isso é tão difundida a crença na justeza da lei de Talião e a

justiça pelas próprias mãos, da qual os linchamentos de presos

retirados das delegacias é o melhor exemplo na região. A elas

correspondem os muitos casos sabidos de impunidade ou Justiça

condescendente para aqueles que possuem poder político e/ou

econômico*

A ambiguidade existente entre uma terra que se quer do

bem» mas onde sucedem os mesmos dramas e as mesmas tragédias

como e» qualquer outro lugar, encontra sua relat ivlzaçao via a

presença dos santos, que podem livrar do mal e lembrar a todos

aua condição de pecadores. Enquanto Isso, os fiéis exareisa» o

3 97
doü 1imite a do l u g a r — p e l o menos do

filitf ier r Itdr io de G»Gebaitlão " zelando p a t a que al i se

tebh* iMnnfvtl felicidade terrena.

Tomando o espaço cumo unu\ linguagem, Hall (1904) frisa

que va% fatos espacial* dão ã comunIcav.au sua er>tsn^ção e o seu


acento» ultrapassando i\n vezes o discursos propriamente dito.
àssim» o lugar que o homem reconhece como seu é dotado cie uma
reverencia particular» relativamente independente dos
estereótipos que o identificam. Não bò o lugar» mas os padrões
selos quais se o divide e hierarquiza, os relacionamentos que se
estabelecem e sao preservados» a qualificação das pessoas e das
situações» constituem um todo significativo que recobre não sd
as questSes menores como os problemas transcendentais*

No amor que as pesso \s demonstram ter por Varre Sai não


sei atd quando está atuando a velha oposição campo/c idade, que
di margem a tanta valorização do primeiro» enquanto realidade
associada k pureza e simplicidade. Penso que o morador do
caapo* por sua experiência» não cai tão facilmente na ilusão de
que vive no paraíso. No entanto» é bom lembrar que a
deterloraclo da qualidade de vida nas grandes cidades do Brasil
pode estar colaborando para consolidar m idéias, tão duramente
construída» c o mo m o s t r a Williams (1989)» da e x c e l ê n c i a da vida
<ó>
no meio rural» por sua "natureza bucólica:

398
Para mim, a especificidade de um lugar, para além do

discurso sobre uma sua "natureza", é dada pelas definições

decorrentes dos processos histdricos (onde se forja inclusive o

discurso acima citado) e condensados no nome do lugar que o

transformam em único, particular. 0 nome, então, retem em si

não só o esforço consciente dos seus amantes em proclamar sua

excelência, mas também e ao mesmo tempo, esss massa de

sentimentos e emoções que seu nome evoca. Conceituado

positivamente, é um emblema, escudo e meta do espírito dos que

dele se sentem parte, cristalização dos seus ideais, enfim,

sagrado•

Cabe frisar o quant o V a r r e sai a p r e s e n t a de sinais, da

religião e c omo e s t e s c o n f o r ma m um s i s t e m a c o e r e n t e co.n a s b a s e s

tia doutrina católica. Na o b a s t a l embr ai que os limitas sao

guardados por templos» é bom l e mb r a r o entrelaçamento de

princípio® topográficos e princípios r e l l g i o s o s r como acontece

coa os logradouros? que ã d e s p e i t o da c r e s c e n t e s u b o r d i n a ç ã o c<

interesse® ditos cívicos cm homenagear p e r s o n a l I d a de s locais,

estlo consagrado® pelo uso, em t o d a s as camadas? mesmo daquelas

que t i r a m proveito das inovaçBes.

A rua de B a i x o , po r o p o s i ç ã o U de Ci ma , e» t er mos de

altitude, tem, no® f u n d o s da H a t r i z , o Calvário, onde a n u a l me n t e

se repete a Via Sacra, p e r c u r s o d o l o r o s o dc C r i s t o pela terra.

Na Bua de Cima, nos f u n d o s da c a p e l a de sta Fílonena, se

encontra o c e m i t é r i o . 0 Primeiro, s i t u a d o em t e r r a s mai s altas

399
que o segundo, forca o penitente & penosa subida na cerimônia da

Sexta-Feira Santa, da qual o fiel não se furta « bem de

partilhar das dores de Cristo e da posterior salvação. 0 morro

do cemitério, mais suave, parece colaborar com seus vlsitadores,

diminuindo o peso dos que carregam os seus para repousar al I

para sempre.

Claro que é possível elaborar argumentações mais

prosáicas e materiaist que a Matriz está ao lado do Casarão, que

foi sede da fazenda do doador do patrimônio, constI tuindo— se

assim em coração da cidade, e portanto, bem distante do

cemitério, que fica no extremo oposto e agora centralizado em

função do crescimento da cidade. Varre sai não colocou sua

Matriz num centro, em torno do qual o espaço se dilata: a Matriz

está na sua célula primeira e se desdobra pelo espaço, em todas

as direções.

Não só servindo de marcos para as fronteiras que separam

o lugar de outros pontos, os templos são também locais para

■arcar as fronteiras que separam os estados sociais, preferindo-

se a Matriz para os rituais de entrada: batizados, primelras-

cottunhões, casamentos e missas congratultdrias, mas são os sinos

de St a Filomena que dobram finados, anunciando que um dos

■embroa da comunidade se foi.

Tais escolhas, seja lá quais forem as determinações

históricas e as posteriores rac ionalizaçoes que as explicam,

*allo dadas. conformando a real idade do nat tvo e se


transformando, pela repetição, na verdade daquela gente,

preenchendo de s i g n i f i c a d o s os m o m e n t o s mais Importantes de suas

experiências, ao mesmo tempo em que são reforçados pela carga

emocional que a c o m p a n h a episódios cruciais para a consciência de

si mesmo e do mundo.

VI.2 - As Bases do Sentimento

Ao iderário de uma sociedade dotada de coesão interna e

integridade individual corresponde a valorização de relações

amistosas, não-discriminatd ias que, na prática, resultam na

condenação das pessoas ditas orgulhosas. Estas, como que

traindo a pretensa solidariedade generalizada, ameaçam a

Identidade que se quer para o lugar, e sofrem relativo

isol a m e n t o .

S e g u n d o uma informante, esta valorização de uma conduta

generosa d antiga no lugar: al i nunca se viu, como em

Natividade, » separação rígida entre ricos e pobres, brar.cos e

negros. E n q u a n t o nesta havia, até a década de 50, o costume de

ung andarem de um lado da run e outros, na calçada oposta, em

Varre S a i isto n unca se verificou. Segundo ela, a Justificativa

talvez r e s i d a n o fato de não haver grandes fortunas no local.

Todos são peque n o s produtores, herdeiro» de magras frações de

terra q u e , ao longo (jo teapo é pulverizada na divisão entre os

filhos ae c o n c e n t r a na» mãos de alguns que dedicam w vida a

recompor o que foi desmembrado por herança. Mesmo a»»im, a

4#
situação é diffcil para todos, até para o proprietário de vários

negdcios, a quem falta capital de giro. e isto porque o

comércio local é muito singelo, vendendo fiado se quizer manter

a freguesia e, em função da galopante inflação do final da

década de 80 tendo mesmo que passar a cobrar Juros sobre as

d Cv id a s .

Embora v is fvel a distância entre os que residem no

Buraco Quente, n a Cháca ra ou nas muitas casas sem reboco do

bairro St o Anton ia e os que ocupam as melhores casas da "rua //r

podem possuir carro e conseguir empréstimos bancários para

investir no sTtio, todos possuem hábitos mor igerados r.o comer e

no vestir que, pelo menos aparentemente, impede uma ostentação

de riqueza. Mas há reais diferenças, apenas camufladas pelas

regras de comportamento a que todos se submetem. Não detectei

um discurso de revolta entre os muito pobres e sim a velha fala

conformada e esperançosa da A juda de um protetor forte que


solucione, momentaneamente, uma questão tida como mais grave.

Paradoxalmente, sao os mais aquinhoados que remetem

contra um grupo> o dos bóia-frias que, diaristas, terminara por


conseguir uma receita maior do que os filhos dos abastados que

^***n v o *v *'** modestos negdcios ou 1 imitam-se aos pequenos cargos

públicos. A queixa a esses trabalhadores sazonais,

ikp^ftcidlveit na caf e Icul tura, é que eles rompem com o costume

“* dar Prioridade aos interesses do patrão, subindo nos

camtnhSes dos gatos apenas quando lhes convém. Além disso.

*•2
desde que o que recebem é tido como muito para o que a sociedade

oferece e para os ideais que acalentam? terminam por ocupar-se o

mínimo e d i la pi dar os ganhos em bebedeiras»

Q r a d u a l m e n t e abalada, uma "ideologia da harmonia" começa

a aparecer minada, ameaçando os relacionamentos amistosos, ditos

como sempre tendo existido entre protetores e protegidos. 0

fato é ta nto mais grave porque agora envolve gente que

usualmente lançava mão desse discurso cordial, embora se saiba

que as desavenças entre fazendeiros e colonos sejam de longa

data» Há relatos de como se combateu a exploração entre

mee ir os/col onos imigrantes e os donos do café. Seja na rebeldia

dos que já tinham experiências do anarquismo italiano, seja

constituindo cooperativas entre eles mesmos, foi na luta que

alguns conse guiram se livrar de uma situação muito prdxima ao

trabalho escravo.

C nessr plano que ressalta a importância da família como

instituição que elaborou a solução de impasses, gerando alianças

reguladoras entre os muitos grupos. Foi no seu seio que se

estabeleceu uma Pedagogia dt i1 Para amenizar ns tensões,

pedagogia que inclui* a formação de valores compatíveis com as

deacontinu 1 dades existentes.

As regraa de conduta, hei aadas Junto com o pedaço de

terra, estabelecem, PrimordJalmente, fronteiras rígidas quanto a

<3ívI » 3 o doa seres segundo o sexo e a idade» 0 controle da

At3
mulher é fundamental para que ela, apesar da posição subalterna
que ocupa, transmita à geração seguinte os mesmos valores. & no
bojo de uma unidade menor, a família, que a tensão homem/mulher,

pais/filhos tem que ser elaborada, sob a pena de fazer ruir o

edifício de todos.

Assim, é preciso relativizar a chamada inferiorização da


mulher, na medida em que é através dela que se estabelecem as
alianças com outros grupos, seja num eixo sincrônico (com os
casamentos) seja num eixo diacrònico (na formação dos filhos).
Daí o dilema que é, para os pais, a expectativa criada na
atualidade de prosseguir os estudos em lugares diferentes. Se
por um lado isso significa a possibilidade de manter um
equilíbrio quando da partilha da propriedade, por outro

significa a 9radual substituição dos valores que sustentam o


mundo rural •

Para o ideal local de transformar os filhos também em


pequenos produtores, o problema maior nao é tanto a saida
concreta dos mesmos, que tanto acontece entre os mais abastados
quando entre oi outros: é comum o envio para casa de tios e
outros parentes, em cidades maiores para completar sua formação
para simplesmente dar-lhe uma ocupação que a cidade não tem

meios de oferecer nem a família de prov Idenc Iar. Isto acontece.

0 que parece na Is temido é que nio partilhe» dos mesmos valores


* desconheçam uma forma de vida pautada na ajuda mdtua e na

solidariedade# Primeiro familiar# depois# comunal.

404
respeito aos m a i s vel hos e mulheres (para que elas possam

amanha reproduzir numa família estas mesmas regras). São os

milltiplos r e s p e i t o s devidos (das crianças para os adultos, da

mulheres para os homens, dos homens para cs patriarcas e

autoridades) que susten tam a pretensa harmonia social, que se

quer desdobrar pelos diferentes grupos da sociedade,

independente de rel açõ es de parentesco. Por af corre a idéia de

que Varr e Sai é uma grande família.

A prática do respeito é inculcada desde a mais tenra

idade. Os c o s t u m e s ps Icol og izados de ouvir as crianças ou os

«ais jo ve ns ra ra m e n t e se impõe: quando não são desconhecidos,

são r e j e i t a d o s como um perigo citadino que não cabe no ca m p o •

Apesar de pr ese n t e no discurso e na prática de alguns poucos

professores, penetra, no entanto, pelos meios de comunicação de

massa, mas são tocados como fantasia e apropriados em sua

dimensão neg ati va» apenas enquanto subversão da ordem. Porque

encantam os ma i s jovens, sob dependência econômica e social da

família, ta i s mensag ens sao vistas como constante ameaça ao

indivíduo* & família e à sociedade.


■•vãí.- — .

repressão é grande. Embora os castigos corporais sejam tnenores

9ue na 9eraçao anterior» o controle das atividades e as ameaças


morais são muito fortes.

Relativamente livres no acesso ao espaço, as criancas

são submetidas aos grupos de idade e da parentela que, como

mostrarei adiante, entrelaça grande parte da população. Também

mais livres que as crianças da cidade em relação ao tempo, tèm

na escola o referencial básico de suas vidas, não sendo

aprisionadas nas classes complementares de línguas, esportes e

artes, embora sejam solicitadas para atividades ligadas àt

Igreja. Dedicam-se à brincadeiras tradicionais e a pequenos

encargos cotidianos a que são levados a assumir, de acordo com a

posição social e o estilo do chefe da família. Assim, um

adolescente de família abastada pode ser induzido a trabalhar eo

algum negócio em que o pai tem capital aplicado ou de um amigo

dele, a quem diz dever obrigação.

Meninos são criados diferente de meninas, o discurso

explicativo disso baseando-se na realidade que viverão no

futuro, por isso elas acompanham as '»ãcs nas tarefas domésticas

e, na roca, por vezes sio levadas a pegar na enxada. Os

casamentos costumam scr cedo e as que podem decidir pelo

"prof tssional izante" - que lá é o curso Normal - formam-se

professoras, aumentando o ntímero das que esperam os concursos

Pdblicos ou algu» apadrinhamento polftico para uma nomeação,

findam sendo absorvidas nas mult»» escolas de roca, existentes

496
nas fazendas, mesmo que sd ocupem cargos de apoio, como

«erendeiras. São r a r o s os c a s o s de j o v e n s que p a r t e m para um

c ur s o s u p e r i o r , po is este exige mudança p a r a c a s a de p a r e n t e , ou

deslocamento ca n s a t i v o e dispendioso para cidades vizinhas, como


Itaperuna.

As regras de namoro e noivado sao ditas agora mais

flexrveis do que na geração passadar onde se contam ainda muitos

casos em que o arranjo do casamento foi prov idenc iado pela

faaTlia. Sd entre os tradicionalistas o controle continua

extremado, qualquer pretendente sendo sabatínado pelo pai da

«oca se demonstrar interesse nela. Fora disso, e em contra­

partida, aumenta o ndmero dos casamentos realizados porque a

jovem engravidou e tudo se realiza rapidamente.

