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Derivadas de Estabilidade

João Oliveira

Estabilidade de Voo, Eng. Aeroespacial


Versão de 11 de Novembro de 2011

1 Introdução
Objectivo
Neste capítulo pretende-se encontrar expressões para as derivadas de estabilidade
adimensionais em função das características das aeronaves.

Separaremos os casos de
• Movimento longitudinal

• Movimento lateral

Definição do estado estacionário


Recorde-se que as derivadas são calculadas no estado estacionário.

Definição do estado estacionário:


• Voo rectilíneo uniforme
• p0 = 0 = q0 = r0

• v0 = 0
• Eixos de estabilidade: w0 = 0 ⇒ (αx )0 = 0

2 Derivadas relativas ao movimento longitudinal


2.1 Coeficientes das forças e momentos aerodinâmicos
Forças e momentos longitudinais

• Forças aerodinâmicas: X, Z;
• Momento de picada: M;
• Peso: W .

1
As forças e momentos longitudinais
dependem de:
• Sustentação: L

• Resistência aerodinâmica: D
• Força de propulsão: T

Coeficientes das forças e momentos: definição


Como se sabe:

X Z M
Cx = , Cz = , Cm = ,
1/2 ρV 2 S 1/2 ρV 2 S 1/2 ρV 2 S c̄
L D T
CL = , CD = , CT = ,
1/2 ρV 2 S 1/2 ρV 2 S 1/2 ρV 2 S
W
CW =
1/2 ρV 2 S

Coeficientes das forças longitudinais


Supomos:

• Linha de propulsão coincidente com eixo x


• w pequeno ⇒ αx  1 ⇒ cos αx ≈ 1 e sin αx ≈ αx

Logo:
(
Cx = CT + CL αx − CD
Cz = −(CL + CD αx )

2.2 Derivadas adimensionais


2.2.1 Derivadas em ordem ao ângulo de ataque
Derivadas em ordem ao ângulo de ataque
Pretendemos encontrar expressões para:

• Cxα

2
• Czα
• Cmα

Derivada Cxα
∂Cx
 
Definição: Cxα ≡
∂α 0

∂Cx ∂
   
= (CT + CL αx − CD ) =
∂α 0 ∂α 0

∂CT ∂CL ∂CD


     
+(CL )0 + (αx )0 −
∂α 0 ∂α 0 ∂α 0
| {z } | {z }
=0 =0⇐(αx )0 =0

Derivada Cxα (2)


Logo:
∂CD
 
Cxα = CL0 − ≡ CL0 − CDα
∂α 0

Note-se que:
• CL0 ≡ (CL )0 é o coeficiente de sustentação no estado estacionário.
CL2 ∂CD 2CL0
 
• Se CD = CDmin + , então CDα ≡ = CL
π Ae ∂α 0 π Ae α

Derivada Czα
∂Cz
 
Definição: Czα =
∂α 0

Mas: Cz = −(CL + CD αx )

∂Cz
 

= − CLα + CDα αx + CD 0 = −(CLα + CD0 )
∂α 0

Czα = −(CLα + CD0 )

3
Derivada Cmα
∂Cm
 
Definição: Cmα =
∂α 0

Mas, como se sabe:

Cmα = a(h − hn )

2.2.2 Derivadas em ordem a u


Derivadas em ordem a u
As derivadas em ordem a u traduzem:
• as alterações de forças e momentos quando varia a velocidade horizontal
• supondo α, T , etc. constantes

Se os coeficientes CL e CD não dependessem de u,


2
Força ou momento (uo + ∆u)
= ≈ 1 + 2∆û
Força ou momento inicial u20

Derivadas em ordem a u (2)


Mas os coeficientes CL e CD dependem de u através de:

• número de Mach, Ma (efeitos de compressibilidade)


• pressão dinâmica, pd (efeitos aeroelásticos)
• propulsão, T , devido a:
– variação da propulsão com a velocidade
– interacção da propulsão com a airframe (asa e fuselagem), especialmente no
caso de propulsão a hélice

Derivadas em ordem a u (3)


Caso trivial: são conhecidos CLu , CDu e Cmu .

