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I N S T I T U T O DE E S T U D O S B R A S I L E I R O S
M u r i llo M a r x
d ir e to r
Y ê d d a D ia s Lima
vice-diretora
C e c í l i a de Lara
J o a c i P e r e i r a F ur t ad o
M a r c o Antôn io Silveira
Ronald Polito
coordenação
J o a c i P e r e i r a F ur t ado
O viver em colônia
c u ltu ra e so c ie d a d e no B r a s il c o lo n ia l
cadernos do i eb
cursos& conferências
C a d e r n o s do IEB
editora
M aria Cecília F e r r a z de C a s t r o C a r d o s o
comissão e d i t o r i a l
Mayra Laudanna
1999
Introdução
Ceei li a de L ara
IE B / U S P
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2 M E N D E S , Murilo. Roman ceiro da Inconfidência. Vanguarda, Rio de Janeiro, 1953 (Rep ro duzido
na Fortuna Crítica da Obra Poética).
i D ad o s informativos retirados das fontes citadas na Bibliografia.
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Ver nota 4.
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T u d o m e ch am a: a p o rta, a escad a, os m u ro s,
as lajes d o s m o rto s ain d a vivos
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A i, qu e rios c a u d a lo so s
e q u e m o n ta n h a s tão altas!
A i, q u e reb an h o s de n egros,
e q u e fo rm o sas m u latas!
H a v ia várias im ag en s
na cap ela d o P o m b al:
e p o rta d a de c o rtin as
e san efa de d a m a sc o
e, no altar, o seu fron tal.
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E ra em m aio , fo i em m aio
E ra em m aio , fo i p o r m aio
E m m aio ! F o ra p o r m aio !
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A i, p o b re m ão d a lo u cu ra,
q u e m ataste p o r am ar!
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Q u e m ord en a, ju lg a e pune?
Q u e m é c u lp a d o e in ocen te? (F ala inicial)
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B IB L IO G R A F IA C O M P L E M E N T A R
VARNH AGEM , Francisco Adolfo de. História Gemi do Brasil. São Paulo, 1952. 14.
2.1 Geral
A N D R A D E , M ário de. Cecilia Meirelles e a poesia/Viagem. In: ____ O
empalhador de passarinhos. São Paulo: M artins, 1946.
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L IN S, Alvaro. D ois poetas e uma poetisa. I n : _____ Jornal de Crítica, 5a. série.
Rio de Janeiro: José O lym pio, 1947.
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A colônia dos espelhos:
história e brasilidade em leituras
das Cartas chilenas
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H istó ria S o c ia l/U S P
5
e aos textos acadêmicos os motes fossem indispensáveis, a
este bem que caberia aquela frase de Pablo Picasso que diz: “a
arte começa onde o realismo termina” 1 O que, entretanto,
para estranhamento inicial e decepção definitiva do leitor, resulta
ria glosa primeiro difícil e depois manca, não só pela claudicância
do acadêmico que macaqueia o versejador, mas também porque,
na recepção das Cartas chilenas, quase nunca há começo e fim en
tre realism o e arte. D ito de outra m aneira, predom ina na
historiografia e na crítica literária o pressuposto de uma totalidade
prévia que a sátira gonzaguiana “reflete” “retrata”, “espelha ou
“ ilustra” Em última instância, “o texto é dado como uma janela
que deixa ver uma paisagem além dele que seria o real’”2 E como,
para efeitos de estilo, aqui a história começou pelo fim, é bom que
se dê notícia de seu princípio e não se abandone a linearidade
cronológica, como requer o decoro acadêmico.
Desde que a “Epístola a Critilo” foi impressa, em 1826, no
Rio de Janeiro, inaugurando a lenta publicação do que restou
das Cartas chilenas, o poema sempre foi tomado como momento
literário da gestação da brasilidade —supostamente em trabalho
de parto naqueles tempos de Inconfidência Mineira. Com a ini
ciativa do Jorn al scientifico, economico e litterario, que publicou a
“Epístola junto com o canto terceiro do épico Vila Rica, de C láu
dio M anuel da Costa, as Cartas chilenas passaram a ser incrusta
das na árvore genealógica da literatura brasileira, cujas raízes o
romantismo tratou de escavar no espólio cultural da colônia.
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T r a t a - s e d e u m a le itu r a q u e , s e m a b d ic a r d a in t e r p r e t a ç ã o
r e a lis ta de o r ig e m r o m â n tic a , p rocu ra c o n fo rm a r o
c o n se r v a d o r ism o q u e e stu d o s re c e n te s ra stre a ra m na ob ra
g o n z a g u i a n a 4 à t r a d iç ã o r e c e p c io n a i d a s á t ir a , m a r c a d a p e lo r e fe
r id o v ín c u lo e n tr e o s v e r s o s d e C r it ilo e a c o n ju r a d a s G e r a is .
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V H A N S E N , J. A. Op. cit., p. 1.
A R I S T Ó T E L E S . Poética. Trad. Eudoro de Souza. 2. ed. São Paulo: Ars Poética, 1993. p. 53.
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. LAPA, M anue l Rodrigues. As “Cartas chilenas", um pr oble ma histórico e filológico. Rio de Jan e i
ro: M E C / I N L , 1958. p. 51.
10 C A S T R O , A. P. de Castro. Op. cit., p. 6 3 4-5 . Ver ta m bém p. 6 3 8.
G O N Z A G A , Tomás An tônio. Poesias - Cartas chilenas, Rio de Janeiro: IN L , 1957, p. 233-4 .
Todas as citações do poem a foram retiradas desta edição.
