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11635 km:

Dias de Amor e Morte

Victor Henrique da Silva Ferreira

2016
11635 km: Dias de Amor e Morte

Autor: Victor Henrique da Silva Ferreira


Capa: Juliano Schiavo
Diagramação: Victor Henrique da Silva Ferreira
Ano de publicação: 2016
Cidade: Santos-SP
Dedicatória

Àqueles que morreram de amor,


àqueles que morreram pela distância,
àqueles que,
pelo menos uma vez,
amaram,
verdadeiramente.
Agradecimentos

Antes de tudo, agradeço a minha mãe e a minha irmã por


sempre estarem comigo e por permitirem que eu seja autêntico
em toda minha psicodelia e volatilidade. Agradeço ao meu
amigo Kaleo Gradilone por sempre ter estimulado minha veia
artística e por sempre ter sido um exemplo de pessoa.
Agradeço ao meu amigo Juliano Schiavo por ser meu mentor,
corretor e piadista nas horas vagas: sem você, esse livro teria
sido engavetado e, consequentemente, esquecido. Agradeço as
minhas amigas Valeria Roseno e Cibelly Anunciação por terem
lido cada um desses poemas e terem sentido uma pequena
fração do que senti. Agradeço a minha amiga Gabriela
Nascimento por ter dividido tantos momentos comigo, inclusive
os que antecederam os acontecimentos que culminaram no
nascimento desse livro e, especialmente, agradeço pelos
momentos em que esteve comigo depois de tudo, e por ter
compreendido as razões do meu afastamento. Agradeço a
todos que leram algo que escrevi, que me apoiaram, me
criticaram, dividiram momentos comigo. Tudo foi essencial para
que eu evoluísse o suficiente para continuar o que comecei. Por
último, um muito obrigado àquele que foi embora e levou
consigo, tudo que eu acreditava ser pois, dessa maneira, estou
tendo a oportunidade de ser quem devo. Você me ensinou
muito, principalmente que o amor não é suficiente; nunca é
nem nunca será, mas, ainda assim, é grande parte.
“Só aquilo que somos realmente tem o poder de curar-nos”
Gustav Jung
Prefácio
O que é o amor? O que é a saudade? O que é a esperança? O
que é viver? Nessa profusão de perguntas, inquietantes,
irrequietas, arredias, eis que delas vão se transmutando
palavras. Soltas em um primeiro momento. Unidas num outro
segundo. Sistematizadas numa frase. E, por fim, transformadas
em poesias, que escorrem tal qual os sentimentos de quem as
vivencia.

E, desta forma, dando forma ao seu sentir, ao seu condoer, ao


seu viver, o poeta exalta o que saboreia com suas palavras.
Brinca. Se engana. Se perde em devaneios. E assim leva o
leitor ao sentir também. Àquele que emerge nas águas,
molhado ficará.

O jovem Victor Ferreira, nesse seu primeiro passo na produção


de sua antologia, reúne por meio de seus poemas aquilo que
estava no lugar que ninguém poderia ver – a não ser ele
mesmo. E mais do que ver, sentir. E quando ele coloca em
palavras suas esperanças, suas incertezas, suas amarguras,
suas pequenas alegrias, eis que tudo toma forma e, tal qual o
subir da maré, se ergue e preenche parte da praia.

Então você se dá conta: você também está na praia e seus pés


estão à mercê das águas que chegam vagarosamente em
ondas. Você titubeia em sair, mas não há para onde correr. As
ondas vem. E enquanto você navega nas águas da vida, você
sente. Pois é humano. E está à mercê da maré chamada, para
uns, acaso, para outros, destino. E Victor Henrique, em sua
antologia, divide-a em três momentos: Amor, Morte e
Transcendência.

Pois quando você sente o AMOR, por obra do acaso ou do


destino, 11.635 km podem ser facilmente transpassados por
uma conexão aérea ou marítima. Mas dificilmente suportados
quando você percebe que não é a distância física que te separa
daquela pessoa que você se enxerga parte. Mas a distância
sentimental, que nada mais é do que uma muralha erguida e
que, do lado de quem ama e não é correspondido, não há
escadas, não há saídas. Apenas um muro se ergue de
esperanças. Esperanças que, com um tempo – e com certa
uma dose de dor – se transformam em MORTE, pois assim
como a esperança, o amor não mais correspondido, em dado
momento, se torna pó.