Então, de (
Cx = CT + CL αx − CD
Cz = −(CL + CD αx )
deduz-se facilmente

Cxu = CTu − CDu

Czu = −CLu

4
Derivada Cxu (1)
Habitualmente é necessário determinar todas as contribuições separadamente:

∂Cx
 
Cxu ≡ =
∂ û 0
! 
∂Cx ∂Ma ∂Cx ∂pd ∂Cx ∂CT
        
+ +
∂Ma 0 ∂ û 0 ∂pd 0
∂ û 0 ∂CT 0 | ∂ {z
û 0
}
CTu

Derivada Cxu (2)  


Note-se que V 2 = (u0 + ∆u)2 + v 2 + w 2 ⇒ ∂V
∂u
= 1. Logo
0

∂Ma ∂Ma ∂V /a u0 ∂V
       
= u0 = u0 = = (Ma)0
∂ û 0 ∂u 0 ∂u 0 a ∂u 0

!
∂pd ∂pd 1 ∂V 2 1
   
= u0 = u0 ρ = u0 ρ2u0 = ρu20
∂ û 0 ∂u 0 2 ∂u 0
2

Derivada Cxu (3)


Por outro lado, de Cx = CT + CL αx − CD , deduz-se

∂Cx ∂CT ∂CD


     
= −
∂Ma 0 ∂Ma 0 ∂Ma 0

! ! !
∂Cx ∂CT ∂CD
= −
∂pd 0
∂pd 0
∂pd 0
| {z }
≈0

∂Cx ∂CD
   
=1−
∂CT 0 ∂CT 0

Derivada Cxu (final)


O resultado final para Cxu é:

!
∂CT ∂CD ∂CT ∂CD
 
Cxu = (Ma)0 − + ρu20 − +
∂Ma ∂Ma 0 ∂pd ∂pd 0

∂CD
 
CT u 1 −
∂CT 0

5
Derivada CTu (1)
T
Por definição: CT = , donde
1/2 ρV 2 S
∂T
∂CT ∂u 2T ∂V
= 2
− 3
∂u 1/2 ρV S 1/2 ρV S ∂u

 
∂T
∂CT ∂CT 2T
   
∂u 0
CT u = = u0 = −
∂ û 0 ∂u 0 1/2 ρu0 S 1/2 ρu20 S

 
∂T
∂u 0
CTu = − 2CT0
1/2 ρu0 S

Derivada CTu para voo planado


∂T
Para o cálculo da derivada ∂u é necessário considerar o tipo de voo.

Para voo planado: T = 0

Logo

CT u = 0

Derivada CTu para voo com propulsão constante


Propulsão constante (aproximação para aviões a jacto em voo de cruzeiro):

∂T
=0
∂u

Logo

CTu = −2CT0

Derivada CTu para voo com potência constante


Potência constante (aproximação para aviões com propulsão a hélice com veloci-
dade constante, em voo de cruzeiro):

T 0 V0
T V = cte = T0 V0 ⇒ T =
V
Logo
∂T T0 V0 T0 −T0
   
=− =− ⇒ CTu = − 2CT0
∂u 0 V2 0 V0 1/2 ρu20 S

CTu = −3CT0

6
Cálculo de CT0

Se admitirmos que no estado estacionário:


• a força de propulsão e a velocidade são co-
lineares,
• e usando eixos de estabilidade,

CT0 = CD0 + CW0 sin θ0

Derivada Czu (1)


Agora temos:

∂Cz
 
Czu ≡ =
∂ û 0
! 
∂Cz ∂Ma ∂Cz ∂pd ∂Cz ∂CT
        
+ +
∂Ma 0 ∂ û ∂pd ∂ û 0 ∂CT 0 ∂ û 0
| {z 0} 0| {z } | {z }
=(Ma)0 =ρu20 CTu

Derivada Czu (2)


∂Cz ∂CL
   
= −



∂Ma 0 ∂Ma 0








 ! !
 ∂C

∂CL
z
Mas Cz = −(CL + CD αx ) ⇒ = −
 ∂pd ∂pd 0


 0




 ∂Cz ∂CL

    

 =−
∂CT 0 ∂CT 0

Logo !
∂CL ∂CL ∂CL
   
Czu = −(Ma)0 − ρu20 − CTu
∂Ma 0 ∂pd 0
∂CT 0

Derivada Cmu
Finalmente, de forma análoga obtém-se
!
∂Cm ∂Cm ∂Cm
   
Cmu = (Ma)0 + ρu20 + CTu
∂Ma 0 ∂pd 0
∂CT 0

2.2.3 Derivadas em ordem a q


Derivadas em ordem a q
Calculadas admitindo que são constantes:

7
• α
• as outras variáveis

Contribuições mais importantes


• Contribuição da cauda: a mais importante
• Contribuição da asa: menos importante e mais difícil de estimar

Prática corrente:
contribuição da asa = 10% da contribuição da cauda
(i.e., a derivada total ≈ 1.1× contribuição da cauda)

Expressões gerais para Czq


Derivada dimensional e adimensional:
! !
c̄ ∂Cz 2u0 ∂Cz
q̂ = q ⇒ Czq = =
2u0 ∂ q̂ 0
ĉ ∂q 0

Relação com derivada do coeficiente de sustentação:


! !
∂Cz ∂CL
Cz = −(CL + CD αx ) ⇒ =−
∂q 0 ∂q 0

Contribuição da cauda para Czq


Efeito mais importante na cauda: variação do ângulo de ataque efectivo devido à
velocidade angular de picada q.