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Apu d C A S T R O , A. P. de. Op. cit. p. 6 3 5 (nota). Francisco de Pina e Me lo tam bém atribuía peso
decisivo à “c o m m o ç ã o ” no exercício da retórica: “ So geitar os an im os, com o concerto, e efficacia das
vozes: en sinando, deleitando, e c o m m ov en d o he que se co nsegue este ar duo empe nho. Facilitar a
dou trina co m argu m entos, a deleitação co m ornato, a c o m m o ç ã o com as im m agens, que se ch a m ã o
patheticas: A doutr in a respeita à necessidade, a deleitação à doçura, a c o m m o ç ã o à victoria: este he
o fim universal da Rhetorica” . Apu d Ibidem , p. 650-1 (nota).
i3. Ibidern, p. 6 6 5 -6 . A propósito cabe lembrar os versos 4 a 6 da “ Epístola a C ri ti Io’ a rigor, a
primeira leitura das Cartas chilenas-, “ Dentro em minha alma / que diversas paixões, que afectos
vários / a um te m po se suscitam.'” (p. 183).
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M “ O contato co m o passado altera o sentido que pode ser conhecido. Estamos sempre nos ombreando
c o m mistérios - não sim plesm en te a ignorância (fenôm eno familiar), mas a insondável estranheza
da vida entre os mortos. O s historiadores voltam desse m u n d o c o m o missionários qu e partiram
para co nquistar culturas estrangeiras e agora retornam convertidos, rendidos à alteridade dos o u
tros’ . D A R N T O N , Robert. O beijo de Lamourettr, mídia, cultura e revolução, Trad. Denise Bottmann,
S ão Paulo: C o m p a n h i a das Letras, 1990. p. 13-4. Sobre as relações entre literatura e história ver
F R E I T A S , Maria Teresa de. A história na literatura: princípios de abord agem ’ . Revista de História ,
S ão Paulo, n. 1 17, p. 171-6, ju l ./d e z ./1984.
IS V E L O S O , M ôn ica Pimenta. A literatura c o m o espelho da nação. Estudos históricos, Rio de Ja n e i
ro, ano 1, n. 2, p. 2 3 9 - 6 3 , 1988. p. 241.
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lf’ . S e gu n d o eles, a leitura, enquan to acto, nunca é inocente, o que não significa que seja culpada,
mas que a verdade do texto é a sua leitura’ . B A R T H E S , Roland, M A U R I È S , Patrick. Leitura. In:
Enciclopédia Einaudi. Trad. C on ce iç ã o Pais et al. Lisboa: Imprensa Nacional, 1987. v. 1 1, p. 184-
20 5.
I7. C o m o bem observa Flora Süss ekind, “ Meio filho pródigo, meio espelho, meio fotografia; é uma
busca de unidade e de especifidades qu e possam fundar numa identidade nacional que se co stum a
definir a literatura no Brasil. E, diante da im possibilidad e de se fugir ao ‘dese nraizam ento ’ , à ‘orfan-
dad e’ , o projeto de uma literatura realista’ e ‘d o c u m e n ta l’ parece viajar em direção à utopia se m e
lhante a C o m a la , a cid ade-fan tasm a de Pedro Páramo. E, qu anto mais longe a identid ad e e a na cio
nalidade qu e busca, tanto m aior a exigência que se faça da linguagem apenas med iad ora invisível’
de um a viagem impossível. M edia dora de um a tal literatura brasileira’ qu e procura um Brasil, um a
‘verdade’ , u m a nacionalidad e’ , qu e possa reproduzir de m o d o fiel". E, mais adiante, acrescenta algo
sobre o romance naturalista qu e pod e ser aplicado à crítica literária brasileira desde o século XIX :
“ Discurs o m imético, ao naturalism o deveria co rresponder um leitor igualmente mimético. Se o
texto co nfirma um su post o real, ao leitor caberia reafirmar as significações e a representação do
m u n d o qu e o texto lhe apresenta c o m o verdades. Tanto o texto se dissimula o seu funcionamento e se
nega sistematicamente o estatuto de ficção, quanto do leitor se retira a condição de intérprete. Am bos,
texto e leitor, dentro da pr ogram ática naturalista, parecem se definir co m o transparências, co m o
satélites ou espelhos de um a significação qu e se encontra fora deles, num a exterioridade, num refe
rente que lhes serve de modelo. N ad a define melhor o papel d o leitor de um texto naturalista do que
a ênfase em apenas um órgão: o olho. Em apenas um a função: olh ar’ S Ü S S E K I N D , Flora. Tal
Brasil, qual romance? Rio de Janeiro: Achimé, 1984. p. 107. G rifo no original.
O R T I G U E S , E. Interpretação. Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa N acio n a l/C a sa da M o e
da, 1987. ,. 1 1. p. 2 1 8 , 2 2 0 , 231.
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19. R I B E I R O , Santiago N un es. (nota). In: G O N Z A G A , To más Antônio. Cartas chilenas... Minerva
brasiliense; bibliotheca brasilica, ou collecção de obras originaes, ou traduzidas de autores celebres, Rio
de Janeiro, ano 8, n. 1, p. 4, 1845.
20. SILVA, Rogério Forastieri da. Movimento s nativistas: a história co m o ‘biografia da nação’ ” . Anais
do Museu Paulista. Sã o Paulo, n. 3 9 , p. 125, 1984. C o m o lembra Ja c o b Guinsb urg, “o R om a n tism o
é um fato histórico e, mais do que isso, é o fato histórico que assinala, na história da consciência
hum ana, a relevância da consciência histórica. É, pois, uma forma de pensar que pensou e se pensou
historicamen te” . G U I N S B U R G , Jacob. R om an tism o, historicismo e história. I n : _________ Roman
tismo, São Paulo: Perspectiva, 1978, p. 14. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, criado em
1838, principal responsável pela constituição da memória oficial d o país durante o século X IX ,
surgiu “precisamente q u and o floresciam na França os historiadores românticos, em polg ad os pelas
idéias de liberdade, de exaltação à nacionalidade, cujas origens últimas procuravam reconstituir em
suas obras” . G L É N I S S O N , Jean. Iniciação aos estudos históricos. 2. ed. São Paulo: Difel, 1977. p.