A vida de um casal gira em torno do circuito domdstlco,

ao qual a mulher fica restrita, salvo as que estão no magistério

ou as que auxiliam os maridos nas casas comerciais. Os homens

vivem ou simulam uma fidelidade que para a mulher é

in que st icn ivc 1 • Hi a f| gur a do 9 av iao", homem casado sem pr e

pronto a alguma aventura extra-conjugal desde que sinalizada sua

possib i1 idatíe. Para cies, como para alguns Jovens que podem

escapar ao controle familiar, existe a saída "pura o asfalto",

eufemismo para a procura de motéis fora do distrito. A ida a

bordéis é dita como feita em grupos, geralmente nos dias de

ftsta de outras local idades. A procura de alguma mulher,

possivelmente moradora na Chácara, onde já houve um prost fbulo,

4 07
tf cercada de muit o wilstrfrio e provavelmente de muita imaginação*

Diz-se de h o m e n s encapuzados que abandonam os lares altas horas

da noite e pagam r eg iamente para que suas famílias não saibam do

caso. £ desnecessário dizer que breve o as&un to tf de

conhecimento geral r o que recobre a esposa traida de uma aura de

sant idade r r e f o r ç a d a ainda pela estdrias sobre o r igor com que o

marido a co ntr ola . Infidelidades da mulher desclassificam o

casal e os f i l h o s r enodoando os parentes e afins que podem

partir para m e d i d a s extremadas, com o apoio moral da comunidade*

Muitas mul he re s reclama da rotina do casamento,

acomodando-se a idtfi» de um romântico passado idealizado,

soterrado ao peso dos impera ivos do cotidiano e desgastado pela

repetição e mod os de sentir muito diferenciados, construídos na

educação p a r t i c u l a r que receberam homens e mulheres. Diz-se que

os homens, no plan o da vida s ex ua lr são verdadeiros "jegues",

Insensfvcis às e x p e c t a t i v a s femininas e impondo-lhes submissão.

Tais f r u s t r a ç õ e s - as vezes sublimadas via discurso religioso ou

pela pressão f a m il iar - levam algumas esposas a medicaiizar a

Infelicidade, caindo no uso de tranquilizantes para conciliar o

sono* Mas esses ass un to s sao comentados apenas em circuitos

muito fntiwos, pois o "nervosismo" da mulher tf tido como sinal

tfftabonador das r e l a ç õ e s mat r iroon ia is •

A velhice tf muito respeitada, seja quando o idoso tf

ainda poderoso, seja pela Ênfase na dimensão afetiva que deve

unir as gerações g comum a preaença dc casais formados por


viúvos e cercados de netos que entram em mais
categoria
de parentesco, em virtude das relações

Levantamento não-exaustivo realizado entre 12 nomec d

família mostra como <í possível encontrar, numa geração ou


noutra, conexões que tornam uma pessoa aparentada de muitas
outras. Cabe ressaltar que no quadro abaixo busquei apenas
mostrar a miiltipla vinculação de ura indivíduo, sem atentar para
a ainda maior complexidade que apareceria se levasse em conta a
adoção do nome do marido.

I
I

I
I
t
I
I
I
I
I
t
t
I
I
I
t
I

4*9
Lembro ainda que nao estive Preocupada com questões de
herança, Justiças ou Injustiças pratica(jas com oli sem respaldo
legal. Hinha intenção foi exclusivamente mostrar a base
aaterial (biológica e jurídica) de uma "ideologia do parente'',
formuladora de uma concepção do lugar como fechado sobre si
mesmo e sob a responsabilidade de todos. •

Se esta realidade representa o esperado apoio do

parente, significa t a mb é m um fator de coerção, na base de uma

obr igat or ie d a d e de fa v o re s aos quais o indivíduo nao pode — ou

pelo menos n ao de ve — se furtar. Isto n?o significa que nao

haja d i s c r i m i n a ç õ e s e antagonismos. Há. E tanto mais acirrados

quanto menos existam figuras conectivas com força moral para

cobrar a t i t u d e s c o e r e n t e s com a posição que o indivíduo ocupa na

fam Í1 i* •

E c o m u m o c a s o de irmãos, herdeiros de uma porção igual

de terra que, no correr de uma geração apresentam grande

diferença de patrimônios basta que um não tenha tido sucesso no

casamento (em t e r m o s de agregar mais uma porção de terra ou a

esposa nao saber a d mi n is tr a r o que é da competência dela); que o

homem nSo a d m i n i s t r e b e m seus negdctos ou não seja trabalhador;

sue haja c a s o g rav e de do en ç a ou alcoolismo; que insista numa

atividade I n c o m p at ív e l com o trabalho rural etc. Em geral os

*fi^os se socorrem, me smo que seja adquirindo as terr as do

«atro, a l a r g a n d o a s s i m seu próprio patrimônio*


Reforço desta "Ideologia do parente" é ainda o
parentesco social que redefine laços pre-exlstentes ou cria
novos. Ao padrinho compete preocupar-se com o bom nome do

afilhado, cujo prestígio tem retòrno. Se é moça, cabe-lhe zelar


pela sua respeitabilidade e apoio quando do casamento. 0 ciclo
destas ações inicia-se muito cedo, rois os padrinhos são
responsáveis pelo fornecimento diário do leite para o afilhado,
obrigação da qual sd estarão livres quando este abrir mão da
regalia. Complementa-se com o dever de aconselhar e repreender,
incentivar e cobrar posturas dignas tio nome do pai e/ou do
padr inho.

0 hábito do fornecimento de leite, de conotação ás vezes

mais simbólica do que material, sem ddvida é mais comum no

espaço da "roça". No entanto, ainda hoje, e nas primeiras horas

d» manhã, pode-se ver pequenos vasilhames em certas portas* com

naturalidade, o ônibus para em alguns pontos, o cobrador salta e

o recolhe, deixando-o depois, num outro portão, quilômetros

adiante. Embora menos visto na "rua", onde outras alternativas

alo preferíveis, constituem um padrão do que sejam as boas

relações entre compadres. Também é um ideal, c para valorizá-lo

há est 6r ias tristíssimas de padrinhos, que após segundo

| caaaaento, romperam <relat ivamente> com a regra, por conta da


avareza da nova espoaa megera. C difícil delimitar, em alguns

casos ouvidos, onde termina o fato lembrado e começam as

tcrrfvels estórias de madrastas c enteadas rabugentas próprias

•es contos de carochinha.


m, mesmo os ramos mais pobres de determinada

ascedência apropr íam-se desvantagens (materiais e simbólicas) de

pertencimento a certos grupos e daf esperam tirar todo o

proveito possfvel. Dos mais bem aquinhoados espera-se uma

postura generosa e que possa apontar, num círculo o mais amplo

possfvel, pessoas de respeitabi1idader o que define a excelência


(7)
da "raça" (Abreu, Í982)

Homens e mulheres se d e f i n e m de maneira diferente em


( 8)
relação ao espaço e apesar das alterações determinadas por

circunstâncias históricas, as mudanças tendem a ser

interpretadas como efeitos nefastos de uma situação particular,


(9)
raramente articulada a questões mais amplas e universais

Família e casa estão fortemente confundidas no

imaginário brasileiro. A casa, embora estrutura material, é

mais do que um mero "teto sobre a cabeça" "Sua importância é

crucial, constituindo mesmo uma categoria central de uni domfnio

cultural ç um mapa simbólico de representações

ideoldgicas"(Woortmanr Í982SÍ19). Nesse sentido, & casa é

também estrutura simbólica da organização da famflia, espaço qUB


acolherá sempre as mulheres, a despeito da idade, e os filhos

homens que ainda não fundaram suas próprias famílias.

Mas tanto na casa, como fora dela, é a família que dá *


tônica moral à quai se subordinam os menores de idade, cujos

412
diversificados interesses, crescentes à pedida em que começam a
partilhar de clVculos sociais e espaciais cada vez mais amplos,

podem produzir afastamentos entre seus membros, realizando—se

isso de acordo com padrões consagrados pela cultura.

A casa como lugar da mulher concretiza no espaço os


valores que a ela são imputados. resguardando-os de serem
cont am inados por transformações mai s amplas, mesmo de n fvel
Jur íd ic o , que puderam ser conquistados. Desde que tais
conquistas são resultado de longas lutas com vista s a ma ior

espaço na sociedade, a noção de necessidade é acionada pa^a

Justificar transformações consequentes e assim, redefinir

aqueles mesmos valores imputados e associados a condição

feminina. Afinal,neste quadro, sd trabalham (fora de casa) as

aulheres que têm necessidade de faze— lo, o que significa o

reconhecimento de uma dupla dificuldade <a da mulher que precisa

abrir mão de seu principal papel e a incompetência do ho.nem em


atsegurar-lhe este "direito").

Como mostra Linhares (1907), o confinamcnto da mulher ao

lar, a casa enquanto abrigo, é tambdm endossado pelo sistema


<!•>
Jurídico e "as mudanças relativas a esse modelo começaram a
ocorrer n partir de 1962, embora nlo atingissem o modelo como um

tooo. o Estatuto da Mulher Casada, cie 1962, e algumas alterações

*» Lei de Registro Pdblieos nSo abalaram o modelo patriarcal e

*c*oa4miço, em que pesem práticas sociais que se afastam na sua


concretude, com frequancia, do "t Ipo ideal de família, segundo a
ideologia Jurídicas (Linhares, 1987:109).

Esta ideologia jurídica está bem próx.ima da ideologia


familiar católica, principalmente daquela que não foi bafejada
pela perspectiva de uma Teologia da Libertação, que mesmo
mantendo os princípios básicos referentes k família tem, a
partir do pr iv 11egiamento do resgate da dignidade humana, a
pista para uma maior flexibilidade para a concepcão da mulher
como "colaboradora do marido". Prevalece em ambas a idéia de
hierarquia, ratificada com a persistência da supremacia da
vontade masculina sobre a feminina.

0 que está presente neste modelo familiar é a concepcão


de que a família é o lugar da preservação dos bens simbólicos e
materiais, dinamizado pelo lado masculino do grupo, que afere,
no mundo exterior a imagem da sua família, e administrado
internament e pela mulher, de maneira a promover o bem-estar de
todos os seus componentes: o mar ido/pa i e os filhos homens,
diretamente vinculados k produção de riqueza; as filhas para
reproduzir o modelo via a continuação do papel da mãe, no qual
entrarão pelo casamento.

A Ideologia se define nesses elos que ligam várias


famílias, conformando inclusive os ideais das escolhas
satrImoniaiS . apesar destas serem t Idas como a emerpène a dc
amorea eupoat ament e dea int arrasados. Como 1 c r.t**** atrasoea

4 14
aparentemente cegas já não estivessem atuando os pr incfpios

cultura is que definem o belo e o bom. Sem neces3ar iamente

passar por cálculos conscientes, os valores estabelecem os

limites de escolha, sem que os enamorados se dêm conta da

funcio n a l i d a d e do mo d e l o resultante da tendência hipergâmlca,

que favorece igualmente o par (ou seja! em termos dos papál»

consagrados).

A a n a l o g i a deste modelo familiar com o modelo católico é

mais que e s t r u t u r a l , pois as recomendações advindas do campo da

doutrina antecedem a legislação desde que foi regulamentada,

repousando no car á t e r consuet ud inár io pr e—ex ist ent e e onde se

encontram t r a ç o s da tradição judáico- cristã.

As s i m , para o que me interessa aqui, não basta

reconhecer a bfblica subordinação da mulher ao marido, a

"st ab j 1 i t a s " como propriedade fundamental do casamento - tão

louvada por S. Paulo, a submissão de Maria ao Anjo do Senhor, a

indít&olubi 1 idade do matrimônio como resultado do caráter

sacramental do m c i u .

Há uuc detec t a r idroi ■ e expectativas comuns às duas,

faafl«a e Is rej», c que, embora referidos espec if icament e a cada

instituição, as t orna int er c smb iáve is , como que informadas por

ua p r i n c f p i o de identidade.

«15
Po r princTpio de identidade estou entendendo a

propriedade destas instituições de serem pensadas como dotadas


de uma mesma destinaçaor contendo em si as formas de sua
perpetuação e de se Preservar mutuamenter como um eu e seu
duplo, pois o que ameaça uma também ameaça a outra*

Esta par t icu l ar id a d e se expressa, in ic i a l m e n t e , no nome?*

a igreja, enquanto comunidade de fiéis, é o conjunto dos irmãos

ea Cristo, membros de uma famflia que reconhece um mesmo pai e dí

beneficiária de uma mesma herança, a salvação. Mas se o nome

assim o e x p r e s s a é porque retem 2000 anos de desenvolvimento em

que tal idéia foi se enraizando, sendo retrabalhada

culturalmente, de forma a satisfazer os diferentes grupos

sociais sem perdas para cada uma de per si a par« ambas, ao

aesmo te mp o.

£ interessante perceber que no mesmo movimento em que a

nova sensibilidade sobre a família vai se firmando, a Igreja

também p5 e em evidência o culto à Sagrada Família, e* sao

estimulados o s cultos a S. José, pai/patrono da mesma. Ou seja*

na medida e» que a modernidade tende n alocar sep*radamente os

planos da vida social, retirando o homem dc rcl * c 8 e s s o c ia í *

aats i n d i s t i n t a s , com destacamento especifico para certos papcís

sociais do homem, da mulher, da criança, cresce, na Igreja, «&

ênfase neste conjunto qut repõe a dupla oposição Presente nos

liste*** de parentesco, c o n s a g u in ♦d a d e , a f i n i d a d e < M a r ia / J e s u s 7

*aria/S. J o s é ). Não é gratuito que se tem como dado, na

4 16
sociedade catdlica, a Sagrada Família como o modelo da f am Í1 ia
( 11 )
nuclear

Mas no quadro desta ident if icaç«\or onde a Família

catdlica, o grupo de fidis constitue a igreja, é preciso

reconhecer a hierarquia presente, estabelecida não sd pelo

caráter sobrehumano da Sagrada Família como pelo caráter sagrado

do contrato que une a família terrestre à família celeste. Para

o adepto,esta relação, constituída por desígno divino,

pressupõe uma autoridade "sui gcneris" à Sagrada família,

elevada então à categoria de m o d e l o , forma ideal a exigir

reconhecimento, lealdade, imitação.

A ênfase sobre esta imitação, cuja plena realização é

impossível mas desejável, se dá, entre nds, principalmente no

período denominado de romanização. Neste, multiplicam-se as

Lisas Jesus, Maria e Josd, organizações diretamente vinculadas a

este ideal, que sãoreforçados pelas muitas expressões do

movimento mar iol dg ic o , onde Maria, mãe de Deus, mãe dos homens,

4 prestigiada enquanto figura central da família.

Em Maria o elemento feminino está despojado de sua

conotação perigosa, ressarcido que foi por vontade divina e que

a transformou, pela fecundação do Espírito e casamento com um

^••c*^*1**4* d* casa de Davi, em elo de dupla natureza* entre a

nobreza bíblica e a virtuosidade das que obedecem a palavra de

entre a família terrena e a família celeste. A

417
divinização de Maria, t r a n s p o r t a d a £* condição tuprema pela

m a t e r n i d a d e do F i l h o de Deus, c o n s t i t u i dogma desde 1854, o que,

para fie l, a c a b a com q u a i s q u e r argumentações que a i maginação

queira c r i a r para d i s c u t i r o estatuto dela.