Note-se que ∆αt = qlt /u0 .

8
Contribuição da cauda para Czq
Admitimos que Lt varia instantaneamente com αt .

qlt St St qlt
∆CLt = at ∆αt = at ⇒ ∆CL = ∆CLt = at ⇒
u0 S S u0
!
∂CL St lt
⇒ = at
∂q tail S u0
!
  2u0 ∂CL 2u0 St lt
Czq = = at
tail c̄ ∂q tail c̄ S u0

 
Czq = −2VH at
tail

Contribuição da cauda para Cmq


Partimos de
lt ∂Cm lt
∆Cm = −VH ∆CLt = −at VH q ⇒ = −at VH
u0 ∂q u0
  2u0 ∂Cm 2u0 lt
Cmq = =− a t VH
tail c̄ ∂q c̄ u0

  lt
Cm q = −2VH at
tail c̄

Contribuição da asa

• Só é importante para asas com flecha muito grande ou alongamento pequeno.


• A velocidade angular é equivalente a uma curvatura adicional da asa (que produz
uma distribuição de velocidades normais equivalente).

9
Contribuição da asa: dependência da posição do CG
Existe porque q é medido relativamente ao CG.

Contribuição da asa: dependência da posição do CG


Mostra-se que

(CLq )asa ≈ −2CLα (h − h0 )


(Cmq )asa ≈ C̄mq − 2CLα (h − h̄)2

Na aproximação da teoria linear bi-dimensional de asas finas:


1 2
Para voo supersónico: h0 = h̄ = ; C̄mq = p 2
2 3 Ma − 1
3 1
Para voo subsónico: h0 = ; h̄ = ; C̄mq = 0
4 2

2.2.4 Derivadas em ordem a α̇


Derivadas em ordem a α̇
Causa: a distribuição de pressões na asa e na cauda não se ajusta instantaneamente
ao valor de equilíbrio quando α varia (o escoamento não é estacionário).

• Contribuição da asa: pode ser calculada a partir da resposta em frequência de


uma asa com movimento oscilatório harmónico.
• Contribuição da cauda: efeito mais importante é o de lag-of-downwash.

Contribuição da cauda (atraso no downwash)

• Quando α muda, altera-se o escoamento.


• A alteração não é instantânea e só se faz sentir na cauda passados algum tempo
porque a vorticidade do bordo de fuga é convectada pelo escoamento.
• O atraso é da ordem de ∆t ≈ lt /u0 .
• (t) corresponde a α(t − ∆t)

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lt
 = 0 + α α ⇒ ∆ = −α α̇∆t = −α α̇
u0
lt
αt = αwb −  − it ⇒ ∆αt = −∆ = α α̇
u0

Contribuição da cauda para Czα̇

lt
∆CLt = at αt = at α α̇
u0

St lt St
∆CL = ∆CLt = at α α̇
S u0 S

ˆ = α̇c̄ ⇒ Czα̇ = ∂Cz = 2u0 ∂Cz = 2u0 ∂(−CL )


α̇
2u0 ˆ
∂ α̇ c̄ ∂ α̇ c̄ ∂ α̇


Czα̇ tail = −2at α VH

Contribuição da cauda para Cmα̇

lt
∆Cm = −VH ∆CLt = −VH at α α̇
u0

ˆ = α̇c̄ ⇒ Cmα̇ = ∂Cm = 2u0 ∂Cm


α̇
2u0 ˆ
∂ α̇ c̄ ∂ α̇

 lt
Cmα̇ tail = −2at α VH

3 Derivadas relativas ao movimento lateral


3.1 Derivadas em ordem a β
Derivadas em ordem a β

• Derivadas a determinar: Cyβ , Clβ e Cnβ .


• Expressões razoáveis com estimativas para as derivadas: só para contribuição da
cauda.
• Contribuições da asa e fuselagem: obtidas em ensaios em túnel aerodinâmico (ou
usando expressões empíricas).

11
Geometria e forças

Derivada Cyβ
Normalmente negativa e pequena.
Contribuições mais importantes: fuselagem e estabilizador vertical.
S
Contribuição da cauda: Cy = −aF (β − σ ) SF
(Supomos VVF = 1)

∂σ SF
Cyβ = −aF (1 − )
∂β S
∂σ
Nota: ∂β
é difícil de estimar.

Derivada Clβ
Ver atrás!