Das poeiras, aos poucos, surge uma pequena fagulha. Às


vezes, vagarosa, outras vezes, forte como uma estrela no céu
escuro. Então você se agarra a ela. E percebe que a
TRANSCENDÊNCIA é parte natural desse ciclo. Você ama,
morre e transcende. E, desta maneira, você amadurece. Você
vive.

Assim, convido os leitores desta antologia a mergulharem na


maré de Victor Henrique. A caminharem pela praia de seus
sentimentos. A empaticamente se transportarem para o mundo
de poemas em que ele pincelou com seus mais sinceros e
ternos sentimentos. Por fim, desejo-lhes uma boa leitura.

Um forte abraço,

Juliano Schiavo
Jornalista, escritor e biólogo
Palavras do autor

O amor é uma temática sempre abordada pela literatura, seja


pela sua complexidade, dificuldade ou pelo fascínio despertado
em nós.

Entretanto, ao contrario do que é pregado, ele não é estático,


imutável ou imortal, tampouco perfeito. O cerne desse
sentimento fascinante é justamente sua maleabilidade:
característica essencial para continuar vivo, para reinventar-se
e sobreviver às adversidades.

Como muitos sabem, amar é morrer um pouco a cada dia, é


deixar de ser quem acreditávamos que fôssemos para dar lugar
a quem podemos ser: é a morte simbólica em prol do
(re)nascimento transcendental.

O objetivo dessa obra, portanto, não é apenas mostrar poemas


que representem os sentimentos vividos em momentos
específicos após a separação do ser amado, mas, antes de
tudo, mostrar como tais sentimentos são a força motriz para o
desenvolvimento da própria individualidade, do amor próprio e,
finalmente, da transcendência.

Logo, é fundamental ter em mente que a função primordial do


amor, não é a de manter duas pessoas unidas: isso é apenas
uma consequência. Sua função primordial é de estimular o
deslocamento do indivíduo, saindo de si mesmo e indo ao
encontro do outro, do desconhecido. Somente aqueles que
estão dispostos a entrar no submundo do desconhecido, estão
aptos a utilizar seus tesouros.
O amor é a alquimia mais poderosa que existe e a coisa mais
divina que podemos experimentar.
Sumário
Introdução ............................................................................................... 15
Flecha de Ártemis ........................................................................................ 15
Capitulo 1................................................................................................. 17
Amor: O Nigredo .................................................................................. 17
Caçando Estrelas ..................................................................................... 19
Dois Grãos em um Trilhão ....................................................................... 21
Nuvens ................................................................................................... 23
Ponte Invisível......................................................................................... 25
Caronte................................................................................................... 27
Corrida Sob a Chuva ................................................................................ 29
Ser Sintético............................................................................................ 31
Sobre Pétalas que Morrem ....................................................................... 33
Nós do Tempo......................................................................................... 35
Verbo Haver ............................................................................................ 37
Capítulo 2................................................................................................. 39
Morte: O Albedo ................................................................................... 39
Desafio ................................................................................................... 41
Correr ..................................................................................................... 43
Despedida ............................................................................................... 45
Ilusões .................................................................................................... 47
Inconstância ........................................................................................... 49
Assassino Passional ................................................................................. 51
Sobre Melancolia ..................................................................................... 53
Sobre o Amor .......................................................................................... 55
Piano Mudo ............................................................................................. 57
Dívidas e Dúvidas .................................................................................... 59
Névoa Congelante ................................................................................... 61
Versos e Apertos ..................................................................................... 63
Sobre Corações que Secam ...................................................................... 65
Capítulo 3................................................................................................. 67
Transcendência: O Rubedo .................................................................. 67
Desilusão ................................................................................................ 69
Poeira Galáctica....................................................................................... 71
Abismo ................................................................................................... 73
Transcendência ....................................................................................... 75
Estiagem ................................................................................................. 77
Self ......................................................................................................... 79
Introdução
Flecha de Ártemis
Sigo seus sinais,
engano minha intuição,
mas, no final das contas,
ainda posso senti-lo vindo.
Com meu guarda-chuva cheio de buracos,
e meu escudo fragilizado,
sigo por essa floresta tenebrosa,
e grito,
o sentimento morrido.
Sigo seus sinais,
e não olho para trás,
porque ela hei de alcançar-me,
então escondo-me,
contenho-me,
mas ela está em todo lugar.
E por medo de errar,
já terei errado,
e com medo de escolher,
já terei escolhido.
Então, sigo os sinais,
e abraço o fim,
pois não existe vida sem amor,
e não existe amor sem morte.
Sigo os sinais,
pois a caça nunca termina,
e eis que amor e morte,
sustentam a vida.