A r e p r e s e n t açcio de uma Identificação das duas

instituições, fam ília e Igreja, r e s u l t a na concepção de que


ambas s ã o v i t a i s p a r a o homem, uma no plano t e r r e s t r e , outra no

plano c e l e s t e , s a l v a n d o - o de p e r d e r - s e no nada, confereindo-lhe

identidade e dignidade, c ap a z de reproduzir-se na terra e

p e r p e t u a r - s e na v i d a e t e r n a .

Talvez por a í s e compreenda a p o si çã o irredutível da

I g r e j a f r e n t e ao d i v d r c i o e ao a b o r t o . 0 p ri me iro o r I e n t a n d o - s e

para o m a t r i m ô n i o ( s a c r a m e n t o c e l e b r a d o p e l o s f i é i s e abençoado

pelo sacerdote), corrige, a l t e r a as promessas de aliança e

continuidade contidas no modelo i d e a l . Não é g r a t u i t o que a

Cdria Romana t e n h a i n s t i t u í d o um t r i b u n a l e s p e c i a l v o l t a d o aos

Problemas r e l a t i v o s ao c as amento, de forma a s o l u c i o n a r q u es t õe s


( 12 )
circun stan ciais sem a b a l a r os fundamentos doutr inaír Ias . 0

2q , literalm ente vital, do ponto de v i s t a t e r r e n o , é , para a

Igreja, t ã o g r a v e quanto o d i v d r c i o , sua a t u a l i z a ç ã o agr edi ndo

não sd a h i e r a r qu i z a ç ã o c o n t i d a no s is te ma como os prdprios

p r i n c í p i o s da c r i a ç ã o do mundo.

A importância do tema do a bo rto é t a n t a que pode s er

v i s t o como o f i e l da b a l a n ç a que anuncia as mai s g ra ve s tensões

418

■q
no interior da Igreja, seja no plano teológico, seja no plano

pastoral, bastando lembrar


reações as causadas quando da
<13)
publicação da Humanae Vitae, em 1966

Volto a lembrar que embora o debate teológico -no caso

refratando-se ató a questão da autoridade dogmãtica da Igreja —

chegue, não só ao clero como aos leigos, muito mediatizado, atd

os simples fióis tomam posição, na medida em que nenhuma questão

i mais vital do que esta. Aldm disso, ela ainda é

potenc ial izada frente a divisão que ocorreu na D iocese de

Campos, onde os grupos se identificaram como pró ou contra o

Cone f1 io Vat icano II.

Para o que me interessa aqui, importa f r isar quão tensa

é, no quadro do crescente individualismo que caracteriza os

tempos modernos, a reconstrução e manutenção desta identidade

entre família e Igreja. A generalizada ideologia da autonomia

do indivíduo em relação ao seu corpo, secundada pelo

desenvolvimento tecnológico que, eia certos aspectos, superou

muitos dos riscos Ü que se sub me teu os que ousavam ultrapassar


00
limites prctensamente nat urais", torna-se uma v is ível
dificuldade que a I grej a tem que enf rent ar . Num Pr ime iro
momento* no n fvel de seu próprio corpo de agentes. num segundo.
na relação das POS ic ões adot adas por este e as var iadas
txpres»3rs culturalnente reelaboradas.
Ass im r o princfpio de identidade que equaciona a

•sualdade Igreja/família/vidar perpassa a prática informada pelo

senso-comum, o discurso clerical e a reflexão teológica,

permanecendo complexa nos tres planos, à despeito da

sofisticação com que possa ser absorvido enquanto questão

fundamental, constitutiva de uma mentalidade católica. En»

termos de cotidiano cabe verificar como a representação que

Identifica família e Igreja se atual ína nas funções que as duas

instituições cumprem - de mediação, de provisão e de ordenação —

para compreender como o princípio de identidade pode ser

atualizado, apesar das miíltiplas pressões que sofre, de caráter

individual e coletivo, interno e externo.

Como já foi dito, o princípio de identidade atual iz a— se

em três funções, a saber: a de mediação, a de provisão e a de


ordenação.

Por função de mediação estou entendendo a capacidade que

família e Igreja, de estabelecer pontes entre doio mundos,

0^*rcc<rn^° passaçem para universos diferentes e, por isso.

Permitindo que uma pciuoa identificada com o espaço x possa

Partilhar de r *cur*ot destinados ao membros do espaço y.

ia, ao dar o nome, fornece, com ele, o direito de

* 01 unidade acumulada pelos antepassados, em e s fe ra s

* * v*fc •• i% amplas da sociedade. Hestao que não seja para

eivm icar i»r jv $irfg i o s , o nome cf a base sobre a qual o

42*
desconhecido tenta construir o seu reconhecimento. Como af irma

Da Matta, entre nòs predomina uma ideologia mesclada do "voct

sabe com quem está falando" com o "seif-made-man". A ênfase no

individualismo, que favorece esta dltima, é contemporânea de uma

delimitação cada ves mais precisa de campos de atuação, o que

forja a atração, por esses "seif-made-man", para circuitos

específicos, constituindo as "famílias de médicos", de

"militares", de "intelectuais", escamoteando, sob o nome de

vocação o que pode ser uma tendência eletiva determinada pela

"familiaridade" com certas temáticas ou uma escolha pragmática

segundo um cálculo racional de vantagens. Tal neo-

cor porativismo, que parece tão comum entre os profissionais

liberais, pode ser encontrado em qualquer classe, obviamente por

razoes diversas: desde a garantia de sucessão entre os magnatas

até a falta de recursos para outra escolha, entre os não-

favorecidos. De alguma forma, o início de carreira de um jovem

tem, em alguma medida, a presença da família, principalmente nas


(14)
camadas mais baixas (Neves, Í983) .

Da mesma forma a Igreja, no exercício de sua função de

mediação, utiliza recursos tanto de ordem simbdlica quanto de

ordem prática. Mediadora da salvação, enquanto instância que

provê os meios de realizar a promessa divina, utilizando seus

próprios componentes como mediadores, ela assume também a

assistência aos fiíéis em questões materiais sob as mais

diversas formas* desde o antigo acatamento das escolhas das


corporações de offeios em torno de um padroeiro, legitimando

ordens cujo carisma


é a assitência aos desvalidos, »eja os
<15)
atuais projetos de promoção social

Como instituição religiosa, propriamente dita, sua

funcionalidade maior reside na produção e oferta de seus bens

específicos, os sacramentos. Estes são 05 caminhos adequados, a

metodologia de vida que garante chegar ao objetivo liltimo, a

salvação. Da entrada na comunidade dos fiéis, pelo batismo e o

crisma, passando pelo direito de participar da Eucaristia, com a

confissão e a penitência, na benção matrimonial e na partida

definitiva, com os santos dleos, a Igreja fornece os meios para

que cada um, segundo os seus atos, seja merecedor da graça

promet ida.

Além dos sacerdotes que atualizam os sacramentos, a

Igreja ainda criou uma legião de figuras exemplares que advogam

em nome do fiel e realizam milagres. Estes "companheiros

invisíveis", cuja devoção pode ser herdada da família, tornam—se

das poucas companhias livremente selecionadas e disponíveis,

pr incipalmente para a mulher, no seu confinamento doméstico.

Parentes de escolha individual, a confiabilidade é seu grande

atributo, já que neles morrem os segredos inconfessáveis, sem

qualquer ameaça de divulgação.

A inclusão em circuito tão fértil é inicialmente

propiciada pela família, num processo em que esta mesma se

422
apropria um tanto dos méritos da Igreja, em termos da manutenção

da autoridade. Embora nem todas as famílias cobrem doa filhoa a

continuidade na vida referida pela religião, em geral é ela que

toma a iniciativa de introduzir a criança na comunidade dos

fieis, e, além de controle pelo menos temporário sobre a

recepção dos sacramentos, os liga aos santos, atravds de

consagrações a patronos, com o duplo intuito de homenagear o

santo e ver seus filhos protegidos. Em tal barganha indireta

por prestígio, entram despreocupados, por conta da fé que

carregam, com o que significará para o consagrado, aquela

promessa em que foi um dia envolvido. No mundo rural, não são

poucas as vocações que despontam, ou as racionalizações que

sobre elas se elaboram, a partir do gesto de consagrar uma

criança a S. Sebastião ou Sta Teresinha, garantindo um

companheiro exemplar para as crises de vida pelas quais todos

passam, mantendo tanto a sua compreensão quanto o seu

enfrentamento, nos quadros de uma ldgica religiosa, catdlica.

Assim, a função de mediação imprime, principalmente ,

mobilidade entre universos estanques , ampliando o raio de ação

do beneficiário e possibilitando a superação de limites pre—

def in idos.

Por função de provisão estou chamando a capacidade que

tèm ambas de "alimentar" seus membros, função esta que depende

da aceitação tácita das regras de convivência no seio de cada

umas papéis e expectativas conforme o sexo e a idade. a Pos ição


relativa de cada um no quadro de um sistema de relações,

correspondendo isso a uma espécie de constituição Implfeita,

onde estariam detalhados os direitos e deveres de cada um. Para

os que assumem o seu respectivo papel, a Igreja, esposa de

Cristo, detem as chaves da despensa dessas muitas benesses Ja(

mencionadas, englobadas sob o nome de salvação - que é, de certa

forma, o papel da mãe na família, distribuindo a cada um,

segundo sua posição no grupo, aquilo a que tem direito.

Distribuição essa que não se esgota nos bens materiais mas que

inclue os valores que presidem a sua Irígica, enfatizando a

excelência e inevitabilidade deles.

A Igreja zela pelos bens dos fiéis, atenta ãs normas

que os une -doadores e recebedores - e ãs normas de distribuição

do sagrado, vigilante que é da formação e legitimação dos seus

agentes. Eí no plano da produção e da distribuição do sagrado

que ela atualiza sua função de provedora. Uma divisão sexual do

trabalho ali se apresenta, semelhante ãquela existente na

famílias aqui, o chefe da família fala pela boca da esposa/mãe;

al i, a divindade fala pela boca da Igreja.

Eí interessante notar como nas festas religiosas cabe ãs

famílias certa funções ligadas à alimentação e a dimensão

estética do evento, em termos de decoração a aparência

esplendorosa do ato, dividindo-se entre homens e mulheres as

tarefas relativas ao cuidado com os apetrechos necessários, sua


manutenção e aquisição, tal como isso é prov idenc iado no

424
interior da casa da famfilla. Aliás, a Igreja, casa de Deus

recebe desses grupos a maior parte de seus bens materiais —

desde o território onde é edificada aos bancos, vitrais, imagens

e sinos. São as famílias que oferecem bens e próst imos, que

retornarão para a comunidade sob a forma de dádiva da Igreja,

casa que acolhe a todos.

Por função de ordenação refiro-me ã capacidade de

ordenar todos no seu interior, de forma que a distribuição dos

bens se dê de maneira coerente com os princípios da doutrina e

sejam, assim, considerados automaticamente justos. 0 mesmo

critério que informa a ordenação da família, sexo e idade,

está presente na Igreja, complexificando-se no processo

histórico de construção da instituição, sem perder, no entanto,


este referencial básico.

Lá como cá os mais jovens subord inam—se aos mais velhos,


e as mulheres aos homens. Por mais que a diversificação e
especialização das atividades exija alterações neste modelo
básico, ele permanece atuante, apesar das pressões constantes.
Assim como no plano da religião a Igreja é tanto sacramento como
instrumento, subordinada á palavra divina e à obra da Trindade,

no plano fami 1 iar a mulher é "sacral izada^ enquanto mãe e também


o instrumento que aciona, para os seus membros, todas as
vantagens que a família pode oferecer. £ tanto num plano quanto
no outro, elas ocupam papel subalterno, mesmo que na prática
sejam a parte realmente eficiente do grupo. Assim como á com o

425
endosso do nome familiar que a mulher se projeta para a rua sem

ser uma "mulher da rua", também a família se projeta no mundo,

em certo sentido, com o endosso dessa família maior que é a

Igreja, que lhe fornece aval e legitimidade morais. Eí daí,

provavelmente, uma das razoes pelas quais merge o extremo ze lo

que a Igreja devota ás questões da sexualidade, cuja

transformação da representação, ocorrendo com as mudanças da

modernidade, no nível dos saberes e das práticas,' terminaria por


( lá)
minar as bases desta estruturação milenar .

Se no plano da Igreja a vida sexual é teoricamente

contida, exaltando-se a castidade, identificada com a pureza e a

não contaminação com o sexo oposto, vale dizer que as regras de

conduta sexual, no interios cia família, tendem a scr r igorosas

no sentido de fazer valer o projeto de multiplicação cias pessoas

e a divisão dos bens disponíveis. Coerente com o esquema geral

do modelo, um número maior de restrições incide sobre a mulher.

A valorização de princípios como o de fidelidade conjugal, honra

familiar etc-, são indicadores de presservação de uma certa

concepção de família, funcionando a Igreja como salvaguarda de

problemas tão íntimos e, ao mesmo tempo, tribunal das condutas

pessoa is .

Neste sentido, cabe lembrar a preocupação dos

tradicionalistas com a mudança da confissão auricular —

completamentada pela inviolabilidade do segredo de

confissionário-contra a difusão da confissão comunitária que.

426
pelo menos em termos das questões referentes à sexualidade

funcionam como uma cortina de fumaça para autorizar a autonomia

do fiel neste campo tão "pecaminoso".

Com este quadro de como vivem os varressa ie n s e s , penso

ter demonstrado a importância das duas instituições para a

construção do homem de seat.iuieat.Qar digno morador das terras de

um santo. Apoiando-se mutuamente, Igreja e famflia preservam

suas particu1a r i d a d e s , ao mesmo tempo em que elaboram um ideal

de vida e um método de atualizá-lo.

VI.3 - Conquistas

Tanta vital idade constatada no plano do cotidiano levava

a crer que a aquela potencialidade não era um fato isolado. Se

al i, determinações espec i"f icas alimentavam a reprodução social

e cultural, preciso agora voltar-me para um plano mais amplo,

diocesano, para verificar como o desenvolvimento do processo

orquestra novo panorama.

Este, será o pano de fundo de relações ãs quais o

cotidiano em Varre Sai estará remetido, sempre preservando a sua

particularidade , mas mantendo, ao mesmo tempo, os pontos que

marcam o seu pertencimento à diocese.

De volta de sua terceira viagem a Roma, em 1985 de onde

retornou com a alegria de quem ali vai e "vê o papa" (o que de

427
fato aconteceu, diferente da viagem anterior quando sd se

avistara com D« Sebastião B a g g jo ), D« Nav^^^o 6ente~se

estimulado a ampl iar o trabalho em torno da catequese? do ensino

religioso, das vocações sacerdotais e da Campanha da

Fratern idade.