Derivada Cnβ
Ver atrás! (weathercock stability)

3.2 Derivadas em ordem a p


Efeitos do rolamento

• o escoamento em torno de todas as superfícies aerodinâmicas é afectado

• alteração do ângulo de ataque local ⇒ alteração na distribuição de pressões


• modificação da esteira de vórtices atrás da asa
• a distribuição de vorticidade passa a ser assimétrica relativamente a x ⇒ sidewash
no estabilizador vertical

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Efeitos do rolamento: variação do ângulo de ataque local

Na cauda:

pz ∂σ
∆αF = − +p
u0 ∂p

Na asa:

py
∆α =
u0
pb
∆α = na ponta
2u0

Derivada Cyp
2u0
Usando a altura «média» do estabilizador zF , e p = b
p̂:
!
2u0 zF ∂σ 2zF ∂σ
∆αF = − p̂ + p̂ = − + p̂
b u0 ∂ p̂ b ∂ p̂
!
2zF ∂σ
∆CyF = aF ∆αF = aF − + p̂
b ∂ p̂
Para a aeronave completa:
!
SF SF 2zF ∂σ
∆Cy = ∆CyF = aF − + p̂
S S b ∂ p̂
!
  SF 2zF ∂σ
C yp = −aF −
tail S b ∂ p̂

Derivada Clp (damping in roll)


Contribuição significativa: a da asa

Devido ao rolamento:
• a distribuição de sustentação na asa é assimé-
trica
• aparece momento de rolamento L
• L é proporcional a p̂

Clp < 0 (e aproximadamente constante)

Derivada Clp (2)


• assimetria na distribuição de sustentação
diminui
Se parte da asa está em perda: • momento de rolamento L diminui

• |Clp | diminui

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Se parte importante da asa está em perda, Clp pode até mudar de sinal ⇒ autorota-
ção da asa (cfr. spin)

Derivada Cnp

• É derivada cruzada (conduz a acoplamento entre rolamento e guinada)


• Principais contribuições:
– asa
– cauda (especialmente empenagem vertical): estima-se a partir da força lateral

Derivada Cnp : contribuição da asa


A contribuição da asa deve-se a:

• Variação do perfil de resistência com o AoA local da asa


– Se p > 0:
asa direita: α ↑⇒ D ↑;
asa esquerda: α ↓⇒ D ↓.
– Logo N > 0 (nose-right) ⇒ ∆Cnp > 0
• Variação da inclinação da sustentação nas asas (ver a seguir)

Derivada Cnp : contribuição da asa (2)


Contribuição da asa devido a variação da inclinação da sustentação nas asas (porque
há variação do ângulo de ataque):

• Se p > 0:
asa direita: sustentação inclina para a
frente
asa esquerda: sustentação inclina para
trás

• Logo N < 0 (e ∆Cnp ∝ −CL )

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Derivada Cnp : contribuição da cauda

Sf l F
(∆Cn )tail = −∆CyF
S b
!
2zF ∂σ
(∆Cn )tail = +aF − p̂VV
b ∂ p̂

!
2zF ∂σ
(∆Cnp )tail = aF − VV
b ∂ p̂

3.3 Derivadas em ordem a r


Efeitos da guinada
A alteração no escoamento é grande se a asa tem ângulo de flecha elevado.

A velocidade normal a 1/4 de corda:


• varia da raiz para a ponta da asa
• aumenta na asa esquerda
• diminui na asa direita

Logo: as forças e momentos aumentam na


asa esquerda e diminuem na asa direita.
Existe também sidewash.

Força lateral
Recordando a imagem:

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Efeitos da guinada: contribuição da cauda
Variação do ângulo de ataque efectivo na cauda:

r lF ∂σ lF ∂σ
 
∆αF = +r =r +
u0 ∂r u0 ∂r

2u0 lF b ∂σ 2lF ∂σ
   
∆αF = r̂ + = r̂ +
b u0 2u0 ∂ r̂ b ∂ r̂

 
SF
Força lateral: (Cy )tail = aF ∆αF S
= aF r̂ SSF 2 lbF + ∂σ
∂ r̂

SF lF ∂σ
 
(Cyr )tail = aF 2 +
S b ∂ r̂

Derivada Clr
Clr é derivada cruzada. Principais contribuições:

• Contribuição da asa: devida ao aumento de sustentação na asa esquerda e dimi-


nuição na asa direita: Cl ∝ CL , Cl > 0
• Contribuição da cauda: devida à força lateral

SF zF lF ∂σ
 
(Clr )tail = aF 2 +
S b b ∂ r̂

Derivada Cnr (damping-in-yaw)


Cnr deve ser sempre negativa (amortecimento do movimento de guinada).

Principais contribuições:

• Contribuição da asa: devida ao aumento de resistência na asa esquerda e dimi-


nuição na asa direita (resistência induzida): provoca N < 0
• Contribuição da cauda: devida à força lateral

lF ∂σ
 
(Cnr )tail = −aF VV 2 +
b ∂ r̂

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