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Capitulo 1
Amor: O Nigredo

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Caçando Estrelas

Durante a noite,
enquanto o espero,
fico à espreita,
caçando estrelas;

E em sua ausência,
nada me contenta;
e sua ausência,
é o que me esquenta;

Pois sei que depois dela,


você voltará,
e tudo que estava vazio,
se preencherá.

Durante a noite,
enquanto o espero,
eu apenas espero,
que não tenha mais que esperar,

Porque a espera consome,


e enquanto você some,
fico à espreita,
caçando estrelas.

19
20
Dois Grãos em um Trilhão

Somos como grãos de areia,


soprados pelo vento, E se antes eu olhava para o
de partes diferentes céu
viemos para essa ilha; e esperava pelo milagre,
agora olho para os lados
De tantos grãos, e o vejo em toda parte.
de tantas ilhas,
de tantas vidas Somos grãos de areia,
vividas; tão pequenos e frágeis,
mas se tiver você,
Mas o milagre se fez, me sentirei à vontade.
e quilômetros viraram
centímetros, Somos uma partícula do
mas o milagre se fez, Todo,
e agora o sinto. e somos uma partícula um
do outro,
Somos grãos de areia, jamais iremos nos fundir,
e talvez iremos para longe, mas me contenho em tê-lo
mas como grãos de areia, aqui.
não poderemos ficar tão
distantes.

21
Nuvens
Se todos os suspiros, Mas seu coração foi tomado
me levassem até você, e minha música não o toca,
morreria sem ar, pois seu medo o abraça,
pra te ver; e meu canto não basta.

E se cada gota que caísse, Mas, se todos os suspiros


molhasse minha alma, me levassem até você,
afogar-me-ia, estaríamos juntos,
em sua essência; no mesmo leito,

E em cada sombra, Porque não há força


vejo seu semblante, que combata a verdade,
e em luta, tampouco distância,
travaria o instante. que apague a vontade;

Como quem nada sem rumo, Mas seu coração foi ferido,
encontrei sua ilha, não consigo curá-lo,
e sem armas, e por mais forte que seja o
encarei seus demônios. sentir,
meu canto é fraco;
Canto, canto,
na esperança de apaziguá-los, Mas continuo cantando
e toco sua alma, a esperança em curar,
em ato inquestionável; mas continuo cantando
esperando-o amar.

23
24
Ponte invisível
O amor é a melhor ponte sonho e sorte;
entre duas almas, Entre a potencia e realidade,
dois vazios, entre desejo e saudade,
dois olhares, entre ter e ser.
dois calores. O amor é
É a menor distancia, todas as exclamações
entre dúvida e certeza, que se impõe,
contentamento e beleza, e todas as virgulas,
festa e avareza. que insistem em reaparecer;
É o único destino Todos os “adeus”,
dos soldados de chumbo, acompanhados de “olá”,
feitos de carne; e todos os finais,
e o maior temor, que acabaram de começar.
dos falsamente corajosos; É, no fim,
Pois o amor é, a única coisa que persiste,
e sempre será, e resiste,
o melhor atalho ao tempo.
entre a vida e a morte,

25
26
Caronte

O amor não morre,


o que morre é o que o
move,
lentamente,
tento;

Suprimindo,
como quem segura o vento,
ele escapa,
e se instala;

E antes que diga que amei


eu amo,
e antes que diga que
esqueci,
canto.

Quando noto,
o coração
que dizia estar vazio,
está amando;

E quando sigo
estou voltando,
porque no fim,
não há enganos.

Conheço o Hades
e, como poucos,
sei por onde ir,
para não sucumbir;

27
Sigo pelo rio da morte, e eu brilho em você,
e com uma dose de sorte, e se houver um inferno
hei de chegar, entre nós,
até você; serei o rei do Hades;

Pois nunca esqueça:


eu serei sua luz, E se não pudermos voltar,
quando o mundo ficarei com você,
esquecer de sorrir; e de fogo e lama,
surgirá o paraíso;
Eu serei o Caronte,
que o trará de longe, Porque no inferno,
para que siga adiante, com você,
comigo; eu aceitaria
viver.
Porque quando digo que
amei, Mas o prometi o mundo,
eu amo, então fiz de mim Plutão,
e quando digo que morri, e agora o reino dos mortos
eu volto; é onde vivo.