Como o convalescente que, reaninamdo-se, abre a Janela e

permite—se receber os ares e odores da vida que pulsa,

afastando-se dos miasmas mórbidos que o retinham na ante-sala da

morte, assim o bispo declara, em entrevista coletiva fornecida

em 30 de março de 1985, que estava sendo apenas um catalizador

que permitiu a explicitação das questões cuja complexidade vinha

se acumulando desde o longo bispado anterior.

Aqueles problemas, agora se concretizavam nas

aproximadamente 80 "seitas" atuando no meio da população (um

levantamento da Comissão dos Direitos Humanos, da Câmara dos

Vereadores apontara vultoso nJmero de "processos por

charlatanismo, curandeirismo e prâtic* ilegal da medicina) e nas

indmerol capelas clandestinas. Eles PrcclBavam ser enfrentados


a bem de que o povo não se afastasse c|q reto caminho.

Apesar de o bispo diocesano e seus seguidores tenderem a


simpl if iccar o >roblema, reponsabii Brando - mesmo que
ind iret ament e — o )ispo emérito como a fonte das dificuldades
que afetavam sua :ircunscrição, era indicutfvel que pequena
abertura parecia penetrar na diocese, deixando espaço para

428
deslocamentos saluteres, prenunciadores de atitudes mais

otimistas. A morte (presente nas ameaças anônimas ao bispo ou,

simbolicamente atuante na interrupção da missão dos

tradicionalistas) parecia, finalmente, começar a ceder lugar ã

vida.

Para não escravizar o texto ãs metáforas or gan ic lst a s ,

(de nostálgica memória), ou ainda a um envolvimento (até

possível) com a visão esperançosa do cristianismo, vale frisar

que outros fatores oriundos de diferentes domfnios estavam

ativamente dinamizando o processo, impedindo a dimensão

religiosa, que interessa aqui, de sucumbir por isolamento a

ester i1 idade.

Que fatores, externos e internos à Igreja estão

presentes nessa mudança de contexto que, por distorção de dtica

da posição ocupada, por vezes, tornam-se imperceptíveis? Pou um

lado, é possível distinguir aqueles realtivos ao clero ou aos

fiéis. Em t ermos de Igreja, con siderar os tres planos:

un iversai , onde a con soli dação do papado de João Paulo II

desenvolv ia -se em me io ãs suas t en soes própr ias? em termos

nac iona is , as questões relat ivas ao cresc imento de uma forte e

ameaçadora vertente int er pret at iva r que era a Teologia da

L ibert ação; quanto ã 0 iocese de Campos, o conflito ac ima

descrito. Ainda internamente, é impossível não considerar a

problemática relação entre a dimensão religiosa e a secular,


introduzindo complicadores no relacionamento.

429
Desviando o olhar da Igreja, há que considerar

leigos, enquanto fi^ls organizados e vinculados â institulc*0

Wfcs que também são distintos do clero; os fiéis em geral; °®

adeptos de outros credos; os que dizem escapar aos diferentes

credos. E tudo isso considerado nos miiltlplos planos da vida

s°cial, enfatizando o indivíduo ou a sociedade e pensando na

Perspectiva que gr ifa a relação e não os elementos que

arb itrariamente são identificados.

Dessa massa energética complexa, relevam-se certas

Produções objetivamente articuladas à determinados pontos, mas

cujo movimento com o todo deve ser, pelo menos, lembrado. Quero

me referir agora a algumas dessas resultantes que, tão logo se

concretizam, passam a ser pontos de sustentação, referenciais ã

novas decisões e, a despeito de sua aparente singeleza, quando

tomadas isoladamente, são á causa e efeito da dinâmica social.

F»ela ótica do novo bispo, onde a secularização reinante


era decorrência da PrGss^0 cau5ada pelo clero t r a d i c i o n a l i af
era possível perceber 3 e ventos mais amenos começavam a sop^ar!
afinal, não só sua doiQrosa tarefa estava chegando ao termo Com0

também, após tanta luta, ió seminaristas, no Seminário


Arquidiocesano de São j OS(í , preparavam-se para vir colaborar com
o rebanho do Senhor.

con) o inundo oficie*!* os

430

■MQMKT.
mmmm

representantes do Estado, a administração pdbllca, multo»

projetos sociais de iniciativa Privada, eram recurso»

disponíveis para utilizar, in ic ial mente, na implantação de

Planos Pastorais, sustentados por ainda frágeis pernas

inexperientes, mas com tendência ao crescimento. Fort? lec lam-se

os pontos existentes, consolidavam-se relações tíbias,

projetava-se com mais ousadia.

Em termos religiosos, o apoio constante das ordens

existentes foi fundamental, mesmo que se restringisse apenas a

não introduzir novos problemas. Mas abriam-se relacionamentos

que possibilitavam a superação da carência de padres,

inauguravam—se convênios com outros missionários, brasileiros e

do exterior. As Associações leigas, em grande parte prestaram

obediência ao Bispo, e as novas sociedades, tão ansiosamente

aguardadas por alguns encontravam terreno para se desenvolver.

Crescem assim os Movimentos de Jovens, de Casais, Cursi1hist as ,

agora com estímulo diocesano.

A aliança com D. Eugênio Sales, pessoalmente de longa

data, que demonstrara a validade desde o episddio do enfarte,

quando o Arcebispo do Rio providenciou a vinda de D. José

Palmeira Lessa para realizar as cerimônias da Semana Santa,

apresentava-se como
fonte e aval de expansão de uma rede que
<17 >
incluía importantes nomes do episcopado nacional.

Dentre o desenvolvimento gradativo que a d iocese


apresenta» destaco apenas dois pontos! a instalação do Carmelo

São José, em 24 de agosto de 1986, obrigando nove monjas de vida

contemplativa e a instituição da feira do Salvador, réplica da

Feira da Providência, inaugurada em 6 de agosto de 1987.

Em termos de clero, além da chegada de padres que o

processo de substituição tornara ainda mais premente, cabe

frisar não só as ordenações realizadas na Basílica Menor, como

as dos padres Vicente Osmar Batista Coelho (1985), Luiz Carlos

Amorim (1985), Adermirson Nazário(1987), José Carlos Fernandes

(1988)e Oto Campos Braga (1988); como também a valorização de

padres atuantes na diocese agraciados com o título de Monsenhor,

como os Pes. Joaquim Ferreira Sobrinho (Chanceler do Bispado) e

Roberto Guimarães (Reitor do Seminário Menor Maria Imaculada) em

1987 e Olivácio Nogueira Martins (Pároco da Catedral) em 198J.

0 reforço da rede de D. Navarro, coerente com a

tendência que vem marcando o atual papado, expressa-se ainda na

elevação ao cardinalato de D. José Freire Falcão, Arcebispo de

Brasília e presença antiga nas atividades diocesanas de

Campos, o que deve explicar também, a transferênc ia do bispo

"conci1 iador" para a Arquidiocese de Niterói, na qualidade,

portanto, de Metropolita, já agora em 1990.

E preciso, porém, que tantos dados positivos não levem a

pensar que os tradicionalistas, neste processo, seguiram de

derrota em derrota. Se a perda de legitimidade afetou, sem

432

âHMÍliÉÉi
diiv i da o trabalho diocesano, por outro lado o processo de

exonerações c o b r i u alguns padres de uma aura de santidade que os

tornou, talvez, mais in-Pluentes em algumas paróquias e com

alguns gr u p o s .

Do p o n t o de vista organizacional, do precário início,

quando os dest itu idos eram alojados caridosamente em qualquer

espaço disponível - fosse uma garagem vazia, um cinema

desativado ou qualquer outro cômodo - atd hoje, as

transformações são visíveis. Presentes nos mesmos lugares, ou

circulando entre as "paróquias" atuam não sd regularmente como

em franco p r o c e s s o de expansão»

Para isso contribui a rede de aliados com que já

contavam, constituída principalmente de proprietários rurais,

gente f o r t e dos comércios locais, e mesmo figuras H b l i c a s , que

não podendo apoiei— los of ic ia 1ment e , funcionaram como mediadores,

individualmente, canalizandci recursos (materiais, humanos,

simbdlicos> para as m u itas necessidades daqueles que perderam o

estatuto que lhe possibilitava o acesso a certos bens. Foi nesta

conversão do oficial em oficioso que as relações puderam ser

mantidas, pr e s e r v a n d o — se alguns valores caros e consagrados pelo

tempo mas que, circunstancialmente, vinham sendo orb 1 11 erados.

A c r ise, que favoreceu o posicionamento intransigente de

alguns paroquianos, resultou numa ma ior qualificação dos que

permaneceram fidis, por um lado, fazendo aumentar os quadros

433
pre-ex ist entes <a Pia União das Filhas de Maria, por exemplo, 4

hoje praticamente uma asaociacão tradicionalista) ou

transformando parcelas de leigos em novas sociedades.

Atualmente, quase cem religiosas distribuem-se pelas

"pardquias", colaborando com os vigários.

Certas associações de leigos, fadadas na igreja oficial

c» estagnação, e consequente descenso, fortalcceram-xe porque

continuam sendo, na igreja tradicionalista a ilnica forma de

participação dos leigos. Para homens e rapazes, a Liga Catdlica

e a Congregação Mariana? para senhoras e moças, o Apostolado da

Oração e a Pia União das Filhas de Maria? para as crianças, a

Cruzada Eucari'stica - estas sociedades proseguem sendo um lugar

de prática religiosa, vida social e referencial da identidade.

No plano intelectual, o processo mostrou a importância

do aprofundamento doutrinário, que gerou a prática de reuniões

mensais para o estudo e discussão de pontos da Teologia e do

Direito Canônico. Ao mesmo tempo, promoveram—se cursos de

formação para diversas categorias de leigos, onde grupos de

rapazes tèm círculos de estudos doutrinários em suas paróquias e

anualmente se reunem em grandes encontros. Da mesma forma, há

palestras para casais catdlicos e um. curso de formação de elite

catdlica, com aulas de Filosofia, Histdria e Francês, orientado

pelo Pe. Fernando R ifan .

Em termos de templos, já foram inauguradas quatro

43 4
igrejas e mais de trinta capelas, havendo mais oito igrejas em

construção e algumas capelas espalhadas pelas paróquias. Quanto

ao pessoal para dar sentido a esta expanssão, o grupo conta com

três padres ordenados durante o processos os dois primeiros,

ainda no Seminário de N. Sra Corredentora (em La Reja,

Argentina), o dltimo em Varre-Sai, ordenado por D. Mayer. Além

das atividades religiosas propriamente ditas, o grupo dedica-se

aos colégios católicos (existentes agora em quase todas a®

"paróquias"), aos dispensários, associações beneficentes,

orfanatos (dois) e asilos de velhos (dois).

A coincidência cronológica da crise entre o Vaticano e

D. Lefêbvre, com a crise interna da Diocese de Campos, aproximou

ainda mais os dois bispos, cujo intercâmbio doutrinai era, no


entanto, anterior á década de 80. Alguns leigos, principalmente

aqueles também envolvidos com a TFP, estavam já familiarizados

com o tradicionalIsmo francês, assim que a excomunhão decretada


kqueles dois bispos e mais aos outros quatro que eles sagraram,

era esperada, embora, segundo eles, inválida.

Se a aliança com a TFP ('formalmente rompida por D. Mayer

em 1984) deve ter representado uma forte base de apoio


econômico, sólidas raízes deve ter deixado. Por isso a simpatia
ou antipatia no espaço rural, na medida em que a população tem,

em relação àquela sociedade, um sentimento ambivalente* é


pr incipalmente naquela região que são recrutados os meninos que

433
al imentam os quadros cada vez mais difíceis de reproduzir embora

muitas famílias desaprovem os métodos utilizados por aquela

inst itu ic ã o .

A repercussão da ruptura de D. Mayer com a TFP, como a

maioria dos fatos que envolveram aquela sociedade* foi guardada

com zelo, o que não impediu a circulação de duas versões

explicativas! a primeira, mais religiosa, remetia á condenação

de D. Mayer á veneração que o dirigente máximo da entidade,

Plínio Corrêa de Oliveira, vinha devotando à mãe dele mesmo, D.

Lucília, transformada em objeto de culto? a segunda, mais

pragmática, referia-se â mágoa de D. Mayer, que por tanto tempo

promovera a sociedade e ao constatar que afinal ela não deu a

devida divulgação quando da assinatura do documento encaminhado

ao papa, em co-autoria com D. Leffcbvre, em dezembro de 1983, o

"Manifesto Episcopal", onde os dois alertavam João Paulo II dos

perigos da "auto-demolição" da Igreja.

A excomunhão conjunta, no entanto, reforçou os laços dos

tradicionalistas brasileiros com os europeus, com um maior

intercâmbio entre padres da Diocese de Campos e aquela parte do

clero ligada a Fraternidade São Pio X e suas sucursais.

Internamente, verifica-se também a expansão, com a presença

regular de padres tradicionalistas celebrando em outras cidades,

como o Rio de Janeiro, Volta Redonda, São Paulo e Santa Maria,

no Rio Grande do Sul-

436
Se é possivel d iser que o drama da Diocese de Campos

alterou profundamente a vida da Igreja localr é preciso dizer

também que não menos afetada foi a vida dos leigos e dos fiéis.

Agora basta frisar que o processo, ao desdobrar-se em novas

situações, e de crescimento visível, reintroduziu não sá um

equilíbrio (sempre tão desejado) como mostrou que é desses

dramas (quase sempre temidos) que se constitui a vida social.

VI. 4 - Sentimento, Tradição e Trad lc Ional Ismo

Do que foi anter iormente dito, ressalta a idéia de que a

noção de sentimento não é um atributo psicoldgico, embora seja o

indivfduo que o atualiza, portando-o como a um bem que é

coletivo, comum, ligado ã famriia e assimilável à religião. 0

indivfduo, essa categoria moderna, dilui-se no valor comunitário

mais amplo que o gerou e o sustenta pelo qual cada um é


responsável.

Pecaminosa é a exarcebação da individualidade que


afronta a prevalecente coletividade, cuja NteBlaxia e
terapêutica estão a cargo da famflia e da religião. A primeira,

inculcando o sistema de valores que circunscreve o indivfduo no

padrão pretendido? a segunda servindo de aspiração para a

manutenção do mesmo e perdoando aqueles que não o levam em

cons ider ação ■

437
Dessa maneira, forma-se na comunidade ura modelo onde a

continuidade é um aspecto básico, sinônimo de tradição e

constrangedora dos comportamentos. Nestes termos, qual a margem

de manobra para a emergência da diferença sem que a posa fvel

inovação introduzida caia na marginalidade imposta por modelo de

fronteiras tão definidas ?