2 5 7 . A m onta gem da genealogia da brasilidade, porém, definiu-se não só em termos do qu e exter
nam en te a diferenciaria do “outr o” , mas tam bém pela ausência dos que, no plano interno, es capa
vam à noção de civilização assum ida pelas classes dominantes. “A leitura da história empr eendida
pelo I H G B está, assim, marcada por um d uplo projeto: dar conta de um a gênese da N ação brasilei
ra, inserindo-a contu d o numa tradição de civilização e progresso, idéias tão caras ao ilu minism o. A
N ação, cujo retrato o instituto se propõe traçar, deve, por tanto, surgir co m o o desd ob ram ento , nos
trópicos, de uma civilização branca e européia” G U I M A R A E S , Manuel Luís Salgado. N açã o e
civilização nos trópicos: o Instituto Histórico e Geo gráfico Brasileiro e o projeto de uma história
nacional. Estudos históricos. Rio de Janeiro, n. 1, p. 8, 1988. Ver tam bém p. 14-5.
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o v i v er em c o l ô n i a
21 Sobre o afã arqueológ ico dos primeiros historiadores da literatura brasileira ver C Â N D I D O ,
An tonio. O método critico de Sílvio Romero. São Paulo: Edusp, 198. p. 16-28; S C H A P O C H N 1 K ,
Nelson. Letras de fundação, Varnhagen e Alencar: projetos de narrativa instituinte. São Paulo, 1992 .
Dissertação (Mestrado) - Departamento de História da Universidade de São Paulo. p. 16. M A R T I N S ,
Wilson. A crítica literária no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982. v. 1, p. 106-24.
Aliás, antes de qualquer análise estética, “A história literária era então a meta alm ejad a pelo crítico,
pois a obra de literatura era considerada parcela integrante e concretizadora do espírito nacional.
Este desiderato [...] tinha em c o m u m desconsiderar qu alq uer especificidade do objeto literário,
fosse po rque se co nsiderava qu e os gêneros literários eram a resultante de uma dete rm inação geral
aos prod ut os históricos (caso de Brunetière), fosse por se julgar bastante a ordenação cronológica e
sua diferenciação por países (caso de De S i s m o n d i ) ” . L I M A , L. C . “ C o n c e p ç ã o de história literária
na Formação". In: D ’ I N C A O , M. A.; S C A R A B Ô T O L O , E. F. (org.). Dentro do texto, dentro da
vida-, ensaios sobre Anto nio C ân d id o . São Paulo: C o m p a n h i a das Letras, 1992 p. 153. Ver ainda
J O B I M , J. L. História da literatura. I n : ________ (org.), Palavras da crítica, Rio de Janeiro: Imago,
1992. p. 139-44.
22. C Â N D I D O , An tonio. Literatura e sociedade. 7. ed. S ã o Paulo: Nac ional, 1985 p. 171. G r ifo no
original.
2b O q ue se a m o l d a per fe itam en te às concepções historiográficas rom ânticas. S e g u n d o Ja c o b
G u in sb u r g , “ E ngatad o no tem po, co m o se quisesse ilustrar a dou tr ina kantiana sobre o espaço e o
tem p o c o m o form as primeiras do co nh ecim en to a priori, o R o m a n tism o , em sua co nsciência
historicista, ta m p o u co podia fugir à relativização qu e C r o n o s im põe a tu do qu an to toca, deuses e
mortais. É certo que, sob - tutela de seus numes ou espíritos (geiste) e de seus heróis por eles
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c a d e r n o s do ieb
inspirados, a história romântica traça a trajetória de cada povo, país ou nação c o m o se ela fosse
im buída de um telos, de um a finalidade a presidir-lhe o sentido de sua existência e nascida de um
ontos intrínseco, do ser-d o-grupo e do ser-em-grupo, cuja verdade específica, irrefutável em seu
específico porque não sujeita a prova empírica ou lógica, inapreensível só pela razão sem o senti
mento e a intuição, guiaria a grei, realizando-se nela e levando-a através de crises e tragédias perso
nalizadas ou coletivas às realizações expressivas de seus fastos e dos feitos de seus ex poentes” .
G U I N S B U R G , J. Op. cit. p. 18-9.
24. J o a q u i m Maria M ac h ad o de Assis ap u d SILVA, lnocêncio Francisco da. Diccionarto bibliographico
portuguez. Lisboa: Imprensa Nacional, 1858 v. 19, p. 26 1 . (Transcrição de artigo originalmente
p ubli cado na revista O futuro em 1 5 de abril de 1 86 3). É certo, porém, que, co m o escritor, o autor
de Memórias póstumas de Brás Cubas destoava da co ncepção de literatura co m o reflexo do meio” ,
então corrente. “ Em vez de fazer de sua obra d ocu m en to e espelho da realidade brasileira, M ach ad o
problematiza e recria essa realidade, fazendo-a emergir em toda a sua tensão e d inam ism o. Aí não
cabem intenções, convicções e projetos a priori. A realidade (seja ela individual ou social) sempre
supera as expectativas e surpreende: ‘ N ão escrevi a história que esperava; a que de lá trouxe é esta’”
V E L O S O , M . P. Op. cit. p. 2 6 1 .