E jamais morreria Fiz do inferno,


sem vê-lo por mais um dia, paraíso,
e jamais permitiria, e meu prêmio,
que sua luz apagasse, pois, será seu sorriso.

Você brilha em mim,

28
Corrida sob a Chuva

Mediocridade é molhar os pés,


em meu oceano de sentimentos,
e achar que só com isso,
me contento.

Tolice é renegar o que sente,


e tornar-se indiferente
quando me afogo nas dúvidas,
crescentes.

Sabor é quando lembro,


que o mundo tem o talento,
de fazer tudo girar,
e o que é seu, terás.

Realização é quando aceito,


que depois de todos os erros,
você é o presente,
que tem me deixado contente.

Medo é saber que depois do nosso encontro,


vejo-me em escombros,
da distância necessária,
para que a fortaleza se faça.

Esperança é persistir,
naquilo que sinto que está por vir,
mas que a razão nega,
e a fé completa.

Amor é a eterna busca,


e a constante luta,
entre o querer e o poder,
o saber e o temer;

Entre a distância e relutância,


de aceitar que nem tudo
é quando e como desejamos,
mas sempre melhor do que esperamos.

30
Ser Sintético

Talvez eu seja mesmo o último,


a me despedir,
e a despir,
toda armadura que me resguarda.
Talvez seja o último a aceitar,
e a compreender,
que existe uma força maior em viver,
e não há equívoco em ser quem se é.
Não há erro em sentir o que se sente,
pois talvez fosse erro eu não ser o último,
tentando agradar toda essa gente;
Mas sei que sou o primeiro
a sentir e a sofrer:
o primeiro a querer morrer.
E a vida é essa,
resumida em querer te ver,
onde não importa quem chega antes,
ou quem vai depois;
Porque se eu for o primeiro ou último,
saberei que há de chegar minha vez,
e não há equívoco,
ao abraçar o imprevisível,
tudo torna-se vivo.
E desejo apenas,
amar até o último suspiro,
pois não consigo negar,
o impulso que me guia.

31
Não consigo ser sintético
sabendo os detalhes da vida,
pois sou supernova de sentimentos,
e é impossível controlar aqui dentro.
Não serei o primeiro nem o último,
Serei único.

32
Sobre Pétalas que morrem

Fui todas as coisas que poderia,


e ofereci todas as pétalas que gostaria,
olhei nos seus olhos,
senti sua alma;

Fui todos os infinitos


que alcancei,
e o abracei inúmeras vezes,
como se fosse a última;

Corri as distâncias que suportei,


e chorei
ante minhas fraquezas,
e meus erros;

Persisti,
resisti,
fugi,
reagi;

Violentamente,
nadei contra o rio,
que sem permissão,
se impôs entre nós;

Derramei
muitas lágrimas,
e muitas pétalas,
com minhas juras escritas;

33
E acabei
acabando com quem fui,
construindo quem me tornei,
e espalhando;

Pétalas que morrem,


mas que chegarão até você
e de alguma maneira,
hão de florescer.

34
Nós do Tempo

Há um lugar em mim,
onde nunca dissemos adeus,
onde não há dor,
e nossas mãos ainda estão dadas;

Há um lugar em meu âmago,


onde ainda caminhamos na praia,
onde olhamos as estrelas,
e conversamos sem preocupação ou mágoa;

Há um lugar intocado,
onde você ainda põe sua música favorita,
e me acorda com café na cama,
lendo, para que sinta sua voz bonita;

Há um lugar em mim,
onde nem eu,
nem você,
morremos pelo tempo e distância;

Há um lugar,
em algum lugar,
que nada, nem ninguém, pode abalar,
onde o protejo como o tesouro que eras;

É o lugar onde tudo foi,


e não mais será.
Um lugar que posso,
raramente visitar;

A esse lugar nomeio passado,

35
que jamais passará,
pois nesse lugar,
ainda somos "nós";

E os nós do tempo,
não podem nos sufocar,
porque nesse lugar,
nada mudará.

36
Verbo Haver

Ha um tanto de beleza
na amargura,
Um tanto de dor
na despedida,
Um tanto de dúvida
na ferida.
Há um tanto de indiferença
no olhar,
Um tanto de desejo
em ficar,
Um tanto de liberdade
na busca.
Há um tanto de amor
em tudo,
Um vazio
maior que o mundo,
Há um tanto de você
em mim.
Há um tanto de escuridão
no brilho,
Um tanto de tudo
no vácuo,
Um tanto de querer
em negar.
Há um tanto de hesitação
em recomeçar.
Há a vontade de vencer,
em tentar.