Este espaço existe, pequeno porém resguardado pela

formalidade que envolve os relacionamentos e propiciado pelo

fato de a famflia poder ser estendida praticamente à toda a

população, confundindo-se de certa forma com o territdrio e

assim criando sub-redes capazes de aglutinar e proteger os

"estranhos" sem que eles escapem ao plano mais geral. Ao mesmo

tempo, as reivindicações são s ingelas , até por conta dos

recursos concretos que o local oferece para a introdução da

nov idade. Talvez que uma transformação radical - como o fenômeno

da emane ipação — altere est es fat ores e com el e s , o quadro

vi gente.

Um recurso cultural que equilibra esta tensão se situa

nas muitas celebrações já comentadas. Elas aliviam o peso de um

certo ar sufocante que se abate sobre a atmosfera ambiental,

leve e fina, tfpica dos lugares com aquela altitude. Funcionam

como válvula c!e escape para diminuir a pressão, possibilitando a

absorção de papéis que fogem ao modelo ou situações que náo se

encaixam no plano ideal.

438
Parece-me que é por ai que se comprende a coexistência

com a homossewual idade, d ic id idamente uma opção que não encontra

espaço nem no modelo de família fechada, nem no modelo da

Igreja. Alguns exemplos masculinos, menos discretos que os

femininos que podem se ocultar sob as vestes pesadas dos hábito»

para-religiosos ou do rigorismo moralista, são notdrioss é a

figura que se torna indispensável à montagem artística de

algumas festas, o que se dedica ao embelezamento das mulheres,

elevando-as (e o local) ã condição de "pessoas na moda",

"atualizadas", com o que vai pelo mundo - sem ser o mundo, ou

ainda agregando-se a determinadas famílias ou mesmo a Igreja

onde podem exercer sua paixão pela culinária, atividade vista

como tipicamente feminina.

Assim, a parcela de varressaienses que corajosamente

enfrenta os costumes sem abrir.mão do seu legítimo direito de

direcionar sua vida e o uso do seu corpo, conquistou um espaço

que favorece a dinâmica da mudança, à despeito da grande força

que trabalha no sentido da continuidade. Na verdade,

reabsorvidos pela sociedade, o exercício diferenciado da

sexualidade nao aparece como questionando a ordem familiar,

portanto, não rompe com a cadeia de transmissão destes mesmos

valores que a famíl ia e a Igreja guardam.

Tal acolhimento, que não pode ser tido como uma

compreensão plena, mas que esconde a discriminação atrás de um

439
■HnM HHVHBBBH

acordo tácito de não fazer julgamentos pdblicos aponta ainda

para a importância da família: seja porque afinal, há reais

relações de parentescos, seja porque assim agindo condena-se de

fato a dimensão mais perigosa, a lubricidade que acompanha a

vida sexual. Ela é que é condenada, enquanto abandono do homem

a seus desejos sem freios, os quais atingem inclusive membros do

clero. Çomenta-se com horror os olhares de cobiça que um pároco

dirigia ás meninotas que perambulavam pela casa paroquial

fazendo pequenos serviços ao Sr. Vigário...

A emoção e a incont inènc ia que ela pode gerar é que são

perigosas, razão pela qual há que r it uai izá-1 as nas muitas

festas oferecidas, ocasiões em que podem eclodir dentro de

limites previstos, aceitos e justificáveis sem arranhar o modelo

que não admite contestação. Guardada a tradição, pode-se seguir

a vida como uma "pessoa de sentimentos", sempre sem ameaçar a

ordem imposta e desejada.

A dimensão de continuidade, contida na tradição,

confunde-se com a manutenção não-mod if icada dos bens materiais e

dos costumes, numa valorização do antigo que reforça a

particularidade do lugar, em oposição ao resto do mundo, onde o

"novo" é supervaiorizado e responsabilizado pelas dificuldades

que a sociedade enfrenta.

Nesse sentido, todos são tradicionais e aproximam-se do

discurso do bispo emárito, quando invectivava contra a


modernização do mundo e da Igreja. Mas nem todos, embora

apoiando a continuidade em termos culturais, se Identificam como

tradicionalistas. Assim, o movimento tradicionalista, em Varre

Sai foi um exemplo de mudança, propiciada pela determinação

eclesial externa e alimentada pela contante tensão que o local

acalenta desde que se define como um bastião da tradição.

Por isso que o grupo "tradicionalista", num espaço em

que todos se orgulham de ser tradicionais, representa uma

espécie de excrecência, exacerbação da dimensão religiosa sobre

a cultura geral (onde a religiosa está contida) e sendo

portanto, passíveis do perdão. Tal atitude, que tende a

reabsorver os tradicionalistas no grupo mais amplo, é uma

espécie de movimento de condescendência àqueles que com

impetuosidade exorbitam da sua condição d_> católicos. Atitude

ainda católica, coerente com a maneira inclusiva que a Igreja

sempre desenvolveu a bem de manter sua unidade em meio a

diversidade cultural, resulta por reforçar o imaginário local

onde a comunidade aparece dotada de sua real ambiguidades

território do santo habitado pelos homens, que cabe defender e

resguardar em nome da tradição.

44i
N0TA3

^ - Em The Fate of Shechem Pitt-Rivers analisa a noção de honra,


a qual se embasa em tres princípios» o da hierarquia, o da
exogamia e do sagrado. Noção multifacetada, é sempre
paradoxal em seu uso.

2 - Estou usando a noção de área Mediterrânea de acordo com


Pitt-Rivers (Í977), que frisa a sua distinção com relação ao
de área cultural. 0 termo Mediterrâneo é usado por ele com
flexibilidade, sendo teoricamente possível relacioná-lo em
sua distribuição geográfica, enfatisando as caracter i'st icas
estruturais gerais das comunidades mediterrâneas, a saber»
forte coesão moral; ausência do contraste campo/r. idade;
significância de classe soe tal; formas de exploração
agrícola e de comércio e suas mdltiplas variações.

3 - Muitos sobrenomes italianos são encontrados no lugar» Fabri,


Paulanti , Giovannini, Gri11o, Rodolphi <e Ridolphi, grafia
adulterada da anterior, perpetuada pelo uso), Pulitini,
Pendia, Gallo, Bernini, Righetti, Pellegrini, Allessandri,
Murucci , Fittarone, Pirosi, Marceiini, Fratejani, Gorini,
Tupini e outros. Eles começam a aparecer no noticiário desde
a década de 30, quando alguns dos imigrates da leva de 1904
ganhavam algum destaque ou seus filhos alcançavam
notoriedade em atividade menores, como na Banda de Miísica.
Nos documentos do cartdrio, salvo duas execeções, eles não
constam entre os notáveis do lugar, o grupo que promove a
instalação da luz, discute questões políticas, organiza-se
na Sociedade dos Amigos de Varre Sai (que impulsiona . na
década de 50 a instalação do Hospital de S. Sebastião).
Aparecem, no entanto, como membros das Associações
Religiosas, como benfeitores da Matriz, ou mais tarde como
fortes comerciantes de grãos. A importância dos italianos no
âmbito religioso éassinalada por Brandão (1985)» elas
"foram absorvidos com mais facilidade pelo controle da
pardquia do que os camponesees nativos(...). Os colonos
europeus devem ter colaborado de modo decisivo na
romanização do catolicismo oficial em Itapira. Com crenças e
formas de culto semelhantes ás dos camponeses do lugar,
porém 'mais puros' aos olhos do clero, eles trouxeram novos
santos padroeiros(...> e mais do que tudo, uma moderada
atitude de equilíbrio entre a autonomia da prática religiosa
e a aceitação das regras de crança e culto..." (Brandão,
1985» 46) .

442
A C o n g r e g a ç ã o para as causas dos Santos é o órgão da Ciir ia
Romana e n c a r r e g a d o de reconhecer e canonizar determinados
fiéis. Devido a importância dos santos para a Igreja,
destina-se ele a garantir a autenticidadee dos representes
desta c a t e g o r i a e propo-los à imitação dos fiéis. Ocupando-
se das causas dos servidores de Deuss sua introdução,
processo canônico, exame dos escritos, julgamento da
heróicidade e todas as complexas operações que l evam ao
julgamento final dos cardeais. A relação é sempre submetida
ao papa que preside pessoalmente a congregação geral, assim
como proc e d e ao rito solene de canonização, decretado em
consistdrio, para sublinhar sua importância. Aspecto
s ignificativo destes cuidados foi o fato de conferir, pela
primeira vez na história, o título do Doutor da Igreja a
duas mulheres: Sta Teresa de Avila e Sta Catarina de Sena,
em 5 de m a r ç o dee 1970. 0 atual Prefeito desta C o n g r e g a ç ã o é
o Cardeal  ngelo Felici. (Cf. Pou p a r d ,í981).

De Cruz da Ana se diz que o primeiro milagre r e a l i z a d o foi


ter conduzido as autoridades na verdadeira direção do
assassino, possibilitando assim sua posterior condenação.

A r e c o n s t i t u i ç ã o da construção da categoria tiuctíliCQ feita


por W i l l i a m s pauta-se na anãlise da literatura inglesa do
s é c . XVI a t é nossos dias. 0 autor demonstra a historicidade
dos val o r e s que foram sendo atribuídos ao campo, por
oposição à cidade, e que continuam exercendo um fascínio
particular. Provavelmente a força desta valorização p o s i t i v a
advém desta longa inculcação, que com a modernidade se
refratou para todo o universo.. Além disso, como nos espaços
não citadinos o homem med iat iza sua relação com o cosmo
através de elementos pouco ou menos manufaturados, d ã — se u m a
maior p r o ximidade com as concepções de natureza que o
ocidente vem secretando. 0 simples fato de ser o polo o p o s t o
da vida na metrópole, apesar dos valores desenvol vimentist as
que de a l g u m a forma afetam o perfil do campo, este continua
como que d otado de pos it iv id a d e , livre das pressões dos
grandes aglomerados.

"Raça", a ssim como "nome de família" e "sangue" são


categorias p r i v i 1egiadas para compreender a família e n q u a n t o
s ist e s imbdli c o , performando mecanismo de c oesão e
cooperação, sem estar exclusivamente preso a c r it ér ios
ut i1 it ar ist as . As tres categorias circunscrevem a percepção
de parentesco que tem como relação definidora a ênfase na
consanguin idade, Mas enquanto "sangue" r emete ã
consanguin idade, 'nome de família" atua const itu indo a
percepção do que seja a pessoal; e "raça" aponta para a
percepção e cod if icação da af in i d a d e .

443
0 - No caso brasileiro, e não diferentemente em Varre Sai, os
papéis sociais dos membros de uma família, no plano das
avaliações, impõe sv distinção complementar entre masculino c
feminino. EI ela é central: "A mulher é Integralmente
referida l\ família e ao lar. Os papéis significativos são os
de mãe e de esposa. A mulher assim definida, surge como
símbolo do lar, da moral doméstica. 0 homem aparece referido
ao domínio ptjblico, aos 'negócios'. Nesta medida, ó
associado ao mundo exterior, e surge como elemento que
realiza a mediação entre o plano doméstico e o páblico.
Engloba a mulher e a caso e deve controlar a relação da
mulher com o mundo externo" (Abreu, 1982:104).

9 - Dada ainda a situação concreta regional, que subdivide o


local em roça e cidade, opera-se uma part icul ar idade que,
mesmo partilhando já de um modelo menos restritivo para as
mulheres, ainda assim reproduzem o modelo ideal. A maioria
das mulheres que trabalham, o fazem na escola, estendendo
sua atividade de educadora e guardiã moral a outros filhos
que não os seus prdprios, Além disso, há poucos casos de
mulheres à frente de pequenos negócios, em geral comércio,
mas enquanto auxiliares de marido ou substituindo este, por
ausência ou falecimento.

10 - "A análise da legislação sobre a família nos períodos de


1930 a 1964 indica a permanência do modelo jurídico familiar
que se mostra funcional, seja nos momentos de autoritarismo,
seja nos de redemocratizaçáo. Tal modelo funda-se na
assimetria sexual e geracional, incentivando a procriação e
centralizando todo o poder na figura do eatec. família-
Trata-se de um modelo autoritário, que serviu de substrato
às analogias entre Várgas e 'o pai dos pobres', entre a
necessidade de coesão da pátria e a necessária e 'saudável '
ordem familiar" <Linhares,op.cit.:109) .

11- Diz Carlos Brandão (1990a): "... os direitos quase


indiscutíveis dos pais sobre os filhos são apenas a
contrapart ida de uma regra básica quee obriga os pais a um
permanente estado de submissão ao cuidado e á proteção dos
seus filhos. Independentemente das razões sociais e
econômicas em nome das quais a família camponesa tradicional
é ainda numerosa e desenvolva, mais do que qualquer outra
estratégia para se manter coesa e concentrada sempre que
possível, é importante lembrar que simbolicamente ela se
reveste de um perfil de sacralidade muito intenso. Isto não
apenas Iorque ela é o lugar onde os conhecimentos rásticos
da fé e as normas do ethos e da ética camponesa devem ser
transmitidos e vigiados com rigor. E também porque se
entende - algo que a vinda para a cidade atenua muito - que
a família humana é uma espécie de réplica da sagrada
família. Isto porque, se o cor.BUS de seres e situações
sagradas é pensado através de uma ldgica relacionai de

444
jogos de papéis cujo melhor modelo é o do parentesco e o de
grupos de idade, a unidadee mais prdxima da metáfora do
estado celestial de perfeição é a família. A tal ponto que
para muitos camponeses, nos céus Jesus Cristo, De u s - F i l h o d»
Santíssima Trindade, segue sendo plenamente filho de Mari a-
e-José, neto de Santana e São Joaquim, afilhado de São João
Batista. Reza-se a 'Nossa Senhora" para que ela interceda' a
seu filho amado', porque ela segue sendo, ativa e
plenamente, 'a mãe de Deus"' (Br andão,1990a :2i ) .

í2- 0 Tribunal da Rota Romana se originou dos auditores que


assistiam o papa e foi dotado de um regulamento particular
em 1331, por João XXII. Com sua competência determinada em
1747 por Bento XIV, precisada em 1EJ34 por Gregdrio XVI e
codificada por Pio X em 1908, os auditores da Rota são
nomeados pelo papa, je o mais velho dei es exerce a função de
deão. Julgando por turnos de tres auditores, ela é
essenc ialmente um tribunal de apelação de causas já j u l g a d a s
por tribunais ec 1 es iást ic o s , em particular demandas de
reconhec imento de anulação de casamento, tornando-os nia is
agéis e menos caros, pelo Motu Propr io "Causas
mat r imoniales" cie 26 de março de 1971. (Poupard, 1981:103).
Coincidentemente, o atual bispo da Diocese de Campos. D.
João Corso, que substituiu D. Navarro em 8 de deze m b r o de
1990, presidia este importante tribunal da Ciir ia Romana.