2\ Apud SILVA, I. F. da. Op. cit. p. 260. Le mbrando os princípios empiristas que informavam a
historiografia oitocentista, Nelson Schapochnik, op. cit., assinala que “A similaridade entre o trabalho
do historiador e aquele desempenhado pelos naturalistas reforçava a identidade entre o docum en to e o
acontecimento. Assim o docu m en to era concebido co mo expressão irrefutável do ‘fato’, espelho da
realidade e prova irredutível, uma vez que o d ocu m en to fala por si mesmo’. O primado da observação
satisfazia os preceitos da neutralidade e objetividade exigida pelos historiadores” (p. 15). E, mais
adiante, acrescenta: “ O valor de uma obra literária era determinado pela sua função referencial, e o
critério da seleção tendia a privilegiar aquelas obras que poderiam ser convertidas em informação ou
conhecimento útil” (p. 19). O “ levantamento exaustivo de eventos, docu m en to s e personagens” pr o
curava “organizar uma cronologia exaltativa daquilo que passaria a ser compr ee ndido co m o ‘memória
nacional’” (p. 21). C o m o diria Antônio C â n d id o, “ Era preciso mostrar que tínhamos um a literatura,
exprimindo características que se julgavam nacionais; e para lhe dar validade era preciso também
provar que o meio já a vinha destilando antes, graças ao poder causai que lhe atribuíam os pressupostos
românticos” C Â N D I D O , Antonio. Literatura esociedade. Ed. cit. p. 171. C on vém ressaltar, entretan
to, que “A intenção do historiador que escolhe o docu m ento , extraindo-o do conjunto dos dados do
passado, preferindo-o a outros, atribuindo-lhe um valor de testemunho que, pelo menos em parte,
depende da sua própria posição na sociedade da sua época e da sua organização mental numa situação
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o v i v e r em c o l ô n i a
inicial; que é ainda menos ‘neutra’ do que a sua intervenção. O d ocu m en to não é inócuo. É antes de
mais o resultado de um a montagem , consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade
que o produziram, mas t am bém das épocas sucessivas durante as quais c ontinuou a viver, talvez esque
cido, durante as quais continuou a ser m anipulado, ainda que pelo silêncio. O d ocum ento é uma coisa
que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser
em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu significado aparente. O d ocum ento é m o n u
m ento. R esu lta d o esforço das so c ied ad es h istór ica s para i m p o r ao futu ro vo lu n tá r ia ou
involuntariamente determinada imagem de si próprias. N o limite, não existe um documento-verda-
de. To do do cum ento é mentira. C abe ao historiador não fazer o papel de ingênuo” . LE G O F F , Jacques.
D oc u m en to /m o n u m en to . Enciclopédia Einaudi, v. 1, p. 103.
26 “A exigência de vínculo co m um a realidade nacional aprioristicamente constituída implica na
retom ada da velha co ncepção mimética e co ndiciona a escolha de formas e temas literários. A rejei
ção do universalismo clássico justifica o culto ao esponta neísm o sentimentalista e ao prim itivism o
folclórico. O interesse pelas origens generaliza-se c o m o evocação nostálgica do passado, representa
ção épica de situações e personagens, descrição exótica ou bucólica da terra natal, idealização estere
otipada da cultu ra popular. A essa circunscrição de linguagem vai co rrespon der a cristalização de
u m a im agem da nacionalidade que sublima diferenças e conflitos internos, estigmatiza relações
externas e alimenta o m aniqu eísm o e a xenofobia. Em princípio altam en te fecunda, a relação entre
literatura e história acaba tornan do a am bas prisioneiras de um discurso que exorciza a dinâm ica
histórica, na med ida em qu e se propõe a representar um a essência e uma origem nacionais infensas
a qualquer perigo de co nta m inação ou ruptura e aptas a garantir uma evolução inexoravelmente
contínua e har moniosa. A produtividad e literária é am eaçada pelo atr opelam en to a um a 'natureza’
histórica qu e ela expressa e formaliza, contribui para legitimar e, em troca, lhe coíbe a a u to n o m ia e
a renovação estéticas. Reciprocamente, o processo histórico é esvaziado por uma forma de represen
tação estetizante qu e nele se fundam enta e, em troca, anula seu potencial crítico e tr ansform ad or.’
P E D R O S A , Célia. N a cionali sm o literário. In: J O B I M , J. L. (org.). Op. cit. p. 288.
17 V A R N F 1 A G E N , F. A. d e . ” Biographias de brasileiros distinctos ou de individuos illustres que
serviram no Brasil, &£c. Ignacio José de Alvarenga Peixoto ”, Revista trimensal de historia e geographia,
Rio de Janeiro , n. 13, p. 5 1 5, 1 830. Em 1867 Varnhagen entronizava a sátira na m em ória do Brasil
c o m o ‘ um im porta ntí ssim o d ocu m en to historico, não só para a m onograph ia de M inas, c o m o para
a própria historia geral do paiz; visto qu e nellas se vê pinta do o modelo de outros governadores e
que nada valiam [...] ”. Idem. Histó
capitães-generaes tanto do Norte, c o m o do Sul, e d os Sertões,
ria geral do Brasil, antes da sua separação e independência de Portugal. 8. ed. São Paulo: Melh ora
m entos, 1975. v. 4, p. 4 2 4 . As Cartas chilenas explicariam o fato de os colonos “ tu m u ltu arem ’'
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30 “ O s deuses por direito próprio estavam substituídos por semideuses ou simples heróis, autóctenes,
talvez, mas sem dúvida cruzando o telúrico e o celestial. Em lugar dos porte ntoso s sistemas a more
geometrico (Spinoza), m on ad ológ icos (Leibniz) ou m ecânico-m ate m ático (H olb ach, La Mettrie e os
Enciclopedistas, em boa parte) e das vastas polifonias teológicas (Escolástica árabe-judio-cristã,
Bossuet no Discurso sobre a História Universal), todas axiom ática ou dog m aticam en te arrim ad as nas
‘esferas superiores’ , tinha-se agora uma espécie de nova m itopoética histórica, defroquée, rica pela
variedade e co lorido nacionais de suas epopéias nacionais e coletivas e de seus heróis culturais, mas
carregada de elementos semilendários, em ble m as patrióticos ou paroquiais e idealizações acríticas,
acientíficas, não obstante intuições certeiras e descobertas fecundas, mais tarde verificadas co m os
recursos de uma ciência histórica mais apu rada e rigorosa, cu jo desenvolvimen to, aliás, só pôde dar-
se g raç as a essa s c o n t r i b u i ç õ e s r o m â n ti c a s . E m si, p o r é m , era um d i s c u r s o a r r a i g a d o em
particularismos, quase sempre envoltos em gloriosa auréola nacional e em sim bólicas vestes talares,
senão sacerdotais, parecendo falar de coisas eternas e verdades indiscutíveis. N a realidade, este bri
lho e m atizam ento das cores locais mal co nse guiam ocultar, já então, a prosaica roupa de baixo,
‘civil’ e ‘cid ad ã ’ , o ac entu ado grau de secularização e relativização a qu e estava sendo su bm etid o
tudo no R o m an tism o , inclusive este seu discurso, e que transmutava em essência seu interpretante
e suas expressões’ . G U I N S B U R G , J. Op. cit., p. 19-20.