37
38
Capítulo 2
Morte: O Albedo

39
40
Desafio

A distância conspirou,
e assoprou,
em minha face
tomada por lágrimas.
Acreditei em minha força,
como quem acredita no amor jovem,
e lutei, lutei,
contra o oceano que aumentava.
Os dias passavam,
e o sentimento se instaurava
mas, cada vez mais,
via que sozinho estava;
E o oceano afastava,
tudo que não importava.
Abruptamente notei,
que seu amor dissipava,
e a distância que fora inimiga,
passou a ser amiga,
porque foi ela quem ensinou
uma grande lição de vida:
Não se pode forçar
o que a natureza está a criar,
e não se pode obrigar,
alguém a te amar;
pois, se amor é fogo,
distância é vento,
e o verdadeiro sentimento,
há de tornar-se firmamento.

41
42
Correr

Corri pela escuridão,


e vi as ondas tentando me Vi aqueles prédios tortos da
tocar, orla,
desviando, e mais casais apaixonados,
acreditava que nada iria me mas, espero que todos eles,
parar. valorizem o presente dado;

Vi casais em seu amor fugaz, Porque o amor, por mais


e lembrei que há pouco, forte que pareça,
eu quem estava lá, é frágil e delicado:
queimando de amor até nada precisa constantemente ser
sobrar. retocado,
para que o mal permaneça
Vi as aves, do outro lado.
fugindo de minha presença,
mas eu era apenas um vulto Então continuei a correr,
condenado a uma sentença. na esperança de que tudo
sumiria,
E a música tocava, mas os problemas fazem
dizendo coisas que eu não parte da vida,
diria, e tentar escapar seria tolice
aflorando sentimentos que minha.
eu sequer,
sabia que ainda sentia; Senti a brisa gelada ressoar,
e vi a imensidão solitária do
Olhava o horizonte, mar:
vendo somente escuridão e eu era apenas um corredor,
luzes, aguardando a bússola
e o formato das ondas na apontar.
areia
distorcia a sinfonia.

43
Revisitei memórias, Deixo meus restos na praia,
ressenti sentimentos, e aguardo pacientemente
agradeci o aprendizado, alguém,
continuei correndo; para derrubar meu castelo de
areia,
Não sei o fim dos e permitir que a grama
apaixonados, cresça;
tampouco sei o fim do
caminho, Porque eu corri
apenas continuo a correr, o mais longe que pude,
esperando um novo destino. e desmoronei,
por trás das paredes de
Minhas pegadas ficaram na areia;
areia
mas, logo serei apagado, E não há oceano mais
importante mesmo é ser profundo,
lembrado, nem muros mais altos,
por aqueles por quem fui que aqueles construídos,
amado. para um coração desolado.

44
Despedida

Nós aprendemos a viver sem,


a esquecer,
a negar,
a seguir e a apagar.
Aprendemos a não chorar,
a reprimir,
não sentir,
a sorrir.
E aprendemos a nos despedir,
a não prender,
a dizer adeus,
a não olhar para trás.
E antes que possamos aprender mais,
aprendemos a morrer vivendo,
pois, em cada adeus,
há uma morte,
e viver dizendo adeus,
é morrer vivendo.

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46
Ilusões

Somos todos famintos


por ilusões,
que nos preencham,
nos confortem,
que nos deem sustentação ao viver,
que as vezes de tão pesado,
nos faz querer morrer.
E aquele que incorre no erro
de crer em sua vã racionalidade,
é duplamente iludido!
Pois se ilude primeiro,
em crer que não pode se iludir,
e se ilude depois,
por crer que há razão;
E até há razão:
a razão que a gente cria,
em cima de outra,
Ilusão.
Porque não choramos
o amor morrido,
o coração partido:
choramos o que poderia ter sido.
Não choramos os feitos
mas sim os erros,
pois eles são a fonte da ilusão,
do que poderia ter sido feito.

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48
Inconstância

De tanto me empurrar,
aprendi a voar,
e o amor que jurei não matar,
foi jogado ao mar.

Em seu tolo esforço,


de me fazer esquecê-lo,
aprendi a conviver,
com cada um de meus erros;

E o maior deles,
foi acreditar,
que você algum dia,
poderia ficar;

Pois Seu desejo era volúpia,


o meu, constância,
e fiz de suas palavras,
verdades absolutas.

Agora não quero lágrimas,


melancolia ou drama,
fique com sua intensidade,
fique com sua chama.