13- Segundo WacUenheim <1977), a publicacao da Humanai s V i t a e


provocou uma reação de rejeição mais ou menos ostensiva.
Ora, por ocasião da convocação Io Concilio Vaticano II, doi s
tema eram espec ialmente polêmicos: o do celibato sacerdotal
e o do planejamento familiar, e i>éc ie de fiel da balança que
mostra a tensão na alta oipula da Igreja entre cor r r ent. es
mais conservadores ou mais progressistas. A eles assoe ia v a -
se ainda o posicionamento de Paulo VI quanto á condução
daquele encontro. De acordo com Beozzo, al i se podem ver os
indícios de uma reação conservadora, clesde que o papa Paulo
VI "Ao não confiar que a Assembléia Conciliar, constituída
por todos os bispos, fosse a boa instância para a discussão,
esta era transferida para os drgãos da Ciir ia Romana.
Transferiu-se a discussão de üma instância, que gozava
naquele momento da máxima legitimidade na Igreja, para o u t r a
que esta sendo vivamente questionada nos seus métodos e
orientações! a Cdria Romana. De certo modo, não se confiou
no concilio ou acreditou—se que ele iria em direção oposta
àquela que certos meios romanos achavam ser o mais prudente.
0 problema da continuidade doutrinai aparece mais forte na
questão do planejamento familiar. 0 papa João XXIII em i963„
meses antes de sua morte, havia convocado uma comissão
internacional, com casais, moralistas, tecílogos, para
começar a tratar o tema da limitação da natalidade, do
planejamento familiar e da posição da Igreja na questão da
ética, da sexualidade e da família. Paulo VI retira do
concilio a discussão, amplia esta comissão que vai
trabalhando ao longo de cinco anos. Ainda que a u m e ntasse o

445
ruímero de pessoas, f o i-se chegando a um consenso, Mais de 9CX
desta comissão aconselhou ao papa que a igreja não só

aceitasse o planejamento •familiar, mas consagras®® o


deslocamento do ei«o profundo da questão matrimonial* do*
fins do matrimônio como procriação r remédio ã
concup iscência (como dizia Stu Agostinho) para o e i>co do
amor, e um deslocamento do ei ao da natureza para o d»
pessoa. A ética deriva não da natureza, mas da pessoa e da
liberdade. Esses eram os dois deslocamentos fundamentais que
permitiam o uso dos contraceptivos, sem criar um problema de
conflito ético. A comissão se define por esta posição. Houve
um grupo que ficou em minoria absoluta (Ford e Kelly, dos
Estados Unidos) e procurou Paulo VI, dizendo-lhe que se
assumisse essa posição estaria provocando uma ruptura na
Igreja, de continuidade na doutrina, desautorizando a "Casti
Conubi i de Pio XI, e isso ter ia efeitos desastrosos sobre a
autoridade papal e sobre a questão tia ética dentro da
Igreja. Nds teremos assim uma coisa muito híbrida na
"Humanae V i t a e " . Ela afirma as posições da maioria no seu
preâmbulo e na orientação de fundo, que é a ética da pessoa
e da prioridade do amoi como e iko dentro do qual se deve
trabalhar a ética matrimonial. Na segunda parte, porém,
reafirma a doutrina tradicional, numa ética não da pessoa
mas da natureza, não do amor mas da llel natural ' quase
identificada com os ritmos biológicos, aí vistos como
intocáveis, numa ética baseada na prioridade da procriação,
não como um projeto dentro do matrimônio, mas como um
proccesso onde cada ato deveria estar orientado à
procriação. Ao afirma que não se pode ir contra a natureza,
fecham-se as portas do uso de qualquer método artifical de
controle da natalidade. Há a í uma profunda contradição, pois
a teoria é a da maioria e o agir prático é o da minoria"
(Beozzo, í990*9ss).

- Neves, no ensaio "Mendigo* o trabalhador que não deu certo",


destaca o papel da família enquanto fundamental para a
reprodução social do trabalhador. Do apoio no período
inicial da entrada no mercado, quando o assalariado adianta
ao empregador a utilização de sua força de trabalho, à
constituição e manutenção de um conjunto de relações
sociais, valores e crenças; â adequação do consumo aos
rendimentos obtidos; estas funções terminam por gerar a
representação de que ser bom trabalhador é ser também um
bom chefe de família. (Neves, 1933 *20 a 36).

'Se a Igreja dita Progressista em Varre Sai limita-se a


organizar os fiéis nas associações mais evangelizadoras, a
ação dos chamados Tradicionalistas retoma, com vigor, a
dimensão assistencialista. No edifício mesmo da igreja de N»
Sra das Graças está planejado o asilo para idosos e está em
funcionamento um colégio que permite uma educação Primária
nos velhos moldes. Tal procedimento verifica-se também em
outros municípios da diocesee, tendo algumas dessas
iniciativas d e s l a n c h a d o antes da crise de substituição do
bispo. Na igreja oficial, mas basicamente restrita a C a m p o s ,
D. N a v a r r o d e s e n v o l v e u as primeiras pastorais, nos moldes
daquelas e x i s t e n t e s na Ar qu id iocede do Rio de Janeiro.

16” A d e s p e i t o da força da confissão auricular como mecanismo


c o n t r olador da vida sexual, pr inc ipal ment e entre as
mulheres, as concepções de sexualidade veiculadas pela
Igreja são r e l a tiviradas pelos fiéis, como mostra Macedo
(1990). No seio do catolicismo 1uso-brasi1eiro ter ia se
deseen vol v ido a idéia de que esta questão, sobre a qual
pouco se fala, é de âmbito estritamente pessoal, raciocínio
que se alimenta ainda na possibilidade do perdão que o
cat o l i c i s m o of e r e c e ao pecador.

17- S o b r e e s t a r e d e v e j a o e l u c i d a t i v o a r t i g o de S a m y r a Brollo
Crespo, int i t u l a d o " B o l e t i m da R e v i s t a d o C l e r o s um olhar
sobre a estruturação ideológica neocoriser v a d o r a da
Arquidiocese d o R i o d e J a n e i r o " in C o m u n i c a ç õ e s d o I S E R no
34 (Ano 8 - 1989, =22 a 29).
CONCLUSRO

A crise na Diocese de Campos foi fruto da tensão

existente entre grupos da Igreja que enfatizavam aspectos

doutrinatários diferentes mas cuja compreensão ultrapassa os

limites de um debate teológico. Está ligada, portanto, a uma

crise maior da Igreja, o chamado modernismo, que incide sobre o

modo pelo qual a instituição administra sua atualização no

mundo contemporâneo e, ao mesmo tempo, como o imaginário leigo

participa desse processo.

No plano eclesiático, as expressões particulares das

crises caracter íst icas da Igreja no modernismo põem em evidência

tensões estruturais daquela instituição, configurando situações

concretas onde ressalta a questão da autoridade, tão duramente

abalada com o irreversível processo de secularização que se

instalou na sociedade ocidental nesta fase que é denominada

"modern idade".

No plano secular a questão possui outro peso, mesmo para

aqueles que se definem como religiosos! a densidade dos

problemas desliza para a dimensão do cotidiano, em função da

distância que separa o corpo dos fiáis das filigranas

teológicas. Tambóm aqui é muito importante, na medida em que a

Igreja tem sido um centro difusor de valores e princípios que

regem a sociedade. Assim, mesmo que a participação dos fiáis

5eJa minorizada em virtude da estrutura hierárquica que informa

448
a Igreja, ela n ão deixa de realimentar o debate ex ist ent e

constituindo uma força da qual a Igreja não pode prescindir.

Rompida a unidade no seio da Igreja, a divisão da

população entre adeptos de um ou outro lado, denunciou apenas

que ambas não podem prescindir da mesma, sob pena de perder sua

identidade. Paradoxalmente, os termos aplicados aos dois

grupos, punham de novo em evidência a distância que separa o

catolicismo erudito daquele ali vivido realmente. Os chamados

Progressivos recuperam a antiga prática, veiculada pela família,

atualizando uma religiosidade antiga, tradicionalmente presente

em suas vidas. Os ditos Tradicionalistas, apegados ao ri gor

clerical imposto por C>. Mayer, caminham na direção de uma

exigência por coerência prcfpria da modernidade, que tanto

condenam em certos aspectos.

Da tradicional comunidade católica que se pensava uma

família resta agora dois grupos que se hostilizam, rotulando o

outro de fanático (porque de tradicional passou a

tradicionalista) ou hereje (porque aderiu as novidades

introduzidas na "Igreja de Sempre"). E como fica a família

terrena, quando seus membros se dividem por estas facções e com

isso ameaçam o princípio de solidariedade que sempre foi tido

como os informando?

Passada a fase mais dolorosa da crise, a comunidade viu

reproduzida na sua própria carne a ambiguidade típica da vida

449
social* as tensões entre diferenças que devem ser

compatibilizadas, entre papéis consagrados mas nem sempre

acatados com satisfação, entre o plano dos ideais e o plano das

contingências, entre forças centrífugas e centrípetas que

promovem a vida. Longe de sucumbir ao abalo que lhe sacudiu as

entranhas, Varre Sai continuas estão aí as festas a dize-lo.

Do ponto de vista do fiel, mais agudamente observado na

localidade de Varre Sai, a reação ao episódio foi de obediência

aos padres e aos costumes tradicionalmente adotados. Os

relacionamentos sociais, sempre referenciados ã unidade familiar

(biológica ou social), foram marcados pela fidelidade ao antigo

pároco ou ao seu substituto, segundo os mesmo critérios.

Subjacente a uma argumentação eclesioldgica, assimilada durante

o longo processo de substituição do clero, repousa a autonomia

da opção em termos de experiências anteriormente vi vencíados e

profundamente recordadas.

As transformações nos costumes - nem sempre adotados mas

banalizados pelos meios de comunicação de massa - eram a pedra

de toque de um posicionamento dito "trad ic ional ista^v 0 caráter

ameaçador daquelas mudanças eram neutralizadas, por quem aderia

aos "progressistas", em nome do progresso que, de alguma forma,

se introduzia na vida local. Velhas rixas reforçavam os

argumentos que, no entanto, deixavam intocãvel a questão

central, que era definir os rumos que a Igreja vinha tomando. A

ausência de uma corrente realmente inovadora tendeu a limitar o

450
problema nos quadros da idiossincrasia de cada um. Nestes

termos, ocorreu uma identificação daqueles que mais temiam as

mudanças com o grupo tradicionalista, e daqueles que sonhavam

com a modernização do lugar com o novo grupo, c o nstituído na

linha do clero dito moderado no Eirasil.

A veemência com que cada um defendia seu grupo e s c o r a - s e

em elementos do imaginário local, onde as relações típicas do

mandonismo rural puderam ser assimiladas, no plano religioso, a

um cruzadismo intensamente impregnado nos fiéis. Por isso

mesmo, ambas as partes se reconheceram como responsáveis pelo

destino da Igreja, na sua devida qualidade de pecadores, na o

poupando esforços no cambate aos ^tradicionalistas fanáticos ou

aos "progr ess ist as herejes////. De cada lado, poucos f iéis

buscavam um razonamento teolégico ou socioltígico para

relativizar a posição adotada.

Paradoxalmente, os chamados progressistas devolveram ã

comunidade o velho e familiar catolicismo 3 que estavam

habituados e cujo exercício se tornava por vezes penoso, dado a

intransigência da orientação diocesana. Embora s o licitados a

participar das associações leigas, estas agora ap a r e c i a m

renovadas em suas formas, onde os movimentos para casais ou para

jovens colocava o lugar em pé de igualdade com outras cidades

vistas como mais modernas.

451
Também p a r a d o x a l m e n t e , foram os "trad i c i o n a l i s t a s " que
introduziram uma radical idade na maneira de defender sua

posições, trabalhando um rigor racional e um planejamento

cuidadoso para alcançar os seus fins. Nesse sentido, foram

muito "modernos" na diligência com que, sempre guiados pelo

clero, organisaram-se na defesa de um catolicismo supostamente

romanizado - embora Roma não lhes tenha avalisado as o.Jetivos.

Se Foi a própria Igreja que colocou a problemática da

modernidade no lugar, esta foi aprovada e desenvolvida segundo

os padrões cultura is vigentes. quanto à part i<: ipação

d iferenc iada por sexo entre os fiéis. Ass im , a . reii g ios idade

cerceativa e controladora dos "tradicionalistas" encontrou forte

apoio entre os homens, enquanto as mulheres tendiam para a

corrente dita progressista. Enquanto nas cerimônias religiosas

desta corrente permanece o tradicional costume dos homens se

postarem na porta da igr»-ja © as mulheres frequentarem a

sacristia, na outra corrente a afluência de homens nos rituais e

trabalhos paroquiais é maior.

A atração das mulheres pelo grupo que representa a

hierarquia legítima e a dos homens pelo que const itu I uma


hierarquia dissidente aponta para o paradoxo que o conflito na

Diocese de Campos conformou: a explicitação de uma ortodoxia

d iss ident e .

45 2
A divisão observada aponta para a regra cultural de ob

homens apresentaram uma participação mais ativa e direta no

plano da história, enquanto a mulher se dedica a guardar e dar

continuidade aos valores proclamados pelos homens. Por este

mecanismo, que reproduz a relação de dependência e obediência

verificada no seio da família, a mulher conquista o poder e a

respeitabilidade entre seus pares.

0 quadro reforça o papel da mãe-de-famÍ1 ia como

mediadora exemplar das muitas individualidades presentes no

grupo familiar, auxiliando a digerir as diferenças particulares

de cada um, em nome da continuidade do grupo enquanto família,

isto é, membros interligados no espaço mas também ligados ao

passado e para o futuro. Com a divisão na Igreja, a forte

presença feminina entre os Progressistas talvez se explique como

uma tendência feminina em dar continuidade á cultura que, no

caso, é a preservação do modelo tradicional. E a grande adesão

masculina aos agora tradicionalistas se deva ao caráter heróico,

missionário, quase militarista, com que D. Mayer interpretou a

religião e a difundiu pelo mensário 0 Cato'1 ic ismo.

A preferência dos homens pelo tradicionalismo e das

mulheres pelo progressismo ~ que não pode ser, evidentemente,

absolutizada - pode repousar na experiência anterior vivida,

onde os filhos da elite local entravam em sintonia com valores

cavalheirescos e guerreiros difundidos pela TEP, e onde as

mulheres tinham seu espaço de atuação ainda mais limitado. Da

453
w m m MHBBB ■b h b b h h h m h

mesma forma, os rapazes das camadas subalternas encontravam


naquele r ist em de pensamento a justificativa para suas reais
desvantagens e, por vezes, eram cooptados para a sociedade,
configurando a positividade de uma estratégia de ascensão social
via carreira eclesiástica.

A imbricação da ideologia propagada pela TFP com a de


»
uma Igreja de valores anti- 1 iberais propiciou o reforço e a
justificativa das desigualdades sociais vigentes, onde a ruptura

posterior do bispo com aquela sociedade pôde ser entendida como

uma incursão indevido dela no espaço propriamente religioso.