J ' C Â N D I D O , Antonio. O método crítico... p. 49.
32. R O M E R O , Sílvio. História da literatura brasileira. 6. ed. Rio de Janeiro: José O lym pio, 1960 t.
2, p. 4 2 7-8 . A primeira edição é de 1888.
i \ Ibidem, p. 4 3 3 .
M. Ibidem, p. 42 9.
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c a d e r n o s do ieb
tanto, justamente por ter sido “o que tomou parte mais ativa e
entusiástica na conjuração”34, comungando com sua geração. De
forma que, ao lado dos agora inovadores componentes de ordem
natural, derivados do cientificismo europeu35, vigora a mesma
teleologia que se vinha calcificando nas leituras anteriores —in
clusive radicalizando o significado testemunhai do poema, ao
reduzir sua legibilidade à virtude de registrar, sob vários aspec
tos, a pulsão da autonomia.
A novidade desse olhar teleológico está mais no princípio
evolutivo e determinista que orienta a crítica romeriana do que numa
mudança de comportamento interpretativo. A obra literária perma
nece como um epifenômeno —antes, decorrência do gênio criativo
do escritor em consonância com regras de gênero e bom gosto; ago
ra, sublimação de fatos físicos, biológicos e sociais. Importa tomar o
texto em termos de sua função representativa na linha de desenvol
vimento cultural rumo à “diferenciação nacional”, que na história
da literatura brasileira significa evoluir de uma primeira expressão
da miscigenação racial e da consciência nativa em Gregório de Ma
tos, passando pela destilação do lirismo português em Gonzaga, até
chegar à crítica da realidade brasileira inaugurada porTobias Barreto.36
35 “Abeberar-se da ciência européia é uma condição essencial para vencer os escolhos que a história
e a natureza colocaram no cam inh o do Brasil em busca de sua identidade nacional. A inoculação do
cientificismo de procedência européia na corrente sangüínea de nossa história tem por objetivo criar
os anticorpos necessários para qu e o organ ism o da nação em form aç ão possa eliminar, no processo
de desenvolvimento, as moléstias devidas à natureza, à estrutura racial e à experiência histórica do
colo niali sm o.” O D Á L I A , N . Formas do pen sam en to historiográfico brasileiro. Anais de história.
Assis, n. 8, p. 4 0, 1976.
y*. C Â N D I D O , Antonio. O método critico... ed. cit. p. 52, 101-2. Para Roberto Ventura, “ O natu
ralismo crítico aproxima-se do historicismo, relacionando a ob ra à base social a partir dos elementos
conteudísticos existentes naquela. Essa redução do texto literário à sua estrutura de conteúdo im pe
de a investigação das relações entre forma literária e contexto social. C o m isso, o naturalismo e o
historicismo críticos se op õ e m às abo rdagen s estilísticas voltadas, de forma exclusiva, a questões de
técnica ou arte literárias. A oposiç ão entre história e estética constitui um dos equívocos da crítica
brasileira de fins d o século passado. [...]. C o m o se não houvesse a possibilidade de constituição de
um méto do crítico capaz de realizar um equilíbrio entre história e estética, per m itindo apreender os
nexos entre literatura e sociedade, sem qu e uma seja reduzida à outra” . V E N T U R A , Roberto. Ba
charéis em luta: literatura c sociedade na geração de 1870 brasileira. Boletim Bibliográfico. Sã o
Paulo, n. 4 4 , v. 1/4 . p. 91. N a verdade, ''toda a nossa crítica naturalista, todo o nosso positivismo
crítico, q u a n d o deixa o c a m p o ex trem am ente fértil das pesquisas er uditas ou das explicações
etnográficas e sociológicas subsidiárias e parte para a avaliação das obras, não conseg ue superar o
nível primário das interpretações causalísticas, sejam elas apoiadas em pressupostos mesológicos ou
em ideais nacionalísticos. [...]. É que a linguagem crítica por eles instaurada, ao não se desdob rar
em m etalingu agem , perm anecendo antes colada , se pod em os dizer assim, àquela ‘ revalidação ideo
lógica’ referida por An tonio C â n d id o , se auto consu m ia em um modelo de explicação externa e, mais
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Na verdade, jamais deixar am de tentar uma participaç ão global, e ninguém, talvez, mais que Sílvio
Romero se voltava brutalm en te contra a especificação do trabalho crítico, definindo-a sempre co m o
preocupação unilateralm ente estética, obsessão da 'arte pela arte’ a que, num texto bastante superfi
cial, chegava a cham ar de ‘son ho polucional de maníacos ’. B A R B O S A , J. A. Op. cit. p. 91. Grifo no
original.
y) V E L O S O , M . P. Op. cit. p. 24 7.
/1°. Ibidem , p. 243.
. Ibidem , p. 2 46 -8. Sob re os projetos estéticos e ideológicos do moder nism o ver L A F E T Á , Jo ão
Luís. 1930: a critica e o modernismo. São Paulo: Duas Cid ad es, 1974. p. 1 1-27, e C Â N D I D O ,
Antonio. Literatura e sociedade. Ed. cit. p. 109-26.