E quando recordar
do amor que cansei de dar,
deixe-se mergulhar,
em seu próprio rio de lágrimas;

Porque deixar de pensar,

49
não é saída: é armadilha,
e deixar de te amar não é possibilidade,
é liberdade;

E quando sentir o que negou,


sinta seu fogo,
pois amor é chama,
e o seu apagou.

50
Assassino Passional

Dor inenarrável, E a dor do não sentir,


a do nada sentir, é saboreada lentamente,
por ter sentido, como veneno,
tanto; injetado diretamente;

Aos prantos, Nas veias,


choro ao vazio escorrem os rios,
que preenche, de lágrimas já secas,
a imensidão escura; Viro pedra;

A ternura, E a dor do não sentir,


se esvai, não some jamais,
e piscando, porque, mesmo não
Tudo se desfaz. sentindo,
ainda sinto muito;
Abraço-me,
como quem tudo perdeu, E não há maldição maior,
e num soco, que o amor que chega sem
derrubo os muros. aviso,
e escorre como sangue,
Não ouço, que mancha.
não vejo,
não sinto: Olho-me no espelho,
é tudo escuridão! vendo todo sangue,
preso em minha pele.
E pelos pontos que passei, Oh céus!
sinto o que foi,
mas não sinto o que é, Eu o matei,
pois o presente é maldição; sou um assassino,
mato sentimentos,
e sua ausência me mata;

51
vou cortá-lo e arrancá-lo de
Me marca, mim,
me mancha, adeus amor,
mas não dissipa, Adeus.
minha vida;
Sangrarei até a morte por
Estou coagulado, sua ausência,
rastejando pela escuridão, mas olhando as estrelas,
segurando-me nos erros, sorrio à liberdade e à dor,
como quem sangra até a por estar vazio de sentir.
morte.
Prefiro a hemorragia do não
Matá-lo foi um tiro em meu sentir,
peito, a dor do sentir muito,
mas sou um assassino, por te entregar o mundo
e se pra matá-lo eu tiver e receber o luto;
que morrer,
você não terá para onde Porque por amor não se
correr. morre,
por amor não se sofre,
Segure minha mão com pois se você estiver
sangue, sentindo isso,
já se tornou um assassino.

52
Sobre Melancolia

A ferida invisível sangra,


e me escondo em sombras,
na esperança de não ser visto,
pela dor latente.
Uma faca sem lâmina
corta meu peito,
e todo ar
torna-se rarefeito.
Sou um pedaço de carne,
com uma espada encravada,
em meu coração que sangra
e que um dia fora esmeralda.
Agora meu coração é carne pútrida,
pois meu peito estava aberto,
e quando abaixei todas as defesas,
me pegaste como uma presa.
O que acontece com o sentimento
que não tem onde viver?
O que acontece com o sentimento
que tem de morrer,
porque o coração está podre
e o peito vago?
Contamina todo corpo!
pois sentimento sem morada,
é veneno:
lentamente contamina
e mata.

53
54
Sobre o Amor

O amor é uma promessa de felicidade,


até que termine e te mostre o que é de verdade;
e cada gota de chuva
o lembrará os dias vividos,
e cada semblante o remeterá àquele sorriso;
Você olhará para o céu e dirá,
que o amor hei de te amaldiçoar,
porque foi tudo o que você desejou,
mas teve que acabar;
E é essa a maldade:
o sentimento é puro e cheio de verdade;
Mas o que realmente dói é o fim,
quase sempre trágico,
quase sempre letárgico,
e o faz desejar nunca ter amado,
até que você encontre outro amor eterno,
fadado ao fim.
É disso que vivem os amantes,
isso que faz das pessoas tão,
inconstantes:
Possuir o que não se tem,
e lutar contra o fim,
que sempre vem.

55
56
Piano Mudo

Com seu distanciamento


aprendi a ler o silêncio,
e ao tocar o intangível,
entendi o incompreensível;

E se antes, a união era eterna,


agora há esse abismo que nos cerca,
e o tocar de nossas mãos
é como um grão em um trilhão;

Entretanto, continuo subindo,


e os degraus se fazem possíveis,
porque o que aprendi com a ausência,
extrapola qualquer ciência.

Desejei longamente,
que me entregasse sua mente,
mas agora tudo que desejo,
é que fiques contente;

Pois aquele seu conselho


de que a vida não é fácil,
fez com que toda vida,
parecesse calvário;

Mas o amor não deveria seguir


nem a ciência e nem sua inocência,
porque amor improvável é aceitável,
mas o impossível,
é irresistível.