Mas o ponto é doloroso e o assunto evitado por aqueles que

tiveram um envolvimento mais intenso com a mesma. 0 mal estar é

reapropriado ao enfrentar a questão como um medida exemplar da

autoridade da Igreja e da especificidade das duas instituições

que, num determinado momento, caminharam lado à lado.

De toda a forma, para os homens, o ideário heróico

alimentado pela intercambialidade dos símbolos religiosos e dos

sfmbolos seculares — aos quais se podia aderir sem contrariar os

valores culturais dominantes -- representou um arti-ffcio

simbólico de contornar a frustrante dependência a que se viam

condenados! à sede municipal, à capital do estado, às leis

federais, à sociedade que se transforma, impeiindo—os a uma

desconfortável sensação de impotência por não poderem

acompanhar, condignamente, os projetos que vêm de fora.

454
Mas atd porque o catolicismo introjetado na população

era aquele tradicional, de muita resa e pouco padrer os

argumentos e atitudes ortodoxas assumidas no per Todo de


substituição foram, nos anos subsequentes, perdendo a força e
sendo gradativamente substituídos por uma lógica mais
abrangente, onde outros fatores culturais forma ganhando maior
autonomia e recuperando sua proeminencia, enquanto se
reconstituíam, discretamente, os relacionamentos sociais
abalados pela crise religiosa. Em meio aos avanços e recuos, que
constitui qualquer cotidiano, sutil reiativização dos critérios
separatistas religiosos foram se insinuando e dando lugar e uma
convivência mais cômoda.

Assim, se pelo lado do clero o processo de desenvolveu


nos quadros de uma argumentação ec1esiológica,acompanhada
apenas por um pequeno micleo de leigos mais comprometidos, é
possível dizer que a massa que aderiu ao conflito, de um lado ou
de outro, cedia antes a determinações culturais (onde se inclui
a religião, evidentemente) no sentido de que pressões seculares
estavam em Jogo.

O vulto que o episódio ganhou em Varre Sal pode ser


explicado pelo caráter fundante que a Igreja tem no lugar, e,
nesses termos, os princípios religiosos recobriam a totalidade
cultural. Daí que o questionamento religioso não significava
somente um problema de crença (o que não é pouco!) mas nele
colocava—se em jogo a própria possibilidade da expressão

455
1

cultural. 0 amalgamento dos princípios catélicos no cotidiano

tornava, assim, » opção por uma das facções como uma questão de

vida ou morte (social e eterna).

0 drama da Diocese de Campos em Varre Sal pode ser

qualificado como um episddio de radicalização da cultura,

implicando a parada para o exame dos valores naturalizadas e sua

avaliação. Não tanto pelas transformações sociais que lenta,

porém inexoravelmente afetam as regiões mesmo distantes dos

centros de ebulição onde ocorrem as mudanças culturais, mas

porque a crise religiosa exigia a redefinição de categorias de


t
pensamento e dos valores a elas concernentes. Assim, foi pela

mão da Igreja que se introduziu uma certa modernização local.

A Igreja já vivia tal tensão de modernização, e a região

recebia seus efeitos refratados, mas estes se t ornaram

explícitos a partir da crise religiosa. Por outro lado, a

continuidade se verifica não só porque as facções rel i g i o s a s

situam-se ambas na linha menos inovadora enquanto definição do

papel da Igreja na sociedade, mas também porque os fiéis que

participaram pertencem ao mesmo quadro cultural. Dessa forma, a

questão foi reabsorvida no ethos local, preservando o papel do

sistema religioso na cultura regional.

0 paradoxo do caso reside no fato de terem sido os

chamados tradicionalistas que introduziram a l t e rações

modernizadas, exemplificadas na exigência de uma coerência e

456
radical idade do fiel, comportamento tipicamente característico

de uma "mentalidade moderna". No mesmo movimento, os chamados

progr ess ist as devolveram ã comunidade o antigo catolicismo

tradicional, agora realizado nos quadros dos indmeros movimentos

que animam a Igreja de João Paulo II.

A reação de uma parte do clero que acompanhava fielmente

as recomendações de D. Mayer se configurou em torno da categoria


tcadicão a qual, para a Igreja, independentemente da tendência
teológica seguida, é fundamental. Invocada enquanto aspecto
pelo qual aquele grupo discordava das determinações agora
oficiais, a categoria sofreu uma manipulação que preservava o

sentido que o grupo necessitava. 1

A referência acima pode sugerir que exista um


significado ónico para a mesma, do qual alguns estariam se
afastando. Não é isso! das H t ipias inter pretações que o termo
veio adquirindo no correr da história foi privilegiada uma
delas, a qual é coerente com o discurso episcopal de D. Mayer e
intercambiáve1 com o significado, no plano do senso comum, que
os fiéis haviam interiorizado. Minha hipótese é que dessa
coincidência emergiu a forca aglutinadora que a mesma
alcancou, constituindo-se no ponto em torno do qual alguns
católicos se concentraram.

Esta bricolagem a partif de encfclicas emanadas no


período imediatamente após o Concilio de Trento (de Pio V e
j
457
Clemente VIII) e já na chamada "heresia modernista" )(Gregórlo

XVI, Pio IX, Leão XIII, Pio X, Pio XI e Pio XII), apresentava,

além do desgaste da descontextuai Ização, as seguintes

características! a categoria é objetivada; considerada em

escudo/arma contra interpretações diferentes; imposta como a

dnica interpretação valida do termo tradição.

Este procedimento resultou em conferir à categoria

capacidade de operar a modificação daquilo que era um todo

diferenciado internamente para algo assimilável à noção coerente

de um partido. A figura representativa da tradição foi a missa

de Pio V; o grupo que se formou aut o-def in iu-se como

"tradicionalista". A simplicidade do processo ganhou a adesão

fácil de muitos fiáis em função da familiaridade que tinham com

aquela forma de ritual - que lhes suscitava todo o sentido do

mistério da salvação, tal como lhes fora inculcado - e, no mesmo

movimento, lhes reforçava a identidade de católicos.

Dessa maneira, estava conformada uma ideologia, o

tradiconalismo, enquanto sistema de pensamento dotado de

coerencia interna e capaz de mobilizar grupos sociais que, ao

adotá-la, acham-se instrumentalizados


| para lutar por seus

objetivos de variada ordem. Ela se alimenta não só por alguns

9anhos concretos imediatos obtidos como pelo reconhecimento

social que lhe é dado, em virtude da própria parcialidade com

que o hegemônico se apresenta.

458
0 reconhecimento ptíblico terá tanto mais valor quanto

mais valorizada for a fonte de onde emana. No caso do

tradicionalismo da Diocese de Campos, a existência de uma

formação semelhante na Europa teve esta função. Aumentada a

legitimidade pelo encontro de parceiros já valorizados pelo f a t o

de serem europeus, do encontro ainda resulta a soma dos recursos

para levar adiante a ideologia. Ao mesmo tempo, a lenta maneira

pela qual o Vat icano t em que responder a estas reações - atá em

nome da diversidade que a unidade comporta - conduz â ilusão de

uma ace itação de f at o daquela modalidade de at uaii zar o

cat ol ic ismo .

Cobrando para si o estatuto de guardião autêntico da

tradição, o grupo -por isso mesmo- denominado tradicionalista,

põe em evidência questões relacionadas ao poder no interior da

Igreja e no mundo. 0 fundamento de sua legitimidade é dito como

repousando em sinais inquestionáveis e exemplos histdricos

consagrados pelo tempo, desconhecendo, desta forma, a natureza

seletiva da t r a d i ç ã o . Mas n ã o e s c a m o t e i a a luta pela hegemonia,

qualificando negativamente todas a s expressões, passadas ou

contemporâneas, que lhe vão ao encontro.

Concentrando o poder da mensagem cattílica da Igreja na

tradição, opera-se uma identificação desta com o poder que, para

legitimar-se necessita de uma visibilidade que o torne palpável

e distinto de modalidades outras de ser igreja, vistas como

espdrias. E esta exposição do poder vem revestida de formas

1
4 59

s
1

extraord inár ia s , contrastantes com a banalidade do c o t i d i a n o e

até com o poder secular, sobre o qual pretende ter

superioridade. Daf o cerimonial exigir caráter espetacular e

apresentar conotação magestática, ã qual o homem simples d e v e se

submeter.

Procura-se preservar a fisionomia que a Igreja pôde

constituir no transcurso de sua história, r e if icando-se tanto

tradição quanto poder, suja visibilidade serve de exemplo e

prova para as sucessivas gerações, montando um sistema de feed —

back atemporal e a-h istòr ic.o. Enquanto forma acabada, o poder é

tido como retirando sua força dos elementos concretos que o

expressam. A forma é entronizada, junto com os santos que a

Igreja exaltou como os legítimos defensores de sua autori d a d e .

Ora, a ênfase na visibilidade, no seu caráter

palpavelmente presente, remete a um perfil de Igreja datado,

constituído num momento em que tal modelo era questionado de

dentro mesmo. E a visibilidade que o grupo t r a d i c i o n a l i s t a vai

querer preservar fixa-se nos sinais da suntuosidade que a

instituição apresentava quando do cisma protestante. A

confirmação daquelas marcas, legitimadas pelo Concilio de T r e n t o

e pelas providências seguintes, forma o mlcleo da c o n c e p ç ã o de

Igreja defendida pelo grupo.

Não que se negue a graça e a fé, como o espírito

trldentino n unca negou, mas a valorização da hierarquia como

463
guardiã da doutrina e sua exposição nos moldes daquele momento

tornaram-se para alguns, condição do próprio poder da Igreja.


ff
Assim reifiçada, a tradição foi estabilizada num modelo, agora.a

modelo, do qual nada pode ser retirado ou acrescido.

A associação entre a nobreza do conteiido da mensagem e a

forma pela qual ela é exposta, resulta de uma ritual ização que

vai além do ritual, propriamente dito, e contamina os muitos

elementos através dos quais ele é atualizado. A arquitetura do

templo, a mdsica apropriada, o' gestual do clero, sua

indumentária ficam impregnados do valor imputado ã mensagem, de

tal maneira que alterá-los é pensado como alterar a própria


doutr in a .

fí tal exacerbação corresponde um estilo inverso


simétr ico no progressi smo, ao "corrigir " no modelo consagrado.
as marcas de um certo tempo, supondo poder subst it u í-1o por
outras e conservar o alusivo, o valor af et ivo, a força que
estava impregnada naquelas. A "liberdade" de introduzir novas

roupagens nos rituais é compatível com uma sensibilidade


engajada em projetos e planejamentos.

Para isso concorrem as mod if icaç'ões do mundo secular,

onde alguns daqueles sinais vão desaparecendo á medida em que a

sociedade se transforma e outros signos vão se impondo porque

■ais adequados ás condições de vida e aos novos valores que as


acompanham .

rnammn
Sendo a missa o ritual onde se renova o sacrifício

bás ico onde se assenta a doutrina, por isso mesmo merecendo no

período dos cuidados com o cisma protestantes a exortação de que

"nunca será nada acrescentado", serão sobre as alterações

litiirgicas, aí incluído o missal de Paulo VI, que incidirão as

reações do grupo tradicionalista. Nada melhor para exemplificar

umapostura que desacatava a tradição, se ela é definida

objet ivament e .

Mas o debate continua, ou, pelo menos as medidas

resultantes de uma dissenção no seio da Igreja! os


tradicionalistas, de acordo com o referencial que adotam,

alegando a auto-demolição da Igreja; a corrente hegemônica do

Vaticano respondendo com atos informados pelo princípio da

obediência o qual regula a hierarquia. De um lado, enfatiza-se


uma lógica dita "de sempre", de outro, aguarda-se "sinais dos

tempos" para sair de um impasse causado pela chamada dupla


natureza da Igreja: instituição e sacramento.

A postura tradicional e a progressista remetem ã tensa

condição de existência das "estruturas de sentimento"<Wi11iams ,


1978, 1989), estilos de sentir atualizados numa biografia e que
retêm o passado alcançável pelo indivíduo. A abrangência e
intensidade delas estando ligada ãs experiências vividas. De um

lado, a intimidade com a língua magnífica e incompreensível,

acompanhada dos muitos sig ifiçados emocionalmente deflagrados

Pelo tipo de encenação, com miisica própria e incenso a auxiliar

462
I

um estado propício ã adoração da divindade. Oe outro» a

esperança de que a nova forma será recoberta pela m e sma força

que a anterior possuía, sedimentada pelo tempo e legitimada por

sua contemporaneidade.

Para o tradicionalista relativizar tal postura o f i c i a l é

impossível, na medida em que, para isso, ter-se-Ia q u e sair do

sistema referencial de um pensamento que se enclausurou numa

determinada ^poca histdrica, como que desconhecendo que o mundo

já não é o mesmo. Assim, sobra para ele a postura i n t r a nsigente

que adota, valendo-se de uma fórmula que, pelo seu abuso, foi

condenada pelo próprio Concilio de Trento. 0 princípio do

"fideli ter et obedienter" - que sustenta o dir e i t o de

desobedecer - é paradoxalmente atualizado pelos defe n s o r e s do

modelo tridentino.

A reiativização, que permitiría maior flexibilidade para

a reprodução da mensagem divina no mundo contemporâneo

transforma-se, ela mesma, numa postura condenável, isolando uns

poucos e afastando-os da missão a que foram destinados. Tal

rejeição opera a emergencia de tres atributos no catolicismo

assim atualizado* primeiro, o de ser a instância dl ti ma de

instituição da verdade, hiçrarquizando os saberes e crenç a s ,

segundo seu referencial interno? segundo, e decorrente do

anterior, o dever exclusivo de vigiar as outras interpretações,

condenando aquelas que julgam falsas por afastar-se de sua

versão; terceiro, transformando a unidade (sempre prenhe de


d ive rsid a d e ) em u n i “f o r r a i d a d e que, ob j e t i v a m ent e nunca e x istiu na

h istd ria da Ig re ja .

0 p e rfil a ssim co n stitu íd a e sp e lh a-se. no entanto. nos

prdprios exem plos da Ig re ja , qUe a p a rtir da ênfase em

d eterm inad os aspectos h isto ric a m e n te preponderantes, fornece

elem entos para a construção de um siste m a com ta is

c a ra c te rístic a s. 0 problem a destas reconstruções, que não se

aceitam como t a is , é que tendem a fechar o caráter d in â m ico da

form ulação o rigin a l e assim p riv a r as cu ltu ra s da p o ssib ilid a d e

de serem fecundadas por p rin c íp io s p o sitivo s, já que a n ti—

destrut i v o s .

í
M odelada segundo a Id gica do medo, passam de d e fe n siva s

a a gre ssiva s, perdendo a cap a cid ad e de co n vive r com a

am biguidade p rcíp ria dos fatos vivos, condenando a perpetuar-se

enquanto id d ia m orta.

Como repercute no fie l tal m odelo de ca to lic ism o ?