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historiadores se debru çaram sobre a realidade histórica do país. O plane jamento desenvolvimentista,
típico d o período juscelinista, estará representado na obra de Celso Furtado; a co ncepção culturalista,
no livro de Sérgio Buarque de H ollanda; o nac ionalismo estará expresso na prod ução do IS E B [...],
aco lhendo tanto as análises marxistas or todoxas de Nelson Werneck Sodré, co m o as veiculadoras
por vezes de idéia do progressism o da burguesia nacional’ , c o m o as de Wanderley Guilher me e
Inácio Rangel; os textos de Jo s é Honório Rodrigues representariam, nesse contexto, a vertente e r u
dita do trabalhismo getulista, opondo-se de maneira candente à produção elitista dos Institutos
Históricos e Geo gráficos, e ao saber esclerosado - um ‘m odernizador’ nacionalista e p u gn ad o r do
revisionismo historiográfico. Hélio Vianna, representando a abo rd ag em tradicionalista e arcaica,
p od e ser co nsider ad o a antítese do revisionismo’ de José Hon ório. Mencione-se, ainda, R ay m u n d o
Faoro, co m o livro Os Donos do Poder [...] ( 1 9 5 8 ) que se tornará clássico, co lo cando seu Autor na
vertente weberiana de explicação do Brasil, em perspectiva h istórica”. M O T A , C arlos Guilh erm e.
Ideologia da cultura brasileira (1933-1974): pontos de partida para uma revisão histórica. 5. ed. Sã o
Paulo: Ática, 1985. p. 36-7.
H. Á V IL A , Afonso. O problema das Cartas chilenas. Minas Gerais , Belo Horizonte. 08 m a r . / 1973
( “ Su plem e n to Literário” , n. 4 4 3 , p. 7).
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s<> LAPA, Jo sé Roberto do Amaral. História e historiografia-, Brasil pós-64. Rio de Janeiro: Paz &
Terra, 1985. p. 69-70.
56 “ U m a sociedad e de estratificação co mplexa reclamava, na prática profissional do historiador, um
c o m p r om isso co m os seus pr ob le mas e angústias. Havia outros leitores qu e desejavam assumir um
lugar no proscê nio da História, tirando assim o exclusivo privilégio da burguesia, para qu em , até
então, era elaborado o co nhecim ento histórico, que deveria, por tanto, co rrespon der às aspirações
dessa classe, a fim de qu e pu desse ela se ver c o m o â responsável, aquela que, através dos seus agentes
e grupos, se projetava c o m o a única fautora d o processo!
“ Nessa linha ainda, p od em os verificar qu e vários temas, assim co m o a maneira pela qual tinham
sido abo rdad os, vão deixan do de se projetar no horizonte de trabalho d o historiador: o meio geográ
fico, as raças e etnias, a mestiçagem , deixam de assumir n núcleo explicativo e a concen tração da
pesquisa impírica. O u são relegados, ou passam a ser incorporados em ou tr os níveis de interpreta
ção. Este é bem o caso de eventos c o m o a Abolição, a Proclamação da Re pública, a Revolução de 30.
etc .’ . Jbidem , p. 74-5 . G rifo no original.
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se m p re a se c o m p le ta r no m o m e n t o m e s m o em q u e se abre para
novas leituras, no trajeto con texto-em issor-receptor. A ilustra
ção acred ito u q u e à razão c o m p e tia a retificação d o olhar e que
isto bastava. M o d e rn a m e n te sab em o s c o m o é difícil e c o m o nossa
percepção é relativizada. N o v o s precon ceitos, nova carga p sí
q u ic a to rn a m -n o s irrem ediavelm ente presas de nós m esm o s, sem
o c o n so lo d a crença na in ocên cia do olhar. C o m este relativismo,
q u e ir a m o s o u não, terem os de viver.57
Processo civilizatório
A sociedade mineira era, como se sabe, parte constitutiva de
/-A um cenário mais amplo marcado por permanentes trans-
formações. Ademais das profundas mudanças ocorridas nas
estruturas econômicas e políticas da época moderna —definidas
pelo avanço das relações capitalistas e formação dos estados naci
onais absolutistas —, vivia-se, na sociabilidade cotidiana, um pro
cesso de revisão dos valores e comportamentos. Tratava-se, para
utilizar expressão de Norbert Elias, de um momento particular
do “processo civilizatório” Segundo Elias, a aristocracia de al
guns países europeus —especialmente a França—passava por uma
espécie de refinamento dos hábitos devido às alterações que ocor
riam em sua composição como grupo social dominante. Dife
rentemente do caso alemão —no qual se verificou um menor con
tato entre a aristocracia e os grupos burgueses intermediários, o
que permitiu que estes forjassem sua própria “cultura” —, na Fran
ça, a mescla de grupos aristocráticos e burgueses implicou na
assimilação de novas posturas e na reformulação do grupo social
dominante como um todo. Passava-se da courtoisie — isto é, o
modo de se comportar em corte, herdado da Idade Média —para
os novos padrões da civilité.
Uma das conseqüências desta passagem foi a “tendência
cada vez maior das pessoas a se observarem e aos demais” o que,
para Elias, era
'Este texto serviu de base para alguns capítulos de nossa dissertação de mestrad o def en dida em
setembro de 1994. Muitas de suas idéias estão, portanto, melhor desenvolvidas nela. Cf. S IL V E IR A ,
M ar co A ntonio. O universo do indistinto: Estado e sociedade nas Minas setecentistas (1 7 3 5 - / 808). São
Paulo: USP, 1994.
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M inas setecentistas
Sem dúvida, a sociedade que se desenvolveu nas Minas
Gerais durante o Setecentos não deixou de se inserir neste deba
te. Sua população, embora formada, na maioria, por uma gente
pobre cuja vontade era alcançar riqueza e prestígio através do
acúmulo de ouro, também se constituía de membros da Corte e
gente bem sucedida. Estes, influenciados pelo refinamento fran
cês e desejosos de se distinguirem da rusticidade dos demais,
buscaram assimilar essa revisão dos comportamentos, enrique
cendo-a através de críticas às práticas do “vulgo’ Tal procedi
mento mostrava-se tanto mais necessário e premente à medida
em que se tomava consciência do estatuto colonial e escravista da
própria sociedade mineira.