57
Então aprendi a tocar sua música,
porém seus ouvidos não a escutam,
então não faz diferença o amor ou desprezo,
se não há por quem ter desejo;

Agora toco essas notas


vindas de um coração desalinhado,
mas sei que algum dia,
estarei novamente afinado.

58
Dívidas e Dúvidas

O amor é mentira
e é incerteza,
porque aqueles que dizem amar,
ainda estão cobertos de dúvidas;
E aqueles que dizem não sentir,
estão cobertos de mentiras.
E tamanha convicção em sentir,
nada mais é que estaca em lama,
e a luta em negar
é batalhar pela derrota;
Porque amor é mentira
quando se promete o futuro,
sem conhecer o presente,
e é incerteza,
quando prometemos
que tudo será para sempre;
Mas aspiramos seu cheiro,
e inspiramos os desejos,
de que o amor seja eterno,
e que sempre bata em nosso peito;
E por mais que prometamos
que não mais o alimentaremos,
lembramos rapidamente,
dos erros que cometemos;
Quando dizemos que é o fim,
começa,
e quando dizemos que é para sempre,
cessa.
E mesmo escondendo as bússolas,
nosso coração pulsa
para seguir o velho,

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destino chamado amor;
Porque é mentira
que um coração não se cura,
e é incerteza
não mais amar outra criatura;
Porque, às vezes, o que dizemos ser fim
é apenas ínterim,
e, às vezes, o ódio jurado
é amor camuflado;
Pois, é tudo mentira
quando dizemos que,
jamais o teríamos amado
se soubéssemos sobre o fim,
antes de ter começado;
Porque sabemos,
sempre sabemos,
que amor é incerteza,
de alegria,
ou de tristeza.

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Névoa congelante

Invadem-me E o futuro promissor,


como navalhas, é engolido pelo oceano,
cortam o que vivo Seco,
e jogam-me na inexistência. Pois estou navegando
por essas lembranças de
Na frieza da noite morte;
aconchegam-se,
mas não são bem-vindas, Então, o silencio continua a
e ficam; gritar,
pois estou a ser engolido,
Como quem nunca foi, por lembranças,
dominam cada polegada, de minha própria morte;
noto-me possesso,
luto contra o invisível, Lembranças do que foi,
contra esse oceano seco. e do que fui,
porque lembranças são,
A névoa do frio, Tudo,
que logo dissipará, em meio ao,
escurece minha frágil visão, nada.
contagiando tudo;

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Versos e apertos

Havia noites em que eu chorava a seco,


tão seco quanto o ar que preenchia meu peito.
Mas é uma característica do poeta,
falar flor e chorar sangue.
É o morrer em cada verso,
o renascer em cada estrofe.
Talvez eu já esteja morto,
e estou apenas revisitando minhas memórias.
E vago,
nesse vazio afago,
porque, as vezes, estar em lugar nenhum,
me poupa de sentir.
E sinto, sinto muito,
se você estiver chorando sangue também.
Lembre que morri,
mas foi a morte mais bela:
foi por amor;
e sentir,
e poesia,
e fim,
e recomeço.

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Sobre corações que secam

O que dizer à luz


que foi corrompida, - não adianta chorar,
pelo frio tentador, no ritmo que está,
de viver escondida? você terminará por secar.
Coração.
E como lidar,
com a hemorragia Por que não me ouves?
sentida sou a voz da razão,
com ausência de pontos? e nada exercerá controle
sobre minha ausência do
Limites, sentir;
dúvidas,
sofrimentos. Negação,
isso é ser humano. mentiras,
persistência.
E o que dizer, Isso é ser humano.
ao indivíduo que secou
depois de tanto sangrar, Não seria portanto,
e decidir que nada mais o amor a maior demência ?
sentirá? o homem racional
transforma-se em passional.
São corações que secam,
amores que não duram, Catarsis!
pessoas que não ficam, é o coração que seca,
destinos que não se cruzam. mas a alma ainda vibra,
então apostarei a vida.
Catarsis!
viva a explosão do agora.
porque o destino de todo
apaixonado,
é ter o coração despedaçado.

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Todo início é o fim da busca, Mas o coração está seco,
todo término é o adeus eterno, e a alma está cheia,
e quando a flecha fere, então tentamos mais uma vez,
sempre prometo que será a pela última vez.
última;
Isso é ser humano.