A com preensão do fie l passa, obviam ente, p elos recursos

que ele d isp õ e para e qu acio nar o problem a de ver a fonte

fornecedora de se n tid o s q u estion ad a quanto ã a u to rid a d e que

sempre exerceu. Tomando por base a presença de um d ifu n d id o

ant i l c l e r i c a l . r s m o , re strin g i-m e àq u e les membros que se auto—

id e n tificavam como c a td lic o s p ra tica n te s e que durante o

con flito fize ram a opção por uma das duas correntes.

464
Entre estes fióis, a perda de autoridade que o episódio

representava remetia âs suas biografias, todas elas, em maior ou

menor grau, marcadas pela presença do catolicismo. Assim,

modernismo era aquilo definido pela Igreja, variando o grau de

importância que atribuíam â instituição, ou à doutrina, no que

tange ao nfvel em que elas, de per si, ou em conjunto, eram

definidoras das suas decisões.

Tal atitude, remete b concepção de história como sendo

de caráter existencial, como quer Ariefes(1989), que se expressa

por uma forte intimidade entre os acontecimentos gerais e os

mais diretamente familiares ao indivíduo. A histdria é então

aquela tal como comentada no cotidiano, vivida e compreendida

por referência b memória doméstica de certos fatos

tradicionalmente valorizadas pelos antepassac.es. Com tal

instrumental, nem distinguido enquanto artiffeio de apreensão da


realidade, mas confundido com a própria realidade, d que o

episódio foi absorvido.

Por sua vez, o clero - seja lá qual for a opção que

fizer no conflito — não trabalhava com esta ingenuidade. Salvo

talvez aqueles padres de extração muito baixa e cuja formação

não chegou a ultrapassar este enfoque simplista, todos eles

apresentavam uma visão mais ampla e complexa do processo,

distinguindo— se apenas no que tange ao ponto onde alocavam a

fala de
direito que lhes cnbia, pelo juramento na ordenação,
(f
obedecer. Assim, parte aderiu imediatamente as decisões

465
oficiais enquanto outra parte alinhou-se com o bispo emárito,
acatando o mesmo princípio de obediência.

A estes parecia justo acompanhar o superior hierárquico


cuja argumentação era de caráter histórico, portanto, fundada na
tradição da Igreja. Apenas não questionavam o fato da
argumentação episcopal ligar-se às respostas dadas pela Igreja
oficial na grande crise modernista da segunda metade do sóculo
XIX. Da mesma forma, sustentavam uma interpretação de tradição
tal como utilizada no período pós tridentino, sem fazer uso de
uma crítica histórica que esteve inclusive ausente em suas
formações de presbíteros.

Assumindo a concepção de Igreja como Sociedade Perfeita,


eram despossuidos das condiçoes de acatar uma definição mais
atualizada onde, à despeito das interpretaçoes restritivas que
lhes é dada, incorpora—se uma visão mais condizente com o papel
e o lugar da Igreja na sociedade contemporânea. A concepção
adotada na diocese escapava apenas, e de maneira discreta, nas
paróquias dirigidas pelas ordens, congregando em torno de si
paroquianos informados por aquele princípio da história
existencial já comentada.

Foram estas duas modalidades de pensar a história que se


encontram na assimótrica relação clero/fiel e qua fermentou os
desdobramentos que analisei. Assim, por trás da opção f.Hta
pelo fiel repousava a diferença do que estou chamando uma

466
concepção de histó r i a utópica acatada pelo clero. Unidos pela

obediência e respeito ao sacerdote, encontraram-se todos, de um

lado ou do outro, exercendo sua religiosidade de acordo com a

Igreja.

A relação entre a história vivida pelos homens e a

histórias utópica proclamada pelo clero (cuja função é preparar

a chegada do Reino do Cóu) foi atualizada com os recursos

culturais da comunidades a obediência c o heróismo, dimensão

presente do cristianismo, promotora inclusive desses seres

especiais que são os santos. Estes, portadores exemplares

dessas duas virtudes, são acionados como os inspiradores

individuais de cada fiel.

Uma das caracter íst icas do catolicismo tem sido o êxito

de pôr em relação aqueles dois tipos de apreensão da história,


servindo como mediação para o homem entre a certeza das

vicissitudes da existência e a bcmaventurança de um alívio de

suas ansiedade quanto ã finitude, proposta da história utópica.

As virtudes necessárias ã boa assunção deste projet o ,obediência

e horoismo, estavam dadas: a primeira por uma prática

culturalmente disseminada, a segunda pela existência concreta de

uma associação cicil -- devidamente apoiada pelo bispo onde a

mesma podia se desenvolver.

Assim, a gestação da tendência tradicionalista contou

com estes elementos presentes na população católica, elementos

467
onde se encontram raízes religiosas mas também herdadas do mundo

secular. Essa dupla filiação tornava o modelo sedutor nSo sd

para juventude como também para po homem preocupado com o»

destinos de sua sociedade e temeroso (consoante o que ouvia das

autoridade religiosas) de tom futuro nada promissor. £ ainda

esta dupla filiação que permite a existência de tradicionalistas

5Em ligações com a TFP, ou, ao contrário, a permanência de

tradicionalistas ligados a ela, mesmo «pós a ruptura de D. Mayer

com a mesma.

Este é um dos pontos em que se verifica a passagem da

noção de tradição, em termos religiosos, para a concepção

popular, eixo em torno do qual puderam se aproximar (ou se


afastar) as duas categorias sociais, clero e fiéis.

Paradoxalmente, o tradicionalismo vai explicitar um dilemas no

esforço de preservar a obediência á tradição finda por insinuar

ã desobediência á hierarquia, ameaçando assim uma das bases de


sustentação da Igreja.

No tradicionalismo da Diocese de Campos a influência


francesa é grandes associam-se as marcas de elitismo cultural

que tenta reproduzir] a glória cavalheiresca de uma Idade Média


idealizada e romanceada, que, nacionalizada, esforça-se para
ressuscitar estereótipos como o fausto e os rigores do mundo da

flor de lis, onde primava o princípio da hierarquização e


florescia o heroísmo e o sofrimento dos cristãos por sua causa.

468
Recuperar tal espfrito numa diocese fluminense parece

ter sido o projeto de D.Mayer, a partir de sua experiência na

Arquidiocese de São Paulo onde apoiava a emergência de um

"Estado Catdlico". 0 prdprio processo foi reforçado pela


aliança com o tradicionalismo francês, representado por
D.Lefbbvre e hoje simbolisado pela veneração ao P.João Maria
Vianney, sfmbolo do clero que não cedeu às pressões de uma
Igreja Constitucional, tal como existiu na França no perflodo da
Revolução.
i

Para a população mais letrada, a aproximação com tal


simbolismo pode ter significado resgatar a importância que a
região conhecera no Impdrio mas que, inexoravelmente afundava-se
na mediocridade cultural do antigo mundo rural sob o
capitalismo. Para as camadas subalternas, dependentes de
relações e relacionamentos tradicionalmente existentes no
campo, tratava-se antes de preservar um n)QdUS vivendi.
consagrado, cada ves mais ameaçado por um gradativa desgaste e
deterioração na qualidade de vida e seu consequente aumento de
insegurança quanto ao futuro.

Assim, por caminhos diferentes, tradicionalismo campista


e tradicionalismo francês se encontraram, apresentando em comum
a adesão ao reacionarismo religioso e ao conservadorismo
político, ambos temerosos por mudanças que ameaçavam a
configuração cultural em que puderam se alimentar e reproduzir.

469
0 e p i s ó d i o da Diocese de Campos, no plano Institucional

permitiu m o strar a capacidade dinâmica do catolicismo, vertente

do cristianismo que, na história, optou pelo caminho


institucional. 0 catolicismo - onde o acontecimento fundador

fez-se Igreja (S a n c h i s ,1989) pode desenvolver-se em tmiltipla»


direções, s e g u n d o ênfases diferentes em seus diversos aspectos.

Mas a for t e e explícita preocupação com as questões sociais


fazem parte de um mundo moderno, razão pela qual ser neste que
também se c o n f o r m a uma ideologia como o tradicional Ismo.

Mesmo enquanto expressão de uma corrente que contradiz


os avanços t e o l ó g i c o s mais expressivos que contribuiram para uma
presença mais ativa na sociedade, o episódio tradicional ist a é

também a prova d a vitalidade da Igreja, na medida em c u e mostra

a possibi 1 idadee da diferenciação interna, decorrente de seu

caráteer c o n s t i t u t i v o de muitas culturas. E esta vitalidade que

impõe c e r t a s " acomodações de terreno", ora dando arrancos para a

frente, ora -frei ando processos vistos como muito ousados e


através dos quais a doutrina, e com ela a instituição, têm

podido se p e r p e t u a r nestes dois mil anos.

A lent idão com que tais processos são equacionados dá


bem a m e d i d a da complex i d a d e que eles envolvem, e a dificuldade

de solucionar a tensão entre o chamado poder de comunhão que é

invocado pelo clero e o poder de dominação que de fato é

exercido se a instituição assumiu a missão de preparar o mundo

para o -final dos tempos. Na verdade, estes poderes não são

470
antagân tc o s , s n t e s atual isam— se cm nfveis diferentes» a comunhão

no plano da adesao aos princípios e valores» a dominação no

plano da instituição que os administra. Nestes termos» a tensão

é fruto da prdpria condição da Igreja, instituição e sacramento,

profana e sagrada.

0 caso da Diocese de Campos serviu para reavivar a

catolicidade dos fiéis, amortecida pela crescente secularIzaçSo


do mundo e emergência de novas formas dee religiosidade,

fomentadas inclusive pelo maior diálogo entre culturas


diferentes e pela prodigalidade dos meios de divulgação das
mesmas. Embora se possa argumentar do forte ruido caracter íst ico
da comunicação de massa - as mensagens sempre sofrendo os
processos de descont
r ext uai ização -- não se pode negar que este
século 4 rico em refundir e confundir doutrinas.

Tal reavivamento não ficou apenas no plano dos fiéis.


Este efeito atingiu também a própria Igreja, auto-int imada a
posicionar-se ante correntes de maior abertura ou maior
exclus iv ismo, como foi o caso tradicionalista. E 4 neste ponto
que emerge o paradoxo conservador, fadado a lutar pela
permanência de um modelo quando seu próprio procedimento é a
mundança naquilo que quer conservar. I$fannhe im, 1982; Szacki,1966
Ref. de Rubem Cesar Fernandes) E maiss na luta pela manutenção
das formas tradicionais, tem que lançar mão de recursos de um
momento que condena, sem se dar conta que ele mesmo já se
transf ormou .

471
A concepção de tradição objetivada, reif içada, contém em

si duas idéias* a ilusão da não-mudança e a condenação ao

antropocentrismo característico dos tempos modernos, ambas

incompatíveis com o individualismo que, com diferentes matizes,

permeia a mentalidade ocidental nos dltimos cinco séculos.

Mas ela é gerada no interior me«uno da Igreja, a partir

das muitas contribuições que o proceessu btstdr ico carreou,


associados ãquela postura dita exclusivista, para usar a
terminologia de Pannikar(1978) e que, segundo ele, está presente
em qualquer sistema religioso. Caracterizada pela não
flexibilidade frente a outras interpretações possíveis de
religiosidade, o exclusivismo catdlico vai contrapor-se à
sensibilidade dita moderna, em função do privilegiamento dado ao
homem e aos saberes que ele construiu e que escapam à tutela da
Igreja.

Neste quadro, a tradição, devidamente cristalizada num


modelo, confunde-se com a própria Igreja, e esta com a
hierarquia, responsável pela tradição. 0 resultado é uma
proposta dicotonizada, onde o outro é negativizado, anulado. Tal
desvalorização impede que seja visto como polo simétrico,
constituindo um campo onde tensões se conformam e são passíveis
de equac ionament o . 0 uso e abuso do ánátema, tão caro aos papas
invocados pelos tradicionalistas, é a resposta dada a todos que
se desviam da proposta exclusivista.
Profilaticamente, este enfoque tolhe a crenca e o

reconhecimento da possível positividade da mudança e da

adaptação. No mesmo movimento fecha seus seguidores num clVculo

de medo que, se por um lado estimula o isolamento, por outro põe

em evidência a intolerância positivada, em nome da preservação

do projeto.

Se a mentalidadee liberal, marcada pelo primado da razão

do homem e da valorização de sua vontade e emoção, constitui um

terreno prop íc io à emergência da reação exclusivista, mais

fdrti1 ainda se torna quanto o catolicismo nele vigente

apresenta particularidades que o distanciam do modelo

romanizado, como é o caso brasileiro.

0 catolicismo brasileiro, devocional, frouxo e

permissivo, fruto da mistura que a população pôde elaborar a

partir de uma evangelização claudicante em combinação com outras

tradições de variada orfgem, vem sobrevivendo às tentativas de

romanização, assimilando certos aspectos, neutralizando outros,

protegido pela incapacidadee objetiva da Igreja de tudo

controlar. Promovendo o espaço necessário à expressão da

religiosidade do fiel sem impedi~lo de pensar-se catdlico,

incita parte do clero a pender para o exc 1us iv isino.

47 3
N este, a emoção religiosa é constrangida ã formas

ritual izadas de e x p r e e s s ã o , inalteráveis, que pode levar o fiel

Íl considerá-las insuficientes para as suas necessidades

existenciais, ainda mais porque a cultura oferece

legitimamente - f o r m a s outras tradicionalmente consagradas. Com

isso, o fiel que não opta pelo modelo exclusivista não perde um

componente f o r t e de sua identidade e neutraliza a tensão e n t r e a

expectativa gerada pelo discurso clerical e os valores

provenientes do mundo secular.

Est e modelo, mais coerente com outros princípios não—

relígosos, mas que tambdm informam a cultura brasil e i r a .

cont inua aceitando, devi damente reconceptual iz a d o s , os pontos

sobre 05 qua is 0 t r a d ic ionalismo á Irredut f vel , a saber s na

instânci a m ít ica, a noção de pecado or ig in a 1 , mancha que

cont am ina a humanidade; na instância sacrament al , a

poss ib i1 id ade de apagar 0 pecado, via a pen it ênc ia ; no plano

pastoral , a procura de comportamentos condi zent es com a fá.

embora re lida segundo cr it ér ios ma is f 1ex i've is .

Assim, o episddio da Diocese de Campos mostra o caráter

redutor que o "trad ic ionalismo" opera no catolicismo (da me s m a

forma que o c atolicismo operou no cristianismo) ao enfatizar,

sacralizando, o lugar da Igreja na doutrina. Mas mostra t a mbám a

dificuldade que tem o "progressismo" oficial de lidar com a

sacralidade de que é imbuída a tradição que a fundamenta.


çifpula contem poriza. adm in ist r ando a
Sab iamente, a

tensão no sentido de preservar uma unidade que, se de inada

entregue ao modelo exclusivista, transfor niar—se — ia em est é r i1

uniformidade, mas também que, se abandonada aos mod í5m o 3


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