Aliás, esta influência já havia sido constatada, no século
passado, pelo historiador Joaquim Felício dos Santos, atento à
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‘- 'H U I Z I N G A , Joan em O declínio da Idade Média. São Paulo, Ver bo/Edusp , 1978, p. 184-5 e 195,
fala em "pensam ento ” ou "m en talidad e simbólica” . S e g u n d o o autor, "na Idade M édia, a atitude
simbolista estava muito mais em evidência do que a atitude causai ou genética. N ã o qu e esta última
maneira de conceber o m u n d o c o m o processo de evolução estivesse com pleta m ente ausente. O
pensa m ento medieval tam bém procurava compree nder as coisas através das origens...To das as no
ções a respeito de c o m o u m a coisa provinha de outra tom avam a forma simplista da procriação ou
ramificação.” Mais adiante, continua: “ T u d o q u a n to podia ser pensado tomava a forma de imagem:
a co ncepção tinha-se tor nad o quase inteiramente depen den te da im agin ação...Q u and o o h om em da
Idade M é d ia quer co nhecer a natureza ou a razão de um a coisa não a observa para lhe analisar a
estrutura íntima, nem para inquirir sobre as suas origens; olha antes para o céu ond e ela brilha c o m o
idéia. Q u er se trate de uma qu estão política, moral ou social o primeiro passo a dar é reduzi-la
sempre ao seu princípio universal.”
IOC O E L H O , Teixeira. Op. cit. p.4 3 5 . D oc u m en tos (C arta de G o m e s Freire a M artinh o de M e n
don ça de 12 de julho de 1736). RAPM, an o 16, p.24 3 , 1911. Mais um, dentre os inúmeros ex em
plos possíveis, pode ser apontado: “ Pelo que toca aos ciganos me a c o m o d o por hora co m o parecer
de V.S.; por ém , em pod en do havemos de deitar fora essa má casta. p. 272.
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12Cf. G E E R T Z , Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978, cap. “A ideologia
co m o sistema cultural ”. O autor, crítico do funcionalismo em especial do que d enom in a de "teoria
da tensão” e do “ interesse” , pr opõe uma "teoria ex trínse ca”, ou seja, a idéia de que o sím bolo , ao
invés de pr od uto intrínseco da mente h u m ana é, na verdade, elemento d o público, capaz de criar
uma rede de significados sociais. De ssa forma, ideologia são mod elos simbólicos sistematizados que
orientam e dão se ntido a uma determinada vida social. Surge m, aliás, nos m om entos em que a
sociedade está perden do sua orientação. Embora Gee rtz não co nceba ideologia apenas co m o espaço
do político, sugerin do a existência de ideologias morais, estéticas, ec onôm icas, etc., não deixa de
acrescentar que “muito pou cas ideologias de algum a pr oeminência social se ressentem da falta de
implicações políticas.” p. 190, nota 4 1
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'•*" 1 74 2: Devassa ex-ofício que tirou o juiz ordinário o Alferes Francisco Ferreira Velho pelas feridas
que se dera [sic] de noite em Bernarda do Espírito Santo na Rua de São Jo s é .” C ó d ic e 4 4 9 auto n.
9 3 7 1 . As referências à d ocu m en ta ção manuscrita advêm de trabalho realizado no arquivo da C asa
do Pilar, Museu da Inconfidência (M 1C P).
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|7Huizinga discute, para a Idade M éd ia , qu estão correlata a esta. Para ele, ‘existiam duas cam adas
sobrepostas de civilização, não ob stante serem contraditórias. Ao lado do estilo cortês, de origem
literária e recente, as formas primitivas da vida heróica mantiveram a sua força; porqu e um a civili
zação co m plic ad a co m o a dos fins da Idade M éd ia não pode deixar de ser herdeira de uma infinida
de de concepç ões, motivos, formas eróticas que ora co lid iam ora se m istu ravam .” Op. cit. p. 103.
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'^Os dad os referentes a S aldanha são tirados da consulta e transcrição de um sem -n úm ero de proces
sos em qu e aparece co m o autor no MICP.
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:uO padre D o m in g o s Sim ões da C un ha: O que ch am am branquidade. RAPM, ano 14, p.4 14 . 1909.
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cadernos do ieb
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Tradição emodernidade
na obra de Tomás Antônio Gonzaga
Ronald Polito
H istó ria / U F O P
5
ão poucos os casos na história da literatura e das idéias no
Brasil que despertam tantas controvérsias como Tomás A n
tônio Gonzaga. Autor de textos em grande medida dife
rentes entre si, Tomás Gonzaga legou à posteridade problemas
interpretativos intrincados acerca de suas intenções literárias, bem
como das ações que praticou durante sua vida. As poucas parti
cularidades conhecidas de sua biografia e de seus escritos colabo
raram, também, para o enorme enigma que o cerca, o que vem
gerando, em sua fortuna crítica e eventuais biografias, padrões
interpretativos diversos e, por que não dizer, opostos. É provável
que o próprio autor tenha colaborado para disseminar tanta di
ferença. Pense-se, por exemplo, em seu silêncio em torno das
edições sucessivas de M arília de D irceu, publicadas ainda duran
te sua vida, o que levou Alexandre Eulálio a considerá-lo o nosso
Rimbaud.
De que Tomás Antônio Gonzaga falamos, então, quando
estamos aqui reunidos para lembrar seu nascimento? D o poeta
arcádico, pré-romântico ou romântico, como querem alguns,
autor de M arília de D irceu, um dos maiores sucessos literários
em língua portuguesa? Do suposto defensor do despotismo es
clarecido, ao redigir seu Tratado de Direito Natural?. D o represen
tante de um dito Iluminismo na colônia, como tem sido cada
vez mais recorrente nos textos atuais sobre sua obra? D o poeta
satírico das Cartas chilenas, a um só tempo erudito, popular e
mesmo carnavalizante, panfletário de Vila Rica pela causa dos
conjurados mineiros? D o degredado apaixonado e louco, como
quer a crítica romântica, incapaz de versejar e que escreveu um
poema inédito sobre o naufrágio da nau M arialva? De alguém
cuja obra e biografia se esclarecem reciprocamente? Ou de um
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c a d e r n o s do ieb
h o m e m v e n a l, e s p e r t o , o p o r t u n i s t a , à e s p e r a d e tirar o m e l h o r
lu c r o d e q u a l q u e r s i t u a ç ã o ? C o m o se vê, s ã o p o s s í v e i s m u i t a s
b io g r a fia s e in te rp re ta ç õ e s d e se u s texto s, o q u e in d ic ia a p r ó p ria
riq u eza de su a v id a e o b r a c o m o , ig u a lm e n te , os vário s c o n d ic io
n a m e n t o s a n a l í t i c o s q u e o r g a n i z a r a m o s d i s c u r s o s s o b r e as le tr a s
e “p e r s o n a g e n s ” d a h i s t ó r i a d o p a ís.