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Capítulo 3
Transcendência: O Rubedo

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Desilusão

Aquele é o ponteiro do relógio


que gira tão fortemente quanto o mundo,
aquele ponteiro gira,
destruindo tudo;

Essa contagem nunca termina,


e a espera martiriza,
pobres almas humanas,
pequenas e imundas;

Esperam que o ponteiro pare


mas ele não segue ordens,
tamanha a esperança
ante a desordem;

Os dias passam,
e ainda aguardam,
pelo amor que há de chegar,
quase sempre, falho;

O que vive é a esperança,


tola, que ainda há de lutar,
pois o amor que vocês desejam,
morreu antes de despertar;

E quando seus ponteiros pararem,


lembrem -se de todos os amores assassinados,
porque cada amor vivido pela metade,
é desespero para a eternidade.

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Poeira galáctica

Às vezes, paro
e sinto – me,
toco minha própria pele,
encaro meu próprio reflexo,
procuro rugas,
encontro novas marcas,
vejo meus olhos,
mudarem de cor.
Algumas vezes
memorizo sorrisos,
analiso expressões,
aperto mãos,
abraço e,
sempre,
tenho a consciência,
de que em algum momento,
serei pó,
e que antes disso,
terei sangrado,
e morrido,
inúmeras vezes.
Às vezes sinto
a mudança que não vejo,
as marcas que não mostro,
as lágrimas,
que nunca mais,
hão de escorrer
em demasia;
sigo,
reluto,
contra a força,

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contra o tempo,
Contra tudo que me levou,
a ser,
quem sou.

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Abismo

Sinta as raízes,
vindas de seu submundo,
e sinta-se,
consumir pelo Todo;
Ajoelhe-se,
ante a soberania,
entregue sua vida:
existência é poder,
e Morrer é escolher,
Entre todas as portas,
Uma contém a luz
e a saída,
mas não a verá,
enquanto não for consumido,
pelo submundo;
Pois, somente os que perdem
podem ganhar,
e somente os que sacrificam
sabem valorizar,
sentimentos arcaicos,
impronunciáveis.

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Transcendência

Mergulhe, Sentir,
até a árvore da vida, é a única maneira,
e encontre, de ser você;
sua fonte de ilusões; E olhe,
Crescer nunca foi fácil, o sol e a lua,
transcender, em perfeita harmonia,
não é palpável. Transcender,
Siga a intuição, todos os dias.
abra-se para a escuridão, Grite,
transcender, quebre,
supera qualquer razão; jogue-se,
Ouça os sons entregue-se,
de suas batidas, E quando ser você,
esmague todos os não o saciar,
sentimentos, transcenda
de sua vida, e seja,
beba seu sangue, Tudo.
afogue-se nele;

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Estiagem

Sou um punhado de Tentei ser tudo,


sentimentos e o tentar,
descartados, fiz de mim,
E jogados, nada,
ao oceano profundo;
Em dada hora,
Sou os sentimentos que de tanto tentar,
matei, consegui,
enquanto vivia, anular,
morrendo,
sofrendo, Tudo que fui,
tudo que deveria ser,
Por essas ruas, meu oceano,
por essas avenidas, de sentimentos;
tão cheias,
mas tão vazias; Seco, sob a veloz brisa,
seco por aqueles que
Sou tudo que disse, bebem,
tudo que neguei, mas não abastecem,
tudo que fiz florescer, nada;
tudo que sequei;
E no nada,
Fui tudo, está tudo
inclusive, perfeitamente, que fui,
imperfeito, que seria,
cheio de erros;
Se não tivesse
desejado tudo,
se não tivesse,
sido nada.

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Self

Eu sou
todo o amor que poderia ter desejado,
todas as limitações que proclamei,
todas as dores que chorei,
todos os deuses que cultuei.
Sou o centro do meu próprio mundo,
e aquele na beira do precipício;
Sou as flores que secaram
e as sementes que semearam;
Sou todas as coisas que poderia ter sido,
todas as coisas que gostaria de ter vivido,
todos os amores
pelos quais teria morrido.
Sou o início e o infinito.
Sou mar,
de possibilidades,
a luta do profano
com a divindade;
O desejo,
e a saudade.
Sou o que gostaria de ter dito,
e silenciei,
sou todos os sentimentos
que gritei.
Sou todas as crises,
pelas quais passei.
Sou o que gostariam
que tivesse sido,
e a rebeldia,
descabida.
Sou o nada, buscando,

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aprendendo,
vivendo,
sofrendo,
Amando.
Sou o Todo.

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