Q u e i n t e r p r e t a ç ã o s e g u ir , p o r t a n t o ? E m p r i n c í p i o , n e n h u
m a d e s t a s , m a s ta lv e z u m a o u t r a , c o n s t i t u í d a a p a r t i r d a c o m b i
n aç ã o p a rtic u la r d e e le m e n to s q u e c o n s ig a m obter, ao m e n o s,
a lg u m a s c o n c lu sõ e s m a is n ítid as e q u e n ão a p r isio n e m su a v id a e
o b ra n u m a u n id a d e de coerên cia o b lite ra d o ra de su a d iv ersid ad e
real. D e s s e p o n t o d e v i s t a , t a m b é m n ã o h á s í n t e s e e m u m a m e r a
re u n iã o eclética d as c o n c lu sõ e s d e o u tr o s an alistas, n u m a u n id a
d e d e c o e r ê n c i a o b l i t e r a d o r a d e s u a d i v e r s i d a d e real. D e s s e p o n
to d e v i s t a , t a m b é m n ã o h á s í n t e s e e m u m a m e r a r e u n i ã o e c lé t ic a
d a s c o n c l u s õ e s d e o u t r o s a n a l i s t a s , n u m a a s s i m i l a ç ã o li n e a r d a
t r a d iç ã o . I s t o é o q u e h á d e p i o r e n q u a n t o c o n c e p ç ã o d a h i s t ó r ia ,
p o is o c u lta a d e s c o n tin u id a d e in erente à n o ssa relação c o m o
p a s s a d o e o q u e d e le q u e r e m o s o u p o d e m o s le m b r a r . Q u a n d o
pen so , p o rta n to , n a p o ssib ilid a d e d e efetuar u m a o u tra in terp re
taç ão , n ão a t o m o a p e n a s c o m o o u tra , m a s t a m b é m c o m o m ais
fa c tív e l, e m a l g u n s a s p e c t o s , q u e as a n t e r i o r e s , a i n d a q u e n ã o a
ú n i c a p o s s í v e l, o q u e s e r ia u m c o n t r a - s e n s o .
P r e t e n d o a b o r d a r , e s t r it a m e n t e , d o i s a s p e c t o s d e a l g u n s e s
c rito s d e T o m á s A n t ô n i o G o n z a g a : o Tratado de Direito Natural,
M arília de Dirceu, as Cartas chilenas e A Conceição (o n a u f r á g i o d o
Marialva), r e t o m a n d o , e m p a r te , p e s q u i s a s q u e a n t e r i o r m e n t e d e
se n v o lv i e m t o r n o d e s u a o b r a . A i n d a q u e c o n h e ç a d iv e r s o s d o c u
m e n t o s d e o u s o b r e G o n z a g a , b e m c o m o as p r i n c i p a i s b i o g r a f i a s
q u e lhe d e d i c a r a m , n ã o c reio ser p o ssív e l u m a r e n o v a ç ã o d e e s t u
d o s b i o g r á f i c o s e m s e u c a s o , n e m d a s re la ç õ e s e n tr e s u a b i o g r a f i a e
s u a o b r a . S ã o p a r c o s o s e l e m e n t o s q u e t e m o s a r e sp e ito , raro s o s
d o c u m e n t o s sig n ific a t iv o s . D e s v e n c i l h o - m e , t a m b é m , d e u m d o s
m a io r e s o b s t á c u l o s à c o m p r e e n s ã o d e se u s tex to s, q u a l seja, d a a b o r
d a g e m típ ic a d o s é c u lo p a s s a d o , p o r vezes r o m â n t i c a , p o r vezes
p o sit iv ista , q u e b u s c a d e d u z i r as o b r a s d a s a ç õ e s v i v id a s d e f o r m a
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* * *
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B u s c a n d o sin t e t iz a r este s a s p e c t o s a b o r d a d o s , d ir ia q u e as
d if e r e n ç a s e a n t a g o n i s m o s p r e s e n t e s e n tr e o s t e x to s d e G o n z a g a ,
103
c a d e r n o s do ieb
Cecília de L a r a
P rofesso ra A ss o c ia d a d o D e p a r t a m e n t o de Letras C lá s sic a s e
V e r n á c u la s d a F a c u l d a d e de F ilo s o f i a , L e t r a s e C i ê n c i a s
F lu m a n a s d a U n iv e r sid a d e de S ã o P au lo. P u b lic a ç ã o m a is
recente: Pressão afetiva & aquecimento intelectual (cartas de A.
M a c h a d o a P r u d e n te de M o r a e s, n eto) ( E D U C / P U C / E d .
G io r d a n o )
J oa ci Per e i r a Furtado
D o u t o r a n d o e m H is t ó r ia so cial pela U n iv e r s id a d e de S ã o
Paulo. A u to r de Uma república de leitores (H u c ite c ) p r ê m io s
M o in h o Sa n tista / 1 9 9 6 e J a b u t i / 1 9 9 8 - e o r g a n iz a d o r d a n ova
edição das Cartas Chilenas de T o m á s A n t ô n i o G o n z a g a
( C o m p a n h i a das Letras).
Ronald P oli t o
M estre em H istó ria pela U n iv e r sid a d e Federal F lu m in e n se .
105
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M aria Lúcia Fernandes Guelfi - Novíssima: estética e ideologia na década de
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Telê Porto Ancona Lopez (org.) - Manuel Bandeira: verso e reverso, 1987.
próximos lançamentos